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CENTRO DE ENSINO SUPERIOR DO CEARÁ FACULDADE CEARENSE - FAC CURSO DE SERVIÇO SOCIAL VIVIANE ANDRÉ LIMA ASSISTÊNCIA SOCIAL E GÊNERO: UM ESTUDO SOBRE A REALIDADE SOCIAL DAS MULHERES CHEFES DE FAMÍLIA BENEFICIÁRIAS DO PROGRAMA BOLSA FAMÍLIA ACOMPANHADAS PELO CRAS JEREISSATI, EM MARACANAÚ-CE. FORTALEZA - CE 2014

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CENTRO DE ENSINO SUPERIOR DO CEARÁ

FACULDADE CEARENSE - FAC

CURSO DE SERVIÇO SOCIAL

VIVIANE ANDRÉ LIMA

ASSISTÊNCIA SOCIAL E GÊNERO: UM ESTUDO SOBRE A REALIDADE SOCIAL DAS MULHERES CHEFES DE FAMÍLIA

BENEFICIÁRIAS DO PROGRAMA BOLSA FAMÍLIA ACOMPANHADAS PELO CRAS JEREISSATI, EM MARACANAÚ-CE.

FORTALEZA - CE

2014

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VIVIANE ANDRE LIMA

ASSISTÊNCIA SOCIAL E GÊNERO: UM ESTUDO SOBRE A REALIDADE SOCIAL DAS MULHERES CHEFES DE FAMÍLIA

BENEFICIÁRIAS DO PROGRAMA BOLSA FAMÍLIA ACOMPANHADAS PELO CRAS JEREISSATI, EM MARACANAÚ-CE.

Monografia submetida à aprovação da

Coordenação do Curso de Serviço Social

do Centro de Ensino Superior do Ceará,

como requisito parcial para obtenção do

grau de Graduação.

Orientadora: Ms. Luciana Sátiro Silva

FORTALEZA

2014

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À Deus e à minha filha, Maria Laura, meus

motivos pra viver e inspirações pra lutar.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço primeiramente a Deus por me dar a vida, e por me permitir chegar

até a etapa final deste curso, que foi tão difícil, mas posso dizer que venci.

A minha mãe que de maneira muito peculiar sempre esteve ao meu lado me

incentivando a não desistir.

Ao meu esposo que por tantas vezes escutou minhas reclamações referente

às dificuldades do curso e ao final de todas as conversas de forma paciente me dizia

para lembra o porquê de minha escolha ao fazer Serviço Social.

A minha orientadora, Luciana que sempre esteve disposta a compartilhar

seu conhecimento para explicar minhas dúvidas, e com certeza foi uma pessoa

enviada por Deus.

As minhas grandes amigas Claudiane Cavalcante que sempre dividiu

comigo suas angustias e Norma Soely que além de amiga é um exemplo de mulher

e pessoa humana.

As Assistentes Sociais com quem tive o imenso prazer de conviver durante

meu estagio obrigatório: Carla Menezes, Mayara Paulo Medeiros, Ana Caroline

Freire Froes, Josabete Cacau, Rebeca Carvalho, Meline Silva, Carolina Castelo

Branco, obrigada pelos ensinamentos.

E a minha banca composta por Ivna de Oliveira Nunes e Samara Hipólito da

Conceição, muito obrigado pelas contribuições que com certeza foram muito

pertinentes.

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Tudo Bem Já não tenho dedos pra contar De quantos barrancos despenquei E quantas pedras me atiraram Ou quantas atirei Tanta farpa, tanta mentira Tanta falta do que dizer Nem sempre é só easy se viver Hoje eu não consigo mais me lembrar De quantas janelas me atirei E quanto rastro de incompreensão Eu já deixei Tantos bons quantos maus motivos Tantas vezes desilusão Quase nunca a vida é um balão Mas o teu amor me cura De uma loucura qualquer É encostar no teu peito E se isso foi algum defeito Por mim tudo bem. (Lulu Santos)

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RESUMO

A presente pesquisa teve como objetivo analisar a realidade social das mulheres

chefes de família beneficiárias do Programa Bolsa Família acompanhadas pelo Cras

Jereissati, em Maracanaú-CE. Destacamos as mudanças atuais ocorridas no seio

das famílias, bem como, os conflitos vivenciados pelos papéis sociais desenvolvidos

pela sociedade, principalmente no que se refere às mulheres chefes de família,

principais responsáveis pela gestão dos recursos provenientes do Programa Bolsa

Família em nome de suas família. Quanto à metodologia utilizada, optamos pela

pesquisa de natureza qualitativa, utilizando como principal técnica de coleta de

informações a entrevista semi-estruturada com cinco mulheres acompanhadas pelo

Cras Jereissati I. A análise dos dados revela que o Programa Bolsa Família está

focado nas famílias em extrema pobreza e limita-se a garantir um mínimo em termos

monetários, insuficiente para atender as necessidades básicas e com uma frágil

articulação com as demais ações das políticas sociais setoriais. Ademais, possibilita

a reprodução da responsabilidade feminina no lar para sociedade. Percebemos que

a pesquisa tem sua importância na possibilidade de contribuir para reflexão, debate

e apresentação do cenário atual do Programa Bolsa Família deste município, em

interface a percepção das mulheres chefes de famílias sobre o papel da mulher

nesse Programa no intuito de apresentar as possibilidades e desafios ao analisar a

política de Assistência Social na sua tentativa de se constituir como direito social

mediante programas de transferência de renda na contemporaneidade.

Palavras-chaves: Assistência Social. Família. Gênero. Programa Bolsa Família.

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ABSTRACT

This research aims to analyze the social reality of women heads of family

beneficiaries of the Bolsa Família Program accompanied by Cras Jereissati in

Marazion-EC. We highlight the current changes within families, as well as the

conflicts experienced by social roles developed by the company especially in regard

to women heads of major family responsible for managing resources from the Bolsa

Família Program on behalf of his family. Regarding methodology, we chose

qualitative research, using as the main technique of gathering information, the semi-

structured interviews with five women accompanied by Cras Jereissati I. Data

analysis reveals that the Bolsa Família Program is focused on families in extreme

poverty and is limited to ensure a minimum in monetary terms, insufficient to meet

basic and a weak linkage with other actions of the sectoral social policies needs.

Moreover, it enables the reproduction of female responsibility to society at home. We

realize that research has its importance in the possibility of fostering reflection,

discussion and presentation of the current scenario of the Bolsa Família Program

interface with families and the role of women in this program from the perspective of

experience of this municipality, in order to present the possibilities and challenges of

social Assistance attempt to constitute itself as a social right nowadays.

Keywords: Social Assistance. Family. Genre. Bolsa Família Program.

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LISTA DE SIGLAS

AI - Ato Institucional

CADÚNICO - Cadastro Único

CCI - Centro de Convivência do Idoso

CNAS - Conselho Nacional de Assistência Social

CNSS – Conselho Nacional de Serviço Social

CF 88 – Constituição Federal de 1988

CRAS – Centro de Referencia de Assistência Social

CREAS – Centro de Referencia Especializado de Assistência Social

GESUAS - Gestão da informação da Assistência Social

IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

IPEA - Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada

LBA - Legião Brasileira de Assistência

LOAS – Lei Orgânica da Assistência Social

MDS - Ministério de Desenvolvimento e Combate a Fome

NASF - Núcleos de Apoio à Saúde da Família

NOB - Norma Operacional Básica

OIT - Organização Internacional do Trabalho

PAIF - Serviço de Proteção e Atendimento Integral à Família

PBF – Programa Bolsa Família

PROJOVEM - Programa Nacional de Inclusão de Jovens

PRONATEC - Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego

PNAD - Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios

PNAS - Política Nacional de Assistência Social

PTR - Programas de Transferência de Renda

SUAS - Sistema Único de Assistência Social

SASC - Secretaria de Assistência Social

SUDENE - Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste

SCFV - Serviço de Convivência e Fortalecimento de Vínculos

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SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO .....................................................................................................12

2. CAMINHOS METODOLÓGICOS DA PESQUISA ................................................19

2.1 Vivencias e reflexões do caminho percorrido na construção da pesquisa...........19

2.2 Cenários da investigação.....................................................................................27

3. FAMÍLIA: QUAL O PAPEL DA MULHER NESTA COMPLEXA INSTITUIÇÃO

SOCIAL?....................................................................................................................30

3.1 Conceituando a categoria família: olhares sobre as mudanças nas famílias na

contemporaneidade....................................................................................................30

3.2 As relações de gênero como reflexo das relações desiguais entre homens e

mulheres.....................................................................................................................35

4. A POLÍTICA DE ASSISTÊNCIA SOCIAL BRASILEIRA......................................43

4.1 Uma breve contextualização dos cenários políticos e o histórico da política de

assistência social no Brasil .......................................................................................43

4.2 Instrumentos normativos: o que aconteceu com a Assistência Social brasileira

após 1988?.................................................................................................................47

4.3 O Sistema Único da Assistência Social-SUAS e a centralidade da família na

Assistência Social brasileira.......................................................................................57

4.4 Programas de Transferência de Renda e o Programa Bolsa Família:

possibilidades e contradições.....................................................................................59

4.5 A política de Assistência Social em Maracanaú-CE e o acompanhamento familiar

das mulheres chefes de família..................................................................................63

5. O ESTUDO SOBRE A REALIDADE SOCIAL DAS MULHERES CHEFES DE

FAMÍLIAS BENEFICÁRIAS DO PROGRAMA BOLSA FAMÍLIA ACOMPANHADAS

PELO CRAS JEREISSATI EM MARACANAÚ-CE...................................................67

5.1 O perfil socioeconômico das mulheres interlocutoras dessa pesquisa................67

5.2 Análise do Programa Bolsa Família e a vidas das mulheres chefes de famílias do

Cras Jereissati em Maracanaú-CE.............................................................................69

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CONSIDERAÇÕES FINAIS.......................................................................................79

REFERÊNCIAS..........................................................................................................82

APÊNDICE A.............................................................................................................85

APÊNDICE B.............................................................................................................87

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1. INTRODUÇÃO

O caminho da pesquisa é sempre desafiador e instigante, sobretudo na área

social, na qual se estuda as relações sociais, econômicas, políticas e culturais. É,

pois, uma caminhada desafiadora e cheia de surpresas que causam impactos

diretos no modo de agir, pensar e refletir sobre os fatos sociais e tem como objetivo

acompanhar o movimento dinâmico, contraditório e complexo do real.

A interação do pesquisador com o sujeito da pesquisa é uma relação de

muita atenção, o que exige minúcia nos detalhes que envolvem a aproximação com

a realidade. É possível que aconteça do universo do primeiro não faça parte do

cotidiano do segundo, pois estes podem viver em territórios diferentes, com modos

distintos de pensar e agir, o que torna ainda mais interessante e desafiadora a

pesquisa.

Articulando a estrutura social vivenciada na cena contemporânea, o modo de

produção capitalista é um modelo econômico em que os meios de produção e

acumulação se dão pela utilização da exploração da força de trabalho, sendo este, o

chão histórico que cimenta todas as relações sociais, culturais, políticas, ambientais

etc., que desenham a ideologia da sociedade atual.

É percebendo as contradições dessa sociedade que propomos com esta

pesquisa fazer uma reflexão crítica sobre a realidade em que a sociedade brasileira

está inserida, marcada por profundas desigualdades sociais.

Esse sistema econômico se fundamenta no reconhecimento dos direitos

individuais, do favorecimento da propriedade privada, das relações individualistas,

consumistas e formadora das desigualdades sociais e do pauperismo, a partir da

apropriação da riqueza socialmente produzida por uma determinada classe, a

burguesa. É formadora de desigualdades sociais, na medida em que, institui o

trabalhador assalariado que vende a sua força de trabalho ao burguês, com o

objetivo de gerar mais acumulação, sendo esta mediada pela exploração desse

trabalho.

Utiliza-se da atuação do Estado como mediador e legislador político entre as

classes no desenvolvimento de todas as ações sociais reprodutoras do ideal da

classe dominante, adentrando neste rol, as políticas sociais.

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Esse trabalho estabelece uma relação entre a política de assistência social

brasileira analisando a sua importância inicial enquanto politica conservadora com

viés caritativo e de benesse até se estabelecer como uma política pública de direitos

sociais e dever do Estado na sua árdua e lenta busca pela sua efetivação após

aprovação de seus principais documentos legais: Constituição Federal – CF de

1988 e pela Lei Orgânica da Assistência Social – LOAS de 1993 e a Política

Nacional de Assistência Social -PNAS de 2004 e a Norma Operacional Básica de

2005 com a criação do Sistema Único de Assistência Social-SUAS.

Delimitando essa discussão, no ano de 1988, com a promulgação da

Constituição Federal, a Assistência Social passou a compor o tripé da Seguridade

Social como direito, juntamente com as politicas de Saúde e Previdência Social.

Dessa forma, o que até então era entendida pelo Estado e pela sociedade como

favor, filantropia e caridade, direcionada aos pobres e doentes, somente após a

Constituição Federal que esta passa a ser reconhecida legalmente como direito do

cidadão.

A Lei Orgânica da Assistência Social – LOAS foi aprovada no ano de 1993, e

com ela, demarcou-se avanços no que se refere ao estabelecimento de objetivos,

princípios e diretrizes dessa politica em todo o território nacional, bem como com a

garantia de um sistema descentralizado e participativo nas três esferas de governo,

desenhado pela existência dos fundos, conselhos e planos. A LOAS inaugura uma

nova era para a assistência social brasileira.

Dez anos após a LOAS, a IV Conferência de Assistência Social no ano de

2003 definiu a implantação do Sistema Único de Assistência Social – SUAS. Nos

anos seguintes, com a criação do Ministério de Desenvolvimento e Combate a Fome

– MDS, o SUAS passou a articular recursos e meios para a execução de programas,

serviços e benefícios socioassistenciais e suas ações passaram a serem baseadas

nas orientações da nova Politica Nacional de Assistência Social – PNAS, aprovada

no mesmo ano pelo Conselho Nacional de Assistência Social – CNAS.

Entre os anos de 2001 e 2002 foram implementados os primeiros programas

federais de transferência de renda no Brasil: Auxílio Gás, Bolsa Alimentação, Bolsa

Escola e Cartão Alimentação. E no ano de 2003, todos esses programas foram

unificados para a criação do Programa Bolsa Família (PBF).

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O PBF é o maior programa de transferência direta de renda do Brasil. Do

ponto de vista social, tem provocado grandes impactos na vida das pessoas pobres

que veem no beneficio uma renda mensal mínima, apresentando dados

significativos na diminuição relevante nos índices de pobreza e desigualdade social.

O Programa Bolsa Família é um programa de transferência direta de renda

que beneficia famílias em situação de pobreza e de extrema pobreza em todo o

país. Tem como foco as famílias com renda per capita inferior a R$ 70,00 mensais.

Baseia-se na garantia de renda, ações complementares de inclusão produtiva e

profissionalização, no acesso aos serviços públicos, especialmente das políticas de

educação e saúde.

As famílias beneficiadas são selecionadas através do aplicativo eletrônico do

Cadastro Único para programas sociais- CadÚnico criado pelo Governo Federal

para programas sociais, instrumento que funciona como banco de dados nacional

para identificar e caracterizar as famílias em situação de pobreza e extrema

pobreza.

O CadÚnico permite conhecer a realidade socioeconômica dessas famílias,

trazendo informações de todos os integrantes da família, das características do

domicílio, das formas de acesso a serviços públicos essenciais e também, dados de

cada um dos componentes da família.

As mulheres são as principais responsáveis pelo recebimento do beneficio,

pela compreensão da sociedade, reconhecida pelo Governo Federal de que a

mulher é a verdadeira responsável pela economia doméstica e por gerenciar a vida

subjetiva e material dos filhos.

Isso pode ser analisado por dois vieses. O primeiro deles, por nossa cultura

burguesa sexista favorável ao homem que historicamente estabeleceu que a mulher

fosse a figura social com referência à santidade, provedora de bons costumes,

responsável pelos filhos e marido. Como boa gestora de seu lar, recaiu sobre nós a

responsabilidade de criar os filhos e manter a “estabilidade e harmonia familiar”.

Na sociedade moderna, isso manteve, agora com uma nova roupagem, que

além desses atributos, pela ausência do homem como provedor dos bens materiais

ou mesmo pelo mau uso deste em detrimento a que seria melhor para toda a família,

esta passou a chefiar a família, assumindo assim, a dupla referência do lar, sendo

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este último, o argumento utilizado pelo governo ao compreender que a mulher é a

melhor referência para administrar o beneficio.

Outro aspecto que podemos relevar, ainda muito comum, é o fato da mulher

abrir mão da sua possibilidade de trabalhar para cuidar dos filhos reforçando o lugar

tradicional das mulheres na divisão sexual do trabalho doméstico, deixando apenas

para o marido o trabalho, gerando o ciclo de dependência dele. Esta com a renda do

Programa possui mais autonomia financeira adquirida, sendo assim, uma dimensão

positiva desse.

Assim, o Programa Bolsa Família apresenta uma direção de titularidade como

feminina. Somente na sua ausência ou impedimento, o beneficio será repassado

para outro responsável pela unidade familiar.

O referido programa possibilita a sobrevivência das famílias beneficiárias,

além da redução gradual das desigualdades regionais. Todavia, sabe-se que esse

programa ainda comporta várias limitações, em vista da própria estruturação social

de pobreza do sistema de proteção social brasileiro, inserindo o Ceará nessa

discussão.

De acordo com jornal Tribuna do Ceará (2013)1, este Estado ocupa a 4º

posição no ranking nacional com o número de beneficiados do PBF com um total de

3,8 milhões de pessoas. As famílias pobres do Nordeste recebem em média do

programa R$ 97,00 do benefício social do Governo Federal, sendo este muitas

vezes a única renda da família.

Ademais, segundo a pesquisa realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia

e Estatística - IBGE - (2012)2, o percentual de famílias chefiadas por mulheres no país

passou de 22,2% para 37,3%, entre 2000 e 2010. Os dados mostram ainda que as

mulheres têm chefiado mais famílias, mesmo quando possuem marido. O IBGE atribui

esse aumento a uma mudança de valores relativos ao papel da mulher na sociedade e a

fatos como: o ingresso no mercado de trabalho, o aumento da escolaridade em nível

superior e a diminuição da fecundidade.

A tendência à feminização da pobreza está ligada a desigualdade entre os

sexos e não a falta de capacidade das mulheres em chefiar família, pois as mulheres

1 http://www.tribunadoceara.com.br/noticias/tag/bolsa-familia/. Acesso em 18 novembro 2013.

2 http://g1.globo.com/brasil/noticia/2012/10/familias-chefiadas-por-mulheres-sao-373-do-total-

no-pais-aponta-ibge.html/. Acesso em 22 abril 2014

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estão em desvantagens em relação ao sexo masculino referente a direitos, salário e

carga horária de trabalho, e ainda referente à ascendência socioeconômica.

A escolha de trabalhar com este tema deve-se a sua importância na

sociedade burguesa, pois é um assunto de relevante discussão, principalmente pela

histórica centralidade da mulher no ambiente familiar, tendo à politica de Assistência

Social brasileira assumido essa perspectiva, mas direcionada pela a questão das

famílias ou domicílios atualmente serem chefiados por mulheres. Esse cenário

extrapola as fronteiras geográficas e de classes sociais, mas certamente também é

mediada por circunstâncias sociais, regionais e culturais e possui revelações

especificas mesmo dentro de um mesmo país.

O interesse pela temática surgiu durante o ano de 2012, quando realizei

estágio supervisionado obrigatório pelo curso de serviço social ocorrido no Centro de

Referencia de Assistência Social (CRAS), situado no bairro Siqueira II, pertencente

ao município de Maracanaú-CE.

Neste período, mantive contato direto com as famílias inseridas no Cadastro

Único3 beneficiárias do Programa Bolsa Família (PBF) através do atendimento

individual no qual realizava a escuta qualificada, nas visitas domiciliares e na

participação dos grupos de convivência realizados pelo referido CRAS.

Os momentos de maior contato com os(as) usuários(as), de um olhar mais

próximo, são importantes para a construção do vínculo e segurança entre este(a)

usuário(a) e profissional. Em cada visita, em cada atendimento, pôde-se estabelecer

uma relação realmente confiante, pois esses atores sociais permitiam aos poucos

uma maior aproximação da sua dinâmica familiar, nos repassando informações

detalhada de sua vida, do seu cotidiano, suas necessidades, medos e modo de ver a

sua realidade.

Assim, esta pesquisa tem o propósito de contribuir com o debate acerca da

política de Assistência Social contemporânea, bem como fomentar a discussão

sobre o real sentido do programa de transferência de renda, Programa Bolsa Família

articulada à dimensão da chefia feminina das famílias beneficiadas.

3 É um instrumento que identifica e caracteriza as famílias de baixa renda, permite conhecer a

realidade socioeconômica dessas famílias, trazendo informações de todo o núcleo familiar, das características do domicílio, das formas de acesso a serviços públicos essenciais e, também, dados de cada um dos componentes da família. Disponível em

http://www.mds.gov.br/bolsafamilia/cadastrounico. Acesso em 03 março 2014.

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Desse modo, essa pesquisa se estrutura em quatro capítulos. O primeiro

capítulo, intitulado: “Percurso metodológico da pesquisa.”, retrata a escolha do

objeto de estudo, o desenvolvimento da pesquisa, os métodos utilizados e as

aproximações pessoais com o tema. A metodologia consistiu em considerações

feitas pelas autoras Martinelli (1999) e Minayo (2012) acerca dos aspectos

qualitativos da pesquisa e as técnicas que utilizamos para adentrar nas tramas do

real e capturar os fenômenos sociais que estão articulados ao tema com maior

fidelidade e concretude.

