05 zl entre margens e centro 070210

Upload: andreza-reis

Post on 05-Apr-2018

219 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

  • 7/31/2019 05 ZL Entre Margens e Centro 070210

    1/35110

    ARQTEXTO1

    4

    LINA BO BARDI, ENTRE MARGENS E CENTROSLINA BO BARDI, BETWEEN MARGINS AND CENTERS

    Zeuler de Almeida LimaTraduo portugus-ingls: Zeuler de Almeida Lima

    1

  • 7/31/2019 05 ZL Entre Margens e Centro 070210

    2/35111

    ARQTEXTO14

    Lina Bo Bardi provavelmente teria gostado de traba-lhar com Photoshop, o programa de edio de imagens,se o tivesse conhecido. Ela tinha jeito para o desenhoe tambm para recortar, colar e retocar imagens. Entreos incontveis documentos que colecionou durante todaa vida, ela guardou uma srie de trabalhos do incio desua prtica profssional que servem de testemunha de suavivacidade visual e espontaneidade imaginativa. Ela cos-

    tumava alterar imagens quando era ilustradora e designergrfca para vrias revistas na Itlia, durante a SegundaGuerra Mundial, antes de se envolver com o projeto deedicios. Enquanto muitos jovens arquitetos italianos luta-vam para encontrar um emprego durante aqueles anos di-ceis da segunda Guerra Mundial, ela se inclinava sobrea mesa no pequeno escritrio na Via Ges, em Milo, cui-dadosamente reorganizando fguras entregues a ela peloscio e amigo Carlo Pagani, incluindo algumas delas comnotas escritas pelo arquiteto Gio Ponti.

    Sua tcnica era simples e efciente. Num tempo emque arquitetos no viajavam muito, as imagens de revis-

    tas j tinham entrado na era da rpida reprodutibilidade.Por exemplo, de um peridico sueco de decorao, LinaBo Bardi recortou uma otografa em preto e branco comvasos apresentados em uma exibio em Estocolmo, e sis-tematicamente os colou em um pedao branco de papel.Uma vez seco, ela pintou o undo da imagem com guachee ajustou o padro da toalha e a qualidade da luz, crian-do uma nova imagem a partir da original. Na mesmaolha, ela marcou as dimenses fnais nas laterais das oto-grafas com um lembrete manuscrito ao editor e uma novalegenda anunciando que os vasos elegantes de cermicatem ormas novas e arrojadas.1 De outra revista de deco-rao, desta vez de procedncia mais prxima - a Sua -ela virou a imagem vertical de uma cozinha moderna paraa horizontal, usando o mesmo mtodo. A otografa origi-nal ocalizava, no centro, os armrios personalizados demadeira. A nova imagem, modifcada, conduzia os olhosdo observador para as supercies de trabalho periri-cas e para os eletrodomsticos da cozinha. Lina Bo Bardicortou o p-direito do cmodo e literalmente estendeu oselementos horizontais, incluindo uma parede lateral e au-mentando a geladeira. Algumas destas imagens empres-tadas e alteradas oram usadas para ilustrar artigos na

    revista Lo Stile, cujo objetivo era educar consumidores declasse mdia e alta a considerar o despojamento modernoe evitar mobiliar suas casas moda antiga. O artigono assinado Semplicit (Simplicidade), que aparecena edio de setembro de 1941, bastante claro sobreas intenes da publicao. Ele revela as ontes visuais da

    Lina Bo Bardi would probably have enjoyed workingwith Photoshop, the graphics editing program, had sheknown it. She had a knack or drawing and also or cut-ting, pasting and touching up pictures. Among the coun-tless documents she collected throughout her lie, she kepta series o works rom her early proessional practice thatserve as witnesses to her visual keenness and imaginati-ve spontaneity. She used to alter images as an illustrator

    and graphic designer or several magazines in Italy du-ring World War II beore becoming a ully edged archi-tect. While many young Italian proessionals struggled tofnd an occupation during those difcult years, she leanedagainst the desk in her makeshit ofce on Via Ges, inMilan, careully rearranging pictures, which her colleagueand riend Carlo Pagani handed to her, including a ewwith notes written by architect Gi Ponti.

    Her technique was simple and efcient. In a time whenarchitects didnt travel much, images and magazines hadalready entered the era o ast reproducibility. From aSwedish decoration periodical, Bo Bardi cut a black and

    white photograph o vases presented in an exhibition inStockholm and systematically glued it to a piece o whitepaper. Once it was dry, she used gouache to paint overthe background and adjust the table cloth pattern andlight quality o the picture, creating a new image out othe existing one. On the same worksheet, she marked theexact fnal dimensions on the sides o the photographswith a hand-written reminder to the publisher and a newcaption describing that the elegant ceramic vases havenew and bold orms.1 From another decoration magazine,this time coming rom a closer location - Switzerland - shechanged a large vertical picture o a modern kitchen into ahorizontal ormat by using the same method. The originalimage ocused on the customized wooden cabinets at itscenter. Her modifed picture moved the viewers eyes to theperipheral working suraces and appliances in the kitchen.She cropped the room height and literally extended thehorizontal elements, which included adding a side walland enlarging the rerigerator. Some o these imageswere used to illustrate articles in Lo Stilemagazine, whosepurpose was to educate upper and middle class consumersto consider modern plainness and avoid urnishing theirhouses in an old style. The unsigned article Semplicit

    (Simplicity) that appears in the September 1941 issue isvery clear about the publications intentions; it revealsthe visual sources rom Swedish magazine Svenska Hem(Swedish Home), inviting the viewer, Look at the pictures:with simple means, one can compose a corner o clearand resting intimacy [] without exhibitionism [] but

    1 Desenho La camera dellarchitettoFonte: catlogo LBB, 1993.1 Sketch La camera dellarchitettoSource: LBB catalog, 1993.

  • 7/31/2019 05 ZL Entre Margens e Centro 070210

    3/35112

    ARQTEXTO1

    4

    2 Folha avulsa da revista Innen Dekoration reto-cada (cozinha).Fonte: Revista Lo Stile(Itlia, 1941-2).2 Cut Sheet magazine Innen Dekoration retouched(kitchen).Source: Lo StileMagazine (Italy, 1941-2).

    3 Pgina com artigo Lantico nella casa doggi(provavelmente nmero 9 ou 10).Fonte: Revista Lo Stile(Itlia,1941).3 Article page with Lantico nella casa doggi

    (probably number 9 or 10).Source: Lo StileMagazine (Italy, 1941).

    4 Pgina com artigo Architettura e Natura(provavelmente nmero 9 ou 10).Fonte: Revista Domus (Itlia, 1943) no. 191,pgina 464.4 Article page with Architettura e Natura (pro-bably number 9 or 10).Source: Domus Magazine (Italy, 1943) no. 191,page 464.

    2

    3 4

  • 7/31/2019 05 ZL Entre Margens e Centro 070210

    4/35113

    ARQTEXTO14

    revista sueca Svenska Hem (Casa Sueca), convidando oobservador a repensar seu repertrio ao dizer: Olhe asfguras: com meios simples, pode-se compor um canto deintimidade clara e relaxante [...] sem exibicionismo [...]mas com o mesmo gosto simples, o mesmo sentido de vidaque sinal de grande civilidade.2

    Atravs deste tipo de trabalho grfco, Lina Bo Bar-di transormava imagens existentes. Ela as oerecia em

    novos arranjos e criava novos signifcados. Desta orma,ela desenvolveu uma rica e diversifcada prtica e a ha-bilidade para testar e reconciliar vocabulrios variadosdurante sua vida profssional. A complexidade de seu tra-balho no pode ser reduzida s sua primeira experin-cia com design na Itlia, mas ela serve de alegoria parauma mente curiosa e uma sensibilidade aberta a justapordierentes realidades. Reinveno e emprstimo sem com-promissos oram oras maiores por trs do seu trabalho.Bo Bardi usou um procedimento semelhante nos trabalhoseditoriais que desenvolveu posteriormente no Brasil e nasinstalaes e exposies que organizou, colocando lado

    a lado objetos coletados dos mais diversos e de dierentesprocedncias. Mesmo seus trabalhos arquitetnicos maisexperimentais, particularmente os desenvolvidos no fnaldos anos 1950 e nos anos 1960 demonstram como eladeliberadamente transormava as supercies planas devolumes geomtricos simples com padres e texturas, re-gulares ou irregulares, de materiais orgnicos e minerais.Sua abordagem do projeto em geral contradizia o tabu deque esquemas abstratos deveriam se opor a idias fgurati-vas, seja no tratamento de achadas de seus prdios comosupercies bidimensionais e grfcas ou na introduo denovos elementos visuais e ormais em prdios existentes.

    Bo Bardi iniciou-se na arquitetura mais guiada poruma sensibilidade visual e compositiva do que por uminteresse pela histria, pelas tcnicas construtivas ou pelapercepo espacial. Ela tinha amiliaridade com princ-pios artsticos e compositivos desde a primeira inncia,produzindo desenhos e aquarelas com alguma ajuda dopai, que era pintor diletante. Antes de estudar arquitetu-ra, ela cursou o Liceo Artistico na via Ripetta, em Roma,destinada a colegiais interessados em seguir carreira emprofsses da rea visual. Esse tipo de escola preparava,como continua a azer, estudantes planejando ingressar

    em escolas de arte, design e arquitetura - accademia oufacolt - com uma educao de quatro anos. O currculoescolar de Bo Bardi tinha um programa terico e prticointenso, com treinamento em desenho mo livre, geome-tria, composio, histria, pintura e princpios de projetoarquitetnico. As aquarelas, desenhos e esboos que so-

    with the same simple taste, the same sense o lie that issign o great civility.2

    Through this kind o graphic work, Lina Bo Bardi trans-ormed existing images. She displayed them in a new ar-rangement and created new meanings. She developed arich and varied practice and the ability to test and reconcilediverse vocabularies along her lietime as a designer. Thecomplexity o her work cant be reduced to her early de-

    sign experience in Italy, yet it serves as an allegory to hercurious mind and sensitivity to bringing together dierentrealities. Makeover and almost careree borrowing weremajor orces behind her work. Bo Bardi used a similar pro-cedure in the editorial works she later developed in Braziland in the installations and exhibitions she organized withjuxtaposed collected objects. Even her most experimentalarchitecture works, particularly the projects she developedin the late 1950s and the 1960s demonstrate how she de-liberately transormed the at suraces o simple geometricvolumes with regular and irregular patterns and textures omineral and organic materials. Her approach to design in

    general contradicted the taboo that abstract layouts shouldbe at odds with fgurative ideas, either in the treatment othe elevations o buildings as painting canvases or in theintroduction o new visual and ormal elements into exis-ting buildings.

