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CENTRO DE ENSINO SUPERIOR DO CEARÁ
FACULDADE CEARENSE
CURSO DE BACHAREL EM SERVIÇO SOCIAL
Vera Lúcia Matos de Sousa
UMA ANÁLISE DO PROCESSO DE INSERÇÃO NO MERCADO DE
TRABALHO VIVENCIADO PELOS SUJEITOS COM TRANSTORNO
AFETIVO BIPOLAR NO CAPS GERAL – SER III – HUWC/UFC
FORTALEZA
DEZEMBRO 2013
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VERA LÚCIA MATOS DE SOUSA
UMA ANÁLISE DO PROCESSO DE INSERÇÃO NO MERCADO DE
TRABALHO VIVENCIADO PELOS SUJEITOS COM TRANSTORNO
AFETIVO BIPOLAR NO CAPS GERAL – SER III – HUWC/UFC
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Serviço Social do Centro de Ensino Superior Faculdade Cearense – FAC como requisito parcial para obtenção do grau de Bacharel em Serviço Social. Orientadora: Prof.ª Ms. Virzângela Paula Sandy Mendes
FORTALEZA – CEARÁ
Dezembro 2013
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VERA LÚCIA MATOS DE SOUSA
UMA ANÁLISE DO PROCESSO DE INSERÇÃO NO MERCADO DE
TRABALHO VIVENCIADO PELOS SUJEITOS COM TRANSTORNO
AFETIVO BIPOLAR NO CAPS GERAL – SER III – HUWC/UFC
Monografia apresentada como pré-requisito para obtenção do título de Bacharelado em Serviço Social outorgado pela Faculdade Cearense – FAC, tendo sido aprovada pela banca examinadora composta pelos professores. Nota: ______ Data de aprovação:______/______/______
BANCA EXAMINADORA
__________________________________________________
Prof.ª Ms. Virzângela Paula Sandy Mendes
Orientadora
__________________________________________________
Prof.ª Ms. Kelly Maria Gomes Menezes
1ª Examinadora
__________________________________________________
Prof.ª Esp. Verbena Paula Sandy
2ª Examinadora
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Dedicatória
A minha família, meu esposo Ivanildo Coriolano,
meus filhos Willy Matheus, Yan Lucas e Mariana
pela força que me deram ao longo desta caminhada.
Aos meus pais pela presença em minha vida,
especialmente minha mãe Zilda Matos, pelas
orações e palavras de reconforto.
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AGRADECIMENTOS
A Deus, o Criador onipotente que me guia em todos os momentos da
minha vida, me fazendo buscar forças para nunca desistir do meu caminho.
- Aos professores da FAC que me transmitiram seus conhecimentos ao
longo desses quatro anos, me fazendo, cada dia mais amar o Curso de Serviço
Social;
- A minha Supervisora de Campo do CAPS – GERAL SER III assistente
social Neusa Coqueiro que muito me ensinou durante meu estágio naquela
unidade com paciência e de forma incansável;
- A Assistente Social Ana Carla pelo seu acompanhamento quando da
minha passagem pelo CAPS transmitindo sempre os seus conhecimentos;
- A psicóloga do CAPS Francirene pelo seu apoio ao longo do meu
estágio na instituição;
- A Assistente Social Kelly por sua inestimável acolhida e
acompanhamento ao longo do meu estágio supervisionado;
- A toda a equipe do CAPS, em especial a Coordenadora Fabíola por
sua calorosa acolhida nesta instituição;
- Aos componentes do Grupo TAB pela sua participação enquanto
colaboradores da pesquisa;
- A minha Orientadora Virzângela Paula Sandy Mendes pela sua valiosa
colaboração ao longo deste trabalho;
- A minha prima de sangue e irmã de coração Ângela Mesquita pelo seu
incentivo em todos os momentos, especialmente na vida acadêmica;
- As colegas de equipe que compartilharam comigo, ao longo desses
quatro anos, as teorias discutidas em seminários e apresentações, em especial
a Rosana que sempre me ouviu trazendo uma palavra de reconforto com
sabedoria e paciência.
A todos, o meu muito obrigada!
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“Quando deixamos nossa luz própria
brilhar, inconscientemente damos às
outras pessoas permissão para fazer o
mesmo”.
Nélson Mandela
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RESUMO
O presente trabalho é fruto de uma pesquisa feita com usuários do grupo de
transtorno afetivo bipolar no CAPS GERAL – SER III – HUWC/UFC objetivando
saber como ocorre o processo de inserção no mercado de trabalho destes
usuários, acompanhados por essa instituição. Como objetivos específicos
buscamos analisar as novas reconfigurações no mundo do trabalho a partir da
reestruturação produtiva e seus impactos na saúde do trabalhador; identificar a
proposta do sistema substitutivo de saúde mental e compreender os desafios
postos a esses usuários. O estudo é de cunho qualitativo/quantitativo e se
utilizou, enquanto técnicas de pesquisa, de um questionário fechado para
descrever o perfil socioeconômico dos participantes, bem como de uma
entrevista semiestruturada, com vistas a recolher informações dos usuários em
seus relatos orais. Constatamos, de acordo com estas técnicas, que os sujeitos
participantes da pesquisa são de faixas etárias diversificadas, encontram-se à
margem do mercado de trabalho e estão em tratamento, sendo assistidos pelas
famílias e acompanhados pelos profissionais do CAPS. Concluímos através
dos depoimentos dos usuários que as pessoas com transtornos mentais ainda
se encontram excluídas, não tendo, portanto, chance de serem inseridas, ou de
concorrerem a uma vaga no mercado de trabalho de acordo com as suas
limitações.
Palavras-chave: Trabalho, Saúde Mental, Reforma Psiquiátrica.
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RÉSUMÉ
Le présent ouvrage est le résultat d'une enquête auprès des utilisateurs du
CAPS GERAL – SER III –HUWC/UFC dans le but d'analyser comment se
produit le processus d’insertion sur le marche du travail de ces utilisateurs
accompagnés par cette instituition. En tant qu’objectifs spécifiques, nous
cherchons à analyser les reconfigurations dans le monde du travail à partir de
la restructuration productive et son impact sur la santé des travailleurs; identifier
le système de remplacement proposé pour la santé mentale et de comprendre
les défis posés à ces utilisateurs. L’étude a pour base méthodolgique la notion
qualitative/quantitative et comme instruments de recherche nous avons utilisé
un questionnaire pour décrire le profil socioéconomique des participants et d’un
interview semi-structuré en vue de recueillir des informations auprès des
utilisateurs dans leurs rapports oraux. Nous avons constaté, à partir des
instruments, utilisés que les participants de la recherche sont des divers âges,
se trouvent à marge du marché du travail, se trouvent en traitement, sont
assistés par leurs familles et sont accompagnés par les professionnels du
CAPS. Nous avons conclu à travers leurs témoignages que les porteurs de
troubles mentaux se trouvent exclus, n’ayant aucune chance d’être insérés,
pour exécuter une tâche sur le marché du travail selon leurs limitations.
Mots-clefs: Travail, Sainté Mentale, Réforme Psychiatrique.
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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
CAPS – Centro de Atenção Psicossocial
CAPSad - Centro de Atenção Psicossocial Álcool e Drogas
CAPSi – Centro de Atenção Psicossocial Infantil
CEP – Comitê de Ética e Pesquisa
CERSAMES – Centros de Referência em Saúde Mental
COOPCAPS – Cooperativa do Centro de Atenção Psicossocial
DORTs – Doenças Osteo-musculares Adquiridas no Trabalho
FHC – Fernando Henrique Cardoso
HUWC – Hospital Universitário Walter Cantídio
LER – Lesão por Esforço Repetitivo
MG – Minas Gerais
MTSM – Movimento dos Trabalhadores em Saúde Mental
MS – Ministério da Saúde
NAPS – Núcleos de Atenção Psicossocial
OMS – Organização Mundial da Saúde
PDV – Plano de Demissão Voluntária
PT – Partido dos Trabalhadores
SER III – Secretaria Executiva Regional III
SUS – Sistema Único de Saúde
TAB – Transtorno Afetivo Bipolar
TCLE – Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
TEPT – Transtorno de Estresse Pós-Traumático
UFC – Universidade Federal do Ceará
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SUMÁRIO
INTRODUÇÃO...................................................................................................12
Capítulo I
AS TRANSFORMAÇÕES NO MUNDO DO TRABALHO NA
CONTEMPORANEIDADE.................................................................................17
1.1 A Reestruturação Produtiva........................................................................21
1.2 Trabalho e desgaste mental........................................................................26
Capítulo II
A INTERVENÇÃO EM SAÚDE MENTAL A PARTIR DA REFORMA
PSIQUIÁTRICA................................................................................................30
2.1 Trajetória da Reforma Psiquiátrica.no Brasil..............................................35
2.2 Criação do sistema substitutivo de saúde mental......................................41
2.3 Surgimento do CAPS GERAL SER III – HUWC / UFC.............................44
Capítulo III
LEVANTAMENTO DA REALIDADE SOCIOECONOMICA DOS USUÁRIOS
DO GRUPO DE TRANSTORNO AFETIVO BIPOLAR (TAB) DO CAPS
GERAL SER III – HUWC / UFC......................................................................47
3.1 Contextualização do grupo pesquisado ....................................................47
3.2 Informações obtidas nos instrumentos da pesquisa .................................48
3.3 Percepções dos participantes do grupo de transtorno afetivo bipolar sobre
a sua inserção no mercado de trabalho .........................................................51
3.3.1 Chegada dos usuários ao CAPS ................................................52
3.3.2 Experiência profissional e vivência nesse processo ...................55
3.3.3 Atividade laboral no momento da pesquisa ................................57
3.3.4 Processo de inserção no mercado de trabalho ..........................58
11
3.3.5 Representação do trabalho em sua vida ...................................61
3.3.6 Acesso ao emprego hoje............................................................63
3.3.7 Apreciação sobre sua participação no grupo TAB .....................65
CONSIDERAÇÕES FINAIS...........................................................................69
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ..............................................................72
APÊNDICES
ANEXOS
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INTRODUÇÃO
Nossa pesquisa foi realizada no Centro de Atenção Psicossocial – CAPS
Geral – SER III – HUWC/UFC, instituição onde realizamos nosso estágio
supervisionado em Serviço Social no período de março de 2012 a junho de
2013. O nosso interesse neste local foi resultado da experiência em uma das
atividades desenvolvidas em nossa prática, que foi a participação nos trabalhos
de um grupo psicoeducativo de transtorno afetivo bipolar, grupo este que foi
fundado no ano de 2008. O grupo é coordenado por uma assistente social e
uma psicóloga, as quais são facilitadoras e realizam os encontros com
periodicidade.
Vale salientar que este grupo tem como objetivo viabilizar através da
psicoeducação, o acesso às informações que possibilitem uma melhor
convivência por parte dos usuários com transtorno bipolar nos mais diversos
aspectos: social, econômico e cultural.
É importante esclarecermos que os usuários são comprometidos,
assíduos e ativos nas reuniões. Trata-se, portanto, de um público composto por
pessoas de diferentes classes sociais, estudantes, desempregados,
aposentados, jovens e adultos, homens e mulheres, na faixa etária entre 18 a
60 anos. O que mais chamou a nossa atenção foi o nível socioeconômico
desses usuários, onde a maioria não exerce trabalho formal e vivenciam outras
desigualdades sociais.
No decorrer dos encontros, tivemos a oportunidade de debater vários
temas, entre eles a questão do trabalho na contemporaneidade. Com base nos
relatos partilhados, pudemos observar o processo de inserção destes usuários
no mercado de trabalho, fato que nos levou ao desejo de aprofundar o estudo
sobre essa questão.
Dessa forma, o objetivo geral da nossa pesquisa foi analisar como os
sujeitos com transtorno afetivo bipolar, acompanhados pelo CAPS GERAL –
SER – III, vivenciam o seu processo de inserção no mercado de trabalho. E,
como objetivos específicos buscamos: analisar as novas reconfigurações no
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mundo do trabalho a partir da reestruturação produtiva e seus impactos na
saúde do trabalhador; identificar a proposta do sistema substitutivo de saúde
mental e compreender os desafios postos aos usuários no que se refere a sua
inserção no mercado de trabalho.
A metodologia utilizada na nossa pesquisa compreende os aspectos
teóricos e práticos, pois estes abrangem, ao mesmo tempo, segundo Minayo
(2010) a teoria e a prática da abordagem da realidade, ou seja, o método, os
instrumentos que propiciaram o conhecimento, ou seja, as técnicas a serem
trabalhadas, bem como a capacidade criadora do pesquisador.
Nesse contexto metodológico fizemos: pesquisas bibliográficas;
pesquisa documental e pesquisa de campo. No tocante à pesquisa bibliográfica
nos servimos, para fundamentar este estudo, de materiais já elaborados,
compostos especialmente de livros e artigos científicos (GIL, 2008). Na nossa
pesquisa documental lançamos mão de artigos e documentos, cujas fontes
ainda existem sob sua forma inicial, ou seja, ainda não receberam um
tratamento minucioso e/ou são passíveis de modificações no decorrer do
tempo (GIL, 1999). No que concerne à pesquisa de campo a desenvolvemos
através da coleta de dados in loco, o que nos oportunizou o contato direto com
os informantes, de forma espontânea e sem interferências, momento em que
seguimos nosso roteiro cujas questões foram previamente estabelecidas
(LAKATOS; MARCONI, 1991).
Para desenvolver nossa pesquisa, seguimos como trajetória a
abordagem de cunho quali-quanti, pois contempla os sujeitos envolvidos no
processo, permitindo uma maior apreensão da realidade proposta como
estudo. Conforme Minayo (1994, p. 21-22)
A pesquisa qualitativa responde a questões muito particulares. Ela se preocupa nas ciências sociais, com um nível de realidade que não pode ser quantificado. Ou seja, ela trabalha com o universo de significados, motivos, aspirações, crenças, valores e atitudes, o que corresponde a um espaço mais profundo das relações, dos processos e dos fenômenos que não podem ser reduzidos à operacionalização de variáveis.
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Dessa forma, através da pesquisa qualitativa pudemos analisar e
compreender o universo dos usuários pesquisados no CAPS GERAL SER III,
fato que nos permitiu visualizar com profundidade o tema em estudo.
As pesquisas bibliográfica e documental ocorreram entre os meses de
agosto a setembro de 2013, enquanto que a pesquisa de campo foi realizada
no mês de outubro de 2013, durante todo o mês, ao final de seis reuniões de
grupo, na própria instituição.
Enquanto técnica de coleta de dados utilizamos um questionário com
vistas a traçar o perfil socioeconômico dos usuários do grupo pesquisado e
uma entrevista semiestruturada, a fim de colhermos, entre outras, informações
relativas sobre sua inserção no mercado de trabalho. Nesse momento nos
reservávamos em uma sala, individualmente, com cada participante, a fim de
realizarmos a contento as nossas gravações após cada questionamento
colocado.
Dando continuidade ao nosso trabalho, lembramos aos entrevistados
que teriam sua identidade preservada e, nesse momento, apresentamos a
todos àqueles que se submetiam aos questionamentos o Termo de
Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), especificando que todos eram
livres para se pronunciarem após cada questão colocada. Assim, na nossa
análise, nomeamos os participantes de: usuário, o que caracterizou o nosso
conhecimento para cruzar as informações foi a ordem aritmética de todos os
usuários participantes da pesquisa. Nossa amostra de usuários pesquisados
contou com 06 (seis) informantes, os quais foram selecionados de acordo com
a sua disponibilidade. Foi dessa forma que procedemos ao catalogarmos as
informações de maneira ética e fidedigna em relação à pesquisa e a todos os
participantes.
Vale salientar que nosso estudo seguiu todos os trâmites do Comitê de
Ética e Pesquisa (CEP), resguardando o sigilo e os protocolos da pesquisa
com seres humanos, conforme a Resolução 196/96 (CNS), desde a aprovação
do Projeto no Sistema Saúde Escola da SMS, até sua chegada à Plataforma
Brasil, momento em que foi dada a entrada no Comitê de Ética da Maternidade
Escola Assis Chateaubriand, no dia 10 de agosto de 2013 tendo sua aprovação
no dia 28 de agosto de 2013.
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No tocante às categorias teóricas relativas ao nosso objeto de estudo,
ou seja, trabalho, saúde mental e reforma psiquiátrica, fizeram parte da nossa
literatura autores de grande relevância aqui representados por Antunes (1999,
2011); Teixeira (1996); Seligmann-Silva (2011); Freire (2010); Iamamoto (2011,
2012), e Dejours (1992), que discorrem sobre o processo de trabalho, sobre
suas características e consequências para o trabalhador; Santos (2005, 2010)
no tocante à saúde mental; Amarante (1995); Tenório (2002), Foucault (2005);
Resende (1994) que discorrem sobre a trajetória da reforma psiquiátrica no
Brasil. Esses autores, entre outros, muito contribuíram com suas concepções
teóricas sobre os sentidos do trabalho; trabalho e indivíduo social,
reestruturação produtiva, trabalho e desgaste mental e trajetória da reforma
psiquiátrica no Brasil.
Em relação às categorias aqui representadas no nosso estudo –
Trabalho, Saúde Mental e Reforma Psiquiátrica, elencamos alguns autores que
foram relevantes a nossa pesquisa.
Referente à categoria Trabalho, Iamamoto (2012, p. 60), assinala que
“por meio do trabalho o homem se afirma como ser criador, não só como
indivíduo pensante, mas como indivíduo que age consciente e racionalmente”.
