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16 CAWRIS William Bascon

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  • 16 CAWRIS

    William Bascon

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    PREFCIO

    A divinao com dezesseis cawris relaciona-se em mitologia, talvez historicamente e, com certeza, morfologicamente, com a divinao de If. Para integral compreenso do que aqui relatado, os leitores deveriam consultar DIVINAO IF: COMUNICAO ENTRE DEUSES E HOMENS NA FRICA OCIDENTAL (Bascom 1969), e as referncias a este trabalho so feitas a fim de habilit-los a encontrar as passagens relevantes mais prontamente.

    Mantenho ainda meu reconhecimento a funcionrios coloniais e cidados nigerianos neste e nos outros trabalhos precedentes, e sou grato ao Conselho de Pesquisa de Cincia Social de Nova Iorque por haver apoiado meu primeiro trabalho de campo entre os Yorb, em 1937-38. Mas o principal suporte da pesquisa para este livro foi assegurado por uma doao Fullbright em 1950-51, ocasio em que os versos de divinao foram gravados em fita. Estipndios proporcionados pelo Instituto de Estudos Internacionais da Universidade da Califrnia, em 1960, e pelo Conselho de Pesquisa de Cincia Social, em 1965, possibilitaram visitas mais breves Nigria para pesquisa ulterior.

    So expressados no Captulo I os meus reconhecimentos a M. O. Oyawoye, que fez a traduo inicial e a maior parte da transcrio, aos dois outros iorubanos que nela colaboraram, e minha esposa Berta, que realizou a gravao. Tambm no mesmo captulo, bem como na dedicatria do presente livro, expresso a minha gratido a Salak, o divinador que ditou os versos divinatrios dos dezesseis cawris aqui apresentados.

    PRIMEIRA PARTE:

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    INTRODUO

    Dezesseis cawris (rndnlgn, ow mrndnlgn) uma forma de divinao empregada pelos Yorb da Nigria e por seus descendentes no Novo Mundo. mais simples que a divinao If e menos apreciada na Nigria mas, nas Amricas, mais importante que If porque mais conhecida e mais freqentemente empregada. Tal fato pode decorrer de sua relativa simplicidade; da popularidade de ng, Iemonj, Oun e outros deuses Yorb com os quais os dezesseis cawris so associados; e do fato de que podem ser praticadas tanto por homens quanto mulheres, as quais em nmero, excedem os homens nesses cultos, enquanto apenas homens podem praticar If.

    A importncia diferenciada desses dois sistemas de divinao na frica e nas Amricas provavelmente explica o descaso face os dezesseis cawris dos estudiosos da cultura Yorb comparados aos da cultura Afrocubana. Existem numerosos estudos de divinao If entre os Yorb (ver as bibliografias em Bascom, 1961 e 1969, alm de importantes publicaes subseqentes), mas eu sei de apenas dois que tratam de dezesseis cawris na frica. Um dedica apenas dezessete pginas a esse tpico (Ogunbiyi 1952:65-81) e o outro, menos que trs pginas (Maupoil 1943:265-268). Ao invs disso, apareceram muitas publicaes a respeito em Cuba, onde os dezesseis cawris so conhecidos por dillogun ou los caracoles (Lachataere 1942, Hing 1971, Rogers 1973, Cabrera 1974, Elizondo s. d., Suarez s. d., Annimo s. d.). Conquanto a divinao If tambm seja praticada e altamente considerada em Cuba, dezesseis cawris , provavelmente, o mais importante sistema divinatrio nos cultos afro-cubanos. No Brasil, conhecido por Dologum, Edilogun, Endilogum (Alvarenga 1950:157-158), Merindilogum ou Eu (Bastide e Verger, 1953:378).

    Enquanto a divinao If empregada pelo Ewe e Fon para o oeste dos Yorb e pelos Edo, do Benin, para o leste, e talvez por outros vizinhos, conheo apenas um relato sobre divinao dos dezesseis cawris na frica, que pode no se relacionar aos Yorb. a breve nota de Maupoil, do Daom. Diz ele que de origem Nag (Yorb) e que conhecida como Legba-kika. Um devoto de Oshun, em If, Nigria, tambm denominou a divinao de Elegba, outra designao para Eu, ou Exu, conforme conhecido no Brasil. Os nomes das divindades associadas com as figuras, conforme dados por Maupoil, so

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    predominantemente, embora no exclusivamente, Yorb, sugerindo que seus informantes eram Nags ao invs de Fon. Temporariamente pelo menos, dezesseis cawris podem ser considerados especificamente uma forma de divinao Yorb. Os Yorb, que somam cerca de treze milhes de pessoas, habitam nos estados oeste e Lagos, na poro meridional do estado de Kwarra, a sudoeste da Nigria, e no Daom oriental, com encraves mais longe a oeste no Daom central e ao longo da fronteira Daom-Togo.

    A divinao com dezesseis cawris empregada nos cultos de ril e outras divindades brancas, nos cultos de Eu, y, ng, un, b, Yemj, Yew, Nan Buruku e, em algumas cidades, osi e opon. Yew a deusa do rio Yew, b, a deusa do rio b, e Nan Buruku uma deusa associada com uma espcie de cobra que se afirma viver dentro d'gua; a natureza dessas outras divindades ser abordada no Captulo III.

    O presente estudo baseado em informaes fornecidas por Salak (Slk), um divinador no culto de ril, em y, Nigria, que nasceu, foi iniciado e treinado em Igana, uma cidade a umas cinqenta milhas a oeste e que foi subordinada a Alafin, rei de y. Que eu saiba, o primeiro estudo srio dos dezesseis cawris entre os Yorb e a primeira coletnea de seus versos de divinao a ser publicada. Ademais, supe-se represente o corpo inteiro de versos divinatrios sabidos por um nico e instrudo divinador.

    Comparada divinao If, com sua manipulao de dezesseis dends ou mesmo o lanamento de seu opel, a dos dezesseis cawris simples. Os cawris so lanados sobre um tabuleiro de cestaria e o nmero de conchas abertas de boca pra cima contado. H, apenas, dezessete posies ou figuras n +1 ou zero a dezesseis. Entretanto, a memorizao dos versos to difcil e demorada quanto o aprendizado dos de If. As conchas de cawri que so usadas em divinao no so as que outrora (ow y) eram usadas como dinheiro, mas uma menor (ow r). A bandeja de vime tranado (t) plana e do tipo usado para arrumar contas, sal e outros materiais midos para serem vendidos no mercado (veja-se verso A40).

    As dezessete figuras da divinao com dezesseis cawris tem nomes dos quais diversos so cognatos dos nomes das figuras de If. No quadro I, o numeral inicial indica o nmero de cawris abertos para cima, seguido do nome da figura respectiva. Uma vez que a ordem das figuras no quadro I difere daquela pela qual seus versos foram recitados por Salak, esta ltima foi identificada em seqncia

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    alfabtica para o caso de referncia a versos isolados. Assim, por exemplo, A40 indica o quadragsimo verso de Eji Ogb, a figura que tem oito conchas abertas para cima. Seguindo as letras, vm os nomes das divindades ou de outras entidades super-humanas associadas s figuras, conforme fornecido por Salak. A ltima coluna, de numerais indica o nmero de versos registrados para cada figura.

    1 krn D rnyan 7

    2 j k E Ibej (gmeos) 7

    3 gnd H Yemoj 12

    4 rsun F Oblfn (i. e., ril) 22

    5 - G - Oun 15

    6 br I Ornml (i. e., If) 19

    7 di J - gb gb (i. e., abik1) 18

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    8 ji Ogb A - ri Rowu (uma divindade branca) 49

    9 - s C - y 19

    10 fn B Obnl (i. e., risal) e Odu (i. e., Odudu)

    14

    11 - wnrn K gn (i. E., Egngn) 13

    12 jil bor L - ng 8

    13 ka M - pn 2

    14 Otrpn N Okirikishi 2

    15 fn Knrn O gn 1

    16 rt P Oluofin (uma divindade branca) 1

    0 Opr Q gbni 1

    Todos esses nomes aplicam-se tambm as figuras na divinao If (Bascom 1966), excetuados Eji Oko (2), Ejila bra (12) e Opira (0). Como em If, existem nomes alternativos para certas figuras, algumas das quais so dadas no Apndice. Tambm no apndice, quadro 2 apresenta os nomes das figuras fornecidas por outras fontes Yorub e para o Daom, Brasil e Cuba; o Quadro 3 mostra as divindades e outras entidades super-humanas associadas com as figuras por algumas dentre as mesmas fontes.

    Quando a figura (od) foi determinada pela primeira jogada dos cawris, o divinador principia a recitar os versos (ee) a ela associados. Esses versos contm as predicaes e os sacrifcios a serem realizados, baseados no caso de um

    1 Crianas nascidas para morrer

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    consulente mitolgico que serve de precedente. A no ser que ele seja sustado pelo consulente, o divinador, recita todos os versos que aprendeu para aquela figura. Do mesmo modo que na divinao If, maiores informaes especficas podem ser obtidas mediante jogadas adicionais dos cawris a fim de escolher entre alternativas especficas ( ), com base na ordem de precedncia das dezessete figuras.

    Por alguma razo que no foi esclarecida, quer a ordem pela qual as figuras esto listadas no Quadro 1 quer a ordem segundo a qual seus versos foram ditados por Salak, 8-10-9-1-2-4-5-3-6-7-11-12-13-14-15-16-0, diferem desta ordem de precedncia, que ele deu como sendo 8-10-4-3-2-1-12-11-9-7-6-5-13-14-15-16-0. Ao escolher entre a mo direita e a esquerda, indicada a direita com um nico lanamento caso 8,10,4,3,2,1 ou 12 aparea. Se surgir 11,9,7,6 ou 5, faz-se necessrio um segundo arremesso; se ento aparece uma dessas figuras menos poderosas, escolhida a mo direita, mas se uma das mais poderosas aparece no segundo lanamento, a mo esquerda escolhida. Se 13,14,15,16 ou 0 aparece ou no primeiro ou no segundo arremesso, no indicada mo alguma no h resposta.

    Ogunbiyi no aborda ibo ou esta ordem de precedncia, mas certa confirmao procede de fontes cubanas. As figuras maiores em Cuba so dadas como sendo 1-2-3-4-8-10-12-13-14-15-16, e as figuras menores como 5-6-7-9-11 (Hing 1971: 60; Rogers 1973: 23; Suarez s.d.: 37,38; Annimo s.d.: 6). Tanto Hing quanto Rogers, entretanto, dizem que a mo esquerda a indicada quando uma figura maior aparece no primeiro jogo. Cabrera (1974: 188) d 1-2-3-4-8-10 como figuras maiores e 5-6-7-9-11-12 como menores.

    Ao contrrio da divinao If (Bascom 1969: 54-58), no existem escolhas simultneas entre cinco alternativas especficas, segundo Salak. A escolha se restringe a duas alternativas, mo direita e mo esquerda. A escolha entre mais de duas alternativas feita apenas mediante perguntas sobre elas, feitas sucessivamente, e recebendo como respostas sim e no. O consulente segura, em cada mo, um pequeno objeto, como, por exemplo, o osso peitoral de um cgado pequeno, simbolizando o desconhecido (m) e um pequeno seixo representando vida longa (k), e pede a ril que indique qual a mo escolhida.

    Por isso, quando um verso pressagiou um benefcio, o consulente pode ficar sabendo sua natureza ao perguntar sim ou no, na seguinte ordem: se uma graa de vida longa (ire k), de dinheiro (ire aj), a de esposas (ire obnrin), a de filhos (ire m), ou uma beno de um novo lugar para viver (ire bjk). Estes

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    benefcios so anlogos s cinco espcies de boa sorte selecionadas simultaneamente na divinao If: vida longa, dinheiro, casamento, filhos e derrota de seu inimigo. Se nenhum desses cinco benefcios indicado pelos cawris significa que a resposta todas as graas (ire gbogb) ou paz e contentamento (lfi).

