1. introduÇÃo - agb
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GEOGRAFIA E CARTOGRAFIA ESCOLAR: como alunos da segunda fase do
Ensino Fundamental percebem os mapas?
Amanda Abadia Felizardo Custódio Mestranda em Geografia, Programa de Pós-Graduação da
Universidade Federal de Goiás Regional - Catalão.
Raphael de Araújo Pinheiro Mestrando em Geografia, Programa de Pós-Graduação da
Universidade Federal de Goiás Regional - Catalão.
Resumo: A linguagem cartográfica não deve se deter a simples copia de mapa, mas buscar
construir representações reais que levem em consideração o que o aluno trás de casa. O objetivo
deste trabalho é propor atividades que possam ser utilizadas como recursos didáticos para
auxilio do ensino-aprendizado da Cartografia na sala de aula. A metodologia adotada foi a
conciliação da teoria com a pratica, onde os alunos tiveram aulas para que fossem estabelecidos
os conceitos da Cartografia para que depois, estes conceitos fossem aplicados em atividades
propostas. A construção e leitura de um mapa não é tarefa simples para quem não possui o
costume, estas habilidades devem ser construídas ao longo e durante toda escolaridade com
exercícios que proporcionem analises e reflexões a respeito da leitura do espaço. Utilizar
brincadeiras e desenhos foi uma forma de apresentar a Geografia de uma maneira mais atraente
aos alunos, e foi possível perceber maior participação e interesse durante o desenvolvimento das
atividades, após as aulas práticas.
Palavras-Chave: Cartografia, Ensino, Geografia.
1. INTRODUÇÃO
A Geografia assim como outras disciplinas que fazem parte do currículo do
Ensino Fundamental e Médio, procura desenvolver no aluno a capacidade de observar,
analisar, interpretar e pensar criticamente a realidade, tendo em vista a sua
transformação. Para a Geografia, fica o dever de levar o aluno a compreender o espaço
que a sociedade produz, as contradições, as relações de produção e a apropriação da
natureza. A Geografia explica como as sociedades produzem o espaço e essa base
territorial, em que as sociedades vão transformando e construindo, implica a
necessidade das habilidades de localização, a orientação e representação. E estas
habilidades são significativas na compreensão do espaço geográfico e a Cartografia é a
base para o entendimento deste espaço.
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Para que o aluno se torne um cidadão consciente do espaço que o circunda,
se faz necessário que ele tenha contato com a linguagem cartográfica, de preferencia
desde o início de sua escolaridade, que aprenda não somente a ler, escrever e contar,
mas também a construir as primeiras noções de espaço.
A linguagem cartográfica não deve se deter a simples copia de mapa, mas
sim na construção de representações reais e levando sempre em consideração o que o
aluno trás de casa. O objetivo deste trabalho é propor atividades que possam ser
utilizadas como recursos didáticos para auxilio do ensino-aprendizado da Cartografia na
sala de aula. Visto também que se quer despertar nos alunos maior interesse pela
disciplina de Geografia trazendo ela para dentro do seu espaço de vivência.
O interesse por essa temática se deu pelo fato de pertencer ao Programa
Institucional de Bolsas de Iniciação a Docência (PIBID/CAPES/UFG), enquanto aluna
de graduação, e já vir pesquisando sobre assunto desde 2011. O local de realização da
pesquisa foi o Colégio Estadual Maria das Dores Campo localizada no bairro de
Ipanema no município de Catalão (GO).
As aulas de Geografia foram classificadas pelos alunos do ensino
fundamental, do Colégio Estadual Maria das Dores Campos como: cansativas, chatas e
que exigem somente uma boa capacidade de memória, mas a Geografia é uma disciplina
que apresenta um leque extenso de possibilidades na produção de atividades dinâmicas,
a utilização de métodos unicamente teóricos deixam as aulas desinteressantes aos
alunos. A sociedade está constantemente passando por transformações e o professor
necessita buscar estar a par destas mudanças, pois só assim ele poderá mediar o que
ensina em sala com a realidade do aluno.
2. ENSINO DE GEOGRAFIA E A CARTOGRAFIA ESCOLAR
Ao longo do tempo, a Geografia foi considerada como uma disciplina de
descrições e de informações, por isso, para ser professor de Geografia, era preciso de
uma memória extraordinária e ter capacidade de decorar inúmeros dados, nomes de
países, rios, montanhas e outros. De acordo com Almeida:
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Essa tendência da Geografia e as correntes que dela se desdobraram
foram chamadas de Geografia Tradicional. Apesar de valorizar o papel
do homem como sujeito histórico, propunha-se, na análise da produção
do espaço geográfico, estudar a relação homem-natureza sem priorizar
as relações sociais. (ALMEIDA, 1989, p.33).
