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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO USO DE ADVERBIAIS MODALIZADORES E SUA ABORDAGEM EM LIVROS DIDÁTICOS DE ENSINO MÉDIO: REFLEXÕES E PROPOSTAS DE ATIVIDADES Dennis da Silva Castanheira 2017

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO

USO DE ADVERBIAIS MODALIZADORES E SUA ABORDAGEM EM LIVROS DIDÁTICOS

DE ENSINO MÉDIO: REFLEXÕES E PROPOSTAS DE ATIVIDADES

Dennis da Silva Castanheira

2017

USO DE ADVERBIAIS MODALIZADORES E SUA ABORDAGEM EM LIVROS DIDÁTICOS

DE ENSINO MÉDIO: REFLEXÕES E PROPOSTAS DE ATIVIDADES

por

DENNIS DA SILVA CASTANHEIRA

Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de

Pós-Graduação em Linguística da Universidade Federal

do Rio de Janeiro como requisito parcial para obtenção

do título de Mestre em Linguística.

Orientadora: Prof.ª. Dr.ª Maria Maura da Conceição Cezario

Coorientadora: Prof.ª. Dr.ª Leonor Werneck dos Santos

Rio de Janeiro

Fevereiro de 2017

USO DE ADVERBIAIS MODALIZADORES E SUA ABORDAGEM EM LIVROS DIDÁTICOS

DE ENSINO MÉDIO: REFLEXÕES E PROPOSTAS DE ATIVIDADES

Dennis da Silva Castanheira

Orientadora: Professora Doutora Maria Maura da Conceição Cezario

Coorientadora: Professora Doutora Leonor Werneck dos Santos

Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Linguística da

Universidade Federal do Rio de Janeiro como requisito parcial para obtenção do título de Mestre

em Linguística.

Examinada por:

___________________________________________________________________________

Prof.ª. Dr.ª Maria Maura da Conceição Cezario – PPG Linguística, UFRJ (Orientadora)

___________________________________________________________________________

Prof.ª. Dr.ª Leonor Werneck dos Santos – PPGLV (Língua Portuguesa)/ PROFLETRAS, UFRJ

(Coorientadora)

___________________________________________________________________________

Prof.ª. Dr.ª Maria Aparecida Lino Pauliukonis – PPGLV (Língua Portuguesa)/ PROFLETRAS,

UFRJ

___________________________________________________________________________

Prof.ª. Dr.ª Karen Sampaio Braga Alonso – PPG Linguística/ PROFLETRAS, UFRJ

___________________________________________________________________________

Prof.ª. Dr.ª Regina Souza Gomes – PPGLV (Língua Portuguesa), UFRJ (Suplente)

___________________________________________________________________________

Prof.ª. Dr.ª Érika Cristine Ilogti de Sá – UFRJ (Suplente)

Rio de Janeiro

Fevereiro de 2017

EPÍGRAFE

“Continue a nadar”

(Dory)

“Ao infinito e além”

(Buzz Lightyear)

DEDICATÓRIA

À mamãe Jurema, sinônimo de força e

coragem.

À Maura e à Leonor, metades

acadêmicas de um mesmo eu.

Às minhas amigas, companheiras de

uma vida.

Às minhas meninas, Isabella, Juliana,

Raquel e Yasmim, e ao meu filhão,

Hugo, responsáveis por ressignificar

muito do que sou.

AGRADECIMENTOS

Quando decidi que montaria um projeto de Mestrado em 2014, ainda no sétimo período da

graduação, jamais imaginei que passaria por um processo tão complexo de transformações

emocionais e intelectuais. Seria uma missão praticamente impossível listar tudo que ocorreu nesse

tempo, mas, sem dúvidas, saio do Mestrado muito mais maduro e seguro dos caminhos a serem

seguidos na minha vida. Academicamente, exerci papéis que nem nos melhores sonhos daquele

menino de 20 anos seriam possíveis. Na vida pessoal, tive encontros inesperados e consolidei

amizades sinceras. Nos dois âmbitos, me decepcionei algumas vezes, mas entendi que precisava

deixar alguns pesos e pessoas pelo caminho, porque deveria seguir com as pessoas certas. Entendi,

ainda, que era necessário passar por tudo isso para que visse alguns aspectos da vida com maior

clareza. Por isso, cedo espaço, a partir de agora, para as pessoas e forças que fizeram os dois anos

de Mestrado serem muito especiais em minha vida e com as quais escolhi seguir em frente.

Agradeço a Deus e aos espíritos de luz por guiarem meu caminho nessa difícil e pesada

jornada. Foram muitos momentos complicados e de muitas dúvidas, mas a fé e a crença de que tudo

daria certo ao fim da caminhada foram constantes, mesmo nos momentos de maior introspecção e

solidão, fatalmente necessários para produção deste trabalho.

Agradeço à Maura, “orientadora-amiga”. Desde o dia em que entrei pela primeira vez na

sala H314, criamos, cultivamos e amadurecemos uma relação franca de respeito, confiança e

amizade. Foram inúmeras e inacreditáveis oportunidades concedidas a mim, sobretudo ao longo do

Mestrado. Constituímos uma trajetória muito bonita e sólida de parceria em publicações,

orientações, projetos, eventos. Minha caminhada até aqui se deve, em muitos aspectos, a ter

conhecido, aos 17 anos, uma pesquisadora de honestidade ímpar num momento em que eu ainda

estava assustado com a imensidão da Linguística e da vida.

Agradeço à Leonor, também “orientadora-amiga”. Leonor entrou na minha vida no último

período da graduação, num momento em que eu já tinha uma pesquisa, anos de IC, uma trajetória

acadêmica. A vida tratou de nos mostrar, porém, que nosso encontro estava previamente traçado e

que não estávamos ali à toa. Contrariando a máxima – seguida por muitos – “em time que está

ganhando não se mexe”, Leonor entrou neste projeto (com a benção da orientadora Maura) pouco

antes do início do Mestrado e foi peça essencial para que chegássemos ao resultado final. Ao longo

de todo o processo, nos conhecemos melhor, percebemos grandes afinidades e montamos um

projeto de Doutorado, já aprovado para ser iniciado em março de 2017. Com suas perspectivas

inovadoras e seu companheirismo característico, Leonor mudou minha vida e me levou para

caminhos inimagináveis até então.

Agradeço, ainda, às professoras Maria Aparecida Lino Pauliukonis e Lúcia Helena Gouvêa.

Embora tenhamos nos conhecido ainda na graduação, foi no Mestrado que consolidamos nossa

parceria. Aparecida me ensinou, desde o curso de Semântica da LP, caminhos possíveis para o

ensino de língua portuguesa, conferindo, de forma generosa, liberdade criativa a alunos tão jovens e

inexperientes. Lúcia sempre me recebeu com imenso carinho e respeito, trazendo boas energias e

palavras de fé na vida e no ser humano. Essas duas profissionais gentilmente me apresentaram à

análise do discurso, linha de pesquisa com a qual me identifico e com a qual hoje me sinto

conectado.

Agradeço, também, ao Grupo de Estudos Discurso & Gramática (D&G) e ao Grupo de

Pesquisa em Linguística de Texto (GPLT). No D&G, tive grandes oportunidades e trocas

acadêmicas, conheci parte das pessoas mais especiais da minha vida, aprendi sobre funcionalismo,

sobre ciência, sobre trabalho. Agradeço, em especial, ao Professor Roberto Freitas Jr., hoje parceiro

fiel e apostador assíduo em meu potencial profissional. No GPLT, pude conhecer novas perspectivas

teóricas, traçar novos caminhos acadêmicos e trocar experiências com pessoas de vivências

profissionais muito distintas das minhas. Em especial, agradeço às parceiras Vanessa, Fernanda,

Heloísa e Maria Cristina, pela torcida sincera e pela admiração mútua.

Agradeço, ainda, a duas pessoas que fizeram com que o período do curso de Mestrado em

Linguística fosse muito menos pesado e muito mais amigo e divertido: Débora e Patricia. Inúmeras

vezes dividimos nossas angústias, nossos medos, nossas dúvidas, nossos trabalhos de Fonologia

Gerativa e Sociolinguística. Sofremos juntos, esperamos as notas e sempre saímos com a convicção

de que, sem estarmos juntos, nada teria sido como foi.

Agradeço a uma galerinha do bem que tive a oportunidade de conhecer em 2015.1. Diante

do convite da Professora Maura para estagiar em duas turmas de Linguística I no primeiro semestre

de 2015, tive o prazer de conhecer pessoas maravilhosas, que me ensinam todos os dias com suas

postagens incríveis sobre direitos humanos, feminismo e tolerância. Agradeço às queridas Fabiana,

Alexandra, Amanda, Nathália, Ana Clara, Mariane, Iasmin, Christianne, Tainá e Dayane, uma

galerinha que me faz ter esperança num futuro diferente e nas novas gerações e que me enche de

abraços apertados e carinhosos.

Agradeço, é claro, àqueles que meu coração escolheu chamar de filhos. Uma das maiores

surpresas desses dois anos foi encontrar cinco pessoas de tamanhos e anos de vida semelhantes aos

meus, mas com as quais desenvolvi uma relação linda e simplesmente inexplicável. No processo de

autoconhecimento que passei ao longo do Mestrado, entendi, após certo tempo, que amava muito (e

não tenho a menor vergonha de dizer isso!) os “filhos de Castanheira”, pessoas que admiro e

respeito imensamente. Dessa forma, agradeço: à Raquel, primeira filha, que “deu o tom” do que

ocorreria depois e fez com que tudo isso fosse possível com sua vibração positiva constante, seu

bom humor e suas frases icônicas (“EU AMO!”) – como ela diria, “segue o baile”; à Isabella,

“filha-amiga”, que me ouviu tantas vezes por horas seguidas, esteve presente de forma firme e

decidida em momentos importantes e rapidamente reconheceu o quão especial e única era nossa

relação; à Yasmim, “filha-artista”, que “ostenta” o posto de minha cantora favorita e que toca minha

alma com suas poucas e precisas palavras tão sinceras e genuínas; ao Hugo, “filhão-poeta”, que me

ensinou muito sobre o significado da palavra tempo e com o qual venho construindo, de forma

sincera e pura, uma relação de amizade e carinho; à Juliana, “filha-companheira”, que surgiu num

dos momentos mais difíceis da minha vida, me devolveu a esperança no “outro” e se tornou uma

companheira diária e uma amiga extremamente leal.

Agradeço, ainda, às pessoas que fizeram com que eu chegasse até aqui e me acompanham

todos os dias: minhas amigas. Seres humanos ímpares, companheiras de uma vida, responsáveis por

muito do que sou hoje. Agradeço: à Aline, amiga tão sincera, que me “leu” de forma tão precisa no

hoje longínquo 2011, quando eu mesmo sabia tão pouco sobre mim; à Carol Fumaux, amiga de

momentos tão difíceis e cruciais, que me acompanha diariamente e divide comigo o lema “somos

verdade”; à Carol Ribeiro, amiga tão doce e paciente, que surgiu de forma tímida e, aos poucos,

ganhou grande espaço em minha vida, tornando-se figura essencial em minha trajetória; à Érika,

amiga tão preocupada, que, inúmeras vezes, tentou me ajudar a descobrir meus caminhos e seguiu

comigo depois de muitas tempestades; à Julinha, amiga com jeito de “irmã mais velha”, que

acompanhou, com emoção e respeito, meu crescimento emocional e intelectual, me ajudando a

entender “o outro” e a deixar pesos pelo caminho; à Maíra, amiga tão generosa, que me ensinou

sobre inúmeros aspectos essenciais da existência humana e me poupou, mesmo sem sabermos, de

um caminho tortuoso e pesado na vida; à Manuella, amiga de todos os dias, que me ouve de forma

tão paciente e carinhosa inúmeras vezes, dividindo alegrias e pequenos momentos não tão alegres e

que agora também é parceira de Doutorado; à Monique, amiga de dias tão pesados, que sempre me

trata com imenso carinho e amizade e que gentilmente me ajuda com todos os abstracts da vida; à

Thaís, amiga companheira e premiada, que me ensinou muito sobre o significado da palavra

reciprocidade e que fez com que eu me reaproximasse da literatura com seus textos maravilhosos e

seus poemas instigantes.

Agradeço, por fim, à minha família, parte essencial do que sou. Agradeço: à mamãe Jurema,

amiga, companheira e parceira, que me criou à luz de um amor incondicional, sem barreiras ou

limites físicos e emocionais; à vovó Joaninha, base de tudo, que permanece viva em nossos

corações e permeia nossos dias com ecos de sua doída luta em meio a tantos sorrisos; ao

“irmãozão” Douglas, amigo e torcedor, que é parceiro de tantos momentos, defensor de tantas lutas,

companheiro de tantas batalhas.

Seguimos todos juntos ao infinito e além!

RESUMO

USO DE ADVERBIAIS MODALIZADORES E SUA ABORDAGEM EM LIVROS DIDÁTICOS

DE ENSINO MÉDIO: REFLEXÕES E PROPOSTAS DE ATIVIDADES

Dennis da Silva Castanheira

Orientadora: Professora Doutora Maria Maura da Conceição Cezario

Coorientadora: Professora Doutora Leonor Werneck dos Santos

Resumo da Dissertação de Mestrado submetida ao programa de Pós-Graduação em Linguística,

Faculdade de Letras, da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, como parte dos requisitos

necessários à obtenção do título de Mestre em Linguística.

Esta pesquisa discute o uso de adverbiais modalizadores em artigos de opinião e sua

abordagem em livros didáticos de ensino médio à luz do Funcionalismo norte-americano e da

Linguística do Texto. Acerca do uso, observamos sua posição e seu papel como articulador textual

argumentativo e como marca de subjetividade em 60 artigos de opinião publicados nos jornais O

Globo Online e O Dia Online, ambos do Rio de Janeiro. Os resultados apontaram para necessidade

de maior investigação das motivações para ordenação dos adverbiais modalizadores e para seu

importante papel como articulador textual argumentativo subjetivo expressando, sobretudo, efeito

de sentido epistêmico. Nos livros didáticos, observamos panoramicamente como o tema é tratado a

partir dos efeitos de sentido e papéis funcionais dos adverbiais modalizadores e de sua ligação à

argumentação. Os resultados apontaram para necessidade de melhor tratamento do tema, tendo em

vista a escassez e a inadequação da abordagem dos manuais analisados. Por fim, apresentamos

algumas sugestões de propostas de atividades que podem ser adaptadas e usadas posteriormente em

sala de aula por professores de ensino básico ou por trabalhos futuros.

Palavras-chave: adverbiais modalizadores; livros didáticos; propostas de atividades; funcionalismo

norte-americano; Linguística do Texto

Rio de Janeiro

Fevereiro de 2017

ABSTRACT

THE USE OF MODAL ADVERBS AND THEIR APPROACH IN HIGH SCHOOL TEXTBOOKS:

REFLECTIONS AND PROPOSALS TO ACTIVITIES

Dennis da Silva Castanheira

Orientadora: Professora Doutora Maria Maura da Conceição Cezario

Coorientadora: Professora Doutora Leonor Werneck dos Santos

Abstract da Dissertação de Mestrado submetida ao programa de Pós-Graduação em Linguística,

Faculdade de Letras, da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, como parte dos requisitos

necessários à obtenção do título de Mestre em Linguística.

This research studies the use of modal adverbs in opinion articles and the way they are dealt

with in high school textbooks. We combine North American functionalism and Text Linguistics as

the theoretical framework for the study. Regarding linguistic use, we observed the positions of the

adverbs and their roles as argumentative textual articulators and as subjectivity marks in 60 opinion

articles published in the newspapers O Globo Online and O Dia Online, both from Rio de Janeiro.

Results pointed out the need for a wider investigation on the motivations for the word order of

modal adverbs and for their important role as subjective argumentative textual articulators that

particularly express some epistemic effect. In the textbooks, we observed how the theme is treated

in terms of sense effects and functional roles besides their connection to the argumentation. Results

pointed out the need for a better treatment of the topic, considering the scarcity and the inadequacy

of the way it is treated in the manuals analyzed. Finally, we present some suggestions for activities

that can be adapted and used in by elementary school teachers or in any for future work.

Key-words: modal adverbs, textbooks, proposals of activities, North-American functionalism, Text

linguistics.

Rio de Janeiro

Fevereiro de 2017

SINOPSE

Investigação funcional e textual do uso

de adverbiais modalizadores em artigos

de opinião e de sua abordagem em livros

didáticos de Ensino Médio aprovados

pelo Programa Nacional do Livro

Didático de 2015. Elaboração de

propostas de atividades.

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO.................................................................................................................................16

1. FUNCIONALISMO: ASPECTOS TEÓRICOS E REFLEXÕES SOBRE ENSINO...................22

1.1. Linguística Funcional: panorama teórico....................................................................................22

1.2. O funcionalismo norte-americano...............................................................................................24

1.2.1. Iconicidade e marcação............................................................................................................25

1.2.2. A subjetividade na linguagem...................................................................................................26

1.3. Funcionalismo e outras correntes da linguística contemporânea................................................28

1.4. Funcionalismo e ensino...............................................................................................................29

2. LINGUÍSTICA DO TEXTO: QUESTÕES TEÓRICAS E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS..........34

2.1. Primeiras fases e abordagem atual..............................................................................................34

2.2. Linguística do Texto e outras abordagens teóricas......................................................................37

2.3. Texto e ensino..............................................................................................................................38

2.4. Articulação textual.......................................................................................................................43

2.5. O gênero textual artigo de opinião..............................................................................................46

2.5.1. Aspectos gerais dos estudos sobre gêneros..............................................................................46

2.5.2. Os artigos opinativos................................................................................................................48

3. EXPRESSÕES DA MODALIZAÇÃO E ENSINO......................................................................51

3.1. A modalização do discurso..........................................................................................................51

3.2. Adverbiais modalizadores em perspectiva teórica......................................................................52

3.3. O ensino de adverbiais modalizadores........................................................................................58

4. METODOLOGIA...........................................................................................................................62

5. ANÁLISE DE ADVERBIAIS MODALIZADORES: USO E ABORDAGEM............................64

5.1. O uso dos modalizadores em artigos de opinião.........................................................................64

5.1.1. Frequência dos adverbiais modalizadores................................................................................64

5.1.2. Posição......................................................................................................................................65

5.1.3. Articulação textual....................................................................................................................69

5.2. A abordagem dos modalizadores nos livros didáticos de ensino médio......................................81

5.2.1. Português: linguagens em conexão..........................................................................................81

5.2.2. Português: contexto, interlocução e sentido.............................................................................84

5.2.3. Português: língua e cultura.......................................................................................................85

5.2.4. Vozes do mundo: literatura, língua e produção de textos..........................................................86

5.2.5. Em busca de uma sistematização.............................................................................................88

5.3. Confrontando uso e abordagem...................................................................................................89

6. PROPOSTAS DE ATIVIDADES...................................................................................................92

CONSIDERAÇÕES FINAIS...........................................................................................................105

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.............................................................................................108

LISTA DE GRÁFICOS, TABELOS E QUADROS

Gráfico 1: frequência dos adverbiais modalizadores nos jornais utilizados

Tabela 1: relação entre posição dos adverbiais modalizadores e os jornais utilizados

Tabela 2: relação entre ordem dos adverbiais modalizadores e sua estrutura no jornal O Globo

Online

Tabela 3: relação entre ordem dos adverbiais modalizadores e sua estrutura no jornal O Dia Online

Gráfico 2: efeitos de sentido dos adverbiais modalizadores como articuladores textuais na amostra

utilizada

Gráfico 3: relação entre efeitos de sentido dos adverbiais modalizadores e os jornais utilizados

Quadro 1: panorama da abordagem dos livros didáticos acerca dos adverbiais modalizadores

16

INTRODUÇÃO

Nesta dissertação, apresentaremos, sob uma perspectiva funcional e textual, um estudo

acerca do uso de adverbiais (advérbios, advérbios em -mente e locuções adverbiais)

modalizadores em artigos de opinião e analisaremos, panoramicamente, como os livros

didáticos de ensino médio abordam a temática em relação aos efeitos de sentido, papéis

funcionais e à ligação com a argumentação. Por fim, apresentaremos sugestões de atividades

que possam ser adaptadas posteriormente por trabalhos futuros e/ou por professores de ensino

básico. Os exemplos a seguir ilustram alguns dos dados analisados aqui:

(1) “Há mais coisas ocultas. Envolvem o fluxo de dinheiro da Odebrecht para campanhas de

Dilma, Lula e outros do PT. Ficaram reservadas à colaboração premiada cujo desfecho talvez

coincida com o impeachment no Senado” (Artigo “O ‘trouxa’ e a ‘inocenta’” – Jornal O

Globo Online).

(2) “O Peru aplicou uma política econômica ortodoxa, que incluiu uma estrita disciplina

fiscal, uma postura monetária de um rigor anti-inflacionário quase de estilo germânico, e um

agressivo desmantelamento do protecionismo alfandegário” (Artigo “O discreto encanto do

Peru” – Jornal O Globo Online).

(3) “O esquema envolvendo mais de 80 mil agentes de segurança, segundo o Ministério da

Justiça, entre polícias Militar, Civil, Federal e Forças Armadas, nos traz reflexões e até

discussões que merecem permanecer após os Jogos. A primeira é que a integração é um

caminho a ser considerado. Um planejamento integrado, contando com o setor de inteligência

de cada instituição, certamente trará bons frutos não só para o Rio, mas para todas as capitais

brasileiras” (Artigo “Segurança é a medalha mais almejada” – Jornal O Dia Online).

(4) “Parece ter suspirado, antes que se tomasse sua fotografia. Ele é o único a olhar para a

lente da câmera que, provavelmente de outra embarcação, registra a cena de horror da qual

teria preferido não tomar parte” (Artigo “Braços negros ao ar” – Jornal O Globo Online).

17

(5) “Ao contrário, em geral há muita pompa na inauguração das obras de saneamento e

insuficiente avaliação dos resultados ao longo das correspondentes vidas úteis” (Artigo

“Caminhos para privatização” – Jornal O Globo Online).

(6) “É, por certo, a maior parceria público-privado (PPP) que o Estado poderia contratar:

dando condições para a prosperidade das famílias, para as pessoas que estudam à noite, que

procuram um trabalho extra, que empreendem um pequeno negócio” (Artigo “Reunião de

cúpula” – Jornal O Globo Online).

Os advérbios e as locuções adverbiais têm sido largamente estudados sob distintas

abordagens teóricas e vieses metodológicos nos últimos anos. Martelotta (2012) postula que a

categoria dos advérbios engloba elementos muito heterogêneos que, por isso, precisam ser

investigados de forma separada. As pesquisas já desenvolvidas sobre a classe apresentam

comumente um caráter (sócio) funcionalista e buscam as motivações para a ordenação

sintática dos adverbiais temporais, locativos, aspectuais, qualitativos ou modalizadores por

meio de variáveis estruturais, sociais e pragmáticas, observando distintos gêneros textuais e

diferentes sincronias do português brasileiro e europeu (cf. PAIVA, 2008; 2015; PEZATTI,

2014; COSTA NUNES, 2014; ILOGTI DE SÁ, 2015; CEZARIO et al. [no prelo]).

Outras pesquisas, de cunho discursivo-textual, trabalham o papel dos advérbios e das

locuções adverbiais na coconstrução de sentidos em textos de diferentes gêneros, tipologias e

suportes textuais. Essa abordagem considera os advérbios e locuções adverbiais de tempo,

locativos e modalizadores associados a outros elementos linguísticos que colaboram para

processos sociocognitivos, como a referenciação e a sequenciação (cf. KOCH, 2003b;

CAVALCANTE, 2011; KOCH; ELIAS, [2006] 2014; [2009] 2015). Estudos sobre a

modalização do discurso também assumem o importante papel da classe dos advérbios (cf.

FIORIN, 2002; CABRAL, 2010; KOCH, [1984] 2011).

Ainda são escassas, contudo, as investigações sobre os advérbios e as locuções em

interface com o ensino, sobretudo aquelas que focalizem exclusivamente a classe ou um

grupo específico. Os trabalhos já existentes apresentam caráter mais generalista, focando as

classes de palavras de maneira mais ampla (cf. DIAS, 2005; PINILLA, [2007] 2011;

MORAES PINTO; ALONSO, 2012). Alguns estudos, à luz de uma abordagem discursivo-

textual, porém, já apresentam algumas sugestões de atividades e/ou reflexões sobre ensino

18

que incluam, de alguma forma, essa classe (cf. SANTOS; CUBA RICHE; TEIXEIRA, 2012;

KOCH; ELIAS, [2006] 2014; 2016; SANTOS, 2016).

Por isso, a elaboração desta Dissertação englobou diferentes etapas em relação aos

adverbiais modalizadores nos três polos desenvolvidos: análise do uso em artigos de opinião,

análise do ensino em livros didáticos de Ensino Médio e elaboração das propostas de

atividades. Como desenvolvemos uma pesquisa de iniciação científica sobre a posição das

locuções adverbiais de tempo em cartas dos séculos XVI, XVII e XIX e o trabalho está

inserido num projeto mais amplo sobre a ordenação de adverbiais em língua portuguesa,

optamos por manter o enfoque do trabalho nessa classe de palavras. No entanto, devido aos

muitos estudos já desenvolvidos sobre adverbiais temporais na literatura e a necessidade de se

estudar outro grupo desta classe tão heterogênea, optamos por estudar os adverbiais

modalizadores.

Ao longo da elaboração do anteprojeto de mestrado, analisamos o uso dos advérbios

modalizadores em -mente, pois alguns estudos separam os adverbiais em três grupos: em -

mente, advérbios simples e locuções adverbiais. Contudo, posteriormente, revisamos mais

textos da literatura e percebemos que outros trabalhos os agrupavam em conjunto nas suas

análises. Por isso, resolvemos analisar todos os adverbiais modalizadores, mas buscamos

observar se haveria alguma diferença em seus usos de acordo com sua estrutura.

Os estudos desenvolvidos no mesmo projeto a que esta Dissertação se vincula buscam,

em geral, relacionar os elementos gramaticais analisados com o gênero em que eles estão

sendo analisados. Esses trabalhos, embora não sejam sobre análise de gêneros, relacionam os

usos dos adverbiais com as características dos textos em relação às tipologias predominantes,

à sua constituição ou à sua circulação. Por isso, buscamos quais gêneros poderiam ser

observados para análise dos modalizadores. Após o processo de revisão da literatura,

verificamos que esses elementos são articuladores argumentativos e que seria válido observar

seu uso em um gênero mais ligado à argumentação, optamos, por isso, pelos artigos de

opinião.

A partir da identificação da ausência de trabalhos sobre ensino dos adverbiais

modalizadores presente nos estudos linguísticos contemporâneos, esta Dissertação tem como

objetivo geral estabelecer estratégias para preencher essa lacuna. Destacamos que temos como

objetivo estudar os advérbios, os advérbios em -mente e as locuções adverbiais e, por isso,

utilizamos a nomenclatura adverbiais, conforme Oliveira e Cezario (2012).

Observaremos o uso dos adverbiais modalizadores em artigos de opinião e sua

19

abordagem em livros didáticos de Ensino Médio aprovados pelo Programa Nacional do Livro

Didático de Ensino Médio (PNLD) de 2015. Além disso, elaboraremos propostas de

atividades que reflitam nossos resultados. A amostra do trabalho é composta por 60 artigos de

opinião dos jornais O Globo Online e O Dia Online e por 12 livros didáticos pertencentes a 4

coleções aprovadas pelo PNLD e selecionadas aleatoriamente. Assim, buscamos responder

aos seguintes problemas de pesquisa: (1) como ocorre o uso dos adverbiais modalizadores em

artigos de opinião publicados em jornais? (2) como os livros didáticos tratam do tema? Além

disso, buscamos contribuir para a seguinte questão: quais sugestões de atividades podem ser

elaboradas para o tratamento dos adverbiais modalizadores em perspectiva funcional e

textual?

Adotamos, como concepção teórica, uma associação entre o funcionalismo norte-

americano e Linguística do Texto (LT) por essas correntes teóricas investigarem as situações

efetivas de uso, considerando aspectos relacionados ao contexto comunicativo, à interação e à

sociocognição. A adoção dessas teorias demonstra ainda mais relevância ao retomarmos as

preconizações das diretrizes oficiais de língua portuguesa: Parâmetros Curriculares Nacionais

de Língua Portuguesa (PCN), Parâmetros Curriculares Nacionais para Ensino Médio

(PCNEM), Orientações Curriculares Nacionais para Ensino Médio (OCEM) e os Parâmetros

Curriculares + (PCN +).

Em relação ao uso dos modalizadores, observaremos cinco aspectos: (a) posição (b)

estrutura do adverbial; (c) articulação textual (KOCH, 2003b), (d) subjetividade

(TRAUGOTT; DASHER, 2002) e (e) jornal em que ele se insere. A escolha desses fatores é

justificada pela análise do modalizador quanto à sua forma (ordenação; estrutura) e sua função

(articulação textual; subjetividade; jornal) no discurso. Para testar esses aspectos, formulamos

as seguintes hipóteses:

(I) os adverbiais modalizadores apresentarão diferentes tendências de posicionamento

diante de sua estrutura (advérbio, advérbio em -mente ou locução) (cf. MORAES PINTO,

2008; GONÇALVES1, 2015; 2016; CEZARIO, et al, [no prelo]);

(II) os adverbiais modalizadores, como articuladores textuais, terão efeitos de sentido

mais subjetivos;

Em relação aos livros didáticos, nossa abordagem também enfoca os efeitos de

sentido, além de aspectos relacionados à produção textual. Formulamos as seguintes

hipóteses:

1 . Trabalho orientado pela Professora Doutora Deise Cristina de Moraes Pinto.

