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8/19/2019 versao 3 http://slidepdf.com/reader/full/versao-3 1/6 18.2.3 Outra concepção equivocada a ser abandonada é a de que a crise estrutural se refere a algumas condições absolutas. Não é assim. Certamente, todas a três dimensões fundamentais do funcionamento continuado do capital têm os seus limites absolutos que podem ser claramente identificados. (or e!emplo, os limites absolutos da produção podem ser e!pressos pelos meios e materiais de produção, os quais, por sua ve", podem ser mel#or especificados como o colapso total do suprimento das matérias$primas fundamentais. %inda como o colapso igualmente total & não apenas a 'subutili"ação' & da maquinaria produtiva disponvel decorrente, por e!emplo, do abuso irrespons)vel e inconsequente dos recursos energéticos.* +as, apesar de tais considerações não serem certamente irrelevantes, elas sofrem da carência de especificidades sociais (como testemun#am muitos argumentos dos ambientalistas*, que debilitam desnecessariamente as suas prprias armas criticas ao associ)$las -s e!pectativas do dia de um u"o final que jamais se materiali"ar) necessariamente.  % crise estrutural do capital que começamos a e!perimentar nos anos /0 relaciona$se, na realidade, com algo muito mais modesto que as tais condições absolutas. 1ignifica simplesmente que a tripla dimensão interna da auto$e!pansão do capital e!ibe perturbações cada ve" maiores. 2la não apenas tende a romper o processo normal de crescimento mas também pressagia uma fal#a na sua função vital de deslocar as contradições acumuladas do sistema.  %s dimensões internas e condições inerentes à auto$e!pansão do capital constituram desde o incio uma unidade contraditória, e de modo algum não problem)tica, na qual uma tin#a que ser 'subugada' - outra (como +ar! colocou3 para 'subugar todo o momento da produção em si - troca'* de modo a fa"er funcionar o comple!o global.  %o mesmo tempo, enquanto a reprodução ampliada de cada uma pudesse continuar imperturbada & isto é, enquanto fosse possvel cavar buracos cada ve" maiores para enc#er com a terra assim obtida os buracos menores cavados anteriormente &, não s cada uma das dimensões internas contraditrias poderia ser fortalecida separadamente como elas também poderiam funcionar em uma #armonia 'contra$pontual'.  % situação muda radicalmente, porém, quando os interesses de cada uma dei!am de coincidir com os das outras, até mesmo em 4ltima an)lise. % partir deste momento, as perturbações e 'disfunções' antagnicas, ao invés de serem

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18.2.3Outra concepção equivocada a ser abandonada é a de que a criseestrutural se refere a algumas condições absolutas. Não é assim.Certamente, todas a três dimensões fundamentais do funcionamentocontinuado do capital têm os seus limites absolutos que podem serclaramente identificados. (or e!emplo, os limites absolutos daprodução podem ser e!pressos pelos meios e materiais de produção,os quais, por sua ve", podem ser mel#or especificados como ocolapso total do suprimento das matérias$primas fundamentais. %indacomo o colapso igualmente total & não apenas a 'subutili"ação' & damaquinaria produtiva disponvel decorrente, por e!emplo, do abusoirrespons)vel e inconsequente dos recursos energéticos.* +as, apesar 

de tais considerações não serem certamente irrelevantes, elas sofremda carência de especificidades sociais (como testemun#am muitosargumentos dos ambientalistas*, que debilitam desnecessariamenteas suas prprias armas criticas ao associ)$las -s e!pectativas do diade um u"o final que jamais se materiali"ar) necessariamente.

 % crise estrutural do capital que começamos a e!perimentar nos

anos /0 relaciona$se, na realidade, com algo muito mais modesto queas tais condições absolutas. 1ignifica simplesmente que a tripladimensão interna da auto$e!pansão do capital e!ibe perturbações

cada ve" maiores. 2la não apenas tende a romper o processo normalde crescimento mas também pressagia uma fal#a na sua função vitalde deslocar as contradições acumuladas do sistema.

 %s dimensões internas e condições inerentes à auto$e!pansão docapital constituram desde o incio uma unidade contraditória, e demodo algum não problem)tica, na qual uma tin#a que ser 'subugada'- outra (como +ar! colocou3 para 'subugar todo o momento daprodução em si - troca'* de modo a fa"er funcionar o comple!o global.

