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21º Congresso Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental ABES – Trabalhos Técnicos 1 II-108 - EFEITO DO REPRESAMENTO NA QUALIDADE DA ÁGUA DE UM RIO IMPACTADO POR ESGOTOS – RIO BODOCONGÓ, CAMPINA GRANDE, PB Beatriz Susana Ovruski de Ceballos (1) Dr a . em Microbiologia Ambiental (USP–SP). Mestre em Microbiologia (EPM–SP). Bioquímica (Univ. Nacional de Tucumán – Argentina). Prof a Adjunta (DEC/CCT/UFPB). Vice-Coordenadora da Área de Saneamento Ambiental (AESA). Chefe do Laboratório de Saneamento (AESA/DEC/CCT). Annemarie König Dr a . em Botânica (Universidade de Liverpool – UK). Graduada em Biologia (UFSCar). Prof a . Adjunta (DEC/CCT/UFPB). Coordenadora da Área de Saneamento Ambiental (AESA/DEC/CCT). Hosineide de Oliveira Rolim Engenheira Agrícola (UFPB/CCT). Mestranda em Saneamento Ambiental – PRODEMA – UFPB/UEPB Marcílio Lira de Araújo Estudante do Curso de Engenharia Civil (DEC/CCT/UFPB). Bolsista PIBIC (UFPB/CNPq). Alysson Oliveira Guimarães Estudante do Curso de Engenharia Civil (DEC/CCT/UFPB). Bolsista IC/CNPq (Projeto Nordeste II). Endereço (1) : Rua Artur Monteiro Viana, 48 - Bodocongó - Campina Grande - PB - CEP: 58109-140 - Brasil - Tel: +55(83) 310 1154/ 310 1291 - e-mail: [email protected] RESUMO O Rio Bodocongó (PB) recebe ao longo do seu percurso de 75 km, descargas pontuais e difusas de esgotos domésticos e industriais, entretanto é utilizado para irrigação irrestrita, dessedentação de animais e recreação. Após aproximadamente 25 km de suas nascentes, o rio é represado formando uma lagoa, e recebe neste local os efluentes da Estação de Tratamento de Esgotos (ETE) de Campina Grande, que funciona em condições precárias. O objetivo deste trabalho foi avaliar a influência deste represamento na qualidade da água do rio após receber os efluentes da ETE. Para isso, foram escolhidos quatro pontos de amostragem dentro da lagoa (um dele representando a descarga da ETE – LBd1), um ponto localizado à montante (MBd4) da lagoa e outro à jusante (BBd1). Foram realizados amostragens, com freqüência mensal, em dois períodos de: Março a Junho de 1999, com chuvas escassas e de Dezembro de 1999 a Março de 2000, com maior precipitação pluviométrica. Os dados foram armazenados em planilhas Excel e submetidos às análises de estatística descritiva, de variância, de GT2, de agrupamento e de correlação. Os resultados evidenciaram diferenças na qualidade da água entre os diversos pontos nos dois períodos e existência de grupos de pontos com qualidade (compartimentos horizontais) ao longo da lagoa, com melhoria de qualidade no sentido do fluxo hidráulico. Através dos valores da porcentagem de contribuição e redução dos principais parâmetros avaliados, fica evidente que embora a ETE contribua com 57% do aporte de DBO e de DQO e 48% do aporte de coliformes fecais, o efluente da lagoa (BBd1), tem qualidade semelhante ao ponto MBd4, indicando que a lagoa tem uma função importante na autodepuração do efluente da ETE, funcionando como um wetland natural. Caso não recebesse os impactos da ETE, a lagoa teria uma contribuição ainda mais significativa na melhoria da qualidade da água do Rio Bodocongó. PALAVRAS-CHAVE: Wetland Natural, Represamento, Qualidade da Água. INTRODUÇÃO A ocupação e os usos das bacias hidrográficas se refletem nos corpos aquáticos através das alterações na qualidade da água, seja por descargas difusas ou pontuais, que geram compartimentos de diferente qualidade na massa líquida, que são influenciados pelas condições climáticas e por impactos antropogênicos, dentre eles, os despejos de águas residuais (HAMMER, 1979; MARGALEF, 1986).

