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Programa PRH-21/ Agncia Nacional do Petrleo- ANP

Autor: Andr Canelas ([email protected])

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO - UFRJ INSTITUTO DE ECONOMIA IE/UFRJ MONOGRAFIA DE BACHARELADO EM ECONOMIA

INVESTIMENTOS EM EXPLORAO E PRODUO APS A ABERTURA DA INDSTRIA PETROLFERA NO BRASIL: IMPACTOS ECONMICOS

Autor: ANDR CANELAS e-mail: [email protected] / [email protected]

ORIENTADOR(A): Prof. CARMEN ALVEAL

MARO DE 2004

Programa PRH-21/ Agncia Nacional do Petrleo- ANP

Autor: Andr Canelas ([email protected])

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO - UFRJ INSTITUTO DE ECONOMIA IE/UFRJ MONOGRAFIA DE BACHARELADO EM ECONOMIA

INVESTIMENTOS EM EXPLORAO E PRODUO APS A ABERTURA DA INDSTRIA PETROLFERA NO BRASIL: IMPACTOS ECONMICOS

_________________________________________________________

ANDR LUS DE SOUZA CANELAS e-mail: [email protected] / [email protected]

ORIENTADOR(A): Prof. CARMEN ALVEAL

MARO DE 2004

Programa PRH-21/ Agncia Nacional do Petrleo- ANP

Autor: Andr Canelas ([email protected])

As opinies expressas neste trabalho so de exclusiva responsabilidade do autor.

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Autor: Andr Canelas ([email protected])

RESUMO

A monografia aborda os impactos econmicos, em termos de gerao de renda, dos investimentos na atividade de explorao e produo de petrleo realizados no Brasil, do ano de 1998 a 2003. A justificativa para este corte temporal da anlise foi a mudana institucional que ocorreu na indstria brasileira de petrleo, com a aprovao da Emenda Constitucional n 9, que deu incio a esta reforma institucional e flexibilizou a forma de execuo do monoplio da Unio para as atividades de explorao, produo e refino de petrleo, e com a aprovao da Lei n 9.478, comumente designada "Lei do Petrleo", que representou o que seria a partir de ento a nova legislao sobre a organizao econmica das atividades relacionadas indstria de petrleo. Esta mudana de ambiente institucional gerou um fluxo considervel de investimentos nas atividades de explorao e produo, por parte de um grande nmero de companhias entrantes, adicionando-se ao esforo da companhia incumbente, a Petrobras. O trabalho analisa os investimentos em explorao e produo de petrleo, por parte da Petrobras e das companhias entrantes, no que concerne a seus efeitos sobre gerao de valor agregado e a seu impacto sistmico sobre a economia brasileira em termos de encadeamento sobre outros setores e impactos na balana comercial do pas. Para tanto, o trabalho discorre sobre os seguintes aspectos: a importncia econmica da indstria de petrleo e dos investimentos em explorao e produo; os fatores relevantes no processo decisrio para investimentos em explorao e produo; a importncia histrica da indstria de petrleo e da atividade de explorao e produo no Brasil; a abertura da indstria de petrleo no Brasil, suas motivaes e a atratividade do pas; a mensurao dos investimentos em explorao e produo no Brasil e no mundo; e por fim, o objetivo final do trabalho, ou seja, a anlise dos impactos econmicos dos investimentos em explorao e produo de petrleo realizados no Brasil a partir da flexibilizao da indstria petrolfera brasileira. No trabalho, espera-se demonstrar que estes investimentos tm sido de considervel importncia como geradores de renda e de aquecimento do nvel de atividade econmica, sobretudo considerando a atual conjuntura da economia brasileira.

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NDICE

INTRODUO ................................................................................................................................................... 06 CAPTULO I - AS CARACTERSTICAS ECONMICAS DA INDSTRIA DE PETRLEO. .............. 08 I.1- A EVOLUO DA INDSTRIA MUNDIAL DE PETRLEO................................................................................... 13 I.2- A NOVA ESTRUTURA E DINMICA INDUSTRIAL ........................................................................................... 22 I.3- A DINMICA ATUAL DE FORMAO DE PREOS ...........................................................................................28 CAPTULO II - A DETERMINAO DOS INVESTIMENTOS EM EXPLORAO E PRODUO. 31 II.1- A MENSURAO DAS RESERVAS E A TAXA DE DESCOBERTA TIMA .......................................................... 32 II.2- A ESTRUTURA DE RISCOS DO SEGMENTO EXPLORAO E PRODUO........................................................ 34 II.3- A ESTRUTURA DE CUSTOS DO SEGMENTO EXPLORAO E PRODUO ........................................................ 35 II.4- AS BARREIRAS SADA .............................................................................................................................. 41 CAPTULO III- A EVOLUO DO SEGMENTO EXPLORAO E PRODUO NO PSABERTURA DA INDSTRIA BRASILEIRA DE PETRLEO ....................................................................43 III.1- A EVOLUO DO SEGMENTO EXPLORAO E PRODUO NO PADRO DO MONOPLIO DA PETROBRAS.... 45 III.2- A ABERTURA DA INDSTRIA NO BRASIL .................................................................................................. 54 III.3- AS RODADAS DE LICITAO DA AGNCIA NACIONAL DO PETRLEO..................................................... 60 CAPTULO IV- OS IMPACTOS ECONMICOS DOS INVESTIMENTOS EM EXPLORAO E PRODUO NO BRASIL APS A ABERTURA ......................................................................................... 72 IV.1- A MULTIPLICADOR KEYNESIANO E A MATRIZ INSUMO-PRODUTO .............................................................. 73 IV.2- AS ESTIMATIVAS DE MENSURAO DOS INVESTIMENTOS EM EXPLORAO E PRODUO REALIZADOS NO BRASIL ................................................................................................................................................................ 78 IV.3- OS IMPACTOS DOS INVESTIMENTOS EM EXPLORAO E PRODUO REALIZADOS NO BRASIL ................ 86 IV.4- A IMPORTNCIA DOS INVESTIMENTOS EM EXPLORAO E PRODUO PARA A PRODUO DE PETRLEO E A BALANA COMERCIAL APS A ABERTURA ....................................................................................................... 92 CONCLUSO....................................................................................................................................................... ..96 REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS ...............................................................................................................98

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INTRODUO

O objetivo deste trabalho avaliar os impactos econmicos dos investimentos realizados em explorao e produo de petrleo no Brasil aps a abertura do setor petrolfero no pas. Em 1995, o Congresso Nacional aprovou a Emenda Constitucional n 9, que flexibilizou a forma de execuo do monoplio da Unio para as atividades de explorao, desenvolvimento, produo e refino de petrleo, e as atividades relacionadas ao gs natural. Em agosto de 1997, iniciado o processo de regulamentao da Emenda Constitucional n. 9, o Congresso Nacional aprovou a Lei do Petrleo (Lei 9.478), objetivando legislar sobre que seria a partir de ento a nova organizao institucional e econmica para o exerccio das atividades econmicas relacionadas indstria de petrleo e gs natural: as atividades de explorao de reas, desenvolvimento de campos e produo de petrleo, chamadas de upstream, ou segmento E&P (conforme sero doravante chamadas neste trabalho), importao e exportao de petrleo, refino, comercializao de refinados, e atividades relacionadas ao gs natural. A abertura foi bem-sucedida em promover representativa entrada de capital no pas para investimentos em atividades E&P e torn-lo atrativo como opo s companhias internacionais, sobretudo face a ainda pouca acessibilidade das mesmas s melhores reservas internacionais de petrleo, de menores custos, no Oriente Mdio. O quarto round de licitaes da Agncia Nacional do Petrleo (ANP) marcou de forma bem-sucedida a concluso da primeira fase da abertura, de modo que as companhias petrolferas devero doravante atentar aos resultados deste primeiro ciclo a fim de determinar o prosseguimento de sua poltica de investimento no Brasil em atividades de explorao e produo. O objetivo do trabalho analisar o grau de importncia dos investimentos em E&P realizados aps a abertura do setor petrolfero no Brasil. defendida no trabalho a hiptese de que a grande diferena da indstria de petrleo para as demais indstrias no que tange gerao de renda reside precisamente no fato de que esta indstria to relevante a ponto de sua dinmica de crescimento transcender a conjuntura econmica dos pases nos quais esta indstria presente. Espera-se demonstrar que as caractersticas de maior relevncia dos investimentos em E&P no Brasil relacionados diretamente ao evento da abertura (investimentos das entrantes) so seus efeitos sobre a economia brasileira, precisamente a intensificao dos impactos econmicos dos investimentos em E&P da Petrobras no que tange

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gerao de renda, que sempre foram de enorme importncia para gerao de valor agregado e capacitao tecnolgica da indstria nacional de fornecedores de bens de capital. A monografia composta de quatro captulos, cujos propsitos so citados a seguir, e uma concluso, na qual so reafirmadas as concluses do trabalho. O captulo 1 da monografia dispor sobre as caractersticas econmicas da indstria de petrleo, dado que estas a tornam substancialmente distinta das demais indstrias. O captulo 2 dispor das caractersticas especficas da atividade econmica de explorao, desenvolvimento de campos e produo de petrleo. O foco do captulo so as caractersticas particulares dos investimentos em explorao e produo de petrleo, do ponto de vista das motivaes e fatores decisrios para estes investimentos. O captulo 3 discorrer sobre a evoluo da indstria de petrleo no Brasil,

particularmente sobre o segmento de explorao e produo, e sobre o ambiente da indstria no Brasil no ps-abertura. O captulo 4 discorrer sobre a importncia da prpria varivel investimento na determinao da renda e do ciclo econmico, e tambm sobre a importncia dos investimentos em explorao e produo de petrleo para a economia brasileira.

