³violência urbana´ e experiências públicas de familiares ... · trafficker conflicts by...
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FREIRE, Jussara; FERREIRA, Diogo da Cruz; SOARES, Viviany F. M. S.; SANTOS, Tayná. ―Violência
urbana‖ e experiências públicas de familiares de vítimas ―no interior‖ do estado do Rio de Janeiro .
Sociabilidades Urbanas – Revista de Antropologia e Sociologia, v.1, n.2, p. 165-185, julho de 2017. ISSN
2526-4702.
Artigo
http://www.cchla.ufpb.br/sociabilidadesurbanas/
―Violência urbana‖ e experiências públicas de familiares de vítimas ―no
interior‖ do estado do Rio de Janeiro
“Urban violence” and public experiences of victims’ relatives “on the countryside” of the
state of Rio de Janeiro
Jussara Freire
Diogo da Cruz Ferreira
Viviany Férras da Motta dos Santos Soares
Tayná Santos
Resumo: Este artigo apresenta considerações exploratórias de uma pesquisa em andamento
que tem como objeto as experiências públicas de familiares de vítimas de homicídios
relacionados com os modos de problematizar ―a violência urbana‖ em Campos dos
Goytacazes (cidade do estado do Rio de Janeiro). O objetivo do presente artigo é, de um
lado, apresentar como se configura uma linguagem da ―violência urbana‖ em uma cidade
média qualificada como ―interiorana‖. Por outro lado, apresentaremos as primeiras
considerações sobre experiências de familiares após a perda de seus filhos assassinados por
narcotraficantes e os recursos que mobilizam para lidar com este luto, em um contexto
urbano marcado pela inexistência de movimentos sociais, coletivos ou outras instituições
que poderiam ouvir e/ou ancorar denúncias de mortes de vítimas de conflitos entre
narcotraficantes por familiares. Desta forma, procuramos compreender como se articulam a
linguagem da ―violência urbana‖ em um contexto extra-metropolitano com ―os processos
de investigação‖ no sentido de Dewey (2003) e nos inspirando dos modos segundo os quais
Quéré e Terzi (2015), Stavo-Debauge e Trom (2004), Breviglieri (2008) e Menezes (2014),
retomaram esta proposta da filosofia pragmatista conduzidos por familiares que são
atualmente nossos interlocutores. Palavras-chave: processo de investigação, política
habitacional, violência urbana, luto, familiares de vítimas.
Abstract: This article presents the exploratory considerations of an ongoing research that
has as object the public experiences of relatives of victims of homicides related to the ways
of problematizing "urban violence" in Campos dos Goytacazes (city of the state of Rio de
Janeiro). The aim of this article is, on the one hand, to present how a language of "urban
violence" in an average city qualified as "interiorana" is configured. On the other hand, we
will present the first considerations about family experiences after the loss of their children
murdered by drug traffickers and the resources they mobilize to deal with this mourning, in
an urban context marked by the absence of social movements, collectives or other
institutions that could hear and/or anchoring allegations of deaths of victims of drug-
trafficker conflicts by relatives. In this way, we seek to understand how the language of
"urban violence" is articulated in an extra-metropolitan context with "research processes" in
the sense of Dewey (2003) and inspiring us in the ways in which Quéré and Terzi (2015),
Stavo-Debauge and Trom (2004), Breviglieri (2008) and Menezes (2014), have taken up
this proposal of the pragmatist philosophy led by family members who are currently our
interlocutors. Keywords: investigation process, housing policy, urban violence, mourning,
family of victims
A pesquisa em andamento, cujo projeto fundamenta este artigo, partiu de nosso
estranhamento quanto à ―ausência‖ de arenas públicas (CEFAÏ, 2000) problematizando
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as mortes de moradores de ―periferias‖ de Campos dos Goytacazes (cidade média do
interior do estado do Rio de Janeiro) relacionadas com a criminalidade violenta desta
cidade. Observávamos inicialmente um contraste entre mobilizações coletivas de luta
contra a violência institucional, das quais participavam movimentos de familiares de
vítimas de violência policial, na cidade do Rio de Janeiro (BIRMAN e LEITE (2008);
ARAUJO (2008); FREIRE e TEIXEIRA (2017); FARIAS (2007), isto é, em contexto
metropolitano, em relação ao que identificávamos inicialmente como ―ausência‖ de
movimentos sociais em Campos (contexto extra-metropolitano do mesmo estado).
Como detalharemos posteriormente, o debate público campista vem dando cada
vez mais visibilidade ao ―aumento de homicídios‖ decorrentes de conflitos entre
narcotraficantes da cidade de Campos dos Goytacazes que afetam, em particular,
moradores de favelas e de novos conjuntos habitacionais edificados no quadro do
programa habitacional ―Morar Feliz‖. A ―violência urbana‖1 é, neste caso, associada
exclusivamente aos confrontos entre personagens tidos como ―traficantes de drogas‖ ou
―bandidos‖. Diferentemente do caso da cidade do Rio de Janeiro, o personagem do
policial é também ausente das formas de tematizar o problema ―violência urbana‖ em
Campos, outro importante contraste em relação aos modos segundos os quais este
problema se configura no contexto extra-metropolitano do Rio de Janeiro (Campos se
tornando, no caso deste trabalho, um caso particular de uma cidade média possível).
Nos jornais locais dados estatísticos que já levantamos, bem como nas conversas
cotidianas desta cidade, ainda observamos que a categoria ―auto de resistência‖, por
exemplo, não aparece como ―um problema da cidade‖ relacionado com aquele da
―violência urbana‖2.
Estas primeiras observações conduziram a primeira autora em propor uma
pesquisa, em continuidade com seus trabalhos anteriores – que abordavam
exclusivamente contextos metropolitanos do estado do Rio de Janeiro (FREIRE, 2010;
FREIRE, 2014; FREIRE, 2016 e FREIRE, 2017) - sobre as experiências públicas de
familiares de vítimas de homicídios ―no interior‖ cujas mortes são também
problematizadas ―como consequência da violência urbana‖. Devido à atuação
profissional desta autora no campus da Universidade Federal Fluminense em Campos
dos Goytacazes, propôs-se, na presente pesquisa, descrever e interpretar as experiências
públicas de familiares após a perda de seus filhos assassinados por narcotraficantes e os
recursos que mobilizam para lidar com este luto, em um contexto urbano marcado por
uma ausência de movimentos sociais, coletivos ou instituições que poderiam ancorar
denúncias de mortes de vítimas de conflitos entre narcotraficantes. Desta forma,
propusemos analisar ―os processos de investigações‖ no sentido de Dewey (2003)
(inspirando-nos também nos modos segundo os quais Quéré e Terzi (2015); Stavo-
Debauge e Trom (2004); Stavo-Debauge (2012); Breviglieri (2008) e Menezes (2014),
retomaram esta proposta da filosofia pragmatista) conduzidos por estes familiares,
procurando restituir as tramas e os engajamentos destes atores após à perda do filho
1Sobre a categoria ―violência urbana‖, aludimos a uma linguagem que expressa uma categoria nativa do
que se entende por violência e às decorrentes justificativas que emergem no debate público no que tange
ao uso da força desmedida. Assim como a ―metáfora da guerra‖ de (LEITE, 2012), ―A gramática da
―violência urbana‖ altera profundamente os termos dos conflitos sociais, com os atores passando a
discutir, no plano ordinário (e não em sua dimensão institucional) das relações interpessoais, quem
(pessoa e/ou grupo) não se qualifica como portador de direitos. (MACHADO DA SILVA, 2015, p. 10). 2Evidentemente, isso não significa que não existe violência policial em Campos, mas, neste momento da
pesquisa, ainda não muito poucos elementos para concluir sobre as formas como ela se apresenta na
cidade. No entanto, como a pesquisa trata de problematização da ―violência‖ do ponto de vista dos atores
que participam da elaboração do debate público, a falta de visibilidade da violência policial torna-se um
primeiro elemento da pesquisa a ser desenvolvido posteriormente.
