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    Ano VI, n. 08Agosto/2010

    Sabemos que existe uma boa quantidade de obras j publicadas no decorrer dos

    anos, desde a dcada de 1970, com vrios estudiosos brasileiros, entre eles Haroldo de

    Campos, Dcio Pignatari e posteriormente com uma das principais semioticistasbrasileiras, Lcia Santaella. Todos eles procuraram esmiuar a Semitica, quer seja por

    explicaes quer seja por aplicaes e mesmo assim, prevalecem as reclamaes e o

    medo diante da tentativa de compreenso e uso dessa teoria.

    Em tempos de mdias digitais interativas, em que h uma profuso de linguagens

    sendo criadas e desdobradas, vemos a necessidade premente de verificar como vem se

    dando esse processo de criao de signos, capaz de gerar novas significaes. A

    semitica essencial nesse processo.Por sua vez, outro objetivo importante que destacamos para este artigo diz

    respeito necessidade que temos de desenvolver novos mtodos de pesquisa para

    compreendermos esses fenmenos comunicacionais criados no contexto da Internet e da

    Web. E uma das proposies de Peirce que, atravs da Retrica especulativa ou

    metodutica, devemos ir sempre busca da definio de mtodos mais apropriados aos

    diferentes tipos de pesquisas cientficas. Acreditamos que o percurso feito da Gramtica

    especulativa Retrica especulativa poder nos ajudar a compreender um pouco mais a

    Semitica, bem como a perceber a necessidade de desenvolvimento desses novos

    mtodos para estudo e entendimento dos fenmenos da Comunicao contempornea.

    O presente artigo no se prope a resolver todas as dificuldades de compreenso

    da Teoria Semitica que se estabeleceram ao longo dos anos, ou superar os escritos

    anteriores nessa faanha de deslindar uma teoria cheia de complexidades. Mas, to

    somente, ajudar no desdobramento de seu entendimento e de suas aplicaes na rea de

    Comunicao junto ao alunado.

    O princpio da Semitica de Peirce

    A Semitica estuda o mundo das representaes e da linguagem. Imagine que

    voc vem por uma estrada e bem adiante algo chama sua ateno. Um borro vermelho

    que se movimenta. Algo cuja qualidade inicial ser vermelho e isso tudo o que voc

    capta dele em um primeiro momento.

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    Ao se aproximar comea a visualizar que o vermelho se agita como um pano.

    Essa a segunda caracterstica que voc consegue identificar: a relao do vermelho

    com um pano em movimento.Por fim, mais prximo do objeto, voc desvenda sua dvida: algum agita uma

    bandeira vermelha na beira da estrada compreendida imediatamente como sendo um

    aviso de que h perigo mais adiante.

    desse modo que nos situamos no mundo em nossa volta: primeiro os objetos

    surgem em nossa mente como qualidades potenciais; segundo, procuramos uma relao

    de identificao e terceiro, nossa mente faz a interpretao do que se trata. Por isso a

    Semitica se baseia numa trade de classificaes e inferncias, ao demonstrar queexistem os objetos no mundo, suas representaes em forma de signos e nossa

    interpretao mental desses objetos. E uma das explicaes mais citadas de Charles

    Peirce a de que o signo aquilo que substitui o objeto em nossa mente; so eles que

    constituem a linguagem, base para os discursos que permeiam o mundo.

    disso que trata a Semitica de Peirce: o modo como ns, seres humanos

    reconhecemos e interpretamos o mundo nossa volta, a partir das inferncias em nossa

    mente. As coisas do mundo, reais ou abstratas, primeiro nos aparecem como qualidade,

    depois como relao com alguma coisa que j conhecemos e por fim, como

    interpretao, em que a mente consegue explicar o que captamos, ao que Peirce chamou

    dePrimeiridade, Secundidade e Terceiridade. E todo esse processo feito pela mente a

    partir dos signos que compem o pensamento e que se organizam em linguagens.

    Desde uma simples sensao at os discursos mais elaborados, como um filme,

    nossa mente vai lidar com os signos que fazem uma intermediao com a realidade que

    nos cerca. A compreenso que temos do mundo, os registros e as interpretaes, a

    transmisso de informaes, completam o processo de comunicao baseado nos

    sistemas de signos que compem toda e qualquer linguagem.

    Um romance, um anncio numa revista, uma notcia no rdio, so tipos diferentes

    de discursos que utilizam linguagens verbal, imagtica e sonora compostas por signos

    distintos. Ora so imagens similares como um desenho de um animal, ora so signos

    indiciais como poas dgua no cho que indicam que choveu, ora so palavras que

    nomeiam os objetos, convencionados como smbolos que representam estes objetos.

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    Eles ajudam a compor argumentos de raciocnio dedutivos, indutivos e abdutivos, e nos

    permitem estabelecer mtodos para chegarmos compreenso de fenmenos diversos.

    Todo fenmeno cultural tambm um fenmeno de Comunicao, constitudopor linguagens que permitem a produo de sentido. E no ser humano que se

    desenvolve a transformao dos sinais em signos pela relao que ele mantm com a

    linguagem. Portanto, pode ser muito mais prtico compreender a Semitica a partir dos

    processos mentais, que usamos cotidianamente, de compreenso do mundo, para,

    depois, aplicar as nomenclaturas criadas no contexto dos estudos j publicados.

    Noo preliminar anterior e parte dos estudos peirceanos

    A Semitica a cincia dos signos e dos processos significativos ou semiose, que

    ocorrem na natureza e na cultura. Segundo Nth (2003), a palavra semitica tem sua

    origem na expresso grega semeon, que quer dizer signo, e sma, traduzido por

    sinal ou signo.

    Os fenmenos culturais so abordados pela Semitica como sistemas de signos, os

    quais constroem significaes e vo dando sentido s coisas. Tal teoria se preocupa com

    qualquer sistema de signos, como a msica, a fotografia, o cinema, as artes plsticas, o

    design, a moda, a mdia etc.

    A Semitica uma rea de estudos antiga, que tem suas origens nos Gregos, em

    grandes pensadores como Plato e Aristteles, despontando, tambm, na Idade Mdia,

    com Santo Agostinho, Roger Bacon, So Toms, passando pelos estudos dos filsofos

    do sculo XVII e XVIII: John Locke, com sua doutrina dos signos e com Johann

    Heinrich Lambert, autor de tratado intitulado Semiotik. At, finalmente, chegar ao

    sculo XIX e florescer com dois grandes expoentes dessa disciplina: Ferdinand

    Saussure e Charles Sanders Peirce. Mas, tambm repercutiu na Rssia revolucionria,

    dando origem ao estruturalismo lingustico sovitico, aos estudos da potica e a

    movimentos e pesquisas em trabalhos artsticos de vanguarda.

