violentadxs, violentamos

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Violentadxs, violentamos! Nesses derradeiros meses de minha pesquisa no mestrado (estou há oito meses da defesa da dissertação) fiz revoluções nunca desejadas para umx estudante de pós-graduação: modifiquei totalmente meu foco na pesquisa, recusei seguir com instrumentos e ferramentas normativas, herdeiras de uma essencialização do método cartesiano, lancei um novo olhar sobre aquilo que nas ciências seria entendido como "objeto de pesquisa". Há tempos desconfiava que algo não ia bem no meu caminho de pesquisador! Em uma das aulas do componente Estudos das Subjetividades, do qual participo cumprindo as etapas do tirocínio docente, com meu orientador, a ficha caiu... Apesar das mudanças na pesquisa terem acontecido antes do componente, digo que a ficha caiu, justamente porque percebi que um grande tema rondava minhas inquietações. Um tema que sempre me acompanhou, mas que não estava verdadeiramente claro para minhas lentes. Um tema que me moldou ao longo dos anos e que sempre se escondeu atrás de argumentos místicos e ou do plano superior de alguma entidade de fé. Um tema que fala por si, fala dxs outrxs, mas nunca se completa em uma explicação minimamente inteligível: a violência. Refletir sobre violência nos coloca em caminhos múltiplos, isto é, de onde enxergar a violência? Do lugar da Casa Grande? Da senzala? Do tronco? Das atividades nas plantações? Das atividades dentro da Casa? A metáfora da escravidão é apenas um gancho que uso para sugerir o quão fugidio é o tema da violência. Sem me alongar muito, até porque não é o objetivo do texto, afirmo que falo, na nova configuração de minha pesquisa, de um lugar de violência que, apesar das possíveis críticas que possam interrogar o meu texto, é o lugar da violência sobre e a partir das nossas subjetividades. Refletir sobre os aparatos sociais que nos engolem em discursos unitários e totalizadores, formados por relações de poder

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Violentadxs, violentamos.

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Violentadxs, violentamos!

Nesses derradeiros meses de minha pesquisa no mestrado (estou h oito meses da defesa da dissertao) fiz revolues nunca desejadas para umx estudante de ps-graduao: modifiquei totalmente meu foco na pesquisa, recusei seguir com instrumentos e ferramentas normativas, herdeiras de uma essencializao do mtodo cartesiano, lancei um novo olhar sobre aquilo que nas cincias seria entendido como "objeto de pesquisa". H tempos desconfiava que algo no ia bem no meu caminho de pesquisador!

Em uma das aulas do componente Estudos das Subjetividades, do qual participo cumprindo as etapas do tirocnio docente, com meu orientador, a ficha caiu... Apesar das mudanas na pesquisa terem acontecido antes do componente, digo que a ficha caiu, justamente porque percebi que um grande tema rondava minhas inquietaes. Um tema que sempre me acompanhou, mas que no estava verdadeiramente claro para minhas lentes. Um tema que me moldou ao longo dos anos e que sempre se escondeu atrs de argumentos msticos e ou do plano superior de alguma entidade de f. Um tema que fala por si, fala dxs outrxs, mas nunca se completa em uma explicao minimamente inteligvel: a violncia.

Refletir sobre violncia nos coloca em caminhos mltiplos, isto , de onde enxergar a violncia? Do lugar da Casa Grande? Da senzala? Do tronco? Das atividades nas plantaes? Das atividades dentro da Casa? A metfora da escravido apenas um gancho que uso para sugerir o quo fugidio o tema da violncia. Sem me alongar muito, at porque no o objetivo do texto, afirmo que falo, na nova configurao de minha pesquisa, de um lugar de violncia que, apesar das possveis crticas que possam interrogar o meu texto, o lugar da violncia sobre e a partir das nossas subjetividades.

Refletir sobre os aparatos sociais que nos engolem em discursos unitrios e totalizadores, formados por relaes de poder cisheteronormada, um desafio constante para esse indivduo em todos os momentos que se v na frente da tela do notebook tentando continuar a escrita: pensar a minha experincia de abuso sexual na infncia sem fazer disso uma historinha triste de compaixo, vitimizao ou piedade o que me instiga pargrafo aps pargrafo. Demonstrar as lacunas das narrativas de subjetividade e denunciar como esse poder cisheteronormado nos silencia cotidianamente o que me move! Travar uma batalha constante contra o olhar culpado da trade familiar o que me arrepia, o que me d nimo para seguir me expondo.

No fim das contas, pensando a partir das tcnicas de si sugeridas por Foucault, escrevo para violentar violncia. Violento-a com poesia, violento-a com minha histria, violento-a com a minha arte, de forma que o meu pequeno escrito, nesses dois anos dissertativos, sirvam para desmascar-la, sirvam para tocar indivduos e motiv-lxs a violent-la, tambm. A minha ideia de violncia em nada coaduna com o conceito que est posto em nosso cotidiano, mas com absoluta certeza (pelo menos para mim), essa violncia me produz! E, aproveitando a metfora potica, e desconstruindo (com muita coragem) a inteno inicial da fbica cano francesa La Marseillaise eu canto:"Allons enfants de la PatrieLe jour de gloire est arriv!Contre nous de la tyrannieL'tendard sanglant est levEntendez-vous dans les campagnesMugir ces froces soldats?Ils viennent jusque dans vos brasgorger nos fils, nos compagnes!"

NO PASSARO, MAIS!