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FREIRE, Jussara; FERREIRA, Diogo da Cruz; SOARES, Viviany F. M. S.; SANTOS, Tayná. ―Violência urbana‖ e experiências públicas de familiares de vítimas ―no interior‖ do estado do Rio de Janeiro . Sociabilidades Urbanas Revista de Antropologia e Sociologia , v.1, n.2, p. 165-185, julho de 2017. ISSN 2526-4702. Artigo http://www.cchla.ufpb.br/sociabilidadesurbanas/ ―Violência urbana‖ e experiências públicas de familiares de vítimas ―no interior‖ do estado do Rio de Janeiro “Urban violence” and public experie nces of victims’ relatives “ on the countryside of the state of Rio de Janeiro Jussara Freire Diogo da Cruz Ferreira Viviany Férras da Motta dos Santos Soares Tayná Santos Resumo: Este artigo apresenta considerações exploratórias de uma pesquisa em andamento que tem como objeto as experiências públicas de familiares de vítimas de homicídios relacionados com os modos de problematizar ―a violência urbana‖ em Campos dos Goytacazes (cidade do estado do Rio de Janeiro). O objetivo do presente artigo é, de um lado, apresentar como se configura uma linguagem da ―violência urbana‖ em uma cidade média qualificada como ―interiorana‖. Por outro lado, apresentaremos as primeiras considerações sobre experiências de familiares após a perda de seus filhos assassinados por narcotraficantes e os recursos que mobilizam para lidar com este luto, em um contexto urbano marcado pela inexistência de movimentos sociais, coletivos ou outras instituições que poderiam ouvir e/ou ancorar denúncias de mortes de vítimas de conflitos entre narcotraficantes por familiares. Desta forma, procuramos compreender como se articulam a linguagem da ―violência urbana‖ em um contexto extra-metropolitano com ―os processos de investigação‖ no sentido de Dewey (2003) e nos inspirando dos modos segundo os quais Quéré e Terzi (2015), Stavo-Debauge e Trom (2004), Breviglieri (2008) e Menezes (2014), retomaram esta proposta da filosofia pragmatista conduzidos por familiares que são atualmente nossos interlocutores. Palavras-chave: processo de investigação, política habitacional, violência urbana, luto, familiares de vítimas. Abstract: This article presents the exploratory considerations of an ongoing research that has as object the public experiences of relatives of victims of homicides related to the ways of problematizing "urban violence" in Campos dos Goytacazes (city of the state of Rio de Janeiro). The aim of this article is, on the one hand, to present how a language of "urban violence" in an average city qualified as "interiorana" is configured. On the other hand, we will present the first considerations about family experiences after the loss of their children murdered by drug traffickers and the resources they mobilize to deal with this mourning, in an urban context marked by the absence of social movements, collectives or other institutions that could hear and/or anchoring allegations of deaths of victims of drug- trafficker conflicts by relatives. In this way, we seek to understand how the language of "urban violence" is articulated in an extra-metropolitan context with "research processes" in the sense of Dewey (2003) and inspiring us in the ways in which Quéré and Terzi (2015), Stavo-Debauge and Trom (2004), Breviglieri (2008) and Menezes (2014), have taken up this proposal of the pragmatist philosophy led by family members who are currently our interlocutors. Keywords: investigation process, housing policy, urban violence, mourning, family of victims A pesquisa em andamento, cujo projeto fundamenta este artigo, partiu de nosso estranhamento quanto à ausênciade arenas públicas (CEFAÏ, 2000) problematizando

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FREIRE, Jussara; FERREIRA, Diogo da Cruz; SOARES, Viviany F. M. S.; SANTOS, Tayná. ―Violência

urbana‖ e experiências públicas de familiares de vítimas ―no interior‖ do estado do Rio de Janeiro .

Sociabilidades Urbanas – Revista de Antropologia e Sociologia, v.1, n.2, p. 165-185, julho de 2017. ISSN

2526-4702.

Artigo

http://www.cchla.ufpb.br/sociabilidadesurbanas/

―Violência urbana‖ e experiências públicas de familiares de vítimas ―no

interior‖ do estado do Rio de Janeiro

“Urban violence” and public experiences of victims’ relatives “on the countryside” of the

state of Rio de Janeiro

Jussara Freire

Diogo da Cruz Ferreira

Viviany Férras da Motta dos Santos Soares

Tayná Santos

Resumo: Este artigo apresenta considerações exploratórias de uma pesquisa em andamento

que tem como objeto as experiências públicas de familiares de vítimas de homicídios

relacionados com os modos de problematizar ―a violência urbana‖ em Campos dos

Goytacazes (cidade do estado do Rio de Janeiro). O objetivo do presente artigo é, de um

lado, apresentar como se configura uma linguagem da ―violência urbana‖ em uma cidade

média qualificada como ―interiorana‖. Por outro lado, apresentaremos as primeiras

considerações sobre experiências de familiares após a perda de seus filhos assassinados por

narcotraficantes e os recursos que mobilizam para lidar com este luto, em um contexto

urbano marcado pela inexistência de movimentos sociais, coletivos ou outras instituições

que poderiam ouvir e/ou ancorar denúncias de mortes de vítimas de conflitos entre

narcotraficantes por familiares. Desta forma, procuramos compreender como se articulam a

linguagem da ―violência urbana‖ em um contexto extra-metropolitano com ―os processos

de investigação‖ no sentido de Dewey (2003) e nos inspirando dos modos segundo os quais

Quéré e Terzi (2015), Stavo-Debauge e Trom (2004), Breviglieri (2008) e Menezes (2014),

retomaram esta proposta da filosofia pragmatista conduzidos por familiares que são

atualmente nossos interlocutores. Palavras-chave: processo de investigação, política

habitacional, violência urbana, luto, familiares de vítimas.

Abstract: This article presents the exploratory considerations of an ongoing research that

has as object the public experiences of relatives of victims of homicides related to the ways

of problematizing "urban violence" in Campos dos Goytacazes (city of the state of Rio de

Janeiro). The aim of this article is, on the one hand, to present how a language of "urban

violence" in an average city qualified as "interiorana" is configured. On the other hand, we

will present the first considerations about family experiences after the loss of their children

murdered by drug traffickers and the resources they mobilize to deal with this mourning, in

an urban context marked by the absence of social movements, collectives or other

institutions that could hear and/or anchoring allegations of deaths of victims of drug-

trafficker conflicts by relatives. In this way, we seek to understand how the language of

"urban violence" is articulated in an extra-metropolitan context with "research processes" in

the sense of Dewey (2003) and inspiring us in the ways in which Quéré and Terzi (2015),

Stavo-Debauge and Trom (2004), Breviglieri (2008) and Menezes (2014), have taken up

this proposal of the pragmatist philosophy led by family members who are currently our

interlocutors. Keywords: investigation process, housing policy, urban violence, mourning,

family of victims

A pesquisa em andamento, cujo projeto fundamenta este artigo, partiu de nosso

estranhamento quanto à ―ausência‖ de arenas públicas (CEFAÏ, 2000) problematizando

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Sociabilidades Urbanas – Revista de Antropologia e Sociologia v1 n2 julho de 2017 ISSN 2526-4702

as mortes de moradores de ―periferias‖ de Campos dos Goytacazes (cidade média do

interior do estado do Rio de Janeiro) relacionadas com a criminalidade violenta desta

cidade. Observávamos inicialmente um contraste entre mobilizações coletivas de luta

contra a violência institucional, das quais participavam movimentos de familiares de

vítimas de violência policial, na cidade do Rio de Janeiro (BIRMAN e LEITE (2008);

ARAUJO (2008); FREIRE e TEIXEIRA (2017); FARIAS (2007), isto é, em contexto

metropolitano, em relação ao que identificávamos inicialmente como ―ausência‖ de

movimentos sociais em Campos (contexto extra-metropolitano do mesmo estado).

Como detalharemos posteriormente, o debate público campista vem dando cada

vez mais visibilidade ao ―aumento de homicídios‖ decorrentes de conflitos entre

narcotraficantes da cidade de Campos dos Goytacazes que afetam, em particular,

moradores de favelas e de novos conjuntos habitacionais edificados no quadro do

programa habitacional ―Morar Feliz‖. A ―violência urbana‖1 é, neste caso, associada

exclusivamente aos confrontos entre personagens tidos como ―traficantes de drogas‖ ou

―bandidos‖. Diferentemente do caso da cidade do Rio de Janeiro, o personagem do

policial é também ausente das formas de tematizar o problema ―violência urbana‖ em

Campos, outro importante contraste em relação aos modos segundos os quais este

problema se configura no contexto extra-metropolitano do Rio de Janeiro (Campos se

tornando, no caso deste trabalho, um caso particular de uma cidade média possível).

