uso de adverbiais modalizadores e sua abordagem...
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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO
USO DE ADVERBIAIS MODALIZADORES E SUA ABORDAGEM EM LIVROS DIDÁTICOS
DE ENSINO MÉDIO: REFLEXÕES E PROPOSTAS DE ATIVIDADES
Dennis da Silva Castanheira
2017
USO DE ADVERBIAIS MODALIZADORES E SUA ABORDAGEM EM LIVROS DIDÁTICOS
DE ENSINO MÉDIO: REFLEXÕES E PROPOSTAS DE ATIVIDADES
por
DENNIS DA SILVA CASTANHEIRA
Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de
Pós-Graduação em Linguística da Universidade Federal
do Rio de Janeiro como requisito parcial para obtenção
do título de Mestre em Linguística.
Orientadora: Prof.ª. Dr.ª Maria Maura da Conceição Cezario
Coorientadora: Prof.ª. Dr.ª Leonor Werneck dos Santos
Rio de Janeiro
Fevereiro de 2017
USO DE ADVERBIAIS MODALIZADORES E SUA ABORDAGEM EM LIVROS DIDÁTICOS
DE ENSINO MÉDIO: REFLEXÕES E PROPOSTAS DE ATIVIDADES
Dennis da Silva Castanheira
Orientadora: Professora Doutora Maria Maura da Conceição Cezario
Coorientadora: Professora Doutora Leonor Werneck dos Santos
Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Linguística da
Universidade Federal do Rio de Janeiro como requisito parcial para obtenção do título de Mestre
em Linguística.
Examinada por:
___________________________________________________________________________
Prof.ª. Dr.ª Maria Maura da Conceição Cezario – PPG Linguística, UFRJ (Orientadora)
___________________________________________________________________________
Prof.ª. Dr.ª Leonor Werneck dos Santos – PPGLV (Língua Portuguesa)/ PROFLETRAS, UFRJ
(Coorientadora)
___________________________________________________________________________
Prof.ª. Dr.ª Maria Aparecida Lino Pauliukonis – PPGLV (Língua Portuguesa)/ PROFLETRAS,
UFRJ
___________________________________________________________________________
Prof.ª. Dr.ª Karen Sampaio Braga Alonso – PPG Linguística/ PROFLETRAS, UFRJ
___________________________________________________________________________
Prof.ª. Dr.ª Regina Souza Gomes – PPGLV (Língua Portuguesa), UFRJ (Suplente)
___________________________________________________________________________
Prof.ª. Dr.ª Érika Cristine Ilogti de Sá – UFRJ (Suplente)
Rio de Janeiro
Fevereiro de 2017
DEDICATÓRIA
À mamãe Jurema, sinônimo de força e
coragem.
À Maura e à Leonor, metades
acadêmicas de um mesmo eu.
Às minhas amigas, companheiras de
uma vida.
Às minhas meninas, Isabella, Juliana,
Raquel e Yasmim, e ao meu filhão,
Hugo, responsáveis por ressignificar
muito do que sou.
AGRADECIMENTOS
Quando decidi que montaria um projeto de Mestrado em 2014, ainda no sétimo período da
graduação, jamais imaginei que passaria por um processo tão complexo de transformações
emocionais e intelectuais. Seria uma missão praticamente impossível listar tudo que ocorreu nesse
tempo, mas, sem dúvidas, saio do Mestrado muito mais maduro e seguro dos caminhos a serem
seguidos na minha vida. Academicamente, exerci papéis que nem nos melhores sonhos daquele
menino de 20 anos seriam possíveis. Na vida pessoal, tive encontros inesperados e consolidei
amizades sinceras. Nos dois âmbitos, me decepcionei algumas vezes, mas entendi que precisava
deixar alguns pesos e pessoas pelo caminho, porque deveria seguir com as pessoas certas. Entendi,
ainda, que era necessário passar por tudo isso para que visse alguns aspectos da vida com maior
clareza. Por isso, cedo espaço, a partir de agora, para as pessoas e forças que fizeram os dois anos
de Mestrado serem muito especiais em minha vida e com as quais escolhi seguir em frente.
Agradeço a Deus e aos espíritos de luz por guiarem meu caminho nessa difícil e pesada
jornada. Foram muitos momentos complicados e de muitas dúvidas, mas a fé e a crença de que tudo
daria certo ao fim da caminhada foram constantes, mesmo nos momentos de maior introspecção e
solidão, fatalmente necessários para produção deste trabalho.
Agradeço à Maura, “orientadora-amiga”. Desde o dia em que entrei pela primeira vez na
sala H314, criamos, cultivamos e amadurecemos uma relação franca de respeito, confiança e
amizade. Foram inúmeras e inacreditáveis oportunidades concedidas a mim, sobretudo ao longo do
Mestrado. Constituímos uma trajetória muito bonita e sólida de parceria em publicações,
orientações, projetos, eventos. Minha caminhada até aqui se deve, em muitos aspectos, a ter
conhecido, aos 17 anos, uma pesquisadora de honestidade ímpar num momento em que eu ainda
estava assustado com a imensidão da Linguística e da vida.
Agradeço à Leonor, também “orientadora-amiga”. Leonor entrou na minha vida no último
período da graduação, num momento em que eu já tinha uma pesquisa, anos de IC, uma trajetória
acadêmica. A vida tratou de nos mostrar, porém, que nosso encontro estava previamente traçado e
que não estávamos ali à toa. Contrariando a máxima – seguida por muitos – “em time que está
ganhando não se mexe”, Leonor entrou neste projeto (com a benção da orientadora Maura) pouco
antes do início do Mestrado e foi peça essencial para que chegássemos ao resultado final. Ao longo
de todo o processo, nos conhecemos melhor, percebemos grandes afinidades e montamos um
projeto de Doutorado, já aprovado para ser iniciado em março de 2017. Com suas perspectivas
inovadoras e seu companheirismo característico, Leonor mudou minha vida e me levou para
caminhos inimagináveis até então.
Agradeço, ainda, às professoras Maria Aparecida Lino Pauliukonis e Lúcia Helena Gouvêa.
Embora tenhamos nos conhecido ainda na graduação, foi no Mestrado que consolidamos nossa
parceria. Aparecida me ensinou, desde o curso de Semântica da LP, caminhos possíveis para o
ensino de língua portuguesa, conferindo, de forma generosa, liberdade criativa a alunos tão jovens e
inexperientes. Lúcia sempre me recebeu com imenso carinho e respeito, trazendo boas energias e
palavras de fé na vida e no ser humano. Essas duas profissionais gentilmente me apresentaram à
análise do discurso, linha de pesquisa com a qual me identifico e com a qual hoje me sinto
conectado.
Agradeço, também, ao Grupo de Estudos Discurso & Gramática (D&G) e ao Grupo de
Pesquisa em Linguística de Texto (GPLT). No D&G, tive grandes oportunidades e trocas
acadêmicas, conheci parte das pessoas mais especiais da minha vida, aprendi sobre funcionalismo,
sobre ciência, sobre trabalho. Agradeço, em especial, ao Professor Roberto Freitas Jr., hoje parceiro
fiel e apostador assíduo em meu potencial profissional. No GPLT, pude conhecer novas perspectivas
teóricas, traçar novos caminhos acadêmicos e trocar experiências com pessoas de vivências
profissionais muito distintas das minhas. Em especial, agradeço às parceiras Vanessa, Fernanda,
Heloísa e Maria Cristina, pela torcida sincera e pela admiração mútua.
Agradeço, ainda, a duas pessoas que fizeram com que o período do curso de Mestrado em
Linguística fosse muito menos pesado e muito mais amigo e divertido: Débora e Patricia. Inúmeras
vezes dividimos nossas angústias, nossos medos, nossas dúvidas, nossos trabalhos de Fonologia
Gerativa e Sociolinguística. Sofremos juntos, esperamos as notas e sempre saímos com a convicção
de que, sem estarmos juntos, nada teria sido como foi.
Agradeço a uma galerinha do bem que tive a oportunidade de conhecer em 2015.1. Diante
do convite da Professora Maura para estagiar em duas turmas de Linguística I no primeiro semestre
de 2015, tive o prazer de conhecer pessoas maravilhosas, que me ensinam todos os dias com suas
postagens incríveis sobre direitos humanos, feminismo e tolerância. Agradeço às queridas Fabiana,
Alexandra, Amanda, Nathália, Ana Clara, Mariane, Iasmin, Christianne, Tainá e Dayane, uma
galerinha que me faz ter esperança num futuro diferente e nas novas gerações e que me enche de
abraços apertados e carinhosos.
Agradeço, é claro, àqueles que meu coração escolheu chamar de filhos. Uma das maiores
surpresas desses dois anos foi encontrar cinco pessoas de tamanhos e anos de vida semelhantes aos
meus, mas com as quais desenvolvi uma relação linda e simplesmente inexplicável. No processo de
autoconhecimento que passei ao longo do Mestrado, entendi, após certo tempo, que amava muito (e
não tenho a menor vergonha de dizer isso!) os “filhos de Castanheira”, pessoas que admiro e
respeito imensamente. Dessa forma, agradeço: à Raquel, primeira filha, que “deu o tom” do que
ocorreria depois e fez com que tudo isso fosse possível com sua vibração positiva constante, seu
bom humor e suas frases icônicas (“EU AMO!”) – como ela diria, “segue o baile”; à Isabella,
“filha-amiga”, que me ouviu tantas vezes por horas seguidas, esteve presente de forma firme e
decidida em momentos importantes e rapidamente reconheceu o quão especial e única era nossa
relação; à Yasmim, “filha-artista”, que “ostenta” o posto de minha cantora favorita e que toca minha
alma com suas poucas e precisas palavras tão sinceras e genuínas; ao Hugo, “filhão-poeta”, que me
ensinou muito sobre o significado da palavra tempo e com o qual venho construindo, de forma
sincera e pura, uma relação de amizade e carinho; à Juliana, “filha-companheira”, que surgiu num
dos momentos mais difíceis da minha vida, me devolveu a esperança no “outro” e se tornou uma
companheira diária e uma amiga extremamente leal.
Agradeço, ainda, às pessoas que fizeram com que eu chegasse até aqui e me acompanham
todos os dias: minhas amigas. Seres humanos ímpares, companheiras de uma vida, responsáveis por
muito do que sou hoje. Agradeço: à Aline, amiga tão sincera, que me “leu” de forma tão precisa no
hoje longínquo 2011, quando eu mesmo sabia tão pouco sobre mim; à Carol Fumaux, amiga de
momentos tão difíceis e cruciais, que me acompanha diariamente e divide comigo o lema “somos
verdade”; à Carol Ribeiro, amiga tão doce e paciente, que surgiu de forma tímida e, aos poucos,
ganhou grande espaço em minha vida, tornando-se figura essencial em minha trajetória; à Érika,
amiga tão preocupada, que, inúmeras vezes, tentou me ajudar a descobrir meus caminhos e seguiu
comigo depois de muitas tempestades; à Julinha, amiga com jeito de “irmã mais velha”, que
acompanhou, com emoção e respeito, meu crescimento emocional e intelectual, me ajudando a
entender “o outro” e a deixar pesos pelo caminho; à Maíra, amiga tão generosa, que me ensinou
sobre inúmeros aspectos essenciais da existência humana e me poupou, mesmo sem sabermos, de
um caminho tortuoso e pesado na vida; à Manuella, amiga de todos os dias, que me ouve de forma
tão paciente e carinhosa inúmeras vezes, dividindo alegrias e pequenos momentos não tão alegres e
que agora também é parceira de Doutorado; à Monique, amiga de dias tão pesados, que sempre me
trata com imenso carinho e amizade e que gentilmente me ajuda com todos os abstracts da vida; à
Thaís, amiga companheira e premiada, que me ensinou muito sobre o significado da palavra
reciprocidade e que fez com que eu me reaproximasse da literatura com seus textos maravilhosos e
seus poemas instigantes.
Agradeço, por fim, à minha família, parte essencial do que sou. Agradeço: à mamãe Jurema,
amiga, companheira e parceira, que me criou à luz de um amor incondicional, sem barreiras ou
limites físicos e emocionais; à vovó Joaninha, base de tudo, que permanece viva em nossos
corações e permeia nossos dias com ecos de sua doída luta em meio a tantos sorrisos; ao
“irmãozão” Douglas, amigo e torcedor, que é parceiro de tantos momentos, defensor de tantas lutas,
companheiro de tantas batalhas.
Seguimos todos juntos ao infinito e além!
RESUMO
USO DE ADVERBIAIS MODALIZADORES E SUA ABORDAGEM EM LIVROS DIDÁTICOS
DE ENSINO MÉDIO: REFLEXÕES E PROPOSTAS DE ATIVIDADES
Dennis da Silva Castanheira
Orientadora: Professora Doutora Maria Maura da Conceição Cezario
Coorientadora: Professora Doutora Leonor Werneck dos Santos
Resumo da Dissertação de Mestrado submetida ao programa de Pós-Graduação em Linguística,
Faculdade de Letras, da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, como parte dos requisitos
necessários à obtenção do título de Mestre em Linguística.
Esta pesquisa discute o uso de adverbiais modalizadores em artigos de opinião e sua
abordagem em livros didáticos de ensino médio à luz do Funcionalismo norte-americano e da
Linguística do Texto. Acerca do uso, observamos sua posição e seu papel como articulador textual
argumentativo e como marca de subjetividade em 60 artigos de opinião publicados nos jornais O
Globo Online e O Dia Online, ambos do Rio de Janeiro. Os resultados apontaram para necessidade
de maior investigação das motivações para ordenação dos adverbiais modalizadores e para seu
importante papel como articulador textual argumentativo subjetivo expressando, sobretudo, efeito
de sentido epistêmico. Nos livros didáticos, observamos panoramicamente como o tema é tratado a
partir dos efeitos de sentido e papéis funcionais dos adverbiais modalizadores e de sua ligação à
argumentação. Os resultados apontaram para necessidade de melhor tratamento do tema, tendo em
vista a escassez e a inadequação da abordagem dos manuais analisados. Por fim, apresentamos
algumas sugestões de propostas de atividades que podem ser adaptadas e usadas posteriormente em
sala de aula por professores de ensino básico ou por trabalhos futuros.
Palavras-chave: adverbiais modalizadores; livros didáticos; propostas de atividades; funcionalismo
norte-americano; Linguística do Texto
Rio de Janeiro
Fevereiro de 2017
ABSTRACT
THE USE OF MODAL ADVERBS AND THEIR APPROACH IN HIGH SCHOOL TEXTBOOKS:
REFLECTIONS AND PROPOSALS TO ACTIVITIES
Dennis da Silva Castanheira
Orientadora: Professora Doutora Maria Maura da Conceição Cezario
Coorientadora: Professora Doutora Leonor Werneck dos Santos
Abstract da Dissertação de Mestrado submetida ao programa de Pós-Graduação em Linguística,
Faculdade de Letras, da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, como parte dos requisitos
necessários à obtenção do título de Mestre em Linguística.
This research studies the use of modal adverbs in opinion articles and the way they are dealt
with in high school textbooks. We combine North American functionalism and Text Linguistics as
the theoretical framework for the study. Regarding linguistic use, we observed the positions of the
adverbs and their roles as argumentative textual articulators and as subjectivity marks in 60 opinion
articles published in the newspapers O Globo Online and O Dia Online, both from Rio de Janeiro.
Results pointed out the need for a wider investigation on the motivations for the word order of
modal adverbs and for their important role as subjective argumentative textual articulators that
particularly express some epistemic effect. In the textbooks, we observed how the theme is treated
in terms of sense effects and functional roles besides their connection to the argumentation. Results
pointed out the need for a better treatment of the topic, considering the scarcity and the inadequacy
of the way it is treated in the manuals analyzed. Finally, we present some suggestions for activities
that can be adapted and used in by elementary school teachers or in any for future work.
Key-words: modal adverbs, textbooks, proposals of activities, North-American functionalism, Text
linguistics.
Rio de Janeiro
Fevereiro de 2017
SINOPSE
Investigação funcional e textual do uso
de adverbiais modalizadores em artigos
de opinião e de sua abordagem em livros
didáticos de Ensino Médio aprovados
pelo Programa Nacional do Livro
Didático de 2015. Elaboração de
propostas de atividades.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO.................................................................................................................................16
1. FUNCIONALISMO: ASPECTOS TEÓRICOS E REFLEXÕES SOBRE ENSINO...................22
1.1. Linguística Funcional: panorama teórico....................................................................................22
1.2. O funcionalismo norte-americano...............................................................................................24
1.2.1. Iconicidade e marcação............................................................................................................25
1.2.2. A subjetividade na linguagem...................................................................................................26
1.3. Funcionalismo e outras correntes da linguística contemporânea................................................28
1.4. Funcionalismo e ensino...............................................................................................................29
2. LINGUÍSTICA DO TEXTO: QUESTÕES TEÓRICAS E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS..........34
2.1. Primeiras fases e abordagem atual..............................................................................................34
2.2. Linguística do Texto e outras abordagens teóricas......................................................................37
2.3. Texto e ensino..............................................................................................................................38
2.4. Articulação textual.......................................................................................................................43
2.5. O gênero textual artigo de opinião..............................................................................................46
2.5.1. Aspectos gerais dos estudos sobre gêneros..............................................................................46
2.5.2. Os artigos opinativos................................................................................................................48
3. EXPRESSÕES DA MODALIZAÇÃO E ENSINO......................................................................51
3.1. A modalização do discurso..........................................................................................................51
3.2. Adverbiais modalizadores em perspectiva teórica......................................................................52
3.3. O ensino de adverbiais modalizadores........................................................................................58
4. METODOLOGIA...........................................................................................................................62
5. ANÁLISE DE ADVERBIAIS MODALIZADORES: USO E ABORDAGEM............................64
5.1. O uso dos modalizadores em artigos de opinião.........................................................................64
5.1.1. Frequência dos adverbiais modalizadores................................................................................64
5.1.2. Posição......................................................................................................................................65
5.1.3. Articulação textual....................................................................................................................69
5.2. A abordagem dos modalizadores nos livros didáticos de ensino médio......................................81
5.2.1. Português: linguagens em conexão..........................................................................................81
5.2.2. Português: contexto, interlocução e sentido.............................................................................84
5.2.3. Português: língua e cultura.......................................................................................................85
5.2.4. Vozes do mundo: literatura, língua e produção de textos..........................................................86
5.2.5. Em busca de uma sistematização.............................................................................................88
5.3. Confrontando uso e abordagem...................................................................................................89
6. PROPOSTAS DE ATIVIDADES...................................................................................................92
CONSIDERAÇÕES FINAIS...........................................................................................................105
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.............................................................................................108
LISTA DE GRÁFICOS, TABELOS E QUADROS
Gráfico 1: frequência dos adverbiais modalizadores nos jornais utilizados
Tabela 1: relação entre posição dos adverbiais modalizadores e os jornais utilizados
Tabela 2: relação entre ordem dos adverbiais modalizadores e sua estrutura no jornal O Globo
Online
Tabela 3: relação entre ordem dos adverbiais modalizadores e sua estrutura no jornal O Dia Online
Gráfico 2: efeitos de sentido dos adverbiais modalizadores como articuladores textuais na amostra
utilizada
Gráfico 3: relação entre efeitos de sentido dos adverbiais modalizadores e os jornais utilizados
Quadro 1: panorama da abordagem dos livros didáticos acerca dos adverbiais modalizadores
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INTRODUÇÃO
Nesta dissertação, apresentaremos, sob uma perspectiva funcional e textual, um estudo
acerca do uso de adverbiais (advérbios, advérbios em -mente e locuções adverbiais)
modalizadores em artigos de opinião e analisaremos, panoramicamente, como os livros
didáticos de ensino médio abordam a temática em relação aos efeitos de sentido, papéis
funcionais e à ligação com a argumentação. Por fim, apresentaremos sugestões de atividades
que possam ser adaptadas posteriormente por trabalhos futuros e/ou por professores de ensino
básico. Os exemplos a seguir ilustram alguns dos dados analisados aqui:
(1) “Há mais coisas ocultas. Envolvem o fluxo de dinheiro da Odebrecht para campanhas de
Dilma, Lula e outros do PT. Ficaram reservadas à colaboração premiada cujo desfecho talvez
coincida com o impeachment no Senado” (Artigo “O ‘trouxa’ e a ‘inocenta’” – Jornal O
Globo Online).
(2) “O Peru aplicou uma política econômica ortodoxa, que incluiu uma estrita disciplina
fiscal, uma postura monetária de um rigor anti-inflacionário quase de estilo germânico, e um
agressivo desmantelamento do protecionismo alfandegário” (Artigo “O discreto encanto do
Peru” – Jornal O Globo Online).
(3) “O esquema envolvendo mais de 80 mil agentes de segurança, segundo o Ministério da
Justiça, entre polícias Militar, Civil, Federal e Forças Armadas, nos traz reflexões e até
discussões que merecem permanecer após os Jogos. A primeira é que a integração é um
caminho a ser considerado. Um planejamento integrado, contando com o setor de inteligência
de cada instituição, certamente trará bons frutos não só para o Rio, mas para todas as capitais
brasileiras” (Artigo “Segurança é a medalha mais almejada” – Jornal O Dia Online).
(4) “Parece ter suspirado, antes que se tomasse sua fotografia. Ele é o único a olhar para a
lente da câmera que, provavelmente de outra embarcação, registra a cena de horror da qual
teria preferido não tomar parte” (Artigo “Braços negros ao ar” – Jornal O Globo Online).
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(5) “Ao contrário, em geral há muita pompa na inauguração das obras de saneamento e
insuficiente avaliação dos resultados ao longo das correspondentes vidas úteis” (Artigo
“Caminhos para privatização” – Jornal O Globo Online).
(6) “É, por certo, a maior parceria público-privado (PPP) que o Estado poderia contratar:
dando condições para a prosperidade das famílias, para as pessoas que estudam à noite, que
procuram um trabalho extra, que empreendem um pequeno negócio” (Artigo “Reunião de
cúpula” – Jornal O Globo Online).
Os advérbios e as locuções adverbiais têm sido largamente estudados sob distintas
abordagens teóricas e vieses metodológicos nos últimos anos. Martelotta (2012) postula que a
categoria dos advérbios engloba elementos muito heterogêneos que, por isso, precisam ser
investigados de forma separada. As pesquisas já desenvolvidas sobre a classe apresentam
comumente um caráter (sócio) funcionalista e buscam as motivações para a ordenação
sintática dos adverbiais temporais, locativos, aspectuais, qualitativos ou modalizadores por
meio de variáveis estruturais, sociais e pragmáticas, observando distintos gêneros textuais e
diferentes sincronias do português brasileiro e europeu (cf. PAIVA, 2008; 2015; PEZATTI,
2014; COSTA NUNES, 2014; ILOGTI DE SÁ, 2015; CEZARIO et al. [no prelo]).
Outras pesquisas, de cunho discursivo-textual, trabalham o papel dos advérbios e das
locuções adverbiais na coconstrução de sentidos em textos de diferentes gêneros, tipologias e
suportes textuais. Essa abordagem considera os advérbios e locuções adverbiais de tempo,
locativos e modalizadores associados a outros elementos linguísticos que colaboram para
processos sociocognitivos, como a referenciação e a sequenciação (cf. KOCH, 2003b;
CAVALCANTE, 2011; KOCH; ELIAS, [2006] 2014; [2009] 2015). Estudos sobre a
modalização do discurso também assumem o importante papel da classe dos advérbios (cf.
FIORIN, 2002; CABRAL, 2010; KOCH, [1984] 2011).
Ainda são escassas, contudo, as investigações sobre os advérbios e as locuções em
interface com o ensino, sobretudo aquelas que focalizem exclusivamente a classe ou um
grupo específico. Os trabalhos já existentes apresentam caráter mais generalista, focando as
classes de palavras de maneira mais ampla (cf. DIAS, 2005; PINILLA, [2007] 2011;
MORAES PINTO; ALONSO, 2012). Alguns estudos, à luz de uma abordagem discursivo-
textual, porém, já apresentam algumas sugestões de atividades e/ou reflexões sobre ensino
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que incluam, de alguma forma, essa classe (cf. SANTOS; CUBA RICHE; TEIXEIRA, 2012;
KOCH; ELIAS, [2006] 2014; 2016; SANTOS, 2016).
Por isso, a elaboração desta Dissertação englobou diferentes etapas em relação aos
adverbiais modalizadores nos três polos desenvolvidos: análise do uso em artigos de opinião,
análise do ensino em livros didáticos de Ensino Médio e elaboração das propostas de
atividades. Como desenvolvemos uma pesquisa de iniciação científica sobre a posição das
locuções adverbiais de tempo em cartas dos séculos XVI, XVII e XIX e o trabalho está
inserido num projeto mais amplo sobre a ordenação de adverbiais em língua portuguesa,
optamos por manter o enfoque do trabalho nessa classe de palavras. No entanto, devido aos
muitos estudos já desenvolvidos sobre adverbiais temporais na literatura e a necessidade de se
estudar outro grupo desta classe tão heterogênea, optamos por estudar os adverbiais
modalizadores.
Ao longo da elaboração do anteprojeto de mestrado, analisamos o uso dos advérbios
modalizadores em -mente, pois alguns estudos separam os adverbiais em três grupos: em -
mente, advérbios simples e locuções adverbiais. Contudo, posteriormente, revisamos mais
textos da literatura e percebemos que outros trabalhos os agrupavam em conjunto nas suas
análises. Por isso, resolvemos analisar todos os adverbiais modalizadores, mas buscamos
observar se haveria alguma diferença em seus usos de acordo com sua estrutura.
Os estudos desenvolvidos no mesmo projeto a que esta Dissertação se vincula buscam,
em geral, relacionar os elementos gramaticais analisados com o gênero em que eles estão
sendo analisados. Esses trabalhos, embora não sejam sobre análise de gêneros, relacionam os
usos dos adverbiais com as características dos textos em relação às tipologias predominantes,
à sua constituição ou à sua circulação. Por isso, buscamos quais gêneros poderiam ser
observados para análise dos modalizadores. Após o processo de revisão da literatura,
verificamos que esses elementos são articuladores argumentativos e que seria válido observar
seu uso em um gênero mais ligado à argumentação, optamos, por isso, pelos artigos de
opinião.
A partir da identificação da ausência de trabalhos sobre ensino dos adverbiais
modalizadores presente nos estudos linguísticos contemporâneos, esta Dissertação tem como
objetivo geral estabelecer estratégias para preencher essa lacuna. Destacamos que temos como
objetivo estudar os advérbios, os advérbios em -mente e as locuções adverbiais e, por isso,
utilizamos a nomenclatura adverbiais, conforme Oliveira e Cezario (2012).
Observaremos o uso dos adverbiais modalizadores em artigos de opinião e sua
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abordagem em livros didáticos de Ensino Médio aprovados pelo Programa Nacional do Livro
Didático de Ensino Médio (PNLD) de 2015. Além disso, elaboraremos propostas de
atividades que reflitam nossos resultados. A amostra do trabalho é composta por 60 artigos de
opinião dos jornais O Globo Online e O Dia Online e por 12 livros didáticos pertencentes a 4
coleções aprovadas pelo PNLD e selecionadas aleatoriamente. Assim, buscamos responder
aos seguintes problemas de pesquisa: (1) como ocorre o uso dos adverbiais modalizadores em
artigos de opinião publicados em jornais? (2) como os livros didáticos tratam do tema? Além
disso, buscamos contribuir para a seguinte questão: quais sugestões de atividades podem ser
elaboradas para o tratamento dos adverbiais modalizadores em perspectiva funcional e
textual?
Adotamos, como concepção teórica, uma associação entre o funcionalismo norte-
americano e Linguística do Texto (LT) por essas correntes teóricas investigarem as situações
efetivas de uso, considerando aspectos relacionados ao contexto comunicativo, à interação e à
sociocognição. A adoção dessas teorias demonstra ainda mais relevância ao retomarmos as
preconizações das diretrizes oficiais de língua portuguesa: Parâmetros Curriculares Nacionais
de Língua Portuguesa (PCN), Parâmetros Curriculares Nacionais para Ensino Médio
(PCNEM), Orientações Curriculares Nacionais para Ensino Médio (OCEM) e os Parâmetros
Curriculares + (PCN +).
Em relação ao uso dos modalizadores, observaremos cinco aspectos: (a) posição (b)
estrutura do adverbial; (c) articulação textual (KOCH, 2003b), (d) subjetividade
(TRAUGOTT; DASHER, 2002) e (e) jornal em que ele se insere. A escolha desses fatores é
justificada pela análise do modalizador quanto à sua forma (ordenação; estrutura) e sua função
(articulação textual; subjetividade; jornal) no discurso. Para testar esses aspectos, formulamos
as seguintes hipóteses:
(I) os adverbiais modalizadores apresentarão diferentes tendências de posicionamento
diante de sua estrutura (advérbio, advérbio em -mente ou locução) (cf. MORAES PINTO,
2008; GONÇALVES1, 2015; 2016; CEZARIO, et al, [no prelo]);
(II) os adverbiais modalizadores, como articuladores textuais, terão efeitos de sentido
mais subjetivos;
Em relação aos livros didáticos, nossa abordagem também enfoca os efeitos de
sentido, além de aspectos relacionados à produção textual. Formulamos as seguintes
hipóteses:
1 . Trabalho orientado pela Professora Doutora Deise Cristina de Moraes Pinto.