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21º Congresso Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental

ABES – Trabalhos Técnicos 1

II-108 - EFEITO DO REPRESAMENTO NA QUALIDADE DA ÁGUA DE UM RIOIMPACTADO POR ESGOTOS – RIO BODOCONGÓ, CAMPINA GRANDE, PB

Beatriz Susana Ovruski de Ceballos(1)

Dra. em Microbiologia Ambiental (USP–SP). Mestre em Microbiologia (EPM–SP).Bioquímica (Univ. Nacional de Tucumán – Argentina). Profa Adjunta (DEC/CCT/UFPB).Vice-Coordenadora da Área de Saneamento Ambiental (AESA). Chefe do Laboratório deSaneamento (AESA/DEC/CCT).Annemarie KönigDra. em Botânica (Universidade de Liverpool – UK). Graduada em Biologia (UFSCar). Profa.Adjunta (DEC/CCT/UFPB). Coordenadora da Área de Saneamento Ambiental(AESA/DEC/CCT).Hosineide de Oliveira RolimEngenheira Agrícola (UFPB/CCT). Mestranda em Saneamento Ambiental – PRODEMA – UFPB/UEPBMarcílio Lira de AraújoEstudante do Curso de Engenharia Civil (DEC/CCT/UFPB). Bolsista PIBIC (UFPB/CNPq).Alysson Oliveira GuimarãesEstudante do Curso de Engenharia Civil (DEC/CCT/UFPB). Bolsista IC/CNPq (Projeto Nordeste II).

Endereço(1): Rua Artur Monteiro Viana, 48 - Bodocongó - Campina Grande - PB - CEP: 58109-140 - Brasil -Tel: +55(83) 310 1154/ 310 1291 - e-mail: [email protected]

RESUMO

O Rio Bodocongó (PB) recebe ao longo do seu percurso de 75 km, descargas pontuais e difusas de esgotosdomésticos e industriais, entretanto é utilizado para irrigação irrestrita, dessedentação de animais e recreação.Após aproximadamente 25 km de suas nascentes, o rio é represado formando uma lagoa, e recebe neste localos efluentes da Estação de Tratamento de Esgotos (ETE) de Campina Grande, que funciona em condiçõesprecárias. O objetivo deste trabalho foi avaliar a influência deste represamento na qualidade da água do rioapós receber os efluentes da ETE. Para isso, foram escolhidos quatro pontos de amostragem dentro da lagoa(um dele representando a descarga da ETE – LBd1), um ponto localizado à montante (MBd4) da lagoa e outroà jusante (BBd1). Foram realizados amostragens, com freqüência mensal, em dois períodos de: Março a Junhode 1999, com chuvas escassas e de Dezembro de 1999 a Março de 2000, com maior precipitaçãopluviométrica. Os dados foram armazenados em planilhas Excel e submetidos às análises de estatísticadescritiva, de variância, de GT2, de agrupamento e de correlação. Os resultados evidenciaram diferenças naqualidade da água entre os diversos pontos nos dois períodos e existência de grupos de pontos com qualidade(compartimentos horizontais) ao longo da lagoa, com melhoria de qualidade no sentido do fluxo hidráulico.Através dos valores da porcentagem de contribuição e redução dos principais parâmetros avaliados, ficaevidente que embora a ETE contribua com 57% do aporte de DBO e de DQO e 48% do aporte de coliformesfecais, o efluente da lagoa (BBd1), tem qualidade semelhante ao ponto MBd4, indicando que a lagoa tem umafunção importante na autodepuração do efluente da ETE, funcionando como um wetland natural. Caso nãorecebesse os impactos da ETE, a lagoa teria uma contribuição ainda mais significativa na melhoria daqualidade da água do Rio Bodocongó.