    Ressalte-se, portanto, que, parte dos estudos de Charles Sanders Peirce, os quais

    adotaremos aqui, existem estas outras correntes e vertentes da Semitica que merecem

    uma rpida explanao.

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    No contexto da Semitica russa, dois estudiosos, Potiebni e Viesselovski

    iniciaram descobertas no sculo XIX acerca do estruturalismo lingustico. E mesmo

    com a grave influncia negativa do regime stalinista, as pesquisas continuaram atravsdo psiclogo Lev Vygotski e do cineasta Eisenstein, com estudos sobre relaes entre

    linguagem e ritos, linguagem e gestos etc. Eisenstein se preocupava com questes como

    a origem dos sistemas de signos, o teatro, as relaes entre pintura e cinema, a

    influncia dos ideogramas japoneses, dentre outros.

    Por sua vez, os estudos da potica, conhecidos como Formalismo russo

    desenvolveram-se e se problematizaram sobre uma potica histrica e sociolgica, com

    Mikhail Bakhtin. A partir do fim dos anos 50, a Unio Sovitica comea a recuperar oinventrio desses estudos semiticos, tendo como referncia Iuri Lotman. Partindo dos

    problemas da potica e da lingustica, abre-se o leque para o estudo de signos na

    Ciberntica, na Teoria da Informao e at na Matemtica.

    A inteno dos russos era, notadamente, a de querer abranger o todo da produo

    cultural, o que no possvel devido falta de uma slida fundamentao terica por

    parte dos estudiosos russos. O que acontece justamente a adaptao de cincias

    prximas para, s ento, construir uma metodologia capaz de dar conta da totalidade

    dos fenmenos.

    Paralelamente a toda essa empreitada russa, surgia em genebra, no final do sculo

    XIX o Curso de Lingustica Geral, que depois veio a se tornar uma obra publicada

    postumamente, fonte originria de Saussure. O foco desse autor estava na compreenso

    da lngua dentro de um sistema de possibilidades de escolha, portanto, de articulaes.

    Tal livro foi amplamente debatido na Europa e seus estudos foram retomados por

    Hjelmslev, com aplicaes que depois tiveram repercusso na Antropologia e na Teoria

    Literria.

    Comumente, essa linha de estudos ficou conhecida como Semiologia, tendo

    alguns grandes autores vinculados a ela, como Roland Barthes, Umberto Eco, A. J.

    Greimas, entre muitos outros linguistas. A Semiologia, tambm conhecida como a

    Lingustica saussureana, cincia da linguagem verbal, e a Semitica a cincia de

    toda e qualquer linguagem.

    Desse modo, embora tenhamos os estudos da Semitica datados da Grcia antiga,

    da idade mdia at o sculo XIX, somente na era moderna que vai haver uma

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    sistematizao mais apropriada desses estudos, j na poca dos meios impressos, do

    cinema e das expresses artsticas. Como vimos, houve os estudos realizados na Rssia,

    e que, devido ao regime fechado, s veio ser conhecido em dcadas mais recentes aquino ocidente, bem como, os estudos de Saussure, na Europa, que deram origem a uma

    semiologia bastante pesquisada nos cursos de Lingustica, no decorrer de todo o sculo

    XX at ento, bem como os estudos de Peirce, na Amrica. So trs regies distintas em

    que a Semitica foi pesquisada quase que simultaneamente e isolados um do outro

    praticamente.

    A dimenso dos estudos de Saussure

    Ferdinand de Saussure vai estabelecer os pilares metodolgicos de uma economia

    da linguagem, entendendo o objeto lngua como um sistema regido por leis e normas

    muito prprias. No se trata aqui de estrutura em nvel sinttico ou gramatical, pois

    Saussure se concentra na questo da estrutura em si, levando em considerao a

    interao entre as partes do todo. Assim, uma leve mudana em uma parte modifica

    todas as outras partes.

    Lngua seria um sistema de valores especfico. A combinao dos elementos

    estabelece o sentido e o seu significado vai depender da nossa identificao dentro de

    uma comunidade lingustica e social. Ao nascermos, precisamos nos enquadrar na

    lngua. O objeto da lingustica de Saussure a lngua como fenmeno social, com

    regras arbitrrias. A lngua vertical, regrada. J a fala a apropriao da lngua de

    forma particular.

    Saussure se prendeu fundamentao de uma cincia da linguagem verbal. No

    houve por parte do lingusta uma pretenso construo de conceitos voltados para uma

    cincia mais ampla e completa do que a lingustica, e ele mesmo previu a necessidade

    de tal cincia. Apenas depois de 40 anos que a proposta do autor foi desenvolvida, ou

    seja, a partir dos anos 50, com o surgimento e a disseminao de linguagens em

    variados meios de comunicao, necessitando-se de um arcabouo terico apropriado

    para a investigao desses fenmenos.

    Da mesma forma que ocorre com a semitica russa, a semiologia vai buscar em

    cincias vizinhas seus pressupostos (Teoria da Comunicao e Informao, Semntica,

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    Antropologia, Simbologia etc.), faltando da mesma forma uma autonomia terica capaz

    de fundar uma cincia semitica independente e completa.

    Podemos aqui inferir sobre as diferenas bsicas entre a Semiologia lingustica, deorigem saussuriana, e a Semitica, de Peirce. Na Semiologia lingustica, que tem

    origem em Saussure, o signo a unio do sentido e da imagem acstica, concebendo-se

    uma relao didica entre significado e significante. Nesse sentido, quando

    pronunciamos ou escrevemos uma palavra temos seu plano de expresso, chamado de

    significante, composto pelo som ou pelos traos da escrita; mas, o que essa palavra quer

    dizer o significado, constituindo o plano de contedo. Por sua vez, na Semitica, a

    concepo de signo tridica, pois Peirce parte da condio do objeto, de suarepresentao que o signo e do representante, para quem o signo vai fazer sentido.