Nos jornais locais dados estatísticos que já levantamos, bem como nas conversas

cotidianas desta cidade, ainda observamos que a categoria ―auto de resistência‖, por

exemplo, não aparece como ―um problema da cidade‖ relacionado com aquele da

―violência urbana‖2.

Estas primeiras observações conduziram a primeira autora em propor uma

pesquisa, em continuidade com seus trabalhos anteriores – que abordavam

exclusivamente contextos metropolitanos do estado do Rio de Janeiro (FREIRE, 2010;

FREIRE, 2014; FREIRE, 2016 e FREIRE, 2017) - sobre as experiências públicas de

familiares de vítimas de homicídios ―no interior‖ cujas mortes são também

problematizadas ―como consequência da violência urbana‖. Devido à atuação

profissional desta autora no campus da Universidade Federal Fluminense em Campos

dos Goytacazes, propôs-se, na presente pesquisa, descrever e interpretar as experiências

públicas de familiares após a perda de seus filhos assassinados por narcotraficantes e os

recursos que mobilizam para lidar com este luto, em um contexto urbano marcado por

uma ausência de movimentos sociais, coletivos ou instituições que poderiam ancorar

denúncias de mortes de vítimas de conflitos entre narcotraficantes. Desta forma,

propusemos analisar ―os processos de investigações‖ no sentido de Dewey (2003)

(inspirando-nos também nos modos segundo os quais Quéré e Terzi (2015); Stavo-

Debauge e Trom (2004); Stavo-Debauge (2012); Breviglieri (2008) e Menezes (2014),

retomaram esta proposta da filosofia pragmatista) conduzidos por estes familiares,

procurando restituir as tramas e os engajamentos destes atores após à perda do filho

1Sobre a categoria ―violência urbana‖, aludimos a uma linguagem que expressa uma categoria nativa do

que se entende por violência e às decorrentes justificativas que emergem no debate público no que tange

ao uso da força desmedida. Assim como a ―metáfora da guerra‖ de (LEITE, 2012), ―A gramática da

―violência urbana‖ altera profundamente os termos dos conflitos sociais, com os atores passando a

discutir, no plano ordinário (e não em sua dimensão institucional) das relações interpessoais, quem

(pessoa e/ou grupo) não se qualifica como portador de direitos. (MACHADO DA SILVA, 2015, p. 10). 2Evidentemente, isso não significa que não existe violência policial em Campos, mas, neste momento da

pesquisa, ainda não muito poucos elementos para concluir sobre as formas como ela se apresenta na

cidade. No entanto, como a pesquisa trata de problematização da ―violência‖ do ponto de vista dos atores

que participam da elaboração do debate público, a falta de visibilidade da violência policial torna-se um

primeiro elemento da pesquisa a ser desenvolvido posteriormente.

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Sociabilidades Urbanas – Revista de Antropologia e Sociologia v1 n2 julho de 2017 ISSN 2526-4702

morto. Em outros termos, a proposta é de analisar as avaliações, qualificações e

experiências de familiares que perderam seus filhos assassinados por traficantes e como

estas se articulam com uma linguagem da ―violência urbana‖ de uma cidade média,

caso particular do possível, neste caso, Campos dos Goytacazes.

O problema desta pesquisa se articula com aquele que os quatros autores

exploram ou exploraram em trabalhos anteriores: Jussara Freire, integrante do Coletivo

de Estudos sobre Violência e Sociabilidade (CEVIS), participou da pesquisa ―Vida sob

cerco‖ coordenado por Luiz Antonio Machado da Silva (Machado da Silva, 2008) e

neste quadro havia analisado, com a equipe deste grupo de pesquisa, os engajamentos,

recursos e competências políticas de ―líderes comunitários‖ de favelas do Rio de Janeiro

e de mães de vítimas de violência policial para acessar o espaço público. Viviany

Soares, por sua vez, no quadro de sua participação em duas pesquisas do grupo Cidades,

espaços públicos e periferias, coordenado por Jussara Freire, ainda enquanto aluna de

graduação participou de duas pesquisas abordando, em um caso, a reconfiguração da

sociabilidade urbana após grandes empreendimentos em Campos (em particular, o Porto

do Açu) e, em outro, os modos segundos os quais moradores desta cidade

problematizavam a ―violência‖3. Tayná Santos analisou, de 2015 a 2016, interações

entre funcionários públicos e ―usuários‖ em situação de atendimentos em unidades de

saúde, de Campos focalizando o problema da pesquisa nas tensões e conflitos que

emergem e nos modos de administrá-los4. Atualmente, Tayná Santos é bolsista de

iniciação científica em novo projeto de pesquisa, coordenado por Jussara Freire, cuja

proposta é descrever e interpretar a trama do ―problema violência urbana‖ em Campos

dos Goytacazes5. Diogo Ferreira da Cruz, por fim, após ter etnografado as

configurações da sociabilidade em um conjunto habitacional de uma pequena cidade de

Minas Gerais, que se alteraram ao longo do tempo diante do aumento das ameaças e uso

da força por narcotraficantes, estuda atualmente as formas de habitar de moradores de

um dos conjuntos do programa Morar Feliz em Campos dos Goytacazes no quadro de

sua tese de doutorado em andamento6. Nesta atual pesquisa, propomos dar continuar a

estas experiências e dar desdobramentos aos resultados de nossas pesquisas anteriores,

3Freire Jussara e Santos, Viviany (2012). Os grandes empreendimentos da expansão universitária a na

região norte-fluminense: reconfiguração da sociabilidade e novos problemas públicos. 2012 (projeto

coordenado por Jussara Freire e financiado como bolsa de Iniciação Científica da Fundação Carlos

Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro- FAPERJ): Santos, Viviany,

Construindo a Sensação de Insegurança em Campos dos Goytacazes: o ponto de vista dos moradores.

Trabalho de conclusão do curso de Serviço Social da Universidade Federal Fluminense Proteção social e

Política Habitacional em Campos dos Goytacazes. O Programa Morar Feliz sob uma perspectiva

interdisciplinar. 4Freire, Jussara e Santos, Tayná (2016) ―Vulnerabilidades da experiência citadina e acesso aos espaços

públicos urbanos em cidades do norte-fluminense‖ (projeto coordenado por Jussara Freire e financiado

como bolsa de Iniciação Científica PIBIC/PROPPI/UFF – 2015/2016). 5Freire Jussara e Santos, Tayná (2017). Tramas da ―violência política‖ em Campos dos Goytacazes:

grupos de extermínios, narcotraficantes e milícias (projeto coordenado por Jussara Freire e financiado

como bolsa de Iniciação Científica PIBIC/PROPPI/UFF – 2016/2017). 6A pesquisa do autor é financiada pela Fundação Carlos Chagas de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio

de Janeiro (FAPERJ).

FERREIRA, Diogo da Cruz. Das consequências do programa minha casa minha vida na sociabilidade de

um condomínio em uma cidade média de Minas Gerais. 2015. 101 f. Dissertação (Mestrado em Políticas

Sociais) – Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro, Centro de Ciências do Homem

(UENF), Campos dos Goytacazes, 2015.

FERREIRA, Diogo da Cruz. Habitar um conjunto habitacional popular em Campos dos Goytacazes/RJ: a

experiência do programa ―Morar Feliz‖ do Novo Jockey. 2016. Projeto (Doutorado em Políticas Sociais),

Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro, Centro de Ciências do Homem (UENF),

Campos dos Goytacazes, 2016.

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Sociabilidades Urbanas – Revista de Antropologia e Sociologia v1 n2 julho de 2017 ISSN 2526-4702

mas focalizando-nos doravante nas implicações da modalidade de reconhecimento da

―sociabilidade violenta‖7 (Machado da Silva, 2010) em uma cidade ―do interior‖ no que

tange às formas de experimentar e vocalizar, por familiares, perdas de ―seres queridos‖

(DIAZ, 2014). Procuramos ainda compreender como os relatos destes atores se

entremeiam com a elaboração de uma linguagem da ―violência urbana‖ elaborada, neste

caso, em uma cidade média extra metropolitana.

