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BIOLOGIA, SOCIEDADE E CONHECIMENTO EIXO

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I. Ciência, vida cotidiana e o sistema produtivo

II. Ciências, sociedade e ética

III. Ciências da natureza e ciências do homem

IV. Breve discussão sobre a guerra das ciências

V. Referências

Reflexões sobre as ciências e sua função social

Unidade 2

Autora: Professora Ângela Maria Zanon

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128 Módulo II — Processos biológicos na captação e na transformação da matéria e da energia

[...] o conhecimento científico é hoje aforma oficialmente privilegiada de conhecimento e a sua importância para a vida das sociedades contemporâneas não oferece contestação [...].

(SANTOS, 2004, p. 17).

Caro(a) aluno(a), Vamos juntos refl etir sobre o desenvolvimento científi co e o que isso signifi ca para

a humanidade e para nossa vida cotidiana. Ciência, como vida cotidiana e o sistema produtivo,

[...] pode ser considerada como: uma linguagem construída pelos

homens e mulheres para explicar o nosso mundo natural (CHASSOT,

2003, p. 91).

Quero envolvê-los nesta aventura que é entender como o conhecimento cien-tífico acumulado pela humanidade interfere em nosso cotidiano, sem que tomemos consciência disso.

Vocês já pensaram em quanto trabalho, quanto tempo e dinheiro foram investidos para que em um simples toque de dedo se faça a luz em nossas casas? Em quanto conhe-cimento científi co está presente em um ato mecânico que nos parece banal?

Granger (1994) qualifi ca a segunda metade do século XX como A idade da Ciência, mesmo considerando a importância do conhecimento científi co produzido no século XIX

#M2U2 I. Ciência, vida cotidiana e o sistema produtivo

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Saiba mais

Foi assinado em Montreal-Canadá, em fevereiro de 2000, um protocolo de Biossegurança em função dos organismos geneticamente modificados.

e lembrando que isso foi determinante para o extraordinário desenvolvimento da ciência no século XX.

Qualquer descoberta científica não tem como finalidade única sua utilização, sua colocação a serviço da humanidade, mas a possibilidade de oferecer um passo se-guinte para novas descobertas.

O desenvolvimento e a utilização de tecnologias cada vez mais avançadas, ao mes-mo tempo em que trazem soluções imediatas, trazem também problemas a longo prazo, e portanto, devem ser cuidadosamente avaliados.

Segundo Granger:

[...]a presença da ciência no cotidiano do cidadão é anônima, já que a

maioria de nós ignora completamente os seus modos de intervenção [...]

é fundamentalmente por intermédio do objeto técnico que a ciência nos

toca em nossa vida cotidiana. (GRANGER, 1994, p. 16-17).

Basta pensar na televisão em branco e preto (com válvulas), na TV a cores e agora na TV de plasma. Relembrar como o primeiro computador ocupava sozinho uma sala inteira (na Filadélfia, em 1946, com 18 mil válvulas e 200 bits de memória), hoje um pen drive pode ter 1 giga de memória e ser carregado no bolso ou um notebook, que pode ser transportado em uma pequena maleta. Ou, então, pensar nos aparelhos de telefonia ce-lular que servem para a comunicação, tiram e enviam fotos, tocam música, transmitem mensagens escritas.

São equipamentos que estão presentes em nossa vida cotidiana, resultado de pesquisa e produção científica aliada à técnica. E, como fazem parte do nosso cotidiano, não nos preo-cupamos sequer em pensar quanta ciência e quanta tecnologia sua produção envolveu.

A partir do fim do século XVII, ciência e técnica realmente se uniram por

laços indissolúveis (GRANGER, 1994, p. 17).

Atividade complementar 1Pesquise a história do microscópio e o que seu desenvolvimento proporcionou à ciência.

Outro aspecto importante a ser lembrado é com relação à presença da ciência em nossa mesa. Gil-Pérez e Vilches nos trazem essa discussão lembrando da utilização em grande escala de fertilizantes e pesticidas:

[...] a partir da segunda Guerra Mundial produziram uma verdadeira

revolução agrícola [...] da mesma forma que a utilização de produtos

sintéticos no combate a insetos, pragas, doenças e fungos, aumentaram

grandemente a produtividade no campo, visto como necessidade em

função do crescimento populacional mundial [...] (GIL-PÉREZ e VIL-

CHES, 2005 p. 26)

Não vamos, nesse momento, questionar a necessidade de aumento de produção nessas áreas, mas podemos questionar os custos ambientais e para a saúde, que isso re-presentou e ainda representa.

