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Sociologia e Direito em Emile Durkheim/ por Luciano Albino. O grande investimento intelectual do pensador francês E. Durkheim foi de criar uma ciência social que tivesse o mesmo rigor teórico e metodológico próprio daquelas relativas aos fenômenos naturais como física, química e biologia, por exemplo.  Nestes termos procurou res ponder as principais questões sociológicas segundo o espírito científico cartesiano, segundo o qual a razão metódica deve encaminhar qualquer  pesquisa que deseje construir um conhecimento válido do ponto de vista da observação e da experimentação. Como sociólogo, Durkheim desenvolveu uma compreensão bem particular sobre a sociabilidade, ou seja, responder como a sociedade é possível ou o que garante a vida humana em funcionamento, mesmo num contexto de crises e contradições próprias do cotidiano moderno. Seu entendimento era o de que toda sociedade só pode existir segundo a solidariedade ou sentimento de interdependência que o ser humano possui em relação ao outro.  Neste sentido, não significa ajuda, compaixão ou caridade, mas sim, interdependência na medida em que o i ndivíduo tem consciência de que a vida em grupo é mais eficaz ao suprimento de suas necessidades do que se estivesse sozinho. Não é possível sociedade sem tal princípio, de tal maneira que a vida coletiva pressupõe, para Durkheim, a formação de um contexto que possui vida própria, para al ém das vontades individuais. Viver em grupo significa conceder, renunciar vontades particulares em nome de um convívio. Assim, todo grupo existe segundo o desenvolvimento de regras comuns a partir das quais a vida social é possível. Do mesmo modo que há uma consciência individual existe também outra, a coletiva, constituída pelos valores comuns ou que em média são defendidos  pelos membros da sociedade. A sociologia de Durkheim assume uma formação moral ao defender que a sociedade só é coesa, forte às crises, quando o peso das regras religiosas e familiares, por exemplo, são fortes, garantindo assim, harmonia ou controle maior sobre as desobediências individuais. Toda sociedade passaria necessariamente da solidariedade mecânica para a orgânica. Na primeira, os indivíduos compartilham a tal ponto padrões de conduta que não há grande diferenciação entre os indivíduos, pois numa tribo ou numa cidade do interior, o padrão moral se efetiva sobre os indivíduos a tal ponto que o que é válido para um, também o é aos demais, podendo-se dizer que, qualquer deslize moral significa a punição àquele que desrespeita a consciência coletiva. Resumidamente, onde a consciência coletiva é forte, na solidariedade mecânica,  predomina o direito punitivo ou penal, pois tudo se resolve pelo castigo ao infrator desobediente. No contexto moderno predomina a solidariedade orgânica ou aquela onde as individualidades criam maior autonomia em relação à consciência coletiva.

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  • Sociologia e Direito em Emile Durkheim/ por Luciano Albino. O grande

    investimento intelectual do pensador francs E. Durkheim foi de criar uma cincia social que

    tivesse o mesmo rigor terico e metodolgico prprio daquelas relativas aos fenmenos naturais

    como fsica, qumica e biologia, por exemplo.

    Nestes termos procurou responder as principais questes sociolgicas segundo o

    esprito cientfico cartesiano, segundo o qual a razo metdica deve encaminhar qualquer

    pesquisa que deseje construir um conhecimento vlido do ponto de vista da observao e da

    experimentao.

    Como socilogo, Durkheim desenvolveu uma compreenso bem particular

    sobre a sociabilidade, ou seja, responder como a sociedade possvel ou o que garante a vida

    humana em funcionamento, mesmo num contexto de crises e contradies prprias do cotidiano

    moderno. Seu entendimento era o de que toda sociedade s pode existir segundo a solidariedade

    ou sentimento de interdependncia que o ser humano possui em relao ao outro.

    Neste sentido, no significa ajuda, compaixo ou caridade, mas sim,

    interdependncia na medida em que o indivduo tem conscincia de que a vida em grupo mais

    eficaz ao suprimento de suas necessidades do que se estivesse sozinho. No possvel

    sociedade sem tal princpio, de tal maneira que a vida coletiva pressupe, para Durkheim, a

    formao de um contexto que possui vida prpria, para alm das vontades individuais. Viver em

    grupo significa conceder, renunciar vontades particulares em nome de um convvio.

