0[2úscul>s cu

189
0[2úscul>s cU<3&fmaçõO' 3? TUainaux

Upload: others

Post on 19-Nov-2021

4 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

0[2úscul>s cU<3&fmaçõO'

3? TUainaux

#

*

i

I

O P Ú S C U L O S DE F O R M A Ç Ã OPara uso das Congregações Marianas

1. Série

CURSO DE F O R M A Ç A O RELIGIO SA

2. Opúsculo

“SOU EU O SENHOR”

PUBLICAÇÕESdd

CONFEDERAÇÃO N ACIONAL DAS C O N G R EG A Ç Õ ES MARIANAS Rio dc Janeiro - Rua Senador Dantas, 118 - 9.® - Caixa Postal 1.561

" S O U EU O SENHOR"

pelo

P. WALTER MARIAUX 5. J.D ire to r do S ecre ta riado G eral das C ongregações M arianas cm Roma

E D I T O R A :

EDIÇÕES TÉCNICAS BRASILEIRAS LTDA.Rua da Figueira, 701 - Caixa 3798 - TcL 3-5345 • S. Paulo

i

“ SOU EU O SENHOR”

*

Imprimi potest

Rio de Janeiro, 2Ó de Abril de 1942

P. Luiz Riou S. J.

Prep. Prov. do Bras. Central

Imprimatur

Rio de Janeiro, 3 de Maio de 1942

“f Sebastião

Cardial Arcebispo do Rio de Janeiro

Neste livrinho que expõe os nossos deveres para com Deus, tive em vista de modo particular a mocidade, quer do nosso país quer de todo o mundo moderno. Considerei por isso o movi­mento litúrgico tão vigoroso atualmente e fecun­do, tratando largamente o Sacrifício, tanto em ge­ral, como em particular a Santa Missa, procurando naturalmente evitar as exagerações e aberrações deste movimento que se manifestam cá e lá, pre­judicando não só a vida genuinamente cristã, mas também esse movimento mesmo.

O espiritismo que grassa neste país como uma epidemia, exigia uma refutação mais acura­da e assim foi tratado cabalmente sobre uma base científica, em três capítulos de autoria do meu caro amigo e irmão em J. C. Fernando Avila, a quem expresso minha admiração e agradeci­mentos.

São Paulo, 12 de A bril de 1942.

P. Walter Mariaux S. J.

INTRODUÇÃO

Tarde de Domingo. Três rapazes passeiam no parque da cidade. De conversa em conversa veem a falar sobre a Providência divina e a guerra atual.

Um deles, Antônio, congregado mariano, acha que as desgraças, as devastações, a miséria inaudita de tantos milhares de homens, devem ser interpreta­das como manifestações da ira de Deus, que por meio destes castigos procura reconduzir a humanidade ao respeito de suas leis.

— Xinguem pode negar, que os homens indivi­dual e coletivamente teem obrigações morais para com Deus; e, quão pouco se importa a nossa gera­ção com estes deveres, apesar das admoestações c advertências da Igreja...

— Qual obrigação moral!... exclamou o Lúcio. Você gosta de ouvir pregações de moral? Porque não se contenta a Igreja com a pregação da doutrina e com o culto divino? O homem verdadeiramente religioso cumpre os seus deveres espontaneamente.

— Sou da mesma opinião, confirmou Plínio. A multidão de minuciosas prescrições morais certamen­te não contribue para angariar simpatias pela doutri­na católica. Não foi Cristo que nos deus o exemplo da verdadeira religiãot Ora, ele nunca pretendeu es­quadrinhar as conciências hutnanas. Não quadra bem à verdadeira religião, que, afinal, é apenas a ele­vação da alma a Deus, o estabelecer infinitas pres­crições e proibições que só servem para oprimir o

10

homem e tolher-lhe os surtos para Deus, tirando to­do o prazer da religião. . .

Entretidos neste diálogo, aproximaram-se do restaurante que servia às mesas espalhadas no jar­dim.

— Vamos tomar um refresco? convidou Antô­nio, e, sentados, continuaremos nossa conversa.

— E’ pena, mas não posso, respondeu Lúcio, olhando o relógio. Minha esposa já deve estar es­perando por mim. Há quatro semanas que me casei e não posso deixar minha mulher tanto tempo sozi­nha,

— Também eu tenho um compromisso, disse Plínio. Meu novo cargo de assistente do hospital me impõe novas obrigações. Este Domingo c dia de meu plantão, e às 6 horas devo estar no hospital.

— Vocês estão falando sério? perguntou An­tônio.

— Porque não? Novas relações impõem novos deveres.

— Certamente. Mas estou admirado de vocês pensarem assim, se há alguns minutos defenderam o contrário. A declaração de que novas relações im­põem novos deveres, è a mais concludente justifica­ção da moral cristã.

— Como assim?— Muito simples. A vida de cada um de vocês

mudou-se objetivamente. Pelo casamento de um e pelo novo cargo de outro, a vida adquiriu relações que antes não existiam. E vocês, homens honestos,

11

não hesitam tirar disso as consequências. . . Pois bem, por que não tiram as mesmas consequências no terreno religioso?

— Mas que tem isto a ver com a Moral?— Pelo batismo transformou-se objetivamente a

nossa vida; surgiram relações que antes não haviam,’ relações infinitamente mais importantes do que um casamento ou um novo cargo. Pelo batismo trans- formamo-nos em filhos de Deus, irmãos de Jestís, membros de seu Corpo, a Igreja, lutadores pelo seu Reino. Tudo isso, como sabemos, nos ensim o dogm a... Não devemos então conformar a nossa vida a estes novos fatos? Falar com Deus conto fi­lhos falam ao pai, conservar esta graça da filiação, lutando contra o pecado, receber a graça de Deus nos sacramentos, etc., com outras palavras: observar as prescrições morais?

— Quer dizer, que a Moral não seria outra coi­sa senão as consequências dos dogmas da Igreja?

— Isso mesmo. E por isso, dogma e moral não podem ser separados completamente. Suponhamos, por exemplo, que um moço venha a ganhar na lote­ria o maior prêmio', que um soldado seja promovido a marechal. Não lhes adveem, em cada um destes casos, novas obrigações e novos direitos?

E não se dará o mesmo com as verdades dogmá­ticas? 0 fato, por exemplo, de que eu, pelo batis­mo, me tenha tornado filho de Deus, herdeiro dum patrimônio eterno, de que pelos sacramentos tenha

12

recebido forças verdadeiramente divinas, que seja destinado à vida íntima na beatitude do Céu, e tc .. todos estes fatos indubitaveis da minha Fé não me impõem também novas obrigações? Eis o sentido mais profundo da moral: Consequências lógicas das realidades sobrenaturais.

— Esta é, com efeito, uma concepção muito mais simpática da Moral. Até agora concebia a Moral da Igreja como prescrições arbitrariamente impostas pelos sacerdotes.

— De maneira alguma. Basta pensar nos dez mandamentos. Não foi o próprio Deus que nos re­velou sua santa vontade no Monte Sinai?

— Certameutc. Mas o Antigo Testamento já passou. . .

— Mas, lê os Evangelhos. Quantas vezes in- culcou Nosso Senhor estes mesmos mandamentos. "Não vim, diz ele, para abolir ou dissolver mas para cumprir.” Foi êle que insistiu no cumprimento dos mandamentos como sinal do amor de Deus. Não acu­semos portanto a Igreja de querer oprimir o homem ou tirar-lhe o prazer da religião. Ela não faz outra coisa senão promulgar, inculcar e explicar os manda­mentos do Senhor.

Mas, não é verdade que a Moral católica con­tem apenas proibições no sentido negativo f

— Pelo contrário: o conteúdo dos mandamen­tos é positivo, grandioso.

13

Segundo a expressão belíssima de Cristo, eles são a prova do amor: “Quem conhece e observa os meus mandamentos, este é o que me ama." (To. 14, 21; 15,10).

Quantos não falam e escrevem como os rapazes que acabamos de citar, e quantos jovens repetem es- tas objcçõCS, sem refletir. Todos eles' esquecem que a Moral ê essencialmente conexa com as verdadesreveladas da nossa Fé.

Trataremos pois neste livro das nossas obriga­ções morais e. por emquanto, só das que nos ligam aDeus.

O terceiro " Opúsculo’' desta série nos deu a co­nhecer o Deus que a Igreja anuncia. Refutamos as concepções panteistas que identificam o Ser Supremo com o mundo, com o homem ou com a raça. Con­cluímos que acima de nós vive um Deus pessoal tão excelso e tão misterioso, que dele apenas sabemos balbuciar algumas palavras. Contudo, pela revelação, nos fez vislumbrar a vida inefável que em seu seio palpita na Trindade das pessoas: Padre, Filho e Es­pírito Santo. Fez-nos participar desta sua vida pelo dom magnífico que chamamos graça.

Sitn, o grande “Drama da redenção", no qual podemos compendiar a história e a razão de ser da hmnanidade, nada mais c que a história desta vida

14

divina; nada mais é que o seu fluxo para os homens, por intermédio de Cristo, que dela nos fe3 partici­par; e o seu refluxo para Deus, quando com ele nos unirmos, no esplendor da eternidade.

Vamos pois assistir ao desenrolar-se deste '' Dra­ma da humanidade".

Poderiamos imediatamente continuar a expor as obras de Deus: a criação, a graça original, a queda dos primeiros homens pelo pecado, etc.

Antes, porem, convem determo-nos um pouco para tirar as consequências do que vimos estudando.

Perguntemos a nós mesmos, qual deve ser nossa atitude diante deste Deus que nos revelou sua inefá­vel essência e sua grandeza. Por outras palavras, acrescentemos à exposição do dogma, a das nossas obrigações morais com respeito a Deus.

Quem quer que, acompanhando o “Opúscxão" precedente, reflete um instante sobre quem é Deus, só pode tirar uma conclusão: a ele pertence todo o nosso amor! Como duvidaríamos dedicar-nos a ele sem reservas, quando considerarmos que ele c tudo e que nós somos nada ante seu conspecto? Realmente, se há um ser que merece nossa dedicação total, outro não é senão a Trindade augusta.

Mas, porque Deus, tão sublime, faz questão de receber a homenagem de nós, tão pequenos?

15

De fato, muitas e muitas vezes, repetiu e incul- cou Deus o quanto ê cioso de nossa veneração. Pela primeira vez formulou as nossas obrigações para com Ele nos três primeiros mandamentos da Lei, solene­mente promulgada no Monte Sinai.

0 primeiro destes mandamentos reza assim: — “Sou Eu o Senhor, vosso Deus, que vos tirou da terra do Egito, e da casa da servidão. Não tereis ou­tros deuses senão Eu. Não fareis idolos esculpidos, nem imagem alguma daquilo que está no céu ou na terrai para adorá-los.” (Exod. 20, 2-4).

O sentido destas palavras é resumido com pre­cisão pelo catecismo: “Amar a Deus sobre todas as coisas/’ No Novo Testamento, Jesús Cristo em pes­soa, que viera para confirmar a Antiga Aliança, es- tatue esta obrigação como mandamento supremo do cristianismo. (Mat. 22,37-39).

Desta dedicação a Deus pela adoração t pelo amor, falaremos pois neste livro. Veremos como ela se funda nas relações mesmas do homem para com Deus, e quanto ela nobilita a alma hutnana. A se­guir, trataremos do segundo mandamento, que nas inculca o profundo respeito para com o nome de Deus. Finahnente, consideraremos a expressão mais clássica e mais sublime da adoração e do amor de Deus no Sacrifício da Missa, ponderando especiaè- mente sua projeção prática sobre moíjo vida. e fn- zendo em tudo sobre sair o exemplo de nossa Mie e Senhora, Maria Santíssima.

Capítulo I

A adoraçãoAssisti uma vez numa Congregação Mariana

a um círculo de estudo, em que foi tratado o tema: Nossa vida de oração. Eram questões interessan­tes e uteis as que os moços ventilavam, p. e. os motivos da confiança, a oração aparentemente não atendida por Deus, a conformidade roín a divina vontade etc.

Seguiu-se animada discussão por uns três quartos de hora em que uma coisa observava invo­luntariamente: nem uma só vez tora pronunciada a palavra “adoração” .

Quando proferí a palavra esquecida, averiguei que quasi ninguém sabia dizer alguma coisa sobre esta forma de oração.

Podemos concluir com certeza que a adoração é a forma de orar menos praticada pela mocidade e mais alheia à sua mentalidade.

Se duvidas disso, meu amigo, faz uma prova com teus companheiros. Serão pouquíssimos os que, ouvindo a palavra “oração”, hão de referí-la à ado­ração. E a tua própria oração não comprova este asserto?

Adorar é o que mais se omite na oração.

Como se explica? Pelo nosso egoismo. Porque rezamos? Para receber alguma coisa de Deus. Quais são as nossas orações mais fervorosas? Sem dúvida as que fazemos para sermos libertados duma angús­tia ou dum grave perigo, ou para alcançar um bem

17

que nos parece importante. Como se vê, até no nos­so fervor lateja um pouco de egoismo.

Essa omissão ou negligência da adoração é uma pena. Porque a adoração é a mais nobre e a mais bela prece. Pois, na adoração, saimos do*nosso in­teresse pessoal para só nos preocuparmos com a ma­jestade e a glória de Deus. Adorar é com efeito uma forma de orar ntais perfeita e mais pura do que a súplica.

Façamos pois uma revisão das nossas orações e dediquemos a Deus de vez em quando um ato de ho­menagem, de louvor, de reconhecimento, sem olhar de soslaio um bem a alcançar.

Tenhamos presente a excelsa sublimidade de Deus. Em verdade, o nosso único direito em face desse supremo Ser, tão soberano e misterioso, é o mais profundo reconhecimento. Adorar é um dever, é o primeiro dever que Deus nos prescreve nos seus 10 mandamentos.

Merece esta forma de oração nossa reflexão mais profunda e particular.

QUE ENTENDEMOS POR ADORAÇÃO? •

Quando os povos pagãos da antiguidade pres­tavam culto ao Ser Supremo, lançavam-se ao pó, per­maneciam em sua presença no mais respeitoso si­lêncio, ou ofereciam-lhe sacrifícios.

Quando Moisés na sarça ardente ouviu a voz de Deus, velou a face, sem se atrever a fixar o seu Senhor (Exod. 3,6).

18

Quando ao profeta Ezequiel, se manifestou a grandeza do Altíssimo, prostrou-se elé com o rosto em terra (Ezech. 2,1).

O mesmo fazia Cristo, nos diz a Escritura, quando orava ao Pai no monte das Oliveiras. (Mat. 26,36; Marc. 14,35).

Os Magos do Oriente veneraram prostrados o Rei recém-nascido. (Mat. 2.11).

O cego de nascimento, curado por Jesus, ou­vindo ser ele Filho de Deus, atirou-se a seus pés para adorá-lo (Joh. 9,38).

Quando, em nossas igrejas, na benção do San­tíssimo, é exposto nosso divino Salvador, inclinam- se Sacerdote e povo, em profunda adoração.

Não há quem o não reconheça: A adoração co maior culto que nós, homens, podemos prestar: só ao próprio Deus o dirigimos.

QUE CONTÉM ESTE ATO DE ADORAÇAO?

Não é facil analisá-lo. Contudo, se o exami­narmos mais de perto, descobriremos nele dois ele­mentos : a conciência de uma verdade, e o desejo deculto.

E que verdade é esta? E ’ dupla: ser Deus aEssência suprema e absoluta, sermos nada diante dele.

19

A conciência desta verdade é sem dúvida a nota profunda que penetra todo o ato de adoração. E , pois, a fé viva como a raiz, da qual, espontâneas, afloram a adoração e o respeito. A fé nos diz, como vimos, que Deus é o mistério imenso, o Incompreen­sível, cujo semblante anseiam os Anjos contemplar, que habita a luz inacessível, o três vezes Santo, o Onipotente, a quem, nem por conceitos podemos apreender, nem exprimir em palavras.

O.adorador deve estar profundamente penetra­do desta verdade. Daqui lhe decorrerá a convicção de que não é nada; de ter sido criado por pura bondade de Deus, cuja vontade o mantém na exis­tência, e do qual depende a cada instante de sua vida.

Desta convicção nasce o ato especificamente la- trêutico: o culto de Deus. E’ um ato da vontade.

Neste ato, ainda uma vez, podemos distinguir dois elementos, segundo focalizamos Deus ou o ho­mem: com respeito a Deus, o sentimento de suagrandeza, merecedora do maior culto de que somos capazes: com respeito a nós. a confusão por nossa pequenez.

Observemos a linguagem de uma alma fervorosa ante o seu Senhor. Não busca frases feitas, as pa­lavras lhe brotam espontâneas. Enquanto fixa o olhar no Pai celeste, procura louvá-lo com expres­sões hauridas de tudo que é belo, grande e excel- so. Mas sente a pobreza de seu vocabulário, e na

20

exaltação do êxtase, repete sempre as mesmas pala­vras de veneração e louvor.

Não o experimentamos nós mesmos, quando numa hora de recolhimento profundo, estamos ajoe­lhados diante do SSmo. Sacramento e do fundo de nossa alma adoramos o Deus escondido?

E não é o mesmo que nos ensina a S. Escri­tura, quando diz que os Anjos e Santos, ante o tro­no de Deus, repetem como que embriagados pelo mais respeitoso amor: “ Santo, Santo, Santo” . . . ?

No ato de adoração palpita ainda um impulso irresistível de nos fazermos pequeninos, de nos es- - migalharmos quasi, de nos aniquilarmos diante da majestade do Ser Supremo. Ao culto do Onipoten­te, vincula-se inseparável a avaliação da própria mes­quinhez.

Eis porque, quando a atitude de adoração tende a se externar, inclina-se o homem ou prostra-se no pó. A oferta, o sacrifício não é outra cousa senão a concretização simbólica mais natural deste senti­mento. No sacrifício encontra ele sua mais insigne e adequada interpretação: Deus é tudo, nós somosnada; a Deus nos imolamos em preito de submissão, aniquilamo-nos em sua presença.

Assim explicamos o fato de, em todos os povos que cultuavam um Ser superior, encontrarmos o sa­crifício como simbolização da adoração ao Absoluto e da afirmação do próprio nada.

Capítulo II

Louvai ao Senhor 1Falamos sobre o nosso primeiro dever para com

Deus, a adoração.

Depois de termos perscrutado a íntima atitude do homem que adora, passamos à aplicação prática.

I. Quem nos convida à adoração?

1. Deus mesmo.

Pois esta homenagem c dcznda a Deus.Não é ele o Senhor absoluto? E, em seu con­

fronto, não somos nós nada? A adoração é pois a única interpretação legítima de nossas relações com Deus. Ele deve receber tal culto de suas criaturas, pois, como veremos, esta é a profunda razão de ser da criação: glorificar a Deus.

E Deus expressamente o exige.Já o primeiro mandamento nos obriga a adorar

a Deus. “ Sou Eu o Senhor, teu Deus. Diante de mim não tereis deuses alheios. Não fareis imagens esculpidas para adorá-las/’

Há uma prece que Jesús mesmo nos ensinou, — é o Padre-Nosso. Quantas vêzes o repetimos 1 E nesta prece está explicitado, na primeira parte, o ato de adoração: “Santificado seja o vosso nome'’.

22

2. A Igreja

Com que insistência exorta-nos ela à adoração!

Em cada paróquia celebra-se, pelo menos todo domingo, uma hora de adoração diante do SSmo. Sa­cramento, em que os fiéis adoram a Deus com ora­ções e cantos. A Igreja instituiu e confirmou famí­lias religiosas inteiras exclusivamente dedicadas à adoração perpétua de Deus. Mostra-nos sua estima pela adoração na liturgia. Cada dia começa a reci­tação do divino ofício com um “ Invitatorium”, i. é, um convite para louvar a Deus, seguido de um mag­nífico Salmo (N. 94). Neste repete-se o apêlo à glorificação do Altíssimo enumerando três motivos: porque ele é o Senhor, porque criou o mundo e por­que nos agraciou com sua paternal direção.

3. Toda a criação

Ela nos dá o magnífico exemplo.Eis os espíritos celestes e as almas dos escolhi­

dos, que no céu adoram a Deus sem interrupção e cantam suas loas. Em traços magníficos vemos des­crito este quadro no Apocalipse:

Os querubins.. . "cantavam sem descarno dia e noite, dizendo:

Santo, santo, santo

E’ o Senhor, Deus onipotente.

23

Que era, que é e que há de vir.Enquanto os querubins tributavam glória, honra

e ação de graças ao que estava sentado no trono e que vive pelos séculos dos séculos, os vinte e quatro anciãos prostravam-se diante de quem se achava sen­tado no trono e adoravam aquele que vive pelos sé­culos dos séculos. Depositavam as suas coroas ao pé do trono, dizendo: “Digno és tu, Deus nosso, dé receber glória, honra e poder. Tú criaste o univer­so. Por tua vontade c que se fez e foi criado.” (Apoc. 4, 8-11).

Mesmo os condenados no inferno estão incluí­dos neste coro. Pois, eles prestam culto a Deus, confessando, ainda que contra a vontade, sua justiça, majestade e onipotência.

Até, num certo sentido, as criaturas irracionais sc fazem ouvir neste concerto de louvores ao Criador. Submissas à sua vontade, obedecem às leis que lhes impôs. Exaltam-no e celebram-no ainda, refletindo, nas suas variegadas perfeições, a Beleza infinita.

Em versos arrebatadores, chama o salmista a nossa atenção para a voz da natureza que enaltece ao Criador; p. ex.:

“Senhor, nosso Senhor ,Quanto é admiravel o vosso nome Em toda a terra!Porque a vossa magnificência Se elevou sobre os céus...

24

Porque vejo os vossos céus,Obra dos vossos dedos, a lua e as estrelas Que vós creastes...Senhor, nosso Senhor,Quanto é admiravel o vosso nome Em toda terra!” (Ps. 8).

"Os Céus narram a glória de Deus,E o firmamento proclama as obras de suas mãos.O dia expede a palavra ao dia,E a noite dà ciência à noite.Não são as falas deles e os dizeres deles,Desses de que se não ouçam as vozes:0 seu som repercutiu por toda a terra,E em todo o universo as suas palavras.” (Ps. 18)

"Louvai jubilosa a Deus, toda a terra,Cantai, exultai e dizei salmos.Entoai cânticos ao Senhor na citara,Na citara e em voz de salmo,'Com trombetas de metal, e ao som da corneta Regozijai-vos diante do Senhor, que é Rei.Mova-se o mar e tudo quanto contem,0 orbe terráqueo e os que nele habitam.Baterão palmas os rios, até os montes exultarão Pela presença do S en h o r...” (Ps. 97).

"Vós dos céus, louvai ao Senhor; louvai-o nas al-[turas.

25

Uouvai-o, todos os seus anjos; louvai-o, todas as[jm<w potestades.

Louvai-o, sol e lua; louvai-o, todas as estrelas e a[luz.

Louvai-o, céus dos céus, e todas as aguas que estão[sobre os céus

Louvent o nome do Senhor; porque ele falou, e fo*[ram feitas;

Ele ordenou, e foram criadas.Ele as estabeleceu para sempre, c pelos séculos dos

[séculos.Traçou tona lei, e não desaparecerá.Louvai ao Senhor, vós da terra, dragões e todos os

[abismos.fogo, granizo, neve, gelo, sopros das tempestades, Que obedeceis à sua palavra.Montes e todas as colinas; árvores frutíferas e todos

[oí cedros.Animais e rebanhos de toda espécie, serpentes e aves

[que voam.Reis da terra e todos os povos; príncipes e todos os

[juizes da terra.Mancebos e virgens, os velhos com adolescentes Louvem o nome do Senhor.Porque só o nome dele se tem elevado,O seu preito está sobre o céu e a terra,E ele ergueu o poder de seu povo.Rompa um hino de todos os seus santos, dos filhos

de Israel,Do povo que se lhe aproxima (Ps. 148)

26

4. A tua própria dignidade.

Porque a adoração é a ação mais digna do ho­mem.

Um dia a famosa rainha de Sabá visitou Salo­mão. Atraira-a a fama de sua sabedoria e riqueza extraordinária. Vendo o luxo indescritível da corte do rei de Israel, exclamou a rainha: “ Bemaventu-rados os teus servos que podem estar diante de teu trono”.

E nós que temos a dita de estar diante do trono dum Rei tão grande e tão excelso, e de um Senhor, ante o qual milhares de mundos com toda a sua mag­nificência não são mais do que cinza e pó?!

Como se enganam os que julgam a oração uma atitude indigna de homens e moços! Não, meu ami­go, quando estás adorando a Deus, não és mais o vermezinho vil e fraco; participas da grandeza do Altíssimo! O reflexo da luz eterna cobre tua po­breza, transfigurando-a.

“ O homem nunca é tão arrebatador, como quan­do reza”, diz o grande doutor da Igreja, S. João Cri­sóstomo; “ o homem orando vence em nobreza o rei assentado no trono” .

II. Algumas sugestões práticas.

1 — E’ suficiente adorar a Deus no íntimo da alma ?

valor, «mm *|«t q atló.» a.aU»"" * *••)<* ■ <*

gum. Je«»tk J# v 4>.**A.** v*res adoram o Ity *jui <J'J>Entretanto, ttòo *v‘dv-- pvív'- J j: 'deu um corpo, jam*» *0*» fcV***«wv-' v-ííí^ 'riormentc o* imp̂ U>vt <kdor e Senhor de tv<lv tdo corpo. Pode jaoí .* -fke*••*?*# <'*.•?gral, corpo e espírito. *drt«ração.

A taí posai' e j*toc cootonse.a l o a t m a n ; que já nOS pSPm& l ^ " » - i—rnnira n ny « ^ w w in ios cultos exserott e ; atento. Quanto» quenmnaaoT rar o Ser Soçrennr, pr«atra*ua-»« não «o oxetaáó- rica, mas rea&nemei com oroato-em terra, « iater~ pretavam cooi rnúiãcas e cansas »agra»4S «eu eatii- siasmo retigios©.

A Igreja nos sugere par isto, assumirmos uma atitude recolhida, quando adoramos a Deus, ajoc- Iharmo-nos, estarmos de raão postas, e outras práti- cas piedosas. De experiência própria, todos sabem quanto uma posição respeitosa é apta. a sintonizar o espírito.

2 — Qut ocasiòts st nos ofertctm paratsi* ato.*

O maior culto de que toda a criará© é capta, prestamos nós a Deus na Santa Missa. Nela ét da fato, o próprio Filho da Deus, Jesus Cristo», nosso

28

irmão, que o adora como nosso chefe e nossa cabeça; fá-lo em nosso nome. Cada Missa que celebramos na terra, é oferecida a Deus por toda a Igreja, em Jesús Cristo. Daí entenderemos, porque nos impõe a Igreja e assistência da Missa dominical.

Além disto prestamos culto a Deus, quando reci­tamos devotamente o “ Padre Nosso”. Nas orações que fazemos em casa, orações da manhã e da noite, nas que fazemos na igreja durante a santa Missa, na recepção dos Sacramentos, ou quando entramos nu­ma igreja, nunca deixemos de fazer profundos atos de adoração.

Estes, interpretados sem atavios, seriam, por exemplo:

" 0 J Deus infinito! Creio que aqui estais pre­sente, como em toda parte. Sinto a convicção pro­funda de que sois o Criador c soberano Senhor do universo, como de todo o meu ser. Tudo vos deve obediência e serviço. Eu sou um nada ante o vosso conspecto, nem mereço sequer um olhar vosso. Com veneração, prostro-me ante vossa presença, e adoro, cheio de respeito, vossa divina Majestade. Queria poder-vos adorar como os Anjos e Santos no céu. Oh! fôsse eu penetrado daquele espírito de amor e ado-ração com que vossa bendita Mãe, a Virgem

/,Maria, vos acolheu, quando pela primeira vez vos viu, seu Filho, na pobre mangedoura, e com que vos venera perpetuamente no céu. Seja toda a tni-

29

nhã vida um perene louvor a vós, grande Deus, se jam meus pensamentos, palavras e obras outros tan­tos louvores à vossa majestade. Para isto dai-me a vossa graça".

Quando disponho de tempo, posso à vontade de- ter-me mais nalgtms dos pensamentos desta formula.

Poderosos estímulos a que adoremos e pres­temos culto a nosso Senhor, encontramos nas ora­ções da Santa Missa, como seja: no Glória, no Prefácio, no Sanctus, em muitos Salmos (citamos os 144, 145, 146, 147, 148, 149, 150) e hinos, por exemplo, no hino dos três jovens ná fornalha, (Daniel 3, 52-90).

E ' um precioso hábito, antes de cada oração, despertar nossa fé com um breve ato de adoração. Antes de apresentar a Deus meus pedidos, dir-lhe-ei palavras como estas:

‘Deus eterno, Senhor do ccu e da terra, creio firmemente que sois o Criador de tudo que existe. Estou em vossa presença, e adoro-vos cheio do mais profundo respeito. Uno-me às adorações que vos oferecem os Anjos e Santos no ceu, e aos louvores que continuamente vos eleva a Santa Igreja na terra".