PALAVRAS-CHAVE: Wetland Natural, Represamento, Qualidade da Água.

INTRODUÇÃO

A ocupação e os usos das bacias hidrográficas se refletem nos corpos aquáticos através das alterações naqualidade da água, seja por descargas difusas ou pontuais, que geram compartimentos de diferente qualidadena massa líquida, que são influenciados pelas condições climáticas e por impactos antropogênicos, dentre eles,os despejos de águas residuais (HAMMER, 1979; MARGALEF, 1986).

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Uma forma de minimizar o descarte de esgotos domésticos nos rios é sua reciclagem racional, mediante aanálise de seu potencial de uso, em especial a reciclagem através de sua aplicação no solo visto que os esgotospodem ser fontes de matéria orgânica e de nutrientes (MENDONÇA, 2.000).Na região Nordeste do Brasil, a água é um dos elementos limitante ao desenvolvimento sócio-econômico. Asprecipitações irregulares, temporal e espacialmente, em conjunto com a alta taxa de evaporação conferem aesta região um balanço hídrico anual negativo (REBOUÇAS, BRAGA, TUNDISI, 1999). A essas perdasdeve-se ainda adicionar a crescente demanda de água para abastecimento humano, animal e irrigação,(JACCON, 1982).

O clima semi-árido propicia o regime temporário ou intermitente da maioria dos rios, como o rio Bodocongó,localizado na região do Agreste Paraibano (GOVERNO DO ESTADO DA PARAÍBA, 1985). Este rio éperenizado nas épocas de estiagem por esgotos domésticos e industriais, e suas águas são utilizadas pelapopulação ribeirinha como única fonte para múltiplos. Um dos mais fortes impactos antropogênicos ocorre àjusante da Estação de Tratamento de Esgotos (ETE) Municipal, que funciona em condições precárias, edespeja seu efluente (330L/s) no rio.

No trecho de aproximadamente 11 km, atravessando a cidade de Campina Grande e que fica compreendidoentre o açude de Bodocongó e a Estação de Tratamento de Esgotos Municipal, o rio percorre diversos bairrosdrenando a zona Oeste da cidade, e recebe contribuições de lixo e esgoto “in natura”, provenientes dasligações clandestinas na rede pluvial e de contribuições de esgotos domésticos oriundos de áreas não atendidaspelo sistema de esgotamento sanitário. Na zona Sudoeste, o rio conflui com o Córrego da Depuradora quedrena a zona Leste da cidade, e recebe em seguida os efluentes da ETE.

Um represamento existente à jusante da ETE modifica o regime hidráulico do rio, que passa de ambientelótico para lêntico. Este represamento origina uma lagoa (sob estudo) que aparentemente auxilia, de formanatural, o autodepuramento do rio. Esta lagoa durante a maior parte do ano está coberta por macrófitas queutilizam os nutrientes da água, fazendo com que a lagoa atue como um wetland natural. Quando cheia, a lagoainunda uma área de aproximadamente 16.000 m2 (320m X 50m). As macrófitas aparecem principalmente nosperíodos de estiagem; e nos períodos de chuva são arrastadas pelo aumento de vazão, voltando o ambiente a serecuperar após dois ou três meses. O efluente da lagoa escoa por uma pequena cascata de pedras originandonovamente o rio e denominada nesse trecho de Baixo Bodocongó.

Estudos de autodepuração e qualidade das águas superficiais são de grande importância para o manejo dosrecursos hídricos, orientando as tomadas de decisões para sua utilização e proteção adequadas (vonSPERLING, 1996).