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morto. Em outros termos, a proposta é de analisar as avaliações, qualificações e
experiências de familiares que perderam seus filhos assassinados por traficantes e como
estas se articulam com uma linguagem da ―violência urbana‖ de uma cidade média,
caso particular do possível, neste caso, Campos dos Goytacazes.
O problema desta pesquisa se articula com aquele que os quatros autores
exploram ou exploraram em trabalhos anteriores: Jussara Freire, integrante do Coletivo
de Estudos sobre Violência e Sociabilidade (CEVIS), participou da pesquisa ―Vida sob
cerco‖ coordenado por Luiz Antonio Machado da Silva (Machado da Silva, 2008) e
neste quadro havia analisado, com a equipe deste grupo de pesquisa, os engajamentos,
recursos e competências políticas de ―líderes comunitários‖ de favelas do Rio de Janeiro
e de mães de vítimas de violência policial para acessar o espaço público. Viviany
Soares, por sua vez, no quadro de sua participação em duas pesquisas do grupo Cidades,
espaços públicos e periferias, coordenado por Jussara Freire, ainda enquanto aluna de
graduação participou de duas pesquisas abordando, em um caso, a reconfiguração da
sociabilidade urbana após grandes empreendimentos em Campos (em particular, o Porto
do Açu) e, em outro, os modos segundos os quais moradores desta cidade
problematizavam a ―violência‖3. Tayná Santos analisou, de 2015 a 2016, interações
entre funcionários públicos e ―usuários‖ em situação de atendimentos em unidades de
saúde, de Campos focalizando o problema da pesquisa nas tensões e conflitos que
emergem e nos modos de administrá-los4. Atualmente, Tayná Santos é bolsista de
iniciação científica em novo projeto de pesquisa, coordenado por Jussara Freire, cuja
proposta é descrever e interpretar a trama do ―problema violência urbana‖ em Campos
dos Goytacazes5. Diogo Ferreira da Cruz, por fim, após ter etnografado as
configurações da sociabilidade em um conjunto habitacional de uma pequena cidade de
Minas Gerais, que se alteraram ao longo do tempo diante do aumento das ameaças e uso
da força por narcotraficantes, estuda atualmente as formas de habitar de moradores de
um dos conjuntos do programa Morar Feliz em Campos dos Goytacazes no quadro de
sua tese de doutorado em andamento6. Nesta atual pesquisa, propomos dar continuar a
estas experiências e dar desdobramentos aos resultados de nossas pesquisas anteriores,
3Freire Jussara e Santos, Viviany (2012). Os grandes empreendimentos da expansão universitária a na
região norte-fluminense: reconfiguração da sociabilidade e novos problemas públicos. 2012 (projeto
coordenado por Jussara Freire e financiado como bolsa de Iniciação Científica da Fundação Carlos
Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro- FAPERJ): Santos, Viviany,
Construindo a Sensação de Insegurança em Campos dos Goytacazes: o ponto de vista dos moradores.
Trabalho de conclusão do curso de Serviço Social da Universidade Federal Fluminense Proteção social e
Política Habitacional em Campos dos Goytacazes. O Programa Morar Feliz sob uma perspectiva
interdisciplinar. 4Freire, Jussara e Santos, Tayná (2016) ―Vulnerabilidades da experiência citadina e acesso aos espaços
públicos urbanos em cidades do norte-fluminense‖ (projeto coordenado por Jussara Freire e financiado
como bolsa de Iniciação Científica PIBIC/PROPPI/UFF – 2015/2016). 5Freire Jussara e Santos, Tayná (2017). Tramas da ―violência política‖ em Campos dos Goytacazes:
grupos de extermínios, narcotraficantes e milícias (projeto coordenado por Jussara Freire e financiado
como bolsa de Iniciação Científica PIBIC/PROPPI/UFF – 2016/2017). 6A pesquisa do autor é financiada pela Fundação Carlos Chagas de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio
de Janeiro (FAPERJ).
FERREIRA, Diogo da Cruz. Das consequências do programa minha casa minha vida na sociabilidade de
um condomínio em uma cidade média de Minas Gerais. 2015. 101 f. Dissertação (Mestrado em Políticas
Sociais) – Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro, Centro de Ciências do Homem
(UENF), Campos dos Goytacazes, 2015.
FERREIRA, Diogo da Cruz. Habitar um conjunto habitacional popular em Campos dos Goytacazes/RJ: a
experiência do programa ―Morar Feliz‖ do Novo Jockey. 2016. Projeto (Doutorado em Políticas Sociais),
Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro, Centro de Ciências do Homem (UENF),
Campos dos Goytacazes, 2016.
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mas focalizando-nos doravante nas implicações da modalidade de reconhecimento da
―sociabilidade violenta‖7 (Machado da Silva, 2010) em uma cidade ―do interior‖ no que
tange às formas de experimentar e vocalizar, por familiares, perdas de ―seres queridos‖
(DIAZ, 2014). Procuramos ainda compreender como os relatos destes atores se
entremeiam com a elaboração de uma linguagem da ―violência urbana‖ elaborada, neste
caso, em uma cidade média extra metropolitana.
Desde o ano de 2016, os autores e outras recém integrantes do grupo Cidades,
espaços públicos e periferias – CEP28, coordenado por Jussara Freire (em particular
Carolina Mello, Pâmela Martins e Thayná Araújo, alunas do curso de graduação em
ciências sociais da UFF/Campos, que estão também recentemente compondo a equipe
de pesquisa) se distribuíram diferentes eixos da atual pesquisa que se fundamenta na
articulação de três técnicas de pesquisa:
- uma análise documental levantando, sistematizando e analisando: a produção
científica referente aos temas da pesquisa; dados socioeconômicos da população
residente em Campos; - dados do Instituto de Segurança Pública do estado do Rio de
Janeiro e do Mapa da violência (2016); - matérias jornalísticas (em jornais locais, Folha
da Manhã, o jornal Terceira Via, o Diário e o Campos 24 horas e, eventualmente na
imprensa escrita e televisiva nacional) de 2008 a 2017, período que encobre as
diferentes etapas de execução do programa Morar Feliz em Campos e do programa das
UPPs na cidade do Rio de Janeiro. Com estas informações, procuramos organizar as
matérias por temáticas segundo os assuntos relacionados com a criminalidade violenta,
a ―violência urbana‖, o programa Morar Feliz e as intervenções policiais na cidade e
reconstituir a trama discursiva do problema insegurança no debate público.
- Uma observação em situação (e de situações): Iniciamos uma observação in situ
(CEFAÏ, 2010), isto é, de situações da vida cotidiana nas quais familiares
problematizam e buscam lidar com as perdas de seus filhos. Nesta observação que se
encontra ainda em fase inicial, procurando acompanhar as rotinas destes atores em suas
casas, nos seus deslocamentos pela cidade, nas suas atividades profissionais e nas suas
relações de vizinhança. Diante de algumas informações que surgiram neste primeiro
momento da pesquisa de campo (com recorrência nas conversas com nossos atuais
interlocutores), embora não tenhamos ainda iniciado esta etapa da observação,
destacamos que planejamos acompanhar familiares nas igrejas católicas e evangélicas
freqüentadas por algumas dentre eles (mães, pais e irmãos). Com esta observação, nosso
objetivo é de compreender os processos de investigações dos familiares que não
implicam uma exclusiva relação de face a face com o pesquisador, bem como descrever
o ambiente do bairro, as formas de habitar nos conjuntos, suas relações de vizinhança e
as rotinas destes familiares.