O segundo capítulo, com titulo: Família: “Qual o papel da mulher nesta

complexa instituição social?”, apresentamos duas das categorias centrais analisadas

neste estudo, família e gênero. Conceituamos a categoria família, expondo olhares

sobre as mudanças nas famílias na contemporaneidade, dialogamos com autores

como Osterne e Gueiros sobre este grupo. Discutimos ainda sobre as relações de

gênero como reflexo das relações desiguais entre homens e mulheres, destacamos

etapas da historia do movimento feminista no Brasil, expondo suas lutas e

conquistas desde o final do século XIX até os dias atuais.

No terceiro capítulo tratamos da Política de Assistência Social brasileira,

apresentando uma breve análise sobre o histórico dessa, que vai de sua primeira

regulação em 1938, passando pela criação de sua primeira instituição, a Legião

Brasileira de Assistência-LBA em 1942, até a promulgação Constituição Federal de

1988 que foi o marco legal da política como direito do cidadão e dever do Estado.

Fizemos uma breve reflexão inserindo os instrumentos normativos, que

compõe a politica de Assistência Social seus avanços e desafios na sociedade

brasileira.

Ressaltamos a centralidade da família na Assistência Social com o Sistema

Único da Assistência Social-SUAS, no qual a família é percebida como uma

instituição que necessita de condições de sustentabilidade e proteção social para

assim cumprir o seu papel de unidade de proteção primária.

E ainda neste capitulo, contextualizamos a política de Assistência Social em

Maracanaú-CE, desde as principais informações sobre este município, até as ações

das políticas desenvolvidas no cenário contemporâneo.

Finalizamos esse capitulo com possibilidades e contradições dos Programas

de Transferência de Renda tendo como foco principal o Programa Bolsa Família.

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Destacamos de forma sucinta etapas percorridas para chegar até o principal

programa de distribuição de renda, o Programa Bolsa Família. Neste tópico, foram

feitas algumas análises e críticas ao programa, em interface com os depoimentos

das entrevistadas em relação ao programa.

No quarto capitulo designado como “O Estudo Sobre as Vidas das

Mulheres Chefes de Famílias Beneficiárias do Programa Bolsa Família

Acompanhadas pelo Cras Jereissati em Maracanaú-Ce”, foi realizada uma análise

do perfil socioeconômico, apresentando o perfil detalhado dos sujeitos da pesquisa,

para assim, revelarmos suas principais características. Finalizamos apresentando os

dados coletados na pesquisa empírica articulando a realidade social das mulheres

chefes de família no CRAS Jereissati e o Programa Bolsa Família.

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2. PERCURSO METODOLÓGICO DA PESQUISA

2.1 Vivencias e reflexões do caminho percorrido na construção da pesquisa

Pesquisar as mulheres chefes de família não é um interesse recente, pois

vem desde a minha infância em meu espaço doméstico, onde minha mãe desde os

meus sete anos de idade era a responsável pelo núcleo familiar.

Esse interesse aumentou com a realização do Estágio do Curso de Serviço

Social, realizado no Centro de Referencia de Assistência Social – CRAS Parque São

João, onde tive uma importante experiência junto às beneficiárias do Programa

Bolsa Família, mais especificamente mulheres acompanhadas pelo Serviço de

Proteção e Atendimento Integral à Família – PAIF4, programa central de atendimento

nos CRAS5.

Ao iniciar em 2012 meu estágio, pude perceber no meu cotidiano desse

espaço sócio-ocupacional que era comum intervirmos em casos que tivessem

mulheres como chefes de família, administradoras da economia financeira da

família, observando assim, que o caso da minha família não é um fato isolado.

Realizei o estágio supervisionado obrigatório no CRAS Parque São João,

porém, preferi realizar minha pesquisa no CRAS Jereissati6, para dessa forma

manter certo distanciamento dos (as) pesquisados (as), tendo em vista que durante

a minha experiência de estágio no CRAS Parque São João, ocorreram por várias

vezes e ainda ocorre de algumas usuárias me pararem na rua ou irem até a minha

casa para saberem de informações dos serviços ofertados e do resultado de alguma

solicitação por conta de morar no bairro.

4 O Serviço de Proteção e Atendimento Integral à Família – PAIF é uma atribuição exclusiva

do poder público e é desenvolvido necessariamente no Centro de Referência de Assistência Social –

CRAS.

5 Todo Centro de Referência de Assistência Social-CRAS, independentemente da fonte

financiadora, deve, obrigatoriamente, implementar o Programa de Atenção Integral à Família – PAIF

ou seja, o PAIF só é executado no CRAS e todo CRAS executa, obrigatoriamente, o PAIF.

6 O CRAS Jereissati pertence à rede socioassitencial do munícipio de Maracanaú, está situado

na Avenida X, número 254, no bairro Jereissati II, sua área de atendimento são os bairros Jereissati I,

Jereissati II e Timbó.

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Essas situações ocorreram por tantas vezes que ficou constrangedor e na

maioria das vezes as usuárias não querem entender que não tenho como lhes

passar informações que devem ser repassadas no próprio CRAS.

Por esse motivo buscamos outro Cras para realizar a pesquisa, porém

dentro do mesmo município, o Cras ao que nos referimos é o CRAS Jereissati

pertencente ao município de Maracanaú-CE.

Comecei a questionar sobre quantas mulheres são chefes de suas famílias,

como elas enfrentam esse “novo” modo de vida e em alguns casos, como o seu

companheiro passa a depender financeiramente dela. Dessa forma, iniciei minha

pesquisa partindo desses questionamentos e ao longo deste caminho, muitos outros

surgiram no decorrer desde trabalho.

Em se tratando da realidade investigada, é necessário estar disposto a

maior aproximação possível com o real, transpondo nossas barreiras culturais,

simbólicas, o respeito ao que lhe é estranho. Assim, todos esses elementos são

importantes para a pesquisa social.

As manifestações de uma realidade estão sempre em transformações, e

estas impactam diretamente sobre a construção de novas formas de olhar, pensar e

agir sobre os fenômenos sociais. A pesquisa social, assim, busca acompanhar

sempre esse movimento, para que os resultados alcançados sejam sempre

renovados, assim como a realidade.

Esta pesquisa se insere enquanto pesquisa social e busca abranger

aspectos teóricos e práticos relacionados a vida social das mulheres beneficiárias do

Programa Bolsa Família acompanhados pelo Cras Jereissati em Maracanaú-CE.

Entendemos por pesquisa a atividade básica da ciência na sua indagação e

construção da realidade. Alimenta a atividade de ensino e atualiza frente à realidade

do mundo. (MINAYO, 2012, p. 16).

Assim, esta pesquisa é de natureza qualitativa na perspectiva de analisar e

compreender a realidade a partir das falas dos sujeitos, identificando assim, suas

opiniões e seus costumes, pois este modelo de investigação é o mais acessível para

o levantamento das informações sociais, possibilitando o contato direto com o

sujeito. Para Minayo:

A pesquisa qualitativa responde a questões muito particulares. Ela trabalha com o universo dos significados, dos motivos, das aspirações, das crenças, dos valores e das atitudes. Esse conjunto de fenômenos humanos é

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entendido aqui como parte da realidade social, pois o ser humano se distingue não só por agir, mas por pensar sobre o que faz e por interpretar suas ações dentro e a partir da realidade vivida e partilhada com seus semelhantes. (2012, p. 21)

Outra autora que discorre sobre a pesquisa qualitativa, Martinelli, nos informa:

No que se refere às pesquisa qualitativas, é indispensável ter presente que, muito mais do que descrever um objeto, buscam conhecer trajetórias de vida, experiências sociais dos sujeitos, o que exige uma grande disponibilidade do pesquisador e um real interesse em vivenciar a experiência da pesquisa [...] não podemos pensar que chegamos a uma pesquisa como um “saco vazio”. Não! Temos vida, temos Historia, temos emoção. (1999, p. 25).

Através da pesquisa qualitativa pode-se analisar a realidade, além de

proporcionar um olhar mais abrangente sobre o tema. Martinelli (1999) cita alguns

pressupostos que fundamentam o uso da metodologia quantitativa:

O primeiro pressuposto é o do reconhecimento da singularidade do sujeito. Cada pesquisa é única, pois se o sujeito é singular, conhecê-lo significa ouvi-lo, escutá-lo, permitir-lhe que se revele; o segundo pressuposto é que essas pesquisas partem do reconhecimento da importância de se conhecer a experiência social do sujeito, e não apenas as suas circunstancias de vida [...] Envolve, portanto, seus sentimentos, valores, crenças, costumes e práticas sociais cotidianas. Isso nos remete ao terceiro pressuposto, que se expressa no reconhecimento de que conhecer o modo de vida do sujeito pressupõe o conhecimento de sua experiência social. (MARTINELLI, 1999, p. 22 e 23).

O processo de realização da pesquisa se torna importante tanto para

conhecer a realidade, como para o conhecimento profissional, pois o arcabouço

teórico-metodológico geram conhecimentos ainda não percebidos.

Trabalhamos com fatos de forma a poder aprofundar tanto quanto possível a analise e não para conhecê-los apenas de forma sumaria, a partir de uma primeira apresentação. Nesse sentido priorizamos não os fatos épicos, os fatos de grande dimensão, mas aqueles que estão mais próximos do sujeito e que repercutem diretamente na sua vida (MARTINELI, 1999, p. 22).

Dentre as técnicas da pesquisa qualitativa existentes, optou-se pela técnica

de entrevista, tendo em vista, o leque de opções que a referida técnica fornece ao

pesquisador, pois segundo Gil, a intensa utilização da entrevista na pesquisa social

deve-se a uma série de razões:

a) A entrevista possibilita a obtenção de dados referente aos mais diversos aspectos da vida social; b) A entrevista é uma técnica muito eficiente para a obtenção de dados em profundidade acerca do comportamento humano; c) Os dados obtidos são suscetíveis de classificação e de quantificação.

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Se comparada com o questionário, que é outra técnica de longo emprego nas ciências sociais apresenta outras vantagens: a) Não exige que a pessoa entrevistada saiba ler e escrever; b) Possibilita a obtenção de maior número de resposta, posto que é mais fácil deixar de responder a um questionário do que negar-se a ser entrevistado; c) Oferece flexibilidade muito maior, posto que o entrevistador pode esclarecer o significado das perguntas e adaptar-se mais facilmente as pessoas e às circunstâncias em que se desenvolve a entrevista; d) Possibilita captar a expressão corporal do entrevistado, bem como a tonalidade de voz e ênfase nas resposta (GIL, 2011, p. 110).

A pesquisa para a sua realização é baseada em conceitos, procedimentos e

técnicas. Minayo (2012) denomina essas etapas como Ciclo de Pesquisa, dividindo-

as em três fases, que são: (01) fase exploratória; (02) trabalho de campo; (03)

análise e tratamento do material empírico e documental. Ainda, também utilizamos

de pesquisa de caráter bibliográfico e documental.

A pesquisa bibliográfica está sendo feita a partir de fontes históricas que já

foram publicadas, tais como artigos científicos, obras e livros sobre o tema e

percorrerá todas as fases do ciclo da pesquisa.

Sobre a primeira etapa utilizada, a fase exploratória, fundamentamos em

Minayo:

É o tempo dedicado – e que merece empenho e investimento – a definir e delimitar o objeto, a desenvolvê-lo teórica e metodologicamente, a colocar hipóteses ou alguns pressupostos para o seu encaminhamento, a escolher e a descrever os instrumentos de operacionalização do trabalho, a pensar o cronograma de ação e a fazer os procedimentos exploratórios para escolha do espaço e da amostra qualitativa (2012, p. 26).

A partir do estudo realizado, foram identificados às categorias teóricas que

embasaram este estudo: Assistência Social, Programa Bolsa Família e Gênero.

Ainda como produto da fase exploratória, definimos como objetivo geral

desta pesquisa: analisar a realidade social das mulheres chefes de família

beneficiárias do Programa Bolsa Família acompanhadas pelo Cras Jereissati, em

Maracanaú-CE.

Como objetivos específicos, buscaremos:

Elaborar perfil socioeconômico das mulheres chefes de família beneficiárias do

PBF acompanhadas pelo Cras;

Investigar a compreensão dessas mulheres sobre suas relações familiares,

comunitárias e sua história;

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Compreender como são cumpridas as exigências das condicionalidades7 do PBF

na ótica das mulheres pesquisadas;

Analisar a visão que essas mulheres têm sobre do Programa Bolsa Família e qual

o impacto dele em suas vidas.

Para dar conta de responder a esses objetivos específicos, elaboramos um

roteiro (apêndice I) que serviu como norte para nossas perguntas no processo de

investigação com as interlocutoras.

Este estudo teve como temporalidade o período de quatro meses, durante o

mês de março de 2014 a junho de 2014.

Finalizando esta fase, foi ainda nesse momento que desenvolvemos a

problemática, definimos as técnicas da pesquisa; autores da área pesquisada;

levantamento de perguntas de partida e do título desse estudo.

A segunda fase, a de trabalho de campo, é definido por Minayo da

seguinte forma:

Essa fase combina instrumentos de observação, entrevistas ou outras modalidades de comunicação e interlocução com os pesquisados, levantamento de material documental e outros. Ela realiza um momento relacional e prático de fundamental importância exploratória, de confirmação e refutação de hipóteses e de construção de teoria. (MINAYO, 2012, p. 26).

Iniciamos a fase da coleta de dados junto ao campo de pesquisa, é a fase

das entrevistas, do contato com as mulheres pesquisadas, aproximação da sua

realidade.

Foi na fase de campo que desenvolvemos nossa aproximação com o objeto

de estudo e tivemos contato com a realidade das mulheres, nosso público-alvo.

Para a produção utilizamos as seguintes técnicas: dados dos documentos da

instituição, observações no campo de pesquisa e a entrevista, que é a estratégia

mais usada no processo de trabalho de campo (MINAYO, 2012, p. 64).

O que buscamos é o conhecimento, a aproximação dos sujeitos

pesquisados, por esse motivo, não se trata, portanto, de uma pesquisa com grande

numero de sujeitos, pois é preciso aprofundar o conhecimento em relação àquele

sujeito com o qual estamos dialogando (MARTINELLI, 1999, p. 23).

7 São os compromissos assumidos tanto pelas famílias beneficiárias do Bolsa Família quanto

pelo poder público para ampliar o acesso dessas famílias a seus direitos sociais básicos. Por um

lado, as famílias devem assumir e cumprir esses compromissos para continuar recebendo o

benefício. Por outro, as condicionalidades responsabilizam o poder público pela oferta dos serviços

públicos de saúde, educação e assistência social.

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Trabalhamos com cinco mulheres chefes de família, através do roteiro de

entrevista semiestruturada, devido a maior facilidade oferecida por esta técnica em

obter dados das entrevistadas.

Outra vantagem da entrevista semi-estruturada é a sua elasticidade quanto à

duração, o que permite e facilita para o pesquisador ter uma cobertura mais densa

sobre determinados assuntos a serem estudados e pesquisados, bem como a

probabilidade de respostas diversas e uma maior liberdade por parte da

entrevistadora e das entrevistadas. Minayo define entrevista semi-estruturada da

seguinte forma:

A entrevista semi-estruturada combina perguntas fechadas e abertas, em que o entrevistado tem a possibilidade de discorrer sobre o tema em questão sem se prender à indagação formulada. [...] a entrevista como fonte de informação pode nos fornecer dados secundários e primários de duas naturezas: a) os primeiros dizem respeito a fatos que o pesquisador poderia conseguir por meio de outras fontes como censos, estatísticas, registros civis, documentos, atestados de óbito e outros; b) os segundos – que são objetos principais da investigação qualitativa- referem-se a informação diretamente construídas no dialogo com o individuo entrevistado e tratam da reflexão do próprio sujeito sobre a realidade que vivencia (2010, p. 64-65)

Importa destacar que as identidades foram resguardadas e os nomes

substituídos por fictícios. As entrevistas foram feitas com as mulheres beneficiadas

pelo Programa de Transferência de Renda Bolsa Família, inseridas no PAIF- Serviço

de Atenção Integral a Família, residentes no bairro Jereissati.

Para dar inicio a pesquisa de campo no CRAS Jereissati, primeiramente tive

de solicitar uma autorização do Gsuas8 apresentando o Projeto de Trabalho de

Conclusão de Curso, dentro das normas estipuladas na regulamentação de Portaria

nº 41, de 29 de agosto de 2012, que dispõe sobre as normas para pesquisa e

publicação de trabalhos envolvendo os equipamentos vinculados à Secretaria de

Assistência Social e Cidadania - SASC, do município de Maracanaú e dá outras

providências. (Relatório de Gestão, 2012, p. 01).

Após várias visitas a SASC, de posse da autorização, fomos ao CRAS

Jereissati, apresentar à coordenação a autorização para iniciar a pesquisa de

campo.

8 Gestão da informação da Assistência Social – PRONTUÁRIO SUAS DIGITAL E ONLINE.

Disponível em http://www.gesuas.com.br acesso em 26 jun 2014.

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Com a permissão da coordenação, dialogamos com as técnicas de

referência para expor um pouco dos meus objetivos para esta pesquisa, buscando

facilitar acesso junto às usuárias, tendo em vista que as técnicas poderiam ter

algumas famílias dentro do perfil ao qual procurávamos. Com essa estratégia,

realmente ficou um pouco mais fácil o acesso e o contato com algumas mulheres,

porém percebemos receio destas em permitir nosso acesso às fichas das usuárias,

sendo compreendido pela questão do sigilo aos seus dados.

De acordo com os profissionais da equipe multidisciplinar do CRAS

Jereissati, do universo de 100 (cem) famílias acompanhadas pelo Programa de

Atenção Integral a Família - PAIF havia quinze mulheres chefes de família.

Inicialmente, esperávamos entrevistar dessas quinze, cerca de dez mulheres, mas

só foram possíveis cinco delas, devido à dificuldade de acesso as interlocutoras.

Por várias vezes tentamos contato com todas elas, porém das quinze, só

conseguimos falar com seis que de imediato aceitaram participar. Agendamos com

duas para o dia seguinte e as outras quatro para dois dias depois. Contribuiu como

fator dificultador o não conhecimento da área, perguntamos as pesquisadas se as

entrevistas poderiam ser no próprio CRAS e todas concordaram. Porém nos dias

agendados as mulheres não compareceram para as entrevistas.

Entramos novamente em contato por telefone com as mesmas para verificar

o que havia acontecido e a resposta foi à mesma para todas. Falaram que o CRAS é

muito distante das suas casas. Avaliando melhor, nos dispusemos a ir a suas casas

que de prontidão todas aceitaram, porém por conta da distância entre as casas das

usuárias, só foi possível fazer cinco entrevistas.

Assim, do universo de quinze mulheres, a amostra da pesquisa foi de cinco,

o que avaliamos como um dado interessante para representar suas realidades

sociais. Todas elas são acompanhadas pelo CRAS Jereissati e chefes de suas

famílias, respeitando assim, o objeto desta pesquisa.

As entrevistas foram realizadas nas casas das famílias, onde fomos muito

bem recebidas por todas. Algumas mulheres se expuseram um pouco mais que as

outras, falando das suas vidas. O fato de ter de ir às residências delas acabou

favorecendo a realização das entrevistas e contribuindo bastante no nosso

aprendizado, pois conhecer o local onde vivem participar um pouco do seu cotidiano

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contribuiu bastante para coletar mais elementos importantes para esta pesquisa.

Seguimos o roteiro das entrevistas e fizemos nossas devidas anotações.

Finalizado este processo, iniciando a pesquisa documental com o

levantamento dos documentos do Cras Jereissati, como: relatórios, instrumentais,

documentos do Cadastro Único e Programa Bolsa Família que nos ofereceram

dados sobre a realidade das mulheres pesquisadas. Fizemos a leitura desse

material, analisamos e retiramos as principais informações, finalizando então a fase

de campo.

A terceira e última fase da pesquisa se refere à análise e tratamento do

material empírico e documental:

Diz respeito ao conjunto de procedimentos para valorizar, compreender os dados empíricos, articula-los com a teoria que fundamentou o projeto ou com outras leituras teóricas e interpretativas cuja necessidade foi dada pelo trabalho de campo. (MINAYO, 2012, p. 27).

Empregaremos os três procedimentos norteados por Minayo (2012):

a) Ordenação dos dados, organização dos materiais coletados nas visitas ao campo,

nas entrevistas, em documentos, dados, leituras e outros;

b) Classificação dos dados, articulação com os autores, discussão das categorias, a

discussão teórica;

c) Análise propriamente dita se refere à articulação das informações, alcançadas

durante a realização da pesquisa nas entrevistas, nos estudos sobre a realidade e

nos documentos fornecidos pela instituição.

Esperamos com esses caminhos e técnicas metodológicas apresentadas,

conseguir nos aproximar verdadeiramente da realidade social dessas mulheres na

perspectiva de conseguirmos o máximo de dados e informações para embasar este

trabalho.

Compreendemos, pois, que abranger a totalidade de fenômenos envoltos ao

objeto de estudo, é um desafio material. Contudo, sabemos que toda pesquisa social

tem sua temporalidade e limitações do olhar próprio autor, já que a realidade é

dinâmica e contraditória, emaranhada entre as malhas de sua totalidade.

Cabe a nós, esta compreensão, dedicação e compromisso em apreender

esta realidade com responsabilidade e coerência. Esse foi o nosso intuito.

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2.2 Cenários da investigação.

