a arte que recria a vida: mediação cultural na comunidade do tomé/chapada do apodi-ce

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1 A arte que recria a vida: mediação cultural na comunidade do Tomé/Chapada do Apodi-CE Fernando Antônio Fontenele Leão Orientadora: Profa. Dra. Carmen Maria Saenz Coopat Co-orientadora: Profa. Dra. Raquel Maria Rigotto RESUMO O artigo apresenta uma pesquisa-ação em mediação cultural realizada no ano de 2014, na comunidade do Tomé, localizada na Chapada do Apodi, Baixo-Jaguaribe cearense. Desde a década de 1980, essa região sofre os impactos da expansão do modelo agroexportador que tem provocado processos de desterritorialização, perda da autonomia e imposto significativas mudanças culturais para as comunidades. Com o objetivo de contribuir para o fortalecimento comunitário por meio do desenvolvimento de uma consciência crítica e estética coletiva, a presente pesquisa-ação se conformou como um processo que envolveu apresentações em diversas linguagens artísticas (teatro, poesia, música, performance), atividades de arte/educação com crianças, adolescentes e profissionais das escolas da região e ações de valorização da cultura local. Ao longo do percurso fizemos uso da observação participante, do diário de campo, de entrevistas individuais e coletivas e pesquisa bibliográfica. PALAVRAS-CHAVE Cultura popular. Mediação cultural. Comunidade do Tomé. ABSTRACT The article presents a research-action on cultural mediation, held in the year 2014, in the community of the Tome, Ceará, Brazil. Since the Decade of 1980, this region suffers the impacts of the expansion of the agricultural model that has caused processes of deterritorialization, loss of autonomy and imposed significant cultural changes for the communities. Our goal is to contribute to the community-building through the development of an aesthetic awareness. This research-action conformed as a process which artistic presentations (theater, poetry, music, performance), artistic education activities with children, young people and professionals from the schools in the region and actions of appreciation of local culture. Along the way made use of participant observation, field journal, of individual and collective interviews and bibliographical research. KEYWORDS Popular culture. Cultural mediation.Comunidade do Tomé.

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O artigo apresenta uma pesquisa-ação em mediação cultural realizada no ano de 2014, na comunidade do Tomé, localizada na Chapada do Apodi, Ceará, Brasil

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Page 1: A arte que recria a vida: mediação cultural na comunidade do Tomé/Chapada do Apodi-CE

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A arte que recria a vida: mediação cultural na comunidade do Tomé/Chapada do

Apodi-CE

Fernando Antônio Fontenele Leão

Orientadora: Profa. Dra. Carmen Maria Saenz Coopat

Co-orientadora: Profa. Dra. Raquel Maria Rigotto

RESUMO

O artigo apresenta uma pesquisa-ação em mediação cultural realizada no ano de 2014, na

comunidade do Tomé, localizada na Chapada do Apodi, Baixo-Jaguaribe cearense. Desde a

década de 1980, essa região sofre os impactos da expansão do modelo agroexportador que

tem provocado processos de desterritorialização, perda da autonomia e imposto significativas

mudanças culturais para as comunidades. Com o objetivo de contribuir para o fortalecimento

comunitário por meio do desenvolvimento de uma consciência crítica e estética coletiva, a

presente pesquisa-ação se conformou como um processo que envolveu apresentações em

diversas linguagens artísticas (teatro, poesia, música, performance), atividades de

arte/educação com crianças, adolescentes e profissionais das escolas da região e ações de

valorização da cultura local. Ao longo do percurso fizemos uso da observação participante, do

diário de campo, de entrevistas individuais e coletivas e pesquisa bibliográfica.

PALAVRAS-CHAVE

Cultura popular. Mediação cultural. Comunidade do Tomé.

ABSTRACT

The article presents a research-action on cultural mediation, held in the year 2014, in the

community of the Tome, Ceará, Brazil. Since the Decade of 1980, this region suffers the

impacts of the expansion of the agricultural model that has caused processes of

deterritorialization, loss of autonomy and imposed significant cultural changes for the

communities. Our goal is to contribute to the community-building through the development of

an aesthetic awareness. This research-action conformed as a process which artistic

presentations (theater, poetry, music, performance), artistic education activities with children,

young people and professionals from the schools in the region and actions of appreciation of

local culture. Along the way made use of participant observation, field journal, of individual

and collective interviews and bibliographical research.

KEYWORDS

Popular culture. Cultural mediation.Comunidade do Tomé.

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1. Chegando à comunidade

Em algumas ocasiões, nos anos de 2012 e 2013, visitei a comunidade do Tomé,

situada no estado do Ceará, na Microrregião do Baixo Jaguaribe, sobre a Chapada do Apodi.

Minha companheira fazia ali a pesquisa de campo de seu projeto de mestrado e trabalhava

junto a um grupo de moradores. Em uma das visitas, convidado a conduzir uma atividade de

acolhida do grupo, cantei Solencanto1, do Pingo de Fortaleza, e propus uma performance

artística com dois elementos: água e tambor. Solencanto nos convidava a refletir sobre as

adversidades e sobre ver o mundo com outros olhos, a água libertava o coração das mágoas do

passado e nos vivificava para, ao som do tambor, seguir rumo às lutas de resistência. Aquela

comunidade – para mim, naquele momento – era ainda apenas um luto pelo assassinato do

agricultor e ambientalista Zé Maria, um de seus líderes que morrera em 2010 e que devotara

quase uma década de sua vida à denuncia dos riscos causados pelo uso indiscriminado de

agrotóxicos naquele território após a chegada de empresas do agronegócio2. Ao fim daquele

encontro, sensibilizado, aventei a possibilidade de iniciar um trabalho de teatro com os

jovens, ainda sem saber de que maneira eu poderia viabilizar aquele projeto, dado a distância

em relação à Fortaleza, as minhas atividades profissionais, o custo das viagens, etc.. De todo

modo, eu pensava que seria uma boa estratégia de ação mobilizar a juventude em torno da

temática dos problemas socioambientais, a partir do método do Teatro do Oprimido3, e, em

seguida, envolver toda a comunidade por meio da apresentação de cenas de teatro-fórum4. O

projeto ficou engavetado por alguns meses até que em novembro de 2013, como aluno do

Curso de Especialização em Cultura Popular, Arte e Educação do Campo - Residência

Agrária, na Universidade Federal do Cariri (UFCA), consegui uma bolsa de Apoio Técnico

em Extensão (ATP-A)/CNPq, para desenvolver esse projeto.

1 “São muitas estações na vida. Na Terra, quantas situações. Nem sempre tudo está a nos favorecer, mas o dia

pode ser o que se quer. O sol está nos olhos de quem brilha, o céu está nos olhos de quem ver no sol a poesia da alegria de viver”. Solencanto, ou Canto ao Sol, é uma composição do cantor, poeta e pesquisador musical cearense João Wanderley Roberto Militão, conhecido como Pingo de Fortaleza. 2 Na década de 1990, empresas agroexportadoras nacionais e transnacionais foram atraídas à região pelas

condições climáticas, pela fertilidade das terras, e, principalmente, por incentivos fiscais e pela infraestrutura oferecida pelos governos estadual e federal – a citar a implantação do Perímetro Irrigado Jaguaribe-Apodi (PIJA) –, fenômeno esse que provocou uma série de problemas socioambientais como contaminação da água e do solo, relações de trabalho precárias, expropriações, violência. 3 O Teatro do Oprimido é um método que reúne jogos, exercícios e técnicas teatrais, sistematizado pelo

teatrólogo Augusto Boal, e cuja finalidade é adquirir a consciência das situações de opressão e ensaiar as possibilidades de libertação. 4 O Teatro-fórum é uma das técnicas do Teatro do Oprimido e consiste na participação direta do público,

intervindo cenicamente no lugar do personagem oprimido.

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Em dezembro de 2013, numa conversa com amigos do Núcleo Tramas5, grupo

que se dedica a pesquisas sobre os impactos dos agrotóxicos e do agronegócio na Chapada do

Apodi desde 2007 – e que muito me instigou para a ação naquele território – surgiu, além da

percepção de que os jovens tinham pouca participação nas ações políticas da comunidade – o

que justificava o projeto que eu pensara – um dado importante e um tema a ser considerado no

trabalho: o medo. De acordo com pesquisas recentes do Núcleo,

O assassinato de Zé Maria aumentou o clima de insegurança e medo na comunidade

do Tomé (...). Além do medo da violência física, a população teme represálias como

o corte no abastecimento de água ou processos de demissão em massa contra os

trabalhadores. Embora reconheçam a contaminação das águas como uma ameaça à

vida e à saúde, tanto que a população é categórica ao afirmar que esse é atualmente o

maior problema vivido por eles, o medo imposto pela violência simbólica exercida

pelos agentes de poder tem conseguido neutralizar as estratégias coletivas de

enfrentamento (MELO, 2013, p. 20).

