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VIRA MUNDO Editorial O Viramundo está de volta em edição especial, celebrando o 18 de maio e a Luta Antimanicomial! Nas páginas que seguem preparamos uma bela compilação de notícias, artigos e entrevistas sobre a política de saúde mental brasileira. O Viramundo é um canal de comunicação da Coordenação Geral de Saúde Mental, Álcool e Outras Drogas com usuários/as, trabalhadores/as e gestores/as da RAPS e com o público em geral. O Viramundo está na internet, no endereço blogviramundo.wordpress.com . Acesse também o nosso canal no Youtube (http://goo.gl/dx9R8J), onde você poderá assistir, entre outros vídeos, ao discurso do Ministro da Saúde Arhur Chioro sobre o 18 de maio, Dia Nacional da Luta Antimanicomial. A música da capa é o samba-enredo da Escola de Samba Liberdade Ainda que Tan Tan, de Belo Horizonte, para o desfile comemorativo do Dia Nacional da Luta Antimanicomial, realizado na Praça da Liberdade, com a realização do Fórum Mineiro de Saúde Mental e da Associação dos Usuários dos Serviços de Saúde Mental de Minas Gerais. O samba é de autoria do Coletivo Centro de Convivência Venda Nova, e o desfile da Escola teve como tema “A cidade que queremos: seja feita a nossa vontade!” (ouça: http://goo.gl/V2UpxP) REVOLUSSAMBA Autoria: Coletivo Centro de Convivência Venda Nova - SUS - BH Se essa rua fosse minha eu mandava consertar Consertava essa cidade pro meu mundo caminhar. A cidade, minha gente, tem muita poluição, Não precisamos só de carro mas de metrô na estação. REFRÃO Oh, Bombrilhão! Oh, Bombrilhão! Acaba com o preconceito e com a discriminação. (2 x) Não ponha corda no meu bloco, copos de leite e de flor. Na Avenida Afonso Pena, 0 18 já chegou! Nós vamos manifestar nossa indignação Na cidade que queremos não cabe corrupção. REFRÃO Se violar fosse verbo de violão, De tão bela essa cidade teria mais criação. Como não é, o que devemos fazer, É acreditar no povo que luta para vencer. REFRÃO Tempestade, tempestade, eu me encharco em você! Mas com tanta indiferença, como vou sobreviver? Sou amigo do Mandela e contra a segregação, Sou filho da Praça Sete e da Praia da Estação. REFRÃO Como em Cuba e na França, eu vou revolucionar! Vou por meu samba na rua para o povo desfilar Essa rua, ela é nossa e esse muro, ele é seu. Coordenação Geral de Saúde Mental, Álcool e Outras Drogas DAET/SAS/Ministério da Saúde Nº 04 ano 02 Maio/Junho/Julho 2014 Boletim (In)formativo, em formação e desformatado da RAPS - Rede de Atenção Psicossocial Desfile comemorativo do Dia Nacional da Luta Antimanicomial. BH-MG. Foto: Maxwell Vilela

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VIRA MUNDO

Editorial

O Viramundo está de volta em edição especial,

celebrando o 18 de maio e a Luta Antimanicomial!

Nas páginas que seguem preparamos uma bela

compilação de notícias, artigos e entrevistas sobre a

política de saúde mental brasileira. O Viramundo é um

canal de comunicação da Coordenação Geral de

Saúde Mental, Álcool e Outras Drogas com usuários/as,

trabalhadores/as e gestores/as da RAPS e com o

público em geral.

O Viramundo está na internet, no endereço

blogviramundo.wordpress.com . Acesse também o

nosso canal no Youtube (http://goo.gl/dx9R8J), onde

você poderá assistir, entre outros vídeos, ao discurso do

Ministro da Saúde Arhur Chioro sobre o 18 de maio, Dia

Nacional da Luta Antimanicomial.

A música da capa é o samba-enredo da Escola de

Samba Liberdade Ainda que Tan Tan, de Belo Horizonte,

para o desfile comemorativo do Dia Nacional da Luta

Antimanicomial, realizado na Praça da Liberdade, com

a realização do Fórum Mineiro de Saúde Mental e da

Associação dos Usuários dos Serviços de Saúde Mental

de Minas Gerais. O samba é de autoria do Coletivo

Centro de Convivência Venda Nova, e o desfile da

Escola teve como tema “A cidade que queremos: seja

feita a nossa vontade!” (ouça: http://goo.gl/V2UpxP)

REVOLUSSAMBA

Autoria: Coletivo Centro de Convivência

Venda Nova - SUS - BH

Se essa rua fosse minha eu mandava consertar

Consertava essa cidade pro meu mundo caminhar.

A cidade, minha gente, tem muita poluição,

Não precisamos só de carro mas de metrô na estação.

REFRÃO

Oh, Bombrilhão! Oh, Bombrilhão!

Acaba com o preconceito e com a discriminação.

(2 x)

Não ponha corda no meu bloco, copos de leite e de flor.

Na Avenida Afonso Pena, 0 18 já chegou!

Nós vamos manifestar nossa indignação

Na cidade que queremos não cabe corrupção.

REFRÃO

Se violar fosse verbo de violão,

De tão bela essa cidade teria mais criação.

Como não é, o que devemos fazer,

É acreditar no povo que luta para vencer.

REFRÃO

Tempestade, tempestade, eu me encharco em você!

Mas com tanta indiferença, como vou sobreviver?

Sou amigo do Mandela e contra a segregação,

Sou filho da Praça Sete e da Praia da Estação.

REFRÃO

Como em Cuba e na França, eu vou revolucionar!

Vou por meu samba na rua para o povo desfilar

Essa rua, ela é nossa e esse muro, ele é seu.

Coordenação Geral de Saúde Mental, Álcool e Outras Drogas DAET/SAS/Ministério da Saúde Nº 04 ano 02 Maio/Junho/Julho 2014

Boletim (In)formativo, em formação

e desformatado da RAPS - Rede de

Atenção Psicossocial

Desfile comemorativo do Dia Nacional da Luta Antimanicomial. BH-MG. Foto: Maxwell Vilela

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Editorial

Editorial

Mais do que um boletim informativo, o Viramundo retorna em novo formato,

com cara de revista, como um instrumento de divulgação e produção

cultural, no âmbito da Política Nacional de Saúde Mental, Álcool e outras

Drogas, no contexto da reforma psiquiátrica brasileira.

As sessões contemplam os componentes da RAPS e muito mais, buscando

introduzir temas, pensamentos, ideias e a complexidade do campo da

saúde mental. Os textos são produzidos pelos núcleos temáticos da

Coordenação Geral de Saúde Mental e por autores/as convidados/as.

Sugestões, críticas e comentários podem ser enviados para

[email protected]. Além das publicações trimestrais, lançaremos

também edições especiais e temáticas.

Esta edição cumprimenta todos/as os/as usuários/as e familiares neste 18 de

maio, trazendo textos que propõem avançar na luta por liberdade e

autonomia. Abrimos com trechos do discurso de posse do novo Ministro da

Saúde, Arthur Chioro, que iniciou seu trabalho à frente do Ministério com um

belo e contundente discurso, em que destacou a importância da luta

antimanicomial e o compromisso com a defesa radical dos direitos

humanos.

Antonio Lancetti nos brinda com um texto , escrito especialmente para esta

edição do Viramundo, sobre os dias que marcaram a intervenção e o

fechamento da Casa de Saúde Anchieta, em Santos há 25 anos, no que

acabou sendo um dos marcos fundamentais da Reforma Psiquiátrica no

Brasil.

Apresentamos o artigo de Roberto Tykanori, Coordenador Geral de Saúde

Mental, Álcool e outras Drogas do Ministério da Saúde, sobre as primeiras

impressões e expectativas após a implementação do Programa “De Braços

Abertos”, da Prefeitura de São Paulo, que propõe uma nova relação do

poder público municipal com a população que faz uso de crack no Centro

de São Paulo.

Temos também a participação de Moisés Ferreira, da Associação de

Parentes e Amigos dos Pacientes do Complexo Juliano Moreira, em um

papo rápido com o Viramundo sobre os direitos dos usuários de serviços de

saúde mental e a importância de união de forças entre os diversos atores

que compõem a RAPS. Esta conversa aconteceu durante a I Reunião

Regional de Usuários de Serviços de Saúde Mental e Familiares, que produziu

o Consenso de Brasília.

Pedro Carneiro, integrante da Coordenação Geral de Saúde Mental,

inaugura a nova sessão Debates Regionais com um olhar sobre a região

norte do país, e as especificidades amazônicas quando pensamos em

políticas públicas nacionais. Pedro MacDowell, também da equipe da

Coordenação de Saúde Mental, escreve sobre a saúde mental em

contexto indígena e as políticas do bem viver.

Esta edição traz ainda artigos sobre os 10 anos do Programa de Volta pra

Casa; sobre a importância de enfrentar o racismo institucional e do cuidado

diante do sofrimento psíquico decorrente do racismo; sobre o Pronacoop

Social e as iniciativas de cooperativismo social no campo da saúde mental;

sobre as Unidades de Acolhimento e o direito à cidade; sobre a Política

Nacional de Saúde Mental Infanto-Juvenil e a implementação de

Programas de Prevenção ao uso prejudicial de álcool e outras drogas, e

sobre o I Encontro Nacional da RAPS, que aconteceu em dezembro, em

Curitiba.

Finalmente, trazemos aqui as primeiras notícias do Projeto de Percursos

Formativos na RAPS, além de notícias sobre os leitos de saúde mental em

hospital geral, sobre as novidades no campo das políticas sobre álcool e

outras drogas, sobre os CAPS e sobre a saúde mental na atenção básica.

Boa leitura!

Sumário

Editorial 2

Mural 3

Discurso de posse do

Ministro Arthur Chioro 4

Opinião 6

Reforma Psiquiátrica e

a Questão das Drogas:

da Coerção à Coesão

8

Protagonismo de

Usuários e Familiares:

Caminhos da

Emancipação

11

Urgência das pessoas,

Crise das instituições

14

Oikos: habitar a construir 15

Desinstitucionalização:

Direito à Cidade e à

Liberdade

16

Rede de Encontros 17

Saúde Mental

Infantojuvenil 18

Debates Regionais 22

Sofrimento e Atenção

Básica: Desafios para a

Transformação dos

Territórios

25

Radicalizar a Formação

na RAPS 26

Coletivizando Direitos 29

Expediente 32

3

Mural

Foto

s: Lucian

o Freire/M

S

4

Editorial

“Sinto-me profundamente honrado com a missão que me foi atribuída pela presidenta

Dilma Rousseff. Na carreira de um médico sanitarista, docente de Saúde Coletiva e gestor

público, não poderia haver convite mais desafiador. Trata-se de um momento ímpar em minha

vida, uma oportunidade de servir ao meu país, ao povo brasileiro, em especial à imensa parcela

da população brasileira que depende do SUS para garantir a proteção, a prevenção, o

tratamento e a reabilitação da sua saúde.

Mas, sinceramente, o que mobiliza os meus mais profundos sentimentos nesse momento

tão especial, o que me agita e instiga, é a oportunidade a mim conferida pela presidenta Dilma

de colocar em prática tudo que aprendi, os sonhos e ideais de toda uma vida. Penso nesse

instante em tudo aquilo que poderei fazer, contando com o apoio de companheiros e

companheiras de jornada em defesa do SUS e em defesa da vida que há mais de três décadas,

desde que entrei na Faculdade de Medicina, em 1981, compartilham comigo esses mesmos

sonhos e ideais.

(...)

Assumo hoje esta missão acalentado pelo sonho de podermos, nestes próximos anos,

acelerar a construção de uma sociedade sem manicômios! Na minha vida pública o que mais

me emociona, o que me fez ter a certeza que vale a pena, é quando posso olhar nos olhos de

pessoas que passaram 20, 25, 30 anos presos num hospício só porque tinham um sofrimento

psíquico e que agora vivem em liberdade. O Brasil tem uma dívida histórica com esses brasileiros

e, tenham certeza, nós vamos ajudar a pagá-la!

E esta mesma clareza e determinação devem orientar nossas ações para as pessoas em

uso abusivo de álcool e outras drogas. Vamos aprofundar e avançar no Programa Crack é

Possível Vencer, construindo todas as alternativas que apontam para um cuidado singular, em

liberdade, que ajude as pessoas a reconstruírem suas vidas e não caindo na armadilha fácil

daquelas que reatualizam o manicômio e tiram das pessoas sua dignidade!

