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1/37 Raio-X do sistema penal Raio-X do Sistema Penal: do modelo de guerra ao abolicionismo copyright (c) 1995 LINJUR Proibidas alterações sem o consentimento por escrito do autor. Reprodução e distribuição autorizadas desde que mantido o copyright. É vedado o uso comercial sem prévia autorização do autor.

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Page 1: 1/37 Raio-X do sistema penal Raio-X do Sistema Penal: do modelo de guerra ao abolicionismo copyright (c) 1995 LINJUR Proibidas alterações sem o consentimento

1/37Raio-X do sistema penal

Raio-X do Sistema Penal: do modelo de guerra ao

abolicionismo

copyright (c) 1995 LINJUR

Proibidas alterações sem o consentimento por escrito do autor.

Reprodução e distribuição autorizadas desde que mantido o copyright.

É vedado o uso comercial sem prévia autorização do autor.

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2/37Raio-X do sistema penal

UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINACENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICASLABORATÓRIO DE INFORMÁTICA JURÍDICA

Equipe:

Alberto Pinho Amarilho

Marcelo Coral Xavier

Professor Orientador: Samyra H. Naspolini

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O Sistema Penal vigente utiliza-se da criminologia positivista baseada no

paradigma etiológico de delito

nesta perspectiva, o crime:– é entendido como um dado pré-constituído à

reação social– é praticado por indivíduos que tem tendência a

delinqüir– é uma patologia social que deve ser extirpada

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O discurso legitimador do Sistema Penal privilegia duas funções

segurança social ressocialização dos criminosos

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Entende-se segurança social como um estado de relativa paz em que

a violência foi reduzida os direitos fundamentais são

respeitados confiabilidade na Justiça Criminal

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É preciso ressaltar que a violência de que se fala deve ser entendida e

analisada tanto em nível privado, presente nas relações inter-individuais, como em nível

institucional, presente nas relações entre o Estado e os indivíduos.

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Dados que comprovam a incapacidade estrutural do Sistema Penal de lograr a

segurança social (I)

275.000 mandados de prisão não cumpridos, enquanto temos 129.000 indivíduos encarcerados

formação de verdadeiros Estados (com códigos de conduta próprios) nas favelas dos grandes centros urbanos

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Dados que comprovam a incapacidade estrutural do Sistema Penal de lograr a

segurança social (II)

nascimento da indústria do seqüestro desconfiança no trabalho da polícia realização de chacinas por grupos de

extermínio, inclusive com a participação de membros da polícia

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Dados que comprovam a incapacidade estrutural do Sistema Penal de lograr a

segurança social (III)

armas mais sofisticadas em mãos de criminosos do que em mãos da polícia

medo generalizado na sociedade espancamento e tortura de presos desrespeito institucional aos Direitos Humanos

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Ao lado da não promoção da propalada segurança social existe uma subprodução de indivíduos

ressocializados, entendendo-se por ressocialização o processo de

reinserção, com êxito, do ex-criminoso na esfera de convívio social.

Isto é denotado, principalmente, pelas condições de vida nos presídios e

penitenciárias, que geram um alto índice de reincidência.

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Dados que comprovam a não ressocialização (I)

(Sistema Penitenciário do RS)

superlotação: 11500 presos--7000 vagas corrupção:

– compras de vaga em instituições do interior;– tráfico de armas e tóxicos dentro das instituições;– desvio dos alimentos destinados aos presos;– reiterado descumprimento da LEP (Lei das

Execuções Penais).

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Dados que comprovam a não ressocialização (II)(Sistema Penitenciário do RS)

apenas 10% das instituições penais oferecem trabalho

inexistência de assistência social:– para o preso;– para a família do preso.

inúmeras rebeliões

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Dados que comprovam a não ressocialização (III)

(Sistema Penitenciário RS)

freqüente reincidência 40% das mulheres e 30% dos homens

encarcerados são portadores do vírus HIV

Fonte: Palestra proferida por Marco Scapini, Juiz de Direito SP, no I Seminário de Alternativas ao Sistema Penal (Salvador, 17-19 de novembro de 1995).

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Conceito de Crise no Sistema Penal

três idéias:– a crise não decorre apenas da impossibilidade

material do Estado em realizar as funções declaradas do sistema

– a crise é proveniente da evidência do esgotamento do discurso que legitima o sistema

– portanto, o Sistema Penal em si não está em crise

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Funções Declaradas (I)

conclui-se que o Sistema Penal é ineficaz na atuação das funções declaradas pelo discurso que tenta legitimá-lo

há, portanto, uma profunda incongruência entre o que o Sistema Penal representa e o que ele diz que representa

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Funções Declaradas (II)

malgrado tal crise de discurso, esse modelo de Sistema Penal (Modelo de Guerra) continua se reproduzindo, denotando uma funcionalidade diversa da declarada

contudo, no imaginário social, ainda vige a idéia de que é o sistema penal o responsável pela segurança

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Perfil do Modelo de Guerra (I)

cultura autoritária do Poder Judiciário e das polícias

militarização das polícias e conseqüente visão do cidadão como inimigo interno

necessidade de apontar e reproduzir os inimigos (clientela típica do sistema)– estigmatização de determinada classe

social (pobres), raça (negra), profissões (prostitutas), etc.

