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1ª Sessão Novas Fronteiras da Governança Corporativa 4ª Sessão Novas fronteiras de integridade - A boa Governança como elemento inibidor da corrupção 7ª Sessão 3ª Sessão Compliance e sua interface com a estrutura de Governança 6ª Sessão Painel A, B e C - Dedicação do presidente de CA 9ª Sessão Novas fronteiras da Governança Corporativa no Brasil: Perspectivas regulatória 10ª Sessão Governança Corporativa que cria valor: Um processo em evolução 2ª Sessão Novas fronteiras dos conselhos de administração de alto desempenho 5ª Sessão Novas fronteiras de transparência - O que relatar para a sociedade - Relato Integrado 05 09 15 08 13 25 27 06 11 8ª Sessão 20 14º Congresso Internacional de Governança Corporativa 14ª edição do Congresso reúne mais de 600 participantes para debater o futuro da Governança Corporativa e suas novas fronteiras Nº 67 - Dezembro Publicação Trimestral do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa Painel A - Impacto nas empresas e instituições financeiras do julgamento ação penal 470 Painel B - Implementação da Governança Corporativa Painel C - Fundos de pensão e seu papel na Governança das empresas investidas Painel A - O ativismo nas assembleias brasileiras veio para ficar? Painel B - Pequenas ofertas - Teoria e prática Painel C - Desafios na Governança em cooperativas - Conselho de administração e conselho fiscal

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1ª SessãoNovas Fronteiras da Governança Corporativa

4ª SessãoNovas fronteiras de integridade - A boa Governança como elemento inibidor da corrupção

7ª Sessão

3ª SessãoCompliance e sua interface com a estrutura de Governança

6ª SessãoPainel A, B e C - Dedicação do presidente de CA

9ª SessãoNovas fronteiras da Governança Corporativa no Brasil: Perspectivas regulatória

10ª SessãoGovernança Corporativa que cria valor: Um processo em evolução

2ª SessãoNovas fronteiras dos conselhos de administração de alto desempenho

5ª SessãoNovas fronteiras de transparência - O que relatar para a sociedade - Relato Integrado

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8ª Sessão20

14º Congresso Internacional de Governança Corporativa14ª edição do Congresso reúne mais de 600 participantes para debater o futuro da Governança Corporativa e suas novas fronteiras

Nº 67 - DezembroPublicação Trimestral do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa

Painel A - Impacto nas empresas e instituições financeiras do julgamento ação penal 470 Painel B - Implementação da Governança CorporativaPainel C - Fundos de pensão e seu papel na Governança das empresas investidas

Painel A - O ativismo nas assembleias brasileiras veio para ficar?Painel B - Pequenas ofertas - Teoria e práticaPainel C - Desafios na Governança em cooperativas - Conselho de administração e conselho fiscal

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Espaço IBGC

As novas fronteiras da Governança no fortalecimento da sociedade

Heloisa Belotti Bedicks Superintendente-geral do IBGC

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Publicação Trimestral do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa - 67ª ediçãoFOCOem

Neste 14º Congresso Internacional de Governança Corporativa, promovido pelo IBGC, tivemos a satisfação de reunir público de mais de 600 pessoas. Marco importante às ações do Instituto ao expandir o debate dos temas da Governança para um público crescente desde o nosso primeiro grande evento anual.

Para este, reservamos a reflexão de uma sociedade cada vez mais participativa, cujo descontentamento foi evidenciado nas movimentações populares deste ano. Momento distinto também por julgamentos de casos de corrupção, além de novas lições em Governança.

O cenário nos mostra a relevância dos temas da Governança e, consequentemente, a ampliação de suas fronteiras, conteúdo central debatido pelos 51 painelistas, entre palestrantes e moderadores, durante os dois dias de evento. Como sempre, procuramos convidar profissionais renomados no mercado para participar do Congresso, mesclando experiências, convicções e as visões nacionais e internacionais.

A diversidade é destaque também nos temas selecionados. Pela primeira vez, adotamos o formato das trilhas temáticas para assim evidenciar e aprofundar os interesses específicos de três grandes públicos, os de empresas de capital aberto, os de capital fechado, em especial, as empresas familiares, e os de outras organizações, como cooperativas, fundos de pensão e terceiro setor.

Aos temas importantes da Governança e de caráter amplo, reservamos as tradicionais sessões gerais, nas quais trouxemos assuntos novos e outros já conhecidos de nosso público, porém necessários ao fortalecimento das estruturas de Governança das organizações.

A Teoria do Domínio de Fato irrompe o cenário corporativo e assinala aos administradores a importância de se adotar as boas práticas e estar ciente de suas responsabilidades. A conexão das estruturas de compliance à Governança é outro ponto relevante, que demostra a mudança entoada pelas empresas motivadas pela nova realidade brasileira,

a exemplo da Lei 12.846/13, conhecida por Lei Anticorrupção. Tema este tratado de forma transversal em dois de nossos painéis gerais.

Tratar do acesso ao mercado das pequenas e médias empresas sinalizou outro importante passo ao IBGC, já que se mostra uma demanda contínua desse público por mais informações e exemplos práticos. A prática foi também evidenciada no depoimento de presidentes de conselho dos diferentes segmentos tratados nas trilhas temáticas. Neste caso, procuramos abordar temas semelhantes dentro do universo dos mais distintos controles societários e assim refletir sobre o comum e o particular.

Destaco ainda dois temas prementes da Governança: o ativismo nas assembleias e o relato integrado. Questões a terem seus desdobramentos explorados e acompanhados atentamente, a confluir para uma melhor transparência e prestação de contas pelas organizações.

Ações que procuramos retratar e documentar por meio de iniciativas consolidadas, como repercussão na grande imprensa ou por nossos canais: IBGC em Foco, TV IBGC, Twitter (@IBGC_Brasil) e, em novo formato, a coleta gráfica. A partir dela os participantes podem relembrar o conteúdo discutido em cada painel, consultando as imagens em nosso website. Assim como a inovação ao adotar um aplicativo, desenvolvido para Android e iPhone, buscando facilitar aos participantes ao reunir em um único lugar todas as informações, como fotos, mapa do local, programa do evento, currículo dos palestrantes, download de publicações do IBGC e o link para redes sociais.

Iniciativas robustas e reunidas para um fim: criação de valor. Este um processo em evolução e tema da agenda 2014 do IBGC. Convido a todos para mais uma etapa da jornada da Governança.

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www.ibgc.org.br

Ao longo de seu primeiro dia de palestras, o IBGC revelou os três premiados nas duas categorias do Prêmio IBGC Itaú - Academia e Imprensa, dentre os 51 e 73 trabalhos inscritos, respectivamente.

Os participantes das duas categorias receberam premiação em dinheiro, sendo que os vencedores de Academia terão a oportunidade de apresentar o trabalho no Fórum Acadêmico Especial do IBGC. Já os vencedores da categoria Imprensa terão inscrição gratuita para curso promovido pelo Instituto.

Os vencedores desta edição da categoria imprensa foram:1. Yuki Yokoi, para a Capital Aberto, com a matéria “Roubo a céu aberto”.2. Graziella Valenti, para Valor Econômico, com “Anatomia de um desastre”.3. Felipe Datt, para o Valor Econômico, com “O cerco se fecha contra a corrupção”.

Já na categoria academia, os vencedores foram:1. Pedro Bramont (Universidade Católica de Brasília)

e João Souza Neto (Universidade Católica de Brasília), com o trabalho “Maturidade em Governança Corporativa: diretrizes para um modelo preliminar”.

2. Renata Fontes (Universidade de Brasília – UnB), Valmir Emil Hoffmann (UnB) e Rosilene Marcon (Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI), com “Falta monitoramento, sobra assimetria informacional”.

Ao fim do primeiro dia de atividades do 14º Congresso Internacional de Governança Corporativa, ocorreu o coquetel de lançamento do livro “O Futuro da Governança Corporativa– Desafio e Novas Fronteiras”, uma iniciativa do IBGC para incentivar organizações da sociedade civil no debate dos avanços e das boas práticas de Governança Corporativa no Brasil e no exterior, em parceria com Ricardo Leal e Joaquim Fontes Filho, professores de Governança Corporativa.

Dividido em três blocos, os capítulos da obra conduzem os leitores a diversos aspectos sobre as boas práticas de Governança, que estão e permanecem em constante evolução.

Com 16 artigos, o livro busca propor o debate para as novas fronteiras, abordando, por exemplo, os obstáculos para pequenas e médias empresas no mercado de capitais e a atuação de conselheiros de administração, acionistas, reguladores, investidores e governo.

Além disso, a obra traz questionamentos sobre o conceito de maximização do valor para o acionista e as novas realidades para as organizações com o aperfeiçoamento de instrumentos de controle, de transparência e de prestação de contas.

Informes IBGC

Instituto prestigia profissionais de Imprensa e Academia que abordaram temas da Governança

Os vencedores Bramont e Yokoi durante a entrega do primeiro lugar do Prêmio IBGC-Itaú, com Geraldo Soares e Carlos Biedermann

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IBGC lança livro sobre temática do Congresso

Prêmio IBGC Itaú é entregue durante o Congresso

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Publicação Trimestral do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa - 67ª edição

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FOCOem

A busca pelo alinhamento entre os agentes de mercado

Como lembrou o presidente da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), Leonardo Pereira, na abertura do Congresso, as atuais crises que afetaram o nível de confiança do mercado de capitais tiveram como ingredientes comuns problemas relacionados à Governança Corporativa. “O que parece óbvio, na prática, é um grande desafio.”

Para ele, os riscos potenciais que podem impactar na segurança dos mercados estão mudando constantemente e precisam ser entendidos e gerenciados. Apesar disso, ele admite que houve grandes avanços na área nos últimos 15 anos. “As boas práticas são claras, e o Novo Mercado é uma evidência concreta desse caminho percorrido”, avalia.

Mas os avanços, segundo ele, devem ser constantes e imperativos. “Para que essa evolução não venha acompanhada com maior nível de risco, a melhor qualidade da transparência e de boas normas de conduta em geral deve ser perseguida e cada vez mais capilarizada na vida dos negócios e organizações”, afirma Pereira.

De acordo com o presidente da CVM, para que isso ocorra é fundamental ter uma coordenação forte entre diversos agentes. “Uma coordenação efetiva traz uma maior probabilidade para que a priorização e o alinhamento dos temas da Governança ocorram de forma mais natural”, mensura.

Interagentes

É nesse contexto da interação e do alinhamento dos agentes do mercado de capitais que se situa a atuação do grupo de trabalho Interagentes, constituído por 11 instituições, incluindo o IBGC. “Com a iniciativa do grupo há uma melhor chance de construir alternativas que sejam vistas como soluções adequadas e tomadas de forma menos conflituosas”, afirma Pereira. A CVM, junto com o BNDES, são observadores dos trabalhos do grupo.

A presidente do Conselho de Administração do IBGC, Sandra Guerra, destacou que cada uma das entidades-

membro fez sua “lição de casa” e listou aquelas que seriam as prioridades de Governança do grupo. A partir daí, se chegou às três frentes que guiam hoje os trabalhos do Interagentes.

“A primeira é a integração público-privada, que é fazer com que todas essas entidades interajam com o Governo no sentido de avançar em melhores práticas de Governaça e ver elementos que possam representar obstáculos para que o mercado de capitais avance. A segunda é a responsabilidade dos administradores, um componente tanto de educação quanto de detecção de algum ponto crítico. A terceira seria sobre a efetividade que temos em termos regulação e autorregulação”, enumera Guerra. Ela afirma que, em reunião com o Governo Federal, o grupo foi muito bem recebido. “Eles pediram que voltássemos [no final de novembro] com propostas concretas”, revela.

O Grupo de Trabalho Interagentes, formado em março deste ano a fim de criar uma agenda positiva para o mercado de capitais, é composto por representantes da Abrapp (Associação Brasileira das Entidades Fechadas de Previdência Complementar), Abrasca, ABVCAP (Associação Brasileira de Private Equity & Venture Capital), Amec (Associação de Investidores no Mercado de Capitais), Anbima, Apimec (Associação dos Analistas e Profissionais de Investimento do Mercado de Capitais), BM&FBovespa, IBGC, Ibmec (Instituto Brasileiro de Mercado de Capitais) e Ibri (Instituto Brasileiro de Relações com Investidores).

3. Alexandre Di Miceli da Silveira (FEA/USP), Lucas Ayres B. de C. Barros (FEA/USP), Ricardo Pereira Câmara Leal (COPPEAD/UFRJ) e Patricia Maria

Bortolon (UFES), com “Facing the regulators: non-compliance with mandatory compensation disclosure in Brazil”.