Este seria um fator responsável por afastar os jovens dos movimentos sociais? Falei, então,

sobre a técnica intitulada Arco-Íris do Desejo, ou Método Boal de Teatro e Terapia, que

poderia – juntamente com os outros exercícios do Teatro do Oprimido – favorecer os jovens

participantes do projeto a ganharem consciência e compreensão desse problema, a fim de

superá-lo. O grupo considerou uma boa estratégia e acordamos uma data em que eu pudesse

apresentar minha proposta à comunidade e ao M216, movimento que congrega diversas

instituições e atores sociais em torno da problemática perpetrada pelo estabelecimento do

agronegócio na região do Baixo-Jaguaribe. Àquela altura, organizei algumas ideias, as

principais referências e as questões iniciais para dar início ao projeto. Meu propósito era o de

intervir, por meio de uma pesquisa-ação e a partir de atividades teatrais, para a mobilização da

juventude em favor das lutas da comunidade.

Em fevereiro de 2014, apresentei essas ideias na comunidade do Tomé

enquanto uma proposição. Eu compreendia, a partir de Paulo Freire, que “a autossuficiência é

incompatível com o diálogo. Os homens que não têm humildade ou a perdem, não podem

aproximar-se do povo. Não podem ser seus companheiros de pronúncia do mundo” (FREIRE,

2005, p. 93). E sabia, pois, que precisaria acolher os saberes e os anseios daquelas pessoas,

5 Núcleo Tramas – Trabalho, Meio Ambiente e Saúde é um núcleo de pesquisa do Departamento de Saúde

Coletiva da Universidade Federal do Ceará, sendo coordenado pela Profa. Dra. Raquel Maria Rigotto, co-orientadora deste trabalho. 6 M21 ou Movimento 21 é formado pela CPT - Comissão Pastoral da Terra, MST - Movimento dos

Trabalhadores Rurais Sem Terra, Cáritas Diocesana de Limoeiro do Norte, CSP-CONLUTAS - Central Sindical e Popular, Faculdade de Filosofia Dom Aureliano Matos – FAFIDAM/UECE e Núcleo Tramas/UFC, sendo o nome do movimento uma referência à data de 21 de abril de 2010, dia em que o agricultor e líder comunitário Zé Maria do Tomé foi assassinado.

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que a ação precisava se estruturar conjuntamente, que se tratava de um trabalho ‘com’ a

comunidade e não ‘sobre’ ou ‘para’ a comunidade. As pessoas ali presentes receberam com

menos entusiasmo do que eu imaginei (ou que eu queria, talvez com certa vaidade um tanto

comum em artistas e acadêmicos), mas considerou uma boa proposta para ser realizada com

os jovens das escolas, do 6º ao 9º ano. Pensamos, então, junto ao M21, as primeiras atividades

que seriam o start do projeto e que, ao mesmo tempo, poderiam integrar a programação da

Semana Zé Maria, ação anual organizada para lembrar a luta do companheiro morto e a falta

de punição aos criminosos. Voltei à Fortaleza, sem saber ao certo como iria desenvolver as

ações. Mas animado pelo passo importante que tínhamos dado. O projeto havia sido

apresentado e tínhamos dado o pontapé inicial para a sua realização.

2. Do projeto de teatro ao projeto de mediação cultural

Iniciei uma série de estudos e articulações para me aproximar dos temas

ligados às comunidades da Chapada do Apodi. Li uma série de artigos (RIGOTTO, 2011) que

apontavam a crescente perda de autonomia das comunidades no sentido da gerência de seu

potencial ecológico e na determinação de suas necessidades; participei do Encontro dos

Territórios em Conflito - Chapada do Apodi, Tabuleiro de Russas e Figueiredo7; também

minha companheira havia me falado sobre uma professora e gestora de uma escola da região

que havia sido uma grande parceira do Núcleo Tramas em ações anteriores, e marquei um

primeiro encontro com ela (pela indicação da comunidade de realizar o projeto com alunos do

6º ao 9º ano, contatar uma gestora de uma escola era um importante contato).

Voltei à comunidade do Tomé, onde conversei com uma das responsáveis pela

Associação Comunitária São João do Tomé, com uma poetisa da comunidade que me

apresentou tantos poemas, lendas e narrativas que eu não conhecia, com a família de Zé

Maria. Conheci alguns jovens, e falei sobre meu desejo de criar um grupo de teatro no Tomé –

pensei que expressando assim seria mais compreensível do que falar das especificidades do

projeto. Fui apresentado a um secretário de educação e a um secretário de cultura da região, a

técnicos de secretarias municipais de educação, a diretoras e professoras de arte de escolas da

7 Reunião com lideranças comunitárias de comunidades do Baixo-Jaguaribe, organizada pela Cáritas Diocesana

de Limoeiro do Norte, e realizada na data de 27 de fevereiro de 2014, em Limoeiro do Norte.

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região. Com algumas exceções, muitas pessoas que encontrei e conversei demonstravam

algum desconforto quando eu falava na proposta de mobilizar os jovens para as causas

socioambientais. Senti certa preocupação – velada – por parte das diretoras das escolas em

envolver os alunos em atividades diretamente relacionadas à Semana Zé Maria, talvez por

temerem alguma reclamação dos pais ou de seus superiores8. Um gestor municipal foi,

pessoalmente, em uma das primeiras ações públicas que realizamos me fazer três perguntas:

“quem eu era”, “porque estava ali” e “como havia chegado ali”. Soube de algumas pessoas

que, ao saberem que o projeto se ligava de algum modo aos conflitos socioambientais, já

reagiam desfavoravelmente à execução do trabalho na comunidade. Por fim, nas três vezes

que marcamos encontro com os jovens para dar início à prática com as atividades teatrais –

seja pelo fato de ter ligação com as causas associadas ao Zé Maria, pela necessidade de

trabalhar ou estudar nos horários marcados, por falta de interesse, ou outros motivos que não

identificamos –, em duas ocasiões, nenhum jovem compareceu, numa terceira, apenas um

jovem esteve presente.

Ali começava um grande aprendizado. Pensei que talvez tivesse escolhido o

projeto errado, avaliando se seria possível mudar os rumos da pesquisa, sem saber como

realizar as atividades que eu já havia me comprometido junto ao M21. Eu me indagava

continuamente: seria o medo que neutralizava “estratégias coletivas de enfrentamento” –

problema levantado pelo Núcleo Tramas – que se apresentava na situação? Se as pessoas

viviam sob um clima de tensão e medo, como esperar que elas aceitassem se expor – em cena,

diante de uma plateia – para tratar de temas tão fortes e polêmicos? Eu estava preparado para

acolher as ideias das pessoas, a fim de melhorar o projeto que havíamos pensado, mas não

tinha imaginado a possibilidade de mudar de projeto. As pessoas da comunidade não haviam

se interessado pela ideia? Mas por quê? Se a ideia era tão boa? Bom, isso era o que eu

pensava e julgava a partir de minha visão. Em se tratando de pesquisa-ação,

As questões-problema, norteadoras da investigação, não são formuladas a priori, da

mesma forma que não são sugeridas hipóteses a serem testadas ou confirmadas. (...)

Na pesquisa-ação, as hipóteses são formuladas com base na problematização do

cotidiano, na cultura dos participantes, nas discussões coletivas, nas observações

participantes (MIRANDA, 2012, p. 16).

8 A comunidade do Tomé ainda sofre o desenrolar da ação judicial que decorre do assassinato de Zé Maria do

Tomé, em 21 de abril de 2010. Um importante empresário do agronegócio na região foi denunciado pelo ministério público como possível mandante do crime e é comum ouvir depoimentos de ações de intimidação a cada audiência de testemunhas, intimações, novas vistas ao processo, etc..

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E eu, tendo levado o ‘desenho bonitinho’ do projeto que pretendia realizar, a partir do pouco –

ou nada – que eu conhecia daquela comunidade, como querer que o trabalho representasse os

anseios daquelas pessoas?

Três pessoas foram se mostrando cada vez mais interessadas em contribuir do

modo como lhes era possível, me indicando caminhos plausíveis para uma ação cultural na

comunidade do Tomé: a gestora da escola, a integrante da associação comunitária e a poetisa.

Era a constituição – um tanto espontânea, por isso mesmo mais bela – do “pesquisador

coletivo”, de que trata BARBIER (2002)9, designado neste trabalho de Grupo Pesquisação, e

com isso fui me tranquilizando em relação aos desafios que iríamos (agora, no plural)

enfrentar. Não eram aqueles desafios que eu havia imaginado no primeiro ou no segundo

momento, decerto, mas eram os necessários a serem enfrentados por uma situação nova e

original.

