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UNIVERSIDADE VALE DO RIO DOCE FACULDADE DE DIREITO, CIÊNCIAS ADMINISTRATIVAS E ECONÔMICAS CURSO DE DIREITO Adriano Gomes Araujo GUARDA COMPARTILHADA Governador Valadares 2011

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UNIVERSIDADE VALE DO RIO DOCE FACULDADE DE DIREITO, CIÊNCIAS ADMINISTRATIVAS E ECONÔMICAS

CURSO DE DIREITO

Adriano Gomes Araujo

GUARDA COMPARTILHADA

Governador Valadares

2011

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ADRIANO GOMES ARAUJO

GUARDA COMPARTILHADA

Monografia para obtenção do grau de bacharel em Direito apresentada à Faculdade de Direito, Ciências Administrativas e Econômicas da Universidade Vale do Rio Doce. Orientadora: Marlene Franklin Alves

Governador Valadares 2011

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ADRIANO GOMES ARAUJO

GUARDA COMPARTILHADA

Monografia apresentada como requisito para obtenção do grau de Bacharel em Direito pela Faculdade de Direito, Ciências Administrativas e Econômicas da Universidade Vale do Rio Doce.

Governador Valadares, ____ de __________________ de ________.

Banca examinadora:

________________________________________

Prof.ª Marlene Franklin Alves - Orientadora

_________________________________________

Prof. (a) convidado (1)

_________________________________________

Prof. (a) convidado (2)

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Dedico a toda minha família, em

especial a meu filho e minha

esposa.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço primeiramente à Deus por me conceder força de vontade para concluir

este trabalho, estando sempre do meu lado.

Aos meus familiares e amigos pela torcida.

À minha orientadora, Prof.ª Marlene Franklin, pela dedicação e atenção.

Agradeço também à minha esposa Vanessa e meu filho Lucas pela paciência, pelo

carinho, estímulo e cumplicidade.

E por fim, a todos que de alguma forma contribuíram para a execução deste trabalho

monográfico.

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“[...] os filhos são para os “pais como presentes da vida”, para que por um período possam os pais conviver com eles, educando e cuidando, mas que um dia, a ela, à vida, entregarão de volta, prontos para vivê-la sozinhos.” Maria Manoela de Albuquerque Quintas

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RESUMO

O tema da pesquisa é a guarda compartilhada. Com o advento da Lei 11.698 de 13 de junho de 2008, foram introduzidas no Código Civil Brasileiro algumas alterações nos artigos 1.583 e 1.584. A mudança mais relevante ficou por conta da introdução da guarda compartilhada no ordenamento jurídico pátrio. O fundamento basilar da guarda compartilhada é o princípio do melhor interesse da criança e do adolescente, onde ambos os pais são responsáveis pelo exercício do poder familiar, e têm o poder-dever de criar e educar os filhos, devendo estar aptos a prover um ambiente físico e emocional que contribua para um crescimento e um desenvolvimento saudável. O ordenamento jurídico assegura à criança e ao adolescente a convivência familiar. Deve esta ser guardada pelos pais, através do poder familiar. Determina ainda, que a separação e o divórcio não afetam as relações entre pais e filhos, e que o juiz decidirá a guarda sempre a bem dos filhos, tendo estes prioridade absoluta. Neste contexto, a guarda compartilhada surge como um novo modelo de guarda mais adequado à necessidade social. As alterações ocorridas nos artigos 1.583 e 1.584 surgiram para tentar alcançar os interesses dos filhos menores, buscando uma maneira de solucionar o conflito de forma que o menor não seja tão prejudicado como seria se não houvesse nenhuma intervenção jurídica. Palavras chaves: Guarda compartilhada. Melhor interesse da criança e do adolescente. Guarda do menor. Poder familiar.

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ABSTRACT

The theme of the research is shared custody. With the advent of law 11.698 of june 13th, 2008, were introduced in the Brazilian Civil Code amendments in articles 1.583 and 1.584. The most important change was the introduction of shared custody in the legal system of the homeland. The Foundation basilar shared custody is the principle of the best interests of children and adolescents, where both parents are responsible for the exercise of power and have the power-duty to create and educate their children and should be able to provide a physical and emotional environment that contributes to a healthy growth and development. The law ensures to children and adolescents to familial. Should this be saved by their parents, through the power family. Determines that separation and divorce do not affect relations between parents and children, and that the judge will decide custody of the children always well, having these absolute priority. In this context, shared custody emerges as a new model of custody more suited to social need. Changes in articles 1,583 and 1,584 have emerged to try and achieve the interests of minor children, looking for a way to resolve the conflict so that less is not as damaging as it would be if there were no legal intervention.

Keywords: Shared Custody. Best interests of children and adolescents. Custody of the minor. Family power.

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................. 11

2 A GUARDA FRENTE ÀS RELAÇÕES FAMILIARES ...................................................... 13

2.1 A FAMÍLIA CONTEMPORÂNEA: EMANCIPAÇÃO FEMININA E HUMANIZAÇÃO DA PATERNIDADE ................................................................................................................... 13

2.1.1 EVOLUÇÃO DAS RELAÇÕES FAMILIARES ............................................................. 13

2.1.2 A FAMÍLIA CONTEMPORÂNEA ................................................................................. 15

2.1.3 IGUALDADE NAS FAMÍLIAS: IGUALDADE ENTRE OS CÔNJUGES E ENTRE OS FILHOS................................................................................................................................ 16

2.1.4 A CONSTITUCIONALIZAÇÃO DAS RELAÇÕES FAMILIARES ................................. 17

2.2 PRINCÍPIOS DO DIREITO DE FAMÍLIA CONTEMPORÂNEA ...................................... 18

2.2.1 PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA ................................................. 19

2.2.2 PRINCÍPIO DA LIBERDADE E DO PLURALISMO DAS ENTIDADES FAMILIARES .. 20

2.2.3 PRINCÍPIO DA IGUALDADE ...................................................................................... 21

2.2.4 PRINCÍPIO DA AFETIVIDADE ................................................................................... 22

2.2.5 PRINCÍPIO DO MELHOR INTERESSE DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE........... 23

3 ANÁLISE DA ESSÊNCIA DA AUTORIDADE PARENTAL .............................................. 26

3.1 O PODER FAMILIAR E A RUPTURA DA RELAÇÃO FAMILIAR: CONTEÚDO E RESPONSABILIDADE ......................................................................................................... 26

3.2 AS FORMAS DE GUARDA VERSUS O DIREITO DE VISITA EM PROL DA CONVIVÊNCIA FAMILIAR ................................................................................................... 30

3.2.1 A GUARDA E O DIREITO DE VISITA ......................................................................... 31

4 MODALIDADES DE GUARDA ......................................................................................... 34

4.1 GUARDA ORIGINÁRIA E DERIVADA ........................................................................... 34

4.2 GUARDA LEGAL OU JURÍDICA E GUARDA FÍSICA OU MATERIAL ........................... 34

4.3 GUARDA PROVISÓRIA E DEFINITIVA ......................................................................... 35

4.4 GUARDA ALTERNADA ................................................................................................. 35

4.5 GUARDA UNILATERAL ................................................................................................. 36

4.6 GUARDA COMPARTILHADA ........................................................................................ 38

5 PREVISÃO LEGAL DA GUARDA COMPARTILHADA.................................................... 40

5.1 CONCEITOS E OBJETIVOS ......................................................................................... 40

5.2 VANTAGENS E DESVANTAGENS DA GUARDA COMPARTILHADA .......................... 41

6 PROTEÇÃO DA EFETIVA CONVIVÊNCIA FAMILIAR .................................................... 48

6.1 APLICAÇÃO DA GUARDA COMPARTILHADA ............................................................. 48

6.1.1 CONSIDERAÇÕES SOBRE A GUARDA COMPARTILHADA .................................... 48

6.1.2 OBEDIÊNCIA À AFETIVIDADE E AO MELHOR INTERESSE DA CRIANÇA ............. 52

7 CONCLUSÃO ................................................................................................................... 56

ANEXOS ............................................................................................................................. 60

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1 INTRODUÇÃO

Veremos nesta singela pesquisa que a guarda compartilhada, instituída no

ordenamento jurídico pátrio, era empregada no Brasil de forma tímida, e que

somente em junho de 2008, quando promulgada a Lei nº 11.698, ganhou respaldo

jurídico.

O trabalho busca demonstrar a importância desse arranjo na realidade fática

das crianças e adolescentes quando da separação dos pais. Pois são eles que

possuem toda sua estrutura abalada com a ruptura do convívio familiar, e, portanto,

merecem especial proteção da família, da sociedade e do Estado, posto que ainda

estão em desenvolvimento, não possuindo condições de se defenderem sozinhas.

Buscou-se focalizar o interesse do menor na atribuição do arranjo de guarda,

baseando sempre a decisão jurisdicional às características da família

contemporânea, sobretudo a afetividade e responsabilidade por cada qual dos seus

membros, de forma igualitária por ambos os genitores. Sendo um tema atual e de

grande relevância social à medida que a escolha da modalidade de guarda pode

prestigiar ou prejudicar o infante.

A guarda compartilhada que visa a continuidade da relação familiar, tal qual

era antes da ruptura do casal, influencia de sobremaneira na formação do indivíduo.

Um modelo de guarda que veio responder aos anseios de uma sociedade que

rompeu com sua forma conservadora, privilegiando o convívio com ambos os pais

após a separação do casal, minimizando os impactos sofridos pelos filhos. Esse

novo modelo busca atingir o objetivo de proporcionar o cumprimento dos direitos

inerentes à sua condição de pessoa em desenvolvimento, em particular a

participação conjunta dos pais no seu cotidiano.

O objetivo do estudo é demonstrar as características da guarda

compartilhada, bem como suas vantagens e desvantagens, sendo assim, o trabalho

foi dividido em cinco capítulos.

O primeiro capítulo descreve as relações familiares, abordando a evolução do

relacionamento familiar, e também os princípios do direito de família contemporâneo.

No segundo capítulo, a essência da autoridade parental, a guarda e o direito

de visita são enfatizados.

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O terceiro capítulo traz os conceitos das seguintes modalidades de guarda:

originária e derivada; legal ou jurídica e física ou material; provisória e definitiva;

alternada; unilateral; e compartilhada.

A guarda compartilhada de forma objetiva propriamente dita é destacada no

quarto capítulo, onde serão apresentados os conceitos, as vantagens e bem como

suas desvantagens.

Já o quinto e último capítulo, descreve sobre a proteção da efetiva

convivência familiar, a aplicação da guarda compartilhada, bem como comentários

envolvendo a importância da obediência em relação à afetividade e ao melhor

interesse da criança.

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2 A GUARDA FRENTE ÀS RELAÇÕES FAMILIARES

2.1 A FAMÍLIA CONTEMPORÂNEA: EMANCIPAÇÃO FEMININA E HUMANIZAÇÃO DA PATERNIDADE

2.1.1 Evolução das Relações Familiares

Considerando que é no seio da família que o indivíduo nasce e se

desenvolve, moldando sua personalidade ao mesmo tempo em que se integra ao

meio social, o estudo deste grupo é de fundamental importância para o direito de

família, levando em conta que na qualidade de construção social, ditam parâmetros,

que acabam se refletindo em leis.

Nesse contexto, em determinado momento histórico, a sociedade, instruída

pelo Estado e pela Igreja, que intervinham na vida das famílias, com a justificativa de

manter a ordem social e o padrão de moralidade - instituiu o casamento como regra

de conduta. Como exemplifica Dias (2010, p. 44 e 45):

A Igreja consagrou a união entre um homem e uma mulher como sacramento indissolúvel: até que a morte os separe. A máxima crescei e multiplicai atribui à família a função reprodutiva com o fim de povoar o mundo de cristãos. [...] Para o cristianismo, as únicas relações afetivas aceitáveis são as decorrentes do casamento entre um homem e uma mulher em face do interesse na procriação. [...] O Estado solenizou o casamento como uma instituição e o regulamentou exaustivamente. Os vínculos interpessoais passaram a necessitar da chancela estatal. É o Estado que celebra o matrimônio mediante o atendimento de inúmeras formalidades. (grifo do autor)

O Código Civil de 1916 regulava a família existente a sua época, originada

através do casamento.

Dias (2010, p. 42) revela que “ao pensar numa família matrimonializada,

hierarquizada, patrimonialista e heterossexual vem à mente a imagem da família

patriarcal, o pai como a figura central, na companhia da esposa e rodeado de filhos,

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genros, noras e netos”, assim, desempenhando funções procriativas, econômicas,

religiosas e políticas.

A sociedade familiar era estratificada, isto é, cada membro desempenhava um

papel, ou seja, uma função no cenário. Era o que se conhecia como família

patriarcal. O homem exercia a chefia da sociedade conjugal, sendo merecedor de

respeito e obediência da mulher e dos filhos. A finalidade essencial da família era a

conservação do patrimônio, precisando gerar filhos como força de trabalho. Como

era fundamental a capacidade procriativa, as famílias necessitavam ser constituídas

por um par heterossexual e fértil.

Existia uma visão discriminatória referente às pessoas unidas sem a

consagração do matrimônio e de seus filhos. Com adjetivações preconceituosas que

faziam referências punitivas, e serviam unicamente para excluir direitos. Dias (2010,

p. 46) relata em seu texto elementos que traduzem tal ojeriza legislativa:

A lei empresta juridicidade apenas à família constituída pelo casamento, vedando quaisquer direitos às relações nominadas de adulterinas ou concubinárias. Apenas a família legítima existia juridicamente. A filiação estava condicionada ao estado civil dos pais, só merecia reconhecimento a prole nascida dentro do casamento. Os filhos havidos de relações extramatrimoniais eram alvo de enorme gama de denominações de conteúdo pejorativo e discriminatório. Assim, os filhos ilegítimos, naturais, espúrios, bastardos nenhum direito possuíam, sendo condenados à invisibilidade. Não podiam sequer pleitear reconhecimento enquanto o genitor fosse casado. (grifo do autor)

Porém, é indiscutível que tal convivência gerava efeitos jurídicos, e na

tentativa de evitar o enriquecimento sem causa, assim como gritantes injustiças, os

legisladores tentaram variadas possibilidades, utilizando desde indenizações por

serviços prestados até aplicação, por analogia, ao direito comercial. Diante do

exposto, e da aceitação social, a Constituição Federal de 1988 (CF/88) tratou de

regular tal situação, criando a figura da união estável como entidade familiar.

Toda a estrutura familiar não perdurou aos fatos sociais, que impuseram

mudanças significativas. A revolução industrial é um exemplo de fato social que

interferiu na família, com ela se fez aumentar a necessidade de mão-de-obra, a

mulher ingressou no mercado de trabalho, deixando o homem de ser a única fonte

de subsistência da família. A família que antes possuía somente um caráter

produtivo e reprodutivo, migrou para as cidades e passou a conviver em espaços

menores, aproximando seus membros, e com isso aumentando o vínculo afetivo

entre seus integrantes. Uma nova concepção da família é formada por laços

afetivos de carinho e de amor.

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Um novo conceito de família surgiu, mais voltada a aspectos fundamentais

do ser humano.

2.1.2 A Família Contemporânea

O direito de família ganhou a expressão direito das famílias, que melhor

atende à necessidade de passar-se, cada vez mais, a enlaçar, no âmbito de

proteção todas as famílias, sem discriminação e sem preconceitos.

A família deixa de ser uma célula do Estado para se tornar o primeiro agente

socializador do ser humano. Por esta razão, recebe especial atenção do Estado (art.

226, CF/88). Como escreve Dias (2010, p. 29) “a própria Declaração Universal dos

Direitos do Homem estabelece (XVI 3): A família é núcleo natural e fundamental da

sociedade e tem direito à proteção da sociedade e do Estado. (grifo do autor)”.

O Estado precisa preservar a família, intervir em sua intimidade, mas sem

prejudicar a liberdade do “ser” sujeito. Nesse sentido, sucessivas alterações

legislativas ocorreram. Dentre as mais significativas está o Estatuto da Mulher

Casada (Lei nº 4.121/1962) que devolveu a plena capacidade à mulher casada e

assegurou a ela propriedade exclusiva dos bens adquiridos com o fruto de seu

trabalho e também pode-se citar a Lei do Divórcio (Lei nº 6.515/1997) que acabou

com a indissolubilidade do casamento, eliminando a idéia da família como instituição

sacralizada.