- conversas e relatos de vida: partindo da técnica de relato de vida (Hannerz, 1989 e
Thomas e Znaniecki, 2004 [1918-1920]), propusemos retomar as trajetórias singulares
de familiares que aceitaram tecer trocas com os pesquisadores (mães em particular, mas
alguns irmãos de vítimas também receberam algumas das autoras) para buscar
7Sobre a noção de sociabilidade urbana e sua articulação com a linguagem da violência urbana, remeto-
me às contribuições de Machado da Silva (2010). Segundo este autor: (...)a partir do reconhecimento de
uma ―sociabilidade violenta‖, a linguagem dos direitos deixou de articular de maneira unívoca o conflito
social (e os medos a ele associados), passando a competir com a linguagem da violência urbana, que
tematiza os sentimentos difusos de insegurança que pesam sobre as expectativas de prosseguimento
pacífico das rotinas diárias e geram a mentalidade de ―segurança apesar dos outros‖, no lugar da
―segurança com os outros‖, para usar as conhecidas expressões de Bauman (2001, 2000) na sua
interpretação do ―inimigo próximo‖. (MACHADO DA SILVA, 2010, p. 288).
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apreender as possíveis correlações entre as situações de perda, os diferentes laços de
parentescos, os engajamentos dos familiares ao longo de seus trabalhos de luto, as
temporalidades do luto avaliadas pouco após o assassinato ou a posteriori, os recursos
encontrados ao longo do tempo para lidar com estas perdas, ou ainda, a trajetória dos
sofrimentos vivenciados pelos familiares em curto, médio e longo prazo. O relato de
vida é, neste caso, entremeado com a observação in situ e certamente, em momento
mais avançado da pesquisa de campo, ambos se confundirão (são atualmente separados
pelo fato de que nossa entrada, ainda recente, se deparou com a dificuldade de conhecer,
em Campos, familiares que geralmente preferem não publicizar suas experiências). No
entanto, em função da natureza das experiências (no limite do dizível) que são
problematizadas pelos familiares, evitamos rigorosamente apresentar estas situações
como uma ―entrevista‖, preferindo propor outra técnica metodológica, a da ―conversa‖
entre familiares e pesquisadoras, em um movimento de busca de maior simetria entre
conversadores (mesmo que a plena simetria seja evidentemente inatingível pelo fato de
que alguns dos conversadores serem qualificados, pelos nossos interlocutores de
acadêmicos). Em resumo, os relatos de vida são aqui apresentados como situações de
conversas para auxiliar o analista na compreensão da experiência das perdas dos
familiares. Sendo conversas, as trocas não são orientadas por exigências de eixos ou
―roteiros de entrevistas‖, mas pelo pressuposto do que é possível compartilhar estes
tipos de experiências sem forçar a orientação do relato do locutor pelo analista na
direção das exigências de sua pesquisa, o que também flexibiliza a fala e a escuta dos
participantes destas situações. Se uma entrevista é geralmente um momento fixo na
temporalidade da vida de uma pessoa (mesmo que seja possível o analista procurar o
entrevistado para elucidar pontos no relato levantado mas que costuma ser de todo
modo pontual e referenciado a um momento anterior tido, pelo analista como chave), a
conversa é um jogo lúdico de sociação, retomando Simmel (no caso desta pesquisa,
evidentemente, o lúdico da conversa e o trágico da experiência dos familiares se
confundem inexoravelmente), uma forma interacional que permite diminuir imperativos
normativos em relação àquela que seria apresentada como uma ―entrevista sociológica‖
por todos os participantes da situação. A conversa torna-se ainda uma forma ética que
nos parece reduzir níveis de exigências metodológicas em relação ―à entrevista‖ para
poder falar (sobre) e ouvir sofrimentos e dores a partir dos quais se tematizam assuntos
particularmente sensíveis como a morte de um filho ou de um irmão (os familiares com
os quais conversamos até então são mães, irmãos ou irmãs), mais ainda aquela que
decorre dos contextos que analisamos: uma terrível interrupção de cursos de vida e de
trajetórias familiares que é sistematicamente problematizada pelos nossos
interlocutores. A conversa ainda acolhe o ―desabafo‖ da dor sem que seja previsto ou
priorizado, a priori, seus sentidos pelo analista. Na conversa, assuntos, fluxos
discursivos e emocionais em aberto emergem constantemente e, no caso em análise,
vêm nos oferecendo ferramentas compreensivas a partir das quais podemos acompanhar
como familiares, em Campos, exploram e investigam o evento crítico (ARAÚJO, 2007;
2015) que segue a perda de um ―ser querido‖ (DIAZ, 2016).
Habitação, criminalidade violenta e “violência urbana”: consequências do debate
público em Campos dos Goytacazes para familiares de vítimas.
Alguns moradores da cidade do Rio de Janeiro costumam apresentar fortes
emoções (ódio e desprezo, em particular) quando é pronunciado, por lá, o nome de
Campos dos Goytacazes: a cidade pode ser qualificada, por muitos deles, como lugar do
―atraso‖, ―dos Garotinhos‖, do ―fim do mundo‖, ―do deserto‖, etc.
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Paralelamente, Campos é o mais extenso município do estado do Rio de Janeiro
(4.032 km²), divido administrativamente em vinte distritos, e tem a mais numerosa
população do interior, estimada em 487.186 habitantes (IBGE, 2016). Os royalties
representam a principal fonte de arrecadação e recursos municipais8. No entanto, estas
fontes diminuíram significativamente após a queda do preço do petróleo e da
diminuição do volume de negócios da Petrobras a partir de 2015. Além das drásticas
mudanças municipais geradas pela ―crise do petróleo‖, que justificavam segundo seus
administradores municipais a interrupção de uma série de políticas sociais em torno das
quais programas municipais foram planejados, como o programa habitacional Morar
Feliz9 - central na nossa análise-, pode-se ainda destacar o novo quadro de
administração municipal com a vitória recente do candidato do Partido Popular
Socialista (PPS), Rafael Diniz, nas eleições municipais de 2016. O atual prefeito, em
uma campanha eleitoral explicitamente apresentada como o ―fim da era Garotinho‖ por
ele e pela opinião pública, é eleito após dois mandatos de Rosângela Barros Assed
Matheus de Oliveira (―Rosinha Garotinho‖, prefeita de Campos, de 2009 a 2017) com
uma expectativa de profundas mudanças de formas de governo pelo seu eleitorado. Com
efeito, o atual prefeito havia prometido, desde o momento de sua campanha, uma
ruptura sobre as ―tradicionais‖ formas de governar a cidade. Após sua posse, a imediata
integração de professores universitários, pesquisadores e alunos das principais
instituições acadêmicas de Campos na sua equipe gestora parece representar, para este
prefeito, o início do caminho desta ―grande transformação‖.
Paralelamente, no debate público, em escala estadual e nacional, Campos vem
sendo ainda recentemente apresentada como uma das cidades ―mais violentas do
estado‖ quando José Mariano Beltrame exercia ainda o cargo de Secretário de
Segurança do Rio de Janeiro (2007-2016) (In: NF Notícias 20/05/2016 e, muito
recentemente, em junho de 2017, tal pauta se reforçou com o programa de Fernando
Gabeira que propôs um documentário sobre a ―violência em Campos‖ exibido no canal
Globo News). Destacamos ainda outra série de matérias na imprensa nacional e regional
que apresenta Campos como uma ―das cidades mais violenta do interior‖, como é o
caso, por exemplo, de um noticiário televisivo da Inter TV/região serrana (In: G1,
02/02/2017) durante o qual são apresentados dados do Instituto de Segurança (ISP) de
2016 em tom alarmante: o número de homicídios dolosos era de 168 em 2015 e se
elevou em 272 casos em 2016 na cidade de Campos10
. No programa de Fernando
Gabeira supracitado, este jornalista abre o documentário destacando também o
―ranking‖ das ―cidades mais violentas‖ do mundo (―Campos dos Goytacazes é 19º no
ranking mundial de violência‖) e a taxa de homicídio da cidade ―47 por cem mil
habitantes‖ (número citado sem referência às fontes no documentário), o que tornaria
―proporcionalmente‖ a cidade Campos ―mais violenta‖ do que aquela do Rio de Janeiro.
Ainda vale destacar que, na imprensa local, os assuntos ―criminalidade‖ e
―violência‖ são fortemente localizados em áreas específicas de Campos: favelas, bairros
mais distantes do centro (como o bairro Travessão, situado a cerca de 30 km do centro
8Ver: CRUZ, TERRA, (2015).