 %o mesmo tempo, enquanto a reprodução ampliada de cada umapudesse continuar imperturbada & isto é, enquanto fosse possvelcavar buracos cada ve" maiores para enc#er com a terra assim obtidaos buracos menores cavados anteriormente &, não s cada uma dasdimensões internas contraditrias poderia ser fortalecidaseparadamente como elas também poderiam funcionar em uma#armonia 'contra$pontual'.

 % situação muda radicalmente, porém, quando os interesses de

cada uma dei!am de coincidir com os das outras, até mesmo em

4ltima an)lise. % partir deste momento, as perturbações e 'disfunções'antagnicas, ao invés de serem

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absorvidas5dissipadas5desconcentradas e desarmadas, tendem atornar$se cumulativas e, portanto, estruturais, tra"endo com elas umperigoso bloqueio ao comple!o mecanismo de deslocamento dascontradições. 6esse modo, aquilo com que nos confrontamos não é

mais simplesmente 'disfuncional', mas potencialmente muitoe!plosivo. 7sto porque o capital nunca, amais, resolveu sequer amenor de suas contradições.

Nem poderia fa"ê$lo, na medida em que, por sua prpria nature"a

e constituição inerente, o capital nelas prospera (até certo ponto, comrelativa segurança*. O seu modo normal de lidar com contradições éintensific)$las, transferi$las para um nvel mais elevado, desloc)$laspara um plano diferente, suprimi$las quando possvel, e quando elasnão puderem mais ser suprimidas e!port)$las para uma esfera ou um

pas diferente. 8 por isso que o crescente bloqueio no deslocamento ena e!portação das contradições internas do capital é potencialmentetão perigoso e e!plosivo.

6esnecess)rio di"er que esta crise estrutural não est) confinada -esfera scio$econmica. 6adas as determinações inevit)veis do'crculo m)gico' do capital referidas anteriormente, a profunda crise da'sociedade civil' reverbera ruidosamente em todo o espectro dasinstituições polticas. Nas condições scio$econmicascrescentemente inst)veis, são necess)rias novas 'garantias polticas',

muito mais poderosas, garantias que não podem ser oferecidas pelo2stado capitalista tal como se apresenta #oe. %ssim, odesaparecimento ignominioso do 2stado do bem$estar social e!pressaclaramente a aceitação do facto de que a crise estrutural de todas as

instituições políticas ) vem fermentando sob a crosta da 'poltica deconsenso' #) bem mais de duas décadas. O que precisa seracentuado aqui é que as contradições subacentes de modo algum sedissipam na crise das instituições políticas; ao contr)rio, afectam todaa sociedade de um modo nunca antes e!perimentado. 9ealmente, a

crise estrutural do capital revela$se como uma verdadeira crise dedominação em geral.

:uem ac#a que isto soa muito dram)tico deveria ol#ar - sua volta, emtodas as direcções. 8 possvel encontrar qualquer esfera de actividadeou qualquer conunto de relações #umanas não afectado pela crise;<) cento e quarenta anos atr)s, +ar! ainda podia falar sobre 'agrande influência civili"adora do capital', sublin#ando que, por meiodela,

pela primeira ve", a nature"a se torna puramente um obecto para a#umanidade, puramente uma questão de utilidade= cessa de ser

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recon#ecida como um poder em si mesma= e descoberta terica desuas leis autnomas aparece apenas como um ardil para submetê$la-s necessidades #umanas, como um obecto de consumo ou comomeio de produção. 6e acordo com esta tendência, o capital ultrapassa

as barreiras e os preconceitos nacionais, a adoração da nature"a,assim como também todas as satisfações tradicionais, limitadas,complacentes embutidas, das necessidades presentes e asreproduções dos vel#os modos devida. [11] 

2 para onde tudo isto condu"; O capital não pode ter outro obectivoque não a sua prpria auto$reprodução, - qual tudo, da nature"a atodas as necessidade e aspirações #umanas, deve subordinar$seabsolutamente.

 %ssim, a influência civili"adora encontra o seu fim devastador nomomento em que a implac)vel lgica interna da auto$reproduçãoampliada do capital encontra obst)culo nas necessidades #umanas.2m >?@>, o orçamento militar nos 2stados Anidos c#egou aos B00 milmil#ões de dlares, (e quem sabe quanto mais além disso, sob v)riosoutros disfarces orçamentais*, e isso desafia a compreensão #umana.

 %o mesmo tempo, os serviços sociais mais elementares sãosubmetidos a duros testes3 uma medida verdadeira do 'trabal#ocivili"ador' do capital #oe. Contudo, mesmo tais somas e cortes estãomuito longe de serem suficientes para permitir ao capital seguirimperturb)vel o seu camin#o3 uma das provas mais evidentes da crisede dominação.

