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A ALEGORIA DA CAVERNA DE PLATÃO E O RITO DE INICIAÇÃO

MAÇÔNICA NO GRAU DE APRENDIZ: UM ESTUDO

COMPARATIVO

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IR.`. ROGÉRIO HENRIQUE CASTRO ROCHA A.`.M.`.

•MEMBRO DA ARLS GR.: BEN.: BENF.: AUG.: RESP.: LOJ.: SIMB.: RENASCENÇA MARANHENSE

N.º 621

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ROGÉRIO HENRIQUE CASTRO ROCHA A.:M.:

• 1 INTRODUÇÃO O presente estudo tem por objetivo geral analisar os fundamentos simbólicos e filosóficos presentes no rito de iniciação do aprendiz maçônico, abordando, reflexivamente, aspectos doutrinários envolvendo a figura do iniciado em seus primeiros passos dentro da vivência efetiva da Instituição Maçônica, especialmente no que diz respeito aos regramentos dispostos no R.: E.: A.: A.: Propõe-se ainda a empreender breve análise comparativa entre a Alegoria da Caverna de Platão, constante de sua obra “A República” (Livro VII) e a cerimônia de entrada do neófito no 1º grau da maçonaria.

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O neófito e sua entrada no mundo maçônico Inicialmente, é importante ter em vista o contexto encontrado no início da jornada do aprendiz na caminhada progressiva e ascensional de nossa Emérita Ordem. O aprendiz maçom – é importante frisar – até bem pouco tempo, antes de travar o seu primeiro contato com a Arte Real, era um completo profano. Ainda assim, mesmo imerso nos afazeres da vida mundana, tal indivíduo trazia consigo, dentre outras tantas virtudes em potencial, duas, sem as quais não poderia aspirar sequer à condição de candidato: ser livre e de bons costumes. É por ser portador destes imprescindíveis requisitos que candidatase, preenche sua proposta de admissão, passa pelo crivo do exame de seus futuros pares (sobretudo em face dos requisitos legais e morais que lhes são exigidos), submete-se ao ritual iniciático da Cerimônia de Sagração ou Consagração (onde é investido na dignidade do grau) e, após passar por uma série de provas em cerimonial, realiza, por fim, as ‘três viagens’ de purificação simbólica para passar da condição de homem profano à de homem maçom. Como se sabe, porém, o aprendiz é um neófito, um iniciante, inexperiente ainda, seja num ofício, seja numa arte ou saber. É alguém que ignora os conhecimentos mais profundos, os detalhes mais complexos, os ditames mais elevados a respeito de determinada técnica, assunto ou saber. 3 Para Jaime Pusch, citado pelo Irm.: Paulo Thomson de Lacerda, o Grau de Apr.: M.: é a fase purgativa e ativa da Iniciação. Neste Grau o M.: se dedica ao aprendizado dos mistérios simbólicos básicos, leis, usos, costumes e história geral da Maç.:. Trabalha na P.: B.:. Deve evoluir de homem bruto, amorfo, profano, o homem polido, burilado, M.:. (A Trolha, Londrina, nº 308, p. 34, jun. 2012) É, pois, este homem – recém-chegado das lides profanas e recémnascido maçom, agora inserido no ambiente cerimonioso e solene de uma Loja ou Oficina – a quem se denomina aprendiz. Mas, afinal, em termos simbólicos, o que representa a Iniciação Maçônica? E qual relação existe entre esta e a alegoria do filósofo grego?

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A alegoria da caverna em Platão: a transição humana da ignorância ao saber Analogicamente, o melhor exemplo para se compreender a trajetória maçônica do aprendiz em relação ao simbolismo do ritual de iniciação encontra-se na famosa alegoria da caverna, descrita pelo filósofo grego Platão (séc. V a.C.). Trata-se de texto que se desenrola em forma de diálogo filosófico e que possui extraordinária riqueza hermenêutica, dele se podendo extrair várias perspectivas de leitura ou sentidos (pedagógico, ético, epistemológico, político, metafísico). Nele Platão expõe, de forma sistemática, o que seria para si o modelo de estado ideal, bem assim toda a estrutura societária, moral e pedagógica que ajudariam a formar o rei-filósofo (governante da República) e os demais membros de cada classe social. A República, portanto, encontra-se fundada na crença permanente em que ninguém merece progredir dentro de sua sociedade senão como resultado de seus talentos, habilidades e, mais importante de tudo, seu caráter. E para isso, o processo de educação é basilar. Presente no livro VII da obra “A República”, a alegoria da caverna nos descreve a cena em que homens, nascidos e acorrentados no interior de uma caverna, sem poder mudar de posição e, portanto, sendo forçados a olhar somente para o fundo da caverna. Nessa parede veem, projetadas pelo sol que adentra uma fresta de entrada, por detrás de um muro pequeno, as sombras e silhuetas de seres e objetos que transitam no mundo exterior. 4 Na visão dos prisioneiros, acostumados à cegueira do ambiente cavernoso, tudo o que conseguiam admirar nas sombras lançadas sobre a parede à sua frente constituía-se em realidade (o mundo verdadeiro). Do lado de fora, onde transitam pessoas carregando objetos de diversos tipos, o sol brilha com intensidade. Atrás dos cativos, no interior das trevas e abaixo do sol que invade a entrada superior da caverna, uma fogueira que arde, também projetando sombras ao interior do recinto. Do mundo externo, ao qual ignoram por completo, também lhes vêm os ecos de vozes, ruídos e sons de toda ordem. Familiarizados com a escuridão daquele mundo interior, acreditam piamente que tudo o que veem, ouvem e sentem trata-se da mais fiel e única realidade. Supondo, entretanto, que um dos cativos quebrasse seus grilhões e enfim se voltasse para trás, transpondo o muro e alcançando a saída para o mundo exterior, qual não seria sua surpresa ao deparar-se com o forte clarão da luz do sol, a qual ofuscaria sua visão, tendo de acostumar-se primeiro, para só depois, e gradualmente, divisar uma nova realidade que se descortinava a sua frente.