9O programa Morar Feliz foi criado em 2009. O projeto inicial pretendia entregar a moradores da cidade,
até 2012, 5.426 casas populares em 10 bairros tidos como ―periféricos‖ (Penha; Jockey; Tapera; Parque
Prazeres; Santa Rosa; Eldorado; Travessão; Lagoa das Pedras e Aldeia), e, até 2016, a meta seria de criar
mais 4.574 até 2016. Foram assim construindo 18 conjuntos habitacionais, mas a meta da segunda etapa
não foi atingida; em ambas as fases, a prefeitura contratou a construtora Odebrecht Serviços de
Engenharia e Construção Hoje, cerca de 32 000 pessoas residem nas 6.500 casas destes conjuntos (OSEC)
(FREITAS, RIBEIRO, 2013). 10
Estou ainda levantando os dados de segurança pública e em fase de sistematização. Estes resultados
serão apresentados na dissertação.
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da cidade) e conjuntos habitacionais localizados em diversas áreas periféricas
(literalmente, em relação ao centro) deste município. Com efeito, entre estas e outras
matérias da imprensa local e regional analisadas, já é nítido que as notícias sobre
criminalidade violenta se referem recorrentemente ao distrito de Guarus11
(pejorativamente qualificado ―do outro lado‖ por muitos moradores da cidade)12
; favelas
não necessariamente ali localizadas, mais próximas do centro (como a Favela da
Baleeira, Margem da Linha da Tapera e Tira-Gosto); bairros da ―Baixada Campista‖13
da planície e/ou conjuntos habitacionais ―Morar Feliz‖ (que podem ter proximidade
com estes dois outros residenciais). É ainda nítida a criminalização destes moradores na
opinião pública, ou ainda, a encenação de uma maior ―agressividade‖ nestes territórios.
Por exemplo, em uma matéria de 2016 do jornal Terceira Via, intitulada ―Confira o
mapa da violência em Campos‖, o comandante do oitavo batalhão o entrevistado Marco
Aurélio Pires Louzada afirma:
―Os bandidos de Guarus são mais agressivos entre si. Na área da Delegacia
do Centro existe mais uma coordenação dos criminosos. Eles agem de
maneira mais ordenada porque têm os freios inibitórios. Aqui, eles podem
sair pela rua atirando. Os moradores vêem, conhecem quem atirou e
conhecem quem morreu, mas não falam nada porque têm medo. Aqui, eles
são mais agressivos entre si e com a população também‖. (TERCEIRA VIA,
19/12/2016)
A ordem moral (PARK, 1973) de Campos é frequentemente apresentada pelos
seus moradores sob o ângulo dos ―dois lados‖ do Rio Paraíba que atravessa a cidade. O
―outro lado‖, o da margem esquerda do Rio Paraíba, corresponde ao início do distrito de
Guarus, ampla área moral que era exclusivamente associada à ―violência urbana‖ e ao
―mundo do crime‖ por muitos moradores da cidade antes da execução do programa
Morar Feliz. Tal programa tornou estas fronteiras espaciais e morais mais complexas
pelo fato de que seus conjuntos habitacionais se localizam em diferentes áreas da
cidade, geralmente distantes do centro, mas em pontos opostos que não correspondiam
necessariamente à lógica ―dois lados‘ do rio Paraíba do Sul.
Em suma, se os modos segundo os quais moradores de Campos problematizam
os ―dois lados‖ do Rio Paraíba apresentam uma dimensão da configuração da
segregação urbana em Campos, não podemos negligenciar as novas territorialidades
geradas pelo programa Morar Feliz (AZEVEDO, TIMÓTEO, ARRUDA, 2013) por elas
alterarem significativamente a morfologia desta cidade. Além disso, o programa Morar
Feliz em Campos teve uma forte incidência na redefinição das áreas morais tidas como
violentas e nas novas formas de definir as favelas e estes ―novos territórios‖ como
―problemas da cidade‖. Os sentidos conferidos às favelas partiam das representações
sobre territórios em geral correspondentes aos ―aglomerados subnormais‖, retomando
os termos do IBGE. Paulatinamente, estes sentidos vêm se entremeando com as
representações sobre os conjuntos habitacionais criados no quadro do programa Morar
Feliz. Desta forma, se o censo do IBGE (IBGE, 2010; SIQUEIRA, 2016) aponta para a
existência de 27 favelas em Campos, ―as casinhas de Rosinha‖, apelido comum para se
referir a estes 18 conjuntos habitacionais, são outras áreas residenciais que aumentaram
recentemente o número de ―territórios da pobreza‖.
11
Guarus é um distrito da Cidade de Campos que compreende toda a área que se localiza na margem
esquerda do Rio Paraíba do Sul aglomerando vários bairros. 12
Sobre as representações campistas do distrito de Guarus e as avaliações morais relacionadas com o
habitar neste ―outro lado‖ do Rio, ver Assis (2016). 13
Zona geográfica, de planície, do município de Campos que abrange cinco distritos (aqueles localizados
entre o distrito sede e a orla): Goytacazes, São Sebastião, Tocos, Santo Amaro, Mussurepe.
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Após a mudança dos moradores (em muitos casos, removidos de favelas e/ou
―áreas de risco‖ da cidade) em diferentes momentos do interstício 2009-2015, nestes
conjuntos, novos boatos se espalham aos poucos pela cidade; crimes ocorreriam
privilegiadamente nestas áreas (assaltos, estupros de mulheres, assassinatos, comércio
de drogas, expulsão de moradores, desovas etc.). Houveram ainda casos de expulsão de
moradores por traficantes por vezes noticiados na imprensa local14
. A circulação destes
boatos vem também aumentando fortemente a sensação de insegurança dos moradores
da cidade e reconfigura, desde 2009, o problema ―violência‖ em Campos, como Barros
(2012) apontava no ano em que defendeu sua monografia. Na nossa pesquisa de campo,
iniciada no final do ano de 2016, osatuais interlocutores que acompanham de perto os
conflitos existentes em um ou vários conjuntos habitacionais edificados no quadro do
programa Morar Feliz - comprometemo-nos em não identificá-los, por óbvias
exigências éticas -, foi frequentemente questionado (por eles) os modos de ―selecionar‖
os beneficiários das casas do conjunto sem nenhuma consideração sobre as
consequências de reunir moradores nestes em áreas residenciais anteriores
―controladas‖ pelas até então duas ―facções de tráfico‖ da cidade (em junho de 2017,
momento em que escrevemos este artigo, houve uma indicação por jornais locais de
que tais facções se ―uniram‖ e alguns moradores, interlocutores nossos, identificaram
uma redução imediata de conflitos urbanos relacionados com a criminalidade violenta
da cidade).
Pode-se ainda observar um novo movimento moral no que tange à tematização
da ―violência urbana‖ em Campos após a execução do projeto de Unidades de Polícia
Pacificadoras (UPPs) na cidade do Rio de Janeiro, iniciada em 2009, ano que
correspondia também ao início do Programa Morar Feliz. De 2011 a 2012, em sua
etnografia dos cafés comunitários e do conselho comunitário de segurança pública,
Barros (op. cit.) observou progressivas alterações nos modos de problematizar ―a
violência‖ em Campos e, em particular, um movimento que tendia a responsabilizar as
UPPs pelo aumento da violência em Campos. Nesta direção, estas formas de qualificar
as UPPs como grande responsável do aumento da criminalidade em Campos
ressignificava também ―a violência urbana‖ a partir de ―uma expansão do mundo do
crime‖ (FELTRAN, 2011). Articulando as diferentes matérias já levantadas com o
trabalho de Barros (op. cit.) e de Barros e Freire (2012), uma avaliação coletiva passa a
marcar o debate público: ele, ―o mundo do crime‖ da cidade do Rio, teria assim chegado
ao ―interior‖ e estava ―ocupando‖ os conjuntos habitacionais do programa Morar Feliz.