Leonardo Pereira

“Para que essa evolução não venha acompanhada com maior nível de risco, a melhor qualidade da

transparência e de boas normas de conduta em geral deve ser perseguida e cada vez mais capilarizada na vida

dos negócios e organizações”

ABERTURA DO CONGRESSO

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1ª Sessão - As novas fronteiras da Governança Corporativa

Expectativas e pressões, tanto internas como externas, pautam os desafios atuais e futuros da Governança nas organizações

A reputação das empresas ante o crivo popular vem se denegrindo, especialmente, após as crises financeiras internacionais e os inúmeros escândalos corporativos divulgados pela imprensa nos últimos anos. E a medida que esses fatos vão se repetindo no mundo dos negócios, cresce o rigor das medidas regulatórias sobre a Governança das empresas. A alta administração, então, está hoje no centro das pressões e expectativas internas e externas, que a tem conduzido a ampliar sua responsabilidade diante dos interesses da companhia e dos demais stakeholders. Este é o pano de fundo traçado pela especialista em Governança, Holly J. Gregory, sócia do escritório de advocacia internacional Weil, Gotshal & Manges LLP, a respeito das chamadas novas fronteiras de Governança Corporativa.

Para ela, é preciso responder a duas questões fundamentais para entendermos os novos desafios que já começam a bater na porta das companhias. “Como assegurar que o conselho e a gestão estão sendo responsáveis pelo desempenho da empresa e pela proteção dos ativos dos acionistas? Como assegurar aos acionistas informações e influência adequadas, mantendo uma responsabilidade limitada?”, questiona.

Ela explica que os desafios dependem muito do modelo de controle das companhias. Gregory cita como exemplo os negócios familiares onde a família se mantém no controle. O desafio está, principalmente, em proteger os acionistas minoritários, uma vez que o controlador tem o poder de escolher e substituir conselheiros e, portanto, teria uma grande influência nas decisões do conselho.

Qualquer que seja o modelo, ela atenta para o fato de que os conselhos não devem ceder às pressões dos acionistas, mas devem continuar a ouvi-los e inseri-los no contexto dos negócios. “É necessário atentarmos para os limites dos papéis dos acionistas, conselho e executivos”, lembrou.

Novas pressões e expectativas Gregory explica que há muitas pressões e expectativas sobre os conselhos de administração, que são o centro da Governança das organizações. Primeiro, ela cita o decrescente grau de confiança da sociedade em relação à atuação das companhias, que vem caindo a medida que novas crises financeiras e novos escândalos corporativos vão surgindo. Em consequência disso, os órgãos reguladores e a mídia se fazem cada vez mais presentes na vida dos conselhos e administradores.

Mas ela enfatiza que essas pressões e expectativas vêm aumentando com o decorrer do tempo conforme ocorrem mudanças na sociedade em termos políticos, socioeconômicos, ambientais e no próprio ambiente de negócios. Portanto, hoje, se espera da alta administração das companhias mais responsabilidade social corporativa, na qual se atenta para ações que possam beneficiar concomitantemente a sociedade e a própria organização, trazendo, por exemplo, bem-estar para os funcionários.

Gregory cita ainda que para tal empreitada é necessário garantir uma diversidade de conhecimentos dentro do conselho, bem como sua oxigenação com um “saudável turnover”. A gestão de riscos também deve estar permanentemente na pauta dos conselheiros. E isso implica em ter uma preocupação constante a respeito de possíveis ilícitos na organização como fraudes, por exemplo.

Para Holly Gregory, o grande desafio do conselheiro é se concentrar em questões fundamentais da estratégia corporativa

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2ª Sessão - Novas fronteiras para os conselhos de administração de alto desempenho

Palestrantes falam sobre a composição e a dinâmica dos conselhos de administração e o desafio desses colegiados em alinhar interesses entre acionistas e empresa

Um sistema de compliance ajudaria a afastar esses riscos. Ela ressalta, entretanto, que mesmo o melhor modelo de Governança não pode evitar que atos desta natureza ocorram dentro da companhia.

Ela avalia que para haver uma boa Governança deve ser incentivada a interação constante entre investidores e acionistas de forma independente e transparente. Neste contexto, Gregory chama a atenção para a importância dos relatórios, que pela sua própria natureza de informar, devem ser cada vez mais claros, objetivos e concisos. Desta forma, afirma, eles poderiam ser mais bem aproveitados para embasar as decisões dos investidores.

“Quantidade não é qualidade”, enfatiza se referindo ao grande volume dos relatórios atuais. Mas explica que isso é consequência da própria pressão dos investidores para ter mais informações em relação à atuação da companhia em diversas áreas, como sustentabilidade e

Em tempos de reviravoltas financeiras de grandes companhias brasileiras e apreensão na Bolsa, a segunda sessão do Congresso trouxe importantes contribuições para os debates acerca da composição e funcionamento dos conselhos de administração, bem como do balanceamento dos interesses de acionistas e da companhia dentro desses colegiados.

Para debater sobre as “Novas Fronteiras dos Conselhos de Administração de Alto Desempenho”, tema da segunda sessão, foram convidados o sócio diretor da Tempo Giusto Consultoria Empresarial, Eduardo José Bernini, e o senior advisor da Gávea Private Equity, Ronnie Vaz Moreira. Como moderador do debate, foi escolhido o sócio conselheiro da Pragma Patrimônio e ex-presidente do conselho do IBGC, Gilberto Mifano.

Antes de proferir a primeira pergunta aos debatedores, o moderador levantou uma preocupação e uma

reflexão sobre para quem os conselhos deveriam trabalhar para ter um alto desempenho. E lembrou que é preciso contrabalançar os interesses de acionistas e da companhia para que se chegue a um melhor resultado. “Em princípio, o interesse dos acionistas é que a empresa desempenhe da melhor maneira possível. Isso em teoria, pois na prática nós sabemos que ainda temos algumas esquinas a atravessar nessa questão.”

O primeiro questionamento colocado por Mifano foi sobre o papel do regulador diante de um conselho cujas decisões estejam privilegiando interesses dos acionistas em detrimento aos da empresa.

Para Bernini, que desde 1995 atua em conselhos de administração, trata-se de uma questão importante a discutir, principalmente, quando “o próprio conceito de regulação ainda não está consolidado”. Mas ele

responsabilidade social. Segundo Gregory, também se espera da Governança, em especial dos conselhos de administração, contribuir para maior clareza nas decisões sobre remuneração, atentando para as disparidades existentes.

Sem perder o foco Segundo Gregory, as discussões sobre como as organizações podem atender as demandas da sociedade, de acionistas, reguladores clientes e demais stakeholders, continuará na pauta da alta administração por muito tempo e implicará em novas fronteiras.

Mas ela lembra que mesmo diante de todas essas pressões e expectativas, tanto internas como externas, a Governança não pode se desviar do seu foco principal. “O grande desafio para os conselhos é atender as crescentes expectativas sobre eles, balancear conflitos entre os principais agentes e se concentrar em questões fundamentais da estratégia corporativa e de desempenho.”

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Vaz afirma que os conselheiros têm de ter em mente de que o conselho é um trabalho de equipe

destaca um movimento positivo dos entes envolvidos. “A sensibilidade que eu vejo hoje tanto de reguladores como de conselheiros e, eventualmente de acionistas, é muito maior do que foi no passado. E essa, talvez, seja a grande notícia. Não há uma zona de indiferença, mas sim um ponto de atenção que tem ajudado a construir algumas pontes onde hoje só existem rios bravios.”

Relacionamento Outro ponto colocado na discussão foi se as relações entre os conselheiros dentro do colegiado, que vão desde os de amizade, de discordâncias e até de disputas pelo poder, interferem na dinâmica do conselho.

“É importante ter em mente que se trata de um trabalho de equipe. Entre os conselheiros é preciso ter espírito de time e todos devem estar dispostos a tomar posições. Divergências são sempre bem-vindas, pois ajudam a fazer um peso e contrapesos de que se chegou a uma boa posição”, avaliou Ronnie Vaz, que em 15 anos, já participou de aproximadamente 12 conselhos de administração de companhias de capital aberto e fechado.

Bernini avançou um pouco mais na discussão ao lembrar que, antes de se discutir esse relacionamento entre os membros do colegiado é preciso ver como o órgão foi ou será composto. “Se estamos falando efetivamente de que há uma busca consciente para que os conselhos de administração atinjam alta performance, o primeiro diagnóstico básico que um conselho deve fazer - e os acionistas deveriam estar muito conscientes no momento de compor o colegiado - é se esse conselho não é composto de iguais com alguns mais iguais do que os iguais”, avaliou Bernini, para quem a unidade de pensamento não contribui em nada para o melhor desempenho desses órgãos.

“[O conselho] é um ambiente em que polidez e a diplomacia não devem impedir a franqueza e a troca de opiniões embasadas. Um dos dilemas que se coloca é até onde devemos conduzir o dever de diligência. Porque essa é uma fronteira muito importante, é ali que encontraremos, eventualmente, virtudes e alguns pecados para construirmos caminhos para conselhos de alta performance”, concluiu Bernini.

Vinculação de voto Dois temas polêmicos tomaram os momentos finais desta sessão. A primeira foi sobre a vinculação de voto em acordos de acionistas. Sobre o assunto, o moderador Gilberto Mifano lembrou que o IBGC

tem uma posição muito clara, recomendando que o mecanismo não seja utilizado.

Opinião compartilhada por Ronnie Vaz. Mas no caso de haver esta vinculação e o conselheiro discordar da orientação de voto emanada pelos acionistas, ele sugere que o conselheiro renuncie. Vaz, entretanto, ponderou que esse conselheiro, antes da reunião do colegiado, procure “argumentar os pontos de vista que possam ser considerados por outros decisores e, eventualmente até mudar a opinião [dos acionistas]”.

Renúncia O segundo ponto polêmico foi sobre as motivações que podem fazer um conselheiro independente renunciar. Sobre o assunto, Mifano voltou-se para Bernini, que desde 2007 atua como conselheiro independente: “Como se deve fazer a renúncia?”

“Pode ocorrer uma situação em que a gravidade em determinada matéria [previamente comunicada] ser tão profunda e o conselheiro independente não estar confortável. A pior situação é fazer a renúncia em meio à reunião do conselho. Mas isso não deve, por sua vez, servir de nenhuma omissão por parte do conselheiro para que ele manifeste quais as razões que levam à sua renúncia, ao seu ato extremo. Agora isso vai depender do objeto que está sendo tratado, do momento, das condições que cercam a empresa”, avaliou Bernini.

Os especialistas Para fechar o debate, os convidados discorreram sobre o papel dos especialistas nos comitês, que têm como função assessorar os conselhos de administração. Ronnie Vaz lembrou que a presença dos especialistas é muito importante, principalmente, quando há “questões muito complexas, que precisam ser mais bem mastigadas e debatidas para fazer uma recomendação mais fundamentada de uma decisão do conselho”.

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3ª Sessão - Razões para se ter um programa de compliance na empresa

No próximo ano, as empresas brasileiras estarão subordinadas a uma legislação anticorrupção. Se não se adequarem, poderão pagar multas de até 20% de seu faturamento bruto

Sob o viés da lei anticorrupção, que responsabiliza civil e administrativamente empresas que cometerem crimes contra a administração pública, especialistas em Compliance discorreram sobre a importância desse mecanismo dentro das organizações na 3ª sessão do Congresso. Sancionada em agosto deste ano pela presidente Dilma Rousseff, a nova lei (nº 12.846), que começa a vigorar em janeiro de 2014, deve inserir o Brasil em um novo patamar nas relações comerciais e instaurar, a longo prazo, uma nova cultura de integridade dentro das organizações.

Antes da promulgação da lei anticorrupção, as empresas - portanto, as pessoas jurídicas - não eram responsabilizadas pelos crimes cometidos dentro da corporação, mas somente os indivíduos que direta ou indiretamente os praticavam. A partir do próximo ano, a companhia que for pega cometendo atos de improbidade (ou um dos seus entes que o façam em seu nome) e se enquadrar na nova lei brasileira, poderá ter seus bens bloqueados, suas atividades suspensas e ficarão passíveis de pagamento de multa, que pode chegar a 20% de seu faturamento bruto ou alcançar até R$ 60 milhões, caso esse faturamento não possa ser calculado.

Como disse um dos palestrantes da sessão, o cluster compliance officer da Siemens na América do Sul, Wagner Giovanni, por mais que as empresas queiram evitar atos corruptíveis dentro de suas organizações, por meio de seus códigos de conduta, sempre haverá o risco destes serem praticados por um ou mais indivíduos. “Afinal, as empresas são compostas por pessoas”, ressalta Giovanni. Portanto, como todo ser humano, são passíveis de cometerem atos antiéticos.

