52(1) - rbm.org.brrbm.org.br/content/imagebank/pdf/v52n1.pdf · convencional, foi aos poucos...

38
Revista Científica da Associação Médica de Brasília 52(1) 2015 ISSN 0524-2053 Artigos Originais/Original Articles 1 Doação de óvulos: alternativa eficaz quando a mulher não puder utilizar os próprios gametas Vinícius Medina Lopes, Jean Pierre Barguil Brasileiro, Natália Zavattiero Tierno, Thaísa Sant’Anna Lacerda, Anna Luíza Moraes Souza, Aluísio Mendes da Rocha Filho e Joaquim Roberto Costa Lopes Artigos de Revisão/Review Articles 8 Preparações farmacêuticas e cosméticas com uso de nanotecnologia Breno N. Matos, Paula M. Oliveira, Camila A. Areda, Marcílio S. S. Cunha-Filho, Taís Gratieri, Guilherme M. Gelfuso. Revisão de Literatura/Literature Review 21 Perfil do paciente idoso vítima de trauma Ana Cristina Carvalho da Costa, Adriana Pederneiras Rebelo da Silva, Renata Costa Fortes Relato de Caso/Case Reports 28 Leiomioma oral: relato de caso e revisão da literatura Cyntia Helena Pereira de Carvalho, Bruna Rafaela Santana de Oliveira, George João Ferreira do Nascimento, Pedro Paulo de Andrade Santos e Antônio de Lisboa Lopes Costa 33 Síndrome de Sturge-Weber: duplo episódio stroke-like em paciente no exame pré-natal e no puerpério. Relato de caso e revisão da literatura Janayna Thainá Rabelato e Maria Fernanda Mélega Mingossi

Upload: nguyennga

Post on 12-Dec-2018

220 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: 52(1) - rbm.org.brrbm.org.br/Content/imagebank/pdf/v52n1.pdf · convencional, foi aos poucos substituída pela injeção intracitoplasmática de espermatozoides, inicialmen-te usada

Revista Científica da Associação Médica de Brasília

52(1)2015

ISSN 0524-2053

Artigos Originais/Original Articles 1 Doação de óvulos: alternativa eficaz quando a

mulher não puder utilizar os próprios gametas Vinícius Medina Lopes, Jean Pierre Barguil Brasileiro, Natália Zavattiero Tierno, Thaísa Sant’Anna Lacerda, Anna Luíza Moraes Souza, Aluísio Mendes da Rocha Filho e Joaquim Roberto Costa Lopes

Artigos de Revisão/Review Articles 8 Preparações farmacêuticas e

cosméticas com uso de nanotecnologia Breno N. Matos, Paula M. Oliveira, Camila A. Areda, Marcílio S. S. Cunha-Filho, Taís Gratieri, Guilherme M. Gelfuso.

Revisão de Literatura/Literature Review21 Perfil do paciente idoso vítima de trauma

Ana Cristina Carvalho da Costa, Adriana Pederneiras Rebelo da Silva, Renata Costa Fortes

Relato de Caso/Case Reports28 Leiomioma oral: relato de caso e revisão da literatura

Cyntia Helena Pereira de Carvalho, Bruna Rafaela Santana de Oliveira, George João Ferreira do Nascimento, Pedro Paulo de Andrade Santos e Antônio de Lisboa Lopes Costa

33 Síndrome de Sturge-Weber: duplo episódio stroke-like em paciente no exame pré-natal e no puerpério. Relato de caso e revisão da literatura Janayna Thainá Rabelato e Maria Fernanda Mélega Mingossi

Page 2: 52(1) - rbm.org.brrbm.org.br/Content/imagebank/pdf/v52n1.pdf · convencional, foi aos poucos substituída pela injeção intracitoplasmática de espermatozoides, inicialmen-te usada

Thaísa Sant'Anna Lacerda • Doação de óvulos: alternativa eficaz quando a mulher não puder utilizar os próprios gametas

ARTIGO ORIGINAL

1 • Brasília Med 2015;52(1):1-7

RESUMO

Objetivo. Avaliar os resultados de ciclos de ferti-lização in vitro, em mulheres submetidas à trans-ferência embrionária, quando usados oócitos doados frescos

Método. Foram incluídas todas as transferências realizadas desde janeiro de 2014 a março de 2016 em um centro de reprodução assistida. Critérios de seleção: doadoras de 18 a 34 anos etários, com ecografia basal com evidência de mais de dez fo-lículos antrais; receptoras com indicação para o procedimento. Preparo endometrial das recep-toras com valerato de estradiol em doses cres-centes até 6 mg/dia, desde o início do estímulo ovariano das doadoras. Suporte de fase lútea com progesterona vaginal 600 mg/dia, iniciada

Doação de óvulos: alternativa eficaz quando a mulher não puder utilizar os próprios gametas

no dia da captação da doadora. Avaliaram-se idade das receptoras; indicação do procedimen-to; médias de número de oócitos maduros inse-minados; oócitos maduros fertilizados; embriões transferidos e vitrificados; taxas de abortamen-to; gestação em curso com feto vivo na 12ª sema-na gestacional; gemelaridade.

Resultados. Foram avaliados 97 ciclos com a mé-dia etária de 42 (± 4,5) anos. As médias dos nú-meros de oócitos maduros doados e fertilizados, o número de embriões transferidos e vitrifica-dos foram respectivamente 6,48 (± 2,4); 5,11 (± 2); 1,9 (± 0,3); e 1,04 (± 1,4). As taxas de aborta-mento, gestação em curso e gemelaridade foram respectivamente 9% (4/44); 41,2% (40/97); 37,5% (15/40).

Os autores declaram inexistência de conflitos de interesses.

Correspondência: Thaísa Sant’Anna Lacerda.

Instituto Verhum - Ed. Medical Plaza, QI 3, 1.o andar. Lago Sul, DF, telefone 61 3365-4545

Internet: [email protected]

Vinícius Medina Lopes

[email protected]

Vinícius Medina Lopes, Jean Pierre Barguil Brasileiro, Natália Zavattiero Tierno, Thaísa Sant’Anna Lacerda, Anna Luíza Moraes Souza, Aluísio Mendes da Rocha Filho e Joaquim Roberto Costa Lopes.

Vinícius Medina Lopes. Médico, mestre em ciências da saúde pela Universidade de Brasília, UnB. Instituto VERHUM – Videoendoscopia e Reprodução Humana de Brasília, Distrito Federal.

Jean Pierre Barguil Brasileiro. Médico, especialista em reprodução humana e videoendoscopia. Instituto VERHUM – Videoendoscopia e Reprodução Humana de Brasília, Distrito Federal.

Natalia Zavattiero Tierno. Médica, especialista em ginecologia, obstetrícia e reprodução humana. Instituto VERHUM – Videoendoscopia e Reprodução Humana de Brasília, Distrito Federal.

Thaisa Sant’Anna Lacerda. Bióloga, doutora em ciências animais pela Universidade de Brasília, UnB. Instituto VERHUM – Videoendoscopia e Reprodução Humana de Brasília, Distrito Federal.

Anna Luíza Moraes Souza. Médica, mestre em saúde da mulher, área de concentração Patologia Ginecológica e Reprodução, pela Universidade Federal de Minas Gerais, UFMG. Instituto VERHUM- Videoendoscopia e Reprodução Humana de Brasília, Distrito Federal.

Aluísio Mendes da Rocha Filho. Médico, especialista em reprodução humana. Instituto VERHUM- Videoendoscopia e Reprodução Humana de Brasília, Distrito Federal.

Joaquim Roberto Costa Lopes. Médico, especialista em reprodução humana pelo Instituto Dexeus da Universidade Autônoma de Barcelona, Espanha. CENAFERT – Centro de Medicina Reprodutiva – Salvador, Bahia.

DOI - 10.14242/2236-5117.2015v52n1a295p1

Page 3: 52(1) - rbm.org.brrbm.org.br/Content/imagebank/pdf/v52n1.pdf · convencional, foi aos poucos substituída pela injeção intracitoplasmática de espermatozoides, inicialmen-te usada

Thaísa Sant'Anna Lacerda • Doação de óvulos: alternativa eficaz quando a mulher não puder utilizar os próprios gametas

ARTIGO ORIGINAL

2 • Brasília Med 2015;52(1):1-7

Conclusões. A fertilização in vitro feita por meio de doação compartilhada de oócitos é opção efi-caz para as mulheres que não podem utilizar os próprios oócitos. O alto índice de gemelarida-de sinaliza, em casos selecionados que se deve transferir apenas um embrião com intuito de minimizar os riscos materno-fetais.Descritores. Trauma; idoso; queda; injúria; mortalidade.

Palavras Chave. Fertilização in vitro; doação de óvulos; partos múltiplos; fase lútea.

ABSTRACT

Egg donation. An effective alternative when women are not capable to use their own oocyte.

Objective. To evaluate the results of in vitro fertilization cycles in women submitted to embryo transfer, using fresh donated oocytes.

Methods. All transfers from January/2014 to March/2016 were included in an assisted reproduction center. Selection criteria: donors from 18 through 34 years old, with basal echography showing more than ten antral follicles; recipients with indication for performing the procedure. Endometrial preparation of the recipients with estradiol valerate in in-creasing doses up to 6 mg/day, from the beginning of the donor ovarian stimulation. Luteal support with vaginal pro-gesterone started on the day of oocyte pick-up. The day of embryo transfer was decided according to the preference or convenience of the attending physician. The mean reci-pients age, number of inseminated mature oocytes, number of embryos transferred and vitrified, abortion rates, ongoing pregnancy with live fetus at the 12th week of gestation and multiple pregnancy were evaluated.

Results. A total of 97 recipients’ cycles with mean age of 42(± 4.5) were evaluated. The mean number of donated and fertilized mature oocytes, number of embryos transferred and vitrified, were 6.48 (± 2.4), 5.11 (± 2), 1.9 (± 0.3) and 1.04 (± 1.4). The abortion rates, ongoing pregnancy and multiple pregnancy were respectively 9% (4/44), 41.2% (40/97) and 37.5% (15/40).

Conclusions. The shared egg donation is an effective op-tion for women who have in vitro fertilization with donated eggs the alternative to establish their offspring. The high

multiple pregnancy rates indicate that only one embryo should be transferred in selected cases, in order to minimize maternal-fetal risks.

Descriptors. Trauma; elderly; accidental falls; wounds and injury; mortality rate.

Key Words. In vitro fertilization; oocyte donation; multiple birth; luteal phase.

INTRODUÇÃO

As técnicas de reprodução assistida atualmente per-mitem obter gestação na maioria dos casos de infer-tilidade. A técnica mais antiga, a fe rtilização in vitro convencional, foi aos poucos substituída pela injeção intracitoplasmática de espermatozoides, inicialmen-te usada nos casos de infertilidade masculina em que havia uma quantidade mínima de espermatozoides, como nos casos de punção de epidídimo ou de biópsia testicular.

Uma das causas de infertilidade mais impactantes para a mulher é a ausência de oócitos viáveis em ciclos de fertilização in vitro, principalmente em razão da insufi-ciência ovariana e ou da baixa qualidade oocitária, em geral por idade avançada.1 Como opção de tratamen-to, nesses casos, há muitos anos no Brasil é utilizada a técnica de doação de óvulos.2 A necessidade da doação de óvulos pode resultar também de doenças genéticas, ausência dos ovários, pacientes p obres respondedoras submetidas à estimulação ovariana e falhas repetidas em ciclos de fertilização in vitro.3-5

Algumas modalidades de doação de óvulos foram des-critas, a saber – altruísta, quando, espontaneamente, uma mulher que produziu uma quantidade conside-rável de óvulos aceita doar todos ou alguns a outra mulher que lhe é desconhecida; parental, quando uma irmã, parente ou amiga decide doar óvulos de-pois de se submeter ao estímulo ovariano e à coleta ovular; doação mercantil, quando este ato é compen-sado por alguma retribuição financeira. Por fim, uma quarta modalidade, definida como relacional cruza-da ou anônima personalizada, pela qual uma mulher que necessita de óvulos seleciona uma doadora que oferecerá seus óvulos a outra mulher. Essa recepto-ra beneficiada, em contrapartida, providencia uma

Page 4: 52(1) - rbm.org.brrbm.org.br/Content/imagebank/pdf/v52n1.pdf · convencional, foi aos poucos substituída pela injeção intracitoplasmática de espermatozoides, inicialmen-te usada

Brasília Med 2015;52(1):1-7 • 3

ARTIGO ORIGINAL

Thaísa Sant'Anna Lacerda • Doação de óvulos: alternativa eficaz quando a mulher não puder utilizar os próprios gametas

doadora, igualmente de modo anônimo, para a pri-meira mulher.6

Outra modalidade envolve duas mulheres, ambas inférteis, que não se conhecem. Uma candidata à re-cepção de óvulos e a outra, também com indicação de fertilização in vitro, jovem e com reserva ovariana ade-quada ao processo e, além disso, disposta a doar o ex-cedente dos seus óvulos. Nesse procedimento, os cus-tos e os óvulos obtidos, quando coletados em número maior que seis, são partilhados pelas duas pacientes. É a doação compartilhada de óvulos, que teve início no Brasil, em 1993, na Clínica Centro de Endoscopia e Assistência à Fertilização – CENAFERT, Brasília. Seus critérios preliminares, que sofreram progressi-va atualização, foram publicados em 1995.2 A doação compartilhada de óvulos apresenta vantagens sobre outros tipos de doação, já que evitava o uso de drogas pela doadora apenas para doar óvulos, e as medicações usadas na doação compartilhada servem para o pró-prio tratamento, e o esquema beneficia diretamente ambas as mulheres.6 No Brasil, a doação compartilha-da de óvulos é considerada um procedimento ético e atualmente regulamentado pela Resolução 2121/2015, que atende às normas vigentes do Conselho Federal de Medicina (CFM).7 É o único modelo de doação de oócitos aceito pelo CFM. As normas seguem algumas condições, como: doação sem caráter comercial; ano-nimato entre as partes envolvidas (doadoras e recep-toras); e doadoras jovens, com idade limite de 35 anos, para garantir a qualidade oocitária.7

Com o avanço tecnológico aplicado aos laboratórios de fertilização in vitro houve aumento da taxa de im-plantação embrionária, ou seja, maior capacidade de aquele embrião, transferido para o útero, implantar-se e gerar uma criança saudável. Consequentemente, foi observado aumento nas taxas de gestação e de geme-laridade, inclusive nos casos de doação compartilha-da de óvulos.8 Sabe-se hoje que a gemelaridade está associada a riscos materno-fetais e, quanto maior o número de fetos em desenvolvimento, maiores são os riscos.9-11 Esses fatos fizeram o CFM, em 2010, limitar o número de embriões a ser transferidos para as re-ceptoras de acordo com a idade das doadoras, já que esses oócitos provenientes de doadoras jovens geram embriões com alta capacidade de implantação.12-14

Avaliar constantemente os resultados dos tratamen-tos de reprodução assistida para fins de controle e melhora da qualidade laboratorial e clínica é uma ne-cessidade de cada centro. O objetivo deste trabalho foi avaliar os resultados das transferências embrionárias das receptoras de óvulos do programa de doação com-partilhada de óvulos.

MÉTODOS

Trata-se de estudo retrospectivo, no qual se ana-lisou o resultado das transferências de embriões em pacientes receptoras de oócitos no período de janeiro de 2014 a março de 2016, em um centro de reprodução assistida em Brasília-DF.

Foram considerados os seguintes critérios para a seleção de pacientes – doadoras de 18 a 34 anos de idade, com ecografia basal, que evidenciou mais de dez folículos antrais, e receptoras com indicação para o procedimento.

O preparo endometrial das receptoras com vale-rato de estradiol foi iniciado, desde o início da hi-perestimulação ovariana controlada das doadoras, em doses crescentes, isto é, 2 mg por dia nos três primeiros dias, 4 mg por dia nos três dias conse-cutivos e, depois, 6 mg por dia até sua suspensão no período da 8.ª à 12.ª semana de gestação quan-do esta ocorria. Posteriormente, o suporte de fase lútea foi realizado com progesterona vaginal 600 mg por dia, iniciado no dia da captação da doadora com suspensão, também, no período da 8.ª à 12.ª semana de gestação, quando esta ocorria. O dia da transferência embrionária foi decidido de acordo com a preferência e a conveniência do médico as-sistente no período do terceiro ao quinto dia depois da coleta ovular.

Foram avaliados, no estudo, idade das recepto-ras; indicação do procedimento (genética, baixa reserva ovariana, idade materna avançada igual ou maior de 40 anos de idade); número de oóci-tos MII doados e fertilizados; número de embriões transferidos; número de embriões excedentes que foram criopreservados com a técnica de vitrifica-ção; taxas de abortamento; ocorrência de gesta-ção em curso e gemelaridade com feto vivo na 12.ª

Page 5: 52(1) - rbm.org.brrbm.org.br/Content/imagebank/pdf/v52n1.pdf · convencional, foi aos poucos substituída pela injeção intracitoplasmática de espermatozoides, inicialmen-te usada

Thaísa Sant'Anna Lacerda • Doação de óvulos: alternativa eficaz quando a mulher não puder utilizar os próprios gametas

ARTIGO ORIGINAL

4 • Brasília Med 2015;52(1):1-7

e de gemelaridade foram 9% (4/44) e 37,5% (15/40) respectivamente (tabela 2).

DISCUSSÃO

Os resultados da elevada taxa de gravidez clínica (41,2%) em pacientes receptoras – média de 42 anos – reforçam a importância da doação compartilhada de óvulos em mulheres que não obtiveram sucesso na gestação com os próprios óvulos. Os resultados obtidos pelos autores corroboram os índices da Redlara (Rede Latino-Americana de Reprodução Assistida), que resultaram em média de 42,2% de gravidez clínica em mulheres receptoras de óvulos doados de 40 a 42 anos etários.12

A elevada taxa de gravidez clínica em pacientes re-ceptoras decorre da idade da doadora de óvulos, já que um dos fatores primordiais para o suces-so das técnicas de reprodução assistida é a idade da mulher.15,16 Isso também pode explicar a mé-dia de oócitos fertilizados 5,11 ± 2, decorrente do número médio de oócitos maduros doados (6,48),

semana de gestação, confirmada por ultrassono-grafia transvaginal.