Porém, a contemporaneidade congregou mudanças e transformações
radicais para a classe trabalhadora, fato que ocasionou uma ampla expulsão
desta classe de seus postos de trabalho.
No tocante à categoria Saúde Mental, é importante ressaltar a
conceituação dessa categoria. De acordo com a OMS (2001, p. 175), a saúde
mental “abrange o bem-estar subjetivo, autoeficácia percebida, autonomia, a
competência e a autorrealização do potencial intelectual e emocional do
indivíduo”.
De acordo com o exposto, o conhecimento sobre saúde mental não é
suficiente para provocar mudanças no atendimento às pessoas com transtorno
mental, mas sim buscar a sensibilização de que é fundamental a luta pela
preservação de seus direitos.
Em relação à categoria Reforma Psiquiátrica, compactuamos com as
discussões de Tenório (2002, p. 57), quando esse afirma que no Brasil, esta é
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[...] uma forma sociável de tratar a loucura, procurando reduzir [...] a prática asilar, buscando novas alternativas de cuidados, humanizando o atendimento, tentando ressocializar essas pessoas com transtornos mentais.
Assim sendo, a reforma psiquiátrica objetivava oferecer um sistema de
saúde igualitário, que privilegiasse as pessoas com transtornos mentais, e
oportunizasse a reinserção desses na sociedade, de forma que pudessem
exercer sua cidadania.
Os resultados de nossa pesquisa estão organizados em três capítulos, a
seguir dispostos:
O primeiro capítulo, intitulado As transformações no mundo do trabalho
na contemporaneidade, tratou das questões inerentes à reestruturação
produtiva e o trabalho e desgaste mental.
No segundo capítulo, intitulado A intervenção em saúde mental a partir
da Reforma Psiquiátrica, abordamos sobre a trajetória da Reforma Psiquiátrica
e a Criação do sistema substitutivo de saúde mental.
. Por fim, no terceiro capítulo, que trata do Levantamento da realidade
socioeconômica dos usuários do grupo de transtorno afetivo bipolar no CAPS
GERAL SER III; da contextualização do grupo pesquisado e, das percepções
dos participantes do grupo de transtorno afetivo bipolar sobre a sua inserção no
mercado de trabalho.
A seguir detalharemos as discussões de nosso estudo, com vistas a
suscitarmos reflexões acerca do tema pesquisado, de forma que possa
contribuir para um futuro debate e um estudo mais aprofundado entre os
profissionais e estudiosos da área de saúde mental.
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CAPÍTULO I AS TRANSFORMAÇÕES NO MUNDO DO TRABALHO NA
CONTEMPORANEIDADE
Nesse item abordaremos assuntos que discutem as questões inerentes
ao mundo do trabalho, da forma como os trabalhadores são enquadrados na
contemporaneidade, bem como ao tempo que traz mudanças expressivas, na
vida desses trabalhadores ocultando a relação essencial entre o capital e o
trabalho.
Para desenvolvermos essa temática iniciaremos pela conceituação da
categoria trabalho, por compreendermos que este é essencial para o ser
humano e que “o trabalho mostra-se como momento fundante de realização do
ser social, condição para a sua existência; é o momento de partida para a
humanização do ser social” (ANTUNES, 2011, p. 144).
O trabalho é, então, uma atividade humana que transforma a natureza e
o próprio ser humano enquanto ser social, tendo em vista que ele tem a
capacidade de realizar-se como ser livre, buscando meios para a sua
subsistência, bem como a sua interação social, através do trabalho.
Afinal, segundo Iamamoto (2012, p. 60), “por meio do trabalho o homem
se afirma como ser criador, não só como individuo pensante, mas como
individuo que age consciente e racionalmente”. Dessa forma, o trabalho traz
mudanças tanto na matéria quanto no sujeito, na sua competência, permitindo-
o descobrir novas aptidões e atributos humanos.
Conforme Antunes (2011), a produção e reprodução da vida humana
realizam-se pelo trabalho. É, pois, a partir do trabalho no cotidiano que o sujeito
torna-se um ser social, o que o distingue de todos os outros seres vivos.
Constatamos, então, que trabalhar é condição essencial, não somente
para arcar com os custos financeiros, mas para dignificar a vida, pois trabalhar
se constitui um elemento importante da existência humana. Como afirma Lessa
(1997, p. 157) “o homem para existir enquanto tal; deve necessariamente
produzir, pelo trabalho, os bens materiais indispensáveis à sua reprodução”.
Trata-se da sua realização pessoal, para sentir-se útil e encontrar sentido para
os seus dias.
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Conforme Cavaignac (2004), o ser humano nasce e se desenvolve a
partir do trabalho, atividade humana através da qual ele produz sua
subsistência, modificando a própria existência, criando e transformando a si
mesmo. É, pois, por meio do trabalho que o mesmo enquanto ser social recria-
se a si mesmo como gênero humano no processo de autoatividade e de
autocontrole.
Como assinala Antunes (1999, p.142) o trabalho
“quer em sua gênese, quer em seu desenvolvimento, em seu ir-sendo e em seu vir-a-ser, uma intenção ontologicamente voltada para o processo de humanização do homem em seu sentido amplo [...] Tem-se, portanto, por meio do trabalho, um processo que simultaneamente altera a natureza e autotransforma o próprio ser que trabalha”.
Portanto, a importância do trabalho na vida do ser humano é reveladora
da nossa humanidade, uma vez que possibilita uma ação transformadora sobre
a natureza e sobre si mesmo.
Em contraposição a essa visão de trabalho enquanto relação metabólica
do ser humano com a natureza temos o conceito de “capital humano”, que
surge na literatura econômica nos anos 1950, e, mais tarde, entre 1960 e 1970,
na área educacional, com tal consistência, que foi implantada a disciplina de
economia (política) da educação, aprofundando a base do conhecimento nas
ciências sociais e humanas. Como assinala Frigotto (2005), esta noção foi
adotada pelos intelectuais da burguesia mundial com vistas a elucidarem a
desigualdade entre os povos na esfera mundial. Os indivíduos das diversas
camadas sociais desconhecem a realidade que produz essa desigualdade e,
assim, vendem o único produto que possuem para proverem os seus meios de
subsistência, de suas famílias, ou seja, a sua força de trabalho.
Sabemos que o caráter limitado da noção relativa ao “capital humano”
nos leva a observar que há uma perda de direitos, especialmente, em países
considerados em desenvolvimento como o Brasil, onde o trabalhador é
explorado e remunerado com baixo salário.
Outro aspecto que merece destaque é a questão da inserção da classe
trabalhadora no mercado de trabalho na contemporaneidade. Conforme relata
Iamamoto (2012, p.32)
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As tendências do mercado de trabalho, apontado(a)s por inúmeros estudiosos, indicam uma classe trabalhadora, polarizada, com uma pequena parcela com emprego estável, dotada de força de trabalho altamente qualificada e com acesso a direitos trabalhistas e sociais e uma larga parcela da população com trabalhos precários, temporários, subcontratados etc.
Nessa perspectiva, percebemos que o trabalhador é solicitado para
exercer múltiplas funções em seu trabalho, recebendo o mesmo salário, com
vistas a diminuir o número de funcionários das empresas, deixando assim, de
ser especializado e passando a ser multifuncional.
Da mesma forma, como consequência do avanço tecnológico, a
contemporaneidade congregou mudanças e transformações radicais para a
classe trabalhadora, pois desencadeou uma ampla expulsão desta classe de
seus postos de trabalho.
Nesse contexto, devido às crescentes mudanças ocorridas no mundo do
trabalho, conforme Antunes (2008) constata-se a desproletarização do trabalho
industrial fabril, na qual se ampliou o trabalho assalariado e sua
heterogeneização através da inserção do trabalho feminino na classe operária.
Nesse patamar, os efeitos das transformações do mundo do trabalho,
resultam no surgimento expressivo do desemprego estrutural, atingindo em
escala mundial toda a classe trabalhadora, reduzindo o operário industrial e
aumentando o trabalho informal1. Outra consequência para a classe
trabalhadora com o resultado dessas mudanças é a diminuição da estabilidade
no mercado de trabalho, pois o que é interessante para o mercado é a
acumulação da mão de obra, baratear a força de trabalho, enfim, trata-se de
“uma força de trabalho que entra facilmente e é demitida sem custos quando as
coisas ficam ruins”. (HARVEY, 2011, p. 114).
Vale ressaltar que todas essas mudanças tornam-se favoráveis aos
detentores do capital e a lógica de um sistema que só visa o lucro, o consumo
e o progresso tecnológico, predominantemente a serviço da reprodução do
capital.
No que concerne aos trabalhadores, Antunes (1999, p. 205) afirma que: 1 O trabalho informal é o tipo de trabalho desvinculado de qualquer empresa, ou seja, o
trabalhador não possui um contrato formal de trabalho, pois se trata de uma forma de subemprego disfarçado. (OLIVEIRA, 2000, p. 13).
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A classe trabalhadora, os “trabalhadores do mundo na virada do século”, é mais explorada, mais fragmentada, mais heterogênea, mais complexificados, também no que se refere a sua atividade produtiva: é um operário ou uma operária trabalhando em média com quatro, com cinco, ou mais máquinas. São desprovidos de direito, seu trabalho é desprovido de sentido, em conformidade com o caráter destrutivo do capital, pelo o qual relações metabólicas sobre o controle do capital não só degradam a natureza, levando o mundo à beira da catástrofe ambiental.
Nesse contexto, o capitalismo contemporâneo acaba por precarizar as
relações e condições de trabalho, desprezando as proteções trabalhistas ao
legitimar o trabalho terceirizado2, temporário, e precário. Assim, percebemos
nitidamente uma contradição nesse sistema em relação à classe trabalhadora,
ou seja, de um lado há uma classe com boas condições de trabalho e sob
proteção social e, de outro lado, há uma ampliação desta classe de
trabalhadores composta por subcontratados, muitas vezes informais, ou seja,
fora do alcance dos direitos sociais e superexplorados. Assim, “o capital só
pensa, portanto, na formação da mais valia sem se preocupar com a saúde
nem com a vida do trabalhador”. (MARX, 2012, p.105).
Portanto, para o capitalista o que importa é o lucro e não a possibilidade
de defesa e reprodução da vida do trabalhador. Porém, torna-se evidente que,
com a modernização da produção, houve mudanças nos processos de trabalho
devido ao avanço científico e tecnológico em que a qualificação profissional
torna-se imprescindível para o indivíduo, nos termos de Antunes (2011), pela
intelectualização do trabalho social3.
A esse respeito, Iamamoto (2012) relata que nesse processo de
modernização da produção, surge o trabalhador polivalente, exercendo várias
tarefas durante o mesmo período de trabalho e percebendo o mesmo salário.
Deixa, portanto, de ser um trabalhador especializado, trabalhando com mais
2 A terceirização hoje é uma realidade nas relações de trabalho, originada das mudanças no
sistema econômico e da flexibilização das normas. Segundo Lívio Giosa, terceirização é “[...] um processo de gestão pelo qual se repassam algumas atividades para terceiros, com os quais se estabelece uma relação de parceria, ficando a empresa concentrada apenas em tarefas essencialmente ligadas ao negócio em que atua.” (GIOSA apud MORAES, 2003, p. 64).
3 Mudança no interior do processo de trabalho, que decorre do avanço científico e tecnológico e
que se configura pelo peso crescente da dimensão mais qualificada do trabalho. (MARX apud ANTUNES, 2011, p. 55).
21
eficiência e alta tecnologia, trazendo como consequência uma redução da
demanda de trabalhadores e a exclusão de mão de obra.
Nesse sentido, Antunes (1999, p. 232), afirma que o processo de
valorização do capital trata-se, portanto de
uma aguda destrutividade, que no fundo é a expressão mais profunda da crise estrutural que assola a (des)sociabilização contemporânea: destrói a força humana que trabalha; destroçam-se os direitos sociais; brutalizam-se enormes contingentes de homens e mulheres que vivem da venda de sua força de trabalho; torna-se predatória a relação produção/natureza, criando-se uma monumental “sociedade descartável”, que joga fora tudo que serviu como “embalagem” para as mercadorias e o seu sistema, mantendo-se e agilizando-se, entretanto o circuito reprodutivo do capital.
Verificamos, assim, que a força de trabalho na sociabilidade capitalista
transforma-se em estoques de mercadoria, tornando-se descartáveis e em
excesso para as necessidades de acumulação do capital. Desse modo, a
classe trabalhadora encontra-se fragilizada, insegura diante da defesa do
trabalho e das lutas sindicais por melhores condições de trabalho e, sobretudo,
pela manutenção dos empregos, motivados pelo crescimento exorbitante de
desemprego estrutural.
Em última análise, as transformações do mundo do trabalho na
contemporaneidade acontecem através do incremento tecnológico, que eleva a
produtividade e, ao mesmo tempo, desemprega. Nesse clima de instabilidade,
percebemos o desprezo com a classe trabalhadora deixando-a mais explorada,
alienada e precarizada.
Vale ressaltar que as novas reconfigurações ocorridas no mundo do
trabalho estão inseridas em um contexto de crise do próprio sistema capitalista,
onde uma das estratégias para Mota (1995) foi a reestruturação produtiva.
Esse assunto trataremos a seguir.
1.1 A Reestruturação Produtiva
Inserida em um contexto de crise total do capital, a reestruturação
produtiva teve seu início a partir dos anos 1970. Para entendermos sobre a
22
mesma e seus parâmetros, faz-se necessário compreender os velhos modelos
de produção capitalista, com base no binômio taylorismo/fordismo4, aderido
pelo Estado, o qual criou um “acordo” entre capital e trabalho, conhecido como
o Estado de Bem-Estar Social.
O Estado de Bem-Estar Social foi simultâneo à crise do
taylorismo/fordismo intitulado de pacto fordista-keynesiano que, segundo Mota
(1995, p. 05) representa a “incorporação das demandas trabalhistas, aumento
da produção e do consumo operário e estabelecimento de uma relação
negociada entre Estado, capital e trabalho”. Esse Estado de Bem-Estar Social
também conhecido por sua denominação em inglês como Welfare State serviu
para designar o Estado assistencial garantindo padrões mínimos a todos os
cidadãos.
Na virada do século XX até o século XXI, ocorreram várias mutações no
processo produtivo do capital, ocasionando grandes repercussões na esfera do
trabalho. Isto trouxe transformações para o mundo do trabalho, desenvolvendo
um capitalismo com características de acumulações flexíveis.
O processo de produção do capital teve suas repercussões no mundo do
trabalho. Com a crise dos anos 1970 para Antunes (1999, p. 47).
O capital deflagrou, então, várias transformações no próprio processo produtivo, por meio da constituição das formas de acumulação flexível, [...] das formas de gestão organizacional, do avanço tecnológico, dos modelos alternativos ao binômio taylorismo/fordismo, onde se destaca, especialmente o “toyotismo”
5” ou o modelo japonês.
De um lado, ocorreram tais transformações, oriundas da concorrência do
capital em momentos de crises e disputas, e de outro buscaram o controle das
lutas da classe trabalhadora em busca da resposta à sua própria crise.
4 O binômio taylorismo/fordismo, “expressão dominante do sistema produtivo e de seu
respectivo processo de trabalho, que vigorou na grande indústria ao longo praticamente de todo século XX, sobretudo a partir da segunda década, baseada na produção em massa de mercadoria, que se estruturava a partir de uma produção mais homogeneizada e enormemente verticalizada”. (ANTUNES, 1999, p. 36).
5 Toyotismo – “expressa a forma de expansão do capitalismo monopolista do Japão no Pós –
45, cujos traços principais são: produção flexível, existência de grupos ou equipes de trabalho utilizando-se crescentemente da microeletrônica e da produção informatizada”. (ANTUNES, 1999, p. 19).
23
Essas transformações, comumente intituladas de reestruturação
produtiva, trazem consigo grandes repercussões para a vida do trabalhador,
reduzindo a capacidade de luta dos mesmos.
Conforme Freire (2010, p. 52)
o poder destrutivo da reestruturação produtiva é manifestado numa série de perdas para o trabalhador, evidenciando-se, em primeiro lugar, na expulsão massificada do emprego. Tal perda, como as demais, apresentam diferenciação segundo a natureza jurídica das empresas, confirmando a maior preservação da preocupação social na estatal.
Tais prejuízos, desde o início dos anos 1970, deram ênfase à
lucratividade do capital ocorrido pela flexibilização da produção em confronto
com o padrão fordista6. Isso acarretou intensas mudanças na produção deste
capital em escala mundial, assegurando cada vez mais lucros aos detentores
do capital, através da reorganização do processo produtivo e da dominação
social.
Por outro lado, a racionalização produtiva afeta radicalmente as
condições de vida e de trabalho da classe trabalhadora, gerando assim,
insegurança, instabilidade e desigualdade social.
Iamamoto (2011, p. 132) esclarece que
a tendência é ampliar a seletividade direcionada aos grandes grupos econômicos que atuam no setor, “depurando” o acesso aos fundos públicos, consoante à privatização do Estado pelo grande capital. As políticas de racionalização produtiva vêm sendo implementadas por meio de inovações gerenciais e da incorporação, na esfera produtiva.
Nesse sentido, vivemos então em um contexto marcado pela
globalização, modernização e reestruturação produtiva, que destrói a força de
trabalho e se converte também em desemprego. Assim, resultando em
contratos de trabalho flexíveis, manifestados em condições de trabalho
precário, baixos salários, desproteção social, etc.
