16 2 timoteo comentario esperanca

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  • 7/29/2019 16 2 Timoteo Comentario Esperanca

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    CARTAS ATIMTEO

    2Timteo

    COMENTRIO ESPERANA

    autor

    Hans Brki

    Editora Evanglica Esperana

    Copyright 2007, Editora Evanglica EsperanaPublicado no Brasil com a devida autorizao e com todos os direitos reservados pela:

    Editora Evanglica EsperanaRua Aviador Vicente Wolski, 35382510-420 Curitiba-PR

    E-mail: [email protected]: www.esperanca-editora.com.br

    Editora afiliada ASEC e a CBLTtulo do original em alemoDer zweite Brief des Paulus an Timotheus, die Brief an Titus und an PhilemonCopyright 1975 R. Brockhaus Verlag

    Dados Internacionais da Catalogao na Publicao (CIP)

    (Cmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)Brki, HansCartas aos Tessalonicenses, Timteo, Tito e Filemom / Werner de Boor, Hans Brki / traduo Werner Fuchs --Curitiba, PR : Editora Evanglica Esperana, 2007.Ttulo original: Der Briefe des Paulus an die Thessalonicher; Der erste Brief des Paulus an Thimotheus; Derzweite Brief des Paulus an Thimotheus, die Briefe an Titus und an Philemon. ISBN 978-85-86249-97-6 Capa dura

    ISBN 978-85-86249-98-3 Capa dura

    1. Bblia. N.T. Crtica e interpretaoI. Ttulo.06-2419

    CDD-225.6

    ndice para catlogo sistemtico:

    1. Novo Testamento : Interpretao e crtica 225.6

    proibida a reproduo total ou parcial sem permisso escrita dos editores.

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    O texto bblico utilizado, com a devida autorizao, a verso Almeida Revista e Atualizada (RA) 2 edio, da Sociedade Bblicado Brasil, So Paulo, 1993.

    SumrioORIENTAES PARA O USURIO DA SRIE DE COMENTRIOS

    NDICE DE ABREVIATURASPREFCIOQuestes IntrodutriasO Promio2Tm 1.1s1. Remetente e destinatrio2Tm 1.1-2a2. Saudao2Tm 1.2b

    O texto da carta2Tm 1.3-4.18I. Timteo no empenho pelo evangelho2Tm 1.3-5,13

    1. Orao e gratido por Timteo2Tm 1.3-52. Testemunhar no poder do Esprito2Tm 1.6-14

    a) Dom e poder do Esprito2Tm 1.6-7

    b) Convocado como testemunha2Tm 1.8-12c) Preservar por intermdio do Esprito2Tm 1.13s3. O exemplo das testemunhas2Tm 1.15-18

    a) O mau testemunho2Tm 1.15b) O bom testemunho2Tm 1.16-18

    4. Timteo como testemunha do evangelho 2Tm 2.1-13a) Lutar como companheiro de sofrimentos do apstolo 2Tm 2.1-7b) Perseverar na comunho de sofrimentos com Jesus2Tm 2.8-10c) O Senhor continua fiel2Tm 2.11-13

    II. Timteo na resistncia contra o evangelho deturpado 2Tm 2.14-4.5A. Os atuais falsos mestres2Tm 2.14-26

    1. Preservar o cerne da verdade da salvao2Tm 2.14-19a) F e conduta desencaminhada2Tm 2.14-18b) O slido fundamento de Deus2Tm 2.19

    2. Como Timteo capaz de resistir2Tm 2.20-26a) Purificao para o servio2Tm 2.20-22b) Refutando os falsos mestres com brandura 2Tm 2.23-26

    B. Os futuros hereges2Tm 3.1-171. A caracterstica do fim dos tempos2Tm 3.1-9

    a) Pecado camuflado pela devoo2Tm 3.1-5b) Os sedutores devotos2Tm 3.6-9

    2. O verdadeiro mestre do evangelho2Tm 3.10-17a) Paulo como exemplo2Tm 3.10-13b) Timteo, um homem de Deus por meio da palavra de Deus2Tm 3.14-17c) Realizar fielmente o servio2Tm 4.1-5

    C. O apstolo chegou ao alvo2Tm 4.6-181. Sua corrida foi consumada2Tm 4.6-82. Timteo deve vir com urgncia2Tm 4.9-133. preciso contar com oposio 2Tm 4.14-164. O Senhor salva em tudo2Tm 4.17s

    O final da carta2Tm 4.19-221. Saudaes2Tm 4.19-212. Voto de bno2Tm 4.22

    BIBLIOGRAFIA

    ORIENTAESPARA O USURIO DA SRIE DE COMENTRIOS

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    Com referncia ao texto bblico:O texto de 2Timteo est impresso em negrito. Repeties do trecho que est sendo tratado tambm esto

    impressas em negrito. O itlico s foi usado para esclarecer dando nfase.

    Com referncia aos textos paralelos:A citao abundante de textos bblicos paralelos intencional. Para o seu registro foi reservada uma coluna

    margem.

    Com referncia aos manuscritos:Para as variantes mais importantes do texto, geralmente identificadas nas notas,foram usados os sinais abaixo, que

    carecem de explicao:

    TM O texto hebraico do Antigo Testamento (o assim-chamado Texto Massortico). A transmisso exata do textodo Antigo Testamento era muito importante para os estudiosos judaicos. A partir do sculo II ela tornou-seuma cincia especfica nas assim-chamadas escolas massorticas (massora = transmisso).Originalmente o texto hebraico consistia s de consoantes; a partir do sculo VI os massoretasacrescentaram sinais voclicos na forma de pontos e traos debaixo da palavra.

    Manuscritos importantes do texto massortico:

    Manuscrito: redigido em: pela escola de:Cdice do Cairo (C) 895 Moiss ben AsherCdice da sinagoga de Aleppo depois de 900 Moiss ben Asher(provavelmente destrudo por um incndio)Cdice de So Petersburgo 1008 Moiss ben AsherCdice n 3 de Erfurt sculo XI Ben NaftaliCdice de Reuchlin 1105 Ben Naftali

    Qumran Os textos de Qumran. Os manuscritos encontrados em Qumran, em sua maioria, datam de antes de Cristo,portanto, so mais ou menos 1.000 anos mais antigos que os mencionados acima. No existem entre elestextos completos do AT. Manuscritos importantes so:

    O texto de Isaas O comentrio de Habacuque

    Sam O Pentateuco samaritano. Os samaritanos preservaram os cinco livros da lei, em hebraico antigo. Seusmanuscritos remontam a um texto muito antigo.

    Targum A traduo oral do texto hebraico da Bblia para o aramaico, no culto na sinagoga (dado que muitos judeusj no entendiam mais hebraico), levou no sculo III ao registro escrito no assim-chamado Targum (=traduo). Estas tradues so, muitas vezes, bastante livres e precisam ser usadas com cuidado.

    LXX A traduo mais antiga do ATpara o grego chamada de Septuaginta (LXX = setenta), por causa da histriatradicional da sua origem. Diz a histria que ela foi traduzida por 72 estudiosos judeus por ordem do rei

    Ptolomeu Filadelfo, em 200 a.C., em Alexandria. A LXX uma coletnea de tradues. Os trechos maisantigos, que incluem o Pentateuco, datam do sculo III a.C., provavelmente do Egito. Como esta traduoremonta a um texto hebraico anterior ao dos massoretas, ela um auxlio importante para todos ostrabalhos no texto do AT.

    Outras Ocasionalmente recorre-se a outras tradues do AT. Estas tm menos valor para a pesquisa de texto, porserem ou tradues do grego (provavelmente da LXX), ou pelo menos fortemente influenciadas por ela (oque o caso da Vulgata):

    Latina antiga por volta do ano 150 Vulgata (traduo latina de Jernimo) a partir do ano 390 Copta sculos III-IV Etope sculo IV

    NDICE DE ABREVIATURAS

    I. Abreviaturas gerais

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    AT Antigo Testamentocf confiracol colunagr Gregohbr Hebraicokm Quilmetroslat LatimLXX SeptuagintaNT Novo Testamentoopr Observaes preliminarespar Texto paralelop. ex. por exemplopg. pgina(s)qi Questes introdutriasTM Texto massorticov versculo(s)

    II. Abreviaturas de livros

    Bl-De Grammatik des ntst Griechisch, 9 edio, 1954. Citado pelo nmero do pargrafoCE Comentrio EsperanaKi-ThW Kittel: Theologisches WrterbuchNTD Das Neue Testament DeutschRadm Neutestl. Grammatik, 1925, 2 edio, RademacherSt-B Kommentar zum Neuen Testament aus Talmud und Midrasch, vol. I-IV, H. L. Strack, P. BillerbeckW-B Griechisch-deutsches Wrterbuch zu den Schriften des Neuen Testaments und der frhchristlichen Literatur, Walter

    Bauer, editado por Kurt e Barbara Aland

    III. Abreviaturas das verses bblicas usadas

    O texto adotado neste comentrio a traduo de Joo Ferreira de Almeida, Revista e Atualizada no Brasil, 2 ed.

    (RA), SBB, So Paulo, 1997. Quando se fez uso de outras verses, elas so assim identificadas: BLH Bblia na Linguagem de Hoje (1998)BJ Bblia de Jerusalm (1987)BV Bblia Viva (1981)NVI Nova Verso Internacional (1994)RC Almeida, Revista e Corrigida (1998)TEB Traduo Ecumnica da Bblia (1995)VFL Verso Fcil de Ler (1999)

    IV. Abreviaturas dos livros da Bblia

    ANTIGO TESTAMENTOGn Gnesisx xodoLv LevticoNm NmerosDt DeuteronmioJs JosuJz JuzesRt Rute1Sm 1Samuel2Sm 2Samuel1Rs 1Reis2Rs 2Reis1Cr 1Crnicas2Cr 2Crnicas

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    Ed EsdrasNe NeemiasEt EsterJ JSl SalmosPv ProvrbiosEc EclesiastesCt Cntico dos CnticosIs IsaasJr JeremiasLm Lamentaes de JeremiasEz EzequielDn DanielOs OsiasJl JoelAm AmsOb ObadiasJn Jonas

    Mq MiquiasNa NaumHc HabacuqueSf SofoniasAg AgeuZc ZacariasMl Malaquias

    NOVO TESTAMENTO

    Mt MateusMc MarcosLc LucasJo JooAt AtosRm Romanos1Co 1Corntios2Co 2CorntiosGl GlatasEf EfsiosFp FilipensesCl Colossenses1Te 1Tessalonicenses 2Te 2Tessalonicenses 1Tm 1Timteo2Tm 2TimteoTt TitoFm FilemomHb HebreusTg Tiago1Pe 1Pedro2Pe 2Pedro1Jo 1Joo2Jo 2Joo

    3Jo 3JooJd JudasAp Apocalipse

    OUTRAS ABREVIATURAS

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    QUESTES INTRODUTRIAS1. Desde D. N. Berdot (1703) e P. Anton (1726) as cartas a Timteo e a Tito so chamadas cartas pastorais

    (past). Mas Toms de Aquino ( 1274), em sua introduo a 1Tm, j mencionava pastoralis regulae (instrues,regras para pastores). As trs cartas para pastores so dirigidas pelo pastor Paulo aos pastores Timteo e Tito, e pormeio desses dois, aos pastores das igrejas em redor de feso e na ilha de Creta. O fato de que tambm as igrejas estoincludas como destinatrias das cartas evidenciado, p. ex., pelo posicionamento da orao eclesial, na qual se

    aborda a conduta de todos os homens e mulheres na igreja (1Tm 2.8-15) antes da enumerao dos diversos servios naigreja e de suas demandas (1Tm 3.1-13). As consideraes sobre os servos da igreja voltam a desembocar na condutae no culto de todos a Deus (1Tm 3.14-16).

    2. A interpelao pessoal caracterstica para o estilo das trs cartas. Apesar de a carta a Filemom tambm sedirigir a uma pessoa em particular, ela no faz parte das past no que tange a contedo, estilo e poca de redao. Asdemais cartas de Paulo so dirigidas a igrejas. bem verdade que a carta aos Filipenses fato que no deixar de serrelevante para a compreenso e a interpretao das pasttambm cita, depois do endereamento a todos os santos,como destinatrios os presidentes e diconos (Fp 1.1).