Todo dia, diz o Papa S. Leão Magno, o cora­ção do cristão deve confessar seu autor, com ge­midos de súplicas, ou exultando em louvores, ou com0 oferecimento do Sacrifício.” (Sermo V I de nat.1 J m i

Capítulo III

O reversoNo capítulo precedente detivemo-nos no que de­

vemos fazer. Atentemos agora para o reverso, para as faltas que nos importa evitar.

I. Irreverências.

Vai de si que, contra Deus, qualquer irreve­rência é reprovável, pecaminosa mesmo, quando vo­luntária. Um bom cristão portanto manifestará o máximo respeito a tudo que pertence ao culto divino, em especial aos sacerdotes e pessoas consagradas a Deus. Nos ministros do altar reverenciamos ao pró­prio Deus.

A antiga usança tão distinta de saudar na rua os sacerdotes, tirar o chapéu diante das igrejas, onde Nosso Senhor em pessoa está presente, não deveria ser desleixada pela juventude católica.

O porte de um católico na igreja deve ser sem­pre impregnado de respeito. Quem visita um tem­plo para admirar-lhe a arquitetura, a arte, a configu­ração do interior, não deve omitir, antes de mais nada, uma breve oração e uma respeitosa saudação a

Jesús-Hóstia presente no sacrário.

31nr.

II. Sacrilégios.

O sacrilégio é a mais grave falta que se pode perpetrar contra o respeito devido a Nosso Senhor. Comete-o quem agride pessoas ou seriamente dani­fica lugares consagrados a Deus ou os viola com cri­mes; quem trata irreverentemente ou emprega em usos profanos vasos sagrados, alfaias, cruzes, ima­gens, rosários, paramentos, etc.

Muitas vezes, inimigos da Igreja, como os Cé­sares de outrora e os ateus comunistas do tempo mo­derno, tentaram induzir os cristãos a ultrajar símbo­los sagrados, e milhares de filhos fiéis à Igreja pre­feriram derramar o sangue, antes que cometer tal infâmia.

III. Superstições.

Superstição chamamos qualquer prática pela qual, de alguma causa natural, esperamos um efeito preternatural, que, de si mesma, não pode produzir.

São infindas as variedades: rezas, magias, me­sas girantes, trazer amuletos, talismãs, invocar espí­ritos, espiritismo, atribuir efeitos fatídicos a certos dias, números etc.

1) Estas coisas são desatinos.

‘A reta razão nos diz que existe proporção entre o efeito e a caui necessariamente

Como poderá, pois, o número 13 que não goza de nenhuma realidade objetiva, mas é apenas um conceito de minha mente, ocasionar alguma des­graça?

Como pode um miserável amuleto, um ursinho, um anjo de borracha ou de gesso, preservar um auto­móvel de algum acidente?

Como podem os traços da mão revelar o futuro de uma pessoa? Nem o carater de um homem se deixa ler na palma, quanto menos o futuro! A mão não é como*as linhas da fisionomia, o olhar, que de certo modo refletem a alma.

Como o paladar do pão pode ser modificado, só porque comecei a cortar por uma ponta ou por ou­tra? Altera-se com isto a qualidade da massa?

E ’ indigno de uma pessoa racional deixar-se in­fluenciar por tais vácuidades!

Vivemos conrinuaménte em função do princípio de causalidade. D&.determinado efeito chegamos a correspondente causa. Inconsequente é pois o -su­persticioso que, em certos objetos ou^ácohtedmentbs, descobre efeitos sem causas suficientes, deixando-se por isto enleiar de mil ridículos trastes e ceremônias.

2) Na sua grande maioria são halucinações c neu-rastenias.

Segue alguém em seu automovel. De repente repara que esqueceu o amuleto em casa. “ Hoje é

32

33

dia de alguma desgraça! ', pensa consigo ja todo nei- voso. E realmente é o que sucede: esbarra, pouco depois, com outro carro. — Efeito do am uleto. Ab­solutamente; defeito de bons nervos. Perturbado com sua estúpida crendice, já não giua com a costu­mada segurança.

Chega alguém a um jantar. K’ o décimo te r­ceiro. Duas horas depois é atropelado por um auto ; e porque? Por ser o numero 13? Desatino, pura fantasia! Unicamente porque ele ou o chauffeur nao tiveram a devida atenção.

3) Representam perigo sério para os nervos.

A fé me ensina que Deus me ama, que nenhurn mal me pode acontecer sem sua permissão, que os próprios sofrimentos teem um sentido enquanto ser­vem para me purificar e me proporcionar ocasiões de merecer o céu.

Que fundamento teem porem os temores do su­persticioso? Para ele ou não existe Deus, ou, se existe, tem a seu lado forças maléficas, qualquer cou- sa de sinistro, misterioso e cego, personificado no “destino”, ou em espíritos perversos que sem motivo algum, por puro capricho, nos podem atormentar. Nas adversidades e agruras da vida não vê a provi­dência de um Pai atento e amoroso, que permitindo tais sucessos, sabe dar-lhes uma significação salutar e realizar neles amaveis desígnios. Não, para ele

34

são apenas caprichos do acaso, da ‘'fortuna", são a influência oculta de poderes tenebrosos, em cujas mãos ele é um miserável joguete! O supersticioso não pode ter a menor segurança, uma vez que lhes é dado cruciá-lo sem nenhuma culpa de sua parte.

E ’ de estranhar, pois, se tais concepções pertur­bam, arruinam os nervos e acabam com a vitima num manicômio? Que felicidade invejável a de um cató­lico que se sente sob a tutela de um Deus onipoten­te e misericordioso! Isto compreenderam bem certas tribus germânicas que, como lemos na história, abra­çaram o Cristianismo, porque as vinha libertar da despótica e cruciante ansiedade em que as detinham suas crenças em espíritos malignos.

4) São uma ofensa de Deus.

Pois Deus é o Senhor que, em sua aniavel pro­vidência, tudo governa. E ’ portanto uma injúria a Ele falar e agir como se não existisse, ou como se se deixasse levar em seus desígnios por meros capri­chos, como se permitisse que seus planos fòssetn in­terferidos por potências ocultas, como se levasse em pouco a nossa salvação!

Alem disso, as práticas supersticiosas são-nos vedadas por nossa conciência que proíbe a todo cris­tão de por em risco sua fé, sem causa imperativa. Ninguém pode negar que relações com rodas entre­gues a tais misteres, representam graves perigos para

35

nossas crenças, e isto porque, em tais círculos, em sessões espíritas etc., se ouvèm críticas infensas à Igreja.

5) São mesquinha compensação pela religião per­dida.

Xão só de pão vive o homem. Bens, ocupações terrenas deixam-lhe insatisfeito o coração, que por Deus e para Deus foi criado. O homem precisa de fé em qualquer cousa de superior, que transcenda este mundo visível.

Muitas vezes não conhece o verdadeiro Deus. De 90% dos casos de superstição é responsável a ignorância total ou o conhecimento deficiente da ver­dadeira religião.

Frequentemente a causa reside ainda numa de­serção ignóbil da verdadeira fé. Pois, as doutrinas nítidas da Igreja, sua síntese vital, sólida e conclu­dente, irradiam consequências sobre a vida do ho­mem, circunscrevem-lhe o belprazer, impõem-lhe de­terminados pontos e obrigações. A estes deveres porem não agrada curvar-se. Eis o que se diz: “A fé católica não deve ser verdadeira...". E ante a feição severa da verdade, se vai buscar um refúgio na superstição, que, oferecendo sensação e prazeres mórbidos, não traz consigo a carga incômoda de in- junções morais.

36

6) Acima de tudo porem são indignas de umcristão.

O católico que se entrega a qualquer espécie de superstição, é como o príncipe que troca o palácio por um tugúrio; é como o filho pródigo, que, em vez da lauta mesa paterna, se enxafurda na lavagem de animais imundos; imita o que, achando prazer na cegueira, vela os olhos para não ver. Se queremos ptofligar a superstição, devemos aprofundar a reli­gião cristã e sua significação prática. Ser católico é ter luz, ser rico e feliz. Aderir a superstições é des- pojar-se das riquezas sobrenaturais, e atufar-se nas trevas.

Capítulo IV

O espiritismoSeu fracasso dogmático.

Atingimos aqui o ponto nevrálgico, a questão vital para a Igreja Católica no Brasil. O espiritis­mo, de fato, ao lado do protestantismo, e talvez mais que o protestantismo, constitue um perigoso atrativo para os católicos de fé mal esclarecida. Convém pois que enfrentemos de perto o problema, e o destaque­mos em alguns capítulos à parte.

Que c o Espiritismo?

Para só falar do essencial: é a doutrina que afirma podermos entrar em intercâmbio com os es­píritos de modo ordinário e sistematizado.

Posto isto, eis a nossa tese: tal doutrina, consi­derada quer sob seu aspecto dogmático, quer no seu fundamento experimental, fracassou miseravelmente.

Só não fracassou «uma coisa: na faina de obnubilar multidões de infelizes, abalar-lhes o siste­ma nervoso, tolher-lhes o uso das faculdades mentais, pára acabar com eles no desespero ou nalguma casa de alienados.

Falamos neste Capítulo sobre o fracasso dogmá­tico do Espiritismo.

38

À consideração do espiritismo sob o ponto de vista dogmático, está vinculado o nome de Leon Hip- polyte Denizart Rivail, vulgo Allan Kardec. Foi ele o grande construtor que pretendeu dar ao espiritis­mo foros de religião e de filosofia. Entretanto, de­vemos dizê-lo, faliu o seu intento; porque:

A — NSo criou um corpo de doutrina, mas costurou um acervo de recortes.

Allan Kardec não foi um criador, foi um “ re- mendão”. Senão, percorramos suas teses mestras.

A mais central e especificativa é, como vimos, a possibilidade de comércio organizado com o alem. Foi esta que forneceu o material para sua síntese, que em largos traços se pode resumir: Existe umDeus, inteligência suprema, causa primeira e Senhor de todas as cousas. Sob seu domínio há ainda a matéria ponderável e os espiritos. Estes, que pre- existem àquela, povoam o espaço infinito. Criatu­ras imperfeitas, incarnam-se para se aperfeiçoar e expiar, pelo exercício da caridade, as culpas de vidas anteriores. A união com o corpo é garantida por uma .entidade que atende nome de “ periespírito”, substância fluida, astral, energia vital, que participa a um tempo do espírito e da matéria. Após sucessi­vas incarnações e desincarnações chegam afinal, bons e maus, à posse feliz de Deus.

Lucien Roure, expondo o mesmo apanhado, con- clue, com uma pontinha de sa l: “ à la vérité, on a

39

1 impression du déjà vu” (A gente tem deveras a impressão de coisa conhecida).

E, realmente:1) -A teoria da “ familiaridade com os espíri­

tos é tão antiga como o ocultismo e a magia, para não aludir às infantis concepções de nossos negros e de nossos índios.

2) A existência de um Deus, inteligência su­prema, já encontramos corrente nas mais remotas ci­vilizações, bem como na antiguidade clássica e no povo eleito que professa o culto de um Deus único e criador, sobre o qual o cristianismo veiu trazer as luzes da revelação.

3) A tese da preexistência de espíritos, a se incarnar posteriormente em corpos de empréstimo, podia ser reclamada por Platão que já a ensinava 23 séculos antes de Allan Kardec.

4) A expiação e o aperfeiçoamento moral pela caridade, já o pregara, e, o que é mais, já o pratica­ra o cristianismo, desde seus inícios.

5) A paternidade do periespírito, pode reivin­dicá-la para si Cudworth desde o século XVII, com seu “mediador plástico”.

6) A doutrina das reincarnações teve tantos adeptos, que seria longo enumerá-los todos, desde os budistas na Índia, e os neoplatônicos, até Jean Rey* naud, Pierre Leroux, Charles Fourier, Eugène Sue etc. que foram talvez os “espíritos” com os quais Allan Kardec terá tido melhores relações. Nem fa-

40

lemos de Victorien Sardou que reclama para si “ o cenário da doutrina que Allan Kardec deveria ao depois apenas desenvolver.” 1

7) Deus possuído como termo de nossa pere­grinação terrestre, já o anunciava Jesus Cristo, re­volucionando assim a ideologia pagã, que fazia da vida terrestre a finalidade da vida.

B — Caiu nas mais ridículas contradições.

Sem falarmos das contradições infinitas em que cada vez mais se vai esfarelando o espiritismo, prin­cipalmente no Brasil, atentemos para as contradições foco, donde emanam todas as mais.

1) Contradição no método.

Allan Kardec. o ‘'messias dos novos tempos”, ao encetar sua tarefa de dogmatizador, viu-se cm um lance apertado. Por um lado, devia poder obter informações dos espíritos, que só assim se poderia impor; mas percebia por outro, não convir abrir esta porta, pois seria isto penhor seguro da dissolução da seita. Saiu-se bem. Estatuiu o dogma da dificul­dade, quasi impossibilidade de identificação dos es­píritos. Difícil, senão impossível é poder ter certe­za de que, quem me responde, é o espirito invocado, ou algum outro espírito travesso que se compraz em iludir os pobres “ incarnados”. Entretanto, cousa

(J) Lucicn Rourc, Le mcrviillcuN sj■ iritc. j>g. J46 (Paiis. fieauchcôoe. 7. tá. 1931).

41

curiosa, dois anos incompletos (1855-1857) chega­ram para obter suficientes relações autenticas que lhe permitiram compor o alentado pasticho que é “ Le livre des Esprits” (O livro dos espíritos). Dois anos incompletos lhe bastaram para apurar cada uma de suas teses, cada um dos seus argumentos.

Realmente, não é isto atestar com fatos, uma relativa facilidade de identificação? Isto mesmo en­tenderam bem os seus sucessores, muitos dos quais preferiram ir às fontes, e consultar diretamente os transeuntes do espaço, a tragar o indigesto mistifório do mestre.

2) Contradições na doutrina.

Colhamos apenas alguns dos mais lastimáveis desacertos. Pregara o nosso herói o exercício da ca­ridade. mas suprimiu praticamente toda a sanção, uma vez que. segundo ele. mais cedo ou tnais tarde, todos chegarão ao seio de Deus, e deixou com isto campo aberto para o mais desenfreado egoismo. Afirmara que a vida nos é dada para nos purificar­mos, mas admitiu o divórcio, e com ele, as mais in­fames degradações morais, em que se ceva, ninguém ignora, não só o baixo espiritismo... Defendera que há um Ser superior, Senhor dc tudo quanto existe, mas não viu que, taxando como ^pena ao suicídio o aguado “desapontamento” de não entrar logo na pos­se do bem, praticamente o admitia, e com isto jus­tificava uma usurpação da vida que* pertence ao Criador.

42

C — Fugiu à solução de problemas centrais.

1) No campo ético, deixou tudo tão incerto e penumbroso, que não se encontra uma sanção, uma lei m oral. . .

2) No campo filosófico. Pronunciou-se tão vaporosamente sobre Deus, e com trechos tão desen­contrados, que afinal, não se pode apurar se admitia um Deus pessoal, ou se para ele a divindade se iden­tificava com o universo. Poderiamos aqui levantar- lhe inúmeras questões que deixou indecisas: a inte­ligência individual é uma porção da inteligência uni­versal? Os espíritos tiveram começo? São estrita­mente imateriais? Mas como se explica a verifica­ção de contraditórias no mesmo ser?

Já vemos pois, que para se inculcar ao mundo como mestre e legislador, não basta ter ouvido de uma “corbeille” palavras sibilinas profetizando um papel messiânico junto à humanidade extraviada...

Capitulo V

O espiritismoSeu fracasso experim ental (1)

Dogmaticamente fracassou o Espiritismo, eis o claríssimo resultado das nossas observações e re­flexões feitas no Capítulo anterior.

Agora dizemos mais: O Espiritismo fracassoutotalmente, pois fracassou também seu fundamento experimental.

Os espíritas tentaram esteiar sua tese funda­mental, a troca de idéias com os desincárnados, com duas séries de fenômenos: os objetivos c os subje­tivos.

Examinemos por enquanto o valor demonstrati­vo dos fenômenos objetivos.

São aqueles que importam tuna modificação no mundo sensível. Classiíicam-sc, por comodidade, cm telequineses, e ectoplasmias. Compreendem os p ri­meiros: levitações, dcslocnções de objetos, " rap s" , mesas girantes, contatos misteriosos nos assistentes, e todos os mais que de alguma maneira exigem m o­vimento à distância. Entram na segunda elassv ^ materializações, impressões de iltapas fotogtMb as, e vários efeitos luminosos.

Como garantia liislôrlea pata tais renômmm, apela sempre pata os mesmos nmm « ltm ,u l ox

44

Home, Eglinton, Irmãos Davenport, Mad. d ’Espé- rance, Eusapia Paladino, Marta Béraud, Stainton Moses, Linda Gazzera, Stanislawa Tomczyk.

Entretanto, qne valor científico teem estes tes­temunhos? Façamos apenas algumas observações.

I. Controle insuficiente.

E ’ conforme ao sadio bom senso que o rigor da experimentação seja proporcional à gravidade das conclusões. A conclusão a que pretendem chegar os espíritas é grave: ingerência de espíritos nos fenô­menos mediúnicos. Se em fatos banais, perfeita- mente operaveis por um habil prestidigitador, há in­tervenção do alem, já o cientista, em suas investiga­ções, não pôde mais contar com o determinismo da natureza. Deverá sempre suspeitar uma possivcl in­terferência de forças inteligentes.

Entretanto o rigor do controle nas experiências foi proporcional a tal conclusão? Não, certamentc. Pois que rigor científico pode haver em experiências realizadas numa obscuridade crescente, após horas de intensa expectativa, que debilita os nervos e ofusca as faculdades críticas? Como se pode exercer o de^ vido controle, se o médium exige que os controlan- tes se ponham a conversar, dividindo-lhes a atenção?

Mais ainda. A fiscalização é efetuada por con­tato de mãos e pés. Quem não vê, ser imensamente verosímil que, no momento preciso, quando toda a atenção é solicitada por um ponto, o médium iniciádo consiga libertar-se para dar o “coup de pouce . E

45

porque, dos fenômenos de materialização por exem­plo, nunca se requereu a prova decisiva de um exame

químico ?O próprio Richet, conhecidamente tão acolhedor

para toda a sorte de dados mctapsíquicos, tein a in ­genuidade de confessar: “ Todas as p recauções...tendem a diminuir a intensidade dos resu ltad o s... Se se querem obter sessões brilhantes, é preciso dei­xar o médium bastante l iv r e . . . ; quando preso es­treitamente, com uma vigilância inexorável, o mé­dium não apresenta muitas vezes senão pouca cou-

II. Fraudes constatadas.

Quando se busca uma séria verificação experi­mental, é ainda o bom senso quem fala, uma única vez que se surpreende um operador em fraude, é bastante para desacreditá-lo aos olhos da ciência. Realmente, que certeza se poderá ter, se no instante crítico, prevendo um fracasso, o médium não intervi- rá de novo, no sentido de obter um resultado frau ­dulento ?

Ora, fôrça é confessá-lo, e o confessam todos os que de mediunismo leem alguma cousa mais que as revistas espíritas, todos os médiuns mais famosos,uma ou várias vezes foram surpreendidos em esca- moteação.

karles Richet, T raité de Métapsychique. pg. $18.

46

Eusápia Paladino, que na opinião de Richet é o mais poderoso operador de fenômenos objetivos, não de raro aproximava as mãos dos dois controlan- tes, a modo de podê-las tocar com uma só palma, fi­cando com a outra livre para perpetrar maravilhas. Nem falemos de suas burlas em Cambridge nas ses­sões assistidas por Hodgson.

Home foi qualificado por Faraday de habil pres- timano, e é conhecido o fato de ter sido ele convida­do por Napoleão III a suspender a exibição e a reti­rar-se do território francês, devido a uma escanda­losa fraude constatada.

Sabe-se como foram desmascarados os Irmãos Davenport, e como Madame d’Espérance quasi mor­reu de uma crise histérica por ter sido pegada em flagrante dolo numa operação de ectoplasmia.

Seria longo percorrer todos os nomes; deveria­mos enumerar ainda: Ebstein, Eldred, Haxby, Mad. Wood, Lemb, Caracinni, Bournell, Mad. Williams, Sambor, Bailey, Maddoch, Anna Roth, Miller.

Aliás, os processos fraudulentos dos principais fenômenos objetivos, já estão cabalmente demons­trados depois das experiências de Herédia1 que mereceu de um adepto das seitas ocultas o título de “o mais poderoso médium que existiu”. Convem entretanto ouvir o parecer da comissão do Colégio de França e da Sorbona: 1

(1) Cf. do cit. autor "Spiritism and Comraon Sensc’’. Cf. também Tburston S. J., The problem of Matcrialization.

47

“ Os abaixo assinados declaram sua convicção completa e sem reservas: os fenômenos que lhes fo­ram apresentados não põem em jogo nenhum meca­nismo misterioso. E ’ o médium que os produz : ser­vindo-se do cotovelo para certos contatos aplicados à região dos ombros) livrando do controle uma das pernas, realiza deslocamentos, contatos e projeções de objetos por meio do membro livre”. Assinado: P. Langevin, E. Rabaud, H. Langier, A. Marcelin, I. Meyerson.

Pena é que os espíritas brasileiros aprenderam de nossos protestantes o vezo de continuar sempre a repetir os mesmos argumentos, os mesmos testemu­nhos, mil vezes repudiados pela verdadeira ciên­c ia ! ...

III. Confissões.

Contudo o que de mais sintomático se pode adu­zir, são as confissões clamorosas de médiuns notá­veis. Teem subido valor probativo, porque partidas dequeles mesmos cujas manobras, por muito tempo, tinham sido assoalhadas como decisivas para a tese espírita. Marta Béraud, estudada por Richet, a quem induziu a estranhas conclusões, “ fez declarações pú­blicas a respeito das fraudes a que se prestou” » Ninguém desconhece as retratações de M argarida to x feitas a um repórter do “ New-York H erald” e 1

(1) Leonídio Ribeiro e Murillo de Cam B ras il . pg. 53 (Cia. Ed. Nac. 1931). O espiritismo ao

48

posteriormente, na Academia de Música de Xova- York, as confissões de ambas as intuís, que vieram a desvendar um passado de miserável mercantilismo.

Podíamos multiplicar as citações. Atemo-nos à seguinte, que, por seu tom de sarcástica ironia, mos­tra bem o de que é capaz a vaidade feminil quando se vê cortejada por homens de destaque. E ’ de He­lena Petrowna Blavatskv. uma das fundadoras d<* teosofismo:

“ As pessoas mais inocentes e concienciosas, mesmo as mais cépticas, assinaram sem restrições como testemunhas os processos verbais, e no cntan to, eu sabia sempre que a realidade não correspondia de modo algum ao que se lia nos processos... O ’ se soubésseis quantos leões e quantas águias, em to­das as.partes do mundo, a um sinal meu. se tornaram jumentos, e abanaram submissamente suas grandes orelhas, quando eu calcava mais a tecla.” 3 2

(2) Cit. por René Guéron. Le Thêosophisme, pag. 73, 79.

Capítulo VI

O espiritismoSeu fracasso experimental (2)

Falemos agora sobre os fenômenos subjetivos.Estes são os que, se os quisermos definir com

Richet, parecem concluir pela existência de uma fa­culdade cognoscitiva misteriosa, que o dito autor cha­mou “criptestesia”.

Entre os mais ocorrcntes enumeramos: trans­missões telepáticas, transposição e exteriorização da sensibilidade, fenômenos fiptológicos, alohipóstases, monições e “cross-correspondance”.

O que Richet e outros explicam por uma até então desconhecida sensibilidade, o que Janet, Gras- set, e muitos mais explicam pela cisão de persona­lidade, os espíritas julgam dever atribuir a interven­ções de desincarnados.

Entretanto, quanto mais os fatos hipnóticos e histéricos saíam do terreno misterioso e entravam no científico, quanto mais seus mecanismos ocultos iam sendo descobertos, suas leis fixadas, mais se alastra­va o descrédito do espiritismo nos meios cultos. Com efeito, se excluirmos os fenômenos fraudulentos, os registrados sem a devida crítica, os dramatizados por assistentes suspeitos, os realizados por conivência consciente ou inconsciente dos expectadores, bem

50

poucos restam, e estes mesmos perfeitamente expli­cáveis por forças meramente terrenas.

Examinemos os principais. Antes porem con­vem assentar uma

I. Noção importante.O naturalismo filosófico bem entendido nos en­

sina que não é licito, a quem investiga as causas de um fenômeno, admitir uma interpretação distante, quando há outras mais a mão. Assim é ridículo re­correr a uma teoria preternatural, onde intervem nem que seja uma única hipótese natural plausível.

Vivemos nossa vida de cada dia em coerência com este princípio. Qual é o pai de família que, ou­vindo rumores no terreiro, antes de atribuí-los à al­guma alma do outro mundo, não vai verificar se não se trata de algum simpatizado por suas galinhas? Os cientistas e profissionais, se descobrem leis, se acer­tam diagnósticos, é porque obedecem a esta mesma norma, nem ocorre insistir. Entretanto é este desa­tino que cometem os que ainda alardeiam como fe­nômenos supraterrestres, fatos plenamente conquis­tados pela ciência.

Senão vejamos:

II. Explicações naturais.1) As transmissões telepáticas.

Contra a preternaturalidade de tais fenômenos, permanece de pé a objeção de nunca revelarem co­nhecimentos que não tenham sido elaborados por al-

51

gum homem. A teoria de uma vibração capaz dc atuar sobre os centros cerebrais de uma pessoa dis­tante, cada vez recebe mais confirmações da filosofia e da ciência.

2) Exteriorização da sensUnlidade.

Ouçamos a opinião de Richet, falando dos fenô­menos obtidos por Albert de Rochas, que são os que, no gênero, gozam de maior fama: "Não parecemprovir senão de sugestões."1 Mais servero é o depoimento de M. Remy, membro do juri no con­curso internacional de prestidigitação de 1909, por­tanto em ótimas condições para sentenciar: "Entre mil pessoas insensibilizadas... pelo espiritismo, não se encontram duas que apresentem o fenômeno da sensibilidade exteriorizada” 2. Realmente, a por­centagem é infame.

3) Fenômenos tiptológicos, monições, mensagensetc..

Teem por si a invencível suspeita de nunca exce­derem, no seu conteúdo verbal, os conhecimentos côn- scios ou incônscios dos presentes à sessão. A velo­cidade com que são efetuados, a pouca atenção que lhes empresta o médium, já foram satisfatoriamente

(1) op. cit. p*. 122.(2) M. Rémy, Spirite# *t IUu«Íoni»te»,

52

explicados pela ciência que conhece as possibilidade.-» do autohipnotismo e da dissociaç«ão da persona­lidade.

4) Alohipóstases.

Os fenômenos nos quais o médium representa, com maior ou menor perfeição, papéis contrastante* e pitorescos, também jà não estranham mais aos psi­cólogos. Interessantes são, a este propósito, as ex­periências realizadas por Pierre Janet, obtendo re­sultados períeitamente idênticos aos observados nos centros espíritas.1 Clássicos são os estudos de Flournoy sobre a mais famosa médium no gênero,Helena Sm ith,2 que o levaram a tudo atribuir a recordações latentes evocadas c utilizadas por uma imaginação ardente.

5) “ Crosscorrespondcmcc".

E ’ uin dos fenômenos que mais sofreram as ro- mantizações de prosélitos fervorosos. Fala-se em mensagens que, isoladas, nenhum sentido encerram, formando porem um todo lógico, se tomados em con­junto. O fato acusaria a presença de uma inteligên-

(1) Pierre Janet, L ’automatisme psychologiquc. 3.ã ed. pg. 404. (Félix Alcan, Paris, 1899).

(2) Tb. Flournoy, Des Indes à la Planètc Mars. Étude sur un cas de Somnambulisme avec Glossolalie. (Paris, Alcan, 1900). E ainda: Nouvelles observations sur un cas de SoranambuHtniè avecGlossolalie (Genebra Eggimann, 1902).

53

cia transcendente que presidira a inspiração dos de­poimentos. Eliminados os casos de combinação pré­via, difícil aliás de averiguar, devemos afirmar com Flournoy que a crosscorrespondance, como é descri­ta, jamais foi verificada.

— De tudo o que vimos, resalta pois clara a conclusão, que o fundamento experimental do espi­ritismo, se basta para satisfazer a mentalidades mór­bidas e obumbradas, está muito longe de ser convin­cente para quem o examina com a serenidade do cien­tista.

Tu pois, congregado mariano, não sejas da­queles que, sem o rigor de exame da técnica moderna, admitem ingenuamente ingerências preternaturais espíritas ou diabólicas, nas sessões do ocultismo. Eles só fazem comprometer nossa mãe a Santa Igre­ja, aos olhos dos sábios, que, sem ter consultado as opiniões de seus abalizados teólogos, a acusarão de retrógada e anticientista.

III. Resultado doloroso.

O Espiritismo fracassou. — Mas sejamos justos:

Há realmente um ponto, um só, em que não fracassou. E ’ na faina deletéria de fabricar alie­nados.