    Se o verso pressagiou infortnio (ibi), o consulente pode inquirir sucessivamente se trata de morte (ik), de molstia ou enfermidade (rn), de perda (f), de uma briga (j) ou de disputa em tribunal (rn). Essas categorias so tambm semelhantes aos cinco tipos de malefcios selecionados simultaneamente na divinao If: morte, enfermidade, luta, penria de dinheiro e perda. Se nenhum desses cinco tipos escolhido, quer dizer que a resposta todos os gneros de infortnio (ibi gbogb). O consulente pode ento perguntar, por exemplo, se o mal indicado predito para ele prprio, sua esposa, seu filho, seu irmo mais velho, seu irmo mais moo ou um amigo.

    O consulente pode depois perguntar o que se faz necessrio para consolidar o benefcio prometido ou obstar o malefcio augurado. Isto feito perguntando-se, na ordem indicada a seguir, se tem-se de fazer um sacrifcio (b) para Eu ou se para Egungun (gn), ril (r), a cabea do consulente (or), crianas nascidas para morrer (gb gb), runmil (If), ri Oko, Yemoj, a Terra (Il), uma iroko, uma oe, o cho dentro da casa (al il), pna, ou feiticeiras (wn gblgba). Salak sustentou que nunca necessrio mencionar mais do que essas catorze alternativas; uma delas seguramente escolhida.

    Entretanto, se a primeira (b) indicada, significando que um sacrifcio deve ser feito para Eu, necessrio inquirir se deve ser oferecido no assentamento de laterita (yang) que serve como seu altar, em frente casa, em encruzilhada ou bifurcao de caminho (rta meta) onde se diz que ele vive, no quintal dos fundos (hnknl) ou em um monte de refugos (tn). Como na divinao If o objetivo da divinao determinar o sacrifcio correto e nada obtido se ele no for oferecido .Conforme declarado em vrios versos (C18, D3, F15, F16), Oferecer sacrifcios o que ajuda a algum; no oferecer, no ajuda a ningum.

    O nome completo de Salak Maranoro Salak, m Gbonka Igana. Seu primeiro nome quer dizer No envia rancor (M rn oro). O segundo o seu nome de orix, significando Abra pano branco e pendure-o (So l k) no sacrrio

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    de ril. um nome dado a meninos que nascem dentro de uma caul (l2, k) e que, por isso, so identificados como sagrados para ril e destinados a se tornarem seus devotos. As ltimas trs palavras identificam Salak como um filho do chefe Ggnka, da cidade de Igana.

    Salak identificou sua divindade (r), Olufn ou ri Olufn, como um gnero ou tipo de btl . Em outras ocasies, entretanto, ele dizia que o mesmo que btl (Rei do tecido branco), ril(Grande divindade), balufn (Rei Olufn) ou banla (Grande Rei). Em outras oportunidades, ele identificava banla como outro nome para lrun ou Olodumare, o Deus do cu.

    seguro dizer-se que ril, Orianla e btl so nomes alternativos para a mesma deidade. , no entanto, realmente difcil determinar se esses outros nomes so diferentes nomes para a mesma divindade, nomes para diferentes manifestaes da mesma divindade ou nomes para diferentes divindades. Todas so divindades brancas (r funfun), para as quais registrei cerca de noventa e cinco nomes; muitos derivados de nomes de lugares e alguns diz-se referirem-se a filhos de ril.

    Salak afirmou que cada divindade branca tem seu prprio grupo de devotos e sua prpria casa separada de culto (il ri), mas as casas so semelhantes entre si e apenas os devotos conhecem as diferenas entre elas; todas so de ril e todas o reverenciam. Eles usam apenas coisas brancas: contas brancas ( fun) e tecidos brancos, e braceletes, bastes e leques de chumbo esbranquiado (j) anlogo ao estanho. Cozinham com shea butter (ri) ou leo de sementes de melo(gns) em lugar de leo de palmeira cor laranja-avermelhado (epo) que outros empregam, comem nozes brancas de kola (ob ifin) em vez das usuais nozes de cola avermelhadas (ob yipa), e bebem cerveja de milho branco (tn kt) ou gim (tn yinb) ao invs de vinho de palmeira (emu). Caracis e galinhas brancas so sacrifcios favoritos para ril e as outras divindades brancas.

    riOgyian, cujos devotos praticam flagelao, parece ser uma divindade branca distinta ou, pelo menos uma manifestao bastante diferente de ril. O mesmo ocorre com ri Rowu ou ri Lowu, descrito como sendo o primeiro filho de ril. As divindades da colina (ri k), para as quais registrei 2 Caul (ing.) redenho ou mnio. Alm de rede de pescar camares, tambm membrana envolvente de rgos. l designa tecido branco e k, bolsa grande. Pode-se concluir meninos nascidos dentro da bolsa com o lquido amnitico ou nascidos envoltos com o tecido amnitico? (Ndot)

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    outros sessenta e cinco nomes, so tambm consideradas divindades brancas ri Olufn pode ser mais exato, mas ao abordar Salak e sua divinao com dezesseis cawris, usarei o nome mais comum, ril.

    Salak nasceu em Il Gbnka, a casa do chefe Gbnka, em Igana, por volta de 1880. Ele disse que tinha cerca de quinze anos de idade e sabia como fazer uma lavoura antes que o capito R. L. Bower bombardeasse y e destrusse o palcio de Alafin em 1895, nas palavras de Salak, Quando Bower veio para y e disparou armas Pepe (Nigbt Baww l pp). Logo aps seu nascimento, foi levado a um divinador If e seu p foi colocado sobre o tabuleiro divinatrio; o divinador consultou If e confirmou que ele pertencia a ril. No foi iniciado at os quinze anos porque sua av materna no possua dinheiro bastante. A despesas de sua iniciao foram pagas por seu pai e pela me de sua me, que era devota de ril. Quando ela tinha dezenove anos de idade, Adeyyin, sua irm menor da mesma me, foi igualmente iniciada em Igana, e foi seu pai quem pagou.

    Segundo explicao de Salak, para iniciao, os patrocinadores tm de fornecer peixe (j), rato (eku), rato de Tullberg (m) (Abraham I1.78B), pangolim (aka), cgado (ahun), carne de elefante (ran jnku), galinha dangola (tu), galinha (ade), pombo (iyl), caracol (gbn) e sabo (). Depois que a cabea do iniciando tenha sido raspada e um pequeno talho (gbr) feito em sei couro cabeludo, pedacinhos desses ingredientes e um pouco de cabelo oriundo de perto do corte so socados juntos e moldados em forma de pequeno tablete, aproximadamente do tamanho de um cawri grande e posto em cima do corte. Esta medicina no pode cair, mas quando ele vai dormir, sua mulher mais velha ou sua patrocinadora remove a medicina e a guarda para ele rep-la no mesmo lugar, no dia seguinte, aps o banho. Isto feito durante sete dias, aps o que o iniciando nunca mais pode raspar a cabea de novo. Ele poder tranar seus cabelos como uma mulher, como Salak fez. Pode transportar coisas na cabea mas tem de cobri-la toda vez que sair de casa, at mesmo noite. Quando de sua morte, sua cabea raspada a fim de retirar o ria (lati mu r kr lr r`r, ti ba ti k).

    Conforme escolhido por ril atravs do jogo dos dezesseis cawris, um galo, um carneiro no castrado ou caracol abatido para a divindade e o sangue ou a gua da concha do caracol posto na boca do iniciando. Neste nterim rilmonta o iniciando, dele se apossa em um transe e atravs dele fala. Salak disse ri monta uma pessoa (rigun en) ou ri entra em seu corpo (riwara r). Da em diante, qualquer pessoa iniciada pode ser possuda enquanto

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    dana e ril pode falar atravs dela. Ambos, Salak e sua irm menor, desse modo foram possudos aps suas iniciaes, mas no podem falar como o montaria (lgun) oficial. Esta pessoa escolhida por meio de alternativas especficas, jogando os dezesseis cawris enquanto recita os membros do culto em ordem de Antigidade no em termos de idade relativa mas pelas datas de suas iniciaes respectivas. A pessoa assim escolhida precisa fazer sacrifcio (tt) e fazer uma celebrao (wj) tal qual um chefe para marcar sua posse. Nem Salak nem sua irm se tornaria uma montaria oficial, mas quando a me de sua me faleceu, a sua irm foi escolhida do mesmo modo para tomar conta de seu sacrrio.

    Ao novo iniciado dado um smbolo de ril para levar para casa, um pedao branco de osso ou marfim (rn), que tratado com sangue proveniente do corte em sua cabea. Ele pode agregar outros caso deseje mas no pode absolutamente perder esse primeiro. Ele pode tambm adquirir dezesseis cawris para seu sacrrio particular mas no precisa aprender a divinar com eles. A irm de Salak, por exemplo ignora o uso deles.

    Salak aprendeu como divinar em Igana, com seu babaloria, que o iniciou. Disse que levou trs anos para aprender a empregar os cawris e outros trs mais para aprender os versos. Aos quinze anos de idade, pareceu-lhe poca que o primeiro perodo provavelmente lhe havia tomado menos tempo e o segundo, muito mais. Mais tarde aprendeu os usos de folhas e ervas, e depois que iniciou sua carreira de divinador, continuou a aprender versos novos ao escutar outros divinadores. O aprendizado prossegue atravs da vida inteira de um divinador.

    Tal como os divinadores If, todos os sacerdotes de ril so herbanrios. Aprendem a fazer infuses base de folhas (omi r) a fim de purificarem seus sacrrios e parafernlia ritual e algumas medicinas, como sabo com medicina de amor ( wre), mas usam folhas diferentes e fazem medicinas diversas. Salak sabia que alguns de seus versos eram os mesmos que os na divinao If. Ele definiu seu trabalho como semelhante ao de um divinador If, porm diferente. Um divinador If denominado pai tem segredo (babalwo), enquanto Salak chamado segredo (i. e., divinador) de devotos de oria (awolrs, awo olrs).

    Por volta de 1926, Salak veio para y e o Alafin (rei) o manteve na cidade para divinar para ele. Ingressou no principal sacrrio de ril, com mais de um cento de devotos em 1951, na casa do chefe Aipa, em Isale y, um bairro

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    da cidade. Quando sua me morreu, ele trouxe seu sacrrio de Igana e arrumou-lhe um lugar para ele em sua casa de y. isto exige um sacrifcio (tt) antes da remoo e um segundo antes da instalao. Os dezesseis cawris so jogados para determinar se ril exige um bode, galinha, caracol ou alguma outra cosa a ser sacrificada em cada local. Alm de ril, Salak teve de cultuar Yemj. Ele disse que ambas divindades eram importantes para ele, mas ril era o principal j que o havia reivindicado no nascimento.

    Quando encontramos em fevereiro de 195S, Salak tinha cerca de setenta anos. Frgil e de constituio delicada, com seus cabelos tranados como uma mulher, ele tinha um aparncia um tanto efeminada. Conquanto freqentemente tmido em conversas comuns, era auto-confiante quando se chagava a falar sobre ril e divinao com dezesseis cawris. Havia viajado pouco, tendo ar de quem houvesse passado a vida em um claustro. De qualquer modo, estava consciente das vrias mudanas que ocorriam na Nigria, particularmente as que afetavam sua profisso. No muitos anos antes, o Alafin se havia convertido ao islamismo e parte da populao de y acompanhou sua liderana. O nico aprendiz tinha falecido trs anos antes e poucas pessoas vinham ainda a Salak para divinao, s vezes dez, s vezes somente dois por semana, a maioria constituda pelas esposas mais velhas do Alafin. Sentia que ningum estava interessado no conhecimento acumulado por meio do estudo de uma vida inteira, que estava destinado a se perder quando ele morresse.