 % devastação sistem)tica da nature"a e a acumulação continua dopoder de destruição & para as quais se destina globalmente umaquantia superior a um mil#ão de mil#ões de dlares por ano &indicam o lado material amedrontador da lgica absurda dodesenvolvimento do capital. %o mesmo tempo, ocorre a negaçãocompleta das necessidades elementares de incont)veis mil#ões de

famintos3 o lado esquecido e que sofre consequências dos mil#ões demil#ões desperdiçados. O lado #umano paralisante destedesenvolvimento é visvel não s na obscenidade do'subdesenvolvimento' forçado, mas em toda a parte, inclusive namaioria dos pases de capitalismo avançado.

O sistema de dominação e!istente est) em crise porque a sua raisond'être e a sua ustificação #istricas desapareceram, e ) não podemmais ser reinventadas, por maior que sea a manipulação ou a purarepressão. 6esse modo, ao manter mil#ões e!cludos e famintos,

quando os mil#ões de mil#ões desperdiçados poderiam aliment)$losmais de cinquenta vezes, põe o absurdo desse sistema de dominação

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em perspectiva.

O mesmo é verdade para tantas outras grandes questões #umanasque começaram a mobili"ar as pessoas #) relativamente pouco

tempo. 6urante décadas, a literatura sociolgica produ"iu simp)ticoscontos de fadas sobre o 'conflito de gerações' (que, no verdadeiroesprito do 'fim da ideologia', tentou transformar os graves sinais dascontradições de classe em nobres vicissitudes de geraçõesintemporais*= agora eles têm realmente sobre o que escrever. Noentanto, os esquemas pré$fabricados de mistificação psico$sociolgicanão se austam ao quadro real. 7sso porque o assim c#amado conflitode gerações, no momento em que foi apologeticamente circunscrito, )estava solucionado, na medida em que toda a 'rebelião da uventude'evolua, no devido tempo, para a maturidade sensata dos pagamentos

da #ipoteca e da acumulação de uma poupança para a vel#ice, demodo a garantir uma e!istência cmoda até - sepultura, e mesmopara além dela, pela reprodução eterna das novas 'gerações' docapital. :uaisquer que fossem as dificuldades apresentadas pelanature"a & e a noção de 'geração' supostamente deveria sersimplesmente uma categoria da nature"a &, a auto$tranquili"açãovin#a da ideia de que o capital, graças a 6eus, seria, como decostume, a solução.

orém, a verdade tornou$se o e!acto oposto, ) que o capital nãoapenas não soluciona como ainda era o conflito real de gerações emescala sempre crescente. 2m todo o pas capitalista importante, nega$se oportunidade do trabal#o para mil#ões de #omens, obliterando semcerimnia a lembrança não tão antiga das diferenças com a cultura

 ovem', ao mesmo tempo em que espreme até a 4ltima gota de lucrodas sobras de tal cultura. %o mesmo tempo, alguns mil#ões depessoas mais vel#as são forçadas a untar$se -s filas de doações aosnecessitados, enquanto muitos mil#ões a mais estão sob a imensapressão de uma 'reforma prematura da qual a secção mais dinmica

do capital contemporneo & o capital financeiro & pode sugardurante algum tempo ainda um pouco mais de lucro. %ssim, o grupoet)rio da 'geração 4til' est) encol#endo para uma fai!a entre DE e E0anos, opondo$se objectivamente -s 'gerações indeseadas',condenadas pelo capital - inactividade obrigada e - perda da sua#umanidade. 2, então, ) que agora a geração intermedi)ria écomprimida entre 'ovens e 'vel#os in4teis' & até que ela prpria setorne supérflua quando assim determinar o capital & até mesmo osplanos temporais destas contradições se tornam absolutamenteconfusos.

Fipicamente, as soluções propostas nem sequer arran#am a superfcie

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do problema, sublin#ando, novamente, que estamos - frente de umacontradição interna insol4vel do prprio capital. O que est) realmenteem ogo é o papel do trabal#o no universo do capital, uma ve" que seten#a alcançado um nvel muito alto de produtividade. ara resolver

as contradições assim geradas, seria necess)ria uma importantereviravolta, que afectasse não apenas as prprias condições imediatasde trabal#o, mas também todas as facetas da vida social, inclusive asmais ntimas. O capital, ao contr)rio, pode produ"ir somente ascondições materiais necess)rias para o desenvolvimento do indivduosocial autnomo, de modo a neg)$las imediatamente. Fambém asnega materialmente quando ocorrem crises econmicas, bem comopoltica e culturalmente quando é do interesse de sua prpria econtnua sobrevivência como estrutura final de dominação.