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(III) os adverbiais modalizadores serão mais abordados em capítulos/ atividades que
enfoquem gêneros com tipologia predominantemente argumentativa, tais como editoriais e
artigos de opinião, tendo em vista o papel de articulador textual argumentativo (CAMPOS;
TORQUATO, 2013) desses elementos;
(IV) os adverbiais modalizadores serão explorados, sobretudo, a partir de seus efeitos
de sentido e de seus papéis funcionais partindo de exemplos reais de uso.
Para que possamos apresentar nossa investigação: no primeiro capítulo da Dissertação,
abordaremos em que medida os estudos funcionalistas podem ser relacionados com o ensino
de língua portuguesa a partir dos pressupostos teóricos do funcionalismo norte-americano.
Retomaremos aspectos teóricos como iconicidade, marcação e subjetividade e,
posteriormente, exploraremos a relação funcionalismo e ensino.
No segundo capítulo, buscaremos refazer os rumos da LT nas últimas décadas,
destacando sua relação com o ensino e com as diretrizes oficiais para ensino fundamental e
médio. Defenderemos que, no ensino, os efeitos de sentido devem ser enfocados a partir das
relações que ocorrem no texto, ressaltando o papel do uso linguístico na sala de aula.
Destacaremos o caráter sociocognitivo e interacional de nossa abordagem, demonstrando que
o texto deve ser tratado como unidade de ensino e não como pretexto, além de discutirmos
aspectos relacionados à articulação textual.
No terceiro capítulo, retomaremos os estudos já efetuados sobre aspectos relacionados
aos estudos de modalização, adotando, primeiramente, um caráter mais geral, em que
procuraremos definir e problematizar o conceito de modalização e demonstrar alguns
elementos que podem constituir estratégias modalizadoras. Na segunda parte do capítulo,
destacaremos os estudos teóricos já desenvolvidos sobre os adverbiais modalizadores. Por
fim, retomaremos as investigações sobre os adverbiais modalizadores em interface com o
ensino.
No quarto capítulo, explicitaremos as etapas da metodologia do nosso trabalho,
justificando a escolha do corpus, explicando as opções efetuadas por nós ao longo das etapas
de pesquisa e ressaltando a relevância das análises qualitativas e quantitativas efetuadas.
No quinto capítulo, traremos a análise da dissertação. Discutiremos qualitativa e
quantitativamente o uso dos modalizadores nos artigos de opinião a partir de algumas de suas
propriedades. Logo após, discutiremos a abordagem dos livros didáticos quanto aos efeitos de
sentido dos advérbios modalizadores e o tratamento do papel dos adverbiais modalizadores
como construtores de textos argumentativos.
21
No sexto capítulo, apresentaremos atividades que estejam relacionadas aos resultados
de nossas análises. Ou seja, propostas que reflitam, de alguma forma, nossos resultados e
preencham algumas lacunas atestadas nos livros didáticos de Ensino Médio sobre os
adverbiais modalizadores em perspectiva reflexiva. Essas atividades enfocarão os efeitos de
sentido, destacando relações textuais presentes nos usos desses elementos.
Nas “Considerações finais”, retomaremos brevemente os resultados e as propostas
relacionadas aos adverbiais modalizadores, ressaltando a importância do trabalho para os
estudos linguísticos teóricos e relacionados ao ensino, principalmente os que estudam a língua
em seu uso efetivo.
Esta Dissertação, portanto, pretende observar (1) como os adverbiais modalizadores
são utilizados a partir de uma amostra composta por artigos opinativos e (2) como são
abordados em materiais didáticos, adotando como opção metodológica uma abordagem
panorâmica para, ao fim, observar quais estratégias podem ser adotadas para seu ensino em
perspectiva funcional e textual. Dessa forma, objetivamos estabelecer contribuições teóricas e
pedagógicas sobre essa temática.
22
1. FUNCIONALISMO: ASPECTOS TEÓRICOS E REFLEXÕES SOBRE ENSINO
1.1. Linguística Funcional: panorama teórico
Segundo Martelotta (2006), a noção de função passa a ser utilizada a partir do
questionamento de que as línguas não podem ser analisadas considerando apenas seus
elementos internos, já que o principal objetivo de seu uso é estabelecer a comunicação em
sociedade. No cenário linguístico pós-saussureano, os cientistas do Círculo Linguístico de
Praga foram alguns dos primeiros a assumirem essa perspectiva, admitindo que a língua
apresenta determinado fim.
Neves (1997) aponta que adotar uma visão funcionalista implica considerar a
linguagem como entidade não suficiente em si. É preciso adotar uma simbiótica inter-relação
entre discurso e gramática, admitindo a estrutura linguística como maleável às pressões
comunicativas e dependente do uso em contextos reais. Assim, o discurso é processado
cognitivamente pelos padrões da gramática e a gramática é moldada pelo discurso a partir das
necessidades comunicativas.
Na visão funcionalista, a língua é um instrumento de interação social proveniente do
uso, existindo, portanto, para um determinado propósito comunicativo. A comunicação existe
não apenas para transmitir/ receber uma informação, mas para que determinados objetivos do
falante/ouvinte sejam cumpridos. Caso queira, por exemplo, convencer o interlocutor de algo,
o falante usará estratégias linguístico-discursivas específicas para que isso ocorra.
Para o funcionalismo, então, a linguagem não é um fenômeno isolado, servindo, na
verdade, a variadas intenções. Assim, é importante, numa análise funcional, considerar os
usos na interação verbal, englobando o componente pragmático a questões sintáticas,
morfológicas, fonológicas e/ou semânticas. A compreensão das ocorrências linguísticas só é
possível a partir de suas funções dentro dos contextos em que estão inseridas.
Neves (1997) aponta que a Linguística apresenta dois paradigmas em sua abordagem:
formalismo e funcionalismo. O primeiro, bastante associado aos estudos da gramática
gerativa, considera a língua como um objeto formal abstrato, que tem como principal objetivo
a expressão de pensamentos. O foco da Linguística, sob esse prisma, é o estudo da
competência em detrimento do desempenho, isto é, do uso.
Já o “polo funcionalista” engloba as investigações que consideram o uso como centro
de seus estudos, levando em consideração a variação linguística e os contextos reais de
23
comunicação. Esse modelo coloca a função das formas com um papel predominante em sua
análise. Diversas linhas de pesquisa enquadram-se nessa perspectiva, como a sociolinguística
laboviana, a Análise do Discurso e as abordagens que adotamos em nossa Dissertação:
funcionalismo norte-americano e LT.
Adotar uma abordagem funcional implica considerar uma constante relação entre
fonologia, morfologia, sintaxe, semântica e pragmática. O funcionalismo opõe-se, assim, à
perspectiva modular do gerativismo, em que componentes cognitivos de análise, embora em
interação dinâmica, estão organizados separadamente. As prioridades, para o “polo
formalista”, vão da sintaxe à pragmática, constituindo caminho oposto às abordagens
funcionais, em que o estudo da semântica e da sintaxe ocorre por meio da pragmática.
Assumimos, ainda, que, conforme Beaugrande (apud Neves, 1997), uma gramática
funcional engloba especificações funcionais ricas, empenhando-se em acomodá-las de forma
que a “descrição gramatical” do discurso contenha dados para auxiliar uma caracterização
semântica, pragmática e estilística. Assim, o sentido das ocorrências linguísticas não é
independente ou isolado da situação comunicativa, estando, na verdade, relacionado aos seus
contextos de uso (cf. GIVÓN, 1995).
Além disso, para o funcionalismo,
(...) a linguagem não constitui um conhecimento específico, como propõem os
gerativistas, mas um conjunto complexo de atividades comunicativas, sociais e
cognitivas integradas ao resto da psicologia humana. Assim, a visão funcionalista de
cognição assume que a linguagem reflete processos gerais de pensamento que os
indivíduos elaboram ao criarem significados, adaptando-os a diferentes situações de
interação com outros indivíduos. Ou seja, os conceitos humanos associam-se à
época, à cultura e até mesmo a inclinações individuais caracterizadas no uso da
linguagem (FURTADO DA CUNHA, 2008, p. 158).
O funcionalismo adota uma abordagem sociocognitivista para explicar a aquisição da
linguagem. Nessa perspectiva, há uma junção das bases social, interacional e cognitiva na
atuação do processo de aquisição de línguas. Para o sociocognitivismo, esse processo começa
a ocorrer diante da percepção das crianças, a partir dos nove meses de idade, em relação ao
outro como agente intencional. A aquisição, sob essa ótica, engloba transmissões culturais
fruto de uma evolução unicamente característica da espécie humana (cf. TOMASELLO,
2003).
Quanto à mudança linguística, o funcionalismo, de uma forma geral, tem dedicado
seus estudos ao processo de gramaticalização. Essas investigações têm explicado de que
24
maneira, a partir de uma trajetória unidirecional, formas lexicais tornam-se gramaticais ou
formas gramaticais tornam-se ainda mais gramaticais. A partir da metáfora espaço > tempo >
texto, são explicadas mudanças categoriais, como a passagem do item “mente” de substantivo
a sufixo (cf. MARTELOTTA; CEZARIO, 2011).
Estudos mais recentes, à luz de uma abordagem funcional construcionista, têm trazido
aspectos mais cognitivistas às investigações sobre mudança linguística. Traugott e Trousdale
(2013) postulam que novas formas podem ser instanciadas a partir de dois processos de
mudança: construcionalização e mudanças construcionais. O primeiro consiste em novos
pareamentos forma-função ao longo da história da língua e o segundo representa mudança em
apenas um dos aspectos: forma ou função. As investigações à luz dessa abordagem são
caracterizadas pela acepção de que a língua é formada por uma rede de construções
linguísticas, que são pareamentos simbólicos de forma e função. Essa abordagem explica
tanto como a formação de uma construção como, por exemplo, “a gente”, “Maria vai com as
outras”, como construções mais esquemáticas, como “[Dar uma X-da] (dar uma lida, dar uma
varrida) ou [Xmente] (como infelizmente).
Rosario (2015) aponta, ainda, que os principais interesses dos pesquisadores
funcionalistas são: variação e mudança; gramaticalização e construcionalização; estrutura
argumental e transitividade; universais e tipologia; codificação de cláusulas; motivações
competidoras; elementos organizadores do texto e suas respectivas relações com o ensino.
Para isso, o analista pode pesquisar os fenômenos linguísticos a partir de aspectos sociais,
pragmáticos e formais, que incluem perfil sociocultural do usuário, tipo e gênero textual,
modalidade, pressuposições, inferências e marcas de expectativa.
1.2. Funcionalismo norte-americano
Segundo Martelotta e Kenedy ([2003] 2015), o termo “funcionalismo” ganhou força
nos Estados Unidos a partir da década de 1970 por meio dos estudos de Sandra Thompson,
Paul Hopper e Talmy Givón. Esses pesquisadores postulam que a língua deve ser estudada a
partir de seu contexto linguístico e extralinguístico. Para investigar a sintaxe, por exemplo, é
preciso observar os aspectos pragmáticos relacionados ao fenômeno investigado. O estudo do
discurso, nessa visão, é prioritário, tendo em vista que é nele que a gramática emerge.
Em seus pressupostos clássicos, o funcionalismo norte-americano relaciona
constantemente esses planos de análise por meio dos estudos de transitividade, marcação,
25
planos discursivos, iconicidade, informatividade e gramaticalização (cf. FURTADO DA
CUNHA; COSTA; CEZARIO, [2003] 2015). O enfoque de cada estudo é determinado por
seus objetivos específicos. Nesse trabalho também adotamos uma associação dos planos
semântico, sintático e pragmático na análise dos adverbiais modalizadores.
Barlow e Kemmer (2000) apontam, ainda, que o funcionalismo linguístico é uma
abordagem teórica que congrega grupos de fatores de distintas ordens em sua análise. Assim,
aspectos sociais, históricos, cognitivos e interacionais são influenciadores efetivos da forma
como a informação é codificada. Os autores ressaltam, ainda, o importante papel da
observação da frequência de uso, proposta que adotamos nessa investigação. Por meio dela,
serão instanciadas novas formas na língua a partir de processos como a gramaticalização.
1.2.1. Iconicidade e marcação
Segundo Givón (1995), a linguagem seria uma atividade sociocultural que se estrutura
de forma icônica com função cognitiva ou comunicativa, e possuiria semântica ligada ao
contexto de uso. O autor aponta, assim, para o postulado que a língua é estruturada de forma
motivada e não arbitrária. Tido como a correlação natural entre código linguístico e função, o
princípio da iconicidade está relacionado à noção de que as línguas, de alguma forma,
refletem o pensamento. Há três subprincípios relacionados à iconicidade, segundo Givón
(1990):
(a) subprincípio da quantidade, que está ligado ao estatuto informacional do referente,
havendo uma tendência de informações novas serem introduzidas no discurso com uma maior
quantidade de material linguístico. Já as informações previamente conhecidas dos
interlocutores seriam introduzidas por uma estrutura menor.
(b) subprincípio da integração, o qual prevê que a proximidade cognitiva está ligada à
codificação sintática, ou seja, o que é próximo mentalmente também o será estruturalmente;
(c) subprincípio da ordenação linear, que aponta para a relação entre a ordem dos eventos e
sua ocorrência cronológica, isto é, o que acontece primeiro virá antes estruturalmente. Além
disso, as informações mais relevantes tendem a ocorrer anteriormente, demonstrando a
relação entre a posição da estrutura linguística e a importância do que está sendo veiculado.
Relacionado ao princípio da iconicidade, está o princípio da marcação. Segundo Givón
(1990), esse princípio está ligado a três critérios que marcam, binariamente, estruturas
marcadas e não marcadas na língua:
26
(i) complexidade estrutural – categorias marcadas tendem a ser mais complexas, ou maiores
formalmente, que suas categorias não marcadas correspondentes;
(ii) distribuição da frequência – categorias marcadas tendem a ser menos frequentes na língua
suas categorias marcadas correspondentes;
(iii) complexidade cognitiva – categorias marcadas tendem a ser mais complexas
cognitivamente do que suas estruturas não marcadas correspondentes devido a motivações
ligadas ao esforço mental, à demanda de atenção e ao tempo de processamento.2
Givón (1995), contudo, indica que determinadas categorias podem ser marcadas em
alguns contextos e não marcadas em outros. Ou seja, não é possível analisar a marcação
apenas por aspectos estritamente linguísticos. É necessário observar o gênero textual, a
modalidade da língua e outros aspectos envolvidos no contexto linguístico e extralinguístico.
O autor aponta, ainda, que a marcação não está ligada apenas às estruturas linguísticas, mas
também à distinção entre discurso formal e conversação espontânea.
1.2.2. A subjetividade na linguagem
Alguns estudos funcionalistas recentes, sobretudo os de Elizabeth Traugott, têm
enfocado num aspecto da linguagem humana: a subjetividade. Traugott e Dasher (2002)
apontam que a subjetividade só passou a ser um tópico importante para a comunidade
científica internacional a partir dos postulados de Benveniste (1976). Segundo o autor, a
linguagem só pode ser tratada como tal caso seja marcada por profundas marcas de
subjetividade. Traugott e Dasher (2002) também o retomam para definir discurso e debater o
conceito de intersubjetividade. De acordo com Benveniste (1976), o discurso é a língua à
medida que esta é assumida pelo falante diante do estabelecimento de intersubjetividade,
condição para existência da comunicação.
Para Traugott e Dasher (2002), na dinâmica da produção oral ou escrita, os recursos
linguísticos podem ser usados de diversas maneiras para expressão da subjetividade. Segundo
os autores, há produtores mais ou menos conscientes das marcas utilizadas: produtores mais
criativos tenderiam a saber usá-las de forma mais cuidadosa do que os demais. As escolhas
lexicais estariam ligadas à natureza do registro e seu grau de monitoramento. Assim, a escrita
acadêmica, por exemplo, seria mais marcada por traços objetivos. Em ambos os casos,
2 . Furtado da Cunha, Costa e Cezario ([2003] 2015) ressaltam que os critérios de marcação costumam
coincidir nas línguas em geral devido à iconicidade.
27
contudo, as estratégias usadas são provenientes da intenção do produtor e da forma como essa
intencionalidade é codificada.
Segundo Traugott e Dasher (2002), a subjetividade envolve um sujeito que desenvolve
uma visão subjetiva dos fatos, representando-a no discurso. Os autores opõem subjetividade à
objetividade, destacando que o ponto de vista objetivo ocorre quando o falante tenta se
posicionar de forma imparcial, descrevendo os fatos como eles ocorreram efetivamente no
universo biossocial.
É evidente, contudo, que não há objetividade completa na linguagem, pois sempre há
algum grau de subjetividade, por mais o falante/escritor tente escondê-lo em sua produção por
meio de algumas estratégias linguístico-discursivas. Sua expressão ocorre para determinados
fins comunicativos e é expressa por sujeitos com intuito de convencimento e persuasão, o que
configura inquestionável subjetividade (cf. GUIMARÃES, 2009). Cabe a estudos como o
nosso a identificação das marcas que indicam, de alguma forma, o posicionamento do sujeito
em relação ao que está sendo enunciado.
Traugott e Dasher (2002) também adotam essa perspectiva, apontando para a
necessidade de estabelecimento de um continuum entre formas subjetivas e objetivas,
proposta que adaptamos neste trabalho (cf. Introdução). Há, segundo os autores, marcas
específicas de cada um dos pontos. São caracterizadas como expressões dotadas de maior
subjetividade aquelas com: (i) dêixis espacial e temporal explícitas; (ii) marcadores explícitos
da atitude do sujeito em relação à proposição; (iii) marcadores explícitos da atitude do falante/
escritor em relação à estrutura do discurso.
Traugott e Dasher (2002) apontam, ainda, que as escolhas dos falantes/ escritores
dentro desse continuum podem estar relacionadas aos papéis sociais exercidos por eles. Nas
sociedades americana e europeia, por exemplo, figuras que ocupam posições de autoridade
costumam ter um discurso mais marcado pela objetividade, ao passo que pessoas com menor
poder, ou que querem demonstrar menos sua posição superior, tendem a usar uma linguagem
mais subjetiva. Em outras sociedades, porém, essa tendência pode não se confirmar, o que
reitera o caráter pragmático e sociocognitivista da subjetividade.
Traugott (2010) retoma os postulados de Benveniste (1976) para destacar que os
conceitos de subjetividade e intersubjetividade são provenientes de uma abordagem
sincrônica. A autora destaca que essas noções só podem ser entendidas do ponto de vista da
interação verbal e de seus procedimentos de percepção/produção do discurso. Sob essa ótica,
Oliveira, Dias e Wilson (2013) apontam que a subjetividade é um mecanismo bastante
28
apoiado no contexto discursivo-pragmático, além de ser fruto da negociação de sentidos que
ocorre entre os interlocutores devido às necessidades comunicativas decorrentes de
específicas demandas situacionais.
1.3. Funcionalismo e outras correntes da linguística contemporânea
A partir do que apresentamos acerca de alguns postulados do funcionalismo norte-
americano, podemos perceber que essa corrente engloba pressupostos teóricos amplos e
diversificados, configurando um ambiente propício para interfaces teóricas. A Linguística
Funcional pode apresentar inter-relação com diversas teorias, dentre elas a sociolinguística
laboviana, a Linguística Cognitiva (LC) e a Linguística do Texto. Muitos trabalhos têm sido
desenvolvidos no Brasil e no exterior a partir, sobretudo, da associação entre funcionalismo e
LC na linha atualmente denominada cognitivo-funcional ou Linguística Centrada no Uso
(LCU) (cf. CEZARIO; FURTADO DA CUNHA, 2013; OLIVEIRA; ROSARIO, 2015) e do
sociofuncionalismo, associação entre a sociolinguística variacionista e o funcionalismo (cf.
TAVARES; GÖRSKY; 2015; CEZARIO; MARQUES; ABRAÇADO, 2016).
Por associarmos funcionalismo e LT, destacamos o estudo de Neves (2004), que
estabelece a “ponte” entre a linguística funcionalista e a LT por meio de processo
sociocognitivo de ativação e reativação dos objetos de discurso: a referenciação. A autora
ressalta que ambas as teorias englobam perspectivas bastante semelhantes: basear-se no uso a
partir de situações comunicativas reais por meio de uma abordagem interacional e
sociocognitiva.
Para Neves (2004), há uma confluência entre os estudos em LT e as investigações
funcionalistas. A autora aponta que os fatos linguísticos instáveis são os que interessam
sobretudo aos estudiosos do texto e do discurso. A observação da influência do contexto para
os usos e para construção dos sentidos é prioritária para esses pesquisadores. Neves ([2006]
2013) também ressalta essa interface teórica, postulando que é um caminho natural associar
funcionalismo e LT na análise de fenômenos linguísticos que estejam ligados, de alguma
forma, ao processamento de enunciados.
Cezario (2012), embora não use em seus pressupostos teóricos a LT, buscar relacionar,
de alguma forma, os estudos funcionalistas ao surgimento de novos gêneros e suportes
textuais diante do advento da internet. Além disso, apoiando-se em Marcuschi (2008), a
autora ressalta a importância de questões cognitivas, como a criatividade humana e o caráter
29
metafórico da linguagem, para o estudo das relações textuais, destacando as vinculações que
ocorrem no uso de tipologias textuais e de algumas estratégias anafóricas e dêiticas.
1.4. Funcionalismo e ensino
Apesar dos constantes estudos que ressaltam os pressupostos teóricos do
funcionalismo, ainda são bastante escassas as investigações que tentem relacionar a teoria
funcionalista, independentemente do plano de análise, ao ensino de línguas. O funcionalismo,
no entanto, pode proporcionar grandes contribuições para a prática docente. Muitos de seus
postulados, inclusive, estão inseridos nas diretrizes oficiais para ensino fundamental e médio.
Furtado da Cunha e Tavares (2007) apontam que a maior contribuição que o
funcionalismo linguístico pode proporcionar à prática de sala de aula é o trabalho com o
contexto. Ao não estudar o uso de forma isolada, considerando suas condições de produção e
o contexto propriamente linguístico, o funcionalismo passa a ser um forte instrumento teórico
para as pesquisas que visam a uma interface com o ensino e para o professor que está em sala
de aula no ensino básico.
Como uma de suas grandes características é a investigação do uso a partir de fatores
intralinguísticos e extralinguísticos, é possível que o aluno perceba, por meio do auxílio do
professor, que as ocorrências linguísticas não são arbitrárias. A motivação para o uso de
determinadas estratégias sintáticas, semânticas ou morfológicas está diretamente ligada aos
propósitos comunicativos do falante, destacando, como atestam os PCNEM, “a natureza
social e interativa da linguagem, em contraposição às concepções tradicionais, deslocadas do
uso social” (BRASIL, 2000, p. 18). A abordagem eminentemente pragmática do
funcionalismo o coloca, assim, como uma teoria central para o ensino de língua portuguesa.
Oliveira e Cezario (2007) estabelecem uma detalhada análise dos PCN, identificando
seu forte caráter funcionalista. As autoras relacionam o documento especificamente aos
pressupostos do funcionalismo norte-americano, ressaltando o princípio da iconicidade, o
estudo dos planos discursivos e o processo de gramaticalização do item. Oliveira e Cezario
(2007) apontam, ainda, para a necessidade de relacionar outros tópicos de investigação
funcional ao ensino de português.
Além disso, ressaltam
que um dos maiores desafios hoje colocados para professores e pesquisadores, no
sentido, inclusive, de complementar a proposta dos PCN, é o refinamento da
30
metodologia, da busca de alternativas de como lidar ou tratar as desafiantes questões
hoje colocadas para o magistério e para a universidade brasileira (OLIVEIRA;
CEZARIO, 2007, p. 106).
Isto é, academicamente devemos repensar quais estratégias metodológicas podem ser
usadas pelo professor em sala de aula para seguir as diretrizes oficiais associadas a teorias da
linguística contemporânea. Não basta, assim, nos atermos ao que postulam os documentos
oficiais, tendo em vista o caráter naturalmente generalista de suas sugestões. É evidente,
ainda, que não há como formular propostas para todos os fenômenos linguísticos e reunir em
uma só publicação. Esse processo é lento e implica um trabalho coletivo e atualizado por
meio da associação de distintas abordagens teóricas.
Oliveira e Wilson ([2003] 2015), ainda em análise dos PCN, ressaltam que os manuais
postulam que, para ensinar língua, é preciso observar suas estruturas mais regulares a partir de
uma abordagem discursiva. Estudar a língua portuguesa num continuum, observando a
instabilidade da gramática e reconhecendo sua diversidade compreende também adotar uma
abordagem funcionalista em sala de aula.
As autoras apontam, porém, que é preciso ter como enfoque o texto, assumindo a
necessidade de buscar alternativas nos usos de estratégias linguísticas e nas formas de
organização textual para que sejam empregados os efeitos discursivos desejados. Assim, tal
como propõe o funcionalismo, ao “dizer de outra forma”, outros sentidos são ativados devido
ao caráter pragmático da língua.
Os PCN estabelecem eixos em que o ensino de língua portuguesa deve se pautar,
constituindo três práticas de linguagem, a saber: leitura, produção textual e análise linguística.
Embora seja evidente que o funcionalismo auxilie em propostas de ensino de leitura e
produção de textos orais, escritos e multimodais, parece ser sua maior contribuição a “ponte”
entre fenômenos gramaticais e seu ensino reflexivo. Essa abordagem teórica pode estabelecer,
então, grandes relações com a denominada prática de análise linguística.
Além disso, segundo Bezerra e Reinaldo3 (2013), os eixos de leitura e produção
textual têm sido melhor abordados em sala de aula do que o de análise linguística, o que, para
as autoras, demonstra que as pesquisas acadêmicas não têm tido forte repercussão no ensino
de línguas. Mais investigações funcionalistas, então, precisam ter a preocupação da aplicação
do conteúdo por elas desenvolvido em contexto pedagógico.
Mendonça (2006) diferencia o ensino de gramática e a prática de análise linguística. O
3 . Ressaltamos que nem todos os autores relacionados à prática de análise linguística são funcionalistas,
mas foram utilizados por esclarecem pontos importantes para esse eixo do ensino.
31
primeiro, segundo a autora, está vinculado ao ensino tradicional, voltado para uma
metodologia transmissiva e eminentemente metalinguística. Nessa abordagem, a língua é tida
como uma estrutura inflexível e invariável, não havendo uma relação entre o trabalho com
itens linguísticos associado com as atividades de leitura e produção textual. Há, ainda, o
privilégio de exercícios estruturais de identificação, classificação e correção de unidades
morfossintáticas. O foco do ensino de gramática, então, não é o texto ou a reflexão linguística,
o que vai de encontro aos postulados das diretrizes oficiais para o ensino de língua
portuguesa.
Já a prática de análise linguística, segundo Mendonça (2006), apresenta uma visão
diferente do ensino tradicional de gramática. A língua, nessa visão, é “viva” e, portanto,
sujeita a variações e modificações constantes diante das necessidades comunicativas. O
estudo de componentes gramaticais é feito a partir do texto, abandonando seu uso como um
pretexto para “ensinar gramática”. O foco do ensino deixa de ser a metalinguagem e passa a
ser os efeitos de sentido no texto. Trabalhar com as relações textuais implica, também, adotar
o ensino centrado nos gêneros textuais ao contemplar “a interseção das condições de produção
textual e as escolhas linguísticas” (MENDONÇA, 2006, p. 207).
Assim,
se o objetivo é que o aluno aprenda a produzir e a interpretar textos, não é possível
tomar como unidade básica de ensino nem a letra, nem a sílaba, nem a palavra, nem
a frase que, descontextualizadas, pouco têm a ver com a competência discursiva, que
é questão central. Dentro desse marco, a unidade básica de ensino só pode ser o
texto, mas isso não significa que não se enfoquem palavras ou frases nas situações
didáticas específicas que o exijam (BRASIL, 1997, p. 29).
Para trabalhar a prática de análise linguística em sala de aula, o professor precisa
estabelecer uma constante relação com as práticas de leitura e produção de textos orais/
escritos/ multimodais. Além disso, os PCN + destacam que, para trabalhar a significação em
sala de aula, é preciso considerar a “propriedade do uso de recursos semânticos (relações de
oposição ou aproximação, gradação, campo semântico, atenuação, eufemismo, hipérbole,
ironia) na estratégia argumentativa do autor” (BRASIL, 2002, p. 83). Assim, como defendem
também os PCNEM, “o estudo da gramática passa a ser uma estratégia para
compreensão/interpretação/produção de textos” (BRASIL, 2000, p. 18).
As atividades desse eixo são caracterizadas pela reflexão a partir das diferentes
características da língua, sobretudo pela constante
32
formulação e verificação de hipóteses sobre o funcionamento da linguagem que se
realiza por meio da comparação de expressões, da experimentação de novos modos
de escrever, da atribuição de novos sentidos a formas lingüísticas já utilizadas, da
observação de regularidades (no que se refere tanto ao sistema de escrita quanto aos
aspectos ortográficos ou gramaticais) e da exploração de diferentes possibilidades de
transformação dos textos (supressões, ampliações, substituições, alterações de
ordem, etc.) (BRASIL, 1997, p. 53).