O Código Civil de 2002 (CC/02), procurou atualizar os aspectos essenciais do

direito de família. Incorporou as mudanças legislativas que haviam ocorrido por meio

de legislação esparsa, apesar de ter preservado a estrutura do Código anterior.

A Constituição Federal de 1988, instaurou a igualdade entre o homem e a

mulher, protegendo todos os seus membros de maneira igualitária. Proporcionou

proteção à família constituída pelo casamento, bem como pela união estável entre o

homem e a mulher e à comunidade formada por qualquer dos pais e seus

descendentes, que recebeu o nome de família monoparental. Estendeu a igualdade

dos filhos havidos no casamento, aos nascidos fora do mesmo e aos adotados,

garantindo-lhes os mesmos direitos e qualificações.

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Entretanto, a lei nunca se preocupou em definir um conceito de família,

apenas limitava sua identificação ao casamento. Foi a Lei Maria da Penha (Lei nº

11.340/2006) que a definiu, identificando como família qualquer relação de afeto.

Diante de todo esse contexto, se faz necessário uma visão pluralista da

família, albergando todos os diversos arranjos familiares existentes. Um novo

modelo de família surge fundada sobre os pilares da repersonalização, da

afetividade e da pluralidade, proporcionando ao direito de família novos valores.

A família constituída por um grande número de pessoas cedeu lugar à família

nuclear. Resultado de uma evolução social, que deu início com a revolução industrial

tecnológica, igualando a mulher ao homem.

Também teve fundamental importância para a redução do grupo familiar, o

aspecto econômico. Não é difícil perceber como é oneroso manter um filho na

atualidade, frente às exigências para a satisfação de cuidados concernentes à

alimentação, saúde, educação escolar e cultural. Enfim, perde-se em quantidade de

membros e ganha-se em qualidade de afeto.

Essa nova espécie de família, fundada no envolvimento afetivo de seus

integrantes, ganhou nomenclatura própria: família eudemonista.

A família torna-se refúgio para seus membros. Uma espécie de proteção com

relação ao resto da sociedade.

Como não poderia deixar de ser, o constituinte não esqueceu de elencar a

afetividade na carta magna, e estabeleceu em seus artigos 229 e 230, caput, a

obrigação dos pais para com seus filhos e vice-versa e, instituiu o amparo familiar

aos idosos.

2.1.3 Igualdade nas Famílias: Igualdade entre os Cônjuges e entre os Filhos

A família contemporânea é concebida com base nos princípios de liberdade e

igualdade. Alguns aspectos que pronunciaram a alvorada de novos tempos foram o

maior respeito a posição de ambos os cônjuges na sociedade conjugal, a maior

afetividade entre pais e filhos, e a participação crescente das mulheres nas

decisões e nas responsabilidades inerentes ao núcleo familiar.

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Com o grupo familiar menos organizado e hierarquizado e, mais voltado a

afeição mútua, eis que surge uma nova regulamentação. A Constituição Federal

estabelece, em seu artigo 5º, I, a plena igualdade entre cônjuges.

Nesse sentido, pode-se dizer que a igualdade é uma característica comum a

todas as espécies de família previstas na Constituição Federal de 1988, e que não

apenas no casamento os integrantes possuem direitos e obrigações igualitárias.

Ao longo dos anos, seguiram-se avanços normativos em torno da filiação. A

Constituição Federal de 1988, no art. 226, § 6º, estabeleceu a plena igualdade entre

os filhos havidos ou não da relação de casamento, ou por adoção, dispondo que

todos eles possuem os mesmos direitos e qualificações, ficando proibidas quaisquer

designações discriminatórias relativas à filiação. Após a vigência da novel

Constituição, em 13.07.1990 é editada a Lei 8.069/90, que revogou o Código de

Menores e disciplinou o Estatuto da Criança e do Adolescente, regulando os direitos

fundamentais das crianças (faixa etária até 12 anos de idade) e dos adolescentes

(faixa etária após os 12 anos até antes dos 18 anos de idade).

Enfim, todos os dispositivos legais que determinavam discriminação dos filhos

perderam sua eficácia com a promulgação da Constituição Federal. Tal postura vem

ao encontro aos preceitos constitucionais, respeitando seus princípios e resgatando

a dignidade da pessoa humana.

2.1.4 A Constitucionalização das Relações Familiares

A elevação das relações familiares ao texto constitucional dá-se o nome de

“Constitucionalização do Direito de Família” e representa a prova da modernidade

dos contornos da família brasileira contemporânea, em sintonia com idêntico

fenômeno em âmbito mundial.

Com isso a Constituição Federal abriu ainda outros horizontes ao instituto

jurídico da família, dedicando especial atenção ao planejamento familiar, e à

assistência direta à família (art. 226, §§ 7º e 8º, da CF/88).

Atualmente, para se saber quais são os contornos da família contemporânea,

deve-se voltar ao dispositivo constitucional, e não somente ao capítulo destinado à

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família (Capítulo VII, Título VIII, CF/88), como também aos direitos e garantias

fundamentais.

Mas, essa nova concepção de família, regulada pela carta magna, também

trouxe consequências com a intervenção na família. Todavia, ela ocorreu na medida

do essencialmente necessário. Essa intervenção, em vez de escravizá-la, foi sua

fonte de libertação.

A importância da família para o Estado não se seguiu uma ingerência

indevida em seu interior. De maneira contrária, o Estado desempenha papel de

auxílio paralelo às várias espécies de família.

Como se nota, o ordenamento jurídico brasileiro, principalmente no que tange

a família, deve respeitar a hierarquia das fontes normativas, e todas as demais

normas devem estar em sintonia com a Constituição Federal, a ponto de serem

consideradas ineficazes.

2.2 PRINCÍPIOS DO DIREITO DE FAMÍLIA CONTEMPORÂNEA

A sociedade que consagrava o casamento como sacramento indissolúvel, de

característica matrimonial, patriarcal, hierárquica e heterossexual cedeu lugar aos

vários arranjos familiares, fundadas no vínculo afetivo.

Tendo em vista que é da sociedade que emergem as regras de conduta

postuladas em leis, e que o ordenamento jurídico se faz composto de princípios e

regras, importante se faz diferenciar os dois institutos. Dias (2010, p. 58) apud Alexy

(1997, p.84) o faz com maestria, ao conceituar princípios como “normas jurídicas

que se distinguem das regras não só porque têm alto grau de generalidade, mas

também por serem mandatos de otimização”, enquanto que as regras, prossegue,

“são a incidência do fato sobre o texto da lei, e tão somente sobre a letra da lei, sem

muita abrangência”.

Na existência de conflito de princípios ou de regras entre si as soluções são

completamente diferentes, como relata Dias:

Quando, aparentemente, duas regras incidem sobre o mesmo fato, é aplicada uma ou outra. Segundo critérios hierárquico, cronológico ou de especialidade, aplica-se uma regra e considera-se outra inválida. As regras

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podem ser cumpridas ou não, contêm determinações de âmbito fático e jurídico com baixa densidade de generalização. (grifo autor) (DIAS, 2010, p. 59 apud ALEXY, 1997, p. 86)

Ao contrário do que ocorre no conflito de princípios, como relata Dias:

Quando dois princípios incidem sobre determinado fato, o conflito é solucionado levando-se em consideração o peso relativo de cada um. Há ponderação entre os princípios, e não opção por um deles em detrimento do outro. Havendo conflito entre princípios de igual importância hierárquica, o fiel da balança, a medida de ponderação, o objetivo a ser alcançado já esta determinado, a priori, em favor do princípio, hoje absoluto, da dignidade da pessoa humana. (DIAS, 2010, P. 59 apud MORAES, 2003, p. 85)

As assertivas acima demonstram o quanto é equivocada a idéia de que os

princípios tem caráter secundário. Impossível se falar de direito de família sem

mencionar os princípios que o regem.

2.2.1 Princípio da Dignidade da Pessoa Humana

A expressão “dignidade da pessoa humana” criada por Kant no século XVIII

foi positivado pela Constituição Federal de 1988 logo em seu artigo 1º, inciso III. O

presente dispositivo não traz o conceito de dignidade, mas o traz como fundamento

do Estado Democrático de Direito.

Pereira (2006, p. 96) traz alguns pensamentos que fizeram de Kant o

precursor do princípio da dignidade humana:

O valor intrínseco que faz do homem ser superior às coisas (que podem receber preço) é a dignidade; e considerar o homem um ser que não pode ser tratado ou avaliada como coisa implica conceber uma denominação mais específica ao próprio homem: pessoa. Assim, o homem, em Kant, é decididamente um ser superior na ordem da natureza e das coisas. Por conter essa dignidade, esse valor intrínseco, sem preço e acima de qualquer preço, que faz dele pessoa, ou seja, um ser dotado de consciência racional e moral, e por isso mesmo capaz de responsabilidade e liberdade.

Óbvio se faz que não somente Kant foi o responsável pela instituição da

dignidade humana no ordenamento jurídico. Apesar de grande contribuição para que

tal acontecimento se concretizasse, outras reflexões filosóficas cumuladas com lutas

políticas, econômicas e sociais, bem como os ideais de liberdade e igualdade,

dentre outros fatores ao longo da história contribuíram para essa vitória.

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Feita a releitura histórica do conceito de dignidade com o objetivo de melhor

explicar o instituto, pode-se passar a aduzir sobre a importância do mesmo.

Dias (2010, p. 62) apud Sarmento (2000, p.58) descreve da seguinte forma:

É o princípio maior, fundante do estado Democrático de Direito, sendo afirmado já no primeiro artigo da Constituição Federal. A preocupação com a promoção dos direitos humanos e da justiça social levou o constituinte a consagrar a dignidade da pessoa humana como valor nuclear da ordem constitucional. Sua essência é difícil de ser capturada em palavras, mas incide sobre uma infinidade de situações que dificilmente se podem elencar de antemão. (grifo do autor)

Dias completa:

O princípio da dignidade humana não representa apenas um limite à atuação do estado, mas constitui também um norte para a sua ação positiva. O Estado não tem apenas o dever de abster-se de praticar atos que atentem contra a dignidade humana, mas também deve promover essa dignidade através de condutas ativas, garantindo o mínimo existencial para cada ser humano em seu território. (DIAS, 2010, p. 63 apud SARMENTO, 2000, p.60)

Enfim, os direitos humanos, fundamento da dignidade da pessoa humana,

estão intimamente ligados ao princípio da igualdade e ao conceito de cidadania e

dignidade, expressões fundamentais para o exercício justo da democracia que paira

sobre a Carta Magna Brasileira.

2.2.2 Princípio da Liberdade e do Pluralismo das Entidades Familiares

A Carta Magna, obedecendo aos preceitos sociais, instaurou o Estado

Democrático de Direito, fundado na dignidade da pessoa humana, e como tal não

poderia deixar de implementar os princípios da liberdade e da igualdade. Liberdade

aceitável socialmente, e legalmente, entre pais e filhos, entre cônjuges, entre os

membros do núcleo familiar, fazendo insurgir novos modelos de arranjos familiares.

O princípio da pluralidade teve seu marco histórico na Constituição da

República de 1988, que trouxe inovações ao romper com o modelo familiar fundado

unicamente no casamento, ao dispor sobre outras formas de família: união estável e

família monoparental”.

A vigente Constituição acabou com a idéia de que a família existe apenas

para fins reprodutivos e de legitimidade para o livre exercício da sexualidade.

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A Constituição Federal de 1988, ao instaurar o regime democrático, revelou

grande preocupação em banir discriminações de qualquer ordem, deferindo à

igualdade e à liberdade especial atenção.

Nesse contexto, Pereira escreve:

É, portanto, da Constituição da República que se extrai o sustentáculo para a aplicação do princípio da pluralidade de família, uma vez que, em seu preâmbulo, além de instituir o Estado Democrático de Direito, estabelece que deve ser assegurado o exercício dos direitos sociais e individuais, bem como a liberdade, o bem-estar, a igualdade e a justiça como valores supremos da sociedade. Sobretudo da garantia da liberdade e da igualdade, sustentadas pelo macroprincípio da dignidade, é que se extrai a aceitação da família plural, que vai além daquelas previstas constitucionalmente e, principalmente, diante da falta de previsão legal. (PEREIRA, 2006, p. 167)

A própria Constituição Federal, ao dispor sobre outras modalidades de

família, rompeu, juridicamente, com o preconceito existente sobre as famílias

instituídas de forma diversa ao casamento, e concedeu liberdade de escolha aos

envolvidos em uma relação conjugal diferenciada.

2.2.3 Princípio da Igualdade

O princípio da igualdade é, no entendimento de Dias (2010, p. 65), “um dos

sustentáculo do Estado Democrático de Direito”. Está fundamentalmente ligado ao

respeito às diferenças. Se todos fossem iguais não haveria motivo de se falar no

referido princípio. É, portanto, o respeito às diferenças que traz a tona o princípio da

igualdade.

Com isso, para se produzir justiça é necessário o respeito às desigualdades,

garantindo, assim, que a fragilidade vivida pelo sujeito de direito, por causa de suas

diferenças, seja especialmente tutelada, de forma a que ele se torne igual aos

demais.

Buscando consonância com a realidade atual das pessoas como sujeitos de

direito, a Carta Magna, não só proclamou a igualdade logo em seu preâmbulo, como

a reforçou em seus diversos pontos. Nesse sentido, Dias conclui:

Não bastou a Constituição proclamar o princípio da igualdade em seu preâmbulo. Reafirmou o direito à igualdade ao dizer (CF 5º): todos são iguais perante a lei. E foi além. De modo enfático, foi até repetitiva ao

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afirmar que homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações (CF 5º I), decantando mais uma vez a igualdade de direitos e deveres de ambos no referente à sociedade conjugal (CF 226 § 5º). Assim, é a carta constitucional a grande artífice do princípio da isonomia no direito das famílias. A supremacia do princípio da igualdade alcançou também os vínculos de filiação, ao ser proibida qualquer designação discriminatória com relação aos filhos havidos ou não da relação de casamento ou por adoção (CF 227 §6º). Em boa hora o constituinte acabou com a abominável hipocrisia que rotulava a prole pela condição dos pais. (DIAS, 2010, p. 65)

Em suma, no ímpeto de promover a igualdade dos indivíduos, a legislação

traça uma conduta voltada à proteção dos desiguais, para que assim se consiga

alcançar a verdadeira justiça.

2.2.4 Princípio da Afetividade

Diante de uma família que se mantém preponderantemente por elos afetivos,

em detrimento de motivações econômicas, que adquiriram importância secundária,

Pereira define afeto familiar como:

[...] um afeto que enlaça e comunica as pessoas, mesmo quando estejam distantes no tempo e no espaço, por uma solidariedade íntima e fundamental de suas vidas – de vivência, convivência e sobrevivência – quanto aos fins e meios de existência, subsistência e persistência de cada um e do todo que formam. (PEREIRA, 2006, p. 180 apud BARROS, 2002, p. 09)

Frente ao novo rumo das famílias, agora não mais patriarcais e

matrimonializadas, o direito das famílias não podia se omitir em instalar uma nova

ordem jurídica para a família, atribuindo valor jurídico ao afeto.

Embora a Constituição Federal de 1988 e o Código Civil de 2002 não utilizem

a palavra afeto, o princípio se mostra claro em alguns trechos dos dispositivos

legais. Na Constituição são identificados quatro fundamentos essenciais do princípio

da afetividade: a igualdade de todos os filhos independentemente da origem (CF 227

§ 6º); a adoção, como escolha afetiva com igualdade de direitos (CF 227 §§ 5º e 6º);

a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes, incluindo os

adotivos, com a mesma dignidade da família (CF 226 § 4º); e o direito à convivência

familiar como prioridade absoluta da criança e do adolescente (CF 227).

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Fazendo referencia ao Código Civil de 2002, identifica-se a valorização do

afeto: ao estabelecer a comunhão plena de vida no casamento (CC 1.511); quando

admite outra origem à filiação além do parentesco natural e civil (CC 1.593); na

consagração da igualdade na filiação (CC 1.596); ao fixar a irrevogabilidade da

perfilhação (CC 1.604); e quando trata do casamento e de sua dissolução, fala antes

das questões pessoais do que dos seus aspectos patrimoniais.