De acordo com Sennett (2005, p. 69),
6 Padrão fordista - sistema de produção, criado pelo norte-americano Henry Ford em 1914, cuja
principal característica era a fabricação em massa de automóveis. Era necessário racionalizar as operações realizadas pelos trabalhadores, combatendo o desperdício na produção, reduzindo o tempo e aumentando o ritmo de trabalho. (ANTUNES, 1999).
24
Estas, pois, são as forças que dobram as pessoas à mudança, ou seja, reinvenção da burocracia, especialização flexível de produção, concentração sem centralização. Na revolta contra a rotina, a aparência de nova liberdade é enganosa. O tempo nas instituições e para os indivíduos não foi libertado da jaula de ferro do passado, mas sujeito a novos controles do alto para baixo.
Sabemos que esse tempo de flexibilização constrói um novo poder, pois
flexibilidade provoca instabilidade, porém a mudança flexível de hoje procura
reinventar constantemente o tempo no presente. Essa nova forma de trabalho
desordena o tempo, quebra a rotina e leva a um raciocínio em que tudo ocorre
em tempo hábil.
Vale ressaltar que na reestruturação do processo produtivo há uma
desvalorização do trabalho humano e uma flexibilização das relações de
trabalho, expressas sob as mais diversas formas de precarização e exploração
do trabalhador.
Nesse âmbito de enfrentamento da crise através da reestruturação da
produção, acompanhada de novas tecnologias e de produção flexível, como
estratégia de satisfação do mercado, torna-se necessário um novo
gerenciamento da força de trabalho. Teixeira (1996, p. 215) relata que as
empresas demandam:
Um trabalhador que não seja mais aquele tipo de individuo que batia o relógio de ponto recebia ordens do chefe para executar uma tarefa específica e agia bovinamente durante todo o dia de trabalho, sem se preocupar com os resultados de sua atividade. Agora, precisam de um indivíduo capaz de contribuir para melhorar a qualidade do produto, um indivíduo que pense e tenha iniciativa própria, um indivíduo que seja capaz mudar, com facilidade e precisão, de uma atividade para outra, um indivíduo que, na empresa, seja capaz de vender, de produzir, de consertar os defeitos da máquina, de limpar o chão, de dar e receber ordens.
Nessa perspectiva, observamos que o mercado de trabalho
contemporâneo requisita um trabalhador que dedique o máximo de sua energia
à produtividade e ao lucro, exaurindo sua força de trabalho, tornando-se um
operário polivalente e multifuncional para a reprodução do capital. Ao mesmo
tempo, esse operário não se reconhece naquilo que faz, pelo fato de executar
25
várias tarefas, fragmentando o seu processo de trabalho, transformando-o em
desprazer e em sofrimento derivado de seu trabalho alienado7.
Conforme Graneman (2008, p. 14)
“este trabalho alienado é a força de trabalho em ação, cotidiana e continuamente desumanizada, expurgada do conteúdo de sua segunda natureza que, no modo capitalista de produção, é a base do desenvolvimento do capital”.
Em suma, observamos que o reprodutor do capital é o trabalho e que o
trabalhador vive em função desta reprodução, pois se submete ao sistema
produtivo, causando transformações a si próprio e à sua nova forma de
trabalho.
Outro aspecto dessa reestruturação, segundo Mota (1995), é relativo
aos trabalhadores e capitalistas. No tocante aos capitalistas, estes ficam com
seu poder ameaçado; enquanto que os trabalhadores tornam-se, cada vez
mais, submissos e ameaçados na sua materialidade e subjetividade impostos
pelas condições do mercado de trabalho.
Os trabalhadores são, então, excluídos em consequência do modelo da
exploração capitalista, sendo vítimas, assim, do desemprego, e, quando
empregados, recebem baixos salários, o que permite o crescimento do Exército
Industrial de Reserva (EIR) e a redução do potencial das organizações e das
lutas pelas causas trabalhistas.
Como assinala Santos (2005), as tendências do mundo do trabalho
trouxeram intensas modificações, quer na sua forma de organização (mecânico
e automatizado), quer na sua forma material e subjetiva do trabalhador, o qual
busca uma integração às exigências desse novo mercado de trabalho.
De acordo com os estudos de Freire (2010), tais exigências acarretam
danos ao bem-estar do trabalhador, sendo estes de natureza física, social,
econômica e psicológica, provocando a fadiga físico-emocional, stress e mau
humor. Foram estas, entre outras, as consequências da reestruturação
produtiva. Assim, a intensificação da concorrência e a proliferação dos valores
7 Trabalho “alienado (ou estranhado) é a forma como a atividade humana se objetiva na
sociedade capitalista, onde o que deveria ser uma atividade vital do ser social que trabalha, converte-se em mercadoria, sendo que o produto do trabalho aparece como alheio e estranho ao trabalhador”. (ANTUNES, 1999, p. 24).
26
de mercado contribuíram para a adoção da nova forma de exploração da força
de trabalho.
Diante de toda esta contextualização, podemos concluir que a sociedade
contemporânea passa por fortes transformações de caráter destrutivo. Dessa
forma, observamos que as novas reconfigurações do mundo do trabalho, a
partir da reestruturação produtiva, ocasionaram enormes transformações
negativas na vida do trabalhador.
Esse descaso com a classe trabalhadora trouxe consequências à saúde
do trabalhador, desestabilizando-o, levando-o à perda dos seus referenciais,
desgastando-o física e mentalmente. Este é o assunto que discutiremos a
seguir.
1.2 Trabalho e Desgaste Mental
Diversos estudos sobre os impactos da reestruturação produtiva no
mundo do trabalho apontam que a classe trabalhadora vem sofrendo diversas
perdas no que tange aos seus diretos sociais historicamente conquistados,
como também agressão à sua subjetividade, materialidade, identidade e à sua
própria saúde, ultrapassando os seus limites físicos e psicológicos (FREIRE,
2010).
Sabemos que o trabalho humano pode significar realização pessoal,
satisfação, adquirir bens materiais e prestar serviços úteis à sociedade. Por
outro lado, pode também significar exploração, sofrimento, acúmulo de
estresse, doença e, até, morte (SILVA, 1987). O pensamento clássico da
medicina ocupacional colocava a saúde do trabalhador relacionada como o
resultado do ambiente físico, ou seja, o trabalhador se expunha por causa do
contato com produtos, que poderia causar acidentes e/ou ocasionar
enfermidades.
Nesse sentido, torna-se claro que os trabalhadores se submetem às
mais diversas pressões que desencadeiam sofrimento psíquico, desgaste físico
e mental em razão do seu nível de inferioridade, dependência, muitos em
constante rodízio, assumindo novas responsabilidades e se tornando, cada vez
mais fragilizados. Dessa forma, de acordo com Freire (2010, p. 55)
27
os trabalhadores vão assumindo novas responsabilidades e uma grande carga de sofrimento psíquico. Esse processo resulta na ampliação do desgaste físico e mental do trabalhador, crescendo o exército de mutilados e de mortos prematuramente.
Diante deste quadro, a saúde mental do trabalhador torna-se cada vez
mais prejudicada frente às atuais contradições entre a modernização e a
expansão do mundo do trabalho precarizado, temporário e terceirizado.
De acordo com Seligmann-Silva (2011), a dominação no trabalho
identificou-se como o ponto de vista central na constituição do desgaste,
ofendendo a dignidade, magoando a autonomia do sujeito, rompendo com o
seu mundo mental, psicossocial, atacando a sua estabilidade psicossomática,
fabricando o seu sofrimento e esmagando a sua identidade.
Nesse novo cenário, onde cada um torna-se responsável por estar
desempregado e pela sua empregabilidade, o trabalhador deve procurar
manter-se qualificado e especializado. Não há mais garantia de estabilidade, o
trabalhador acaba por submeter-se a todo tipo de humilhação,
constrangimentos e abusos por parte dos patrões.
Dessa maneira, podemos perceber a relevância que o trabalho tem na
vida de um indivíduo, ora considerando-se como um ser ativo e social, onde o
trabalhador encontra a sua identidade, ora transformando o trabalho em um
processo degradante de sua saúde.
No mundo do trabalho contemporâneo, o trabalhador padece com esse
novo paradigma, o que desencadeia angústia repercutindo sobre a sua saúde.
Dessa forma, os trabalhadores são agredidos nos seus limites físicos e
psicológicos.
Segundo Dejours (1992), para aumentar a produção, a organização do
trabalho se utiliza do sofrimento do trabalhador, alienando-o, causando impacto
no seu psiquismo. Nisso, o trabalhador cria estratégias de defesa ajustando-o
ao sofrimento, ou a um desequilíbrio, psicose, neurose, doenças
psicossomáticas, física, decorrente do seu espaço de trabalho.
Dessa forma, a saúde dos trabalhadores é confrontada a situações
nefastas no seu cotidiano, tais como: precarização das condições de vida da
classe trabalhadora; redução de direitos previdenciários; condições precárias
28
de trabalhos profissionais, resultando em agravos que, segundo Freire (1998,
apud FREIRE, 2010, p. 55) originam
Doenças diretamente relacionadas com as novas tecnologias, como as LER (Lesões por Esforços Repetitivos); nas doenças psíquicas e outras provocadas por estresse; na ampliação das doenças graves e degenerativas pré-existentes aos novos processos, que exigem maiores investimentos, como no caso da leucopenia provocada pelo benzenismo na ex-estatal privatizada.
Observamos que os trabalhadores são atingidos, tanto do ponto de vista
psíquico, quanto social, haja vista que são privados dos seus direitos,
adquirindo e desenvolvendo enfermidades no seu próprio ambiente de
trabalho.
Freire (2010) aponta ainda implicações nefastas à saúde dos
trabalhadores e as consequências desencadeadas pelas inovações
tecnológicas, tais como: Doenças Osteo-Musculares adquiridas no Trabalho
(DORTs) e o estresse causado pelas novas condições de trabalho e possíveis
demissões; o surgimento das doenças preexistentes degenerativas, que
demandariam maiores investimentos da empresa face ao trabalhador, ainda
que tais surgimentos sejam mascarados ou disfarçados.
Seligmann-Silva (2011, p. 622) apresenta uma lista dos transtornos
mentais e do comportamento relacionados de acordo com a Portaria/MS Nº
1.339/1999:
- Demências em outras doenças específicas classificadas em outros locais (F02.8) - Delírio, não sobreposto à demência, como descrita (F05.0) - Transtorno cognitivo leve F06.7) - Transtorno orgânico de personalidade (F 07.0) - Transtorno mental orgânico ou sintomático não especificado (F 09.-) - Alcoolismo crônico (relacionado ao trabalho) (F10.2) - Episódios depressivos (F 32.-) - Estado de estresse pós-traumático (F43.1) - Neurastenia (inclui síndrome de fadiga) (F48.0) - Outros transtornos neuróticos especificados (inclui neurose profissional) (F48.8) - Transtorno do ciclo vigília-sono devido a fatores não orgânicos (F 51.2) - Sensação de estar acabado (Síndrome de burn-out@) síndrome do esgotamento (z 73.0).
29
A referida Portaria (BRASIL, 2001) fornece um Manual relativo à saúde
do trabalhador, enquanto área da Saúde Pública e, tem como objeto de estudo
e intervenção das relações entre o trabalho e a saúde. Tem como objetivos a
proteção da saúde do trabalhador, com vistas a desenvolver ações de
vigilância dos riscos presentes nos ambientes e as condições de trabalho, os
agravos à saúde do trabalhador e a organização e assistência aos mesmos,
compreendendo o diagnóstico, o tratamento e a reabilitação de forma
integrada, no Sistema Único de Saúde (SUS).
Conforme Seligmann-Silva (2011), a autora afirma que na Lista de
Transtornos Mentais Relacionados ao Trabalho foram reconhecidos em sua
realidade atual um grupo de transtornos vinculado à precarização e à violência
laboral, “embora a precarização do trabalho possa ser considerada, em si
mesma, uma violência contra a saúde dos trabalhadores” (SELIGMANN-SILVA,
2011, p. 514).
Tais transtornos expõem os trabalhadores a situações de violência
explícita, existentes na sociedade, cujas ações se desenvolvem a partir do
desgaste mental, mediado na atualidade pela precarização do trabalho. Nesse
sentido, os trabalhadores são expostos a condições de trabalho potencialmente
prejudiciais à saúde mental.
A autora elenca cinco transtornos onde são reconhecidos com maior
intensidade: a precarização e a violência laboral. São eles:
- Transtorno de estresse pós-traumático (TEPT); - Síndrome do esgotamento profissional ou burn-out; - Quadros depressivos - incluindo os episódios depressivos que constam na lista brasileira; - Dependências de bebidas alcoólicas; - Paranoia situacional. (SELIGMANN-SILVA, 2011, p. 516).
Então, estes distúrbios são caracterizados por vários sintomas físicos,
psíquicos e emocionais desgastantes, adquiridos através da organização e das
relações humanas no mundo do trabalho, afetando a saúde do trabalhador e
esmagando a sua dignidade. Estas são consequências do trabalho cruel na
sociedade contemporânea, principalmente em relação àquelas pessoas cujas
profissões têm envolvimento direto e intenso no seu cotidiano.
30
Dessa forma, vimos que a saúde do trabalhador é constantemente
ameaçada no seu cotidiano, necessitando de uma intervenção na sua saúde
mental, tópico que desenvolveremos a seguir.
CAPÍTULO II A INTERVENÇÃO EM SAÚDE MENTAL A PARTIR DA
REFORMA PSIQUIÁTRICA
Neste tópico teceremos algumas considerações sobre saúde mental,
fazendo uma breve contextualização, com vistas a entender os significados
atribuídos à loucura ao longo da história, desde o fim da Idade Média até o
surgimento da Psiquiatria. Buscaremos demonstrar, de acordo com o contexto
histórico, como era representada a saúde mental no decorrer dos séculos para
explicar a loucura, até que esta fosse avaliada pelos critérios médicos e
transformada em doença mental.
Nas sociedades ditas primitivas, a loucura tinha denominações, tais
como castigo dos deuses vistos como experiências trágicas, sofridos pelos que
apresentavam diferenças de comportamento, dependendo da conjuntura social
do momento, ou ainda de como as pessoas com condutas alteradas se
manifestavam nos mais diversos contextos sociais (BISNETO, 2011).
Entendemos que na Idade Média ainda não havia estudos para chegar
ao tratamento de pessoas acometidas dessa patologia. A loucura era entendida
como uma experiência cruel e lhe era atribuída uma explicação mística, sem
que lhe fosse conferida uma explicação moral de conduta, daquilo que era
certo ou errado.
Durante todo o período da Antiguidade, segundo (RESENDE, 1994, p.
20-21).
o louco gozou de um certo grau de “extraterritorialidade” e a loucura era no essencial experimentada em estado livre [...]. A doença mental era uma questão largamente privada, basicamente determinada pelos costumes [...]. Os tratamentos médicos na Grécia e Roma antigas permaneceram como fenômenos localizados, restrita aos poucos abastados, contrariamente às práticas populares e mágico-religiosas amplamente difundidas.
31
A grande presença de pessoas com transtornos mentais não era
representada pela classe abastada, pois os ricos permaneciam em suas casas,
enquanto os pobres eram abandonados e ficavam circulando pelas ruas,
dependendo da caridade pública ou realizando pequenos serviços, pois o
“louco” daquele período não representava um problema social e sim familiar.
Foucault (2005), ao descrever o quadro histórico da loucura em cada
período, no fim da Idade Média afirma que, a loucura era percebida como uma
razão dominadora. Assim, na época a loucura passará a ser interpretada como
um universo moral ocupando, segundo o autor, o primeiro lugar na hierarquia
dos vícios do ser humano.
Na Idade Moderna, de acordo com Heidrick (2007, p. 25-26) explica que:
mais especificamente no Século XVI, a loucura irá ser confiscada por uma razão dominadora. Baseada na máxima “Penso logo existo” de René Descartes, a humanidade passa a entender e ver a loucura em “relação” à sanidade e, ao louco como alguém desprovido de razão, e, portanto, distante da verdade. O racionalismo moderno irá separar sabedoria da loucura, Se for sábio, não pode ser louco. Se for louco, não pode ser sábio.
Sobre essa passagem na percepção do racionalismo, observamos uma
visão desprovida de razão, o louco não poderia ser reconhecido como sábio e
este último, não seria reconhecido como louco e, seguindo essa linha de
raciocínio, a loucura não podia ser colocada diante dos saberes racionais.
Dando continuidade à história da loucura através dos séculos, vale
salientar que o fim do século XVII e século XVIII são marcados pelo período
das grandes internações e, por fim, por ocasião do período contemporâneo,
após a Revolução Francesa, surge então a Psiquiatria, desenvolvendo-se
como área responsável pelo diagnóstico e tratamento de transtornos mentais.
Foucault (2005) busca explicar transformações de significados que perpassam
a loucura, até chegar à denominação de doença mental e, assim, requerer uma
especialidade dentro da medicina, e um conjunto de normas e significados que
irão compor a instituição psiquiátrica e a psiquiatria.
32
Segundo o autor, é na era moderna que a loucura vai ser analisada no
interior dos grandes “asilos”, pois foi neste período histórico que foram
fundados os pilares que serviram de base para o surgimento da psiquiatria.
Para Amarante (1995), até o século XVIII, na Europa, os hospitais não
tinham por finalidade a clínica médica. Eram instituições filantrópicas de grande
porte, designadas como abrigo dos indivíduos avaliados como indesejáveis à
sociedade: “leprosos”, “sifilíticos”, “aleijados”, “mendigos” e “loucos”. Esses
hospitais eram lugares de exclusão destinados à pobreza e à miséria
produzidas pela sociedade da época, momento em que os pobres eram
tratados como indigentes e abrigados nessas instituições.