    Essa trade se desdobra em categorias como primeiridade, secundidade, terceiridade;

    quali-signo, sin-signo, legi-signo; cone, ndice, smbolodentro do cone, em imagem,

    diagrama, metfora.

    A concepo da Semitica de Peirce

    Espacialmente distintas e temporalmente sincronizadas nos EUA, na antiga Unio

    Sovitica e na Europa Ocidental; impulsionadas pela Revoluo Industrial e, como

    visto, pela consequente difuso de informaes e mensagens de toda a ordem, as

    vertentes da semitica originaram o que Santaella chama de uma conscincia

    semitica, ou seja, a conscincia das linguagens e da necessidade de estud-las. Nessa

    parte do trabalho iremos nos concentrar na semitica peirceana, por ser o tipo mais

    apropriado aos estudos da rea de comunicao em funo do aporte metodolgico e da

    abrangncia conceitual em se tratando de signos.

    Charles Sanders Peirce foi um cientista generalista (matemtico, fsico, qumico,

    filsofo, psiclogo) que tentava fornecer, com sua vasta filosofia, uma linguagem

    comum a todas s cincias. Uma linguagem que fosse quase uma cincia e possibilitasse

    aos estudiosos entender as relaes de seus diversos objetos de estudos.

    Benjamim Peirce, pai de Charles S. Peirce, era, de acordo com Santaella (1983), o

    matemtico mais importante de Harvard. O filho Charles, pela convivncia em um

    ambiente de intelectualidade, j trabalhava com qumica aos 6 anos, tendo se formado

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    bacharel em qumica por Harvard. Dessa forma, Peirce era matemtico, fsico,

    astrnomo, bilogo etc., no se restringindo apenas rea de exatas. Trabalhou, no

    campo das cincias culturais, com Lingustica, Filologia, Histria, Psicologia, sendopoliglota e tendo ainda estudado Arquitetura.

    O ponto de unio de todas as reas em Peirce, atravs da condio de cientista, era

    a Lgica. Tudo o que Peirce estudou levou-o, inevitavelmente, aos estudos da Lgica. O

    conhecimento de variadas cincias o que explica o estabelecimento das diferenas e

    das proximidades entre uma cincia e outra, realizando comparaes entre mtodos de

    raciocnio variveis entre as matrias e determinados perodos de tempo.

    Durante 60 anos Peirce tentou legitimar a Lgica como cincia. Conhecedor daFilosofia, Peirce ousou levar os mtodos, formas de experimentao e questes

    cientficas para o seio da Filosofia. Sua maior tentativa epistemolgica foi vincular

    Lgica e Filosofia.

    Segundo Santaella (1983), Peirce explica que um dia, aos 12 ou 13 anos de idade,

    pegou, no quarto do irmo mais velho, uma cpia da Lgica de Whateley e perguntou

    ao seu irmo o que era Lgica, recebendo uma resposta muito simples. Jogou-se no

    assoalho e se enterrou no livro. Desde ento, passou a estudar matemtica, tica,

    metafsica, anatomia, termodinmica, tica, gravitao, astronomia, psicologia, fontica,

    economia, a histria da cincia, jogo de cartas, homens e mulheres, vinho, metrologia,

    sempre como um estudo de Semitica.

    Peirce, aps todas as incurses metodolgicas, props um esquema filosfico

    acabado. Partindo da Fenomenologia, que estuda os objetos e as estruturas da

    conscincia cognitiva, daquilo que chega mente, chegou s Cincias Normativas, que

    so Esttica cincia dedicada ao que admirvel por si, sem razo aparente -,

    ticacincia da ao ou da conduta -, e Lgica ou Semiticaestruturada a partir

    da esttica e da tica como uma teoria dos signos e do pensamento racionalizado. Extrai

    da Fenomenologia todos os princpios fundamentais.

    No contexto da Lgica ou Semitica, Peirce demonstrou que existe uma

    Gramtica especulativa, que nos faz identificar os signos, ora como similaridade um

    desenho de um animal na parede -, ora como signo indicial poa dgua que indica

    que choveu ou fumaa que indica fogo -, ora como smbolo convencionado pela cultura

    as palavras que representam objetos sem nenhuma relao de aparncia ou indcio; a

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    Lgica crtica, que permite as inferncias de raciocnio como deduo, induo e

    abduo, processos que nos fazem chegar a concluses de pensamento, como um

    silogismo composto por premissas: as rvores so feitas de madeira, a jaqueira do meuquintal uma rvore, logo, ela feita de madeira; e a Retrica especulativa ou

    Metodutica, que vem a ser o modo como desenvolvemos mtodos para empreender

    essas questes do raciocnio, bem como para saber que mtodos so mais apropriados a

    determinadas pesquisas para descobrir de que forma os signos que compem um

    discurso na mdia, por exemplo, fazem esse discurso funcionar precisamos ir busca de

    respostas, levantando hipteses, verificando pelo raciocnio e chegando a concluses, ou

    seja, precisamos de um mtodo que garanta esse procedimento de descoberta ouconfirmao das respostas. pelaRetrica especulativa que descobrimos qual ou quais

    mtodos so os mais apropriados.

    O princpio da Fenomenologia

    A Semitica, segundo Santaella (2007), uma das disciplinas que fazem parte da

    ampla arquitetura filosfica de Peirce; arquitetura esta alicerada na Fenomenologia,

    uma quase-cincia que investiga os modos como aprendemos qualquer coisa que

    aparece nossa mente: um cheiro, uma formao de nuvens, um rudo de chuva, ou

    mesmo algo complexo como um conceito abstrato provocado por uma lembrana.

    Compreendida como mtodo da crtica do conhecimento universal das essncias

    por Edmund Husserl, fundador da Fenomenologia, a prpria cincia da essncia do

    conhecimento. Na prtica da Fenomenologia efetua-se o processo de reduo

    fenomenolgica que permite ao sujeito atingir a essncia do fenmeno.

    A Fenomenologia, para Peirce, era a primeira via para os trabalhos filosficos. O

    dever primeiro do filsofo seria categorizar seus estudos. Inconformado com as

    categorias aristotlicas, muito mais voltadas para a lingustica, Peirce, atravs da

    experimentao, voltou-se para a elaborao de categorias universais, partindo da

    Fenomenologia que pressupe a observao dos fenmenos e a posterior categorizao

    do pensamento e dos objetos.