Portanto, a família contemporânea possui uma função social, e o direito

valoriza cada indivíduo da entidade familiar como forma de se preservar o princípio

maior, da dignidade da pessoa humana, sobre qual emana, assim como vários

outros, o princípio da afetividade.

2.2.5 Princípio do Melhor Interesse da Criança e do Adolescente

O princípio do melhor interesse da criança e do adolescente tem suas raízes

na evolução da família ao longo da historia, através do qual a família se despojou da

função econômica e passou a um núcleo voltado a afetividade. Com o objetivo de

melhor explicar os motivos da proteção estatal à criança, Pereira afirma:

Em face da valorização da pessoa humana em seus mais diversos ambientes, inclusive no núcleo familiar, o objetivo era promover sua realização enquanto tal. Por isso, deve-se preservar, ao máximo, aqueles que se encontram em situação de fragilidade. A criança e o adolescente encontram-se nesta posição por estarem em processo de amadurecimento e formação da personalidade. Assim, têm posição privilegiada na família, de modo que o Direito viu-se compendo a criar formas viabilizadoras deste intento. (PEREIRA, 2006, p. 127)

Da mesma forma se manifesta Dias (2010, p. 68) apud Gonçalves (2002, p.

31) ao ressaltar que a “maior vulnerabilidade e fragilidade dos cidadãos até os 18

anos, como pessoas em desenvolvimento, os faz destinatários de um tratamento

especial”. (Grifo do autor)

No ordenamento jurídico pátrio, o referido princípio encontra assento

constitucional no artigo 227, e é repetido na íntegra no Estatuto da Criança e do

Adolescente em seu artigo 4º. Também é contemplado em sede de codificação civil

em seus artigos 1.574, parágrafo único, 1.584, II e 1.586 do Código Civil.

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O princípio do melhor interesse da criança e do adolescente vem buscar a

proteção ao infante, ressaltando a responsabilidade de cada ente envolvido na

formação e desenvolvimento da criança, já que, posteriormente, essa criança

também fará parte da sociedade e será responsável por ela.

2.2.6 Princípio do Planejamento Familiar

O planejamento familiar é encontrado com facilidade no ordenamento pátrio.

Instituído no artigo 226, § 7º da Constituição Federal e no artigo 1.565, § 2º do

Código Civil, que estabelecem ser o planejamento familiar de opção do casal, sendo

vedado qualquer coerção.

Entretanto, Gonçalves (2009, p. 08) relata que essa liberdade de

planejamento familiar deve ser fundada nos princípios da dignidade da pessoa

humana e da paternidade responsável.

De responsabilidade de ambos os genitores, o tema foi regulamentado pela

Lei nº 9.263/96, que trata especialmente do assunto no tocante à responsabilidade

do Poder Público.

2.2.7 Princípio da Paternidade Responsável

Num contexto de mudanças sociais, a posição dos pais tanto no núcleo

familiar quanto na sociedade sofreu alterações. Os papéis masculinos e femininos

dentro da entidade familiar, antes tão delineados, se confundem. Homens e

mulheres exercem de forma igualitária a autoridade parental, e possuem a mesma

responsabilidade para com seus filhos, a de formar um cidadão.

Dessa forma percebe-se que a paternidade responsável não se esgota a

função de provedor, mas envolve toda a vida do filho, sendo a relação pai e filho,

uma relação absoluta e única, causada por uma relação de transcendência, em que

a continuidade se impõe como uma de suas características fundamentais.

Nesse sentido Comel (2006, p. 66) discorre:

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Os pais geram o filho, por outro lado, o filho gera, no homem e na mulher, a paternidade e a maternidade, respectivamente, assim como uma segunda natureza. São duas transformações interligadas e interdependentes que acontece. Por isso é que a maternidade e a paternidade biológicas modificam e transformam substancialmente (com nova substância: o filho) e essencialmente o casal.

Complementando o assunto Comel (2006, p. 95) proclama:

O fato acontecerá, na medida em que os homens forem se tornando realmente pais, cultivarem a paternidade social e ocuparem-se das respectivas tarefas. Só assim poderão deixar como legado, como o maior patrimônio, o bem aos filhos, aos filhos de todos, ou seja, uma sociedade onde a vida coletiva se constitua de cidadãos responsáveis: ocupados e preocupados com o bem comum, e por isso mesmo, atuantes na sua comunidade.

Em decorrência do exposto, nítido se faz a importância da presença paternal

na vida de um filho. Uma vez que, é com os pais que a criança vai aprender o que

há de básico e fundamental para uma vida em sociedade, e a ausência destes pode

acarretar frustrações que podem desembocar no seio da sociedade.

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3 ANÁLISE DA ESSÊNCIA DA AUTORIDADE PARENTAL

3.1 O PODER FAMILIAR E A RUPTURA DA RELAÇÃO FAMILIAR: CONTEÚDO E RESPONSABILIDADE

A expressão poder familiar corresponde ao antigo pátrio poder, remonta ao

direito romano: pater potestas – direito absoluto e ilimitado conferido ao chefe da

organização familiar sobre a pessoa dos filhos. Dias relembra que:

O Código Civil de 1916 assegurava o pátrio poder exclusivamente ao marido como cabeça do casal, chefe da sociedade conjugal. Na falta ou impedimento do pai é que a chefia da sociedade conjugal passava à mulher e, com isso, assumia ela o exercício do poder familiar com relação aos filhos. Tão perversa era a discriminação que, vindo a viúva a casar novamente, perdia o pátrio poder com relação aos filhos, independentemente da idade deles. Só quando enviuvava novamente é que recuperava o pátrio poder (CC/1916 393). (DIAS, 2010, p. 412)

A emancipação feminina e o tratamento igualitário dado aos filhos restringiram

o poder patriarcal. Primeiro foi o Estatuto da Mulher Casada (Lei nº 4.121/62),

assegurando o pátrio poder a ambos os pais, que era exercido pelo marido com a

colaboração da mulher. No caso de divergência entre os genitores, prevalecia a

vontade do pai, podendo a mãe socorrer-se da justiça. Depois a Constituição

Federal de 1988 concedeu tratamento igualitário a homens e mulheres (CF/88, art.

5º, I) e lhes assegurou direitos e deveres iguais à sociedade conjugal (CF/88, art.

226, § 5º). Em seguida, o Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069/1990)

mudou substancialmente o instituto deixando de ter um sentido de dominação para

se tornar sinônimo de proteção.

Porém, a expressão mais atual, que goza de simpatia da doutrina é

autoridade parental, pois é a que melhor reflete a consagração constitucional do

princípio da proteção integral de crianças e adolescentes e a que melhor representa

a conversão do poder familiar em um múnus, sendo menos um poder e mais um

dever.

Modernamente, o filho passou de objeto de direito para sujeito de direito e,

reconhece Dias (2010, p. 413) apud Venosa (2008, p. 367) que “essa inversão

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ensejou a modificação do conteúdo do poder familiar, em face do interesse social

que envolve. Não se trata do exercício de uma autoridade, mas de um encargo

imposto por lei aos pais”.

O poder familiar decorre tanto da paternidade natural, como da filiação legal,

e é irrenunciável, intransferível, inalienável e imprescritível. As obrigações que dele

fluem são personalíssimas. Como os pais não podem renunciar aos filhos, e

tampouco vendê-los, os encargos que derivam da paternidade também não podem

ser transferidos ou alienados. É crime entregar filho a pessoa inidônea (CP 245).

Nula é a renúncia ao poder familiar, sendo possível somente delegar a terceiros seu

exercício, preferencialmente a um membro da família.

O Código Civil de 2002 elenca sete hipóteses de competência dos genitores

quanto à pessoa dos filhos menores, conforme preceitua o artigo 1.634:

Art. 1.634. [...] I – dirigir-lhes a criação e educação; II – tê-los em sua companhia e guarda; III – conceder-lhes ou negar-lhes consentimento para casar (CC 1.517); IV – nomear-lhes tutor (CC 1.729) por testamento ou documento autêntico, se o outro dos pais não lhe sobreviver, ou o sobrevivo não puder exercer o poder familiar; V – representá-los, até aos dezesseis anos, nos atos da vida civil, e assisti-los, após essa idade, nos atos em que forem partes, suprindo-lhes o consentimento; VI – reclamá-los de quem ilegalmente os detenha; e VII – exigir obediência, respeito e os serviços próprios de sua idade e condição.

Vale lembrar que, não apenas a lei civil leciona a respeito, pois o Estatuto da

Criança e do Adolescente e a Carta Magna também tratam do assunto.

A Constituição Federal de 1988 também enumera deveres a família:

Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. [...] Art. 229. Os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores, e os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade.

A autoridade parental está impregnada de deveres não apenas no campo

material, mas, principalmente, no campo existencial, devendo os pais satisfazer

outras necessidades dos filhos, notadamente de índole afetiva.

Por isso, a atual jurisprudência vem reconhecendo a responsabilidade civil do

genitor por abandono afetivo, em face do descumprimento do dever inerente à

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autoridade parental de conviver com o filho, gerando obrigação indenizatória por

dano afetivo.

No tocante ao dever de alimento e ensino, contempla Gonçalves (2009, p.

378) que “a infração ao dever de criação configura, em tese, o crime de abandono

material (CP, art. 244) e constitui causa de perda do poder familiar (CC, art. 1.638, II)

[...] a infração ao dever de proporcionar ao menos educação primária aos filhos

caracteriza o crime de abandono intelectual (CP, art. 246)”. Leciona Gonçalves

(2009, p. 388)

II – Deixar o filho em abandono. Prevê o art. 227 da Constituição Federal que a criança e o adolescente têm direito “à convivência familiar e comunitária”. O abandono priva o filho desse direito, além de prejudicá-lo em diversos sentidos. A falta de assistência material coloca em risco a sua saúde e sobrevivência, mas não constitui a única forma de abandono. Este pode ser também moral e intelectual, quando importa em descaso com a educação e moralidade do infante. O Código Penal, visando reprimir as diversas formas de abandono de filho, prevê os crimes de “abandono material” (CP, art. 244), “abandono intelectual” (art. 245), “abandono moral” (art. 247), “abandono de incapaz” (art. 133), “abandono de recém-nascido” (art. 134).

Observa Gonçalves (2006, p. 393) que “o Estatuto da Criança e do

Adolescente (art. 23) dispõe que a falta ou carência de recursos materiais não

constitui, por si só, motivo suficiente para a suspensão ou a perda do poder familiar”.

O poder familiar é compartilhado de forma igualitária entre os genitores, a

todos os filhos, de zero a dezoito anos. A exceção a essa regra, é o poder familiar

exercido exclusivamente por um dos pais, quando da falta ou impedimento do outro

(CC/02, art. 1.631). Assim, se a mãe ou ambos os genitores forem desconhecidos

ou falecidos, o menor ficará sob a autoridade de tutor (CC/02, art. 1.728). Se o filho,

já maior, for incapaz, está sujeito à curatela, podendo o pai ou a mãe ser nomeado

curador (CC/02, art. 1.775, § 1º).

A autoridade parental não se extingue quando é deferida a guarda a terceiros,

ou a criança é colocada em família substituta, nem com o fim do relacionamento dos

pais, nem com novo casamento, ou união estável de qualquer dos pais, não

cabendo a interferência do novo cônjuge ou companheiro (CC/02, art. 1.636). Nesse

caso, configura o genitor e sua prole uma família monoparental. Em caso de

divergência, qualquer um dos pais pode socorrer-se da autoridade judiciária (CC/02,

art. 1.631, parágrafo único).

O genitor não é desobrigado do dever de prestar alimentos ao filho quando a

guarda é deferida a terceiro, ou a criança é colocada em família substituta, ou sob

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tutela, assim como nos casos de perda ou suspensão do poder familiar, mesmo que

o menor esteja com o outro genitor capaz de mantê-lo.

Dentro desse conceito, deve-se reconhecer que pelos atos praticados pelos

filhos, enquanto menores, são responsáveis os pais (CC 932 I). Trata-se de

responsabilidade civil objetiva por ato de terceiro. Sendo assim, mesmo que não

esteja em sua companhia, está sob sua autoridade e nada justifica atribuir exclusiva

responsabilidade ao genitor guardião pelos atos praticados pelo filho, pelo simples

fato de ele não estar na companhia do outro genitor. O patrimônio de ambos os

genitores, e não só o do guardião, deve responder pelos danos causados pelos

filhos.

Conforme preceito constitucional, o Estado também é responsável pela

criança e pelo adolescente. Nesse intuito de proteção, o Estado fixa limites de

atuação aos titulares do poder familiar e reserva-se o direito de fiscalizar o

adimplemento de tal encargo, podendo suspender e até excluir o poder familiar.

Dispõe o artigo 1.637 do Código Civil:

Art. 1.637. Se o pai, ou a mãe, abusar de sua autoridade, faltando aos deveres a eles inerentes ou arruinando os bens dos filhos, cabe ao juiz, requerendo algum parente, ou o Ministério Público, adotar a medida que lhe pareça reclamada pela segurança do menor e seus haveres, até suspendendo o poder familiar, quando convenha. Parágrafo único. Suspende-se igualmente o exercício do poder familiar ao pai ou à mãe condenados por sentença irrecorrível, em virtude de crime cuja pena exceda a dois anos de prisão.

A suspensão do poder familiar pode ser decretada a um único filho, assim

como pode abranger apenas algumas prerrogativas do poder familiar (ECA, arts.

155 a 163), possuindo caráter temporário. A suspensão é facultativa, podendo o juiz

deixar de aplicá-la representando uma medida menos grave, tanto que se sujeita a

revisão. Superadas as causas que a provocaram, pode ser cancelada sempre que a

convivência familiar atender ao interesse dos filhos.

O Código Civil prevê a extinção e a destituição do poder familiar:

Art. 1.635. Extingue-se o poder familiar: I – pela morte dos pais ou do filho; II – pela emancipação, nos termos do art. 5º, parágrafo único; III – pela maioridade; IV – pela adoção; V – por decisão judicial, na forma do artigo 1.638. [...] Art. 1.638. Perderá por ato judicial o poder familiar o pai ou a mãe que: I – castigar imoderadamente o filho; II – deixar o filho em abandono; III – praticar atos contrários a moral e aos bons costumes, IV – incidir, reiteradamente, nas faltas previstas no artigo antecedente.

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A doutrina distingue perda e extinção do poder familiar, sendo perda, uma

sanção imposta por sentença judicial, de maior alcance e corresponde à infringência

de um dever mais relevante, sendo medida imperativa, e não facultativa, enquanto a

extinção ocorre pela morte, emancipação ou extinção do sujeito passivo. Sendo

assim, Gonçalves (2009, p. 393) alude que “a perda (ou destituição) que é causa de

extinção do poder familiar por decisão judicial (art. 1.635, V)”, “decorre de faltas

graves, que configuram inclusive ilícitos penais (art. 1.638)”.

Dias (2010, p. 425) apud Comel (2003, p. 296) enfatiza que “a perda da

autoridade parental por ato judicial (CC 1.638) leva à sua extinção (CC 1.635 V), que

é o aniquilamento, o término definitivo, o fim do poder familiar”. No entanto,

conforme aduz a citada autora (2010, p. 425) apud Pereira (1990 , p. 242), que

“inclina-se a doutrina em admitir a possibilidade de haver a revogação da medida”.

Bom lembrar que sempre que no exercício do poder familiar colidirem os

interesses dos pais com os filhos, o juiz lhe dará curador especial (CC/02, art. 1.692,

CPC, art. 9º, I e art. 1.042, II, e ECA, art. 142, parágrafo único).

Preleciona Dias que:

A falta de convivência sob o mesmo teto não limita nem exclui o poder-dever dos pais, que permanece íntegro, exceto quanto ao direito de terem os filhos em sua companhia (CC 1.632). Não ocorre limitação à titularidade do encargo, apenas restrição ao seu exercício, que dispõe de graduação de intensidade. Como o poder familiar é um complexo de direitos e deveres, a convivência dos pais não é requisito para a sua titularidade. (DIAS, 2010, p. 416/417)

Grisard Filho (2009, p. 50) diz que “o direito de guarda compreende

necessariamente o de vigilância”. Compreende o direito-dever de guiar o menor até

a sua formação moral.