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CAPTULO I AS CARACTERSTICAS ECONMICAS DA INDSTRIA DE PETRLEO

O objetivo deste captulo discorrer sobre a importncia econmica da indstria de petrleo. As peculiaridades desta indstria lhe do caractersticas mpares, algumas das quais no observadas nem mesmo entre outras indstrias energticas ou de infra-estrutura. O petrleo, um hidrocarboneto1, uma fonte de energia primria de baixssima substituibilidade, apresentando demandas de curto e mdio prazo inelsticas a variaes nos preos; ou seja, variaes percentuais nos preos implicam em variaes comparativamente muito menores nas quantidades demandadas. Dado um certo patamar da demanda por petrleo e seus derivados de um espao scio-produtivo definido, esta demanda tem que ser realizada para que no haja drstica reduo do nvel de atividade econmica deste espao, independentemente do nvel corrente de preos do leo2. Assim, o petrleo tem fundamental importncia estratgica para os pases que so grandes importadores lquidos, e tal importncia to alta quanto o grau de dependncia de um pas em relao a importaes de leo e seus derivados. Como indstria de energia, de caractersticas infra-estruturais, a indstria de petrleo gera bens que so insumos insubstituveis na matriz produtiva de qualquer pas, de grande participao na mesma, sendo estes insumos sustentculos do modo de produo e consumo e mesmo da cultura da sociedade moderna. Um exemplo claro desta importncia so os derivados de petrleo usados como combustveis para motores de combusto interna (ex: gasolina e diesel) dos veculos utilizados em servios de transporte, servio de infra-estrutura sem o qual nenhuma estrutura produtiva industrial moderna funcionaria. A disponibilidade de petrleo e seus derivados e seus nveis de preos tm grande importncia para a determinao do nvel de crescimento econmico e do nvel de preos das economias nacionais, pois energia e transporte so insumos absolutamente necessrios para produo de quaisquer bens ou servios.

Por hidrocarbonetos, entende-se os recursos naturais, originados da fossilizao de organismos em rochas de bacias sedimentares, cujas molculas sejam formadas por cadeias de carbono e hidrognio. Estes so o petrleo, em suas diversas variaes de qualidade, o gs natural, o leo condensado e os derivados obtidos a partir do refino de petrleo, ou seja, a partir da separao das molculas de carbono e hidrognio de acordo com seu peso molecular (THOMAS, 2001). 2 Obs: Os termos petrleo, petrleo cru, leo, leo cru, petrleo bruto , leo bruto e cru so sinnimos. 9

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O petrleo representa hoje cerca de 40 % das necessidades energticas mundiais, e os preos de outras fontes de energia, notadamente o gs natural, tambm dependem do preo do petrleo. O preo do barril tem efeitos muito relevantes na determinao do nvel de atividade, de investimentos e de exportaes dos pases grandes produtores, especializados basicamente neste produto, a exemplo de Arbia Saudita e Venezuela, entre outros. A evoluo de setores industriais inteiros, como as indstrias qumica, automobilstica e de construo naval, irremediavelmente ligada indstria de petrleo. Os componentes de intensidade de capital e de mudana de padro tecnolgico na indstria de petrleo so to relevantes, que esta indstria foi responsvel pelo desenvolvimento de toda uma indstria diferenciada em seu bojo: a indstria para-petrolfera. No existe nada semelhante com relao a outras indstrias: tomando como exemplo a indstria automobilstica. por sua importncia, no existe uma indstria para-automobilstica. O fato de a indstria de petrleo depender de uma longa cadeia produtiva (da prospeco at o consumo final dos derivados, passando pelo desenvolvimento das jazidas, produo, transporte, refino e distribuio) levou historicamente a uma tendncia pela busca constante de integrao vertical entre os diferentes ramos da cadeia, e tambm de integrao horizontal. A busca por integrao vertical se baseia sobretudo no risco associado ao segmento E&P. este o segmento da cadeia que absorve a maior parte dos dispndios de capital dos investimentos da indstria, e nele se baseiam mais fortemente suas rendas diferenciais, sobretudo as rendas ricardianas, conceito tratado a seguir. A busca por integrao horizontal se baseia na desigual distribuio das jazidas ao longo do mundo. Apenas as firmas integradas vertical e horizontalmente so capazes de gerenciar os riscos das atividades de E&P, e investir na escala necessria para a manuteno de um fluxo de caixa futuro apropriado (CLO, 2000). As reservas de petrleo se encontram apenas em bacias de rochas sedimentares, e se encontram irregularmente dispersas pelas regies mundiais, criando elevadas rendas diferenciais para os produtores das regies com reservas de maior volume e de mais fcil explorao. Tal irregularidade responsvel por uma estrutura de custos absolutamente dspar entres as regies produtoras, disparidade esta no registrada para nenhuma outra indstria, extrativa ou no. O custo mnimo, dos velhos campos de explorao no Oriente Mdio, oscila entre menos de um dlar por barril (com um mnimo de apenas US$ 0,25 para os barris dos poos que iniciaram produo nas dcadas de 20 e 30), enquanto o custo por barril nos campos marginais no Mar do Norte chega a variar entre 15 e 25 dlares. Tal grau de disparidade de custos na indstria de petrleo em enorme parte responsvel pelas rendas10

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diferenciais que a marcam. No houvesse as rendas diferenciais da atividade petrolfera, como em uma situao de concorrncia perfeita na qual o lucro econmico seria zerado pelo equilbrio entre P=Cmg (preo igual a custo marginal)3, muitos produtores seriam inviabilizados, sobretudo os norte-americanos e os do Mar do Norte (ALVEAL, 2001). Estas rendas so conceitualmente tratadas na literatura econmica como rendas ricardianas e rendas tecnolgicas. As rendas ricardianas podem ser divididas entre renda de raridade, renda de produtividade e renda de qualidade. Estas esto associadas aos diferentes nveis de retorno que se obtm ao passar da produo em reas melhores a reas de qualidade inferior s primeiras. Esta noo guarda analogia clara ao Modelo do Trigo, modelo de reproduo econmica de atividades baseadas na explorao de recursos naturais, que foi desenvolvido no incio do sculo XIX pelo economista britnico David Ricardo. O modelo mostrou a queda de rentabilidade associada ocupao total de reas cultivveis de dado grau de qualidade, levando a ocupao posterior de terras menos produtivas, de menor qualidade e retorno. A diminuio contnua da taxa de lucro dos empresrios em razo da ocupao das terras marginais seria acompanhada pelo aumento da renda auferida pelos detentores de direitos de explorao das melhores terras. Esta renda, ou seja, a renda ricardiana, diretamente proporcional qualidade das terras sobre as quais tem direito o recebedor desta renda (NAPOLEONI, 1981). Este modelo claramente aplicado indstria de petrleo; para entender esta aplicao, basta considerar os campos produtores de petrleo como as terras do modelo ricardiano, e a sua qualidade como sendo determinada por basicamente trs fatores: produtividade dos poos, qualidade do leo extrado e posio geogrfica das jazidas. A renda de raridade referente ao fato de o petrleo ser um recurso natural exaurvel, pois h um custo de oportunidade do produtor em funo da explorao de um recurso esgotvel, que no encontra substitutos (TIETENBERG, 1996). Dado que este um recurso que dever ser esgotado no futuro, a obteno desta renda absolutamente fundamental para um grande nmero dos pases grandes exportadores. Estes pases so, em sua maioria, destitudos de vantagens absolutas e comparativas na produo de outros produtos (vantagens com relao a concorrentes no comrcio internacional) , sejam estas baseadas na explorao intensiva de recursos naturais ou no. Por vantagem absoluta de um pas em relao a um produto hipottico A, entende-se a relao entre o custo de produo de A neste pas e nos3

Custo marginal o custo adicional de se produzir mais uma unidade do produto, no curto prazo, quando nem todos os fatores de produo podem ter sua utilizao incrementada. 11

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demais pases produtores, custo em termos de utilizao de fatores de produo. Por vantagem comparativa, por exemplo de um pas em relao a um produto hipottico B, entende-se o custo da produo deste produto B neste pas em relao ao custo de produo de outros produtos neste mesmo pas (estes custos sendo tambm medidos em termos de utilizao de fatores de produo). Estas duas medidas de competitividade de um pas no mercado internacional foram desenvolvidas respectivamente pelos economistas britnicos da escola liberal clssica Adam Smith e David Ricardo (CANUTO et al. , 1998). 4 Assim sendo, particularmente imperioso a estes pases maximizar a renda gerada pela atividade petrolfera. Na literatura econmica, esta situao ficou conhecida como a doena holandesa: enormes vantagens comparativas de um pas na produo de um determinado produto fazem com que o retorno dos investimentos nesta atividade seja to grande a ponto de impedir uma aplicao volumosa de capital em outros setores, levando o pas a especializar-se centralmente na exportao deste produto, e usando as divisas obtidas com esta exportao para importar os bens e servios que no produz. Esta situao pode ser observada em um grande nmero dos maiores exportadores de petrleo: Angola e pases da Organizao dos Pases Exportadores de Petrleo, doravante chamada de OPEP neste trabalho, a saber Venezuela, Nigria e pases do Oriente Mdio. Desta forma, pode-se secionar os pases de grande envergadura estratgica para a indstria mundial de petrleo em dois grupos: de uma lado, os pases altamente industrializados, os maiores consumidores de leo, em geral sem dotaes do mesmo, assim sendo importadores do petrleo que consomem5. Do outro lado, os pases da OPEP, pases de grande exportao de leo cru, porm de pequeno consumo do mesmo, em razo do pouco dinamismo de suas economias, o que se d em parte em funo da doena holandesa ; enquanto nos pases mais desenvolvidos a

O conceito de vantagem comparativa, introduzido por Ricardo na teoria econmica clssica e mais tarde reafirmado pelo teorema econmico neoclssico de Hecksher-Ohlin (CANUTO et al., 1998), afirmava que a economia de cada pas deveria basear-se centralmente em apenas 1 produto, aquele no qual o custo de oportunidade de produzi-lo fosse menor, custo de oportunidade medido em termos do custo relativo deste produto em relao ao custo dos demais produtos (custo esse medido em termos de uso de fatores de produo). Este conceito foi a base da chamada diviso internacional do trabalho dos sculos XVIII e XIX, modelo de insero de pases no comrcio internacional destes sculos, na qual os pases subdesenvolvidos especializavamse na exportao de bens agrcolas (no caso por exemplo do Brasil, o caf), enquanto os pases desenvolvidos se especializariam na exportao de bens manufaturados e industrializados. 5 Excees so o Reino Unido, a Noruega, Canad, EUA, Brasil e China. Estes pases se destacam internacionalmente tanto como produtores quanto como consumidores de petrleo. Tm parque industrial bastante diversificado, alguns dos quais tendo logrado altos ndices de Desenvolvimento Humano (IDH), notadamente os quatro primeiros. Entre estes, apenas Reino Unido e Noruega so auto-suficientes no consumo de petrleo cru. No caso de Brasil e China, estes so representativos tanto como produtores quanto como consumidores de petrleo, porm ainda apresentam dependncia das importaes deste produto, que no caso de Brasil e China no to elevada como no caso dos EUA. 12

