2367841 00036 gramatica do portugues falado ii

728
Volume VII: Novos Estudos Gramática do Português Falado

Upload: claudio-yh

Post on 03-Jan-2016

244 views

Category:

Documents


4 download

TRANSCRIPT

  • 1Volume VII: Novos Estudos

    Gramtica doPortugus Falado

  • USP UNIVERSIDADE DE SO PAULOReitorProf. Dr. Jacques MarcovitchVice-Reitor Prof. Dr. Adolpho Jos Melfi

    FFLCH FACULDADE DE FILOSOFIA,LETRAS E CINCIAS HUMANASDiretorProf. Dr. Francis Henrik AubertVice-DiretorProf. Dr. Renato da Silva Queiroz

    CONSELHO EDITORIAL ASSESSORPresidente: Prof. Dr. Milton Meira do Nascimento (Filosofia)Membros: Prof. Dr. Lourdes Sola (Cincias Sociais)

    Prof. Dr. Carlos Alberto Ribeiro de Moura (Filosofia)Prof. Dr. Sueli Angelo Furlan (Geografia)Prof. Dr. Elias Thom Saliba (Histria)Prof. Dr. Beth Brait (Letras)

    Compras e/ou assinaturas

    Humanitas FFLCH/USP dezembro/1999

    UNICAMP UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINASReitorHermano TavaresCoordenador Geral da UniversidadeFernando GalembeckPr-Reitor de Desenvolvimento UniversitrioLus Carlos Guedes PintoPr-Reitor de Extenso, Cultura e Assuntos ComunitriosRoberto Teixeira MendesPr-Reitor de GraduaoAngelo Luiz CortelazzoPr-Reitor de PesquisaIvan Emlio ChambouleyronPr-Reitor de Ps-GraduaoJos Cludio Geromel

    IEL INSTITUTO DE ESTUDOS DA LINGUAGEMDiretorProf. Dr. Luiz Carlos da Silva DantasVice-DiretoraProf. Dr. Maria Augusta Bastos de Mattos

    DIRETOR EXECUTIVOLuiz Fernando Milanez

    COODERNADOR-GERALCarlos Roberto Lamari

    CONSELHO EDITORIALMembros: Prof. Dr. Luiz Fernando Milanez

    Prof. Dr. Elza Cotrim SoaresProf. Dr. Milton Jos de AlmeidaProf. Dr. Ricardo Luiz Coltro AntunesProf. Dr. Sueli Irene Rodrigues Costa

    FFLCH

    FFLCH/USPPUBLICAES

    EDITORA DA UNICAMPCaixa Postal 6074Cidade Universitria Baro Geraldo13083-970 Campinas SP BrasilTel: (19) 788-1015 Telefax: (19) 788-1097www.editora.unicamp.br

    HUMANITAS LIVRARIA FFLCH/USPRua do Lago, 717 Cid. Universitria05508-900 So Paulo SP BrasilTel: 818-4589e-mail: [email protected]://www.fflch.usp.brSERVIO DE DIVULGAO E INFORMAOTelefax: 818-4612 e-mail: [email protected]

    Endereo para correspondncia

  • Volume VII: Novos Estudos

    1999

    Gramtica doPortugus Falado

    FFLCH/USPPUBLICAES

  • G 771 Gramtica do portugus falado / organizado por Maria Helena de Moura

    Neves. So Paulo: Humanitas/FFLCH/USP; Campinas: Editora daUnicamp, 1999.v. 1 -

    Contedo: v. 7. Novos Estudos

    ISBN 85-86087-45-9 / 85-268-0497-9

    1. Portugus (Gramtica) 2. Portugus (Lngua) 3. Fonologia 4. Mor-fologia 5. Sintaxe I. Neves, Maria Helena de Moura II. Ttulo: NovosEstudos

    CDD 469.5

    Editor ResponsvelProf. Dr. Milton Meira do Nascimento

    Coordenao editorialM. Helena G. Rodrigues

    DiagramaoSelma M. Consoli Jacintho

    CapaAdilton Clayton Santos

    RevisoAutores / Simone Zaccarias

    HUMANITAS FFLCH/USP

    e-mail: [email protected].: 818-4593

    Copyright 1999 daHumanitas FFLCH/USP e da Editora da Unicamp

    proibida a reproduo parcial ou integral,sem autorizao prvia dos detentores do copyright

    Servio de Biblioteca e Documentao da FFLCH/USPFicha catalogrfica: Mrcia Elisa Garcia de Grandi CRB 3608

  • In MemorianGiselle Machline de Oliveira e Silva

  • SUMRIO

    APRESENTAOMaria Helena de Moura Neves ................................................................. 9

    PARTE I GRUPO ORGANIZAO TEXTUAL-INTERATIVA

    Segmentao: uma estratgia de construo do texto falado(Ingedore G. V. Koch) ............................................................................ 29

    A correo do texto falado: tipos, funes e marcas (Leonor LopesFvero, Maria Lcia C. V. O Andrade e Zilda Gaspar O. Aquino) ........5 3

    O relevo no portugus falado: tipos e estratgias, processos e recursos(Luiz Carlos Travaglia) ........................................................................... 7 7

    Funes textuais-interativas dos parnteses (Cllia Cndida AbreuSpinardi Jubran) .................................................................................... 131

    A hesitao (Luiz Antnio Marcuschi) ................................................. 159

    Aspectos basicamente interacionais dos marcadores discursivos(Hudinilson Urbano) ............................................................................. 195

    Aspectos textuais-interativos dos marcadores discursivos de aberturabom, bem, olha, ah, no portugus culto falado (Mercedes SanfeliceRisso) .................................................................................................... 259

  • 8Anatomia e fisiologia dos marcadores discursivos no-prototpicos(Giselle Machline de O. e Silva) ........................................................... 297

    PARTE II GRUPO SINTAXE I

    Estruturas coordenadas aditivas (Roberto Gomes Camacho) ............... 351

    Estruturas coordenadas alternativas (Erotilde Goreti Pezatti) .............. 407

    Os enunciados de tempo no portugus falado no Brasil (Maria LuizaBraga) .................................................................................................... 443

    As construes causais (Maria Helena de Moura Neves) .................... 461

    As construes condicionais (Maria Helena de Moura Neves) ............ 497

    As construes concessivas (Maria Helena de Moura Neves) ............. 545

    PARTE III GRUPO SINTAXE II

    Elementos nulos ps-verbais no portugus brasileiro oral contempo-rneo (Sonia Maria L. Cyrino) .............................................................. 595

    PARTE IV GRUPO DE MORFOLOGIA DERIVACIONAL

    Adjetivos denominais no portugus falado (Margarida Basilio e LaGamarski) .............................................................................................. 629

    PARTE V GRUPO DE MORFOLOGIA FLEXIONAL

    Correlao modo-temporal nas construes complexas: concessivas(ngela C. S. Rodrigues, Odette G. L. A. S. Campos e Paulo T.Galembeck) ........................................................................................... 653

    O uso do futuro do pretrito no portugus falado (Luiz CarlosTravaglia) .............................................................................................. 673

    PARTE VI GRUPO DE FONTICA E FONOLOGIA

    A slaba e seus constituintes (Leda Bisol) ............................................ 701

  • 9APRESENTAO

  • Este o Volume VII da srie Gramtica do Portugus Falado, que temtrazido a pblico os textos discutidos nos seminrios de pesquisa realizadosanualmente pelos pesquisadores do grupo, a partir do final de 1988. A equipe,que abriga pesquisadores de todo o pas, sob a coordenao do Prof. AtalibaTeixeira de Castilho, vem estudando o material do Projeto NURC (NormaUrbana Culta), desde essa poca, com vistas a elaborar uma gramtica de refe-rncia do portugus culto falado no Brasil.

    Os seminrios anuais tm constitudo a instncia maior no processo deproduo dos textos que vm sendo publicados na srie Gramtica do Por-tugus Falado, uma vez que nesses seminrios que os estudos preparadospelos diversos pesquisadores sofrem discusso, uma discusso extremamenterica, em primeiro lugar pela diversidade de formao dos componentes dogrupo, mas, especialmente, pelo modo particular de interao que esse grupodesenvolveu, dispondo-se todos a ouvir todos, e, assim, a relativizar pontos devista, a temperar a rigidez de convices assumidas, e, afinal, a reconhecererros ou inadequaes, sem melindres.

    A sensao da apresentadora e organizadora deste volume que deveser a de todos os outros componentes do projeto que poucas vezes se terconseguido viver uma experincia como a que se viveu no interior do grupo,durante esses anos. Todos entraram no projeto achando que tinham sido convi-dados porque sabiam alguma coisa, e, no entanto, todos fizeram dele umaescola, sentando, estudando, falando, ouvindo, perguntando, respondendo,

  • 12

    pensando e remoendo, e, enfim, aprendendo como nunca. Quanto monstrosagrado se viu, nas atividades do projeto, desvestindo mscaras de altar, dandoa face e abrindo o peito, expondo-se para ensinar, mas tambm para incorporarlies, com sabedoria, e principalmente com humildade afinal, com a sabe-doria da humildade, e seguindo, alis, a postura do comandante, Prof. Ataliba.Todos disseram o que quiseram e ouviram o que lhes era dito, como se aquiloque ouviam fosse sempre o que queriam ouvir. Toda fala foi troca, e a troca foisaber, foi experincia, foi vida. Ningum, com certeza, saiu o mesmo dessaaventura. E, com certeza, muito dificilmente se ter outra oportunidade igual.

    A histria do funcionamento deste projeto est primorosamente traa-da no prefcio de Mary Kato ao volume V da srie, prefcio que compe umlivro do Gnese do projeto: vai do caos (uma barafunda de gregos e troia-nos) ao cosmos ( inspirao para o ttulo desse volume V: Convergncias).

    Isso significa que h pelo menos trs anos a equipe se considera capazde produzir uma obra em que as grandes diferenas inevitveis e benficas encontram um ponto de convergncia, embora (e felizmente) sem fazer redu-o da riqueza de posies e de formao do grupo.

    A diversidade de posies tericas no impede, por exemplo, que seproponham fundamentos tericos e metodolgicos que possam encabear con-fortavelmente a gramtica a ser produzida: afinal com suas diferenas, todosos grupos envolvidos pretendem, a partir do tratamento dos dados da NormaUrbana Culta (NURC) em anlise, no s determinar regularidades como tam-bm especificar o funcionamento dos subsistemas envolvidos na produodos enunciados, considerada, na base, a competncia comunicativa dos falan-tes. A partir dos pressupostos tericos assentados dentro de cada grupo detrabalho, e tambm a partir dos trabalhos produzidos dentro desses grupos, oassessor acadmico do projeto, Prof. Mlton do Nascimento, vem preparandoo captulo da gramtica de referncia que explicitar tais pressupostos. Emdiscusses que ocupam sempre um perodo de cada reunio anual da grandeequipe, esse texto vem sendo ferrenhamente discutido e rearranjado, para quepossa constituir o real registro dos objetivos, das perspectivas e das propostasda obra que ser produzida.

  • 13

    No ponto atual de sua elaborao, o texto do Prof. Mlton assim regis-tra a srie de pressupostos adotados na construo do ponto de vista terico-metodolgico que circunscreveu o objeto de estudo dos pesquisadores:

    1) uma concepo de linguagem como uma atividade, uma forma deao, a verbal, que no pode ser estudada sem se considerar suas principaiscondies de efetivao;

    2) a pressuposio de que, na contingncia da efetivao da atividadelingstica do falante/ouvinte [na produo e recepo de textos] tem-se amanifestao de sua competncia comunicativa, caracterizvel a partir deregularidades que evidenciam um sistema de desempenho lingstico consti-tudo de vrios subsistemas;

    3) a pressuposio de que cada um dos subsistemas constituintes dessesistema de desempenho caracterizvel em termos de regularidades obser-vveis no texto e nas operaes envolvidas em sua produo, lugares onde possvel identificar os indcios do modo de funcionamento do sistema de de-sempenho lingstico dos falantes;

    4) a pressuposio de que, sendo a linguagem uma atividade, uma ma-nifestao dinmica da mente humana, para descrev-la e explic-la precisa-mos de um processo analtico que disponha de categorias processuais.