Esse diálogo me apresentava a comunidade como eu ainda não conhecia e me

colocava diante de Paulo Freire ao afirmar que “será a partir da situação presente, existencial,

concreta, refletindo o conjunto de aspirações do povo, que poderemos organizar o conteúdo

programático da educação ou da ação política” (FREIRE, op. cit., p.100). Pois a situação

presente e aquelas três pessoas me mostravam que deveríamos mudar de perspectiva. O

trabalho a partir de um teatro com viés político claramente definido se mostrava inviável, e

talvez devêssemos seguir um caminho oposto ao da proposição inicial. Se antes víamos a

participação nas lutas sociais como o motor para o fortalecimento da comunidade, agora,

nosso objetivo passaria a ser, primeiramente, o de fortalecer a comunidade, por meio do

desenvolvimento de uma consciência crítico-estética, fomentando uma postura comprometida

com o ambiente.

O projeto que foi sendo pensado no coletivo, então, caminhou no sentido de

oferecer à comunidade – em seu conjunto, não mais apenas à juventude, e abrindo ainda à

participação de outras comunidades do entorno (também impactadas pelo modelo do

agronegócio) – experiências estéticas, afetivas e significativas, que estimulassem mudanças

nos hábitos culturais construídos com pauta numa realidade problemática de perda de

autonomia do seu próprio território, de drásticas alterações nas práticas produtivas, de

ressignificação de valores, de contaminação da água e da terra, de violência, de medo.

9 Para Barbier (2002), o pesquisador coletivo é um modo de organização do trabalho que busca assegurar a

maior participação do grupo envolvido na construção coletiva do processo de pesquisa e na sua continuidade.

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Desvelávamos em nossas conversas a demanda do coletivo, ou seja, um projeto

de mediação cultural que intentasse promover diálogos interculturais, favorecer reflexões e

percepções acerca do mundo, fortalecer a identidade coletiva, estimular a criatividade, instigar

à prática cultural. Sabíamos que essas questões trabalhadas a contento poderiam levar a uma

autonomia de ação, abrindo possibilidades futuras para o engajamento crítico aos movimentos

de lutas. E concordávamos que

Nosso papel não é falar ao povo sobre a nossa visão do mundo, ou tentar impô-la a

ele, mas dialogar com ele sobre a sua e a nossa. Temos de estar convencidos de que

a sua visão do mundo, que se manifesta nas várias formas de sua ação, reflete a sua

situação no mundo, em que se constitui. A ação educativa e política não pode

prescindir do conhecimento crítico dessa situação, sob pena de se fazer “bancária”

ou de pregar no deserto (FREIRE, op. cit., p. 100).

Essa percepção de que a ação político-cultural deveria se dar a partir do diálogo com a

comunidade estava cada vez mais clara, e o Grupo Pesquisação ganhava ânimo para gestar

uma realidade nova para o Tomé, tendo a arte como catalisadora desse sonho.

3. O coletivo transformando ideia em ação

“Se cada ser carrega em si o dom de ser capaz e ser feliz” (SATER;

TEIXEIRA, 1990), como possibilitar a essa comunidade o encontro com a capacidade e a

felicidade ou o encontro com o que isso representa em termos de autonomia e liberdade?

Fomos nessa “toada” compondo nossa pesquisa-ação em mediação cultural.

A escolha do método foi motivada pela compreensão de que a pesquisa-ação é

“uma maneira filosófica de existir e de fazer pesquisa interdisciplinar para um pesquisador

implicado” (BARBIER, op. cit., p. 85), nos situando no polo oposto ao do paradigma

cientificista que estabelece uma ruptura epistemológica entre senso comum e conhecimento

científico e persegue pretensa neutralidade e objetividade alheias aos problemas reais do

cotidiano; ao tempo que nos alinhamos com um modelo contra-hegemônico de ciência,

fomentador de um conhecimento que se constrói com o outro, democraticamente,

comprometido com as causas da emancipação social.

O trabalho foi desenvolvido, em sua totalidade, coletivamente pelo Grupo

Pesquisação, integrado por mim, pela gestora da escola, por uma integrante da associação

comunitária São João do Tomé e pela poetisa. Em momentos pontuais, quando da necessidade

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de equipamentos, organização do espaço em que aconteciam as atividades, divulgação,

avaliação, esse grupo se ampliava e contava com a presença de outros moradores da

comunidade. Apesar de o Grupo Pesquisação não contar com encontros formais e regulares,

mantinha um diálogo constante, pessoalmente – entre os que residiam na comunidade – e/ou

via internet, uma vez que a comunidade do Tomé ainda não contava com área de telefonia

celular à época da pesquisa.

A primeira questão que nos surgiu se relacionava ao programa de ações que

íamos executar (talvez, por nosso perfil coletivo mais prático que teórico), e tentamos

identificar tais ações a partir da observação participante, de entrevistas individuais e coletivas

semi-estruturadas e, principalmente, de conversas informais com moradores da comunidade

(entre eles, e especialmente, os próprios sujeitos do Grupo Pesquisação).

Em uma conversa informal, uma jovem de 20 anos havia dito que nunca tinha

visto teatro lá no Tomé, com exceção de algumas breves representações da Igreja na Semana

Santa. A ausência de apresentações artísticas na comunidade também foi reforçada por outros

moradores. Essa constatação era a indicação de que precisávamos, antes de tudo, garantir o

acesso da comunidade às obras culturais. Então, pensamos em a) organizar uma série de

apresentações artístico-culturais, na Praça da Matriz da comunidade do Tomé, favorecendo o

acesso a expressões artísticas e estimulando o diálogo entre as representações do que é

apresentado e as representações do público a que se destina, ou seja, além das apresentações,

queríamos dar algumas informações sobre o artista/grupo, fazer reflexões, questionar,

comparar, etc.;

Em uma entrevista coletiva com nove professoras de artes de escolas das

comunidades do Tomé e de Cercado do Meio, realizada no dia 28 de março de 2014, uma

professora demonstrou certa insatisfação por perceber predisposições dos alunos para certas

linguagens artísticas e não poder auxiliá-los no desenvolvimento dessas habilidades, devido a

falta de formação específica na área de arte/educação. Diz a professora que

(...) muitos alunos têm o dom da pintura, do desenho, dos versos, da escrita, mas nós

não sabemos resgatar desse aluno, porque nós não tivemos aquela formação básica

para buscar do aluno. (...) Eu gosto de trabalhar com artes, mas sinto essa

dificuldade, porque não tive formação. Nós não temos formadores [na Secretaria

Municipal de Educação] dentro dessa área [de artes]. (depoimento de professora de

artes, durante entrevista coletiva, na comunidade do Tomé, em 28/03/2014).

Ficava clara a deficiência da política de educação do município, e definimos que seria muito

importante b) oferecer atividades de arte/educação a crianças e adolescentes, de modo a

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fortalecer o impulso criador e a percepção de si e do mundo; e c) promover momentos de

reflexão e estudo acerca de artes para professores da educação básica, a fim de contribuir com

o aperfeiçoamento de sua prática didática;

Figura 1 - Entrevista coletiva com professoras de arte, na comunidade do Tomé (2014)

Em uma entrevista individual, no dia 28 de fevereiro de 2014, a poetisa

demonstrava um descontentamento relacionado à falta de interesse das pessoas pelas

narrativas, pelos versos, pelos dramas populares que já não mais eram cantados naquela

comunidade. Ela falava com saudosismo de quando era dramista e representava por horas a

fio, às vezes, repetindo a mesma canção diversas vezes, tamanho era o interesse do público, e

teceu críticas às escolas.

(...) os meninos dos colégios, de vez em quando eles chegam: - “Dona M., faça um

versinho pra mim a respeito ‘disso assim’, que a professora pediu...”. Ali, de

repente, eu faço, eles passam à limpo, e pronto, tiram uma nota boa... (risos). Mas

tudo isso podia ter dentro da sala de aula, né? Eu não tenho vergonha, eu não me

importava se o professor chegasse... – “M., hoje vá dar uma ajuda a nós, contar uma

história, ler um verso, brincar com os meninos um pouco”. Mas quê? Eu é que não

vou chegar de gaiata, dizendo: - “Muié, eu vim contar história pros teus alunos

hoje”. Não tem nem sentido. Mas tudo isso são coisas que davam pro colégio

aproveitar, e eu acredito que não é possível que no meio de duzentos e tantos alunos

não tivesse um que se interessasse, porque tem. Não faz é ser estimulado. Mas tem.

Porque quando eles vêm pra a gente fazer um pedacinho de conversa, eles acham

bom. Quando dá fé, vem dois, mais três, e porque não no colégio? Não tem

incentivo. Os professores parece que faz aquela aula por obrigação, pra ver se

termina aquele horário, pra ir embora, e pronto, né? (depoimento de Dona M.,

poetisa, durante entrevista individual, na comunidade do Tomé, em 28/02/2014).

Por fim, decidimos que íamos d) registrar alguns poemas e dramas que já não eram mais

cantados a fim de apresentá-los à comunidade, valorizando e estimulando as produções

artísticas e culturais locais.