RESULTADOS

Das 97 transferências embrionárias em receptoras com idade de 30 a 51 anos, a idade média apresen-tada entre as assistidas foi 42 ± 4,5 anos. As indi-cações para utilização de oócitos doados foram: genética (2); baixa reserva ovariana isolada (19); idade materna avançada isolada (6); baixa reserva ovariana associada à idade materna avançada (70).

O número de oócitos doados maduros, ou seja, com estado de maturação em metáfase II (MII) variou de 2 a 13 com a média de 6,48 ± 2,4, e aqueles que resultaram em fertilização variaram de 1 a 11 com a média de 5,11 ± 2 (tabela 1). Os números de em-briões transferidos e vitrificados variaram de 1 a 2 (média = 1,90 ± 0,3 e 0 a 5 média = 1,04 ± 1,4 respec-tivamente) (tabela 1).

Das 97 pacientes receptoras, 40 tiveram uma ges-tação em curso (41,2%), e as taxas de abortamento

OÓCITOS E EMBRIÕES NÚMEROS OBSERVADOS MÉDIAS (DP*)

Oócitos maduros (MII) 2 a 13 6,48 (±2,4)

Oócitos maduros fertilizados 1 a 11 5,11 (±2)

Embriões transferidos 1 a 2 1,90 (±0,3)

Embriões vitrificados 0 a 5 1,04 (±1,4)

*Desvio-Padrão

Tabela 1. Resultados da manipulação dos gametas em ciclos de fertilização in vitro com oócitos doados

Page 6: 52(1) - rbm.org.brrbm.org.br/Content/imagebank/pdf/v52n1.pdf · convencional, foi aos poucos substituída pela injeção intracitoplasmática de espermatozoides, inicialmen-te usada

Brasília Med 2015;52(1):1-7 • 5

ARTIGO ORIGINAL

Thaísa Sant'Anna Lacerda • Doação de óvulos: alternativa eficaz quando a mulher não puder utilizar os próprios gametas

resultantes nesse trabalho. Oócitos de mulheres jovens têm grande potencial de fertilização e con-sequentemente embriões com grande poder de implantação, e esse potencial é usado na doação compartilhada de óvulos.1 No entanto, o sucesso da evolução da gestação clínica nas receptoras re-quer endométrio receptivo de boa qualidade e bem sincronizado, além de técnica adequada de transfe-rência embrionária.17,18 Segundo dados da Redlara, a taxa de gestação em pacientes com idade igual ou menor que 34 anos, com uso de óvulos próprios, é de 35,4% por transferência embrionária.12 Quando utilizada doação compartilhada de óvulos, essa ta-xa variou de 28,1% a 39,9%, por transferência de embrião congelado e a fresco, respectivamente, próxima à nossa taxa de gestação para receptoras.12

O alto índice de gemelaridade (37,5%) que resultou do presente trabalho pode ser explicado pela trans-ferência de mais de um embrião de boa qualidade (média de 1,9). No entanto, dada a elevada taxa de complicações na gestação e no parto, em pacientes com idade avançada, com mais de 45 anos, espe-cialmente entre gestações gemelares, a transferên-cia de embrião único precisa ser incentivada em re-ceptoras de óvulos em idade mais avançada.19 Além disso, estudos anteriores têm relatado aumento de ocorrência de complicações obstétricas e perina-tais, como pré-eclâmpsia e hipertensão gestacional em receptoras de óvulos, independentemente da idade, agravando-se quando decorrentes de gesta-ção gemelar.19-25

A incidência de abortamento obtida neste trabalho

dos autores (9%) foi menor quando comparada à taxa de abortamentos espontâneos em recepto-ras relatados pela Redlara (15,4%).12 A literatura evidencia taxas de abortamento para essa faixa etária, acima de 40 anos, quando utilizados os próprios óvulos, de 20% a 50%.12 Encontrada, no presente estudo, incidência menor do que a re-ferida, provavelmente pela diminuição de cro-mossomopatias embrionárias, resultantes de oócitos jovens de melhor qualidade.

CONCLUSÃO

A fecundação in vitro por meio da doação com-partilhada de oócitos é opção eficaz para as mulheres que não podem usar os próprios oó-citos. O alto índice de gemelaridade aponta que se deve transferir apenas um embrião em casos selecionados, com intuito de minimizar os riscos materno-fetais.

REFERÊNCIAS

1. Sauer M V. Principles of oocyte and embryo do-nation. Vol. 9781447123, Principles of Oocyte and Embryo Donation. Londres: Springer London; 2013. 1-426 p. Disponivel em: http://www.springer.com/gp/book/9781447123910. Acesso em: 21 nov. 2016.

2. Lopes JRC, Brandi MCC, Costa RR, Medina-Lopes MD. Doação compartilhada de óvulos. Reprodução Clim. 1995;10(148):50.

3. Klein J, Sauer MV. Oocyte donation. Best Pract Res

GESTAÇÃO E TAXAS % CASOS

Gestação em curso 41,2 40/97

Taxa de abortamento 9 04/44

Taxa de gemelaridade 37,5 15/40

Tabela 2. Resultados dos ciclos de fertilização in vitro em receptoras de oócitos

Page 7: 52(1) - rbm.org.brrbm.org.br/Content/imagebank/pdf/v52n1.pdf · convencional, foi aos poucos substituída pela injeção intracitoplasmática de espermatozoides, inicialmen-te usada

Thaísa Sant'Anna Lacerda • Doação de óvulos: alternativa eficaz quando a mulher não puder utilizar os próprios gametas

ARTIGO ORIGINAL

6 • Brasília Med 2015;52(1):1-7

Clin Obstet Gynaecol [Internet]. 2002;16(3):277–91. Dis-ponível em: http://linkinghub.elsevier.com/retrieve/pii/S1521693402902889. Acesso em: 21 nov. 2016.

4. Remohi J, Vidal A, Pellicer A. Oocyte donation in low re-sponders to conventional ovarian stimulation for in vitro fertilization. Fertil Steril. 1993;59(6):1208–15.

5. Burton G, Abdalla HI, Kirkland A, Studd JW. The role of oocyte donation in women who are unsuccess-ful with in-vitro fertilization treatment. Hum Reprod. 1992;7(8):1103–5.

6. Lopes JRC, Lopes VM, Brasileiro JPB, Pereira TR, Café TC, dos Santos JJM, et al. Doação compartilhada de óvu-los (DCO): uma alternativa ética? Egg Sharing Donation: an ethical alternative? JBRA - J Bras Reprodução Assist. 2006;10(2):10–6.

7. Brasil. Conselho Federal de Medicina. Resolução CFM no 2.121/2015 sobre Reprodução Assistida. 2015;2015(D). Disponível em: http://www.portalmedico.org.br/resolu-coes/CFM/2015/2126_2015.pdf. Acesso em: 8 dez. 2016.

8. Zegers-Hochschild F, Schwarze JE, Crosby JA, Musri C, de Souza MCB. Assisted reproductive technologies in Latin America: The Latin American Registry, 2010. JBRA Assist Reprod. 2012;16(6):320–8.

9. Luke B, Brown MB. Maternal morbidity and infant death in twin vs triplet and quadruplet pregnancies. Am J Ob-stet Gynecol. 2008;198(4):401.e1-10.

10. Campbell DM, Templeton A. Maternal complications of twin pregnancy. Int J Gynecol Obstet. 2004;84(1):71–3.

11. Breathnach FM, Malone FD. Fetal growth disorders in twin gestations. Semin Perinatol. 2012;36(3):175–81.

12. Zegers-Hochschild F, Schwarze JE, Crosby JA, Musri C, de Souza MCB. Assisted reproductive technologies (ART) in Latin America: The Latin American registry, 2012. J Bras Reprod Assist. 2014;18(4):127–35.

13. Savasi VM, Mandia L, Laoreti A, Cetin I. Maternal and fe-tal outcomes in oocyte donation pregnancies. Hum Re-prod Update. 2016 Sep;22(5):620–33.

14. Brasil. Conselho Federal de Medicina. Resolução CFM no 1.957/2010. 2010;(2011). Disponível em: http://www.portalmedico.org.br/resolucoes/CFM/2011/1957_2011.pdf. Acesso em: 21 nov. 2016.

15. Deatsman S, Vasilopoulos T, Rhoton-Vlasak A. Age and Fertility: A Study on Patient Awareness. JBRA Assist Reprod [Internet]. 2016;20(3):99–106. Dis-ponível em: http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pub-med/27584600. Acesso em: 21 nov. 2016.

16. Navot D, Drews MR, Bergh PA, Guzman I, Karstaedt A, Scott RT, et al. Age-related decline in female fertil-ity is not due to diminished capacity of the uterus to sustain embryo implantation. Fertil Steril [Internet]. 1994;61(1):97–101. Disponível em: http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/8293851 Acesso em: 21 nov. 2016.

17. Paulson RJ, Sauer M V, Lobo RA. Embryo implanta-tion after human in vitro fertilization: importance of endometrial receptivity. Fertil Steril [Internet]. 1990;53(5):870–4. Disponível em: http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/2110078. Acesso em: 21 nov. 2016.

18. Rashid NA, Lalitkumar S, Lalitkumar PG, Gemzell-Dan-ielsson K. Endometrial receptivity and human embryo implantation. Am J Reprod Immunol. 2011;66:23–30.

19. Guesdon E, Vincent-Rohfritsch A, Bydlowski S, San-tulli P, Goffinet F, Le Ray C. Oocyte donation recipi-ents of very advanced age: perinatal complications for singletons and twins. Fertil Steril [Internet]. 2016; Disponível em: http://dx.doi.org/10.1016/j.fertnstert.2016.09.021.

20. Sekhon LH, Gerber RS, Rebarber A, Saltzman DH, Klauser CK, Gupta S, et al. Effect of oocyte donation on pregnancy outcomes in in vitro fertilization twin gesta-tions. Fertil Steril. 2014;101(5):1326–30.

21. Martínez-Varea A, Pellicer B, Perales-Marín A, Pellicer A. Relationship between maternal immunological re-sponse during pregnancy and onset of preeclampsia. Journal of Immunology Research. 2014, 2014:15. Dis-ponível em: http://dx.doi.org/10.1155/2014/210241. Acesso em: 21 nov. 2016.

Page 8: 52(1) - rbm.org.brrbm.org.br/Content/imagebank/pdf/v52n1.pdf · convencional, foi aos poucos substituída pela injeção intracitoplasmática de espermatozoides, inicialmen-te usada

Brasília Med 2015;52(1):1-7 • 7

ARTIGO ORIGINAL

Thaísa Sant'Anna Lacerda • Doação de óvulos: alternativa eficaz quando a mulher não puder utilizar os próprios gametas

22. Masoudian P, Nasr A, De Nanassy J, Fung-Kee-Fung K, Bainbridge SA, El Demellawy D. Oocyte donation pregnan-cies and the risk of preeclampsia or gestational hyperten-sion: A systematic review and meta-analysis. Am J Obstet Gynecol [Internet]. 2016;214(3):328–39. Disponível em: http://dx.doi.org/10.1016/j.ajog.2015.11.020. Acesso em: 21 nov. 2016.

23. Nejdet S, Bergh C, Källén K, Wennerholm UB, Thurin-Kjell-berg A. High risks of maternal and perinatal complications in singletons born after oocyte donation. Acta Obstet Gy-necol Scand. 2016;95(8):879–86.

24. Pecks U, Maass N, Neulen J. Oocyte donation: a risk factor for pregnancy-induced hypertension: a meta-analysis and case series. Dtsch Arztebl Int [Internet]. 2011;108(3):23–31. Disponível em: http://www.pub-medcentral.nih.gov/articlerender.fcgi?artid=3026399&tool=pmcentrez&rendertype=abstract. Acesso em: 21 nov. 2016.

25. Söderström-Anttila V. Pregnancy and child out-come after oocyte donation. Hum Reprod Update. 2001;7(1):28–32.

Page 9: 52(1) - rbm.org.brrbm.org.br/Content/imagebank/pdf/v52n1.pdf · convencional, foi aos poucos substituída pela injeção intracitoplasmática de espermatozoides, inicialmen-te usada

Guilherme Martins Gelfuso • Preparações farmacêuticas e comséticas com uso de nanotecnologia

ARTIGO DE REVISÃO

8 • Brasília Med 2015;52(1):8-20

RESUMO

A nanotecnologia é uma área da ciência dedica-da a pesquisas sobre sistemas estruturados em escala nanométrica. No campo farmacêutico, os nanocarreadores têm sido investigados como veículos de fármacos no desenvolvimento de medicamentos inovadores para solucionar pro-blemas correlatos a biodisponibilidade, estabili-dade e toxicidade. As formulações farmacêuticas nanoestruturadas são capazes de controlar a li-beração de moléculas e ainda direcioná-las para seu local específico de ação e, assim, otimizam a terapia e reduzem seus efeitos adversos. Nos dermocosméticos, o uso de nanotecnologia tem conseguido elevar a capacidade dos ativos cos-méticos de penetrar e de se manter mais tempo na pele, obtendo-se melhoras estéticas compro-vadas cientificamente. Este artigo tem o objeti-vo de apresentar os principais sistemas nanotec-nológicos de uso médico e cosmético, bem como trazer discussões relativas às suas aplicações e

Preparações farmacêuticas e cosméticas com uso de nanotecnologia

revisão dos sistemas que já foram lançados ou que se encontram em fases avançadas de pes-quisa. Foram compilados vários estudos em que se investigaram diferentes sistemas nanoestru-turados, com destaque para os lipossomas, os dendrímeros e as nanopartículas poliméricas, lipídicas sólidas, magnéticas e metálicas. São também apresentadas perspectivas futuras que mostram a nanotecnologia como área em franco crescimento e que tem contribuído de forma sig-nificativa para avanços na área da saúde.

Palavras Chave. Nanotecnologia; nanopartículas; lipossomas; dendrímeros; liberação vetorizada.

ABSTRACT

Pharmaceutical and cosmetic preparations using nanotechnology.

The field of nanotechnology studies has struc-tured systems at the nanometer scale. In the

Os autores declaram inexistência de conflitos de interesses.

Correspondência: Prof. Dr. Guilherme Martins Gelfuso

Faculdade de Ciências da Saúde, Universidade de Brasília. Campus Universitário Darcy Ribeiro

Universidade de Brasília. Campus Universitário Darcy Ribeiro, s/n. CEP: 70910-900. Brasília, DF

Telefone: +55 61 31071842 Internet: [email protected]

Breno N. Matos, Paula M. Oliveira, Camila A. Areda, Marcílio S. S. Cunha-Filho, Taís Gratieri, Guilherme M. Gelfuso.

Breno N. Matos . Farmacêutico, doutorando. Laboratório de Tecnologia de Medicamentos, Alimentos e Cosméticos (LTMAC), Faculdade de Ciências da Saúde, Universidade de Brasília. Brasília, DF.

Paula M. Oliveira . Farmacêutica, doutoranda. Laboratório de Tecnologia de Medicamentos, Alimentos e Cosméticos (LTMAC), Faculdade de Ciências da Saúde, Universidade de Brasília. Brasília, DF.

Camila A. Areda . Farmacêutica, doutora, professora adjunta. Faculdade de Ceilândia, Universidade de Brasília. Ceilândia, DF.

Marcílio S. S. Cunha-Filho. Farmacêutico, doutor, professor adjunto. Laboratório de Tecnologia de Medicamentos, Alimentos e Cosméticos (LTMAC), Faculdade de Ciências da Saúde, Universidade de Brasília. Brasília, DF.

Taís Gratieri. Farmacêutica, doutora, professora adjunta. Laboratório de Tecnologia de Medicamentos, Alimentos e Cosméticos (LTMAC), Faculdade de Ciências da Saúde, Universidade de Brasília. Brasília, DF.

Guilherme M. Gelfuso. Farmacêutico, doutor, professor adjunto. Laboratório de Tecnologia de Medicamentos, Alimentos e Cosméticos (LTMAC), Faculdade de Ciências da Saúde, Universidade de Brasília. Brasília, DF.

DOI - 10.14242/2236-5117.2015v52n1a296p8

Page 10: 52(1) - rbm.org.brrbm.org.br/Content/imagebank/pdf/v52n1.pdf · convencional, foi aos poucos substituída pela injeção intracitoplasmática de espermatozoides, inicialmen-te usada

Guilherme Martins Gelfuso • Preparações farmacêuticas e comséticas com uso de nanotecnologia

ARTIGO DE REVISÃO

9 • Brasília Med 2015;52(1):8-20

pharmaceutical area, nanocarriers have been investigated as drug delivery systems on the development of innovative medicines to solve bioavailability, stability and toxicity problems. Nanostructured carriers are also capable of con-trolled and targeted drug delivery, optimizing drug therapy and reducing side effects. Regarding dermocosmetics, nanotechnology has been capa-ble of enhancing cosmetic actives penetration and skin contact time, resulting in scientifically pro-ven aesthetic improvements. This paper aims to present the main nanotechnology systems used in medicines and cosmetics, discussions on each ap-plication and a review on the main systems that have already been launched or are in advanced research stages. The use of liposomes, nanoparti-cles (polymer, solid lipid, magnetic and metal) and dendrimers are highlighted. Future perspectives are finally presented, showing nanotechnology as a growthing area, which has significantly contribu-ted to advances in health care.

Palavras Chave. Nanotechnology; nanoparticles; li-posomes; dendrimers; targeted delivery

INTRODUÇÃO

Nas terapias medicamentosas sistêmicas convencio-nais, principalmente as que fazem uso das vias de administração oral e parenteral, são requeridas altas doses do fármaco para que, após a absorção e biodis-tribuição, a substância ativa atinja o tecido-alvo em concentrações terapêuticas. Nesse processo, quanti-dades significativas do fármaco são acumuladas em tecidos não alvos, desencadeando diversos efeitos adversos, muitos deles tóxicos.1,2 A utilização de vias tópicas, em que o medicamento é aplicado diretamen-te no tecido-alvo, como pele e mucosas, nem sempre representa uma alternativa viável, uma vez que a ab-sorção de fármacos nesses tecidos tende a ser limitada ou incompleta.

Um grande desafio para os pesquisadores na área far-macêutica está no desenvolvimento de medicamentos mais eficientes, que utilizem doses menores do fárma-co e que sejam capazes de direcioná-lo exclusivamen-te ao local de ação pretendido, sem se acumular em outros tecidos, evitando-se efeitos adversos. Outro

importante desafio consiste na liberação progressiva do fármaco durante longos períodos, de forma que se reduza a necessidade de aplicação do medicamento repetidas vezes ao longo do dia, mantendo-se níveis eficazes e seguros do fármaco em seu local de ação du-rante todo o período de tratamento.