    Como do conhecimento do pblico, so seis os grupos de trabalhoque vm preparando os textos de base para a produo da gramtica do por-tugus falado culto do Brasil, cada um deles investigando dentro de uma subrea:Fontica e Fonologia; Sintaxe I; Sintaxe II; Morfologia Derivacional; Morfo-logia Flexional; Organizao Textual-Interativa. Esses grupos esto organiza-dos desde o incio do projeto e trabalham, em seu campo e em sua linha, nocumprimento do programa maior estabelecido para toda a equipe e no cumpri-mento das metas traadas.

    No ponto em que se encontram atualmente os trabalhos, cada um dosgrupos tambm tem seu plano preliminarmente assentado para a gramtica dereferncia que o fim ltimo do projeto.

    O Grupo Organizao Textual-Interativa prev uma introduo que ex-plicite a proposta terica, a que devem seguir-se quatro captulos: o primeiro,

  • 14

    sobre a natureza da lngua falada: a especificidade de sua produo, as ativida-des de formulao textual, os fenmenos intrnsecos da oralidade (hesitao einterrupo); o segundo, sobre a organizao tpica: o conceito e as proprieda-des do tpico discursivo, o desenvolvimento tpico da conversao, o par per-gunta / resposta na construo tpica, o relevo no processamento da informa-o; o terceiro, sobre as estratgias de construo textual: repetio, correo,parfrase, insero, segmentao, referenciao e progresso referencial; o quarto,sobre marcadores discursivos: traos definidores e funes textuais-interativas.

    O Grupo Sintaxe I, sob o tema geral A palavra: classes, processos efunes, projeta uma introduo que dar a perspectiva terica, e uma sriede oito captulos, referentes s classes de palavras: nome, artigo, verbo, adjeti-vo, advrbio, pronomes, conjunes e preposies.

    O Grupo Sintaxe II tambm projeta uma introduo terica sobre a ques-to da construo da sentena, seguindo-se quatro captulos: sobre adjuno,sobre padres de predicao, sobre complementao e sobre construes-Q.

    Os dois grupos de Morfologia devem analisar a construo morfolgi-ca da palavra.

    O Grupo Morfologia Derivacional prev um texto em trs captulos quetratar dos seguintes temas: condies de produtividade e condies de pro-duo; condies de produo de processos lexicais especficos: formaes pre-fixadas, formaes compostas, gradao e pejorativos, converso de adjetivos emarcadores conversacionais; condies de produtividade e produo de pro-cessos lexicais categorialmente definidos: a nominalizao de verbos e de adje-tivos, adjetivos deverbais e adjetivos denominais, verbos denominais e verbosdeajetivais.

    O Grupo Morfologia Flexional abriga em seu plano os seguintes estu-dos: da natureza e realizao da flexo do portugus; da expresso das catego-rias gramaticais; da estrutura do vocbulo flexionado; da flexo como proces-so de expresso (as relaes e os valores); da relao entre flexo e sintaxe(concordncia nominal e concordncia verbal); dos valores das formas verbaisflexionadas (na palavra, na frase e no texto); da relao entre flexo e discurso.

    O Grupo Fontica e Fonologia resume sob o ttulo Construofonolgica da palavra uma srie de seis captulos: sobre o acento; sobre aslaba; sobre vocalismo; sobre consonantismo; sobre a entoao, na variaoregional; sobre a viso diatpica dos fenmenos. Esses captulos tambm se-ro introduzidos pelo texto que assenta as perspectivas tericas, prevendo-se,no final deles, a apresentao de um glossrio.

  • 15

    !"

    Os textos que neste volume VII se apresentam foram discutidos nareunio de pesquisa realizada em dezembro de 1995, tendo sido reformuladose definitivamente redigidos durante o ano de 1996. Eles quase completam aagenda firmada de cada um dos grupos, chegando praticamente ao fim o cum-primento do programa estabelecido para essa fase bsica de produo dos es-tudos sobre os quais se vai consolidar a Gramtica do Portugus Falado doBrasil, que se far a seguir. Entretanto, verificadas algumas lacunas em deter-minados subcampos da investigao necessria a essa consolidao, o trabalhoda equipe mantm-se em curso, prevendo-se, pois, dentro de um ano, a publi-cao do volume VIII, que ser o ltimo da srie.

    O Grupo Organizao Textual-Interativa apresenta oito textos. Cincodeles contemplam especialmente estratgias de construo do texto falado: asegmentao, a correo, o relevo, os parnteses, e a hesitao. Trs outros secentram no estudo dos marcadores discursivos, num aprofundamento da an-lise j apresentada no volume VI da srie. O ltimo contempla um dos fen-menos intrnsecos da oralidade: a hesitao.

    A segmentao como estratgia de construo do texto falado tratadano texto de Ingedore G. V. Koch, que objetiva examinar, com base no corpuspartilhado do PGPF, as diferentes formas de articulao tema-rema emprega-das pelos falantes da norma culta do portugus brasileiro, bem como descreveros matizes de sentido que cada uma delas, quando posta em ao, viabiliza. Anfase especial vai para aquelas formas em que, em virtude de deslocamentosde constituintes, ocorre algum grau de segmentao sinttica do enunciado,casos em que o falante opta pela utilizao de estratgias de tematizao e derematizao. O estudo mostra que, em termos da articulao tema-rema, parti-cularmente em se tratando da lngua falada, existe, ao lado de casos de plenaintegrao sinttica (construes no-marcadas, em que o rema, portador deinformao nova, sucede naturalmente ao tema, que veicula a informao dada),uma srie de padres expressivos em que se pode falar de segmentao e/ou dedeslocamento de constituintes. A segmentao , ento, entendida com qual-quer tipo de alterao da ordem no-marcada, devida extrao, ou mise-en-relief, de um constituinte do enunciado, dando origem a construes de temaou rema marcados. A partir da noo j corrente de que a ordem dos constitu-intes que seria de esperar por razes de ordem sinttica freqentemente in-fringida por motivaes de ordem funcional, o trabalho focaliza, dentre a mul-tiplicidade de funes possveis, aquelas que se afiguram mais relevantes.

  • 16

    O texto que estuda a correo como estratgia de construo do textofalado de autoria de Leonor Lopes Fvero, Maria Lcia C. V. O. Andrade eZilda Gaspar O. Aquino. Operando com a noo de texto como produto quecongrega e sinaliza o processo de produo e interao, o trabalho investiga acorreo como estratgia de construo textual. Definida como procedimentoempregado pelos interlocutores para suprir dificuldades e inadequaes emer-gentes durante o processamento discursivo, a correo examinada no s apartir da dinmica interacional que se reflete diretamente nos aspectos lings-ticos e enunciativos, mas tambm quanto a sua operacionalizao, os princi-pais tipos de marcas prosdicas e/ou verbais encontradas para indicar a refor-mulao e as funes estabelecidas. No artigo discutem-se, ainda, os possveislimites entre correo, parfrase, repetio e hesitao, procedimentos revela-dores do carter criativo da atividade conversacional, que exige, constante-mente, ajustes e reajustes por parte dos interlocutores na busca de cooperaoe intercompreenso.

    O texto de Luiz Carlos Travaglia estuda o processo de estabelecimentode relevncia no texto falado, buscando determinar os tipos, estratgias e re-cursos desse processo, alm de suas funes. Relevo considerado o fen-meno de o falante dar destaque a determinados elementos do texto quando oconstri e formula. Considera-se que o relevo: a) pode incidir sobre elementosunitrios do texto, ou sobre um conjunto deles, ou sobre um tipo de elemento;b) pode ser positivo (os elementos so colocados em um plano de destaque) ounegativo (h uma espcie de ocultamento dos elementos), o que afeta a per-cepo do interlocutor. Esse fenmeno inclui fatos que tm sido tratados comocontraste entre figura e fundo, ou primeiro e segundo planos, organizao dasinformaes em essenciais e secundrias, relevncia pragmtica de uma situa-o ou de algo no texto para a situao presente ou para um ponto de refern-cia, fatos de focalizao.

    Estudam-se os seguintes recursos de estabelecimento de relevo: a) osrecursos fnicos: entonao, altura da voz, silabao, velocidade da fala, alon-gamento, msica de fundo; b) os recursos lxicos: o uso de itens lexicais quefuncionam como expletivos ou cujo semantema implica destaque de elemen-tos do texto; c) os recursos morfolgicos e categoriais: o aspecto, o tempo; d)os recursos sintticos: topicalizao, repetio, uso de oraes principais cujosentido implica destaque do que lhes est subordinado, uso de oraes reduzi-das ou desenvolvidas, uso de oraes adjetivas; e) o uso de parnteses no texto;f) o uso de marcadores conversacionais; g) a mudana de cdigo (dialetos eregistros); h) os recursos estruturais, como a posio dos elementos dentro dos

  • 17

    segmentos textuais. Quanto s funes do relevo, observa-se que a bsica darproeminncia, derivando da vrias outras funes: enfatizar, intensificar, marcarum sentido especial, estabelecer contraste, reforar argumentos, marcar im-portncia dentro da estrutura ideacional do texto e marcar foco informacional.

    As funes textuais-interativas dos parnteses so tratadas por ClliaCndida Abreu Spinardi Jubran, que apresenta uma classificao das funestextuais-interativas dos parnteses, com base nos critrios de desvio tpico ede introjeo dos processos formulativo e interacional no texto. O trabalhomostra que, ao longo de um contnuo, que leva em conta graus variveis dodesvio da centrao tpica e da presena de dados da situao enunciativa nasinseres parentticas, so estabelecidas quatro classes de parnteses, de acor-do com o elemento focalizado predominantemente por eles: (a) elaboraotpica do texto; (b) locutor; (c) interlocutor; (d) ato comunicativo.

    O estudo da hesitao, de autoria de Luiz Antonio Marcuschi, tem comoobjetivo mostrar que os estudos formais da lngua so redutores quando idea-lizam os materiais analisados, eliminando, por uma suposta irrelevncia, as-pectos tipicamente discursivos tais como a hesitao. Ele se baseia na idia deque, embora tpica da fala, a hesitao no irrelevante como fenmeno lin-gstico. De tal modo, dizer que a hesitao faz parte apenas do uso e no dosistema formal da lngua tomar a lngua como uma entidade que existeem si e por si. Contudo, no se pode isolar, de um lado, um objeto tpico dalngua, a frase, e de outro, um objeto do uso da lngua, o discurso: ambosesto interligados e se codeterminam funcionalmente. A hesitao vista comoparte da competncia comunicativa em contextos interativos de natureza oral,e no como uma disfuno do falante. Defende-se que ela desempenha papisimportantes na fala (papis formais, cognitivos e interacionais) e que umaatividade textual-discursiva que atua no plano da formulao textual. Tambmse defende que a hesitao no se acha aleatoriamente distribuda, mas obede-ce a alguns princpios gerais de distribuio e serve como indicao de organi-zao sintagmtica da lngua. Ela constitui uma amostra de que, se o princpioda linearidade fundamental no uso da lngua, ele no pode ser entendidocomo simples seqenciao ininterrupta de enunciados da esquerda para a di-reita. Produzida tanto no nvel suprassegmental (pela prosdia) como no nvelsegmental (com elementos formais da lngua), a hesitao a presena deatividades discursivas na materialidade lingstica, evidenciada numa trans-crio fiel da fala.