Considerando que o capital s pode funcionar por meio decontradições, ele tanto cria como destri a famlia= produ" a geração

 ovem economicamente independente com a sua 'cultura ovem' earruna$a= gera as condições de uma vel#ice potencialmenteconfort)vel, com reservas sociais adequadas, para sacrific)$las aosinteresses de sua infernal maquinaria de guerra. 1eres #umanos são,ao mesmo tempo, absolutamente necess)rios e totalmente supérfluospara o capital. 1e não fosse pelo facto de que o capital necessita dotrabal#o vivo para a sua auto$reprodução ampliada, o pesadelo do#olocausto da bomba de neutrões certamente se tornaria realidade.+as, ) que tal 'solução final' é negada ao capital, somosconfrontados com as consequências desumani"adoras das suascontradições e com a crise crescente do sistema de dominação.

8 possvel que tal desumani"ação não sea tão bvia quanto a que sereflecte na luta cada ve" mais intensa pela libertação das mul#eres.Goram irreparavelmente destrudos os fundamentos econmicos daantiga ustificação #istrica da opressão das mul#eres, e o prprioavanço produtivo do capital desempen#ou a um papel central. +as,

novamente, podemos perceber as contradições inerentes. 2m umsentido & para seus prprios propsitos & o capital auda a liberar asmul#eres para mel#or poder e!plor)$las como membros de uma forçade trabal#o muito mais variada e convenientemente 'fle!vel'. %omesmo tempo, precisa manter a sua subordinação social noutro plano& para a reprodução sem problemas da força de trabal#o e para aperpetuação da estrutura familiar predominante & a fim desalvaguardar a sua prpria dominação como sen#or absoluto doprprio scio$metabolismo.

 %ssim, evidencia$se claramente que os sucessos parciais podem seevaporar de um momento para o outro & as mul#eres estão entre as

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primeiras a serem forçados ao desemprego ou a empregos parciaismiseravelmente remunerados & ) que os interesses lobais docapital predominam sobre os mais limitados. 6ado o facto de que aquestão real é o sistema e!istente de dominação e que os sucessos

significativos da liberação feminina obrigatoriamente abrem neleprofundas brec#as, minando a sua viabilidade, qualquer coisa que nãopossa ser mantida estritamente dentro de limites fi!ados pela buscade lucro deve ser reprimida. %o mesmo tempo, o importanteenvolvimento do capital na destruição de toda a ustificaçãoeconmica da opressão das mul#eres torna impossvel solucionar esteproblema por meio de um mecanismo económico. (Na realidade,puramente em termos econmicos, o equilbrio aponta frequentementena direcção oposta, contribuindo assim para o aguçamento destacontradição.*

Ama ve" que a famlia é o verdadeiro microcosmos da sociedade &cumprindo, além de suas funções imediatas, a necessidade deassegurar a continuidade da propriedade, à qual se acrescenta o seupapel como a unidade b)sica de distribuição e a sua capacidade deagir como a 'correia de transmissão' da estrutura de valorpredominante na sociedade & a causa da liberação das mul#eresafecta directa ou indirectamente a totalidade das relações sociais emtoda a sua fragilidade.

Neste particular, o aparente impasse actual, sob a pressão imediatada crise econmica, é bastante enganador. 7sso porque, considerandoo facto de uma perspectiva de tempo mais longa, podemos observaruma mudança dram)tica, na medida em que a famlia de trêsgerações que tn#amos antes da 4ltima guerra se transformouefectivamente agora numa famlia de uma eração! com todas as suasconsequências altamente benéficas para a e!pansão da economia deconsumo.

+as nem mesmo isso é mais suficiente. 6a as pressõescontraditrias por mudanças adicionais & ainda que, na realidade, seten#am esgotado as possibilidades de tais mudanças enquanto semantiver a actual estrutura familiar & assim como pressõesigualmente fortes para, no sentido oposto, restabelecer os vel#os'valores da famlia' patriarcal, no interesse da sobrevivênciacontinuada do capital. 1ão a presença e a intensidade simultneas deforças que pressionam irresistivelmente em direcções opostas quefa"em da actual crise estrutural do capital uma verdadeira crise dedominação.