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Wittgenstein A virada linguística da filosofia

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Page 1: Wittgenstein A virada linguística da filosofia. A melhor maneira de introduzir a filosofia de Wittgenstein, talvez seja descrever um pouco o percurso

Wittgenstein

A virada linguística da filosofia

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• A melhor maneira de introduzir a filosofia de Wittgenstein, talvez seja descrever um pouco o percurso de vida de Wittgenstein, descrever como ele chegou as suas duas filosofias, exibir um pouco os principais temas que tornaram sua filosofia como uma das principais referências do pensamento do século xx.

• Quando ele chega a Cambridge, ele encontra Russell (1872-1970), que vai ser seu professor no auge de sua carreira, Russell acaba de publicar o “Principia Mathematica”.

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O que trata no principia:

• Basicamente o projeto de Russell era reduzir a aritmética à lógica.

• Uma das questões que surgem quando nós pensamos a aritmética é a respeito da natureza das proposições da aritmética.

• O que quer dizer quando falamos que 2+2=4?

• O que nos faz atribuir verdade a um enunciado como esse?

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Gottiob Frege• Essa questão tinha ocupado diversos filósofos entre eles

um antecessor de Russel chamado Gottiob Frege (1848-1925).

• Frege tinha conseguido fazer aquilo que chamamos hoje de uma redução da aritmética à lógica.

• Basicamente o que Frege fez foi em primeiro lugar definir os termos da aritmética apenas usando o vocabulário da lógica;

• Em segundo lugar Frege deduziu as verdades elementares da aritmética de enunciados puramente lógicos.

• Um enunciado da lógica ele tem o mesmo estatuto de necessidade de um enunciado da aritmética.

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Wittgenstein• Wittgenstein chega para estudar filosofia depois

de um período errático de sua vida. • Primeiro trabalha em diversos projetos de

engenharia, chega a desenvolver um modelo de avião, depois estuda matemática pura e por indicação de Frege vai procurar Russell em Cambridge para estudar os fundamentos da matemática.

• Em um ano lê e domina o pensamento de Russell, além de ver diversas falhas em seu pensamento.

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Qual a crítica:• Porque Wittgenstein criticou Russell? • Quais foram os erros que ele encontrou na

filosofia de Russell? – Sua falta de radicalidade! – Russell havia elaborado anterior ao Principia

Mathematica aquilo que ficou conhecido como a sua teoria das descrições.

– Para dar uma idéia da teoria das descrições de Russell, eu gostaria que vocês formulassem uma pergunta a respeito da origem dos significados das sentenças que nós pronunciamos.

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• Pense por exemplo nas sentenças que eu estou falando agora, provavelmente todos vocês estão as ouvindo pela primeira vez, provavelmente também eu estou falando essas sentenças pela primeira vez, vocês nunca tinham ouvido isso antes.

• No entanto, todos vocês me entendem, todos vocês sabem do que estou falando.

• Como isso é possível?

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Como é possível transmitir significações constantemente novas por intermédio da linguagem?

• Mais ainda, o treinamento que nós somos submetidos para apreender uma língua é um treinamento extremamente restrito, se pensarmos bem, em um espaço muito curto de tempo, expostos a um estimulação completamente aleatório uma criança consegue exibir resultado que a melhor escola de língua não conseguiria produzir em um adulto.

• Então surge uma questão, como disse, não foi a que Russell se fez, mas é uma questão que a maioria dos lingüistas de faz, surge a questão de saber, como isso é possível?

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• Como é possível uma pessoa em um espaço de tempo tão pequeno e submetida a um treinamento tão aleatório, seja capaz de adquiri uma capacidade por assim dizer, infinita?

• É infinita, porque é indefinido, é infinitamente grande o número de sentenças que nós podemos produzir dentro da nossa língua.

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• Uma resposta mais natural a essa questão é que nós assimilamos um determinado vocabulário, juntamente com esse vocabulário nós assimilamos uma determinada sintaxe, aprendemos enfim, a concatenar as palavras da nossa língua e de posse desse vocabulário e de posse dessa sintaxe podemos então iniciar o jogo da linguagem.

• Mas essa resposta, nos remete a uma série de outros problemas: – se é verdade que as sentenças de nossa linguagem são

constituídas, isto é, os sentido de nossa linguagem, são constituídas a partir dos nomes que as compõem, então devemos perguntar, como é possível que determinadas sentenças adquiram significado, adquiram algum sentido, quando as palavras, ou algumas das palavras que as compõem, parecem não apontar para objeto nenhum?

