30 occhini, m. f.; teixeira, m. g. atendimento a pacientes ... · co.pdf.> acesso em: 15 dez....

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30 OCCHINI, M. F.; TEIXEIRA, M. G. Atendimento a pacientes dependentes de drogas: atuação conjunta do psicólogo e do psiquiatra . Estud. psicol. (Natal) vol.11 no.2 Natal Maio/Agosto 2006. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S1413-294X2006000200012&script =sci_ arttext> Acesso em: 15 dez. 2008. PESSOTTI, I. A formação humanística do médico . Medicina, Ribeirão Preto, Simpósio: Ensino Médico de Graduação out./dez. 1996. Disponível em: <http://www.fmrp.usp.br/revista/1996/vol29n4/10_aformacao_humanistica_medi co.pdf.> Acesso em: 15 dez. 2008. SANTOS, N. S. Componentes e atributos que configuram a qualidade na relação médico-paciente – Tese Universidade Federal de Santa Catarina. Florianópolis, 2004. Disponível em: <http://teses. eps.ufsc.br/defesa/pdf/5474.pdf.> Acesso em: 15 dez. 2008. SILVA, A. L. Relação médico-paciente . Belo Horizonte – MG: Revista Associação Médica Brasileira 51(3): 121-32, 2005.

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Page 1: 30 OCCHINI, M. F.; TEIXEIRA, M. G. Atendimento a pacientes ... · co.pdf.> Acesso em: 15 dez. 2008. SANTOS, N. S. Componentes e atributos que configuram a qualidade na relação médico-paciente

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OCCHINI, M. F.; TEIXEIRA, M. G. Atendimento a pacientes dependentes de

drogas: atuação conjunta do psicólogo e do psiquiatra. Estud. psicol. (Natal)

vol.11 no.2 Natal Maio/Agosto 2006. Disponível em:

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LEITURAS COMPLEMENTARES

CAPRARA, A.; RODRIGUES, J. A relação assimétrica médico-paciente:

repensando o vínculo terapêutico. Ciência & Saúde Coletiva vol.9 no. 1 Rio de

Janeiro 2004. Disponível em: <http://www.scielosp.org/scielo. php?pid=S1413-

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DEL GIGLIO, A. A Relação Médico-Paciente Sob Uma Perspectiva Dialógica.

Disponível em: <http://www.psy.med.br/textos/ medico_paciente/perspectiva_

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FERNANDES, J. C. L. A Quem Interessa a Relação Médico Paciente? Cad.

Saúde Públ., Rio de Janeiro, 9 (1): 21-27, jan/mar, 1993. Disponível em:

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Standard Brasileira. Rio de Janeiro: Imago, 1969.

____ - As perspectivas futuras da terapêutica psicanalítica (1910), vol. XI,

Obras Completas Standard Brasileira. Rio de Janeiro: Imago, 1970.

____ - Fragmento da análise de um caso de histeria (1905 [1901] ), vol. VII,

Obras Completas Standard Brasileira. Rio de Janeiro: Imago, 1989.

____ - Recomendações aos médicos que exercem a psicanálise (1912), vol.

XII, Obras Completas Standard Brasileira. Rio de Janeiro: Imago, 1976.

____ - Sobre o Narcisismo: uma introdução (1914), vol. XIV, Obras Completas

Standard Brasileira. Rio de Janeiro: Imago, 1969.

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REFERÊNCIAS

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Ainda no contexto da Dependência Química seria fundamental destacar

os aspectos motivacionais e expectativas diante dos sintomas apresentados

pelo paciente durante o tratamento, visando o estabelecimento do vínculo

necessário no desenvolvimento do mesmo.

As barreiras que impedem ou enfraquecem o vínculo terapêutico na

relação médico-paciente contribuem, muitas vezes, para o abandono do

tratamento, com o agravamento da evolução do uso das substâncias

psicoativas. Visualizar estas barreiras sob o ponto de vista do profissional ajuda

a esclarecer procedimentos que fortalecem o vínculo. Uma dessas barreiras é

a estigmatização do dependente químico, por parte do profissional, seguida da

dificuldade de manter a neutralidade num tratamento em longo prazo,

conservando uma posição de distanciamento saudável para não perder a

objetividade sem prejuízo da empatia. Dificuldade, também, em lidar com a

transferência e contratransferência, em um tratamento que cursa, muitas

vezes, com recaídas e comorbidades.

Sendo assim, a relação médico-paciente é uma produção social, na qual

há o desafio de se tentar fazer com que a pessoa saia do lugar de

“contaminante” – carregando um rótulo – para potencializar vivências, ações,

emoções, como parte do processo de subjetivação e de reencontro de um

modo de subjetivação, através da recuperação sustentada. Porém, para que

isso ocorra, é necessário que o médico promova a empatia, demonstrando

receptividade, aceitação para uma possível troca, enfatizando a confiança.

Portanto, percebe-se que o melhor instrumento do médico não é a

tecnologia e sim seu conhecimento aprimorado e específico e, principalmente,

reconhecimento deste conhecimento na situação clínica. É ali, na atividade

clínica, na relação, que acontecem os fenômenos importantes para a

manutenção do vínculo e para o conseqüente desenrolar do tratamento. O

tratamento surge como um processo no qual a ciência e a tecnologia

funcionam como apoio e não como a força que move. É a relação médico-

paciente, tão descuidada, aquela que promove o uso do conhecimento

científico. O lugar do médico não deve ser o do lugar do saber e, sim, daquele

que com sua postura frente ao paciente, permite que o saber ocorra.

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CONCLUSÃO

A relação médico-paciente, ao longo da história, se confundiu com o

científico, tornando técnico aquilo que era para ser humano. A consulta

também perdeu seu valor de encontro de subjetividades, para dar lugar ao

encontro de papéis pré-estabelecidos, o que pode dificultar a relação médico-

paciente, culminando no não atendimento satisfatório das necessidades do

paciente.

Este trabalho se propôs a discutir alguns dos aspectos que prejudicam

esta relação a partir da perspectiva do médico. Na maioria dos casos, por não

estarem claros para o profissional, seu papel como aquele que ocupa o lugar

do saber e sua atuação na transferência e na contratransferência, o tratamento

pode se tornar prejudicado.

No caso específico do paciente Dependente Químico, podemos concluir,

através das entrevistas, que além destes aspectos de conscientização do seu

papel e da percepção da transferência e contratransferência, o médico deve se

aprofundar mais ainda no reconhecimento de situações específicas:

ambivalência, recaída e comorbidade1.