Nem podería ser de outro modo. Viver numa atmosfera de provocações malsãs da sensibilidade,

54

passar horas a fio em salões abafados e penumbro- sos, sofrendo o contágio de estúpidas crises histé­ricas, habituar-se a viver projetando as próprias ela­borações cerebrinas sobre a tela chã do prosai smo da vida, só serve para tirar o senso da realidade e acaba por tolher a razão e disturbar lastimosamente as fa-

. culdades mentais, em especial em nosso povo já de si tão sentimentalista.

A ação nefasta do espiritismo é reconhecida pe­los cientistas de todo o mundo que se ocupam da questão. Ouçamos porem apenas a voz de catedrá- ticos brasileiros, sobre o nosso meio.

Fale por nós Afránio Peixoto: '‘De minha ob­servação conclui que os centros espíritas do Rio de Janeiro eram laboratórios de histeria co le tiva ...” '

Falem por nós o Dr. Lconídio Ribeiro e Murillo de Campos na obra a que já diversas vezes recorre­mos: “ A frequência de perturbações mentais con­sequentes às práticas do espiritismo é, no Brasil, cada vez maior” 1 2

Decisivos são os dados do Dr. Xavier de Olivei­ra que define o espiritismo “ loucura epidêmica que ora devasta a humanidade” 3: “ No pavilhão deobservações da assistência a psicopatas, uma nova

(1) Afránio Peixoto, prefaciando a obra de Lconídio Ribeiro e Murillo de Campos, supr. cit. pg. 8.

(2) Leonidio Ribeiro e Murillo de Campos, Op. cit. pg. 61.(3) Xavier dc Oliveisa, Espiritismo e Loucura — pg-

(Coelbo Franco, 1931, Rio).

55

pergunta foi introduzida no questionário da anatn- nese que ali se faz, quotidianamente, dos enfermos entrados: “ Qual o centro espirita que frequenta?...”Em cêrca de 90% dos casos a resposta é afirma­tiva !” 4 5

Numa estatística levantada pelo ilustre professor no hospital nacional de psicopatas, apuraram-se os seguintes dados: De 1917 a 1928 num total de .. 18.2S1 entradas, 1.723 insanos eram portadores de psicoses causadas só e cxclusivamente pelo espiri­tismo. 3

Foi o que levou o ilustre psiquiatra a afirmar que “após a sífilis e o álcool, é o espiritismo o ter­ceiro fator de alienação mental no Rio de Janei­ro”. 6

Apraz-nos ainda aduzir aqui a palavra de nosso velho e invito polemista Carlos de Laet. Assim es­crevia ele na “ A União” de 4 de Fevereiro de 1917 referindo-se aos centros espíritas: “ Delles saem asnevroses que, estragando innúmeras mentalidades,

♦ singularmente as predispõem á perpetração de cri­mes, c principalmente dos que promanam da lascívia e da crueza com tendências homicidas”.

(4) Xavier de Oliveira op. cit. pg. 193.(5) op. c. pg. 197.(6) pg. 198.

56

Concluamos. Se o espiritismo dogmaticamente fracassou, se como fulcro experimental dc suas dou­trinas aduz fenômenos dos cjuais são responsáveis fraudes escandalosas, ou forças meramente naturais, e para os quais invoca potências ocultas, se possuc o terrível condão dc fornecer ingressos para os manicô­mios, não deve causar admiração, que a Igreja mãe solícita do bem temporal e eterno de seus íillios, proiba tomar parte em tais sessões, mesmo como sim­ples cxpectador.

A oportunidade deste aresto sobe de ponto, se consideramos que a penumbra dos bastidores não serve tanto a manifestações dc desincarnados, como de véu para os mais enxovalhantes delitos, apadri­nhados pela figura benigna de Allan Kardec; se con­sideramos que os profetas que pontificam nos cen­tros, pretendendo ser o espiritismo a realização da promessa de Jesus: Quando vier o Espírito de ver­dade. .. (João 16, 13), não passam de fonógrafos de heresias refutadas e dc injustiças desmoralizadas contra a história da Religião e da Igreja.

O espiritismo pois não é religião. E ’ epidemia mental da qual devemos livrar nossa jovem pátria; cia precisa de filhos dotados de bom sistema nervoso para arrostar todas as dificuldades que encontra um povo na estrada ascencional do progresso.

Reflete pois sobre o que aqui expressamos, con­gregado de Maria, procura extrair destas páginas um

57

pequeno arsenal contra as estólidas arremetidas de nossos adversários, esforça-te por completar estes dados com leituras sob a indicação de teu P. Diretor, e depois inclue no teu programa, no teu castelo azul de ideais pela Rainha Imaculada, a decisão pensada c ardente de começar uma campanha contra esta peste que vem arruinando o Brasil e os brasileiros. Será urna campanha religiosa, moralizadora, patriótica, c higiênica!

Capítulo VII

O amor de DeusA lei de Deus no seu primeiro mandamento nos

obriga não só a adorar o Altíssimo, mas também a amá-lo. — Falemos neste capítulo sobre o sentido deste amor.

Que significa: Amor de Deus?Amar a Deus é

I. A maior nobreza da alma humana.

Vivia na parte meridional da França durante a Idade Média um santo sacerdote que, depois de ter servido a Deus muitos anos na solidão, parti­ra um dia a visitar a Terra Santa.

Passando pela Itália, adoeceu e foi encontra­do estendido, sem sentidos, na margem da estrada pelo jovem filho dum conde, que o fez levar ao castelo paterno, onde com o bom tratamento de­pressa se restabeleceu. O jovem, que até então só tinha vivido para ideais mundanos, ficara tão impressionado com a santidade do velho, que pe­diu e obteve dos seus pais a permissão dc acom­panhá-lo na sua peregrinação.

Nas longas horas dc viagem o jovem fidalgo contava com muito ardor ao sacerdote as artes ca- valeirescas que havia aprendido no castelo, mas o santo ancião tinha apenas um soriso de compaixão por tudo isso. Começou então o fidalgo a passar em revista os conhecimentos adquiridos acerca da administração dum grande condado, a cultura da terra, o tratamento dos servos c operários, os cos­tumes da corte e coisas parecidas. Mas também isto fez pouca impressão sobre o homem de Deus. Admirado, perguntou-lhe o rapaz:

59

— Não vos alegrais, padre, de eu ter apren­dido tudo isso para mais tarde, quando for senhor do condado, usar disto para o bem dos meus sú­ditos ?

— Certamente convem, meu filho, que saibas tudo isso, pois pertence aos deveres de teu esta­do. Mas não são estas as tuas melhores qualida­des, nem as mais nobres. Descobrirei em ti fa­culdades muito mais sublimes.

Quando uma vez passaram a noite num hospi­tal, o jovem fidalgo, arrastado pelo exemplo do sa­cerdote, põe-se também a servir aos doentes, a lavar-lhes as feridas, arrumar-lhes as camas etc. No dia seguinte, em caminho, disse o jovem:

— Padre, parece-me que agora compreendo o que me dizias sobre as minhas melhores qualida­des... Sentí uma alegria nova esta noite, no ser­viço dos pobres desamparados.

— Tens razão. O que fizeste aos doentes, foi o fruto de valiosas emoções de teu coração. Mas, a faculdade mais nobre de tua alma, ate agora, não a puseste em prática.

Num famoso santuário dc N \ S \ os peregri­nos dcmoraram-sc alguns dias, e foi aí, que o jo­vem cavaleiro, que até então não tinha participado dos exercícios piedosos do velho, começou a rezar com fervor; impressionado com a piedade do sa­cerdote, ficou o moço ajoelhado longo tempo ao lado de seu mestre. Quando se levantaram, o sa­cerdote disse sorrindo:

— Agora praticaste uma ação mais sublime do que todas as que enumeraste com tanto en­tusiasmo. Até o serviço dos doentes não atinge o valor desta singela palavra: “ Eu vos amo, meu Deus”.

Tinha razão o nosso peregrino? Sem dúvida. Lembra-te disso, meu amigo.

Serás talvez um ginasta de lei, um trunfo nal- gum sport, bem dotado para tua profissão, talvez

60

tens melhores prendas oratórias, manobras com mais êxito os negócios, tens tino administrativo, sabes educar, és um mestre procurado, ou, que sei eu . . . Talvez justamente te ufanas desites títulos.

E, no entretanto, como tudo isto é pouco diante desta realidade:

Tu podes amar a Deus!

Eis uma arte; uma faculdade mil vezes mais va­liosa! Tens em tuas mãos o te pores em contacto com Ele, e te é dado dizer-lhe, a Ele, o Infinito, uma palavra de amor, de amor pessoal. Eis a maior, a mais admiravel de tuas prerogativas. Como uma criança à sua mãe, como um filho a seu pai, como a esposa a seu esposo, podes e deves dirigir-te ao Criador do universo e dizer-Lhe: Eu te am o! . . .Verdadeiramente, este é o ato mais sublime que a alma duma criatura pode produzir .

II. E* o que de mais teu podes oferecer.

O amor é o que há de mais profundo no ho­mem. Fazemos muito por alguém, quando lhe pro­porcionamos subsídios materiais; mais ainda, quan­do lhe sacrificamos nosso tempo, nosso interesse pes­soal, quando lhe dedicamos um olhar amigo, uma pa­lavra afavel. Porem só lhe- doamos tudo, quando lhe doamos o nosso am or.. Pois, neste nos doamos a

61

nós mesmos, doamos o nosso ser; no amor entre­gamos a outrem o que há de mais profundo na nossa personalidade.

i£is um presente digno do Ser supremo. Ou são porventura os nossos bens exteriores o que ele quer? Estes bens que ele mesmo nos deu, e que continuam as pertencer mais a ele, o supremo Se­nhor, do que a nós? — Não, os bens que possuímos, não são o que ele deseja de nós.

E' antes aquele único bem que é inteiram ente nosso: o nosso coração, o nosso amor. E ’ o de quedispomos com piena e soberana liberdade, tão íntimo e essencial, que o mais brutal tirano é incapaz de a r­rancá-lo a força.

Pois, que significa o amor?

Ele é mais que mera simpatia, mais que gra­tidão, é uma entrega total de si, é a oferta do pró­prio eu ao ser amado. Amar é querer bem e é tanto maior e tanto mais puro, quanto mais me esqueço de miin para viver no objeto de minha afeição.

Não encontramos já, no afeto natural de um coração desinteressado, este elemento caraterístico do amor ? este querer bem, este esquecer-se de si este perder-se de vista? A mãe que sabe amar! não pensa mais em si, vive em seu filho. É por isto que os homens, quando se querem dar provas de sua mutua amizade, trocam penhores que se­jam como um representante seu junto ao amigo

62

E deste modo, nos diz Jesus, cjuc devemos auiai- a D eus; com tudo o que somos, com todas as for­ças, mesmo as mais profundas do nosso ser. Re­para como o Mestre insinua, 'numa enumeração pro­gressiva, o quanto nosso amor a Deus deve ser ín­timo e sem partilhas: “ Amarás ao Senhor, teuDeus, com todo o teu coração, com toda a tua alma, com todas as tuas forças” (Mat. 22,37).

Quem ama a Deus assim, como se deve amar, de bom grado pensa nele, contempla sua beleza, nele habita e só anseia por se lhe unir para sempre.

III. E ’ o dom mais divino que podes fazer a Deus.

Algo mais grandioso e mais esplêndido que o amor de Deus é inconcebível. Amando-o, lhe ofere­ces não só o que tens de melhor e de mais teu, mas lhe ofereces uma dádiva divina, nem mais nem me­nos que divina. Ante este poder como parecem pe­quenas todas as tuas prerogativas, todas as tuas for­ças!

Indubitavelmente latejam no homem potên­cias arrebatadoras. Como prova aí estão os gê­nios nos quais culmina o poder de um mortal; aí estão os generais que numa arrancada arrastam suas tropas à vitória; aí estão os grandes organi­zadores, que com admiravel firmeza de cálculos erigem e administram a indústria de países intei­ros; os inventores que dominam a matéria e redu­zem as energias da natureza ao serviço da huma­nidade; OS artistas que vivificam o mármore ou a tela com suas sublimes concepções. Todas estas virtualidades humanas merecem, sem dúvida, nos­sa admiração.

63

Mas, ouve, podes mais que tudo isto! Tu podes atuar a Deus! E isto supera as forças do homem; elas não chegam a tanto, nem mesmo os gênios o conseguem.

Porque atuar a Deus é uiu ato divino.

Sabemos como Deus elevou nossos primeiros pais a uma vida sobrenatural, e os fez filhos seus. Naquele instante, inoculou em suas almas, pela gra­ça santificante, um germen inefável: o poder deamá-lo. E ’ este mesmo poder divino que ele nos outorga também a nós pela sua graça, quando no batismo nos adota por filhos. Adão perdeu-o no pecado original; Cristo porem no-lo restituiu pela redenção. No batismo, que nos faz participantes da graça da filiação divina que chamamos a graça santificante, são-nos infundidas outrosim as virtu­des teológicas, ou seja: o dom da fé, da esperança e da caridade.

O amor de Deus é pois uma força divina que desde o batismo palpita em nossa alma, e que, per­dida pelo pecado, é-nos dado recuperar pelo sacra­mento da confissão.

Em última análise, é portanto o amor, mais uma vez, uma potência divina, pois é o amor com que Deus mesmo se ama. Sem duvida, devemos como que despertá-lo em nós, devemos colaborar com ele, deve­

64

mos como que pô-lo em circulação, cotno se faz com a energia elétrica. Mas ele lá está latente, e quan­do em estado de graça um homem diz a Deus urna palavra de amor, ama-o não com um amor humano, mas com um amor realmente divino.

Em nós vive algo daquele Amor que estreita o Pai e o Filho, na santidade da vida íntima de Deus. A Sagrada Escritura diz expressamente, que o amor de Deus nos é infundido pelo Espírito Santo.

Estupendo mistério! Vemos agora porque o amor é o primeiro dever do cristão? Percebemos já porque tantas vezes nos recorda a Igreja a graça de que gozamos de podermos chamar a Deus pelo doce nome de Pai?

Capítulo VIII

Porque amamos a Deus?Encaramos no capítulo precedente a profunda

significação e a dignidade sublime do amor de Deus. Examinemos agora os motivos deste amor. Porque devemos amar a Deus?

I. Porque ele é o bem supremo.

Quem reflete sobre quem é Deus, não pode fa­zer uma tal pergunta. E ’ o Bem supremo, infinito!

Quem sabe quantas vezes, jovem católico, em­pregaste esta expressão: “ bem infinito”. Já pro­curaste penetrar o seu sentido? Tudo o que nesta vida encontramos, quer de perfeição e beleza natural, quer de ordem moral, — tudo o que nesta terra admi­ramos de bondade, nobreza, pureza, amabilidade, tudo, não passa de um raio perdido da infinita be­leza e perfeição de Deus.

Nosso coração já foi por natureza plasmado para a felicidade. Todo o homem que ainda conser­va um pouco de senso moral, que não abusa misera­velmente de sua liberdade, não pode manter-se indi­ferente ante o Bem que mais que todos é digno do nosso amor.

Amas os encantos da natureza, e como te eleva um empolgante panorama de serra numa fresca ma­nhã primayeril ! Escancaras teu coração ao sopro da

66

arte e te deixas arrebatar ante um quadro, uma es­tátua artística, ouvindo uma peça clássica. Na ino­cência que brilha no olhar de uma criança, parece-te ver algo de celeste. Como te comove a vista do des­velo sacrificado de uma mãe que tudo imola, a saude e a vida, por seu filho; em tal gesto julgas encon­trar o que de mais sublime e mais divino pode haver na terra.

E no entanto, podes estar certo: todas estas be­lezas e grandezas não passam de apagadas sombras, ante aquela formosura que chamamos “ Deus”, o mais alto e mais excelso Bem.

Vês agora o que isto significa? Atinges o al­cance do que dizes, quando rezas: “ Eu vos amo,ó meu Deus, porque sois o objeto mais digno do meu amor” ?

Santo Agostinho no seu livro “ Confissões”, lan­ça uma vista retrospetiva sobre sua vida; enche-o de pesar a conciência do seu estravio, de ter seu coração errado tanto tempo atrás dos bens terrenos, de cria­turas que passam, de riquezas, de honras que não podiam satisfazê-lo. O ’, se em vez delas tivesse co­nhecido e amado a beleza eterna, o maior de todos os bens, Deus! * O' Beleza tão antiga e eternamen­te noda, exclama ele, ah!, quão tarde aprendí a te amar!”

Eis o verdadeiro amor de Deus. Amamo-lo por ser Ele tão grande, tão rico, tão belo, e tão perfeito, amamo-lo por ser Ele quem é.

67

O podermos amar deste modo ao Altíssimo, eis a mais inefável delicadeza de Deus para conosco.

II. Porque ele nos amou primeiro.

Entretanto, que distância profunda entre nós e Deus! Como é pequeno, mesquinho, desprezível o homem em seu confronto! Que é a terra mais que um grão de areia arrebatado no turbilhão dos mun­dos, “uma gotinha que cai do balde”, como diz o Profeta?

E no entanto a mim, um nada agarrado a esse grãozinho, o Infinito se dignou chamar-me, e mais ainda: dignou-se aptar-me não só a serví-lo, a hon­rá-lo, a adorá-lo, mas até a amá-lo!

Quem observa o comportamento de muitos cris­tãos, e talvez até nosso, não chegará espontanea­mente à conclusão de que estes cristãos consideram como um grande favor que fazem a Deus, o protes­tar-lhe seu amor? Que aberração!

Antes da última guerra mundial de 1914, na época, em que os reis reinavam ainda com poder absoluto, costumava o exército oferecer ao monar­ca, em certas ocasiões, homenagens especiais em forma de paradas, desfiles, concertos etc. Trans- portemo-nos em espírito a uma destas festas.

Na maior praça da capital enfileiram-se alguns regimentos. Perdido na última fila está um jovem recruta. Tão afastado se encontra da 'tribuna do rei, que nem chega a avistá-lo. Entre ele e o so­berano muitíssimas fileiras de militares e um sem número de oficiais de todos os graus possíveis.

Dc repente, o rei levanta-se, e, com um gesto, ordena que a música se cale. Sai da grande ro­da de seu magnífico séquito, atravessa, sob o olhar espantado de todos os presentes, os pelotões de guarda, passa defronte das esplêndidas fardas con­decoradas dos oficiais que se perfilam e o saudam, caminha até a última fila da última companhia, e para diante do nosso jovem recruta, sorrindo-lhe.

Todos alongam os pescoços: Que é isso? Que honra! O rei se digna sorrir, mais, falar àquele simples soldadol Eis que lhe pega a mão, pergun­tando-lhe:

Queres ser meu amigo? Faço questão que o sejas.

Tal cena é impossível, dirão meus leitores. En­tretanto não é só possível, mas é um fato, é realidade. E este jovem guerreiro és tú, e não é nada menos do que o Rei do céu e da terra quem deixa atrás de si seu esplêndido cortejo celeste e ante o espanto dos Anjos e Santos, desce à terra, penetrando até à ulti­ma fila de seus servos e para diante de t i ; não so­mente para dar-te um olhar ou uma palavra bon­dosa, mas para pedir simplesmente teu amor. O Rei divino pede teu amor!

Não é acaso verdade que Deus se apouca diante dos homens, desce aos nossos altares, escondido sob o mesquinho véu do pedaço de pão, para mendigar o nosso amor? Em cada Santa Missa ele convida aos fieis a celebrar com ele o banquete do amor.

E qual a reação dos homens?

Lembremos o nosso soldado. Que responderá ele à amizade que lhe pede seu rei ? Dirá por acaso:

69

“ Pensarei nisso” .'' Considerará como uma graça que ele presta ao rei? Não, ele cairá de joelhos, excla­mando: “ Majestade, como pode dignar-se de fazer caso de mim? Como pode importar-se com a minha amizade! Uma vez, porem, que se dignou de olhar para mim saiba: A vós pertenço com corpo e alma.”

E os homens? Quantas vezes se esquecem da­quele que os convida! Em lugar de cairem de joelhos estremecidos diante dessa condescendência, acostu­mam-se a isso, deixam o rei sem resposta ou o fazem esperar, e se lhe concedem afinal uma palavra de amor ou participam no banquete da S. Comunhão, pensam ter-lhe concedido um grande favor. Levam- lhe a mal se não lhes cumprir todos os fúteis e tolos desejos.

Não, a única resposta deve ser aquela do jovem guerreiro. Como S. Tomé devemos exclamar: Meu Senhor e meu Deus! Como S. Pedro devemos dizer envergonhados: Senhor, retira-se de mim,porque sou um homem pecador. Devemos exclamar com S. João: Eis o cúmulo do amor: Deus nos amou primeiro!

Com efeito, que enorme graça é esta, que Deus nos concede de lhe chamarmos como o filho chama ao seu pai: “ Meu Pai!” Muito maior é esta graça que a de um poderoso rei que dissesse a um maltra- pilhozinho: “Goste de mim, que tenho agrado nisso”.

70

O’ meu Deus, como é sequer possível que te tenhas feito objeto do meu amor! Mistério da bon- .dade divina ! Foi por puro amor que ele fez todo o universo!

O amor gera a união e intimidade. Duas pes­soas que se amam, já não fazem ceremônias. O amor vara os abismos, suprime as distâncias, unifica os amantes. Também com Deus isto vale, também dele o amor nos permite achegar-nos, também a ele podemos dizer: "Que sejamos um no amor !”Que predileção ! —

Já nossos primeiros pais tinham sido chamados a este amor. Deus fizera o paraiso, no intuito de re­ceber do primeiro homem o tributo de adoração e afeição total. Nada de mais sublime podia este fa­zer, no momento em que pela primeira vez abriu os olhos à luz, que ajoelhar-se e dizer ao Altíssimo: "Eu te amo!"

Capítulo IX

Como demonstrai nosso amor?Nos capítulos antecedentes tentamos apreciar o

valor indizivel e os motivos do amor de Deus.Ocupemo-nos agora de como nos é dado demons­

trá-lo. Destacam-se duas maneiras: cumprimentoda vontade de Deus, e prontidão ao sacrifício.

I. Cumprir a vontade de Deus.

Eis um ponto importante! Amor não é apenas sentimento! Amar é fazer a vontade de alguém; da afeição devem decorrer fatos.

O’ quanto os homens desnaturaram a palavra: amor! Promessas vãs, verdadeiros perjúrios à “ fide­lidade eterna”, que muitas vezes não passa de um mês, fórmulas vazias da cortezia, até os movimentos do instinto, tudo isto foi rotulado de “amor” . Que profanação! — Não é de admirar pois que ao ouvir­mos tal vocábulo, nos pareça ele gasto e suspeito.

Não pactuemos com os profanadores; não nos ilu­damos a nós mesmos. O fervor que nos invade após um sermão arrebatador, a alegria de uma prece pro­fundamente sentida, o entusiasmo religioso desper­tado por uma celebração litúrgica, — tudo isto pode e deve encaminhar-nos ao amor de Deus; contudo, ainda não è necessariamente o verdadeiro amor;

72

quantas vezes não passa de sentimentos efêmeros que duas horas depois, se dissiparam.

Não, o genuíno amor é algo de muito mais pro­fundo, exsurge das mais primitivas e mais centrais estratificações da personalidade; o amor é uma ati­tude proveniente do cem* mesmo do eu, isto é, da vontade. Amor não é sopro fugaz, não é disposição passageira, é a mais eficiente das realidades, poi:? só ele consegue do homem uma dedicação plena, de­sinteressada, cordial.

O amor de Deus é pois, em primeiro lugar, cumprimento de sua vontade, obediência a seus man­damentos.

Com que vigor sublinhou Jesús Cristo esta verdade ! Mesmo entre os Israelitas devotos havia quem, com piedosos suspiros, pretendia se descar­tar da lei. Passavam a vida cm pios afetos c pro­testos de amor de Deus, mas pouco se lhes dava de atender às ordens do Senhor. A eles se diri­gia Jesús, quando disse: “Não o que mc diz:Senhor, Senhor, entrará no reino dos céus, mas o que faz a vontade dc meu Pai que está no céu” (Mat. 7, 21). E a seus discipulos: "Se me amais, guardai os meus mandamentos. Quem observa os meus mandamentos este é o que me am a... Se guardardes os meus mandamentos permanecereis no meu amor” (Joh, 14, 15; 14, 21; 15, 10).

Esta é pois a primeira c fundamental prova do nosso amor, a que Deus mesmo reclama de nós: cum­prir os seus mandamentos. E nós os conhecemos. Promulgou-os entre relâmpagos e trovões no mon­te Sinai; e Jesús Cristo de novo no-los recomendou, como lemos naquele fato do evangelho: certo dia

73

perguntou ao Senhor um jovem rico: “ Mestre, que devo fazer para alcançar a vida eterna?” Jesús lhe responde: “Conheces a lei; não farás adultério, não matarás, não cometerás fu r to . . .”

Todos concordam nisto que nem sempre é facil ser fiel. Contudo, lembra-te que, observando os man­damentos, estás provando o teu amor. E observar os mandamentos significa: não tomar o santo nome de Deus em vão, guardar domingos e festas de guar­da, honrar pai e mãe, portar-te com atenção e cari­dade para com os próximos, observar a temperança dos costumes, respeitar os direitos alheios, sempre acatar a verdade.

Um bom cristão pois, em sua vida, faz con­vergir seus melhores esforços para viver a vontade de Deus.

Como um prudente comerciante que sempre tem cm ordem seus negócios, cada noite percorre os li­vros de contas, e faz seus balanços, assim um ver­dadeiro cristão examina diariamente sua conciência: “ Em que faltei hoje?... Em que foi Deus ofen­dido, em meus pensamentos, palavras e obras?” . . . Arrepende-se depois de seus pecados, e toma bons propósitos para o dia seguinte.

E perseverar assim sempre fiel por meses e anos a fio, constitue inegavelmente um depoimento elo­quente de amor. E' fácil manter a linha, quando sentimos fervor e não somos batidos de tentações, porem prosseguir sempre com a mesma constância e lealdade, e, prescindindo dos caprichos c disposi-

74

ções da natureza, enfrentar as tentações, apesar de agredidos por todos os lados, eis o amor autêntico!...

Se tombas, ergue-te de novo por uma boa con­fissão, fortifica-te na Sagrada Eucaristia. Assim po­derás ter conciência de que em ti palpita o amor dc Deus. Foi Jesús quem o disse: “ Quem observaos meus' mandamentos, este é o que me am a.”

II. Prontidão para o sacrifício.

De fato o amor está sempre pronto a renunciar a tudo, porque, onde palpita genuíno c intenso, é rei e único rei. Tudo o deve servir, ante ele tudo o mais é insignificante e secundário.

Não é isto um fato de obesrvação quotidiana? O amor está sempre disposto para a renúncia, e esta renúncia chamamos “sacrifício” .

“ Sacrifício” na sua acepção mais ampla, de­signa a abdicação de um bem, em vista de um bem superior.

O vocábulo “ sacrifício” portanto pode incluir modalidades que em nada teem que ver com o amor de Deus, que de nenhum valor gozam perante ele.

Assim são todos os esforços por objetivos pu­ramente terrenos, cgoísticos e mesmo condenáveis. Sacrifica-se o avarento, impondo-se mil pequenos incômodos, só no intuito de acumular riquezas. Sacrifica-se o vaidoso sempre preocupado em con­servar a "fineza das linhas”. Sacrifica-se o “bo- xer” que 6e submete aos mais penosos exercícios, para poder nas cordas abater por “knock out” o adversário. Sacrifica-se o atleta, privando-se tal­vez por anos a fio de fumo e bebidas alcoólicas, para, na próxima olimpíada, assegurar sua vitó-

75

ria. E o mesmo podemos dizer ainda de pesquisa­dores, de inventores, de sábios que se submetem a longas privações, a expedições cientificas laborio­sas, às vezes mais que arriscadas.

Porque ? Talvez será o amor da ciência, será o desejo de colaborar para o progresso da cultura humana; talvez será apenas a ambição de conquis­tar um nome imortal.

O dispender de energias humanas, qual o ve­mos no sacrifício, é sempre digno de nossa admira­ção, pois sempre significa uma vitória da vontade sobre a matéria, sobre os instintos, sobre o egoismo rasteiro.

Mais ainda, quando o sacrifício vem unido à genuína caridade para com Deus, ou para com o próximo, representa um verdadeiro triunfo do co­ração. E ’ nele que se mede o potencial do amor.

Um senhor, restabelecido de grave enfermi­dade, entretem-se com seu diretor espiritual: “Reverendo, sabe a quanto tempo desfruto da companhia de minha consorte. Entretanto, pos­so-lhe assegurar, que até agora nunca avaliara de­vidamente o amor que ela me consagrava. Foi a moléstia que me abriu os olhos. Abalaram-mc profundamente os sacrifícios que me dispensou naquelas dolorosas semanas. Quantas noites em claro, a saúde posta à prova, quantas privações, quantas renúncias em meu favor 1 Foi aquí que apreciei a grandeza do seu am or.”

E ’ sempre assim. Também com respeito ao amor para com Deus os sacrifícios são o mais fiel "termômetro” . Quem ama a Deus de fato, ama-o sobre todas as cousas.

76

Não que o nosso amor às criaturas, aos bens, à honra, aos que nos são caros, não seja em si mes­mo louvável ou reto. Certamente o é. Apenas de­vem ser subordinados ao amor de Deus, de sorte que, se entrassem em conflito com este último, deviamos sempre ficar bastante fortes para romper qualquer amarra e sermos fiéis ao Pai celeste.