Particularmente nesta agenda queremos explicitar nosso compromisso com a defesa

radical dos direitos humanos! Em 27 anos de profissão e 25 anos como gestor público, nada me

proporcionou mais alegria e sensação de dever cumprido do que encontrar, andando na rua,

sorrindo e felizes, ainda que seus rostos e corpos tenham sido indelevelmente marcados pela

cronicidade e perversidade dos métodos utilizados nos hospícios, os ex-moradores que passam a

viver livres nas Residências Terapêuticas. Viver com saúde e liberdade, ser protagonista de nossas

próprias vidas é um direito de cada um de nós, independente de cor, sexo, orientação sexual,

ser portador de deficiência, de transtorno mental, ou qualquer outra situação. Simplesmente

porque somos seres humanos, somos cidadãos.

Temos uma política nacional de saúde mental e de álcool e drogas muito bem

concebida. Produzimos em São Bernardo do Campo uma experiência profundamente exitosa e

referencial, ao longo de 5 anos. O mérito que tivemos, com total apoio do Prefeito Luiz Marinho

E m seu discurso de posse como o 42º Ministro da Saúde, em 03 de abril de 2014, Arthur

Chioro enalteceu a luta por uma sociedade livre de manicômios. Ao falar da Política Nacional

de Saúde Mental, o Ministro afirmou o compromisso com a defesa radical dos direitos humanos,

destacando os princípios de liberdade, autonomia, protagonismo e dignidade de todas as pes-

soas, e a importância de fortalecer os processos participativos nas políticas públicas. Destaca-

mos alguns trechos de seu discurso, que pode ser lido na íntegra através de nosso canal do

Youtube: http://goo.gl/dx9R8J

Discurso de posse do Ministro da Saúde Arthur Chioro

5

e do governo municipal, já que tem sido uma experiência intersetorial, foi o de implantar, em toda a

radicalidade, a Política Nacional de Saúde Mental e de Álcool e Drogas conduzida pelo Ministério da

Saúde, conduzida pelo Governo da presidenta Dilma.

Não abrirei mão de conduzir e aperfeiçoar essa política como uma das prioridades da minha

gestão. Porque sei que é possível mudar a realidade sem trancafiar e restringir a liberdade!

Os governos têm uma grande responsabilidade na consolidação das políticas públicas. Mas estas

só sairão de fato do papel e responderão aos anseios da população se formos capazes de construir um

processo verdadeiramente participativo. O primeiro compromisso é seguir no fortalecimento do

Conselho Nacional de Saúde e de todos os Conselhos de Saúde do país, para que usuários e

trabalhadores possam participar cada vez mais ativamente da condução do SUS. O segundo é de

realizar, junto com o Conselho Nacional de Saúde, e todas as forças políticas em defesa do SUS em

2015, a maior, mais produtiva, representativa e popular Conferência Nacional de Saúde. O desafio é

consolidar o que está bom e não ter medo de reinventar novos caminhos para garantir esse princípio

fundante do SUS. Reafirmo nosso compromisso de mantermos uma agenda aberta aos movimentos

sociais, garantindo o diálogo na diferença. “

Arthur Chioro é o novo Ministro da Saúde. Fonte: ASCOM/MS

Discurso de posse do Ministro da Saúde Arthur Chioro

6

Opinião

Os dias que comoveram a Psiquiatria Brasileira

À s oito da manhã tocou a campainha de casa. Era o sábado de 29 de abril de 1989 e David

Capistrano já tinha chegado para reunião marcada para nove horas em que iria programar a Intervenção da

Casa de Saúde Anchieta.

Expliquei a David que ainda não tinha acordado direito e que também não tinha comprado o jornal. Ele

me disse para não me preocupar, que já tinha lido os jornais e que iria me esperar na sala bisbilhotando a

biblioteca.

As nove em ponto estávamos todos, Cenise Monte Vicente, Williams Valentini, Tykanori, David e eu

sentados na mesa. David abriu o livro de John Reed “Dez dias que abalaram o mundo”, na página 73. Ali,

Reed citava a afirmativa de Lenin de que era necessário o apoio à insurreição em toda Rússia, para poder

dizer: "Eis o poder em nossas mãos! Que irão vocês fazer com ele?" A

insurreição deveria ser deflagrada no dia 7 de novembro, pois o dia 6

era cedo e o 8 era tarde demais.

David fechou o livro que tinha apanhado da estante e abriu a

reunião perguntando: Quando é nosso 7 de novembro?

O dia escolhido foi o 3 de maio de 1989, quando adentramos na

cidadela da psiquiatria com Telma de Souza, a prefeita de Santos.

O hospital era uma empresa privada e o Professor Sérgio Cérvulo

da Cunha, vice-prefeito, grande jurista e belo socialista, quebrava a

cabeça para fundamentar a ação juridicamente. Só contávamos com

um princípio consagrado na recentemente promulgada Constituição

que afirmava que a saúde é dever de Estado e direito do cidadão.

Se a opinião pública estava sensibilizada pela denúncia de várias

mortes ocorridas naquela época, a nossa entrada, então marcada pela

batalha jurídica que ganhamos, com a abertura das portas daquele

campo de concentração para toda cidade foi o que realmente

comoveu a todos.

Daquela quarta-feira lembro de um funcionário trocando uma lâmpada na porta do hospital, os rostos

absortos de um dos donos da Casa e depois no pátio feminino as mulheres rodeando o grupo de interventores

e exclamando: “Telma você veio nos libertar”!

Na noite do 3 de maio já tinham sido abertas as celas fortes, proibidos os eletrochoques, os castigos e

iniciado um trabalho coletivo que influenciou muitas das experiências de desisntitucionalização e invenção

institucional em várias áreas de saúde , assim como de muitas politicas públicas.

Naquela experiência aprendemos que o processo terapêutico era inerente à desmontagem institucional

e à criação de serviços substitutivos. Era possível uma cidade existir sem manicômios.

Quanto aprendemos! Manuel Raimundo, um homem negro e brilhante, numa daquelas manhãs me

tomou pelo braço e disse:

- Eu reparei que o senhor entende muito de Sigmund Freud, se quiser nos entender estude Raul Seixas.

Num desses dias uma jornalista perguntou ao Tykanori: “o que é saúde mental?” Ele respondeu no calor

daquilo que Guattari chamou de quarta revolução psiquiátrica: “poder, afeto e liberdade”.

Estas ideias, enunciadas há 25 anos, não param de nos alegrar e inspirar a cada passo

que damos na construção da reforma psiquiátrica brasileira.

Antonio Lancetti, psicanalista, analista insti-

tucional e consultor. Foto: intervenção da

Casa de Saúde Anchieta, 1989

Santos, 1989. Entrada na Casa de Saúde Anchieta

7

Opinião

Para assistir o vídeo da intervenção da Casa de Saúde Anchieta em Santos,

acesse o canal de Denis Petuco no Youtube: http://goo.gl/m7NGTF

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8

eles iriam cumprir os pactos para levar adiante o

projeto e gerou um sentimento de

pertencimento aos indivíduos.

O reconhecimento da extrema

desvantagem – o perfil das pessoas apresentava

uma série de vulnerabilidades crônicas ligadas à

baixa educação e empregabilidade, à

marginalização pela pobreza e preconceitos

vários de classe e raça e à condição de ex-

presidiários. Pessoas de baixíssimo poder

contratual, isto é, pessoas que encontram

barreiras quase instransponíveis para participar

do “contrato social”, perpetuando a situação

de exclusão e marginalidade.

A garantia de um “Pacote de Direitos”–

moradia, trabalho e renda, que viabilizou uma

relação contratual, isto é, uma relação civil,

cidadã, ofertados com um mínimo de

exigências. A moeda de troca básica foi a

palavra e a vontade manifesta. A maioria das

pessoas que aderiram ao projeto sustentaram o

contrato após 4 semanas.

O impacto de alternativas ao “FLUXO”

marginal - O primeiro pagamento injetou na

região por volta de R$ 36 mil reais que

movimentaram o comércio local. Pessoas que

estavam à margem da dinâmica de trocas

sociais passaram a fazer parte das circulaçãos

de mercadorias, mensagens e afetos da

comunidade local.

A combinação de baixíssima exigência e

alta disposição para estabelecer uma relação

O artigo escrito em fevereiro de 2014, no

contexto das primeiras notícias e efeitos do

programa “De Braços Abertos”, em São Paulo:

Estratégias de Produção de Contratualidade

Esta semana completa um mês a ação da

Prefeitura de São Paulo junto à população que

se concentrava na região central da cidade,

conhecida como “cracolândia”. A favelinha da

Rua Helvetia foi desmontada em comum

acordo com os moradores, que se hospedaram

em alguns hotéis da região. Além de moradia

assegurada, também se criou frentes de

trabalho, com pagamento semanal, em troca

de algumas horas de trabalho diário, sem que

fosse exigido o abandono imediato das drogas,

mas garantindo o acesso a tratamento de

saúde integral e para as necessidades

decorrentes do uso de álcool e outras drogas,

quando desejado. Aderiram todos os moradores

dos barracos que foram totalmente

desmontados e a rua pôde novamente receber

a circulação regular de carros e pedestres.

Embora não fosse exigido a abstinência ou o

tratamento obrigatório, muitas daquelas

pessoas relataram que estavam abstinentes há

vários dias, e estima-se uma redução do

consumo diário da ordem de 70%. Após

receberem o primeiro pagamento, depois de

dias de trabalho, não houve uma corrida às

bocas de venda de drogas, mas muito mais aos

mercados, lojas de roupas e outros pequenos

consumos. Shampoos, doces, sabonetes,

chinelas etc.

Que lições podemos tirar desta

surpreendente ação?

A importância da constituição de um

sujeito coletivo – a Prefeitura inicialmente

dialogou com vários indivíduos dali, para traçar

um perfil daquelas pessoas e de suas

necessidades e reivindicações. Passou então a

fazer reuniões com coletivos, tomando como

interlocutor um sujeito coletivo, apostando que

Foto: João Luiz/ SECOM-PMSP, disponibilizada por fotospublicas.com

Reforma Psiquiátrica e a Questão das Drogas: da Coerção à Coesão

Lições da Cracolândia de São Paulo

De Braços Abertos

9

Roberto Tykanori Kinoshita é

o Coordenador Geral de

Saúde Mental, Álcool e Ou-

tras Drogas, do Ministério da

Saúde. Foto: intervenção da

Casa de Saúde Anchieta,

1989.

condições que reduziram ou até interromperam

o consumo de drogas para muitos dos

participantes.

Seguridade Social como base da Política

de Segurança - A continuidade do projeto

depende da preservação destas características

que permitiram a geração de relações

contratuais com pessoas desempoderadas. A

inserção na vida do trabalho precisa apresentar

alternativas à lógica do mercado de mão de

obra que submete os indivíduos à pressões de

exploração. Requer, antes, formas de

organização produtiva pautadas pelos

preceitos da economia solidária e do

cooperativismo social. A moradia precisa

evoluir para programas de aluguel social, que

relacionam o valor do aluguel a uma

porcentagem da renda concreta e não às

pressões do mercado imobiliário, de modo a

gerar estabilidade e segurança aos locadores.

As abordagens de tratamento psicossocial

precisam se ajustar à ideia de baixa exigência

para viabilizar contratualidade e maior

continuidade. Se a exclusão social e a miséria

não são a causa direta dos problemas das

drogas, a ação da Prefeitura de São Paulo

indica que um modelo de superação daquelas,

que opera sob uma equidade radical, cria as

bases concretas para o cidadão poder superar

o seus problemas com drogas.

contratual por parte da Prefeitura me parece ser a

essência do “De Braços Abertos”. Ou seja, uma

efetiva disposição para produzir o lugar de sujeito-

cidadão individual e coletivo para participar da

sociedade.

Os efeitos da contratualidade – A relação

contratual serviu como um dispositivo que

reintroduziu as pessoas na vivência temporal da

duração, tirando-os do eterno presente. A vida em

extrema pobreza impõe a necessidade de

satisfação imediata de suas carências. Como esta

satisfação é muito custosa e fugaz, mantém presos

no presente, sem futuro, sem projetualidade. A

relação contratual introduziu uma temporalidade

cotidiana, tempo de trabalho, tempo de lazer,

tempo de descanso. Produziu uma situação de

expectativas futuras, e permitiu o exercício do

adiamento das satisfações imediatas por

satisfações a médio e longo prazo, mais

estruturantes.