    Hudinilson Urbano estuda aspectos basicamente interacionais dos mar-cadores discursivos com o objetivo especfico de observar suas subfunes,

  • 18

    propriedades e comportamentos interativos salientes. O estudo se apia empesquisa maior sobre os marcadores e se centra nos marcadores que, em pes-quisa anterior (publicada no volume VI da srie), foram classificados funcio-nalmente como basicamente orientadores da interao.

    Os aspectos textuais-interativos dos principais marcadores discursivosde abertura no portugus culto falado so estudados por Mercedes SanfeliceRisso. O trabalho parte de um assentamento de traos definidores dos marca-dores discursivos, em geral, a ttulo de suporte para a investigao do padrode prototipicidade dos quatro marcadores de abertura (bom, bem, olha e ah)em questo, examinados preliminarmente sob a tica dos traos categoriaisestabelecidos. A parte central do estudo ocupada pela caracterizao da fun-o de abertura promovida por esses marcadores na articulao interna do paradjacente pergunta-resposta e em outras instncias de organizao tpica dotexto falado. Aspectos funcionais bsicos diferenciadores de seu foco na estru-tura (inter)pessoal e ideacional do discurso so examinados luz das relaescom as respectivas fontes lexicais homnimas, sem estatuto de marcador. Des-dobramentos e deslocamentos dessas diferenas so depreendidos na dinmi-ca da tessitura textual-discursiva. A natureza e a distribuio dos aspectos ge-rais apurados oferecem elementos que auxiliam na diferenciao tipolgicaentre as modalidades dos inquritos analisados.

    Valendo-se dos critrios propostos em Risso, Silva e Urbano (1995)Giselle Machline de Oliveira estuda, como marcadores no-protpicos, as for-mas: etc... e tal, (comparadas a formas similares, possveis alternantes taiscomo e tal e coisa, e tudo (o) mais); por exemplo, (comparada a como porexemplo, e um exemplo); digamos (vamos dizer (assim) digamos assim), as-sim.

    Os resultados so compatveis com o modelo da teoria dos conjuntossubjacente ao trabalho. O elemento encabeado por por exemplo (o exemplifi-cante) prototpico: concreto, objetivo, real e disponvel. Pelo contrrio, osmarcadores de procura de elementos como digamos, como assim, no soprototpicos e coocorrem com elementos abstratos, subjetivos e novos. Coo-correm tambm com hesitaes, evidenciando dificuldades de processamentodo elemento e indicando uma funo de preenchimento de espao vazio naconversa durante esse processamento.

    As partculas de expanso etc. e tal (e as outras alternantes), tendem afechar enumeraes de elementos concretos e objetivos. Descartou-se a hip-tese de que sejam majoritariamente um produto de esquecimento moment-

  • 19

    neo dos elementos da enumerao, em favor da hiptese alternativa de que apartcula de expanso serve como coringa para enumeraes de pouca rele-vncia.

    Assim e digamos se assemelham, mas enquanto o digamos acumulaoutras funes alm da principal, o assim, que de procura de um elemento,exerce apenas essa funo. Malgrado essa diferena, parece haver certa distri-buio complementar entre esses dois MDs, em relao a regies do pas estu-dadas e aos dois sexos. Se for tomado o verbo como medula espinhal do enun-ciado, os marcadores assim e digamos so encontrados quase que exclusiva-mente direita. Alm desse forte condicionamento estrutural, os fatores dis-cursivos examinados justificam a posio direita, que prpria dos segmen-tos novos (qualidade que caracteriza esses dois MDs). J o exemplificante,que anuncia elemento disponvel, est situado preferencialmente na fronteiraanterior ao sujeito.

    Confirma-se a pouca importncia discursiva do sujeito. O fato de ainformao do complemento tender a ser nova e a do sujeito ser velha nobasta para explicar essa propriedade: a varivel status informacional no atuoucom tanta fora que desse conta dessa quase impossibilidade da presena detais MDs nos sujeitos.

    A tendncia de os MDs estudados no se aglutinarem a outros nomostrou relao com a no-prototipicidade. Outro resultado foi que a demar-cao prosdica dos no-prototpicos foi menor do que a dos MDs tomadosglobalmente (68,9%), fato que se pode creditar tendncia que esses MDs tmde no serem to marginais. O exame incipiente da fronteira entre MDs ealguns elementos no-MDs fez encontrar algumas diferenas dignas de estu-dos posteriores, como a especializao de funo do digamos que, diferente deseu alelo digamos, mas no evidenciou nenhuma fronteira drstica.

    O Grupo Sintaxe I, que investiga o uso dos diversos itens da lngua,partindo de sua organizao tradicional em classes, rene, neste volume, seusestudos sobre as diversas subclasses de conjunes, em nmero de seis.

    As tradicionalmente denominadas conjunes coordenativas so estu-dadas por Roberto Gomes Camacho e Erotilde Goreti Pezatti.

    Roberto Camacho estuda as estruturas coordenadas aditivas, com opropsito de fornecer uma classificao tipolgica dos usos da relao de con-juno, a partir de um exame empreendido nos diferentes nveis da gramticado portugus falado. Na investigao dos usos diversos do juntivo e, o estudoassumiu um compromisso terico com o enfoque funcional-cognitivo, que os

  • 20

    trata como casos de ambigidade pragmtica. O universo da investigao constitudo por uma amostragem do corpus mnimo do Projeto de Gramticado Portugus Falado, que sofreu tratamento quantitativo, mediante o uso dealguns programas do pacote Varbrul. O texto se organiza em duas partes. Naprimeira, examina-se a coordenao de termos, em sua manifestao prototpica,estrutural, e em sua manifestao discursiva. Na segunda parte, examina-se acoordenao de oraes em estruturas simtricas e assimtricas, descrevendo-se os processos de juno que envolvem tambm procedimentos discursivosde natureza pragmtica. Observou-se que a necessidade de identidade semn-tica perpassa o juntivo e nos nveis sinttico, textual e pragmtico em que atua,incluindo-se os nveis da coordenao de termos e de oraes. Se extrema-mente visvel no nvel da juno simples de contedo, por outro lado no nvelepistmico e no ilocucionrio a visibilidade da identidade semntica se enfra-quece, mantendo-se, porm, como inferncias e dedues a partir de esquemasreferenciais e cognitivos. A principal direo para a qual apontam os resulta-dos a confirmao de que o juntivo e atua: no nvel do contedo, como ummero coordenador de idias independentes; no nvel semntico, como ummecanismo para a construo do texto; no nvel pragmtico como um meca-nismo interacional, seja com valor epistmico seja com valor ilocucionrio.Em razo disso, reconheceu-se a pertinncia do conceito de ambigidade prag-mtica para um mapeamento adequado dos usos do juntivo e numa gramticaunificada, mas de condicionamentos multifuncionais.

    O estudo de Erotilde Pezatti fornece uma descrio do comportamentosinttico-semntico das conjunes coordenativas alternativas no portugus fa-lado, ou, mais especificamente, da relao de disjuno, tradicionalmente deno-minada de alternncia. O fundamento terico da anlise das conjunes o fun-cional, particularmente a Gramtica Funcional de Dik. O texto se organiza emcinco partes. Na primeira discute-se a questo da disjuno, de uma perspectivalgica e de uma perspectiva lingstica, procurando-se mostrar que o processona linguagem natural nem sempre coincide com o que se prev na linguagemformal. Como um reflexo da primeira, na segunda parte discutem-se os doistipos semnticos de disjuno, a inclusiva e a exclusiva, e as condies possveispara sua manifestao nos enunciados do corpus. Devido ao fato de a disjunose dar em diferentes nveis, examina-se, na terceira parte, a coordenao de ter-mos e a coordenao de oraes separadamente. Na quarta seo, afinal, exami-nam-se os usos pragmticos adicionais das ocorrncias da conjuno ou.

    As tradicionalmente denominadas conjunes subordinativas soestudadas por Maria Luiza Braga e Maria Helena de Moura Neves.

  • 21

    Maria Luiza Braga trata as oraes de tempo (na sua grande maioriaintroduzidas por quando), cotejando, inicialmente, o tratamento concedido pelaabordagem gramatical tradicional e pela vertente funcionalista desenvolvidapor Sandra Thompson. Consideram-se os dois argumentos apresentados poressa vertente para classificar as oraes de tempo como hipotticas, como nopropriamente subordinadas. Examinam-se algumas propriedades formais des-sas oraes: realizao do sujeito, ordem e correlao entre tempo e modo.Quanto realizao do sujeito, leva-se em considerao a posio, da orao ea correferncia entre o sujeito da ncleo e o da hipottica. Aps todos os cruza-mentos, conclui-se que as oraes de tempo tendem a explicitar foneticamenteo sujeito, comprovando-se, portanto, a hiptese de Haiman de que a explicita-o constitui um trao das chamadas adverbiais. Quanto posio, mostra-seque a ordem no marcada a anteposio, um dos critrios alm do tipo deconectivos que distingue as oraes de tempo nos registros falado e escrito.Quando nessa posio, as oraes de tempo criam moldura temporal para oseventos que so codificados pela ncleo. Outras funes podem agregar-se aessa, tais como a sinalizao de incio de pargrafo (novo episdio) e a codi-ficao de tpico. As oraes pospostas posio marcada so principal-mente aquelas que funcionam como adendos, alguns dos quais exibem umafuno metalingstica, isto , parafraseiam um termo mencionado previamente.Verifica-se que muitas ocorrncias, quando descontextualizadas, admitem aalterao da ordem. Uma vez, porm, que se considere o contexto maior, aalterao da ordem ou se v totalmente bloqueada (casos de tpicos e adendos)ou , no mnimo, problemtica. Por fim, quanto correlao tempo-modo,conclui-se que as oraes de tempo tendem a exibir um leque mais ou menosvariado de combinaes possveis.

    Maria Helena de Moura Neves apresenta o estudo de trs tipos de cons-trues adverbiais: as causais, as condicionais e as concessivas. Nos trs casos,examinam-se construes do corpus selecionado do NURC, buscando-se dis-cutir a noo de condicionalidade lato sensu e de causalidade lato sensu, emrelao ao complexo de domnios envolvidos na produo dos enunciados.Assim, ao lado da reflexo sobre os esquemas lgico-semnticos implicadosnas relaes causal, condicional e concessiva, busca-se uma definio prag-mtica dos enunciados que se constroem sobre essas relaes, envolvendo-seespecialmente a questo da distribuio da informao, qual se vincula aquesto da ordem. O estudo das construes complexas considera, afinal, osdiferentes domnios de interpretao semntica, conduzindo-se dentro da pro-posta funcionalista de organizao dos enunciados em camadas, e abrigando-se, ainda, no modelo mais amplo que estabelece as metafunes da linguagem.

  • 22

    No estudo das relaes stricto sensu causais, verificou-se que as cons-trues causais com a orao causal anteposta (representativamente as comcomo) e as construes causais com a orao causal posposta (representativa-mente as com porque) constituem diferentes organizaes das relaes cau-sais, do ponto de vista informativo: as primeiras trazem a causa em funotemtica, representando basicamente informao compartilhada, enquanto asoutras trazem a causa em funo remtica, representando basicamente infor-mao nova. Considerando-se as diferentes camadas de constituio da frase(Dik, 1989) das construes causais, separam-se dois grandes grupos, o dascausais de enunciado (em que se relacionam predicaes ou proposies) e odas causais de enunciao (em que se relacionam atos de fala). Verifica-se,ainda, que as construes causais encontradas no NURC apresentam predomi-nantemente predicaes no-tlicas (86%) e no-dinmicas (70%). Predomi-na o tempo presente, especialmente nas predicaes de estado (mais de 80%,tanto nas oraes nucleares como nas oraes adverbiais), o que tem relaocom o carter no-tlico das predicaes.