20

(III) os adverbiais modalizadores serão mais abordados em capítulos/ atividades que

enfoquem gêneros com tipologia predominantemente argumentativa, tais como editoriais e

artigos de opinião, tendo em vista o papel de articulador textual argumentativo (CAMPOS;

TORQUATO, 2013) desses elementos;

(IV) os adverbiais modalizadores serão explorados, sobretudo, a partir de seus efeitos

de sentido e de seus papéis funcionais partindo de exemplos reais de uso.

Para que possamos apresentar nossa investigação: no primeiro capítulo da Dissertação,

abordaremos em que medida os estudos funcionalistas podem ser relacionados com o ensino

de língua portuguesa a partir dos pressupostos teóricos do funcionalismo norte-americano.

Retomaremos aspectos teóricos como iconicidade, marcação e subjetividade e,

posteriormente, exploraremos a relação funcionalismo e ensino.

No segundo capítulo, buscaremos refazer os rumos da LT nas últimas décadas,

destacando sua relação com o ensino e com as diretrizes oficiais para ensino fundamental e

médio. Defenderemos que, no ensino, os efeitos de sentido devem ser enfocados a partir das

relações que ocorrem no texto, ressaltando o papel do uso linguístico na sala de aula.

Destacaremos o caráter sociocognitivo e interacional de nossa abordagem, demonstrando que

o texto deve ser tratado como unidade de ensino e não como pretexto, além de discutirmos

aspectos relacionados à articulação textual.

No terceiro capítulo, retomaremos os estudos já efetuados sobre aspectos relacionados

aos estudos de modalização, adotando, primeiramente, um caráter mais geral, em que

procuraremos definir e problematizar o conceito de modalização e demonstrar alguns

elementos que podem constituir estratégias modalizadoras. Na segunda parte do capítulo,

destacaremos os estudos teóricos já desenvolvidos sobre os adverbiais modalizadores. Por

fim, retomaremos as investigações sobre os adverbiais modalizadores em interface com o

ensino.

No quarto capítulo, explicitaremos as etapas da metodologia do nosso trabalho,

justificando a escolha do corpus, explicando as opções efetuadas por nós ao longo das etapas

de pesquisa e ressaltando a relevância das análises qualitativas e quantitativas efetuadas.

No quinto capítulo, traremos a análise da dissertação. Discutiremos qualitativa e

quantitativamente o uso dos modalizadores nos artigos de opinião a partir de algumas de suas

propriedades. Logo após, discutiremos a abordagem dos livros didáticos quanto aos efeitos de

sentido dos advérbios modalizadores e o tratamento do papel dos adverbiais modalizadores

como construtores de textos argumentativos.

21

No sexto capítulo, apresentaremos atividades que estejam relacionadas aos resultados

de nossas análises. Ou seja, propostas que reflitam, de alguma forma, nossos resultados e

preencham algumas lacunas atestadas nos livros didáticos de Ensino Médio sobre os

adverbiais modalizadores em perspectiva reflexiva. Essas atividades enfocarão os efeitos de

sentido, destacando relações textuais presentes nos usos desses elementos.

Nas “Considerações finais”, retomaremos brevemente os resultados e as propostas

relacionadas aos adverbiais modalizadores, ressaltando a importância do trabalho para os

estudos linguísticos teóricos e relacionados ao ensino, principalmente os que estudam a língua

em seu uso efetivo.

Esta Dissertação, portanto, pretende observar (1) como os adverbiais modalizadores

são utilizados a partir de uma amostra composta por artigos opinativos e (2) como são

abordados em materiais didáticos, adotando como opção metodológica uma abordagem

panorâmica para, ao fim, observar quais estratégias podem ser adotadas para seu ensino em

perspectiva funcional e textual. Dessa forma, objetivamos estabelecer contribuições teóricas e

pedagógicas sobre essa temática.

22

1. FUNCIONALISMO: ASPECTOS TEÓRICOS E REFLEXÕES SOBRE ENSINO

1.1. Linguística Funcional: panorama teórico

Segundo Martelotta (2006), a noção de função passa a ser utilizada a partir do

questionamento de que as línguas não podem ser analisadas considerando apenas seus

elementos internos, já que o principal objetivo de seu uso é estabelecer a comunicação em

sociedade. No cenário linguístico pós-saussureano, os cientistas do Círculo Linguístico de

Praga foram alguns dos primeiros a assumirem essa perspectiva, admitindo que a língua

apresenta determinado fim.

Neves (1997) aponta que adotar uma visão funcionalista implica considerar a

linguagem como entidade não suficiente em si. É preciso adotar uma simbiótica inter-relação

entre discurso e gramática, admitindo a estrutura linguística como maleável às pressões

comunicativas e dependente do uso em contextos reais. Assim, o discurso é processado

cognitivamente pelos padrões da gramática e a gramática é moldada pelo discurso a partir das

necessidades comunicativas.

Na visão funcionalista, a língua é um instrumento de interação social proveniente do

uso, existindo, portanto, para um determinado propósito comunicativo. A comunicação existe

não apenas para transmitir/ receber uma informação, mas para que determinados objetivos do

falante/ouvinte sejam cumpridos. Caso queira, por exemplo, convencer o interlocutor de algo,

o falante usará estratégias linguístico-discursivas específicas para que isso ocorra.

Para o funcionalismo, então, a linguagem não é um fenômeno isolado, servindo, na

verdade, a variadas intenções. Assim, é importante, numa análise funcional, considerar os

usos na interação verbal, englobando o componente pragmático a questões sintáticas,

morfológicas, fonológicas e/ou semânticas. A compreensão das ocorrências linguísticas só é

possível a partir de suas funções dentro dos contextos em que estão inseridas.

Neves (1997) aponta que a Linguística apresenta dois paradigmas em sua abordagem:

formalismo e funcionalismo. O primeiro, bastante associado aos estudos da gramática

gerativa, considera a língua como um objeto formal abstrato, que tem como principal objetivo

a expressão de pensamentos. O foco da Linguística, sob esse prisma, é o estudo da

competência em detrimento do desempenho, isto é, do uso.

Já o “polo funcionalista” engloba as investigações que consideram o uso como centro

de seus estudos, levando em consideração a variação linguística e os contextos reais de

23

comunicação. Esse modelo coloca a função das formas com um papel predominante em sua

análise. Diversas linhas de pesquisa enquadram-se nessa perspectiva, como a sociolinguística

laboviana, a Análise do Discurso e as abordagens que adotamos em nossa Dissertação:

funcionalismo norte-americano e LT.

Adotar uma abordagem funcional implica considerar uma constante relação entre

fonologia, morfologia, sintaxe, semântica e pragmática. O funcionalismo opõe-se, assim, à

perspectiva modular do gerativismo, em que componentes cognitivos de análise, embora em

interação dinâmica, estão organizados separadamente. As prioridades, para o “polo

formalista”, vão da sintaxe à pragmática, constituindo caminho oposto às abordagens

funcionais, em que o estudo da semântica e da sintaxe ocorre por meio da pragmática.

Assumimos, ainda, que, conforme Beaugrande (apud Neves, 1997), uma gramática

funcional engloba especificações funcionais ricas, empenhando-se em acomodá-las de forma

que a “descrição gramatical” do discurso contenha dados para auxiliar uma caracterização

semântica, pragmática e estilística. Assim, o sentido das ocorrências linguísticas não é

independente ou isolado da situação comunicativa, estando, na verdade, relacionado aos seus

contextos de uso (cf. GIVÓN, 1995).

Além disso, para o funcionalismo,

(...) a linguagem não constitui um conhecimento específico, como propõem os

gerativistas, mas um conjunto complexo de atividades comunicativas, sociais e

cognitivas integradas ao resto da psicologia humana. Assim, a visão funcionalista de

cognição assume que a linguagem reflete processos gerais de pensamento que os

indivíduos elaboram ao criarem significados, adaptando-os a diferentes situações de

interação com outros indivíduos. Ou seja, os conceitos humanos associam-se à

época, à cultura e até mesmo a inclinações individuais caracterizadas no uso da

linguagem (FURTADO DA CUNHA, 2008, p. 158).

O funcionalismo adota uma abordagem sociocognitivista para explicar a aquisição da

linguagem. Nessa perspectiva, há uma junção das bases social, interacional e cognitiva na

atuação do processo de aquisição de línguas. Para o sociocognitivismo, esse processo começa

a ocorrer diante da percepção das crianças, a partir dos nove meses de idade, em relação ao

outro como agente intencional. A aquisição, sob essa ótica, engloba transmissões culturais

fruto de uma evolução unicamente característica da espécie humana (cf. TOMASELLO,

2003).

Quanto à mudança linguística, o funcionalismo, de uma forma geral, tem dedicado

seus estudos ao processo de gramaticalização. Essas investigações têm explicado de que

24

maneira, a partir de uma trajetória unidirecional, formas lexicais tornam-se gramaticais ou

formas gramaticais tornam-se ainda mais gramaticais. A partir da metáfora espaço > tempo >

texto, são explicadas mudanças categoriais, como a passagem do item “mente” de substantivo

a sufixo (cf. MARTELOTTA; CEZARIO, 2011).

Estudos mais recentes, à luz de uma abordagem funcional construcionista, têm trazido

aspectos mais cognitivistas às investigações sobre mudança linguística. Traugott e Trousdale

(2013) postulam que novas formas podem ser instanciadas a partir de dois processos de

mudança: construcionalização e mudanças construcionais. O primeiro consiste em novos

pareamentos forma-função ao longo da história da língua e o segundo representa mudança em

apenas um dos aspectos: forma ou função. As investigações à luz dessa abordagem são

caracterizadas pela acepção de que a língua é formada por uma rede de construções

linguísticas, que são pareamentos simbólicos de forma e função. Essa abordagem explica

tanto como a formação de uma construção como, por exemplo, “a gente”, “Maria vai com as

outras”, como construções mais esquemáticas, como “[Dar uma X-da] (dar uma lida, dar uma

varrida) ou [Xmente] (como infelizmente).

Rosario (2015) aponta, ainda, que os principais interesses dos pesquisadores

funcionalistas são: variação e mudança; gramaticalização e construcionalização; estrutura

argumental e transitividade; universais e tipologia; codificação de cláusulas; motivações

competidoras; elementos organizadores do texto e suas respectivas relações com o ensino.

Para isso, o analista pode pesquisar os fenômenos linguísticos a partir de aspectos sociais,

pragmáticos e formais, que incluem perfil sociocultural do usuário, tipo e gênero textual,

modalidade, pressuposições, inferências e marcas de expectativa.

1.2. Funcionalismo norte-americano

Segundo Martelotta e Kenedy ([2003] 2015), o termo “funcionalismo” ganhou força

nos Estados Unidos a partir da década de 1970 por meio dos estudos de Sandra Thompson,

Paul Hopper e Talmy Givón. Esses pesquisadores postulam que a língua deve ser estudada a

partir de seu contexto linguístico e extralinguístico. Para investigar a sintaxe, por exemplo, é

preciso observar os aspectos pragmáticos relacionados ao fenômeno investigado. O estudo do

discurso, nessa visão, é prioritário, tendo em vista que é nele que a gramática emerge.

Em seus pressupostos clássicos, o funcionalismo norte-americano relaciona

constantemente esses planos de análise por meio dos estudos de transitividade, marcação,

25

planos discursivos, iconicidade, informatividade e gramaticalização (cf. FURTADO DA

CUNHA; COSTA; CEZARIO, [2003] 2015). O enfoque de cada estudo é determinado por

seus objetivos específicos. Nesse trabalho também adotamos uma associação dos planos

semântico, sintático e pragmático na análise dos adverbiais modalizadores.

Barlow e Kemmer (2000) apontam, ainda, que o funcionalismo linguístico é uma

abordagem teórica que congrega grupos de fatores de distintas ordens em sua análise. Assim,

aspectos sociais, históricos, cognitivos e interacionais são influenciadores efetivos da forma

como a informação é codificada. Os autores ressaltam, ainda, o importante papel da

observação da frequência de uso, proposta que adotamos nessa investigação. Por meio dela,

serão instanciadas novas formas na língua a partir de processos como a gramaticalização.

1.2.1. Iconicidade e marcação

Segundo Givón (1995), a linguagem seria uma atividade sociocultural que se estrutura

de forma icônica com função cognitiva ou comunicativa, e possuiria semântica ligada ao

contexto de uso. O autor aponta, assim, para o postulado que a língua é estruturada de forma

motivada e não arbitrária. Tido como a correlação natural entre código linguístico e função, o

princípio da iconicidade está relacionado à noção de que as línguas, de alguma forma,

refletem o pensamento. Há três subprincípios relacionados à iconicidade, segundo Givón

(1990):

(a) subprincípio da quantidade, que está ligado ao estatuto informacional do referente,

havendo uma tendência de informações novas serem introduzidas no discurso com uma maior

quantidade de material linguístico. Já as informações previamente conhecidas dos

interlocutores seriam introduzidas por uma estrutura menor.

(b) subprincípio da integração, o qual prevê que a proximidade cognitiva está ligada à

codificação sintática, ou seja, o que é próximo mentalmente também o será estruturalmente;

(c) subprincípio da ordenação linear, que aponta para a relação entre a ordem dos eventos e

sua ocorrência cronológica, isto é, o que acontece primeiro virá antes estruturalmente. Além

disso, as informações mais relevantes tendem a ocorrer anteriormente, demonstrando a

relação entre a posição da estrutura linguística e a importância do que está sendo veiculado.

Relacionado ao princípio da iconicidade, está o princípio da marcação. Segundo Givón

(1990), esse princípio está ligado a três critérios que marcam, binariamente, estruturas

marcadas e não marcadas na língua:

26

(i) complexidade estrutural – categorias marcadas tendem a ser mais complexas, ou maiores

formalmente, que suas categorias não marcadas correspondentes;

(ii) distribuição da frequência – categorias marcadas tendem a ser menos frequentes na língua

suas categorias marcadas correspondentes;

(iii) complexidade cognitiva – categorias marcadas tendem a ser mais complexas

cognitivamente do que suas estruturas não marcadas correspondentes devido a motivações

ligadas ao esforço mental, à demanda de atenção e ao tempo de processamento.2

Givón (1995), contudo, indica que determinadas categorias podem ser marcadas em

alguns contextos e não marcadas em outros. Ou seja, não é possível analisar a marcação

apenas por aspectos estritamente linguísticos. É necessário observar o gênero textual, a

modalidade da língua e outros aspectos envolvidos no contexto linguístico e extralinguístico.

O autor aponta, ainda, que a marcação não está ligada apenas às estruturas linguísticas, mas

também à distinção entre discurso formal e conversação espontânea.

1.2.2. A subjetividade na linguagem

Alguns estudos funcionalistas recentes, sobretudo os de Elizabeth Traugott, têm

enfocado num aspecto da linguagem humana: a subjetividade. Traugott e Dasher (2002)

apontam que a subjetividade só passou a ser um tópico importante para a comunidade

científica internacional a partir dos postulados de Benveniste (1976). Segundo o autor, a

linguagem só pode ser tratada como tal caso seja marcada por profundas marcas de

subjetividade. Traugott e Dasher (2002) também o retomam para definir discurso e debater o

conceito de intersubjetividade. De acordo com Benveniste (1976), o discurso é a língua à

medida que esta é assumida pelo falante diante do estabelecimento de intersubjetividade,

condição para existência da comunicação.

Para Traugott e Dasher (2002), na dinâmica da produção oral ou escrita, os recursos

linguísticos podem ser usados de diversas maneiras para expressão da subjetividade. Segundo

os autores, há produtores mais ou menos conscientes das marcas utilizadas: produtores mais

criativos tenderiam a saber usá-las de forma mais cuidadosa do que os demais. As escolhas

lexicais estariam ligadas à natureza do registro e seu grau de monitoramento. Assim, a escrita

acadêmica, por exemplo, seria mais marcada por traços objetivos. Em ambos os casos,

2 . Furtado da Cunha, Costa e Cezario ([2003] 2015) ressaltam que os critérios de marcação costumam

coincidir nas línguas em geral devido à iconicidade.

27

contudo, as estratégias usadas são provenientes da intenção do produtor e da forma como essa

intencionalidade é codificada.

Segundo Traugott e Dasher (2002), a subjetividade envolve um sujeito que desenvolve

uma visão subjetiva dos fatos, representando-a no discurso. Os autores opõem subjetividade à

objetividade, destacando que o ponto de vista objetivo ocorre quando o falante tenta se

posicionar de forma imparcial, descrevendo os fatos como eles ocorreram efetivamente no

universo biossocial.

É evidente, contudo, que não há objetividade completa na linguagem, pois sempre há

algum grau de subjetividade, por mais o falante/escritor tente escondê-lo em sua produção por

meio de algumas estratégias linguístico-discursivas. Sua expressão ocorre para determinados

fins comunicativos e é expressa por sujeitos com intuito de convencimento e persuasão, o que

configura inquestionável subjetividade (cf. GUIMARÃES, 2009). Cabe a estudos como o

nosso a identificação das marcas que indicam, de alguma forma, o posicionamento do sujeito

em relação ao que está sendo enunciado.

Traugott e Dasher (2002) também adotam essa perspectiva, apontando para a

necessidade de estabelecimento de um continuum entre formas subjetivas e objetivas,

proposta que adaptamos neste trabalho (cf. Introdução). Há, segundo os autores, marcas

específicas de cada um dos pontos. São caracterizadas como expressões dotadas de maior

subjetividade aquelas com: (i) dêixis espacial e temporal explícitas; (ii) marcadores explícitos

da atitude do sujeito em relação à proposição; (iii) marcadores explícitos da atitude do falante/

escritor em relação à estrutura do discurso.

Traugott e Dasher (2002) apontam, ainda, que as escolhas dos falantes/ escritores

dentro desse continuum podem estar relacionadas aos papéis sociais exercidos por eles. Nas

sociedades americana e europeia, por exemplo, figuras que ocupam posições de autoridade

costumam ter um discurso mais marcado pela objetividade, ao passo que pessoas com menor

poder, ou que querem demonstrar menos sua posição superior, tendem a usar uma linguagem

mais subjetiva. Em outras sociedades, porém, essa tendência pode não se confirmar, o que

reitera o caráter pragmático e sociocognitivista da subjetividade.

Traugott (2010) retoma os postulados de Benveniste (1976) para destacar que os

conceitos de subjetividade e intersubjetividade são provenientes de uma abordagem

sincrônica. A autora destaca que essas noções só podem ser entendidas do ponto de vista da

interação verbal e de seus procedimentos de percepção/produção do discurso. Sob essa ótica,

Oliveira, Dias e Wilson (2013) apontam que a subjetividade é um mecanismo bastante

28

apoiado no contexto discursivo-pragmático, além de ser fruto da negociação de sentidos que

ocorre entre os interlocutores devido às necessidades comunicativas decorrentes de

específicas demandas situacionais.

1.3. Funcionalismo e outras correntes da linguística contemporânea

A partir do que apresentamos acerca de alguns postulados do funcionalismo norte-

americano, podemos perceber que essa corrente engloba pressupostos teóricos amplos e

diversificados, configurando um ambiente propício para interfaces teóricas. A Linguística

Funcional pode apresentar inter-relação com diversas teorias, dentre elas a sociolinguística

laboviana, a Linguística Cognitiva (LC) e a Linguística do Texto. Muitos trabalhos têm sido

desenvolvidos no Brasil e no exterior a partir, sobretudo, da associação entre funcionalismo e

LC na linha atualmente denominada cognitivo-funcional ou Linguística Centrada no Uso

(LCU) (cf. CEZARIO; FURTADO DA CUNHA, 2013; OLIVEIRA; ROSARIO, 2015) e do

sociofuncionalismo, associação entre a sociolinguística variacionista e o funcionalismo (cf.

TAVARES; GÖRSKY; 2015; CEZARIO; MARQUES; ABRAÇADO, 2016).

Por associarmos funcionalismo e LT, destacamos o estudo de Neves (2004), que

estabelece a “ponte” entre a linguística funcionalista e a LT por meio de processo

sociocognitivo de ativação e reativação dos objetos de discurso: a referenciação. A autora

ressalta que ambas as teorias englobam perspectivas bastante semelhantes: basear-se no uso a

partir de situações comunicativas reais por meio de uma abordagem interacional e

sociocognitiva.

Para Neves (2004), há uma confluência entre os estudos em LT e as investigações

funcionalistas. A autora aponta que os fatos linguísticos instáveis são os que interessam

sobretudo aos estudiosos do texto e do discurso. A observação da influência do contexto para

os usos e para construção dos sentidos é prioritária para esses pesquisadores. Neves ([2006]

2013) também ressalta essa interface teórica, postulando que é um caminho natural associar

funcionalismo e LT na análise de fenômenos linguísticos que estejam ligados, de alguma

forma, ao processamento de enunciados.

Cezario (2012), embora não use em seus pressupostos teóricos a LT, buscar relacionar,

de alguma forma, os estudos funcionalistas ao surgimento de novos gêneros e suportes

textuais diante do advento da internet. Além disso, apoiando-se em Marcuschi (2008), a

autora ressalta a importância de questões cognitivas, como a criatividade humana e o caráter

29

metafórico da linguagem, para o estudo das relações textuais, destacando as vinculações que

ocorrem no uso de tipologias textuais e de algumas estratégias anafóricas e dêiticas.

1.4. Funcionalismo e ensino

Apesar dos constantes estudos que ressaltam os pressupostos teóricos do

funcionalismo, ainda são bastante escassas as investigações que tentem relacionar a teoria

funcionalista, independentemente do plano de análise, ao ensino de línguas. O funcionalismo,

no entanto, pode proporcionar grandes contribuições para a prática docente. Muitos de seus

postulados, inclusive, estão inseridos nas diretrizes oficiais para ensino fundamental e médio.

Furtado da Cunha e Tavares (2007) apontam que a maior contribuição que o

funcionalismo linguístico pode proporcionar à prática de sala de aula é o trabalho com o

contexto. Ao não estudar o uso de forma isolada, considerando suas condições de produção e

o contexto propriamente linguístico, o funcionalismo passa a ser um forte instrumento teórico

para as pesquisas que visam a uma interface com o ensino e para o professor que está em sala

de aula no ensino básico.

Como uma de suas grandes características é a investigação do uso a partir de fatores

intralinguísticos e extralinguísticos, é possível que o aluno perceba, por meio do auxílio do

professor, que as ocorrências linguísticas não são arbitrárias. A motivação para o uso de

determinadas estratégias sintáticas, semânticas ou morfológicas está diretamente ligada aos

propósitos comunicativos do falante, destacando, como atestam os PCNEM, “a natureza

social e interativa da linguagem, em contraposição às concepções tradicionais, deslocadas do

uso social” (BRASIL, 2000, p. 18). A abordagem eminentemente pragmática do

funcionalismo o coloca, assim, como uma teoria central para o ensino de língua portuguesa.

Oliveira e Cezario (2007) estabelecem uma detalhada análise dos PCN, identificando

seu forte caráter funcionalista. As autoras relacionam o documento especificamente aos

pressupostos do funcionalismo norte-americano, ressaltando o princípio da iconicidade, o

estudo dos planos discursivos e o processo de gramaticalização do item. Oliveira e Cezario

(2007) apontam, ainda, para a necessidade de relacionar outros tópicos de investigação

funcional ao ensino de português.

Além disso, ressaltam

que um dos maiores desafios hoje colocados para professores e pesquisadores, no

sentido, inclusive, de complementar a proposta dos PCN, é o refinamento da

30

metodologia, da busca de alternativas de como lidar ou tratar as desafiantes questões

hoje colocadas para o magistério e para a universidade brasileira (OLIVEIRA;

CEZARIO, 2007, p. 106).

Isto é, academicamente devemos repensar quais estratégias metodológicas podem ser

usadas pelo professor em sala de aula para seguir as diretrizes oficiais associadas a teorias da

linguística contemporânea. Não basta, assim, nos atermos ao que postulam os documentos

oficiais, tendo em vista o caráter naturalmente generalista de suas sugestões. É evidente,

ainda, que não há como formular propostas para todos os fenômenos linguísticos e reunir em

uma só publicação. Esse processo é lento e implica um trabalho coletivo e atualizado por

meio da associação de distintas abordagens teóricas.

Oliveira e Wilson ([2003] 2015), ainda em análise dos PCN, ressaltam que os manuais

postulam que, para ensinar língua, é preciso observar suas estruturas mais regulares a partir de

uma abordagem discursiva. Estudar a língua portuguesa num continuum, observando a

instabilidade da gramática e reconhecendo sua diversidade compreende também adotar uma

abordagem funcionalista em sala de aula.

As autoras apontam, porém, que é preciso ter como enfoque o texto, assumindo a

necessidade de buscar alternativas nos usos de estratégias linguísticas e nas formas de

organização textual para que sejam empregados os efeitos discursivos desejados. Assim, tal

como propõe o funcionalismo, ao “dizer de outra forma”, outros sentidos são ativados devido

ao caráter pragmático da língua.

Os PCN estabelecem eixos em que o ensino de língua portuguesa deve se pautar,

constituindo três práticas de linguagem, a saber: leitura, produção textual e análise linguística.

Embora seja evidente que o funcionalismo auxilie em propostas de ensino de leitura e

produção de textos orais, escritos e multimodais, parece ser sua maior contribuição a “ponte”

entre fenômenos gramaticais e seu ensino reflexivo. Essa abordagem teórica pode estabelecer,

então, grandes relações com a denominada prática de análise linguística.

Além disso, segundo Bezerra e Reinaldo3 (2013), os eixos de leitura e produção

textual têm sido melhor abordados em sala de aula do que o de análise linguística, o que, para

as autoras, demonstra que as pesquisas acadêmicas não têm tido forte repercussão no ensino

de línguas. Mais investigações funcionalistas, então, precisam ter a preocupação da aplicação

do conteúdo por elas desenvolvido em contexto pedagógico.

Mendonça (2006) diferencia o ensino de gramática e a prática de análise linguística. O

3 . Ressaltamos que nem todos os autores relacionados à prática de análise linguística são funcionalistas,

mas foram utilizados por esclarecem pontos importantes para esse eixo do ensino.

31

primeiro, segundo a autora, está vinculado ao ensino tradicional, voltado para uma

metodologia transmissiva e eminentemente metalinguística. Nessa abordagem, a língua é tida

como uma estrutura inflexível e invariável, não havendo uma relação entre o trabalho com

itens linguísticos associado com as atividades de leitura e produção textual. Há, ainda, o

privilégio de exercícios estruturais de identificação, classificação e correção de unidades

morfossintáticas. O foco do ensino de gramática, então, não é o texto ou a reflexão linguística,

o que vai de encontro aos postulados das diretrizes oficiais para o ensino de língua

portuguesa.

Já a prática de análise linguística, segundo Mendonça (2006), apresenta uma visão

diferente do ensino tradicional de gramática. A língua, nessa visão, é “viva” e, portanto,

sujeita a variações e modificações constantes diante das necessidades comunicativas. O

estudo de componentes gramaticais é feito a partir do texto, abandonando seu uso como um

pretexto para “ensinar gramática”. O foco do ensino deixa de ser a metalinguagem e passa a

ser os efeitos de sentido no texto. Trabalhar com as relações textuais implica, também, adotar

o ensino centrado nos gêneros textuais ao contemplar “a interseção das condições de produção

textual e as escolhas linguísticas” (MENDONÇA, 2006, p. 207).

Assim,

se o objetivo é que o aluno aprenda a produzir e a interpretar textos, não é possível

tomar como unidade básica de ensino nem a letra, nem a sílaba, nem a palavra, nem

a frase que, descontextualizadas, pouco têm a ver com a competência discursiva, que

é questão central. Dentro desse marco, a unidade básica de ensino só pode ser o

texto, mas isso não significa que não se enfoquem palavras ou frases nas situações

didáticas específicas que o exijam (BRASIL, 1997, p. 29).

Para trabalhar a prática de análise linguística em sala de aula, o professor precisa

estabelecer uma constante relação com as práticas de leitura e produção de textos orais/

escritos/ multimodais. Além disso, os PCN + destacam que, para trabalhar a significação em

sala de aula, é preciso considerar a “propriedade do uso de recursos semânticos (relações de

oposição ou aproximação, gradação, campo semântico, atenuação, eufemismo, hipérbole,

ironia) na estratégia argumentativa do autor” (BRASIL, 2002, p. 83). Assim, como defendem

também os PCNEM, “o estudo da gramática passa a ser uma estratégia para

compreensão/interpretação/produção de textos” (BRASIL, 2000, p. 18).

