x anped sulxanpedsul.faed.udesc.br/arq_pdf/1456-0.pdfnão basta só ter vontade! diálogos sobre os...

17
 X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014.                                                                            p.1         Não basta  ter vontade! Diálogos sobre os sentidos do curso de tecnologia em produção cênica da Universidade Federal do Paraná     Resumo O propósito do presente artigo é compreender os sentidos do Curso Superior de Tecnologia em Produção Cênica para os estudantes da área, considerando que essa formação é recente na esfera universitária e sendo a Universidade Federal do Paraná a primeira universidade pública a instaurar o curso. Como metodologia optei pela análise enunciativa de uma publicação na página da rede social Facebook, postada por um estudante do curso. No enunciado, o discente, logo após uma aula, expõe na rede suas expectativas e reflexões sobre o que é ser produtor cênico, sendo possível perceber os anseios do futuro profissional em relação à Universidade, ao mercado de trabalho e à atividade que se pretende exercer, principalmente por ser uma profissão em busca de reconhecimento. Por compreender que as palavras e a língua estão ligadas pela história, optei como aporte teórico da pesquisa a perspectiva de Bakhtin e o Círculo. Na fundamentação utilizome dos conceitos da teoria da enunciação na busca da compreensão dos diálogos produzidos nos enunciados dos estudantes com seus interlocutores e recorro à concepção de gêneros discursivos para refletir sobre as publicações da rede social Facebook e suas relações dialógicas.   Palavraschave: Educação Superior; Produção Cênica; Círculo de Bakhtin   Patricia Pluschkat Universidade Federal Do Parana [email protected]       

Upload: others

Post on 20-Jan-2020

2 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: X Anped Sulxanpedsul.faed.udesc.br/arq_pdf/1456-0.pdfNão basta só ter vontade! Diálogos sobre os sentidos do curso de tecnologia em produção cênica da Universidade Federal do

 

X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014.                                                                                p.1 

 

 

 

 

    Não basta só ter vontade! Diálogos sobre os sentidos do curso de tecnologia em produção cênica da Universidade Federal do Paraná    

 

Resumo O propósito do presente artigo é compreender os sentidos do Curso Superior de Tecnologia em Produção Cênica para os estudantes da área, considerando que essa  formação é recente  na  esfera  universitária  e  sendo  a  Universidade Federal  do  Paraná  a  primeira  universidade  pública  a instaurar  o  curso.  Como  metodologia  optei  pela  análise enunciativa  de  uma  publicação  na  página  da  rede  social Facebook,  postada  por  um  estudante  do  curso.  No enunciado, o discente,  logo após uma aula, expõe na rede suas  expectativas  e  reflexões  sobre o que  é  ser produtor cênico,  sendo  possível  perceber  os  anseios  do  futuro profissional  em  relação  à  Universidade,  ao  mercado  de trabalho  e  à  atividade  que  se  pretende  exercer, principalmente  por  ser  uma  profissão  em  busca  de reconhecimento.  Por  compreender  que  as  palavras  e  a língua estão ligadas pela história, optei como aporte teórico da  pesquisa  a  perspectiva  de  Bakhtin  e  o  Círculo.  Na fundamentação  utilizo‐me  dos  conceitos  da  teoria  da enunciação  na  busca  da  compreensão  dos  diálogos produzidos  nos  enunciados  dos  estudantes  com  seus interlocutores  e  recorro  à  concepção  de  gêneros discursivos para refletir sobre as publicações da rede social Facebook e suas relações dialógicas.   Palavras‐chave: Educação Superior; Produção Cênica; Círculo de Bakhtin  

 Patricia Pluschkat 

Universidade Federal Do Parana [email protected] 

     

 

Page 2: X Anped Sulxanpedsul.faed.udesc.br/arq_pdf/1456-0.pdfNão basta só ter vontade! Diálogos sobre os sentidos do curso de tecnologia em produção cênica da Universidade Federal do

Não basta só ter vontade! Diálogos sobre os sentidos do curso de tecnologia em produção cênica da Universidade Federal do Paraná  Patricia Pluschkat 

X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014.                                                                                p.2 

 

X A

nped Sul

A  arte  carrega  o  estigma  de  ser  algo  dispensável  do  ensino  no  Brasil,  sendo 

caracterizada por vezes como atividade somente de lazer. Se no ensino básico o teatro é 

tido  como uma  ferramenta para diversão, podemos  refletir o que  reverbera no ensino 

superior.  A  pesquisa  que  proponho  aponta  perspectivas  em  repensar  a  Arte  Cênica  e 

algumas reflexões acerca do Curso Superior de Tecnologia em Produção Cênica ofertado 

pela Universidade Federal do Paraná.  

 A  Arte  Cênica  é  a  atividade  que  possui  grande  dinamismo  e  cujo  diálogo  vivo 

possui  um  efeito  transformador,  para  além  de  apenas  um meio  de  entretenimento  e 

prazer.  Pensando  no  contemporâneo,  a  linguagem  teatral  convida  o  espectador  a 

participar do  jogo de signos e significados, do questionar e do ser questionado. Mas e a 

Produção Cênica?  

Segundo  o  dicionário  on  line  Michaelis,  o  verbete  produção  vem  do  latim:  

producere. Um de seus significados é “dar existência”. Produtores cênicos estão detrás 

das cortinas com a tarefa de colaborar para que a arte teatral se realize.  

A UFPR  foi  a primeira universidade pública  a  fundar o  curso,  iniciado  em 02 de 

março de 2009. Oferecia 45 vagas no período noturno, com a duração de 6 semestres de 

carga horária total de 1800 horas, no campus do Prédio Central. Na data, segundo registro 

do MEC1,  essa  formação  só  era  ofertada  por  duas  universidades  privadas:  a  Pitágoras 

Universidade  de  Cuiabá  (UNIC),  desde  2006  e  a  Universidade  de  Passo  Fundo  (UPF), 

desde 2008. 