Surgiram, então, os hospitais psiquiátricos como forma de garantir a
nova ordem social. Assim, foi institucionalizado o saber racional dos médicos
psiquiatras, atrelando a psiquiatria ao campo dos saberes médicos. Foucault
(2005, p. 99) citou a transformação dos hospitais, antes de caráter
assistencialista, assinalando que:
O hospital como instrumento terapêutico é uma invenção relativamente nova, que data do final do século XVII. A consciência de que o hospital pode e deve ser um instrumento destinado a curar, aparece claramente em torno de 1780 e é assinalada por uma nova prática: a visita e a observação sistemática e comparada dos hospitais.
Tratava-se, portanto, de lugares habitados não só por loucos, mas por
pobres, vagabundos e alguns doentes. Esses locais não podiam ser
considerados como casas de tratamento, mas sim de lugares onde as pessoas
eram tratadas com crueldade, submetidas a diversos tipos de maus-tratos e a
lamentáveis condições de existência.
Nesse contexto, esses espaços não tinham finalidade médica, as
medidas de repressão se articulavam para a criação de instituições, as
chamadas casas de correção e de trabalho, eram os denominados hospitais
gerais que, apesar de serem assim chamados, não tinham nenhuma função
clínica e destinavam-se a evacuar das cidades os mendigos e marginalizados
em geral, o que suscitou um novo modelo de assistência aos doentes mentais
naquele momento.
33
Então, foram estabelecidas práticas baseadas no suporte “asilar”,
originando, assim, “uma relação entre medicina e hospitalização, fundada na
tecnologia hospitalar e em um poder institucional com um novo mandato social:
o de assistência e tutela” (AMARANTE, 1995, p. 26). Dessa forma, o hospital
do século XVIII deveria oferecer meios para que o mal viesse à tona tornando-
se, então, o lugar de revelação da verdadeira doença.
O médico Philippe Pinel foi o responsável pela mudança desse
paradigma no que concerne ao tratamento dos doentes recolhidos nesses
hospitais. O médico psiquiatra foi contemporâneo da Revolução Francesa e
chefe do Hospital de Bicêtre e Salpêtrière em 1793, assumindo um papel
fundamental na fundação da psiquiatria, pois ficou conhecido por desacorrentar
os pacientes internos naqueles hospitais (AMARAL, 2006).
Nesse sentido, Pinel foi o protagonista da defesa dos “asilos” e dos
hospitais como forma e isolamento, tendo assim contribuído para diferenciar o
tratamento, estabelecendo a possibilidade de cura desses pacientes.
Conforme Amarante (1995, p. 25), o autor postula
o isolamento como fundamental a fim de executar regulamentos de polícia interna e observar a sucessão de sintomas para descrevê-los, organizando dessa forma o espaço asilar, a divisão objetiva à loucura e dá-lhe unidade desmascarando-a ao avaliar suas dimensões médicas exatas, libertando as vítimas e denunciando suspeitos.
Dessa forma, houve uma transformação no processo de suas amarras,
pois os loucos, ao serem desamarrados das correntes que os prendiam,
passaram a ser aprisionados pelos saberes científicos da medicina e pela
instituição psiquiátrica.
Pinel é citado, então, como referência no tocante às possibilidades
terapêuticas no tratamento da alienação, estabelecendo a possibilidade de cura
para a doença mental, dando assim o primeiro e mais extraordinário passo
histórico na função do hospital, transformando-o em instituição médica
(AMARANTE, 1995).
Nessa instituição Pinel utilizava um método composto por três etapas,
que, de acordo com Pereira, (2013, p. 16).
34
o isolamento do mundo exterior, que possibilitaria uma melhor observação do objeto a ser estudado; a organização do espaço, tanto no sentido físico como no processo de identificar e agrupar doenças por semelhanças e diferenças; e o estabelecimento de uma relação terapêutica fundada na autoridade do médico.
No referido método surge o médico clínico como figura fundamental, e a
doença é classificada de acordo com os sintomas que o doente apresenta. A
seguir, os mesmos são catalogados, tendo em vista que apresentam sintomas,
que devem ser observados.
Nesse sentido, foi Pinel quem concebeu as técnicas laborais, com o
objetivo de reeducar o pensamento, com implicações voltadas para o
tratamento moral, incluindo no processo terapêutico o trabalho como forma de
ocupação da mente.
Foi então a partir da segunda metade do século XIX, que os estudos da
psiquiatria, bem como outros conhecimentos na área social, tornaram-se
necessários para a categorização das pessoas acometidas de transtornos
mentais. Assim, a psiquiatria tomará o rumo das demais ciências naturais,
admitindo um cunho positivista, uma amostra pautada na medicina biológica,
balizando-se em analisar e expor os distúrbios nervosos, buscando a noção
objetiva do ser humano. (AMARANTE, 1995).
Foi a partir da segunda metade do século XX, instigada especialmente
pelo psiquiatra italiano Franco Basaglia, que aconteceu um avanço da medicina
e uma análise crítica em relação ao tratamento das pessoas acometidas de
transtorno mental, bem como das instituições psiquiátricas. Esse movimento se
iniciou na Itália, mas sua repercussão foi mundial e, em particular, no Brasil. O
momento foi marcado pelo movimento de luta antimanicomial que nasceu
caracterizado pela defesa dos direitos humanos e resgate da cidadania
daquelas pessoas acometidas de transtornos mentais.
Segundo Amarante (1995), quando Baságlia assumiu a direção do
Hospital Psiquiátrico de Gorizia, na Itália, o mesmo criticou a psiquiatria
clássica e hospitalar, por esta voltar-se para o isolamento do alienado. O
médico defendia que a pessoa em sofrimento mental retornasse ao seio
familiar.
35
Nesse contexto, surgiram no Brasil discussões que tratavam da
desinstitucionalização do acometido de sofrimento mental e da humanização
do tratamento a essas pessoas, com o objetivo de promover a reinserção
social.
No item a seguir abordaremos o tema referente à trajetória do
movimento de Reforma Psiquiátrica no Brasil, o qual, em última instância,
transformou-se em um processo de mudança na saúde mental.
2.1 Trajetória da Reforma Psiquiátrica no Brasil
Para compreendermos a dimensão processual de Reforma Psiquiátrica
no Brasil, devemos retornar ao passado, situando as várias concepções do que
representou a “loucura”, bem como as suas formas de tratamento.
A partir da desinstitucionalização da “loucura”, surgiu o movimento de
Reforma Psiquiátrica, “através do qual, pela primeira vez, os loucos seriam
separados de seus colegas de infortúnio e passariam a receber cuidados
psiquiátricos sistemáticos” (RESENDE, 1994, p. 25).
Nesse sentido, podemos inferir que o movimento propunha uma política
de saúde mental a partir de um novo paradigma, atentando para um período
cuja representação maior seria a reforma psiquiátrica.
Segundo Tenório (2002, p. 27)
A expressão reforma psiquiátrica passa, então a exigir uma ‘adjetivação precisa’, denotando um movimento cujo inicio o autor situa na segunda metade da década de 1970 e que tem uma característica essencial no Brasil da restauração democrática, sua característica dominante é o repto da cidadania de sujeitos obrigatoriamente tutelados.
Nesse contexto, a reforma psiquiátrica tinha por meta oferecer um
sistema de saúde igualitário, que não excluísse as pessoas com transtornos
mentais, e que desse oportunidade de reinserção das mesmas, de forma que
pudessem exercer sua cidadania.
36
A reforma psiquiátrica passou por duas fases: a primeira de 1978 a 1981
compreende uma crítica ao modelo hospitalocêntrico e, a segunda, de 1992
aos dias atuais, destaca-se pela implantação de uma rede de serviços extra-
hospitalares (BRASIL, 2005).
A Reforma Psiquiátrica no Brasil representa um movimento político e
social, tendo como objetivo desconstruir a cultura manicomial e, assim, poder
“construir coletivamente uma crítica ao chamado saber psiquiátrico e ao
modelo hospitalocêntrico na assistência às pessoas com transtornos mentais”
(BRASIL, 2005, p. 02). Esta é uma das estratégias utilizadas para promover a
desinstitucionalização psiquiátrica, criticando radicalmente o manicômio,
rompendo com os antigos modelos, a fim de libertar as pessoas com
transtornos mentais.
No início da década de 1970, foram mobilizados profissionais de saúde
mental e familiares de pessoas com transtornos mentais. Nesse sentido, a
Reforma Psiquiátrica Brasileira, além de contribuir com o processo de
construção de estratégias e serviços substitutivos, tem o objetivo de extinguir a
ideia de tratar o louco no seu isolamento, propiciando-lhe o retorno ao convívio
social, bem como a possibilidade de se desenvolver como cidadão na sua
subjetividade.
Foi no cotidiano da vida das instituições, dos serviços e das relações
interpessoais que o processo da Reforma Psiquiátrica no Brasil avançou,
sendo marcada por grandes conflitos e desafios. O processo da reforma foi
construído através de uma intensa luta, onde se buscavam melhoras por
condições nas políticas em saúde mental, saneamento e higiene para todos os
cidadãos.
De acordo com Bisneto (2011, p. 115),
O Movimento de Reforma Psiquiátrica representa um grande avanço nas práticas em saúde mental [...] enfatiza a importância da reabilitação social dos portadores de sofrimento mental, por meio de programas nas áreas de trabalho, habitação, lazer (práticas que não são especificamente ‘’psi’’, ressaltando a necessidade de se estabelecer uma cidadania efetiva para os usuários da rede de saúde mental: os aspectos sociais são essenciais para um serviço integralizado de assistência.
37
Dessa forma, o processo de reforma dá a devida importância aos
indivíduos com doenças mentais, buscando a sua inclusão e inserção em
programas sociais fortalecendo, assim, a sua cidadania.
O início do processo de Reforma Psiquiátrica no Brasil é recente, foi
contemporâneo à eclosão do movimento sanitário nos anos 1970, que teve
como consequência a criação do Sistema Único de Saúde (SUS)8 (BRASIL,
2005).
Nesse contexto, ocorreu no Brasil esse Movimento Sanitário, que tinha
como ponto de partida a luta pela garantia do direito universal à saúde e pela
organização de um sistema único, integral, universal e estatal de prestação de
serviços.
O processo de reforma psiquiátrica é paralelo ao movimento sanitário
representando uma mudança dos padrões de cuidado de gestão das práticas
de saúde, em defesa da saúde coletiva, igualdade na oferta dos serviços, e
protagonismo dos trabalhadores e usuários dos serviços de saúde.
Conforme Amarante (1995), o processo de reforma psiquiátrica começa
a partir do Movimento dos Trabalhadores da Saúde Mental no final da década
de 1970. Esse movimento foi caracterizado, inicialmente, pelas recorrentes
denúncias e reivindicações da parte desses trabalhadores da saúde mental que
denunciavam as difíceis condições dos internos nos manicômios, o que deu
início ao Movimento de Trabalhadores da Saúde Mental (MTSM), servindo para
reivindicar as necessidades pela reforma da assistência psiquiátrica no Brasil.
Vale ressaltar que havia uma necessidade de mudanças no tratamento
das pessoas acometidas de transtornos mentais. Trata-se de situar a trajetória
histórica da reforma psiquiátrica brasileira, face às discussões políticas que
abrangem a assistência à saúde mental, a partir deste período.
Nessas discussões, ocorreram, nos seus campos de luta, críticas, neste
período, momento em que os doentes eram submetidos à tortura nos
“manicômios”, pois se estabeleceu o “mercado da loucura”, cujo poder da rede
privada de assistência e a construção coletiva, desencadeou a crítica ao
8 Lei Nº 8080, de 19 de setembro de 1990, que dispõe sobre as condições para promoção de
ações e serviços de saúde, prestados por órgãos e instituições públicas federais, estaduais e municipais, da Administração direta e indireta e das fundações mantidas pelo Poder Público, constitui o Sistema Único de Saúde (SUS).
38
chamado saber psiquiátrico e ao modelo hospitalocêntrico9 na assistência às
pessoas com transtornos mentais (BRASIL, 2005).
No processo de transformação da saúde mental, por uma “sociedade
sem manicômios”, surgiu a luta antimanicomial.
Para Tenório (2002, p. 35), essa questão
passa a ocupar um lugar estratégico no agora denominado Movimento de Luta Antimanicomial: trata-se de chamar a sociedade para discutir e reconstruir sua relação com o louco e com a loucura. A participação dos agora chamados usuários dos serviços de saúde mental (em lugar de paciente) e de seus familiares nas discussões, encontros e conferências passa a ser uma característica marcante do processo.
Nesse contexto, o referido movimento teve sua ampliação sendo
instituído no dia 18 de maio de 1987, como Dia Nacional de Luta
Antimanicomial, visando aprofundar o poder de concentração de grandes
parcelas da sociedade em favor da causa.
Esse movimento trouxe transformações para a sociedade, com vistas a
construir uma “sociedade sem manicômios”, a fim de facilitar a convivência da
pessoa com transtorno mental com o seu meio social. Outro aspecto do
referido movimento menciona a criação de novos dispositivos no tocante aos
cuidados, permitindo ao usuário um tratamento diversificado e mais
humanizado no seu meio.
Nesse processo de luta antimanicomial, é oportuno salientar a
importância da realização de dois eventos ocorridos no ano de 1987, a saber: a
I Conferência Nacional de Saúde Mental10 e o II Encontro Nacional do
Movimento dos Trabalhadores em Saúde Mental11 (TENÓRIO, 2002).
9 “Modelo hospitalocêntrico versus “sistema de saúde” organizado em uma “pirâmide” de
serviços de complexidade crescente”. O hospital, de fato, tem funcionado como o centro do “sistema de saúde”, algo como um “buraco negro” que atrai uma grande demanda “distorcida” que acaba sobrecarregando todos os seus serviços” (CECILIO, 1994, p. 01). 10
A I Conferência representa, portanto,” o fim da trajetória sanitarista, de transformar apenas o sistema de saúde e o início da trajetória de desconstruir no cotidiano das instituições e da sociedade as formas arraigadas de lidar com a loucura. É a chamada desinstitucionalização”. (TENÓRIO, 2002, p. 35). 11
O II encontro institui um novo lema: “Por uma Sociedade sem Manicômios”. “Estabelece um
novo horizonte de ação: não apenas as macrorreformas, mas a preocupação com o “ato de saúde”, que envolve profissional e cliente; não apenas as instituições psiquiátricas, mas a cultura, o cotidiano, as mentalidades” (TENÓRIO, 2002, p. 35).
39
Tais eventos representaram um marco na trajetória da psiquiatria
brasileira, pois apresentam a aspiração dos estudiosos da área, tendo em vista
que a mesma deve estar integrada à política nacional de desenvolvimento
social das instâncias superiores.
Em 1989, foi colocado no Congresso Nacional o Projeto de Lei do
deputado Paulo Delgado (PT/MG), marcando o início das lutas do movimento
pela Reforma Psiquiátrica nos campos legislativo e normativo.
O referido projeto propunha a regulamentação dos direitos da pessoa
com transtornos mentais e a extinção progressiva dos manicômios no País.
Este projeto previa o impedimento da construção de novos hospitais
psiquiátricos, ou a contratação de novos hospitais privados pelo poder público,
o direcionamento dos recursos públicos para a criação de recursos não
manicomiais de atendimento. (BRASIL, 2005).
Nesse sentido, foi sancionada a Lei Nº 10.216, de 06 de abril de 2001,
que dispõe sobre a proteção e os direitos das pessoas com transtornos
mentais e redireciona o modelo assistencial em saúde mental. De acordo com
o Presidente da República, representado na época por Fernando Henrique
Cardoso (FHC), o mesmo fez saber ao Congresso Nacional decretando e
sancionando a seguinte Lei 10.216/01 que dispõe em seus artigos:
Art. 1º Os direitos e a proteção das pessoas acometidas de transtorno mental, de que trata esta Lei, são assegurados sem qualquer forma de discriminação quanto à raça, cor, sexo, orientação sexual, religião, opção política, nacionalidade, idade, família, recursos econômicos e ao grau de gravidade ou tempo de evolução de seu transtorno, ou qualquer outra. Art. 2º Nos atendimentos em saúde mental, de qualquer natureza, a pessoa e seus familiares ou responsáveis serão formalmente cientificados dos direitos enumerados no parágrafo único deste artigo. Parágrafo único. São direitos da pessoa portadora de transtorno mental: I - ter acesso ao melhor tratamento do sistema de saúde, consentâneo às suas necessidades; II - ser tratada com humanidade e respeito e no interesse exclusivo de beneficiar sua saúde, visando alcançar sua recuperação pela inserção na família, no trabalho e na comunidade; III - ser protegida contra qualquer forma de abuso e exploração.
Os artigos citados assinalam que é dever do Estado prestar assistência
igualitária às pessoas com transtorno mental, independente de sua raça, cor ou
sexo, bem como observa que as mesmas devem ser acompanhadas no seu
40
tratamento e que sejam tratados com respeito e dignidade. A referida Lei
apresenta uma mudança inovadora no que se refere aos termos para definir o
sujeito que precisa desse tipo de cuidados em saúde mental, pois, no Decreto
24.55912 de 1934, a pessoa com transtorno mental era chamada de psicopata.