Hoje temos a noção exata dos prejuízos à saúde e dos problemas ambientais cau-sados pela utilização desmedida desses produtos. É preciso lembrar que esses dados são resultantes de pesquisas científicas, que foram avaliados em sua potencialidade contra insetos considerados pragas e ignoradas as conseqüências secundárias, como aspectos de contaminação ambiental, por exemplo.

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Reflexões sobre as ciências e sua função social

Atividade complementar 2Pesquise, analise, reflita e redija sua opinião a respeito dos benefícios e malefícios dos organismos geneticamente modificados. Disponibilize esta reflexão para uma discussão em grupo, tendo seu tutor como mediador. Sugestão: consulte os seguintes sites sobre diferentes opiniões a respeito dos orga-nismos geneticamente modificados:

http://www.agroportal.pt/a/2001/jpicarra.htmhttp://www.comciencia.br/reportagens/transgenicos/trans01.htm

Vamos abrir um pequeno parêntese para lembrar da alfabetização científica que deve fazer parte da educação geral do cidadão, que difere da formação do cientista:

[...] alfabetização científica — pode ser considerada como uma das di-

mensões para potencializar alternativas que privilegiam uma educação

mais comprometida [...], defende [...] que a ciência seja uma linguagem;

assim ser alfabetizado cientificamente é saber ler a linguagem em que

está escrita a natureza [...] é um analfabeto científico aquele incapaz de

uma leitura do universo [...] (CHASSOT, 2003, p. 91).

Podemos constatar que os currículos escolares são reducionistas, concentram-se em conteúdos básicos e impedem a visão global dos conhecimentos, que podem promo-ver a visão crítica do cidadão, a sua alfabetização científica.

Isso acontece em todos os níveis do ensino formal. Porém, termos como biosse-gurança, organismos geneticamente modificados, ecodesenvolvimento, sustentabilidade, entre muitos outros, precisam fazer sentido e partir do cotidiano do cidadão, para que ele possa avaliar inclusive seu estilo de vida.

Pois, como nos lembra Leff, a capitalização da natureza se dá nos processos de:

apropriação e distribuição desigual [...] a partir das estratégias de po-

der inscritas na lógica do mercado e da racionalidade do conhecimento

(LEFF, 2006, p. 31).

A produção, em larga escala, de bens e produtos, possibilitada pelo desenvolvi-mento tecnológico, baixa os custos do produto, sua qualidade e durabilidade a ponto de torná-lo descartável. Isso eleva os custos ambientais, seja na velocidade com que os recursos naturais são explorados, seja no descarte da matéria-prima, industrializada e rapidamente transformada em “lixo” e descartada, lembrando que o que chamamos de “lixo”, na maioria das vezes, é matéria-prima desperdi-çada ou subutilizada.

[...] A crise ambiental veio questionar os fundamentos ideológicos e teóricos que impulsionaram e legitimaram o crescimento econômico, negando a natureza e a cultura, deslocando a relação entre o real e o simbólico. A sustentabilidade ecológica aparece assim como um cri-tério normativo para a reconstrução da ordem econômica, como uma condição de sobrevivência humana e para o desenvolvimento durável

(LEFF, 2006, p. 133-134).

O consumismo de bens e produtos da sociedade ocidental é empecilho à sustenta-bilidade ecológica. Da mesma forma que trazemos para o nosso cotidiano as inovações técnicas e tecnológicas, trazemos também aspectos da crise ambiental, alimentada pelo consumismo exagerado, pelo desperdício e pelo desconhecimento.

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Ainda em resposta à crise ambiental, Leff nos esclarece que:

são propostas estratégias de ecodesenvolvimento, postulando a necessi-

dade de se criar novas formas de produção e de estilos de vida baseados

nas condições e potencialidades ecológicas de cada região, assim como

nas diversidades étnicas e na capacidade das populações locais para a

gestão participativa dos recursos naturais (Idem, ibidem, p. 135).

Esses são aspectos de responsabilidade socioambiental, da qual todo cidadão deve ter conhecimento e dela participar.

Pois, não importa onde estejamos, temos sempre ao nosso alcance algo resultante de construção científica, de produção tecnológica. Pode ser um artefato de cozinha, uma caneta esferográfica, um computador, um objeto de entretenimento, um veículo de trans-porte, um aparelho de hemodiálise, um cartão de banco ou mesmo uma arma.

São artefatos, produtos resultantes de desenvolvimento científico nas áreas de quí-mica, física, biologia, mecânica, computação, entre muitas outras que fazem parte do nos-so cotidiano, seja como usuários, seja como produtores.

Atividade complementar 3Olhe em torno do ambiente onde você está nesse momento e tente imaginar que áreas das ciências foram necessárias para se chegar à produção de algo que está ao alcance de sua mão.

a) Liste as ciências que você julga que estão envolvidas na construção de dois obje-tos, como por exemplo: um celular e um lápis.

b) Depois de listar as ciências, construa um mapa conceitual com os conteúdos do en-sino (todas as disciplinas) que você poderia desenvolver a partir desses dois objetos.