As atividades desse eixo são caracterizadas pela reflexão a partir das diferentes

características da língua, sobretudo pela constante

32

formulação e verificação de hipóteses sobre o funcionamento da linguagem que se

realiza por meio da comparação de expressões, da experimentação de novos modos

de escrever, da atribuição de novos sentidos a formas lingüísticas já utilizadas, da

observação de regularidades (no que se refere tanto ao sistema de escrita quanto aos

aspectos ortográficos ou gramaticais) e da exploração de diferentes possibilidades de

transformação dos textos (supressões, ampliações, substituições, alterações de

ordem, etc.) (BRASIL, 1997, p. 53).

Segundo Geraldi ([1984] 2011), para trabalhar com elementos gramaticais em sala de

aula, é preciso partir do texto do aluno, pois o ensino só é funcional se for para auxiliar o

estudante. A partir da produção feita pelos alunos, o professor deve selecionar um problema

por aula e trabalhá-lo, incentivando a reescritura. Tal proposta ecoa nos PCN por meio da

sequência USO –> REFLEXÃO –> USO.

Para estabelecer reflexões sobre questões linguístico-discursivas, é preciso observar os

usos dos alunos por meio de seus textos. Após essas produções textuais, o professor pode

examinar seus usos (como formas variantes, estratégias argumentativas e elementos textuais)

e, consequentemente, “os conhecimentos anteriores (...) em relação ao que se pretende

ensinar, identificando até que ponto os conteúdos ensinados foram realmente aprendidos”

(BRASIL, 1997, p. 36), discutindo os conteúdos programáticos para que, então, sejam feitas

novas produções.

Bezerra e Reinaldo (2013) apontam que, para fazermos análise linguística no ensino

fundamental e médio, temos que conceber a língua como um fenômeno interativo e adotar a

indução como processo metodológico. É preciso trabalhar com dados heterogêneos,

observando seu uso no texto e, posteriormente, sistematizando sua análise. Para adotar esse

procedimento, é necessário partir do gênero textual para chegar às unidades linguísticas em

perspectiva interacionista. Nesta Dissertação, partimos do gênero artigo de opinião e do uso

de adverbiais modalizadores para estabelecer algumas sugestões de atividades. Bezerra e

Reinaldo (2013) acrescentam, a essa discussão, a relevância de um tratamento semântico-

pragmático para as operações linguísticas. É preciso enfocar texto e discurso considerando

também uma perspectiva enunciativa.

As OCEM também ressaltam a importância de trabalhar os elementos pragmáticos,

destacando seu papel na interação, no texto e nos gêneros textuais em que estão inseridos. A

partir das preconizações dos documentos, Oliveira, Dias e Wilson (2013), numa abordagem

funcionalista, reiteram que a língua não pode ser tratada como objeto autônomo, constituindo

tarefa prioritária a focalização de estratégias textuais de construção de sentido.

33

A Linguística Funcional, então, engloba diferentes planos de análise sob perspectiva

interacional e discursiva. Seus estudos, embora ainda não sejam muito relacionados ao ensino,

podem proporcionar grandes contributos para a prática pedagógica, o que já é atestado nas

diretrizes oficiais. Ao relacionar o funcionalismo com outras abordagens teóricas, grandes

ganhos podem ser efetuados e, por isso, esse caminho vem sendo seguido por diversos autores

brasileiros e estrangeiros. Nosso trabalho pretende contribuir para o ensino de língua

portuguesa em perspectiva funcionalista a partir da caracterização do uso dos adverbiais

modalizadores e como esse aspecto pode ser transferido para o ensino a partir, também, das

lacunas identificadas na análise de livros didáticos de ensino médio

Nesta Dissertação, como expusemos, utilizaremos o funcionalismo norte-americano,

observando alguns aspectos presentes nessa linha teórica: iconicidade, marcação e

subjetividade. Na análise do uso dos adverbiais modalizadores, observaremos quais as

tendências de ordenação desses elementos e seus graus de subjetividade. Nos livros didáticos

de Ensino Médio, analisaremos em que medida os manuais abordam os papéis funcionais dos

adverbiais modalizadores. Nas propostas de atividades, traremos algumas sugestões que

refletem seus usos e as lacunas presentes nos livros didáticos analisados.

34

2. LINGUÍSTICA DO TEXTO: QUESTÕES TEÓRICAS E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS

2.1. Primeiras fases e abordagem atual

Segundo Koch ([2004] 2015), em sua fase inicial, que durou até meados dos anos

1970, a Linguística do Texto (LT) tinha como objetivo estudar os mecanismos interfrásticos

que confeririam a um enunciado o status de texto. Nessa primeira fase, as investigações

priorizavam o estudo da correferencialidade, considerada um dos maiores fatores de coesão

textual. As relações anafóricas e catafóricas operantes entre os elementos textuais constituíam,

de forma geral, o limite das investigações da LT, bastante influenciadas por Halliday e Hasan.

Ainda nessa fase, alguns dos linguistas envolvidos com a LT, mas com formação

gerativista, tiveram como objetivo constituir gramáticas do texto. Isso ocorria, pois o texto era

tido apenas como uma unidade linguística superior à sentença. Essas gramáticas tinham como

principais tarefas: determinar os princípios de constituição do texto, os fatores de coerência e

as condições de textualidade; identificar critérios para delimitar os textos; diferenciar os

distintos textos.

Nessa época, segundo Koch ([2004] 2015), passou-se a postular a existência de uma

competência textual semelhante à competência linguística atrelada aos estudos formalistas de

Noam Chomsky. A justificativa encontrada era a capacidade que todo falante tem de

diferenciar um texto coerente de um enunciado incoerente. Essa competência, de cunho

linguístico, também estaria relacionada à capacidade humana de resumir um texto e avaliar se

sua constituição é completa ou incompleta, dentre outros aspectos.

Posteriormente, a LT passou pela denominada “virada pragmática”. Koch ([2004]

2015, p. 27) aponta que não tardou para que os estudiosos do texto buscassem ir além da

abordagem sintático-semântica.

A princípio timidamente, mas logo a seguir com maior vigor, a adoção da

perspectiva pragmática vai se impondo e conquistando proeminência nas pesquisas

sobre o texto: surgem as teorias de base comunicativa, nas quais ora apenas se

procura integrar sistematicamente fatores contextuais na descrição dos textos (...),

ora a pragmática era tomada com ponto de partida e de chegada para tal descrição.

O texto, a partir de então, passa a ser reconhecido como unidade básica da interação e

as investigações da LT focalizam o uso linguístico em situações comunicativas concretas.

Abandona-se, assim, a concepção de língua como sistema autônomo e a visão do texto como

35

um produto acabado em si. Para a LT, o texto é um instrumento das intenções comunicativas

de seus produtores, sendo considerado como parte constitutiva de uma atividade complexa.

De acordo com Koch ([2004] 2015), as mudanças nos rumos da LT foram fortemente

influenciadas pela Psicologia e pela Filosofia da Linguagem, especialmente a Psicologia da

Atividade de origem soviética e a Filosofia da Escola de Oxford, que desenvolveu a Teoria

dos Atos de Fala. A LT passa a ter, como uma de suas grandes tarefas, a transferência da

abordagem teórico-metodológica dessas abordagens para um viés textual, provando que o

texto também pode ser tido como uma ação verbal. Essa passagem foi problematizada por

diversos pesquisadores, como Wunderlich, Schmidt, Moscht e Van Dijk. Também foram eles

alguns dos grandes responsáveis pelos estudos da LT em sua segunda fase.

Marcuschi ([1984] 2012) e Koch ([2004] 2015) ressaltam que, diante das novas

acepções da LT, houve uma mudança também nos conceitos alicerçados nos estudos do texto.

A coerência deixa de ser considerada apenas a partir de aspectos sintáticos e semânticos,

sendo englobadas questões pragmáticas e contextuais à sua análise. É, nesse cenário, segundo

a autora, que os postulados de Charolles sobre a coerência textual também se modificam: a

visão de que há enunciados incoerentes é superada diante da possibilidade de construção de

contextos de interação em que essa incoerência seria desfeita.

A LT passa por uma nova mudança em seus estudos a partir da década de 1980. A

“virada cognitivista” ocorre “a partir da tomada de consciência de que todo fazer (ação) é

necessariamente acompanhado de processos de ordem cognitiva, de que quem age precisa

dispor de modelos mentais de operações e tipos de operação” (KOCH, [2004] 2015, p. 34).

Diante dessa nova fase, o conceito de texto mais uma vez se modifica, passando a ser tido

como fruto de processos mentais.

A comunicação começa a ser considerada a partir dos conhecimentos prévios dos

participantes da interação. Cada indivíduo já traz em sua cognição determinadas informações

que precisam ser ativadas para que haja o sucesso do ato comunicativo. Além disso, cada um

apresenta determinadas expectativas ao se comunicar e faz uma seleção das estratégias que

adotará para que seus objetivos sejam cumpridos.

A LT, então, começa a ser vista como uma abordagem que tem como objetivo o

desenvolvimento de modelos procedurais que sejam capazes de englobar processos cognitivos

que permitam a integração dos sistemas de conhecimento dos participantes da interação.

Cabe, também, à LT, a descrição e a atualização dos processos envolvidos na compreensão e

na produção textual. Nessa visão, o texto passa a ser originado pelas operações cognitivas

36

interligadas multiplamente (BEAUGRANDE; DRESSLER apud KOCH, [2004] 2015, p. 34).

Uma das grandes características das ciências cognitivas clássicas é a separação entre

exterioridade e interioridade, dissociando aspectos mentais e sociais. A LT, contudo, assume a

cognição correlacionada a questões socioculturais, opondo-se a perspectivas formalistas e

enquadrando-se nas abordagens baseados no uso. Essa visão está vinculada também ao

conceito de contexto.

Na primeira fase da LT, o contexto estava relacionado ao cotexto, ou seja, aos

segmentos textuais linguisticamente anteriores e posteriores ao fenômeno estudado.

Posteriormente, com a “virada pragmática”, o contexto passou a englobar a situação

comunicativa e seu entorno social, histórico e cultural. Após a “virada cognitivista”, ele passa

a ser constitutivo da interação, sendo também construído, inclusive, nela própria. Pauliukonis

([2007] 2011) ressalta que, para trabalhar o contexto em sua acepção mais ampla é preciso

informar-se sobre as condições de produção de um texto, reconhecer sua autoria e recuperar

suas intenções comunicativas por meio das operações linguístico-discursivas por ele

efetuadas.

Além disso, para Koch ([2004] 2015, p. 43),

as abordagens interacionistas consideram a linguagem uma ação compartilhada que

percorre um duplo percurso na relação sujeito/realidade e exerce dupla função em

relação ao desenvolvimento cognitivo: intercognitivo (sujeito/mundo) e

intracognitivo (linguagem e outros processos cognitivos). Cognição, aqui, define-se

como um conjunto de várias formas de conhecimento, não totalizado por linguagem,

mas de sua responsabilidade: os processos cognitivos, dependentes, como

linguagem, da significação, não são tomados como comportamentos previsíveis ou

aprioristicamente concebidos, à margem das rotinas significativas da vida em

sociedade.

Atualmente, a LT caracteriza-se, por uma abordagem sociocognitiva e interacional. O

texto deixa de ser concebido um produto do ato comunicativo, passando a ser considerado

como um complexo processo sociocognitivo. Os sentidos, nessa nova perspectiva, não estão

no texto, havendo apenas pistas textuais que auxiliam em sua coconstrução. Só é possível

compreender algumas de suas acepções diante do contexto comunicativo em que o texto está

inserido. A significação, nessa visão, nunca é totalmente compreendida, pois os

conhecimentos ativados serão relativos diante do inventário cognitivo de cada participante da

interação.

O texto passa a ser visto como “um evento comunicativo em que estão os elementos

linguísticos, visuais e sonoros, os fatores cognitivos e vários aspectos” (CAVALCANTE,

37

2011, p. 20). Koch e Elias ([2006] 2014) apontam, ainda, que a partir de uma concepção

dialógica de língua, como atualmente a LT adota, os sujeitos são construtores sociais ativos

que se constroem e reconstroem no texto, o locus da interação. Os sentidos são construídos na

interação entre o texto e os sujeitos, não sendo, então, preexistentes ao ato da interação e,

portanto, independentes do leitor.

A partir da “virada cognitivista”, os linguistas do texto passam a concentrar suas

investigações em fenômenos de coconstrução de sentidos por meio da congregação de

aspectos sociais e cognitivos (cf. ADAM ([2008] 2011), dentre outros). Os processos de

referenciação, sequenciação e articulação textual

são alguns dos temas relevantes

desenvolvidos à luz da LT. Os estudos acerca dos gêneros orais, escritos e multimodais e das

tipologias textuais também são responsáveis por boa parte das investigações textuais

atualmente.

2.2. Linguística do Texto e outras abordagens teóricas

Cavalcante (2015) aponta que uma parcela dos estudos da LT também visam a uma

abordagem em interface com outras teorias. A autora apresenta duas delas: funcionalismo e

Análise Crítica do Discurso (ACD). Para ela, as investigações de Maria Helena Moura Neves

representam bem a inter-relação entre uma abordagem funcionalista associada aos estudos de

texto (cf. NEVES, 2004; [2006] 2013). Essas análises podem englobar a relação entre as

categorias textuais e aspectos funcionais, analisando processos como a referenciação e a

sequenciação. Cavalcante (2015) ressalta, ainda, que, muitas vezes, a LT se vale de análises

funcionalistas em suas investigações.

Já a relação com a ACD é representada, sobretudo, pelos trabalhos desenvolvidos por

Van Dijk. As investigações dessa corrente teórica versam sobre temas como crenças,

ideologias e gênero social e são alicerçadas numa abordagem não apenas cognitiva, mas

também social, pois, para a ACD, o que é cognitivo é, também, sociocognitivo. Um de seus

principais objetivos é desmistificar os discursos, decifrando suas ideologias, já que a

linguagem, em si, não tem poder, assumindo-o a partir dos poderes detidos por quem a utiliza

(cf. VAN DIJK, 2001; WODAK, 2004). Assim, assumir uma interface entre a LT e a ACD

designa “afirmar que os modelos mentais são socialmente produzidos e passam a ser

compartilhados por determinados grupos sociais” (CAVALCANTE, 2015, p. 375).

Muitos estudos da LT também recorrem às investigações sobre análise de gêneros para

38

poder explicar determinados fenômenos linguísticos. A partir da associação dos estudos

bakhtinianos com escolas de gêneros recentes, são investigados os gêneros em relação aos

seus aspectos formais e funcionais correlacionando com algum aspecto linguístico. Colamarco

(2014), por exemplo, recorre a teorizações sobre o gênero fábula para buscar explicações para

as diferentes estratégias de referenciação usadas nas fábulas de Monteiro Lobato e Esopo. A

autora percebe, ainda, que questões ideológicas também estão envolvidas nos processos de

construção dos sentidos, o que remete à associação estudos da LT com análises de gêneros e

ideológicas.

2.3. Texto e ensino

Devido à sua preocupação com a construção de sentido em gêneros/ suportes textuais

diversos, a LT tem se consolidado atualmente como umas das principais abordagens para os

estudos que têm como objetivo uma interface com o ensino. Com a publicação dos PCN, as

teorias do texto ganharam ainda mais visibilidade, sobretudo pela proposta de trabalhar a

língua portuguesa em sala de aula a partir de gêneros textuais. A publicação das diretrizes

oficiais posteriores (PCNEM, PCN+, OCEM) corroborou os postulados já vigentes, até então,

sobre o papel central do texto na sala de aula.

Koch (2003a) retoma algumas das preconizações dos PCN, ressaltando a função

fundamental atribuída ao texto como principal unidade de ensino. Além disso, aponta que,

para seguir a proposta dos PCN, é preciso que haja subsídios para o trabalho em sala de aula.

Koch (2003a) aponta três aspectos relacionados aos estudos de texto que passam a ser

prioritários: gêneros textuais, coesão e coerência.

Para trabalhá-los em sala, contudo, é preciso adotar a perspectiva atual da LT,

considerando o texto como processo sociocognitivo e interacional. Ao assumir essa postura

teórico-metodológica, o professor poderá explorar efetivamente diferentes gêneros textuais a

partir de seu contexto histórico e social. Além disso, poderá trabalhar coesão e coerência de

forma integrada, indo muito além das marcas presentes no texto, ou seja, de sua superfície.

Apenas dessa forma será possível lidar, por exemplo, com casos de referências que não se

encontram efetivamente no texto, mas no contexto sociocognitivo em que ele se insere (cf.

SANTOS, 2015).

Como expusemos na seção anterior, discutiremos nessa seção duas das práticas de

linguagem dos PCN: leitura e produção textual. Os pesquisadores da LT são, provavelmente,

39

os que mais têm enfocado, nos últimos anos, em suas investigações, o complexo

processamento sociocognitivo de leitura e de produção de textos. Além disso, eles tem

buscado sistematicamente estabelecer reflexões efetivas para um ensino produtivo dessas

práticas, principalmente a partir de aspectos relacionados aos gêneros e tipologias textuais (cf.

PAULIUKONIS; SANTOS, 2006; SANTOS, 2007; 2008; 2009; SANTOS; TEIXEIRA,

2016).

Segundo Koch e Elias ([2006] 2014, p. 11), a leitura engloba

uma atividade interativa altamente complexa de produção de sentido, que se realiza

evidentemente com base nos elementos linguísticos presentes na superfície textual e

na sua forma de organização, mas requer a mobilização de um vasto conjunto de

saberes no interior do evento comunicativo.

Assim, não é possível ler e compreender um texto sem ativar determinados

conhecimentos prévios relacionados às próprias experiências acumuladas. Durante a leitura e

a produção de sentidos, são, então, ativados diferentes sistemas de conhecimentos que

colaboram para o processamento textual. A esse respeito, Santos, Cuba Riche e Teixeira

(2012), baseando-se em Koch (2003b), elencam cinco conhecimentos prévios envolvidos no

processo sociocognitivo de leitura. São eles: linguístico, enciclopédico, textual, intertextual e

contextual.

De acordo com Koch e Elias ([2006] 2014), o conhecimento linguístico envolve

aspectos linguístico-discursivos gramaticais e lexicais a partir dos quais podemos

compreender a organização e o funcionamento dos elementos da língua na superfície do texto,

o uso de elementos de coesão para sequenciação textual e a seleção lexical adequada ao tema

ou aos modelos cognitivos ativados.

Já o conhecimento enciclopédico, segundo as autoras, engloba os conhecimentos de

mundo do sujeito, bem como os saberes que remetem a suas experiências pessoais e aos

eventos vividos por ele e situados no espaço e no tempo. Santos, Cuba Riche e Teixeira

(2012) apontam, ainda, que, aos efetuarmos a leitura de um texto, remetemos naturalmente

aos conhecimentos que temos e ao que já lemos e conhecemos para que possamos estabelecer

inferências e compreender alguns dos seus sentidos.

Segundo Santos, Cuba Riche e Teixeira (2012), o conhecimento textual está ligado à

percepção dos sujeitos em relação à organização do texto. Assim, não é por acaso que um

leitor que já tenha conhecimento da forma típica de determinado gênero textual o reconhecerá

com maior facilidade. É evidente que os gêneros apresentam formas relativamente estáveis

40

(cf. capítulo “Análise de adverbiais modalizadores: uso e abordagem”) e elas podem sofrer

variações, mas, de forma geral, uma receita, por exemplo, é caracterizada, dentre outros

aspectos, por sua organização textual.

De acordo com as autoras, o conhecimento intertextual “colabora para identificarmos

as referências, explícitas ou implícitas, a outros textos” (SANTOS; CUBA RICHE;

TEIXEIRA, 2012, p. 43). Assim, percebemos a remissão a um texto que está inserido, de

alguma forma, num outro texto, denominado intertexto, já produzido e presente na memória

coletiva ou discursiva dos interlocutores (cf. KOCH; BENTES; CAVALCANTE, 2007).

Já o conhecimento contextual está ligado à associação do texto lido com seu contexto

de leitura e produção discursiva. Para entender esse conhecimento, é preciso admitir que

“contextualizar significa perceber intencionalidades interacionais” (SANTOS; CUBA RICHE;

TEIXEIRA, 2012, p. 43). Isto é, a observação do contexto engloba a percepção dos aspectos

subjetivos da linguagem, identificando o porquê de determinadas escolhas lexicais e

gramaticais.

Diante de tantos conhecimentos necessários para o processamento da leitura, é

evidente que o trabalho com atividades de leitura em sala de aula envolve um processo

bastante complexo que exige grandes reflexões, já que, como apontam os PCNEM, “o texto é

único como enunciado, mas múltiplo enquanto possibilidade aberta de atribuição de

significados” (BRASIL, 2000, p. 19). Devem ser adotadas estratégias pedagógicas adequadas

e uma metodologia bem delimitada, o que só é possível a partir de uma formação que

considere aspectos mais recentes dos estudos de texto. Por isso, as diretrizes oficiais para o

ensino de língua portuguesa dedicam boa parte de suas recomendações para a chamada prática

de leitura.

Essa prática consiste na efetiva compreensão de textos com características diversas,

considerando seu contexto social, cultural e histórico. A partir do acionamento dos

conhecimentos prévios, o leitor levantará algumas hipóteses acerca do que está sendo

enunciado e estabelecerá sua própria leitura. Trabalhar a prática de leitura também pressupõe

entender que há diferentes leituras possíveis, o que a opõe a abordagens tradicionais que

postulam uma leitura certa e única. Contudo, nem sempre o leitor consegue efetuar leituras

adequadas dos textos, chegando a alguns níveis de extrapolação (cf. MARCUSCHI, 1996).

Além disso, é preciso que a leitura não seja abordada meramente como a codificação

mecânica de grafemas, sendo vista, na verdade, a partir de um letramento crítico (cf.

SOARES, [2003] 2015).

41

Assim, como postulam os PCN+, o aluno precisa ter consciência "[d]os diversos

aspectos implicados em sua estruturação, a partir das escolhas feitas pelo autor entre as

possibilidades oferecidas pela língua" (BRASIL, 2002, p. 60). Ler significa estabelecer uma

compreensão crítica vinculada aos conhecimentos partilhados e às marcas da superfície

textual. É preciso entender algumas das intencionalidades e relacioná-las ao contexto

comunicativo de ocorrência daquele texto.

Além disso, para trabalhar a prática de leitura, o professor deve assumir que o conceito

de texto foi expandido. O texto não engloba apenas produções escritas, mas também

produções orais e multimodais. A modalidade oral ainda tem sido mal trabalhada em sala e

nos livros didáticos, mesmo diante das enfáticas preconizações das diretrizes oficiais (cf.

GOMES-SANTOS et al., 2010; SANTOS; CRUZ, 2012). Muitas vezes, os textos orais são

colocados como opostos aos textos escritos, sem considerar que, na verdade, há um

continuum em que estão os textos mais, ou menos, prototípicos de cada uma das modalidades

(cf. MARCUSCHI, [2001] 2010).

Os textos multimodais são ainda menos trabalhados em sala de aula. Além dos

inquestionáveis problemas estruturais, presentes nas escolas, que dificultam a tarefa do

professor, há grandes limitações quanto à formação docente. Muitos professores ainda não

conseguem perceber a importância de trabalhar a multimodalidade pedagogicamente,

presumindo que será muito difícil ou, pelo contrário, acreditando que o aluno já domina textos

com diferentes semioses. Há, ainda, um caminho longo a percorrer, sobretudo nessa área, pois

determinados gêneros textuais, como propagandas, acabam não sendo efetivamente

trabalhados em sala. Da mesma forma, atividades de retextualização poderiam também

englobar os textos multimodais, o que raramente ocorre nas escolas.

Além disso, não cabe apenas ao professor de língua portuguesa trabalhar a leitura em

sala. Se as aulas de todas as disciplinas são, de alguma forma, pautadas em textos, é

incoerente que seja cobrado apenas do profissional de línguas a preocupação com a leitura.

Exercícios de matemática não exigem apenas conhecimentos de álgebra ou geometria, tendo

em vista que são necessárias diversas interpretações do que está sendo enunciado de forma

escrita/ oral/ multimodal. Essa ingênua concepção é bastante difundida nas escolas e, por isso,

ressaltamos que “todo professor, de qualquer disciplina, é um leitor e, para sua atividade de

ensino, depende necessariamente, do convívio com textos os mais diversos” (ANTUNES,

[2009] 2013, p. 187).

Em relação à prática de leitura, Koch (2003, p. 97) acrescenta que

42

é importante (...) possibilitar a discussão sobre os diferentes sentidos atribuídos aos

textos e sobre os elementos discursivos que validam ou não essas atribuições,

propiciando, também, a construção de um repertório de recursos linguísticos a

ser utilizado quando da produção textual [grifo da autora].

Nessa mesma abordagem, os PCN + preconizam que “ser leitor, no sentido pleno da

palavra, pressupõe uma série de domínios: do código (verbal ou não) e suas convenções; dos

mecanismos de articulação que constituem o todo significativo; do contexto em que se insere

esse todo” (BRASIL, 2002, p. 61). Assim, conforme Silva ([1988] 1998), os leitores são

aqueles que efetivamente adentram o texto, havendo a real compreensão de algumas ideias

coconstruídas pelas marcas linguísticas da leitura efetuada.

O autor opõe os leitores aos “ledores”. O segundo grupo é caracterizado por não

conseguir efetivamente entender o que está sendo enunciado no texto, tendo dificuldade de ir

além da superfície textual e estabelecendo uma mera repetição do que já fora escrito/dito pelo

autor. Isso ocorre, pois o autor não é o detentor dos sentidos ancorados na superfície do texto,

constituindo, na verdade,

uma instância discursiva de que emana o texto, se mostra e se dilui nas leituras de

seu texto: deu-lhe uma significação, imaginou seus interlocutores, mas domina

sozinho o processo de leitura do seu leitor, pois este, por sua vez, reconstrói o texto

na sua leitura, atribuindo-lhe a sua (do leitor) significação (GERALDI, [1984] 2011,

p. 91).

De acordo com Silva ([1988] 1998), contudo, muitas vezes as escolas acabam

formando “ledores” em vez de leitores realmente críticos. Como aponta o autor, a sociedade

precisa de bons leitores e essa ausência, naturalmente, gera diversos problemas sociais. Por

isso, Silva ([1988] 1998) defende que deve haver um enfoque na leitura compreensiva/

significativa, em que os alunos discutam e assumam os propósitos para diferentes tipos de

leitura, mantendo, como base, a compreensão textual.

Trabalhar a leitura em sala de aula, portanto, compreende ler com um viés crítico,

percebendo as marcas linguísticas e seu papel na construção dos sentidos do texto. Essas

pistas podem indicar subjetividade, ideologias e outros aspectos que muitos leitores acreditam

não existir em textos do domínio jornalístico, por exemplo. Para efetivamente enfocar essa

prática, porém, é preciso trabalhá-la em conjunto com a prática de análise linguística e com a

de produção textual, pois apenas pela compreensão da integração entre as práticas de

linguagem o aluno será capaz de efetuar, como atestam as OCEM, o uso de determinados

43

“recursos linguísticos em relação ao contexto em que o texto é construído (elementos de

referência pessoal, temporal, espacial, registro linguístico, grau de formalidade, seleção

lexical, tempos e modos verbais)” (BRASIL, 2006, p. 38).

A prática de produção textual está diretamente ligada a atividades pré-textuais e

textuais de leitura e análise linguística. Para que um texto seja produzido, é necessário que seu

produtor seja um leitor efetivo do gênero textual vinculado a esse texto. Sem conhecer os

aspectos relacionados ao gênero notícia, o aluno terá grandes dificuldades em construir

textualmente sua produção e pode não conseguir escolher conscientemente as marcas

linguísticas adequadas, nem saber organizar efetivamente seu texto quanto à tipologia

predominante.

É preciso, então, que os enunciados relacionados a possíveis produções textuais não

estejam vinculados a comandos que apenas atestem o tipo textual pedido – como: “redija um

texto argumentativo” –, pois o produtor não saberá para quem está escrevendo, qual sua

finalidade comunicativa e a que gênero esse texto está vinculado. Torna-se central, então, a

noção de contexto na sala de aula. Se o texto está relacionado ao seu entorno histórico, social

e cultural, é natural que todos esses aspectos sejam devidamente considerados ao longo de sua

produção, seja ela oral, escrita ou multimodal.

Sob essa perspectiva, o aluno precisa saber qual o contexto de sua produção textual,

englobando, como atestam as OCEM, os “papéis sociais e comunicativos dos interlocutores,

relações entre esses, propósito discursivo, função sociocomunicativa do gênero, aspectos da

dimensão espaço-temporal em que se produz o texto” (BRASIL, 2006, p. 38). Sem esses

esclarecimentos, o texto continua sendo tratado em sala como pretexto, pois sua vinculação

sociocognitiva e interacional é ignorada.

Assim, mesmo utilizando estratégias de leitura bem delimitadas e ancoradas na LT e

nas diretrizes oficiais, o professor precisa refletir, nas atividades de produção textual, as

concepções relacionadas aos gêneros textuais e seus contextos de produção, integrando leitura

e produção de textos. A análise linguística também deve ser usada como um instrumento para

os alunos perceberem sua funcionalidade ao produzirem textos diversificados. Congregar

análise linguística, leitura e produção textual à luz de teorias vinculadas às noções de texto e

discurso parece, então, ser o caminho prioritário no ensino reflexivo de língua portuguesa.

