1999 lourenco et al

9
Sobre o Cálculo Automático no Projecto de Estruturas de Betão Armado Paulo B. Lourenço 1 , Augusto Gomes 2 , Daniel V. Oliveira 3 , Eduardo M. Marques 4 , João Vinagre 2 e Rui Oliveira 5 1 Prof. Auxiliar, Universidade do Minho, Departamento de Engenharia Civil, Azurém, 4800 Guimarães. 2 Prof. Auxiliar, Instituto Superior Técnico, Departamento de Engenharia Civil, 1096 Lisboa Codex. 3 Assistente, Universidade do Minho, Departamento de Engenharia Civil, Azurém, 4800 Guimarães. 4 Director do Gabinete de Projectos, Sociedade de Construções Soares da Costa, SA,4200 Porto. 5 Director Técnico, AFA - Consultores de Engenharia, Lda, 4400 Vila Nova de Gaia. Resumo de uma comunicação apresentada em Sessão Especial no V Encontro Nacional de Mecânica Computacional, Guimarães, Universidade do Minho, Outubro, 1997 Resumo: A presente comunicação tem como objectivo essencial discutir a automatização do cálculo de estruturas e a figura do Engenheiro projectista. No contexto actual é certo que é necessário melhorar a preparação técnica dos projectistas e que os tempos e meios para a realização de projectos são, em geral, demasiado escassos. Esta situação, que urge rever, reflecte-se negativamente na qualidade dos projectos e, em consequência, na qualidade dos empreendimentos. A qualidade dos projectos de estruturas é fortemente condicionada pela concepção estrutural na fase inicial do projecto, em que o Engenheiro tem papel fundamental. Contrariamente ao que seria de esperar, a informatização generalizada popularizou os projectos de estruturas e, simultaneamente, reduziu dras- ticamente a sua qualidade. Na presente comunicação é apre- sentada uma análise dos resultados de cinco programas comer- ciais no dimensionamento de dois edifícios de betão armado. Espera-se que as diferenças encontradas sirvam de catalisador de uma reflexão sobre a situação actual do cálculo estrutural. Introdução Os riscos inerentes ao cálculo automático de qualquer estrutura têm diversas origens, tais como: enganos na introdução dos dados; desconhecimento das hipóteses, admitidas pelos programadores, e da sua validade; erros de programação. As consequências que poderão advir de um dimensio- namento deficiente de uma estrutura são particular- mente gravosas, quer em termos de vidas humanas quer em termos meramente económicos, como sejam os asso- ciados à reparação de patologias estruturais. Em Portugal, a importância dos projectos de estruturas de betão armado carece atenção. Não é admissível que qualquer técnico possa assumir a responsabilidade por um projecto de estabilidade e que qualquer programa de cálculo possa ser utilizado no dimensionamento da estrutura. Deste modo, a Comissão Organizadora do V Encontro Nacional de Mecânica Computacional julgou ser de interesse promover uma sessão especial dedicada à apreciação e comparação dos resultados fornecidos por alguns dos programas comercializados em Portugal. Os resultados detalhados do trabalho desenvolvido pelo painel que procedeu à análise de dois exemplos, espe- cialmente propostos para o efeito, podem ser encontra- dos em Lourenço et al (1998). Este relatório inclui uma comparação dos resultados da análise dinâmica, do cál- culo de esforços e do dimensionamento do betão arma- do para vigas, pilares e paredes. Os aspectos de facili- dade de introdução de dados ou de apresentação geral dos programas foram relegados para segundo plano, em detrimento dos aspectos relativos aos resultados, às hipóteses de cálculo, à segurança e à qualidade do dimensionamento. Na presente comunicação apresentam-se, de forma condensada, os aspectos essenciais do relatório referido. O objectivo principal da comunicação é promover a discussão sobre a situação actual do projecto de estruturas e representa o primeiro passo numa comparação e análise dos resultados de diversos programas. Espera-se poder contribuir para que, a breve prazo, se possam assistir a novos desenvolvimentos, ver ainda Lourenço e Oliveira (1998). Para a realização deste trabalho foram contactadas as empresas indicadas na Tabela 1, tendo duas delas recu- sado participar nesta iniciativa. Assim, foram analisados os programas CYPE Cad (versão 2.97), MGE (versão 3.01), PAC Pórticos (versão 3.5), QSE (versão 2.3) e TRICALC (versão 3.4). Tabela 1 - Lista de empresas contactadas Programa Empresa Participação CYPE Cad TOP - BRAGA MGE Eng. Mateus Gomes - PORTO PAC Pórticos NEWTON - PORTO QSE GIPAC - COIMBRA ROBOT UNICIVIL - LISBOA SAP CSE - OEIRAS TRICALC ARKTEC - LISBOA A importância do projecto e do projectista A qualidade das construções inicia-se, obrigatoriamente, pela capacidade técnica e pela experiência dos projectistas, pelos métodos de cálculo adoptados e pelo controlo do projecto. A busca da qualidade pressupõe uma adequada preparação técnica, maiores recursos de meios e tempo para a realização dos projectos e, necessariamente, custos acrescidos. Nos últimos anos tem-se assistido a um incremento dos métodos de controlo e certificação, que visam a qualida- de das construções na fase de execução. O mesmo não se tem passado a nível do projecto, ainda que seja legítimo afirmar que a qualidade dos empreendimentos passa, em primeira lugar, pela qualidade dos projectos. É normal responsabilizar-se a construção pelas patologias,

Upload: alexandra-prata

Post on 23-Oct-2015

16 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: 1999 Lourenco Et Al

Sobre o Cálculo Automático no Projecto de

Estruturas de Betão Armado

Paulo B. Lourenço1, Augusto Gomes2, Daniel V. Oliveira3, Eduardo M. Marques4, João Vinagre2 e Rui Oliveira5

1 Prof. Auxiliar, Universidade do Minho, Departamento de Engenharia Civil, Azurém, 4800 Guimarães.

2 Prof. Auxiliar, Instituto Superior Técnico, Departamento de Engenharia Civil, 1096 Lisboa Codex. 3 Assistente, Universidade do Minho, Departamento de Engenharia Civil, Azurém, 4800 Guimarães.

4 Director do Gabinete de Projectos, Sociedade de Construções Soares da Costa, SA,4200 Porto. 5 Director Técnico, AFA - Consultores de Engenharia, Lda, 4400 Vila Nova de Gaia.