Ao interpretarmos o texto desta nova Lei Federal, observamos que a
mesma apresenta um avanço no processo da reforma psiquiátrica,
transformando o modelo de assistência em saúde mental. Assim, reconhece a
pessoa com este transtorno em seus direitos, os quais se tornaram explícitos
na referida Lei, considerada pelo movimento da reforma uma lei progressista,
um passo a frente, ou seja, uma Lei que demonstrou seus efeitos antes de ser
aprovada. Observamos que a nova Lei Federal é pautada em duas grandes
linhas: a proteção dos direitos do doente mental e o redirecionamento do
modelo assistencial.
Vimos que as políticas de saúde mental objetivam colocar em prática as
leis sancionadas, com vistas à melhoria ao atendimento dos serviços e
benefícios para os usuários facilitando, assim, o processo de inclusão e
inserção social na comunidade.
No tocante ao processo de inclusão das pessoas com transtorno mental
na sociedade, Tenório (2002, p. 57), afirma que a reforma psiquiátrica
tem efeitos positivos também do ponto de vista da cidadania brasileira. Movimentando-se no sentido contrário ao da redução das políticas sociais do Estado, ela aponta para a construção de uma sociedade mais inclusiva e para a recuperação do sentido público de nossas ações. Trata-se, enfim, de uma transformação generosa e radical de algumas das mais importantes instituições sociais de nosso tempo.
Os efeitos da Reforma Psiquiátrica trouxeram avanços no que concerne
ao tratamento em saúde mental, mas sabemos que esta ainda é limitada,
passa por grandes desafios, não há investimentos, nem recursos nesta área,
12
O Decreto 24.559 de 1934 revogou o anterior de 1903 e "Dispõe sobre a profilaxia mental, a assistência e a proteção à pessoa e aos bens dos psicopatas, a fiscalização dos serviços psiquiátricos [...]". O termo alienado foi retirado do ordenamento jurídico, que passou a referir-se somente ao psicopata, considerada uma denominação mais ampla. A incapacidade do doente mental foi reafirmada, sendo facilitado o recurso à internação, válido por qualquer motivo que torne incômoda a manutenção do psicopata em sua residência.
41
ainda que haja uma grande demanda nos serviços psiquiátricos, para atender
as pessoas com transtorno mental. Daí a necessidade de fortalecer o serviço
substitutivo, no que concerne à acolhida a essas pessoas, inclusive as mais
vulneráveis, pois estas não dispõem de recursos para um tratamento adequado
e digno.
Como estratégias para o avanço dessa política, de acordo com a Lei Nº
10.216, de 06 de abril de 2001, que modifica o modelo assistencial em saúde
mental, surgiram os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) enquanto
estratégia e continuidade principal de avanço da reforma psiquiátrica. É o
assunto que abordaremos a seguir, fazendo um pequeno histórico a partir de
seus objetivos na rede pública de saúde.
2.2 Criação do sistema substitutivo de saúde mental
Como consequência da Reforma Psiquiátrica Brasileira, em
conformidade com a Portaria do Ministério da Saúde de Nº 224/92 que
regulamentava novos serviços de atendimento aos atingidos por transtornos
mentais. Daí surgem os CAPS, como um dos serviços substitutivos propostos
pela Reforma (BRASIL, 2004).
Os CAPS começaram a surgir nas cidades brasileiras na década de
1980 e passaram a receber uma linha específica de financiamento do
Ministério da Saúde a partir do ano de 2002, momento no qual estes serviços
experimentam grande expansão.
O primeiro CAPS do Brasil, denominado Professor Luís da Rocha
Cerqueira, conhecido como CAPS da Rua Itapeva, foi inaugurado em março de
1987, na cidade de São Paulo. No mesmo período, registra-se ainda a
inauguração do primeiro Núcleo de Atenção Psicossocial (NAPS), na cidade de
Bauru, em São Paulo. Dois anos depois, observa-se a criação da primeira rede
municipal de serviços de saúde mental, em Santos, também em São Paulo
(1989). Este como tantos outros, fez parte de um intenso movimento social,
inicialmente, conforme já salientamos, buscava a melhoria da assistência no
Brasil e denunciava a atuação precária dos hospitais psiquiátricos que ainda
42
eram os únicos recursos destinados aos usuários com transtornos mentais.
(BRASIL, 2004).
O CAPS Professor Luiz da Rocha Cerqueira teve a sua origem a partir
do novo modelo de cuidado com a pessoa com transtorno mental, servindo de
base para os diversos CAPS de todo o País, os quais se apresentavam como
satisfatórios, diminuindo progressivamente as internações em unidades
hospitalares (TENÓRIO, 2002).
Conforme o Ministério da Saúde (BRASIL, 2004, p. 12)
Os CAPS, assim como os NAPS (Núcleos de Atenção Psicossocial), os CERSAMES (Centro de Referência em Saúde Mental) e outros tipos de serviços substitutivos que têm surgido no país, são atualmente regulamentados pela Portaria n° 336/GM, de 19 de Fevereiro de 2002 e integra a rede do Sistema Único de Saúde, o SUS. Essa Portaria reconheceu e ampliou o funcionamento e a complexidade dos CAPS, que têm a missão de prestar atendimento às pessoas que sofrem com transtornos mentais severos e persistentes, num dado território, oferecendo cuidados clínicos e de reabilitação psicossocial. O objetivo é substituir o modelo hospitalocêntrico, evitando as internações e favorecendo o exercício da cidadania e da inclusão social dos usuários e de suas famílias.
É a partir do surgimento destes serviços que são demonstradas as
possibilidades de organização de uma rede substitutiva ao Hospital Psiquiátrico
no País. A função dos CAPS é, pois, de minimizar o sofrimento e prestar
atendimento às pessoas com transtornos mentais, demonstrando a
possibilidade de tratar de outra forma esses usuários, em consonância com a
família e com a rede de serviços da comunidade. É função, portanto, e por
excelência, dos CAPS organizar a rede de atenção às pessoas com
transtornos mentais nos municípios. Os CAPS são os articuladores
estratégicos desta rede e da política de saúde mental em um determinado
território.
Os CAPS devem ser substitutivos, e não complementares ao hospital
psiquiátrico. Cabem aos CAPS, o acolhimento e a atenção às pessoas com
transtornos mentais severos e persistentes, procurando preservar e fortalecer
os laços sociais do usuário em seu território. De fato, o CAPS é o núcleo de
uma nova clínica, produtora de autonomia, que convida o usuário à
43
responsabilização e ao protagonismo em toda a trajetória do seu tratamento.
(BRASIL, 2004).
A Portaria Nº 336/GM, de 19 de fevereiro de 2002, estabelece e define
as bases para o funcionamento dos CAPS, diferenciando-os de acordo com os
usuários que procuram os serviços de atenção psicossocial. São denominados
de CAPS I, II e III, CAPSi e CAPSad .
As denominações CAPS I, II e III são modalidades de serviços que
funcionam de acordo com a complexidade e abrangência populacional, onde
são priorizadas às pessoas com transtornos mentais severos e persistentes.
Os CAPSi são serviços de atendimento para crianças e adolescentes e os
CAPSad são tratamentos direcionados aos usuários de substâncias
psicoativas. (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2004).
De acordo com as determinações da Portaria GM 336//02 do Ministério
da Saúde, após as definições terapêuticas de acordo com as necessidades dos
usuários é oferecida uma das três modalidades de atendimento, das quais
dispõe o CAPS: atendimento intensivo, onde o usuário, em virtude de grave
acometimento psíquico, é submetido à atenção contínua; atendimento semi-
intensivo, em que o usuário é atendido até 12 dias por mês e já tem
demonstrado substancial recuperação de suas faculdades mentais;
atendimento não intensivo, em que o usuário não necessita de
acompanhamento superior a 3 dias por mês, por já ter retomado todas as suas
atividades sociais. (BRASIL, 2004).
Estes são serviços de saúde abertos, comunitários, que oferecem
atendimento às pessoas com transtornos mentais severos e persistentes,
realizando o acompanhamento clínico e a reinserção social destas pessoas
através do acesso ao trabalho, lazer, exercício dos direitos civis e
fortalecimento dos laços familiares e comunitários.
Vale salientar que os CAPS possuem equipes multiprofissionais,
compostas por psicólogos, psiquiatras, enfermeiros, técnicos de enfermagem,
assistentes sociais, terapeutas ocupacionais, técnicos administrativos, entre
outros. Assim, perante a presença de todos os gêneros de profissionais da
área da saúde, os CAPS tonaram-se “uma espécie de exemplo irradiador de
um novo modelo de cuidados para a psiquiatria brasileira” (TENÓRIO, 2002, p.
39).
44
Ressaltamos a importância dos serviços extra-hospitalares prestados
aos usuários acometidos de transtornos mentais, onde os CAPS representam o
espaço social como possibilitador de mudanças de vida, oferecendo uma rede
de cuidados e contribuindo com o mesmo para que este seja inserido na
sociedade.
Vale salientar que os usuários, ao chegarem ao CAPS, são acolhidos e
submetidos a uma triagem através de uma entrevista, com vistas a identificar o
perfil de acordo com a demanda, mas este usuário enfrenta dificuldades de
acessiblidade à rede, pois o quantitativo de demanda ultrapassa a capacidade
do serviço. Outra dificuldade enfrentada pelos usuários reside na falta de
profissionais, implicando que os mesmos sejam submetidos a uma lista de
espera. Outro aspecto o qual devemos dar ênfase no que concerne ao
atendimento desses usuários nos CAPS está intimamente ligado a um tipo de
transtorno, para que estes sejam incluídos nesse serviço.
Nesse contexto, daremos sequência à nossa pesquisa, contextualizando
o surgimento do CAPS in loco.
2.3 Surgimento do CAPS GERAL SER III – HUWC / UFC
De acordo com documentos institucionais, o Centro de Atenção
Psicossocial Professor Frota Pinto CAPS GERAL – SER III – HUWC/UFC
surgiu da iniciativa de um grupo de profissionais do Hospital Universitário
Walter Cantídio (HUWC) que, engajados na luta da Reforma Psiquiátrica,
deram início a um trabalho que resultaria na implantação do primeiro serviço
substitutivo de saúde mental aberto, de base comunitária, no município de
Fortaleza. Este é fruto de um convênio estabelecido entre a Prefeitura
Municipal de Fortaleza e Universidade Federal do Ceará (UFC), tendo sido
inaugurado em 28 de Setembro de 1998. Sua missão é prestar assistência à
pessoa com transtorno mental severo e persistente bem como executar
atividades no âmbito acadêmico, contemplando ensino, pesquisa e extensão,
funcionando como espaço de difusão cientifica em saúde mental.
45
Esse serviço substitutivo de saúde mental é integrado ao Sistema Único
de Saúde (SUS), funcionando como um CAPS escola, pois possui vínculo com
a UFC desde a sua fundação.
Em meados de novembro de 2012, esse CAPS, segundo Coqueiro
(2013, p. 184).
tinha cadastrado um total de 10.107 pessoas. Desse montante, 4.061 usuários tinham sido transferidos para outros serviços em função de fatores relacionados, por exemplo, à territorialização ou acessibilidade local (pessoas que residiam em bairros pertencentes a diferentes regionais ou municípios, sendo, portanto, área de abrangência de outros CAPS) ou por não estarem em consonância com perfil de assistência prestada pelo serviço, ou seja, pessoas com histórico de sofrimento mental considerado leve, consequentemente encaminhados para atendimento nas unidades de saúde da família (posto de saúde) mais próximos de sua área de moradia.
Essas transferências ocorreram por volta do ano de 2008 tornando-se
necessárias, pois foram implantados novos serviços nos CAPS no município de
Fortaleza.
Nas palavras de Coqueiro (2013), a instituição funciona desde a sua
fundação próxima ao Hospital Universitário Walter Cantídio (HUWC), no bairro
Rodolfo Teófilo – cuja área abrange a Regional III, que é composta por 16
bairros pertencendo à área de cobertura de responsabilidade do CAPS em
questão.
Vale ressaltar que os usuários do CAPS GERAL SER III passam por
consultas médicas; atendimentos terapêuticos individuais e/ou grupais,
atividades que envolvem a economia solidária, grupos de capacitação
profissionalizante, oficinas produtivas (bijuterias, culinária, biscuit), expressivas
e artísticas, lúdicas e recreativas, bem como as famílias e cuidadores são
atendidos, com vistas a estimularem os usuários a aderirem ao tratamento.
Dentre as atividades desenvolvidas pela instituição, destacam-se: o
acolhimento na sala da coordenação do serviço. Esta atividade é realizada por
profissionais de diversas categorias, responsáveis por receber e orientar a
pessoa recém-chegada no serviço de saúde mental (CAPS), que veio
encaminhada de hospital ou Unidade Básica de Saúde (UBS), ou por demanda
espontânea, com queixas psíquicas.
46
O usuário, ao chegar à instituição, passa por uma triagem, momento em
que é aberto o seu prontuário, que será atendido pela equipe. Após a triagem,
será agendada, pela recepção, o atendimento psiquiátrico que se refere à
consulta com o psiquiatra.
A Psicoterapia Individual ocorre através de encaminhamento do
Psiquiatra do Serviço, nos horários agendados pelo psicólogo, enquanto a
avaliação de Terapia Ocupacional ocorre através de encaminhamento do
Psiquiatra do serviço, nos horários agendados pelo Terapeuta Ocupacional. O
atendimento social ocorre nos horários de funcionamento do serviço (segunda
à sexta-feira de 8:00 às 17:00h). Dentre os procedimentos dessa avaliação,
acontece também a Consulta de Enfermagem após encaminhamento da
Psiquiatria do Serviço. Dando continuidade às atividades, visitas domiciliares
são incluídas quando são solicitadas no CAPS sendo referenciadas pela rede
de saúde mental de Fortaleza, bem como visitas institucionais, realizadas pela
equipe do CAPS a hospitais psiquiátricos, no intuito de sensibilizar o vínculo da
pessoa internada e de seus familiares com o serviço prevenindo, assim, novas
hospitalizações. Os Grupos de Família, Terapêuticos e de Terapias
Complementares na Comunidade são referenciados pelo serviço do
CAPS. Além disso, o Matriciamento representa as ações conjuntas com a UBS,
sendo referenciada pela própria unidade ou equipe do CAPS. Concluindo,
temos ainda como atividades: o Conselho Local de Saúde e a
Assembleia Geral de Usuários13.
O CAPS GERAL – SER III – HUWC/UFC é de suma importância e
presta serviços relevantes à comunidade da referida regional representando,
também, o fortalecimento do seu vínculo social, visando alcançar sua
recuperação pela inserção na família, no trabalho e na comunidade, cuidando e
contribuindo com a inserção do usuário em seu meio, para que este retorne à
sua vida cotidiana.
13
BLOG CAPS GERAL SER III – HUWC/UFC
47
CAPÍTULO III LEVANTAMENTO DA REALIDADE SOCIOECONÔMICA DOS
USUÁRIOS DO GRUPO DE TRANSTORNO AFETIVO BIPOLAR (TAB) DO
CAPS GERAL SER III – HUWC/UFC
Neste capítulo apresentaremos o perfil socioeconômico dos informantes
que participaram da nossa pesquisa e o resultado da sua realização, momento
em que buscamos: investigar como os usuários com transtorno afetivo bipolar,
que são acompanhados pelo CAPS GERAL SER III – HUWC / UFC vivenciam
sua inserção no mercado de trabalho.
Para contextualizar os procedimentos realizados no nosso estudo,
enfatizamos que fizemos uma pesquisa de campo nessa unidade do CAPS em
Fortaleza, o mesmo local onde atuamos enquanto estagiária durante a
graduação em Serviço Social.
Esse foi o momento mais significativo do nosso trabalho, haja vista que
tivemos a oportunidade de nos aproximar dos sujeitos pesquisados e, assim,
poder melhor compreender a realidade dos usuários inseridos no contexto
investigado. Essa ação nos permitiu observar a nossa hipótese inicial no
tocante às dificuldades encontradas pelos usuários selecionados face à sua
inserção no mercado de trabalho.
3.1 Contextualização do grupo pesquisado
Conforme abordamos anteriormente, realizamos nossa pesquisa no
Centro de Atenção Psicossocial Professor Frota Pinto – CAPS GERAL – SER
III – HUWC/UFC. A instituição surgiu com o propósito de cuidar dos usuários,
garantindo-lhes o convívio familiar e em sociedade durante o tratamento.
A pesquisa foi realizada no decorrer do semestre letivo do ano de
2013.2, entre os meses de setembro e outubro, com os usuários do Grupo de
Transtorno Afetivo Bipolar (TAB). O quantitativo dos participantes da pesquisa
foram 06 (seis) usuários do CAPS que frequentam e utilizam os serviços da
instituição. Nesse universo, escolhemos aqueles com os quais tínhamos mais
afinidades e que não se encontravam em crise, com vistas a se sentirem mais
48
confiantes para participar da nossa pesquisa. Os instrumentos utilizados na
pesquisa foram entrevistas semiestruturadas e um questionário contendo
perguntas fechadas (perguntas que facilitam a análise e interpretação das
respostas).
A entrevista, segundo Gil (1999), é definida como uma forma de
questionar o investigado, acontecendo através da intenção de captar respostas
aos questionamentos sobre o assunto averiguado. Esta interação acontece
naturalmente através desse diálogo, onde o investigador procura coletar dados
e o investigado fornece as informações que estão sendo buscadas.
O questionário, na visão de Malhotra (2006), é definido enquanto técnica
estruturada para a coleta de dados. Esse questionário traz uma série de
perguntas escritas cujas respostas devem facilitar o processamento dos dados
colhidos, análise e interpretação dos resultados.