O município de Maracanaú está situado no Estado do Ceará pertencente à

região do semiárido do nordestino, distante a 13 km da capital cearense. O nome

Maracanaú vem do tupi-guarani, significa “lagoa onde os maracanãs bebem”. É um

município relativamente novo, teve sua emancipação do município de Maranguape

em 1983, resultado da ação politica liderada por um agrupamento de políticos com

interesse de libertá-lo da tutela.

Atualmente Maracanaú ocupa a posição de maior Distrito Industrial do

Ceará, concorrendo para isto à instalação de grandes conglomerados industriais,

que atrai um contingente de mão de obra e promove um crescimento econômico

significativo.

O referido município está situado na Região Metropolitana de Fortaleza. Sua

área territorial é de 106,648 km² com uma população de 209.057 habitantes

segundo dados do censo 2010 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística –

IBGE9.

De acordo com a Politica de Nacional Assistência Social – PNAS é

caracterizado como município de grande porte. Atualmente a população de

Maracanaú é atendida por 10 (dez) CRAS em diferentes territórios.

O primeiro CRAS do município surge em 2005 através de uma ONG,

denominado CRAS Alto Alegre. No ano seguinte é criado o CRAS Jereissati/Antônio

Justa e o Indígena e nos anos posteriores até o ano de 2012, os outros seis CRAS.

O CRAS Jereissati surgiu em 2006, no prédio da Secretaria de Assistência

Social e Cidadania (SASC) no município de Maracanaú. Na época era conhecida

como Secretaria de Promoção Social, onde funcionava em um pequeno prédio,

situado na Rua Antônio de Alencar, 297 – centro de Maracanaú.

No ano de 2008, o CRAS Jereissati passou a funcionar em um prédio

alugado na Rua 11, nº 696, Bairro Jereissati I, com uma abrangência territorial que

compreendia quatorze bairros, permanecendo nesse endereço por quatro anos.

9 Disponível em: http://www.cidades.ibge.gov.br/xtras/perfil.php?lang=&codmun=230765.

Acesso em 09 maio 2014.

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Em março de 2012, mudou-se para um prédio pertencente à prefeitura de

Maracanaú onde antes funcionava somente o Pólo de Convivência10 Jereissati. Com

a chegada do CRAS, o Pólo passou a integrar as suas ações.

Atualmente o CRAS Jereissati está localizado no Bairro Jereissati II, Av. X nº

254, vizinho a outros equipamentos da rede socioassistencial como: Centro de

Referencia Especializado de Assistência Social – CREAS, Centro de Convivência do

Idoso – CCI, e a Escola Municipal de Ensino Médio Gonzaga Mota. Embora

localizado em um prédio próprio, situa-se numa área de difícil acesso, com queixas

constantes, por boa parte dos (as) usuários (as).

O CRAS conta com uma estrutura de: uma sala para atendimento social,

duas para a realização das atividades do PROJOVEM, um pequeno auditório onde

acontecem as aulas de teatro, dança e capoeira, a sala de atendimento do Cadastro

Único, a da coordenação, além de uma cozinha com refeitório, três banheiros, uma

dispensa e o almoxarifado.

O prédio possui uma arquitetura que lembra uma escola. A área externa é

bem ampla, com um campo improvisado atrás do prédio, uma quadra onde se

realizam as atividades esportivas e um pequeno parquinho com poucos brinquedos

para crianças menores.

A equipe de trabalhadores (as) do CRAS Jereissati é formada por vinte e

três pessoas: três assistentes sociais, sendo duas concursadas e uma via contrato;

uma psicóloga concursada; três pedagogas, uma concursada e duas com contratos

temporários; quatro agentes administrativos; quatro educadores sociais; cinco

facilitadores culturais; dois porteiros; um coordenador geral; dois serviços gerais;

uma cozinheira e um motorista. Estes últimos todos contratados.

A perspectiva de trabalhar o SUAS significa trabalhar com uma totalidade de

5.564 municípios, um Distrito Federal, 26 estados. Por isso, é muito importante ir a

fundo e analisar pesquisas, como a MUNIC (Pesquisa de Informações Básicas

Municipais), que trabalha todos os dados das gestões municipais, mostrando que,

nos municípios, 73% da força de trabalho que atua na Assistência Social é de nível

fundamental e médio. Só 1/3 é universitário e destes uma parte maior é de

assistentes sociais (CFESS, 2011, p. 50).

10

Locais de atividades educacionais para crianças e jovens de Maracanaú.

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O CRAS desenvolve ações do Serviço de Proteção e Atendimento Integral a

Família – PAIF com as ações de atendimentos técnicos, escuta qualificada,

encaminhamentos a rede de serviços, busca ativa, dentre outros. Ainda, desenvolve

como atividade do Serviço de Convivência e Fortalecimento de Vínculos - SCFV

para crianças e adolescentes numa faixa etária de 06 a 17 anos, e para idosos com

idade acima de 60 anos, contando também com atividades esportivas e culturais

como: capoeira, dança, teatro e eventuais palestras, também realizam as atividades

do PROJOVEM. Além desses serviços, também desenvolve ações do Cadastro

Único, concessão dos Benefícios Eventuais, Inclusão Produtiva11, e cursos do

Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego – PRONATEC.

Após apresentar os ciclos da pesquisa, o caminho e técnicas que utilizamos

para apreensão das informações; também relatamos as ações e serviços do Cras

Jereissati, seu histórico e peculiaridades. No próximo capítulo, discutiremos sobre

conceitos e principais debates sobre as principais categorias deste estudo: família,

gênero e assistência social.

11

Inclusão Produtiva é um programa que visa promover a cidadania das famílias inseridas nos

programas de transferência de renda através do acesso a informações e reflexões acerca dos seus

direitos, da inserção na rede de proteção social e da capacitação para atividades produtivas.

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3. FAMÍLIA: QUAL O PAPEL DA MULHER NESTA COMPLEXA INSTITUICÃO

SOCIAL?

3.1 Conceituando a categoria família: olhares sobre as mudanças nas famílias

na contemporaneidade.

Para estudar a instituição social família devemos sempre levar em conta sua

perspectiva histórica, pois é sob a tutela da história que as sociedades tendem a

desencadear um complexo processo de transformações sociais. Os acontecimentos

sócio-históricos devem ser considerados, pois estes são resultados de modificações

sociais resultantes das ações humanas no percurso das sociedades.

A família é a instituição fundamental para a garantia de sobrevivência de um

grupo social. Podemos defini-la como núcleo formador dos vínculos sociais,

biológicos, afetivos e emocionais, podendo ocorrer a presença deste isolados ou

juntos, tendo em vista que o conceito de família vai além de laços consanguíneos.

É no convívio da família que o individuo processa suas primeiras relações de

afetividade em sociedade, seja ela familiar ou/e comunitário, sendo através desta

que se influencia a identidade individual dos sujeitos.

A família pode ser compreendida por um grupo pessoas unidas por grau de

parentesco, amizade, solidariedade e relação econômica que tem como objetivo

principal a socialização, integração e satisfação de outras necessidades básicas.

Para Dias (2000, p. 150) esta instituição social consiste num grupo de

pessoas que são relacionadas entre si pelo sangue, casamento ou adoção, vivendo

juntas por um período de tempo definido. Na leitura deste autor, a família ainda se

constitui fixa e determinada pela união dos sujeitos pelo matrimônio ou condicionada

por sua constituição biológica, não abrangendo a interpretação de família unida por

laços afetivos.

Podemos afirmar que o conceito de família está em constante transformação

e, desta maneira, sua definição pode ocorrer de acordo com a cultura e significado

social, mesmo que a união dos laços não seja biológica.

A família é a primeira instituição que uma pessoa entra em contato em sua

vida. É o primeiro grupo social a que pertencemos. Embora haja normas sociais que

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determinam regras de funcionamento da instituição familiar, cada família tem ainda

suas próprias regras de controle e comportamento.

Ainda para Dias (2000, p. 50), a família é considerada como uma unidade

social básica e universal. Básica, por dela depender a existência da sociedade; e

universal, pois é encontrada em todas as sociedades humanas, de uma forma ou de

outra.

Já Lakatos e Marconi (1999) concordam com o pensamento de Dias ao

discorrer que:

Em todas as sociedades humanas encontra-se uma forma qualquer de família. Sua posição, dentro do sistema mais amplo de parentesco, pode oscilar muito, desde um lugar central e dominante (sociedade ocidental) até uma situação de reduzida importância, que dão maior destaque ao grupo de parentesco, mais amplo do que a unidade representada pelo marido, mulher e filhos. (LAKATOS e MARCONI, 1999, p. 171).

Giddens (2005) conceitua família como um grupo de pessoas diretamente

unidas por conexões parentais, cujos membros adultos assumem a responsabilidade

pelo cuidado das crianças. Apresenta a família nuclear a partir de dois adultos

vivendo juntos num núcleo doméstico e coloca que a família ampliada é quando

parentes próximos além do casal e seus filhos vivem juntos no mesmo ambiente

familiar ou um relacionamento próximo e contínuo uns com os outros. Em uma

família ampliada pode incluir os avós, irmãos/irmãs e seus cônjuge, tias e sobrinhos.

A família medieval inicia a partir do século XIV ao século XVII um processo

de transformação tomando assim novas formas em sua base. A situação da mulher

era de inteira subordinação ao homem, sendo tratada com um “objeto” de sua posse

ou propriedade, ocorrendo desta forma uma forte dominação. O mundo era do

homem por excelência, as crianças e mulheres não passavam de seres

insignificantes.

A legislação reforça o poder do marido e dos homens em geral, estabelecendo a desigualdade entre homem e mulher. Expressão disso é o fato de a escolaridade passar a fazer parte da vida dos meninos desde o século XV, mas vai ser extensiva às meninas somente no final do século XVIII e inicio do século XIX. (GUEIROS, 2002, p. 106).

A família moderna surge no final do século XVIII, havendo neste período

mudanças significativas, tais como a separação do público e do privado e as

modificações no papel social da mulher. Esta mudança fica evidente principalmente

com o movimento feminista no século XIX, período em que a mulher inicia a sua

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emancipação social e sexual. Feministas e acadêmicos analisaram a história deste

movimento em três "ondas".

A primeira onda teria ocorrido nos Estados Unidos e no Reino Unido, entre o

final do século XIX e o início do século XX. Tendo como destaque a luta pelo direito

ao voto. No Brasil, a conquista ao direito de voto pelas mulheres data o ano de 1932.

A segunda onda teve como foco a preocupação com as questões da

igualdade entre os sexos e o fim da discriminação. No Brasil, a segunda onda

corresponde ao período da ditadura militar (1964-1989), o que levou as feministas a

se rebelarem contra o regime e também contra a opressão de gênero.

A terceira onda feminista se inicia na década noventa e segue até os dias

atuais. Há quem acredite que essa terceira onda tenha surgido como uma resposta

às falhas da segunda onda.

Com as mudanças no século XVIII, a família passa por alguns ajustes que

favorecem a transformação de seu perfil, deste modo, o novo desenho familiar

passa a ser chamado de família nuclear . Nesse sentido diz Osterne (2001):

No século XVIII, então, com o aparecimento da escola, da privacidade do lar, da ênfase da igualdade entre filhos, da manutenção das crianças junto aos pais no núcleo conjugal, do sentimento de família em intima relação com o sentimento de classe, valorizado pelas instituições, sobretudo pela igreja, inicia-se a delinear-se, o que convencionou chamar família nuclear burguesa. (p. 53).

Ressalta-se que a história da família é descontinua, não linear e não

homogênea, constituindo-se de padrões familiares distintos, cada em um

determinado contexto histórico. Abrangendo o conceito de família além de laços

consanguíneos, sendo esta nossa compreensão sobre esta categoria, nos

fundamentamos em Osterne, quando esta autora a conceitua:

A definição dominante de família congrega um conjunto de palavras afins: pai, mãe, filhos, casa, unidade doméstica, casamento e parentesco. A família tida como “legitima”, “normal”, que se interioriza no imaginário das pessoas, caracterizam-se como um conjunto de indivíduos aparentados que se ligam entre si por aliança, casamento, filiação, adoção ocasional ou afinidade. É pressuposto comum que esses indivíduos habitem um mesmo teto. (OSTERNE, 2001, p. 51).

Quando se fala em família quase que de forma instantânea vem ao

pensamento à imagem do pai, mãe e filhos, um modelo de família tradicional. A

família está organizada de diferentes formas, o que lhe atribui um caráter plural ao

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modelo de família tradicional e, mais tarde, de família nuclear, tida como formas de

organização dominante na sociedade brasileira.

A família burguesa apresentava em seu contexto uma forma nuclear,

representada pela figura do pai, da mãe e dos filhos, ou seja, era organizada numa

rígida divisão dos papeis: o pai era responsável pela garantia do sustento e a mãe

pela administração do lar e cuidado dos filhos.

De acordo com Gueiros (2002), começa então, a se desenvolver a família

conjugal moderna com novas formulações para os papeis do homem e da mulher no

casamento. Dá-se inicio a família contemporânea que surgiu em meados do século

XIX e prossegue até hoje.

A existência de traços da família patriarcal na família conjugal moderna persiste até o século XX, fundamentada inclusive na legislação, pois, no Brasil, somente na Constituição de 1988 a mulher e o homem são assumidos com igualdade no que diz respeito aos direitos e deveres na sociedade conjugal. (GUEIROS, 2002, p. 107).

O período industrial surgiu mundialmente, e junto com a revolução a

ampliação das famílias. Mesmo com tantos avanços na área social, ainda nos dias

atuais a mulher continua assumindo as tarefas históricas de mãe, esposa e, em

muitos casos, dona de casa.

Osterne (2001, p. 51) levanta os seguintes questionamentos sobre o que

seria família:

Seria a família este grupo concreto, formado por um numero de pessoas ligadas por consanguinidade ou aliança, ocupando posições diversificadas numa hierarquia interna de poder e de papéis? Ou seria a família uma representação social, uma realidade simbólica? Por outro lado, as manifestações empíricas do real e suas representações não seriam partes igualmente constitutivas da realidade objeto da análise social? Quais as manifestações mais comuns da família como fato empírico? Como se desenvolve sua historicidade? Como aparece no plano das representações sociais?

Na atualidade as relações familiares, constituem-se por novos rearranjos

sociais, resultante da diversidade de situações implicando em novas adaptações do

cotidiano de cada indivíduo. A família passa a ser todos que de certo modo,

compartilham formas de convivência diária, sejam de afeto ou mesmo de conflitos.

O tipo mais comum de família nuclear é aquela constituída pelo pai, pela

mãe e filhos não casados, esta, porém, não deve ser considerada universal, pois a

estrutura de família nuclear não é encontrada em todas as sociedades.

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Na contemporaneidade, a família tem perdido o sentido de tradição por

causa das mudanças na sociedade e pela necessidade dos seres humanos de

conviver sobre um mesmo teto.

O reposicionamento do papel da família contemporânea na sociedade é

importante para que possamos compreender muitas das relações sociais existentes

na atualidade. Por ser tão relevante o tema, por vezes, requer intervenção estatal

para que a definição de família seja legalmente estabelecida.

Existem alguns tipos contemporâneos de família: família nuclear constituída

por dois adultos de sexo diferente que vivem maritalmente com os seus filhos

biológicos e/ou adotados; agregados monoparentais constituídas por apenas um

adulto e seu(s) filho(s) na maioria dos casos, o adulto é uma mulher; famílias

recompostas podem acontecer em várias circunstâncias: uma situação é o segundo

casamento entre pessoas jovens que não trazem filhos do anterior casamento e

outra inclui a existência de filhos de casamentos anteriores que veem viver num

novo agregado com o novo conjugue.

A coabitação é cada vez mais frequente entre os jovens, sobretudo com um

período de experiência de vida em comum antes do casamento oficial; casais

homossexuais que se relacionam afetivamente que optam por viver maritalmente,

famílias chefiadas por mulheres sem presença masculina; na ausência dos pais, os

avós como referência, dentre outros. Esses são alguns casos de famílias

contemporâneas existentes. A seguir Osterne (2004) faz uma breve síntese do que é

ser família.

Família seria portanto: … algum lugar seja o lar, a casa, o domicilio, o ponto focal onde se possa desfrutar do sentido de pertencer, onde se possa experimentar a sensação de segurança afetiva e emocional, onde se possa ser alguém para outro, apesar das condições adversas mesmo independente das relações de parentesco e consanguinidade. (p. 65).

Assim, chegamos ao fim da nossa conclusão desta discussão considerando

que eram necessários alguns esclarecimentos sobre a instituição familiar, e iniciando

no tópico a seguir, sua articulação com as relações de gênero ocorridas nas famílias

e na sociedade contemporânea.

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3.2 As relações de gênero como reflexo das relações desiguais entre homens e

mulheres

O termo gênero é fruto de uma construção social desenvolvida ao longo da

historia. Para iniciar esse assunto, retornaremos a gênese do movimento feminista

brasileiro que teve sua origem no final do século XIX e inicio do século XX.

A perspectiva das lutas das mulheres baseava-se na igualdade de direitos

entre homens e mulheres. Suas demandas referiam-se à causa abolicionista e,

posteriormente, ao direito à participação eleitoral. A luta pelos direitos políticos foi

reforçada pelas exigências de melhores condições de trabalho para as mulheres e a

constantes lutas contra a dominação masculina e o direito a educação. Sua

constituição é repleta de correlação de forças, resistências e conquistas.

A instituição família também se desenhou na sociedade burguesa formando

o ser homem e o ser mulher. Culturalmente, ao homem são atribuídos papeis como

o de brincar com bola e carros; poder vestir-se de qualquer jeito dentro do padrão

masculino, além de aparentar força e coragem. Para a mulher, esta tem que ser

doce, meiga, frágil e dependente; gostar de bonecas; ter dons para a atividade

doméstica e seguir os passos da mãe, tornando-se sua continuidade. Proteger e

educar os filhos, cuidar da casa e do marido, não se esquecendo de lhe ser fiel por

toda a vida.

Assim, a família, para muitas mulheres, foi considerada como algo sagrado.

Os filhos, a casa, o marido são à base de tudo. Pertence historicamente à mulher a

responsabilidade em manter a “harmonia” do lar. O que é do mundo privado, do lar,

deve ser admitido pela mulher, e tudo que se refere à esfera pública é atribuído ao

homem.

Em síntese, o homem deve ser o provedor e a mulher a dona de casa, “a

rainha do lar”, dando- se a ela o título de nobreza. No entanto apesar de “rainha”, ela

não detém o poder, pois este pertence à figura masculina. Tal ordem reforça a

construção de relações de poder, reafirmando a dominação masculina como algo

natural e lógico pertencente ao modelo patriarcal de sociedade.

O movimento feminista era um movimento que lutava pela equidade, liberdade

e a favor de uma sociedade sem preconceito contra a mulher. Muitas mulheres

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buscavam respeito para as suas ideias e um lugar na sociedade. Dessa forma, com

a luta do movimento feminista, trazemos a reflexão de Osterne:

Ocorre maior igualdade entre os sexos, maior controle de natalidade, maior incidência de separações e de novos casamentos. A atividade renumerada da mulher contribuiria para a redução da autoridade parental. Ocorreria também um enfraquecimento dos laços de parentesco. (OSTERNE, 2001, p. 67).

Osterne (2008) aborda em seu livro as compreensões de Pinto (2003),

quando este salienta nas primeiras décadas do século XX que havia três claras

vertentes do movimento feminista.

A primeira vertente foi liderada por Bertha Lutz12, a qual reflete como

objetivo a inclusão das mulheres na sociedade, evidenciando-as como cidadãs de

direito, tanto quanto os homens, uma visão de igualdade para ambos os sexos. A

segunda vertente é denominada como feminismo difuso, pois esta se expressava

nas mais diversas manifestações da imprensa feminista alternativa.

Defendia o direito à educação das mulheres, falava sobre a dominação

masculina e discorria a respeito de temas delicados para a época. A terceira

vertente era formada por mulheres trabalhadoras e intelectuais que militavam no

movimento anarquista e no Partido Comunista, com o objetivo de lutar pela

libertação da mulher de forma radical, tendo a exploração do trabalho feminino como

peça central das lutas.

Os estudos sobre gênero emergem inseridos principalmente no movimento

feminista acadêmico, no final do século XX, entre as décadas de 1970 e 1980. Seu

objetivo advém da necessidade de desnaturalizar e historicizar as desigualdades

entre homens e mulheres, analisadas, pois, como construções sociais, determinadas

pelas e nas relações sociais. (CISNE, 2012).

As hipóteses explicativas sobre as origens da opressão feminina foram sendo gradualmente questionadas e abandonadas na busca de ferramentas conceituais mais apropriadas para desnaturalizar essa opressão. Esse quadro de efervescência intelectual é o contexto no qual se desenvolve o conceito de gênero. (PISCITELLI, 2002 apud CISNE, 2012, p. 77):

12

Berta Lutz, cientista, líder feminista e política paulista (1894-1976). É uma das pioneiras da

luta pelo voto feminino e pela igualdade de direitos entre homens e mulheres no país. Em 1919

começa a se destacar na busca de igualdade de direitos jurídicos entre os sexos, ao se tornar a

segunda mulher a ingressar no serviço público brasileiro, após ser aprovada em concurso do Museu

Nacional, no Rio de Janeiro.

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Apesar de este conceito ser de relevante importância para as mulheres, o

contexto de seu surgimento também é marcado por perigos de atraso para o

movimento feminista e também para a classe trabalhadora, pois destaca as ligações

de poder em detrimento da busca das causas da dominação e opressão.

O conceito de gênero veio também no sentido de analisar de maneira relacional a subordinação da mulher ao homem, ou seja, os estudos sobre as mulheres não deviam apenas limitar-se à categoria mulher, mas esta deve sempre ser analisada de forma relacional ao homem. Portanto gênero se constitui como uma categoria relacional. (CISNE, 2012, p. 78).

