waly salomao

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  • 7/27/2019 Waly Salomao

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    WalySalomo

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    Waly Dias Salomo(Jequi, 3 de setembro de 1943 Rio de Janeiro, 5 de maio de 2003).

    O poeta, letrista, ator e produtor cultural brasileiro nascido em Jequi, Estado daBahia, participou do movimento cultural Tropiclia, na dcada de 60, que misturoutemas e palavras americanas aos utilizados pela popular Bossa Nova, mas no seconsiderava do grupo. Filho de pai srio e me baiana, desde cedo mostrou-sevoltado para a intelectualidade.Lanou seu primeiro livro de poemas, Me Segura que eu Vou Dar um Troo (1971),uma obra com textos escritos durante uma temporada passada na priso,paginados e diagramados pelo artista plstico e seu amigo Hlio Oiticica (1937-

    1980). Neste ano tambm dirigiu o clssico show Fa-tal (1971), marco na carreirade Gal Costa. Co-autor de msicas como Mel e Talism, ambas em parceria comCaetano e que viraram ttulo dos discos de Maria Bethnia (1979 /1980),respectivamente, Anjo Exterminado e Mal Secreto, com Jards Macal, Assaltarama Gramtica, com Lulu Santos e sucesso com os Paralamas do Sucesso, Baladade um Vagabundo, com Roberto Frejat, Pista de Dana, com Adriana Calcanhotto,e Vapor Barato, com Jards Macal, entre outros.

    Entre seus livros de sucesso figuraram Gigol de Bibels, Surrupiador deSouvenirs, Algaravias, Lbia e Tarifa de Embarque (2000), entre outros. Participoudo filme Gregrio de Mattos (2002), da cineasta Ana Carolina, onde vivia o poeta

    luso-baiano ao lado de Marlia Gabriela e Ruth Escobar. Casado e pai de doisfilhos, o poeta da Tropiclia ficou internado por doze dias na Clnica So Vicente,na Gvea, zona sul do Rio, para fazer tratamento de um cncer no intestino emorreu aos 59 anos. A causa mortis oficial foi a falncia mltipla de rgos, depoisque a doena causou metstase para o fgado. Aps o velrio no Cemitrio SoJoo Batista, o corpo do poeta e letrista foi cremado no Cemitrio do Caju, nazona norte do Rio de Janeiro. Era secretrio Nacional do Livro do Ministrio daCultura, nomeado pelo Ministro Gilberto Gil, e responsvel pela divulgao do livroe da leitura.

    Em 1997, ganhou o Prmio Jabuti de Literatura com o livro de poesia Algaravias.Seu ltimo livro foi Pescados Vivos, publicado em 2004, aps sua morte.

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    HojeWaly Salomo

    O que menos quero pro meu diapolidez,boas maneiras.Por certo,

    um Professor de Etiquetasno presenciou o ato em que fui concebido.Quando nasci, nasci nu,ignaro da colocao correta dos dois pontos,do ponto e vrgula,e, principalmente, das reticncias.(Como toda gente, alis...)

    Hoje s quero ritmo.Ritmo no falado e no escrito.Ritmo, veio-central da mina.Ritmo, espinha-dorsal do corpo e da mente.Ritmo na espiral da fala e do poema.

    No est prevista a emissode nenhuma Ordem do dia.Est prescrito o protocolo da diplomacia.AGITPROP Agitao e propaganda:Ritmo o que mais quero pro meu dia-a-dia.pice do pice.

    Algum acha que ritmo jorra fcil,pronto rebento do espontanesmo?Meu ritmo s ritmoquando temperado com ironia.Respingos de modernidade tardia?E os pingos dguado saltos bruscos do cano da torneira

    epassam de um ritmo regularpara uma turbulncia

    aleatria.

    Hoje...

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    Fbrica do PoemaWaly Salomo

    In memoriam Donna Lina Bo Bardi

    sonho o poema de arquitetura idealcuja prpria nata de cimento encaixa palavra porpalavra,tornei-me perito em extrair fascas das britase leite das pedras.acordo.e o poema todo se esfarrapa, fiapo por fiapo.acordo.o prdio, pedra e cal, esvoaacomo um leve papel solto merc do ventoe evola-se, cinza de um corpo esvadode qualquer sentido.acordo,e o poema-miragem se desfazdesconstrudo como se nunca houvera sido.acordo!os olhos chumbados

    pelo mingau das almas e os ouvidos moucos,assim que saio dos sucessivos sonos:vo-se os anis de fumo de pioe ficam-se os dedos estarrecidos.

    sindoques, catacreses,metonmias, aliteraes, metforas, oxmorossumidos no sorvedouro.no deve adiantar grande coisapermanecer espreita no topo fantasmada torre de vigia.

    nem a simulao de se afundar no sono.nem dormir deveras.pois a questo-chave :sob que mscara retornar o recalcado?