Resumo de uma comunicação apresentada em Sessão Especial no

V Encontro Nacional de Mecânica Computacional, Guimarães, Universidade do Minho, Outubro, 1997

Resumo: A presente comunicação tem como objectivo essencial discutir a automatização do cálculo de estruturas e a figura do Engenheiro projectista. No contexto actual é certo que é necessário melhorar a preparação técnica dos projectistas e que os tempos e meios para a realização de projectos são, em geral, demasiado escassos. Esta situação, que urge rever, reflecte-se negativamente na qualidade dos projectos e, em consequência, na qualidade dos empreendimentos. A qualidade dos projectos de estruturas é fortemente condicionada pela concepção estrutural na fase inicial do projecto, em que o Engenheiro tem papel fundamental. Contrariamente ao que seria de esperar, a informatização generalizada popularizou os projectos de estruturas e, simultaneamente, reduziu dras-ticamente a sua qualidade. Na presente comunicação é apre-sentada uma análise dos resultados de cinco programas comer-ciais no dimensionamento de dois edifícios de betão armado. Espera-se que as diferenças encontradas sirvam de catalisador de uma reflexão sobre a situação actual do cálculo estrutural.

Introdução Os riscos inerentes ao cálculo automático de qualquer estrutura têm diversas origens, tais como:

• enganos na introdução dos dados; • desconhecimento das hipóteses, admitidas pelos

programadores, e da sua validade; • erros de programação.

As consequências que poderão advir de um dimensio-namento deficiente de uma estrutura são particular-mente gravosas, quer em termos de vidas humanas quer em termos meramente económicos, como sejam os asso-ciados à reparação de patologias estruturais. Em Portugal, a importância dos projectos de estruturas de betão armado carece atenção. Não é admissível que qualquer técnico possa assumir a responsabilidade por um projecto de estabilidade e que qualquer programa de cálculo possa ser utilizado no dimensionamento da estrutura. Deste modo, a Comissão Organizadora do V Encontro Nacional de Mecânica Computacional julgou ser de interesse promover uma sessão especial dedicada à apreciação e comparação dos resultados fornecidos por alguns dos programas comercializados em Portugal. Os resultados detalhados do trabalho desenvolvido pelo painel que procedeu à análise de dois exemplos, espe-cialmente propostos para o efeito, podem ser encontra-dos em Lourenço et al (1998). Este relatório inclui uma comparação dos resultados da análise dinâmica, do cál-culo de esforços e do dimensionamento do betão arma-

do para vigas, pilares e paredes. Os aspectos de facili-dade de introdução de dados ou de apresentação geral dos programas foram relegados para segundo plano, em detrimento dos aspectos relativos aos resultados, às hipóteses de cálculo, à segurança e à qualidade do dimensionamento. Na presente comunicação apresentam-se, de forma condensada, os aspectos essenciais do relatório referido. O objectivo principal da comunicação é promover a discussão sobre a situação actual do projecto de estruturas e representa o primeiro passo numa comparação e análise dos resultados de diversos programas. Espera-se poder contribuir para que, a breve prazo, se possam assistir a novos desenvolvimentos, ver ainda Lourenço e Oliveira (1998). Para a realização deste trabalho foram contactadas as empresas indicadas na Tabela 1, tendo duas delas recu-sado participar nesta iniciativa. Assim, foram analisados os programas CYPE Cad (versão 2.97), MGE (versão 3.01), PAC Pórticos (versão 3.5), QSE (versão 2.3) e TRICALC (versão 3.4).

Tabela 1 - Lista de empresas contactadas

Programa Empresa Participação CYPE Cad TOP - BRAGA ✔

MGE Eng. Mateus Gomes - PORTO ✔ PAC Pórticos NEWTON - PORTO ✔

QSE GIPAC - COIMBRA ✔ ROBOT UNICIVIL - LISBOA ✘

SAP CSE - OEIRAS ✘ TRICALC ARKTEC - LISBOA ✔

A importância do projecto e do projectista

A qualidade das construções inicia-se, obrigatoriamente, pela capacidade técnica e pela experiência dos projectistas, pelos métodos de cálculo adoptados e pelo controlo do projecto. A busca da qualidade pressupõe uma adequada preparação técnica, maiores recursos de meios e tempo para a realização dos projectos e, necessariamente, custos acrescidos. Nos últimos anos tem-se assistido a um incremento dos métodos de controlo e certificação, que visam a qualida-de das construções na fase de execução. O mesmo não se tem passado a nível do projecto, ainda que seja legítimo afirmar que a qualidade dos empreendimentos passa, em primeira lugar, pela qualidade dos projectos. É normal responsabilizar-se a construção pelas patologias,

Page 2: 1999 Lourenco Et Al

que infelizmente assumem proporções elevadas. Estudos em diversos países, onde o controlo de projecto é mais apertado, ver referências em Costa (1995), concluíram que cerca de 50% dos custos necessários para a reabilitação das construções afectadas incidiram sobre situações originadas por erros ou por omissões de projecto. O custo final de um empreendimento é muito influen-ciado pelas opções iniciais feitas na fase de projecto. É, pois, necessário inverter a mentalidade dos Donos de Obra e de muitos projectistas, de minimizar os custos e os prazos dos projectos, consciencializando-os de que a maior parte dos problemas deverão ser resolvidos na fase do projecto e não em obra. Apesar de muito complexa e de difícil implementação, pensamos que deveria ser equacionada a hipótese de um técnico, para se poder responsabilizar por projectos, ter que prestar provas curriculares efectivas e demonstrar cabalmente, através de exame, os seus conhecimentos teóricos e práticos, após um número de anos de ex-periência profissional. Por outro lado, é urgente que haja uma efectiva responsabilização sobre os erros cometidos, de forma a melhorar o nível profissional e do projecto. No contexto da legislação vigente, tal poderá ser feito através do seguro de projecto, situação prevista mas infelizmente ainda pouco utilizada, permitindo que os utentes finais das construções tenham as garantias devidas de qualidade do produto que adquiriram e possuam mecanismos legais para accionar em situação de anomalia.