O conceito de gênero desde a sua origem e no decorrer do seu

desenvolvimento que ainda está em andamento, foi e é dotado de diferentes

aspectos. Esta diversidade é provocada tanto pelas polêmicas teóricas e políticas no

interior das ciências humanas e exatas, quanto por ser uma categoria que possui um

estudo relativamente recente. (CISNE, 2012, p. 79).

A luta por equidade e liberdade ainda se configuram como as principais

linhas de pensamento, atualmente criam-se novas reivindicações, como o

questionamento do papel da mulher na família, no trabalho e na sociedade. As lutas

mais recentes se configuram nas transformações das relações humanas baseadas

na discriminação social e de gênero.

No Brasil, o impulso dos movimentos feministas e de mulheres e a receptividade da academia a essa temática inicia-se a partir dos anos 1970. No entanto, enquanto no final da década de 80 ocorre um refluxo da viabilidade do movimento, multiplicam-se os estudos sobre o assunto no âmbito universitário. (OSTERNE, 2001, p. 117).

O movimento feminista brasileiro conquistou, nas últimas décadas, a

ampliação dos direitos da mulher. Suas ações foram decisivas para articular o

caminho da igualdade entre os gêneros, que, apesar de todos os avanços, ainda

não é plenamente garantida.

A categoria de gênero não será usada para substituir referencias à mulher ou ao homem, mas para designar a dimensão inerente de uma escolha cultural e de conteúdo relacional, que rejeite o caráter fixo e permanente da posição binária entre masculino e feminino. O reconhecimento da importância de sua historicidade e de seu permanente estado de desconstrução deverá evitar sua aceitação como obvia ou de presente na natureza das coisas. (OSTERNE, 2001, p. 118).

Carloto (2006) concorda com Osterne (2001) ao aborda que:

Embora o conceito gênero tenha ganhado força e destaque enquanto instrumento de análise das condições das mulheres, não deve ser utilizado como sinônimo de “mulher”. O conceito é usado tanto para distinguir e

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descrever as categorias mulher e homem, como para examinar as relações estabelecidas entre eles. (p. 142)

Cabe ressaltar ainda que gênero e sexo não tem o mesmo sentido, pois

gênero seria a construção social e sexo seria o que é determinado biologicamente,

fisiologicamente, portanto natural. (CISNE, 2012, p. 79). Referente à relação de

gênero e sexo Osterne (2001) faz a seguinte menção.

As relações de gênero, portanto, não são consequências da existência de dois sexos, machos e fêmea. O vetor caminha em sentido contrário, ou seja, do social para os indivíduos. Os indivíduos transformam-se em homens e mulheres por intermédio das relações de gênero. (p.119)

Apesar do estudo de gênero está sempre coligado às coisas referentes ao

feminino. Assim, enfatiza a perspectiva relacional entre mulheres e homens, ou seja,

só alcançará verdadeiro sentido se recuperar a experiência conjunta entre homens e

mulheres em toda a sua complexidade.

O feminismo era um protesto contra a exclusão da mulher: Seu objetivo era eliminar as “diferenças sexuais” na política, mas a reivindicação tinha de ser feita em nome das “mulheres” (um produto do próprio discurso da „diferença sexual‟). Na medida em que o feminismo defendia as „mulheres‟, acabava por alimentar a „diferença sexual‟ que procurava eliminar. Esse paradoxo – a necessidade de, a um só tempo, aceitar e recusar a “diferença sexual” – permeou o feminismo como movimento político por toda a sua história. (SCOTT, 2002 apud PEIXOTO, 2010, p. 121).

De acordo com Peixoto (2010):

A partir da década de 1970, o movimento feminista contemporâneo teve como expressividade, as lutas pela afirmação das diferenças e da entidade, sobretudo, ao abordar questões mais específicas da condição feminina. Nessa época, surgem às demandas por novos direitos, tais como os direitos sexuais e reprodutivos. (p. 120-121).

Na década de 1970 aumentou significativamente à quantidade de mulheres

que adentraram ao mercado de trabalho, assim como o seu nível de escolaridade,

as chefias femininas nos lares brasileiros é um fenômeno cada vez mais aparente e

frequente.

As condições adversas das mulheres chefes de família de administrar

duplamente a sua participação nas esferas produtivas e reprodutivas, sejam estas

pertencentes a qualquer estrutura e arranjo familiar, ainda encontram-se em

disparidade em relação aos homens. Um dos exemplos concretos dessa

desigualdade refere-se à inserção em condições desiguais de tratamento, tempo,

mobilidade e remuneração, em relação aos homens no mercado de trabalho.

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A segregação no mercado de trabalho destinou às mulheres os empregos mais precários, geralmente informais ou em tempo parcial, salários mais baixos, menor cobertura dos serviços de seguridade social e dificuldades de acesso aos direitos trabalhistas. (PEIXOTO, 2010, p. 109).

Peixoto (2010) ressalta algumas razões exposta por Lavinas (1999) que

podem explicar o aumento do sexo feminino no mercado de trabalho.

Uma delas decorre da amplitude do processo de reestruturação produtiva, iniciado nos anos 1980, e que afeta, sobretudo o mercado industrial, cuja redução tem rebatimentos negativos, incidindo mais nos trabalhadores homens que compõem a maior parte da mão-de-obra desse setor.

Outro fato, segundo essa autora, que estimula a inserção produtiva das mulheres é a expansão da economia de serviços. Uma terceira questão refere-se à maior flexibilização no mercado de trabalho e a precarização das relações de trabalho, com o aumento da ocupação por conta própria e da informalidade em geral. (p. 109).

De acordo com a Organização Internacional do Trabalho - OIT13 em estudo

publicado em março 2010 a taxa de participação das mulheres no mercado de

trabalho aumentou de 50,2% para 51,7% entre 1980 e 2008, com uma progressão

mais sentida nos anos 1980 e no início dos anos 1990. O percentual de mulheres

que entram no mercado de trabalho teve um significativo aumento nos últimos 30

anos, mas elas seguem ganhando menos que os homens, e geralmente não gozam

dos mesmos benefícios.

Compartilho com Cisne (2012) ao refletir que:

Há uma falsa e vulgar ideia de que as mulheres já atingiram um patamar de igualdade social com os homens, se libertaram, adquiriram independência, já ocupam grande parte do mercado de trabalho, enfim já temos uma nova mulher. Esses pensamentos, que infelizmente vêm crescendo na sociedade, contribuem para a argumentação de que agora só se precisa de “um novo homem”, o que significaria a necessidade de se trabalhar muito mais a masculinidade. (p. 85).

Estudos apontam que na atualidade há dois fatos que merecem a atenção

em relação à questão de gênero no Brasil: o aumento número de domicílios com

chefia feminina e a consistente presença da mulher no mercado de trabalho.

É complicado afirmar qual o motivo pela entrada da mulher no mercado de

trabalho e o aumento da chefia feminina em domicílios, pelo fato dos dois

movimentos decorrem de varias razões que se ligam entre si, entre as causas estão:

a busca pela emancipação feminina, o aumento de importância do setor de serviços,

13

Disponível em: http://noticias.r7.com/economia/noticias/mulheres-sao-51-7-do-mercado-de-

trabalho-mundial-20100305.html acesso em 26 maio 2014.

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a importância da renda feminina para complementação da renda familiar, maior

desagregação familiar e, até mesmo, opção pessoal, entre outros motivos.

Na década de 1980, o movimento de mulheres no Brasil era uma força

política e social concretizada. Os conceitos feministas expandiram-se no cenário

social do país, fruto do clima receptivo das demandas de uma sociedade que se

modernizava. Os grupos feministas propagaram-se pelo país. Houve uma

expressiva penetração do movimento feminista em partidos e sindicatos entre outros

que vieram a legitimar a mulher como sujeito social.

Durante a década de 1980, as mulheres organizadas adentram os partidos políticos, sindicatos e associações comunitárias. Destacam-se, nesse período, as reivindicações voltadas para o enfrentamento da violência doméstica. Nos anos de 1990, muitos grupos feministas ganharam uma forma mais especializada transformando-se em organizações não-governamentais (ONGs) e, mediante canais institucionalizados, buscaram influenciar as políticas públicas no tocante às questões das mulheres. (PEIXOTO, 2010, p. 121-122).

No ponto de visto governamental, no ano de 2003 inicia-se o governo Lula,

momento em que foram fundadas algumas políticas públicas de superação das

disparidades de gênero, na esfera do Estado. Em 2003 foi criado a Secretaria

Especial de Políticas para as Mulheres e em 2004 e 2007 foram realizadas as

Conferências Nacionais de Políticas para as Mulheres, que resultaram em Planos

Nacionais de Políticas para as Mulheres.

Com efeito, nesse percurso, percebe-se que o movimento de mulheres e feminista tem contribuído para vários avanços no tocante ao fortalecimento da cidadania feminina, sobretudo, mediante os avanços recorrentes da ampliação dos direitos das mulheres. É inegável, pois, o caráter ousado e o enfrentamento às práticas patriarcais desse movimento que, sob as máximas da igualdade e da diferença continua contribuindo para a efetivação de valores e comportamentos humanos mais justos. (PEIXOTO, 2010, p. 123).

Nesse período, entre as recentes lutas estavam: a luta pelo reconhecimento

dos direitos econômicos, sociais, culturais e ambientais das mulheres; necessidade

do reconhecimento do direito universal à educação, saúde e previdenciária; defesa

dos direitos sexuais e reprodutivos; reconhecimento do direito das mulheres sobre a

gestação, com acesso de qualidade à concepção e/ou contracepção; a

descriminalização do aborto como um direito de cidadania e questão de saúde

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pública14. Algumas dessas lutas como pode se ver não é algo tão atual, porém, são

alvos de uma luta constante.

No período de 2001 a 2009, os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de

Domicílios - PNAD evidenciam a continuidade do aumento da proporção de famílias

chefiadas por mulheres no Brasil.

Essas famílias, no entanto, são bastante heterogêneas e apresentam as mais diversas configurações: mulheres solteiras, separadas ou viúvas com filhos e tendo ou não parentes e/ou agregados em casa; mulheres solteiras, separadas ou viúvas, sem filhos com presença ou não de parentes e/ou agregados; mulheres solteiras, separadas ou viúvas morando sozinhas; e, ainda, mulheres casadas chefiando a família mesmo tendo um marido ou companheiro em casa, com ou sem filhos. (IPEA, 2009, p. 05).

Na tentativa de explicar essa “nova chefia”, o Instituto de Pesquisa

Econômica Aplicada - IPEA (2009) nos informa que o reconhecimento como chefe

da família pode ser dado a quem assume a responsabilidade com os cuidados da

casa e com os filhos ou, ainda, a quem responde mais fortemente pela manutenção

econômica do lar... O total de famílias chefiadas por mulheres representava 35,2%

dos arranjos em 2009, enquanto as chefiadas por homens eram 64,8% (p. 05 e 07).

Com a introdução do conceito de „pessoa de referência‟ em substituição ao de „chefe do domicílio‟, a PNAD transferiu ao respondente a tarefa de nominar a pessoa, homem ou mulher, responsável pelo domicílio. Essa mudança da perspectiva de gênero foi um salto importante, pois a noção de chefia, pela matriz cultural dominante, poderia ser mais facilmente atribuída à figura masculina do domicílio, marido ou pai... (IPEA, 2009, p. 05).

O aumento proporcional nos novos arranjos pode estar associado, portanto,

ao potencial de autonomia que as mulheres têm assumido nas relações familiares e

na esfera pública.

Resultado de um forte patriarcalismo, o lugar historicamente reservado as

mulheres na sociedade brasileira foi a casa e o cuidado com os filhos, dentro de

uma estrutura opressiva. A divisão sexual do trabalho e fruto dessa vertente

presente no desenvolvimento da nossa sociedade.

O patriarcado estabelece diferenças entre comportamentos femininos e

masculinos. Nesse contexto as mulheres sofrem repressões especialmente no

campo da sexualidade, o modelo patriarcal que há tempos imperou na sociedade

14

Disponível em: http://www.brasil.gov.br/cidadania-e-justica/2012/02/feminismo-pela

igualdade-dos-direitos.

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brasileira caracterizava-se pela limitação e obrigação feminina de procriação tendo

como fins a herança e a sucessão, e ao homem a liberdade sexual.

Articulando essa discussão com o nosso objeto, o Programa Bolsa Família

materializa essa ideia da mulher como a melhor indicada para os cuidados com a

família e com o lar, à medida que as mulheres são foco de administração do

beneficio, a figura feminina são as titulares do programa e portadoras do cartão de

repasse de renda. Compreendendo que as mulheres são as mais indicadas para a

tarefa de administrar a renda recebida, a fim de atender as reais necessidades da

família.

O papel de cumprir as condicionalidades presentes no PBF, relacionados à

saúde e educação, também é atribuído às mulheres, além da responsabilidade de

participar dos grupos de atividades desenvolvidas pelo CRAS. Dessa forma as

mulheres utilizam a maioria do seu tempo em atividades não remuneradas e

socialmente desvalorizadas, restringindo-se mais uma vez ao âmbito privado da vida

familiar.

Na atualidade a mulher realiza diversas tarefas que antes eram privativas

aos homens, até mesmo o papel de chefe de família. Este em particular tem um

valor singular visto que a família é o primeiro lugar social do ser humano. A mulher

no decorrer dos anos, exerceu múltiplos papéis até conseguir chegar ao cenário

atual, objetivando serem independentes e respeitadas, as mulheres alcançaram até

o cargo que era garantido ao homem, o de chefe de família.

Para finalizar este capitulo deixamos a seguinte mensagem: a consciência

de ser mulher não é dirigida aos homens e nem mesmo contra eles, mas dá

preferência ao relacionamento da mulher consigo mesma, à conquista da sua

subjetividade.

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4. A POLÍTICA DE ASSISTÊNCIA SOCIAL BRASILEIRA

4.1 Uma breve contextualização dos cenários políticos e o histórico da política

de assistência social no Brasil

No Brasil, a assistência social se constituiu nas marcas deixadas pelo

escravismo, a desqualificação da classe trabalhadora, pelas lutas e movimentos

sociais feitos por esta classe, o desenvolvimento desigual, pelas relações de

compadrio, clientelismo e o patrimonialismo, forma de relações de trato com a

população que direcionam a política na sociedade brasileira, havendo seus reflexos

ainda na atual conjuntura.

Antes de 1930, a economia brasileira era agroexportadora e o sistema político caracterizado pela ausência de planejamento social. O Estado quase não geria o processo de provisão social, deixando esse mister com as seguintes instâncias: o mercado – que atendia a preferências e demandas individuais-; a iniciativa não mercantil – que dava respostas tópicas e informais aos reclamos da pobreza-; e a polícia, que controlava, repressivamente, a questão social então emergente. (PEREIRA, 2007, p. 127 e 128).

As instituições sociais e assistenciais, a partir de 1930, foram utilizadas

como instrumentos de controle politico e social. Essa foi à estratégia utilizada pelo

Estado para manter as relações sociais estáveis e evitar conflitos sociais.

Em 1945, após 15 anos no poder, Getúlio Vargas caiu, e abriu-se um novo período no país, de intensas turbulências econômicas, politicas e sociais. Afinal, o Brasil tornou-se um país mais urbanizado, com uma indústria de base já significativa, apesar de a vocação agrário-exportadora permanecer forte, e com um movimento operário e popular mais maduro e concentrado, com uma agenda de reinvindicações extensa. (BEHRING, 2008, p. 109).

A primeira regulação da assistência social no Brasil em 1938 foi com a

instalação do Conselho Nacional de Serviço Social-CNSS, órgão que reproduzia o

clientelismo, objeto de escândalos nacionais, processos de corrupção e subvenções

às instituições fantasmas.

O CNSS foi criado como um dos órgãos de cooperação do ministério da

educação e saúde. Formado por figuras ilustres da sociedade de cultura filantrópica

e substituindo o governante na decisão quanto às quais organizações dar auxílio.

Foi à primeira forma de presença da assistência social do Estado brasileiro, ainda

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44

que na função subsidiária de concessão às organizações que prestavam amparo

social.

O CNSS foi, portanto, a primeira forma de presença da assistência social na burocracia do Estado republicano brasileiro, ainda que na função subsidiaria de subvenção às organizações sociais que prestam amparo social. Assim, atuou como uma forma pautada na ajuda ao setor privado, sem relação direta com a população. Desta maneira, a regulação estatal da assistência social começa na década de 30, com Getúlio Vargas. (MESTRINER, 2011, p. 66-67).

Após quatro anos do CNSS, foi criado em 1942 a primeira instituição de

assistência social com traços de público e privado, denominada de Legião Brasileira

de Assistência-LBA gerida pelas primeiras damas15.

Essa instituição foi criada para atender as famílias dos pracinhas envolvidos na Segunda Guerra e era coordenada pela primeira-dama Sra. Darci Vargas, o que denota aquelas características de tutela, favor e clientelismo na relação Estado e sociedade no Brasil, atravessando a constituição da politica social. Posteriormente, a LBA vai se configurando como instituição articuladora da assistência social no Brasil, com uma forte rede de instituições privadas conveniadas, mas sem perder essa marca assistencialista, fortemente seletiva e de primeiro-damismo, o que só começará a se alterar muito tempo depois com a constituição de 1988. (BEHRING, 2008, p. 107 e 108).

Criada com o objetivo de ajudar as famílias dos soldados enviados à

Segunda Guerra Mundial, a LBA teve em sua gênese a presença das mulheres e foi

marcada pelo patriotismo, após o fim do conflito mundial. A instituição continuou

suas ações filantrópicas no atendimento às famílias carentes da época, guiadas

pelos interesses do governo.

A assistência social funcionava como ação social, ato de boa vontade e não

como direito. Foi extinta somente em 1995 no governo de Fernando Henrique

Cardoso.

A assistência social como campo de ação governamental registra no Brasil duas ações inaugurais: a primeira em 1937 com a criação do CNSS – Conselho Nacional de Serviço Social; e, a segunda, na década de 40 do século XX, com a criação da Legião Brasileira de Assistência, a LBA. (BRASIL, 2005, p. 09).

Em 1946 foi derrotado o Estado Novo, e entrou o governo de Dutra. O país

passou por uma fase de redemocratização, contrária ao governo de Vargas. Ao que

se refere aos direitos sociais, foi reconhecido o direito a greve e mantidas as

15 Primeira-dama no Brasil é o título que recebe a esposa do presidente da República do Brasil.

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garantias dos(as) trabalhadores(as) já conquistados na constituinte de 1934, não

havendo nenhum retrocesso no campo dos direitos dos cidadãos.

A Constituição de 1946 suprimiu a repressão profissional, prevista na

constituição de 1934, que trazia a marca do corporativismo de inspiração fascista.

(FAUSTO, 2008, p. 400).

Juscelino Kubitschek, em 1955, assumiu a Presidência da República, com o

propósito de desenvolver o Brasil. Apresentou ao povo brasileiro o seu Plano de

Metas, cujo lema era “cinquenta anos em cinco”, a ideia nacional

desenvolvimentista, que ficou conhecida como os anos de ouro.

Na memoria dos brasileiros, os cinco anos do governo Juscelino são lembrados como um período de otimismo associado a grandes realizações, cujo maior exemplo é a construção de Brasília. Na época, a fundação de uma nova capital dividiu as opiniões e foi considerada um tormento pelo funcionalismo público da antiga capital da República, obrigado a transferir-se para o Planalto Central do país. (FAUSTO, 2008, p. 429 e 430).

Juscelino Kubitschek propiciou a integração do desenvolvimento industrial

com outros setores, como transporte, educação e energia entre outros. A cidade de

Brasília foi construída em quatro anos, e passou a ser a nova capital do país, nova

sede do governo.

Foi em sua gestão, que se criou a Superintendência do Desenvolvimento do

Nordeste – SUDENE, como resultado da preocupação governamental com as

questões regionais, para reduzir a desigualdade socioeconômica dessa região em

relação a Centro-Sul do país. Esse órgão atuava no combate à seca, com medidas

de curto prazo, principalmente de caráter assistencial e de longo prazo na

construção de açudes.

Segundo Behring (2008, p. 111), o golpe militar de 1964 instaurou uma nova

ditadura que durou 20 anos e impulsionou um novo momento de modernização

conservadora no Brasil, com fortes consequências para a politica social. O período

de 1964 a 1985 envolveu vários governos, iniciando com o governo de Castelo

Branco e seguindo até o de Figueiredo. Pereira aponta quais foram esses governos:

•1964-1966: governo Castelo Branco, que instituiu o modelo autoritário, rompendo com a prática populista/desenvolvimentista anterior;

•1967-1969: governo Costa e Silva, que afirmou o modelo autoritário e preparou o caminho para a sua continuidade;

•1970-1973: governo Médici, que aprofundou e enrijeceu o modelo autoritário;

•1974-1979: governo Geisel, que vivenciou o início da abertura política;

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•1980-985: governo Figueiredo, que participou da continuidade da abertura política (PEREIRA, 2008, p. 134 – 135).

O período de ditadura foi marcado por generais se alternado no poder e

decidindo os destinos da nação, intervalo que ficou conhecido como anos de

chumbo. Os militares consideravam que para ser um país moderno era necessário o

inicio da ditadura, que resultou em, vinte anos de autoritarismo. O período de 1969 e

1973 foi marcado por intenso crescimento da economia. Nesta época o Brasil era

governado pelo general Médici. O termo “milagre economico” está relacionado com

este rápido e ordinário desenvolvimento econômico pelo qual passou o Brasil neste

período.

