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VARIAÇÕES SOBRE SEXO E GÊNERO Beauvoir, Wittig e Foucault JUDITH BUTLER

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VARIAES SOBRE SEXO E GNERO Beauvoir, Wittig e FoucaultJUDITH BUTLER

OBRAArtigo publicado em 05 de janeiro de 1986 na revista Praxis International, N 4, pp 505-516.

BEAUVOIR E TORNAR-SE MULHERNo se nasce, mas torna-se mulher. Esse j famoso dito de Simone de Beauvoir afirma a no coincidncia de identidade natural e identidade de gnero. Como o que nos tornamos no o que j somos, o gnero desalojado do sexo; a interpretao dos atributos sexuais distinguida da facticidade ou simples existncia desses atributos. O verbo tornar-se encerra, porm, uma ambiguidade existencial.

BUTLER, Judith. Variaes sobre Sexo e Gnero Beauvoir, Wittig e Foucault. In: BENHABIB, Seyla & CORNELL, Drucilla. Feminismo como Crtica da Modernidade Rio de Janeiro, Ed. Rosa dos Tempos, 1987, p.139 BEAUVOIR E TORNAR-SE MULHERButler analisa a obra de Beauvoir, O Segundo Sexo, criticando, em um primeiro momento, a teoria por uma ambiguidade consequencial: os gneros seriam ao mesmo tempo escolhidos e construdos culturalmente. E estas posies seriam contraditrias, pois, o gnero passaria a ser o lugar dos significados culturais tanto recebidos quanto inovados* que entendem que o corpo (e seu sexo) como um lugar cultural de significados de gnero. A noo de que escolhemos em parte nossos gneros provoca um enigma ontolgico. Se estamos sempre j dotados de gnero, imersos em gnero, que sentido tem dizer que escolhemos o que j somos?

BUTLER, Judith. Variaes sobre Sexo e Gnero... Op.cit., p. 140.BEAUVOIR E TORNAR-SE MULHERPara Beauvoir, tornar-se mulher um conjunto de atos propositais e apropriativos, a aquisio gradual de uma postura, um projeto em termos sartrianos, assumir um estilo e significado corpreo culturalmente estabelecido. Quando tornar-se entendido como significando assumir ou encarnar intencionalmente, a declarao de Beauvoir parece arcar com o fardo da escolha sartriana.

BUTLER, Judith. Variaes sobre Sexo e Gnero... Op.cit., p.139.

BUTLER E TORNAR-SE MULHERButler afirma que ser mulher defende um ato da vontade, uma construo que identifica a variedade de modos pelos quais se pode adquirir significaes culturais ou reconhecer o processo de autoconstruo do gnero que se torna.CORPOS SARTRIANOS E FANTASMAS CARTESIANOSIdeia de que se escolhemos em parte nossos gneros, provoca um enigma ontolgico. No s a tese parece tautolgica, mas na medida em que postula um eu que escolhe antes do seu prprio gnero escolhido, parece adotar uma viso cartesiana do eu, uma estrutura egolgica que vive e luta antes da linguagem e da vida cultural. Esse modo de ver o eu contraria recentes descobertas sobre construo linguistica de iniciativa e arbtrio pessoais e, como o problema dos egos cartesianos em toda parte, sua distncia ontolgica da linguagem e vida cultural impede a possibilidade de sua verificao final.