Segundo Geraldi ([1984] 2011), para trabalhar com elementos gramaticais em sala de
aula, é preciso partir do texto do aluno, pois o ensino só é funcional se for para auxiliar o
estudante. A partir da produção feita pelos alunos, o professor deve selecionar um problema
por aula e trabalhá-lo, incentivando a reescritura. Tal proposta ecoa nos PCN por meio da
sequência USO –> REFLEXÃO –> USO.
Para estabelecer reflexões sobre questões linguístico-discursivas, é preciso observar os
usos dos alunos por meio de seus textos. Após essas produções textuais, o professor pode
examinar seus usos (como formas variantes, estratégias argumentativas e elementos textuais)
e, consequentemente, “os conhecimentos anteriores (...) em relação ao que se pretende
ensinar, identificando até que ponto os conteúdos ensinados foram realmente aprendidos”
(BRASIL, 1997, p. 36), discutindo os conteúdos programáticos para que, então, sejam feitas
novas produções.
Bezerra e Reinaldo (2013) apontam que, para fazermos análise linguística no ensino
fundamental e médio, temos que conceber a língua como um fenômeno interativo e adotar a
indução como processo metodológico. É preciso trabalhar com dados heterogêneos,
observando seu uso no texto e, posteriormente, sistematizando sua análise. Para adotar esse
procedimento, é necessário partir do gênero textual para chegar às unidades linguísticas em
perspectiva interacionista. Nesta Dissertação, partimos do gênero artigo de opinião e do uso
de adverbiais modalizadores para estabelecer algumas sugestões de atividades. Bezerra e
Reinaldo (2013) acrescentam, a essa discussão, a relevância de um tratamento semântico-
pragmático para as operações linguísticas. É preciso enfocar texto e discurso considerando
também uma perspectiva enunciativa.
As OCEM também ressaltam a importância de trabalhar os elementos pragmáticos,
destacando seu papel na interação, no texto e nos gêneros textuais em que estão inseridos. A
partir das preconizações dos documentos, Oliveira, Dias e Wilson (2013), numa abordagem
funcionalista, reiteram que a língua não pode ser tratada como objeto autônomo, constituindo
tarefa prioritária a focalização de estratégias textuais de construção de sentido.
33
A Linguística Funcional, então, engloba diferentes planos de análise sob perspectiva
interacional e discursiva. Seus estudos, embora ainda não sejam muito relacionados ao ensino,
podem proporcionar grandes contributos para a prática pedagógica, o que já é atestado nas
diretrizes oficiais. Ao relacionar o funcionalismo com outras abordagens teóricas, grandes
ganhos podem ser efetuados e, por isso, esse caminho vem sendo seguido por diversos autores
brasileiros e estrangeiros. Nosso trabalho pretende contribuir para o ensino de língua
portuguesa em perspectiva funcionalista a partir da caracterização do uso dos adverbiais
modalizadores e como esse aspecto pode ser transferido para o ensino a partir, também, das
lacunas identificadas na análise de livros didáticos de ensino médio
Nesta Dissertação, como expusemos, utilizaremos o funcionalismo norte-americano,
observando alguns aspectos presentes nessa linha teórica: iconicidade, marcação e
subjetividade. Na análise do uso dos adverbiais modalizadores, observaremos quais as
tendências de ordenação desses elementos e seus graus de subjetividade. Nos livros didáticos
de Ensino Médio, analisaremos em que medida os manuais abordam os papéis funcionais dos
adverbiais modalizadores. Nas propostas de atividades, traremos algumas sugestões que
refletem seus usos e as lacunas presentes nos livros didáticos analisados.
34
2. LINGUÍSTICA DO TEXTO: QUESTÕES TEÓRICAS E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS
2.1. Primeiras fases e abordagem atual
Segundo Koch ([2004] 2015), em sua fase inicial, que durou até meados dos anos
1970, a Linguística do Texto (LT) tinha como objetivo estudar os mecanismos interfrásticos
que confeririam a um enunciado o status de texto. Nessa primeira fase, as investigações
priorizavam o estudo da correferencialidade, considerada um dos maiores fatores de coesão
textual. As relações anafóricas e catafóricas operantes entre os elementos textuais constituíam,
de forma geral, o limite das investigações da LT, bastante influenciadas por Halliday e Hasan.
Ainda nessa fase, alguns dos linguistas envolvidos com a LT, mas com formação
gerativista, tiveram como objetivo constituir gramáticas do texto. Isso ocorria, pois o texto era
tido apenas como uma unidade linguística superior à sentença. Essas gramáticas tinham como
principais tarefas: determinar os princípios de constituição do texto, os fatores de coerência e
as condições de textualidade; identificar critérios para delimitar os textos; diferenciar os
distintos textos.
Nessa época, segundo Koch ([2004] 2015), passou-se a postular a existência de uma
competência textual semelhante à competência linguística atrelada aos estudos formalistas de
Noam Chomsky. A justificativa encontrada era a capacidade que todo falante tem de
diferenciar um texto coerente de um enunciado incoerente. Essa competência, de cunho
linguístico, também estaria relacionada à capacidade humana de resumir um texto e avaliar se
sua constituição é completa ou incompleta, dentre outros aspectos.
Posteriormente, a LT passou pela denominada “virada pragmática”. Koch ([2004]
2015, p. 27) aponta que não tardou para que os estudiosos do texto buscassem ir além da
abordagem sintático-semântica.
A princípio timidamente, mas logo a seguir com maior vigor, a adoção da
perspectiva pragmática vai se impondo e conquistando proeminência nas pesquisas
sobre o texto: surgem as teorias de base comunicativa, nas quais ora apenas se
procura integrar sistematicamente fatores contextuais na descrição dos textos (...),
ora a pragmática era tomada com ponto de partida e de chegada para tal descrição.
O texto, a partir de então, passa a ser reconhecido como unidade básica da interação e
as investigações da LT focalizam o uso linguístico em situações comunicativas concretas.
Abandona-se, assim, a concepção de língua como sistema autônomo e a visão do texto como
35
um produto acabado em si. Para a LT, o texto é um instrumento das intenções comunicativas
de seus produtores, sendo considerado como parte constitutiva de uma atividade complexa.
De acordo com Koch ([2004] 2015), as mudanças nos rumos da LT foram fortemente
influenciadas pela Psicologia e pela Filosofia da Linguagem, especialmente a Psicologia da
Atividade de origem soviética e a Filosofia da Escola de Oxford, que desenvolveu a Teoria
dos Atos de Fala. A LT passa a ter, como uma de suas grandes tarefas, a transferência da
abordagem teórico-metodológica dessas abordagens para um viés textual, provando que o
texto também pode ser tido como uma ação verbal. Essa passagem foi problematizada por
diversos pesquisadores, como Wunderlich, Schmidt, Moscht e Van Dijk. Também foram eles
alguns dos grandes responsáveis pelos estudos da LT em sua segunda fase.
Marcuschi ([1984] 2012) e Koch ([2004] 2015) ressaltam que, diante das novas
acepções da LT, houve uma mudança também nos conceitos alicerçados nos estudos do texto.
A coerência deixa de ser considerada apenas a partir de aspectos sintáticos e semânticos,
sendo englobadas questões pragmáticas e contextuais à sua análise. É, nesse cenário, segundo
a autora, que os postulados de Charolles sobre a coerência textual também se modificam: a
visão de que há enunciados incoerentes é superada diante da possibilidade de construção de
contextos de interação em que essa incoerência seria desfeita.
A LT passa por uma nova mudança em seus estudos a partir da década de 1980. A
“virada cognitivista” ocorre “a partir da tomada de consciência de que todo fazer (ação) é
necessariamente acompanhado de processos de ordem cognitiva, de que quem age precisa
dispor de modelos mentais de operações e tipos de operação” (KOCH, [2004] 2015, p. 34).
Diante dessa nova fase, o conceito de texto mais uma vez se modifica, passando a ser tido
como fruto de processos mentais.
A comunicação começa a ser considerada a partir dos conhecimentos prévios dos
participantes da interação. Cada indivíduo já traz em sua cognição determinadas informações
que precisam ser ativadas para que haja o sucesso do ato comunicativo. Além disso, cada um
apresenta determinadas expectativas ao se comunicar e faz uma seleção das estratégias que
adotará para que seus objetivos sejam cumpridos.
A LT, então, começa a ser vista como uma abordagem que tem como objetivo o
desenvolvimento de modelos procedurais que sejam capazes de englobar processos cognitivos
que permitam a integração dos sistemas de conhecimento dos participantes da interação.
Cabe, também, à LT, a descrição e a atualização dos processos envolvidos na compreensão e
na produção textual. Nessa visão, o texto passa a ser originado pelas operações cognitivas
36
interligadas multiplamente (BEAUGRANDE; DRESSLER apud KOCH, [2004] 2015, p. 34).
Uma das grandes características das ciências cognitivas clássicas é a separação entre
exterioridade e interioridade, dissociando aspectos mentais e sociais. A LT, contudo, assume a
cognição correlacionada a questões socioculturais, opondo-se a perspectivas formalistas e
enquadrando-se nas abordagens baseados no uso. Essa visão está vinculada também ao
conceito de contexto.
Na primeira fase da LT, o contexto estava relacionado ao cotexto, ou seja, aos
segmentos textuais linguisticamente anteriores e posteriores ao fenômeno estudado.
Posteriormente, com a “virada pragmática”, o contexto passou a englobar a situação
comunicativa e seu entorno social, histórico e cultural. Após a “virada cognitivista”, ele passa
a ser constitutivo da interação, sendo também construído, inclusive, nela própria. Pauliukonis
([2007] 2011) ressalta que, para trabalhar o contexto em sua acepção mais ampla é preciso
informar-se sobre as condições de produção de um texto, reconhecer sua autoria e recuperar
suas intenções comunicativas por meio das operações linguístico-discursivas por ele
efetuadas.
Além disso, para Koch ([2004] 2015, p. 43),
as abordagens interacionistas consideram a linguagem uma ação compartilhada que
percorre um duplo percurso na relação sujeito/realidade e exerce dupla função em
relação ao desenvolvimento cognitivo: intercognitivo (sujeito/mundo) e
intracognitivo (linguagem e outros processos cognitivos). Cognição, aqui, define-se
como um conjunto de várias formas de conhecimento, não totalizado por linguagem,
mas de sua responsabilidade: os processos cognitivos, dependentes, como
linguagem, da significação, não são tomados como comportamentos previsíveis ou
aprioristicamente concebidos, à margem das rotinas significativas da vida em
sociedade.
Atualmente, a LT caracteriza-se, por uma abordagem sociocognitiva e interacional. O
texto deixa de ser concebido um produto do ato comunicativo, passando a ser considerado
como um complexo processo sociocognitivo. Os sentidos, nessa nova perspectiva, não estão
no texto, havendo apenas pistas textuais que auxiliam em sua coconstrução. Só é possível
compreender algumas de suas acepções diante do contexto comunicativo em que o texto está
inserido. A significação, nessa visão, nunca é totalmente compreendida, pois os
conhecimentos ativados serão relativos diante do inventário cognitivo de cada participante da
interação.
O texto passa a ser visto como “um evento comunicativo em que estão os elementos
linguísticos, visuais e sonoros, os fatores cognitivos e vários aspectos” (CAVALCANTE,
37
2011, p. 20). Koch e Elias ([2006] 2014) apontam, ainda, que a partir de uma concepção
dialógica de língua, como atualmente a LT adota, os sujeitos são construtores sociais ativos
que se constroem e reconstroem no texto, o locus da interação. Os sentidos são construídos na
interação entre o texto e os sujeitos, não sendo, então, preexistentes ao ato da interação e,
portanto, independentes do leitor.
A partir da “virada cognitivista”, os linguistas do texto passam a concentrar suas
investigações em fenômenos de coconstrução de sentidos por meio da congregação de
aspectos sociais e cognitivos (cf. ADAM ([2008] 2011), dentre outros). Os processos de
referenciação, sequenciação e articulação textual
são alguns dos temas relevantes
desenvolvidos à luz da LT. Os estudos acerca dos gêneros orais, escritos e multimodais e das
tipologias textuais também são responsáveis por boa parte das investigações textuais
atualmente.
2.2. Linguística do Texto e outras abordagens teóricas
Cavalcante (2015) aponta que uma parcela dos estudos da LT também visam a uma
abordagem em interface com outras teorias. A autora apresenta duas delas: funcionalismo e
Análise Crítica do Discurso (ACD). Para ela, as investigações de Maria Helena Moura Neves
representam bem a inter-relação entre uma abordagem funcionalista associada aos estudos de
texto (cf. NEVES, 2004; [2006] 2013). Essas análises podem englobar a relação entre as
categorias textuais e aspectos funcionais, analisando processos como a referenciação e a
sequenciação. Cavalcante (2015) ressalta, ainda, que, muitas vezes, a LT se vale de análises
funcionalistas em suas investigações.
Já a relação com a ACD é representada, sobretudo, pelos trabalhos desenvolvidos por
Van Dijk. As investigações dessa corrente teórica versam sobre temas como crenças,
ideologias e gênero social e são alicerçadas numa abordagem não apenas cognitiva, mas
também social, pois, para a ACD, o que é cognitivo é, também, sociocognitivo. Um de seus
principais objetivos é desmistificar os discursos, decifrando suas ideologias, já que a
linguagem, em si, não tem poder, assumindo-o a partir dos poderes detidos por quem a utiliza
(cf. VAN DIJK, 2001; WODAK, 2004). Assim, assumir uma interface entre a LT e a ACD
designa “afirmar que os modelos mentais são socialmente produzidos e passam a ser
compartilhados por determinados grupos sociais” (CAVALCANTE, 2015, p. 375).
Muitos estudos da LT também recorrem às investigações sobre análise de gêneros para
38
poder explicar determinados fenômenos linguísticos. A partir da associação dos estudos
bakhtinianos com escolas de gêneros recentes, são investigados os gêneros em relação aos
seus aspectos formais e funcionais correlacionando com algum aspecto linguístico. Colamarco
(2014), por exemplo, recorre a teorizações sobre o gênero fábula para buscar explicações para
as diferentes estratégias de referenciação usadas nas fábulas de Monteiro Lobato e Esopo. A
autora percebe, ainda, que questões ideológicas também estão envolvidas nos processos de
construção dos sentidos, o que remete à associação estudos da LT com análises de gêneros e
ideológicas.
2.3. Texto e ensino
Devido à sua preocupação com a construção de sentido em gêneros/ suportes textuais
diversos, a LT tem se consolidado atualmente como umas das principais abordagens para os
estudos que têm como objetivo uma interface com o ensino. Com a publicação dos PCN, as
teorias do texto ganharam ainda mais visibilidade, sobretudo pela proposta de trabalhar a
língua portuguesa em sala de aula a partir de gêneros textuais. A publicação das diretrizes
oficiais posteriores (PCNEM, PCN+, OCEM) corroborou os postulados já vigentes, até então,
sobre o papel central do texto na sala de aula.
Koch (2003a) retoma algumas das preconizações dos PCN, ressaltando a função
fundamental atribuída ao texto como principal unidade de ensino. Além disso, aponta que,
para seguir a proposta dos PCN, é preciso que haja subsídios para o trabalho em sala de aula.
Koch (2003a) aponta três aspectos relacionados aos estudos de texto que passam a ser
prioritários: gêneros textuais, coesão e coerência.
Para trabalhá-los em sala, contudo, é preciso adotar a perspectiva atual da LT,
considerando o texto como processo sociocognitivo e interacional. Ao assumir essa postura
teórico-metodológica, o professor poderá explorar efetivamente diferentes gêneros textuais a
partir de seu contexto histórico e social. Além disso, poderá trabalhar coesão e coerência de
forma integrada, indo muito além das marcas presentes no texto, ou seja, de sua superfície.
Apenas dessa forma será possível lidar, por exemplo, com casos de referências que não se
encontram efetivamente no texto, mas no contexto sociocognitivo em que ele se insere (cf.
SANTOS, 2015).
Como expusemos na seção anterior, discutiremos nessa seção duas das práticas de
linguagem dos PCN: leitura e produção textual. Os pesquisadores da LT são, provavelmente,
39
os que mais têm enfocado, nos últimos anos, em suas investigações, o complexo
processamento sociocognitivo de leitura e de produção de textos. Além disso, eles tem
buscado sistematicamente estabelecer reflexões efetivas para um ensino produtivo dessas
práticas, principalmente a partir de aspectos relacionados aos gêneros e tipologias textuais (cf.
PAULIUKONIS; SANTOS, 2006; SANTOS, 2007; 2008; 2009; SANTOS; TEIXEIRA,
2016).
Segundo Koch e Elias ([2006] 2014, p. 11), a leitura engloba
uma atividade interativa altamente complexa de produção de sentido, que se realiza
evidentemente com base nos elementos linguísticos presentes na superfície textual e
na sua forma de organização, mas requer a mobilização de um vasto conjunto de
saberes no interior do evento comunicativo.
Assim, não é possível ler e compreender um texto sem ativar determinados
conhecimentos prévios relacionados às próprias experiências acumuladas. Durante a leitura e
a produção de sentidos, são, então, ativados diferentes sistemas de conhecimentos que
colaboram para o processamento textual. A esse respeito, Santos, Cuba Riche e Teixeira
(2012), baseando-se em Koch (2003b), elencam cinco conhecimentos prévios envolvidos no
processo sociocognitivo de leitura. São eles: linguístico, enciclopédico, textual, intertextual e
contextual.
De acordo com Koch e Elias ([2006] 2014), o conhecimento linguístico envolve
aspectos linguístico-discursivos gramaticais e lexicais a partir dos quais podemos
compreender a organização e o funcionamento dos elementos da língua na superfície do texto,
o uso de elementos de coesão para sequenciação textual e a seleção lexical adequada ao tema
ou aos modelos cognitivos ativados.
Já o conhecimento enciclopédico, segundo as autoras, engloba os conhecimentos de
mundo do sujeito, bem como os saberes que remetem a suas experiências pessoais e aos
eventos vividos por ele e situados no espaço e no tempo. Santos, Cuba Riche e Teixeira
(2012) apontam, ainda, que, aos efetuarmos a leitura de um texto, remetemos naturalmente
aos conhecimentos que temos e ao que já lemos e conhecemos para que possamos estabelecer
inferências e compreender alguns dos seus sentidos.
Segundo Santos, Cuba Riche e Teixeira (2012), o conhecimento textual está ligado à
percepção dos sujeitos em relação à organização do texto. Assim, não é por acaso que um
leitor que já tenha conhecimento da forma típica de determinado gênero textual o reconhecerá
com maior facilidade. É evidente que os gêneros apresentam formas relativamente estáveis
40
(cf. capítulo “Análise de adverbiais modalizadores: uso e abordagem”) e elas podem sofrer
variações, mas, de forma geral, uma receita, por exemplo, é caracterizada, dentre outros
aspectos, por sua organização textual.
De acordo com as autoras, o conhecimento intertextual “colabora para identificarmos
as referências, explícitas ou implícitas, a outros textos” (SANTOS; CUBA RICHE;
TEIXEIRA, 2012, p. 43). Assim, percebemos a remissão a um texto que está inserido, de
alguma forma, num outro texto, denominado intertexto, já produzido e presente na memória
coletiva ou discursiva dos interlocutores (cf. KOCH; BENTES; CAVALCANTE, 2007).
Já o conhecimento contextual está ligado à associação do texto lido com seu contexto
de leitura e produção discursiva. Para entender esse conhecimento, é preciso admitir que
“contextualizar significa perceber intencionalidades interacionais” (SANTOS; CUBA RICHE;
TEIXEIRA, 2012, p. 43). Isto é, a observação do contexto engloba a percepção dos aspectos
subjetivos da linguagem, identificando o porquê de determinadas escolhas lexicais e
gramaticais.
Diante de tantos conhecimentos necessários para o processamento da leitura, é
evidente que o trabalho com atividades de leitura em sala de aula envolve um processo
bastante complexo que exige grandes reflexões, já que, como apontam os PCNEM, “o texto é
único como enunciado, mas múltiplo enquanto possibilidade aberta de atribuição de
significados” (BRASIL, 2000, p. 19). Devem ser adotadas estratégias pedagógicas adequadas
e uma metodologia bem delimitada, o que só é possível a partir de uma formação que
considere aspectos mais recentes dos estudos de texto. Por isso, as diretrizes oficiais para o
ensino de língua portuguesa dedicam boa parte de suas recomendações para a chamada prática
de leitura.
Essa prática consiste na efetiva compreensão de textos com características diversas,
considerando seu contexto social, cultural e histórico. A partir do acionamento dos
conhecimentos prévios, o leitor levantará algumas hipóteses acerca do que está sendo
enunciado e estabelecerá sua própria leitura. Trabalhar a prática de leitura também pressupõe
entender que há diferentes leituras possíveis, o que a opõe a abordagens tradicionais que
postulam uma leitura certa e única. Contudo, nem sempre o leitor consegue efetuar leituras
adequadas dos textos, chegando a alguns níveis de extrapolação (cf. MARCUSCHI, 1996).
Além disso, é preciso que a leitura não seja abordada meramente como a codificação
mecânica de grafemas, sendo vista, na verdade, a partir de um letramento crítico (cf.
SOARES, [2003] 2015).
41
Assim, como postulam os PCN+, o aluno precisa ter consciência "[d]os diversos
aspectos implicados em sua estruturação, a partir das escolhas feitas pelo autor entre as
possibilidades oferecidas pela língua" (BRASIL, 2002, p. 60). Ler significa estabelecer uma
compreensão crítica vinculada aos conhecimentos partilhados e às marcas da superfície
textual. É preciso entender algumas das intencionalidades e relacioná-las ao contexto
comunicativo de ocorrência daquele texto.
Além disso, para trabalhar a prática de leitura, o professor deve assumir que o conceito
de texto foi expandido. O texto não engloba apenas produções escritas, mas também
produções orais e multimodais. A modalidade oral ainda tem sido mal trabalhada em sala e
nos livros didáticos, mesmo diante das enfáticas preconizações das diretrizes oficiais (cf.
GOMES-SANTOS et al., 2010; SANTOS; CRUZ, 2012). Muitas vezes, os textos orais são
colocados como opostos aos textos escritos, sem considerar que, na verdade, há um
continuum em que estão os textos mais, ou menos, prototípicos de cada uma das modalidades
(cf. MARCUSCHI, [2001] 2010).
Os textos multimodais são ainda menos trabalhados em sala de aula. Além dos
inquestionáveis problemas estruturais, presentes nas escolas, que dificultam a tarefa do
professor, há grandes limitações quanto à formação docente. Muitos professores ainda não
conseguem perceber a importância de trabalhar a multimodalidade pedagogicamente,
presumindo que será muito difícil ou, pelo contrário, acreditando que o aluno já domina textos
com diferentes semioses. Há, ainda, um caminho longo a percorrer, sobretudo nessa área, pois
determinados gêneros textuais, como propagandas, acabam não sendo efetivamente
trabalhados em sala. Da mesma forma, atividades de retextualização poderiam também
englobar os textos multimodais, o que raramente ocorre nas escolas.
Além disso, não cabe apenas ao professor de língua portuguesa trabalhar a leitura em
sala. Se as aulas de todas as disciplinas são, de alguma forma, pautadas em textos, é
incoerente que seja cobrado apenas do profissional de línguas a preocupação com a leitura.
Exercícios de matemática não exigem apenas conhecimentos de álgebra ou geometria, tendo
em vista que são necessárias diversas interpretações do que está sendo enunciado de forma
escrita/ oral/ multimodal. Essa ingênua concepção é bastante difundida nas escolas e, por isso,
ressaltamos que “todo professor, de qualquer disciplina, é um leitor e, para sua atividade de
ensino, depende necessariamente, do convívio com textos os mais diversos” (ANTUNES,
[2009] 2013, p. 187).
Em relação à prática de leitura, Koch (2003, p. 97) acrescenta que
42
é importante (...) possibilitar a discussão sobre os diferentes sentidos atribuídos aos
textos e sobre os elementos discursivos que validam ou não essas atribuições,
propiciando, também, a construção de um repertório de recursos linguísticos a
ser utilizado quando da produção textual [grifo da autora].
Nessa mesma abordagem, os PCN + preconizam que “ser leitor, no sentido pleno da
palavra, pressupõe uma série de domínios: do código (verbal ou não) e suas convenções; dos
mecanismos de articulação que constituem o todo significativo; do contexto em que se insere
esse todo” (BRASIL, 2002, p. 61). Assim, conforme Silva ([1988] 1998), os leitores são
aqueles que efetivamente adentram o texto, havendo a real compreensão de algumas ideias
coconstruídas pelas marcas linguísticas da leitura efetuada.
O autor opõe os leitores aos “ledores”. O segundo grupo é caracterizado por não
conseguir efetivamente entender o que está sendo enunciado no texto, tendo dificuldade de ir
além da superfície textual e estabelecendo uma mera repetição do que já fora escrito/dito pelo
autor. Isso ocorre, pois o autor não é o detentor dos sentidos ancorados na superfície do texto,
constituindo, na verdade,
uma instância discursiva de que emana o texto, se mostra e se dilui nas leituras de
seu texto: deu-lhe uma significação, imaginou seus interlocutores, mas domina
sozinho o processo de leitura do seu leitor, pois este, por sua vez, reconstrói o texto
na sua leitura, atribuindo-lhe a sua (do leitor) significação (GERALDI, [1984] 2011,
p. 91).
De acordo com Silva ([1988] 1998), contudo, muitas vezes as escolas acabam
formando “ledores” em vez de leitores realmente críticos. Como aponta o autor, a sociedade
precisa de bons leitores e essa ausência, naturalmente, gera diversos problemas sociais. Por
isso, Silva ([1988] 1998) defende que deve haver um enfoque na leitura compreensiva/
significativa, em que os alunos discutam e assumam os propósitos para diferentes tipos de
leitura, mantendo, como base, a compreensão textual.
Trabalhar a leitura em sala de aula, portanto, compreende ler com um viés crítico,
percebendo as marcas linguísticas e seu papel na construção dos sentidos do texto. Essas
pistas podem indicar subjetividade, ideologias e outros aspectos que muitos leitores acreditam
não existir em textos do domínio jornalístico, por exemplo. Para efetivamente enfocar essa
prática, porém, é preciso trabalhá-la em conjunto com a prática de análise linguística e com a
de produção textual, pois apenas pela compreensão da integração entre as práticas de
linguagem o aluno será capaz de efetuar, como atestam as OCEM, o uso de determinados
43
“recursos linguísticos em relação ao contexto em que o texto é construído (elementos de
referência pessoal, temporal, espacial, registro linguístico, grau de formalidade, seleção
lexical, tempos e modos verbais)” (BRASIL, 2006, p. 38).
A prática de produção textual está diretamente ligada a atividades pré-textuais e
textuais de leitura e análise linguística. Para que um texto seja produzido, é necessário que seu
produtor seja um leitor efetivo do gênero textual vinculado a esse texto. Sem conhecer os
aspectos relacionados ao gênero notícia, o aluno terá grandes dificuldades em construir
textualmente sua produção e pode não conseguir escolher conscientemente as marcas
linguísticas adequadas, nem saber organizar efetivamente seu texto quanto à tipologia
predominante.
É preciso, então, que os enunciados relacionados a possíveis produções textuais não
estejam vinculados a comandos que apenas atestem o tipo textual pedido – como: “redija um
texto argumentativo” –, pois o produtor não saberá para quem está escrevendo, qual sua
finalidade comunicativa e a que gênero esse texto está vinculado. Torna-se central, então, a
noção de contexto na sala de aula. Se o texto está relacionado ao seu entorno histórico, social
e cultural, é natural que todos esses aspectos sejam devidamente considerados ao longo de sua
produção, seja ela oral, escrita ou multimodal.
Sob essa perspectiva, o aluno precisa saber qual o contexto de sua produção textual,
englobando, como atestam as OCEM, os “papéis sociais e comunicativos dos interlocutores,
relações entre esses, propósito discursivo, função sociocomunicativa do gênero, aspectos da
dimensão espaço-temporal em que se produz o texto” (BRASIL, 2006, p. 38). Sem esses
esclarecimentos, o texto continua sendo tratado em sala como pretexto, pois sua vinculação
sociocognitiva e interacional é ignorada.
Assim, mesmo utilizando estratégias de leitura bem delimitadas e ancoradas na LT e
nas diretrizes oficiais, o professor precisa refletir, nas atividades de produção textual, as
concepções relacionadas aos gêneros textuais e seus contextos de produção, integrando leitura
e produção de textos. A análise linguística também deve ser usada como um instrumento para
os alunos perceberem sua funcionalidade ao produzirem textos diversificados. Congregar
análise linguística, leitura e produção textual à luz de teorias vinculadas às noções de texto e
discurso parece, então, ser o caminho prioritário no ensino reflexivo de língua portuguesa.