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participao da indstria de petrleo no Produto Interno Bruto, PIB, no ultrapassa a faixa de 3 a 6 %, nos pases grandes exportadores esta participao se situa em torno de 70 a 90%. Em razo da exauribilidade do petrleo, h alta carga tributria cobrada pelos governos sobre o valor da produo de petrleo e gs, na forma de royalties, alquotas de participao especial, taxas de ocupao das reas produtoras e impostos (JOHNSTON, 1994). O tema tributao ser tratado adiante neste trabalho. A renda de qualidade determinada pela varivel qualidade das variantes de petrleo, em funo de atributos fsico-qumicos, em particular sua densidade. Quanto mais leve o leo, melhores suas qualidades para o refino. Variaes de leo mais leves apresentam coeficientes tcnicos de refino que geram maior proporo dos chamados derivados nobres, como a gasolina, de maior valor agregado e menos poluentes. A classificao das variantes de petrleo medida pelo padro internacional API (ou American Petroleum Institute), que mede o densidade da petrleo em relao gua. Quanto maior o nmero de graus API de uma variante de leo, mais leve este ser, e melhores sero suas qualidades de refino. Por exemplo: o petrleo do campo de Brent, no Mar do Norte, que comumente citado como referncia internacional, tem viscosidade de 30 a 35 graus API, sendo assim de boa qualidade. Tomando como exemplo o petrleo brasileiro, pode-se classific-lo como em sua maior parte pesado: a variante comercialmente explorvel mais pesada o leo do Campo de Marlim, da Petrobras, de 17 graus API. A renda referente aos diferentes nveis de produtividade dos poos associada a um custo marginal de longo prazo. A renda de posio determinada em funo da maior ou menor proximidade geogrfica entre reservas e centros consumidores. As rendas tecnolgicas so determinadas em funo dos diferentes estgios de tecnologia empregados pelos diversos produtores, favorecendo os operadores com acmulo de experincia e capacidade inovativa no desenvolvimento tecnolgico Esta diferente da renda ricardiana, que determinada pelas condies geolgicas das jazida. As rendas ricardianas so determinantes muito mais importantes da vantagem comparativa dos grandes pases produtores do que o diferencial tecnolgico entre estes. Em funo da ocorrncia de oportunidades de apropriao das rendas diferenciais, h a competio geopoltica entre pases hospedeiros e empresas pelo acesso s e propriedade das melhores jazidas.

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Pode-se ainda considerar a chamada renda de monoplio, referente ao poder de mercado das firmas. De acordo com a Teoria Microeconmica (VARIAN, 2000), estruturas de mercado caracterizadas por restries livre concorrncia geram renda de monoplio aos produtores, que ligada diferena entre o preo do barril e o seu custo econmico marginal. Tal renda est ligada a existncia de um mark-up (margem de lucro lanada sobre este custo marginal) caracterstico das indstrias oligopolsticas, em funo do grau de inelasticidade de preo-demanda do mercado. A indstria de petrleo apresenta caractersticas que a marcam como oligopolista, como por exemplo demanda inelstica a preos e grandes barreiras entrada (ver captulo 2). A indstria de petrleo , na verdade, no apenas uma indstria oligoplica, mas sim um paradigma de organizao industrial oligoplica: as decises de investimento nesta indstria dependem de fatores relativos ao comportamento estratgico dos agentes nos diversos ramos da cadeia. Esta estrutura de concorrncia oligoplica da indstria petrolfera est entrelaada prpria histria de desenvolvimento e internacionalizao da indstria.

I.1 - A Evoluo da Indstria Mundial de Petrleo

A origem da moderna indstria de petrleo se deu nos EUA, a partir da descoberta pioneira de petrleo por Edwin Drake em um poo em Tuttisville, Pensilvnia, em 1849. Na verdade, o petrleo j era conhecido na Antigidade e na Idade Mdia. Por exemplo, o descobridor Marco Polo descreveu em uma de suas cartas o mercado de petrleo em Baku, no atual Azerbaijo; alguns historiadores defendem a idia de que o leo bruto teria sido usado como argamassa no templo do Rei Salomo; o leo era usado para a queima das bolas incendirias lanadas pelas catapultas, artefato blico tpico da Idade Mdia (YERGIN, 1994). A moderna indstria de petrleo, entretanto, somente se desenvolveu a partir da

descoberta de Drake. A princpio, as atividades de E&P de petrleo eram feitas de forma artesanal, por vezes mesmo domiciliar (como at hoje ainda acontece em pequenos campos onshore no Texas6), e o mercado era bastante livre e desorganizado, dando margem entrada6

Vale notar que nos EUA, ao contrrio do que ocorre no Brasil, os recursos do subsolo so de propriedade do proprietrio do solo e no da Unio. Assim, parte substantiva da produo de leo americana, sobretudo texana, se deriva de companhias familiares ou de contratos de cesso de direitos entre famlias e companhias de E&P. Estes so casos de campos de petrleo de relativamente baixos volume e produtividade diria, e que podem ser explorados por tcnicas relativamente tradicionais menos intensivas em capital e tecnologia. 14

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de free-riders nas atividades de E&P, conforme houvesse variaes no preo do cru. Isto conferia grande instabilidade ao mercado, pois variaes no preo levavam entrada e sada de muitos agentes do E&P. No seu incio, o mercado de petrleo se baseava em um nico derivado, a querosene para iluminao, pois at aquele momento utilizava-se leo de baleia para tal fim, mas este animal estava sendo caado em direo extino. Todos os demais derivados que no a querosene iluminante eram jogados fora aps o refino. Naquele momento, no havia padronizao alguma da qualidade do produto: as querosenes produzidas variavam largamente de qualidade, e o ndice de acidentes com vtimas com a queima da querosene era alto. Naquele momento, a indstria de petrleo era comensurada ao nvel de desenvolvimento tecnolgico do mundo poca: os nicos campos explorados eram aqueles em terra e que fossem de mais fcil perfurao, via percusso a base de utenslios mecnicos rudimentares. A indstria se assemelhava tecnologicamente em pouqussimo ou nada indstria atual e a seus atuais processos de tecnologia de ponta7, sobre os quais no cabe discorrer em um trabalho de cunho econmico e no tcnico. As atividades de explorao de petrleo eram feitas a partir da localizao visual do petrleo; ou seja, s eram exploradas jazidas de petrleo nas quais pequenos montantes de leo aflorassem naturalmente superfcie do solo (oil seeps).

Estes investimentos pioneiros, sem processos de avaliao mais refinados sobre a possibilidade de encontrar petrleo, apresentavam baixssimas taxas de sucesso exploratrio, menores que os cerca de 30 a 40 % atuais (ou seja, 3 ou 4 poos encontrados com reservas de petrleo ou gs natural para cada 10 poos perfurados), e se chamavam wild cats, termo que at hoje usado na indstria de petrleo para se referir a investimentos em reas petrolferas pioneiras.

A indstria de petrleo s comeou a se organizar como grande indstria a partir da companhia Standard Oil, de John Rockfeller. A Standard Oil foi a companhia pioneira do padro de grande organizao industrial internacionalizada, que to fundamental foi para o desenvolvimento da economia capitalista moderna no sculo XX (GALBRAITH, 1982). O termo Standard (do ingls, padro) dizia respeito ao fato de a companhia ter se proposto aNo atual estado de desenvolvimento tecnolgico da atividade de E&P, estes so geofsica, ssmica 2D e 3D, gravimetria, magnetometria, perfurao direcionada, entre outros. 157

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padronizar o produto final, no caso a querosene resultante do refino de petrleo, de modo a criar um mercado cativo; ou seja, uma demanda estvel por um produto padronizado, que seria confivel ao consumidor, que seria fiel companhia. Quando da criao da Standard, havia diversas refinarias e companhias de E&P nos EUA, mais de duzentas companhias adicionando os dois segmentos da cadeia petrolfera. O monoplio da Standard Oil foi obtido atravs da busca de economias de escala, escopo e de integrao na indstria de petrleo: a princpio a Standard Oil se tornou monopolista do refino de petrleo, via compra das demais refinarias e controle do transporte de derivados, tornando-se assim formadora de preos e de quantidades para a venda s companhias distribuidoras de derivados, e tambm monopsonista (nica demandante) da compra de leo bruto junto s companhias produtoras de leo cru, em funo de ser monopolista do refino. Logo, a Standard Oil se tornou monopolista integrada verticalmente em todos os segmentos da cadeia do petrleo (E&P, transporte de cru, refino, transporte de derivados e distribuio). A partir desta total integrao, obteve grandes economias de escala, escopo e de custos de transao. As economias de escala se deram em funo do vultoso aumento dos volumes extrados e processados sem que houvesse um aumento substancial do investimento em capital fixo, reduzindo-se assim o custo mdio; as economias de escopo se deram em funo de produzir, transportar e comercializar vrios derivados a partir da mesma logstica operacional, e as economias de custos de transao se deram em funo de todo a cadeia petrolfera pertencer a uma nica empresa. A Standard Oil se tornou assim a primeira grande monopolista privada do capitalismo moderno do sculo XIX. Dado seu enorme poder econmico, foi desmembrada em trinta e trs companhias pela Suprema Corte dos EUA, em 1911, com base no Sherman Act, de 1890, que foi o incio do que hoje se conhece como o aparato jurdico de defesa da concorrncia. O Sheman Act foi a base do desenvolvimento da defesa da concorrncia nos EUA, pas onde este aparato mais desenvolvido, paradigma dos demais existentes no mundo. A partir do desmembramento da Standard Oil, o desenvolvimento da indstria americana de petrleo prosseguiu baseado na coexistncia de grandes majors, internacionalizadas e integradas verticalmente, com companhias menores, especializadas em apenas um dos segmentos da cadeia petrolfera. Deve-se dizer que j nos seus primrdios, quando ainda era corporificada no monoplio da Standard Oil, a indstria de petrleo j imprimia sua importncia para o desenvolvimento da economia, da sociedade e do way of life do seu pas