Métodos e meios de cálculo Os primeiros e mais importantes passos de um projecto são dados durante a fase de concepção, uma vez que esta define, logo à partida, as soluções para os vários elementos estruturais. O custo da estrutura fica balizado e são definidas as eventuais interferências com a arquitectura e com as tubagens e condutas das especialidades. Ficarão, assim, definidas as condições que permitem um bom ou um deficiente com-portamento estrutural, o qual, nesta segunda hipótese, poderá originar problemas de fendilhação, durabilidade e manutenção. Uma deficiente idealização da estrutura conduz a um conjunto de maus resultados (em termos de segurança e economia), mesmo que se adoptem mei-os sofisticados de cálculo e se cumpram todas as espe-cificações regulamentares. É nesta fase do projecto que o Engenheiro tem um papel preponderante, não sendo substituível por qualquer programa, independentemente do seu grau de sofisticação. Contrariamente ao que seria de esperar, a informatiza-ção generalizada reduziu drasticamente a qualidade dos projectos de estruturas. A utilização indiscriminada, e sem qualquer controlo, de programas de cálculo auto-mático em que os projectistas não têm necessidade de intervir activamente nas diferentes fases do cálculo, e a confiança cega nos resultados do computador, condu-zem à perda de sensibilidade estrutural. Os programas em que o desenho final é executado automaticamente, sem qualquer intervenção do projectista, podem ser extremamente perigosos. A urgência na entrega de projectos e a tendência para a redução de custos conduz, por vezes, à não verificação dos resultados gráficos. É, assim, frequente encontrarem-se projectos com erros

graves e pormenorizações insuficientes. Ainda que inconscientemente, a utilização destes programas traduz-se, por vezes, na demissão das responsabilidades do projectista. É de referir que a maioria dos programas comerciais podem ser considerados bons, desde que devidamente utilizados e conhecidas as suas bases e limites de validade. Incompreensivelmente, não há qualquer obri-gação, nem regulamentação, no tocante aos programas de cálculo utilizados no dimensionamento estrutural. Apesar da responsabilidade ser sempre do projectista, parece-nos imprescindível encarar a certificação dos programas de cálculo, que poderá passar pela sua homologação (seja pelo Laboratório Nacional de Engenharia Civil, pelo Instituto Português da Qua-lidade, pela Ordem dos Engenheiros ou por outra enti-dade competente), pela definição de exemplos de referência (que serviriam para validação do programa) e pela acreditação do utilizador através de cursos e exames. É importante que seja possível responsabilizar as empresas que comercializam os programas, quando devidamente utilizados, pelas consequências dos erros por eles originados. Salienta-se, no entanto, que qualquer iniciativa deste género não poderá nunca conduzir à desresponsabilização do projectista.

Exemplos de referência propostos

Os exemplos propostos para a análise comparada referem-se a dois edifícios correntes. Todas as características relativas à geometria e às acções foram perfeitamente definidas, de forma a limitar diferenças de dados nas análises com os diversos programas. O primeiro edifício é de pequeno porte (quatro pisos), sem qualquer cave, com uma ligeira irregularidade em planta e com duas paredes de betão armado. O seu dimensionamento é condicionado essencialmente pelas acções verticais. As lajes são aligeiradas com vigotas pré-esforçadas. A planta, corte e perspectiva tridi-mensional do edifício estão representadas na figura 1.

4.00

4.00

4.00

7.002.004.007.00C EDBA

3

4

2

1 (a)

(b)

Page 3: 1999 Lourenco Et Al

(c)

Figura 1 - Exemplo 1: a) planta; b) corte; c) perspectiva. O segundo edifício é de médio porte (oito pisos) e possui uma cave. O edifício é formado por uma malha regular de pilares e um núcleo resistente. Existe irregularidade em altura, com uma zona térrea de maior desenvolvi-mento em planta e uma torre. O seu dimensionamento é condicionado pelas acções horizontais. As lajes são ma-ciças, armadas em duas direcções, estando a planta, o corte e a perspectiva tridimensional do edifício represen-tadas na figura 2.

6.006.006.006.006.006.00

GFEDCBA

1

2

3

4

5

6 (a)

(b)

(c)

(d)

(e)

Figura 2 - Exemplo 2: a) planta da cave; b) planta dos pisos 0 a 2; c) planta dos pisos 3 a 8; d) corte; e) perspectiva.

Modelação do edifício

❑ CYPE, QSE e TRICALC: estes programas recorrem a um cálculo espacial com seis graus de liberdade por nó. A modelação da estrutura pode incluir todos os elemen-tos estruturais, ainda que, por vezes, de forma simplifi-cada. ❑ MGE e PAC: recorrem a um cálculo plano com três graus de liberdade por nó. A modelação da estrutura apenas pode incluir pórticos planos (vigas, pilares e paredes). No caso de acções horizontais, o compor-tamento tridimensional da estrutura é considerado. Comentário: os dois tipos de modelação possuem van-tagens e desvantagens. A modelação espacial aproxima--se mais da realidade. No entanto, esta modelação torna mais difíceis os cálculos expeditos de verificação e, no caso de as lajes serem incluídas na modelação, não per-mite conhecer as cargas efectivamente aplicadas nas vigas.

Modelação das lajes

❑ CYPE: as lajes aligeiradas com vigotas pré-esforçadas foram modeladas com elementos de viga tridimensio-nais e as lajes maciças com elementos finitos triangulares

Page 4: 1999 Lourenco Et Al

de laje, que incluem a deformação por corte. As lajes foram consideradas indeformáveis no seu plano. ❑ MGE, PAC e QSE: as lajes não foram incluídas na modelação. ❑ TRICALC: as lajes aligeiradas com vigotas pré-esfor-çadas foram calculadas, pelo programa, independente-mente do resto da estrutura. As cargas nas vigas resul-taram deste cálculo preliminar. As lajes maciças foram modeladas com uma grelha, com espaçamento de um metro e considerando 60% da rigidez teórica à torção para as barras. Comentário: a consideração das lajes no cálculo da estrutura obriga à divisão das vigas em vários elemen-tos, o que tem consequências no tempo de execução. Para lajes aligeiradas com vigotas pré-esforçadas, parece-nos desnecessário a sua inclusão no cálculo. Para lajes maciças, a sua inclusão pode ser vantajosa, especi-almente no caso do CYPE, que recorre a elementos fini-tos. Este programa considera elementos triangulares sempre com 0.25 m de tamanho, conduzindo a um grande esforço de cálculo.