Nos últimos anos, vislumbrou-se na nanotecnologia uma possibilidade real de desenvolver medicamentos alvo-específicos mais eficazes e seguros. A nanotecno-logia é uma área emergente da ciência que se dedica ao desenvolvimento de sistemas estruturados em di-mensões compreendidas normalmente nos valores de 0,1 a 500 nm, produzidos a partir dos mais diversos tipos de materiais, ou seja, polímeros, cerâmicas, me-tais, semicondutores e biomateriais.3,4 O interesse por essa tecnologia está em explorar as novas proprieda-des que a matéria assume em dimensões tão reduzidas que se diferem de material em macroescala quanto a características ópticas, eletrônicas, magnéticas e biológicas.2,4

No campo médico, os nanocarreadores têm sido efica-zes em solucionar problemas relacionados à baixa bio-disponibilidade de alguns fármacos, à sua instabilidade química e baixa solubilidade aquosa. Mais importante, os carreadores nanoestruturados mostram-se capazes de melhorar a absorção de fármacos, sustentar sua li-beração e até vetorizar sua liberação, direcionando-os ao sítio de ação.2

Nesse contexto, esse artigo apresenta os principais sistemas nanotecnológicos para liberação de fárma-cos (lipossomas, nanopartículas e dendrímeros), traz discussões a respeito de suas principais aplicações e uma revisão relativa aos sistemas que foram lançados no mercado nacional ou internacional ou que se en-contram em fases avançadas de pesquisa.

Liposomas. Os lipossomas são vesículas consti-tuídas de fosfolipídios, que se organizam em uma ou mais bicamadas concêntricas e englobam um compartimento aquoso interno5-7 (figura 1A). A natureza anfifílica dos fosfolipídios permite que essas vesículas sejam capazes de encapsular tan-to compostos hidrofílicos, no seu interior, quanto compostos hidrofóbicos, entre as bicamadas lipídi-cas. Outra característica interessante desse sistema

Page 11: 52(1) - rbm.org.brrbm.org.br/Content/imagebank/pdf/v52n1.pdf · convencional, foi aos poucos substituída pela injeção intracitoplasmática de espermatozoides, inicialmen-te usada

Brasília Med 2015;52(1):8-20 • 10

ARTIGO DE REVISÃO

Guilherme Martins Gelfuso • Preparações farmacêuticas e comséticas com uso de nanotecnologia

é a possibilidade de modificar sua superfície, que pode ser revestida de moléculas específicas, como antígenos e anticorpos, fazendo essas estruturas se ligarem seletivamente a células de tecidos-alvo e li-berem o fármaco encapsulado diretamente no local

de ação.7 Além disso, a elevada biocompatibilidade dessas estruturas as tornou uma solução interes-sante para aumentar o tempo de meia-vida de pro-teínas, peptídeos e diversos fármacos na circula-ção sanguínea. Alguns medicamentos lipossômicos

NOME COMERCIAL FÁRMACOVIA DE

ADMINISTRAÇÃOTIPO DE ESTRUTURA

INDICAÇÃO/ALVO/APLICAÇÃO

SITUAÇÃO

AmBisome® Anfotericina B IV Lipossoma Infecções fúngicasAprovado FDA

(1997) EMA (1990)

Curosurf® AlfaporactanteIntratraqueal ou intrabronquial

LipossomaSíndrome do desconforto

respiratório (SDR)FDA (1999)

DaunoXome® Daunorrubicina IV Lipossoma Sarcoma de KaposiAprovado FDA

(1996)

Definity® Perflutren IV LipossomaAgente de contraste

Aprovado FDA (2001)

DepoCyt® Citarabina IV LipossomaTratamento meningite

linfomatosa

Aprovado FDA (1999) EMA (2001)

DepoDur® Sulfato de morfina Parental LipossomaTratamento da dor

crônicaAprovado FDA

(2004)

Doxil® Daunorrubicina IV

Lipossoma furtivo stealth

liposomes

Câncer de ovário, sarcoma de

Kaposi e mieloma múltiplo

Aprovado FDA (1995) EMA (1996)

Tabela 1. Principais medicamentos contendo nanotecnologia registrados no FDA e EMA para aplicação terapêutica59-60

Figura 1. Representação esquemática dos principais sistemas nanoestruturados: (A) lipossoma unilamelar; (B) nanopartícula lipídica sólida – núcleo constituído por lipídeos sólidos (temperatura ambiente) e estabilizado por moléculas de tensoativos; (C) dendrímero polimérico; (D) nanopartícula magnética de dióxido de ferro; (E) nanocápsula polimérica (revestimento polimérico de um núcleo oleoso); nanoesfera (estrutura polimérica maciça)

Page 12: 52(1) - rbm.org.brrbm.org.br/Content/imagebank/pdf/v52n1.pdf · convencional, foi aos poucos substituída pela injeção intracitoplasmática de espermatozoides, inicialmen-te usada

Guilherme Martins Gelfuso • Preparações farmacêuticas e comséticas com uso de nanotecnologia

ARTIGO DE REVISÃO

11 • Brasília Med 2015;52(1):8-20

Inflexal®VAntígenos do vírus

influenzaIV Lipossoma

Vacina para influenza (gripe)

AprovadoSuíça (1997)

Marqibo® Sulfato de vincristina

IV LipossomaLeucemia linfoide

agudaAprovado FDA

(2012)

MepactTM Mifamurtide IV Lipossoma OsteossarcomaAprovado EMA

(2009)

Myocet® Doxorrubicina IV Lipossoma Câncer de mamaAprovado EMA

(2000)

Survanta® Beractanto Intratraqueal LipossomaSíndrome do desconforto

respiratório (SDR)

Aprovado FDA (1991)

Visudyne® Verteporfina IV LipossomaNeovascularização

coroidiana subfoveal

Aprovado FDA (2000) BRA

Abraxane® Paclitaxel IVNanopartícula

poliméricaCâncer de mama e

de pulmãoAprovado FDA

(2005) EMA (2008)

Copaxone® Acetato de glatirâmer

IVNanopartícula

poliméricaEsclerose múltipla

Aprovado FDA (1996)

Eligard® Acetato de leuprolida

SubcutâneoNanopartícula

poliméricaCâncer de próstata

avançadoAprovado FDA

(2002)

Opaxio® Paclitaxel IVNanopartícula

poliméricaGlioblastoma

Aprovado FDA (2012)

Renagel® Cloridrato de sevelâmer

VONanopartícula

poliméricaHiperfosfatemia

Aprovado FDA (2000)

EMA(2000)

Zevalin® Ibritumomab tiuxetan

IVNanopartícula

poliméricaLinfoma não

HodgkinAprovado FDA

(2002)

conjugada com anticorpo

EMA (2004)

FerahemeTMFerumoxytol -

partícula de óxido de ferro

IVNanopartícula

magnética

Tratamento da anemia por deficiência de

ferro

Aprovado FDA (2009)

Feridex®Ferumoxides -

partícula de óxido de ferro

IVNanopartícula

magnéticaAgente de

contraste - fígado

Aprovado pelo FDA (1996) e retirado

(2008)

Ferrlicit® Gluconato férrico IVNanopartícula de

óxido de ferroAnemia ferropriva

Aprovado FDA (2009)

Fosrenol® Carbonato de lantânio

VONanopartícula

magnéticaEstádio final de

doença renalAprovado FDA

(2004)

Nanotherm® Partícula de óxido de ferro

ParenteralNanopartícula de

óxido de ferroTerapia do câncer

Aprovado EMA (2013)

Sucrofer® Sacarato de hidróxido férrico

IVNanopartícula de

óxido de ferroDeficiência de

ferroAprovado FDA

(2000)

Tabela 1. Principais medicamentos contendo nanotecnologia registrados no FDA e EMA para aplicação terapêutica59-60

Page 13: 52(1) - rbm.org.brrbm.org.br/Content/imagebank/pdf/v52n1.pdf · convencional, foi aos poucos substituída pela injeção intracitoplasmática de espermatozoides, inicialmen-te usada

Brasília Med 2015;52(1):8-20 • 12

ARTIGO DE REVISÃO

Guilherme Martins Gelfuso • Preparações farmacêuticas e comséticas com uso de nanotecnologia

aprovados pela agência sanitária norte-americana Food and Drug Administration (FDA) ou que estão em fase de estudos clínicos – são listados na tabela 1.

Os carreadores lisossômicos têm tido ampla aceita-ção clínica no tratamento do câncer por alterarem a farmacocinética e a biodistribuição dos fármacos antineoplásicos, o que leva a um aumento de efi-cácia e redução de efeitos tóxicos associados aos tratamentos quimioterápicos.8 Chou e colaborado-res9 avaliaram a atividade do quimioterápico do-xorrubicina encapsulado em lipossomas (LipoDox®) em pacientes com carcinoma ovariano epitelial resistente à platina na dose de 45 mg/m2 e verifi-caram seu baixo perfil de toxicidade e sua eficácia constatada contra o câncer recorrente. Lukyanov e colaboradores,10 por sua vez, modificaram lipos-somas que continham doxorrubicina (Doxil®) adi-cionando anticorpos monoclonais à sua superfície, que reconhecem antígenos da superfície do tumor, mas não de células não tumorais, e observaram au-mento da citotoxicidade específica contra as célu-las cancerígenas.

Um medicamento lipossômico com anfotericina B também está no mercado (Ambisome®) e tem mostrado eficácia no tratamento de leishmaniose visceral.11

Os lipossomas também têm sido amplamente utili-zados como veículo em formulações dermocosmé-ticas,5,6,12 uma vez que essas vesículas biocompatí-veis conseguem fundir-se à pele quando aplicadas, o que aumenta a absorção de ativos no tecido cutâ-neo. Entre algumas preparações cosméticas que incorporam essa tecnologia, está o Liporeductil® (ativo anticelulite), a Vanistryl® (ativo antiestrias) e o Vecorexin® (ativo para os cabelos).

NANOPARTÍCULAS

Nanopartículas é a denominação geral dada a par-tículas sólidas e esféricas com diâmetros inferio-res a algumas centenas de nanômetros. São dota-das de características diferenciadas de partículas com maiores dimensões ou agregado de partícu-las.13,14 Em dependência do material com o qual são

preparadas, as nanopartículas são classificadas como poliméricas, lipídicas sólidas, magnéticas ou metálicas.

I) Nanopartículas poliméricas:

MAs nanopartículas poliméricas são habitu-almente preparadas com polímeros biode-gradáveis e têm atraído grande atenção de pesquisadores devido à sua capacidade de pro-piciar a liberação controlada das substâncias terapêuticas encapsuladas. Outras vantagens incluem a alta estabilidade dessas partículas nos fluídos biológicos e durante o período de armazenamento.15

De acordo com sua composição e organização estrutural, as nanopartículas podem se apresen-tar em forma de nanocápsulas ou nanoesferas (figuras 1E e 1F). As nanocápsulas são constituí-das de invólucro polimérico, comumente oleoso, disposto ao redor de um ou mais núcleos, estan-do o fármaco dissolvido no núcleo e ou adsorvi-do à parede polimérica. As nanoesferas são for-madas por matriz polimérica, em que o fármaco se distribui homogeneamente em seu interior ou permanece adsorvido em sua superfície.13,16 As nanopartículas poliméricas têm apresentado aplicações promissoras, principalmente na veto-rização de fármacos anticancerígenos,17 proteí-nas e peptídios,18 vacinas19 e antibióticos.20

Fármacos antitumorais nanoencapsulados, mes-mo após administração sistêmica, acumulam-se preferencialmente nos tumores devido ao me-canismo de vetorização passiva, ou seja, há um acúmulo de nanopartículas nos tumores sólidos devido a uma alteração na fisiologia dos seus vasos. Essa modificação fisiológica ocorre devi-do ao aumento da permeabilidade do endotélio vascular na região do tecido tumoral, o que per-mite extravasamento tanto de líquidos quanto das próprias nanopartículas.2 As nanopartículas poliméricas podem ainda ser revestidas de polí-meros como polietilenoglicol (PEG) com a fun-ção de prevenir sua opsonização por proteínas

Page 14: 52(1) - rbm.org.brrbm.org.br/Content/imagebank/pdf/v52n1.pdf · convencional, foi aos poucos substituída pela injeção intracitoplasmática de espermatozoides, inicialmen-te usada

Guilherme Martins Gelfuso • Preparações farmacêuticas e comséticas com uso de nanotecnologia

ARTIGO DE REVISÃO

13 • Brasília Med 2015;52(1):8-20

e aumentar a meia-vida desses carreadores na cir-culação sistêmica.2

Outra promissora aplicação das nanopartículas é a administração oftálmica de fármacos.21,22 As nanopartículas preparadas com polímeros muco-adesivos, como é o caso da quitosana, tendem a permanecer em contato com a mucosa ocular por um período mais longo e aumentar a biodisponi-bilidade de fármacos, além de reduzir a ocorrên-cia de efeitos adversos devido à absorção sistê-mica da fração da preparação drenada pelo ducto nasolacrimal.22

Entre os medicamentos comercializados na forma de nanopartículas poliméricas para liberação pro-longada de fármacos, destaca-se o Abraxane® (pa-clitaxel). Indicado para o tratamento sistêmico do câncer de mama,23 esse medicamento é constituído de nanopartículas conjugadas à albumina com ta-manho aproximado de 130 nm. As nanopartículas com albumina interagem com a proteína gp60, o que facilita o transporte do fármaco da circulação sistêmica para o sítio tumoral.24

No campo dermatológico, a indústria nacional Biolab propiciou duas inovações em medicamen-tos com nanopartículas poliméricas, ou seja, um creme anestésico de prilocaína e uma formulação para controle da alopecia com finasterida em sua composição.25,26 Ambas as formulações são com-postas de nanocápsulas produzidas com um polí-mero biodegradável que liberam os fármacos de maneira sustentada na pele. Esses medicamentos, resultados de parceria entre a empresa farmacêu-tica e pesquisadores da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS),25 estão em testes clí-nicos de fase III. Sistemas com nanopartículas ou micropartículas de quitosana para direcionar a liberação do minoxidil para o folículo piloso com vista ao tratamento tópico da alopecia vêm sendo desenvolvidos.27-29

A maior aplicação dermocosmética de nanopar-tículas poliméricas está no desenvolvimento de filtros solares de alto desempenho, em que se des-taca o uso de nanopartículas de dióxido de titânio e óxido de zinco. Essas nanopartículas, por suas

dimensões reduzidas, refletem seletivamente os raios ultravioleta do sol. O aspecto transparente dessas preparações à luz visível as torna mais atrativas aos consumidores.30 Além disso, essas dispersões de nanopartículas são menos visco-sas, de fácil espalhamento e apresentam alta efi-cácia quando comparadas aos filtros convencio-nais. A Biolab disponibiliza no mercado a linha Photoprot de protetores cutâneos desenvolvi-dos à base de nanopartículas.25 Entre os produ-tos comercializados, podem ser citados ainda o Nanoserum® da linha Active de O Boticário e o Revitalift® da L’Oreal

II) Nanopartículas lipídicas sólidas:

As nanopartículas lipídicas sólidas (NLS) são for-madas por lipídios endógenos sólidos à tempe-ratura ambiental. Têm tamanho reduzido, de 50 a 100 nm, e são normalmente estabilizadas por tensoativos (figura 1B).31,32 Tais partículas foram desenvolvidas como sistema alternativo de en-capsulação de fármacos, mais compatíveis que os sistemas tradicionais, tais como lipossomas e nanopartículas poliméricas.31,32 As principais vantagens desse tipo de sistema é que o controle da liberação do fármaco é exercido pela matriz lipídica das nanopartículas em referência. Tal matriz é dotada de excelente estabilidade físico--química em suspensão e tem baixa toxicidade.32 Na área farmacêutica, as nanopartículas lipídi-cas sólidas podem ser aplicadas a diferentes vias de administração, como oral, parenteral,33 ocu-lar,34 tópica ou transdérmica.35

Após a administração oral, pode-se obter a li-beração modificada dos princípios ativos para a mucosa gastrointestinal e otimizar o processo de absorção de fármacos em comparação com as nanopartículas poliméricas, em razão das propriedades mucoadesivas da matriz lipídica.34 Além disso, os lipídios das nanopartículas lipídi-cas sólidas podem ser processados e absorvidos, bem como os lipídios provenientes da alimenta-ção. Assim, têm-se a possibilidade de os princí-pios ativos serem absorvidos com os lipídios, au-mentando-se a biodisponibilidade do fármaco.

Page 15: 52(1) - rbm.org.brrbm.org.br/Content/imagebank/pdf/v52n1.pdf · convencional, foi aos poucos substituída pela injeção intracitoplasmática de espermatozoides, inicialmen-te usada

Brasília Med 2015;52(1):8-20 • 14

ARTIGO DE REVISÃO

Guilherme Martins Gelfuso • Preparações farmacêuticas e comséticas com uso de nanotecnologia

Vários fármacos estão sendo incorporados em na-nopartículas lipídicas sólidas para a administração oral, entre eles, ácido transretinoico, ciclosporina A, camptotencina, curcumina, digoxina, fenofibra-to, insulina, lovastatina, melatonina, metotrexato e praziquantel.36

Ainda, vários estudos mostraram a utilização des-sas nanopartículas para uso tópico. A tretinoína, por exemplo, incorporada nessas nanopartículas, resultou em um sistema com menor irritação cutâ-nea, com oclusão e liberação mais lenta quando comparada à formulação comercializada.37 As na-nopartículas lipídicas sólidas contendo penciclo-vir também levaram a um aumento da penetração cutânea do princípio ativo.38

Entre os produtos que contêm aquelas nanopartícu-las, aprovados pela Food and Drug Administration (FDA) e disponíveis no comércio, destacam-se o Nanobase®, um medicamento usado por meio de injeção intravenosa, indicado para o tratamento da hepatite C, e o Nanopearl®, um produto utilizado por via tópica como máscara de hidratação.39

III) Nanopartículas magnéticas:

As nanopartículas magnéticas (NPM) contêm um núcleo magnético e um revestimento polimérico que propiciam capacidade de vetorização única e ampla gama de aplicações médicas. As proprieda-des físico-químicas dessas nanopartículas permi-tem que atuem tanto como agentes terapêuticos quanto de diagnóstico.40 As nanopartículas su-perparamagnéticas de óxido de ferro (figura 1D), por exemplo, são usadas como eficientes meios de contraste em exames por ressonância magnética. Atualmente, algumas nanopartículas magnéticas desenvolvidas para atuar como agentes de diagnós-tico estão em estádios iniciais de estudos clínicos, e outras já foram aprovadas.40 Alguns desses sistemas estão descritos na tabela 1.