Por que ter um programa de compliance? É neste sentido que surgem os debates sobre a necessidade de implementação de uma área de compliance na empresa, cujo objetivo é previnir, detectar e dar respostas quanto à irrupção desses atos dentro da corporação.

A nova legislação, apesar de endurecer as regras de punição das empresas, traz um atenuante chamado “acordo de leniência”, uma espécie de delação premiada que ameniza as penas daquelas organizações que cooperarem com as investigações.

Em um programa de compliance, todas as análises de riscos de improbidade, recomendações e treinamentos, por exemplo, são devidamente documentados pelos profissionais atuantes nesta área. Portanto, se enquadrada na lei, uma companhia sob investigação poderá demonstrar através de documentos de seu programa de compliance o quanto foi feito para se evitar atos antiéticos dentro da empresa e, assim, atenuar possíveis punições.

Exemplos de grandes companhias O compliance officer para as Américas da Stryker Corporation, Fernando Caleiro Palma, destaca alguns exemplos de como os programas de Compliance foram importantes para zelar pela reputação de

Wagner Giovanni

“Sem apoio da alta administração, nem perca tempo porque o

programa não vai funcionar”

Mifano aproveitou para pontuar uma preocupação recorrente quando o assunto é o papel dos especialistas nos comitês. “Se não tiver uma combinação muito clara entre o conselho de administração e o comitê, há o risco daquela

recomendação que o comitê estiver fazendo virar automaticamente uma decisão, porque o conselho não quer perder tempo com algo que os especialistas já discutiram”, avaliou. Nesta situação, segundo Mifano, a função do conselho ficaria descaracterizada.

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grandes companhias e minimizar as penas aplicadas sobre elas.

Ele cita o caso do banco de investimentos Morgan Stanley, que em abril do ano passado teve seu então diretor executivo da área imobiliária na China, Garth Peterson, identificado como reponsável por burlar os controles contábeis internos da companhia e desviar recursos do caixa para a conta pessoal.

“Pela primeira vez na história, as agências reguladoras trouxeram em uma decisão, em um NPA [Norm Prosecution Agreement] – equivalente ao nosso Termo de Ajustamento de Conduta – dizendo tudo que o Morgan Stanley fez para não ser processado, e sim somente Garth Peterson”, conta Palma. Segundo ele, a companhia foi capaz, através de seu programa de compliance, de informar às agências reguladoras cada etapa que a organização fez para treinar o ex-diretor no programa de corrupção. “Por exemplo, no documento, dizia que Peterson foi treinado 7 vezes, que recebeu 35 compliance reminders durante o período em que ficou na empresa, ou seja, isso tudo estava documentado”, explica.

Apoio da alta administração A corresponsável pelo grupo de Compliance de Tozzini Freire Advogados, Shin Jae Kim, moderadora da sessão, destacou que em grande parte dos casos de empresas sob investigação por supostos problemas de “ficha limpa” os seus conselheiros de administração “não haviam lido o código de conduta de suas organizações nem o

programa de compliance”. Para ela, o engajamento dos profissionas da Governança é importante para o sucesso do mecanismo dentro da corporação.

Por que se preocupar com os outros? A preocupação de uma companhia não deve se ater apenas ao que ocorre dentro dela. É o que explica Shin Jae Kim. Segundo ela, é preciso que se atente também à atuação das empresas que prestam serviços em seu nome, os chamados terceiros.

Essa preocupação também deve ser estendida para as aquisições e extensões de negócios, alerta Kim. “Quando uma companhia pretende adquirir uma empresa local é recomendável fazer uma auditoria extensa, tocando os mesmos pontos quando se faz a auditoria de terceiros. Porque se essa empresa adquirida tiver envolvida em algum ato de corrupção no passado ou em fraude de contrato com o Governo” também poderá ser enquadrada na lei, explica Kim.

Cultura de integridade Assim, acredita Giovanni, com tantas interdependências, empresas passarão a se auto-fiscalizar no longo prazo. Dessa forma, como diz Palma, também se estaria criando paulatinamente uma cultura de integridade dentro das organizações.

“Não tem mais volta. As empresas vão começar a banir as outras que não trabalharem com a integridade requerida. Pouco a pouco, as coisas entrarão no eixo. Ou a empresa, seja grande ou pequena, entra na linha ou morre no caminho”, sentencia Giovanni.

4ª Sessão - A sociedade civil como fiscal ético das empresas

A reputação das companhias estaria, cada vez mais, nas mãos dos “cidadãos do século 21”, que exigem mais comprometimento e integridade das companhias

As corporações de hoje se deparam com um cenário no qual suas credibilidades e, portanto, também o futuro de seus negócios estão diretamente associados aos anseios atuais da sociedade contemporânea, que exige delas mais transparência, ética e modelos de produção sustentáveis socioambientalmente. É o que

mostraram os palestrantes da 4ª sessão geral do Congresso, para quem a questão da integridade deixou de ser uma opção, mas uma exigência dentro das organizações.

Uma das razões para isso, segundo o diretor presidente do Instituto Akatu, Helio Mattar, é

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Publicação Trimestral do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa - 67ª edição

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que a própria sociedade está mais transparente, ética e interconectada, especialmente, através dos meios de comunicação de massa e das redes sociais na internet.

“Ações e omissões por parte das empresas são visíveis para o consumidor e todos os stakeholders. Eles passaram a ser grandes veículos de comunicação. A reputação de uma empresa passa a depender mais e mais do que é dito pelos stakeholders e pessoas em geral e menos do que a companhia fala de si própria”, analisa. Para ele, o “cidadão do século 21” vem se tornando um grande fiscal das corporações com uma postura que ele chama de “egoísta altruísta”. “Então, esse cidadão passa a fazer ao outro o que gostaria que fosse feito para si próprio. Portanto, ele vem se tornando um consumidor ético”, explica Mattar.

Ciclo virtuoso

Para o sócio-diretor da ProFinancial e ex-presidente da Brain, Paulo Oliveira, disseminar uma cultura de honestidade dentro de uma companhia, diminuiria custos, faria crescer a fidúcia e geraria crescimento dos negócios. Mas para que isso ocorra, segundo ele, seria necessário partir da ideia de que essa disseminação começa do individual (o colaborador, por exemplo) para a coletividade (conjunto de colaboradores que formam uma organização). “Indivíduos que têm valores e são educados em conceitos coerentes com um ambiente saudável de fazer negócios, quando se expressam em sociedade viram coletivo, e desta forma, então, temos uma sociedade que prospera”.

De acordo com Oliveira, ainda é preciso avançar muito para se chegar a esse patamar. Ele relata que, certa vez, um empresário de uma companhia de matriz chilena, que atuava no setor de prestação de serviços no Brasil, sentiu-se inseguro quando um fiscal de um município brasileiro lhe disse que “daria um jeito” para resolver questões relacionadas ao pagamento do ISS. Ele somente teria optado por continuar em terras brasileiras, pois sua empresa capta quase a metade de seu faturamento em nosso país.

Apesar de achar esse “jeitinho brasileiro” um problema, Oliveira conta que o Brasil, por enquanto, continua a atrair muitos investimentos estrangeiros diretos, perdendo neste quesito apenas para os chineses e os norte-americanos no ranking mundial. Ele ainda cita que, em relação aos outros mercados emergentes do Brics (Rússia, Índia e China), o Brasil é o que está mais avançado em termos de institucionalidade. “Nós temos um sistema financeiro maduro, uma democracia organizada,

somos muito maiores em relação ao respeito aos contratos, à regra do jogo, do entendimento de como ele funciona, em relação a esses países.” “Mas quando olhamos para a Europa e os EUA, temos de melhorar muito em relação a Governança corporativa e regras do jogo”, pondera.

Visão sociológica

O cientista político do Insper, Carlos Melo, endossa alguns aspectos do discurso de Oliveira e ressalta que “temos de nos esmerar para sermos os melhores”. “Precisamos caminhar pelo aperfeiçoamento institucional. Temos instituições melhores que as de outros países do Brics, mas essa não pode ser a margem de comparação” avalia.

Melo explica que, por questões históricas - que partem desde o período escravagista-, no Brasil o trabalho é visto como “algo ruim” e a “esperteza” usada para burlar as normas impostas faz com que “muitas coisas não funcionem bem”. “Temos um problema, que talvez seja nossa esperteza. Se vemos que algo tem a mínima possibilidade de dar certo, então é porque vai dar certo [sem esforço]”, explica Melo.

Para ele, o que falta na sociedade contemporânea são lideranças políticas capazes de trazer exemplos de integridade de forma prática e de desmistificar o conceito de Política, hoje comumente associado a “algo ruim”. “Gestão boa também é política. E o papel do político é procurar escolher o melhor para a maioria”. Neste sentido, Melo avalia que os interesses coletivos devem ser considerados, especialmente, por aquele que governa. “Às

Segundo Mattar, as empresas do século 21 estão condenadas à ética e à qualidade das relações com seus stakeholders

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vezes, a única forma para resguardar meus interesses é me envolvendo com o que o coletivo almeja”, analisa.

O cientista político também enumera qualidades positivas do Brasil e questiona como esses fatores não o impulsiona economicamente. “Não é possível que um país como o Brasil, rico e de povo generoso, que não tem conflitos de ordem étnica e cultural mesmo com seu tamanho continental, com potencial econômico, não consiga crescer 2% ao ano”, pontua.

Sustentabilidade dos negócios

Mas essa problemática apontada por Melo vem acompanhada por outra: a de promover um crescimento econômico sustentável do País. E para isso, as corporações têm um papel fundamental. Helio Mattar, através de pesquisa realizada pelo Instituto Akatu, lembra que os cidadãos avaliam

que as empresas têm poderes de promoverem mudanças e, portanto, carregam hoje um acordo social com a sociedade, não mais um acordo meramente produtivo.

“A Governança deveria reconhecer que as empresas do século 21 estão condenadas à ética e à redefinição de produtos, à qualidade das relações e aos impactos sobre a sociedade e o meio ambiente”, analisa Mattar, para quem esse movimento pode começar a se dar de dentro para fora da organização.

Afinal, quando uma companhia adota uma conduta que incentiva e promove boas práticas corporativas internamente e as exteriorizam para seus stakeholders e as pessoas em geral, disseminando valores éticos, ela acaba por contribuir para se criar no longo prazo uma cultura de integridade dentro e fora do ambiente empresarial.

5ª Sessão - Será o fim dos tradicionais relatórios corporativos?

O movimento pela aplicação do conceito de Relato Integrado nos demonstrativos de resultados das empresas defende que as companhias comuniquem seus valores de forma relevante, detalhada e transparente

No atual mundo dos negócios, começa a tomar fôlego a discussão sobre como as companhias devem comunicar seus resultados aos investidores e demais stakeholders. É o que mostraram os palestrantes da 5ª sessão do Congresso, cujo tema em debate girou em torno do conceito e da aplicabilidade do Relato Integrado nas organizações. Segundo estes especialistas, os amontoados de números dos relatórios corporativos de hoje revelam pouco sobre o desempenho das companhias.

“O mercado hoje já não se satisfaz mais com a informação financeira. Saber que uma empresa deu lucro ou prejuízo, antigamente, era suficiente. E as empresas, muitas vezes, se limitavam a dar essa informação ao mercado, como se o lucro compensasse toda e qualquer consequência dos passos que se tomou para gerar aquele resultado. Estamos vivendo um momento de mudança de paradigma neste contexto”, analisa Vania Borgerth, assessora da presidência do BNDES, que

acompanha os trabalhos no Brasil do International Integrated Reporting Council (IIRC), entidade que encabeça o movimento pela divulgação, desenvolvimento e implantação do Relato Integrado (IR na sigla em inglês) mundo a fora.

De acordo com Borgerth, diante deste cenário, o IR pretende mudar o modelo atual dos relatórios corporativos, mostrando o desempenho das empresas não somente sob o viés financeiro, mas também não-financeiro. Para isso, as organizações terão de mudar seus processos e, principalmente, a forma de pensar e comunicar, medindo perdas e ganhos em seis fluxos de capital: financeiro, manufaturado, intelectual, social, humano e natural.

Criar valor

Para Lisa French, head de relações exteriores da IIRC nas Américas, não se trata de criar seis relatórios distintos acerca dos capitais acima

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Lisa French: “Não se trata de criar valor apenas hoje, mas de se ter a habilidade de continuar a criar valor no longo prazo”

enumerados, mas de identificar como esses elementos podem ajudar a criar valor à empresa no longo prazo. “Os investidores e provedores do mercado de capitais querem saber mais sobre as empresas nas quais investem: por quanto tempo elas vão existir, irão prosperar, gerar fluxos de caixa; se serão por 20, 10 ou 5 anos”, observa French. Segundo ela, uma empresa pode priorizar 3 ou 4 capitais materiais (relevantes), dependendo de seu modelo de negócios.

