vulnerabilidade ao uso de agrotÓxicos e difusÃo da agroecologia… · 2012. 9. 25. · 5...

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1 VULNERABILIDADE AO USO DE AGROTÓXICOS E DIFUSÃO DA AGROECOLOGIA: A CONSTRUÇÃO DE TERRITÓRIOS SAUDÁVEIS Ana Clara Sicari Martins Laboratório de Geografia Agrária – LAGEA Universidade Federal de Uberlândia – UFU [email protected] Raíssa Camin Franco Laboratório de Geografia Agrária – LAGEA Universidade Federal de Uberlândia – UFU [email protected] Marcelo Cervo Chelotti Laboratório de Geografia Agrária – LAGEA Universidade Federal de Uberlândia – UFU [email protected] Resumo O presente artigo discursa a respeito da questão dos agrotóxicos demonstrando a insustentabilidade do modelo que implica seu uso. Os insumos agrícolas são uma das expressões de uma agricultura pautada em princípios capitalistas, e afetam negativamente nosso meio por gerar desgaste ambiental e problemas sociais graves. Na busca por um modelo sustentável, observamos que a Agroecologia possui todas as ferramentas para um sistema de produção agrícola alternativo, atendendo as urgentes necessidades de mudanças socioambientais bem como as exigências dos consumidores preocupados com a origem e qualidade dos produtos que chegam às suas mesas. Palavras-chave: Geografia Agrária. Agrotóxicos. Agroecologia. Sustentabilidade. Introdução Diariamente ingerimos uma grande quantidade de agrotóxicos. Nossos alimentos estão contaminados por que as lavouras em todo o Brasil são pulverizadas com grande quantidade de agrotóxicos. O Brasil tornou-se o maior consumidor de agrotóxicos do mundo desde 2009. E o veneno, não vai parar só no que comemos graças à pulverização ele contamina rios, lagos e lençóis freáticos, por tanto, os agrotóxicos vão parar também no que bebemos. Pesquisas indicam que os agrotóxicos causam uma série de doenças, afetando diretamente os trabalhadores rurais, comunidades rurais e toda a população, que consome alimentos com substâncias tóxicas.

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    VULNERABILIDADE AO USO DE AGROTÓXICOS E DIFUSÃO DA AGROECOLOGIA: A CONSTRUÇÃO DE TERRITÓRIOS SAUDÁVEIS

    Ana Clara Sicari Martins Laboratório de Geografia Agrária – LAGEA Universidade Federal de Uberlândia – UFU

    [email protected]

    Raíssa Camin Franco Laboratório de Geografia Agrária – LAGEA Universidade Federal de Uberlândia – UFU

    [email protected]

    Marcelo Cervo Chelotti Laboratório de Geografia Agrária – LAGEA Universidade Federal de Uberlândia – UFU

    [email protected]

    Resumo O presente artigo discursa a respeito da questão dos agrotóxicos demonstrando a insustentabilidade do modelo que implica seu uso. Os insumos agrícolas são uma das expressões de uma agricultura pautada em princípios capitalistas, e afetam negativamente nosso meio por gerar desgaste ambiental e problemas sociais graves. Na busca por um modelo sustentável, observamos que a Agroecologia possui todas as ferramentas para um sistema de produção agrícola alternativo, atendendo as urgentes necessidades de mudanças socioambientais bem como as exigências dos consumidores preocupados com a origem e qualidade dos produtos que chegam às suas mesas. Palavras-chave: Geografia Agrária. Agrotóxicos. Agroecologia. Sustentabilidade. Introdução Diariamente ingerimos uma grande quantidade de agrotóxicos. Nossos alimentos estão

    contaminados por que as lavouras em todo o Brasil são pulverizadas com grande quantidade de

    agrotóxicos. O Brasil tornou-se o maior consumidor de agrotóxicos do mundo desde 2009. E o

    veneno, não vai parar só no que comemos graças à pulverização ele contamina rios, lagos e

    lençóis freáticos, por tanto, os agrotóxicos vão parar também no que bebemos.