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Refl exões sobre as ciências e sua função social

O desenvolvimento das ciências transforma o homem, transforma o mundo e con-seqüentemente se transforma com ele. O desenvolvimento tecnológico possibilita uma velocidade muito grande nas transformações que a sociedade vem presenciando, notada-mente a partir da segunda metade do século XX. Transformações que trouxeram e trazem benefícios para a vida humana, mas que também têm promovido muito desequilíbrio ambiental em função da utilização dos recursos naturais muito acima do que o ambiente pode suportar.

Assim, o desenvolvimento cada vez mais rápido das ciências trouxe consigo pro-blemas éticos, seja em seu desenvolvimento ou em sua aplicação.

Granger coloca o problema da seguinte forma:

[...] deve-se deixar à ciência em marcha a liberdade total de explorar to-

dos os seus caminhos de pesquisa, sabendo que seus resultados poderão

eventualmente ser utilizados contra o que reconhecemos como o bem

coletivo? ( GRANGER, 1994, p. 20)

ou ainda: São os cientistas responsáveis pelas conseqüências nefastas do saber que

produziram? (Idem, ibidem, p. 20).

Esse é um debate que precisa ser travado no seio da sociedade. Limitar pesquisas científi cas pode signifi car danos irreparáveis para a humanidade, mas é preciso ética e responsabilidade na propositura de pesquisas e na aplicação de seus resultados.

Cita, ainda, como exemplo:[...] os problemas provocados pela presença das instalações nu-cleares, a proliferação do lixo atômico, a existência de ‘buracos de ozônio’, a engenharia genética, a procriação com auxílio mé-dico, os transplantes de órgãos, o prolongamento artifi cial da

vida por aparelhos [...] (GRANGER, 1994, p. 20).

Essa lista pode se tornar extremamente longa com novos itens sendo acrescentados todos os dias, porém ele próprio nos lembra que esse fenômeno:

Depois de pelo menos dois séculos de fé universal no progresso científico, o fim do século XX opõe as liberdades conquistadas pela humanidade graças a um domínio crescente da natureza aos estragos que esse progresso foi engendrando pouco a pouco e que parece impor-se aos indivíduos e às sociedades futuras. Essas dificuldades manifestam-se nitidam-ente em forma de custos sociais. O custo social que se identifi-cou mais rapidamente, desde os anos 60, foi o da destruição cada vez mais acelerada do ambiente natural. Com o ritmo da produtividade atual, determinada pelas tecnologias modernas, os recursos, ditos não renováveis, correm o risco de se esgota-rem em pouco tempo, quer se tratem de recursos energéticos ou de terras aráveis. Além disso, as indústrias baseadas nas ciências físicas, químicas e biológicas, normalmente, são produtoras de poluições, também destruidoras ou perturbado-ras da natureza. (BLONDEL, 2005, p. 15).

#M2U2 II. Ciências, sociedade e ética

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[...] diz respeito diretamente a certas aplicações do conhecimento,

muito mais do que o próprio conhecimento [...] um conhecimento en-

contrará necessariamente, para o mal ou para o bem, quem o aplique

[...] (Idem, ibidem, p. 21).

Portanto, as questões éticas estão presentes na aplicação do conhecimento muito mais do que em sua produção. Cabe à sociedade regular a utilização, mas cabe também ao cientista analisar as possíveis vertentes de sua aplicação.

Segundo Fourez (1994), nos debates sobre ética, as ciências podem expressar sua interpretação, de acordo com suas especializações, que podem não estar em consonância com outros pareceres éticos.

Por exemplo: em que momento de seu desenvolvimento um feto humano pode ser considerado um ser humano? As ciências biológicas darão sua posição, considerando todos os aspectos, biológicos, químicos, genéticos, fisiológicos, etc. A Psicologia e a Socio-logia, levarão em consideração outros parâmetros para se posicionarem sobre essa mesma questão, portanto sua visão ética também será diferente. Esses parâmetros são estabeleci-dos pelos limites dos paradigmas destas ciências, portanto todos podem ter argumentos fortes e coerentes para defender seu posicionamento:

[...] diante das questões éticas relativas à contracepção, por exemplo, a

Psicologia, a Biologia e a Sociologia trarão elementos próprios de análise

[...] (FOUREZ, 1994, p. 300).

Saiba mais sobre bioética visitando o site do Centro de Bioética – CREMESP:http://www.bioetica.org.br/

A interdisciplinaridade no desenvolvimento de pesquisas pode minorar essas dife-renças, mas não resolvê-las, pois quaisquer que sejam as escolhas, quaisquer que sejam as decisões, não satisfarão completamente todas as áreas do conhecimento envolvidas.