O  curso  tem  como  objetivo  a  formação  de  um  profissional  que  atenda  às 

demandas tecnológicas e estéticas de espetáculos cênicos, e que estejam aptos a realizar 

projetos desde a captação de recursos até a sua execução. Por ser um curso recente na 

esfera universitária, e já tendo passado por alteração em seu currículo, quais os sentidos 

de Produção Cênica para os estudantes e futuros profissionais dessa nova área?   

Com o olhar sobre a Universidade e sobre um curso que caminha com o teatro, e 

sendo  ambos  presentes  na  esfera  escolar,  acredito  num  conceito  que  não  se  limita  à 

palavra  Instituição, visto que é o  lugar de vivência, memórias e descobertas. Momentos 

                                                            1 Ministério da Educação e Cultura 

Page 3: X Anped Sulxanpedsul.faed.udesc.br/arq_pdf/1456-0.pdfNão basta só ter vontade! Diálogos sobre os sentidos do curso de tecnologia em produção cênica da Universidade Federal do

Não basta só ter vontade! Diálogos sobre os sentidos do curso de tecnologia em produção cênica da Universidade Federal do Paraná  Patricia Pluschkat 

X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014.                                                                                p.3 

 

X A

nped Sul

de  relações pulsantes. É o despertar. É o conceber. É o expressar. Faço uso da voz de 

Japiassu (2008) para dar vazão à minha: 

 Tenho a  clara  convicção de que não existe apenas um  caminho para o desenvolvimento do trabalho com teatro na escola e, além disso, a firme opinião  de  que,  entre  os  caminhos  possíveis,  nenhum  pode  ser considerado, absoluta ou descontextualizadamente, melhor ou superior aos outros. Eles são diferentes – cada um com seus próprios encantos, habitantes e lugares de onde se vê. (JAPIASSU, 2008, p. 22)    

Diálogos teóricos 

 O sujeito como tal não pode ser percebido e estudado a título de coisa porque,  como  sujeito,  não  pode,  permanecendo  sujeito,  ficar  mudo; conseqüentemente,  o  conhecimento  que  se  tem  dele  só  pode  ser dialógico. (BARROS, 1997, p. 29)  

Evidentemente, a trajetória da pesquisa não é fácil, principalmente em se tratando 

da  Educação,  já  que  na  área  de  Ciências Humanas  verificamos  o  homem  analisando  o 

homem.  Acreditando  que  “o  sujeito  tem  que  intervir  interpretando,  procurando  seu 

sentido,  e  utilizando  técnicas  abertas  que  permitam  a  manifestação  profunda  dos 

fenômenos”. (SANTOS FILHO & GAMBOA, 2000, p.95), então optei em nortear o artigo 

por meio da pesquisa qualitativa, aplicando como metodologia a análise enunciativa de 

uma publicação de status em uma  rede social por um aluno que está no último ano da 

graduação em Produção Cênica.  

Essa  pesquisa  será  permeada  pelos  estudos  de  Bakhtin  e  o  Círculo,  em  que  o 

homem é um ser em constante alteridade, sendo impossível uma definição vulgarizada do 

ser humano. Há de se considerar que em cada enunciado há questões históricas, sociais e 

culturais. E esse ser, sempre em construção, demanda o compreender. 

As palavras e a língua estão ligadas pela história, assim, a própria história do curso 

será  permeada  pela  palavra  dos  que  vivenciaram  e  estão  vivenciando  o  cotidiano  do 

curso.  E  nessas  relações  dentro  da  Universidade  que  vozes  são  ouvidas?  Conforme 

Desgranges (2011) diz: 

Page 4: X Anped Sulxanpedsul.faed.udesc.br/arq_pdf/1456-0.pdfNão basta só ter vontade! Diálogos sobre os sentidos do curso de tecnologia em produção cênica da Universidade Federal do

Não basta só ter vontade! Diálogos sobre os sentidos do curso de tecnologia em produção cênica da Universidade Federal do Paraná  Patricia Pluschkat 

X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014.                                                                                p.4 

 

X A

nped Sul

 

O mergulho na corrente viva da linguagem acende também a vontade de lançar um olhar  interpretativo para a vida, exercitando a capacidade de compreendê‐la  de  maneira  própria.  Podemos  conceber,  assim,  que  a tomada de consciência se efetiva como leitura de mundo. Apropriar‐se da linguagem é ganhar condições para essa  leitura. (DESGRANGES, 2011, p. 23)  

 

Diálogos históricos 

Historicamente  foi  a  partir  da  segunda  metade  do  século  XIX  que  surgiram 

investigações específicas na  relação  teatro e educação, graças aos  intentos do  filósofo 

Jean‐Jacques  Rousseau.  Mas  foi  somente  no  século  XX  que  a  educação  artística  foi 

inserida no currículo escolar e que novas concepções em torno do teatro possibilitaram 

que  diversas  correntes  o  reconhecessem  necessário  para  a  Educação,  sob  cunho 

pedagógico, terapêutico e semiótico. 

O  curso  de  graduação  em  Produção  Cênica  advém  do  Curso  Técnico  em  Artes 

Cênicas da Universidade Federal do Paraná, que atuou desde 1998 até o ano de 2008. Por 

isso, em seu início, tratava‐se de um curso cuja grade horária era mais voltada às práticas 

do  teatro,  como  interpretação  teatral,  direção  cênica,  entre  outras  atividades  que 

envolvam o ator, propriamente. 

Em  2010,  Produção  Cênica  passa  pela  primeiro  ajuste  em  sua  grade  curricular. 

Agora sim, buscando se  identificar com o propósito de formar um produtor cênico. Por 

ser  um  curso  tecnólogo,  vale  ressaltar  que  seu  princípio  é  focar‐se  principalmente  no 

campo de  trabalho. E pensando nesse  território, afinal, o que  faz um produtor cênico? 

