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    Utilizao de aos inoxidveis em implantes

    BIT Boletim Informativo de Tecnovigilncia, Braslia, Nmero Especial, dez 2011 - ISSN 2178-440X

    1

    Utilizao de aos inoxidveis em implantes

    Buss GAM1; Donath KS

    2; Vicente MG

    1

    1Unidade de Tecnovigilncia NUVIG/Anvisa2

    Gerncia de Materiais GGTPS/Anvisa

    Introduo

    Os requisitos gerais para a seleo de

    materiais utilizados em implantes cirrgicos

    devem levar em considerao, alm dos

    requisitos e efeitos de fabricao, as reaes

    possveis de materiais de implantes com

    tecidos humanos e fluidos corpreos,

    reaes com outros materiais, possveis

    efeitos de radiao e campos magnticos e

    eletromagnticos sobre o material.

    Aos inoxidveis utilizados em

    produtos implantveis devem ter

    propriedades mecnicas e fsicas adequadas,

    tais como alta resistncia mecnica, baixo

    teor de impurezas e baixa permeabilidade

    magntica. Alm disso, tais aos tambm

    devem possuir considervel resistncia

    corroso quando expostos aos fludos

    corpreos e agentes de limpeza e

    desinfetantes, bem como a uma variedade de

    tcnicas de esterilizao.

    Existem inmeros tipos de aos

    inoxidveis para diversas aplicaes, desde

    aos para aplicaes gerais, instrumentos,

    panelas, tubulaes, at os aos para

    aplicaes espaciais e para utilizao em

    produtos implantveis. As nomenclaturas e

    classificaes destas ligas metlicas tambm

    variam, sendo possvel caracteriz-las por

    meio das designaes: Society of

    Automotive Engineers (SAE), American

    Iron and Steel Institute (AISI), Unified

    Numbering System for Metals and Alloys

    (UNS) e normas tcnicas internacionais

    (ASTM e ISO).

    As designaes SAE de aos so muito

    utilizadas na rea aeroespacial e pelo setor

    automotivo, as AISI so utilizadas como

    referncia para os produtores de ao

    inoxidvel na Amrica do Norte e as normas

    ASTM internacionais so elaboradas pela

    Sociedade Americana para Teste e Materiais

    (American Society for Testing and

    Materials). As normas ISO so baseadas no

    consenso internacional entre experts de

    cada rea de atuao, sendo a NBR ISO a

    verso brasileira da ISO.

    Os aos designados como AISI 316L

    so aos inoxidveis austenticos, com baixo

    teor de carbono, utilizados para inmeras

    aplicaes. No requisito composio

    qumica apresentam uma faixa ampla de

    concentraes de elementos qumicos, de tal

    forma que um ao que atende ao requisito

    AISI 316L pode se enquadrar nas

    especificaes de diferentes normas, tais

    como: ASTM A240, ASTM A276, ASTM A

    269, ASTM F138 e ISO 5832-1 (NBR ISO

    5832-1, no Brasil). Desta forma, as

    especificaes trazidas pelas normas so

    importantes para a escolha do ao mais

    adequado para cada aplicao.

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    BIT Boletim Informativo de Tecnovigilncia, Braslia, Nmero Especial, dez 2011 - ISSN 2178-440X

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    Diante da necessidade de melhoria dos

    aos AISI 316L para aplicao em implantes

    cirrgicos, foram desenvolvidos os aos

    conforme normas ISO 5832-1 (NBR ISO

    5832-1), ASTM F138 e ASTM F139,tambm designados como aos 316LVM.

    Estes aos so obtidos a partir do ao AISI

    316L sob processo de refuso ESR/VAR, o

    que garante ao produto, alm do controle

    perfeito da composio qumica, uma

    elevada homogeneidade da estrutura e alto

    grau de pureza - reduzida presena de

    microincluses no-metlicas. Teores decromo e molibdnio mais elevados garantem

    uma maior resistncia corroso por pites

    nestes aos, com relao a outros aos AISI

    316L.