    Bo Bardi entered architecture primarily guided by acompositional, visual sensitivity rather than by an interestin construction techniques and spatial perception. She hadbeen amiliar with artistic principles since her early chil-dhood, producing drawings and watercolors with someguidance rom her ather who was a dilettante painter. Be-ore studying architecture, she attended the Liceo Artisticoon Ripetta Street in Rome, geared to teen-agers interestedin pursuing careers in the visual proessions. Italian Liceiprepared, as they continue to do, students planning to at-tend art, design and architecture schools - accademia orfacolt - with a ull-time, our-year high-school education.Bo Bardis academic curriculum oered an intensive practi-cal and theoretical program, training students in ree-handdrawing, geometry, composition, painting, and principleso architectural design and history. The watercolors, dra-wings and sketches that survived her youth attest more di-rectly to her visual skills than to her interest in buildings.

    She was not an outstanding student but she produced workwith clear sense o composition, frm and balanced linesand intense color and mood contrast that were consistentthroughout her lie.

    Even though Bo Bardi later tempered her discourse withtectonic, humane and environmental notions, she remai-

  • 7/31/2019 05 ZL Entre Margens e Centro 070210

    5/35114

    ARQTEXTO1

    4 breviveram sua juventude oerecem um testemunho maisevidente das suas habilidades visuais do que do seu inte-resse por prdios. Ela se dedicou ao trabalho, no sendouma estudante excepcional para os padres da poca,mas produziu um trabalho com claro senso de composi-o, linhas frmes e balanceadas, cor intensa e contrastesde tom que oram consistentes durante toda a sua vida.

    Apesar de Bo Bardi ter, mais tarde, alargado o seu dis-

    curso com noes humanitrias, tectnicas e ambientais,ela continuou altamente sensvel arquitetura como en-meno visual e consciente da pluralidade de reernciasestticas que a sustm. Com o tempo, ela passou a deen-der a idia de que os projetistas deveriam se preocuparmenos com questes de beleza e estilo que com a vida eos programas que seus projetos promovem. No entanto, apreocupao inicial com imagens nunca a abandonou. Aespontaneidade transormadora com que ela desmontavae recriava imagens e objetos estava na base da sensibili-dade visual que conduziu a maior parte do seu trabalhoeditorial e de projetos de arquitetura, objetos, cenografa

    e exposies. Como outros arquitetos italianos educadosantes e durante a Segunda Guerra Mundial, Bo Bardi erauma arquiteta moderna, mas no tinha um pensamentolimitado. Nos anos 1920 e 1930, enquanto arquitetos devanguarda tendiam a rejeitar elementos fgurativos e ade-rir a princpios ormais e conceituais estritos, os italianosem geral operavam em um contexto cultural nuanado pe-las tradies da pennsula. Apesar de que, dos dois ladosdos Alpes, os arquitetos modernos tenham resistido aosexcessos do ecletismo, a Itlia no dispunha dos mesmosavanos econmicos e tecnolgicos de naes a Nortee a Oeste da pennsula, inviabilizando a materializaode estticas estritamente abstratas e industriais em gran-de escala. O pas j estava politicamente unifcado, masera, ainda, em grande parte empobrecido e provinciano,pouco industrializado e geografcamente desarticuladonas primeiras dcadas do sculo vinte. Alm disso, a as-sociao da enorme herana artstica e arquitetnica daItlia com a descoberta e exposio etnogrfca de suastradies regionais teve importante papel nas disputassimblicas entre os grupos mais liberais e reacionrios doespectro poltico sobre a modernizao cultural e artsticaitaliana depois da Primeira Guerra Mundial.

    O debate arquitetnico moderno na Itlia emergiucomo um enmeno pluralista no fnal da dcada de1920, num contexto de crescente nacionalismo e totali-tarismo, entre desacordo esttico e concesses polticas.Esse debate no s ganhou espao comparativamente tar-de como tambm se deu s margens de mudanas mais

    ned highly conscious o architecture as a visual phenome-non and o the plurality o aesthetic reerences that supportit. She grew to believe that designers should be less con-cerned with questions o beauty and style than with the lieand programs their projects promote, but her awarenesso images never abandoned her. The transormative spon-taneity with which she pulled apart and recreated imagesand objects is at the core o the visual sensitivity she brou-

    ght into most o her broad-ranging work in publishing, ar-chitecture, objects, stage, and exhibition design. Like otherItalian architects trained beore and during World War II,Bo Bardi was a modern architect but not a narrow-min-ded thinker. While progressive European architects in the1920s and 1930s tended to reject ornaments and adhereto strict conceptual and ormal principles, Italian architectsoperated in the context o much more nuanced culture.Despite the act that on both sides o the Alps designersresisted the excesses o eclecticism, Italy didnt provide thesame economic and technological advances available innations North and West o the peninsula to materialize

    strictly non-fgurative and industrial aesthetics in a largescale. The country was politically unifed, but still mostlyimpoverished and provincial, little industrialized, and ge-ographically disconnected in the frst decades o the twen-tieth century. Moreover, Italys enormous artistic and ar-chitectural heritage along with the ethnographic discoveryand exposure o its regional traditions played an importantrole in the symbolic disputes about Italian cultural and ar-tistic modernization ater World War I to the let and to theright o the political spectrum.

    The Italian modern architectural debate emerged asa pluralistic phenomenon in the late 1920s, in a contexto increasing nationalism and totalitarianism and betwe-en aesthetic disagreement and political compromise. Notonly did it take place comparatively late, it also happenedin the margins o more progressive changes happeningamong its European neighbors even though they didntderive rom a unifed theoretical approach. The peninsulawas still considerably isolated and the scarce contacts withthe rest o the continent were restricted by the regimescultural protectionism concentrated in Rome.3 The lack oconsensus about the directions presented by the Europe-an avant-gardes and about the signifcance o rationalism

    and unctionalism and the role o tradition in a unevenlyindustrialized country gained ambiguous reinterpretationsi not creative misunderstanding in the minds o Italian ar-chitects. Modern architecture ulflled a desire or change,but these historic circumstances distanced the Italian move-ment rom progressive social-democratic aspirations. With

  • 7/31/2019 05 ZL Entre Margens e Centro 070210

    6/35115

    ARQTEXTO14

    progressistas promovidas por seus vizinhos europeus,mesmo que sem uma abordagem terica unifcada. Apennsula ainda era consideravelmente isolada e os es-cassos contatos com o resto do continente europeu eramrestritos devido ao protecionismo cultural do regime as-cista concentrado em Roma.3 A alta de consenso sobreas direes e sobre o signifcado do racionalismo e douncionalismo apresentada pelas vanguardas europias e

    o papel da tradio em um pas ainda no plenamenteindustrializado geraram reinterpretaes ambguas - seno mal-entendidos criativos - no pensamento dos arqui-tetos italianos. A arquitetura moderna preenchia um de-sejo de mudana, mas essas circunstncias histricas, emgeral, distanciaram o movimento italiano das aspiraessocial-democratas. Com poucas excees, a esttica e oescopo poltico das vanguardas italianas fcaram limita-dos experimentao ormal e ao planejamento estatal,tendo estado os arquitetos requentemente voltados paraquestes mais socialmente exclusivas e politicamente con-vencionais.

    No momento em que Bo Bardi estudava no Liceu Artsti-co no incio dos anos 1930 e na Escola de Arquitetura nasegunda metade daquela dcada, Roma era o centro deum acalorado debate artstico. Duas questes tornaram-seintimamente correlacionadas nesse processo: a associa-o com a lgica racional da objetividade cientfca eda produo industrial; e a negociao com as tradiesitalianas. A controvrsia estilstica crescente e a plurali-dade na arquitetura moderna italiana terminaram porobscurecer o consenso poltico ao redor da ascendnciado regime de Mussolini, que promoveu uma expanso naconstruo e, paradoxalmente, benefciou enormementearquitetos de dierentes linhas estticas. Consequentemen-te, essas disputas, o relativo isolamento e a situao pol-tica e econmica do pas aetaram diretamente o discursoarquitetnico na Itlia.

    O panorama cultural italiano durante as dcadas de1920 e 1930 era to estimulante quanto instvel, comsrias disputas e utuaes. De um lado, estavam os ar-quitetos e crticos que apoiavam princpios abstratos eracionalistas, como o Gruppo 7 e seus seguidores. Deoutro lado, estavam aqueles que adotavam princpios ne-oclssicos e vernculos, como o urbanista e historiador

    romano Gustavo Giovannoni e o arquiteto milans GiPonti, respectivamente o inuente proessor de histria daarquitetura e a primeira reerncia profssional de Lina BoBardi. No meio, fcava Marcello Piacentini, que postulavauma terceira via, um classicismo simplifcado imaginadocomo resposta intermediria s posies de outros grupos

    ew exceptions, the aesthetic and political scope o theItalian avant-gardes was limited to ormal experimentationand state planning and Italian architects oten remainedcommitted to more urbane and conventional subjects.

    At the time Bo Bardi attended the Liceo Artistico in thefrst part o the 1930s and the School o Architecture in thelatter part o that decade, Rome was at the center o a he-ated debate. Two questions became intimately correlated

    in this process: on the one hand, the association with therational logic o scientifc objectivity and industrial produc-tion; on the other, the negotiation with Italian traditions.The growing stylistic controversy and plurality in the mo-dern Italian architecture ended up obscuring the politicalconsensus around the ascendance o Mussolinis regime,which promoted a construction boom and, paradoxically,largely benefted architects rom dierent aesthetic persu-asions. Yet, such disputes, the countrys relative isolationand its economic and political situation directly aectedthe architectural discourse in Italy.

    The Italian cultural panorama during the 1920s and

    1930s was both exciting and unstable, with serious stru-ggles and uctuations. On the one side stood those ar-chitects and critics who supported abstract and rationa-list principles such as Gruppo 7and with their ollowers.On the other side were those embracing neoclassical andvernacular principles such as Roman urban planner andhistorian Gustavo Giovannoni and Milanese architect GiPonti, respectively Lina Bo Bardis inuential history proes-sor and frst proessional reerence. In the middle, stoodMarcello Piacentini advocating a third path, a simplifedclassicism devised as a halway response to the consensu-al positions o the other groups, which was increasingly a-vored by Mussolini. Piacentinis mediatory approach andastute political moves during the ascist regime guaranteedhis dominant position over the proessional environmento the capital, which was closed and generally conor-mist.4 He was also the dean o the School o Architecturein Rome when Lina Bo Bardi attended it in the late 1930s.He played a prominent role both in education and in theproessional world but was not alone in trying to inuencethe Duce. Architects holding dierent and opposing viewssaw great opportunity in the regimes eorts to modernizethe country as a way or transorming the spatial, technical

    and visual vocabulary o Italian architecture. They activelyembraced the debate and marketing strategies through alarge number o publications, exhibitions and airs such asthe Milanese Triennali, which periodically set up the toneo avant-gardemanuacture and building design.