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• Tome por exemplo a sentença: – “O atual rei da França é careca”.

• A França não tinha rei, a expressão o atual rei da França não designava coisa alguma.

• No entanto, todos nós entendemos perfeitamente aquilo que a frase quer dizer, isso é, todos vocês entenderam o que eu quis dizer com a sentença “o atual rei da França é careca”.

• Vocês vão dizer, para entender a sentença, eu tive de entender as palavras que compõe a expressão o atual rei da França.

• É mais ou menos isso que Russell faz com um pequeno acréscimo.

• Pequeno aqui é uma injustiça, já que esse acréscimo é que compõe a teoria das descrições, o pequeno acréscimo vai se referir ao sentido do artigo definido que inicia a sentença, isto é, o.

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• Esse artigo definido, ele introduz a idéia de unicidade, ele introduz a idéia que havia um rei da França e que ele era único, que não havia mais de um.

• Mas mesmo quando consideramos o problema dessa maneira, mesmo quando nós reduzimos o significado de uma expressão complexa, ao significado das expressão que a compõe, nós ainda teríamos muitos problemas com respeito a determinados nomes próprios, por exemplo, considere o nome próprio Homero.

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• Se eu digo a vocês: “Homero foi autor da Ilíada”. – vocês entendem o que eu quero dizer, no entanto,

qual o significado que eu associo ao som Homero? – Para que esse som aponta? – Se nós considerarmos que Homero significa apenas

uma construção mental, vocês devem admitir também que uma sentença como:

• “Homero não existe” se refere a uma entidade mental e seria falso dizer que Homero não existe simplesmente porque eu estou tomando Homero aqui como um certo construto mental meu individual;

• Não só Homero existe, como existe neste momento. • Se eu estou chamando Homero uma certa construção

mental.

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• Ora, se eu quero me referir, não a essa construção mental, mas a uma certa pessoa que viveu a muito tempo atrás, eu devo atribuir a esse sinal, ao som Homero, uma significação objetiva.

• Se Homero enfim, pode não ter existido é perfeitamente possível que essa sentença toda fique sem sentido, isto é, Homero escreveu a Ilíada.

• Se Homero existiu, então a sentença, Homero escreveu a Ilíada, se refere àquele homem que existiu na antiguidade e essa sentença vai ser verdadeira caso aquele homem tenha de fato escrito a Ilíada.

• Mas suponhamos que Homero não tenha existido, a que é que se refere esse som?

• Não se refere a nada? Mas se não se refere a nada, como é que eu consigo compor o sentido da sentença, Homero escreveu a Ilíada?

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• É exatamente esse dilema que constitui o núcleo das preocupações de Russell quando escreve o artigo sobre a denotação (1905).

• Russel está diante das exigências:– por um lado de dotar as significações da linguagem

de algum conteúdo objetivo, de não reduzi-las a mera descrição dos estados mentais;

– E, por outro, ele se vê diante da exigência de dotar de significação a sentença independentemente do fato daquilo que ocorre no mundo Homero, ou seja, as sentenças não podem ficar esperando uma resposta da história, a respeito da existência de Homero, para poder adquirir sua significação, afinal de contas a sentença adquiriu aqui, entre nós uma significação precisa.

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• Ora, embora Russel não tenha levado até as últimas conseqüências a sua teoria das discrições, Wittgenstein vai rapidamente perceber o caminho que havia sido aberto por essa teoria e vai explorá-lo com toda radicalidade.

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Wittgenstein• Explorando essa questão, Wittgenstein vai

chegar no seu primeiro livro “Tratactus Logico-Philosoficus”. – A postulação de um conjunto de entidades que

cumpririam o papel de significação dos termos básicos da linguagem;

– Ou seja, Wittgenstein nota que as teorias de descrição de Russel aponta no sentido da exigência de um conjunto de entidades capazes de preencher os nomes da linguagem da significação.

– Ao mesmo tempo porem, Wittgenstein nota que essa exigência não pode ser cumprida pelos nomes que nós temos na nossa linguagem portuguesa.

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• Os nomes que nos temos na linguagem portuguesa, de alguma maneira, nos remetem aos mesmos problemas que uma palavra como Homero nos remetia.