1 A ambivalência, enquanto um estado mental, no qual a pessoa tem sentimentos co-existentes, porém conflitantes a respeito de alguma coisa, deve ser vista como uma parte normal da experiência humana. A ambivalência na DQ é considerada como um obstáculo a ser vencido. O modo como o terapeuta vê a ambivalência é crucial para não cair na armadilha da confrontação, não usar a persuasão direta e sim, usar habilidades empáticas, sintonizantes com sentimentos, valores e crenças do paciente. O importante para o terapeuta numa avaliação individual é descobrir e compreender as motivações do paciente, entender suas expectativas nos diferentes cursos de ação pesando custos e benefícios na balança da ambivalência. A recaída faz parte do processo de mudança e, muitas vezes, é até essencial para que a pessoa possa aprender com a experiência e recomeçar de forma mais consciente. mudanças de pensamento, sentimento e comportamento precisam ser adotados se hábitos novos e saudáveis quiserem ser mantidos e as recaídas impedidas. “A ocorrência de uma patologia qualquer em um indivíduo já portador de outra doença, com potencialização recíproca entre estas é conhecida como comorbidade. O surgimento de um transtorno adicional é capaz de alterar a sintomatologia, interferindo no diagnóstico, no tratamento e no prognóstico da primeira doença,” (Laranjeiras et al., 2004).

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A falta de motivação e a falta de confiança aparecem também como

barreiras na relação médico-paciente, enfraquecendo o vínculo; identificando

que é na relação e ao longo dela que acordos vão sendo realizados no

processo terapêutico. O profissional constata a necessidade de trabalhar o

vínculo (transferência) na relação, bem como a tolerância do profissional

(contratransferência) quanto às recaídas e dificuldades dessa relação.

Através das entrevistas exploratórias, foi possível ilustrar o que foi

pretendido na revisão teórica. No que se refere a dificuldades na atenção ao

dependente químico - barreiras na relação médico-paciente relacionadas ao

profissional, observa-se na entrevista com um Especialista em DQ, como

deveria ser a dinâmica da relação médico/paciente dependente químico, diante

das dificuldades e potencialidades dessa relação.

Por fim, é importante observar a necessidade de um maior investimento

em qualificação e capacitação na área da DQ, dando especial atenção aos

preconceitos dos terapeutas e às suas expectativas em relação aos

dependentes de álcool, tabaco e outras drogas.

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bem às abordagens psicoterápicas. Pessoas com padrões complexos de uso

de drogas podem ser extremamente difíceis de tratar, já que elas podem estar

sob a influência de efeitos farmacológicos opostos ou superponíveis.”

“Outro ponto importante é a questão da confiança. Muitos pacientes

minimizam o seu consumo de substâncias e omitem fatos relevantes para o

entendimento do caso, e o terapeuta não pode se sentir desafiado e tampouco

desvalorizado, pois isso faz parte do quadro clínico. Por isso, os testes de urina

e o uso do bafômetro (alcoolímetro) são um aspecto importante da estrutura de

tratamento. A aplicação desses testes que averiguam a presença de drogas de

abuso encorajam a honestidade e ajudam a manter o paciente responsável

pelo seu comportamento. A rápida informação sobre o resultado de amostras

de urina positivas ou negativas para drogas auxilia o paciente a sentir que o

terapeuta está preocupado e está monitorando o progresso do paciente em

recuperação. Tal recurso, portanto, deve ser proposto em combinação aberta

com o paciente e sua família, servindo como mais um dos componentes do

tratamento.”

COMENTÁRIOS:

Diante desta entrevista, observa-se: uma visão que considera a

individualidade do paciente, a singularidade de cada caso, a necessidade do

profissional estar familiarizado com o “universo” da dependência química e

suas conseqüências. Se torna então importante, a obtenção de dados

(anamnese) quanto ao estilo de vida do paciente, seu ambiente familiar e

social, sua relação com a família e com a droga.

O profissional identifica que o paciente tende a desenvolver um

comportamento defensivo, o que dificulta o grau de aceitação de ajuda, mesmo

partindo do paciente a procura pelo serviço de intervenção.

A maior familiaridade com o tema ainda permite espaço para esboçar

alguns preconceitos tais como o dependente como manipulador, sedutor e

paciente complicado.

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familiar se faz necessária a fim de obterem-se dados mais objetivos sobre o

paciente.”

“A tolerância do terapeuta também é crucial no que tange às recaídas,

que são freqüentes nesses pacientes. As palavras de apoio e o contato

verbalmente afetivo com eles costumam melhorar o vínculo. Ao contrário da

psicanálise, não se pode ser completamente neutro, costumeiramente tendo-se

que assumir uma postura mais maternal ou paternal, especialmente no início

do tratamento.”

QUESTÃO 2: Quais as barreiras que percebe nesta re lação?

“Sabe-se que a maioria dos dependentes químicos apresenta outras

comorbidades psiquiátricas como Transtornos do Humor e/ou de

Personalidade, o que costuma tornar o trabalho ainda mais difícil. Do ponto de

vista psicodinâmico, também é muito comum que apresentem um padrão de

defesas da linha narcisista de personalidade, que aumentam ainda mais na

vigência da adição. Em minha opinião, esse é um dos maiores complicadores

para estabelecer uma boa relação médico-paciente. São pacientes muito

sensíveis a críticas e, ao mesmo tempo, arrogantes e onipotentes. Por isso, é

fundamental se ter paciência e continência para o seu discurso, que muitas

vezes está afastado da realidade. O reforço positivo, através de elogios, deve

ser utilizado com freqüência.”

“A motivação para o tratamento é um dos pontos centrais que interfere

na relação médico-paciente. Devemos perguntar quais as razões que o trazem

para o tratamento e aceitar que muitas vezes os objetivos deles serão

diferentes dos nossos. Em geral, os acordos são feitos lentamente ao longo do

processo psicoterápico. A falta de motivação para tratar os aspectos

relacionados ao uso de substâncias é uma das principais barreiras para o

tratamento desses pacientes. O terapeuta não pode ser demasiadamente

incisivo quanto a isso, exceto em casos que envolvem riscos. Ao mesmo

tempo, sabemos que não podemos tratar por longo tempo pacientes que estão

consumindo altas quantidades de álcool ou outras drogas, pois não respondem

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QUESTÃO 1. Como encara a relação médico-paciente, q uando se trata de

um DQ?

Relata que “Como tudo na psiquiatria, a primeira coisa que temos que

ter cuidado é para não generalizar as pessoas de acordo com um diagnóstico.

Acredito que cada caso tem a sua história que, somada à sua genética, vai

apresentar uma gama de manifestações psicológicas e comportamentais que

devemos avaliar com muita calma. Enfim, o tratamento do Dependente

Químico deve ser individualizado, assim como na maioria dos outros

transtornos psiquiátricos, uma vez que os problemas variam de gravidade de

acordo com cada paciente, podendo surgir vários tipos de manifestações

clínicas, nem sempre relacionadas à freqüência ou à dose de droga utilizada.”