    O estudo fenomenolgico o que vai permitir a decifrao do mundo enquanto

    linguagem. Fenmeno tudo o que nos aparece: real, ilusrio, virtual, imagtico etc.

    http://pt.wikipedia.org/wiki/Redu%C3%A7%C3%A3o_fenomenol%C3%B3gicahttp://pt.wikipedia.org/wiki/Redu%C3%A7%C3%A3o_fenomenol%C3%B3gicahttp://pt.wikipedia.org/wiki/Ess%C3%AAnciahttp://pt.wikipedia.org/wiki/Fen%C3%B3menohttp://pt.wikipedia.org/wiki/Fen%C3%B3menohttp://pt.wikipedia.org/wiki/Ess%C3%AAnciahttp://pt.wikipedia.org/wiki/Redu%C3%A7%C3%A3o_fenomenol%C3%B3gicahttp://pt.wikipedia.org/wiki/Redu%C3%A7%C3%A3o_fenomenol%C3%B3gicahttp://pt.wikipedia.org/wiki/Redu%C3%A7%C3%A3o_fenomenol%C3%B3gica
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    Partindo disso, entendemos que a Fenomenologia intenta caracterizar e compreender

    todos os fenmenos. Para estudarmos os fenmenos precisamos ter uma habilidade

    contemplativa, estar apto a distinguir as diferenas fenomnicas e ter a capacidade decolocar as observaes em categorias.

    A fenomenologia forneceu as fundaes para as trs cincias normativas: Esttica,

    tica e Lgica ou Semitica e estas, por sua vez, fornecem as fundaes para a

    metafsica. De acordo com Santaella (2007), elas so disciplinas muito abstratas e gerais

    que no se confundem com cincias prticas; e so chamadas de normativas porque tm

    por funo estudar ideais, valores e normas. A Esttica guia nossos sentimentos; a tica

    guia nossa conduta e a Lgica estuda os ideais e normas que conduzem o pensamento.A Lgica ou Semitica, por sua vez, no vai se prender apenas s leis do

    pensamento e da sua evoluo, debruando-se, primeiramente, sobre as condies gerais

    dos signos: como se d a transmisso de significado de uma mente para outra e de um

    estado mental para outro. Para proceder assim, foi dividida em trs ramos: Gramtica

    especulativa, Lgica crtica e Metodutica ou Retrica Especulativa.

    A gramtica especulativa o estudo de todos os tipos de signos eformas de pensamento que eles possibilitam. A lgica crtica tomacomo base as diversas espcies de signos e estuda os tipos deinferncias, raciocnios ou argumentos que se estruturam atravs designos. Esses tipos de argumentos so a abduo, a induo e adeduo. Por fim, tomando como base a validade e fora que soprprias de cada tipo de argumento, a metodutica tem por funoanalisar os mtodos a que cada um dos tipos de raciocnio d origem.Portanto, a metodutica estuda os princpios do mtodo cientfico, omodo como a pesquisa cientfica deve ser conduzida e como deve sercomunicada. (SANTAELLA, 2007, p. 3-4).

    A Semitica peirceana no deve ser confundida com uma cincia aplicada, pois

    seu legado demonstra a preocupao em tecer conceitos de signo adaptveis a qualquer

    cincia aplicada. Como linguagens, as cincias so na verdade aliceradas pela teoria

    semitica.

    O quadro que se segue demonstra o desdobramento dessa classificao e em

    seguida, apresentamos cada uma dessas categorias universais peirceanas.

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    FENOMENOLOGIA

    ticaEsttica

    Lgica ou Semitica: Gramtica especulativa:

    cone, ndice, smbolo

    Lgica crtica:

    deduo, induo, abduo

    Retrica especulativa ou Metodutica

    Fonte: os autores a partir das designaes de Peirce (1977)

    As disciplinas normativas: Esttica, tica e Lgica

    Definio de Gramtica especulativa

    A Gramtica especulativa uma cincia geral dos signos, que estuda todos os

    tipos de signo e as formas de pensamento que possibilitam, trabalhando com conceitos

    abstratos que so capazes de determinar quando certos processos podem ser

    considerados signos. Ela traz definies e classificaes para a anlise de todos os tipos

    de linguagem, signos, sinais dentre outros.

    O signo qualquer coisa que represente outra coisa e cause um efeito em uma

    mente em potencial podendo, segundo Peirce, ser analisado de acordo com suas

    propriedades internas, seu significado, de acordo com sua referncia quilo que indica,

    como representao, e de acordo com os efeitos que est apto a produzir nos seus

    receptores, como interpretao. Podemos dizer, como exemplo, que a foto de um gato, o

    desenho de um gato, a prpria palavra gato so signos desse animal. E mesmo que se

    trate de um objeto que no existe, como um unicrnio, essa representao sgnica

    continua valendo do mesmo modo.

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    Aqui fica evidente a tricotomia sgnica, como explica o prprio Peirce (1977): a

    primeira, conforme o signo em si mesmo for uma mera qualidade, um existente

    concreto ou uma lei geral; a segunda, conforme a relao do signo para com seu objetoconsistir no fato de o signo ter um carter em si mesmo, ou manter alguma relao

    existencial com esse objeto ou em sua relao com um interpretante; a terceira,

    conforme seu interpretante represent-lo como um signo de possibilidade ou como um

    signo de fato ou como um signo de razo. (PEIRCE, p. 51)

    As propriedades do signo na relao com ele mesmo

    De acordo com Peirce, h trs propriedades formais que do capacidade a algo

    para que este funcione como um signo: sua qualidade, sua existncia e seu carter de lei.

    Retomando nosso exemplo do incio, quando vemos um vulto vermelho temos uma

    qualidade daquilo que pode ser um signo; quando constatamos que se trata de um pano,

    temos a existncia desse signo; e quando verificamos ser uma bandeira temos a

    convico de que por lei, trata-se de um signo convencionado na cultura.

    Agora podemos entender o que Peirce quis dizer por Quali-signo, Sin-signo e

    Legi-signo. Na relao do signo com o prprio signo, quando uma qualidade funciona

    como signo, como a cor vermelha, por exemplo, que por si s pode remeter a perigo,

    temos um Quali-signo; O Sin-signo, por sua vez est relacionado com a existncia do

    signo no espao e no tempo, bem como com sua singularidade. um signo de uma

    coisa real, algo existente: aquele vermelho feito de pano; e, por fim, o Legi-signo,

    quando os signos agem de acordo com uma conveno. As palavras so convencionadas

    e a bandeira do nosso exemplo tambm: designou-se que uma bandeira vermelha

    tremulando na estrada um aviso de alerta.