    Assim, todo grupo existe segundo o desenvolvimento de regras comuns a partir

    das quais a vida social possvel. Do mesmo modo que h uma conscincia individual existe

    tambm outra, a coletiva, constituda pelos valores comuns ou que em mdia so defendidos

    pelos membros da sociedade.

    A sociologia de Durkheim assume uma formao moral ao defender que a

    sociedade s coesa, forte s crises, quando o peso das regras religiosas e familiares, por

    exemplo, so fortes, garantindo assim, harmonia ou controle maior sobre as desobedincias

    individuais. Toda sociedade passaria necessariamente da solidariedade mecnica para a

    orgnica. Na primeira, os indivduos compartilham a tal ponto padres de conduta que no h

    grande diferenciao entre os indivduos, pois numa tribo ou numa cidade do interior, o padro

    moral se efetiva sobre os indivduos a tal ponto que o que vlido para um, tambm o aos

    demais, podendo-se dizer que, qualquer deslize moral significa a punio quele que desrespeita

    a conscincia coletiva.

    Resumidamente, onde a conscincia coletiva forte, na solidariedade mecnica,

    predomina o direito punitivo ou penal, pois tudo se resolve pelo castigo ao infrator

    desobediente. No contexto moderno predomina a solidariedade orgnica ou aquela onde as

    individualidades criam maior autonomia em relao conscincia coletiva.

  • Nas grandes cidades industriais observadas por Durkheim no final do sculo

    XIX e incio do XX, as relaes sociais no estavam pautadas, como nas de solidariedade

    mecnica pr-capitalista, pela intensa imposio moral, inversamente, o individualismo e a

    diversidade de perspectivas em relao conduta causam, num certo sentido, perda de coeso e

    desarmonia, uma vez que sem consenso, no possvel a vida em sociedade.

    Enquanto na solidariedade mecnica o direito punitivo ou penal mais

    caracterstico, na orgnica se destaca o direito restitutivo, ou a restaurao. Tal direito est

    relacionado s indenizaes por perdas e danos mediante a criao de tribunais especficos a

    questes trabalhistas, administrativas, etc. que instauram um procedimento sistemtico para

    ressarcir prejuzos dos mais diversos tipos.

    Na solidariedade orgnica, mesmo com a diminuio da fora da conscincia

    coletiva, a interdependncia possvel pela diviso social do trabalho, no sentido de que com a

    especializao das profisses, cada um fica mais dependente do trabalho do outro, o mdico do

    advogado, este do comerciante, aquele do professor, e assim por diante.

    Pelo trabalho, ou melhor, pelas relaes interdependentes de tais

    individualidades funcionais, torna-se possvel a manuteno do consenso, como clulas que

    combinadas criam tecidos, rgos, etc. O direito, especialmente o restitutivo, garante pelo corpo

    de profissionais especializados como juzes, promotores e advogados, a funcionalidade do corpo

    social mediante o conjunto de regras de convivncia comuns aos que integram tal formao

    coletiva. Referncia Bibliogrfica: DURKHEIM, mile. Da diviso do trabalho social.

    A sociologia do francs mile Durkheim (1858-1917) adota uma posio que

    rejeita as interpretaes biolgicas ou psicolgicas do comportamento dos indivduos, este

    focaliza os determinantes scio-estruturais na explicao da vida e dos problemas sociais. Para

    ele, existem fatos sociais que so o assunto da sociologia e que influenciam e condicionam as

    atitudes e os comportamentos dos indivduos na sociedade. Esses fatos sociais so reais,

    objetivos, slidos, sui generis, isto , no reduzveis a realidades biolgicas, psicolgicas,

    climticas, etc. Esses fatos sociais so relaes sociais exteriores aos indivduos que perduram

    no tempo, enquanto indivduos particulares morrem e so substitudos por outros. Os fatos

    sociais no so somente exteriores ao indivduo, mas possuem um poder coercitivo... pelo qual

    se impem a ele, independentemente de sua vontade individual. Os constrangimentos, seja na

    forma de leis ou costumes, manifestam-se cada vez que as demandas sociais so violadas pelo

    indivduo. Assim, para Durkheim, o indivduo sente, pensa e age condicionado e at

    determinado por uma realidade social maior, a sociedade ou a classe. Durkheim define o fato

    social como cada maneira de agir, fixa ou no, capaz de exercer um constrangimento (uma