“Aliás, uma boa avaliação do caso é primordial para se saber como

deveremos proceder nas primeiras consultas, que são vitais. É importante

familiarizar-se tanto com os efeitos comuns como também com os efeitos

adversos das drogas que são abusadas, além de conhecer as suas formas de

aplicação, combinações de seu uso, prevalência de uso e padrões de uso mais

típicos, e não demonstrar preconceito em relação a isso. É também

fundamental realizar uma história médica e familiar pregressa do paciente e

ainda bastante útil ser conhecedor do estilo de vida e da cultura na qual o

indivíduo está inserido, o que pode ser obtido pela própria anamnese ou por

entrevistas subseqüentes. Dessa forma, o clínico poderá melhor compreender

o impacto da "abstinência" dessa cultura quando propuser a retirada da droga e

a retomada de novos hábitos sociais.”

“Desde o início do atendimento, caso não haja alguma emergência

médica, deve-se também estar atento ao vínculo a ser estabelecido com o

paciente. Não é incomum que ele chegue bastante desconfiado, desmotivado

ou mesmo obrigado pelos seus familiares. Por isso, uma entrevista com

perguntas mais abertas e não confrontativas ou preconceituosas geralmente

promove uma diminuição da ansiedade e maior aproximação com o paciente.

Alguns pacientes tendem a minimizar distorcer, ou mesmo negar o seu

consumo de álcool ou drogas. Nesses momentos, uma entrevista com algum

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fazendo uso de algum tipo de drogas e não conseguir, muitas vezes

estabelecer uma relação com estes pacientes, o que faz com que ele os

encaminhe a médicos especialistas, gerando frustração, pois percebe a

necessidade do tratamento de comorbidades.

COMENTÁRIOS:

Observa-se uma visão que prioriza os sintomas psíquicos e físicos do

paciente. Porém, para o médico, o paciente passa a ver a relação como dúbia,

ou seja, que pode proporcionar alívio aos sintomas de abstinência e

comorbidades, mas, também como o censurador/privador, pois o médico

irá ditar regras ao paciente para que este lute contra o prazer que as

substâncias psicoativas podem proporcionar.

Diante do que o profissional relata sentir como “uma certa falta de

paciência” para com estes pacientes, podemos associar com o que antes fora

visto como contratransferência, onde esta pode ser oriunda daquilo que

é inconsciente no médico, mobilizado pela transferência do paciente, afetando

o campo clínico, ou melhor, o tratamento. Porém, podemos observar que este

profissional reconhece suas limitações, a partir de uma auto-análise, e por

vezes já encaminhou pacientes a outros profissionais especialistas e DQ. Há

uma dificuldade na relação, através do viés do médico, que pode ser vista sob

o prisma da frustração e do preconceito (são pacientes mais difíceis, geradores

de decepção e de desafio ao médico, que se coloca no papel de censurador).

Há uma tendência a se observar mais a patologia que o paciente.

ENTREVISTA 2:

Médico psiquiatra com mestrado e doutorado pela UFRGS, formado há

13 anos. Trabalha no Centro de Pesquisa em Álcool e Drogas da UFRGS há

três anos e na edição na área de Dependência Química da Revista de

Psiquiatria do Rio Grande do Sul.

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ENTREVISTA 1:

Médico psiquiatra, não especialista em Dependência Química, 36 anos

de formado, 25 anos de atendimento em Hospital Psiquiátrico e consultório. Há

11 anos atende apenas em consultório, com uma clínica ampla e diferenciada.

QUESTÃO 1. Como encara a relação médico-paciente, q uando se trata de

um Dependente Químico (DQ)?

Relata que quando atende um DQ procura focar e tratar a comorbidade.

Este tratamento inclui medicação e encaminhamento para tratamento

psicoterápico para a DQ. Nas suas consultas procura orientar o paciente sobre

os malefícios da droga de uso e interferência desta no agravamento da

comorbidade e na medicação. Porém, acha muito complicada a manutenção

deste atendimento, por ser este paciente bem mais difícil de aderir ao

tratamento do que aqueles que sofrem de transtornos psiquiátricos. Estes

últimos, até a consciência da doença precisam ser medicados por algum

responsável, e após a aceitação da doença, eles mesmos tomam os

medicamentos por perceberem o alívio que estes promovem. Já o DQ busca

este bem-estar primeiramente nas drogas e ele enquanto médico, que pode

oferecer o conforto para as doenças psiquiátricas pelos medicamentos, passa a

funcionar como um censurador deste prazer. Esta situação complica o vínculo,

pois o torna aquele que dita às regras e o paciente, muitas vezes, como aquele

que desrespeita as regras, por não querer abrir mão do prazer que estas lhe

proporcionam.

QUESTÃO 2: Quais as barreiras que percebe nesta rel ação?

Relata sentir “uma certa falta de paciência” para com estes pacientes,

muitas vezes impondo condições com relação ao uso de drogas. Completa

dizendo que quase que a totalidade da sua população de pacientes jovens está

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conseguinte, quase unicamente como uma forma de resistência inconsciente

do analista.

Os autores não são unânimes quanto à conceituação e a utilização, ou

não, na prática terapêutica, da contratransferência. O que pode ser afirmado é

que na atualidade o termo adquiriu o significado de um fenômeno um pouco

diferente do descrito por Freud.

Na atualidade, predomina entre terapeutas a aceitação do tríplice

aspecto da contratransferência: como obstáculo, como instrumento e como

campo, onde o paciente pode reviver as fortes experiências que originalmente

ele teve. Assim, o fenômeno contratransferencial surge em cada situação

clínica de forma singular e única (ZIMERMAN, 1999).

O lugar estigmatizado do médico como aquele que ocupa o lugar do

saber, tem aqui, novamente, grande repercussão. Ao ocupar este lugar, o

médico é aquele que sabe, e não aquele que sente. Está protegido com

relação aos seus sentimentos para com o paciente.

Portanto, no manejo das reações de contratransferência, o primeiro

problema é o reconhecimento, pelo terapeuta, de sua existência e a tentativa

de identificação tão específica quanto possível. Isto implica contínuo processo

de auto-avaliação e introspecção de parte do terapeuta, à medida que interage

com o paciente, e contínua vigilância de sua possível ocorrência.

VI ENTREVISTAS EXPLORATÓRIAS

. Com o objetivo de fazer uma reflexão no tocante à relação

médico/paciente dependente químico, foram realizadas entrevistas com

profissionais especialistas e não-especialistas em DQ. Buscou-se identificar

aspectos referentes a dificuldades no manejo, atenção no que se refere às

comorbidades e, principalmente, a importância de um diagnóstico respeitando

a singularidade de cada caso.

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relacionamentos anteriores, como também sentimentos oriundos destes papéis

estigmatizados. O paciente dependente químico, além de conflitos anteriores e

papel do doente na relação, sofre o estigma de exclusão social, daquele que

está à margem, sendo isto mais um fator para dificultar o processo

de transferência.