BUTLER, Judith. Variaes sobre Sexo e Gnero... Op.cit., p.140.CORPOS SARTRIANOS E FANTASMAS CARTESIANOSPara que a afirmao de Beauvoir seja irrefutvel, e para ser verdade que nos tornamos nossos gneros por uma espcie de atos volitivos e ajustativos, ela deve significar algo diferente de um ato cartesiano no localizado.Para que a teoria de Beauvoir seja entendida como isenta do fantasma cartesiano, devemos primeiro estabelecer de que maneira ela enxerga nossa identidade encarnada, e considera suas meditaes sobre as possibilidades de almas desencarnadas.BUTLER, Judith. Variaes sobre Sexo e Gnero... Op.cit., p.140 e 141.CORPOS SARTRIANOSSartre argumenta que o corpo coextensivo com a identidade pessoal ( uma perspectiva que se vive), tambm insinua que a conscincia est de certo modo alm do corpo (Meu corpo um ponto de partida que eu sou e que ao mesmo tempo ultrapasso). Em vez de refutar o cartesianismo, a teoria de Sartre assimila o momento cartesiano como um aspecto imanente e parcial da conscincia.BUTLER, Judith. Variaes sobre Sexo e Gnero... Op.cit., p. 141.CORPOS SARTRIANOSPara Sartre pode-se ultrapassar o corpo, mas isso no significa que se v definitivamente alm do corpo; o paradoxo subversivo consiste no fato de que o corpo em si um ultrapassamento. O corpo no um fenmeno esttico ou idntico a si mesmo, mas um modo de intensionalidade, uma fora direcional e modo de desejar. (...)O corpo vivido e percebido como o contexto e meio para todos os esforos humanos.O corpo natural s existe na condio de ser ultrapassado: Jamais poderemos apreender essa contingncia como tal na medida em que nosso corpo para ns; porque somos uma escolha, e para ns ser nos escolhermos ... Esse corpo inapreensvel precisamente a necessidade de haver uma escolha, de que no existo repentinamente.BUTLER, Judith. Variaes sobre Sexo e Gnero... Op.cit., p.141 e 142.CRTICA DE BUTLERPara Butler no refuta Sartre mas adota a seu lado o no cartesiano.O problema de sua teoria no est no e alm do corpo, mas a mudana do corpo natural para o corpo aculturado.Tornar-se mulher no implica em uma liberdade desencarnada a uma incorporao cultural. Se um corpo de incio, e s depois nos tornamos nosso gnero.CRTICA DE BUTLERSegundo Beauvoir nos tornemos nossos gneros, o movimento temporal desse tornar-se no segue uma progresso linear. A origem do gnero no temporalmente descontnua precisamente porque o gnero no originado de repente em algum ponto do tempo depois do que assume forma definitiva.O gnero no historivel a partir de uma origem definvel porque, por sua vez, uma atividade originante que acontece sem cessar.BUTLER, Judith. Variaes sobre Sexo e Gnero... Op.cit., p. 142.O CORPO COMO SITUAOBeauvoir, ir antecipar a questo cultural na definio do gnero, bem como, desnaturalizar a noo de corpo, colocando-o como uma situao cultural: lugar de interpretaes culturais e contextualizaes sociais que, ao mesmo tempo, lugar de interpretar e transformar o que recebemos.O corpo como situao tem pelo menos um dplice significado. Como um lugar de interpretaes culturais, o corpo uma realidade material que j foi situado e definido dentro de um contexto social. O corpo tambm a situao de ter que estudar e interpretar aquele conjunto de interpretaes recebidas.CORPO COMO SITUAOSe o gnero precisa de algum modo estar vinculado com sexo ou se essa prpria vinculao uma conveno cultural. Se o gnero um modo de existir o prprio corpo, e esse corpo uma situao, um campo de possibilidades a um tempo recebidas e reinterpretadas, ento gnero e sexo parecem ser questes inteiramente culturais.CRTICA DE BUTLERSe aceitarmos o corpo como uma situao cultural, a noo de um corpo natural e, de fato, um sexo natural parece cada vez mais suspeita.Quando o corpo concebido como um lugar cultural de significados de gnero, torna-se obscuro que aspectos deste corpo so naturais ou isento de marca cultural.Se o gnero a corporificao da escolha, e a aculturao do corpreo, ento o que sobrou da natureza, e em que se transformou o sexo?

BUTLER, Judith. Variaes sobre Sexo e Gnero... Op.cit., p.140 e 145.A ESCOLHA COMO PONTO EM COMUM ENTRE BEAUVOIR E WITTIGAs posies de Beauvoir e Wittig so diferente em pontos importantes, mas tem em comum uma teoria do gnero que tenta dar sentido cultural existencial da escolha.