    For the most part, modern Italian architects did not as

  • 7/31/2019 05 ZL Entre Margens e Centro 070210

    7/35116

    ARQTEXTO1

    4 e que oi altamente avorecida por Mussolini. A aborda-gem mediadora de Piacentini e suas astutas manobras po-lticas garantiram sua posio dominante durante o regi-me ascista sobre o ambiente profssional da capital, queera echado e geralmente conormista.4 Ele tambm erao diretor da Escola de Arquitetura de Roma quando LinaBo Bardi estudou nela no fnal da dcada de 1930. Pia-centini tinha um papel proeminente tanto no mundo pro-

    fssional quanto no acadmico, mas no estava sozinhona tentativa de inuenciar o Duce. Arquitetos com pontosde vista dierentes e opostos viram grandes oportunidadesnos esoros do regime em modernizar o pais, como or-ma para transormar o vocabulrio espacial, tcnico e vi-sual da arquitetura italiana. Eles adotaram ativamente asestratgias de debate e publicidade, atravs de um grandenmero de publicaes, exposies e eiras como a Trienalde Milo, que periodicamente dava o tom da vanguardano projeto de produtos manuaturados e de edicios.

    Em geral, os arquitetos modernos italianos resistirammenos tradio do que ao conservadorismo esttico das

    artes decorativas e do uso indiscriminado da ornamentaoe da citao historicista. Ainda que osse mais ou menosprogressista, a idia de modernizao arquitetnica noexclua a presena de tradies vernculas e antigas aolongo da pennsula. Pelo contrrio, o retorno ordem rei-vindicado pelos arquitetos italianos desde o fm da PrimeiraGuerra Mundial estava ligado s caractersticas visuais etcnicas da arquitetura clssica e rural. Essa relao erauma resposta ao que eles viam como tentativas racassadasde expressar a identidade de uma nao recm-unifcadapela livre citao de estilos histricos europeus - e no na-cionais - largamente utilizada pelo Ecletismo italiano na vi-rada do sculo vinte. Os arquitetos modernos na Itlia, noentanto, no desfzeram o antagonismo entre arquiteturamoderna e ecltica, mesmo enatizando o respeito a mani-estaes autenticamente histricas e regionais. A maioriadeles estava menos preocupada em rejeitar os princpiosde sua educao acadmica e a inuncia da cultura vie-nense que em se distanciar do que viam como escolhasenganosas e como excessos de riqueza burgueses. Umbom exemplo deste sentimento compartilhado que mes-mo racionalistas esteticamente mais undamentalistas comoo Gruppo 7apoiavam a idia de que o modernismo devia

    estar enraizado na tradio clssica.Assim como os seus colegas europeus, os arquitetositalianos punham no potencial emancipador do plane-jamento racional, das novas tecnologias, da produoem massa e da modernizao social, estabelecendo di-erentes conexes com as tradies que eles aspiravam a

    much resist tradition as they rejected aesthetic conservatismand the afliation to ornamentation and decorative arts.Whether more or less progressive, the idea o architecturalmodernization did not exclude the presence o vernacularand ancient traditions along the peninsula. On the contra-ry, the return to order claimed by Italian architects sincethe end o World War I was tied to visual and technical e-atures o rural and classical architecture. This relationship

    was in response to what they saw as ailed attempts toexpress the identity o a unifed nation through the reequotation o historic European styles that had been wides-pread in turn-o-the-century Eclecticism. Modern architectsin Italy didnt undo the antagonism between modern andeclectic architecture, even though they maintained a conci-liatory sensitivity and respect to authentically historic andregional maniestations. Most o them were less concernedwith rejecting the principles o their academic educationand the inuence o Viennese culture than with distancingthemselves rom what they saw as the mistaken choicesand excesses o bourgeois wealth. A good example o this

    shared sentiment is that even the most undamental rationa-lists such as Gruppo 7supported the idea that modernismshould be enrooted in classical tradition.

    Like their European colleagues, Italian architects nur-tured the belie in the emancipating potential o rationalplanning, new technologies, mass production and socialmodernization, establishing dierent links with the tradi-tions they aspired to transorm or overcome. Italy oeredespecially strong challenges in that regard, as designersabsorbed and translated unctionalism and planninginto their particular cultural and political conditions. Thecountrys history and everyday realities prompted archi-tects to juxtapose elaborate theoretical and cultural cons-tructs with empirical knowledge about their physical andcultural environment. Instead o abandoning traditions, thenew generation o Italian designers and critics o variousorientations took them as a solid basis or the emergenceo modern architecture. Modern architecture in Italy grewout o the unusual coexistence between a pluralistic cultu-re and a totalitarian state, oten producing hybrid works,both conceptually and ormally.

    It is no coincidence that Lina Bo Bardi ound hersel atease with this open mentality, developing a practice that

    combined heterogeneous resources and reerences. Shewas not as alone as it may seem rom a Brazilian perspec-tive. Her cultural environment and experiences were nur-tured by both intellectual disagreement and symbolic jux-taposition. Despite studying in the polemical environmento the capital, producing a rationalist graduation project

  • 7/31/2019 05 ZL Entre Margens e Centro 070210

    8/35117

    ARQTEXTO14

    transormar ou superar. A Itlia oerecia grandes desafosnesse sentido, e os arquitetos e urbanistas absorveram etraduziram o uncionalismo e o planejamento para dentrode condies culturais e polticas particulares. A histriado pas e a realidade cotidiana incitavam os arquitetosa justapor imagens tericas e culturais elaboradas comconhecimentos empricos sobre seu ambiente sico e cul-tural. Em vez de abandonar tradies, a nova gerao

    de projetistas e crticos italianos de vrias orientaes astomaram como base slida para a modernizao da ar-quitetura. A arquitetura moderna na Itlia cresceu a partirda incomum coexistncia entre uma cultura pluralista eum estado totalitrio, produzindo muitas vezes trabalhoshbridos, tanto conceitual quanto ormalmente.

    No coincidncia, portanto, que Lina Bo Bardi se sen-tisse livre nessa mentalidade cultural mais aberta, desenvol-vendo um trabalho que combinava ontes e reerncias hete-rogneas. Ela no esteve to sozinha quanto parece, comoem geral se imagina desde uma perspectiva brasileira. Seuambiente cultural e suas experincias se alimentaram tanto

    da discordncia intelectual quanto da justaposio simb-lica. Apesar de estudar no polmico ambiente da capital,produzir um trabalho de graduao racionalista e ter aspi-raes grandiosas, h poucas evidncias de que ela tenhaadotado uma posio esttica nica como estudante. Tam-pouco h evidncia de que ela tenha entrado na rbita dasdisputas artsticas italianas dos anos 1930. Na verdade,ela teve difculdade para se ormar. Ela certamente gostavade polmicas, porque elas combinavam com seu tempera-mento provocativo, mas ela no se engajou ativamente ne-las se no bem mais tarde. De ato, em 1939, quando elase ormou, muito do debate racionalista tinha sido tempo-rariamente suocado pelas aspiraes megalomanacas docambaleante regime ascista. Uma coisa certa: Bo Bardiera inteligente, ambiciosa e aberta a inuncias dierentese absorveu sua educao ormal e experincia profssio-nal como cardpio de possibilidades abertas em vez deuma doutrina. Juntamente com esta relativa liberdade, eladeu passos importantes para defnir um uturo profssionalindependente como mulher, trabalhando em um ambientedominado por homens no incio da guerra.

    Com a ajuda de seu amigo Carlo Pagani, ormadoalguns meses antes, ela pode trocar Roma por Milo

    em 1940. Os talentos de Lina Bo Bardi como escritora,projetista e desenhista a ajudaram muito num perodo emque os trabalhos estavam nas mos de projetistas maisvelhos e bem estabelecidos. Pagani era empreendedore tinha contato direto com Gi Ponti, que dirigia muitasrevistas de arquitetura e decorao, e regularmente

    and having grandiose aspirations, there is little evidencethat she embraced a single-sided aesthetic position as astudent. Neither is there evidence that she entered the orbito artistic disputes happening in Italy in the 1930s. In rea-lity, she struggled to graduate rom college. She certainlyenjoyed controversies, because they suited her provoca-tive temperament, but she didnt actively engage in themuntil later. As a matter o act, by the time she graduated in

    1939, much o the rationalist debate had been temporarilysuocated by the megalomaniacal aspirations o a crum-bling Fascist regime. One thing is certain: Bo Bardi wasclever and open to dierent inuences and absorbed herormal education and proessional experience as a menuo open possibilities instead o as a doctrine. Along withthis relative reedom, she took important steps to defne anindependent proessional uture working as a woman in amale-dominated environment at the outset o the war.

    With the help o her riend Carlo Pagani who hadgraduated a year earlier, she was able to leave Rome toMilan in 1940. Her writing, drawing and graphic skills

    served her well during a period when most o the scarcework was in the hands o older, well-established desig-ners. Pagani was entrepreneurial and had direct contactwith Gi Ponti, who directed several architecture and de-coration magazines, and oten passed editorial projectson to Pagani. For several years, he loyally shared thosecommissions with his college riend Lina Bo Bardi (whosename was just Lina Bo at the time), allowing her to gainexperience in graphic, urniture and interior design andto be exposed to the proessional circles o the city. Theirriendship and work partnership was very productive andthey co-authored several illustrated short articles with sug-gestions or upper and middle-class home interior layouts,decoration and liestyle in magazines edited by Ponti. Thisis probably also the period during which Lina Bo Bardifrst met her uture husband, Pietro Maria Bardi, since theirarticles appear together in several numbers o Lo Stileanddespite the act the couple was misleading about the preci-se date o their encounter and development o a romanticrelationship.

    Not only did Bo Bardi develop refned sensitivity to or-ganize the visual feld o her illustrations, she also took herfrst steps into theoretical and prescriptive writing about

    design. Her heightened visual attention was put to use inillustrations and drawings she produced independently,such as the images that accompany short stories writtenby Italian writers in LIllustrazione Italiana (The Italian Illus-tration). Among the articles she co-authored with Paganior Lo Stile, there are several that endorsed the overlap

  • 7/31/2019 05 ZL Entre Margens e Centro 070210

    9/35118

    ARQTEXTO1

    4

    5 Pginas com artigo Alla ricerca di una archi-tettura vivente.Fonte: Revista Domus (Itlia, 1943) encarte espe-cial com capa branca e ttulo.5 Pages with article Alla ricerca di una architet-tura living.Source: Revista Domus (Italy, 1943) special insertwith white cover and title.