Conforme o Novo Projeto divulgado no site do curso:  

 Propondo  uma  interface  entre  o  artístico,  o  administrativo  e  o tecnológico,  o  egresso  do  Curso  Superior  de  Tecnologia  em  Produção Cênica estará apto a arregimentar e administrar  recursos,  contribuindo para  a  consolidação  dos  avanços  que  se  enunciam  na  área  da  cultura, atendendo às expectativas nacionais e respondendo às demandas  locais por produtores e gestores cênicos qualificados para atuarem na cidade de Curitiba e região, a fim de contribuir para a maior regularidade, para o 

Page 5: X Anped Sulxanpedsul.faed.udesc.br/arq_pdf/1456-0.pdfNão basta só ter vontade! Diálogos sobre os sentidos do curso de tecnologia em produção cênica da Universidade Federal do

Não basta só ter vontade! Diálogos sobre os sentidos do curso de tecnologia em produção cênica da Universidade Federal do Paraná  Patricia Pluschkat 

X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014.                                                                                p.5 

 

X A

nped Sul

crescimento,  e  para  a  diversidade  da  produção  cultural  e  artística. (CÊNICA, p. 09)  

De acordo com a Lei 9.394/1996, cuja ementa estabelece as diretrizes e bases da 

educação  nacional,  “a  educação  escolar  deverá  vincular‐se  ao mundo  do  trabalho  e  à 

prática social”. E pensando no mercado de trabalho do produtor cênico, a reformulação 

do  curso  passou  a  priorizar  disciplinas  que  abrangem  principalmente  as  etapas  de 

Produção  e  Gestão  Cultural,  que  totalizam  540  horas  na  grade  curricular.  Seguem  os 

gráficos, extraídos do website do curso: 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Figura 1: Carga horária eixo Produção e Gestão  Fonte:  CÊNICA.  Curso  Superior  de  Tecnologia  em  Produção.  Disponível  em http://www.tpc.ufpr.br/. Acesso em 16/08/2013 às 15h30.  

 

 

 

 

 

Page 6: X Anped Sulxanpedsul.faed.udesc.br/arq_pdf/1456-0.pdfNão basta só ter vontade! Diálogos sobre os sentidos do curso de tecnologia em produção cênica da Universidade Federal do

Não basta só ter vontade! Diálogos sobre os sentidos do curso de tecnologia em produção cênica da Universidade Federal do Paraná  Patricia Pluschkat 

X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014.                                                                                p.6 

 

X A

nped Sul

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Figura 2: Carga horária eixo Teorias e Humanidades Fonte:  CÊNICA.  Curso  Superior  de  Tecnologia  em  Produção.  Disponível  em http://www.tpc.ufpr.br/. Acesso em 16/08/2013 às 15h30.  

 

 

 

 

 

 

 

 

Figura 3: Carga horária eixo Laboratórios Cênicos Fonte:  CÊNICA.  Curso  Superior  de  Tecnologia  em  Produção.  Disponível  em http://www.tpc.ufpr.br/. Acesso em 16/08/2013 às 15h30.  

 

Page 7: X Anped Sulxanpedsul.faed.udesc.br/arq_pdf/1456-0.pdfNão basta só ter vontade! Diálogos sobre os sentidos do curso de tecnologia em produção cênica da Universidade Federal do

Não basta só ter vontade! Diálogos sobre os sentidos do curso de tecnologia em produção cênica da Universidade Federal do Paraná  Patricia Pluschkat 

X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014.                                                                                p.7 

 

X A

nped Sul

Curtir, comentar, compartilhar 

A  análise de enunciados na pesquisa,  transcorrendo por  seu  contexto histórico‐

social,  pode  contribuir  para  que  o  universo  acadêmico  se  aproxime  de  um  sistema 

educacional  amplo,  pois  é  preciso  “compreender  o  passado,  situar‐se  no  presente  e 

sentir‐se capaz de projetar‐se no futuro”. (DESGRANGES, 2011, p. 24). 

E de acordo com os estudos bakhtinianos, o enunciado “está  ligado às  relações 

com  sujeitos, mundo,  visão  de mundo,  valores,  ou  seja,  concebido  como  um  todo  de 

sentidos,  marcado  por  tensões,  fronteiras,  confronto  de  valores,  pontos  de  vista”. 

(BRAIT, p.16) 

O  enunciado  a  seguir  é  de  autoria  de  um  aluno  do  último  ano  do  curso  de 

Produção Cênica da UFPR, publicado no status de uma rede social, em 6 de maio de 2013. 

E os comentários posteriores à publicação são de discentes ainda em andamento com o 

curso e discentes já formados. 

A  publicação  realizada  na  rede  social  Facebook  pode  nos  indicar  com  quem  o 

sujeito dialoga e quem são seus  interlocutores,  já que funciona também como um tecer 

de  enunciados. O  intuito,  nesse momento,  não  é  o  de  analisar  o  fenômeno das  redes 

sociais, mas sabe‐se que essa mídia possui uma linguagem bem específica. Ora, se a língua 

está  em  ininterrupta  evolução,  e  se  somos  sujeitos  em  alteridade,  os  meios  de 

comunicação  também  se  modificam  de  acordo  com  as  mudanças  que  ocorrem  na 

sociedade.  

 É nessa mesma ordem que  se desenvolve a evolução  real da  língua: as relações  sociais  evoluem  (em  função  das  infra‐estruturas),  depois  a comunicação  e  a  interação  verbais  evoluem  no  quadro  das  relações sociais,  as  formas  dos  atos  de  fala  evoluem  em  consequência  da interação verbal, e o processo de evolução reflete‐se, enfim, na mudança das formas da língua. (BAKHTIN, 2010 p. 124)  

E  é  preciso  situar  o  leitor  da  esfera  social  no  qual  os  enunciados  ocorrem:  o 

Facebook.  Com  a  evolução  tecnológica,  esse  meio  torna‐se  efetivamente  uma  esfera 

enunciativa que permite o diálogo social.  