3.2 AS FORMAS DE GUARDA VERSUS O DIREITO DE VISITA EM PROL DA CONVIVÊNCIA FAMILIAR

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3.2.1 A Guarda e o Direito de Visita

No tocante ao Código Civil de 1916, a guarda do filho era definida com a

identificação do cônjuge culpado, ficando a criança sob a guarda do cônjuge

inocente.

A Constituição Federal de 1988, enfim, consagrou o princípio da igualdade

(art. 226, § 5º), e o Estatuto da Criança e do Adolescente deu prioridade absoluta à

criança e ao adolescente, tornando-os sujeitos de direito e não mais os tratando

como objetos. Já o Código Civil de 2002 apenas estabeleceu algumas diretrizes com

relação a guarda, quando os pais deixam de conviver sob o mesmo teto.

Lobo define guarda:

A guarda consiste na atribuição a um dos pais separados ou a ambos dos encargos de cuidado, proteção, zelo e custódia do filho. Quando é exercido por um dos pais, diz-se unilateral ou exclusiva: quando por ambos, compartilhada. Nessas circunstâncias a guarda integra o poder familiar, dele destacando-se para especificação do exercício. [...] Diferente é o conceito e alcance de guarda para os fins do Estatuto da Criança e do Adolescente. Neste, a guarda inclui-se entre as modalidades de família substituta, ao lado da tutela e da adoção, pressupondo a perda do poder familiar dos pais, razão por que é atribuída a terceiro. (LOBO, 2009, p. 169)

Mas não apenas aos pais cabe a guarda da criança, pois em situação de

abandono afetivo, a guarda pode ser atribuída desde o nascimento, à outra pessoa.

De qualquer forma, o guardião tem o dever de assistência material, moral e

educacional, o que lhe confere legitimidade para opor-se a terceiros, inclusive aos

pais (ECA 33).

Mister se faz definir na companhia de qual dos pais os filhos vão residir. Dias

assinala que:

De qualquer sorte, com o rompimento da convivência dos pais, há a fragmentação de um dos componentes da autoridade parental. Ambos continuam detentores do poder familiar, mas, em regra, o filho vive com um, e ao outro é assegurado o direito de visita, que é regulamentado minuciosamente, estabelecendo-se dias e horários de forma às vezes bastante rígida. (grifo do autor) (DIAS, 2010, p. 430)

Assim, se encontra na esfera familiar a decisão de quem fica com a guarda do

filho (CC/02, art. 1.583), e quem fica com o direito de visita (CC/02, art. 1.589),

valendo o que for acordado entre os genitores. Porém, depende da chancela judicial,

que só ocorrerá depois de ouvido o Ministério Público. Pode o juiz deliberar de forma

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diversa, inclusive não homologando a separação (CC/02, art. 1.574, parágrafo

único), pois este delibera atendendo ao melhor interesse da criança e do

adolescente.

O direito de visita é assegurado ao genitor não guardião, conforme o que foi

acordado com o outro genitor ou fixado pelo juiz. Tendo este o direito de visitá-lo e

de tê-lo em sua companhia. Também lhe é concedido o direito de fiscalizar sua

manutenção e educação (CC 1.589). A regulamentação desse instituto pelo Código

Civil é escassa, encontrando sua conceituação no Código de Processo Civil,

conforme disposto no artigo 1.121, §2º:

Entende-se por regime de visitas a forma pela qual os cônjuges ajustarão a permanência dos filhos em companhia daquele que não ficar com sua guarda, compreendendo encontros periódicos regulamente estabelecidos, repartição das férias escolares e dias festivos.

A visitação com data predeterminada tem efeito perverso sobre a criança ou o

adolescente, criando um transtorno na rotina da prole e estremecendo a relação

entre o pai não guardião e o filho. Devido às angústias perante os encontros e as

separações repetidas, as visitas periódicas propiciam o afastamento entre pais e

filhos, lenta e gradualmente, até o desaparecimento. O direito de visita é um direito

recíproco dos pais com os filhos e vice-versa, assegurando a companhia de uns com

os outros. O direito de ter o filho em sua companhia é expressão do direito à

convivência familiar, que não pode ser restringido em regulamentação de visita.

Em se tratando de medida desabonadora, por vezes o juiz se vê em situação

de suspender a visita, mas em outras ocasiões, no intuito de traumatizar o menos

possível o filho, defere as chamadas visitas supervisionadas.

Sempre que necessário a colocação da criança ou do adolescente em família

substituta, recomenda-se que os mesmos sejam ouvidos, sendo necessário o

consentimento caso o menor conte com mais de 12 anos. Assim, o juiz ao julgar o

caso concreto deve buscar ajuda de profissionais de outras áreas, em virtude do

estado de conflito em que se encontram os pais, a ponto de não conseguirem decidir

o destino dos filhos, determinando a realização de estudos sociais e laudos por

equipe da área da saúde mental para subsidiar sua decisão.

Considerando que a Constituição Federal de 1988 e a Lei nº 8.069/90 (ECA),

acolheram a doutrina da proteção integral à infância e a juventude, o menor foi

colocado a salvo de toda forma de negligência. A falta de convívio dos filhos com os

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pais, pode gerar severas seqüelas psicológicas e comprometer o desenvolvimento

saudável da prole, em face do rompimento do elo de afetividade.

O luto da separação e o sentimento de rejeição, de traição, desencadeado por

uma separação onde um dos cônjujes não consegue aceitar, pode fazer surgir um

desejo de vingança. O filho é utilizado como instrumento da agressividade e induzido

a odiar o outro genitor, afastando-o de quem ama e de quem também o ama. Isso

gera contradição de sentimentos e destruição do vínculo entre ambos.

Constatando tal situação, o juiz, no intuito de assegurar a proteção integral da

criança e do adolescente, reverte a guarda ou suspende as visitas, determinando a

realização de estudos sociais e psicológicos.

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4 MODALIDADES DE GUARDA

4.1 GUARDA ORIGINÁRIA E DERIVADA

A guarda originária advém da própria maternidade ou paternidade, de forma

natural. É integrada no poder familiar como um direito-dever de plena convivência

com o menor, e vice-versa, que possibilita o exercício de todas as funções parentais

como a educação, a assistência, a vigilância.

A guarda derivada surge da lei e corresponde a quem exerça a tutela do

menor, sejam um particular, de forma dativa, legítima ou testamentária, seja por um

organismo oficial, cumprindo o Estado sua função social, abrangendo as formas de

guarda que não se enquadram nos modelos tradicionais.

4.2 GUARDA LEGAL OU JURÍDICA E GUARDA FÍSICA OU MATERIAL

Mister se faz diferenciar guarda legal ou jurídica de guarda física. Sendo a

guarda legal, atribuída por lei como elemento do poder familiar, refere-se à

responsabilidade dos pais de decidir o futuro dos filhos, direcionando-os, vigiando-os

e protegendo-os. Enquanto que a guarda física diz respeito, à presença do menor

na mesma residência dos pais. Ambas coexistem, porém o detentor da guarda legal

pode não ter a guarda física. Quintas destaca:

A guarda jurídica encerra as relações parentais de caráter pessoal emergentes do poder familiar (sustento, criação, educação, proteção, correção, controle, guia moral e intelectual, vigilância, respeito, honra, afeição etc.), e é o direito de „reger a pessoa dos filhos, dirigindo-lhes a educação e decidindo todas as questões do interesse superior deles‟ e custódia ou guarda material, refere a imediatidade do exercício da guarda jurídica por aquele com quem viva o menor. (QUINTAS, 2009, p. 23 apud SANTOS, 2001, p. 158)

Importante salientar que guarda física e companhia não se confundem uma

vez que, para caracterizar a guarda física, necessário se faz a determinação da

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residência da criança ou do adolescente, e o Código Civil estabelece como domicílio

necessário dos incapazes o domicílio do seu representante ou assistente. Ou seja,

se o pai deixar a criança ou adolescente com seu avô para trabalhar, por exemplo,

caracteriza-se apenas companhia.

4.3 GUARDA PROVISÓRIA E DEFINITIVA

A guarda provisória ou temporária, surge da necessidade de atribuir a guarda

a um dos genitores na pendência dos processos de separação ou de divórcio. Já a

guarda definitiva surge a partir da sentença, que homologa ou decreta a dissolução

do vínculo conjugal, que o tema adquire um grau de estabilidade, de definitividade.

Da relatividade da guarda definitiva Grisard Filho realça:

A definitividade da guarda é, paradoxalmente, relativa, porquanto pode ser modificada a qualquer tempo, mediante ato fundamentado do juiz (arts. 35 e 149, parágrafo único, do ECA), pois sua concessão não faz coisa julgada. A cláusula rebus sic standibus subordina, nessas questões, a coisa julgada: vale dizer, a sentença é imutável enquanto a situação fática se mantiver a mesma, não incidindo a regra do art. 471 do CPC. Ao contrário, tratando-se de relação jurídica continuativa e sobrevindo modificação no estado de fato ou de direito, pode o juiz rever a decisão anterior. (GRISARD FILHO, 2009, p. 87)

A guarda pode ser modificada a qualquer momento, sempre com o objetivo de

resguardar os interesses da criança.

4.4 GUARDA ALTERNADA

Nessa espécie de guarda o filho ora fica com o pai ora com a mãe, ou seja, é

atribuída a ambos os pais, alternadamente o que implica uma alternância da guarda

física. Tem como fundamento proporcionar a convivência com ambos os pais, na

mudança de residências, exercendo cada genitor ao seu tempo os direitos-deveres

inerentes da autoridade parental. Grisard Filho relata que:

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Neste modelo de guarda, tanto a jurídica como a material, é atribuída a um e a outro dos genitores, o que implica alternância no período em que o menor mora com cada um dos pais. Desta forma, cada um dos genitores, no período de tempo preestabelecido a eles, exerce de forma exclusiva a totalidade dos direitos-deveres que integram o poder parental.(GRISARD FILHO, 2009, P. 91)

Uma forma encontrada também de amenizar as transformações no cotidiano

da prole é chamado de nidação ou aninhamento. É a possibilidade de se fazer um

arranjo em que as crianças continuem morando sempre na mesma casa e com as

mesmas rotinas, são os pais que se mudam por períodos alternados. Mas que não

perdura em decorrência de todos os inconvenientes que traz, principalmente para os

pais.

Dentre as críticas da doutrina, está sua oposição dessa modalidade de

guarda ao princípio da continuidade. Quintas estabelece que essa modalidade de

guarda apresenta pontos positivos e negativos:

Tem a seu favor a possibilidade de manter a relação mais intensa entre os pais e os filhos, possibilitando uma rotina de vida normal entre eles, além de assegurar aos pais a igualdade no exercício do poder familiar. Por outro lado, o filho será dirigido, a cada período de mudança, de forma diferente, tendo que se adequar a decisões diferenciadas no que concerne a sua educação, criação e proteção, que gera “confusão e falta de referências”, contrariando, além do mais, sua necessidade de estabilidade. (QUINTAS, 2009, p. 27)

Admitida no direito substantivo civil, em seu artigo 1.586, não tem sido

praticada por atender muito mais aos interesses dos pais do que do filho, além de

causar a ausência de identidade do filho.

4.5 GUARDA UNILATERAL

Com o advento do princípio do melhor interesse da criança e do adolescente,

ou da prioridade absoluta destes, tutelado na Constituição, na Convenção

Internacional dos Direitos da Criança e no Estatuto da Criança e do Adolescente a

guarda é deferida a quem ofereça as melhores condições para exercê-la, o que para

fins legais não significa ter melhores condições financeiras, considerando o juiz as

situações existenciais, circunstâncias afetivas, sociais e econômicas adequadas

para o desenvolvimento moral, educacional e psicológico do filho.

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A guarda unilateral, até pouco tempo atrás, era regra no instituto civil pátrio,

mas com o advento da Lei n.º 11.698/2008 a situação se alterou, sendo aplicada

sempre que não for possível a aplicação da guarda compartilhada, que é a regra.

Essa modalidade de guarda decorre da separação fática, judicial ou do divórcio dos

pais; como pode advir de um ou de ambos os genitores, do óbito de um genitor, e

também por conseqüência da paternidade não revelada.

Uma guarda definida por acordo dos pais, na ruptura consensual de sua

união, ou por sentença judicial se os genitores não se encontrarem aptos a

discernirem na identificação dos melhores interesses dos rebentos.

A lei nº 11.698/2008 indica, num rol não taxativo e sem preferência, segundo

Lobo (2009, p. 172) “os seguintes fatores de melhor aptidão para a atribuição

unilateral a um dos pais: afeto nas relações como genitor e com o grupo familiar;

saúde e segurança; educação”. O autor ainda explica:

Para a realização desses fatores também é importante o grupo familiar a que pertence o genitor que pretende ter a guarda do filho. Saúde não é apenas a curativa, mas, principalmente, a preventiva, com atenção a higiene e a hábitos saudáveis de alimentação e desenvolvimento físico. A segurança diz respeito à integridade física, à liberdade de ir e vir, ao acompanhamento das relações sociais do filho de modo a evitar os riscos com más companhias, ao acompanhamento do desenvolvimento moral. Por fim, a educação inclui a formação escolar e a formação moral, espiritual, artística e esportista. Evidentemente, que tudo há de ser dosado de acordo com os rendimentos dos genitores, pois o ponto ótimo nem sempre é possível de ser atingido. (LOBO, 2009, p. 173)

O juiz sempre vai julgar cada caso concreto, sempre ponderando os

elementos acima descritos em consonância com o que melhor atender a criança e o

adolescente. Preferencialmente, privilegia-se a preservação da convivência do filho

com seu grupo familiar, que deve ser entendido como o conjunto de pessoas que ele

concebe como sua família, constituído de parentes ou não. Tal avaliação dever ser

feita com auxílio de equipes multidisciplinares, pois as relações reais de afeto

dificilmente podem ser aferidas em audiência.

Cabe destacar também, que o fato de um dos pais dedicar menor

disponibilidade de tempo ao filho em virtude de atividade profissional, não deve por

si só influenciar o julgador, o genitor pode ser fisicamente presente e afetivamente

ausente. O que vale é qualidade do tempo dedicado à criança e não a quantidade.

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4.6 GUARDA COMPARTILHADA

No momento em que há o rompimento do casal, mister se faz uma

reestruturação das funções inerentes ao poder familiar. Quando da existência de

filhos há de se pensar qual tipo de guarda melhor corresponde aos interesses do

menor. Acontece que, com a evolução histórica, já vista em capítulo a parte,

sabendo que a Carta Magna adotou o princípio do melhor interesse da criança e do

adolescente, entre outros, claro se faz do porque da alteração da guarda unilateral

para a guarda compartilhada como uma possível regra. A respeito, Grisard Filho

destaca:

Nesse novo contexto, os arranjos que bem definiam o pai provedor e a mãe dona de casa não funcionavam bem, pois desestimulavam aquele de exercer um papel parental ativo e sobrecarregavam esta com as exigências do dever de cuidar dos filhos. As falhas que os sistemas apresentavam, o movimento feminista, a facilitação ao divórcio, a aceitação da união estável, levaram à constatação sobre os efeitos benéficos do envolvimento do pai na criação dos filhos, abrindo uma nova era nos arranjos de guarda e visita. (GRISARD FILHO, 2009, p. 130)

Assim, o desejo de ambos os pais em compartilharem a criação e a educação

dos filhos e o destes de manterem comunicação com aqueles, bem como, o dever

jurídico comum dos pais de decidir sobre a vida e o patrimônio de seus filhos, tanto

durante como depois da separação, cabendo ao juiz cobrar-lhes o exercício do

múnus desta forma, compartilhadamente, pressupõem fundamentos para o

surgimento da guarda compartilhada.

Nesse novo contexto, como ressalta o acima citado autor (2009, p. 160), “de

raízes constitucionais, da paternidade responsável e da co-responsabilidade

parental, a velha guarda exclusiva, preferencial em outro momento histórico-social”,

começa a ser questionada, cedendo lugar a outros arranjos de guarda. Buscou-se

escolher um modelo novo, que possibilitasse o exercício pleno do poder familiar,

estabelecendo a convivência da prole com seus genitores de forma igualitária,

sempre buscando o melhor para a criança. Surge, assim, a guarda compartilhada.