    Alm dos aos ISO 5832-1, ASTM

    F138 e ASTM F139, tradicionalmente

    utilizados para aplicao em implantes

    cirrgicos, existe ainda o ao com alto teorde nitrognio, o qual pode ser utilizado na

    fabricao de implantes cirrgicos conforme

    as normas tcnicas ISO 5832-9 (NBR ISO

    5832-9) e ASTM F1586.

    Corroso em aos

    A resistncia corroso umparmetro fundamental para a escolha de

    uma liga metlica utilizada na fabricao de

    um produto implantvel, uma vez que os

    fludos biolgicos presentes no corpo

    humano possuem alto poder corrosivo.

    Somente determinados tipo de aos

    inoxidveis podem ser utilizados como

    matria-prima para a fabricao de prtese

    implantveis, j que nem todos suportam tais

    condies.

    A corroso de uma pea metlica

    implantada pode trazer diversos resultados

    negativos para o paciente, dentre eles aquebra do implante e a liberao de ons

    metlicos indesejveis no organismo. No

    segundo caso, o produto da corroso do

    implante pode causar mudanas na

    histologia do tecido local, tanto por efeitos

    txicos diretos quanto por uma

    hipersensibilidade local. Nquel, cobalto e

    cromo, conhecidos causadores de alergias,podem ocasionar respostas biolgicas

    contrrias do tecido localizado prximo ao

    implante, levando at mesmo perda de

    uma parte de uma articulao implantada.

    Por essas e outras razes, os materiais para

    implante precisam ter uma boa resistncia a

    corroso.

    A elevada resistncia corroso dosaos inoxidveis se deve, principalmente, ao

    seu elevado teor de cromo (acima de 11%):

    o cromo presente na superfcie do ao reage

    quimicamente com oxignio, formando uma

    fina camada de xido de cromo (CR2O3)

    sobre o metal, denominada camada de

    passivao, a qual confere proteo contra

    agentes corrosivos. Em prteses implantadasa camada de passivao protege o metal

    contra o ataque corrosivo de ons cloreto,

    presentes no sangue e nos demais fludos

    biolgicos. A formao de uma camada de

    passivao muito delgada, bem como a

    presena de impurezas no ao, so fatores

    que contribuem para a dissoluo da pelcula

    de xido de cromo em pontos especficos da

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    superfcie do metal, tornando o material

    susceptvel a diferentes tipos de corroso.

    Durante o processo de fabricao de

    um ao, a adio de molibdnio, em teores

    acima de 2%, permite a formao de umacamada de passivao mais resistente a

    meios salinos agressivos. Um baixo teor de

    carbono tambm inibe a corroso - na

    presena de molibdnio, o carbono pode

    reagir e formar carbonetos de cromo, os

    quais tendem a precipitar nos contornos dos

    gros e enfraquecer a camada de passivao

    do metal.Em um dos tipos mais freqentes de

    corroso em aos, a corroso por pites,

    ocorre o aparecimento de minsculos pontos

    (pites) de brechas na camada de

    passivao, os quais tornam a superfcie

    metlica susceptvel ao ataque de

    substncias corrosivas. Em funo do

    progresso da corroso nestes pontos e dastenses mecnicas cclicas s quais as

    prteses implantadas normalmente so

    submetidas, os pites podem evoluir para

    rachaduras maiores, levando ruptura da

    prtese. Alm da corroso por pites, a

    quebra da camada de passivao tambm

    pode levar a outros tipos de corroso -

    corroso intergranular, por frestas e sobtenso.

    Portanto, so fatores que podem

    favorecer a corroso localizada em aos

    inoxidveis: (i) variaes na composio de

    um ao, na medida em que tais variaes,

    mesmo que pequenas, resultem em teores

    inadequados dos elementos que formam a

    camada de passivao; e (ii) a presena deimpurezas no ao, as quais podem formar

    brechas na camada de passivao ou

    contribuir para a formao de estruturas

    heterogneas no metal. Tais fatores, ao

    contribuir para a corroso localizada dos

    aos inoxidveis, podem influenciarsignificativamente no desempenho de

    prteses implantveis.