    Mais para o final de nossa estada de trs meses em y, Salak aquiesceu em recitar todos os versos que conhecia para um gravador de fita, de molde q eu pudessem ser preservados no futuro. Estvamos de partida para Ilea para nossos trs meses finais na Nigria, mas ele disse que viria visitar-nos. Porque parecia estar to fora de contato com o novo universo da Nigria, achamos altamente improvvel que ele assim agiria. Mas assim o fez. Completamente sozinho, tomou uma jardineira para a apinhada cidade de Ibadan, transferiu-se para outra jardineira e nos encontrou em Ilea, nunca havendo feito o percurso anteriormente.

    Sentou-se, ento,frente ao gravador com a Sra. Berta M. Bascom e registrou cinco e meia horas compactas de versos. Rapidamente aprendendo a operar o equipamento e apreciando a experincia de escutar suas gravaes em play back, logo iniciava cada carretel com as palavras Testi, testi (Testando, testando), tal qual Berta havia feito. Inicialmente, nossos empregados olhavam

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    Salak com superioridade, tomando-o por um campnio (ar k) e uma pessoa sada de um passado oral e pago. Mas quanto tiveram a chance de escutar os versos que ele estava recitando, a atitude deles transformou-se em respeito, reunindo-se por ocasio das sesses de gravao to logo estivessem de folga para ouvi-lo com deleite. Mas, mesmo assim, sentiam que ele no era capaz de enfrentar e competir com o mundo moderno, e quando ele necessitava de um novo par de sandlias, l ia um deles acompanhando-o at o mercado, para ver que no fosse enrolado.

    Nosso equipamento de gravao, adquirido com oramento limitado em 1950, estava imensamente abaixo dos mais comuns hoje disponveis. Nossa fonte de energia era um transformador, acoplado bateia de nosso automvel, cujo motor tinha de ficar em funcionamento de modo que no se descarregasse a bateria. O resultado foi que as gravaes, imperfeitas, tem passagens de difcil entendimento, mesmo para nativos da fala Yorb. Algumas gravaes foram transcritas pelo Sr. Adedeji, na Nigria. Ele pode fazer perguntas a Salak sobre algumas passagens duvidosas, mas a maior parte foi transcrita em Evanston, Illinois, depois de nosso retorno para casa, pelo Sr. Nathaniel Adibi e pelo Sr. M. O. ywoye, que se tornou o primeiro Ph.D. da Nigria em Geologia e atualmente professor dessa matria e chefe do departamento respectivo na Universidade de Ibadan. A esses trs homens, minha mulher e, especialmente a Salak, tenho profunda dvida de gratido.

    ywoye tambm fez as tradues iniciais, que eu editei, e quando retornou Nigria, levou consigo uma cpia dos textos. Visitou especialmente Salak e revisou versos com ele, fazendo as correes que ele indicava. Salak, j ento mais idoso, nem sempre se recordava exatamente do que havia dito, mas essa verificao de campo eliminou alguns erros decorrentes da gravao defeituosa. Outros podem ainda existir, mas isto foi o melhor que poderia ser feito.

    Pouco antes da independncia da Nigria, em 1960, revisitei Salak em y rapidamente e obtive informaes adicionais. Novamente em 1965, Berta e eu fomos v-lo mas o encontramos enfermo, de cama, incapaz de levar adiante debates mais avanados. Presumo que, atualmente, j tenha falecido. Com ele, morre um cavalheiro, surpreendentemente corajoso. Mas, pelo menos, seu grande conhecimento encontra-se, neste livro, preservado para o futuro.

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    OS VERSOS DIVINATRIOS

    Salak afirmou que ditaria todos os versos que conhecia, e um total de 210 versos aqui apresentado. possvel, no entanto, que alguns versos que ele sabia no foram registrados. Um rolo de fita, com os versos de Eji Ogb(A, tambm conhecido por Agbe Meji), comea assim:

    Eles pegaram dend e o derrama dentro do aposentoE Formiga saiu;Eles pegaram fogo e aqueceram as paredes E Barata saiu.ri disse: Foi isso que aconteceu.Orunmila, voc pegou todos os meus escravos e os escondeu

    Parece que, em decorrncia de um erro de gravao, um verso anlogo a A12 foi omitido. Em outra oportunidade, Salak inseriu as seguintes linhas, que esto, obviamente, fora do lugar (A35, nota 2), sugerindo que elas pertencem a outro verso que no foi gravado:

    por isso que ng no mais come nozes de cola porque est comendo at hoje nozes de cola amarga.ng disse: As nozes de cola que comi e que assim me decepcionaram,No as comerei novamente.E nunca mais comeu nozes de cola;Ele est comendo nozes de cola amarga.

    Depois que terminou os versos divinatrios, Salak gravou 71 textos complementares, principalmente sobre divindades. Deles, 26 so repeties, tornando possvel o estudo das variaes no modo em que so contados. Seis so miscelneas, 25 so lendas e 14 so indiscutivelmente versos divinatrios adicionais. Um deles, que provavelmente pertence a Ofun (B) conta como o Rei de Ketu teve de manter a casa quando esteve com sua mulher em cativeiro. Um, que pode pertencer a Irosun (F), conta como Chuva Conquistou Fogo e porque fogo no deve ficar perto de ril. Um outro, que possvel pertena a Ogund (H), narra o modo como Yemj fez seu lar perto do rio. Outro ainda, de wnrin (K), conta como mulher de ril, Aladun, o caracol, rompeu os tabus dele ao comer sal e bebendo vinho de palmeira, e a maneira de como si abateu sua me com uma

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    flecha. Um quinto, de Oturukpn (N), narra conhecido conto popular Retornado ao Cativeiro (Aarne Thompson 155), envolvendo Eu. todavia, uma vez que as figuras com as quais os outros esto associados no podem ser identificadas, e no se pode determinar se, at mesmo, esses cinco pertencem aos dezesseis cawris ou divinao If, eles no se acham includos aqui.

    Gravar os versos revelou-me algo que me havia escapado em minha anlise dos versos de If. Estes haviam sido penosamente transcritos mo e por causa do necessariamente ritmo lento em que podiam ser ditados, eles surgiram como parecendo prosa e, como tal, eu os apresentei. As gravaes mostram, no entanto, que eles so recitados efetivamente com frases curtas, sob a forma de verso livre. Tanto Adibi quanto ywoye reconheceram essa estrutura interna e o fraseado deles obedecido aqui. Ele tinha sido igualmente reconhecido por scholars iorubanos, inclusive Wande Abimbola, que os chama de poemas, conquanto versos parece igualmente apropriado.

    Yorb uma linguagem tonal, com um alto (), mdio ( ) e baixo (`), assim como tons ascendentes e descendentes (~). Em anos recentes, a prtica tornou-se indicar tons ascendentes e descendentes atravs de vogais dobradas, cujos tons so marcados individualmente, mas eu tive de confiar nas transcries a mim fornecidas. No estou seguro que o sinais tonais estejam todos corretos, mesmo onde esto indicados, mas a novamente tive de confiar nos iorubanos que fizeram as transcries. Para facilitar a leitura, os sinais diacrticos, que podem ser encontrados, em Yorb, nas pginas opostas, so omitidos na traduo e o substitudo pelo sh, seu equivalente em Ingls. Em Yorb, a vogal o como no alemo Gott, em Portugus p, e como no ingls bet, em Portugus p, e as outras vogais tem valores continentais. A consoante p, pronunciada kp, e n representa nasalizao, exceto em incio de palavra ou entre duas vogais, quando ento pronunciado como em Ingls.

    O padro comum de pontuao em Ingls no apropriado para os versos por causa do nmero de vezes em que uma citao interrompida, a maioria das vezes por Ele disse. Para facilitar a identificao do comeo e do fim de uma citao, e, por conseguinte, de quem est falando, as aspas no so usadas ao fim de cada linha mas somente ao trmino de declarao ou fala, como no seguinte exemplo, do verso 110.

    Ele disse: Voc, Vbora,

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    Deite para que possam mat-la;Ele disse: Com uma vara de ferro eles vo imobilizar sua cabea.Ele disse: Voc, Pton,Ele disse: Deite para que possam mat-la.Ele disse: Voc Escorpio,Ele disse: Eles vo imobilizar voc sobre as costas com uma varaE virar seu peito para o cu.Assim ele os amaldioou.

    A traduo tambm apresentou problemas. Os textos Yorb incluem palavras arcaicas e expresses em desuso cujos significados no eram sequer sabidos por Salak, e outras foram descartadas como refres de cantigas, nomes de louvor e expresses divinatrias, por no terem significado. Esses pedaos no traduzidos so dados em itlico na verso inglesa, mas os nomes prprios de figuras de divinao, divindades, cidades, e de pessoas esto em tipo romano.

    Outro problema diz respeito expresso freqentemente repetida k prr ou k pnr r, para a qual sacrifcios so oferecidos. ywoye no sabia o que significava e, com base em trabalho anterior, interpretei-a como sua alma guardi ancestral (Bascom 1960: 405-409).

    Entretanto, quando os versos foram verificados em campo, Salak explicou (A8, A26, A28, I19, J18) que queria dizer o depsito de seus materiais de divinao, que eu encurtei para seu conjunto divinatrio. Acompanhei sua interpretao conquanto em alguns exemplos (p.e. A28, E4, G8) sua alma guardi ancestral parece fazer mais sentido. Em outros versos (A12, B6, G3, I12, J9) seu conjunto divinatrio claramente correto.

    A frase kw lr, t ml foi traduzida como Ele ps suas mos sobre a cabea, ele foi para os divinadores. A primeira metade parece ser uma traduo literal, que Abraham (1858: 361) d francamente como ele mostrou pesar; a ltima metade uma traduo livre. Outra frase duvidosa O j lj m, t lyn (f2, J6); isso foi traduzido livremente por Suas vidas estavam perturbadas e eles estavam infelizes. Embora Salak tenha interpretado seu sentido como Eles estavam vindo da primeira y para a atual y (C8, F22, G7), a frase Won nti kl run b w ikl aiy foi traduzida por Eles estavam vindo do cu para a terra.

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    Nos versos divinatrios e nas lendas mitolgicas Yorb existem referncias a um mercado e uma cidade cujo nome dado aqui como Ejigbomkun (A3) ou jgbmkn (C3 nota 1, G3, G9, J1). Um informante em Mk deu nome como Agbomkun e traduzi como Carneiro toma Leopardo (gb mu kn), mas isso parece muito improvvel. Em If, informantes interpretaram Ejigbomkun tanto como o nome de antiga cidade, no mais existente, quanto se referindo aos habitantes de seus territrios (Bascom 1969: 257, 267 nota 5, 475). Salak disse que foi em Ojogbomkun que terra foi criada nas guas primevas, ao invs de na cidade de If, conforme se acredita em geral, e que os deuses ali viviam antes de se mudarem para If; mas no decorrer da verificao de campo, identificou-a como a primeira y.

    H tambm referncias cidade de Gbndgbndu (A13, B5, G5), que identificada em um verso (G5) como sendo Ibadan, com Oluyle tendo sido seu primeiro governante. Dois versos (G4, G5) referem-se fundao e expanso dessa grande cidade Yorb e outro verso (K5) relata como gba Yorb refugio-se debaixo de uma rocha na colina Olum, dando cidade que fundaram o nome Abokut que quer dizer sob uma rocha.