    Estas trs propriedades no so excludentes, geralmente elas agem juntas, pois a

    maioria das coisas, por exemplo, esto sob o domnio da lei. O que pode acontecer a

    evidncia de uma das propriedades como em uma obra de arte abstrata no qual a

    qualidade enquanto cor, volume, textura ficam mais evidentes que as demais

    propriedades.

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    Relao do signo com seu objeto

    Assim como so trs tipos de propriedades, tambm so trs os tipos de relaoque o signo pode ter com o assunto tratado, isto , seu objeto. So elas: o cone, o ndice

    e osmbolo. Mas antes vamos falar um pouco de objeto.

    O objeto do signo aquele ao qual o signo se refere. No caso de uma foto de uma

    bola de futebol, por exemplo, o signo a imagem enquanto o objeto a bola e a forma

    como ela foi retratada. Para ajudar na compreenso das relaes entre signo e objeto,

    Peirce estabeleceu uma distino que a do objeto dinmico e do objeto imediato.

    No objeto dinmico o assunto tratado pelo signo, como por exemplo, quandofalamos uma frase, a prpria frase o signo e o assunto tratado o objeto dinmico.

    Com relao ao objeto imediato, este o modo como o objeto dinmico representado

    ou sugerido. Vejamos um exemplo utilizado por Santaella (2007) quando olhamos uma

    reportagem abordada em dois jornais diferentes, o objeto dinmico o mesmo, mas o

    objeto imediato que a forma com que vo tratar este assunto vai ser diferente

    dependendo do perfil e do estilo de cada jornal.

    Por sua vez, na relao do signo com o objeto encontramos, como j dissemos, as

    categorias de cone, ndice e smbolo. O cone um signo que tem como fundamento

    um quali-signo, ou seja, remete-se a seu objeto pela similaridade de suas qualidades.

    Como qualidades no representam, apenas apresentam, o objeto imediato justamente

    as qualidades exibidas e o objeto dinmico s aparece se essa qualidade sugerir outra

    qualidade. Os rabiscos que esboam uma casa no papel formam uma similaridade com

    uma casa de verdade pela aparncia das formas finais.

    O signo icnico foi divido por Peirce em trs nveis, chamados de hipocones:

    imagem, diagrama e metfora. A imagem tem uma relao de semelhana com seu

    objeto apenas pela aparncia, como no caso do desenho da minha casa numa folha de

    papel. J o diagrama representa, por semelhana as ligaes internas do signo e as

    ligaes internas do objeto, como a planta dessa minha casa feita pelo arquiteto, por

    exemplo, em que a semelhana entre a planta e a casa no est na aparncia e sim nas

    ligaes internas. A metfora, por seu turno a representao do objeto pela analogia e

    se d na semelhana do significado de duas coisas distintas. Mantendo-se no exemplo

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    da casa, cham-la de meu lar uma metfora porque o lar envolve a casa onde vive

    minha famlia, que vai muito alm do desenho e da planta.

    Podemos especificar melhor essa condio da metfora atravs do uso de umditado popular: macaco velho no pe a Mao em cumbuca. Tal provrbio pode ser

    aplicado a infinitas situaes humanas em qualquer parte do mundo. Isso porque existe

    uma imagem interna comum entre o fato de uma pessoa experiente no cair numa

    armadilha que j conhece e o dizer do macaco velho (pessoa experiente) que no mete a

    mo em cumbuca (no cai na armadilha j conhecida).

    Ressalte-se, por sua vez, que os hipocones so chamados de cones degenerados,

    ou seja, eles so imagens comuns a muitas pessoas. Se mostrarmos a imagem de PapaiNoel em qualquer parte do planeta, todos iro reconhecer de quem se trata. Porm, se

    falarmos da Cumadre Florzinha, a entidade que substitui a Caipora no Nordeste

    brasileiro, vamos verificar que h grandes diferenas na imagem que as pessoas fazem

    dela em diferentes lugares. Por isso ela no um hipocone, afinal no h uma imagem

    nica, e sim, vrias possveis.

    O hipocone muito usado em reas como a de publicidade: para falar de um

    turista, por exemplo, o anncio precisa ter a certeza de que todos iro reconhecer a

    imagem, caracterizando-a com um padro reconhecvel: um sujeito com chapu, camisa

    florida de mangas curtas, culos escuros, sandlias e mquina fotogrfica pendurada no

    pescoo. No seria um esteretipo, ento, um hipocone? Qual a imagem que nos faz

    reconhecer uma dona de casa?

    O ndice, como o prprio nome sugere, indica algo tendo como fundamento a

    existncia concreta deste e est diretamente ligado ao objeto. Tudo o que existe um

    ndice ou pode funcionar como um. Afinal, temos aqui uma relao de causa e efeito.

    Pegadas na areia imediatamente nos remetem ao fato de que algum passou por ali;

    poas de gua no cho indicam que acabou de chover. Quando olhamos para a fumaa,

    geralmente no nos detemos nas propriedades dela, pensamos imediatamente no fogo

    que a produz.

    O fundamento do smbolo um legi-signo, sendo um signo que representa o

    objeto dinmico atravs de uma lei, de uma conveno, possuindo carter geral e no

    singular como no caso do ndice. Seu objeto imediato a forma como o signo ir

    representar seu objeto dinmico, o significado. Um cone pode se tornar um smbolo por

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    convenes socioculturais, ao ser carregado de significados simblicos. Como j

    dissemos, as palavras so smbolos porque foram convencionadas.

    Talvez possamos compreender melhor essas trs categorias em um processocontnuo: um oriental que chegue ao Brasil pode ver numa cruz um cone, identificando

    aqueles dois paus entrecruzados como o instrumento de tortura que os romanos usavam;

    se chegssemos em um pas oriental, cuja religio oficial fosse o Budismo, ao vermos

    uma cruz no alto de uma construo veramos aquela imagem como um ndice,

    deduzindo imediatamente que ali existem cristo; mas ns, cristo, sempre olhamos

    para a cruz como um smbolo da morte de Cristo nesses casos, temos a mesma cruz

    vista como cone, ndice e smbolo em trs situaes diferentes.