    Comparao entre aos

    Em termos de composio qumica o

    ao AISI 316L difere dos aos com

    especificao para utilizao em implantescirrgicos (especificaes ASTM F138,

    ASTM F139 e ISO 5832-1), apresentando

    diferentes faixas de composio para cinco

    elementos qumicos: fsforo, enxofre,

    cromo, molibdnio e nquel (Tabela 1).

    De acordo com a norma ASTM F138,

    h um consenso de que uma estrutura

    metalrgica homognea superior emtermos de resistncia corroso e fadiga

    mecnica. Tendo em vista atender tal

    consenso, requisitos para a fabricao de

    aos inoxidveis especiais geralmente

    determinam que estes materiais possuam

    estrutura austentica, com gros finos e de

    tamanho uniforme, livre de ferrita e com

    reduzida presena de incluses, bem comocapacidade de passar em testes de

    susceptibilidade corroso intergranular.

    Os elementos fsforo e enxofre

    geralmente contribuem para a formao de

    fases frgeis (incluses) durante o processo

    de fabricao do ao, reduzindo a

    homogeneidade do metal. Tendo em vista

    que ao AISI 316L possui uma faixa detolerncia maior para o fsforo e enxofre,

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    este pode conter um teor de incluses maior

    do que os aos ISO 5832-1 e ASTM F138

    os quais possuem uma faixa de tolerncia

    menor para estes elementos. Como

    conseqncia, um ao de designao 316L

    pode ter uma estrutura menos homognea e

    mais propensa a corroso e fadiga

    mecnica.

    Tabela 1. Composio (%) dos aos inoxidveis AISI 316L, ISO 5832-1 e ASTM F138/139

    ELEMENTOS AISI 316L ISO 5832-1*

    ASTM F138/ASTM F139

    Carbono (C) 0,03 mx. 0,03 mx. 0,03 mx.

    Mangans (Mn) 2 mx. 2,0 mx. 2 ,00 mx.

    Fsforo (P) 0,045 mx. 0,025 mx. 0,025 mx.

    Enxofre (S) 0,03 mx. 0,010 mx. 0,010 mx.

    Nitrognio (N) 0,010 mx. 0,10 mx. 0,1 mx.

    Cromo (Cr) 16 18 17,0 19,0 17,00 19,00

    Molibdnio (Mo) 2 3 2,25 3,0 2,25 3,00

    Nquel (Ni) 10 14 13,0 15,0 13,00 15,00

    Cobre (Cu) -- 0,50 mx. 0,50 mx.

    Silcio (Si) 0,75 mx. 1,0 mx. 0,75 mx.

    Ferro (Fe) Balano Balano Balano

    * Equivalente norma brasileira NBR ISO 5832-1.

    Com relao ao cromo e molibdnio,

    as faixas de concentrao destes elementos

    nos aos ISO 5832-1 e ASTM F138 so

    mais amplas do que no ao AISI 316L.

    Como so responsveis pela formao da

    camada de passivao na superfcie

    metlica, teores mais elevados destes

    elementos resultam em maior proteo

    contra a corroso. O nquel o elemento

    responsvel pela estabilidade da

    microestrutura do ao. Um menor teor deste

    elemento pode diminuir a homogeneidade

    do ao produzido, tornando-o,

    conseqentemente, mais susceptvel ao

    ataque de substncias corrosivas e mais

    propenso a falhas mecnicas (rompimento).

    A faixa de teor de nquel permitida para os

    aos ISO 5832-1 e ASTM F138 , tambm,

    mais elevada do que a do ao AISI 316L.