Page 8: X Anped Sulxanpedsul.faed.udesc.br/arq_pdf/1456-0.pdfNão basta só ter vontade! Diálogos sobre os sentidos do curso de tecnologia em produção cênica da Universidade Federal do

Não basta só ter vontade! Diálogos sobre os sentidos do curso de tecnologia em produção cênica da Universidade Federal do Paraná  Patricia Pluschkat 

X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014.                                                                                p.8 

 

X A

nped Sul

E esse diálogo acontece seja por meio de comentários expostos em seguida dos 

enunciados postados, ou mediante a  ferramenta que não precisa da escrita, o clicar do 

link Curtir, ou até mesmo pela ausência da opinião dos demais amigos vinculados a essa 

rede.  Os  enunciados  postados  no  Facebook  também  permitem  uma  compreensão 

responsiva. O  sujeito  locutor espera uma  resposta, por  isso publica  seus pensamentos, 

idéias, opiniões. 

E se um post não obteve comentários ou “curtir” ou “compartilhar” pode  indicar 

não  somente uma  incompatibilidade  com o enunciado e o  seu autor, mas  também um 

receio  de  comprometimento  com  a  exposição  de  sua  opinião.  Ou  uma  concordância 

parcial. Ou apenas o sujeito acredita dispensável mostrar uma opinião assertiva ou não 

para o público virtual.  

  “O próprio falante está determinado precisamente a essa compreensão ativamente  responsiva:  ele  não  espera  uma  compreensão  passiva,  por assim dizer, que apenas duble o seu pensamento em voz alheia, mas uma resposta,  uma  concordância,  uma  participação,  uma  objeção,  uma execução, etc. (os diferentes  gêneros discursivos pressupõem diferentes diretrizes  de  objetivos,  projetos  de  discurso  dos  falantes  ou escreventes)”. (BAKHTIN, 2011, p. 272)  

Visto que o diálogo ocorre nesse gênero discursivo de várias  formas, a quem as 

postagens  se  destinam?  A  priori,  aos  que  também  utilizam  desse  instrumento  de 

comunicação e recorrem ao mesmo estilo linguístico. Entretanto, os enunciados possuem 

sempre uma  temática abordada. Então, o diálogo destina‐se aos que queiram opinar a 

respeito do assunto abordado.  

E  aqui  enfatizo,  o  diálogo  não  é  destinado    para  somente  quem  tenha 

conhecimento científico do conteúdo postado, mas a todos que queiram interagir. Assim, 

afirmo que há muitas vozes repercutidas no Facebook.  

 Trata‐se de apreender o homem como um ser que se constitui na e pela interação,  isto  é,  sempre  em  meio  à  complexa  e  intrincada  rede  de relações  sociais  de  que  participa  permanentemente.  As  dimensões  e implicações dessa rede de relações sociointeracionais estão ainda  longe de  ser  suficientemente entendidas, o que é plenamente  compreensível face  ao  formalismo  e  o  caráter    antisséptico  das  teorias  nossas conhecidas sobre o homem e a linguagem. (FARACO, 2007, p. 101)  

Page 9: X Anped Sulxanpedsul.faed.udesc.br/arq_pdf/1456-0.pdfNão basta só ter vontade! Diálogos sobre os sentidos do curso de tecnologia em produção cênica da Universidade Federal do

Não basta só ter vontade! Diálogos sobre os sentidos do curso de tecnologia em produção cênica da Universidade Federal do Paraná  Patricia Pluschkat 

X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014.                                                                                p.9 

 

X A

nped Sul

   

Nesse artigo, me ative especificamente aos enunciados de dois sujeitos: o Sujeito 

1,  aluno  do  último  ano  do  curso  que  postou  o  primeiro  enunciado  em  sua  página  no 

Facebook e o Sujeito  2, que  fez  comentários  a despeito do enunciado do Sujeito  1 e é 

discente  da  primeira  turma  que  foi  concluída  em  2011. O  Sujeito  1  possui  415  amigos 

interligados  e  esse  enunciado  publicado  foi  Curtido  por  doze  desses  amigos,  uma 

reafirmação de seu discurso, além de receber sete comentários em concordância com seu 

status. 

 

Não basta só ter vontade! 

 SUJEITO 1: Conclusão sobre a aula: É realmente difícil ser produtor cultural em  Curitiba.  Não  basta  só  ter  vontade  de  fazer  algo,  tem  que  escrever direito, tem que ter bons contatos profissionais e o mais confuso e difícil é: começar. É isso mesmo Produção.  SUJEITO 2: Nem me fale... Mas vamos  lá, que 10 minutos de carreira não é nada ainda, né?!  

No  primeiro  enunciado  já  é  possível  ter  variadas  percepções.  Percebe‐se  que  o 

Sujeito 1, ao utilizar a sinalização Dois Pontos,  indica que  irá enunciar algo que acaba de 

acontecer. Ele reafirma  isso com a frase que antecede o sinal, “conclusão sobre a aula”. 

Após  assistir  a  aula  de  uma  determinada  disciplina,  o  sujeito  sente  a  dificuldade  em 

exercer  sua  futura profissão na  cidade de Curitiba. Aqui, podemos  identificar o eco de 

outras  vozes,  afinal,  esse  conflito  com  a  profissão  e  com  a  cidade  em  que  vive  foi 

concluído após uma aula, “(...) cedo ou tarde, o que foi ouvido e compreendido de modo 

ativo  encontrará  um  eco  no  discurso  ou  no  comportamento  subseqüente  do  ouvinte” 

(BAKHTIN, 1992, p. 291) 

Mas por que é difícil ser Produtor Cênico? Por que especificamente na cidade de 

Curitiba? É possível que essa tensão ocorra porque essas outras vozes sociais atuam ou 

tentam atuar no mercado de  trabalho da capital paranaense sem êxito, visto que é um 

campo profissional relativamente recente. 