• Assim, ele é levado a imaginar que a linguagem toda esteja assentada, que o sentido lingüístico esteja assentado, sob um conjunto de entidades absolutamente simples, absolutamente no sentido lógico do termo, ou seja, entidades a respeito das quais eu não pudesse ter a dúvida sobre a existência que eu tenho a respeito a Homero.

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• A linguagem só pode funcionar caso eu pressuponha na sua base a existência de nomes imediatamente ligados a objetos logicamente simples, objetos que não podem ser descritos de maneira alguma e que por não poderem ser descritos não podem deixar de existir.

• Ou seja, eles não são formados por nenhuma conjunção contingente de outros objetos, eles não podem ser imaginados como uma concatenação de objetos mais simples que eles e nesse sentido eles só podem ser nomeados e não podem ser objetos de discrição como Homero pode.

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• Nos vivemos usando nomes de coisas extremamente complexas como Homero, como CAETERA, COMO GARRAFA, etc.

• E eu respondo a vocês que nem mesmo as cores eram consideradas por Wittgenstein objetos simples.

• Wittgenstein termina sua obra “Tratactus Logico-Philosoficus” sem dar um único exemplo de objeto simples.

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• O objeto simples no Tractatus é uma postulação que é exigida pela estrutura essencial da linguagem, mas que só vai poder ser definitivamente verificada ao final do processo de análise que ele acreditava que poderia ser feito depois que o Tractatus tivesse sido escrito.

• Ou seja, depois do Tractatus estabelecer a necessidade desses objetos simples, os filósofos, os lógicos da posteridade, tratariam de analisar as sentenças da linguagem e achar esses objetos logicamente simples de que toda nossa linguagem é composta.

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• Ou melhor, esses objetos logicamente simples, designados pelos nomes que estão na base de toda e qualquer linguagem possível.

• É como, portanto, se inconscientemente ao falar, nós mobilizássemos internamente, inconscientemente esses nomes de objetos simples.

• Nós não sabemos quais são esses nomes, nós não temos consciência deles, mas eles devem estar ali, eles devem estar mobilizados para que o sentido tenha se formado.

• As cores não satisfazem Wittgenstein em função de uma outra exigência que Wittgenstein faz para essa grade da linguagem, para esse solo a partir do qual toda e qualquer preposição pode ser construída.

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• Essa outra exigência, é que as preposições da linguagem, as preposições mais básicas da linguagem, sejam não apenas constituída por nomes logicamente simples, mas sejam também completamente independente umas das outras.

• Uma proposição básica da linguagem, diz Wittgenstein, não pode conter uma outra proposição dentro dela.

• Se, de fato, toda nossa linguagem, está assentada numa rede de nomes que se projetam por objetos logicamente simples, então a conseqüência imediata disso é que toda e qualquer linguagem, o português, o italiano, o inglês, etc, é expressão de um mesmo pensamento, de um conjunto de possibilidades combinatórias, por trás do meu pensamento, por trás da minha articulação lingüística, que eu faço no nível mais externo, por intermédio dos sinais e das regras do português, por trás disso, está a mesma estrutura que sustenta um discurso feito numa língua completamente diferente.

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• Existe portanto, indissociável do Tractatus, uma certa visão absolutista do significado lingüístico, e por conseqüência disso da própria racionalidade humana.

• Se nós considerarmos que a racionalidade humana está indissociavelmente ligada do exercício da linguagem, então para o primeiro Wittgenstein, essa racionalidade era única, a mesma, em qualquer língua que ela se manifestasse, em qualquer época, em qualquer tempo.

• O homem seria basicamente um animal que fala, e ao falar e para falar, projeta para o mundo a mesma rede de combinações elementares que é constituidora de todo e qualquer sentido possível.

• No entanto, essa afirmação tem que ser qualificada, porque para o primeiro Wittgenstein não existe uma linguagem associada à cultura, à sociedade, nem mesmo associada à duas pessoas que estejam conversando.

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• Para o primeiro Wittgenstein é indispensável que a linguagem só se constitui a partir do momento em que eu projeto nomes sobre objetos.

• Como eu disse, essa projeção é em grande parte inconsciente, não tenho consciência que estou fazendo mas a faço, enquanto eu produzo sentidos eu estou necessariamente projetando os nomes sobre os objetos do mundo.