    Segundo lendas Yorb, a divinao de dezesseis cawris foi introduzida pela deusa fluvial un. Aprendeu-a com runmila (If) enquanto vivia com ele, embora alguns devotos de un neguem tal coisa. Numa verso, enquanto ela ainda estava aprendendo If, un comeou a divinar para consulentes de runmila quando este no estava em casa, e to logo soube disse, ele a mandou embora; esta a razo pela qual um no aprendeu inteiramente a divinao If (Bascom 1968 :90). Este incidente no ocorreu na seguinte lenda acerca de como runmila e n aprenderam divinao, como registrado por Salak. Sua verso difere tambm da crena largamente difundida de que foi Olodumare, o Deus do Cu, que conferiu aos deuses os seus poderes; aqui, essa funo atribuda prpria divindade de Salak, identificada como ril rgbo, com Apodihr como outro de seus nomes sagrados ou de culto.

    Quando Pai Apodihr, ril rgbo,Pai originou 401 filhos,Apodihr, Pai criou 401 profisses.Apodihr, ril rgbo,Pai criou 401 talentos.Ele disse que cada filho teria de escolher o seu.

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    E havia Orunmila;Ele no forte.Exatamente como um cupinzeiro,Segurar uma enxada o pe em apuros;Carreg-la lhe difcil,E at mesmo caminhar.No h trabalho que seja fcil para Orunmila.Pai disse: O que voc vai fazer?Ele disse que seria divinador.Que espcie de divinador?Ele disse: Para tudo que as pessoas buscam com voc.Eram nozes de cola que traziam para o Pai naqueles tempos (para divinao).Se algum falasse para a noz de colaE a deitasse,Pai era quem dava conselho.Quero saber resposta minha pergunta.E ril ento diria.Desse modo, chamou OrunmilaE Orunmila recebeu uma bolsa de divinao.Pai pegou a bolsa de If,Disse que Orunmila tinha de aprende-laDe modo se algum quisesse alguma coisaTinha de ir a Orunmila.Qualquer um que desejasse perguntarTinha de ir a Orunmila,E quando Orunmila olhou o seu If,Tudo que eles queriam saber, Orunmila lhes contaria;O que quer que desejassem saber,Orunmila lhes diria.Nunca mais ningum foi ao Pai (para divinao);Ao invs, iro a Orunmila.Mulher com gravidez de um s dia,Orunmila j o saberia,E assim por diante.Desse modo Orunmila se tornou divinador.Todos os demais tambm queriam ser.

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    Egungun queria ser um deles;O Pai disse: Voc que forte?Ogun queria ser um deles;O Pai disse: Voc que forte?Voc deveria ser comerciante.Hoje todos os devotos de alguns deuses podem divinar.Devotos de ng, devotos de y,E os devotos de ril.Isso graas a un.Foi n que no deixava runmila descansar,No o deixava sair;Tanto insistiu, at que runmila lhe ensinou divinao.Foi com n que todos os demais Aprenderam a divinar.Mas s Erinle no aprendeu;ri Oko no aprendeu;Ogun no aprendeu;Egungun no aprendeu.No receberam os dezesseis cawris.Os dezesseis cawris de pnaEstavam sempre em sua mo,Mas as lutas no o deixavam divinar.Por ser frgil runmila se tornou divinador.Ele cantava. Apodihr, ril, rgbo.O Pai teve 401 filhos;Apodihr, ril, rgbo,O Pai criou 401 profisses,Apodihr, ril, rgbo,O Pai criou 401 talentos,Apodihr.Deu aqueles que aprendessem um meio de vida,Apodihr.Com aquele que aprendi, agora estou comendo,Apodihr.Com aquele que eu aprendi, estou comendo nozes de cola e pimenta,

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    Apodihr.Com quem aprendi, estou comendo sal e dend,Apodihr.Com quem aprendi, tomo dinheiro de outros,Apodihr.Foi como runmila se tornou divinador.

    Pesquisa adicional faz-se necessria para determinar as ocasies em que os dois sistemas so empregados. Entretanto, eu creio que quando assuntos de Estado tem de ser resolvidos, utilizada a divinao If (Bascom 1969: 77,95); mas quando esto envolvidos assuntos religiosos pessoais de reis ou chefes, eles podem confiar nos dezesseis cawris se forem devotos de ril, ng e de outras divindades em cujos cultos esta forma de divinao empregada.

    Caso contrrio, provavelmente se voltariam para a divinao If para questes pessoais, preferindo-a a confiar em outras formas de divinao que no dispem de versos explanatrios, tais como o arremesso de quatro cawris ou dos quatro segmentos da noz de cola. Mesmo que um governante tenha sido convertido ao Isl, suspeito que ele confiaria na divinao If para assuntos de Estado, embora para assuntos pessoais provavelmente se voltasse para a forma divinatria islmica do corte na areia. Segundo o relato de Salak a respeito de sua prpria carreira, parece que todos aqueles que no fossem muulmanos ou cristos, pelo menos levam seus filhos para um divinador If a fim de precisar os seus destinos desde o nascimento, mas que na iniciao e outros importantes rituais, os dezesseis cawris so jogados naqueles cultos em que se usa este sistema de divinao.

    As divinaes If e de dezesseis cawris so distintos entre si pelos seus nomes e pelos divinadores, diferindo inclusive pelos seus sexos, pela parafernlia empregada, pelo nmero de figuras envolvidas, pela escolha entre alternativas especficas e pelas divindades que presidem os cultos. No If, os divinadores so conhecidos por babalwo, que tem de ser homens; os dezesseis dends so manipulados nas mos ou um opol lanado ao solo, h 256 figuras; uma escolha pode ser feita simultaneamente entre duas ou cinco alternativas; e a entidade que preside rnmla, tambm conhecido como If. Nos rndnlgun (como praticado por Salak), os divinadores so conhecidos por awo olr, que podem ser homens ou mulheres; dezesseis cawris so arremessados ao solo; h 17 figuras; uma escolha pode ser feita simultaneamente entre apenas duas alternativas

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    especficas; e a divindade que preside Or Olfn, tambm conhecido por rl.

    H, entretanto, muitas semelhanas. Tanto os babalwo quanto os awo olr so definidos como awo, ambos so herbanrios assim como divinadores. Em ambos os sistemas, as figuras so conhecidas por od e os versos por s. Os nomes das figuras so anlogos. Os versos memorizados constituem o ncleo de ambos sistemas, os quais se distinguem de outros meios de divinao conhecidos dos Yorb, tais como o jogo de quatro cawris, jogo de quatro segmentos da noz de cola (Cola acuminata) ou noz de cola amarga (Garcinia kola), hidromancia, transes medinicos, corte de areia islmico e jogo dos quatro rosrios divinatrios (agbigba), embora este ltimo tenha versos curtos associados com suas figuras. Em ambas na divinao If e na dos dezesseis cawris, os versos contem as predies e os sacrifcios a serem realizados, o consulente escolhe o verso apropriado a seu caso, o propsito da divinao de determinar o sacrifcio necessrio para afastar o malefcio ou assegurar a graa do benefcio que tiver sido augurado, e alguns dos versos so semelhantes.

    Trs versos podem ser suficientes para mostrar as semelhanas nos versos. O seguinte verso de If (Bascom 1969: 446-451), fornecido em prosa, parece ser apenas uma verso mais completa do A27, em dezesseis cawris:

    O co sorve a gua do lado de sua boca; a mosca no arrumas contas para vender e Se a exprobao se recusa a ir adiante, ento ns a trazemos para trs eram os que jogaram If para Osu, que era filha do rei de y, Ajri, que no tinha experimentado as dores do parto, e que estava corando porque no tinha dado a luz a uma criana.

    O co sorve a gua do lado de sua boca; a mosca no dispe contas para vender e Se a exprobao se recusa a avanar ento ns a trazemos para trs foram os que jogaram If para Arera, que era o filho do rei de If e que estava em lgrimas porque no havia gerado um filho.

    O sacrifcio de Arera foi um carneiro inteiro. O sacrifcio de Osu foi uma ovelha. Arera tinha de criar seu pequeno carneiro. Osu teria de criar sua pequena ovelha.

    Ambos estavam tentando ter filhos; eles se encontraram e tiveram relaes, ficando Osu grvida. Arera disse a ela que a criana deveria chamar-se

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    Ojodu. No muito tempo depois disso, surgiu uma conspirao contra Ojodu. O povo de If, queria compra-lo para que ni pudesse sacrific-lo. Quando manietaram Ojodu, ele comeou a chorar dizendo que havia sido levado para sua prpria cidade como um cativo. Disse que ni deveria dar-lhe oito cola para jogar e que se viessem quatro com a face para baixo e quatro para cima, todos deveriam comear a cantar:

    Ojodu chega, o filho de Arera;Ojodu chega, o filho de Arera;Vocs deviam dar graas comigo porque as colas se revelaram boas. Ojodu chega, o filho de Arera;Vocs deveriam pegar um animal como sacrifcio;Vocs no deveriam tomar a cabea de um parente.Vocs deveriam tomar um animal como sacrifcio;Vocs no deveriam tomar a cabea de um parente;Ojodu chega, o filho de Arera.

    A partir de ento, sacrificamos ovelhas para If.

    Um outro verso If (Abimbla 1968: 24-25;1976: 160-162), em verso potica, pode ser comparado com o verso A6. Algumas variaes so simplesmente diferenas arbitrrias em traduo.

    Voc e conhecido como Ollkun;Cujo outro nome mnnkun;Elefante no pode ser virado cabea para baixo para ser trinchadoQue tambm chamado ttb-kun.O pequeno e terrvel homem noite.Um cachorro macho significa honra.Um gl macho conhecido como lua.O prprio filho de algum para ele uma fonte de contas okn.O prprio filho de algum uma fonte de toda riqueza.Enquanto as ndegas do filho so sem contas.Ningum vai decorar com contas o peito do filho de outra pessoa.A divinao If foi realizada para Onds o homem de pele clara da colina pCuja casa foi assombrada pela Morte e pela Doena,Cuja casa foi persistentemente assombrada por todos Ajogun.

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    Seu sacerdote If portanto pediu-lhe para oferecer bastante bj em sacrifcio.Eles pegaram parte do bj e esfregaram em seu corpoE ele se tornou uma pessoa muito preta.O resultado foi que os Ajogun no podiam reconhece-lo.Ele comeou a danar,Ele comeou a comemorar.Ele comeou a louvar seus sacerdotes IfEnquanto seus sacerdotes If louvavam If.Gongos foram soados em pr,O tambor rn foi percutido em kij,Varas foram usadas para produzir msica melodiosa em rimOgb.Ele abriu um pouco a boca,E a cano de If foi o que ele exprimiu.Quando ele distendeu as pernas,A dana o agarrou.Ele disse: Morte, no mate o homem do bj por equvoco.Voc que agora est fadada a enganar o homem para outra coisa.Voc que doravante tem de enganar o homem por outro ser.Doena no aflija o homem de bj por enganoVoc que est destinada a enganar o homem por outra coisa.Voc que doravante precisa enganar o homem por outro ser.Guerreiros do cu,Volteiem-se e corram embora,Vocs que agora esto fadados a enganar o homem por um outro ser.