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De acordo com Miranda,

Para Kurt Lewin, a pesquisa-ação é um processo em espiral que envolve três fases: a

primeira é a fase do planejamento, quando o pesquisador reconhece a situação e a

problemática que a constitui. A segunda é a fase da tomada de decisão, possível a

partir do conhecimento da situação. A terceira é a fase de encontro dos fatos, quando

são desenvolvidas as ações de intervenção, as quais possibilitam retomar o

planejamento reiniciando o ciclo (MIRANDA, op. cit., p. 19).

Havíamos, pois, completado a primeira fase e parte da segunda. Ainda nos faltava tomar

algumas decisões, antes de ir ao encontro dos fatos, ou às ações, propriamente ditas. Outras

questões, agora mais teóricas, surgiam. Quando falamos de cultura, a que concepção de

cultura estamos nos referindo? Diante de uma população que foi privada do acesso às obras

culturais, que peças de teatro, shows musicais, leituras de poesia poderiam oferecer um alento,

uma reflexão, um outro olhar sobre o mundo, um riso pra espantar o medo? Por que as

expressões artísticas populares dessa comunidade estão esquecidas? Qual a importância da

escola para esse processo de mediação artística e cultural? Em que consiste e como se opera

essa mediação?

4. Breves discussões sobre cultura, obras culturais e mediação

As culturas não são iguais, a despeito de vários conceitos que sugerem essa

falsa impressão. O conceito antropológico mais amplo que opõe cultura e natureza coloca no

mesmo patamar toda a produção material e simbólica humana; o conceito das elites estabelece

que cultura é, única e exclusivamente, o “cruzamento de certas práticas culturais com as

dimensões metafísicas, espirituais e intelectuais” (DARRAS, 2009, p. 25), pautando a arte

que enobrece o espírito como aquilo que deve ser considerado cultura, sendo as demais

produções do ser humano “incultura”; há ainda outros conceitos mais recentes que se referem

à equanimidade cultural, trazendo a concepção de que “todas as produções valem e devem ser

tratadas de maneira equânime e equivalente” (ibidem, p. 30), induzindo pensamentos do tipo

“tudo é arte”, “todo mundo é artista”, na ânsia de desconstruir os valores elitistas do conceito

anterior.

Indagamos: um quarteto de cordas tem o mesmo valor cultural que uma dupla

de cantadores repentistas? Uma dupla de cantadores repentistas é considerada cultura? Como

se estabelece a cultura popular? Diz o antropólogo Néstor Canclini que os produtos do povo

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“originam-se tanto da experiência direta das classes populares como do seu contato com o

saber e a arte ‘cultos’, sendo a sua existência, em boa parte, um resultado de uma ‘absorção

degradada’ da cultura dominante” (CANCLINI, 1983, p. 44). Tendo acordo com tal

afirmação, como sustentar o discurso de equidade das culturas, se algumas delas são

submetidas a trocas materiais e simbólicas desiguais?

As culturas – por uma série de questões (geográficas, históricas, políticas,

econômicas, etc.) – são diversas, e não estão encapsuladas, isentas umas das outras, mas ao

contrário, estão em constantes (e, muitas vezes, conflituosas) interações. Essa diversidade e a

interrelação entre as culturas nada apresenta de contraditório, desde que as trocas sejam de

reciprocidade igualitária. Porém, as necessidades de expansão do capitalismo exigem, cada

vez mais, adequações dos grupos sociais aos modelos hegemônicos. “Mesmo os grupos

étnicos mais remotos são obrigados a subordinar a sua organização econômica e cultural aos

mercados nacionais, e estes se transformam em satélites da metrópole, de acordo com uma

lógica monopolística” (CANCLINI, op. cit., p. 26). Ou, em outras palavras, as culturas

populares são obrigadas a assumirem valores e costumes alheios, passando a balizar suas

relações sociais e práticas produtivas pelas leis do mercado.

Nesse contexto capitalista, há, pois, um poder cultural exercido pela cultura

hegemônica. “As relações capitalistas engendram ideias, noções, valores e doutrinas. Sem

estes elementos intelectuais, isto é, da cultura espiritual, as relações de apropriação econômica

e dominação política específicas do capitalismo não poderiam constituir-se nem subsistir”

(IANNI, 1976, p. 22). Ou seja, a classe dominante, a fim de manter o poder econômico e o

status quo, impõe sua cultura, oferecendo-a como o que é ‘naturalmente belo’ ou

‘naturalmente bom’, e ocultando a violência que subjaz a essa imposição, levando as culturas

populares a sentirem tal “adequação” como necessária para a vida em sociedade. Trata-se

claramente de uma relação de opressão, em que o oprimido assume como sua a cultura do

opressor, por meio do Estado, a partir dos aparelhos culturais (família, escola, igreja, meios de

comunicação, entre outros) e da ação de mecanismos repressivos (burocracia, polícia,

exército, entre outros).

Em relação às obras culturais (obras de arte e de pensamento), ou a classe

dominante não oferece o acesso amplo à população ou, quando oferece, não disponibiliza às

camadas populares os meios de se apropriar delas. Da mesma maneira que os outros

elementos da cultura, as obras culturais parecem estar à disposição de todos, mas somente

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12

alguns podem efetivamente compreender seus códigos, o que leva as classes populares a se

desinteressarem por essa prática cultural. E o que é pior, de acordo com Bourdieu, “a falta de

prática [cultural] é acompanhada pela ausência do sentimento dessa privação” (BOURDIEU,

2007, p. 69), levando as pessoas a uma distância cada vez maior do seu lastro cultural – sem

essa clara percepção – e facilitando, assim, os processos de manipulação pelas elites políticas

e econômicas. Importante lembrar o quadro de uma ausência quase total de programação

artístico-cultural na comunidade do Tomé, com apenas alguns poucos eventos pontuais no

decorrer do ano.

A propensão em acessar as obras culturais, ou seja, a “necessidade cultural”,

diferente das necessidades básicas do ser humano, é um produto da educação. As pesquisas

em relação ao público de museus na França chegam a números bastante claros (BOURDIEU,

op. cit.). Nos dados pesquisados, em relação ao nível de instrução, apenas 9% dos visitantes

não tinham diploma; 11% dos visitantes tinham diploma de estudos primários; 17% de ensino

técnico ou secundário; 31% tinham vestibular; 24% tinham diploma de nível superior. De

acordo com Bourdieu, isso se dá porque a leitura das obras culturais exige um grau de

competência artística, ou seja, conhecimentos específicos para interpretar e se apropriar da

obra. E o espectador que não teve acesso a tais conhecimentos, diante de uma obra que excede

suas possibilidades de apreensão da mensagem, irá se desinteressar e, possivelmente, um

sentimento de indignidade ou de incompetência possa afastá-los permanentemente desse tipo

de obra, reservando, então, às elites a legitimidade dessa prática cultural.

Quando ouvimos falar em direito de acesso às fontes da cultura como

democratização cultural, saibamos que esse discurso está incompleto (ou é maldoso – para

depois culpar os excluídos por sua própria exclusão). Uma verdadeira democratização da

cultura exige, para além do acesso, as possibilidades de fruição da obra, por meio da

informação e da formação, além da criação de um cenário que oportunize as pessoas a

produzirem suas próprias obras de arte. É nesse ponto em que se fundamenta o projeto de

mediação cultural na comunidade do Tomé. Considerando que “a cultura não apenas

representa a sociedade; cumpre também, dentro das necessidades de produção do sentido, a

função de reelaborar as estruturas sociais e imaginar outras novas” (CANCLINI, op. cit., p.

29-30), poderemos, a partir do diálogo intercultural (entre as representações contidas nas

obras culturais, nos textos trabalhados pelas professoras, nas atividades de arte/educação com

crianças e adolescentes e as representações da comunidade), favorecer a compreensão de que

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13

é possível relativizar a visão de mundo atual, reconhecer que os significados dados às coisas

podem ser modificados, desvelar a ideologia dominante para possibilitar uma visão crítica.

Mas o que seria mediação cultural? Paulo Freire afirma que “já agora ninguém

educa ninguém, como tampouco ninguém educa a si mesmo: os homens se educam em

comunhão, mediatizados pelo mundo” (FREIRE, op. cit., p. 79). Mediação, ou mediatização,

seria a construção de uma relação dialógica entre sujeitos cognoscentes (educador-educando e

educando-educador) e objeto cognoscível (o mundo). Muito diverso de um ensinar ao outro

sobre o objeto, na mediação há o que Freire chama de superar o imediato no mediato.