    Pesquisas indicam que os agrotóxicos causam uma série de doenças, afetando diretamente os

    trabalhadores rurais, comunidades rurais e toda a população, que consome alimentos com

    substâncias tóxicas.

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    Portanto, a difusão da Agroecologia surge como a proposta de uma nova agricultura, não

    utilizando os princípios da agricultura impostos no pós Revolução Verde. O discurso em prol da

    agricultura moderna entra em declínio assim que se percebe a insustentabilidade de seu modelo,

    bem como a necessidade de um novo paradigma, que respeite as variantes multidisciplinares

    inclusas no meio.

    Em uma época em que as leis são feitas para proporcionar um ambiente próspero para a

    produção em larga escala, os pequenos agricultores saem prejudicados, obrigados a se adaptar a

    um modelo sufocante. Trata-se de uma questão de saúde pública, não se contamina apenas o solo

    e ambiente, mas também o alimento que vai para a mesa do consumidor, e a mão-de-obra

    envolvida na produção agrícola.

    Portanto, a Agroecologia pode então ser vista, para além de uma solução socioambiental, um

    novo modelo de produção que visa à qualidade antes da quantidade. “O conceito de

    sustentabilidade tem suscitado muita discussão e ao mesmo tempo tem gerado certo consenso

    acerca da necessidade de se propor maiores ajustes na agricultura convencional de modo a torná-

    la mais viável e compatível sob o ponto de vista ambiental, social e econômico.” (ALTIERI,

    2012. p. 104)

    Nesse contexto, o presente artigo é resultante do projeto de extensão financiado pela PROEX-

    UFU intitulado “Territórios livres de agrotóxicos: análise de vulnerabilidade e difusão de práticas

    agroecológicas em assentamentos rurais do município de Uberlândia/MG” tendo como objetivo central

    identificar ambientes potencialmente vulneráveis quanto à exposição e uso de agrotóxicos, bem

    como difundir os princípios agroecológicos entre os agricultores familiares residentes nos

    assentamentos rurais localizados no município de Uberlândia/Minas Gerais. Assim, buscamos

    aproximar a UFU enquanto instituição federal da realidade socioespacial do seu entorno, bem

    como das problemáticas aí existentes.

    O veneno está na mesa: a história de uma dependência. Na agricultura tradicional, presente no período anterior a década de 1950 do século XX,

    presenciávamos o intenso uso da força familiar e a produção voltada, primeiramente, para o

    autosustento da própria família, apenas o excedente era destinado à comercialização.

    Mas, após a Segunda Guerra Mundial, a necessidade de aumento da produtividade, mudou o

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    cenário e impôs ao meio rural um novo ritmo de produção, pautados nos princípios capitalistas

    de produção. Era necessário acompanhar o intenso processo de urbanização e internacionalização

    da economia no qual o país estava submetido. Com isso, se inicia a introdução de adubos

    químicos, implementos agrícolas e agrotóxicos na agricultura brasileira.

    A agricultura tradicional caracterizava-se pela utilização intensiva dos recursos naturais, ou seja, a fertilidade natural do solo e a mão-de-obra direta. O objetivo primeiro da produção é a alimentação da família, sendo o excedente destinado a comercialização. [...] Os instrumentos de trabalho eram simples: foice e machado, para o desbravamento e derrubada do mato; enxada e arado de tração animal para o preparo do solo e controle das ervas daninhas; máquina manual de plantar; foicinha de cortar trigo, arroz, etc. (BRUM, 1988, p. 56).

    Com a proposta de que o objetivo do agrotóxico era matar determinadas espécies maléficas

    para a agricultura (caráter biocida), e com isso aumentar a produção de alimentos, a ideia da

    utilização foi bem aceita. Porém a sua essência é, tóxica, assim prejudicando também os

    alimentos que provém da utilização do mesmo e os consumidores.

    O DDT foi sintetizado em 1939, e foi ele quem deu a largada para a cadeia produtiva desses

    “defensores”, mas em 39, o mesmo era utilizado como arma química na Segunda Guerra

    Mundial. Terminada a guerra, a maioria das indústrias bélicas voltou-se para outras

    aplicabilidades das armas químicas: a eliminação de pragas da agricultura, da pecuária e de

    doenças endêmicas transmitidas por vetores. A Saúde Pública na época, e até hoje, ajudou a

    legitimar a introdução desses produtos tóxicos e a ocultar sua nocividade.