    No estudo das relaes stricto sensu condicionais, parte-se do esquemacondicional bsico se x, y, em que se estabelece um possvel mundo x, que serverdade apenas no caso em que y for verdadeiro nesse mundo x. Nessa defini-o se enquadram todos os esquemas condicionais, tanto os eventuais como osfactuais e os contrafactuais. Considera-se que os esquemas eventuais constitu-em os hipotticos prototpicos, porque neles que se est em dvida sobre omundo A, estando, pois, a orao condicional se x fazendo uma adio hipot-tica e provisria ao estoque de conhecimento partilhado entre falante e ouvin-te. Essas construes por excelncia hipotticas so as mais utilizadas pelosfalantes do corpus do NURC (66,66%). evidente que, quando o falante lanauma predicao condicionante para uma outra predicao, de se esperar quemais freqentemente esteja servindo ela como hiptese a ser verificada, j que,para condies resolvidas (que implicam causalidade, seja afirmada, como nocaso das factuais, seja negada, como no caso das contrafactuais), a lngua dis-pe de outros recursos mais efetivos, como a prpria expresso de relaescausais.

    No estudo das construes concessivas, considera-se que, no seu es-quema bsico (embora p, q), a relao lgico-semntica que se estabelece ade frustrao da implicao pressuposta, que pode ser uma implicao causalou uma implicao condicional: em uma construo concessiva, a causalidadepressuposta na orao concessiva (p) negada na orao ncleo (q), e a condi-o pressuposta em (p), por sua vez, no suficiente para evitar (q), ou seja,

  • 23

    ineficaz para evitar o cumprimento de (q). A frustrao da implicao causal /condicional pressuposta est diretamente relacionada aos esquemas envolvi-dos no jogo de polaridade em que (q) positivo frustra a pressuposio negati-va, e (q) negativo frustra a pressuposio afirmativa. Alm disso, verifica-seque, se, por um lado, so noes de natureza lgico-semntica que relacionamas construes concessivas causalidade e condicionalidade, por outro lado, a sua natureza essencialmente argumentativa que as aproxima das constru-es adversativas. Tanto as construes concessivas quanto as adversativasso essencialmente dialgicas, ou seja, envolvem a presena de dois locutores,e o jogo argumentativo entre falante e ouvinte implica, em muitos casos, ummisto concessivo-adversativo. justamente essa natureza argumentativa e di-algica das construes concessivas que explica o fato de tais construescodificarem com maior freqncia a oposio no domnio epistmico e nodomnio conversacional, com baixa freqncia no domnio do contedo.

    Dentro do Grupo Sintaxe II, que produz estudos de sintaxe formal, estevolume apresenta o trabalho de Sonia Maria L. Cyrino sobre os elementosnulos ps-verbais no portugus brasileiro oral contemporneo. O estudo partedas concluses sobre os padres de complementao do portugus falado en-contradas em Dillinger et alii (1996), que levam os autores a propor que have-ria um fundo sinttico para a frase do portugus, que S-V-O. Continuandoa anlise, o estudo focaliza o no-preenchimento ps-verbal, mostrando que ocomplemento nulo no homogneo. Desse modo, as ocorrncias do comple-mento nulo so classificadas em elipse de VP, objeto direto nulo e objeto indi-reto nulo. Os dados utilizados so os mesmos j codificados em Dillinger etalii (1996), com algumas alteraes na escolha dos grupos de fatores e comampliao do corpus a fim de abranger todas as capitais.

    O Grupo de Morfologia Derivacional estudou os adjetivos denominaisno portugus falado. O trabalho apresentado, de autoria de Margarida Baslioe La Gamarski, investiga, em duas subseces, a formao e as caractersti-cas de adjetivos denominais no portugus falado. Na primeira parte, focali-zam-se questes gerais relacionadas formao e s funes de adjetivos de-nominais, determinando-se algumas condies gerais de produtividade e deproduo de adjetivos denominais no portugus falado. Na segunda parte, fo-calizam-se anlises numricas especficas, e cotejam-se resultados relativos aadjetivos denominais, com resultados prvios obtidos para adjetivos deverbaisno que tange s ocorrncias de adjetivo em posio adnominal ou predicativanos diferentes tipos de inqurito do corpus pesquisado. Foram objeto de anli-se apenas as formaes consideradas regulares, isto , as formaes fonolgica

  • 24

    e semanticamente transparentes. Dentre os resultados obtidos, destaca-se oque faz concluir que a formao de adjetivos denominais apresenta funoprimria denotativa, sendo a predicativa uma funo de carter secundrio ecircunscrita a processos particulares correspondentes a especificaes de car-ter semntico, ao contrrio do que ocorre na formao e no uso dos adjetivosdeverbais, que apresentam sobretudo funo predicativa.

    No Grupo de Morfologia Flexional, produziram-se dois textos, ambossobre tempos verbais.

    ngela C. S. Rodrigues, Odette G. L. A. S. Campos e Paulo T. Galem-beck estudaram a correlao modo-temporal nas construes complexas con-cessivas. Investiga-se a manifestao formal das relaes que se estabelecementre as oraes do complexo concessivo, um dos complexos subordinativosque no incluem estruturas encaixadas. A anlise dos dados coletados nos in-quritos do corpus baseia-se em duas hipteses fundamentais: 1. Existe corre-lao entre o valor das construes concessivas e o esquema modo-temporalempregado para expresso desse valor. 2. Existe correlao entre os conecto-res e o jogo modo-temporal que se estabelece nas construes concessivas.

    Luiz Carlos Travaglia investigou o uso do futuro do pretrito no por-tugus falado. Nesse estudo, a partir da observao do corpus, prope-se umvalor bsico para o futuro do pretrito, que o de posterioridade, do qual deri-vam os demais valores, sejam de natureza temporal, sejam de natureza modal.O valor temporal se subdivide em dois, cronolgico e polifnico, e o valornocional se subdivide em quatro, que so condio, possibilidade, polidez edesejo. Quantificando-se o uso da forma com estes valores em inquritos doprojeto NURC, verifica-se que os falantes a utilizam muito mais com valoresnocionais do que com valores propriamente temporais. Dos valores nocionais,entre os quais esto os usos tradicionalmente chamados de modais, a maiorfreqncia para condio, seguindo-se possibilidade, polidez e desejo. Dosvalores temporais, apenas o cronolgico apareceu no corpus, no havendonenhuma ocorrncia do polifnico. O estudo revela que descrever o futuro dopretrito como uma forma verbal que marca futuro em relao a um momentodo passado, entendendo-se esse valor temporal separado dos chamados valo-res modais, no uma descrio que encontre uma generalizao para todos osvalores da forma. Parece mais conveniente descrev-lo como uma forma verbalcuja funo fundamental no funcionamento textual dentro da lngua marcarposterioridade, derivando da todos os valores propostos no estudo ou tradi-cionalmente levantados. Portanto, essa forma seria, antes de tudo, um seqen-

  • 25

    ciador de situaes dentro do texto, com uso tambm relacionado tipologiatextual.

    O Grupo de Fontica e Fonologia apresenta o estudo de Leda Bisolsobre os constituintes prosdicos da slaba, que discute, inicialmente, os prin-cpios de composio da slaba bsica, apresentados em forma de rvore, dosquais se depreende o padro silbico do portugus. Segue-se o desenvolvimentoda idia de que o mapeamento da slaba tem como ponto inicial a identificaodos ncleos, e, por ordem, o mapeamento do onset e, finalmente, da coda.Certas operaes como apagamento do elemento no-silabado e epntese, con-sideradas como processos de legitimao de consoantes extraviadas, merecemespecial ateno, em virtude de a aplicao de uma ou outra propiciar varia-es silbicas. Admitindo-se que a silabao um processo contnuo, dispon-vel em qualquer etapa da derivao, a anlise, fundamentada nos princpiosgerais da teoria, busca dar conta tanto das slabas que se encaixam no padrocannico como das formas variantes.

    #$%

    Este volume traz o resultado dessa srie de pesquisas que acima seresumiram, constituindo o repositrio de dois anos de investigao das diver-sas equipes, mas ele tem, ainda, um significado muito especial dentro da hist-ria da vivncia do grande grupo. Dedicados a suas investigaes, como se decada um dependesse a gramtica referencial do portugus falado culto do Bra-sil, no entanto todos os colegas de trabalho do Projeto GPF desenvolveram umnotvel esprito de unio, enriquecendo a interao pessoal e criando uma co-munidade de fortes sentimentos. Isso no apenas se deveu amizade que,naturalmente, cada vez mais foi unindo a todos, indiscriminadamente, mas sedeveu, muito especialmente, ao papel de alguns elementos dotados de especialfora de aglutinao e brilho pessoal, que funcionaram como plos intensifi-cadores de relaes positivas.

    Falo, especialmente, de Giselle Machline de Oliveira, que transitavacomo preferida, tanto para simples papos como para atuao em pesquisa,dentro de todos os grupos. Todos sempre achavam que tinham o que aprendercom ela, e esperavam dela, inclusive, lies de vida, distribudas, semnegaceamento, a cada frase, a cada palavra, a cada gesto e atitude. de suagrande amiga Yonne Leite, que to bem a conhecia, um depoimento em que acuriosidade cientfica e o esprito de grande mestra que Giselle possua bem seevidenciam: biloga que ela era, no teve dvidas em, l pelos anos 70, provi-

  • 26

    denciar uma laringe de boi ou de vaca? para que o seu grupo de estudos defontica, dirigido pela Yonne, pudesse observar o funcionamento das cordasvocais. Nesse mesmo depoimento, outra notvel caracterstica de nossa Giselle sua grande capacidade de liderana tambm encontra comprovao: Yonne,recm-chegada dos Estados Unidos, queria converter todos ao gerativismo,mas, sob a liderana da Giselle, tudo terminou num grupo de sociolingstica,que, instigado por ela, ouvia antroplogos, socilogos, demgrafos, abrindo-se sempre a novas indagaes.

    De Giselle, um outro amigo, Hudinilson Urbano, diz que tinha sensi-bilidade e carinho flor da pele. E isso foi o que, mais que tudo, nos marcou.Foi ela que simbolizou a dor da perda que o grupo teve com o passamento docolega Fernando Tarallo, em 1994: a fora de sua dor era bem a amostra doquanto ela era o prprio grupo. Agora estamos ns editando este volume VIIda Gramtica do Portugus Falado em homenagem a Giselle Machline deOliveira, extraordinria cientista, colega, amiga, mulher e me (como lhechama o Hudinilson), falecida em 2 de abril de 1996. Faz parte do livro oltimo trabalho que ela produziu e apresentou dentro do grupo, trabalho quetive o privilgio de debater, no nosso seminrio de 1995, em Campos de Jordo.Preparado para publicao por sua grande amiga Maria Luiza Braga, ele estaqui enriquecendo este volume VII, e adiando para o prximo volume a grandelacuna que agora se instalar no mbito das produes do grupo.

    Na prpria homenagem que aqui lhe fazemos, com toda a nossa forade amigos e admiradores cativos, vai notar-se que ficar faltando aquela fibraque s uma homenagem que ela prpria Giselle encabeasse conseguiriater. Afinal, na amizade no se herda, e no somos mais que plidos discpulos,que, acima de tudo, a ela agradecemos as inesquecveis lies de carter e devida que nos deu.