2.4. Articulação textual
44
Segundo Koch (2003b), o encadeamento de segmentos ou porções textuais de
qualquer extensão é feito, na maioria dos casos, por elementos linguísticos denominados pela
LT como articuladores textuais, que podem ligar “períodos, parágrafos, subtópicos,
sequências textuais ou partes inteiras do texto” (KOCH, 2003, p. 133), contribuindo para a
construção de um texto coeso e coerente. Os articuladores são marcadores que desempenham
papel importante no texto, elementos que, segundo Santos (2003), englobam um caráter
coesivo que garante a progressão textual, além de apresentarem nuances diversas em seus
sentidos, diante do contexto em que estão inseridos.
De acordo com Koch (2003, p. 133), eles são responsáveis por
relacionar elementos de conteúdo, ou seja, situar o estado de coisas de que o
enunciado fala no espaço e/ou no tempo, bem como estabelecer entre eles relações
de tipo lógico-semântico; podem estabelecer relações entre dois os mais atos de fala,
exercendo funções enunciativas ou discursivo-argumentativas; e podem, ainda, no
texto, desempenhar funções meta-enunciativas.
Os articuladores textuais, então, são “conectores” que estão envolvidos no processo de
encadeamento textual a partir de determinadas estratégias de sequenciação ancoradas em
marcas linguísticas específicas que colaboram para a progressão do texto. Para que a
sequenciação seja garantida, segundo Koch (2003b), é possível utilizar estratégias de
diferentes níveis – fonético-fonológico, sintático, semântico. Podem ser efetuadas, ainda,
recorrências de vários tipos, dentre as quais a reiteração de itens lexicais, de elementos
fonológicos, de tempos verbais, além de paralelismos e paráfrases.
Campos e Torquato (2013) apontam que, dentre os vários mecanismos responsáveis
pelo processo de sequenciação, está a articulação textual argumentativa. De acordo com os
autores, para estudar os articuladores argumentativos, a LT recorre aos estudos da Semântica
Argumentativa, de Oswald Ducrot, incorporando algumas premissas, como a acepção de que
a argumentação está na língua, sendo tecida por elementos discursivo-argumentativos que
orientam os sentidos para o interlocutor e marcam subjetivamente o texto, constituindo os
denominados articuladores textuais, operadores de discurso ou operadores argumentativos. As
investigações da LT, contudo, utilizam a nomenclatura “articuladores textuais”, também
adotada nesse trabalho.
Os articuladores argumentativos englobam diferentes grupos de elementos
linguísticos, como as conjunções e os advérbios. Cabral (2010) exemplifica o processo de
articulação textual a partir do uso do conector “mas”. Segundo a autora, a condução
45
argumentativa envolvida no uso de “mas” ocorre sempre para a conclusão conduzida pelo
segundo enunciado. No exemplo, “Você ficou linda nesse vestido, mas ele é caro” (CABRAL,
2010, p. 17), o articulador “mas” tem como função reforçar a argumentação de que a
interlocutora não deve comprar o vestido, mesmo que tenha ficado bem nela.
Ducrot (1981) aponta que o conector “mas” não liga apenas ideias opostas, havendo,
na verdade, conclusões distintas conduzidas pelas orações por ele ligadas. Isso pode ser visto
no exemplo seguinte: “Aquele hotel é muito bom, mas muito caro” (CABRAL, 2010, p. 18).
Não há uma real oposição entre ser “muito bom” e ser “caro”. Teríamos ideias realmente
opostas caso tivéssemos enunciados, como “aquele hotel é muito bom, mas muito ruim” ou
“aquele hotel é muito barato, mas muito caro”. Nesses casos, teríamos ideias que se opõem,
mas que estariam, evidentemente, vinculadas a outros sentidos, em que aquilo que é “caro”
não está necessariamente relacionado a aspectos monetários, mas a questões outras.
Na verdade, ao enunciarmos que há um “hotel muito bom”, de alguma forma,
orientamos nosso discurso para a conclusão de que o interlocutor deve se hospedar nele.
Quando o enunciado aponta que o hotel também é “muito caro”, contudo, há uma mudança na
orientação argumentativa, pois locais que custem muito financeiramente não são, geralmente,
recomendados por quem não pretende gastar uma grande quantia. O “mas” é a marca
linguística que permitirá a condução desse enunciado de acordo com a forma pretendida.
Além disso, os articuladores textuais têm diversas funções pragmático-discursivas, as
quais, de acordo com Nascimento (2008), são definidas pelo tipo de relação estabelecida,
contextualmente, entre as unidades articuladas e pelos níveis estruturais em que se inscrevem
essas mesmas unidades. Ou seja, os papéis dos articuladores não são estanques, apresentando
variações entre os sentidos construídos sociocognitivamente a depender do contexto em que
eles estão inseridos.
Santos (2003), por exemplo, ao estudar os articuladores “e”, “mas”, “aí” e “então”
numa amostra composta por textos de literatura infantil e juvenil, observou que esses itens
podem apresentar subfunções semelhantes, mas também englobam suas especificidades.
Outras investigações em gêneros e/ ou suportes textuais diferentes podem encontrar novos
usos para esses elementos, além de observarem possíveis interseções pragmáticas distintas.
Assim, o contexto é tido como um fator determinante nos usos dos articuladores.
Koch (2003b) e Koch e Elias (2016) elencam algumas das funções ligadas à
articulação textual de forma ampla: introduzir relações discursivo-argumentativas de
contrajunção, justificativa, explicação, generalização, comprovação; “comentar” a própria
46
enunciação a partir de delimitações, marcação de atitude, demonstração de afetividade,
preservação de faces, indicação de graus de imperatividade; organizar o texto; situar ou
ordenar o estado de coisas de que o enunciado fala no espaço e/ou no tempo; estabelecer
relações lógico-semânticas. Essas funções são ligadas, pelas autoras, aos itens adverbiais
(sobretudo os modalizadores) e às conjunções. Adotamos essa proposta nesse trabalho,
considerando os adverbiais modalizadores (“talvez”, “provavelmente”, “com certeza”) como
articuladores meta-enunciativos (KOCH, 2003).
Além do campo teórico englobado pelos articuladores textuais, Koch ([1992] 2013, p.
39-40) ressalta que esses elementos são pouco explorados em relação ao ensino, constituindo
uma lacuna na interface língua portuguesa e ensino, pois eles
têm merecido pouca atenção nos livros didáticos e nas aulas de língua portuguesa, já
que pertencem às classes gramaticais invariáveis (advérbios, preposições,
conjunções, locuções adverbiais, prepositivas, conjuntivas) ou, então, são palavras
que, de acordo com a N.G.B. (Nomenclatura Gramatical Brasileira), não forma
incluídas em nenhuma das dez classes gramaticais, merecendo, assim, ‘classificação
à parte’ (...). Acontece, porém, que justamente essas ‘palavrinhas’ (tradicionalmente
descritas como ‘meros elementos de relação, destituídas de qualquer conteúdo
semântico’) as responsáveis, em grande parte, pela força argumentativa de nossos
textos.
2.5. O gênero textual artigo de opinião
2.5.1. Aspectos gerais dos estudos sobre gêneros
Os estudos sobre gêneros vinculam-se sempre, em alguma medida, à perspectiva
bakhtiniana. O autor, precursor na temática e autor de diversos trabalhos vinculados aos
estudos de literatura, postulou que os gêneros são formas relativamente estáveis estabelecidas
como práticas sócio-históricas. Sua concepção eminentemente dialógica vincula-se a três
critérios ligados à esfera social da linguagem e postulados para classificação dos gêneros:
conteúdo temático, estilo e construção composicional. O conteúdo temático engloba do que
trata o gênero, ou seja, o que é dito e o que pode ser dito nele; o estilo compreende as seleções
lexicais e aos aspectos gramaticais; a construção composicional representa a estruturação e o
enquadramento formal, o que engloba as tipologias textuais e as partes constitutivas de cada
gênero.
Bakhtin ([1979] 1997) aponta, ainda, que a riqueza e a diversidade dos gêneros são
47
infinitas, tendo em vista que são inesgotáveis as possibilidades da multiforme atividade
humana, além de ser integral, em cada campo dessa atividade, o crescimento do repertório de
gêneros e sua diferenciação à medida que se desenvolve e se complexifica um determinado
campo. Isto é, os gêneros são infinitos e incontáveis, podendo desaparecer e surgir diante das
necessidades comunicativas dos falantes/ ouvintes. Uma evidência desse aspecto é a
multiplicidade de novos gêneros diante do advento da internet ao mesmo tempo em que
gêneros muitos comuns antigamente, como o telegrama, são, atualmente, poucos utilizados;
outros caíram em total desuso, desaparecendo.
Para analisar um gênero, no entanto, precisamos levar em consideração outros
conceitos, como o de tipologia textual. As tipologias textuais diferenciam-se dos gêneros, pois
são características formais dos próprios textos, constituindo um número finito de estratégias
discursivas que podem ser utilizadas por qualquer usuário da língua, mesmo que não
escolarizado. Seu estudo apresenta diversas vertentes teóricas defendidas por autores como
Schnewlly e Dolz (2004), Charaudeau (2008), Marcuschi (2008) e Travaglia (2009). Nesse
trabalho, seguimos a proposta de Marcuschi (2008), pois buscamos observar qual delas era
mais referida nas documentações oficiais e nos livros didáticos devido à relação do trabalho
com o ensino. Após esse panorama, observamos que a perspectiva defendida por Marcuschi
(2008) era a mais frequente.
De acordo com o autor, há cinco tipologias textuais possíveis de serem utilizadas:
descrição, narração, exposição, argumentação e injunção. Cada gênero caracteriza-se por
apresentar algumas tipologias mais características e/ou predominantes. Artigos de opinião e
editoriais são caracterizados por seu caráter argumentativo; receitas pelo uso da injunção;
notícias pelas tipologias narrativa e descritiva. Esses gêneros, porém, não apresentam apenas
essas tipologias textuais. Assim, cada texto pode apresentar diferentes tipologias, apesar de
alguma(s) dessa(s) tipologias se sobressaírem.
Cada gênero, além de caracterizado por suas tipologias geralmente predominantes,
também se vincula a diferentes domínios discursivos. Esses domínios são esferas de produção
em que os gêneros podem ser agrupados, como domínio jornalístico, literário, religioso, etc.
Outro relevante aspecto para os estudos sobre gêneros é a intergenericidade. Como dissemos,
há a possibilidade de surgimento e extinção de incontáveis gêneros; no entanto, também é
possível que os gêneros sejam mesclados em alguns contextos comunicativos específicos, em
que uma notícia, por exemplo, também faz uma propaganda, ou uma receita é tida como um
poema.
48
Outro aspecto relevante é o suporte em que o texto está inserido. Marcuschi (2003),
pautando-se numa visão textual de suporte, postula que, preliminarmente, podemos dizer que
o suporte é imprescindível para a circulação do gênero na sociedade e, por isso, deve ter
alguma influência em sua constituição. O autor busca definir o suporte como o locus físico ou
virtual formatado especificamente para servir como base ou ambiente para fixação de um
gênero materializado como texto. Assim, para Marcuschi (2003), o suporte é um lugar físico
ou virtual, tem um formato específico e serve para fixar e mostrar um texto. Admite-se, dessa
forma, que: o suporte representa, incontornável e imprescindivelmente, algo real; não é
informe ou uniforme, aparecendo com um formato específico; sua função base é fixar o texto,
tornando-o acessível para determinado fim comunicativo.
2.5.2. Os artigos opinativos
De acordo com Boff, Köche e Marinello (2009), os artigos de opinião partem da
argumentação para analisar, avaliar e responder questões controversas e atuais discutidas
socialmente. Esses artigos são escritos por articulistas, muitas vezes autoridades nos assuntos
sobre os quais estão escrevendo. O enfoque dos artigos opinativos não é a apresentação de
acontecimentos e fatos, mas sua análise, marcando o posicionamento do enunciador em
relação ao que está sendo tratado. Sua publicação geralmente está vinculada a seções
opinativas com periodicidade regular em sua publicação e espaço físico limitado. Para Boff,
Köche e Marinello (2009), sua produção deve considerar que os leitores já apresentam
opiniões prévias sobre o que será defendido e que as teses apresentadas devem considerar, em
alguma medida, essas opiniões, omitindo-as ou antecipando possíveis respostas.
De acordo com os autores, os artigos opinativos apresentam uma estrutura regular:
situação-problema, discussão e solução-avaliação. A situação-problema engloba a
apresentação da questão a ser debatida ao longo do texto, contextualizando o assunto,
podendo evidenciar o objetivo da argumentação a ser desenvolvida ou da relevância na
discussão do tema. A discussão, por outro lado, é caracterizada pela argumentação e
construção da tese acerca do tema analisado, apresentando fatos, “argumentos de autoridade”,
exemplos a partir de trechos marcados por outras tipologias textuais. Já a solução-avaliação é
uma resposta ao que foi apresentado, reafirmando a tese defendida, sem apenas resumir ou
reafirmar o que foi afirmado anteriormente.
Schneuwly e Dolz (2004) apontam que os artigos de opinião são caracterizados por
49
discutirem questões sociais controversas. Para Melo (2015), esse gênero trata de assuntos
polêmicos e seus autores visam a defender, a partir de seus argumentos, as teses construídas
nos textos. Assim, como aponta Costa (2009, p. 37), o artigo de opinião “forma um corpo
distinto na publicação, trazendo a interpretação do autor sobre um fato noticiado ou tema
variado (político, cultural, científico, etc.)”. Ou seja, representa um gênero opinativo, marcado
pelo posicionamento do enunciador e pelas marcas de subjetividade.
Segundo Melo (2015), o gênero artigo de opinião está presente em diversas esferas da
comunicação humana, apresenta forte caráter sociodiscursivo e circula em diferentes suportes
textuais. Assim, de acordo com a autora, os artigos opinativos são típicos de variados
domínios discursivos: jornalístico, religioso, político, científico, etc. Além disso, esse gênero é
caracterizado “pela defesa de um posicionamento sobre determinada temática, o qual
relaciona o ponto de vista de um sujeito que pode ou não concordar com o tema abordado”
(MELO, 2015, p. 73).
Para Bräkling (2000), esse gênero tem como característica a busca pelo
convencimento do interlocutor acerca da tese defendida, influenciando e transformando suas
perspectivas a partir dos argumentos apresentados. Para isso, são utilizadas, segundo Boff,
Köche e Marinello (2009), diferentes estratégias que ajudam na tentativa de persuadir o leitor.
Algumas delas são: o uso de outras “vozes” a partir de “argumentos de autoridade”, ou seja,
depoimentos/ opiniões de pessoas que tenham grande conhecimento do assunto tratado; apoio
em fatos que corroboram a validade do que é dito. Assim, como aponta Perelman (apud Boff,
Köche e Marinello (2009)), o objetivo é provocar ou aumentar a adesão do leitor em relação à
tese apresentada.
De acordo com Dolz e Schneuwly (2004), os artigos de opinião tem como tipologia
predominante a argumentação tendo em vista seu objetivo de convencimento junto ao público
leitor. Bräkling (2000) aponta, ainda, que há pistas textuais típicas desse gênero: presente do
indicativo ou subjuntivo na exposição dos argumentos, uso da terceira pessoa ao longo do
texto e presença de articuladores argumentativos, que contribuem para construção da
argumentação. Os elementos aqui estudados, como já expusemos, funcionam como
articuladores textuais argumentativos e, portanto, são importantes na construção desse gênero
textual.
Para Boff, Köche e Marinello (2009, p. 4), “é a expressão do posicionamento crítico
do autor que garante consistência ao artigo de opinião. As características do contexto de
produção (enunciador, assunto, finalidade comunicativa) determinam a configuração do artigo
50
de opinião”. Por isso, Melo (2015) aponta que esse gênero é propício para o trabalho em sala
ao levantar o posicionamento crítico do aluno em relação a temas controversos discutidos
socialmente e apresentados a partir de argumentos e contra-argumentos.
Nesta Dissertação, recorremos aos pressupostos teóricos da LT para observarmos os
efeitos de sentido envolvidos no uso dos adverbiais modalizadores como articuladores
textuais argumentativos a partir, sobretudo, dos estudos desenvolvidos por Ingedore Koch.
Além disso, recorremos à LT para analisar o tratamento dado nos livros didáticos a esses
elementos relacionados à argumentação e também utilizamos suas reflexões teóricas na
elaboração de atividades que possam ser, posteriormente, adaptadas por professores e
pesquisas futuras com efetiva aplicação em sala de aula.
51
3. EXPRESSÕES DA MODALIZAÇÃO E ENSINO
3.1. A modalização do discurso
De acordo com Castilho et al. (2014), a gramática clássica distinguia dois grandes
componentes das sentenças: o dictum e o modus. O primeiro corresponde ao componente
proposicional, constituído de sujeito e predicado; o segundo é o componente modal, que
representa uma avaliação do dictum. Um dos principais conceitos a serem depreendidos dessa
noção é a modalização, isto é, a avaliação sobre o que é dito na sentença – o dictum. Segundo
os autores, ela ocorre à medida que, ou o falante assume diferentes graus de
comprometimento com os valores de verdade do dictum, ou expressa a seu respeito uma
atitude ou reação psicológica.
Baseado e fundamentado na teoria da enunciação4, de Benveniste, o conceito de
modalização do discurso vincula-se à noção de subjetividade. Diante do posicionamento do
enunciador em relação à proposição, marcas (inter)subjetivas são deixadas em seu discurso e,
assim, o enunciador assinala sua presença por meio de índices de modalização, tidos como
marcas atitudinais, opiniões, intenções, sentimentos e pontos de vista.
Cabral (2010) ressalta que é preciso diferenciar modalidade e modalização. A
modalidade diz respeito aos estudos da retórica clássica para classificar as proposições em
possibilidade/ impossibilidade e necessidade/ contingência. Os enunciados, segundo a autora,
podem se encaixar em três tipos de modalidade: epistêmica (ligada ao conhecimento, à crença
e ao julgamento em termos de probabilidade, possibilidade e certeza); deôntica (relacionada
ao dever, à obrigação e à permissão) e alética (refere-se à necessidade). São noções
fundamentais da lógica modal, então, a necessidade e a possibilidade diante de um estado de
coisas.
Para Cabral (2010, p. 111), a modalização “refere-se à expressão da aproximação ou
do distanciamento do locutor diante do conteúdo de seu enunciado, atestando seu grau de
adesão”. Já Koch ([1984] 2011) recorre à teoria dos atos de fala, de Austin, para discutir a
noção de modalização. Para a autora, ao produzir um enunciado, o locutor manifesta suas
intenções e atitudes por meio de sucessivos atos ilocucionários de modalização, atualizados a
partir de diferentes modos de lexicalização oferecidos pela língua, dentre os quais os
adverbiais modalizadores.
4 . Para essa teoria, a enunciação "é a colocação em funcionamento da língua por um ato individual de
utilização" (BENVENISTE, 1976, p. 79).
52
Assim, como aponta Bronckart (1999, p. 330),
as modalizações têm como finalidade geral traduzir, a partir de qualquer voz
enunciativa, os diversos comentários ou avaliações formulados a respeito de alguns
elementos do conteúdo temático. (...) Portanto, as modalizações pertencem à
dimensão configuracional do texto, contribuindo para o estabelecimento de sua
coerência pragmática ou interativa e orientando o destinatário na interpretação de
seu conteúdo temático (grifos do autor).
Portanto, o conceito de modalização do discurso está relacionado, como ressalta
Kebrat-Orecchioni ([1980] 1997), às marcas dadas pelo sujeito da enunciação ao seu
enunciado, ou seja, ao componente que permite avaliar o grau de adesão do enunciador ao que
está sendo proferido por ele. A ideia de modalização vincula-se, dessa forma, à aplicação dos
conceitos de modalidade à enunciação e ao uso em contextos reais de interação.
Além disso, é preciso ressaltar que a modalização é expressa por marcas linguísticas e,
por isso, é objeto de estudo, sobretudo, dos estudos sobre argumentação, pois a investigação
do grau de adesão está vinculada à força argumentativa conferida aos textos e, portanto, ao ato
de argumentar. Charaudeau (2008) aponta, ainda, que esses índices de modalização são
responsáveis por marcar, de alguma forma, a presença do sujeito da enunciação no discurso e,
portanto, marcar a subjetividade da linguagem. Essas marcas enunciativas podem ser
expressas por diferentes estruturas lexicais, morfológicas e sintáticas, dentre as quais os
adverbiais modalizadores e os verbos modais (cf. LIMA, 2011; STEFFLER, 2013)
3.2. Adverbiais modalizadores em perspectiva teórica
Acerca da classe dos adverbiais, Martelotta (2012, p. 13) afirma que
a categoria dos advérbios é reconhecidamente a menos homogênea e, portanto, a
mais difícil de ser definida. De acordo com Givón (2001), não surpreende que os
advérbios sejam a classe que, translinguisticamente, apresenta menos aspectos
universais, podendo estender-se pelos planos morfológico, léxico e sintático. Essa
versatilidade, provavelmente, se deve ao fato de os advérbios funcionarem num
plano de utilização da língua que oscila entre o campo representacional, típico do
léxico, e a área da gramática, relacionada à orientação intersubjetiva que
normalmente se associa aos elementos de caráter gramatical.
O grupo denominado adverbiais engloba elementos muito diferentes sintática,
semântica e pragmaticamente, o que leva à necessidade de estudá-los e descrevê-los de forma
separada. A heterogeneidade da classe aponta para os adverbiais como uma categoria fluida,
com constituintes que transitam entre o léxico e a gramática e organizam-se radialmente com
53
elementos mais ou menos prototípicos. Martelotta (2012) destaca alguns dos aspectos
importantes para essa classe em relação à morfossintaxe, à semântica e ao discurso.
Morfossintaticamente, o autor primeiramente discute a estrutura dos adverbiais. Para
ele, é preciso diferenciar os advérbios, ou seja, aqueles com um só vocábulo, e as locuções
adverbiais, aquelas com estrutura sintagmática de algum tipo. Aos advérbios podem ser
acrescidos sufixo -mente ou não. Já as locuções, segundo o autor, são formadas, sobretudo,
pela junção de uma preposição com algum substantivo. A esse respeito, Neves (2000)
apresenta outras formações estruturais possíveis: substantivos quantificados; substantivo +
preposição + substantivo; substantivo/ pronome quantificador + preposição + mesmo
substantivo/ pronome quantificador; formas verbais havia/ fazia + substantivo quantificado.
Martelotta (2012) ressalta, contudo, que, diante das evidências diacrônicas já descobertas, não
é recomendável estabelecer uma rígida diferença entre os advérbios e as locuções adverbiais,
sendo necessário adotar uma teoria que considere a gramática como fenômeno criativo e
dinâmico.
Outro ponto destacado pelo autor é a invariabilidade. Para Martelotta (2012), os
advérbios são caracterizados como elementos qualificativos, aproximando-os dos adjetivos.
Nesse ponto, o que diferenciaria os dois grupos seria a invariabilidade dos advérbios. Essa
característica aproxima os advérbios de outras classes, como as preposições e as conjunções.
Ou seja, em relação aos adjetivos, estariam mais próximos do campo da gramática do que do
campo do léxico sob esse prisma, mas em relação às preposições e às conjunções estariam
mais no campo do léxico, pois veiculam sentidos lexicais, apesar de assumirem funções
discursivas. Esse critério, porém, precisa ser relativizado diante de algumas exceções, como o
advérbio “meio”, que apresenta variabilidade em alguns contextos.
Semanticamente, Martelotta (2012) aponta que os adverbiais são modificadores, sendo
definidos “como elementos que modificam a ação expressa pelo verbo, indicando as
circunstâncias referentes a essa ação, ou seja, as informações acessórias, que ajudam a formar
quadro geral associado a essa ação” (MARTELOTTA, 2012, p. 38). Alguns grupos de
advérbios, porém, parecem não estar tão ligados a essa definição, sobretudo os não
predicativos, o que inclui os circunstanciadores temporais e locativos, os focalizadores e os
advérbios de inclusão.
Pragmaticamente, os adverbiais podem exercer diversas funções a depender dos
contextos em que estão inseridos. Martelotta (2012) cita os estudos de Ducrot para ressaltar
que esses elementos colaboram para construção da pressuposição, como “já” e “quase”. É
54
preciso trabalhar os aspectos discursivos num continuum de circunstâncias, que, para
Martelotta (2012), engloba desde o cenário espaço-temporal até o processo de construção do
texto. É preciso considerar as intencionalidades do falante, tendo em vista a constante
negociação envolvida na interação falante e ouvinte. Paiva (2008) apresenta algumas funções
típicas dos circunstanciadores temporais e locativos, como contraste, introdução de subtópico,
focalização, dentre outras. Em relação a outros grupos de adverbiais, outros pesquisadores
elencam outras propriedades pragmáticas, agrupadas de acordo com seus contextos
discursivos.
Para Martelotta (2012), os adverbiais podem ser divididos em três subgrupos:
centrados nos qualitativos, centrados nos aspectuais e locativos de referência fixa. O primeiro
subgrupo engloba, para o autor, os qualitativos, os que apontam para atitude do sujeito, os
modalizadores, os intensificadores, os marcadores discursivos e os conjuntivos. Nesse
trabalho, destacamos, desse grupo, os modalizadores com o qual dialogaremos nesta seção a
partir do próximo parágrafo.
O estudo de Castilho e Castilho ([1992] 2002), marco nas investigações sobre
modalizadores, consiste na análise do uso desses elementos em perspectiva funcionalista a
partir da união de uma análise estrutural, por meio de sua ordenação, com as estratégias de
modalização e seu valor semântico. O estudo demonstra que os modalizadores podem ocorrer
em distintas posições na oração e que seu posicionamento pode estar relacionado com as
estratégias modalizadoras e com seu valor semântico. Para os autores, esses advérbios podem
apresentar valores semânticos que vão além de seu sentido original, englobando um grupo
denominado “paragógico” com modalizadores que assumem dois sentidos e um grupo
nomeado como “complexo” com elementos que perdem seu valor original e assumem novos
valores.
Adotando uma abordagem histórica, Moraes Pinto (2003; 2008), ao observar os
advérbios qualitativos e modalizadores em -mente, constatou que houve uma modificação nos
seus usos em relação à ordenação e aos seus valores semânticos, detectando novos usos na
comparação entre as distintas sincronias e constatando uma relação entre a ordenação e o
processo de gramaticalização sofrido por esses advérbios. A autora demonstrou, a partir de
dados do português arcaico, que os advérbios modalizadores em -mente têm origem
qualitativa, passando a desempenhar função modalizadora posteriormente na língua
portuguesa.
Tescari Neto e Pezatti (2005) analisam os adverbiais modalizadores epistêmicos a
55
partir de sua ordenação. Seguindo os pressupostos teóricos da linguística funcional de Dik, os
autores partem da perspectiva de que os elementos analisados funcionam como satélites de
nível três ao se ligarem à camada proposicional, avaliando eventos em seu conteúdo
proposicional veiculado por determinado ato de fala. A partir da análise dos modalizadores em
um corpus de fala do português europeu, os autores demonstram que os epistêmicos tendem
ao posicionamento periférico na oração, além de apontarem para a necessidade de observar os
valores semânticos propostos por Castilho e Castilho ([1992] 2002).
Já Vidal (2009) investiga o uso e a ordem dos advérbios em -mente, englobando vários
grupos, como os temporais, focalizadores, modalizadores e qualitativos. Seus resultados
demonstraram que alguns aspectos a serem observados na análise desses elementos são a
modalidade em que eles se inserem (oral ou escrita), os gêneros textuais a que eles se
vinculam e também fatores sociais, como o grau de escolaridade. A autora demonstrou, a
partir de seu estudo, que os advérbios em -mente são mais utilizados na modalidade escrita da
língua, no gênero relato opinativo e por pessoas com Ensino Médio completo. Com isso,
percebemos que esses elementos são aparentemente ligados a contextos mais formais, sendo
usados por falantes mais escolarizados. O trabalho, apesar de propor uma conexão com o
ensino, não apresenta nenhuma reflexão sobre o ensino desses elementos, limitando-se a
reflexões genéricas sobre ensino de língua portuguesa em diferentes perspectivas teóricas.
Castilho et al. (2014) apontam que a classe dos advérbios é, de maneira geral, tratada a
partir de ideias como invariabilidade, modificação do verbo, do adjetivo ou do advérbio e que,
por vezes, é tida como uma classe bem delimitada com palavras que funcionam da mesma
forma. Para os autores, essa ideia é disseminada em contexto escolar e perdura posteriormente
na mente dos falantes. Segundo eles, a classe não é bem delimitada, pois há "áreas cinzentas"
(CASTILHO et al., 2014, p. 267) entre advérbios e locuções adverbiais (denominadas por eles
como “adverbiais”), adjetivos e operadores de discurso. Eles ressaltam, ainda, a plurivocidade
da classe, o que, segundo os pesquisadores, gera múltiplas possibilidades interpretativas para
o linguista e, também, algumas dúvidas descritivo-analíticas.