Nosso estudo é de cunho qualitativo e quantitativo (quali-quanti) com
vistas a melhor compreendermos o problema apontado, ou seja, apresentar os
dados a partir de uma análise estatística, exposta sob a forma de gráficos e
uma análise das respostas obtidas no momento das entrevistas
semiestruturadas.
3.2 Informações obtidas nos instrumentos da pesquisa
Para delimitar o universo investigado, inicialmente, distribuímos uma
ficha contendo um questionário (ver apêndice A) dirigido aos usuários do Grupo
TAB, no CAPS Geral SER III HUWC / UFC. Esse instrumento tinha por objetivo
levantar o perfil socioeconômico dos usuários, no qual questionamos sobre a
idade, profissão, nível de escolaridade, situação no mercado de trabalho,
tempo de serviço, renda individual e/ou renda familiar. Assim, traçamos o perfil
socioeconômico dos usuários por nós selecionados nesta pesquisa, o qual será
apresentado através de gráficos para melhor visualizar os dados obtidos.
Após o levantamento e a análise dos questionários dos sujeitos
pesquisados no total de seis usuários, constatamos que 83,3% do quantitativo
é composto por mulheres e 16,6% é do sexo masculino. Isso pode significar, no
nosso entendimento, que as mulheres, procuram mais os serviços do CAPS,
49
coforme Gráfico 01. Segundo Silva e Cordas, apud ABREU (2006, p. 48) “os
estudos epidemiológicos apontam igual prevalência de TAB para homens e
mulheres na fase adulta”.
Gráfico 01: Sexo dos usuários do grupo TAB
Fonte: Pesquisa Direta, Outubro. 2013
A faixa etária que prevalece entre os pesquisados, situa-se entre 30
(trinta) e 40 (quarenta) anos de idade, apresentando um percentual de 50%. A
outra idade encontrada é superior a 60 (sessenta) anos, representando 33,3%
e, por último, a idade abaixo de 30 anos (trinta) com o percentual de 16,6%,
como podemos observar no gráfico a seguir.
Gráfico 02: Faixa etária dos usuários do grupo TAB
Fonte: Pesquisa Direta, Outubro. 2013
0,0%
10,0%
20,0%
30,0%
40,0%
50,0%
60,0%
70,0%
80,0%
90,0%
Feminino Masculino
Feminino
Masculino
0,0%
5,0%
10,0%
15,0%
20,0%
25,0%
30,0%
35,0%
40,0%
45,0%
50,0%
Acima de 30anos 50%
Acima de 60anos 33,3
Abaixo de 30anos 16,6
Acima de 30anos 50%
Acima de 60anos 33,3
Abaixo de 30anos 16,6
50
Quanto à escolaridade dos usuários, 50% destes declaram ter ensino
médio, 33,3% afirmam possuir nível superior e 16,6% informam ter apenas o
ensino fundamental. Como podemos observar no gráfico 03, de acordo com os
resultados, dentre essas pessoas com transtorno mental, algumas
conseguiram estudar e até alcançar o nível superior de ensino, ainda que não
conheçamos sua história de vida para saber em que idade os usuários
adquiriram esse transtorno. Estudos demonstram14 que “cerca de 20% dos
pacientes adultos com transtorno bipolar têm sintomas iniciais antes de 20
anos de vida”.
Gráfico 03: Nível de escolaridade dos usuários do grupo TAB
Fonte: Pesquisa Direta, Outubro. 2013
Quanto à situação sócio-ocupacional dos usuários, verificamos, de
acordo com as respostas obtidas nos questionários, que todos estão fora do
mercado de trabalho, ou seja, não têm nenhuma atividade laboral, isto, na
nossa visão, por ser difícil conseguir uma vaga devido à competitividade e às
exigências desse novo mercado.
Em relação à renda familiar15 de todos os usuários do grupo pesquisado,
constatamos que 33,3% sobrevivem com três salários mínimos; 33,3% com
14
ABRATA - Associação Brasileira de Familiares, Amigos e Portadores de Transtornos
Afetivos.
15 Renda familiar mensal é a soma dos rendimentos brutos de todos os membros da família.
Informe Controle Social Bolsa Família – Nº 16 outubro de 2008
0,0%
10,0%
20,0%
30,0%
40,0%
50,0%
60,0%
70,0%
80,0%
90,0%
100,0%
Ensino médio50,0%
Ensino superior33,3%
Ensinofundamental16,6%
51
dois salários mínimos; 16,6% sobrevivem apenas com um salário mínimo e
16,6% têm uma renda acima de três salários mínimos por mês. O perfil da
renda familiar destes usuários demonstra que os mesmos não se encontram
abaixo da linha de pobreza, porque recebem de um a mais de três salários
mínimos, e, assim, não estão enquadrados no perfil das famílias de baixa
renda16.
Gráfico 04: Renda familiar dos usuários
Fonte: Pesquisa Direta, Outubro. 2013
Concluído o perfil socioeconômico, a segunda parte da nossa pesquisa
apresenta os relatos obtidos na nossa entrevista, a qual discutiremos e
comentaremos à luz dos autores que fundamentaram nosso estudo,
apresentando as nossas constatações relativas ao seu processo de inserção
no mercado de trabalho, explicando os desafios postos a estes usuários no que
se refere à sua inclusão.
3.3 Percepções dos participantes do grupo de transtorno afetivo bipolar
sobre a sua inserção no mercado de trabalho
Nesta seção apresentamos e interpretamos as falas obtidas através das
entrevistas feitas com os 06 (seis) usuários selecionados e que participaram da
16
A Lei nº 8.742/93 [...] conceitua como família de baixa renda – aquela cuja renda mensal per
capita é inferior a ¼ do salário mínimo. Rev. bras. estud. popul. vol.23 Nº.2 São Paulo July/Dec. 2006 .
0,0%
5,0%
10,0%
15,0%
20,0%
25,0%
30,0%
35,0%
Saláriomínimo
Dois salários Três salários Acima detrês16,6%
Salário mínimo
Dois salários
Três salários
52
nossa pesquisa. As entrevistas aconteceram no CAPS GERAL SER III –
HUWC / UFC, no período da tarde, durante o mês de outubro / 2013, um pouco
antes do horário das reuniões cotidianas dos usuários, momento em que
comparecíamos e os convidávamos a participarem da nossa pesquisa.
Como assinala Monteiro-Plantin (2008, p. 78-79) “entrevistar é uma
prática discursiva que se apresenta em diversos textos, ora constituindo um
gênero específico, ora estruturada como consequência discursiva de outros
gêneros”. Assim a entrevista é o resultado de um diálogo com objetivo
específico, com foco no assunto que abordamos, a fim de saber do
entrevistado, a sua apreciação sobre o tema em questão.
Dessa forma, demos início à nossa pesquisa colocando
questionamentos previamente elaborados, com vistas a atingir os objetivos da
pesquisa. As questões colocadas aos usuários no momento das entrevistas
obedeceram a um roteiro previamente elaborado, conforme apêndice B
apresentado ao final do presente trabalho.
Informamos aos participantes da pesquisa que estes teriam sua
identidade preservada. Assim, na nossa análise, nomeamos os participantes de
usuários, os quais colocamos em ordem numérica do número 01 (um) ao
número 06 (seis), pois contamos com 06 (seis) informantes, que foram
selecionados de acordo com a sua disponibilidade e que são ativos no
momento das reuniões, às quais os mesmos comparecem sistematicamente.
Em seguida, apresentaremos uma análise das falas dos usuários,
buscando compreender os significados das respostas e embasando suas
afirmações à luz dos teóricos que fundamentaram nossa pesquisa.
3.3.1 Chegada dos usuários ao CAPS GERAL SER III – HUWC / UFC
O CAPS GERAL SER III – HUWC / UFC funciona desde a sua fundação
próximo ao Hospital Universitário Walter Cantídio – HUWC, no bairro Rodolfo
Teófilo – cuja área abrange a Regional III. O usuário ao chegar à instituição é
encaminhado ao acolhimento na sala da coordenação do serviço. Esta
atividade é realizada por profissionais de diversas categorias, com o objetivo de
escutar e acolher o usuário em sua demanda numa perspectiva de
aproximação e inclusão, buscando a humanização no serviço.
53
Nesse contexto, quando questionados sobre como chegaram ao CAPS,
dois dos seis entrevistados, (usuários 01 e 03) afirmaram que, ao serem
diagnosticados com transtorno afetivo bipolar em uma unidade de saúde, foram
encaminhados para o CAPS.
“Eu me tratava no interior e eu pedi a transferência pra cá, eu só vivia de licença por causa do tratamento do CAPS de lá; eu me tratei aqui, era no Nosso Lar, pelo IPEC, quando eu descobri que eu era bipolar, eu vim para cá, para o Dr. Dimitri”. (Usuário 01).
“Cheguei por causa da morte da minha mãe, aí eu descobri que eu tinha transtorno bipolar. Fiquei tão perturbado na época em que a mamãe morreu. Aí eu tive que ir pro hospital, fui hospitalizado aí descobriram que eu tinha bipolar. Eu vim pro CAPS em 2005, de lá pra cá, sempre fui acompanhado pelo CAPS”. (Usuário 03).
De acordo com as falas dos entrevistados, as pessoas com transtornos
mentais, uma vez assim diagnosticadas, são imediatamente encaminhadas ao
serviço substitutivo de saúde mental.
Em seguida, outros dois usuários (02 e 06) afirmaram ter passado por
uma triagem, para, em seguida, receberem atendimento médico na sua
especialidade.
“Faz três anos, vim com minha mãe, quando cheguei aqui eu suspeitava que eu tinha, porque a minha mãe era que tinha olhado na internet, eu achava que era só depressão e aí eu vim com ela e fiz uma triagem aqui. Estavam vários médicos na sala, aí o Dr. Eugênio disse
que eu tinha bipolaridade”. (Usuário 02).
“Foi através de uma triagem, eu saí do hospital, primeiro eu saí do hospital, depois eu fiz uma triagem aqui no CAPS III, fui avaliada, aí me inseri num tratamento aqui, de três em três meses. Aqui nesse CAPS, é desde 2003, só que eu me trato desde os meus 21 anos, que é lá para 2000, desde 2000 que eu me trato em outros hospitais”. (Usuário 06).
Observamos nas falas anteriores que o usuário e a própria família
encontraram dificuldades em reconhecerem a doença, pois o diagnóstico
representa um desafio a ser superado por essas pessoas. Daí a importância de
identificar o aparecimento da doença o mais breve possível, é o que
observamos nas falas em que os mesmos procuraram o profissional na
unidade de saúde, sendo, em seguida, encaminhados ao psiquiatra.
54
Os usuários, por vezes, são encaminhados ao CAPS provenientes de
outros hospitais, e, de acordo com o seu perfil, encontram no CAPS os serviços
que permitem superar suas crises, dando continuidade ao seu tratamento e,
permanecendo por tempo indeterminado como usuários do serviço.
Os outros 02 (dois) entrevistados (04 e 05) afirmaram terem sido
encaminhados ao CAPS, um, proveniente de uma instituição de saúde de outro
estado do País, o outro de uma instituição privada da capital como podemos
observar nas falas abaixo:
“Eu cheguei ao CAPS através de um encaminhamento que veio de São Paulo, de um psiquiatra, eu vim assim, bem doentinha né, aí minha mãe me indicou pro CAPS ela me trouxe aqui. A primeira vez eu vim, passei mais ou menos um ano e agora estou novamente, vai fazer dois
anos. E agora estou efetiva”. (Usuário 04).
“Eu estava em uma crise de depressão muito grande e não estava
tendo acompanhamento particular, porque antes eu tinha atendimento particular. Aí eu fui até o IPC conversar com um médico lá, um médico particular, que ele descobriu que eu tinha transtorno, aí eu fui, conversei com ele e tal, expliquei o que eu estava passando. Como era do SUS, ele pôde me encaminhou pra cá, porque se eu fosse pra consulta particular não tinha como encaminhar pra cá.” (Usuário 05).
De acordo com o relato acima, o primeiro (usuário 04) está sendo
acompanhado há algum tempo desde sua chegada em Fortaleza, pois a
mesma passou por um problema particular, fato que a trouxe para junto da sua
família, pois já se encontrava doente. Desde então o usuário é acompanhado
pelo CAPS e já se sente “efetivo” na instituição. O segundo (usuário 05) ao
chegar ao CAPS se encontrava em crise de depressão, foi atendido pelo
médico e continua em tratamento.
Dessa forma, os CAPS têm por finalidade tratar as pessoas com
transtornos mentais graves exigindo “condições terapêuticas que inexistem nos
ambulatórios e hospitais psiquiátricos” (GOLDBERG apud TENÓRIO, 2002, p.
39). Esse atendimento exige que o usuário compareça à unidade diariamente,
para serem acompanhados e participarem das atividades terapêuticas
oferecidas pelo serviço.
55
3.3.2 Experiência profissional e vivência nesse processo
O assunto nos remete ao processo de produção do capital que teve suas
repercussões no mundo do trabalho. Este ocasionou transformações,
comumente intituladas de reestruturação produtiva, trazendo consigo grandes
repercussões para a vida do trabalhador.
Por outro lado, essas repercussões afetam radicalmente as condições
de vida e de trabalho da classe trabalhadora, gerando assim, insegurança,
instabilidade e desigualdade social. Essas características destroem a força de
trabalho e se convertem em desemprego. Vale ressaltar que na reestruturação
do processo produtivo há uma desvalorização do trabalho humano e uma
flexibilização das relações de trabalho, expressas sob as mais diversas formas
de precarização e exploração do trabalhador.
Em relação à questão da experiência profissional dos usuários e suas
vivências nesse processo, estes afirmaram:
“Eu trabalhei como professora, mas nunca gostei de cumprir horários, eu mesma reconhecia também eu não tinha muita estabilidade emocional, eu não tinha muita paciência [...]. As minhas principais dificuldades é eu não perseverar, comprar as coisas e guardar, e quando chega o dia do cheque, para pagar as coisas, fica difícil, não tem dinheiro, e eu pago do meu dinheiro, desfalca alguma coisa, atrasa o cartão, o cheque volta, e eu gasto dinheiro com outra coisa”. (Usuário 01).
Trabalhei pouco, mais com a minha mãe, ela tinha uma telemensagens, eu trabalhei dez anos com ela e aí ela fechou, eu trabalhei também numa Lan House com minha irmã, três anos e ela fechou. [...] Tinha dificuldade do transtorno mesmo, a gente lidava com crianças que eram de uma escola especial, foi muito bom, foi gratificante pra mim, mas não dava porque eu ficava muito triste vendo aquelas crianças naquela situação, aí eu fiquei deprimida [...] (Usuário 02).
“A minha experiência profissional foi de serviços gerais e também de auxiliar de limpeza num supermercado, eu gostei muito porque foi meu primeiro emprego de carteira assinada, e assim eu tenho vontade de voltar, embora muitas vezes eu acho que não tem mais jeito, mas no fundo algo me diz que tem jeito sim de voltar, ainda agora que eu estou estudando [...]. (Usuário 04).
“[...] Arranjei um emprego no Shopping [...], numa lanchonete, passei um ano lá aí depois faliu, fechou a lanchonete, continuei na mesma empresa, só que em outro emprego [...]. As principais dificuldades de inserir, não é por causa do transtorno, [...] mas eu sentia as dificuldades de convivência, entendeu, de convivência, de rotina, era difícil, e depois eu optei pela faculdade mas na época da faculdade eu tentava conciliar, até tentei, fiz um tratamento, mas eu mesma desisti
56
porque eu não aguentei, eu estava ficando muito sobrecarregada, estresse, e tudo mais [...]. (Usuário 05).
“Bom, o distúrbio atrapalha muito, embora eu tenha muitos talentos como artesã, vendedora, como costureira, mas eu não consigo produzir nada nas empresas devido à exigência que o comércio pede, né, a toda pessoa, a pressão pra produzir resultados, aí, quando eu consigo um emprego, eu não consigo lidar com essa pressão, aí eu acabo adoecendo e perdendo o emprego [...]”. (Usuário 06).
Nesse discurso, os usuários 01 (um), 02 (dois), 04 (quatro) e 05 (cinco) e
06 (seis) demonstraram um quadro similar, pois, por um lado, apresentaram
características das pessoas acometidas de TAB, tais como, instabilidade
emocional, incapacidade de cumprir horários, alteração, desinteresse ou falta
de prazer, falta de concentração, esquecimentos, entre outras. Segundo Silva e
Cordás (2006, p. 49) o transtorno bipolar “em muitos casos, a situação
econômica é colocada em risco pela prodigabilidade excessiva”. Desse modo,
o usuário descontrola sua situação financeira, não tendo a capacidade de
controlar suas próprias despesas.
Por outro lado, a partir da fala dos entrevistados podemos aludir à
reestruturação do processo produtivo, pois neste há uma desvalorização do
trabalho humano e uma flexibilização das relações de trabalho, expressas
sobre as mais diversas formas de instabilidade do mercado em relação às
empresas, bem como a precarização do trabalho e exploração do trabalhador.
Em relação ao entrevistado abaixo, este afirma:
“Eu trabalhava [...], sempre tinha muito serviço pra mim, trabalhei [...] como eletrotécnico. Não tive dificuldade em trabalhar, eu tinha feito a escola e fui mandado direto pra lá. Trabalhei muitos anos [...] trabalhei por 27 anos. Aí, eu saí e fiz o acordo, PDV (Plano de Demissão Voluntária), logo após, eu me aposentei”. (Usuário 03).