V CONTRATRANSFERÊNCIA

O estudo do fenômeno da contratransferência está intimamente ligado

ao da transferência, de forma que eles são indissociáveis, um não existe sem o

outro, muitas vezes se superpondo, se confundindo. A contratransferência,

oriunda daquilo que é inconsciente no médico, mobilizado pela transferência do

paciente, afeta o campo clínico, ou melhor, o tratamento.

O conceito contratransferência foi introduzido por Freud (1970) em 1910,

em seu trabalho As perspectivas futuras da terapêutica psicanalítica, no qual

refere: “As outras inovações na técnica relacionam-se com o próprio médico.

Tornamo-nos cientes da contratransferência, que nele surge como resultado da

influência do paciente sobre seus sentimentos inconscientes.” (FREUD, op. cit.,

pág. 130).

Segundo Freud (op. cit.), a contratransferência consiste nos sentimentos que

surgem no inconsciente do terapeuta como influência nele dos sentimentos

inconscientes do paciente. Considerou também que a contratransferência é

decorrente de complexos e resistências internas do médico, salientando a

necessidade da auto-análise e, alguns anos depois, da análise didática e das

reanálises periódicas para reconhecê-la e superá-la. Assim, para Freud (op.

cit.), a contratransferência é um obstáculo à análise, que deve ser superado

pelo analista. Destaca o quanto era imprescindível que o analista

“reconhecesse essa contratransferência em si próprio, bem como a

necessidade de superá-la”. (FREUD, op. cit., pág. 130) No entanto, ele a

abordava do ponto de vista do risco dos sentimentos eróticos e, por

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sentimentos hostis para com o médico merecem ser chamados de

"transferência", pois a situação, no tratamento, com muita razão, não

proporciona qualquer fundamento para sua origem.

Para os médicos, é impossível ceder às exigências do paciente,

decorrentes da transferência; aliás, seria absurdo também rejeitá-las de modo

indelicado e, o que seria pior, estarem ou ficarem indignados com elas. "A

transferência é superada mostrando ao paciente que seus sentimentos não se

originam da situação atual e não se aplicam à pessoa do médico, mas sim que

eles estão repetindo algo que lhe aconteceu anteriormente. Por esse meio, a

transferência que, amorosa ou hostil, parecia de qualquer modo constituir a

maior ameaça ao tratamento, torna-se seu melhor instrumento, com cujo

auxílio os mais secretos compartimentos da vida mental podem ser abertos”

(FREUD, 1996, pág. 445).

Importante enfatizar que a doença do paciente não é algo acabado e

tornado rígido, mas algo que ainda está crescendo e evoluindo como um

organismo vivo. O início do tratamento não põe fim a essa evolução; quando,

porém, o tratamento logra o domínio sobre o paciente, ocorre a totalidade da

produção de sua doença concentrar-se em um único ponto - sua relação com o

médico.

De acordo com Zimerman (1999), todos os sintomas de paciente

abandonam seu significado original e assumem um novo sentido que se refere

à transferência; ou apenas tais sintomas persistem, por serem capazes de

sofrer essa transformação. Uma pessoa que se tornou normal e livre da ação

de impulsos instituais reprimidos em sua relação com o médico, assim

permanecerá em sua própria vida após o médico haver-se retirado dela.

Importante enfatizar que o paciente busca no médico uma relação de

ajuda. E, nesta relação, os papéis são estigmatizados: o médico aparece como

o "detentor do conhecimento" e o paciente como o "fragilizado pela doença".

Considerando este contexto, segundo Fulgêncio (2007), o paciente

experimenta uma emoção em relação ao médico, através da qual são trazidos

para o relacionamento médico-paciente sentimentos e conflitos originários de

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IV TRANSFERÊNCIA

Considerando a importância do tratamento ao dependente químico na

busca do restabelecimento do mesmo por sua qualidade de vida mental e

física, faz-se necessário esclarecer aspectos que se tornam barreiras na

relação médico – paciente, relacionadas ao profissional, que contribui

diretamente interagindo no tratamento oferecido. Antes mesmo de iniciar o

tratamento, o paciente tende a criar expectativas diante do processo de

intervenção profissional e, sendo assim, é fundamental abordar o tema

transferência, que ocorre na relação médico-paciente.

A transferência está presente no paciente desde o começo do

tratamento e, por algum tempo, é o mais poderoso motor de seu progresso.

Dela não há indício algum, e com ela não há com o que se preocupar enquanto

age a favor do trabalho conjunto de análise.

Designa, segundo Freud (1996), o processo pelo qual os desejos

inconscientes se atualizam sobre determinados objetos no quadro de certo tipo

de relação estabelecida com eles e eminentemente, no quadro da relação

analítica. Trata-se aqui de uma repetição de protótipos infantis vivida com um

sentimento de atualidade acentuada. A transferência é classicamente

reconhecida como terreno em que se dá a problemática de um tratamento

psicanalítico, pois é a sua instalação, as suas modalidades, a sua interpretação

e a sua resolução que caracterizam este processo, segundo Freud (op. cit.).

É necessário falar em uma transferência positiva e outra negativa. A

transferência de sentimentos afetuosos e dos hostis e tratá-los separadamente.

Ainda de acordo com Freud (op. cit.), os sentimentos hostis revelam-se, via de

regra, mais tarde do que os sentimentos afetuosos, e se ocultam atrás destes.

Indicam, tal qual os afetuosos, haver um vínculo afetivo, da mesma forma como

o desafio tanto como a obediência, significa dependência, embora tendo à sua

frente um sinal "menos" em lugar de "mais". Importante enfatizar que os

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Segundo Ramirez (op. cit., pág.13), ¨quando produzimos estereótipos,

estamos patologizando. Quando patologizamos, desqualificamos. Ao

desqualificarmos, discriminamos. Ao discriminarmos, segregamos. A exclusão,

o estigma, o não reconhecimento da existência, a invisibilidade, matam muito

mais que qualquer doença”.

Embora seja importante reconhecer que o estigma, a discriminação e a

negação estão longe de serem construções individuais, e que se caracterizam

por um alto grau de diversidade e complexidade intercultural, um dos fatores

mais importantes que limitam o nosso entendimento desses fenômenos até

agora, poderá ser menos a sua complexidade inerente do que a relativa

simplicidade das estruturas conceituais existentes.

Para ir além das limitações do pensamento corrente nessa área

precisamos rever nossos entendimentos sobre estigmatização e discriminação

para conceituá-los como processos sociais.

Acima de tudo, precisamos enfatizar que esses processos só podem

ser entendidos em relação a noções mais amplas de poder e dominação.