Desde o ano de 2016, os autores e outras recém integrantes do grupo Cidades,

espaços públicos e periferias – CEP28, coordenado por Jussara Freire (em particular

Carolina Mello, Pâmela Martins e Thayná Araújo, alunas do curso de graduação em

ciências sociais da UFF/Campos, que estão também recentemente compondo a equipe

de pesquisa) se distribuíram diferentes eixos da atual pesquisa que se fundamenta na

articulação de três técnicas de pesquisa:

- uma análise documental levantando, sistematizando e analisando: a produção

científica referente aos temas da pesquisa; dados socioeconômicos da população

residente em Campos; - dados do Instituto de Segurança Pública do estado do Rio de

Janeiro e do Mapa da violência (2016); - matérias jornalísticas (em jornais locais, Folha

da Manhã, o jornal Terceira Via, o Diário e o Campos 24 horas e, eventualmente na

imprensa escrita e televisiva nacional) de 2008 a 2017, período que encobre as

diferentes etapas de execução do programa Morar Feliz em Campos e do programa das

UPPs na cidade do Rio de Janeiro. Com estas informações, procuramos organizar as

matérias por temáticas segundo os assuntos relacionados com a criminalidade violenta,

a ―violência urbana‖, o programa Morar Feliz e as intervenções policiais na cidade e

reconstituir a trama discursiva do problema insegurança no debate público.

- Uma observação em situação (e de situações): Iniciamos uma observação in situ

(CEFAÏ, 2010), isto é, de situações da vida cotidiana nas quais familiares

problematizam e buscam lidar com as perdas de seus filhos. Nesta observação que se

encontra ainda em fase inicial, procurando acompanhar as rotinas destes atores em suas

casas, nos seus deslocamentos pela cidade, nas suas atividades profissionais e nas suas

relações de vizinhança. Diante de algumas informações que surgiram neste primeiro

momento da pesquisa de campo (com recorrência nas conversas com nossos atuais

interlocutores), embora não tenhamos ainda iniciado esta etapa da observação,

destacamos que planejamos acompanhar familiares nas igrejas católicas e evangélicas

freqüentadas por algumas dentre eles (mães, pais e irmãos). Com esta observação, nosso

objetivo é de compreender os processos de investigações dos familiares que não

implicam uma exclusiva relação de face a face com o pesquisador, bem como descrever

o ambiente do bairro, as formas de habitar nos conjuntos, suas relações de vizinhança e

as rotinas destes familiares.

- conversas e relatos de vida: partindo da técnica de relato de vida (Hannerz, 1989 e

Thomas e Znaniecki, 2004 [1918-1920]), propusemos retomar as trajetórias singulares

de familiares que aceitaram tecer trocas com os pesquisadores (mães em particular, mas

alguns irmãos de vítimas também receberam algumas das autoras) para buscar

7Sobre a noção de sociabilidade urbana e sua articulação com a linguagem da violência urbana, remeto-

me às contribuições de Machado da Silva (2010). Segundo este autor: (...)a partir do reconhecimento de

uma ―sociabilidade violenta‖, a linguagem dos direitos deixou de articular de maneira unívoca o conflito

social (e os medos a ele associados), passando a competir com a linguagem da violência urbana, que

tematiza os sentimentos difusos de insegurança que pesam sobre as expectativas de prosseguimento

pacífico das rotinas diárias e geram a mentalidade de ―segurança apesar dos outros‖, no lugar da

―segurança com os outros‖, para usar as conhecidas expressões de Bauman (2001, 2000) na sua

interpretação do ―inimigo próximo‖. (MACHADO DA SILVA, 2010, p. 288).

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apreender as possíveis correlações entre as situações de perda, os diferentes laços de

parentescos, os engajamentos dos familiares ao longo de seus trabalhos de luto, as

temporalidades do luto avaliadas pouco após o assassinato ou a posteriori, os recursos

encontrados ao longo do tempo para lidar com estas perdas, ou ainda, a trajetória dos

sofrimentos vivenciados pelos familiares em curto, médio e longo prazo. O relato de

vida é, neste caso, entremeado com a observação in situ e certamente, em momento

mais avançado da pesquisa de campo, ambos se confundirão (são atualmente separados

pelo fato de que nossa entrada, ainda recente, se deparou com a dificuldade de conhecer,

em Campos, familiares que geralmente preferem não publicizar suas experiências). No

entanto, em função da natureza das experiências (no limite do dizível) que são

problematizadas pelos familiares, evitamos rigorosamente apresentar estas situações

como uma ―entrevista‖, preferindo propor outra técnica metodológica, a da ―conversa‖

entre familiares e pesquisadoras, em um movimento de busca de maior simetria entre

conversadores (mesmo que a plena simetria seja evidentemente inatingível pelo fato de

que alguns dos conversadores serem qualificados, pelos nossos interlocutores de

acadêmicos). Em resumo, os relatos de vida são aqui apresentados como situações de

conversas para auxiliar o analista na compreensão da experiência das perdas dos

familiares. Sendo conversas, as trocas não são orientadas por exigências de eixos ou

―roteiros de entrevistas‖, mas pelo pressuposto do que é possível compartilhar estes

tipos de experiências sem forçar a orientação do relato do locutor pelo analista na

direção das exigências de sua pesquisa, o que também flexibiliza a fala e a escuta dos

participantes destas situações. Se uma entrevista é geralmente um momento fixo na

temporalidade da vida de uma pessoa (mesmo que seja possível o analista procurar o

entrevistado para elucidar pontos no relato levantado mas que costuma ser de todo

modo pontual e referenciado a um momento anterior tido, pelo analista como chave), a

conversa é um jogo lúdico de sociação, retomando Simmel (no caso desta pesquisa,

evidentemente, o lúdico da conversa e o trágico da experiência dos familiares se

confundem inexoravelmente), uma forma interacional que permite diminuir imperativos

normativos em relação àquela que seria apresentada como uma ―entrevista sociológica‖

por todos os participantes da situação. A conversa torna-se ainda uma forma ética que

nos parece reduzir níveis de exigências metodológicas em relação ―à entrevista‖ para

poder falar (sobre) e ouvir sofrimentos e dores a partir dos quais se tematizam assuntos

particularmente sensíveis como a morte de um filho ou de um irmão (os familiares com

os quais conversamos até então são mães, irmãos ou irmãs), mais ainda aquela que

decorre dos contextos que analisamos: uma terrível interrupção de cursos de vida e de

trajetórias familiares que é sistematicamente problematizada pelos nossos

interlocutores. A conversa ainda acolhe o ―desabafo‖ da dor sem que seja previsto ou

priorizado, a priori, seus sentidos pelo analista. Na conversa, assuntos, fluxos

discursivos e emocionais em aberto emergem constantemente e, no caso em análise,

vêm nos oferecendo ferramentas compreensivas a partir das quais podemos acompanhar

como familiares, em Campos, exploram e investigam o evento crítico (ARAÚJO, 2007;

2015) que segue a perda de um ―ser querido‖ (DIAZ, 2016).

Habitação, criminalidade violenta e “violência urbana”: consequências do debate

público em Campos dos Goytacazes para familiares de vítimas.

Alguns moradores da cidade do Rio de Janeiro costumam apresentar fortes

emoções (ódio e desprezo, em particular) quando é pronunciado, por lá, o nome de

Campos dos Goytacazes: a cidade pode ser qualificada, por muitos deles, como lugar do

―atraso‖, ―dos Garotinhos‖, do ―fim do mundo‖, ―do deserto‖, etc.

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Sociabilidades Urbanas – Revista de Antropologia e Sociologia v1 n2 julho de 2017 ISSN 2526-4702

Paralelamente, Campos é o mais extenso município do estado do Rio de Janeiro

(4.032 km²), divido administrativamente em vinte distritos, e tem a mais numerosa

população do interior, estimada em 487.186 habitantes (IBGE, 2016). Os royalties

representam a principal fonte de arrecadação e recursos municipais8. No entanto, estas

fontes diminuíram significativamente após a queda do preço do petróleo e da

diminuição do volume de negócios da Petrobras a partir de 2015. Além das drásticas

mudanças municipais geradas pela ―crise do petróleo‖, que justificavam segundo seus

administradores municipais a interrupção de uma série de políticas sociais em torno das

quais programas municipais foram planejados, como o programa habitacional Morar

Feliz9 - central na nossa análise-, pode-se ainda destacar o novo quadro de

administração municipal com a vitória recente do candidato do Partido Popular

Socialista (PPS), Rafael Diniz, nas eleições municipais de 2016. O atual prefeito, em

uma campanha eleitoral explicitamente apresentada como o ―fim da era Garotinho‖ por

ele e pela opinião pública, é eleito após dois mandatos de Rosângela Barros Assed

Matheus de Oliveira (―Rosinha Garotinho‖, prefeita de Campos, de 2009 a 2017) com

uma expectativa de profundas mudanças de formas de governo pelo seu eleitorado. Com

efeito, o atual prefeito havia prometido, desde o momento de sua campanha, uma

ruptura sobre as ―tradicionais‖ formas de governar a cidade. Após sua posse, a imediata

integração de professores universitários, pesquisadores e alunos das principais

instituições acadêmicas de Campos na sua equipe gestora parece representar, para este

prefeito, o início do caminho desta ―grande transformação‖.