    3. Ademais as past tm em comum a situao histrica das igrejas, dos colaboradores interpelados e do remetente,alm do vocabulrio, do desdobramento da doutrina do evan-gelho e do combate s heresias. No mbito desses pontos

    em comum, porm, h tambm considerveis diferenas: 1Tm tem o dobro do comprimento de Tt, com a qual possui amaior semelhana, a ponto de Tt ter sido considerada como edio abreviada de 1Tm e adaptada s circunstncias. Noentanto 2Tm chama ateno por causa das muitas declaraes de cunho bem pessoal e pelo insistente tom de apelo.

    4. A autoria paulina das past no foi questionada desde o sc. I at 1804 (J. Schmidt) e 1807 (F. Schleiermacher).Desde que Schleiermacher contestou a autenticidade de 1Tm por razes estilsticas e idiomticas (as caractersticasinteriores para a autoria de uma carta), no teve mais fim a controvrsia em torno de autoria, poca de redao einterpretao de todas as trs cartas. Defensores e crticos da autenticidade acumularam cada vez mais argumentospara fundamentar sua deciso. Justamente aquelas cartas que advertem com tanta insistncia contra discusses (1Tm1.4; 6.20,21; 2Tm 2.14,23; Tt 3.9) tornaram-se centro de uma luta por palavras que se solidificou cada vez mais emuma infrutfera guerra de posies: quem rejeita a autenticidade da carta procura apresentar as expresses que parecemde Paulo como imitao consciente de um autor posterior, e as novas formulaes no conhecidas nos demais escritosde Paulo como provas de que nem tudo pode ser de Paulo. Quem defende a autenticidade argumenta de formaexatamente oposta: a mais leve semelhana com Paulo precisa ser interpretada a favor da autoria de Paulo e todadiferena em relao s cartas anteriores de Paulo depe contra o argumento de um falso autor que, afinal, se estivessetentando fazer uma imitao, teria procedido de forma mais cuidadosa, a fim de dissimular suas prprias marcas.

    Contudo, no possvel obter clareza com base nesses entendimentos prvios. Uma vez que os elementos paulinos,independentemente de como forem aquilatados, predominam de tal maneira nas past, nenhuma crtica scaractersticas interiores, por mais radical que seja, por si s suficiente para refutar a autoria de Paulo.

    5. Analisemos mais de perto trs diferentes possibilidades de entendimentos preconcebidos:a) Afirma-se que com os mtodos da pesquisa histrico-crtica possvel chegar a uma compreenso das Escrituras

    melhor do que a dos prprios autores. Por exemplo, M. Dibelius escreve em um comentrio s past (p. 95):

    Evidentemente o autor no tem diante de si a seqncia dos acontecimentos (por ns reconstruda) na vida de Pauloda forma como ns telogos de hoje Por isso pode-se na melhor das hipteses supor que o autor simplesmente seequivocou. Portanto o telogo de hoje sabe que as anotaes pessoais surgiram de algumas informaes dignas decrdito, de lendas sobre Paulo e da combinao de notcias. Conseqentemente, o final de 2Tm pode ser explicadoassim: O admirvel etos da seo final, uma concretizao da conscincia de envio apostlico-missionrio nosofrimento, induziu vrios comentaristas a proteger essa carta ou pelo menos sua parte final contra a suspeita dainautenticidade. Contudo, uma vez que o predicado impossvel de inventar pode no significar nada nesse caso quantas cenas que respiram a proximidade da morte em poemas antigos e novos so inventadas! aquela ponderaono constitui uma prova. Contudo, quem avalia apropriadamente essa caracterstica pessoal de 2Tm, particularmenteem sua relevncia para a histria da igreja no mais ter grande dificuldade em considerar no-paulina essa carta,apesar de seus dados pessoais (p. 97).

    b) Para diversos o radicalismo da crtica vale como medida de confiabilidade, e at mesmo de cientificidade.

    verdade que tudo pode ser cientificamente questionado, mas a crtica possui limites. A caracterstica pessoal de 2Tmdeve ser aquilatada corretamente em sua relevncia para a histria da igreja, i. , entendida criticamente. Mas quesignifica isso? Primeiramente se pressupe a inautenticidade, depois a carta transferida ao sc. II, e ento a situaoda histria da igreja no sc. II deve determinar a motivao e o contedo do escrito: A apreciao histrica precisaentend-las no caso, as past(na premissa de sua inautenticidade) na situao eclesial da poca ps-apostlica. O

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    juzo sobre as cartas no pode ser separado da ampla transformao na autocompreenso da igreja que se realizanaquela poca (p. 7). Essa autocompreenso da igreja descrita pelo termo aburguesamento, que desde Dibeliusfoi adotado pela maioria dos comentaristas de forma no exatamente crtica. No entanto, quando os prprios textos soinvestigados na correlao com a teologia de Paulo, antes de julg-los com uma concepo de igreja do sc. II, elescontradizem inequivocamente ao julgamento prvio do aburguesamento. Alm do mais questionvel se a igreja dosc. II, intensamente perseguida, j pode ser chamada de burguesa.

    c) Quem contesta a autenticidade de uma afirmao apresenta-se como acusador, cabendo ao acusado o nus daprova: Aquela dvida no constitui prova! Na verdade deveria sero contrrio: o acusador que precisa produzir a

    prova. Entretanto, que provas so essas, quando o melhor (!) supor (!) que o autor simplesmente (!) se enganou eque aquele que simulou cartas, certamente tambm (!) podia simular votos de saudao e informaes pessoais (p.96)! Traduzindo, a frase acima diz: quem acusado certamente tambm culpado. Onde, porm, foi provado que oautor das past incorreu em culpa? possvel inventar cartas e compor cenas que respiram a proximidade da morte,mas ser que assim demonstrado que foi isso que aconteceu no presente caso?

    Obviamente a assero de cenas e dados pessoais impossveis de inventar assinala tambm a reao exagerada deum defensor da autenticidade (QI 4). O crtico contesta com razo a impossibilidade fundamental de inventar taiscenas, mas ao mesmo tempo ele inventa sua prpria seqncia de fatos por ele reconstruda, sem ter razo, porquecom isso aumenta as dificuldades que visava eliminar com sua explicao.

    6. Para poder declarar a inautenticidade das cartas, preciso supor que foramfalsificadas. Para no enfrentar maisgrande dificuldade, tentou-se expor que a prtica da falsificao era muito disseminada na poca e no era

    moralmente condenvel. No entanto, o que se sabe historicamente contradiz essa assero. P. ex., entre 150-200 opresbtero de uma igreja na sia Menor escreveu, como ele mesmo diz, por amor a Paulo, os chamados Atos dePaulo. Foi condenado por falsificao (no por heresia) e destitudo da funo de presbtero, porque haviaintroduzido em seus Atos o nome de Paulo.

    J em 2Ts (2.2; 3.17) Paulo solicita igreja que examine tanto a autenticidade das cartas como os espritos dosprofetas.

    At o ano de 130 no se tem notcia de falsificaes; somente depois disso elas surgem em nmero maior.Ningum, no entanto, situa as past depois de 130. Todas as cartas falsificadas de Paulo surgidas depois desse anopodem ser reconhecidas sem problemas: a) por sua juno superficial de palavras de Paulo retiradas de diversas cartascannicas, b) por sua pobreza de reflexo, c) por sua brevidade, que no ocorre em nenhuma das demais cartas dePaulo. Isso estabelece parmetros corretos para uma apreciao crtica da autenticidade das past.

    H. Balz escreve que as past seriam falsificaes tendenciosas, no produtos de uma escola, porque essas cartash muito se distanciaram de Paulo. Ele encerra com a afirmao tranqilizante de que essa atividade da falsificaoteria sido considerada incua ou natural. Na Antigidade, quem redigia escritos pseudo-epigrficos (i. , de autoriadesconhecida e atribuda a um nome notrio), sabia o que estava fazendo Precisava ter conscincia de que seuprocedimento dava ensejo a equvocos.

    Como Balz chega acusao, to claramente pronunciada, de que as past seriam falsificaes tendenciosas, i. ,visavam introduzir conscientemente uma doutrina diferente da de Paulo em nome do prprio? Balz parte de umaconcepo pr-determinada do que significa esprito. Por trs dos escritos das cartas de Paulo supostamenteinautnticas (conforme Balz fazem parte delas tambm Efsios, Colossenses, etc.) est o esprito da tradio e danorma apostlica, mas no o esprito que de acordo com 1Co 12.3 produz a confisso ao KriosIesous (i. , ao SenhorJesus) (p. 419). No comeo estavam as testemunhas, sucedidas pelos criativos proclamadores e inventores, que j nojustificavam pessoalmente sua f, razo pela qual empreenderam uma tcita modificao da tradio apostlica (p.

    43). Esse tipo de premissa no novo. J em 1845 F. C. Baur opinou de forma anloga sobre o esprito (do infinito)em Paulo, contrapondo-o carne (como finita), totalmente de acordo com os parmetros da viso hegeliana daHistria. Em virtude desse parmetro restaram somente quatro cartas genunas de Paulo, nas quais o esprito seexpressaria de maneira pura: Rm, Gl, 1 e 2Co. Todavia sempre que esprito e tradio, esprito e cargo, esprito eEscritura so contrapostos de forma mais ou menos excludente, est subjacente esse esquema mental filosfico, que adotado e retransmitido sem crtica, apesar de no fazer justia doutrina paulina do esprito.

    7. Na realidade, porm, no se entende em Paulo o contraste carneesprito nem de forma filosfica (finitoinfinito), nem moral (sensualidaderazo), nem mstica (neste mundoem Cristo), nem soteriolgico-antropolgica(o ser humano carnal redimido para ser humano espiritual), porm em termos de histria da salvao e deescatologia (histria do fim dos tempos): o centro da teologia de Paulo a proclamao do tempo da salvao, queiniciou na vida, morte e ressurreio do Messias e por isso tambm vir na consumao. Quando se toma essa viso de

    Paulo como ponto de partida, todos os 13 escritos cannicos do apstolo alinham-se de forma bem orgnica, incluindoprecisamente as 3 past, sem que houvesse necessidade de intervenes artificiais.

    A revelao do mistrio oculto e a atestao da salvao presente e vindoura perfazem contedo e incumbncia doevangelho. Na realidade mistrio uma palavra dos cultos msticos de helenistas (os cultos secretos eramentendidos e realizados de forma mgica!), mas em Paulo designa em toda e qualquer ocasio a obra redentora antes

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    oculta e agora revelada de Deus na histria dos humanos. Sob essa tica, 1Tm 3.16; 2Tm 1.9-11; Tt 1.2-3 esto emestreita correlao com 1Co 2.7; Rm 16. 25-27; Cl 1.26; 2.2-4; Ef 1.9-14; 3.4-12.

    8. A tenso escatolgica no foi dissolvida nas past. A igreja do Senhor vive da vinda do Redentor na humildade(Tt 2.14), de sua revelao na carne (1Tm 3.16; idntico a Gl 4.4; cf. Ef 1.10 e Mc 1.15!; bem como Rm 1.3; 8.3; 9.5;Ef 2.14; Cl 1.22), razo pela qual aguarda seu aparecimento na glria (Tt 2.13; 2Tm 4.1,8; 1Tm 6.14s). Aquele dia,o dia do Messias, ainda est por vir (1Tm 6.14; 2Tm 1.10,12,18; 4.1,8; Tt 2.13 como 1Co 1.8; 2Co 1.14; Fp 1.6,10;2.16). Os evangelhos atestam a mesma verdade em outras palavras: o reino de Deus uma realidade que abarca

    presente e futuro, j expressa na proclamao pr-pascal de Jesus. A igreja suplica: Venha teu reino e confessa: oreino de Deus veio (Mt 6.10; 12.28).

    9. Afirma-se que a expectativa da primeira igreja pela vinda iminente do Senhor teria esmaecido, que teria havidonecessidade de explicar a delonga e que a igreja precisou organizar-de dar conta do suposto adiamento da parusia.Esse esquema de explicao na verdade se tornou preferido, porm no adquiriu validade maior por ter sido acolhido edisseminado acriticamente, porque novamente o esquema tem por base o movimento intelectual de Hegel: aexpectativa imediata original (tese) teria levado, pela experincia da duradoura ausncia e delonga (anttese) dissoluo da tenso na histria da salvao (sntese).