O estigma desempenha um papel central na produção e na

reprodução das relações de poder e de controle em todos os sistemas sociais,

faz com que alguns grupos sejam desvalorizados e que outros se sintam

superiores. Em última análise, portanto, estamos falando em desigualdade

social.

O médico, por constituir parte da elite intelectual da sociedade, deveria

contribuir para a prevenção de comportamentos inaceitáveis relacionados a

pacientes já estigmatizados pelo próprio Sistema. O que se presencia, no

entanto, em boa parte de Centros de recuperação de drogas é,

frequentemente, a estigmatização desses pacientes, resultando em tratamento

que, além de ferir os princípios de cidadania, os alijam da própria condição

humana.

Entende-se aqui que violência, estigma, discriminação, são

aprendizados e por essa razão podem e devem ser desconstruídos

socialmente, rompendo com processos educacionais anteriores e velhos tabus

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“(...) drogado é uma acusação moral e médica que assume

explicitamente uma dimensão política, sendo, portanto, também

uma acusação totalizadora. O fato de os acusados serem

moralmente nocivos segundo o discurso oficial, pois têm hábitos e

costumes desviantes, acaba por transformá-los em ameaça ao

status quo, logo em problema político (...) A categoria drogado

explicita de imediato, a problemática de patologia individual. O

drogado seria, por definição médica, um doente. A partir daí,

constrói-se todo um discurso sobre a anormalidade do consumo de

drogas e sobre as conseqüências nefastas para o indivíduo e para

a sociedade desse hábito, vício, dependência, etc.” (VELHO op.

cit, pág.60-61).

Segundo Ramirez (2002, pág.12), a relação médico-paciente é uma

produção social, ou seja, é uma relação que, apesar de estabelecida entre

duas pessoas, é construída, mantida e modificada pela sociedade. “Na relação

médico-paciente o desafio é tentar fazer com que a pessoa saia do lugar de

contaminante como aquele que foi marcado pela categoria de acusação, para

potencializar vivências, ações e emoções, como parte desse novo processo de

subjetivação” (RAMIREZ, op. cit.). Para tal, é necessário que o médico

promova a empatia que a chave é aceitação, justamente o contrário da

estigmatização.

No tratamento o médico deve estar preparado, no caso dos usuários

de drogas, para conduzir o relacionamento médico-paciente estabelecendo um

vínculo de confiança mútua. O preparo para compreender o paciente

estigmatizado que manipula sua identidade deteriorada, criando muitas vezes

uma identidade virtual, a visualização da sua capa de defesa de agressividade

ou retração, sua atitude de negação ou ambivalência, o entendimento da

recaída como parte do processo do tratamento, requer do profissional o

despojamento de preconceitos. No caso dos usuários de drogas a relação

médico/paciente ditará o grau de aderência do paciente ao tratamento, a

evolução e eficácia deste.

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transferida a seus usuários. Essa é uma questão central para se compreender o estigma das drogas: o status de ilegalidade da substância é projetado na personalidade do usuário¨ ( Mota, 2005, pág. 01).

. A respeito da noção de estigma, em primeiro lugar, Goffman (2008)

faz uma distinção entre desacreditados e desacreditáveis. A primeira categoria

é referente aos indivíduos que possuem alguma característica distintiva já

conhecida ou imediatamente evidente; a segunda categoria diz respeito aos

indivíduos em que essa característica distintiva não é nem conhecida, nem

imediatamente evidente. Quando a identidade de um usuário de drogas ilícitas

é conhecida publicamente, ele se encaixa na primeira categoria de

desacreditado; quando sua identidade de usuário é preservada, ele é um

desacreditável.

A grande questão colocada por essas duas categorias analíticas é

que quando o indivíduo é desacreditado, ele tem que manipular as tensões

geradas pelo convívio social a respeito do seu estigma; já o indivíduo

desacreditável tem que manipular a informação sobre si, se deseja ou não que

seu estigma seja de conhecimento público, ou seja, a manipulação da

informação pode livrar-lhe da classificação estigmatizadora. Para tanto,

Goffman (op. cit.) identifica várias táticas de acobertamento ou encobrimento

do estigma, para que o indivíduo desacreditável não passe a ser um

desacreditado.

A questão do estigma se estende não somente ao indivíduo

estigmatizado em questão, mas também às pessoas que se relacionam: “diga-

me com quem andas que eu te direi quem és”. O estigma passa a se constituir

em uma relação social, onde o indivíduo recebe tal atribuição negativa, como

uma resposta social a uma determinada característica particular.

Gilberto Velho (1999), um estudioso das camadas médias urbanas

que trabalhou com grupos de usuários de drogas, demonstra com clareza que

tipo de restrições sofre um usuário de drogas que tem sua identidade de

consumidor revelada ao utilizar o conceito de categorias de acusação, neste

caso específico, a de drogado:

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III ESTIGMA E SUBJETIVIDADE NA RELAÇÃO MÉDICO- PA CIENTE

Os gregos criaram o termo estigma para se referir a sinais corporais

através dos quais se procurava evidenciar alguma coisa de extraordinário ou

mau sobre o status moral de quem os representava.

Mais tarde, na Era Cristã, dois níveis de metáfora foram

acrescentados ao termo: o primeiro deles referia-se a sinais corporais de graça

divina; o segundo, uma alusão médica a essa alusão religiosa, referia-se a

sinais corporais de distúrbio físico. Atualmente o termo é amplamente usado de

maneira um tanto semelhante ao sentido literal original, porém é mais aplicado

à própria desventura do que à evidência.

O estigma envolve não tanto um conjunto de indivíduos concretos que

podem ser divididos em duas pilhas, a de estigmatizado e a de normais, quanto

um processo de dois papéis no qual cada indivíduo participa de ambos, pelo

menos em algumas conexões e em algumas fases da vida. O normal e o

estigmatizado não são pessoas, e sim perspectivas que são geradas em

situações sociais durante os contatos mistos, em virtude de normas não

cumpridas que provavelmente atuem sobre o encontro.

Ao longo do Século XX as drogas adquiriram um caráter ilegal. Este

fato influenciou negativamente na identidade pública das pessoas que

continuaram a usá-las a despeito da proibição. Ao longo das décadas foi se

constituindo uma demonização dessas drogas e, conseqüentemente, dos seus

usuários, ou seja, todos os males sociais associados às drogas ilícitas recaíam

sobre os usuários ou sobre as próprias substâncias.

“propõe-se um discurso de demonização das drogas,

centrado predominantemente nas drogas ilícitas, justamente aquelas que representam o menor contingente de usuários no Brasil.(...) Desta forma, concluímos que o termo droga implica numa representação moral da substância, sendo esta automaticamente

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que a porta, que se torna mero instrumento de acesso à doença ¨(ACIOLE,

2003, pág. 104).

