universidade vale do rio doce–univale faculdade … · momentos de cansaço e desânimo foi ele...

80
UNIVERSIDADE VALE DO RIO DOCE–UNIVALE FACULDADE DE DIREITO, CIÊNCIAS ADMINISTRATIVAS E ECONÔMICAS– FADE CURSO DE DIREITO Geane Alves Vieira MEDIAÇÃO COMO PROPOSTA DE RESOLUÇÃO DE CONFLITOS FAMILIARES Governador Valadares/MG 2010

Upload: hoangcong

Post on 21-Nov-2018

214 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

UNIVERSIDADE VALE DO RIO DOCE–UNIVALE

FACULDADE DE DIREITO, CIÊNCIAS ADMINISTRATIVAS E ECONÔMICAS–

FADE

CURSO DE DIREITO

Geane Alves Vieira

MEDIAÇÃO COMO PROPOSTA DE RESOLUÇÃO DE CONFLITOS FAMILIARES

Governador Valadares/MG

2010

GEANE ALVES VIEIRA

MEDIAÇÃO COMO PROPOSTA DE RESOLUÇÃO DE CONFLITOS FAMILIARES

Monografia para obtenção do grau de Bacharel em Direito apresentada à Faculdade de Direito, Ciências Administrativas e Econômicas da Universidade Vale do Rio Doce.

Orientadora: Marlene Franklin Alves

Governador Valadares/MG

2010

GEANE ALVES VIEIRA

MEDIAÇÃO COMO PROPOSTA DE RESOLUÇÃO DE CONFLITOS FAMILIARES

Monografia para obtenção do grau de Bacharel em Direito apresentada à Faculdade de Direito, Ciências Administrativas e Econômicas da Universidade Vale do Rio Doce.

Governador Valadares, ___ de ____________ de 2010.

Banca Examinadora:

__________________________________________Prof.ª Marlene Franklin Alves - Orientadora

Universidade Vale do Rio Doce

__________________________________________Prof. Roberto Apolinário de Castro

Universidade Vale do Rio Doce

________________________________________Profª. Sara Edwirgens Barros Silva

Universidade Vale do Rio Doce

Dedico esta monografia a meu esposo

Romer José de Sá, meu filho Marcos Wendell Jesus

Vieira de Sá e minha mãe Nilda Alves Estevão Vieira.

AGRADECIMENTOS

Á Deus, por minha vida, por minha família, pelo curso e por tudo. Nos

momentos de cansaço e desânimo foi ele quem me manteve de pé,

guiando-me até este momento tão sublime.

Á minha orientadora, Professora Marlene Franklin Alves, por todo seu

direcionamento na construção deste trabalho. Suas preciosas dicas foram

os fundamentos que sustentaram todo esse trabalho, sem as quais, não

teria sido possível. Se hoje logro êxito em ver essa obra pronta, foi graças

às valorosas contribuições, amizade e sapiência.

Aos Professores Andreza da Cruz Soares, Rosimeire Pereira e Yuri Dias

Miranda, que se dispuseram a acompanhar e ajudar quando a eles recorri,

fosse com material de pesquisa, fosse pela leitura do material, fosse pelas

dicas, fosse pela amizade e pesquisas empreendidas à fim de apurar da

melhor forma possível este trabalho.

Á Universidade Vale do Rio Doce – UNIVALE, especialmente à Faculdade

de Direito, Ciências Administrativas e Econômicas – FADE, que na pessoa

de sua coordenadora, Professora Lissandra Lopes Coelho Rocha,

proporciona um ensino de alta qualidade, preocupando não apenas com o

aluno de hoje, mas, principalmente, com o profissional de amanhã.

Ao Escritório de Assistência Judiciária – EAJ, pelo compromisso em

mostrar aos alunos do curso de Direito a realidade jurídica, integrando o

aprendizado teórico à prática, a vivência profissional à sala de aula. E aos

professores que compõem o EAJ por sempre contribuírem para o meu

progresso.

As minhas amigas do EAJ, Jackeline e Maria da Penha, pela amizade e

apoio, pois sempre que a elas recorri não negaram seu ombro amigo, e

quando não recorri, se anteciparam a todos em me estender o braço

amigo.

A todos os colegas formandos do 10º período do curso de Direito.

“É mais seguro reconciliar-te com um

inimigo do que derrotá-lo. A derrota pode privá-

lo de seu veneno; mas a reconciliação o privará

de sua vontade de prejudicar”.

Owen Feltcham

RESUMO

Sabe-se que as soluções de conflitos podem ser frutos da própria vontade dos interessados, como expressão de sua autonomia pessoal, ou bem provir do Estado, em razão de exigências sociais. O direito pode cobrir ambas as possibilidades, legitimando as eleições individuais ou coletivas ou afirmando certas responsabilidades originadas nas funções familiares por meio de regras que visem impedir os inadimplementos das práticas familiares. Angústias, sofrimentos, medos, são sentimentos nascidos dos conflitos familiares. Esses sentimentos podem encontrar respostas e soluções mais dignas do que em uma demanda judicial, que só as perpetuam na alternatividade da Mediação. Assentada na autonomia de vontade das partes, a Mediação tem seu início, curso e término sujeitos unicamente a ela, pressupondo a disponibilidade dos envolvidos para rever a posição adversarial em que se encontram. A Mediação é um legítimo instrumento complementar que possibilita mudanças relacionais, articulando as necessidades de cada um com as possibilidades do outro, em um esforço conjunto em direção ao fim da lide. Não só porque pode antecedê-la ou sucedê-la. Quando não é mais possível a convivência do casal, nasce uma complexa negociação. Negociam-se as perdas afetivas no mesmo rol das materiais. São múltiplos os divórcios em uma única separação; o psíquico, o emocional, o físico, o financeiro, das famílias primárias, dos amigos, dos casal conjugal. Eles não são simultâneos e, na maioria das vezes, ultrapassam o momento da legalização da separação. Estas pautas tóxicas, alimentadoras e sustentadoras das disputas, poderão ser exorcizadas e conduzir os litigantes à harmonia mediante a utilização de métodos alternativos de resolução de conflitos; um deles, a Mediação.

Palavras-Chave: Conflitos. Família. Crise. Separação. Solução. Mediação

ABSTRACT

It is known that the solutions of conflicts can be fruits of the free will of the parties as an expression of personal autonomy, or well come from the state, because of social demands. The law may cover both possibilities, legitimizing the elections or collective or individual claiming responsibility originated in certain family functions by rules aimed at preventing defaults practices family. Sorrows, sufferings, fears, feelings are born of family conflicts. These feelings can find answers and solutions more worthy than a lawsuit, which only perpetuate the alternativity mediation. Settled on the autonomy of the will of the parties, mediation has its onset, course and subject only to end it, assuming the availability of those involved to review the adversarial position where they are. Mediation is a legitimate complementary tool that allows relational changes, articulating the needs of each of the possibilities of another in a joint effort towards the end of the dispute. Not only because it may precede or succeed it. When it is possible coexistence of the couple, was born a complex negotiation. Negotiate to the emotional loss in the same roll of material. There are multiple divorces in a single separation, the mental, emotional, physical, financial, families, schools, friends, the couple married. They are not simultaneous and, in most cases, exceeded the time of the legalization of separation. These guidelines toxic, feeding and sustaining the disputes may be exorcised the litigants and lead to harmony through the use of alternative resolution of conflicts, one of them, mediation.

Keywords: Conflicts. Family. Crisis. Separation. Solution. Mediation.

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO .............................................................................................................. 15

2 CONCEPÇÃO DO TERMO FAMÍLIA E SUA EVOLUÇÃO HISTÓRICA ................................. 11

3 A FAMÍLIA E A CRISE FAMILIAR .................................................................................... 17

4 CARACTERÍSTICA DO DIREITO DE FAMÍLIA E OS CONFLITOS FAMILIARES .................... 23

4.1 CONFLITOS FAMILIARES E SUAS CONSEQUÊNCIAS ................................................... 23

5 OS MEIOS ALTERNATIVOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS .............................................. 26

5.1 NEGOCIAÇÃO ............................................................................................................ 26

5.2 CONCILIAÇÃO ............................................................................................................ 28

5.3 ARBITRAGEM ............................................................................................................ 29

5.4 MEDIAÇÃO ................................................................................................................ 32

5.5 DIFERENÇA ENTRE NEGOCIAÇÃO, CONCILIAÇÃO, ARBITRAGEM E MEDIAÇÃO ......... 35

6 TUTELA JURISDICIONAL DIFERENCIADA NO DIREITO DE FAMÍLIA ................................ 37

6.1 MEDIAÇÃO FAMILIAR COMO FORMA ALTERNATIVA DE RESOLUÇÃO DAS CONTROVÉRSIAS FAMILIARES ......................................................................................... 40

6.2 CONCEITO ................................................................................................................. 41

6.3 ORIGEM DA MEDIAÇÃO ............................................................................................ 45

6.4 OBJETIVOS DA MEDIAÇÃO ........................................................................................ 46

6.5 NATUREZA JURÍDICA DA MEDIAÇÃO ......................................................................... 47

6.6 O PAPEL DO MEDIADOR ............................................................................................ 49

6.7 PRINCÍPIOS ÉTICOS BASILARES DA MEDIAÇÃO ......................................................... 53

7 VANTAGENS E DESVANTAGENS DA MEDIAÇÃO .......................................................... 56

7.1 VANTAGENS DA MEDIAÇÃO ...................................................................................... 56

7.2 DESVANTAGENS DA MEDIAÇÃO ............................................................................... 58

8 MEDIAÇÃO INTERDISCIPLINAR .................................................................................... 59

9 DIREITO COMPARADO ................................................................................................ 62

10 SEPARAÇÃO CONJUGAL: O ADVOGADO E A IMPORTÂNCIA DA MEDIAÇÃO NO

CONFLITO E SUAS CONSEQUÊNCIAS NO ÂMBITO FAMILIAR .......................................... 64

11 A ÉTICA DO MEDIADOR ............................................................................................. 70

12 CONCLUSÃO .............................................................................................................. 74

REFERÊNCIAS .................................................................................................................. 78

1 INTRODUÇÃO

Esta monografia é um estudo abrangente, porém não exaustivo, que

visa trazer à lume a temática da Mediação Familiar.

O objetivo é avaliar a Mediação como proposta de resolução de

conflitos familiares em seus direitos supostamente violados que envolvem

relações entre pessoas desestabilizadas e nem sempre reestruturadas.

O objeto de pesquisa simula a problematização do contexto a ser

examinado, e as soluções prováveis para o problema apresentado.

Assim, a questão da pesquisa consubstancia-se em saber se a

Mediação Familiar propiciará às partes mais vantagens do que

desvantagens. Esse desafogamento da justiça realmente conseguirá

promover e resguardar a justiça social? E a segurança jurídica? Será

preservada? O judiciário conseguirá adequar-se a essa forma alternativa

de pacificar os conflitos?

É sabido por todos que a justiça está em volta de processos e que

suas decisões, por isso, levam muito tempo para serem pronunciadas.

Perante este episódio concreto, surge que os profissionais do direito

busquem uma solução alternativa e mais célere, e que ainda assim

sustentem a credibilidade, e, principalmente, a imparcialidade de que goza

o Poder Judiciário, sem nunca deixar de lado o propósito principal,

garantindo a segurança jurídica, que visa a paz social, trazendo a

conscientização dos indivíduos.

A Mediação aponta um caminho mais sensato e mais ético para

além do tormentoso litígio familiar instalado judicialmente. A proposta é que

as próprias partes resolvam suas questões por si mesmas, e com a

ajuda/intervenção de um mediador. Esta idéia não é nova, claro. Nova é a

proposta técnica visando esses resultados práticos. Aliás, qualquer teoria

só terá sentido e será boa, se der resultados práticos. Afinal, a evolução do

conhecimento deve sempre ter esse sentido e direção.

A técnica da Mediação desenvolveu-se, especialmente, nos EUA, a

partir do início da década de 70. Para começar a entendê-la é necessário

não confundi-la com arbitragem. Também não é terapia, nem tratamento,

ou consultoria. A Mediação é um processo onde um terceiro é colocado

entre, in medio, os cônjuges, ou partes litigantes, para eliminar,

inicialmente, o aspecto adversarial e competitivo entre eles.

Com a demonstração de que não existe um ganhador e um perdedor com a

dissolução da conjugabilidade, através de técnicas e regras previamente

estabelecidas, como proposto nesta monografia, torna-se possível mediar e dirimir o

embate, estabelecendo cláusulas “menos-perdedoras" para ambas as partes.

Sem dúvida alguma a Mediação no campo do Direito de Família é uma das

grandes possibilidades de solução para dirimir conflitos, que poderiam ser longos e

tenebrosos processos judiciais. Não é tão simples como se poderia imaginar, pois o

litígio conjugal está permeando de uma subjetividade quase sempre encoberta por

um discurso onde a desculpa recai sobre o calor da pensão alimentícia, guarda de

filhos etc.

É isto exatamente que será abordado, abrindo-se uma grande e inovadora

possibilidade de solução de conflitos.

Mas isso não é tarefa fácil. Talvez seja mesmo uma missão. Para os

profissionais que desejam conduzir-se na vida, e em sua profissão, antes de tudo

eticamente, esta é uma grande idéia e desafio. A posição mais acomodada e

sedimentada por uma cultura equivocada na advocacia é exatamente contrária a

esta, ou seja, a de, às vezes, estimular o conflito ou de não trabalhar em direção a

um acordo.

O mediador precisa, antes de tudo, ter o desejo de ser mediador. Muita

paciência também, claro! Mas não é só isso. É necessário técnica. E é isto

exatamente que esta monografia trata. Suas idéias abrem uma grande e inovadora

possibilidade de solução de conflitos, evitando-se, inclusive e principalmente, as

histórias de degradação de uma parte à outra e até mesmo encontrando caminhos

alternativos para a tão morosa realidade jurídica.

Já que o Brasil pretende um movimento legislativo para acolher o instituto da

Mediação, eis, portanto, a oportunidade de se tecer uma criteriosa reflexão acerca

do tema, pois, diante da demora e complexidade do processo, é preciso retomar o

desenvolvimento de seu conceito e repensar se a positivação desta prática social é

o melhor caminho.

11

2 CONCEPÇÃO DO TERMO FAMÍLIA E SUA EVOLUÇÃO HISTÓRICA

A família, como um todo, é apregoada como fundamental que rege a

constituição de sistemas conexos à promoção da sociedade de pessoas e da

elevação do Estado.

Viana (1998, p. 23) classifica família em três acepções: restrita, ampla e

amplíssima.

O Código Civil de 2002 utiliza-o em acepção restrita, quando tem a família

como os cônjuges e a prole. Essa acepção compreende as pessoas ligadas pelo

matrimônio, cônjuges e filhos (Arts. 1.567 e 1.716) ou pela união estável,

companheiros e filhos, Art. 226 § 3°, da Constituição Federal, além da família

monoparental, aquela formada por um dos pais e a prole, instituto que está previsto

na Constituição Federal, Art. 226, § 4°. O Estatuto da Criança e do Adolescente

procede da mesma forma, ao dispor a respeito da família substituta (Art. 25).

O Código Civil também emprega o vocábulo em sentido amplo, nele incluindo

o casal, parentes da linha reta ou colateral, e afins (estranhos), como é o caso de

serviçais, mas que vivem sob o mesmo teto (Art. 1.591 e ss do CC).

Em sentido amplíssimo a família envolve o conjunto de pessoas ligadas pelo

vínculo de consanguinidade, que descendem do mesmo tronco ancestral, (Art. Art.

1.412, § 2o do CC). Também esse sentido inclui o vínculo da afinidade, de modo que

chega a incluir estranhos, cônjuge, enteados, genros, noras e os cunhados (esse

vínculo da afinidade pode ser encontrado no Art. 241 do Estatuto dos Servidores

Públicos da União (Lei n. 8.112/90), nele a família do funcionário abrange cônjuge,

filhos e as pessoas que vivam às suas expensas e constem de seu

assentamento individual) .

O Estatuto da Criança e do Adolescente distingue entre a família natural e a

família substituta. Aquela é formada pelos pais ou qualquer deles e seus

descendentes, ligados por laços de sangue, enquanto esta é a que recebe a criança

ou o adolescente, por um dos institutos permitidos pelo Estatuto.

Viana (1998, p. 24) entende não ser necessário nenhum esforço para se

concluir que a família, como instituição, conheceu profundas transformações, só

guardando remota identidade com seus antecedentes históricos. Segundo estudos

12

do referendado autor, a grande família, que compreendia a própria linha de

escravos, cede passo à família nuclear, centrada na tríade pai-mãe-filho.

Em seus estudos, Viana (1998, p. 24) aponta ainda que a família romana

estava alicerçada sobre o princípio da autoridade, em que o pater era, ao mesmo

tempo, chefe político, sacerdote e juiz. A mulher ocupava posição subalterna; os

filhos estavam submetidos à autoridade paterna em tal nível, que o pai tinha sobre

eles direito de vida e de morte (ius vitae ac necis). E no direito romano o termo

família apresentava duas significações, designando o grupo de pessoas submetidas,

em dado momento, à autoridade soberana de um chefe (familia jure proprio), ou o

grupo de todas aquelas que seriam submetidas a uma autoridade única, se o pater

familias comum ainda vivesse (familia jure comnuni).

O referido autor pondera que a evolução operada no sentimento humano, sob

a inspiração do Cristianismo, abrandou o rigor dos primeiros tempos e caminhou, da

unidade proposta para fins econômicos, políticos, culturais e religiosos, para o grupo

de companheirismo e lugar de afetividade. A organização autocrática da família cede

lugar a uma orientação democrático-afetiva. A família no presente é muito mais do

que antes, o espaço de realização pessoal-afetiva, despatrimonializada.