Segundo Castilho et al. (2014), é preciso observar os advérbios a partir de suas
subclasses. Os autores apresentam diversas divisões dentro da classe, constituindo a seguinte
proposta: predicadores (qualificadores, modalizadores, aspectualizadores, graduadores,
quantificadores); verificadores (de focalização, de negação, de inclusão e de exclusão,
aproximadores, delimitadores); circunstanciais (de lugar e tempo). Essa divisão engloba,
ainda, grupos mais específicos dentro dos apresentados anteriormente, como os fóricos e as
56
locuções constituídas pelo item “vezes”.
Castilho et al. (2014) defendem, ainda, que os adverbiais modalizadores são aqueles
que estão envolvidos no processo de modalização do discurso, em que há uma avaliação sobre
o enunciado. Esse grupo, também heterogêneo, engloba diversos modalizadores, como os
epistêmicos, os deônticos e os atitudinais. Os autores destacam o uso do modalizador
“realmente” devido à sua alta frequência de ocorrência em uma amostra de 254 modalizadores
de certeza. Para eles, a flutuação na posição desse elemento está ligada ao polifuncionalismo
dos advérbios, derivando-os para o domínio do texto e agindo, assim, como articuladores
textuais, como discutiremos a partir dos próximos trabalhos.
Sobre o papel dos elementos adverbiais como articuladores textuais ou operadores de
discurso, Koch (2003b) defende que advérbios e conjunções são itens que ligam porções do
texto e que veiculam diferentes efeitos pragmáticos diante de seu uso. A autora aponta que
eles podem ser divididos, de maneira geral, em três grupos: de conteúdo proposicional,
enunciativos, ou discursivo-argumentativos, e metaenunciativos. Koch (2003b) recorre a
pesquisas anteriores escritas por ela para exemplificar e comentar alguns casos de
articuladores enunciativos (“mas”, “portanto” e “ainda que”) e de conteúdo proposicional
(“por causa de”, “para” e “porque”).
Koch (2003b) aprofunda-se mais, no entanto, nos articuladores metaenunciativos. Por
definição, esses elementos são os que “comentam a própria enunciação” (KOCH, 2003, p.
135), grupo que engloba, dentre outros, os itens linguísticos que estudamos nessa pesquisa: os
adverbiais modalizadores. Esses articuladores, segundo a autora, podem ser divididos em
alguns grupos: delimitadores de domínio, ou hedges (“geograficamente” e “politicamente”);
organizadores textuais, baseando-se em Maingueneau, (“primeiramente” e “em segundo
lugar”); epistêmicos (“evidentemente” e “aparentemente”); atitudinais ou afetivos
(“infelizmente” e “felizmente”); axiológicos (“curiosamente” e “mais uma vez”); deônticos
(“opcionalmente” e "é indispensável"); atenuadores (“talvez” e “ao que me parece”) e
metaformulativos (“digamos assim” e “quero dizer”).
Já em Koch ([2004] 2015; [2008] 2014), a autora reorganiza seus postulados
anteriores. Primeiramente, ela detalha as operações discursivas desses articuladores,
ressaltando que eles operam em diferentes níveis: desde a microestrutura textual, articulando
membros oracionais e/ou orações até a organização global do texto, em que são responsáveis
por explicitar sequências textuais maiores. Logo após, Koch ([2004] 2015; [2008] 2014)
apresenta uma nova divisão para esses elementos: de conteúdo proposicional, discursivo-
57
argumentativos, organizadores textuais e metadiscursivos. Ou seja, as mudanças consistem na
separação dos organizadores textuais dos demais meta-enunciativos, no maior detalhamento
dos marcadores discursivos, recorrendo a Santos (2003) e, como destacamos, na
reorganização dos meta-enunciativos.
Koch ([2004] 2015; [2008] 2014) aponta que há, ainda, um grupo de articuladores
metadiscursivos. Esses são responsáveis por comentar o estatuto discursivo do que é dito, por
vezes, sobre a própria enunciação. Incluem-se nesse grupo, então, os metaenunciativos e os
demais elementos anteriormente tidos como parte dessa classificação: modalizadores e
metaformulativos. Para a autora, os modalizadores podem ser divididos entre stricto e lato
sensu. No primeiro grupo, estão os deônticos, aléticos e epistêmicos e, no segundo, estão os
axiológicos, atitudinais e atenuadores. Em relação aos metaenunciativos, a autora inclui
apenas elementos que introduzem a autorreflexão da linguagem (“digamos assim” e “vamos
dizer assim”).
Koch e Elias (2016), ainda sobre os articuladores textuais, buscam sistematizar a
temática a partir de mais exemplos e listas resumitivas. Além disso, ressaltam que o
agrupamento classificatório é decorrente das funções exercidas por esses elementos no texto.
As autoras recorrem, no geral, ao que já fora postulado por Koch em seus últimos estudos,
mas apresentam um detalhamento muito mais amplo a partir de diversos exemplos e do
esmiuçamento dos efeitos de sentido envolvidos nesse processo sociocognitivo. Quanto aos
metadiscursivos, porém, elas apresentam algumas modificações. Por um lado, apenas alteram
a nomenclatura de alguns – denominam os metaenunciativos como evidenciadores e os
metaformulativos como formulativos –, mas, por outro, excluem os delimitadores do grupo
dos modalizadores, colocando-os num grupo à parte.
Ressaltamos, contudo, que, embora todas essas investigações apresentem listas
classificatórias seguidas de alguns exemplos e seus respectivos comentários, o objetivo
principal é demonstrar que esses elementos veiculam diferentes efeitos de sentido e, por isso,
podem ser agrupados, de alguma forma, em subgrupos com elementos pragmaticamente
semelhantes no que cerne à articulação textual. Essas listagens, porém, não devem ser tidas
como uma rígida divisão, mas como uma forma de agrupamento desses itens que pode ser
modificada a depender do contexto em que estão inseridos. Ou seja, um mesmo elemento
pode ter diferentes efeitos a depender de vários aspectos envolvidos em sua produção.
Nesta Dissertação, analisaremos alguns elementos responsáveis pela modalização do
discurso: advérbios, advérbios em -mente e locuções adverbiais. Para isso, consideraremos,
58
conforme Koch (2003b), que os adverbiais modalizadores são articuladores textuais e podem
ser agrupados diante de determinados efeitos de sentidos. Apresentaremos, posteriormente, os
efeitos encontrados em nossa amostra e o papel qualitativo desses elementos enquanto
articuladores argumentativos.
3.3. O ensino de adverbiais modalizadores
A classe dos advérbios, de forma geral, ainda não tem sido muito observada fora do
campo da Linguística teórica, havendo, então, poucos trabalhos relacionados à sua interface
com o ensino. Um grupo desses estudos engloba uma abordagem mais generalista acerca da
problematização das classes de palavras como um todo. Ressaltamos, contudo, que essas
investigações não destacam, em momento algum, os adverbiais modalizadores, mas são
relevantes diante de seu pioneirismo no tratamento do tema a que se propõem e da ausência
de um debate sobre o ensino de adverbiais em perspectiva linguística em outros trabalhos.
Dias ([2001] 2005), ao investigar a abordagem sobre classes de palavras em livros
didáticos, aponta que há duas tendências nos manuais didáticos analisados: uma abordagem
“conservadora”, especificando o estudo das classes de palavras, mesmo que associada a
textos; e outra, denominada pelo autor como “inovadora”, que não especifica o estudo das
classes gramaticais. A essas tendências, o autor associa o efeito de evidência do conceito e o
efeito de apagamento do conceito, ligados, respectivamente, aos manuais conservadores e
inovadores. Segundo Dias ([2001] 2005), esse quadro reflete o cenário das escolas brasileiras
“com defensores e opositores do ensino de gramática (...) [sem] clareza do que defendem ou
atacam” (DIAS, [2001] 2005, p. 126).
Em sua pesquisa, o autor optou por destacar três classes – adjetivos, substantivos e
pronomes – por considerar que é a partir delas que estão as questões mais relevantes diante do
caráter semântico de sua proposta de análise. Em linhas gerais, Dias ([2001] 2005) observou
que os livros didáticos conservadores centram-se em conceituações acerca das classes, mesmo
utilizando textos. Além disso, por vezes, ele adotam uma abordam generalista e reducionista
da caracterização das classes a partir de definições genéricas e reflexões simplistas. Embora
não utilize esse termo, sua descrição parece apontar para o uso do texto como pretexto para
ensinar gramática sem considerar outros aspectos necessários relevantes para a prática de
análise linguística.
Já os livros “inovadores” não apresentam conceituação alguma para as classes de
59
palavras. Segundo Dias ([2001] 2005), a abordagem é caracterizada pela integração com a
leitura e produção textual, sobretudo em relação aos adjetivos. Nos exemplos analisados,
esses livros didáticos discutem as classes por meio de suas funções nos textos sem recorrer à
nomenclatura da gramática tradicional. Por fim, o autor defende que deve haver um equilíbrio
entre trabalhar a gramática e o texto, sendo papel do livro didático formular uma orientação
segura ao professor para que sejam aproveitados os recentes estudos sobre as classes de
palavras no país, indo além da “didatização” dos conceitos da tradição gramatical.
Esse trabalho, apesar de algumas aplicações pouco claras às classes destacadas,
demonstra que alguns livros didáticos ou se pautam apenas nas funções, ou apenas na
nomenclatura. Esses caminhos, como defendemos ao longo desta Dissertação, não são
opostos, havendo, na verdade, uma complementariedade entre eles. É preciso destacar, ainda,
que o trabalho de Dias ([2001] 2005) é anterior ao início das avaliações periódicas dos livros
didáticos feitas pelo Ministério da Educação. Assim, há maior chance de os manuais estarem
distantes do que discutem as diretrizes oficiais e os estudos linguísticos atuais. Ao longo dessa
investigação, o autor usa diversas vezes o termo “ensino de gramática” para referir-se ao
ensino de elementos linguísticos, mas, ressaltamos, essa prática precisa ocorrer também em
perspectiva discursivo-textual.
Ainda sobre as classes de palavras, Pinilla ([2007] 2011) destaca que, a partir da
consulta a programas escolares e a livros didáticos, é possível depreender que o ensino de
classes de palavras, na maioria das vezes, está restrito ao conhecimento da nomenclatura. A
autora retoma um estudo de Neves da década de 1990, o qual demonstra que as classes de
palavras constituem o conteúdo mais abordado em sala de aula por professores. Pinilla
([2007] 2011) ressalta que os exercícios de identificação e classificação constituem, ainda na
época da publicação de seu trabalho, a prioridade dos professores de ensino fundamental e
médio, havendo, inclusive, uma repetição, ano a ano, de muitos conteúdos.
Pinilla ([2007] 2011) retoma, ainda, algumas definições de gramáticas e livros
didáticos sobre as dez classes propostas pela Nomenclatura Gramatical Brasileira (NGB):
adjetivo, substantivo, advérbio, verbo, artigo, pronome, numeral, preposição, conjunção e
interjeição. Diante desse agrupamento, a autora demonstra que há uma mistura de critérios
nessas definições: ora é adotado o critério semântico, ora o morfológico, ora o funcional.
Como exemplificação, destacamos que o substantivo e o numeral são definidos somente a
partir de aspectos semânticos; o verbo a partir de critérios semânticos e mórficos e o advérbio
a partir dos três critérios: morfológico (“palavra invariável”), semântico (“exprime
60
circunstância”) e funcional (“modifica essencialmente o verbo”) (PINILLA, [2007] 2011, p.
172).
Após a retomada de diversos estudos sobre as classes de palavras, quase todos em
perspectiva teórica, Pinilla ([2007] 2011) termina seu estudo apontando que os materiais
didáticos devem ser melhor organizados para que haja um ensino produtivo das classes. Além
disso, a autora aponta que é preciso que pesquisadores tenham contato contínuo com
universitários e professores em atuação para que eles possam discutir como integrar o ensino
de leitura às classes de palavras. Para Pinilla ([2007] 2011), é preciso destacar os estudos
descritivos acerca das classes, mas vinculados ao conhecimento de como cada classe atua na
organização e na produção textual. A autora conclui indicando que o estudo desses elementos
deve contribuir para ampliar a expressão oral e escrita dos alunos para que possa combiná-los
na construção de seus textos,
Já Moraes Pinto e Alonso (2012) destacam os advérbios para discutir, também, o
ensino de classes de palavras. As pesquisadoras retomam autores, como Pinilla ([2007] 2011)
e Dias ([2001] 2005) para evidenciar que há muito a ser pensado sobre o ensino das classes.
As autoras propõem que é preciso focalizar a relação entre o texto e as classes de palavras
sem tratá-las de forma estanque, considerando, na verdade, categorias radiais, baseando-se,
sobretudo, na noção de categorização da LC. De acordo com as autoras, para isso, é preciso
apresentar, em sala, as características de determinada classe – como a dos advérbios – sem
deixar de demonstrar que nem todos os membros dessa categoria são prototípicos. Pautando-
se em Bybee (2010), elas apontam, ainda, que os membros mais centrais de uma determinada
categoria normalmente são os mais frequentes.
Moraes Pinto e Alonso (2012) destacam o caso dos advérbios modais em -mente para
debater os problemas na descrição da classe, argumentando que as tentativas de caracterização
dos advérbios são limitadas, pois não consideram a ordenação desses elementos e o gênero em
que eles estão inseridos, além de apresentarem os advérbios como uma classe fechada, o que
os opõe ao posicionamento das autoras. Posteriormente, retomam a abordagem das gramáticas
tradicionais, de alguns estudos linguísticos e de alguns livros didáticos em relação à classe
destacada. Por fim, reforçam a importância de categorias textuais no trabalho com advérbios a
partir do estudo de Moraes Pinto (2008) e postulam que oferecer ao aluno instrumentos para
tratar da gramática de sua língua é um começo promissor para um ensino produtivo.
Em relação à elaboração de propostas de atividades para ensino básico, também há
poucos trabalhos que observam os modalizadores. Algumas obras, porém, englobam diversos
61
elementos gramaticais, incluindo outros tipos de advérbios, a partir de uma abordagem
enunciativa (SANTOS; CUBA RICHE; TEIXEIRA, 2012; SANTOS, 2016). Destacamos,
contudo, o trabalho de Koch e Elias (2016), que propõe atividades que focalizam a relação
entre os articuladores textuais e a argumentação. As autoras destacam adverbiais
modalizadores, como “infelizmente” e “felizmente” para trabalhar a identificação de
articuladores textuais, a discussão de suas funções pragmáticas e a orientação argumentativa
que imprimem em textos de diferentes gêneros e tipologias textuais.
Dessa forma, percebemos que os adverbiais modalizadores ainda são pouco frequentes
em trabalhos sobre ensino de língua portuguesa. Muitas vezes, essas investigações recorrem,
como expusemos, ao trabalho com classes de palavras, ou, ao menos, com a classe dos
advérbios. Devido à sua heterogeneidade, entretanto, é preciso que subgrupos da classe sejam
focalizados, o que ainda constitui um caminho a ser percorrido nas pesquisas acadêmicas com
enfoque aplicado. Com esse segmento em relação aos adverbiais modalizadores, passarão a
ser priorizadas, como apontam as OCEM:
[as] formas de agenciamento de diferentes pontos de vista na textualização
(identificação dos elementos que sinalizam as vozes e o posicionamento dos
enunciadores trazidos à cena no texto), uso dos elementos de modalização
(identificação dos segmentos que funcionam como indicações acerca do modo como
o enunciador se posiciona em relação ao que é dito, a seu interlocutor ou a si
mesmo) (BRASIL, 2006, p. 38).
Esta Dissertação pretende estabelecer contribuições para o ensino a partir da
caracterização de como os adverbiais modalizadores são utilizados pelos articulistas em
jornais, como o tema é tratado em livros didáticos de Ensino Médio e como é possível tratar
do tema em sala de aula a partir de propostas de atividades elaboradas diante de alguns textos
usados como amostra deste trabalho.
62
4. METODOLOGIA
A metodologia desta Dissertação engloba três etapas. Em relação ao uso de adverbiais
modalizadores em artigos opinativos, estabelecemos uma análise qualitativa e quantitativa
baseada em uma amostra compostas por jornais, pois esse é um gênero recorrente nesse
suporte. A opção pelos jornais O Globo Online e O Dia Online foi motivada pela
periodicidade na publicação de artigos de opinião nesses jornais; já a escolha pelas versões
online relaciona-se ao acesso mais facilitado aos textos usados na amostra constituída para a
Dissertação. Ao todo, analisamos o uso dos adverbiais modalizadores em 60 artigos de
opinião, 30 do jornal O Globo Online e 30 do jornal O Dia Online. Coletamos todos os dados
presentes nesses textos, totalizando 74 adverbiais.
Foram observados os seguintes aspectos:
(a) posição na oração: se marginal ou não-marginal;
(b) estrutura do adverbial: se advérbio, advérbio em -mente ou locução adverbial.
(c) articulação textual: se epistêmico, deôntico, afetivo, delimitador ou axiológico;
(d) veículo: se O Globo Online ou O Dia Online;
Também analisamos um outro aspecto, a subjetividade, a partir de fator “articulação
textual”. Ou seja, depois de classificarmos todos os dados num dos tipos de articuladores
textuais, procuramos ver que tipos são mais subjetivos e que tipos são menos subjetivos. A
proposta de gradiência de subjetividade está no capítulo seguinte.
Além da análise do uso, também observamos a abordagem dos modalizadores em
livros didáticos de Ensino Médio. O projeto a que esta Dissertação se vincula também tem
como objetivo estabelecer contribuições para o ensino de adverbiais. Além disso, percebemos
que não havia trabalhos sobre essa temática.
Metodologicamente, optamos por uma análise panorâmica dos livros didáticos, tendo
em vista os outros objetivos do trabalho. O guia do PNLD 2015 apresenta 10 coleções aptas
para serem utilizadas nas escolas públicas, totalizando 30 livros didáticos, portanto
escolhemos aleatoriamente 4 dessas coleções, totalizando 12 livros didáticos: Português:
linguagens em conexão, Português: contexto, interlocução e sentido, Português: língua e
cultura e Vozes do mundo: literatura, língua e produção de textos.
Essa análise não consistiu apenas em observar a abordagem em capítulos relacionados
à temática diretamente, ou seja, aqueles que abordam prototipicamente adverbiais,
63
argumentação, classes de palavras. Buscamos observar como ocorria essa abordagem em
todos os capítulos dos 12 livros destacados, mesmo que, aparentemente, não tivessem relação
com o tema. Além disso, observamos, nos 12 livros didáticos, como era o tratamento do
Manual do Professor em relação ao tema, se havia alguma contribuição complementar em
relação aos modalizadores.
Nos livros didáticos, observamos dois aspectos:
(a) ligação entre adverbiais modalizadores e produção de textos argumentativos;
(b) apresentação dos usos adverbiais modalizadores em situações reais de uso.
Diante disso, nossa metodologia engloba uma análise qualitativa em relação ao uso
dos modalizadores, observando seu papel na construção dos artigos de opinião e congregando
com uma análise quantitativa pautada, sobretudo, na noção de frequência. Nos livros
didáticos, observamos qualitativamente a abordagem sobre os modalizadores em exposições
do livro, exercícios e no Manual do Professor, não tendo como objetivo quantificá-las, mas
estabelecer um panorama e, possivelmente, uma generalização. Além disso, também
confrontamos essas análises para que pudéssemos elaborar propostas de atividades que
preencham as lacunas encontradas.
Em relação a essas propostas, seguimos a metodologia já usada em Colamarco (2014)
para elaboração de atividades sobre referenciação em fábulas de Lobato e Esopo. A autora
observou as estratégias mais salientes e produtivas em sua amostra e elaborou atividades que
as refletissem. Santos, Cuba Riche e Teixeira (2012) e Santos (2016) também elaboraram
atividades sobre temas diversificados diante de exemplos reais de uso e de seus papéis
textuais. Nesta Dissertação, buscamos elaborar atividades a partir de textos pertencentes à
nossa amostra e dos usos prototípicos dos modalizadores, preenchendo, também, as lacunas
dos livros didáticos analisados.
64
5. ANÁLISE DE ADVERBIAIS MODALIZADORES: USO E ABORDAGEM
5.1. Uso de adverbiais modalizadores em artigos de opinião
Nesta seção, observaremos o uso dos adverbiais modalizadores a partir de uma
amostra composta por 60 artigos de opinião dos jornais O Globo Online e O Dia Online.
Primeiramente, faremos um panorama da frequência dos elementos nos jornais e,
posteriormente, observaremos seu uso em relação ao seu posicionamento na cláusula e sua
estrutura e aos efeitos de sentido envolvidos na articulação textual, considerando aspectos,
como a subjetividade e o veículo. Também observaremos como os livros didáticos de Ensino
Médio abordam a temática dos adverbiais modalizadores a partir de sua ligação à
argumentação e de exemplos efetivos de uso ligados aos efeitos de sentido e aos papéis
funcionais desses elementos.
5.1.1. Frequência dos adverbiais modalizadores
Nossa análise em relação aos adverbiais modalizadores parte dos usos dos
modalizadores na amostra montada para o trabalho. Ressaltamos que não temos como
objetivo apresentar uma visão categórica sobre o uso desses elementos, nem defender que no
gênero artigo de opinião esses usos são mais recorrentes, pois reconhecemos a complexidade
de caracterizar e categorizar determinados usos relacionados a um gênero. Para isso, é
necessário obter uma amostra mais ampla, que apresente diferentes suportes, veículos, etc.
Por isso, buscamos, na verdade, relacionar os usos ao gênero, encontrando possíveis relações,
sem taxá-las, contudo, como categóricas.
Como um dos nossos objetivos é observar de que maneira os adverbiais modalizadores
são usados em artigos de opinião, mapeamos alguns aspectos relacionados a seus usos:
posição, estrutura, articulação textual e subjetividade. Também buscamos observar se havia
alguma influência do veículo em relação ao seu uso. Ao longo dos exemplos e dos resultados
apresentados, mostraremos se há alguma relação com esses aspectos quantitativa e
qualitativamente.
No gráfico abaixo, apresentamos a distribuição geral dos 74 adverbiais modalizadores
na amostra montada para o trabalho:
65
Jornal O Globo Online
Jornal O Dia Online
Gráfico 1: frequência dos adverbiais modalizadores nos jornais analisados
Percebemos, a partir do gráfico 1, que houve mais adverbiais modalizadores no jornal
O Globo Online do que no jornal O Dia Online. Do total de 74 dados, 66% deles (ou seja, 49
casos) ocorreram em O Globo Online e 34 % (isto é, 25 casos) em O Dia Online. Esses
resultados serão mais bem explorados a partir das próximas seções com os testes das
hipóteses postuladas anteriormente.
5.1.2. Posição
Nossa hipótese em relação à ordenação era que os adverbiais modalizadores
apresentariam diferentes tendências de posicionamento diante de sua estrutura (advérbio,
advérbio em -mente ou locução), tendo em vista as investigações de Moraes Pinto (2008),
Gonçalves (2015; 2016) e Cezario et al. (no prelo). Os adverbiais modalizadores tendem a
ocorrer em diferentes posições diante de seu padrão estrutural (advérbio, advérbio em mente,
locução). A pesquisa de Moraes Pinto (2008), com base numa amostra formada por textos
religiosos e injuntivos, demonstrou que 65,6 % dos dados com advérbios em -mente ocorrem
em posição inicial (ou seja, margem esquerda). A mesma autora informa que, em cartas (de
leitor e particulares), a ocorrência em posição inicial ainda é mais alta: cerca de 80% dos
dados ocorrem nessa posição (cf. CEZARIO et al, [no prelo]). Já as locuções adverbiais de
valores semelhantes tendem a ocorrer em posição medial (cf. GONÇALVES, 2016). Com
relação aos advérbios simples estudados aqui não encontramos pesquisas com hipóteses
relativas à ordenação de palavras, mas acreditamos que cada item tenha um comportamento
66
em termos de posição mais frequente.
Dividimos os modalizadores em dois grupos quanto à sua posição: marginal e não
marginal. Essa opção foi motivada pelo baixo quantitativo de dados, tendo em vista que
trabalhos com maior quantitativo apresentam um agrupamento mais vasto para suas posições,
a exemplo de Ilogti de Sá (2015).
Podemos observar alguns exemplos a seguir:
a) Posição marginal à oração
(7) “Talvez, minha mãe esteja vendo. Depois ela vai se ocupar de outras coisas lá no céu e aí
ele namora como quiser” (Artigo “Minha mãe é uma estrela” – Jornal O Dia Online).
(8) “Basicamente, em troca da “valorização” dos analistas tributários, os parceiros políticos
conseguiriam perfurar as regras de autonomia da Receita, nomeando aliados para os postos de
chefia do órgão federal.” (Artigo “Receita para capturar o Leão” – Jornal O Globo Online).
(9) “No geral, os prefeitos, como muitos governadores, administraram como se nunca
houvesse a possibilidade de uma redução nas receitas. Era como se todo ano houvesse mais
dinheiro que no anterior" (Artigo “Ajude, por bem ou por mal” – Jornal O Globo Online).
Nos exemplos apresentados acima, podemos observar que os adverbiais modalizadores
ocupam as margens da oração: em (7), o modalizador “talvez” introduz a oração “talvez,
minha mãe esteja viajando”; em (8) o adverbial “basicamente” ocorre na margem esquerda da
oração; em (9) a locução modalizadora “em geral” também ocorre no início da oração,
introduzindo-a. Dos dados encontrados em posições marginais, ressaltamos que houve apenas
dois casos em margem direita, ocupando a posição final da oração, como podemos ver a
seguir:
(10) “De acordo com a Febraban, o mercado é um dos mais avançados tecnologicamente.
Assim, houve nos últimos anos um salto dos canais digitais, o que impactou no crescimento
de agências e da mão de obra" (Artigo “Greve dos bancários, uma luz na histórica
exploração” – Jornal O Dia Online).
67
Nesse exemplo, o adverbial modalizador “tecnologicamente” ocupa posição marginal
final, fechando a oração e a frase em que está inserido.
b) Posição não marginal à oração
(11) “Depois de uma letargia talvez secular em relação ao tema, os presidentes dos Três
Poderes da República se encontram para debater a segurança pública.” (Artigo “Reunião de
cúpula” – Jornal O Globo Online).
(12) “Lembrei-me do '‘sambinha’' — como Tom o chamava — ao observar que, passados três
meses do afastamento da presidente Dilma, muito pouco de concreto foi realizado para o
reequilíbrio das contas públicas. Apesar do déficit primário (diferença entre despesas e
receitas excluído o pagamento de juros) de R$ 170,5 bilhões, Temer praticamente limitou-se
a encaminhar ao Congresso Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que cria um teto para
as despesas” (Artigo “A PEC não cura zika” – Jornal O Globo Online).
(13) “Os americanos têm uma expressão para qualificar suas comédias cinematográficas
leves, em geral românticas e familiares, que eles chamam de feel good comedies (mais ou
menos, ‘comédias para se sentir bem’)” (Artigo “Um mundo maravilhoso” – Jornal O Dia
Online).
Nos exemplos apresentados nesta subseção, podemos perceber que todos os dados
apresentam ordenação não marginal: em (11), o modalizador “talvez” está em posição não
marginal, entre “depois de uma letargia” e “secular”; em (12), o adverbial “praticamente”
ocorre em posição não marginal, mais especificamente entre o sintagma deslocado “apesar do
deficit primário (diferença entre despesas e receitas excluído o pagamento de juros) de R$
170,5 bilhões”, o sujeito (“Temer”) e a outra parte da oração “limitou-se a encaminhar ao
Congresso Proposta de Emenda à Constituição (PEC)”; em (13), a locução “em geral” ocorre
entre dois trechos da oração: “os americanos têm uma expressão para qualificar suas comédias
cinematográficas leves” e “românticas e familiares”.
Moraes Pinto (2008) e Gonçalves (2015) demonstram, em seus trabalhos, que as
posições prototípicas dos advérbios modalizadores em -mente no século XX são Adverbial
68
seguido de Oração e Oração seguida do Adverbial, ou seja, apresentam um posicionamento
predominantemente marginal. Já em Gonçalves (2016), podemos observar que as locuções
adverbiais modalizadoras apresentam ordenação prototípica no meio da oração na mesma
sincronia do português – século XX. Assim, o posicionamento desses elementos parece estar
ligado à estrutura do adverbial.
Marginal Não Marginal
ADVÉRBIOS5 9
60%
6
40%
ADVÉRBIOS EM -MENTE 16
36,4%
28
63,6%
LOCUÇÕES ADVERBIAIS 1
14,3%
6
85,7%
Tabela 1: relação entre ordenação e estrutura do adverbial
A partir da tabela acima, podemos perceber que as tendências de ordenação dos
adverbiais apresentam algumas disparidades. Em relação aos advérbios, percebemos que
houve mais dados em posição marginal, já em relação aos advérbios em -mente e às locuções
adverbiais observamos que há mais dados em posicionamento não marginal. Ou seja, de fato,
há algumas especificidades na relação estrutura e ordenação, o que confirma nossa hipótese.