    5

  • 7/31/2019 05 ZL Entre Margens e Centro 070210

    10/35119

    ARQTEXTO14

    passava projetos editoriais para Pagani. Por muitos anos,ele dividiu lealmente esses encargos com sua amiga deaculdade Lina Bo Bardi (cujo nome era ento Lina Bo),permitindo que ela ganhasse experincia em desenhogrfco, projeto de mveis e interiores, e se expusesseaos crculos profssionais da nova cidade. A amizadee parceria de trabalho dos dois jovens arquitetos erabastante produtiva e eles oram co-autores de vrios

    artigos ilustrados com sugestes para projetos de interioresresidenciais, decorao e estilo de vida em revistaseditadas por Ponti para as classes mais abastadas.Provavelmente esse o perodo em que Lina Bo encontroupela primeira vez aquele que seria seu uturo marido, PietroMaria Bardi, visto que seus artigos comeam a aparecerjuntos em muitos nmeros de Lo Stilee tambm porque ocasal se esquivou sobre a data do primeiro encontro edesenvolvimento de seu relacionamento romntico.

    Bo Bardi no s desenvolveu uma sensibilidade ref-nada para organizar o campo visual de suas ilustraescomo tambm escreveu seus primeiros textos tericos so-

    bre projeto. Ela tambm usou sua acurada habilidadevisual nas ilustraes e desenhos que produzia indepen-dentemente, como as imagens que acompanhavam contosde escritores italianos na revista LIllustrazione Italiana (AIlustrao Italiana). Entre os artigos escritos em co-autoriacom Pagani para Lo Stile, muitos endossam a sobreposi-o entre o viver moderno e temas histricos e vernculoscom princpios racionalistas de projeto. Dois exemplos sig-nifcativos destes textos e ilustraes tinham ttulos comoNelle vacanze destate, semplicit e tradizione nelle vos-tre case (Para as rias de vero, simplicidade e tradioem suas casas) e Lantico nella casa doggi (O antigo nacasa de hoje). O primeiro artigo contm cinco desenhospitorescos e coloridos de janelas, sacadas e uma salamostrando o uso de detalhes decorativos como tecidos co-loridos e plantas acompanhados de legendas que azemreerncia a tradies locais de dierentes regies da It-lia. O segundo artigo, que parte de uma srie intituladaCasa, publicado em 1941, nominalmente descreve umaparede composta de elementos tanto modernos quantoantigos... unidos atravs de prateleiras que cobrem todaa parede.5 Eles ornecem instrues detalhadas de comoreutilizar objetos existentes e peas de moblia. Composi-

    o, ritmo e padres so destacados como importantesaspectos visuais desse processo hbrido, o qual inclui, porexemplo, a organizao de objetos nas prateleiras deacordo com suas tipologias, ormas e o uso de cores etexturas especfcas. Adicionalmente, eles sugeriam trans-ormar e atualizar peas antigas com novos materiais e

    between modern living and historic and vernacular moti-s as well as rationalist layout principles. Two meaningulexamples o those texts and illustrations have titles such asNelle vacanze destate semplicit e tradizione nelle vos-tre case (For the summer holidays, simplicity and traditionin your houses) and Lantico nella casa doggi (The oldin todays house). The ormer article contains fve colorul,picturesque sketches o windows, balconies and a room

    showing the use o decorative details such as colorul a-bric and plants accompanied by captions that make ree-rence to local traditions in dierent regions o Italy. Thelatter article, which is part o a series titled Casa (House)published in 1941, namely describes a wall composed oboth modern and old elements used through the use oshelves covering the whole wall.5 They provide detailedinstructions about how to reuse existing objects and urni-ture pieces. Composition, rhythm and patterns are highli-ghted as important visual aspects o this hybrid process,which includes, or example, the organization o objectson the shelves according to their typology and shape and

    the use o specifc colors and textures. In addition, theysuggest transorming and updating old pieces with newmaterials and uses, such as painting a nineteenth-centurychair in white or using an eighteenth-century statue as thebracket supporting a sconce. However, the article warnedreaders to avoid any kind o imitation. No old style, ro-coco or venetian style, they advised, the urniture mustbe beautiul, authentic, and valuable otherwise do less,be happy with a present-day, well-lit, and simple house.6Even though the fnal comments suggest they may havebeen aware o market restrictions imposed by the war, theimages in those early publications are so picturesque andthe articles so light-hearted that one would hardly assumethey were produced under German occupation - shortly a-ter Milan had been bombed by a British air raid - and thatthe Italian population was living under tremendous mate-rial deprivation. Despite this political void, the works pro-duced by them during this ormative period in Bo Bardiscareer was flled with the combination o dierent visualideas. That was the moment during which she literally andmetaphorically learned how to cut, copy, and paste ima-ges rom dierent sources into newly transormed realities.

    Still in 1941, in the October issue o Lo Stile, Bo Bar-

    di signed a book review praising the work Das Grundris-swerk(Groundwork or Foundation)7 by Otto Vlckers orhis prolifc eort to document and to analyze buildinglayouts. The editorial circumstances or this review areunknown, but Bo Bardi considered the book to oer acommanding collection o built works seen rom a rigorou-

  • 7/31/2019 05 ZL Entre Margens e Centro 070210

    11/35120

    ARQTEXTO1

    4 usos, como pintar uma cadeira do sculo dezenove debranco ou usar uma esttua do sculo dezoito como apoiopara um castial. Contudo, o artigo alerta os leitores paraevitar qualquer tipo de imitao. Nada de estilo antigo,rococ ou veneziano, eles advertiam, a moblia deveser bonita, autntica e de valor... de outra orma, aamenos, seja eliz com uma casa de hoje simples e bem ilu-minada.6 Mesmo que os comentrios fnais sugiram que

    eles estivessem cientes das restries de mercado impos-tas pela guerra, as imagens naquelas primeiras publica-es so to pitorescas e os artigos to despreocupadosque dicil imaginar que eles tenham sido produzidossob a ocupao alem - pouco depois de Milo ter sidobombardeada por um ataque areo britnico - e que apopulao italiana estivesse vivendo sob enorme privaomaterial. Apesar do vazio poltico, os trabalhos produzi-dos por eles durante esse perodo de ormao na carrei-ra de Bo Bardi oram preenchidos com a combinao dedierentes idias visuais. Esse oi o momento no qual elaliteral e metaoricamente aprendeu como cortar, copiar e

    colar imagens de dierentes ontes, transormando-as emnovas realidades.

    Ainda em 1941, no nmero de outubro de Lo Stile, BoBardi assinou uma critica elogiando o livro Das Grundris-swerk (Fundamentos)7 de Otto Vlckers por seu esoroprolfco para documentar e analisar plantas de edicios.As circunstncias editoriais dessa crtica so desconhe-cidas, mas Bo Bardi considerava que o livro oerecesseuma coleo imponente de obras construdas vistas deum ponto de vista rigorosamente distributivo, quase ma-temtico abrangendo dierentes tipos de edicios.8Nos seus comentrios, ela explicitava tambm algumasquestes chave que abordaria continuamente durante suavida. Dizia que a arquitetura nasce a partir das necessi-dades da humanidade; est a servio dessas demandase acrescentava que a arquitetura , portanto, a expres-so da vida humana e tem um proundo contedo moral.9Concordava com o apelo do livro por uma base histricacitando Vitrvio, como requentemente ez, dizendo quedas trs condies clssicas do bom construir - utilitas, r-mitas, venustas - a primeira condio necessria para aexistncia das outras duas. Ela enatizava a utilidade noem sentido restrito e fnito, mas utilidade nascida do vasto

    conhecimento das necessidades humanas, das experin-cias trazidas atravs do tempo, de problemas [previamen-te] resolvidos. Alm disso, mostrava que o ordenamentodas plantas [no livro de Vlckers] se preocupa menos coma modernidade de prdios isolados que com o grau deabordagem positiva das necessidades solicitadas.10 Esse

    sly distributive, almost mathematical, viewpoint regardingdierent kinds o buildings.8 In her comments, she alsoannounced some o the key points to which she wouldcontinuously return to along her lie. She stated that, Ar-chitecture is born out o the needs o mankind; it is at theservice o those demands, and added that architectureis, thereore, the expression o human lie and it has a pro-ound moral content.9 She agreed with the books claim

    or a historic oundation by quoting Vitruvius, as she otendid, and by saying that, rom the three classical condi-tions o good building - utilitas, frmitas, venustas - the frstone is a necessary condition or the existence o the othertwo. She emphasized useulness not in a restricted andfnite sense, but useulness born out o wide knowledgeo human needs, o experiences carried out through time,o [previously] resolved problems. Moreover, she pointedout that the ordering o plans [in Vlckers book] regardless the modernity o isolated buildings than the degree towhich they positively address required needs.10 This com-ment resonates with the way she laid out objects on the

    shelves as she illustrated the article about old elements in acontemporary house, and later, as she designed buildingsand organized exhibitions with everyday objects collectedrom incursions into remote areas o Brazil.

    Both visually and conceptually Bo Bardis work was intune with the multiple associations her predecessors andcontemporaries had loosely established between everydaylie and educated aesthetics, abstract and fgurative ree-rences and between historic, progressive, local and gene-ral symbolic values. This compromise had practical rootsin the cultural and political action o Italian architects inthe previous decades. It was also, even i indirectly, inor-med by Benedetto Croces essentialist ideas about aesthe-tics, through his writings about the Philosophy o Spirit,the relationship between orm and content, and his eortto reconcile conicts between rationalism and empiricismthat pervaded Italian intellectual lie at the time.11 Lina BoBardis visual imagination - which allowed her to drawimages in great detail and quantity borrowed rom whatseemed to be a rich imaginary warehouse o pictures andobjects - along with her aspiration to a moral purpose inarchitecture were in tune with Croces defnition o the tasko an artist as the translation o ideal mental images into

    visual and perceptive orms. She subscribed to the core othis worldview or a long time, until the mid-1960s, whenshe became aware o Antonio Gramscis critique o Cro-cian philosophy and his praise o the political role o intel-lectuals and culture.

    Another signifcant graphic piece produced by Lina Bo

  • 7/31/2019 05 ZL Entre Margens e Centro 070210

    12/35121

    ARQTEXTO14

    comentrio ecoa a maneira com que ela dispunha os ob-jetos nas prateleiras ao ilustrar os artigos sobre elementosantigos em uma casa contempornea, e, posteriormente,ao projetar edicios e organizar exposies com objetoscotidianos, recolhidos em suas incurses por reas remotasdo Brasil.