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Tal homem, recém-saído da caverna, alcançaria a luz e descobriria que o que pensava ser real não o era. A realidade verdadeira estava no mundo externo, clareado pela fulgurante luz solar. Por fim, entenderia o ex-cativo ter vivido em um mundo de ilusões, um mundo de aparências, mero simulacro do real. E que doravante, com a ação que tomara, afastar-se-ia da ignorância e do erro para trilhar as sendas da verdade, do saber e do conhecimento inteligível. Como se pode depreender, a alegoria platônica, em seus múltiplos contextos interpretativos, opera constantemente com a presença de dualismos ou dicotomias (sabedoria e ignorância, aparência e realidade, trevas e luz, mundo superior e mundo inferior, etc.). Elementos estes que, como veremos a seguir, também se refletem nas práticas e simbolismos da iniciação maçônica.

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Das sombras à luz: o itinerário do aprendiz na iniciação maçônica A Iniciação Maçônica representa, em breves palavras, a Morte e a Ressurreição. A morte das trevas, do obscurantismo em que se encontrava o neófito, e sua renascença para a Luz da Verdade. 5 A luz, tanto no mito platônico quanto na filosofia e simbolismo maçônicos, adquire vários significados, dentre eles o de esclarecimento, evolução, conhecimento, ingresso no universo da interioridade da busca intelectual. Não se pode esquecer, num paralelo com a caverna, que um dos prisioneiros ascende à luz, ou seja, sai da gruta, desvencilhando-se de suas cadeias e curando-se de sua ignorância. Ao “receber a luz”, quando lhe são desvendados os olhos, o iniciado tem-lhe revelados os mistérios do primeiro passo dado na seara do misticismo. Como bem nos lembra Rizzardo da Camino (Breviário maçônico. 6.ed. Madras: São Paulo, 2012, p. 326), “o maçom e todos nós, estamos na escuridão e ansiamos pela Luz”. Então, a partir dessa análise, podemos, desde já, perceber os estreitos liames que enredam a trama tanto do iniciado maçônico – em seu trajeto de passagem das celas, das masmorras, da prisão simbólica, da qual emerge ao final de sua sagração – quanto a do cativo da caverna platônica. Assim como o prisioneiro da caverna, o candidato a maçom adentra o templo sem nada ver nem conhecer. Ingressa às escuras, olhos vendados, não conhece ninguém, não sabe o que lhe aguarda, para onde será levado, o que irá acontecer daquele momento em diante. Simbolicamente, entra-se em outro mundo. Nos damos conta do quanto era vã a nossa existência, o quão pouco sabíamos das coisas, dos outros e de nós mesmos. Por horas a fio o iniciado permanece envolto em mistérios, sozinho, consigo mesmo e com seus pensamentos. A angústia e o temor lhe invadem. Dúvidas e inquietações lhe passam à mente. Impressões e sensações a todo instante lhe assombram. Sons próximos e ruídos distantes, vozes, um arrastar de pés ou cadeiras, conversas, palavras ditas por pessoas que não sabe ao certo quem são e com que propósito o cercam. Nesse instante, uma jornada de interiorização se inicia. O candidato, ainda ‘imerso nas sombras’, à espera do momento do início da cerimônia, volta-se para dentro de si mesmo, para sua caverna, nas ‘entranhas da terra’ onde ora habita, ‘prisioneiro’ de sua própria ignorância, ‘acorrentado’ aos seus vícios e paixões mundanas. Assim como o cativo da obra platônica, vive a ilusão de que a realidade é tal como se lhe parece. Na Câmara de Reflexões, por breve período, a escuridão do ver lhe é amenizada.