Ela explica que os produtos, serviços e atividades de uma empresa podem trazer consequências - positivas ou negativas – sobre esses capitais e, consequentemente, à própria organização. “Dependendo da atividade do negócio, de como a companhia usa, consome ou transforma esses capitais para produzir, ela pode trazer impactos na sociedade em torno da organização”, analisa.

Programa piloto

Para sair das discussões conceituais e trazer experiências práticas de aplicabilidade do IR nas organizações, a IIRC mantém há três anos um programa piloto que envolve mais de 100 empresas do mundo todo, além de investidores e orgãos reguladores do mercado de capitais. Destas, 10 são brasileiras: Natura, Via Gutemberg, BNDES, Petrobras, Itaú Unibanco, CPFL Energia, Grupo CCR, Votarantim, AES Brasil e Mapfre Seguros.

Para relatar a própria experiência, o vice-presidente de Finanças e Relações Institucionais da Natura, Roberto Pedote, explica que sua empresa já trabalha com um relatório único que une resultados financeiros, sociais e ambientais. “Mas temos uma jornada muito grande pela frente para, de fato, transformar o que hoje é um relatório único em uma integração de aspectos do negócio, que vão gerar mais valor para nossos diversos públicos”, avalia Pedote, moderador desta sessão do Congresso.

Do projeto piloto como um todo, French afirma que algumas conclusões já podem ser tomadas em relação à adoção do IR. Com essa nova forma de relatar os resultados, diz a head do IIRC, os investidores se depararão com mais transparência das empresas em relação a riscos, oportunidades e estratégias. Além disso, poderão organizar, contextualizar e integrar as diversas divulgações produzidas dentro da organização. Desta forma, reduziriam duplicações, redundâncias e, consequentemente, os custos.

Complementar a este segundo item, ela cita ainda a necessidade de integração do pensamento entre os departamentos da organização, tais como

o de finanças, contabilidade, sustentabilidade, jurídico, relações com investidores, comunicação externa e, principalmente, a alta administração, que responde diretamente pelo desempenho e estratégia de uma companhia.

Relato vs relatório

Mas, enfim, o IR viria a substituir os relatórios tradicionais e os de sustentabilidade produzidos hoje pelas organizações? Segundo Vania Borgerth, não. “O relato integrado não é um relatório integrado. O que o IIRC quer mexer é no processo de geração de informação, na maneira de reportar, para que ele seja mais integrado”, explica.

Para Borgerth, os relatórios das empresas passariam a ter mais informações relevantes detalhadas e contextualizadas. Mas ela atenta para o aumento do volume de dados dos relatórios corporativos atuais, que não representariam qualidade dos documentos.

Borgerth ressalta ainda que as empresas precisam compreender o IR não como um instrumento que ajudaria somente os investidores e provedores do mercado de capitais, ao dotarem de demonstrativos mais concisos e transparentes. “O principal benificiário [de uma implantação do IR] é a própria gestão do negócio. Quanto mais completo e integrado for esse relatório, melhor a empresa irá conhecer seus riscos e suas oportunidades. Assim, ele poderá implementar meios de se beneficiar dessas oportunidades, bem como neutralizar ou mitigar esses riscos”, defende.

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6ª Sessão - Trilhas temáticas para Empresas de Capital Aberto, Capital Fechado, Familiares e outras organizações

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Lideranças em busca do melhor modelo de Governança

Presidentes de conselhos de administração de organizações distintas falam sobre as estruturas e dinâmicas de seus colegiados

O modelo do Conselho de Administração (CA) de uma organização, seja ela de capital aberto, fechado, familiar ou sem fins lucrativos, deve ser determinado de acordo com a natureza, perfil e o momento do negócio. Em alguns casos, a Governança das corporações precisa se transformar para se adaptar a novas realidades que as empresas estariam inseridas. Esta é a conclusão dos três painéis temáticos da sexta sessão do Congresso, cujos debates buscaram também esclarecer a atuação dos presidentes desses colegiados, bem como de seus membros.

A Embraer é um exemplo de companhia que teve de realizar diversos ajustes em sua Governança em diferentes momentos de sua existência. Como lembrou o moderador de um dos painéis da sessão, o vice-presidente da Associação Brasileira das Companhias Abertas (Abrasca), Luiz Spinola, a empresa passou de companhia estatal para privatizada e, em seguida, por uma reestruturação societária, na qual se optou por ter um capital pulverizado, sem um grupo de controle ou um acionista controlador. “A Governança da empresa foi mudando e se ajustando a essa nova realidade e continua mudando”, analisa Alexandre G. Silva, presidente do Conselho da companhia.

Para Silva, não é preciso aguardar uma reviravolta dos negócios para começar a promover mudanças. “Uma coisa que está dando certo hoje vai ficar defasada, as coisas evoluem. Você precisa sempre procurar melhorar sua Governança e questionar mesmo aquilo que está dando certo”, analisa.

O colegiado presidido por ele é formado hoje por 11 membros, sendo três indicados e oito independentes. “A Embraer é uma empresa sem controle definido com uma característica interessante. Ela tem uma golden share da União, que lhe dá alguns direitos. Por exemplo, indicar um membro do conselho. E durante o processo de privatização foi garantido ainda que os funcionários pudessem eleger um membro do Conselho e o clube de investidores da Embraer também”, explica Silva.

O processo de adaptação da Governança da Fibria Celulose S/A foi um pouco mais conturbado, segundo

José Luciano Penido, presidente do Conselho da companhia. “A Fibria nasceu de uma falha de uma oportunidade de consolidação concomitantemente com uma falha de Governança. Começamos a empresa com endividamento muito alto. O foco do conselho naquele momento era reconstruir a estabilidade financeira e fazer o equacionamento da dívida, e a presidência do conselho tinha três prioridades: Governança, sustentabilidade e formação de gente, de sucessores”, relata Penido. Ele conta que naquele momento, o objetivo era capturar R$ 4 bilhões em sinergias dessa consolidação. “E isso foi feito”.

Empresa de capital aberto de controle definido, na Fibria há um acordo de acionistas entre o BNDES e a Votarantim Industrial, que juntas respondem por 59,2% das ações. “Isso pode mudar ao longo do tempo”, antecipa Penido. Ele explica que o CA conta com nove membros, sendo que sete representam esses dois acionistas e dois são independentes.

Os comitês

A maturidade dos negócios e dos membros do próprio CA também determina como se dará a estrutura e a dinâmica da Governança de uma companhia. É o que explica o empresário e presidente de conselho da J. Macêdo, Amarilio Macêdo. Ele conta que a empresa, por exemplo, já chegou a ter um “festival de comitês” em determinada época, visto que a composição do conselho ainda era jovem e necessitava ter um suporte maior para as deliberações do colegiado. “Hoje, com a composição de seniores, mais experientes, restringimos em dois comitês, sendo um de auditoria e outro de pessoas”, relata.

A J.Macêdo é uma empresa familiar com capital aberto na Comissão de Valores Mobiliários (CVM), mas sem ações em Bolsa. “Isso em consequência do lançamento de debêntures públicos que fizemos em 2007. Concluída a operação, decidimos permanecer vinculados à CVM, porque no momento que fizermos o IPO (oferta pública de ações), a empresa não vai sair do zero, sendo mais fácil se relacionar com o mercado”, explica.

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“Uma coisa que está dando certo hoje vai ficar defasada, as coisas evoluem.

Você precisa sempre procurar melhorar sua Governança e questionar mesmo

aquilo que está dando certo”

Alexandre G. Silva

Os comitês aos quais Macêdo se refere são uma realidade na maioria das companhias com CAs em suas estruturas, e têm como principal função assessorar o colegiado, dando inclusive recomendação de voto em temas específicos. Em geral, são formados por conselheiros e, em alguns casos, contam com especialistas em determinadas áreas para dar mais substratos às deliberações do conselho. O número de comitês varia conforme a necessidade e porte da organização.

“Esses órgãos não têm poder decisório, eles servem para assessorar e aprofundar assuntos. É o conselho que dá a palavra final”, enfatiza o presidente do Conselho da Embraer, que conta com comitês de estratégia, recursos humanos e auditoria e risco.

Dedicação do presidente

O tempo de dedicação de todos os presidentes dos conselhos nesses diferentes perfis de organização, conforme os próprios relataram, mostra-se bastante intenso visto as funções que lhes cabem à frente dos seus respectivos colegiados. Além disso, eles acompanham e integram os comitês e, alguns deles, atuam também em outros conselhos de administração.

Penido, por exemplo, além de presidir o CA da Fibria, participa diretamente em 3 comitês e é conselheiro em outras três empresas: Copersucar, Grupo Orteng e Química Amparo – Ypê. Além disso, ele também é membro do Comitê de Governança e Sustentabilidade do grupo Santander. “Eu tenho um acordo com acionistas para dedicar 50% do meu tempo à gestão da Fibria”, ressalta Penido ao afirmar que consegue balancear os períodos de dedicação a todas essas atividades.

Já entre os presidentes dos conselhos das organizações sem fins lucrativos, o tempo de dedicação é quase total, afirmam eles. Isso porque suas atividades acabam ultrapassando as atribuições de assegurar a eficácia e o bom desempenho do órgão e de seus membros. Entre as demandas mais comuns estão a de captação de recursos financeiros e técnicos para as entidades para as quais atuam.

De acordo com José Luiz Egydio Setúbal, presidente da Fundação Hospital Infantil Sabará, sua dedicação é de 16 horas por semana como presidente do Conselho, função para a qual também se dedica. Mas junto com todas as outras atividades da fundação, ele afirma que a dedicação se torna integral. Ele conta que a entidade surgiu após ele, como sócio do hospital (uma S.A.), efetuar a compra das outras partes societárias. Setúbal relata que nesses três últimos anos, o Conselho do hospital,

anterior à compra, foi todo dissolvido. Hoje o CA da fundação é formado por cinco membros, sendo a maioria da administração do hospital, que se reúne quatro vezes ao ano. “Partiremos, nos próximos meses, a ter até 11 conselheiros”, antecipa.

Para Alair Martins, presidente do Conselho e fundador da Martins Comércio e Serviços de Distribuição, é a paixão pelo seu trabalho que justifica o tempo despendido exclusivamente para os assuntos relacionados à sua empresa. Ele tem 79 anos e está à frente de um CA de oito membros, sendo quatro da família e outros quatro externos. “Fui convidado para outros conselhos, mas eu não teria tempo [para tamanha dedicação]”, conta.

A recomendação do Código das Melhores Práticas de Governança Corporativa do IBGC é de que os presidentes de conselhos participem, no máximo, de outros dois colegiados.

Profissionalização

Outro aspecto abordado na 6ª sessão do Congresso foi o desafio da profissionalização da Governança das empresas tanto familiares e das entidades sem fins lucrativos. O presdiente do Conselho da J.Macêdo conta que essa sempre foi uma das prioridades da empresa nestes 75 anos de existência, em especial, a partir da década de 1970. “Hoje temos uma gestão totalmente profissionalizada”, comemora Macêdo.

Este processo, entretanto, se torna mais complicado para as organizações sem fins lucrativos, pela questão da própria natureza de suas atividades. Segundo o presidente do Conselho do Instituto Ethos, Sérgio E. Mindlin, um dos empecilhos para a formação de um CA e sua profissionalização entre as organizações sem fins lucrativos é a legislação tributária, que prevê a suspensão das isenções fiscais às entidades deste perfil que remunerarem, por exemplo, seus conselheiros de administração. “Nas organizações sérias, isso [a remuneração] ajudaria a profissionalizar e a cobrar mais resultados e dedicação”, conclui Mindlin.

“Pensando na melhoria da gestão de uma instituição me parece que seria algo interessante remunerar o presidente do conselho”, também defende o presidente dos Conselhos da Fundação Jari e do Graacc, Sergio

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Amoroso. Ele conta que as duas instituições têm realidades diferentes em relação à Governança.

A formação do Conselho da Fundação Jari passou por mudanças e hoje conta com oito membros externos e quatro internos, o que segundo Amoroso “tem ajudado a trazer um equilíbrio”.

Já no CA do Graacc, constituído há um ano, todos os nove conselheiros são externos. Ele explica que ainda existem dificuldades no diálogo entre o colegiado (por ser todo de fora da instituição) com os médicos da universidade Paulista de Medicina, ligada à instituição, e com a própria administração. “O desafio é nos próximos 8 ou 10 anos entregar ao Graac um modelo de Governança redondo, bem estruturado. O processo [de Governança] é que deveria comandar e, hoje, temos as pessoas influenciando demais nele”, avalia Amoroso.