Sim, devemos estar prontos para sacrificar a Deus até o mais precioso e mais querido de nossos bens. O exemplo clássico desta prontidão é o san­to patriarca Abrahão. Leiamos a história tão sin­gela e, ao mesmo tempo, tão empolgante, que nos narra o livro do Gênesis.

“Deus disse a Abrahão: Toma Isaac, teu fi­lho único, a quem amas, e vai à terra da visão e aí o oferecerás em holocausto sobre um dos montes que eu te mostrar. Abrahão pois levantando-se de noite, poz a sela ao seu jumento, levando comsigo dois servos e Isaac, seu filho; e tendo cortado a lenha para o holocausto partiu para o lugar que Deus lhe tinha dito.

Ao terceiro dia, levantando os olhos, viu o lu­gar de longe e disse aos seus servos: Esperaiaqui com o jumento; eu e o menino vamos até acolá, e depois que adorarmos, voltaremos a vós. Tomou também a lenha do holocausto e pô-la so­bre Isaac, seu filho; ele porem levava nas mãos o fogo e o cutelo.

Enquanto ambos caminhavam juntos, disse Isaac, a seu pai: Meu pai. E ele respondeu: Que queres, filho ? Eis, disse Isaac, o fogo e a lenha; mas onde está a vitima para o holocausto? E Abrahlo respondeu: Meu filho, Deus deparará a vítima para o seu holocausto. Caminhavam pòis ambos juntos.

Chegaram ao lugar, que Deus lhe tinha de­signado, no qual levantou um altar e sobre ele pre­parou a lenha; e tendo ligado Isaac, seu filho, pó­

77

lo no altar sobre o feixe de lenha. E estendeu a mão. e pegou no cutelo, para imolar seu filho.

E eis que o anjo do Senhor gritou do ceu, di­zendo: Abrahão! Abrahão! E ele respondeu:Aqui estou. E o anjo lhe disse: Não estendas amão sobre o menino, e não lhe faças mal al­gum; agora conhecí que temes a Deus, e nSo pou­paste a teu filho único por amor de minn

Abrahão levantou os olhos, c viu atrás de si um carneiro preso pelos chifres entre os espinhos, e pegando nele, o ofereceu em holocausto em lu­gar do filho.” (Genes. 22,2-13).

Como é realística e viva esta história até nospormenores. Aí está o Deus cioso da sua absolu­ta autoridade, que breve e claramente dá suas ordens e exige submissão incondicional dos seus sú­ditos, — o Deus ao mesmo tempo tão sábio e bon­doso, que se contenta no último momento com a pro­va e cumula dc grandiosas promessas aquele que a ela se submete. Ai está o inocente menino Isaacque, com curiosidade tipicamente pueril, pergunta pela vítima, sem suspeitar que se trata da sua vida. Aí está afinal e sobretudo a obediência cega do pai, que recebe silenciosamente o terrivel golpe do man­dato divino, e vê, com a imolação do primogênito, destruidas todas as suas esperanças e até o sentido de sua vida, mas que, apesar disso, não pronuncia nenhuma palavra de contradição, não regateia ou negocia com Deus nem por um momento, mas sim prontamente se inclina diante da vontade do Altís­simo.

Sim, a atitude de Abrahão é a ilustração mais exata do que significa a frase: Devemos amar a Deus sobre todas as coisas.

78

Almas sensíveis facilmente recuam espantadas diante de tais postulados. E com efeito, são eles duros para o nosso sentimento. Deus, porem, é grande, tão grande e Senhor tão absoluto, que pode exigir tudo, e nós temos que obedecer, ainda que com o coração dilacerado.

Como são também empolgantes os exemplos vi­vidos pelos Santos de nossa Igreja, exemplos de amor que sabe imolar-se.

Porque amavam a Deus sobre todas as cousas, abandonavam tudo os antigos anacoretas, teres e ha- veres, para viver com Deus, na oração e na peni­tência .

Porque amavam a Deus, renunciavam as vir­gens aos amores terrenos, para se consagrar ao úni­co esposo de suas almas.

Porque amavam a Deus, desprezavam os márti­res as dores e tormentos, e consideravam uma graça excélsa, poder selar com o sangue a sau caridade.

Porque amam a Deus, afrontam ainda hoje os missionários as mais remotas paragens, privam-se de todas as comodidades da pátria, para ensinar aos pobres pagãos a amar o Pai celeste.

Porque amam a Deus, inúmeras almas de escol, mesmo em nossos tempos, ingressam na vida reli­giosa, dão de mãos aos bens, á pátria, às vezes a um futuro brilhante, para dedicar-se ao serviço divino pelos santos votos. . .

O’ Senhor, acende em nossos corações uma cen­telha deste sublime amor !

Capítulo X

O santo nome de Deus ?O respeito que devemos a Deus, nos impõe uma

outra obrigação inculcada pelo segundo mandamento da lei de Deus: Não tomar seu santo nome em vão.

Isto significa que não podemos abusar deste santo vocábulo, empregando-o levianamente, de mo­do especial, em imprecações e falsos testemunhos.

I. Imprecações.

A maldição é a erupção da cólera, que execra a si ou aos demais. Isto porem nos proibe nossa, conciência de cristãos. Não temos direito de amal­diçoar ou chamar, sobre nós ou sobre o próximo, algum mal temporal, nem muito menos a condena­ção eterna. Deus nos deu o preceito do amor que nos impõe desejar para nossos irmãos todos os bens, do tempo e da eternidade. Não fomos feitos para detestar, mas sim para abençoar.

Sem dúvida, o mais das vezes se age inconsi- deradamente, para desafogar o mau humor. E ntre­tanto é óbvio: toda a imprecação importa sempre um deslise no próprio domínio, por onde é absoluta­mente contraindicada para uma pessoa que se preza.

Não raro é envolvido também o nome de Deus. Neste caso a execração significa uma irreverência. Só pensar no três vezes Santo deve bastar para nos. penetrar de respeito.

Dirás talvez: Mas, eu nem reflito, quando,num acesso de raiva, venho a proferir este santo no­me. Não contesto, por isto mesmo comete-se habi­tualmente pecado venial, que não chega a ser grave. Contudo, é ou não verdade, que mesmo no inad­vertido de imprecações precipitadas, reside sempre uma descortesia para com Deus? Ele é tão grande, tão santo, merece tanto nossa adoração e nosso amor, que é sempre uma falta de nobreza empregar, em usos tão baixos, seu nome, ou o de pessoas e cousas que lhe são consagradas.

Que dirías de uma criança que tudo devendo a sua mãe, e amando-a sinceramente, profanasse seu nome com imprecações ? . . . Ou do cidadão que o mesmo fizesse com o nome da personalidade mais representativa do país, por todos acatada e altamen- te merecedora da estima pública? E Deus é para nós mais que uma mãe, mais que um Rei, ou Chefe

f de Estado !A forma mais execrável de imprecação é a

blasfêmia. Consiste ela em expressões direta ou in­diretamente ofensivas a Deus. Incorre pois neste pecado que impugna ou ridiculariza Deus, a sua es­sência, sua majestade, justiça, santidade ou outro qualquer atributo. Evidentemente, o que dissemos, vale também para impropérios contra pessoas santas, contra instituições sagradas, contra a religião ou a Igreja. Todas estas cousas são estreitamente relacio­nadas com Deus, que profaná-las é injuriar ao pró­prio Deus.

81

Nos países em que as leis são inspiradas no espí­rito cristão, tais crimes são ressarcidos com severas

penas.

S Luiz, rei de França, ordenara que se ferre- teasse a língua do blasfemo. Mitigou posterior- niente este castigo, a pedido do Papa Clemente IV. Contudo, a blasfêmia continuou a ser punida corti rigor.

Se hoje muitas legislações não lhe impõem pe­nas oficiais, continua cia a scr aos olhos de Deus e da Igreja um gravissimo pecado.

Não de raro, na história, foi a blasfêmia con­siderada como atestado de abjuração da fé. Nos primeiros tempos do cristianismo, foi S. Policarpo arrestado na sua diocese de Smirna, na Ásia Me­nor, e conduzido ao circo. Por entre os brados da multidão só lhe exige o juiz: “Ou a blasfêmiacontra-Cristo, ou a morte !’’ O Bispo atalhou com uma esplêndida resposta: “Já são 86 anos que sir­vo a Jesús, sem nunca ter dele o menor ressenti­mento. Como podería agora negar a meu Rei e Salvador ?“

S. Francisco Xavier dizia que preferia morrer a ouvir profanado o nome de Deus.

Pensemos nas inumeráveis blasfêmias que fo­ram e são vomitadas por hereges e perseguidores 1 Ainda em nossos dias, se escrevem livros que ultra­jam a Cristo, Filho de Deus, injuriosamente o ape­lidam de “o judeu”, qualificam seus sofrimentos de fraquezas, e sua morte reparadora na cruz, de fra ­casso completo, chamam seu representante na terra de

82

“curandeiro de Roma” e o culto de Maria rotulam de “histeria religiosa” .

Que nos compete fazer? Ofereçamos a Deus reparações por tais ofensas, não perdendo oportuni­dade de louvar e engrandecer seu santo nome. Acom­panhemos fervorosamente as lindas orações da Mis­sa, como o Glória, ou o Prefácio e outras mais. Re­citemos com toda a convicção e profundo recolhi­mento as belas invocações da benção do Santíssimo : Bendito seja Deus. . .

II. O juramento.

Eis outra ocasião em que podemos profanar o nome de Deus. O que jura, chama a Deus por tes­temunha. Não negamos que em geral, não se refle­te quando se diz, por exemplo. “ Que Deus me cas­tigue” . . . “Juro por Deus” . . . “ Que Deus me condene, s e . .. ” Sem dúvida, não pode haver culpa grave onde não há deliberação. Entretanto é neces­sário extirpar absolutamente também estes hábitos.

Jesús se exprimiu claro e categórico: “ Não per- jurarás nem pelo céu, porque é trono de Deus, nem pela terra porque é o escabelo de seus pés, nem por Jerusalém, porque é a cidade do grande Rei. Nem por tua. cabeça jurarás, porque não podes sequer tornar um cabelo branco ou negro. Mas, seja o vosso falar: Sim, sim ; não, não; pois, tudo o que passa disto, vem do mal” (Mat. 5, 36-37).

83

Tudo a que costumamos apelar em nossos jura­mentos, esta é a lição do Mestre, é santificado pela sua consagração a Deus, a cujo respeito faltamos, quando fazemos uso de tais expressões.

Em todos os povos, mesmo entre os primitivos, o juramento foi tido por algo de santo, de religioso. Os Romanos o chamavam “sacramentam”, isto é, cousa santificada. Para nós, pois, deve sempre va­ler a regra citada de Jesús.

Será então proibido jurar em qualquer ocasião, sem excepção alguma?

Não, pois há casos em que se trata de defender uma causa séria e sagrada. Nestes casos, porem, de­vem ser realizadas estas três condições, a saber: Que o juramento seja exigido pela legítima autori­dade, que sirva a uma causa justa e grave, e que corresponda à verdade.

Capítulo XI

O sacrifícioA voz da história

Ao Ser supremo devemos adoração e amor. Ambas essas atitudes brotam da parte mais íntima, e profunda da alma humana; mas ambas anseiam tam­bém por uma expressão sensível.

I. O símbolo.

Somos homens. Somos compostos duma alma e dum corpo. Não nos satisfaz uma homenagem pu­ramente interior e espiritual. Queremos exprimir em sinais, símbolos e gestos o que sentimos no coração.

Não é verdade, que observamos isto cm todos os homens ? Saudamos com um sorriso a um bom amigo, apertamos-lhe a mão, abraçamo-lo, c diante dum superior tiramos o chapéu, inclinamo-nos etc...

Ora, qual será a forma exterior conveniente para exprimirmos a atitude de adoração em face ao Ser supremo ? Deverá ser uma atitude apropriada, da qual só Ele seja digno, correspondendo à sua sublimidade absoluta, atitude que exprima o senti­mento que os homens só a ele dedicam: adoração. Existe tal símbolo ? E deonde nos veio ? Quem o terá inventado ?

85

Sim, existe tal forma exterior. E* o Sacrifício.

Falamos aqui do sacrifício no mais alto e clás­sico sentido: de uma oferta a Deus de dons visíveis para adorá-lo e para nos oferecermos a ele simboli­camente nas nossas dádivas. Adoração e amor bor­bulham como dois mananciais no Sacrifício e são por isso mesmo a alma de todo o sacrifício.

Desde os alvores da humanidade realizam-se sacrifícios, sempre aplicados à homenagem do Ser supremo. Todos os demais sinais de respeito e de estima, mesmo o dobrar os joelhos ou o prostrar-se no chão, praticam-se em certas ocasiões também diante de príncipes humanos. O Sacrifício porem é reservado à divindade, exclusivamente.

Lemos na história, como os imperadores roma­nos, com editos severos, exigiam que seus súditos oferecessem incenso a suas imagens e estátuas. Que tenção se esconde por traz destes decretos ?

Embriagados de orgulho, queriam ser venerados como deuses. O incenso era sinal inequivoco de adoração.

Respondemos assim também à outra pergunta relativa à origem deste símbolo do sacrifício. De sua universalidade sem exceções podemos concluir que originou-se duma necessidade interior da natu­reza humana, baseando-se portanto numa lei na­tural.

86

II. A tradição universal.

Todos os povos conheceram a oblação litúrgica de presentes como manifestação de sua homenagem ao supremo Ser. Por mais que recuemos na história da humanidade, jamais encontraremos uma religião sem sacrifício. Sempre é o sacrifício o ato supremo de religião.

Digamos mais: em toda a parte mostra o sacri­fício os mesmos traços essenciais. Embora esse uso tenha sido empregado através de muitos séculos pela humanidade inteira, ainda que os homens que sacri­ficam sejam das mais diversas raças, zonas, culturas e civilizações, conquanto naturalmente a forma ex­terna, a incensação, o ceremonial, as palavras e ges­tos sejam notavelmente diversos, — sempre o sentido do sacrifício é em toda a parte o mesmo.

Apresentemos alguns exemplos.

Já os povos primitivos conheciam sacrifícios ri­tuais. E ’ o que demonstram estudos recentes, por exemplo, os do P . Guilherme Schmidt S. V. D. Após uma caçada feliz, antes de distribuir as rezes abatidas pelos companheiros da tribu, os primitivos homens oram. Depois tomam a mais delicada por­ção de sua presa e, no meio de orações, separam-na das restantes. As preces se dirigem áo Ser supremo, Criador de todas as coisas. A ele ofertam a porção

87

adrede destinada, precisamente para homenageá-lo como soberano Senhor.

Os povos pastoris mais remotos, que eram so­bretudo nômades, ofereciam ao Deus do Céu como primícias o primeiro leite de seus animais como dons de sacrifício.

No bramanismo antigo os sacrifícios desempe­nhavam um papel relevante. Estavam ligados a ri­tuais complicados e eram apresentados aos deuses como homenagem e. ao mesmo tempo, com a intenção de influenciar as próprias divindades.

Os assírio-babilônios e os fenicios concebiam os sacrifícios mais como presentes feitos à divindade pa­ra assim ganhar o seu favor. Assim era costume en­tre eles presentear os soberanos e senhores temporais com dons e tributos, e ninguém devia aproximar-se deles sem presentes mesmo que fôssem modestos, para reconhecer assim simbolicamente sua dignidade e domínio.

Os caldens uniam ao sacrifício a idéia de ofere- recer uma refeição aos deuses, alimentando-os ao mesmo tempo que os tornavam favoráveis.

Todos os povos semíticos conheciam o sacrifício também como meio de penitência e remissão dos pe­cados.

Entre os árabes tinha o sangue especial impor­tância nos ritos sacrificais. Ofereciam-se animais domésticos e selvagens, aspergia-se com sangue do

88

sacrifício o altar na intenção de estabelecer assim uma aliança de sangue com a divindade.

Em muitos povos infelizmente encontramos também a triste aberração da imolação de vítimas humanas. Assim nos Fenícios, Cartagineses, Babilô­nios, Gauleses, Germanos, Escandinavos, sem mes­mo excetuar os Gregos e Romanos apesar de sua cultura superior. Os Cananeus imolaram os filhos e filhas primogênitos ao Deus Moloch. E também en­tre os primitivos habitantes do México encontramos essa bárbara usança.

Qual a idéia que a dominava ? — Sem dúvida a concepção de que aplacava assim a ira dos deuses, oferecendo-lhes os mais caros e preciosos seres, os próprios irmãos.

Que variedade dc concepções e usos ! — E ape­sar disso — se encaramos somente o essencial — en­contramos sempre os mesmos elementos, já nos sin­gelos sacrifícios dos povos primitivos, já nos ritos grandiosos dos povos posteriores mais cultos.

Assim podemos resumi-los:

O Sacrifício é o dom visível tomado como sinal de dedicação interior; o homem abre mão de um bem terreno, precioso e caro, para ofcrccê-lo a Deus como símbolo de homenagem, na esperança de tor­ná-lo assim propício e de entrar em certa comunhão com ele.

Capitulo XII

O sentido do sacrifícioI. As três partes.

Podemos discernir no Sacrificio três partes: o sacrificador, o dom do sacrificio e a ação sacrifical.

1. O sacrificador ou sacerdote.

Bem que nos tempos primitivos seja ainda o homem particular quem oferece o dom à Divindade (Caini, Abel, Noé etc .), em breve reconhece-se nele um representante da coletividade. Nos princí­pios é o chefe natural da comunidade, o rei ou o príncipe da tribu, quem preside à cerimônia da imo- lação. Pouco a pouco porem se separa um sacerdó­cio propriamente dito.

Na mentalidade dos pagãos, o sacerdote paira como mediador entre os homens e a divindade. Por uma parte ele é o representante do povo; pois são os seus dons que ele apresenta à divindade; por outra, deve ele estar mais perto de Deus, pois lhe é consa­grado de modo especial.

Os feiticeiros e curandeiros da África, por exemplo, só são reconhecidos pela respetiva tribu de negros, depois que provarem sua comunicação com os poderes supraterrenos por meio de um si­nal impressionante ou de qualquer feito mágico.

90

Em todos os povos goza por isso o sacerdote de certos privilégios; ele é também o porta-voz de Deus e o mensageiro de sua vontade.

2. O dom do sacrifício.

E ’ sempre um dom visivel. Em geral algo de valor. Assim os primitivos doavam as primícias dos frutos do campo e da caça abatida, que eram ao mes­mo tempo o mais precioso que possuíam, pois era o de que se alimentavam. Ou então se abandonavam a Deus os mais belos cachos de uvas ou espigas de trigo, os animais sem mancha. Ainda nas imolações humanas aparece a preocupação de ofertar à divin­dade o mais excelente, o mais amado, um primogê­nito, uma virgem pura. “ Deus não se venera doutro modo senão oferecendo-lhe o que ele mesmo nos deu”, — diz o Papa Leão Magno (Serm. VI de N ativ.) .

A dádiva representa o homem mesmo que a en­trega; a primícia significa toda a messe, que nos serve ao sustento, com cujo uso mantemos a vida. Especialmente nos sacrifícios dc sangue transparece essa idéia; pois entre os antigos o sangue era tido como a sede da vida. Quando o sacerdote rega o al­tar com o sangue da vítima, os homens protestam oferecer sua mesma vida de maneira total à divindade.

3. A açio sacrifical, oferta dos dons.

O modo de ofertar os dons é variado. O vinho ou os líquidos em geral são derramados. Hervas

91

odoriferas, incenso, frutos da terra são queimados. Os animais são imolados e seu sangue libado sobre o altar. Essa operação se realiza como ação religiosa, acompanhada com um religioso silêncio ou então com preces e cânticos sagrados.

II. A essência do sacrifício.

1. A atitude interior.

Que idéia reside no cerne de todos esses ritos ?Que coisa quer o ilhéu do Pacífico ou o chefe

esquimó, que coisa queria, séculos atrás, o pastor nômade, o caçador da floresta virgem, quando pela primeira vez levantou um altar e ofereceu seus hu­mildes dons ? Que coisa pensava o sacerdote babi­lônio ou fenício, que coisa o chefe de tribu árabe, quando pela primeira vez reuniu os seus à volta do altar da divindade e ofereceu a vítima ?

Tentemos ler no íntimo desses homens. Todos teem a conciência dc estar praticando um ato de imolação na presença do Ser Supremo. Sua alma está impregnada de um sentimento que nós podemos interpretar nestas palavras:

Tu és grande, ó Deus poderoso, — e diante de ti eu nada sou. Eu te reconheço por meu senhor e amo. Mas como demonstrar-te minha submissão, minha dedicação? Vê, como eu tomo algo que me é caro e útil, e to consagro como imagem de mim mesmo. Da mesma sorte que eu te oferto esta dá­diva, assim a minha própria alma te quero ofertar,

92

como a meu supremo Senhor. Eu te pertenço, dis­põe de mim, que sou teu servo.

Que grandiosa homenagem esta ! Podem os lá­bios pronunciá-la com dizeres pobres, podem as ora­ções concomitantes não passar de balbúcios imper­feitos; no coração e na conciência do sacrificador lá está esplêndida e vivida !

Como chamar essa atitude? Reconhecimento, homenagem, adoração, reverência, submissão, doa­ção, sagração do homem a Deus !

2. A expressão simbólica.

E essa disposição interior não fica ocultá no íntimo do coração. O homem não é só alma e espi­rito, — ele é um ser espiritual e corpóreo. Daí o ter ele necessidade espontânea de expressar sua ati­tude intensa pela ação simbólica da iniciação.

Conta-se que um dia, das fronteiras do Império romano, vieram embaixadores de um povo extranho afim de trazer presentes ao Senado. Na sessão solene o orador da delegação apresentou dois cá­lices de ouro.

Que espanto contudo o dos senadores, ao ver de mais perto o que os cálices continham. Num estava um punhado de terra, e no outro encontra­va-se uma pequena escudela com agua. O em­baixador explicou então que esses dons eram em­blemas de sua sujeição. “ Este punhado de terra, disse ele, foi tomado no chão de nossa pátria; nós entregamos neste torrão nosso país ao vosso domí­nio. Esta vasilha contem água do maior rio de nosso país, que nos dá fertilidade aos campos e meios de transporte, fazendo a prosperidade de nosso comércio. Nessa pouca de água vos entrega-

nioí fetiM ## fb * ,<# dftáii* dftdí vtii+i. fa t iMftjtrrftcíí' phirV hífíffVt̂ Vr-f* * rifrjaf !t<y»**Vr r*<fc, qWíffffifif' >'aí<f.Yo* 'onío HUflitCM VCfV^Ví,. ,i*V t-’ ■•.<?♦{ ;1 r d ^ -iteçlo- *

A prdrr«ín*a vtet» po<fraf!V ov r^ntafro*' prrusr ‘ que eram rferacrsindo rric-sffHrnfK»* ov prir<rrtív?< oí*T- tado» por aqueles «rtr&ngrifnv Seô valor yirrrfni residia naquilo que representavam como ímberto*. isto é — sua gleba <* sua gente.

De igual sorte podem os dons do sacrifício dar a impressão de que oferecem ao Ser Supremo ape­nas coisas materiais. — portanto sem valor. Na realidade, porem, são apenas como mensageiros, que se enviam para anunciar e significar a oferenda da própria pessoa. A dádiva oferecida é o emblema da própria alma que se humilha diante de Deus e se lhe consagra.

£ ’ portanto o sacrifício o mais profundo e mais fundamental ato de religião. E‘ sua essênda inti­ma, sua visceral relação para com Deus que o ho­mem incorpora no sacrifício. Oferecendo o seu sa­crifício a Deus, o homem sente-se vitalmente homem, sente-se criatura de Deus, escravo e servidor do Al­tíssimo. Desmorona-se toda a humana soberba e a pretensa “autonomia” do homem aparece em toda a sua mesquinhez.

No sacrifício sente ele sua inteira dependência, sua indigência, sua pequenez, — mas também a sua grandeza. O que ele é, o que ele possue. o que ele produz, tudo depende de Deus, tudo $e valoriza na dêpendênda do Absoluto.

94

3. O desenvolvimento deste ato.

Que pensamento profundo e frutuoso ! Que maravilha, pois, encontrar-se no curso da história cada vez mais desenvolvido, em toda a sua riqueza, o sentido íntimo do sacrifício !

Em primeiro lugar, é o Sacrifício a expressão clássica da homenagem oferecida pelo homem a Deus como a seu Criador, Senhor, Juiz, e último fim.

Ao recoúhecimento e à homenagem associa-se a gratidão. Pois o homem tem a conciência de que a Deus deve todos os bens da terra e a sua própria vida; isso o leva espontaneamente a exprimir sua atitude de gratidão por meio do sacrifício.

Ao mesmo tempo recorda sua própria indigni­dade, sua inconstância moral e fraqueza, sente-se en­dividado ante o Ser Supremo e esse sentimento o leva a considerar o sacrifício como instrumento de expiação e purificação.

E’ óbvio que o homem deva também dirigir súplicas àquela mesma divindade que honra com o sacrifício.

Estas quatro atitudes de louvor, gratidão, ex­piação e súplica, são de fato as que se encontram em quasi todos os povos e são expessas não só nos ritos, mas ainda nas orações e cantos que os acompanham.

95

Que exortação empolgante significa essa tradi­ção da humanidade!

Com mil vozes me apostrofam os povos: Ohomem, dobra o teu joelho diante de Deus, reco­nhece-o como teu Senhor. Nada de maior podes fa­zer que adorá-lo, lazer sua vontade, amá-lo !

Que juízo aniquilador pronuncia essa voz da humanidade contra o homem moderno que recusa ao Senhor o tributo de sua adoração e homenagem, que recusa chegar ao conhecimento daquele Deus a quem todos os povos sacrificaram. Dolorosamente dege­nerado ele considera os bens da terra como seu últi­mo fim, ou cego de despeito faz-se a si mesmo Deus.

E ’ verdade que no decorrer da história ordina­riamente os povos erravam, a tactear nas sombras em busca de uma concepção do Ser Supremo.

Mas ao mesmo tempo tinham a convicção de que um Senhor e Soberano os governava, e todos >e esforçavam por prestar-lhe homenagem em seus sacrifícios.

E’ a mais triste glória da humanidade contem­porânea, que milhares- e milhares de homens não reconheçam mais um Deus a que ofereçam o tributo da adoração e reverência, tributo que todos os povos, em tradição uníssona, sempre lhe renderam. E ’ tris­te apanágio de nossos dias haver produzido o “ Sem Deus no mais radical sentido da palavra.

Capítulo XO

A preparação ao sacrifício de Cristo

A tradição da humanidade aponta-nos a rota para Deus.

Sem dúvida, cada vez mais percebiam os povos no curso de sua evolução, que precisavam de uma direção superior. Obscura nuvem pairava sobre os sacrifícios dos antigos: O Altíssimo ouvirá a nos­sa voz ? Penetrarão nossos sons até os seus ouvi­dos ? Ser-lhe-ão aceitos os nossos obséquios ?

Jamais soube alguém dar resposta a essas inter­rogações .

Mas essa resposta devia ser dada. O próprio Deus a trouxe, entrando a tomar parte na história da humanidade.

Todos sabemos, que dentre os povos escolheu Deus um, o povo israelita, que por isso se ficou cha­mando “povo eleito” . Com estupenda benevolência inclinou-se o altíssimo até ele, com ele se comunicou e tomou pessoalmente a sua direção.

Ora, qual será a atitude de Deus com relação aos sacrifícios que' encontrava em uso ? Suprime-os ?

I. Os sacrifícios do Antigo Testamento.

Não: Deus sanciona os sacrifícios da humani­dade. Mas, ao mesmo tempo, aperfeiçoa-os, deixan­do evidenciar-se pouco a pouco sua imperfeição.

9?

Sob sua conduta são os sacrifícios meios peda­gógicos, são uma escola, urna via rumo ao grande, perfeito e legítimo Sacrifício, que a humanidade na plenitude dos tempos deverá oferecer, por meio de seu representante autorizado, o segundo Adão, Jesús Cristo.

1. Deus sanciona os sacrifícios.

Deus acolheu sempre complacente os sacritidos que com reta intenção lhe foram ofereridos em ho­menagem. Assim, por exemplo, agradou-lhe o sacri­fício de Abel e mais tarde as vítimas que Noé lhe dedicou em ação de graças por ter escapado ao dilú­vio. Mais tarde ainda, aceitou propírio os sacrifí­cios de Abraão e dos demais patriarcas.

No tempo de Moisés selou Deus u grande alian­ça com seu povo. Este ato tão importante para a história do povo hebreu se realizou debaixo da for­ma de sacrifício.

O povo de Israel se reune ordenado seguado as doze tribus, aos pés do monte Sinai. Eatio to­ma Moisés o sangue das vítimas e asperge a me­tade sobre o altar ereto em honra de Javé, e a outra metade sobre o povo e acrescenta: Este ê o sangue da aliança que Deus concluiu convosco (Exod. 24, 5-8).

98tV 2 — Como jrçi de seu povo. Deus aperfeiçoa os

- sacrifícios.

