universidade tuiuti do paranÁ denise...

49
1 UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ Denise Fornea A PRISÃO CIVIL DO DEVEDOR DE ALIMENTOS CURITIBA 2011

Upload: tranxuyen

Post on 20-Nov-2018

216 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ Denise Forneatcconline.utp.br/.../08/A-PRISAO-CIVIL-DO-DEVEDOR-DE-ALIMENTOS.pdf · As Leis Ordinárias também cuidam da prisão civil por alimentos

1

UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ

Denise Fornea

A PRISÃO CIVIL DO DEVEDOR DE ALIMENTOS

CURITIBA

2011

Page 2: UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ Denise Forneatcconline.utp.br/.../08/A-PRISAO-CIVIL-DO-DEVEDOR-DE-ALIMENTOS.pdf · As Leis Ordinárias também cuidam da prisão civil por alimentos

2

A PRISÃO CIVIL DO DEVEDOR DE ALIMENTOS

CURITIBA

2011

Page 3: UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ Denise Forneatcconline.utp.br/.../08/A-PRISAO-CIVIL-DO-DEVEDOR-DE-ALIMENTOS.pdf · As Leis Ordinárias também cuidam da prisão civil por alimentos

3

Denise Fornea

A PRISÃO CIVIL DO DEVEDOR DE ALIMENTOS

Trabalho de Conclusão de Curso

apresentada ao Curso de Direito da

Faculdade de Ciências Jurídicas da

Universidade Tuiuti do Paraná, como

requisito parcial para obtenção do grau de

Bacharel.

Orientadora: Profª. Georgia Sabbag

Malucelli

CURITIBA

2011

Page 4: UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ Denise Forneatcconline.utp.br/.../08/A-PRISAO-CIVIL-DO-DEVEDOR-DE-ALIMENTOS.pdf · As Leis Ordinárias também cuidam da prisão civil por alimentos

4

TERMO DE APROVAÇÃO

Denise Fornea

A PRISÃO CIVIL DO DEVEDOR DE ALIMENTOS

Esta monografia foi julgada e aprovada para a obtenção do grau de Bacharel no Curso de

Direito da Universidade Tuiuti do Paraná.

Curitiba, 07 de Junho de 2011.

__________________________________________

Eduardo de Oliveira Leite

Coordenador

Universidade Tuiuti do Paraná

Orientadora: Profª. Georgia Sabbag Malucelli

Universidade Tuiuti do Paraná

Prof°(a) Dr(a). __________________________

Universidade Tuiuti do Paraná

Prof°(a) Dr(a). __________________________

Universidade Tuiuti do Paraná

Page 5: UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ Denise Forneatcconline.utp.br/.../08/A-PRISAO-CIVIL-DO-DEVEDOR-DE-ALIMENTOS.pdf · As Leis Ordinárias também cuidam da prisão civil por alimentos

5

Agradeço com muita alegria e prazer a minha amiga,

sócia e mais que uma irmã - Maria Regina Gaspar - cuja

pessoa gentil impregnou cada página desta Monografia ...

e ao meu filho Leonardo Fornea Binotto - o amor da

minha vida - que me trouxe este pensamento ... e sei que

depois deste feito virá o Sucesso!

“O segredo do sucesso não é tentar evitar os problemas

nem se esquivar ou se livrar deles, mas crescer

pessoalmente para se tornar maior do que qualquer

adversidade”. (T. Harv Eker)

Page 6: UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ Denise Forneatcconline.utp.br/.../08/A-PRISAO-CIVIL-DO-DEVEDOR-DE-ALIMENTOS.pdf · As Leis Ordinárias também cuidam da prisão civil por alimentos

6

SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO..........................................................................................07

2. EVOLUÇÃO DO ENTENDIMENTO DO TEMA................ ........................11

3. NORMAS INTERNACIONAIS – PACTO DE SÃO JOSÉ DA COS TA

RICA...............................................................................................................18

4. FORMAS DISTINTAS DE EXECUÇÃO DE ALIMENTOS....... ................22

4.1- PRISÃO CIVIL DO DEVEDOR DE ALIMENTOS...................................23

4.2- CONTROVÉRSIAS ACERCA DOS PRAZOS PRISIONAIS..................31

4.3- DESCARACTERIZAÇÃO DA URGÊNCIA DA COBRANÇA................37

4.4- FUNDAMENTO CONSTITUCIONAL.....................................................43

5. CONCLUSÃO....................................... ....................................................47

6. BIBLIOGRAFIA.................................... ....................................................49

Page 7: UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ Denise Forneatcconline.utp.br/.../08/A-PRISAO-CIVIL-DO-DEVEDOR-DE-ALIMENTOS.pdf · As Leis Ordinárias também cuidam da prisão civil por alimentos

7

1. INTRODUÇÃO.

Em relação à prisão no sistema jurídico brasileiro, há

que se fazer a distinção entre a prisão penal da pr isão civil.

A prisão penal tem como objetivo principal a puniçã o,

retirando o indivíduo do convívio em sociedade em

determinados casos. Já a prisão civil não tem natur eza

punitiva e sim coercitiva, visa tão somente ao cump rimento

de uma obrigação, isto é, refere-se a ilícito civil , enquanto

que a prisão penal refere-se a ilícito penal. Estab elecida

esta diferença, será analisada no presente trabalho a

prisão civil.

A Constituição Federal de 1988 autoriza a prisão civil apenas em duas

hipóteses: no caso do depositário infiel1, ou ainda no caso do responsável pelo

inadimplemento de obrigação alimentar – conforme determina o artigo 5º, LXVII2.

1 A prisão prevista constitucionalmente para o depositário infiel poderá ser extinta. Proposta de Emenda à Constituição – PEC – nesse sentido, cujo 1º signatário é o senador Augusto Botelho (PT-RR), está na pauta da comissão de constituição, Justiça e Cidadania – CCJ, desde 25/03/2009, com parecer favorável do senador Demóstenes Torres (DEM-GO). Acessado em 16/04/2009 – http://blog.redel.com.br/leisetribunais/2009. 2 “Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes”: “LXVII - não haverá prisão civil por dívida, salvo a do responsável pelo inadimplemento voluntário e inescusável de obrigação alimentícia e a do depositário infiel”;

Page 8: UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ Denise Forneatcconline.utp.br/.../08/A-PRISAO-CIVIL-DO-DEVEDOR-DE-ALIMENTOS.pdf · As Leis Ordinárias também cuidam da prisão civil por alimentos

8

Mas, no entanto, a Convenção Interamericana de Direitos Humanos (Pacto

de São José da Costa Rica), foi incorporada no direito positivo brasileiro pelo

Decreto nº. 678/1992, e somente admite a prisão civil em caso de débito alimentar.

As Leis Ordinárias também cuidam da prisão civil por alimentos e outras

formas de execução de prestação alimentícia, tal como a Lei de Alimentos - nº.

5.478/1968, nos artigos 16 a 193, e o Código de Processo Civil através dos artigos

732 a 7354.