Tomemos uma de nossas apresentações culturais da presente pesquisa-ação como exemplo. O

poema Da paz, do poeta Marcelino Freire, recitado pelo ator Edivaldo Férrer, relata a história

de uma mãe, de luto pela morte do filho assassinado, que se mostra bastante irritada quando a

convidam para ser parte de uma manifestação pela paz. Diz trechos do poema:

"Eu não sou da paz. Não sou mesmo, não. Não sou. Paz é coisa de rico! (...) A paz é

muito branca. A paz é pálida. A paz precisa de sangue! (...) Quem vai ressuscitar

meu filho, o Joaquim? Eu é que não vou levar a foto do menino para ficar exibindo

lá embaixo. Carregando na avenida a minha ferida”. (FREIRE, 2011)

O poema apresentado é o imediato. Quando as pessoas são questionadas sobre o porquê da

personagem afirmar que “não é da paz”, sobre o clima de violência vivido no Brasil e naquela

comunidade, sobre o poeta, esse artista que mistura sua visão de mundo com uma técnica para

escrever seus versos, elas estabelecem outra relação com a obra, intensificando a experiência

estética e aprofundando sua compreensão do poema e do mundo, isso é o mediato. Em outras

palavras, o imediato (poema) passa a ser mediato (cultura), quando ganha novos significados

e relações (com a arte, com o mundo, com os seres humanos) para os sujeitos cognoscentes.

É importante não compreender a mediação num sentido redutor, como

sinônimo de ajuda daquele que detém o conhecimento ao que está desprovido desse

conhecimento. Tal concepção, por vezes ainda assumida nos meios educacionais, situa o

educador num ‘meio’ entre o educando e o objeto do conhecimento, transformando-lhe

naquele que transfere conhecimentos e negando-lhe sua condição de sujeito da história. E

temos a clareza de que “no mundo da História, da cultura, da política, constato não para me

adaptar, mas para mudar” (FREIRE, 1996, p. 85-86).

A teoria histórico-cultural de Vygotsky (2007) afirma que a relação sujeito-

conhecimento-sujeito é fundamental ao desenvolvimento humano. Se pensarmos que o legado

material e simbólico de nossos antepassados encontra-se nos objetos e no conhecimento

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organizado, ou seja, fora do indivíduo; que esses objetos, por si só, não podem influenciar

esses indivíduos; poderíamos indagar: qual a forma pela qual a cultura se estabelece? É por

meio da interação com outros indivíduos, que se dá o processo de apropriação da cultura. De

acordo com Leontiev,

Para se apropriar destes resultados, para fazer deles as suas aptidões, “os órgãos da

sua individualidade”, a criança, o ser humano, deve entrar em relação com os

fenômenos do mundo circundante através doutros homens, isto é, num processo de

comunicação com eles. Assim, a criança aprende a atividade adequada. Pela sua

função, este processo é, portanto, um processo de educação. (LEONTIEV, 1978, p.

272)

Ou seja, a criança passa a significar o mundo, tornar-se um ser cultural, humanizar-se a partir

da relação com o outro, a partir de um processo de interação.

Na mediação das obras culturais, especificamente, BARBOSA (2009) é

categórica ao afirmar que a arte tem um importante papel na mediação entre os sujeitos e o

mundo, visto que a “arte, como uma linguagem aguçadora dos sentidos, transmite

significados que não podem ser transmitidos por nenhum outro tipo de linguagem, como a

discursiva e a científica” (BARBOSA, 2009, p. 21). É o que alguns autores, como LANGER

(1980), chamam de o “padrão dinâmico do sentir”, anterior ao pensamento, que não se estreita

à linearidade da linguagem e permite uma comunicação sem palavras. O dramaturgo Plínio

Marcos, em um poema dedicado ao ator, quase uma oração, fala sobre essa particularidade da

arte e do artista:

Bendito seja quem souber dirigir-se a esse homem que se deixou endurecer, de

forma a atingi-lo no pequeno núcleo macio de sua sensibilidade, e por aí despertá-lo,

tirá-lo da apatia, essa grotesca forma de autodestruição a que, por desencanto ou

medo, se sujeita, e por aí inquietá-lo e comovê-lo para as lutas comuns da libertação.

(MARCOS) [s.d.]

O ponto fundamental da criação artística talvez esteja – ao menos para nós nesta mediação

artística e cultural na comunidade do Tomé –, no acesso ao “pequeno núcleo macio de

sensibilidade”, de que fala Plínio Marcos, a fim de gerar novo ânimo para o espectador. É

preciso considerar que, talvez, as palavras que convocam à razão estejam saturadas e não

consigam mais mobilizar; enquanto esse diálogo de emoções, verdadeiro e sem falácias,

ecoando imaginários perdidos – ou ainda não encontrados – possa comover as pessoas “para

as lutas comuns (sua e de sua comunidade) da libertação”.

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5. O projeto de mediação artística e cultural na comunidade do Tomé

Tratando do projeto de mediação artística e cultural conduzido na comunidade

do Tomé, iremos elencar algumas ações mais significativas, visto que não teríamos espaço

neste artigo para estudar cada uma das ações desenvolvidas em seu particular, nem intentamos

esgotar o assunto nestas primeiras reflexões.

Quadro 1 – números das ações realizadas na pesquisa-ação na comunidade do Tomé (2014) Ação Artistas e/ou

arte/educadores

envolvidos

Público envolvido

(média)

06 noites culturais, com 25 apresentações artísticas 100 artistas 1.000 pessoas

03 oficinas de arte/educação nas escolas 13 arte/educadores 150

crianças/adolescentes

01 encontro de diagnóstico e reflexão e 01 formação de

contação de histórias para professores da educação

básica.

02 arte/educadores 38 profissionais da

educação

01 exposição de fotografias, com imagens das ações

realizadas

- 150 pessoas

As atividades foram organizadas, mês a mês, pelo Grupo Pesquisação, e a

partir da articulação com artistas e arte/educadores conhecidos do Grupo, jovens – em sua

maioria – que solidariamente se engajaram no projeto.

A primeira programação cultural foi realizada no dia 28 de março, em

homenagem ao Dia do Teatro, comemorado mundialmente no dia 27. Certamente, comemorar

o Dia Mundial do Teatro em uma comunidade que pouco – ou nunca mesmo – havia visto

teatro, tinha um ‘sabor especial’. Fizemos uma articulação com o Projeto Arte e Cultura na

Reforma Agrária (PACRA), vinculado ao INCRA-CE, para contarmos com uma peça do

Grupo Deu Zebra no Teatro, do Assentamento Ipanema, município de Alto Santo, na mesma

região do Baixo-Jaguaribe cearense. A peça apresentada foi Um Zé qualquer também ama,

uma comédia divertida, de tema leve e popular (o namoro da jovem proibido pelo tio, homem

muito valente, e as estratégias de Zé para ficar com a moça), e com um grupo de teatro

formado por jovens, ideal para iniciar o projeto de forma atraente. Como uma estratégia para

chamar a atenção dos moradores da comunidade, o grupo fez a maquiagem e vestiu seu

figurino na praça, no fim da tarde. As crianças foram as primeiras a chegar e perguntar o que

aconteceria ali. Naquela altura, já tínhamos disposto alguns bancos da igreja, instalado dois ou

três refletores de chão, e anunciávamos a apresentação no microfone.

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16

No momento da apresentação, falei sobre o projeto de mediação cultural

elaborado em conjunto com moradores da comunidade, das ações que pretendíamos realizar e

da alegria de estar iniciando o projeto naquela data em que se comemora o Dia Mundial do

Teatro, assim como, em linhas gerais, sobre a peça que iriam assistir (enredo, autor,

encenação, grupo-intérprete). Uma fala rápida. Não queríamos transformar a experiência

estética em uma aula expositiva e precisávamos manter o público atento e animado com a

apresentação10

. A peça ocorreu com o público muito à vontade, simpático, comentando com

quem estava ao lado, rindo. Alguns jovens, em suas motocicletas, não permaneciam na praça,

chegavam e saíam com frequência. Ao final da peça, a impressão era de satisfação geral.

Marcamos – junto aos moradores que ali estavam – a data para a próxima programação.

No dia seguinte ao da apresentação, logo pela manhã, várias pessoas que nos

encontravam na rua vinham cumprimentar, dizer que gostaram muito da peça, e perguntar

“quando vai ter teatro de novo?” – mesmo sabendo da data, combinada na noite anterior.

Íamos compreendendo que aquela pergunta tinha a ver com o desejo de ver outros espetáculos

teatrais, ou, em outras palavras, tratava-se do surgimento de uma aspiração à prática cultural,

em acordo com o pensamento de Bourdieu ao afirmar que “a aspiração à prática cultural varia

como a prática cultural e que a ‘necessidade cultural’ reduplica à medida que esta é satisfeita”

(BOURDIEU, op.cit., p. 69). A comunidade, pois, tendo acessado a obra cultural – obra essa

cujo nível de emissão (complexidade da obra) não excedia, significativamente, o nível de

recepção dos espectadores (controle dos código da obra), sendo, pois, uma obra legível – ia se

apropriando de um conhecimento que a levaria a uma necessidade cultural cada vez maior. O

espetáculo ganhou espaço nas conversas da comunidade nos dias posteriores.