    Maria Helena de Moura Neves

  • &'()*

    +'&'+,*-./()0(12*,()'(*3

  • 4)+5),(./65)4('(7+*8)9,4('./8()0(:18

    Ingedore G. V. Koch(UNICAMP)

    *$%

    O presente trabalho insere-se no temrio previsto no Projeto Organi-zao textual-interativa no portugus falado no Brasil, a saber, no item 3.1 Estratgias de construo. Essas estratgias fazem parte do subsistema dedesempenho textual, pedra angular do sistema de desempenho lingstico (cf.Nascimento, 1993).

    sabido que cada lngua apresenta uma variedade de formas de ex-presso, abrindo-se, desta maneira, para o falante um amplo espao de formu-lao, isto , a possibilidade de escolha entre um leque de opes possveis.Assim, a construo dos sentidos no texto depende, em grande parte, das esco-lhas que ele realiza.

    As vrias possibilidades de efetivar, nos textos, a articulao tema-rema constituem um desses leques de escolhas significativas. Este estudo ob-jetiva, portanto, examinar as diferentes possibilidades de articulao tema-rema, com nfase especial naquelas em que, em virtude de deslocamentos deconstituintes, ocorre algum grau de segmentao sinttica do enunciado ca-sos em que o falante opta pela utilizao de estratgias de tematizao e derematizao (ou seja, de deslocamento do tema ou do rema) , bem comodescrever as nuances de sentido que cada uma delas, quando posta em ao,viabiliza.

    Os conceitos de tema e rema em questo so aqueles postulados pelosautores da Escola Funcionalista de Praga (Dane, Firbas, Sgall, entre outros),

  • 30

    ou seja: do ponto de vista funcional, cada enunciado divide-se em (pelo me-nos) duas partes tema e rema , a primeira das quais consiste no segmentosobre o qual recai a predicao trazida pela segunda. Isto , tem-se um seg-mento comunicativamente esttico o tema oposto a outro segmentocomunicativamente dinmico o rema, ncleo ou comentrio. No se trataaqui apenas de um critrio posicional (posio defendida, como se sabe, pormuitos lingistas), mas de um critrio funcional, fortemente relacionado pro-sdia do enunciado (portanto, verificvel especialmente na fala) e, sob muitosaspectos, associado s noes de dado e novo.

    No dizer de Ilari (1992: 25), a Escola Funcionalista de Praga desen-volve em suma uma lingstica da fala (...) e insiste no fato de que se podemencontrar regularidades, que autorizam tentativas de organizao e descrio,mesmo no nvel da orao realizada (utterance). Ora, ao analisar oraes efe-tivamente realizadas, e no apenas oraes que sirvam de exemplo de boaformao sinttica, constata-se que, enquanto unidade comunicativa, a oraoserve aos locutores para realizar uma dupla funo: a de estabelecer um elocom a situao de fala, ou com o texto lingstico que a precedeu, e a de veicu-lar informaes novas. Assumindo tal posio, tomaremos como unidadebsica de anlise o enunciado ou a unidade comunicativa (Marcuschi, 1986:62)1, embora, como ser ressaltado mais adiante, uma construo com temamarcado tenha, em muitos casos, a funo de delimitar segmentos tpicos ouindiciar a introduo ou a mudana de tpicos discursivos.

    Em termos da articulao tema-rema, particularmente em se tratandoda lngua falada, tem-se, como mostram Koch & Oesterreicher (1991), ao ladode casos de integrao sinttica plena (construes no-marcadas, em que orema, portador de informao nova, sucede naturalmente ao tema, que veiculaa informao dada), uma srie de padres expressivos em que se pode falar desegmentao e/ou de deslocamento de constituintes. A segmentao seraqui entendida como qualquer tipo de alterao da ordem no-marcada, devi-da a uma ciso ou modificao na ordem no-marcada dos constituintes, comvistas extrao ou mise-en-relief de um constituinte do enunciado, dandoorigem a construes de tema ou rema marcados. Dane (1967) j afirmavaque a ordem dos constituintes que seria de se esperar por razes de ordemsinttica freqentemente infringida por razes de ordem funcional.

    Existem, assim, duas grandes modalidades de seqenciao tema-rema:

    1. seqncias em que ocorre plena integrao sinttica entre elementos temti-cos e remticos, sem qualquer tipo de segmentao (construes no marcadas),que constituem o padro, sendo comuns oralidade e escrita;

  • 31

    2. construes com tema ou rema marcados (em conseqncia do emprego deestratgias de tematizao e de rematizao), com graus mais reduzidos deintegrao sinttica, devidos ocorrncia de segmentao, nos termos acimadefinidos.

    Objetivamos, neste trabalho, aprofundar o estudo da segunda modali-dade. Sero examinados casos de deslocamento (anteposio e posposio) deelementos temticos e remticos. Em se tratando de tematizao, sero exami-nados especialmente os exemplares de temas marcados representados por SNs.No se tratar, portanto, de todos os casos de anteposio de constituintes,como, por exemplo, a anteposio dos diversos tipos de construes adverbi-ais, a no ser que estas venham a assumir a forma de sintagmas nominais no-preposicionados (SPs sem cabea, na terminologia de Kato, 1989) ou a confi-gurar o tipo especfico de tematizao marcada derivada da anteposio doque, nas gramticas tradicionais, se costuma denominar adjunto adverbial deassunto (cf. item 1.1, caso 1).

    Levar-se-o em conta, na anlise, os seguintes critrios: a. grau de inte-grao sinttica do enunciado, nos moldes postulados por Koch & Oesterreicher,1991; b. procedimentos lingsticos utilizados para realizar a tematizao ou arematizao (marcas); c. funes discursivas das construes resultantes desegmentao.

    Esta pesquisa situa-se, pois, na interface sintaxe-discurso.

    4;

  • 32

    1.1 No que diz respeito aos graus de integrao sinttica, na acepo deKoch & Oesterreicher (1991), podemos destacar os seguintes casos:

    1. construes com tematizao marcada, introduzidas por expresses do tipoquanto a..., no tocante a..., no que diz respeito a..., com referncia a.... etc., queso comuns s modalidades oral e escrita, sendo mais freqentes na comunica-o relativamente formal. Alm do enunciado que introduz o presente item,vejam-se, por exemplo:

    (1) Em relao s bancadas, os quercistas sentem maiores dificuldades noSenado. Um grupo de senadores chegou a convidar o governador Luiz AntonioFleury Filho (SP) para uma conversa anteontem, em Braslia.(FSP, 19/3/93,1-9).

    (2) ... e ns temos boas orquestras tambm ( )... inclusive na Tupi temos boasorquestras e temos... e no que tange a nossa msica popular eu acho que::agora a televiso est abrindo as portas... para a nossa msica popuLARcoisa que o rdio no faz...

    (NURC/SP D2 333: 335-339)

    (3) ento... sobre o problema do primrio... essa reforma do primrio e ginsioeu no estou muito a par no, n?

    (NURC/SSA DID 231:17-19)

    Ilari (1992: 58) acrescenta a esse tipo de construo enunciados intro-duzidos mediante expresses como por falar em..., a propsito de..., jque voc tocou em / j que estamos tocando em... e outras, bastante co-muns na interao informal face-a-face.

    2. construes com tema marcado, em que ocorre a anteposio de um ele-mento do enunciado com funo sinttica bem definida, que depois confir-mada pela presena de um elemento de retomada no interior do comentrio.

    Segundo Lambrecht (1981), a coocorrncia de um nome e de um pro-nome anaforizado nas construes deslocadas a manifestao formal de umprincpio funcional: a codificao de uma relao tema-propsito na estruturade superfcie do enunciado.

  • 33

    Riegel, Pellat & Rioul (1994) afirmam que a informao veiculadapela frase analisa-se em uma parte conhecida, o tema e uma parte nova, ocomentrio (...). Um constituinte destacado em incio de frase e retomado porum pronome desempenha o papel de tema. Fala-se, ento, em tematizao.

    Blasco (1995), por sua vez, acusando de reducionistas as anlises pura-mente temticas ou discursivas, procura mostrar a importncia de se levaremem conta as propriedades morfossintticas dos elementos que entram nessasconstrues e, em especial, de se distinguir entre deslocamentos para diante doverbo e deslocamentos para depois do verbo, j que, para ela, tanto a posiocomo a forma morfolgica e a funo sinttica do elemento deslocado soindissociveis de seu valor informacional. Tais questes sero retomadas maisadiante. Limitamo-nos, por ora, a apresentar alguns exemplos do caso em tela:

    (4) ... ele vai ao jogo de futebol com o tio... porque o Nlson.... fins de semanaele estuda ento:: quase no sai com a gente...

    (NURC/SP D2 360: 1356-1358)

    (5) ento o Japo... ele... desde o seu incio...((interferncia de locutor aciden-tal)) desde o seu incio... ele tinha... ele contava como fora fundamental dassuas cidades-colnias... os dois fatores ...

    (NURC/RJ EF 379: 53-56)

    (6) esses Bicudos ... parece-me que um deles foi para:: regio de Itu ... e o outroentrou... para o vale do Paraba...

    (NURC/SP DID 208: 551-553)

    (7) como assim? no entendi a sua dvida por exemplo o::... lemingue toda vezque tem superpopulao eles vo para o mar e:: se matam aos montes...(NURC/SP D2 343: 1466-1468)

    (8) esse problema de puxar pela criana --- Ah, no deve puxar pela criana-- eu acho que isso no funciona muito

    (NURC/SSA DID 231: 93-95)

    Cabe observar que, quando o elemento de retomada , como no exem-plo (8), um pronome demonstrativo ou indefinido como isto, isso, aquilo, tudo,etc., ele remete, freqentemente, a seqncias significativas expressas ou su-

  • 34

    bentendidas no contexto precedente, que nem sempre so fceis de delimitarcom preciso.

    3. construes com tema marcado, sem retomadas pronominais, isto , comelipses (categorias vazias), mas em que a funo sinttica, no enunciado, doelemento tematizado , em geral, bem definida:

    (9) bebida alcolica... eu gosto muito (0) ... sabe?(NURC/RJ DID 328: 773)

    (10) mas eu:: ahn merenda escolar eu tenho pouca noo (0)...(NURC/RJ DID 328: 510-511)

    (11) ... eu no viajo nem num outro carro acima de oitenta ou noventa... de velo-cidade... a Kombi d pra fazer isso (0) de modo que eu vou tranqilo

    (NURC/SSA D2 98)

    (12) Olinda ningum mora (0)... ningum diz l que eu moro... no... diz lque eu pernoito

    (NURC/REC D2 05: 1094-1096)

    (13) as comidas baianas eu gostei muito (0) sabe?(NURC/RJ DID 328: 167-168)

    (14) ...ento a menopausa... ::... ns vamos notar uma diminuio considerveld/dos hormnios... dessas glndulas mamrias (0) ...

    (NURC/SSA EF 049: 62-64)

    Casos dos tipos 2 e 3 so extremamente comuns em nosso corpus, nostrs tipos de inquritos, com o elemento tematizado exercendo as mais varia-das funes sintticas no enunciado. H exemplos em que os dois tipos estoco-presentes, como em:

    (15) ... mas o campo deles eu acho que (0) est muito mais saturado do que onosso... tanto que:: ... eu conheo ...em:: advogados que eles esto traba-lhando como ...auxiliares na nossa prpria empresa entende?...

    (NURC/SP D2 62: 1199-1203)

  • 35

    Em outros casos, temos a coexistncia dos tipos 3 e 1, como se podeverificar no exemplo (3) acima.

    4. construes com tema livre (tema pendens, hanging topic), anteceden-do uma seqncia oracional, sem explicitao do nexo sinttico e/ou lgico-semntico:

    (16) agora H. ah:: filme... gua-com-acar -- digamos assim -- para a gente vercertas coisas que a gente v:: americanas principalmente... antes A Moreni-nha n?