    Tanto visual quanto conceitualmente, o trabalho deLina Bo Bardi estava em sintonia com as mltiplas asso-

    ciaes que seus predecessores e contemporneos tinhamestabelecido de modo vago entre vida cotidiana e estticarefnada, reerncias abstratas e fgurativas, assim comoentre valores simblicos histricos e progressistas, contin-gentes e abstratos. Este acerto tinha razes prticas naao cultural e poltica dos arquitetos italianos nas d-cadas anteriores. Ele tambm dizia respeito, ainda queindiretamente, s idias essencialistas de Benedetto Crocesobre esttica, divulgadas nos seus textos sobre a Filosofado Esprito, a relao entre orma e contedo e seus esor-os para aplacar os conitos entre racionalismo e empi-rismo que dominaram a vida intelectual italiana naquele

    perodo.11 A imaginao visual de Lina Bo Bardi - que lhepermitia criar imagens em grande detalhe e quantidade,tomando emprestado elementos do que parecia ser umrico armazm imaginrio de pinturas e objetos - assimcomo a sua aspirao a um propsito moral para a arqui-tetura coincidiam com a defnio de Croce para a tareado artista, que seria a traduo de imagens mentais ide-ais em ormas visuais e perceptveis. Ela endossou a baseconceitual desta viso de mundo por um longo tempo, ata metade da dcada de 1960, quando se aproximou dacrtica de Antonio Gramsci sobre a flosofa Crociana ede seu elogio ao papel poltico das prticas culturais e daorganicidade do trabalho intelectual.

    Outra pea grfca signifcativa produzida por Lina BoBardi durante o perodo inicial de sua carreira evocati-va do sistema de valores que a cercou durante seus anosde ormao. O desenho a nanquim intitulado Cameradellarchitetto (O quarto do arquiteto), realizado aps elater deixado o trabalho para Lo Stile, mostra uma mesa, umacadeira e um armrio preenchidos com maquetes de todosos tipos de prdios e monumentos. Entre as amostras no de-senho esto templos clssicos, obeliscos, uma pirmide, atorre de Pisa, o Coliseu romano, uma pequena torre medie-

    val, uns poucos prdios residenciais, um capitel corntio ealguns slidos platnicos. Ao lado direito, preso parede,um console de madeira apia a maquete de uma residn-cia modernista colocada sob outro pequeno obelisco. Acasa no desenho no se parece com as outras maquetes,pois tem supercies lisas, sem ornamentos, az uso parcial

    Bardi during this period is evocative o the value systemthat surrounded her ormative years. The 1943 ink dra-wing titled Camera dellarchitetto (The architects room),which she produced ater having let Lo Stile, shows adesk, a chair, and an armoire flled up with models oall kinds o buildings and monuments. Among the sam-ple works in the drawing are classical temples, obelisks, apyramid, the tower o Pisa, the Roman Coliseum, a small

    medieval tower, a ew residential buildings, a Corinthiancapital and a ew platonic solids. On the right side, atta-ched to the wall, a wooden console supports the modelo a modernist house sitting under another small obelisk.The house in the drawing stands out rom the other modelsbecause o its at suraces with no ornaments, the partialuse o pilotis, and a long horizontal window turned towardthe viewer. However, the modernist model was not treatedas having more signifcance than the Roman or the Greektemple models respectively sitting on the table and chair.The purpose o this illustration is unclear as there are nodocuments or notes that help identiy or contextualize it.

    Still, it evokes the mindset o Italian culture at the time. Onethe one hand, the stark juxtaposition o classical images asordinary objects in a distorted perspective resembles theidealized and unconscious meanings o modernist Pitturametasica (Metaphysical art); on the other hand, their sta-ging suggests the architects dilemma in ace o pervasivetraditions and the emergence o new aesthetic maniesta-tions. The drawing does not seem to pretend there shouldbe hierarchy between those maniestations; it seems to pre-sent history as parts o a modern architectural primer. Ineither case, despite its ambiguities, Camera dellarchitetto(The architects room) seems to reserve a certain ceremonyto tradition and the academic background o Bo Bardismilieu than to target irony against eclecticism. Still, inother occasions, she produced several sketches ridiculingthe unrestrained mixture o styles and uneducated use osuperuous ornaments by eclectic architects and their os-tentatious clients.

    This work precedes the publications Lina Bo Bardi andCarlo Pagani would produce as co-directors o Domus ma-gazine when architect Melchiorre Bega handed down hismanagement position to them in November 1943. Withthe creation o Repubblica Sociale Italiana (Italian Social

    Republic), the Sal Republic, set in place as a puppet stateunder German occupation in the north o Italy in Septem-ber 1943, Mussolini fnally became the leader o a com-pletely totalitarian state. Given this aggravating politicalsituation and increasing threat o air bombing, Bega deci-ded to transer Domus to Bergamo, about an hour outside

  • 7/31/2019 05 ZL Entre Margens e Centro 070210

    13/35122

    ARQTEXTO1

    4

    6 Capa da revista.Fonte: Revista A (Itlia, 1946) no. 9 (ltimo).6 Magazine Cover.Source: A Magazine (Italy, 1946) no. 9 (last).

    7 Artigo Bela Criana.Fonte: Revista Habitat (Brasil, Janeiro-Marode1951) no. 2, pgina 3.7 Article Beautiful Child.Source: HabitatMagazine (Brazil, January-March,1951) no. 2, page 3.

    6 7

  • 7/31/2019 05 ZL Entre Margens e Centro 070210

    14/35123

    ARQTEXTO14

    de pilotis e tem uma grande janela horizontal voltada parao observador. Entretanto, a maquete modernista no pa-rece ser tratada como se tivesse maior signifcado que asdos templos gregos ou romanos, dispostos respectivamentesobre a mesa e a cadeira. O objetivo desta ilustrao no claro pois no existem documentos ou notas que ajudema contextualiz-la. Contudo, ela evoca o modo de pensarda cultura italiana naquele tempo. Por um lado, a orte jus-

    taposio de imagens clssicas como objetos comuns numaperspectiva distorcida relembra os signifcados idealizadose inconscientes da Pittura metasica (Arte Metasica). Poroutro lado, seu posicionamento sugere o dilema do arqui-teto em ace das tradies prevalentes e a emergncia denovas maniestaes estticas. O desenho no parece pre-tender que haja uma hierarquia entre estas maniestaes,mas, sim, sugere mostrar a histria como parte da cartilhaarquitetnica moderna. De qualquer modo, apesar de suasambigidades, Camera dellarchitettoparece mais conteruma certa reverncia tradio e ao milieu acadmico deBo Bardi do que se voltar ironicamente contra o Ecletismo.

    Ainda assim, em outras ocasies, ela ez muitos croquisridicularizando a mistura sem medida de estilos e o usodesinormado de ornamentos supruos por arquitetos ecl-ticos e seus ostentadores clientes.

    O desenho em questo precedia as publicaes queLina Bo Bardi e Carlo Pagani produziriam como co-dire-tores da revista Domus, quando o arquiteto MelchiorreBega passou a direo da revista para eles em novem-bro de 1943. Com o surgimento da Repubblica SocialeItaliana (Repblica Social Italiana), a Repblica de Sal,um estado-marionete sob a ocupao alem no norte daItlia em setembro de 1943, Mussolini fnalmente se tor-nou o lder de um estado completamente totalitrio. Dadaa agravada situao poltica e a ameaa crescente debombardeio areo, Bega decidiu transerir parte da edi-o de Domus para Bergamo, a cerca de uma hora deMilo. Pela primeira vez, o ato de Lina Bo Bardi ser umamulher a ajudou a ganhar liderana no meio de um am-biente profssional dominado por homens. Com 29 anosde idade, ela oi designada para ser a rente e a achadado processo de comunicao e publicao porque as mu-lheres levantavam menos suspeitas, ajudando a dissimulara censura e particularmente o controle policial nos trens

    entre as duas cidades da Lombardia.Alm de ganhar mais proeminncia profssional, LinaBo Bardi tambm se exps mais amplamente cultura ar-quitetnica da Itlia e de ora do pas na poca. A revistaDomus no era progressista como sua concorrente Casa-bella, mas era menos elitista que Lo Stilee mais prxima

    o Milan. For the frst time, the act that Lina Bo Bardi was awoman designer helped her gain leadership in the middleo a male-dominated proessional environment. At the ageo 29, she was designated to be the ront and at the ore-ront o the publication and communication process becau-se women raised less suspicion, helping dispel censorshipand particularly police control on trains between the twocities in Lombardy.

    Besides gaining more proessional prominence, LinaBo Bardi also gained new and broader exposure to thearchitectural culture in Italy and outside the country at thetime. Domus magazine was not as liberal and progressi-ve as its competitor Casabella, but it was less elitist thanLo Stileand closer to the rationalist debate. Together withCarlo Pagani, she edited over 12 issues with a varietyo articles that attest to the pluralist Italian debate aroundarchitecture and design, which was also closer to modernand rationalist ideas, particularly related to Swiss-born ar-chitects such as Le Corbusier, Max Bill and Albert Frey.Switzerland was a neutral country during the World War

    II, had produced reerential proessionals and maintainedpublications that were much likely more accessible to itsimmediate southern neighbor.