A prisão civil do devedor de alimentos é o meio coercitivo legal pelo qual o

Estado obriga o cumprimento do dever alimentar, que decorre de sentença

transitada em julgado. Todavia, conforme determina o enunciado da Súmula 309 do

STJ, é autorizada a decretação de prisão do devedor alimentício inadimplente com

relação às 03 (três) prestações alimentares devidas e anteriores ao ajuizamento da

ação de execução e ainda as parcelas que subsequentemente vencerem durante o

deslinde do processo.

3 “Art 16. Na execução da sentença ou do acordo nas ações de alimento será observado o disposto no artigo 919 e seu parágrafo único do Código de Processo Civil”. “ Art 17. Quando não for possível a efetivação executiva da sentença ou do acordo mediante desconto em folha, poderão ser as prestações cobradas de alugueres de prédios ou de quaisquer outros rendimentos do devedor, que serão recebidos diretamente pelo alimentando ou por depositário nomeado pelo Juiz”.

“Art 18. Se, mesmo assim, não for possível a satisfação do débito alimentício, o Juiz aplicará o disposto no artigo 920 do Código de Processo Civil”. “Art 19. O Juiz, para instrução da causa, ou na execução da sentença ou do acordo, poderá tomar todas as providências necessárias para seu esclarecimento ou para o cumprimento do julgado ou do acordo, inclusive a decretação de prisão do devedor até sessenta dias”. 4 “Art. 732. A execução de sentença, que condena ao pagamento de prestação alimentícia, far-se-á conforme o disposto no Capítulo IV deste Título”. “Parágrafo único. Recaindo a penhora em dinheiro, o oferecimento de embargos não obsta a que o exeqüente levante mensalmente a importância da prestação”. “Art. 733. Na execução de sentença ou de decisão, que fixa os alimentos provisionais, o juiz mandará citar o devedor para, em três dias, efetuar o pagamento, provar que o fez ou justificar a impossibilidade de efetuá-lo”. “§ 1o Se o devedor não pagar, nem se escusar, o juiz decretar-lhe-á a prisão pelo prazo de um a três meses”. “§ 2o O cumprimento da pena não exime o devedor do pagamento das prestações vencidas e vincendas”. “§ 3o Paga a prestação alimentícia, o juiz suspenderá o cumprimento da ordem de prisão”. “Art. 734. Quando o devedor for funcionário público, militar, diretor ou gerente de empresa, bem como empregado sujeito à legislação do trabalho, o juiz mandará descontar em folha de pagamento a importância da prestação alimentícia”. “Parágrafo único. A comunicação será feita à autoridade, à empresa ou ao empregador por ofício, de que constarão os nomes do credor, do devedor, a importância da prestação e o tempo de sua duração”. “Art. 735. Se o devedor não pagar os alimentos provisionais a que foi condenado, pode o credor promover a execução da sentença, observando-se o procedimento estabelecido no Capítulo IV deste Título”.

Page 9: UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ Denise Forneatcconline.utp.br/.../08/A-PRISAO-CIVIL-DO-DEVEDOR-DE-ALIMENTOS.pdf · As Leis Ordinárias também cuidam da prisão civil por alimentos

9

Da análise em conjunto dos dispositivos legais supracitados, verifica-se que,

dada à importância de que se reveste a obrigação alimentar, o legislador pôs à

disposição do credor alimentício formas distintas de execução, com vistas a obter o

crédito dela decorrente.

O credor, desde logo, pode optar pela prisão civil do devedor de alimentos,

ou deve primeiro exaurir as outras medidas executórias disponíveis?

O questionamento apresentado é objeto de controvérsias no meio jurídico,

causando dúvidas aos operadores do direito, ou seja, a questão é bastante

polêmica, sendo alvo de discussões entre juristas e doutrinadores.

A indagação é complexa e muito abrangente, pois envolve de um lado a

sobrevivência do credor de alimentos (alimentando), e de outro, o direito de ir e vir

do devedor de alimentos (alimentante).

A regra consolidada pela jurisprudência e pela Súmula 309 do STJ5 é no

sentido de que a medida só poderá ser ordenada em face das 03 (três) últimas

parcelas em atraso, devendo ser levadas em conta as parcelas anteriores ao

ajuizamento da ação de execução e as que vencerem no curso do processo6.

Afinal, por que apenas para as 03 (três) últimas parcelas?

Onde estaria o fundamento constitucional ou legal desta diretriz?

Poderia ser ordenada a medida para obrigar o devedor a adimplir as 04

(quatro) ou 05 (cinco) últimas ou ainda mais parcelas em atraso, sem que houvesse

5 STJ Súmula nº 309 - 27/04/2005 - DJ 04.05.2005 - Alterada - 22/03/2006 - DJ 19.04.2006 Débito Alimentar - Prisão Civil - Prestações Anteriores ao Ajuizamento da Execução e no Curso do Processo O débito alimentar que autoriza a prisão civil do alimentante é o que compreende as três prestações anteriores ao ajuizamento da execução e as que se vencerem no curso do processo. 6 A prisão civil do devedor de alimentos - Pablo Stolze Gagliano - Juiz de Direito (BA) - Professor de Direito Civil da UFBA, do JusPodivm (BA) e do Instituto Luiz Flavio Gomes – SP http://www.juspodivm.com.br/i/a/%7BF443AAFD-11DB-47D1-8EBF-0F73AD69EEA2%7D_026.pdf

Page 10: UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ Denise Forneatcconline.utp.br/.../08/A-PRISAO-CIVIL-DO-DEVEDOR-DE-ALIMENTOS.pdf · As Leis Ordinárias também cuidam da prisão civil por alimentos

10

afronta a Constituição Federal, já que a referida legislação não limitou a ordem de

prisão às 03 (três) últimas parcelas?

Não obstante estes questionamentos, a lei não estabelece nenhuma

hierarquia das vias de execução do débito alimentar, de modo que, em regra, o

credor tem o direito de requerer, de pronto, a prisão do alimentante

inadimplente.

O foco central da monografia é avaliar se a prisão civil é o meio adequado

para que se cumpra a obrigação alimentar, assegurando o direito do credor,

entretanto, deve ser feito uma análise mais aprofundada sobre as vantagens e

desvantagens de tal medida.

A referida matéria é vasta e oferece conotações diversas, motivo pelo qual

comporta o referido estudo.

Page 11: UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ Denise Forneatcconline.utp.br/.../08/A-PRISAO-CIVIL-DO-DEVEDOR-DE-ALIMENTOS.pdf · As Leis Ordinárias também cuidam da prisão civil por alimentos

11

2. EVOLUÇÃO DO ENTENDIMENTO DO TEMA.

Há um contexto histórico e jurídico definido no qual se formou a idéia da

prisão civil como resposta ao inadimplemento do débito alimentar, contudo, é

necessário inicialmente conceituar alimentos.

Juridicamente, a expressão alimentos significa a importância em dinheiro ou

in natura, que uma pessoa se obriga, por força de lei, a prestar a outra. A sua

abrangência é muito maior e inclui tudo que se entende por necessário para a

manutenção de um indivíduo como, comida, vestuário, saúde, habitação, educação,

lazer etc.