A lei nº 11.698 que entrou em vigor em 13 de junho de 2008 veio instituir a

guarda compartilhada ao Código Civil brasileiro de 2002 e promoveu alteração

radical no modelo de guarda dos filhos, até então dominante no direito brasileiro, ou

seja, da guarda unilateral conjugada com o direito de visita. Lobo (2009, p. 178)

assinala:

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A guarda compartilhada é exercida em conjunto pelos pais separados, de modo a assegurar aos filhos a convivência e o acesso livres a ambos. Nessa modalidade, a guarda é substituída pelo direito à convivência dos filhos em relação aos pais. Ainda que separados, os pais exercem em plenitude o poder familiar.

A guarda compartilhada busca, como todas as demais modalidades de

guarda, cada qual à sua época, o que melhor atende ao interesse da criança, à

medida que tenta a efetiva participação conjunta dos genitores no exercício do poder

familiar a eles inerentes.

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5 PREVISÃO LEGAL DA GUARDA COMPARTILHADA

5.1 CONCEITOS E OBJETIVOS

A guarda compartilhada é um dos meios de assegurar o exercício da

autoridade parental que o pai e a mãe desejam continuar a exercer na totalidade

conjuntamente. Ela nasceu a pouco mais de vinte anos na Inglaterra e de lá

trasladou-se para a Europa continental, desenvolvendo-se na França. Depois

atravessou o Atlântico, encontrando eco no Canadá e nos Estados Unidos.

Presentemente desenvolve-se na Argentina e no Uruguai.

No Brasil, a guarda compartilhada surgiu já a alguns anos, e somente com o

advento da Lei nº 11.698/2008 foi instituída na legislação brasileira dando a essa

modalidade, além de outras atribuições, um conceito. Dessa forma aduz Quintas

(2009, p. 134):

O primeiro ponto positivo da lei, e talvez o mais importante, é que a mesma insere no Código Civil o conceito de guarda compartilhada, que sempre foi muito confundida com a guarda alternada ou totalmente desconhecida. A lei não vem com o objetivo de legalizar a guarda compartilhada, que, como visto, já era permitida no nosso direito, e sim discipliná-la e garantir a sua aplicação onde conceituá-la é fundamental.

A conceituação legal, permitiu à doutrina dissertar com mais segurança a seu

respeito, cada qual lhe atribuindo um conceito doutrinário. Pessoas residentes em

locais separados e que ficam como detentores da guarda jurídica sobre um menor.

Outra modificação introduzida pela referida lei foi atribuição da guarda compartilhada

como regra no ordenamento jurídico pátrio, não sendo mais subordinada ao acordo

do casal quando se separam, que realizam de forma conjunta o exercício do poder

familiar. Competindo a ambos os pais dirigir a criação e a educação dos filhos e tê-

los em sua companhia e guarda, como dever e direito a um só tempo

A guarda compartilhada, tem por finalidade essencial a igualdade na decisão

em relação ao filho ou co-responsabilidade, em todas as situações existenciais e

patrimoniais, o que leva à pluralização das responsabilidades, estabelecendo

verdadeira democratização de sentimentos, sempre de forma a minimizar os efeitos

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da separação dos pais, mantendo os laços de afetividade, minorando os efeitos que

a separação sempre acarreta nos filhos e conferindo aos pais o exercício da função

parental de forma igualitária. A finalidade é consagrar o direito da criança e de seus

dois genitores, colocando um freio na irresponsabilidade provocada pela guarda

individual.

Grisard Filho também se manifesta nesse sentido, enfatizando que:

[...] a guarda compartilhada busca reorganizar as relações entre os pais e os filhos no interior da família desunida, conferido àqueles maiores responsabilidades e garantindo a ambos um melhor relacionamento. [...] ela propicia a continuidade da convivência de ambos os genitores com seus filhos, preservando as relações de afeto existentes anteriormente. (GRISARD FILHO, 2009, p. 169/170)

A guarda compartilhada tem como alvo a continuidade da relação da criança

com os dois genitores, tal como era durante o casamento, ou da união fática,

conservando os laços de afetividade, direitos e obrigações recíprocas.

5.2 VANTAGENS E DESVANTAGENS DA GUARDA COMPARTILHADA

A bem da verdade, a guarda compartilhada surgiu legislativamente em 2008,

mas já estava sendo utilizada por meio da doutrina e da jurisprudência. Grisard Filho

faz referência a esse respeito dizendo que:

Na doutrina, vozes há que, veementemente, já afirmam o valor do novo modelo e sua importância para o menor manter uma relação ativa e permanente com cada um de seus genitores. No nível jurisprudencial, que vem garantindo a manutenção dos vínculos parentais, aplicando a cada caso concreto a melhor solução, a guarda compartilhada desenvolveu-se em eco ao sufrágio universal do melhor interesse do menor, como critério fundante da atribuição da guarda. (GRISARD FILHO, 2009, p. 216/217)

Apesar de os estudos científicos não sejam ainda conclusivos (e se

desenvolvem por mais de 20 anos), podemos, seguramente, alinhar algumas das

vantagens desse novo modelo de guarda, citando inclusive, alguns desses estudos

como forma de melhor conhecer esse novo modelo. Com esse escopo, Grisard Filho

(2009, p. 219) relembra a pesquisa feita por “Judith S. Wallerstein e Joan Berlin

Kelly” realizada com sessenta casais, que passaram pelo divórcio, iniciada em 1971

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e teve sua publicação em 1980 no livro “Surviving the breakup: how children and

parents cope with divorce”1. O autor (2009, p. 219) apud Leite (1997, p. 281/282)

“anota que esses estudos validaram a nova forma de guarda”, ao revelarem:

[...] a importância para o menor de uma relação contínua com cada um dos genitores (e não, prioritariamente com a mãe, como sempre se afirmara). São Wallerstein e Kelly que afirmam, pela primeira vez, que 2/3 (dois terços) das crianças entrevistadas, oriundas de famílias monoparentais, lamentavam a ausência do genitor não-guardião (pai, no caso); que existe uma correlação entre o estado depressivo da criança e a ausência de contato com o pai não-guardião; que a segurança, a confiança e a estabilidade da criança estão diretamente vinculadas à manutenção das relações pais-filhos.

O doutrinador revela que:

Judith S. Wallerstein repetiu esta pesquisa em, cinco e dez anos depois do divórcio, com cinqüenta e seis dos sessenta casais da pesquisa originária, juntamente com a escritora especialista em assuntos médicos e científicos, Sandra Blakeslee, cujos resultados não contrariam as observações precedentes. [...] indubitavelmente, as boas relações entre pais e filhos podem ter uma importância decisiva no bem-estar psicológica e na auto-estima dos filhos do divórcio; que, particularmente, os adolescentes são vulneráveis quando privados do relacionamento com o pai; que há um crescimento do intercâmbio de papéis entre o homem e a mulher tanto no trabalho como na família; que a guarda compartilhada incentiva compromissos tácitos relativos à pensão dos filhos. [...] que há um número cada vez maior de homens que deseja continuar envolvido na vida dos filhos, mostrando menor disposição de conceder a guarda à ex-esposa. Por outro lado, há um número cada vez maior de mulheres que deseja seguir ou retomar suas carreiras juntamente com a criação dos filhos, recebendo muito bem a oportunidade oferecida pelo acordo de guarda compartilhada. Por ela os pais podem ajustar seus horários de trabalho. (GRISARD FILHO, 2009, p. 220)

Outra pesquisa relevante sobre o tema, demonstrada por Quintas (2009, p.

87) foi a realizada pelo “psicólogo Robert Bauserman” (...) “entre 1982 e 1999”, com

“1.846 crianças em sistema de guarda exclusiva e 814 crianças em sistema de

guarda compartilhada, com e sem alternância de residências”, que constatou

conforme seus estudos “divulgados pelo Journal of Family Psychology2, publicada

pela American Psychological Association (APA)3”, que “as crianças”, sobre a guarda

compartilhada, “teriam demonstrado estar tão bem ajustadas quanto uma criança

nas mesmas condições de uma família intacta”. Quintas ainda revela sobre o

enfoque da pesquisa que:

[...] crianças que viviam sob o arranjo de guarda compartilhada teriam apresentado menos problemas emocionais e de comportamento, maior

1 “Sobreviver à separação: como crianças e pais lidam com o divórcio”.

2 Revista de Psicologia da Família.

3 Associação Americana de Psicologia.

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auto-estima, melhor desempenho na escola e no relacionamento familiar do que as crianças em sistema de guarda exclusiva. [...] ainda demonstrou que os casais apresentaram menos conflito no arranjo de guarda compartilhada em relação à guarda exclusiva. (QUINTAS, 2009, p. 87)

A guarda compartilhada sobre o ponto de vista dos filhos, diminui a angústia

produzida pelo sentimento de perda do genitor que não detém a guarda, tal como

ocorre com freqüência na guarda única. O sentimento de rejeição também diminui e

lhes proporciona a convivência livre de conflitos, com os papéis masculino e

feminino, paterno e materno, facilitando o processo de socialização e identificação.

A guarda conjunta proporciona aos filhos que se mantenham algumas

características da família nuclear, o que permite que os mesmos não se sintam

diferentes dos amigos. Além de reduzir a possibilidade futura de a criança visualizar

a relação entre homem e mulher como algo negativo. Possibilita o contato com os

familiares de ambos os genitores e, em caso de falecimento de um dos pais, o filho

estará habituado à presença do outro genitor, o que facilitará a sua adaptação e

amenizará o sofrimento da perda.

O grau de satisfação de pais e filhos é elevado e os conflitos de lealdade

gerados quando a criança tem que escolher entre seus pais, passam a não existir ,

além de elevar os padrões éticos dos pais, quando reconhecem que, para o filho, o

ex-cônjuge tem a mesma importância que eles. Os juízes costumam sentir a opinião

do menor, sem exigir que faça escolha.

A atribuição a ambos os pais da guarda jurídica dos filhos, proporciona uma

responsabilidade igualitária e simultaneamente todos os direitos-deveres relativos à

pessoa dos filhos, o que assegura que os genitores não perderão o contato com

seus filhos. Além de ser mais justa, à medida que alivia a pressão sobre um só

genitor possibilita uma maior flexibilidade na sua vida pessoal e profissional.

Pai e mãe são considerados aptos a exercer a guarda e passarão para os

filhos uma imagem positiva, de que são capazes de cuidar deles. Geralmente os

pais são os não-guardiões e acabam se afastando dos filhos, com a guarda

compartilhada uma relação mais próxima dos filhos é favorecida e ajuda a diminuir o

sentimento de perda, falência pessoal, baixa estima e culpa que cerca a ruptura

familiar. Para as mães, em sua maioria detentoras exclusivas da guarda, a guarda

compartilhada é benéfica porque as permite desfrutar de mais liberdade para suas

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atividades pessoais, já que não detêm a inteira responsabilidade para com seus

filhos.

Também perante o judiciário a guarda compartilhada é a melhor opção, haja

vista que, segundo dados do IBGE mencionados por Quintas (2009, p. 90) “70,5%

dos divórcios e 79,5% das separações são consensuais” o que, “agiliza os

processos, posto que não seria necessário discutir com quem ficariam os filhos,

evitando conflitos longos”, que seriam prejudiciais ao menor.

A doutrina mostra que, para o juiz que encontra subsídios em outros

profissionais para tomar a melhor decisão em favor da criança, a guarda

compartilhada também se enquadra como melhor opção.

A guarda compartilhada facilita, inclusive, a resolução de processos de

alimentos, uma vez que viabiliza a convivência dos pais com a prole, os tornando

conhecedores e conscientes das necessidades destes, o que facilita um acordo no

tocante aos alimentos e a posterior satisfação destas necessidades.

Esse tipo de guarda proporciona uma baixa em taxas de novos litígios, além

de evitar a fuga dos pais com seus filhos. Enfim, a guarda compartilhada propicia ao

julgador uma decisão fundada no melhor interesse da criança, conforme preceitua a

Constituição Federal (art. 227), o ECA (art. 19) e todos os demais princípios que

redundam a matéria.

Vários são os autores que elencam uma série de vantagens sobre a aplicação

da guarda compartilhada. Nesse sentido temos a exposição de Lobo (2009, p.

179/180):

[...] prioriza o melhor interesse dos filhos e da família, prioriza o poder familiar em sua extensão e igualdade dos gêneros no exercício da parentalidade, bem como a diferenciação de suas funções, não ficando um dos pais com mero coadjuvante, e privilegia a continuidade das relações da criança com seus dois pais. Respeita a família enquanto sistema, maior do que a soma das partes, que não se dissolve, mas se transforma, devendo continuar sua finalidade de cuidado, proteção e amparo dos menores. Diminui, preventivamente, as disputas passionais pelos filhos, remetendo, no caso de litígio, o conflito conjugal para seu âmbito original, que é o das relações entre os adultos. As relações de solidariedade e do exercício complementar das funções, por meio da cooperação, são fortalecidas a despeito da crise conjugal que o casal atravessa no processo de separação.

Explana Grisard Filho (2009, p. 188):

a guarda compartilhada reflete o maior intercâmbio de papéis entre o homem e a mulher, aumenta a disponibilidade para os filhos, incentiva o adimplemento da pensão alimentícia, aumenta o grau de cooperação, de comunicação e de confiança entre os pais separados na educação dos filhos. Isso lhes permite discutir os detalhes diários da vida dos filhos, como pressuposto do novo modelo.

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Porém, deve-se ressaltar que a guarda compartilhada, assim como qualquer

modalidade de guarda, também apresentam pontos desfavoráveis. Afinal, nem

sempre o que funciona bem com uma família se configura como a melhor opção

para outra. Nesse passo, Quintas (2009, p. 92) afirma que:

argumentos contrários a guarda compartilhada asseguram ser irreal a possibilidade de pais que nunca conviveram, ou pior, que romperam uma relação, compartilhar decisões a respeito da educação e criação dos filhos.

Óbvio que para produzir bons resultados é necessário uma maior

compreensão e colaboração dos pais, de forma que os genitores consigam separar

relacionamento homem/mulher do relacionamento pai/mãe. A forma como se

comportam os pais em relação ao outro é muito importante, pois podem contaminar

o tipo de educação que proporcionam a seus filhos, e nesses casos, os filhos

acabam sendo lesionados com esse tipo de guarda devido à postura de um ou de

ambos os pais.

Os pais devem estar dispostos a isolar seus conflitos quando decidem

compartilhar a guarda dos filhos e das responsabilidades parentais, haveriam casos

em que o fato de os pais não mais viverem juntos diminuiria as áreas de conflito

entre eles, ou seja existem casais que se relacionam melhor entre si após a

separação.

A crítica tenta chegar à conclusão de que a guarda compartilhada estaria

propensa ao desentendimento, que com certeza afetaria os filhos. Porém, o conflito

entre os genitores existe independente da modalidade de guarda. A guarda conjunta

ainda é mais satisfatória nesse sentido, pois pressupõe um acordo entre os

genitores quando da existência de um conflito, enquanto que as demais

modalidades partem do princípio do desacordo, que somente se sanará mediante o

judiciário. Outro argumento a essa crítica é que, de acordo com Quintas (2009, p.

93) “apenas 20 % dos divórcios com guarda compartilhada mantêm a forma

conflituosa”. Complementando seu comentário Quintas (2009, p. 92/93) leciona que:

[...] o SPIG – Shared Parenting Informations Group, grupo inglês que tem o objetivo de promover a co-parentalidade após a separação de um casal, afirma que frenquentemente a raiva entre o casal diminuiria após o primeiro ano. [...] Argumenta-se ainda que, se os pais se relacionam bem, um bom sistema de visitas asseguraria a criança o contato com os pais e as decisões geralmente seriam tomadas em conjunto, como uma guarda compartilhada de fato. O problema da guarda exclusiva tem início antes da decisão de guarda, gera conflito entre os pais na luta para provar quem apresenta melhores condições e tem como conseqüência um desentendimento

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posterior que afeta o menor e que poderia ser evitado diante da possibilidade de ser atribuída a ambos.