    Once again, Lina Bo Bardis transormative graphicskills came in handy, publishing articles with more whi-te space, simpler layout and a rich collage o images,among which some had already appeared in other Ita-lian magazines. Together with Pagani, she opened issue191, their frst issue as co-editors o Domus, with an in-dividually signed essay titled Architettura e Natura; Lacasa nel paesaggio (Architecture and Nature; The housein the landscape), which suggests an emerging neo-realistsensitivity among Italian architects. Bo Bardis text intro-duction was particularly in avor o a rationalism enrootedin tradition. She was critical o ornaments and academiceighteenth-century ormalism, criticized this practice orhaving crystallized architecture in fxed orms collectedinto a superfcial, a-unctional aestheticism that is indepen-dent rom building essential conditions, lie needs, and theenvironment.12 She announced the realistic investigationo the modern world, which destroys any superfciality,any prejudice, any decorative impulse, has taken architec-ture to the relationship SOIL, CLIMATE, ENVIRONMENT,

    LIFE, justiying that this relationship emerges, in a won-derully primitive way, rom the most spontaneous orms oarchitecture: rural architecture. She went on to highlightthe Mediterranean house as the primary example o theperect correspondence o architecture with the environ-ment in which the human lie develops standing pure,

  • 7/31/2019 05 ZL Entre Margens e Centro 070210

    15/35124

    ARQTEXTO1

    4 do debate racionalista. Junto com Carlo Pagani, ela editou12 nmeros, com uma variedade de artigos que atestam odebate pluralista italiano sobre arquitetura e design, bas-tante prximo das idias modernas e racionalistas, particu-larmente as relativas aos arquitetos nativos da Sua comoLe Corbusier, Max Bill e Albert Frey. A Sua era um paisneutro durante a Segunda Guerra Mundial e produziu pro-fssionais de reerncia, mantendo publicaes que eram

    muito mais acessveis a seu vizinho imediato do sul.Mais uma vez, as transormadoras habilidades grf-cas de Lina Bo Bardi se mostraram teis e tambm moder-nas, publicando artigos com uso deliberado de espaoem branco, layoutmais simples e uma rica colagem deimagens, entre as quais algumas que j tinham apare-cido em outras revistas italianas. Junto com Pagani, elaabriu o nmero 191, o primeiro da Domus co-editadopor eles, com um ensaio intitulado Architettura e Natu-ra; La casa nel paesaggio (Arquitetura e Natureza; Acasa na Paisagem), que sugere uma sensibilidade neo-realista emergente entre os arquitetos italianos. A introdu-

    o do texto individualmente assinada por Bo Bardi e particularmente avorvel a um racionalismo enraizadona tradio. Ela criticava os ornamentos e o ormalismoacadmico oitocentista. Para ela, o academismo tinhacristalizado a arquitetura em ormas fxas colhidas deum esteticismo superfcial, auncional, independente dascondies construtivas essenciais, necessidades de vida,e do ambiente.12 Ela anunciava a investigao realsticado mundo moderno, que destri qualquer superfcialida-de, qualquer preconceito, qualquer impulso decorativo,e traz a arquitetura para a relao entre SOLO, CLIMA,AMBIENTE, VIDA, justifcando que esta relao emer-ge, numa maneira maravilhosamente primitiva, a partirdas mais espontneas ormas de arquitetura: a arquiteturarural. Ela destacava a casa mediterrnea como exem-plo primrio da pereita correspondncia da arquiteturacom o ambiente no qual a vida humana se desenvolve,permanecendo pura, pereitamente aderida ao solo e apaisagem, coerente com a vida que h nela.13

    Esses pontos apiam a hiptese que ela dividia com osarquitetos de sua gerao de que a arquitetura modernalevou aquele organismo complexo que a casa diretarelao entre TCNICA ESTTICA FUNO. Sua

    reverncia a Vitrvio reaparece desta vez com matizesidealistas e romnticos ao descrever que o modernismoestabelecia uma unio prxima entre casa, terra, vidae trabalho humano,14 unindo ortemente a arquitetura,o ambiente natural e a medida humana. Ela declarouque o instinto primordial do abrigo que inspirou a

    perectly adherent to the soil and landscape, and coherentto the lie in it.13

    These points supported the hypothesis she shared witharchitects o her generation that modern architecture hasled that complex organism which is the house to the ri-ght relationship between TECHNIQUE AESTHETIC FUNC-TION. Her reverence to Vitruvius reappears this time withidealist and romantic overtones as she describes how mo-

    dernism established a close link between house, earth,lie and human labor,14 closely connecting architecture,the natural environment and human measure. She de-clared, The primordial instinct o the shelter that inspiredthe hut made out o straw and branches, the conic andcubic reuges in stone blocks can be ound today in theproound evolution o houses, by explaining that, Eventhough they [houses] respond to rigorous laws o unctiona-lity and essence o modern architecture, they preserve thepurity o spontaneous and primordial orms rom whichthey derive.

    Her one-page introduction is ollowed by fve more pa-

    ges with a selection o examples and short texts depictingplans and black-and-white photographs o North-Americanhouses, particularly rom Caliornia and the Southwest - allo them sharing a pasted watercolor blue sky. The sourceo these images and their accompanying texts is unclearand they probably come rom another unidentifed publi-cation. Still, they illustrate her points about houses in thelandscape, some conventional, as she pointed out, andsome anti-architectural, not even close to the canon oa traditional house but rather itsel landscape [] in aharmonious usion15 with the natural elements o the site.This inaugural essay opened up a series o other articlesbringing together the international and Italian modernistdebates. The text was in line with an essay Pagani and BoBardi were preparing or the ollowing December 1943issue o Domus. This ollowing case was an extended texttitled Alla ricerca di una architettura vivente, which alsocame out as a special booklet. It did not have a clearlyidentifable author, despite the act that it was a verbatimItalian version and contained several photographs o Al-bert Freys 1939 book In Search of a Living Architecture.16At the center o the frst page, one reads our small initials -L.B.C.P. - rotated vertically ambiguously suggesting the co-

    editors as authors o the essay Freys name while his nameand book title only appear in the short bibliography at thetop o the next page. The list includes two other reerences:Compositions by Freys Swiss-American compatriot, desig-ner and artist Max Bill - which were graphically recrea-ted by Bo Bardi with gouache paint along with the small

  • 7/31/2019 05 ZL Entre Margens e Centro 070210

    16/35125

    ARQTEXTO14

    cabana eita de ramos e galhos, os regios cnicos ecbicos em blocos de pedra pode ser encontrado hojena prounda evoluo das residncias, explicando quemesmo que elas [casas] respondam s leis rigorosasda uncionalidade e essncia da arquitetura moderna,elas preservam a pureza das ormas espontneas eprimordiais das quais elas derivam.

    Sua introduo de uma pgina seguida por mais cin-

    co com uma seleo de exemplos e textos curtos mostrandoplantas e otografas em branco e preto de casas norte-americanas, particularmente da Calirnia e do sudoesteamericano - todas compartilhando um cu azul adicionadoem aquarela. A onte destas imagens e dos textos que asacompanham no clara e eles provavelmente vm de ou-tra publicao no identifcada como ocorria muitas vezesnas revistas editadas por Bo e Pagani. De qualquer modo,eles ilustram tambm os pontos de vista dela sobre casasna paisagem: algumas convencionais, como ela notou, eoutros anti-arquitetnicos, nada prximos do cnone dacasa tradicional mas prximos em alguma medida da pai-

    sagem [...] em uma uso harmoniosa15 com os elementosnaturais do stio. Este ensaio inaugural abre uma srie deoutros artigos, juntando os debates modernistas internacio-nais e italianos. O texto estava alinhado com um ensaioque os dois editores estavam preparando para o nmeroseguinte de Domus, de dezembro de 1943 logo aps Pa-gani ter voltado da guerra. Tratava-se de um texto extensointitulado Alla ricerca di una architettura vivente, que tam-bm oi lanado como um ascsculo em separado. O autordo texto nao imediatamente identifcvel, apesar do atode ser uma traduo literal em italiano e de conter muitasotografas do livro de Albert Frey, In Search of a LivingArchitecture, lanado em 1939.16 No centro da primeirapgina, o leitor encontra trs pequenas iniciais - L.B.C.P. -giradas na vertical, sugerindo ambiguamente os co-editorescomo autores do ensaio de Frey, enquanto o nome deste eo titulo de seu livro s aparecem em uma curta bibliogra-fa no alto da pgina seguinte. A lista inclui duas outrasreerncias: Compositions, do designer e artista Max Bill,compatriota suo-americano de Frey - grafcamente recria-do por Bo Bardi com pintura guache atravs de pequenosdiagramas mostrando os princpios ormais e visuais queacompanham o livro de Frey - e uma nota obscura sobre

    rochas baslticas de um atlas rancs do sculo dezoito.Ambos ensaios de abertura, publicados nos dois pri-meiros nmeros de Domus e co-editados por Bo Bardi ePagani, apresentam uma estrutura em orma de catlogoe aspiraes metodologicamente objetivas.17 Apesar doato de eles no serem contribuies tericas originais dos

    diagrams showing abstract visual and ormal principlesthat accompany Freys book - and an obscure entry aboutbasalt rocks rom an eighteenth century French atlas.

    Both opening essays published in two frst issues o Do-mus co-edited by Bo Bardi and Carlo Pagani present acatalog-like structure and methodologically objective as-pirations.17 Despite the act that these were not originaltheoretical contributions by the young editors, they reveal

    unequivocal emphasis on the continuities between tradi-tion and modernity, and on the close relation between ar-chitecture and landscape. Whether or not the choice topublish them was determined by the magazines director,Melchiorre Bega, or inuenced by her work partner Paga-ni, these articles show or the frst time Bo Bardis ull em-brace o the investigation about tradition and vernaculararchitecture (architettura minore). This approach took intoaccount the relationship between architecture and lands-cape, careul attention to siting strategies and the incorpo-ration o traditional building techniques. These issues hadbeen at the center o the debate about modern architec-

    ture in Italy in the previous two decades with supportersranging rom a picturesque approach such as in GustavoGiovanonnis writings to a technically driven argumenta-tion such as in Giuseppe Paganos position. The essayspublished by Bo Bardi and Pagani in Domus reinorced theessentialist value reemerging during and ater World WarII that rationalism could and should be legitimized withinthe sphere o traditional and popular architecture. Moreo-ver, they also pointed to Frank Lloyd Wrights naturalisticnotion o organic architecture introduced by architect andcritic Bruno Zevi in Italy through a movement intended toadvance the early debate about rationalism.

    The work or Domus allowed Lina Bo Bardi to expandher proessional and social circles as well as her knowled-ge about architecture but the magazine was discontinuedduring 1945 because o economic and political problemscaused by the war. During that period, she met other de-signers and critics and inormally gravitated around theMilanese Movimento di Studi per lArchitettura (MSA, Ar-chitecture Study Movement), which ofcially emerged in1945 as one o the orums or the study o modern ar-chitecture and urbanism in Italy as part o the eorts orpostwar reconstruction. This varied group o young and

    veteran architects and intellectuals aimed at ostering theaesthetic debate between international and abstract di-rections on the one hand and regionalist and fgurativeinterests on the other hand. It also proposed to reorgani-ze the relationship between the proessional and politicalspheres o architecture. No archival documentation has

  • 7/31/2019 05 ZL Entre Margens e Centro 070210

    17/35126

    ARQTEXTO1

    4 jovens editores, ainda assim revelam nase inequvocana continuidade entre tradio e modernidade, e na re-lao estreita entre arquitetura e paisagem. Ainda quea escolha de public-los tenha ou no sido determinadapelo diretor da revista, Melchiorre Bega, ou inuenciadapor seu colega de trabalho, Pagani, estes artigos mostrampela primeira vez a plena adoo por Bo Bardi da investi-gao sobre tradio e arquitetura verncula (architettura

    minore). Essa abordagem levava em considerao a rela-o entre arquitetura e paisagem, cuidadosas estratgiasde implantao e a incorporao de tcnicas tradicionaisde construo. Essas questes tinham estado no centro dodebate sobre arquitetura moderna na Itlia nas duas d-cadas anteriores, com propostas variando de uma abor-dagem pitoresca, como aparece nos escritos de GustavoGiovanonni, a uma argumentao baseada na questoda tcnica conorme a posio de Giuseppe Pagano. Osensaios publicados por Bo Bardi e Pagani na Domus reor-avam o valor essencialista que reemergiu durante e de-pois da Segunda Guerra Mundial, que sugeria que o ra-

    cionalismo podia e devia ser legitimado dentro da eserada arquitetura tradicional e popular. Alm disso, eles tam-bm apontavam para a noo naturalista de Frank LloydWright sobre a arquitetura orgnica, introduzida um anomais tarde na Itlia pelo arquiteto e critico romano BrunoZevi, atravs de um movimento que pretendia avanar odebate inicial sobre o racionalismo.