O presente trabalho objetivou: (a) estudar o efeito do represamento do Rio Bodocongó (PB), no processo deautodepuração; (b) avaliar a qualidade física, química e microbiológica da água no local de represamento, àmontante e à jusante deste, para verificar a eficiência deste sistema lêntico na melhoria da qualidade da água

MATERIAIS E MÉTODOS

A bacia do rio Bodocongó está localizada na região sudeste do Estado da Paraíba, com uma área de 981 km2 ese constitui numa sub-bacia do rio Paraíba. O rio apresenta regime intermitente, sendo perenizado no trechoque corta a cidade de Campina Grande (350.000 habitantes), após o açude de Bodocongó, pelo recebimentodos efluentes do sangradouro deste (no inverno) e de uma indústria de reciclagem de papel, entre outros.

A Figura 1 apresenta o mapa da bacia do Rio Bodocongó, com destaque para a lagoa em estudo.

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Figura 1: Mapa da bacia do Rio Bodocongó (PB) com detalhe da lagoa.

Os pontos de amostragem selecionados (6 em total) correspondem a 4 locais na lagoa formada pelorepresamento do rio Bodocongó (LBd1, LBd2, LBd3 e LBd4) logo após receber o efluente da ETE, um pontoà montante (MBd4) e outro à jusante (BBd1) deste sistema. Todos os pontos foram georeferenciados eescolhidos de forma que pudessem ser representativos do corpo aquático, observando seu fluxo hidráulicoatravés da utilização de traçador (uranina). Este, quando lançado na água, produz uma coloração verde intensaque facilita a visualização do fluxo hidráulico preferencial.

A Figura 2 apresenta a distribuição espacial dos pontos de amostragem na lagoa.

Figura 2: Posição geométrica dos pontos de amostragem da lagoa.

As coletas com freqüência mensal foram realizadas em dois períodos: o primeiro — de Março a Junho de 1999— correspondeu a uma época de chuvas escassas; o segundo — de Dezembro de 1999 a Março de 2000 —correspondeu a um período de chuvas abundantes. Os parâmetros analisados entre outros foram: pH,Temperatura, Demanda Bioquímica de Oxigênio (DBO5) e coliformes fecais. As técnicas utilizadas seguiram

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APHA 1998. Os resultados foram armazenados em planilhas do software Excel e submetidos à análise deestatística descritiva, análise de correlação, análise de variância e GT2 e análise de agrupamento (este últimoatravés do software SPSS for Windows).

DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

As Figuras 3 e 4 apresentam a precipitação pluviométrica ocorrida no 1º e no 2º período, respectivamente, emalguns postos de coleta que fazem parte da Bacia do Bodocongó. Os valores de precipitação pluviométricativeram acentuada diferença mensal nos postos da cidade de Campina Grande, Barra de Santana e Caturité,para os dois períodos de estudo. Houve variações entre 13,8 mm em Abril de 1999 e maior que 220mm emMarço de 2000.

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Campina Grande/Açúdede Dentro

CampinaGrande/EMBRAPA

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Figura 3: Precipitação pluviométrica em postos ao longo da Bacia do Bodocongó (PB) para o 1º períodode pesquisa.

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dez/99 jan/00 fev/00 mar/00Meses

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Barra de Santana

Campina Grande/Açúdede Dentro

CampinaGrande/EMBRAPA

Campina Grande/SãoJosé da Mata

Caturité/Campo deEmas, Fz.

Figura 4: Precipitação pluviométrica em postos ao longo da Bacia do Bodocongó (PB) para o 2º períodode pesquisa.

A Figura 5 apresenta a variação dos valores médios de pH e temperatura das amostras para o 1º e o 2º períodoao longo da lagoa. O pH flutuou entre 7,20 e 7,81 no 1º período e entre 7,16 e 8,19 no 2º. Esse aumentorelaciona-se com o processo fotossintético das macrófitas que surgiram naquela época, através do consumo deCO2. A temperatura, sempre em torno de 27ºC, favoreceu o aumento das taxas metabólicas de decomposição e

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biossínteses. A condutividade elétrica manteve-se em torno de 2400 µmho/cm em ambos os períodos,indicando concentrações elevadas de sais, provavelmente pela contribuição dos esgotos que alimentam o rioalém das características dos solos cristalinos da região.