    Segundo o Ministério da Agricultura: “De acordo com a legislação vigente, agrotóxicos são

    produtos e agentes de processos físicos, químicos ou biológicos para uso no cultivo,

    armazenamento e beneficiamento de produtos agrícolas, para alterar a composição da flora ou

    da fauna, a fim de preservá-las da ação de seres vivos nocivos.”

    A Revolução Verde começa em 1940, porém só em meados de 1970 consolida-se, com o

    pretexto erradicar a fome do mundo. Um discurso que rendeu apoio da população mundial e

    lideres de países desenvolvidos, mas principalmente os subdenvolvidos.

    “A chamada revolução verde se inicia nos anos de 1940, com experimentos realizados por cientistas contratados pela Fundação Rockfeller, no México. No Brasil, a revolução verde se inicia no final dos anos de 1960 e se intensifica no início dos anos de 1970, graças a incentivos governamentais: ‘este paradigma tecnoeconômico emula a

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    aplicação dos mesmos princípios da manufatura no processo de produção agrícola.” (SAUER,2009 p.8)

    O modelo de agricultura da Revolução Verde tinha então a justificativa para aumentar a

    produção agrícola através do desenvolvimento de pesquisas em sementes, fertilização do solo e

    utilização de máquinas no campo que aumentassem a produtividade. Isso se daria através do

    desenvolvimento de sementes adequadas para tipos específicos de solos e climas, adaptação do

    solo para o plantio e desenvolvimento de máquinas.

    O uso intensivo de insumos agrícolas e a mecanização do campo trouxeram diversas

    conseqüências, dentre elas destaca-se o êxodo rural, a ampliação da concentração fundiária e

    profundos impactos ambientais. Nesse sentido, o agrotóxico toma papel de destaque. “Os

    resultados ambientais são, entre outros danos, a erosão e contaminação do solo, o desperdício e a

    contaminação dos recursos hídricos, a destruição das florestas e o empobrecimento da

    biodiversidade.” (SAUER, 2009 p.11)

    Realmente, houve um aumento considerável na produção de alimentos. No entanto, o problema

    da fome não foi solucionado, pois a produção dos alimentos é destinada especialmente para

    exportação. O processo de modernização o campo alterou toda uma estrutura agrária que já

    estava estruturada. Os pequenos produtores que não conseguiam se adaptar às novas técnicas de

    produção, não atingiam produtividade suficiente para se manter na atividade, consequentemente,

    muitos se endividaram devido a empréstimos bancários solicitados para a mecanização das

    atividades agrícolas, tendo como única forma de pagamento da dívida a venda da propriedade

    para outros produtores. Então, além de não ter resolvido os problemas nutricional e da fome, a

    Revolução Verde também é reconhecida por aumentar a concentração fundiária e a dependência

    de sementes, já que alterava a cultura dos pequenos proprietários. A concentração da posse da

    terra e o decorrente êxodo rural causaram um inchaço das cidades, e o esvaziamento parcial do

    campo.

    Esse modelo de agricultura intensificou-se em nosso país no Regime Militar, onde foram criadas

    Políticas Públicas para adoção do novo modelo por parte dos agricultores. Entre elas, pode-se

    citar o crédito subsidiado atrelado à compra de insumos como agrotóxicos e adubos. A criação de

    órgãos de pesquisas nacionais e estaduais para dar suporte ao modelo também é considerada

    como um incentivo, junto ao treinamento entre eles o Centro Nacional de Ensino e Pesquisas

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    Agronômicas (CNEPA) e a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), além de

    cursos voltados para a agricultura e a pecuária.

    Assim, fica evidente a estratégia do Estado em associar o Plano Nacional de Defensivos

    Agrícolas, condicionando o crédito rural ao uso obrigatório de agrotóxicos. Tão forte foi essa

    medida, que rapidamente a maioria dos produtores rurais passou a produzir nos moldes da

    Revolução Verde.