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de origem.8 Sua importncia econmica foi absolutamente relevante para o desenvolvimento econmico dos EUA como um todo, entretanto mais profundamente para o estado do Texas, que se desenvolveu economicamente sobretudo a partir da explorao deste hidrocarboneto. Como indstria internacional, o desenvolvimento da indstria de petrleo foi marcado por dois paradigmas distintos: a princpio, o crescimento de agentes privados - oriundos sobretudo da diviso da gigante Standard Oil, a grande construtora dos primrdios da indstria -, transformando-se nas grandes majors de origem americana (mais tarde adicionadas s majors de origem europia); posteriormente , o desenvolvimento de empresas de origem estatal ou estatizadas, como em Brasil , Mxico e pases da OPEP, a saber Nigria, Venezuela e os pases do Oriente Mdio. A internacionalizao da indstria de petrleo como paradigma de cartel internacional teve seu incio nos primeiros anos da segunda dcada do sculo XX, com governos e corporaes de Europa e Estados Unidos iniciando uma disputa para se apropriar das jazidas de petrleo do Oriente Mdio. A internacionalizao aumentou a relevncia da competio estratgica no oligoplio internacional das majors, americanas (a antiga Gulf Oil e as companhias filhas da diviso da Standard Oil pelo Sherman Act, que deram origem s atuais Exxon Mobil e Chevron Texaco), e europias (as precursoras das atuais BP-Amoco, Royal Dutch Shell e Total Fina Elf).9 O excesso de oferta e a conseqente queda dos preos internacionais do petrleo na segunda metade da dcada de 1920, em funo de guerra de preos na ndia entre Shell e Standard Oil of New York, levaram formalizao do cartel atravs do Acordo de Achnacarry (Esccia), fortalecendo as posies consolidadas at o momento pelas majors atravs de um acordo de diviso dos mercados mundiais. O acordo foi a base da fase mais estvel de sustentao do crescimento da indstria, que seguiu at o primeiro choque de ofertaA figura de inovador e empreendedor de John Rockfeller um dos mais conhecidos exemplos da idealizao do self-made man, figura presente na cultura do capitalismo norte-americano, cujo desenvolvimento foi baseado no apenas em polticas pblicas, mas tambm a partir da acumulao privada de capital e expertise industrial, ao contrrio do padro de desenvolvimento industrial prevalecente em pases como o Brasil, que se baseou primordialmente em investimentos de capital estatal. Desta forma, Rockfeller pode ser considerado como um exemplo do chamado empreendedor inovador schumpeteriano. 9 A Standard Oil foi dividida em 33 empresas, das quais as mais importantes foram a SONJ - Standard Oil of New Jersey (que mais tarde se transformou em Esso, depois Exxon, e Exxon Mobil ao se fundir com a Mobil), SONY - Standard Oil of New York (mais tarde Mobil Oil, que se fundiu Exxon dando origem Exxon Mobil), SOCAL - Standard Oil of California (mais tarde Chevron, que se fundiu Texaco formando a Chevron Texaco). Alm da Standard Oil, havia poca duas outras grandes companhias de petrleo nos EUA: Texaco, hoje Chevron Texaco, e Gulf Oil, mais tarde comprada pela Chevron, sendo assim tambm uma das precursoras da Chevron Texaco. No que tange s majors europias, o grupo anglo-holands Royal Dutch Shell surgiu da fuso, no sculo XIX, da holandesa Royal Dutch com a Shell, de propriedade do ingls Marcus Samuel. A British Petroluem-Amoco, surgiu da estatal britncia Anglo Persian, mais tarde chamada Anglo Iranian e por fim chamada British Petroleum (BP), mais tarde comprando a americana Amoco e se tornando a BP-Amoco. A Total Fina Elf surgiu da fuso das ex-estatais franco-belgas Total, Fina e Elf. Pode-se citar tambm a italiana Agip e a espanhola Repsol-YPF como outras majors europias. 178

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em 1973, tendo tornado o cartel das majors um exemplo de regulao corporativa privada (op. cit. , 2001) : em 1950, as majors j controlavam 48% das jazidas mundiais, 70% da capacidade de refino, e 66% da frota de petroleiros e dos mais importantes dutos. Os contratos de concesso entre as majors e os pases hospedeiros de reservas eram amplamente desfavorveis aos segundos. Aps a Segunda Guerra Mundial, o consumo energtico mundial, puxado pela reconstruo e modernizao das economias europias e japonesa, cresceu a uma velocidade sem precedentes. Entre 1950 e 1973, a produo de eletricidade foi multiplicada por 6, a de petrleo por 5,4 e a de gs natural por 6,3. Tais transformaes apoiam-se na importao macia de petrleo e, mais tarde de gs natural, por parte dos pases em industrializao e/ou reconstruo no ps-guerra. Tal fato se deve sobretudo ao desenvolvimento econmico destes pases, que trouxe no seu bojo o desenvolvimento da indstria automobilstica na Europa, Japo e EUA; assim, o petrleo passava a fazer parte do way of life no apenas americano, mas tambm europeu e japons. A partir do desenvolvimento do transporte por veculos automotores, o petrleo substitui o carvo como principal fonte de energia das economias nacionais. O carvo havia servido como combustvel central da Revoluo Industrial, a partir da utilizao da mquina a vapor e das ferrovias nos processos de industrializao do sculo XIX, em Reino Unido, EUA, Alemanha e em menor parte Frana e Blgica; mais tarde, o carvo serviu difuso da eletricidade, a partir da gerao de energia eltrica por usinas termoeltricas a carvo no sculo XX. Entretanto, aps a Segunda Grande Guerra, os veculos automotores, cuja utilizao j era crescente no decorrer do sculo XX, adicionaram-se s ferrovias como principais fontes de transporte nestes diversos pases, o que contribuiu para a parcial substituio das mquinas a vapor por motores de combusto interna; a dificuldade no transporte de carvo em larga escala conduziu sua parcial substituio para uso industrial por caldeiras queima de leo combustvel.

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Tais fatos conduziram por conseguinte cada vez maior substituio do carvo por leo combustvel, para uso industrial, por diesel e gasolina, para transportes, e mais tarde por gs natural, no que diz respeito gerao termoeltrica10. Apesar de as reservas mundiais de carvo serem muito mais abundantes que as de petrleo, a indstria de petrleo tem peso muito maior na matriz energtica mundial e gera muito mais valor agregado que a indstria carbonfera, em termos de renda e desenvolvimento tecnolgico. Deve-se notar que o setor transporte ainda hoje o uso final da, transformado de longe, maior parte do petrleo extrado e em derivados. Tal afirmao particularmente verdadeira no caso do

consumo brasileiro atual de derivados de petrleo. Da mesma forma que a indstria automobilstica teve papel fundamental para o desenvolvimento da indstria de petrleo, em funo da gerao do core da demanda mundial por derivados, a indstria de petrleo tambm teve importncia fundamental para o desenvolvimento da indstria automobilstica, que foi uma das principais responsveis pelo estabelecimento da moderna sociedade de consumo em meados do sculo XX, ou sociedade fordista, sociedade de demanda de massa por bens de consumo durvel padronizados, modelo de sociedade que foi a base para a ocorrncia dos saltos da industrializao e do padro de consumo capitalista mundial no sculo XX (HOBSBAWN, 1995). O automvel sem dvida uma das maiores marcas da sociedade e cultura de consumo modernas: o petrleo esteve assim na base da formao, no s econmica e poltica, mas tambm scio-cultural do modus vivendi do homem moderno. Tal importncia do automvel particularmente gritante no caso dos EUA, pas no qual o automvel e por conseguinte o petrleo se tornaram um condicionante de maior importncia do padro de vida dos habitantes do mesmo, e por conseguinte do padro de vida nos demais pases.

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Deve-se considerar que, desde meados dos anos 80, a gerao termoeltrica, principal uso do carvo, vem tendo seu consumo de combustvel deslocado deste para o gs natural. A principal razo desta mudana so as demandas ambientais, ligadas ao fato de a combusto para fins energticos de petrleo, derivados e do carvo resultar na emisso atmosfrica de CO2 (dixido de carbono), gs responsvel pelo efeito estufa, ou seja, o aquecimento global decorrente da depleo da camada de oznio, enquanto a utilizao do gs natural implica em emisses atmosfricas muito menores (DE OLIVEIRA, 1998). Desde os anos 80, vrios pases, sobretudo os membros da Unio Europia aderentes ao Protocolo de Kioto, tm alavancado polticas de reduo de suas emisses de CO2, de maneira a buscar um modelo de desenvolvimento sustentvel, polticas estas que tm se baseado em tentativas de reduo da participao do petrleo e do carvo na matriz energtica destes pases, e de aumento da participao do gs natural e de fontes alternativas de energia, como energia solar fotovoltaica, elica e biomassa. Como exemplo mais contundente deste processo, pode-se citar a substituio do carvo pelo gs natural no parque gerador de eletricidade no Reino Unido, a partir do governo de Margareth Thatcher, a despeito deste pas ter historicamente baseado sua gerao eltrica na combusto de carvo, desde a Revoluo Industrial. Deve-se notar, contudo, que a demanda de carvo para fins de gerao eltrica ainda pulsante no mundo, em funo da ampla utilizao deste para gerao eltrica em China e ndia, dois pases de envergadura na economia mundial. 19

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A indstria de petrleo foi prioritria para desenvolvimento da maior parte dos pases de industrializao tardia, como o Brasil (ALVEAL, 1994). No perodo aps a 2 Guerra, estava j bastante claro o papel geopoltico da indstria de petrleo11, e seu grande potencial para ser o carro-chefe do processo de desenvolvimento produtivo dos pases industrializados retardatrios. Desde ento houve uma poltica mais firme destes pases na negociao de contratos de concesso, e se deu o surgimento das grandes estatais de petrleo. Este perodo foi marcado por eventos fundamentais para a configurao da indstria de petrleo atual: a nacionalizao do petrleo mexicano em 1938; a renegociao dos contratos de concesso na Venezuela; e o retorno do petrleo russo ao mercado europeu na dcada de 50; a deposio do x Reza Pahlevi e a Revoluo Islmica no Ir, resultando na a renegociao dos contratos de concesso neste pas. Entretanto, tiveram importncia mais decisiva a criao da OPEP em 1960; o surgimento de novos produtores, como Nigria e Indonsia; e a criao das maiores estatais de petrleo, como a Petrleos de Venezuela, suas co-irms do Oriente Mdio na OPEP, e a Petrobras. A estatizao das empresas petrolferas dos pases da OPEP e o primeiro choque de preos de petrleo em 1973 foram o ponto drstico de mudana de estrutura da indstria. Verificou-se um inconteste declnio do controle da indstria pelas sete irms (as majors), pois a partir deste evento a indstria de petrleo passou a apresentar uma crescente caracterstica de desintegrao, tanto no nvel horizontal quanto vertical, com as sete majors no tendo mais acesso s melhores jazidas do mundo, como resultado da expulso das majors da rea da OPEP. Pode-se afirmar que o choque de petrleo teve motivaes de naturezas poltica e econmica. Em 1973, Sria e Egito fizeram um ataque surpresa a Israel durante o feriado judaico de Yom Kippur, o Dia do Perdo, tendo Israel respondido violentamente ao ataque. Em outubro de 1973, quando a guerra eclodiu entre Israel, Egito e Sria, os pases exportadores do Oriente Mdio, reunidos em Genebra (Sua), elevaram unilateralmente o preo do barril do tipo Arabian Light de 2,989 dlares para 4,119 dlares. Nos dias que se seguiram ao incio da Guerra do Yom Kippur, a OPEP decidiu embargar as exportaes destinadas aos aliados de Israel, a saber EUA e Holanda. Dois meses mais tarde (dezembro de 1973), houve nova alta dos preos de referncia, para 11,651 dlares. Esta seqncia de11