No entendimento de Carlos Roberto Gonçalves7, “Alimentos, segundo a

precisa definição de Orlando Gomes, são prestações para satisfação das

necessidades vitais de quem não pode provê-las por si”.

O fundamento desta obrigação, segundo Maria Helena Diniz8, “É o princípio

da preservação da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III da CF)9 e o da

7 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro. 3 ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 440. 8 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. 19 ed. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 496. 9 “Art. 1º - A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos”:

Page 12: UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ Denise Forneatcconline.utp.br/.../08/A-PRISAO-CIVIL-DO-DEVEDOR-DE-ALIMENTOS.pdf · As Leis Ordinárias também cuidam da prisão civil por alimentos

12

solidariedade familiar, pois vem a ser um dever personalíssimo, devido pelo

alimentante, em razão de parentesco que o liga ao alimentando”.

Analisando historicamente a legislação sobre o tema abordado, verificou-se

que no período de vigência do Código Civil de 1916 o dever alimentar possuía várias

origens, sendo regrado em distintos diplomas legais e de modo diferenciado.

A lei civil disciplinava os alimentos que decorriam do vínculo de

consangüinidade e da solidariedade familiar.

A Lei do Divórcio e a legislação de união estável regulavam os alimentos

derivados do dever de mútua assistência.

Entretanto, o Código Civil anterior (1916) vedava a renúncia aos alimentos,

havendo tão somente a possibilidade de não serem cobrados (art. 404)10, e esta

obrigação alimentar era intransmissível (art. 402)11.

Já o Código Civil atual (arts. 1.694 a 1.710)12, como diz Francisco José

Cahali, trata promiscuamente dos alimentos, não se sabe se por falha,

“III - a dignidade da pessoa humana”; 10 “Art. 404. Pode-se deixar de exercer, mas não se pode renunciar o direito a alimentos”. 11 “Art. 402. A obrigação de prestar alimentos não se transmite aos herdeiros do devedor”. 12 “Art. 1.694. Podem os parentes, os cônjuges ou companheiros pedir uns aos outros os alimentos de que necessitem para viver de modo compatível com a sua condição social, inclusive para atender às necessidades de sua educação”. “§ 1o Os alimentos devem ser fixados na proporção das necessidades do reclamante e dos recursos da pessoa obrigada”. “§ 2o Os alimentos serão apenas os indispensáveis à subsistência, quando a situação de necessidade resultar de culpa de quem os pleiteia”. “Art. 1.695. São devidos os alimentos quando quem os pretende não tem bens suficientes, nem pode prover, pelo seu trabalho, à própria mantença, e aquele, de quem se reclamam, pode fornecê-los, sem desfalque do necessário ao seu sustento”. “Art. 1.696. O direito à prestação de alimentos é recíproco entre pais e filhos, e extensivo a todos os ascendentes, recaindo a obrigação nos mais próximos em grau, uns em falta de outros”. “Art. 1.697. Na falta dos ascendentes cabe a obrigação aos descendentes, guardada a ordem de sucessão e, faltando estes, aos irmãos, assim germanos como unilaterais”. “Art. 1.698. Se o parente, que deve alimentos em 1º lugar, não estiver em condições de suportar totalmente o encargo, serão chamados a concorrer os de grau imediato; sendo várias as pessoas obrigadas a prestar alimentos, todas devem concorrer na proporção dos respectivos recursos, e, intentada ação contra uma delas, poderão as demais ser chamadas a integrar a lide”. “Art. 1.699. Se, fixados os alimentos, sobrevier mudança na situação financeira de quem os supre, ou na de quem os recebe, poderá o interessado reclamar ao juiz, conforme as circunstâncias, exoneração, redução ou majoração do encargo”. “Art. 1.700. A obrigação de prestar alimentos transmite-se aos herdeiros do devedor, na forma do art. 1.694”. “Art. 1.701. A pessoa obrigada a suprir alimentos poderá pensionar o alimentando, ou dar-lhe hospedagem e sustento, sem prejuízo do dever de prestar o necessário à sua educação, quando menor”.

Page 13: UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ Denise Forneatcconline.utp.br/.../08/A-PRISAO-CIVIL-DO-DEVEDOR-DE-ALIMENTOS.pdf · As Leis Ordinárias também cuidam da prisão civil por alimentos

13

desconhecimento ou real intenção, ou seja, não distingue a origem da obrigação, se

decorrente do poder familiar, do parentesco ou do rompimento do casamento ou da

união estável.13

Para garantir tal obrigação, o alimentando dispõe dos seguintes meios: a

ação de alimentos regida pela Lei nº. 5.478/1968; a execução por quantia certa, do

art. 732 do Código de Processo Civil; a penhora em vencimento de magistrados,

professores e funcionários públicos; os soldos de militares e salários em geral e

inclusive subsídios de parlamentares (art. 649, IV do CPC)14; o desconto em folha de

pagamento da pessoa obrigada (art. 734 do CPC); a reserva de alugueres de

prédios do alimentante (art. 17 da Lei nº. 5.478/1968)15; a constituição de garantia

real ou fidejussória e de usufruto (art. 21 da Lei nº. 6.515/1977)16 e, por fim, a prisão

“Parágrafo único. Compete ao juiz, se as circunstâncias o exigirem, fixar a forma do cumprimento da prestação”. “Art. 1.702. Na separação judicial litigiosa, sendo um dos cônjuges inocente e desprovido de recursos, prestar-lhe-á o outro a pensão alimentícia que o juiz fixar, obedecidos os critérios estabelecidos no art. 1.694”. “Art. 1.703. Para a manutenção dos filhos, os cônjuges separados judicialmente contribuirão na proporção de seus recursos”. “Art. 1.704. Se um dos cônjuges separados judicialmente vier a necessitar de alimentos, será o outro obrigado a prestá-los mediante pensão a ser fixada pelo juiz, caso não tenha sido declarado culpado na ação de separação judicial”. “Parágrafo único. Se o cônjuge declarado culpado vier a necessitar de alimentos, e não tiver parentes em condições de prestá-los, nem aptidão para o trabalho, o outro cônjuge será obrigado a assegurá-los, fixando o juiz o valor indispensável à sobrevivência”. “Art. 1.705. Para obter alimentos, o filho havido fora do casamento pode acionar o genitor, sendo facultado ao juiz determinar, a pedido de qualquer das partes, que a ação se processe em segredo de justiça”. “Art. 1.706. Os alimentos provisionais serão fixados pelo juiz, nos termos da lei processual”. “Art. 1.707. Pode o credor não exercer, porém lhe é vedado renunciar o direito a alimentos, sendo o respectivo crédito insuscetível de cessão, compensação ou penhora”. “Art. 1.708. Com o casamento, a união estável ou o concubinato do credor, cessa o dever de prestar alimentos”. “Parágrafo único. Com relação ao credor cessa, também, o direito a alimentos, se tiver procedimento indigno em relação ao devedor”. “Art. 1.709. O novo casamento do cônjuge devedor não extingue a obrigação constante da sentença de divórcio”. “Art. 1.710. As prestações alimentícias, de qualquer natureza, serão atualizadas segundo índice oficial regularmente estabelecido”. 13 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. 5. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009. p. 457. 14 “Art. 649. São absolutamente impenhoráveis”: “IV - os vencimentos, subsídios, soldos, salários, remunerações, proventos de aposentadoria, pensões, pecúlios e montepios; as quantias recebidas por liberalidade de terceiro e destinadas ao sustento do devedor e sua família, os ganhos de trabalhador autônomo e os honorários de profissional liberal, observado o disposto no § 3o deste artigo”; 15 “Art. 17. Quando não for possível a efetivação executiva da sentença ou do acordo mediante desconto em folha, poderão ser as prestações cobradas de alugueres de prédios ou de quaisquer outros rendimentos do devedor, que serão recebidos diretamente pelo alimentando ou por depositário nomeado pelo juiz”. 16 “Art 21 - Para assegurar o pagamento da pensão alimentícia, o juiz poderá determinar a constituição de garantia real ou fidejussória”.