Trazendo a questão para os dias atuais, as análises de Viana concluem que a

família sofre o embate da ciência e da tecnologia, que dispensam o congresso

sexual para procriar, a inseminação artificial, a concepção in vitro, a denominada

barriga de aluguel são exemplos desse novo estado de coisas, que abalam os

alicerces tradicionais do Direito de Família. O pátrio poder cede lugar ao poder

familiar. O direito francês substitui a puissance paternelle do Código de Napoleão

pela autorite parentale. O poder, refletindo a patria potestas do direito romano, cede

lugar à idéia de autoridade, em que está presente a concepção de proteger,

assegurar segurança, saúde e moralidade aos filhos. O direito pátrio não fica alheio

a esse novo estado de coisas, que se reflete na Constituição Federal de 1988 (Art.

226), ao elevar a família como base da sociedade concedendo a ela especial

proteção do Estado, e no Estatuto da Criança e do Adolescente.

Essas mudanças no Direito e no âmbito social depositam reflexos expressivos

na família. A surpreendente revolução dos costumes, proveniente do afastamento

entre Estado e Igreja, ocasionou intensas mutações na conceituação de família, para

tanto dispersou da imagem sagrada do casamento. No decorrer do século XX, que

13

foram ocasionadas tais mudanças, o Direito de Família veio a sofrer uma evolução

paralela, com objetivo de satisfazer os atuais anseios da sociedade.

O conceito de família, antigamente fundamentado unicamente no matrimônio,

passou a envolver diferentes possibilidades de formação, diante deste feito,

excluindo o remoto padrão patriarcal. Portanto, novos valores para a composição da

família começaram a predominar, sobretudo com o advento da Constituição Federal

de 1988, que inseriu na sociedade a imagem de igualdade, afetividade e,

principalmente, dignidade da pessoa humana.

No que diz respeito às relações parentais, estas passaram a ser analisadas

sob nova perspectiva.

A Declaração Universal dos Direitos Humanos aplica a família como ambiente

natural e principal da sociedade, garantindo o direito de ser resguardado pela

sociedade e pelo Estado e adotando o direito do homem e da mulher de adquirirem

casamento, em idade núbil, com o seu consentimento pleno e livre.

Este Estatuto Universal, ao contrário do que afirmam alguns ilustres

intérpretes, não consagra o casamento entre pessoas do mesmo sexo, como diretriz

fundamental, senão assegura a toda pessoa o direito de associar-se livremente a

outras sem ser molestada por suas opiniões, nem poderá ser objeto de ingerências

arbitrárias ou ilegais em sua vida privada. A lei necessita resguardá-la sempre e a

Constituição brasileira assenta como finalidade fundamental a edificação de uma

sociedade solidária, justa e livre, dispondo à elevação do bem-estar de todos,

indistintamente.

A coexistência entre os seres humanos é fundamental. Uma coisa é o direito

incontestável de cada um seguir sua própria vida, outra, bem diferente, é contrariar

instituições milenares.

Porém, não obstante o que foi dito, e acompanhando as evoluções do direito,

o Direito moderno vem reconhecendo, mesmo que discretamente, que tanto as

uniões homoafetivas, quanto os relacionamentos em que há comprometimento

mútuo merecem ser chamados de família, independentemente do número ou do

sexo de seus integrantes.

O modelo de família da sociedade do século XXI vive seu ápice, pois se

romperam os paradigmas em que a família era identificada pelo casamento. A

evolução dos costumes, a emancipação da mulher, o surgimento dos métodos

14

contraceptivos, a própria globalização levaram à reformulação da estrutura da

família.

A família transformou-se em um ambiente da afetividade que abriga todas as

modalidades vivenciais, motivando consequência que devem ser implantadas na

esfera do Direito de Família. Assim, tanto as uniões homoafetivas, quanto os

relacionamentos em que há comprometimento mútuo merecem ser chamados de

família, independentemente do número ou do sexo de seus integrantes.

No atual estágio, em que as uniões de pessoas do mesmo sexo já vêem

alcançando reconhecimento no âmbito judicial, provavelmente o conceito de família

será remodelado. Nesse sentido já vem à jurisprudência identificando as uniões

homoafetivas como união estável e as inserindo no Direito Sucessório. De outro

lado, as alterações introduzidas no projeto originário, vedando inclusive a adoção de

crianças, vêm de encontro aos princípios da proteção integral da criança e da

filiação socioafetiva, pois gera a irresponsabilidade de quem está exercendo as

funções parentais. Ao invés de proteger, desprotege, pois deixa em total desamparo

as crianças que vivem em lares homoafetivos, indo contra o mandamento

constitucional que é textualmente claro ao dispor que "a família, base da sociedade,

tem especial proteção do Estado" (art. 226).

A família brasileira padece de graves problemas de desestruturação, seja ela

de classe baixa, média ou alta; a sociedade, por sua vez, está individualista e sem

os valores capazes de preservar a saúde para uma boa estrutura; e, por fim, o

Estado, num conjunto legitimamente constituído, é inoperante e politicamente

egocêntrico. Esse, porém, não é um mal brasileiro e sim, mundial.

O grande elemento do mundo moderno é a desarmonia moral, pois a

educação não tem sido suficiente em razão da forma como o processo moral é

aprendido.

Desta forma, o novo rumo dado ao pátrio poder, a isonomia conjugal, o fim

das distinções entre os filhos conforme sua origem, que o texto constitucional

consagrou, revela que, no seio da família, predomina a igualdade, a liberdade, o

respeito. A família patriarcal sacralizada, autocrática, morreu.

A tutela persegue, agora, o equilíbrio entre o interesse social e o interesse

privado. É na família que o ser humano nasce e se desenvolve, plasma sua

personalidade para, depois, integrar-se na sociedade.

15

O direito busca dar à família uma nova organização, procura captar o caudal

de novas situações criadas, reconhecendo-lhe como núcleo de preparação do ser

humano para a vida. A igualdade assume seu lugar, o respeito, também. Marido,

mulher e filhos, todos são titulares de direitos e obrigações, sem contar os deveres

que decorrem da constituição do universo familiar. Há igualdade. A realização

pessoal da afetividade inclui-se entre as funções básicas da família.

A dignidade humana desponta, a unidade na affectio consolida-se, a

afetividade prepondera. Efetiva-se com maior rigor o direito de fundar uma família,

presente na Declaração Universal dos Direitos do Homem. E o legislador pátrio

acolhe essa concepção e admite a família fora do casamento, estatuindo que, para

efeito de proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a

mulher como entidade familiar, determinando que a lei deve facilitar sua conversão

em casamento.

A família monoparental está ao lado da união estável como entidade familiar.

A Constituição Federal estabelece que é entidade familiar a comunidade formada

por qualquer dos pais e seus descendentes (§ 4º, Art. 228).

A própria vinculação biológica tradicional cede passo à família como

estruturação psíquica onde cada membro tem seu lugar definido. Fala-se em lugar

definido porque uma pessoa pode assumir o lugar de pai sem sê-lo biologicamente,

ou de mãe sem que o vínculo natural esteja presente. O raciocínio vale para o filho,

também, como se passa na adoção. É possível que o pai ou a mãe biológicos não

ocupem os lugares referidos, por motivos os mais diversos, até mesmo a dificuldade

de desempenhar esse papel.

Remontando ainda aos ensinamentos de Viana (1998, p. 25), conclui-se que

a família cumpre certas finalidades básicas no mundo fático, a partir da concepção

universalmente aceita de que é a célula vital do organismo social: a primordial,

capaz de gerar e de formar outras pessoas assegurando a perpetuação da espécie;

a consequente, de contribuir para a manutenção e o desenvolvimento do Estado,

inserindo em seu seio pessoas preparadas para a vida social.

Em verdade a família é a escola do espírito, onde se forja o caráter do ser

humano e ele é preparado para o convívio social. Como o Direito passa por

momentos de transformações, reclama-se cautela e prudência para que não

caminhar rumo a extremos, onde a turbulência sempre está presente.

16

Infelizmente, muitos vêem a família como apenas um conjunto de pessoas e

não mais um grupo de pessoas ligadas entre si por laços afetivos e princípios a

regê-los perante a sociedade e o Estado. Esse é o grande mal do novo século. É

nesse cenário que culmina a necessidade de um instituto que deite base nas

necessidades da manutenção, preservação e proteção da família: A Mediação

Familiar.

17

3 A FAMÍLIA E A CRISE FAMILIAR

Famílias desestruturadas atualmente não faltam. As estatísticas de divórcio

só aumentam. Há ainda os casais que simplesmente moram juntos e se separam,

ou moram juntos e vivem como se separados fossem.

A família é a principal vítima das mudanças sociais. Nesse panorama em que

imperam as crises, ela utiliza-se da fuga ou do rompimento em vez de buscar as

soluções mais adequadas, virando as costas à solução de uma aparente dificuldade.

As chamadas famílias nucleares, compostas por pai, mãe e filhos, estão cada

vez mais reduzidas. Os demais membros, avós, tios, tias vivem uma relação cada

vez mais discreta com seus netos ou sobrinhos.

Nesse cenário já preocupante, entra o divórcio como um divisor ainda maior

de águas.

Silveira (2005, p. 179) em artigo publicado sobre os conflitos familiares e a

Mediação como proposta, faz uma excelente consideração dos conflitos e da

necessidade de serem solucionados.

Os conflitos fazem parte de nossa vida. São inevitáveis nas relações humanas em razão das diferenças individuais. No domínio das relações familiares, acontecem frequentemente e é preciso atribuir-lhes sentido e ultrapassá-los de modo construtivo em vez de evitá-los ou ignorá-los, tendência frequente de alguns grupos de indivíduos. A maioria dos indivíduos relaciona com a palavra conflito conceitos de crise, batalha, guerra, disputa, sendo visto sempre como algo prejudicial e indesejável. Por este motivo, devem ser resolvidos. (SILVEIRA, 2005, p. 179)

Silveira (2005, p. 179), no mesmo artigo supra, pondera que:

Quando as relações familiares chegam a um momento conflituoso em que não mais existe o diálogo como norteador da relação, ou mesmo diante de qualquer adversidade própria da convivência, as pessoas integrantes do grupo familiar não chegam ao entendimento, é bastante comum a busca pela Justiça familiar, através do ajuizamento de ações junto as Varas de Família. (SILVEIRA, 2005, p. 179)

18

Para a autora, a família deve ser vista como rede de apoio social e afetivo

importante para o desenvolvimento humano

O casamento, um contrato que promove a união do homem e da mulher,

conforme a lei, regulando as relações sexuais, o cuidado da prole comum e a mútua

assistência, é a instituição ideal, prevista em todas as sociedades, mesmos as mais

primitivas.

Com o casamento vem o sentimento de que a vida será como em um conto

de fadas, com final feliz e sem problemas. Não é essa, porém, a realidade da maior

parte dos casamentos.

Os problemas enfrentados são inúmeros: pessoais, financeiros, trabalhos,

filhos e os problemas inerentes do próprio casamento. As emoções nocivas põem

tanto em risco a saúde física quanto o equilíbrio emocional.

A princípio supõe-se que o amor que originalmente unia aquelas pessoas,

“até que a morte os separe”, seria uma chama que não se apagaria, e que existindo

o amor tudo seria de pequena complexibilidade e passível de resolução. Nem

sempre é isso que acontece. É aí que o juramento de união eterna torna-se utopia.

Os entendimentos tendem a não acontecer, culminando em momentos de crises e

até a dissolução do casamento em processos contenciosos, discussões de restos de

amor e desamor em torno das relações pessoais e patrimoniais do casamento mal-

sucedido.

A crise converte-se em perigo, em oportunidade. Aparece a tentativa de

superação. Às vezes, a tentativa virá frustração pelo fracasso.

A superação da crise conduz ao fortalecimento do casal, em contrapartida, o

fracasso, à falência emocional.

A separação conjugal é o ápice da crise. Há mais perdas que ganhos. Não é

verdade que com a separação, extingue-se a família. Os filhos sempre serão uma

ligação entre o casal que perdurará para sempre. No fim da crise familiar nem tudo

ganha o ar de tragédia, pois pode ser que a família saia não só desorganizada, mas

também evoluída e fortalecida, porque crises são oportunidades para crescimento. O

movimento de proteção e cuidados para a com a prole pode reorganizar o vínculo do

ex-casal, independentemente da ruptura do relacionamento conjugal e fortalecer os

vínculos com filhos, ressegurando que o fim do casamento não significa

necessariamente, para eles, a perda do pai ou da mãe.

19

A separação além de causar a ruptura de um casal, tem um efeito psicológico

grande nas crianças e nos adolescentes. As crianças ficam isoladas em sua família,

em geral confiadas à mãe, às vezes ao pai.

A separação é sentida, sobretudo pela criança. Às vezes até o sentimento de

culpa aparece, como se uma parte da responsabilidade coubesse a ela. E como se

fosse a causa dessa ruptura.

A violência interior com que os filhos vivem por causa da separação deve-se

aos pais que não se situam amigavelmente dentro da ruptura. Um divórcio, uma

separação, é uma fase particularmente difícil. De certa maneira, é uma constatação

de fracasso e, no plano afetivo, um período particularmente delicado. Além disso,

trata-se de uma decisão que há muito tempo é considerada depreciadora aos olhos

da sociedade.

Não incomum na pós-crise, as pessoas expressam grande violência e às

vezes ódio. Recorrer à justiça seria a resposta a essas divergências.

Para Silveira (2005, p. 179) o grande número de conflitos familiares que se

desenrola no judiciário traz como consentâneo o aumento da desestruturação da

família.

A justiça não cabe julgar os atos de um membro do casal, ou procurar

culpados, seu papel é de atuar como mediadora. Nem sempre, no entanto esse

papel mediador é fácil de ser exercido, o divórcio litigioso passa a ser o grande

obstáculo a ser transpassado.

Apesar dos divórcios litigiosos serem o grande bolo, o número dos chamados

divórcios "amigáveis" crescem.

O sentimento de culpa nos divórcios traduz a tentação de responsabilizar o

outro pelo fracasso. Os adultos não têm coragem de reconhecer a falta de

entrosamento do casal e a possibilidade de encontrar um espaço de compreensão.

Os pais culpam-se mutuamente por terem sofrido uma violência por parte do

outro, de engano, de covardia, de ter instaurado a instabilidade do casal. Uma das

partes, ou ambas, tomam as rédeas de forma brusca. Nessas situações, onde todos

se sentem afetivamente feridos, torna-se difícil controlar o desejo de vingança.

A crise familiar afeta diretamente o vínculo entre pais e filhos. Do ponto de

vista da criança, a separação ou a ameaça dela gera grande ansiedade; o risco de

perda de um dos pais provoca imensa dor e revolta.

20

As crises de família clamam por um mediador para que as partes envolvidas

no conflito possam dar um novo rumo na sua relação, a fim de que dessa forma

consigam alcançar a paz tão almejada.

A justiça clássica, rara às vezes, consegue resolver com uma acepção

solidária e construtiva um conflito familiar. Diante desta ortodoxia entra a Mediação.

A Mediação, conduzida pelo Estado é um meio alternativo para que as crises

familiares sejam resolvidas de maneira mais pacífica, beneficiando a todos os

envolvidos, em especial, aos filhos.

A Mediação tenta separar os casais nas melhores condições possíveis, a fim

de preservar, sobretudo o interesse dos filhos. Deve ficar claro para as crianças que

às vezes é melhor separar-se do que viver uma relação que não funciona e que lhes

mostram uma imagem negativa do que é o amor. É difícil para um casal fingir, há

atitudes que não enganam. É preciso saber explicar à criança.

Mesmo com a oposição e desacordo, aparecerá obrigatoriamente o dever de

zelar pela vida dos filhos. Infelizmente querer atenuar conflitos, ou tentar evitá-los é

uma fuga na qual não existe um ideal de realização, apesar de a Mediação tentar

abrandá-los.

A presença do Estado no momento da dissolução do casamento,

determinando e impondo as causas que permitem seja o casamento desfeito.

Além disso é importante considerar que ao direito de se casar corresponde

um outro direito que é o de não se manter o casamento contra a vontade dos

cônjuges. Qual o sentido de manter-se um casal unido, porque as causas que o

Estado entende adequadas à separação judicial ou ao divórcio não podem ser

provadas? Não são poucos os casamentos desfeitos, em que os cônjuges e os filhos

vivem em péssimas condições, passando, no entanto, aos olhos de todos, como se

tudo estivesse bem.

Além disso temos uma violação do direito à intimidade e à autodeterminação

pessoal. Ponderemos, outrossim, que as legislações admitem a dissolução por

causas objetivas, como a observância de determinado lapso de tempo, a doença

mental grave, dentre outras, relevando que não há obstáculo a uma solução mais

decisiva nesse território.

O Estado sempre está presente no momento da dissolução do casamento,

determinando e impondo as causas que permitem seja o casamento desfeito.

Nesse sentido Viana:

21

[...] é importante considerarmos que ao direito de se casar corresponde um outro direito que é o de não se manter o casamento contra a vontade dos cônjuges. (1998, p. 151)

Viana (1998, p. 151) entende que o que se denomina de causas para o

divórcio, ou para a separação judicial, são, antes, consequências da falência da

relação existente. O adultério, a intolerância com o cônjuge enfermo, a injúria,

apenas para citar algumas dessas causas, melhor se colocam como

consequênciasde um casamento que faliu.

A presença do estado na dissolução do casamento tem o condão de proteger

a família acima de tudo. No entanto, o importante não é o Estado dificultar a

separação, mas dar ao casal uma assistência no campo psicológico, capaz de

orientá-lo para o alcance do ato que está sendo praticado.

Casa-se por vários motivos, mas, infelizmente, nem todos são os casamentos

ditados pelo Amor.