A seguridade com base para relação entre a

capacidade de poupar e a de projetar – A

garantia de moradia (nos hotéis) permitiu que as

pessoas pudessem fazer projeções sobre o uso do

dinheiro obtido pelo trabalho, de modo a induzir

uma série de planos de compras e consumos,

separando e hierarquizando este uso. Eliminando-

se a insegurança imediata das ruas, sem a

ameaça de despejo, cria-se a possibilidade de

poupar, que reforça a ideia de projeção futura e

adiamento das satisfações.

A suspensão do foco sobre a problemática

das drogas, deslocado para a promoção de

sujeitos contratuais, paradoxalmente criou

Foto: Fábio Arantes/ SECOM-PMSP, disponibilizada por fotospublicas.com

Reforma Psiquiátrica e a Questão das Drogas: da Coerção à Coesão

10

C omo os profissionais que atuam na atenção e no cuidado a usuários de crack e outras

drogas podem fazer a detecção de casos e a melhor condução para diagnóstico e tratamento da

tuberculose entre seu público? E para os profissionais que atuam no campo da tuberculose, qual a

melhor forma de se aproximar dos usuários de crack e outras drogas?

Está em construção, sob os cuidados dos pesquisadores Dartiu Xavier da Silveira, Rossana

Coimbra Brito e Thiago Marques Fidalgo, uma publicação sobre as interfaces entre o uso do crack e a

tuberculose. O documento terá o objetivo de ajudar a instrumentalizar profissionais de saúde e

assistência para o acompanhamento e o cuidado da tuberculose para pessoas que fazem uso de

crack.

No último dia 09 de abril, representantes do Ministério da Saúde, da Organização Panamericana

de Saúde (OPAS) e do Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC) estiveram reunidos

com a equipe de pesquisadores para debater o problema e avançar na construção do documento.

A publicação será uma importante ferramenta para profissionais de saúde e assistência social

que trabalham diretamente com a tuberculose e a atenção ao usuário de crack e outras drogas,

buscando a melhor abordagem para as diversas condições associadas aos dois agravos. Esta primeira

aproximação traz um recorte específico, ao focar no uso do crack, mas será um ganho importante no

cuidado às pessoas que fazem uso de drogas.

O intuito é aproximar cada vez mais os diferentes atores, potencializando e ampliando o olhar

sobre o usuário do SUS.

II Reunião Regional da Rede Pan-americana de Álcool e Saúde Pública

O álcool provoca, em média, 80.000 mortes anuais nas Américas, segundo dados da

Organização Pan-americana de Saúde (OPAS). Com 12,2 óbitos para cada 100 mil mortes anuais

entre 2007 e 2009, o Brasil ocupa um desconfortável quinto lugar entre os países americanos com o

maior índice de mortes ligadas ao uso prejudicial de álcool.

Estratégias para reduzir a mortalidade associada ao álcool estiveram em discussão na II Reunião

Regional da Rede Pan-Americana de Álcool e Saúde Pública (PANNAPH), realizada em Cartagena, na

Colômbia, entre os dias 9 e 11 de abril. O encontro, organizado pela OPAS/OMS em colaboração com

o Ministério da Saúde colombiano, foi uma importante oportunidade para a troca de conhecimentos

e boas práticas entre representantes dos países da região.

Entre os objetivos da Reunião estava a apresentação e discussão dos avanços na

implementação de duas importantes estratégias: o Plano de Ação para Reduzir o Consumo Nocivo de

Álcool, da OPAS, e a Estratégia Mundial para Reduzir o Consumo de Álcool, coordenada pela OMS.

O Plano de Ação regional propõe a utilização da Estratégia Mundial da OMS como um marco

para orientar a redução do uso prejudicial do álcool, promovendo uma abordagem centrada na

saúde pública e nos direitos humanos. O objetivo é reduzir os níveis do consumo de álcool per capita

da população, assim como reduzir os danos relacionados ao álcool.

Os países signatários do Plano, dentre eles o Brasil, comprometem-se com uma série de objetivos,

que incluem ampliar a conscientização e o compromisso político, aumentar a cooperação técnica

entre os países e melhorar os sistemas de monitoramento e vigilância e a difusão de informações para

formulação de políticas e avaliação.

Acesse o documento completo do Plano de Ação regional, em espanhol, em

http://goo.gl/PueCL0

Publicação Crack e Tuberculose

Reforma Psiquiátrica e a Questão das Drogas: da Coerção à Coesão

11

A I Reunião Regional de Usuários de Serviços de Saúde Mental e Familiares reuniu em Brasília, entre

15 e 17 de outubro de 2013, representantes de 18 países das Américas e de vários estados brasileiros.

Realizada em colaboração entre a Organização Pan-Americana de Saúde e o Ministério da Saúde, este

evento histórico teve a participação maciça de associações de usuários dos serviços de saúde mental e

familiares da região, além de autoridades nacionais e da Organização Mundial da Saúde.

O encontro resultou no Consenso de Brasília, documento importante e atual que reflete as lutas e

desejos dos usuários dos serviços de saúde mental e familiares na garantia e respeito aos direitos humanos,

participação efetiva nos processos de formulação, desenvolvimento e avaliação de políticas públicas de

saúde mental e fortalecimento das organizações de usuários e familiares.

As recomendações contidas no Consenso de Brasília contribuem efetivamente para o

desenvolvimento e fortalecimento de ações governamentais, setoriais e intersetoriais, com a perspectiva de

promover a autonomia, de ampliar o acesso ao cuidado de base comunitária e territorial e de lutar contra o

estigma e o preconceito associado às pessoas com transtorno mental.

O documento completo pode ser acessado em: http://goo.gl/W7MTBe

Consenso de Brasília

Moisés Ferreira para o

“ Eu fui um corpo morto e hoje eu não sou mais; não quero ser louco, louco

nunca mais; saí do hospício pra nunca mais voltar.” (Moisés Ferreira)

Entre uma atividade e outra da I Reunião Regional de Usuários de

Serviços de Saúde Mental e Familiares, o admirável Moisés Ferreira (fotos), da

Associação de Parentes e Amigos dos Pacientes do Complexo Juliano Moreira

(APACOJUM), brindou os leitores e as leitoras do Viramundo com uma

inspiradora entrevista. O corpo expressivo, sempre em movimento, as mãos

entrelaçadas, falam tão bem quanto as palavras sobre sua trajetória de

militância e liberdade, a importância da luta pelos direitos dos usuários e a

necessidade de uma integração cada vez maior entre os serviços, os usuários

e os familiares. Fala, Moisés:

“Tem três eixos que podem colocar em discussão: trabalho, moradia e

liberdade social; cuidador, técnico e morador; e médico, família e paciente.

Acho que é hora de fazer um mutirão que ajuda a participação do paciente,

ele que ensina a pessoa a trabalhar com ele, um trabalho de base, que é

com ele, a família e a equipe, para poder recuperar ele.”

“Tem que fazer associação de moradores da comunidade, como

buscar solução e verba para alugar casa com a cuidadora e o morador

juntos. Na casa eles trabalham, entendeu? A cuidadora ensina a fazer uma

comida, a conhecer um banco, a higiene do corpo, a limpeza da casa, a

cuidadora sai pra passear com ele, pra fazer compras sozinho. Isso aí é o

projeto de vida.”

A sugestão quem faz é Moisés: reunir os moradores da residência

terapêutica, a comunidade, as associações e quem mais quiser para assistir o

depoimento de um usuário que ficou internado por 40 anos e hoje não está

mais. Para assistir o vídeo completo, debater, opinar, participar, acesse:

http://goo.gl/dx9R8J

Fonte: gravação

de Thais Soboslai

Protagonismo de usuários e familiares: caminhos da emancipação “Pelo Direito de Produzir e Viver em Cooperação de Maneira Sustentável”*

*II Conferência Nacional de Economia Solidária . Acesse: http://goo.gl/5vMWbK

12

PRONACOOP Social

A garantia do direito ao trabalho das pessoas com sofrimentos decorrentes de transtornos

mentais, inclusive aqueles relacionados ao uso de álcool e drogas, é uma das diretrizes centrais da Política

Nacional de Saúde Mental, Álcool e outras Drogas. O trabalho como direito se alicerça na perspectiva da

inclusão social, da promoção de autonomia, do fortalecimento do poder contratual e do exercício de

direitos de cidadania. É para a efetivação deste direito que, desde 2004, se iniciou a articulação entre o

Ministério da Saúde, através da a Coordenação Geral de Saúde Mental, Álcool e outras Drogas e a

Secretaria de Economia Solidária do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE).

A parceria já rendeu iniciativas importantes, como a realização da Oficina de Experiências de

Trabalho e Renda de Usuários da Saúde Mental, em 2004, da I Conferência Temática de Cooperativismo

Social, em 2010, e da II Oficina de Experiências de Geração de Trabalho e Renda de Usuários da Saúde

Mental, em 2011. Destaca-se, ainda, a participação da Coordenação de Saúde Mental em espaços

importantes como o Comitê Gestor do Programa Nacional de Incubadoras Tecnológicas de Cooperativas

Populares - PRONINC, a IV Conferência Nacional de Saúde Mental Intersetorial, e outros seminários, eventos

e formações neste campo, de âmbitos nacional, estadual e municipal, além da implantação do Grupo de

Trabalho Interministerial Saúde Mental e Economia Solidária de 2005 a 2007.

Com a publicação da Portaria nº 3.088 do Ministério da Saúde, em dezembro de 2011 (republicada

em maio de 2013), o direito ao trabalho dos usuários da Rede de Atenção Psicossocial (RAPS) passa a

compor o componente de reabilitação psicossocial da Rede. As iniciativas de trabalho e cultura e de

inclusão e protagonismo de usuários e familiares têm sido apoiadas anualmente pelo Ministério da Saúde,

por meio de Chamadas Públicas de Seleção de Projetos. A quarta edição da Chamada de Seleção de

Projetos de Reabilitação: trabalho, cultura e inclusão social na RAPS, e a segunda Chamada de Seleção de

Projetos de Protagonismo de Usuários e Familiares da RAPS, ambas em 2013, ofereceram incentivos nos

valores de R$15.000,00, R$30.000,00 e R$50.000,00 a projetos de diversos municípios brasileiros, num total de

R$ 6.440.000,00.

De acordo com o Cadastro de Iniciativas de Inclusão Social pelo Trabalho (CIST) da Coordenação de

Saúde Mental, estão registradas hoje no Brasil mais de 660 iniciativas de inserção no trabalho. A formação

de cooperativas sociais apresenta-se, neste contexto, como um dos principais desafios para a

consolidação do direito ao trabalho de usuários da RAPS, em conformidade com a Lei nº 9867, de 10 de

novembro de 1999, que dispõe sobre a criação e o funcionamento de Cooperativas Sociais, visando à

integração social dos cidadãos.

Em dezembro de 2013 conseguimos um marco importante para o avanço nas políticas públicas de

saúde mental, economia solidária e cooperativismo social com a assinatura pela Presidenta Dilma Rousseff

do Decreto Presidencial nº 8163, de 20 de dezembro de 2013 que instituiu o Programa Nacional de Apoio

ao Associativismo e Cooperativismo Social, o Pronacoop Social.

São princípios do Pronacoop Social, de acordo

com o artigo 3º do referido decreto:

I - respeito à dignidade e independência da pessoa,

inclusive a autonomia individual e coletiva;

II - não discriminação e promoção de igualdade de

oportunidades;

III - participação e inclusão de pessoas em

desvantagem na sociedade e respeito pela diferença

como parte da diversidade humana;

IV - geração de trabalho e renda a partir da

organização do trabalho com foco na autonomia e

autogestão;

Protagonismo de usuários e familiares: caminhos da emancipação “Pelo Direito de Produzir e Viver em Cooperação de Maneira Sustentável”

13

V - articulação e integração de políticas públicas para a

promoção do desenvolvimento local e regional; e

VI - coordenação de ações dos órgãos que desenvolvem

políticas de geração de trabalho e renda para as pessoas

em desvantagem.