  • coero) externo sobre o indivduo. Algum pode, por exemplo, pensar que age por vontade e

    deciso pessoal; na realidade, age-se deste ou daquele modo por fora da estrutura da sociedade,

    isto , das normas e padres estabelecidos.

    A SOCIOLOGIA ESTRUTURAL DE DURKHEIM

    A sociologia estrutural de Durkheim difere completamente da de

    Marx. Enquanto Marx insiste nos conflitos e na luta entre as classes, colocando as relaes de

    poder e a fora como centrais explicao da sociedade. O socilogo francs v a sociedade

    como integrada, formando um todo coeso, e mantida por regras de convivncia. A integrao

    no sempre a mesma, mas est sempre presente, se no fosse assim no haveria

    sociedade. Um dos elementos da integrao a intensidade com que os membros de um grupo

    ou de uma sociedade interagem entre si. A participao em rituais, por exemplo, tender a unir

    os membros de grupos religiosos. Tambm, trabalhos diferenciados, mas complementares

    provocam um aumento na integrao de grupos de trabalhadores.

    A ideia fundamental de Durkheim que indivduos que participam dos

    mesmos grupos e da mesma sociedade compartilham valores, crenas e normas coletivas que os

    mantm integrados. Uma sociedade somente pode funcionar se tais valores, crenas e normas

    constrangem as atitudes e os comportamentos individuais provocando uma solidariedade bsica,

    que orienta as aes dos indivduos. Durkheim usa a expresso conscincia coletiva para

    expressar essa solidariedade comum que molda as conscincias individuais. A famlia, o

    trabalho, os sindicatos, a educao, a religio, o controle social e at a punio do crime so

    alguns mecanismos que criam e mantm viva a integrao e a partilha da conscincia

    coletiva. Os processos de socializao e internalizao individual so responsveis pela

    aquisio por parte dos indivduos de valores, crenas e normas sociais que mantm os grupos e

    as sociedades integrados. O controle social refora o domnio da sociedade sobre os

    indivduos.

    Durkheim, evidentemente, sabia da existncia de fenmenos tais como conflitos

    sociais, crises, marginalidade, criminalidade, suicdio, etc, em todas as sociedades. Nem tudo

    nas sociedades integrao, consenso e harmonia. Mas, para ele, essas formas de desvios

    sociais no eram consequncias da perverso ou de aberraes dos indivduos; eram,

    sim, consequncias da prpria estrutura social que, enfraquecida, produzia um estado de

    anemia, isto , um estado de enfraquecimento ou ausncia de leis e normas. Sem normas claras,

    os indivduos no sabem como agir e se entregam ganncia, s paixes, ao crime e mesmo ao

    suicdio. Numa sociedade fraca, o indivduo perde o norte e se perde e os processos de

    socializao e internalizao de normas se tornam ineficientes. A sociedade fica, ento,

    ameaada por no impor limites aos indivduos que Durkheim concebia como cheios de desejos

  • ilimitados. Quanto mais os homens possuem, mais eles querem, j que as satisfaes

    estimulam, ao invs de preencher as necessidades.

    Durkheim julgava que a sociedade industrial, marcada por uma ampla diviso

    social do trabalho, precisava com urgncia de um conjunto de valores comuns a todos os

    indivduos, isto , de solidariedade para superar seus muitos conflitos. A necessria integrao

    da sociedade moderna seria dada, em parte, pensava Durkheim, pela inter-relao e pela

    dependncia mtua dos diversos papis desempenhados pelos indivduos. Mas isto no seria

    suficiente; a construo de um conjunto de crenas seria necessria. Para tanto, Durkheim, um

    liberal, no pensava no uso da fora ou de aes repressivas.