Apesar das dificuldades e desafios, as organizações sem fins lucrativos iniciam, paulatinamente,

processos de profissionalização da Governança corporativa. Afinal, como apontam todos os presidentes de conselhos desta sessão nas três trilhas temáticas, a Governança funciona como alicerce de uma organização, seja ela de capital aberto, fechado, ou fundações.

Quem responderá pelos atos ilícitos dentro da organização?

7ª Sessão A - Trilha temática para Empresas de Capital Aberto

Esta pergunta tem permeado entre o empresariado brasileiro desde a forte divulgação da Teoria do Domínio do Fato, um dispositivo do Direito Processual Penal, que poderia incriminar um administrador por atos cometidos por um subordinado

Marco Araújo

“No âmbito administrativo, os reguladores vêm alargando

esse conceito de culpa aos administradores por falta de vigilância ou por eleger uma

pessoa em certas funções”

Nos últimos meses, o mundo corporativo vem se questionando sobre a jurisprudência de um dispositivo utilizado em argumentações da Ação Penal 470 (mais conhecido como processo do Mensalão) em casos de atos ilícitos cometidos dentro das empresas. Trata-se da Teoria do Domínio do Fato, cuja fundamentação se finca na possibilidade de um indivíduo em cargo elevado ser responsabilizado por um crime cometido por um subordinado.

Apesar do alarde recente da mídia em torno da possível aplicabilidade dessa teoria em ilegalidades praticadas dentro das corporações, o sócio da Albino Advogados, Arnaldo Dutra, ressalta que o dispositivo não é recente, nem pouco usual. “Conforme podemos observar em várias partes do acórdão do julgamento do Mensalão, a teoria já vem sendo examinada pela doutrina penal brasileira

há mais de 30 anos, sendo certo que a própria jurisprudência dos tribunais não tem sido a ela indiferentes”, relata o advogado.

Para Luiz Leonardo Cantidiano, sócio da Motta Fernandes Rocha Advogados, ninguém será penalizado pelo simples fato de ser o superior

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Martins, Villares e Macedo falam sobre dedicação do PCA em empresas de capital fechado

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direto de um indivíduo que tenha cometido um crime. “É preciso demonstrar, ainda que por indícios, que aquela pessoa estava efetivamente envolvida na prática do ilícito, seja ela agindo ou se omitindo, tendo ela tomado conhecimento da irregularidade”, explica Cantidiano.

Segundo ele, a utilização deste dispositivo para os crimes corporativos deve apresentar uma alavancada. “Há uma tendência, em função da sofisticação do mercado, de se ter uma utilização maior dessa teoria para apreciação de processos que envolvam administradores de instituições financeiras e companhias de capital aberto”, avalia Cantidiano, para quem não haveria surpresa quanto ao fato de reguladores como Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e Banco Central (BC) venham a utilizar o dispositivo para analisar um eventual ilícito que venha ser praticado nas corporações.

Na opinião de Marco Araújo, vice-presidente executivo de Assuntos Corporativos do Banco Santander Brasil, a publicidade dada à Teoria do Domínio do Fato, no noticiário nacional, trouxe um efeito imediato, que foi a conscientização da sociedade e dos administradores em relação “de onde termina a culpa deles do ponto vista criminal e civil”. Mas para ele, sua aplicabilidade em casos de crimes corporativos não se dará da mesma forma.

“Eu acho que a decisão da Ação Penal 470 não vai ter um impacto imediato nas decisões judiciais do País, porque ainda está sendo julgada na corte suprema (STF). É um caso que não necessariamente vincula a jurisprudências dos juízes inferiores”, analisa Araújo.

Boas práticas Antes que se tenha qualquer problema de ordem criminal dentro da organização, os três debatedores do painel são unânimes quanto à necessidade das companhias utilizarem mecanismos para prevenir e, se possível, mitigar os riscos de atos ilícitos dentro da organização. O primeiro passo se daria dentro da perspectiva da Governança corporativa.

“No âmbito administrativo, os reguladores vêm alargando esse conceito de culpa não somente para punir aquele que estava na ponta realizando um ilícito, mas culpando os administradores por falta de vigilância ou por eleger uma pessoa em certas funções. Isso tem sido aplicado de forma corriqueira”, alerta Araújo, que também avalia que os conselhos podem até ser alvo de sanções criminais ou administrativas.

“É importante que todos conheçam o seu papel. As empresas, em termos de Governança, precisam informar aos administradores quais são suas responsabilidades”, analisa. Araújo também ressalta que os conselhos contem com comitês para chegarem à melhor decisão e que as corporações contem com um compliance independente. “Se desvios acontecerem, que a companhia tenha mecanismos de supervisão, verificação, correção e até de punição interna. Isso é uma ferramenta de defesa da empresa, que é capaz de atuar, corrigir e mostrar o exemplo efetivo que existe um compliance dentro da empresa”, explica. Ele cita ainda um mecanismo simples que pode ser implantado nas empresas que é o canal de denúncias. “Trata-se de um canal de reclamações internas e de fornecedores. É um instrumento fundamental para a boa Governança das empresas. Tenho visto a implantação desses canais em algumas empresas e o retorno que se tem. O canal ajuda a examinar desde questões de assédio até de corrupção privada. É um instrumento muito relevante.”

Numa visão mais geral, Cantidiano ressalta algumas características, atitudes e posições para se ter o que viria a ser um administrador com perfil “standart” de probidade e competência, que atenuaria os surgimento de irregularidades dentro das companhias. “Ter comprometimento dele com a participação nos órgãos que integra; buscar informação antes de tomar uma decisão; ter confiança nas pessoas que integram a estrutura administrativa da empresa; investigar

Palestrantes destacam as implicações do uso da Teoria do Domínio do Fato para as organizações

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A família Stefani conta como vem implementando as boas práticas de Governança nas empresas de seu grupo e preservando os valores construídos por seu fundador ao longo de mais de cinco décadas

Uma história de gestão afetiva e efetiva

7ª Sessão B - Trilha temática para Empresas de Capital Fechado e Familiares

Há um aforismo popular que diz que “as coisas de família, em família devem ficar”. Esse provérbio, entretanto, nem sempre se aplica nos moldes das companhias familiares modernas que pretendem sobreviver em mercados cada vez mais competitivos. O Grupo Stefani, conglomerado de empresas das áreas de transporte, distribuição e revenda de combustíveis, entretanto, mostrou neste painel que é possível manter a gestão nas mãos de entes da família, mas sob a condição de profissionalizá-la dentro do contexto das boas práticas de Governança Corporativa.

E esse processo de profissionalização começou em 2005, quando a companhia contratou uma consultoria e criou um conselho de família, que diagnosticou o perfil dos entes da primeira, segunda e terceira gerações que trabalhavam no grupo e os problemas advindos da relação empresa-família, que muitas vezes se confundiam no cotidiano. Por exemplo, familiares que buscavam na empresa a resolução de questões de interesse privado, tais como pagamento de contas pessoais, contratos de rescisão de trabalho de empregados domésticos, entre outros.

Mas para compreender melhor esse processo, é preciso contextualizar com a história do grupo e apresentar os principais personagens dessa saga empresarial familiar. Tudo se inicia em 1954 quando Henrique Stefani, o fundador do grupo, ao ver oportunidades e demandas crescentes no setor de combustíveis, cria sua primeira empresa em Canoas (RS), cidade onde se concentravam grandes companhias de petróleo na época. A transportadora Henrique Stefani Cia LTDA começou com apenas 4 caminhões-tanque e hoje conta com uma frota de 450 conjuntos completos, que transportam cerca de 2 bilhões de litros de combustíveis por ano dentro do Brasil e em alguns países do Mercosul.

Depois de se consolidar nesse setor, Henrique Stefani também fundou, em 1979, a empresa de comércio e distribuição de diesel e lubricantes Querodiesel e, junto com outros sócios, a rede de postos de combustíveis Latina, em 1998. Hoje, a família detém 100% do capital da Henrique Stefani, 98% da Querodiesel e 50% da Latina.

Genealogia empresarial

Henrique Stefani, falecido em 2012, era casado com Irma Stefani e teve cinco filhos. Apenas dois deles resolveram se inserir nos negócios do pai: Luiz Carlos e Miraci, ambos membros atuais do conselho de administração (CA) do grupo, sendo o primeiro, o presidente do colegiado. Quatro netos também fazem parte das empresas do conglomerado familiar: Diogo e Rodrigo (co-CEOs), filhos de Miraci, e as filhas de Luiz Carlos, Karina (coordenadora de marketing) e Giovana (secretária do CA).

Rodrigo explica que todos os entes familiares inseridos na organização passaram por um sólido programa de capacitação e formação para assumir seus respectivos cargos. Como exemplo, Rodrigo conta que ele e seu irmão possuem muito conhecimento dos negócios do grupo, já que trabalharam em vários setores da companhia desde o ano 2000. Fato que teria os elevado aos cargos de co-CEOs. Segundo ele, os dois dividem a sala e as responsabilidades em uma co-gestão bem definida.

“A fim de não dar margem para dúvidas para quem se reportar, nós estabelecemos uma divisão muito clara, na qual Diogo é responsável pela Henrique Stefani e pela parte de back office operacional e eu com a Querodiesel e o backoficce da empresa. Assim,

potenciais problemas; não ficar burocraticamente participando das reuniões; deixar registrado tudo e mostrar elementos que revele que ele foi diligente”, enumera.

A conclusão dos palestrantes é de que esses elementos e mecanismos se fazem cada vez mais necessários dentro das organizações não

somente com a publicidade e conscientização da sociedade e dos administradores quanto à Teoria do Domínio do Fato, ou até pela aprovação da chamada lei anticorrupção empresarial discutida na 3ª sessão deste Congresso, mas sim para se promover a longo prazo uma cultura de boa Governança no ambiente corporativo.

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temos o backup do CEO. Está dando muito certo e nunca tivemos nenhum problema interno sobre as competências de cada um”, relata Rodrigo.

Sua prima Giovana também reforça o trabalho que vem sendo feito para formação e preparação dos herdeiros da família. “Montamos dentro do grupo um plano de capacitação de herdeiros, onde temos uma previsão no acordo de sócios, em que todos devem participar de um programa de PDI [Plano de Desenvolvimento Individual]. Dentro desse plano, temos programas de estágio, intercâmbio e cursos de Governança Corporativa para empresas familiares e finanças”, explica Giovana, para quem o nivelamento do conhecimento promovido pelo plano ajuda a preservar a harmonia familiar nos negócios.

Governança Corporativa

A formação do conselho de familia, em 2005, foi o primeiro passo para muitas mudanças e ajustes que passaram o grupo nos últimos anos. Rodrigo cita esses momentos divididos em períodos. Segundo ele, entre 2006 e 2008, o grupo montou seu conselho de administração, inicialmente formado por Luiz Carlos, que na época acumulava as funções de presidente do colegiado e CEO do grupo, Miraci e um membro independente. Em seguida, se constituiu o Comitê de Governança.

Em 2007, foi contemplado a assinatura do primeiro acordo de acionistas, que estabeleceram regras acerca da entrada e saída de sucessores, de cargos e salários, da capacitação dos sucessores e da segregação dos ativos da família e da empresa.

No período de 2006 e 2008, o grupo contratou uma auditoria independente, que culminou na formação de outro comitê para tratar assuntos relacionados a essa área. Rodrigo também destaca a criação do family office em 2008, que segundo ele, “formalizou a separação das contas família-empresa, que ajudou o trânsito patrimônio-família-empresa”. Nesse mesmo ano, a companhia teria contratado o segundo conselheiro independente.

No segundo período, que corresponde aos anos entre 2008 e 2010, Rodrigo destaca a contratação de um executivo não-familiar para CEO do grupo, pois, de acordo com o acordo de acionistas, Luiz Carlos não poderia acumular este cargo e o de presidente do Conselho. Pouco depois, este executivo deixou a função propiciando a promoção de Diogo e Rodrigo aos cargos de co-CEOs. Outro ajuste importante foi a criação de uma auditoria interna.”Fizemos a matriz de riscos,

o mapeamento dos processos críticos e, com isso, fizemos um cronograma de auditoria que é acompanhada pelo Conselho”, explica Rodrigo.

Diogo também destaca outra medida adotada pelo grupo em 2012, quando se inicou uma estrutura de compliance. “Queríamos entender o que ainda não estávamos fazendo e onde poderíamos ter riscos efetivos de ter problemas em termos trabalhistas, fiscais, etc. A partir daí, tivemos um trabalho forte de ajuste”, explica Diogo. Segundo ele, o reflexo disso é que, neste ano, o grupo teria saído de duas operações, que apesar de serem rentáveis, não tinham um nível de compliance adequado para tê-las sob controle. “Temos um negócio complexo, com alta regulação, que envolve riscos por conta do transporte de carga perigosa, portanto, é preciso investir muito em Governança”, avalia.