Modelação das paredes e núcleos ❑ CYPE: as paredes foram modeladas com elementos finitos triangulares de casca espessa com deformação por corte. ❑ MGE e QSE: as paredes foram modeladas através de um pilar de grande rigidez, ligado a vigas com troços rígidos. ❑ PAC: os núcleos foram modelados através de um con-junto de barras (pilares de reduzidas dimensões nos can-tos e nas extremidades da secção, pilares de grandes dimensões no interior da parede e vigas de grande rigi-dez). ❑ TRICALC: modelação com pilares, vigas e barras dia-gonais. Comentário: a modelação do CYPE para paredes e núcleos é a mais poderosa, sendo a do MGE e do QSE mais simples e habitual. Apesar da mesma modelação poder ser efectuada pelo PAC e pelo TRICALC, as modelações efectivamente adoptadas parecem-nos mais discutíveis, dada a complexidade na obtenção dos esforços resultantes na parede e núcleos.

Análise Dinâmica a) Modelação das estruturas A análise do comportamento dinâmico de estruturas re-ticuladas de betão armado pode ser efectuada de diver-sas formas. A forma habitual para a projecto de estruturas é proceder a uma análise dinâmica linear, combinada com coeficientes de comportamento que tomam em consideração o comportamento não linear do material. Dos programas em estudo, apenas o QSE não efectua a análise dinâmica. Neste caso, a consideração da acção sísmica passa pela avaliação, exteriormente ao programa, de forças equivalentes aos seus efeitos. Nos exemplos estudados, o programa CYPE apenas consi-derou as duas componentes ortogonais horizontais de translação da acção sísmica, ao passo que os programas MGE, PAC e TRICALC consideraram ainda a componente rotacional. Em termos de análise dinâmica é possível estabelecer os seguintes comentários:

❑ MGE e PAC: a estrutura é discretizada através de pór-ticos planos com condensação a um modelo tridimensio-nal de três graus de liberdade por piso. A resposta é cal-culada por análise modal espectral, com a obtenção dos esforços máximos de combinação por pórtico, por parte do MGE, e a obtenção de forças sísmicas equivalentes por piso e por pórtico, no caso do PAC. ❑ CYPE e TRICALC: a estrutura é discretizada através de um modelo espacial de 6 graus de liberdade por nó, com condensação a 3 graus de liberdade por piso. A resposta é calculada por análise modal espectral, com a obtenção dos esforços máximos da estrutura. b) Frequências de vibração Na Tabela 2 transcrevem-se os valores das frequências próprias de vibração relativas ao Exemplo 1. Na tabela encontram-se também representadas as frequências pró-prias de vibração, associadas aos primeiros modos com deformada de translação nas direcções x-x e y-y, obtidas pelo método de Rayleigh. Estes valores podem constituir um bom indicador da qualidade dos resultados obtidos pelos diferentes programas.

Tabela 2 - Exemplo 1: frequências próprias (Hz) e direc-ções dominantes dos modos de vibração.

Modos de

Vibração

Programas Método de Rayleigh

CYPE MGE PAC TRICALC DIR. X DIR. Y

1º Modo 1.22 (?) 1.04 (x) 1.03 (x) 1.14 (?) 1.14 2.77 2º Modo 1.44 (?) 1.49 (θ) 1.57 (θ) 3.06 (?)

3º Modo 2.20 (?) 2.76 (y+θ) 2.85 (x) 3.07 (?)

4º Modo 3.20 (?) 2.94 (x) 2.87 (y) 5.16 (?) 5º Modo 4.10 (?) 4.87 (θ) 4.80 (x) 6.98 (?)

6º Modo 5.91 (?) 5.07 (?) 4.98 (y+θ) 9.55 (?)

x: direcção x; y: direcção y; θ : rotação; ?: desconhecido

Os valores das frequências próprias de vibração referen-tes ao Exemplo 2 são apresentadas na Tabela 3.

Tabela 3 - Exemplo 2: frequências próprias (Hz) e direc-ções dominantes dos modos de vibração.

Modos de

Vibração

Programas Método de Rayleigh

CYPE MGE PAC TRICALC DIR. X DIR. Y

1º Modo 1.41 (?) 1.25 (θ) 1.14 (θ) 1.74 (?) 1.10 1.27

2º Modo 1.43 (?) 1.37 (θ) 1.21 (θ) 2.62 (?)

3º Modo 1.63 (?) 1.54 (θ) 1.37 (θ) 4.40 (?)

4º Modo 3.74 (?) 3.52 (θ) 3.01 (θ) 6.24 (?)

5º Modo 4.28 (?) 4.62 (θ) 3.58 (y+θ) 6.57 (?)

6º Modo 4.52 (?) 5.05 (?) 3.97 (θ) 8.45 (?)

x: direcção x; y: direcção y; θ : rotação; ?: desconhecido No Exemplo 2, as frequências transcritas na Tabela 3 estão associadas a modos de vibração caracterizados por deformadas de rotação (torção da parte superior do edifício), devido à irregularidade em altura da estrutura. A proximidade entre os valores das frequências regis-tadas pelos vários programas e os valores obtidos pela análise com recurso ao método de Rayleigh não traduz nenhum significado físico. O estudo sísmico deste exem-plo, com base no método de Rayleigh, é completamente desadequado e não deve ser realizado, pois este método

Page 5: 1999 Lourenco Et Al

apenas fornece duas frequências de translação, uma em cada direcção. As estruturas com irregularidades em altura de massa e/ou rigidez devem ser analisadas, em termos dinâmicos, com modelos tridimensionais para que o efeito de torção possa ser considerado. Da observação das Tabelas 2 e 3 constata-se que o pro-grama TRICALC apresentou frequências claramente diferentes das dos outros programas. Este facto estará, provavelmente, relacionado com o tipo de modelação adoptada pelo utilizador para as paredes e núcleos. Para uma melhor comparação entre os programas seria conveniente proceder à análise do corte basal associado à acção sísmica, em cada direcção e para cada programa. Tal não é possível, uma vez que apenas o MGE e PAC permitem conhecer estes valores. Os programas CYPE e TRICALC não possibilitam qualquer controlo do valor das forças envolvidas.