No artigo 4º são apresentados os seguintes objetivos do

Pronacoop Social:

I - incentivar a formalização dos empreendimentos

econômicos solidários sociais em cooperativas sociais;

II - promover o fortalecimento institucional das cooperativas

sociais e dos empreendimentos econômicos solidários

sociais, e a qualificação e formação dos cooperados e

associados;

III - promover o acesso ao crédito;

IV - promover o acesso a mercados e à comercialização da

produção das cooperativas sociais e dos empreendimentos

econômicos solidários sociais;

V - incentivar a formação de redes e cadeias produtivas constituídas por cooperativas sociais e

empreendimentos econômicos solidários sociais; e

VI - monitorar e avaliar os resultados e alcances sociais e econômicos das políticas de apoio ao

cooperativismo e ao associativismo social.

O Pronacoop Social prevê a composição de um Comitê Gestor, com a participação do Ministério da

Saúde, atualmente representado pela Coordenação Geral de Saúde Mental, Álcool e outras Drogas do

Departamento de Atenção Especializada e Temática da Secretaria de Atenção a Saúde (CGMAD/DAET/

SAS) como titular, e pelo Departamento de Apoio à Gestão Participativa (DAGEP/SGEP) como suplente. O

Comitê Gestor também contará com seis entidades da sociedade civil, de caráter nacional, que serão

selecionadas por meio de chamamento público através do Edital de Chamada Pública SENAES/MTE nº

001/2014.

Para maisinformações, veja:

BRASIL. Saúde Mental e Economia Solidária: Inclusão Social pelo Trabalho. Brasília: Editora MS, 2005.

Link: http://goo.gl/JCqDde

BRASIL. Relatório Final do Grupo de Trabalho Interministerial Saúde Mental e Economia Solidária, instituído pela

portaria nº 353/2005. Brasília: ATSM, 2006.

Brasil. Ministério do Trabalho e Emprego. Secretaria Nacional de Economia Solidária. (2010). Conferência Temática

de Cooperativismo Social: caderno temático. Brasília: Ministério do Trabalho e Emprego, 2010.

Link: http://goo.gl/F7XxZb

BRASIL. Decreto nº 7.537, de 17 de novembro de 2010 - Instituição do PRONINC.

BRASIL. IV Conferência Nacional de Saúde Mental – Intersetorial: Relatório Final. Brasília: Ministério da Saúde, 2011.

Link: http://goo.gl/f0qkfP

BRASIL. Portaria nº 132, de 26 de janeiro de 2012 - Institui incentivo financeiro de custeio para desenvolvimento do

componente Reabilitação Psicossocial da Rede de Atenção Psicossocial do Sistema Único de Saúde (SUS).

PRONACOOP Social

Protagonismo de usuários e familiares: caminhos da emancipação “Pelo Direito de Produzir e Viver em Cooperação de Maneira Sustentável”

Link para acessar o Caderno: http://goo.gl/kVx9um

14

E m janeiro deste ano, a Coordenação Geral de Saúde Mental, Álcool e Outras Drogas realizou

a videoconferência sobre Leitos de Saúde Mental em Hospital Geral, destinada aos coordenadores de

saúde mental, de hospitais gerais com leitos de saúde mental e demais interessados.

O Componente de Atenção Hospitalar da RAPS tem como principal objetivo oferecer cuidado

hospitalar integral em hospital geral para pessoas com sofrimento mental, inclusive aquelas com

necessidades decorrentes do uso de álcool e outras drogas.

As internações em hospital geral devem ser de curta ou curtíssima permanência, seguir a lógica de

redução de danos e da resolutividade. Sua regulação deve ser feita preferencialmente pelo CAPS de

referência, a partir de critérios clínicos e observando o Projeto Terapêutico Singular de cada usuário. Os

leitos de saúde mental em hospital geral podem estar localizados em enfermarias de clínica médica,

pediatria ou obstetrícia ou configurados em enfermarias de saúde mental. Estas, no entanto, não devem

estar isoladas das outras enfermarias, evitando a segregação e discriminação do usuário.

A implementação de leitos de saúde mental em hospital geral deve se dar articulada aos outros

pontos de atenção da RAPS e visa à garantia de continuidade e integralidade do cuidado, de forma a

superar o estigma e o preconceito e promover o acesso aos demais serviços de saúde.

Assista à videoconferência sobre Leitos de Saúde Mental em Hospital Geral através

do canal da Coordenação Geral de Saúde Mental, Álcool e outras Drogas no Youtube:

http://goo.gl/dx9R8J

Videoconferência sobre Leitos de Saúde Mental em Hospital Geral

CONSTRUINDO CAPS E UAs

Em 2013 foi lançada uma versão preliminar do Manual de

estrutura física dos Centros de Atenção Psicossocial e Unidades de

Acolhimento: orientações para elaboração de projetos de construção,

reforma e ampliação de CAPS e de UA como lugares da atenção

psicossocial nos territórios. A publicação é destinada a gestores e

equipes de CAPS e UAs com o objetivo de fornecer subsídios para a

construção, reforma e ampliação destes dispositivos psicossociais,

considerando a Portaria 615 de 15 de abril de 2013. Os projetos

arquitetônicos e de ambiência consideram a qualificação do cuidado

através de espaços acolhedores, que promovam as trocas sociais e a

atenção humanizada, em consonância com as diretrizes da RAPS.

Para maiores informações, acesse:

Manual de estrutura física no link http://goo.gl/KNrrXy

Nota Técnica com esclarecimentos e orientações sobre

Unidades de Acolhimento no link http://goo.gl/Ugqoeu

Urgência das pessoas, Crise das instituições

15

Unidades de Acolhimento

O início da década de 2010 provocou todos/

as os/as trabalhadores/as, usuários/as e familiares a

exigir a qualificação das estratégias de atenção

psicossocial, a começar pela mobilização dos

recursos das redes de atenção à saúde que resultou

não apenas na criação e aprimoramento de serviços

existentes, mas na ampliação e qualidade de

diversos elementos que sustentam um conjunto de

ações e serviços a compor a então recém-nascida

Rede de Atenção Psicossocial (RAPS) - Portaria GM/

MS n. 3.088/2011.

A Unidade de Acolhimento, nas modalidades

adulto (UAA) e infantojuvenil (UAI), está presente no

componente “Atenção Residencial de Caráter

Transitório” da RAPS. Esse dispositivo de cuidado se dá

justamente nas lacunas, nos intervalos e nos

parênteses da vida cotidiana: a vida que pede

proteção, hospitalidade e convivência quando essas

características estão ausentes ou fragilizadas – há

muito ou pouco tempo – em outros ambientes de

natureza residencial; ou, em mais delicada situação,

quando não se está, permanentemente, em

ambiente residencial algum, tal como ocorre com

significativa parcela da população em situação de

rua.

Mas para construir um ambiente acolhedor, com

características de uma casa, que promova a

participação nas trocas sociais e a constituição de

redes ampliadas, existem componentes

fundamentais para a produção de vida e saúde

junto às UAs, como a proximidade de recursos

comunitários essenciais; acessibilidade e mobilidade

perante recursos comunitários preferidos pelo/a

usuário/a; espaços de convívio com outros/as

usuários/as, bem como com visitantes; ambiência

agradável para a passagem e permanência

cotidianas; entrada aberta, acessível e facilitada;

edificação passível de reinvenções arquitetônicas e

decorativas de acordo com o gosto dos/as que nela

residem e trabalham; acomodações adequadas

para refeições e outros afazeres típicos do dia-a-dia

residencial; espaços adaptados para as pessoas com

deficiência e, quando necessário, espaços de brincar

(Manual de Estrutura Física dos CAPS e UAs, 2013).

Oikos*: habitar a construir *Do grego morada, universo habitado

“As nossas casas constituem inegavelmente uma boa oportunidade para exercitar o poder (e o prazer) do habitar, mas não é sempre assim, já que mesmo nas nossas casas podemos experimentar uma perda de poder contratual, material e simbólico, podemos experimentar um aprisionamento no habitar ou mesmo uma expulsão do habitar. O manicômio (como o cárcere) é o lugar por excelência onde é negado o habitar e afirmado o estar.”

“Habitat é o processo de transformação de espaço em lugar, de instituição residencial em habitat o que deve dar sentido à pratica reabilitativa”

Em: Benedetto Saraceno - “Libertando Identidades: da reabilitação psicossocial à cidadania possível” - Te Corá Editora/IFB Livros

Ao mesmo tempo é preciso destacar que, se

de um lado a UA não é o locus de cumprimento

das ações terapêuticas – papel institucional dos

CAPS e outros pontos de atenção - de outro

compõe, inevitavelmente, a rede de produção de

cuidados. É primordial considerá-la como um

recurso do Projeto Terapêutico Singular, de acordo

com as necessidades dos usuários em seus

contextos sociorelacionais, em particular, o

“habitar” como um dos eixos centrais nos processos

de reabilitação psicossocial.

Dessa forma, não estão nos preceitos deste

ponto de atenção os espaços para o

desenvolvimento de atividades terapêuticas, sala

de enfermagem e sala de atividades individuais e

de grupo.

Em últimas palavras, é importante destacar

que a promoção do “habitar” compõe não

apenas o direito à saúde, mas o direito à cidade. A

UA é um espaço que contribui para o acesso a

todos os serviços públicos possíveis (mediados pelo

CAPS, principal referência) bem como aos demais

bens sociais. Ela expressa, genuinamente, a

estratégia de garantia do “direito a ter direitos”,

pois realiza mediações entre o sujeito, o espaço e o

tempo na conformação e reinvenção de modos

de produção de afeto, território e história.

Para saber mais sobre as Unidades de

Acolhimento, assista à videoconferência realizada

em 2013 através de nosso canal no Youtube:

http://goo.gl/dx9R8J

16

O processo de desinstitucionalização, como dizia Franco Rotelli, “é um trabalho prático de

transformação que, a começar pelo manicômio, desmonta a solução institucional existente para

desmontar o problema”. Nesta perspectiva, seguimos com firmeza no propósito de ampliação da RAPS

e da construção de ações e programas que contemplem o problema em toda sua complexidade,

visando ao desmonte da lógica manicomial.

A Lei 10.708 de 2003 inaugura o Programa De Volta Para Casa (PVC) que garante o auxílio-

reabilitação psicossocial para a atenção e o acompanhamento de pessoas em sofrimento mental

egressas de internação em hospitais psiquiátricos, inclusive em hospitais de custódia e tratamento

psiquiátrico, cuja duração tenha sido por um período igual ou superior a dois anos.

O PVC visa à restituição do direito de morar e conviver em liberdade nos territórios e também a

promoção de autonomia e protagonismo do/a usuário/a. Dessa forma, assume papel central nos

processos de desinstitucionalização e reabilitação psicossocial das pessoas com história de internação

de longa permanência, conforme indicado pela Lei 10.216 de 2001.

No entanto, cabe destacar que, de acordo com o relatório de 2011 do Departamento Nacional

de Auditoria do SUS (DENASUS), 37,5% das pessoas internadas nos hospitais psiquiátricos apresentavam

internações acima de um ano, o que constitui um desafio da Política Nacional de Saúde Mental, Álcool

e Outras Drogas para a desinstitucionalização desta população.

O Conselho Nacional de Justiça apresentou em julho de 2013, em Sorocaba, o projeto “Resgate

da Cidadania das pessoas internadas em hospitais psiquiátricos”, que visa garantir o acesso aos

documentos e benefícios sociais e previdenciários, contribuindo para os processos de

desinstitucionalização. Por fim, é importante ressaltar que, em 2013, o Ministério da Saúde reajustou o

valor do benefício do PVC para R$ 412,00, um aumento de quase 30%!

Temos hoje 4.292 pessoas advindas de longas internações em Hospitais Psiquiátricos ou em

Hospitais de Custódia e Tratamento Psiquiátrico recebendo o benefício do PVC, vivendo com seus

familiares ou nos serviços residenciais terapêuticos e acompanhadas pelos CAPS e/ou Unidades Básicas

de Saúde do SUS. Estas pessoas fazem as coisas simples e complexas do dia a dia, realizam desejos,

cuidam de si, fazem compras, passeiam, retomam os estudos, resgatam laços familiares ou encontram

novas amizades, sonham e projetam o futuro, entram e saem de casa com liberdade - plurais e

singulares projetos de vida,

cidadãos presentes nas

cidades e que têm múltiplas

histórias para contar.

10 anos do Programa “De Volta para Casa”:

4292 histórias para contar

Desinstitucionalização: Direito à Cidade e à Liberdade

Acesse o passo a passo para

o cadastramento de

beneficiários do PVC no link:

http://goo.gl/v9Pb0w

Mais informações:

http://pvc.datasus.gov.br/

Pôster Comemorativo dos dez anos do PVC, 2013.