Pode-se destacar que outro importante aspecto da ―ocupação do tráfico‖ nos conjuntos
era problematizado a partir da copresença de ―facções opostas‖ em alguns dos conjuntos
do Morar Feliz.
Em sua análise sobre a circulação juvenil de moradores de periferias de Campos,
Siqueira (2016) propôs um mapeamento dos territórios da cidade ―controlados‖ por
facções de narcotraficantes. A autora identifica uma fronteira simbólica entre dois
outros lados da cidade, desta vez dividida (também geograficamente) pelo Canal Rio
Macaé (mais conhecido na cidade como ―Beira Valão‖). Os territórios nos quais drogas
são comercializadas de um lado da ―Beira Valão‖ seriam ―controlados‖ pela facção
14
Pode-se apreender a repercussão do caso da expulsão de uma família do conjunto habitacional do bairro
Eldorado, que ocorreu no dia 22 de setembro de 2012, notadamente em matérias dos sites de informações
da cidade de Campos dos Goytacazes: A matéria do site Ururau (particularmente consultado na cidade)
―Família é expulsa da própria casa por traficantes no Eldorado‖ (24/09/2012) In
http://www.ururau.com.br/cidades21762 ou aquela do jornal Terceira Via: ―Família é expulsa de casa por
traficantes em Campos ― (24/09/2016) In: http://177.184.3.226/noticias/campos-dos-
goytacazes/5586/familia-e-expulsa-de-casa-por-traficantes-em-campos-
173
Sociabilidades Urbanas – Revista de Antropologia e Sociologia v1 n2 julho de 2017 ISSN 2526-4702
Amigos Dos Amigos (ADA) e, do outro, pelo Terceiro Comando Puro (TCP). Segundo
a autora, essa rivalidade iniciou-se nos anos 1990, período de importantes conflitos
entre ―gerentes‖ do tráfico de drogas das duas principais favelas da cidade: a favela
Baleeira (―controlada‖ pela ADA) e a (Tira Gosto, pelo TCP). Semelhantemente às
análises de Farias (In: Machado da Silva, 2008), a autora observa também fortes
restrições de circulação dos jovens moradores destas favelas na cidade quando estes
temem frequentar um dos dois lados da ―Beira Valão‖ e justificam seus medos pela
presença de facções opostas.
Apresentamos resumidamente, nesta sessão, algumas das principais dimensões
que substanciam, em Campos, o problema ―violência urbana‖. A articulação destes
aspectos é central para fundamentar o problema de nossa pesquisa por ela permitir
apresentar o ambiente moral - isto é, parte de uma dimensão ecológica (PARK,1945)
destes conjuntos habitacionais e do problema ―violência urbana‖ em Campos - das
investigações (DEWEY, op. cit.) de familiares de vítimas após a perda de seus filhos.
Ao acompanhar a trama do problema ―violência‖ desta cidade, observamos uma
conexão de sentidos relacionada com as progressivas formas de problematizar a
segregação urbana em Campos que cada vez mais parece se articular com os modos de
elaborar e publicizar, recentemente, a ― ―violência urbana‖ em Campos: diferentes
divisões geográficas da cidade que se associam paulatinamente com fronteiras
simbólicas fundamentadas nas ―disputas de facções‖ que contribuiria para a
multiplicação de modos de ―dividir‖ a cidade (neste sentido, as fronteiras da ―beira rio‖
ou da ―beira valão‖ vêm sendo fortemente marcadas, como alguns trabalhos acadêmicos
apontam (como Siqueira, op. cit.), por respectivos ―controles generalizados‖ (não em
territórios circunscritos, e sim em extensas zonas da cidade) de grupos de
narcotraficantes na cidade em função de ―áreas de atuação do tráfico‖ em expansão;
logo, a criminalidade violenta e suas representações adquirem central relevância para a
compreensão da produção de novas formas de segregação urbana; uma política
habitacional (o programa municipal Morar Feliz) que aproximou moradores originários
de territórios residenciais associados a ―facções do tráfico‖ opostas, que exerceriam um
controle passado territorialmente circunscrito e, quando moram literalmente juntos (por
meio do referido programa), a copresença residencial destes moradores em ―novos
territórios‖, agora misturados, e geraria conflitos imediatos e inevitáveis pelas
identificações de seus moradores com as ―facções‖ que ―dominavam‖ suas áreas
residenciais de origens, independentemente da distância ou aproximação com drogas
e/ou com tais grupos.; tal política se elabora ainda em um pano de fundo de recursos
municipais marcados por repasses de royalties (que contribuíram para uma
representação de Campos como uma cidade rica e decadente após a ―crise do petróleo‖,
tocando a corda sensível de elites campistas que defendem um projeto ―de
modernidade‖ e, com ele, de ―desenvolvimento‖15
); e, por fim, as ―UPPs do Rio‖ na
capital do estado que teriam . Os empilhamentos (ARAÚJO, 2016) destes ―pacotes
interpretativos‖ (Gusfield, 1981) contribuíram para ressignificar paulatinamente a
linguagem da ―violência urbana‖ em torno de um de seu importante repertório e
personagem, ―o bandido‖, o qual era tido, após as UPPs, como fugitivo da metrópole.
O aumento do número de homicídios em Campos destacado no debate público
(que se confirma nas conversas com atuais interlocutores, apesar da ausência de
produção de dados sistematizados sobre a relação entre estes homicídios e os novos
conflitos que emergiram após as mudanças dos moradores nos conjuntos do programa
Morar Feliz) não se acompanhou de indignações no que tange às ―vítimas do tráfico‖,
15
Cf. Cruz, 2003.
174
Sociabilidades Urbanas – Revista de Antropologia e Sociologia v1 n2 julho de 2017 ISSN 2526-4702
ou senão de modo muito excepcional. Talvez a indiferença quanto ao aumento destes
tipos de homicídios, não mensurável oficialmente, possa sugerir uma naturalização ou
grande evitação de problematizar as consequências dos conflitos armados na cidade.
Além disso, a dinâmica associativa da cidade é fortemente marcada pelas oposições de
movimentos de base, associações de moradores em particular, à administração
municipal dos anos 70, que representava interesses de elites agrárias e da indústria
canavieira:
―A administração pública local, enquanto representante dos interesses das
tradicionais elites agrárias associadas à indústria canavieira, era vista como o
principal alvo na luta pela democratização das estruturas de poder no
município. Em função deste processo de mobilização, as associações de
moradores que eram apenas duas na década de 1970, chegaram a representar
45% do total das entidades associativas criadas durante a década de 1980‖
(FONTE).(AZEREDO, op. cit. p. 48).
Criada em 1983, a Federação das Associações de Moradores e Amigos de
Campos (FAMAC) contribuiu para uma série de mobilizações na cidade que tiveram
fortes repercussões, como aquelas contra os aumentos abusivos do IPTU (op. cit.). No
entanto, AZEREDO (2008) a drástica diminuição de associações de moradores na
década de 90 associada, neste trabalho, ao personagem de Anthony William Matheus de
Oliveira:
―Neste sentido, um fator que merece destaque na conjuntura campista é a
ascensão política de Anthony William Matheus de Oliveira, o Garotinho, cuja
liderança no movimento denominado de ―Muda Campos‖ serviu para que se
tornasse prefeito do município. O Movimento ―Muda Campos‖ articulava
diferentes segmentos da sociedade civil organizada, entre eles, o próprio
movimento associativo de bairros representado pela FAMAC. Para Franco
(2006), as eleições municipais de 1988 constituíram um marco importante da
história política de Campos dos Goytacazes, na medida em que iniciaram um
período no qual Anthony Matheus, o Garotinho, se tornou o maior articulador
―da política municipal. Esta posição foi mantida por 15 anos, onde Garotinho
se tornou praticamente imbatível eleitoralmente. No entanto, Franco postula
que as tradicionais práticas de dominação política, associadas à elite agrária
canavieira, foram substituídas a partir de 1988 ―por um enorme clientelismo
montado a partir da inviabilidade eleitoral das antigas formas de dominação
pessoal e do vultoso montante de recursos orçamentários possível com o
advento dos royalties do petróleo‖ (Franco, 2006:73). Para Franco, este
clientelismo pode ser identificado nas numerosas contratações para a
prestação de serviços públicos, através das nomeações para os cargos em
DAS (Cargo de Direção e Assessoramento). Deste modo, é importante
ressaltar que a retração na atuação do movimento de bairros coincidiu com a
ascensão política de Anthony Garotinho na política local, podendo
representar o momento inicial de cooptação das principais lideranças
comunitárias pela administração pública‖ (AZEREDO, op. cit. 49)