Um exemplo claro de quo importante o petrleo para a sustentao das economias nacionais, e de sua conseqente importncia geopoltica, foi o fato de o Japo ter atacado os Estados Unidos na Segunda Guerra Mundial em funo dos EUA terem naquele momento cortado o suprimento de petrleo e derivados para o Japo. Um exemplo mais claro e recente da importncia geopoltica do petrleo foi a Guerra do Golfo, no incio dos anos 90. 20

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eventos polticos muitas vezes apresentada como a razo por detrs do primeiro choque de petrleo. Entretanto, foi apenas um fator de incentivo para o choque da OPEP naquele momento. Na verdade os choques se deram principalmente por fatores de natureza econmica: os pases grande-exportadores da OPEP haviam percebido a crescente perda de renda petrolfera, que estavam cedendo ao ocidente em um ambiente de baixos preos de petrleo, principalmente renda de raridade, pois este um recurso no-renovvel que se constitui na nica vantagem comparativa dos pases da OPEP. De fato, a desvalorizao do dlar americano12 e a inflao mundial dos anos anteriores ao choque vinham reduzindo, em termos reais, o valor do barril de petrleo, reduzindo a renda real dos pases exportadores de petrleo, que j era baixssima na mdia por barril exportado, vis-a-vis o valor real do produto quando considerada sua importncia estratgica e no-renovabilidade (MARTIN, 1992). No h dvida de que a intensidade e a velocidade das mudanas se deram sobretudo em funo da mudana nos direitos de propriedade dentro da rea da OPEP. A perda de controle sobre estes recursos pelas majors e a paralela entrada no mercado de um nmero de novos produtores levaram a dois efeitos inter-relacionados:a)

Uma considervel reduo do nvel de concentrao da produo de leo cru,

com relao ao pico observado nos anos oitenta.b)

O relativo desaparecimento de gerenciamento coordenado de oferta atravs de

consrcios e contratos de longo prazo entre majors, e feedbacks de informao decorrentes da integrao vertical. Os choques de petrleo em 1973 e 1979 foram os mais fortes choques de oferta negativos j observados na economia mundial. Por choque de oferta negativo, entende-se uma elevao da chamada Curva de Phillips de uma economia, curva esta que a representao do trade-off (conflito) existente no curto prazo entre crescimento econmico e nveis de inflao, em funo da existncia da inflao de demanda: maiores nveis de crescimento econmico resultam em maiores nveis de inflao, em funo dos maiores nveis de demanda. Assim, se uma economia cresce a uma taxa anual X, por exemplo, com nvel estvel de inflao resultante de Y, mas sofre um choque de oferta negativo, a economia hipottica em questo ter de suportar taxas de inflao superiores a Y para manuteno do ritmo de crescimento econmico X, ou taxas de crescimento econmico inferiores a X para que a taxa de inflao no seja superior a Y; em ambos os casos, reduzido ceteris paribus o montante de bem estar12

Em todo o mundo, utiliza-se o dlar como moeda para precificar o petrleo, independente do pas considerado. 21

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de uma sociedade a nvel de seu PIB real, ou renda real, que seu PIB ou renda deflacionado pelo ndice de preos (MANKIW, 1998). Os choques de petrleo foram responsveis pela maior mudana de padro estratgico observada na histria da indstria de petrleo: dos choques resultou o incio da competio das grandes majors internacionais pelas reservas de petrleo no planeta, com estas objetivando fincar posies estratgicos em todas as reas de jazidas representativas. Os choques acabaram por forar uma descentralizao da produo (aumento da participao de pases no-membros da OPEP), em razo de uma nova viso dos pases grandes importadores de petrleo sobre a importncia deste, que colocava em um patamar muito mais alto de relevncia a substituio de petrleo importado por petrleo nacional. Alm disso, os choques desencadearam uma mudana na estrutura de consumo energtico mundial: anseios por legislaes ambientais mais rigorosas (PERMAN et al., 1999), uma busca constante de substituio dos derivados de petrleo por outras fontes de energia13, sobretudo eletricidade, gs natural e fontes renovveis, incluindo-se a programa do Banco Mundial de fomento a investimentos nestas indstrias (durante a gesto de Robert McNamara a frente desta instituio), e um aumento da carga tributria das atividades relacionadas cadeia petrolfera. A ao destes fatores reduziu a competitividade dos derivados de petrleo vis--vis a outras fontes energticas. Pode-se argumentar que os dois choques foram bastante dramticos pela drstica virada da economia mundial a partir do incio da dcada de 80: dos aumentos do preo do barril do cru (de cerca de US$ 3,00 para cerca de US$ 12,00 em 1973, e em 1979 para US$ 40,00) decorreram enormes dficits na balana corrente dos pases mais dependentes de petrleo, sendo este um dos principais fatores responsveis pelo choque de juros do Banco Central americano, no enxugamento da liquidez internacional de capital nos anos 80, na crise da dvida na Amrica Latina, no catico ambiente estagflacionrio da dcada perdida e no fortalecimento do paradigma terico liberal sobre o papel da interveno econmica do Estado.

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Em 1973, o petrleo representava cerca de 45% das necessidades energticas mundiais, percentual superior aos cerca de 40% atuais. 22

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I.2 - A Nova Estrutura e Dinmica Industrial

Deste turning point em diante a indstria de petrleo experimentou uma vastido de inovaes: de natureza tecnolgica, especialmente o crescente desenvolvimento da explorao offshore, dado o inevitvel esgotamento futuro da produo onshore (em terra) em territrios no-OPEP; e tambm de natureza financeira: uma crescente comoditizao do petrleo, e a utilizao dos modernos mecanismos financeiros de gerenciamento de risco, como operaes de hedge e nos mercados futuros, a termo e de opes (CLO, 2000). importante notar que o termo comoditizao referente unicamente ao fato de o mercado de petrleo se dar no tipo mercado de bolsa. O petrleo difere frontalmente das demais commodities, sobretudo das agrcolas, no que tange s elasticidades de preo-demanda, de renda-demanda, de substituio na matriz de consumo produtivo de uma economia, a seu dinamismo tecnolgico e geo-poltico, e a seus impactos sobre os ndices de preos e nveis de atividade econmica. Entre os efeitos de natureza tecnolgica, o crescente direcionamento s atividades E&P offshore (em lmina dgua) pelas major companies foi certamente o mais importante resultado dos choques de petrleo. Os choques marcaram assim a mais drstica reorientao de pesquisa e desenvolvimento j ocorrida nesta indstria. Ademais, outra importante conseqncia dos choques de grande importncia para a estrutura industrial da atividade petrolfera foi a atitude adotada pelas empresas petrolferas de priorizar o papel da concentrao, por intermdio de fuses, aquisies e acordos de curto mdio e longo prazos de cooperao entre empresas para projetos, sobretudo em atividade exploratria. Este aumento do nvel de concentrao industrial foi resultante da diminuio do valor acionrio de grande parte das companhias de petrleo (CONN e WHITE, 2004). A formao do preo passou a ser regida pela determinao em bolsas de mercadorias. A relativa substituio das relaes contratuais de longo termo por contratos de prazos menores, a reestruturao das grandes companhias e um aumento no nmero de agentes na indstria passaram a causar absoluta imprevisibilidade e volatilidade nos preos, resultado de um ambiente altamente incerto. O nvel de informao disponvel no mercado se elevou, assim como sua transparncia e eficincia. A combinao de globalizao fsica e econmica dos mercados ajudou a acentuar a instabilidade de preos, sobretudo em perodos de exceo, como guerras. Qualquer evento extraordinrio e de razovel relevncia que ocorra em uma

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refinaria no Texas ou em uma plataforma no Mar do Norte tende a impactar, em tempo real, toda a estrutura de preos mundial. Em 1973, ano do primeiro choque, as majors (incluindo gigantes privadas e estatais) produziam 30 milhes de barris por dia de petrleo, ento 65% da produo mundial, sendo 80% vindo dos territrios da OPEP. Setenta e cinco por cento iam para suas prprias refinarias e vinte e cinco por cento para terceiros via contratos de longo prazo. Ao fim da dcada de 1990, registrava-se drstica mudana de situao. A produo controlada pelas majors estava em 9 milhes de barris dirios em 1998: 14% da produo mundial (op. cit., 2000). O nvel de integrao vertical das majors privadas, dada pela relao entre fluxos de disponibilidade de petrleo e fluxos de venda de derivados, caiu de valores em torno de 1,0 verificados no padro de Achnacarry para valores entre 0,3 e 0,4 nos anos ps-choque. Passou assim a haver um grande excedente nas quantidades vendidas no downstream, com relao quelas vendidas a nvel E&P. Entretanto, o inverso deste fato o que se d no caso das estatais dos pases grandes produtores. A indstria de petrleo pode deste ponto de vista ser dividida em dois grupos: de um lado as companhias dos principais pases da OPEP na oferta de leo cru; no outro, as majors privadas que tm maior controle sobre o mercado final de derivados, apesar de seus market shares individuais serem menores aps os choques. Ambos os lados esto relativamente distantes da situao de equilbrio entre produo de leo/venda de derivados (op. cit., 2000). O segundo choque de petrleo, juntamente falncia do sistema de contratos preferenciais, intensificou os efeitos do primeiro choque, sobretudo o direcionamento a E&P em guas profundas, provocando a redefinio da integrao ou quase-integrao como sistema de alocao de recursos e fixao de preos. As relaes entre pases e companhias mudaram de cooperativas para conflituosas. Ao invs de serem agentes para os pases, as companhias se tornaram suas contra-partes. Tal mudana de posio pode ser atribuda ao fato de que, ao invs de vendedores lquidos de leo, as majors seriam, ento, compradores lquidos, e assim, interessadas em explorar as oportunidades oferecidas pela competio entre pases produtores. As novas condies de maior competio deram relevncia fundamentalmente maior aos mercados, e sua globalizao. Cabe considerar que a concorrncia na indstria se d longe do que seria um ambiente de concorrncia perfeita, no qual preo iguala o Custo marginal (o custo de adicionar uma unidade de produto), conforme