Determinante a desfavor desse novo modelo de guarda, é o fato de, ainda

hoje, muitos homens não quererem assumir as responsabilidades para com seus

filhos. Assim o é no dizer de Quintas:

Em pesquisa realizada com os juízes das Varas de Família, alguns afirmaram que muitos pais lutariam pela guarda apenas como forma de atingir a mulher. Desta maneira, a guarda compartilhada deixaria de servir aos interesses da criança e à igualdade dos genitores para se apresentar como uma volta à submissão feminina, posto que, depois de estabelecida, só a mãe assumiria os encargos com os filhos, mas precisaria da concordância do pai para tomar qualquer decisão. (QUINTAS, 2009, p. 94)

O preconceito, ainda hoje existente, advindo da sociedade patriarcal, ainda

faz com que homens e mulheres se achem diferentes com relação aos cuidados

relativos aos filhos. A cultura ocidental por exemplo, defende a idéia de que a mãe

seria a única capaz de cuidar dos filhos, criaram-se mitos em torno dos papéis do

pai e da mãe. Mitos que até hoje são difundidos por homens e mulheres, conforme

discorre Quintas:

[...] a afirmativa de os pais não teria interesse nem saberiam cuidar dos filhos seria um preconceito que inviabilizaria a guarda compartilhada e o princípio segundo o qual a criança necessita de ambos ao mesmo tempo, desencorajando os homens na luta pela guarda dos filhos. (QUINTAS, 2009, p. 95 apud LEITE, 1997, p. 201)

Grisard Filho resenha as desvantagens da guarda compartilhada:

Elas se centram na praticidade de tais arranjos quando há conflito continuado entre os pais (...); na exploração da mulher se a guarda compartilhada é usada como um meio para negociar menores valores de pensão alimentícia (...); e na viabilidade da guarda conjunta para famílias de classe socioeconômica mais baixa (...).(GRISARD FILHO, 2009, p. 228)

Esse mesmo autor relaciona outras desvantagens da guarda compartilhada,

dessa vez sobre o enfoque dos pais e dos filhos, de forma sintetizada:

PAIS: a) maiores custos (moradias apropriadas); b) permanência no mesmo lugar ou cidade, onde vive o grupo familiar; c) constante adaptação; d) necessidade de um emprego flexível. FILHOS: a) Adaptação a duas moradias; b) problemas práticos ou logísticos.(GRISARD FILHO, 2009, p. 228)

Dentre todos os argumentos contrários à guarda compartilhada, o que

predomina em seu desfavor é a alternância de residências, a instabilidade que essa

mudança de residência acarreta aos filhos. Em sua defesa, Quintas (2009, p. 97)

observa que “a criança alternar a casa dos pais é uma possibilidade dentro da

guarda compartilhada e não uma característica desta, que impeça a sua aplicação,

podendo a mesma ser adotada com uma residência fixa para os filhos”.

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Evidente se faz que não há solução acabada e perfeita, uma vez que, a

família original do menor também não está imune a erros, limitações e dificuldades.

O que vale salientar aqui é a flexibilidade da guarda compartilhada, mas o que

realmente vai ser levado em consideração para a determinação do tipo de guarda a

ser adotada para aquele casal, ou melhor, para aquela criança, é o que melhor

atender aos interesses do infante.

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6 PROTEÇÃO DA EFETIVA CONVIVÊNCIA FAMILIAR

6.1 APLICAÇÃO DA GUARDA COMPARTILHADA

6.1.1 Considerações Sobre a Guarda Compartilhada

A nova lei (Lei nº 11.698/2008) veio preencher o vazio legislativo,

assegurando a ambos os pais a participação ativa e igualitária na vida dos filhos

após a ruptura do casal. A lei, de modo claro, reafirma que o poder parental subsiste

absolutamente inalterável com a separação, o divórcio e a dissolução da união

estável (art. 1.632 do CC). Vindo a nova lei reequilibrar os papéis parentais. Os

princípios da dignidade da pessoa humana, da solidariedade, da afetividade, da

paternidade responsável, são de responsabilidade do conteúdo específico pelo

doutrina. Nesse sentido vale ressaltar alguns pontos.

Quanto da postulação da guarda, Lobo (2009, p. 177) estabelece que:

pode ser requerida ao juiz por ambos os pais, em comum acordo, ou por um deles nas ações litigiosas de separação, divórcio, dissolução de união estável, ou, ainda, em medida cautelar preparatória de uma dessas ações.

Da mesma forma prevalece para o terceiro interessado, sendo salutar lembrar

que esta poderá ser requerida a qualquer tempo e que será decidida em atenção às

necessidades específicas do menor.

Quanto a residência dos filhos, a doutrina estabelece que a guarda

compartilhada poderá compreender dois lares, o que aliás é admitido pelo Código

Civil, em seu artigo 71, o filho fica livre para transitar de uma residência para a outra.

O que não significa que outra forma não possa ser estipulada pelos genitores para

melhor atender a criança, pois a lei não trata a respeito da alternância de

residências, deixando a cargo do juiz e da família decidir podendo o juiz se basear

em orientações técnico-profissional ou de equipe interdisciplinar.

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Entretanto, pode ser estipulada a residência de apenas um dos pais como

residência do filho.

A essência do acordo da guarda compartilhada reflete o compromisso dos

pais de manter dois lares para seus filhos e de continuar a cooperar um com o outro

na tomada de decisões. Uma residência principal facilita a manutenção de uma

rotina de vida favorável ao desenvolvimento da criança, porém, cabe ao juiz decidir,

depois de avaliar as condições especiais de cada caso, preservando de toda

maneira o que melhor atender os interesses dos filhos.

Importante ser observado é que na residência única, onde o menor se

encontra juridicamente domiciliado, definindo o espaço dos genitores ao exercício de

suas obrigações. Juridicamente falando, a residência do domicílio de quem exerce a

guarda será o foro competente para apreciar e julgar as ações que versem sobre os

interesses do menor, conforme pressupõe o artigo 147, I do ECA.

Grisard Filho complementa o assunto relatando o seguinte:

o menor necessita contar com a estabilidade de um domicílio, um ponto de referência e centro de apoio para suas atividades no mundo exterior, enfim, de uma continuidade espacial (além da afetiva) e social, onde finque raízes físicas e sociais, com o qual sinta uma relação de interesse e onde desenvolva uma aprendizagem doméstica, diária, da vida. São dessas condições de continuidade, de conservação e de estabilidade que o menor mais precisa no momento da separação de seus pais, não de mudanças e rupturas desnecessárias. Os pais devem tentar manter constantes o maior número possível de fatores da vida dos filhos após a ruptura. (GRISARD FILHO, 2009, p. 172/173)

Quanto ao tradicional direito de visita empregada na guarda unilateral, pode-

se dizer que com relação à guarda compartilhada, este direito seria visto com

estranheza. Por permitir a ambos os pais os mesmos direitos e deveres, a guarda

física pode ser definida entre eles.

Nesse contexto de liberdade quanto à visitação aos filhos, os mesmos podem

(devem) passar um período com o pai e outro com a mãe, sem que se fixe prévia e

rigorosamente tais períodos de deslocamento. Mesmo assim, a residência continua

sendo única. Enfim, mais uma vez, vale aquele arranjo que melhor atenda aos

interesses da criança.

Na guarda compartilhada, assim como em outras modalidades de guarda, as

divergências dos genitores em relação aos cuidados inerentes ao filho podem ser

dirimidas na esfera judicial. Nesse sentido Grisard Filho aduz que:

havendo divergência de opiniões, por exemplo, quando ao colégio ou ao esporte que o filho praticará, qualquer dos pais pode recorrer ao juiz para

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dirimir o conflito. A contestação das escolhas também é possível fora da guarda compartilhada.(GRISARD FILHO, 2009, P. 209)

Outra questão a ser considerada diz respeito aos alimentos parentais que

tanto derivam da lei civil, como se vê nos artigos 1.696 do CC e 22 do ECA, como do

texto constitucional em seu artigo 229.

Os genitores, nem sempre gozam das mesmas condições econômicas,

portanto, a guarda compartilhada não impede a fixação de alimentos. Na guarda

compartilhada, a rigor não existe pensão alimentícia, pois os pais dividem os

encargos de criação, sustento e educação do filho comum.

Mister se faz definir a palavra alimento, como bem descreve Pontes de

Miranda, aqui descrita por Grisard Filho:

conforme a melhor acepção técnica, e, conseguintemente, podada de conotações vulgares, possui o sentido e compreender tudo quanto for imprescindível ao sustento, à habitação, ao vestuário, ao tratamento de enfermidades e às despesas de criação e educação. Ensinamento análogo se encontra nas fontes de direito luso-brasileiro. Hoje em dia, ao catálogo mencionado se acrescenta o lazer, fator essencial ao desenvolvimento equilibrado e à sobrevivência sadia da pessoa humana.(GRISARD FILHO, 2009, p. 177)

Vale ressaltar também que o descumprimento desse dever, assim como aos

demais, também acarreta sanções. Nesse contexto Grisard Filho faz as seguintes

considerações:

O descumprimento desse dever – que se verifica em altíssimo grau – leva, freqüentemente, os pais aos Tribunais (e, às vezes, à prisão), aumentando os conflitos parentais em ambiente (normalmente) já hostil, de efeitos devastadores sobre a prole, deixando inevitáveis seqüelas ao desenvolvimento psicoemocional do menor. A incapacidade de pagar alimentos, traduzida na doutrina por abandono da família, mais no sentido material que moral, não encontra soluções nas leis, mais perfeitas que sejam, nem no estudo aprofundado do tema, nem em uma justiça mais ágil. Não logramos, ainda, encontrar o caminho que garanta, e com eficácia plena, a satisfação do direito aos alimentos, que, em síntese, é o direito à própria vida, como proclama o art. 227 de nossa Carta Magna: “dever da família, da sociedade e do Estado.(GRISARD FILHO, 2009, p. 179)

Outra questão relevante diz respeito à responsabilidade civil dos pais por

danos causados pelos filhos menores, serão solidariamente responsáveis, uma vez

que as decisões relativas à educação são tomadas em comum e a guarda conjunta

é construída sobre essa presunção. Ocorrendo dano, a presunção de erro na

educação da criança ou falha na fiscalização de sua pessoa recai sobre os

genitores.

A subsidiariedade da guarda unilateral é uma consideração muito importante

à respeito da guarda compartilhada, tendo em vista que, o estabelecimento da

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guarda compartilhada não faz extinguir a guarda unilateral, que, sendo possível e

necessária, será aplicada pelo juiz, por acordo entre os pais ou quando a guarda

compartilhada for absolutamente impossível. A lei obriga ao não-guardião o

exercício da supervisão dos fatores determinantes da guarda, no interesse dos

filhos.

A lei em comento conceituou a guarda unilateral e a guarda compartilhada,

estabelecendo, um sistema duplo, porém reconhece como preferencial a guarda

compartilhada (art. 1.584, § 2º), estabelecendo claramente o princípio do melhor

interesse da criança e do adolescente como critério fundamental para a atribuição da

guarda.

Prevê a concessão da guarda por consenso ou por decisão judicial, a quem

revele melhores condições para exercê-la, não se entendendo como melhores

condições, somente os recursos financeiros, devendo obedecer aos critérios

objetivos descritos no artigo 1.583, § 2º e incisos, que não são taxativos.

A guarda compartilhada pode ser concedida a pessoa diversa dos genitores,

sempre que se verificar a inconveniência da criança em permanecer com o pai ou

com a mãe, concedendo a guarda a quem revele compatibilidade com a natureza da

medida, respeitando o grau de parentesco.

Deve-se salientar também, sobre a mutabilidade da decisão, que nenhuma

das necessidades da criança é estável, o que serve num nível aos seus interesses

de desenvolvimento, num outro pode ser prejudicial à sua evolução. Dessa forma,

para que melhor se atenda ao interesse da criança, é preciso que seja possível, a

modificação da decisão da guarda, quando necessária.

Este aspecto é destacado por Quintas quando disserta:

Humberto Theodoro Júnior afirma que isto se daria nas situações de julgamento rebus sic stantibus. A sentença basear-se-ia numa situação atual, mas teria sua eficácia projetada sobre o futuro, já que os fatos que motivaram a sentença poderiam ser alterados ou mesmo desaparecer. A eficácia do julgado não deveria perdurar imutável e intangível. (QUINTAS, 2009, p. 144)

Mas o que há de mais importante a ser dito a respeito desse modelo de

guarda não se encontra na doutrina e sim no judiciário, pois é o juiz, sempre

baseado no melhor interesse da criança, quem vai decidir pela sua adoção ou não.

Dessa forma pode-se dizer que esse profissional deve, sim, estar

acompanhado de profissionais de todas as áreas para melhor basear sua decisão,

posto que a vida de uma criança se encontra em suas mãos, uma criança que

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posteriormente vai se transformar num adulto consciente ou não de suas obrigações

como cidadão, e sua formação familiar contribui muito para tal.

6.1.2 Obediência à Afetividade e ao Melhor Interesse da Criança

A ruptura da relação conjugal afeta diretamente os filhos, que tem toda a sua

estrutura organizacional abalada, muitas vezes, se tornando objeto de disputa entre

os pais, gerando um sofrimento psicológico. A guarda compartilhada busca

minimizar essas, perturbações psicoemocionais. Na medida em que valoriza o

convívio do menor com seus dois pais assume uma importância extraordinária, pois

apesar da separação mantém o exercício em comum da autoridade parental e

reserva, a cada um dos pais, o direito de participar das decisões importantes que se

referem à criança.

Garantir a convivência entre pais e filhos, se faz cumprir com o propósito

constitucional de proteger a família, surgida ou não do casamento, conforme o art.

226 da CF. No que se trata da guarda compartilhada em nosso direito, a Lei

11.698/2008 recolhe os princípios constitucionais de proteção à criança e ao

adolescente e estabelece preceitos de direito material e processual que assegurem

uma adequada comunicação entre pais e filhos, para a consolidação dos

sentimentos dos filhos com os pais, contribuindo assim para uma coesão afetiva e

eficaz dos vínculos familiares e para o desenvolvimento de uma estrutura sólida e

equilibrada na formação da personalidade dos filhos menores.

A guarda compartilhada é sem dúvida, o arranjo de guarda mais justo, a

opção que melhor atende aos anseios de proteção do menor. Porém, existem alguns

pontos na Lei nº 11.698/2008 em que divergem os estudiosos do direito, um ponto

negativo é atribuir ao juiz possibilidade de fixar a guarda compartilhada, sempre que

possível, quando não houver acordo entre os pais quanto à guarda dos filhos. Para

que haja um bom funcionamento da guarda compartilhada os pais devem estar de

comum acordo, tornando difícil imaginar uma situação que se adeqüe ao que a lei

estabelece como sempre que possível.

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A questão da priorização da guarda compartilhada, mesmo nos casos de

conflito entre os pais, ganhou destaque jurídico. A propósito José Carlos Teixeira

Giorgis aqui citado por Grisard Filho, desembargador aposentado do TJRS,

comenta:

É necessário esclarecer que a guarda compartilhada não será remédio milagroso para a cura dos distúrbios familiares; nem divisão de tempo ou de semana, para folgança dos pais; não é a intromissão lá e cá, principalmente quando se cuidam de entidades reconstituídas; não tem lugar quando há mágoas, litigo ou difícil relacionamento na parceria.(GRISARD FILHO, 2009, p. 204/205)

Através da mediação, a própria família tem o poder de decidir seu futuro. Sua

participação no litígio é de extrema importância, pois faz com que seus membros

assumam a responsabilidade pela manutenção do litígio e, conseqüentemente, pela

resolução do mesmo, além de ser uma forma de pacificar o conflito.

Stella Galbinski Breitman, aqui citada por Quintas conceitua o instituto,

buscando mostrar seu objetivo:

É um conjunto de ferramentas, através das quais, uma terceira pessoa imparcial e especialmente treinada, vai ajudar as pessoas envolvidas em disputas familiares a reconhecerem e negociarem suas diferenças, podendo chegar a um acordo que as beneficie, mutuamente, através da auto-regulação dos conflitos. (QUINTAS, 2009, p. 98)

O mediador não exerce um papel profissional e não impõe uma

decisão, age como um facilitador, orientando as partes na identificação dos temas,

engajando-as a solução dos problemas em conjunto e explorando as possibilidades

de acordos alternativos, trazendo aos pais, a importância e responsabilidade destes

na vida de seus filhos, direcionando os genitores para um interesse comum, qual

seja, o melhor interesse da criança, o que acaba favorecendo a opção pela guarda

compartilhada.

