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§ 02.4 – CONCURSO DE AGRAVANTES E ATENUANTES Alexandre Ramalho de Farias 1 Luiz Carlos Hallvass Filho 2 Sumário: 1. Referência Jurisprudencial. 2. O Caso. 3. Os Fundamen- tos da Decisão. 4. Problematização. 5. Referências. 1 REFERÊNCIA JURISPRUDENCIAL Supremo Tribunal Federal. 2 a Turma. Habeas Corpus 101.909/MG. Rel. Min. Ayres Britto. Data do julgamento: 28.02.2012. 2 O CASO Em relação à aplicação da pena, chamam a atenção sucessivas (diversas) decisões recentes e contraditórias do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça afetas ao concurso de circunstâncias agravantes e atenuantes. Neste tema, destaca-se a constante mudança de entendimento que evidencia a ausência de critérios técnicos de dogmática jurídico-penal ou mesmo de política criminal. A 2ª Turma do STF, no julgamento do HC 101909 (objeto de análise neste artigo) entendeu que a atenuante da confissão compensa a agravante da reincidência. Em sentido contrário, a mesma 2ª Turma do STF, no julgamen- to do HC 108138 (29/11/2011) – decidiu que “(…) igualmente sedimen- tado é o entendimento de que, nos termos do art. 67 do Código Penal, a agravante da reincidência prepondera sobre a atenuante da confissão 1 Promotor de Justiça do Estado do Paraná e Doutorando em Ciencias Jurídicas y Polí- ticas na Universidad Pablo de Olavide, Sevilla/Espanha. 2 Promotor de Justiça do Estado do Paraná. Especialista em Direito Processual Civil. Mestrando em Criminologia Forense pela UCES, Buenos Aires, Argentina.

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Teoria da Pena

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§ 02.4 – CONCURSO DE AGRAVANTES E ATENUANTES

Alexandre Ramalho de Farias1 Luiz Carlos Hallvass Filho2

Sumário: 1. Referência Jurisprudencial. 2. O Caso. 3. Os Fundamen-

tos da Decisão. 4. Problematização. 5. Referências.

1 REFERÊNCIA JURISPRUDENCIAL

Supremo Tribunal Federal. 2a Turma. Habeas Corpus 101.909/MG. Rel. Min. Ayres Britto. Data do julgamento: 28.02.2012.

2 O CASO

Em relação à aplicação da pena, chamam a atenção sucessivas (diversas) decisões recentes e contraditórias do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça afetas ao concurso de circunstâncias agravantes e atenuantes. Neste tema, destaca-se a constante mudança de entendimento que evidencia a ausência de critérios técnicos de dogmática jurídico-penal ou mesmo de política criminal.

A 2ª Turma do STF, no julgamento do HC 101909 (objeto de análise neste artigo) entendeu que a atenuante da confissão compensa a agravante da reincidência.

Em sentido contrário, a mesma 2ª Turma do STF, no julgamen-to do HC 108138 (29/11/2011) – decidiu que “(…) igualmente sedimen-tado é o entendimento de que, nos termos do art. 67 do Código Penal, a agravante da reincidência prepondera sobre a atenuante da confissão 1 Promotor de Justiça do Estado do Paraná e Doutorando em Ciencias Jurídicas y Polí-

ticas na Universidad Pablo de Olavide, Sevilla/Espanha. 2 Promotor de Justiça do Estado do Paraná. Especialista em Direito Processual Civil.

Mestrando em Criminologia Forense pela UCES, Buenos Aires, Argentina.

Alexandre Ramalho de Farias / Luiz Carlos Hallvass Filho

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espontânea, razão pela qual é inviável a compensação entre circunstân-cias agravantes e atenuantes”.

Em síntese, este também é o entendimento da 1ª turma, que, no julgamento do HC 106113 (18/10/2011), decidiu que “A reincidência é uma agravante que prepondera sobre as atenuantes, com exceção daque-las que resultam dos motivos determinantes do crime ou da personalida-de do agente, o que não é o caso da confissão espontânea”.

No STJ a divergência se repete. Enquanto a 6ª Turma entende, desde o julgamento do HC 94051/DF (2008), que é cabível a compensa-ção entre a agravante da reincidência com a atenuante da confissão es-pontânea, a 5ª Turma posiciona-se no sentido de que não é admissível a compensação em questão, devendo prevalecer a reincidência dado o seu caráter preponderante.

Para analisar o tema, vamos selecionar um dos polêmicos julga-dos citados acima, especificamente o Habeas Corpus 101.909/MG, sendo relator o Ministro Ayres Britto que, como dito, admitiu que a confissão é uma circunstância preponderante e como tal poderia ser admitida para compensar a agravante da reincide ncia.

Vejamos o julgado.