    (mas eu figuro meu vultocaminhando at a escrivaninhae abrindo o caderno de rascunhoonde j se encontra escritoque a palavra "recalcado" uma expresso

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    por demais definida, de sintomatologia cerrada:assim numa operao de supresso mgicavou rasur-la daqui do poema)

    pois a questo-chave :sob que mscara retornar?

    "Poema jet-lagged"Waly Salomo

    "Viajar, para que e para onde,se a gente se torna mais infelizquanto retorna? Infelize vazio, situaes e lugaresdesaparecidos no ralo,ruas e rios confundidos (...)

    Mas ficar, para que e para onde,se no h remdio, xarope ou elixir,se o p no encontra cho onde pousar,(...)se viajar a nica forma de ser felize pleno?"

    (do livro "Algaravias", 1996)

    Eu e Outros PoemasWaly Salomo

    Adeus clara vista para estrelas e sol.Retirada da Laguna:perda gradual de cabelos,

    dentes,consoantes,substantivos, verbos, sentenas, prefixose sufixos.

    A pugna imensa travada nas gengivas murchase recuadas.

    O verme ser o herdeiro de excessos e tibiezas,expectativas e indiferenas.O verme ser o equalizador de otimismos

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    e pessimismos,iluminismos e trevas,ilustrao e pardia.

    Os ossos descarnados e desfeita a potnciaQue urdia uma clonagem do canio pensantede Pascal.

    Cado feito Lcifer que no sonha maiscom a luz.

    Devenir, devirWaly Salomo

    Trmino de leiturade um livro de poemasno pode ser o ponto final.

    Tambm no pode sera pacatez burguesa doponto seguimento.

    Meta desejvel:alcanar oponto de ebulio.

    Morro e transformo-me.

    Leitor, eu te reproponhoa legenda de Goethe:Morre e devm

    Morre e transforma-te.

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    Novelha cozinha poticaWally Salomo

    Pegue uma fatia de Theodor AdornoAdicione uma posta de Paul CelanLimpe antes os laivos de forno crematrioAt torn-la magra-enigmticaCozinhe em banho-mariaFogo bem baixoE depois leve ao Departamento de Letras

    Para o douto Professor dourar.

    A vida a copia da arteWaly Salomo

    AreiaPedra

    AncinhoJardins de Kioto

    Alucinado pelo destemorDe morrer antesDe ver diagramado este poemaOu eu trago Horcio pra cPra Maca-de-CimaOu imperativo tra-loE ao preceito latino de coisa alguma admirar

    SapoVaga-lumeUrutauEstrela

    Nestes ermos cravar as tendas de Omar

    Ler poesia como se mirasse uma flor de ltusEm botoEntreabrindo-seAberta

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    AnacreonteFragmentos de SafoHinos de HrderlinOdes de ReisEl jardn de senderos que se bifurcanJardim de EpicurodenAgulhas imantadas & frutas frescas para a vida diria.

    Amante da AlgazarraWaly Salomo

    No sou eu quem d coices ferradurados no ar. esta estranha criatura que fez de mim seu encosto. ela !!!Todo mundo sabe, sou uma lisa flor de pessoa,Sem espinho de roseira nem spera lixa de folha de figueira.

    Esta amante da balbrdia cavalga encostada ao meu sbrio ombroVixe!!!Enquanto caminho a p, pedestre -- peregrino atnito at a morte.Sem motivo nenhum de pranto ou angstia rouca ou desalento:No sou eu quem d coices ferradurados no ar. esta estranha criatura que fez de mim seu encostoE se apossou do estojo de minha figura e dela expeliu o estofo.

    Quem corre desabridaSem ceder a concha do ouvidoA ningum que dela discorde estaSelvagem sombra acavalada que faz versos como quem morde.