2.4. Articulação textual

44

Segundo Koch (2003b), o encadeamento de segmentos ou porções textuais de

qualquer extensão é feito, na maioria dos casos, por elementos linguísticos denominados pela

LT como articuladores textuais, que podem ligar “períodos, parágrafos, subtópicos,

sequências textuais ou partes inteiras do texto” (KOCH, 2003, p. 133), contribuindo para a

construção de um texto coeso e coerente. Os articuladores são marcadores que desempenham

papel importante no texto, elementos que, segundo Santos (2003), englobam um caráter

coesivo que garante a progressão textual, além de apresentarem nuances diversas em seus

sentidos, diante do contexto em que estão inseridos.

De acordo com Koch (2003, p. 133), eles são responsáveis por

relacionar elementos de conteúdo, ou seja, situar o estado de coisas de que o

enunciado fala no espaço e/ou no tempo, bem como estabelecer entre eles relações

de tipo lógico-semântico; podem estabelecer relações entre dois os mais atos de fala,

exercendo funções enunciativas ou discursivo-argumentativas; e podem, ainda, no

texto, desempenhar funções meta-enunciativas.

Os articuladores textuais, então, são “conectores” que estão envolvidos no processo de

encadeamento textual a partir de determinadas estratégias de sequenciação ancoradas em

marcas linguísticas específicas que colaboram para a progressão do texto. Para que a

sequenciação seja garantida, segundo Koch (2003b), é possível utilizar estratégias de

diferentes níveis – fonético-fonológico, sintático, semântico. Podem ser efetuadas, ainda,

recorrências de vários tipos, dentre as quais a reiteração de itens lexicais, de elementos

fonológicos, de tempos verbais, além de paralelismos e paráfrases.

Campos e Torquato (2013) apontam que, dentre os vários mecanismos responsáveis

pelo processo de sequenciação, está a articulação textual argumentativa. De acordo com os

autores, para estudar os articuladores argumentativos, a LT recorre aos estudos da Semântica

Argumentativa, de Oswald Ducrot, incorporando algumas premissas, como a acepção de que

a argumentação está na língua, sendo tecida por elementos discursivo-argumentativos que

orientam os sentidos para o interlocutor e marcam subjetivamente o texto, constituindo os

denominados articuladores textuais, operadores de discurso ou operadores argumentativos. As

investigações da LT, contudo, utilizam a nomenclatura “articuladores textuais”, também

adotada nesse trabalho.

Os articuladores argumentativos englobam diferentes grupos de elementos

linguísticos, como as conjunções e os advérbios. Cabral (2010) exemplifica o processo de

articulação textual a partir do uso do conector “mas”. Segundo a autora, a condução

45

argumentativa envolvida no uso de “mas” ocorre sempre para a conclusão conduzida pelo

segundo enunciado. No exemplo, “Você ficou linda nesse vestido, mas ele é caro” (CABRAL,

2010, p. 17), o articulador “mas” tem como função reforçar a argumentação de que a

interlocutora não deve comprar o vestido, mesmo que tenha ficado bem nela.

Ducrot (1981) aponta que o conector “mas” não liga apenas ideias opostas, havendo,

na verdade, conclusões distintas conduzidas pelas orações por ele ligadas. Isso pode ser visto

no exemplo seguinte: “Aquele hotel é muito bom, mas muito caro” (CABRAL, 2010, p. 18).

Não há uma real oposição entre ser “muito bom” e ser “caro”. Teríamos ideias realmente

opostas caso tivéssemos enunciados, como “aquele hotel é muito bom, mas muito ruim” ou

“aquele hotel é muito barato, mas muito caro”. Nesses casos, teríamos ideias que se opõem,

mas que estariam, evidentemente, vinculadas a outros sentidos, em que aquilo que é “caro”

não está necessariamente relacionado a aspectos monetários, mas a questões outras.

Na verdade, ao enunciarmos que há um “hotel muito bom”, de alguma forma,

orientamos nosso discurso para a conclusão de que o interlocutor deve se hospedar nele.

Quando o enunciado aponta que o hotel também é “muito caro”, contudo, há uma mudança na

orientação argumentativa, pois locais que custem muito financeiramente não são, geralmente,

recomendados por quem não pretende gastar uma grande quantia. O “mas” é a marca

linguística que permitirá a condução desse enunciado de acordo com a forma pretendida.

Além disso, os articuladores textuais têm diversas funções pragmático-discursivas, as

quais, de acordo com Nascimento (2008), são definidas pelo tipo de relação estabelecida,

contextualmente, entre as unidades articuladas e pelos níveis estruturais em que se inscrevem

essas mesmas unidades. Ou seja, os papéis dos articuladores não são estanques, apresentando

variações entre os sentidos construídos sociocognitivamente a depender do contexto em que

eles estão inseridos.

Santos (2003), por exemplo, ao estudar os articuladores “e”, “mas”, “aí” e “então”

numa amostra composta por textos de literatura infantil e juvenil, observou que esses itens

podem apresentar subfunções semelhantes, mas também englobam suas especificidades.

Outras investigações em gêneros e/ ou suportes textuais diferentes podem encontrar novos

usos para esses elementos, além de observarem possíveis interseções pragmáticas distintas.

Assim, o contexto é tido como um fator determinante nos usos dos articuladores.

Koch (2003b) e Koch e Elias (2016) elencam algumas das funções ligadas à

articulação textual de forma ampla: introduzir relações discursivo-argumentativas de

contrajunção, justificativa, explicação, generalização, comprovação; “comentar” a própria

46

enunciação a partir de delimitações, marcação de atitude, demonstração de afetividade,

preservação de faces, indicação de graus de imperatividade; organizar o texto; situar ou

ordenar o estado de coisas de que o enunciado fala no espaço e/ou no tempo; estabelecer

relações lógico-semânticas. Essas funções são ligadas, pelas autoras, aos itens adverbiais

(sobretudo os modalizadores) e às conjunções. Adotamos essa proposta nesse trabalho,

considerando os adverbiais modalizadores (“talvez”, “provavelmente”, “com certeza”) como

articuladores meta-enunciativos (KOCH, 2003).

Além do campo teórico englobado pelos articuladores textuais, Koch ([1992] 2013, p.

39-40) ressalta que esses elementos são pouco explorados em relação ao ensino, constituindo

uma lacuna na interface língua portuguesa e ensino, pois eles

têm merecido pouca atenção nos livros didáticos e nas aulas de língua portuguesa, já

que pertencem às classes gramaticais invariáveis (advérbios, preposições,

conjunções, locuções adverbiais, prepositivas, conjuntivas) ou, então, são palavras

que, de acordo com a N.G.B. (Nomenclatura Gramatical Brasileira), não forma

incluídas em nenhuma das dez classes gramaticais, merecendo, assim, ‘classificação

à parte’ (...). Acontece, porém, que justamente essas ‘palavrinhas’ (tradicionalmente

descritas como ‘meros elementos de relação, destituídas de qualquer conteúdo

semântico’) as responsáveis, em grande parte, pela força argumentativa de nossos

textos.

2.5. O gênero textual artigo de opinião

2.5.1. Aspectos gerais dos estudos sobre gêneros

Os estudos sobre gêneros vinculam-se sempre, em alguma medida, à perspectiva

bakhtiniana. O autor, precursor na temática e autor de diversos trabalhos vinculados aos

estudos de literatura, postulou que os gêneros são formas relativamente estáveis estabelecidas

como práticas sócio-históricas. Sua concepção eminentemente dialógica vincula-se a três

critérios ligados à esfera social da linguagem e postulados para classificação dos gêneros:

conteúdo temático, estilo e construção composicional. O conteúdo temático engloba do que

trata o gênero, ou seja, o que é dito e o que pode ser dito nele; o estilo compreende as seleções

lexicais e aos aspectos gramaticais; a construção composicional representa a estruturação e o

enquadramento formal, o que engloba as tipologias textuais e as partes constitutivas de cada

gênero.

Bakhtin ([1979] 1997) aponta, ainda, que a riqueza e a diversidade dos gêneros são

47

infinitas, tendo em vista que são inesgotáveis as possibilidades da multiforme atividade

humana, além de ser integral, em cada campo dessa atividade, o crescimento do repertório de

gêneros e sua diferenciação à medida que se desenvolve e se complexifica um determinado

campo. Isto é, os gêneros são infinitos e incontáveis, podendo desaparecer e surgir diante das

necessidades comunicativas dos falantes/ ouvintes. Uma evidência desse aspecto é a

multiplicidade de novos gêneros diante do advento da internet ao mesmo tempo em que

gêneros muitos comuns antigamente, como o telegrama, são, atualmente, poucos utilizados;

outros caíram em total desuso, desaparecendo.

Para analisar um gênero, no entanto, precisamos levar em consideração outros

conceitos, como o de tipologia textual. As tipologias textuais diferenciam-se dos gêneros, pois

são características formais dos próprios textos, constituindo um número finito de estratégias

discursivas que podem ser utilizadas por qualquer usuário da língua, mesmo que não

escolarizado. Seu estudo apresenta diversas vertentes teóricas defendidas por autores como

Schnewlly e Dolz (2004), Charaudeau (2008), Marcuschi (2008) e Travaglia (2009). Nesse

trabalho, seguimos a proposta de Marcuschi (2008), pois buscamos observar qual delas era

mais referida nas documentações oficiais e nos livros didáticos devido à relação do trabalho

com o ensino. Após esse panorama, observamos que a perspectiva defendida por Marcuschi

(2008) era a mais frequente.

De acordo com o autor, há cinco tipologias textuais possíveis de serem utilizadas:

descrição, narração, exposição, argumentação e injunção. Cada gênero caracteriza-se por

apresentar algumas tipologias mais características e/ou predominantes. Artigos de opinião e

editoriais são caracterizados por seu caráter argumentativo; receitas pelo uso da injunção;

notícias pelas tipologias narrativa e descritiva. Esses gêneros, porém, não apresentam apenas

essas tipologias textuais. Assim, cada texto pode apresentar diferentes tipologias, apesar de

alguma(s) dessa(s) tipologias se sobressaírem.

Cada gênero, além de caracterizado por suas tipologias geralmente predominantes,

também se vincula a diferentes domínios discursivos. Esses domínios são esferas de produção

em que os gêneros podem ser agrupados, como domínio jornalístico, literário, religioso, etc.

Outro relevante aspecto para os estudos sobre gêneros é a intergenericidade. Como dissemos,

há a possibilidade de surgimento e extinção de incontáveis gêneros; no entanto, também é

possível que os gêneros sejam mesclados em alguns contextos comunicativos específicos, em

que uma notícia, por exemplo, também faz uma propaganda, ou uma receita é tida como um

poema.

48

Outro aspecto relevante é o suporte em que o texto está inserido. Marcuschi (2003),

pautando-se numa visão textual de suporte, postula que, preliminarmente, podemos dizer que

o suporte é imprescindível para a circulação do gênero na sociedade e, por isso, deve ter

alguma influência em sua constituição. O autor busca definir o suporte como o locus físico ou

virtual formatado especificamente para servir como base ou ambiente para fixação de um

gênero materializado como texto. Assim, para Marcuschi (2003), o suporte é um lugar físico

ou virtual, tem um formato específico e serve para fixar e mostrar um texto. Admite-se, dessa

forma, que: o suporte representa, incontornável e imprescindivelmente, algo real; não é

informe ou uniforme, aparecendo com um formato específico; sua função base é fixar o texto,

tornando-o acessível para determinado fim comunicativo.

2.5.2. Os artigos opinativos

De acordo com Boff, Köche e Marinello (2009), os artigos de opinião partem da

argumentação para analisar, avaliar e responder questões controversas e atuais discutidas

socialmente. Esses artigos são escritos por articulistas, muitas vezes autoridades nos assuntos

sobre os quais estão escrevendo. O enfoque dos artigos opinativos não é a apresentação de

acontecimentos e fatos, mas sua análise, marcando o posicionamento do enunciador em

relação ao que está sendo tratado. Sua publicação geralmente está vinculada a seções

opinativas com periodicidade regular em sua publicação e espaço físico limitado. Para Boff,

Köche e Marinello (2009), sua produção deve considerar que os leitores já apresentam

opiniões prévias sobre o que será defendido e que as teses apresentadas devem considerar, em

alguma medida, essas opiniões, omitindo-as ou antecipando possíveis respostas.

De acordo com os autores, os artigos opinativos apresentam uma estrutura regular:

situação-problema, discussão e solução-avaliação. A situação-problema engloba a

apresentação da questão a ser debatida ao longo do texto, contextualizando o assunto,

podendo evidenciar o objetivo da argumentação a ser desenvolvida ou da relevância na

discussão do tema. A discussão, por outro lado, é caracterizada pela argumentação e

construção da tese acerca do tema analisado, apresentando fatos, “argumentos de autoridade”,

exemplos a partir de trechos marcados por outras tipologias textuais. Já a solução-avaliação é

uma resposta ao que foi apresentado, reafirmando a tese defendida, sem apenas resumir ou

reafirmar o que foi afirmado anteriormente.

Schneuwly e Dolz (2004) apontam que os artigos de opinião são caracterizados por

49

discutirem questões sociais controversas. Para Melo (2015), esse gênero trata de assuntos

polêmicos e seus autores visam a defender, a partir de seus argumentos, as teses construídas

nos textos. Assim, como aponta Costa (2009, p. 37), o artigo de opinião “forma um corpo

distinto na publicação, trazendo a interpretação do autor sobre um fato noticiado ou tema

variado (político, cultural, científico, etc.)”. Ou seja, representa um gênero opinativo, marcado

pelo posicionamento do enunciador e pelas marcas de subjetividade.

Segundo Melo (2015), o gênero artigo de opinião está presente em diversas esferas da

comunicação humana, apresenta forte caráter sociodiscursivo e circula em diferentes suportes

textuais. Assim, de acordo com a autora, os artigos opinativos são típicos de variados

domínios discursivos: jornalístico, religioso, político, científico, etc. Além disso, esse gênero é

caracterizado “pela defesa de um posicionamento sobre determinada temática, o qual

relaciona o ponto de vista de um sujeito que pode ou não concordar com o tema abordado”

(MELO, 2015, p. 73).

Para Bräkling (2000), esse gênero tem como característica a busca pelo

convencimento do interlocutor acerca da tese defendida, influenciando e transformando suas

perspectivas a partir dos argumentos apresentados. Para isso, são utilizadas, segundo Boff,

Köche e Marinello (2009), diferentes estratégias que ajudam na tentativa de persuadir o leitor.

Algumas delas são: o uso de outras “vozes” a partir de “argumentos de autoridade”, ou seja,

depoimentos/ opiniões de pessoas que tenham grande conhecimento do assunto tratado; apoio

em fatos que corroboram a validade do que é dito. Assim, como aponta Perelman (apud Boff,

Köche e Marinello (2009)), o objetivo é provocar ou aumentar a adesão do leitor em relação à

tese apresentada.

De acordo com Dolz e Schneuwly (2004), os artigos de opinião tem como tipologia

predominante a argumentação tendo em vista seu objetivo de convencimento junto ao público

leitor. Bräkling (2000) aponta, ainda, que há pistas textuais típicas desse gênero: presente do

indicativo ou subjuntivo na exposição dos argumentos, uso da terceira pessoa ao longo do

texto e presença de articuladores argumentativos, que contribuem para construção da

argumentação. Os elementos aqui estudados, como já expusemos, funcionam como

articuladores textuais argumentativos e, portanto, são importantes na construção desse gênero

textual.

Para Boff, Köche e Marinello (2009, p. 4), “é a expressão do posicionamento crítico

do autor que garante consistência ao artigo de opinião. As características do contexto de

produção (enunciador, assunto, finalidade comunicativa) determinam a configuração do artigo

50

de opinião”. Por isso, Melo (2015) aponta que esse gênero é propício para o trabalho em sala

ao levantar o posicionamento crítico do aluno em relação a temas controversos discutidos

socialmente e apresentados a partir de argumentos e contra-argumentos.

Nesta Dissertação, recorremos aos pressupostos teóricos da LT para observarmos os

efeitos de sentido envolvidos no uso dos adverbiais modalizadores como articuladores

textuais argumentativos a partir, sobretudo, dos estudos desenvolvidos por Ingedore Koch.

Além disso, recorremos à LT para analisar o tratamento dado nos livros didáticos a esses

elementos relacionados à argumentação e também utilizamos suas reflexões teóricas na

elaboração de atividades que possam ser, posteriormente, adaptadas por professores e

pesquisas futuras com efetiva aplicação em sala de aula.

51

3. EXPRESSÕES DA MODALIZAÇÃO E ENSINO

3.1. A modalização do discurso

De acordo com Castilho et al. (2014), a gramática clássica distinguia dois grandes

componentes das sentenças: o dictum e o modus. O primeiro corresponde ao componente

proposicional, constituído de sujeito e predicado; o segundo é o componente modal, que

representa uma avaliação do dictum. Um dos principais conceitos a serem depreendidos dessa

noção é a modalização, isto é, a avaliação sobre o que é dito na sentença – o dictum. Segundo

os autores, ela ocorre à medida que, ou o falante assume diferentes graus de

comprometimento com os valores de verdade do dictum, ou expressa a seu respeito uma

atitude ou reação psicológica.

Baseado e fundamentado na teoria da enunciação4, de Benveniste, o conceito de

modalização do discurso vincula-se à noção de subjetividade. Diante do posicionamento do

enunciador em relação à proposição, marcas (inter)subjetivas são deixadas em seu discurso e,

assim, o enunciador assinala sua presença por meio de índices de modalização, tidos como

marcas atitudinais, opiniões, intenções, sentimentos e pontos de vista.

Cabral (2010) ressalta que é preciso diferenciar modalidade e modalização. A

modalidade diz respeito aos estudos da retórica clássica para classificar as proposições em

possibilidade/ impossibilidade e necessidade/ contingência. Os enunciados, segundo a autora,

podem se encaixar em três tipos de modalidade: epistêmica (ligada ao conhecimento, à crença

e ao julgamento em termos de probabilidade, possibilidade e certeza); deôntica (relacionada

ao dever, à obrigação e à permissão) e alética (refere-se à necessidade). São noções

fundamentais da lógica modal, então, a necessidade e a possibilidade diante de um estado de

coisas.

Para Cabral (2010, p. 111), a modalização “refere-se à expressão da aproximação ou

do distanciamento do locutor diante do conteúdo de seu enunciado, atestando seu grau de

adesão”. Já Koch ([1984] 2011) recorre à teoria dos atos de fala, de Austin, para discutir a

noção de modalização. Para a autora, ao produzir um enunciado, o locutor manifesta suas

intenções e atitudes por meio de sucessivos atos ilocucionários de modalização, atualizados a

partir de diferentes modos de lexicalização oferecidos pela língua, dentre os quais os

adverbiais modalizadores.

4 . Para essa teoria, a enunciação "é a colocação em funcionamento da língua por um ato individual de

utilização" (BENVENISTE, 1976, p. 79).

52

Assim, como aponta Bronckart (1999, p. 330),

as modalizações têm como finalidade geral traduzir, a partir de qualquer voz

enunciativa, os diversos comentários ou avaliações formulados a respeito de alguns

elementos do conteúdo temático. (...) Portanto, as modalizações pertencem à

dimensão configuracional do texto, contribuindo para o estabelecimento de sua

coerência pragmática ou interativa e orientando o destinatário na interpretação de

seu conteúdo temático (grifos do autor).

Portanto, o conceito de modalização do discurso está relacionado, como ressalta

Kebrat-Orecchioni ([1980] 1997), às marcas dadas pelo sujeito da enunciação ao seu

enunciado, ou seja, ao componente que permite avaliar o grau de adesão do enunciador ao que

está sendo proferido por ele. A ideia de modalização vincula-se, dessa forma, à aplicação dos

conceitos de modalidade à enunciação e ao uso em contextos reais de interação.

Além disso, é preciso ressaltar que a modalização é expressa por marcas linguísticas e,

por isso, é objeto de estudo, sobretudo, dos estudos sobre argumentação, pois a investigação

do grau de adesão está vinculada à força argumentativa conferida aos textos e, portanto, ao ato

de argumentar. Charaudeau (2008) aponta, ainda, que esses índices de modalização são

responsáveis por marcar, de alguma forma, a presença do sujeito da enunciação no discurso e,

portanto, marcar a subjetividade da linguagem. Essas marcas enunciativas podem ser

expressas por diferentes estruturas lexicais, morfológicas e sintáticas, dentre as quais os

adverbiais modalizadores e os verbos modais (cf. LIMA, 2011; STEFFLER, 2013)

3.2. Adverbiais modalizadores em perspectiva teórica

Acerca da classe dos adverbiais, Martelotta (2012, p. 13) afirma que

a categoria dos advérbios é reconhecidamente a menos homogênea e, portanto, a

mais difícil de ser definida. De acordo com Givón (2001), não surpreende que os

advérbios sejam a classe que, translinguisticamente, apresenta menos aspectos

universais, podendo estender-se pelos planos morfológico, léxico e sintático. Essa

versatilidade, provavelmente, se deve ao fato de os advérbios funcionarem num

plano de utilização da língua que oscila entre o campo representacional, típico do

léxico, e a área da gramática, relacionada à orientação intersubjetiva que

normalmente se associa aos elementos de caráter gramatical.

O grupo denominado adverbiais engloba elementos muito diferentes sintática,

semântica e pragmaticamente, o que leva à necessidade de estudá-los e descrevê-los de forma

separada. A heterogeneidade da classe aponta para os adverbiais como uma categoria fluida,

com constituintes que transitam entre o léxico e a gramática e organizam-se radialmente com

53

elementos mais ou menos prototípicos. Martelotta (2012) destaca alguns dos aspectos

importantes para essa classe em relação à morfossintaxe, à semântica e ao discurso.

Morfossintaticamente, o autor primeiramente discute a estrutura dos adverbiais. Para

ele, é preciso diferenciar os advérbios, ou seja, aqueles com um só vocábulo, e as locuções

adverbiais, aquelas com estrutura sintagmática de algum tipo. Aos advérbios podem ser

acrescidos sufixo -mente ou não. Já as locuções, segundo o autor, são formadas, sobretudo,

pela junção de uma preposição com algum substantivo. A esse respeito, Neves (2000)

apresenta outras formações estruturais possíveis: substantivos quantificados; substantivo +

preposição + substantivo; substantivo/ pronome quantificador + preposição + mesmo

substantivo/ pronome quantificador; formas verbais havia/ fazia + substantivo quantificado.

Martelotta (2012) ressalta, contudo, que, diante das evidências diacrônicas já descobertas, não

é recomendável estabelecer uma rígida diferença entre os advérbios e as locuções adverbiais,

sendo necessário adotar uma teoria que considere a gramática como fenômeno criativo e

dinâmico.

Outro ponto destacado pelo autor é a invariabilidade. Para Martelotta (2012), os

advérbios são caracterizados como elementos qualificativos, aproximando-os dos adjetivos.

Nesse ponto, o que diferenciaria os dois grupos seria a invariabilidade dos advérbios. Essa

característica aproxima os advérbios de outras classes, como as preposições e as conjunções.

Ou seja, em relação aos adjetivos, estariam mais próximos do campo da gramática do que do

campo do léxico sob esse prisma, mas em relação às preposições e às conjunções estariam

mais no campo do léxico, pois veiculam sentidos lexicais, apesar de assumirem funções

discursivas. Esse critério, porém, precisa ser relativizado diante de algumas exceções, como o

advérbio “meio”, que apresenta variabilidade em alguns contextos.

Semanticamente, Martelotta (2012) aponta que os adverbiais são modificadores, sendo

definidos “como elementos que modificam a ação expressa pelo verbo, indicando as

circunstâncias referentes a essa ação, ou seja, as informações acessórias, que ajudam a formar

quadro geral associado a essa ação” (MARTELOTTA, 2012, p. 38). Alguns grupos de

advérbios, porém, parecem não estar tão ligados a essa definição, sobretudo os não

predicativos, o que inclui os circunstanciadores temporais e locativos, os focalizadores e os

advérbios de inclusão.

Pragmaticamente, os adverbiais podem exercer diversas funções a depender dos

contextos em que estão inseridos. Martelotta (2012) cita os estudos de Ducrot para ressaltar

que esses elementos colaboram para construção da pressuposição, como “já” e “quase”. É

54

preciso trabalhar os aspectos discursivos num continuum de circunstâncias, que, para

Martelotta (2012), engloba desde o cenário espaço-temporal até o processo de construção do

texto. É preciso considerar as intencionalidades do falante, tendo em vista a constante

negociação envolvida na interação falante e ouvinte. Paiva (2008) apresenta algumas funções

típicas dos circunstanciadores temporais e locativos, como contraste, introdução de subtópico,

focalização, dentre outras. Em relação a outros grupos de adverbiais, outros pesquisadores

elencam outras propriedades pragmáticas, agrupadas de acordo com seus contextos

discursivos.

Para Martelotta (2012), os adverbiais podem ser divididos em três subgrupos:

centrados nos qualitativos, centrados nos aspectuais e locativos de referência fixa. O primeiro

subgrupo engloba, para o autor, os qualitativos, os que apontam para atitude do sujeito, os

modalizadores, os intensificadores, os marcadores discursivos e os conjuntivos. Nesse

trabalho, destacamos, desse grupo, os modalizadores com o qual dialogaremos nesta seção a

partir do próximo parágrafo.

O estudo de Castilho e Castilho ([1992] 2002), marco nas investigações sobre

modalizadores, consiste na análise do uso desses elementos em perspectiva funcionalista a

partir da união de uma análise estrutural, por meio de sua ordenação, com as estratégias de

modalização e seu valor semântico. O estudo demonstra que os modalizadores podem ocorrer

em distintas posições na oração e que seu posicionamento pode estar relacionado com as

estratégias modalizadoras e com seu valor semântico. Para os autores, esses advérbios podem

apresentar valores semânticos que vão além de seu sentido original, englobando um grupo

denominado “paragógico” com modalizadores que assumem dois sentidos e um grupo

nomeado como “complexo” com elementos que perdem seu valor original e assumem novos

valores.

Adotando uma abordagem histórica, Moraes Pinto (2003; 2008), ao observar os

advérbios qualitativos e modalizadores em -mente, constatou que houve uma modificação nos

seus usos em relação à ordenação e aos seus valores semânticos, detectando novos usos na

comparação entre as distintas sincronias e constatando uma relação entre a ordenação e o

processo de gramaticalização sofrido por esses advérbios. A autora demonstrou, a partir de

dados do português arcaico, que os advérbios modalizadores em -mente têm origem

qualitativa, passando a desempenhar função modalizadora posteriormente na língua

portuguesa.

Tescari Neto e Pezatti (2005) analisam os adverbiais modalizadores epistêmicos a

55

partir de sua ordenação. Seguindo os pressupostos teóricos da linguística funcional de Dik, os

autores partem da perspectiva de que os elementos analisados funcionam como satélites de

nível três ao se ligarem à camada proposicional, avaliando eventos em seu conteúdo

proposicional veiculado por determinado ato de fala. A partir da análise dos modalizadores em

um corpus de fala do português europeu, os autores demonstram que os epistêmicos tendem

ao posicionamento periférico na oração, além de apontarem para a necessidade de observar os

valores semânticos propostos por Castilho e Castilho ([1992] 2002).

Já Vidal (2009) investiga o uso e a ordem dos advérbios em -mente, englobando vários

grupos, como os temporais, focalizadores, modalizadores e qualitativos. Seus resultados

demonstraram que alguns aspectos a serem observados na análise desses elementos são a

modalidade em que eles se inserem (oral ou escrita), os gêneros textuais a que eles se

vinculam e também fatores sociais, como o grau de escolaridade. A autora demonstrou, a

partir de seu estudo, que os advérbios em -mente são mais utilizados na modalidade escrita da

língua, no gênero relato opinativo e por pessoas com Ensino Médio completo. Com isso,

percebemos que esses elementos são aparentemente ligados a contextos mais formais, sendo

usados por falantes mais escolarizados. O trabalho, apesar de propor uma conexão com o

ensino, não apresenta nenhuma reflexão sobre o ensino desses elementos, limitando-se a

reflexões genéricas sobre ensino de língua portuguesa em diferentes perspectivas teóricas.

Castilho et al. (2014) apontam que a classe dos advérbios é, de maneira geral, tratada a

partir de ideias como invariabilidade, modificação do verbo, do adjetivo ou do advérbio e que,

por vezes, é tida como uma classe bem delimitada com palavras que funcionam da mesma

forma. Para os autores, essa ideia é disseminada em contexto escolar e perdura posteriormente

na mente dos falantes. Segundo eles, a classe não é bem delimitada, pois há "áreas cinzentas"

(CASTILHO et al., 2014, p. 267) entre advérbios e locuções adverbiais (denominadas por eles

como “adverbiais”), adjetivos e operadores de discurso. Eles ressaltam, ainda, a plurivocidade

da classe, o que, segundo os pesquisadores, gera múltiplas possibilidades interpretativas para

o linguista e, também, algumas dúvidas descritivo-analíticas.