As nanopartículas magnéticas têm a propriedade de serem guiadas a um alvo específico do corpo por campos magnéticos externos. Uma vez direcio-nadas para o alvo de ação podem ser submetidas à influência de um campo magnético externo de

frequência alternada com o que produzem ca-lor. Essa hipertermia causa lise das células can-cerosas de maneira muito eficiente.41-43 Como o campo magnético não é absorvido pelos tecidos vivos, ele pode ser aplicado em regiões profun-das do organismo. Estudos também mostram baixo risco da utilização de hipertermia para o tratamento de tumores, uma vez que a tempera-tura requerida para a eliminação tumoral (43oC) é inferior ao limite de temperatura suportado pelas células saudáveis.41-43

A maioria dos estudos pré-clínicos realizados em nanopartículas magnéticas para o trata-mento do câncer com aplicação de hipertermia utilizam como modelos os cânceres de cérebro e de próstata.43 O primeiro estudo para avaliar a viabilidade do tratamento com essas nano-partículas foi realizado em março de 2003 por Maier-Hoff e colaboradores em pacientes na fase terminal de glioblastoma multiforme. Em 2010, os estudos mostraram que a combinação de nanopartículas magnéticas com hipertermia aumentou sobremaneira o tempo de sobrevida dos doentes.40,43

cutânea do princípio ativo.38

Entre os produtos que contêm aquelas na-nopartículas, aprovados pela Food and Drug Administration (FDA) e disponíveis no comér-cio, destacam-se o Nanobase®, um medicamento usado por meio de injeção intravenosa, indicado para o tratamento da hepatite C, e o Nanopearl®, um produto utilizado por via tópica como más-cara de hidratação.39

III) Nanopartículas magnéticas:

As nanopartículas magnéticas (NPM) contêm um núcleo magnético e um revestimento poli-mérico que propiciam capacidade de vetoriza-ção única e ampla gama de aplicações médicas. As propriedades físico-químicas dessas nanopar-tículas permitem que atuem tanto como agentes terapêuticos quanto de diagnóstico.40 As nano-partículas superparamagnéticas de óxido de ferro (figura 1D), por exemplo, são usadas como

Page 16: 52(1) - rbm.org.brrbm.org.br/Content/imagebank/pdf/v52n1.pdf · convencional, foi aos poucos substituída pela injeção intracitoplasmática de espermatozoides, inicialmen-te usada

Guilherme Martins Gelfuso • Preparações farmacêuticas e comséticas com uso de nanotecnologia

ARTIGO DE REVISÃO

15 • Brasília Med 2015;52(1):8-20

eficientes meios de contraste em exames por resso-nância magnética. Atualmente, algumas nanopar-tículas magnéticas desenvolvidas para atuar como agentes de diagnóstico estão em estádios iniciais de estudos clínicos, e outras já foram aprovadas.40 Alguns desses sistemas estão descritos na tabela 1.

As nanopartículas magnéticas têm a propriedade de serem guiadas a um alvo específico do corpo por campos magnéticos externos. Uma vez direciona-das para o alvo de ação podem ser submetidas à influência de um campo magnético externo de fre-quência alternada com o que produzem calor. Essa hipertermia causa lise das células cancerosas de maneira muito eficiente.41-43 Como o campo mag-nético não é absorvido pelos tecidos vivos, ele pode ser aplicado em regiões profundas do organismo. Estudos também mostram baixo risco da utilização de hipertermia para o tratamento de tumores, uma vez que a temperatura requerida para a eliminação tumoral (43oC) é inferior ao limite de temperatura suportado pelas células saudáveis.41-43

A maioria dos estudos pré-clínicos realizados em nanopartículas magnéticas para o tratamento do câncer com aplicação de hipertermia utilizam co-mo modelos os cânceres de cérebro e de próstata.43 O primeiro estudo para avaliar a viabilidade do tratamento com essas nanopartículas foi realizado em março de 2003 por Maier-Hoff e colaborado-res em pacientes na fase terminal de glioblastoma multiforme. Em 2010, os estudos mostraram que a combinação de nanopartículas magnéticas com hipertermia aumentou sobremaneira o tempo de sobrevida dos doentes.40,43corpo por campos mag-néticos externos. Uma vez direcionadas para o alvo de ação podem ser submetidas à influência de um campo magnético externo de frequência alternada com o que produzem calor. Essa hipertermia causa lise das células cancerosas de maneira muito efi-ciente.41-43 Como o campo magnético não é absor-vido pelos tecidos vivos, ele pode ser aplicado em regiões profundas do organismo. Estudos também mostram baixo risco da utilização de hiperter-mia para o tratamento de tumores, uma vez que a temperatura requerida para a eliminação tumoral (43oC) é inferior ao limite de temperatura suporta-do pelas células saudáveis.41-43

A maioria dos estudos pré-clínicos realizados em nanopartículas magnéticas para o trata-mento do câncer com aplicação de hipertermia utilizam como modelos os cânceres de cérebro e de próstata.43 O primeiro estudo para avaliar a viabilidade do tratamento com essas nano-partículas foi realizado em março de 2003 por Maier-Hoff e colaboradores em pacientes na fase terminal de glioblastoma multiforme. Em 2010, os estudos mostraram que a combinação de nanopartículas magnéticas com hipertermia aumentou sobremaneira o tempo de sobrevida dos doentes.40,43

IV) Nanopartículas metálicas:

As nanopartículas metálicas, principalmente as de ouro e de prata, têm se mostrado iner-tes em fluidos biológicos e apresentam várias aplicações como biomarcadores na sinalização celular e na detecção de agentes infecciosos, atuando como sondas ópticas e marcadores ele-troquímicos, o que justifica seu uso na área de diagnóstico.44

O núcleo dessas nanopartículas é normalmente revestido por uma camada orgânica, fundamen-tal para modular os tipos de interações estabe-lecidas com o ambiente circundante. A incor-poração de ligantes ou a funcionalização com diferentes tipos de moléculas permite aumentar a variedade e a especificidade das interações, o que propicia grande versatilidade e diversidade de utilização.44,45

Um exemplo de nanopartículas metálicas com aplicação terapêutica que está em fase avançada de estudo é o Aurimmune®, o qual é composto de nanopartículas de ouro revestidas de polie-tilenoglicol e de um fator de necrose tumoral (TNF-a). Esse medicamento tem sido investiga-do no tratamento de diversos cânceres metas-táticos em estados avançados que não respon-dem mais ao tratamento usual. O medicamento está atualmente sob estudo clínico de fase III.2

Investigações histopatológicas mostraram que as nanopartículas do Aurimmune® são capazes de acumular-se ao redor do tumor e que a ação

Page 17: 52(1) - rbm.org.brrbm.org.br/Content/imagebank/pdf/v52n1.pdf · convencional, foi aos poucos substituída pela injeção intracitoplasmática de espermatozoides, inicialmen-te usada

Brasília Med 2015;52(1):8-20 • 16

ARTIGO DE REVISÃO

Guilherme Martins Gelfuso • Preparações farmacêuticas e comséticas com uso de nanotecnologia

sob outros tecidos é muito reduzida devido à espe-cificidade do TNF-a.46,47

Em relação a testes de diagnóstico in vitro, as na-nopartículas metálicas estão sendo usadas em testes de urina para detecção da proteína gona-dotrofina coriônica humana (hCG), característica da gravidez. A molécula de hCG é introduzida em uma membrana, que a atravessa por capilaridade e interage com nanopartículas de ouro revestidas de anticorpos anti-hCG. A região de interação en-tre as nanopartículas e as moléculas torna-se co-lorida com vermelho muito mais vigoroso que o dos agentes cromóforos antes utilizados, havendo, portanto, aumento considerável na sensibilidade do método.48

As nanopartículas de ouro também estão sendo usadas para a detecção genômica, pois dispensam o uso de reação em cadeia da polimerase (PCR). Essa tecnologia foi aprovada pela Food and Drug Administration para o screening genético com a finalidade de determinar a sensibilidade de fárma-cos e mutações genéticas.49 Uma aplicação parti-cular é o screening de nucleotídio único de genes do fator V e fator II e o gene 5,10-metilenotetra--hidrofolatoredutase, para as mutações trombofilia e hiper-homocisteínemia.50

Outras aplicações incluem curativos antimicrobia-nos produzidos com nanopartículas de prata que apresentam efeito antisséptico e propriedades adesivas. Entre os curativos com nanopartículas de prata disponíveis comercialmente estão Acticoat®, Silverlon® e Silvasorb®30. A tabela 1 mostra alguns produtos comerciais com as nanopartículas metáli-cas ou magnéticas que estão aprovados ou em fases avançadas de estudo.

DEDRÍMEROS

Dendrímeros são nanoestruturas poliméricas ver-sáteis com arquitetura bem definida, em que múl-tiplas ramificações partem de molécula única, que forma um núcleo (figura 1C). Essas estruturas são de forma globular semelhante a proteínas fisio-lógicas, com massa molecular e tamanho deter-minados, baixa polidispersividade e alto grau de

funcionalização na superfície.51-53

Os dendrímeros podem encapsular fármacos hidrofóbicos em sua cavidade interna e, assim, aumentar sua solubilidade aquosa, ou associar fármacos em sua superfície.53 A presença de nu-merosos grupos funcionais reativos na superfí-cie de dendrímeros permite o fácil acoplamento de moléculas sinalizadoras, como antígenos e anticorpos, o que vai direcionar a liberação de fármacos a alvos específicos. Além disso, a adi-ção de moléculas como as de polietilenoglicol permite diminuir a toxicidade inerente a alguns tipos de dendrímeros ou fármacos encapsula-dos, além de conferir maior biodisponibilidade do sistema e controlar a liberação de fármacos.54

Os primeiros dendrímeros sintetizados e co-mercializados foram os de poliaminoamida – PAMAM.55 O diâmetro de sua estrutura varia de 10 a 12 nm e se inicia a partir de um grupo cen-tral de etiodilenodiamina. De maneira geral, os dendrímeros PAMAM são considerados ótimos carreadores de fármacos por sua alta capacidade de solubilização aquosa e pela presença de mui-tos grupos reativos de superfície.53

Existem alguns produtos à base de dendrímeros aprovados pela Food and Drug Administration. Entre eles, é possível citar o SuperFect, da com-panhia Qiagen, que pode ser utilizado para a transfecção gênica de várias linhagens celula-res.56 Já o Stratus CS Acute Care, produzido pela Dade Behring, é usado para o rápido diagnóstico de isquemia miocárdica em doentes com suspei-ta de ter essa afecção. O método contém dendrí-meros ligados a anticorpos monoclonais para a quantificação e determinação do peptídeo na-triurético N-terminal no plasma humano. Por fim, o VivaGel® é uma linha de produtos micro-bicidas para usos intravaginais, preparados por meio de dendrímeros baseados no aminoácido lisina e que contêm grupos ácidos sulfônicos su-perficiais. O gel vaginal dessa linha mostrou-se eficaz no tratamento de vaginite bacteriana em estudos de fase clínica II e encontra-se em es-tudos clínicos de fase III.53,56 Além disso, outros produtos dessa linha, como preservativos com

Page 18: 52(1) - rbm.org.brrbm.org.br/Content/imagebank/pdf/v52n1.pdf · convencional, foi aos poucos substituída pela injeção intracitoplasmática de espermatozoides, inicialmen-te usada

Guilherme Martins Gelfuso • Preparações farmacêuticas e comséticas com uso de nanotecnologia

ARTIGO DE REVISÃO

17 • Brasília Med 2015;52(1):8-20

dendrímeros, vêm sendo testados clinicamente na prevenção de doenças sexualmente transmissíveis.

PERSPECTIVAS FUTURAS

O maior domínio do conhecimento sobre nanotec-nologia e de sua aplicação iniciou uma verdadeira revolução quanto aos produtos médicos, farma-cêuticos e cosméticos produzidos pelas indústrias. Países com maior representatividade no cenário mundial têm investido maciçamente em pesquisas com essa nova tecnologia.57

De acordo com um estudo de 2010, da Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI), chamado Panorama de Nanotecnologia no Mundo e no Brasil, os produtos nanotecnológicos movi-mentaram, na economia mundial, acima de treze bilhões de dólares no ano de 2004. Três anos de-pois, esse mercado cresceu dez vezes e arreca-dou 135 bilhões de dólares. A previsão é de que, em 2015, esse valor atinja 2,95 trilhões de dóla-res.25 Segundo o Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI),58 vem ocorrendo crescimento nos depósitos de patentes relacionados à nanotecno-logia no mundo, com a concentração dos depósi-tos, principalmente nos domínios de preparações para finalidades médicas, odontológicas ou higiê-nicas e dispositivos semicondutores. Além disso, adveio um avanço no domínio de nanoestruturas formadas por manipulação individual de átomos, moléculas ou grupos limitados de átomos ou mo-léculas como unidades discretas, fabricação ou seu tratamento.

Os Estados Unidos lideram o ranking das patentes em nanotecnologia no mundo. Há destaque tam-bém para a China e o Japão. O Brasil aparece em 13.° lugar nesse ranking de prioridades (INPI, 2011). Ainda assim, hoje, a maior parcela desse mercado é do setor químico (53%), seguido pelos semicon-dutores (34%).25,57 É esperado, portanto, que, nos próximos anos, os produtos nanotecnológicos de aplicações na área da saúde representem grande parcela desse mercado.

O Brasil conta com renomados pesquisadores que focam seus esforços em diferentes aplicações

médicas da nanotecnologia. Contudo, os estudos desenvolvidos aqui ainda são realizados de for-ma pontual e descoordenada, o que comprome-te inovações. É extremamente importante que haja investimentos do governo e das empresas nesse tipo de inovação, para que o País possa, pelo menos, abastecer o mercado nacional com futuros medicamentos mais eficazes e seguros.

CONCLUSÃO

A nanotecnologia tem contribuído de forma sig-nificativa para originar avanços na área médica com aplicação na medicina preventiva, curativa ou diagnóstica. As diferentes interfaces da nano-tecnologia com outras áreas do conhecimento são ricas e relevantes na criação de novos me-dicamentos, cosméticos e agentes diagnósticos. Após intensas pesquisas na área, começa-se a lançar no mercado consumidor produtos inova-dores baseados em nanotecnologias, com eficá-cia superior aos produtos mais convencionais. Quanto à segurança desses produtos, é difícil predizer se os efeitos tóxicos desses nanossis-temas seriam apenas relacionados ao fármaco associado ou se a nanoestruturação traria al-gum efeito adverso adicional ao medicamento. Em todo caso, antes de chegar ao mercado, os medicamentos nanoestruturados passam por di-versos ensaios clínicos que avaliam, além de sua eficácia terapêutica, sua segurança em relação ao paciente.

REFERÊNCIAS

1. Alexis F, Pridgen E, Molnar LK, Farokhzad OC. Factors affecting the clearance and biodistribution of poly-meric nanoparticles. Mol Pharm. 2008;5(4):505-15.

2. Kim BYS, Rutcka JT, Chan WCW. Nanomedicine. N Engl J Med. 2010;363(25):2434-43.

3. Duran N, Mattoso LHC, de Moraes PC. Nanotecnologia: introdução, preparação e caracterização de nanomate-riais e exemplos de aplicação. São Paulo: Artliber, 2006.

4. Ramsden JJ. Applied nanotechnology: the conversion of research results to produtcs. 2nd ed. Amsterdam,

Page 19: 52(1) - rbm.org.brrbm.org.br/Content/imagebank/pdf/v52n1.pdf · convencional, foi aos poucos substituída pela injeção intracitoplasmática de espermatozoides, inicialmen-te usada

Brasília Med 2015;52(1):8-20 • 18

ARTIGO DE REVISÃO

Guilherme Martins Gelfuso • Preparações farmacêuticas e comséticas com uso de nanotecnologia

Holland: Elsevier; 2014.

5. Batista CM, de Carvalho CMB, Magalhães NSS. Liposso-mas e suas aplicações terapêuticas: estado da arte. Rev Bras Cienc Farm. 2007;43(2):167-79.

6. Santos NC, Castanho MARB. Lipossomas: A bala mágica acertou? Quim Nova. 2002;25(6B):1181-5.

7. Torchilin VP. Recent advances with lipossomes as pharmaceutical carriers. Nat Rev Drug Discov. 2005;4(2):145-60.

8. Mamot C, Drummond DC, Hong K, Kirpotin DB, Park JW. Lipossome-based approaches to overcome anticancer drug resistence. Drug Resist Updat. 2003;6(5):271-9.

9. Chou HH, Wang KL, Chen CA, Wei LH, Lai CH, Hsieh CY, Yang YC, Twu NF, Chang TC, Yen MS. Pegylated liposo-mal doxorubicin (Lipo-Dox) for platinum-resistant or refractory epithelial ovarian carcinoma: a Taiwanese gy-necologic oncology group study with long-term follow-up. Gynecol Oncol. 2006;101(3):423-8.

10. Lukyanov AN, Elbayoumi TA, Chakilam AR, Torchilin VP. Tumor-targeted liposomes: Doxorubicin-loaded long-circulation liposomes modified with anti-cancer anti-body. J Control Release. 2004;100(1):134-44.

11. Sundar S, Singh A, Rai M, Chakravarty J. Single-dose in-digenous liposomal amphotericin B in the treatment of Indian visceral leishmaniasis: a phase 2 study. Am J Trop Med Hyg. 2015;92(3):513-7.

12. Chorilli M, Leonardi GR, Oliveira AG, Scarpa MV. Li-possomas em formulações dermocosméticas. Infarma. 2004;16(7-8):75-9.

13. Schaffazick SR, Gutteres SS. Caracterização e estabi-lidade físico-química de sistemas poliméricos nanopar-ticulados para a administração de fármacos. Quim Nova. 2003;26(5):726-37.

14. Faria-Tischer PCS, Tischer CA. Nanobiotechnology, biomaterials and biological application of nanostruc-tures. Biochem Biotechnol Rep. 2012;1(1):32-53.