Page 14: UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ Denise Forneatcconline.utp.br/.../08/A-PRISAO-CIVIL-DO-DEVEDOR-DE-ALIMENTOS.pdf · As Leis Ordinárias também cuidam da prisão civil por alimentos

14

do devedor (art. 2117 da Lei nº. 5.478/1968 e art. 733 do CPC), sendo este o cerne

central do presente estudo.

De suma importância a análise dos pressupostos norteadores da obrigação

alimentar, como bem resume Maria Berenice Dias,

Tradicionalmente, invoca-se o binômio necessidade-possibilidade, ou seja, perquirem-se as necessidades do alimentando e as possibilidades do alimentante para estabelecer o valor da pensão. No entanto, essa mensuração é feita para que se respeite a diretriz da proporcionalidade. Por isso se começa a falar, com mais propriedade, em trinômio: proporcionalidade-possibilidade-necessidade.18

Quanto à proporcionalidade da pensão observa-se que os alimentos devem

ser fixados na proporção das necessidades do reclamante e dos recursos da pessoa

obrigada - é a regra do art. 1.694, § 1º do Código Civil de 2002 (art. 400 do CC

revogado), e que se encontra na generalidade das legislações.

Já a possibilidade da pensão, a teor do art. 1.695 do atual Código Civil, para

que exista obrigação alimentar é necessário que a pessoa de quem se reclama os

alimentos possa fornecê-los sem privação do necessário ao seu sustento.19

Esclarece, entretanto, Cahali que o art. 1.695 do novo Código Civil não pode

ser interpretado na sua literalidade para uma sumária exclusão da pretensão de

alimentos em favor daquele que os reclama, inobstante demonstrada a sua condição

de possuidor de bens de qualquer natureza.20

17 “Art. 21. O art. 244 do Código Penal passa a vigorar com a seguinte redação: "Art. 244 - Deixar, sem justa causa, de prover a subsistência do cônjuge, ou de filho menor de 18 anos ou inapto para o trabalho ou de ascendente inválido ou valetudinário, não lhes proporcionando os recursos necessários ou faltando ao pagamento de pensão alimentícia judicialmente acordada, fixada ou majorada; deixar, sem justa causa, de socorrer descendente ou ascendente gravemente enfermo: Pena - Detenção de um ano a quatro anos e multa, de uma a dez vezes o maior salário-mínimo vigente no País. Parágrafo único. Nas mesmas penas incide quem, sendo solvente, frustra ou ilide, de qualquer modo, inclusive por abandono injustificado de emprego ou função, o pagamento de pensão alimentícia judicialmente acordada, fixada ou majorada”. 18 Id. ib., p. 493. 19 CAHALI, Yussef Said. Dos alimentos. 5. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2007. p. 510 a 517. 20 Id. ib., p. 510.

Page 15: UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ Denise Forneatcconline.utp.br/.../08/A-PRISAO-CIVIL-DO-DEVEDOR-DE-ALIMENTOS.pdf · As Leis Ordinárias também cuidam da prisão civil por alimentos

15

A lei não quer o perecimento do alimentando, mas também não deseja o

sacrifício do alimentante. Não há direito alimentar contra quem possui o estritamente

necessário a própria subsistência.

Neste entendimento, o juiz, não fixará pensões de valor exagerado, nem por

demais reduzido, devendo estimá-lo com prudente arbítrio, sopesando os vetores

necessidade e possibilidade, na busca do equilíbrio entre eles com a devida

proporcionalidade.21

Eduardo de Oliveira Leite, cita o seguinte exemplo,

Se uma família composta, por exemplo, de quatro membros vivia, até o momento da ruptura com 100% de renda, é humanamente impossível que, após a ruptura passem a viver, um (no caso, o marido) com 67% (isto é, com dois terços do orçamento) enquanto os demais membros (mulher e filhos) devam sobreviver com 33% (isto é, com um terço). Tudo leva a crer que se a lógica do percentual devesse ser aplicada, os 67% deveriam, naturalmente, ser canalizados aos três membros (porque sendo três, certamente, têm três vezes mais necessidades do que uma pessoa) o inverso, como ocorre na estranha sistemática nacional. Logo, a pretensa “proporcionalidade” fica negada pela realidade.22

Corroborando esta linha de raciocínio vejamos as seguintes jurisprudências:

Acórdão: 14959 - DECISÃO: ACORDAM os Desembargadores integrantes da 12ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Paraná, por unanimidade de votos, em negar provimento a ambos os recursos. EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL ALIMENTOS FIXAÇÃO DO QUANTUM ADEQUAÇÃO DO VALOR FIXADO INTELIGÊNCIA DO ART. 7º, IV DA CF - APELAÇÃO 1 NECESSIDADE DE MAJORAÇÃO DO QUANTUM AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DESPROVIDA APELAÇÃO 2 NECESSIDADE DE MINORAÇÃO DO VALOR FIXADO A TÍTULOS DE ALIMENTOS AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DESPROVIDO ANÁLISE DO BINÔMIO NECESSIDADE/POSSIBILIDADE FIXAÇÃO PROPORCIONAL - MANUTENÇÃO DA SENTENÇA A QUO CONVERSÃO DO VALOR FIXADO EM SALÁRIOS MÍNIMOS RESPEITO À DISPOSIÇÃO CONSTITUCIONAL. Ambos os apelos desprovidos. 1- A fixação do valor dos alimentos em salário mínimo é vedada pelo art. 7º, IV da CF, portanto, esse deve ser fixado em valor líquido, respeitando a disposição constitucional. 2- O magistrado, ao fixar os alimentos, conta com u m largo poder discricionário voltado para a defesa do s interesses do alimentado, em conformidade com a possibilidade fin anceira do alimentante . Apelação Cível nº 647.348-7, da Comarca de São Miguel do

21 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro. 3 ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 470. 22 LEITE, Eduardo de Oliveira. O quantum da pensão alimentícia. p. 39-40.