O homem e a mulher descobrem que os valores que lhes foram oferecidos,

como os mais expressivos e significativos para a vida social, não são ferramentas

adequadas para a solução das crises morais e espirituais que serão chamados a

vencer, quando enfrentam dificuldades. No elenco dessas crises está justamente a

vida em comum. Como não aprendeu o sentido e o alcance do matrimônio, a

tendência normal é fugir do problema, mesmo que isso custe o sofrimento dos filhos.

O sentimento egoístico do prazer e felicidades pessoais sobrepõe-se a qualquer

outro, porque o que se aprendeu só pode levar à preocupação individual. Quando

nos casamos, deixamos de ser eu, para vivermos o nós. Mas isso não é um princípio

admitido ou compreendido.

Segundo Viana (1998, p. 152), a maior dificuldade não é o problema que o

casal enfrenta, mas como enfrentá-lo. À míngua de uma base moral e espiritual

sólida a tendência é fazer o como enfrentar o obstáculo mais complexo do que o

problema em si. Por essa razão é que seria importante a existência de serviços,

formados por profissionais habilitados, junto às Varas de Família, visando orientar os

casais. No lugar da imposição de causas específicas que autorizem a separação ou

o divórcio, apoio nesse momento difícil, buscando orientar e assistir aos casais para

o alcance e consequênciasdo ato que pretendem praticar.

22

Quem milita na área de família sabe que não são poucas as vezes que se

evita uma separação conversando e orientando o casal. Ele acaba por ver pontos e

aspectos que antes desconhecia ou que não conseguia perceber, tudo fruto da

orientação que recebe.

23

4 CARACTERÍSTICA DO DIREITO DE FAMÍLIA E OS CONFLITOS FAMILIARES

4.1 CONFLITOS FAMILIARES E SUAS CONSEQUÊNCIAS

Nenhuma área de conflito reflete melhor as vantagens e desvantagens da

negociação de acordos, feitos através da Mediação, do que a familiar. Conflitos de

família ocorrem entre pais e filhos adolescentes, ou entre cônjuges em separação,

sobre guarda de filhos, ou propriedade, e são configurados por questões

especialíssimas e extremamente interligadas. Por isso vêem desafiando as decisões

judiciais, pelo retorno sem fim de seus processos às salas dos tribunais.

Quem nunca viveu conflitos? São eles inerentes da vida humana, e mesmo

entre pessoas com fortes laços afetivos estão presentes, pois as pessoas são

diferentes, carregam histórias particulares, têm pontos de vista e se comunicam de

formas diferentes. Cada um possui seus valores, poderes, interesses, recursos ou

posições diferentes. Quando instaurados, surge a tensão e a luta entre as partes. Na

família, quando estas diferenças abrem fendas profundas, instala-se o conflito.

Todos conhecem um caso de divórcio ou separação onde, por anos a fio, os

cônjuges brigam por questões básicas, como pensão alimentícia e guarda de filhos.

De igual modo, todos conhecem casos onde obrigações decididas judicialmente são

desobedecidas, e não raro, são objeto de novas e novas ações.

Conflitos familiares podem ser latentes, emergentes ou manifestos. Conflitos

latentes são as situações nas quais o conflito ainda não se instalou, mas se

avizinha. Emergentes são os que surgem no intercurso do processo, um impasse.

Manifestos são os que permanecem sem solução, eternizando o litígio, comum em

questões sobre a guarda de filhos menores, visitas e suporte alimentar.

As famílias, de regra, atuam em concordata com suas próprias leis, e são

revoltados a determinações de terceiros. Sendo pressionadas, ignoram decisões

sejam elas profissionais ou judiciais, fazendo a justiça com suas próprias mãos.

Na verdade as contendas familiares contêm nebulosos emaranhados de

conflitos legais e emocionais, e quando não são decididos pelos figurantes,

transformam-se em disputas intermináveis nas mãos de terceiros, admitindo sérios

sinais nos membros da família. A fuga às drogas, por exemplo, é uma consequência

24

cantada e decantada de dissolução de famílias, quando os conflitos, que envolvem

seus elementos, não recebem tratamento adequado. Estes conflitos são tidos como

mais complexos do que as próprias questões criminais. No crime, os determinantes

causais são detectados pela revelação, e na família, muitos conflitos sequer deixam

o campo interno de sua estrutura, para que possam ser observados.

As disputas familiares, por definição, envolvem relacionamentos que precisam

perdurar. Numa família onde existem filhos, os cônjuges transformam-se em

parentes, até muito além do que a morte os separe. Mesmo que se separem, terão

netos em comum, bisnetos e assim por diante. Existirão sempre discussões sobre

questões que envolvem ex-cônjuges, seja decisões de última vontade dos pais, uso

comum de propriedade de herança, entre irmãos, ou a disposição de um negócio de

família. Será sempre difícil evitar encontros, mesmo que seja em casamentos ou

funerais.

Serpa (1999, p. 18) pondera que a síndrome do perde-ganha dos tribunais

provoca um verdadeiro desastre numa família que se desfaz. Não existe a devida

preocupação dos responsáveis com as consequências de suas decisões. Não que o

comportamento se constitua em desleixo, mas porque os conflitos, com

envolvimento de questões familiares, raramente podem ser resolvidos a contento de

todos os envolvidos, sem uma intervenção criteriosa. Um critério que tenha esse

cuidado, nem de longe, pode ser encontrado nas decisões do sistema adversarial.

Segundo Serpa (1999, p. 18), a Mediação onde vem sendo aplicada, tem se

revelado no método mais eficiente e de soluções mais duradouras em questões

familiares. Suas técnicas de intervenção neutra trouxeram resposta às milhares de

perguntas que sempre se fez em matéria de disputas familiares, principalmente onde

exista a necessidade de continuidade dos relacionamentos, seja adoção,

transmissões necessárias de bens mortis causa, divórcio, ou conflitos entre pais e

filhos. Serpa (1999, p. 10) dá conta que nos Estados Unidos, as leis e os costumes

são extremamente vigilantes com relação a esses conflitos. Os pais são

constantemente policiados por professores e autoridades, com relação ao seu

comportamento com os filhos. Facilmente se enquadram atitudes educativas dos

pais como child abuse (maus-tratos contra criança). Por essas razões, o processo

de Mediação caiu como uma luva para o difícil trabalho de solução de disputas,

entre componentes de famílias, onde não raro existem situações de maltrato a crian-

ças, violência com mulheres, e outros problemas.

25

Conflitos são complexos, geram a dinâmica oposicional, escapam das

querelas judiciais. Assenta-se sobre um conturbado mundo de sentimentos e

emoções, comprometendo a estrutura psicoafetiva de seus integrantes. Envolvem

frustração, abandono, ódio, vingança, medo, insegurança, rejeição familiar e social,

fracasso e culpa que o direito não objetiva e nem valora diretamente. A realidade

extra jurídica é um componente primário e essencial do conflito familiar.

Entregar às partes em conflito o controle sobre suas próprias

decisões,direcioná-las em assuntos pessoais, reduzir a hostilidade inerente ao

próprio processo e assentar as bases de uma comunicação diferente são os

objetivos perseguidos pela Mediação.

26

5 OS MEIOS ALTERNATIVOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS

Dentre as diversas formas alternativas de solução de conflitos utilizadas como

instrumentos legais à disposição daqueles interessados em evitar a intervenção

estatal no campo da realização da justiça, destacam-se negociação, a conciliação, a

arbitragem e a Mediação.

5.1 NEGOCIAÇÃO

As pessoas estão constantemente em negociação. Sendo assim, não há

menor dúvida de que negociar é uma das aptidões mais formidáveis para o sucesso

pessoal e profissional de qualquer indivíduo.

Alfonso (2008), conceitua negociação como a relação que constituem duas ou

mais pessoas a respeito de um determinado assunto, visando localizar estilos

comuns e chegar a um acordo que seja benéfico e proveitoso para todos os

envolvidos.

A negociação inicia-se quando há contenda entre as posições das partes,

buscando extinguir essas diferenças aproximando gradativamente as posições até

elevar-se a um ponto plausível para todos.

Segundo Tavares (2002, p. 42), negociação é “a forma básica de resolução

de disputas”. Nela, as partes se encontram diretamente e, de acordo com suas

próprias estratégias e estilos, procuram resolver uma disputa ou planejar uma

transação, mediante discussões que incluem argumentação e arrazoamento.

A Negociação poderia não se adequar como uma forma de solução de

conflitos. Nesse sentido, in verbis:

Sem influência de terceiros, as partes buscam decidir as questões, resolvendo diferenças mediante discussões que podem ser geridas pelas partes autonomamente, ou por representantes. Diante disso, determinados autores não a apreciam como uma forma de solução de conflitos propriamente dita. (TAVARES, 2002, p. 42)

27

Ainda de acordo com Tavares (2002, p. 42), a negociação é usada para

qualquer tipo de disputa e faz parte do dia-a-dia transacional. É uma atividade

constante entre advogados. É um método apropriado a ser utilizado quando as

partes continuam a ter relações comerciais, cotidianamente, ou quando é possível

solução criativa, sendo certo que tal vínculo caracteriza-se pela confiança mútua e

credibilidade entre as partes.

Tavares (2002, p. 42) citando Pucci, aponta que as formas de conduzir uma

negociação estão sintetizadas em duas correntes de pensamento: a de “negociação

competitiva”, em que os negociadores buscam maximizar seus lucros, e a

“negociação colaborativa”, que é aquela em que o objetivo é ajudar as partes a

satisfazerem suas necessidades, ao mesmo tempo em que se resolve o conflito.

Visando o melhor efeito possível, o formato básico de resolução de diferenças

é realmente a negociação. Nela, as partes se deparam espontaneamente e, de

acordo com suas próprias táticas e estilos, procuram resolver uma contenda ou

projetar uma transação, mediante discussões que abrangem argumentação e

arrazoamento.

A negociação é um exercício contínuo entre advogados; é empregada para

qualquer elemento de disputa, fazendo parte do dia-a-dia transacional. É uma

técnica adequada a ser utilizada quando as partes continuam a ter relações

comerciais, continuadamente, ou quando é possível solução criativa, sendo

apropriado que tal junção caracteriza-se pela confiança mútua e credibilidade entre

as partes.

Além disso, o importante em um procedimento de negociação é que todos

alcancem resultados, pois a balança da percepção de determinado negócio não

pode decair mais para um caminho e menos para outro; o melhor é sempre o

equilíbrio; o acordo precisa valer a pena para os dois envolvidos, isso porque, com

os dois elementos satisfeitos, os riscos de surgirem dificuldades e surpresas lá na

frente serão bem menores.

A procura pelo consenso legítimo é o grande caminho, que é o consenso

acordado e garantido por uma solução debatida, decantada e acordada, e não um

consenso fundamentado na ausência de alternativa e por isso alinhavado.

Em definitivo, carece atingir uma solução justa que compreenda os pontos de

vista e interesses de todos os envolvidos.

28

Desta maneira, todos eles analisarão o acordo como algo próprio e não como

uma solução imposta. Além do mais, todos sairão satisfeitos da negociação e com a

finalidade de cumprir com o tratado e com interesse em sustentar essa relação

profissional que tem consequência tão vantajosa.

5.2 CONCILIAÇÃO

A conciliação é uma forma de resolução de disputa na relação de interesses

gerida por um conciliador acometido de autoridade ou apontado pelas partes, a

quem cabe aproximá-las, dominar as negociações, aconselhar e estabelecer

propostas, apontar vantagens e desvantagens, cujo objetivo é excluir o conflito,

formalizando um acordo judicial ou extrajudicial, que será devidamente homologado

pelo juiz, e assim, constitui-se em título executivo judicial.

Este meio alternativo de conflitos familiares tem suas próprias características

onde, além da gerência do conflito por um terceiro neutro e imparcial, este mesmo

conciliador tem o prerrogativa de poder sugerir um possível acordo, após um

criterioso julgamento das vantagens e desvantagens que tal proposição traria para

ambas as partes.

Conciliação, segundo Tavares é:

o processo pelo qual o conciliador tenta fazer com que as partes evitem ou desistam da jurisdição, encontrando denominador comum, seja renunciando ao seu direito, seja submetendo-o ao de outrem, ou mesmo transigindo, nos moldes previstos pela Lei Civil. (TAVARES, 2002, p. 42)

Tavares (2002, p. 42) citando Serpa, diz que conciliação é um processo

informal em que existe um terceiro interventor que atua como elo de ligação,

inclusive por telefone. A finalidade é levar as partes a um entendimento, através da

identificação de problemas e possíveis soluções. O conciliador apazigua as

questões sem se preocupar com a qualidade das questões. Interfere, se necessário,

29

nos conceitos e interpretações dos fatos, com utilização de aconselhamento legal ou

de outras áreas.

Pellegrini (1998, p.17) apud Gomes (2006, p. 20), ensina que o Código de

Processo Civil atribui ao juiz o dever de “tentar a qualquer tempo conciliar as partes”

(Art.125, IV) e em seu procedimento ordinário inclui-se uma audiência preliminar (ou

audiência de conciliação), na qual o juiz, tratando-se de causas versando direitos

disponíveis, tentará a solução conciliatória antes de definir os pontos controvertidos

a serem provados.

O Art. 449 do Código de Processo Civil Brasileiro é compulsório ao dizer que a

tentativa de conciliação é obrigatória. Antes de iniciar a instrução, o juiz deve tentar

conciliar as partes.

A lei dos Juizados Especiais, Lei 9.099 de 26.09.1995, institui a conciliação

das partes em seus artigos 21 a 26, passando-se para a fase de instrução e

julgamento somente se a conciliação for frustrada e o juízo arbitral não for

instaurado.

A conciliação extrajudicial visa induzir as partes a escolherem uma solução

para seus conflitos.

Mendonça (2001, p.38-39) apud Gomes (2006, p. 21), diz que as principais

etapas da conciliação são; inflexibilidade das partes para alcançarem uma solução

para problemas; intencionalidade na busca de um acordo; buscar a natureza ou os

limites de um direito/situação jurídica que se apresenta subjetiva ou objetivamente

controversa; sem intenção de transigir ou renunciar.

Desta forma, no processo de conciliação, o conciliador tenta fazer as partes

desistirem da jurisdição.

5.3 ARBITRAGEM

Arbitragem, na definição de Szklarowsky (2004), é um procedimento por meio

do qual as controvérsias entre as pessoas podem ser resolvidas, por meio de

árbitros escolhidos livremente por elas. O árbitro – juiz de fato e de direito – é

pessoa altamente especializada e geralmente do mesmo ramo dos sujeitos em

conflito. Eis a grande vantagem, além, obviamente, da presteza, desburocratização

30

e economia. O prazo máximo para a apresentação da sentença é de seis meses,

contados da instituição da arbitragem ou da substituição do árbitro, podendo ser

prorrogado, somente se houver acordo entre as partes e o árbitro. Os prazos são

extremamente curtos e devem ser rigorosamente obedecidos.

Segundo Grinover (2007), a arbitragem consiste em submeter a decisão de

determinada questão a um terceiro imparcial que não o Estado-juiz, sendo que as

partes se vinculam à decisão assim proferida.

A grosso modo, trata-se de uma modalidade em que as partes resolvem suas

pendengas escolhendo um árbitro ou juiz arbitral, que decide, definitiva e

irrevogavelmente, o conflito em questão.

Importa revelar que arbitragem não é sinônimo de arbitramento. Quem explica

a diferença é Carlos Alberto Carmona:

Sendo a arbitragem forma de solução de litígios, não se pode confundi-la com o arbitramento, verdadeiro procedimento que se promove no sentido de apurar o valor de determinados fatos ou coisas, de que não se têm elementos certos de avaliação. (CARMONA, 1993, p.22)

Observa Fiuza (1995, p. 45) que a arbitragem, enquanto equivalente

jurisdicional, “constitui espécie autônoma, ocorrendo sempre que duas ou mais

pessoas submetam suas disputas ao arbítrio de terceiro, não integrante dos quadros

do Poder Judiciário”.

Tavares (2002, p. 43) tomando os dizeres de Serpa, esclarece que, nesse

processo, as partes concordam em submeter seu caso a uma parte neutra, à qual é

atribuído poder para apresentar uma decisão em face de uma determinada disputa.

Os lados em disputa têm a oportunidade de apresentar seus fatos, testemunhas e

arrazoados, inclusive por meio de advogados, se preferirem. É utilizada nas relações

industriais, de trabalho, bem como nas relações entre comerciantes e consumidores.

Vale destacar que este instituto veio a sofrer profunda modificação legislativa,

no Brasil, com o advento da Lei n. 9.307, de 23/9/96.

Nos últimos tempos buscam uma forma mais sensata de solução de conflitos

imparcial por meio de árbitros. Esses árbitros são pessoas de confiança mútua em

que as partes nomeiam para solucionar suas contendas. Antigamente, esta

31

intervenção recaía sobre presbíteros que garantiam soluções acertadas, de acordo

com a vontade dos deuses, em face de suas transações com as divindades, ou

então buscavam a solução por meio dos anciões e sábios que apreciam os

costumes do grupo social da comunidade que pertenciam às partes.

As instituições poderão selecionar e/ou convidar profissionais conhecidos

para comporem o grupo de árbitros, desde que maiores e capazes, especializados,

independentemente de formação acadêmica e registro em sua área. Portanto, os

profissionais deverão possuir caráter e ilibada aptidão, devendo ser comprovada por

apresentação ou recomendação por outras instituições, por árbitros ou conveniados,

facultando a exigência de certidões negativas ou exames se fizer necessários.

Vale ressaltar, que é necessário que o árbitro conheça e que aceite firmar

compromisso de adesão ao Regulamento de Arbitragem e ao respectivo Código de

Ética para árbitros. Entretanto terá que aprimorar seus conhecimentos

especializados e os necessários para exercer a arbitragem.

As partes envolvidas escolhendo a arbitragem abrem mão de recorrer ao

Poder Judiciário escolhendo árbitros de sua confiança para julgamento do conflito.