    (NURC/SP D2 333: 779-781)

    (17) ... o direito... o fenmeno jurdico... voc olha... o fenmeno jurdico ... atra-vs de uma perspectiva...

    (NURC/REC EF 33)

    Em (17), acumulam-se dois segmentos tematizados, o primeiro odireito um hanging topic e o segundo o fenmeno jurdico do tipo 2,com as peculiaridades que sero apontadas no item 1.2.

    5. construes com deslocamento para o final de um elemento do enun-ciado que, no interior deste, introduzido apenas por meio de um pronome oude uma categoria vazia. Trata-se de um procedimento bastante produtivo, emque o SN deslocado convalida, precisando-o melhor, ou chamando a atenosobre, o referente da forma pronominal ou da categoria vazia, desambigizandoa mensagem e facilitando a compreenso. Lambrecht (1981) chama a atenopara a importncia, no francs no-standard, dessas construes, que denomi-na antitpicos, exemplificadas, entre muitas outras, pelo grito de guerra deAstrix: Ils sont fous, ces romains. Vejam-se os seguintes exemplos, extra-dos do nosso corpus:

    (18) L1 e... depois volto para casa mas chego j apronto o outro para ir para aescola... o menorzinho... e fico naquelas lides domsticas...

    (NURC/SP D2 360: 157-159)

    (19) ... ento os ingleses esto importando os filas naciona/brasileiros... Para...amansarem isso2 que lindo a contribuio do Brasil para a paz ((risos) --

  • 36

    no digo entre os povos mas pelo menos entre os ces -- para amansar os cesde guarda... ingleses que eram muito ferozes...

    (NURC/SP D2 333: 1057-1062)

    Na terminologia de Blasco (1995), temos aqui o deslocamento paradepois do verbo. Segundo a autora, nesses casos, o elemento lexical deslocadopara depois do verbo sempre uma espcie de lembrete (rappel) lexical,referencial e sinttico. Para ela, o referente do sintagma deslocado no podeser pressuposto: ser sempre um referente conhecido e dado pelo contextoanterior. Acontece, porm, que, em muitos casos, o referente, mesmo tendosido mencionado ou indiciado, de alguma forma, no contexto anterior, difcilde determinar, de modo que o uso desse tipo de construo tem por fim, justa-mente, deixar claro para o interlocutor, precisando-o melhor, o referente deque se trata, como o caso em (18).

    6. construes em que se justapem os dois blocos de informao, sem qual-quer ligao sinttica. Por exemplo:

    (20) e os amigos... nada... (embora se trate de um exemplo criado, so constru-es extremamente comuns na fala espontnea)

    (21) porque a telenovela... como feita aqui um gnero ... que o estrangeiro... oestrangeiro... de bom nvel intelec/intelectual que chega ao Brasil... se ena-mora das boas novelas bem entendido ento Gabriela ... conversei com umprofessor francs que disse que jamais isso veria nada parecido em Paris...que achava a televiso que se fazia l... do ponto de vista ficcional... era...infinitamente pior... porque... eles no tem:: eles/ eh em matria de fico soos velhos filmes no ?

    (NURC/SP D2 333: 385-394)

    Poder-se-ia, assim, definir os seis tipos aqui apresentados por meio dacombinao dos seguintes parmetros:3

  • 37

    >8'

    CASO direo do desloc. ligao sinttica pres. de pron.sombracaso 1 esquerda explcita ou inexistente sim/nocaso 2 esquerda explcita simcaso 3 esquerda no explcita-intuvel nocaso 4 esquerda no h nocaso 5 direita explicta ou intuvel sim/nocaso 6 sem deslocamento no h no

    1.2 Quanto aos procedimentos lingsticos utilizados, podem-se, pois, arro-lar os seguintes:

    1.2.1 deslocamento direita do SN extradoa. com presena de uma forma pronominal no lugar do elemento extrado;b. sem a presena de qualquer forma pronominal marcando o lugar do elemen-

    to extraposto (categoria vazia).

    1.2.2. deslocamento esquerda:a. com o uso de expresses tematizadoras (exs. 1 a 3);b. com retomada do elemento tematizado no interior do enunciado (exs. 4 a 8);c. sem retomada do elemento tematizado no interior do enunciado (exs. 9a 14);d. atravs de mera justaposio, acompanhada de entonao especfica (exs.20 e 21).

    Nos casos de deslocamento com retomada do elemento tematizado, interessante examinar a natureza do elemento deslocado (funo sinttica ecategoria sintagmtica), bem como a do elemento utilizado como repetidore, ainda, as diferenas que ocorrem conforme os vrios casos.

    1. Quanto funo sinttica do elemento deslocado (co-indexado):a. sujeito:(22) ... a glndula mamria... como vocs esto vendo... ela representa a

    forma de uma semiesfera... de uma semiesfera...(NURC/SSA EF 049: 41-42)

  • 38

    (23) ento a minha de onze anos... ela supervisiona o trabalho dos cinco...(NURC/SP D2 360: 61)

    b. sujeito da subordinada:(24) medicina voc sabe que (0) prtica

    (NURC/SSA DID 231: 145)

    (25) ... a Air France a gente s ouve falar que (0) d prejuzo...(NURC/RJ D2 355: 1203-1204)

    c. complemento:(26) inclusive o tal pato no tucupi eu achei (0) muito ruim ((rindo)) sabe...

    (NURC/RJ DID 328: 140-141)

    (27) mas eu... ahn... merenda escolar eu tenho pouca noo (0)(NURC/RJ DID 328: 512)

    (28) doce em calda ... eu no vi (0) no...(NURC/RJ DID 328: 287-288)

    d. complemento da subordinada:(29) essas outras peas que eu tenho assistido eu no acho que o pblico se

    manifestasse assim aplaudindo (0)(NURC/SP DID 234: 116)

    e. adjunto (indexado posio no-V-argumental), dando origem a SPs semcabea:(30) Paris eu no pago hotel... Paris... eu fico na casa de um amigo... aparta-

    mento de um amigo...(NURC/RJ- D2 335: 83)

    (31) Drama j basta a vida(NURC/SP DID 234: 155)

  • 39

    (32) o Amazonas impressionante o nmero de frutas(NURC/RJ DID 328: 85)

    2. quanto categoria sintagmtica do elemento deslocado:a. SN simples ou complexo: veja-se, por exemplo, (27), (28), (29), (30)b. pronome pessoal ou ditico:

    (33) eles tambm eles comem muitas coisas...(NURC/RJ DID 328: 171)

    (34) Olhe isso eu repito (0)...(NURC/REC EF 337: 140)

    (35) ... isso eu j estou sabendo a causa (0)(NURC/SP D2 343: 625)

    Caso interessante o seguinte, que parece ir contra as regras de ana-forizao, j que o pronome vem antes de seu referente, ou seja, age catafori-camente:

    (36) L. ... inclusive o pato no tucupi eu achei muito ruim... sabe... eu no gos-tei realmente... achei ruim demais... no... no sei se por que no... eles acham aquilo maravilhoso... n... mas pro meu gosto [Doc.como ... voc sabe? ]

    L. o pato assim... ele vem o pato cozido feito uma espcie de canja...(NURC/RJ DID 328: 140-147).

    Talvez se pudesse classific-lo como um deslocamento direita, masno me parece ser este o caso. Seria algo como: Nesse prato (pato no tucupi)o pato vem cozido... ou Ele (o pato) vem cozido.

    c. SP:(37) De primeira classe hoje em dia aqui ns temos poucas 0

    (NURC/SSA D2 98: 194)

  • 40

    d. SP sem cabea:(38) ... o Amazonas impressionante o nmero de frutas...

    (NURC/RJ DID 328: 90-91)

    3. Quanto categoria sintagmtica do elemento co-indexado interno ao enun-ciado: embora se costume dizer que o caso mais comum a retomada atravsde um pronome-cpia ou pronome-sombra (pessoal, demonstrativo, partitivo),so mais freqentes em nosso corpus as retomadas atravs da repetio in-tegral ou parcial do prprio elemento lexical anteposto, como foi tambm cons-tatado por Koch (1992) e Callou, Moraes, Leite, Kato et al.(1993) e se podever nos exemplos abaixo:

    (39) ... ento a salada pro... pro pessoal de Buenos Aires a salada se resume aalface e tomate...

    (NURC/RJ DID 328: 231-232)

    (40) Doc. a que se deve esse hiato que o senhor mencionou?Inf. o qu?Doc. esse hiatoInf. esse hia::to olha um pouco difcil de se estabelecer assim:: a ...

    causa desse hiato porque ... o...essa... () o Orfeu do Carnaval se euno::estou bem lembrada da data... mas me parece que foi nummomento...

    (NURC/SP D2 333: 698-704)

    (41) no... tu vs... por exemplo... o peixe ... peixe aqui no Rio Grande eutenho impresso que se come peixe exclusivamente na Semana Santa...

    (NURC/POA D2 291: 25-26)

    (42) um arquiteto que se forma, o salrio inicial de arquiteto (es)t em tornode quatro mil e quinhentos cruzeiros...

    (NURC/RJ D2 335: 265-267)

    Questo interessante, que j tem sido objeto de estudos na rea da sin-taxe (cf. por exemplo, Kato, 1989) e na interface sintaxe/discurso (cf. Pontes,

  • 41

    1987), a do SP sem cabea: em sendo o elemento tematizado um adjuntoadverbial introduzido por preposio, ao operar-se o deslocamento para a es-querda, a preposio , com grande freqncia, omitida na fala. Isto me leva adiscordar de Ilari (1992: 56), quando afirma haver uma compulso parapreposicionar o tpico quando falta um pronome-sombra no comentrio(oque explicaria, inclusive, o uso do objeto direto preposicionado), mesmo por-que tal uso fica praticamente limitado linguagem escrita ou fala altamenteformal.

    Relevante lembrar, como o faz tambm Blasco (1995: 53), que oselementos lexicais deslocados para diante do verbo, mesmo que j tenhamsido mencionados no contexto precedente, nem sempre correspondem a enti-dades dadas, no sentido de informao velha, de modo que se faz precisodistinguir entre retomada lexical e retomada referencial.

    H casos, por exemplo, em que se antepe ao verbo um SN genrico,que depois retomado no interior do enunciado por um pronome ou um SNdefinido, que refere membros da classe, sendo, pois, ao mesmo tempo, novo eprevisvel, devido relao semntica que mantm com o SN j mencionado,como em (43):

    (43) como assim? no entendi a sua dvida por exemplo o::... lemingue todavez que tem superpopulao eles vo para o mar e:: se matam aos montes

    (NURC/SP D2 343: 1466-1468)

    Outras vezes, o SN anteposto retomado apenas parcialmente (cf.ex.42); ou, ento, expande-se, por ocasio da tematizao, um SN presente nocontexto imediatamente anterior (em exemplos como O motor novo; ummotor novo, ele necessita de um tempo de amaciamento). Pode ocorrer, tam-bm, a tematizao de um elemento lexical que designa um domnio de refe-rncia (frame), sendo o elemento de retomada um dos elementos desse dom-nio (em exemplos do tipo O nibus, o pneu estava furado.), isto , o elementode retomada pode remeter a algum conhecimento pressuposto pelo SNtematizado. Tambm aqui, o elemento deslocado , ao mesmo tempo, novo eprevisvel, em funo do nexo semntico que mantm com um elemento pre-cedente4.

    H, ainda, casos como o do ex. (17), em que o hanging topic odireito , em seguida, especificado por outro elemento tematizado o fen-meno jurdico , sendo este retomado no interior do enunciado.