1º período 2º período

24,5

25

25,5

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27,5

MBd4 LBd1 LBd2 LBd3 LBd4 BBd1 MBd4 LBd1 LBd2 LBd3 LBd4 BBd1

PONTOS

TEM

PE

RA

TUR

A(º

)

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7,4

7,6

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pH

temppH

Figura 5: Variação espacial dos valores médios de temperatura e pH para o 1º e o 2º período depesquisa (Lagoa de Bodocongó – Campina Grande/PB).

A Figura 6 apresenta a variação espacial dos valores médios de DBO e DQO para os dois períodos de estudo.Os altos valores DBO5 (máximo de 140 mg/L no local de lançamento do efluente da ETE – ponto LBd1) eDQO (máximo de 787 mg/L no LBd3) estimularam o crescimento de bactérias heterótrofas que passaram aconsumir o oxigênio dissolvido na água na degradação da matéria orgânica, transformando a lagoa numambiente anaeróbio (valores de OD iguais a zero em todos os pontos). Alto valor de DBO5 no ponto LBd1,indica a alta carga orgânica aportada ao sistema por esse afluente, evidenciando o funcionamento precário daETE. O valor de 36 mg/L no efluente da lagoa (ponto LBd4) indicou uma redução de 63,6 % desde o ponto dedescarga. Os valores de DQO no efluente da ETE sempre foram maiores que os provenientes do Médio RioBodocongó (ponto MBd4) montante desta. Entretanto, o valor de 55 mg/L no ponto LBd4, indicou umaeficiência de remoção de 92,9 % para este parâmetro, comprovando o efeito positivo do represamento.

1º período 2º período

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MBd4 LBd1 LBd2 LBd3 LBd4 BBd1 MBd4 LBd1 LBd2 LBd3 LBd4 BBd1

PONTOS

DB

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DQ

O (m

g/L)

DBODQO

Figura 6: Variação espacial dos valores médios de DBO5 e DQO para o 1º e o 2º período de pesquisa(Lagoa de Bodocongó – Campina Grande/PB).

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O maior valor de nitrogênio amoniacal ocorreu em LBd1 em Maio de 2000 (45,7 mg/L), evidenciando adegradação e a transformação do nitrogênio orgânico dos esgotos em amônia, através da decomposiçãobacteriana (amonificação) (SAWYER et al., 1994). Os valores médios de nitrogênio nítrico variaram entre 0,0e 2,4 mg/L para o 1º período; o ponto BBd1 apresentou uma concentração bastante elevada de nitrogênionítrico durante o 2º período de estudo, atingindo um valor máximo de 44,9 mg/L, que elevou a média nesseponto. Essa alta concentração é proveniente, provavelmente de fertilizantes, visto que próximo a este local háculturas diversas e criação de animais, e a chuva causa o arraste desses fertilizantes para dentro do rio.

A Figura 7 apresenta o comportamento dos valores médios de nitrogênio nítrico e nitrogênio amoniacal aolongo da lagoa nos dois períodos estudados.

1º período 2º período

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MBd4 LBd1 LBd2 LBd3 LBd4 BBd1 MBd4 LBd1 LBd2 LBd3 LBd4 BBd1

PONTOS

NIT

RO

N. A

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N/L

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NIT

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(mg

/L)

AMÔNIANITRATO

Figura 7: Variação espacial dos valores médios de nitrogênio amoniacal e nitrogênio nítrico para o 1º eo 2º período de pesquisa (Lagoa de Bodocongó – Campina Grande/PB).