17

E m dezembro do ano passado, aconteceu em Curitiba/PR o I Encontro Nacional das Redes de

Atenção Psicossocial do SUS. Este evento foi realizado pelo Ministério da Saúde e pela Organização Pan-

Americana de Saúde e teve a colaboração da Secretaria Municipal de Saúde de Curitiba e o apoio da

Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, da Prefeitura de Curitiba e da Secretaria de

Saúde do Paraná.

A ideia inicial foi justamente essa: um Encontro, vários encontros; criar uma oportunidade para

compartilhar as mais diversas experiências, discutir temas cotidianos e caros a todos/as nós e elaborar

proposições coletivamente... celebrar o cuidado em liberdade! Um espaço que se fazia necessário após

3 anos desde a última grande reunião, na IV Conferência Nacional de Saúde Mental – Intersetorial.

Na etapa de organização do Encontro, aproveitamos o formulário de Pré-Inscrições para consultar

quais os temas mais presentes e urgentes no dia a dia da RAPS. As principais indicações foram: os novos

dispositivos de saúde; a ampliação do acesso; a garantia da qualidade do cuidado; a questão do

álcool e das outras drogas; o debate das internações compulsórias; os processos de

desinstitucionalização; a intersetorialidade; a saúde mental na infância e na adolescência; a interface

com a atenção básica; o protagonismo de usuários e familiares e a afirmação e construção de direitos.

O Encontro das Redes foi tecido em Conferências, Mesas-Redondas, Ágoras, Apresentações de

Pôsteres e Rodas de Conversa, Cursos e Programações Culturais (música, escolas de samba, teatro). E se

inicialmente a ideia de Ágora causou estranhamento, cada vez produzia mais sentido: com influência de

experiências do Mental Tchê, as ágoras, na história grega, remontam às praças, espaços de expressão

cultural e discussões políticas, constituintes fundamentais do espaço urbano na pólis e do exercício da

cidadania. Daí nossa inspiração.

Foram três dias de intensos debates, muitos encontros, muitas conversas. O nosso intuito de fato era

de que se criasse um momento entre a rede, para que a rede possa se reconhecer como única, que

possa se fortalecer sabendo que existe por todo o país parceiros que estão no mesmo barco e na

mesma luta...

Participaram deste grande Encontro aproximadamente 3 mil pessoas, vindas do Caburaí ao Chuí,

entre representantes de todos os Estados (!), das três esferas de governo, usuários/as, familiares,

trabalhadores/as, representantes de associações e dos movimentos sociais, pesquisadores, docentes e

estudantes.

Assim, o primeiro Encontro Nacional da RAPS expressou nossa certeza sobre o percurso político da

Reforma Psiquiátrica, bem como o desafio de consolidar práticas emancipatórias a partir da garantia do

direito à saúde mental. Em suma, é a certeza de que o Encontro demarcou não mais um ponto de

chegada, mas um novo ponto de partida, sinalizado pelas tantas trocas resultantes da convivência entre

todos nós ao longo de todos os dias.

Redes de Encontros

Em breve lançaremos uma Edição Especial do Viramundo exclusivamente sobre este encontro histórico!

18

No Brasil, a história do controle do Estado sobre crianças e jovens foi marcada pela construção de

um modelo centrado na institucionalização, que levou à expansão de diversas instituições fechadas de

caráter filantrópico e à privação da liberdade dessa população. Neste campo, temos como marco legal

as seguintes legislações: Código Mello Mattos de 1927 e Código de Menores de 1979. O código Mello

Mattos tinha por finalidade o “saneamento social”, ao “juiz de menores” cabia intervir na vida da

população infantojuvenil. Nesse período (1927-1979) surgiu o termo “menino de rua”, através dos meios de

comunicação de massa, que associavam a infância e a juventude à periculosidade. Em 1979, entrou em

vigor o Código de Menores, que era caracterizado pelo entendimento de que havia situações de risco na

realidade infantojuvenil, e que isso precisava ser controlado com internações em massa.

Na década de 80, a Constituição Federal (1988) marcou uma mudança significativa, consagrando

valores baseados no respeito à dignidade e aos direitos fundamentais da pessoa humana, entendendo

crianças e adolescentes como sujeitos de direitos. Em seguida, o Estatuto da Criança e do Adolescente

(ECA) de 1990, calcado na doutrina da proteção integral, abandonou a visão dos antigos códigos

fundados no assistencialismo, deslocando as ações para a proteção integral de crianças e adolescentes,

desencadeando no país, em diversas instâncias, debates cada vez mais aprofundados sobre a

necessidade de se criar políticas públicas diferenciadas para crianças e adolescentes. Pautou também a

garantia de “preferência na formulação e na execução das políticas sociais públicas”, além de

“destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas com a proteção à infância e à

juventude”.

A nova doutrina da proteção integral vem superar a ideia do assistencialismo do Estado voltado

para o controle e asilamento de crianças e adolescentes e entre outros parâmetros importantes, prevê

que a privação de liberdade seja tomada sob critérios de excepcionalidade, com mínimo período de

duração. Esses princípios fundamentais, no Brasil, estarão presentes na Constituição Federal de 1988 – que

afirma a condição cidadã de crianças e adolescentes, com ampla garantia de direitos; e também na Lei

12.594 de 2012 - Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (Sinase), que estabelece parâmetros e

diretrizes para a execução das medidas socioeducativas. O Sinase busca parâmetros mais justos que

evitem ou limitem a discricionariedade e reafirma o caráter pedagógico da medida socioeducativa.

Além disso, ratifica o ECA ao priorizar as medidas em meio aberto (Prestação de Serviço à Comunidade -

PSC e Liberdade Assistida - LA) em detrimento daquelas restritivas de liberdade (Semiliberdade e

Internação), pois considera que estas devem ser aplicadas em caráter de excepcionalidade e

brevidade.

É importante destacar que essas premissas buscam reverter uma tendência crescente de

internação de adolescentes, que tem sido avaliada como tendo uma “eficácia invertida”, pois o maior

rigor das medidas não tem levado à maior inclusão social dos egressos do sistema socioeducativo.

Em 2005, com a publicação “Caminhos para uma política de saúde mental infanto-juvenil“ do

Ministério da Saúde, é

apresentado um conjunto de

contribuições de distintas

áreas para uma abordagem

pública deste tema.

Destacamos alguns de seus

princípios e diretrizes a seguir:

Política Nacional de Saúde Mental Infantojuvenil

Saúde Mental Infantojuvenil

Encontro realizado em maio de 2013: “Atenção Psicossocial para crianças e adolescentes

no SUS: tecendo redes para garantir direitos”

19

• Criança e adolescente como sujeito de direitos: implica a noção de singularidade, impedindo

que o cuidado se exerça de forma homogênea, massiva e indiferenciada. É incluir, no centro das

discussões e construções de uma política, a criança ou o adolescente como sujeito, com suas

peculiaridades e responsabilidades.

• Acolhimento universal: as portas de todos os serviços públicos de saúde

mental, especialmente serviços voltados para a infância e adolescência, devem

estar abertas a toda e qualquer demanda dirigida ao serviço de saúde do

território.

• Construção permanente da rede: o serviço inclui no corpo de suas

competências o trabalho com os demais equipamentos e dispositivos do território,

permanentemente construindo a rede. Tal concepção de rede articula a ação

do cuidado para fora e para além dos limites da instituição e implica a noção de

território.

• Território: espaço onde acontecem as relações, vivências e circulação do sujeito. É construído

por instâncias pessoais e institucionais, incluindo a casa, a escola, a igreja, o clube, a lanchonete, o

cinema, a praça, a casa dos colegas, a unidade de saúde e todas as outras, incluindo-se centralmente o

próprio sujeito na construção do território. O território é o lugar psicossocial do sujeito.

• Intersetorialidade na ação do cuidado: o conjunto das ações no campo da saúde mental

infantojuvenil deve incluir intervenções junto a todos os equipamentos que de alguma forma estejam

envolvidos na vida das crianças e adolescentes que acompanham.

Além disso, com a constituição do Fórum Nacional sobre Saúde Mental Infantojuvenil, através da

Portaria 1608/2004, estabeleceu-se um espaço intersetorial de caráter representativo e deliberativo que

objetiva o fortalecimento da Política de Saúde Mental Infantojuvenil.

Dentre as realizações que reafirmam e consolidam as diretrizes dessa política, podemos apontar:

- Diminuição do parâmetro populacional do CAPSi através da republicação da Portaria 3.088 de

23 de dezembro de 2011, republicada em 21 de maio de 2013;

- I Congresso Brasileiro de CAPSi - CONCAPSi realizado em abril de 2013 em conjunto pela

Universidade Federal do Rio de Janeiro e a Universidade Estadual do Rio de Janeiro, com apoio do

Ministério da Saúde;

- Fórum Nacional de Saúde Mental Infantojuvenil, realizado em Brasília em 2012, e Fóruns Regionais

em 2013, que ocorreram nas regiões Sul (Curitiba/PR), Centro-Oeste (Campo Grande/MS) e Norte (Belém/

PA);

- Encontro “Atenção Psicossocial para crianças e adolescentes no SUS: tecendo redes para garantir

direitos”, realizado pelo Ministério da Saúde e Conselho Nacional do Ministério Público, em maio de 2013.

O documento produzido será lançado ainda neste ano;

- Produção da “Linha de Cuidado para a atenção às pessoas com transtorno do espectro do

autismo e suas famílias na RAPS do SUS”, construído por grupo de trabalho diversificado do Ministério da

Saúde e representantes de Universidades, sociedade civil, gestores e profissionais de RAPS entre outras.

Acesse o documento preliminar em http://goo.gl/Qxdjle

- Comitê Nacional de Assessoramento para Qualificação da Atenção à Saúde das Pessoas com

Transtornos do Espectro do Autismo no âmbito do Ministério da Saúde, instituído em maio de 2013;

- Chamamentos públicos nº12/2012 e nº 04/2014 do Edital Viva Jovem da Secretaria Nacional de

Políticas sobre Drogas do Ministério da Justiça, que têm como estratégias a promoção da saúde e a

redução de danos, construção de espaços de vida, e enfrentamento à violência letal.

Apesar dos avanços, a implementação da Política Nacional de Saúde Mental Infantojuvenil

apresenta diferentes desafios. A ampliação de espaços de discussão e organização de diferentes setores

da sociedade possibilita a construção de novas formas de cuidar dessa população.

Saúde Mental Infantojuvenil

Acesse: http://goo.gl/fZjaNM

20

Iniciativas de prevenção às drogas entre jovens e famílias:

possíveis inovações

Saúde Mental Infantojuvenil

estão prioritariamente voltadas para crianças

(no caso do Good Behavior Games), para

adolescentes (no caso do Unplugged) e para

adolescentes e seus pais/responsáveis (no caso

do Strengthening Families Program).

No Brasil, as três estratégias de prevenção

citadas vêm passando por um intenso processo

de adaptação cultural de seus formatos,

conteúdos e atividades para que sejam

adequadas aos diferentes contextos que

constituem a realidade do país. Desde 2013, em

parceria com secretarias das áreas da Saúde,

Educação e Assistência Social de municípios e

estados das regiões Sul, Sudeste e Nordeste, as

metodologias estão sendo implementadas por

meio de atividades organicamente intersetoriais,

com o objetivo de fortalecer as diferentes redes

de proteção nas quais estão implicados

diretamente os participantes prioritários: os/as

jovens e suas famílias. Além disso, para que se

mantenham os resultados dos programas

preventivos, vêm sendo conduzidos estudos de

monitoramento de processo de implementação

de cada uma das estratégias, bem como se

está promovendo estudo randomizado

controlado das versões brasileiras dos

programas para avaliação de sua efetividade

no Brasil. As cidades que estão participando

atualmente dos programas são Tubarão (SC),

Florianópolis (SC), Curitiba (PR), São Paulo (SP),

São Bernardo do Campo (SP), Brasília (DF), João

Pessoa (PB) e Fortaleza (CE).