Esses resultados corroboram o estudo de Gonçalves (2016) em relação às locuções adverbiais
modalizadoras em cartas, mas vão de encontro aos achados da autora em relação aos
advérbios em -mente, o que aponta para a necessidade de observar outros gêneros textuais
quanto à ordenação.
Observamos, também, se o veículo poderia ser um aspecto motivador para o
posicionamento não marginal dos adverbiais modalizadores. Assim, chegamos às tabelas
abaixo:
5 . Não quantificamos os dados com advérbio “quase”, tendo em vista que esse elemento ocorre quase
categoricamente em posição não marginal, o que poderia enviesar nossa análise.
69
Marginal Não Marginal
ADVÉRBIOS 6
54,5%
5
45,6%
ADVÉRBIOS EM -MENTE 10
38,5%
16
61,5%
LOCUÇÕES ADVERBIAIS 1
14,3%
6
85,7%
Tabela 2: relação entre ordem dos adverbiais modalizadores e sua estrutura no jornal O Globo
Online
Marginal Não Marginal
ADVÉRBIOS 3
75%
1
25%
ADVÉRBIOS EM -MENTE 6
31,6%
13
68,4%
LOCUÇÕES ADVERBIAIS –
–
–
–
Tabela 3: relação entre ordem dos adverbiais modalizadores e sua estrutura no jornal O Dia
Online
Nas tabelas 2 e 3, podemos observar que há mais dados em posição não marginal do
que em posição marginal nos padrões estruturais advérbio em -mente e locução adverbial. Em
relação ao primeiro grupo, percebemos que essa tendência ocorre em ambos os jornais, nas
locuções, percebemos que há essa tendência no jornal O Globo Online, mas no jornal O Dia
Online elas sequer são utilizadas. Já os advérbios ocorrem mais em posição marginal em
ambos os jornais. Ou seja, não houve influência do veículo nesse aspecto do uso dos
adverbiais modalizadores. Pesquisas futuras, com base numa amostra maior, poderão
confirmar, ou não, as tendências apontadas aqui.
5.1.3. Articulação textual
Postulamos inicialmente que os adverbiais modalizadores, que atuam como
articuladores textuais, veiculariam efeitos de sentido mais subjetivos. Essa hipótese se vincula
70
ao gênero artigo opinativo tendo em vista que é esperado que em textos que expressem
opinião haja marcas mais subjetivas do que em textos pouco opinativos, como as notícias.
Para teste dessa hipótese, retomamos o trabalho de Koch (2003b) sobre articulação textual e
observamos quais efeitos de sentido eram veiculados pelos modalizadores, tidos pela autora
como articuladores metaenunciativos, ou seja, os que “comentam” a enunciação. O
agrupamento feito neste trabalho não compreende uma repetição da proposta de Koch
(2003b), mas, na verdade, uma adaptação, um reagrupamento de acordo com os dados que
encontramos, o que pode ser visto nos exemplos a seguir:
a) Epistêmico: demonstra o grau de comprometimento/ engajamento do enunciador e o grau
de certeza em relação ao que está sendo enunciado.
(14) “Isso os jornais estrangeiros ainda não registraram, eles, que estão implicando tanto com
nossa maneira de torcer, e até de comer: esta Olimpíada talvez seja a mais liberada que já
existiu em termos de comportamento” (Artigo “Sem culpa ou preconceito” – Jornal O Globo
Online).
(15) “O gesto político de repercussão nacional, certamente, já está provocando frutos no
encaminhamento do ordenamento das contas estaduais, evidenciando a gravidade do
momento e da importância dos altos mandatários se preocuparem menos com a próxima
eleição e mais com o futuro do país” (Artigo “O grito do Rio” – Jornal O Dia Online).
Nos exemplos acima, apresentamos casos de modalizadores que veiculam efeito de
sentido epistêmico. Em (14), o enunciador constrói seu texto apresentando uma crítica à
imagem construída pela imprensa estrangeira em relação ao comportamento dos brasileiros
nas olimpíadas, incluindo sua torcida e sua forma de alimentação. Posteriormente, busca um
argumento contra os julgamentos midiáticos em relação ao evento, afirmando que seriam os
jogos com maior liberdade comportamental. Contudo, utiliza o modalizador “talvez”,
possivelmente como uma estratégia atenuativa, relativizando, sendo menos categórico e,
portanto, apresentando menor grau de certeza e comprometimento. Já em (15), há o
modalizador “certamente”, que indica um posicionamento bem mais assertivo, categórico em
relação à proposição: as consequências da repercussão nacional do gesto político. O grau de
certeza e comprometimento é muito maior, da mesma forma que o grau de engajamento,
71
construindo uma argumentação mais marcada subjetivamente e possivelmente mais
transparente ao leitor.
b) Deôntico: indica o grau de imperatividade/ facultatividade dos enunciados.
(16) “Sempre que ouvimos uma dessas canções para se sentir bem, nos imaginamos num pôr
de sol de uma praia idílica, a correr de braços abertos em direção ao ser amado, como nos
mais contundentes comerciais de cigarro de antigamente. É como se o pôr do sol, a praia
idílica e o ser amado só nos fossem permitidos nesses momentos de alienação e fantasia. Na
real, não temos direito a nada disso, porque nos disseram que o prazer não presta, e o mundo é
necessariamente um vale de lágrimas. O contrário do que está, por exemplo, na difamada
‘what a wonderful world’'” (Artigo “Um mundo maravilhoso” – Jornal O Globo Online).
(17) “Imagine-se a situação de um proprietário que tem a sua terra invadida, enquanto
decisões judiciais de reintegração de posse não são cumpridas. O Pará é um estado que vive
uma enorme crise, em uma situação que poderíamos caracterizar como a de uma terra sem lei.
Um tal mecanismo de obtenção de terras, a preços vigentes, e com pagamento em dinheiro —
e não necessariamente mediante TDAs (Títulos da Dívida Agrária) — seria um instrumento
que poderia facilitar o equacionamento de tais conflitos, além, evidentemente, de um maior
respeito à lei, não seguida em vários estados do país. Seriam compras nas condições de uma
economia de mercado" (Artigo “Incra” – Jornal O Globo Online).
Nos exemplos (16) e (17), percebemos que há o uso de modalizadores que apresentam
efeito deôntico. Em (16), o adverbial “necessariamente” indica como o mundo é: um vale de
lágrimas. Seu uso é relacionado ao que já vem sendo construído por outras pistas textuais no
artigo em questão. A ideia de o mundo como um local ruim é montada a partir da ausência de
direitos, da ideia de que o prazer é algo ruim, o que leva o mundo a ser fatalmente um vale de
lágrimas, ou seja, um local de tristeza e desânimo. Nesse exemplo, podemos perceber que o
modalizador “necessariamente” indica a imperatividade do que está sendo enunciado,
afirmando que certamente o mundo será da forma enunciada. No exemplo (17), o modalizador
“necessariamente” é utilizado pelo enunciador para indicar o grau de facultatividade do
enunciado, demonstrando que não é obrigatório que haja Títulos da Dívida Agrária para que
haja obtenção de terras a preços vigentes. Vale ressaltar que, embora os exemplos (16) e (17)
72
apresentem o mesmo modalizador, a pista textual “não” orienta a argumentação para um
caminho diferente no exemplo (17), atuando na construção dos sentidos do texto.
c) Afetivo ou atitudinal: encena a atitude psicológica do enunciador em relação ao evento
enunciativo.
(18) “Lamentavelmente, a maioria das agências hoje existentes, em particular as municipais,
não se enquadra nesse figurino e, por uma questão de escala, jamais se enquadrará” (Artigo
“Caminhos para privatização” – Jornal O Globo Online).
(19) “Houve quase 14 mil amputações e mais de 40 mil fraturas. O que justificaria afrouxar as
normas, beneficiando (pra variar) os empresários em detrimento dos trabalhadores?
Infelizmente, se faz necessário estarmos atentos a iniciativas que vão contra a vida dos
trabalhadores” (Artigo “Retrocesso nas normas de segurança do trabalho” – Jornal O Dia
Online).
Nos exemplos (18) e (19), há casos que identificamos efeito de sentido afetivo. Em
(18), o adverbial “lamentavelmente” marca o posicionamento do enunciador em relação às
agências brasileiras atuais. Esse modalizador não apenas marca a subjetividade,
demonstrando, além disso, uma avaliação negativa em relação às agências nacionais. No
exemplo (19), o modalizador “infelizmente” também marca um posicionamento negativo em
relação ao fato apresentado: a necessidade de atenção em relação às iniciativas contra a vida
dos trabalhadores. Em ambos os casos, os modalizadores apresentam um posicionamento
claro do enunciador em relação à proposição, contudo é necessário destacar a escolha de bases
adjetivas ligadas às emoções, como “infeliz” e “lamentável”, que apresentam uma avaliação
mais passional, causando um efeito discursivo também calcado na intersubjetividade entre
escritor e leitor.
d) Delimitador ou hedge: explicita o âmbito do conteúdo enunciado.
(20) “Para ilustrar, mencionamos que a politicamente correta isenção das mercadorias da
cesta básica é um benefício autorizado pelo Confaz. Portanto, para dar a César o que é de
César, é necessário excluir 75% dos incentivos concedidos naquele período, já que decorrem
73
de tais dispositivos legais” (Artigo “Manicômio tributário, o retorno” – Jornal O Dia Online).
(21) “O Estado brasileiro historicamente ignora grandes partes das cidades, compostas pelos
bairros populares, localizados em geral, mas não só, no que hoje chamam por periferias”
(Artigo “Reunião de cúpula” – Jornal O Globo Online).
Nos exemplos (20) e (21), encontramos alguns modalizadores com efeito discursivo
delimitador. Em (20), o adverbial destacado delimita que a isenção das mercadorias da cesta
básica é “politicamente correta”. É importante ressaltar que, nesse caso, o adverbial assume
um sentido além do seu original; “politicamente” não se refere a um aspecto político stricto
sensu, mas há algo mais amplo, social, negociado entre os cidadãos em sociedade. A
combinação com outra pista textual – “correta” – reforça esse novo sentido do modalizador
“politicamente”. Casos de modalizadores apresentando novos papéis semânticos também
foram defendidos por Castilho e Castilho ([1992] 2002) a partir das classificações prototípico,
paragógico e complexo. Em (21), o modalizador “historicamente” delimita a ausência de
prioridade em relação a algumas partes da cidade, apontando que é uma questão histórica, que
não ocorre apenas atualmente, mas sistematicamente. Logo após, a locução “em geral”
também delimita, em alguma medida, que há uma problemática geralmente mais ampla nos
bairros periféricos. Além desse delimitar, o adverbial “historicamente” constrói o texto
argumentativamente, mostrando o descaso do estado com a população há muitos anos, o que é
complementado com a locução “em geral”, que aponta para um descaso sobretudo com a
população mais pobre.
e) Axiológico: representa a valoração em relação ao enunciado.
(22) “Aqui, dois ‘detalhes’ se destacam imperiosamente: as regras explícitas e um uso do
corpo com foco exclusivo no seu desempenho, talento e capacidade. No caso, uma refrega do
atleta-herói contra o tempo, o espaço e os “estrangeiros” — esses outros que,
paradoxalmente, não podem ser eliminados” (Artigo “Detalhes olímpicos” – Jornal O Globo
Online).
No exemplo (22), o único com adverbial modalizador axiológico encontrado na
amostra, percebemos o uso do modalizador “paradoxalmente”, que indica a avaliação do
74
enunciador em relação aos problemas enfrentados pelos atletas nas olimpíadas. Há um
julgamento, indicando que é paradoxal a impossibilidade de eliminar alguns percalços de sua
trajetória, ideia reforçada por outra pista textual: a expressão “atleta-herói”. Os axiológicos
apresentam um posicionamento mais claro do enunciador, com alto grau de subjetividade,
mas são menos subjetivos do que os afetivos ao trazer bases adjetivas ligadas às emoções, o
que possivelmente causa no leitor menos efeitos discursivos.
Após a observação dos dados, percebemos que alguns desses efeitos são mais
subjetivos do que outros. Postulamos, então, com base na análise dos dados e na literatura, o
seguinte continuum:
Mais subjetivos Menos subjetivos
Seguindo esse continuum, teríamos, no polo dos mais subjetivos, exemplos, como:
(23) “Dornelles, além de preparado como economista e professor, alto funcionário de carreira
do Ministério da Fazenda, é político nato, tendo exercido muito jovem a função de secretário
particular do primeiro-ministro, seu tio Tancredo Neves. Seu pai, general Mozart Dornelles,
fez carreira militar e de gestor público respeitado. O tio Ernesto, também militar, foi
governador e senador pelo Rio Grande do Sul. Não poderia ter tido melhor escola e melhores
mestres. Exemplo, infelizmente, raro na política, tem sido de extrema correção com o
governador licenciado, mostrando na postura discreta, mas firme, ao enfrentar a tormenta, a
grandeza do homem público e da figura humana” (Artigo “O grito do Rio” – Jornal O Globo
Online).
Nesse exemplo, temos o adverbial modalizador “infelizmente” marcando de forma
clara o posicionamento do enunciador em relação à postura dos políticos no Brasil. Ele
lamenta por poucas políticos terem o preparo e as atitudes do vice-governador Francisco
Dornelles, ressaltando o quão discreto e firme ele é; o que demonstra, para ele, que o político
Afetivo > Axiológico > Epistêmico > Deôntico > Delimitador
75
é um homem grandioso na política e na vida. O modalizador reforça subjetivamente o
discurso do enunciador, mas ancora-se em outras pistas textuais, ou seja, em outras marcas
linguísticas, como os adjetivos “raro”, “extrema”, “discreta” e “firme”, que, colaboram na
construção de sua argumentação, construindo uma cadeia argumentativa mais sólida, que
engloba aspectos profissionais e pessoais. Dessa forma, a imagem de Dornelles, que já vinha
sendo construída ao longo do texto, como um homem bem preparado (“economista”,
“professor”, “alto funcionário do ministério da fazenda”) e talentoso (“político nato”), passa a
ser defendida e construída com mais clareza a partir do articulador argumentativo
“infelizmente”.
Já no polo menos subjetivo, teríamos casos, como:
(24) “Em um cenário com dados alarmantes de acidentes na indústria, divulgados pelo
Ministério do Trabalho e Previdência Social, é no mínimo contraditória a atitude do governo
interino de ceder aos empresários. Somente de 2011 a 2013 foram cerca de 600 mortes por
causa desse tipo específico de acidente, uma a cada 44 horas. Houve quase 14 mil
amputações e mais de 40 mil fraturas. O que justificaria afrouxar as normas, beneficiando (pra
variar) os empresários em detrimento dos trabalhadores?” (Artigo “Retrocesso nas normas de
segurança do trabalho” – Jornal O Dia Online).
Nesse exemplo, o adverbial modalizador “quase” atua na construção argumentativa do
texto delimitando a quantidade de amputações no período de 2011 a 2013. O modalizador,
além de delimitar, também atua na intensificação do valor, já que não o especifica
completamente, causando uma impressão de que há ainda mais amputações. Se fosse usado
um número exato, como 37 mil, haveria menor efeito discursivo no leitor. Da mesma forma,
posteriormente, é utilizado o intensificador “mais” para designar as faturas, deixando claro
que essas pistas textuais colaboram para a construção da tese do texto de que a atitude do
governo em ceder aos empresários é contraditória.
É preciso ressaltarmos, ainda, que as categorias apresentadas são fluidas e englobam
elementos diferentes, com complexidades estruturais, pragmáticas e cognitivas distintas. No
exemplo a seguir, podemos observar essa questão:
(25) “O Réveillon seria uma espécie de início das libações que só se encerram na Quarta-Feira
76
de Cinzas, em grande estilo. Para ser exato, devo confessar que não é exatamente de
Carnaval que eu gosto: prefiro mesmo as escolas de samba” (Artigo “Balanço de Carnaval” –
Jornal O Dia Online).
Em (25), podemos observar o adverbial modalizador “exatamente”. O artigo opinativo,
escrito no contexto do carnaval carioca de 2016, apresenta uma relação entre a comemoração
de ano novo e as festas de carnavalescas. O enunciador parece ter como objetivo deixar claro
(“para ser exato”) que prefere as escolas de samba ao carnaval em si e, por isso, utiliza o
adverbial “exatamente”. Esse termo, então, parece delimitar o que ele gosta, mas, ao mesmo
tempo, apresenta um grau de certeza em relação ao que está sendo enunciado, o que faz com
que seja tido como veiculador também de efeito epistêmico. No trabalho, consideramos que
seu valor é delimitador, embora reconheçamos que há um grau de certeza no enunciado bem
maior do que em outros casos de delimitadores, como “historicamente” e “matematicamente”.
Com esse exemplo, queremos demonstrar que há uma fluidez categorial entre esses elementos
e que eles podem, a depender do contexto enunciativo, apresentar distintos efeitos discursivos.
Além disso, uma mesma categoria engloba elementos bastante diferentes e com graus de
subjetividade também distintos. No entanto, acreditamos que seja possível estabelecer alguns
postulados baseando-se, sobretudo, nos exemplos prototípicos dessas categorias.
Assim, podemos concluir que os modalizadores “infelizmente”, “quase” e
“exatamente” veiculam, de fato, efeitos de sentido subjetivos, mas apresentam graus
diferentes. No exemplo (25), parece ser menos claro a um leitor que não atinja níveis de
leitura mais avançados que o modalizador “quase” veicule subjetividade, enquanto os
modalizadores “infelizmente” e “certamente” apresentam um posicionamento mais claro,
veiculando maior grau de subjetividade. Dessa forma, postulamos que há categorias mais e
menos subjetivas dentro do grupo dos adverbiais modalizadores e reconhecemos que, dentro
desses grupos, há elementos mais e menos prototípicos. Ressaltamos, ainda, que não
postulamos um continuum entre subjetividade e objetividade, pois, como mostram outros
trabalhos, toda linguagem apresenta marcas subjetivas e veicula ideologia (cf. VAN DIJK,
1997; PAULIUKONIS, [2003] 2007; ODORISI, 2016).
Diante do continuum apresentado, verificamos quantitativamente quais eram os efeitos
de sentido mais comuns e seu grau de subjetividade para que pudéssemos relacionar à nossa
hipótese. Obtivemos o seguinte resultado:
77
0% 10% 20% 30% 40% 50% 60%
Epistêmico
Delimitador
Deôntico
Afetivo
Axiológico
Efeitos de sentido
Gráfico 2: efeitos de sentido dos adverbiais modalizadores como articuladores textuais na
amostra utilizada
Esse resultado demonstra o efeito de sentido mais frequente na amostra do trabalho foi
epistêmico (54%), o qual está no meio do continuum de subjetividade postulado neste
trabalho, o que confirma nossa hipótese de que os modalizadores usados são mais subjetivos.
Acreditamos que o baixo quantitativo de dados com efeitos afetivo e axiológico possa estar
vinculado ao gênero textual (artigos de opinião) em que esses textos estão inseridos, tendo em
vista que parece ser mais características expressões de certeza do que de afetividade devido ao
próprio gênero. Ou seja, a ausência de adverbiais modalizadores com efeito axiológico e
afetivo não estaria ligada à menor expressão da subjetividade, mas a ser mais efetivo para os
enunciadores demonstrar seu grau de certeza em relação ao assunto debatido, muitas vezes de
cunho político, do que o uso de expressões que veiculem sentimentos e emoções.
Em outros suportes menos monitorados, como blog ou facebook, textos desse gênero
podem apresentar pistas textuais ligadas a outros efeitos de sentido. É preciso destacar a
ausência de adverbiais modalizadores como “com certeza” e “sem dúvida”, bastante
encontrados em outros trabalhos sobre o tema em outros corpora. Na fala, esses resultados
indicam outras tendências (cf. CASTILHO; CASTILHO, [1992] 2002) e na escrita menos
monitorada talvez modalizadores com efeito de sentido afetivo e axiológico possam ser mais
utilizados. Esse confronto aponta para a necessidade de estudar os usos no continuum
tipológico de Marcuschi ([2001] 2010) com textos distribuídos em gêneros que vão desde a
fala menos monitorada à escrita mais monitorada. Também é necessário destacar que boa
78
parte dos adverbiais modalizadores apresentam efeito delimitador, considerado por nós o
menos subjetivo, o que reforça o papel da linha editorial dos jornais O Globo Online e O Dia
Online e o suporte jornal de forma geral.
Esses resultados também podem ser explicados pelo princípio funcionalista da
marcação: formas mais marcadas tendem a ser menos frequentes do que formas menos
marcadas. Diante da existência de adverbiais modalizadores com diferentes efeitos de sentido,
como demonstramos, acreditamos que os modalizadores afetivos e axiológicos tendem a ser
mais marcados nesse aspecto, o que levaria a sua baixa frequência em textos desse gênero
nesse suporte. Por isso, formas que são menos marcadas (“historicamente”,
“tecnologicamente”, “matematicamente”) ocorreriam com maior frequência do que as formas
mais marcadas (“infelizmente”, “felizmente”, “com certeza”).
Em relação à distribuição dos modalizadores quanto aos seus efeitos de sentido nos
jornais e à sua constituição estrutural, apresentamos os gráficos a seguir:
0% 10% 20% 30% 40% 50% 60%
Epistêmico
Delimitador
Deôntico
Afetivo
Axiológico
Jornal O Dia Online
Jornal O Globo Online
Gráfico 3: relação entre efeitos de sentido dos adverbiais modalizadores e os jornais
utilizados
A partir desse gráfico, podemos observar que não há diferenças significativas nos dois
jornais, o que parece demonstrar uma aproximação entre eles. Mesmo tendo públicos-alvo
distintos, os efeitos dos modalizadores foram basicamente os mesmos. A diferença
quantitativa está no maior uso de adverbiais com efeito deôntico em O Globo Online e a
existência de um modalizador afetivo a mais em O Dia Online. A diferença de um dado não
apresenta grande valor estatístico, mas, se combinada com a baixa frequência de afetivos,
79
corrobora a argumentação apresentada anteriormente de que esses usos são pouco frequentes
devido ao suporte. O maior uso de modalizadores com efeito deôntico pode ser explicado pelo
constante uso do modalizador “necessariamente” por alguns articulistas, o que pode ter
causado a diferença quantitativa dos resultados.
Diante dos resultados encontrados em relação à subjetividade, percebemos que seria
válido observar um artigo de opinativo utilizado no trabalho em relação às suas marcas
subjetivas para analisarmos em que medida o uso dos modalizadores reflete o grau mais (ou
menos) subjetivo das pistas textuais encontradas nos textos pertencentes à amostra. Para isso,
utilizamos o artigo a seguir publicado no dia 13 de outubro de 2016 no Jornal O Dia Online:
O grito do Rio
O fim do ano já está aí, e as dificuldades tendem a se agravar
Em meio à tempestade provocada pela crise na economia e pela brutal queda da receita com o
petróleo (o Rio é o maior produtor nacional), há, pelo menos, uma boa notícia. A ação de Francisco Dornelles
no comando do Estado do Rio, durante a licença médica do governador Pezão, levantou com autoridade e
credibilidade a questão do endividamento dos estados — e até mesmo dos municípios. E de forma exemplar,
no desprendimento e na coragem em que se mostrou aberto a uma colaboração do governo federal na gestão
do caixa.
Na verdade, parte do drama vivido pelos estados é devida aos juros da dívida
consolidada junto ao governo federal, implacável na cobrança e insensível na renegociação
que a realidade impõe. Acuados, os governadores vão procurando sobreviver enquanto não
surge a inevitável solução. O fim do ano já está aí, e as dificuldades tendem a se agravar. E o
momento é este.
No entanto, o grito de alerta do governo fluminense trouxe o peso de um homem público dos mais
completos, tendo sido ministro da Fazenda, do Trabalho, da Indústria e do Comércio, deputado por cinco
legislaturas, senador e presidente nacional de um dos cinco maiores partidos do país. Dornelles, além de
preparado como economista e professor, alto funcionário de carreira do Ministério da Fazenda, é político nato,
tendo exercido muito jovem a função de secretário particular do primeiro-ministro, seu tio Tancredo Neves.
Seu pai, general Mozart Dornelles, fez carreira militar e de gestor público respeitado. O tio Ernesto, também
militar, foi governador e senador pelo Rio Grande do Sul. Não poderia ter tido melhor escola e melhores
80
mestres.
Exemplo, infelizmente, raro na política, tem sido de extrema correção com o
governador licenciado, mostrando na postura discreta, mas firme, ao enfrentar a tormenta, a
grandeza do homem público e da figura humana.
O gesto político de repercussão nacional, certamente, já está provocando frutos no
encaminhamento do ordenamento das contas estaduais, evidenciando a gravidade do
momento e da importância dos altos mandatários se preocuparem menos com a próxima
eleição e mais com o futuro do país. Ou seja, precisam ser mais estadistas e menos
politiqueiros.
O brado do Estado do Rio foi mais do que um ato voltado para a crise local e muito mais um fator
determinante de uma solução rápida e realista para o drama vivido pelos estados, com reflexos sociais
profundos.
No artigo “O grito do Rio”, percebemos que há diversas marcas de subjetividade
utilizadas pelo enunciador. Ao longo do artigo, são usados inúmeras escolhas lexicais que
avaliam de forma bastante subjetiva a enunciação (“tormenta”, “insensíveis”) e ajudam na
construção argumentativa do texto. Num primeiro momento, há a contextualização do
momento político e econômico vivido pelo estado do Rio de Janeiro, marcada pelas escolhas
lexicais “tempestade” para caracterizar a crise e “brutal” para descrever a queda da receita.
Posteriormente, o enunciador passa a construir a imagem positiva do vice-governador
Dornelles, caracterizando-o de forma extremamente idealizada, remetendo ao seu passado
político e enaltecendo suas origens familiares.
Ao longo do texto, são usados dois adverbiais modalizadores: “infelizmente” e
“certamente”. Ambos são modalizadores que marcam a subjetividade de forma mais clara,
sobretudo “infelizmente”. Esses modalizadores convergem para as demais marcas subjetivas
presentes no artigo, como o adjetivo “raro” em “exemplo, infelizmente, raro”, que constrói a
subjetividade e a argumentação junto com a pista textual “infelizmente”. Assim, embora haja
outras marcas de subjetividade que vão além dos adverbiais modalizadores, esses elementos
parecem refletir o uso mais (ou menos) subjetivo das pistas textuais. No artigo destacado, há
alta carga de subjetividade e os adverbiais modalizadores usados refletem essa tendência do
enunciador. Dessa forma, ressaltamos a importância de observar o comportamento das demais
pistas textuais na análise de qualquer fenômeno linguístico, tendo em vista que outros
elementos podem indicar efeitos de sentido distintos daqueles veiculados pelas pistas
81
estudadas na investigação.
Ao longo dessa subseção, observamos o uso dos adverbiais modalizadores em artigos
opinativos dos jornais O Globo Online e O Dia Online. Em relação à posição, encontramos
um número maior de dados em posição não marginal com as estruturas advérbio em -mente e
locução adverbial e um número maior de dados em posição marginal com os demais
advérbios. A hipótese foi parcialmente comprovada, pois em relação aos advérbios em –mente
esperávamos uma frequência maior em posição inicial, como foi apontado em outros
trabalhos (Cf. MORAES PINTO, 2008; CEZARIO, et al., no prelo). Mas é preciso levar em
consideração que os trabalhos anteriores tratavam de outros gêneros. Em relação aos efeitos
de sentido, percebemos uma predominância do efeito deôntico, provavelmente vinculada ao
alto uso do modalizador “necessariamente” e da existência de um continuum de subjetividade
em relação aos efeitos de sentido vinculados aos adverbiais modalizadores como articuladores
textuais. Tais resultados apontam, como defendemos anteriormente, para a necessidade de
novas investigações acerca desses elementos, principalmente em relação à sua posição.
5.2. A abordagem dos adverbiais modalizadores nos livros didáticos de Ensino Médio
Como expusemos na introdução, nossa análise dos livros didáticos é pautada em duas
hipóteses: (I) os adverbiais modalizadores serão mais abordados em capítulos/ atividades que
enfoquem gêneros com tipologia predominantemente argumentativa, tais como editoriais e
artigos de opinião, tendo em vista o papel de articulador textual argumentativo (CAMPOS;
TORQUATO, 2013) desses elementos; (II) os adverbiais modalizadores serão explorados,
sobretudo, a partir de seus efeitos de sentido e de seus papéis funcionais partindo de exemplos
reais de uso. Nas subseções seguintes, discutiremos em que medida algumas coleções
didáticas abordam o tema considerando essas duas hipóteses.
5.2.1. Português: linguagens em conexão
Em relação aos efeitos de sentido e aos papéis funcionais dos adverbiais
modalizadores, destacamos alguns trechos da coleção. No capítulo 29 do volume 1 da coleção
Português: linguagens em conexão, intitulado “Crônica humorística com diálogo e antologia
da turma” e inserido no eixo “Produção de textos orais e escritos”, há, na seção “Palavras na
lupa”, a apresentação de uma crônica de Luiz Fernando Veríssimo e um exercício.