Assim, ao longo do período 1964-84, o Brasil transforma-se em verdadeiro Estado unitário, ficando o poder concentrado no Executivo federal, que usa a ideologia da segurança nacional como justificativa para todas as medidas de força e arbitrariedade adotadas e como eixo converge de todas as políticas, inclusive a econômica. Por meio de atos institucionais, amplia de tal forma a capacidade de intervenção governamental, que exclui da luta politica e das decisões econômicas sociais os demais poderes, estados, municípios, a sociedade em geral e as classes subalternas. (MESTRINER, 2011, p. 153 e 154).

Apenas em meados da década de 1980, após várias manifestações da

população, forte tensão da sociedade civil em questionar o período de forte censura

e autoritarismo do período militar, a sociedade brasileira levantou a bandeira da

democracia como forma de amenizar os conflitos nacionais, as politicas sociais

nesse, foram impostas para acalmar os ânimos da sociedade, e não como forma de

consciente de atender as necessidades sociais, que se aprofundavam no contexto

de pobreza, miséria, inflação desenfreada e desigualdades sociais.

[...] graças à crescente mobilização da sociedade, alguns avanços civis e políticos se fizeram notar: anistia, em 1979, com a restrição dos direitos civis e políticos aos cidadãos cassados pelo regime militar, eleições para governadores, em 1982, e ampla campanha popular pelas „Diretas Já‟, isto é, pelas eleições diretas para a Presidência da República. (PEREIRA, 2007, p. 148).

No ano de 1983, inicia-se um grande movimento nunca visto no país,

denominado “diretas já”, o movimento lutava pelo direito de eleições diretas para a

presidência da República.

Graças à mobilização da sociedade, as politicas sociais tornaram-se centrais, nessa década, na agenda de reformas institucionais que culminou com promulgação da Constituição Federal de 1988. Nesta Constituição, a reformulação formal do sistema de proteção social incorporou valores e critérios que, não obstante antigos no estrangeiro, soaram, no Brasil como inovação semântica, conceitual e politica. Os conceitos de „direitos sociais‟,

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„seguridade social‟, „universalização‟, „equidade‟, „descentralização político-administrativa‟, „controle democrático‟, „mínimos sociais‟, dentre outros, passaram, de fato, a constituir categorias-chaves norteadoras da constituição de um novo padrão de politica social e ser adotado no país. (MESTRINER, 2008, p. 152).

O período de 1985 a 1990 foi o responsável por contornar os problemas

econômicos do país e garantir o retorno das liberdades democráticas. A partir de

então, iniciou-se um novo período na história política do Brasil conhecido como

“Nova República”, repercutindo nas políticas sociais, e no reconhecimento da

Assistência Social como “[...] direito do cidadão e dever do Estado [...]” (Art. 1º).

Assim, no final dos anos de 1980, temos como contexto um momento de

exigência de práticas inovadoras do setor assistencial para as novas demandas da

realidade do país que estava em transição democrática. Um crescente número da

população pedia respostas mais efetivas de uma política assistencial. As discussões

se intensificaram alterando o caminho para se formular uma política pública de

assistência social para direitos sociais e, mais especificamente, do direito à

Seguridade Social, e nela, a garantia à saúde, à assistência social e previdência

social na Constituição Federal.

As políticas sociais são também um espaço de lutas cujos resultados variam em função das diferentes conjunturas históricas. Ou seja, existem momentos de potencialização de conflitos, onde a fragmentação de lutas se aglutina em torno de oposições e adquire caráter coletivo. Por decorrência deste movimento, as políticas sociais particularizam-se em diferentes momentos históricos conforme o grau de prevalência dos interesses da força de trabalho em suas proposições. (SPOSATI, 2010, p. 71).

Dessa forma, apontando as possibilidades de construção de uma esfera

pública e democrática, ou seja, uma nova forma de compreender a Assistência

Social.

4.2 Instrumentos normativos: o que aconteceu com a Assistência Social

brasileira após 1988?

A Assistência Social como política de proteção social configura-se como uma nova situação para o Brasil. Ela significa garantir a todos, que dela necessitam, e sem contribuição prévia a provisão dessa proteção. Esta perspectiva significaria aportar quem, quantos, quais e onde estão os brasileiros demandatários de serviços e atenções de assistência social. (BRASIL, MDS/PNAS 2004).

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A Constituição Federal de 1988 surge como o primeiro instrumento legal a

determinar transformações estruturais e políticas, e o marco legal para a

compreensão das transformações e redefinições do perfil histórico da assistência

social no país porque a reconhece como política social, junto com as políticas de

saúde e de previdência social, compõe o tripé do sistema de seguridade social

brasileiro, ingressando no campo dos direitos (art. 6º C.F/88), da universalização,

dos acessos e da responsabilidade estatal previsto no art. 194.

A Seguridade Social compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos poderes públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à Assistência Social.

Parágrafo único – Compete ao Poder Público, nos termos da lei, organizar a seguridade social, com base nos seguintes objetivos:

I – universalização da cobertura e do atendimento;

II – uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços às populações urbanas e rurais;

III – seletividade e distributividade na prestação de benefícios e serviços;

IV – irredutibilidade do valor dos benefícios;

V – equidade na forma da base de financiamento;

VII – caráter democrático e descentralizado da administração, mediante gestão quadripartite, com participação dos trabalhadores, dos empregadores, dos aposentados e do Governo nos órgão colegiados. (BRASIL, 1988, p. 55).

A CF/88 assumiu duas vias para o acesso da população às políticas de

Seguridade Social: a contributiva que se refere à Previdência Social aos

trabalhadores(as) e a não contributiva de caráter universal no caso da Saúde.

Temos no capitulo da Seguridade Social, na seção especifica para a

Assistência Social previsto no Art. 203 da CF que prevê os destinatários desta e seu

segmento de ordem social:

A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de contribuição à seguridade social, e tem por objetivos:

I – a proteção à família, à maternidade, à infância, à adolescência e à velhice;

II – o amparo às crianças e adolescentes carentes;

III – a promoção da integração ao mercado de trabalho;

IV – a habilitação e reabilitação das pessoas portadoras de deficiência e a promoção de sua integração à vida comunitária;

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V – a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei. (BRASIL, 1988, p. 57).

No artigo seguinte a CF estabelecem as fontes de custeio das ações de

forma descentralizada politico-administrativo responsabilizando as três esferas do

governo, como também as diretrizes da politica nas quais se devem adotar a

participação da população nas suas ações. A seguir art. 204 da CF:

As ações governamentais na área da assistência social serão realizadas com recursos do orçamento da seguridade social, previstos no art. 195, além de outras fontes, e organizadas com base nas seguintes diretrizes:

I – descentralização político-administrativa, cabendo a coordenação e as normas gerais à esfera federal e a coordenação e a execução dos respectivos programas às esferas estadual e municipal, bem como a entidades beneficentes e de assistência social;

II – participação da população, por meio de organizações representativas, na formulação das políticas e no controle das ações em todos os níveis.

Parágrafo único. É facultado aos Estados e ao Distrito Federal vincular a programa de apoio à inclusão e promoção social até cinco décimos por cento de sua receita tributária líquida, vedada a aplicação desses recursos no pagamento de:

I – despesas com pessoal e encargos sociais;

II – serviço da dívida;

III – qualquer outra despesa corrente não vinculada diretamente aos investimentos ou ações apoiados. (BRASIL, 1988).

As disposições expressas na Constituição Federal de 1988 possibilitam um

cenário de mudanças no contexto brasileiro ao instituir um Sistema de Proteção

Social na órbita dos direitos sociais e de cidadania. Porém, permanecem diversas

formas de obstáculos para a sua concretização.

Cinco anos após a CF, a Lei Orgânica de Assistência Social – LOAS

inaugura uma nova formatação para a assistência social no cenário nacional,

enquanto Política Pública. Regulamentou o disposto nos artigos 203 e 204 da CF de

1988, dispondo da organização da Assistência Social. Propõe romper com uma

longa tradição cultural e política de filantropia e benemerência.

A LOAS apresenta 42 artigos em seis capítulos, nos quais define a política e

seus objetivos, estabelece seus princípios e diretrizes: universalização e igualdade

de acesso, descentralização e participação. Trata da organização e gestão da

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assistência social e apresenta elementos do sistema descentralizado e participativo

da assistência social: conselhos, planos, fundos de assistência social nos três entes

federados.

A LOAS deixa claro que,

A assistência social, direito do cidadão e dever do Estado, é Política de Seguridade Social não contributiva, que provê os mínimos sociais, realizada através de um conjunto integrado de ações de iniciativa pública e da sociedade, para garantir o atendimento às necessidades básicas. (LOAS, 1993, Art. 1º)

A LOAS foca seu atendimento aos cidadãos em situação de vulnerabilidade

e pobreza, considerando os níveis de desigualdade que existem no Brasil.

Entendendo que problemas provenientes da histórica exclusão social jamais

poderão ser enfrentados por meio de um assistencialismo meramente complementar

e emergencial, a LOAS objetivou o fortalecimento da concepção de Assistência

Social e reconhecimento desta como função do governamental e política.

A assistência social tem por objetivos: I - a proteção à família, à maternidade, à infância, à adolescência e à velhice; II - o amparo às crianças e adolescentes carentes; III - a promoção da integração ao mercado de trabalho; IV - a habilitação e reabilitação das pessoas portadoras de deficiência e a promoção de sua integração à vida comunitária; V - a garantia de 1 (um) salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família. (BRASIL, 1993, Art. 2º)

Em 2003 foi criado o Ministério de Assistência Social no governo do

Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, e em dezembro do mesmo ano foi realizada a

IV Conferencia Nacional de Assistência Social com a discussão para a construção e

implantação do Sistema Único de Assistência Social – SUAS no Brasil.

O SUAS tem suas bases de implantação consolidadas em 2005, por meio da

sua Norma Operacional Básica do SUAS – NOB/Suas16, que apresenta as

competências de cada órgão federado e os eixos de implementação e consolidação

da iniciativa.

16

A NOB/SUAS, aprovada em 2005, pelo CNAS, apresenta os eixos estruturantes para a

realização do pacto a ser efetivado entre os três entes federados e as instancias de articulação,

pactuação e deliberação, visando à implementação e consolidação do Sistema Único de Assistência

Social – SUAS no Brasil. (BRASIL, 2005, p. 75).

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No ano seguinte foi criado o Ministério de Desenvolvimento Social e

Combate a Fome – MDS que acelerou o processo de implantação do SUAS, que

germina como resposta à sociedade brasileira articulada a rede de Proteção Social.

Surge como um novo modelo de gestão que busca estruturar a operacionalização da

politica através da execução de serviços, programas, projetos e benefícios sócios

assistenciais, visando garanti-la como direito e responsabilidade do Estado.

O SUAS é coordenado pelo Ministério de Desenvolvimento Social e combate

a fome – MDS, tem sua gestão composta pelo poder público e pela sociedade civil,

que participa diretamente do processo de gestão compartilhado do SUAS.

A Política Nacional de Assistência Social aprovada pela Resolução n°15, de

15 de outubro de 2004, do CNAS, expressa a materialidade das diretrizes da Lei nº

8.742, de 7 de dezembro de 1993, a Lei Orgânica da Assistência Social.

Política Nacional de Assistência Social – PNAS busca incorporar as demandas presentes na sociedade brasileira no que tange à responsabilidade política, objetivando tornar claras suas diretrizes na efetivação da assistência social como direito de cidadania e responsabilidade do Estado. (BRASIL, 2004, p. 13).

A PNAS é resultado de um processo histórico e coletivo, o qual defendeu a

assistência social como uma politica de inclusão social. Suas diretrizes foram

baseadas na Constituição Federal de 1988 e na LOAS e tem como objetivos:

I - Prover serviços, programas, projetos e benefícios de proteção social básica e, ou, especial para famílias, indivíduos e grupos que deles necessitar; II - Contribuir com a inclusão e a eqüidade dos(as) usuários(as) e grupos específicos, ampliando o acesso aos bens e serviços socioassistenciais básicos e especiais, em áreas urbana e rural; III - Assegurar que as ações no âmbito da assistência social tenham centralidade na família, e que garantam a convivência familiar e comunitária; (BRASIL, 2005, p. 33).

Na PNAS está definido que o SUAS é o novo modelo de gestão da

assistência social e que tem, dentre suas diretrizes:

I - Descentralização político-administrativa para os Estados, o Distrito Federal e os Municípios e comando único das ações em cada esfera de governo, respeitando-se as diferenças e características socioterritoriais locais; II - Participação da população, por meio de organizações representativas, na formulação das políticas e no controle das ações em todos os níveis;

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III - Primazia da responsabilidade do Estado na condução da política de assistência social em cada esfera de governo; IV - Centralidade na família para concepção e implementação dos benefícios, serviços, programas e projetos.(BRASIL, 2005, p. 32 - 33)

Os(as) usuários(as) da PNAS são os:

Cidadãos e grupos que se encontram em situações de vulnerabilidade e riscos, tais como: famílias e indivíduos com perda ou fragilidade de vínculos de afetividade, pertencimento e sociabilidade; ciclos de vida; identidades estigmatizadas em termos étnico, cultural e sexual; desvantagem pessoal resultante de deficiências; exclusão pela pobreza e, ou, no acesso às demais políticas públicas; uso de substâncias psicoativas; diferentes formas de violência advinda do núcleo familiar, grupos e indivíduos; inserção precária ou não inserção no mercado de trabalho formal e informal; estratégias e alternativas diferenciadas de sobrevivência que podem representar risco pessoal e social. (BRASIL,2005).

A PNAS estrutura a Assistência Social em níveis de Proteção Social e

complexidade, com perspectiva socioterritorial considerando diversidades locais e

regionais e tem como base a referência à família como espaço privilegiado de

proteção de socialização primária.

A organização dos níveis de Proteção Social está dividida em Básica e

Especial e dissolve a noção de que os(as) usuários(as) da PNAS sejam cidadãos e

grupos que se encontram em situação de vulnerabilidade e risco. Contudo, ao atuar

com situações de desigualdade social ou mesmo vulnerabilidade e risco social será

requisitada uma atenção especifica.

A proteção social básica tem como objetivos prevenir situações de risco por

meio do desenvolvimento de potencialidades e aquisições, e o fortalecimento de

vínculos familiares e comunitários. Destina-se à população que vive em situação de

vulnerabilidade social decorrente da pobreza, privação e, ou, fragilização de vínculos

afetivos – relacionais e de pertencimento social.

Prevê o desenvolvimento de serviços, programas e projetos locais de acolhimento, convivência e socialização de famílias e de indivíduos, conforme identificação da situação de vulnerabilidade apresentada. Deverão incluir as pessoas com deficiência e ser organizados em rede, de modo a inseri-las nas diversas ações ofertadas. Os benefícios, tanto de prestação continuada como os eventuais, compõem a proteção social básica, dada a natureza de sua realização. (BRASIL, 2005, p. 34).

As ações são prestadas de forma direta prioritariamente pelo Centro de

Referência da Assistência Social – CRAS que é uma unidade pública estatal de

base territorial, localizado em áreas de vulnerabilidade social, é a principal porta de

entrada para o SUAS.

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O CRAS atua com famílias e indivíduos em seu contexto comunitário, visando a orientação e o convívio sociofamiliar e comunitário. Neste sentido é responsável pela oferta do Programa de Atenção Integral às Famílias. Na proteção básica, o trabalho com famílias deve considerar novas referências para a compreensão dos diferentes arranjos familiares, superando o reconhecimento de um modelo único baseado na família nuclear, e partindo do suposto de que são funções básicas das famílias: prover a proteção e a socialização dos seus membros; constituir-se como referências morais, de vínculos afetivos e sociais; de identidade grupal, além de ser mediadora das relações dos seus membros com outras instituições sociais e com o Estado. (BRASIL, 2005, p.35).

São considerados serviços de proteção básica de assistência social aqueles

que potencializam a família como unidade de referência, fortalecendo seus vínculos

internos e externos, visam à convivência, a socialização e o acolhimento, em

famílias cujos vínculos familiar e comunitário não foram rompidos, bem como a

promoção da integração ao mercado de trabalho, tais como:

• Programa de Atenção Integral às Famílias. • Programa de inclusão produtiva e projetos de enfrentamento da pobreza. • Centros de Convivência para Idosos. • Serviços para crianças de 0 a 6 anos, que visem o fortalecimento dos vínculos familiares, o direito de brincar, ações de socialização e de sensibilização para a defesa dos direitos das crianças. • Serviços socioeducativos para crianças, adolescentes e jovens na faixa etária de 6 a 24 anos, visando sua proteção, socialização e o fortalecimento dos vínculos familiares e comunitários. • Programas de incentivo ao protagonismo juvenil, e de fortalecimento dos vínculos familiares e comunitários. • Centros de informação e de educação para o trabalho, voltados para jovens e adultos (BRASIL, 2005, p. 36).

O CRAS possui duas funções exclusivas: a gestão territorial da rede

socioassistencial de Proteção Social Básica e a oferta do Serviço de Proteção e

Atendimento Integral a Família – PAIF, que é o principal serviço ofertado por este

equipamento, visa fortalecer os vínculos familiares e comunitários bem como

prevenir situações de risco social.

Outra regulamentação muito importante no que se refere à

operacionalização da política de assistência social é a resolução nº 109, de 11 de

novembro de 2009, que aprova a Tipificação Nacional de Serviços

Socioassistenciais representando uma importante conquista para a assistência

social brasileira, alcançando um novo patamar e estabelecendo tipologias que, sem

dúvidas, corroboram para ressignificar a oferta e a garantia do direito

socioassistencial.

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Esta normativa possibilitou a padronização em todo território nacional dos

serviços de proteção social básica e especial, constituindo o público a ser atendido,

a finalidade de cada um deles e os resultados esperados para a garantia dos direitos

socioassistenciais.

Consoante a Tipificação, o Serviço de Proteção e Atendimento Integral a

Família – PAIF é um trabalho de caráter continuado que visa a fortalecer a função de

proteção das famílias, prevenindo a ruptura de laços, promovendo o acesso e

usufruto de direitos e contribuindo para a melhoria da qualidade de vida. Tem como

público famílias em situação de vulnerabilidade social.

Nesta pesquisa daremos maior ênfase a Proteção Social Básica pelo fato

de ser o nosso foco de investigação. De acordo com a Tipificação Nacional esta é

composta pelos seguintes serviços: Serviço de Proteção e Atendimento Integral a

família – PAIF; Serviços de Convivência e Fortalecimento de vínculos; Serviços de

Proteção Social Básica no Domicilio para pessoas com Deficiência e Idosas17.

O Serviço de Proteção e Atendimento Integral à Família - PAIF consiste no

trabalho social de caráter continuado com famílias, buscando promover seu acesso

e usufruto de direitos e contribuir na melhoria de sua qualidade de vida. Prevê o

desenvolvimento de potencialidades e aquisições das famílias e o fortalecimento de

vínculos familiares e comunitários, por meio de ações de caráter preventivo,

protetivo e proativo. Seus objetivos são:

- Fortalecer a função protetiva da família, contribuindo na melhoria da sua qualidade de vida; - Prevenir a ruptura dos vínculos familiares e comunitários, possibilitando a superação de situações de fragilidade social vivenciadas; - Promover aquisições sociais e materiais às famílias, potencializando o protagonismo e a autonomia das famílias e comunidades; - Promover acessos a benefícios, programas de transferência de renda e serviços socioassistenciais, contribuindo para a inserção das famílias na rede de proteção social de assistência social; - Promover acesso aos demais serviços setoriais, contribuindo para o usufruto de direitos; - Apoiar famílias que possuem, dentre seus membros, indivíduos que necessitam de cuidados, por meio da promoção de espaços coletivos de escuta e troca de vivências familiares. (BRASIL, 2013, p. 11).

17

Todos os serviços da proteção social básica, desenvolvidos no território de abrangência do

CRAS, em especial os Serviços de Convivência e Fortalecimento de Vínculos, bem como o Serviço

de Proteção Social Básica no Domicílio para Pessoas com Deficiência e Idosas, devem ser a ele

referenciados e manter articulação com o PAIF. (BRASIL, 2013, p. 10).

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O PAIF prioriza o acompanhamento de famílias que vivem em decorrência

de vulnerabilidade social, visa atender demandas relacionadas a uma série de

questões tais como habitação, saúde, educação, falta de renda e etc.

Como forma metodológica esse atendimento é feito inicialmente através do

atendimento técnico qualificado, que se propõe de forma continuada a solucionar as

situações familiares e ou individuais mesmo que estas estejam relacionadas a outras

politicas sociais.

É importante citar que o atendimento exige compromisso do técnico e

compreensão quanto às complexidades de situações que as famílias em condição

de pobreza estão submersas.

Os profissionais devem estar preparados para enfrentar algumas questões como: a dificuldade em acessar determinados territórios, a ausência de rede de proteção social, a falta de apoios sociais, a não-aceitação da família em ser atendida e/ou acompanhada, entre outras. (ORIENTAÇÕES TECNICAS SOBRE O PAIF, 2012, p. 49).

A Tipificação Nacional também estabelece e estrutura outro serviço de Cras

além do PAIF, o Serviço de Convivência e Fortalecimento de Vínculos para os

públicos de criança de 0 a 15, o para adolescentes e jovens de 15 a 17 anos, e

serviço para idosos de idade igual ou superior a 60 anos. Busca o fortalecimento da

convivência familiar e comunitária, desenvolvimento de potencialidades e discussões

coletivas sobre pautas sociopolíticas e direitos sociais. É desenvolvido por meio de

atividades que estimulem a convivência social através de formação de grupos com

atividades coletivas.