O autor sugere uma retomada deste movimento de base no meado da década de
2000. Porém, as mobilizações das associações são atualmente pouco visíveis na cidade.
No âmbito de pesquisas sobre o tema das mobilizações coletivas e da construção de
problemas públicos em Campos, na década de 2000, desenvolvidas por membros do
grupo Cidades, espaços públicos e periferias (CEP28), observamos a presença de
associações de moradores em Cafés Comunitários ou no Conselho de Segurança
Pública. Neste caso, seus representantes abordavam problemas particulares do bairro
(como os ―buracos nas ruas‖ ou problema de iluminação do bairro), mas nunca tocavam
em público o assunto das mortes provocadas por conflitos de tráfico de drogas, mesmo
nos bairros mais afetados por esta forma de letalidade. Estas observações motivaram a
175
Sociabilidades Urbanas – Revista de Antropologia e Sociologia v1 n2 julho de 2017 ISSN 2526-4702
proposta de analisar as experiências públicas de moradores de Campos para
compreender como lidam com a morte de familiares no ambiente apresentado nesta
seção. Se os canais de denúncias parecem (de acordo com o que estamos observando)
escassos, as conversas que realizamos com mães e irmãos apontam para outros formatos
de engajamentos dos familiares de vítimas de Campos. Desta forma, propomos dar
continuidade a este mapeamento na atual pesquisa, mas focalizando-nos agora nas
implicações da modalidade de reconhecimento da ―sociabilidade violenta‖16
(MACHADO DA SILVA, 2010) no que tange às formas de experimentar e vocalizar,
por familiares, perdas de filhos, em contexto extra metropolitano. A orientação do
debate público sobre ―a violência em Campos‖ aponta para as formas segundo as quais
uma cidade do ―interior‖ (categoria que usualmente se distancia de conflitos geralmente
aproximados a conflitos metropolitanos) apresenta indicadores e posições em ranking
estaduais, nacionais e mundiais que competiria com índices de criminalidade violenta,
geralmente associados à grande cidade. Este é um dos motivos pelos quais Campos dos
Goytacazes torna-se, também, um bom caso para pensar..
Soares (op. Cit.) analisou os recursos emotivos mobilizados por gestores
públicos e ―usuários‖ do programa municipal de habitação Morar Feliz. O estudo desta
autora se focalizou nas diversas formas de justificar este programa por funcionários da
prefeitura da ―era Garotinho‖, que freqüentemente recorriam a uma gramática de
necessidade. Esta gramática e as orientações da prefeitura de alojar emergencialmente
moradores que residiam em ―áreas de risco‖ foram determinantes para selecionar os
beneficiários prioritários na primeira fase do programa Morar Feliz. Desta forma,
retomando o nome do programa, a autora procurou analisar os sentidos conferidos à
―felicidade‖ dentre outras emoções apresentadas em público que promovia esta política
habitacional e as formas de agradecimentos pelos seus moradores que podiam ser
divulgadas na imprensa regional. Em vez dos ―usuários‖ perceberem o acesso à moradia
como um ―direito social‖, retomando a categoria de certos funcionários da prefeitura,
tantas as demandas por habitação quanto o reconhecimento da política após a concessão
da casa de seus beneficiários eram marcados, nesta época, pela sensação de serem
―presenteados‖ pela prefeitura e, mais particularmente, por ―Rosinha‖ (apelido do
prefeito durante seus dois mandatos, de 2009 a 2017) ou por Deus. Frequentemente, a
casa recém adquirida era tida como ―dádiva ―pelos moradores e, na opinião pública, se
multiplicavam agradecimentos à ―Rosinha‖ e a ―Deus‖ (SOARES, 2014). A pesquisa
foi concluída em 2014 no momento em que o ―assunto violência‖ relacionado com estes
novos conjuntos habitacionais aparecia ainda timidamente no debate público campista.
No entanto, observamos posteriormente importantes alterações no que tango às
formas de qualificar o programa Morar Feliz após a pesquisa de Soares. Por este
motivo, propusemos em seguida compreender os atuais enquadramentos cognitivos do
―problema habitação na cidade‖ que correspondem aos momentos em que os conjuntos
passaram a ser associados ao ―recrudescimento da violência em Campos dos
Goytacazes‖ (cujo auge, situamos aproximada e temporalmente, nos três últimos anos
seguindo as novas pautas que surgiram no debate público da cidade). Aos poucos, estes
lugares eram tidos como áreas de concentração do tráfico de drogas, de assassinatos e,
16
Sobre a noção de sociabilidade urbana e sua articulação com a linguagem da violência urbana, remeto-
me às contribuições de Machado da Silva (2010). Segundo este autor: (...)a partir do reconhecimento de
uma ―sociabilidade violenta‖, a linguagem dos direitos deixou de articular de maneira unívoca o conflito
social (e os medos a ele associados), passando a competir com a linguagem da violência urbana, que
tematiza os sentimentos difusos de insegurança que pesam sobre as expectativas de prosseguimento
pacífico das rotinas diárias e geram a mentalidade de ―segurança apesar dos outros‖, no lugar da
―segurança com os outros‖, para usar as conhecidas expressões de Bauman (2001, 2000) na sua
interpretação do ―inimigo próximo‖. (MACHADO DA SILVA, 2010, p. 288).
176
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mais amplamente, da condensação da criminalidade violenta. Os conflitos letais eram
associados ao fato de que moradores originários de ―áreas controladas por facções
opostas‖ estavam doravante reunidos e convivendo em mesmos conjuntos habitacionais
―do Morar Feliz‖. Em todos estes momentos, as indignações de familiares de vítimas
(compartilhadas por alguns atores atuando em serviços públicos e com casos de mortes
de jovens moradores de periferias serem cotidianamente noticiados) era, em todos os
momentos, ausente deste debate.
Nas nossas conversas atuais, os familiares problematizam constantemente a
incapacidade ou a impossibilidade de vocalizar estas experiências de injustiça em
Campos. Desta forma, comparando os relatos de algumas mães de vítimas de violência
policial no quadro da pesquisa coordenada por Luiz Antonio Machado da Silva (2008)
com aqueles atualmente analisados, procuram-se compreender os contrastes entre
diferentes formas de engajamento de atores mobilizados em arenas de publicização ou
os seus impedimentos. Em resumo, estamos procurando descrever e interpretar
momentos em que familiares apresentam ao pesquisador os ―casos‖ de seus filhos (sem
que estes se tornam ―públicos‖, pelo menos na aceitação cívica do termo), questionando
os modos de tematizar a ―violência urbana‖ no debate público do Rio de Janeiro. Porém,
diferentemente do que foi explorado anteriormente (FREIRE, 2010 e FREIRE, 2017),
esses atores abordam a problemática da não participação na arena de publicização
mobilizada para denunciar casos de vítimas de violência policial, de milicianos e de
traficantes. Mesmo quando são convidados a integrar coletivos de familiares de vítimas
(os quais são localizados na região metropolitana), não conseguem ou não podem se
engajar na arena. Preferindo evitar a política, no caso em análise, por serem
frequentemente ameaçados e com dificuldade, senão impossibilidade, de situar suas
experiências de injustiça nesse horizonte de publicização, se refugiam no silêncio e na
resignação. ―Desgastados‖, ―exaustos‖ e, por vezes, ―resignados‖ — tais são alguns dos
termos que aparecem nos atuais relatos —, eles descrevem a impossibilidade, a recusa
ou a falta de força para se engajar na arena e, aquém disso, de depositar uma queixa que
iniciaria uma investigação policial. Alguns apresentam suas incredulidades em relação
ao tratamento de suas perdas no horizonte da ―justiça dos homens‖. Outros, muitas
vezes ameaçados de represálias, avaliam que seus filhos (particularmente se estes
moravam na rua, usavam drogas ou eram próximos de traficantes) eram particularmente
expostos ao risco de serem assassinados. Em dois casos, familiares comentaram que a
morte do filho já era anunciada quando este ainda estava vivo.