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Perfil do Modelo de Guerra (II)

construção do medo e do perigo sociais para atuarem como justificadores do sistema no imaginário social

apresentação do Sistema Penal como suficiente e único, capaz de promover a segurança social

identificação do Sistema Penal com a ORDEM, e sua ausência com o CAOS

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Agentes do Modelo de Guerra

mídia Poder Legislativo polícias Poder Judiciário

– julgamento– execução

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Papel da Mídia criar uma visão estereotipada do

criminoso apontar os inimigos internos incutir medo e pânico no meio social insistir num aumento do rigor das penas

como forma de extinguir a criminalidade justificar, no nível do imaginário social, a

existência do sistema penal

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Papel do Legislativo

definir as condutas que são consideradas criminosas pela moral social dominante

impor as penas correspondentes direcionar os tipos penais a determinados

estereótipos presentes no imaginário social

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Papel das polícias

fazer uso da violência, dita legítima, para responder ao pânico social

identificar e prender os indivíduos previamente estigmatizados

reproduzir os preconceitos, econômicos, raciais, etc.

dar a aparência de que existe para manter a ordem institucional

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Papel do Judiciário (I - julgador)

identificar os indivíduos que se adeqüem aos estereótipos

processar e julgar esses indivíduos e não propriamente suas condutas

condenar os indivíduos que se subsumem ao estereótipo de criminoso presente no imaginário dos operadores jurídicos

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Papel do Judiciário (II - julgador)

separar os indivíduos maus dos indivíduos bons

criar um sentimento de segurança ao condenar os criminosos

passar à população a idéia de que a justiça está sendo realizada

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Papel do Judiciário (I -execução)

estigmatizar os criminosos mais perigosos, cujos crimes implicam encarceramento

destruir a dignidade dos presos, baseando sua atuação numa lógica de poder hierarquizada

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Papel do Judiciário (II -execução)

reprodução das relações de dominação presentes na sociedade

produzir cidadãos de segunda classe transmitir a idéia de segurança

proveniente da segregação dos criminosos

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Processo de Seletividade

dentro do modelo de guerra, existe um processo que seleciona os indivíduos mais propensos a sofrer a imposição das sanções penais

didaticamente, pode ser dividido em três etapas

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Processo de Seleção

C rim ina liza ç ã o

P rimá r ia S ec undá r ia T e rc iá r ia

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Criminalização Primária

é realizada pelo Poder Legislativo quando elabora, vota e aprova as leis

consiste no etiquetamento das condutas sobre as quais recairão as sanções penais

reflete a moral dominante da classe social hegemônica

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Criminalização Secundária

é realizada pela Polícia quando faz investigações e diligências, realiza prisões e redige o inquérito policial

consiste em limitar seu campo de atuação sobre as classes estigmatizadas como propensas a delinqüir

reproduz os preconceitos sócio-raciais

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Criminalização Terciária (I)

é realizada pelo Poder Judiciário quando o Estado-juiz procura subsumir as condutas aos tipos legais

consiste em limitar o campo de abrangência da norma penal a determinados sujeitos ativos

resulta na criação de uma verdadeira clientela penal

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Criminalização Terciária (II)

é realizada pelo Poder Judiciário quando o processo penal está em sua fase de execução

consiste em encarcerar somente aqueles rotulados de socialmente perigosos

enseja a formação de um exército de criminosos nas penitenciárias os quais irão retroalimentar o imaginário social

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Paradigma da reação social

quatro momentos:– criminalidade não é qualidade intrínseca do

indivíduo, mas resultado do processo de seleção– todos os indivíduos praticam condutas

consideradas criminosas– construção do controle social através da

estigmatização de indivíduos– estigmatização gerada pela moral da classe social

hegemônica

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Funções Latentes (I)

três momentos:– percepção de que existem funções não

declaradas do Sistema Penal– percepção de que são as funções latentes as

verdadeiras funções do Sistema Penal, para as quais ele foi criado

– percepção de que o Sistema Penal desempenha com êxito essas funções

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Funções Latentes (II)

são elas:– constituir a definição da conduta desviante– gerar e gerir a criminalidade, de modo a

expressar e reproduzir a desigualdade social

– manutenção do status quo

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Abolicionismo

conceito– corrente de pensamento que pretende abolir o

Sistema Penal como regulador das condutas e relações sociais

justificativas– - o Sistema Penal encarcera o perigo apenas

simbolicamente– - não existe segurança

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Para saber mais Bibliografia

– Foucault, Michel. Vigiar e punir.– _____________. Microfísica do poder.– Baratta, Alessandro. Criminologia crítica e crítica do Direito

Penal– Hulsmann, Louk. As penas perdidas.– Zaffaroni, Raul Eugênio. Em busca das

penas perdidas.– Andrade, Vera R. Sistema Penal e Dogmática Penal: Em

busca da segurança jurídica prometida.