• Mas essa projeção por sua vez, ela não seria descritível, como ela é condição de possibilidade da linguagem, como ela é aquilo que torna possível o exercício da linguagem, ela está por assim dizer fora daquilo do campo que pode ser descrito.

• Eu só poderia descrevê-la, diz Wittgenstein, se eu assumisse um ponto de vista externo à linguagem, se eu saísse por assim dizer da linguagem e visse aquilo com que faz com que a linguagem ganhe sentido.

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• Ora, quando eu saio da linguagem, eu não sou capaz de nenhuma articulação lingüística, tudo o que eu posso fazer é enxergar essas articulações sem poder descrevê-las.

• Ora quem faz estas articulações entre nomes e objetos sou eu, sou eu que projeto os nomes nos objetos, sou eu que doto as sentenças de sentido.

• Sou eu que atribuo esse sentido ou aquele a sentença de que estou falando agora.

• Portanto, é apenas pelo exercício desse eu que a linguagem se constitui.

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• Esse eu porem não é o eu psicológico:– O que eu quero dizer com o eu psicológico é

uma série de fatos que eu poderia descrever, dizer por exemplo, eu estou com dores, estou com saudades, ou que estou imaginado, tal ou tal coisa, estou lembrando da minha tia, tudo isso eu posso dizer, tudo isto pode ser descrito, isso que acontece no âmbito desse eu é perfeitamente descritível, é o objeto das discrições lingüísticas e não constitui portanto esse campo pré-linguístico que, segundo Wittgenstein, é responsável pela instauração do sentido.

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• Esse eu que instaura significações, esse eu que projeta nomes sobre objetos é um eu que está subtraído a possibilidade de descrição e por isso merece de Wittgenstein a qualificação de eu transcendental.

• Por que esse eu é transcendental? – Ele ultrapassa em primeiro lugar o campo da

discrição possível. – Mas ele é transcendental também num segundo

sentido, ele é transcendental porque ele é condição de possibilidade do exercício lingüístico, sem condição de possibilidade quer dizer o seguinte:

• sem ele o sentido não se constitui.

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• Ele é portanto de um lado exterior ao sentido já que ele não pode ser objeto de uma discrição, mas ele é por outro lado inerente ao sentido, já que sem ele o sentido não se constitui.

• Esse eu que está por trás da discrição, esse eu que constitui a significação, que projeta um nome sobre o mundo, é o que Wittgenstein chama de eu transcendental e que vai constituir um dos principais focos de crítica do segundo Wittgenstein.

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Wittgenstein, ética e estética:• Há duas filosofias de Wittgenstein, a partir do momento

que ele constata que sem um eu que está para além da discrição e que fundamenta a projeção da linguagem no mundo, sem esse eu o sentido jamais se constituiria, ele passa a formular, um ponto de vista ético e estético que constituiria o núcleo mesmo do Tratactus.

• Wittgenstein não está nem um pouco preocupado quando fala em ética no Tratactus com a divisão que nós habitualmente traçamos entre ações boas e ações más, entre aquilo que merece castigo e aquilo que merece recompensa, entre aquilo que deve ser elogiado e aquilo que deve ser condenado.

• Wittgenstein não está preocupado enfim com alguma coisa que seja interna a cultura, com nada que seja da economia interna dessa ou daquela cultura.

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• Wittgenstein está preocupado, isto sim, com o bem absoluto que não tem contrario, Wittgenstein está preocupado em saber se há alguma coisa absolutamente desejável, desejável por si mesma, não desejável em função de uma conseqüência que ela tenha, não desejável em função de um regra que se instituiu nessa ou naquela época histórica, mas desejável por si mesma, desejável para esse sujeito dizer sozinho no exercício da constituição do sentido.

• Vocês vão ver que o sujeito da linguagem, esse sujeito que constitui sentidos, está diante de um conjunto de objetos que tenha uma existência necessária, ou seja, que não podem deixar de existir, objetos que estão na base da constituição na base de todas as outras sentenças que podem ser verdadeiras ou falsas na linguagem e que portanto tem uma existência que não está submetido a oposição entre o verdadeiro e o falso.

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• O sujeito que projeta sinais nessa rede de objetos tem uma ordem eterna de significações, uma ordem eterna de objetos, que preenchem de sentido esses sinais mais básicos da linguagem, que a análise com o tempo irá, assim esperava Wittgenstein, descobrir, desvelar.