Nessas conversas com dez mães (duas dentre elas convidaram também outros
filhos, irmãos de vítimas para nossos encontros), observou-se ainda um ponto comum
entre esses relatos: em tais circunstâncias, a fé do familiar permite se defrontar com a
ameaça do esquecimento do filho assassinado, como se permitisse que a família não
venha a desmoronar e que a mãe se mantenha viva (nem que seja para cuidar dos outros
filhos vivos). Abordam momentos em que a participação política é rigorosamente
evitada e onde se coloca paralelamente a questão de pertencimento às comunidades
religiosas. Se a esperança na ―justiça dos homens‖ é (também) perdida, é em torno
daquela depositada na ―justiça divina‖ que se desenham outras formas de participação,
distantes da ―forma de denúncia pública‖ (BOLTANSKI, 1990) ou de um regime de
justificação (BOLTANSKI e THÉVENOT, 1991). Exacerbam-se, então, intensos
engajamentos em comunidades pentecostais a partir dos quais se recompõem ―a
dignidade‖ (termo recorrentemente mobilizado nos relatos) da família e a do filho morto
e se elaboram outras formas de vocalizar a perda, não mais orientadas na direção da
―justiça dos homens‖.
177
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Considerações Finais: os públicos religiosos: luto, experiência pública e fé
Como já anunciamos desde o início, o presente artigo procurou apresentar os
problemas de uma pesquisa recentemente iniciada, que nos pareceram importante
publicar mesmo em estágio tão inicial pelo fato de que diferentes questões que já
emergem ao longo da pesquisa de campo nos conduzem em retomar substantivamente
questões de ordens metodológicas, analíticas e teóricas.
Problematizar a violência urbana como linguagem remete a um recorte
socioantropológico fortemente marcado, no debate acadêmico do estado do Rio de
Janeiro, pelas contribuições de Luiz Antonio Machado da Silva e de Michel Misse.
Apesar das diferenças substantivas entre essas contribuições, a problematização da
violência urbana como linguagem permite privilegiar a compreensão das representações
sobre a violência urbana e como estas incidem nos ordenamentos sociais da cidade do
Rio de Janeiro, em particular que se estende, na nossa proposta, ―ao interior‖, (mesmo
considerando suas variações e ressignificações em tal contexto).
O problema desta pesquisa ainda se elaborou a partir da proposta de Quéré e
Terzi (2015) e Diaz (op. cit.) denominaram de sociologia da experiência pública.
Considerando o ―público‖ como uma forma e uma modalidade de experiência, esta
sociologia se focaliza no estudo empírico da organização prática de experiência (op.
cit.). Como é também o caso destes autores, inspiramo-nos ainda em diversas
contribuições de Dewey (notadamente The Public and Its Problems, 1927), porém
considerando recentes críticas de pesquisadores em relação a esta obra, que também
dialogam com a antropologia capacitaria de Paul Ricoeur. No plano da sociologia,
alguns pesquisadores (como Breviglieri, 2017) observam certa naturalização em outras
pesquisas pragmatistas (mesmo eles se reconhecendo nesta abordagem) aos modos de
tomar como taken for granted um caminho do reconhecimento, que dialogam com a
obra de Dewey e de Goffman no que tange ao pressuposto das competências ou
capacidades dos atores. A principal crítica se focaliza nas formas como vem sendo
problematizado o agir em um horizonte de reconhecimento. Neste caso, ―o público‖
emerge, se constitui e se organiza em torno de uma investigação a partir de uma
situação indeterminada possa exercer algum controle sobre transações cujas
consequências o afeta indiretamente. No entanto, diferentemente da ―sociologia dos
problemas públicos‖17
, inspirada nas obras de Dewey e iniciada a partir das
contribuições de Gusfield (1891)18
, frequentemente voltadas para os modos de perceber,
identificar e problematizar uma situação indeterminada, há alguns anos, diferentes
autores vem questionando ―o otimismo‖ desta sociologia. Com efeito, Quéré e Terzi
(op. cit.), retomando observações empíricas realizadas em grande maioria em contexto
francês ou de países vizinhos, avaliam que Dewey supervalorizou ―os choques‖
(cognitivos) que gerariam uma ruptura nas rotinas dos atores e orientariam então a
operação de definição ―situação problemática em sua qualidade imediata‖, (isto é,
―embaralhada, conflituosa, desordenada‖ etc.‖, Dewey, 1983 [1938]).
Retomando o trabalho de Stavo-Debauge (2012), estes autores ainda apontam
para o fato de que aqueles que sofrem deste ―choque‖ não seriam sempre atores capazes
de avaliar, em momentos turvos, a positividade gerada pelo estímulo gerado pela
situação problemática, isto é, de tornar-se ―problematizadores‖ e ―exploradores‖ (em
alusão aos modos segundo os quais Dewey percebe o público como uma ―comunidade
de exploradores‖). Stavo-Debauge (op. cit.) e os autores supracitados destacam as
17
Sobre a Sociologia dos problemas públicos, Cf., dentre outros, Cefaï e Joseph, 2002 e Cefaï, 2013. 18
Para uma apresentação da obra de Guslfied e suas articulações com problemas públicos em contexto
brasileiro, cf Freire, 2016.
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situações em que os atores podem estar profundamente incapazes de se deparar com tal
―choque‖ e de encontrarem então a energia que despertaria o início de uma
investigação. Freire (2013), analisando algumas de suas pesquisas empíricas a
posteriori, ainda observa que a percepção, identificação e problematização de uma
situação tida como problemática não se encerra necessariamente em um processo de
publicização, mais ainda em, contexto brasileiro no qual as modalidades de uso da força
desmedida são profundos obstáculos para muitas modalidades de engajamentos em
mundos cívicos. Em diálogo com os trabalhos de Stavo-Debauge (op. cit.) e de
Breviglieri (2008), mas partindo de um contexto carioca e fluminense da ação coletiva,
a autora (2017) ainda observou que em situações de ação coletiva marcadas pelo uso da
força desmedida (Brodeur, 2004), muitos dos atores que defendem causas em prol de
moradores de favelas e de periferias se deparam com uma série de obstáculos e ameaças
de represálias que tornam árduos um esforço associativo na forma de uma arena
―pública‖ (por este motivo, a autora prefere se referir, nos casos analisados por ela de
―arena de publicização‖, que permite dar conta que a problematização coletiva da
situação indeterminada é ela também, indeterminada). Neste sentido, a evitação do
tratamento de certos assuntos ou o exit (tal como Freire (2016) problematizou a partir da
obra de Hirshman) dos atores em compor estas arenas, como é o caso dos familiares de
Campos, precisam ser retomados a partir do trabalho de significação (Snow apud Freire,
2016) das pessoas e entremeado com uma análise do quadro de forças em jogo, e logo
de ameaças que pesam no processo de investigação, o que contribui para uma
compreensão sociológica de públicos – sem privilegiar a articulação entre formas
cívicas (no sentido de Boltanski e Thévenot, 1991) e ação coletiva.