    A narrativa que se segue, contada por um divinador de If e registrada numa mquina de escrever como prosa, pode ser comparada com A12.

    runmila despertou cedo certa manh e foi para Oria. ri disse que ele deveria divinar para ele porque seus escravos estavam perdidos. A cabra (ewur), o escravo de Oria, o sapo (pl), o escravo de ri e o camaleo (alagm), o escravo de Oria, estavam perdidos. Eles procuraram e procuraram por eles mas no puderam encontr-los.

    runmila lhes disse para trazerem gua quente, cascas de inhame e uma pena vermelha do rabo de um papagaio, e eles trouxeram essas trs coisas. Eles verteram a gua quente para dentro do ralo do banheiro e o Sapo veio para

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    fora. Puseram a pena contra uma rvore akoko3 e Camaleo tornou-se vermelho e eles o pegaram. Colocaram ento as cascas de inhame no celeiro e a Cabra saiu. ri ficou surpreso com a rapidez com que runmila havia encontrado os trs escravos e disse: Voc, runmila, foi quem roubou meus escravos.4.

    runmila chorou e voltou para sua casa. No caminho, encontrou Eu. Eu perguntou-lhe qual era o problema e runmila lhe contou que ri o tinha chamado de ladro. Eu disse: Tudo bem. Seja apenas paciente. Vou indo para l para me pendurar. Quando l chegou, Eu amarrou uma corda ao redor dos quadris e a mandou para o ar; ramf5 segurou a corda e Eu pendurou-se no ar, de cabea para baixo.a gente o viu e diziaEu se dependurou. Ento Alara e Ajero e Orangun6 se trajaram em finas roupas e se assentaram com ria. Disseram que chamariam runmila enviou os mensageiros de volta para dizer-lhes que os trs reis deveriam largar todos os seus finos trajes e fugir porque ningum deveria enxergar Eu dependurado ali. No deveriam levar nada com eles, mas irem despidos.

    runmila foi para l e achou todas as roupas. Disse que chamaria gente para cuidar de Eu que se havia dependurado. Quando estava de volta, encontrou seu amigo, o sacerdote de bameri, em meio do caminho. O sacerdote pegou todas as roupas os trs reis haviam deixado para trs e olhou para Eu ali pendurado quando ningum mais ali se encontrava. Quando Eu o viu, disse a ramf que soltasse a corda. Saltou para o cho e se postou diante do sacerdote. Este pegou os trajes, duas ovelhas e duas cabras do ri e levou tudo para runmila. runmila pegou tudo e perguntou: Com que nome deveramos chamar o homem que trouxe essas coisas para mim? Ele disse que seu nome deveria ser: Aquele que anda o que encontra seu amigo no caminho aquele que ns chamamos Lokor, o sacerdote que corta quem se pendura (niti o rin, li o ko r lna la npe ni Lokor, ioro ti on j io)7.

    Outros paralelos entre versos para dezesseis cawris, de Salak, e aqueles em divinao If incluem os seguintes:

    3 em itlico, no original.

    4 Por isso diz runmila que se jogamos If nossa predio no pode ocorrer no mesmo dia porque as pessoas ficaro desconfiadas. Cf. A 12, nota 2.5 O deus do Trovo de If. Cf. Bascom 1969B: 87.6 Trs reis.7 Isto explica o ttulo do sacerdote de Obameri, Lokore (li o ko r), O que encontra seu amigo que quem abate aqueles que cometem suicdio se dependurando e faz expiao para eles. A figura associada com este verso no foi registrada.

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    B8. A origem do jejum muulmano. Abimbla S. D., IV: 87; 1971: 449-450; 1977: 128-131 (Otu a Meji)

    B9. Aranha tece sua teia como feitio. Abimbla S.D., IV: 14; 1976: 218; 1977: 54-55 (Iwor Meji)

    C11. Lmure foge de carneiro. Epega S.D., I/II: 121 124 (Ogb s)

    C18. Feijo Sarnento. Abimbla S.D., IV: 101-102; 1976: 230-231 (s Meji)

    E6. Filhotes de Esquilo. Abimbla S.D., IV: 85; 1976: 199-200; 1977: 126-129 (Otura Meji)

    F1. Forasteiro resoluto vai para peri. Bascom 1969: 314-317 (Edi Meji)

    H8. Ira, Exaltao e Frieza. Epega S. D., I/II: 116-117 (Ogb Ogund)

    I1. Abboras de br. Abimbla 1696: 63-66; 1977:82-87 (br Meji)

    I10. Vbora, Pton e Escorpio. Abimbla 1968: 78-79 (br Meji)

    I12. Filho de Poye. Gleason 1973: 164-168 (Irt Meji); Bascom 1969: 66

    I16. Eu deixa caa escapa. Gleason 1973: 223-225 (Ogb Otura)

    I18. Caixo de Calau. Abimbla S. D., IV: 46-48; 1976: 212-215; 1977: 88-93 (br Meji)

    J5. Medida. Abimbla 1968: 57; 1976: 106-107 (Odi Meji)

    J6. Milhafre mergulha na fumaa. Gleason 1973: 247-250 (Otura s)

    J12. Forasteiro resoluto vai para o Benin. Abimbla 1969: 137-139; 1977: 62-65 (Odi Meji)

    Menos parecidas so as histrias do Pombo e da Pomba (A15. Bascom 1969: 268-275, Iwor Ogb), lkn se torna rei de todas as guas (A47. Abimbla 1968: 154-155: 1976: 59-60, Ofun Meji), Lrio apanha gua para lkn (13. Epega S. D., III: 38-39, Ogund yku), e Pombo tem gmeos (18: Abimbla, S. D., III: 5-7; 1976: 206-208, Ogb Meji). Apenas sete (A6, G14, I1, I18, J5 e J12) desses vinte e trs versos esto associados com figuras de nomes semelhantes em ambos sistemas de

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    divinao, como por exemplo Odi em dezesseis cawris e Odi Meji em If (J12). Explanaes parecidas do nome de Olodumare so dadas em diferentes versos (B12. Bascom 1969: 322-323, Edi kanran), e dois versos bastante diferentes explicam porque o ferro enferruja mas lato e chumbo, no (C5. Bascom 1969: 300-303, Iwor Meji).

    Trs dos cinco versos de dezesseis cawris publicados por Ogunbiyi so tambm semelhantes aqueles dados por Salak: Tela Oko acha dinheiro na lavoura (E2. Ogunbiyi 1952: 68-69), Asno Insensato retira Leopardo de dentro de um poo (F13. Ogunbiyi 1952: 73). Destes, o segundo (F13) atribudo a Irosun por Salak, mas s (C) por Ogunbiyi. H concordncia, no entanto, sobre as figuras s quais os outros dois versos pertencem.

    A narrativa acerca dos tabus de Yemj e Okr (H12) foi registrada como uma lenda-mito em Isyin, y e Koso e aquela sobre runmila e o filho de Poye (112) em Igana (Bascom 1969: 66). Outras narrativas nos versos de Salak foram registradas como contos populares (C9, I11, J8, K9,); e os versos contm provrbios (K8, L7) e um enigma (M). Lendas, contos populares, provrbios e enigmas ocasionais tambm ocorrem em versos de If.

    Conquanto os trs versos If citados no sejam idnticos aos seus correlativos em divinao com dezesseis cawris, eles tambm diferem de um divinador para outro e at mesmo em diferentes ocasies quando recitados pelo mesmo divinador. Isso tambm foi verdadeiro no caso de Salak, que gravou alguns versos mais de uma vez. A verso seguinte pode ser comparada com L4. A expresso Jogado para o Dia e partilhado com o Sol significa que a divinao para o Dia tambm inclui o Sol, mesmo assim ele no consultando o divinador, e que ambos teriam de oferecer um sacrifcio. Doze maiores refere-se aos doze cawris abertos para cima.

    ri d uma beno de via longa, o que ele vaticinaOnde vemos os Doze Maiores.Colina redonda com um cume pontudo no caiJogado para o Dia e partilhado com o Sol.Dia, o que deveria ele fazer de modo que os braos dos outros no o segurassem?Sol, o que deveria ele fazer para que os braos dos outros no o segurassem?Ele disse que os braos dos outros no o segurariam;Um sacrifcio era o que ele tinha de oferecer.

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    O que deveria ele oferecer?Eles disseram que ele deveria oferecer 24.000 cawris.E disseram que o Sol deveria oferecer a taa importada que ele tinha.O Dia reuniu o sacrifcio, ofereceu o sacrifcio;O Sol apaziguou os deuses.Ambos vieram para a terra;Estiveram deleitando-se na terra,E suas vidas corriam agradveis.O Dia ficava danando,O Sol se rejubilava;Louvavam os divinadores,E estes o riQue seus divinadores tinham falado a verdade.Redonda, redonda colinaCom cume pontudo no caiJogou para o DiaE dividiu com o Sol.Ele cantou: Dia, ofereci um sacrifcio por causa das bocas;Sol, fiz um sacrifcio por causa das bocas;Nenhum brao pode segurar o Sol;Boca nenhuma pode comandar o Dia.ri diz que as bocas de outros no sero capazes de nos comandar.

    A despeito de as diferenas no serem grandes, fica claro que os versos no so decorados palavra por palavra; o divinador dispe de alguma latitude ao recit-los. Por exemplo, L4 acrescenta Quando o Sol apareceu, as pessoas disseram O sol est quente hoje. Ambos versos foram gravados como versos divinatrios. Como seria de esperar, as divergncias so ainda maiores quando os versos foram registrados como lendas.

    Algumas diferenas possivelmente se devem a gravaes imperfeitas e outras devidas talvez a lapsos de memria em decorrncia da idade de Salak e a declinante freqncia das vezes em que era solicitado a divinar. Por exemplo, em L4, a pergunta Dia e Sol, o que poderiam eles fazer de modo a que as bocas dos outros no pudessem lhes dar ordens? mas aqui Dia, que deveria ele fazer para que os braos dos outros no o segurassem? Sol, o que teria ele de fazer para que os braos dos outros no segurassem? Por causa da cano, que idntica em ambas

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    gravaes, suspeito que a verso correta Dia, o que deveria ele fazer para que as bocas de outros no pudessem comand-lo? Sol, que deveria ele fazer a fim de que os braos dos outros no pudessem segur-lo?

    Atentei nos erros (A10, A12, A30, A35, F6, G12,) e erros possveis (C6, C17, D6, J9, J16, K7, K12, L4). Pode haver outros, mas erros em apenas 14 destes 210 versos de modo algum seria uma marca ruim mesmo para um homem mais jovem que tivesse de confiar exclusivamente na memria. Houve outras ocasies em que Salak se repetiu ou inseriu o que se poderia denominar tapa-buraco, toda vez que obviamente hesitava e procurava ganhar tempo para se recordar do que vinha adiante. Entretanto, conforme ressalta Abimbla, algumas repeties so expletivas. Considerando-se que se trata de transcries literais duma tradio puramente oral, at que suas recitaes so notavelmente acuradas e de fluncia retilnea. Evidentemente, Salak tinha aprendido os versos bem.

    Em minhas anlises dos versos If, encontrei como padro geral para a maior parte dos versos (1) a declarao do caso mitolgico que serve como um precedente, (2) a soluo ou desfecho desse caso e (3) sua aplicao ao consulente (Bascom 1969: 122). Isto vlido igualmente para os versos destinados aos dezesseis cawris, conquanto o sacrifcio requerido ao consulente no expresso to especificadamente como nos versos If; habitualmente entendido como sendo o mesmo que o feito no caso mitolgico. A primeira seo normalmente inclui diversas linhas obscuras, embora freqentemente muito belas, que so interpretadas como sendo os nomes dos divinadores no caso que serve como precedente; elas so anexadas entre aspas na traduo em Ingls, sendo amide repetidas perto do fim do verso.