    Janela de MarinettiWaly Salomo

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    cidade dura e arreganhada para o solcomo uma posta de carne curtida ao sal -onde na rua do maracuj adolesci

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    e, louco, sorvia a vida a talagadas de cachaade alambique.graveto-do-co pitu luar do serto.

    uma ponte corta um rio de fazer contas.arco e flecha de Sulto das Maltasmira certeira as ventas do drago l na lua.uma seta e um nome tupi de cidade em uma placa- , , jequi, cesto oblongo de cip pra pegar peixen'gua, , . -e a rua de paraleleppedo e a rua de cho batidoe a outra rua metade paraleleppedo metade cho batidolembra jurema p de jo cacto mandacaru.

    fruta de palma perde os espinhos

    mergulhada dentro da bacia cheia de areia.bolo de puba umburana flor de sisal.cidade dura e arreganhada para o solcomo uma posta de carne curtida no sal,meu museu do inconsciente um prdio mais duro de roermais arreganhado para o solmais curtido nas salinas do canal lacrimal.

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    o anncio ditava:..."a farmcia estreita da rua larga"...abrominha caixa de amor e dioabusoda enumerao evocativa,desando a disparar:rua alves pereira...rua apolinrio peleteiro...rua do cochicho...distingo bem o caroo duro de umbu chupado

    da bostica, da bostiquinha redondinhaque nem biscoito de gomaque a cabra da caatinga fabrica.de pouco vale agora essa sabena.o cho e tudo s paisagem calcinadae tela deserta e miragem e cena envidraada.

    janela de marinettisem vista panormicame lixo pro louvre da vitria de samotrciaapois aposto na corrida futurista da prepego carona na rasante de um urubu

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    diviso lajedo molhado espelhando umbuzeiro gravat.

    um aleijada esmola e merca rolete de canatrs ararsa dois micos uma jibia enrondilhada.uma velha choraminga e mi dez tostes de ervamais cinco mil-ris de sementes de uruncum.

    jegues carregados de panacuns.pau-ferro rolim curral dos bois.

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    uma ponte corta um rio de fazer contas.pego as contas dos olhos e as enfio

    nas platibandas das casas coloridas.rua das pedrinhas... borda dam mata...guito guit... bolha de mijo de pot...a profa. teresinha fialhoe a famlia inteira de doutor fialhono poleiro das galinhas verdes de plnio salgado.verdes, verdes. e o amarelo aceso do enxofreno fundo da talha d''agua-de-beber.que no escutei "queto!", ouvir no ouo "coitado!".

    urubuservar a vida besta do alto do urubuservatrio.

    por amor de quando fera e peixe e planta e pedra e avee besouro e estrela e estrume e gro de areia.cada qual de per si,e os jeitos e as qaulidadesdas palavrasdas quimerasdos seres,separados ou em unssonossilibavam orculos...a ti confesso, janela de marinetti:

    comparacem at o mirantemnimas brasas inquietascatulptadas pelas cricimasdos rios pretos enchidos dos cafunds-do-judas(mincias de azinhavres,lnguas de trapos e de caroos,de troncos e tocos,hemorragias de baronesas e molambos);

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    na porta da casa facistao audaz tenor bambino torregrossa assassina lua e luar.

    a acha de lenha do passado figura fsforo queimadocarvo apagadotio perdido e achado aceso(no meio-dia calcinado carvo forja diamante)que crepita confundido com as paredesinternas

    externasdo poro da bexigaque crepita fundido no fole refenfemfem femfemfemno resflego da tripa que toca gaita,a tripa gaiteira da folia dos magos reis do boi janeiro.quem foi que disse que janeiro no saaboi janeiro t na rua com prazer e alegria.

    essa alegria, motor que me move.

    nascido com o auxlio das mos da parteira me jove.

    para todo sempre confinoo registro da palavra rotinacom o vento e a chuvacom o plvio e o pneumamachetados no registroda palavra enigma.

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    Cidade-Sol.Helipolis,Baalbeckda minha infncia desterrada.

    in Algaravias, Editora 34

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    ExteriorWaly Salomo

    Por que a poesia tem que se confinar?s paredes de dentro da vulva do poema?Por que proibir poesiaestourar os limites do greloda gretada grutae se espraiar alm da grade

    do sol nascido quadrado?

    Por que a poesia tem que se sustentarde p, cartesiana milcia enfileirada,obediente filha da pauta?Por que a poesia no pode ficar de quatroe se agachar e se esgueirarpara gozar

    carpe diem! fora da zona da pgina?