O ensino de Geografia é alvo de diversas discussões, principalmente sobre a
relação teoria/prática, que colocam os professores, em particular os iniciantes, diante
uma crise constante (MARTINELLI, 1991, p. 19). Na busca de uma metodologia que
contribua para a formação de um aluno-cidadão, que não só aprenda os conteúdos
geográficos como também os utilize na reflexão de conceitos aplicados na sua realidade,
substitui-se as aulas puramente de reprodução, por aulas construtivas, que se baseie em
trabalhar com o entorno do aluno. O desafio é trabalhar esta Geografia extensa sem cair
na reprodução de conceitos. De acordo com Almeida (1989) nova perspectiva
considera que não basta explicar o mundo, é preciso transformá-lo.
Segundo Lacoste (1988) a Geografia deve largar seu papel informativo e
partir para a formação de pessoas através da dúvida, dos questionamentos. Para que
serve a Geografia informativa? Para alienar. O conhecimento do território é o ponto
fundamental para dominá-lo, organizar-se sobre ele e organizar os que o desconhecem.
O objetivo principal de estudo da Geografia continua sendo o espaço geográfico. Para
Castrogiovanni (2000) :
Alfabetizar não é apenas repetir, copiar, escrever, alfabetizado é
aquele que se apropria do símbolo e o utiliza para fazer as suas
criações, a sua cultura. Estar alfabetizado na geografia é relacionar
espaço com natureza, natureza com sociedade.
(CASTROGIOVANNI, 2000, p. 51).
Cartografia constitui a base de representação e compreensão do objeto de
estudo da Geografia que é o espaço geográfico (SANTOS, 1978, p.63). A capacidade
de visualização da organização espacial é importante como conhecimento para uma
participação responsável, consciente e possibilidade de propor mudanças alternativas. O
desejo de demarcar o espaço e representá-lo esteve presente desde a origem da vida
social. Duarte (2002), afirma que os mapas eram muito rudimentares e confeccionados
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com as técnicas e materiais disponíveis, mas era o começo de uma caminhada do que
hoje conhecemos como Cartografia.
Desde século XIX, quando a Geografia tornou-se uma disciplina
institucionalizada, seu ensino estava ligado à necessidade desenvolver o sentimento de
nacionalidade e também se pautava na descrição dos fenômenos físicos. Os mapas eram
utilizados para descrever, localizar e exemplificar estes fenômenos. A representação
gráfica, o mapa, está intimamente ligada a Geografia desde os seus primórdios, o que
varia é a importância atribuída aos mapas em cada momento desta trajetória, que por
sua vez, dependia do paradigma vigente. Santos (1978) afirma que:
Uma mudança de paradigma corresponde a uma mudança completa na
visão do mundo, que o novo paradigma deve representar. [...] que
significa uma nova combinação de técnicas [...]. (SANTOS, 1978, p.
159).
A Cartografia teve sua evolução relacionada com as mais significativas
transformações da sociedade e não pode ser entendida nem explicada fora do âmbito do
processo de desenvolvimento das forças produtivas e relações de produção. Para
Simielli (1999) a Cartografia se preocupa atualmente com o usuário do mapa, com a
mensagem transmitida e com a eficiência do mapa como elemento transmissor de
informação. Castrogiovanni (2000) ressalta que,
A preocupação da Cartografia com o mapa e com seu usuário
possibilita que a linguagem cartográfica seja validada como um
instrumento de comunicação, onde o leitor pode, de fato, participar
deste processo, para melhor compreender e representar o espaço.
(CASTROGIOVANNI, 2000, p. 40).
Durante todo o processo de desenvolvimento dos mapas estava nítida a
preocupação com a organização do espaço, o que liga a Cartografia a Geografia.
Quando falamos de alfabetização, rapidamente pensamos em aprender a ler e escrever;
ações relevantes nas funções da escola e fundamentais para a sociedade no que se refere
a sua organização. A alfabetização cartográfica faz parte do processo ensino-
aprendizagem, das séries iniciais, no qual as crianças necessitam vivenciar para serem
capazes de interpretar e elaborar mapas. O aluno precisa pensar o espaço para estar apto
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a elaborar os mapas, que são as formas de representação deste espaço fazendo uso das
escalas, legendas e símbolos. A educação cartográfica nos ensinos fundamental e médio
é relevante para que o aluno adquira uma percepção espacial que permita a ele entender
o espaço que habita. Para entender o espaço é preciso que haja o processo de
alfabetização cartográfica.