Assim, [...] o que a ciência não pode fornecer jamais é a resposta à questão ética.

Mas pode e deve considerar todos os aspectos éticos concernentes à sua

área de conhecimento, principalmente nos aspectos éticos relacionados

às questões sociais e ambientais. (Idem, ibidem, p. 300)

Nenhuma dessa escolhas é, contudo, indiferente, pois, afinal, nós nos tor-

namos aquilo que fazemos em nossa história (FOUREZ, 1994, p. 302).

Hoje existem, necessariamente, nas universidades e centros de pesquisa brasileiros, Comitês de Ética. Esses comitês analisam projetos de pesquisas que envolvem seres humanos (Resolução do Conselho Nacional de Saúde n. 196/1996. Site:

http://conselho.saude.gov.br/comissao/conep/resolucao.html)

É obrigatória, também, a existência de um Comitê de Ética para pesquisas envol-vendo animais.

Estamos vivenciando hoje uma situação ímpar na história da humanidade. Em-bora a maioria da população mundial se beneficie dos avanços científicos e tecnológicos (remédios, técnicas cirúrgicas, produtos alimentícios, equipamentos para lazer e entrete-nimento, facilidade de comunicação e locomoção, entre outras de uma longa lista), ain-

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134 Módulo II — Processos biológicos na captação e na transformação da matéria e da energia

Reflexões sobre as ciências e sua função social

da enfrentamos sérios problemas de exclusão social e tecnológica, seja de populações marginalizadas, de países empobrecidos por guerras ou que enfrentam sérios problemas ambientais, como a falta de água, por exemplo.

Não podemos ter a ilusão de que soluções científicas, técnicas ou tecnológicas resol-verão esses problemas, pois têm servido mais para a exclusão do que para a globali-zação, para as relações sociais e ambientais mais sadias, mais ética e mais justa.

Países ricos tornam-se ainda mais ricos e poderosos com a produção de tecnologias cada vez mais avançadas (incluindo aí desde produtos para alimentação e promotores de saúde até artefatos de espionagem industriais e bélicos). E quanto mais ricos e poderosos se tornam, mais investem em pesquisas científicas e tecnologia. Restam para os países pobres, os problemas, principalmente, os socioambientais.

Segundo Altvater:

[...] como os ecossistemas globais são limitados, outras espécies de natureza

viva são reprimidas e por fim eliminadas. A sociedade industrial reduz a

multiplicidade natural [...]. Concorrentes são eliminados na medida em que

lhes são retiradas as bases vitais: concorrentes que não podem se defender,

como povos indígenas, animais e vegetais. (ALTVATER, 1995, p. 30)

Podemos acrescentar a esses “concorrentes”, populações pobres (ou países pobres), marginalizadas, expostas a riscos ambientais como poluição industrial (das águas e do ar), resíduos da produção de bens e serviços que determinam melhor qualidade de vida para uma parcela da população de cidades ou de países.

Segundo Guimarães, as origens dos problemas ambientais são:

[...] conseqüências de uma intervenção antrópica sobre o meio, e essa inter-

venção vem rompendo a capacidade suporte desse ambiente se auto-equi-

librar através de sua dinâmica natural [...]. (GUIMARÃES, 2006, p. 16)

Salienta que essa intervenção:

[...] é o resultado das relações sociais constituídas e constituintes de um

meio de produção, promotor de um modelo de desenvolvimento, que

imprime uma forma de relação (fragmentada, individualista e privatis-

ta) entre sociedade e natureza (Idem, ibidem, p. 16).

O desenvolvimento e a utilização de tecnologias cada vez mais avançadas, ao mes-mo tempo em que traz soluções imediatas, geram problemas a longo prazo e devem ser cuidadosamente avaliadas.

Porém, como nos lembra Bateson:

Populações humanas existem hoje graças à interferência maciça na “na-

tureza”. Sem a invenção da agricultura e de outras tecnologias, popula-

ções humanas teriam permanecido minúsculas, e a maioria dos nossos

ancestrais jamais haveria nascido [...] provavelmente, cada um de nós

está vivo graças a tecnologias médicas, saúde pública e imunizações

(BATESON, 1997, p. 26-27).

A expectativa de vida do brasileiro chega hoje a aproximadamente 70 anos, fato impensável nos séculos XVII e XVIII. Certamente, isso se deve a produtos e arte-fatos tecnológicos, produtos da criatividade e genialidade da própria humanidade, ao longo de sua história.