 

Page 10: X Anped Sulxanpedsul.faed.udesc.br/arq_pdf/1456-0.pdfNão basta só ter vontade! Diálogos sobre os sentidos do curso de tecnologia em produção cênica da Universidade Federal do

Não basta só ter vontade! Diálogos sobre os sentidos do curso de tecnologia em produção cênica da Universidade Federal do Paraná  Patricia Pluschkat 

X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014.                                                                                p.10 

 

X A

nped Sul

É  grande  o  número  de  festivais  de  teatro, mostras  artísticas,  oficinas, editais  de  fomento  às  artes  circences  e  operísticas,  produzidos  e/ou sediados  no  perímetro  compreendido  pela  capital  paranaense  e  sua região metropolitana: Festival de Teatro de Curitiba, Festival de Teatro de Bonecos de Curitiba, Festival de  Inverno da UFPR, Festival de Teatro de Araucária, Festival de Teatro de Piraquara, Festival de Teatro de Pinhais, Festival de Teatro de Campo Largo, Festival  Internacional de Teatro de Objetos,  Mostra  Cena  Breve  Curitiba,  Oficina  de  Música  de  Curitiba, Ópera  Ilustrada, Circo da Cidade, entre diversos outros. Contudo, se  tal abundância  de  eventos  subtende  a  ocasional  circulação  de  um  grande número  de  artistas  e  avolumado  público  na  região,  não  pressupõe  a constância da produção e oferta locais. (CÊNICA, p. 02)  

Há que se elucidar também que os debates em torno da reformulação da antiga 

Lei Rouanet (Lei nº 8.313 de 23 de dezembro de 1991) ainda estão em voga.  E é em meio a 

essas  discussões  que  o Ministério  da  Educação  incluiu  em  seu  Catálogo  Nacional  de 

Cursos  de  Graduação  o  Curso  Superior  de  Tecnologia  em  Produção  Cênica.  E  nesse 

intento, a reformulação da Lei Rouanet entra num impasse quando se trata em abrandar 

as vias burocráticas. Assim: 

 Ponto pacífico das discussões em  torno da  reformulação da Rouanet é que  a  legislação  cultural  tenha  conferido  às  grandes  empresas  e  ao captador de recursos, na figura de um produtor cultural  limitado à ótica monetária, o poder de conduzir a produção e oferta de arte e cultura no país.  Com  isso,  os  artistas  e  agentes  da  cultura  veem‐se  reféns  do marketing empresarial e de burocratas culturais, formados tão somente na prática diletante da arrecadação de recursos, ficando comprometida a diversidade  cultural  do  país  e  o  amplo  acesso  aos  bens  culturais. (CÊNICA, p. 01)  

O  Sujeito  1  indica  que  antes  dessa  aula,  já  havia  percebido  dificuldades  em  seu 

caminho profissional e reafirma por meio do adjunto adverbial de afirmação “realmente” 

que a dificuldade que sentia também foi apreendida por outros sujeitos. 

  Num outro momento no enunciado, o Sujeito 1 assinala que é preciso mais do que 

a “vontade” de realizar produções culturais. E o que é ter “vontade”? Estar inserido num 

curso universitário? Se dedicar aos estudos? Tentar se inserir no mercado de trabalho? Ao 

utilizar o advérbio “só” que nesse caso possui um valor restritivo, ele assume que não é 

suficiente essa “vontade”, essa ânsia, esse desejo. É necessário ter atributos específicos. 

E esses atributos deveriam ser estimulados no Ensino Superior. De acordo com o Projeto 

Page 11: X Anped Sulxanpedsul.faed.udesc.br/arq_pdf/1456-0.pdfNão basta só ter vontade! Diálogos sobre os sentidos do curso de tecnologia em produção cênica da Universidade Federal do

Não basta só ter vontade! Diálogos sobre os sentidos do curso de tecnologia em produção cênica da Universidade Federal do Paraná  Patricia Pluschkat 

X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014.                                                                                p.11 

 

X A

nped Sul

Pedagógico,  há  um  estímulo  para  as  aulas  de  campo,  que  são  realizadas  em  teatros, 

estúdios, produtoras entre outros locais relacionadas com a área. 

 O  papel  da  universidade  em  uma  democracia  deve  não  somente incentivar  a  reprodução, mas  também  a  produção  de  conhecimentos, bem como qualificar as novas gerações para a vida e o trabalho. (GHELLI, 2004, p. 01)  

Por outro  lado, o Sujeito 1 salienta que uma das condições para sua profissão é a 

de  ter  “bons  contatos  profissionais”.  Atualmente  o  curso  não  proporciona  estágio 

obrigatório. Mesmo apoiando a realização de estágios no campo da produção cênica, o 

fato  de  não  ser  uma  disciplina  obrigatória  pode  indicar  a  dificuldade  da  abertura  de 

contatos profissionais da  área, de  acordo  com o  reclame do discente. A discussão  em 

torno da dicotomia teoria versus prática na Educação é um caminho a ser alinhado, afinal 

o próprio conceito de curso tecnólogo é uma alternativa para que exista uma unidade. De 

acordo com Ghelli (2004): 

 A  relação  entre  teoria  e  prática  deverá  ser  o  fim  a  que  propõe  o professor, pois toda teoria começa com a prática, e ela é uma tentativa de explicar uma prática, ou seja, uma não existe sem a outra. A teoria não deve  ser  uma  mera  contemplação,  mas  guia  de  uma  ação.  A  prática também não deve ser mera aplicação da teoria, mas deve ser vista como a própria ação guiada e mediadora da teoria. (GHELLI, 2004, p. 08)  