  • 42

    Interessante tambm o exemplo (44) abaixo, em que o SN complexotematizado retomado por outro elemento tambm tematizado, no caso, odemonstrativo aquilo:

    (44) aquelas matrias todas que publicam ali aquilo at eu coleciono (0) (NURC/SP D2 255: 1176-1177)

    Outro caso em que o elemento tematizado no veicula necessariamen-te informao dada aquele em que dois enunciados so ligados por conecti-vos semnticos. Reinhart (1980) defende a posio de que, ao relacionaremdois enunciados, os conectivos semnticos abrem a possibilidade de se intro-duzir, no tema (marcado) do segundo, informao nova. Seria o caso de:

    (46) L1 agora eu vou por isso s... porque eu tenho que fazer esse negcio evou aproveitar pra uma coisa que h muito tempo desejava ver...que oMaquin...

    L2 Maquin...L1 ... tem uma visita gruta do Maquin... porque Ouro Preto eu j

    conheo j tive l... Congonhas tambm... de modo que minha pre-tenso agora essa...

    (NURC/SSA D2 98: 110-117)

    Contudo, a informao aqui introduzida nova apenas com relao aocontexto imediatamente precedente: levando-se em conta que o tpico dessesegmento viagens e que o locutor est falando de Maquin, local turstico doEstado de Minas, Ouro Preto e Congonhas fazem parte do mesmo frame oudomnio de referncia.

    >?

    Vimos acima que, ao lado das seqncias em que h integrao plenaentre elementos temticos e remticos, sem segmentaes ou retomadas prono-minais as construes no-marcadas, que constituem um padro neutro emrelao a oralidade/escrita tm-se os procedimentos de tematizao marcada,alguns tambm comuns aos textos falado e escrito (em geral aqueles em que se

  • 43

    verifica maior integrao sinttica!), outros tpicos apenas da modalidade oral.Pode-se dizer que, de modo geral, ao recorrer s construes com tema marcado,o falante seleciona um elemento (estado de coisas, propriedade, relao, coorde-nada espacial ou temporal, indivduo ou grupo de indivduos etc.) que desejaativar ou reativar na memria do interlocutor e sobre o qual seu enunciado deve-r lanar nova luz, para apresentar a seguir algo que considera desconhecido poreste, que deseja enfatizar ou com o qual pretende estabelecer algum tipo decontraste. por esta razo que o elemento tematizado desempenha papel rele-vante no processamento pragmtico-cognitivo do sentido, na medida em queesta forma de organizao determinada quer por questes ligadas continuida-de ou mudana de tpico, quer por fatores como facilitao do processamento dotexto, interesse, relevncia, expressividade, necessidade de ganhar tempo para oplanejamento da parte restante do enunciado, entre outros.

    Vejamos um exemplo em que, atravs da tematizao, se introduz umnovo segmento tpico:

    (46) Doc. agora aquela zona ali do Paran... eu tenho parentes l... as sobre-mesas deles voc teve oportunidade de...

    L. ah... sobremesas... no... ns no ficamos muito tempo em Curitibans... fomos a/ viemos.... quando ns voltamos da Argentina nsfizemos pernoite s em Curitiba e viemos...entende?

    (NURC/RJ DID 328: 252-258)

    Em (47), por sua vez, a tematizao do SN bebida alcolica na respos-ta do informante assinala a mudana de tpico induzida pela pergunta do doc.

    (47) Doc.e bebida alcolica?L. bebida alcolica... eu gosto muito... sabe... e domingo tambm eu

    s vezes me dou ao luxo... eh...s vezes a gente pe assim umvinhozinho ... ento a gente toma vinho de acordo tambm com otipo de comida... se carne... aqueles hbitos que a gente tem... se carne vinho tinto... se peixe a gente usa vinho branco...

    (NURC/RJ DID 328: 772-778)

    O exemplo(4), aqui retomado como (48), um exemplo em que, atra-vs da tematizao, ocorre a retomada de um tpico anterior (Nelson, maridoda locutora, havia constitudo o tpico de um segmento anterior do dilogo):

  • 44

    (48) ... ele vai ao jogo de futebol com o tio... porque o Nlson... fins de sema-na ele estuda ento:: quase no sai com a gente

    (NURC/SP D2 360: 1356-1358)

    Em (49), temos um caso semelhante: o documentador apresenta umquadro tpico derivados do leite cujos diversos itens a locutora passa adesenvolver para, no final, atravs de um aposto resumitivo, reiterar o tpi-co que lhe foi oferecido, sob forma de um antitpico:

    (49) Doc. h um derivado da:: do leite... que (assenta) bem em regimes...dependendo do tipo n?...

    L. o queijo de Minas... eu o uso:: de manh s vezes eu como umpedao de queijo Minas... e quando eu h quando eu sinto que voupassar (um) perodo do dia... fora de casa que eu no vou chegar atempo pra comer meio-dia... eu ento levo um pedao de queijo deMinas... o que eu uso e/ uso tambm muita ricota...

    Doc. ah t...L . ... gosto muito de ricota... sa/ iogurte s vezes eu em vez de tomar

    caf com leite... eu tomo iogurte ou coalhada tambm... que eugosto... sabe?... eu gosto muito de coalhada... iogurte esses produ-tos derivados do leite eu... mas s... queijos brancos... eu s comoqueijos brancos

    (NURC/RJ DID 328: 610-623)

    Outra funo que costuma ser atribuda tematizao de estabelecercontraste entre a informao veiculada pelo elemento tematizado e algumainformao apresentada anteriormente ou qual a primeira se ope. Veja-se,por exemplo:

    (50) L2 ... os outros mesmos no se incumbem de coloc-la no lugar dela?L1 bom... com uns TApas... s vezes ela se colocaL2 ahnL1 [mas com palavras ela no se coloca porque elaL2 [ ahnL1 aumenta a voz com os irmos... no ? ...

    (NURC/SP D2 360: 258-234)

  • 45

    Funo interessante aquela apontada por Blasco (1995: 52). Segundoela, o deslocamento do SN para diante do verbo funciona como um dispositivoque permite retomar, em posio associada ao sujeito, um elemento lexicalcom todo o seu peso referencial. Assim, de uma parte, o elemento lexical sedesloca no interior do discurso de uma posio construda pelo verbo regente(argumental) a uma posio no construda (no-argumental); de outra parte,esse deslocamento permite retomar o elemento j citado no contexto ante-rior em posio associada ao sujeito, podendo-se, assim, dizer que se trata deuma articulao sinttica que organiza a repetio.

    A par de tudo o que foi discutido acima, pode-se afirmar, de conformi-dade com Van Dijk (1982, 1983) que, ao estabelecer o quadro geral de refern-cia no interior do qual o contedo proposicional do enunciado se verifica, aestratgia da tematizao desempenha papel de relevo na construo da coe-rncia, tanto no nvel local, quanto no nvel global do texto.

    4;

  • 46

    (51) o tal problema que a gente sente(NURC/SP D2 62: 325-326)

    (52) ... isso que eu acho entende?(NURC/SP D2 62: 436 D2 343: 1571-1573)

    J (53) consiste em exemplo do que se tem denominado pseudo-clivadaem que ocorre rematizao:

    (53) o que me revolta profundamente o programa Cinderela (idem).(NURC/SP D2 333: 1117)

    2. construes com rema anteposto, marcado apenas prosodicamente, espec-ficas da modalidade oral. Segundo Ilari (1992: 43-44), a expresso do remaest sempre associada a algum tipo de proeminncia entoacional. Assim, aopapel de rema estaria ligado um invariante fonolgico que permite o seu reco-nhecimento nas diferentes posies da orao em que possa ocorrer5. Vejam-se alguns dos exemplos extrados de nosso corpus:

    (54) ..passei ali em frente :: Faculdade de Direito... ento estava lembran-do... que eu ia muito l quando tinha sete nove onze... (com) a titia sabe?...e:: est muito pior a cidade... est... o aspecto dos prdios assim bemmais sujo... tudo acinzentado n?

    (NURC/SP D2 343: 20-24)

    (55) L1 ... e toda segunda noite eu passo ali do lado da faculdade certo?L2 quando voc vai pra:: para Aliana n? [L1 quando eu pego o carro... e:: tambm horr-

    vel o aspecto... (parece) assim montoeira de concreto... sem ne-nhum aspecto humano certo?

    (NURC/SP D2 343: 28-33)

    (56) ... Lins por exemplo no assim n? voc tem... tem um aspecto de::... deacho que parece bairro a cidade n?

    (NURC/SP D2 343: 58-59)

  • 47

    (57) Doc. vocs acham ento que o noticirio em TV tem melhoradobastante

    [ tem pode melhorar mais nesse ponto o o:: telejornal nosso...

    pode aprimorar bastante... eu acho... bastante(NURC/SP D2 333: 988-902)

    Interessante notar que, no exemplo acima, tem-se um caso de double-bind sinttico (cf. Frank, 1986): o tema o o:: telejornal nosso, posposto aorema, torna-se, por sua vez, o tema (no marcado) do rema seguinte podeaprimorar bastante .

    (58) ento o cara a ... analogia n? o cara est no carro mas... o que querem?... tribal a coisa n?

    (NURC/SP D2 343: 701-702)

    (59) e o pato assim... ele vem o pato cozido feito uma espcie de canja... sque o caldo justamente uma gua misturada com uma farinha eu achoque ... ta/ tacac se no me engano o nome da farinha que eles usam...

    (NURC/RJ DID 328: 133-136)

    3. seqncias formadas dos dois blocos rema-tema sem verbo, apenas jus-tapostos sem vnculo sinttico, em que ocorre um aumento da expressividade,a par de um menor esforo de planejamento6:

    (60) ...eu gostei um filme de amor... umas cenas maravilhosas... lindo ofilme... eu assisti faz tempo j...

    (NURC/SP DID 234: 335-337)

    4. seqncias em que se antepe um elemento remtico que repetido imediata-mente na seqncia (cf. Castro, 1994). Trata-se de repetio que incide quasesempre sobre um substantivo, adjetivo, advrbio ou verbo, tendo, como uma dasprincipais funes, enfatizar o significado essencial do termo ou, muitas vezes,questionar a adequao de seu emprego naquela situao Por exemplo, almo-ar, no almocei ainda; s comi um sanduche na cantina; bom bom, s achei

  • 48

    o ltimo captulo) Todavia, no exemplo (61), extrado do nosso corpus, no meparece ser esta a funo, mas algo como voc me pergunta se evoluiu, e eu meapresso a responder ou, ento, preciso reconhecer que evoluiu:

    (61) Doc. voc acha que o teatro evolui::u? como que est?Inf. evoluir evoluiu... evoluiu muito o teatro principalmente no Brasil...

    (NURC/SP DID 161: 625-627)

    2.2 Quanto aos procedimentos lingsticos utilizados, tem-se, basicamente,o deslocamento esquerda . Este pode ocorrer acompanhado apenas de mar-cas prosdicas (casos 2 e 3), ou com a utilizao de determinadas marcas sin-tticas que caracterizam as oraes cindidas (caso 1), a saber:

    a. expresso que(foi que) delimitando o rema antepostob.expresso que(foi(o) que/ que) seguindo o rema antepostoc. construes gramaticais usando oraes adjetivas, como o que(me) ... /foi,

    podendo o pronome relativo vir elidido .

    2.3 Quanto s funes que desempenham as construes com anteposio dorema, verifica-se que esto diretamente ligadas expressividade e aoenvolvimento do falante com o assunto e com o interlocutor, sendo, por isso,mais freqentes na fala do que na escrita, especialmente em situaes de inte-rao menos formais.

    A anteposio do rema ao tema constitui expresso de alto envolvimento.Na perspectiva do falante, permite-lhe antecipar na formulao aquilo que cons-titui a meta de sua comunicao; do ponto de vista do interlocutor, tal seqncia,normalmente acompanhada de acentuao entonacional do rema, sentida comomarcada relativamente seqncia tema-rema e, portanto, veiculadora de algumtipo de informao discursiva adicional, o que, sem dvida, compensa o seuduplo custo operacional: o rema fora de sua posio sinttica normal e de suaposio em termos da estrutura informacional dado/novo.