Habeas corpus. Dosimetria da pena. Concursos de circunsta ncias atenuantes e agravantes. Prepondera ncia. Confissão esponta nea. Compensac ão com a agravante da reincide ncia. Ordem concedi-da. 1. A Constituic ão Federal assegura aos presos o direito ao si-le ncio (inciso LXIII do art. 5º). Nessa mesma linha de orientac ão, o Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos (Pacto de São José da Costa Rica) institucionaliza o princípio da “não-auto-incriminac ão” (nemo tenetur se detegere). Esse direito subjetivo de não se auto-incriminar constitui uma das mais eminentes formas de densificac ão da garantia do devido processo penal e do direito à presunc ão de não-culpabilidade (inciso LVII do art. 5o da Constituic ão Federal). A revelar, primeiro, que o processo penal é o espac o de atuac ão apro-priada para o órgão de acusac ão demonstrar por modo robusto a au-toria e a materialidade do delito. r gão que não pode se esquivar da incumbe ncia de fazer da instruc ão criminal a sua estratégia oportuni-dade de produzir material probatório substancialmente sólido em termos de comprovac ão da existe ncia de fato típico e ilícito, além da culpabilidade do acusado. 2. A presunc ão de não-culpabilidade trata, mais do que de uma garantia, de um direito substantivo. Direito mate-rial que tem por conteúdo a presunc ão de não-culpabilidade. Esse o bem jurídico substantivamente tutelado pela Constituic ão; ou seja, a presunc ão de não-culpabilidade como o próprio conteúdo de um di-reito substantivo de matriz constitucional. Logo, o direito à presunc ão de não-culpabilidade é situac ão jurídica ativa ainda mais densa ou de

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mais forte carga protetiva do que a simples presunc ão de inoce ncia. 3. O Supremo Tribunal Federal tem entendido que não se pode rela-cionar a personalidade do agente (ou toda uma cro nica de vida) com a descric ão, por esse mesmo agente, dos fatos delitivos que lhe são debitados (HC 102.486, da relatoria da ministra Cármen ú cia; HC 99.446, da relatoria da ministra Ellen Gracie). Por outra volta, não se pode perder de vista o caráter individual dos direitos subjetivo-constitucionais em matéria penal. E como o indivíduo é sempre uma realidade única ou insimilar, irrepetível mesmo na sua condic ão de microcosmo ou de um universo à parte, todo instituto de direito penal que se lhe aplique – pena, prisão, progressão de regime penitenciário, liberdade provisória, conversão da pena privativa de liberdade em restritiva de direitos – há de exibir o timbre da personalizac ão. Quero dizer: tudo tem que ser personalizado na concreta aplicac ão do direi-to constitucional-penal, porque a própria Constituic ão é que se deseja assim orteguianamente aplicada (na linha do “Eu sou eu e minhas circunsta ncias”, como sentenciou Ortega Y Gasset). E como estamos a cuidar de dosimetria da pena, mais fortemente se deve falar em per-sonalizac ão. 4. Nessa ampla moldura, a assunc ão da responsabilida-de pelo fato-crime, por aquele que tem a seu favor o direito a não se auto-incriminar, revela a conscie ncia do descumprimento de uma norma social (e de suas conseque ncias), não podendo, portanto, ser dissociada da noc ão de personalidade. 5. No caso concreto, a leitura da sentenc a penal condenatória revela que a confissão do paciente, em conjunto com as provas apuradas sob o contraditório, embasou o juízo condenatório. Mais do que isso: as palavras dos acusados (entre eles o ora paciente) foram usadas pelo magistrado sentenciante para rechac ar a tese defensiva de delito meramente tentado. É dizer: a con-fissão do paciente contribuiu efetivamente para sua condenac ão e afastou as chances de reconhecimento da tese alinhavada pela própria defesa técnica (tese de não consumac ão do crime). O que re-forc a a necessidade de desembarac ar o usufruto máximo à sanc ão premial da atenuante. Assumindo para com ele, paciente, uma postura de lealdade (esse vívido conteúdo do princípio que, na cabec a do art. 37 da Constituic ão, toma o explícito nome de moralidade). 6. Ordem concedida para reconhecer o caráter preponderante da confissão es-ponta nea e determinar ao Juízo Processante que redimensione a pena imposta ao paciente.

3 OS FUNDAMENTOS DA DECISÃO

O acórdão em questão considerou que a confissão é circuns-ta ncia atenuante de grande relevância pelo prisma de que ninguém é obri-gado a se autoincriminar. Assim, abrir mão desta garantia, em especial no caso concreto em que a confissão foi fundamental para a condenac ão, não pode deixar de ser considerada circunsta ncia preponderante.

(41) 3352-1200 - [email protected]

w w w . j u r u a . c o m . b r

Coordenador: Paulo César Busato

Organizador: Alexey Choi Caruncho

ISBN: 978853624724-3

Número de Páginas: 520

* Preço sujeito à alteraçãosem aviso-prévio

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