Como assinala Dejours (1992, p. 124) [...] “o sofrimento mental, e, em
particular a ansiedade, não têm o direito de existir no local de trabalho”. Essa
situação pode até remeter à demissão sem justa causa. No caso, nessa época
o governo oferecia aos servidores o Plano de Demissão Voluntária (PDV), na
gestão de Fernando Henrique Cardoso, então Presidente da República, na
década de 1990. Como assinala Pereira (1998), o PDV representa uma forma
de desligamento do funcionário da empresa, em que esta busca enxugar o
57
quadro de funcionários, propondo uma série de benefícios sociais e financeiros.
O usuário se serviu deste recurso, pois se encontrava em tratamento no CAPS,
permanecendo, assim na ociosidade.
A fala do usuário 03 aponta para uma das consequências da
reestruturação produtiva, ou seja, “o poder destrutivo da reestruturação
produtiva é manifestado numa série de perdas para o trabalhador,
evidenciando-se, em primeiro lugar, na expulsão massificada do emprego”.
(FREIRE, 2010, p. 52).
Assim, torna-se claro que os trabalhadores se submetem às mais
diversas pressões que desencadeiam sofrimento psíquico, desgaste físico e
mental em razão do seu nível de dependência, muitos em constantes rodízios,
assumindo novas responsabilidades e se tornando cada vez mais fragilizados.
3.3.3 Atividade laboral no momento da pesquisa
Em decorrência de todos os fatores relacionados anteriormente, os seis
usuários estão fora do mercado de trabalho, conforme destacaram nos
depoimentos abaixo.
“Não estou trabalhando. Perdi com muito desgosto o cadastro da
Linhas e Cores, eu perdi porque eu não comprei por R$:1500,00 trimestral, o kit”. (Usuário 01).
“Não estou trabalhando”. (Usuário 02)
“Hoje não trabalho mais, eu tinha uma bodeguinha, mas fechei.
Entrar agora no mercado de trabalho tá meio difícil, devido à idade, eles querem pessoas mais novas, eu não estou mais trabalhando porque estou aposentado”. (Usuário 03).
“Não, não estou trabalhando”. (Usuário 04).
““Não”. (Usuário 05).
“Não, no momento não”. (Usuário 06).
Nesse sentido, todos os usuários afirmam estar sem nenhuma atividade
laboral no momento da nossa entrevista. É notória a dificuldade de inserção no
mercado de trabalho dos usuários com transtorno bipolar, pois, ficou
58
constatado nas falas dos usuários entrevistados. Dados da Organização
Mundial da Saúde (OMS) ainda na década de 1990, mostraram que o
transtorno bipolar foi a sexta maior causa de incapacitação no mundo
(MIRANDA, 2013).
3.3.4 Processo de inserção no mercado de trabalho
Ao serem questionados sobre o seu processo de inserção no mercado
de trabalho, os entrevistados narraram as dificuldades pelas quais passaram e,
em alguns casos, ainda passam:
O processo de inserção, pra mim, não é difícil, porque eu trabalho com vendas, porque eu tenho muita facilidade de fazer amizade, eu vendo, eu viajo muito, levo lá pra minha mãe, vendo em Mossoró, Itapipoca, na Baleia, vendo Romanel”. (Usuário 01).
O entrevistado acima apresenta uma contradição em relação à questão
anterior, pois questionado se no momento trabalha, este afirma não estar
trabalhando e na questão sobre sua inserção no mercado de trabalho afirma “o
processo de inserção, pra mim, não é difícil, porque eu trabalho com vendas”,
mas, observamos que este se encontra em um estado de humor elevado, muito
falante, apresentando-se “com aumento exagerado de sua autoestima,
expressando-se com eloquência e manifestando ideias de grandeza,
supervalorizando suas condutas e capacidades” (SILVA; CORDÁS apud
ABREU, 2006, p. 49).
Essa variação de humor representa uma característica da fase maníaca
da pessoa com transtorno afetivo bipolar, ora se expressando com coerência e
fluidez, ora em contrassenso com o que foi dito anteriormente.
O usuário 02 fala da sua dificuldade para entrar no mercado de trabalho
“[...] não tenho oportunidade de trabalhar, não tem aluno prá mim e também,
sabe como está difícil entrar no mercado de trabalho [...]”.
O mesmo entrevistado (usuário 02) coloca a dificuldade no momento da
entrevista com o psicólogo, pois o mesmo afirma: “[...] você tem que passar por
uma entrevista com um psicólogo e aí ele percebe. Já fiz algumas entrevistas,
59
pelas minhas respostas fui reprovada, porque não tem como a gente fingir para
um psicólogo” [...], ou seja, o profissional ao entrevistar percebe através das
respostas que o entrevistado tem algum tipo de transtorno e o reprova,
impossibilitando, assim o seu processo de inserção no mercado de trabalho.
O método de seleção das empresas envolve a comprovação do currículo
do candidato, entregue com antecedência, cuja função é, após análise por
parte dos profissionais da empresa, levar o candidato para uma entrevista.
Nesse sentido, a entrevista representa uma etapa importante do
concorrente, que passa pelo processo seletivo e essa é a ocasião de confirmar
as informações que foram apresentadas no currículo, previamente analisado
pelos profissionais das empresas.
Assim, é feita uma avaliação da pessoa que está se submetendo à
entrevista e esta deverá, neste momento, demonstrar suas competências, os
seus valores, atitudes e demais características que podem expor a sua
personalidade e seu comportamento. É, pois, neste momento, que o candidato
deve responder de forma objetiva ao que lhe é perguntado, demonstrando
otimismo e autoconfiança no seu pronunciamento17. É nessa ocasião que o
psicólogo testa o nível de conhecimento do candidato apresentado em seu
currículo, e, no momento, é necessário que nas suas respostas haja raciocínio
lógico, demonstrando ponderação e bom senso.
Entendemos ser este o momento crucial para o usuário acometido de
adoecimento mental, pois o mesmo deve responder objetivamente aos
questionamentos colocados pelo entrevistador, no caso, o psicólogo. O
entrevistado 02 percebe a sua limitação e entende o motivo da reprovação no
momento da sua entrevista com esse profissional, fato que dificulta sua
inserção no mercado de trabalho.
Conforme ressaltamos anteriormente, o usuário 03 coloca como
dificuldade a idade, pois afirma: “Entrar agora no mercado de trabalho tá meio
difícil, devido à idade, eles querem pessoas mais novas, eu não estou mais
trabalhando porque estou aposentado”.
Ao interpretar a fala do entrevistado, este coloca a dificuldade relativa à
sua faixa etária para retornar ao mercado de trabalho, pois, segundo
17
BLOG. Psicologia do Trabalho. Campos (2013).
60
Seligmann-Silva (2011), à medida que o trabalhador avança na idade este fica
ameaçado para prosseguir tanto na sua vida profissional quanto em relação à
sua própria sobrevivência, modificando seu plano de vida no âmbito pessoal e
familiar.
O usuário 04 relata a questão do preconceito dizendo: “[...] Hoje eu não
estou trabalhando por causa do preconceito comigo mesma, então eu fico
parada em casa, só fazendo as coisas de casa mesmo [...]”. A fala do
entrevistado se refere à sua exclusão perante a si próprio, já que a sociedade
contemporânea alimenta a ideia do preconceito, fato que nos habituou a
manter os acometidos de sofrimento mental sempre isolados e marginalizados
(FOUCAULT, 2009).
A fala do usuário 05 relata que se sente: “[...] um pouco diferente, então
assim, dificuldade de acordar, dificuldade física e mental, eu me desgasto
muito, ou eu fico depressiva ou eufórica, quando eu gasto muita energia [...]”. O
entrevistado apresenta no seu relato uma situação característica do transtorno,
um estado depressivo, alternando com acontecimentos de euforia, também
nomeada de mania ou hipomania, dependendo do grau de intensidade e da
duração, no momento em que há uma mescla dos episódios depressivos como
os de euforia. (SILVA; CORDÁS apud ABREU, 2006). Os usuários com mania
podem passar por quadros excêntricos, quando mais leves “hipomanias”, mas,
nos quadros mais graves, são os familiares ou os amigos que deles se
ocupam, levando-os ao médico, uma vez que os mesmos não se reconhecem
na sua doença.
O usuário 06 no tocante à sua inserção no mercado de trabalho afirma
ser “[...] muito dificultoso, porque o perfil, as pessoas querem gente formada”
[...]. O relato do usuário retorna à questão da sua qualificação profissional, este
se sente desqualificado e coloca, então, a sua dificuldade de inserção no
mercado de trabalho devido ao seu nível instrucional.
Seligmann-Silva (2011) relata a questão da discriminação dos
“nervosos” enquanto fator de superexploração vinculado à desqualificação, ou
seja, pessoas estigmatizadas como “desviantes”, passam por dificuldades para
serem aceitas no mercado formal de trabalho, sendo submetidas a trabalhos
temporários e precários prestados até aos próprios familiares.
61
Nesse contexto, observamos quão nefasto é o processo de
precarização, o qual desestabiliza os sujeitos, pois remete à perda dos seus
referenciais, bem como à falta de proteção aos direitos sociais do trabalho,
levando todos os trabalhadores a uma desmedida competição, gerando
insegurança e instabilidade.
3.3.5 Representação do trabalho em sua vida
Ao serem questionados sobre a importância do trabalho para a sua vida,
os entrevistados relataram que:
“O trabalho é muito importante, porque ele distrai a mente, valoriza o ser humano, você amanhece o dia, não tem nada pra fazer, você se sente uma pessoa inútil, e vai se deitar, vai se esmorecendo, até que fica doente mesmo. Eu tive várias crises de querer ficar no canto da rede deitada, aí eu disse: “eu vou me levantar”, então meto as cara e vou, e invento qualquer coisa pra fazer e dá certo”. (Usuário 01).
“O trabalho é importante porque é uma fonte de renda né? Eu no momento to passando por muita dificuldade financeira porque dependo da minha mãe e ela tem dificuldade e eu preciso fazer uma manutenção e tenho que pedir a ela, preciso voltar ao médico, tenho que pedir a ela entendeu? É muito chato”. (Usuário 02)
“Sim, o trabalho é importante porque é muito ruim a pessoa ficar sem
fazer nada. Eu acho muito ruim ficar sem fazer nada, eu vou ver o que eu posso inventar pra trabalhar de novo, porque o mercadinho eu acabei, tenho que inventar outro meio pra trabalhar”; (Usuário 03).
“O trabalho é importante, porque realiza né, a gente, e a gente se sente útil, se sente feliz”. (Usuário 04).
De acordo com os relatos dos entrevistados, estes compartilham o
mesmo sentido em relação à importância do trabalho em suas vidas, pois este
representa não somente satisfazer as necessidades pecuniárias, mas também
garantir a subsistência humana. É, pois, através do trabalho, que o ser humano
alcança o seu desenvolvimento pessoal, bem como tem a oportunidade de
produzir bens materiais. A atividade laboral realiza o ser humano, eleva a
autoestima e traz bem estar, então o trabalho é tão importante, quanto vital
para o ser humano.
Em relação à mesma questão, os entrevistados a seguir assinalaram:
62
“Com certeza, é importante porque, qualquer trabalho, por mais simples que seja, como esse que eu vivenciei, né, caso de família, sofri preconceito, por eu ser uma menina que já tinha ensino médio, meus próprios irmãos de casa. Por mais que seja, o trabalho dá autonomia, não só questão financeira, dá independência de você mesmo, porque é ruim depender de outras pessoas, do pai, dos irmãos, dos outros e é ruim, e como eu comecei a depender do meu esposo também, eu me sentia mal, sendo que ele é uma pessoa legal, mas ele me deixa feliz, de bem com a vida, eu me sinto útil, porque assim, eu já trabalhei também por conta própria, e eu gosto mais ainda do trabalho por conta própria, eu faço o que eu quero, da forma que eu quero, não tem tanta limitações como uma empresa, né, aí eu me sinto muito bem assim, trabalhando”. (Usuário 05)
“Muito, primeiro porque dignifica o ser humano, segundo porque eu não quero depender do meu marido”. (Usuário 06).
Os entrevistados afirmam em suas falas que o trabalho valoriza o ser
humano, distrai, traz felicidade, dá independência e dignifica o ser humano. De
acordo com Iamamoto (2012, p. 60), “por meio do trabalho o homem se afirma
como ser criador, não só como individuo pensante, mas como individuo que
age consciente e racionalmente”. Dessa forma, o trabalho traz mudanças tanto
na matéria quanto no sujeito, na sua competência, permitindo-o descobrir
novas aptidões e atributos humanos.
Conforme Antunes (2011), a produção e a reprodução da vida humana
realizam-se pelo trabalho. É, pois, a partir do trabalho no cotidiano que o sujeito
torna-se um ser social, o que o distingue de todos os outros seres vivos. É por
meio do trabalho que o ser humano enquanto ser social recria-se a si mesmo
como gênero humano no processo de autoatividade e de autocontrole.
Complementando essa análise, Foucault (2009) destaca que o trabalho
representa um mecanismo inestimável de inclusão, causando grande
transformação na vida do ser humano.
Nesse contexto, sabemos que grandes benefícios da vida em sociedade
provêm do trabalho, pois este permite a produção dos bens de consumo, bem
como o indivíduo terá à sua disposição uma forma de adquirir bens e serviços,
pois a falta destes, como assinala Dejours (1992), propicia sofrimento, tédio,
desespero e desconforto existencial.
Dessa forma, em relação à importância do trabalho, corroboramos com
Iamamoto (2011, p. 42) quando esta afirma que: “o trabalho é, portanto,
inseparável do conhecimento, de ideias e concepções de mundo, isto é, de
63
formas de pensar a vida real”. Assim, o sujeito que trabalha recria seu mundo
através da sua atividade, pois, dessa forma, desenvolve sua capacidade para
transformar a sua realidade, a fim de melhor desempenhar suas funções em
seu meio social. Daí a importância da inserção no mercado de trabalho no
momento atual, item que desenvolveremos a seguir.
3.3.6 Acesso ao emprego hoje
Em relação a esse assunto, os entrevistados consideram difícil
conseguir emprego na atual situação em que se encontram:
Na fala dos entrevistados a seguir, estes assim se pronunciam:
“Acho difícil conseguir emprego hoje, porque tá difícil imagina pra quem
é bipolar” (Usuário 02). “É difícil conseguir um emprego hoje, pela minha idade,
porque eles querem pessoas mais novas” (Usuário 03).
“Sim, hoje eu acho que seria um pouco mais difícil, porque eu teria que passar por um psicólogo, e eu acho que muitas das vezes, eu vou passar na psicóloga chorando, talvez por causa do transtorno, ou porque eu sou sensível mesmo se eu me emocionar com qualquer coisa eu choro, como é que vai dar certo, mas como eu disse, vai chegar uma hora que vai dar certo, mas por causa das entrevistas, eu acho que é difícil, mas se fosse só pelo fato da entrevista e eu me emocionar a psicóloga iria perceber que seria só isso, mas tem uma coisa a mais, a doença, né” (Usuário 04).
“Com certeza. Por exemplo, estou fazendo curso de administração, se eu for pra uma empresa, eu com 34 anos de idade, procurar algum trabalho, cargo de chefia, ou seja lá qual for, não vou encontrar, porque eu não tenho experiência nenhuma” (Usuário 05).
“Sim, porque eu estou numa crise maníaca, estou sofrendo entre a depressão e a mania, hoje eu já fui me consultar” (Usuário 06).
De acordo com os informes apresentados nas falas dos entrevistados
acima, estes afirmam ser tarefa difícil conseguir um trabalho na situação em
que se encontram, porque há dificuldade de encontrar emprego de uma forma
geral e ainda mais sendo “bipolar” (Usuário 02).
Os dados coletados coadunam com as discussões de Coqueiro (2013)
quando esta relata que uma questão importante refere-se à falta de inclusão
64
social pela via do trabalho voltada aos usuários com transtorno mental, mesmo
que haja na esfera governamental uma articulação visando à inserção das
pessoas com alguma deficiência, para terem uma vaga assegurada no mundo
do trabalho.
Nesse contexto, Santos (2010) menciona a Lei Nº 785318 de 1989 e o
Decreto de Nº 339819 que a regulamenta, estes revelam que “as organizações
devem contratar mão de obra portadora de algum tipo de deficiência, mas em
algum momento menciona o portador de transtorno mental” (SANTOS, 2010, p.
84).
A declaração do autor nos remete à questão da falta de inclusão para a
pessoa com transtorno mental, no tocante ao mercado formal para estes
usuários, pois ainda não há legislação que contemple as pessoas acometidas
de adoecimento mental.
Vale salientar que as políticas públicas no seio da sociedade brasileira
ainda são elementares, demonstrando que a pessoa com transtorno mental
ainda se encontra excluída não tendo, portanto, chance de ser inserida, ou de
concorrer a uma vaga no mercado de trabalho de acordo com a sua limitação.
A fala do entrevistado 05 coloca a questão da idade e da falta de
experiência e, por fim, em relação a conseguir emprego na atualidade, o
entrevistado 06 afirma ser difícil encontrar trabalho por estar em crise maníaca
e depressão.
Segundo Cordás e Silva (apud ABREU, 2006), há fases que
caracterizam a pessoa com sofrimento mental: a depressiva, em que o
indivíduo tem baixa concentração, apresentando fadiga e cansaço para realizar
suas tarefas cotidianas e baixa autoestima e autoconfiança, permeados de
ansiedade e desesperança; a fase maníaca, que apresenta elevações de
humor, por vezes agitações e argumentos incoerentes, demonstrando ideias de
grandeza e colocando em evidência seu comportamento e sua competência.