15. Kumari A, Yadav SK, Yadav SC. Biodegradable polymeric

nanoparticles based drug delivery systems. Colloids Surf B. 2010;75(1):1-16.

16. Singh MN, Hemant KSY, Ram M, Shivakumar HG. Microencapsulation: a promising technique for con-trolled drug delivery. Res Pharm Sci. 2010;5(2):65-77.

17. Babu A, Templeton AK, Munshi A, Ramesh R. Nan-oparticle-based drug delivery for therapy of lung cancer: progress and challenges. J Nanomater. 2013;2013(14):1-11.

18. Mc Daniel JR, Bhattacharya J, Vargo KB, Hassouneh W, Hammer DA, Chilkoti A. Self-Assembly of thermally re-sponsive nanoparticles of a genetically encoded pep-tide polymer by drug conjugation. Angew Chem Int Ed Engl. 2012;52(6):1683-87.

19. Bolhassani A, Javanzad S, Saleh T, Hashemi M, Aghasa-deghi MR, Sadat SM. Polymeric nanoparticles: po-tent vectors for vaccine delivery targeting cancer and infectious diseases. Hum Vaccin Immunother. 2014;10(2):321-32.

20. Tan F, Sun D, Gao J, Zhao Q, Wang X, Teng F, Quan X, Chen J. Preparation of molecularly imprinted poly-mer nanoparticles for selective removal of fluoroqui-nolone antibiotics in aqueous solution. J Hazard Mater. 2012;244(15):750-7.

21. Gratieri T, Gelfuso GM, Rocha EM, Sarmento VH, De Freitas O, Lopez RF. A poloxamer/chitosan in situ forming gel with prolonged retention time for ocular delivery. Eur J Pharm and Biopharm. 2010;75(2):186-93.

22. Diebold Y, Jarrin M, Saez V, Carvalho ELS, Orea M, Ca-longe M, Seijo B, Alonso MJ. Ocular drug delivery by liposome-chitosan nanoparticle complexes (LCS-NP). Biomaterials. 2007;28:1553-64.

23. Ibrahim NK, Samuels B, Page R, Doval D, Patel KM, Rao SC, Nair MK, Bhar P, Desai N, Hortobagyi GN. Multi-center phase II trial of ABI-007, an albumin-bound pa-clitaxel, in women with metastatic breast cancer. J Clin Oncol. 2005;23(25):6019-26.

24. Miele E, Spinelli GP, Miele E, Tomao F, Tomao S. Al-bumin-bound formulation of paclitaxel (Abraxane®

Page 20: 52(1) - rbm.org.brrbm.org.br/Content/imagebank/pdf/v52n1.pdf · convencional, foi aos poucos substituída pela injeção intracitoplasmática de espermatozoides, inicialmen-te usada

Guilherme Martins Gelfuso • Preparações farmacêuticas e comséticas com uso de nanotecnologia

ARTIGO DE REVISÃO

19 • Brasília Med 2015;52(1):8-20

ABI-007) in the treatment of breast cancer. Int J Nanomed-icine. 2009;4:99-105.

25. Da Silveira, E. Remédio em nanoescala. Pesquisa FAPESP. 2012;201:76-9.

26. Jornada DS, Raffin RP, Pohlmann AR, Guterres SS. Fin-asteride nanocapsules for topical administration. In: II Mostra de Nanonociência e Nanotecnologia – CNANO – UFRGS, 2008, Porto Alegre. Anais, 2008. p. 56.

27. Gelfuso GM, Gratieri T, Simão PS, de Freitas LA, Lopez RF. Chitosan microparticles for sustaining the topical delivery of minoxidil sulphate. J Microencapsul. 2011;28(7):650-8.

28. Gelfuso GM, Barros MA, Delgado-Charro MB, Guy RH, Lopez RF. Iontophoresis of minoxidil sulphate loaded mi-croparticles, a strategy for follicular drug targeting? Col-loids Surf B Biointerfaces. 2015;134:408-12.

29. Matos BN, Reis TA, Gratieri T, Gelfuso GM. Chitosan nano-particles for targeting and sustaining minoxidil sulphate delivery to hair follicles. Int J Biol Macromol. 2015;75:225-9.

30. Faria-Tischer PCS, Tischer CA. Nanobiotechnology, bio-materials and biological application of nanostructures. Biochem Biotechnol Rep. 2012;1(1):32-53.

31. Muhlen AZ, Schwarz C, Mehnert W. Solid lipid nano-particles (SLN) for controlled drug delivery – drug re-lease and release mechanism. Eur J Pharm Biopharm. 1998;45(2):149-55.

32. Qi J, Lu Y, Wu W. Absorption, disposition and pharma-cokinetics of solid lipid nanoparticles. Curr Drug Metab. 2012;13(4)418-28.

33. Joshi MD, Müller RH. Lipid nanoparticles for parenteral de-livery of actives. Eur J Pharm Biopharm. 2009;7(2):161-72.

34. Souto EB, Severino P, Santana MHA, Pinho SC. Na-nopartículas de lipídios sólidos: métodos clássicos de produção laboratorial. Quim Nova. 2011;34(10):1762-9.

35. Bhaskar K, Anbu J, Ravichandiran V, Venkateswarlu V, Rao YM. Lipid nanoparticles for transdermal delivery of flurbiprofen formulation in vitro, ex vivo and in vitro studies. Lipids Health Dis. 2009;26(8):6.

36. Das S, Chaudhury A. Recent advances in lipid nanoparti-cle formulations with solid matrix for oral drug delivery. AAPS Pharm Sci Tech. 2011;12(1):62-76.

37. Mandawgade SD, Patravale VB. Development of SLNs from natural lipids: Application to topical delivery of tretinoin. Int J Pharm. 2008;363(1-2):132-8.

38. Lv Q, Yu A, Xi Y, Li H, Song Z, Cui J, Cao F, Zhai G. De-velopment and evaluation of penciclovir-loaded solid lipid nanoparticles for topical delivery. Int J Pharm. 2009;372(1-2):191-8.

39. Marcato PD, Dúran N. New aspects of nanopharmaceutical delivery systems. J Nanosci Nanotechnol. 2008;8(5):1-14.

40. Singh A, Sahoo SK. Magnetic nanoparticles: a novel platform for cancer theranostics. Drug Discov Today. 2014;19(4):474-81.

41. Lacava ZGM, de Morais PC. Aplicações biomédicas de nanopartículas magnéticas. Parcerias Estratégicas. 2004;18:73-86.

42. Castro VF, Celestino J, de Queiroz AAA, Garcia FG. Proprie-dades magnéticas e biocompatíveis de nanocompósitos para a utilização de magneto-hipetermia. Rev Bras Fís Méd. 2010;1(4):79-82.

43. Salunkhe AB, Khot VM, Pawar SH. Magnetic hyperthermia with magnetic nanoparticles: a status review. Curr Top Med Chem. 2014;14(5):572-94.

44. Santos SA, Pinto RJ, Rocha SM, Marques PA, Pascoal Neto C, Silvestre AJ, Freire Cs. Unveiling the chemistry behind the green synthesis of metal nanoparticles. Chem Sus Chem. 2014;7(9):2704-11.

45. Rai M, Ingle AP, Birla S, Yadav A, Santos CA. Strategic role of selected noble metal nanoparticles in medicine. Crit Rev Microbiol. 2015;42:1-24.

46. Visaria RK, Griffin RJ, Williams BW. Enhancement of tu-mor thermal therapy using gold nanoparticle-assisted tumor necrosis factor-alpha delivery. Mol Cancer Ther. 2006;5(20):1014-20.

47. Libutti SK, Paciotti GF, Myer L, Haynes R, Gannon WE,

Page 21: 52(1) - rbm.org.brrbm.org.br/Content/imagebank/pdf/v52n1.pdf · convencional, foi aos poucos substituída pela injeção intracitoplasmática de espermatozoides, inicialmen-te usada

Brasília Med 2015;52(1):8-20 • 20

ARTIGO DE REVISÃO

Guilherme Martins Gelfuso • Preparações farmacêuticas e comséticas com uso de nanotecnologia

Eugeni M, Seidel G, Shutack Y, Yuldasheva N, Tamarkin L. Preliminary results of a phase I clinical trial of CYT-6091: a pegylated colloidal gold-TNF nanomedicine. J Clin Oncol. 2007;25(18):3603.

48. Posthuma-Trumpie GA, Korf J, van Amerongen AV. Lateral flow (immuno)assay: its strengths, weaknesses, opportu-nities and threats: a literature survey. Anal Bioanal Chem. 2009;393(2):569-82.

49. Nam JM, Thaxton CS, Mirkin CA. Nanoparticle-based bio-bar codes for the ultrasensitive detection of proteins. Sci-ence. 2003;301(5641):1884-6.

50. Lefferts JA, Jannetto P, Tsongalis GJ. Evaluation of the na-nosphere verigene system and the verigene F5/F2/MTH-FR nucleic acid tests. Exp Mol Pathol. 2009;87(2):105-8.

51. Tomalia DA, Baker H, Dewald J, Hall M, Kallos G, Mar-tin S, Roeck J, Ryder J, Smith P. A new class of polymers: starburstdendritic macromolecules. Polymer Journal. 1985;17:117-32.

52. Jedrych M, Borowska K, Galus R, Jodłowska-Jedrych B. The evaluation of the biomedical effectiveness of poly(amido)amine dendrimers generation 4.0 as a drug and as drug carriers: A systematic review and meta-analysis. Int J Pharm. 2014;462(1-2):38-43.

53. Yavuz B, Pehlivan SB, Unlu N. Dendrimeric systems and their applications in ocular drug delivery. Scientific World Journal. 2013;2013:1-13.

54. Bhadra D, Bhadra S, Jain S, Jain NK. A PEGylated dendrit-ic nanoparticulate carrier of fluorouracil. Int J Pharm. 2003;257(1-2):111-24.

55. Haensler J, Szoka Jr. FC. Polyamidoamine cascade poly-mers mediate efficient transfection of cells in culture. Bio-conjugated Chemistry. 1993;4:372-79.

56. Menjoge AR, Kannan RM, Tomalia DA. Dendrimer-based drug and imaging conjugates: design considera-tions for nanomedical applications. Drug Discov Today. 2010;15(5-6):171-85.

57. Loureiro I. Monitoramento tecnológico: um estudo sobre as patentes e artigos científicos de nanotecnologia deposi-tadas no Brasil entre 2006 e 2008. Diretoria de Inovação e Tecnologia, 2011.

58. INPI. Alerta tecnológico: pedidos de patentes sobre nano-tecnologia, no 1.º semestre de 2011. Rio de Janeiro, 2011.

59. Weissig V, Pettinger TK, Murdock N. Nanopharmaceuti-cals (part 1): products on the market. International Jour-nal of Nanomedicine. 2014;9:4357:73.

60. Sainz V, Conniot J, Matos AI, Peres C, Zupancic E, Moura L, Silva LC, Florindo HF, Gaspar RS. Regulatory aspects on nanomedicine. Biochem Biophys Res Commun. 2015;1-7.

Page 22: 52(1) - rbm.org.brrbm.org.br/Content/imagebank/pdf/v52n1.pdf · convencional, foi aos poucos substituída pela injeção intracitoplasmática de espermatozoides, inicialmen-te usada

Ana Cristina Carvalho da Costa • Perfil do paciente idoso vítima de trauma

REVISÃO DE LITERATURA

21 • Brasília Med 2015;52(1):21-27

RESUMO

O aumento da expectativa de vida, da capaci-dade e da independência funcional dos idosos ocasionou significativo aumento da prevalência de trauma nessa população. Destacam-se as que-das como eventos traumáticos principais entre os idosos. Entretanto, devido às características fisiológicas inerentes ao próprio envelhecimen-to e às comorbidades, o trauma em idosos apre-senta maior morbimortalidade quando compa-rado ao trauma em pacientes jovens. Ocasiona também custos significativos para a sociedade e para as famílias. O objetivo deste artigo foi identificar o perfil do paciente idoso vítima de trauma por meio de revisão narrativa. A pre-sente revisão aborda aspectos epidemiológicos, preventivos, do tratamento e da reabilitação do idoso vítima de trauma.

Descritores. Trauma; idoso; queda; injúria; mortalidade.

Perfil do paciente idoso vítima de trauma

ABSTRACT

Profile of elderly patient suffering from trauma.

The increase in life expectancy, the ability and func-tional independence of the elderly caused a significant increase in the prevalence of trauma in this popula-tion, configuring the fall as a major traumatic event among the elderly. However, due to the physiological characteristics inherent to aging and associated co-morbidities, trauma in the elderly presents a higher morbidity and mortality in the elderly compared to the young people, as well to causing significant costs to society and families. The objective of this article was to identify the profile of the elderly trauma victim through narrative review. This review covers epide-miologic, prevention, treatment and rehabilitation of elderly trauma victims.

Descriptors. Trauma; elderly; accidental falls; wounds and injury; mortality rate.

Os autores declaram inexistência de conflitos de interesses.

Correspondência: Ana Cristina Carvalho da Costa.

Fundação de Ensino e Pesquisa em Ciências da Saúde - Secretaria de Estado de Saúde do Distrito Federal – Fepecs-SES-DF

Avenida Universitária s/n, Bairro Santa Cecília, caixa postal 61, Patos-PB, CEP 58708-110, telefone 83 35113045

Internet: [email protected]

Ana Cristina Carvalho da Costa, Adriana Pederneiras Rebelo da Silva, Renata Costa Fortes.

Ana Cristina Carvalho da Costa. Enfermeira, mestre pelo Programa de Mestrado Profissional em Ciências para a Saúde, Fundação de Ensino e Pesquisa em Ciências da Saúde – Fepecs, Secretaria de Estado de Saúde do Distrito Federal.

Adriana Pederneiras Rebelo da Silva. Nutricionista; doutora, docente do Programa de Mestrado Profissional em Ciências para a Saúde, Fundação de Ensino e Pesquisa em Ciências da Saúde – Fepecs, Secretaria de Estado de Saúde do Distrito Federal.

Renata Costa Fortes. Nutricionista; doutora, docente do Programa de Mestrado Profissional em Ciências para a Saúde, Fundação de Ensino e Pesquisa em Ciências da Saúde – Fepecs, Secretaria de Estado de Saúde do Distrito Federal.

DOI - 10.14242/2236-5117.2015v52n1a297p21

Page 23: 52(1) - rbm.org.brrbm.org.br/Content/imagebank/pdf/v52n1.pdf · convencional, foi aos poucos substituída pela injeção intracitoplasmática de espermatozoides, inicialmen-te usada

Ana Cristina Carvalho da Costa • Perfil do paciente idoso vítima de trauma

REVISÃO DE LITERATURA

22 • Brasília Med 2015;52(1):21-27

INTRODUÇÃO

A população de idosos vem crescendo nos últimos anos. No Brasil, a proporção de pessoas com 60 anos de idade ou mais aumentou de 6,7% em 1990 para 8,1% em 2000. As projeções do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) sugerem que essa popu-lação chegue a 64 milhões de pessoas em 2050, o que corresponderia a 24,6% do total de habitantes.1,2

Melhorias no controle de enfermidades infectoconta-giosas e crônicas, além do surgimento de novas tecno-logias contribuem para haver maior longevidade, pois os cuidados com a saúde garantem que mais indivídu-os tenham oportunidade de atingir idade avançada e vivam mais anos produtivos.3

A avaliação da reserva funcional é considerada o me-lhor método para estabelecer as limitações orgânicas determinadas pelo processo de envelhecimento. A progressão da idade é acompanhada por mudanças previsíveis em praticamente todos os órgãos e siste-mas com tendência à diminuição da reserva fisiológi-ca. O envelhecimento também é associado a alterações morfológicas, funcionais e patológicas nos grandes ór-gãos e sistemas, sendo os mais frequentemente descri-tos o cardiovascular, o respiratório e o renal.3,4

A reserva fisiológica, que compreende a idade, o sexo e o estado de saúde antes do agravo, tem sido usada para prognosticar complicações e mortalidade. O con-ceito de reserva fisiológica limitada é consistente com as alterações funcionais do processo de envelhecimen-to entre os diversos sistemas orgânicos e é sobremodo variável entre as pessoas.4

Concomitante à transição demográfica brasileira, que estabelece a elevação do envelhecimento populacio-nal, a prevalência de trauma em idosos tem aumenta-do de forma significativa nos últimos anos, especial-mente nos grandes centros urbanos.5

O trauma em idosos tem algumas características es-pecíficas, principalmente pela diminuição das reser-vas fisiológicas, mas também pelo maior número de medicamentos em uso contínuo, pelas comorbidades,

pelos próprios mecanismos de trauma e lesões encontradas.3,6

A queda é o mecanismo de lesão mais frequente en-tre os idosos, seguida pelo acidente automobilístico, atropelamento, ferimento por arma de fogo e arma branca entre outros, como os decorrentes de maus tratos ou negligência praticada por familiares ou por cuidadores.4,7

Além disso, o trauma não raras vezes está associado a sequelas, incapacidades, deficiências e mesmo à di-minuição da capacidade funcional, o que representa prejuízo na qualidade de vida das vítimas e de suas fa-mílias devido à perda de autonomia e independência, tornando-se importante questão social, econômica e de saúde.5

O trauma é um grande agravo à saúde no mundo. Em termos globais, aparece entre as cinco principais cau-sas de morte. Ao se comparar a parte restante da po-pulação com a população idosa, observa-se que esta é mais suscetível à doença e ao trauma. Logo, o envelhe-cimento influencia diretamente o aumento das taxas de mortalidade e morbidade referentes ao trauma.8,9

O objetivo deste estudo foi investigar, na literatu-ra científica, o perfil do idoso vítima de trauma e os aspectos a ele relacionados. Abordam-se os aspectos epidemiológicos, fisiológicos, de tratamento, de rea-bilitação e as formas de prevenção do trauma nessa população.

MÉTODO

Trata-se de revisão narrativa de artigos científicos publicados em periódicos indexados do PubMed (U.S. National Library of Medicine)/ Medline (Medical Literature Analysis and Retrieval System On-Line), Lilacs (Latin American and Caribbean Center on Health Sciences Information)/ Bireme (Biblioteca Regional de Medicina) e SciELO (Scientific Electronic Library Online), com ênfase nos publicados durante os últimos dez anos. Foram selecionados artigos nos idiomas português, inglês e espanhol.