Os valores de fósforo total, entre 5 e 13 mg/L, evidenciaram alto nível de trofia ( lagoa hiper-eutrófica). Osmaiores valores ocorreram no 2º período, associados com a precipitação pluviométrica e o escoamentosuperficial. Os comportamentos dos valores médios de fósforo total e de ortofosfato solúvel estão apresentadosna Figura 8.

1º período 2º período

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MBd4 LBd1 LBd2 LBd3 LBd4 BBd1 MBd4 LBd1 LBd2 LBd3 LBd4 BBd1

PONTOS

FÓS

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L (m

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L (

mg

P/L

)

fósforoorto

Figura 8: Variação espacial dos valores médios de fósforo total e ortofosfato solúvel para o 1º e o 2ºperíodo de pesquisa (Lagoa de Bodocongó – Campina Grande/PB).

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O maior valor de coliformes fecais ocorreu no ponto LBd3 no 2º período (2,0 x 107 UFC/100mL), e o menorem BBd1 no 1º período (1,6 x 105 UFC/100mL), evidenciando eficiência de remoção na lagoa, desde o pontoLBd3 ao BBd1, embora o efluente ainda apresente concentrações elevadas. Para estreptococos fecais, o maiorvalor ocorreu em BBd1 (1 x 107 UFC/100mL), e o menor no LBd1 (7,9 x 10 UFC/100mL), ambos no 1ºperíodo. A contribuição média de estreptococos e coliformes proveniente da ETE foi sempre menor do que acontribuição proveniente do Médio Rio Bodocongó, refletindo uma alta contaminação fecal neste último (quecontribui com 53 % do aporte total). Em geral, os valores de estreptococos fecais e coliformes fecais forammaiores no segundo período, devido ao arraste, pelas chuvas, de material fecal da bacia para a lagoa.

A Figura 9 apresenta o comportamento dos valores médios de coliformes fecais e estreptococos fecais (emlogaritmos) para ambos os períodos.

1º período 2º período

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MBd4 LBd1 LBd2 LBd3 LBd4 BBd1 MBd4 LBd1 LBd2 LBd3 LBd4 BBd1

PONTOS

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estrep.colif.

Figura 9: Variação espacial dos valores médios logaritmos de coliformes fecais e estreptococos fecaispara o 1º e o 2º período de pesquisa (Lagoa de Bodocongó – Campina Grande/PB).

A análise de variância ANOVA não mostrou diferença significativa entre as médias dos parâmetros para cadaponto. Entretanto, quando aplicada aos valores médios de todos os pontos em cada data de coleta, algunsparâmetros apresentaram diferença entre a média amostral e a populacional. Para estes, aplicou-se a análise deGT2 (método gráfico comparativo), observando-se variações significativas entre os dois períodos. Um dosparâmetros que mais apresentou variação entre datas foi o nitrogênio amoniacal. Esta variação pode éobservada no gráfico de GT2 (Figura 10). A imagem de fundo é a visualização do ponto de coleta LBd4,destacando a muralha que represa a lagoa e origina o ecossistema Baixo Rio Bodocongó.

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mar/99 abr/99 mai/99 jun/99 dez/99 jan/00 fev/00 mar/00

Meses

Nit

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Limite Inferior Média Limite Superior

Figura 10: Método gráfico GT2 aplicado aos valores médios de nitrogênio amoniacal para o conjuntogeral de dados (Lagoa de Bodocongó – Campina Grande/PB).

Aplicou-se análise de agrupamento para os valores de todos os parâmetros de todos os pontos no 1º período,no 2º, e para o conjunto geral de dados. Foram obtidos conjuntos de pontos de qualidade semelhante, quedestacam a posição dos pontos amostrais entre si e sua localização no corpo aquático.