Page 16: UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ Denise Forneatcconline.utp.br/.../08/A-PRISAO-CIVIL-DO-DEVEDOR-DE-ALIMENTOS.pdf · As Leis Ordinárias também cuidam da prisão civil por alimentos

16

Iguaçu - Vara Única - Relator: Rafael Augusto Cassetari - Revisor: Carlos Mauricio Ferreira- Julgamento: 12/05/2010 (16:03) EMENTA: HABEAS CORPUS - HC 77570 / MG - 2007/0039710-0. PRISÃO CIVIL. DÍVIDA ALIMENTAR. ALEGAÇÃO DE INCAPACIDADE FINANCEIRA. QUESTÃO INVIÁVEL NA VIA ESTREITA DO WRIT. AUSÊNCIA DE ILEGALIDADE NA DECISÃO PROFERIDA PELO TRIBUNAL DE ORIGEM. ORDEM DENEGADA. 1. Este Superior Tribunal sumulou entendimento - Verbete n. 309 (...) 2. A alegação lançada pelo impetrante – dificuldade financeira a resultar na ausência do binômio possibilidade e nec essidade para o dever de prestar alimentos –, não é o bastante para demonstrar qualquer ilegalidade, muito menos para eximir o pac iente do pagamento dos alimentos . Ainda, tal argumento não deve ser apreciado em sede de habeas corpus, tendo esta Corte já se firmado no sentido da impossibilidade de examinar fatos controvertidos ou complexos no âmbito deste remédio constitucional. Precedentes do STJ. 3. Demonstrado que o paciente apenas efetuou depósitos parciais referentes à pensão alimentícia no decorrer da ação executiva, permanecendo, dessarte, inadimplente quanto ao valor total devido, autorizada está a decretação da prisão civil, na espécie. 4. Ordem denegada. Acórdão Vistos, relatados e discutidos estes autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da 4ª TURMA do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas, por unanimidade, em denegar a ordem de habeas corpus, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Massami Uyeda, Fernando Gonçalves e Aldir Passarinho Junior votaram com o Sr. Ministro Relator. Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Hélio Quaglia Barbosa. Data do Julgamento: 18/10/2007. EMENTA: Direito civil e processual civil. Família. Alimentos. Recurso Especial – 1027930 / RJ. Revisão de alimentos. Pedido de redução. Elementos condicionantes. Mudança na situação financeira do alimentante ou do alimentando. Princípio da proporcionalidade . Constituição de nova família com nascimento de filho. Desinfluência. Embargos de Declaração. Omissões. Novo julgamento. - A modificação das condições econômicas de possibili dade ou de necessidade das partes, constitui elemento condicio nante da revisão e da exoneração de alimentos, sem o que não há que se adentrar na esfera de análise do pedido, fulcrado no art. 1.699 do CC/02 . - As necessidades do reclamante e os recursos da pess oa obrigada devem ser sopesados tão-somente após a verificação da necessária ocorrência da mudança na situação financeira das pa rtes, isto é, para que se faça o cotejo do binômio , na esteira do princípio da proporcionalidade, previsto no art. 1.694, § 1º, do CC/02, deve o postulante primeiramente demonstrar de maneira sati sfatória os elementos condicionantes da revisional de alimentos , nos termos do art. 1.699 do CC/02 . - Se não há prova do decréscimo das necessidades dos credores, ou do depauperamento das condições econômicas do devedor, a constituição de nova família, resultando ou não em nascimento de filho, não importa na redução da pensão alimentícia prestada a filhos havidos da união anterior. - Com fundamento no art. 535 do CPC, deve ser cassado o acórdão recorrido, para que outro seja proferido, em consonância com o entendimento desta Corte – acima referenciado – desta vez pronunciando-se o Tribunal de origem a respeito de omissões apontadas pelos recorrentes, em sede de apelação e de embargos declaratórios, notadamente no que concerne à alteração da causa de pedir deduzida pelo

Page 17: UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ Denise Forneatcconline.utp.br/.../08/A-PRISAO-CIVIL-DO-DEVEDOR-DE-ALIMENTOS.pdf · As Leis Ordinárias também cuidam da prisão civil por alimentos

17

recorrido e consequente julgamento extra petita, em violação ao art. 265 e 460 do CPC. - Diante do quadro fático posto no acórdão recorrido, imutável nesta sede especial, em que preponderou circunstância divorciada do entendimento pacificado por esta Corte, a justificar a redução do valor dos alimentos devidos aos recorrentes, impõe-se a devolução do processo ao Tribunal de origem, para que nova análise do pedido seja realizada, com base na jurisprudência destacada. - A revisibilidade munida da efetiva alteração da ordem econômica das partes há de ser o fator desencadeante de um Judiciário mais atento e sensível às questões que merecem peculiar desvelo como o são aquelas a envolver o Direito a Alimentos em Revisional, permitindo a pronta entrega da prestação jurisdicional, no tempo e modo apropriados, sem interpretações deslocadas. Recurso especial conhecido e provido. Acórdão Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade, conhecer do recurso especial e dar-lhe provimento, nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora. Os Srs. Ministros Massami Uyeda, Sidnei Beneti, Vasco Della Giustina e Paulo Furtado votaram com a Sra. Ministra Relatora NANCY ANDRIGHI. Data do Julgamento: 03/03/2009. Acórdão: DECISÃO: ACORDAM os Desembargadores e o Juiz de Direito Substituto de 2º Grau da 12ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade de votos, em conhecer e dar provimento ao recurso, nos termos do voto do relator. EMENTA: DIREITO DE FAMÍLIA. ALIMENTOS PROVISÓRIOS. VALOR ARBITRADO POR ESTIMATIVA. ADEQUAÇÃO. BINÔMIO NECESSIDADE E POSSIBILIDADE. RECURSO PROVIDO. Os alimentos provisórios ainda que arbitrados por estimativa devem obedecer aos ditames do art. 1694, § 1º do Código Civil, qual seja, na proporção das necessidades do reclamante e dos recursos da pessoa obrigada , autorizando-se o acertamento do quantum em qualquer fase processual . Processo: 0666131-4 - Segredo de Justiça - Relator: Carlos Mauricio Ferreira. Recurso: Agravo de Instrumento - Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba - Data do Julgamento: 27/10/2010 (14:56)

Page 18: UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ Denise Forneatcconline.utp.br/.../08/A-PRISAO-CIVIL-DO-DEVEDOR-DE-ALIMENTOS.pdf · As Leis Ordinárias também cuidam da prisão civil por alimentos

18

3. NORMAS INTERNACIONAIS – PACTO DE SÃO JOSÉ DA COS TA RICA.

Em novembro de 2002, mediante o Decreto nº. 678, o Brasil aderiu ao Pacto

de São José da Costa Rica, que trata da Convenção Americana sobre Direitos

Humanos. O item nº 7, do art. 7º, deste Decreto, admite apenas uma forma de prisão

civil, a decorrente de crédito alimentar, in verbis:

7. Ninguém deve ser detido por dívida. Este princípio não limita os mandados de autoridade judiciária competente expedidos em virtude de inadimplemento de obrigação alimentar.