Paralelamente, no debate público, em escala estadual e nacional, Campos vem

sendo ainda recentemente apresentada como uma das cidades ―mais violentas do

estado‖ quando José Mariano Beltrame exercia ainda o cargo de Secretário de

Segurança do Rio de Janeiro (2007-2016) (In: NF Notícias 20/05/2016 e, muito

recentemente, em junho de 2017, tal pauta se reforçou com o programa de Fernando

Gabeira que propôs um documentário sobre a ―violência em Campos‖ exibido no canal

Globo News). Destacamos ainda outra série de matérias na imprensa nacional e regional

que apresenta Campos como uma ―das cidades mais violenta do interior‖, como é o

caso, por exemplo, de um noticiário televisivo da Inter TV/região serrana (In: G1,

02/02/2017) durante o qual são apresentados dados do Instituto de Segurança (ISP) de

2016 em tom alarmante: o número de homicídios dolosos era de 168 em 2015 e se

elevou em 272 casos em 2016 na cidade de Campos10

. No programa de Fernando

Gabeira supracitado, este jornalista abre o documentário destacando também o

―ranking‖ das ―cidades mais violentas‖ do mundo (―Campos dos Goytacazes é 19º no

ranking mundial de violência‖) e a taxa de homicídio da cidade ―47 por cem mil

habitantes‖ (número citado sem referência às fontes no documentário), o que tornaria

―proporcionalmente‖ a cidade Campos ―mais violenta‖ do que aquela do Rio de Janeiro.

Ainda vale destacar que, na imprensa local, os assuntos ―criminalidade‖ e

―violência‖ são fortemente localizados em áreas específicas de Campos: favelas, bairros

mais distantes do centro (como o bairro Travessão, situado a cerca de 30 km do centro

8Ver: CRUZ, TERRA, (2015).

9O programa Morar Feliz foi criado em 2009. O projeto inicial pretendia entregar a moradores da cidade,

até 2012, 5.426 casas populares em 10 bairros tidos como ―periféricos‖ (Penha; Jockey; Tapera; Parque

Prazeres; Santa Rosa; Eldorado; Travessão; Lagoa das Pedras e Aldeia), e, até 2016, a meta seria de criar

mais 4.574 até 2016. Foram assim construindo 18 conjuntos habitacionais, mas a meta da segunda etapa

não foi atingida; em ambas as fases, a prefeitura contratou a construtora Odebrecht Serviços de

Engenharia e Construção Hoje, cerca de 32 000 pessoas residem nas 6.500 casas destes conjuntos (OSEC)

(FREITAS, RIBEIRO, 2013). 10

Estou ainda levantando os dados de segurança pública e em fase de sistematização. Estes resultados

serão apresentados na dissertação.

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Sociabilidades Urbanas – Revista de Antropologia e Sociologia v1 n2 julho de 2017 ISSN 2526-4702

da cidade) e conjuntos habitacionais localizados em diversas áreas periféricas

(literalmente, em relação ao centro) deste município. Com efeito, entre estas e outras

matérias da imprensa local e regional analisadas, já é nítido que as notícias sobre

criminalidade violenta se referem recorrentemente ao distrito de Guarus11

(pejorativamente qualificado ―do outro lado‖ por muitos moradores da cidade)12

; favelas

não necessariamente ali localizadas, mais próximas do centro (como a Favela da

Baleeira, Margem da Linha da Tapera e Tira-Gosto); bairros da ―Baixada Campista‖13

da planície e/ou conjuntos habitacionais ―Morar Feliz‖ (que podem ter proximidade

com estes dois outros residenciais). É ainda nítida a criminalização destes moradores na

opinião pública, ou ainda, a encenação de uma maior ―agressividade‖ nestes territórios.

Por exemplo, em uma matéria de 2016 do jornal Terceira Via, intitulada ―Confira o

mapa da violência em Campos‖, o comandante do oitavo batalhão o entrevistado Marco

Aurélio Pires Louzada afirma:

―Os bandidos de Guarus são mais agressivos entre si. Na área da Delegacia

do Centro existe mais uma coordenação dos criminosos. Eles agem de

maneira mais ordenada porque têm os freios inibitórios. Aqui, eles podem

sair pela rua atirando. Os moradores vêem, conhecem quem atirou e

conhecem quem morreu, mas não falam nada porque têm medo. Aqui, eles

são mais agressivos entre si e com a população também‖. (TERCEIRA VIA,

19/12/2016)

A ordem moral (PARK, 1973) de Campos é frequentemente apresentada pelos

seus moradores sob o ângulo dos ―dois lados‖ do Rio Paraíba que atravessa a cidade. O

―outro lado‖, o da margem esquerda do Rio Paraíba, corresponde ao início do distrito de

Guarus, ampla área moral que era exclusivamente associada à ―violência urbana‖ e ao

―mundo do crime‖ por muitos moradores da cidade antes da execução do programa

Morar Feliz. Tal programa tornou estas fronteiras espaciais e morais mais complexas

pelo fato de que seus conjuntos habitacionais se localizam em diferentes áreas da

cidade, geralmente distantes do centro, mas em pontos opostos que não correspondiam

necessariamente à lógica ―dois lados‘ do rio Paraíba do Sul.

Em suma, se os modos segundo os quais moradores de Campos problematizam

os ―dois lados‖ do Rio Paraíba apresentam uma dimensão da configuração da

segregação urbana em Campos, não podemos negligenciar as novas territorialidades

geradas pelo programa Morar Feliz (AZEVEDO, TIMÓTEO, ARRUDA, 2013) por elas

alterarem significativamente a morfologia desta cidade. Além disso, o programa Morar

Feliz em Campos teve uma forte incidência na redefinição das áreas morais tidas como

violentas e nas novas formas de definir as favelas e estes ―novos territórios‖ como

―problemas da cidade‖. Os sentidos conferidos às favelas partiam das representações

sobre territórios em geral correspondentes aos ―aglomerados subnormais‖, retomando

os termos do IBGE. Paulatinamente, estes sentidos vêm se entremeando com as

representações sobre os conjuntos habitacionais criados no quadro do programa Morar

Feliz. Desta forma, se o censo do IBGE (IBGE, 2010; SIQUEIRA, 2016) aponta para a

existência de 27 favelas em Campos, ―as casinhas de Rosinha‖, apelido comum para se

referir a estes 18 conjuntos habitacionais, são outras áreas residenciais que aumentaram

recentemente o número de ―territórios da pobreza‖.

11

Guarus é um distrito da Cidade de Campos que compreende toda a área que se localiza na margem

esquerda do Rio Paraíba do Sul aglomerando vários bairros. 12

Sobre as representações campistas do distrito de Guarus e as avaliações morais relacionadas com o

habitar neste ―outro lado‖ do Rio, ver Assis (2016). 13

Zona geográfica, de planície, do município de Campos que abrange cinco distritos (aqueles localizados

entre o distrito sede e a orla): Goytacazes, São Sebastião, Tocos, Santo Amaro, Mussurepe.

172

Sociabilidades Urbanas – Revista de Antropologia e Sociologia v1 n2 julho de 2017 ISSN 2526-4702

Após a mudança dos moradores (em muitos casos, removidos de favelas e/ou

―áreas de risco‖ da cidade) em diferentes momentos do interstício 2009-2015, nestes

conjuntos, novos boatos se espalham aos poucos pela cidade; crimes ocorreriam

privilegiadamente nestas áreas (assaltos, estupros de mulheres, assassinatos, comércio

de drogas, expulsão de moradores, desovas etc.). Houveram ainda casos de expulsão de

moradores por traficantes por vezes noticiados na imprensa local14

. A circulação destes

boatos vem também aumentando fortemente a sensação de insegurança dos moradores

da cidade e reconfigura, desde 2009, o problema ―violência‖ em Campos, como Barros

(2012) apontava no ano em que defendeu sua monografia. Na nossa pesquisa de campo,

iniciada no final do ano de 2016, osatuais interlocutores que acompanham de perto os

conflitos existentes em um ou vários conjuntos habitacionais edificados no quadro do

programa Morar Feliz - comprometemo-nos em não identificá-los, por óbvias

exigências éticas -, foi frequentemente questionado (por eles) os modos de ―selecionar‖

os beneficiários das casas do conjunto sem nenhuma consideração sobre as

consequências de reunir moradores nestes em áreas residenciais anteriores

―controladas‖ pelas até então duas ―facções de tráfico‖ da cidade (em junho de 2017,

momento em que escrevemos este artigo, houve uma indicação por jornais locais de

que tais facções se ―uniram‖ e alguns moradores, interlocutores nossos, identificaram

uma redução imediata de conflitos urbanos relacionados com a criminalidade violenta

da cidade).