    Os riscos da utilização de agrotóxicos

    Os agrotóxicos (inclusive herbicidas) - aplicados regularmente em grandes quantidades, muitas vezes por aviões – são facilmente espalhados além de seus alvos, matando diretamente insetos benéficos e a vida selvagem, e envenenando trabalhadores agrícolas. Os agrotóxicos que seguem para córregos, rios e lagos – e, finalmente, para o oceano – podem ter efeitos deletérios graves sobre os ecossistemas. Predadores de peixes, por exemplo, podem comê-los com alta contaminação por agrotóxicos, que acabam reduzindo sua capacidade reprodutiva, atingindo ecossistemas terrestres. Embora agrotóxicos organoclorados persistentes, como o DDT – conhecidos por sua habilidade de permanecerem nos ecossistemas por várias décadas -, estejam sendo menos usados em diversas partes do mundo, seus substitutos, menos persistentes, em geral tem toxicidade muito mais aguda. Os agrotóxicos também penetram na água subterrânea, contaminando reservatórios de água potável. (GLIESSMAN, 2000 p. 45)

    De acordo com a ANVISA durante o ano de 2009 no país, foram utilizados 4,1Kg de veneno por habitante, e no corrente ano (2012) a estimativa é de 5,2Kg/habitante, como podemos comprovar na imagem 1. Figura 1: Consumo de agrotóxicos no Brasil

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    Fonte: Jornal Brasil de Fato, junho de 2012, ano 10, Nº 486.

    Com este numero, fica claro que essa técnica de cultivo, não pode mais continuar assim, mas a

    proibição ou o controle de vendas dos produtos tóxicos fica extremamente dificultada já que a

    distribuição e a produção são concentradas em grandes empresas, e assim, as mesmas formam

    uma frente conjunta que rebate qualquer tipo de refutação aos produtos. Assim, passam uma

    imagem de que os agrotóxicos comercializados são “defensivos”.

    Para Graziano da Silva (1996) a industrialização do campo é apenas um momento específico do

    processo de modernização, ocorrendo em um patamar mais elevado que do simples consumo de

    bens industriais pela agricultura. Dessa maneira, é o momento da modernização a partir do qual a

    indústria passa a comandar a direção, as formas e o ritmo da mudança da base técnica agrícola.

    Uma das grandes evidências do poder industrial atuando na agricultura, principalmente naquela

    voltada para o mercado consumidor, foi à crescente utilização de agrotóxicos nas lavouras.

    Embora hoje seu uso esteja generalizado em todo o país, sua concentração ocorre,

    principalmente na região centro-sul do país, onde são cultivadas as lavouras comerciais de soja,

    cana-de-açúcar, arroz, dentre outros. O mapa 1 demonstra a territorialização do consumo de

    agrotóxicos por municípios em 2006, em que fica evidenciado tal afirmação.

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    Mapa 1: Utilização de agrotóxicos por municípios no Brasil (2006)

    Fonte: Bombardi (2011)

    Portanto, os reflexos socioambientais desse modelo de agricultura dependente da utilização de

    agrotóxicos para seu desenvolvimento, desdobram-se em altos índices de contaminação

    encontrados nos alimentos consumidos diariamente na mesa dos brasileiros. De acordo com o

    Programa de Análise de Resíduos de Agrotóxicos de Alimentos (PARA) da Agência Nacional de

    Vigilância Sanitária (ANVISA) cada vez mais são encontradas nas amostras teores de resíduos

    de agrotóxicos acima do permitido e o uso agrotóxicos não autorizados para estas culturas.

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    A temática sobre os agrotóxicos, bem como a qualidade dos alimentos que estamos comendo no

    Brasil tem sido debatida com bastante freqüência, seja na esfera acadêmica, entre os movimentos

    sociais, e até mesmo no cinema, como foi o caso do documentário lançado em 2011 “O veneno

    está na mesa” do diretor Silvio Tendler. Assim, evidenciamos uma latente questão entre o nosso

    modelo de agricultura e as questões relacionadas à saúde ambiental, seja por parte dos

    consumidores desses alimentos, e dos trabalhadores que no campo manipulam tais agrotóxicos

    durante a sua aplicação.