Análise comparada dos esforços Um dos principais objectivos deste trabalho consistia na comparação dos esforços obtidos pelos diferentes pro-gramas que aceitaram o desafio proposto. Embora as es-truturas que serviram de base a este estudo sejam as mesmas, a sua modelação e cálculo obriga, necessaria-mente, à adopção de algumas hipóteses simplificativas por parte dos utilizadores. Estas opções, associadas às limitações dos próprios programas, podem conduzir a diferenças significativas de esforços entre elementos. Dado o elevado volume de informação que, em regra, resulta das análises tridimensionais, optou-se por soli-citar o conjunto de resultados relativos somente a alguns elementos que se consideraram representativos. Este facto, e o não conhecimento aprofundado dos progra-mas (entrada de dados, opções permitidas, modelos de cálculo adoptados, etc.) podem, eventualmente, falsear algumas das considerações que a seguir se apresentam. Para a comparação dos esforços obtidos pelos diversos programas seleccionaram-se os seguintes elementos: vi-ga V1 (Exemplo 1, alinhamento 1, piso 1) com três vãos de 7m, 6m e 7m; viga VE (Exemplo 2, alinhamento E, piso 3) com três vãos de 6m; pilar P1A (Exemplo 1, ali-nhamentos 1 e A); pilar P5E (Exemplo 2, alinhamentos 5 e E); parede PB (Exemplo 1, alinhamento B). A metodologia adoptada consistiu na identificação dos esforços elásticos obtidos nas secções mais solicitadas (apoios e vão). Dadas as dificuldades de comparação em elementos solicitados à flexão composta, foi também efectuada a identificação das quantidades de armadura obtidas e/ou as soluções de pormenorização. a) Vigas De modo a permitir uma melhor comparação, represen-taram-se, nas Figuras 3 e 4, os gráficos dos valores da envolvente de esforços nas secções à esquerda e à direita dos apoios e de meio vão para as vigas V1 do Exemplo 1 e VE do Exemplo 2 (quando indicados). Da Figura 4 constata-se existir uma diferença significativa entre os valores dos momentos, em particular nos negativos. As diferenças entre os programas MGE e PAC poderão ser parcialmente justificadas pelas cargas aplicadas nas vigas (no MGE foi considerada uma diminuição de carga na viga de bordadura, devido ao efeito de continuidade da laje, enquanto que no PAC se admitiu uma repartição de carga baseada na área de influência). Outro aspecto relevante que poderá conduzir a

variações de esforços é a consideração (ou não) da deformabilidade axial dos pilares. No caso do programa CYPE é possível que a diferença (muito significativa) possa ser parcialmente explicada pela inclusão das lajes na modelação, conduzindo parte da carga directamente para os apoios.

-250-200-150-100-50

050

100150

A1d V1 A2e A2d V2 A3e A3d V3 A4e

CYPETricalcMGEPACQSE

Figura 3 - Exemplo 1: envolvente de momentos flecto-

res na viga V1 (piso 1).

-600

-500

-400

-300

-200

-100

0

100

200A1d V1 A2e A2d V2 A3e A3d V3 A4e

CYPETricalcMGEPAC

Figura 4 - Exemplo 2: envolvente de momentos flecto-res na viga VE (piso 3).

Tentou-se proceder à comparação dos esforços devidos a uma determinada combinação de acções (por exemplo, a combinação fundamental de acções tendo como acção variável de base a sobrecarga). Porém, tal não foi possí-vel uma vez que alguns dos programas apenas indicam, para cada secção, os esforços envolventes de todas as combinações efectuadas. A forma encontrada para possi-bilitar a comparação directa entre os diferentes resulta-dos foi a de determinar o valor da carga uniformemente distribuída equilibrada pelos esforços envolventes, p, considerando como vão a distância a eixos dos apoios. A carga foi determinada através da seguinte expressão:

( ) ( ) ( )2/L

MMM2MMMMM2p

2

221

2v2121v −−−++−−

=

sendo L a distância entre apoios, M1 e M2 os momentos nas extremidades 1 e 2, com o sinal correspondente, e Mv o momento máximo no vão. Na Tabela 4 apresentam-se os valores obtidos, por apli-cação da expressão anterior, à viga V1 do Exemplo 1.

Tabela 4 – Exemplo 1: valores da carga distribuída equi-librada pelos momentos flectores envolven-tes da Viga V1.

Vão CYPE TRICALC MGE PAC QSE 1 35.5 50.4 43.5 43.0 47.6 2 38.6 48.6 45.1 42.7 42.1 3 35.5 45.8 43.6 43.0 47.6

Page 6: 1999 Lourenco Et Al

Dos resultados obtidos (flexão e esforço transverso) ha-verá que salientar: - os valores sistematicamente inferiores corresponden-

tes à solução proposta pelo programa CYPE; - a não ocorrência da esperada simetria nos resultados

da viga V1 no programa TRICALC; - nenhum dos programas procede ao dimensionamento

da armadura de suspensão, necessária nos apoios indirectos (Exemplo 1, viga VA).

b) Pilares Alguns dos programas não apresentam os esforços nos pilares associados a cada combinação de acções, sendo apenas indicados os esforços correspondentes à combi-nação mais condicionante, o que dificulta a análise de resultados. Não sendo as combinações condicionantes as mesmas em todos os programas, optou-se por comparar a área de armadura efectiva obtida nas secções da base de todos os troços dos pilares P1A (Exemplo 1) e dos troços dos pisos 2, 4, 6 e 8 do pilar P5E (Exemplo 2), fi-gura 5. A análise desta figura permite confirmar de uma forma geral os comentários tecidos em relação aos esfor-ços das vigas: valores inferiores obtidos no programa CYPE e superiores no TRICALC. É, no entanto, de assi-nalar que as diferenças registadas ao nível das quanti-dades de armadura poderão estar associadas: às diferen-ças nos esforços elásticos obtidos; à inclusão (e metodo-logia adoptada) ou não dos efeitos de 2ª ordem; ao dimensionamento em dupla flexão composta ou em fle-xão desviada composta; aos critérios adoptados para a escolha de varões e sua variação em altura. Na verificação da segurança dos pilares ao estado limite último de encurvadura, todos os programas procedem ao agravamento dos esforços, quando necessário. A clas-sificação da estrutura (nós fixos ou nós móveis) é, em todos eles, definida pelo utilizador. A esbelteza dos elementos foi calculada de forma automática pelos pro-gramas MGE e PAC recorrendo, para o efeito, às regras preconizadas no REBAP. De acordo com os responsáveis da ARKTEC, também o TRICALC o pode fazer. Nos programas CYPE e QSE, é necessário proceder à atribuição, pilar a pilar, dos respectivos comprimentos efectivos de encurvadura. Os programas CYPE e TRICALC não fornecem quais-quer resultados intermédios, apresentando unicamente os esforços finais (não permitindo ao projectista aferir da importância ou não destes efeitos).