    O trabalho realizado para a Domus permitiu a LinaBo Bardi expandir seus crculos profssionais e sociais,bem como seu conhecimento sobre arquitetura, embora arevista tenha interrompido sua circulao durante 1945,devido a problemas econmicos e polticos causadospela guerra. Durante aquele perodo, ela conheceu outrosarquitetos e crticos, e gravitou inormalmente ao redordo MSA, Movimento di Studi per lArchitettura (Movimen-to de estudo pela Arquitetura), surgido ofcialmente em1945 como um dos runs de renovao da arquiteturae do urbanismo modernos na Itlia, dentro do esoro dereconstruo do ps-guerra. Ao mesmo tempo que estevariado grupo de jovens e veteranos arquitetos e intelec-tuais queria promover o debate esttico entre tendnciasestticas abstratas internacionais e elementos regionalis-tas, fgurativos, eles tambm procuraram reorganizar o

    relacionamento entre as eseras poltica e profssional daarquitetura. Nenhum documento encontrado atesta a par-ticipao ofcial de Bo Bardi no MSA - ou, que se saiba,menos ainda sua participao na Resistncia Italiana -mas possvel afrmar que ela oereceu, para reunies, ouso do apartamento de sua amlia no centro da cidade,

    been ound attesting Bo Bardis claim to have ofcially par-ticipated in the MSA - or, or that matter, even less in thecontemporaneous Italian Resistance - but she did in actauthorize the use or meetings o her amilys downtownapartment, where some o her riends temporarily lived.In the occasion, she may have had the chance to observeand inormally participate in the discussions. During thisperiod, she and Carlo Pagani met another younger Ro-

    man architect, Bruno Zevi, who had recently returned romhis studies at the Graduate School o Design at Harvard.He had just published, at age 27, the book Toward anOrganic Architecture and created the Associazione perlArchitettura Organica, APAO (Association or OrganicArchitecture) in Rome, which promoted the collaborationamong dierent proessionals and critics, including thoserom the MSA.

    In 1945, Bo Bardi, Pagani and Zevi gathered their in-terests and editorial experience and worked on the crea-tion o a bi-weekly, low-cost magazine with the initial helpo Pietro Maria Bardi to support post-war reconstruction.

    The magazine was called A. It later received a subtitle A,Cultura della Vita and was published January and July o1946. Zevi insisted that Pagani and Bo should completelyabandon and reuse the pettiness o Domus18 - even thou-gh his magazine ended up been published by EditorialeDomus itsel - and to occupy a political space let openater the war. He hoped that A magazine would be a po-werul alternative - and with no compromises - to enhancepublic awareness about the psychological postwar reality.A magazine, according to Zevi, should present an ad-venture into reality, a violent accusation against culture,liestyle, liberalism, traditional socialism, gossip, govern-ment [] and sickening Crocianism and the no-less sicke-ning Catholic Church. ACCUSATION must be our majormotivation, and the word ACCUSATION starts with A.19Zevi was also one o the ounders o the small, anti-ascistPartito dAzione (Action Party) and was working or theUnited States Inormation Service (USIS) in Rome at thetime. Given his bureaucratic and political labor incompati-bilities, he named Pagani to the position o editor-in-chie.

    Lina Bo Bardi was initially responsible or coordina-ting the design and editorial work and produced severalillustrations or the magazine. She continued her quest to

    reconcile modern and vernacular vocabularies. Her ap-proximation to Zevi in the work or A, Cultura della Vitaadded a political dimension o that search, which ully ma-terialized a couple o decades later in the independentand experimental architecture work she developed in adierent, Brazilian context. According to their discussions,

  • 7/31/2019 05 ZL Entre Margens e Centro 070210

    18/35127

    ARQTEXTO14

    onde alguns de seus amigos viveram temporariamente. bastante provvel que ela tenha tido a oportunidade deobservar e participar inormalmente das discusses. Du-rante este perodo, ela e Carlo Pagani conheceram BrunoZevi, que havia recentemente retornado dos seus estudosna Graduate School o Design de Harvard. Ele tinha aca-bado de publicar, aos 27 anos de idade, o livro Versounarchitettura organica (Por uma arquitetura orgnica) e

    criado a Associazione per lArchitettura Organica, APAO(Associao para a Arquitetura Orgnica) em Roma, quepromovia a colaborao entre dierentes grupos de profs-sionais e criticos, incluindo os do MSA.

    Em 1945, Bo Bardi, Pagani e Zevi uniram seus inte-resses e experincias editoriais e trabalharam na criaode uma revista quinzenal de baixo custo, com a ajudainicial de Pietro Maria Bardi, para apoiar a reconstruodo Ps-Guerra. A revista se chamava A. Logo, ela rece-beu o subttulo de Cultura della Vita e oi publicada entrejaneiro e julho de 1946. Zevi insistia que Pagani e Bodeveriam completamente abandonar e recusar a mesqui-

    nhez de Domus18 - mesmo que A tenha acabado sendopublicada pela prpria EditorialeDomus - e a ocupar oespao poltico deixado aberto depois da guerra. Ele es-perava que a revista A osse uma alternativa poderosa - esem concesses - para aumentar a conscincia pblicasobre a realidade psicolgica do ps-guerra. De acordocom Zevi, a revista devia apresentar uma aventura pelarealidade [...] uma acusao violenta contra a cultura, oestilo-de-vida, o liberalismo, o socialismo tradicional, aboataria, o governo [...] e o Crocianismo pestilento e ano menos pestilenta Igreja catlica. ACUSAO deveser nossa maior motivao, e a palavra ACUSAO co-mea com A.19 Zevi tambm era um dos undadores dopequeno e anti-ascista Partito dAzione(Partido da Ao)e trabalhava para o servio de inormao dos EstadosUnidos (USIS) quele tempo. Dada a incompatibilidadedesses compromissos burocrticos e politicos com a revis-ta, ele nomeou Pagani para o posto de editor-chee.

    Lina Bo Bardi oi inicialmente responsvel por coorde-nar os trabalhos grfcos e editoriais, alm de produzirilustraes para a revista. Ela continuava seu esoro dereconciliao entre vocabulrios modernos e vernculos.Sua aproximao de Zevi no trabalho para A, Cultura

    della Vita, expandiu essa busca para uma dimenso po-ltica, que se materializou por completo duas dcadasdepois no trabalho independente e experimental que eladesenvolveu num outro contexto, o brasileiro. De acordocom as discusses que Zevi, Pagani e Bo Bardi tiveramsobre a montagem da revista, o novo peridico no deve-

    the new periodical should not be limited to architecture,art, and housing. It should be about everyday lie and cul-ture. Together, the three architects collected and publishedmany articles. However, they oten encountered editorialproblems caused by limited resources and distribution. Themajor resistance came rom Mazzocchi, the publisher oDomus, who considered the journal to be too progressive.Given these difculties, the magazine closed down in the

    summer o 1946 ater only fve months and nine issues.Lina Bo had already resigned rom the editorial job in Mi-lan beore the last issue because o a nervous breakdown.She had returned to Rome once the war ended much likelyto stay closer to her uture husband Pietro Maria Bardi, butnever orgot the political lesson learned in collaborationwith her Milanese riends, Zevi, and Pagani.

    When A magazine closed, Achillina Bo prepared toembark in a new adventure, a seemingly temporary ad-venture that turned out to be permanent. She became Sig-nora Lina Bo Bardi at the age o 31, ater marrying thecontroversial art dealer and journalist with whom she had

    maintained a love aair or some time. He was ourteenyears her senior.20 Bardi had been a key, polemical ad-vocate o rationalism, advocate o Le Corbusiers ideas,and co-publisher o Quadrante during the early 1930sin Italy. On September 24, 1946, one month ater theirwedding, the Bardi couple let rom the port o Naplesor Brazil. They traveled less on a honeymoon than onbusiness. There was little money in the European art ma-rket ater the war and Pietro Maria Bardi wanted to fndnew markets or the works in his art gallery ater havinghad his commercial authorization revoked in the post-waranti-ascist witch hunting.21 He went to Brazil ollowing thesuggestion rom the Brazilian critic Mrio da Silva Britothat an eccentric Brazilian journalist, Assis Chateaubriand,wanted to create one o the most important galleries in theworld. With the help o riends in the Brazilian Embassy inRome, Bardi organized three exhibitions o his collectionin Rio de Janeiro, where Chateaubriand used to live at thetime. One o them was in the oyer o the iconic modernistbuilding o the Ministry o Education and Health. Chateau-briand, who was an extremely controversial character inthe political and cultural lie o the country, made specialarrangements to meet Bardi. He bought a ew paintings

    and, a ew weeks later, proposed that the Italian art dealerstay in Brazil and become the general director o a newart gallery to be opened in So Paulo. In the beginning o1947, the Bardi couple moved to So Paulo against BoBardis desire to remain in Rio. This was how she becameresponsible at age 32 or the design o the Museum o Art

  • 7/31/2019 05 ZL Entre Margens e Centro 070210

    19/35128

    ARQTEXTO1

    4 ria se limitar arquitetura, arte e decorao. Ele deveriaser sobre a vida e a cultura cotidianas. Juntos, os trsarquitetos coletaram e publicaram muitos artigos. Entre-tanto, sempre encontraram problemas editoriais devido limitao de recursos e de distribuio. A maior resistn-cia vinha de Mazzochi, o editor de Domus, que achavaa revista muito progressista. Dadas estas difculdades, A,Cultura della Vita echou aps apenas cinco meses e nove

    edies. Lina Bo Bardi j tinha se demitido do empregoeditorial em Milo antes do ltimo nmero por causa de umcolapso nervoso. Ela havia retornado a Roma logo aps ofnal da guerra, provavelmente para fcar mais prxima deseu uturo marido Pietro Maria Bardi, mas nunca esqueceua lio poltica aprendida em colaborao com os amigosZevi e Pagani.