• Essa ordem eterna não se confunde com nenhum fato do mundo. – Qualquer fato do mundo, qualquer coisa que eu possa

descrever, qualquer coisa que eu posso tornar as sentenças da minha linguagem verdadeiras ou falsas, vai ser uma concatenação acidental desses objetos.

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• Uma concatenação que ocorreu, mas que poderia não ter ocorrido.

• Essa concatenação acidental é aquilo que é objeto das ciências naturais, em primeiro lugar, e do nosso discurso cotidiano de maneira geral.

• Ao contrário, os objetos não estão submetidos a essa oposição, eles não são formados por nenhuma espécie de concatenação, eles são absolutamente simples.

• Portanto não cabe falar a respeito da existência ou inexistência de um objeto, o objeto é algo que se vocês quiserem existe necessariamente, é algo a respeito de que eu não posso imaginar a inexistência, é algo que fundamenta toda e qualquer coisa que eu imagino, todas as minhas imaginações podem ser traduzidas em sentenças, mas nenhuma dessas imaginações é absolutamente necessária no sentido em que o objeto é, porque se o objeto não estiver presente, nenhuma dessas imaginações pode ser, se quer, articulada.

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• Portanto os objetos simples, são uma presença necessária para todo e qualquer sujeito capaz de linguagem.

• Mais do que isso, essa presença necessária se traduz num certo tipo de eternidade, esse objeto não pode mudar, não pode se alterar, se ele se alterasse, essa alteração devia me revelar algo que permanece e algo que mudou, e deveria me revelar portanto uma certa complexidade no interior do objeto.

• Não podendo haver essa complexidade, a conclusão de Wittgenstein é: – esses objetos são eternos. – A contemplação desses objetos eternos é para Wittgenstein

aquilo que constituem propriamente o objeto de uma ética.

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O que é a ética para Wittgenstein?• É a contemplação da ordem eterna do universo, é a contemplação

de uma certa ordem eterna, melhor dizendo, do qual todo e qualquer universo vai ser um determinado recorte.

• Todo e qualquer mundo possível que eu posso imaginar vai ser um diferente arranjo de objetos que existem necessariamente.

• E portanto, a contemplação dessas existências necessárias, constitui uma contemplação de uma ordem imutável, de uma ordem que é dessa maneira e não poderia ser de outra.

• Qualquer que seja essa ordem de objetos, esse conjunto de objetos, a contemplação desse conjunto de objetos quando realizada, deve coincidir com a contemplação de todos os estados de coisas possíveis, ou seja, de todos os estados de coisas que eu posso descrever na linguagem.

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• Mas nós sabemos, que contemplar esses objetos significaria contemplar não o que ocorre, mas a possibilidade de ocorrência de alguma coisa.

• Significaria contemplar não o mundo tal como ele é, mas contemplar a possibilidade de um mundo.

• A contemplação ética no Tratactus é simplesmente um olhar dirigido a possibilidade do acontecimento, isso quer dizer simplesmente uma coisa, significa eu contemplar a existência de algo por oposição da existência do nada.

• Significa olhar em volta e ver que está acontecendo algo sem me preocupar em dizer o que está acontecendo.

• Essa contemplação, segundo Wittgenstein, coincidiria com exercício silencioso dirigido a essência do mundo.

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• Um exercício silencioso porque isso que eu contemplo nesse momento, a existência de algo, ao invés da existência do nada, não pode ser descrito por nenhuma linguagem.

• O que eu estou contemplando ao final de contas não são fatos, mas a possibilidade dos fatos.

• Não são concatenações de objetos, mas os próprios objetos ou a possibilidade de concatenação desses objetos.

• Esse era para Wittgenstein o objeto ultimo da ética que coincidia segundo ele com objeto ultimo da estética.

• Se há alguma coisa que é absolutamente bela, essa coisa deve coincidir com isso que é absolutamente bom.

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• O que é absolutamente belo, segunda Wittgenstein, é novamente o mundo visto do ponto de vista da eternidade, não o mundo visto pelos olhos de um cientista, mas o mundo visto pelos olhos de um místico, que se assombra por assim dizer, não como os fenômenos que estão diante deles, mas com a existência de algo diante dele, seja lá o que for.

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O Segundo Wittgenstein• Essa concepção da filosofia do Tratactus vai ser

radicalmente combatida, na segunda fase do pensamento de Wittgenstein.