Pode-se ainda observar um novo movimento moral no que tange à tematização

da ―violência urbana‖ em Campos após a execução do projeto de Unidades de Polícia

Pacificadoras (UPPs) na cidade do Rio de Janeiro, iniciada em 2009, ano que

correspondia também ao início do Programa Morar Feliz. De 2011 a 2012, em sua

etnografia dos cafés comunitários e do conselho comunitário de segurança pública,

Barros (op. cit.) observou progressivas alterações nos modos de problematizar ―a

violência‖ em Campos e, em particular, um movimento que tendia a responsabilizar as

UPPs pelo aumento da violência em Campos. Nesta direção, estas formas de qualificar

as UPPs como grande responsável do aumento da criminalidade em Campos

ressignificava também ―a violência urbana‖ a partir de ―uma expansão do mundo do

crime‖ (FELTRAN, 2011). Articulando as diferentes matérias já levantadas com o

trabalho de Barros (op. cit.) e de Barros e Freire (2012), uma avaliação coletiva passa a

marcar o debate público: ele, ―o mundo do crime‖ da cidade do Rio, teria assim chegado

ao ―interior‖ e estava ―ocupando‖ os conjuntos habitacionais do programa Morar Feliz.

Pode-se destacar que outro importante aspecto da ―ocupação do tráfico‖ nos conjuntos

era problematizado a partir da copresença de ―facções opostas‖ em alguns dos conjuntos

do Morar Feliz.

Em sua análise sobre a circulação juvenil de moradores de periferias de Campos,

Siqueira (2016) propôs um mapeamento dos territórios da cidade ―controlados‖ por

facções de narcotraficantes. A autora identifica uma fronteira simbólica entre dois

outros lados da cidade, desta vez dividida (também geograficamente) pelo Canal Rio

Macaé (mais conhecido na cidade como ―Beira Valão‖). Os territórios nos quais drogas

são comercializadas de um lado da ―Beira Valão‖ seriam ―controlados‖ pela facção

14

Pode-se apreender a repercussão do caso da expulsão de uma família do conjunto habitacional do bairro

Eldorado, que ocorreu no dia 22 de setembro de 2012, notadamente em matérias dos sites de informações

da cidade de Campos dos Goytacazes: A matéria do site Ururau (particularmente consultado na cidade)

―Família é expulsa da própria casa por traficantes no Eldorado‖ (24/09/2012) In

http://www.ururau.com.br/cidades21762 ou aquela do jornal Terceira Via: ―Família é expulsa de casa por

traficantes em Campos ― (24/09/2016) In: http://177.184.3.226/noticias/campos-dos-

goytacazes/5586/familia-e-expulsa-de-casa-por-traficantes-em-campos-

173

Sociabilidades Urbanas – Revista de Antropologia e Sociologia v1 n2 julho de 2017 ISSN 2526-4702

Amigos Dos Amigos (ADA) e, do outro, pelo Terceiro Comando Puro (TCP). Segundo

a autora, essa rivalidade iniciou-se nos anos 1990, período de importantes conflitos

entre ―gerentes‖ do tráfico de drogas das duas principais favelas da cidade: a favela

Baleeira (―controlada‖ pela ADA) e a (Tira Gosto, pelo TCP). Semelhantemente às

análises de Farias (In: Machado da Silva, 2008), a autora observa também fortes

restrições de circulação dos jovens moradores destas favelas na cidade quando estes

temem frequentar um dos dois lados da ―Beira Valão‖ e justificam seus medos pela

presença de facções opostas.

Apresentamos resumidamente, nesta sessão, algumas das principais dimensões

que substanciam, em Campos, o problema ―violência urbana‖. A articulação destes

aspectos é central para fundamentar o problema de nossa pesquisa por ela permitir

apresentar o ambiente moral - isto é, parte de uma dimensão ecológica (PARK,1945)

destes conjuntos habitacionais e do problema ―violência urbana‖ em Campos - das

investigações (DEWEY, op. cit.) de familiares de vítimas após a perda de seus filhos.

Ao acompanhar a trama do problema ―violência‖ desta cidade, observamos uma

conexão de sentidos relacionada com as progressivas formas de problematizar a

segregação urbana em Campos que cada vez mais parece se articular com os modos de

elaborar e publicizar, recentemente, a ― ―violência urbana‖ em Campos: diferentes

divisões geográficas da cidade que se associam paulatinamente com fronteiras

simbólicas fundamentadas nas ―disputas de facções‖ que contribuiria para a

multiplicação de modos de ―dividir‖ a cidade (neste sentido, as fronteiras da ―beira rio‖

ou da ―beira valão‖ vêm sendo fortemente marcadas, como alguns trabalhos acadêmicos

apontam (como Siqueira, op. cit.), por respectivos ―controles generalizados‖ (não em

territórios circunscritos, e sim em extensas zonas da cidade) de grupos de

narcotraficantes na cidade em função de ―áreas de atuação do tráfico‖ em expansão;

logo, a criminalidade violenta e suas representações adquirem central relevância para a

compreensão da produção de novas formas de segregação urbana; uma política

habitacional (o programa municipal Morar Feliz) que aproximou moradores originários

de territórios residenciais associados a ―facções do tráfico‖ opostas, que exerceriam um

controle passado territorialmente circunscrito e, quando moram literalmente juntos (por

meio do referido programa), a copresença residencial destes moradores em ―novos

territórios‖, agora misturados, e geraria conflitos imediatos e inevitáveis pelas

identificações de seus moradores com as ―facções‖ que ―dominavam‖ suas áreas

residenciais de origens, independentemente da distância ou aproximação com drogas

e/ou com tais grupos.; tal política se elabora ainda em um pano de fundo de recursos

municipais marcados por repasses de royalties (que contribuíram para uma

representação de Campos como uma cidade rica e decadente após a ―crise do petróleo‖,

tocando a corda sensível de elites campistas que defendem um projeto ―de

modernidade‖ e, com ele, de ―desenvolvimento‖15

); e, por fim, as ―UPPs do Rio‖ na

capital do estado que teriam . Os empilhamentos (ARAÚJO, 2016) destes ―pacotes

interpretativos‖ (Gusfield, 1981) contribuíram para ressignificar paulatinamente a

linguagem da ―violência urbana‖ em torno de um de seu importante repertório e

personagem, ―o bandido‖, o qual era tido, após as UPPs, como fugitivo da metrópole.

O aumento do número de homicídios em Campos destacado no debate público

(que se confirma nas conversas com atuais interlocutores, apesar da ausência de

produção de dados sistematizados sobre a relação entre estes homicídios e os novos

conflitos que emergiram após as mudanças dos moradores nos conjuntos do programa

Morar Feliz) não se acompanhou de indignações no que tange às ―vítimas do tráfico‖,

15

Cf. Cruz, 2003.

174

Sociabilidades Urbanas – Revista de Antropologia e Sociologia v1 n2 julho de 2017 ISSN 2526-4702

ou senão de modo muito excepcional. Talvez a indiferença quanto ao aumento destes

tipos de homicídios, não mensurável oficialmente, possa sugerir uma naturalização ou

grande evitação de problematizar as consequências dos conflitos armados na cidade.

Além disso, a dinâmica associativa da cidade é fortemente marcada pelas oposições de

movimentos de base, associações de moradores em particular, à administração

municipal dos anos 70, que representava interesses de elites agrárias e da indústria

canavieira:

―A administração pública local, enquanto representante dos interesses das

tradicionais elites agrárias associadas à indústria canavieira, era vista como o

principal alvo na luta pela democratização das estruturas de poder no

município. Em função deste processo de mobilização, as associações de

moradores que eram apenas duas na década de 1970, chegaram a representar

45% do total das entidades associativas criadas durante a década de 1980‖

(FONTE).(AZEREDO, op. cit. p. 48).