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Em seu lugar surge, por sua vez, a gravidade das questões que lhes são lançadas, novamente a confrontá-lo com seus próprios pensamentos, a inquirir seus princípios, suas ideias, seus medos, sua existência e sua fortaleza espiritual. 6 Como nos ensina a própria letra do rito do 1º grau, “o estado de cegueira, em que vos achais, é o símbolo do mortal que não conhece a estrada da Luz, que ides principiar a trilhar.” (Grande Oriente do Brasil. Ritual do 1º Grau: rito escocês antigo e aceito. São Paulo, 2009, p. 106). Ademais, a analogia que aqui se tenta demonstrar também é notada, ainda no rito de iniciação, quando se faz menção à ligação existente entre o simbolismo da 1ª prova, a da Terra, e a caverna onde estivera recolhido o candidato, ao fazer suas disposições. (Idem, Ibidem, p. 108) Ao final dessa jornada, consolidando a ideia aqui apresentada de paralelismo entre elementos do mito da caverna em relação a determinadas passagens dentro do ritual de iniciação maçônica, tem-se o momento áureo da cerimônia de sagração: o “Fiat Lux” (faça-se a luz ou que se lhe dê a luz). A passagem das trevas à luz é uma alusão ao difícil trabalho de construção e reconstrução que se fará da pedra bruta à pedra polida. É o encerramento da travessia, o nascimento do novo homem. No mito platônico corresponderia ao instante em que se passa do mundo sensível ao supra-sensível. Ou seja, trata-se da caminhada ascendente entre o interior escuro da gruta e o seu exterior iluminado. Ou como bem assevera o filósofo grego, em importante passagem da obra em comento, que teríamos, em verdade, “a reorientação de uma mente de uma espécie de crepúsculo para a verdadeira luz do dia – e esta orientação é uma ascensão da realidade, ou em outras palavras – verdadeira filosofia.” (PLATÃO. A República, 1997). Representaria, portanto, a passagem da visão da sombra à visão do sol. Do mundo cavernoso dos sentidos e falsas percepções à vida na pura luz, na dimensão do espírito; como que um libertar-se de grilhões. Verdadeira conversão que se contempla e se completa na verdade racional que se manifesta à realidade. Após tomar consciência de suas falsas noções da realidade, o cativo/neófito nunca mais voltará a conduzir sua vida do mesmo modo. Ele foi iluminado. Como sustenta o Ir.: Stephen Michalak, essa é a base de toda iniciação. Mais ainda, pois consiste num processo que não acontece, como pode por vezes parecer, apenas e tão-só em uma noite. Tal processo perdura por todo o restante dos nossos dias. A profunda riqueza do mito nos deixa entrever, pois, sem sombra de dúvidas, elementos da caminhada maçônica. Em sua vertente especulativa, vê-se a exigência de uma busca pelo conhecimento e o combate incessante a toda forma de obscurantismo. Em sua vertente operativa, a necessidade de que o saber seja aplicado na transformação do homem e do mundo.

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Conclusão

Pretendeu-se, com o presente estudo, traçar uma breve análise comparativa entre a filosofia e o simbolismo presentes no mito ou alegoria da caverna, do filósofo grego Platão, e o ritual iniciático do grau de aprendiz maçom do R.: E.: A.: A.:. Para tanto, teve-se por referencial teórico nessa pesquisa a doutrina de grandes expoentes da literatura e filosofia maçônicas bem como a exegese da filosofia platônica, a partir da interpretação dos significados encontrados no mito platônico, apresentado mais especificamente no livro VII da sua obra “A República”. Do que se pôde concluir, após a exposição dos argumentos que serviram de base à referida análise, dentre outras coisas, vê-se que é grande a influência da filosofia platônica nos círculos especulativos e operativos da Maçonaria. De igual modo, pode-se também afirmar que tal influência precede mesmo, na história, a fundação da ordem em sua configuração mais recente, como produto da modernidade franco-maçônica, visto que remonta à época da longínqua antiguidade, bem como ao período medieval, onde o pensamento de Platão foi novamente estudado. Outrossim, infere-se da leitura interpretativa do texto filosófico de “A República”, para além da mera alusão à passagem aqui citada de sua conhecida alegoria, presente no Livro VII, inúmeras outras referências (simbólicas, práticas e epistemológicas), perfeitamente alinhadas aos preceitos ainda hoje constantes dos ritos e ofícios da Maçonaria. Logo, não nos parece equívoco afirmar a existência de uma conexão lógica, ou seja, de uma correlação de sentidos entre a filosofia platônica e os ritos, simbolismos e a filosofia maçônicas. Ambas as concepções mostram-se voltadas, por seu fim, ao desenvolvimento de um autogoverno humano, capaz de permiti-lo, através da reflexão filosófica e da busca de si mesmo, libertar-se das amarras da ignorância para, enfim, galgar novas escalas no seu aprimoramento pessoal, moral e social, transformando-se e ajudando a transformar para melhor a realidade que o cerca.