Lacoste (1998) ressalta que se vai à escola para aprender a ler, a escrever e a
contar, não se vai a escola aprender a ler um mapa. Para Passini (1994), “A educação
cartográfica ou alfabetização para a leitura de mapas deve ser considerada tão
importante quanto a alfabetização para a leitura da escrita”. Para melhor esclarecer a
respeito da importância de desenvolver aspectos do domínio espacial e sua
representação. Aprender a ler um mapa pode contribuir e muito na formação de um
cidadão autônomo, que saiba se deslocar em diferentes espaços comuns, ou não, a ele.
Ler e escrever em Geografia exige domínio da linguagem cartográfica, e
para que o aluno adquira este domínio é preciso que ele aprenda a construir
representações do espaço. Segundo Almeida (2011) um aluno, para chegar a ver uma
representação do espaço como possibilitadora de estudos geográficos, precisa se dar
conta dos problemas que um cartógrafo encontra para elaborar um mapa, antes de ser
um decodificador ele precisa ser um codificador, o indivíduo deverá confrontar as
questões que um cartógrafo encontra: projeção, escala, simbologia e localização.
3. OBJETIVOS
Este trabalho teve como objetivo fazer com que os alunos do 7º ano do
colégio Maria das Dores Campos tenham uma familiarização com os mapas; construção
de noções cartográficas; compreensão de como ocorre à representação gráfica do espaço
e construção de uma leitura do espaço em que está inserido (cotidiano). Lacoste (1988)
ressalta o descompromisso da escola em relação à educação cartográfica, afirma que se
vai à escola para aprender a ler, a escrever e a contar. Por que não para aprender a ler
um mapa? Aprender a ler um mapa pode contribuir e muito na formação de um cidadão
autônomo, que saiba se deslocar em diferentes espaços comuns, ou não, a ele.
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A familiarização com os mapas é essencial desde as series inicias,
respeitando as capacidades cognitivas do aluno, com produção de atividades bem
simples como, produzir de um mapa do percurso que o aluno faz de casa para escola.
Mas o que o aluno vai aprender com isso?
Segundo Francischett (1999) a sala de aula, a escola, a casa e todos aqueles
espaços que as crianças conhecem do ponto de vista de sua distribuição espacial
constituem boas escolhas para que elas façam a representação. E para e que estas
atividades venham a dar resultados é preciso que o professor se posicione e questione as
produções dos alunos, avaliando forma, tamanho, posição, orientação, distância, direção
e produção dos objetos e locais representados, confrontando a realidade, gerando
oportunidades para a construção de noções cartográficas. Assim, estabelecer uma leitura
do espaço em que o aluno/sujeito está inserido.
4. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
As atividades desenvolvidas foram pensadas levando em consideração o
valor da Geografia Cartográfica, ampliando e concretizando conceitos iniciais de
localização, orientação e representação. Foram feitas intervenções, uma vez por semana,
primeiramente com aulas assistidas para acompanhamento de conteúdo em duas turmas
de 7º ano. Depois foi dado aos alunos um pequeno questionário com intuito de saber o
que os alunos acreditam ser Geografia e se eles podem utiliza-la em suas vidas fora da
escola.
Este questionário foi a base para explicar aos alunos o objetivo das
atividades que seriam desenvolvidas com eles, que seria explicar a importância de se
conhecer o bairro, o estado e o país onde vive para que possa se tornar um cidadão
consciente do espaço em que vive.
Primeiro foi desenvolvida uma atividade lúdica com os alunos: a brincadeira
da Cabra-Cega Geográfica. Os alunos foram divididos em dois grupos:
Grupo A: meninas
Grupo B: meninos
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Após a divisão foi escolhido um representante de cada grupo, ambos
tiveram os olhos vendados, e desta forma teriam que se deslocar a procura de peças
espalhadas pelo pátio guiados pelo som das vozes dos colegas, que por sua vez, teriam
que orientar seu representante usando os pontos cardeais. A atividade foi utilizada para
explicar sobre a dificuldade que temos de nos deslocarmos por meio de orientações
cartográficas.
De volta a sala foi pedido aos alunos que fizessem um mapa do trajeto de
casa a escola, posteriormente esses desenhos foram utilizados para explicar o que uma
representação gráfica precisam apresentar para ser informativa como: título, legenda,
escala, proporcionalidade e orientação. Nesta parte da atividade foi mostrado aos alunos
diferentes tipos de representações gráficas e mapas com diversas escalas. E para
finalizar os alunos fizeram uma nova representação, desta vez da sala de aula, onde
teriam que e lavar em consideração os conceitos já explicados. Nas fotos abaixo é
possível observar as etapas da atividade.
Foto 1 - Brincadeira da cabra-cega geográfica.
Fonte: Pesquisa de campo (set. 2013). Org: CUSTÓDIO, A. A. F.
Foto 2 - Distribuição dos materiais.