Aperfeiçoa os sacrificantes; pois institue uni sa- ' cerdócio especial e segrega a tribu de Leví para o ser­viço do santuário.

Aperfeiçoa os dons do sacrifício: seleciona-os com determinações minuciosas: frutos da terra, ani­mais cuidadosamente escolhidos, e em grande va­riedade .

Antes de tudo, porem, inicia Deus o seu povo em uma nova concepção e mais perfeita do ato mes­mo do sacrifício.

Primeiramente é um grande número de minu­ciosas prescrições que regulam a ação da oferenda, para evitar qualquer abuso possível. Inculca depoii a transcendência do sacrifício: o sacrifício recebeum posto verdadeiramente central no culto de Deus. Moisés deve levantar o tabernáculo, segundo normas determinadas com precisão, e Salomão deve substi­tuir o tabernáculo por um majestoso Templo, no qual deverá ser oferecido um sacrifício ‘‘eterno”, isto é, quotidiano, cuja oblação é regulada por um profuso cerimonial.

Devido a seu profundo simbolismo, os sacrifí­cios da lei mosáica deviam completar a formação re­ligiosa do povo de Israel.

E não cabe dúvida de que eles foram de fato uma sublime escola para o povo.

99

Inculcavam energicamente a idéia de um só Deus verdadeiro àquele povo superficial, sempre inclinado ao culto idolátrico: pois eram oferecidos sempre ao mesmo Javé, o Criador do Universo.

O “holocausto” oferecido diariamente, no qual a vitima é totalmente consumida pelo fogo, traduz a intenção de entregar-se dc todo a Deus, sem re­servas, corpo e alma. Este pensamento dc doa­ção integral, de fidelidade, aparece em expressões cada vez mais sublimes nos esplêndidos ritos, nas orações, salmos e cânticos.

A gratidão para com Deus se manteni desper­ta na liturgia sacrifical do povo judeu, com sem­pre renovada intensidade, por meio do “Sacrifício de ação de graças”, que é celebrado sobretudo nos grandes dias memoriais, como na 14 festa dos tabér- náculos”, na Páscoa etc., em agradecimento pela guia miraculosa através do deserto, pela redenção do poderio egípcio, etc.

Com impressionante transparência ensinam os múltiplos sacrifícios cruentos a necessidade da ex~ piação dos pecados. Os animais são abatidos, para pôr em evidência que o homem pelos seu9 pecados merece em justiça a morte, e que só por efusão de sangue a ofensa de Deus pode ser reparada.

No “Sacrifício do incenso” sobem até Deus com as espirais do fumo, as orações dos sacrifi- cantcs, suplicando graça, ajuda e libertação da miséria corporal e espiritual.

3 — Os sacrifícios da Antiga Lei preparam o Sacrifício de Cristo.

Deus faz ao povo israelita compreender cada vez mais claramente que seus sacrifícios não bastam.

Não só se queixa da falta de intenção pura, do cumprimento meramente mecânico das cerimô­nias, mas excita ainda no povo uma nostalgia por um culto mais íntimo.

100

Com eíeito havia perigo de que a execução ex­terior do sacrifício, que representa como que o seu corpo, o rito externo, o sangue a borbotar em tor­rentes, absorvesse a atenção do povo, e viesse a sufo­car o que constituía a alma do sacrifício, a disposi­ção interior.

Profetas e salmistas o presentiram e acentua­ram a importância indispensável da atitude interna.

Deus não necessita de vossos sacrifícios, bra­davam eles ao povo hebreu, tudo lhe pertence, c não retira vantagens deles; — vossos sacrifí­cios só valem enquanto exprimem a doação de vosso interior. Obediência, docilidade a respeito de sua palavra, piedade, misericórdia com a mi­séria alheia, isso é o que dá valor aos sacrifícios, aos olhos de Deus. Quando faltam essas dispo­sições, Deus os detesta.

Destarte despertam os profetas o desejo de uma religião mais profunda; mais: predizem não só a abolição dos antigos sacrifícios, mas ainda a institui­ção de um novo Sacrifício do Messias e “ Servo de Deus” .

“ O Ungido virá e porá fim aos sacrifícios cruentos e incruentos de Israel”, diz o Profeta Da­niel (9, 27). E o grande Isaias prevê em espírito o sacrifício do “Justo” que em perfeita obediência, como servo de Javé, dará voluntariamente sua vida pelos homens. (Isaias 51,5; 52, 13-15; 53, 1-2, so­bretudo vers. 5, 7, 10, 12).

Com a mais explícita clareza promete o projeta Malaquias um sacrifício novo, incruento, universal:

101

" O meu afeto não está em vós, diz o Senhor dos exércitos, nem eu aceitarei oferenda alguma da vos­sa mão.

Porque, desde o nascer do sol, até ao poente, o meu nonte è grande entre as nações, e cm todo o lugar se sacrifica e se oferece ao meu nome uma obla- ção pura; porque o meu nome é grande entre as na­ções, diz o Senhor dos exércitos.” {Mal. 1,10, 11).

O sacrifício perfeito virá, pois, como o ponto culminante e final de toda essa iniciação do povo escolhido; sacrifício qüe será perfeito em todos os seus elementos, no sacerdote, que o executa, no dom que se oferece, e na intenção com que será oferecido ao Altíssimo.

Quando será instituído e onde será por primeira vez oferecido ?

II. O sacrifício de Jesús Cristo.

Estamos mais ou menos no ano 30 depois de Cristo, em Jerusalem. Rodeado pelos seus discípu- los, o Salvador toma a ceia pascal.

“Durante a refeição, como narram os Evange­listas, tomou o pão, e o benzeu, e o partiu, e deu-o a seus discípulos, e disse: Tomai e comei; isto é o meu corpo. E, tomando o cálice, deu graças e deu- lho, dizendo: Bebei dele todos. Porque isto é o meu sangue do novo testamento, o qual será derramado

102

por muitos para remissão dos pecados” (M at. 26, 26ss).

1. E um verdadeiro sacrifício que nesse mo­mento é instituído.

E ’ o que ensina a Igreja expressamente, e assim também o manifestam as palavras do Senhor: pois ele fala de sangue que será derramado. Ora, efu- são de sangue e sacrifício na linguagem dos Judeus a da Sagrada Escritura são uma e a mesma coisa.

2. E o sacrif ício da Nova Lei.

Pois não foi também a Antiga Aliança concluí­da por meio de um sacrificio ? Não derramou Moi­sés o sangue das vitimas sobre o altar e o povo, e não acrescentou ele: “ Eis o sangue da aliança que Deus contraiu convosco” ? Agora veiu o verdadeiro Moisés, o verdadeiro guia da humanidade, do qual Moisés foi apenas uma debil imagem. Ele é quem lhe dá o verdadeiro maná, não como o que Moisés deu aos patriarcas no deserto e não os impediu de morrer.

Não, este maná transmite imortalidade, é a re­feição sacrifical do corpo e sangue do Senhor (V. Joh 6, 48 ss).

3. E este o sacrifício puro que o profeta Ma- laquias previra.

103

Pois, é aquele sacrifício em que nos é servido o corpo e sangue de Cristo como alimento de nossa alma.

4. E’ o sacrifício universal que, como diz Ma- laquias, será oferecido em todos os povos.

Pois que um único e o mesmo sacrifício de Je­sús Cristo será realizado todos os dias em nossos altares.

Porque, como todos sabem, os sacerdotes da Nova Lei não são mais que os vigários e au­xiliares do Sumo Sacerdote, Cristo, que instituiu este sacrifício, e sabemos que em cada Santa Missa nada mais se faz do que o cumprimento do grande mandato de Cristo aos apóstolos, sucessores seus “ Fazei isso em memória de mim” .

Onde quer que existam homens, desde os cam­pos de gelo do Alasca até às tendas dos Índios da Terra de Fogo, em todas as partes da terra será oferecida uma oblação pura pelo Sumo Sacerdote da Nova Aliança por meio de homens, seus represen­

tantes.

5. Este é o sacrifício digno e perfeito, pelo qual o nome de Deus é glorificado em todo o mundo.

ê

104

Tão puro e digno, tão perfeito, que nenhum outro se compara com ele: pois, podemos dizer que todos os outros existiam para este sacrificio. Em toda a sua variedade, em toda a beleza de suas ceri­mônias, em toda a riqueza de seu simbolismo, em toda a pujança empolgante das orações e cânticos que as acompanhavam, não passavam de silhuetas, figuras, marcos indicadores do Novo Sacrifício de Cristo.

No dia 10 de junho do ano 70 cessou o sacri­fício no templo de Jerusalém, por falta de homens, como escreve Flávius Josephus; o sacrifício de Je­sús Cristo porem será oferecido atravez dos séculos até o fim do mundo.

Capítulo XIV

O sacrifício perfeito(I. Parte)

No capítulo precedente mostramos como sem o sacrifício de Cristo todos os precedentes ficariam sem significação, sem fim, nem sentido; porque to­dos foram resumidos, completados e sobreelevados no Sacrifício de Jesús Cristo.

Pois, a idéia básica dc todo o sacrifício reside na doação que se faz de um dom visível, como sím­bolo da doação pessoal do homem a Deus; doação vivificada pelas atitudes de fidelidade, gratidão, ex* piação e súplica.

Doação feita a Deus é também a idéia básica do sacrifício de Cristo; nele também palpitam os senti­mentos de homenagem, agradecimento, perdão e im- pet ração.

Porem neste sacrificio realiza-se uma doação que é infinitamente mais perfeita que a que se cum­pre em qualquer outro, doação tão grande que não é possível imaginar-se maior.

Como poderemos medir o valor de um sacri­fício?

Recordemos que em todo o sacrifício entram três elementos: Sacerdote, Dádiva, Oblação. Nosacrifício de Jesús Cristo todos esses três elementos são perfeitos, cm todo o sentido da palavra.

106

Falemos neste capitulo doSacerdote sacrificador.

A. Na história.

Já os gentios tinham reconhecido que ao sacer­dote sacrificante compete uma posição de mediador entre a divindade e os homens. Ele paira entre dois mundos; ou melhor, é o representante de dois mundos.

De um lado deve ele pertencer à mesma raça que os homens, pois, deve levar suas oferendas e desejos à presença de Deus, e em seu nome realizar o sacrifício. De outro lado, em todas as gentes o sacerdote aparece como exaltado dentre a comuni­dade, goza de uma dignidade peculiar, e é conside­rado como especialmente consagrado a Deus; e isto, porque ele se deve conservar em estreita ligação com a divindade, afim de anunciar e interpretar ao povo sua vontade.

No Velho Testamento o caratcr de mediador do sacerdote entre Javé e o povo encontrou uma expres­são inequívoca.

Acima de todos o Grão Sacerdote representava o povo inteiro. E ’ por isso que trazia ante o peito uma tá boa dc mármore com o nome das doze tribus de Israel. lst<> tinha a intenção de significar: Por meu intermédio todos os filhos das doze tribus apa­recem na lua presença, ú grande Deus. e te prestam reverência.

107

Ao mesmo tempo mantinham os sacerdotes re­lações especiais com Deus. Separados do povo, for­mavam uma casta rica em privilégios.

- Eram tidos como especialmente dedicados ao Deus da Antiga Aliança. Por isso trazia o Sumo Sacerdote na fronte um círculo de ouro, em que se lia: Consagrado a Deus.

B. Contemplemos agora Jesús.

Não é ele também, e mais que ninguém, o "me­diador" entre Deus e os homens? Não pertence ele verdadeiramente a dois mundos?

1. E' o nosso representante.

E ele o pode ser, pois é homem como todos nós. “ Todo o sacerdote, reza a Epístola aos 'Hebreus, c escolhido dentre os homens, afim de representá-los junto a Deus, oferecendo dons e sacrifícios pelos seus pecados” (Hebr, 5,1).

Ora, Jesús Cristo é tomado dentre os homens; pois no seio de Maria revestiu-se de carne mortal; fora do pecado, nada do que é humano lhe é extra- nho.

Jesús levou úma vida de homem, atravessou todos os estádios do desenvolvimento de uma vida humana, desde a puerícia e infância até a juventude e madureza; teve uma pátria, companheiros, paren­tes, amigos.

108

“ O Sumo Sacerdote, diz a citada Epístola, deve poder compadecer-se dos ignorantes e dos que erram, pois ele mesmo está circundado de debilidades” (H ebr. 5,2). — Ainda que naturalmente Cristo fôsse livre de qualquer fraqueza moral, é no entanto essa frase verdadeira em seu pleno sentido no que se refere a todas as outras dores e misérias.

Com efeito, este sacerdote não se furtou a ne­nhuma dureza da vida humana, suportou todas as privações da pobreza, da vida escondida de 30 anos, das indigências de toda a espécie, do escondimento e inimizades de seus compatrícios, do abandono co- barde e traição por parte de seus amigos. Imergiu fundo na dor e na miséria humana.

Todo esse sofrimento ofereceu-o ele a Deus. Impressionante é o que lemos na Epístola aos He- breus:

“Nos.dias dc sua vida terrestre apresentou, no meio de veemente clamor c lágrimas, suplicantes preces àquele que o podia preservar da morte; e foi ouvido em atenção à sua reverencia. E, embora fôsse Filho de Deus, aprendeu, contudo, obediência pelo sofrimento, e, depois dc consumado, se tornou para todos os que o seguem, autor de eterna salva­ção e foi por Deus designado pontífice segundo a ordem de Melquisedec” {Hebr. 5,7-10).

Assim vemos que o ser sacrificador para Jesús Cristo não é um mero título, mas custou-lhe a amar­gura das dores, “clamou para Deus, na angústia do seu coração, aprendeu na dor a obediência” ; ele é o

109

homem das dores, como Isaias o entreviu. Esse Sumo Sacerdote viveu a intenção íntima do sacrificio, tor nando-se assim exemplo para todos os que o seguem.

Quantas vezes no curso da história se rebaixou o sacrifício ao nível de mera ação exterior. Deus mesmo linha de advertir continuamente os Judeus de que só pela atitude interior é que o ato externo adquiria valor.

Em Jesús Cristo temos um sacerdote como nos­so representante, para o qual o sacrifício não é ape­nas uma cerimônia visivel; um sacerdote que está impregnado visceralmente do espírito de sacrifica­dor, cuja oblação procede e brota de sua humildade sem limite: “ Aprendei de mim, eu sou manso e hu­milde de coração”. Um sacerdote que aprendeu, entre as dores, e que podia dizer: “ Meu alimento é fazer a vontade daquele que me enviou” . Uin sa­cerdote no qual as potências inferiores quedaram es­magadas no monte das oliveiras ante a grandeza e amargura do sacrifício. Um sacerdote enfim, que como prece matinal de sua vida já tinha protestado sua vontade pronta para um sacrificio total: “ Sa­crifícios cruentos e incruentos não os queres; des­te-me, porem, um corpo. Holocaustos e expíaçõesna° te agradam; Pel° que eu disse: eis que venho meu Deus, para cumprir a tua vontade” (Hebr. 10,

110

2. E’ o representante de Deus.

O sacerdote, porem, é como sacrificador não so­mente representante dos homens, mas também repre­sentante de Deus; pois deve transmitir aos homens a graça'e a lei do Altíssimo. Por isso tem de con­servar-se em estreita' comunicação com Ele.

Entre os africanos, como vimos, o feiticeiro de­ve provar seus poderes sobrenaturais por meio de lances mágicos.

No Testamento Antigo o Sumo Sacerdote era explicitamente assinalado como “ consagrado a Deus".

Em Jesús Cristo, porem, como está essa con­dição realizada de maneira incomparável !

Com a divindade está ele tão unido que forma um só ser com ela: Este sacerdote é o próprio filho de Deus ! Por isso é santo não somente nas suas qualidades, mas é, na sua mesma essência, o Deus três vezes santo, ante o qual os anjos velam a face. “ Ele não tem, diz São Paulo, como os sumos sa­cerdotes (dos Hebreus), necessidade de oferecer diariamente sacrifícios pelos próprios pecados e de­pois pelos do p o v o ..." (H ebr. 7,27).

Quando Moisés concluiu em nome de Javé a grande e divina aliança com o povo de Israel, passou 40 dias e 40 noites na presença de Deus sobre o monte, honrado com colóquios tão íntimos e confi­

111

denciais que seu rosto brilhava, quando desceu da montanha, precisando cobrí-lo com um véu.

O Antigo Testamento, selado por Moisés, fi­cou entretanto, como diz S. Paulo, letra morta.

Quarenta dias de coloquio com Deus, e certa­mente pura um homem mortal uma grande mercê ! Entretanto que são 40 dias de coloquio com Deus em comparação com a dignidade de Filho de Deus, qual a do Moisés do Novo Testamento, nosso Sumo Pontífice, Jesús Cristo !

Quando nos distribue como sacerdote os dons do Senhor, tira-os do que lhe pertence. Não tem necessidade, como um homem qualquer, de implorar para aproximar-se do Altíssimo. E que tesouros estão à sua disposição ! Não se trata apenas de al­gumas iluminações celestes, de algumas visões pro­féticas, de algumas palavras de revelação divina: ele dispõe de toda a plenitude das riquezas do Pai, de todo o mundo da sabedoria e amor divinos; tudo está às suas ordens, como Filho de Deus, consubs­tanciai ao Pai.

Que favor fez Deus aos homens, enviando-lhes tal sacerdote !

Com ilimitada confiança vamos pois unir-nos ao sacrificio que ele oferece ao Altíssimo.

Capítulo XV

O sacrifício perfeito(II. Parte)

Consideremos agora os outros dois elementos, que determinam o valor do sacrifício, dom e obla- ção. Também eles, como veremos, são tão sublimes, que constituem o fastigio do culto sacrifical da hu­manidade .

I. O dom perfeito.

A. Dom sem aparência.

Já reparaste alguma vez no que o sacerdote ca­tólico coloca sobre a patena de ouro, antes de come­çar a celebração do Sacrifício da Missa?

E ’ uma pétala pequena de pão ázirno. Pode-se imaginar coisa mais desprezível do que uma migalha de pão ? Em dinheiro não vale mais que alguns vinténs.

Todavia, quando o sacerdote na consagração le­vanta-a, todos os presentes caem de joelhos em ado­ração .

Sua mão contem o maior tesouro que há na ter­ra e no céu, em cujo confronto o mais fúlgido dia­mante não passa de um grãozinho de areia; um dom do qual é indigna a preciosa patena: o corpo deCristo, Nosso Senhor.

113

Estudando os sacriiícios antigos já observamu a ânsia de oferecer à divindade os dons de maioi preço.

Já os primitivos ofereciam os primogênitos de seus rebanhos e os frutos do campo, algo do que mais precioso possuíam. Na persuasão de que seus dons eram por demais mesquinhos, muitos povos pa­gãos adotaram até sacrifícios humanos; imolavam seus prediletos à divindade ou lhe dedicavam de modo peculiar homens inocentes, virgens imaculadas.

Quando os reis de Israel, Davi, Salomão, etc., queriam honrar de modo inédito o seu Deus, pro­curavam aumentar o valor de sua oblação, imolando milhares e milhares de animais sem mancha, e os ofereciam a Deus como holocausto.

Entretanto, só nós cristãos é que temos, no N o­vo Testamento, a possibilidade de ofertar a Deus uma vítima que é efetivamente de valor infinito: o corpo de seu Filho unigênito. “ Nosso cordeiro foi imolado, exclama jubiloso S. Paulo, o cordeiro de Deus, cujo sangue lava os pecados de todo o mundo” .

B. Dom inestimável.

Imaginemos que os homens se dedicassem a reu­nir todas as preciosidades da natureza e da civiliza­ção, todos os tesouros que jazem nas entranhas do globo, tudo o que a arte humana produziu no decor­rer de tantos séculos — imaginemos tudo isso como

114

que acumulado em um grande holocausto oferecido a Deus. Que farrapo seria afinal tudo isso, compa­rado com o dom precioso que nós, na santa Missa, podemos ofertar.

Consideremos' todas as riquezas da alma, tudo o que os corações humanos abrigam dc pureza, amor, bondade, desprendimento, tudo, reunido num só co­ração humano que nos fôsse dado ofertar a Deus. Como-seria pobre esta oferta, cm face daquele três vezes Santo, do Filho de Deus e de Maria, que na Missa se imola ao Altíssimo !

C. Dom da humanidade.

Nossa é a dádiva que se oferece na santa Mis­sa; em nosso nome, como representante nosso, o Sumo Sacerdote, apresenta esses dons, sua carne c seu sangue, a Deus Todo Poderoso.

E ’ nossa a dádiva; pois esse corpo nasceu de um ser humano, a Virgem Maria. Nele podemos oferecer a Deus o fruto mais precioso desta terra.

O fruto do trigo e o suco da vide, os mais no­bres produtos dos nossos campos, trazemo-los como dons ao altar, como figuras de nossa vida, a que eles servem.

Mas não são eles propriamente os dons do Sa­crifício da Missa; eles são transformados no corpo e sangue do Senhor ! Assim apresentam eles o mais inestimável fruto que nossa terra produziu. Não é

115

c-.ta a nossa grande consolação e. alegria de poder­mos, na Santa Missa, aproximar-nos de Deus c, apontando a sagrada Hóstia, dizer-lhe: Eis a nossa oferta ? E ’ ele um membro da raça humana, um irmão nosso, que vos oferecemos. — Oferta digna de vós. porque o fruto das puríssimas entranhas da Virgem Maria é o mais santo de todos os homens, sendo ao mesmo tempo vosso Filho.

Eis a oferta que Deus não pode rejeitar, que violenta de certo modo o seu coração.

II. A oblação perfeita.

A. Glorificação de Deus.

O sentido de todo o sacrifício é homenagem de adoração e amor a Deus. Esta idéia, que domina o sacrifício, e que já era persuasão corrente entre os pagãos, cada vez mais se aprofundou e desdobrou nas atitudes de louvor, graças, expiação e súplica.

No santo Sacrifício da Missa temos diante de nós um sacrifício em que essa glorificação de Deus se realiza em grau incomensuravel.

1. Infinito louvor é prestado a Deus.

Pois, esse louvor brota dos lábios de quem é digno de louvá-lo. Que valería afinal o louvor de um mendigo a um rei ? ou o de um pobre campô- nio a um sábio genial ?

116

Aqui na Santa Missa, entretanto, alguém se prostra por terra em homenagem a Deus, possuindo ele mesmo dignidade infinita, isto é, divina. Assim é que a Santa Igreja reza em cada Missa: “ PerIpsum et cum Ipso et in Ip so .. . Por ele, com ele e nele a ti, Deus Pai onipotente, é devida em união com o Espírito Santo, toda a honra e glória”.

2. As graças rendidas a Deus no Sacrifício da Missa são também infmitas.

Que alegria para os pais, quando o filho lhes diz uma palavra de sincero agradecimento: Meupai, minha mãe, eu vos agradeço; eu sei que o que sou e o que posso, e o que tenho, tudo o devo a vós.

No Sacrifício da Missa, nosso Sumo Sacerdote, apresenta suas próprias dores como sinal de agrade­cimento. Na narrativa da instituição deste Sacrifí­cio diz a Escritura: Jesús “ tomou o pão, deu gra­ças, partiu-o e disse: Isto é o meu corpo .. . ” (Luc. 22,19).

A atitude de gratidão emprestou o nome a todo o sacrifício: “ Sacrifício eucarístico” isto é: Sacri­fício de ação de graças !

No santo Sacrifício da Missa agradece ele como nosso mediador e chefe por tudo o que nós homens recebemos de Deus, e não são somente os bens da terra, como também os dons divinos da verdade e da graça, e ainda nossa vida, nossa mesma exis-

117

tência. Que consolação saber que a palavra de gra­tidão de nosso Sumo Sacerdote possue virtude in­finita !

3. Cada gota- do sangue do diirino Cordeiro re­presenta expiaçõo infinita.

No Apocalipse se nos descreve, como os San­tos do céu sempre entoam cânticos ao Cordeiro que foi imolado: “Digno és tu, de receber o livro c de romper-lhe os sigilos; porque foste imolado, e com teu sangue nos conquistaste para Deus de todas as tribus e línguas, povos e nações. . . ” (Apoc. 5,9).

E como diz bem a Epístola aos Hebreus: "Ora, se o sangue de cabritos e touros e as cinzas de uma vitela conferiam, pela asperção, pureza corporal aos impuros, quanto mais o sangue de Cristo, que em virtude do seu espírito eterno se ofereceu a Deus como hóstia imaculada, purificará a vossa conciên- cia das obras mortas, para servirdes a Deus vivo ? (Hebr. 9,13 s).

4. Afinal, é infinito o poder impetraiòrio des­te Sacrifício.

Este sacrifício do sangue e do corpo do Senhor “clama mais alto do que o sangue de Abel” (Hebr. 12,24).

E num outro lugar a Escritura diz: “Nossa esperança penetra até ao interior do Santo dos San-

118

tos, onde entrou por nós, como precursor, Jesús, o pontífice eterno segundo a ordem de. Melquisedec” (Hebr. 6,19 s ) .

Este é o fim do sacrifício de Jesús, como nos ensina a Escritura: “ Pelo seu sacerdócio sempi-terno pode salvar períeitamente os que por seu in­termédio se chegarem a Deus; pois que vive eterna­mente para interceder por eles” (H ebr. 7,25).

B. A comunicação com Deus.

Perfeito sacrifício! Uma confirmação disso te­mo-lo na sua aceitação por parte de Deus !

1. Já os antigos povos pagãos ansiavam por obter um sinal do acolhimento de suas súplicas pe rante Deus, e muitas vezes interpretavam assim im­previstas tempestades e outros fenômenos extraordi­nários. Xa Antiga Lei. Deus de fato muitas vezes deu sinais especiais de sua graça e de sua complacên­cia fazendo, por exemplo, consumir as vitimas com fogo do céu.

Entretanto, o desejo da humanidade visava mais alto. a tona participação da divindade por meio do sacrifício. Foi sempre a nostalgia dc todos os povos entrar numa espécie de comércio íntimo com Deus, e nos sacrifícios esperavam a realização deste anseio.. Tal era o seu pensamento: Deus a quem oferecemos o sacrifício, convida-nos a participar dele como sinal de aceitação e amizade.

119

Daí o costume de repartir entre os sacrificantes e a divindade os dons, aniquilando unia parte deles como símbolo da entrega a Deus, e fazendo consu­mir a outra parte pelos homens, sacerdote ou povo.

2. Essa profunda tendência da humanidade dc tomar parte 11a divindade por meio do sacrifício, en­contra no sacrifício e banquete eucarístico uma rea­lização em uma generosa medida nunca dantes sus­peitada.

Nele oferece-nos Deus como resposta uma co­municação real: convida-nos para uma ceia, em que nos apresenta um alimento verdadeiramente divino: a carne e o sangue de seu Filho predileto !

Não é, pois. somente uma união moral ou inte­lectual que este sacrifício realiza, mas uma participa­ção real e efetiva com a divindade.

Mais ainda: Pista ceia eucaristica é imagem,antegosto e penhor daquele eterno banquete e con­vívio, que nós, um dia, com ele celebraremos 11a gló­ria do céu.

Capítulo XVI

. O exemplo de MariaJesús Cristo, nosso Sumo Sacerdote, mostra-nos

no Sacrifício da Missa qual a atitude que o homem deve tomar perante Deus: uma doação de todo seu ser ! E ’ esta a atitude que Jesús realizou no gran­de Sacrifício de Gólgota; e que ele renova dum mo­do impressionante todo dia, e até a cada momento, na Santa Missa.

Quando o sacerdote na consagração apresenta ao povo o Corpo e o Sangue do Cordeiro, quer com isto fazer um apelo a todos nós, um apelo a imitar­mos sua doação a Deus.

Vêde, — assim fala Cristo, — como Eu, vosso Sumo Pontífice, me humilho diante dc Deus, sacri­ficando-me completamente. Seguí-mc, irmãos meus, venerai a Deus como Eu, com adoração e com amor i

O Sacrifício da Missa deveria ser a alta escola da nossa homenagem a Deus, o centro de toda nossa religião.

A toda a humanidade é dirigido esse apelo do hilho do homem, ecoando há quasi dois mil anos em inúmeros altares.

Como respondem os homens ?Muitos propositalmente se fazem surdos, não

querem se entregar a Deus, preferem sei autônomos e independentes.

121

Outros seguem o Sumo Sacerdote da nova lei, quando bem lhes apraz, flutuando entre a fidelida­de e a desídia.

Mas, sempre reaparecem almas generosas no curso da história que tomam a sério a imitação de Cristo, — são os Santos da Igreja.

Porem, nem eles correspondem totalmente ao ideal, pois nenhum foi extreme de pequenas falhas e defeitos.

Entre todos, apenas uma pessoa se destaca, uma única, que, de uma maneira ideal e perfeita, atendeu ao apelo de Cristo Rei, sem denegaçâo e sem desfa- lecimento: Essa c Maria, a Santa Mãe de Jesús.

Não temos muitas referências sobre a vida de Maria. Os Evangelhos, pouco nos relatam da sua peregrinação na terra, muito pouco. Não seria isto uma lástima? A vida daquela que é tão intimamen­te ligada à do Salvador, cuja santidade está acima de todos os homens e até dos anjos, que é a nossa Mãi e Rainha, e que foi elevada como Rainha acima de todos os espíritos bemaventurados, — não mere­cería, digo, ser narrada em todos os seus porme­nores ?