    Alguns, p. ex., declaram que Lucas tenta explicar o adiamento da volta de Cristo pelo projeto de uma histria dasalvao, enquanto outros afirmam que ele teria deslocado a consumao da redeno do mbito temporal para oatemporal. Porm tanto seu evangelho como Atos dos Apstolos se opem a essas afirmativas. Cullmann tem razo

    em sua indagao crtica: Se a expectativa imediata de Jesus consiste da tenso entre j e ainda no, essa tensono pode ser somente um substitutivo ou uma soluo para o embarao da expectativa imediata no concretizadaOnde, porm, est a prova de que a no-realizao da parusia constitua um problema central que tinha se sersolucionado?

    Lucas no tinha de explicar o suposto adiamento da parusia, mas enfrentar expectativas excessivamente zelosas edistorcidas que deturpavam a doutrina de Jesus e a misso da igreja (Lc 17.20-23; Mt 24.26s; 2Ts 2.1ss). Tambmpara Paulo o ponto de partida no o problema de uma parusia no-realizada, mas a causa motora de tudo para ele ocumprimento acontecido. O tempo est cumprido! (Mc 1.15; Gl 4.4). Proximidade no significa tempo breve, mastempo premente: a premncia da obra divina de salvao que avana para o mundo inteiro. Por isso a vida emexpectativa no depreciar a vida neste mundo e nesta poca, mas na realidade lhe conferir a fora de tenso que levaa atos de amor e pressiona para que se proclame o evangelho a todas as pessoas.

    Ter uma conduta santa, apegar-se s tradies e ser zeloso em boas obrastudo isso no decorrncia da

    expectativa imediata enfraquecida, no conseqncia da perda da experincia direta do Esprito e da necessriaadaptao no mundo. Vale o contrrio: como o Senhor est prximo, todos que invocam o nome dele devem viveruma vida pura (1Ts 5.14; 2Ts 3.6,10-13); como o esprito est atuando, deve ser preservada a tradio do Senhor (cf.2Ts 2.13 com v. 15; 3.1,14; 2Tm 1.14; 3.16s), como o Senhor vem, a palavra do Senhor precisa correr (cf. 2Ts 3.1;2Tm 2.9; cf. Lc 21.24: os tempos dos gentios com 1Tm 3.16: pregado entre os gentios e Rm 11.25: at que hajaentrado a plenitude dos gentios).

    Nas past, insistir em uma conduta agradvel a Deus na igreja e no mundo, enfatizar a doutrina de acordo com oevangelho e combater falsas doutrinas no representa a prova de uma evoluo posterior, ou de uma decadncia dasalturas do esprito, mas constitui um sinal da tenso existente desde o comeo entre a redeno j atuante e a suaconsumao a ser ainda realizada.

    10. Nem Lucas nem Paulo mencionam o esprito da tradio e da norma apostlica como contraposto aoEsprito que confessa Jesus como Senhor, conforme Balz afirma devido sua posio preconcebida. Lucas atesta oEsprito como fora do mundo vindouro, que atuou em Jesus na plenitude dos tempos e agora se torna manifesto aseus seguidores. Conseqentemente experimentam, na comunho de vida e morte com o Ressuscitado produzida peloEsprito, efeitos do poder do mundo futuro na era atual (Lc 3.16; 10.21; 17.21; 11.13,20 = Mt 12.28; cf. 10.19s).

    O mesmo Esprito que confessa Jesus como Senhor abre o entendimento dos discpulos substitui as Escrituras. AsEscrituras no so substitutas do Esprito (perdido). No poder do Esprito os discpulos so e continuam sendotestemunhas disso que seu Senhor fez e que as Escrituras j afirmam acerca do Messias (Lc 24.28-29; At 1.2b,6-8).

    11. Por essa razo nem os evangelhos nem Paulo conhecem um contraste entre testemunhas orais e escritas dainspirao espiritual (2Ts 2.13,15; 3.6,14; 1Co 12.13 com 15.3s bem como 2Tm 1.7s,14 com 2Tm 3.16s). oEsprito que confere fora para o testemunho, e o Esprito que impele, pela instruo das Escrituras, s boas obras.

    falsa contraposio entre esprito da tradio e Esprito de Jesus correspondem tambm as falsas distines emrelao aos dons do Esprito: a) espiritual (orgnico)administrativo (organizacional), b) atualista (atuante nomomento)institucional (duradouramente regulamentado), c) carismtico (com autoridade espiritual, sobrenatural) sensato (ordenado conforme as regras humanas do bom senso, d) carisma (livre, espontneo, concreto) ministrio(institucional, slido, regulamentado).

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    Assim como a tenso entre a experincia do tempo de salvao cumprido no Messias e a consumao aguardadaest presente desde o incio, assim como o Esprito desde o comeo faz com que o futuro se torne eficaz na atualidade,assim como desde o incio testemunho e Escritura so conjugados pelo mesmo Esprito, assim existem, igualmentedesde o incio, servios autorizados de conduo ao lado de outros dons nas igrejas.

    12. Na carta mais antiga do NT, escrita por Paulo igreja em Tessalnica poucos meses depois de sua fundao(por volta do ano 50), o apstolo pede aos irmos que reconheam aqueles que presidem a igreja no Senhor. De 1Ts5.12s depreende-se: a) Os trs verbos trabalhar, presidir, admoestar no apenas designam funes, mas tambm

    pessoas ativas (do mesmo modo, 1Co 12.14ss no enumera apenas funes, mas tambm seus portadores). b) Trata-sede determinado grupo de pessoas assim designado; ou seja, no um simples arrolamento de trs categorias. c) Essesservos podem ser notados, do contrrio no seriam reconhecidos. d) Seu presidir est ligado ao seu trabalho (1Co16.16 emprega o mesmo verbo de 1Tm 5.17 para trabalhar em funo de autoridade). e) A admoestao paz revelaque direo e coordenao no acontecem sem atritos (pode-se traduzir assim o v. 13b: Tende paz com eles, osirmos que presidem).

    U. Brockhaus demonstrou que desde o comeo podemos reconhecer nas igrejas todos os elementos para os quais seempregou mais tarde o termo ministrio, passvel de equvocos: durao, autoridade, legitimao (oral ou escrita,cartas de referncia), posio destacada, remunerao. Servio (diakonia) o termo mais apropriado que Pauloemprega at mesmo para sua incumbncia singular (Rm 11.13; 2Co 4.1; 6.3; Cl 4.17; past: 1Tm 1.12; 2Tm 4.5,11), outambm mordomia (1Co 9.17; Ef 3.2; Cl 1.25; cf. 1Co 4.1 com 1Tm 3.4s,13; 2Tm 4.5).

    Desde o comeo (cf. 1Ts) Paulo apia e fomenta o servio da liderana autorizada, como fica comprovado em suas

    cartas tambm para Corinto e est pressuposto na carta aos romanos. Sim, os profetas e mestres da primeira igrejada Palestina at mesmo representam servios e designaes de servio ainda mais antigos que as funes diretivas semttulo em Tessalnica. Evangelista igualmente designao para uma funo eclesistica que pertence poca maisantiga (cf. 2Tm 4.5; Ef 4.11; At 21.8); o mesmo vale tambm para apstolo. Alm do limitado apostolado combase nas aparies dos Doze, U. Brockhaus consegue comprovar de modo plausvel que tambm existia desde ocomeo um apostolado de envio e congregacional aberto: emissrios de igrejas dos primeirssimos tempos comincumbncias missionrias (1Co 9.5ss; cf. v. 14; At 13.2; Gl 2.1,9; At 14.4,14) e outras (Fp 2.25; 2Co 8.23).

    13. Alguns vem em Paulo um adversrio da autoridade ministerial nas igrejas, para outros o apstolo praticamente defensor de ordem e ministrio. Perguntamos: ser que as igrejas tinham uma constituio carismtica daqual pudessem afastar-se mais cedo ou mais tarde em favor de uma constituio legal institucional? Como se deveentender a doutrina dos carismas em Paulo?

    Todo o bloco acerca dos dons em 1Co 12-14 uma parclese (discurso de exortao): em Cristo e direcionada parao Senhor que retorna na consumao. Paulo adotou a palavra charisma (ddiva, presente) do entorno profano eformulou listas de carismas nas quais as funes ministeriais na realidade esto integradas, mas no destacadas deoutras funes. Pois Paulo no avalia a funo em si, mas o modo como exercida, e a contribuio que ela d aotodo (U. Brockhaus, p. 216; exatamente esse aspecto mostrado tambm pelas past com todos os pormenores). Adoutrina dos carismas est aberta para as questes da constituio da igreja, mas no entra nelas. Por isso no se podefalar de uma constituio carismtica da igreja em Paulo.

    Com sua doutrina dos carismas, h pouco esboada em 1Co (em cartas anteriores de Paulo no ocorrem a palavradom da graa charisma e uma doutrina dos dons, nesse for-mato), o apstolo intervm exortando profeticamente ecorrigindo no contexto concreto da situao da igreja. Supera-se o contraste preladocarismtico (mais precisamente:detentor dopneuma, i. , pleno do Esprito), porque todos receberam um carisma, e todos os diferentes dons devem ser

    empenhados em benefcio da igreja. Paulo acrescenta aos dons reconhecidos em Corinto tambm aqueles que sereferem a funes de servio e direo.No se pode ignorar que os discursos de exortao acerca da questo dos dons ( 1Co 12-14; Rm 12) os situam em

    determinado contexto: ordem, auto-restrio comedida, insero no todo, mtua considerao e complementao. Issosomente poder surpreender ao que se apega a um conceito filosfico de Esprito e no reconhece que o Esprito Santono Novo Testamento fora transformadora e ao mesmo tempo norma compromissiva. Paulo pressupe o Espritopara todos os crentes e todas as igrejas como efeito de poder escatolgico doado ( 1Ts 5.19; Gl 3.2,5), que no apenasinspira neles palavras, mas se evidencia tambm em atos significativos (1Ts 1.5; 1Co 2.4; etc.).

    O Esprito simultaneamente a norma compromissiva da nova vida. J em 1Ts 4.8 aparece uma referncia norma, o que passa a ser plenamente desenvolvido em Gl 5.15s; Rm 8.4s; Fp 1.27. Por essa razo o apstolo ordenaem 1Ts 4.2, determina em 1Co 7.17, exorta (entendido como determinar) em Rm 16.17 assim como em 1Tm 2.1.Os discursos de admoestao concretizam a norma do Esprito (cf. 1Tm 4.1: o Esprito declara expressamente),

    sendo proferida na forma verbal do jussivo decretatrio (sentenas de direito sagrado; 1Co 14.13,28,30,35,37; 7.1;8.1; 9.14; 11.2s; 12.1; 16.15,18).

    Logo a doutrina dos carismas constitui uma ponte genuna entre o Esprito, como fora presenteada para a novavida, e a incumbncia concreta para essa nova vida. Ela uma tentativa de tornar eficaz a presena da novaexistncia pneumtica sob as condies da finitude. A liberdade est ligada com compromisso, fora presenteada

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    com definio prtica de tarefas. Por essa razo no historicamente possvel diferenciar entre funes carismticas eministeriais nas igrejas paulinas.

    14. Havia necessidade dessas referncias para superarparmetros no-bblicos e estranhos teologia de Paulo,visto que obstruem de antemo o acesso compreenso das past. Aps analisar Esprito e dons do Esprito emPaulo, Ridderbos constata, em sntese: no existe diferena profunda ou fundamental entre as cartas mais antigas dePaulo e as dirigidas a Timteo e Tito. Particularmente cabe rejeitar a idia de que as determinaes nas cartasanteriores devam ser atribudas diretamente a Cristo ou seu Esprito, e de que nas past o Esprito funcionaria conforme

    esprito de um princpio especfico, a saber, como poder da santa tradio apostlica.Um exemplo prtico explicitar isso: quando algum l o cntico dos cnticos do amor em 1Co 13 de formameramente superficial e o compara com admoestaes das past, poderia ser rapidamente arrastado para preconceitos.Aqui o mpeto do Esprito, l a lacnica enumerao de virtudes, aqui o eixo secreto da tica de Paulo, l aconotao moral de um epgono imitador. Que acontece, porm, quando se observa mais de perto? Por um lado, aenumerao em 1Co 13.4-7evidencia uma dependncia da terminologia e das formas da parclese filosfico-popular, e esses elementos gregos chegaram a Paulo pela via de uma tradio de doutrina e pregao judaico-palestina. Portanto, de acordo com isso Paulo acolheu elementos helenistas e judaicos tardios, mas elaborou a partirdeles algo completamente novo. O todo se transformou em um discurso de admoestao em forma de louvor(parclese hnica), surgido sob a impresso imediata do ainda esperado aperfeioamento da igreja no amor.