Certamente que a mediação não se aplica a todos os casos e tem suas

limitações. Assim como nem sempre se reflete em um arranjo de guarda

compartilhada, podendo demonstrar que a melhor opção é o contrário, mas o

importante é que proporcione à própria família decidir seu destino, permitindo a

opção pelo arranjo de guarda que mais se adequar, porque faz com que os pais

entendam os motivos pelos quais tomarão tal decisão.

Enfim, mesmo que a mediação não consiga fazer com que os pais cheguem a

um acordo, ela poderá desfazer a confusão geralmente existente entre o papel

parental e o papel conjugal, amenizando o conflito existente, acabando com a

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percepção dos pais em ganhar ou perder, beneficiando o diálogo, pacificando o

conflito.

Com a mediação, a decisão surge das partes, sendo mais fácil e durável sua

aplicação. A mediação é como uma ajuda preciosa ao juiz, pois oferece às partes

um espaço de diálogo e um tempo de compreensão do conflito que permitiria a

reorganização de novas relações.

Outro ponto importante, que pode ajudar o juiz na aplicação do arranjo de

guarda mais adequado aquela determinada família, é a utilização da equipe

interdisciplinar (art.1.584, § 3º). É através do estudo procedido por esta equipe que o

juiz coleta elementos informativos para a determinação do melhor interesse do

menor e, conseguintemente, para a outorga da guarda, mas, como salienta Quintas

(2009, p. 142), “não deve consistir no único caminho a ser seguido pelo juiz, mas

como um elemento a mais de exame”. A autora ainda disciplina:

A apreciação social informará as condições de vida, materiais e sociais, que os pais irão proporcionar aos filhos. Já o auxílio psicológico não tem como objetivo fazer um acompanhamento das partes, mas uma análise de suas características psíquicas, para ajudar o juiz na sua decisão, sendo, atualmente, de suma importância, afinal, conforme Guita Goldenberg e César Gonçalves: A família hoje, em termos jurídicos, vem mais de encontro com o conhecimento psicanalítico, pois está mais voltada para a afetividade existente entre seus membros. A família, antes de tudo, deve ser estruturante para seus membros, independente da situação jurídica da mesma. (QUINTAS, 2009, p. 142/143)

A estrutura do poder familiar se compõe com a diferença dos institutos da

autoridade parental e da guarda compartilhada e tal diferenciação é de crucial

relevância, pois constitui o ponto de partida para analisar o cabimento da guarda

compartilhada em nossa ordem jurídica, bem como suas implicações.

O poder-dever de proteção e provimento das necessidades da criança

encontram abrigo muito mais na autoridade parental do que na guarda. A guarda

jurídica compartilhada define os dois genitores, do ponto de vista legal, como iguais

detentores da autoridade parental para tomar todas as decisões que afetem os

filhos.

O que se constata é a presença marcante da possibilidade do exercício

conjunto da autoridade parental, como aspecto definidor da guarda compartilhada,

pois que possibilita que os genitores compartilhem as decisões mais relevantes da

vida dos filhos. Diante disso, tal instituto é desnecessário, em face do que dispõe o

art. 1.632 do Código Civil. A relação parental é desatrelada da definição dos rumos

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da conjugalidade dos pais, garantindo aos filhos a vinculação do laço afetivo com

ambos os genitores, mesmo após o esfacelamento da vida em comum.

De qualquer sorte a guarda obedece, fundamentalmente, ao princípio do

melhor interesse da criança e do adolescente, e o melhor interesse da criança é

estar em companhia e sob a guarda de seus pais, os maiores interessados em sua

proteção, e assim determina o código civil vigente.

Portanto, a decisão do julgador deve obedecer ao referido princípio, bem

como ao princípio da prioridade absoluta da criança e do adolescente (art. 227, CF).

O que significa dizer, segundo Quintas (2009, p. 130) apud Oliveira e Muniz (1999,

p. 453) que todos os critérios estudados “seriam os mais gerais e abstratos”.

Assim, o magistrado deve estar apto a decidir de modo diferente, sempre a

bem da criança. Nesse passo, Quintas proclama:

A Constituição Federal de 1988 prevê que a garantia dos direitos da criança e do adolescente coloca-se como “prioridade absoluta”. Ao fazê-lo, estabelece critério hermenêutico a nortear o intérprete quando do exame de situações que envolvam a criança e o adolescente. (QUNTAS, 2009, p. 130 apud FACHIN, 1999)

Ou seja, a decisão deve estar direcionada à criança, a atender os interesses

dela. Dessa forma, não há uma forma preestabelecida de guarda que vá satisfazer o

interesse daquela criança em questão, o juiz possui um poder discricionário busca o

que é mais vantajoso ao modo de vida da criança, levando em consideração seu

desenvolvimento, seu futuro, felicidade e equilíbrio.

Constata-se, portanto, que o princípio do melhor interesse da criança e do

adolescente deve se fazer presente, fundamentalmente, em todas as situações e

que a família e a criança se fizerem envolvidas.

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7 CONCLUSÃO

O estudo da família contemporânea foi de fundamental importância para essa

pesquisa, levando em consideração as mudanças na estrutura familiar. A mulher era

importante para gerar filhos e responsável pela organização do lar, já o homem

exercia a chefia da família, era responsável pelo sustento da mesma. Somente os

filhos nascidos no casamento possuíam direitos e a união entre um homem e uma

mulher sem o casamento era vista com preconceitos. Alguns fatos sociais, como

exemplo a Revolução Industrial, contribuíram para a necessidade da mão-de-obra

feminina, e a mulher passou a ter uma postura diferente no núcleo da família,

passou a dividir responsabilidades com o homem. Famílias migraram para as

cidades e ficaram cada vez mais próximos, os laços afetivos foram reforçados. Com

a evolução familiar entendeu-se que era necessário uma mudança na legislação, o

direito de família ganhou a expressão direito de famílias, onde o casamento, a união

estável e a família monoparental passaram a ter a mesma proteção jurídica, e foi

instaurada a igualdade entre o homem e a mulher.

O poder patriarcal, antes conferido somente ao homem da família, foi

restringido com a emancipação feminina e com o tratamento igualitário dado aos

filhos. Autoridade parental é a expressão mais atual que melhor representa a

conversão do poder familiar em uma obrigação, sendo mais um dever que um poder.

Os pais possuem o dever de propiciar o crescimento e amadurecimento

responsável do filho, promovendo sua criação e educação de forma conjunta, no

seio da convivência familiar, mas, na ruptura da sociedade conjugal, essa

convivência pode ser forçosamente interrompida. Com o surgimento da Lei nº

11.698/2008, o ordenamento jurídico pátrio ganhou maior segurança, para conferir o

que, até então, era empregado de forma tímida, que é a guarda compartilhada.

Quando o pai e a mãe desejam juntos continuar a exercer a autoridade parental,

essa guarda é que assegura isso. A guarda compartilhada nasceu na Inglaterra a

aproximadamente vinte anos, se estendeu até a Europa continental, se desenvolveu

na França e teve repercussão no Canadá e nos Estados Unidos, chegou no Brasil a

alguns anos, mas era exercida de forma tímida e só em 13 de Junho de 2008

começou a vigorar e ganhar espaço no país.

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Muitos são os questionamentos que a promulgação da referida lei fez

insurgir. A guarda é apenas uma forma de exercício da autoridade parental, e como

este não se dissolve com a separação dos pais, o filho continuaria a conviver com

seus genitores mesmo após a separação. A mediação tem sido utilizada para se

chegar à guarda compartilhada, pois a falta de consenso entre os pais seria a falta

do próprio pressuposto da guarda compartilhada. A doutrina classifica a guarda

compartilhada como a melhor solução para a criança após o rompimento conjugal de

seus pais, visto que proporciona à prole uma continuidade da convivência familiar.

Considerando a realidade fática das crianças e adolescentes, a guarda

compartilhada se destaca com importância, tendo em vista que ela elimina um

conflito de escolha entre pai e mãe que o filho deve realizar, proporciona uma

aproximação entre o filho e os pais, reatando os laços afetivos que se soltaram com

a dissolução da família, proporcionando à criança um ambiente favorável de

desenvolvimento. Um ponto negativo é a possibilidade de o juiz levar em

consideração a aplicação da guarda compartilhada sempre que possível, podendo

envolver um caso onde um dos genitores não concorda com a aplicação da mesma,

dessa forma não tem como dar certo, podendo frustrar a criança.

O emprego da equipe interdisciplinar é de grande importância, para que,

junto com todos os outros elementos expostos ao juiz, o auxilia na sua decisão,

decidindo o destino da criança, sem esquecer que cada caso apresentará suas

peculiaridades. Certo, porém, que tudo quanto foi exposto neste trabalho

monográfico é de grande valia na aplicação prática da guarda compartilhada, sem o

qual impossível seria a apreciação do juiz ao caso concreto. Contudo, o que vai

prevalecer dentre todos os critérios a dispor da discricionariedade do julgador é a

manifestação do princípio do melhor interesse da criança e do adolescente, que será

aplicado pelo magistrado considerando o caso daquela determinada criança.

Portanto, o que há de mais importante a ser observado é se os deveres impostos

aos pais estão sendo cumpridos. Independente da modalidade de guarda a ser

fixada, deve-se garantir o interesse do filho para que o mesmo possa amadurecer de

forma responsável.

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REFERÊNCIAS

BRASIL, Constituição República Federativa do. Brasília, 1988. Vade Mecum. 9ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2010. BRASIL, Novo Código Civil: Lei 10.406/2002: Vade Mecum. 9ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2010. COMEL, Nelsina Helena Damo. Paternidade Responsável. 2ª Ed. Curitiba: Juruá. 2006. COSTA, Wagner Veneziani; AQUAROLI, Marcelo. Dicionário Jurídico. São Paulo: DIAS, Maria Berenice. Manual do Direito das Famílias. 7ª Ed. São Paulo: Revistas dos Tribunais, 2010. DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro – Direito de Família. Volume V. 24ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2009. GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro – Direito de Família.Volume VI. 6ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2009. GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal – Parte Especial. Volume III. 6ª Ed. Niterói: Impetus, 2009. GRISARD FILHO, Waldyr. Guarda Compartilhada - Um novo modelo de responsabilidade parental. 4ª Ed. Rio de Janeiro: Revista dos Tribunais, 2009. LOBO, Paulo. Direito Civil: família. 2ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2009. Madras, 2004. MARAFELLI, Mayra Soraggi. Responsabilidade Civil por Abandono Afetivo: a possibilidade de se conceder indenização ao filho afetivamente abandonado pelo pai. Disponível em: http://www.jurisway.org.br/v2/dhall.asp?id_dh=1164

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MELO, Maria Marli Castelo Branco de. IBDFAM ACADÊMICO – Guarda Compartilhada: Novo padrão Contemporâneo do Direito de Família. Disponível em: http://www.ibdfam.org.br/?artigos&artigo=453 MIRANDA, Pontes de. Tratado de Direito de Família. Volume III. 1ª Ed. Campinas: Bookseller, 2001. PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil – Direito de Família. Voluma V. 18ª Ed. Rio de Janeiro: Forense, 2010. PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Princípios Fundamentais Norteadores para o Direito de Família. Belo Horizonte: Del Rey, 2006. QUINTAS, Maria Manoela Rocha de Albuquerque. Guarda Compartilhada. 1ª Ed. Rio de Janeiro: Forense, 2009. TOLEDO, Antônio Luiz de. et al. Vade Mecum. 9ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2010. VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil – Direito de Família. Volume VI. 7ª Ed. São Paulo: Atlas,2007.

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ANEXOS

ANEXO A – LEI Nº 11.698, DE 13 DE JUNHO DE 2008

Presidência da República Casa Civil

Subchefia para Assuntos Jurídicos

LEI Nº 11.698, DE 13 DE JUNHO DE 2008.

Altera os arts. 1.583 e 1.584 da Lei no 10.406, de 10 de janeiro de 2002 – Código

Civil, para instituir e disciplinar a guarda compartilhada.

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional

decreta e eu sanciono a seguinte Lei:

Art. 1o Os arts. 1.583 e 1.584 da Lei no 10.406, de 10 de janeiro de 2002 –

Código Civil, passam a vigorar com a seguinte redação:

“Art. 1.583. A guarda será unilateral ou compartilhada.

§ 1o Compreende-se por guarda unilateral a atribuída a um só dos genitores ou a

alguém que o substitua (art. 1.584, § 5o) e, por guarda compartilhada a

responsabilização conjunta e o exercício de direitos e deveres do pai e da mãe que

não vivam sob o mesmo teto, concernentes ao poder familiar dos filhos comuns.

§ 2o A guarda unilateral será atribuída ao genitor que revele melhores condições

para exercê-la e, objetivamente, mais aptidão para propiciar aos filhos os seguintes

fatores:

I – afeto nas relações com o genitor e com o grupo familiar;

II – saúde e segurança;

III – educação.

§ 3o A guarda unilateral obriga o pai ou a mãe que não a detenha a supervisionar os

interesses dos filhos.

§ 4o (VETADO).” (NR)

“Art. 1.584. A guarda, unilateral ou compartilhada, poderá ser:

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I – requerida, por consenso, pelo pai e pela mãe, ou por qualquer deles, em ação

autônoma de separação, de divórcio, de dissolução de união estável ou em medida

cautelar;

II – decretada pelo juiz, em atenção a necessidades específicas do filho, ou em

razão da distribuição de tempo necessário ao convívio deste com o pai e com a

mãe.

§ 1o Na audiência de conciliação, o juiz informará ao pai e à mãe o significado da

guarda compartilhada, a sua importância, a similitude de deveres e direitos

atribuídos aos genitores e as sanções pelo descumprimento de suas cláusulas.

§ 2o Quando não houver acordo entre a mãe e o pai quanto à guarda do filho, será

aplicada, sempre que possível, a guarda compartilhada.

§ 3o Para estabelecer as atribuições do pai e da mãe e os períodos de convivência

sob guarda compartilhada, o juiz, de ofício ou a requerimento do Ministério Público,

poderá basear-se em orientação técnico-profissional ou de equipe interdisciplinar.

§ 4o A alteração não autorizada ou o descumprimento imotivado de cláusula de

guarda, unilateral ou compartilhada, poderá implicar a redução de prerrogativas

atribuídas ao seu detentor, inclusive quanto ao número de horas de convivência com

o filho.

§ 5o Se o juiz verificar que o filho não deve permanecer sob a guarda do pai ou da

mãe, deferirá a guarda à pessoa que revele compatibilidade com a natureza da

medida, considerados, de preferência, o grau de parentesco e as relações de

afinidade e afetividade.” (NR)

Art. 2o Esta Lei entra em vigor após decorridos 60 (sessenta) dias de sua

publicação.

Brasília, 13 de junho de 2008; 187o da Independência e 120o da República.

LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA Luiz Paulo Teles Ferreira Barreto José Antonio Dias Toffoli

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ANEXO B - JURISPRUDÊNCIAS

JURISPRUDÊNCIAS DE GUARDA COMPARTILHADA DE MINAS GERAIS TJMG

Número do processo:

1.0324.07.057434-2/001(1)

Numeração Única:

0574342-42.2007.8.13.0324

Acórdão Indexado!

Precisão: 100

Relator: Des.(a) DÍDIMO INOCÊNCIO DE PAULA

Data do Julgamento: 16/04/2009

Data da Publicação: 26/06/2009

Ementa:

FAMÍLIA - APELAÇÃO - AÇÃO DE SEPARAÇÃO JUDICIAL LITIGIOSA - GUARDA COMPARTILHADA - PERMANÊNCIA ALTERNADA DO MENOR COM SEUS GENITORES - COMPARTILHAMENTO DA GUARDA FÍSICA - INVIABILIDADE - VÍNCULO AFETIVO INTENSO COM O PAI - PROVIMENTO DO RECURSO - A alternância da posse física do menor entre os genitores, sendo aquele submetido ora aos cuidados do pai, ora da mãe, configura guarda alternada, repudiada pela doutrina e pela jurisprudência, e não guarda compartilhada, na qual os pais regem, em conjunto, a vida da prole, tomando as decisões necessárias à sua educação e criação. - Apurando-se através dos estudos sociais realizados nos autos que a criança tem maior vínculo afetivo com seu pai, deve ser fixada sua residência naquela do genitor.