Segundo Castilho et al. (2014), é preciso observar os advérbios a partir de suas

subclasses. Os autores apresentam diversas divisões dentro da classe, constituindo a seguinte

proposta: predicadores (qualificadores, modalizadores, aspectualizadores, graduadores,

quantificadores); verificadores (de focalização, de negação, de inclusão e de exclusão,

aproximadores, delimitadores); circunstanciais (de lugar e tempo). Essa divisão engloba,

ainda, grupos mais específicos dentro dos apresentados anteriormente, como os fóricos e as

56

locuções constituídas pelo item “vezes”.

Castilho et al. (2014) defendem, ainda, que os adverbiais modalizadores são aqueles

que estão envolvidos no processo de modalização do discurso, em que há uma avaliação sobre

o enunciado. Esse grupo, também heterogêneo, engloba diversos modalizadores, como os

epistêmicos, os deônticos e os atitudinais. Os autores destacam o uso do modalizador

“realmente” devido à sua alta frequência de ocorrência em uma amostra de 254 modalizadores

de certeza. Para eles, a flutuação na posição desse elemento está ligada ao polifuncionalismo

dos advérbios, derivando-os para o domínio do texto e agindo, assim, como articuladores

textuais, como discutiremos a partir dos próximos trabalhos.

Sobre o papel dos elementos adverbiais como articuladores textuais ou operadores de

discurso, Koch (2003b) defende que advérbios e conjunções são itens que ligam porções do

texto e que veiculam diferentes efeitos pragmáticos diante de seu uso. A autora aponta que

eles podem ser divididos, de maneira geral, em três grupos: de conteúdo proposicional,

enunciativos, ou discursivo-argumentativos, e metaenunciativos. Koch (2003b) recorre a

pesquisas anteriores escritas por ela para exemplificar e comentar alguns casos de

articuladores enunciativos (“mas”, “portanto” e “ainda que”) e de conteúdo proposicional

(“por causa de”, “para” e “porque”).

Koch (2003b) aprofunda-se mais, no entanto, nos articuladores metaenunciativos. Por

definição, esses elementos são os que “comentam a própria enunciação” (KOCH, 2003, p.

135), grupo que engloba, dentre outros, os itens linguísticos que estudamos nessa pesquisa: os

adverbiais modalizadores. Esses articuladores, segundo a autora, podem ser divididos em

alguns grupos: delimitadores de domínio, ou hedges (“geograficamente” e “politicamente”);

organizadores textuais, baseando-se em Maingueneau, (“primeiramente” e “em segundo

lugar”); epistêmicos (“evidentemente” e “aparentemente”); atitudinais ou afetivos

(“infelizmente” e “felizmente”); axiológicos (“curiosamente” e “mais uma vez”); deônticos

(“opcionalmente” e "é indispensável"); atenuadores (“talvez” e “ao que me parece”) e

metaformulativos (“digamos assim” e “quero dizer”).

Já em Koch ([2004] 2015; [2008] 2014), a autora reorganiza seus postulados

anteriores. Primeiramente, ela detalha as operações discursivas desses articuladores,

ressaltando que eles operam em diferentes níveis: desde a microestrutura textual, articulando

membros oracionais e/ou orações até a organização global do texto, em que são responsáveis

por explicitar sequências textuais maiores. Logo após, Koch ([2004] 2015; [2008] 2014)

apresenta uma nova divisão para esses elementos: de conteúdo proposicional, discursivo-

57

argumentativos, organizadores textuais e metadiscursivos. Ou seja, as mudanças consistem na

separação dos organizadores textuais dos demais meta-enunciativos, no maior detalhamento

dos marcadores discursivos, recorrendo a Santos (2003) e, como destacamos, na

reorganização dos meta-enunciativos.

Koch ([2004] 2015; [2008] 2014) aponta que há, ainda, um grupo de articuladores

metadiscursivos. Esses são responsáveis por comentar o estatuto discursivo do que é dito, por

vezes, sobre a própria enunciação. Incluem-se nesse grupo, então, os metaenunciativos e os

demais elementos anteriormente tidos como parte dessa classificação: modalizadores e

metaformulativos. Para a autora, os modalizadores podem ser divididos entre stricto e lato

sensu. No primeiro grupo, estão os deônticos, aléticos e epistêmicos e, no segundo, estão os

axiológicos, atitudinais e atenuadores. Em relação aos metaenunciativos, a autora inclui

apenas elementos que introduzem a autorreflexão da linguagem (“digamos assim” e “vamos

dizer assim”).

Koch e Elias (2016), ainda sobre os articuladores textuais, buscam sistematizar a

temática a partir de mais exemplos e listas resumitivas. Além disso, ressaltam que o

agrupamento classificatório é decorrente das funções exercidas por esses elementos no texto.

As autoras recorrem, no geral, ao que já fora postulado por Koch em seus últimos estudos,

mas apresentam um detalhamento muito mais amplo a partir de diversos exemplos e do

esmiuçamento dos efeitos de sentido envolvidos nesse processo sociocognitivo. Quanto aos

metadiscursivos, porém, elas apresentam algumas modificações. Por um lado, apenas alteram

a nomenclatura de alguns – denominam os metaenunciativos como evidenciadores e os

metaformulativos como formulativos –, mas, por outro, excluem os delimitadores do grupo

dos modalizadores, colocando-os num grupo à parte.

Ressaltamos, contudo, que, embora todas essas investigações apresentem listas

classificatórias seguidas de alguns exemplos e seus respectivos comentários, o objetivo

principal é demonstrar que esses elementos veiculam diferentes efeitos de sentido e, por isso,

podem ser agrupados, de alguma forma, em subgrupos com elementos pragmaticamente

semelhantes no que cerne à articulação textual. Essas listagens, porém, não devem ser tidas

como uma rígida divisão, mas como uma forma de agrupamento desses itens que pode ser

modificada a depender do contexto em que estão inseridos. Ou seja, um mesmo elemento

pode ter diferentes efeitos a depender de vários aspectos envolvidos em sua produção.

Nesta Dissertação, analisaremos alguns elementos responsáveis pela modalização do

discurso: advérbios, advérbios em -mente e locuções adverbiais. Para isso, consideraremos,

58

conforme Koch (2003b), que os adverbiais modalizadores são articuladores textuais e podem

ser agrupados diante de determinados efeitos de sentidos. Apresentaremos, posteriormente, os

efeitos encontrados em nossa amostra e o papel qualitativo desses elementos enquanto

articuladores argumentativos.

3.3. O ensino de adverbiais modalizadores

A classe dos advérbios, de forma geral, ainda não tem sido muito observada fora do

campo da Linguística teórica, havendo, então, poucos trabalhos relacionados à sua interface

com o ensino. Um grupo desses estudos engloba uma abordagem mais generalista acerca da

problematização das classes de palavras como um todo. Ressaltamos, contudo, que essas

investigações não destacam, em momento algum, os adverbiais modalizadores, mas são

relevantes diante de seu pioneirismo no tratamento do tema a que se propõem e da ausência

de um debate sobre o ensino de adverbiais em perspectiva linguística em outros trabalhos.

Dias ([2001] 2005), ao investigar a abordagem sobre classes de palavras em livros

didáticos, aponta que há duas tendências nos manuais didáticos analisados: uma abordagem

“conservadora”, especificando o estudo das classes de palavras, mesmo que associada a

textos; e outra, denominada pelo autor como “inovadora”, que não especifica o estudo das

classes gramaticais. A essas tendências, o autor associa o efeito de evidência do conceito e o

efeito de apagamento do conceito, ligados, respectivamente, aos manuais conservadores e

inovadores. Segundo Dias ([2001] 2005), esse quadro reflete o cenário das escolas brasileiras

“com defensores e opositores do ensino de gramática (...) [sem] clareza do que defendem ou

atacam” (DIAS, [2001] 2005, p. 126).

Em sua pesquisa, o autor optou por destacar três classes – adjetivos, substantivos e

pronomes – por considerar que é a partir delas que estão as questões mais relevantes diante do

caráter semântico de sua proposta de análise. Em linhas gerais, Dias ([2001] 2005) observou

que os livros didáticos conservadores centram-se em conceituações acerca das classes, mesmo

utilizando textos. Além disso, por vezes, ele adotam uma abordam generalista e reducionista

da caracterização das classes a partir de definições genéricas e reflexões simplistas. Embora

não utilize esse termo, sua descrição parece apontar para o uso do texto como pretexto para

ensinar gramática sem considerar outros aspectos necessários relevantes para a prática de

análise linguística.

Já os livros “inovadores” não apresentam conceituação alguma para as classes de

59

palavras. Segundo Dias ([2001] 2005), a abordagem é caracterizada pela integração com a

leitura e produção textual, sobretudo em relação aos adjetivos. Nos exemplos analisados,

esses livros didáticos discutem as classes por meio de suas funções nos textos sem recorrer à

nomenclatura da gramática tradicional. Por fim, o autor defende que deve haver um equilíbrio

entre trabalhar a gramática e o texto, sendo papel do livro didático formular uma orientação

segura ao professor para que sejam aproveitados os recentes estudos sobre as classes de

palavras no país, indo além da “didatização” dos conceitos da tradição gramatical.

Esse trabalho, apesar de algumas aplicações pouco claras às classes destacadas,

demonstra que alguns livros didáticos ou se pautam apenas nas funções, ou apenas na

nomenclatura. Esses caminhos, como defendemos ao longo desta Dissertação, não são

opostos, havendo, na verdade, uma complementariedade entre eles. É preciso destacar, ainda,

que o trabalho de Dias ([2001] 2005) é anterior ao início das avaliações periódicas dos livros

didáticos feitas pelo Ministério da Educação. Assim, há maior chance de os manuais estarem

distantes do que discutem as diretrizes oficiais e os estudos linguísticos atuais. Ao longo dessa

investigação, o autor usa diversas vezes o termo “ensino de gramática” para referir-se ao

ensino de elementos linguísticos, mas, ressaltamos, essa prática precisa ocorrer também em

perspectiva discursivo-textual.

Ainda sobre as classes de palavras, Pinilla ([2007] 2011) destaca que, a partir da

consulta a programas escolares e a livros didáticos, é possível depreender que o ensino de

classes de palavras, na maioria das vezes, está restrito ao conhecimento da nomenclatura. A

autora retoma um estudo de Neves da década de 1990, o qual demonstra que as classes de

palavras constituem o conteúdo mais abordado em sala de aula por professores. Pinilla

([2007] 2011) ressalta que os exercícios de identificação e classificação constituem, ainda na

época da publicação de seu trabalho, a prioridade dos professores de ensino fundamental e

médio, havendo, inclusive, uma repetição, ano a ano, de muitos conteúdos.

Pinilla ([2007] 2011) retoma, ainda, algumas definições de gramáticas e livros

didáticos sobre as dez classes propostas pela Nomenclatura Gramatical Brasileira (NGB):

adjetivo, substantivo, advérbio, verbo, artigo, pronome, numeral, preposição, conjunção e

interjeição. Diante desse agrupamento, a autora demonstra que há uma mistura de critérios

nessas definições: ora é adotado o critério semântico, ora o morfológico, ora o funcional.

Como exemplificação, destacamos que o substantivo e o numeral são definidos somente a

partir de aspectos semânticos; o verbo a partir de critérios semânticos e mórficos e o advérbio

a partir dos três critérios: morfológico (“palavra invariável”), semântico (“exprime

60

circunstância”) e funcional (“modifica essencialmente o verbo”) (PINILLA, [2007] 2011, p.

172).

Após a retomada de diversos estudos sobre as classes de palavras, quase todos em

perspectiva teórica, Pinilla ([2007] 2011) termina seu estudo apontando que os materiais

didáticos devem ser melhor organizados para que haja um ensino produtivo das classes. Além

disso, a autora aponta que é preciso que pesquisadores tenham contato contínuo com

universitários e professores em atuação para que eles possam discutir como integrar o ensino

de leitura às classes de palavras. Para Pinilla ([2007] 2011), é preciso destacar os estudos

descritivos acerca das classes, mas vinculados ao conhecimento de como cada classe atua na

organização e na produção textual. A autora conclui indicando que o estudo desses elementos

deve contribuir para ampliar a expressão oral e escrita dos alunos para que possa combiná-los

na construção de seus textos,

Já Moraes Pinto e Alonso (2012) destacam os advérbios para discutir, também, o

ensino de classes de palavras. As pesquisadoras retomam autores, como Pinilla ([2007] 2011)

e Dias ([2001] 2005) para evidenciar que há muito a ser pensado sobre o ensino das classes.

As autoras propõem que é preciso focalizar a relação entre o texto e as classes de palavras

sem tratá-las de forma estanque, considerando, na verdade, categorias radiais, baseando-se,

sobretudo, na noção de categorização da LC. De acordo com as autoras, para isso, é preciso

apresentar, em sala, as características de determinada classe – como a dos advérbios – sem

deixar de demonstrar que nem todos os membros dessa categoria são prototípicos. Pautando-

se em Bybee (2010), elas apontam, ainda, que os membros mais centrais de uma determinada

categoria normalmente são os mais frequentes.

Moraes Pinto e Alonso (2012) destacam o caso dos advérbios modais em -mente para

debater os problemas na descrição da classe, argumentando que as tentativas de caracterização

dos advérbios são limitadas, pois não consideram a ordenação desses elementos e o gênero em

que eles estão inseridos, além de apresentarem os advérbios como uma classe fechada, o que

os opõe ao posicionamento das autoras. Posteriormente, retomam a abordagem das gramáticas

tradicionais, de alguns estudos linguísticos e de alguns livros didáticos em relação à classe

destacada. Por fim, reforçam a importância de categorias textuais no trabalho com advérbios a

partir do estudo de Moraes Pinto (2008) e postulam que oferecer ao aluno instrumentos para

tratar da gramática de sua língua é um começo promissor para um ensino produtivo.

Em relação à elaboração de propostas de atividades para ensino básico, também há

poucos trabalhos que observam os modalizadores. Algumas obras, porém, englobam diversos

61

elementos gramaticais, incluindo outros tipos de advérbios, a partir de uma abordagem

enunciativa (SANTOS; CUBA RICHE; TEIXEIRA, 2012; SANTOS, 2016). Destacamos,

contudo, o trabalho de Koch e Elias (2016), que propõe atividades que focalizam a relação

entre os articuladores textuais e a argumentação. As autoras destacam adverbiais

modalizadores, como “infelizmente” e “felizmente” para trabalhar a identificação de

articuladores textuais, a discussão de suas funções pragmáticas e a orientação argumentativa

que imprimem em textos de diferentes gêneros e tipologias textuais.

Dessa forma, percebemos que os adverbiais modalizadores ainda são pouco frequentes

em trabalhos sobre ensino de língua portuguesa. Muitas vezes, essas investigações recorrem,

como expusemos, ao trabalho com classes de palavras, ou, ao menos, com a classe dos

advérbios. Devido à sua heterogeneidade, entretanto, é preciso que subgrupos da classe sejam

focalizados, o que ainda constitui um caminho a ser percorrido nas pesquisas acadêmicas com

enfoque aplicado. Com esse segmento em relação aos adverbiais modalizadores, passarão a

ser priorizadas, como apontam as OCEM:

[as] formas de agenciamento de diferentes pontos de vista na textualização

(identificação dos elementos que sinalizam as vozes e o posicionamento dos

enunciadores trazidos à cena no texto), uso dos elementos de modalização

(identificação dos segmentos que funcionam como indicações acerca do modo como

o enunciador se posiciona em relação ao que é dito, a seu interlocutor ou a si

mesmo) (BRASIL, 2006, p. 38).

Esta Dissertação pretende estabelecer contribuições para o ensino a partir da

caracterização de como os adverbiais modalizadores são utilizados pelos articulistas em

jornais, como o tema é tratado em livros didáticos de Ensino Médio e como é possível tratar

do tema em sala de aula a partir de propostas de atividades elaboradas diante de alguns textos

usados como amostra deste trabalho.

62

4. METODOLOGIA

A metodologia desta Dissertação engloba três etapas. Em relação ao uso de adverbiais

modalizadores em artigos opinativos, estabelecemos uma análise qualitativa e quantitativa

baseada em uma amostra compostas por jornais, pois esse é um gênero recorrente nesse

suporte. A opção pelos jornais O Globo Online e O Dia Online foi motivada pela

periodicidade na publicação de artigos de opinião nesses jornais; já a escolha pelas versões

online relaciona-se ao acesso mais facilitado aos textos usados na amostra constituída para a

Dissertação. Ao todo, analisamos o uso dos adverbiais modalizadores em 60 artigos de

opinião, 30 do jornal O Globo Online e 30 do jornal O Dia Online. Coletamos todos os dados

presentes nesses textos, totalizando 74 adverbiais.

Foram observados os seguintes aspectos:

(a) posição na oração: se marginal ou não-marginal;

(b) estrutura do adverbial: se advérbio, advérbio em -mente ou locução adverbial.

(c) articulação textual: se epistêmico, deôntico, afetivo, delimitador ou axiológico;

(d) veículo: se O Globo Online ou O Dia Online;

Também analisamos um outro aspecto, a subjetividade, a partir de fator “articulação

textual”. Ou seja, depois de classificarmos todos os dados num dos tipos de articuladores

textuais, procuramos ver que tipos são mais subjetivos e que tipos são menos subjetivos. A

proposta de gradiência de subjetividade está no capítulo seguinte.

Além da análise do uso, também observamos a abordagem dos modalizadores em

livros didáticos de Ensino Médio. O projeto a que esta Dissertação se vincula também tem

como objetivo estabelecer contribuições para o ensino de adverbiais. Além disso, percebemos

que não havia trabalhos sobre essa temática.

Metodologicamente, optamos por uma análise panorâmica dos livros didáticos, tendo

em vista os outros objetivos do trabalho. O guia do PNLD 2015 apresenta 10 coleções aptas

para serem utilizadas nas escolas públicas, totalizando 30 livros didáticos, portanto

escolhemos aleatoriamente 4 dessas coleções, totalizando 12 livros didáticos: Português:

linguagens em conexão, Português: contexto, interlocução e sentido, Português: língua e

cultura e Vozes do mundo: literatura, língua e produção de textos.

Essa análise não consistiu apenas em observar a abordagem em capítulos relacionados

à temática diretamente, ou seja, aqueles que abordam prototipicamente adverbiais,

63

argumentação, classes de palavras. Buscamos observar como ocorria essa abordagem em

todos os capítulos dos 12 livros destacados, mesmo que, aparentemente, não tivessem relação

com o tema. Além disso, observamos, nos 12 livros didáticos, como era o tratamento do

Manual do Professor em relação ao tema, se havia alguma contribuição complementar em

relação aos modalizadores.

Nos livros didáticos, observamos dois aspectos:

(a) ligação entre adverbiais modalizadores e produção de textos argumentativos;

(b) apresentação dos usos adverbiais modalizadores em situações reais de uso.

Diante disso, nossa metodologia engloba uma análise qualitativa em relação ao uso

dos modalizadores, observando seu papel na construção dos artigos de opinião e congregando

com uma análise quantitativa pautada, sobretudo, na noção de frequência. Nos livros

didáticos, observamos qualitativamente a abordagem sobre os modalizadores em exposições

do livro, exercícios e no Manual do Professor, não tendo como objetivo quantificá-las, mas

estabelecer um panorama e, possivelmente, uma generalização. Além disso, também

confrontamos essas análises para que pudéssemos elaborar propostas de atividades que

preencham as lacunas encontradas.

Em relação a essas propostas, seguimos a metodologia já usada em Colamarco (2014)

para elaboração de atividades sobre referenciação em fábulas de Lobato e Esopo. A autora

observou as estratégias mais salientes e produtivas em sua amostra e elaborou atividades que

as refletissem. Santos, Cuba Riche e Teixeira (2012) e Santos (2016) também elaboraram

atividades sobre temas diversificados diante de exemplos reais de uso e de seus papéis

textuais. Nesta Dissertação, buscamos elaborar atividades a partir de textos pertencentes à

nossa amostra e dos usos prototípicos dos modalizadores, preenchendo, também, as lacunas

dos livros didáticos analisados.

64

5. ANÁLISE DE ADVERBIAIS MODALIZADORES: USO E ABORDAGEM

5.1. Uso de adverbiais modalizadores em artigos de opinião

Nesta seção, observaremos o uso dos adverbiais modalizadores a partir de uma

amostra composta por 60 artigos de opinião dos jornais O Globo Online e O Dia Online.

Primeiramente, faremos um panorama da frequência dos elementos nos jornais e,

posteriormente, observaremos seu uso em relação ao seu posicionamento na cláusula e sua

estrutura e aos efeitos de sentido envolvidos na articulação textual, considerando aspectos,

como a subjetividade e o veículo. Também observaremos como os livros didáticos de Ensino

Médio abordam a temática dos adverbiais modalizadores a partir de sua ligação à

argumentação e de exemplos efetivos de uso ligados aos efeitos de sentido e aos papéis

funcionais desses elementos.

5.1.1. Frequência dos adverbiais modalizadores

Nossa análise em relação aos adverbiais modalizadores parte dos usos dos

modalizadores na amostra montada para o trabalho. Ressaltamos que não temos como

objetivo apresentar uma visão categórica sobre o uso desses elementos, nem defender que no

gênero artigo de opinião esses usos são mais recorrentes, pois reconhecemos a complexidade

de caracterizar e categorizar determinados usos relacionados a um gênero. Para isso, é

necessário obter uma amostra mais ampla, que apresente diferentes suportes, veículos, etc.

Por isso, buscamos, na verdade, relacionar os usos ao gênero, encontrando possíveis relações,

sem taxá-las, contudo, como categóricas.

Como um dos nossos objetivos é observar de que maneira os adverbiais modalizadores

são usados em artigos de opinião, mapeamos alguns aspectos relacionados a seus usos:

posição, estrutura, articulação textual e subjetividade. Também buscamos observar se havia

alguma influência do veículo em relação ao seu uso. Ao longo dos exemplos e dos resultados

apresentados, mostraremos se há alguma relação com esses aspectos quantitativa e

qualitativamente.

No gráfico abaixo, apresentamos a distribuição geral dos 74 adverbiais modalizadores

na amostra montada para o trabalho:

65

Jornal O Globo Online

Jornal O Dia Online

Gráfico 1: frequência dos adverbiais modalizadores nos jornais analisados

Percebemos, a partir do gráfico 1, que houve mais adverbiais modalizadores no jornal

O Globo Online do que no jornal O Dia Online. Do total de 74 dados, 66% deles (ou seja, 49

casos) ocorreram em O Globo Online e 34 % (isto é, 25 casos) em O Dia Online. Esses

resultados serão mais bem explorados a partir das próximas seções com os testes das

hipóteses postuladas anteriormente.

5.1.2. Posição

Nossa hipótese em relação à ordenação era que os adverbiais modalizadores

apresentariam diferentes tendências de posicionamento diante de sua estrutura (advérbio,

advérbio em -mente ou locução), tendo em vista as investigações de Moraes Pinto (2008),

Gonçalves (2015; 2016) e Cezario et al. (no prelo). Os adverbiais modalizadores tendem a

ocorrer em diferentes posições diante de seu padrão estrutural (advérbio, advérbio em mente,

locução). A pesquisa de Moraes Pinto (2008), com base numa amostra formada por textos

religiosos e injuntivos, demonstrou que 65,6 % dos dados com advérbios em -mente ocorrem

em posição inicial (ou seja, margem esquerda). A mesma autora informa que, em cartas (de

leitor e particulares), a ocorrência em posição inicial ainda é mais alta: cerca de 80% dos

dados ocorrem nessa posição (cf. CEZARIO et al, [no prelo]). Já as locuções adverbiais de

valores semelhantes tendem a ocorrer em posição medial (cf. GONÇALVES, 2016). Com

relação aos advérbios simples estudados aqui não encontramos pesquisas com hipóteses

relativas à ordenação de palavras, mas acreditamos que cada item tenha um comportamento

66

em termos de posição mais frequente.

Dividimos os modalizadores em dois grupos quanto à sua posição: marginal e não

marginal. Essa opção foi motivada pelo baixo quantitativo de dados, tendo em vista que

trabalhos com maior quantitativo apresentam um agrupamento mais vasto para suas posições,

a exemplo de Ilogti de Sá (2015).

Podemos observar alguns exemplos a seguir:

a) Posição marginal à oração

(7) “Talvez, minha mãe esteja vendo. Depois ela vai se ocupar de outras coisas lá no céu e aí

ele namora como quiser” (Artigo “Minha mãe é uma estrela” – Jornal O Dia Online).

(8) “Basicamente, em troca da “valorização” dos analistas tributários, os parceiros políticos

conseguiriam perfurar as regras de autonomia da Receita, nomeando aliados para os postos de

chefia do órgão federal.” (Artigo “Receita para capturar o Leão” – Jornal O Globo Online).

(9) “No geral, os prefeitos, como muitos governadores, administraram como se nunca

houvesse a possibilidade de uma redução nas receitas. Era como se todo ano houvesse mais

dinheiro que no anterior" (Artigo “Ajude, por bem ou por mal” – Jornal O Globo Online).

Nos exemplos apresentados acima, podemos observar que os adverbiais modalizadores

ocupam as margens da oração: em (7), o modalizador “talvez” introduz a oração “talvez,

minha mãe esteja viajando”; em (8) o adverbial “basicamente” ocorre na margem esquerda da

oração; em (9) a locução modalizadora “em geral” também ocorre no início da oração,

introduzindo-a. Dos dados encontrados em posições marginais, ressaltamos que houve apenas

dois casos em margem direita, ocupando a posição final da oração, como podemos ver a

seguir:

(10) “De acordo com a Febraban, o mercado é um dos mais avançados tecnologicamente.

Assim, houve nos últimos anos um salto dos canais digitais, o que impactou no crescimento

de agências e da mão de obra" (Artigo “Greve dos bancários, uma luz na histórica

exploração” – Jornal O Dia Online).

67

Nesse exemplo, o adverbial modalizador “tecnologicamente” ocupa posição marginal

final, fechando a oração e a frase em que está inserido.

b) Posição não marginal à oração

(11) “Depois de uma letargia talvez secular em relação ao tema, os presidentes dos Três

Poderes da República se encontram para debater a segurança pública.” (Artigo “Reunião de

cúpula” – Jornal O Globo Online).

(12) “Lembrei-me do '‘sambinha’' — como Tom o chamava — ao observar que, passados três

meses do afastamento da presidente Dilma, muito pouco de concreto foi realizado para o

reequilíbrio das contas públicas. Apesar do déficit primário (diferença entre despesas e

receitas excluído o pagamento de juros) de R$ 170,5 bilhões, Temer praticamente limitou-se

a encaminhar ao Congresso Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que cria um teto para

as despesas” (Artigo “A PEC não cura zika” – Jornal O Globo Online).

(13) “Os americanos têm uma expressão para qualificar suas comédias cinematográficas

leves, em geral românticas e familiares, que eles chamam de feel good comedies (mais ou

menos, ‘comédias para se sentir bem’)” (Artigo “Um mundo maravilhoso” – Jornal O Dia

Online).

Nos exemplos apresentados nesta subseção, podemos perceber que todos os dados

apresentam ordenação não marginal: em (11), o modalizador “talvez” está em posição não

marginal, entre “depois de uma letargia” e “secular”; em (12), o adverbial “praticamente”

ocorre em posição não marginal, mais especificamente entre o sintagma deslocado “apesar do

deficit primário (diferença entre despesas e receitas excluído o pagamento de juros) de R$

170,5 bilhões”, o sujeito (“Temer”) e a outra parte da oração “limitou-se a encaminhar ao

Congresso Proposta de Emenda à Constituição (PEC)”; em (13), a locução “em geral” ocorre

entre dois trechos da oração: “os americanos têm uma expressão para qualificar suas comédias

cinematográficas leves” e “românticas e familiares”.

Moraes Pinto (2008) e Gonçalves (2015) demonstram, em seus trabalhos, que as

posições prototípicas dos advérbios modalizadores em -mente no século XX são Adverbial

68

seguido de Oração e Oração seguida do Adverbial, ou seja, apresentam um posicionamento

predominantemente marginal. Já em Gonçalves (2016), podemos observar que as locuções

adverbiais modalizadoras apresentam ordenação prototípica no meio da oração na mesma

sincronia do português – século XX. Assim, o posicionamento desses elementos parece estar

ligado à estrutura do adverbial.

Marginal Não Marginal

ADVÉRBIOS5 9

60%

6

40%

ADVÉRBIOS EM -MENTE 16

36,4%

28

63,6%

LOCUÇÕES ADVERBIAIS 1

14,3%

6

85,7%

Tabela 1: relação entre ordenação e estrutura do adverbial

A partir da tabela acima, podemos perceber que as tendências de ordenação dos

adverbiais apresentam algumas disparidades. Em relação aos advérbios, percebemos que

houve mais dados em posição marginal, já em relação aos advérbios em -mente e às locuções

adverbiais observamos que há mais dados em posicionamento não marginal. Ou seja, de fato,

há algumas especificidades na relação estrutura e ordenação, o que confirma nossa hipótese.