“O mundo unificado é um mundo dividido” (ALTVATER, 1995, p. 25). O mundo tornado global pela tecnologia da comunicação e da informação e pelos meios de trans-

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porte é o mesmo mundo dividido entre os que têm acesso aos artefatos técnicos e tecno-lógicos e os que ficam com os prejuízos e os custos socioambientais de sua produção. Seja em termos de qualidade ambiental, seja pela exclusão social:

Qualquer estratégia de desenvolvimento e, portanto, de industrialização,

traz conseqüências para o mundo. Desenvolvimento e meio ambiente

encontram-se em uma relação recíproca: atividades econômicas trans-

formam o meio ambiente, e este alterado constitui uma restrição externa

para o desenvolvimento econômico e social (ALTVATER, 1995, p. 26).

Atividade complementar 41. Relacione pelo menos 10 bens e produtos que foram disponibilizados às popu-lações humanas nas últimas 50 décadas e liste os benefícios e malefícios de sua produção e de sua utilização.

2. A partir da atividade anterior discuta o conceito de justiça socioambiental

De acordo com Leff:

[...] os processos biológicos que contribuem para a formação de um es-

toque de matérias primas haviam sido considerados, até antes da crise

ambiental, como uma oferta gratuita de recursos naturais [...] os sistemas

vivos não estabelecem apenas um conjunto de condições que a economia

deve respeitar e funciona como umbrais da capacidade de carga dos ecos-

sistemas. A natureza, como um conjunto de sistemas de suporte de vida,

potenciais ecológicos e de serviços ambientais, é condição fundamental

para a existência de uma economia sustentável. (LEFF, 2006, p. 185)

Saiba mais sobre desenvolvimento sustentável no site da Universidade de Brasília: http://www.unb.br/temas/desenvolvimento_sust/index.php

Falar em economia sustentável é falar em ética e em justiça ambiental, que confor-me menciona Carvalho:

[...] é um termo cada vez mais freqüente nos fóruns sociais e diz respeito

ao conjunto de princípios e práticas que asseguram aos grupos sociais o

acesso aos bens ambientais e ao seu uso, o acesso às informações sobre

os recursos ambientais, a destinação de rejeitos, a localização de riscos.

(CARVALHO, 2004, p. 169-170)

Precisamos considerar também que o desenvolvimento das ciências conduziu a novas especialidades, que surgiram de interfaces entre áreas do conhecimento (ou disci-plinas - por exemplo: biofísica, bioquímica), que têm contribuído para a construção inter-disciplinar do conhecimento. Isso, segundo Leff, tem possibilitado que:

[...] a aplicação progressiva das ciências e das técnicas no sistema pro-

dutivo faça confluir uma diversidade de atividades de pesquisas num

projeto de desenvolvimento econômico-social (LEFF, 2001, p. 35)

“A ciência nunca teria sido ciência se não tivesse sido transdisciplinar” (MORIN, 2000, p. 136). Faz-se necessário pensar não apenas nas conexões entre as ciências biológi-cas, físicas e químicas, mas também destas com as ciências humanas (Psicologia, Pedago-gia, Ética, Economia, Sociologia, entre outras) pois:

[...] ciência e razão [...] têm poderes absolutamente ambivalentes sobre o

desenvolvimento futuro da humanidade. (idem, ibidem, p. 125)

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Refl exões sobre as ciências e sua função social

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Decisões sobre o futuro da humanidade são decisões políticas, mas principalmente decisões éticas, que não devem fi car restritas aos meios políticos e científi cos. Os cami-nhos trilhados pelo desenvolvimento científi co passam também por questões econômicas, inclusive e principalmente por quem fi nancia pesquisas. Depende do homem a destinação que se dará aos conhecimentos científi cos sistematizados a cada nova descoberta.

A transformação das ciências, o aprimoramento dos conhecimentos científi cos, téc-nicos e tecnológicos, se falarmos em termos éticos, deveria atender a todos os po-vos, principalmente quando seu produto signifi ca melhoria das condições de vida.

Segundo Morin(2000), a introdução da ciência nas universidades (século XIX), nas empresas, indústrias e no âmbito do Estado, que fi nancia, controla e desenvolve institui-ções de pesquisa científi ca, a colocou em uma posição central de destaque.

Podemos citar como exemplo o desenvolvimento do Projeto Genoma Humano, que teve a participação de muitos países e muitos pesquisadores, que contribuíram com o desenvolvimento de pesquisas, com equipamentos e fi nanciamento. Da mesma forma os conhecimentos adquiridos estão disponibilizados para todos os parceiros, para usá-los ou dar seqüência a novas pesquisas.

Este autor cita Thomas Kuhn que diz que:

[...] o desenvolvimento da ciência não se efetua por acumulação de co-nhecimentos, mas por transformações dos princípios que organizam o conhecimento, [...] a ciência não se limita a crescer, transforma-se [...] (KUHN apud MORIN, 2000).