No primeiro período houve semelhança entre os pontos LBd3, LBd4, MBd4 e BBd1, indicando que o pontode descarga do efluente da ETE (LBd1) e o mais próximo a ele (LBd2) são diferentes dos demais,constituindo, cada um, um grupo separado. Essa distribuição é explicada pelos altos valores da maioria dosparâmetros no LBd1 e por ser o LBd2 um local de mistura entre o efluente da ETE e a água que chega doMédio Rio Bodocongó.

Os dados obtidos para o 2º período evidenciaram semelhanças entre os pontos LBd2, LBd4, LBd3 e BBd1,enquanto que os pontos LBd1 e MBd4 constituíram, cada um, um grupo.

O terceiro agrupamento evidenciou um grupo formado pelos pontos LBd2, LBd4, LBd3 e MBd4, um outroformado pelo ponto BBd1 e outro pelo LBd1, sendo este último bastante diferentes dos demais. A Figura 11apresenta o resultado de agrupamento obtido para o conjunto geral de dados (3° caso).

H I E R A R C H I C A L C L U S T E R A N A L Y S I S Dendrogram using Average Linkage (Between Groups) Rescaled Distance Cluster Combine CASE 0 5 10 15 20 25 Label Num+---------+---------+---------+---------+---------+ LBd2 -+-----+ LBd4 -+ +---+ LBd3 -------+ +---+ MBd4 -----------+ +---------------------------------+ BBd1 ---------------+ + LBd1 -------------------------------------------------+ Figura 11: Dendrograma obtido para o conjunto geral de dados de qualidade de água através do SPSSfor Windows – Agrupamento (Lagoa de Bodocongó – Campina Grande/PB).

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Para cada grupo do caso 3, aplicou-se a análise de correlação múltipla de Pearson (bicaudal), que evidencioualgumas interdependências entre as diversas variáveis de cada grupo. A Tabela 1 mostra os resultados dasanálises de correlação para o grupo formado pelos pontos LBd2, LBd4, LBd3 e MBd4.

TEMP 1,000PH -0,894 1,000CE -0,283 -0,044 1,000

DBO 0,055 -0,043 -0,197 1,000DQO 0,122 -0,258 0,229 0,475 1,000

N. AMONIACAL -0,656 0,373 0,804 0,110 0,444 1,000N. NÍTRICO 0,371 0,033 -0,815 0,137 -0,384 -0,815 1,000FÓSFORO -0,666 0,699 0,280 0,082 -0,221 0,450 -0,250 1,000

ORTO FOSFATO -0,591 0,393 0,821 -0,048 0,394 0,884 -0,805 0,462 1,000EF 0,111 0,169 -0,882 0,036 -0,222 -0,651 0,592 -0,403 -0,537 1,000CF 0,077 0,260 -0,561 -0,264 0,085 -0,312 0,612 -0,416 -0,373 0,767 1,000

CORRELAÇÃO SIGNIFICATIVA NO NÍVEL 0,01 (BICAUDAL)

CORRELAÇÃO SIGNIFICATIVA NO NÍVEL 0,05 (BICAUDAL)

ORTO FOSFATO

EF CFDQO N. AMONIACAL N. NÍTRICO FÓSFOROTEMP PH CE DBO

Tabela 1: Valores da correlação de Pearson (variável à variável e bicaudal) para o conjunto formadopelos pontos LBd2, LBd4, LBd3 e MBd4, evidenciado na análise de agrupamento para todo os dadosdos dois períodos de pesquisa (Lagoa de Bodocongó – Campina Grande/PB).

Uma correlação que chamou a atenção foi entre a condutividade elétrica e os coliformes fecais e estreptococosfecais. Entre este último e a condutividade houve correlação negativa significativa no nível (α=0,05; r= -0,882), evidenciando que uma concentração elevada de sais inibe o desenvolvimento das bactérias,entretanto não houve correlação significativa entre CF e condutividade elétrica, embora sabe-se que CF sãomais sensíveis a CE que EF . As demais correlações estiveram dentro dos padrões esperados.