O campo da prevenção ao uso e

abuso de álcool e outras drogas vem se

inserindo na discussão sobre as políticas de

saúde mental de modo particular. Há iniciativas

que adotam estratégias preventivas visando

menos à transferência de informações sobre os

danos causados pelas drogas e mais à

promoção de habilidades de vida e

potencialização dos fatores de proteção que

eventualmente levam os sujeitos ao uso, abuso

e dependência de substâncias. Desse modo, a

prevenção ao álcool, tabaco, crack e outras

drogas traduz-se, na prática, em ações que

qualificam os vínculos entre os sujeitos e entre os

sujeitos e as instituições às quais estão

vinculados em um movimento de inclusão social

e de exercício de cidadania. Aposta-se

precisamente na ativação de mecanismos de

inclusão (por exemplo, através do

fortalecimento da rede de proteção) para

evitar uma série de exclusões sociais,

econômicas e culturais que acabam por

conduzir os indivíduos ao uso e abuso de

sustâncias (ver “Perfil dos usuários de crack e/ou

similares no Brasil” – Brasil, 2013).

A Coordenação Geral de Saúde Mental,

Álcool e Outras Drogas, em parceria com o

Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e

Crime (UNODC), vem implementando no Brasil

três estratégias de prevenção no campo do

álcool e outras drogas com resultados exitosos

no que tange à promoção de habilidades de

vida e potencialização de fatores de

prevenção: Good Behavior Game (GBG),

Unplugged e Strengthening Families Program

(SFP). Essas são estratégias que já foram

monitoradas e avaliadas por décadas em

países da Europa e América do Norte, cujos

resultados são aferidos por meio de estudos

sistemáticos de eficácia e efetividade e que

apontam para impactos relevantes para a

redução do consumo de drogas. Tais estratégias

21

Saúde Mental Infantojuvenil

autonomia dos/as educandos/as, sendo esta

pressuposto para a construção de coletivos

democráticos. Trata-se de uma proposta lúdica

realizada concomitantemente a qualquer

atividade escolar que não necessite da

intervenção direta do/a educador/a. Os jogos

são realizados em sala de aula, coordenados

pelos/as professores/as, e duram cerca de 10-30

minutos. Podem ser jogados ao longo de um ano

letivo.

Já o Fortalecendo Famílias, versão brasileiro

do Strengthening Families Program, é uma

estratégia de acompanhamento familiar que

acontece por meio de encontros semanais

dirigidos com duas horas de duração, nos quais

as famílias são convidadas a refletir sobre seus

valores, dinâmicas e metas. Na primeira hora é

formado o grupo de pais/responsáveis e o grupo

de adolescentes separadamente. Na segunda

hora, ambos os grupos se reúnem. Há sessões

gravadas e apresentadas em DVD, com tempo

cronometrado para discussão, que disparam

debates e realização de atividades de ambos os

grupos. As famílias participantes devem ser

representadas por 2 adultos (pais/responsáveis) e

pelo menos uma criança/adolescente entre 10 e

14 anos. Ao todo, o programa prevê um encontro

por semana ao longo de sete semanas – isto é,

são sete encontros de duas horas de duração nos

quais pais/responsáveis e filos/as participam de

atividades, debates, jogos e lanches

comunitários. O oitavo encontro é uma grande

confraternização entre os/as participantes.

O #tamojunto, versão brasileira do

Unplugged, é um programa de prevenção ao uso

de drogas realizado em escolas, voltado para

adolescentes entre 10 e 14 anos de idade. Tem

como objetivo instrumentalizar adolescentes com

habilidades e recursos específicos para que

possam lidar com influências sociais adquirindo

conhecimento sobre drogas e suas consequências

para a saúde. O programa #tamojunto propõe

doze aulas conduzidas por professores que tenham

educandos entre os dez e os quatorze anos, entre

a sexta e a oitava séries do Ensino Fundamental.

Nessas doze aulas, há uma série de jogos,

brincadeiras, debates, questionários e informações

que visam à redução do consumo regular ou

abusivo de álcool e outras drogas, à prevenção

da transição do uso esporádico para o uso

frequente de drogas pelos jovens. Sua linha teórica

baseia-se no modelo de influência social global,

sustentanda pelo tripé: a) promoção de

habilidades de vida, b) informações sobre drogas

e c) pensamento crítico frente às crenças

normativas dos educandos que participam das

aulas.

O Jogo Elos - construindo coletivos, versão

brasileira do Good Behavior Games, é um

programa voltado para crianças entre seis e dez

anos que cursam o 1º, 2º e 3º anos do Ensino

Fundamental. O Elos se traduz em uma estratégia

de mediação das relações sociais em sala de

aula, que contribui para a produção de uma

interação harmônica e cooperativa entre os/as

educandos/as e com o/a educador/a. Esta

mediação está delimitada por alguns elementos

básicos e necessários para o desenvolvimento da

Os Programas

22

D e vez em vez costuma-se diminuir as

distâncias entre o Norte do país e as manchas

cinza do adensamento urbano. Com a presença

da tecnologia em nosso cotidiano não é difícil se

ver as fotos de satélites e notícias pluviométricas

da região amazônica. No entanto, pouco se tem

na boca do povo e em seu imaginário a maneira

como se vive em partes do país que não

compõem os grandes eixos metropolitanos.

Ou seja: suas agruras, suas belezas, seus

conflitos, as soluções possíveis e boa parte das

expressões e interpretações oriundas do contato

com a realidade desse Brasil não trafegam tanto

quanto deveriam e ficam reduzidas a uma

dimensão regional mesmo que tenham tamanho

e densidade de continente.

O reconhecimento da diversidade e da

adversidade abundantes no Brasil profundo foi já

tema de figuras importantes que trouxeram

grandes contribuições para o reconhecimento

do Brasil pelos brasileiros e mesmo sem a

visibilidade necessária ecoam ainda nos nossos

dias.

No primeiro quartel do século XX Mário de

Andrade esteve pelas bandas do Norte e muito

se manifestou acerca do impacto da vida social

em Belém. Caminhou por diversas regiões da

face ocidental e meridional. Dessa viagem

surgiram livros como “Macunaíma” (1928) e “O

turista aprendiz”(1943), além de fotografias,

recolhimento de canções do nosso folclore e do

nosso artesanato. Mário foi decisivo na

integração cultural brasileira.

Da mesma forma que Mário de Andrade nos

trouxe a possibilidade de contato com um

conjunto de elementos fundamentais da “riqueza

humana”, outros tantos assim o fizeram em

diferentes assuntos. Aziz Ab’saber e Paulo

Vanzolini são dois grandes exemplos do contato

orgânico com a realidade do plano amazônico,

sua dinâmica social e seus desafios. Traduziram

em suas interpretações sobre o Brasil elementos

essenciais da vida humana no contexto

amazônico e ultrapassaram seus campos de

estudo (a Geografia e a Zoologia,

respectivamente).

É preciso salientar em nossa conversa sobre

a região amazônica que se trata de uma região

que ficou por anos distante do profundo debate

sobre a política social. Isso por uma razão

aparentemente simples: a Política Social na

perspectiva dos direitos sociais é decorrência da

sedimentação e do tensionamento das lutas dos

trabalhadores e tem sua maior expressão,

especialmente no que se refere a sua gênese, em

grandes centros urbanos com características de

trabalho fabril. Não se trata aqui de minimizar as

conquistas e as lutas do povo do norte. Grandes

expressões da vida política e social se

desenvolveram na região (podemos tomar o

exemplo da Cabanagem, as mobilizações nas

docas e mais recentemente a luta pela terra).

Brincando com Tolstoi podemos dizer que

temos políticas sociais de caráter universal em

implantação e que a política social que conhece

os pormenores de sua aldeia é a que pode

mesmo ser universal.

Política social e política econômica são duas

faces da mesma moeda. Formam uma trama

complexa marcada por um conjunto de

determinações que, atravessadas pela dimensão

cultural, tomam formas variadas de

sedimentação das práticas e inserções do Estado

contemporâneo na vida das pessoas.

Os bons ventos de Marajó

Debates Regionais

Mario de Andrade diante da Samaúma em Porto Velho,

1927. Acervo IEB-USP.

23

Sabemos que a política social como é

entendida hoje tem suas raízes nas lutas

históricas dos trabalhadores nos contextos

específicos da relação capital-trabalho. Não à

toa, são desenvolvidas historicamente com

maior densidade no seio das cidades, local

privilegiado da acumulação capitalista. A

política de saúde mental, como expressão

particular da política social de modo geral,

ligada nas últimas décadas à ampliação dos

direitos de cidadania, reproduz a ação do

Estado em locais de significativa concentração

da presença humana. Para termos uma

imagem, um município da região metropolitana

de São Paulo como Carapicuíba chega a ter

uma densidade demográfica de até 10 mil

habitantes/km², enquanto no Marajó

encontramos densidades que chegam a 0,5

pessoa/km².

Como aprimorar o sentido da política

dialogando com diversidades tão expressivas?

Estamos conversando aqui sobre o

desenvolvimento assimétrico e ao mesmo

tempo articulado de ações

imprescindivelmente marcadas pela noção de

liberdade diante do histórico saber institucional.

O desenvolvimento da Reforma Psiquiátrica

Brasileira se associa à necessidade de

aprofundar as compreensões regionais,

favorecer a existência de arranjos locais que,

respeitando as particularidades loco-regionais,

diminuam os vazios assistenciais e ofereçam

respostas para os desafios no campo da saúde.

Notadamente, temos o acesso aos serviços

(que materializa de maneira mais imediata o

direito à saúde) como grande desafio. Junto a

isso, temos a imperiosa necessidade de fixação

de profissionais.

A garantia da descentralização da gestão

e do cuidado parece estar associada à

necessidade de qualificação da gestão,

especificamente na possibilidade de

planejamento, elaboração e execução das

políticas.

Hoje temos nas capitais da região norte

concentração significativa de CAPS, sendo que

uma parcela dos serviços no interior ainda é de

gestão estadual. O processo de

descentralização garante que o gestor tenha

maior autonomia sobre suas propostas,

fortalecendo a noção de política municipal.

Para avançarmos nessa conversa precisamos

passar pelos seguintes pontos:

Ampliação, articulação e qualificação da

rede;

Formação de profissionais apropriados do

processo de desenvolvimento do SUS ;

Capacidade de fortalecer estratégias e

oferecer respostas para atenção à crise;

Só avançamos nessa conversa se

soubermos dialogar com as realidades locais.

Registro de catraieiro feito por Mário de Andrade, ao fun-

do, Santarém. Acervo IEB-USP.

Mário de Andrade, 1927. Acervo IEB-USP.

Debates Regionais

24

Temos algumas notícias sobre o diálogo:

conseguimos em 2013 experienciar o Encontro

da RAPS que reuniu cerca de 3 mil pessoas de

todas as regiões do país e abordou diferentes

questões que aparecem na vida social das

cidades de forma distinta.

Ademais, a grande novidade é o contato

com os ventos do Marajó. Em novembro do ano

que passou foi redigida a “Carta do Marajó”*

pelos gestores das cidades do arquipélago, que

apresenta suas questões diante do território e

trazem de forma propositiva suas manifestações

sobre as condições necessárias para ampliação

doa cesso e qualificação da rede de saúde na

região. Tivemos contato com estes gestores em

reunião na II EXPOGEP (Mostra Nacional de

Experiências em Gestão Estratégica e

Participativa no SUS). Entre as questões

apresentadas, uma que nos parece central é a

ideia de um fator de financiamento

diferenciado.

Dialogar com a realidade regional na

perspectiva da integração das políticas e redes é

um grande desafio para campo da articulação

federativa no Brasil. Para além dos ventos do

Marajó, que nos apontam uma série de aspectos

que estão indiscutivelmente relacionados ao

desenvolvimento do SUS, é preciso que

consigamos fazer uma leitura da realidade local

que considere a existência do impacto das

ações ligadas ao desenvolvimento econômico

na vida das pessoas. Há na região amazônica o

enorme impacto social e ambiental de obras de

infraestrutura como as Usinas Hidrlétricas (UHE), os

complexos minero-siderurgicos, a construção de

portos e estradas. Essa situação nos coloca o

desafio de rever o passado da intervenção do

Estado na Região e apontar para o caminho do

diálogo, que só pode existir diante da

consideração e do conhecimento das

realidades locais.

Para isso temos de considerar a existência

de diferentes custos nas regiões do Brasil, assim

como a dívida histórica com as limitações de

acesso e a coexistência entre a grande

diversidade e riqueza cultural, histórica e política,

com indicadores sociais alarmantes.