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Referências ABRÃO, Bernardete Siqueira. História da filosofia. São Paulo: Nova Cultural, 2004. AS RAÍZES PLATÓNICAS DO PENSAMENTO MAÇÓNICO. Disponível em: http://www.maconariaportugal.com/pranchas/prancha-7 Acesso em 07/12/2012. CAMINO, Rizzardo da. Breviário Maçônico. 6. ed. São Paulo: Madras, 2012. CASTELANI, José. Dicionário de termos maçônicos. 3. Ed. Londrina: A Trolha, 2007. CHAUÍ, Marilena. Convite à filosofia. 13. ed. São Paulo: Ática, 2003. COTRIM, Gilberto. Fundamentos da filosofia: história e grandes temas. 15. ed. reform. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2002. D’ELIA JUNIOR, Raymundo. Maçonaria: 100 instruções de aprendiz. São Paulo: Madras, 2012. GRANDE ORIENTE DO BRASIL. Ritual do 1º grau: rito escocês antigo e aceito. São Paulo, 2009, p. 106. LACERDA, Paulo E. Thomson de. Ser aprendiz. A Trolha, Londrina, n.º 308, p. 34-35, jun. 2012. LIMA, Walter Celso de. Ensaios sobre filosofia e cultura maçônica. São Paulo: Madras, 2012. MICHALAK, Stephen. A influência de “A República” de Platão sobre a maçonaria e o ritual maçônico. Disponível em:

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 As advertências do Mito da Caverna

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Uso do Mito da Caverna de Platão para tipificar a mentalidade predominante no mundo ocidental e identificar as condições gerais de contorno que terão de ser consideradas em virtual projeto de intervenção social.Contextualização

 O Mito da Caverna representa um momento de esplendor da inteligência humana e explica em boa medida por que Platão ocupa posição proeminente no panteão da Filosofia e por que a lembrança dele se apresenta sempre que a sério falamos de Filosofia. Na alegoria da caverna, Platão não apenas indica sua concepção filosófica básica, como também mapeia e circunscreve o núcleo central de problemas que têm catalisado e tipificado a Filosofia como desafio intelectual superior da espécie. Daí a recorrência constante a Platão desde o Iluminismo, menos em razão de uma virtual genialidade literária, mais pelo fato de explicitar o âmago das questões filosóficas, as quais até hoje angustiam o homem e ainda esperam solução. O que Platão nos lega, como veremos, é a indicação clara da imperiosa necessidade de conquistar competência mental e autonomia perceptiva, caso almejemos levar o projeto humano à maturidade.Para compreender o Mito da Caverna temos de considerar que essa alegoria consta do capítulo VII da sua obra principal – A República – dedicada a especificar, em forma de diálogo, como deveria ser a cidade ideal, capaz de propiciar aos homens existência plena e vida segura. A linha geral da obra contempla, portanto, a organização do Estado e da Sociedade, embora se tratasse de cidades-estados, e não do Estado como hoje o conhecemos. Platão entendia que esse Estado ideal devesse ser gerido por filósofos, ou que seus gestores tivessem sólida formação filosófica, usando, em boa medida, a alegoria da caverna para justificar isso.Além do mais, é preciso considerar que Platão, à semelhança de boa parte dos gregos clássicos, adota perspectiva filosófica específica, que hoje geralmente designamos de Metafísica. Isso leva Platão a entender que tudo o que existe possui uma essência que é determinante e condicionante daquela forma específica de ser.

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Segundo ele, para além daquilo que se oferece à nossa visão, há uma essência em cada coisa e é ela que determina o que a coisa é. Para caracterizar bem essa indispensável distinção entre essência e aparência, Platão usa a seguinte expressão: “as coisas que são vistas não são pensadas, enquanto as essências são pensadas, mas não podem ser vistas”. Muitas correntes de pensamento de todos os tempos, em particular as religiões, adotam a mesma perspectiva quando afirmam a precedência do espírito sobre a matéria. A Metafísica busca encontrar nos alicerces da matéria e do mundo visível as leis invariantes responsáveis pelo advento e pela compleição do Universo. Um projeto semelhante ao próprio projeto das ciências modernas, em busca das leis que regem a compleição e o funcionamento da natureza.