 O enunciado também evidencia a  importância do outro, afinal, é pelo outro que 

nos construímos, “a alteridade define o ser humano, pois o outro é imprescindível para sua 

concepção”. (BARROS,  1997, p. 39). Ora, relações sociais são  indispensáveis em qualquer 

campo, entretanto relações implicam em conflitos. Faraco complementa: 

 Trata‐se de apreender o homem como um ser que se constitui na e pela interação,  isto  é,  sempre  em  meio  à  complexa  e  intrincada  rede  de relações  sociais  de  que  participa  permanentemente.  As  dimensões  e implicações dessa rede de relações sociointeracionais estão ainda  longe de  ser  suficientemente entendidas, o que é plenamente  compreensível face  ao  formalismo  e  o  caráter  antisséptico  das  teorias  nossas conhecidas sobre o homem e a linguagem. (FARACO, 2007, p. 101)   

A  expressão  “tem  que”  faz  pensar  em  uma  maior  responsabilidade  e 

obrigatoriedade nos  saberes distintos.  “Escrever direito”  – o que é  escrever direito? É 

Page 12: X Anped Sulxanpedsul.faed.udesc.br/arq_pdf/1456-0.pdfNão basta só ter vontade! Diálogos sobre os sentidos do curso de tecnologia em produção cênica da Universidade Federal do

Não basta só ter vontade! Diálogos sobre os sentidos do curso de tecnologia em produção cênica da Universidade Federal do Paraná  Patricia Pluschkat 

X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014.                                                                                p.12 

 

X A

nped Sul

escrever de acordo com as normas lingüísticas? Ou escrever de acordo com que os outros 

querem ler? Para o produtor cênico, escrever um bom projeto é fundamental para que o 

mesmo seja aprovado, por exemplo, em editais.  

A escrita vai além das normas e não foge das exigências do interesse do mercado 

cultural. Um grupo artístico tem seu movimento e seus preceitos ao criar um espetáculo, 

todavia, o mesmo pode acabar restrito às diretrizes de festivais. Cabe ao produtor essa 

“escrita direita” com o fim de cativar os leitores sobre a qualidade do projeto. Além disso, 

o produtor cênico também está apto a idealizar e promover festivais culturais. 

 A arte é uma  forma de comunicação.  (...) A característica da arte é sua conotação  estética.  Ela  comunica‐se  de  uma  maneira  mais  densa  e concentrada do que experimentamos na vida cotidiana. Também o  local ou  contexto  em  que  a  comunicação  artística  acontece  indicam  que alguma coisa especial está ocorrendo. (SMIERS, 2006, p. 121)  

O Sujeito 1 afirma estar confuso principalmente por achar que o mais custoso da 

profissão é “começar”. Esse verbo infinitivo sugere o agir, o dar início a. Afinal, por onde 

começar? Em qualquer algo novo no qual nos  inserimos sentimos a dificuldade da ação 

inicial.  Inexperiência?  E  como  a  Universidade  pode  impulsionar  o  estudante  a  se 

profissionalizar na prática? Um  jovem em geral entra num curso universitário por volta 

dos 18 anos e, ao se formar, possui maturidade o suficiente para enfrentar um mercado 

globalizado? 

 O  início  de  uma  profissão  inclui  o  reconhecimento  de  sua  cultura,  do estatuto que ocupa na pirâmide social e do trabalho e das peculiaridades sociopolíticas que a caracterizam. (CUNHA & ZANCHET, 2010, p. 192)  

A  postagem  do  enunciado  do  Sujeito  1  até  poderia  ser  um  desabafo,  já  que 

nenhum  amigo  em  específico  foi  marcado  para  responder  suas  considerações. 

Entretanto, ao fim, fica o convite: “é isso mesmo Produção”. Seus interlocutores são seus 

colegas do curso de Produção Cênica. É com eles que esse sujeito incita o diálogo e anseia 

por uma resposta, seja concordante ou não. E como todo ato implica sim numa resposta, 

ocorre em sete minutos a primeira. 

O interlocutor Sujeito 2 assente com seu locutor por meio da expressão “nem me 

fale”, demonstrando que mesmo  já  formado no  curso,  ainda  sente dificuldades em  se 

Page 13: X Anped Sulxanpedsul.faed.udesc.br/arq_pdf/1456-0.pdfNão basta só ter vontade! Diálogos sobre os sentidos do curso de tecnologia em produção cênica da Universidade Federal do

Não basta só ter vontade! Diálogos sobre os sentidos do curso de tecnologia em produção cênica da Universidade Federal do Paraná  Patricia Pluschkat 

X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014.                                                                                p.13 

 

X A

nped Sul

posicionar profissionalmente no mercado de trabalho e complementa incentivando “mas 

vamos lá”.  

A  conjunção  adversativa  “mas”  aponta  que  mesmo  com  os  problemas 

identificados pelo Sujeito 1 e admitidos pelo Sujeito 2, ele confia na profissão de produtor 

cênico. O  Sujeito  2  reforça  essa  expectativa positiva  com  “vamos  lá”. A  expressão  no 

plural  faz  com que o Sujeito  2  tenha o  reconhecimento de  si pelo  reconhecimento do 

outro. Conforme Bakhtin: 

 De  fato, o ouvinte que  recebe e compreende a significação  (lingüística) de  um  discurso  adota  simultaneamente,  para  com  este  discurso,  uma atitude  responsiva  ativa:  ele  concorda  ou  discorda  (total  ou parcialmente),  completa,  adapta,  apronta‐se  para  executar,  etc.  (...)  A compreensão  de  uma  fala  viva,  de  um  enunciado  vivo  é  sempre acompanhada de uma atitude responsiva ativa (...); toda compreensão é prenhe  de  resposta  e,  de  uma  forma  ou  de  outra,  forçosamente  a produz: o ouvinte torna‐se o locutor. (BAKHTIN, 1992, p. 290)   

O Sujeito 2 continua o enunciado com um alerta ao Sujeito 1 de “que 10 minutos de 

carreira  não  é  nada  ainda”,  utilizando  um  sentido  temporal  de minutos mostra  que  é 

preciso  um  tempo  maior  de  vivência  para  um  aprimoramento  profissional.  Incito,  a 

carreira se  inicia após a  formação de um curso superior ou durante os anos em que se 

está na Universidade? E três anos para um curso superior voltado essencialmente para o 

mercado de  trabalho  são  suficientes? Como conduzir esses  futuros profissionais a uma 

maior autonomia? 