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    A relao Cr-Mo tambm importante

    para a categorizao da resistncia

    oxidao de um ao - o nmero PRE (Pitting

    Resistance Equivalent), que a relao entre

    os teores dos elementos cromo e molibdnio,permite avaliar a resistncia de um ao

    corroso por pites. As normas ISO 5832-1,

    ASTM F138 e ASTM F139 estabelecem que

    o nmero PRE deve ser maior que 26, como

    requisito para enquadramento nestes tipos de

    aos. A avaliao deste nmero no um

    requisito na designao dos aos AISI 316L.

    Uma vez que as especificaes decomposio qumica dos aos definem

    faixas de concentrao para os diferentes

    elementos que os constituem, e que tais

    faixas so em parte coincidentes (ver Tabela

    1), um ao com especificao AISI 316L

    pode ser produzido com teores (de

    elementos qumicos) semelhantes aos de um

    ao apropriado para implante (ISO 5832-1ou ASTM F138). No entanto, para o ao

    AISI 316L geralmente no h controle do

    tamanho de gro, do teor de incluses e da

    proporo de cromo/molibdnio,

    responsvel pela garantia da resistncia

    corroso por pites.

    Concluso

    Os aos inoxidveis austenticos com

    baixo teor de carbono e especificaes

    ASTM F138, ASTM F139 e ISO 5832-1

    atendem s exigncias para produtos

    implantveis, tendo em vista a composio

    qumica e os controles microestruturais e de

    impurezas - adequados para garantia de

    propriedades mecnicas e de resistncia corroso. Nos aos de especificao AISI

    316L no h garantia que tais exigncias

    sejam atendidas, ainda que sua composio

    qumica seja semelhante s dos aos ASTM

    F138, ASTM F139 e ISO 5832-1 em muitos

    casos. Os servios de sade devem estar

    atentos para estes detalhes na aquisio de

    implantes cirrgicos, verificandoatentamente as especificaes das matrias-

    primas componentes dos produtos a serem

    adquiridos e escolhendo sempre os materiais

    mais adequados.

    Bibliografia Consultada

    American Society for Testing and Materials - ASTM. Norma ASTM F138-8:2008. Standard Specification

    for Wrought 18Chromium-14Nickel-2.5Molybdenum Stainless Steel Bar and Wire for Surgical Implants

    (UNS S31673).

    American Society for Testing and Materials - ASTM. Norma ASTM F139-8:2008.ASTM F139 - Standard

    Specification for Wrought 18Chromium-14Nickel-2.5Molybdenum Stainless Steel Sheet and Strip for

    Surgical Implants (UNS S31673).

    Araujo TL, Couto AA. Estudo do ao inoxidvel aplicado como implante ortopdico. Revista Mackenzie

    (on-line). Maio. 2004. Disponvel on-line na Internet no link:

    ://http://www.mackenzie.br/fileadmin/Graduacao/EE/Revista_on_line/aco_inoxidavel.pdf. Acesso em

    14 de setembro de 2011.

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    Associao Brasileira de Normas Tcnicas ABNT. Norma ABNT NBR ISO 5832-1:2008. Verso corrigida

    2010. Implantes Cirrgicos - Materiais Metlicos - Parte 1: Ao Inoxidvel Conformado. Especifica as

    caractersticas e os mtodos de ensaio correspondentes para aos inoxidveis conformados para uso na

    fabricao de implantes cirrgicos. Vlida a partir de 01/10/2008.

    Associao Brasileira de Normas Tcnicas ABNT. Norma ABNT NBR ISO 5832-9:2008. Implantes

    Cirrgicos - Materiais Metlicos - Parte 9: Ao inoxidvel conformado de alto nitrognio. Especifica ascaractersticas e os mtodos de ensaio correspondentes para aos inoxidveis conformados contendo uma

    frao mssica de 0,25% a 0,50% de nitrognio para uso na fabricao de implantes cirrgicos para os quais

    so requeridos altos niveis de resistncia mecnica e de resistncia corroso. Vlida a partir de 08/10/2008.

    Virtanen S, et al. Special modes of corrosion under physiological and simulated physiological conditions.

    Acta Biomaterialia. 2008. 4(3), p. 208-213.