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j afirmado; na indstria de petrleo o pico da razo P/Cmg (mark-up) chega a 40 (ALVEAL , 2001). Enfim, esta reorientao da indstria mundial de petrleo aps os eventos da estatizao das indstrias de petrleo na regio da OPEP e dos choques um exemplo tpico do processo de destruio criadora schumpeteriano, conforme conceito proposto pelo economista austraco Joseph Alois Schumpeter, na qual h uma forte restruturao competitiva, tecnolgica, organizacional e do padro de crescimento de uma indstria, em direo a um novo modus operandi. Esta destruio criadora pode ser observada tanto pela reorientao da pesquisa e desenvolvimento e dos investimentos para E&P em reas de fronteira exploratria, em guas profundas e ultra-profundas14, como Bacia de Campos e Mar do Norte, quanto pela reorganizao da estrutura oligopolista da indstria mundial de petrleo, que teve os nveis de integrao vertical e horizontal das major companies reduzidos consideravelmente em comparao aos nveis do padro de Achnacarry. Tal mudana se deu a partir dos eventos da nacionalizao das indstrias de petrleo dos pases que hoje compe a OPEP, que implicou na expulso das majors da explorao daquelas reservas de cru, de longe as melhores do globo, o que implicou na reduo do seu nvel de integrao vertical. Aps a insustentvel experincia de fixar preos muitos elevados para o petrleo - com volume ofertado compatvel e aps o contrachoque de 1986, quando a Arbia Saudita abandonou o seu papel de swing producer15 dentro da OPEP, os pases grandes produtores adotaram a poltica de fixao de preos de acordo com sua determinao exgena pelo mercado, dando origem ao ambiente de sobre-oferta que tem sido dominante desde ento. Esta poltica ajuda a manter os interesses de longo prazo dos pases exportadores, sobretudo a Arbia Saudita, no que tange manuteno temporal da demanda no longo prazo e a manuteno do seu market share. Neste evento est originada a sobre-oferta de petrleo e a abundncia na oferta de leo que se tem observado desde ento, a partir do evento do contrachoque de petrleo. Assim, a incumbncia de fixao de preos foi relativamente legada aos mercados futuros de leo.

A diviso entre profundidade de guas rasas, guas profundas e guas ultra-profundas feita por critrios no rgidos, sendo assim varivel por empresa ou instituio. No Brasil, a Petrobras considera guas rasas como aquelas de lmina dgua inferior a 400 metros de profundidade, guas profundas como superior a 400 metros de profundidade, e guas ultra-profundas como de lmina dgua superior a 1000 metros. As empresas britnicas, BP-Amoco e Shell, por exemplo, consideram guas profundas como acima de 500 metros de profundidade de lmina dgua (DOUGLAS WESTWOOD, 2002). 25

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O contrachoque da OPEP teve sua origem na

diviso da OPEP em dois grupos

diferenciados de pases-membros: o primeiro, simbolizado sobretudo pela Arbia Saudita, tem reservas de petrleo em abundncia suficiente para manter um horizonte de produo no longo prazo por muitas dcadas, ou seja, indicador Reservas/Produo muito alto (conceito a ser exposto no captulo seguinte). Para os pases deste grupo, no o mais vantajoso manter os preos de petrleo em demasia altos, pois assim haveria incentivo econmico para investimentos de E&P em reas no-OPEP, de maior custo de produo por barril, e para investimentos para substituio no mdio e longo prazos do petrleo por outras fontes de energia. Assim, tais pases buscam reproduzir o padro petrleo de consumo energtico mundial por muitas dcadas, e maximizar sua renda petrolfera no longo prazo. J o segundo grupo de pases, representado por exemplo pelo Equador (que mais tarde decidiu retirar-se da OPEP), tem como caractersticas a posse de reservas de petrleo relativamente pequenas em comparao aos membros da OPEP de maior dotao, de modo que objetivam maximizar sua renda petrolfera no mdio prazo. Conforme a produo de leo no-OPEP crescia na dcada de 1980, e esta organizao se via obrigada a diminuir sua oferta para manter os preos nos patamares estabelecidos, e assim manter estveis seu market share e sua renda petrolfera mdia por barril, a Arbia Saudita ia assumindo a responsabilidade pela diminuio na oferta, em razo de ser de longe o maior produtor mundial; os pases que desejavam maximizar sua renda petrolfera no curto prazo no aceitavam a reduo de suas cotas no total de produo da OPEP. No ano de 1986, a Arbia Saudita no mais suportou tal responsabilidade, e aumentou muito a sua oferta, derrubando os preos de petrleo para cerca de US$ 10 por barril. Este evento ficou conhecido como o contra-choque de petrleo. Os ganhos das companhias de petrleo seguiram de perto a tendncia de queda dos preos de petrleo aps o contra-choque, o que determinou maiores nveis de endividamento destas companhias e produziu a necessidade de financiamento externo para suprir necessidades operacionais. Nos anos 90, estas empresas voltaram a ter seus nveis de endividamento bastante reduzidos em funo da volta dos preos de petrleo a patamares mais elevados, com pico de cerca de US$ 40, quando do evento da Guerra do Golfo Prsico. No ambiente empresarial petrolfero da dcada de 90, as alianas estratgicas evoluram para cobrir todos os ramos da cadeia. O segmento que alavancou mais perspectivas nesseO papel de swing producer pode ser definido como o papel da Arbia Saudita de gerenciador da quantidade produzida pelo cartel em direo s cotas estabelecidas, atravs de sua margem de capacidade produtiva de leo. 2615

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sentido foi o de E&P, na medida em que o incremento das reservas provadas, sobretudo para explorao offshore, tambm trouxe incremento nas reservas de gs natural. Esta foi a dcada de pice da onda de fuses e aquisies, tendo dado origem s super-majors conforme so conhecidas hoje: conforme j mencionado, British Petroleum Amoco, Chevron Texaco, Total Fina Elf e Exxon Mobil surgiram neste perodo pela unio de majors anteriores. A razo preponderante desta unio o fato de as empresas buscarem aumentar suas escalas e horizontes de produo no futuro mais imediato, sem incorrer em custos de aumentados esforos exploratrios. Este contnuo aumento da produo de petrleo em razo do maior nmero de regies produtoras contribuiu decisivamente para a j citada comoditizao do petrleo. Os enormes esforos exploratrios no perodo ps-choque elevaram as reservas provadas mundiais em 58,76% no perodo 1980-2002, chegando a uma relao reservas/produo de 40,6 anos em 2002 (British Petroleum, 2003, disponvel em ). Cabe destacar o contnuo aumento da participao do leo offshore no total, e uma melhor distribuio geogrfica do esforo exploratrio, reduzindo o direcionamento deste esforo para os pases da OPEP. Tal mudana de padro da atividade de E&P foi bem-sucedida em maior parte pela poltica energtica dos pases maiores demandantes de petrleo e pelas estratgias das empresas petrolferas. Entretanto, cabe ressaltar que, em nmeros absolutos, a rea da OPEP continua de longe superior no que tange abundncia de reservas e competitividade via eficincia de custos, auferindo os maiores montantes da renda diferencial petrolfera mundial (BOUSSENA, 1994). Desta maneira, pode-se sumariar as caractersticas que aparecem no padro atual de concorrncia inter-estados nacionais da indstria (op. cit., 2001), como se segue. Por um lado, h uma desproporcionalidade geogrfica considervel entre o custo marginal de produo de longo prazo, sobretudo entre as reas do Oriente Mdio (e OPEP) e as dos pases grandes consumidores. Esta desproporcionalidade pressionada pelo fato de os EUA, maior economia nacional responsveis por do mundo, altamente intensiva no consumo de petrleo16, serem 25% da demanda mundial por petrleo, o que salienta a importncia

substancial para a indstria de petrleo que a conjuntura macroeconmica deste pas tem. A partir de meados da dcada de 50, os EUA passaram a ser importadores lquidos de petrleo, e atualmente tem uma dependncia de cerca de 52% de petrleo importado.

Os EUA so o pas de maior participao do petrleo na matriz energtica nacional, em todo o mundo industrializado. 27

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Por outro lado, o aumento da competio, em razo da produo mundial advinda tanto de novas regies e companhias produtoras, tais como Rssia, China e Costa da Amrica Latina, quanto de majors privadas e estatais no-OPEP, que vm seguindo uma tendncia em direo abertura de capital desde os anos 90. Nesta dcada, deu-se um grande nmero de processos de abertura e flexibilizao de indstrias petrolferas nacionais, ao redor do mundo, de maneira a permitir investimentos privados na indstria de petrleo destes pases, nos quais estas indstrias se configuravam antes como monoplios estatais institucionalizados. Por fim, cabe considerar o papel decisivo da regio da OPEP na indstria de petrleo. Em 2002 a OPEP detinha 78,2% das reservas mundiais provadas de petrleo, 38,4% da produo total mundial, e, o ponto no qual est centrada sua importncia, cerca de 65-70 % do comrcio internacional de leo cru (Fonte: British Petroleum, disponvel em ). No bastasse unicamente o poder de convencimento destes nmeros, deve-se considerar que como as reservas de hoje so a produo futura, esta diferena entre os shares de reservas e produo da OPEP implica no crescimento contnuo de seu indicador R/P (reservas provadas/ produo corrente) vis-a-vis as demais regies produtoras mundiais, e consequentemente o aumento de seu share nas reservas mundiais. Logo, a importncia central da OPEP na indstria mundial de petrleo uma verdade inexorvel independentemente do recorte futuro a considerar, a despeito de alguns analistas considerarem a falta de harmonia poltica dos membros como um fator desestabilizador do poder de controle do grupo, o que no corroborado pela observao real do share da OPEP nas reservas mundiais e no comrcio internacional de leo cru. O fator realmente determinante da posio da OPEP o percentual do petrleoOPEP no comrcio mundial de petrleo, cerca de 65-70%, e a tendncia de crescimento do seu indicador Reservas/Produo a longo prazo. Isto implica em margem de manobra para a organizao manter e mesmo elevar, via mecanismo de alteraes na oferta, sua banda de variao dos preos de petrleo, atualmente de US$ 21 a US$ 28 por barril, para valores mais elevados.17

A banda de variao o intervalo de preos estipulado pela OPEP, para o qual o preo no est baixo o suficiente para dilapidar sua renda petrolfera, nem alto o suficiente para induzir a entrada no mercado de produtores marginais ou investimentos em fontes alternativas de energia, o que reduziria seu share na oferta mundial de energia (BOUSSENA, 1994). Desde o contra-choque de petrleo, a poltica da OPEP tem sido de gerenciar sua oferta para manter os preos do barril entre esta faixa de variao. 28