Ratificando o Decreto, posteriormente, dispôs o § 3º, do art. 5º, da Emenda

Constitucional de nº. 45, de dezembro de 2004:

Art. 5º, § 3º Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais.23

Enfim, a referida emenda prevê expressamente que os tratados e

convenções internacionais serão equivalentes às emendas constitucionais, somente

se preenchidos dois requisitos: (a) tratem de matéria relativa a direitos humanos e

(b) sejam aprovados pelo Congresso Nacional, em 02 (dois) turnos, pelo quorum de

3/5 (três quintos) dos votos dos respectivos membros (duas votações em cada Casa

do Parlamento, com 3/5 (três quintos) de quorum em cada votação). Obedecidos

tais pressupostos, o tratado terá índole constitucional, podendo revogar norma

constitucional anterior, desde que em benefício dos direitos humanos, ou seja, será

imune a supressões ou reduções futuras, diante do que dispõe o art. 60, § 4º, IV da

23 Abolição da Prisão por Dívida? http://www.uj.com.br/publicacoes/doutrinas/default.asp?action=doutrina&coddou=4879

Page 19: UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ Denise Forneatcconline.utp.br/.../08/A-PRISAO-CIVIL-DO-DEVEDOR-DE-ALIMENTOS.pdf · As Leis Ordinárias também cuidam da prisão civil por alimentos

19

CF24 (as normas que tratam de direitos individuais não podem ser suprimidas, nem

reduzidas, mesmo que por emenda constitucional, tornado-se cláusulas pétreas).

Tal situação trouxe dúvidas quanto aos tratados e convenções

internacionais promulgados antes da Emenda Constitucional nº. 45/2004, isto é,

sobre a necessidade ou não de submetê-los ao quorum qualificado de aprovação,

como condição para tornarem-se equivalentes às emendas constitucionais.

Recentemente, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no Habeas Corpus

87585/TO, do qual é relator o Ministro Marco Aurélio, na data de 3.12.2008 decidiu

que, com a introdução do Pacto de São José da Costa Rica, que restringe a prisão

civil por dívida ao descumprimento inescusável de prestação alimentícia (art. 7º,

parágrafo 7), em nosso ordenamento jurídico, restaram derrogadas as normas

estritamente legais definidoras da custódia do depositário infiel, prevista na Magna

Carta. Segundo consta do Informativo 531 do Supremo Tribunal Federal

prevaleceu, no julgamento, a tese do status de supra legalidade da referida

convenção, inicialmente defendida pelo Min. Gilmar Mendes no julgamento do RE

466343/SP.

Note-se que, no referido julgado, restaram vencidos, no ponto, os Ministros

Celso de Mello, Cezar Peluso, Ellen Gracie e Eros Grau, que a ela davam a

qualificação constitucional, perfilhando o entendimento expendido pelo primeiro no

voto que proferira nesse recurso. O Min. Marco Aurélio, relativamente a essa

questão, se absteve de pronunciamento.

No RE 349703/RS (rel. orig. Min. Ilmar Galvão, rel. para o acórdão Min.

Gilmar Mendes, 3.12.2008) e no (rel. Min. Cezar Peluso, 3.12.2008) a mesma

24 “Art. 60. A Constituição poderá ser emendada mediante proposta”: “§ 4º - Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir”: “IV - os direitos e garantias individuais”.

Page 20: UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ Denise Forneatcconline.utp.br/.../08/A-PRISAO-CIVIL-DO-DEVEDOR-DE-ALIMENTOS.pdf · As Leis Ordinárias também cuidam da prisão civil por alimentos

20

orientação acima foi seguida. No entanto, vale mencionar que, o Min. Celso de

Mello, embora tenha concluído pela inadmissibilidade da prisão civil do depositário

infiel defendeu a tese de que os tratados internacionais de direitos humanos

subscritos pelo Brasil teriam hierarquia constitucional e não status supra legal.

De qualquer modo, independentemente do status que assumiriam os

tratados e convenções internacionais de direitos humanos, no ordenamento jurídico

brasileiro, é possível concluir, segundo a decisão exarada no Habeas Corpus

87585/TO, que o Pacto de São José da Costa Rica, subscrito pelo Brasil, torna

inaplicável a legislação com ele conflitante, não havendo mais base legal para a

prisão civil do depositário infiel, mas, entretanto, confirmando a medida extrema na

hipótese de dívida alimentar.25

Neste entendimento no caso da obrigação alimentar esta medida tão

somente ratificou o disposto em norma constitucional.

Isto posto, confirma-se a posição do Supremo Tribunal Federal, senão

vejamos:

Órgão Julgador: 17ª Câmara Cível Comarca - Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba Processo: 0677245-0 APELAÇÃO CÍVEL ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA - AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO CONVERTIDA EM DEPÓSITO - PEDIDO DE PRISÃO CIVIL DO DEPOSITÁRIO INFIÉL - IMPOSSIBILIDADE - PACTO DE SÃO JOSÉ DA COSTA RICA - APLICAÇÃO DO ART. 5º, LXVII, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL - REVOGAÇÃO PELO STF DA SÚMULA Nº 619 - PRECEDENTES DO STF E STJ, E ENTENDIMENTO PREDOMINANTE NESTE TRIBUNAL RECURO A QUE SE NEGA SEGUIMENTO DECISÃO MONOCRÁTICA DO RELATOR ART. 557, "CAPUT", CPC. VISTOS... (...) 5. Na atualidade a única hipótese de prisão civil, no Direito brasileiro, é a do devedor de alimentos . O art. 5°, §2°, da Carta Magna, expressamente estabeleceu que os direitos e garantias expressos no caput do mesmo dispositivo não excluem outros decorrentes do regime dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte. O Pacto de São José da Costa Rica, entendido como um tratado internacional em ma téria de direitos humanos, expressamente, só admite, no seu bojo, a p ossibilidade de

25 A prisão civil do depositário infiel na visão do Supremo Tribunal Federal - por Fernando Capez http://jusvi.com/artigos/38208

Page 21: UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ Denise Forneatcconline.utp.br/.../08/A-PRISAO-CIVIL-DO-DEVEDOR-DE-ALIMENTOS.pdf · As Leis Ordinárias também cuidam da prisão civil por alimentos

21

prisão civil do devedor de alimentos e, conseqüente mente, não admite mais a possibilidade de prisão civil do depositário infiel . 6. (...) Curitiba, 25 de maio de 2010. FABIAN SCHWEITZER Relator -- 1 TJPR. AP nº. 504.282-8. Rel. Des. Paulo Roberto Hapner. DJ 31.10.08. -- 2 TJPR. AP nº. 522.964-3. Rel. Des. Lauri Caetano da Silva. DJ 21.11.08 3 TJPR. HC nº. 477.643-2. Rel. Des. Vicente Del Prete Misurelli. DJ. 11.04.2008 -- 4 STJ. AgRg no REsp 801128/RJ, 4ª Turma. Rel. Min. Aldir Passarinho Junior. J. 09.03.2006. DJ 15.05.2006 -- 5 STF. HC nº. 94702 / GO. Rel. Min. Ellen Gracie. 2ª Turma. j. 07.10.08