A Proteção Social Especial – PSE é designado a famílias e indivíduos em

situação de risco pessoal ou social, cujos direitos tenham sido transgredidos ou

ameaçados, ou seja, são famílias que estão em situações de violações de direitos

por ocorrência de violência física ou psicológica, abuso ou exploração sexual;

abandono, rompimento ou fragilização de vínculos ou afastamento do convívio

familiar.

A PSE tem seus serviços ofertados pelo Centro de Referências de

Especializado de Assistência Social - CREAS, que ampara as pessoas e as

incentivam a superarem suas dificuldades por se tratarem de situações de violação

de direitos do cidadão e da própria legislação. As ações da PSE estão subdivididas

em média e alta complexidade.

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A média complexidade oferece serviços de atendimentos às famílias e

indivíduos com seus direitos violados, mas cujos vínculos familiares e comunitários

não foram rompidos, oferece serviços tais como:

• Serviço de orientação e apoio sociofamiliar. • Plantão Social. • Abordagem de Rua. • Cuidado no Domicílio. • Serviço de Habilitação e Reabilitação na comunidade das pessoas com

deficiência. • Medidas socioeducativas em meio-aberto (Prestação de Serviços à

Comunidade – PSC e Liberdade Assistida – LA). (BRASIL, 2005, p. 38).

A Proteção Social Especial de média complexidade abrange também o

Centro de Referência Especializado da Assistência Social- CREAS, tendo em vista a

orientação e a convivência sociofamiliar e comunitário. Sua diferença em relação à

Proteção Social Básica está em se tratar de um atendimento dirigido às situações de

violação de direitos.

Os serviços de alta complexidade são aqueles que garantem proteção

integral, como: moradia, alimentação, higienização e trabalho, protegido para

famílias e indivíduos que se encontram sem referência e, ou, em situações de

ameaças, necessitando serem retiradas de seu núcleo familiar e, ou, comunitário.

Oferece serviços tais como:

• Atendimento Integral Institucional. • Casa Lar. • República. • Casa de Passagem. • Albergue. • Família Substituta. • Família Acolhedora. • Medidas socioeducativas restritivas e privativas de liberdade (semiliberdade, internação provisória e sentenciada). • Trabalho protegido. (BRASIL, 2005 p. 38).

Aprovada em 2005, a Norma Operacional Básica – NOB/SUAS disciplina a

gestão pública da política de assistência social no território brasileiro, exercida de

modo sistêmico pelos entes federativo, em consonância com a Constituição da

República de 1988, a Lei Orgânica da Assistência Social - LOAS e as legislações

complementares a ela aplicáveis. Seu conteúdo institui:

a) Caráter do SUAS; b) Funções da política pública de assistência social para extensão da proteção social brasileira; c) Níveis de gestão do SUAS; d) Instâncias de articulação, pactuação e deliberação que compõem o processo democrático de gestão do SUAS; e) Financiamento;

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f) Regras de transição (BRASIL, 2005, p. 15).

Como nosso lócus de investigação se dá em uma unidade de CRAS, darei

ênfase a este, principalmente no que se refere às ações, estratégias e ao PAIF, pois

este compreende o acompanhamento familiar e todas as famílias, dentre elas, as

mulheres chefes de família, sendo este, o vínculo das interlocutoras desta pesquisa

com o Cras Jereissati. Abaixo, trataremos de como o Sistema Único de Assistência

Social direciona o trabalho social para famílias em situação de vulnerabilidade e

pobreza.

4.3 O Sistema Único da Assistência Social-SUAS e a centralidade da família na

Assistência Social brasileira

Ao ser analisada a história da assistência social no Brasil, percebe-se que

suas ações nem sempre foram voltadas para a família, e sim voltadas para atender

as necessidades individuais, por meio de medidas pontuais e emergenciais.

Assistência Social assegura em seus objetivos a proteção à família a partir

da Constituição Federal 1988, e da promulgação da LOAS em 1993 que além de

dispor sobre a organização da Assistência Social reafirma em seus objetivos a

família como principal alvo de proteção.

Com a aprovação da PNAS em 2004, esta reitera a relevância da família na

Política de Assistência Social contemporânea, ao colocar como uma de suas

diretrizes a centralidade na família para a concepção e implementação dos

benefícios, serviços, programas e projetos, até chegar a implementação do Sistema

Único de Assistência Social - SUAS.

O reconhecimento da importância da família no contexto da vida social está explicito no artigo 226, da Constituição Federal do Brasil, quando declara que a: "família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado", endossando, assim, o artigo 16, da Declaração dos Direitos Humanos, que traduz a família como sendo o núcleo natural e fundamental da sociedade, e com direito à proteção da sociedade e do Estado (BRASIL, 2005, p. 41).

O SUAS por meio do eixo matricidade sóciofamiliar, na qual tem a família

como centralidade, busca romper com a lógica individualista na prestação de

serviços públicos. Conforme disposto na PNAS:

Por reconhecer as fortes pressões que os processos de exclusão sociocultural geram sobre as famílias brasileiras, acentuando suas fragilidades e contradições, faz-se primordialmente sua centralidade no

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âmbito das ações da politica de assistência social, como espaço privilegiado e insubstituível de proteção e socialização primárias, provedora de cuidados aos seus, membros, mas que precisa também ser cuidada e protegida (2005, p. 40-41).

O princípio da matricidade sociofamiliar no âmbito da Política de Assistência

Social amplia o entendimento de família, ao ser percebida como um grupo social de

pessoas com vínculos consanguíneos e/ou de afinidades. É também entendida

como lócus básico de acolhida, socialização, aprendizagens e protagonismo social

(NOB/SUAS, 2005).

Nesta perspectiva, a Politica de Assistência Social busca ultrapassar o

conceito tradicional e idealizado de família, ao compreender o universo familiar a

partir de sua variedade de modelos, configuração, arranjos, estruturas e dinâmica.

A família no âmbito da Politica Assistência Social é percebida como uma

instituição que necessita de condições de sustentabilidade e proteção social para

assim cumprir o seu papel de unidade de proteção primária. O fortalecimento de

possibilidades de convívio, educação e proteção social, na própria família, não

restringe as responsabilidades públicas de proteção social para com os indivíduos e

a sociedade (BRASIL, 2005, p. 90).

Ao defender a centralidade da família como principio e superação da

focalização e fragmentação, parte da premissa de que para a família prevenir,

proteger, promover e incluir seus membros, é necessário dar condições de

sustentabilidade para tal (PNAS, 2005).

[...] as famílias são o palco no qual a política de assistência social finca seus alicerces e busca, junto com esses sujeitos, engendrar possibilidades de inserção social, para garantir sua sobrevivência, o acolhimento de suas necessidades e interesses e o convívio familiar e comunitário – enfim, a proteção social (GUEIROS e SANTOS, 2011, p. 85).

Com base no principio da matricidade sócio familiar foi criado o primeiro e

principal Serviço da Politica de Assistência Social denominado Serviço de Proteção

e Atendimento Integral a Família (PAIF), fruto do amadurecimento e consolidação do

SUAS e constitui-se como o serviço essencial à proteção social básica do SUAS e

desenvolvido pelo Cras.

Dentro da esfera da proteção social, a família garantiu a centralidade nas

politicas sociais, em que a

A identificação das mulheres com a família, dada a naturalização dos papéis de gênero, permitiu que Estado, mercado e sociedade construíssem alianças que, muitas vezes, reforçam o lugar das mulheres como

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responsáveis diretas pelo bem estar familiar (PEIXOTO, 2010, p. 143).

A Assistência Social reforça a ideia que a família é o núcleo básico de

acolhida, autonomia, convívio e protagonismo social, porém não oferece as

condições sequer de prover as suas necessidades básicas.

4.4 Programas de Transferência de Renda e o Programa Bolsa Família:

possibilidades e contradições.

O debate sobre os Programas de Transferência de Renda – PTR, no Brasil

se estabeleceu no contexto de hegemonia do neoliberalismo18, com o

reordenamento do frágil Sistema de Proteção Social, quando a Constituição Federal

de 1988 parecia estabelecer a universalização dos direitos sociais.

É diante de uma situação de crescimento do desemprego, da insegurança

nas grandes cidades, do reconhecimento da baixa qualificação da nossa mão de

obra para atender as demandas do modelo de produção, a ampliação dos trabalhos

precarizados.

Coloca-se em questão a necessidade de reforma dos programas sociais e,

dentro desta lógica, os programas de transferência de renda ganham visibilidade

como forma de enfrentar o desemprego e a pobreza.

Os programas de transferência de renda passam a ter mais visibilidade em

meados da década de 1990, quando o governo passa a utiliza-los como politica

social que visa suprir as necessidades básicas das famílias.

Dessa forma no ano de 1991, o PTR passou a fazer parte da agenda pública

brasileira, com o projeto de Lei 80/1991 de autoria do Senador Eduardo Suplicy, que

instituía um Programa de Garantia de Renda Mínima brasileiro de abrangência

nacional.

Várias experiências foram pioneiras para o desenvolvimento e ampliação

dos programas de transferência de renda. Cunha aponta algumas destas

experiências:

18

Neoliberalismo é um sistema econômico que prega uma intervenção mínima do estado na

economia, deixando o mercado se auto-regular com total liberdade. Disponível em:

http://pt.scribd.com/doc/11337/Neoliberalismo acesso em 18 jun 2014.

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1995: experiência pioneiras de Campinas e do Distrito Federal, com transferência de recursos a famílias que garantissem a frequência escolar de suas crianças; 1996: Programa Bolsa Escola de Belo Horizonte; 1998: Programa Nacional de Garantia de Renda Mínima (MEC); 2001: Bolsa Escola e Bolsa Alimentação (âmbito nacional); 2002: Auxilio Gás (âmbito nacional; e 2003: Cartão Alimentação (âmbito nacional). (CUNHA, 2009, p. 335).

Porem mesmo contando com a aprovação do senado no de 1991, apenas

em 2004 o Projeto de Lei 80/1991 foi convertido na lei 10.835, de 8 de janeiro de

2004, de caráter universal.

Art. 1º É instituída, a partir de 2005, a renda básica de cidadania, que se constituirá no direito de todos os brasileiros residentes no País e estrangeiros residentes há pelo menos 5 (cinco) anos no Brasil, não importando sua condição socioeconômica, receberem, anualmente, um benefício monetário

19.

No entanto a lei continuava paralisada, pois a mesma era para ter entrado

em vigor no ano de 2005, mas continuou sendo uma lei sem efeito.

Em 1992 surge a Campanha de Ação Contra a Fome, a Miséria e pela Vida,

com o objetivo de enfretamento da questão social e para suprir a exigência de

formulação de políticas de assistência social, orientadas pela LOAS.

No mandato de Fernando Henrique Cardoso em 1995, seu governo buscou

prioritariamente a estabilização da economia e a inserção na economia globalizada.

Com essa intenção adotou uma politica neoliberal que apontou os novos rumos para

o trato da questão social.

Esse governo foi marcado pela proliferação de programas de transferência

de renda, de iniciativa do governo federal com a implementação descentralizada nos

municípios.

Em 2001 foram implementados os primeiros programas federais de

transferência de renda. A criação do Programa Bolsa Família (PBF) tem origem na

unificação de outros programas não contributivos, a saber: Bolsa Escola, Auxílio-

Gás e Bolsa Alimentação, todos criados no período 2001-2003.

A partir de 2003, iniciou-se o governo do presidente Luiz Inácio Lula da

Silva, marcado por inovações institucionais, mudanças objetivando o fortalecimento

da área assistencial, com a criação do Ministério da Assistência Social e do

Gabinete de Segurança Alimentar da Presidência da República.

19

Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2004/lei/l10.835.htm

acesso em 23 jun 2014.

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Antes mesmo de tomar posse da presidência Lula já tinha definido o

combate à fome como carro chefe de sua política social, lançando na mídia o

Programa Fome Zero.

O primeiro procedimento adotado pelo presidente Lula, foi a criação do

Programa Bolsa Família (PBF) instituído por medida provisória No 132/2003 e

posteriormente convertido em Lei 10.836 de 09 de Janeiro de 2014. O segundo

procedimento adotado foi a criação do Ministério do Desenvolvimento Social e

Combate a Fome - MDS, que tem a missão de coordenar, supervisionar, controlar e

avaliar a execução um conjunto amplo e estratégico de politicas e programas.

O Programa Bolsa Família:

Tem por finalidade beneficiar famílias em situação de pobreza (com renda mensal por pessoa de R$ 70,00 a R$ 140,00) e extrema pobreza (com renda mensal por pessoa de até R$70,00). Este programa integra o Fome zero, que por sua vez é uma estratégia impulsionada pelo governo federal para assegurar o direito humano à alimentação adequada às pessoas com dificuldade de acesso aos alimentos. Essa estratégia está inserida na promoção da segurança alimentar e nutricional, buscando a inclusão social e a conquista da cidadania da população mais vulnerável (CAVALCANTE, 2010, p. 04).

Ao se constituir o Programa Bolsa Família, não apenas se racionalizou o

provimento de um mecanismo de transferência de renda na sociedade brasileira,

como também se consolidou uma forma de benefício não vinculado aos riscos

inerentes às flutuações do mercado de trabalho, uma forma de enfrentar o problema

da pobreza para parcela da população trabalhadora ou não.

O Bolsa Família é um programa de transferência direta de renda que

beneficia famílias em situação de pobreza e de extrema pobreza em todo o país.

Tem como foco de atuação os milhões de brasileiros com renda familiar per capita

de até R$ 70 mensais por integrante da família e está baseado na garantia de renda,

inclusão produtiva e no acesso aos serviços públicos.

A seleção das famílias é feita através da inserção destas no Cadastro Único

para Programas Sociais do Governo Federal - CADÚNICO, este se configura como

um instrumento de coleta de dados objetivando identificar as condições

socioeconômicas das famílias.

O PBF divide-se em três eixos de atuação: 1) a transferência de renda

propriamente dita; 2) as condicionalidades e programas complementares que se

configuram como uma contrapartida que a família toma como responsabilidade para

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o recebimento do valor monetário e 3) os programas complementares que visam

incentivar a geração de renda, por meio de oficinas de inclusão produtiva dentre

outras ações.

Atualmente, o PBF integra o Plano Brasil Sem Miséria, que está baseado na

garantia de renda, inclusão produtiva e no acesso aos serviços públicos. O

programa articula com a Política Nacional de Assistência Social - Proteção Social

Básica, de gestão descentralizada, se configurando como um direito social do

cidadão que dele necessitar, garantido através da Lei Orgânica da Assistência

Social - LOAS.

O Programa Bolsa Família tem possibilitado vários debates tanto no meio

acadêmico, como na sociedade brasileira. Há quem o defenda levando em

consideração as mudanças ocorridas na vida das pessoas que não tem condições

por inúmeros motivos de prover a sobrevivência da sua família.

No entanto há autores que ressaltam que a política de transferência de

renda do Brasil é falha, especialmente no que diz respeito à ideia de uma

redistribuição de renda. De acordo com Demo:

A grande diferença está em que, no ataque à pobreza absoluta, bastam política distributivas (transferência de renda), enquanto no ataque à pobreza relativa, são imprescindíveis políticas redistributivas (que desconcentrem renda) ( 2006, p. 85).

A continuidade do acesso à transferência de renda dependerá do

cumprimento, de condicionalidades relativas ao exame pré-natal, ao

acompanhamento nutricional, ao acompanhamento de saúde, a frequência escolar

de 85% (oitenta e cinco por cento) para crianças e 75% para adolescentes.

A distância existente entre as politicas sociais e a concepção de direitos

conquistados e garantidos por lei e a sua vinculação com a prática da ajuda,

possibilita seu uso eleitoral ou clientelista por governos, principalmente nas

prefeituras, além de governos estaduais e federais, mediante a concessão de

benefícios, assegurando o caráter assistencialista.

É um programa importante, contudo não tem proporcionado a essas famílias

a superação da pobreza. Esse benefício permite garantir as famílias o atendimento

das necessidades mínimas, mas não as necessidades básicas, ou seja, tudo aquilo

que o ser humano necessita para viver dignamente. No qual o mesmo teria acesso à

educação de qualidade, a saúde, a uma profissionalização para ter acesso ao

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mercado de trabalho, entretanto não consegue na atual forma como esta sendo

operacionalizado o programa.

O que se pode ver é que o desenvolvimento da Politica Social brasileira tem

um conjunto amplo e variado, porém, descontinuo e insuficiente, de programas

sociais direcionados para a população mais empobrecida.

4.5 A política de Assistência Social em Maracanaú-CE e o acompanhamento

familiar das mulheres chefes de família

O município de Maracanaú vem estruturando sua rede de assistência social

desde 2005, pautado no modelo determinado pelo Sistema Único de Assistência

Social – SUAS, aos municípios brasileiros. Antes de 2005 era denominada a

Secretária de Saúde e Ação Social passando a denominar-se Secretaria de

Assistência Social e Cidadania, a partir da Lei nº 986, de 7 de janeiro de 2005, com

a finalidade de atuar como um comando único na esfera municipal.

[...] em 2005, através da lei nº 986, de 7 de janeiro do mesmo ano, a Coordenadoria de Ação Social desagrega-se da Secretária de Saúde passando a denominar-se Secretária de Assistência Social e Cidadania – SASC, proporcionando mais autonomia ao órgão, tornando um marco na politica municipal de assistência social, apesar de contar com apenas 10 servidores efetivos. Nesse sentido, começam a ser criadas as condições para a implantação do Sistema Único de Assistência Social – SUAS preconizado pela Politica Nacional de Assistência Social – PNAS. No ano de 2006, a SASC iniciou a implantação de equipamentos de Proteção Social. (MEDEIROS, 2014, p 46).

A politica municipal foi organizada em dois eixos operacionais de acordo

com o SUAS, a proteção social básica e proteção social especial, organizada em

uma rede local, pública e conveniada de proteção social com o objetivo de garantir à

família: segurança, acolhida, renda, convívio familiar e comunitário.

No ano de 2005, deu-se inicio a implantação de equipamentos de proteção

social básica através dos Centros de Referencia e Assistência Social – CRAS e no

ano seguinte a implantação do Centro de Referencia Especializada da Assistência

Social CREAS.

O Centro de Referência de Assistência Social – CRAS assume o papel de gestor da Politica de Assistência Social no território, como equipamento de Referencia de Assistência Social que responde às situações de vulnerabilidade e contribui com papel de proteção as famílias do território, juntamente com sua articulação com outros serviços sócioassistenciais disponíveis no território, dando ênfase aos serviços de convivência social e

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os de segurança alimentar, no âmbito da proteção social básica. (MEDEIROS, 2012, p. 47).

Ou seja, o CRAS é um equipamento de articulação com os outros serviços

socioassistenciais disponíveis no município. Neste sentido, a criação de uma rede

socioassistencial é uma ferramenta importante para as ações desenvolvidas pelos

CRAS.

Segundo o Relatório de Gestão (2012), no município de Maracanaú e a rede

socioassistencial nos anos de 2005 a 2012 é composta no âmbito da Proteção

Social Básica por equipamentos de convivência social como:

Os CRAS, Centro de Convivência Social, Pólos ABC‟s, Centro de Convivência do Idoso, Equipamentos de Segurança Alimentar, Como Restaurante Popular, Cozinhas Comunitárias e Banco de Alimentos; equipamentos de Proteção Social Especial Média Complexidade: CREAS e Centro POP; e equipamentos de Proteção Social Especial de alta complexidade: Casa de Passagem e Abrigos (VIGILANCIA SOCIAL, SASC – MARACANAÚ apud GESUAS, 2012).

Compreende-se que para a efetivação da assistência social enquanto

politica pública de direito, decorre por demandas que se esquivam da realidade

vivida pela população que busca o atendimento às suas necessidades, resultando,

portanto em uma politica focalizada e reducionista, justamente por não conseguir

contemplar a realização de todas as demandas que lhe são apresentadas no

cotidiano, pois este se mostra dinâmico e complexo no que se refere a cada

realidade.

O acompanhamento das famílias no CRAS é feita através do PAIF, é

destinado às famílias que apresentam situações de vulnerabilidades, que requerem

a proteção da assistência social para garantia de seus direitos, demandando de

atenção diferenciada, de um olhar mais atento dos profissionais do CRAS.

O Serviço de Proteção e Atendimento Integral a Família – PAIF é o

responsável pelo acompanhamento das famílias. Estas são divididas entre os cinco

técnicos, que passam a acompanhá-las através de ações como: o atendimento

técnico, a visita domiciliar, encaminhamentos a rede de serviços, concessões de

auxilio enxoval e cestas básicas entre outros benefícios ou serviços ofertados pelo

equipamento.

O acompanhamento familiar do PAIF consiste em um conjunto de

intervenções, desenvolvidas de forma continuada, a partir do estabelecimento de

compromissos entre famílias e profissionais, com o desenvolvimento de um Plano de

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Acompanhamento Familiar que estabelecem objetivos a serem alcançados,

realização de medidas periódicas, inserção em ações do PAIF a fim de superar

gradativamente as vulnerabilidades sociais vivenciadas, alcançarem aquisições e ter

acesso a direitos.

O CRAS desenvolve as ações do PAIF e dentro dele tem o

acompanhamento familiar de grupo e individual com as 100 famílias acompanhadas.

O cadastro único, os serviços de convivência, os benefícios eventuais e os cursos

do PRONATEC.

O acompanhamento é feito de forma particularizada ou coletiva. O

particularizado, inicialmente as famílias são atendidas, por demanda espontânea, ou

atendimento por encaminhamento contra referenciado pelo CREAS, ou busca ativa.

A partir desse atendimento os técnicos vão conhecer a realidade da família e

prosseguir, sejam com informações, orientações, encaminhamentos, realizando

assim o atendimento especifico de acordo com a demanda apresentada.