Foram selecionados ensaios clínicos randomizados

Page 24: 52(1) - rbm.org.brrbm.org.br/Content/imagebank/pdf/v52n1.pdf · convencional, foi aos poucos substituída pela injeção intracitoplasmática de espermatozoides, inicialmen-te usada

Brasília Med 2015;52(1):21-27 • 23

REVISÃO DE LITERATURA

Ana Cristina Carvalho da Costa • Perfil do paciente idoso vítima de trauma

e estudos observacionais com significância estatís-tica de 5% e artigos de revisão de literatura, uti-lizando-se os descritores idosos, trauma, quedas, injúria, contidos no vocabulário estruturado e tri-língue DeCS – Descritores em Ciências da Saúde nos idiomas português, inglês e espanhol – e os des-critores elderly, trauma, accidental falls, wounds and injury, contidos no MeSH (Medical Subject Headings) da National Library of Medicine, além dos operadores booleanos and e or.

No total, foram encontrados quarenta artigos. Destes, doze (30%) foram excluídos por conterem temas relacionados ao trauma, mas sem contem-plar a população-alvo em questão (idosos), ou por conterem temas pertinentes ao envelhecimento sem abordar os tipos de evento traumático, sua in-cidência ou suas complicações.

Assim, 28 (70%) publicações foram utilizadas, sen-do 24 (85,7%) artigos originais, um (3,6%) consenso, duas (7,1%) revisões de literatura e uma (3,6%) me-tanálise. Em relação às bases de dados e à biblioteca eletrônica virtual, sete artigos (25%) foram pesqui-sados na Pubmed-Medline, três (10,7%) na Lilacs-Bireme e dezoito (64,3%) na SciELO

DISCUSSÃO

Fisiologia do envelhecimento

A redução da função fisiológica no paciente geriá-trico é identificada pela existência de menores ín-dices de função cardíaca, de complacência pulmo-nar, de função renal e de dificuldade para regular e equilibrar líquidos perdidos. A reserva cardíaca no idoso é geralmente associada a doença corona-riana, que, mesmo ausente clinicamente, pode ser responsável pela redução do débito cardíaco de até 50% na referida faixa etária.4,11,12

A diminuição da acuidade e do campo visuais, da audição, das funções e vascularização cerebrais com quadros de síncope ou perda da consciência são importantes como contribuintes para a ocor-rência de trauma em idosos.4,10,11

Acima de 50% da população geriátrica vítima de

trauma tem hipertensão arterial não diagnosti-cada, e mais de 30% sofrem de doença cardíaca. Diabetes, eventos cerebrovasculares prévios, do-ença pulmonar obstrutiva crônica, demência, ar-ritmias e distúrbios endócrinos estão presentes em cerca de 10% dessa população. Outras doenças co-muns entre os idosos, como infecções respiratórias, neoplasias e insuficiência renal crônica, também aumentam o risco de ocorrer complicações após o trauma. As comorbidades que conferem maior risco de mortalidade na população geriátrica são a doença hepática, a insuficiência renal e o câncer. A presença de insuficiência cardíaca congestiva, par-ticularmente em doentes que usam betabloqueado-res ou anticoagulantes, pode aumentar de cinco a dez vezes o risco de morte após o trauma.11-13

Aspectos epidemiológicos e mecanismos do trauma em idosos

OAtualmente, pacientes acima de 65 anos de idade correspondem a cerca de 23% das admissões por trauma nos Estados Unidos. Devido à alta prevalên-cia de múltiplas comorbidades no idoso, há um au-mento considerável da mortalidade ou de sequelas graves depois do evento traumático.1

As quedas são a causa-líder de trauma no idoso. Aproximadamente 28% a 35% das pessoas maiores de 65 anos caem por ano, incrementando-se em 32% a 42% dos idosos acima dos 70 anos de idade, que moram em determinada comunidade. As con-sequências das quedas, amenas ou graves, podem acarretar alto custo para a sociedade em gastos com hospitalização, tratamento e reabilitação, bem como custos significativos para a família em razão da necessidade de mudança do ambiente físico, de dependência do idoso e de cuidados a ele dedi-cados por algum membro da família ou cuidador particular.14,15

Vários fatores aumentam o risco da população ido-sa de sofrer um evento traumático, além de contri-buírem para recuperação pós-trauma mais lenta. O trauma, por si, aumenta o risco de ocorrer futuros traumas. Idosos que sofreram trauma no passado têm três vezes mais probabilidade de sofrer novo trauma.

Page 25: 52(1) - rbm.org.brrbm.org.br/Content/imagebank/pdf/v52n1.pdf · convencional, foi aos poucos substituída pela injeção intracitoplasmática de espermatozoides, inicialmen-te usada

Ana Cristina Carvalho da Costa • Perfil do paciente idoso vítima de trauma

REVISÃO DE LITERATURA

24 • Brasília Med 2015;52(1):21-27

lesões neurológicas ou ortopédicas. Esse período é considerado crítico, pois o idoso torna-se ainda mais susceptível ao comprometimento da função cardiopulmonar, ao aparecimento de trombose venosa profunda, à atrofia muscular, às alterações articulares e às lesões por pressão.

Sabe-se que a morbidade e a mortalidade em idosos são mais altas no trauma que em pacientes jovens. No entanto, a maioria desses pacientes com idade avançada sobrevive às lesões. Assim, o oportuno esclarecimento sobre as expectativas de reabilita-ção e outras complicações além da mortalidade é a chave para o doente e sua família entenderem a gravidade da injúria sofrida.11,23,25,27

Fatores de risco de trauma em idosos

Diminuição da acuidade visual e do equilíbrio cor-poral, instabilidade da marcha, lentificação dos reflexos, fraqueza ou perda de força generalizada resultantes de doenças crônicas e redução da ca-pacidade cognitiva são importantes incapacida-des que podem levar à ampliação da incidência de eventos traumáticos nos idosos. 1,11

O lar do idoso é descrito como o principal cenário das quedas, seguido pelo ambiente público. Vários são os obstáculos e facilitadores das quedas encon-trados no domicílio de forma geral. No quarto –, camas altas, tapetes soltos; no banheiro –, vaso sa-nitário baixo, sem barra de suporte; na sala –, má iluminação, objetos espalhados pelo chão, piso es-corregadio, cadeiras sem braços e instáveis. Aliada à maior permanência dos idosos em seu domicílio, a falta de conhecimento dos seus membros familia-res e cuidadores quanto às medidas de prevenção de quedas em idosos é outro fator contribuinte pa-ra esse aspecto.28

Fatores de risco de trauma em idosos

As ações dos profissionais de saúde e as políticas públicas devem incluir medidas não somente in-terventivas como também preventivas. Deve-se incluir o controle do ambiente do idoso de modo que este disponha de livre e segura circulação, controle de suas enfermidades de base, instrução

Diferente dos jovens, os idosos geralmente sofrem mais traumas contusos que traumas penetrantes. As quedas respondem por aproximadamente três quartos de todos os traumas ocorrentes na popu-lação geriátrica, e os acidentes automobilísticos correspondem a cerca dos 25% restantes. Traumas penetrantes e outros mecanismos traumáticos si-milares são responsáveis por somente 4% do total de traumas nessa população. Quedas associadas com lesão cerebral e fraturas de ossos longos levam a maior morbidade e mortalidade.16-20

Aproximadamente um quarto dos idosos vítimas de acidentes automobilísticos sofrem trauma to-rácico, com tórax instável e fratura de costelas. Esses eventos podem complicar doenças cardio-pulmonares preexistentes e levar à pneumonia ou à insuficiência respiratória, complicações que são conhecidas particularmente por sua alta morbi-mortalidade. Embora os traumas penetrantes se-jam raros na população idosa, eles estão associados a maior morbidade, longa permanência na unida-de de terapia intensiva e permanência hospitalar prolongada quando comparados com traumas em pacientes jovens.19,21,22

Tratamento e reabilitação de idosos vítimas de trauma

Embora o protocolo do Advanced Trauma Life Suport (ATLS), do Colégio Americano de Cirurgiões (2008), recomende que pacientes geriátricos sejam atendidos da mesma forma que pacientes jovens, há diferenças na fisiologia normal dos pacientes idosos que podem tornar sua avaliação e seu trata-mento mais desafiadores.23,24

É sugerido que a abordagem inicial mais agres-siva nesse tipo de assistidos esteja relacionada a maior taxa de sobrevida. Dentre os procedimentos propostos estão a monitorização hemodinâmica invasiva, a hemodiálise e o suporte nutricional precoce.23,25,26

Aos pacientes idosos pode faltar reserva reabilita-tória orgânica necessária para sobreviver à longa hospitalização após o trauma ou para ter condi-ções de participar da reabilitação intensiva após as

Page 26: 52(1) - rbm.org.brrbm.org.br/Content/imagebank/pdf/v52n1.pdf · convencional, foi aos poucos substituída pela injeção intracitoplasmática de espermatozoides, inicialmen-te usada

Brasília Med 2015;52(1):21-27 • 25

REVISÃO DE LITERATURA

Ana Cristina Carvalho da Costa • Perfil do paciente idoso vítima de trauma

a seus cuidadores e pessoas de sua família, desen-volvimento e incentivo de sua participação em pro-gramas de atividade física.5

Ademais, a prevenção é a melhor maneira de redu-zir a mortalidade e a morbidade do trauma entre os idosos. Algumas estratégias, em diferentes momen-tos, podem ser utilizadas com tal intuito, a saber: 1) pré-evento – tem como objetivo principal educar a população e promover programas que possam in-fluenciar a legislação referente a essa demanda; 2) evento – nessa fase, os esforços dirigem-se à cria-ção de mecanismos que diminuam a transferência de energia durante o processo de injúria; 3) pós--evento – prevenção ou redução das complicações, além do aprimoramento dos mecanismos de reani-mação cardiorrespiratória.

A “casa protegida” é uma das propostas para di-minuição do número de eventos traumáticos em idosos, bem como a educação da população quanto à segurança no trânsito.3,4,26

A atenção à saúde do idoso, principalmente dian-te de sua maior expectativa de vida e das diversas síndromes decorrentes do processo de envelheci-mento, exige mais investimentos em estratégias de promoção da saúde e prevenção de agravos. Dentre esses cuidados, a avaliação de riscos de quedas e a formação de recursos humanos preparados são es-tratégias fundamentais para propiciar assistência de alta qualidade a essa população.14,16

O sinistro traumático tem maior incidência na po-pulação jovem, e a maioria das políticas públicas nas áreas de educação e promoção em saúde são voltadas para essa faixa etária. Entretanto, com o aumento acentuado da população idosa no nosso país, a qual se apresenta mais ativa e independente, a incidência de trauma nessa categoria etária vem aumentando na mesma proporção, o que requer mais atenção por parte da equipe multiprofissional de assistência ao à saúde.

Cabe salientar que, recentemente, houve aumento da produção de artigos relacionados à epidemio-logia da queda e de suas consequências na popu-lação idosa. Contudo, os estudos relacionados à

epidemiologia dos eventos traumáticos pro-vocados por causas externas nessa população ainda são limitados. Há necessidade de mais investigações a esse respeito. Nesse sentido, as limitações do presente estudo estão relaciona-das essencialmente à escassez de literatura as-sociada à ocorrência do trauma especificamente no idoso.

CONCLUSÃO

Com foco nessa revisão é possível compreender que a ocorrência de trauma, tão comum entre os jovens, vem aumentando de forma significativa na população idosa em todo o mundo. Isso de-corre não somente do próprio envelhecimento populacional, mas também da maior indepen-dência funcional do idoso. Vários fatores intrín-secos e extrínsecos influenciam e colaboram para que o evento traumático ocorra nessa po-pulação, com destaque para a queda e os aciden-tes com transporte, sobretudo atropelamentos.

O trauma no idoso não se trata apenas de uma questão de saúde pública, mas também de ordem social e econômica. Diante disso, é fundamental que medidas preventivas sejam efetivamente implementadas, como adoção de estratégias educativas, formação e capacitação de recur-sos humanos, a fim de reduzir a incidência do trauma na população idosa e melhorar o manejo dessa relevante questão da nossa realidade.

REFERÊNCIAS

1. Bonne S, Schuerer DJE. Trauma in the older adult. Clin Geriatr Med 2013; 29:137-50.

2. IBGE – Diretoria de pesquisas. Coordenação de pop-ulação e indicadores sociais. gerência de estudos e análises da dinâmica demográfica. Projeção da popu-lação do Brasil por sexo e idade para o período 1980-2050. Revisão 2004.

3. Parreira JG, Soldá SC, Perlingeiro JAG, Padovese CC, Karakhanian WZ, Assef JC. Análise comparativa das

Page 27: 52(1) - rbm.org.brrbm.org.br/Content/imagebank/pdf/v52n1.pdf · convencional, foi aos poucos substituída pela injeção intracitoplasmática de espermatozoides, inicialmen-te usada

Ana Cristina Carvalho da Costa • Perfil do paciente idoso vítima de trauma

REVISÃO DE LITERATURA

26 • Brasília Med 2015;52(1):21-27

características do trauma entre pacientes idosos e não idosos. Rev Assoc Med Bras. 2010;56(5):541-6.

4. Souza JAG, Iglesias ACRG. Trauma no idoso. Rev Assoc Med Bras. 2002;48(1):79-86.

5. Monteiro CR, Faro ACME. Avaliação funcional de idoso vítima de fraturas na hospitalização e no domicílio. Rev Esc Enferm USP. 2010;44(3):719-24.

6. Luz TCB, Malta DC, Sá NNBD, Silva MMAD, Lima-Costa MF. Violências e acidentes entre adultos mais velhos em comparação aos mais jovens: evidências do Sistema de Vigilância de Violências e Acidentes (VIVA), Brasil. Cad Saúde Pública. 2011;27(11):2135-42.

7. Katz M, Okuma MAA, Santos ALG, Guglielmetti CLB, Sakaki MH, Zumiotti AV. Epidemiologia das lesões traumáticas de alta energia em idosos. Acta Ortop Bras. 2008;16(5):279-83.

8. . Lima RS, Campos MLP. Perfil do idoso vítima de trauma atendido em uma Unidade de Urgência e Emergência. Rev Esc Enferm USP. 2011;45(3):659-64.

9. Fernández BU, Trevigno AB, Luna FG, Fernández FB. Relación entre mortalidad hospitalaria y edad en pa-cientes con trauma encéfalo craneano moderado y grave. Rev Anacem. 2012;6(1):18-22.

10. Rodrigues J, Ciosak SI. Idosos vítimas de trauma: análise de fatores de risco. Rev Esc Enferm USP. 2012;46(6):1400-05.

11. Ong AW, Omert LA, Vido D, Goodman BM, Protetch J, Rodriguez A, et al. Characteristics and outcomes of trauma patients with ICU lengths of stay 30 days and greater: a seven-year retrospective study. Critical Care. 2009;13(5):R154.

12. Broska Júnior CA, De Folchini AB, De Ruediger RR. Estudo comparativo entre o trauma em idosos e não idosos aten-didos em um hospital universitário de Curitiba. Rev Col Bras Cir. 2013;40(4):281-86.

13. Navarro JTM, Estrada AF, López RM, Díaz OLC. Car-acterización de adultos mayores hospitalizados con lesiones traumáticas osteomioarticulares. Medisan. 2011;15(7):909-15.

14. Fhon JRS, Rosset I, Freitas CP, Silva AO, Santos JLF, Rodrigues RAP. Prevalência de quedas de idosos em situação de fragilidade. Rev Saúde Pública. 2013;47(2):266-73.

15. Cavalcante ALPM, Aguiar JBD, Gurgel LA. Fatores associados a quedas em idosos residentes em um bairro de Fortaleza, Ceará. Rev Bras Geriatr Geron-tol. 2012;15(1):137-46.

16. Biazin DT, Rodrigues RAP. Perfil dos idosos que sofre-ram trauma em Londrina, Paraná. Rev Esc Enferm USP. 2009;43(3):602-8.

17. Costa CDS, Scarpelini S. Avaliação da qualidade do atendimento ao traumatizado através do estudo das mortes em um hospital terciário. Rev Col Bras Cir. 2012;39(4):249-54.

18. Ribeiro AP, Souza ER, Valadares FC. Atendimento de saúde para pessoas idosas vítimas de violência no mu-nicípio do Rio de Janeiro. Ciência & Saúde Coletiva. 2012;17(5):1167-77.

19. Mathias TAF, Jorge MHPM, Andrade OG. Morbimortali-dade por causas externas na população idosa residente em município da região sul do Brasil. Rev Latino-am Enfermagem. 2006;14(1):17-24.

20. Campos JFS, Poletti NAA, Rodrigues CDS, Garcia TPR, Angelini JF, Von Dollinger APA, et al. Trauma em idosos atendidos no pronto atendimento da emergência do Hospital de Base. Arq Ciênc Saúde. 2007;14(4):193-7.

21. Thompson HJ, McCormick WC, Kagan SH. Traumat-ic brain injury in older adults: epidemiology, out-comes, and future implications. J Am Geriatr Soc. 2006;54(10):1590-95.

22. Yee WY, Cameron PA, Bailey MJ. Road traffic injuries in the elderly. Emerg Med J. 2006;23:42-6.

23. Calland JF, Ingraham AM, Martin N, Marshall GT, Schul-man CI, Stapleton T, et al. Evaluation and management of geriatric trauma: an Eastern Association for the Surgery of Trauma practice management guideline. J Trauma Acute Care Surg. 2012;73(5):S345-50.

Page 28: 52(1) - rbm.org.brrbm.org.br/Content/imagebank/pdf/v52n1.pdf · convencional, foi aos poucos substituída pela injeção intracitoplasmática de espermatozoides, inicialmen-te usada

Brasília Med 2015;52(1):21-27 • 27

REVISÃO DE LITERATURA

Ana Cristina Carvalho da Costa • Perfil do paciente idoso vítima de trauma

24. Campos JFS, Poletti NAA, Rodrigues CDS, Garcia TPR, An-gelini JF, Von Dollinger APA, et al. Trauma em idosos aten-didos no pronto atendimento da emergência do Hospital de Base. Arq Ciênc Saúde. 2007;14(4):193-7.

25. Frederickson TA, Renner CH, Swegle JR, Sahr SM. The cumulative effect of multiple critical care protocols on length of stay in a geriatric trauma population. J Intensive Care Med. 2013;28(1):58-66.