    Assim, no caso das oraes cindidas, em que comumente a parte focalrepresenta informao nova e a parte pressuposicional, informao dada, afuno enfatizar o rema anteposto. Desta forma, um importante fatordeterminante do uso das cindidas seria o propsito do falante de assinalar uma

  • 49

    sutil oposio ou contraste. Segundo Hupet & Costermans (1982: 280), aousar uma estrutura cindida, a inteno do falante contrastar sua mensagemcom qualquer outra proposio que poderia invalid-la. Os autores acabampor concluir que, em termos dos componentes pragmticos determinantes des-se uso, as cindidas podem ser vistas como motivadas pela discordncia que ofalante supe existir entre a sua posio e aquela que ele se sente autorizado aatribuir ao seu interlocutor. importante essa ressalva: no se trata da realposio do interlocutor, mas daquela que o falante lhe atribui, isto , das cren-as que, correta ou incorretamente, o falante atribui ao seu parceiro.

    Hupet & Costermans ressaltam, ainda, que h casos em que a oraocindida enfatiza no um elemento que poderia ser visto como no partilhadopelo interlocutor, mas um elemento sobre o qual o prprio falante no tinhatotal certeza at alguns minutos atrs. Aqui seria como se o falante falassecom seus botes, corrigindo seu ponto de vista anterior.

    Ao contrrio das estratgias de tematizao, que tm sido objeto deampla gama de investigaes, as estratgias de rematizao, excetuando-se ocaso das oraes clivadas e pseudo-clivadas, constituem um domnio aindapouco explorado, pelo menos no que diz respeito ao portugus (ressalve-se,contudo, o trabalho de Ilari, 1987/1992).

    9$@

    O grupo de estratgias que estamos estudando sob o rtulo de segmen-tao tem interferncia direta na produo do sentido e exerce, portanto, papelrelevante na construo do texto e da coerncia textual.

    As marcas de redundncia implicadas na formao das construessegmentadas, conforme ressalta Lbre (1987: 129), constituem, para o locutor,um meio de remediar os inconvenientes da linearidade da fala, j que nestaqualquer retorno impossvel, bem como acrescentar ao seu enunciado ndi-ces que, sem elas, no lhe seria possvel inserir.

    Freqentemente, as construes segmentadas, por vezes precedidas ouseguidas de hesitaes ou de marcadores discursivos como enfim, quer dizer,bom, bem, entre outros, so resultantes de estratgias de reformulao ou cor-reo do texto falado.

    Alm disso, como bem mostra Lbre, a segmentao permite ao locu-tor proceder a uma espcie de hierarquizao das unidades lingsticas utiliza-

  • 50

    das, e apresentar um ponto de vista pessoal, modalizando destarte seu enuncia-do. Desta forma, tais construes constituem marcas da inscrio do enunciadorno discurso.

    Ao destacar um elemento do enunciado, estabelece-se uma oposioentre ele e outros elementos, que pode ser explcita ou implcita. As oposiesimplcitas, que so apenas sugeridas pelo elemento destacado, revelam a pre-sena de um no-dito: Faire dun objet quelconque un thme marqu, lisoleet par l mme le dfinit comme quelque chose dont le commentaire ne peutsappliquer qu lui. Il y a une exclusion implicite dans toute topicalisation, etdans tout thme marqu, il y a toujours, implicite, un autre. (Laparra, 1982:222, apud Lbre, 1987).

    Alm disso, salienta Lbre, as construes segmentadas desvelam umno-dito de certa forma inerente elaborao de toda e qualquer produo delinguagem, j que permitem distinguir entre o que posto e o que pressupos-to e estabelecem as prprias condies de existncia do discurso.

    Assim, para o interlocutor, as construes segmentadas so tambm ondice de uma confrontao ou de uma aproximao no explicitamente marcadaentre os propsitos explicitamente apresentados e outras produes discursi-vas, o que vem comprovar a afirmao de Bakhtin (1929: 113) de que todacomunicao verbal, toda interao verbal, desenrola-se sob a forma de umintercmbio de enunciados, isto , sob a forma de um dilogo.

    So as aproximaes implcitas que permitem relacionar a expressodestacada, isolada do enunciado, temtica global de um discurso, estabele-cendo um liame entre seus diferentes segmentos. Isto explica por que, muitasvezes, o emprego de construes segmentadas coincide com a passagem deum segmento tpico a outro, isto , marca uma mudana ou um deslocamentodo tpico discursivo.

    Outra funo importante das construes segmentadas em que se des-loca para a direita o elemento extrado , como foi dito, a de desambigizar oenunciado e facilitar a compreenso: a redundncia assegurada pela retomadacontribui para a melhor interpretao do texto e para a construo de sua coe-rncia.

    Por todas estas razes a par de outras que no puderam ser aqui des-tacadas que se pode afirmar que as estratgias de segmentao desempe-nham papel de relevncia na construo e na compreenso do texto falado.

    Embora muitas delas j tenham merecido bastante ateno da parte demuitos sintaticistas e semanticistas, as abordagens textuais-discursivas so ainda

  • 51

    pouco numerosas em nosso pas, especialmente em se tratando das estratgiasde rematizao, embora, evidentemente,se deva ressalvar, a par de outros, osautores citados neste trabalho.

    ,(41

    A expresso unidade comunicativa aqui tomada (cf. Rath, 1979) como substitutoconversacional para frase, ou seja, a expresso de um contedo que pode dar-se,mas no necessariamente, numa unidade sinttica tipo frase. (Marcuschi, 1986: 61/62).

    2 Observe-se que isso, neste exemplo, parece funcionar, simultaneamente, como anafricoe catafrico, isto , remete tanto ao que o precede, como ao que vem na seqncia.

    3 Este quadro me foi sugerido por Rodolfo Ilari, mas, infelizmente, acho que no conse-gui dar-lhe o aspecto sintetizador por ele proposto.

    4 Tais entidades entram na categoria das inferveis, na classificao proposta por Prince(1981).

    5 Muitos autores tratam tais exemplos como casos de deslocamento direita. Ilari, porexemplo (comunicao pessoal) os enquadraria como antitpicos; Kato (1989) os con-sidera como exemplos de deslocamento direita do tpico, que supem um sujeitonulo. Prefiro, contudo, sustentar a tese da rematizao e acredito que uma anlise pro-sdica mais acurada que pretendo empreender com o auxlio de um fonlogo dever vira reforar esta posio.

    6 o que Kato (1989) denomina free small clauses.

    '):)'A,9*4B*B1*+'C:*94

    BAKHTIN, M. (1981) Marxismo e Filosofia da Linguagem. Trad. bras. So Pau-lo, Hucitec, 2. ed. (original russo: 1929)

    BLASCO, M. (1995) Dislocation et thematisation en franais parl. Recherchessur le franais parl 13, Aix-Marseille, Publications de lUniversit deProvence, p. 45-65.

    BRAGA, M.L. (1991) As sentenas clivadas no portugus falado no Rio de Ja-neiro. Organon 18, Porto Alegre, UFRS, p. 109-125.

    CALLOU, D.; MORAES, J.; LEITE, Y.; KATO, M. et alii. (1993) Topicalizao edeslocamento esquerda: sintaxe e prosdia. In: CASTILHO, A.T. (org.). Gra-mtica do Portugus Falado, v. III: As abordagens. Campinas, Edunicamp/Fapesp, p. 315-362.

    CASTILHO, A.T. & PRETI, D. (1995) A linguagem falada culta na cidade de SoPaulo. Vol.1: Elocues formais. So Paulo, T.A.Queiroz/FAPESP.

  • 52

    ________ (1987) A linguagem culta falada na cidade de So Paulo. Vol.2:Dilogos entre dois informantes. So Paulo, T.A.Queiroz/FAPESP.

    DANE, F. (1967) Order of elements and sentence intonation. In: To honor RomanJakobson I. Haia, Mouton, p. 499-512.

    ________ (1974) (ed.). Papers on Functional Sentence Perspective. Praga,The Hague.

    FRANCK, D. (1986) Sentenas em turnos conversacionais: um caso de double-bind sinttico. Cadernos de Estudos Lingsticos 11, IEL-Unicamp, p. 9- 20.

    HUPET, M. & COSTERMANS, J. (1982) A functional approach of language pro-cessing. In: NY, Le & KINTSCH (eds.), Language and comprehension, Ams-terd, North-Holland.

    ILARI, R. (1991) Perspectiva Funcional da Frase Portuguesa. 2.ed. revista,Campinas, Ed. da Unicamp.

    KATO, M. (1989) O estatuto sinttico e semntico da noo de tpico no por-tugus do Brasil. Conferncia proferida em concurso para Professor Titular.Campinas, Unicamp, (mmeo).

    ________ (1989) Sujeito e tpico: duas categorias em sintaxe? Cadernos deEstudos Lingsticos 17, IEL-Unicamp.

    KOCH, I.G.V. (1992) Markierte Topik-Konstruktionen im Brasilianischen Por-tugiesich. Folia Linguistica XXVI/1-2, p. 65-74.

    KOCH, P. & OESTERREICHER, W. (1990) Gesprochene Sprache in der Romania:Franzsich, Italienisch, Spanisch. Tbingen, Niemeyer.

    LAMBRECHT, K. (1981) Topic, Antitopic, and Verb-Agreement in Non-standardFrench. Amsterd, Benjamins.

    LEBRE, M. (1987) Lcoute-analyse des documents sonores et leur utilisationen classe de langue. Thse Nouveau Rgime, Paris III, Sorbonne Nouvelle.

    MATEUS, M. et al. (1983) Gramtica da Lngua Portuguesa. Coimbra, Almedina.NASCIMENTO, M. Prolegmenos Gramtica do Portugus Falado. (mmeo)PONTES, E. (1987) O tpico no portugus do Brasil. Campinas, Pontes.PRETTI , D. & URBANO, H. (1988) A linguagem falada culta na cidade de So

    Paulo. Vol.III: Entrevistas. So Paulo, T.A.Queiroz/FAPESP.REINHART, T. (1981) Pragmatics and Linguistics: an analysis of sentence topics.

    Philosophica 27, (1): 53-94.VAN DIJK, T.A. (1982) Text and context: explorations in the semantics and

    pragmatics of discourse. 2.ed., Londres, Longman.________ (1983) La Ciencia del Texto. Barcelona, Paids.

  • 53

    9'')./,()0(:186(*&4D:,.E)4)5'94

    Leonor Lopes FveroMaria Lcia da Cunha Victrio de Oliveira Andrade

    Zilda Gaspar Oliveira de Aquino(Universidade de So Paulo)

    F&;

    O presente trabalho integra o projeto maior da Gramtica do PortugusFalado que se prope a elaborar uma gramtica referencial da lngua falada noBrasil. Nesse sentido, investigar-se- um dos processos de formulao do textofalado a correo, como contribuio para que se possam explicitar quais osmecanismos de construo desse tipo de texto.

    O corpus restringe-se, predominantemente, ao material do Projeto Nor-ma Urbana Culta (NURC), englobando as trs modalidades de inqurito: Di-logo entre dois informantes (D2), Dilogo entre informante e documentador(DID) e Elocuo formal (EF), no excluindo o exame de conversaes es-pontneas, coletadas em situaes e contextos variados. As gravaes espon-tneas no utilizaram video-tape (da mesma forma que o material do ProjetoNURC), j que no se considerou a configurao no-verbal (gestos, mmica eoutros).

    A escolha das trs modalidades deveu-se ao fato de que se julgavapossvel encontr