Page 22: UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ Denise Forneatcconline.utp.br/.../08/A-PRISAO-CIVIL-DO-DEVEDOR-DE-ALIMENTOS.pdf · As Leis Ordinárias também cuidam da prisão civil por alimentos

22

4. FORMAS DISTINTAS DE EXECUÇÃO DE ALIMENTOS.

Foi pródiga a disciplina legal em relação aos meios executórios da obrigação

de prestar alimentos. Três mecanismos tutelam a obrigação alimentar: o desconto

(art. 734 do CPC), a expropriação (art. 646) e a coação pessoal (art. 733). O

legislador expressou, na abundância da terapia executiva, o interesse público

prevalente da rápida realização forçada do crédito alimentar.26

No entanto, o estudo científico dos meios executórios, avaliados e pesados

como expedientes práticos, predispostos com o único propósito de realizar as

operações materiais destinadas ao implemento executivo da eficácia sentencial

condenatória, revela a verdade: a prisão civil do alimentante não merece o opróbrio

de coisa obsoleta, de entulho autoritário e violento, e, portanto, a custo tolerado e

admitido no ordenamento jurídico contemporâneo.27

Por conseguinte não se pode deixar de enfrentar, na seara da execução da

prestação de alimentos, as conseqüências da reforma implementada no Código de

Processo Civil pela Lei nº. 11.232/2005.

A matéria é de grande revelo na prática forense e tem suscitado muitas

dúvidas entre os operadores e os aplicadores do direito.

De fato, a execução da prestação de alimentos, que pode realizar-se sob

pena de penhora ou de prisão, antes da reforma empreendida pela Lei nº.

11.232/2005 ocorria em processo autônomo, ou seja, o credor dos alimentos deveria

ajuizar uma nova ação para a obtenção do direito previamente reconhecido.

26 ASSIS, Araken de. Da execução de alimentos e prisão do devedor. 6. ed. São Paulo: Editora Revistas do Tribunais. 2004. p. 147. 27 Id. ib., p. 157.

Page 23: UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ Denise Forneatcconline.utp.br/.../08/A-PRISAO-CIVIL-DO-DEVEDOR-DE-ALIMENTOS.pdf · As Leis Ordinárias também cuidam da prisão civil por alimentos

23

Desse modo, após a implementação da reforma processual, a execução das

decisões condenatórias ao pagamento de importância em pecúnia passou a ser um

prolongamento do processo já inaugurado. Por outras palavras: a execução foi

sincretizada ao processo cognitivo, consistindo em mera etapa deste. A relação

processual é única, tanto para a prática de atos cognitivos, como para a prática de

atos executórios.

O professor Alexandre Freitas Câmara defende a necessidade de se fazer

uma releitura do Código de Processo Civil, no que tange à execução dos alimentos,

considerando-se a estrutura sincretizada para cumprimento de sentença, pois afinal,

como disse em célebre frase um saudoso intelectual brasileiro, HEBERT DE SOUZA

(o Betinho), “quem tem fome, tem pressa”.28

4.1- PRISÃO CIVIL DO DEVEDOR DE ALIMENTOS.

A prisão civil é meio executivo de finalidade econômica - prende-se o

executado não para puní-lo, como se criminoso fosse, mas para forçá-lo

indiretamente a pagar, supondo-se que tenha meios de cumprir a obrigação e queira

evitar sua prisão, ou readquirir sua liberdade.

Embora o art. 733, § 2º, do Código de Processo Civil fale em “pena” de

prisão, de pena não se trata. Lembrando Bellot, a prisão civil é meio de experimentar

a solvabilidade, ou de vencer a má vontade daquele que procura ocultar o que

possui.29

Washington de Barros Monteiro adverte que,

28 HERTEL, Daniel Roberto. Execução de alimentos e a nova técnica de cumprimento da sentença. Revista Jurídica Consulex – Ano XII – nº. 279 – 31 de agosto/2008. 29 CAHALI, Yussef Said. Dos alimentos. 5. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2007. p. 741.

Page 24: UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ Denise Forneatcconline.utp.br/.../08/A-PRISAO-CIVIL-DO-DEVEDOR-DE-ALIMENTOS.pdf · As Leis Ordinárias também cuidam da prisão civil por alimentos

24

só se decreta a prisão se o alimentante, embora solvente, frustra, ou procura frustrar, a prestação. Se ele se acha, no entanto, impossibilitado de fornecê-la, não se legitima a decretação da pena detentiva. A prisão por débito alimentar reclama acurado e criterioso exame dos fatos, para vir a ser decretada, em consonância com o princípio de hermenêutica, que recomenda exegese estrita na compreensão das normas de caráter excepcional.30

Maria Berenice Dias ensina que não há distinção entre a lei e a origem do

título que dá ensejo à cobrança da obrigação alimentar – se judicial ou extrajudicial.

Não só a sentença, mas também a obrigação assumida extrajudicialmente, por meio

de título executivo extrajudicial, permitem ameaçar o devedor com a prisão (art. 733

do CPC), principalmente quando o acordo é referendado pelo Ministério Público,

pela Defensoria Pública ou pelos advogados das partes. Exigir a homologação

judicial é desprestigiar todo o esforço para compor o litígio feito pelos promotores,

defensores e advogados. Esse procedimento, de todo desnecessário e incabível,

seria a única forma de legitimar o credor ao uso da execução pelo rito da coação

pessoal. O absurdo de tal exigência é evidente.31 Nesse horizonte, a Terceira Turma

do Superior Tribunal de Justiça foi clara: a cobrança de dívida alimentícia firmada

em título executivo extrajudicial pode ser realizada por meio de processo em juízo

com ameaça de prisão civil (cf. REsp 1.117.639-MG, rel. Min. Massami Uyeda, j.

20/5/2010).

ALIMENTOS. EXECUÇÃO. ACORDO EXTRAJUDICIAL. Trata-se de execução ajuizada para receber as prestações alimentícias vencidas fixadas em acordo extrajudicial referendado pela Defensoria Pública em que o juiz extinguiu o processo, reconhecendo a ausência de interesse de agir nos termos do art. 267, VI, do CPC. Fundamentou tal decisão no entendimento de que o título executivo extrajudicial não seria apto a ensejar a execução prevista no art. 733 do CPC, porque, para isso, o acordo deveria ser homologado judicialmente. Por sua vez, o tribunal a quo manteve a sentença . Assim, a questão debatida no REsp é saber se

30 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro. 3 ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 499, ap. Curso, cit. 37. Ed., v. 2, p. 378-379. 31 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. 5. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009. p. 513.