Não esqueçamos, que Maria possuia todas as virtudes no grau mais perfeito, num grau tão alto que se distanciou imensamente de todos os Santos da Igreja. Foi a mais pura, a mais desinteressada, a mais obediente, a mais misericordiosa de todas as criaturas que jamais viveram sobre a terra. Que

122

pena portanto, que não possamos conhecer e citar mais exemplos dessas virtudes.

E, entretanto, por mais parcimoniosos que se mostrem os Evangelistas na descrição de pormeno­res, desenham eles nas poucas cenas que nos descre­vem, uma grandeza tão sublimo que compensam com isto o seu laconismo.

Mais: eles deram à figura de Maria um encan­to extraordinário, procurando salientar-lhe um úni­co traço. — E qual é ele ?

E ’ a submissão humilde à vontade de Deus, é a dedicação incondicional a Ele, é o espírito de sa­crifício.

Este transparece em quasi todas as cenas ma­rianas dos _Evangelhos. Afigura-se-nos que Deus, quando nos apresenta Maria nos Evangelhos, quer revelar-nos o sentido mais profundo da natureza hu­mana, ou seja precisamente a dedicação a Deus, a imitação de Cristo em união com o seu sacrifício. Podemos dizer com acerto: parece que a grande missão que Deus confiou à Mulher admiravel. c de mostrar a todas as gerações futuras que a atitude fundamental da crcatura é abandono a Deus, pron­tidão ao sacrifício.

E esta é uma missão que nos tempos atuais tem certamente a maior significação.

Em três cenas os Evangelistas focalizam o exemplo de Maria: Na incarnação, nos mistérios da

123

vida oculta e nos da vida pública de Jesus. E sem­pre vemos o espírito de sacrificio como traço carate- rístico das atitudes da Virgem Mãe.

I. Na Incamação.

A. Importância desta hora.

Há lances na história do mundo rjue teem re­percussões seculares.

Lembremo-nos do momento cm que o impe­rador Constantino assinou no ano 313 o decreto de Milão, pelo qual assegurou o auxílio do Estado ao Cristianismo até então perseguido; ou de quan­do os Godos em 410 escalaram os baluartes da ca­pital do mundo, Roma. Lembremo-nos dc quan­do Colombo pisou pela primeira vez terras ame­ricanas. Ou de quando o monge agostinho Bcrtold Schwarz descobriu o primeiro explosivo. Ou ain­da quando cm 1919 em Versalhes os Impérios Cen­trais assinaram o tratado dc paz, imposto pelos vencedores.

Lances sensacionais, sem dúvida ! Entretanto nâo foram os mais importantes da história. I lá fa-v

cuja importância c alcance a nada são compará­veis.

Tal foi o “ Fiat" criador pronunciado por Deus na criação do mundo; ou a hora em que o Salvador no Gólgota inclinou a sua cabeça e expirou; assim o momento em que o Espírito Santo no dia de Pen- tecostes desceu sobre a jovem Igreja; e assim será mats tarde o dia em que o Filho do homem aparecer nas nuvens do céu para julgar o mundo.

124

Acrescentemos mais um fato de igual transcen­dência: ê aquele em que o anjo saudou a VirgemMaria, pedindo em nome de Deus o consentimento para ser a Mãe do Salvador.

Maria naquele momento representava toda a humanidade e lhe dava um belíssimo exemplo.

Dando o seu consentimento, segundo nos dizem os teólogos, representava o gênero humano. Ela pro­nunciou o “Fiat” em nosso nome. Grandeza imensa desta hora ! Mas não é tudo.

B. O exemplo de humildade.

Ela nos dava exemplo. A palavra que pronun­ciou era digna do alcance do momento. Foi uma das maiores palavras que jamais se pronunciaram sobre a terra. “ Eis aqui a escrava do Senhor, disse Ela modestamente, faça-se em mim segundo a vossa pa­lavra” . Eis a verdadeira humildade !

1. Que é humildade ?

Nenhuma virtude fora da Igreja Católica é tão deturpada como a humildade.

Pergunta a um amigo teu: o que é humildade? Responderá: humildade é baixar os olhos e curvar a cabeça. Ou: humildade é não reconhecer os próprios merecimentos; humildade é estar conven­cido da própria inferioridade.

Tudo isso são concepções completamente erra­das! Pois, se isto fôsse humildade, nem Maria nem Jesús Cristo teriam sido humildes.

125

Pois Maria exclamou cheia de alegria: randes coisas me fez o Poderoso; e eis que desde agora me chamarão bemaventurada todas as nações. . Logo, Maria reconheceu a extraordinária dignida­de que lhe foi concedida e a anunciou aos séculos. E Cristo afirmou que lhe fôra dado todo poder no céu e na terra, que era o Messias, que viria com gran­de esplendor sobre as nuvens do céu. Não, a humil­dade não é incompatível com a conciência do próprio valor.

Em que consiste, pois, a humildade ?

Não consiste em negar as próprias capacidades, porem, no reconhecimento de Deus como autor e doador delas. Maria disse: Ele, Deus, fez grandes coisas em mim; é a Ele que devo as graças que me foram concedidas. O que eu sou, devo-o a Ele. Sou somente uma serva do Senhor. — E foi também assim que Jesús foi humilde, sempre atribuindo seus extraordinários dons a Deus, procurando como ho­mem curvar-se diante do Altíssimo.

O humilde é sincero: não oculta o que possue esabe, mas não se vangloria com isso, pois está con-ciente de que lhe foi concedido pelo Pai do céu.O humilde é sincero, tem conciência do que valee reconhece ao mesmo tempo sua dependência e li­mitação .

Como esta concepção sincera do próprio eu exi-

s — — - -

126

O humilde-honra a Deus, porque se contempla com os olhos de Deus, mede a sua grandeza pela grandeza do Senhor; para ele só pesa o julgamento de Deus, a eterna Verdade.

2. A humildade de Maria

A humildade é tanto maior quanto mais sedu­tora é a tentação de enamorar-se. por assim dizer, das próprias prendas, em vez de medir-sc segundo a eterna verdade, e de dar glória a Deus.

Maria foi, de todos os filhos de Adão. a mais elevada e privilegiada. Quem jamais recebeu se­melhante mensageiro, um mensageiro do Todo Po­deroso ? Quem jamais recebeu semelhante sauda­ção: “Ave Maria, gratia plena — cheia dc graça” ? A quem jamais foi concedida semelhante magnitude: a de ser Mãe de Deus? E quanta tacinação há na grandeza!!

Quando no conhecido drama de Shakespeare as adivinhas prometeram a Macbeth a realeza, per­deu ele completamente a paz da alma. A cobiça do poder e da grandeza dominava-o. Em vez de receber o poder com humildade, como uma dádiva do céu, procurou obtê-lo pelo assassínio do legíti­mo rei. Humanamente compreensível! Porque a grandeza humana é perigo e tentação.

Maria resistiu à maior sedução que se podia oferecer a uma creatura. Compreendeu a extraordi­nária dignidade que lhe era concedida, porem, nem um só momento se deixou perturbar. Mediu sua

127

_randeza pela grandeza divina: Eis a serva do -T o r ! Curva-se neste momento, adorando aquele que só é verdadeiramente grande, Deus !

Sob esta palavra “ Serva do Senhor”, transpa­rece a maior homenagem à augusta grandeza e Deus, e a prontidão da vontade de curvar-se diante dele ! Somente Vós. meu Deus, sois grande; eu, diante de Vós, nada sou; Vós sois o Senhor, e eu a última de vossas servas !

Verdadeiramente, neste exemplo de M aria ve­mos um reflexo do Coração do Sumo Sacerdote que, como disse S. Paulo, “ despojou-se de si mesmo, assumindo forma de servo” (Phil. 2 , 7 ) . A “ Serva do Senhor” está ao lado do “ Servo de Deus” , como Isaias chamou a Cristo.

Assim o "F ia t” de Maria nada tem de passivo, pelo contrário, é uma maravilhosa demonstração dc força. E ’ o reconhecimento da própria indignidade e, ao mesmo tempo, um corajoso desprendimento para entregar-se a Deus.

E’ uma doação total de si mesmo ! Doação e dedicação à maior obra da história, a Redenção p por isso mesmo, entrega à dor e ao sofrimento, ’re- nuncia e ao sacrifício; numa palavra: prontidão para a cruz. Pois Maria, como Rainha dos Profetasve a espantosa dureza do cami„h0 que se lhe abrediante. O seu “ Fiat” â\7 - “ ir

d z - Eu estou preparada”brande é este “ F ia t ”

mento ainda é maior. ’ P em 0 seu fi«l cumpri-

128

II. Nos mistérios da vida oculta.

Contemplemos rapidamente essas cenas miste­riosas, o nascimento de Jesús, sua apresentação, a fuga para o Egito, o desaparecimento e o encontro no templo.

Qual é aqui a atitude característica de sua Mãe? Sempre o espírito de sacrifício !

1 . Quando Maria leva no seio materno o Fi­lho, tão maravilhosamente recebido do céu, a provi­dência divina dispõe as coisas de maneira que Ela deva empreender viagens, que nos albergues não en­contre lugar, e que deva escolher para berço de seu Filho recem-nascido uma mangedoura. Lembremo-

x nos do que representa para uma mãe não poder dar um berço a seu filho. E assim foi obrigada a Virgem Mãe a repetir o seu “Fiat” .

2. A cena da apresentação de Jesús no Tem­plo, em todos os seus pormenores fala de sacrifício.

Quando o sacerdote, segundo o rito prescrito, toma a creança nos braços e a oferece a Deus, sabe Maria que não se trata somente duma cerimônia tradicional, de um símbolo litúrgico; não, esta crian­ça de fato pertencerá inteiramente ao Senhor.

Ela sabe, como Rainha dos Profetas e “ Sede da Sabedoria”, que seu Filho é o Cordeiro Divino, que deverá ser sacrificado. Sabe, que nos outros casos, Deus aceita como oferta as pombas, renunciando aos

129

* 'tnc «nas neste, não. Jeova exige que estenienino^seja a hóstia destinada ao ^Filho deve morrer de uma morte cruel em holocaus­to ao Senhor. E ela deve consentir, ela, sua mae, que ama seu Filho mais que a própria vida.

Esta determinação lhe foi expressamente con­firmada pelo santo velho Simeão, inspirado pelo Espírito Santo. "Tu, sua mãe. tomarás parte no sa­crifício do teu F ilh o ... uma espada de dor a tra ­vessará o teu coração.”

Nenhuma palavra de Maria nos é revelada nes* ta cena; em humilde conformidade assiste a esta consagração do Filho ao sacrificio. Em seu coração ela exclama como naquela hora da Incarnação: ‘'E is a escrava do Senhor” .

3. Na fuga para o Egito, Maria conheceu o que é para uma mãe ver seu filho hostilizado pelo seu próprio povo, vê-lo perseguido até a m orte . Sabe que isto é somente uma antecipação daquilo que ela tinha que esperar mais tarde na vida pública de Jesús.

4. Pensemos finalmente no doloroso fato do desaparecimento de Jesús em Jerusalém.

Não terá querido Deus dar-nos um exemplo em­polgante, mostrando-nos como a criatura mais eleita aquela que Ele saudou como “gratia plena”, deve estar sempre pronta a dar e a sacrificar o que mais ama, com humildade e suie.Vs,. • , 4

A atitude deste “ fiat” dn • 9 * VOntade divina ?ftat domina toda a vida de M aria.

130

III. Nos mistérios da vida pública de Jesús.

A vida pública de Jesús começa com a separa­ção de sua Mãe. Ela o deve perder novamente, deve abandoná-lo, e desta vez — sabe-o perfeitamente — é para sempre, até a sua morte.

Quando ela, juntamente com outros parentes, encontra Jesús que prega ao povo, repete-lhe o Mes­tre o dever da renúncia e do sacrifício. — Dizem a Jesús: “La fora te chamam tua mãe c teus irmãos”. — “ Quem é minha mãe ? Quem são os meus ir­mãos ? Quem obedece à vontade de meu Pai que está no céu, este é meu irmão, e irmã e mãe” (Math. X II, 46). Jesús não tem outra missão fora da salvação das almas, e quer que sua Mãe querida participe também do sacrificio da separação. E ela, como discípula do Mestre divino, o aceita com toda a sua alma.

Mais tarde vemo-la em atitude erecta junto à cruz, no Gólgota, oferecendo o holocausto em união com o Filho. “ E junto à cruz de Jesús estava de pé sua Mãe.” (João, XIX, 25).

Esta é a mais grandiosa cena da sua vida. Nes­te momento, Maria é ainda mais sublime do que no momento da Incarnação. Agora deve cumprir e rea­lizar tudo o que aceitou no seu “ Fiat” .

Neste momento, é com uma espada de dor a lhe atravessar a alma que ela entrega o seu Filho em holocausto ao Pai celeste. Teve que executar o que de Abrahão fôra apenas exigido como prova, e as-

131

sim é consagrada como Rainha dos Mártires. Tor­na-se Rainha, exemplo e guia da humanidade, parti­cipando intimamente do sacrifício do Salvador.

Não há palavras humanas que possam descre­ver o que se passou naquela hora na alma de Maria. E’ adoração, é submissão, é humildade, é amor ? E’ tudo isto. O seu porte erecto e silencioso o deixa transparecer: Deus é grande; só Ele é o Senhor; Ele tem o direito de exigir como sacrifício até o que mais amamos. A nós compete adorá-lo e dizer: “ Somos os servos do Senhor. Fiat".

Capítulo XVD

A mestra da humanidadeE’ a grande missão de Maria, como temos visto,

incitar e animar os homens com o seu exemplo de grandiosa submissão à vontade de Deus.

Esta missão não terá também em nossos tempos uma grande significação ?

“Eu sou o Senhor, teu Deus’’ — estas palavras ainda estão escritas como postulado divino acima de todos os mandamentos de Deus. Deveríam eia-, exercer também decisiva influência sobre o agir c pensar dos homens de nossos dias.

“Eu sou o Senhor, teu Deus” ; Eu, que sou o Ser supremo e absoluto; Eu, que sou o sublime e o misterioso, o infinitamente rico e fonte de toda a vida; Eu, o escondido e, não obstante, conhecido pelas criaturas; Eu, que estando imensamente longe de vós, estou ao mesmo tempo infinitamente perto. E’ a mim que deveis adorar, diante de mim deveis curvar-vos, cheios de veneração e humildade obede­cer à minha palavra, e procurar-me com o amor de vossos corações.

No longo decurso day história, como é que res­pondiam a este apelo divino os homens de coração reto, sinceros, bem intencionados ?

133

Com o sacrifício! Vós sois o Senhor, nós so­mos vossos servos, eis o que dizia cada sacrifício, como expressão de homenagem e de submissão.

Mas apesar de se repetirem tantas vezes esses sacrifícios no decurso da história, nunca puderam constituir uma reparação condigna de Deus. Até que, chegada a plenitude dos tempos,- foi oferecido o sacrifício perfeito pelo segundo Adão da humani­dade. E hoje se renova este sacrificio diariamente diante dos nossos olhos, celebrado nos altares das nossas igrejas.

E quem é aquela que está perto, bem perto do Sumo Sacerdote? E ’ Maria, guia de todos os que devem seguir a Cristo.

Animo, diz-nos ela, coragem para a humildade, para o abandono total a Deus; aprendei de mim como se segue a Cristo desinteressadamente, com o seu genuíno espírito, que é o espírito de sacrificio.

Sim, que benefício é para nós o exemplo de Maria, nestes tempos, em que o maior mal é o espí­rito de autonomia, de independência absoluta do ho­mem, o seu afastamento do Criador!

I. O homem moderno.

Se nos séculos passados eram as questões dog­máticas as que mais se debatiam, é o problema da relação fundamental do homem para com Deus, que sobe à primeira plana nos tempos atuais.

134

Xa verdade, em dois grandes campos se divide a humanidade de hoje: o dos que reconhecem a Deus e os seus divinos direitos sobre nós, e o dos ateístas, que o negam e, consequentemente, negam também os seus direitos sobre nós.

A atitude do homem moderno contrasta radical­mente com a atitude da “Ancilla Domini” . O ho­mem de hoje não quer ser servo, mas senhor; não é a humildade, mas sim o orgulho o seu distintivo; não quer servir, quer dominar.

1. Os ateus sem rebuços.

Ainda hoje ha inúmeros ateus declarados. Não nos iludamos. Mesmo se o ateismo organizado dos comunistas não existir mais nas suas formas antigas, mesmo se a organização dos ateus combatentes desa­parecer, — é certo, entretanto, que os homens que compõem suas fileiras e milhares dos que com eles simpatizam, continuarão a existir. Sim, ainda exis­tem muitos daqueles que acoimam a religião de “ópio para o povo” — existem, dizemos, mesmo fora da Rússia.

Será preciso procurar muito para encontrar ho­mens que não se preocupam com a Igreja, com a Religião, com Deus? Que vivem inteiramente absor­vidos pelos seus negócios e interesses terrenos? Que durante semanas e talvez anos não pensam uma vez sequer no Ser Supremo que acima deles vive ?

135

2 . Os ateus disfarçados.

Sâo legiões os que ocultam o seu ateísmo sob belas e sonoras palavras, que, em vez de adorar o verdadeiro Deus, divinizam qualquer bem creado.

Quando se penetra no fundo da alma de um desses ateus, percebe-se que na realidade ele adora a um Deus, não o verdadeiro Deus, mas um Ídolo qualquer. Um perfeito ateu não existe. Quem re­jeita o verdadeiro Deus, fabrica para si, como diz a Escritura, uma imagem, um idolo para adorar. E quantos não proclamam hoje em altas vozes os seus ídolos, divinizando qualquer bem terrestre — que é a moderna forma do ateísmo l

Para muitos é o gozo ou o dinheiro o objeto do seu principal interesse, e é a esses interesses que vendem a própria alma. Para outros é um bem qual­quer da natureza, sua família ou sua profissão, — dedicam-se completamente a isso e não conhecem objetivo mais sublime. Outros consideram a nação, o Estado ou o povo, como o bem supremo, e nessesbens querem ver a finalidade da vida.

Certamente, todos estes valores são apreciáveis, mas com suas gradações: a família, a profissão, 0 po­vo, são de fato bens mais preciosos do que o gozo, a riqueza ou a força física.

Quem não vê, entretanto, que está tudo isto in­finitamente abaixo de Deus ? Considerar portanto esses bens como os mais elevados, e considerá-los como fim último da existência, é uma revolta contra a vontade de Deus, que disse: Eu sou o Senhor, teu Deus !

136

II. O ensino da SSma. Virgem.

Em Maria foi dada à humanidade uma pessoa que incarna a congruente atitude do homem para com Deus, que realiza em toda a sua vida o “ teocen- trismo”, a submissão incondicional e amorosa sob a vontade divina e o abandono total ao Todopoderoso.

1 . Para os indiferentes.

Sem dúvida, em nosso pais a maioria dos nossos compatriotas são católicos, batizados no catolicismo, respeitam o sacerdote, e se alguém lhes perguntar, qual a sua religião, responderão imediatamente que é a católica.

Porem, quantos há na realidade que são de to­do indiferentes para com Deus e seu serviço ?! Quantos há que não o servem, que nele não crcm, mas vivem segundo princípios pagãos! Que reco­nhecem a Deus na igreja, mas que na sua profissão, na sua vida familiar, na educação dos seus filhos, na escolha dos seus livros, nos seus divertimentos, ja­mais se preocupam com a vontade divina; que são capazes de ir à Missa pela manhã, e de à noite par­ticipar de diversões imorais!

A todos esses falta o espírito da “Ancilla Do- mini” ; todos eles devem aprender de novo, com o exemplo de Maria, o que é servir a Deus, adotando como lema de sua vida, tal como a Virgem Santís­sima, as palavras: “ fiat mihi secundun verbum tuum, faça-se em mim segundo a vossa palavra” .

137

2. Para a juventude.

Missão relevantíssima cabe à juventude católica: dar ao povo o exemplo da dedicação a Deus. Com sua conduta deve mostrar quanto é detestável a ne­gligência ou tibieza em tudo aquilo que se refere a Deus ou ao seu santo serviço.

A juventude católica, e principalmente a juven­tude mariana, deve vencer esse indiferentismo que vai grassando tão assustadoramente em nossos dias ! O nosso episcopado depositou nela toda a sua con­fiança, como se lê, por exemplo, na ata da fundação da Federação Mariana de Pernambuco.

Frustará ela as esperanças e votos dessa tão gloriosa coroa de bispos brasileiros ? Nunca ! E ’ este um dever mariana, de que não pode ela eximir- se. Sim. da oporá um dique contra a onda do indi­ferentismo, que, como disse um autorizado porta-voz do episcopado brasileiro, reina. em toda a parte. E’ nesse sentido que ela fomentará a verdadeira hu­mildade .

A humildade! . . . Eis o que se pode chamar uma virtude fora da moda, uma virtude mal com­preendida. Mas acima de tudo está a verdade: averdade nos humilha. E ’ preciso coragem para ser humilde. . . Curvemo-nos diante do Senhor que reina sobre nós.'

Tenhamos valor para proclamar alto e bom som o que nos ensina a razão e a fé: Não nos criamos a

138

nós mesmos. De Deus procedemos e para ele cami­nhamos. Existe um Ser superior que nos chamou do nada, e este é Deus. Reconhecemos e admira- mos os preciosos tesouros que se encerram na na­tureza, e devidamente os avaliamos. No entanto, como somos fracos em não reconhecer a mais primi­tiva de todas as verdades, a verdade da nossa depen­dência.

Teem sido precisamente os grandes homens da história e de todos os povos, que nos deram o exemplo do humilde reconhecimento de Deus. Para citar só a lguns:

O príncipe dos músicos, Beethoven, copiou numa das horas mais duras de sua vida as se­guintes frases dum livro de preces: “Devo confes­sar, em louvor de vossa bondade, ó Deus, que apli­castes todos os meios para atrair-me a Vós. Às vezes vos agradou, fazer-me sentir a mão pesada de vossa ira e de humilhar com rígidos castigos o meu orgulhoso coração. Enviastes-me doenças e outras desgraças para conduzir-me à reflexão sobre as minhas aberrações... Só isto vos peço, ó meu Deus, não desistir de cuidar da minha cor­reção... Fazei-me fecundo em boas obras por quaisquer meios. . . ”

O famoso astrônomo Copérnico destinou para a própria tumba a seguinte inscrição: “Não de­sejo a graça de um São Paulo, nem a benignida- de com que perdoastes a um São Pedro; só aquela que destes na Cruz ao ladrão da direita, só esta vos peço.”

Não menos engenhoso do que Copérnico foi o astrônomo Kepler, que encerrou sua grande obra ?i°k»re harmonia dos mundos” com esta prece: “O* Vós, que despertais em nós pela luz da natu-

139

ir * ?uz7» °glérià,“l Vôf C ri» "» ™ 'Xnhor oor me fazerdes jubilar com vossas obra..

e ^ r i o t u e Vós* me \ £ £vossas obras ao homens, na medida em que a minha alma pode c o m p re e n d e r a sua ínfim tude.. .Perdoai-me bondosamente, se tiver dito algo in­digno de V ó s... ”

Queremos, como juventude católica, cultivai a humildade. Falamos respeitosamente de Deus c lan­çamos um alto protesto contra a injúria, o desprezo e a blasfêmia contra o Senhor. Naquela mesma ati­tude da nossa Rainha, rezamos humildemente a Deus. A oração não é uma degradação do homem. E ’ o reconhecimento da verdadeira essência da nos­sa natureza e nada eleva e dignifica tanto ao homem.

Como diz o grande Ruy Barbosa na sua inspi­rada “Oração aos moços”:

"Oração e trabalho são os recursos mais po­derosos na criação moral do homem. A oração é o íntimo sublimar-se d’alma pelo contato com D eus... O indivíduo que trabalha acerca-se con­tinuamente do Autor de todas as coisas, tomando na sua obra uma parte de que depende também a dele. O Criador começa e a criatura acaba de si própria. Quem quer pois que trabalhe, está em oraçao ao S e n h o r...”

sa * * b “ »°-

d« n l Í7 ntUde “ tóliCa aiic,ha-5' diantede Deus. levanta para ele, súplices, as suas mãos re-

£ £ de“ * *«— •

140

3. Sobretudo para a juventude mariana.

Juventude mariana! Eis a briosa juventude que, sem respeitos humanos, ostenta sobre o peito os seus distintivos e insígnias, professando-se aberta­mente juventude de Maria.

Refleti, entretanto, ó juventude mariana: nãoé nas exterioridades que consiste a verdadeira devo­ção a Nossa Senhora. E ’ bom e digno louvar e ve­nerar a Maria, realizar procissões e desfiles, cantar- lhe hinos. Não é isto, entretanto, o principal; a mesma recitação do Oficio Mariano não basta.

O distintivo da verdadeira juventude mariana é a imitação de Maria.

A juventude mariana deve fazer da atitude da sua Rainha sua própria atitude; deve viver o “ Ecce Ancilla Domini, — Eis a Serva do Senhor''. — Este é o lema de Maria, este é o nosso lema, e nele temos confiança.

E ’ assim, tal como a compreendemos aqui, que a devoção a Maria, longe de nos afastar de Cristo, a ele nos aproxima eficazmente. Mais, é uma devo­ção indispensável a quem deveras quer aproximar-se de Jesús.

Uma verdadeira devoção mariana, que não se contenta com atos externos, mas concebe a Virgem como guia e exemplo ideal da virtude cristã, é cami­nho seguro para Cristo Jesús. Ela nos leva a imi­tar em nosso Rei a mais profunda, a mais sublime, a

141

mais dificil das suas carateristicas: o espírito de sa­crifício. A atitude mariana é a própria atitude teo- cêntrica do Sacrifício da Missa.

Não §e pode Separar Maria, do Sacrifício da Missa. A devoção a Maria é a escola do sacrifício para quem a cultiva à luz dos verdadeiros princípios e soube vivê-la. Cristo, Sumo Sacerdote, espera em meio à estrada imaculada de sua Mãe Santíssima, a quantos por ela escolheram caminhar.

Capacite-se a juventude mariana do tesouro pre­cioso que possue na devoção e consagração a Maria. Mas não fuja à responsabilidade que lhe é imposta.

Que benção será para o Brasil, se os grupos de marianos e Filhas dc Maria, erigidos em tantas cente­nas de paróquias, conseguirem proscrever o indife- rentismo e a mediocridade; se levarem os seus com­panheiros a realizar a atitude da “ Ancilla Domini”, da “ Escrava do Senhor”, mostrando-lhes o que si­gnifica ser católico total e genuinamente.

Capítulo XVHI

Nóssa participação na missaA Santa Missa significa, como já vimos, a gran­

de homenagem que a humanidade, no Testamento Novo, oferece a Deus por meio de Cristo, seu chefe. E nós desejamos tomar parte nesse sacrifício, seguin­do o exemplo de Maria; queremos cada vez mais fazer do sacrifício de Cristo o centro da nossa vida.

Ninguém pode dispensar-se da participação desse holocausto. Constantemçnte celebra a Igreja a San­ta Missa, e não há momento em que nalguma parte do mundo não sejam pronunciadas pelo sacerdote as palavras da transubstanciação.

0 convite para assistir diariamente a este Sacri­fício, é dirigido a todos os cristãos; e cada um está obrigado a assistir-lhe uma vez na semana.

Ponderemos em primeiro lugar os motivos por­que aceitamos de boa vontade este convite, e depois como convem assistir à Missa, sobretudo aos do­mingos.

I. Excusas.Porque muitos jovens faltam aos domingos à

Santa Missa?1 — Muitos não sabem que a assistência à Mis­

sa aos domingos é um dos mandamentos da Igreja, que nos obriga rigorosamente. Cabe-nos a nós ins­truí-los.

143

2 — Há moços que dizem: Não é, afinal, de­masiada exigência, assistir à Missa todos os domin gos ? Quantas vezes não se desejaria fazer precisa- mente no domingo uma pequena excursão para refa­zer-se do cansaço da semana! E ’ tão agradável dormir mais um pouco aos domingos para recuperar o sono; é justamente no domingo que podemos en­contrar os nossos amigos, e é nesses dias geralmcn te que eles nos visitam; como é embaraçoso o cum­primento desse dever!

3 — Outros pensam que a Igreja não devia ser tão rigorosa em coisas exteriores. Deus certamen- te não dará tanta importância a isso. Ele olha mais para o coração do que para os atos externos. H á pessoas que frequentam a igreja até diariamente, e nem por isso são melhores do que os outros, às ve­zes até deixam mais a desejar.

4 — Não falta quem objete: Porque há de serjustamente a Missa? Uma bela novena, uma solene procissão, uma exposição do Santíssimo, uma H ora Santa, na qual o sacerdote nos fala ao coração__istosão coisas que me empolgam, que me satisfazem mais. 5

5 Enfim, alguns acham que este m andamen- to atenta contra a sua liberdade. Não é mesquinho da parte da Igreja, ditem, exigir a assistência cada domingo, e isto sob pecado grave? Afina! de con-tas cada um sabe o que deve f a ^ r •tratar t ^ o - fazeri nao se podemtratar todos os cristãos como crianças.