E ressalta que: [...] a relação entre ciência e técnica passou a ser dominante e indissolú-vel. (Idem, ibidem, p. 125)

Os problemas socioambientais gerados pela intensa utilização dos recursos natu-rais, nas últimas décadas, estão exigindo a transformação da ciência, conforme cita Kuhn (apud MORIN, 2000). É necessária e urgente a adoção de práticas produtivas responsáveis e socialmente mais justas. A produção multidisciplinar do conhecimento, considerando os aspectos biológicos, físicos, químicos, sociais, econômicos e ambientais, pode diminuir as desigualdades sociais geradas pelos modos de produção adotados até então. A crise ambiental está posta como um fato para a humanidade.

Existem várias pesquisas de cunho multidisciplinar, um exemplo disso é a recente dissertação defendida por Bruno Bernardes (CDS/UnB) tratando de um tema so-cioambiental nas empresas do Distrito Federal. Leia a reportagem no site:http://www.unb.br/acs/bcopauta/desenvolvimentosustentavel2.htm.

A pesquisa completa pode ser encontrada na biblioteca virtual do CDS/UnB:http://www.unbcds.pro.br/pub/?

Problemas ambientais não têm fronteiras, assim as conse-qüências dos danos ambientais podem chegar a qualquer cidadão, independente de onde viva, e de seu status social e econômico.

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Antes de tudo, é preciso pensar em que se constituem as ciências da natureza e as ciências do homem.

As conhecidas como ciências da natureza são, por exemplo: a química, a física, a bio-logia e as ciências do homem, a Sociologia, a Psicologia, a Lingüística, entre outras.

Granger coloca uma questão sobre em que sentido é lícito atribuir o termo ciência aos saberes sociológicos, psicológicos, econômicos ou lingüísticos, por exemplo.

[...] o obstáculo fundamental está, evidentemente, na natureza dos fenô-

menos do comportamento humano, que carregam uma carga de signifi-

cações que se opõe a sua transformação simples em objetos, ou seja, em

esquemas abstratos, lógicos e matematicamente manipuláveis. (GRAN-

GER, 1995, p. 85)

A grande diferença é que as ciências ditas experimentais podem, se necessário, ma-nipular seus objetos de estudos, construir modelos, realizar simulações, colocar seu objeto de estudo sob um microscópio ou em uma gaiola.

Isso não é possível nas ciências humanas, onde o pesquisador é fundamentalmen-te um observador, uma vez que, independente de sua área de pesquisa, seu informante ou é um ser humano ou tem relação estreita com ele, como se dá nas pesquisas históricas, por exemplo, onde se busca conhecer o fato histórico através de documentos (produção humana), ou através de relatos de pessoas que o presenciaram.

Cada situação de pesquisa nas ciências humanas é única, pois é localizada no tem-po e no espaço, não se repete, não pode ser remontada, reconstruída, como a reprodução de um fato histórico, por exemplo. Até mesmo as condições psicológicas dos participantes são outras, dessa forma, a situação é uma reconstrução, é falsa, é ilusória. Pode servir para contextualizar, para permitir uma visualização, mas o momento real da pesquisa passou.

As ciências humanas não permitem generalizações ou conceitualizações, mas possibili-tam uma multiplicidade de pontos de vista que, segundo Granger (GRANGER, 1994, p. 92):

[...] são estas características que distinguem visivelmente das ciências da

natureza, as tentativas de conhecimento científico dos fatos humanos [...] Continua:

[...] vimos que as estruturas matemáticas desempenham um papel de-

terminante na formação dos conceitos das ciências da natureza (Idem,

ibidem, p. 92).

As análises quantitativas, estatísticas, por exemplo, também são utilizadas nas ciên-cias humanas, agregam valores às análises qualitativas.

Porém, é preciso lembrar que as ciências biológicas também se utilizam de análises qualitativas, onde a subjetividade tem seu papel, e isso não torna seus resultados menos confiáveis.

Nas pesquisas em ciências biológicas, uma das vertentes é a pesquisa em comporta-mento animal. Nesse caso, o pesquisador se serve da observação como método de pesqui-sa. É permitido a ele colocar seus objetos de pesquisa em uma situação de experimentação, com a utilização de grupos controle (o que não é permitido para as ciências humanas). Em

#M2U2 III. Ciências da natureza e ciências do homem

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Reflexões sobre as ciências e sua função social

função destas observações e possivelmente com análises estatísticas ele poderá indicar resultados ou caminhos.