18
Dispõe sobre o apoio às pessoas portadoras de deficiência, sua integração social, sobre a Coordenadoria Nacional para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência - Corde, institui a tutela jurisdicional de interesses coletivos ou difusos dessas pessoas, disciplina a atuação do Ministério Público, define crimes, e dá outras providências. 19
Decreto nº 3398 de 20 de dezembro de 1999. Regulamenta a Lei 7853 de 24 de outubro de 1989. Dispõe sobre Política Nacional para a integração da Pessoa Portadora de Deficiência e consolida as normas de proteção. (BRASIL, 1988).
65
3.3.7 Apreciação sobre sua participação no grupo TAB
Em relação à participação dos usuários em um grupo TAB, a equipe
multiprofissional busca inserir o usuário na sua especificidade e, assim,
acompanhar o seu desenvolvimento ao longo do seu tratamento. Dessa forma,
a equipe multidisciplinar acolhe os usuários, com vistas a desenvolver os
trabalhos psicoeducativos, propondo atividades de reabilitação psicossocial,
buscando a solução para os problemas por eles apresentados, objetivando que
os mesmos retornem ao convívio social. A equipe de profissionais trabalha com
o objetivo de viabilizar através da psicoeducação a possibilidade de uma
melhor convivência com o transtorno, nos diversos aspectos da vida dos
usuários, tais como, convívio com os familiares e participação no grupo.
A organização do grupo objetiva trabalhar o caráter psicoeducativo,
tornando possível ao usuário ter o conhecimento acerca da doença, visando
conhecer e reconhecer sintomas, perceber suas oscilações de humor, fatores
que desencadeiam a doença e a partilha de informações sobre medicações e
tratamentos.
Nesse sentido, nossa última questão se reporta sobre a participação dos
usuários no grupo, ou melhor, se esta facilita ou dificulta para que eles
encontrem trabalho.
Assim, os usuários questionados sobre sua participação no grupo, com
vistas a saber se esta integração facilita ou dificulta para que encontrem
trabalho, o entrevistado 01 assim respondeu: “Facilita, ajudou muito o grupo,
porque a gente se sente valorizado. No primeiro dia que eu vim pro grupo, no
segundo dia, eu já queria que fosse de novo terça-feira, o grupo me estimulou
muito”.
Podemos interpretar a fala do entrevistado 01 assinalando que o grupo é
importante, este passa a ser um campo apropriado para instigar a
subjetividade, possibilitando que os participantes pratiquem neste espaço
atividades que modificam o seu cotidiano.
Nesse mesmo entendimento, o usuário 02 destaca a importância do
grupo para a elevação da sua autoestima.
66
“Acho que facilita porque acaba aprendendo muita coisa e então dá para você se reconhecer e se perceber. Se reconhecer quando está na crise, eu acho que essa é a principal meta, através das experiências que você ouve. O grupo ajuda, tem me ajudado em muitas coisas, eu estou tentando me acordar mais cedo, acho que é devido ao grupo, ele anima muito a gente. As pessoas quando estão contando o que elas passam, a gente passa a mesma coisa e cada pessoa vivencia aquilo de forma diferente, depende de como você recebe aquela informação e aí vivendo e ouvindo as experiências aí a gente aprende a lidar com a situação”. (Usuário 02).
Verificamos, portanto, que o usuário 02 comenta sobre o seu estado de
desenvolvimento e crescimento por participar do grupo, tendo em vista que
encontra, escuta e troca experiências com os demais participantes. Através
dessa prática, os usuários sentem-se motivados e estimulados, pois no grupo
expõem as dificuldades vivenciadas, ouvindo dos demais participantes seus
testemunhos e dividindo suas experiências. Ele demonstra que naquele grupo
há partilha e discussões em relação às demais situações vivenciadas por ele,
pois o mesmo sente que in loco recebe orientações para dividir com os outros
participantes, o seu problema.
Dessa forma, os profissionais do CAPS-GERAL SER III organizam as
atividades do grupo psicoeducativo, incluindo desde a acolhida ao tratamento
dos usuários, objetivando, fundamentalmente, “a produção de atos de cuidado
e de intervenções sociais visando à construção de autonomia nos usuários20”.
Nesse contexto, a equipe do CAPS-GERAL SER III desenvolve
atividades que possibilitam o acompanhamento dessas pessoas com
transtornos mentais, objetivando um tratamento nesta instituição prestadora de
serviço substitutivo aos hospitais psiquiátricos.
É, pois, a partir da busca de estratégias e concepções de vida, a fim de
promover a inserção do usuário com transtorno mental e sua inserção na vida
social, que a equipe multidisciplinar faz uma adequação a cada caso, com
vistas a superar o transtorno por ele vivido. É este o objetivo da equipe do
CAPS-GERAL SER III, buscando uma constante reconstrução desse sujeito na
sua inclusão com a sociedade.
Graças ao trabalho realizado em equipe, de forma articulada e integrada,
os diversos profissionais que compõem o CAPS-GERAL SER III se unem com
20
Conselho Federal de Psicologia.
67
vistas a debater sobre os casos dos usuários que se encontram nesta unidade.
Trata-se de uma equipe multiprofissional, pois é composta de pessoas
especializadas e cônscias de que devem adotar uma postura acolhedora no
serviço, devendo administrar a complexa situação dos usuários com lucidez, a
fim de manterem o real significado do papel do CAPS, enquanto organismo
criado após a implantação do processo de Reforma Psiquiátrica.
No tocante à valorização da pessoa com transtorno e facilitação por
participar do grupo, os demais entrevistados relatam: “Eu tenho pra mim que o
grupo facilita conseguir um trabalho, ajuda a pessoa a melhorar e conseguir um
emprego”. (Usuário 03). “Eu acho que facilita né, porque dá todo suporte que a
gente precisa, em termos de abrir a mente da gente, eu acho que é isso, o
grupo é importante em tudo”. (Usuário 04).
“Com certeza facilita, porque quando eu vim pro grupo, eu era uma
pessoa totalmente afastada da sociedade eu estava saindo da crise de depressão, então o grupo ele me fez acordar pro mundo, pra vida, também me inseriu no mercado, na sociedade, eu comecei a me perceber de forma diferente, me perceber como um ser humano, como eu sou igual aos outros, eu não sou inferior a ninguém, tenho direito de conseguir as coisas, eu tenho direito de lutar, agora sou uma pessoa mais otimista [...]” (Usuário 05).
“Sim. [...] Eu vejo o grupo bipolar como uma maneira de a gente do grupo, sentir a dor do outro, que agente pensa que é só na gente, essa dor, e agente vê no grupo que não estamos sós, tem o outro, pra gente se espelhar, quando tá bem, quando tá mal, quando tá em crise, quando morre alguém, quando não temos dinheiro pra comprar remédio, aí eu me espelho nisso, no grupo, como se fosse um analgésico, pra passar a dor”. (Usuário 06).
Os usuários acima não refletem exatamente a resposta à questão, tendo
em vista que perguntamos se participar do grupo facilita ou não para encontrar
trabalho, tendo apenas um usuário (04) que assim se pronunciou “Eu acho que
facilita né, porque dá todo suporte que a gente precisa [...]”. Os demais
entrevistados colocaram em evidência a participação do grupo, enquanto
suporte terapêutico, assinalando que: o grupo abre “a mente da gente, eu acho
que é isso, o grupo é importante em tudo” que está sentindo sua inclusão na
sociedade, de se perceber como ser humano”, de se sentir “igual aos outros” e
de ter recuperado o seu otimismo (usuário 05).
68
O relato do usuário 06 afirma na sua fala a possibilidade de “[...] sentir a
dor do outro [...]”, de observar que tem com quem contar,
“[...] não estamos sós, tem o outro, pra gente se espelhar, quando tá bem, quando tá mal, quando tá em crise, quando morre alguém, quando não temos dinheiro pra comprar remédio, aí eu me espelho nisso, no grupo, como se fosse um analgésico, pra passar a dor]”. (Usuário 06).
Dessa forma, o usuário demonstra que o CAPS cumpre com sua
atividade terapêutica, pois permite ao usuário desse serviço substitutivo
integração entre os participantes, compartilhamento e, como assinala Andaló
(2006) em relação à atuação do grupo por parte dos usuários, “permite [...]
contatos face a face, ligados por algum(ns) objetivo(s) comum(ns) que os
leva(m) a interagir e estabelecer relações de reciprocidade. [...]”. (ANDALÓ,
2006, p. 68).
Portanto, conclui-se que o CAPS, através dos profissionais facilitadores,
cumpre com a sua função de atendimento ao grupo com transtorno bipolar,
desde a escuta qualificada, ao atendimento humanizado, visando compreender
a história daquele participante do grupo, ajudando-o a se reconhecer e a
encontrar nesse serviço o apoio necessário, comprovando sua eficácia como
vimos nos depoimentos dos entrevistados, funcionando até como um
“analgésico para passar a dor”. (Usuário 06).
69
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Vivemos um contexto marcado por grandes transformações sociais -
globalização da economia, reestruturação produtiva e revolução tecnológica
são exemplos desse movimento -, as quais repercutem no mundo do trabalho,
reivindicando novas demandas aos trabalhadores. O aparato tecnológico como
parte integrante dessas transformações se volta para o incremento da
produção e da produtividade, contribuindo para a ampliação da exploração da
mão de obra e a precarização das relações de trabalho, trazendo como
consequência imediata perdas incomensuráveis para a classe trabalhadora no
que se refere aos seus direitos trabalhistas, os quais foram conquistados
historicamente.
Outro aspecto que merece destaque é a questão da inserção da classe
trabalhadora no mercado de trabalho na contemporaneidade. Na maioria das
vezes, o trabalhador desenvolve múltiplas funções em seu local de trabalho,
percebendo o mesmo salário, momento em que a classe empregadora diminui
o número de funcionários das empresas, e o empregado deixa de ser
especializado, passando a ser multifuncional.
Em estudos feitos acerca do mercado de trabalho, os pesquisadores
apontam que, na classe trabalhadora, somente uma pequena parcela possui
uma ocupação estável, cuja força de trabalho é mais qualificada e se beneficia
dos direitos trabalhistas, enquanto que a outra camada da população ainda se
submete a trabalhos precários, assumindo seus empregos na categoria de
temporários.
Considerando todos esses aspectos, vale salientar que houve
modificações e transformações radicais na vida desses trabalhadores, o que
desencadeou demissões, em larga escala, desta classe de seus postos de
trabalho.
Por todas essas constatações, verificamos as consequências da
reestruturação produtiva, a qual provocou inúmeras transformações no mundo
do trabalho, trazendo à tona o desemprego para a classe trabalhadora,
reduzindo a classe operária industrial e aumentando consideravelmente o
trabalho informal. Outra consequência para a referida classe com o resultado
dessas mudanças foi a diminuição da estabilidade no mercado de trabalho,
70
pois o que é almejado pelo empregador é a oferta da mão de obra, fato que
majora a força de trabalho, e diminui as possibilidades do empregado.
Pesquisas sobre as consequências da reestruturação produtiva no
mundo do trabalho demonstram que os trabalhadores além das perdas dos
seus direitos sociais, foram também violados na sua subjetividade, identidade
bem como abalados na sua própria saúde e superando os seus limites físicos e
psicológicos. Diante do exposto, verificamos que essa modificação no cenário
do trabalho, acarretou desgaste mental na saúde do trabalhador.
Com o advento da Reforma Psiquiátrica no Brasil, esta trouxe avanços
para o tratamento em saúde mental, embora a realidade atual demonstre
limitações, pois não há investimentos, fato que representa desafios face à
grande demanda nos serviços psiquiátricos. Faz-se necessário fortalecer os
serviços substitutivos de saúde mental, para que estes possam melhor atender
os seus usuários, já que os mesmos não dispõem de recursos pecuniários para
receber um tratamento adequado e digno.
Tendo em vista os argumentos apresentados relativos ao mundo do
trabalho, constatamos as reais dificuldades dos nossos informantes no tocante
ao tema questionado na pesquisa, relativo ao seu processo de inserção no
mercado de trabalho. Dessa forma, procuramos responder aos
questionamentos colocados, através da sistematização dos procedimentos
científicos adotados.
Ao analisarmos sobre o processo de inserção dos usuários no mercado
de trabalho, os resultados colhidos apontaram que todos os participantes se
encontram, no momento da entrevista, sem nenhuma atividade laboral, ou seja,
estão excluídos do mercado de trabalho. Esse resultado nos levou a refletir
sobre as várias dificuldades enfrentadas pelos trabalhadores de um modo geral
em se inserirem nesse mercado, que é cada vez mais competitivo, seletivo e
excludente. Essas dificuldades tendem a ser multiplicadas se considerarmos
que esses usuários ainda precisam conviver com as limitações advindas de
seu transtorno aliada ao preconceito que envolve a sociabilidade de uma
pessoa que vive com sofrimento mental e, ainda, outras dificuldades, dentre
tantas outras limitações.
Vale ressaltar que essa exclusão social é respaldada pelo Estado, se
considerarmos que não existe uma legislação específica que garanta a
71
inclusão dos mesmos. Cabe citarmos que, ainda que a Lei Nº 7853 de 1989 e o
Decreto de Nº 3398 determinem a contratação de mão de obra de pessoas
com algum tipo de deficiência, em nenhum momento a referida legislação faz
alusão a pessoa com transtorno mental, ou seja, reafirma a exclusão das
pessoas acometidas de adoecimento mental.
Por todas essas constatações, percebemos, nos depoimentos, que a
pessoa com transtorno mental ainda se encontra excluída, não tendo, portanto,
chance de ser inserida, ou de concorrer a uma vaga no mercado de trabalho de
acordo com a sua limitação. Faz-se necessário, então, que políticas públicas
voltadas às pessoas com transtornos mentais, sejam implementadas no
sentido de atenderem às mesmas, de acordo com as suas necessidades.
Nessa perspectiva, ainda que o CAPS – GERAL SER III, através da sua
equipe multiprofissional, desenvolva de forma responsável suas atividades, fica
claro que a inclusão social desses usuários, por meio do trabalho, ainda
representa um grande desafio, necessitando de estratégias que vão além da
responsabilidade e competência técnica dos profissionais.
A nossa pesquisa, sem a pretensão de esgotar o assunto, espera
contribuir para a ampliação do debate sobre os desafios da inclusão produtiva
das pessoas em sofrimento psíquico, contribuindo, também, para darmos uma
maior visibilidade aos discursos, narrativas e percepções desses sujeitos que
são o alvo da política de saúde mental.
Dessa forma, ressaltamos que, apesar de concordarmos que a
implantação dos CAPS representa um grande avanço para a política de saúde
mental, ainda existem grandes desafios a serem ultrapassados, sendo um
deles a inserção dos usuários no mercado de trabalho.
72
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82
APÊNDICE A
Questionário para abordagem da construção do perfil socioeconômico dos
usuários do Grupo TAB - CAPS GERAL SER III/UFC
Trabalho de Conclusão de Curso - Graduação em Serviço Social
Faculdade Cearense
Este questionário é dirigido aos usuários do Grupo TAB, para uma
pesquisa, cujo tema é : Estudo de um grupo de transtorno afetivo biplolar no
CAPS Geral SER III HUWC / UFC : Uma análise dos processos de inserção no
mercado de trabalho vivenciados pelos sujeitos com transtorno de humor.
Solicitamos a todos que respondam as perguntas abaixo, pois não haverá
nenhuma publicação das respostas e as informações aqui recolhidas serão
destinadas unicamente a uma análise científica dos dados coletados.
Nome________________
Idade _______________
Sexo F ( ) M ( )
Profissão_____________
Nível de escolaridade ( ) Ensino Fundamental ( ) Ensino Médio
( ) Ensino Superior ( ) Especialização
Encontra-se inserido no mercado de trabalho ? ( ) SIM ( ) NÃO
Se Sim, qual a forma de contratação? _______________________________
Tempo de Serviço :
a) ( ) Menos de 6 meses
b) ( ) Concurso Público
c) ( ) De 1 a 5 anos
d) ( ) Empresa Privada
e) ( ) De 6 a 10 anos
f) ( ) Trabalho Informal
g) ( ) Mais de 10 anos
Renda individual ________________________
Renda familiar _________________________
83
APÊNDICE B
Roteiro de entrevista semiestruturada dirigido aos usuários do Grupo TAB –
CAPS GERAL SER III/UFC
Trabalho de Conclusão de Curso - Graduação em Serviço Social
Faculdade Cearense
Este questionário é destinado aos usuários do Grupo de Transtorno
Afetivo Bipolar, cujo tema de pesquisa é : Estudo de um grupo de transtorno
afetivo bipolar no CAPS Geral SER III HUWC / UFC : Uma análise dos
processos de inserção no mercado de trabalho vivenciados pelos sujeitos com
transtorno de humor. Solicitamos a todos que respondam as perguntas feitas,
pois não haverá nenhuma publicação das respostas, as informações aqui
recolhidas e, são destinadas unicamente, a uma pesquisa e análise científica
dos dados coletados.
Fale um pouco, como você chegou ao CAPS?
Fale um pouco de sua experiência profissional. Quais as principais
dificuldades vivenciadas nesse processo.
Você está trabalhando? Em quê?
Como tem se dado para você, o processo de inserção no mercado de
trabalho? (Se não estiver trabalhando, diga o porquê).
O trabalho é importante para você? Por quê?
Você acha que é difícil conseguir um emprego hoje? Por quê?
Participar do grupo dificulta ou facilita você conseguir um trabalho? Por
quê?
Origem da renda individual ___________________________