    Relao do signo com o interpretante

    Depois de conhecermos os signos em relao ao objeto e em relao a ele mesmo,

    agora podemos compreender como se processa o signo em relao ao interpretante,

    tendo em mente as relaes anteriores de forma bem claras, como se segue.

    Na relao do signo com ele mesmo percebemos as propriedades inerentes de

    qualidade, existncia e legitimao: o vermelho por si mesmo, um pano vermelho que

    d existncia ao vermelho e uma bandeira vermelha que convenciona o vermelho como

    perigouma bandeira azul no faria essa legitimao. Na relao do signo com o objeto

    temos sua representao icnica, indicial e simblica: o cone tem uma similaridade

    com o objeto, como o desenho da casa; o ndice indica algo do objeto como a fumaa

    indica o fogo; e o smbolo que uma conveno na sua relao com o objeto, como a

    aliana na mo esquerda que convenciona o casamento. Na relao com o interpretante

    precisamos observar que se trata do mudo como a mente opera o signo consigo mesma.

    De acordo com essa terceira tricotomia, um signo pode ser denominado Rema,

    Dicissigno ou Dicente (isto , uma proposio ou quase-proposio) ou Argumento.

    Um Rema um signo que, para seu interpretante, um signo de possibilidade

    qualitativa, ou seja, entendido como representando esta e aquela espcie de Objeto

    possvel. Todo rema propiciar, talvez, alguma informao, mas no interpretado

    nesse sentido. O rema um signo qualitativo. Quali-signos icnicos s podem produzir

    interpretantes remticos, como por exemplo, quando algum diz que uma nuvem no cu

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    parece com um coelho, trata-se de uma hiptese de quando uma qualidade usada como

    um signo de outra qualidade na forma de comparao.

    Um signo Dicente um signo que, para seu interpretante, um signo de existnciareal. Portanto, no pode ser um cone o qual no d base para interpret-lo como sendo

    algo que se refere a uma existncia real. Um Dicissigno necessariamente envolve, como

    parte dele, um Rema para descrever o fato que interpretado como sendo por ela

    indicado. Mas este um tipo especial de Rema e, embora seja essencial ao Dicissigno,

    de modo algum o constitui. O dicente um interpretante de signos reais, ou seja,

    indiciais. Um exemplo um caderno em cima da cama, realmente existe e sua

    existncia pode ser comprovada. J o argumento um signo de lei com base nassequncias lgicas de que o legi-signo simblico depende.

    Um argumento um signo que, para seu interpretante, signo de lei. Podemos

    dizer que um Rema um signo que entendido como representando seu objeto apenas

    em seus caracteres; que um Dicissigno um signo que entendido como representando

    seu objeto com respeito existncia real.; e que um Argumento um Signo que

    entendido como representando seu objeto em seu carter de Signo. (PEIRCE, 1977, p.

    53).

    Um quadro simples dessas relaes do signo com o signo, do signo com o objeto e

    do signo com o interpretante:

    CategoriaUniversal

    O signo em relaoa si mesmo

    O signo em relaoao objeto

    O signo em relaoao interpretante

    Primeiridade Qualisigno cone Rema

    Secundidade Sinsigno ndice Dicente

    Terceiridade Legisigno Smbolo ArgumentoFonte: Coelho Netto (1999, p. 68).

    A partir dessas conjecturas Peirce vai apresentar as dez classes de signos

    constitudas pelas trs tricotomias em conjunto, com a recombinao dessas tricotomias,

    demonstrando que elas atuam em constante interao. E mostra as afinidades entre essas

    dez classes de signos assim constitudas: 1) remtico, icnico, qualissigno; 2) remtico,

    icnico, sinsigno; 3) remtico, indicial, sinsigno; 4) dicente, indicial, sinsigno; 5)

    remtico, icnico, legissigno; 6) remtico, indicial, legissigno; 7) dicente, indicial,

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    legissigno; 8) remtico, simblico, legissigno, 9) dicente, simblico, legissigno; 10)

    argumento, simblico, legissigno.

    A nossa interao diria com o mundo que habitamos, feita por atos e aescotidianas, no nos permite ver de forma particularizada essas operaes e

    procedimentos mentais. Ns internalizamos nossa relao com tudo em volta e com a

    percepo em processos contnuos de pensamento. Mas, se analisarmos o modo como

    aprendemos desde a mais tenra infncia, ao longo da nossa formao, bem como o

    modo como lidamos com assuntos e situaes desconhecidas, vamos perceber cada uma

    dessas etapas em ao.

    A base da cultura humana a linguagem e esta constituda pelos signos quechegam s nossas mentes, compostos por um corpo imediato, que sua constituio, e

    um corpo dinmico, que seu significado. Processamos e organizamos o conhecimento

    a partir desse processo e constitumos nossa personalidade com os significados dessa

    existncia.

    A Lgica crtica

    O raciocnio o conhecimento que exige provas e demonstraes e se realiza

    igualmente por meio de provas e demonstraes das verdades que esto sendo

    conhecidas ou investigadas. No um ato intelectual, mas so vrios atos intelectuais

    internamente ligados ou conectados, formando um processo de conhecimento. O

    raciocnio, segundo a Lgica Crtica de Peirce, se d pela deduo, induo e abduo.

    importante que se leve em conta que esses trs tipos de raciocnio no so

    privilgio exclusivo, nem da lgica como disciplina, nem de outras cincias, mas trata-

    se, isto sim, de formas de pensamento que empregamos de modo rudimentar

    cotidianamente. So as formas pelas quais o pensamento se organiza em qualquer

    situao e das quais a lgica e os mtodos de raciocnio empregados nas cincias so

    uma sofisticao, pois representam os casos em que forma e raciocnio so submetidas

    disciplina do autocontrole. (DRIGO, 2007).

    A deduo consiste em partir de uma verdade j conhecida (seja por intuio, seja

    por uma demonstrao anterior) e que funciona como um princpio geral ao qual se

    subordinam todos os casos que sero demonstrados a partir dela. Em outras palavras, na

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    deduo parte-se de uma verdade j conhecida para demonstrar que ela se aplica a todos

    os casos particulares iguais. Por isso tambm se diz que a deduo vai do geral ao

    particular ou do universal ao individual. O ponto de partida de uma deduo ou umaidia verdadeira ou uma teoria verdadeira.