Esses resultados corroboram o estudo de Gonçalves (2016) em relação às locuções adverbiais

modalizadoras em cartas, mas vão de encontro aos achados da autora em relação aos

advérbios em -mente, o que aponta para a necessidade de observar outros gêneros textuais

quanto à ordenação.

Observamos, também, se o veículo poderia ser um aspecto motivador para o

posicionamento não marginal dos adverbiais modalizadores. Assim, chegamos às tabelas

abaixo:

5 . Não quantificamos os dados com advérbio “quase”, tendo em vista que esse elemento ocorre quase

categoricamente em posição não marginal, o que poderia enviesar nossa análise.

69

Marginal Não Marginal

ADVÉRBIOS 6

54,5%

5

45,6%

ADVÉRBIOS EM -MENTE 10

38,5%

16

61,5%

LOCUÇÕES ADVERBIAIS 1

14,3%

6

85,7%

Tabela 2: relação entre ordem dos adverbiais modalizadores e sua estrutura no jornal O Globo

Online

Marginal Não Marginal

ADVÉRBIOS 3

75%

1

25%

ADVÉRBIOS EM -MENTE 6

31,6%

13

68,4%

LOCUÇÕES ADVERBIAIS –

Tabela 3: relação entre ordem dos adverbiais modalizadores e sua estrutura no jornal O Dia

Online

Nas tabelas 2 e 3, podemos observar que há mais dados em posição não marginal do

que em posição marginal nos padrões estruturais advérbio em -mente e locução adverbial. Em

relação ao primeiro grupo, percebemos que essa tendência ocorre em ambos os jornais, nas

locuções, percebemos que há essa tendência no jornal O Globo Online, mas no jornal O Dia

Online elas sequer são utilizadas. Já os advérbios ocorrem mais em posição marginal em

ambos os jornais. Ou seja, não houve influência do veículo nesse aspecto do uso dos

adverbiais modalizadores. Pesquisas futuras, com base numa amostra maior, poderão

confirmar, ou não, as tendências apontadas aqui.

5.1.3. Articulação textual

Postulamos inicialmente que os adverbiais modalizadores, que atuam como

articuladores textuais, veiculariam efeitos de sentido mais subjetivos. Essa hipótese se vincula

70

ao gênero artigo opinativo tendo em vista que é esperado que em textos que expressem

opinião haja marcas mais subjetivas do que em textos pouco opinativos, como as notícias.

Para teste dessa hipótese, retomamos o trabalho de Koch (2003b) sobre articulação textual e

observamos quais efeitos de sentido eram veiculados pelos modalizadores, tidos pela autora

como articuladores metaenunciativos, ou seja, os que “comentam” a enunciação. O

agrupamento feito neste trabalho não compreende uma repetição da proposta de Koch

(2003b), mas, na verdade, uma adaptação, um reagrupamento de acordo com os dados que

encontramos, o que pode ser visto nos exemplos a seguir:

a) Epistêmico: demonstra o grau de comprometimento/ engajamento do enunciador e o grau

de certeza em relação ao que está sendo enunciado.

(14) “Isso os jornais estrangeiros ainda não registraram, eles, que estão implicando tanto com

nossa maneira de torcer, e até de comer: esta Olimpíada talvez seja a mais liberada que já

existiu em termos de comportamento” (Artigo “Sem culpa ou preconceito” – Jornal O Globo

Online).

(15) “O gesto político de repercussão nacional, certamente, já está provocando frutos no

encaminhamento do ordenamento das contas estaduais, evidenciando a gravidade do

momento e da importância dos altos mandatários se preocuparem menos com a próxima

eleição e mais com o futuro do país” (Artigo “O grito do Rio” – Jornal O Dia Online).

Nos exemplos acima, apresentamos casos de modalizadores que veiculam efeito de

sentido epistêmico. Em (14), o enunciador constrói seu texto apresentando uma crítica à

imagem construída pela imprensa estrangeira em relação ao comportamento dos brasileiros

nas olimpíadas, incluindo sua torcida e sua forma de alimentação. Posteriormente, busca um

argumento contra os julgamentos midiáticos em relação ao evento, afirmando que seriam os

jogos com maior liberdade comportamental. Contudo, utiliza o modalizador “talvez”,

possivelmente como uma estratégia atenuativa, relativizando, sendo menos categórico e,

portanto, apresentando menor grau de certeza e comprometimento. Já em (15), há o

modalizador “certamente”, que indica um posicionamento bem mais assertivo, categórico em

relação à proposição: as consequências da repercussão nacional do gesto político. O grau de

certeza e comprometimento é muito maior, da mesma forma que o grau de engajamento,

71

construindo uma argumentação mais marcada subjetivamente e possivelmente mais

transparente ao leitor.

b) Deôntico: indica o grau de imperatividade/ facultatividade dos enunciados.

(16) “Sempre que ouvimos uma dessas canções para se sentir bem, nos imaginamos num pôr

de sol de uma praia idílica, a correr de braços abertos em direção ao ser amado, como nos

mais contundentes comerciais de cigarro de antigamente. É como se o pôr do sol, a praia

idílica e o ser amado só nos fossem permitidos nesses momentos de alienação e fantasia. Na

real, não temos direito a nada disso, porque nos disseram que o prazer não presta, e o mundo é

necessariamente um vale de lágrimas. O contrário do que está, por exemplo, na difamada

‘what a wonderful world’'” (Artigo “Um mundo maravilhoso” – Jornal O Globo Online).

(17) “Imagine-se a situação de um proprietário que tem a sua terra invadida, enquanto

decisões judiciais de reintegração de posse não são cumpridas. O Pará é um estado que vive

uma enorme crise, em uma situação que poderíamos caracterizar como a de uma terra sem lei.

Um tal mecanismo de obtenção de terras, a preços vigentes, e com pagamento em dinheiro —

e não necessariamente mediante TDAs (Títulos da Dívida Agrária) — seria um instrumento

que poderia facilitar o equacionamento de tais conflitos, além, evidentemente, de um maior

respeito à lei, não seguida em vários estados do país. Seriam compras nas condições de uma

economia de mercado" (Artigo “Incra” – Jornal O Globo Online).

Nos exemplos (16) e (17), percebemos que há o uso de modalizadores que apresentam

efeito deôntico. Em (16), o adverbial “necessariamente” indica como o mundo é: um vale de

lágrimas. Seu uso é relacionado ao que já vem sendo construído por outras pistas textuais no

artigo em questão. A ideia de o mundo como um local ruim é montada a partir da ausência de

direitos, da ideia de que o prazer é algo ruim, o que leva o mundo a ser fatalmente um vale de

lágrimas, ou seja, um local de tristeza e desânimo. Nesse exemplo, podemos perceber que o

modalizador “necessariamente” indica a imperatividade do que está sendo enunciado,

afirmando que certamente o mundo será da forma enunciada. No exemplo (17), o modalizador

“necessariamente” é utilizado pelo enunciador para indicar o grau de facultatividade do

enunciado, demonstrando que não é obrigatório que haja Títulos da Dívida Agrária para que

haja obtenção de terras a preços vigentes. Vale ressaltar que, embora os exemplos (16) e (17)

72

apresentem o mesmo modalizador, a pista textual “não” orienta a argumentação para um

caminho diferente no exemplo (17), atuando na construção dos sentidos do texto.

c) Afetivo ou atitudinal: encena a atitude psicológica do enunciador em relação ao evento

enunciativo.

(18) “Lamentavelmente, a maioria das agências hoje existentes, em particular as municipais,

não se enquadra nesse figurino e, por uma questão de escala, jamais se enquadrará” (Artigo

“Caminhos para privatização” – Jornal O Globo Online).

(19) “Houve quase 14 mil amputações e mais de 40 mil fraturas. O que justificaria afrouxar as

normas, beneficiando (pra variar) os empresários em detrimento dos trabalhadores?

Infelizmente, se faz necessário estarmos atentos a iniciativas que vão contra a vida dos

trabalhadores” (Artigo “Retrocesso nas normas de segurança do trabalho” – Jornal O Dia

Online).

Nos exemplos (18) e (19), há casos que identificamos efeito de sentido afetivo. Em

(18), o adverbial “lamentavelmente” marca o posicionamento do enunciador em relação às

agências brasileiras atuais. Esse modalizador não apenas marca a subjetividade,

demonstrando, além disso, uma avaliação negativa em relação às agências nacionais. No

exemplo (19), o modalizador “infelizmente” também marca um posicionamento negativo em

relação ao fato apresentado: a necessidade de atenção em relação às iniciativas contra a vida

dos trabalhadores. Em ambos os casos, os modalizadores apresentam um posicionamento

claro do enunciador em relação à proposição, contudo é necessário destacar a escolha de bases

adjetivas ligadas às emoções, como “infeliz” e “lamentável”, que apresentam uma avaliação

mais passional, causando um efeito discursivo também calcado na intersubjetividade entre

escritor e leitor.

d) Delimitador ou hedge: explicita o âmbito do conteúdo enunciado.

(20) “Para ilustrar, mencionamos que a politicamente correta isenção das mercadorias da

cesta básica é um benefício autorizado pelo Confaz. Portanto, para dar a César o que é de

César, é necessário excluir 75% dos incentivos concedidos naquele período, já que decorrem

73

de tais dispositivos legais” (Artigo “Manicômio tributário, o retorno” – Jornal O Dia Online).

(21) “O Estado brasileiro historicamente ignora grandes partes das cidades, compostas pelos

bairros populares, localizados em geral, mas não só, no que hoje chamam por periferias”

(Artigo “Reunião de cúpula” – Jornal O Globo Online).

Nos exemplos (20) e (21), encontramos alguns modalizadores com efeito discursivo

delimitador. Em (20), o adverbial destacado delimita que a isenção das mercadorias da cesta

básica é “politicamente correta”. É importante ressaltar que, nesse caso, o adverbial assume

um sentido além do seu original; “politicamente” não se refere a um aspecto político stricto

sensu, mas há algo mais amplo, social, negociado entre os cidadãos em sociedade. A

combinação com outra pista textual – “correta” – reforça esse novo sentido do modalizador

“politicamente”. Casos de modalizadores apresentando novos papéis semânticos também

foram defendidos por Castilho e Castilho ([1992] 2002) a partir das classificações prototípico,

paragógico e complexo. Em (21), o modalizador “historicamente” delimita a ausência de

prioridade em relação a algumas partes da cidade, apontando que é uma questão histórica, que

não ocorre apenas atualmente, mas sistematicamente. Logo após, a locução “em geral”

também delimita, em alguma medida, que há uma problemática geralmente mais ampla nos

bairros periféricos. Além desse delimitar, o adverbial “historicamente” constrói o texto

argumentativamente, mostrando o descaso do estado com a população há muitos anos, o que é

complementado com a locução “em geral”, que aponta para um descaso sobretudo com a

população mais pobre.

e) Axiológico: representa a valoração em relação ao enunciado.

(22) “Aqui, dois ‘detalhes’ se destacam imperiosamente: as regras explícitas e um uso do

corpo com foco exclusivo no seu desempenho, talento e capacidade. No caso, uma refrega do

atleta-herói contra o tempo, o espaço e os “estrangeiros” — esses outros que,

paradoxalmente, não podem ser eliminados” (Artigo “Detalhes olímpicos” – Jornal O Globo

Online).

No exemplo (22), o único com adverbial modalizador axiológico encontrado na

amostra, percebemos o uso do modalizador “paradoxalmente”, que indica a avaliação do

74

enunciador em relação aos problemas enfrentados pelos atletas nas olimpíadas. Há um

julgamento, indicando que é paradoxal a impossibilidade de eliminar alguns percalços de sua

trajetória, ideia reforçada por outra pista textual: a expressão “atleta-herói”. Os axiológicos

apresentam um posicionamento mais claro do enunciador, com alto grau de subjetividade,

mas são menos subjetivos do que os afetivos ao trazer bases adjetivas ligadas às emoções, o

que possivelmente causa no leitor menos efeitos discursivos.

Após a observação dos dados, percebemos que alguns desses efeitos são mais

subjetivos do que outros. Postulamos, então, com base na análise dos dados e na literatura, o

seguinte continuum:

Mais subjetivos Menos subjetivos

Seguindo esse continuum, teríamos, no polo dos mais subjetivos, exemplos, como:

(23) “Dornelles, além de preparado como economista e professor, alto funcionário de carreira

do Ministério da Fazenda, é político nato, tendo exercido muito jovem a função de secretário

particular do primeiro-ministro, seu tio Tancredo Neves. Seu pai, general Mozart Dornelles,

fez carreira militar e de gestor público respeitado. O tio Ernesto, também militar, foi

governador e senador pelo Rio Grande do Sul. Não poderia ter tido melhor escola e melhores

mestres. Exemplo, infelizmente, raro na política, tem sido de extrema correção com o

governador licenciado, mostrando na postura discreta, mas firme, ao enfrentar a tormenta, a

grandeza do homem público e da figura humana” (Artigo “O grito do Rio” – Jornal O Globo

Online).

Nesse exemplo, temos o adverbial modalizador “infelizmente” marcando de forma

clara o posicionamento do enunciador em relação à postura dos políticos no Brasil. Ele

lamenta por poucas políticos terem o preparo e as atitudes do vice-governador Francisco

Dornelles, ressaltando o quão discreto e firme ele é; o que demonstra, para ele, que o político

Afetivo > Axiológico > Epistêmico > Deôntico > Delimitador

75

é um homem grandioso na política e na vida. O modalizador reforça subjetivamente o

discurso do enunciador, mas ancora-se em outras pistas textuais, ou seja, em outras marcas

linguísticas, como os adjetivos “raro”, “extrema”, “discreta” e “firme”, que, colaboram na

construção de sua argumentação, construindo uma cadeia argumentativa mais sólida, que

engloba aspectos profissionais e pessoais. Dessa forma, a imagem de Dornelles, que já vinha

sendo construída ao longo do texto, como um homem bem preparado (“economista”,

“professor”, “alto funcionário do ministério da fazenda”) e talentoso (“político nato”), passa a

ser defendida e construída com mais clareza a partir do articulador argumentativo

“infelizmente”.

Já no polo menos subjetivo, teríamos casos, como:

(24) “Em um cenário com dados alarmantes de acidentes na indústria, divulgados pelo

Ministério do Trabalho e Previdência Social, é no mínimo contraditória a atitude do governo

interino de ceder aos empresários. Somente de 2011 a 2013 foram cerca de 600 mortes por

causa desse tipo específico de acidente, uma a cada 44 horas. Houve quase 14 mil

amputações e mais de 40 mil fraturas. O que justificaria afrouxar as normas, beneficiando (pra

variar) os empresários em detrimento dos trabalhadores?” (Artigo “Retrocesso nas normas de

segurança do trabalho” – Jornal O Dia Online).

Nesse exemplo, o adverbial modalizador “quase” atua na construção argumentativa do

texto delimitando a quantidade de amputações no período de 2011 a 2013. O modalizador,

além de delimitar, também atua na intensificação do valor, já que não o especifica

completamente, causando uma impressão de que há ainda mais amputações. Se fosse usado

um número exato, como 37 mil, haveria menor efeito discursivo no leitor. Da mesma forma,

posteriormente, é utilizado o intensificador “mais” para designar as faturas, deixando claro

que essas pistas textuais colaboram para a construção da tese do texto de que a atitude do

governo em ceder aos empresários é contraditória.

É preciso ressaltarmos, ainda, que as categorias apresentadas são fluidas e englobam

elementos diferentes, com complexidades estruturais, pragmáticas e cognitivas distintas. No

exemplo a seguir, podemos observar essa questão:

(25) “O Réveillon seria uma espécie de início das libações que só se encerram na Quarta-Feira

76

de Cinzas, em grande estilo. Para ser exato, devo confessar que não é exatamente de

Carnaval que eu gosto: prefiro mesmo as escolas de samba” (Artigo “Balanço de Carnaval” –

Jornal O Dia Online).

Em (25), podemos observar o adverbial modalizador “exatamente”. O artigo opinativo,

escrito no contexto do carnaval carioca de 2016, apresenta uma relação entre a comemoração

de ano novo e as festas de carnavalescas. O enunciador parece ter como objetivo deixar claro

(“para ser exato”) que prefere as escolas de samba ao carnaval em si e, por isso, utiliza o

adverbial “exatamente”. Esse termo, então, parece delimitar o que ele gosta, mas, ao mesmo

tempo, apresenta um grau de certeza em relação ao que está sendo enunciado, o que faz com

que seja tido como veiculador também de efeito epistêmico. No trabalho, consideramos que

seu valor é delimitador, embora reconheçamos que há um grau de certeza no enunciado bem

maior do que em outros casos de delimitadores, como “historicamente” e “matematicamente”.

Com esse exemplo, queremos demonstrar que há uma fluidez categorial entre esses elementos

e que eles podem, a depender do contexto enunciativo, apresentar distintos efeitos discursivos.

Além disso, uma mesma categoria engloba elementos bastante diferentes e com graus de

subjetividade também distintos. No entanto, acreditamos que seja possível estabelecer alguns

postulados baseando-se, sobretudo, nos exemplos prototípicos dessas categorias.

Assim, podemos concluir que os modalizadores “infelizmente”, “quase” e

“exatamente” veiculam, de fato, efeitos de sentido subjetivos, mas apresentam graus

diferentes. No exemplo (25), parece ser menos claro a um leitor que não atinja níveis de

leitura mais avançados que o modalizador “quase” veicule subjetividade, enquanto os

modalizadores “infelizmente” e “certamente” apresentam um posicionamento mais claro,

veiculando maior grau de subjetividade. Dessa forma, postulamos que há categorias mais e

menos subjetivas dentro do grupo dos adverbiais modalizadores e reconhecemos que, dentro

desses grupos, há elementos mais e menos prototípicos. Ressaltamos, ainda, que não

postulamos um continuum entre subjetividade e objetividade, pois, como mostram outros

trabalhos, toda linguagem apresenta marcas subjetivas e veicula ideologia (cf. VAN DIJK,

1997; PAULIUKONIS, [2003] 2007; ODORISI, 2016).

Diante do continuum apresentado, verificamos quantitativamente quais eram os efeitos

de sentido mais comuns e seu grau de subjetividade para que pudéssemos relacionar à nossa

hipótese. Obtivemos o seguinte resultado:

77

0% 10% 20% 30% 40% 50% 60%

Epistêmico

Delimitador

Deôntico

Afetivo

Axiológico

Efeitos de sentido

Gráfico 2: efeitos de sentido dos adverbiais modalizadores como articuladores textuais na

amostra utilizada

Esse resultado demonstra o efeito de sentido mais frequente na amostra do trabalho foi

epistêmico (54%), o qual está no meio do continuum de subjetividade postulado neste

trabalho, o que confirma nossa hipótese de que os modalizadores usados são mais subjetivos.

Acreditamos que o baixo quantitativo de dados com efeitos afetivo e axiológico possa estar

vinculado ao gênero textual (artigos de opinião) em que esses textos estão inseridos, tendo em

vista que parece ser mais características expressões de certeza do que de afetividade devido ao

próprio gênero. Ou seja, a ausência de adverbiais modalizadores com efeito axiológico e

afetivo não estaria ligada à menor expressão da subjetividade, mas a ser mais efetivo para os

enunciadores demonstrar seu grau de certeza em relação ao assunto debatido, muitas vezes de

cunho político, do que o uso de expressões que veiculem sentimentos e emoções.

Em outros suportes menos monitorados, como blog ou facebook, textos desse gênero

podem apresentar pistas textuais ligadas a outros efeitos de sentido. É preciso destacar a

ausência de adverbiais modalizadores como “com certeza” e “sem dúvida”, bastante

encontrados em outros trabalhos sobre o tema em outros corpora. Na fala, esses resultados

indicam outras tendências (cf. CASTILHO; CASTILHO, [1992] 2002) e na escrita menos

monitorada talvez modalizadores com efeito de sentido afetivo e axiológico possam ser mais

utilizados. Esse confronto aponta para a necessidade de estudar os usos no continuum

tipológico de Marcuschi ([2001] 2010) com textos distribuídos em gêneros que vão desde a

fala menos monitorada à escrita mais monitorada. Também é necessário destacar que boa

78

parte dos adverbiais modalizadores apresentam efeito delimitador, considerado por nós o

menos subjetivo, o que reforça o papel da linha editorial dos jornais O Globo Online e O Dia

Online e o suporte jornal de forma geral.

Esses resultados também podem ser explicados pelo princípio funcionalista da

marcação: formas mais marcadas tendem a ser menos frequentes do que formas menos

marcadas. Diante da existência de adverbiais modalizadores com diferentes efeitos de sentido,

como demonstramos, acreditamos que os modalizadores afetivos e axiológicos tendem a ser

mais marcados nesse aspecto, o que levaria a sua baixa frequência em textos desse gênero

nesse suporte. Por isso, formas que são menos marcadas (“historicamente”,

“tecnologicamente”, “matematicamente”) ocorreriam com maior frequência do que as formas

mais marcadas (“infelizmente”, “felizmente”, “com certeza”).

Em relação à distribuição dos modalizadores quanto aos seus efeitos de sentido nos

jornais e à sua constituição estrutural, apresentamos os gráficos a seguir:

0% 10% 20% 30% 40% 50% 60%

Epistêmico

Delimitador

Deôntico

Afetivo

Axiológico

Jornal O Dia Online

Jornal O Globo Online

Gráfico 3: relação entre efeitos de sentido dos adverbiais modalizadores e os jornais

utilizados

A partir desse gráfico, podemos observar que não há diferenças significativas nos dois

jornais, o que parece demonstrar uma aproximação entre eles. Mesmo tendo públicos-alvo

distintos, os efeitos dos modalizadores foram basicamente os mesmos. A diferença

quantitativa está no maior uso de adverbiais com efeito deôntico em O Globo Online e a

existência de um modalizador afetivo a mais em O Dia Online. A diferença de um dado não

apresenta grande valor estatístico, mas, se combinada com a baixa frequência de afetivos,

79

corrobora a argumentação apresentada anteriormente de que esses usos são pouco frequentes

devido ao suporte. O maior uso de modalizadores com efeito deôntico pode ser explicado pelo

constante uso do modalizador “necessariamente” por alguns articulistas, o que pode ter

causado a diferença quantitativa dos resultados.

Diante dos resultados encontrados em relação à subjetividade, percebemos que seria

válido observar um artigo de opinativo utilizado no trabalho em relação às suas marcas

subjetivas para analisarmos em que medida o uso dos modalizadores reflete o grau mais (ou

menos) subjetivo das pistas textuais encontradas nos textos pertencentes à amostra. Para isso,

utilizamos o artigo a seguir publicado no dia 13 de outubro de 2016 no Jornal O Dia Online:

O grito do Rio

O fim do ano já está aí, e as dificuldades tendem a se agravar

Em meio à tempestade provocada pela crise na economia e pela brutal queda da receita com o

petróleo (o Rio é o maior produtor nacional), há, pelo menos, uma boa notícia. A ação de Francisco Dornelles

no comando do Estado do Rio, durante a licença médica do governador Pezão, levantou com autoridade e

credibilidade a questão do endividamento dos estados — e até mesmo dos municípios. E de forma exemplar,

no desprendimento e na coragem em que se mostrou aberto a uma colaboração do governo federal na gestão

do caixa.

Na verdade, parte do drama vivido pelos estados é devida aos juros da dívida

consolidada junto ao governo federal, implacável na cobrança e insensível na renegociação

que a realidade impõe. Acuados, os governadores vão procurando sobreviver enquanto não

surge a inevitável solução. O fim do ano já está aí, e as dificuldades tendem a se agravar. E o

momento é este.

No entanto, o grito de alerta do governo fluminense trouxe o peso de um homem público dos mais

completos, tendo sido ministro da Fazenda, do Trabalho, da Indústria e do Comércio, deputado por cinco

legislaturas, senador e presidente nacional de um dos cinco maiores partidos do país. Dornelles, além de

preparado como economista e professor, alto funcionário de carreira do Ministério da Fazenda, é político nato,

tendo exercido muito jovem a função de secretário particular do primeiro-ministro, seu tio Tancredo Neves.

Seu pai, general Mozart Dornelles, fez carreira militar e de gestor público respeitado. O tio Ernesto, também

militar, foi governador e senador pelo Rio Grande do Sul. Não poderia ter tido melhor escola e melhores

80

mestres.

Exemplo, infelizmente, raro na política, tem sido de extrema correção com o

governador licenciado, mostrando na postura discreta, mas firme, ao enfrentar a tormenta, a

grandeza do homem público e da figura humana.

O gesto político de repercussão nacional, certamente, já está provocando frutos no

encaminhamento do ordenamento das contas estaduais, evidenciando a gravidade do

momento e da importância dos altos mandatários se preocuparem menos com a próxima

eleição e mais com o futuro do país. Ou seja, precisam ser mais estadistas e menos

politiqueiros.

O brado do Estado do Rio foi mais do que um ato voltado para a crise local e muito mais um fator

determinante de uma solução rápida e realista para o drama vivido pelos estados, com reflexos sociais

profundos.

No artigo “O grito do Rio”, percebemos que há diversas marcas de subjetividade

utilizadas pelo enunciador. Ao longo do artigo, são usados inúmeras escolhas lexicais que

avaliam de forma bastante subjetiva a enunciação (“tormenta”, “insensíveis”) e ajudam na

construção argumentativa do texto. Num primeiro momento, há a contextualização do

momento político e econômico vivido pelo estado do Rio de Janeiro, marcada pelas escolhas

lexicais “tempestade” para caracterizar a crise e “brutal” para descrever a queda da receita.

Posteriormente, o enunciador passa a construir a imagem positiva do vice-governador

Dornelles, caracterizando-o de forma extremamente idealizada, remetendo ao seu passado

político e enaltecendo suas origens familiares.

Ao longo do texto, são usados dois adverbiais modalizadores: “infelizmente” e

“certamente”. Ambos são modalizadores que marcam a subjetividade de forma mais clara,

sobretudo “infelizmente”. Esses modalizadores convergem para as demais marcas subjetivas

presentes no artigo, como o adjetivo “raro” em “exemplo, infelizmente, raro”, que constrói a

subjetividade e a argumentação junto com a pista textual “infelizmente”. Assim, embora haja

outras marcas de subjetividade que vão além dos adverbiais modalizadores, esses elementos

parecem refletir o uso mais (ou menos) subjetivo das pistas textuais. No artigo destacado, há

alta carga de subjetividade e os adverbiais modalizadores usados refletem essa tendência do

enunciador. Dessa forma, ressaltamos a importância de observar o comportamento das demais

pistas textuais na análise de qualquer fenômeno linguístico, tendo em vista que outros

elementos podem indicar efeitos de sentido distintos daqueles veiculados pelas pistas

81

estudadas na investigação.

Ao longo dessa subseção, observamos o uso dos adverbiais modalizadores em artigos

opinativos dos jornais O Globo Online e O Dia Online. Em relação à posição, encontramos

um número maior de dados em posição não marginal com as estruturas advérbio em -mente e

locução adverbial e um número maior de dados em posição marginal com os demais

advérbios. A hipótese foi parcialmente comprovada, pois em relação aos advérbios em –mente

esperávamos uma frequência maior em posição inicial, como foi apontado em outros

trabalhos (Cf. MORAES PINTO, 2008; CEZARIO, et al., no prelo). Mas é preciso levar em

consideração que os trabalhos anteriores tratavam de outros gêneros. Em relação aos efeitos

de sentido, percebemos uma predominância do efeito deôntico, provavelmente vinculada ao

alto uso do modalizador “necessariamente” e da existência de um continuum de subjetividade

em relação aos efeitos de sentido vinculados aos adverbiais modalizadores como articuladores

textuais. Tais resultados apontam, como defendemos anteriormente, para a necessidade de

novas investigações acerca desses elementos, principalmente em relação à sua posição.

5.2. A abordagem dos adverbiais modalizadores nos livros didáticos de Ensino Médio

Como expusemos na introdução, nossa análise dos livros didáticos é pautada em duas

hipóteses: (I) os adverbiais modalizadores serão mais abordados em capítulos/ atividades que

enfoquem gêneros com tipologia predominantemente argumentativa, tais como editoriais e

artigos de opinião, tendo em vista o papel de articulador textual argumentativo (CAMPOS;

TORQUATO, 2013) desses elementos; (II) os adverbiais modalizadores serão explorados,

sobretudo, a partir de seus efeitos de sentido e de seus papéis funcionais partindo de exemplos

reais de uso. Nas subseções seguintes, discutiremos em que medida algumas coleções

didáticas abordam o tema considerando essas duas hipóteses.

5.2.1. Português: linguagens em conexão

Em relação aos efeitos de sentido e aos papéis funcionais dos adverbiais

modalizadores, destacamos alguns trechos da coleção. No capítulo 29 do volume 1 da coleção

Português: linguagens em conexão, intitulado “Crônica humorística com diálogo e antologia

da turma” e inserido no eixo “Produção de textos orais e escritos”, há, na seção “Palavras na

lupa”, a apresentação de uma crônica de Luiz Fernando Veríssimo e um exercício.