    Wande Abimbla (1971: 40; 1976: 43) props uma estrutura composta de oito partes: (1) nomes de sacerdote(s) If em divinao no passado, (2) nomes de consulente (s) para que a divinao foi realizada, (3) razo pela qual foi feita, (4) instrues ao (s) consulente(s), (5) se o consulente (s) agiu ou no de acordo com as instrues, (6) o que aconteceu com o consulente (s), (7) reao do consulente (s) e (8) uma moral baseada na histria. As partes 1-3 e 7-8 so memorizadas e recitadas o mais acuradamente possvel, sendo salmodiadas rapidamente. As partes remanescentes (4-6) no so decoradas, mas so recitadas lentamente na prpria linguagem do divinador e numa forma mais livre que se assemelha prosa (Abimbla 1976: 63). Por isso existe considervel latitude na minha segunda parte,

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    a resoluo do caso ou o que os consulentes fizeram e o que aconteceu a eles como um desfecho.

    Embora Abimbla indique que as instrues ao consulente (4) so opcionais e no memorizadas, acho surpreendente que o sacrifcio que o consulente instrudo a oferecer varie em diferentes registros do mesmo verso. Nas duas gravaes consideradas, o galo e o pombo mencionados em L4 so omitidos do sacrifcio na segunda verso. A ordem do segundo a qual os itens a serem sacrificados so mencionados aparece ser irrelevante, mas em diversas oportunidades Salak fez um esforo especial para nomear um item que houvera sido omitido, por exemplo, o f12, onde o assento mencionado depois de dizer que o sacrifcio tinha sido realizado, e N2, quando dois caranguejos so acrescentados de modo semelhante. De toda maneira, h exemplos onde fica claro que um item no mencionado havia sido sacrificado (B11, G12, H8, P1) e outros onde itens so agregados ou omitidos em uma segunda gravao (C11, F15, G3, J6, L1, L2, L3, L4, L5). O sacrifcio, freqentemente, no especificado (A10, A23, A41, C7, C13, C15, E5, F2, F5, F7, G8, H12, K8, K11) e muitas vezes sequer mencionados (A1, A9, A17, A20, A22, B3, B12, C2, C8, D7, E1, E6, F10, K9).

    Da mesma forma que em If, os versos instruem o consulente a sacrificar uma ampla variedade de aves domsticas e animais, tambm selvagens, carne de caa, alm de outros alimentos e produtos. Vrios deles so sacrifcios apropriados a divindades determinadas. Quando pssaros ou animais devem ser sacrificados, a cabea e o sangue so dados de comer divindade indicada no verso ou identificada por intermdio de alternativas especficas, como o lquido da casca de um caracol; a carne cozida e comida pelos divinadores. Tecidos, ferramentas e outros objetos includos no sacrifcio so tambm conservados pelos divinadores, a no ser que outra determinao esteja especificada no verso.

    Quando dinheiro se acha includo nos sacrifcios, deve ser conservado pelo divinador como pagamento (eru), ao invs de oferecido divindade. O montante expressado em cawris, que outrora serviam como dinheiro. O valor do cawri tem declinado ao longo do tempo como resultado da inflao (Bascom 1969:64-65), mas quando moeda corrente foi introduzida, o valor de dois mil cawris foi estabilizado, para fins de divinao, a seis pence, agora cinco kobo, ou 80.000 cawris para libra esterlina, agora 2 naira. Nestes versos, como nos If 2.000 cawris (gbw, gb) so a unidade bsica de dinheiro contbil, e, neste caso, o montante

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    especificado usualmente relacionado com o nmero de cawris jogados com a face aberta para cima, conforme mostrado abaixo.

    A Eji Ogb 8 cawris 8 x 2.000 ou dobro deste montanteB Ofun 10 cawris 10 x 2.000C s 9 cawris 9 x 2.000D kanran 1 cawri 11 x 2.000E Eji Oko 2 cawris 12 x 2.000F Irosun 4 cawris 4 x 2.000 ou mais freqentemente 14 x 2.000G 5 cawris 5 x 2.000H Ogund 3 cawris 3 x 2.000 ou mais freqentemente 13 x 2.000I br 6 cawris 6 x 2.000J Odi 7 cawris 7 x 2.000K wnrin 11 cawris 11 x 2.000L Ejila bra 12 cawris 12 x 2.000M Ika 13 cawris 33 x 2.000N Oturukpn 14 cawris 14 x 2.000O Ofun Karan 15 cawris 15 x 2.000P Irt 16 cawris 16 x 2.000Q Opir 0 cawri Nenhum dinheiro especificado

    Apenas Ik (M) acompanha o padro regular. Para 5 cawris e acima, o nmero de abertos para cima simplesmente multiplicado por 2.000. Porque, presumivelmente, so demasiado reduzidos, os montantes para um e dois cawris (D, E) so aumentados mediante acrscimo de 20.000 cawris, e isso pode ou no ser feito para trs e quatro cawris (H, F). Para Eji Ogb(A), o montante freqentemente dobrado. Pode ser duplicado para qualquer figura ao se pedir o mesmo montante nos lados direito e esquerdo ou triplicado (I7) ao se pedir 12.000 cawris do lado direito. 12.000 cawris no meio. Em certos casos, os montantes foram decuplicados, especificando 120.000 cawris (I14), 140.000 cawris (J6, j13, j15), 220.000 cawris (K3), 240.000 (E3) e 320.000 cawris (A30, A48). Caso um verso especifique 20.000cawris ou menos, em mltiplos de 2.000 deveria ser possvel identificar a figura a que pertence, mesmo que o nome no seja expressado.

    A conta em cawris pode tambm influenciar o nmero de itens no sacrifcio, por exemplo, onze pores de massa de milho branco, onze bolinhos fritos, onze ise e onze tigelas de cerveja (K13). Pode influenciar tambm os

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    nmeros no texto da narrativa, como quando runmila demanda oito fardos de inhames, oito cargas de milho, oito de feijes e oito de homens (A10).

    Muitos elementos etiolgicos aparecem nos versos e, a despeito de serem fantasiosos, provavelmente foram aceitos em tempos passados a ttulo de explanaes acerca das caractersticas de pssaros, animais, insetos, plantas e objetos, e das origens de costumes e instituies (Bascom 1969: 127-128). Do mesmo modo que nos versos If, essas caractersticas so, em geral, o resultados de haver oferecido o sacrifcio prescrito ou de no hav-lo feito e, uma vez que as caractersticas so conhecimento comum ou rapidamente constatveis, do substncia veracidade do verso, com seus vaticnios e sacrifcios prescritos, alm de ao sistema de divinao como um todo. As explicaes podem ser implcitas ou declaradas explicitamente na narrativa.

    Destarte, os versos contam como os papagaios tiveram penas vermelhas na cauda (G11), porque pombos vivem com os homens e pombas nas florestas (A15), porque pssaros Teceles da Aldeia esbrugam palmeiras nas suas copas para fazerem seus ninhos (F21) e como o calau tem um tufo em sua cabea (I18). Contam porque ratos so pegos pelos rabos (B3), porque galos so sacrificados (B3), porque galos cocoricam do modo que se conhece (B3 nota 1), porque leopardos so temidos pelos outros animais (B7), porque macacos so presos com correntes ao redor e seus peitos e alimentados com bananas e papaias (F17), como o esquilo terrestre obteve sua cauda (14), porque gatos almiscarados dormem mais que todos os outros animais (11) e como as lebres conseguiram as linhas brancas em suas testas (J4). Explicam a razo pela qual as cobras tem se rastejar sobre seus ventres e porque se livram de suas peles (A38, B12). Porque crocodilos ganharam seus dentes e escamas, tornando-se os reis nos rios (H10), porque troveja antes dos crocodilos terem filhotes (L6), e como o sapo Konko se fez rei de todos os sapos (C13). Explicam porque filarias podem abater seres humanos (A49) e a razo pela qual aranhas tecem seus fios como magia, sem um fuso (B9).

    Esclarecem a respeito da origem da papaia (D7), porque nozes de cola so utilizadas em rituais e em divinao (C17, J10), porque gente come feijo-manteiga e pe feijes sarnentos de lado (C18), porque inhames-cco crescem na lama (F6), porque as rvores fcus crescem na praa do mercado (I2) e como duas ervas Amaranthus e Kalanchoe crenata se tornaram notrias por sua frescura (J3). Explicam porque colinas nunca morrem (A21), porque o ferro oxida e o lato e o chumbo, no (C5), e porque os arco-ris desaparecem no dia em que surgem (F22).

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    Explicam como a cascavel kr obteve sua rede de cawris e porque ela e o gongo de ferro soam como soam (B4, B5), porque o tambor bata no deixa ago (L8), porque tempo frio provoca desconforto (B11), como a noite obteve o fruto do labor matinal (F3).

    De especial interesse so as explanaes e relatos lendrios das origens de costumes e instituies. Desse modo, os versos informam sobre a grande dimenso da cidade de Ibadan (G4, G5) e a importncia da cidade de y (A30, G9, I14). Explicam a origem do servio de Arm, o Prncipe Herdeiro e presumido herdeiro do rei de y (I16) e do Estribeiro-mr do rei (G3); e contam como Atiba, o Alafn que estabeleceu a capital na nova y, tomou terras de Aipa, um de seus chefes (A31). Relatam a origem dos julgamentos em tribunal (H11), e como comeou a competio por ttulos (A3).

    Os versos explicam porque os homens no tomam emprestadas as esposas de outros homens para lev-las junto em viagens (A36), porque recm-nascidos so mimados e objeto de indulgncias (A45), porque um marido no deve estar presente para receber sua noiva quando ela chega em sua casa com seu cortejo matrimonial (K3), e porque um irmo mais novo toma as vivas de seu irmo mais velho (K3). Contam como a lavoura sobrepujou todas as outras ocupaes (J7), e porque comerciantes usam medidas ao venderem milho e feijo (J5) e cestas para fazer a exposio de suas mercadorias (A40). Contam a propsito a origem de um nome (C8), de um ditado (C12) e de um provrbio (K8). Explicam porque albinos no penetram na cidade de Ejibo. (J17)., porque um carneiro inteiro morto sobre o tmulo em funerais (C11), porque as pessoas oram pelas bnos da noite (F3), e como comeou o jejum dos muulmanos (B8). Existem tambm muitos elementos explicativos que do conta de crena religiosa, ritual, e parafernlia ritualstica.

    A SISTEMTICA DA CRENA

    Como uma introduo aos versos divinatrios que se seguem, informaes acerca das divindades Yorb e outros elementos do credo Yorb, aqui apresentada, juntamente com aquilo que os versos nos relatam a respeito da religio Yorb e seu modo de visualizar o mundo (Weltanschauung).

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    Os versos confirmam, suplementam e, por vezes, contradizem aquilo que conhecido sobre religio iorubana, revelando como variam crenas, com membros do culto freqentemente atribuindo maior importncia s suas prprias divindades do que geralmente reconhecido. Por isso, enquanto pna especialmente proeminente no estudo de Ogunbiyi (1952: 67) sobre os dezesseis cawris, ril quem controla os dezesseis cawris de Salak, e quem mencionado repetidamente em seus versos e exerce algumas das funes usualmente atribudas a outras divindades, incluindo at mesmo lrun, o Deus do cu e divindade suprema. Se os versos divinatrios recitados por devotos de Eu, un, Yemj e outras deidades associadas com os dezesseis cawris fossem analisados, revelariam provavelmente uma glorificao semelhante de suas prprias divindades, do mesmo modo que ocorre com os versos da divinao If. Existe um grande nmero de divindades (bora, bura, iml, r) segundo a crena Yorb, cujo total jamais foi registrado. Informantes falam, com freqncia, de 401 deidades, assim como o fazem os versos (A10, G9, K8), mais um deles (A18) menciona 3.200 divindades. Cada uma delas possui atributos especiais ou poderes especficos, mas todos podem dar filhos, proteo e outros benefcios a seus fiis devotos. Acredita-se que todas as divindades, exceo de lrun, o deus do cu, j viveram alguma vez na terra e que entraram pelo cho adentro, subiram ao cu, se transformaram em rios colinas e tornaram-se divindades. Um verso (A32) fala de Egungun, Oro, pna e Ogun que entraram na terra e ficaram imortais, alm de outro (H12) que relata como Yemj e Ofiki se transformaram em rios. Muitas deidades esto associadas com cidades onde se acredita tais coisas tenham tido lugar ou local onde tenham vivido. Um verso (A34) enumera as cidades de ng, Ori Oko, If (runmil, y, Egungun, pna, lgba (Eu) e balufn, e ainda outro (J17) identifica a cidade de ri Ogiyan.