Para a moderadora da sessão, Magda Geyer Ehlers, sócia diretora da Geyer Ehlers Desenvolvimento Organizacional e Instituto Sucessor, a família Stefani conseguiu derrubar “o grande mito de que as boas práticas de Governança contraria tudo o que se construiu em uma vida de uma empresa familiar”.

De acordo com o relato de todos os membros da família presentes na sessão, todos os ajustes feitos ao longo desses últimos sete anos tinham, além de promover a perenidade do grupo, um objetivo claro para os herdeiros de Henrique Stefani. “O principal legado deixado pelo meu pai foi o princípio de valores da família e a preocupação de zelar pelo nome Stefani. E ele sempre dizia ‘eu trabalhei até agora e deixei um nome para vocês e agora cuidem bem dele’”, sintetiza Luiz Carlos o sentimento propulsor dos negócios.

Membros da família Stefani relatam suas motivações para investir em boas práticas de Governança

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Diretores da Previ e da Funcef falam sobre a importância da boa Governança nas empresas investidas

Governança para preservar os investimentos e as aposentadorias

7ª Sessão C - Trilha temática para Outras Organizações

A Governança Corporativa hoje tem papel-chave dentro da gestão dos investimentos dos fundos de pensão, dada à variedade de empresas investidas por elas e à própria função em que se apresentam à sociedade. Sob essa premissa, dois dirigentes dos maiores fundos do País explicam como a implementação de boas práticas tem sido fundamental para preservar essas duas entidades, que juntas gerenciam uma carteira de mais de R$ 200 bilhões em ativos.

“Muita gente pensa na Previ somente na parte de investimentos, mas a nossa razão de ser é garantir a qualidade de vida e o benefício de aposentadoria para os nossos milhares de participantes”, enfatiza Marco Geovanne Tobias da Silva, diretor de Participações dos fundos de pensão dos funcionários do Banco do Brasil (BB), um dos convidados desta sessão, moderada pela editora-executiva da Capital Aberto, Simone Azevedo.

A Previ tem um patrimônio de R$ 165,8 bilhões de ativos, sendo mais de 60% em renda variada. A quantidade de participantes é de aproximadamente 100 mil, excluindo os pensionistas. Silva afirma que a Previ precisa se manter bem dotada e continuar a realizar investimentos para conseguir, perenemente, pagar seus beneficiários. Para ilustrar, ele exemplifica um momento em que o volume desses pagamentos anuais saltou de R$ 6,2 bilhões em 2010 para R$ 9 bilhões no ano seguinte.

“O desafio é muito grande, pois temos que gerir a carteira de investimentos ao longo do tempo para dar conta de pagar esses benefícios. Então, a Governança é uma forma de garantir esse pagamento. Precisamos de visão estratégica dos negócios e questionar às companhias investidas quais são suas estratégias de criação de valor sustentável. Não podemos ficar presos no ‘curto prazismo’, temos que monitorar as estruturas e os representantes [conselheiros] que efetivamente atuem e sejam diligentes, que cobrem prestação de contas das empresas”, explica Silva.

Ele conta que há certa complexidade na gestão já que eles podem ser controladores em determinadas empresas e acionistas minoritários em outras. “O que nos ajuda a entender esse papel são alguns princípios de Governança”, ressalta o diretor da Previ. Ainda assim, segundo ele, há muitos desafios pela frente neste contexto. “Estávamos acostumados a fazer uma Governança na qual éramos os acionistas minoritários, nos protegíamos do controlador, que era o grande vilão. Hoje, temos um quadro mais abrangente com outras estruturas de Governança”, relata.

Escolha dos conselheiros

Para a escolha de conselheiros, a Previ tem se utilizado de uma metodologia pensada junto a uma consultoria contratada, que cataloga os funcionários do BB que querem ser candidatos aos conselhos fiscal e de administração do fundo. O mecanismo os avalia com os critérios de formação e experiência. Também há indicação de membros pelo órgão patrocinador.

O procedimento é parecido ao adotado pelo Funcef, fundação de previdência complementar dos funcionários Caixa Econômica Federal. A diferença é que neste fundo o processo de escolha é todo interno, ou seja, não há conselheiros fora do quadro de funcionários, por se tratar de um fundo patrocinado por uma empresa 100% pública e sem ações.

Paulo Alberto Caser, diretor-presidente da Funcef, relata que a preocupação com as questões relacionadas à Governança Corporativa surgiu no fundo em meados dos anos 2000. Ele conta que no início havia somente meia dúzia de conselheiros, os quais foram escolhidos sem muitos critérios técnicos pelos dirigentes da fundação.

“No decorrer dos anos 2000, a Funcef teve um trabalho bem ativo para a diversificação de portifólio e, obviamente, isso se refletiu em aquisições e participações de diversas empresas. O número de conselheiros, portanto, cresceu e demandava uma atuação mais incisiva. Criamos,

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então, a diretoria de participações [societárias e imobiliárias]”, relata Caser.

Hoje a Funcef tem 135 mil participantes e R$ 52 bilhões em ativos, sendo um dos maiores fundos de pensão do País. Para preservar o andamento dos investimentos, explica, a entidade teve de mudar o processo de escolha de conselheiros de administração e fiscais. “Há oito anos, é tudo normatizado, com regras internas que fazem toda uma seleção para que a Funcef possa nomear seus representantes nessas diversas empresas”. Atualmente, conta Caser, os conselheiros têm realizado cursos em Governança, inclusive o mais recente com suporte do IBGC.

Outro ponto destacado pelo diretor da Funcef é a participação da entidade dentro das empresas investidas. “Nós damos muito valor à Governança e raramente entramos em um investimento se não tivermos participação efetiva nos órgãos de Governança das companhias. É uma exigência para, assim, ajudar a gerar valor para nossos investimentos”, explica.

Sobre uma possível interferência do Governo na agenda de investimentos da Funcef, por se tratar de um fundo de pensão ligado a um banco estatal, Caser é taxativo. “Da mesma forma como a iniciativa privada bate todos os dias à nossa porta, o Governo também o faz. Mas temos uma Governança e decidimos o que é bom para o fundo de pensão. Se não for bom, a gente não entra”.

Longo prazo

O diretor da Previ reforça que aos fundos de pensão não interessa muito se determinada empresa investida não teve lucro no primeiro trimestre, por exemplo. “Sabemos que uma companhia passa por ciclos, é dinâmico”. Silva avalia que o processo de melhoria da Governança de uma empresa “gasta tempo, estrutura, suor”, mas os benefícios são duradouros. “É por isso que todo mundo quer casar com o fundo de pensão, quer nos ter em sua base de acionistas, por temos uma perspectiva de longo prazo”.

Para Silva, a perenidade de entidades de previdência complementar como a Previ e a Funcef se dá em grande parte pelo olhar fiscalizador de seus participantes que, por sua vez, são o motivo delas investirem e existirem.

“As pessoas que escolhemos para efetivamente nos representar são os beneficiários dos investimentos. Eles fiscalizarão a companhia porque a aposentadoria deles depende do sucesso daquele negócio. E isso muda o enfoque, e passa a ser longo prazo, porque não é só para eles, é para seus filhos, esposas ou maridos”, explica Silva.

A formação de um ativismo 3.0

Painelistas acreditam que um novo perfil de investidor está surgindo, mas ainda há muito que se avançar para tê-lo em ação nas assembleias de acionistas das empresas

8ª Sessão A - Trilha temática para Empresas de Capital Aberto

Tendo como pano de fundo a temporada de assembleias realizadas entre março e abril deste ano, com maior número de pedidos de voto múltiplo, procurações e maior participação de investidores estrangeiros, painelistas desta sessão acreditam que está em curso a formação de um novo perfil de investidor, que pretende ter uma participação mais

“É por isso que todo mundo quer casar com o fundo de pensão, por temos uma perspectiva de

longo prazo”

Marco Geovanne Tobias da Silva

ativa na vida societária da companhia. O caminho, entretanto, seria longo, visto que ainda existem empecilhos de cunhos cultural e operacional no ambiente de negócios.

Para o sócio fundador da Leblon Equities, Pedro Rudge, culturalmente, o Brasil criou um perfil

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sermos propositivos para criar esse novo arcabouço”, avalia o presidente do Conselho da Tarpon.

Dentre as propostas, ele cita as pré-assembleias, reuniões nas quais se teria um debate aberto para nivelar o conhecimento dos acionistas a respeito da realidade atual da empresa. A iniciativa abriria um canal de comunicação capaz de captar opiniões e posições diversas, bem como mostraria o posicionamento efetivo e capacidade contributiva de cada um dos stakeholders. O moderador da sessão, Mauro Rodrigues da Cunha, presidente da Associação de investidores no Mercado de Capitais (Amec), afirma que esta proposta estaria alinhada com uma proposição enviada pela entidade à CVM em março deste ano. “A proposta visa um período pré-convocatório nas assembleias exatamente para que seja possível receber o input dos acionistas e para que a assembleia aconteça com maior nível de informação e debate prévio possível”. Para ele, ainda há um obstáculo que o mercado precisa transpor e que isso se daria na percepção da importância da CVM em assegurar a livre fluidez das informações e das propostas entre os acionistas.

Sinais de mudanças

Algumas empresas já vêm adotando medidas neste sentido. É o que explica o sócio fundador da Leblon Equities. “Alguns casos bastante emblemáticos tiveram mais atenção da mídia. O caso da Petrobras, da HRT e da Gafisa, onde se viu os investidores mobilizados, mantendo diálogos anteriores às assembleias, tentando definir nomes em comum acordo, fazendo com que as decisões se tornassem mais unânimes possíveis. Nos últimos anos, temos visto sim um ativismo dos investidores, sejam os locais ou os estrangeiros”, avalia Rudge.

Para ele, independente de qual tipo de ativismo vier a surgir, é preciso mais conscientização sobre fatores básicos da vida societárias das companhias. “Acho que tem uma questão cultural [da baixa proatividade dos participantes das assembleias], mas nós investidores temos que compreender que existe sim um dever fiduciário, que como sócios precisamos participar das decisões importantes das empresas nas quais investimos”.

“Vem ganhando força o pensamento de que faz parte do meu dever

deixar registrado a minha visão do que seria adequado para a empresa”

Pedro Rudge

de investidor pouco confrontador e que não vê a necessidade de participar ativamente das decisões relacionadas à companhia na qual investe. “No passado muito recente, sempre se tinha a presença do acionista controlador que decidia tudo sozinho os rumos da empresa no final do dia”, analisa. A mudança do modelo societário de muitas organizações, entretanto, estaria pressionando naturalmente para que eles tivessem uma nova postura diante dos assuntos tratados nas assembleias de acionistas.

“Mas esse cenário vem se alterando não somente em empresas que não têm a figura do controlador, por exemplo, mas também em empresas com controle definido. Vem ganhando força o pensamento de que, mesmo que a minha participação não seja decisiva, faz parte do meu dever deixar registrado a minha visão do que seria adequado para a empresa”, avalia Rudge, para quem isso seria ainda apenas um princípio de mudança.

Segundo ele, além do fator cultural, há ainda os fatores burocráticos para inibir a participação ativa de alguns investidores, especialmente para os estrangeiros. “Eles têm diversos caminhos e etapas a cumprir, nem sempre têm o tempo hábil e nem as informações, muitas vezes, chegam a eles da melhor maneira possível”, afirma. Apesar desta dificuldade, ele acredita que neste aspecto há uma movimentação da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e que as companhias têm disponibilizado procuradores e tentado estimular a sua base a participar das assembleias.

Ativismo 3.0

José Carlos Magalhães, presidente do Conselho da Tarpon, também acredita que ainda há muito o que avançar em termos de participação nas assembleias de acionistas. Para ele, está sendo moldado um ativista 3.0 nas assembleias que não se trataria somente daquele “que impacta, que muda o status quo, que reforça ou propõe algo novo, mas aquele que tem compromisso e responsabilidade por aquilo que faz”.

Para Magalhães, o Brasil deve fazer surgir esse novo ativismo entre os investidores antes mesmo de países mais desenvolvidos como os Estados Unidos. Isso porque a CVM teria se posicionada a favor dos acionistas.