  Desta forma, pretende‐se que o curso esteja sempre aberto a incorporar as novidades das áreas que  lhe  são  formadoras, mantendo um diálogo constante entre  inovação e  tradição. O NDE, neste aspecto, deve estar atento para que o  curso não  incorpore modismos passageiros que por ventura venham a prejudicar a formação de uma base sólida que permita ao  egresso  desenvolver  a  sua  autonomia,  condição  fundamental  para que ele, por si, passe a dialogar com essas novidade. (CÊNICA, p. 17)  

Com o advérbio “ainda”, suscita mais uma vez a esperança de que  futuramente, 

essa  área de  trabalho não necessite de  tantos “tem que...  tem que...  tem que...” para 

fomentar, assim como também poder ser um “ainda” motivando o colega de que o curso 

Page 14: X Anped Sulxanpedsul.faed.udesc.br/arq_pdf/1456-0.pdfNão basta só ter vontade! Diálogos sobre os sentidos do curso de tecnologia em produção cênica da Universidade Federal do

Não basta só ter vontade! Diálogos sobre os sentidos do curso de tecnologia em produção cênica da Universidade Federal do Paraná  Patricia Pluschkat 

X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014.                                                                                p.14 

 

X A

nped Sul

está a caminho de dar subsídios para preparar esses futuros profissionais para o mercado 

de trabalho. 

 Para finalizar, o Sujeito 2 conduz o enunciado com a expressão “né” e um ponto 

de  interrogação  junto  com o ponto de exclamação,  se  auto‐concordando e esperando 

por uma resposta assertiva de seus interlocutores. Para Bakhtin: 

 Em qualquer enunciado, desde a réplica cotidiana monolexemática até as grandes  obras  completas  científicas  ou  literárias,  captamos, compreendemos,  sentimos  o  intuito  discursivo  ou  o  querer‐dizer  do locutor    que  determina  o  todo  do  enunciado:  sua  amplitude,  suas fronteiras. (BAKHTIN, 1992, p. 300)   

 

Diálogos finais 

O  exercício  da  análise  enunciativa  de  dois  enunciados  sob  a  perspectiva 

bakhtiniana elucida algumas expectativas de estudantes de um curso pioneiro no ensino 

universitário público, que poderá contribuir a construir não somente a história do curso 

quanto  a  corroborar  com  a  evolução  do mesmo  para  uma melhor  preparação  desses 

futuros profissionais. 

Há,  dentro  da  área  de  Arte  Cênica,  um  certo  pré‐conceito  ao  envolver  a  área 

Administrativa com a Arte. Entretanto, esse trabalho é  indispensável para que a própria 

Arte aconteça. É necessário profissionais que  tenham conhecimento especializado, mas 

que,  no  entanto,  estejam  do  mesmo  modo  presentes  na  cultura  das  artes  e 

compreendam os elementos da linguagem cênica, como o produtor cênico. 

 Naturalmente,  todo artista  tenta vender o  seu  trabalho. Esse é um ato comercial. E os organizadores ou promotores dos seus trabalhos fazem o mesmo. Todos deveriam ganhar sua vida assim. O problema começa, no entanto,  quando  o  comércio  se  torna  o  centro  de  suas  atividades  e quando seu trabalho é reduzido a uma matéria‐prima e ideias distorcidas e  transformadas pelas  indústrias  culturais  e  corporações  comerciais de acordo  com  seus  próprios  gostos  ou  necessidades  econômicas, apresentando  o  trabalho  apenas  nos  ambientes  propícios  para  obter lucros. (SMIERS, 2006, p. 239)   

Page 15: X Anped Sulxanpedsul.faed.udesc.br/arq_pdf/1456-0.pdfNão basta só ter vontade! Diálogos sobre os sentidos do curso de tecnologia em produção cênica da Universidade Federal do

Não basta só ter vontade! Diálogos sobre os sentidos do curso de tecnologia em produção cênica da Universidade Federal do Paraná  Patricia Pluschkat 

X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014.                                                                                p.15 

 

X A

nped Sul

Entre  os  amantes  da  Arte,  fica  difícil  concebê‐la  como  um  produto  cultural. 

Entretanto, as  leis de  incentivo à Cultura não a dissociam desse conceito  reduzindo‐a a 

editais. Há de se  ter um profissional preparado para a escrita de projetos, captação de 

recursos  financeiros,  divulgação  do  trabalho.  Hoje,  é  indispensável  essa  capacitação 

profissional para que o espetáculo aconteça. 