144

Não foi este, caro amigo, algumas vezes também o teu modo de falar e de pensar? São por acaso jus­tas estas objeções e excusas?

— E porque não? Há algum ern> em pensar assim ?

Esquecem o que é a Santa Missa!

II. Porque tomamos parte na Santa Missa?

1. Porque na Missa renova-se o sacrificio que nos trouxe a salvação.

Estamos no ano de 1934. Na China, bandos de comunistas assediam uma cidade. Exigem ex­cessivo resgate ameaçando, caso não seja pago, destruir todas as casas e degolar os que delas fu­girem. Não há defesa possivel.

Um pânico tremendo apodera-se dos habitan­tes da infeliz cidade. Parecem, irremediavelmen­te perdidos.

Casualmente acha-se entre eles um príncipe extrangeiro, a quem cabe o direito de deixar a ci­dade num determinado prazo. Entretanto, antes que expire o prazo, dá-se um fato extraordinário.

O príncipe pede uma entrevista ao chefe dos comunistas. Levam-no com os olhos vendados ao acampamento vermelho. Lá chegado, pergunta em quanto' monta a importância do resgate. O chefe vermelho, sorrindo, exige uma fantástica so­ma de dinheiro.

Então o príncipe tira do bolso sua carteira c entrega-a ao bandido com estas palavras: Aqui está o resgate; é toda a minha fortuna.

A cidade está salva; os bandidos partem para n exercer provavelmente a mesma pressão sobre uma outra cidade. Mas como receiam que o ge­neroso doador possa servir de testemunha contra eles, levam-no consigo e o assassinam na noite se­guinte.

145

Quando os habitantes da cidade ^ s ervam a retirada dos vermelhos, nao querem dar credito ao que estão vendo. Rapidamente espattta-se> u noticia da ação generosa do príncipe. Lm a imen- sa multidão reune-se diante de sua casa. Entre­tanto, apesar dc vários dias de espera, o príncipe não volta. Compreendem então que fora ^assas­sinado. Os criados de nada sabem, a nao ser que o seu senhor deixara uma carta a ser entre­gue às autoridades locais, caso não voltasse. Abrem-na. O príncipe nela explica o seu modo de agir: assumia voluntariamente o resgate da cidade, conciente de que corria um grande risco, mas que se sacrificava por amor dos habitantes. Só tinha um pedido a fazer, que os habitantes da cidade se reunissem uma vez por semana numa singela comemoração para lembrar-sc do seu devotamento.

Éscusa perguntar se os habitantes cumpriram o último desejo do príncipe. Seria possível que o achassem oneroso demais ? Que procurassem pre­textos para evitar essa comemoração semanal ? E quem assim pensasse, não cairia no desprezo pú­blico ?

Tu poderás aplicar, 'leitor amigo, esse caso a Cristo Nosso Senhor. Sim, Cristo é esse príncipe extrangeiro, no qual os sitiantes não podiam tocar. Voluntariamente, por nosso amor, aceita o sacrifício da vida e entrega-se aos inimigos. E a Santa Missa não é acaso a comemoração solene do seu sacrifício ? “ Memoriale mortis Domini”, comemoração da mor­te do Senhor, como a Igreja a chama.

Queres de fato, ante esta prova de amor infini­to, persistir nas tuas excusas e desculpas? Queres responder a quem se sacrificou por ti: Exiges dema,s, pensar semanalmente, durante meia hora, na

146

tua morte! Não sentirías pejo em alegar tuas co­modidades, teus ócios e teus passatempos? Ousarias falar em infantilidade ou em coação não justificada?

Há alguns anos achava-me cm Paris, visitan­do o túmulo do “Soldado desconhecido", que fica próximo ao “Arco do Triunfo”. Uma luz perma­nente arde sobre esse singelo monumento que os habitantes enfeitam diariamente com flores.

Um amigo francês, que me acompanhava, dis­se: Há poucos lugares que me impressionamtanto como este túmulo, o que acontece aliás a muitos meus compatriotas. Sentimos cxtranha co­moção junto ao túmulo de um herói, do qual ca­da um deve dizer: Ele morreu por mim. Se essesoldado desconhecido não tivesse aceitado todos os sofrimentos e mesmo a morte, o que seria de nós?

O meu amigo não tinha razão? Mas o que é afinal o sacrifício do soldado desconhecido no front, em comparação com o sacrifício de Cristo feito por nós na cruz? Não morreu Ele por mim, por ti e por todos? O que seria de nós, se Ele não tivesse mor­rido?

2. Porque a Santa Missa nos proporciona pre­ciosas lições.

Na história da humanidade o observador atento percebe a ânsia incontida de oferecer ao Criador um sacrifício satisfatório. A Santa Missa, a mais alta expressão do sacrifício, foi a plena satisfação deste anseio secular. Quão dignos de lástima são portan­to os que, como judeus e protestantes, opondo-se à tradição ininterupta da humanidade, prescrevem o

147

sacrifício dos seus cultos! — E também tu serás um deles? Queres destoar nesta tradição constante da História ?

O que os pagãos e judeus almejaram e puderam demonstrar só imperfeitamente, consuma-se na San­ta Missa. Nós, que caminhamos à luz da revelação, que possuímos na Missa o sacrificio perfeito, deve­mos apreciá-lo e acatá-lo com mais solicitude do que aqueles povos sem fé os seus sacrifícios, pobres som­bras do verdadeiro Sacrifício.

Não esquece, meu amigo, esta verdade: ASanta Missa é a mais grandiosa expressão da nossa dedicação a Deus; e toda homenagem, todo agrade­cimento, toda expiação, todas as súplicas, que se ele­varam e ainda se elevam da terra para Deus, teem o seu valor somente mediante o Sacrifício de Cristo.

Não tens, tu também, meu amigo, motivos para louvar a Deus? Não é ele também teu Senhor? E a dedicação total a ele não é o único objetivo digno de tua vida?

Não tens motivos para agradecer? Pergunta a ti mesmo: “Que possuo que não tenha recibido da fonte de todo bem’ ?

E os teus pecados não clamam por expiação e penitência? E se tu pessoalmente pouco tivesses de que te penitenciar, que mar de pecados e culpas não acumula a humanidade em nossos dias! E não se­remos todos nós de qualquer modo solidários nelas?

148

Ofereçamos à Deus a penitência que o nosso «Sumo Sacerdote lhe apresenta no Sacrifício da Miasa!

Quantas preocupações temporais e espirituais fervilham em teu coração! Aqui tens-ocasiãu de su­plicar a Deus por meio de Cristo que representa tam­bém a ti, oferecendo o seu sangue, o sangue do ver­dadeiro Cordeiro pascal, “que fala mais alto”, como diz Paulo, “ do que o sangue de Abel’’.

Tú veneras a Xossa Senhora, és talvez até con­gregado mariano. Maria é tua verdadeira mãe. Tú a amas e lhe prometeste venerá-la com devoção espe­cial. Queres agradá-la, segui-la, e ser por ela guiado.

Ora bem, qual é o seu mais ardente desejo ? Em que advertência insiste ela mais ? Que atitude anseia ver em ti? Qual é o ensino que toda a sua vida mais inculca ?

E ' a doação total a Deus, é a humilde submis­são a ele, em adoração e amor, e esta é a grande lição que Jesús nos dá no seu sacrifício.

3. Porque empolgantes exemplos nos aduzem a esta atitude.

Pensa, como a Santa Missa sempre foi estima­da pelos verdadeiros católicos.

Entre os príncipes alemães que, no fim daguerra mundial de 1918, perderam o trono, conta­va-se o rei Frederico Augusto de Saxônia. Ape-

149* *

^ar dc seu país ser quasi na totalidade protestante, rei e a sua família eram católicos exemplares,

eu filho mais velho, o antigo príncipe herdeiro Jorge, hoje Padre Jcsuita, afirma-nos que seu pai nunca faltou à Missa. Muitas vezes, quando per­correndo % seu país e, entrando na igreja de qual­quer aldeia, achava todos os lugares ocupados, ajoelhava-se, sem mais, no pavimento e seguia a função sagrada com a maior devoção. Frequente-

r mente ajudava à Missa. Tinha aliás orgulho cm sè dizer Congregado mariano.

Estima idêntica da Santa Missa lemos na vida de S. Tomaz More, chanceler da Inglaterra no rei­nado de Henrique VIII.

Assistia diariamente á Santa Missa. Era de opinião, que o serviço divino nunca podería ser celebrado com o esplendor e a dignidade que me­recia. Dois amigos seus confirmaram unanime­mente que Tomaz More ajudou frequentemente à Santa Missa, mesmo depois de ser chanceler do Reino.

Certa vez o Duque de Norfolk chegou a Chcl- sea (lugar onde residia o chanceler) para almoçar com ele. Encontrou-o na igreja, cantando, vesti­do de sobrepeliz. Pois, Tomaz, na Missa dos do­mingos cantava no côro com a sua bela voz. De­pois da Missa exclamou o Duque:

“Mylord chanceler tornou-se sacristão ? Vós deshonrais o rei e o vosso cargo !" Sorrindo res­pondeu o Santo: “A meu senhor, o rei, não pode desagradar o que faço por reverência ao Senhor do meu senhor. ” Resposta digna de um Santo í

Mesmo quando o chanceler era chamado com urgência pelo rei, não deixava de assistir à Mis­sa. Dizia então que tinha que servir primeira­mente a um Senhor fhais alto.

150

Lembremo-nos finalmente o que significava a Missa para o povo católico em tempos de perse­guição.

Pensemos no México, onde muitos jovens cató­licos, muitos congregados marianos, morreram mar- tirizados, porque, contra as injustas leis do Estado, reuniam os fiéis para a celebração da Santa Missa. Assim, por exemplo, possuímos uma fotografia da Congregação Mariana de Colima, na qual estão assi­nalados como mártires sete congregados, 11a maioria assassinados por terem avisado secretamente aos fiéis da celebração da Missa; outros morreram por terem ouvido Missa ou terem ajudado aos padres que es­tavam ocultos no país.

Capitulo XIX

Nossa missa dominicalI. A Missa aos domingos como obrigação.

O primeiro mandamento da Igreja nos obriga a “ouvir missa inteira aos domingos e festas de guar­da Vejamos a que este mandamento praticainen- te nos obriga.

1. “Aos domingos e festas de guarda".

Corresponde a uma exigência profunda da natu­reza, que o homem, após seis dias de trabalho, reser­ve um para o descanso. Os esforços de governos ateus, no sentido de introduzir o décimo dia para dia de descanso, como os jacobinos na revolução franceza, ou no sentido de simplesmente abolí-lo, como os leaders comunistas na Rússia, foram todos baldados, e pouco a pouco voltou-se a adotar o do­mingo como dia de repouso. O Antigo Testamento nos oferece a este respeito o exemplo do próprio Deus. Depois de narrar a criação do mundo em seis dias, acrescenta: “E no sétimo dia descansou...”

Porque a Igreja escolheu justamente o domin­go, é facil de compreender. Pois foi no dia seguinte ao sabado judáico o em que Cristo ressuscitou, e foi também num domingo, que o Espírito Santo desceu sobre a nascente Igreja.

152

Comemoramos assim todos os domingos a Res­surreição de Cristo e a descida do Espírito Santo.

As festas de guarda são também dia^ <le come­moração que nos recordam acontecimentos da vida e obra redentora de Nosso Senhor; outros são con­sagrados a nossa Mãe Celeste Maria, e aos Santos.

Este mandamento nos obriga sol) pecado mortal. Há porem excepçôes, em casos justificados.

Estes são por exemplo:

1. Impossibilidade física. — Os doentes qiu teem de ficar de cama ou no quarto, os prisionei­ros detidos, caso não tenham assistência religiosa, os passageiros ou tripulantes, caso não tenham ca­pelão etc., acham-se pelo fato mesmo dispensado> de assistir à Missa.

2. Impossibilidade moral. — Ou seja, impe­dimento verdadeiramente grave para assistir ã Mb- sa: os aleijados, os convalescentes, os que moram a grande distância da igreja, ou estão impedidos pelo mau tempo ou por estradas intransitáveis: os que devem tomar conta dc uma casa, que não pode ser abandonada sem inconvenientes graves; os filhos ou criados cujos pais ou patrões não per­mitem ir à Missa sem despedi-los ou maltratá-los; militares retidos por suas obrigações etc., todos eles teem como desculpa legítima a impossibilida­de moral.

3. Caridade. — As pessoas, que devem cuidar dos doentes, vigiar criancinhas, os que são chama­dos para levar algum socorro urgente, e tc ...

Em caso duvidoso pode-se pedir dispensa ao Padre Vigário.

(Segundo Cauly, Curso dc instrução religiosa,T. 1, p. 212s).

153

B. A presença pessoal k Missa é exigida.

A Igreja impõe aos fiéis o comparecimento fí­sico. Não é pois suficiente ouvir a S. Missa p. ex. pelo rádio.

C. Ouvir a Missa inteira.

E ’ portanto necessário para cumprir o manda­mento da Igreja, estar presente a todas as partes essenciais da Missa, praticamente desde o Ofertório até à Comunhão inclusive. Pois, ofertório, consagra­ção da Hóstia e comunhão do Sacerdote são' as três partes essenciais da Santa Missa. Quem chega, por exemplo, durante o “ Prefácio” ou abandona a igreja antes da “ Comunhão”, não ouviu uma Missa in­teira.

D. Com atenção.

O fiel deve ter a intenção de assistir à Missa. Mas as distrações, invalidam a assistência da Missa? Distrações mesmo voluntárias, e portanto pecamino­sas, não tornam inválida a assistência, quando per­manece a intenção. — Para a validade, será preciso acompanhar as orações do Padre ? Não, não é ne­cessário, ainda que muito recomendável.

II. A Missa de domingo como ato de re­ligião.

E' um ponto de honra para a juventude católica, não limitar-se ao simples cumprimento deste manda­

154

mento, mas cumprí-lo bem, isto é, com devoção e procurando tirar fruto. Como podes conseguir isto?

A. Antes da S. Missa,

ou pelo menos no começo, — recolhe-te de ma­neira seguinte:

1. Faze a intenção: Vou agora assistir aograndioso Sacrifício que o nosso Sumo Sa­cerdote Jesús Cristo oferece a Deus em no­me de toda a humanidade, também em meu nome. E ’ portanto também meu sacrifício. Uno-me com as intenções de Jesús e faço minha a homenagem que ele rende ao Altís­simo.

2. Pensa alguns momentos na importância deste ato, que é da parte de

Deus: A renovação daquele ato que recon­ciliou o mundo com Deus, que resta­beleceu a amizade entre Deus e nós, apagando as nossas dívidas e abrindo- nos os tesouros divinos.

Jesús Cristo: O apogeu de sua obra re­dentora; a renovação de sua morte vo­luntária pelos seus irmãos, prova su­blime do seu amor.

Igrçja: A ação central de todo o culto;a fonte de todos os Sacramentos; a

155

reunião festiva de toda a família de Deus.

Humanidade: O acontecimento mais im­portante de toda a história.

Religião: O ato mais elevado de toda aveneração de Deus; sacrifício infini­tamente perfeito no sacerdote, na víti­ma e na ação sacrifical; expressão mais perfeita de homenagem, gratidão, ex­piação e súplica.

Minha alma: A causa da minha salvação;o sacrifício expiatório dos meus pe­cados ; fonte de todas as graças; o ban­quete verdadeiramente divino e o pe­nhor do banquete nupcial no Céu; o ensino das virtudes mais sublimes: adoração, obediência, amor de Deus e dos homens.

B. Durante a S. Missa

há vários modos de rezar:

1 . Podes meditar sobre o profundo sentido da Missa, segundo os 4 fins deste Sacri­fício :

Sacrifício de louvor: Merece este louvoro Deus escondido, de cuja grandeza fala a natureza e cuja santidade glori­ficam os Anjos e os Santos no Céu. A glorificação de Deus seja o sentido de tua vida: todos os teus pensamen­tos, palavras e obras devem ser uma homenagem a Deus.

Sacrificio de gratidão: Pensa nos benefí­cios inumeráveis recebidos de Deus no terreno natural (vida, saude, instrução, família, etc.) e sobrenatural (batismo, remissão dos pecados, filiação divina, os demais Sacramentos etc.).

Sacrifício de expiação: Reflete com quesentimentos de gratidão e amor esta­rias pela primeira vez no túmulo de um amigo que se teria sacrificado por ti. A Jesús Cristo deves mais do que aquela cidade devia ao príncipe ge­neroso, ou do que o povo deve ao “ sol­dado desconhecido” tombado pela Pá­tria. Aquele que te salvou, é mais digno de tua gratidão e de teu am or... A infelicidade, da qual te preservou, é incomparavelmente mais horrenda... O amor, com que realizou o seu sacri­ficio, é inegavelmente mais profundo e pessoal.

157

Sacrifício de súplica: Quantas preocupa­ções preenchem tua alma, preocupa­ções temporárias e espirituais; depondo tuas súplicas por meio deste sacrifício nas mãos do Mediador Jesús Cristo, tens a garantia de ser atendido, se rezas com constância e conformidade. *

Faze desta maneira, durante a S. Missa, atos de homenagem, de agradecimento o u ' de dor de teus pecados, e pede sinceramente a graça divina. O fe­rece a Deus, juntamente com o sacerdote, todo o teu ser, corpo e alma, com teus pensamentos, palavras e obras.

1. Podes acompanhar durante a S. Missa as orações litúryicas do Sacerdote. Marca-as com antecedência no teu missal, lendo-as, pelo menos uma vez, com atenção. Natu- turalmente não é obrigatório acompanhar as orações litúrgicas. Nem é necessário acompanhá-las sempre todas. Para al­ternar, podes hoje concentrar tua atenção mais na homenagem expressa nas orações litúrgicas, outra vez será no agradecimen­to ou na atitude de contrição pelos pecados ou de petição.

3. Podes recitar lambem outras orações. O principal é que tenhas a intenção de te unir ao Sacrifício de Cristo e ores com fervor.

158

Quanto mais íntima fôr a relação de tuas orações para com o Sacrifício, tanto me­lhor!

A recitação do terço, por exemplo, é também oportuna no S. Sacrifício, pois consiste precisamen­te na meditação dos mistérios da vida, da paixão e da glorificação de Cristo. Ora, todos eles, sendo òs mistérios da Redenção, teem relações essenciais com o S. Sacrifício. Os mistérios gozosos e dolo­rosos do rosário são estações no caminho que con­duz ao Gólgota. E os mistérios gloriosos são ir­radiações do Sacrifício de Cristo.

O saudar a Maria no rosário, não contraria de maneira alguma uma participação atenta no Sacri­fício da Missa. Pelo contrário: Maria está unidade um modo inseparável aos mistérios da Salvação. Como já vimos, ela, como nosso modelo, viveu e rea­lizou as atitudes do sacrifício e da entrega total a Deus no grau mais perfeito a que uma criatura pode aspirar. E ’ pois, natural, que meditemos os misté­rios da Redenção sob a sua direção, guiados por sua mão, pedindo-lhe sempre de novo que nos conceda um pouco do seu heróico espírito de doação total a Deus.

III. A Missa dominical como centro de nossa vida.

Não há maior ato de culto do que o Sacrifício de Jesús, Nosso Sumo Sacerdote, e tudo o que ofe­recemos a Deus em palavras e afetos, em ações e sofrimentos, recebe o seu valor desse Sacrifício de

159

Cristo. E ’ portanto conforme com a hierarquia dos valores que façamos dele o centro da nossa vida re­ligiosa ; e, como a religião é o centro da vida inteira em todos os sentidos, podemos dizer com acerto, que o S. Sacrifício da Missa deverá ser o centro da nossa vida em geral. — Que quer dizer isso prati­camente ?

1. A S. Missa deve ocupar o primeiro lugar na nossa estima. Não há nenhum acontecimento mais importante em todo o mundo do que a renova­ção do Sacrificio da Redenção. Por isso não podes durante toda a semana fazer ação mais digna do que participar do sacrifício da Missa. Seria pois o ideal que assistisses diariamente à Missa ou dela partici­passes no banquete eucarístico. Se não puderes fa­zê-lo, não te prives de participar do Sacrifício co­mungando, ainda que fora da Missa.

Não ouças portanto a Missa somente aos domin­gos, mas se possível fôr, também nos dias uteis, e, se não podes estar presente, une-te pelo menos em espírito com as Missas que são celebradas pelos sa­cerdotes em todo o mundo.

2. Procura penetrar cada vez mais profunda­mente o sentido da Missa, meditando especialmente sobre o sentido do Sacrifício. Escolhe conforme este ponto de vista, tua leitura espiritual! Não são as ce­rimônias externas o principal, e sim a idéia funda­mental, isto é, o sentido objetivo do Sacrifício.

160

3. Ponto central não quer dizer exclusividade ou limitação. Seria falso limitarmos as nossas prá­ticas religiosas à Santa Missa. Nossa religião abran­ge também a recepção dos Sacramentos, o domínio das paixões desordenadas, exige a prática das virtu­des e os exercícios de piedade, como as orações or­dinárias da manhã e da noite, etc. E ’ pela aplicação constante e enérgica destes meios de santificação que o cristão tira todo o fruto da S. Missa.

Portanto, muitos meios são aconselhados pela Igreja para o progresso espiritual, são inculcados aos marianos nos estatutos das Congregações, e não que­remos deixar de recomendá-los também aqui: por exemplo: exame de conciência, direção espiritual, me­ditação, rosário e, em geral, a devoção a Maria e aos Santos.

4. E’ muito recomendável de relacionar todas essas práticas religiosas com a Santa Missa.

Ao receber a Comunhão, podemos lembrar-nos que participamos do banquete a que Deus mesmo nos convida como ao penhor do banquete celestial; que é o Corpo sacrificado de N. S. Jesús Cristo, que recebemos; e que em virtude deste alimento, nos devemos resolver a dar-nos totalmente a Deus; que, fortalecidos por ele, devemos, pela luta inte­rior e pela prática das virtudes, viver cada vez mais o dogma da comunhão dos santos, integrando- nos como membros do Corpo místico de Cristo, e tornando-nos de mais em mais solidários com os outros membros desse Corpo.

O Sacramento da penitência, que convém re­ceber pelo menos uma vez por mez, purifica as nossas almas dos pecados; é portanto uma partici-

161

pagão da expiação oferecida a Deus P°r J c*£s Cristo, no seu Sacrificio. Ê, com efeito, pela vir­tude do seu sangue, que se perdoam os nossos pe­cados e que recebemos novas graças para a luta contra o mal.

Nas nossas orações pensemos frequentemente na adoração, no agradecimento, 11a súplica, que Jesús Cristo oferece na S. Missa, e unamo-nos às suas intenções.

Quando veneramos a Maria, é bom pensar co­mo ela nos deu o sublime exemplo da doação^ to ­tal a Deus em união com o Sacrifício de Cristo, realizando, vivendo cada dia as atitudes da humil­dade, da adoração e do amor desinteressado.

Finalmente lembremos de que todas as nossas boas obras são também uma espécie de dons que ofe­recemos a Deus, um “ sacrifício de piedade”, como diz o Papa S. Leão Magno. Assim penetrará a for- ' ça do Sacrifício da Missa a nossa vida inteira. “ H os­pedemos os peregrinos, ajudemos aos opressos, vista­mos os nús, cuidemos dos doentes. Quem assim oferece a Deus, autor de todos os bens, o sacrifício de piedade, merecerá dele o prêmio do Reino do Céu (Sermo 2 de jejunio X. mensis).

1

, Capítulo XX

A oração particularTodo bom cristão cultiva a oração privada.

Pois, há na Igreja católica alem do culto público e oficial, também o culto particular a cujo exercício todos somos obrigados. Devemos, portanto, também fora da Missa louvar a Deus, agradecer-lhe e pedir- lhe a sua graça.

Certamente as orações da Igreja na Missa e o ofício divino dos Sacerdotes gozam de uma digni­dade e eficácia especial. Mas, isto não nos deve indu-

* zir a menosprezar a oração pessoal e individual do cristão.

Este menosprezo nos é proibido: .

I. Pelo expresso mandamento de Cristo.

Não foi por acaso a oração em particular, que Cristo ensinou aos seus Apóstolos, quando lhes disse: “Assim deveis rezar: Pai nosso, que estais noc é u . . .” ? E não disse ele também: “ Quando qui-zeres orar, entra no teu aposento, fecha a porta e ora ao Pai às ocultas. Teu Pai que vê o que é ocul­to, te há de recompensar” ? (Mateus 6 ,6 ).

II. Pelo exemplo de Cristo.

Com a sua vida Jesús Cristo nos inculca o alto valor da oração privada. Pois buscava ele muitas

163

vezes sozinho, como nos narra a Escritura, os cumes das montanhas e passava a noite inteira imerso na oração.

III. Pela tradição da Igreja.

Os primeiros cristãos não rezavam somente em comunidade, mas também em particular.

Antes dc São Pedro ter a importante visão, que lhe ordenou a admissão dos pagãos à Igreja, diz a Escritura: “Pedro subiu ao terraço da casa para orar (Act. 10, 9). Quando Deus enviou Ana- nias a Paulo recemconvertido, disse-lhe: “ Ele(Paulo) está orando” (Act. 9, 11). — E nas suas epístolas às comunidades cristãs, S. Paulo insiste incessantemente na oração: “Com ardentes preces % e súplicas pedí sem cessar cm espírito” (Efes. 6, 18). “De coração grato cantai a Deus salmos, hinos e cânticos espirituais” (Col. 3, 16). *“Sede perseverantes na oração” (Col. 4, 2). “Orai sem cessar” (1 Tess. 5, 16). “Apresentai a Deus todas as vossas necessidades em ferovorosa prece e ação dc graças” (Felip. 4, 6). E S. Tiago diz na sua epístola: “ E* de grande valor a oração perseveran­te do justo” (Ep. de S. Tiago 5, 16).

E ’ evidente que os Apóstolos com estas exorta­ções e exemplos se referem não somente às orações litúrgicas em comum, mas também às orações parti­culares de cada cristão.

IV. Pela prática da Igreja.

A Igreja obriga seus filhos à oração particular. Inúmeras são as citações dos Padres da Igreja e dos escritores eclesiásticos que no-las aconselham. To-

164

das as ordens e congregações religiosas, de sacerdo­tes como de leigos, prescrevem nos seus estatutos aprovados pela Igreja, exercícios da oração em par­ticular. Os Êxercícios de Santo Inácio, tão reco­mendados pela autoridade eclesiástica, (v. p. ex. a En- cíclica: “ Mens nostra” ) ( I ) e prescritos pelo Direi­to canônico para seminaristas, sacerdotes e religiosos, aplicam como meio principal a meditação e a oração privada. Seria mais do que leviandade ter em pou­co estas prescrições e diretrizes da Igreja, para se­guir uma opinião discordante. Porque a Igreja é um organismo animado pelo Espírito Santo, e é o pró­prio Espírito de Deus que se revela nas práticas apro­vadas pela autoridade eclesiástica. Como congrega­dos fazemos questão, não somente de obedecer à Igreja, mas de segui-la nos seus pensamentos e sen­timentos, fazemos questão de “ sentire cum Ecclesia”, como nos adverte a regra 33 dos estatutos das Con­gregações Marianas.

V. Pela observação quotidiana da vida.

Saltam aos olhos os efeitos salutares e a benção da oração pessoal! E isto especialmente com respei­to aos cristãos que vivem no mundo.

O homem que durante o dia dirige seus pensa­mentos de vez em quando a Deus, está preservado do perigo de afogar-se completamente nos seus cui-

(1) Desde Paulo III, que aprovou a Companhia de Jesús, todos os Sumos Pontífices recomendam os exercícios espirituais de S. Inácio.

165

dados e trabalhos terrenos. A oração é a respiração da alma, como já foi dito. Ela é um meio de reco­lhimento espiritual e uma fonte de força sobrenatu­ral nas tentações, que nos ameaçam diariamente.

A oração nos estimula para um conciensioso cumprimento dos mandamentos de Deus. Desperta em nós o gosto das virtudes cristãs, como do amor dc Deus e do próximo, da sociabilidade, bondade, pure­za, caridade para com os pobres e necessitados. Tu­do isto qualquer bom cristão o terá sentido por ex­periência própria milhares de vezes.

Fiquemos, pois, nisso: A oração pessoal é,segundo a vontade de Cristo e da Igreja, um dever para todos nós.

Acautelemo-nos portanto de exagerar a diferen­ça entre o valor da oração oficial-litúrgica da co­munidade, e o da oração pessoal de cada cristão, de modo a caraterizar p. ex. esta como uma forma de piedade dispensável, por ser “ subjetiva” ou “ indivi­dualista”.

Ou queremos por ventura qualificar assim uma forma de oração que Cristo mesmo praticou e re­comendou, e que a Igreja durante séculos inculcou?