Desde que tenha sido escolhida livremente pelas partes, qualquer pessoa capaz

poderá atuar como árbitro. Tanto as pessoas físicas maiores de 18 anos e capazes

quanto à pessoa jurídica podem recorrer a este instituto.

Qualquer pessoa maior, capaz, com percepção e que possa exprimir sua

vontade pode atuar como árbitro na arbitragem, desde que tenha a confiança das

partes envolvidas no conflito. Não há necessidade que o árbitro seja um profissional

de direito, necessita apenas que possua conhecimentos jurídicos, pois a arbitragem

envolve o uso de muitos conceitos legais. Assim como na justiça comum, o árbitro

deve ser independente e imparcial, bem como, não ser amigo ou ter algum

parentesco com as partes ou ter algum interesse pessoal no Julgamento da causa.

A arbitragem é um meio privado de soluções de conflitos e aparece na

ocasião em que as partes não resolveram de maneira amigável a questão. As

questões relativas a direitos que tenham valor econômico e que possam ser

comercializados ou transacionados livremente pelo seus donos, problemas advindos

de contratos em geral ou casos que envolvam a responsabilidade civil, tal como

acidentes podem ser solucionados através da arbitragem. Este instituto trata-se de

um método de natureza contenciosa e informal. O árbitro decide a controvérsia, um

especialista analisa a situação e profere sua decisão. O árbitro é nomeado pelas

32

partes ou indicado pela câmara arbitral tendo um grande conhecimento sobre o

assunto tratado.

Na arbitragem, as partes admitem que um terceiro resolva a controvérsia, que

não pode ser superada mediante acordo. Os interessados aspiram uma solução e

não necessita buscá-la na Justiça comum, pois a arbitragem é uma forma de

composição extrajudicial dos conflitos. O árbitro só pode dirimir questões se as

partes envolvidas concordarem previamente com a escolha dele, caso contrário ele

não pode adotar qualquer medida. Vale ressaltar que, se uma pessoa receber

qualquer comunicação solicitando o comparecimento em um órgão de arbitragem

tem a liberdade de não aceita-la.

A decisão adotada pelo árbitro tem a mesma eficácia que uma sentença do

poder judiciário, ou seja, é uma decisão obrigatória, que vincula as partes de

maneira definitiva. Na justiça comum, a parte que perdeu pode recorrer da decisão

para instâncias superiores. Logo na arbitragem, não são acolhidos recursos.

Contudo, havendo ofensa a determinados direitos, a decisão do árbitro poderá ser

anulada pelo poder judiciário.

Antes da decisão os árbitros tentam a conciliação, mas não protelam, caso as

partes não cheguem a um acordo, pois, se assim fosse, correriam risco de perder o

prazo de recorrer ao judiciário, caso acreditassem ser necessário, devido o instituto

da prescrição.

Vale ressaltar que a arbitragem não pode ser utilizada em matéria de Direito

de Família, Direito Penal e outros que não possuam caráter patrimonial, tendo em

vista que sua restrição a direitos passíveis de serem transacionados. É o que dispõe

o artigo 1º da Lei 9.307/96: “As pessoas capazes de contratar poderão valer-se da

arbitragem para dirimir litígios relativos a direitos patrimoniais disponíveis”. (Lei

9.307/1996).

5.4 MEDIAÇÃO

Fazem parte do nosso convívio diversos tipos de conflitos, tais como,

individuais, sociais, institucionais, empresariais, profissionais, políticos. Os conflitos

fazem parte da nossa vida. A Mediação é um processo eficaz e de bastante

33

credibilidade em solucionar controvérsias por meio de um trabalho de elevada

qualidade técnica, relacionados nos mais severos princípios éticos.

É um processo fundamentado em regras, técnicas e conhecimentos,

objetivando gerir a qualidade do diálogo entre os intervenientes em conflito no

sentido de privilegiar a resolução dos problemas que os opõem, construindo eles

próprios as suas soluções. Além disso, facilita a comunicação e a construção da

relação na regulação das situações conflituosas e um modo de acompanhamento na

tomada de decisões.

De acordo com Eliana Riberti Nazareth:

Um método de condução dos conflitos, voluntário e sigiloso, no qual um terceiro neutro, imparcial, escolhido pelas partes e especialmente capacitado, colabora com as pessoas que se encontram em um impasse, para que restabeleçam a comunicação produtiva, ajudando-as a chegar a um acordo, se esse for o caso. (NAZARETH, E., 2002, p. 311)

Entretanto, a intervenção de um entendedor da comunicação, é sem dúvida

mais célere, tem menor onerosidade e facilita o diálogo entre as partes conflitantes,

regulando as situações, mantendo e reconstruindo a relação entre eles.

A Mediação ultrapassa a solução da controvérsia, transformando uma situação

adversária em colaborativa. É um método sigiloso e voluntário, onde o encargo das

decisões cabe às partes envolvidas. Diferencia da negociação, da conciliação e da

arbitragem, constituindo-se em uma alternativa ao litígio e também um meio para

resolvê-lo.

A figura do mediador é um terceiro neutro e imparcial que, mediando uma

série de procedimentos próprios, auxiliam as partes a identificar os seus conflitos e

interesses, e a edificar, em conjunto, alternativas de solução propondo o consenso e

a consumação do acordo. Contudo, o Mediador, no desempenho de suas

atribuições, deve proceder de forma a resguardar os princípios éticos.

O exercício regular da Mediação demanda conhecimento e treinamento

específico de técnicas adequadas. O mediador deve se qualificar e aperfeiçoar,

aprimorando consecutivamente seus estilos e suas capacidades profissionais. O

profissional necessita assegurar a ética e a credibilidade do instituto da Mediação

por meio de sua conduta. Portanto o instituto motiva-se na autonomia da pretensão

das partes, necessitando o Mediador centrar sua atuação nesta premissa.

34

A Mediação sendo de caráter voluntário assegura o poder dos envolvidos de

reger, formando variados procedimentos e a liberdade de tomar as próprias decisões

no decorrer ou ao final do processo.

O mediador deverá exercer a atividade de acordo com os princípios

fundamentais já mencionados, mantendo a forma do processo de Mediação.

Publicará imediatamente se há interesse ou relacionamento que possa atingir a

imparcialidade, já que a decisão é sempre das partes envolvidas.

35

5.5 DIFERENÇA ENTRE NEGOCIAÇÃO, CONCILIAÇÃO, ARBITRAGEM E

MEDIAÇÃO

Muito comum as pessoas pensarem realizar uma Mediação, enquanto que na

verdade realizam uma conciliação ou algum outro instituto, como a arbitragem ou

negociação.

Tais institutos, embora tenham formatos consensuais de solução de conflitos,

contem várias diferenças entre si, incumbindo às pessoas deliberarem qual

metodologia mais adequada ao seu caso.

Dentre essas formas de resolver os conflitos, o grau de autonomia das

decisões dos envolvidos é o principal diferenciador entre uma e outra.

Como o processo de Mediação gera uma certa confusão entre ele e as demais

formas de gestão (ou resolução) de conflitos, passa-se a expor, sucintamente, as

principais diferenças entre os institutos em comento.

Em breve síntese, pode-se diferenciar as técnicas mencionadas de acordo

com a atuação do terceiro (em relação às partes) na resolução do litígio:

• Negociação: Terceiros não participam. As partes em conflito buscam, por elas

mesmas, a resolução do problema (autocomposição). Representantes (ex:

advogados) podem ou não participar.

• Mediação: A autocomposição é assistida, ou seja, são os próprios envolvidos

que discutirão e comporão o conflito, mas com a presença de um terceiro

imparcial, que não deve influenciar ou persuadir que as pessoas entrem em

um acordo. No processo de Mediação existe a preocupação de recriar

vínculos entre as pessoas, estabelecer pontes de comunicação, transformar e

prevenir conflitos.

• Conciliação: É a que mais confundem com a mediação, apesar dos institutos

serem distintos. Na conciliação, o conciliador faz sugestões, interfere, oferece

conselhos. Na mediação, o mediador facilita a comunicação, sem induzir as

partes ao acordo. Na conciliação, além de aproximar as partes, aconselha e

ajuda, fazendo sugestões de acordo. Na Mediação, por outro lado, o acordo

36

será apenas uma consequência e um sinal de que a comunicação entre as

pessoas foi bem desenvolvida.

• Arbitragem: É eleito um árbitro, escolhido pelas próprias pessoas em conflito,

para decidir suas divergências, utilizando critérios específicos. Não possuem,

portanto, o poder de decisão. A arbitragem difere da Mediação, pois esta

consiste em resolver os litígios por intermédio de um mediador, e as próprias

partes chegam à solução de seus conflitos. Já na arbitragem, a decisão cabe

ao juiz arbitral ou árbitro. Este não precisa ter conhecimentos jurídicos e nem

formação superior, mas deve, ao menos, ter conhecimento técnico para

resolver o problema e ser digno de confiança de ambas as partes. Para

selecionar o corpo de árbitros em uma Câmara, Corte ou Centro Arbitral,

normalmente é feita uma entrevista, uma prova objetiva para saber se a

pessoa conhece a lei que rege a arbitragem, e uma prova prática,

demonstrando a capacidade do candidato de solucionar o litígio por esse

meio.

37

6 TUTELA JURISDICIONAL DIFERENCIADA NO DIREITO DE FAMÍLIA

Crise, palavra em foco. Para citar algumas mais próximas da realidade jurídica -

crise da família, crise do Estado, crise do Judiciário; enfim, são amplos os

questionamentos nas instituições e nas áreas de conhecimento.

Os conflitos tendem a ser vistos pela sociedade, de modo geral, com

desconfiança. Eles trazem à tona o emocional, muitas vezes de uma forma que

escapa à compreensão racional e às vãs tentativas de controle. E isto assusta. A

questão que se impõe é o que será feito com os conflitos.

Atualmente, crescente é a busca de sistematização e utilização da Mediação no

gerenciamento de situações daqueles conflitos que se transformam em impasses,

sobretudo na área do Direito de Família.

No que tange às mudanças paradigmáticas na sociedade moderna, cite-se a do

paradigma da culpa para o da responsabilidade. Com o que se traduz pelo declínio

da influência da ideologia religiosa da culpa, surgem novos princípios de

organização social. Um grande salto foi dado com a introdução do princípio da boa-

fé no ordenamento e reclama-se cada vez mais pela eficácia que deve ser conferida

aos valores sociais da responsabilidade e solidariedade.

A Mediação aparece com força em tempos de mudanças culturais e de valores

que se refletem em um questionamento quanto as fronteiras do público e do privado

e da medida de interferência do Estado nas relações. Ela surge como um espaço de

análise que preserva a necessária natureza de intimidade das relações, o reconheci-

mento das diferenças e o empoderamento dos indivíduos.

O mediador deve analisar os vários níveis da comunicação e dos conflitos de

forma a buscar uma equalização dos poderes, agindo como um catalizador das

relações. O princípio metodológico é o de construção conjunta de conhecimento,

uma reflexão que requer o reconhecimento e a valorização do ponto de vista dos

integrantes do sistema e o respeito à autonomia do outro.

No modelo anterior, de família, matrimonializado, patrimonializado e

sacralizado, e com grande influência do Estado, os papéis e as funções estavam

claramente definidos. Tal modelo custava não só a exclusão daqueles que a ele não

se adaptavam, como um alto nível de hierarquia e controle das relações.

38

As mudanças na sociedade em geral e nas configurações familiares trazem a

questão ética em como colaborar com as famílias em sua reorganização, uma vez

que há crescente consciência de sua importância fundamental para a saúde mental

dos indivíduos e da sociedade. São necessárias novas leis, novos ordenamentos

indiscutivelmente de uma nova abordagem das transformações familiares e

separações.

Tome-se o exemplo da nova Lei n° 11.441/2007, que facilita as separações

consensuais e sem filhos menores em cartórios. Um grande avanço que não pode

estar somente a serviço de desafogar o Judiciário e para o qual não basta apenas a

mudança de lugar, exigindo uma nova postura dos profissionais na função de

cartorários e advogados. A mudança deve implicar na diminuição da "cultura do

litígio" e sua substituição pela cultura da Mediação, o que não se dá por decreto,

mas sim com a formação de um novo profissional.

Toda separação traz um luto e, seja no Judiciário, seja nos cartórios, há a

necessidade de colaboração e respeito para que os pares possam elaborar as

perdas trazidas pela separação conjugal. Esta necessidade é ainda mais imperiosa

quando deve ser preservado o casal parental - uma aplicação bastante difundida da

Mediação. Não há dúvida que a metodologia jurídica tradicional é precária para

atender a essas e outras demandas.

Segundo a advogada especialista em Direito de Família Águida Arruda Barbosa

(2007, p. 160), para a Psicanálise, o desenvolvimento do ser humano se dá

continuamente pelo conflito e pela transformação do conflito, sendo este inerente à

nossa natureza e constitutivo do ser humano. A sua resolução não implica em seu

desaparecimento, e sim em sua transformação, em sua elaboração. E também no

entendimento do que é o conflito e da dinâmica que lhe é própria que a Psicanálise

tem valiosa contribuição a dar à Mediação, pois é a ciência que procura justamente

acompreensão dos impasses da intersubjetividade e a atribuição de um novo sentido

aos conflitos.

Ainda de acordo com Barbosa (2007, p. 160), de modo geral, os conflitos

podem ter várias naturezas, sendo sempre multideterrninados, podendo ir do

existencial ao patológico, tendo várias molduras, ganhando diversos enquadres e

expressando-se em áreas que não se excluem mutuamente: conflitos intra e

interpessoais, conflitos que se exteriorizam nas relações familiares; nas relações

sociais, conflitos conscientes e inconscientes.

39

Quando os conflitos ultrapassam a capacidade, quer do indivíduo quer do

sistema, seja este a família, ou as relações sociais, em lidar com eles, passa a ser

necessária a colaboração de um terceiro. Pode haver necessidade de uma

psicoterapia, quando os conflitos se transformam em sintomas psíquicos, de um

redimensionamento dos papéis e de seu reconhecimento e sua resignificação legal,

seja no Judiciário - quando se transformam em impasses, seja nos cartórios. O

privilégio a uma destas visões vai também depender do profissional que recebe um

cliente ou paciente em busca de ajuda e lhe interpreta o conflito, apontando um

caminho para sua transformação. Claro está que, da parte do profissional, é

fundamental a visão que este tem do que é o conflito e do conhecimento que possui

dos níveis de sua abrangência e de suas consequências.

Em geral, as famílias levam seus impasses aos escritórios de advocacia, que

tendem a lhes dar um tratamento de modo a enquadrá-los na moldura legal,

tentando transformar o subjetivo em objetivo, o que pode acabar por mutilar ou dar

um valor inadequado para os aspectos emocionais. As duas possibilidades de

abordagem dos conflitos conhecidas por estes profissionais são o litígio e a

conciliação. Com estas abordagens, a emoção pode ser cooptada muito mais para

firmar posições jurídicas, e o resultado pode ser o acirramento do conflito, ou sua

repressão, por meio de uma atitude conformista. No último caso, a tendência é que o

conflito venha a emergir, posteriormente, com igual ou maior força.

Na área do Direito de Família, a subjetividade, de forma científica, foi aos

poucos e timidamente se fazendo presente. Atualmente, vê-se um crescente

prestígio dado aos pareceres do denominado setor psicossocial, mas que,

absolutamente, não atendem a necessidade de uma dinâmica de Mediação. Todo

cuidado é pouco para que não se confunda a dinâmica e finalidade das avaliações,

não desconsiderando, inclusive, seu caráter persecutório e de sigilo relativo, com a

dinâmica da Mediação.

A abordagem dos conflitos no Judiciário obedece a três lógicas: a lógica da

força, a lógica da conciliação e a lógica da Mediação.

A utilização dessas lógicas se dá segundo a visão que se tem do conflito, e da

família em transformação. Na lógica da força, um ganha e o outro perde. Acredita-se

que o conflito se resolve e não pode ser contemplada a visão da família como um

sistema em que as partes são interdependentes. A lógica da força é a da sentença

produto de um litígio. A lógica da Mediação é aquela em que o sistema é

40

considerado em seus aspectos subjetivos, e como um todo maior do que a soma

das partes, no qual o ganho ou a perda de um dos elementos afeta, direta ou

indiretamente, os demais.

É certo que as questões de aplicação e expansão da Mediação são espinhosas,

o que não exime os mediadores da responsabilidade pela sua difusão judicial e

extrajudicial, como prática de desenvolvimento da cidadania, de promoção de saúde

mental social e de diminuição do sofrimento social.

A Mediação deve ser o princípio que rege a comunicação equânime entre as

pessoas, levando em conta seus interesses e diferenças, fomentando o

fortalecimento dos laços sociais, o desenvolvimento dos laços intersubjetivos e dos

recursos pessoais. Através dela, amplia-se o conhecimento dos aspectos racionais e

emocionais do conflito, de modo a desenvolver a autonomia e responsabilidade

pelas decisões. O acordo é apenas uma das possibilidades do resultado da

Mediação.

A Mediação, difundida como uma nova profissão ou mesmo como forma de

desafogar o Judiciário, é uma via de escoamento da demanda feita a um sistema em

crise. Mas, felizmente, a Mediação vai muito além, e estas são questões que

merecem cuidadosa atenção, dado o engano a que ensejam.

A Mediação é porta-voz de um novo paradigma e sua presença no cenário

jurídico contribui para a formação e prática dos operadores do Direito para além da

cultura do litígio.

Na Mediação encontra-se um profícuo campo que visa a compreensão e busca

de sentido para as angústias e os conflitos. Esse percurso aponta para uma forma

de ampliar a ação social junto às famílias em transformação.

6.1 MEDIAÇÃO FAMILIAR COMO FORMA ALTERNATIVA DE RESOLUÇÃO DAS

CONTROVÉRSIAS FAMILIARES

A Mediação Familiar é uma modalidade extrajudicial de resolução de conflitos

parentais em que o casal, com a sua participação pessoal e direta, são

auxiliados pelo mediador a alcançar um acordo.