    A induo realiza um caminho exatamente contrrio ao da deduo. Com a

    induo, partimos de casos particulares iguais ou semelhantes e procuramos a lei geral,

    a definio geral ou a teoria geral que explica e subordina todos esses casos particulares.

    A definio ou a teoria so obtidas no ponto final do percurso. E a razo tambm

    oferece um conjunto de regras precisas para guiar a induo; se tais regras no forem

    respeitadas, a induo ser considerada falsa.A abduo uma espcie de intuio, mas que no se d de uma s vez, indo

    passo a passo para chegar a uma concluso. A abduo a busca de uma concluso pela

    interpretao racional de sinais, de indcios, de signos.

    Podemos compreender melhor a relao entre esses trs tipos de inferncias na

    seguinte situao: voc est em um armazm repleto de sacas de feijo. O proprietrio

    mostra que um determinado lote composto por sacas de feijes pretos. Ele tem um

    punhado de feijes na mo fechada e pergunta: Aquelas sacas de feijes so pretos;

    estes feijes na minha mo so daquelas sacas; qual a co r desses feijes? E voc

    responde acertadamente, pelo raciocnio de deduo, que so feijes pretos. Em outra

    ocasio, o proprietrio mostra um novo punhado de feijes e diz: Estes feijes so

    pretos; eles so daquelas sacas. Que cor so os feijes daquelas sacas?. Agora, pelo

    raciocnio de induo, voc responde que os feijes das sacas so pretos, o que tambm

    est correto, considerando, como vimos, que as premissas so verdadeiras.

    Porm, se o proprietrio chega para voc e diz: Os feijes daquelas sacas so

    pretos; estes feijes em minha mo so pretos; estes feijes so daquelas sacas? Nesse

    caso, no h como estabelecer a relao entre os feijes da mos com os feijes

    daqueles nas sacas, exceto pela cor; podemos ter essa relao por hiptese: se estou em

    um armazm que tem um conjunto de sacas de feijes pretos e algum traz na mo um

    punhado de feijes pretos, posso supor que os feijes foram retirados das sacas, mas

    vou precisar de confirmao dessa hiptese. Pode ser que os feijes naquela mo

    tenham vindo de fora e trazidos at ali.

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    meio de smbolos e de outros signos, lidando com condies lgicas efetivas da

    significao. A Metodutica vai transformar o mtodo em um signo simblico,

    estudando a sua relao com os interpretantes. Ela est relacionada com o estudo do usode formas significativas, uma maneira de pensar que deveria indicar quais formas de

    pensamento adequada ao propsito da Razo.

    Com o objetivo de examinar a ordem ou o procedimento mais apropriado a

    qualquer investigao, a Metodutica vai tratar os tipos de raciocnio (abduo, deduo

    e induo) como mtodos e estes ento como estgios da pesquisa cientfica. Neste caso

    o raciocnio segue a seguinte lgica: a abduo seria a descoberta de uma hiptese; a

    deduo, como as conseqncias da hiptese; e a induo como a tese da hiptese.As leis de evoluo do pensamento, trazidas pelo entendimento dos tipos de

    raciocnio, faz com que Santaella (2001) afirme que Peirce encontrou uma constante a

    toda variedade de procedimentos e mtodos empregados pela cincia, mesmo que

    Peirce, em sua obra sobre a semitica, no traga um tratamento sistemtico do assunto,

    com observaes da pesquisa e os princpios em relao metodutica espalhados por

    toda a sua obra.

    Semitica aplicada Comunicao

    A Semitica no uma cincia aplicada, e sim, uma cincia formal e abstrata que,

    segundo Santaella (1983) tem por objetivo a investigao de todas as linguagens

    possveis e o exame dos modos de constituio de todo e qualquer fenmeno de

    produo de significao e de sentido.

    Geralmente estudamos os signos de maneira controlada, a partir de fotos,

    desenhos, filmes, discursos etc. Mas, no podemos esquecer que eles so muito

    dinmicos, esto sendo criados numa profuso muito grande nos ltimos anos e mudam

    constantemente.

    Um signo tem um significado hoje diferente de ontem. Em um lugar de uma

    jeito e em outro, tem nova significao. Existem signos nicos para muitas

    interpretaes e uma mesma interpretao para muitos signos. Eles so extremamente

    mutveis: uma cor, um trao, uma posio, muda completamente o significado de um

    antigo smbolo.

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    A Web, por sua vez, tem espaos miditicos propcios a essas constantes

    mutaes. No mesmo ambiente de sites, portais e blogs, por exemplo eles aparecem

    todos os dias e mudam toda hora.Um blog um site composto por linguagens que estruturam um gnero j definido

    historicamente.

    Para fazermos uma pesquisa cientfica de compreenso de como e porque um blog

    tornou-se um fenmeno de Comunicao, precisamos compreender a composio

    estrutural do blog com seus signos formadores de linguagens.

    So palavras, textos, grficos, desenhos, fotos e tarjas coloridas h recursos

    sonoros, verbais e imagticos; cones que se tornam smbolos, relaes indiciais ebtresignos, todos compondo discursos funcionais.

    Precisamos fazer as inferncias necessrias para tirar concluses e isso exige uma

    definio de mtodos que permitem fazer a pesquisa funcionar.

    Ao fazermos constataes vamos constituindo premissas. As dedues exigem,

    muitas vezes, o levantamento de hipteses, como prtica da abduo.

    Podemos decidir que o melhor mtodo o da anlise do discurso ou da anlise de

    contedo. Tambm podemos ir em busca de um mtodo novo, apropriado a uma viso

    do ponto de vista da Comunicao.

    H uma pesquisa em curso, ento, exigindo o desenvolvimento ou a aplicao de

    mtodos. So fenmenos comunicacionais novos que requerem a criao, at, de

    mtodos inovadores de pesquisa.

    Como entender em uma foto como ser essa estruturao dos signos at a

    formao de hipocones. Trata-se de uma foto que em seu carter representativo visto

    como um visto como um cone por ser uma imagem similar do real. Seu carter

    indicial est no fato de ser um produto de causa e efeito: imagem registrada por uma

    luz; seu aspecto simblico est no fato de ser um smbolo da modernidade, dos meios de

    comunicao criados a partir da revoluo industrial.

    Ao mesmo tempo em que a foto composta por cones: h cones de uma criana,

    de uma mulher, de um homem, de uma escada, de uma rvore de Natal e de uma

    lmpada de Natal.