26. Oliveira FMRL, Fernandes MGM, Barbosa KTF, Pereira MA, Santos KFO, Nunes TB. Caracterização do trauma em idosos atendidos em serviço de atendimento móvel de urgência. Rev Rene. 2013;14(5):945-50.

27. Salottolo KM, Mains CW, Offner PJ, Bourg PW, Bar-Or D. A retrospective analysis of geriatric trauma pa-tients: venous lactate is a better predictor of mortality than traditional vital signs. Scand J of Trauma, Ressus-citation and Emergency Medicine. 2013:21-7.

28. Monteiro CR, Faro ACME. O cuidador do idoso e sua compreensão sobre a prevenção e o tratamento cirúr-gico das fraturas de fêmur. Estud Interdiscip Envelhec. 2006; (10):105-21.

Page 29: 52(1) - rbm.org.brrbm.org.br/Content/imagebank/pdf/v52n1.pdf · convencional, foi aos poucos substituída pela injeção intracitoplasmática de espermatozoides, inicialmen-te usada

Cyntia Helena Pereira de Carvalho • Leiomioma oral: relato de caso e revisão da leitura.

RELATO DE CASO

28 • Brasília Med 2015;52(1):28-32

RESUMO

Introdução. Os leiomiomas são neoplasias be-nignas provenientes da proliferação das células da musculatura lisa, com possibilidade de ocor-rer em qualquer região do corpo. São incomuns na cavidade oral.

Objetivo. O presente trabalho objetiva relatar um caso clínico de leiomioma oral.

Descrição do Caso. Mulher de 44 anos de idade, leucodérmica. Compareceu ao consultório odonto-lógico com queixa de discreta tumefação no lado direito do lábio inferior. Ao exame intraoral, verifi-cou-se lesão submucosa do lábio em referência com aproximadamente dois centímetros de diâmetro, bem delimitada, assintomática, consistente à pal-pação e de cor semelhante à dos tecidos circunja-centes. Realizou-se a biópsia excisional, e o exame histopatológico e imuno-histoquímico (desmina, HHF-35 e ɑ-SMA) da peça revelou leiomioma oral.

Leiomioma oral: relato de caso e revisão da literatura

Conclusão. Há poucos especialistas em Saúde da Família, sendo necessário melhorar os programas de educação médica continuada para médicos da atenção básica e assim aumentar o número de diag-nósticos e de referenciamentos de pacientes com nefropatia. O aumento do número de ambulatórios em nefrologia também se faz necessário.

Comentário. O estudo de lesões de ocorrência in-comum e o relato de novos casos são necessários, pois permitem reunir dados que levam ao conheci-mento do comportamento biológico e prognóstico dessas lesões.

Palavras-chave. Leiomioma; cavidade oral; neo-plasia oral; imuno-histoquímica

ABSTRACT

Oral leiomyoma: a case report and literature review

Introduction. Leiomyomas are benign neoplasms ari-sing from the proliferation of smooth muscle cells that

Os autores declaram inexistência de conflitos de interesses.

Correspondência: Prof.a Dr.a Cyntia Helena Pereira de Carvalho

Universidade Federal de Campina Grande, Centro de Saúde e Tecnologia Rural – CSTR

Unidade Acadêmica de Ciências Biológicas – UACB

Avenida Universitária s/n, Bairro Santa Cecília, caixa postal 61, Patos-PB, CEP 58708-110, telefone 83 35113045

Internet: [email protected]

Cyntia Helena Pereira de Carvalho, Bruna Rafaela Santana de Oliveira, George João Ferreira do Nascimento, Pedro Paulo de Andrade Santos e Antônio de Lisboa Lopes Costa

Cyntia Helena Pereira de Carvalho. Professora, doutora em Patologia Oral, curso de Odontologia, Universidade Federal de Campina Grande, Patos-PB, Brasil.

Bruna Rafaela Santana de Oliveira. Graduanda, curso de Odontologia, Universidade Federal de Campina Grande, Patos-PB, Brasil

George João Ferreira do Nascimento. Professor, doutor em Patologia Oral, curso de Odontologia, Universidade Federal de Campina Grande, Patos-PB, Brasil

Pedro Paulo de Andrade Santos. Professor, doutor, Departamento de Morfologia, Programa de Pós-Graduação em Patologia Oral, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal-RN, Brasil

Antônio de Lisboa Lopes Costa. Professor, doutor, Programa de Pós-Graduação em Patologia Oral, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal-RN, Brasil

DOI - 10.14242/2236-5117.2015v52n1a298p28

Page 30: 52(1) - rbm.org.brrbm.org.br/Content/imagebank/pdf/v52n1.pdf · convencional, foi aos poucos substituída pela injeção intracitoplasmática de espermatozoides, inicialmen-te usada

Cyntia Helena Pereira de Carvalho • Leiomioma oral: relato de caso e revisão da leitura.

RELATO DE CASO

29 • Brasília Med 2015;52(1):28-32

may affect the body anywhere, but their occurrence in mouth is rare.

Objective. This study reports a clinical case of oral leiomyoma.

Case report. A. T44-years-old leucodermic woman presen-ted a swelling on the right side of the lower lip. Intraoral exa-mination revealed a well-defined submucosal lesion of about 2 cm in diameter, asymptomatic, with firm consistency to palpation and with similar color to the labial mucosa. After excisional biopsy, the specimen underwent histopathologi-cal examination and immunohistochemistry analysis for desmin, HHF-35 and ạ-SMA. Diagnosis was oral leiomyoma.

Comment. Studies and case reports of rare tumors may help to improve our knowledge of their biological beha-vior and prognosis.

Key Words. Leiomyoma; oral cavity; oral neoplasm; immunohistochemistry.

INTRODUÇÃO

Leiomioma é um tumor benigno de origem me-senquimal, que se desenvolve com proliferação de células da musculatura lisa. Pode acometer qualquer local que tenha célula muscular lisa. É especialmente mais comum em útero, trato gas-trointestinal e pele.1 De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), os leiomiomas podem ser classificados em angiomiomas ou leiomioma vas-culares e leiomiomas de tecidos moles profundos. Os leiomiomas vasculares podem ainda apresentar três subtipos de acordo com o padrão histopatoló-gico dominante, ou seja, leiomioma sólido, venoso ou cavernoso.2

Esses neoplasmas são raramente encontrados na cavidade oral. Representam 0,016% a 0,064% de todos os leiomiomas relatados.3,4 Os leiomiomas de cavidade oral se apresentam como lesões de evolu-ção lenta em submucosa, são predominantemente assintomáticos e, geralmente, acometem lábio, lín-gua e palato duro. Outras localizações menos fre-quentes são assoalho, gengiva e região retromolar.5

Devido à apresentação clínica inespecífica do

leiomioma oral, seu diagnóstico é feito após análise histopatológica, que pode ser auxiliada por estudo imuno-histoquímico que demonstre imunorreati-vidade positiva, sugestiva de ter origem em mús-culo liso.6

A terapêutica adotada é a remoção cirúrgica con-servadora, que tem se mostrado eficaz, com bai-xíssimos índices de recorrência. De maneira geral, lesões benignas ou com potencial de malignidade devem ser sempre minuciosamente analisadas, e uma rápida avaliação diagnóstica pode significar sucesso no tratamento.7

Este trabalho teve como objetivo relatar um caso de leiomioma oral e apresentar uma revisão da li-teratura acerca dessa neoplasia rara.

CASO CLÍNICO

Mulher de 44 anos de idade, leucodérmica, com-pareceu ao ambulatório odontológico e queixou-se de um aumento de volume no lábio inferior com cerca de dezoito meses de evolução. Ao exame clínico, verificou-se que a paciente era saudável, sem outras referências dignas de nota. Ao exame extraoral, observou-se discreta tumefação indolor no lábio inferior. Ao exame intraoral, a lesão tinha aspecto de nódulo único submucoso, ligeiramen-te ovalado, séssil, bem delimitado, normocrômico, com aproximadamente dois centímetros de exten-são, consistência firme e flutuante à palpação, o que levou à hipótese de diagnóstico de mucocele (figura 1).

Figura 1. Visão intraoral de mucosa labial, que mostra a lesão submucosa

Page 31: 52(1) - rbm.org.brrbm.org.br/Content/imagebank/pdf/v52n1.pdf · convencional, foi aos poucos substituída pela injeção intracitoplasmática de espermatozoides, inicialmen-te usada

Brasília Med 2015;52(1):28-32 • 30

ARTIGO ORIGINAL

Cyntia Helena Pereira de Carvalho • Leiomioma oral: relato de caso e revisão da leitura.

Diante dos achados descritos, optou-se pela rea-lização de biópsia excisional. Durante a execução do procedimento, foi possível observar uma lesão com limites precisos que facilmente foi separada dos tecidos circunjacentes (figura 2A). Ao exame macroscópico, o espécime media 1,8 por 1,5 por 1 cm (figura 2B).

Microscopicamente observou-se uma lesão encap-sulada, com massa sólida composta de muitas célu-las fusiformes, organizadas em feixes com núcleos alongados de extremidades rombas, palidamente coradas e sem atipia celular. O estroma era escasso, com vasos sanguíneos dispersos e focos de calcifi-cações distróficas (figura 3A). A lesão foi submetida à avaliação imuno-histoquímica com utilização de anticorpos contra desmina, HHF-35, a-SMA, que se mostraram todos positivos e confirmaram o diag-nóstico de leiomioma (figura de 3B, C e D).

DISCUSSÃO

O leiomioma é a neoplasia benigna de músculo liso mais comum do trato genital feminino (95%), se-guido da pele (3%) e do trato gastrintestinal (1,5%). Menos de 1% ocorre nas regiões da cabeça e do pes-coço.8 Trata-se de lesão incomum na cavidade oral. Isso pode ser constatado, por exemplo, por meio de um levantamento das neoplasias benignas na cavidade oral feito com 336 lesões, entre as quais o leiomioma correspondeu apenas a 0,8% delas.9 Essa baixa incidência pode ser explicada pela es-cassa quantidade de músculo liso na cavidade oral.

A literatura relata que o leiomioma oral tem etio-patogenia incerta.7,10 Há indícios de que, na cavi-dade oral, o desenvolvimento do leiomioma esteja relacionado às células musculares lisas presentes na túnica média dos vasos sanguíneos além das cé-lulas mioepiteliais presentes na periferia dos duc-tos excretores e ácinos das glândulas salivares.11,12 No presente caso, foi possível evidenciar vasos em meio à neoplasia com paredes repletas de células neoplásicas. Isso fez os autores pensar que essa ne-oplasia tenha surgido de vasos sanguíneos, já que, na cavidade oral, a lâmina própria subjacente à mucosa é extremamente vascularizada.13

Neste caso clínico, o leiomioma localizou-se na mucosa do lábio inferior que, de acordo com a lite-ratura, é a localização mais frequente, seguida de língua, palato duro, palato mole e mucosa jugal.7,12 Há ainda relatos de leiomioma oral em trígono re-tromolar, músculo masseter e mandíbula, localiza-ções muito incomuns da lesão.5,14,15

O leiomioma oral apresenta possibilidade de se de-senvolver em qualquer faixa etária, porém, é mais comumente relatada em adultos, nas quintas e sex-tas décadas de vida, com idade média de 45 anos, e o aparecimento desse tipo de lesão em crianças e idosos é muito incomum.4,10,12,16 Entretanto, há re-lato de leiomioma em crianças, como descrito por Alvarez e colaboradores,10 em que um lactente de 8 meses de idade apresentou múltiplos leiomiomas, situados na língua, na mucosa jugal e no assoalho bucal, os quais foram removidos sob anestesia ge-ral.

Figura 2. (A) Aspecto da lesão no período transcirúrgico, que mostra a separação da lesão e os limites precisos após divulsão tecidual. (B) Aspecto macroscópico da lesão

Figura 3. (A) Fotomicrografia que exibe proliferação sólida com muitas células fusiformes organizadas em feixes com núcleos alongados, pali-damente corados com extremidades rombas e sem presença de atipia celular (HE-400×). (B) Fotomicrografia que mostra marcação positiva de desmina (LSAB-200×). (C) Fotomicrografia que mostra marcação positi-va de HHF35 (LSAB-200×). (D) Fotomicrografia que evidencia imunor-reatividade positiva da a-SMA (LSAB-200×)

Page 32: 52(1) - rbm.org.brrbm.org.br/Content/imagebank/pdf/v52n1.pdf · convencional, foi aos poucos substituída pela injeção intracitoplasmática de espermatozoides, inicialmen-te usada

Cyntia Helena Pereira de Carvalho • Leiomioma oral: relato de caso e revisão da leitura.

RELATO DE CASO

31 • Brasília Med 2015;52(1):28-32

imuno-histoquímica demonstra-se como impor-tante auxiliar, na qual esses tumores revelam forte imunorreatividade contra actinas, desmina, h-cal-desmona e vimentina.17,18 Nesse caso, foi realizada a imuno-histoquímica de três marcadores especí-ficos de músculo liso – desmina, a-SMA e HHF-35 – com os quais todos marcaram fortemente as cé-lulas específicas.

A desmina está presente na composição das fibras musculares lisas e pode ser marcada nessas célu-las.19 Análises de imunoeletroforese seguidas de imunotransferência demonstraram que o anti-corpo monoclonal HHF-35 faz o reconhecimento da variante alfa da actina por meio de fontes de músculo esquelético, músculo cardíaco e da varian-te gama em músculo liso, mostrando ser útil como marcador celular,20 já o a-SMA (a- smooth muscle actin) assinala a presença de actina específica de músculo liso.4,18

O tratamento do leiomioma consiste na ressecção conservadora completa da lesão.7,21 Caso o exame anatomopatológico revele a ocorrência de atipias celulares e o aumento do número de mitoses, ain-da que insuficientes para se emitir um diagnósti-co de leiomiossarcoma, deve-se optar por excisão cirúrgica com a devida margem de segurança e acompanhamento periódico para garantir que não ocorram possíveis recidivas da lesão,7,18 embora se-ja muito baixo o índice de recidivas.7,18,21

REFERÊNCIAS

1. Weiss SW, Goldblum JR. Bening tumors of smooth mus-cle. In: Enzinger and Weiss’s Soft Tissue Tumors. 4th ed. St. Louis, MO: Mosby, Inc; 2002. p.695-726.

2. Hashimoto H, Quade B. Leiomyoma of deep soft tissue. In: Fletcher C.D.M., Unni K.K., Mertens F. (Eds.): World Health Organization Classification of Tumours. Pathol-ogy and Genetics of Tumours of Soft Tissue and Bone. IARC Press: Lyon; 2002.

3. Brooks JK, Nikitakis NG, Goodman NJ, Levy BA. Clin-icopathologic characterization of oral angioleiomyo-mas. Oral Surg Oral Med Oral Pathol Oral Radiol Endod. 2002;94(2):221-7.

O leiomioma é uma lesão de crescimento lento, assintomática, raramente ocorre relato de dor e apresenta coloração semelhante à da mucosa oral normal ou, dependendo da associação com o sis-tema vascular, a cor varia do vermelho ao violá-ceo.10,12 Contudo, considerando-se a localização anatômica da lesão, algumas manifestações atípi-cas foram relatadas, tais como dificuldade de de-glutição, odontalgia, mobilidade dentária e dor re-ferida na articulação temporomandibular afetada.14

Clinicamente, o leiomioma oral tem aparência inespecífica. Abrange múltiplos diagnósticos clí-nicos diferenciais, dentre eles – fibroma, lipoma, lesões de glândulas salivares, tumores vasculares como hemangioma ou linfangioma, tumor da bai-nha de nervos periféricos e leiomiossarcoma.4,10,12 Neste relato, pela aparência clínica de lesão flutu-ante e sua localização em lábio inferior a hipóte-se clínica levantada primeiramente foi mucocele, sendo então fechado o diagnóstico de leiomioma apenas depois da análise microscópica.

Dentre as princi¬pais variantes histopatológicas de cavidade oral, os leiomiomas orais podem ser clas-sificados em sólidos, vasculares e epitelioides.3,4,17 O leiomioma vascular é o mais comum na cavidade oral e corresponde a taxas de 67% a 75% dos casos, e o epitelioide é o mais raro.17

Os leiomiomas orais têm aspecto microscópico al-tamente diferenciado com pouca ou nenhuma ati-pia, embora, muito raramente, possam apresentar pleomorfismo celular. Não há necrose nem invasão tecidual e é escassa a atividade mitótica. Há possi-bilidade de aparecimento de degeneração mucino-sa, fibrose e hialinização. Estas, porém, se distri-buem de forma focal e são mais comuns em lesões maiores.17 No presente caso, foi possível observar um tumor muito sólido, com células fusiformes ne-oplásicas bem típicas de leiomioma e poucas áreas de calcificação, que podem ser identificadas em al-guns leiomiomas orais, porém constituem achados histopatológicos menos expressivos.18

Outras neoplasias constituídas de células fusifor-mes devem ser excluídas, como os neurofibro-mas e os neurilemomas. Nesse contexto, a técnica

Page 33: 52(1) - rbm.org.brrbm.org.br/Content/imagebank/pdf/v52n1.pdf · convencional, foi aos poucos substituída pela injeção intracitoplasmática de espermatozoides, inicialmen-te usada

Brasília Med 2015;52(1):28-32 • 32

ARTIGO ORIGINAL

Cyntia Helena Pereira de Carvalho • Leiomioma oral: relato de caso e revisão da leitura.

4. González-Sánchez MA, Colorado-Bonnin M, Berini-Aytés L, Gay-Escoda C. Leiomyoma of the hard palate: a case report. Med Oral Patol Oral Cir Bucal. 2007;12:E221-4.

5. Goel A, Goel H. Oral leiomyoma extending in retro-molar region. J Indian Soc Pedod Prev Dent Índia. 2011;29(2):s61-s65.

6. Wertheimer-Hatch L, Hatch GF, Hatch BS, Davis GB et al. Tumors of the oral cavity and pharynx. World J Surg. 2000;24:395-400.

7. Almeida LE, Costa DL, Madureira, JF. Leiomioma vascular em lábio superior: relato de caso e revisão de literatura. Rev ABO Nac. 2008;16(4):241-2.

8. Campelo VES, Neves MC, Nakanishi M, Voegels RL. An-gioleiomioma de cavidade nasal: relato de um caso e revisão de literatura. Rev Bras Otorrinolaringol. 2008;74(1):147-50.

9. Rocha DAP, Oliveira LMM, Souza LB. Neoplasias benignas da cavidade oral: estudo epidemiológico de 21 anos (1982 a 2002). Rev Odontol Univ São Paulo. 2006;18(1)53-60.