41

Atualmente, a Mediação Familiar tem o seu âmbito de atuação sob conflitos

emergentes da regulação, alteração e cumprimento.

A competência da Mediação Familiar é alargada, para poderem ser mediados

por esta via quaisquer conflitos familiares de diversas ordens, entre as principais

destacam-se:

• Divórcio e separação de pessoas e bens;

• conversão da separação de pessoas e bens em divórcio;

• reconciliação de cônjuges separados;

• separação de bens;

• atribuição e alteração de alimentos, provisórios ou definitivos;

• partilha de bens;

• autorização para o uso do sobrenome do ex-cônjuge.

A Mediação Familiar tem sua especificidade, pois é voltada à condução de

conflitos que envolvem níveis diversos de complexidade, em que psíquico e intra-

psíquico exercem papel preponderante.

No entanto, cabe ressaltar que a Mediação se aplica a qualquer contexto de

relação humana, desde as relações comerciais, como às de vizinhança, de

comunidade, entre países, etnias etc.

Como esta monografia versa sobre “Mediação Como Proposta De Resolução

De Conflitos Familiares”, apresenta-se a Mediação de forma a mostrar como se dá o

procedimento passo-a-passo.

Desse modo, o profissional que se interessa pela Mediação poderá ter uma

noção de suas etapas de desenvolvimento.

A seguir, esclarece-se muitos dos aspectos mais aplicáveis à Mediação

Familiar.

6.2 CONCEITO

Inequivocamente, a Mediação constitui instrumento eficaz e rápido de resolver

os conflitos, especialmente na área do Direito de Família.

42

A Mediação procura encontrar métodos que possibilitem uma convivência

pacífica, pelo que se torna imprescindível transmitir a todos formas mais apropriadas

para resolverem-se problemas.

EIiana Riberti Nazareth define Mediação como:

Um método de condução de conflitos, voluntário e sigiloso, no qual um terceiro neutro, imparcial, escolhido pelas partes e especialmente capacitado, colabora com as pessoas que se encontram em um impasse, para que restabeleçam a comunicação produtiva, ajudando-as a chegar a um acordo, se esse for o caso. (NAZARETH, E., 2002, p. 311)

Para Waldyr Grisard Filho a Mediação é

um método por meio do qual uma terceira pessoa, neutra e imparcial, ajuda as partes envolvidas em um conflito a restabelecer a comunicação, para que possam construir um acordo reciprocamente satisfatório, que ponha termo às divergências, conferindo uma certa ordem no caos. (GRISARD FILHO, 2008)

A Mediação tenta fazer com que a sociedade – plena de mudanças e

conflitos – busque soluções rápidas e eficientes que permitam uma melhor

comunicação entre seus integrantes. Tenta encontrar métodos que possibilitem uma

convivência pacífica, pelo que se torna imprescindível transmitir a todos os níveis

sociais os conhecimentos vinculados às formas mais apropriadas para resolverem-

se problemas.

Uma sociedade em crise necessita transmitir esses conhecimentos a partir de

todas as suas instituições, especialmente as governamentais, porquanto é numerosa

a demanda de pessoas que se apresentam diariamente com conflitos que não

sabem resolver, por não terem conhecimentos básicos de relações humanas.

Tendo em conta os conceitos enunciados e que a realidade se constrói,

estando nas mãos dos protagonistas a sua modificação, considera-se o instituto da

Mediação como sendo uma técnica de resolução pacífica de conflitos, que nos

países em que já foi implantado se desenvolveu nas últimas décadas, propiciando

muitos benefícios.

43

Seu aprendizado implica o acesso a conhecimentos práticos que expandem,

de forma notável, a capacidade para uma melhor comunicação e também para

gerar, de modo integrativo, opções mais amplas e elaboradas para a solução dos

problemas que se apresentam cotidianamente, quer seja na realidade do trabalho,

da família, entre vizinhos, nos negócios, na escola etc.

Na Mediação utilizam-se técnicas de resolução de conflitos que procuram

alcançar um acordo embasado nos interesses reais dos indivíduos, os quais mantêm

seu poder de decisão, porquanto são eles, e não um terceiro, que elaboram a

solução para o seu caso.

A Mediação é um processo no qual um terceiro, imparcial, dá assistência às

pessoas em conflito com a finalidade de que possam manter uma comunicação

produtiva, à procura de um acordo possível para elas.

Diz-se que é um processo uma vez que tem um desenvolvimento lógico e

organizado; alternativo, pelo que constitui a via jurisdicional, já que não colide nem

compete com o procedimento judicial, mas que é outra opção para a resolução dos

conflitos que se apresentam entre os particulares. É voluntário, o que significa que

as pessoas em conflito decidem ou não participar no mesmo, e podem pôr um

término a essa instância se considerarem que isso é mais benéfico aos seus

interesses. Ademais, não estão obrigadas a chegar a um acordo.

Patrícia Monica Marino (2002), diz que em alguns ordenamentos jurídicos foi

feita a implementação do instituto da Mediação como uma etapa pré-jurisdicional

obrigatória, com o que o haver alguém concorrido à Mediação constitui um trâmite

prévio à iniciação de todo julgamento. Para os fins de creditar-se ao cumprimento do

trâmite da Mediação, o requerente deverá acompanhar a ata final que houver

expedido o Mediador, na qual deverá constar que não se chegou a um consenso,

não tendo havido acordo, ou então que alguma das pessoas arroladas no conflito

não compareceu.

EIiana Riberti Nazareth (2002, p. 310), entende que a Mediação pode ser

concebida de duas maneiras: como técnica e como procedimento. Como técnica,

pode contribuir com outros métodos de condução de conflitos, como a Conciliação e

a Arbitragem, auxiliando-os a melhor formular acordos ou soluções mutuamente

satisfatórios às partes em conflito. Como procedimento, sobretudo o modelo mais

complexo que é o da Mediação Familiar, tem fases que compõem todo um processo.

44

Ainda como procedimento, pode ser aplicado a dois planos distintos de

emergência do conflito.

O primeiro plano refere-se ao sistema de profissionais e consiste em o

mediador trabalhar os conflitos suscitados na equipe dos que atuam com as pessoas

e famílias em crise. É o que pode-se chamar de "Mediação-suporte". O objetivo é

desenvolver nesses profissionais a habilidade e capacidade de compreensão e

continência emocional necessárias ao atendimento. Frequentemente há a produção

na equipe de conflitos que guardam semelhança com os conflitos originais, isto é,

com os conflitos daquelas famílias ou casais merecedores de atenção.

Denominados conflitos por procuração, são na maioria das vezes inconscientes.

O segundo plano refere-se à "Mediação-direta", isto é, quando o mediador

interfere diretamente nos sistemas em crise.

Pode ser global ou parcial, enfocando todos ou somente alguns aspectos de

uma situação.

Pode ser paraprocessual ou não guardar relação alguma com o processo

judicial. A Mediação pode incidir em qualquer momento da emergência de um

conflito.

Marino (2002) dispõe que a Mediação possui duas características: flexível e

confidencial.

Diz-se que é flexível, já que não é solene, porquanto não se devem cumprir

formas rígidas tais como num processo judicial. Se bem que o Mediador determina e

faz respeitar pautas que levam a um bom desenvolvimento do procedimento, não

existem formalismos nem formulações intangíveis.

É de fundamental importância o caráter de confidencialidade, que significa

que o Mediador não poderá revelar o que sucedeu nas sessões, ou seja, que não

poderá ser citado como testemunha na hipótese de que o conflito dê origem ou

prossiga uma causa judicial, nem poderá comentar com terceiros alheios ao âmbito

da Mediação o que tomou conhecimento por ocasião do exercício da sua função.

Tampouco poderá revelar à outra parte o que lhe foi confiado numa sessão

privada, salvo se tivesse expressa autorização para fazê-lo.

A confidencialidade alcança todos quantos se encontraram na sessão de

Mediação. Assim, as pessoas em conflito, e os observadores, se os houver, deverão

guardar sigilo acerca do que conhecem neste particular.

45

Este princípio se vê garantido pela assinatura do "Convênio de

Confidencialidade" que será subscrito no momento de começar-se a Mediação.

6.3 ORIGEM DA MEDIAÇÃO

Grisard Filho (2008) ensina que o sentido de Mediação pode ser melhor

entendido através da definição elaborada pelo Centro Nacional de Mediação da

França, e que foi inserida no Código de Mediação francês, que a considerou como

sendo "um procedimento facultativo que requer a concordância livre e expressa das

partes concernentes de se engajarem numa ação (Mediação) com a ajuda de um

terceiro independente e neutro (mediador) especialmente formado para esta arte. A

Mediação não pode ser imposta. Ela é aceita, decidida e realizada pelo conjunto dos

protagonistas”.

Quanto a origem da Mediação, na modalidade de resolução extrajudicial de

conflitos matrimoniais, Grisard Filho (2008) diz ter ocorrido nos Estados Unidos da

América, na segunda metade da década de 70, evoluindo rapidamente para a

regulação das questões de guarda, visitas e suporte aos filhos menores e demais

questões decorrentes da ruptura conjugal. O fenômeno logo atingiu o Canadá, onde

existem serviços de Mediação tanto de caráter privado como público, como o

instituído pelo Governo de Quebec em 1997. Na Europa, a Grã-Bretanha foi pioneira

na criação de centros de Mediação Familiar, em Bristol, em 1976, atingindo mais

tarde todo o país, diante do incremento do número de divórcios. Na Europa

continental, criaram-se serviços similares na França, Áustria, Alemanha, Bélgica,

Finlândia, Itália, Polônia, Noruega e Suécia. Na Espanha, os primeiros serviços

surgiram nas comunidades da Catalunha e País Basco, seguidos pelo Município de

Madrid. Em Portugal, a primeira estrutura apareceu em 1993, criada pelo Instituto

Português de Mediação Familiar. No ano de 1997, foi celebrado um protocolo de

colaboração entre o Ministério da Justiça e a Ordem dos Advogados, com o

propósito de implantar um serviço de Mediação Familiar em matéria de regulação do

exercício do poder paternal (como lá se chama o velho pátrio poder), limitado,

porém, à Comarca de Lisboa.

46

6.4 OBJETIVOS DA MEDIAÇÃO

EIiana Riberti Nazareth (2002, p. 310), faz uma esclarecedora análise dos

objetivos da Mediação, aos quais aqui passa-se a expor:

• Fomentar relações mais harmoniosas dentro das condições possíveis →

Poder ser escutado e conseguir acertos referente a questões aparentemente

inconciliáveis, resulta em alívio importante de angústia e sofrimento. De

acordo com Homes e Rahe (1967), o divórcio ocupa o segundo lugar no

ranking dos acontecimentos estressantes. Antes dele, vem somente a morte

do companheiro. Depois dele, vem a morte de amigos queridos e a própria

prisão.

• Estimular a autodeterminação da família → Em um processo de

separação, observa-se o alijamento cada vez maior das pessoas em relação

a decisões fundamentais concernentes às suas próprias vidas.

• Determinar dentro do "melhor interesse da criança" o que é mais

adequado → Há os aspectos gerais desse princípio, porém há os

específicos, que são derivados dos diferentes momentos da vida da criança e

dos pais, de sua origem social, cultural, étnica e do tipo de família de origem

de cada um dos genitores (que é o que fornece os substratos para o exercício

das funções e papéis paterno e materno). Em outras palavras, a Mediação

permite que sejam avaliadas e estabelecidas as melhores condições de

atendimento às necessidades da criança.

• Equilibrar os "tempos" → As pessoas possuem tempos diferentes de

amadurecimento do desapego, isto é, evoluem diferentemente frente à

separação. Observa-se que quem pede a separação a elabora e amadurece

mais rapidamente, pois, na verdade, a idéia de separar-se está presente em

seu imaginário muito tempo antes de ser verbalizada.

47

• Discriminar o que é de ordem legal e o que é de ordem emocional →

Essas duas ordens se confundem nos momentos de crise. Muitos, quando se

separam, alimentam a ilusão de que "ganhando uma ação" estarão sendo

ressarcidos dos prejuízos emocionais sentidos e temidos. Poder-se-ia então

dizer que a meta da Mediação é fornecer as condições mínimas para que as

pessoas, em situação de crise, passem a operar de uma maneira mais

madura.

Tem-se então uma síntese dos objetivos, que seriam:

• Evitar decisões precipitadas;

• soluções das partes e não de terceiros;

• esclarecer as reais necessidades e interesses;

• visar a responsabilização, cooperação e respeito mútuo;

• flexibilização dentro da organização e relação familiar.

6.5 NATUREZA JURÍDICA DA MEDIAÇÃO

A teoria sobre a natureza jurídica da Mediação mais aceita pela doutrina é a

de que ela é de natureza contratual.

A natureza jurídica seria contratual posto as vontades das partes de contratar

um profissional para que este as auxilie na solução de seus conflitos.

Várias são as características da Mediação que a tornam similares a um

contrato:

• É contrato de prestação de serviços, pois de comum acordo contratam

um mediador para prestar-lhes assistência na solução do conflito.

• É um contrato plurilateral, por estarem ajustadas no mínimo 2 (duas)

pessoas físicas ou jurídicas mais o mediador.

• É consensual, uma vez que nasce do consenso entre as partes

envolvidas

48

• É informal, pois as regras são flexíveis de acordo com os interesses das partes.

• Oneroso, uma vez que o serviço é prestado mediante a remuneração de profissional

contratado.

• Tal como um contrato, através da manifestação de vontade das partes, extingue,

cria, ou modifica direitos; baseia-se no princípio da boa-fé, na autonomia das

vontades etc;

• Só é valido se o objeto for lícito e não defeso em lei.

E, como contrato, há que se pensar, a partir de seus princípios norteadores,

os seguintes requisitos mínimos:

• Qualificação completa das partes e dos seus advogados, devendo

estes apresentarem os documentos legais que lhes conferem poderes

de representação legal, nos termos da lei;

• Qualificação completa do mediador e do co-mediador, se for o caso de

co-Mediação;

• Regras estabelecidas para o processo;

• Número indicativo de reuniões para o bom andamento do processo de

Mediação;

• Honorários, bem como as despesas incorridas durante a Mediação, e

formas de pagamento, os quais, na ausência de estipulação expressa

em contrário, serão suportados na mesma proporção pelas partes;

• Dispositivo de que qualquer das partes, assim como o mediador, pode,

a qualquer momento, retirar-se da Mediação, comprometendo-se a dar

um pré-aviso desse fato ao mediador, e vice-versa.

• Disposição obrigatória de cláusula de confidencialidade absoluta

referente a todo o processo e ao conteúdo da Mediação, nos termos da

qual as partes e o mediador se comprometem a manter em total sigilo

a realização da Mediação e a não utilizar em qualquer informação

documental ou não, oral, escrita ou informática, produzida durante ou

em resultado da Mediação, para efeitos de utilização posterior em juízo

arbitral ou judicial.

49

Como visto, na Mediação estão presentes os elementos formadores do

contrato. Desde que o negócio jurídico não constitua sanções penais e que não

atente contra a moral e os bons costumes, poderá

Sobre a natureza contratual da Mediação Eiras assim se manifesta:

A natureza jurídica da Mediação é contratual, destacando Cachapuz que é firmada na soberania da vontade das partes, criando, extinguindo ou modificando direitos, devendo constituir-se de objeto lícito e não defeso em lei, razão pela qual estão presentes os elementos formadores do contrato, tem como objeto o comportamento humano, pois sua finalidade é a resolução dos conflitos relativos à interação do ser na sociedade. (EIRAS, 2007 apud CAPACHUZ, 2003, p. 41)

Eliana Riberti Nazareth e Maria Barbosa Antonieta Pisano Mota (1998)

definem a natureza jurídica da Mediação como sendo extrajudicial e multidisciplinar.

A Mediação é de natureza extrajudicial e multidisciplinar, com autuação de profissionais de diversas áreas, como psicólogos, advogados, psiquiatras, assistentes sociais. (NAZARETH; MOTA, 1998, p.26)

6.6 O PAPEL DO MEDIADOR

Sendo um terceiro imparcial, o Mediador é quem dará assistência às partes.

Terá que manter-se atento à linguagem não apenas oral, mas também de atitudes.

O Mediador está especialmente capacitado a facilitar a comunicação entre as partes.

Em consequência, não poderá assessorar as partes, tarefa que,

necessariamente, deve ser realizada por um profissional da advocacia. Este

advogado de partes tem o inarredável trabalho de proteger os interesses do seu

cliente, informando-o acerca de seus direitos. Enquanto o Mediador leva adiante o

procedimento, o advogado conserva seu papel, já que é ele – e não outro – quem

assessorará legalmente seu cliente, e analisará as vantagens ou desvantagens do

possível acordo. Dada a importância que tem o tema do papel do advogado na

Mediação, é ele de suma importância no processo de Mediação.

50

O Mediador lida com pessoas em conflito, no sentido de ser humano integral,

que tem pensamentos, sentimentos e emoções próprias, que tem vontades, que

aspira a resolver seus problemas porque padece por tê-los. Por isso, no âmbito da

Mediação devem ter uma atitude colaborativa, na procura de solução para seus

conflitos, não deve ver o outro como um adversário, mas como alguém com quem

tem diferenças que não necessariamente devem ser insondáveis e que – talvez –

possam ser complementares para um acordo mais benéfico.

O Mediador não lida com partes (autor contra demandado), porquanto no

processo judicial é assim que se as denominam, sendo isto descritivo de que seus

protagonistas se situam em posições totalmente antagônicas, atitude que não é

produtiva num processo de Mediação. Estas pessoas que se apresentam à

Mediação têm um conflito, uma divergência percebida de interesses.