Dalcídio Jurandir (1909-1979), grande homem

das letras do Pará, infelizmente tem poucas

edições recentes, a maioria esgotadas. Traz em

suas obras as contradições da vida nas ilhas do

Marajó e nos convida à reflexão ao ser uma farta

referência para o debate do regionalismo na

literatura brasileira. Trata-se de uma das riquezas

do Brasil, escondida, distante; ao mesmo tempo

presente e próximo, absolutamente

contemporâneo ao nosso tempo:

“Ia o mundo sempre para trás? Por que não se

reconstruía o que havia desabado? Por que não

mandavam instalar novamente luz elétrica na

vila? Por que seu pai não mais podia ver em

Belém as companhias teatrais? (...) Os velhos se

lastimavam pelo que acabou. Os novos pelo que

não vinha. Repentinamente, se lembrou de uma

observação feita sobre os catálogos do pai. Neles

vira fábricas, nos Estados Unidos, Inglaterra,

França e Alemanha. Que aconteceria lá para

que as fábricas crescessem? Lá pobre, gasto,

difícil, seria só o passado? Como explicar?

(Dalcídio Jurandir, Três casas e um Rio,1958)

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Pedro Henrique Marinho Carneiro, psicólogo,

integrante da Coordenação de Saúde

Mental, toca violão de cabeça pra baixo e

tem grande simpatia pelo time do Remo.

Debates Regionais

25

E m março de 2014 foi lançado, na IV Mostra

Nacional de Experiências em Atenção Básica/Saúde

da Família, o “Guia de Saúde Mental – Atendimento e

Intervenção com Usuário de Álcool e outras

Drogas”, de autoria de Antonio Lancetti, Marco Aurélio

S. Jorge, Sergio Alarcon, Marise L. Ramos e Pedro

Papini. Esta publicação, elaborada para o Projeto

Caminhos do Cuidado, procura reunir de modo claro e

simplificado várias orientações sobre intervenções de

âmbito territorial no campo de Álcool e outras Drogas.

Como o tema é complexo e não pode ser dissociado

dos aspectos que compreendem a atenção

psicossocial, o “Guia” aborda o tema Álcool e outras

Drogas de modo amplo, tratando os elementos do

cuidado em saúde mental que não estão circunscritos

a especialistas.

O Projeto Caminhos do Cuidado é uma iniciativa

do Ministério da Saúde que, juntamente com a Fiocruz

(RJ), o Grupo Hospitalar Conceição (RS) e a Rede de

Escolas Técnicas do SUS, oferece capacitações em

todo o Brasil para Agentes Comunitários de Saúde e

Auxiliares e Técnicos de Enfermagem da Atenção

Básica. Essas capacitações estão em andamento e

serão disponibilizadas para 290.760 trabalhadores da

saúde, reforçando a importância da participação dos

profissionais da Atenção Básica no cuidado em saúde

mental.

O Guia de Saúde Mental – Atendimento e Inter-

venção com Usuário de Álcool e outras Drogas

está disponível em: http://goo.gl/iEV6Pv

Para saber mais sobre o projeto Caminhos do

Cuidado, acesse:

http://www.caminhosdocuidado.org/

Guia de Saúde Mental – Atendimento e Intervenção com Usuários de

Álcool e outras Drogas

Alguns trechos do Guia de Saúde Mental:

“As ações da Estratégia da Saúde da Família

(ESF) devem, em conjunto com a Rede de

Atenção Psicossocial (RAPS), evitar o isolamento

social e apoiar as famílias para que estas

consigam lidar com seus membros mais

problemáticos.”

“Redução de Danos (RD) é uma estratégia para

aumentar a qualidade de vida das pessoas. Essa

estratégia está fortemente alicerçada no

estabelecimento de vínculo de confiança e

empatia entre profissionais da equipe de saúde e

o usuário. Uma pessoa que está em uma relação

dependente de uso de drogas muitas vezes não

quer, não pode, ou não consegue parar de usar

drogas. Mesmo assim, é preciso que estejamos

dispostos a ajudá-la a cuidar de sua saúde, da

melhor maneira possível.”

“Nos territórios violentos reina o silêncio. Como

disse o filósofo francês Gilles Deleuze, a violência

não fala. O contrário da violência é a palavra, a

solidariedade e as relações democráticas.”

“Um dos maiores clínicos da dependência de

drogas, Claude Olievenstein, disse que o

contrário da droga não é a abstinência, mas a

liberdade.”

Sofrimento e Atenção Básica:

Desafios para a Transformação dos Territórios

26

Projeto Percursos Formativos

A s ações de formação e Educação Permanente no âmbito do SUS são fundamentais para o

desenvolvimento de estratégias e práticas consonantes com os desafios cotidianos da atenção em

saúde, que se transformam a partir da reestruturação dos serviços em rede, modificação da cultura e

fortalecimento de propostas de cuidado no território.

Frente aos desafios vivenciados no contexto da RAPS foi lançado em novembro de 2013 o Projeto

Percursos Formativos. A seleção de projetos se deu por meio de chamada pública, contemplando apoio

financeiro para estados e municípios que desenvolvam projetos de educação permanente no âmbito

específico da troca de experiência entre profissionais e supervisão clinico-institucional. Participam dessa

chamada redes de 21 estados das cinco regiões do Brasil.

A portaria de referência para essa chamada é a portaria Nº 1174/GM de 07 de julho de 2005, que

destina incentivo financeiro para o Programa de Qualificação dos Centros de Atenção Psicossocial -

CAPS e dá outras providências. Dentro dessa proposta, o intercâmbio entre experiências é uma iniciativa

inovadora, que se organiza por meio de módulos de formação. Um módulo de formação é constituído de

uma Rede Receptora e cinco Redes Visitantes.

As redes receptoras irão receber dez profissionais por mês (dois de cada uma das redes visitantes

presentes no módulo) durante 10 meses, apresentando propostas e estratégias desenvolvidas por meio

das práticas em seus territórios, favorecendo a reflexão a partir da troca de experiências. Além disso,

também serão responsáveis por desenvolver cinco oficinas de 40 horas no território de cada um dos cinco

municípios visitantes que compõem o módulo.

As redes visitantes são as que indicaram o interesse em aprimorar e aprofundar as experiências e

conhecimentos a partir da troca de experiência, liberando dois profissionais a cada mês para a vivência

da formação na Rede receptora. Tais profissionais permanecerão “in loco”, no município, durante 30 dias

consecutivos, somando 160h de formação.

Ao final dos 10 meses do Processo de Intercâmbio, prevê-se que pelo menos 20 profissionais de

cada Rede Visitante, mais o coletivo de trabalhadores da RAPS nas Redes Receptoras, tenham

vivenciado essa experiência formativa, totalizando mais de 1700 trabalhadores em trânsito por todo o

Brasil!

Nesta ação estarão contempladas discussões sobre as temáticas de Saúde Mental Infantojuvenil,

Saúde Mental na Atenção Básica, demandas associadas ao consumo de álcool e outras drogas,

Encontro de Planejamento em Brasília, dia 16/04/2014,

com participação de 15 Redes Receptoras.

Radicalizar a Formação na RAPS

Durante o Encontro de Redes

Receptoras, Beatriz Barreiros da

Coordenação de Saúde Mental de

Santo André/SP, falou ao

Viramundo sobre este projeto.

Veja o vídeo em nosso canal do

Youtube: http://goo.gl/dx9R8J.

27

Projeto Percursos Formativos

Encontro de planejamento, dia 28/04/2014, com

participação dos munícipios de Uberlândia/MG,

Rio Pomba/MG, Laranjeiras do Sul/PR, Ijuí/RS,

Capivari/SP e Cândido Motta/SP.

Encontro de Planejamento, dia 28/04/2014, com

participação dos munícipios de Embu das Artes/

SP, Juazeiro/BA, Eunápolis/BA, Teresina/PI e

Moju/PA.

Encontro de Planejamento, dia 12/05/2014, com

participação dos munícipios de Ouro Preto/MG,

Barbacena/MG, Coronel Fabriciano/MG, Boa

Vista/RR, Campo Grande/MS e Iguatu/CE.

Encontro de Planejamento, dia 24/04/2014, com

participação dos munícipios de Resende/RJ,

Palmas/TO, Icó/CE, Imperatriz/MA, Jacobina/BA

e Itaúna/MG.

Radicalizar a formação na RAPS

Atenção à Crise e Urgência em Saúde Mental, Desinstitucionalização e Reabilitação Psicossocial.

Nesta perspectiva, entende-se que o Percursos Formativos se constitui enquanto ação para

qualificação da RAPS, fortalecendo práticas do cuidado à medida que introduz no encontro, no ‘fazer

junto’, a possibilidade da transformação e invenção de novas atuações e papéis.

28

Radicalizar a Formação na RAPS

No início de maio iniciaram as primeiras turmas dos cursos a distância realizados em parceria do Ministério

da Saúde por meio da Secretaria de Gestão do Trabalho e da Educação (SGTES) e da Coordenação de

Saúde Mental, com a Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) pelo sistema Universidade Aberta do

SUS (UNA/SUS). Os cursos têm a proposta de construir estratégias que viabilizem a qualificação da atenção

prestada através da formação continuada, especialmente nos serviços e dispositivos da RAPS.

Considerando as diretrizes da Política Nacional de Saúde Mental Infantojuvenil, foram ofertadas 800 vagas

para o “Curso de atualização em Saúde Mental na infância e adolescência no âmbito da Rede de Atenção

Psicossocial” para profissionais com formação universitária que desenvolvam atividades no cuidado em

saúde mental com crianças e adolescentes na RAPS. Com duração de 100 horas, o curso traz uma

atualização no campo ao tratar dos desafios para o atendimento em Redes de Atenção à Saúde dentro da

regulamentação do Estatuto da Criança e Adolescente (ECA) e a perspectiva do cuidado interdisciplinar, e

intersetorial.

Também foram ofertadas 2.800 vagas para o curso “Álcool e outras drogas: da coerção à coesão”, no

intuito de oferecer subsídios para a atenção às pessoas com necessidades decorrentes do uso de álcool e

outras drogas sob a ótica interdisciplinar e intersetorial, com a perspectiva de trabalho em rede e da defesa

dos direitos humanos.

Por fim, o curso “Crise e urgência em saúde mental” ofereceu 800 vagas com a finalidade de abordar as

situações de crises mais prevalentes, urgência em saúde mental e possibilidades de cuidado, bem como os

desafios para o atendimento nas Redes de Atenção em Saúde. Há a previsão de novas vagas para o

próximo semestre.

Também já aconteceram reuniões de planejamento no Município de Embu das Artes/SP, Coronel Fa-

briciano/MG, São Paulo/SP, Recife/PE, São Lourenço/RS. E ainda estão previstos outros oito encontros de

planejamento.

O módulo de formação composto pelos municípios de Resende/ RJ, Palmas/TO, Icó/CE, Imperatriz/

MA, Jacobina/BA e Itaúna/MG iniciou o primeiro mês do intercâmbio dia 05/05/2014. Os demais módulos

começarão as atividades de intercâmbio a partir do dia 21/07/2014.

Para as próximas edições do Viramundo, selecionaremos relatos de experiência do

Percursos Formativos. Envie sua contribuição!

Encontro de Planejamento, dia 12/05/2014, com

participação dos munícipios de Santo André/SP,

São Vicente/SP, Sorocaba/SP, Joinville/SC,

Araranguá/SC, Guaíba/RS, Caruaru/PE, Horizonte/

CE e dos estados do Tocantins e do Acre.

Encontro de Planejamento realizado em 14 de

maio de 2014 em São Paulo com a

participação dos municípios de Contagem/

MG, Vitória da Conquista/BA e Goiânia/GO.

Cursos a Distância

29

Coletivizando Direitos

S ão amplas, complexas e nefastas as consequências do racismo na sociedade brasileira. As mais

visíveis se percebem em qualquer espaço público: seja na gritante e evidente maioria negra nas funções

e nos lugares menos valorizados de nossa estrutura social, seja na igualmente escandalosa exclusão da

negritude dos espaços centrais e oficiais de tomada de decisão. Essa cruel organização de uma

sociedade estratificada racialmente é escancarada dia a dia nas ruas, em imagens e em dados

estatísticos.

Não menos violentas, entretanto, são as consequências psíquicas do racismo para a população

negra do país. O estigma racial marca de forma indelével as subjetividades de quem vive o racismo no

cotidiano. “O mais profundo é a pele”, dizia o poema de Paul Valéry. Profundas são as dores causadas

pelo racismo em uma sociedade que discrimina pela cor da pele, diriam os milhões de negros e negras

do Brasil.