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I.3 A Dinmica Atual de Formao de Preos

Conforme j mencionado, a fixao de preos de petrleo a partir dos choques passou a depender quase totalmente do mecanismo Oferta X Demanda, com destaque para o poder da OPEP em influenciar as cotaes atravs de alteraes na oferta. As cotaes so expressas diariamente nos mercados futuros e spot e tomam como referncia cinco tipos de cru, chamados de petrleos de referncia ou marcadores: Brent (Reino Unido), Alaskan North Slope e WTI-West Texas Intermediate (EUA), Dubai e Tapis (sia-Pacfico). As variaes dos preos destes tipos de leo apresentam elevadssimo coeficiente de correlao entre si (altssimo coeficiente de aderncia ao serem plotados em regresso linear no plano cartesiano).18 Entretanto, o baixo volume de oferta fsica dos tipos de referncia vis--vis produo total de petrleo e ao valor dos paper transactions conectados a eles apresenta dois tipos de risco que definem a alta volatilidade dos preos: a excessiva determinao da produo total por produtores marginais; e o risco de manipulao dos preos de referncia (BUSH e JOHNSTON, 1998). Assim, para suprir as necessidades da indstria de petrleo e de outras indstrias, os mercados financeiros desenvolveram uma variedade de produtos para gerenciar riscos associados com variaes de preos, juros e taxas de cmbio. Existem basicamente quatro meios para gerenciar tais riscos: contratos a termo, futuros, opes e swaps. Contratos futuros e opes de contratos futuros surgiram para proteo (hedge) contra movimentos adversos nos preos do leo cru e de derivados, e so negociados nos vrios mercados globais. Foram iniciados na praa do New York Merchantile Exchange (NYMEX) em 1996. Entretanto, em anos anteriores, umas poucas firmas j ofereciam opes do tipo over-the-counter (OTC). Contratos a termo so contratos que garantem que uma companhia produtora vai vender algo de sua produo em uma transao a ser virtualmente concretizada em uma data futura. Os termos do acordo (preo, data de entrega, volume, origem geogrfica do leo, etc.) so negociados em particular (no em mercados organizados tipo bolsa de commodities). Os objetivos dos agentes podem ser especulativos, ou de intermediao, onde o comprador vendedor em outro contrato, ou ambos os agentes podem estar na indstria deA relao entre os tipos marginais de petrleo no mercado internacional se d da seguinte forma: o preo de barril de uma dada variante Y de petrleo estabelecido em contrato de entrega futura entre comprador e vendedor como sendo o preo de um tipo de referncia, digamos o Brent, mais um dado valor que embute o diferencial de qualidade entre as duas variantes de petrleo, sendo este valor estvel, de pequena varincia. 2918

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petrleo (por exemplo, quando um comprador uma refinaria que quer assegurar um suprimento confivel de leo cru). Contratos a termo so semelhantes aos contratos futuros ao se basearem em datas futuras de vencimento. Os contratos futuros so diferenciados por serem padronizados e negociados em bolsa (impessoais), tendo portanto fins especulativos de preo, e um mercado secundrio lquido. Os preos so os nicos termos contratuais que no so padronizados. Apenas uma mdia de 1 a 3% dos contratos futuros de petrleo chega a resultar numa transferncia real de mercadorias (op. cit., 1998). A diferena entre o preo na abertura do contrato e este no seu fechamento determina o resultado da operao. Este valor determina dbito ou crdito para o operador. Entretanto, movimentos de preo no so aleatrios, uma vez que seguem a tendncia do preo formada no mercado fsico, graas ao fato de ser possvel a ocorrncia de operaes de arbitragem. Alguns dos mercados que transacionam contratos futuros de energia so a NYMEX, o International Petroleum Exchange em Londres, o Singapore International Monetary Exchange, e o Rotterdam Energy Futures Exchange. Opes incluem tanto puts (opes de venda) e calls (opes de compra). Uma opo de compra de petrleo designa o direito de compra (do produto fsico ou de um contrato futuro) a uma data especfica (maturidade ou data de exerccio) e a um preo especfico (strike price ou preo de exerccio). O termo direito de compra refere-se ao fato de o portador do contrato ter a opo de exercer o direito de compra ou no; se o preo no mercado vista estiver menor que o strike price, naturalmente no exercer o direito de compra. O detentor de uma opo de venda poder exerc-la pelo strike price, e a exercer caso o strike price seja superior ao preo vista. O fato de o portador de uma opo ter um direito implica em uma obrigao para o lanador da opo (BODIE e MERTON, 1999). Swaps so instrumentos flexveis, atravs dos quais dois agentes concordam em comercializar algum ativo-objeto por um perodo especificado de tempo. Um swap de petrleo um swap de commodity, comumente envolvendo um produtor e um consumidor de leo. Uma instituio financeira age como intermediria, permitindo anonimato para as partes envolvidas. Uma hiptese seria um produtor que espera que os preos caiam, pagando ento um preo varivel por barril para o intermedirio, baseado em um ndice e depois recebendo um preo fixo em retorno. O consumidor de petrleo, uma refinaria, temendo um aumento nos preos, pagar o preo fixo e receber o preo varivel atravs da instituio que esteja atuando como intermediria. O produtor capaz de fixar o preo do leo que ir produzir, protegendo-se contra um declnio do preo vista. A outra parte, a refinaria, protegida de uma subida do

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preo vista de petrleo. Ambos os agentes desistem de sua oportunidade de se beneficiar de movimentos favorveis no preo para diminuir o seu risco. A existncia de tais mercados atenua em considervel medida o elevadssimo nvel de barreiras entrada e diminui o custo de especulao. Por fim, pode-se sumariar as razes para a atual vigncia do mecanismo Oferta versus Demanda prevalecer no mercado de petrleo como sendo fruto do menor grau de concentrao da oferta. Tais mudanas foram resultado da fragmentao das unidades decisrias tambm pelo lado da demanda. Primeiramente, devido expanso da base de consumidores, e entrada de novos atores; em segundo lugar, em funo da maior disperso geogrfica da produo e das unidades exportadoras. Cada uma dessas razes contribui para uma aderncia cada vez maior entre volatilidade de preos e variaes na oferta e na demanda. Ainda assim, instabilidade e incerteza so fatores chave na atual dinmica da indstria mundial de petrleo ao alterarem o nvel de confiana dos agentes nas suas previses sobre os movimentos futuros de preos, impactando os nveis de gasto em capital (investimentos, de uma forma geral), que so fortemente relacionados ao preo do petrleo. O nvel de preos corrente na indstria do petrleo de fato o fator de maior relevncia na deciso de investir em E&P a ser tomada no momento corrente. Considerando as caractersticas dos investimentos em E&P no que concerne ao seu prazo de maturao e aos valores envolvidos, a volatilidade do preo um fator crtico para a determinao destes investimentos considerando um dado recorte temporal. Neste aspecto explicitada a importncia da OPEP como fator estabilizador da variao de preos.

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CAPTULO II A DETERMINAO DOS INVESTIMENTOS EM EXPLORAO E PRODUO

Este captulo discorre sobre os determinantes dos investimentos em E&P de petrleo, ou upstream, e suas caractersticas no que tange a objetivos, custos e riscos associados. vlido notar que os investimentos em E&P de gs natural so indissociveis dos investimentos em E&P de petrleo, pois a tecnologia, os equipamentos e os processos so os mesmos, alm do fato de parte das reservas mundiais de gs natural se encontrar em reservatrios nos quais o gs est associado a petrleo (o chamado gs associado); no Brasil, por exemplo, atualmente 77,88% da produo de gs de gs associado (Fonte: ANP, Anurio Estatstico 2003, disponvel em ). 19 Como quaisquer grandes empresas, as companhias petrolferas fazem anlises de retorno financeiro para otimizar a alocao do seu capital nas diversas oportunidades de investimento, sendo estas anlises baseadas tanto nos conhecidos mecanismos usuais de anlise por fluxo de caixa esperado, como valor presente lquido (NPV), taxa interna de retorno (IRR) e payback descontado, quanto em mecanismos mais modernos de anlise de risco e avaliao de investimentos. Entretanto, as atividades de E&P de petrleo tm singularidades que as distinguem frontalmente de quaisquer outras atividades econmicas, tendo a deciso de investir nesta atividade uma estrutura decisria diferenciada e altamente complexa. O segmento E&P o mais relevante da cadeia petrolfera no que tange a riscos, barreiras entrada, montante de capital requerido e, sobretudo, gerao de valor agregado (renda diferencial petrolfera), afetando profundamente o comportamento estratgico dos agentes. O segmento E&P pode ser dividido em trs diferentes sub-segmentos: a explorao, ou seja, o conjunto de operaes ou atividades destinadas a fazer a avaliao de reas, com vistas identificao de jazidas de petrleo; o desenvolvimento de campos, que o conjunto de atividades com vistas a adequar o campo para as atividades de produo de petrleo; e a produo, que o conjunto de atividades de extrao de petrleo de uma jazida e de preparo para o seu transporte; este ltimo designa o incio do segmento downstream da cadeia, composto de transporte do petrleo cru, refino, distribuio e comercializao de derivados.

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No que concerne aos impactos dos investimentos em E&P sobre produo, reservas e importaes, sero discutidos neste trabalho os impactos relativos apenas ao hidrocarboneto petrleo, dado que este hidrocarboneto o tema central do trabalho. 32

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Os investimentos em E&P se norteiam na comparao entre os custos da atividade de desenvolvimento de infra-estrutura local, mapeamento e desenvolvimento das jazidas de fronteira e nova produo, e as rendas diferenciais auferveis da atividade petrolfera. A varivel decisria primordial dos investimentos neste segmento da cadeia petrolfera a tendncia de curto e longo prazos do preo do petrleo, pois ao subir o preo do petrleo, produtores que no teriam boa margem de lucro por barril produzido a preos mais baixos passariam a t-la, e sua produo seria viabilizada; analogamente, preos baixos de petrleo podem ser menores que o custo marginal de extrao do barril de produtores de maior custo, inviabilizando sua produo. Alm do fator preo, tm importncia as expectativas quanto evoluo temporal da demanda, a evoluo da fronteira tecnolgica hoje no que tange explorao offshore em guas cada vez mais profundas, as caractersticas particulares dos pases alvos dos investimentos20; e a manuteno de um nvel estvel de reproduo econmica das reservas, conceito tratado a seguir. Estas so as variveis decisrias dos investimentos em E&P das companhias petrolferas.