10

Adotamos esse modelo sintético de falas para as ações seguintes. Nos dias em que acontecia mais de uma apresentação, lançávamos uma ou duas questões de provocação. Ia ficando claro, também, que as professoras das escolas que iam participando de encontros de formação, as crianças e os adolescentes que escutavam das professoras e/ou participavam das oficinas, também seriam mediadores do processo, no dia-a-dia da comunidade, tanto quanto o Grupo Pesquisação.

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17

Figura 2 - Apresentação de ‘Um Zé qualquer também ama’, na comunidade do Tomé (2014)

Na programação seguinte, em 23 de maio de 2014, realizamos uma intervenção

artística no Acampamento Zé Maria do Tomé11

, pensando na importância de a arte ocupar as

várias situações do cotidiano, e apresentamos outra peça teatral, na Praça da Matriz do Tomé.

Ainda que não quiséssemos reduzir a mediação a uma única linguagem artística (a teatral),

considerávamos de grande importância oportunizar outra peça de teatro, a fim de evidenciar

uma diversidade de poéticas dessa mesma linguagem, pensando, ao mesmo tempo, no que diz

Brecht ao afirmar que, “para observar é preciso aprender a comparar. Para comparar é preciso

já ter observado. Através da observação é produzido conhecimento, mas é preciso

conhecimento para a observação” (apud TEIXEIRA, 2003, p. 95). A Isca, monólogo do ator

Edivaldo Férrer, tem um texto que inclui história e imaginação (quatro pescadores em uma

jangada perdida no mar em plena Segunda Guerra Mundial), com um trabalho de ator

sofisticado, visto que o mesmo ator representa vários personagens apenas com mudanças de

corporeidade (postura, tônus, olhar, voz, etc.), e um único elemento cênico (um penico, que se

transforma em chapéu, rabo de peixe, bomba, navio, etc.), ou seja, há uma clara diferença no

grau de complexidade e sutileza na obra em relação à obra anterior (Um Zé qualquer também

ama, do Grupo Deu Zebra no Teatro), estimulando uma ampliação da imaginação e das

percepções. Na ocasião, comentamos um pouco sobre poéticas teatrais e buscávamos

comparar as duas obras, identificando semelhanças e diferenças. Esse “teatro” era bem

diferente do outro “teatro”, como algumas pessoas da comunidade se referiram.

11

Um grande grupo de camponeses e camponesas da Chapada do Apodi (CE) ocuparam, em conjunto com o MST, com apoio do Movimento 21, no dia 5 de maio de 2014, uma área localizada em Limoeiro do Norte, a fim de promover a discussão acerca da 2ª etapa do Perímetro Irrigado Jaguaribe-Apodi.

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18

Figura 3 – Intervenção dos atores Edivaldo Férrer e Maruska Ribeiro, no Acampamento Zé Maria do Tomé (2014)

A terceira programação cultural, em 1º de agosto de 2014, incluiu uma

formação em contação de histórias para profissionais da educação básica – demanda de

professores e gestores das escolas da comunidade – e um espetáculo de contação de histórias

na Praça da Matriz, com a arte/educadora e contadora de histórias Camila Barbosa. A poetisa,

integrante do Grupo Pesquisação, também participou da apresentação e apresentou o

Romance do filho que matou a mãe, uma peça de procedência portuguesa, com registros no

Brasil, principalmente no Sudeste, desde o século XIX, de acordo com as pesquisas do

folclorista Rossini Tavares de Lima (LIMA, 1971). O romance (narrativa cantada) tem por

enredo a história da mãe que tenta impedir que o filho case com determinada moça, e esta,

inconformada, sugere que o pretendente mate a própria mãe, o que realmente acontece.

Pretendíamos dar visibilidade ao vasto conhecimento de narrativas da poetisa, buscando

valorizá-lo ao apresentar esse “tesouro” que sempre esteve ali na comunidade e que precisava

ser descoberto.

Após a apresentação do romance, lançamos uma série de informações e

questões de provocação para os moradores que ali estavam, na busca de ir além da “camada

primária dos sentidos que podemos penetrar com base em nossa experiência existencial”

(BOURDIEU, op. cit., p. 79), que seria na história em questão o absurdo do matricídio, para

acessar outros conhecimentos como a importância do legado cultural que, ao se constituir, nos

constitui; do quanto é interessante o fato dessa mesma história ter sido ouvida por um

pesquisador em 1945, em São Paulo, e a história estar sendo ouvida agora, quase 70 anos

depois, do outro lado do Brasil, no Ceará, e sabermos que essa história chegou ao Brasil com

os colonizadores portugueses; da percepção de como a música pode ser comovente e o trecho

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“meu filho não faça isso, com a mãe que lhe criou, espaço de nove meses, dores por ti que

passou”, ganha em dramaticidade quando cantado.

Figura 4 - Partitura da melodia-base cantada pela poetisa (transcrição por Fernando Antônio Fontenele Leão)

Nos dias 30 e 31 de agosto de 2014, conseguimos viabilizar a ida de 23 alunos

da disciplina de Metodologia do Ensino em Teatro para uma série de ações na comunidade,

compondo a quarta programação cultural do projeto. Entre as atividades, os alunos

apresentaram esquetes teatrais, poemas, histórias, músicas, performances, visitaram o

Acampamento Zé Maria do Tomé, onde apresentaram o Romance do Príncipe Louro

(recolhido integralmente em entrevista com a poetisa e sua filha, no dia 02 de agosto de 2014)

e conversaram com integrantes do MST; por fim, conduziram atividades de arte/educação em

escolas das comunidades do Tomé, Cercado do Meio e Lagoinha, sendo três comunidades

próximas, situadas na Chapada do Apodi. A ação foi de grande importância para os

licenciandos em teatro, que já construíam há dois meses seu plano de trabalho para aquela

ocasião, e se preparavam afetivamente para vivenciar essa relação intercultural. Fica nítido

em vários depoimentos o quanto a vivência foi significativa.

Ainda não consigo digerir tudo que vivemos nesses dois dias, que, por quantidade,

poderia parecer pouco, mas a sua intensidade fala, por si, a sua importância. (...) O

transbordar de informações ainda lateja: luta, resignação, amor, alegria mesclada

com a dor. E isso nos alimenta de exemplos, de aprendizado. Não somente em nossa

arte, mas em nós como seres humanos. Deixo aqui o meu sentimento de gratidão por

cada um ter vivenciado cada instante comigo (...) (relato de uma aluna do curso de

Licenciatura em Teatro/IFCE, após visitar a comunidade do Tomé, publicado em

rede social, em 02/09/2014)

Também foi significativo para as crianças e adolescentes das comunidades que buscavam

ansiosamente saber – ao final do encontro – quando seria a próxima aula de teatro (deixando

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20

os alunos da licenciatura com o “coração apertado” por não poder corresponder às

expectativas).

Os facilitadores buscaram, nas atividades mediadas, criar um espaço-tempo

propício para a expressão, a criação, a fantasia. Sabíamos que

Dar existência a um universo imaginário, propor novas realidades, conhecer

emoções vividas por outros ajuda a agilizar a imaginação, a gerar sonhos, a fazer

projetos e vencer as fronteiras dos que vivem um cotidiano marcado pelas privações.

(CARVALHO, 2008, p. 93)

E foi com essa clareza que o trabalho foi desenvolvido, não só considerando as habilidades

específicas da linguagem teatral (o gesto, o movimento, a fala, etc.), mas ampliando o foco

das atividades para possibilitar um estímulo à criatividade e à afetividade vivenciada em

grupo.

Figura 5 - crianças da comunidade de Cercado do Meio, em atividade de arte/educação (2014)

A quinta programação cultural foi bastante especial, realizada em 26 de

setembro de 2014. Tínhamos feito uma provocação aos moradores, na finalização da quarta

noite cultural, ao dizer que nenhum dos nossos amigos artistas de Fortaleza tinham

disponibilidade para contribuir na edição posterior do projeto. Perguntamos: “se não teremos

artistas de Fortaleza, será que teríamos artistas daqui da região para compor essa

programação, ou teremos de cancelar a data que estamos marcando?”. Nosso intuito era de,

mais uma vez, valorizar a cultura local, e fortalecer a percepção de que o projeto era

construído em coletivo. Os moradores responderam que tinham artistas na região, e

propusemos que aquela programação pudesse, então, ser organizada por eles – em especial,

mas não exclusivamente, pelos moradores que integravam o Grupo Pesquisação – que

aceitaram o desafio.