    Um dos fatores que agrava o problema atual de aplicação de agrotóxicos e consequente

    intoxicação dos consumidores dos produtos por estes fornecidos é a total falta de informação

    técnica dos agricultores sobre os componentes químicos presentes nos agrotóxicos e as

    consequências do uso desses produtos à saúde humana, também a falta de treinamento para o uso

    adequado dos produtos. O descaso das autoridades e a falta de incentivos governamentais à

    educação rural, e as falhas na rotulação dos produtos cometidas pelos fabricantes, acabam por

    piorar a situação, pois não tendo a informação e orientação correta, não podemos exigir um uso

    totalmente correto por parte dos agricultores.

    A difusão da agroecologia A Agroecologia surge como renovação para a política, dos sistemas técnicos de plantio e

    mudanças socioeconomicas e culturais. Agroecologia é o nome dado pelo agrônomo russo Basil

    Bensin para uma forma refutadora e mais sustentável que a chamada agricultura moderna, que

    garantisse a preservação do solo, dos recursos hídricos, da vida silvestre e dos ecossistemas

    naturais, e que desse suporte a segurança alimentar.

    Vai além das técnicas orgânicas de cultivo, pois inclui elementos ambientais e humanos, é, praticamente, um modo de vida que busca resgatar e valorizar o conhecimento tradicional da agricultura de base familiar. É uma disciplina que engloba princípios ecológicos básicos para estudar, planejar e manejar sistemas agrícolas que, ao mesmo tempo, sejam produtivos, economicamente viáveis, preservem o meio ambiente e sejam socialmente justos. Em relação à agricultura tradicional, a agroecologia se distingue ao utilizar os recursos naturais, permitindo a renovação do solo de forma natural e mantendo a biodiversidade. (TELLES, Andre. ActionAid, Brasil, 2011)

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    Presenciamos a necessidade de uma agricultura que atenda a demanda de produção e ainda

    assim, tenha um caráter sustentável. Sustentabilidade é um conceito múltiplo e variado, mas

    segundo Gliessman é a condição de ser capaz de perpetuamente colher biomassa de um sistema,

    porque sua capacidade de se renovar ou ser renovado não é comprometido.

    O conceito de sustentabilidade tem suscitado muita discussão e ao mesmo tempo tem gerado certo consenso acerca da necessidade de se propor maiores ajustes na agricultura convencional de modo a torná-la mais viável e compatível sob o ponto de vista ambiental, social e econômico. (ALTIERI, 2012. p. 104)

    Todos os argumentos já expostos comprovam a insustentabilidade do modelo de agricultura

    moderna. Mas o retorno a agricultura tradicional também não é o ideal, é necessário uma

    retomada de aspectos de conservação de recursos da agricultura tradicional local e ao mesmo

    tempo explorar conhecimentos e métodos ecológicos modernos. Portanto, uma das alternativas

    mais avançadas para superar o atual modelo de agricultura é a Agroecologia, forma de produção

    agrícola centrada na produção sustentável, incorporadora de conhecimentos tradicionais e

    técnicos, que valoriza não só o meio ambiente e a produção sustentável, mas a comercialização

    solidária que reforça as relações tanto dos produtores entre si, como dos rurais com as empresas

    do setor de sementes, insumos e aquelas que operam na venda da produção.

    A Agroecologia surge da união de duas ciências (a Ecologia e a Agronomia) e contribuiu para o

    desenvolvimento do conceito de sustentabilidade na agricultura. E dentre outros pontos, uma

    agricultura sustentável deve considerar:

    Manutenção a longo prazo dos recursos naturais e da produtividade agrícola; o mínimo de impactos adversos ao ambiente; retornos adequados aos produtores; otimização da produção das culturas com o mínimo de insumos químicos; satisfação das necessidades humanas de alimentos e de renda; atendimento das necessidades sociais das famílias e das comunidades rurais. (EHLRERS 1999, p.103)