Considerando as percepções como um dos elementos que podem estar

provocando o conflito, ou seja, considerando que o conflito tem um componente

subjetivo, que desempenha um papel preponderante. Se for possível a modificação

ou a conscientização dessa percepção, que é subjetiva, é viável a troca da

predisposição confrontativa para uma atitude colaborativa.

É tarefa do Mediador conseguir que as pessoas em conflito tenham bem claro

quais são seus interesses e quais são os que podem complementar-se. Em muitos

casos chega-se à conclusão de que as diferenças não têm sustentação real ou

objetiva, mas que o conflito se originou de uma percepção errônea, com o que o

processo mediativo tenderá a possibilitar a modificação das percepções

equivocadas que impediam que as pessoas tivessem uma atitude colaborativa.

No âmbito da Mediação buscar-se-á que as pessoas em conflito possam

manter uma comunicação produtiva, que é nem mais nem menos que elas possam

expressar claramente os antecedentes do problema, que é que ocorreu, como cada

uma delas o percebeu, como lhe afetou e por que; como uma contrapartida, isto

outorga a possibilidade de que o outro escute e talvez se inteire pela primeira vez

daquilo que sente ou necessita. A Mediação permite que o "ser humano integral"

tome assento à mesa, que possa dizer o que sente e o que quer, possibilita ser, por

sua vez, ouvido também. o Mediador, por meio de técnicas, fará com que o que se

disse seja cumprido, purificado de cargas emotivas negativas, e que se cumpram

pautas de respeito.

51

Geralmente o que ocasionou o conflito é a impossibilidade de conversar ou a

errônea interpretação do que foi dito, por isso a tarefa primeira do Mediador é fazer

com que as partes restabeleçam a comunicação e que compreendam o que dizem e

o que escutam, sem aditamentos emocionais que podem prejudicar a captação do

que realmente sucede ou se pretende.

O Mediador deve atuar como um elo entre os interessados, fazendo com que

a comunicação efetue uma troca positiva na situação problemática que se

apresenta, e procurar um restabelecimento das boas relações humanas – como

condição primeira – e assentando as bases sobre as quais se possa elaborar um

acordo.

O fim último da Mediação é que as partes cheguem a um acordo, que com

fundamento nas coincidências e possibilidades se estabeleçam os eventos a serem

cumpridos por cada uma das pessoas, para liberá-las do conflito.

Durante a Mediação, o Mediador clariará quais são as necessidades e

interesses dos participantes, que podem ser comuns – quando a todas as pessoas

envolvidas interessar satisfazer, e nas quais todos podem cooperar – especiais –

quando são de cada pessoa e o outro pode satisfazer – e contrários ou em luta –

quando são opostos às pretensões de outros, pelo que serão matéria de uma

negociação que seja satisfatória para todos.

O acordo e seu posterior cumprimento põe fim ao conflito; na sua redação se

deverão consignar, claramente, quais são as intenções dos subscreventes, em

virtude do que deve ser redigido numa linguagem clara e concreta, que não dê

margem a interpretações que sejam fontes de futuros conflitos.

As pessoas envolvidas são as donas do acordo, já que elas pactuarão

livremente as contraprestações a serem cumpridas, tendo como única limitação o

que não seja contrário à Lei. É aqui onde o advogado tem especial importância, já

que dele surgirá o assessoramento e a redação eficiente, para fazer-se um bom

acordo com base nos conceitos trabalhados durante a Mediação.

Deve ser possível, ou plausível, viável, ou seja, que seu cumprimento possa

concretizar-se, porque um acordo que estabeleça obrigações de cumprimento

impossível não será senão a origem de novos problemas.

Analisando o papel do mediador, pode-se aferir pelo exposto, que são

condições básicas para poder mediar:

• Querer resolver o problema;

52

• estar disposto a colaborar;

• dizer a verdade e ser sincero;

• respeitar-se mutuamente;

• ter boa comunicação;

• ser confiável;

• ser ponderado;

• ter uma visão aberta;

• ser paciente;

• conhecer o comportamento humano;

• ser observador

A atividade de retirar o olhar dos mediandos, focado no passado e no

presente para libertá-los a enxergar o futuro, é atividade que requer muito estudo,

informação criteriosa e formação. Trata-se de um conhecimento organizado, de

natureza interdisciplinar, que se agrega ao direito para ampliar a sua atuação e

eficácia.

O conteúdo da Mediação Familiar é o próprio Direito de Família, amplificado

com lentes que lhe outorgam outra dimensão, exigindo a atuação de profissionais

especialmente formados para este mister.

O que tem ocorrido, com muita frequência, é que os profissionais das

profissões jurídicas não identificam a Mediação como um conhecimento

interdisciplinar, e, com isso, não compreendem o alcance da prática deste princípio.

E o que tem ocorrido com o enquadre da Mediação na lei.

A atividade do mediador é um comportamento. Ela consiste em uma dinâmica

que envolve mediador e mediandos numa linguagem comum e peculiar, que, numa

comunicação proveniente de cuidados mútuos, acarreta o deslocamento do olhar,

até então, paralisado sobre o passado e o presente, para se lançar ao futuro,

permitindo que os conflitantes abram-se a um projeto de vida. Este projeto pode ser

desenhado com as mais variadas nuances, porque a criatividade é o mote propulsor

deste movimento.

Os mediandos poderão ter um projeto comum, a exemplo da organização do

casal parental, e também poderão se lançar sobre projetos pessoais que não

53

encontravam espaço para eclodir, devido ao comportamento que os fixava sobre o

conflito.

Para ser mediador é preciso ter técnica, mas a Mediação também se expressa

como comportamento de juízes, advogados, promotores de justiça e das partes.

Este é o espírito da Mediação, disponível para todos.

6.7 PRINCÍPIOS ÉTICOS BASILARES DA MEDIAÇÃO

Alguns princípios constituem verdadeiras diretrizes a fim de resguardar a ética

da Mediação.

Eiras (2007) apresenta os seguintes princípios éticos da Mediação elencados

por Rozane Cachapuz (2003, p. 35) que direcionam o atuar do mediador, são eles:

imparcialidade, flexibilidade, aptidão, sigilo, credibilidade e diligência.

• Princípio ético da Imparcialidade - centra-se na figura do mediador. Tem o

papel de conduzir as partes na resolução do litígio, pela imparcialidade que

assume, não deve se envolver pessoalmente nas questões conflituosas, do

início ao fim do processo de Mediação, violando essa regra, tornar-se-á

impedido a exercer a função de mediador.

• Princípio ético da Flexibilidade – No processo de Mediação pode ser que

ocorram situações novas que redirecionem completamente a resolução do

conflito. O mediador deve apresentar às partes as alterações que se

apontam, dar a elas o redimensionamentos dos fatos. Todas as

possibilidades passadas, presentes ou futuras devem vir a tona. O espírito de

flexibilidade não pode ser afastado do mediador.

• Princípio ético da Aptidão – O mediador deve avaliar se possui capacidade

técnicas (conhecimento do assunto) para desempenhar a função de

mediador. Deve se auto dignosticar se possui condições para ser mediador

no caso concreto. Se nesse diagnóstico considerar-se capacitado para

54

conduzir as partes a um bom acordo, estará apto a assumir o compromisso,

caso contrário, deve recusar-se.

• Princípio ético do Sigilo – O conflito não diz respeito a terceiros, sendo

assim os mediandos devem ser poupados da exposição do problema a

terceiros não participantes do processo de Mediação. A todos os participantes

do processo quer partes, assistentes, advogados ou, e principalmente, o

mediador, é vedado revelar ou divulgar qualquer informação a respeito da

Mediação, seja ela de qual ordem for.

• Princípio ético da Credibilidade – Pauta-se na confiança que as partes

depositam sob o profissional escolhido para conduzir o processo de resolução

de seus conflitos. Esse vínculo de confiança entre mediador e mediados é

reforçado à medida que a Mediação vai acontecendo. Quanto maior for a

confiança das partes no mediador, maior será as chances do acordo ser bem

recebido por elas.

• Princípio ético da Diligência – Diligência é palavra de vários significados. O

portal jurídico Jus Brasil, dentre uma dessas várias definições, define

diligência como a atenção ou cuidado aplicado pelo agente ou pela pessoa

que executa um ato ou procede num negócio, para que tudo se cumpra com a

necessária regularidade. Pautando-se por esse conceito, deve o mediador

aplicar todas as normas impostas ao instituto, tomando várias precauções

para assegurar a qualidade do processo, tais como: preparação, cuidado,

atenção, estudo, formalidades do procedimento, observação estrita da

legislação vigente, celeridade, qualidade dos seus serviços, evitar

procrastinações.

56

7 VANTAGENS E DESVANTAGENS DA MEDIAÇÃO

7.1 VANTAGENS DA MEDIAÇÃO

É possível se ter uma idéia de quais são as vantagens e desvantagens do

processo de Mediação.

Inúmeras são as vantagens da Mediação, dentre elas destacam-se as

seguintes:

• Confidencial e Imparcial;

• Voluntária e não-adversarial;

• Promove o diálogo;

• Reestabelece relações de confiança, respeito e valorização do outro;

• Procura de acordos equilibrados.

• Rápida;

• Consensual;

• Evita a manutenção do conflito;

• Facilita a comunicação do casal antes, durante e após uma separação;

• Gera alternativas criativas;

• O mediador é escolhido pelas partes, o que lhe confere maior confiança e

credibilidade;

• Acordos são construídos pelas pessoas; portanto, são mais duradouros,

pois atendem suas necessidades, evitando o aparecimento das chamadas

"ações-filhotes".

• Auxiliar o Poder Judiciário, diminuindo o número de processos deste e

promovendo a justiça;

• É uma justiça confidencial, a qual guarda segredos;

• Expressa a confiança de julgamento.

• Por ser mais rápida, é uma justiça mais barata;

• Há flexibilidade;

• Cada caso é considerado à parte;

• Há autonomia e controle do procedimento;

57

• Sentimento de justiça viabilizado pelo acordo de que todos saíram

ganhando;

• Resolve pendências do passado, vislumbrando um futuro mais harmônico;

• Evita os desgastes dos foros, acumulo de ações judiciais;

• Evita o aumento do conflito;

• Na Mediação é preservada a integridade física, moral, social econômica e

psicológica da família;

• Mantém-se a dignidade sem desgastes emocionais;

• Contribui para desafogar o judiciário;

• Satisfaz a vontade das partes;

• Como trata-se de um consentimento de vontades, é maior a probabilidade

do cumprimento dos acordos mediados;

• Para os advogados é uma nova oportunidade de trabalho;

• Contribui para a pacificação social;

• Há gratificação pessoal pela concorrência de vontades;

• A privacidade é poupada pela não-interferência estatal;

• Como são os próprios interessados que resolvem, o resultado torna-se

inquestionavelmente melhor;

• Sentimento ‘justiça” de uma forma muito mais concreta;

• Há prevenção de conflitos futuros;

• Estimula a cooperação e o convívio pacífico das partes;

• Mitiga os conflitos;

• Poupa as as crianças de tensões;

• Todas as partes podem ficar satisfeitas com a justiça oferecida pelo acordo

onde a feitura adveio de sua criação;

• O casal aprende a trabalhar para benefícios mútuos onde trocas honestas

de informações são feitas;

• A auto estima é desenvolvida como resultado de sua habilidade em tomar

para si a responsabilidade da resolução de seus próprios conflitos;

• Proporciona menor possibilidade de futuros conflitos em função do grande

compromisso das partes no acordo e o conhecimento de que têm condição

de cooperar

• Existem menos gastos com honorários advocatícios e custos processuais;

58

• O controle do processo permite a estimativa de tempo pelas partes;

• Mostra às partes como é mais vantajoso um espírito mais propenso ao

desarmamento do que à beligerância.

7.2 DESVANTAGENS DA MEDIAÇÃO

É difícil apontar desvantagens no processo de Mediação, porém elas existem

e são bem poucas, felizmente. Desta feita, apesar de existirem algumas

desvantagens no processo de solução extrajudicial de litígio denominado de

Mediação, estas não são representativas e não superam os benefícios decorrentes

das inúmeras vantagens de solucionar um conflito por meio da Mediação.

Podem ser consideradas desvantagens na Mediação:

• O sistema só pode funcionar mediante a boa-fé de todas as partes;

• Quando não é possível eliminar os efeitos do desequilíbrio de poder o

processo é impossível;

• Em caso de litígio: limitações no recurso à força pública

• Consubstancia-se num acordo reduzido a contrato

• O mediador não tem o poder de obrigar a participação das partes;

• A Mediação não tem as devidas salvaguardas processuais;

• A Mediação não produz obrigações legais;

• A Mediação não aplica ou desenvolve normas públicas;

• As emoções podem ser muito fortes para permitir que os envolvidos

trabalhem as questões de forma racional.

59

8 MEDIAÇÃO INTERDISCIPLINAR

Não há como compreender a atividade da Mediação e a atividade do

mediador sem levar em conta sua natureza multidisciplinar, em que concorre a

atuação de profissionais de diversas áreas, como psicólogos, advogados,

psiquiatras, assistentes sociais.

Concebida como uma transdisciplina, a Mediação utiliza conhecimentos de

várias disciplinas, como a Psicologia, a Psicanálise, a Teoria Geral de Sistemas, a

Teoria do Conflito, o Direito, a Sociologia etc.

A diferença essencial entre as vertentes americana e européia, centra-se no

âmbito de abordagem do tema. Enquanto a busca de resolução de conflitos possui

natureza unidisciplinar (sistema de um só nível e um só objetivo), a transformação

de conflito é essencialmente interdisciplinar, pois se define como axiomática comum

a um grupo de disciplinas conexas e definida no nível hierárquico imediatamente

superior, introduzindo-se à noção de finalidade.

Registre-se, porém, a forte tendência que, frequentemente, se estabelece

entre interdisciplinaridade, multidisciplinaridade e pluridisciplinaridade.

Inicialmente, releva considerar o conceito de disciplinaridade dado Barbosa

como:

Exploração científica especializada de determinado domínio homogêneo de estudo, isto é, o conjunto sistemático e organizado de conhecimentos que apresentam características próprias nos planos do ensino, da formação, dos métodos e das matérias; esta exploração consiste em fazer surgir novos conhecimentos que se substituem aos antigos. (BARBORSA, 2002, p. 320)

Assim, como doutrina, ensina Hilton Japiassu:

a multidisciplinaridade é uma gama de disciplinas adotadas simultaneamente, abstraídas das relações existentes entre si. A pluridisciplinaridade, ao contrário, caracteriza-se pela justaposição de diversas disciplinas situadas geralmente no mesmo nível hierárquico e agrupadas, mantendo-se as relações existentes. (JAPIASSU, 1976, p. 71 apud BARBORSA, 2002, p. 320-321)

60

Em síntese, única semelhança entre multidisplinaridade e pluridisciplinaridade

está no agrupamento disciplinar, enquanto a diferença é marcada pela existência, ou

não, de cooperação.

Um exemplo típico de pluridisciplinaridade pode ser explicitado pela atuação

do serviço técnico de psicologia e serviço social no Poder Judiciário. O juiz requer

estudos de outras disciplinas que irão cooperar com a aplicação do Direito. Cada

profissional é independente para atuar no campo de sua disciplina de

especialização, sem que haja, porém, a coordenação de um sobre os demais.

Neste passo cabe registrar a frequente confusão que se faz quanto à

percepção do conceito de Mediação Familiar. Muitos profissionais declaram-se

"mediadores" porque atuam com a multidisciplinaridade, o que, evidentemente, não

basta. A exemplo, no Brasil há instituições sérias que acreditam e declaram realizar

Mediação Familiar, porque o atendimento ao cliente é feito por advogado e psicólogo

ou assistente social, simultaneamente. Claro que essa forma de abordagem da

pessoa em estado de sofrimento é louvável, ampliando, em muito, a qualidade de

atuação profissional. Entretanto, não se trata de Mediação, visto que esta tem

conteúdo interdisciplinar, e não meramente multidisciplinar.

Para Barbosa (2002, p. 320), o conceito de interdisciplinaridade envolve maior

complexidade por se tratar de neologismo que traduz um significado ainda não

inteiramente sintetizado pela compreensão universal. Na Bélgica, por exemplo, é

considerada interdisciplinar a relação entre Direito Penal e Direito Civil. Já na

França, há uma forte tendência a se considerar interdisciplinar a relação entre

disciplinas com diferentes métodos de observação do mesmo fenômeno.

No Direito de Família francês, por exemplo, há uma coordenação hierárquica

rigorosa e uma cooperação sistemática entre Psicanálise e Direito, com a finalidade

de construção de um Direito de Família mais aberto, com a compreensão das

qualidades intrínsecas das relações familiares. Essa visão moderna do conceito de

família só foi tornada possível com a implantação da interdisciplinaridade no estudo

desse campo do conhecimento.

Barbosa (2002, p. 322), ensina que a interdisciplinaridade é decorrente dos

tempos atuais e resultante do estágio em que se encontra a teoria do conhecimento

científico. Para Japiassu:

61

Constitui importante instrumento de reorganização do meio científico, a partir da construção de um saber que toma por empréstimo os saberes de outras disciplinas, integrando-os num conhecimento de um nível hierarquicamente superior. (JAPIASSU, 1976, p. 71 apud BARBORSA, 2002, p. 321)

Barbosa (2007, p. 146), fazendo elogiável aporte a Lídia Almeida Prado

(2001), considera que a interdisciplinaridade amplia a potencialidade do

conhecimento humano, pela articulação entre as disciplinas e o estabelecimento de

um diálogo entre os mesmos, visando à construção de uma conduta epistemológica.

É importante destacar que se trata de "conduta" individual, e não coletiva,

como acreditam alguns que confundem o conceito de interdisciplinaridade com

pluridisciplinaridade e multidisciplinaridade.

Mediação Familiar e interdisciplinaridade são indissociáveis, posto que se

trata de um conhecimento constituído pela organização de uma pluralidade de

conhecimentos.