82
Logo após, no exercício quatro, há o seguinte enunciado: “A crônica ‘Comunicação’
reproduz uma situação informal de fala. Identifiquem no texto algumas marcas de fala e
registrem-nas no caderno” (SETTE; TRAVALHA; STARLING, 2013, p. 346). Embora o
enunciado aparentemente não trate do tema abordado neste trabalho, posteriormente, há um
comando que pede, no item “b”, que sejam apresentados trechos em que há “interrupções que
contam com a cooperação do outro no que se refere a completar o sentido” (SETTE;
TRAVALHA; STARLING, 2013, p. 346). O livro coloca, para o professor, como um dos
gabaritos, a expressão “infelizmente, cavalheiro” (SETTE; TRAVALHA; STARLING, 2013,
p. 346). Já no item “h”, são pedidas “expressões usadas para orientar o interlocutor”. É
apresentado, mais uma vez, um modalizador, “assim”, tendo como exemplo: “É assim,
assim... assim” (SETTE; TRAVALHA; STARLING, 2013, p. 346).
Em ambos os itens, percebemos uma abordagem centrada nos efeitos de sentido
envolvidos no processo de modalização do discurso. Ao discutir “interrupções” e
“cooperação”, o livro demonstra que os adverbiais modalizadores têm papel intersubjetivo na
produção e na percepção do discurso, o que é possível, também, pela combinação com outras
pistas textuais, como o vocativo “cavalheiro” e o uso das reticências. Embora seja um
exercício focado na identificação dos papéis funcionais, sem apresentar reflexões posteriores,
é um ponto de partida importante, pois pode auxiliar na elaboração de propostas posteriores
pelos professores.
No capítulo 19, intitulado “Advérbios e locuções adverbiais” e inserido no eixo
“Gramática e estudo da língua”, do volume dois, o exercício dezesseis da seção “Passos
largos” trabalha os papéis funcionais do adverbial modalizador “quase”: “16. Registre o
sentido do advérbio ‘quase’ nos enunciados a seguir: a) João quase foi picado pela cobra; b)
Ela tem quase vinte anos; c) Eu tenho quase mil reais; d) Estou quase aposentando; e) A lei
está quase sendo aprovada” (SETTE; TRAVALHA; STARLING, p. 219).
Nesse exemplo, percebemos que o livro tem como objetivo destacar a importância do
contexto para os usos dos elementos linguísticos. O exercício tem como ponto positivo
demonstrar a multifuncionalidade do adverbial modalizador “quase” em distintos contextos
pragmáticos, mas não o faz a partir de exemplos reais de uso, de textos efetivos, recorrendo a
frases soltas e pouco contextualizadas.
Percebemos, assim, que os adverbiais modalizadores são tratados em âmbito reflexivo
nessa coleção, o que, confirma nosso postulado. No entanto, percebemos que, para isso, ainda
são usados, por vezes, exemplos inventados, o que vai de encontro aos objetivos dos manuais
83
aprovados pelo PNLD. Destacamos, ainda, que são escassas as abordagens sobre os
adverbiais modalizadores de forma geral na coleção.
Em relação à hipótese de que os adverbiais modalizadores seriam mais abordados em
temas ligados à argumentação, percebemos que a coleção Português: linguagens em conexão
apresenta alguns pontos relacionados à nossa hipótese. No volume 2, mais especificamente no
capítulo “Advérbios e locuções adverbiais”, do eixo “Gramática e estudo da língua”, é
apresentado um texto de um verbete que indica que devem ser evitados os advérbios que
expressem juízos de valor – ou seja, os modalizadores – em textos jornalísticos. Além disso,
são apresentados alguns advérbios em -mente como “certamente, levemente, definitivamente,
absolutamente” (SETTE; TRAVALHA; STARLING, 2013, p. 216 – 217) para exemplificar tal
questão para os alunos.
A partir do mesmo verbete, o livro didático traz um exercício que questiona se é de
fato necessário seguir essa recomendação no gênero artigo de opinião: “Um texto do gênero
artigo de opinião precisa seguir essa orientação?” (SETTE; TRAVALHA; STARLING, 2013,
p. 217). O gabarito fornecido ao professor indica que não, pois “o objetivo de um artigo de
opinião é expressar pontos de vista e juízos de valor, e advérbios que expressem valor ajudam
nessa função” (SETTE; TRAVALHA; STARLING, 2013, p. 217).
Com a apresentação do verbete e os questionamentos expostos anteriormente, o livro
cumpre nesse trecho um dos principais objetivos do ensino: unir leitura e análise linguística.
O aluno terá instrumental para compreender a funcionalidade desses elementos, também
ligada ao seu caráter subjetivo, e reflete sobre um possível uso num gênero marcado pelo
caráter opinativo. Assim, além de apresentar um dos efeitos de sentido envolvidos em sua
produção, também utiliza um gênero argumentativo.
Contudo, o livro não apresenta um exemplo que parta de um texto real, em que os
alunos possam observar os papéis funcionais dos modalizadores em seu uso efetivo. Na
verdade, parte-se apenas de uma recomendação de um verbete, o que é válido para construção
coletiva das características do gênero artigo opinativo com os alunos, mas falha ao não
apresentar ao menos um exemplo. Além disso, não há a proposta de uma atividade de
produção textual que coloque em prática os conhecimentos construídos, o que poderia ser
feito, inclusive, num capítulo do eixo “Produção de textos orais e escritos”.
Ao longo dos demais capítulos dos três volumes, porém, não há mais nenhuma
menção ou abordagem indireta acerca dos adverbiais modalizadores. Mesmo em capítulos
propícios ao debate, como “Artigo de opinião”, volumes 1 e 2, não há abordagem alguma
84
sobre o papel de articulador argumentativo desses elementos. Podemos dizer, então, que a
coleção apresenta uma abordagem reducionista e incoerente em relação a esse aspecto, tendo
em vista que não estabelece a ligação proposta pela própria no capítulo sobre adverbiais.
Nossa hipótese inicial foi parcialmente confirmada, tendo em vista que, apesar de existir
alguma relação entre os temas, essa conexão é pouco e mal explorada.
5.2.2. Português: contexto, interlocução e sentido
Esta coleção apresenta uma abordagem bem mais escassa sobre os adverbiais
modalizadores do que a coleção analisada anteriormente. Quanto aos seus efeitos de sentido,
os modalizadores são apresentados no capítulo 20 – “Advérbios” – do volume dois de acordo
com suas circunstâncias a partir de listas classificatórias que apresentam advérbios, como
“talvez” e “certamente” e aspectos a eles relacionados como “dúvida” e “afirmação”. Essa
abordagem se liga à classificação da classe a partir de seus efeitos pragmáticos. Ou seja, são
apresentados alguns adverbiais e a quais circunstâncias eles se ligam. No entanto, não são
apresentados exemplos reais que demonstrem seu uso efetivo, centrando-se, apenas, em
palavras isoladas agrupadas de forma classificatória.
No mesmo volume, ainda no capítulo 20, é proposto um exercício que trabalha uma
possível equivalência entre a oração modalizadora “é provável” e o adverbial
“provavelmente”, destacando, depois, sua classificação semântica. Essa atividade, única sobre
os adverbiais modalizadores na coleção, trabalha os efeitos de sentido envolvidos em sua
produção, destacando a “dúvida” envolvida na enunciação. Utiliza, ainda, uma estratégia
bastante válida ao tentar relacionar uma oração modalizadora com um adverbial modalizador.
No capítulo 23 – “Sintaxe do período simples” – do mesmo volume, após apresentar,
mais uma vez, as possíveis circunstâncias, o livro ressalta que “a classificação das
circunstâncias é uma questão de natureza semântica” (ABAURRE; ABAURRE; PONTARA,
2013, p. 348). Porém, mais uma vez, essa classificação não é vista na prática, com usos reais
de adverbiais.
Quanto aos efeitos de sentido dos modalizadores, a coleção apresenta uma abordagem
escassa, ainda muito ligada à produção de listas classificatórias. De forma geral, alguns
efeitos são abordados principalmente pelo fato de a classificação dos advérbios ser pautada
pelo critério semântico nas gramáticas tradicionais seguidas pelos livros didáticos. Mesmo
assim, essa abordagem é bastante simplista, desconsiderando aspectos mais complexos
85
envolvidos em seu uso. Assim, essa coleção adota, de forma extremamente escassa, uma
abordagem dos efeitos de sentido e não engloba, efetivamente, seus papéis funcionais. Ou
seja, nossa hipótese foi refutada, já que não são utilizados textos reais para apresentação dos
efeitos de sentido.
Em relação à hipótese de que os adverbiais modalizadores serão ligados à
argumentação, percebemos que essa coleção não apresenta em capítulos sobre textos
argumentativos, mesmo nos que tratam de advérbios, locuções ou adjuntos adverbiais,
nenhuma abordagem sobre os modalizadores como construtores de textos argumentativos.
Não há, inclusive, nenhuma menção, mesmo no manual do professor, sobre o trabalho esses
elementos em gênero algum. Assim, nossa hipótese, em relação à coleção, foi refutada, tendo
em vista que os adverbiais modalizadores não são sequer citados quanto à argumentação.
5.3.3. Português: língua e cultura
Ao longo da coleção Português: língua e cultura, percebemos que há mais aspectos
relacionados à argumentação do que aos efeitos de sentido dos adverbiais modalizadores. Em
seu primeiro volume, o livro agrupa todas as classes de palavras em um só capítulo, intitulado
“Classes de palavras”. Contudo, há um comentário que pode ser destacado no trecho sobre as
classes invariáveis: “advérbios para expressar nossos comentários e julgamentos a propósito
de todo um evento” (FARACO, 2013, p. 232), sendo destacados os itens “felizmente”,
“certamente” e “inegavelmente”.
Nesse trecho, percebemos que alguns adverbiais modalizadores são colocados como
índices de subjetividade, tendo em vista que veiculam comentários e julgamentos acerca da
enunciação, o que Koch (2003b) denomina como articuladores metaenunciativos. Os
modalizadores têm como característica comentar a enunciação, estabelecendo, de fato,
julgamento sobre o discurso. Assim, são elementos marcados pela subjetividade. Dessa forma,
o livro aborda um efeito de sentido ligado aos adverbiais modalizadores.
O livro não apresenta, porém, atividades sobre os adverbiais modalizadores, tendo,
inclusive, como única atividade sobre todas as classes de palavras invariáveis, um exercício,
vale dizer, de cunho exclusivamente classificatório. Mesmo nessa proposta, os adverbiais
modalizadores não são colocados, nos parágrafos descontextualizados, para serem
classificados. O livro também não apresenta nenhuma classificação para os elementos
adverbiais. Ou seja, nossa hipótese foi refutada, tendo em vista que não são apresentados
86
exemplos reais de adverbiais modalizadores relacionados aos seus efeitos de sentido e aos
seus papéis funcionais. No Manual do Professor também não há menção a esses aspectos.
Em relação à argumentação, os adverbiais modalizadores são apresentados em dois
capítulos, intitulados “Gênero argumentativo”, mais especificamente, os capítulos 3 e 4 do
volume 2. É necessário destacar que o livro apresenta apenas o modalizador “talvez” em
ambos os capítulos. Nos dois capítulos, ele é colocado na seção intitulada “articuladores
argumentativos”, que apresenta um texto e destaca diversos articuladores, como “mas”.
Em todos os outros capítulos e no manual do professor não há menção, mesmo que
indireta, aos adverbiais modalizadores como construtores da argumentação, nem de sua
ligação com efeitos de sentido. Essa coleção apresentou uma abordagem escassa em relação à
ligação entre adverbiais modalizadores e argumentação, embora tenha apresentado o elemento
“talvez” como articulador argumentativo. Caberia ao professor demonstrar que os demais
adverbiais modalizadores também são articuladores argumentativos, tendo em vista que a
coleção não o faz.
5.2.4. Vozes do mundo: literatura, língua e produção de textos
Na coleção Vozes do mundo: literatura, língua e produção de textos, há uma
abordagem mais voltada para os efeitos de sentido dos adverbiais modalizadores. No capítulo
5 do volume 3, intitulado “Os adjuntos”, os adverbiais modalizadores são apresentados a
partir das circunstâncias que expressam, como o item “certamente”. Logo após, contudo, o
capítulo vai além ao dizer que “os adjuntos adverbiais, além de acrescentarem circunstâncias
ao verbo, em determinados contextos, revelam apreciações subjetivas” (ABREU-TARDELLI
et al., 2013, P. 293), sendo apresentado o adverbial “infelizmente”.
Ainda no mesmo capítulo, é apresentado um texto denominado “Carnívoro anterior
aos dinossauros é achado” e são destacados alguns adjuntos. Nas atividades, há dois itens que
focalizam o valor subjetivo dos modalizadores, indo ao encontro ao que o livro havia proposto
nas páginas anteriores: “Os adjuntos adverbiais podem ser usados para expressar uma posição
de quem produz o texto. Observe o adjunto adverbial em destaque. A que fato ele se refere?
(...) Qual a opinião expressa por esse adjunto adverbial?” (ABREU-TARDELLI et al., 2013, p
295).
No volume 2, no capítulo “Advérbio”, é apresentado um texto “No caso, com
certeza!” e é debatida, no quadro “interação”, a relevância do tema para expressão de opinião:
87
“2. Para expressar uma opinião sobre o que é a arte da retórica, a crônica menciona duas
expressões como exemplo: ‘no caso’ e ‘com certeza’. a) Que expressões poderiam substituí-
las nas situações apresentadas no texto?” (ABREU-TARDELLI et al., 2013, p. 370).
Nessa sequência de atividades, percebemos que os livros debatem a importância do
adverbial modalizador como marca de subjetividade. Assim, é trabalhado um de seus efeitos
de sentido. O livro tem como destaque, ainda, a coerência adotada no capítulo ao seguir, nas
atividades, o que havia sugerido na parte teórica.
Ainda no capítulo “Advérbio”, do volume 2, os adverbiais modalizadores são listados
diante de circunstâncias como “afirmação” e “dúvida”, mas são mais bem aprofundados a
partir do texto “O homem que não sorri”. São destacados, nesse texto, os modalizadores
“certamente” e “provavelmente” e, numa “caixa” ao lado, é pedido que o aluno observe esses
itens adverbiais e discuta de que forma eles apresentam a opinião do produtor textual”. O
livro segue a mesma proposta, na página 375, a partir da apresentação de uma entrevista com
Maurício de Sousa, e do destaque do advérbio modalizador “curiosamente”.
Sua principal contribuição, porém, é, além de destacá-los, buscar exemplificá-los por
meio de alguns de seus efeitos de sentidos: “positivo, negativo, relativo” (ABREU-
TARDELLI et al., 2013, p 373), dizendo, inclusive, que “os advérbios modalizadores podem
delimitar o ponto de vista sobre uma declaração a partir da perspectiva do falante
(pessoalmente, particularmente) ou de um campo de conhecimento (tecnicamente,
geograficamente) (...) [e] também podem indicar estado de espírito do falante em relação ao
conteúdo de uma declaração” (ABREU-TARDELLI et al., 2013, p 373), elencando alguns
exemplos com advérbios como “historicamente”, “particularmente”, “lamentavelmente” e
“curiosamente”.
Ao longo desse trecho do livro, há uma abordagem bastante complexa e diversificada
em relação aos efeitos de sentido dos adverbiais modalizadores, destacando sua propriedade
de articulador textual metaenunciativo (KOCH, 2003b) e as formas mais específicas de
articulação ligadas a ele, como delimitador e afetivo (KOCH, 2003b), além de outros efeitos
de sentido como a subjetividade e efeitos mais gerais “positivo, negativo, relativo”.
Dessa forma, essa coleção engloba uma abordagem mais extensa e aprofundada sobre
o tema no que concerne aos seus efeitos de sentido, o que confirma nossa hipótese inicial.
Constitui um problema, porém, a inexistência de capítulos/ seções/ trechos que liguem os
modalizadores à produção de textos argumentativos e, de forma mais ampla, à produção
textual, o que representa relativa incoerência da coleção, principalmente em capítulos sobre
88
textos opinativos. Tal aspecto refuta nossa hipótese de que os livros ligariam os modalizadores
à argumentação.
5.2.5. Em busca de uma sistematização
Após a análise das quatro coleções selecionadas e apresentadas anteriormente,
buscamos estabelecer uma sistematização do que ocorre panoramicamente nos livros
didáticos de Ensino Médio aprovados pelo PNLD 2015. Isso pode ser visto no quadro abaixo:
89
Coleção
didática
analisada
Ligação a textos argumentativos
Efeitos de sentido e papéis funcionais
Português:
linguagens em
conexão
Adverbiais modalizadores como
construtores de artigos de opinião,
o que é apresentado a partir de um
texto técnico – verbete
Intersubjetividade e papéis funcionais
a partir de exemplos ora reais, ora
inventados
Português:
contexto,
interlocução e
sentido
Aspecto não abordado
Efeitos de sentido a partir das
circunstâncias expressas pelos
adverbiais a partir de listas
classificatórias e exemplos inventados
Português:
língua e cultura
Adverbial modalizador “talvez”
apresentado como articulador
argumentativo a partir de exemplos
inventados e descontextualizados
Subjetividade a partir de observações
do livro didático
Vozes do
mundo:
literatura,
língua e
produção de
textos
Aspecto não abordado
Subjetividade e efeitos de sentido
ligados à articulação textual a partir de
exemplos reais de uso
Quadro um: panorama da abordagem dos livros didáticos acerca dos adverbiais modalizadores
Diante desse quadro, podemos observar que os livros didáticos de Ensino Médio
ainda não apresentam uma abordagem satisfatória em relação aos adverbiais modalizadores.
Esses manuais, no geral, dedicam muito pouco espaço de suas obras para essa temática e,
quando a abordam, ainda recorrem, muitas vezes, a exemplos inventados e
descontextualizados sem considerar o papel dos adverbiais modalizadores na construção dos
textos argumentativos. Além disso, em alguns livros, há capítulos que apresentam postulados
que apontam que uma abordagem discursivo-textual sobre a temática, mas, nos demais,
acabam não cumprindo esse objetivo.
90
No Manual do Professor, não há um auxílio efetivo em relação a esse tema. Esses
trechos dos livros didáticos, dedicam boa parte do seu espaço a temas mais gerais,
construindo um instrumental básico ao professor. Contudo, há diversas obras e autores na
bibliografia sugerida, muito usados nesta Dissertação, inclusive, que abordam temáticas
ligadas à modalização, texto, discurso. Alguns dos autores citados por esses manuais são:
Magda Soares, Luiz Carlos Travaglia, Maria Aparecida Lino Pauliukonis e João Wanderley
Geraldi. Ou seja, embora a bibliografia sugerida aos professores como leitura tenha cunho
discursivo-textual e defenda o enfoque nos efeitos de sentido e em seu papel na construção de
textos diversificados, não é o que os livros didáticos apresentam.
Parece haver a necessidade, ainda, de uma reorganização de alguns aspectos
apresentados nos livros uma vez que muitos deles apresentam pontos relevantes em
perspectiva discursivo-textual, mas acabam não os executando posteriormente. Ou seja, essa
sistematização pode colaborar no estabelecimento de um panorama do que precisa ser revisto
e melhor organizado nos manuais didáticos de Ensino Médio. Ressaltamos que nosso objetivo
não é criticar os autores dos livros didáticos. Temos como objetivo traçar um panorama de
como os livros didáticos de Ensino Médio aprovados pelo PNLD 2015 abordam o tema dos
adverbiais modalizadores e observar como isso pode ser modificado para aprimoramento do
tratamento da temática.
5.3. Confrontando uso e abordagem
Nesta subseção da Dissertação, faremos uma breve retomada dos resultados
encontrados no uso e nos livros didáticos para observarmos se há confluência entre eles. Em
relação ao uso dos adverbiais modalizadores em artigos opinião publicados em jornais,
percebemos que esses elementos tem importante papel na construção argumentativa dos
textos e são marcas efetivas de subjetividade. Concluímos, ainda, que há diferentes efeitos de
sentido envolvidos em sua produção e que esses efeitos estão ligados aos graus de
subjetividade envolvidos no uso dos adverbiais modalizadores. Além disso, percebemos que
esses elementos tendem a não se posicionar nas margens da oração, ao contrário do que
postulamos inicialmente em nossa hipótese baseada em outras pesquisas.
Os livros didáticos de Ensino Médio aprovados pelo PNLD 2015 tem como objetivo
apresentar os diversos conteúdos programáticos a partir de alguns aspectos, sendo os
principais: usos reais dos elementos linguísticos e sua ligação com leitura e produção de
91
textos orais, escritos e multimodais. Esses aspectos são defendidos pelas documentações
oficiais a partir da sequência USO-REFLEXÃO-USO e do enfoque no texto como principal
foco do ensino. Além disso, nosso aporte teórico aponta para a necessidade de adotar uma
abordagem baseada no uso e centrada nos efeitos de sentido e nos papéis funcionais desses
elementos.
Em nossa análise, percebemos que os livros didáticos de Ensino Médio aprovados pelo
PNLD 2015 e analisados panoramicamente nesta Dissertação não se baseiam, no geral, no uso
dos adverbiais modalizadores. Isso se deve aos manuais não apresentarem o conteúdo a partir
de usos reais e não refletirem, no geral, os efeitos de sentido e os papéis funcionais desses
elementos. Os livros didáticos já apresentam os adverbiais modalizadores como elementos
subjetivos e, em alguns momentos, reconhecem alguns dos seus papéis funcionais e seu papel
na construção argumentativa dos textos. No entanto, essa abordagem ainda é escassa e pouco
recorrente (cf. Quadro 1). Ou seja, os livros didáticos já englobam alguns aspectos relevantes
dos adverbiais modalizadores, mas ainda o fazem de forma pouco frequente e sem recorrer a
usos efetivos desses elementos, o que constitui um dos caminhos a ser melhorado nesses
manuais didáticos.
Vale ressaltar que nosso olhar é baseado nos pressupostos do funcionalismo norte-
americano e da LT e parte do pressuposto que os usos lexicais e gramaticais estão fortemente
ligados aos objetivos comunicativos do falante/escritor e, assim, cada adverbial usado tem um
papel argumentativo específico diante do contexto em que está inserido. Ou seja, é uma
abordagem que centra seus estudos no uso linguístico e em seus papéis no texto/discurso a
partir de situações efetivas dos usos dos elementos. Dessa forma, como outros trabalhos,
buscamos observar o tratamento dado pelos livros didáticos a temáticas ligadas à leitura,
análise linguística e produção textual (cf. BUENO, 2011; SANTOS, 2011; 2014; ROJO;
BATISTA, 2014).
92
6. PROPOSTAS DE ATIVIDADES
Ao longo desta seção, apresentaremos algumas propostas de atividades a partir de
textos usados na Dissertação. Para elaborá-las, pautamo-nos em trabalhos anteriores com
metodologia semelhante na elaboração de propostas de atividades, como Santos, Cuba Riche
e Teixeira (2012), Colamarco (2014), Koch e Elias (2016) e Santos (2016). Ao longo dessas
propostas, há articulação entre leitura, produção textual e análise linguística. O nível de
escolaridade é ensino médio, tendo em vista que analisamos os livros didáticos desse nível de
ensino. Nosso objetivo não é elaborar exercícios prontos, mas estabelecer sugestões que
possam ser usadas na elaboração de enunciados a partir dos pontos destacados ao longo do
capítulo.
Optamos, metodologicamente, por utilizar cinco artigos de opinião provenientes da
amostra montada para esta Dissertação. Após a apresentação de cada texto, explicamos como
poderiam ser trabalhados aspectos mais gerais acerca dos artigos opinativos enquanto gênero,
sobre a importância do veículo, do suporte, etc. Além disso, destacamos como poderiam ser
trabalhados os adverbiais modalizadores nesses textos a partir, sobretudo, de seus efeitos de
sentido. Assim, não temos como objetivo esgotar as possibilidades dos textos trazidos, mas,
na verdade, estabelecer algumas sugestões possíveis à luz das teorias aqui utilizadas e dos
resultados encontrados na Dissertação.
Retrocesso nas normas de segurança do trabalho
Flexibilizar a Norma Regulamentadora 12, criada para evitar acidentes é desejo antigo de empresários do setor
industrial
Em tempos de Jogos Olímpicos, onde o clima de ‘fair-play’ está no ar, algo oposto e
inadmissível está em andamento. O atual governo federal, ainda interino, está preparando uma
flexibilização de uma norma de segurança de trabalhadores no manuseio de máquinas e
equipamentos na indústria. Trata-se de um retrocesso nas garantias de preservação da
integridade física e psicológica de milhões de operários. Tal medida é perigosa, considerando
que somos um dos países com maior índice de acidente de trabalho.
Recentemente, a Associação de Magistrados da Justiça do Trabalho da 1ª Região
alertou para o fato de o Brasil registrar mais de 700 mil acidentes por ano, o que coloca o país
em quarto lugar no mundo, segundo a Organização Internacional do Trabalho, atrás apenas da
93
China, Índia e Indonésia. É evidente que ainda precisamos evoluir, o que implica uma política
de ações preventivas mais eficazes, tanto por parte dos órgãos governamentais quanto das
empresas.
Flexibilizar a Norma Regulamentadora 12, criada para evitar acidentes é desejo antigo
de empresários do setor industrial que pressionam o governo. Tudo isso porque uma portaria
de 2010 especificou alterações necessárias em equipamentos já existentes para torná-los mais
seguros. Entretanto, os empresários as consideram caras demais, o que justifica, segundo
pesquisadores de acidentes de trabalho, o fato de apenas uma minoria das empresas terem se
adaptado. Não restam dúvidas, portanto, quanto ao pouco respeito à vida humana.
Em um cenário com dados alarmantes de acidentes na indústria, divulgados pelo
Ministério do Trabalho e Previdência Social, é no mínimo contraditória a atitude do governo
interino de ceder aos empresários. Somente de 2011 a 2013 foram cerca de 600 mortes por
causa desse tipo específico de acidente, uma a cada 44 horas. Houve quase 14 mil amputações
e mais de 40 mil fraturas. O que justificaria afrouxar as normas, beneficiando (pra variar) os
empresários em detrimento dos trabalhadores?
Infelizmente, se faz necessário estarmos atentos a iniciativas que vão contra a vida dos
trabalhadores. Medalha de lata ao governo interino por sua “reforma trabalhista”, que é, na
verdade, conjunto inadmissível de retrocessos para a classe trabalhadora.
A partir do artigo de opinião “Retrocesso nas normas de segurança do trabalho”, o
professor pode, em âmbito geral, trabalhar com algumas características do gênero a que o
texto destacado pertence. Para isso, pode pedir que os alunos identifiquem e indiquem a tese
central e os argumentos desenvolvidos ao longo do texto, sublinhando partes do artigo, por
exemplo. Posteriormente, para trabalhar as estratégias argumentativas usadas pelo enunciador,
o professor pode pedir que os alunos justifiquem a relevância em mencionar a Associação
de Magistrados da Justiça do Trabalho e a Organização Internacional do Trabalho para
que seja observada a importância do uso de argumentos de autoridade em textos com tipologia
predominantemente argumentativa. Ainda em busca do trabalho com a argumentação, o
professor pode pedir que os alunos relacionem a estratégia de questionamento direto ao
leitor em “O que justificaria afrouxar as noras, beneficiando (pra variar) os empresários
em detrimento dos trabalhadores?” com o que vinha sendo argumentativamente
construído ao longo do texto.
Em relação ao uso de adverbiais modalizadores, o professor pode pedir,
94
primeiramente, que os alunos identifiquem a relevância dos elementos “quase” e “mais” a
partir do trecho “Houve quase 14 mil amputações e mais de 40 mil fraturas”, em que o
adverbial “quase”, combinado à pista textual “mais”, estabelece efeito intensificador nesse
contexto ao tornar imprecisa a quantidade de amputações ocorridas. Além disso, é possível
que pedir que alunos comentem a relevância do uso do elemento “infelizmente” a partir
do trecho “Infelizmente, se faz necessário estarmos atentos a iniciativas que vão contra a
vida dos trabalhadores” para a constituição do artigo analisado como texto opinativo.
Posteriormente, o professor pode pedir que os alunos relacionem o uso do item
“infelizmente” às demais pistas textuais presentes no texto, destacando sua (in)coerência
com o que vinha sendo construído ao longo do artigo.
Caminhos da privatização
É preciso garantir aos operadores de saneamento, públicos ou privados, regras simples e
seguras para atualização tarifária e para a recuperação dos investimentos.
A manchete do GLOBO de domingo afirma que a “União quer privatizar tratamento
de esgoto” e que para isso o “BNDES vai discutir modelos para o setor com os estados”. A
intenção governamental é boa porque estamos muito atrasados nesse setor, mesmo quando
comparados a países com renda per capita semelhante à nossa. Um bom exemplo do potencial
dessa política é a Sabesp, que tem empreendido Parcerias-Público-Privadas com ganhos de
produtividade. Além disso, capitais privados são particularmente bem-vindos em tempos de
escassez de recursos fiscais. Contudo, para que essa iniciativa prospere, será necessário
resolver os três problemas enunciados a seguir.