Segundo Aciole (op. cit.), o paciente é o indivíduo no qual se exerce o

fazer médico para legitimação do uso do saber médico. É o pólo passivo sobre

o qual se opera uma transformação produzida pelo médico, muitas vezes

negadora de sua subjetividade o que acaba por reduzi-lo a sua dimensão

biológica.

Outra decorrência desta concepção da medicina é a fragmentação do

saber em campos compartimentados, cabendo a cada especialista uma

investigação rigorosa de uma parte do todo. Dentro da noção de especialização

está também justificado o poder da técnica e também da tecnologia,

distanciando mais ainda o acesso ao ser do paciente e tornando a consulta em

si sem valor.

A tal enfoque se propõe uma clínica ampliada, na qual cada caso é um

caso, mas que consegue dialogar e incorporar criticamente outros saberes e

diretrizes, como por exemplo, preocupações com o vínculo. Aciole (op. cit.)

propõe reconhecer a medicina mais como arte do que como ciência absoluta,

constituindo um novo sujeito médico, lembrando que a clínica é soberana ao

responder a necessidade básica humana de ser ouvido e reconhecido na

condição de sujeito portador de singularidades.

A visão utilitarista que decorre do saber objetivo e tecnocrático retira o

espaço da filosofia, pois esta parece não servir para nada. Mas, uma das

funções da filosofia é a análise das condições em que se realizam as

pesquisas e das conseqüências das técnicas utilizadas. Portanto, a filosofia

abre a possibilidade de uma interdisciplinaridade recolocando o problema da

unidade do saber, tornado fragmentado pela ciência moderna positivista, no

qual o homem se tornou o grande ausente da ciência.

Um novo olhar sobre o indivíduo indo muito além de sua dimensão

biológica pode criar novos compromissos de intervenção, novas técnicas e a

aproximação de outras linguagens e saberes como, por exemplo, psicologia,

sociologia e psicanálise. “Lembrar do saber ouvir, antecessor do saber fazer,

romper com o convencional biológico “. (ACIOLE, op. cit., pág. 111)

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prever os fenômenos e, também, poder regulá-los e modificá-los dentro de

limites. Todo médico ao administrar remédios eficazes aos seus doentes

colabora para edificação da medicina experimental. Mas, para diferenciar a

medicina experimental da medicina empirista e fazer com que a primeira

receba o status de ciência, é necessário que ela se baseie no conhecimento

das leis que governam os fenômenos biológicos no ambiente interno do

organismo sadio e doente. Conclui Bernard (REALE; ANTISERI, op. cit.) que a

base científica da medicina experimental é a fisiologia. É através da fisiologia

que podemos explicar os mecanismos das doenças e as ações dos agentes

terapêuticos e tóxicos. Segundo este paradigma, ¨os doentes nada mais são do

que fenômenos fisiológicos em condições novas, que é preciso determinar. As

ações tóxicas e terapêuticas se remetem a simples modificações fisiológicas

das propriedades dos elementos histológicos dos tecidos¨ (REALE; ANTISERI,

op. cit., pág. 309).

Bernard, ao pôr a fisiologia como base da medicina, coloca a medicina

do laboratório como base da medicina clínica. A medicina experimental ocupa

assim o lugar da medicina de observação. A ciência de observação visava a

descobrir as leis dos fenômenos naturais para poder prevê-los, porém sem

poder modificá-los. E a medicina experimental pretende descobrir as leis dos

fenômenos naturais para prevê-los, regulá-los e dominá-los. Aqui o médico

passa a ocupar o lugar de um interventor ativo.

Esta mesma postura de prática intervencionista se mantém até os

nossos dias e desenvolveu ao longo da história, no imaginário social, um papel

para o médico e também para o paciente. Esta é uma das variáveis que

interferem na relação médico-paciente. A forte base nas Ciências Biológicas

faz com que este conjunto de saberes e instrumentos constituam para a

Medicina uma prática profissional intervencionista que retira um problema que

se localiza no corpo. O objeto de atenção do médico passa a ser a patologia:

¨O médico dialoga com a doença que habita o corpo do paciente, e com ela

interage, articula, define, recorta e estabelece sua ação. E não com o sujeito

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Segundo esta lei, a humanidade, da mesma forma que o psiquismo dos

indivíduos, passa por três estágios teóricos: o teológico, o metafísico e o

positivo¨. (REALE; ANTISERI, op. cit., pág.299) No primeiro, os fenômenos são

vistos como produtos da ação direta de agentes sobrenaturais, no segundo os

fenômenos são explicados em função de essências, idéias ou forças abstratas

e o terceiro é o estado físico e definitivo, onde “o espírito humano reconhece a

impossibilidade de perguntar-se qual é a sua origem, qual o destino do

universo e quais as causas íntimas dos fenômenos”. Procura “somente

descobrir, com o uso bem combinado do raciocínio e da observação, as suas

leis efetivas, isto é, as suas relações invariáveis de sucessão e semelhança”

(REALE, ANTISERI, op. cit., pág. 299).

Para Comte, o objetivo da ciência está na pesquisa das leis, porque só

o conhecimento das leis dos fenômenos, cujo resultado constante é o de fazer

com que possamos prevê-los, evidentemente, pode nos levar, na vida ativa, a

modificá-los em nosso benefício . A lei é necessária para prever e a previsão é

necessária para a ação do homem sobre a natureza. Conclui Reale e Antiseri

sobre Comte: “a verdadeira ciência consiste em leis controladas com base nos

fatos, excluindo da ciência toda busca de essências metafísicas, ou seja, toda

tentativa do pensamento humano no sentido de ultrapassar o mundo empírico”.

Ainda dentro do pensamento positivista, Claude Bernard (1813-1878)

apresentou a obra Introdução ao Estudo da Medicina Experimental, com

método de observação e experimento baseado sempre nos mesmos princípios

e variando apenas na aplicação.

Segundo Bernard o homem é fantasioso e, por isto, acreditava, antes da

ciência, que as concepções ideais de sua mente, que correspondiam aos

sentimentos, representavam também a realidade. Então o método experimental

seria a imposição de uma disciplina à fantasia, eliminando hipóteses incapazes

de descrever, explicar ou prever algum aspecto do mundo real. A idéia

experimental é a idéia a priori, que se apresenta sob a forma de hipóteses e

cuja validade se julga submetendo suas deduções ao critério experimental. A

medicina experimental quer conhecer as leis do organismo sadio e doente para

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II Abordagem Filosófica da Medicina Contemporânea

Na Antiguidade grega, a ciência se encontra vinculada à filosofia. A

separação só ocorre no século XVII, quando Galileu introduziu o método

científico, baseado na experimentação e na matematização. Nos séculos

seguintes a nova maneira de abordar a realidade inicia a ruptura com o

pensamento medieval contemplativo e se faz notar no desenvolvimento da

técnica, aliada da ciência no processo experimental. A revolução industrial

(séc. XVII) e as descobertas científicas na Europa repercutiram na sociedade,

transformando-a. Houve um crescimento de cidades, aumento da produção e

riqueza, e sobre este pano de fundo a medicina começou a controlar as antigas

e angustiantes doenças infecciosas.