O conceito de interdisciplinaridade adotado por Lídia Almeida Prado para

explicar a Mediação é:

A interdisciplinaridade amplia a potencialidade do conhecimento humano, pela articulação entre as disciplinas e o estabelecimento de um diálogo entre os mesmos, visando à construção de uma conduta epistemológica. [...] A interdisciplinaridade é considerada como a mais recente tendência da teoria do conhecimento, decorrência obrigatória da modernidade, por se tratar de um saber oriundo da predisposição para um 'encontro' entre diferentes pontos de vista (diferentes consciências), o que pode levar, criativamente, à transformação da realidade. (PRADO, 2003, p. 3 apud BARBOSA, 2007, p. 146-147)

A produção de conhecimento interdisciplinar é oriunda da adoção de uma

atitude individual, construída com suporte na observação e na cooperação com

outros saberes. Para tanto, fundamental desperte no pesquisador uma nova

manifestação de inteligência e uma nova pedagogia, opondo a extrema

especialização à propedêutica interdisciplinar.

Assim, para compreender a Mediação Familiar interdisciplinar é preciso

adotar uma atitude corajosa de despojamento de conceitos e preconceitos já

ultrapassados, pois trata-se de uma atitude ousada de ampliação do conhecimento.

62

9 DIREITO COMPARADO

As duas principais vertentes mundiais da Mediação são o modelo norte-

americano e europeu.

Barbosa (2002, p. 319) discorrendo sobre a experiência americana e

européia, ensina que, nos Estados Unidos, a Mediação desenvolveu-se com o

objetivo de satisfazer a necessidade de aliviar o Judiciário, cada vez mais

sobrecarregado pela crescente demanda judicial. Assim, sob o enfoque de

negociação, a Mediação encontra em Harvard a fundamentação teórica que a

conceitua como um modo de resolução de conflitos. O objetivo focaliza-se no acordo

entre as partes, afastando qualquer preocupação com as causas subjacentes do

impasse. Logo, não há preocupação com o caráter preventivo.

Sob tais aspectos, a Mediação norte-americana apresenta-se como circuito

derivado tendente ao "aperfeiçoamento do acesso à justiça", decorrente da explosão

do contencioso. Coincide, justamente, com a tendência mundial de criação de

instâncias de conciliação e arbitragem para todas as causas. A exclusão das de

pequeno valor da apreciação das instâncias superiores logo mereceu críticas, pois

as chamadas "pequenas causas" passaram a ser tratadas como "justiça de segunda

classe" ou uma nova forma de "controle social".

Diante do alto custo do acesso à justiça, nos Estados Unidos, os cidadãos

aderem, rapidamente, à via intitulada ADR - Alternative Dispute Resolution, que se

apresenta como uma alternativa rápida e econômica, na qual foi inserida a

Mediação.

Barbosa (2002, p. 319), sobre a outra vertente da Mediação, o modelo

europeu, ensina que na metade da década de 1980, franceses interessados nas

experiências norte-americanas tiveram a iniciativa de estudar a Mediação no

Canadá, país que, pela facilidade da proximidade geográfica aos Estados Unidos e

pelo acesso à dupla lingua oficial - inglês e francês – realizou uma Mediação entre o

continente americano e o europeu. Assim, com as devidas adaptações, começa a

ser construído um modelo inicialmente francês, mas que logo se torna um modelo

europeu de Mediação.

A prática da Mediação Familiar na França foi enraizada e estruturada sob o

enfoque da interdisplinariedade, afastando-se, assim, do conceito de Mediação

63

consagrado nos Estados Unidos - de resolução de conflitos – para construir um

conceito próprio, pautado na transformação do conflito.

A divergência no conceito, entre as duas marcadas tendências da Mediação,

está na origem do movimento. Enquanto nos Estados Unidos a Mediação

correspondia a uma resposta capaz de desafogar o Judiciário, na França teve a sua

origem na É cole des Parents e no Conseil Congugal ET Familial, institutos que se

aperfeiçoaram a partir do desenvolvimento teórico da Mediação Familiar.

64

10 SEPARAÇÃO CONJUGAL: O ADVOGADO E A IMPORTÂNCIA DA

MEDIAÇÃO NO CONFLITO E SUAS CONSEQUÊNCIAS NO ÂMBITO

FAMILIAR

Por que ainda há resistência em aceitar as formas extrajudiciais de solução de

conflito?

O desconhecimento quanto às formas alternativas de resolução de

controvérsias leva os advogados a tecer estas considerações para tentar superar os

hábitos arcaicos, o medo do novo e a acomodação, para então adentrar num

universo moderno e altamente eficaz, onde a inteligência, o respeito e a satisfação

pessoal e profissional são regiamente recompensados.

O perfil do advogado moderno não é mais é apenas ser guerreiro é também ser

negociador.

Por outro lado, e outro aspecto que não tem sido olvidado, é a própria natureza

da formação acadêmica do advogado, pois ele é treinado para o litígio e a única

solução é pela via judicial. Sua escuta e sua visão do problema apresentado sempre

estão dirigidas a estratégias e formalismos para adequar o problema à configuração

processual.

Para Vezzulla,

o advogado trabalha com uma visão jurídica e adversarial do conflito. Resultado: tem que sofrer as reclamações dos clientes pela demora, pelos custos e pelo resultado, já que este raramente os satisfaz. Em resumo, desprestígio e muito desgaste pessoal. (VEZZULA, 1999 apud CARMO, 2001)

Fundados nas considerações expostas, verifica-se que a conciliação, a

negociação, a Mediação, ou mesmo a própria arbitragem, são vias abertas ao pleno

trabalho do advogado, pois seu campo de aplicação é o mais amplo, servindo a

quase todos os conflitos entre pessoas físicas ou jurídicas, acompanhados, por força

dos Códigos de Ética do Mediador e do Árbitro, adotados pelas maiores instituições

do Brasil, pelo aconselhamento dos advogados somado à informalidade do

procedimento.

65

É oportuno frisar que nenhum desses métodos é o meio mágico para desafogar

o Judiciário, pois há um costume arraigado na população quanto à jurisdição estatal,

sendo este, portanto, apenas um novo caminho para resolução de conflitos em que

os envolvidos situam-se perto da autocomposição.

Por se tratar de uma atividade marcada por profundo conhecimento da técnica

jurídica, já que a sentença arbitral é idêntica à judicial, resta claro que esse

mecanismo não prescindirá dos serviços prestados pelos advogados ou outros

profissionais da área que assessoram o Poder Judiciário.

Em outra vertente, a própria experiência, quer na implantação da Justiça

especializada trabalhista, quer dos Juizados Especiais Cíveis (Lei nº 9.099/95), que

em um primeiro momento causaram receios com relação à perda do mercado do

advogado, são provas cabais da realidade de que o jus postulandi foi e sempre será

exercido de forma absoluta pelos advogados e a busca por seus serviços só

ampliou.

Nas sábias palavras de Wagner Leão do Carmo:

Criou-se o falso mito de que a Mediação e a arbitragem teriam a capacidade de "privatizar a Justiça" e de "roubar serviços da classe jurídica", ambas as afirmações são levianas e despidas de qualquer fundo de verdade, visto que nem o árbitro estaria aparelhado para julgar conflitos senão aqueles de especialidade – onde funciona um perito, e só nesses –, e nem a Mediação teria a capacidade de retirar qualquer serviço dos advogados, muito em contrário, abre um novo caminho para aqueles que, por diversas razões, não se servem dos serviços jurídicos, passem a fazê-lo, como aliás aconteceu significativamente nos continentes europeu e americano. (CARMO, 2001)

A atividade do negociador, de outro turno, terá uma função preventiva de suma

importância para o advogado, já que por este meio não só os resultados são

alcançados em brevíssimo tempo, como a paga pelos serviços também.

O mediador, de outro tanto, por ser terceiro e imparcial, ainda que tenha

formação jurídica, não pode indicar soluções jurídicas para as partes, e, dessa

forma, os serviços prestados pelos profissionais da área do Direito serão sempre

exigidos, até porque, a assessoria jurídica é prerrogativa do advogado, e não do

mediador e conciliador, repita-se.

66

Nunca é demais lembrar-se, portanto, que o papel dos que lidam com o Direito permanece intocável frente à Justiça estatal, pois esta é a realidade construída em todos os países onde essa promissora técnica foi implantada (EUA, Canadá, Espanha, França, Inglaterra, etc.), além de que proporcionou, assim como as outras vias alternativas (Juizados Especiais, etc.), um crescimento espantoso no serviço do advogado. (CARMO, 2001)

De outra parte, dispondo de um treinamento formal sobre negociação,

conciliação e Mediação, por certo será aposentado o velho e superado método

aplicado por quase todos os advogados, que se resume na "tentativa e erro", muito

embora seja uma ocorrência importantíssima nas atividades jurídicas.

Como se vê, para o sucesso profissional é fundamental saber trabalhar com

situações conflituosas, vez que ‘diuturnamente’ o advogado está voltado para as

lides, devendo atuar com habilidade e desenvoltura, que podem ser adquiridas por

algumas técnicas que lhes proporcionarão belíssimos resultados, quer em termos de

satisfação, quer de remuneração.

Em muitos passos e setores do Direito, passando pela Constituição, pelo

Código Civil e pelos preceitos do nosso Código de Ética (Art. 2º, parágrafo único,

item VI), vislumbra-se o propósito do Direito brasileiro, que é o de "estimular a

conciliação entre os litigantes, prevenindo, sempre que possível, a instauração de

litígios".

O grande papel a ser desempenhado pelo advogado, em vez de feroz

combatente nas rixas judiciárias, é o de competente negociador, mediador e árbitro,

afastando do sistema judicial tradicional as questões que envolvem conflitos de

especialidade, aumentando o seu próprio nível de eficiência e satisfação

profissional, pois que elas, contrariando o que ocorre nos casos litigiosos judiciais,

contribuem para restaurar as relações e o necessário consenso, de modo geral.

Mas, se por tudo isso ainda o leitor venha a resistir a esta matéria, por certo se

curvará às novas realidades que mostram uma profunda crise de segurança em

sentido amplo e também jurídica, com tensões sociais fruto do desemprego e da

exclusão social pela supressão de setores produtivos. Carmo (2001) remontando

aos ensinamentos de Alejandro Poniem (1999), adverte que mudanças profundas e

constantes dificultam o cumprimento do princípio da pacta sunt servanda que são

fatores multiplicadores de conflitos com base em outro princípio condicionante da

teoria da imprevisão, rebus sic stantibus.

67

O risco de agravamento da crise jurídico-institucional bate diuturnamente em

nossas portas e é sentido pela diminuição sistêmica de nossa clientela.

Carmo (2001) conclui, com base na construção do ideograma chinês que, "a

crise tem dois componentes: o risco e a oportunidade".

Nesse novo contexto do tecido social, onde foi criada uma sociedade

hiperdinâmica, profundas modificações se fazem necessárias, e estas passam pelo

fortalecimento de um sistema jurídico em que o emprego de métodos de resolução

de controvérsias seja uma constante, porque ágeis e atualizados, e além disso

idôneos para pacificar uma sociedade convulsionada. Sendo esta, ao nosso sentir, a

oportunidade trazida pela crise.

Esse aspecto da atividade profissional do advogado deve ser reformulado, não

só pelo anseio da população, propensa a duvidar de seu papel profissional, que é,

indiscutivelmente, o de fomentador da paz social, mas, principalmente, os atores da

função jurídica em cujas mãos estão as amarras da segurança, da estabilidade e do

progresso social, visto que "onde não impera a lei e a ordem, não há investimentos e

nem produção".

Finalizando, é oportuno registrar que o advogado preparado para atuar no

mercado atual é aquele que pode até conhecer profundamente da legislação

tributária deste e de outros países, ou sobre o Direito no campo do comércio

internacional, no Direito ambiental, no Direito do consumidor, em telecomunicação,

em comércio eletrônico, pode ser versado nas disposições dos contratos de

outsourcing ou de acordos de transferência de tecnologia, em várias línguas, deve,

acima de tudo e todos, ter plena capacidade de comunicação e habilidades de

negociação com êxito em situações difíceis, por meio de um método global, pois

como disse Fortune de Felice, 1778, "é preciso saber navegar com um vento

contrário e bordejar até encontrar o vento certo".

Rossi (2006, p. 54) demonstra a importância do advogado no processo

resolutivo de disputas familiares, como instrumental construtivo da Mediação.

Para a autora, a separação conjugal transforma, muitas vezes, um

relacionamento outrora pacífico em acirrada disputa familiar. A assistência jurídica

pode amenizar ou intensificar o conflito, dependendo, em certos casos, da atuação

do advogado, já que a Mediação envolve, além de aspectos legais, questões de

natureza psicológica.

68

Conflitos decorrentes da separação conjugal, como a guarda dos filhos,

divisão de bens, pensão alimentícia ou qualquer outra questão que venha a se

constituir objeto de ação judicial, podem receber auxílio do profissional do Direito,

para se chegar a um acordo ou minimizar os desentendimentos. Não obstante essas

particularidades, é necessário distinguir a Mediação em processo de separação

daquela realizada em face de outros litígios.

As disputas familiares transformam os cônjuges em "parentes", muito além da

morte, principalmente quando há filhos. Afinal, o casal em conflito terá netos,

bisnetos, e assim por diante, o que os obrigará ao respeito mútuo para sempre.

Normalmente, num processo adversarial, cada cônjuge é representado por

um advogado. Várias, porém, são as razões para que deixem de lado tal prática e

contratem um único profissional da advocacia, em especial se ambos já definiram o

que é melhor para si, não mais se verificando a necessidade de aconselhamento em

separado, ou quando simplesmente buscam orientação acerca de seus direitos.

Ressalte-se, por oportuno, que na hipótese de diferentes advogados, a

hostilidade entre o casal tende a crescer.

O advogado conciliador não se limita a facilitar a comunicação entre os

cônjuges, visando o equilíbrio da relação. Adentra o mérito do conflito e luta pelo

convencimento da parte recalcitrante em aceitar o que é conforme a lei ou o direito.

Desse modo, deve propiciar ao casal uma forma de transigir atendendo, mais de

perto, aos aspectos legais, sem, contudo, olvidar da problemática que envolve a

separação do ponto de vista psicológico. Nesse contexto, a Mediação cumpre

melhor o seu papel.

Ao mesmo tempo em que aumenta a conscientização dos profissionais do

Direito acerca das limitações da lei para tratar dos conflitos entre os cônjuges, a

Psicologia apresenta-se como importante instrumento de auxílio às famílias em

desajuste.

Todos os que mergulham no processo resolutivo de disputas familiares, com

o instrumental construtivo da Mediação, têm como principal objetivo o futuro dessas

relações. Nessa perspectiva, deve o profissional do Direito empenhar-se por

melhorar a comunicação entre o casal; explorar alternativas de solução pacífica para

o litígio, como, por exemplo, um acordo que atenda às necessidades de cada

cônjuge ou o estabelecimento de regras para se evitar novos conflitos.

69

O chamamento à realidade feito pelo advogado, muitas vezes, leva em

consideração o demonstrativo de valores apresentado pelos cônjuges. Tal atitude

induz à veracidade, encorajando-os a um comportamento cooperativo. Não havendo

consenso quanto à separação, deve o mediador especificar minuciosamente os

ganhos e gastos, principalmente quando a questão em pauta é pensão alimentícia.

Não se pode negar a eficácia dos instrumentos jurídicos para supervisionar o

aspecto econômico-financeiro dos cônjuges após a separação. Todavia, questões

como pensão alimentícia, guarda dos filhos, divisão de bens e uso do nome do

cônjuge, via de regra, se consubstanciam numa petição, para homologação judicial.

Por essa razão, o acordo deve ser claro, simples, inteligível e concludente.

Evidencia-se, assim, que o advogado não pode mais ater-se ao seu papel

convencional. É imprescindível a intervenção do causídico quando o acordo envolver

divisão de propriedades, pensão alimentícia e guarda de filhos. Indubitavelmente, os

benefícios dessa Mediação valem todo e qualquer esforço.

70

11 A ÉTICA DO MEDIADOR

O fundamento ético das atividades do mediador presta muito mais serventia

ao desempenho de suas funções do que propriamente o conhecimento estritamente

jurídico, tendo-se por bem que o cerne mesmo de tais atividades é a compreensão

das relações humanas e sociais.

O tema faz entender recorrentemente que o circunstanciamento ético da

atividade do mediador é condição substancial para seu regular desempenho, além

de requisito formal.

Mediadores lidam com a mais diversifïcada gama de relações humanas, o

que é ambiente fértil para um seriado de armadilhas atinentes ao regramento da

conduta do exercício profissional.

Se a sociedade espera que as formas de resolução alternativa de conflitos

conduzam à paz social, é incontrastável a premência da conduta de mediadores e

árbitros pautada na expectativa social valorativa que se tem dos mesmos, sob risco

do descrédito de tais mecanismos e, por fim, levando à sua inocuidade.

Não há garantias específicas extraordinárias, nem jurídico-positivas ou

constitucionais, para o exercício da atividade de mediador. O mesmo não está

protegido por garantias corporativas ou elos de subordinação ao Estado. Não

havendo monopólio desta atividade, a manutenção dos mediadores na mesma se

pauta nos rigores do aprimoramento técnico e ético e na visão humanística da

realidade social de que seja portador, o mediador.

Os atos do mediador devem ser manifestos em seu raio de ação e na

proporção da importância deles para eficácia na ordem jurídica da decorrência do

conteúdo das decisões quanto aos interesses-direitos subjetivos das partes em

conflito.

A dignidade da pessoa humana como o mais sereno ponto de apoio, na órbita

do qual deve se circunscrever a atividade do mediador. É indicador do rumo certo

por que labora o mediador.