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. Fonte: Pesquisa de campo (set. 2013). Org: CUSTÓDIO, A. A. F.
A escolha das atividades se baseou nas obras de Almeida (2011) (2008)
(2004), uma autora que possui trabalhos voltados ao ensino de Cartografia no Ensino
Fundamental, principalmente no âmbito da Alfabetização Cartográfica. Vale ressaltar,
que as atividades propostas nesta pesquisa não tinham o objetivo de trabalhar a
Alfabetização Cartográfica, mas sim desenvolver conteúdos de Cartografia com base
no pressuposto de que estes alunos já haviam tido uma aproximação alguns conceitos
básicos.
Foto 3 - Aluna fazendo o mapa do trajeto escola/casa.
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Fonte: Pesquisa de campo (set. 2013). Org: CUSTÓDIO, A. A. F.
Figura 1 - Mapa do trajeto escola/casa grupo 1
Fonte: Pesquisa de campo (nov. 2013). Org.: CUSTÓDIO, A. A. F.
Figura 2 - Mapas do trajeto escola/casa grupo 1
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Fonte: Pesquisa de campo (nov. 2013). Org.: CUSTÓDIO, A. A. F.
Figura 3 - Planta da sala de aula A. L.
Fonte: Pesquisa de campo (nov. 2013). Org.: CUSTÓDIO, A. A. F.
Figura 4 - Planta da sala de aula T. S.
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.Fonte: Pesquisa de campo (nov. 2013). Org.: CUSTÓDIO, A. A. F.
5. RESULTADOS
Com a conclusão dos desenhos dos alunos foi feita uma exposição na
própria escola Maria das Dores, no horário do recreio. Nesta exposição os alunos
puderam apreciar suas produções e também as produções dos demais colegas.
A finalidade da exposição foi fazer com que os alunos observassem
atentamente seus desenhos, proporcionando uma conversa entre eles sobre o que
representaram. Esta atividade também facilitou a observação e identificação de
diferentes formas de representação do espaço.
Posteriormente, houve a realização de uma nova aula expositiva, desta vez o
tema foi “Os elementos necessários para a produção de um mapa”. Lembrando, que
basicamente os mapas devem possuir um conjunto de elementos que possibilitem a sua
fácil identificação e respectiva utilização, que são os seguintes: título, orientação,
legenda e escala. E durante as aulas foram trabalhados todos estes, explicando por que
deviam ser utilizados e como utiliza-los. Para melhor demonstração foi apresentados aos
alunos uma pequena variedade de mapas com diferentes informações e escalas, para
melhor visualizassem o que foi exposto nas aulas.
A atividade gerou maior envolvimento dos alunos se tratando de uma aula
lúdica com desenvolvimento de jogos e desenhos. Foi possível perceber após as aulas
práticas o surgimento de dúvidas que não ocorreram durante as aulas expositivas. O
saldo final pode ser classificado como positivo, pois o principal objetivo foi demonstrar
aos alunos a utilidade dos conceitos básicos da cartografia e realizar uma aula de
geografia dinâmica, mas sem excluir as aulas expositivas, que são essenciais a qualquer
disciplina.
REFERÊNCIAS.
ALMEIDA, R. D. e PASSINI, E. Y. Espaço geográfico: ensino e representação. São
Paulo: Contexto,1989.
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CASTROGIOVANNI, Antônio Carlos (ORG). Ensino de geografia: Práticas e
textualizações no cotidiano. Porto Alegre: Mediação, 2000.
DUARTE, Paulo Araújo. Fundamentos de Cartografia. Florianópolis: Ed. da UFSC,
2002.
FRANCISCHETT, Mafalda Nesi. A Cartografia no Ensino de Geografia:
Construindo os Caminhos do Cotidiano. ANAIS do Evento Fala Professor, Curitiba -
18 a 13 de Julho de 1999.
LACOSTE, Yves. A geografia – isso serve, em primeiro lugar para fazer guerra.
Tradução Maria Cecília França – Campinas, SP: Papirus, 1988.
MARTINELLI, M. Curso de Cartografia Temática. Contexto: São Paulo, 1991.
PASSINI, Elza Yasuro. Alfabetização Cartográfica e o livro didático: uma análise
Crítica. Belo Horizonte: Editora Lê, 1994.
SANTOS, M. A. Natureza do Espaço. Técnica e Tempo. Razão e Emoção. 2º
Edição. São Paulo: Hucitec, l978.
SIMIELLI, Maria Elena Ramos. Cartografia no ensino fundamental e médio. In:
CARLOS, Ana Fani Alessandri (org.). A Geografia na sala de aula. São Paulo:
Contexto, 1999. – (Repensando o ensino).