Segundo Reale e Antiseri (1991), a idéia de progresso humano e social

foi gerada pela pretensão de achar que se possuíam os instrumentos para

resolver todos os problemas humanos. A ciência passou a ser um destes

elementos de solução de problemas, confirmando a idéia de progresso humano

e social da época. Dentre os êxitos da medicina estariam Pasteur e seus

discípulos desenvolvendo a microbiologia, Claude Bernard construindo a

fisiologia e a medicina experimental, além da teoria evolucionista de Darwin.

Como movimento de pensamento surge então o positivismo,

reivindicando o primado da ciência e combatendo as concepções idealistas e

espiritualistas da realidade. Para ele, o único método de conhecimento é o das

ciências naturais, no qual ocorre a identificação das leis causais e seu domínio

sobre os fatos. Conhece-se somente aquilo que as ciências conhecem.

O positivismo afirma a unidade do método e o primado desse método

como instrumento cognoscitivo, além de exaltar a ciência como o único meio

capaz de resolver, ao longo do tempo, todos os problemas humanos. É então

uma época de otimismo fundamentada na certeza de progresso.Auguste

Comte (1798 - 1857) é o iniciador do positivismo francês e o conceito-chave da

sua filosofia é a ¨grande lei dos três estágios¨.

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Quanto aos modelos de relações médico-paciente (propostos pelo

professor americano Roberto Veatch em 1972), temos os modelos 1)

Sacerdotal - baseado na tradição hipocrática e que assume uma postura

paternalista com relação ao paciente, sendo que o médico nesse modelo

assume um papel de poder e autoridade sobre o paciente que se coloca

submisso; 2) Engenheiro - onde traz o paciente responsável pela tomada de

decisões, enquanto o médico é um prestador de serviços; 3) Colegial - que

equipara os papéis na relação médico-paciente e o poder é compartilhado

igualitariamente; e por último 4) o Contratualista - considerando a autoridade

médica e sua responsabilidade pela tomada de decisão e técnicas (MOREIRA

FILHO, 2002). Este último seria o que melhor corresponde à relação médico-

paciente atual, visto também considerar o paciente como ativo no processo.

Como princípios médicos fundamentais temos a não discriminação em

relação ao paciente, a reciclagem constante em benefício do paciente, o

respeito à vida. O médico deve respeitar a si enquanto profissional, aos seus

colegas e aos pacientes. Em nome da ética deve o médico agir, respeitando

critérios, visando o bem comum. É sua postura ética que vai estabelecer a

relação com seu paciente, norteando, desta forma, sua prática (EIZIRIK, 2008).

Segundo Eizirik (op. cit.) “existe na medicina contemporânea um

paradoxo, a crença mágica em aparelhos que mais são da ordem da fantasia

que da realidade” (informação oral). Cyro (1993) diz que as possibilidades de

engano são muitas e a angustia gerada frente a isso faz com que o médico (e a

medicina, conseqüentemente) se baseie em evidências. Seguindo tal reflexão

podemos dizer que atualmente a relação médico-paciente requer posições

ativas, responsáveis, racionais e humanas e, antes de tudo, “o médico de hoje

necessita ser antes de tudo um homem do seu tempo” (EIZIRIK, op. cit.).

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Sérgio Rego (apud CALVO, 2003) diz “até que o processo de

“medicalização” ocorresse, não havia médicos diariamente nos hospitais e

somente os serviços religiosos eram oferecidos diariamente, em especial a

confissão, obrigatória a todos que se internassem” (CALVO, op. cit.).

Muito tempo depois, referindo-se ao ato sintomático no caso Dora, Freud

nos dirá “aqueles cujos lábios calam denunciam-se com as pontas dos dedos;

a denúncia lhes sai por todos os poros”. (FREUD, 1989, pág.78) validando a

importância da escuta médica em relação ao paciente no sentido da

observação utilizada na prática Hipocrática.

Por muito tempo associada à cura quase mágica, a medicina e mesmo o

lugar do médico foi sofrendo modificações. Em sociedades primitivas era o

xamã que, expulsando maus espíritos, trazia o alívio aos doentes. A doença

estava ligada ao castigo sofrido pelos pecadores e o cristianismo seguiu

mantendo essa concepção através da segregação dos leprosos e dos loucos

que eram considerados impuros. O médico tinha uma posição de poder

primeiramente ligado ao espiritual e, secundariamente, às enfermidades

propriamente: “... a tomada de poder pelo médico, se manifesta no ritual da

visita, desfile quase religioso em que o médico, na frente, vai ao leito de cada

doente seguido de toda a hierarquia do hospital: assistentes, alunos,

enfermeiras...” (FOUCAULT, op. cit. pág.64) Será o ritual da visita que no

século XVII demarcara um certo poder ao médico que até então era exclusivo

do religioso.

Em seguida do nascimento do hospital em si, ainda no século XVIII, o

paciente passa então a ser mais investido no sentido econômico. A relação

médica passa a desempenhar um papel num contexto de poder capitalista e a

história da medicina passa a sofrer a pressão das mudanças de relação de

mercado. O capitalismo socializara então uma medicina que até o século XIX

era privada. O corpo fora socializado a partir de um contexto de controle social

sobre os indivíduos como força de produção, de trabalho. (FOUCAULT, op. cit.)

Segundo Scliar (2008), no Brasil, no século XIX, acontecia a criação das

primeiras Casas de Saúde e a reforma da Santa Casa de Misericórdia.

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2

Objetivo do trabalho

O objetivo deste trabalho é analisar as características da relação

terapêutica e suas interferências negativas no processo terapêutico a partir da

perspectiva do profissional que cuida do paciente com dependência química.

O trabalho se delineará através de revisão bibliográfica buscando-se

um entendimento amplo da questão da relação médico-paciente pelo viés do

médico que trata de pacientes com dependência química.

A partir de uma revisão sobre as características desta relação, serão

apontadas as potenciais influências negativas ocorridas no vínculo médico-

paciente dependente químico.

Justificativa: Espera-se que a compreensão das barreiras relacionadas à

postura do médico, seus conceitos e preconceitos em relação ao dependente

possa levar a um posicionamento profissional mais equilibrado gerando menos

frustrações tanto em pacientes quanto em terapeutas.

I Aspectos Históricos da Relação Médico-Paciente

Hipócrates, considerado o pai da medicina, viveu cerca de 300 anos

antes de Cristo e pode-se dizer que foi o primeiro grande observador médico.