10. Alvarez E, Laberry MP, Ardila CM. Multiple oral leiomyo-mas in an infant: a rare case. Case Report in Dentistry. Colombia. 2012: 1-3.

11. Gianluca S, Marini R, Tonoli F, Cristalli MP. Leiomyoma of oral cavity: case report and literature review. Ann Stom-atol. 2011;(1-2):9-12.

12. Rey RL, Franco FL, Oliveira GG, Seijas BP et al. Oral leio-myoma in retromolar trigone: A case report. Med Oral Patol Oral e Cir Bucal. 2007;12:53-5.

13. Mjör IA, Fejerskov O. Embriologia e histologia oral hu-mana. São Paulo: Panamericana S. A., 1990:1-332.

14. Grippaudo G, Becelli R. Leiomioma del muscolo massetere: descrizione di un caso clinico. Minerva Stomatol. 1996;45:277-80.

15. Kotler HS, Gould NS, Gruber B. Leiomyoma of the tongue presenting as congenital air way obstruction. Internat J Ped Ortohinolaryngol. 1994;29(2):139-45. 2012;17(11):3135-4.

16. Silveira VAS, Amadel SU, Machado ACP, Prado RF et al. Leiomioma vascular bucal: relato de dois casos, revisão da literatura e estudo imuno-histoquímico. J Bras Patol Med Lab. 2007;43(3):211-7.

17. Gaitan-Cepeda L, Quezada-Rivera D, Tenorio-Rocha F, Leyva H, Mendez-Sánchez E. Vascular leiomyoma of the oral cavity. Clinical, histopathological and immu-nohistochemical characteristics. Presentation of five cases and review of the literature. Med Oral Patol Oral Cir Bucal. 2008;13(8):E483-8.

18. Nonaka CFW, Pereira KMA, Miguel MCC. Oral vascular leiomyoma with extensive calcification áreas. Braz J Otohinolaryngol. 2010;76(4):539.

19. Machado GF, Figueiredo F. Revisão: Filamentos inte-mediários. Rev Med. 1996;29:104-13.

20. Tsukada T, Tippens D, Gordon D, Ross R et al. HHF35, a muscle-actin-specific monoclonal antibody. I. Im-munocytochemical and biochemical characterization. Amer J Pathol. 1987;126(1):51-60.

21. Alves PM, Novaes MM, Lucas Neto A, Godoy GP et al. Leiomioma vascular oral: relato de caso e es-tudo imuno-histoquímico. Rev Cir Traumatol BMF. 2013;13(1):47.

Page 34: 52(1) - rbm.org.brrbm.org.br/Content/imagebank/pdf/v52n1.pdf · convencional, foi aos poucos substituída pela injeção intracitoplasmática de espermatozoides, inicialmen-te usada

Maria Fernanda Mélega Mingossi • Síndrome de Sturge-Weber: duplo episódio stroke-like em paciente no exame pré-natal e no puerpério. Relato de

caso e revisão da literatura

RELATO DE CASO

33 • Brasília Med 2015;52(1):33-37

RESUMO

APaciente de 23 anos etários, feminina, sem história familiar de retardo mental, epilepsia ou síndromes neurocutâneas. Ao exame físico, observou-se mancha vinho-do-porto na região palpebral superior direita. O primeiro episódio stroke-like ocorreu no terceiro dia depois do parto cesáreo, precedido de quadro súbito de in-tensa cefaleia. Dois dias depois, sobreveio hemi-plegia completa à esquerda. A tomografia com-putadorizada de crânio evidenciou hiperostose, atrofia cortical na região occipital à direita, associada a imagens de calcificações giriformes em forma de linha de trem. Realizada angiogra-fia cerebral, que mostrou alteração da drenagem venosa cerebral à direita e, por ressonância nu-clear magnética de crânio, identificou-se exten-sa estrutura de aspecto vascular calcificada na convexidade parietotemporal direita. Quatro anos depois, procurou pronto-socorro por ocorrência de novo episódio de cefaleia e para-lisia no hemicorpo esquerdo, quando se encon-trava gestante com trinta semanas e três dias. Realizada tomografia computadorizada de crâ-nio, que não evidenciou alterações em relação

Síndrome de Sturge-Weber: duplo episódio stroke-like em paciente no exame pré-natal e no puerpério. Relato de caso e revisão da literatura

aos exames anteriores. Não foi encontrada, na literatura, relação entre o número de episódios stroke-like e a gravidade quanto à exacerbação de sinais e sintomas nas crises.

Palavras Chave. Mancha vinho do porto; hemor-ragia cerebral; cefaleias vasculares; cuidado pré--natal; período pós-parto.

ABSTRACT

Sturge-Weber syndrome: double stroke-like episode in a patient during the prenatal and the postpartum periods. Case report and literature review.

v A 23-year-old female with no family history of mental re-tardation, epilepsy or neurocutaneous syndromes. At physi-cal examination, a port wine stain in the upper right eyelid was noted. The first stroke-like episode occurred on the third day after the cesarean section, preceded by sudden onset of severe headache. After two days, she developed hemiplegia and facial paralysis on the left. Computed tomography of the skull showed hyperostosis, cortical atrophy in the right occipital region associated with calcifications in giriform "train line" pictures cerebral angiography performed that

Os autores declaram inexistência de conflitos de interesses.

Correspondência: Maria Fernanda Mélega Mingossi.

Avenida Conselheiro Nébias, n.º 580, conjunto 64, Santos, São Paulo, CEP 11045-002

Internet: [email protected]

Telefone: (13) 98127-7110 / Fax: (13) 3234-3353

Janayna Thainá Rabelato e Maria Fernanda Mélega Mingossi

Janayna Thainá Rabelato . Graduada em Medicina pelo Centro Universitário Lusíada, Santos, São Paulo.

Maria Fernanda Mélega Mingossi. Médica neurocirurgiã, mestre, professora, Centro Universitário Lusíada, Santos, São Paulo.

DOI - 10.14242/2236-5117.2015v52n1a299p33

Page 35: 52(1) - rbm.org.brrbm.org.br/Content/imagebank/pdf/v52n1.pdf · convencional, foi aos poucos substituída pela injeção intracitoplasmática de espermatozoides, inicialmen-te usada

Maria Fernanda Mélega Mingossi • Síndrome de Sturge-Weber: duplo episódio stroke-like em paciente no exame pré-natal e no puerpério. Relato de

caso e revisão da literatura

RELATO DE CASO

34 • Brasília Med 2015;52(1):33-37

presented changes in cerebral venous drainage to the right and skull nuclear magnetic resonance displayed an exten-sive structural aspect of vascular calcification in the right parietal-temporal convexity. After four years, she sought an emergency room due to a new episode of headache and paralysis on the left side of the body when she was thirty weeks pregnant and three days. Another CT scan showed no changes compared with previous exams. There was nothing found in the literature on the relationship between the num-ber of stroke-like episodes and severity with exacerbation of signs and symptoms.

Key Words. Port wine stain; cerebral hemorrha-ge; vascular headaches; prenatal care; postpartum period.

INTRODUÇÃO

A síndrome de Sturge-Weber é uma rara síndrome de desenvolvimento, um distúrbio congênito, não heredi-tário, caracterizado por desordem neurocutânea, com angiomas na pele da face, nas leptomeninges e, prin-cipalmente, nos ramos oftálmico e maxilar do nervo trigêmeo.1 O achado clínico mais característico é a pre-sença de nevo flâmeo, seguido de angiomatose corti-cocerebral, calcificações cerebrais, epilepsia e afecções oculares.2 Os episódios stroke-like são caracterizados por quadros de déficits focais transitórios atribuídos à estase venosa nas malformações leptomeníngeas.3

O presente estudo relata o primeiro caso na literatura de uma paciente com síndrome de Sturge-Weber com primeira manifestação clínica de início tardio (défi-cit motor) compatível com stroke-like durante duas gestações – na primeira, a manifestação ocorreu no puerpério e, na segunda, no período pré-natal. Os au-tores apresetam uma revisão da literatura sobre essa síndrome

RELATO DE CASO

Mulher de 23 anos, parda, solteira, procedente de Itanhaém, São Paulo, natural de Teófilo Otoni – Minas Gerais, grau de ensino médio completo. Sem história familiar de retardo mental, epilepsia ou síndromes neurocutâneas. Ao exame físico, obser-vou-se mancha vinho-do-porto na região palpebral superior direita (figura 1).

No primeiro episódio, a paciente era primigesta, sem antecedentes patológicos ginecológicos, sub-metida a cesárea segmentar transversa. Deu à luz um recém-nascido vivo, masculino, peso de 3.557 gramas, Apgar 9 e 10 no primeiro e quinto minutos respectivamente. No terceiro dia após a cesárea, a doente teve quadro súbito de cefaleia pulsátil e de forte intensidade nas regiões frontal e temporal direita. Após dois dias, apresentou hemiplegia e paralisia facial central à esquerda.

Realizada tomografia computadorizada de crânio, que evidenciou hiperostose, atrofia cortical na região occipital à direita, associada a imagens de calcificações giriformes em forma de linha de trem (figura 2).

Figura 1. Mancha vinho-do-porto de região palpebral direita

Figura 2. Tomografia computadorizada de crânio com calcificações giriformes em linha de trem

Page 36: 52(1) - rbm.org.brrbm.org.br/Content/imagebank/pdf/v52n1.pdf · convencional, foi aos poucos substituída pela injeção intracitoplasmática de espermatozoides, inicialmen-te usada

Brasília Med 2015;52(1):33-37 • 35

RELATO DE CASO

Maria Fernanda Mélega Mingossi • Síndrome de Sturge-Weber: duplo episódio stroke-like em paciente no exame pré-natal e no

puerpério. Relato de caso e revisão da literatura

A angiografia cerebral mostrou alteração de dre-nagem venosa cerebral à direita e extensa estrutu-ra de aspecto vascular calcificada na convexidade parietotemporal direita (figura 3). A ressonância magnética de crânio evidenciou angioma calcifica-do (figura 4). A avaliação oftalmológica não apon-tou alterações.

Baseada nos exames complementares e no exame físico, foi feita a hipótese de diagnóstico da síndro-me de Sturge-Weber, atribuindo-se o déficit motor a um episódio stroke-like, sendo então introduzida aspirina.

Sete dias depois, a paciente recuperou totalmen-te a força motora e a mímica facial. A tomografia

computadorizada de crânio de controle manteve--se inalterada.

Durante o período de acompanhamento ambulato-rial de quatro anos, a paciente sofreu dois episódios transitórios de déficit motor com menos de uma hora de duração, mas não necessitou de interna-ção. Procurou serviço de pronto-socorro, após seis meses, por ocorrência de novo episódio de cefaleia e hemiplegia à esquerda, quando se encontrava gestante havia trinta semanas e três dias. Realizada tomografia computadorizada de crânio, que não evidenciou alterações em relação aos exames an-teriores (figura 5).

Encaminhada para internação em Unidade de Terapia Intensiva, onde permaneceu um dia devido aos níveis pressóricos elevados. Recebeu alta com transferência para uma enfermaria, recuperou-se totalmente do déficit motor e obteve alta hospita-lar no quinto dia de permanência hospitalar.

A paciente manteve-se em seguimento ambula-torial com reavaliação mensal no ambulatório de neurologia. Teve gravidez de alto risco até o par-to. Com 39 semanas e dois dias de gestação houve parto normal. Deu à luz uma criança viva, do sexo feminino, com peso de 3.490 gramas, Apgar 8 e 9 nos primeiro e quinto minutos respectivamente. Recebeu alta hospitalar após dois dias sem inter-corrências. Encaminhada ao ambulatório de plane-jamento familiar

Figura 3. Imagens da angiografia cerebral realizada mos-tram alteração da drenagem venosa à direita

Figura 4. Imagens de ressonância nuclear mag-nética do angioma calcificado

Figura 5. Tomografia computadorizada de crânio com ima-gens do segundo episódio stroke-like à direita

Page 37: 52(1) - rbm.org.brrbm.org.br/Content/imagebank/pdf/v52n1.pdf · convencional, foi aos poucos substituída pela injeção intracitoplasmática de espermatozoides, inicialmen-te usada

Maria Fernanda Mélega Mingossi • Síndrome de Sturge-Weber: duplo episódio stroke-like em paciente no exame pré-natal e no puerpério. Relato de

caso e revisão da literatura

RELATO DE CASO

36 • Brasília Med 2015;52(1):33-37

computadorizada de crânio evidenciou hemorra-gia intraventricular lateral esquerda. Após dois meses, as crises foram controladas com fenitoína e carbamazepina.8

Posteriormente, Chabriat e colaboradores (1996) relataram o caso de uma paciente que, durante o terceiro trimestre da gravidez e depois de 48 ho-ras de convulsões focais, teve hemiplegia direita e afasia com hemianopsia. A tomografia computado-rizada de crânio não revelou lesão cerebral, mas o meio de contraste em um exame com ressonância magnética revelou angiomatose hemisférica es-querda. A paciente recuperou-se progressivamente a partir do terceiro dia do puerpério.9

Zanconato, em 2008, relatou o caso de mulher com 42 anos, primigesta de 37 semanas que, no sexto dia de puerpério, apresentou um pico hipertensivo facilmente controlado.10

Na literatura, os casos relatados da síndrome de Sturge-Weber que apresentaram relação ao ciclo gravídico receberam o diagnóstico antes da gesta-ção e realizaram tratamento para epilepsia.

Em razão da raridade da síndrome, não há consen-so sobre o manejo de pacientes grávidas. A docu-mentação é necessária para conhecimento e futu-ramente estabelecer sua relação com o prognóstico dessas pacientes

REFERÊNCIAS

1. Palheta Neto FX, Vieira Jr MA, Ximenes LS, Jacob CCS, Rodrigues Jr AG, Palheta ACP. Aspectos clínicos da sín-drome de Sturge-Weber. Arquivos Internacionais de Otorrinolaringologia. 2008;12(4):565-70.

2. Zhou J, Li NY, Zhou XJ, Wang JD, Heng-hui MA, Zhand RS. Sturge-Weber syndrome: a case report and review of literatures. Chinese Medical Journal. 2010;123(1):117-21.

3. Pearce JM. Sturge-Weber syndrome (encephalotrigeminal or leptomeningealangiomatosis). Journal of Neurology, Neurosurgery and Psychiatry. 2006;77(1):291-92.

4. Zaroff CM, Isaacs K. Neurocutaneous

DISCUSSÃO

Em 1879, William Sturge relatou o caso de uma me-nina de seis anos de idade com nevo facial bilateral, malformações vasculares no olho direito e espas-mos no dimídio esquerdo. Em 1922, Parkes Weber mostrou calcificações intracranianas radiografica-mente.3 Posteriormente, Van der Hoeve a incluiu nas síndromes neurocutâneas.4

Acredita-se que a síndrome de Sturge-Weber seja decorrente de persistência do plexo vascular ao re-dor da porção cefálica do tubo neural, formando a angiomatose cerebral e o nevo facial.5

A mancha vinho-do-porto é o achado mais fre-quente da síndrome e, somente os pacientes com o nevo flâmeo ao longo do nervo oftálmico, desen-volvem a síndrome em sua forma clássica. Quando associado a crises de convulsões, é suficiente para o diagnóstico clínico da síndrome.1 A ocorrência de calcificações intraparenquimatosas é atribuída à anóxia causada pela estase sanguínea dos vasos leptomeníngeos.5

Em relação aos distúrbios cerebrais, a tomografia computadorizada de crânio documenta as calcifi-cações intracranianas e atrofia cortical unilateral. As malformações vasculares cerebrais são mais facilmente identificadas por meio de ressonância magnética. A angiografia é o exame de escolha para a angiomatose cerebral.1

A presença de eventos stroke-like está associada com pior evolução clínica.2 Os déficits transitó-rios motores, visuais e cognitivos duram de horas a dias.6 Quando reconhecido, o fenômeno deve ser tratado de maneira agressiva com hidratação, fe-nobarbital e aspirina nas doses de 3 a 5 mg/kg/dia.7

Em pacientes grávidas, há poucos casos na litera-tura relacionados ao episódio stroke-like e à sín-drome. Dolkart e Bhat (1995) relataram o caso de uma doente com 24 anos secundigesta em uso de fenobarbital e fenitoína devido às crises convul-sivas desde os 12 anos de idade. Apresentou, no quarto dia pós-parto, múltiplas convulsões com atividade motora tônico-clônica. A tomografia

Page 38: 52(1) - rbm.org.brrbm.org.br/Content/imagebank/pdf/v52n1.pdf · convencional, foi aos poucos substituída pela injeção intracitoplasmática de espermatozoides, inicialmen-te usada

Brasília Med 2015;52(1):33-37 • 37

RELATO DE CASO

Maria Fernanda Mélega Mingossi • Síndrome de Sturge-Weber: duplo episódio stroke-like em paciente no exame pré-natal e no

puerpério. Relato de caso e revisão da literatura

syndromes: behavioral features: epilepsy and behavior. 2005;7(2):133-42.

5. Lo W, Marchuk DA, Ball KL, Juhász C, Jordan LC, Ewen JB, et al. Brain vascular malformation consortium national Sturge-Weber syndrome workgroup: updates and future horizons on the understanding, diagnosis and treatment of Sturge-Weber syndrome brain involvement. Develop-mental Medicine and Child Neurology. 2012;54(3):214-23.

6. Jung A, Raman J, Hill CR. Acute hemiparesis in Sturge-Weber syndrome. Practical Neurology. 2009;9(3):169-71.

7. Maria BL, Olson LO, Comi AM. Sturge-Weber syn-drome. Current Management in Child Neurology. 2005;3(1):470-75.

8. Dolkart LA, Bhat M. Sturge-Weber syndrome in preg-nancy. American Journal of Obstetrics and Gynecol-ogy. 1995;173(3):969-71.

9. Chabriat H, Pappata S, Traykov L, Kurtz A, Bousser MG. Sturge-Weber angiomatosis responsible for hemiplegia without cerebral infarction in term preg-nancy. Revue Neurologique. 1996;152(8):536-41.

10. Zanconato G, Papadopoulos N, Lampugnani F, Caloi E, Franchi M. An uncomplicated pregnancy associated with Sturge-Weber angiomatosis. European Journal of Obstetrics, Gynecology and Reproductive Biology. 2008;137(1):118-27.