    Para o funcionamento harmônico de um agroecossistema é necessário um equilíbrio entre os

    quatro tipos de recursos oferecidos, divididos e agrupados por Norman (1979): (a) Recursos

    naturais, (b) recursos humanos, (c) recursos de capital, e (d) recursos de produção. Os recursos

    naturais seriam as condições físicas do ambiente: terra, água, clima, vegetação natural, fatores

    extremamente importantes para a produção agrícola. Já os recursos humanos envolvem não

    apenas as pessoas relacionadas à produção agrícola como também abrange e considera a relação

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    destas com seu meio, sua saúde física e mental e seu bem estar. Recursos de capital são os bens e

    serviços envolvidos na produção, duradouros ou não, mas essenciais para o funcionamento. E os

    recursos de produção é a produção agrícola da propriedade (gado e produtos agrícolas, por

    exemplo), e que pode se tornar recurso de capital se vendido. Ou seja, a complexidade dessas

    relações e o sua evolução harmônica depende de uma gestão que compreenda e considere a

    pluralidade e as diversas variantes do meio.

    Sendo assim, a Agroecologia enquanto um novo paradigma é hoje uma proposta em curso pois

    trabalha de forma interdisciplinar.

    A agricultura ecológica e outras designações a ela associáveis podem ser consideradas como forma perfeitamente harmônica de integração homem/ambiente a serem preservados, como habitantes, garantindo-lhes políticas não discriminatórias e até mesmo, estimuladoras [...]. Um desafio/contribuição que a agricultura pode dar ao desenvolvimento sustentado é garantir uma política que permita uma conformação do espaço rural em que sejam dadas as condições para a viabilização das propostas tecnológicas radicais, como sinalização da diretriz ao processo de transformação tecnológica para a sustentabilidade. Isso implica uma política voltada à eliminação de estímulos à práticas não ecológicas e também o fortalecimento das condições para sua implementação. (CARVALHO. 1997, p. 25)

    Como vimos, a agroecologia é um sistema de produção que respeita a biodiversidade e a

    natureza, utilizando-a como parte integrante da sua tecnologia de manejo. E a partir, montamos a

    idéia de que este sistema de plantio é cada vez mais urgente para restauração do equilíbrio

    ecológico e a dignidade social e cultural das famílias camponesas.

    Nesse sentido, o desafio agroecológico passa a ser a aceitação da sociedade mas principalmente

    hoje, já que existe a vontade no meio do campesinato e cada vez mais é um assunto em pauta, de

    políticas publicas. Ainda não existe o fortalecimento, por meio de incentivos que existiu para

    com a Revolução Verde a fim de difundir as técnicas da época. Já existem grupos/assentamentos

    reunidos para a produção orgânica em nosso país porém incentivos para a produção neste

    sentido, ajudará a difusão do assunto. O que traria benefícios para o produtor e também para o

    consumidor.

    Considerações Finais

    A luta por uma agricultura mais saudável e sustentável ainda tem um longo caminho a percorrer,

    principalmente no Brasil, que é um país rico em terra e água, assim atraindo o capital

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    especulativo e agroexportador gerando um aumento de desigualdade social e devastação

    ambiental.

    Não existem níveis seguros para a utilização de agrotóxicos, para a natureza ou para os que

    necessitam dela, nós, seres humanos. Deste modo, e com tudo que as pesquisas indicam torna-se

    indispensável a busca e implementação de um projeto de reestruturação da agricultura brasileira

    para a construção de ambientes e alimentos saudáveis livres de agrotóxicos.

    Desse modo fortaleceríamos o campesinato, resgatando a sabedoria familiar e sua cultura, a

    partir de um equilíbrio ecológico em que no ambiente manejado pelo homem ocorra relações

    harmoniosas entre os organismos vivos.

    Com educação e percebendo os benefícios da Agroecologia, juntos, deveríamos produzir e

    consumir além da Revolução Verde, deveremos fazer do Brasil um grande produtor mundial,

    mas produtor de alimentos saudáveis. Isso deveria ser estimado como meta de desenvolvimento.

    Como estudantes, professores e estudiosos em Geografia, deveremos sim, participar da luta e do

    movimento agroecológico, em prol da construção de territórios saudáveis, tanto do ponto de vista

    social quanto ambiental.

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