O respeito à dignidade da pessoa, noutras palavras é situar-se no

procedimento impingindo aos contendores a condição inerente de sujeitos, em nada

o submetendo a situações que o equiparem a objeto ou instrumento de interesses

espúrios, aí deve o mediador conferir às partes a informação necessária dos atos do

71

procedimento e a oportunidade concreta de reação frente às situações que lhe

possam trazer algum ônus.

Segundo o Prof. Otacílio Paula Silva:

Há profissão ou atividade cujo êxito acha-se ligado a atitudes intimamente relacionadas a valores éticos, como, v.g., a caridade para o sacerdote, a isenção para o magistrado, a honestidade para o servidor público em geral. (SILVA, 1994 apud ALVES, 2000)

O mediador deve ter boa formação, maturidade psicológica e social, visão de

universalidade dos fatos e dos problemas, ou seja, saber eleger seus próprios

valores; saber estimar os valores em jogo nos processos: quer da personalidade

humana, quer dos elementos envolvidos, fatos e atitudes, por fim, possuir conduta

compatível com os valores por ele eleitos (capacidade e sentimento para eleger para

si os valores mais elevados em pauta de sua conduta profissional e pessoal) bem

como os valores que lhe cumpre estimar (visão e sensibilidade para perceber os

valores nas personalidades dos outros).

A ética profissional pressupõe uma reflexão sobre a expectativa social e do

cliente sobre tal atividade, o que conduz ao entendimento que, em boa medida, ser

ético é atender a uma expectativa geral, a um interesse público. Tanto isto é verdade

que, por vezes, há um verdadeiro dogma circundando certas profissões (o que varia

segundo a evolução da sociedade), e o profissional não deve se descurar deste

aspecto, pois é em virtude desta condição que são respeitados e venerados boa

parte dos profissionais, isto sem se referir às profissões que encerram verdadeiros

mitos, como ocorre quanto ao médico e ao advogado.

É de grande valia social um profissional ético, embora inexperiente ou sem

maior aprimoramento técnico, pois este tende a entregar à sociedade resultados

mais relevantes do que aquele que é festejado pelo saber científico, mas que não

guarda qualquer credibilidade quanto aos métodos e aos expedientes profissionais

utilizados. Este é de duvidosa recuperação ética, tendo em mente que a formação

moral não é uma sacola que se põe e tira das costas ao sabor do momento; ao

passo que o primeiro só depende de sua constância de propósitos para aliar a

conduta ética ao aprimoramento técnico, o que pode ser certo e determinável.

72

Na condução dos seus trabalhos não pode o mediador participar do drama

subjetivo em solvência pelas partes, sob pena de gerar descrença tanto pelas partes

(o que paralisa a sua atividade) quanto comprometer os seus próprios juízos, úteis

ou à condução ou à decisão do caso em que se detém.

Pelo conteúdo enunciado abstrai-se o entendimento de que a atividade do

mediador deve ser permeada por um modo de dar lucidez à atividade humana de

conhecer um "objeto", devendo o observador manter os paradigmas próprios e

sociais, atentando para os riscos que os mesmos representam para a

imparcialidade, esta, que a bem da verdade, não passa de um mito, pois é

inalcançável em sua totalidade.

Em qualquer espécie de Mediação deve-se perseguir a imparcialidade e

identificar os canais de sintonia e de não-sintonia com a situação em exame,

considerando também a influência das redes de pertinência, deve fazer juízos

hipotéticos.

Deve o mediador agir com visão ou pensamento sistêmico que conduz ao

entendimento da interdisciplinariedade das relações, entre as ações e múltiplas

reações, de sorte que para o concurso dos resultados funcionam como norteadores

inúmeras influências que interagem em latente fricção e co-autoria.

É imperativo reservar atenção para o mecanismo de aferição do ânimo do

interlocutor, sabendo que a comunicação não se dá apenas por palavras. Por meio

da comunicação pela linguagem – das palavras, do corpo e de todos os sentidos –

pode-se dar a reconhecer as verdades, os anseios e objetivos do nosso interlocutor

e aquilatar os valores em jogo.

Na condução dos seus trabalhos não podem, mediador e árbitro, participar do drama subjetivo em solvência pelas partes, sob pena de gerar descrença tanto pelas partes (o que paralisa a sua atividade) quanto comprometer os seus próprios juízos, úteis ou à condução ou à decisão do caso em que se detém. (ALVES, 2000)

O resultado da comunicação não é somente a adição da linguagem, mas o

resultado da interação entre as linguagens em coexistência, cada uma modificando

a outra, e esta modificação reverbera modificando a si própria.

73

Outra fonte de informação primorosa para o trabalho do mediador é a

assertiva de que há sítios específicos onde mais acuradamente pode-se negociar os

processos emocionais, profissionais, políticos, religiosos etc. De tal sorte deve ser o

labor do mediador que permita a segmentação e classifïcação dos conflitos em cada

um destes estágios, tornando-os mais vulneráveis à solução.

É bem verdade que parte do trabalho do mediador é a de desvendar conflitos

meramente aparentes ou desfocados e desnudar os reais conflitos a fim de que as

partes sobre estes e somente sobre estes negociem. Esta é uma forma sobejante de

reduzir a área de conflito, o potencial de contenciosidade.

É recomendável ao mediador, ainda, a identificação dos discursos das partes,

que é sinal para que ele possa distribuí-los a cada momento da negociação,

convidando-os ao ambiente correto, mais permissivo à confluência dos interesses.

Para tal identificação, mister se faz que o mediador lance mão de perguntas,

com carga de curiosidade e suscite reflexão nos contendores. Deste modo o

mediador pode trazer o contendor à escuta inclusiva, ao incluir o ponto de vista do

outro na opinião que o mesmo está proferindo, diminuindo consideravelmente a

posição adversarial, logo, também, aumentando a possibilidade de negociação.

74

12 CONCLUSÃO

Ao reforçar a capacidade negocial dos casais em fase de separação ou

divórcio, a Mediação aparece como um meio mais que apto rumo a negociação,

possibilitando a sua autodeterminação para garantir a continuidade das relações

paterno-filiais, fomentar a co-parentalidade, e também prevenir os inadimplementos

de acordos de regulação.

Nos conflitos de família, é da maior importância concluir-se pela necessidade

da Mediação, para garantir a autonomia e a complementaridade desta fase ao

sistema judicial.

Ao se aperfeiçoar um instituto, a primeira idéia que pode vir à mente é a de

sua real utilidade. A Mediação, apesar de não ser muito utilizada no passado

constitui um importante instrumento a ser desenvolvido para cumprir a sua função,

qual seja, a de resolver os litígios.

Os questionamentos existem, e não são poucos: No balanço final, a Mediação

propicia mais vantagens do que desvantagens? Sendo uma modalidade extrajudicial

de resolução dos conflitos, conseguirá a Mediação realmente promover e resguardar

a justiça social? E a segurança jurídica? Será preservada? O judiciário conseguirá

adequar-se a essa forma alternativa de pacificar os conflitos?

Pela amplitude do rol de vantagens, a Mediação pode contribuir para a

pacificação social, pois a verdadeira Justiça só se alcança quando os casos se

solucionam mediante consenso que resolva não só a parte dos problemas em

discussão, mas também todas as questões que envolvam o relacionamento entre os

interessados. Com a implementação de um ‘modelo mediacional’ de resolução dos

conflitos, o Estado estará mais próximo da conquista da pacificação social e da

harmonia entre as pessoas.

Dentre as grandes virtudes da Mediação, a maior é a segurança com relação

ao cumprimento dos acordos, uma vez que estes não são impostos às partes. Ao

contrário, são as próprias partes que sentem a necessidade de compor um acordo, e

desta forma, empregam suas forças para persuadir a parte contrária de suas razões,

o que faz com que uma parte entenda a posição da outra, e desta forma, cheguem à

um consenso, onde nenhuma das duas partes saem prejudicadas. Ambas as partes

75

perdem, mas apenas perdem o mínimo necessário para a realização do acordo,

fazendo com que no final ambas as partes ganhem.

A enormidade de demandas para o judiciário, poderá ser aliviada. O judiciário

ganha, pois somente os casos que realmente demandarem decisão judicial para

resolução.

A Mediação não veda o acesso ao Judiciário, mas sim condiciona acordos,

além de contribuir com a diminuição da quantidade de processos em tramitação nos

foros e, por via de consequência, à agilização da Justiça.

A Mediação contribui para a justiça, pois resolve conflitos menos formais e

mais céleres que a jurisdição estatal, nos casos em que não há a obrigatoriedade de

se percorrer a via jurisdicional.

Não substitui o judiciário. É uma técnica interdisciplinar, subsidiária e

complementar ao Judiciário, que deve reconhecer, nas pessoas interessadas, a

capacidade e a responsabilidade na resolução de seus próprios conflitos,

intrinsecamente pessoais, cuja intimidade e vida privada são direitos fundamentais

seus.

A solução dos conflitos pode ser encontrada através de um simples consenso

entre as partes. O mediador ao tornar mais fácil a exposição de vontades reais e

confronto de idéias, possibilitará maior oportunidade de consenso. Sua atividade

traduz-se em importante instrumento de pacificação e harmonização de relações,

dignificando e educando para enfrentar os conflitos com serenidade e cooperação.

A pacificação social é real e não apenas jurídica, já que as partes chegam ao

acordo por sua própria vontade. O método é especialmente recomendado para as

relações que se perpetuam no tempo, como no direito de família, pois nesses casos

o desejo é acabar apenas com o conflito e não com a relação entre as partes.

No uso de suas atribuições, o mediador deve, atentar para a formalização do

termo de acordo, porque constituirá um título executivo extrajudicial, possibilitando

execução futura em caso de descumprimento.

O acordo celebrado já gera direitos e obrigações e oferece certeza e

segurança. Uma vez reduzido a termo, assinado pelas partes, pelo mediador e por

duas testemunhas, se descumprido por uma das partes acordantes, poderá ser

levado à execução pela parte prejudicada pelo descumprimento. A parte lesada terá

à disposição um título executivo extrajudicial capaz de viabilizar a busca imediata

por seus direitos. Não será preciso buscar no Judiciário uma decisão de mérito. O

76

artigo 585, II do Código de Processo Civil, faz com que o acordo formalizado já gera

direitos e obrigações e oferece certeza e segurança.

A Mediação traz, em seu bojo, uma grande e maior possibilidade dos conflitos

serem naturalmente adimplidos, considerando a autoridade dos participantes do

procedimento, vale dizer, as próprias partes em dissídio. Para que a Mediação atinja

os efeitos desejados é importante que sejam preenchidos certos requisitos de

validade, isto é, requisitos de ordem subjetiva, de ordem objetiva e formais.

Para implementação de todo este processo, há critérios orientadores para

institucionalização das soluções extrajudiciais, a saber: a eficácia executiva da

transação obtida pela via conciliativa extrajudicial, critério necessário para o

implemento das questões obtidas pela Mediação.

A importância da Mediação está na capacidade de mudar a ótica sobre o

conflito, mudando, consequentemente, de atitudes diante da própria história,

responsabilizando-se pelas escolhas.

Conforme os conceitos enunciados, a Mediação é um instituto que facilitará a

convivência em sociedade, que dará uma solução rápida aos conflitos que sejam

suscetíveis de apresentar-se ou que já se apresentaram na ordem judicial, com o

que todos serão beneficiados.

As pessoas em conflito terão a oportunidade de resolver eficientemente seus

problemas, bem como de serem elas próprias quem determinará a solução, já que

são os atores principais. Os advogados aguçarão suas condições de bons

negociadores, logrando que os clientes se sintam seguros e respaldados por seu

assessoramento e apoio profissional, concretizando saídas imediatas que dão

agilidade ao seu trabalho e, em consequência, às suas rendas. O Estado, na função

de administrar a justiça, se verá aliviado da sobrecarga que em todos os países

desenvolvidos ou em via de desenvolvimento se vê com a responsabilidade de

suportar.

Assim é a sociedade toda que deve tomar consciência de que a Mediação,

como método de resolução pacífica ou não adversarial de conflitos, constitui um

elemento para uma vida mais eficiente e civilizada.

À guisa dessa conclusão, crê-se que o fundamento ético das atividades do

mediador presta muito mais serventia ao desempenho de suas funções do que

propriamente o conhecimento estritamente jurídico, tendo-se por bem que o cerne

mesmo de tais atividades é a compreensão das relações humanas e sociais, após o

77

que é que se instrumentaliza o trabalho com as normas do direito eleito, a fim de

conduzir para a realidade concreta o resultado destas atividades.

O bom mediador é aquele que melhor introjeta o sentido e o alcance do

conteúdo essencial da utilidade de sua função de resolução alternativa de conflitos,

segundo a ótica da sociedade em geral e conforme a expectativa institucional dos

contendores.

É importante o papel do advogado, no desenvolvimento e no incremento da

resolução consensual dos conflitos.

A Mediação é prática de desenvolvimento da cidadania, de promoção de

saúde mental social e de diminuição do sofrimento social.

A magia da Mediação está nesta recuperação da capacidade de mudar de

ótica sobre o conflito, mudando, consequentemente, de atitudes diante da própria

história, responsabilizando-se pelas escolhas.

O afeto está para o Direito de Família assim como a vontade está para o

Direito das Obrigações. Portanto, por ser o afeto conteúdo de sua atividade, não

pode a Mediação familiar afastar-se dessa máxima.

78

REFERÊNCIAS

ALFONSO, Navil García. Negociação. Texto publicado em 2008. Disponível em: <http://site.suamente.com.br/negociacao/>. Acesso em: 24/03/2010.

ALVES, Alexandre Magno Vasconcelos. A Ética do Mediador e do Árbitro. Revista Jurídica Consulex, Ano IV - Nº 40 - 30 de abril de 2000.

BARBOSA, Aguida Arruda. A política pública da Mediação e a experiência brasileira. In: PEREIRA, Rodrigo da Cunha (Coord). Família e cidadania - o novo CCB e a vacatio legis. Belo Horizonte: IBDFAM/Del Rey, 2002, 578p.

______. Estado de arte da Mediação Familiar Interdisciplinar no Brasil. Revista IOB de Direito de Família, nº 40 - Fev-Mar/2007.

CARMO, Wagner Leão do. Mediação e Arbitragem: Os avanços tecnológicos e a expectativa profissional dos operadores do Direito. Revista Jurídica Consulex, Ano V - Nº 105 - 31 de maio de 2001.

CARMONA, Carlos Alberto. A arbitragem no processo civil brasileiro. São Paulo: Malheiros, 1993.

DILIGÊNCIA. Disponível em: <http://www.jusbrasil.com.br/topicos/295976/diligencia>. Acesso em: 15/04/2010.

EIRAS, Márcia dos Santos. Mediação: educação para a paz. Publicado em 15/4/2007 <http://www.boletimjuridico.com.br/doutrina/texto.asp?id=1781#_ftn1>. Acesso em: 15/04/2010.

FIUZA, César. Teoria geral da arbitragem. Belo Horizonte: DeI Rey, 1995.

GOMES, Silvia Martins. Mediação Familiar. 2006. 54 f. Monografia de Conclusão de Curso – Universidade do Vale do Rio Doce, Governador Valadares, 2006.

GRISARD FILHO, Waldyr. A Mediação Como Instrumenta Eficaz na Solução dos Conflitos de família. Revista IOB de Direito de Família, nº 50 - Out-Nov/2008.

79

MARINO, Patrícia Monica. O Que é a Mediação? Revista Jurídica Consulex, Ano III - Nº 28 - 30 de abril de 1999.

NAZARETH, Eliana Riberti. A Prática da Mediação. In: PEREIRA, Rodrigo da Cunha (Coord). Família e cidadania - o novo CCB e a vacatio legis. Belo Horizonte: IBDFAM/Del Rey, 2002, 578p.

NAZARETH, Eliana Riberti; MOTA, Maria Barbosa Antonieta Pisano. Direito de Família e Direitos Humanos. Belo Horizonte: Del Rey, 2003.

ROSSI, Eliane Assmann. Separação conjugal : a importância da Mediação no conflito e suas consequências no âmbito familiar. Revista Jurídica Consulex, Ano X - Nº 234 - 15 de outubro de 2006.

SERPA, Maria de Nazareth. Mediação de Família. Belo Horizonte: Del Rey, 1999.

______. Teoria e prática da Mediação de conflitos. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 1999.

SILVEIRA, Simone de Biazzi Ávila Batista da. Considerações sobre os Conflitos Familiares e a Mediação como Proposta. JURIS, Rio Grande, 11: 179-184, 2005. Edição comemorativa, 45 anos Direito/FURG. Disponível em: <http://docs.google.com/viewer?a=v&q=cache:YMxMb35WmUsJ:www.seer.furg.br/ojs/index.php/juris/article/viewPDFInterstitial/592/135+Quando+as+rela%C3%A7%C3%B5es+familiares+chegam+a+um+momento+conflituoso+em+que+n%C3%A3o+mais+existe+o+di%C3%A1logo+como+norteador+da+rela%C3%A7%C3%A3o,+ou+mesmo+diante+de+qualquer+adversidade&hl=pt-BR&gl=br&pid=bl&srcid=ADGEEShklPnQk0UP1Om88ppzVxURXRi4rn4nVeyCrzgnGVSRn26XVwJ60LckoB8GDP0rVHTybssOJ_unoTXWy202l8gBQ7DarplbqkRZ13J93DmGFLFsrM9EazTlR7Q0DeBSpBjcWWvE&sig=AHIEtbQoVuTBWBjg5DgRQUDd37Q54NMsOQ>. Acesso em: 24/04/2010.

TAVARES, Fernando Horta. Mediação e Conciliação. Belo Horizonte: Mandamentos, 2002.

VEZZULLA, Juan Carlos. A Mediação. O Mediador. A Justiça e Outros Conceitos – Mediação – Métodos de Resolução de Controvérsias, nº 1, LTr., São Paulo, 1999.

VIANA, Marco Aurélio da Silva. Direito Civil: Direito de Família. 2ª ed. Belo Horizonte: Del Rey, 1998.