O racismo brasileiro – instituído pelas relações escravistas que estruturaram o país e seu imaginário

desde o início da colonização europeia – é antes de tudo um sistema de discriminação das pessoas

quanto ao seu valor em função da cor de sua pele e de sua origem. A população negra do país, trazida

à força de lugares diversos do continente africano para o trabalho escravo, vem sendo há séculos

tratada como inferior em suas qualidades e potencialidades. Esse cenário produz sofrimentos profundos,

mas também mobilização e afirmação da negritude.

Organizados de diversas formas para enfrentar o

racismo desde a luta contra a escravidão, coletivos e

movimentos negros acumulam importantes conquistas.

Hoje, o próprio Estado reconhece a existência e o peso do

racismo, e busca com a sociedade formas de enfrentá-lo e

de promover a igualdade racial. Exemplos importantes são

as políticas de ação afirmativa e políticas setoriais, como a

Política Nacional de Saúde Integral da População Negra, no

SUS.

A Coordenação Geral de Saúde Mental, Álcool e outras Drogas, do Ministério da Saúde, vem

buscando somar forças para promover o enfrentamento ao racismo institucional na Rede de Atenção

Psicossocial e para garantir a atenção e o cuidado a quem experimenta sofrimento psíquico decorrente

do racismo. Em parceria com o Departamento de Apoio à Gestão Participativa (DAGEP), do Ministério da

Saúde, foi realizada no I Encontro Nacional da RAPS, em dezembro de 2013, uma Mesa Redonda para

discussão do tema “Racismo, Saúde Mental e Direitos Humanos”, com a participação de gestores/as,

trabalhadores/as e usuários/as da saúde, bem como representantes da sociedade civil e da academia.

A conversa no Encontro da RAPS deu origem ao Grupo de Trabalho sobre Racismo e Saúde Mental,

que realizou sua primeira reunião em Brasília, no último dia 9 de abril. O segundo encontro foi no dia 27 de

maio, e o GT está empenhado na construção de estratégias efetivas para enfrentamento ao racismo

institucional e ao sofrimento psíquico decorrente do racismo. É só com o amplo engajamento de forças

diversas da sociedade brasileira que poderemos superar o racismo e suas trágicas consequências

psíquicas, permitindo que as subjetividades negras se manifestem em toda sua potencialidade.

Como escreveu a grande militante negra e psicanalista Neusa Santos Souza, no já clássico Tornar-se

negro, “ser negro é tomar consciência do processo ideológico que, através de um discurso mítico acerca

de si, engendra uma estrutura de desconhecimento que o aprisiona numa imagem alienada, na qual se

reconhece. Ser negro é tomar posse desta consciência e criar uma nova consciência que reassegure o

respeito às diferenças e que reafirme uma dignidade alheia a qualquer nível de exploração. Assim, ser

negro não é uma condição dada, a priori. É um vir a ser. Ser negro é tornar-se negro.”

Acesse em: http://goo.gl/Qp91sX

O GT de Racismo e Saúde Mental está preparando uma Webconferência para toda a Rede.

Em breve divulgaremos mais informações!

30

Coletivizando Direitos

Q uestões relacionadas à saúde mental em contexto indígena têm sido um grande desafio para a

saúde pública brasileira. Em cenário de grande vulnerabilidade, envolvendo disputas territoriais, ameaças,

situações de miséria e tensões constantes, algumas comunidades encaram problemas como altas taxas

de suicídio, violência e uso prejudicial de álcool e outras drogas. Por trás desse cenário, apesar da

variedade de contextos locais, estão os projetos hegemônicos de desenvolvimento nacional, onde a

imensa diversidade de povos que habitam o país deve ser considerada. O modelo de agronegócio

baseado no latifúndio, na monocultura e na exportação, a estratégia energética dependente de obras

de alto impacto socioambiental, o racismo estrutural e um ideal hegemônico de cultura alicerçado em

referenciais europeus são as principais causas do sofrimento dos povos originários do Brasil.

Tem sido chamado de “novo constitucionalismo latino-americano” o movimento que culmina com a

promulgação das constituições do Equador e da Bolívia, respectivamente em 2008 e 2009. Ambas foram

construídas em um contexto de ampla participação dos movimentos indígenas e de garantia dos direitos

de todos os povos que habitam o território dos países. Dentre os vários pontos que aproximam as duas

cartas magnas, um dos mais destacados é a ideia do “bem viver” como um princípio constitucional e um

ideal a ser atingido por toda a sociedade.

O princípio do bem viver, que nas novas constituições aparece também nos idiomas indígenas

majoritários dos dois países (na Bolívia, suma qamaña, em aymara; no Equador, sumak kawsay, em

quéchua), pode ser definido como “o equilíbrio material e espiritual do indivíduo (saber viver) e a relação

harmoniosa do mesmo com todas as formas de existência (conviver)” (Margot Mariaca*). Trata-se de uma

ideia cara às cosmologias de muitos povos ameríndios, que pela primeira vez atinge o status de princípio

constitucional nos novos Estados Plurinacionais (ou seja, Estados que reconhecem a convivência de

muitas nações, em oposição ao modelo europeu moderno de Estado Nacional).

Após séculos de colonização, racismo, genocídios, expropriação de seus territórios tradicionais e

formas diversas de violência, os povos indígenas da América-Latina e do Brasil travam luta incessante

pelos seus direitos, afirmando seu protagonismo enquanto povos autônomos. Sua luta supera em muito a

busca por direitos individuais, tendo como norte as coletividades e as relações entre as pessoas,

garantindo a multiplicidade de formas de existência e a diversidade de saberes.

Se o paradigma que pressupõe a superioridade do saber e das práticas ocidentais está na raiz do

sofrimento dos povos indígenas no país, não pode haver erro maior que o de tentar curá-lo com o próprio

veneno. Assim, pensar os problemas desses povos com os mesmos conceitos que usamos e tentar aplicar

as mesmas ferramentas para resolvê-los é reproduzir o modelo que lhes retira a autonomia e o

protagonismo e deslegitima seus saberes próprios. A própria noção de saúde mental, portanto, deve ser

posta em questão – afinal, o conceito de “mente” não é invenção de um momento histórico singular,

ocidental, urbano, moderno?

Sabemos que são de grande riqueza, inclusive na capacidade de inovação, os conhecimentos

indígenas sobre as técnicas de cura e cuidado, envolvendo ciências sofisticadas sobre o uso das plantas

de seus territórios e os saberes espirituais. Não rejeitam, no entanto, os saberes e os recursos do ocidente,

sobretudo quando podem ajudar a lidar com problemas causados ou agravados pelo contato com o

homem branco. Sendo assim, qualquer ação de cuidado em saúde relacionada aos povos indígenas

deve necessariamente partir de uma perspectiva intercultural, intersetorial e multidisciplinar. No contexto

O Bem Viver e os Povos Indígenas

31

Coletivizando Direitos

da saúde mental, RAPS, DSEI (Distrito Sanitário Especial Indígena) e as próprias comunidades devem

construir juntos suas estratégias de cuidado e promoção da saúde.

Falar em saúde mental, em qualquer contexto, requer uma visão ampliada de saúde e seus

determinantes – as políticas de saúde mental, cada vez mais abrangentes em suas estratégias,

envolvem uma visão complexa e intricada que inclui uma vasta rede de relações, uma ampla reflexão

sobre a cidade, a cultura, os direitos humanos e a vida em comunidade, um entendimento elaborado

sobre o trabalho, a moradia e a autonomia dos sujeitos. Quando se trata do contexto indígena devemos

ir ainda mais longe, pondo em perspectiva nossas crenças mais arraigadas, abrindo-nos a formas muito

diferentes de compreensão do mundo.

O que está em questão é o próprio lugar que a diferença ocupa em nossos projetos de

humanidade e de sociedade. O conceito de “bem viver”, em toda sua amplitude e no respeito que

implica a todas as formas de existência, pode ser um bom horizonte para a efetivação da Política

Nacional de Atenção Integral à Saúde Mental das Populações Indígenas. Temos a oportunidade – e

talvez não haja uma próxima – de embarcar na onda dos projetos de reinvenção do Estado e da

própria sociedade propostos por bolivianos/as e equatorianos/as e repensar o lugar que a diferença tem

ocupado no projeto brasileiro de desenvolvimento. Essa diferença é a que inclui povos indígenas,

quilombolas, ciganos, ribeirinhos e todos aqueles que vigoram em outra lógica que a do consumo e da

mercadoria.

* MARIACA, Margot, "¿Qué es el Suma Qamaña?", disponível em: http://goo.gl/dg0VKj

Pedro MacDowell, antropólogo, integrante da

Coordenação de Saúde Mental, Álcool e

outras Drogas, fundador e puxador da Horda

Carnavalesca Até Parece.

O Bem Viver e os Povos Indígenas

A Coordenação Geral de Saúde Mental,

Álcool e outras Drogas (CGMAD/DAET/SAS/

MS) e a Coordenação Geral de Atenção

Primária à Saúde Indígena (CGAPSI/DASI/

SESAI/MS) participarão das atividades da

Ação Karajá, evento que ocorrerá de 2 a 6 de

junho nas quatro aldeias Karajá da Ilha do

Bananal, no estado do Tocantins. A Ação

Karajá ocorre desde 2012, como uma resposta

do povo Karajá ao grande número de suicídios

ocorridos em suas aldeias nos últimos anos.

Participam também representantes da Funai e

do DSEI Araguaia. Na próxima edição do

Viramundo traremos mais notícias desta ação!

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Expediente

Expediente

Coordenação Geral

Roberto Tykanori Kinoshita

Coordenação adjunta

Fernanda Nicácio

Alexandre Trino

Pauta: Fernanda Nicácio

Conselho editorial | Arte | Diagramação:

Adélia Benetti de Paula Capistrano

Marcel Henrique de Carvalho

Pedro de Lemos MacDowell

Endereço

Coordenação Geral de Saúde Mental, Álcool

e outras Drogas. SAF-Sul, Trecho 2, Lotes 05/06,

Torre II , Ed. Premium, térreo, sala 13.

CEP:70070-600

Telefone: (61) 3315-9144

Agradecemos a generosa colaboração de

Rosangela Ogawa, Marta Soares, Maxwell

Vilela e o Fórum Mineiro de Saúde Mental de

Minas Gerais, Moisés Ferreira, Beatriz Barreiros,

para esta edição.

Equipe da Coordenação de Saúde Mental

Adélia Benetti de Paula Capistrano Alexandre

Teixeira Trino Ana Carolina Conceição Andrea

Borgli Moreira Jacinto Anissa Rahnamaye Rabbani

Aretuza Santos de Oliveira Freitas Arthur Mamed

Cândido Barbara Coelho Vaz César Henrique dos

Reis Cinthia Lociks de Araújo Claudio Antônio

Barreiros Cleide Aparecida Souza Daniel Adolpho

Daltin Assis Denis Wilson Recco Enrique Araújo

Bessoni Fernanda Nicácio Gabriela Hayashida

Greici Cristhina Justino Ingrid Hrusa Coutinho da

Silva, Isadora Simões de Souza Jakson Silva Brito

Janaina Barreto Gonçalves Jaqueline Tavares de

Assis Hinara Helena Silva Pereira de Souza June

Correa Borges Scafuto Keyla Kikushi Câmara

Leisenir de Oliveira Marcel Henrique de Carvalho

Luiz Felipe Zago Maria Fernanda de Silva Nicácio

Mariana da Costa Schorn Mariane Ribas Barbosa

Michaela Batalha Juhasova Milena Leal Pacheco

Nádia Maria Silva Pacheco Patricia Herli Diniz

Patricia Portela de Aguiar Patrícia Santana Santos

Paula Valicchelli Yamaoka Pedro de Lemos

MacDowell Pedro Henrique Marinho Carneiro

Pollyanna Fausta Pimentel de Medeiros Raquel de

Aguiar Alves Raquel Turci Pedroso Roberto Tykanori

Kinoshita Rubia Cerqueira Persequini Samia Abreu

Oliveira Silvana Di Maio Andrade Santiago Taia

Duarte Mota Thais Soboslai Thiago Monteiro Pithon

Viviane Paula Rocha Wanda Ferreira Vasconcelos

Para solicitar que algum tema seja aprofundado na próxima edição do

Viramundo ou fazer sugestões, críticas ou elogios, entre em contato conosco

através do e-mail:

[email protected]

Foto: intervenção da Casa

de Saúde Anchieta, 1989.

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