Criada em 1983, a Federação das Associações de Moradores e Amigos de

Campos (FAMAC) contribuiu para uma série de mobilizações na cidade que tiveram

fortes repercussões, como aquelas contra os aumentos abusivos do IPTU (op. cit.). No

entanto, AZEREDO (2008) a drástica diminuição de associações de moradores na

década de 90 associada, neste trabalho, ao personagem de Anthony William Matheus de

Oliveira:

―Neste sentido, um fator que merece destaque na conjuntura campista é a

ascensão política de Anthony William Matheus de Oliveira, o Garotinho, cuja

liderança no movimento denominado de ―Muda Campos‖ serviu para que se

tornasse prefeito do município. O Movimento ―Muda Campos‖ articulava

diferentes segmentos da sociedade civil organizada, entre eles, o próprio

movimento associativo de bairros representado pela FAMAC. Para Franco

(2006), as eleições municipais de 1988 constituíram um marco importante da

história política de Campos dos Goytacazes, na medida em que iniciaram um

período no qual Anthony Matheus, o Garotinho, se tornou o maior articulador

―da política municipal. Esta posição foi mantida por 15 anos, onde Garotinho

se tornou praticamente imbatível eleitoralmente. No entanto, Franco postula

que as tradicionais práticas de dominação política, associadas à elite agrária

canavieira, foram substituídas a partir de 1988 ―por um enorme clientelismo

montado a partir da inviabilidade eleitoral das antigas formas de dominação

pessoal e do vultoso montante de recursos orçamentários possível com o

advento dos royalties do petróleo‖ (Franco, 2006:73). Para Franco, este

clientelismo pode ser identificado nas numerosas contratações para a

prestação de serviços públicos, através das nomeações para os cargos em

DAS (Cargo de Direção e Assessoramento). Deste modo, é importante

ressaltar que a retração na atuação do movimento de bairros coincidiu com a

ascensão política de Anthony Garotinho na política local, podendo

representar o momento inicial de cooptação das principais lideranças

comunitárias pela administração pública‖ (AZEREDO, op. cit. 49)

O autor sugere uma retomada deste movimento de base no meado da década de

2000. Porém, as mobilizações das associações são atualmente pouco visíveis na cidade.

No âmbito de pesquisas sobre o tema das mobilizações coletivas e da construção de

problemas públicos em Campos, na década de 2000, desenvolvidas por membros do

grupo Cidades, espaços públicos e periferias (CEP28), observamos a presença de

associações de moradores em Cafés Comunitários ou no Conselho de Segurança

Pública. Neste caso, seus representantes abordavam problemas particulares do bairro

(como os ―buracos nas ruas‖ ou problema de iluminação do bairro), mas nunca tocavam

em público o assunto das mortes provocadas por conflitos de tráfico de drogas, mesmo

nos bairros mais afetados por esta forma de letalidade. Estas observações motivaram a

175

Sociabilidades Urbanas – Revista de Antropologia e Sociologia v1 n2 julho de 2017 ISSN 2526-4702

proposta de analisar as experiências públicas de moradores de Campos para

compreender como lidam com a morte de familiares no ambiente apresentado nesta

seção. Se os canais de denúncias parecem (de acordo com o que estamos observando)

escassos, as conversas que realizamos com mães e irmãos apontam para outros formatos

de engajamentos dos familiares de vítimas de Campos. Desta forma, propomos dar

continuidade a este mapeamento na atual pesquisa, mas focalizando-nos agora nas

implicações da modalidade de reconhecimento da ―sociabilidade violenta‖16

(MACHADO DA SILVA, 2010) no que tange às formas de experimentar e vocalizar,

por familiares, perdas de filhos, em contexto extra metropolitano. A orientação do

debate público sobre ―a violência em Campos‖ aponta para as formas segundo as quais

uma cidade do ―interior‖ (categoria que usualmente se distancia de conflitos geralmente

aproximados a conflitos metropolitanos) apresenta indicadores e posições em ranking

estaduais, nacionais e mundiais que competiria com índices de criminalidade violenta,

geralmente associados à grande cidade. Este é um dos motivos pelos quais Campos dos

Goytacazes torna-se, também, um bom caso para pensar..

Soares (op. Cit.) analisou os recursos emotivos mobilizados por gestores

públicos e ―usuários‖ do programa municipal de habitação Morar Feliz. O estudo desta

autora se focalizou nas diversas formas de justificar este programa por funcionários da

prefeitura da ―era Garotinho‖, que freqüentemente recorriam a uma gramática de

necessidade. Esta gramática e as orientações da prefeitura de alojar emergencialmente

moradores que residiam em ―áreas de risco‖ foram determinantes para selecionar os

beneficiários prioritários na primeira fase do programa Morar Feliz. Desta forma,

retomando o nome do programa, a autora procurou analisar os sentidos conferidos à

―felicidade‖ dentre outras emoções apresentadas em público que promovia esta política

habitacional e as formas de agradecimentos pelos seus moradores que podiam ser

divulgadas na imprensa regional. Em vez dos ―usuários‖ perceberem o acesso à moradia

como um ―direito social‖, retomando a categoria de certos funcionários da prefeitura,

tantas as demandas por habitação quanto o reconhecimento da política após a concessão

da casa de seus beneficiários eram marcados, nesta época, pela sensação de serem

―presenteados‖ pela prefeitura e, mais particularmente, por ―Rosinha‖ (apelido do

prefeito durante seus dois mandatos, de 2009 a 2017) ou por Deus. Frequentemente, a

casa recém adquirida era tida como ―dádiva ―pelos moradores e, na opinião pública, se

multiplicavam agradecimentos à ―Rosinha‖ e a ―Deus‖ (SOARES, 2014). A pesquisa

foi concluída em 2014 no momento em que o ―assunto violência‖ relacionado com estes

novos conjuntos habitacionais aparecia ainda timidamente no debate público campista.

No entanto, observamos posteriormente importantes alterações no que tango às

formas de qualificar o programa Morar Feliz após a pesquisa de Soares. Por este

motivo, propusemos em seguida compreender os atuais enquadramentos cognitivos do

―problema habitação na cidade‖ que correspondem aos momentos em que os conjuntos

passaram a ser associados ao ―recrudescimento da violência em Campos dos

Goytacazes‖ (cujo auge, situamos aproximada e temporalmente, nos três últimos anos

seguindo as novas pautas que surgiram no debate público da cidade). Aos poucos, estes

lugares eram tidos como áreas de concentração do tráfico de drogas, de assassinatos e,

16

Sobre a noção de sociabilidade urbana e sua articulação com a linguagem da violência urbana, remeto-

me às contribuições de Machado da Silva (2010). Segundo este autor: (...)a partir do reconhecimento de

uma ―sociabilidade violenta‖, a linguagem dos direitos deixou de articular de maneira unívoca o conflito

social (e os medos a ele associados), passando a competir com a linguagem da violência urbana, que

tematiza os sentimentos difusos de insegurança que pesam sobre as expectativas de prosseguimento

pacífico das rotinas diárias e geram a mentalidade de ―segurança apesar dos outros‖, no lugar da

―segurança com os outros‖, para usar as conhecidas expressões de Bauman (2001, 2000) na sua

interpretação do ―inimigo próximo‖. (MACHADO DA SILVA, 2010, p. 288).

176

Sociabilidades Urbanas – Revista de Antropologia e Sociologia v1 n2 julho de 2017 ISSN 2526-4702

mais amplamente, da condensação da criminalidade violenta. Os conflitos letais eram

associados ao fato de que moradores originários de ―áreas controladas por facções

opostas‖ estavam doravante reunidos e convivendo em mesmos conjuntos habitacionais

―do Morar Feliz‖. Em todos estes momentos, as indignações de familiares de vítimas

(compartilhadas por alguns atores atuando em serviços públicos e com casos de mortes

de jovens moradores de periferias serem cotidianamente noticiados) era, em todos os

momentos, ausente deste debate.