    Agora, porm, as past apresentam uma srie de discursos de admoestao, para as quais vale a mesmacaracterizao: estruturas terminolgicas helenistas e judaicas so combinadas em algo novo na forma de um louvor

    (1Tm 3.14-16; 6.11-16; 2Tm 1.6-14; 2.8-13; Tt 1.1-9; 2.9-14; 3.1-8). Em termos de fora expressiva, densidade eprofundidade espiritual algumas dessas parcleses hnicas esto no mesmo nvel do enaltecimento do amor em 1Co 13(quanto a detalhes, veja o comentrio). Tambm nas past o amor (igualmente entendido como fora e norma, por serfruto do Esprito) o eixo secreto e o alvo final de toda a exortao (1Tm 1.5,14; 2.15b; 4.12; 6.11; 2Tm 1.7; Tt 3.2-4comparados com 1Co 13.4-7!).

    Alguns crticos vem no suposto pseudo-Paulo um escritor de genialidade mpar, outros asseveram que ele seriauma pessoa simples que cobre suas palavras e idias singelas com a autoridade do grande apstolo. Mais plausvel,no entanto, aceitar o que os prprios textos dizem, a saber, que Paulo seu autor.

    15. Paulo tomou do entorno grego a palavra comum presente (charisma), desenvolvendo-a em 1Co para umadoutrina que abordava de forma admoestadora e orientadora a realidade concreta da igreja, posicionandosimultaneamente a f, a vida e o servio dos crentes no horizonte superior da expectativa e tenso escatolgicas: os

    dons so sinais do novo tempo j iniciado em Jesus, o Senhor e Redentor; mas todos terminaro quando chegar aperfeio esperada, mas ainda futura. Ento restar unicamente o amor.

    Nas past, pois, Paulo configurou o termo helenista para devoo (eusebeia) em ponto focal de uma doutrina quepor um lado mantm uma ntida relao com as cartas anteriores do apstolo, mas que por outro lado, com a mesmanovidade como no passado no caso da doutrina dos carismas, aborda agora a situao mudada das igrejas em forma deexortao, confirmando-as na esperana pelo Senhor vindouro (QI 19).

    A traduo da palavra eusebeia difcil. Selecionamos dentre as possveis expresses (venerao a Deus, temor aDeus, submisso a Deus, ligao a Deus, devoo) a palavra beatitude, hoje incomum, mas originalmente utilizadapor Lutero. Seu atual carter estranho pode chamar ateno para a peculiaridade que est contida no termo gregoutilizado por Paulo.

    Em seu Pequeno Catecismo Lutero fornece uma definio que continua sendo certeira e que fixa a correlao entre

    devoo, doutrina e vivncia a partir de Deus: Para crermos, por sua graa, em sua santa palavra e vivermos vidapiedosa, neste mundo e na eternidade [Livro de Concrdia, S. Leopoldo/P. Alegre, 1980, p. 373]. A palavra beatitudecombina a piedade com as bem-aventuranas do Sermo do Monte, apontando simultaneamente tambm para asalvao messinica presenteada por meio de Jesus, que constitui a verdadeira felicidade do crente, porque subsiste eest guardada no Redentor.

    a) A beatitude est integralmente ancorada no mistrio do Ungido de Deus. Ela a vida do Deus bendito (1Tm1.11; 6.15), que se revelou na carne mortal como ser humano (1Tm 3.16) e que transmite essa sua vida aos crentes.Por isso essa devoo no conquista prpria do ser humano, mas beatitude em Cristo (2Tm 3.12). A eusebeia emCristo definida com tanta clareza que j por isso preciso rejeitar uma simples adoo ou acosto a concepeshelenistas de religiosidade.

    b) A beatitude no um sentimento piedoso, religioso, devoto, mas vida presenteada a partir de Cristo e em Cristo,assim como tambm o Esprito Santo no sentimento, mas transmisso de poder (cf. 2Tm 1.7 com 3.5!), no

    sensao de fora subjetiva, mas demonstrao de poder divino em meio impotncia humana. Unicamente a partirdessa premissa compreensvel por que a beatitude (como o amor) aparece como realidade superior ou que coordenatodas as coisas: o reconhecimento da verdadesim, a doutrina do evangelho tem por medida a beatitude (Tt 1.1; 1Tm6.3). Por isso a beatitude no apenas poder, mas igualmente norma. Sozinha, a doutrina, to fortemente frisada naspast, forosamente ficaria enrijecida em forma de dogma, letra morta e matadora. A doutrina de acordo com a

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    beatitude permanece viva, i. , s doutrina. Combina entre si fora vital e orientao compromissiva. Paulocombina beatitude com verdade, doutrina, vida, servio, esperana, de forma similarmente livre, i. , em correlaoassistemtica, mas nem por isso menos sensata e eficaz (como nos dons espirituais).

    c) Diante do ensinamento estranho fica explcito por que esse tipo de beatitude est ligado verdade e doutrina:a heresia no est de acordo com a beatitude (1Tm 6.3). devoo falsa sem poder (2Tm 3.5). Ao contrrio do amor,ela visa seus prprios interesses, a saber, o lucro (1Tm 6,5;1Co 13.5).

    d) A verdadeira devoo est associada justia, que vive da graa (Tt 2.12). parcimoniosa porque no visa aosseus interesses (1Tm 6.6), prtica porque se comprova na vida cotidiana (1Tm 5.4). Atrs dela que se deve correr

    (1Tm 6.11), assim como se deve abraar a vida eterna (1Tm 6.12); cumpre exercit-la (1Tm 4.7).Ora, reveste-se de importncia que em lugar algum nas longas listas das past a beatitude esperada ou demandadacomo virtude dos que servem. Como o carisma, a beatitude realidade fundamental para todos os membros daigreja. Timteo e Tito so exortados beatitude no porque estivessem acima da igreja, mas por serem irmos comotodos os demais e uns servos quaisquer. A beatitude pode ser tudo, menos uma virtude sobrenatural que osservidores da igreja detm em contraposio aos membros da igreja. Todos receberam dons da graa e devem utiliz-los em benefcio do todo na igreja. Todos receberam a beatitude em Cristo e devem exercitar e vivenci-la na igreja e(o que uma novidade em relao aos dons da graa, relacionados com o servio na igreja) no mundo (Tt 2.12).

    e) Na confrontao com o mundo permanece ou torna-se explcito que a beatitude apre-senta um direcionamentoescatolgico. A vida em beatitude neste mundo est repleta da expectativa do mundo vindouro (Tt 2.12s). Essadevoo vive da promessa para a vida atual e futura. Sua parcimnia no modstia piedosa, mas est marcada pelanoo de morte (1Tm 6.7), runa, destruio (1Tm 6.9) e do surgimento do Juiz sobre vivos e mortos (2Tm 4.1).

    f) Na perseguio e no sofrimento se revela cabalmente o contraste entre a vida na beatitude e o ser humanonatural e seu modo de vida. Essa devoo no civismo incuo, pa-cato, mas poder e norma para a vida em Cristo,que provoca separao simplesmente por existir, razo pela qual enfrenta oposio (2Tm 3.12; 4.15). Assim como oEsprito fala por meio das testemunhas odiadas e perseguidas (Mt 10.20-22), assim o poder da beatitude capaz depreservar nas perseguies (escatolgicas; 2Tm 2.10). Reiterando: no sero servos particularmente destacados deDeus que experimentaro resistncia e perseguio, mas todos (2Tm 3.12!) aqueles que pertencem a Jesus.

    g)Resumindo: na doutrina dos carismas, o novo pensamento fundamental desenvolvido a multiplicidade dos donsdistribudos; na doutrina da devoo das past, a simplicidade da beatitude obtida em Cristo que interliga todos oscrentes. A doutrina da beatitude demonstra de uma maneira nova, correspondente mudana da situao, aquilo quese costuma designar de sacerdcio universal de todos os que crem no Senhor Jesus.

    16. O vocabulrio e o estilo das past apresentam fortes diferenas em relao s cartas anteriores de Paulo.Conseqentemente, desde Schleiermacher foram constantemente apresentados novos argumentos, justamente deordem lingstica, contra a autenticidade das past, sem, no entanto, conseguirem ser de fato convincentes.

    O vocabulrio total das past consiste de aproximadamente 900 palavras, das quais cerca de 300 no soencontradas em nenhuma outra carta de Paulo e cerca de 150 (deixando-se de lado as repeties) nem mesmo ocorremno restante do NT. Isso parece ser uma grande diferena em comparao com outras cartas de Paulo. Contudo aestatstica no diz tudo, porque novos temas tambm requerem novas expresses lingsticas. Nas past so novas asconsideraes sobre a condio das vivas, as exigncias para os servidores da igreja, a controvrsia especial com asheresias. Em decorrncia, as palavras exclusivas das past esto assim distribudas: ordem e disciplina na igreja (90),exigncias e instrues para Timteo e Tito (60), hereges (50), servidores da igreja (30), listas (30), situao de Paulo(20); ou distribudas sobre as trs cartas: 1Tm (60), 2Tm (90), Tt (60).

    A subdiviso por ordem temtica no tpica apenas das past. Das 250 palavras exclusivas da carta aos Romanos,

    110 esto comprimidas em apenas 182 frases (de um total de 940), porque os trechos correspondentes ( Rm 1.18-3.26;12; 16.17-20) versam sobre um assunto novo. O mesmo vale para 1Co: duzentos termos exclusivos de um total de 310aparecem nos textos que expem um tema especial. presumvel que nos trechos de exortaes (parcleses), quetratam de questes e situaes concretas novas, ocorram mais palavras inditas que nos trechos doutrinrios. De resto,o grande nmero de termos exclusivos leva a equvocos, porque: a) muitas vezes o verbo novo, mas o adjetivoderivado da mesma raiz bem conhecido em Paulo; b) palavras muito freqentes no linguajar cotidiano do mundo dapoca no podem ser consideradas realmente como termos exclusivos; at ento o autor os havia empregado apenasaleatoriamente; c) termos conhecidos e adotados da Septuaginta (i. , a traduo grega do AT, abreviada com LXX)no podem realmente ser computados como material exclusivo de Paulo.

    Quando se levam em conta essas distines restam apenas cerca de 40 expresses que no aparecem em nenhumoutro escrito da Bblia.

    17. Tentou-se inferir das propriedades do vocabulrio novo que as past fazem parte do linguajar do sc. II, umavez que os termos exclusivos das past (que no ocorrem nem nas demais cartas de Paulo nem no NT em geral) soconhecidos entre os chamados pais apostlicos e apologistas do sc. II. Mas tambm essa justificativa no conclusiva, porque a) das 300 palavras exclusivas das past, foi possvel comprovar a ocorrncia de 270 na literaturaextra-bblica anterior ao ano 50; b) dos 60 termos exclusivos que as past tm em comum com os pais apostlicos 40

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    ocorrem na LXX. No total se podem encontrar na LXX 80 termos exclusivos das past! c) 137 dos termos exclusivosde Paulo nas demais epstolas igualmente podem ser encontrados nos pais apostlicos.

    18. Quando comparamos os termos exclusivos de cada carta de Paulo com o total de seu vocabulrio, resultam asseguintes propores: 2Co (21%), 1Co (24%), Ef (25%), 1Ts (30%), Gl (34%), past (34%), Fp (37%), 2Ts (50%). Porconseguinte, as past de forma alguma apresentam um nmero desproporcionalmente grande de palavras nicas. Mas,quando se comparam os termos exclusivos com o vocabulrio dos pais da igreja do sc. II, preciso concluir que ainfluncia de 1Co sobre a literatura dos pais da igreja foi maior (55%) que 1Tm (50%) ou Tt (50%).