Desta forma, Quéré e Terzi (op. cit.) observam que as situações indeterminadas
não resultam sempre na constituição de um público de investigadores, dispostos para
questionar e experimentar soluções inéditas. Afirmam que as situações indeterminadas
podem ainda atiçar temores, mais ainda quando são suscitados pela ameaça de um
conflito interno (o que também se articula com a proposta de Freire, mesmo que a
autora não problematize nestes termos a questão da ameaça, por ela partir das formas
como os atores definem, em situações de conversa, o que é a ameaça, mas sendo de todo
modo vivenciada como ―interna‖):
―Quando tal maneira de se deparar com problemas transformam-se em rotina,
a coletividade tende em se instalar em uma postura defensiva de
encolhimento de modo que os problemas que emergem, longe de
desestabilizá-la apenas conforta mais ainda os preconceitos os mais
enraizados e nos costumes mais rotineiros‖. (QUÉRÉ e TERZI, op. cit. p.8,
tradução nossa)
Estas observações conduzem os autores em focalizar a noção de situação
indeterminada no conjunto de ―dinâmicas experimentais‖ (op. cit. P. 17) durantes as
quais o que denominam de ―comunidades desestabilizadas‖ se converte paulatinamente
em público para reconfigurar instituições e engajar ―um trabalho de valiação (valiation)
e de avaliação‖ (idem, ibid.) – reorientando assim o problema de Dewey -, trabalho que
não é mais taken for granted. Desta forma, sustentam que o público é indissociável da
experiência de problematicidade cuja compreensão partiria da inteligibilidade endógena
das atividades pelos quais os atores organizam e geram as situações da vida cotidiana,
em suma da ―accoutability‖, tal como proposto por H. Garfinkel.
Ainda destacamos os modos segundos os quais Quéré e Terzi definem ―o
público‖, que – no nosso entendimento - parece escapar de muitas das tendências atuais
em reduzir esta noção a um plano estritamente institucional ou, mesmo quando
problematizado por autores que se situam em uma herança da obra de Dewey, de uma
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associação exclusiva do termo com a ideia de ―comunidade de investigadores‖. Segundo
Quéré e Terzi, ―(...) Toda experiência, desde que seja inteligível, pode ser tida como
pública no sentido de que ela pode estruturar, encobrir uma forma inteligível e logo
observada e descrita enquanto tal apenas se ela incorpora mediações públicas‖ (op. cit.,
p. 20). Para fundamentar esta afirmação, os autores recorrem a Wittgenstein que negava
a possibilidade de existir uma linguagem privada e lembram que o próprio Dewey
preconizava que a observação de um evento era necessariamente associada ―às
características publicamente determinadas na linguagem, algo ‗apreendido sob
condições sociais e públicas‘ [DEWEY, 1943 3 1938, apud QUÉRÉ; TERZI]‖ (op. cit.
p. 21). Estas definições ainda dialogam com a obra de Goffman que também propôs
partir de uma noção particularmente elástica do ―público‖, que se formaria no momento
em que haveria uma relação de face a face entre pelo menos dois atores corporalmente
em co-presença, logo consciente da reciprocidade de sua visibilidade19
. Desta forma, o
que une os autores supracitados, é que esta sociologia ―da experiência pública‖ toma
como cerne modalidades de organização social em conjunto, o que implica
problematizar a ordem pública a partir do esforço de descrever modalidades de
coordenações do ponto de vista dos atores e de suas ―accountabilidade‖. No caso desta
pesquisa, como a copresença corporal é permeada por um pano de fundo de forças que
representam rotineiramente uma ameaça à vida, a plasticidade do que se define por
―público‖ nos parece representar uma condição da execução do projeto. Com efeito, nas
primeiras conversas exploratórias que realizamos, os relatos apontam para uma recusa
dos familiares com os quais conversamos de orientar suas ações, após as mortes dos
filhos e/ou irmãos, na direção de denúncia pública ou de participar da arena de
publicização ―dos familiares de vítimas‖. Em quase todos os casos das conversas desta
atual pesquisa, mães e/ou irmãos problematizaram os modos de lidar com suas perdas a
partir de novos ou da intensificação de investimentos (para aqueles que já participavam
de igrejas pentecostais) em comunidades pentecostais. Por este motivo, se seguirmos
uma definição do ―público‖ elaborada a partir de eixos analíticos cívicos ou
institucionais, ou de um plano sociológico e normativamente definido, perderíamos a
possibilidade de compreender como estes engajamentos podem traduzir outras
modalidades de engajamentos públicos do ponto de vista de familiares, os quais, por sua
vez, não se voltam para planos institucionais, de denúncia pública ou de outras formas
de ação coletiva ―tradicional‖ no sentido sociológico convencional do termo (como
seria o caso, por exemplo, de atores integrarem a arena de publicização ou movimentos
sociais contra os públicos mais fortes que problematizam ―a violência urbana‖ e
articulam tal assunto como combate aos ―bandidos‖).
Paralelamente na literatura pragmatista, a questão da incapacidade dos atores
tende a ser eventualmente associada à ideia de um encolhimento (repli) de si que pode
eventualmente se traduzir na busca de um fechamento comunitário (mas que talvez, na
nossa leitura, não exclua a dimensão eminentemente pública dos engajamentos
encolhidos). Por exemplo, Quéré e Terzi procuram demonstrar que dadas situações
indeterminadas e os modos de se deparar com problemas se convertem em rotina ―a
coletividade tende e se instalar em uma postura defensiva de encolhimento de modo que
os problemas que emergem, longe de desestabilizá-la, como vimos, a conforta mais
19
Se as definições do público deveriam partir do conjunto da obra Goffmaniana, observa-se que Goffman
define explicita e insistentemente o público como copresença corporal em Goffman (2011 [1967]). O
autor chama, no livro Ritual de a atenção para a centralidade de focalizar o olhar sociológico nos corpos
em copresença, pois esta é a característica a partir da qual é possível ler o problema da visibilidade
recíproca e os decorrentes ajustamentos dos atores às situações, problema que também atravessa o
conjunto de sua obra.
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ainda nos seus preconceitos os mais enraizados e nos seus hábitos mais rotineiros‖ (op.
cit., p. 8)
Neste sentido, ainda que estes autores propõem criticar a ideia que marca o
pragmatismo americano – filosófico e sociológico -, a questão da incapacidade do agir
parece convertida em uma modalidade de encolhimento do (s) ator (e) s – não sendo
neste caso um problema de inação, mas de momento em que o refúgio voltado para si
parece tornar-se uma outra capacidade mínima, diante da incapacidade de agir. Nestes
termos, como hipótese que procuramos explorar nas atuais e próximas etapas da nossa
pesquisa e em relação ao objeto e problema que propomos aqui, se o encolhimento não
seria uma versão interpretativa de crítica ao modelo de competência dos atores. Parece-
nos também que tal pressuposto declina também o convite de problematizar a
emergência de públicos religiosos, porém centrais em contexto brasileiro marcado por
uma fluidez entre engajamentos religiosos e engajamentos cívicos. Neste sentido, a
―justiça divina‖, quando a voz não pode ser compartilhada com homens, pode apontar
para sentidos bastante impensados sobre outras formas de elaboração de públicos.
Por este motivo, procuramos atualmente compreender, a partir de nossas
conversas com familiares, os sentidos de justiça que correspondem com os
engajamentos e/ou encolhimentos em comunidades religiosas (católicas e,
principalmente, evangélicas). Neste momento da pesquisa, como já apresentamos,
estamos observando que o engajamento e encolhimento nas comunidades religiosas se
repete nos relatos dos familiares pelo fato de que a aproximação com a justiça divina é
nitidamente um dos poucos caminhos que permite lidar com uma perda insuportável e
não denunciável por medo de ameaças e de represálias. Parece-nos que tal experiência
corresponde a um momento chave dos processos de investigação que estamos tentando
reconstituir, o da perda de ―fé na justiça dos homens‖. Paralela e muito
excepcionalmente, no caso de uma mãe com a qual uma das autoras conversou, a
impossibilidade da ―busca por justiça‖ é acompanhada de uma resignação generalizada,
que gerava também uma recusa de pertencer à comunidade religiosa apesar de ter sido
inúmeras vezes convidadas para participar de cultos evangélicos e católicos. Neste caso,
a vida desta mãe seguia com uma profunda indignação no limite do dizível e do
compartilhável, que não se convertia em um processo de investigação pelo impacto da
perda e da avaliação de que ―nada poderia ser feito‖.
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