Uma vez que os dados estatísticos coletados em uma pesquisa em ciências biológi-cas não trazem a resposta por si e precisam ser analisados pelo pesquisador, cabe a nós questionar: que capacidades ele utiliza para estas análises? Será que é totalmente isento de interferência de seu eu, de seus pressupostos teóricos e paradigmáticos?

Com relação à validação dos dados, dificuldades podem ser encontradas tanto nas ciências humanas quanto nas ciências experimentais. A diferença é que as ciências expe-rimentais podem repetir os experimentos, podem reproduzir as condições exatas ou se aproximarem delas, refazer os experimentos, confirmar os resultados, ou a presença de um elemento diferente, inesperado, pode alterar os dados dando respostas diferentes da primeira situação. Nas ciências humanas não é possível repetir uma situação anterior. Cada situação é um novo momento.

Segundo Santos, estas disputas contribuíram:

[...] para aprofundar a auto-reflexividade das ciências e dos cientistas,

tornando mais explícitos os pressupostos e as crenças metacientíficas

em que se baseia o conhecimento científico (SANTOS, 2004, p.25).

As áreas de atuação para pesquisas nas áreas das ciências experimentais tanto como para as áreas das ciências humanas se expandiram. A interdisciplinaridade na pesquisa se tornou realidade obrigatória frente aos novos problemas colocados.

Nunes confirma essa postura dos cientistas lembrando que:

[...] as mudanças climáticas globais, a biodiversidade humana, a prima-

tologia, as ciências do ambiente ou as ciências cognitivas são exemplos

de terrenos novos, cujos objetos são, ao mesmo tempo, “naturais” e “so-

ciais”, e que têm levado a novas articulações dos saberes e a colaborações

e aproximações entre pesquisadores de áreas tradicionalmente separa-

das pela “grande separação” das “duas culturas” (NUNES, 2004, p. 68).

Da mesma forma, como ciência e religião chegaram a pontos de consenso, tam-bém as “duas culturas” – ciências experimentais e ciências humanas – vivenciam uma nova realidade.

O conhecimento científico, independente da área de conhecimento, é sempre alvo de discussões:

[...] em um dado momento histórico e numa dada sociedade, foram obje-

to de debates sobre a sua natureza e suas potencialidades, os seus limites

e seu contributo para o bem-estar da sociedade. (SANTOS, 2004, p. 17)

Estes debates têm sua origem geralmente na possi-bilidade de que o conhecimento possa conferir “privilé-

gios extracognitivos (sociais, políticos, culturais) a quem o detém” (idem, ibidem p. 17).Os privilégios que esses conhecimentos conferem, coloca nações (ou regiões, ou

grupos sociais) em situação de vantagem sobre outras, sejam conhecimentos elaborados para tempos de guerra ou para tempos de paz, sejam nas áreas das ciências humanas, biológicas, tecnológicas, etc.

#M2U2 IV. Breve discussão sobre a guerra das ciências

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Segundo Santos:[...] ao longo dos últimos três séculos, os debates sobre a ciência tiveram

sempre duas vertentes: a natureza e o sentido das transformações do mun-

do operado pela ciência; a natureza e a validade do conhecimento científi-

co que produz e legitima essas transformações. (SANTOS, 2004, p. 19)

Esses debates aconteceram (e acontecem) entre cientistas de uma mesma área do co-nhecimento e entre as áreas de conhecimento. Segundo Santos (2004), deu-se inicialmente “entre cientistas e titulares de outros conhecimentos – filósofos, teólogos, artistas, etc”.

Aqui temos um ponto importante para reflexão desta disputa que foi denominada guerra das ciências: a desconsideração de algumas áreas do conhecimento como não científicas, em função, inclusive, de seus princípios epistemológicos e metodológicos.

A primeira fase significativa desse debate aconteceu na década de 1950 entre as “duas culturas – a humanística e a científica –” como citado por Santos e que foi iniciada por uma conferência proferida por C.P. Snow (SANTOS, 2004, p. 20).

Essas discussões, ou os últimos debates, começaram na década de 1990, na Inglater-ra, se estenderam para os Estados Unidos e retornaram à Europa.

Ainda segundo Santos:

[...] foi um debate entre cientistas em geral e cientistas cujo objeto de investi-

gação é a própria ciência, enquanto fenômeno social (SANTOS, 2004, p. 19).

Esse debate tinha como princípio primeiro desacreditar as pesquisas realizadas na chamada área humanística das ciências.