    Por que a poesia de rabo presosem poder se operare, operada,polimrfica e perversa,no pode travestir-secom os clitris e balangands da lira?

    Mal SecretoWaly Salomo

    No choroMeu segredo queSou rapaz esforadoFico parado calado quietoNo corro, no choro, no converso

    Massacro meu medoMascaro minha dor

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    J sei sofrer

    No preciso de genteQue me orienteSe voc me perguntaComo vai?Respondo sempre igualTudo legalMas quando voc vai emboraMovo meu rosto no espelhoMinha alma choraVejo o Rio de JaneiroVejo o Rio de Janeiro

    O morro no salvo no mudoSujo o olho vermelhoNo fico paradoNo fico caladoNo fico quietoCorro, choro, conversoE tudo maisJogo num versoIntitulado Mal Secreto

    No choro

    Meu segredo queSou rapaz esforado

    (Poema musicado por Jards Macal, LP Fatal, Gal a todo Vapor Show gravado ao vivo, 1971)

    LauspereneWaly Salomo

    Quase qualquer antologiada atual poesia nacional:sequncia segue sequncia

    de poema-piadae pseudo-haicai.Ou o pior de tudoe o mais usual:brevidade-no concisobrevidade-camuflagemde poema travadoengolido pra dentro.Belo quando o seco,rgido, severo

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    esplende em flor.Seu nome: Cabral.Nome de descobridor.

    SENHOR DOS SBADOSWaly Salomo

    Uma noitenoitesnoites em claronoites em claro no matam ningummas claro, perdi a razogritei seu nome por toda a partedo edifcio em voquebrei vidraas da casa

    estilhaos de vidro espatifados no chorisquei paredes do apartamentocom frases roucas de paixoah que noche mas nocheraah que noche mas ...Dentro da escurido do quartorasguei no dente seu retratominha alma ardia meu bem...Volte cedoantes que acenda a luz do diaapague meu desejo num beijo

    bem bommeu bem volte cedo meu bem volte bem cedo

    (Poema musicado por Jards Macal)

    OUTROS QUINHENTOSWaly Salomo

    Abrolhos !Apuro juzo e vista :

    em matria de previso eu deixo furofuturo, eu juro, dimensoque no consigo vernem sequer reveristo porque no lusco-fuscoora pitombas!minha bola de cristal fica foscamando bala no escuroacerto tiro na boca da moscaoutras tantas giro a terra toda s tontasdobro o Cabo das Tormentas

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    rebatizo-o de Boa-Esperanae nessa espcie de caa ao vento levianovou pegando pelo rabo

    a lebre de vidro do acaso.Por acaso,em matria de previso s deixo furo- o juzo e a vista apuro -futuro, juro, dimensido q ignoroabrolhosvejo bem no claroturvo no escurominha vida afinal navega taliqualcaravela de Cabralum marinheiro enfia a cara na escotilha

    um grumete na gvea ziguezagueia e berrasinal

    de terra, terra ignota vista !tanto faz Brasil, ndia Ocidental ndia Oriental,

    sina, toucinho do cu e tormento, fado, amo e odeioo vira, a volta e o volteio

    da sinucada sempre mesma

    da

    n

    a-

    le

    s

    ma

    da sinuca-de-bico vital.Aorda !Vatap !

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    BarrocoWaly Salomo

    Quero crer que creioE finjo e creioQue mundo e egoAmbosSo teatrosDsparesE antpodas.

    Absolutos que se refratam / difratamEspelhos estilhaados que no se colam.

    Entanto soEcos de ecos que se interpenetramPartculas de ecos ocos, partculas de ecos plenos que se conectamA cosmos so cagados, cuspidos e escarrados pelo opparo caosE o uso do adjetivo est corretoPois que o caos um banquete.Fantasmas de peras.

    Ratos de coxias.Atos truncados.

    H uma lasca de palcoem cada gota de sangueem cada punhado de terra

    de todo e qualquer poema.

  • 7/27/2019 Waly Salomao

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    TRILOGIA AO MODO ENVIESADO DE WALY SALOMO

    Esttica da recepo

    Turris eburnea

    Que o poeta brutalista o espeto do co.

    Seu lar esburacado na lapa abrupta. Acol ele vira ona

    E cutuca o mundo com vara curta.

    O mundo de dura crosta de natural mudo,

    E, o poeta o anjo da guarda

    Do santo do pau oco.