    Acima de todas as divindades acha-se o deus do cu, Olodumare, aquele que dono do cu (lrun) ou rei do cu (b run), que foi sincretizado com o Deus cristo e o Allah muulmano. Os versos identificam Marvel (r)8 como seu filho (B13) e duas das mulheres de runmila, Aina e r, como filhas (A9). lrun no tem devotos especficos, nenhum culto e sacrrio algum. Sacrifcio nenhum lhe oferecido diretamente mas qualquer um pode orar para ele (F3). Habita nas alturas, acima do arco-ris (A2), mas como mostram os versos de If (Bascom 1969: 104), ele pode intervir nos assuntos humanos. Nos versos de Salak, tambm, ele envia a Morte para trazer Onderoro para o cu (A6), um agricultor diz que lrun

    8 Curiosamente, Marvel (em ing.) significa prodgio, maravilha.

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    lhe deu um escravo (B6) e quando n cura crianas, todos dizem que foi lrun que o fez (M2). Um verso (F20) prediz que lrun ajudar o consulente a pegar algum que quer rouba-lo, e outro (K9) recomenda que devemos ser pacientes em pedir a devoluo de um emprstimo porque no sabemos o que dir lrun no futuro. Uma das personagens designada de Se lrun no me mata, gente no poder faz-lo (J8).

    O mais importante que lrun quem determina e controla os destinos humanos (Bascom 1969:115-118). Os Yorb crem na reencarnao e em algumas almas mltiplas. A mais importante dentre elas a alma guardi ancestral (ld, pnri, ipr), associada com a cabea da pessoa, seu destino reencarnao. A segunda a respirao (m), que reside nos pulmes e no trax e tem as narinas para servi-la como as duas aberturas no fole de um ferreiro Yorb. A respirao a fora vital que faz o homem trabalhar e lhe d a vida.

    Alguns dizem que existe uma terceira alma, a sombra (jji), que no tem funo no decorrer da vida mas simplesmente segue o corpo vivente por todos os lugares.

    Pode-se ver a sombra e ouvir e sentir a respirao; mas ningum ouve, sente ou enxerga a alma guardi ancestral enquanto o indivduo for vivo. A sombra no dispe de substncia e no quer alimento; a respirao sustentada pela comida que o prprio indivduo ingere; mas a alma guardi ancestral precisa ocasionalmente nutrida por intermdio de sacrifcios conhecidos por alimentando a cabea (br, b ori).

    Antes de uma criana nascer ou renascer , a alma guardi ancestral comparece perante lrun a fim de receber um novo corpo, uma nova respirao, e seu destino (w, pn) para sua nova vida na terra. Ajoelhando-se diante de lrun, a essa alma dada a oportunidade de escolher seu prprio destino, e se acredita poder ela fazer qualquer escolha que desejar, embora lrun possa recusar caso os pedidos no sejam feitos humildemente ou sejam desarrazoados. O destino envolve a personalidade do indivduo, sua ocupao e sua sorte; e inclui um dia fixo no qual as almas tem de retornar para o cu. Por vezes, a alma guardi ancestral denominada de cabea (or) ou de dona da cabea (olr), e nos versos de Salak personificada como Cabea (A28, A34, A35, A13, J19). Um verso (A35) conta como a cabea escolheu todos os destinos. Em outro (A5), uma mulher chamada a que tem filhos pequenos disse que suas bnos se atrasaram; ela disse que suas bnos celestiais se atrasaram. Ela disse que no sabe se sua cabea

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    escolheu um destino de contas, sua cabea escolheu um destino de lato, sua cabea escolheu uma grande abundncia de dinheiro. Uma pessoa de sorte chamada a que tem boa cabea, significando um bom destino, e uma pessoa sem sorte a que tem uma m cabea.

    Informantes enfatizam a importncia da alma guardi ancestral, alguns at denominando de deidade. A cabea a principal divindade do indivduo. A cabea mais importante para qualquer um do que sua prpria divindade. A cabea a mais velha e mais poderosa de todas as deidades (Bascom 1960: 408). Um verso (A34) narra como a Cabea lanou nove divindades para suas cidades, onde elas prosperam, e Assim foi como a cabea ultrapassou todas as divindades. runmila sacrifica sua cabea e casa com Dinheiro; ele louva-se a si prprio por este fato at que sua esposa faz objeo, ele louva Dinheiro at que seus divinadores lhe dizem que louve aquela que o fez ser bem sucedido, e finalmente ele louva a Cabea (A28). As personagens nos versos freqentemente so instrudos no sentido de que sacrifiquem para suas cabeas (A28, E4, F12, H2, H9, I11, J1, J8, J9 nota 1) mas nos dizem Se nossa cabea vai dar ateno s nossas splicas, isso no sabemos (C8). Nos versos, h muitas louvaes cabea. No existe pas onde a cabea no seja conhecida (A28). Cabea o melhor defensor, aquele que tem boa cabea no tem equivalente (A34). A cabea de uma pessoa o que a faz rica (I16). Cabea o que faz do menino um homem (A28). No h nada que uma cabea no possa fazer de um homem; a cabea de uma pessoa faz dela um rei (G5).

    O dia da morte de uma pessoa nunca pode ser postergado, mas outros aspectos de seu destino podem ser modificados por meio de atos humanos e por seres ou fora supra-humanas. Se algum dispe do integral apoio e proteo de sua alma guardi ancestral, de lrun, e das outras divindades, ento desfrutar do destino que lhe foi prometido e esgotar o lapso de vida que lhe foi atribudo; caso contrrio pode ver-se privado das bnos a ele destinadas ou morrer antes da hora. Atravs de sua vida, o indivduo faz sacrifcios para sua alma guardi ancestral e para suas divindades; dispe de magias ou medicinas, preparadas para proteg-lo e assisti-lo; e quando em dificuldades, ele consulta um divinador a fim de determinar o que deveria ser feito para melhorar sua sorte. O divinador tambm consultado antes de qualquer empreendimento de maior envergadura, para saber que sacrifcio necessrio para assegurar um desfecho bem sucedido.

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    Por ocasio da morte, as mltiplas almas abandonam o corpo e normalmente atingem o cu, l permanecendo at sua alma guardi ancestral seja reencarnada. Pessoas que morrem antes de seu tempo, continuam na terra como fantasmas, permanecendo em cidades distantes aonde no possam ser reconhecidas, at que chegue o dia indicado por lrun, momento que morrem uma segunda morte e seguem para o cu. Quando as trs almas l chegam, lrun lhes prescreve um um bom cu ou um mau cu, dependendo de seu comportamento na terra. Aqueles que foram enviados para o mau cu jamais podero ser restitudos vida atravs da reencarnao; tampouco podem os suicidas, as quais nunca alcanam o cu mas se tornam espritos malignos, que se dependuram s copas das rvores, tais como morcegos ou borboletas.

    Se uma mulher tem diversos filhos em sucesso, que morrem no parto, na infncia ou at quando um tanto mais velhos, possvel que no seja uma sucesso de diferentes almas guardis ancestrais porm uma s alma que repetidamente renasce, apenas para retornar por curto espao de tempo ao cu, onde conserva sua forma infantil. Ela no quer permanecer por longo tempo na terra, preferindo a vida no cu ou simplesmente desejando ir e vir entre o cu e a terra, havendo-lhe sido concedidos curtos tempos de vida por lrun. Tais crianas so conhecidas por abiku (bk) ou o nascido para morrer, e suas mes podem unir-se a gb gb, um culto que torna propcios os abiku e cujos membros tem feitos grandes guizos de ferro para suas crianas e que estas usam atados aos quadris. O cadver da criana pode ser marcado mediante a raspagem de um local da cabea ou um corte na orelha para atestar que se trata de um abiku quando venha a renascer com a mesma marca; e o corpo morto de um abikupode ser ameaado de ser queimado ou ter um artelho ou dedo decepado a fim de aterroriz-lo para que permanea na terra quando de novo renasa. Nos versos, consulentes so mandados sacrificar por causa de um abiku (F22) e de modo que a criana que venham ter no seja abiku (12). runmila ofereceu um sacrifcio antes que se casasse com uma abiku, e ela no morreu (A26). Arco-ris Frvolo continua morrendo como um abiku porque seus pais no sabem seu nome verdadeiro (F22).

    Um sacrifcio tambm prescrito para gmeos (J8). Estes (ibj) no so to ruins como abiku mas so temidos porque so poderosos e podem fazer mal ou at mesmo provocar a morte de seus pais. Quando nascem gmeos, dois pintinhos so parcialmente enterrados a um canto de um cmodo e sacrifcios so oferecidos

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    prximos a eles, anualmente. Quando um dos gmeos morre, os pais mandam um entalhador de madeira esculpir uma figurinha de gmeos (re ibj) do mesmo sexo e com as marcas faciais de sua linhagem. Caso o segundo venha a morrer enquanto jovem, uma segunda figura lavradas. Como os abiku, os gmeos guardam a forma de crianas no cu e passam seu tempo brincando. Gmeos e abiku no so deidades; os sacrifcios a eles oferecidos so para suas almas. Um verso (A5) conta como pessoas comearam a cozinhar inhames amassados e temperados, milho (cozido), fritar banana-da-terra e inhames para gmeos.

    Um verso (G1) conta de que modo lrun deu a uma dentre as dezessete figuras () todos os destinos que este havia perdido. Entretanto, em outro verso (A35), ril (rnanl) quem distribui destinos e, conforme j vimos, segundo alak, no Olorun mas ril (ranl rgb) quem determinou as divindades os respectivos poderes. Este tema repetido em outros versos (A18, A35).

    Os versos, da maneira como foram ensinados a Salak, obviamente, enriquecem a importncia de sua prpria divindade.

    lrun tambm chamado de Oldmar (A6, B13, G1). Vrias interpretaes desse nome tem sido oferecidas (Bascom: 1969: 104), inclusive aquela contida no verso B12, no entanto, identifica Olodumare como ri Oluofin, uma das divindades brancas e filho de Pton e ril. Isso diverge claramente da crena amplamente em vigor que Olodumare se encontra acima de todas as outras divindades (Idowu 1962: 56) assim como no se coaduna com o mito da criao conforme relatado pelos sacerdotes de ril em If.

    No relato deles, Olodumare deu a ril um pouco de terra dentro duma concha de caracol e uma galinha de cinco dedos e o enviou com Camaleo a fim de criar a terra sobre as primevas. Entretanto, ril embriagou-se com vinho de palmeira e adormeceu, tomando Odu, seu irmo mais moo, os materiais em mos e descendo por uma corrente dos cus, foi acompanhado por Camaleo e Calau. Camaleo lanou a terra gua e colocou o galinceo de cinco dedos sobre ela, ordenando-lhe Odu que a espalhasse. Quando Odu despertou e percebeu o que ocorrera, interditou o vinho de palmeira (e todas as coisas derivadas do leo de palma) a seus devotos e seguiu Odu at a terra, onde lutaram pela posse dela. Quando Olodumare ouviu acerca da briga, enviou runmila para apaziguamento. Outras verses acrescentam que ao Criador da Terra, Odu, foi dado o direito de

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    govern-la. Tornou-se o primeiro rei, de quem os monarcas Yorb alegam descender diretamente. A ril foi dado o poder de moldar os corpos humanos, tornando-se ele o criador da Humanidade.