0

5

10

15

20

25

Piso1 Piso2 Piso3 Piso4

CYPETricalcMGEPACQSE

0

10

20

30

40

50

60

70

Piso 2 Piso 4 Piso 6 Piso 8

CYPETricalcMGEPAC

Figura 5 - Pilares: áreas de armadura, em cm2. a) pilar

P1A; b) pilar P5E.

c) Paredes As paredes são elementos resistentes fundamentais ao equilíbrio das acções horizontais. A sua importância é acrescida em estruturas situadas em regiões de sismi-cidade elevada. Dada a grande rigidez destes elementos aos deslocamentos horizontais, é necessário dedicar especial atenção aos esforços resultantes (em particular ao nível da fundação, que se poderão traduzir em dimensões de sapatas não exequíveis). Será, pois, conveniente que os programas procedam à montagem de um output que permita ao projectista aferir, de forma simples, a sua resposta. No que respeita à modelação, as paredes são, sem dúvida, os elementos estruturais em que as diferenças entre os diversos programas são mais significativas. Elas traduzem-se quer ao nível da discretização (por elemen-tos de casca, por barras contraventadas por diagonais ou por uma barra única), quer no tipo de resultados impressos, ver Lourenço et al. (1998)

d) Comentários gerais A análise dos resultados anteriores possibilitam que se teçam alguns comentários aos programas em estudo. Nos parágrafos seguintes, e procurando unicamente respeitar a ordem de apresentação dos programas, referem-se aquelas que consideramos serem as suas principais qualidades e defeitos. ❑ CYPE: este programa tem a particularidade de trabalhar os diagramas de esforços na zona dos nós, re-correndo ao equilíbrio no interior do nó. No cálculo dos esforços das vigas, nesta região, são consideradas distri-buições de tensões lineares associadas aos esforços dos pilares nas secções superior e inferior do nó. Resulta, assim, um diagrama de esforços nas vigas que é arre-dondado e contínuo sobre a largura do pilar. Os esforços

a)

b)

Page 7: 1999 Lourenco Et Al

fornecidos pelo programa correspondem ao valor máxi-mo que ocorre entre eixos dos nós das vigas. Este proce-dimento é também aplicado aos pilares, resultando, em geral, momentos nulos no eixo do nó, sendo os valores condicionantes os correspondentes às faces superior e inferior da viga (valores inferiores aos usualmente consi-derados). Esta metodologia não é comummente prati-cada nas análises lineares, sendo discutível se os coeficientes de segurança usualmente adoptados a contemplam e se a segurança global da estrutura não é afectada. O programa não fornece listagens dos esforços para as diferentes acções e combinações de acções (só é possível a sua visualização, barra a barra, em visor), apresen-tando apenas os esforços envolventes. A visualização de deformadas não é possível. É ainda de referir que, nos exemplos em estudo, foram consideradas 52 combina-ções de acções. Estas características não permitem uma fácil análise e verificação dos resultados e impossibili-tam que o projectista conheça a acção ou combinação condicionante. A informação relativa ao dimensionamento das armadu-ras das vigas não é apresentada, sendo apenas indicadas as armaduras a colocar e os respectivos comprimentos, não permitindo uma análise crítica do resultado. Relativamente à segurança ao estado limite último de encurvadura, o programa procede ao agravamento de esforços devido aos efeitos de 2ª ordem. O comprimento efectivo de encurvadura é definido pelo utilizador atra-vés de uma constante que afecta o comprimento de cada troço de pilar. Não são, no entanto, apresentados quais-quer valores relativos aos diferentes parâmetros calcula-dos (esbeltezas, excentricidades adicionais) que permi-tam concluir da sensibilidade da estrutura a este tipo de efeitos. Este programa não permite a listagem de quaisquer esforços nas paredes, sendo unicamente tabeladas as quantidades de armadura requeridas. No que se refere às fundações, são apenas apresentados os esforços na base dos pilares (valores não majorados e não combinados) para cada uma das acções considera-das. ❑ TRICALC: este programa apresenta simultaneamente os esforços e deslocamentos devidos às diversas combi-nações em estudo, bem como as envolventes. Nos pilares, o programa procede à apresentação dos es-forços devidos a cinco combinações correspondentes aos esforços axiais máximo e mínimo, aos momentos flecto-res máximos em cada um dos eixos principais do pilar e à combinação condicionante em termos de armaduras. Os efeitos de 2ª ordem podem ser contabilizados de acordo com o disposto no REBAP. As paredes estruturais foram modeladas através de pila-res de secção de 0.2 × 1.0 m2 e de diagonais de 0.2 × 0.2 m2. De acordo com o representante, o objectivo era simular a rigidez equivalente da parede. Este tipo de modelação, e o facto de o programa não efectuar o di-mensionamento automático das paredes, dificultam quer a análise dos resultados quer o cálculo da armadura. Nas fundações são apresentados, para cada acção, os esforços na base dos pilares e os valores extremos (máxi-mos e mínimos) da envolvente de todas as combinações. ❑ MGE: a técnica adoptada na modelação da estrutura tridimensional consiste na sua discretização em pórticos planos. Obtém-se, assim, um conjunto de resultados com