    Quando comparamos as outras cartas de Paulo quanto ao acervo total de termos exclusivos, conhecido pelos paisda igreja (46%), com o total correspondente nas past (53%), a diferena surpreendentemente pequena e, para 1Tm,inferior que para 1Co.

    Seja como for, a estatstica das palavras no rendeu quaisquer provas contra a autenticidade das past; pelocontrrio, acaba servindo para explicitar e corroborar de modo surpreendente seu parentesco e sua contemporaneidadecom as demais cartas de Paulo, bem como com a totalidade do NT.

    19. De resto, a mudana de vocabulrio e estilo prpria de todas as cartas de Paulo. Uma palavra, um grupo determos predomina por certo tempo, passando aos poucos para segundo plano ou desaparecendo totalmente. Exemplos:aquilatar ocorre 10 vezes somente em 1Co e em nenhum outro escrito de Paulo; juzo, condenao, direito, justiasomente em Rom aparece 5 vezes (QI 15). As cartas de Paulo podem ser subdivididas segundo sua propriedadeestilstica e segundo o emprego de locues figuradas em 4 grupos: a) 1 e 2Ts; b) 1 e 2Co, Gl, Rm; c) Fp, Ef, Cl, Fm

    (as chamadas cartas de prises); d) as past. Entre c) e d) h ligaes mais estreitas. As past possuem menosformulaes figuradas, assemelhando-se nisso novamente a 1 e 2Ts.

    20. Tentou-se realar de tal forma as diferenas no vocabulrio e estilo que se perdeu de vista as estreitas relaescom as demais epstolas de Pauloou que elas foram classificadas (de genial a ingnua) como imitao mais oumenos hbil de um falsificador. Em contra-posio, Schlatter reuniu uma lista de 66 locues gregas que as past tmem comum com as demais cartas paulinas: com Rm, 26; com 1Co, 12; com Ef, 10; com 1Ts, 5; com Cl, 4; e com Gl eFm, 1 cada.

    Igualmente cabe ponderar que as past no possuem apenas 300 termos exclusivos que no aparecem nas demaiscartas de Paulo, mas 600 palavras (i. , dois teros do vocabulrio total das past!) em comum com as cartasreconhecidas. Por exemplo, est entre as concordncias uma lista de 20 expresses prediletas do apstolo nas past, queocorrem com freqncia tambm nos demais textos paulinos. Alm disso, chama ateno que 38 expresses que as

    past tm em comum com as demais cartas de Paulo no ocorrem em nenhum outro lugar do NT. Exemplos: entregar aSatans (1Co 5.5; 1Tm 1.20); renovao (Rm 12.2; Tt 3.5); viver com (Rm 6.8; 2Co 7.3; 2Tm 2.11); ser ofertadocomo libao (Fp 2.17; 2Tm 4.6). Finalmente preciso enfatizar que a forma pessoal do estilo de Paulo se expressa nasintaxe, tpica para ele, que as past tm em comum com as demais cartas. Exemplos: contraposies como algemadono algemado (2Tm 2.9) ou trabalhei todavia no eu (1Co 15.10; Gl 2.20); e ainda locues hebraicas, quandocita das Escrituras: 1Tm 2.13s; 5.18. Nesse local cumpre citar uma diferena significativa de estilo que depe emfavor da autenticidade das past. Foram encontradas nas past 160 palavras ou locues com conotao tipicamentelatina (latinismos). Esses latinismos podem ser atribudos facilmente ao cativeiro de 4 a 5 anos do apstolo e seuconvvio com guardas romanos.

    21. A hiptese dos fragmentos. As numerosas pesquisas sobre linguagem e estilo das past levaram algunscontestadores da autenticidade a aceitar algumas partes das cartas como autnticas, p. ex., 1Tm 1.20; 2Tm 1.15-18;2.17s; 4.9-21; Tt 3.13-15. Contudo as diversas propostas divergem tanto entre si que hoje servem apenas comoilustrao de como parmetros e hipteses inadequados to-somente geram novos problemas, ao invs de elucidarcorrelaes ainda no esclarecidas. Por quais motivos um imitador deveria pretender acolher peas genunas de Paulo(do qual estaria separado por 30 anos ou mais), uma vez que pode simular com facilidade idntica, quando nomaior? E no caso de uma pessoa ser capaz de combinar os fragmentos autnticos com suas prprias elaboraes deforma to perfeita que isso s descoberto nos dias de hoje, como uma personalidade to destacada teria desejadoou podido permanecer incgnita em seu tempo? A hiptese dos fragmentos digna de meno tambm porque nela possvel evidenciar o predomnio de 40 anos do mtodo da histria das formas sobre a pesquisa teolgica. Ponto departida para a histria das formas do evangelho a afirmao de que a primeira igreja crist, em vista de suaexpectativa pelo fim prximo, no se preocupava com a fixao escrita. A tradio de Jesus teria surgido somente apartir da pregao oral. Os evangelistas teriam sido meros colecionadores, que compilavam peas de prdicas sobre

    Jesus. Com base nessa teoria associada idia do desenvolvimento acreditava-se poder reconhecer e separarcriteriosamente em toda a parte dos evangelhos e em todo o NT material da tradio mais recente e mais antigo. Poressa razo as past representam para M. Dibelius e seus seguidores o ltimo estgio de uma histria da tradio noNT. A partir desse tipo de premissa torna-se possvel falar de incluses, alteraes redacionais, fragmentos, partes epartculas antigas e recentes, autnticas e inautnticas. Um exemplo que tambm relevante para as past trazido por

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    Rm 6.17: obedecer de corao forma de doutrina. R. Bultmann classifica a meno da doutrina como incluso ps-paulina. U. Wilckens simplesmente omite em sua traduo a alegada incluso, mas no deixa de acrescentar na nota derodap: Todos os manuscritos trazem aqui a seguinte continuao da frase: Mas de todo o corao estaiscompromissados obedincia diante da forma doutrinria convencionada que vos foi transmitida. Contudo essacontinuao introduz uma idia completamente nova no nexo das afirmaes. Ao mesmo tempo colide com a fraseseguinte do v. 18, cuja afirmao corresponde do v. 17a, trazendo por isso a verdadeira continuao do v. 17a. Poressa razo provvel que no v. 17b existe uma incluso de mo ps-paulina, que no contedo evidentementecomplementa um raciocnio inegavelmente paulino: no batismo os cristos foram compromissados com a tradio

    doutrinria convencionada da igreja crist, cf. 1Co 15.1s.Embora todos os manuscritos tragam a frase e embora possua inegvel carter paulino, ainda assim deve ser umaincluso ps-paulina. O motivo principal dessa afirmao obtido do esquema de histria da forma e desenvolvimentoadotado. Diante disso preciso declarar: a obedincia diante da doutrina compromissiva vale j para a carta aosRomanos. A frmula que sintetiza a epstola como uma unidade : obedincia da f (incio Rm 1.5; final: Rm16.26). A obedincia se refere s Escrituras (Rm 3.21; 16.25s). O batismo est ligado tica, e essa obedinciaperante a doutrina (Rm 6.17s,19).

    No apenas em 1Co 15.3, mas tambm na carta aos Romanos o evangelho como doutrina compromissiva aquiloque Paulo recebeu e transmitiu segundo as Escrituras: crer no corao, com o corao se cr, obediente de corao:Rm 10.9s; 6.17.

    Apesar de ter iniciado cedo, a crtica histria das formas foi pouco considerada na exegese. No apenas precisoque nesse caso o evangelista seja reabilitado como autor perante M. Dibelius, mas tambm caem por terra

    muitssimos argumentos contra a autoria paulina das past. Assim como temos desde o comeo autoridades na direodas igrejas, assim havia tambm desde o comeo a doutrina como autoridade e tradio escrita. As cartas do NT que sobretudo nos discursos de exortaofazem parte da proclamao da igreja, no se referem aos atos e s palavras deJesus porque as pressupem. Por isso a proclamao no pode ser o nico espao de vida por meio do qual atradio de Jesus surgiu e foi transmitida. As cartas do NT pressupem a tradio escrita (!) de Jesus, que j existeantes do ano 50. muito provvel uma redao em torno do ano 40 ou logo depois. Isso, no entanto, significa queentre a crucificao do Senhor e a anotao de suas palavras e atos presumivelmente se estende menos de uma dcada.

    Por meio de sua atividade de testemunho a igreja primitiva no criou a tradio de Jesus do nada, mas usou-acomo base de sua proclamao. Os escritos sinticos possuem seu espao de vida na leitura durante os cultos (cf.1Tm 4.13) e so considerados como Escritura Sagrada, i. , como palavra de Deus com autoridade.

    H. Ridderbos afirma: Constitui a essncia do evangelho como mensagem do agir salvador de Deus sem nossasinergia que a autoridade do evangelho se baseie, sobretudo na concretude do acontecido, motivo pelo qual oevangelho no pode ser evangelho, a f no pode ser f, a obedincia de f no pode ser obedincia quando a tradiodo evento da salvao no confivel e a f para o acontecimento salvfico no pode se estribar na tradio nemsubmeter-se a ela.

    Do mesmo modo Schlatter demonstrou que concordncia com a tradio faz parte da essncia do conceito paulinode f e que nesse aspecto as past apresentam um desdobramento, porm nenhuma alterao ou mesmo falsificao.

    22. Palavra de Deus e doutrina. No ao ler as past (2Tm 3.16), mas consistentemente em toda a Bblia que oleitor se depara com a pergunta se frases escritas, afinal, podem ser pa-lavra de Deus. Ser que assim a palavra deDeus no se tornaria uma posse fixa, disponvel, do ser humano? Porventura o ser humano n o poderia crer porfora prpria nas sentenas que lhe so propostas, no sentido de consider-las verdade?

    No foi apenas em poca recente que se pensou ou alegou que preciso proteger a palavra de Deus como Escritura

    Sagrada diante do assenhoreamento das pessoas. A nfase na pregao oral e no evento da palavra desvaloriza apalavra externa da Sagrada Escritura, pensando que assim seria capaz de proteger a indisponibilidade do evangelho.Como na histria da igreja graa e palavra exterior foram equiparadas desde muito cedo, Agostinho, defensivamente,teve de apostar tudo que levava negligncia para com a Sagrada Escritura na palavra interior e no agir interior deDeus. A depreciao da palavra exterior torna-se a hipoteca de toda a Idade Mdia e tambm da era mais recente,como deveramos acrescentar. Contra essa falsa contraposio deve-se objetar: em Jesus Deus se entrega inteiramentenas mos dos seres humanos, insere-se integralmente na histria deles. Sua justia justia realmente concedida pessoa, sua graa graa realmente experimentvel, sua palavra escrita por profetas e aps-tolos clara palavra derevelao que pode ser sabida, e a proclamao do evangelho a-nncio real de Deus no Esprito, que renova o serhumano. Contudo, apesar de toda a entrega em amor Deus continua sendo ele prprio, ele no se perde, e tambm aSagrada Escritura continua sendo, pelo Esprito, poder e norma de Deus que se impe contra todas as crticas da razoe do sentimento. A tenso entre palavra e Esprito (2Tm 3.16s), doutrina e vivncia (Tt 1.1; 2.7), eleio e obedincia

    (2Tm 2.19) continua preservada, como em todas as cartas de Paulo, tambm nas past. O destaque dado nas past doutrina no decadncia das alturas do primeiro amor, nem um enrijecimento da inspirao, inicialmente direta, detodos os discpulos, nem substitutivo para a no-acontecida volta do Senhor (veja QI 7-9), mas instruo concreta,associada exortao para viver na beatitude.