Nas nossas conversas atuais, os familiares problematizam constantemente a

incapacidade ou a impossibilidade de vocalizar estas experiências de injustiça em

Campos. Desta forma, comparando os relatos de algumas mães de vítimas de violência

policial no quadro da pesquisa coordenada por Luiz Antonio Machado da Silva (2008)

com aqueles atualmente analisados, procuram-se compreender os contrastes entre

diferentes formas de engajamento de atores mobilizados em arenas de publicização ou

os seus impedimentos. Em resumo, estamos procurando descrever e interpretar

momentos em que familiares apresentam ao pesquisador os ―casos‖ de seus filhos (sem

que estes se tornam ―públicos‖, pelo menos na aceitação cívica do termo), questionando

os modos de tematizar a ―violência urbana‖ no debate público do Rio de Janeiro. Porém,

diferentemente do que foi explorado anteriormente (FREIRE, 2010 e FREIRE, 2017),

esses atores abordam a problemática da não participação na arena de publicização

mobilizada para denunciar casos de vítimas de violência policial, de milicianos e de

traficantes. Mesmo quando são convidados a integrar coletivos de familiares de vítimas

(os quais são localizados na região metropolitana), não conseguem ou não podem se

engajar na arena. Preferindo evitar a política, no caso em análise, por serem

frequentemente ameaçados e com dificuldade, senão impossibilidade, de situar suas

experiências de injustiça nesse horizonte de publicização, se refugiam no silêncio e na

resignação. ―Desgastados‖, ―exaustos‖ e, por vezes, ―resignados‖ — tais são alguns dos

termos que aparecem nos atuais relatos —, eles descrevem a impossibilidade, a recusa

ou a falta de força para se engajar na arena e, aquém disso, de depositar uma queixa que

iniciaria uma investigação policial. Alguns apresentam suas incredulidades em relação

ao tratamento de suas perdas no horizonte da ―justiça dos homens‖. Outros, muitas

vezes ameaçados de represálias, avaliam que seus filhos (particularmente se estes

moravam na rua, usavam drogas ou eram próximos de traficantes) eram particularmente

expostos ao risco de serem assassinados. Em dois casos, familiares comentaram que a

morte do filho já era anunciada quando este ainda estava vivo.

Nessas conversas com dez mães (duas dentre elas convidaram também outros

filhos, irmãos de vítimas para nossos encontros), observou-se ainda um ponto comum

entre esses relatos: em tais circunstâncias, a fé do familiar permite se defrontar com a

ameaça do esquecimento do filho assassinado, como se permitisse que a família não

venha a desmoronar e que a mãe se mantenha viva (nem que seja para cuidar dos outros

filhos vivos). Abordam momentos em que a participação política é rigorosamente

evitada e onde se coloca paralelamente a questão de pertencimento às comunidades

religiosas. Se a esperança na ―justiça dos homens‖ é (também) perdida, é em torno

daquela depositada na ―justiça divina‖ que se desenham outras formas de participação,

distantes da ―forma de denúncia pública‖ (BOLTANSKI, 1990) ou de um regime de

justificação (BOLTANSKI e THÉVENOT, 1991). Exacerbam-se, então, intensos

engajamentos em comunidades pentecostais a partir dos quais se recompõem ―a

dignidade‖ (termo recorrentemente mobilizado nos relatos) da família e a do filho morto

e se elaboram outras formas de vocalizar a perda, não mais orientadas na direção da

―justiça dos homens‖.

177

Sociabilidades Urbanas – Revista de Antropologia e Sociologia v1 n2 julho de 2017 ISSN 2526-4702

Considerações Finais: os públicos religiosos: luto, experiência pública e fé

Como já anunciamos desde o início, o presente artigo procurou apresentar os

problemas de uma pesquisa recentemente iniciada, que nos pareceram importante

publicar mesmo em estágio tão inicial pelo fato de que diferentes questões que já

emergem ao longo da pesquisa de campo nos conduzem em retomar substantivamente

questões de ordens metodológicas, analíticas e teóricas.

Problematizar a violência urbana como linguagem remete a um recorte

socioantropológico fortemente marcado, no debate acadêmico do estado do Rio de

Janeiro, pelas contribuições de Luiz Antonio Machado da Silva e de Michel Misse.

Apesar das diferenças substantivas entre essas contribuições, a problematização da

violência urbana como linguagem permite privilegiar a compreensão das representações

sobre a violência urbana e como estas incidem nos ordenamentos sociais da cidade do

Rio de Janeiro, em particular que se estende, na nossa proposta, ―ao interior‖, (mesmo

considerando suas variações e ressignificações em tal contexto).

O problema desta pesquisa ainda se elaborou a partir da proposta de Quéré e

Terzi (2015) e Diaz (op. cit.) denominaram de sociologia da experiência pública.

Considerando o ―público‖ como uma forma e uma modalidade de experiência, esta

sociologia se focaliza no estudo empírico da organização prática de experiência (op.

cit.). Como é também o caso destes autores, inspiramo-nos ainda em diversas

contribuições de Dewey (notadamente The Public and Its Problems, 1927), porém

considerando recentes críticas de pesquisadores em relação a esta obra, que também

dialogam com a antropologia capacitaria de Paul Ricoeur. No plano da sociologia,

alguns pesquisadores (como Breviglieri, 2017) observam certa naturalização em outras

pesquisas pragmatistas (mesmo eles se reconhecendo nesta abordagem) aos modos de

tomar como taken for granted um caminho do reconhecimento, que dialogam com a

obra de Dewey e de Goffman no que tange ao pressuposto das competências ou

capacidades dos atores. A principal crítica se focaliza nas formas como vem sendo

problematizado o agir em um horizonte de reconhecimento. Neste caso, ―o público‖

emerge, se constitui e se organiza em torno de uma investigação a partir de uma

situação indeterminada possa exercer algum controle sobre transações cujas

consequências o afeta indiretamente. No entanto, diferentemente da ―sociologia dos

problemas públicos‖17

, inspirada nas obras de Dewey e iniciada a partir das

contribuições de Gusfield (1891)18

, frequentemente voltadas para os modos de perceber,

identificar e problematizar uma situação indeterminada, há alguns anos, diferentes

autores vem questionando ―o otimismo‖ desta sociologia. Com efeito, Quéré e Terzi

(op. cit.), retomando observações empíricas realizadas em grande maioria em contexto

francês ou de países vizinhos, avaliam que Dewey supervalorizou ―os choques‖

(cognitivos) que gerariam uma ruptura nas rotinas dos atores e orientariam então a

operação de definição ―situação problemática em sua qualidade imediata‖, (isto é,

―embaralhada, conflituosa, desordenada‖ etc.‖, Dewey, 1983 [1938]).

Retomando o trabalho de Stavo-Debauge (2012), estes autores ainda apontam

para o fato de que aqueles que sofrem deste ―choque‖ não seriam sempre atores capazes

de avaliar, em momentos turvos, a positividade gerada pelo estímulo gerado pela

situação problemática, isto é, de tornar-se ―problematizadores‖ e ―exploradores‖ (em

alusão aos modos segundo os quais Dewey percebe o público como uma ―comunidade

de exploradores‖). Stavo-Debauge (op. cit.) e os autores supracitados destacam as

17

Sobre a Sociologia dos problemas públicos, Cf., dentre outros, Cefaï e Joseph, 2002 e Cefaï, 2013. 18

Para uma apresentação da obra de Guslfied e suas articulações com problemas públicos em contexto

brasileiro, cf Freire, 2016.

178

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situações em que os atores podem estar profundamente incapazes de se deparar com tal

―choque‖ e de encontrarem então a energia que despertaria o início de uma

investigação. Freire (2013), analisando algumas de suas pesquisas empíricas a

posteriori, ainda observa que a percepção, identificação e problematização de uma

situação tida como problemática não se encerra necessariamente em um processo de

publicização, mais ainda em, contexto brasileiro no qual as modalidades de uso da força

desmedida são profundos obstáculos para muitas modalidades de engajamentos em

mundos cívicos. Em diálogo com os trabalhos de Stavo-Debauge (op. cit.) e de

Breviglieri (2008), mas partindo de um contexto carioca e fluminense da ação coletiva,

a autora (2017) ainda observou que em situações de ação coletiva marcadas pelo uso da

força desmedida (Brodeur, 2004), muitos dos atores que defendem causas em prol de

moradores de favelas e de periferias se deparam com uma série de obstáculos e ameaças

de represálias que tornam árduos um esforço associativo na forma de uma arena

―pública‖ (por este motivo, a autora prefere se referir, nos casos analisados por ela de

―arena de publicização‖, que permite dar conta que a problematização coletiva da

situação indeterminada é ela também, indeterminada). Neste sentido, a evitação do

tratamento de certos assuntos ou o exit (tal como Freire (2016) problematizou a partir da

obra de Hirshman) dos atores em compor estas arenas, como é o caso dos familiares de

Campos, precisam ser retomados a partir do trabalho de significação (Snow apud Freire,

2016) das pessoas e entremeado com uma análise do quadro de forças em jogo, e logo

de ameaças que pesam no processo de investigação, o que contribui para uma

compreensão sociológica de públicos – sem privilegiar a articulação entre formas

cívicas (no sentido de Boltanski e Thévenot, 1991) e ação coletiva.