    Quando a revista A echou, Achillina Bo preparava-separa embarcar em uma nova aventura; uma aventura queparecia temporria e que acabou se tornando permanen-te. Ela se tornou Signora Bardi com 31 anos, aps secasar com o polmico marchande jornalista com quem

    ela manteve um caso amoroso por algum tempo. Barditinha sido um deensor chave e polmico do racionalismo,deensor das idias de Le Corbusier e co-editor de Qua-drantenos primeiros anos da dcada de 1930 na Itlia.20

    Ele era quatorze anos mais velho do que ela. No dia 24de setembro de 1946, um ms aps o matrimnio, o casalBardi partiu do porto de Npoles em direo ao Brasil.A viagem que os levou ao Rio de Janeiro era menos umalua de mel do que uma viagem de negcios. Havia poucodinheiro no mercado europeu de arte aps a guerra e Pie-tro Maria Bardi, tendo tido seus direitos comerciais tem-porariamente revogados no caa-s-bruxas anti-ascistado ps-guerra, queria encontrar novos mercados para asobras de arte de sua galeria.21 Ele veio ao Brasil seguindoa pista de que, segundo o crtico de arte brasileiro Mrioda Silva Brito, havia no pas um excntrico jornalista, As-sis Chateaubriand, desejoso de criar uma das mais impor-tantes galerias de arte do mundo. Com a ajuda de amigosna Embaixada Brasileira em Roma, Bardi organizou trsexibies de sua coleo no Rio de Janeiro onde na po-ca morava Chateaubriand. Uma delas oi no saguo doicnico prdio modernista do Ministrio da Educao eSade Pblica. Chateaubriand, que era um personagem

    extremamente polmico na vida poltica e cultural dopas, oi encontrar-se com Bardi na abertura da mostra.Ele comprou algumas das pinturas, e poucas semanas de-pois, props ao marchanditaliano que fcasse no Brasil eassumisse o cargo de diretor geral de uma nova galeriade arte a ser aberta em So Paulo. No incio de 1947, o

    o So Paulo (MASP) in the new building o Dirios Asso-ciados Press, also owned by Chateaubriand. To leave thevibrant cultural lie o Rio de Janeiro or what amountedonly to the promises o an emerging but still provincialindustrial center had been a great disappointment to her.Yet, the new country and the new city oered unmatchedproessional and personal opportunities.

    Later in lie, Bo Bardi liked to say that she was greatly

    amazed as she saw the building or the Ministry o Edu-cation and Health, fnished in 1943, while approachingthe bay o Rio de Janeiro. She metaphorically describedthe modernist building as a sail opened up to the wind onew architectural possibilities. To her, Brazil representeda land where everything was possible, where there wereno [war] ruins, a privileged space or artistic creation,and a new place or utopias.22 In addition to her com-ments about her frst approach to the building o Ministryo Education and Health, Bo Bardi described her encoun-ter with the daily lie o the city with great enthusiasm. Shewas impressed by peoples brusqueness on the streets o

    Rio. She took their lack o polish both as a sign o impo-liteness and as evidence o their genuine distance romwhat she called European civilization. Bo Bardi said thatRio de Janeiro was very cosmopolitan and attracted manyoreigners ater the World War II. She particularly liked astory about a German proessor who had been hit by thespit o a passerby in a bar at Carioca Square, and whodecided to leave the country because o that. Her enduringascination with this kind o cultural contrast is likely to bemore revealing about her encounter with Brazil than herreconstructed memories about the Ministry building.

    To Bo Bardi, Brazil had no middle term. There was nomoderation. And it was in this peculiar situation - morethan in the countrys modernizing ambition - that she sawpotential or developing her notions and practice towarda Brazilian aesthetics in the countrys cultural and socialtension. Her departure rom Italy happened in a momentwhen Italian architects debated the challenges o postwarreconstruction, but she had become disappointed with thepromises o modernization. She also elt out o place inBrazil. Unlike the spontaneity o Brazilian architects shewas still very much inuenced by the stricter work ethicso Milan. Also, unlike the experience o modern Brazilian

    architects, the war and its atermath had deeply aectedthe values o the young architect, during a period in whichItalian architectures rationalist belies quickly yielded toneo-realist existentialism. This context oered Lina Bo Bardithe seeds o a value system, which she transerred to theertile, yet hard to cultivate, ground she ound in Brazilian

  • 7/31/2019 05 ZL Entre Margens e Centro 070210

    20/35129

    ARQTEXTO14

    casal Bardi se mudou para So Paulo, contra a vontadede Lina de permanecer no Rio. Dessa orma, ela se tor-nou responsvel, aos 32 anos de idade, pelo projeto doMuseu de Arte de So Paulo no prdio do Jornal DiriosAssociados de propriedade de Chateaubriand. Deixar aestimulante vida cultural do Rio de Janeiro pelo que se re-duzia promessa de um centro industrial emergente, masainda provinciano, oi uma grande decepo para ela.

    Contudo, o novo pas e a nova cidade iriam lhe oereceroportunidades profssionais e pessoais inigualveis.Ao fnal da vida, Bo Bardi gostava de dizer que tinha

    fcado muito impressionada assim que viu o prdio parao Ministrio da Educao e Sade Pblica, concludo em1943, ao se aproximar de navio da baa do Rio de Ja-neiro. Ela metaoricamente descreveu o prdio modernistacomo uma vela que se abria aos ventos de novas possibi-lidades arquitetnicas. Para ela, o Brasil representava umpais onde tudo era possvel, onde no haviam runas [deguerra], um novo lugar para utopias.22 Em adio aosseus comentrios sobre sua primeira viso da sede do Mi-

    nistrio, Bo Bardi descreveu seu encontro com a vida coti-diana da cidade com grande entusiasmo. Ela havia fcadoimpressionada com a atitude brusca das pessoas nas ruasdo Rio. Ela tomou essa alta de polidez tanto como um si-nal de alta de educao quanto como prova da genunadistncia do que ela chamava de civilizao europia.Bo Bardi dizia que o Rio de Janeiro era muito cosmopolitae que havia atrado muitos estrangeiros depois da Segun-da Guerra Mundial. Ela particularmente gostava de umahistria sobre um proessor alemo que ora atingido pelocuspe de um passante num bar do Largo da Carioca eque decidira deixar o pas por causa disso. Seu ascnioduradouro com este tipo de contraste cultural talvez sejamais revelador sobre seu encontro com o Brasil do quesuas memrias reconstrudas sobre o prdio do Ministrio.

    Para Lina, o Brasil no tinha meios termos. No ha-via moderao. E oi nessa excentricidade, mais do quena ambio modernizante do pas, que ela viu potencialpara desenvolver seus conceitos e sua prtica para umaesttica brasileira. Sua partida da Itlia ocorreu no mo-mento em que os arquitetos italianos discutiam os desafosda Reconstruo do ps-guerra, enquanto ela se havia de-sencantado com as promessas de modernizao. Ela tam-

    bm se sentia deslocada no Brasil. Dierentemente da es-pontaneidade dos arquitetos brasileiros, ela estava aindamuito inuenciada pela tica de trabalho mais estrita deMilo. Ao mesmo tempo, dierentemente da experinciados arquitetos modernistas brasileiros, a guerra e as suasseqelas marcaram proundamente os valores da jovem

    design and architecture.She saw the modernist cultural project in Brazil as the

    result o the conrontation between dierent cultural identi-ties. Her transit between both sides o the Atlantic and theEquator along with her multiple cultural afliations allowedher to stand at a privileged position o thought and action,transerring the dissatisaction and hope o her generationto a new context. The writings and the inherently hybrid

    projects that she developed in Brazil oer a meaningulrecourse or exploring the compromise between marginsand centers in the discourse about architectural moder-nization. She tried to constantly move between modern,everyday, urbane and popular reerences as she proposedthe coexistence between the strategic concision o the ra-tionalist rule and the tactic spontaneity o what she saw asbeing authentically Brazilian.

    Even though Bo Bardi occupied a privileged social po-sition, the criteria o modernity and cultural identity sheembraced were in the counter-current o those generallysupported by the Brazilian elites, creating an ambivalent

    relationship to the realities around her. While developingthose criteria, she inverted the values o European moder-nism twice onto itsel: frstly, through her experience at themargins, in the eccentricity o Italy and or being a womanand then a oreigner; secondly, through the realities sheound in the margins o the cultural establishment in Bra-zil, a country she saw as as segregated and archaic butrich or its miscegenation and spontaneity. Eccentricity andcentrality, deprivation and excess marched in parallel inher work as an editor and critic as well as in her activitiesas a designer and architect, proposing to bring togethertraditionally opposed conditions. In the movement betwe-en afrmation and transgression o the norm she recogni-zed meaningul ways o building and living.

    Early on, Bo Bardi occupied a controversial place inthe almost void space o architectural criticism in Brazil.She saw fssures in the overall project o modern Brazilianarchitecture and tried to deal with them productively throu-gh her design work and the articles she edited or Habitatmagazine between 1950 and 1954. Her critical appro-ach was more incisive than North-American critics andmore guarded than the celebratory Brazilian tone, but shewas more optimistic and romantic than skeptical European

    critics in the 1940s and 1950s. While in the United Statescritics endorsed the ormal prowess o Brazilian architects,their colleagues in Europe suspected that the reduction omodern architecture to a Brazilian style risked denying itsown principles. Among such critics was Bruno Zevi, lie-long riend o Bo Bardis. In his 1948 book Saper veder

  • 7/31/2019 05 ZL Entre Margens e Centro 070210

    21/35130

    ARQTEXTO1

    4 arquiteta, num perodo em que a crena racionalista daarquitetura italiana cedia lugar rapidamente ao existen-cialismo neo-realista. Esse contexto orneceu as sementesde um sistema de princpios que Lina Bo Bardi transeriupara o cho rtil, porm dicil de cultivar, que ela encon-trou na arquitetura e no design do Brasil.

    Ela via o projeto modernista no Brasil como resultadodo conronto entre dierentes identidades culturais. O trn-

    sito entre os dois lados do Atlntico e da linha do Equadorjunto s suas mltiplas afliaes culturais lhe permitiramuma condio privilegiada de pensamento e de ao,transerindo o descontentamento e a esperana de suagerao para um novo contexto. Os escritos e os projetosinerentemente hbridos que ela desenvolveu no Brasil ex-ploram as tenses entre margens e centros no discurso so-bre a modernizao arquitetnica. Lina tentava constante-mente mover-se entre reerncias modernas, quotidianas,sofsticadas e populares ao propor