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    23. A hiptese do secretrio. Uma vez que de mltiplas formas flagrante o parentesco com as demais cartas dePaulo, vrios comentadores levantaram a tese de que Paulo na verdade deveria ser considerado o pai e autorintelectual (Holtz, p. 15) das past, mas que ele teria dado a um secretrio grande autonomia na redao (Jeremias, p.5). sabido que Paulo ditou a maioria das cartas. Em Rm 16.22at mesmo Trcio faz as saudaes (que escrevi estaepstola no Senhor) de prprio punho e citando seu nome (cf.1Co 16.21; Gl 6.11; 2Ts 3.17; Cl 4.18; Fm 19). Emmuitos promios de cartas so citados tambm outros colaboradores, cuja possvel participao na redao no deveser descartada (1Co; 2Co; Fp; 1 e 2Ts). De acordo com H. v. Campenhausen o escritor (ps-paulino) deve ter sidouma destacada personalidade. Holtz considera o secretrio como imagem de um cristo de alta erudio dos

    tempos finais de Paulo, que dominava integralmente a teologia e o linguajar de Paulo, mas que tambm estavafamiliarizado com a linguagem dos evangelhos, bem como das cartas catlicas, ou seja, com a totalidade docristianismo, que conhecia muito bem a filosofia popular e o linguajar helenista, bem como a teologia da sinagoga dadispora, estando firmemente ancorado na vida litrgica das igrejas. Por que, no entanto, um colaborador todestacado no seria citado por nome? No seria plausvel reconhecer nesse secretrio to paulino o prprio Paulo,tal como tambm se apresenta nas trs cartas?

    24. A atestao formal das past. Dibelius afirma que a atestao na igreja antiga no seria muito favorvel. Masformalmente as past so to acreditadas como Rm e 2Co. Tanto Policarpo ( por volta de 160) como Incio ( porvolta de 110) citam as past. Jeremias explica a circunstncia de que a coletnea das cartas de Paulo, inclusive aepstola aos Hebreus no comeo do sc. III, no menciona as past pelo fato de que se perderam o comeo (faltam osprimeiros captulos da carta aos Romanos!) e o final (past) do livro. Conhecidos telogos dos primrdios que

    escreveram antes ou no incio do sc. III pressupunham sem qualquer restrio a autenticidade das past (p. ex., Ireneo,Tertuliano, Clemente de Alexandria, Orgenes).O cnon de Marcio no traz as past, o que no entanto no constitui prova contra a autoria de Paulo. Sua rejeio

    das past se insere no contexto da rejeio de todas as influncias do AT. Marcio foi excludo em 144 da igreja deRoma. O cnon Muratori, que surgiu em Roma entre 150 e 200, contm as past como acervo consolidado das cartaspaulinas, enquanto cartas no genunas de Paulo so rejeitadas. Em nenhum lugar e por ningum se contesta a autoriade Paulo. O principal se torna limpidamente certo: todos os textos de Paulo que possumos remontam em ltimaanlise ao exemplar original de uma coletnea de 9 mais 4 cartas No possumos o menor indcio de que algumavez tenha existido uma coletnea com menos ou mais cartas alm das que nos so conhecidas.

    O rol mais detalhado das atestaes exteriores trazida por Spicq, que dedica 208 pginas s questes introdutriase trabalha uma bibliografia de 18 pginas.

    25.As caractersticas interiores (detalhes a este respeito devem ser conferidos no comentrio, de modo que aquiser fornecido somente um resumo panormico).

    a) Todas as 3 cartas reivindicam repetida e expressamente que foram escritas por Paulo (1Tm 1.1; 2.7; 2Tm 1.1; Tt1.3,5).

    b) A descrio dos dois colaboradores e o relacionamento de Paulo com eles correspondem ao que sabemos dasdemais cartas e de At.

    c) A doutrina das past coincide com as demais epstolas de Paulo (veja QI 7) e est sintetizada da forma maiselaborada nos 3 blocos da carta a Tito (Tt 1.1-4; 2.10-14; 3.4-7), cada um dos quais emprega o termo Redentor tantopara Deus como para Jesus como o Messias. Lutero considerava a carta a Tito como sntese das demais cartaspaulinas. Nele estaria contida a doutrina de Paulo.

    d) As heresias combatidas no pertencem ao sc. II, como foi alegado com freqncia no passado sem nunca ter

    sido comprovado, mas poca do NT. So de origem judaica (1Tm 1.7; Tt 1.10), alicerando-se sobre a lei (1Tm 1.7;Tt 3.9), trazendo fbulas (Tt 1.14) bem como especulaes genealgicas (1Tm 1.4; Tt 3.9), e falsificando a mensagemda ressurreio (2Tm 2.18 como em 1Co 15.29s). Os vestgios gnsticos no tm nada a ver com o gnosticismo dossc. II e III, mas se assemelham muito mais com os das epstolas aos Corntios e Colossenses, por serem fortementemesclados com elementos judaicos (1Tm 6.20; Tt 1.10; Cl 2.16,21,23).

    e) A situao da igreja corresponde ao contexto do NT. Somente um dcimo das past contm instrues sobreadministrao e ordem do culto, sendo que se enfatizam mais as premissas e tarefas pessoais que o ministrio (1Tm3.1-13; 5.3-22; Tt 1.5-9). Assim como em Fp 1.1, os servidores da igreja so pressupostos, no introduzidos, sendocitados apenas em segundo lugar depois dos membros da igreja (1Tm 3 depois do 1Tm 2). No se pode definirclaramente a relao e distino entre presidentes, diconos e presbteros, nem sequer h ttulos fixos para asatribuies. Os conceitos presbtero e presidente so intercambiveis (Tt 1.5-7; 1Tm 5.17). Em lugar algum sepode constatar uma ordem hierrquica ao citar expressamente o carisma proftico no contexto dos servios eclesiais

    (1Tm 4.14). Alm de seus cultos de orao (1Tm 2.1s) as igrejas praticavam a orao das vivas (1Tm 5.5), a orao mesa (1Tm 4.3-5), a preleo da Escritura (1Tm 4.13; 2Tm 3.16), a instruo doutrinria com base na palavra doSenhor (1Tm 6.3; Tt 1.1-4,9; 2Tm 4.2), pronunciamentos profticos (1Tm 4.14), alm de hinos, doxologias econfisses de f (1Tm 2.5s; 3.16; 6.15s; 2Tm 2.11-13). Nada nas past aponta para depois da poca de Paulo. Ascircunstncias em feso e Creta condizem com a poca entre 60 e 100. Timteo e Tito recebem uma incumbncia, no

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    um cargo: sua posio mantida em aberto, no determinada ou engessada por direito eclesistico. Paulo chamaTimteo de feso para Roma, enviando Tquico em seu lugar (2Tm 4.12).

    f) Apessoa do autor. Partes doutrinrias alternam-se com sbitas manifestaes concretas e pessoais (1Tm 2.1-7;3.14-16). O autor oferece a si mesmo e suas experincias como exemplo (1Tm 1.16), revela seus mais ntimossentimentos de alegria (2Tm 1.4) e confiana (2Tm 1.12; 2.10,13), inclusive em vista da morte (2Tm 4.6-8). 2Tm estprxima de 2Co; ambas as cartas foram escritas a partir de grande aflio pessoal. Ele confessa seus antigos erros(1Tm 1.12-15; Tt 3.3; 1Co 15.8-10; etc.) e ao mesmo tempo sua autoridade apostlica em Cristo (1Tm 1.15s), mas emlugar algum se fala de uma glorificao do autor e de seus colaboradores. Tpico para Paulo o empenho de confirmar

    as instrues orais por escrito, apesar da expectativa de visit-los em breve (1Tm 3.14; 1Co 4.17,19; Fp 2.19-24). Oautor pode ser reconhecido nos traos humanos: caloroso, pessoal, sincero, franco, direto.g) As inegveis diferenas lingsticas e estilsticas no podem ser levantadas contra a autoria de Paulo (QI 20).

    Pelo contrrio, so explicveis e na realidade esperadas, pelas seguintes razes suficientes: 1) As cartas de Pauloevidenciam diversos perodos estilsticos, das quais o ltimo, o das past, no representa uma exceo (QI 19). 2)Novos temas levam ao uso de novas expresses. 3) Um contexto diferente (cativeiro de vrios anos) pode sersuficientemente responsvel pelo vocabulrio ampliado. 4) As past na verdade no so dirigidas exclusivamente apessoas particulares, mas no obstante se diferenciam claramente das epstolas pblicas dirigidas a igrejas, o que tornacompreensveis certas mudanas de estilo. 5) A idade do autor influi sobre o estilo e vocabulrio, tornando-se ambosmais simples e menos adornados, ao mesmo tempo em que ficam mais densos e concentrados.

    26. Os dados histricos nas past. 1Tm: Timteo deve permanecer em feso. H pouco o prprio Paulo estivera em

    feso ou nas proximidades, estando agora na Macednia. No se encontra detido e tem diversos planos de viagem.1Tm no traz nenhum outro dado histrico, ao contrrio dos muitos indcios em 2Tm. Por que um pseudo-Paulohaveria de simular apenas essas breves aluses, se seu interesse era a visibilidade histrica?

    Tt: Paulo j esteve pessoalmente em Creta. possvel que j tenham existido igrejas antes. Est bem familiarizadocom os problemas das igrejas, o que pressupe mais que uma breve visita (Tt 1.5). Paulo pretende permanecer nacidade porturia de Nicpolis (em Epiro) durante o inverno. Tito deve visit-lo ali (Tt 3.12).

    2Tm: agora Paulo est preso em Roma (2Tm 1.8) e s voltas com um processo judicial (2Tm 4.16). Onesforo ovisitou (2Tm 1.16). Antes de Roma Paulo esteve por breve tempo sem Timteo em Mileto, Trade e Corinto (2Tm4.13,20).

    27. Esses dados apontam para alm das viagens e detenes narradas em At. Trfimo foi um companheiro deTimteo (At 20.4) e esteve junto de Paulo em Jerusalm, no que deu motivo involuntrio para seu aprisionamento ( At21.29), logo 2Tm 4.20 no pode ter sido escrito da priso em Cesaria. Contra um cativeiro em feso, suposto poralguns comentaristas, depe 2Tm 1.17. Nas cartas anteriores de priso Paulo aguarda confiante sua libertao (Fm 22;Fp 1.25; 2.23s), de acordo com a situao do prisioneiro em Roma, descrita como positiva em At 26.32; 28.17-31.2Tm, porm, pressupe uma situao diferente: as circunstncias da priso so difceis, a morte iminente certa.

    28. A autenticidade das past tem como premissa que depois da primeira priso em Roma Paulo foi liberto e queaps algumas atividades de viagem e autoria tornou a ser detido. Quem defende a autenticidade no precisademonstrar a veracidade de uma libertao dessas, mas apenas evidenciar sua possibilidade. Se as past fossem umafalsificao e se Paulo no tivesse sido solto, as past forosamente afirmariam isso de forma expressa. Contudo noesboam o menor esforo para harmonizar as circunstncias das past com das de At. Pelo contrrio, pressupem com amaior naturalidade a libertao.

    As past no tratam justamente dos ltimos anos de Paulo, o que um falsificador teria feito para satisfazer acuriosidade de seus leitores, mas se ocupam, como as demais cartas de Paulo, com as aflies e tarefas atuais daigreja. Uma absolvio com libertao do cativeiro romano com certeza historicamente vivel. Sob Tibrio houveperseguies em Roma. Por volta do ano 50 Cludio expulsou temporariamente os judeus da cidade ( At 18.2). Oscristos, que inicialmente haviam sido considerados em Roma como seita judaica, agora passaram a ser denunciadospelos judeus. Somente a partir de 64 o nome cristo em Roma equivalente a incendirio. O incndio de Roma sobNero durou de 18 a 24 de julho do ano 64 e desencadeou a primeira perseguio aos cristos. Debaixo de Nero oscristos s podiam ser executados se fosse possvel demonstrar que cometeram um crime. Contudo na poca de At aagitao judaica contra os cristos ainda no era apoiada pelos romanos (At 26.32). A soltura de Paulo pode sersuposta para o ano de 63.

    29. Questes de datao. A seguinte viso geral no reivindica ser historicamente exata. Cada exegeta difere nas

    indicaes de datas. Tampouco so necessrias dataes sumamente exatas. Pelo contrrio, o objetivo apresentar aspossibilidades cronolgicas para a redao das past e as circunstncias histricas nelas pressupostas.Inconteste a data do ano 50 para a primeira carta aos Tessalonicenses. Quando datamos a converso de Paulo no

    ano de 36 e sua idade na poca em pelo menos 30 anos, o apstolo tinha diante de si um tempo de atuao de 30 anos,interrompidos por pelo menos 5 anos de cativeiro e, anterior a tudo isso, 3 anos na Arbia ( Gl 1.17).