A porcentagem de redução dos nutrientes e dos coliformes fecais e estreptococos fecais provenientes doMédio Bodocongó (ponto MBd4) e da ETE (ponto LBd1), ao longo de seu percurso pela lagoa, até BBd1,assim como a porcentagem de contribuição proveniente de cada ponto (MBd4 e LBd1) estão apresentados naTabela 2. No geral, os coliformes fecais tiveram os menores valores de remoção (de 3,1 % entre MBd4 eBBd1) e DQO teve maior decréscimo (de 57,2 % entre LBd1 e BBd1). A maior contribuição de nutrientes foiproveniente da ETE, enquanto que o Médio Bodocongó contribuiu mais com coliformes fecais eestreptococos.

Tabela 2: Eficiência de remoção da lagoa para os principais parâmetros e contribuição proveniente dospontos Mbd4 e LBd1 (Lagoa de Bodocongó – Campina Grande/PB).

MBd4 BBd1 %REDUÇÃO LBd1 BBd1 %REDUÇÃO %MBd4 %LBd1DBO* 73 62 15,1 95 62 34,7 43,5 56,5DQO* 346 195 43,6 456 195 57,2 43,1 56,9

n. amoniacal* 24,9 23 7,6 35,8 23 35,8 41 59n. nítrico* 0,4 6,2 - 0,7 6,2 - 36,4 63,6fósforo* 5,4 5,3 1,9 7,3 5,3 27,4 42,6 57,4

orto* 3,5 3,2 8,6 1,9 3,2 - 64,8 35,2EF** 5,3 7,2 - 4,4 7,2 - 54,6 45,4CF** 6,4 6,2 3,1 5,9 6,2 - 52 48

* em mg/L ** em log de UFC/100mL

Porcentagem de redução do MBd4 ao BBd1

Porcentagem de redução do LBd1 ao BBd1

Porcentagem de contribuição proveniente do MBd4 e do Lbd1

21º Congresso Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental

ABES – Trabalhos Técnicos10

CONCLUSÕES

O trabalho realizado possibilitou as seguintes conclusões:

A carga poluidora que chega ao Rio Bodocongó com as descargas da ETE-CG, contribui, em relação àquelaproveniente do Médio Rio Bodocongó, com 56,5% da DBO5 do que entra na lagoa, 56,9% de DQO, 59,0% denitrogênio amoniacal, 63,6% de nitrogênio nítrico e 57,4% de fósforo; Os altos valores de fósforo na lagoaindicaram um estágio avançado de eutrofização.

Os valores de DBO5 no efluente da lagoa (em média 55 mg/L) são altos, apesar da redução de 34,7% desde oefluente da ETE.

Os valores elevados de coliformes fecais e estreptococos fecais sugerem fortemente a possibilidade dapresença de enteropatógenos no Médio Bodocongó, no efluente da ETE e no efluente da lagoa (que origina oBaixo Rio Bodocongó). Isto é grave por ser este rio utilizado para irrigação irrestrita e lazer;

A precipitação pluviométrica causou um aumento significativo nas concentrações dos parâmetros analisadosno 2º período, principalmente nos nutrientes, através do aporte de material para a lagoa: o nitrogênio nítrico,no ponto localizado à jusante da lagoa, obteve um aumento de 1.770,8 %;

A análise de agrupamento revelou compartimentos horizontais de diferentes qualidades na lagoa, melhorandono sentido do fluxo hidráulico. A análise de variância mostrou diferenças entres os valores médios para asdatas de coleta, não evidenciando diferenças para as médias entre pontos;

A lagoa mostrou-se eficiente na redução de nutrientes provenientes da ETE, de forma que seu efluente atingiua mesma qualidade que a do Médio Bodocongó;

A lagoa formada pelo represamento do rio funciona como um wetland natural vegetado, que teria umacontribuição ainda mais significativa no processo de autodepuração caso não recebesse os impactos doefluente da ETE.

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