Na alegoria da caverna, os homens estão acorrentados dentro dela, de modo que somente podem olhar para a parede situada no fundo. Próximo à entrada, há uma fogueira, e entre ela e os homens existe uma passarela ladeada por muro. Nessa passarela, pessoas carregam sobre a cabeça esculturas de todas as coisas do mundo, em silêncio ou conversando. Como o muro cobre as pessoas que passam, a luz da fogueira projeta apenas a sombra das esculturas na parede do fundo da caverna, formando as únicas imagens vistas pelas pessoas acorrentadas. Dado que as pessoas nascem, crescem e morrem nessa situação, essas sombras são as únicas coisas que elas enxergam, por isso acreditam que se trata da única realidade existente. Em consequência, a sua vida se limita a identificar e a comentar as diferentes imagens que se oferecem.Posto isso, Platão passa a explorar o que aconteceria se uma das pessoas, de índole mais inquieta, olhando para trás, pudesse libertar-se das correntes, percebesse o clarão vermelho da fogueira e, apesar das dificuldades, conseguisse arrastar-se até a parte superior. Veria primeiro um grupo de pessoas não totalmente imobilizadas, responsáveis pela manutenção da fogueira, pela programação do trabalho dos carregadores, e entenderia que as imagens projetadas na parede do fundo não são a realidade, mas a projeção das peças carregadas.

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De repente se daria conta de como funcionavam as coisas na caverna, mas não de que se tratava de uma caverna. Então, diz Platão, após acostumar-se com a claridade da fogueira, ele percebe um clarão ainda mais forte, de uma luz amarelada. Apesar do desconforto e da dor nos olhos que aquela luz provoca, decide para lá encaminhar-se e, ao ultrapassar o umbral, vê-se diante da luminosidade intensa e ofuscante do Sol, sendo forçado a fechar os olhos. Mas logo descobre que pode abri-los lentamente e aos poucos vai descortinando: primeiro, vultos envoltos em névoa; depois, paulatinamente, o contorno e a forma de todas as coisas; finalmente, as cores – a profusão e a beleza das cores. Descobre toda a magnitude da natureza planetária e à noite vê as estrelas no firmamento. Finalmente, com os olhos ajustados à luz matinal, consegue fitar o próprio Sol e percebe que é ele, o Sol, o responsável pela vida e pela natureza exuberante que o cerca.Ele se dá conta de que vivera numa caverna escura, sem cor, e, ao lembrar-se dos amigos ainda presos lá dentro, volta para libertá-los. Ao entrar na caverna enfrenta a transição: precisa acostumar novamente seus olhos à escuridão, mas só o consegue em parte; nunca mais terá a mesma eficiência de antes no escuro. Conta aos amigos o que descobriu e convida-os a sair, garantindo conhecer o caminho. Qual a reação deles?- pergunta Platão. Criticam-no porque perdeu visão e habilidades, porque quer acabar com a felicidade que desfrutam e, ainda por cima, por lhes fazer proposta de passar por sofrimentos. Não demora a ser tachado de louco ou a ser morto para que deixe de importunar.Esse, em resumo, o relato que Platão faz do mito da caverna

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InterpretaçãoPara entender por que Platão afirma que os homens estão acorrentados, é preciso esclarecer que para ele o conhecimento admite graus distintos de efetividade. Ele identifica quatro níveis diferentes do conhecer, que vão da mais completa ignorância até a plena sabedoria. No nível inferior situa os homens que não sabem nada, não querem saber e têm raiva de quem sabe. É o plano dos maria vai com as outras. Não duvidam nem questionam nada, apenas imitam e repetem o que ouvem. No segundo nível estão as pessoas que sabem um pouquinho, mas pensam que sabem muito. São pessoas que externam opinião sobre tudo. Se alguém está com dor de cabeça, receitam logo analgésico sem qualquer preocupação com as causas da dor. São viciadas na expressão: eu acho… São capazes de escalar o time muito melhor do que o técnico. Possuem idéias infalíveis para resolver os problemas econômicos ou para conduzir melhor as relações exteriores do país, sem nunca ter estudado medicina, cursado economia ou estudado relações internacionais. Platão chama esses dois níveis inferiores de plano da opinião, que reúne a maioria da população. Nesse plano não predomina a razão, predomina a opinião!O terceiro plano do conhecimento é ocupado pelos buscadores do conhecimento. Estes, antes de falar sobre algo, vão atrás e se apropriam do conhecimento da tradição sobre o assunto. Depois de dominar tal conhecimento, passam a tratar das questões, como engenheiros, médicos, biólogos, etc.No quarto nível do conhecimento, Platão situa aqueles buscadores do saber que, depois de recolher todo o conhecimento da tradição, com auxílio de longa prática e aplicação das teorias em casos concretos, adquirem a capacidade de ler diretamente na natureza, quando ampliam o próprio acervo de conhecimentos da humanidade. Assim caracteriza esse quarto nível como o nível dos que, sem intermediários, conseguem ler diretamente na natureza. Isso somente é possível para quem tenha saído da caverna, porque é ali que a natureza se situa.Embora de forma indireta, Platão ainda fala no que seria um quinto nível superior do conhecimento, correspondente àqueles que verdadeiramente alcançam a condição de filósofos. O filósofo para Platão é aquele que aprecia o espetáculo da verdade, é aquele que capta a essência e por isso conquista um conhecimento verdadeiro.