   Se  o  ideal  é  ter  muitas  iniciativas  artísticas  acontecendo  em  cada sociedade,  é  continua  sendo  inevitável  o  insucesso  de  algumas  ano mercado. (...) É responsabilidade pública possibilitar a um grande número de  artistas,  individualmente,  em  grupos  ou  em  outros  tipos  de associações,  trabalhar  e  disponibilizar,  dessa  forma,  muitas  criações culturais  diferentes.  Ao  mesmo  tempo,  o  Estado,  representando  o interesse  público,  não  deveria  intervir  nos  processos  artísticos  e  seus conteúdos.  Seu  papel  é  garantir  a  diversidade  no  campo  cultural  e esperar  pelo  resto,  ver  o  que  acontece  e  deixar  o  julgamento  da qualidade estética e a importância do trabalho para o debate público e os críticos. (SMIERS, 2003, p. 273)   

 Se  avaliarmos  que  falta  uma  relação  dialógica  entre  as  disciplinas  do  ensino 

superior que dissocia a teoria da prática, fica a reflexão acerca da responsabilidade de se 

repensar o ensino universitário tecnólogo dirigido ao mercado de trabalho no tocante à 

preparação  desses  profissionais  cujo  foco  é  o  envolvimento  direto  com  a  relação 

produção  cultural  e mercado  cultural. Um  profissional  com  senso  crítico,  estético  que 

atenda às demandas artísticas e mercadológicas.  

Um desafio para a Arte Cênica e a Educação. Entretanto, o enunciado provocado 

após uma aula permite afirmar que o curso está no mínimo a caminho da compreensão de 

sentidos da profissão.  

 (...) podemos entender aprendizagem como mudanças que ocorrem no comportamento de uma pessoa em função de experiências e vivências. A aprendizagem na aula universitária pode ser verificada no momento em que ela  termina e o aluno  tem a sensação de que construiu, descobriu, acrescentou  algo  na  sua  forma  de  pensar  e  ver  determinada  situação. (GHELLI, 2004, p. 06)  

Deixo  aqui  ao  leitor mais  questionamentos  que  respostas  dessa  pesquisa  que 

ainda está iniciando e que possui uma longa jornada de reflexões, sentidos e descobertas.  

Page 16: X Anped Sulxanpedsul.faed.udesc.br/arq_pdf/1456-0.pdfNão basta só ter vontade! Diálogos sobre os sentidos do curso de tecnologia em produção cênica da Universidade Federal do

Não basta só ter vontade! Diálogos sobre os sentidos do curso de tecnologia em produção cênica da Universidade Federal do Paraná  Patricia Pluschkat 

X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014.                                                                                p.16 

 

X A

nped Sul

Referências 

BAKHTIN, Mikhail. (VOLOSHINOV,V.N.) Marxismo e filosofia da linguagem: problemas fundamentais do método sociológico na ciência da linguagem. Tradução para a Língua Portuguesa: Michel Sahud e Yara Frateschi Vieira ; São Paulo: Hucitec, 2010. 

 

__________________________________. Estética da Criação Verbal. 1. ed. São Paulo: Ed Martins Fontes, 1992. 

 

__________________________________. Questões de literatura e estética. A teoria do romance. 4. ed. São Paulo: UNESP, 1998. 

 

BARROS, Diana Luz Pessoa de Barros. Contribuições de Bakhtin às teorias do discruso. In: BRAIT. Beth. Bakhtin: dialogismo e construção do sentido. Campinas: Editora da Unicamp, 1997. 

 

BRAIT, Beth. Perspectiva dialógica. In: BRAIT, Beth & SOUZA‐e‐SILVA, Maria Cecília. Texto ou Discurso? São Paulo: Editora Contexto. p. 9‐30. 

 

BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. 1996. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9394.htm. Acesso em 16/08/2013 às 14h00 

CASTRO, Gilberto. Os apontamentos de Bakhtin: uma profusão temática. In: FARACO, C. et alli. Diálogos com Bakhtin. 4ª edição. Curitiba: Editora UFPR, 2007 

CÊNICA. Curso Superior de Tecnologia em Produção. Disponível em http://www.tpc.ufpr.br/. Acesso em 16/08/2013 às 15h30. 

 

CÊNICA. Curso Superior de Tecnologia em Produção. Disponível em http://www.tpc.ufpr.br/. Acesso em 16/08/2013 às 15h30. 

 

CUNHA, M. I da; ZANCHET, B. M. B. A. A problemática dos professores iniciantes: tendência e prática investigativa no espaço universitário. Educação, Porto Alegre, v. 33, n. 3, p. 189‐197, set/dez, 2010. 

 

DESGRANGES, Flávio. Pedagogia do teatro: provocação e dialogismo. 3ª ed. São Paulo: Hucitec Editora, 2011. 

 

FARACO, Carlos Alberto. O dialogismo como chave de uma antropologia filosófica. In: FARACO, C. et alli. Diálogos com Bakhtin. 4ª edição. Curitiba: Editora UFPR, 2007. 

 

GHELLI, G. M. A construção do saber no ensino superior. Cadernos da FUCAMP, v. 3, n.3, 2004. 

 

Page 17: X Anped Sulxanpedsul.faed.udesc.br/arq_pdf/1456-0.pdfNão basta só ter vontade! Diálogos sobre os sentidos do curso de tecnologia em produção cênica da Universidade Federal do

Não basta só ter vontade! Diálogos sobre os sentidos do curso de tecnologia em produção cênica da Universidade Federal do Paraná  Patricia Pluschkat 

X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014.                                                                                p.17 

 

X A

nped Sul

JAPIASSU, Ricardo. Metodologia do Ensino de Teatro. 7ª ed. Campinas: Papirus Editora, 2008. 

 

SANTOS FILHO, José Camilo dos & GAMBOA, Silvio Sánchez. Pesquisa Educacional: quantidade‐qualidade. São Paulo: Cortez, 2000. p. 84‐109. 

 

SMIERS, Joost. Artes sob Pressão ‐ promovendo a diversidade cultural na era da globalização. São Paulo: Escrituras, 2006. 

 

UOL. Editora Melhoramentos Ltda. Disponível em: <http://michaelis.uol.com.br/moderno/portugues/index.php?lingua=portugues‐portugues&palavra=produzir> Acesso em 02/05/2014 às 14h00.