    Abre os poros, pipoca as plpebras, e, com a p virada,

    mija em leque no cururu malocado na cruz da encruzilhada.

    Cachaas para capotar e enrascar-se em palpos de aranhas.

    mundo de surdas vboras sem papas nas lnguas cindidas,

    serpes, serpentes

    j que o poeta mimtico se lambuza de mel silvestre,

    carrega antenas de gafanhoto mas no posa de profeta:

    voz clamando no deserto.

    Pois eu, pitonisa, falo que ele, poeta,

    no permite que sua pele crie calo

    dado que o mundo de spera epiderme

    como a casca rugosa de um fero rinoceronte

  • 7/27/2019 Waly Salomao

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    ou de um extrapoemtico elefante

    posto que nas entranhas do poema os estofos do elefante

    so sedas

    delicadezas

    carncias de humano paquiderme.

    o mundo ocluso e mouco amasiado ao poeta gris e oco.

    Caatinga de groto seco atada gamela de piro pouco.

    Suportar a vaziez.

    Suportar a vaziez como um faquir que come sua prpria fome

    e, sem embargo, destitudo qui do usucapio e usufruto do tino

    com a debandada de qualquer noo de impresso prazo de jejum.

    Suportar a vaziez.

    Suportar a vaziez.

    Suportar a vaziez.

    Sem fanfarras, o vazio no carece delas.

    (Tarifa de embarque)

    Tarifa de embarque

    Sou srio. O que que te assombra, estrangeiro,

    Se o mundo a ptria em que todos vivemos,

    Paridos pelo caos?

    - Meleagro de Gdara, 100 anos a.C.

  • 7/27/2019 Waly Salomao

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    No te decepciones

    ao pisares os ps no p

    que cobre a estrada real de Damasco.

    No descerres cortinas fantasmagricas:

    camadas de folheados

    - gua de flor de roseira

    - gua de flor de laranjeira

    que guloso engolias,

    gravuras de aldes portando nforas ou cntaros,

    cartes do templo de Baal

    e das runas do reino de Zanubia em Palmira,

    fotos do Allepo, Latakia, Tartus, Arward

    que em criana folheavas nas pginas da revista Oriente

    na idade de ouro solitria e febril

    por entre as pilhas de fardos de tecidos

    da loja Samira;

    arabescos, poos, atalaias, minaretes, muezins,

    curvas caligrafias torravam teus clios, tuas retinas

    no vo af de erigires uma fonte e origem e lugar ao sol

    na moldura acanhada do mundo.

    Sria nenhuma iguala a Sria

  • 7/27/2019 Waly Salomao

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    que guardas intacta na tua mente rgia.

    Nunca viste o narguil de ouro que tua av paterna

    - Kadije Sabra Suleiman-

    exibia e fumava e borbulhava nos dias festivos

    da ilha de Arward.

    Retire da tela teu imaginrio inchado

    de filho de imigrante

    e sereno perambule e perambule desassossegado

    e perambule agarrado e desgarrado perambule

    e perambule e perambule e perambule.

    Perambule

    - eis o nico dote que as fatalidades te oferecem.

    Perambule

    - as divindades te dotam deste nico talento.

    (Tarifa de embarque)

  • 7/27/2019 Waly Salomao

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    Falax opus

    Obra enganadora

    Como se fosse dialogando com Z Celso Martinez Correia

    Chego e constato:

    - Teatro no se explica

    Teatro ato

    Afnico sim, afsico no

    Eu, poeta, perco a voz

    E quase me some o nume

    caro cado

    Asas Crestadas pelo sol

    Dos refletores

    Caricatura de caro

    Sapecado

    Estatelado no trio pergunto:

    - Aonde eu entro?

    Onde eu entro?

    Um eco cavo cavernoso retruca:

    - No entreato

    No entreato

  • 7/27/2019 Waly Salomao

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    No entreato

    (Armarinho de miudezas)

    Em louvor de PropertiusWaly Salomo

    AgoraUm olhar que passaE perpassa sobre as coisasIndolente como um gato persa

    pimana majestadepotestade oriental.

    Em louvor da poesia futura de PropertiusOutrora a vida fervilhou em TebasE era Tria adornada com torres.

    Protegido pela Lei do Direito AutoralLEI N 9.610, DE 19 DE FEVEREIRO DE 1998Permitido o uso apenas para fins educacionais.Este material pode ser redistribudo livremente, desde que no seja alterado, modificado e que asinformaes sejam mantidas.