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Para tanto, a educação do filósofo deve ser programada e começar na infância com o trato do corpo e da sensibilidade, com a percepção da beleza e com a superação dos instintos a fim de estabelecer a precedência da razão, do bem e da justiça. Depois deve se estender até a maturidade com o domínio do conhecimento da tradição das ciências gerais: da Retórica, da Matemática, da Geometria, da Música, das Artes Marciais e da Astronomia. Finalmente, para ser um verdadeiro filósofo, precisa ainda, tornar-se um dialético e esse é um detalhe fundamental, particularmente importante.A palavra dialética não possui para Platão o mesmo significado que modernamente damos a ela, de contraposição de tese e antítese sobre a linha do tempo, descortinando o processo histórico. Dialético para Platão é aquele que deixou de ser sectário porque logrou visualizar a totalidade. O termo sectário, por sua vez, não tem a conotação fundamentalista moderna, mas indica qualquer privilégio indevido da parte sobre o todo. Um médico pode ter reunido todo o conhecimento médico da tradição. Mesmo assim esse conhecimento é parcial, constitui recorte bem limitado, que não representa o todo universal. Caso esse médico pretenda ler a natureza diretamente, apenas baseado nesse recorte, produzirá  conhecimento distorcido. Nos termos de Platão, sectário. Para ler com competência a natureza, precisa estar munido de visão totalizante da natureza e do mundo; essa conquista de uma visão que contemple a totalidade Platão designa dialética. Duas citações extraídas do nosso texto básico de referência (Perine, 2002) testemunham isso.1. “Ninguém pode ser chamado de dialético se não consegue captar a essência das coisas.” (pág. 91)2. “…quem sabe ver o todo é dialético, quem não sabe, não é.” (pág. 92)Ou seja, é sectário quem toma a parte como referência nos seus julgamentos; é dialético quem toma o todo como referência. Amparado na tese de que somente a visão do todo possibilita a verdadeira justiça, Platão entende que somente filósofos podem, legitimamente, estar à frente do mais perfeito modelo de governo possível. Modelo que chama de aristocracia. Nele, a missão essencial do governante é retirar a população  da caverna. Como? Pela educação verdadeira, afirma ele. Pela educação que conduz ao uso consciente, autônomo e competente da razão.Ora, isso nos coloca diante de um impasse. Antes foi dito que quando o sujeito que conseguiu sair da caverna volta e conta aos amigos o que viu, é desacreditado, chamado de chato, de estraga-prazeres, até mesmo de louco. Como educar gente assim?

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Principalmente porque não se trata de colocar simplesmente conhecimentos dentro da cabeça, não se trata de educação distorcida, que informa sem educar, mas de fazer o aluno elaborar a própria independência intelectual. Algo que só pode ocorrer de dentro para fora, nunca de fora para dentro. A maioria das pessoas de dentro da caverna sequer prioriza o conhecimento. Como fazê-las pensar?É em razão desse impasse estrutural que o outro texto de referência que adotamos – a palestra do professor Luis Carlos Marques da Associação Cultural Nova Acrópole de Brasília – cuida de destacar a crítica de Platão à democracia.Platão diz que existem cinco formas possíveis de governo: a aristocracia, quando a cidade é governada pelos melhores e mais bem preparados dos seus cidadãos; a timocracia, em que predomina o gosto por honrarias; a oligarquia, em que mandam os mais ricos; a democracia, quando o governo é dirigido pela maioria da população; e a tirania, que costuma ser o governo de um só.Segundo Platão, pior que a democracia somente a tirania, o que ele justifica com a alegoria da caverna. Nesse caso o governo está representado pelos que cuidam da fogueira e planejam a geração das imagens refletidas no fundo da caverna: os formadores de opinião. Qual é o objetivo desses governantes? Naturalmente serem benquistos pela população que vota e decide quem deve ocupar o poder. O objetivo principal de tal governante é manter-se no poder. Como consegue isso? Gerando imagens que agradem à população. Pois, quando as imagens lhe desagradam, ela costuma, pelo voto, democraticamente, trocar os mandatários.Naturalmente tais governantes não estão interessados em educar a população, nem mesmo possuem habilidades para tanto. Como a maioria da população não considera o conhecimento importante, mas apenas cultiva seus instintos, o que lhe agrada mesmo é o jogo das paixões, as novelas, o futebol, as páginas policiais. Por isso, tais imagens são geradas em profusão, e a situação geral da caverna nunca se altera. Pode, entretanto, ficar pior, quando a corrupção e a necessidade de preservar força política ensejam a criação incessante de cargos públicos para atender aos novos e aos velhos aliados. Na sequência do crescimento da máquina pública, crescem também os impostos, e a situação geral da população se deteriora. Finalmente, como canalha não consegue confiar em canalha, a população se vê cada vez mais explorada, começa a desejar a vinda de um salvador da pátria, que finalmente aparece e se estabelece com truculência.