82

Logo após, no exercício quatro, há o seguinte enunciado: “A crônica ‘Comunicação’

reproduz uma situação informal de fala. Identifiquem no texto algumas marcas de fala e

registrem-nas no caderno” (SETTE; TRAVALHA; STARLING, 2013, p. 346). Embora o

enunciado aparentemente não trate do tema abordado neste trabalho, posteriormente, há um

comando que pede, no item “b”, que sejam apresentados trechos em que há “interrupções que

contam com a cooperação do outro no que se refere a completar o sentido” (SETTE;

TRAVALHA; STARLING, 2013, p. 346). O livro coloca, para o professor, como um dos

gabaritos, a expressão “infelizmente, cavalheiro” (SETTE; TRAVALHA; STARLING, 2013,

p. 346). Já no item “h”, são pedidas “expressões usadas para orientar o interlocutor”. É

apresentado, mais uma vez, um modalizador, “assim”, tendo como exemplo: “É assim,

assim... assim” (SETTE; TRAVALHA; STARLING, 2013, p. 346).

Em ambos os itens, percebemos uma abordagem centrada nos efeitos de sentido

envolvidos no processo de modalização do discurso. Ao discutir “interrupções” e

“cooperação”, o livro demonstra que os adverbiais modalizadores têm papel intersubjetivo na

produção e na percepção do discurso, o que é possível, também, pela combinação com outras

pistas textuais, como o vocativo “cavalheiro” e o uso das reticências. Embora seja um

exercício focado na identificação dos papéis funcionais, sem apresentar reflexões posteriores,

é um ponto de partida importante, pois pode auxiliar na elaboração de propostas posteriores

pelos professores.

No capítulo 19, intitulado “Advérbios e locuções adverbiais” e inserido no eixo

“Gramática e estudo da língua”, do volume dois, o exercício dezesseis da seção “Passos

largos” trabalha os papéis funcionais do adverbial modalizador “quase”: “16. Registre o

sentido do advérbio ‘quase’ nos enunciados a seguir: a) João quase foi picado pela cobra; b)

Ela tem quase vinte anos; c) Eu tenho quase mil reais; d) Estou quase aposentando; e) A lei

está quase sendo aprovada” (SETTE; TRAVALHA; STARLING, p. 219).

Nesse exemplo, percebemos que o livro tem como objetivo destacar a importância do

contexto para os usos dos elementos linguísticos. O exercício tem como ponto positivo

demonstrar a multifuncionalidade do adverbial modalizador “quase” em distintos contextos

pragmáticos, mas não o faz a partir de exemplos reais de uso, de textos efetivos, recorrendo a

frases soltas e pouco contextualizadas.

Percebemos, assim, que os adverbiais modalizadores são tratados em âmbito reflexivo

nessa coleção, o que, confirma nosso postulado. No entanto, percebemos que, para isso, ainda

são usados, por vezes, exemplos inventados, o que vai de encontro aos objetivos dos manuais

83

aprovados pelo PNLD. Destacamos, ainda, que são escassas as abordagens sobre os

adverbiais modalizadores de forma geral na coleção.

Em relação à hipótese de que os adverbiais modalizadores seriam mais abordados em

temas ligados à argumentação, percebemos que a coleção Português: linguagens em conexão

apresenta alguns pontos relacionados à nossa hipótese. No volume 2, mais especificamente no

capítulo “Advérbios e locuções adverbiais”, do eixo “Gramática e estudo da língua”, é

apresentado um texto de um verbete que indica que devem ser evitados os advérbios que

expressem juízos de valor – ou seja, os modalizadores – em textos jornalísticos. Além disso,

são apresentados alguns advérbios em -mente como “certamente, levemente, definitivamente,

absolutamente” (SETTE; TRAVALHA; STARLING, 2013, p. 216 – 217) para exemplificar tal

questão para os alunos.

A partir do mesmo verbete, o livro didático traz um exercício que questiona se é de

fato necessário seguir essa recomendação no gênero artigo de opinião: “Um texto do gênero

artigo de opinião precisa seguir essa orientação?” (SETTE; TRAVALHA; STARLING, 2013,

p. 217). O gabarito fornecido ao professor indica que não, pois “o objetivo de um artigo de

opinião é expressar pontos de vista e juízos de valor, e advérbios que expressem valor ajudam

nessa função” (SETTE; TRAVALHA; STARLING, 2013, p. 217).

Com a apresentação do verbete e os questionamentos expostos anteriormente, o livro

cumpre nesse trecho um dos principais objetivos do ensino: unir leitura e análise linguística.

O aluno terá instrumental para compreender a funcionalidade desses elementos, também

ligada ao seu caráter subjetivo, e reflete sobre um possível uso num gênero marcado pelo

caráter opinativo. Assim, além de apresentar um dos efeitos de sentido envolvidos em sua

produção, também utiliza um gênero argumentativo.

Contudo, o livro não apresenta um exemplo que parta de um texto real, em que os

alunos possam observar os papéis funcionais dos modalizadores em seu uso efetivo. Na

verdade, parte-se apenas de uma recomendação de um verbete, o que é válido para construção

coletiva das características do gênero artigo opinativo com os alunos, mas falha ao não

apresentar ao menos um exemplo. Além disso, não há a proposta de uma atividade de

produção textual que coloque em prática os conhecimentos construídos, o que poderia ser

feito, inclusive, num capítulo do eixo “Produção de textos orais e escritos”.

Ao longo dos demais capítulos dos três volumes, porém, não há mais nenhuma

menção ou abordagem indireta acerca dos adverbiais modalizadores. Mesmo em capítulos

propícios ao debate, como “Artigo de opinião”, volumes 1 e 2, não há abordagem alguma

84

sobre o papel de articulador argumentativo desses elementos. Podemos dizer, então, que a

coleção apresenta uma abordagem reducionista e incoerente em relação a esse aspecto, tendo

em vista que não estabelece a ligação proposta pela própria no capítulo sobre adverbiais.

Nossa hipótese inicial foi parcialmente confirmada, tendo em vista que, apesar de existir

alguma relação entre os temas, essa conexão é pouco e mal explorada.

5.2.2. Português: contexto, interlocução e sentido

Esta coleção apresenta uma abordagem bem mais escassa sobre os adverbiais

modalizadores do que a coleção analisada anteriormente. Quanto aos seus efeitos de sentido,

os modalizadores são apresentados no capítulo 20 – “Advérbios” – do volume dois de acordo

com suas circunstâncias a partir de listas classificatórias que apresentam advérbios, como

“talvez” e “certamente” e aspectos a eles relacionados como “dúvida” e “afirmação”. Essa

abordagem se liga à classificação da classe a partir de seus efeitos pragmáticos. Ou seja, são

apresentados alguns adverbiais e a quais circunstâncias eles se ligam. No entanto, não são

apresentados exemplos reais que demonstrem seu uso efetivo, centrando-se, apenas, em

palavras isoladas agrupadas de forma classificatória.

No mesmo volume, ainda no capítulo 20, é proposto um exercício que trabalha uma

possível equivalência entre a oração modalizadora “é provável” e o adverbial

“provavelmente”, destacando, depois, sua classificação semântica. Essa atividade, única sobre

os adverbiais modalizadores na coleção, trabalha os efeitos de sentido envolvidos em sua

produção, destacando a “dúvida” envolvida na enunciação. Utiliza, ainda, uma estratégia

bastante válida ao tentar relacionar uma oração modalizadora com um adverbial modalizador.

No capítulo 23 – “Sintaxe do período simples” – do mesmo volume, após apresentar,

mais uma vez, as possíveis circunstâncias, o livro ressalta que “a classificação das

circunstâncias é uma questão de natureza semântica” (ABAURRE; ABAURRE; PONTARA,

2013, p. 348). Porém, mais uma vez, essa classificação não é vista na prática, com usos reais

de adverbiais.

Quanto aos efeitos de sentido dos modalizadores, a coleção apresenta uma abordagem

escassa, ainda muito ligada à produção de listas classificatórias. De forma geral, alguns

efeitos são abordados principalmente pelo fato de a classificação dos advérbios ser pautada

pelo critério semântico nas gramáticas tradicionais seguidas pelos livros didáticos. Mesmo

assim, essa abordagem é bastante simplista, desconsiderando aspectos mais complexos

85

envolvidos em seu uso. Assim, essa coleção adota, de forma extremamente escassa, uma

abordagem dos efeitos de sentido e não engloba, efetivamente, seus papéis funcionais. Ou

seja, nossa hipótese foi refutada, já que não são utilizados textos reais para apresentação dos

efeitos de sentido.

Em relação à hipótese de que os adverbiais modalizadores serão ligados à

argumentação, percebemos que essa coleção não apresenta em capítulos sobre textos

argumentativos, mesmo nos que tratam de advérbios, locuções ou adjuntos adverbiais,

nenhuma abordagem sobre os modalizadores como construtores de textos argumentativos.

Não há, inclusive, nenhuma menção, mesmo no manual do professor, sobre o trabalho esses

elementos em gênero algum. Assim, nossa hipótese, em relação à coleção, foi refutada, tendo

em vista que os adverbiais modalizadores não são sequer citados quanto à argumentação.

5.3.3. Português: língua e cultura

Ao longo da coleção Português: língua e cultura, percebemos que há mais aspectos

relacionados à argumentação do que aos efeitos de sentido dos adverbiais modalizadores. Em

seu primeiro volume, o livro agrupa todas as classes de palavras em um só capítulo, intitulado

“Classes de palavras”. Contudo, há um comentário que pode ser destacado no trecho sobre as

classes invariáveis: “advérbios para expressar nossos comentários e julgamentos a propósito

de todo um evento” (FARACO, 2013, p. 232), sendo destacados os itens “felizmente”,

“certamente” e “inegavelmente”.

Nesse trecho, percebemos que alguns adverbiais modalizadores são colocados como

índices de subjetividade, tendo em vista que veiculam comentários e julgamentos acerca da

enunciação, o que Koch (2003b) denomina como articuladores metaenunciativos. Os

modalizadores têm como característica comentar a enunciação, estabelecendo, de fato,

julgamento sobre o discurso. Assim, são elementos marcados pela subjetividade. Dessa forma,

o livro aborda um efeito de sentido ligado aos adverbiais modalizadores.

O livro não apresenta, porém, atividades sobre os adverbiais modalizadores, tendo,

inclusive, como única atividade sobre todas as classes de palavras invariáveis, um exercício,

vale dizer, de cunho exclusivamente classificatório. Mesmo nessa proposta, os adverbiais

modalizadores não são colocados, nos parágrafos descontextualizados, para serem

classificados. O livro também não apresenta nenhuma classificação para os elementos

adverbiais. Ou seja, nossa hipótese foi refutada, tendo em vista que não são apresentados

86

exemplos reais de adverbiais modalizadores relacionados aos seus efeitos de sentido e aos

seus papéis funcionais. No Manual do Professor também não há menção a esses aspectos.

Em relação à argumentação, os adverbiais modalizadores são apresentados em dois

capítulos, intitulados “Gênero argumentativo”, mais especificamente, os capítulos 3 e 4 do

volume 2. É necessário destacar que o livro apresenta apenas o modalizador “talvez” em

ambos os capítulos. Nos dois capítulos, ele é colocado na seção intitulada “articuladores

argumentativos”, que apresenta um texto e destaca diversos articuladores, como “mas”.

Em todos os outros capítulos e no manual do professor não há menção, mesmo que

indireta, aos adverbiais modalizadores como construtores da argumentação, nem de sua

ligação com efeitos de sentido. Essa coleção apresentou uma abordagem escassa em relação à

ligação entre adverbiais modalizadores e argumentação, embora tenha apresentado o elemento

“talvez” como articulador argumentativo. Caberia ao professor demonstrar que os demais

adverbiais modalizadores também são articuladores argumentativos, tendo em vista que a

coleção não o faz.

5.2.4. Vozes do mundo: literatura, língua e produção de textos

Na coleção Vozes do mundo: literatura, língua e produção de textos, há uma

abordagem mais voltada para os efeitos de sentido dos adverbiais modalizadores. No capítulo

5 do volume 3, intitulado “Os adjuntos”, os adverbiais modalizadores são apresentados a

partir das circunstâncias que expressam, como o item “certamente”. Logo após, contudo, o

capítulo vai além ao dizer que “os adjuntos adverbiais, além de acrescentarem circunstâncias

ao verbo, em determinados contextos, revelam apreciações subjetivas” (ABREU-TARDELLI

et al., 2013, P. 293), sendo apresentado o adverbial “infelizmente”.

Ainda no mesmo capítulo, é apresentado um texto denominado “Carnívoro anterior

aos dinossauros é achado” e são destacados alguns adjuntos. Nas atividades, há dois itens que

focalizam o valor subjetivo dos modalizadores, indo ao encontro ao que o livro havia proposto

nas páginas anteriores: “Os adjuntos adverbiais podem ser usados para expressar uma posição

de quem produz o texto. Observe o adjunto adverbial em destaque. A que fato ele se refere?

(...) Qual a opinião expressa por esse adjunto adverbial?” (ABREU-TARDELLI et al., 2013, p

295).

No volume 2, no capítulo “Advérbio”, é apresentado um texto “No caso, com

certeza!” e é debatida, no quadro “interação”, a relevância do tema para expressão de opinião:

87

“2. Para expressar uma opinião sobre o que é a arte da retórica, a crônica menciona duas

expressões como exemplo: ‘no caso’ e ‘com certeza’. a) Que expressões poderiam substituí-

las nas situações apresentadas no texto?” (ABREU-TARDELLI et al., 2013, p. 370).

Nessa sequência de atividades, percebemos que os livros debatem a importância do

adverbial modalizador como marca de subjetividade. Assim, é trabalhado um de seus efeitos

de sentido. O livro tem como destaque, ainda, a coerência adotada no capítulo ao seguir, nas

atividades, o que havia sugerido na parte teórica.

Ainda no capítulo “Advérbio”, do volume 2, os adverbiais modalizadores são listados

diante de circunstâncias como “afirmação” e “dúvida”, mas são mais bem aprofundados a

partir do texto “O homem que não sorri”. São destacados, nesse texto, os modalizadores

“certamente” e “provavelmente” e, numa “caixa” ao lado, é pedido que o aluno observe esses

itens adverbiais e discuta de que forma eles apresentam a opinião do produtor textual”. O

livro segue a mesma proposta, na página 375, a partir da apresentação de uma entrevista com

Maurício de Sousa, e do destaque do advérbio modalizador “curiosamente”.

Sua principal contribuição, porém, é, além de destacá-los, buscar exemplificá-los por

meio de alguns de seus efeitos de sentidos: “positivo, negativo, relativo” (ABREU-

TARDELLI et al., 2013, p 373), dizendo, inclusive, que “os advérbios modalizadores podem

delimitar o ponto de vista sobre uma declaração a partir da perspectiva do falante

(pessoalmente, particularmente) ou de um campo de conhecimento (tecnicamente,

geograficamente) (...) [e] também podem indicar estado de espírito do falante em relação ao

conteúdo de uma declaração” (ABREU-TARDELLI et al., 2013, p 373), elencando alguns

exemplos com advérbios como “historicamente”, “particularmente”, “lamentavelmente” e

“curiosamente”.

Ao longo desse trecho do livro, há uma abordagem bastante complexa e diversificada

em relação aos efeitos de sentido dos adverbiais modalizadores, destacando sua propriedade

de articulador textual metaenunciativo (KOCH, 2003b) e as formas mais específicas de

articulação ligadas a ele, como delimitador e afetivo (KOCH, 2003b), além de outros efeitos

de sentido como a subjetividade e efeitos mais gerais “positivo, negativo, relativo”.

Dessa forma, essa coleção engloba uma abordagem mais extensa e aprofundada sobre

o tema no que concerne aos seus efeitos de sentido, o que confirma nossa hipótese inicial.

Constitui um problema, porém, a inexistência de capítulos/ seções/ trechos que liguem os

modalizadores à produção de textos argumentativos e, de forma mais ampla, à produção

textual, o que representa relativa incoerência da coleção, principalmente em capítulos sobre

88

textos opinativos. Tal aspecto refuta nossa hipótese de que os livros ligariam os modalizadores

à argumentação.

5.2.5. Em busca de uma sistematização

Após a análise das quatro coleções selecionadas e apresentadas anteriormente,

buscamos estabelecer uma sistematização do que ocorre panoramicamente nos livros

didáticos de Ensino Médio aprovados pelo PNLD 2015. Isso pode ser visto no quadro abaixo:

89

Coleção

didática

analisada

Ligação a textos argumentativos

Efeitos de sentido e papéis funcionais

Português:

linguagens em

conexão

Adverbiais modalizadores como

construtores de artigos de opinião,

o que é apresentado a partir de um

texto técnico – verbete

Intersubjetividade e papéis funcionais

a partir de exemplos ora reais, ora

inventados

Português:

contexto,

interlocução e

sentido

Aspecto não abordado

Efeitos de sentido a partir das

circunstâncias expressas pelos

adverbiais a partir de listas

classificatórias e exemplos inventados

Português:

língua e cultura

Adverbial modalizador “talvez”

apresentado como articulador

argumentativo a partir de exemplos

inventados e descontextualizados

Subjetividade a partir de observações

do livro didático

Vozes do

mundo:

literatura,

língua e

produção de

textos

Aspecto não abordado

Subjetividade e efeitos de sentido

ligados à articulação textual a partir de

exemplos reais de uso

Quadro um: panorama da abordagem dos livros didáticos acerca dos adverbiais modalizadores

Diante desse quadro, podemos observar que os livros didáticos de Ensino Médio

ainda não apresentam uma abordagem satisfatória em relação aos adverbiais modalizadores.

Esses manuais, no geral, dedicam muito pouco espaço de suas obras para essa temática e,

quando a abordam, ainda recorrem, muitas vezes, a exemplos inventados e

descontextualizados sem considerar o papel dos adverbiais modalizadores na construção dos

textos argumentativos. Além disso, em alguns livros, há capítulos que apresentam postulados

que apontam que uma abordagem discursivo-textual sobre a temática, mas, nos demais,

acabam não cumprindo esse objetivo.

90

No Manual do Professor, não há um auxílio efetivo em relação a esse tema. Esses

trechos dos livros didáticos, dedicam boa parte do seu espaço a temas mais gerais,

construindo um instrumental básico ao professor. Contudo, há diversas obras e autores na

bibliografia sugerida, muito usados nesta Dissertação, inclusive, que abordam temáticas

ligadas à modalização, texto, discurso. Alguns dos autores citados por esses manuais são:

Magda Soares, Luiz Carlos Travaglia, Maria Aparecida Lino Pauliukonis e João Wanderley

Geraldi. Ou seja, embora a bibliografia sugerida aos professores como leitura tenha cunho

discursivo-textual e defenda o enfoque nos efeitos de sentido e em seu papel na construção de

textos diversificados, não é o que os livros didáticos apresentam.

Parece haver a necessidade, ainda, de uma reorganização de alguns aspectos

apresentados nos livros uma vez que muitos deles apresentam pontos relevantes em

perspectiva discursivo-textual, mas acabam não os executando posteriormente. Ou seja, essa

sistematização pode colaborar no estabelecimento de um panorama do que precisa ser revisto

e melhor organizado nos manuais didáticos de Ensino Médio. Ressaltamos que nosso objetivo

não é criticar os autores dos livros didáticos. Temos como objetivo traçar um panorama de

como os livros didáticos de Ensino Médio aprovados pelo PNLD 2015 abordam o tema dos

adverbiais modalizadores e observar como isso pode ser modificado para aprimoramento do

tratamento da temática.

5.3. Confrontando uso e abordagem

Nesta subseção da Dissertação, faremos uma breve retomada dos resultados

encontrados no uso e nos livros didáticos para observarmos se há confluência entre eles. Em

relação ao uso dos adverbiais modalizadores em artigos opinião publicados em jornais,

percebemos que esses elementos tem importante papel na construção argumentativa dos

textos e são marcas efetivas de subjetividade. Concluímos, ainda, que há diferentes efeitos de

sentido envolvidos em sua produção e que esses efeitos estão ligados aos graus de

subjetividade envolvidos no uso dos adverbiais modalizadores. Além disso, percebemos que

esses elementos tendem a não se posicionar nas margens da oração, ao contrário do que

postulamos inicialmente em nossa hipótese baseada em outras pesquisas.

Os livros didáticos de Ensino Médio aprovados pelo PNLD 2015 tem como objetivo

apresentar os diversos conteúdos programáticos a partir de alguns aspectos, sendo os

principais: usos reais dos elementos linguísticos e sua ligação com leitura e produção de

91

textos orais, escritos e multimodais. Esses aspectos são defendidos pelas documentações

oficiais a partir da sequência USO-REFLEXÃO-USO e do enfoque no texto como principal

foco do ensino. Além disso, nosso aporte teórico aponta para a necessidade de adotar uma

abordagem baseada no uso e centrada nos efeitos de sentido e nos papéis funcionais desses

elementos.

Em nossa análise, percebemos que os livros didáticos de Ensino Médio aprovados pelo

PNLD 2015 e analisados panoramicamente nesta Dissertação não se baseiam, no geral, no uso

dos adverbiais modalizadores. Isso se deve aos manuais não apresentarem o conteúdo a partir

de usos reais e não refletirem, no geral, os efeitos de sentido e os papéis funcionais desses

elementos. Os livros didáticos já apresentam os adverbiais modalizadores como elementos

subjetivos e, em alguns momentos, reconhecem alguns dos seus papéis funcionais e seu papel

na construção argumentativa dos textos. No entanto, essa abordagem ainda é escassa e pouco

recorrente (cf. Quadro 1). Ou seja, os livros didáticos já englobam alguns aspectos relevantes

dos adverbiais modalizadores, mas ainda o fazem de forma pouco frequente e sem recorrer a

usos efetivos desses elementos, o que constitui um dos caminhos a ser melhorado nesses

manuais didáticos.

Vale ressaltar que nosso olhar é baseado nos pressupostos do funcionalismo norte-

americano e da LT e parte do pressuposto que os usos lexicais e gramaticais estão fortemente

ligados aos objetivos comunicativos do falante/escritor e, assim, cada adverbial usado tem um

papel argumentativo específico diante do contexto em que está inserido. Ou seja, é uma

abordagem que centra seus estudos no uso linguístico e em seus papéis no texto/discurso a

partir de situações efetivas dos usos dos elementos. Dessa forma, como outros trabalhos,

buscamos observar o tratamento dado pelos livros didáticos a temáticas ligadas à leitura,

análise linguística e produção textual (cf. BUENO, 2011; SANTOS, 2011; 2014; ROJO;

BATISTA, 2014).

92

6. PROPOSTAS DE ATIVIDADES

Ao longo desta seção, apresentaremos algumas propostas de atividades a partir de

textos usados na Dissertação. Para elaborá-las, pautamo-nos em trabalhos anteriores com

metodologia semelhante na elaboração de propostas de atividades, como Santos, Cuba Riche

e Teixeira (2012), Colamarco (2014), Koch e Elias (2016) e Santos (2016). Ao longo dessas

propostas, há articulação entre leitura, produção textual e análise linguística. O nível de

escolaridade é ensino médio, tendo em vista que analisamos os livros didáticos desse nível de

ensino. Nosso objetivo não é elaborar exercícios prontos, mas estabelecer sugestões que

possam ser usadas na elaboração de enunciados a partir dos pontos destacados ao longo do

capítulo.

Optamos, metodologicamente, por utilizar cinco artigos de opinião provenientes da

amostra montada para esta Dissertação. Após a apresentação de cada texto, explicamos como

poderiam ser trabalhados aspectos mais gerais acerca dos artigos opinativos enquanto gênero,

sobre a importância do veículo, do suporte, etc. Além disso, destacamos como poderiam ser

trabalhados os adverbiais modalizadores nesses textos a partir, sobretudo, de seus efeitos de

sentido. Assim, não temos como objetivo esgotar as possibilidades dos textos trazidos, mas,

na verdade, estabelecer algumas sugestões possíveis à luz das teorias aqui utilizadas e dos

resultados encontrados na Dissertação.

Retrocesso nas normas de segurança do trabalho

Flexibilizar a Norma Regulamentadora 12, criada para evitar acidentes é desejo antigo de empresários do setor

industrial

Em tempos de Jogos Olímpicos, onde o clima de ‘fair-play’ está no ar, algo oposto e

inadmissível está em andamento. O atual governo federal, ainda interino, está preparando uma

flexibilização de uma norma de segurança de trabalhadores no manuseio de máquinas e

equipamentos na indústria. Trata-se de um retrocesso nas garantias de preservação da

integridade física e psicológica de milhões de operários. Tal medida é perigosa, considerando

que somos um dos países com maior índice de acidente de trabalho.

Recentemente, a Associação de Magistrados da Justiça do Trabalho da 1ª Região

alertou para o fato de o Brasil registrar mais de 700 mil acidentes por ano, o que coloca o país

em quarto lugar no mundo, segundo a Organização Internacional do Trabalho, atrás apenas da

93

China, Índia e Indonésia. É evidente que ainda precisamos evoluir, o que implica uma política

de ações preventivas mais eficazes, tanto por parte dos órgãos governamentais quanto das

empresas.

Flexibilizar a Norma Regulamentadora 12, criada para evitar acidentes é desejo antigo

de empresários do setor industrial que pressionam o governo. Tudo isso porque uma portaria

de 2010 especificou alterações necessárias em equipamentos já existentes para torná-los mais

seguros. Entretanto, os empresários as consideram caras demais, o que justifica, segundo

pesquisadores de acidentes de trabalho, o fato de apenas uma minoria das empresas terem se

adaptado. Não restam dúvidas, portanto, quanto ao pouco respeito à vida humana.

Em um cenário com dados alarmantes de acidentes na indústria, divulgados pelo

Ministério do Trabalho e Previdência Social, é no mínimo contraditória a atitude do governo

interino de ceder aos empresários. Somente de 2011 a 2013 foram cerca de 600 mortes por

causa desse tipo específico de acidente, uma a cada 44 horas. Houve quase 14 mil amputações

e mais de 40 mil fraturas. O que justificaria afrouxar as normas, beneficiando (pra variar) os

empresários em detrimento dos trabalhadores?

Infelizmente, se faz necessário estarmos atentos a iniciativas que vão contra a vida dos

trabalhadores. Medalha de lata ao governo interino por sua “reforma trabalhista”, que é, na

verdade, conjunto inadmissível de retrocessos para a classe trabalhadora.

A partir do artigo de opinião “Retrocesso nas normas de segurança do trabalho”, o

professor pode, em âmbito geral, trabalhar com algumas características do gênero a que o

texto destacado pertence. Para isso, pode pedir que os alunos identifiquem e indiquem a tese

central e os argumentos desenvolvidos ao longo do texto, sublinhando partes do artigo, por

exemplo. Posteriormente, para trabalhar as estratégias argumentativas usadas pelo enunciador,

o professor pode pedir que os alunos justifiquem a relevância em mencionar a Associação

de Magistrados da Justiça do Trabalho e a Organização Internacional do Trabalho para

que seja observada a importância do uso de argumentos de autoridade em textos com tipologia

predominantemente argumentativa. Ainda em busca do trabalho com a argumentação, o

professor pode pedir que os alunos relacionem a estratégia de questionamento direto ao

leitor em “O que justificaria afrouxar as noras, beneficiando (pra variar) os empresários

em detrimento dos trabalhadores?” com o que vinha sendo argumentativamente

construído ao longo do texto.

Em relação ao uso de adverbiais modalizadores, o professor pode pedir,

94

primeiramente, que os alunos identifiquem a relevância dos elementos “quase” e “mais” a

partir do trecho “Houve quase 14 mil amputações e mais de 40 mil fraturas”, em que o

adverbial “quase”, combinado à pista textual “mais”, estabelece efeito intensificador nesse

contexto ao tornar imprecisa a quantidade de amputações ocorridas. Além disso, é possível

que pedir que alunos comentem a relevância do uso do elemento “infelizmente” a partir

do trecho “Infelizmente, se faz necessário estarmos atentos a iniciativas que vão contra a

vida dos trabalhadores” para a constituição do artigo analisado como texto opinativo.

Posteriormente, o professor pode pedir que os alunos relacionem o uso do item

“infelizmente” às demais pistas textuais presentes no texto, destacando sua (in)coerência

com o que vinha sendo construído ao longo do artigo.

Caminhos da privatização

É preciso garantir aos operadores de saneamento, públicos ou privados, regras simples e

seguras para atualização tarifária e para a recuperação dos investimentos.

A manchete do GLOBO de domingo afirma que a “União quer privatizar tratamento

de esgoto” e que para isso o “BNDES vai discutir modelos para o setor com os estados”. A

intenção governamental é boa porque estamos muito atrasados nesse setor, mesmo quando

comparados a países com renda per capita semelhante à nossa. Um bom exemplo do potencial

dessa política é a Sabesp, que tem empreendido Parcerias-Público-Privadas com ganhos de

produtividade. Além disso, capitais privados são particularmente bem-vindos em tempos de

escassez de recursos fiscais. Contudo, para que essa iniciativa prospere, será necessário

resolver os três problemas enunciados a seguir.