De acordo com as vulnerabilidades observadas a família passará a ser

acompanhada. Neste acompanhamento o técnico compactua com a família como vai

ser o acompanhamento e assim é traçado o plano, a família tem que querer ser

acompanhada e fechar junto com o técnico as ações que serão realizadas, pois o

acompanhamento conta com a participação da família, do CRAS e da rede

socioassistencial.

O acompanhamento coletivo é realizado através de grupos. Ocorre com

mais constância o grupo de descumprimento de condicionalidades da educação do

PBF, é uma demanda que vem da listagem de descumprimento que sai a cada dois

meses, e então as famílias são convocadas a participar de uma reunião onde vai ser

explicado o motivo das mesmas estarem ali, o que é o descumprimento de

condicionalidades, porque elas foram chamadas a comparecer ao CRAS.

A abordagem é feita com as mães ou responsável familiar e também com os

descumpridores, as crianças e adolescentes, as temáticas trabalhadas são sobre

bolsa família, estatuto da criança e do adolescente e no final acontece um momento

em que as mães e filhos vão conversar sobre os temas.

Há também outros grupos espontâneos, tais como: grupos de gestantes,

grupos de mulheres, entre outros. Cada grupo acontece de uma demanda especifica

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e tem durabilidade de dois a três meses, cada um tem seu projeto e sua técnica de

referência que terá um norte e saberá do que se trata aquele grupo.

O grupo de gestantes é realizado em parceria com a equipe dos Núcleos de

Apoio à Saúde da Família20 (NASF), é um grupo rotativo, pois as gestantes vão

tendo o bebê e não voltam mais para o grupo.

Os encontros são realizados de quinze e quinze dias revezando uma vez o

Cras outra saúde. As temáticas trabalhadas são relacionadas à saúde do bebê e da

gestante, o que é o Cras, o papel da família, deveres e direitos das gestantes,

direitos trabalhistas, licença maternidade, ou seja, as temáticas vão se adequando

as necessidades das gestantes.

Quanto ao grupo de mulheres, são encontros também quinzenais, onde

participam mulheres beneficiárias do PBF, acompanhadas pelo PAIF, que são

participantes do grupo de maior vulnerabilidade social, neste grupo são discutidos

temas como: violência contra mulher em todas as suas variações, Lei Maria da

Penha, os direitos da mulher, entre outros temas. Esse grupo tem o objetivo de

informar, apresentar novos caminhos para as mulheres que muitas vezes são

violentadas e nem sabem, explicar seus direitos, e assim transformar suas

realidades sociais.

Os instrumentos de acompanhamento familiar são divididos em

instrumentais de acompanhamento particularizado: instrumental que detalha

bastante as informações, no qual será traçado o perfil econômico e social dessas

famílias, e instrumental de acompanhamento coletivo, no qual está dividido em dois,

no primeiro consta o nome do grupo, público alvo, objetivos, as metas e a

metodologia, e no outro consta todas as atividades que vão ser trabalhadas no

grupo, como por exemplo: roda de conversa, tema, quantidade de pessoas, material

utilizado, e no final terá um espaço para a avaliação do grupo.

20 Os Núcleos de Apoio à Saúde da Família (NASF) foram criados pelo Ministério da Saúde em 2008 com o objetivo de apoiar a consolidação da Atenção Básica no Brasil, ampliando sua abrangência e resolubilidade. São equipes multiprofissionais que devem trabalhar de forma integrada às equipes Saúde da Família, apoiando-as e compartilhando saberes. Disponível em: http://www.saude.rs.gov.br/upload/1383057504_NASF_set2013.pdf acesso em 09 jul 2014.

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5. O ESTUDO SOBRE AS VIDAS DAS MULHERES CHEFES DE FAMÍLIAS

BENEFICÁRIAS DO PROGRAMA BOLSA FAMÍLIA ACOMPANHADAS PELO

CRAS JEREISSATI EM MARACANAÚ-CE

5.1 O perfil socioeconômico das mulheres interlocutoras dessa pesquisa

Para a construção deste estudo, realizamos uma pesquisa de campo na

perspectiva de identificarmos dados sobre impactos sociais e econômicos na vida

das mulheres chefes de família beneficiárias do Programa Bolsa Família.

Nesse sentido, mesmo compreendendo a subjetividade de todas as

entrevistadas, buscamos elaborar um breve perfil de cada uma delas, uma vez que

suas vidas apresentam muito mais peculiaridades do que podemos visualizar nas

entrevistas realizadas.

Enfatizamos que no intuito da garantir o anonimato das entrevistadas

substituímos seus nomes verdadeiros, por nomes fictícios representados por nomes

de flores. Assim, entrevistadas serão identificadas como: Lírio, Tulipa, Rosa,

Girassol e Cravo.

A primeira entrevistada, denominamos de Tulipa: quarenta e dois anos,

dona de casa, cursou até o sexto ano do ensino fundamental, reside no bairro

Jereissati há onze anos. Mora com o esposo e dois filhos. Trabalha em casa

cuidando dos filhos, do marido e da sua casa. Sua renda familiar mensal é de R$

600,00, sendo esta a soma do ganho do seu esposo que não tem salário fixo, pois

trabalha de maneira informal e o valor do seu beneficio proveniente do Programa

Bolsa Família.

Minha vida se resume em cuidar da minha família dar o meu melhor a eles (filhos) e ao meu marido que apesar de nem sempre poder me ajudar sei que ele também faz o que pode, quem sabe algum dia tudo mude, pois meus filhos vão crescer e é neles que eu confio pra mim ajuda (TULIPA).

A segunda, Lírio tem vinte e dois anos, solteira, cursou até o segundo ano do

ensino médio. Deixou de estudar no ano de 2012 para começa a trabalhar, porém o

trabalho não deu certo e no momento dedica-se a cuidar da sua casa e dos filhos

que tem idade de sete e quatro anos. Sua renda mensal é proveniente da pensão

dos filhos e do Programa Bolsa Família, resultando no valor de R$ 384,00. Mora na

sua residência com os filhos e seu irmão, mora no bairro há quinze anos.

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Eu gosto de morar assim perto de toda a família, mas as vezes isso tudo é sufocante, agente não pode fazer nada que toda a família vem perguntar alguns pra ajuda e outros só pra mata a curiosidade, eu sou simples gosto de viver aqui, só queria um pouco mais de liberdade (LÌRIO).

A terceira, Rosa possui trinta e um anos, vive com um companheiro há quinze

anos e com seus cinco filhos, tendo a idade de treze anos o mais velho e portador

de deficiência auditiva, e o mais novo com quatro anos. Seu companheiro não

trabalha, seu filho deficiente auditivo recebe o benefício de prestação continuada -

BPC, e ela recebe o recurso do Programa Bolsa Família há três anos, resultando

numa renda de R$ 1.144, 00 mensal. Não trabalha fora de casa, pois acompanha o

filho mais velho a escola todos os dias. No iniciou do ano voltou a estudar depois de

vinte anos longe da sala de aula. Rosa descreve de forma emocionada sua decisão

de depois de tanto tempo voltar a estudar.

Volteia a estudar por estimulo do meu filho que é surdo e estuda em escola para surdos. Acompanhar ele e ver como ele fica feliz com tanta coisa nova, quando agente ta voltando pra casa dentro do ônibus ele ta sempre me explicando tudo oque aprendeu. Depois de um tempo comecei a assistir as aulas junto com ele, la dentro da sala fica um interprete traduzindo tudo pra ele na língua de libras. E então decidi voltar a estudar e um dia quero ser uma interprete e voltar a ver nos olhos de outras crianças o que hoje vejo nos olhos do meu filho. (ROSA).

A quarta, Girassol possui trinta e nove anos, solteira, mora no bairro há

dezoito anos, em sua casa vive com seus dois filhos sendo eles uma adolescente de

dezessete anos, uma criança de doze, e uma sobrinha de seis anos. Sua renda é

proveniente da pensão dos filhos e do programa de transferência de renda

resultando num valor de R$ 312,00. Vivem próximo aos seus pais. Sua mãe é uma

idosa de setenta e três anos que tem Alzheimer e é Girassol que cuida diariamente,

tanto na parte da alimentação como nos medicamentos e nos momentos de levar ao

médico. É a principal responsável por seus pais sendo que além dela seus pais têm

mais sete filhos. Mesmo com uma vida dedicada ao próximo, ela afirma que o faz de

bom grado e dá o seu melhor:

Me sinto muito importante em cuidar dos meus pais que são tudo na minha vida, pois a pesar das necessidades que já passamos no passado quando morávamos no interior, eles sempre cuidaram de todos nós de mim e dos meus irmãos nos ensinando sempre o caminho do bem da honestidade, e hoje sei que o que eu faço é o mínimo, mas dou o meu melhor dentro do meu poder. (GIRASSOL).

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A quinta e última chamamos de Cravo. Aos quarenta e três anos, solteira,

analfabeta, é mãe de dois filhos ambos adultos, vivem em sua casa com a filha e

dois netos, residindo no bairro há quinze anos. Sua renda é única e exclusivamente

do valor do programa bolsa família R$ 77,00. A mesma veio do interior do estado,

pois segundo relata, sofria demais com o ex-marido, então decidiu deixá-lo no

interior e veio tentar uma nova vida na cidade, longe de tudo o que a fazia sofrer.

Aquela vida que tia lá no interior eu não quero mais não, vivia sofrendo na mão daquele homi, chegava bebo, cheirando a cachaça, assustava meus filhos, dava mal exemplo, então num dia eu tava parada lá pensando e decidi amanhã vou embora dessa casa, (nesse momento com um olhar distante como se revivesse aquele momento que descrevia, então continuou) sai de lá com os meus dois filhos e até hoje não me arrependo, podia ser melhor, mas nos vive bem (CRAVO).

Nesse sentido identificamos que o público pesquisado trata-se de mulheres

em idade adulta, cuja faixa etária é de 22 a 45 anos, todas são beneficiárias do

mesmo programa de transferência de renda na condição de responsável familiar,

seus níveis de escolaridade são distintos. Suas rendas médias são de menos de um

salário mínimo. Vale destacar que todas têm filhos, moram no bairro em torno de 15

anos, todas em casa própria e no que consiste a situação conjugal, duas vivem em

união estável e três são separadas.

Esse foi o perfil traçado das mulheres entrevistadas, os dados colhidos na

pesquisa nortearam as análises mediante a relação com as pesquisas documental e

bibliográfica desenvolvidas no desenrolar deste trabalho.

5.2 Análise do Programa Bolsa Família e a vidas das mulheres chefes de

famílias do Cras Jereissati em Maracanaú-CE.

A escolha das mulheres chefes de família como objeto da minha pesquisa

ocorreu devido ao contato que tive com as mesmas em meu estágio no CRAS

Parque São João, onde me atiçou a curiosidade para entender o que se passa na

vida dessas mulheres, como vivem, o que elas pensam sobre o PBF e quais as

mudanças depois de inseridas no programa, uma tentativa de ir além do imediato e

adentrar as questões individuais das condições de existência dessas mulheres, suas

trajetórias de vida, seus costumes e suas crenças.

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Vale ressaltar antes desta analise o Art. 4º que traz os objetivos básicos do

Programa Bolsa Família, em relação aos seus beneficiários que são:

I - promover o acesso à rede de serviços públicos, em especial, de saúde, educação e assistência social; II - combater a fome e promover a segurança alimentar e nutricional; III - estimular a emancipação sustentada das famílias que vivem em situação de pobreza e extrema pobreza; IV - combater a pobreza; e V - promover a intersetorialidade, a complementaridade e a sinergia das ações sociais do Poder Público.

Ao analisar os objetivos do programa bolsa família é necessário ter em

mente, que além de diminuir a miséria, a transferência de renda deve ser

considerada apenas a primeira etapa, que deve seguir para a fase seguinte, que é a

inserção socioeconômica sustentável das populações vulneráveis.

Dessa forma iniciamos as entrevistas indagando as pesquisadas sobre o

que é o Programa Bolsa Família, de que maneira ele influencia nas suas vidas.

Desde quando passei a receber essa ajuda do governo minha vida mudou, melhorou pra mim e pros meus filhos, acho que melhorou pra todo mundo e recebe, se o programa acabar não sei o que será de tanta gente que é pobre e depende dele pra viver (TULIPA).

Bom eu sei que esse dinheiro é só uma ajuda, um complemento pra gente que é pobre, mais a cada mês que agente recebe, ele se torna mais importante e acaba que agente não sabe nem o que fazer sem ele na nossa vida, pois ele já faz parte da nossa renda (LÌRIO).

O programa pra mim significa a melhora da qualidade de vida pra mim e pros meus filhos, pra compra um calçado, uma roupa que antes eu não podia, é muito importante nem sei o que fazer sem essa ajuda que o governo dá (ROSA).

O programa é muito bom porque não é só o dinheiro que agente recebe tem muitos benefícios né, como a conta de energia que vem mais baixa, por conta do baixa renda, é uma coisa que auxilia muito na renda. Como por exemplo, hoje quando chega a volta as aulas posso comprar o material escolar dos meninos eles podem escolher porque é um dinheiro que também é deles (GIRASSOL).

Tudo de bom, ele influenciou muito, pois foi à ajuda que eu tive no momento em que eu tava mais precisando. Melhorou muito é uma fonte de renda pra muita gente, para todas as mulheres eu acho que melhorou (CRAVO).

De acordo com a fala das mulheres entrevistadas, essas encontram no PBF

uma forma de ajuda para suprir as necessidades do seu lar e de sua família, embora

não seja suficiente para suprir todas as necessidades apresentadas pela família, e

ainda exista a concepção do acesso ao programa como ajuda e não como um direito

social, ou seja, o fetiche da ajuda contrapondo-se à noção de direitos.

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A distância existente entre as politicas sociais e a concepção de direitos

conquistados e garantidos por lei e a sua vinculação com a prática da ajuda,

possibilita seu uso eleitoral ou clientelista por governos, principalmente nas

prefeituras, ressaltando governos estaduais e federais, mediante a concessão de

benefícios, assegurando o caráter assistencialista e politico.

Este é um programa importante, contudo não tem proporcionado a essas

famílias a superação da pobreza. Esse benefício permite garantir as famílias o

atendimento das necessidades mínimas, mas não as necessidades básicas, ou seja,

tudo aquilo que o ser humano necessita para viver dignamente, no qual o mesmo

teria acesso à educação de qualidade, a saúde, a uma profissionalização para ter

acesso ao mercado de trabalho, entretanto não consegue na atual forma como esta

sendo operacionalizado o programa.

Um traço relevante acerca das mulheres beneficiárias do Programa Bolsa

Família foi a sua representatividade como chefe de família. Dessa forma,

ponderamos como esse fenômeno se identifica nas relações sociais.

O Responsável pela Unidade Familiar deve, obrigatoriamente, ser um dos componentes da família e morador do domicílio, com idade mínima de 16 anos e preferencialmente do sexo feminino. Conforme avaliações, o benefício do Bolsa Família transferido, preferencialmente, às mulheres responsáveis pela unidade familiar tem contribuído para ganhos de autonomia e ampliação de seu poder decisório feminino. Das famílias cadastradas os responsáveis pela unidade familiar são pessoas do sexo feminino, proporção ainda maior entre as famílias beneficiárias do PBF,com 93,1%. A proporção de pessoas do sexo feminino como responsáveis pela unidade familiar é maior entre famílias em situação de pobreza (92,1%) e extrema pobreza (91,5%) – público-alvo do Programa Bolsa Família – que entre aquelas em situação de baixa renda (84,6%). (BRASIL, 2013, p. 35).

Dessa forma questionamos as entrevistadas por que as mulheres são as

principais responsáveis pelo recebimento do benefício.

Receber esse dinheiro, essa ajuda que o governo ta dando pra nos que é pobre e muito importante porque antes ficava só pensando meu Deus o que agente vai merenda a manha de manhã, o que eu vou fazer pro almoço dos meus filhos, agora é pouco mais tem todo dia, dá pra compra umas coisinhas ai agente junta com o pouco que meu marido ganha e aquele pouco daqui com o pouco de lá dá pra viver um pouquinho melhor que antes, ta tudo melhor agora. Fico feliz por ser eu a receber, pois eu vejo o que faço, eu contribuo muito em gastar esse dinheiro da forma certa, (TULIPA).

A mulher depois do beneficio ficou mais independente, não depende só do marido. A mulher é a cabeça da casa ela é que sabe o que realmente precisa pra dentro de casa, ela é que administra o dinheiro, eu sou a responsável porque eu sou a chefe da minha família, com o dinheiro eu

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pago agua, pago luz, compro o gás, compro a mistura, uma fruta, o pão pra de manhã (ROSA).

Eu me sinto muito bem em ser eu a responsável pelo beneficio, porque sempre na casa é a mulher, é ela quem sabe o que os filhos precisam mais, como material escolar o homem não se atenta a isso, depois do beneficio as mulheres passaram a ser mais valorizadas, o dinheiro que eu recebo é pouco né mais da pra comprar o material escolar dos meninos quando começa as aulas, todo dia tem que comprar pão de manhã, serve pra essas coisas. (GIRASSOL).

Nesses trechos, podemos afirmar que as entrevistadas veem a

responsabilidade pelo benefício como a oportunidade de maior autonomia dentro do

lar, uma vez que o aumento da independência financeira e do poder de decisão são

fatores inseparáveis da autonomia.

A identificação das mulheres com a família, dada a naturalização dos papéis de gênero, permitiu que Estado, mercado e sociedade construíssem alianças que, muitas vezes, reforçam o lugar das mulheres como

responsáveis diretas pelo bem estar familiar (PEIXOTO, 2010, p.145).

Percebemos que o programa trouxe para a vida dessas famílias além de

acesso a renda, certa autonomia para as mulheres, para que elas pudessem adquirir

um alimento ou pagar uma conta, a liberdade na aplicação do dinheiro recebido.

No entanto de acordo com Cavalcante:

O que se tem observado é que além do programa não atender a todos que precisam tendo que se fazer uma seleção dos mais pobres entre os pobres, o mesmo não tem sido eficiente em retirar os beneficiários da situação de pobreza no sentido de não garantir as condições inclusão desses no mercado de trabalho, ou de torná-los capazes de produzir formas alternativas dignas de promover seu sustento a partir de recursos próprios (2010, p. 09).

A mulher assume neste contexto, o papel de chefe de família que mais se

destaca entre os componentes familiares, pois ele adquire o papel de ser mãe, de

mulher, de provedora do lar, de protetora, enfim a mulher assume múltiplas funções

em busca de melhorar as condições de vida da família, fazendo-a sair da condição

de vulnerabilidade social em que se encontra.

A ideologia naturalizadora do papel das mulheres como mães, na sociedade, e, ainda, como as principais responsáveis pelo trabalho doméstico continua sendo reproduzida pelas esferas institucionais, seja o Estado, a família, a escola, a religião, fixando valores e condutas que reposicionam as mulheres como as principais cuidadoras da humanidade. Essas práticas persuasivas são, muitas vezes, permeadas por sentimentos amorosos que responsabilizam as mulheres pelo sucesso ou fracasso dos membros de suas famílias (PEIXOTO, 2010, p. 168).

Concordo com Peixoto (2010) quando fala que “A realidade das políticas

sociais no Brasil comporta o modelo familista de proteção social”, destaca-se a

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focalização do Programa na figura da mulher, como responsável familiar pelo

controle do beneficio, ou seja, é a mulher a representante da família diante da

politica de assistência. Diante dessa realidade levantamos a seguinte questão,

houve mudanças em relação ao papel da mulher na família, a partir do recebimento

do benefício.

Bom, na minha casa desde quando passei a receber o beneficio mudou, que eu é que dou a ultima palavras, ele vive comigo (se refere ao companheiro), mas sabe que não lhe dou o direito de reclama de nada, porque ele não trabalha, nem em casa e nem fora de casa (ROSA).

Me sinto mais responsável pela minha família, só sou eu, ninguém mais então eu tenho que cuidar dos meus filhos, e receber esse beneficio ajuda muito, apesar de pouco me sinto mais dona de mim, meu papel dentro de casa agora é de chefe de família, pesado né essa palavras (risos) mais sou a chefe da minha família (LÌRIO).

Teve uma grande mudança que as mulheres passaram a ser mais útil a se valorizar, saber que ela é muito importante dentro da sua família não só pra lavar passar, cozinhar, nos temos nossa importância dentro e fora de casa (GIRASSOL).

Depois do beneficio pra mim tá melhor porque não dependo de ninguém, é uma grande ajuda, me sinto muito bem de ser eu que recebo, e receber esse dinheiro me deixa um pouco mais despreocupada (CRAVO).

Apesar de ainda permanecer as raízes conservadoras provenientes das

concepções machistas históricas, que colocam em seus preceitos que o chefe de

família só pode ser representado pela figura masculina, hoje a mulher tem se

destacado como representante principal de muitas famílias, o crescimento da

organização da família monoparenteral, chefiadas por mulheres, leva a Politica de

Assistência a focalizar seus programas e benefícios nas mesmas.

Ao que se refere à matricialidade no PBF, Peixoto (2010, p. 148-149) reflete:

O Programa Bolsa Família, portanto, carrega em seu próprio nome a marca desse lugar de destaque que a família ocupa, seja como esfera de provisão do bem-estar de seus membros, seja como um dos pilares de sustentação do Programa, uma vez que as condicionalidades e os recursos serão administrados no interior da família.

As condicionalidades postas aos beneficiários são apontadas como outra

fragilidade na operacionalização do PBF. Bichir (2010) destaca, "exigir que a

população mais pobre cumpra contrapartidas implica uma negação do direito de

receber parte da riqueza socialmente (BICHIR, 2010, p. 123)”.