(RIBEIRO JR., 2003) Ao atender um paciente que sofria com a “doença da

languidez” conseguiu o que outros colegas tentaram sem sucesso: a cura

daquele paciente deprimido (BRUNINI, 1998). Isso ocorreu em conseqüência

de sua “escuta”, pela sua capacidade de observar o paciente naquilo que ele

desejou contar.

Segundo Foucault (1992), no século XVIII se assinala uma nova prática

e o médico então passa a visitar o doente e a observá-lo sistematicamente e de

forma comparada. No hospital encontravam-se loucos, doentes, devassos,

prostitutas e a função médica de cura e inserção social não ocorria.

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1

INTRODUÇÃO

A relação médico-paciente é uma construção social a partir do encontro

de duas subjetividades: a do médico e a do paciente. O primeiro ocupa o lugar

do saber, e o segundo o objeto de trabalho do saber fazer médico. Existem

duas condições, no momento da clínica, para que ocorra uma situação

dialógica nesta relação. Uma delas é a ciência demandando necessidade de

qualificação, e outra a arte como capacidade de apreensão (ACIOLE, 2003).

Dentre os principais aspectos terapêuticos da relação médico-paciente

destacam-se o conteúdo e o processo. A análise de conteúdo é uma busca de

realidades através das mensagens. Visa ao conhecimento de variáveis de

ordem médicas, psicológicas, sociológicas, históricas, etc., com base em

indicadores reconstruídos a partir de mensagens particulares.

O processo refere-se à dimensão relacionamento interpessoal paciente/

terapeuta. Neste enfoque interacional, os aspectos comunicacionais

introduzem mudanças na maneira de pensar e vivenciar o vínculo. Comunicar

faz parte de um processo que necessita da participação de duas ou mais

pessoas. E este processo recíproco poderá significar mudança e transformação

em alguma direção e mesmo em ambas as partes envolvidas.

O universo da dependência química nos remete à necessidade de tratamento

para o dependente e, no desenvolvimento deste processo, é fundamental o

estabelecimento do vínculo médico-paciente dependente químico. Um vínculo

que se configura de um modo e importância particulares e que pode ter o poder

de influenciar a conduta do paciente configurando a possibilidade de mudança.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO............................................................................................ .... 1

OBJETIVO........................................................................................................ 2

I ASPECTOS HISTÓRICOS DA RELAÇÃO MÉDICO-PACIENTE........... 2

II ABORDAGEM FILOSÓFICA DA MEDICINA CONTEMPORÂNEA......... 5

III ESTIGMA E SUBJETIVIDADE NA RELAÇÃO MÉDICO-PACIENTE.... 9

IV TRANSFERÊNCIA................................................................................ 13

V CONTRATRANSFERÊNCIA.................................................................... 15

VI ENTREVISTAS EXPLORATÓRIAS........................................................ 16

CONCLUSÃO................................................................................................. 23

REFERÊNCIAS............................................................................................ 25

LEITURAS COMPLEMENTARES.................................................................. 29

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ABSTRACT

The biopsychosocial consequences of addiction in the life of the

individual are significant and a major means to intervene in this reality can be

through treatment. Therefore, it is essential to focus on the relationship between

the doctor and patient, pointed the barriers in this regard at the therapeutic

meeting.

This paper is aimed at analyzing the context of the doctor-patient

relationship in history, also focusing on the philosophical approach of medicine

practiced today; analyze the roles stigmatized on the two subjectivities involved,

considering the processes of transference and countertransference.

Beyond the literature search, was conducted exploratory interviews to

obtain data that reflect this reality, thus enabling a comparison between the

theoretical content with practical content. Conclusion: We suggest that doctor-

patient relationship in various aspects are essential for it to occur successfully

and bond facilitates the processing. For the doctor, it is essential to be aware of

the role it plays in this relationship, but also to be attentive to the specific

circumstances of the patient that may cause weakening of this link, such as

ambivalence, relapse and comorbidities.

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RESUMO

As conseqüências biopsicossociais da dependência química na vida do

indivíduo são notórias e um dos principais meios de intervir nesta realidade

pode ser através do tratamento. Desta forma, é essencial enfocar a relação

estabelecida entre o médico e o paciente, destacando as barreiras nesta

relação no momento do encontro terapêutico.

Os objetivos deste trabalho são analisar o contexto da relação médico-

paciente na história, enfocando também a abordagem filosófica da medicina

exercida atualmente; analisar os papéis estigmatizados sobre as duas

subjetividades envolvidas, considerando os processos de transferência e

contratransferência.

Além da pesquisa bibliográfica, foram realizadas entrevistas

exploratórias para a obtenção de dados que retratam esta realidade,

possibilitando assim uma comparação entre o conteúdo teórico com o conteúdo

prático.

Conclusão: Sugerimos que na relação médico-paciente vários aspectos

são imprescindíveis para que a mesma ocorra com êxito e o vínculo facilite o

tratamento. Para o médico, é fundamental estar ciente do papel que ocupa

nesta relação, como também estar atento às situações específicas do paciente

que possam provocar enfraquecimento deste vínculo, tais como ambivalência,

recaída e comorbidades.

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ANTONIETA LIRA E SILVA

LÚCIA HELENA ARAUJO

MÁRCIA CRISTINA HENRIQUE DE SOUZA

ROSA MARIA MARINHO DUARTE MONTEIRO

RÚBIA PAULA DIAS DA SILVA

"Dificuldades na atenção ao dependente químico – bar reiras

na relação médico-paciente relacionadas ao profissi onal."

Trabalho de Conclusão do Curso de Dependência

Quimica Virtual da UNIFESP - Universidade Fe deral

de São Paulo.

Orientador: Prof.Dr.Hamer NastasyPalhares Al ves

DATA DA APROVAÇÃO: _____/_____/_____

NOME DO EXAMINADOR

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ANTONIETA LIRA E SILVA

LÚCIA HELENA ARAUJO

MÁRCIA CRISTINA HENRIQUE DE SOUZA

ROSA MARIA MARINHO DUARTE MONTEIRO

RÚBIA PAULA DIAS DA SILVA

"Dificuldades na atenção ao dependente químico – ba rreiras

na relação médico-paciente relacionadas ao profissi onal."

Trabalho de Conclusão do Curso de Dependência

Quimica Virtual da UNIFESP - Universidade Feder al

de São Paulo

Orientador: Prof. Dr. HAMER NASTASY PALHARES

ALVES.

UNIFESP, dezembro de 2 008.

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO PAULO – UNIFESP

DEPARTAMENTO DE PSIQUIATRIA UNIDADE DE PESQUISA EM ÁLCOOL E DROGAS

CURSO ON-LINE DE ESPECIALIZAÇÃO EM DEPENDÊNCIA QUÍMICA

Dificuldades na atenção ao dependente químico – bar reiras

na relação médico-paciente relacionadas ao profissi onal

DEZEMBRO / 2008