É preciso garantir aos operadores de saneamento — públicos ou privados — regras

simples e seguras para atualização tarifária e para a recuperação dos investimentos na hipótese

de rompimento dos respectivos contratos. Nesse sentido, é importante manter registro dos

valores prudentemente investidos nas obras, que devem ser continuamente ajustados para

considerar a incorporação de novas instalações e a depreciação das existentes. Como se trata

do montante a ser indenizado ao operador de saneamento na hipótese de interrupção ou fim da

prestação do serviço, não surpreende que o ambiente para investimentos no saneamento

dependa diretamente da capacidade técnica, independência decisória e autonomia

administrativa da correspondente agência, que tem a responsabilidade de cuidar da

contabilidade regulatória. Lamentavelmente, a maioria das agências hoje existentes, em

95

particular as municipais, não se enquadra nesse figurino e, por uma questão de escala, jamais

se enquadrará.

É preciso compatibilizar a legislação ambiental, que exige soluções imediatas, com a

do saneamento, que admite soluções gradativas. Por exemplo, o afastamento do esgoto de

onde as pessoas vivem, mesmo quando não seja possível o correspondente tratamento. A atual

diferença de enfoque resulta em riscos para as empresas prestadoras de serviço e para seus

funcionários, que chegam a ser acusados de crimes ambientais quando solucionam

provisoriamente algum problema que não admite imediata implementação de solução

definitiva.

Como se sabe, a legislação ambiental foi concebida para impedir que pessoas físicas

ou jurídicas, motivadas por interesses particulares, causem externalidades ambientais

prejudiciais ao interesse coletivo. Trata-se de tipologia que não se adéqua a uma empresa de

saneamento, que atua para mitigar a poluição causada pela sociedade, e não por ela própria.

Confundir “a solução” com “o problema” afugenta do setor profissionais e empresas

competentes, que poderiam dar significativas contribuições ao progresso do saneamento.

É preciso garantir o correto funcionamento das estruturas já existentes e das que ainda

serão construídas, em vez de construir novas obras, frequentemente efêmeras. Idealmente, o

serviço de saneamento deveria operar como se fosse uma indústria de produção de lodo.

Primeiro, a carga poluidora intrínseca à condição humana é diluída numa grande quantidade

de água para possibilitar o transporte por tubulações subterrâneas. Depois, o esgoto que chega

à estação de tratamento passa por uma combinação de processos físicos, químicos e

biológicos para inverter o processo. Isto é, para voltar a concentrar a carga poluidora num

volume relativamente pequeno, chamado de “lodo”. Portanto, quanto mais lodo se produz

para deposição final em aterro sanitário ou para uso como insumo energético, menor é a carga

poluidora lançada nos corpos hídricos. Como qualquer indústria, seria de se esperar que

houvesse grande controle sobre o lodo, que é o resultado final da produção. Mas não é isso o

que se observa. Ao contrário, em geral há muita pompa na inauguração das obras de

saneamento e insuficiente avaliação dos resultados ao longo das correspondentes vidas úteis.

O que explica o grande número de estruturas disfuncionais espalhadas pelo país. Isso tem que

mudar.

Diante do artigo opinativo “Caminhos da privatização”, o professor pode, a partir da

estrutura geral do texto, pedir que os alunos identifiquem os argumentos usados para

96

construção da tese central defendida no artigo. Posteriormente, pode pedir que os alunos

comentem a relevância da contextualização efetuada no início do artigo de opinião

destacado para construção argumentativa do texto. Logo após, o professor pode utilizar

como estratégia para a “ponte” entre as características constitutivas do gênero e o trabalho

com o uso linguístico o pedido, aos alunos, de destaque de alguns elementos linguísticos

que marquem o posicionamento do enunciador. Comentando, posteriormente, a relevância

de itens mais subjetivos para construção de um texto pertencente ao gênero artigo de opinião.

Para o trabalho com os adverbiais modalizadores, o professor pode pedir que os alunos

identifiquem as semelhanças nos efeitos de sentido envolvidos no uso das expressões

“idealmente” e “em geral” a partir dos trechos “Idealmente, o serviço de saneamento

deveria operar como se fosse uma indústria de produção de lodo” e “Ao contrário, em

geral há muita pompa na inauguração das obras de saneamento e insuficiente avaliação

dos resultados ao longo das correspondentes vidas úteis”. Posteriormente, é que possível

pedir que os alunos demonstrem quais são as diferenças observadas nos efeitos de sentido

envolvidos no uso das expressões “idealmente” e “em geral” a partir das demais pistas

apresentadas ao longo do texto, sobretudo os elementos que indicam ação.

Ainda em relação ao trabalho com os adverbiais modalizadores, o professor pode

solicitar que os alunos expliquem o porquê de a expressão “em geral” ser utilizada no

texto diante de uma informação aparentemente categórica. Além disso, para aprofundar o

trabalho com essa locução, pode pedir que os alunos identifiquem a (in)validade na troca

da expressão “em geral” por “obrigatoriamente” e sua relevância na construção desse

texto. O professor também pode pedir que os alunos comentem a relevância do termo

“lamentavelmente”, do trecho “Lamentavelmente, a maioria das agências hoje

existentes, em particular as municipais, não se enquadra nesse figurino e, por uma

questão de escala, jamais se enquadrará”, para construção argumentativa da tese

desenvolvida, ligando o uso dos adverbiais modalizadores com a construção da argumentação

nesse artigo.

Reunião de cúpula

O Estado brasileiro historicamente ignora grandes partes das cidades, compostas pelos bairros populares,

localizados em geral, mas não só, no que hoje chamam por periferias

97

Depois de uma letargia talvez secular em relação ao tema, os presidentes dos Três

Poderes da República se encontram para debater a segurança pública. Ante número de

assassinatos maior no Brasil do que na Síria flagelada pela guerra, segundo O GLOBO, a

reunião acende uma luz ao fim do túnel (verdade que o assunto foi antes iluminado pela ONU,

chamando a atenção do mundo).

Anunciou-se um trabalho de articulação entre os governos federal, estaduais e

municipais quanto à inteligência e troca de informações. Há muito a fazer na gestão e em

inovações tecnológicas. Espera-se que também alcance o combate ao tráfico de armas, ao jogo

e às organizações paramilitares. Enfim, a reunião sinaliza uma promissora atitude.

A questão da segurança é emergencial, mas não se equacionará no curto prazo, é claro,

como demonstrado em tantos programas realizados, tantos estudos importantes conhecidos.

A vitoriosa experiência das UPPs evidenciou que o domínio territorial pela

bandidagem armada é a base do crime na cidade. E que não basta a ação policial. Assim, na

reunião de cúpula dos Três Poderes, em que estiveram também presentes o ministro da

Justiça, o da Defesa e os comandantes militares, faltou o ministro das Cidades.

O Estado brasileiro historicamente ignora grandes partes das cidades, compostas pelos

bairros populares, muitos de classe média, localizados em geral, mas não só, no que hoje

chamam por periferias. Aí, onde se conjugam energias vigorosas em busca da inserção na

sociedade, os governos não estão ou estão precariamente. Nesses lugares, sejam loteamentos,

favelas ou bairros consolidados, que constituem a grande experiência social de milhões de

cidadãos, os serviços públicos, inerentes ao Estado, são escassos ou inexistentes, tais como o

controle urbanístico e edilício, que, junto com o de segurança, garantem o usufruto do espaço

da cidade — onde se tece a rede social e política da cidadania.

Nosso país tem 85% de seus 200 milhões de habitantes morando em cidades. Talvez a

maior parte na irregularidade urbanística, edilícia ou fundiária. É preciso rever os estatutos

que idealizam o inacessível, justificando a inaceitável abstenção do governo; rever leis

federais para permitir adequar a legislação local de ordenação do solo e de controle

urbanístico, reconhecendo a diversidade urbana; que dê às prefeituras e aos estados condições

de exercício e lhes cobre responsabilidades. Também a legislação fundiária precisa ser revista

absolutamente, para que atenda à realidade para a qual as leis (e os cartórios) voltam as

costas. É com a lei que o Estado domina o território.

Nesta geração, até o fim dos anos 2030, mais meio Brasil será construído em nossas

cidades.

98

Nunca antes na história do país se fez tanto como se fará em tão pouco tempo: 40

milhões de novas moradias, mais de metade do que temos hoje. Onde serão construídas?

Continuaremos expandindo a anomia?

Nesta geração, até o fim dos anos 2030, mais meio Brasil será construído em nossas

cidades.

O domínio territorial de toda a cidade pelo Estado democrático é a questão-chave.

É esse o caminho para aflorar a gigantesca energia social hoje abafada pela violência e

pelo desprezo institucional. É, por certo, a maior parceria público-privado (PPP) que o Estado

poderia contratar: dando condições para a prosperidade das famílias, para as pessoas que

estudam à noite, que procuram um trabalho extra, que empreendem um pequeno negócio. O

Estado entra com o que lhe cabe, e as pessoas oferecem sua potencialidade para o bem-estar

geral. Por certo, o isolamento no individualismo, ou na grei, deixaria de ser opção para

milhões de brasileiros. Quem sabe a política poderia retomar seu alto prestígio?

Foi uma reunião de cúpula. Saudê-mo-la! (Ops!) E que haja outras, em que o espaço

da cidade esteja na pauta.

A partir do artigo opinativo “Reunião de cúpula”, o professor pode, mais uma vez,

trabalhar a argumentação presente no texto a partir da identificação da tese central e dos

argumentos desenvolvidos ao longo do texto. Também é possível que o docente peça aos

alunos que identifiquem a relevância argumentativa da repetição do subtítulo do artigo

ao longo do texto.

Em relação ao uso de adverbiais modalizadores no artigo destacado, o professor pode

pedir, inicialmente, que os alunos identifiquem uma expressão usada duas vezes ao longo

do texto para indicar incerteza, solicitando, posteriormente, que eles expliquem o papel

dessa expressão na construção do artigo destacado como texto opinativo. Posteriormente,

o professor pode pedir que os alunos comentem a importância de combinar

argumentativamente as expressões “historicamente” e “em geral” no artigo lido. Ainda

no tratamento desses adverbiais modalizadores, o professor também pode solicitar que os

alunos discutam o papel do termo “historicamente” ao delimitar e contextualizar a

postura do Estado em relação ao tema tratado ao longo do texto e comentem a

combinação entre a locução “em geral” e a expressão “mas não só”, indicando a

existência de algumas ressalvas nas afirmativas construídas.

99

Incra

Assentados não são produtores autônomos, mas objetos de uma política assistencialista,

voltada à criação de uma clientela.

O noticiário político está tão voltado para questões urgentes, como a da aprovação da

PEC do teto dos gastos públicos e a da Reforma da Previdência, que iniciativas importantes

terminam por serem relegadas a segundo plano.

Neste caso, encontram-se mudanças importantes no Plano da Reforma Agrária que

estão sendo implementadas, mostrando uma outra face do governo Temer. A reforma fiscal

tem, aqui, uma contraparte essencialmente social.

O presidente tem dado orientações explícitas a esse aspecto social de sua atuação,

enfatizando todo um novo processo de aprimoramento dos instrumentos de obtenção de terras,

de titulação dos assentamentos, de novo processo de seleção dos beneficiários e de

regularização de terras cultivadas sem a anuência do Incra.

No dizer do presidente deste órgão estatal, Leonardo Góes: “O governo federal busca

dar maior segurança jurídica àqueles que têm terra e produzem, além de promover o acesso à

terra a quem quer produzir alimentos.”

Em pouco tempo será publicada uma medida provisória, voltada para o

equacionamento destas questões. Ela caracteriza-se por seu perfil eminentemente técnico,

avesso a problemas de ordem ideológica. Só este ponto já seria suficiente para caracterizar a

nova gestão do Incra.

Em vários momentos das gestões anteriores, com a ressalva da gestão Guedes, este

importante órgão deixou de ser propriamente um órgão de Estado para tornar-se um

instrumento dos movimentos sociais. Agora, a orientação técnica é predominante, com um

sentido de Estado.

A questão da titulação é, certamente, uma das mais importantes em pauta. Uma

característica dos assentamentos da reforma agrária, até aqui, consistia no fato de serem

tutelados pelos movimentos sociais, que aí fincaram um dos pilares de sua militância e de

recrutamento de membros para invasões.

Um assentado é, assim, não somente tutelado pelo Estado, mas, principalmente, pelo

MST. Não são produtores autônomos, mas objetos de uma política assistencialista, voltada

para a criação de uma clientela política. Não são, propriamente ditos, agricultores familiares

por não possuírem a propriedade de suas terras.

100

Com a titulação, abre-se a possibilidade de se tornarem verdadeiramente agricultores

familiares, com melhores condições de obtenção de crédito, de compra de maquinário e de

assistência técnica. Um agricultor familiar entra em uma relação de mercado, tendo melhores

condições de trabalho e de educação para seus filhos, vislumbrando-se um futuro melhor.

Contraste-se, por exemplo, a condição dos agricultores familiares no Sistema

Integrado de Produção no sul do país, envolvendo as cadeias produtivas do tabaco (pioneira),

de aves e de suínos, estendendo-se a outros setores produtivos, a dos assentados. Uns são

prósperos, outros vivem em favelas rurais.

Muitos assentamentos têm assentados produtivos, que almejam tornar-se agricultores

familiares, mas se veem impedidos por não poderem adquirir terras de seus vizinhos, que não

produzem e vivem da assistência estatal. Por exemplo, pelos critérios atuais, ao cultivarem as

terras destes seus vizinhos, que podem tê-las cedido mediante um contrato informal de

arrendamento ou de compra e venda, eles encontram-se em situação irregular. Aliás, ambos

estão por não serem proprietários de suas respectivas terras.

São tutelados, não possuindo liberdade de escolha. Segundo a nova MP, poderão

regularizar tal situação, aumentando a produção de alimentos e a terra sendo cultivada por

quem quer realmente produzir. É urgente este novo reordenamento fundiário, corrigindo tais

anomalias, ainda defendidas por movimentos sociais ideologicamente obtusos.

A nova seleção de beneficiários almeja, também, ser técnica e transparente, deixando

de ser um instrumento do MST, que tinha a função de escolher os beneficiários, aumentando

assim a sua militância. Várias denúncias, inclusive, têm aparecido, envolvendo pessoas que já

são proprietárias, funcionários públicos, militantes etc.

O TCU, apropriadamente, exigiu medidas, que estão sendo atendidas pela nova

presidência do Incra. Chegou a impedir novos assentamentos para que essas anomalias fossem

devidamente corrigidas. O descalabro era enorme, produzido, principalmente, pelo viés

ideológico e político-partidário que presidia o processo seletivo. Haverá, agora, um papel

mais importante das prefeituras e, sobretudo, uma maior publicização de todo este processo.

Outro ponto diz respeito à obtenção de terras para a regularização fundiária, por

exemplo, na Amazônia Legal ou para os assentamentos da reforma agrária. Há a necessidade

de agilização dos trâmites administrativos, visando a dar celeridade a este processo.

Imagine-se a situação de um proprietário que tem a sua terra invadida, enquanto

decisões judiciais de reintegração de posse não são cumpridas. O Pará é um estado que vive

uma enorme crise, em uma situação que poderíamos caracterizar como a de uma terra sem lei.

101

Um tal mecanismo de obtenção de terras, a preços vigentes, e com pagamento em

dinheiro — e não necessariamente mediante TDAs (Títulos da Dívida Agrária) — seria um

instrumento que poderia facilitar o equacionamento de tais conflitos, além, evidentemente, de

um maior respeito à lei, não seguida em vários estados do país. Seriam compras nas condições

de uma economia de mercado.

O campo brasileiro foi, nos governos petistas, um terreno privilegiado de conflitos,

como se tivéssemos aqui uma “luta de classes”, que terminaria com a vitória “revolucionária”

dos ditos “movimentos sociais”. O setor rural, a despeito dos ideólogos esquerdistas, foi,

porém, objeto de uma verdadeira reforma, que tornou o país um dos maiores produtores

mundiais de alimentos.

A realidade mudou completamente nas últimas décadas. Cabe, agora, uma nova

legislação e uma nova política que reflitam e deem conta desta nova situação. O caminho

abre-se à pacificação nacional.

Após a leitura do artigo de opinião “Incra”, o professor pode pedir que os alunos

identifiquem a tese central e os argumentos defendidos ao longo do texto e,

posteriormente, focalizar suas questões no uso dos adverbiais modalizadores. O docente pode

pedir que os alunos identifiquem algumas expressões usadas que indiquem o grau de

certeza em relação ao que está sendo discutido e, posteriormente, comentem a relevância

de expressões com esse efeito de sentido na construção da argumentação defendida ao

longo do texto, trabalhando, assim, o efeito de sentido deôntico, o mais recorrente em nossa

análise dos modalizadores em artigos opinativos.

O professor pode, ainda, pedir que os alunos discutam a possível troca do elemento

“certamente” por termos, como “seguramente” e “inegavelmente” a partir do trecho “A

questão da titulação é, certamente, uma das mais importantes em pauta”, pedindo que,

posteriormente, expliquem se haveria modificação no grau de posicionamento do

produtor em relação ao que está sendo dito diante dessas possíveis trocas. A partir dessas

atividades, será possível demonstrar aos alunos que as escolhas linguísticas não são arbitrárias

e, diante da troca de um elemento, os efeitos de sentido envolvidos na sua produção passam a

ser outros. O docente pode solicitar, também, que os alunos comentem os efeitos de sentido

envolvidos no uso do elemento “necessariamente” no texto, o que se torna bastante

relevante diante de sua alta frequência em nossa amostra. O professor pode, também, pedir

que os alunos relacionem os efeitos destacados no uso do “necessariamente” às demais

102

pistas textuais presentes ao longo do artigo opinativo. Por fim, pode pedir que os alunos

comentem o uso da expressão “evidentemente” combinada à expressão “além de” e ao

efeito de sentido de inclusão.

Segurança é a medalha mais almejada

Um planejamento integrado, contando com o setor de inteligência de cada instituição, certamente trará bons

frutos

Com o início das competições, o clima olímpico pouco a pouco envolve a todos. E

mesmo os mais avessos ao esporte, inevitavelmente, são atingidos pelas mudanças na rotina,

desde as alterações no trânsito, passando pelos turistas, até o aparato de segurança, com

soldados fortemente armados nas ruas da cidade. Um clima que, inicialmente, até

representaria tranquilidade; porém, essa sensação é parcial. Se por um lado há, sim, maior

segurança, por outro ela se concentra em determinadas áreas, ficando outras vulneráveis a

ações de bandidos.

O esquema envolvendo mais de 80 mil agentes de segurança, segundo o Ministério da

Justiça, entre polícias Militar, Civil, Federal e Forças Armadas, nos traz reflexões e até

discussões que merecem permanecer após os Jogos. A primeira é que a integração é um

caminho a ser considerado. Um planejamento integrado, contando com o setor de inteligência

de cada instituição, certamente trará bons frutos não só para o Rio, mas para todas as capitais

brasileiras.

Discute-se isso, pelo menos, há mais de 40 anos, mas já passou da hora de,

efetivamente, isso sair do campo das ideias e ir para a prática. Não adianta ficar apagando

incêndio e priorizando ações pontuais para garantir a realização de eventos. Mesmo porque a

Olimpíada é o último dessa sequência que iniciou com o Pan de 2007, depois com a Jornada

Mundial da Juventude, em 2013, e a Copa do Mundo. Vai demorar para organizarmos algo

com essa dimensão. No entanto, a violência continua crescendo.

Autoridades já solicitaram a permanência da Força Nacional até as eleições

municipais, em outubro, mas isso é pouco e se apresenta como uma medida paliativa e não

como uma estratégia objetiva para amenizar a violência e combater o crime organizado.

Segurança não é algo simples, exemplo disso é que mesmo com todo esse aparato para

os Jogos, vergonhosamente ocorreu um arrastão no Flamengo, a poucos metros da sede do

103

governo. Uma ousadia que nos sinaliza o ponto a que chegamos e nos preocupa quanto ao que

está por vir se não tomarmos sérias providências.

Nesse momento em que o mundo olha para o Brasil e para o Rio por conta de recordes

e ouro olímpico, devemos deixar claro que a medalha que mais almejamos é a da segurança.

A partir do artigo de opinião “Segurança é a medalha mais almejada”, o professor

pode, inicialmente, pedir que os alunos identifiquem os argumentos e a tese central

presentes no texto. Posteriormente, é possível pedir aos alunos que justifiquem a relevância

de citar, no terceiro parágrafo, outros eventos de grande porte ocorridos no Rio nos

últimos anos para a argumentação construída ao longo do texto. Logo após, professor

pode pedir que os alunos destaquem a relevância da publicação do artigo opinativo

destacado num jornal carioca de grande circulação diante da temática abordada,

solicitando, na sequência, que comentem o maior/menor impacto para o leitor diante da

publicação do mesmo texto em um veículo de outra cidade, como Folha de São Paulo,

por exemplo. O professor pode, ainda, pedir que os alunos identifiquem a relevância da

repetição, com algumas modificações, do subtítulo do artigo no corpo do texto e,

posteriormente, relacionem os acréscimos efetuados ao contexto de divulgação digital do

jornal O Globo Online.

Em relação ao uso de adverbiais modalizadores, o professor pode pedir que os alunos

destaquem a importância argumentativa do item “certamente” na modificação

destacada no parágrafo anterior. Além disso, pode solicitar que os alunos identifiquem a

relação de pressuposição envolvida no título do artigo opinativo e como o enunciador se

posiciona no subtítulo a partir do elemento “certamente”. O professor também pode pedir

que os alunos comentem a relevância do elemento “inevitavelmente” para construção dos

efeitos argumentativos do texto. Pode, ainda, solicitar que os alunos comentem a

relevância do elemento “efetivamente” para a oposição construída ao longo do artigo

entre o que é discutido em âmbito teórico, no planejamento e aquilo que feito na prática.

PROPOSTA DE PRODUÇÃO TEXTUAL

Após a leitura e análise dos artigos opinativos destacados ao londo deste capítulo, o professor

pode pedir que os alunos produzam um texto constitutivo desse gênero. Isto é, um artigo de

opinião eminentemente argumentativo, que trate de um tema atual e polêmico, que apresente

104

uma tese e argumentos que a fundamentem e que tenha marcas linguísticas que atuem na

construção argumentativa e subjetiva dos textos. Para isso, é preciso que esses textos circulem

em alguma esfera social. A divulgação pode ocorrer num jornal local, num blog, no facebook

ou em outro suporte que seja acessível aos alunos e aos familiares e que seja possível divulgar

os todos textos ou, ao menos, alguns deles.

105

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao longo desta Dissertação, procuramos apresentar algumas reflexões acerca do uso e

do ensino dos adverbiais modalizadores em perspectiva discursivo-textual. Buscamos

estabelecer uma relação teórica pouco evidenciada na literatura especializada, relacionado

funcionalismo norte-americano e Linguística do Texto, correntes que, como demonstramos,

apresentam muitos pontos de contato ao basearem suas análises nos usos linguísticos,

estudarem a função dos elementos, ao adotarem uma perspectiva discursivo-textual e ao

buscarem trazer aspectos sociocognitivos para suas investigações.

Demonstramos que ambas as teorias podem ser usadas como instrumental teórico e

metodológico no tratamento de temas ligados ao ensino de língua em geral e, sobretudo, ao

ensino de português. Embora a Linguística do Texto tenha sido mais utilizada em trabalhos

recentes com algum enfoque pedagógico, defendemos que o funcionalismo norte-americano

apresenta as bases necessárias para relacionar forma e função e estabelecer contribuições

efetivas para o ensino-aprendizagem.

Retomamos nesta Dissertação as diretrizes oficiais para o ensino de língua portuguesa

no Brasil e focalizamos a relação que essas documentações têm com a base teórica adotada

neste trabalho. Assim, o tratamento dado aos temas presentes em sala de aula deve,

necessariamente, perpassar, uma abordagem funcional e textual, considerando os efeitos de

sentido dos elementos linguísticos e tratando de sua relação com a estrutura a partir da inter-

relação sintaxe, semântica e pragmática.

Procuramos, na análise do uso de adverbiais modalizadores em artigos de opinião,

caracterizar como os articulistas de opinião utilizam esses elementos no campo da forma e da

função. Em relação à forma, nossa hipótese inicial era que a estrutura do adverbial poderia

influenciar a posição dos adverbiais. Nossos resultados confirmaram nossa hipótese, mas

apontaram para tendências de ordenação diferentes daquelas encontradas por Moraes Pinto

(2008) e Gonçalves (2015), o que indica a necessidade de observar o uso desses elementos em

outros gêneros textuais para verificar se é esse, de fato, o fator determinante.

Em relação à função, observamos os efeitos de sentido e os graus de subjetividade

envolvidos no uso dos adverbiais modalizadores. Primeiramente, retomamos os estudos sobre

esses elementos, como expusemos no capítulo 3 desta Dissertação, e, posteriormente, a partir

dos dados encontrados, estabelecemos uma categorização dos efeitos de sentido,

estabelecendo uma proposta de reclassificação. Após esse processo, observamos que esses

106

grupos apresentavam diferentes graus de subjetividade e que poderíamos estabelecer um

continuum entre eles.

Diante desse continuum, controlamos a frequência dos efeitos de sentido e percebemos

que o efeito deôntico é o mais frequente nos artigos opinativos analisados, o que relacionamos

com um uso subjetivo e ligado à expressão de certeza/ incerteza em relação à proposição, algo

constitutivo desse gênero. Além disso, observamos que os veículos utilizados na análise

também não influenciaram em relação a esse aspecto do uso dos adverbiais modalizadores, ou

seja, em relação aos seus efeitos de sentido/ subjetividade.

Ao longo da análise do uso, também procuramos apresentar uma metodologia

qualitativa, centrada no papel desses elementos na construção argumentativa dos textos

utilizados como exemplos. Recorremos à análise do contexto, remetendo a outras pistas

textuais e a seus efeitos de sentido para, então, estabelecermos nossas reflexões. Também

demonstramos que as classificações propostas pelo trabalho não são estanques, o que está

relacionado à característica fluida dos adverbiais (cf. MARTELOTTA, 2012) e ao forte papel

do contexto nas análises efetuadas. Dentro de uma mesma categoria pragmática, há elementos

diversos que, embora categorizados conjuntamente, são heterogêneos e apresentam suas

especificidades.

Em relação à análise efetuada a partir de livros didáticos, optamos,

metodologicamente, por estabelecer um panorama da abordagem acerca dos adverbiais

modalizadores em manuais didáticos aprovados pelo PNLD 2015. Por isso, analisamos 4

coleções, totalizando 12 livros didáticos. Efetuamos a análise de todos os capítulos desses

manuais a partir de duas hipóteses.

A primeira hipótese relaciona-se à ligação dos adverbiais modalizadores a textos

argumentativos, como artigos de opinião e editoriais, tendo em vista que esses elementos são

articuladores argumentativos. Diante da análise, percebemos que 2 das 4 coleções sequer

abordavam essa relação e as demais o tratavam de forma breve, sem explorar de forma mais

sistemática, recorrendo a união entre os capítulos dos eixos gramaticais e de produção de

textos.

A segunda hipótese baseia-se nos efeitos de sentido e nos papéis funcionais desses

elementos nos livros didáticos. Nossos resultados demonstraram que, de forma geral, mesmo

os manuais já apresentando algumas reflexões relevantes, ainda recorrem a exemplos

inventados, descontextualizados e descolados das funções textuais que esses elementos

apresentam. No entanto, já existem aspectos relacionados aos efeitos de sentido dos

107

modalizadores como articuladores textuais. Percebemos, ainda, que o principal ponto

abordado é a subjetividade expressa por esses elementos, o que é coerente diante do forte

caráter subjetivo das expressões modalizadoras, como debatemos no capítulo 3 desta

investigação.

Por fim, elaboramos algumas sugestões de atividades, que podem funcionar como

pontos de partida para professores usarem em sala de aula, adotando uma perspectiva

reflexiva, levando os alunos a (re)pensarem o uso dos adverbiais modalizadores como

construtores de textos argumentativos e, sobretudo, de artigo de opinião. Também podem ser

utilizadas por futuros pesquisadores que queiram fazer uma aplicação em sala de aula e

verificar os resultados de uma abordagem centrada nos efeitos de sentido, contribuindo para o

ensino de leitura, análise linguística e produção textual.

Assim, após o fim deste trabalho, acreditamos que constituem próximos passos para

trabalhos futuros: unir funcionalismo norte-americano e Linguística do Texto em trabalhos

teóricos e aplicados; analisar o uso dos modalizadores em outros veículos, gêneros e suportes,

sobretudo, em relação à sua ordenação; elaborar materiais didáticos acerca do tema em

perspectiva funcional e textual; aplicar as sugestões de atividades em sala a partir de uma

metodologia reflexiva e indutiva. Assim, acreditamos que esta Dissertação tenha contribuído

para melhor descrição e análise do uso e da abordagem didática dos adverbiais modalizadores

em perspectiva funcional e textual, apresentando alguns possíveis caminhos a serem seguidos

nessa visão, deixando explícita a necessidade de um ensino de língua portuguesa nas escolas a

partir do uso real, atentando sempre para as estratégias comunicativas dos usuários da língua.

108

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