Desta forma, Quéré e Terzi (op. cit.) observam que as situações indeterminadas

não resultam sempre na constituição de um público de investigadores, dispostos para

questionar e experimentar soluções inéditas. Afirmam que as situações indeterminadas

podem ainda atiçar temores, mais ainda quando são suscitados pela ameaça de um

conflito interno (o que também se articula com a proposta de Freire, mesmo que a

autora não problematize nestes termos a questão da ameaça, por ela partir das formas

como os atores definem, em situações de conversa, o que é a ameaça, mas sendo de todo

modo vivenciada como ―interna‖):

―Quando tal maneira de se deparar com problemas transformam-se em rotina,

a coletividade tende em se instalar em uma postura defensiva de

encolhimento de modo que os problemas que emergem, longe de

desestabilizá-la apenas conforta mais ainda os preconceitos os mais

enraizados e nos costumes mais rotineiros‖. (QUÉRÉ e TERZI, op. cit. p.8,

tradução nossa)

Estas observações conduzem os autores em focalizar a noção de situação

indeterminada no conjunto de ―dinâmicas experimentais‖ (op. cit. P. 17) durantes as

quais o que denominam de ―comunidades desestabilizadas‖ se converte paulatinamente

em público para reconfigurar instituições e engajar ―um trabalho de valiação (valiation)

e de avaliação‖ (idem, ibid.) – reorientando assim o problema de Dewey -, trabalho que

não é mais taken for granted. Desta forma, sustentam que o público é indissociável da

experiência de problematicidade cuja compreensão partiria da inteligibilidade endógena

das atividades pelos quais os atores organizam e geram as situações da vida cotidiana,

em suma da ―accoutability‖, tal como proposto por H. Garfinkel.

Ainda destacamos os modos segundos os quais Quéré e Terzi definem ―o

público‖, que – no nosso entendimento - parece escapar de muitas das tendências atuais

em reduzir esta noção a um plano estritamente institucional ou, mesmo quando

problematizado por autores que se situam em uma herança da obra de Dewey, de uma

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associação exclusiva do termo com a ideia de ―comunidade de investigadores‖. Segundo

Quéré e Terzi, ―(...) Toda experiência, desde que seja inteligível, pode ser tida como

pública no sentido de que ela pode estruturar, encobrir uma forma inteligível e logo

observada e descrita enquanto tal apenas se ela incorpora mediações públicas‖ (op. cit.,

p. 20). Para fundamentar esta afirmação, os autores recorrem a Wittgenstein que negava

a possibilidade de existir uma linguagem privada e lembram que o próprio Dewey

preconizava que a observação de um evento era necessariamente associada ―às

características publicamente determinadas na linguagem, algo ‗apreendido sob

condições sociais e públicas‘ [DEWEY, 1943 3 1938, apud QUÉRÉ; TERZI]‖ (op. cit.

p. 21). Estas definições ainda dialogam com a obra de Goffman que também propôs

partir de uma noção particularmente elástica do ―público‖, que se formaria no momento

em que haveria uma relação de face a face entre pelo menos dois atores corporalmente

em co-presença, logo consciente da reciprocidade de sua visibilidade19

. Desta forma, o

que une os autores supracitados, é que esta sociologia ―da experiência pública‖ toma

como cerne modalidades de organização social em conjunto, o que implica

problematizar a ordem pública a partir do esforço de descrever modalidades de

coordenações do ponto de vista dos atores e de suas ―accountabilidade‖. No caso desta

pesquisa, como a copresença corporal é permeada por um pano de fundo de forças que

representam rotineiramente uma ameaça à vida, a plasticidade do que se define por

―público‖ nos parece representar uma condição da execução do projeto. Com efeito, nas

primeiras conversas exploratórias que realizamos, os relatos apontam para uma recusa

dos familiares com os quais conversamos de orientar suas ações, após as mortes dos

filhos e/ou irmãos, na direção de denúncia pública ou de participar da arena de

publicização ―dos familiares de vítimas‖. Em quase todos os casos das conversas desta

atual pesquisa, mães e/ou irmãos problematizaram os modos de lidar com suas perdas a

partir de novos ou da intensificação de investimentos (para aqueles que já participavam

de igrejas pentecostais) em comunidades pentecostais. Por este motivo, se seguirmos

uma definição do ―público‖ elaborada a partir de eixos analíticos cívicos ou

institucionais, ou de um plano sociológico e normativamente definido, perderíamos a

possibilidade de compreender como estes engajamentos podem traduzir outras

modalidades de engajamentos públicos do ponto de vista de familiares, os quais, por sua

vez, não se voltam para planos institucionais, de denúncia pública ou de outras formas

de ação coletiva ―tradicional‖ no sentido sociológico convencional do termo (como

seria o caso, por exemplo, de atores integrarem a arena de publicização ou movimentos

sociais contra os públicos mais fortes que problematizam ―a violência urbana‖ e

articulam tal assunto como combate aos ―bandidos‖).

Paralelamente na literatura pragmatista, a questão da incapacidade dos atores

tende a ser eventualmente associada à ideia de um encolhimento (repli) de si que pode

eventualmente se traduzir na busca de um fechamento comunitário (mas que talvez, na

nossa leitura, não exclua a dimensão eminentemente pública dos engajamentos

encolhidos). Por exemplo, Quéré e Terzi procuram demonstrar que dadas situações

indeterminadas e os modos de se deparar com problemas se convertem em rotina ―a

coletividade tende e se instalar em uma postura defensiva de encolhimento de modo que

os problemas que emergem, longe de desestabilizá-la, como vimos, a conforta mais

19

Se as definições do público deveriam partir do conjunto da obra Goffmaniana, observa-se que Goffman

define explicita e insistentemente o público como copresença corporal em Goffman (2011 [1967]). O

autor chama, no livro Ritual de a atenção para a centralidade de focalizar o olhar sociológico nos corpos

em copresença, pois esta é a característica a partir da qual é possível ler o problema da visibilidade

recíproca e os decorrentes ajustamentos dos atores às situações, problema que também atravessa o

conjunto de sua obra.

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ainda nos seus preconceitos os mais enraizados e nos seus hábitos mais rotineiros‖ (op.

cit., p. 8)

Neste sentido, ainda que estes autores propõem criticar a ideia que marca o

pragmatismo americano – filosófico e sociológico -, a questão da incapacidade do agir

parece convertida em uma modalidade de encolhimento do (s) ator (e) s – não sendo

neste caso um problema de inação, mas de momento em que o refúgio voltado para si

parece tornar-se uma outra capacidade mínima, diante da incapacidade de agir. Nestes

termos, como hipótese que procuramos explorar nas atuais e próximas etapas da nossa

pesquisa e em relação ao objeto e problema que propomos aqui, se o encolhimento não

seria uma versão interpretativa de crítica ao modelo de competência dos atores. Parece-

nos também que tal pressuposto declina também o convite de problematizar a

emergência de públicos religiosos, porém centrais em contexto brasileiro marcado por

uma fluidez entre engajamentos religiosos e engajamentos cívicos. Neste sentido, a

―justiça divina‖, quando a voz não pode ser compartilhada com homens, pode apontar

para sentidos bastante impensados sobre outras formas de elaboração de públicos.

Por este motivo, procuramos atualmente compreender, a partir de nossas

conversas com familiares, os sentidos de justiça que correspondem com os

engajamentos e/ou encolhimentos em comunidades religiosas (católicas e,

principalmente, evangélicas). Neste momento da pesquisa, como já apresentamos,

estamos observando que o engajamento e encolhimento nas comunidades religiosas se

repete nos relatos dos familiares pelo fato de que a aproximação com a justiça divina é

nitidamente um dos poucos caminhos que permite lidar com uma perda insuportável e

não denunciável por medo de ameaças e de represálias. Parece-nos que tal experiência

corresponde a um momento chave dos processos de investigação que estamos tentando

reconstituir, o da perda de ―fé na justiça dos homens‖. Paralela e muito

excepcionalmente, no caso de uma mãe com a qual uma das autoras conversou, a

impossibilidade da ―busca por justiça‖ é acompanhada de uma resignação generalizada,

que gerava também uma recusa de pertencer à comunidade religiosa apesar de ter sido

inúmeras vezes convidadas para participar de cultos evangélicos e católicos. Neste caso,

a vida desta mãe seguia com uma profunda indignação no limite do dizível e do

compartilhável, que não se convertia em um processo de investigação pelo impacto da

perda e da avaliação de que ―nada poderia ser feito‖.

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