É preciso garantir aos operadores de saneamento — públicos ou privados — regras
simples e seguras para atualização tarifária e para a recuperação dos investimentos na hipótese
de rompimento dos respectivos contratos. Nesse sentido, é importante manter registro dos
valores prudentemente investidos nas obras, que devem ser continuamente ajustados para
considerar a incorporação de novas instalações e a depreciação das existentes. Como se trata
do montante a ser indenizado ao operador de saneamento na hipótese de interrupção ou fim da
prestação do serviço, não surpreende que o ambiente para investimentos no saneamento
dependa diretamente da capacidade técnica, independência decisória e autonomia
administrativa da correspondente agência, que tem a responsabilidade de cuidar da
contabilidade regulatória. Lamentavelmente, a maioria das agências hoje existentes, em
95
particular as municipais, não se enquadra nesse figurino e, por uma questão de escala, jamais
se enquadrará.
É preciso compatibilizar a legislação ambiental, que exige soluções imediatas, com a
do saneamento, que admite soluções gradativas. Por exemplo, o afastamento do esgoto de
onde as pessoas vivem, mesmo quando não seja possível o correspondente tratamento. A atual
diferença de enfoque resulta em riscos para as empresas prestadoras de serviço e para seus
funcionários, que chegam a ser acusados de crimes ambientais quando solucionam
provisoriamente algum problema que não admite imediata implementação de solução
definitiva.
Como se sabe, a legislação ambiental foi concebida para impedir que pessoas físicas
ou jurídicas, motivadas por interesses particulares, causem externalidades ambientais
prejudiciais ao interesse coletivo. Trata-se de tipologia que não se adéqua a uma empresa de
saneamento, que atua para mitigar a poluição causada pela sociedade, e não por ela própria.
Confundir “a solução” com “o problema” afugenta do setor profissionais e empresas
competentes, que poderiam dar significativas contribuições ao progresso do saneamento.
É preciso garantir o correto funcionamento das estruturas já existentes e das que ainda
serão construídas, em vez de construir novas obras, frequentemente efêmeras. Idealmente, o
serviço de saneamento deveria operar como se fosse uma indústria de produção de lodo.
Primeiro, a carga poluidora intrínseca à condição humana é diluída numa grande quantidade
de água para possibilitar o transporte por tubulações subterrâneas. Depois, o esgoto que chega
à estação de tratamento passa por uma combinação de processos físicos, químicos e
biológicos para inverter o processo. Isto é, para voltar a concentrar a carga poluidora num
volume relativamente pequeno, chamado de “lodo”. Portanto, quanto mais lodo se produz
para deposição final em aterro sanitário ou para uso como insumo energético, menor é a carga
poluidora lançada nos corpos hídricos. Como qualquer indústria, seria de se esperar que
houvesse grande controle sobre o lodo, que é o resultado final da produção. Mas não é isso o
que se observa. Ao contrário, em geral há muita pompa na inauguração das obras de
saneamento e insuficiente avaliação dos resultados ao longo das correspondentes vidas úteis.
O que explica o grande número de estruturas disfuncionais espalhadas pelo país. Isso tem que
mudar.
Diante do artigo opinativo “Caminhos da privatização”, o professor pode, a partir da
estrutura geral do texto, pedir que os alunos identifiquem os argumentos usados para
96
construção da tese central defendida no artigo. Posteriormente, pode pedir que os alunos
comentem a relevância da contextualização efetuada no início do artigo de opinião
destacado para construção argumentativa do texto. Logo após, o professor pode utilizar
como estratégia para a “ponte” entre as características constitutivas do gênero e o trabalho
com o uso linguístico o pedido, aos alunos, de destaque de alguns elementos linguísticos
que marquem o posicionamento do enunciador. Comentando, posteriormente, a relevância
de itens mais subjetivos para construção de um texto pertencente ao gênero artigo de opinião.
Para o trabalho com os adverbiais modalizadores, o professor pode pedir que os alunos
identifiquem as semelhanças nos efeitos de sentido envolvidos no uso das expressões
“idealmente” e “em geral” a partir dos trechos “Idealmente, o serviço de saneamento
deveria operar como se fosse uma indústria de produção de lodo” e “Ao contrário, em
geral há muita pompa na inauguração das obras de saneamento e insuficiente avaliação
dos resultados ao longo das correspondentes vidas úteis”. Posteriormente, é que possível
pedir que os alunos demonstrem quais são as diferenças observadas nos efeitos de sentido
envolvidos no uso das expressões “idealmente” e “em geral” a partir das demais pistas
apresentadas ao longo do texto, sobretudo os elementos que indicam ação.
Ainda em relação ao trabalho com os adverbiais modalizadores, o professor pode
solicitar que os alunos expliquem o porquê de a expressão “em geral” ser utilizada no
texto diante de uma informação aparentemente categórica. Além disso, para aprofundar o
trabalho com essa locução, pode pedir que os alunos identifiquem a (in)validade na troca
da expressão “em geral” por “obrigatoriamente” e sua relevância na construção desse
texto. O professor também pode pedir que os alunos comentem a relevância do termo
“lamentavelmente”, do trecho “Lamentavelmente, a maioria das agências hoje
existentes, em particular as municipais, não se enquadra nesse figurino e, por uma
questão de escala, jamais se enquadrará”, para construção argumentativa da tese
desenvolvida, ligando o uso dos adverbiais modalizadores com a construção da argumentação
nesse artigo.
Reunião de cúpula
O Estado brasileiro historicamente ignora grandes partes das cidades, compostas pelos bairros populares,
localizados em geral, mas não só, no que hoje chamam por periferias
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Depois de uma letargia talvez secular em relação ao tema, os presidentes dos Três
Poderes da República se encontram para debater a segurança pública. Ante número de
assassinatos maior no Brasil do que na Síria flagelada pela guerra, segundo O GLOBO, a
reunião acende uma luz ao fim do túnel (verdade que o assunto foi antes iluminado pela ONU,
chamando a atenção do mundo).
Anunciou-se um trabalho de articulação entre os governos federal, estaduais e
municipais quanto à inteligência e troca de informações. Há muito a fazer na gestão e em
inovações tecnológicas. Espera-se que também alcance o combate ao tráfico de armas, ao jogo
e às organizações paramilitares. Enfim, a reunião sinaliza uma promissora atitude.
A questão da segurança é emergencial, mas não se equacionará no curto prazo, é claro,
como demonstrado em tantos programas realizados, tantos estudos importantes conhecidos.
A vitoriosa experiência das UPPs evidenciou que o domínio territorial pela
bandidagem armada é a base do crime na cidade. E que não basta a ação policial. Assim, na
reunião de cúpula dos Três Poderes, em que estiveram também presentes o ministro da
Justiça, o da Defesa e os comandantes militares, faltou o ministro das Cidades.
O Estado brasileiro historicamente ignora grandes partes das cidades, compostas pelos
bairros populares, muitos de classe média, localizados em geral, mas não só, no que hoje
chamam por periferias. Aí, onde se conjugam energias vigorosas em busca da inserção na
sociedade, os governos não estão ou estão precariamente. Nesses lugares, sejam loteamentos,
favelas ou bairros consolidados, que constituem a grande experiência social de milhões de
cidadãos, os serviços públicos, inerentes ao Estado, são escassos ou inexistentes, tais como o
controle urbanístico e edilício, que, junto com o de segurança, garantem o usufruto do espaço
da cidade — onde se tece a rede social e política da cidadania.
Nosso país tem 85% de seus 200 milhões de habitantes morando em cidades. Talvez a
maior parte na irregularidade urbanística, edilícia ou fundiária. É preciso rever os estatutos
que idealizam o inacessível, justificando a inaceitável abstenção do governo; rever leis
federais para permitir adequar a legislação local de ordenação do solo e de controle
urbanístico, reconhecendo a diversidade urbana; que dê às prefeituras e aos estados condições
de exercício e lhes cobre responsabilidades. Também a legislação fundiária precisa ser revista
absolutamente, para que atenda à realidade para a qual as leis (e os cartórios) voltam as
costas. É com a lei que o Estado domina o território.
Nesta geração, até o fim dos anos 2030, mais meio Brasil será construído em nossas
cidades.
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Nunca antes na história do país se fez tanto como se fará em tão pouco tempo: 40
milhões de novas moradias, mais de metade do que temos hoje. Onde serão construídas?
Continuaremos expandindo a anomia?
Nesta geração, até o fim dos anos 2030, mais meio Brasil será construído em nossas
cidades.
O domínio territorial de toda a cidade pelo Estado democrático é a questão-chave.
É esse o caminho para aflorar a gigantesca energia social hoje abafada pela violência e
pelo desprezo institucional. É, por certo, a maior parceria público-privado (PPP) que o Estado
poderia contratar: dando condições para a prosperidade das famílias, para as pessoas que
estudam à noite, que procuram um trabalho extra, que empreendem um pequeno negócio. O
Estado entra com o que lhe cabe, e as pessoas oferecem sua potencialidade para o bem-estar
geral. Por certo, o isolamento no individualismo, ou na grei, deixaria de ser opção para
milhões de brasileiros. Quem sabe a política poderia retomar seu alto prestígio?
Foi uma reunião de cúpula. Saudê-mo-la! (Ops!) E que haja outras, em que o espaço
da cidade esteja na pauta.
A partir do artigo opinativo “Reunião de cúpula”, o professor pode, mais uma vez,
trabalhar a argumentação presente no texto a partir da identificação da tese central e dos
argumentos desenvolvidos ao longo do texto. Também é possível que o docente peça aos
alunos que identifiquem a relevância argumentativa da repetição do subtítulo do artigo
ao longo do texto.
Em relação ao uso de adverbiais modalizadores no artigo destacado, o professor pode
pedir, inicialmente, que os alunos identifiquem uma expressão usada duas vezes ao longo
do texto para indicar incerteza, solicitando, posteriormente, que eles expliquem o papel
dessa expressão na construção do artigo destacado como texto opinativo. Posteriormente,
o professor pode pedir que os alunos comentem a importância de combinar
argumentativamente as expressões “historicamente” e “em geral” no artigo lido. Ainda
no tratamento desses adverbiais modalizadores, o professor também pode solicitar que os
alunos discutam o papel do termo “historicamente” ao delimitar e contextualizar a
postura do Estado em relação ao tema tratado ao longo do texto e comentem a
combinação entre a locução “em geral” e a expressão “mas não só”, indicando a
existência de algumas ressalvas nas afirmativas construídas.
99
Incra
Assentados não são produtores autônomos, mas objetos de uma política assistencialista,
voltada à criação de uma clientela.
O noticiário político está tão voltado para questões urgentes, como a da aprovação da
PEC do teto dos gastos públicos e a da Reforma da Previdência, que iniciativas importantes
terminam por serem relegadas a segundo plano.
Neste caso, encontram-se mudanças importantes no Plano da Reforma Agrária que
estão sendo implementadas, mostrando uma outra face do governo Temer. A reforma fiscal
tem, aqui, uma contraparte essencialmente social.
O presidente tem dado orientações explícitas a esse aspecto social de sua atuação,
enfatizando todo um novo processo de aprimoramento dos instrumentos de obtenção de terras,
de titulação dos assentamentos, de novo processo de seleção dos beneficiários e de
regularização de terras cultivadas sem a anuência do Incra.
No dizer do presidente deste órgão estatal, Leonardo Góes: “O governo federal busca
dar maior segurança jurídica àqueles que têm terra e produzem, além de promover o acesso à
terra a quem quer produzir alimentos.”
Em pouco tempo será publicada uma medida provisória, voltada para o
equacionamento destas questões. Ela caracteriza-se por seu perfil eminentemente técnico,
avesso a problemas de ordem ideológica. Só este ponto já seria suficiente para caracterizar a
nova gestão do Incra.
Em vários momentos das gestões anteriores, com a ressalva da gestão Guedes, este
importante órgão deixou de ser propriamente um órgão de Estado para tornar-se um
instrumento dos movimentos sociais. Agora, a orientação técnica é predominante, com um
sentido de Estado.
A questão da titulação é, certamente, uma das mais importantes em pauta. Uma
característica dos assentamentos da reforma agrária, até aqui, consistia no fato de serem
tutelados pelos movimentos sociais, que aí fincaram um dos pilares de sua militância e de
recrutamento de membros para invasões.
Um assentado é, assim, não somente tutelado pelo Estado, mas, principalmente, pelo
MST. Não são produtores autônomos, mas objetos de uma política assistencialista, voltada
para a criação de uma clientela política. Não são, propriamente ditos, agricultores familiares
por não possuírem a propriedade de suas terras.
100
Com a titulação, abre-se a possibilidade de se tornarem verdadeiramente agricultores
familiares, com melhores condições de obtenção de crédito, de compra de maquinário e de
assistência técnica. Um agricultor familiar entra em uma relação de mercado, tendo melhores
condições de trabalho e de educação para seus filhos, vislumbrando-se um futuro melhor.
Contraste-se, por exemplo, a condição dos agricultores familiares no Sistema
Integrado de Produção no sul do país, envolvendo as cadeias produtivas do tabaco (pioneira),
de aves e de suínos, estendendo-se a outros setores produtivos, a dos assentados. Uns são
prósperos, outros vivem em favelas rurais.
Muitos assentamentos têm assentados produtivos, que almejam tornar-se agricultores
familiares, mas se veem impedidos por não poderem adquirir terras de seus vizinhos, que não
produzem e vivem da assistência estatal. Por exemplo, pelos critérios atuais, ao cultivarem as
terras destes seus vizinhos, que podem tê-las cedido mediante um contrato informal de
arrendamento ou de compra e venda, eles encontram-se em situação irregular. Aliás, ambos
estão por não serem proprietários de suas respectivas terras.
São tutelados, não possuindo liberdade de escolha. Segundo a nova MP, poderão
regularizar tal situação, aumentando a produção de alimentos e a terra sendo cultivada por
quem quer realmente produzir. É urgente este novo reordenamento fundiário, corrigindo tais
anomalias, ainda defendidas por movimentos sociais ideologicamente obtusos.
A nova seleção de beneficiários almeja, também, ser técnica e transparente, deixando
de ser um instrumento do MST, que tinha a função de escolher os beneficiários, aumentando
assim a sua militância. Várias denúncias, inclusive, têm aparecido, envolvendo pessoas que já
são proprietárias, funcionários públicos, militantes etc.
O TCU, apropriadamente, exigiu medidas, que estão sendo atendidas pela nova
presidência do Incra. Chegou a impedir novos assentamentos para que essas anomalias fossem
devidamente corrigidas. O descalabro era enorme, produzido, principalmente, pelo viés
ideológico e político-partidário que presidia o processo seletivo. Haverá, agora, um papel
mais importante das prefeituras e, sobretudo, uma maior publicização de todo este processo.
Outro ponto diz respeito à obtenção de terras para a regularização fundiária, por
exemplo, na Amazônia Legal ou para os assentamentos da reforma agrária. Há a necessidade
de agilização dos trâmites administrativos, visando a dar celeridade a este processo.
Imagine-se a situação de um proprietário que tem a sua terra invadida, enquanto
decisões judiciais de reintegração de posse não são cumpridas. O Pará é um estado que vive
uma enorme crise, em uma situação que poderíamos caracterizar como a de uma terra sem lei.
101
Um tal mecanismo de obtenção de terras, a preços vigentes, e com pagamento em
dinheiro — e não necessariamente mediante TDAs (Títulos da Dívida Agrária) — seria um
instrumento que poderia facilitar o equacionamento de tais conflitos, além, evidentemente, de
um maior respeito à lei, não seguida em vários estados do país. Seriam compras nas condições
de uma economia de mercado.
O campo brasileiro foi, nos governos petistas, um terreno privilegiado de conflitos,
como se tivéssemos aqui uma “luta de classes”, que terminaria com a vitória “revolucionária”
dos ditos “movimentos sociais”. O setor rural, a despeito dos ideólogos esquerdistas, foi,
porém, objeto de uma verdadeira reforma, que tornou o país um dos maiores produtores
mundiais de alimentos.
A realidade mudou completamente nas últimas décadas. Cabe, agora, uma nova
legislação e uma nova política que reflitam e deem conta desta nova situação. O caminho
abre-se à pacificação nacional.
Após a leitura do artigo de opinião “Incra”, o professor pode pedir que os alunos
identifiquem a tese central e os argumentos defendidos ao longo do texto e,
posteriormente, focalizar suas questões no uso dos adverbiais modalizadores. O docente pode
pedir que os alunos identifiquem algumas expressões usadas que indiquem o grau de
certeza em relação ao que está sendo discutido e, posteriormente, comentem a relevância
de expressões com esse efeito de sentido na construção da argumentação defendida ao
longo do texto, trabalhando, assim, o efeito de sentido deôntico, o mais recorrente em nossa
análise dos modalizadores em artigos opinativos.
O professor pode, ainda, pedir que os alunos discutam a possível troca do elemento
“certamente” por termos, como “seguramente” e “inegavelmente” a partir do trecho “A
questão da titulação é, certamente, uma das mais importantes em pauta”, pedindo que,
posteriormente, expliquem se haveria modificação no grau de posicionamento do
produtor em relação ao que está sendo dito diante dessas possíveis trocas. A partir dessas
atividades, será possível demonstrar aos alunos que as escolhas linguísticas não são arbitrárias
e, diante da troca de um elemento, os efeitos de sentido envolvidos na sua produção passam a
ser outros. O docente pode solicitar, também, que os alunos comentem os efeitos de sentido
envolvidos no uso do elemento “necessariamente” no texto, o que se torna bastante
relevante diante de sua alta frequência em nossa amostra. O professor pode, também, pedir
que os alunos relacionem os efeitos destacados no uso do “necessariamente” às demais
102
pistas textuais presentes ao longo do artigo opinativo. Por fim, pode pedir que os alunos
comentem o uso da expressão “evidentemente” combinada à expressão “além de” e ao
efeito de sentido de inclusão.
Segurança é a medalha mais almejada
Um planejamento integrado, contando com o setor de inteligência de cada instituição, certamente trará bons
frutos
Com o início das competições, o clima olímpico pouco a pouco envolve a todos. E
mesmo os mais avessos ao esporte, inevitavelmente, são atingidos pelas mudanças na rotina,
desde as alterações no trânsito, passando pelos turistas, até o aparato de segurança, com
soldados fortemente armados nas ruas da cidade. Um clima que, inicialmente, até
representaria tranquilidade; porém, essa sensação é parcial. Se por um lado há, sim, maior
segurança, por outro ela se concentra em determinadas áreas, ficando outras vulneráveis a
ações de bandidos.
O esquema envolvendo mais de 80 mil agentes de segurança, segundo o Ministério da
Justiça, entre polícias Militar, Civil, Federal e Forças Armadas, nos traz reflexões e até
discussões que merecem permanecer após os Jogos. A primeira é que a integração é um
caminho a ser considerado. Um planejamento integrado, contando com o setor de inteligência
de cada instituição, certamente trará bons frutos não só para o Rio, mas para todas as capitais
brasileiras.
Discute-se isso, pelo menos, há mais de 40 anos, mas já passou da hora de,
efetivamente, isso sair do campo das ideias e ir para a prática. Não adianta ficar apagando
incêndio e priorizando ações pontuais para garantir a realização de eventos. Mesmo porque a
Olimpíada é o último dessa sequência que iniciou com o Pan de 2007, depois com a Jornada
Mundial da Juventude, em 2013, e a Copa do Mundo. Vai demorar para organizarmos algo
com essa dimensão. No entanto, a violência continua crescendo.
Autoridades já solicitaram a permanência da Força Nacional até as eleições
municipais, em outubro, mas isso é pouco e se apresenta como uma medida paliativa e não
como uma estratégia objetiva para amenizar a violência e combater o crime organizado.
Segurança não é algo simples, exemplo disso é que mesmo com todo esse aparato para
os Jogos, vergonhosamente ocorreu um arrastão no Flamengo, a poucos metros da sede do
103
governo. Uma ousadia que nos sinaliza o ponto a que chegamos e nos preocupa quanto ao que
está por vir se não tomarmos sérias providências.
Nesse momento em que o mundo olha para o Brasil e para o Rio por conta de recordes
e ouro olímpico, devemos deixar claro que a medalha que mais almejamos é a da segurança.
A partir do artigo de opinião “Segurança é a medalha mais almejada”, o professor
pode, inicialmente, pedir que os alunos identifiquem os argumentos e a tese central
presentes no texto. Posteriormente, é possível pedir aos alunos que justifiquem a relevância
de citar, no terceiro parágrafo, outros eventos de grande porte ocorridos no Rio nos
últimos anos para a argumentação construída ao longo do texto. Logo após, professor
pode pedir que os alunos destaquem a relevância da publicação do artigo opinativo
destacado num jornal carioca de grande circulação diante da temática abordada,
solicitando, na sequência, que comentem o maior/menor impacto para o leitor diante da
publicação do mesmo texto em um veículo de outra cidade, como Folha de São Paulo,
por exemplo. O professor pode, ainda, pedir que os alunos identifiquem a relevância da
repetição, com algumas modificações, do subtítulo do artigo no corpo do texto e,
posteriormente, relacionem os acréscimos efetuados ao contexto de divulgação digital do
jornal O Globo Online.
Em relação ao uso de adverbiais modalizadores, o professor pode pedir que os alunos
destaquem a importância argumentativa do item “certamente” na modificação
destacada no parágrafo anterior. Além disso, pode solicitar que os alunos identifiquem a
relação de pressuposição envolvida no título do artigo opinativo e como o enunciador se
posiciona no subtítulo a partir do elemento “certamente”. O professor também pode pedir
que os alunos comentem a relevância do elemento “inevitavelmente” para construção dos
efeitos argumentativos do texto. Pode, ainda, solicitar que os alunos comentem a
relevância do elemento “efetivamente” para a oposição construída ao longo do artigo
entre o que é discutido em âmbito teórico, no planejamento e aquilo que feito na prática.
PROPOSTA DE PRODUÇÃO TEXTUAL
Após a leitura e análise dos artigos opinativos destacados ao londo deste capítulo, o professor
pode pedir que os alunos produzam um texto constitutivo desse gênero. Isto é, um artigo de
opinião eminentemente argumentativo, que trate de um tema atual e polêmico, que apresente
104
uma tese e argumentos que a fundamentem e que tenha marcas linguísticas que atuem na
construção argumentativa e subjetiva dos textos. Para isso, é preciso que esses textos circulem
em alguma esfera social. A divulgação pode ocorrer num jornal local, num blog, no facebook
ou em outro suporte que seja acessível aos alunos e aos familiares e que seja possível divulgar
os todos textos ou, ao menos, alguns deles.
105
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao longo desta Dissertação, procuramos apresentar algumas reflexões acerca do uso e
do ensino dos adverbiais modalizadores em perspectiva discursivo-textual. Buscamos
estabelecer uma relação teórica pouco evidenciada na literatura especializada, relacionado
funcionalismo norte-americano e Linguística do Texto, correntes que, como demonstramos,
apresentam muitos pontos de contato ao basearem suas análises nos usos linguísticos,
estudarem a função dos elementos, ao adotarem uma perspectiva discursivo-textual e ao
buscarem trazer aspectos sociocognitivos para suas investigações.
Demonstramos que ambas as teorias podem ser usadas como instrumental teórico e
metodológico no tratamento de temas ligados ao ensino de língua em geral e, sobretudo, ao
ensino de português. Embora a Linguística do Texto tenha sido mais utilizada em trabalhos
recentes com algum enfoque pedagógico, defendemos que o funcionalismo norte-americano
apresenta as bases necessárias para relacionar forma e função e estabelecer contribuições
efetivas para o ensino-aprendizagem.
Retomamos nesta Dissertação as diretrizes oficiais para o ensino de língua portuguesa
no Brasil e focalizamos a relação que essas documentações têm com a base teórica adotada
neste trabalho. Assim, o tratamento dado aos temas presentes em sala de aula deve,
necessariamente, perpassar, uma abordagem funcional e textual, considerando os efeitos de
sentido dos elementos linguísticos e tratando de sua relação com a estrutura a partir da inter-
relação sintaxe, semântica e pragmática.
Procuramos, na análise do uso de adverbiais modalizadores em artigos de opinião,
caracterizar como os articulistas de opinião utilizam esses elementos no campo da forma e da
função. Em relação à forma, nossa hipótese inicial era que a estrutura do adverbial poderia
influenciar a posição dos adverbiais. Nossos resultados confirmaram nossa hipótese, mas
apontaram para tendências de ordenação diferentes daquelas encontradas por Moraes Pinto
(2008) e Gonçalves (2015), o que indica a necessidade de observar o uso desses elementos em
outros gêneros textuais para verificar se é esse, de fato, o fator determinante.
Em relação à função, observamos os efeitos de sentido e os graus de subjetividade
envolvidos no uso dos adverbiais modalizadores. Primeiramente, retomamos os estudos sobre
esses elementos, como expusemos no capítulo 3 desta Dissertação, e, posteriormente, a partir
dos dados encontrados, estabelecemos uma categorização dos efeitos de sentido,
estabelecendo uma proposta de reclassificação. Após esse processo, observamos que esses
106
grupos apresentavam diferentes graus de subjetividade e que poderíamos estabelecer um
continuum entre eles.
Diante desse continuum, controlamos a frequência dos efeitos de sentido e percebemos
que o efeito deôntico é o mais frequente nos artigos opinativos analisados, o que relacionamos
com um uso subjetivo e ligado à expressão de certeza/ incerteza em relação à proposição, algo
constitutivo desse gênero. Além disso, observamos que os veículos utilizados na análise
também não influenciaram em relação a esse aspecto do uso dos adverbiais modalizadores, ou
seja, em relação aos seus efeitos de sentido/ subjetividade.
Ao longo da análise do uso, também procuramos apresentar uma metodologia
qualitativa, centrada no papel desses elementos na construção argumentativa dos textos
utilizados como exemplos. Recorremos à análise do contexto, remetendo a outras pistas
textuais e a seus efeitos de sentido para, então, estabelecermos nossas reflexões. Também
demonstramos que as classificações propostas pelo trabalho não são estanques, o que está
relacionado à característica fluida dos adverbiais (cf. MARTELOTTA, 2012) e ao forte papel
do contexto nas análises efetuadas. Dentro de uma mesma categoria pragmática, há elementos
diversos que, embora categorizados conjuntamente, são heterogêneos e apresentam suas
especificidades.
Em relação à análise efetuada a partir de livros didáticos, optamos,
metodologicamente, por estabelecer um panorama da abordagem acerca dos adverbiais
modalizadores em manuais didáticos aprovados pelo PNLD 2015. Por isso, analisamos 4
coleções, totalizando 12 livros didáticos. Efetuamos a análise de todos os capítulos desses
manuais a partir de duas hipóteses.
A primeira hipótese relaciona-se à ligação dos adverbiais modalizadores a textos
argumentativos, como artigos de opinião e editoriais, tendo em vista que esses elementos são
articuladores argumentativos. Diante da análise, percebemos que 2 das 4 coleções sequer
abordavam essa relação e as demais o tratavam de forma breve, sem explorar de forma mais
sistemática, recorrendo a união entre os capítulos dos eixos gramaticais e de produção de
textos.
A segunda hipótese baseia-se nos efeitos de sentido e nos papéis funcionais desses
elementos nos livros didáticos. Nossos resultados demonstraram que, de forma geral, mesmo
os manuais já apresentando algumas reflexões relevantes, ainda recorrem a exemplos
inventados, descontextualizados e descolados das funções textuais que esses elementos
apresentam. No entanto, já existem aspectos relacionados aos efeitos de sentido dos
107
modalizadores como articuladores textuais. Percebemos, ainda, que o principal ponto
abordado é a subjetividade expressa por esses elementos, o que é coerente diante do forte
caráter subjetivo das expressões modalizadoras, como debatemos no capítulo 3 desta
investigação.
Por fim, elaboramos algumas sugestões de atividades, que podem funcionar como
pontos de partida para professores usarem em sala de aula, adotando uma perspectiva
reflexiva, levando os alunos a (re)pensarem o uso dos adverbiais modalizadores como
construtores de textos argumentativos e, sobretudo, de artigo de opinião. Também podem ser
utilizadas por futuros pesquisadores que queiram fazer uma aplicação em sala de aula e
verificar os resultados de uma abordagem centrada nos efeitos de sentido, contribuindo para o
ensino de leitura, análise linguística e produção textual.
Assim, após o fim deste trabalho, acreditamos que constituem próximos passos para
trabalhos futuros: unir funcionalismo norte-americano e Linguística do Texto em trabalhos
teóricos e aplicados; analisar o uso dos modalizadores em outros veículos, gêneros e suportes,
sobretudo, em relação à sua ordenação; elaborar materiais didáticos acerca do tema em
perspectiva funcional e textual; aplicar as sugestões de atividades em sala a partir de uma
metodologia reflexiva e indutiva. Assim, acreditamos que esta Dissertação tenha contribuído
para melhor descrição e análise do uso e da abordagem didática dos adverbiais modalizadores
em perspectiva funcional e textual, apresentando alguns possíveis caminhos a serem seguidos
nessa visão, deixando explícita a necessidade de um ensino de língua portuguesa nas escolas a
partir do uso real, atentando sempre para as estratégias comunicativas dos usuários da língua.
108
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