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    Na primavera de 58 ele escreve aos romanos que h uma srie de anos (At 19.21) j tinha planos de ir a Roma,para de l prosseguir at a Espanha, mas que de muitas formas (!) havia sido impedido de execut-los ( Rm 15.22-24).Certo para ele que Roma lhe serve somente de parada intermediria ( Rm 15.28). Tem esperanas de quecolaboradores o acompanharo at a Espanha (Rm 15.24). Um dos muitos motivos que o impediram, embora ocorridoapenas depois da redao de Rm, o aprisionamento em Jerusalm, que por fim o leva a Roma aps longosinterrogatrios e tempos de deteno. Como prisioneiro ele dever ser interrogado perante o imperador, por sercidado romano.

    Paulo est em Roma de 61 a 63 d.C. No segundo ano de cativeiro ele escreve a carta aos Filipenses, cheio de

    confiana de que em breve poder visit-los (Fp 1.25; 2.24). Escreve a Filemom reservando desde j um alojamentona casa deste para quando passar por l! (Fm 22).Portanto, a suposio de uma libertao no ano 63 est em consonncia com os conhecidos planos e expectativas

    de Paulo. No ano de 93, ou seja, 30 anos depois, Clemente de Roma escreve que Paulo de fato fora liberado e teriaviajado para o extremo Oeste, o que pela maioria interpretado como sendo a Espanha. E mais tarde Eusbio escreve: tradio que, depois de se ter justificado, o apstolo tornou a viajar a servio da pregao, mas que, quando entrouna mencionada cidade pela segunda vez, foi aperfeioado pelo martrio. Estando preso nessa ocasio, escreveu asegunda carta a Timteo.

    Constitui uma arte interpretativa estranha quando crticos afirmam que tais informaes teriam sido inventadasposteriormente com base em Rm, quando na verdade os textos do NT disponveis atestam o plano de Paulo, elaboradoh anos (Rm 15.20; 2Co 10.15s). Na poca em que Clemente escreve sua carta ainda vivia um suficiente nmero decristos em Roma que podiam ter conhecimento da libertao e das subseqentes viagens de Paulo por experincia

    pessoal (cf. 1Co 15.6).A partir das anotaes existentes no possvel elucidar se Paulo viajou primeiro Espanha e depois visitou as

    igrejas no leste ou vice-versa. Ambas as viagens, seja para oeste, seja para leste, estavam consolidadas em seus planos,que haviam sido interrompidos e alterados mais de uma vez. Se Paulo profetizou conforme At 20.25,38 que ospresbteros em feso no mais veriam sua face e se apesar disso mais tarde os visitasse outra vez, ser que issosignifica que se enganou? 1Tm 1.3 no afirma que Paulo esteve novamente em feso. Ele no declara de onde saiupara ir Macednia. Certo que espera poder chegar a Timteo em breve (2Tm 3.14). Contudo o v. 15 prev novosobstculos e delongas. Na seqncia, a segunda carta deixa explcito que Timteo no haveria de permanecer oupermaneceu por muito tempo em feso.

    Por causa da incerteza dos tempos (1Tm 2.2!) seus planos tiveram de ser alterados com freqncia, mas apesardisso no se deixou deter das muitas viagens. Talvez tenhamos uma idia equivocada da atividade de viagens doscomerciantes e missionrios daquela poca. No se pode descartar a suposio de que Paulo viajou at mesmo duasvezes para o leste: imediatamente aps a soltura, como previsto, indo s igrejas em Colossos (hospedado porFilemom) e em Filipos, em seguida para a Espanha, e por fim novamente para o leste. Isso, porm, no passa deconjeturas. Importante a constatao de que entre libertao e segunda deteno h suficiente tempo disponvel,tanto para uma viagem Espanha como para outra viagem provncia da sia, inclusive para Creta.

    Conseqentemente, Paulo pode ter escrito a carta a Timteo no vero de 66 e poucas semanas ou meses depois acarta a Tito, antes ou durante a viagem para Nicpolis, onde pretendia passar o inverno com Tito ( Tt 3.12). Naprimavera de 67 ele seguiu para Roma (provavelmente junto com Tito), sendo preso ali presumivelmente de formainesperada. Desde o incndio de Roma ele no estivera mais l. A atitude para com os cristos havia mudadoradicalmente. Talvez Paulo tenha sido denunciado como inimigo do Estado e criminoso (2Tm 2.9). Desconhecemos ascircunstncias exatas.

    A redao da segunda carta deveria ser datada para o outono de 67. A carta reproduz a gravidade da mudana de

    situao. Nela pede insistentemente ao amado colaborador que venha at ele, preso em Roma, ainda antes do inverno.Provavelmente Paulo foi executado no final do ano de 67.

    30.A vida de Timteo. O nome Timteo muito difundido na literatura antiga e significa: aquele que honra a Deus.Timteo nasceu em Listra, uma colnia romana fundada por em Augusto em 6 a.C., por volta da poca em que Jesuspassou a atuar publicamente na Palestina. A cidade est situada sobre uma colina na plancie da Licania. Oshabitantes falavam o licanico, ou seja, nem latim nem grego era sua lngua materna ( At 14.11). Somente a elite dacidade falava grego, qual tambm pertencia o pai de Timteo (At 16.1).

    Na primeira viagem missionria no ano de 45 Paulo e Barnab falaram a judeus e gregos em Listra, quando muitosaceitaram a f, entre os quais provavelmente naquele tempo tambm a me judia Eunice e a av Lide ( 2Tm 1.5; At14.1). O jovem Timteo era testemunha de como Paulo foi apedrejado (cf. o comentrio a 2Tm 3.11; cf. At 14.19s).Na ocasio Timteo tornou-se crente em Jesus, o Senhor, de modo que o apstolo podia cham-lo seu amado filho no

    Senhor (1Tm 1.2,18; 2Tm 1.2; 1Co 4.17). Timteo conhecia as Sagradas Escrituras desde criana; as duas mulheresjudaicas o haviam instrudo no AT, antes de se tornarem pessoalmente crentes em Jesus, o Messias.

    Cinco anos mais tarde, no segundo itinerrio de evangelizao (ano 50), Paulo visitou o jovem, que entrementeshavia crescido na f e gozava de destacado reconhecimento por parte dos irmos na igreja de sua cidade natal e almdela. Foi ele que Paulo e Silas levaram consigo como ajudante em lugar de Joo Marcos na continuao da viagem.

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    (At 16.3; 15.37-40). Uma vez que pelo visto todos sabiam que o pai de Timteo era grego e o filho no foracircuncidado, Paulo o deixou circuncidar por causa dos judeus que viviam em grande nmero na regio. Esse atopode causar espcie quando se leva em conta que Paulo se negou a circuncidar o colaborador gentio cristo Tito ( Gl2.3; 5.11); mas no se deve desconsiderar que por amor ao servio de evangelizao o apstolo estava disposto a serum judeu para os judeus, a fim de conquistar os judeus (1Co 9.20). Nesse caso no estava em jogo uma questo desalvao nem uma questo comunitria, mas um direcionamento missionrio para os numerosos judeus da regio, dosquais muitos j se haviam tornado crentes no Messias Jesus durante a primeira estadia (At 14.1).

    Ser que deve ser situado aqui o momento em que os irmos das igrejas adjacentes forneceram o bom atestado

    sobre Timteo, proferiram profecias e conselhos, impondo-lhe as mos, enquanto ele prestava o testemunho da f? Ouser que esse ato fraterno aconteceu apenas mais tarde e repetidamente (cf. 1Tm 4.14; 2Tm 1.6; 6.12)?A partir de agora, vinte anos de vida e servio em conjunto haveriam de unir o jovem milhares de quilmetros,

    suportando como companheiros de jugo agruras e perigos, experimentando o fortalecimento mtuo e a amizade.Timteo para o apstolo auxiliar, colaborador, companheiro de viagem, filho, confidente, amigo. Ser que Pauloteria sido capaz de realizar tudo da forma como fez sem a fidelidade e proximidade desse verdadeiro homem de igualsentimento (Fp 2.20s)?

    Muito cedo Timteo aprendeu a no ficar preso unilateral e exclusivamente a Paulo. J em sua primeira viagem foiseparado do apstolo, permanecendo com Silas em Beria (At 17.14). De l os dois rumaram a Atenas, ondereencontraram Paulo (v. 15). Paulo, Silas e Timteo formavam uma equipe. Paulo escreve em 2Co 1.19 expressamenteque o Filho de Deus havia sido proclamado entre os corntios por ele e Silvano e Timteo! Os nomes dos trsaparecem como remetentes das cartas aos Tessalonicenses. Seus nomes no apenas so citados para constar. Timteo

    recebeu imediatamente uma incumbncia de grande responsabilidade. Paulo o enviou sozinho de volta paraTessalnica, para que fortalecesse na f e exortasse a jovem igreja. Paulo j no o chamava apenas nosso irmo(irmo de Paulo e Silas), mas colaborador de Deus no evangelho de Cristo (1Ts 3.2). Nisso se manifesta, apesar daautoridade apostlica e da relao pai-filho, a liberdade que Paulo d aos colaboradores: em ltima anlise ele colaborador de Deus e somente por isso tambm colaborador de Paulo.

    Conseqentemente, nada menos que 5 anos aps sua converso Timteo j pode ser um consolador e confirmadordos irmos e trazer ao apstolo a boa notcia de que a viagem no foi em vo, mas que os crentes foram firmados noSenhor (1Ts 3.6-8). Durante os 18 meses subseqentes (final de 51 at incio de 53) Timteo trabalhou com Paulo emCorinto (At 18.1-11).

    Tambm na terceira expedio evangelstica e nos trs anos de atuao em feso (54-57) Timteo esteve junto dePaulo. Uma vez o apstolo o enviou com Erasto para a Macednia (At 19.22).

    Uma visita de Timteo igreja em Corinto parece no ter sido coroada de xito. Se Paulo j falava com fraqueza,temor e grande tremor aos corntios to seguros de si (1Co 2.3), quanto mais difcil devia ser a tarefa para ocompanheiro mais jovem, de apresentar-se ali como colabo-rador de Deus sem medo diante do menosprezo de outros.O que Timteo no conseguiu pde ser executado por Tito. Ele apaziguou o conflito dos corntios com o apstolo(2Co 7.6s,13-15; 8.6; 12.17s). O prprio Timteo retornou at Paulo na Macednia (2Co 1.1,19; At 20.4). No ano de58 eles novamente viajaram juntos para a Grcia, de onde Paulo escreve a carta aos Romanos, acrescentandosaudaes de Timteo (Rm 16.21), que citado em primeiro lugar e destacado como meu colaborador.

    Importante o atestado que Paulo emite em favor de Timteo em 1Co 16.10: Ele trabalha na obra do Senhor,como tambm eu. Nisso se expressa a igualdade no servio concedida pela graa de Deus, o reconhecimentoespiritual da incumbncia divina, a confirmao da vocao diante de irmos crticos. A mesma atitude bsica doapstolo diante de Timteo expressa tambm pelas past.

    Da Grcia Paulo viajou para Jerusalm. No se pode estabelecer com certeza se Timteo estava com ele. Cita-se

    por nome apenas Trfimo de feso (At 21.29), que um companheiro de viagem e colaborador de Timteo (cf. At20.4!). Durante os prximos 2 a 3 anos Timteo desaparece do campo de viso das cartas do NT. Com certeza, porm,ele volta a estar com Paulo em Roma, apoio consolador e companheiro na priso (anos 61-63). Alguns intrpretessupem que Hb 13.23 se refere a essa poca, de acordo com o que Timteo esteve por um perodo preso com Paulo.Contudo mais provvel que tenha sido detido somente depois da morte do apstolo e novamente solto mais tarde(alis, uma soltura atestada no NT!).

    A tradio eclesistica informa que Timteo foi bispo de feso e que sofreu o martrio no ano de 97 sob oimperador Nerva.