    Podemos fazer uma primeira inferncia de que se trata de uma famlia, pelos

    cones indicados. Mas, a imagem pode estar constituda por uma criana que passa

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    numa calada, diante de uma vitrine em que se v uma mulher enfeitando uma rvore

    com a lmpada e ao lado da vitrine, uma mendigo pedindo esmolas. Portanto, no seria

    uma famlia.A imagem indicaria uma famlia se o diagrama das figuras demonstrasse isso:

    uma mulher segurando a escada na qual o homem sobre para alcanar o topo de uma

    rvore de Natal e uma criana estende a lmpada para ele ornar a rvore. Teramos uma

    simbologia do Natal com a famlia. Na nossa cultura trata-se de um hipocone

    devidamente constitudo porque todos vo fazer a mesma leitura e interpretao

    imediata.

    Um caso interessante o da logomarca da Google que muda frequentemente demotivo, mas a marca no perde sua identidade. Ocorrem mudanas de cores, formatos,

    tamanhos etc., mas a palavra Google mantm a identidade e a personalidade da marca

    sem criar nenhum rudo ou enfraquecimento da mesma.

    A busca por mtodos mais apropriados para estudos diversos em vrias reas j

    constitui o uso evidente da Metodutica ou Retrica especulativa. Mas, o uso mais

    comum da Semitica nas pesquisas em Comunicao vem da aplicao da Gramtica

    especulativa em inmeras linguagens como a da fotografia, presente nas reas de

    jornalismo e publicidade.

    Podemos utilizar a Semitica, mais especificamente sua Gramtica especulativa,

    para compreender o processo de significao decorrente, por exemplo, das marcas e

    logomarcas, em que os cones so carregados de significados para se transformarem em

    smbolos. Ou mesmo para analisar de que forma certas representaes como Papai Noel,

    como j foi mencionado antes, tornam-se hipocones, ou seja, cones degenerados,

    reconhecveis por qualquer pessoa em qualquer parte do mundo.

    Essa operacionalidade configurativa dos signos o que permite o jogode significados que certas representaes passam a ter em nossasmentes, a partir da plasticidade com que as mdias usam aslinguagens, compondo mensagens constitutivas do discursopublicitrio para as marcas. (NICOLAU, 2007, p. 5)

    Mas, tambm, a Gramtica especulativa permite que possamos verificar como

    discursos inteiros se tornam icnicos, indiciais ou simblicos: o jornalismo procura

    representar a realidade a partir da reproduo de partes desta; a publicidade tem todas as

    suas mensagens vinculadas diretamente s marcas e produtos, sem as quais perderia sua

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    funo; a literatura pura conveno, criada e legitimada no mbito de sua arte so,

    portanto, discursos icnicos, indiciais e simblicos, respectivamente, passveis de

    estudos semiticos. importante destacar que a fotografia se assemelha ao objeto fotografado, em

    certos exemplos, o que no significa afirmar que todas as fotografias so cones. Tal

    afirmao no pode ser feita, devendo as fotografias ser analisadas caso a caso e como

    imagens.

    Ao fazer referncia fotografia, necessrio observar em que categoria as

    fotografias analisadas se inserem. Se categoria das fotografias em si prprias, se das

    fotografias jornalsticas ou das fotografias publicitrias e, ainda, se so flagrantes ouinstantneas. preciso, num primeiro momento, estabelecer a que categoria pertence a

    fotografia a ser analisada. Perceber esse fator essencial para as observaes que se

    seguiro e que sero fundamentais para a classificao das fotografias enquanto cones

    ou ndices.

    Quando observamos fotografias publicitrias, devemos atentar para a questo de

    que esse tipo de fotografia passa por outro processo, por um nvel de codificao, por

    criao, sendo a fotografia transformada em imagem publicitria.

    A rigor a fotografia publicitria, uma vez inserida no anncio, nunca fotografia

    pura ou em si mesma, mas imagem fotogrfica sujeita a processos de codificao entre

    os quais o icnico (nvel das denotaes) e iconogrfico (nvel das conotaes). Neste

    sentido, so icnicas e no indiciais.

    Dependendo do contexto, as fotografias jornalsticas so cones porque entram em

    cena, por exemplo, o enfoque do editor e a prpria mensagem que o jornal ou revista

    deseja transmitir com a utilizao da referida fotografia. Nesses casos, existe uma

    relao de similaridade, mas a representao do objeto no se d na totalidade.

    Uma das riquezas da Teoria de Peirce a viso generalista e lgica de

    organizao dos signos. No entanto, as especificidades de cada linguagem, nesse caso as

    cores, as formas, as animaes, os sons dos signos digitais, a funcionalidade, a

    navegabilidade, a usabilidade das interfaces criadas devem ser profundamente

    analisadas, pois a tambm se encontram os elementos significantes e os significados

    que iro permitir a compreenso do signo em sua totalidade.

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    As mdias digitais da atualidade parecem ser bastante propcias ao estudo da

    Semitica, uma vez que nesse contexto que tm surgido um nmero muito grande de

    linguagens, com a criao de cones representativos de uma realidade virtual. Aomesmo tempo em que a virtualizao da linguagem fechou um ciclo importante na

    constituio das imagens no mbito da nossa cultura. Segundo Santaella (2009),

    podemos distinguir as imagens que habitam a cultura humana como sendo pictricas

    feitas pela mo do homem; fotogrficas feitas pela mquina; virtuais feitas pelo

    computador. Elas so representativas de processos icnicos, indiciais e simblicos. A

    pictrica pela sua similaridade; a fotogrfica pela relao de causa e efeito da impresso

    da imagem; e a virtual pela sua dimenso simblica no plano do ciberespao.Citada por Santaella (2007, p. XIII) em sua obra Semitica aplicada, Buczynska-

    Garewicks, considerada uma das maiores crticas do uso da semitica peirceana para

    estudos empricos, diz que a teoria dos signos capaz de explicar e interpretar todo o

    domnio da cognio humana [...] Alm de ser uma teoria do conhecimento, a

    Semitica tambm fornece as categorias para a anlise da cognio j realizada. Com

    isso, ela tambm uma metodologia. [...] Infelizmente, completa a autora, moda

    aludir a semitica de Peirce em geral, ou a muitas de suas categorias semiticas, sem

    uma apreenso mais completa de seu sentido profundo e multimensional.

    Referncias

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