“Esse é o pano de fundo importante, que faz com que o mercado de capital brasileiro possa ambicionar um ativismo 3.0 com mais consciência e mais impacto. Como é algo novo, boa parte dos documentos e dos papéis está ainda em formação e cabe a nós, investidores, companhias, reguladores,

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As atenções voltadas para as companhias de pequeno e médio porte

O RI da Senior Solution compartilha os passos dados pela empresa para realizar a primeira oferta de ações em bolsa e os desafios enfrentados

8ª Sessão B - Trilha temática para Empresas de Capital Fechado e Familiares

No âmbito regulatório do mercado de ações, o Brasil vive um momento no qual se cogita iniciativas centradas na formação de capital, principalmente no que diz respeito à viabilização de oferta de títulos de valores menores pelas companhias de médio e pequeno porte. Esta é a visão do diretor da BM&FBovespa, Carlos Rebello, moderador desta sessão, sobre o atual cenário no mercado de capitais no País (veja quadro). Neste contexto, está a empresa Senior Solution, que após anos de preparação e foco na estratégia, abriu o capital e realizou sua primeira oferta pública de ações na Bolsa para financiar projetos futuros.

Fundada em 1996, a Senior Solution, empresa de tecnologia para o mercado financeiro, inicialmente, desenvolvia projetos e prestava serviços na área de Tecnologia da Informação (TI) para as instituições financeiras. Com o estouro da “bolha da internet” em 1999, a companhia se viu diante da necessidade de repensar seu modelo de negócios, considerado frágil pelos seus empreendedores naquele momento.

Foi então, no ano 2000, que a Senior Solution iniciou um processo de mudanças desse modelo, passando de prestadora de serviços para desenvolvedora de produtos, no caso, de softwares. Para a nova empreitada, fizeram a primeira captação de recursos com o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), que culminou no lançamento do primeiro sistema em 2004, o SBS (Senior Banking Solution). Isso fez com que os empreendedores refletissem sobre a estratégica da empresa, chegando à conclusão que o melhor objetivo a focar era a consolidação.

“O nosso mercado é composto por aproximadamente 150 empresas de pequeno e médio porte, portanto, há um grande potencial de consolidação e hoje esse potencial não é muito bem aproveitado”, explica o diretor de Relações com Investidor (RI) da companhia, Thiago Almeida Ribeiro da Rocha.

A decisão pela abertura Para iniciar o projeto estratégico de consolidação, os

empreendedores do negócio procuraram investidores para financiamento e, enfim, conseguiram aporte do BNDESPar e do fundo gerido pela Stratus. Mas, visto a oportunidade no mercado, que segundo Rocha poderia durar poucos anos, a Senior Solution entendeu que era necessário levantar mais recursos para dar continuidade ao projeto.

“Tivemos problemas com limites, pois éramos uma prestadora de serviços, sem ativos, sem garantias reais, além de ter uma estrutura de controle difusa, com dois empreendedores com posições acionárias pequenas e dois sócios, o BNDES e fundo de participações Stratus, que por suas posições não fazia muito sentido darem aval em um empréstimo. Sobraram duas opções que eram fazer uma captação privada de recursos ou, então, uma oferta de ações, sendo que optamos pela última”, relata Rocha.

Caminho trilhado O RI da companhia explica que todo o processo de abertura de capital até a oferta de ações levou pelo menos oito anos. “A decisão não foi por uma janela de oportunidade, mas de estratégia de longo prazo da empresa”, ressalta. Além disso, ele aconselha às empresas de pequeno e médio porte que desejam realizar um IPO, que o assunto seja muito discutido, que se tenha alinhamento entre os sócios, grau de preparação para a empreitada e o comprometimento da administração, pois o projeto exige foco.

Outro ponto destacado por Rocha é a necessidade de estruturar bem a companhia antes de iniciar o processo. Segundo ele, isso se deu de forma natural na Senior Solution. “Em 2002, a empresa passou a ser auditada e três anos depois, surgiu o embrião do que seria uma Governança Corporativa da empresa. Constituímos um Conselho de Administração (CA) com cinco membros, sendo um independente. Como Governança é uma questão de exercício, o CA se reúne mensalmente para discutir a estratégia da empresa. Nosso processo de amadurecimento se deu entre 2005 e 2012. No ano passado, a empresa já atendia boa parte dos requisitos de

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Governança do Bovespa Mais, até um pouco mais que isso, com requisitos do Novo Mercado.”

Depois de criar esse ambiente dentro da empresa, conta Rocha, a última etapa da preparação foi a conversão de ações preferenciais em ordinárias, realizada no final de ano passado.

A oferta O início do processo se deu em fevereiro de 2012, com uma reunião entre acionistas, administradores e seus assessores jurídicos. Em quase 100 dias, a empresa teve de passar por diversos procedimentos, tais como a preparação de documentos, análise dos mesmos pela comissão de listagem da BM&FBovespa e, por fim, a obtenção do registro de companhia aberta na CVM.

Próximo do terceiro trimestre, os acionistas tomaram a decisão de iniciar de fato a oferta de ações. Em setembro de 2012, a empresa contratou um intermediário financeiro. Por fim, em março deste ano, foi dado início às negociações das ações da Senior em Bolsa, com a liquidação quatro dias depois.

“Tivemos a oferta primária de quase R$ 40 milhões e uma secundária de R$ 15 milhões e uma adição de uma pequena parte do lote suplementar. A oferta total foi de R$ 57 milhões”, contabiliza o RI da companhia.

E agora? Dada a primeira oferta de ações na bolsa, a Senior Soution tem o desafio de se manter como companhia aberta. Para Rocha, empresas do porte da Senior Solution (que teve uma receita bruta de R$ 50 milhões em 2012) têm muitos desafios para entrar no mercado de capitais. Portanto, precisam avaliar minuciosamente se isto se encaixaria na estratégia de longo prazo da companhia e evitar serem levados por movimentos oportunistas de liquidez transitória. “A grande mensagem que fica aqui é que Governança Corporativa e abertura de capital não são apenas para grandes companhias. Pelo contrário, é o caminho que as pequenas e as médias podem trilhar e, talvez, ser tão bem-sucedidas quanto as grandes.”

Para Rocha, “mais importante que ter estruturas no papel é o exercício diário”

A diretora de Desenvolvimento de Empresas BM&FBovespa, Cristiana Pereira, anunciou proposta de mudanças nos segmentos de listagem de bolsa. Segundo ela, o objetivo seria criar mecanismos e ambientes mais propícios para o acesso de pequenas e médias empresas ao mercado acionário. Como parâmetro mínimo, foi estabelecido que as companhias elegíveis tenham faturamento de até R$ 500 milhões, valor de mercado inferior a R$ 700 milhões, que façam uma captação majoritariamente primária e tenham regras mínimas de Governança Corporativa.

Com a proposta de reestruturação, a BM&FBovespa passará a ter oito segmentos de listagem: Premium, com o Novo Mercado e o Nível 2; Nível 1; os segmentos especiais, com o Bovespa Mais (somente com ações ordinárias) e o Bovespa Mais N2 (ordinárias e preferenciais); o tradicional; e dois segmentos no ambiente de mercado de balcão organizado, sendo o tradicional e o Potencial, este último voltado para investidores super qualificados que seriam dispensados de registro na CVM.

Os novos segmentos de listagem da BM&FBovespa

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Os desafios da Governança nas cooperativas

As cooperativas de assistência à saúde e de crédito avançam na busca de modelos de Governança que respeitem suas particularidades

8ª Sessão C - Trilha temática para Outras Organizações

Dois grandes segmentos do cooperativismo brasileiro dão continuidade a um movimento pela profissionalização da administração e pela introdução dos princípios das boas práticas de Governança Corporativa. Tratam-se das cooperativas de assistência à saúde e as de crédito, ambas de setores em expansão no País e sensíveis ao desempenho da economia. Em níveis diferentes de desenvolvimento, as iniciativas nas duas áreas são conduzidas por seus respectivos reguladores em parceria com o IBGC. Representantes da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) e do Banco Central do Brasil (BC) relataram as experiências e seus desafios neste painel da oitava sessão do Congresso.

Nos últimos anos, as cooperativas – em especial, dos ramos de saúde e crédito – apresentaram crescimento de suas operações, mas não tiveram, proporcionalmente, uma modernização de suas estruturas organizacionais. E isso estaria incorrendo na incapacidade de algumas cooperativas de sobreviverem no mercado. É o que mostra João Carlos Alves da Silva Junior, gerente-geral de Regimes Especiais da ANS.

Segundo ele, este cenário propiciou a necessidade dessas sociedades em implementar princípios de boas práticas de Governança para estabelecer a perenidade delas em seus respectivos segmentos. Silva Junior explica que o próprio monitoramento rotineiro realizado pela ANS nas cooperativas reguladas por ela já é um grande indutor de boas práticas. “Isso porque tem o objetivo de mitigar os riscos de insolvência e promover a sustentabilidade do segmento de assistência à saúde”.

Mas, para ele, é preciso avançar mais. Silva Junior conta que há muitos desafios de se implementar modelos de Governança dentro das cooperativas de saúde, que representam cerca de 22% das operadoras ativas de assistência médica e respondem por 38% dos beneficiários do segmento no mercado brasileiro.

“Temos o conflito de interesses entre cooperativas e cooperados, sendo que estes últimos, muitas vezes, não se sentem donos do negócio e estão mais preocupados com o incremento de suas atividades finalísticas, que é a prestação do serviço”, relata. Ele ainda cita como desafios estimular o interesse e a participação dos cooperados nas assembleias e criar mecanismos eleitorais nas quais possam trazer independência aos membros dos conselhos de administração e fiscal.

Primeiros passos Silva Junior afirma que, apesar das dificuldades, a ANS vem empenhando esforços para criar um projeto de implementação de boas práticas de Governança nas cooperativas reguladas por ela. O primeiro passo foi inseri-lo em sua agenda regulatória (2013/2014) no eixo de sustentabilidade do setor. “Para isso temos a celebração de um convênio de cooperação com o IBGC e a criação de um grupo técnico com a participação de entidades representativas do setor para a implementação”.

Ele explica que o grupo técnico a ser formado terá como objetivos definir padrões mínimos de Governança e desenvolver mecanismos de aferição. “Para isso, serão necessários definir se os parâmetros serão por porte ou modalidade; como será feita a aferição e por quem; se as normas serão de orientação ou impostas; e se terão incentivos regulatórios”.

Silva Junior ressalta que para o êxito do projeto é preciso que as cooperativas compreendam que a adoção de boas práticas de Governança Corporativa, “além de permitir a sustentabilidade do setor, deve criar valor para todas as partes interessadas”.

Cooperativas de crédito O estágio de implementação de boas práticas de Governança nas cooperativas de crédito, que congregam cerca de 6 milhões de cooperados

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em todo o País, estaria mais avançado. Isso porque o Banco Central, em 2006, iniciou um projeto estratégico voltado para essas sociedades que culminou na publicação, em 2009, do documento “Governança Corporativa – Diretrizes e Mecanismos para Fortalecimento da Governança nas Cooperativas de Crédito”, que tem sido referência para o segmento.

“Em um mercado com cerca de 1.200 instituições, algumas com mais de 100 anos, ainda estamos engatinhando. Mas estamos funcionando, de certa forma, estruturados nesta parte de Governança”, avalia Claudio Filgueiras Pacheco Moreira, chefe-adjunto de Departamento do BC. E faz uma reflexão sobre a regulamentação do setor: “se a estrutura de supervisão continuar como está por 3 ou 4 anos, posso afirmar com convicção que ela não funcionará bem”.

Moreira afirma que, apesar dos avanços, ainda há muitas arestas a ajustar entre as cooperativas de crédito, que podem se estender as de outros segmentos. “As discussões sobre Governança hoje

giram em torno da segregação plena de funções estratégicas e executivas na alta administração, do custo da Governança, da independência do conselho fiscal, da transparência do funcionamento das assembleias, da política de sucessão e educação financeira e cooperativista dos associados”, enumera.

O representante do BC também salienta que o órgão vem discutindo a questão da recomendação da retirada de algumas funções de supervisão, controladoria e auditoria de dentro do sistema cooperativista e colocar algumas entidades externas que tenham mais independência.

No cooperativismo, assim como ocorrem em muitas empresas, ainda é preciso avançar em termos de Governança, a começar pelo alinhamento de interesses dos entes das organizações, evitando assim conflitos entre cooperados, diretoria, auditores, membros do conselho de administração e demais stakeholders, e preservar a participação igualitária, um dos preceitos básicos do cooperativismo.

9ª Sessão - A regulação do mercado em debate

Convidados discutem algumas propostas e iniciativas de viés regulatório em curso no País e como impactariam no ambiente de negócios brasileiro

O cenário atual de iniciativas regulatórias está movimentado tanto no Congresso Nacional como na Comissão de Valores Mobiliários (CVM). Alguns projetos que tramitam nessas esferas, se aprovados, devem trazer impactos para o ambiente de negócios e para a Governança Corporativa das empresas. Este foi panorama traçado pela moderadora desta sessão, a conselheira de administração de companhias abertas e ex-presidente da CVM, Maria Helena Santana.