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Perguntamos o que você acha das exigências do Programa em relação à

frequência das crianças na escola e às questões vinculadas ao tratamento da sua

saúde e de seus filhos/as, as chamadas condicionalidades, e ainda questionamos se

elas encontravam alguma dificuldade para cumprir as exigências. Algumas das

respostas:

Mas que obrigatório porque é dever, obrigação de todas as mães mesmo que não existisse isso (se refere as condicionalidades), é mais um incentivo pras mães que não faziam isso, cuidar de seus filhos, acompanha-los um pouco mais, ver o que eles precisam o que acontece na vida deles na escola. (ROSA).

Eu acho que no caso da vacina é muito bom, agora no caso da escola não é tão bom assim por que tem criança que vai só por que tem a obrigação de ir e a mãe obriga (usuária refere-se ao fato da escola não ter nem um atrativo que incentive as crianças a ir a escola), para não perder o beneficio, acredito que deveria ter mais investimentos em outras áreas como no esporte, uma coisa mais dinâmica que atraia as crianças para a escola, pra não ir só por obrigação (GIRASSOL).

Não acho ruim não porque sendo obrigatório ou não agente tem que fazer, mas acho complicado por que nem sempre tenho tempo pra ta indo pro posto de saúde e quando agente vai tem que ta com muito tempo porque tudo demora a as vezes agente tem até que brigar pra poder ser atendido e as vezes nem é, ai agente volta pra casa sem ter feito nada. Às vezes penso que se eles exigem que agente faça um acompanhamento eles tinham que ver como é que ta sendo as coisas mas escolas e nos posto de saúde (TULIPA).

É tipo assim, é um compromisso que a pessoa tem que ter né, tem que ter aquela responsabilidade pra poder receber, se a pessoa não tiver ela também não recebe, eu não encontro nem uma dificuldade de cumprir (LÌRIO).

Acho que importante ter essas... como chama hein? acho que é punição, para as mãe fazer o que é certo pros filhos, e as vezes mesmo sabendo que vai perde elas ainda num faz o que é o certo, num vejo dificuldade nem uma, agente todo dia tem que buta os meninos pro colégio né verdade, e o que custa levar pra vacinar, o posto é longe mais num é nem todo dia, eu sempre levo os meus netos e gosto muito de fazer isso pra eles, pois eu sei que é pro bem deles (CRAVO).

As condicionalidades obrigatórias como contrapartida das famílias

beneficiárias dentre as falas, percebemos que apenas duas das entrevistadas falam

um pouco da dificuldade que é cumprir as tais exigências e da deficiência destas

politicas.

A respeito das condicionalidades afirma Cavalcante:

(...) sob a ótica do direito, a um direito não se deve impor contrapartidas, exigências ou condicionalidades, visto que a condição da pessoa deve ser o requisito básico para essa titularidade. Além disso, a obrigação de garantir escola, postos de saúde e demais condicionalidades, ora impostas cabe aos

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poderes e não as pessoas. Sendo essa uma questão a ser repensada no programa. (CAVALCANTE, 2010, p. 04)

No que se referem às condicionalidades, os críticos ao Programa considera

a instabilidade das políticas de saúde e educação, haja vista que, muitas vezes as

famílias são "penalizadas" por deficiências das próprias politicas públicas.

De acordo com a Constituição Federal de 1988, em seu artigo 226, afirma “A

família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado”. Esta afirmação é

confirmada no inciso no 8º do referido artigo que estabelece: “O Estado assegurará

a assistência à família na pessoa de cada um dos que a integram, criando

mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações”.

A centralidade da família na politica social recai sobre o fato de que esta tem

como uma de suas funções fazer a mediação das relações entre o sujeito e o

Estado, embora esteja inserida num espaço contraditório, marcado pela luta

cotidiana em busca da sobrevivência no contexto social capitalista. Diante do

exposto, questionamos sobre qual a importância da família e quais atividades as

entrevistadas desempenham nas suas famílias.

Família pra mim é amor é amizade, minha família é tudo pra mim (CRAVO).

Família é um ambiente que agente tá tudo junto, é uma coisa que todo ser humano precisa é de uma família, precisa de alguém pra conversar, pra cuidar, você precisa se sentir útil, porque antes eu não me achava útil e agora que eu tenho eles (se refere aos filhos) eu me sinto útil é o que me faz mais feliz assim, é ter eles pra cuidar. Dentro da minha família, minha obrigação é dá um bem estar pra eles, cuidar deles ensinando o certo e o errado, e proteger também (ROSA).

A família significa apesar de ter muita confusão e conflitos é normal dentro da família, mas ela é muito importante, conviver com a família, eu considero minha família meus filhos e meu irmão, pra mim eles são a minha família, e minha obrigação é cuida de casa, cuida dos filhos, levar pro colégio (LÌRIO).

Família é um porto seguro, é um lugar que você se sente sempre protegido, você sabe que pode contar com ele sempre. Família é muito importante é à base de tudo, se você tiver uma boa educação você não vai se meter com coisas erradas. Dentro da minha família eu acredito ter um papel importante, porque eu cuido do meu pai da minha mãe que são idosos, e também das minhas sobrinhas e eu acho que pra essas pessoas eu sou importante (GIRASSOL).

Minha família é tudo o que eu tenho, sem ela não sei o que eu seria, sem ela me sentiria sem rumo, eu cuido da minha família essa é a minha principal obrigação (TULIPA).

Neste momento da entrevista, diferente de todos os momentos anteriores,

podemos perceber a emoção nas falas das usuárias, inicialmente todas sem nem

uma exceção deram um meio riso no canto da boca, respiraram fundo e dessa forma

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começaram a responder, porém, antes das respostas sempre falavam “ai meu e

agora o dizer”, essa também foi uma frase unânime. Cada mulher busca, pensa e

age tendo em mente a proteção da sua família.

Em relação à contribuição concreta para o desenvolvimento da

autonomização da família, a natureza das ações:

Não permite a possibilidade do que poderia considerar-se uma capacitação capaz de alavancar a autonomização das famílias, constituindo-se este aspecto possivelmente em um dos mais problemáticos no desenvolvimento do Bolsa Família, mesmo que a articulação com programas estruturantes se constitua em elemento central na própria proposta do Programa (SILVA, 2010).

Atualmente na sociedade brasileira, a família além de ser reconhecida como

instancia de cuidado e proteção, deve ser reconhecida como instancia a ser cuidada

e protegida, ponto em que se ressalta a responsabilidade pública para com os seus

membros, garantindo lhes acesso aos serviços públicos de forma universal e justa.

Prosseguimos com a entrevista fazendo a seguinte pergunta: O que é ser

mulher, e se as entrevistadas consideravam que existam desigualdades entre

homens e mulheres.

Ser mulher é sempre ter que ceder, é ser sofredora. Ser mulher é buscar ser independente, sempre vai existir diferenças entre homem e mulhe, um exemplo é se você tá dirigindo qualquer que acontece ele olha e diz “só podia ser mulher”, então é claro que tem diferença e tem e é muita (CRAVO).

Ser mulher é ser forte é ter liderança, dentro da nossa sociedade a mulher tem sido uma líder, como é o caso da nossa presidente que é mulher, vejo que hoje a mulher pode lutar pelos seus direitos, mas os direitos não estão em igualdade, mas a mulher hoje tem muito maios consciência do seu poder na sociedade, ainda falta muito a conquistar (GIRASSOL).

Destacamos essas duas falas, pois as mesmas refletem sobre uma mulher

guerreira que tudo deve suportar, porém que deve sempre lutar, não pode desistir.

As entrevistadas falam que apesar de existir uma grande desigualdade entre

homens e mulheres no que se refere aos direitos, ela sabe e deve sempre tentar

ultrapassar as barreiras impostas pela sociedade.

Sabemos que o Brasil nos últimos anos vem passando por grandes

mudanças nos padrões socioeconômico das famílias. Houve um avanço na redução

das desigualdades de gênero. Este sucesso foi influenciado pelas conquistas sociais

e políticos do papel da mulher na sociedade e mudanças de comportamento e os

valores sociais das mulheres, proporcionado por alterações na formação da

identidade feminina.

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Em uma ultima indagação, questionamos as entrevistadas da seguinte

forma: De acordo com o que você vive hoje, como você enxerga o seu futuro?

Eu quero melhoras pro meu futuro, quero terminar os meus estudos, eu não quero sempre viver aqui com o meu irmão, pois é muito complicado conviver com ele, eu quero ter minha família com os meus filhos e meu marido que ainda não sei quem vai ser (risos) (LÌRIO).

Assim o que eu vivo hoje eu posso dize que é bem melhor do que eu vivi no passado, então para o futuro deve ter algo bem melhor, eu quero e espero que seja assim (TULIPA).

Eu queria que o futuro fosse melhor, não que eu não seja feliz hoje, mas eu queria que fosse melhor a minha vida. Se eu pudesse sairia dessa casa com os meus filhos. No meu futuro quero ver eles tudo grande, eu trabalhando, terminar os meus estudos e me tornar uma interprete de libras, caminhar com as minhas próprias pernas sem precisar de ninguém (ROSA).

Se Deus quiser eu tenho boas perspectivas pro meu futuro, pois eu estou estudando e eu acho que agente não deve parar, agente não pode ficar achando que é tarde, a gente tem que lutar, eu penso que o meu futuro vai ser bem melhor. Quero terminar os meus estudos e me forma em psicologia (GIRASSOL).

Eu quero viver tranquila na minha casa, ver os meus netos terminando os estudos dele, já que eu não terminei, eu espero que no futuro eu tenha um mais de sossego, é só isso que desejo, não me preocupar com o que vamos comer amanhã (CRAVO).

Ao falarem nos planos para o futuro as entrevistadas colocam sempre o

bem estar dos filhos em primeiro lugar, um diferencial notado nesta entrevista é que

mais da metade das entrevistadas têm para o seu futuro planos, seja de voltar a

estudar, seja de terminar os estudos e terem uma formação acadêmica.

Diante dos relatos das entrevistadas, que assumem múltiplas funções para

dar conta do seu papel como responsáveis pela família, percebemos que o

sentimento de acomodação não lhes acomete, pois elas exprimem o desejo por

mudanças e conquistas, principalmente no que se refere às suas condições de vida

e ao seu futuro e de seus filhos.

No que se refere às politicas sociais o que se pode ver é que o

desenvolvimento da Politica Social brasileira tem um conjunto amplo e variado,

porém, descontinuo e insuficiente, de programas sociais direcionados para a

população mais empobrecida.

Compartilho com Silva e Silva (2006) quanto às possibilidades dos PTR‟s:

Considero que ao mesmo que resultados e impactos decorrentes desses programas, em termo de superação da fome e da pobreza no Brasil, sejam muito modestos, conforma tem demostrado avaliações desenvolvidas sobre vários deles, o significado real que apresentam para as famílias beneficiarias é significativo, por permitir a elevação ou mesmo um único

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acesso a renda monetária por parte de um número elevado de famílias que se encontra à margem da sociedade. Toda via, entendo que isso não significa que esses programas sejam capazes de ir além da manutenção de um nível de pobreza que poderá ser cristalizada e não superada (2006, p. 28).

Não há duvidas que a implantação de programas de transferência de renda

em todos os municípios brasileiros provocou uma melhora nas condições de vida de

milhões de brasileiros que a eles tem acesso. É fato o impacto que esses programas

causam nas famílias beneficiadas, o efeito de alivio, ao conceder a obtenção ou

ampliação de uma renda, até então inexistente ou insignificante quando proveniente

do trabalho, sendo, em muitos casos, esses programas a única possibilidade de

obter renda, mesmo que baixa.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Para o desenvolvimento desta pesquisa, iniciamos destacando que nem tudo

ocorreu como o esperado, pois foram encontradas algumas dificuldades no caminho.

Não em relação às mulheres entrevistadas que, com ternura, dedicaram parte de

seu tempo para conversarmos. No referimos a outras dificuldades que tivemos que

enfrentar. Por mais que as entrevistas tenham sido feitas em tempo possível para

investigação das temáticas, não conseguimos adentrar com profundidade alguns

pontos de ordem mais subjetiva, a exemplo as possíveis relações de poder

vivenciadas no interior dessas famílias, e dessa forma, a sua realidade mais estreito.

A presente pesquisa buscou analisar a realidade social das mulheres chefes

de família beneficiárias do Programa Bolsa Família acompanhadas pelo Cras

Jereissati, em Maracanaú-CE.

Nessa análise, verificamos aspectos que se tornaram relevante à autonomia

das mulheres, tanto sobre situações sociais quanto econômicas, sejam por meio das

ações complementares (ex: PRONATEC) oferecidas pelo Programa Bolsa Família

que buscam a qualificação profissional das mulheres compreendendo-as enquanto

provedoras de seus sustentos e de seus lares, e como essa renda, que lhes

possibilitem superar, de certa forma, as relações de desigualdade de gênero, por

meio da participação das mesmas no complemento da renda familiar lhes

assegurando certa autonomia de renda.

Outro fator que aparece na analise deste estudo é o significado do programa

para as mulheres, diante das novas configurações familiares. Diante do significativo

crescimento das mulheres como chefes de família, é colocado pelas entrevistadas

que o recebimento do beneficio do PBF reforça as possibilidades de assumiram tal

posição. Vale salientar que os impactos do programa na vida das mulheres têm

significados diversos reconhece-se que o fator da renda é significativo, porém não é

o único.

É importante destacarmos que apesar desse programa de transferência de

renda representar uma espécie de “socorro” para as famílias pobres, não podemos

deixar de reconhecer que o mesmo não atinge todas as vulnerabilidades da

população brasileira, especificamente sobre as mulheres.

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Concordamos que o Programa Bolsa Família pode ser visto como uma

medida de tentativa de superação da pobreza no Brasil, mas, não podemos deixar

de considerar que o problema da desigualdade neste país certamente não será

solucionado apenas com a manutenção ou expansão de programas dessa natureza.

É necessário que haja um ordenamento na estrutura política do Brasil, não só sobre

os programas de transferência de renda, mas, acerca de todas as dimensões

politicas, econômicas e sociais de natureza pública e uma radical transformação

societária.

O desafio da politica de assistência social é de tornar mínimas a situação de

pobreza e extrema pobreza em que vivem milhões de brasileiros (as). As mudanças

e os avanços da política ao longo dos anos é algo perceptível, pois muitos desafios

foram enfrentados e seus resultados se concretizam por meio da LOAS, da PNAS,

do SUAS, mas ainda existem outros desafios a serem enfrentados e conquistados,

pois no atual contexto vê-se o crescimento das desigualdades sociais e o grande

número de sujeitos que vivem em situação de vulnerabilidade social.

Apesar das mudanças ocorridas no Brasil ao longo do desenvolvimento

político, econômico e social, relatórios e estudos recentes apontam que milhões de

pessoas ainda vivem na linha da pobreza e extrema pobreza.

É por meio das demandas apresentadas pela sociedade civil que o Estado

visa intervir na realidade, é a partir destas que surgem leis, politicas que visam

assegurar os mínimos sociais às pessoas que se encontram em situação de

vulnerabilidade.

Os relatos de cada uma das mulheres mostram o quanto são precárias suas

condições de vida, mostram também suas lutas e anseios por melhor qualidade de

vida. Na pesquisa, que teve como foco as mulheres chefes de família beneficiarias

do PBF, é possível observar o quanto a vida delas e de seus familiares transforma-

se após a inserção no programa.

É necessário o desenvolvimento de ações dentro dos equipamentos

socioassistenciais que atenda a demanda apresentada. A vida das mulheres antes e

após a inserção no programa teve modificações, porém ainda faltam muitos

obstáculos a serem vencidos e superados neste ambiente de alta vulnerabilidade

social para que as famílias consigam superar a pobreza que lhes atinge.

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A mulher é tida pelo programa como uma aliada na superação da pobreza, a

ela foi incumbida à responsabilidade de controle do cartão do beneficio, bem como a

autonomia no que se refere ao destino dado a esse dinheiro mensalmente recebido.

Com isso mudam-se as relações de gênero, pois a mulheres passam a dividir

responsabilidades com seus cônjuges, ou passam a assumi-las sozinha, como é o

caso da maioria das beneficiárias entrevistadas.

A pesquisa mostra que as mulheres mantêm a esperança de conseguir um

trabalho, acreditam que os filhos podem ter melhores condições de vida, elas

acreditam em um futuro promissor, quando terão seus direitos garantidos, e não

tenham o beneficio do Programa Bolsa Família como renda principal.

Como diz Yazbek (2006, p. 09) “Sonhar é necessário para mudar”. E sonhos

não faltam para as mulheres que almejam alcançar melhores condições de vida para

a sua família, são esses sonhos que movem essas mulheres a seguir na luta e a

acreditar que o futuro de seus filhos será bem melhor do que suas próprias vidas, e

que no futuro essas também serão modificadas, para viverem bem melhor.

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REFERÊNCIAS

CAVALCANTE Valéria Araújo. Análise crítica do programa bolsa família: vantagens e desvantagens. Disponível em: http://pt.scribd.com/doc/60252145/ANALISE-

CRITICA-DO-PROGRAMA-BOLSA-FAMILIA-VANTAGENS-E-DESVANTAGENS Acesso em 09 jul 2014. BEHRING, Elaine Rossetti. Politica Social: Fundamentos e História. – 9. Ed. – São Paulo: Cortez, 2011. – (Biblioteca básica de Serviço Social; v. 2). BICHIR, Renata Mirandola. O Bolsa Família na Berlinda? Os desafios atuais dos programas de transferência de renda. – Disponível em http://www.scielo.br/pdf/nec/n87/a07n87 acesso em 15 jun 2014. BRASIL, Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Perfil das Famílias do Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal. Brasilia, 2013. ______. Lei. nº 10.836, de 9 de janeiro de 2004. Institui o Programa Bolsa Família e dá outras providências. ______. Orientações técnicas sobre o PAIF. Vol. 2: O Serviço de Proteção e Atendimento Integral a Família – PAIF, segundo a tipificação nacional de Serviços Socioassistenciais. Brasilia: MDS, 2012. ______. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Norma Operacional Básica / Sistema Único de Assistência Social. Brasília, 2005. ______. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Política Nacional de Assistência Social. Brasília, 2004. ______. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Lei Orgânica De Assistência Social. Brasília 1993. CISNE, Mirla. Gênero, divisão sexual do trabalho e serviço social. / Mirla Cisne. –1. Ed. – São Paulo: Outras Expressões, 2012. 144p. DEMO, Pedro. Pobreza Politica: a pobreza mais intensa da pobreza brasileira. Campinas, SP: Editora Armazém do Ipê (Autores Associados), 2006.

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APÊNDICE A

TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO

Convidamos o (a) Senhor (a) a participar da pesquisa com objetivo: Analisar a

realidade social das mulheres chefes de família beneficiárias do Programa Bolsa

Família acompanhadas pelo Cras Jereissati, em Maracanaú-CE, sob a

responsabilidade da seguinte pesquisadora Viviane André Lima sob orientação da

Ms. Luciana Sátiro Silva.

Sua participação é voluntária e se dará por meio do preenchimento de um roteiro

com perguntas abertas e fechadas e trará aspectos relativos à sua vida familiar,

comunitária e participação nos serviços do CRAS Jereissati, em Maracanaú-CE.

Os resultados dessa pesquisa serão analisados e publicados nos meios científicos,

mas ressaltamos que sua identificação não será divulgada, sendo resguardada em

sigilo.

Não há risco decorrente da sua participação e o(a) Sr.(a) possui a liberdade de

retirar sua permissão a qualquer momento, seja antes ou depois da coleta de dados,

independente do motivo e sem nenhum prejuízo ao seu atendimento ou tratamento

na Instituição.

Em qualquer etapa do estudo, poderá contatar para o esclarecimento de dúvidas ou

para retirar o consentimento de utilização dos dados coletados com a pesquisadora:

Viviane André Lima – residente no endereço: Rua Jaçanaú, nº: 1680.

Consentimento Pós – Informação

Eu,______________________________________________, fui informado e

prestado os devidos esclarecimentos sobre o que a pesquisadora deseja realizar e

porque motivo precisa da minha colaboração, e compreende a explicação

transmitida pela pesquisadora. Desde modo, eu concordo em participar da pesquisa,

sabendo que não vou ganhar nada e que posso desistir quando quiser. Este

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documento é emitido em duas vias que serão ambas assinadas por mim e pela

pesquisadora, ficando uma via com cada um de nós.

___________________________ ____________________________

Assinatura da participante Viviane André Lima- pesquisadora

___________________________________

Ms. Luciana Sátiro Silva- Orientadora

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APÊNDICE B

ROTEIRO DE ENTREVISTA

1) Idade:____________ Profissão:____________ Estado civil:______________

Escolaridade________________

2) Há quanto tempo mora no bairro Jereissati? __________________________

3) Quantas pessoas moram na residência _______________

4) Trabalha? ( ) sim ( ) não Se sim, com qual tipo de vinculo da sua

ocupação?__________________________________________

5) Qual o valor da sua renda mensal? _______

6) O que é o Programa Bolsa Família, de que maneira ele influencia na sua vida?

7) Por que as mulheres são as principais responsáveis pelo recebimento do

benefício?

8) Houve mudanças em relação ao seu papel na família, a partir do recebimento do

benefício?

9) O que você acha das exigências do Programa em relação à frequência das

crianças na escola e às questões vinculadas ao tratamento da sua saúde e de

seus filhos/as?

10) Você encontra alguma dificuldade para cumprir as exigências?

11) Qual a importância da família para você?

12) Você considera que existam desigualdades entre homens e mulheres quais?

13) De acordo com o que você vive hoje, como você enxerga o seu futuro?