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Oficialmente, para eliminar os corruptos, mas, de fato, para eliminar os adversários. Procede a uma limpa no governo, eliminando todos os possíveis concorrentes e os que não se submetem à sua vontade. Assim, concentra poder inusitado: eis claramente formulada a figura plena do tirano.Para a população ele posa de bonzinho, porém nos bastidores exerce truculência com mão de ferro, pois pretende ficar no poder o resto da vida. Um dia poderá ser assassinado, e provavelmente será substituído por outro pior. Essa, segundo Platão, é a ordem e o destino da democracia. Essa também é a razão pela qual Platão entende que o governo precise ser exercido por filósofos, por dialéticos, que conheçam a natureza em sua totalidade, que em razão disso tenham superado seus instintos e que sejam conhecedores do bem, da beleza e da justiça, porque isso os fará dedicar-se, não a interesses pessoais mesquinhos ou a agrados à população – que despreza o conhecimento e desconhece a razão -, mas ao resgate dos homens do interior da caverna, ainda que isso tenha que ser feito contra a “opinião” da maioria.4.4 – Existe saída ao impasse platônico?Este estudo objetiva justamente responder à questão. Quando examinamos os habitantes da caverna, constatamos que a maioria da população não usava a razão. Tinha, entretanto, opinião sobre tudo. Afinal de contas, a cultura predominante na caverna entendia que a realidade eram as sombras projetadas no fundo. Ora, a mente humana, por mais ingênua e despreparada que seja, por compleição estrutural, exige, no mínimo, coerência entre o que a pessoa sabe e suas interpretações. Mesmo se tratando de mera opinião, sem fundamento, resulta de experiência de vida, que representa a bagagem a partir da qual ela opina. Essa experiência, como a alegoria esclarece, é limitada, estreita; nos termos de Platão, sectária: as sombras projetadas são aceitas como se fossem a realidade. O sujeito passou a vida toda a ver aquelas sombras e somente a elas, portanto nada mais natural do que pensar que aquelas sombras sejam a única realidade existente. Trazendo essa alegoria para a nossa situação atual, temos de convir que também somos sectários, uma vez que também somos desprovidos de compreensão da totalidade universal.Olhamos para o mundo, vemos sua materialidade e acreditamos que ele se reduza à materialidade observada.

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Por que isso nos parece coerente? Porque a bagagem que usamos para julgar e entender o mundo nos diz que essa compreensão é adequada. Conforme já discutimos nos capítulos anteriores, o nosso modo de pensar está sempre confinado e condicionado por paradigma e por seus dispositivos, de sorte que a única maneira de fazer uma verdadeira revolução no modo de pensar é mudar de referencial. O paradigma que sustenta o mundo moderno ocidental, como também já vimos, pode ser chamado de cartesiano, porque é baseado nas formulações essenciais de René Descartes, as quais constituíram elementos cruciais de superação da mentalidade medieval e de estabelecimento da mentalidade científica, tipificadora da modernidade ocidental. Naturalmente a superação da mentalidade medieval não se deveu exclusivamente a Descartes, e estender o mérito a Copérnico, Galileu, Newton, Bacon e Espinosa, os mais citados, não nos livra de cometer injustiças e esquecimentos. Trata-se, entretanto, de contemplar as contribuições, destacando aquelas que mais profundamente moldaram o protótipo que preside a civilização ocidental como alicerce condicionante de toda a percepção cognitiva do homem de nosso tempo. A palavra paradigma, como aqui a empregamos, indica pressupostos culturais que geralmente não são citados nos discursos, embora estejam sempre presentes, condicionando e determinando-os de forma velada. Expressões como inconsciente coletivo, espírito do tempo ou espírito de uma época, constituem tentativas de indicar aproximadamente o que designamos por paradigma civilizatório.Nesse sentido, de ser formadora do espírito de uma época, a obra de Descartes se destaca. Ele descobriu principalmente que o espaço comporta três dimensões: altura, largura e profundidade. Como essas três dimensões viabilizam o espaço, com amplitude para comportá-lo – e é essa realidade do espaço que se oferece a todos os nossos sentidos orgânicos -, acreditamos que o mundo todo esteja contido no espaço. Só acreditamos no que manifestamente se mostre presente no espaço, isto é, aquilo que também possua três dimensões: a matéria.Tanto é verdade que a ciência não se pergunta mais sobre o que os fenômenos são, como no tempo de Platão, mas apenas se interessa pela constituição e pelo funcionamento da matéria, na única intenção de descobrir que utilidade ela pode ter para atender aos nossos interesses possessivos e de bem-estar. Coisificamos todos os fenômenos e olvidamos o ser que os constitui; atemo-nos a sua utilidade para satisfazer os nossos desejos.