• Ele aos poucos vai percebendo que alguns detalhes do seu primeiro livro, do Tratactus, simplesmente não funcionam, que alguns detalhes do seu livro levariam todo seu projeto ao naufrágio.

• E vai aos poucos abandonando seu projeto, e passa a construir uma filosofia que se define por uma oposição radical ao Tratactus, ao livro que ele mesmo havia escrito.

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• Se vocês abrirem logo na primeira página do segundo livro de Wittgenstein, Investigações Filosóficas, vocês vão ver ali uma citação de Agostinho.

• Essa citação, tirada das confissões de Agostinho, Agostinho está lembrando o modo pelo qual ele aprendeu a utilizar as palavras da sua linguagem.

• Agostinho está lembrando como foi quando era criança que ele aprendeu a falar.

• Agostinho diz o seguinte: bom, quando os meus pais queriam me ensinar a significação de uma palavra, eles se aproximavam do objeto e repetiam a palavra diante do objeto, faziam gestos diante do objeto e me faziam perceber que as palavras que eles usavam, garrafa por exemplo, queria se referir aquele objeto.

• Wittgenstein toma essa citação de Agostinho como uma espécie de motivo condutor de seu livro já que todo ele vai se constituir numa crítica dessa noção.

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• Na crítica da noção de que, em primeiro lugar, o significado de uma palavra seja um objeto que essa palavra designa.

• Em segundo lugar, a idéia de que uma sentença seja uma concatenação de palavras.

• E em terceiro lugar, a idéia dessa concatenação de palavras, apresente diante de mim, uma concatenação impossível de objetos.

• O que Wittgenstein vai colocar diante dos olhos do leitor, não é uma argumentação serrada, não é uma teoria, não são deduções lógicas, mas é um caso.

• Ele pede que o leitor imagine que está num mundo em que a linguagem é muito mais simples que a nossa.

• Nesse mundo, só existem três categorias de palavras. • A primeira categoria diz respeito a objetos que nós podemos

comprar numa mercearia. • A segunda categoria de palavras são nomes de cores.

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• A terceira categoria de palavras são números. • E nesse mundo, onde só existe uma linguagem tão pobre como

esta, só existe um tipo de sentença possível, composta pela concatenação de palavras tomadas dessas três categorias.

• Por exemplo, quando alguém quer cinco maçãs vermelhas, pode simplesmente mandar uma criança a mercearia com um papel no qual está escrito a sentença cinco maçãs vermelhas.

• Ele monta uma cena de uso lingüístico na qual aparentemente, no primeiro momento, tudo parece ocorrer da maneira como o Tratactus esperava que ocorresse.

• Ou seja, vocês tem três categorias de palavras, cada uma delas designa um tipo de objeto e a concatenação dessas palavras, designa uma certa concatenação de objetos que está expressa numa cena final com o saco contendo cinco maçãs vermelhas.

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• Por tanto, num primeiro momento, devemos perceber uma parodia do Tratactus, ou seja, aquilo que o Tratactus dizia acontecer no nível daqueles objetos sublimes, absolutamente simples, inalcançáveis, que eu só poderia alcançar num longo processo de análise, aqui ocorre no nível dos objetos cotidianos.

• Apesar de ter essa intenção paródica, o mesmo exemplo tem intenções construtivas.

• Trata-se também de apresentar a mesma cena, a mesma proposição, a mesma mensagem sobre aquele papel, sob um outro ponto de vista.

• Trata-se de apresentar uma linguagem do ponto de vista que o Tratactus se recusou sistematicamente a considerar.

• O ponto de vista da ação do sujeito. • O ponto de vista de uma ação governada por regras. • O que é que o nosso vendedor faz o tempo todo?

– Ele aplica uma determinada técnica que ele aprendeu na sua infância. – Ele sabe, em primeiro lugar, que quando está diante de um nome como

maçãs, ele deve ir à gaveta.

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• A mesma forma que a palavra vermelho está associada a outra técnica.

• Não se trata de procurar a palavra vermelho nas gavetas. • Ele não iria encontrar. Ele deve saber que aquela palavra deve

levá-lo a uma tabela. • E ele sabe usar uma tabela. Ou seja, existe uma certa técnica que

você aprendeu referente a tabela e que é suficiente que você exercite a linguagem naquele contexto.