Entre os projetos, está o de revisão da chamada Lei de Arbitragem, que ganhou destaque na mídia nacional, em especial, por propor a atualização e regulamentação dos instrumentos de apaziguamento de interesses que, em tese, desafogariam a Justiça brasileira. A primeira seria a mediação, que como

o próprio nome sugere visa mediar as partes de um litígio para que se chegue a um acordo. Neste caso, seriam objetos casos mais simples como briga de vizinhos, por exemplo. O segundo seria a própria arbitragem, que teria a mesma função, mas aplicada em questões empresariais e comerciais. A decisão no caso tem peso judicial.

Mas os pontos do projeto que têm provocado discussões no mundo dos negócios são outros. Santana cita, por exemplo, o direito de recesso, tema que foi discutido pela comissão de juristas instaurada no Senado para formulação do projeto de revisão da lei. Este dispositivo poderia permitir, por exemplo, que um acionista minoritário dissidente em assembleia se retirasse da companhia e recebesse o valor de suas ações diretamente dela, sem ter que vendê-las no mercado.

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“Direto de recesso nas companhias abertas é muito complicado, poderiam ter outras estratégias regulatórias para tratar esse problema, pois ele tende a ser usado, como mero direito patrimonial”, avalia Santana.

Para José Alexandre Tavares Guerreiro, da Tavares Guerreiro Advogados, há outras questões a se fazer sobre a Lei de Arbitragem. “A obrigatoriedade estatutária de arbitragem no nível 2 cria um problema que muitos acionistas levantam. A arbritagem se baseia na vontade das partes, não pode ter arbitragem imposta, contra a vontade do acionista. E ainda, no litígio com a sociedade, um determinado acionista instaura um procedimento arbitral, que vai ser julgado e a decisão atingirá este e outros milhares de acionistas que sequer tiveram conhecimento ou participaram do procedimento arbitral”.

Sobre a extensão dos efeitos da sentença arbitral, que teria o mesmo de uma decisão judicial, Marcelo Guedes Nunes, presidente da Associação Brasileira de Jurimetria (ABJ), afirma que é preciso encontrar mecanismos para coletivizar esse processo. “Não é só uma questão dos acionistas saberem que existe um certo litígio judicial ou arbitral que afeta a vida deles, mas é poder avaliar conjuntamente que aquele acionista e seus advogados que propuseram aquela medida são representantes adequados da maioria. Porque na prática o que está acontecendo é isso, quem entra na medida é em nome de todos os acionistas”.

Segundo Nunes, esses mecanismos de coletivização podem ser mais uma questão regulatória de boa prática de Governança para vida das empresas, podendo ser pensado tanto no ponto de vista judicial como extra-judicial.

Partes relacionadas

Outro assunto tratado nesta sessão foi referente às questões e projetos envolvendo transações entre partes relacionadas. Uma delas é o projeto de lei (6962/2010) que tramita na Câmara dos Deputados a alterar a Lei das Sociedades Anônimas (S.A.). Ela tornaria obrigatório o conhecimento prévio pelos acionistas em assembleia das operações com partes relacionadas e as que envolvessem conflitos de interesses.

Sobre essa questão, Nunes afirma que uma ideia seria essa aprovação em assembleia ser efetuada por uma minoria qualificada anteriormente informada do contrato. “Ela avocaria o contrato na assembleia caso entendesse que houve algum potencial lesivo. Não seriam todos os contratos submetivos à aprovação em assembleia”, explica.

Além desse projeto, conta Santana, há uma alteração da instrução 480 da CVM, em especial ao item do formulário de referência reservado às transações com partes relacionadas, a exigir a divulgação imediata em até sete dias de montantes considerados relevantes. “Uma alteração que vai em direção ao que já é adotado em outros países”, acrescenta Santana, para quem a transação entre partes relacionadas mais complicada seria a incorporação de companhia controlada por uma controladora.

Nunes complementa ao afirmar que a discussão ao redor da 480 nesse tópico “busca dar uma verticalização maior à quantidade de informações que tem de ser apresentada para justificar a transação”, devendo ser explicado até o motivo de negociar com parte relacionada e não com terceiros.

Código comercial

Também na pauta de discussões desta sessão esteve o projeto de lei que dispõe sobre a alteração do código comercial brasileiro. Sobre o tema, Guerreiro é taxativo: “O Direito Comercial é ‘incodificável’(sic)”. Para ele, há o desafio de fazer com que este documento sobreviva ao longo dos anos.

“Nenhum país conseguiu fazer seu código durar muito tempo, nem nós. Tivemos um código comercial em 1850 e dele saíram as SA numa lei ordinária, títulos de crédito na Lei Saraiva, outra lei ordinária, falências, concordatas, recuperação judicial, propriedade imaterial, franquia, representação comercial. Todos os contratos importantes saíram do código até ao ponto de o código do império ficar reduzido a 30 e poucos artigos sobre o comércio marítimo. É o caso de pensar o que faz realmente um código sobreviver ao tempo” analisa Guerreiro.

Nunes também não acredita na viabilidade de codificação, mas avalia que a discussão acerca dos assuntos trazidos no projeto é uma oportunidade de rever pontualmente diversas áreas do Direito Comercial e fixar algumas premissas básicas, com vistas a melhorar o ambiente de negócios no País.

Apesar de muitos desafios e indefinições, os painelistas assistem essa mobilização de juristas, legisladores e reguladores como um esforço, ainda que fragmentado, de dar mais estabilidade ao mercado de capitais. Entretanto, este ambiente desejado não se dará apenas com uma regulação mais incisiva, mas sim junto ao comprometimento das companhias em adotar de forma cotidiana as boas práticas de Governança Corporativa.

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10ª Sessão - Refletindo sobre uma Governança libertadora

Convidados pensam sobre os rumos da Governança Corporativa na missão de criar valor para as empresas, cerne da discussão temática do IBGC para o próximo ano

Muito mais do que uma lista de recomendações, as boas práticas de Governança Corporativa não devem ser entendidas como amarras para o crescimento das organizações. Pelo contrário, elas devem ser compreendidas como parte de um processo libertador, que culmina com a criação de mais valor às companhias, bem como com a longevidade dos negócios. Esta foi uma das reflexões tiradas pelos palestrantes desta sessão, cujo tema estará no centro da discussão temática do IBGC no próximo ano.

Mas quais são esses valores? Para a moderadora do painel, Sandra Guerra, cofundadora e presidente do Conselho de Administração do IBGC, hoje as empresas que querem se preservar no mercado têm o desafio de identificar esses valores para além do que são percebidos numa transação de compra e venda ou no seu custo de capital, seja por dívida ou por equity.

O presidente-executivo da Abril S.A, Fabio Barbosa, acredita que a criação de valores em uma companhia estaria intrinsicamente ligada à dinâmica e à evolução de uma sociedade. Sob este aspecto, as empresas estariam subordinadas ao crivo da percepção baseada nos valores desse grande conjunto de pessoas. Mas, para ele, há um exercício a se fazer.

“Governança tem a ver com você conectado com seu tempo. Tem de ter essa visão para onde está indo a sociedade. Você pode não estar vendo agora, mas uma atitude hoje pode se tornar amanhã em um passivo ambiental, social, trabalhista, de imagem. Olhe a empresa com a visão daquilo que será cobrado lá na frente. O impacto que você causa e como isso será visto ao longo dos anos é o ponto principal.”

Para ele, isso se dá porque a sociedade, seja por meio do consumo, imprensa, funcionários que uma companhia consegue reter ou mesmo dos acionistas, está cobrando constantemente das empresas para que tenham uma boa Governança. Segundo Barbosa, a nova geração, que formará o futuro quadro de gestores e acionistas das organizações, tem um papel de destaque nesta fiscalização, pois ela tem sido mais questionadora em relação aos aspectos ambientais e sociais que as gerações passadas.

Investidores

Apesar de terem como claro objetivo obter retornos financeiros, para Clovis Meurer, sócio e diretor-superintendente da CRP, na indústria de private equity, os investidores vêm se inserindo também na concepção de que não vale a pena ter “lucros a todo custo” e que os impactos externos também devem ser medidos, pois eles também irão incidir no valor final de um negócio. “É claro que todos medem a performance dos gestores e das empresas por retornos financeiros, mas todos também estão colocando claramente como uma condição para essa indústria de private equity, que se olhe sob a linha de seus valores futuros para ter ações no presente”, avalia.

Meurer também destaca que esse movimento pode ser notado pela adesão de boa parte da indústria de private equity em iniciativas como PRI (sigla em inglês para Princípios para investimentos Responsáveis), programa da Organização das Nações Unidas (ONU) que visa promover a inclusão de diretrizes sociais, ambientais e de Governança Corporativa nas decisões de investidores.

Para ele, os investidores também estão mais conscientes em relação às consequências de atitudes irresponsáveis que a companhia, ou alguns de seus entes, venha a realizar. “A cadeia que tem responsabilidade na sociedade permeia a empresa, o investidor, o conselheiro. Qualquer um de nós, seja executivo, seja conselheiro, pode ser responsabilizado por algum passivo”, avalia Meurer.

Barbosa pontua com Sandra e Meurer a necessidade de as empresas prestarem contas à sociedade e os benefícios da boa Governança

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Av. das Nações Unidas, 12551World Trade Center Tower - 25º andar - cj. 2508CEP 04578-903 - São Paulo/SPtel.: 55 11 3043 7008e-mail: [email protected]ítulo Paranátel.: (41) 3022 5035 - [email protected]

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ConselhoPresidente: Sandra Guerra

Vice-Presidentes: Carlos Biedermann e Luiz Alexandre Garcia

Conselheiros: Alberto Whitaker, Anna Maria Guimarães,

Carlos Eduardo Lessa Brandão, João Laudo de Camargo,

Leonardo Viegas e Roberta Nioac Prado

DiretoriaHenri Vahdat, Matheus Rossi e Sidney Ito

Superintendente GeralHeloisa Belotti Bedicks

Produção e Coordenação da NewsletterJornalista responsável: Maíra Sardão (MTB 42968)

Texto: Sandra Nagano

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Além disso, segundo ele, as informações correm com grande velocidade, e os investidores devem saber relatar com clareza e transparência. “Principalmente hoje com a rapidez dos meios de comunicação, tal como o Twitter”.

Perenidade dos negócios

A necessidade de adoção de um modelo de Governança pelas companhias, na percepção de Barbosa, é um caminho sem volta. “Tem três razões para as empresas adotarem boas práticas de Governança: convicção, conveniência e por constrangimentos, porque não dá mais para não adotá-las. Mas o fato é que todos caminham para mesma direção.”

Para ele, ainda existe no mundo corporativo um falso dilema em que ou se opta pela Governança ou pelos ganhos financeiros. “Empresas com melhor Governança têm melhores resultados, pois elas gerenciam melhor as despesas, conflitos e interagem melhor com a sociedade”, explica o executivo da Abril S.A. Desta forma, as companhias estariam contribuindo para a formação de seus próprios valores e caminhando para sua manutenção no mercado.

E essa longevidade desejada pelos administradores e investidores, estaria acompanhada pelo conceito mais amplo da sustentabilidade. Barbosa revisita uma clássica frase do economista Milton Friedman que dizia que “os negócios dos negócios são negócios”. “Ele dizia que valor de uma empresa nada mais é que a perspectiva de resultado futuro trazido ao valor do presente. Ora, se você não tem uma proposta de negócio sustentável é obvio que sua empresa não tem valor. Eu entendi que o que Friedman disse como ‘negócio dos negócios são negócios sustentáveis’. É algo que posso fazer hoje, amanhã, ano que vem, no outro, e é isso que dá uma perspectiva grande à empresa”, analisa.

Ele entende também que a questão da sustentabilidade está incitando as organizações a inovarem. “As empresas vêm com inovações em materiais, em processos, formas de gestão, entendendo que estar conectado às demandas da sociedade não é um fator de restrição, mas um fator de inspiração para inovação”.

Consequência a todos

Uma das mensagens deixadas pelos painelistas desta sessão é de que o mundo dos negócios não pode mais apenas se fincar no foco dos resultados financeiros. É preciso transpor para além dos portões da organização, pois é do outro lado dessa fronteira que está o grande fiscal e regulador do futuro: a sociedade, também chamada por um expectador do painel como o acionista virtual. E um grande passo para isso se dará por meio do aperfeiçoamento da Governança.

“Toda empresa tem de prestar contas para a sociedade, pois usa seus recursos, mão de obra, logística, espaço. A boa Governança é libertadora, pois dá mais transparência, perpetuidade, independente se é uma organização sem fins lucrativos, familiar, capital fechado ou aberto. Todos saem ganhando”, conclui Barbosa.