    A solidariedade social haveria de surgir da autonomia individual da conduta dos

    indivduos, j que a crescente diviso social do trabalho criava um saudvel

    individualismo. Arregimentar os indivduos no adiantaria de nada; o convencimento pela

    educao e pela religio deveria ser a funo principal da famlia, da escola, dos sindicatos, das

    associaes e do Estado.

    A preocupao sociolgica de Durkheim, portanto, reside em responder

    seguinte pergunta: como a sociedade possvel e funciona? Sua resposta consiste em enfatizar

    a capacidade e a fora da prpria sociedade em difundir solidariedade, integrao, ordem, por

    meio de valores, crenas, normas e regras que indivduos devidamente socializados

    compartilhariam.

    Na sociologia de Durkheim, a sociedade to forte que a individualidade quase

    desaparece.

    CONCLUSO

    Antes de indagarmos qual o mtodo que convm ao estudo dos fatos sociais,

    necessrio sabermos que fatos podem ser assim chamados. A questo tanto mais necessria

    quanto esta qualificao que utilizada sem muita preciso. Empregam-na correntemente para

    designar quase todos os fenmenos que se passam no interior da sociedade, por pouco que

    apresentem, alm de certa generalidade, algum interesse social. Todavia, desse ponto de vista,

    no haveria por assim dizer nenhum acontecimento humano que no pudesse ser chamado de

    social. Cada indivduo bebe, dorme, come, raciocina e a sociedade tem todo o interesse em que

    estas funes se exeram de modo regular. Porm, se todos esses fatos fossem sociais, a

    sociologia no teria objeto prprio e seu domnio se confundiria com o da biologia e da

    psicologia.

  • Na verdade, porm, h em toda sociedade um grupo determinado de fenmenos

    com caracteres ntidos, que se distingue daqueles estudados pelas outras cincias da natureza.

    Quando desempenho meus deveres de irm, de filha ou de cidad, quando me

    desincumbo de encargos que contra, pratico deveres que esto definidos fora de mim e de meus

    atos, no direito e nos costumes.

    Mesmo estando de acordo com sentimentos que me so prprios, sentindo-lhes

    interiormente, a realidade, esta no deixa de ser objetiva; pois no fui eu quem os criou, mas

    recebi-os atravs da educao. Contudo, quantas vezes no ignoramos o detalhe das obrigaes

    que nos incumbe de desempenhar, e precisamos, para sab-lo, consultar o Cdigo e seus

    intrpretes autorizados! Assim tambm o devoto, ao nascer. Encontra prontas as crenas e as

    prticas da vida religiosa; existindo antes dele, porque existem fora dele.

    O sistema de sinais de que me sirvo para exprimir pensamentos, o sistema de

    moedas que emprego para pagar as dvidas, os instrumentos de crdito que utilizo nas relaes

    comerciais, as prticas seguidas na profisso, etc, funcionam independentemente do uso que

    delas fao. Tais afirmaes podem ser estendidas a cada um dos membros de que composta

    uma sociedade, tomados uns aps outros. Estamos, pois, diante de maneiras de agir, de pensar e

    de sentir que apresentam a propriedade marcante de existir fora das conscincias individuais.

    Estamos diante de uma ordem de fatos que apresenta caracteres muito especiais:

    consistem em maneiras de agir, de pensar e de sentir exteriores ao indivduo, dotadas de um

    poder de coero em virtude do qual se lhe impem. Por conseguinte, no poderiam se

    confundir com os fenmenos orgnicos, pois consistem em representaes e em aes; nem

    com os fenmenos psquicos, que no existem seno na conscincia individual e por meio

    dela. Constituem, pois, uma espcie nova e a eles que deve ser dada e reservada a

    qualificao de sociais.

    Fonte: http://pt.shvoong.com/law-and-politics/law/1620847-sociologia-direito-em-emile-durkheim/#ixzz1ojPmoUfp

    Fonte: http://pt.shvoong.com/law-and-politics/law/1620847-sociologia-direito-em-emile-durkheim/#ixzz1ojOIMgV7