• E da mesma forma com os números. • E você tem que aprender a contar, e mais do que isso, associar o

processo de contagem a determinada atividade no interior da mercearia, ou seja, pegar as maçãs da gaveta enquanto conta.

• Dominando essas técnicas, você tem tudo aquilo que é necessário e suficiente para exercer com competência a linguagem naquele contexto.

• Contexto como nós vimos é um microcosmos, é um recorte, uma situação artificialmente simples, mas que pretende não apenas parodiar o Tratactus, mas também oferecer uma alternativa.

• Indicar um caminho diferente, abrir um novo horizonte.

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• É como se nesse primeiro parágrafo das investigações, Wittgenstein oferecesse uma nova maneira de enxergar a constituição do sentido.

• Mas não temos mais a necessidade de um sujeito projetando nomes sobre objetos.

• O numero cinco afinal de contas não é objeto nenhum nesse jogo. • Nós não temos mais a necessidade de postular simplicidade dos

objetos. • A maçã afinal de contas é um objeto extremamente complexo. • E nós não temos mais a necessidade de preocuparmos com a sutileza

atribuída na atribuição das cores, pouco importa que quando eu atribuo o vermelho eu não possa atribuir o verde, o que importa é eu saber usar aquela tabela.

• Portanto, de um lado há essa destruição do Tratactus, por outro lado um horizonte sendo aberto que pode ser resumido numa palavra: – domínio de uma técnica, capacidade de seguir uma determinada regra.

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• Regra que foi ensinada através de um processo de adestramento dessa pessoa que a tornou apta a utilizar os sinais da linguagem da maneira como as pessoas daquela comunidade utilizam esses sinais.

• Existem também ali, uma parodia referente a maneira pela qual concebemos independentemente de aceitarmos ou não as doutrinas radicais do Tratactus, a constituição do sentido. Porque todos nos pensamos no sentido como algo ocorrendo na nossa mente.

• Todos nos pensamos a constituição do sentido como um fenômeno mental que é por de alguma maneira intransferível, que está trancado na minha esfera privada.

• Como eu penso a constituição do sentido na esfera privada? • Eu penso fundamentalmente como uma capacidade em primeiro

lugar de abstrair. • Como é que eu aprendi o que é o vermelho?

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• Nós fomos levados a pensar o seguinte: – eu fui apresentado a diversos vermelhos e extrai desses objetos

todos aquilo que era comum a todos eles. – E guardei essa característica comum em algum escaninho da

memória na forma de uma amostra. – Fiz a mesma coisa com as outras cores, de tal modo que ao

final desse processo de abstração, eu tinha uma seqüência de escaninhos que formavam um mesmo território: o território das cores.

– Formavam por assim dizer, uma tabela mental. – Que eu agora uso todas as vezes que eu emprego a palavra

vermelho para descrever situações do mundo ou para compreender discrições que me são feitas.

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• Quando alguém me diz o carro é vermelho, ainda que nós não aceitemos o Tratactus, ainda que nós achemos que o Tratactus está com a razão, nós somos insensivelmente levados a pensar que de algum modo no meu interior, no meu inconsciente lingüístico existe algo semelhante a uma tabela, uma tabela de cores armazenadas na memória, que me permite chamar de vermelho coisas que têm uma determinada cor e não outra, que me permite não confundir o vermelho com o verde, por exemplo.

• Independentemente de aceitar as doutrinas radicais do Tratactus, nós todos somos tentados a pensar o funcionamento da linguagem como um evento essencialmente mental, em primeiro lugar, e somos levados a pensar esse evento mental como algo essencialmente análogo a essa mercearia.

• Essa mercearia não é apenas uma parodia do Tratactus é uma parodia de nossa mente como qual a concebemos.

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• É assim que nós imaginamos que a linguagem funcione em câmera lenta.

• O mentalismo, outra dos alvos de Wittgenstein, já está prefigurado a ir nesse exemplo da mercearia do primeiro parágrafo das investigações filosóficas.

• Todos esses temas vão ser longamente explorados por Wittgenstein ao longo de todo o livro, e eles nos dão uma imagem da linguagem, da racionalidade, profundamente diferente daquela que nos fora legado pelo Tratactus.

• Em primeiro lugar, agora significação, é o domínio de uma técnica e esse domínio não tem nada de mental, ele é absolutamente objetivo, ele é não apenas objetivo, mas antes de mais nada, domínio social.