    31. a) Quem era Timteo? As indicaes nas past, referentes pessoa de Timteo, coincidem com as demais cartase com o que se sabe a partir de At, sendo que algo relevante para a autenticidade das pastno existem traosisolados que o ilustram com muita fantasia ou enaltecendo o ser humano. Assim como justamente a descrio contidados evangelhos apresenta Jesus como verdadeiro e pleno ser humano, assim vemos o lado pessoal de Paulo, deTimteo, de Pedro, etc. com toda a clareza, contudo no descrito de forma exaustiva e ininterrupta. A nfase noreside naquilo que so em si mesmos, nem no que fazem para Deus, mas no que Deus para eles e realiza por meiodeles. Timteo filho, irmo, colaborador e amigo de Paulo, amado de forma to integral e humana porque ele umhomem de Deus (1Tm 6.11; 2Tm 3.17) e um colaborador de Deus (1Ts 3.2).

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    b) Como menino teve oportunidade para gozar de boa formao, como se costuma dizer, visto que a famlia faziaparte da elite da cidade (QI 30; At 16.1). Contudo os pais no concordavam entre si sobre os objetivos finais. Nosabemos como o homem grego e a mulher judia se encontraram. De qualquer modo permanece inexplicvel comouma judia, que evidentemente vivia na tradio de f de sua prpria me Lide, podia se casar com um no-judeu. Ohomem deve ter lhe dado grande liberdade. Isso tambm se evidenciava justamente pelo fato de que a mulher, juntocom o filho e a sogra, se tornaram crentes no Messias Jesus. A famlia permaneceu unida ( At 16.1; 1Co 7.3). Comomenino Timteo no foi circuncidado, do que se pode concluir que sua me no mantinha contato estreito com asinagoga judaica. As duas mulheres tementesa Deus devem ter sido parte daquela grande multido oculta de

    pessoas que no participavam da atividade religiosa formal e apesar disso buscavam a Deus com o corao desperto.De acordo com At 18.7Paulo se refugia junto de Tcio Justo, que era temente a Deus, e cuja casa era vizinha dasinagoga em que a congregao crist se reunia. Tementes a Deus so chamados os no-judeus que crem no Deusde Israel, freqentando tambm a sinagoga, mas (ainda) no se submetem circunciso. Precisamente entre essestementes a Deus, dos quais tambm faziam parte a me e av, havia muitos que se tornaram crentes em Jesus, oMessias.

    Em At 16.1 a me mencionada antes do pai, o que pode constituir um indcio da influncia determinante sobre aeducao do menino (cf. 2Tm 1.5; 3.15).

    c) Timteo predominantemente ligado me. Sua sade pouco resistente e com freqncia est indisposto,talvez j desde a infncia. Contudo isso no o detm das longas caminhadas, desconfortveis viagens martimas eexperincias cheias de privaes (p. ex., junto ao prisioneiro Paulo em Roma; 1Tm 5.23). O jovem fisicamente poucorobusto acanhado e tmido (2Tm 1.6s; 1Co 16.10). A impresso que causa no imponente, de sorte que se pode

    facilmente subestim-lo, e at mesmo menosprez-lo (1Co 16.11; 1Tm 4.12), no que ele no se diferencia muito doapstolo (2Co 10.1,10!; 1Co 2.3), que igualmente era debilitado pela enfermidade (2Co 12.7-10; Gl 6.17; 4.13-15;Bem sabeis, foi por ocasio de uma doena que vos anunciei pela primeira vez a boa nova; e, por mais que meucorpo fosse para vs uma provao, no mostrastes nem desdm nem repugnncia TEB).

    d) Os dois apresentam semelhanas fsicas e psquicas, mas o apstolo tem a vantagem da grande autonomia eindependncia, para dentro da qual ele libera o jovem colaborador com uma pacincia que nunca esmorece, porque amais nobre tarefa do pai conduzir o filho maioridade. O pai, de cuja ausncia Timteo se ressentiu nodesenvolvimento da prpria f e talvez tambm da prpria vida, ele agora encontra em Paulo. Seu apego grande(2Tm 1.4; Fp 2.22), mas no se transforma em dependncia errada, mas em fidelidade por livre deciso. Por essa razoo apstolo o envia desde o comeo com incumbncias e responsabilidades reais para viagens a Tessalnica, Corinto,Filipos, feso. Por essa razo o recomenda s igrejas, para que lhe dediquem confiana. Por essa razo ele o direcionaincessantemente para o prprio Senhor. Deve estar ciente e saber de forma cada vez mais real que ele colaboradorde Deus. O colaborador em vias de amadurecer deve ter no prprio Deus sua fonte de vigor e sua norma: fortalece-tepela graa de Cristo (2Tm 2.1); o Senhor te dar compreenso em todas as coisas (2Tm 2.7); no negligencies do domda graa em ti (1Tm 4.14), mas atia-a para novo ardor (2Tm 1.6); realiza cabalmente teu servio como eu o completei(2Tm 4.5,7), porque promoves a obra da mesma maneira como eu (1Co 16.10).

    e) Talvez a fragilidade fsica e psquica no sejam consideradas vantagens para um mensageiro do evangelho. Noentanto importa reconhecer o reverso da fora que faz parte de toda a fraqueza: a sensibilidade de Timteo est livredo medo por si mesmo e por isso colocado integralmente a servio do amor. Consegue sensibilizar-se, entregar-se,esquecer-se. capaz de sentir, sofrer, andar com os outros. Pode consolar, fortalecer, aprumar os irmos ( 1Ts 3.2; Fp2.20; 2Tm 1.4). Foi esse dom que ele exercitou primordial e mais intensamente aps 20 anos de servio conjunto comPaulo. Por isso o apstolo solitrio e certo da iminente morte anseia pela presena fsica daquele que forte comoconsolador (2Tm 4.9,21).

    A mencionada influncia de uma educao feminina pode, mas no precisa ser considerada restritiva ou at mesmonegativa. O prprio Paulo a v positivamente (2Tm 1.5; 3.15), j que havia experimentado pessoalmente o efeitoabenoador e protetor de uma mulher maternal (Rm 16.13). No sensvel Timteo algumas caractersticastradicionalmente femininas, que em geral so reprimidas nos homens, se desenvolveram mais. Tambm nisso ele bastante semelhante ao apstolo quecom Timteo e Silvanoatuou entre os tessalonicenses qual ama que acariciaos prprios filhos (1Ts 2.7).

    f) Para quem capaz de se colocar to intensamente na situao de outros torna-se difcil traar limites, posicionar-se com determinao contra coisas incorretas, ordenar que tudo pare e introduzir mudanas. Por isso Timteo noconseguiu sanar o conflito em Corinto. Para isso havia necessidade de Tito, mais autnomo e de atitudes maisdeterminadas (QI 30; 2Co 7.6s). Quem capaz de andar um longo trajeto com outros, quem consegue sintonizar-sebem com a situao de outra pessoa, em dado momento tambm pode ir longe demais e passar dos limites. Por issoTimteo precisa de exortao castidade (no apenas na rea sexual) e ao distanciamento, a nica forma de conseguir

    julgar de maneira bem imparcial (1Tm 5.2,22,21; 2Tm 2.22). Quem est indefeso facilmente vulnervel, podeapresentar-se subitamente com rigor para escapar da dissoluo total (1Tm 5.1; 2Tm 2.24s). Quem julga e age deforma hesitante pode despercebidamente tentar forar solues precipitadas, no intudo de recuperar, refazer, inserira outros na cooperao (1Tm 5.22a; 4.14; 2Tm 1.6; 4.9,21). A pessoa medrosa pode facilmente cair sob o domnio dalei. Talvez Timteo tenha se deixado influenciar pelos hereges que ordenavam abster-se de determinadas comidas (e

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    bebidas; 1Tm 4.3; 5.23). O colaborador facilmente impressionvel podia cair mais facilmente do que se dava contasob a influncia dos hereges que se apresentavam como inofensivos e solcitos (1Tm 6.11,20; 2Tm 2.16,23; 3.5c;3.13; 4.2-5).

    g) Contudo, em todas essas consideraes sobre pontos fortes e fracos ainda no mencionamos a caractersticadecisiva que marca Timteo, fazendo dele o colaborador destacado que Paulo menciona com louvor em dez cartas.

    O esprito desse homem, a orientao fundamental de sua natureza ntida e igualmente perceptvel em todas asafirmaes que se referem a ele: Timteo sinceramente abnegado. Que significa isso? Sua mentalidade sincera,transparente, clara. No apenas Paulo, mas todo colaborador e todas as igrejas sempre sabem qual a sua posio

    diante de Timteo. Ele no diz uma coisa e pensa outra. Sua f de fato no-fingida (2Tm 1.5), assim como o seuamor (Fp 2.20). Nessa verdadeira singeleza, retido, franqueza e sinceridade ele semelhante ao apstolo, tendo defato o mesmo pensamento e, por isso, sendo seu autntico filho (Fp 2.20,22).

    Embora seja tmido, no busca sua auto-afirmao no servio ao evangelho; embora receba pouco reconhecimento,no visa lucro espiritual ou material para si (Fp 2.20-22; 1Tm 6.5s): No tenho ningum mais que compartilhe osmeus sentimentos, que realmente se preocupe com o que vos concerne. Todos visam os seus interesses pessoais, noos de Jesus Cristo; mas ele, vs sabeis que provas deu a sua capacidade: qual filho junto do seu pai ele se ps comigoa servio do evangelho. (TEB)

    Visar sinceramente no os prprios interesses, essa a essncia do amor ( 1Co 13.5). Esse objetivo final de todas asinstrues (1Tm 1.5) irrompeu em Timteo apesar de todas as fraquezas e insignificncia. Em sua vivncia e em seuservio se manifestou a mentalidade de Jesus, que como verdadeiro dicono de Deus no veio para ser servido, masque entregou a vida at a morte no servio salvao do mundo (Fp 2.5,20).

    Essa unidade peculiar e singular de sinceridade e entrega, de desprendimento no-impositivo e comoventefidelidade, caracteriza o esprito de Timteo. Nisso ele unnime com Paulo. E esse esprito, que caracteriza as pastda mesma forma como todas as demais cartas de Paulo, constitui a principal evidncia da autenticidade no apenas dastrs ltimas cartas do apstolo, mas de sua existncia e da de Timteo como servos do Senhor. o Esprito de Jesus,Esprito de poder, de amor e de disciplina (2Tm 1.7), que ambos receberam e irradiam em sua vida.

    COMENTRIO

    OPROMIO2TM 1.1S

    1 Paulo, apstolo de Cristo Jesus, pela vontade de Deus, de conformidade com a promessa davida que est em Cristo Jesus,

    2 ao amado filho Timteo, graa, misericrdia e paz, da parte de Deus Pai e de Cristo Jesus,nosso Senhor.

    1. Remetente e destinatrio 2Tm 1.1-2a

    1 O apstolo inicia tambm sua ltima carta com a seguinte nfase, indispensvel e inesquecvel paraele: pela vontade de Deus ele se tornou o que . Paulo, apstolo do Messias Jesus, pela vontadede Deus. Inicia de forma idntica quatro outras cartas.

    Segundo a promessa da vida (katepangelian). Quando se traduz com segundo, precisopensar nas promessas do AT, que chegam todas ao sim, i. , ao cumprimento no Messias. Tambm possvel traduzir katacomo um alvo visado: para obteno de. Nesse caso essa palavra expressaa esperana que encontramos em 1Tm 1.1. O fundamento de seu ministrio apostlico a vontadeconvocadora de Deus, o alvo o prprio Jesus, a esperana a promessa da vida como tal. Diante daiminente morte seu olhar contempla a promessa da vida. Essa sucinta assero tambm pode conter ograto conhecimento de que ele foi chamado como apstolo para ser, at a ltima hora, ummensageiro da vida, que se manifestou e pode ser encontrada no Messias Jesus. No de formaabrandada, mas particularmente enftica e freqente, Paulo emprega essa sntese mais caracterstica

    de sua teologia e seu servio, uma sntese de toda a revelao, todos os pensamentos e experincias:no Messias Jesus.2a Meu amado filho. Um amor pessoal e afetuoso une o apstolo ao seu mais fiel colaborador. O pai

    espiritual que se tornou idoso emprega a expresso mais terna que conhece para o jovem queamadurece