    A despeito de sua importncia na mitologia Yorb, Odu (Odu, Oduw, Odduw) no aparece nos versos de Salak, conquanto fosse mencionado como vinculado figura Ofun (B) e constando em uma das lendas de Salak, como acompanhante de ril terra. Em discusso, Salak descreveu-o como uma das divindades brancas e mensageiro de ril em If, que o usava para auxili-lo em seu trabalho de modelar crianas no nascidas. Mesmo em sua verso da criao, contada sob a forma de lenda, ril (banl) e no Odu ou Camaleo quem ps o bocado de terra sobre a gua, pousou a galinha dos cinco dedos para espalh-la, e criou os pssaros, animais, rvores, arbustos e gramneas. Ambas verses so mencionadas por Idowu (1962: 1922), o qual favorece o depoimento de Salak.

    ranmiyan (rnmyn, rnyn) outra importante divindade que no aparece nesses versos, mas mesmo assim Salak o mencionou como divindade associada figura kanran (D). Diz-se haver tido ele dois pais e ser meio pele branca como Odu e meio pele negra como gn, o Deus do Ferro. Tornou-se grande guerreiro como seu pai, gn, e curioso que no tenha sido citado pelo fato de haver sido o fundador e primeiro rei de y.

    ril, o Deus da Brancura e o criador da Humanidade, j foi abordado porm exige considerao adicional em decorrncia de sua importncia na verso de Salak da divinao com dezesseis cawris. Havendo-lhe sido dado o poder de moldar os corpos humanos, ele criou o primeiro homem e a primeira mulher; de acordo com Salak, eram eles Gbgbade e Mtawede, outros nomes para ri Rowu e risa Yemo. ril tambm modela a forma humana dos seres no tero, antes que nasam. Salak declarou que ignorava como isso era feito, mas outros informantes disseram que, trabalhava na escurido com uma faca, ele molda seus corpos e depois, como um entalhador de madeira, separa os braos, as pernas, os dedos e artelhos, e abre os olhos, os ouvidos, o nariz e a boca. Ele , por vezes, denominado escultor de Olorun e dois de seus nomes quando louvado so Aquele que exculpe na escurido (Agbknkn son) e A pessoa que faz os olhos e que faz o nariz (ni to sj sem; cf. Idowu 1962: 72). Em um dos versos (A18), Eu achou ril esculpindo e dele aprendeu como fazia ps, bocas e olhos.

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    Outro dos nomes de louvao de ril Aquele que cria uma pessoa como bem entende (Adni b ti ri). Crianas que ele modela como albinos (fn), corcundas (abuk), aleijados (ar), anes (Arr) e surdos-mudos (odi), so, para ele, sagrados. Um quarto nome de louvor Marido de corcunda, marido de aleijado, marido de ano que tem cabea achatada (k abuk, k, arr aborpt), e versos mencionam tanto aleijados (A41, A43, G12,) quanto albinos (A43, J17). Os nascidos envoltos na mnio (k, l) tambm so sagrados ante ril, e os nomes dados aos nascidos nessas condies tambm so mencionadas (B10, K10).

    Ele aparece nos versos com os nomes rl e rsnl, freqentemente encurtado para l e nl, ou com seus nomes de louvao rl rgb e Erijialo (A25). bafnw que significa Rei d destino parece constituir outra designao de louvor (K10). Os nomes blfn, cuja cidade identificada como rn (A34), Olfon (C16) e r Wuji (A7, G8) ou rsa tambm so usados. Mais amide referem-se a ele como, simplesmente, Pai (Bb) ou Divindade (r, ou em sua forma reduzida, ). Enquanto a palavra ri traduz-se como divindade, comumente se refere, especificamente, s divindades brancas, distinguindo-se de outras deidades (bra, bura, iml).

    Claramente ril quem controla a divinao de dezesseis cawris, de Salak, do mesmo modo que runmila que o faz na divinao If. Repetidamente rezam os versos ri diz quando anunciam a predio, e o consulente estava louvando os divinadores e os divinadores estavam louvando ri por seus divinadores terem falado a verdade ou, literalmente, que os divinadores tinham falado com boas bocas. Isto significa que os divinadores estavam louvando ril porque ele fez com que a divinao tenha sido acurada, de modo que a predio revelou-se verdadeira.

    Os versos identificam Aratumi (A1), n (A25), Ere ou Pton (B12), Oro (C16) e Yemo ou Yemuo (J16), tambm conhecida por Mtawde, como sendo as esposas de ril, havendo Salak acrescentando Adun, ou Caracol, e Yemj. Diz-se que sejam seus filhos Eu (K2) e mniyinr (G8). Os versos narram como ril conseguiu o poder () de ter suas predies no se realizam em um dia (A12, F8) e como lhe foi dito para que usasse roupa branca (J16). Quando n se rene a ril em seu sacrrio, dito a ela para trajar-se com tecido branco, com chapu branco, e calas compridas brancas e que Elas tem de estar limpas! (A29). Quando a roupa de ril enodoada com leo de palmeira e leo de caroo de palmeira, ambos tabu para ele, e sujada por madeira preta, Yemo lhe d roupas

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    brancas limpas para vestir (J16). Outros versos contam como ele comeou a comer o guisado no temperado que lhe oferecido em sacrifcio (D1), e como ele fez do sal um tabu para albinos (A43).

    Referncias so feitas s suas contas brancas (B13), seu metal especial, o chumbo (C5, C19, J16), e a seu tambor agba (J11), e os sacrifcios que ele instrudo a fazer incluem tecidos brancos, galinhas brancas, pombos brancos e caracis (B13, J16). Em um verso (A20), ril encontra Caracol cobrando pedgio no porto da cidade e runmila e gn, de maneira semelhante, encontram seus animais sacrificiais favoritos, a Cabra e o Co. A maioria destes pontos confirmam crenas aceitas acerca de ril, mas eu no consigo explicar a razo pela qual um sacrifcio a ele deveria incluir uma galinha preta, um pombo e uma cabra preta. (P1).

    Diversas outras divindades brancas so citadas nos versos. ri Olufin, j mencionado como identificado com Olodumare, transporta o traje branco do ri Rowu, que toma o ttulo do ri Olojo (A3). Segundo Salak, estas so trs divindades brancas distintas e ri Rowu o filho mais velho de ril, mas Idowu (1962: 75) identifica ri Rowu como Oril na cidade de Owu. Um verso (J18) prescreve um sacrifcio para uma divindade branca no identificada. ri Ogiyan, que denominado Aquele que desfruta da honra, golpeado com bastes por sete albinos em ejigbo, sua cidade, uma aparente aluso e flagelao, que praticada por seus devotos (J17). este mesmo prescreve um sacrifcio colina Ogiyan e outros prescrevem sacrifcios para uma colina (L3 nota I, L4). Colinas figuras notavelmente em vrios versos (e. g., A21), incluindo Osinnido, em Ibadan (G4, G5) e Olumo, em Abeokut (K5).

    Eu () o divino mensageiro que entrega os sacrifcios oferecidos em seu sacrrio, de acordo com o que prescrevem os divinadores, a lrun. Ele tambm o divino trapaceiro que no s delicia em fazer arruaa mas tambm serve a outras divindades ao perturbar os seres humanos que as ofenderam ou negligenciaram. Ele chamado de Eu no bom ( dra; A44, C15), e tambm conhecido por lgb (A34) e Joriw (K2). Sua cidade Iworo (A34). Independentemente de qual divindade cultuada por cada indivduo, todo mundo era para ele de modo a que ele no lhes cause problema, e uma parte de qualquer sacrifcio posta de lado, para ele. Seu assentamento sagrado um bloco de laterita montado fora da casa e ao qual sacrifcios so oferecidos ou uma tosca figura de

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    barro posta em encruzilhadas, qual os passantes do cawris ou pedacinhos de alimento.

    Eu a mais jovem e a mais esperta dentre todas as divindades criadas por lrun, conquanto Salak novamente parta da crena comum ao atribuir este ato a ril. Em um dos versos de Salak (K2), antes que ril gerasse Eu ele foi advertido de que Eu vai querer super-lo e tomar seu mundo de voc se no prestar ateno; depois Eu talhava porretes e os usava para superar qualquer um sobre a terra, e tudo que o Pai fazia, Eu fazia. E de novo foi ril quem enviou Eu para viver nas encruzilhadas e fazer coleta de alguma coisa de qualquer um que passasse; e por isso Eu se tornou rico e maior que todos os seus maiores (A18). Ele preguioso (K2) e no tem trabalho para fazer (A18). A afirmao que homens indolentes vivem de sua sabedoria; somente os tolos no sabem como administrar seus negcios (A18) se refere a Eu.

    Do mesmo modo que nos versos de If, Eu aparece aqui, primariamente, em seu papel de divino executor, o que impe, quem pune aqueles que deixam de fazer os sacrifcios prescritos pelos divinadores e recompensa os que os fazem. Sua notvel imparcialidade neste papel (Bascom 1969: 105-106, 118) e no de mensageiro das divindades so dificilmente compatveis com sua identificao a Satans como o fazem tanto cristos como muulmanos. Abimbla (1976: 86) define-o como um policial, mas Eu no prende simplesmente as pessoas ou as traz perante um julgamento; ele, em pessoa, quem ministra justia divina, quer recompensas, quer punies. Tampouco este papel coerente com sua identificao com o que se chamaria de o princpio da ambigidade (Fagg 1960)ou um esprito de acaso e incerteza (Elisofon e Fagg 1958: 114). No existe nada mais infalvel do que quando Eu assiste algum, porque essa pessoa ofereceu o sacrifcio prescrito ou fez alguma outra coisa que lhe agradou, ou ento quando algum deixou de realizar o sacrifcio, se recusa a obedecer a outras instrues, ou ainda comete uma outra ofensa qualquer, Eu a punir ou se alegrar com seu infortnio.

    Por isso, um verso afirma que Eu estraga o trabalho de um menino que se recusa a ficar em casa aprendendo If, os ritos sacrificais e como apaziguar os deuses (C15). gn rompe com um tabu e depois mata o encarregado do pedgio da porta da cidade, e Eu o faz foragir-se na floresta (A20). Uma mulher realizou sacrifcio e tem filhos; mas escarnece dos divinadores e Eu faz com que as crianas joguem frutas nela (A5). Um combatente chama Eu de ladro e se recusa a fazer

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    sacrifcio, sendo ento morto em batalha (J13). Quando Akisa mr desafia os deuses e se recusa a sacrificar carne seca, Eu exclama: Ele no deveria comportar-se assim! e Akinsa mr se engasga sufocado com a carne enquanto Eu se rejubila (I17). Egungun e Agunfn se recusam a sacrificar suas espadas e Eu diz: Eles no ofereceram sacrifcio. Egungun decapita Agunfn com sua espada e Eu se regozija (N1).

    O tambor agba leva um sova com a baqueta que ele deixou de sacrificar e Eu se deleita (J11). A rvore cola no completa seu sacrifcio e Eu diz s pessoas para usarem seus filhos (nozes de cola) em seus rituais (C17, J10). Uma erva daninha no completa seu sacrifcio e Eu diz aos lavradores para capinarem com a enxada o que ela no ofereceu (A37). Embora no sejamos informados se ele sacrificou ou no, aparentemente o Esquilo no obedece s instrues para no falar; camponeses matam ento seus filhotes e de novo Eu se alegra (E6).

    Quando a Pomba se recusa a sacrificar, Eu leva os campnios a comer seus filhotes e y a quebrar seus ovos; mas porque o pombo