um formato tradicional, permitindo uma mais fácil interpretação dos mesmos. Para as vigas são apresentados os deslocamentos e os esforços devidos às diversas acções e combinações de acções. É ainda de salientar a informação detalhada relativa ao cálculo das armaduras (longitudinal e transversal) que permite a sua fácil verificação. Para cada troço de pilar, entre pisos, são apresentados os valores dos parâmetros requeridos no estudo da en-curvadura (classificação da estrutura; comprimentos efectivos de encurvadura e esbeltezas segundo ambas as direcções; esforços devidos às cargas quase-permanen-tes), de acordo com o estipulado no REBAP. Para as diferentes combinações de acções, são fornecidos os esforços elásticos, as excentricidades adicionais obtidas, os esforços de dimensionamento e as correspondentes quantidades de armadura. Esta metodologia tem a gran-de vantagem de permitir ao Engenheiro projectista veri-ficar qual a combinação condicionante e a sua impor-tância relativa. Os valores relativos ao dimensionamento das armaduras transversais não são apresentados. As paredes são modeladas com uma barra que inclui rigidez à torção, não sendo possível o seu dimensiona-mento automático. Relativamente aos apoios, o programa não fornece quaisquer reacções e não procede ao dimensionamento das fundações. A opção de não incluir as reacções nos resultados dificulta a verificação global de equilíbrio. ❑ PAC: a análise estrutural é em tudo semelhante à adoptada pelo programa MGE. Assim, são apresentados os deslocamentos e os esforços para cada acção, bem como os esforços associados a cada combinação de acções. A informação relativa ao cálculo da armadura longitudinal é apropriada. Os esforços transversos de dimensionamento não foram apresentados em tabela. Para cada troço de pilar é fornecida a informação relati-va aos diversos parâmetros necessários ao cálculo das excentricidades adicionais de acordo com as regras pre-conizadas no REBAP. São também apresentados os es-forços associados às diversas combinações, podendo o utilizador especificar o número de combinações mais desfavoráveis a incluir na listagem. São apresentados os valores das armaduras longitudinais e transversais requeridos. As paredes foram tratadas como uma associação de pila-res e vigas, não sendo possível o seu dimensionamento automático. Para cada sapata, o programa fornece a listagem dos es-forços associados a cada uma das combinações de acções em estudo. São apresentadas as dimensões do pilar e da sapata, as quantidades de armadura inferior e superior, segundo cada uma das direcções, e as tensões no solo, associadas à situação mais gravosa. ❑ QSE: o programa QSE fornece os esforços devidos às diferentes combinações bem como às envolventes. Não foram fornecidos os esforços nem os deslocamentos de-vidos a cada uma das acções. O programa permite a im-pressão de gráficos com as envolventes de todos os es-forços, barra a barra. Infelizmente foram-nos fornecidos sem distinção do tipo de traço, impossibilitando a sua leitura. O cálculo da armadura é apresentado de uma forma muito complexa (excessiva informação) dificul-tando a sua análise. O dimensionamento é efectuado com base na BS8110, cuja aplicação em Portugal é discutível.

Page 8: 1999 Lourenco Et Al

Os esforços de dimensionamento dos pilares, tendo em conta os efeitos de 2ª ordem, são obtidos através da apli-cação das regras definidas na norma inglesa, tendo o comprimento de encurvadura sido considerado igual ao comprimento do elemento. O volume de informação in-cluído na listagem para cada troço de pilar é excessivo e apresentado de forma muito densa, o que dificulta a ve-rificação e apreciação dos resultados por parte do utili-zador. Para as paredes não foram fornecidos os diagramas envolventes de esforços (N-My) e (N-Mz), pelo que não é possível tecer qualquer comentário aos resultados.

Dimensionamento e Representação das Armaduras Relativamente ao dimensionamento e representação grá-fica de armaduras, foram analisados os seguintes ele-mentos estruturais: sapatas, pilares, paredes estruturais e vigas. Refira-se que alguns destes programas permi-tem tratar outros tipos de elementos como vigas parede, consolas curtas, vigas de equilíbrio em fundações e lajes maciças, nervuradas ou aligeiradas. Os cinco programas permitem calcular as secções de armaduras em pilares e vigas e todos, excepto o MGE, efectuam o cálculo das armaduras em sapatas. CYPE, PAC e TRICALC permitem obter desenhos com a por-menorização das armaduras. O programa QSE apenas fornece esquemas dos alçados das armaduras em vigas e o MGE não produz qualquer desenho. O CYPE é o único que calcula e pormenoriza as armaduras em paredes estruturais. Com a excepção do programa QSE, os fornecedores afir-mam que os programas seguem o REBAP relativamente aos materiais, métodos de cálculo e disposições cons-trutivas de armaduras. O programa QSE está de acordo com a norma britânica BS8110. Todos os programas calculam as secções de aço necessá-rias para o momento flector e para o esforço transverso em vigas. Os que utilizam uma formulação de pórtico tridimensional (CYPE, TRICALC e QSE) calculam também as armaduras para a torção. O TRICALC e o CYPE fornecem armaduras de alma e este último determina ainda as armaduras de ligação banzo-alma nas vigas em T. Com a excepção do MGE, os programas definem as armaduras para as áreas calculadas e fazem a sua por-menorização. CYPE, PAC e TRICALC apresentam alça-dos e cortes das vigas. Na pormenorização é possível limitar os diâmetros dos varões a utilizar, o número de dispensas a efectuar e a utilização, ou não, da armadura de montagem como resistente. Os programas só consideram estribos verticais como armadura transversal e, em apoios indirectos de vigas, nenhum fornece armadura de suspensão. Nos programas CYPE e TRICALC é feito um controlo das flechas das vigas. No primeiro, define-se uma flecha activa como a flecha a tempo infinito que se dá após a construção das paredes divisórias, sendo o coeficiente de fluência dado pelo utilizador. O valor desta flecha é controlada pelo programa e são dados avisos no caso de serem excedidos os limites pré-establecidos. O QSE faz o controle das deformações através das relações l/h modificadas pela percentagem de armadura, de acordo com a BS8110. Nos cortes transversais das vigas apresentadas pelo TRI-CALC apenas são indicadas as armaduras de montagem