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21

Abro um parêntese (Eu, Fernando) para uma explicação e uma reflexão. Entre

uma e outra edição, alguns amigos do Grupo Mandacaru de Arte, do município de Caucaia

(Região Metropolitana de Fortaleza), me contataram para oferecer uma peça teatral para ser

apresentada no âmbito do projeto. Eu disse, porém, que deixasse para o final do ano, pois que

essa programação tinha o caráter especial de contar apenas com artistas da região jaguaribana,

expliquei todo o propósito, mas eles insistiram, dizendo que a peça tratava da questão do voto

consciente, e que nessa edição, por ser às vésperas das eleições (as eleições aconteceriam uma

semana após a programação cultural na comunidade), se mostrava particularmente importante

pela oportunidade das pessoas debaterem o sistema eleitoral, entre outras coisas. Eu, então,

consultei minhas parceiras do Grupo Pesquisação sobre o que elas achavam da proposta de

alterar a ideia da programação. Elas não titubearam e incluíram a peça Confirma? na

programação, considerando muito importante discutir o tema. Ainda quis insistir pela ideia

inicial, mas as parceiras não abriram mão da peça. Fiz uma reflexão no sentido de que se a

programação estava sendo organizada pela comunidade, ela tinha - inclusive - total liberdade

para incluir outros grupos, sendo ou não da região, contrariando a proposta de uma

programação exclusivamente local (será que essa proposta tinha sido muito mais minha,

individualmente?), o que denotava a autonomia cada vez maior do coletivo no decorrer do

projeto.

A comunidade organizou uma bela programação cultural. A começar pela

poetisa que ensaiou com três garotas (de 9, 12 e 13 anos) – entre elas, duas netas – várias

partes de uma apresentação tradicional de dramas populares (canto e dança), confeccionou as

saias de papel crepom – “do jeito que era nos drama de verdade”, de acordo com ela –, e foi

nos apresentando aquele universo de histórias. Era emocionante ver aquelas garotas – a

despeito de possíveis comentários maldosos das colegas (diziam que dramas populares era

“coisa de velho”) – cantar e dançar peças culturais já esquecidas, ou não conhecidas, da maior

parte das pessoas da região. Em uma das entrevistas com a poetisa e sua filha (citada

anteriormente, realizada em 02/08/2014), sobre os dramas, a poetisa já se queixara que os

jovens ali na comunidade só queriam saber de forró (referindo-se não ao forró tradicional,

mas às festas costumeiramente frequentadas pelos jovens), então imagino o quanto aquele

momento foi significativo também para ela. Essa apresentação aconteceu na casa da poetisa,

no fim da tarde do dia 26 de setembro de 2014, para um grupo pequeno de pessoas, entre

moradores e alguns artistas que iam participar da programação da noite.

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22

Mais tarde, na Praça do Tomé, tivemos uma tocante e longa programação com

aproximadamente três horas de duração e um público médio de 250 pessoas. Para além da

peça teatral Confirma?, do grupo de Caucaia, tivemos um poema de nossa poetisa (sobre as

eleições no Brasil), cinco textos escritos e apresentados por jovens das escolas das

comunidades do Tomé e de Cercado do Meio, pernas de pau, um imitador de cantos/assobios

de pássaros, engolidores de fogo, malabaristas, palhaços, músicos, e uma dezena de figuras

interessantíssimas do Boi Mirim de Quixeré, que encerrou a festa daquela noite memorável. A

noite foi também memorável por um fato menos poético, muito diverso de um mundo tão

cheio de boniteza que estava sendo apresentado ali. Em determinado momento, um grande

número de ônibus, carros, motocicletas passaram anunciando um comício político, em volume

máximo, impossibilitando as apresentações. Temíamos que aquilo esvaziasse nossa

programação, mas, felizmente, isso não aconteceu. Passada a carreata, nossa praça recobrou a

atenção e permaneceu ali todo o tempo para contemplar as produções artísticas de seus

conterrâneos. A gestora da escola, integrante do Grupo Pesquisação, em depoimento no dia

posterior ao da apresentação, refletiu:

Eu até comentei que quando passaram os carros algumas pessoas iam sair, mas não,

quem estava aqui não saiu pra ir pra lugar nenhum. A gente começou com um

público e com aquele público terminou. E foi extenso ontem, eu até disse pro Toinho

[coordenador do Boi Mirim] pra ir um pouco mais rápido, porque sendo muito

extenso ia cansar o pessoal, tinha muita criança... mas, mesmo assim, ficamos até o

final, firme e forte. (...) então, é claro que isso é um ponto positivo pro trabalho e pra

todo o projeto, pra toda a ideia. A gente tira por ontem que foi um dos dias que tinha

mais gente, mesmo com o movimento de política e tudo o mais. (depoimento de L.,

gestora da escola e integrante do Grupo Pesquisação, durante entrevista coletiva, na

comunidade do Tomé, em 27/09/2014).

Abro outro parêntese (eu, Fernando) para falar da emoção daquele momento.

Ao final do espetáculo, fui parabenizar Toinho de Toni, do município de Quixeré, multi-

artista virtuoso, organizador do Boi e de várias daquelas apresentações, e lhe falei o quanto

estava impressionado com aquilo tudo, que tinha sido uma das noites mais tocantes de minha

vida cultural. Ele, por certo, não entendia o meu espanto e meus olhos marejados. Ou, talvez,

ele – intuitivo como era – muito tranquilamente me compreendia a emoção, e sabia que

choramos diante da beleza porque “ao contemplar a beleza, a alma faz uma súplica de

eternidade” (ALVES, 1995, p. 107), em meio a essa nossa vida tão efêmera. Apenas me

abraçou.

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Figura 6 - Garotas apresentando trechos de Dramas Populares, na comunidade do Tomé (2014)

6. Refletindo e avaliando resultados junto à comunidade

Após a quinta programação cultural, realizamos uma entrevista coletiva, no dia

27 de setembro de 2014, com sete moradores da comunidade do Tomé e alguns jovens artistas

que tinham participado da programação da noite anterior. Nos seis meses de projeto até aquele

momento, a comunidade se mostrara mais claramente e queríamos ouvir sua avaliação do que

estava se dando a partir das ações de mediação cultural. Alguns moradores já percebiam

mudanças bastante significativas, no plano coletivo, com novos hábitos que iam se

consolidando; também no plano mais individual, em relação a certas posturas e reflexões

acerca das obras apresentadas.

Uma das principais mudanças percebidas pela comunidade tinha relação com o

fato de que muitas pessoas evitavam sair de suas casas à noite, preocupadas com o aumento

da violência, o que impedia uma vivência social. Segundo moradores, após às 19h., em dias

comuns, há pouca gente na rua. Porém, nos dias em que organizamos as programações

culturais, tivemos um significativo movimento na comunidade, com uma reunião de 120 a

250 pessoas, aumentando a cada edição, entre 19h. e 22h., a participar ativamente da ação

cultural proposta. Essa mudança ficou bastante clara, pois, num depoimento de S., integrante

da associação comunitária, ligada ao Grupo Pesquisação:

Tem gente que não sai de dentro de casa, às vezes tem medo até de vir pra Igreja.

Diz: “não vou pra igreja, não, porque tem muito movimento na estrada, eu tenho

medo”. E se tranca, realmente, no seu mundo. Mas quando apareceu agora o

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“teatro”12

, sempre tão vindo. Aí a gente disse: “ah, agora você saiu de casa”; Ela

disse: “no meio de tanta desgraça, pelo menos a gente pode rir de alguma coisa, pra

distrair a mente!” (depoimento de S., integrante da associação comunitária, durante

entrevista coletiva, na comunidade do Tomé, em 27/09/2014).

A entrevista seguia falando acerca do fenômeno da violência, e percebíamos

que outra mudança estava se processando. Havia um incômodo da comunidade diante de

tantos comentários que imputavam ao Tomé a pecha de uma comunidade perigosa. Diz uma

moradora, “a gente é vista como uma comunidade violenta, uma comunidade sangrenta. O

povo diz: ‘você mora lá naquele Tomé? Ave Maria, tenho medo até de falar no nome, porque

ali é muito violento. Como é que você consegue viver lá?’”, diz Dona R., moradora. A

mudança já percebida por alguns moradores tratava da percepção da comunidade do Tomé

pelos próprios moradores e entre as comunidades vizinhas. Moradores do Tomé já diziam –

com certo orgulho – que pessoas das comunidades do entorno perguntavam muito sobre o

projeto de arte. Diz uma das moradoras que uma “comadre” de outra comunidade perguntou

se esse “teatro” não podia ir nem um dia pra lá. “A gente passa agora a divulgar as coisas boas

também. As coisas boas que acontecem, as coisas que as pessoas da comunidade sabem

fazer”, diz L., gestora da escola e integrante do Grupo Pesquisação.

Em determinado momento desse encontro, o grupo é surpreendido pelo pedido

de fala de uma jovem atriz de Fortaleza, que tinha se apresentado na programação cultural da

noite anterior. Diz a jovem,

nada se compara à grandeza de receber o outro, e aqui eu fui muito bem recebida e

senti toda a força de vocês. Eu queria poder passar mais tempo aqui no Tomé, morar

um tempo aqui, fazendo um trabalho de arte na escola, com as crianças.