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Daí o consumismo, a superficialidade, o egoísmo, a competição, a pouca ética, enfim, o modelo ocidental de civilização. Em resumo podemos afirmar que nós, ocidentais, vivemos dentro de uma caverna: a caverna do mundo ocidental. Podemos sair disso? Podemos sair da caverna? O advento do conceito de paradigma civilizatório indica que talvez seja possível, porque, ainda que a maioria da população apenas tenha opinião e não conhecimento embasado, sendo maria-vai-com-as-outras, basta ensinar-lhe a pensar segundo outro modelo. Um paradigma que mostre não o interior da caverna ocidental, mas a natureza existente fora de todas as cavernas. Um paradigma que exponha claramente a presença da totalidade, da interdependência universal, que nos vincula, e a prevalência do ser, viabilizando naturalmente uma justiça de validade universal/cósmica. Com isso, em lugar de tentar retirar da caverna as pessoas, que lá estão desde criancinhas, a estratégia mais promissora se afigura em as novas gerações nascerem já do lado de fora, à plena luz do Sol. Usamos o mito da caverna para contextualizar o problema prático que se oferece em face da índole predominante de populações que tomam as decisões em ambientes democráticos e para sustentar a conclusão de que é a educação das novas gerações, a partir de outro paradigma, que se afigura como opção mais promissora e eficaz de superação de um modelo de civilização estruturalmente destinado à catástrofe. Não significa entender que a instrução e o esclarecimento dos adultos da caverna sejam desnecessários ou inúteis. Apesar da previsível pouca efetividade no resgate dos já deformados para o novo paradigma, a disseminação das idéias também para os adultos revela-se indispensável tanto para tornar o processo consciente, e em alguma medida consentido, como para a amenização do conflito de gerações, que inexoravelmente advirá com a transferência facilitada do poder à nova cultura, quando chegar a hora.Em termos de implementação, considerando a hipótese de que um novo modelo suficientemente convincente esteja disponível, parece, em principio, indispensável o papel do Estado, pelo fato de o paradigma da totalidade requerer ação de abrangência planetária. Mas os grandes agentes seriam os professores, desafiados a dominar o novo paradigma, apesar da sua formação cartesiana. Então, pensamos indicar os dois pontos críticos do processo.

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De um lado o Estado e os governantes admitem a urgência e serem capazes de deflagrar um movimento planetário de propósito cultural, sem se aproveitar da oportunidade para tentar engendrar novas formas de concentração de poder. De outro, os educadores, serem capazes de mudar suas estruturas perceptivas e conquistar o domínio da nova ferramenta, de sorte a se tornarem aptos a realizar sua disseminação. Ambos os desafios, radicalmente dependentes do poder de convencimento do novo paradigma e das esperanças que for capaz de despertar.Trataremos de especificar esse paradigma no próximo capítulo, mas desde já o espírito nos impõe como essencial a pergunta sobre como saber se ele resolve o problema. Se o processo interpretativo exige sempre referencial, a troca de referencial não nos colocaria dentro de outra caverna? Como saber se esse novo paradigma nos situaria fora de todas as cavernas, isto é, nos colocaria realmente em presença da natureza.A resposta é simples: avaliando se ele efetivamente atende aos requisitos estruturais pretendidos. Ainda, segundo o que Platão nos ensina na República, uma das características do verdadeiro filósofo é ser dialético, não sectário, isto é, ser dotado de visão de totalidade da natureza. Como nenhum homem jamais conseguirá conhecer extensivamente toda a natureza, reunir todo o conhecimento da tradição sobre a natureza, a saída consiste em conhecer as leis básicas comuns a tudo o que existe. Ou seja, conhecer a essência ontológica do existente, o Logos ou Verbo, segundo o qual tudo se dá: as leis constitutivas do Universo, bem nos moldes do que já pensava Pitágoras, que foi referência tanto de Sócrates como de Platão.Pitágoras já conhecia o modelo capaz de resolver a questão, assim como os sacerdotes do antigo Egito. Aquelas eram, respectivamente, versões matemática e geométrica do paradigma, que hoje, tal como moedas antigas, já não possuem mais valor de curso. Agora, como se verá, a nova versão do Logos acrescenta a lógica à geometria e à matemática, gerando um modelo adaptado às exigências e condições da cultura científica moderna, afinal trata-se de convencer mentes científicas. Portanto, sem mais delongas, tratemos de especificar esse modelo lógico e de verificar as suas potencialidades.