Número do processo:

1.0231.05.040613-2/001(1)

Numeração Única:

0406132-84.2005.8.13.0231

Acórdão Indexado!

Precisão: 74

Relator: Des.(a) HELOISA COMBAT

Data do Julgamento: 07/08/2007

Data da Publicação: 21/09/2007

Ementa:

APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE GUARDA - CRITÉRIOS - INTERESSE DO MENOR - GUARDA COMPARTILHADA. - A guarda dos filhos deve ser concedida ao genitor que revelar melhores condições de atender aos interesses dos menores. - Nada havendo que contra-indique a guarda compartilhada e que a criança resida com a mãe, deve ser mantida a sentença.

Número do processo:

1.0521.03.022519-2/001(1)

Numeração Única:

0225192-98.2003.8.13.0521

Acórdão Precisão: 50

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Indexado!

Relator: Des.(a) FERNANDO BRÁULIO

Data do Julgamento: 26/07/2007

Data da Publicação: 18/10/2007

Ementa:

MENOR - GUARDA COMPARTILHADA NÃO RECOMENDADA - GUARDA QUE SE CONCEDE À MÃE - INTERESSE DO MENOR - ESTUDO PSICOLÓGICO E SOCIAL - RECURSO IMPROVIDO - Justifica-se a concessão da guarda à mãe, no interesse de filho menor, na hipótese de pais que residem em cidades distantes, para que se evitem prejuízos à formação do infante.

Número do processo:

1.0016.06.062550-2/001(1)

Numeração Única:

0625502-94.2006.8.13.0016

Acórdão Indexado!

Precisão: 37

Relator: Des.(a) VANESSA VERDOLIM HUDSON ANDRADE

Data do Julgamento: 04/03/2008

Data da Publicação: 28/03/2008

Ementa:

DIREITO DE FAMÍLIA - ALTERAÇÃO DA GUARDA - ATENDIMENTO DOS INTERESSES DO MENOR - INEXISTÊNCIA DE RAZÃO RELEVANTE QUE ATESTE A NECESSIDADE DE ALTERAÇÃO DA SITUAÇÃO FÁTICA. - A manutenção da situação de fato é medida de interesse do menor desde que inexistam motivos para a alteração da guarda. O artigo 1.584 do Código Civil preconiza que a guarda deve ser concedida àquele cônjuge que tiver melhores condições para criar o filho. Essa expressão se dirige ao atendimento dos interesses da criança. Sendo assim, caso não haja nos autos provas que desabonem o detentor da posse fática do infante, havendo comprovada satisfação dos interesses do menor, a situação existente há de ser mantida.

Número do processo:

1.0701.06.140907-7/001(1)

Numeração Única:

1409077-38.2006.8.13.0701

Acórdão Indexado!

Precisão: 37

Relator: Des.(a) EDUARDO ANDRADE

Data do Julgamento: 29/05/2007

Data da Publicação: 05/06/2007

Ementa:

GUARDA - PEDIDO FEITO PELO PADRINHO - INTERESSE DOS MENORES - DEFERIMENTO DO PEDIDO. - Sendo a guarda um instituto que visa à proteção dos interesses do menor, deve ficar com aquele que tiver melhor condição de propiciar o seu bom desenvolvimento. Assim, é de se deferir o pedido de guarda feito pelo padrinho dos menores, que estão na sua companhia desde a mais tenra idade.

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JURISPRUDÊNCIA DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESPÍRITO SANTO TJES

1. 035101114458

Classe: Agravo de Instrumento

Relator : JOSÉ PAULO CALMON NOGUEIRA DA GAMA

Orgão Julgador: SEGUNDA CÂMARA CÍVEL

Data do Julgamento: 08/02/2011

AGVTE.:VALQUÍRIA DA CRUZ ALMEIDA AGVDO.:JOSÉ RICARDO GOMES CAIADO RELATOR:DESEMBARGADOR JOSÉ PAULO CALMON NOGUEIRA DA GAMA

A C Ó R D Ã O EMENTA: DIREITO CIVIL, FAMÍLIA. Agravo de instrumento. ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA. REQUISITOS. INOCORRÊNCIA. GUARDA COMPARTILHADA. PREFERÊNCIA. MANUTENÇÃO DO STATUS QUO ANTE. RECURSO IMPROVIDO 1) Para a antecipação dos efeitos da tutela é necessária a demonstração da prova inequívoca da verossimilhança da alegação e o fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação; ou que fique caracterizado o abuso de direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório do réu, nos termos do art. 273 do CPC. 2) No caso em que, de um lado a genitora ventila que o pai não possui condições de cuidar da criança, uma vez que permanece embarcado em plataformas da Petrobras, de modo que só está em casa com aquela regularidade, já que fica embarcado por 15 dias, permanecendo em casa durante os outros 15 dias e, por outro lado, o genitor induz que a mãe possui uma vida pouco ortodoxa, uma vez que ¿juntou¿ com uma pessoa que mal conhecia e retirou o menor abruptamente da escola onde já estudava há mais de 02 (dois) anos e levou consigo para uma cidade estranha e com pessoas que até então não faziam parte do seu convício social, tentando impedir a boa convivência do pai com a criança, não se constata a plausibilidade jurídica das alegações da agravante, pelo menos no que tange ao interesse superior da criança em ser colocada na guarda unilateral da mãe, ensejando a mudança de cidade e do círculo social em que se encontra inserida. 3) Por expressa determinação legal, ¿quando não houver acordo entre a mãe e o pai quanto à guarda do filho, será aplicada, sempre que possível, a guarda compartilhada¿ (§ 2º do art. 1.584 do CC). 3) Recurso improvido. ACORDA a Egrégia Segunda Câmara Cível, em conformidade da ata e notas taquigráficas da sessão, que integram este julgado, à unanimidade de votos, conhecer do recurso e negar-lhe provimento.

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Vitória, 08 de fevereiro 2011.

DESEMBARGADOR PRESIDENTE

DESEMBARGADOR RELATOR

PROCURADOR DE JUSTIÇA

2. 021070010901

Classe: Apelação Civel

Relator Designado: BENICIO FERRARI

Orgão Julgador: TERCEIRA CÂMARA CÍVEL

Data do Julgamento: 20/10/2009

APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE MODIFICAÇÃO DE GUARDA - SENTENÇA QUE CONCEDE A GUARDA COMPARTILHADA DO MENOR ENTRE OS PAIS - POSSIBILIDADE - DESNECESSIDADE DE PEDIDO - INTERESSE DO MENOR - SENTENÇA MANTIDA - RECURSO IMPROVIDO. 1- Não se pode considerar extra petita a sentença que concede a guarda compartilhada entre ambos os pais, ainda que o pedido da demanda seja de modificação de guarda em favor apenas de um deles. 2- O art. 1.584, II do Código Civil prevê a possibilidade do juiz decretar a quarda unilateral, ou mesmo compartilhada, em atenção às necessidades específicas do menor, ou em razão da distribuição de tempo necessário ao convívio deste com o pai e com a mãe. 3 - A intenção do legislador ao incluir tal instituto em nosso sistema é de aproximar o menor de sua família mesmo que seus pais, em virtude da separação, não estejam vivendo sob o mesmo teto, para que conjuntamente possam exercer os seus direitos e deveres no que concerne ao poder familiar, possibilitando um maior suprimento material, moral e emocional do filho menor. 4 - Não havendo qualquer elemento desabonador da conduta da outra parte, que não a demandante, e sendo demonstrado nos autos a existência de um ambiente saudável e harmônico entre os membros da família, bem como os cuidados de ambos os pais em relação a seus filhos, não há razão para o deferimento da guarda a apenas um deles. 5 - Recurso improvido.

3. 057050003433

Classe: Apelação Civel

Relator : FREDERICO GUILHERME PIMENTEL

Orgão Julgador: PRIMEIRA CÂMARA CÍVEL

Data do Julgamento: 04/11/2008

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PRIMEIRA CÂMARA CÍVEL APELAÇÃO CÍVEL Nº 057050003433 APTE: KELI CRISTINA CORTELETE APDA: MARCELO LIMA FEDESZEN RELATOR: DES. FREDERICO GUILHERME PIMENTEL

ACÓRDÃO EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE MANUTENÇÃO E REGULARIZAÇÃO DE GUARDA - MANUTENÇÃO DA GUARDA COM O AUTOR (PAI) - ESTABILIZAÇÃO DE SITUAÇÃO VIVIDA ENQUANTO A GENITORA ENCONTRAVA-SE AUSENTE DO PAÍS - SITUAÇÃO QUE MELHOR INTERESSA AOS MENORES - PRELIMINARES REJEITADAS - MÉRITO - REDISCUSSÃO DA TESE DE DEFESA JÁ ENFRENTADA - APELO CONHECIDO E IMPROVIDO - SENTENÇA MANTIDA. 1. Rejeita-se a preliminar de ausência de fundamentação quando a sentença guerreada encontra-se devidamente embasada, inclusive tecendo detalhes da vida íntima dos envolvidos, característica própria das decisões proferidas em ação de guarda de menores disputada por seus genitores. 2. A preliminar de sentença extra e ultra petita deve ser rejeitada quando se constata que a decisão objurgada não ultrapassou os limites da lide proposta, nem concedeu ao vencedor algo diverso do que foi pleiteado. 3. Em sede de lide envolvendo a delicada questão acerca da guarda dos filhos dos genitores litigantes, revela-se acertado o entendimento que busca acolher o que for melhor para o interesse dos menores enquanto pessoas em formação. 4. A novel legislação da guarda compartilhada - Lei nº 11.698⁄2008, ainda em período de vacatio legis - fomenta a guarda simultânea entre os genitores, salvo nas hipóteses de impossibilidade comprovada, configurada no caso dos autos diante da distância existente entre os domicílios dos pais - Vitória e Águia Branca. Vistos, relatados e discutidos os presentes autos, em que são partes as acima mencionados. Acorda, a Egrégia Primeira Câmara, na conformidade da ata e notas taquigráficas da sessão, à unanimidade, rejeitar as preliminares argüidas. No mérito, por idêntica votação, negar provimento ao recurso, nos termos do voto do Eminente Relator.

Vitória (ES), 04 de novembro de 2008.

PRESIDENTE

RELATOR

PROCURADOR DE JUSTIÇA

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4. 035069000434

Classe: Agravo de Instrumento

Relator : ELPÍDIO JOSÉ DUQUE

Orgão Julgador: SEGUNDA CÂMARA CÍVEL

Data do Julgamento: 10/10/2006

SEGUNDA CÂMARA CÍVEL

ACÓRDÃO AGRAVO POR INSTRUMENTO nº 035.069.000.434 Agvte. : LUIZ GUILHERME RISSO Agvda. : CLAUDINE RODRIGUES PIMENTA Relator: DES. ELPÍDIO JOSÉ DUQUE EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO - PROCESSUAL CIVIL E DIREITO DE FAMÍLIA - REGULAMENTAÇÃO DE VISITA - PEDIDO ALTERNATIVO - VISITAÇÃO DO PAI - CONDIÇÕES DE IGUALDADE - PRIMAZIA DO INTERESSE DO MENOR - GUARDA ALTERNADA E GUARDA COMPARTILHADA - DIFERENÇA ONTOLÓGICA. 1). O pedido alternativo traduz-se em possibilidade da aceitação de qualquer um dos pedidos realizados. 2). Na participação da vida sócio-educativa do menor, os pais devem participar em condições de igualdade, propiciando, desse modo, tanto a existência da figura materna, quanto da paterna. 3). Na regulamentação de visita do pai ou da mãe deve o Poder Judiciário primar pelos interesses do menor, de modo que as alterações em sua rotina não sejam drásticas. 4). A diferença entre guarda alternada e a compartilhada é ontológica. Enquanto a guarda compartilhada de filhos menores é o instituto que visa a participação em nível de igualdade dos genitores nas decisões que se relacionam aos filhos, a guarda alternada se consubstancia na alternância de lares, ou seja, passa a menor a possuir duas casas. 5). A guarda compartilhada é recomendada quando os pais, mesmos separados ou divorciados, convivem em perfeita harmonia e pacificidade. Precedentes. VISTOS, relatados e discutidos estes autos, ACORDAM os Desembargadores que integram a Segunda Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Espírito Santo, na conformidade da ata e notas taquigráficas, à unanimidade, em dar provimento ao recurso.

Vitória, 10 de outubro de 2006.

Presidente

Relator

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Procurador de Justiça JURISPRUDÊNCIA DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO RIO GRANDE DO SUL

TJRS

1. Número: 70040493330 Inteiro Teor: doc html Tribunal: Tribunal de Justiça do RS Seção: CIVEL Tipo de Processo: Agravo de Instrumento Órgão Julgador: Oitava Câmara Cível Decisão: Acórdão Relator: Luiz Felipe Brasil Santos Comarca de Origem: Comarca de Horizontina Ementa: AGRAVO DE INSTRUMENTO. ALTERAÇÃO DE GUARDA. GUARDA COMPARTILHADA. DESCABIMENTO. Descabe a fixação de guarda compartilhada quando há entre os genitores clima de embate. Só é viável tal modalidade quando preservados os canais de comunicação entre o casal. A demanda objetiva apenas a regularização de situação fática já existente, qual seja, o deferimento da aguarda ao pai. NEGARAM PROVIMENTO. UNÂNIME. (Agravo de Instrumento Nº 70040493330, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Luiz Felipe Brasil Santos, Julgado em 31/03/2011) Data de Julgamento: 31/03/2011 Publicação: Diário da Justiça do dia 08/04/2011 Versão para impressão

2. Número: 70037517273 Inteiro Teor: doc html Tribunal: Tribunal de Justiça do RS Seção: CIVEL Tipo de Processo: Apelação Cível Órgão Julgador: Sétima Câmara Cível Decisão: Acórdão Relator: André Luiz Planella Villarinho Comarca de Origem: Comarca de Montenegro Ementa: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE GUARDA COMPARTILHADA. AUSENCIA DOS REQUISITOS. IMPOSSIBILIDADE DE IMPOSIÇÃO AOS GENITORES DE TAL MODALIDADE DE GUARDA ANTE A DISCORDÂNCIA DE UMA DAS PARTES. A guarda compartilhada pressupõe harmonia e consenso entre os genitores, quanto à criação, educação e guarda do filho. Se um dos genitores se opõe à continuidade da guarda compartilhada até então mantida, demonstrando forte dissidência entre os genitores, não há como se impor a ambos a guarda compartilhada, ante a ausência de requisito essencial a sua configuração. Guarda deferida à genitora, preservado... Ver íntegra da ementa o direito de intensa visitação entre pai e filho. Mantidos os alimentos no patamar fixado na sentença, convertido para valor fixo, corrigido anualmente pelo IGP-M. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA. (Apelação Cível Nº 70037517273, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: André Luiz Planella Villarinho, Julgado em 23/03/2011) Data de Julgamento: 23/03/2011 Publicação: Diário da Justiça do dia 05/04/2011

3. Número: 70038192860 Inteiro Teor: doc html Tribunal: Tribunal de Justiça do RS Seção: CIVEL Tipo de Processo: Apelação Cível Órgão Julgador: Sétima Câmara Cível Decisão: Acórdão Relator: André Luiz Planella Villarinho Comarca de Origem: Comarca de Porto Alegre Ementa: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE GUARDA. DEFERIMENTO DA GUARDA COMPARTILHADA ENTRE A AVÓ MATERNA E OS GENITORES. SITUAÇÃO EXCEPCIONAL. Exercendo a avó materna e os genitores da criança, de fato a guarda compartilhada da menor, em razão da situação peculiar dos genitores que viajam constantemente a trabalho,

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períodos em que a menor, que possui problemas cardíacos permanece sob os cuidados da avó, autora do pedido em exame, a guarda compartilhada consiste, no caso, na medida mais adequada para proteger os interesses da menor, mormente havendo concordância dos pais ao pedido. Precedentes.... Ver íntegra da ementa APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA. (Apelação Cível Nº 70038192860, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: André Luiz Planella Villarinho, Julgado em 23/03/2011) Data de Julgamento: 23/03/2011 Publicação: Diário da Justiça do dia 04/04/2011