BUTLER, Judith. Variaes sobre Sexo e Gnero... Op.cit., p.140.GNERO COMO ESCOLHABeauvoir v o gnero como um projeto incessante, um ato dirio de reconstruo e interpretao, de acordo com a doutrina de Sartre de escolha pr-reflexiva e d aquela estrutura epistemolgica abstrata um significado cultural concreto. A escolha pr-reflexiva um ato espontneo e tcito que Sartre chama de quase conhecimento. Aquele tipo de escolha que fazemos e no sabemos por que.Escolha: processo corpreo de interpretaes no seio de uma rede de normas culturais profundamente entranhadas.BUTLER, Judith. Variaes sobre Sexo e Gnero... Op.cit., p.143.BUTLER E O GNERO COMO ESCOLHAPara Butler , quando Beauvoir examina o mecanismo de atuao e ajuste, tenta juntar a anlise da opresso das mulheres com o potencial emancipatrio. A opresso no um sistema autocontido que confronta os indivduos como objetivo terico ou nos gera como seus joguetes culturais.BUTLER E A CRTICA DO GNERO COMO ESCOLHANo possvel assumir um gnero de um momento para o outro. Trata-se de um projeto laborioso, sutil e estratgico, e quase sempre velado. Tornar-se um gnero um processo impulsivo, embora cauteloso, de interpretar uma realidade de plenas sanes, tabus e prescries. A escolha de assumir certo tipo de corpo, viver ou usar o corpo de certo modo que as reproduzam e organizem de novo. Menos um ato radical de criao, o gnero interpretar normas de gnero recebidas de um modo que as reproduzam e organizem de novo. Menos um ato radical de criao, o gnero um projeto tcito para renovar a histria cultural nas nossas prprias condies corpreas. No uma tarefa prescritiva de que devamos nos esforar para fazer, mas aquela em que estamos nos esforando sempre, desde o comeo.

BUTLER, Judith. Variaes sobre Sexo e Gnero... Op.cit., p.143BUTLER E A CRTICA DO GNERO COMO ESCOLHABeauvoir no trata diretamente do fardo da liberdade que o gnero apresenta, mas podemos extrapolar de sua posio como as normas constringentes do gnero atuam para reprimir o exerccio da liberdade do gnero. As constries sociais sobre conformidade e desvio de gnero so to grandes que a maioria das pessoas se sentem profundamente feridas se lhes dizem que exercem sua masculinidade ou feminilidade inadequadamente.Identidade de gnero repousa na base instvel da inveno humana.ENCARNAO E AUTONOMIABeauvoir analisa as mulheres como os outros, definida como uma perspectiva masculina que procura salvaguardar seu status desencarnado mediante identificao das mulheres em geral com a esfera corporal. O desencarnamento masculino s possvel sob a condio que as mulheres ocupem seus corpos como suas identidades essenciais escravizadoras.BUTLER, Judith. Variaes sobre Sexo e Gnero... Op.cit., p. 144 CRTICA DE BUTLERA dialtica de Beauvoir do eu e Outro mostra os limites de uma verso cartesiana da liberdade desencarnada e critica implicitamente o modelo de autonomia sustentado pro essa normas masculinas de gnero. A busca da desencarnao necessariamente ilusria porque o corpo jamais poder ser realmente negado; sua negao torna-se a condio de seu surgimento de forma estranha. A POLTICA DO CORPO A feminista francesa Monique Wittig, que escreveu um importante artigo intitulado No se nasce mulher (1978), amplia a natureza ambqua de identidade de gnero, isto , esse eu cultural em que nos transformamos mas que parece ter sido sempre.Beauvoir e Wittig convergem teoricamente na recusa de doutrinas essencialistas da feminilidade.BUTLER, Judith. Variaes sobre Sexo e Gnero... Op.cit., p.139. A POLTICA DO CORPOSe o corpo natural e o sexo natural uma fico, a teoria de Beauvoir parece implicitamente indagar se sexo no seria gnero desde sempre.A discriminao de sexo ocorre no campo poltico, para que o sexo permanea didtico.A demarcao da diferena dos sexos no precede a interpretao daquela diferena, mas essa demarcao por sua vez um ato interpretativo carregado de pressupostos normativos sobre um sistema binrio de gneros. Wittig argumenta a erogeneidade, a reatividade sexual do corpo, est restrita pela institucionalizao da diferena binria dos sexos.Wittig contesta a prtica social de valorizar certas caractersticas anatmicas como definitivas no s de sexo anatmico mas de identidade sexual. Observa que h outras espcies de diferenas entre as pessoas, diferenas em forma e tamanho, na formao das orelhas...Diferenciao sexual em um certo sentido ir determinar o destino social da criana. Destino estruturado por um sistema de gnero segundo a naturalidade das oposies binrias.