e não a totalidade da armadura. Nas pormenorizações efectuadas pelo CYPE e TRICALC, as armaduras supe-riores ditas “de montagem” aparecem emendadas sobre os apoios. No caso do programa CYPE isto é decidido pelo utilizador. A opção de emendar estas armaduras no apoio não nos parece ser a mais apropriada. As armadu-ras inferiores aparecem muitas vezes emendadas a 100% sobre os pilares. Este procedimento não está de acordo com o artº 93 do REBAP onde se diz que alguns varões das armaduras inferiores devem transitar, sem interrup-ção, de vão para vão através do apoio. A pormenoriza-ção de armaduras longitudinais do QSE apresenta um número elevado de varões de pequeno diâmetro. Os programas CYPE, QSE e TRICALC também dimen-sionam pilares de secção circular. No MGE e no PAC as armaduras longitudinais são calculadas, em cada troço de pilar, nas secções críticas definidas no REBAP. O CYPE verifica unicamente as secções extremas de cada tramo, o que não está de acordo com o REBAP no caso das estruturas de nós fixos. O MGE, CYPE e TRICALC efectuam o cálculo das armaduras em flexão composta desviada por métodos iterativos bastante precisos en-quanto no PAC é utilizado um método aproximado que dá bons resultados. Apenas o QSE e o TRICALC fazem a verificação da segurança dos pilares em relação ao esfor-ço transverso. Os programas CYPE, PAC e TRICALC produzem tabelas de pilares que nos agradaram. Só o CYPE permite o cálculo, pormenorização e desenho de armaduras em paredes resistentes ou núcleos de betão armado. O programa permite determinar armadu-ras nas duas faces e verificar as tensões no betão. Os cortes das paredes que o programa produz são acom-panhados de esquemas das armaduras horizontais, ver-ticais e eventuais estribos. Com excepção do MGE que não possui um módulo de cálculo específico, os programas fazem o dimensiona-mento da geometria e das armaduras das sapatas. O CYPE apresentou bons desenhos de sapatas com plan-tas, alçados e cortes onde se incluem as armaduras de arranque dos pilares. No caso da sapata das paredes do Exemplo 1, a disposição de armaduras não nos pareceu ser a melhor. O TRICALC apresentou uma tabela onde, para cada sapata, constava uma planta, a altura e as armaduras. O PAC apresenta cortes das sapatas onde todas as dimensões e armaduras estão definidas. Nos resultados do QSE apenas se encontra uma planta esquemática das sapatas onde se definem as armaduras e dimensões.

Tempos de cálculo A Tabela 5 apresenta, para os Exemplos 1 e 2, os tempos de cálculo aproximados de cada um dos programas.

Tabela 5 - Tempos de cálculo (dados dos representantes dos programas).

Programa Exemplo 1 Exemplo 2 CYPE Cad 15 minutos 8 horas

MGE < 5 min < 10 min PAC Pórticos < 5 min < 10 min

QSE < 5 min < 10 min TRICALC 1 min 7 horas

Em relação aos programas CYPE e TRICALC, foram uti-lizados computadores com processador Pentium a 166 MHz e 32 Mb de RAM. É de esperar que os tempos de

Page 9: 1999 Lourenco Et Al

cálculo não sejam significativamente reduzidos com ou-tros processadores, dado que o tempo de acesso ao disco deverá ser condicionante. Os tempos de cálculo gastos com estes programas, no Exemplo 2 (edifício de apenas oito pisos) são elevados, o que poderá condicionar a sua utilização em edifícios de grande porte.

Espaço requerido em disco

A Tabela 6 apresenta o espaço em disco necessário em cada um dos programas, para os exemplos 1 e 2, consta-tando-se que o programa CYPE exige recursos elevados.

Tabela 6 - Espaço em disco aproximado (dados dos representantes dos programas).

Programa Exemplo 1 Exemplo 2 CYPE Cad 100 Mb 1000 Mb

MGE 0.5 Mb 1.0 Mb PAC Pórticos 2.5 Mb 7.5 Mb

QSE 0.5 Mb 1.0 Mb TRICALC 1.5 Mb 55 Mb

Preço aproximado

A Tabela 7 apresenta os preços aproximados para os módulos necessários para efectuar os cálculos apresen-tados. Existem diversas condições especiais e promoções temporárias.

Tabela 7 - Preço aproximado (dados dos representantes dos programas, Outubro 1997).

Programa Custo (+IVA) CYPE Cad 700.000$00

MGE 100.000$00 PAC Pórticos 500.000$00

QSE 300.000$00 TRICALC 600.000$00

Sistema operativo

A Tabela 8 apresenta os sistemas operativos utilizados. O CYPE tira partido das vantagens do WINDOWS não tendo a sua interface típica. Uma versão WINDOWS do PAC Pórticos é esperada a curto prazo. No contexto actual considera-se fundamental a existência de uma versão WINDOWS.

Tabela 8 - Sistema operativo

Programa Sistema Operativo CYPE Cad, QSE e Tricalc WINDOWS

MGE e PAC Pórticos DOS

Conclusões

É inevitável concluir-se que ainda há muito a fazer no domínio e nos processos de cálculo do projecto de estru-turas. As conclusões do presente estudo são fortemente limitadas pelas dificuldades em analisar com detalhe os resultados de cálculos efectuados por outros, neste caso, os representantes dos programas. Por outro lado, o utilizador do programa foi sempre diferente e, ainda que os exemplos calculados se encontrassem perfeitamente definidos à partida, as opções de modelação foram diferentes, nomeadamente no que respeita aos núcleos e paredes, resultando em dificuldades acrescidas na

comparação dos resultados. Evidentemente que modelos diferentes podem conduzir a resultados diferentes, no entanto, as diferenças de valores encontradas nos resultados dos diferentes programas, que em alguns casos variam na proporção de 1:3, são dificilmente justificáveis. Independentemente de um programa poder ser mais adequado que outro, para um determinado caso concreto, pretende-se com esta comunicação chamar a atenção para a necessidade de um melhor controlo dos projectos e de uma utilização responsável dos programas de cálculo. Só com um esforço colectivo intenso, que se traduza em medidas efectivas, é que poderá ser possível alterar as situações preocupantes que muitas vezes se encontram na área do projecto de estruturas. Os responsáveis desta comunicação têm fé que este debate de ideias possa ser mais um passo para elevar o nível da Engenharia em Portugal.

Agradecimentos

Agradece-se a colaboração do Eng. Mateus Gomes e das empresas Arktec Portugal, Gipac, Newton e Top na análise das estruturas propostas e fornecimento dos resultados que permitiram a realização do presente estudo.

Referências

Costa, J.M. — Métodos de avaliação da qualidade de projectos de edifícios de habitação — Tese de Doutoramento, Faculdade de Engenharia de Universidade do Porto (1995). Lourenço, P. B., Gomes, A., Oliveira, D. V., Marques, E. M., Vinagre, J. e Oliveira, R. — Análise de duas estruturas porticadas em betão armado com recurso a cinco programas de cálculo automático — Relatório 98-DEC/E-1, Guimarães, Universidade do Minho (1998). Lourenço, P. B., Oliveira, A.F. — Análise comparada de uma estrutura porticada em betão armado — Jornadas Portuguesas de Engenharia de Estruturas, LNEC, Lisboa, pp. 131-140 (1998).