• Ele depende de uma serie de regras, que são acordadas socialmente e são seguidas e controladas socialmente.

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• A significação nas investigações filosóficas não é algo que possa ocorrer dentro de mim, na minha mente.

• Nem muito menos no nível de um sujeito transcendental, como queria o Tratactus, isolado de todo resto do mundo, projetando sobre o mundo as suas significações.

• A significação não é algo que possa ocorrer em mim, ou em qualquer um de vocês, é algo que só pode ocorrer entre nós, é algo que só pode estar baseado num acordo que todos nós fizemos para utilização das palavras.

• É algo que está baseado no domínio de uma técnica associada a determinados sinais sonoros ou escritos, exatamente semelhantes à aquela técnica necessária e suficiente para execução daquelas tarefas no interior da mercearia.

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• A razão, conseqüentemente, já não é algo que posso ser fundamentada no sujeito, já não é algo que possa ser extraído de um sujeito que pensa sozinho no mundo, e que passa em seguida a repor por esse mundo todos os conteúdos, todas as idéias, todos os raciocínios, todas as deduções.

• A razão é agora um jogo social, é um fruto de determinada convenções que nós fizemos e que não se baseiam em nenhuma instância anterior a essas convenções.

• Wittgenstein no seu segundo período não vai em nenhum momento negar a existência de uma dimensão subjetiva no homem.

• Mas vai negar a essa dimensão subjetiva qualquer papel fundamentador, qualquer papel básico na fundamentação da linguagem e da razão.

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A Importância de Wittgenstein• É por isso talvez que Wittgenstein seja tão importante para o

pensamento do século XX. • Ele rompe com uma certa doutrina, com uma certa concepção da

razão, que se vocês pensarem bem, nos acompanham pelo menos desde Descartes.

• A concepção de uma razão que pode encontrar no sujeito, no individuo, e mais especificamente, na mente humana, o seu fundamento ultimo, a sua base suficientemente necessária.

• Escapando dessa dimensão, Wittgenstein como outros filósofos do século XX, vai colocar no seu lugar, uma outra dimensão, a dimensão do social, do coletivo, do comunitário, o acordo entre as pessoas substituindo as intenções e projeções de um sujeito onipotente, de um sujeito capaz de si só, por em funcionamento a máquina da linguagem, por em funcionamento a máquina da razão.

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• É por isso fundamentalmente que Wittgenstein seja um autor tão importante.

• De um lado, no Tratactus, ele é a combinação de toda uma tradição filosófica, ninguém foi mais radical que Wittgenstein nessa tradição.

• O sujeito do Tratactus não é um sujeito da ciência, não é um sujeito do conhecimento, não é o sujeito que vai fundamentar minhas certezas, o sujeito vai fundamentar o meu sentido.

• Sem o sujeito do Tratactus eu não tenho conhecimento, mas eu também não tenho desejos, eu não tenho crenças, não tenho duvidas, não tenho perguntas, eu não tenho coisa alguma.

• Ou seja, o ponto de vista do Tratactus coincide com o ponto de vista da razão clássica ao localizar no sujeito, o ponto de todo jogo racional.

• Mas radicaliza esse modelo clássico na medida em que adota um afastamento máximo em relação a todas as atividades humanas.

• Nenhum ponto de vista conseguiria um afastamento tão grande quanto da linguagem

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• A linguagem impregna tudo que nós fazemos. • É por isso que o Wittgenstein do Tratactus é de uma certa maneira

a combinação da razão ocidental. • No segundo Wittgenstein, nós temos um rompimento, o mais

radical possível com esse modelo. • O mais radical possível pois não se trata de dissolver esse

deslocamento das atribuições para nível social em nenhuma espécie de sociologia, em nenhuma espécie de história da cultura.

• Eu continuo procurando nesses jogos que nós acordamos entre nós, o fundamento do sentido.

• Continuo procurando aí a origem da necessidade. • Continuo procurando aí os sentidos da linguagem. • No entanto essa linguagem já não é única, ela não é dada

anteriormente a esses tratos, não é dada anteriormente a essas convenções, ela é constituída por elas.

• E não há nenhum ponto de vista anterior que possa por assim dizer por essas convenções em movimento, elas são a origem do nosso movimento racional.

• Wittgenstein rompe com uma concepção de uma razão fundamentada no individuo e coloca a dimensão do social.