Infelizmente, eu não posso. Só posso dizer obrigada por tudo. (depoimento de M.,

aluna do curso de Licenciatura em Teatro/IFCE, durante entrevista coletiva, na

comunidade do Tomé, em 27/09/2014).

Essa fala e alguns relatos escritos de alunos da Licenciatura em Teatro que lemos para o

grupo fizeram essas pessoas abrirem um belo sorriso. E não tínhamos como não lembrar que

“o sorriso, mais que o riso ou o pranto, é a mais suave forma de se dar razão à vida” (BOAL,

2003, p. 11).

12

Os moradores da comunidade chamavam as programações culturais genericamente de “teatro”, a despeito de terem sido apresentadas obras de diversas linguagens artísticas. Possivelmente, porque as primeiras apresentações eram peças teatrais. De todo modo, é interessante se pensarmos que o termo teatro deriva do grego e se refere a “lugar de onde se vê”.

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As falas dos moradores também apresentavam novas posturas num plano mais

individual, em relação às obras culturais, e inclusive por parte de crianças, conforme o relato

de uma moradora que participou de todas as programações. Diz a moradora,

O que eu observei lá onde eu tava sentada foi as crianças... tinha gente fazendo

zoada... e elas [crianças]: “‘psiu’, cala a boca, eu quero assistir”.Aí teve uma mulher

que disse: “eu tô com 30 anos, nunca meu pai mandou eu calar a boca quem é você

pra mandar eu calar a boca?” (risos)... aí ela disse: “pois então se arretire daí, se

você não veio pra assistir, eu quero assistir”. As crianças, né, pequenas, e elas lá,

olhando, dando risada, e reclamando com o adulto que tava fazendo zoada. Quer

dizer, elas tavam prestando atenção e tava gostando. (depoimento de Dona R.,

moradora da comunidade, durante entrevista coletiva, na comunidade do Tomé, em

27/09/2014).

A situação demonstra o interesse de uma plateia diante do que é apresentado, exigindo que o

indivíduo que faz barulho e está desatento se retire a fim de não perturbar a recepção. Essa

atenção também pode ser percebida em certo grau de apreensão da obra pelo espectador, ao

criar, por exemplo, conexões com o mundo real. As programações culturais faziam parte,

definitivamente, das conversas cotidianas dos moradores, como um estímulo para a percepção

da realidade. Diz L.,

(...) ontem tinha uma senhora que disse assim: “Ave Maria, esse pessoal [o grupo de

teatro] tá dizendo tudo o que é verdade, porque semana passada o candidato fulano

passou na minha porta e disse essa mesma coisa, e eu sei que é mentira, porque ele

não vai fazer mesmo” [referindo-se à peça teatral ‘Confirma?’, do Grupo Mandacaru

de Arte, sobre o voto consciente]. Então, assim, de uma maneira lúdica, de uma

maneira criativa, está despertando a consciência do povo. (depoimento de L., gestora

da escola e integrante do Grupo Pesquisação, durante entrevista coletiva, na

comunidade do Tomé, em 27/09/2014).

7. Concluindo a ação e a pesquisa

Em 10 de dezembro de 2014, retornamos à comunidade para montarmos uma

exposição de fotografias das cinco programações culturais realizadas, apresentarmos um

grupo de dramistas das comunidades de Lagoa da Casca e Carnaúbas (comunidades do

entorno do Tomé), um outro grupo de dramistas do município de Itaitinga, e uma cantoria

com os repentistas Geraldo Amâncio e Zé Vicente. Foi bonito ver os moradores do Tomé

apontando os conhecidos nas fotografias, cantarolando as canções dos antigos dramas,

sorrindo com o desafio poético dos cantadores repentistas. Foi bonito acompanhar as

senhorinhas dramistas de Itaitinga numa visita a um casal bastante idoso do Tomé, ouvir as

histórias que Geraldo Amâncio contou no fim da tarde para alguns moradores, sentir o

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cuidado e a disposição dos companheiros do Núcleo Tramas que ali estiveram para prestigiar

a finalização da pesquisa-ação. Foi bonito estar mais uma vez com todos os parceiros da

comunidade do Tomé a construir mais uma programação, uma articulação e uma outra

percepção de si e do lugar em que vivem.

Figura 7 - Crianças visitam a exposição de fotografias da pesquisa-ação, na Comunidade do Tomé (2014)

Se a proposta, desde o início, era desenvolver uma ação política, estamos

certos de que isso aconteceu. Sem denúncia, sem dedo em riste, sem os estereótipos que

imputam à arte dita engajada. De outro modo, nossa ação política, amorosa, fundada no

diálogo, na cocriação, na certeza de que a esperança gesta a utopia, ofereceu momentos – por

pequenos que fossem – de dignidade, de beleza, de humanidade, e assim levou as pessoas a se

reconhecerem mais dignas, belas e humanas. Nossa pesquisa-ação em mediação cultural

cumpriu com os objetivos de favorecer o acesso às expressões artísticas em sua diversidade,

promover o diálogo intercultural, estimular a criatividade, apresentar informações com

conteúdos da arte e da educação, valorizar e estimular as produções artístico-culturais locais,

mas fez mais. Por exemplo, possibilitou que uma senhora superasse o medo de sair de casa e

hasteasse a bandeira da coragem; conduziu pessoas pela sensação de se orgulhar do seu

território e querer defendê-lo; ofereceu determinação e afoiteza a um garoto que pediu para

um adulto se retirar pois o estava atrapalhando no sério ato de ver um palhaço fazer graça;

instigou uma mulher a não votar num candidato falacioso.

Canclini nos indaga em sua obra: “como suscitar, a respeito do modo de vida

que nos foi imposto mas que assimilamos como próprios, o distanciamento necessário para

que surja a visão crítica?” (CANCLINI, op. cit., p. 37). Tendo vivenciado essa pesquisa-ação,

cremos ainda mais no potencial emancipatório da arte. Concebemos mais claramente o que

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diz Boal ao afirmar que “uma estética democrática, ao tornar seus participantes capazes de

produzir suas obras, vai ajudá-los a expelir os produtos pseudoculturais que são obrigados a

tragar no dia-a-dia dos meios de comunicação, propriedade dos opressores” (BOAL, 2009, p.

167). Isso quer dizer que as classes oprimidas precisam se apropriar da palavra, da imagem,

do som, em suma, do capital cultural, não para assumir a cultura da elite, mas para não se

deixar manipular por ela, e para, crítica e livremente, estabelecer sua própria cultura. Cultura

que, sendo diversa, é respeitada em sua diversidade; que se desenvolvendo autonomamente,

possa estabelecer relações interculturais; que não sendo autossuficiente, não lhe sejam

impostas trocas materiais e simbólicas desiguais.

Nossa pesquisa-ação na comunidade do Tomé, por um lado, identificou a

ausência de programações artísticas e culturais na região, a carência de formação para

professores na área de artes, as escassas oportunidades de fruição e produção artística

oferecidas às crianças e aos adolescentes pelas escolas públicas, a construção de um ideário

que estabelece as expressões populares como “atrasadas”, “coisa de velho”, “incultura”

levando ao desaparecimento de um legado cultural de valor inegável, como resultado do

modelo hegemônico e desigual de desenvolvimento capitalista, que busca a homogeneização

de produção para atender à sua lógica monopolística; por outro lado, assumiu a frente de

oferecer possibilidades de acesso, de informação, de formação e de produção artístico-

cultural, no período de março à dezembro de 2014, proporcionando uma experiência de

democratização de arte e cultura, com a finalidade de contribuir para o fortalecimento

comunitário a partir do desenvolvimento de uma consciência crítica e estética. O cantador

Geraldo Amâncio, em cantoria realizada no Tomé, por ocasião da última programação

cultural no âmbito desta pesquisa, sintetiza em uma estrofe parte da história da comunidade e

as mudanças conquistadas: “Aqui houve um grande abalo / Pra o povo desse ambiente, /

Quem chorava antigamente / Já, hoje em dia, não chora. / Houve uma grande melhora, / Tem

cultura e tem poesia”.

Trata-se, logicamente, dos primeiros resultados, pois, estamos certos de que um

trabalho dessa magnitude não poderia estar concluído, ou, como proposto pela metodologia da

pesquisa-ação, deveria se reiniciar o ciclo (planejamento, tomada de decisão, encontro dos

fatos) após sua conclusão. Porém, chegando ao fim nosso processo de estudos no Curso de

Especialização em Cultura Popular, Arte e Educação do Campo – Residência Agrária,

estabelecemos o fechamento dessa etapa, a fim de socializar tais resultados, em gratidão pela

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confiança depositada em nós pela comunidade e por tantos parceiros e com a esperança de

referenciar futuros trabalhos de companheiros de anuncio da causa da emancipação humana

por meio da arte.

8. Referências bibliográficas

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