Muitas reações foram registradas em conferências, encontros e publicações de li-vros. Em Portugal estava se implantando um sistema nacional de ciência e tecnologia com a constituição e consolidação de “centros e institutos de investigação apoiados por financiamentos públicos e sujeitos à avaliação internacional”, com o objetivo de investir na formação de jovens cientistas de todas as áreas do conhecimento:

[...] incluindo as ciências naturais, as áreas tecnológicas, as ciências so-

ciais e as humanidades – e caracterizou-se por experiências extrema-

mente produtivas, de diálogo e de colaboração entre investigadores das

ciências naturais e cientistas sociais que se dedicavam ao estudo das

ciências (SANTOS, 2004, p. 22-23).

Isso está de acordo com o que dissemos acima sobre a fecundidade da interdisci-plinaridade, não apenas para a disseminação de conhecimento em sua forma mais con-textualizada, mas para a produção do conhecimento. As áreas de sobreposição entre as áreas de conhecimento são inegáveis, em função inclusive dos desdobramentos que uma descoberta científica possibilita.

Podemos exemplificar com o que está muito próximo de nós neste curso. Hoje a educação lança mão de muitos recursos tecnológicos como recurso didático, inclusive o uso de softwares. Em princípio eles não eram idealizados, produzidos visando ao processo educacional, mas à educação; Os educadores e os pesquisadores em educação se apropria-ram deles, promoveram adaptações e, finalmente, estimularam a realização de pesquisas por pesquisadores das áreas de informática e comunicação voltadas para a educação. Isso só foi possível graças ao trabalho interdisciplinar de pesquisadores em educação e pes-quisadores das áreas tecnológicas. Dois saberes produzindo conhecimento científico com um objetivo comum.

Os desdobramentos dessas incursões estão sendo usados cotidianamente por vo-cês, nossos alunos.

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Reflexões sobre as ciências e sua função social

Atividade complementar 5Busque conhecer um software educativo para as Ciências Biológicas. Analise os conhecimentos biológicos existentes nesse software e sua forma de interatividade. Reflita sobre o que foi possível aprender com ele não apenas sobre as Ciências Bio-lógicas mas também sobre as possibilidades tecnológicas presentes. Mas não basta refletir, socialize suas idéias com seu tutor e com seus colegas de curso. Lembre-se a construção do conhecimento é dialógica!

Para as ciências experimentais, até muito recentemente, os dados obtidos pelas pes-quisas em ciências humanas careciam de validação, de confiabilidade, talvez em função das pesquisas em ciências humanas terem, de início, se apropriado de metodologias das áreas das ciências ditas experimentais. Hoje, as ciências humanas possuem uma identida-de própria, seja epistemológica, seja metodológica.

Todo processo de construção do conhecimento, tanto nas ciências experimentais, quanto nas ciências humanas, requerem do pesquisador uma postura ética e crítica, e que a condução da pesquisa seja realizada de forma sistematizada e criteriosa.

Porém, cabe perguntar: não são todas as ciências – ciências do homem? Seja qual for o objeto de estudos, quem o faz é um ser humano que mesmo procu-

rando desvendar, ou desvelar os mistérios da natureza, é um indivíduo com característi-cas próprias e únicas. Seu olhar, sua sensibilidade, seu passado e mesmo a decisão de se utilizar determinados pressupostos teóricos para embasar sua pesquisa é que determinam sua análise final, suas conclusões.

Assim também ocorre com os cientistas que buscam desvendar os segredos do ho-mem, enquanto ser social, que vive em um grupo social, que dele recebe influência ao mesmo tempo em que o influencia. Concordamos com Minayo (1994, p. 14) que diz que:

[...] não é apenas o investigador que dá sentido ao seu trabalho intelec-

tual, mas os seres humanos, os grupos e as sociedades que dão signifi-

cado e intencionalidade às suas ações e às suas construções, na medida

em que as estruturas sociais nada mais são que ações objetivadas (MI-

NAYO, 1994, p. 17).

Assim, os cuidados, os critérios, a seriedade, a ética e as metodologias devem fazer parte do mundo do pesquisador, seja ele um pesquisador das “ciências naturais” ou das “ciências do homem”.

Atividade complementar 61. Selecione dissertações de mestrado e teses de doutorado, de áreas de conheci-mento das Ciências Biológicas e das Ciências Humanas (Sociologia, Psicologia, Jor-nalismo, Economia, etc.). Verifique os pressupostos teóricos que sustentam a pes-quisa, a metodologia utilizada para a coleta e para a análise dos dados e a própria estruturação em capítulos desses trabalhos científicos.

2. Discuta as peculiaridades de cada proposta científica, inclusive em termos de validação e credibilidade dos dados da pesquisa realizada.

3. Faça essa reflexão lembrando do que nos diz Minayo:

[...] é a pesquisa que alimenta a atividade de ensino e a atualiza fren-

te à realidade do mundo, embora seja uma prática teórica, a pesqui-

sa vincula pensamento e ação. (MINAYO, 1994. p.17)

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#M2U2 V. Referências