Estas expressões facilmente trazem consigo ma­lentendidos. Pois é preciso lembrar-se que a oração pessoal do cristão é um ato vital sobrenatural. E ’, como disse o Apóstolo, “o próprio Espírito Santo que reza em nós” (Rom. 8 , 26). O cristão que reza

166

“no seu aposento”, de fato não está isolado, nem se­parado do Corpo de Cristo, porque a sua união com a Igreja é um fato objetivo. Não há nenhum ato vi­tal do membro de Cristo, que esteja objetivamente se­parado de Cristo e que seja por conseguinte pura­mente “individualista”.

E o cristão, que é membro do Corpo nhstico dc Cristo, não deve ele também executar atos indivi­duais e pessoais de piedade? Até do sacerdote que tem o privilégio de ser o liturgo oficial da comu­nidade cristã, a Igreja intende que precisa do auxí­lio de exercícios de piedade, como meditação, rosá­rio, visita ao SSmo. Sacramento etc.

Atos pessoais de devoção não contrariam abso­lutamente o fato de pertencer à comunidade. Certa­mente não devemos esquecer esta nossa solidarieda­de com um organismo superior e sim cuidá-la; mas não estamos obrigados a lembrar-nos dela em cada ato religioso.

Não é de maneira alguma contrário a esta nossa conexão com a comunidade cristã, falarmos pessoal­mente com Deus. Pois não terá por acaso o indi­víduo também deveres pessoais e individuais? Não deve o cristão cuidar da sua própria salvação? au­mentar o próprio estado de graça? vencer suas ten­tações pessoais e individuais? procurar moderar e plasmar o próprio carater segundo o perfil do Mes­tre? Em última análise, a comunidade é destinada a contribuir para a salvação e santificação do indi­víduo.

Capítulo XXI

Nossa vida de oraçãoPelo que expusemos no capítulo anterior, não é

possível duvidar do alto valor da oração particular. Mas, como havemos de praticá-la?

Com isto pisamos um terreno em que certamen­te a maioria dos jovens católicos sente grandes di­ficuldades.

Naturalmente supomos que conheces as orações ordinárias que todo cristão deve saber, e que as sai­bas dizer nas suas fórmulas usuais. (V. “ Na famí­lia de Deus, “p. 114 ss). Mas já conseguiste rezar pessoalmente e com ardor?

I. O p erig o ...Rezar é falar com Deus. Pelo menos deveria

sê-lo. Quanto mais íntima e fervorosamente rezares, isto é, quanto mais pessoalmente falares com Deus, tanto mais valerá a tua oração.

Falas muitas vezes com Deus. Mesmo se não rezas mais do que os teus camaradas, fazes pelo me­nos tuas orações diárias, a da manhã, da noite, nas refeições; rezas aos domingos durante a Missa, rezas ante e depois da Confissão, antes e depois da Co­munhão.

Observa-te uma vez nestas práticas. Não veri­ficas continuamente que estás distraido, mesmo usan­do o teu livro de orações, e que recitas a oração me*

168

canicamente e que acontece perguntares a ti mesmo: “ Já rezei esta oração?” e por precaução a recitas mais uma vez? Há aqui um problema, não é ver­dade?

Poderá realmente dizer-se das tuas orações, que falas com Deus, como uma criança fala com o pai, õu um amigo com outro amigo?

Quando foi a última vez que falaste assim tão , pessoalmente e de todo coração com Deus, por exemplo: agradecendo-lhe sinceramente a graça de ser católico, a graça do batismo, do ensino reli­gioso, por teres sido chamado para fazer parte de sua família ?

Quando lhes tens pedido, suplicado, mendiga­do, por assim dizer, como um pobre indigente ? Como o homem grita por socorro, quando está em perigo de morte ?

Sim, compara com estes atos tuas orações or­dinárias: como são frias, triviais, mecânicas, sem alma e vida l Quantas vezes não recitas a ora­ção como um disco de vitrola... automaticamente!

Participamos interiormente tão pouco dc nos­sas preces, que se poderia quasi criar uma nova forma verbal impessoal, dizendo: “Reza” como di­zemos : “ Chove ” ou “ Anoitece ” . . .

Quantos jovens são escravos do mecanismo da oração! Fazem as suas orações diárias, recitando apressadamente a fórmula habitual, não pensando em nada absolutamente. Durante a S. Missa estão de pé ou sentados nos bancos sem nada fazer, pensando em mil coisas e ansiosos pela hora de abandonar a igre­ja. Na confissão e comunhão, quando muito, pegam num livro e leem orações sem as acompanhar em espírito.

169

Tais jovens passam geralmente por bons c r t^ tãos, cumprem com certa regularidade seus deveres religiosos... Mas pode o catolicismo brasileiro es­perar deles alguma cousa? E ’ isto religião vivida? Não, é um serviço de Deus exterior e mecanizado.

II. Este estado de cousas deve ser reformado.

Não deves resignar-te com este modo de rezar mecânico. Deves aprender a rezar. A oração me­cânica é : t

A — Uma vergonha!

Há quantos anos és católico? Desde o teu ba­tismo, que provavelmente recebeste na mais tenra infância. Olha! há tanto tempo vives como filho de Deus e ainda não aprendeste a falar com ele pessoal­mente !

Sabes que Deus é teu Pai, que Cristo é teu irmão, o primogênito, teu Rei e Salvador, e que Maria é tua Mãe. Bem, se disto estás convencido, porque não falas, conversas e tratas com Deus, com Cristo e Maria, como com pessoas vivas ? Que dizer de um oficial que, convivendo dez anos com o seu ge­neral, não fôsse capaz, após tanto tempo, de conver­sar com ele com naturalidade, sem constrangimento?

170

B — Um prejuízo!

Porque a oração é um meio estupendo para o nosso enriquecimento sobrenatural. Não necessitas por acaso da graça de Deus? Podes verdadeiramen­te refreiar as tuas paixões, vencer os baixos instin­tos da tua natureza sem a sua graça? Não, necessi­tas de conforto interior, de um auxílio sobrenatural. Como podes obter essas graças? Pela oração, ora­ção fervorosa e pessoal! E como exigirás que Deus preste atenção às tuas orações, se és o primeiro a não prestá-la?

C — Um perigo!

Achas realmente que moços que sucumbem ao mecanismo na vida de oração, possam ser fiéis a Deus? Talvez no caso em que todo o ambiente os ajude e apoie, se não sobrevem nenhuma tentação especial, se nunca são aliciados por más companhias. Talvez nunca abandonarão oficialmente a Igreja. Mas, são eles realmente membros vivos dela? Que farão mais do que aumentar o exército dos indiferen­tes, dos tíbios, dos indecisos? E que farão se os tempos se tornarem mais graves, obrigando-os a se decidirem, — quando forem exigidos maiores sacri­fícios ?

Para um congregado mariano, tal estado é simplesmente insuportável ! O verdadeiro senti­do da Congregação é justamente a formação do

171

cristio conciente e resoluto ! A d£j d Q uem

S K n«°d íu^a^eHgiosidade°^ivfda *! nNãoe^dev^Vcontenta^ecom o mecanismo de oração nem em sua própria vida, nem na de seus camaradas.

Esforça-te, portanto, por chegares a uma vida de oração pessoal e fervorosa. Se não tivesses aprendido na Congregação mais do que falar com Deus e de gostar da oraçao, já terias ganho um tesouro para toda a tua vida.

III. Como vencer o autom atism o?

1 . Recolhe-te antes da oração; pelo menos por um momento. Faze um ato de fé na presença de Dèus, dizendo a ti mesmo: Agora falarei com Deus, que está presente em toda parte, e também em mim. Ou então: terei agora uma audiência com meu Rei Jesús Cristo, que está esperando por mim no taber­náculo.

2. Reza de vagar e presta atenção ao que dizes. Reza uma vez um Padre Nosso ou uma Ave Maria vagarosamente. . . espaçadamente. . .

3. Omite de vez em guando as fórmulas de oração e reza espontaneamente, de coração. P o |8| de onde provem o mecanismo nos excrcicio* espirituais ? Da constante repetição da niesnm fórmula. Pm- mai* bela que esta seja, a atenção *c afrouxa pouco aco e nada mais pensamos mm sentimos ao prnuuu

172

Este fato se apoia, em última análise, na lei do automatismo psicológico, pela qual, por exem­plo, um profissional executa com a máxima faci­lidade o seu mister. Vai uma vez à oficina dc um ferreiro e observa a diferênça que há entre a instintiva segurança do mestre e a inhabilidadc do aprendiz. Este último deve refletir antes de executar a mais simples manipulação, porque lhe falta a prática e a experiência.

Ora, a mesma lei natural, que é um grande auxílio para o progresso, pode tornar-se fatal pa­ra a nossa vida religiosa. Pois, a oração e as prá­ticas religiosas são tanto mais perfeitas quanto menos mecanicamente executadas, quanto mais as faculdades da nossa alma são postas em jogo.

E ’ portanto aconselhável prevenir a quasi ine­vitável mecanização, mudando frequentemente as fórmulas das nossas orações.

Improvisa pois, de vez em quando, as palavras, quando rezas. Não utilize sempre as mesmas locu­ções, exprime o mesmo pensamento sob outra forma.

Talvez aches isso difícil. Na realidade é muito facil, é somente vencer a primeira timidez. Lem- bra-te sempre que rezar é falar com Deus, teu Pai. Será possível, que sejas incapaz de dizer-lhe pela manhã e noite algumas palavras sem formulário e sem livro de oração? Que dizer de um menino que saudasse o pai pela manhã com estas palavras: Um momento, papai, vou buscar o livro no qual anotei o que lhe quero dizer?

Não perderá absolutamente em valor a tua ora­ção, se for feita sob uma pobre forma verbal e sem estilo. Pois, quando falamos em casa com mamãe, não vem ao caso de fazer uma composição literária.

173

Mudar com frequência as fórmulas, nao s e r a ne­nhum impedimento para o verdadeiro amor. Nao falas amiude com os teus, e sempre afetuosam ente. Pensa, como fala um filho carinhoso com o seu pai, c conversa assim com o teu Deus. O que é indigno, é recitar distraído uma fórmula, como podería faze-lo um gramofone ou um papagaio.

IV. Exemplos de orações sem fórm ulas fixas.

1. Orações da manhã :

Pergunta-te primeiro: que desejo eu dizer aDeus ao levantar-me? Naturalmente três coisas:a) agradecer-lhe pelo descanso da noite e pelo novo dia; b) fazer a reta intenção, quer dizer: ofere­cer a Deus todos os pensamentos, palavras e obras do dia que começa, afim de que possam, sem exce­ção, agradar a Deus e a minha Mãe, Maria Santís­sima; c) pedir-lhe o auxílio da sua graça.

E ’ possível que tu não possas dizer essas três coisas tão singelas com tuas palavras, na maneira que ocorre à tua mente? Experimenta-o com suma gentileza, com naturalidade! Repete-o com outras palavras; amplifica-ò mais! Por exemplo:

a) Eu vos iòu grafas, meu Deus, porque me conservas,es nesta noite. Sei que em vossas mãos esta a minha vida. Quantos chamastes hoje nesta

174

mesma cidade para prestar~vos contas. . . ! E a núni concedeis mais um dia. Graças também por terdes protegido meus pais e meus parentes.

b) Este novo dia há de ser vosso; quero agra­dar-vos, meu Deus, em tudo que fizer e disser; no trato com meus pais, irmãos c companheiros... em casa, no colégio, no trabalho, no escritório, e tc ... Desejo alegrar o vosso coração!

c) Porem que posso eu sem vossa graça? Quantas vezes prometí e não cumprí?. .Ajudai-me hoje a ser fiel. E vós, Maria, lembrai-vos de que sois minha Mãi e não me abandoneis.

2. Orações da noite.

Que queres dizer a Deus? a) Graças pelo dia -passado, b) Exame e arrependimento das faltas do dia. c) Entregar-te confiante nas suas mãos. — Podes dizer por exemplo:

a) Meu Deus, eu vos dou graças por todos os benefícios com que me cumulastes hoje. Todos os bens deste dia, e s te ... aquele... me vieram de vossas mãos. Eu vos agradeço, ó meu Deus, por todos os dons naturais e sobrenaturais que me con­cedestes h o je ...

b) Senhor, ajudai-mc a ser sincero c jamais hipócrita diante de vós. Como vos serví no dia de

175

hoje? Com que vista contemplastes a tnim e as tni~ nhas ações? Com um olhar amigo e carinhoso...? Ou triste e de irada reprovação. . . ? Senhor, pequei; quisera não o ter feito; mereço castigo. Que me aconteceria, sc tivesse falecido hoje? E por tais mi­sérias expus-me ao perigo da condenação eterna!. . . E vós, meu Salvador, merecestes que eu vos tratasse assim? Em que me contristastes, para que eu vos ofendesse? Por qual de iwssos benefícios vos ofen­dí hoje? Assim pago o vosso carinho, vossos sofri­mentos, os açoites, a coroa de espinhos, a morte na Cruz e tudo mais que por mim fizestes? Hoje fos­tes novamente crucificado por mim, e exclamastes cm meu favor: “Pai, perdoai-lhe, porque não sabeo que faz". Mostrastes-me vosso Coração abrasado de amor por mim. E a minha resposta?... Ne- guei-vos como Pedro. Vós, ao passar o olhastes, e ele entrou em si e reconheceu o seu pecado. Senhor, lançai sobre mim o olhar que sobre ele lançastes! Jamais, Senhor, nunca m ais!... Minha Mãe, aju­dai-me a pedir o perdão, a propor a emenda, dai-me a graça e a fortaleza para o bem. . .

c) E então encomenda a Deus os teus e a ti mesmo para a noite vindoura.

Naturalmente é da máxima importância que re­pitas de vez em quando estas orações espontâneas. Muda por isto sempre a fórmula, repete o mesmo pensamento, o mesmo pedido com outras palavras,

176

ora curtas, ora extensas, como teu coração te ditar. Esteja certo, que assim cada vez se tornará mais facil, expor a Deus as tuas súplicas, e terás cada vez mais gosto interno e satisfação em tua prece. O teu rezar tornar-se-á pouco a pouco uma conversa com Deus, — eis a verdadeira vida religiosa!

Nunca te deites cônscio de ter ofendido a Deus com pecado mortal. Antes de dormir faze sempre um ato de contrição perfeita e promete confessar o pecado na primeira ocasião. Pois, se assim rezares, recuperarás imediatamente o estado de graça.

Quando passares por uma igreja, não omitas, sempre que for possível, uma rápida visita ao Deus oculto no tabernáculo, e dize com tuas próprias pa­lavras o que te vai no coração.

Naturalmente não devemos rezar exclusivamen­te desta maneira espontânea. A oração oral conser­va seu grande valor, principalmente quando se trata das orações litúrgicas ou feitas em comunidade, ou para ganharmos certas indulgências. Necessitas alem disto de vez em quando de novas idéias impressio­nantes e fórmulas atrativas para dar às tuas orações novo vigor e nova vida.

Questionário“ Introdução” :

As múltiplas prescrições da Igreja pa™*®1 supérfluas para um homem verdadeiramcnte relt irioso e servem apenas para oprimir as concien- cias. Porque impõe a Igreja as obrigações mo­rais? Fá-lo arbitrariamente? — Podem ser sepa­rados completamente dogma e moral? Contem a Moral católica só proibições no sentido n*jSa“ ' vo? — Sabes mostrar com exemplo como se deduz a Moral dos fatos dogmáticos?

Cap. 1 A adoração.Qual c a forma de oração mais esquecida? — Como se explica isto? — Que é adoração?_— Quais as atitudes que contem o ato de adoração? Com res­peito a Deus? — Com respeito a nós?

Cap. 2. Louvai ao Senhor.Sabes citar alguns motivos que nos induzem a ado­rar a Deus? — Quem nos dá o exemplo da adora­ção? — Porque não basta a adoração puramente interior? — Quais as ocasiões mais apropriadas para praticar a adoração? — Formula com tuas próprias palavras um ato de adoração.

Cap. 3. O reverso.Quais são os pecados contrários à adoração? — Cita alguns exemplos de ireverência. — Que é o sacrilégio? — Cita formas de superstição. — Que diz a razão humana sobre a superstição? — Por­que teem as superstições consequências funestas para o sistema nervoso? — Porque são uma ofensa de Deus? — Em que sentido são compensação pela verdadeira religião? — Porque indignas de um cristão?.

Cap. 4. O espiritismo; seu fracasso dogmático.Que é espiritismo? — Que dizer sobre o funda­mento doutrinário do espiritismo? — Quais suasS a?rT PaÍS? ~ São ou não originais? - Sabes todo gUm— contradições na doutrina e no mé-mo o ^ eus,pintas? - R«olve ou não o espiritis­mo os problema centrais da vida humana? P

178

Cap. 5. O espiritismo; seu fracasso experimental,1. parte.E ' sólido o fundamento experimental do espiri­tismo? — Sabes citar alguns fenômenos em qué se baseia? — Como dividí-los? — Foram provados como fatos reais os fenômenos objetivos? — Que dizer sobre o controle nas experiências? — Foram constatadas fraudes? — Confessadas estas pelos mesmos mediums?

Cap. 6. O espiritismo; seu fracasso experimental,2. parte.Cita alguns fenômenos subjetivos, aduzidos como provas pelo esperitismo. — São necessárias as in­terpretações preternaturais? — Qual o princípio geral que aqui vale? — Excedem os fenômenos necessariamente o terreno do autohipnotismo, das sugestões etc.? — Qual é o resultado funesto do .espiritismo no terreno da higione? — Conhece autores notáveis que isto confirmam? — E f por­tanto o combate contra o espiritismo só um dever religioso?

Cap. 7. O amor de Deus.Quais são as forças mais nobres da alma humana? — Existe um presente mais pessoal do que o amor? — Descreve a tendência do verdadeiro amor. — Como se exprime Jesús sobre as quali­dades do amor? — Enumera algumas das faculda­des mais estupendas da personalidade humana. — Porque ultrapassa o amor de Deus estas capaci­dades todas? — De onde vem aos homens esta fa­culdade divina?

Cap. 8. Porque amamos a Deus?Cita os motivos principais do amor de Deus. — Descreve um pouco o que significa a expressão “bem infinito”. — Significa nosso amor um favor que nós prestamos a Deus? — Podes exprimir numa comparação a atitude de condescendência de Deus? — Qual deve ser nossa resposta a esta humilhação de Deus?

Cap. 9. Como demonstrar nosso amor?E* o amor apenas sentimento? — Não é este o sen­tido comum da palavra “amor”? — Fervor, en­tusiasmo etc., são eles sempre verdadeiro amor? —

179

Se não, carecem de qualquer valor? — De qual faculdade brota o genuíno amor? — Como ele se manifesta? — Estigmatizou por acaso Jesú^s mes­mo o amor das puras palavras? — Em ,uc insistiu

- cle? — E* facil ser sempre fiel aos mandamentos de Deus? — Conheces um meio que facilite o con­trole dc si mesmo? — Há um laço essencial entre amor e sacrifício? — Conheces exemptos de espí­rito generoso por puros motivos naturais? — E ’ nosso amor dos bens terrestres reprovável? — Que significa então “amar a Deus sobre todas as coisas’'? — Qual das pessoas célebres do Antigo Testamento nos dá o exemplo de prontidão para o sacrifício por amor de Deus? — Conheces exem­plos deste amor generoso no Novo Testamento?

Cap. 10. O santo nome de Deus.Como reza o 2.® mandamento de Deus? — Co­nheces pecados contra este mandamento? — Te­mos o direito de amaldiçoar aos nossos irmãos?— São as imprecações em geral pecados mortais?— Que inclue a imprecação com respeito a Deus?— Porque o desrespeito de Deus é pecado? — Que é blasfêmia? — É grave pecado ou leve? — Co­nheces o exemplo de um Santo que preferiu a morte à blasfêmia? — Que podemos oferecer a Deus em reparação? — Porque o juramento le­viano é pecado? — Quem proibiu este juramento?— Foi ele sempre considerado coisa sagrada? — Sob quais condições é lícito o juramento?

Cap. 11. O sacrifício; a voz da história.Teem os sentimentos internos uma tendência na­tural de exprimir-se em atos externos? — Conhe­ces sinais externos de amizade, homenagem, res­peito? — Qual o sinal conveniente da homenagem a Deus? — Quem o inventou? — Como podemos descrever o sacrifício? — Qual é, por assim dizer, a alma de todo sacrifício? — Qual a inten- ção^ dos imperadores romanos ao prescrever sa- crifícios às próprias imagens? — Existiu na his- l°ric i"8'um Povo Que não conhecia o sacrifício? 77 wa. s «numerar alguns exemplos de sacrifícios tustOncos? — Havia sob os variadísaimos ritos sacrificais uma idéia comum? — Qual é ela?

180

Cap. 12. O sentido do sacrifício.Quais são as três partes que podemos distinguir em qualquer sacrifício? — Qual o papel do sa­crificador? — Qual sua posição com respeito ao Ser supremo e aos homens? — Enumera algumas espécies de dádivas usadas 11a história. — Que é que representavam elas? — Como se realizava%a oferta dos dons? — Sabes descrever a ideia fundamental de todo sacrifício? — Como chamar esta atitude? — Basta esta atitude interior? — Os dons mesmos teem eles de ser muito consi­deráveis? — Em que reside o valor deles? — É portanto o sacrifício um ato dc religião? — Enumera os quatro elementos que encontramos nos sacrifícios mais desenvolvidos.

Cap. 13. A preparação ao sacrifício de Cristo.Encontramos sacrifícios na humanidade já antes da eleição do povo israelita? — Desaprovava ou aprovava Deus o uso de sacrifícios? — Cita exem­plos. — Instituiu ele mesmo sacrifícios na Antiga Lei? — Como concluiu ele a grande Aliança com o povo eleito? — Qual o fim que Deus tem em vista com estes sacrifícios? — Que faz para aper­feiçoá-los? — Sabes alguma coisa sobra as di­versas espécies de sacrifícios do Antigo Testa­mento e o simbolismo deles? — De que maneira prepara Deus o sacrifício da Nova Lei? — Como ensina a insuficiência dos antigos sacrifícios? — Qual é a profecia mais clara sobre o futuro sa­crifício de Cristo? — Sabes mostrar, como o sa­crifício da Missa realiza esta profecia em todos os pontos? — Continuam ainda hoje os sacrifícios do Antigo Testamento? — Quando acabaram?

Cap. 14. O sacrifício perfeito (1. parte).Porque podemos chamar o Sacrifício da Missa o sacrifício infinitamente perfeito? — Qual a posi­ção do sacerdote nos sacrifícios antigos? — De­monstra como o papel do mediador em Jesús está realizado no supremo grau. — Descreve seu papel como representante nosso, — como o de Deus.

Cap. 15. O sacrifício perfeito (2. parte)Qual é o segundo elemento essencial do sacri­fício? — Parece que este elemento não se pode

181

chamar perfeito, sendo na Missa © dom mes­quinho e sem aparência? — Que fizeram os pa­gãos e os iraclitas em sua ânsia de ofertar a Deus dons de grande valor? — Porque na Missa a dádiva é dc valor inestimável? — Em que sentido é ela o dom da humanidade? — Porque é um louvor infinito que na Missa é prestado a Deus?— Como se manifesta o agradecimento nele? — Porque a expiação é de valor infinito? — De­monstra o mesmo com respeito ao poder impe- tratório. — Aspiravam os povos por meio do sacrifício a uma comunicação íntima com Deus?— Está esta tendência realizada no Sacrifício da Missa?

Cap. 16. O exemplo de Maria.Contem o sacrifício um apelo a nós? — Qual é este apelo? — Como respondem os homens? — Não tomam os Santos a sério a imitação de Cristo? — Qual é a única pessoa que atendeu a este apelo duma maneira perfeita? — Temos muitos traços particulares da vida terrena de Maria? — Qual o traço fundamental que salien­tam os Evangelistas na figura da SSma. Virgem?— Qual é portanto a missão de Maria na huma­nidade? — Sabes demonstrar a importância da hora da Incarnação? — Como manifesta Maria nesta hora a humildade modelar? — Que é humil­dade? — Descreve um pouco a atitude da humil­dade. — Porque é tão extraordinária a humildade de Maria? — Quais são os principais mistérios da vida oculta de Jesús? — Explica a atitude da SSma. Virgem nestes mistérios. — Faze o mesmo com respeito aos mistérios da vida pública de Jesús.

Cap. 17. A mestra da humanidade.Qual o lema que inculca Maria a toda a huma­nidade? — Corresponde a atitude do homem mo­derno em geral à atitude apresentada pela SSma. Virgem? — Há ainda hoje ateus? — Pelo menos disfarçados? — Quais os deuses que eles adoram?— Que ensino dá Maria aos indiferentes?_ Quala mocidade? — Conheces grandes homens na his­tória que nos dão o exemplo da humildade? _

182

Quais devem ser as consequências que tira a ju­ventude mariana do exemplo de Maria? — Terá isto importância particular para o Brasil?

Cap. 18. Nossa participação na Missa.Qual é o preceito da Igreja com respeito â Missa dominical? — Quais as excusas mais comuns entre a mocidade? — Porque não são elas válidas? — Sabes explicar com um exemplo o carater ver­gonhoso de tais excusas? — Que ato histórico sc apresenta e renova no Sacrifício da Missa? — Por quem morreu Jesús Cristo? — Qual portanto a consequência que devemos tirar disso? — Sabes algum exemplo de alto apreço da S. Missa da parte de católicos?

Cap. 19. Nossa Missa dominical.Porque é exatamente o Domingo o dia em que devemos assistir à Missa? — Que nos lembra o Domingo? — É obrigação grave ou leve que impõe este preceito? — Conheces algumas ex­cusas legítimas? — Basta ouvir a Missa pelo rádio? — Quais as partes essenciais a que ninguém pode faltar? — Se alguém assistir só a partir do Evan­gelho, satisfaz ao preceito da Igreja? — Invalidam as distrações a assistência à Missa? — Sabes alguns pensamentos que possam servir para rc- colher-te antes da Missa? — Quais os modos dc rezar durante a' Missa que conheces? — Sabes descrever alguns atos de meditação sobre os 4 fins da Missa? — É bom acompanhar as orações litúrgicas do sacerdote? — É necessário rezá-las sempre todas? — Podes rezar também outras orações, p. ex. o terço? — Tem o terço uma re­lação íntima com o Sacrifício da Missa? — Que lugar na nossa estima tem que ocupar a Sta. Missa? — Quantas vezes assiste um cristão fer­voroso à Missa? só nos Domingos? — Devemos limitar nossas práticas religiosas à S. Missa? — Porque não? — Enumera outros exercícios de nossa religião. — Pode-se tirar todo o fruto da S. Missa sem esforços para formar seu carater, dominar suas paixões, praticar as virtudes cristãs? — Como podes relacionar certas práticas religio- sw_cem a s. Missa, p, ex. a Comunhão, a con­fissão, a devoção mariana, etc.?

183

Cap. 20. A oração particular.Há na Igreja católica alem do culto público e oficial também um culto particular? — Quem está obrigado a praticar este culto? — Podemos me­nosprezar a oração particular? — Quem nos proibe isso? — Deu-nos Jesús um mandamento expresso sobre a oração particular? — Praticou talvez ele mesmo esta espécie de oração? — Que dizem sobre este ponto os apóstolos? — Obriga-nos a Igreja a praticar a oração particular? — Está também nisso a Igreja sob a direção do Espirito Santo? — É recomendada a oração particular pela observação quotidiana? — A que nos estimula a oração particular? — São os cristãos obrigados a executar atos individuais e pessoais na sua re­ligião?

Cap. 21. Nossa vida de oração.De que depende o valor dc tuas orações? Em grande parte também do fervor interior com que rezas? — Qual o perigo que ameaça todo cristão na sua vida de oração, até o mais fervoroso? — Que pensas do perigo da mecanização da vida dc oração? — Porque é vergonhoso? — Porque um prejuizo? — Em que sentido um grande perigo? — Podes indicar alguns meios para vencer o automatismo na vida de oração? — É de admirar que a repetição frequente das mesmas fórmulas produza um certo mecanismo? — Será portanto aconselhável dc mudar de vez em quando as fór­mulas usuais? — Não é isto muito difícil? — É necessário que tuas orações sejam pronunciadas cm estilo perfeito? — Sabes alguns exemplos de orações sem fórmulas?

m

Í N D I C E

Introdução . 9

Capítulo 1: A adoração . 16

” 2: Louvai ao S e n h o r .................................. 21

” 3: O reverso 80

” 4: O espiritismo; seu fracasso dogmático 37

” 5: O espiritismo; seu fracasso experimen­

tal (1) 43

” 6: 0 espiritismo; seu fracasso experimen­

tal (2) 49

" 7: O amor de Deus 68

’* 8: Porque amamos a Deus? 65

” 9: Como demonstrar nosso amor? 71 •

” 10: O santo nome de Deus 79

’* 11:' O sacrifício; a voz da história 84

” 12: O sentido do sacrifício 89

” 13: A preparação ao sacrifício de Cristo . 96

14: O sacrifício perfeito (1) 105

15: O sacrifício perfeito (2) . 112

” 16: 0 exemplo de Maria . 120

” 17: A mestra da humanidade 132” 18: Nossa participação na Missa . . 142

” 19: Nossa Missa dominical . . 161” 20: A oração particular . , 162” 21: Nossa vida de oraçio . 167

Questionário . . . 177

m

J*1