II.1 - A Mensurao das Reservas e a Taxa de Descoberta tima

Para mensurar quantitativamente a disponibilidade de leo, so utilizados os conceitos de recursos, reservas e capacidade de produo disponvel sustentvel, tambm designado como reproduo econmica das reservas. O conceito de recursos define a disponibilidade de leo passvel de extrao, em condies economicamente no comerciais e presumveis de extrao num futuro indefinido. O conceito de reservas designa o volume de leo passvel de ser economicamente extrado de uma jazida com a tecnologia ento disponvel, de acordo com trs nveis de exatido na mensurao dos limites de quantidade: reservas provadas, identificadas com total exatido sobre dimenso, localizao e qualidade; reservas provveis, cuja identificao de exatido menor; e reservas possveis, estimadas de volumes de leo a partir do estgio inicial de prospeco (anterior perfurao), com baixo nvel de exatido. Recursos e reservas so conceitos que identificam os limites de produo de petrleo, cujos nveis e variaes influenciam e so influenciados pela dinmica das relaes entre custos e preos no mdio e longo prazos da indstria. A dinmica da indstria de petrleo no20

Estas so basicamente seu nvel de tributao e o seu potencial para esta atividade, determinado pelas condies de acesso s jazidas, custos, e estabilidades poltica, regulatria e macroeconmica. 33

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curto e mdio prazos determinada por um terceiro conceito de cunho operacional, que a capacidade de produo disponvel sustentvel ou reproduo econmica das reservas. Esta capacidade representada pela razo entre reservas e produo, designada R/P (reservas provadas e fluxo de produo por um dado perodo de tempo, ex: ms, ano, etc.). Mensurado em unidades de tempo (ex: anos), o indicador R/P muitas vezes mal usado como indicao do tempo de vida til dos poos, quando na verdade deve ser encarado como uma indicao das polticas de explorao das companhias, e no como algo fora de sua influncia (pelo menos at que os recursos restantes coincidam com o volume de reservas provadas). Do ponto de vista da manuteno da posio das companhias no longo prazo, os investimentos em E&P so determinados pela manuteno de uma taxa R/P constante (reservas/produo), de modo a garantir a continuao de um nvel satisfatrio de produo no longo prazo e uma posio competitiva confortvel da empresa. A utilizao do termo constante bastante correta: atualmente, em razo dos crescentes custos de explorao, as empresas petrolferas s investem na explorao de novas reservas para que estas se mantenham no nvel mnimo necessrio para a manuteno do seu horizonte de longo prazo. O conceito de reproduo econmica das reservas depende assim das descobertas de novas reservas, do volume de investimentos em explorao e desenvolvimento nos campos e na infra-estrutura necessria para a produo de petrleo. O ritmo timo de descoberta -R/P mantido constante- pode ser representado pela seguinte frmula (PERCEBOIS, 1989): (1) R (t + 1) = R(t) + D(t) - P(t) , considerando que : R= reservas ; R(t) = volume de reservas provadas em um dado ano t D(t) = P(t) . (1 + r . n) = volume de descobertas no ano t n = taxa de crescimento da demanda r = reservas / produo = R(t) / P(t) P(t) = produo como funo do tempo (cresce de acordo com n) A frmula 1 pode ser alternativamente representada como:

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(2) R (t + 1) = R(t) + P(t) [(1 + n . R/P ) 1] Esta frmula a representao do previamente exposto sobre a manuteno do R/P constante: pode-se dizer que, ceteris paribus (considerando um dado volume de reservas provadas e um nvel de produo dado, e estabilidade de preos), a estratgia tima de investimentos das companhias seria, aquela que teria como alvo a reposio anual das reservas em montante equivalente ao volume extrado anualmente. Obviamente, tal proposio considera como dados os volumes de produo e de demanda. Investimentos exploratrios em expanso da capacidade produtiva, em um ambiente de queda de demanda, podem levar a uma competio via preos entre os produtores antigos, que tentariam expulsar os novos produtores, pois estes estariam diminuindo o market share dos primeiros. Esta foi a situao caracterstica da indstria de petrleo entre os anos de 1983 e 1986 (CLO, 2000). A obteno de reservas de petrleo em intensidade economicamente vivel s pode ser comprovada aps bem-sucedido esforo exploratrio (at a efetiva perfurao), no podendo ser certificada probabilisticamente a priori com 100% de exatido. Tal fato confere a esta indstria uma estrutura singular de risco de investimento.

II.2 - A Estrutura de Riscos do Segmento Explorao e Produo

O processo exploratrio s pode ser considerado bem-sucedido aps a perfurao. Ademais, a confirmao da rentabilidade de um investimento depende no s do sucesso exploratrio, como tambm dos nveis de preos atuais e futuros (op. cit., 1998). Assim sendo, a estrutura de riscos ma indstria de petrleo diferente das existentes em qualquer outra atividade: alm dos riscos normais (preo, demanda, desastres, etc.), inclui o risco geolgico decorrente da incerteza dos resultados da explorao, e tambm o risco geopoltico internacional, associado s incertezas da evoluo poltico-institucional dos pases hospedeiros. Esta estrutura de riscos leva as empresas a priorizar a manuteno da sua atividade a longo prazo ao invs da realizao de lucros a curto prazo. O horizonte de longo prazo leva as firmas a provisionarem o montante de capital necessrio com os custos dos investimentos nas atividades E&P: os montantes investidos geograficamente (share por pas) correspondem a decises oramentrias das companhias realizadas no incio de cada ano (CLO, 2000).

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Em resumo, os riscos associados aos investimentos nas atividades relacionadas ao segmento E&P so determinados pelo capital total disponvel, pelo tamanho e grau de integrao entre as empresas, e pelos riscos peculiares desta indstria. O elevado nvel de risco agregado e os altos custos fixos (em grande parte sunk costs ou custos irrecuperveis) tornam assim muito complexa a deciso de investir das empresas petrolferas, resultando no fato de as atividades E&P serem marcadas usualmente por considerveis altos nveis de autofinanciamento por parte das companhias, entre 70 e 80%21. Obviamente, requerida a operao em grande escala, pois a necessidade de economias de escala determinada pelos altos custos fixos. Estas economias se do pois, conforme j mencionado, os custos fixos da produo so altos, e o custo mdio reduz-se ao se aumentar o tamanho da planta e o volume de produo. No caso da indstria de petrleo, a importncia destes conceitos ocorre a partir da existncia de ativos indivisveis na, que requerem altssimo dispndio de implantao: quanto maiores e mais dispendiosas forem estas instalaes, maior ser seu custo fixo e menor seu custo marginal de produo.

II.3 - A Estrutura de Custos do Segmento Explorao e Produo

A indstria de petrleo, em particular o segmento E&P, altamente intensiva em capital e em tecnologia, sendo marcada por bens de capital e servios tecnolgicos de altssima especificidade, alguns de natureza indivisvel, o que implica na necessidade de certo nvel de integrao de mdio e longo prazo entre empresas investidoras em E&P e empresas fornecedoras de bens e servios de produo a estes investimentos. Em indstrias deste tipo, destaca-se a importncia da chamada economia de integrao: em todas as indstrias cujos investimentos se baseiam em ativos de alta especificidade, a obteno destes ativos no mercado implica em grandes custos transacionais entre agentes, os chamados custos de transao (FIANI, 2002); ao se proceder integrao vertical entre investimento e fornecimento de bens de capital e servios de produo, atravs de mecanismos como contratos de longo prazo, internalizao na firma da produo dos insumos, ou fuses e aquisies, procede-se realizao de importantes economias de integrao, ou economias de custos de transao. No que tange a economias de escopo, estas so mais relevantes ao segmento downstream da cadeia de petrleo, em funo de se ter refino, transporte, distribuio e comercializao de derivados de leo conduzidos a partir da mesma logstica21

Entretanto, os investimentos em E&P podem ter seu nvel de risco parcialmente reduzido, notadamente pela explorao de blocos via consrcios entre empresas. 36

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operacional.22 No que tange ao segmento E&P, economias de escopo so relacionadas produo conjunta de petrleo e gs natural a partir de uma mesma jazida de leo e gs natural, o que se d quando a jazida de gs natural associado e h infra-estrutura de transporte e escoamento de gs natural.23 A indstria de petrleo tem uma alta razo entre custos fixos e custos variveis, conforme j mencionado, em razo de os custos rotineiros de produo serem bastante reduzidos quando comparados ao dispndio de capital requerido pelos investimentos em explorao e desenvolvimento dos campos. A razo entre custos de produo fixos e variveis em mdia 4; nas piores condies de produo, chegam a 1 (op. cit., 2000). Logo, o custo marginal tende a ser menor que o custo mdio e o custo total mdio de produo tende a diminuir com o aumento do volume extrado de um poo, indicando a dependncia de economias de escala. Isto leva as empresas a acelerarem o quanto possvel a extrao de um poo, at onde esta acelerao no seja prejudicial s condies de extrao futura no poo (ou predatria). Tal acelerao se d tambm por uma questo referente ao payback do investimento, indicador cujo encurtamento buscado pelas empresas (ABREU e STEPHAN, 1982). Uma classificao importante diz respeito ao conceito temporal de custo de explorao na indstria. Alm do conceito de custo econmico, referente capacidade produtiva atual, e indicando a soma de custos para extrair um barril, cabe tambm, considerar o custo de reproduo econmica das reservas. Este considera o custo de um barril produzido no futuro e pode ser representado pela seguinte frmula (CLO, 2000):Ao longo da cadeia de valor da indstria de petrleo, o segmento downstream preso ao segmento E&P. A maior parte das refinarias de petrleo existentes no mundo pertence aos grandes grupos petrolferos e est desta forma integrada verticalmente ao E&P e distribuio de derivados; as refinarias recebem o leo advindo das atividades de E&P de sua prpria empresa proprietria. As refinarias que no pertencem aos grandes grupos petrolferos, chamadas independentes, recebem o leo que processam a partir de contratos de fornecimento de mdio prazo. Deve-se notar que o segmento downstream muito mais dependente de economias de escala e escopo do que o E&P, de modo que no mundo h muitssimas jazidas de petrleo em produo, entretanto menos de oitocentas refinarias. Um outro problema do refino a sua rigidez tecnolgica: ao ser equipada para realizar determinados processos de refino, uma refinaria estar restrita utilizao de um determinado conjunto de variantes de petrleo. 23 Em funo da no-estocabilidade do gs natural e da grande complexidade da deciso de investir em redes de transporte e distribuio deste hidrocarboneto, grande parte do gs natural extrado no mundo no escoado e comerc