Page 25: UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ Denise Forneatcconline.utp.br/.../08/A-PRISAO-CIVIL-DO-DEVEDOR-DE-ALIMENTOS.pdf · As Leis Ordinárias também cuidam da prisão civil por alimentos

25

o acordo referendado pela Defensoria Pública sem a intervenção do Poder Judiciário permite a ação de execução de alim entos prevista no art. 733 da lei processual civil, isto é, com a pos sibilidade de expedir o decreto prisional do obrigado alimentar inadimplent e. Após o voto-vista da Min. Nancy Andrighi, ao qual todos os Mini stros aderiram, considerou-se que a redação do art. 733 do CPC não faz referência ao título executivo extrajudicial, porque, à época em que o CPC entrou em vigência, a única forma de constituir obrigação de alimentos era por título executivo judicial. Só posteriormente, em bu sca de meios alternativos para a solução de conflitos, foram int roduzidas, no ordenamento jurídico, as alterações que permitiram a fixação de alimentos em acordos extrajudiciais, dispensando a homologação judicia l. A legislação conferiu legitimidade aos acordos extr ajudiciais, reconhecendo que membros do MP e da Defensoria Públ ica são idôneos e aptos para fiscalizar a regularidade do i nstrumento, bem como verificar se as partes estão manifestando sua vontade livre e consciente . Também se observou que não se poderia dar uma interpretação literal ao art. 733 do CPC diante da análise dos dispositivos que tratam da possibilidade de prisão civil do alimentante e acordo extrajudicial (art. 5º, LXVII, da CF/1988; arts. 585, II, 733, § 1º e 1124-A do CPC; art. 19 da Lei n. 5.478/1968 e art.13 do Estatuto do Idoso). Entre outros argumentos, destacou-se que a obrigação constitucional de alimentar e a urgência de quem necessita de aliment os não poderiam mudar com a espécie do título executivo (se judicia l ou extrajudicial ). Os efeitos serão sempre nefastos à dignidade daquel e que necessita de alimentos, seja ele fixado em acordo extrajudici al ou título judicial . Ademais, na hipótese de dívida de natureza alimentar, a própria CF/1988 excepciona a regra de proibição da prisão civil por dívida, entendendo que o bem jurídico tutelado com a coerção pessoal sobrepõe-se ao direito de liberdade do alimentante inadimplente. Diante do exposto, a Turma anulou o processo desde a sentença e determinou que a execução prossiga . REsp 1.117.639-MG, Rel. Min. Massami Uyeda, julgado em 20/5/2010.32

Contudo, a corrente majoritária jurisprudencial é contrária a esse

entendimento, qual seja: o de que só cabe prisão civil para título judicial, senão

vejamos:

EMENTA: PROCESSO CIVIL - FAMÍLIA - EXECUÇÃO - ALIMENTOS - ACORDO REFERENDADO PELA DEFENSORIA PÚBLICA - PRISÃO CIVIL - IMPOSSIBILIDADE. A despeito de a espécie versar sobre alimentos devidos em razão do dever de sustento, in erente ao poder familiar existente entre pais e filhos, o acordo ho mologado pela Defensoria Pública, embora viabilize a ação executi va, não enseja a prisão civil do devedor, na medida em que se trata de título executivo extrajudicial .

32 Alimentos « Divisão dos informativos do STF e STJ por matéria 10 jan. 2011 ... 733 do CPC não faz referência ao título executivo extrajudicial, porque, ... e complementar à responsabilidade dos pais, por isso só é exigível em caso de .... Anote-se, por último, que cabe a prisão civil do devedor de ...divisaoinformativos.wordpress.com/.../alimentos/ - Em cache - Similares

Page 26: UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ Denise Forneatcconline.utp.br/.../08/A-PRISAO-CIVIL-DO-DEVEDOR-DE-ALIMENTOS.pdf · As Leis Ordinárias também cuidam da prisão civil por alimentos

26

APELAÇÃO CÍVEL N° 1.0702.06.276131-8/001 - COMARCA DE UBERLÂNDIA - APELANTE(S): A.V.A.S. REPRESENTADO(A)(S) P/ MÃE I.A.O. - APELADO(A)(S): C.B.S. - RELATOR: EXMO. SR. DES. ALBERTO VILAS BOAS - ACÓRDÃO (SEGREDO DE JUSTIÇA) Vistos etc., acorda, em Turma, a 1ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, sob a Presidência do Desembargador EDUARDO ANDRADE, incorporando neste o relatório de fls., na conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas, à unanimidade de votos, EM NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO. Belo Horizonte, 09 de novembro de 2010. DES. ALBERTO VILAS BOAS - Relator NOTAS TAQUIGRÁFICAS - O SR. DES. ALBERTO VILAS BOAS: VOTO Conheço do recurso. Em ação de execução de alimentos, fundada em acordo referendado pela Defensoria Pública, o Juiz a quo entendeu que o rito previsto no art. 733, CPC somente é admissível para execução de sentença ou decisão . Diante disto, facultou à parte a conversão para o rito apropriado, sob pena de extinção (f. 79), e, diante do posicionamento da ora apelante - que entendeu adequado o rito eleito (f. 80/83) -, julgou extinta a execução, nos termos dos arts. 267, VI c/c art. 616, CPC (f. 85/8). Compartilho do entendimento esposado pela autoridade judiciária, data venia. Enfatizo, inicialmente, que participei como Revisor (Ap. Civ. nº 1.0702.07.402438-2) e Vogal (AI nº 1.0702.573014-0) nos quais o tema foi examinado, e, em razão da contradição posteriormente por mim apurada, reputo necessário definir o entendimento jurídico que considero mais correto para situação como a narrada nos autos. Com efeito, a despeito de a espécie versar sobre alimentos devi dos em razão do dever de sustento, inerente ao poder famil iar existente entre pais e filhos, considero que o acordo homologado pe la Defensoria Pública, embora viabilize a ação executiva, não ens eja a prisão civil do devedor na medida em que se trata de título executi vo extrajudicial . (...) Seguindo o mesmo entendimento, confiram-se arestos do colendo Superior Tribunal de Justiça: RECURSO ESPECIAL - ALIMENTOS - PRISÃO CIVIL - ACORDO CELEBRADO PERANTE O JUIZADO ESPECIAL CRIMINAL - INVIABILIDADE. 1 - "Excluídas da competência do Juizado Especial as causas de natureza alimentar, o acordo celebrado pe las partes, ainda que homologado por aquele Juízo, não tem eficácia p ara a compulsão executória da prisão civil do devedor, à míngua do devido processo legal " . (HC 9.363/BA, Rel. Min. BARROS MONTEIRO, DJ de 17.12.1999) 2 - Recurso não conhecido. (REsp 769.334/SC, Rel. Ministro JORGE SCARTEZZINI, QUARTA TURMA, julgado em 07/12/2006, DJ 05/02/2007 p. 246) Habeas corpus. Título executivo extrajudicial. Escritura pública. Alimentos. Art. 733 do Código de Processo Civil. Prisão civil. 1. O descumprimento de escritura pública celebrada entre os interessados, sem a intervenção do Poder Judiciário, fixando alimentos, não pode en sejar a prisão civil do devedor com base no art. 733 do Código de Proces so Civil, restrito à "execução de sentença ou de decisão, que fixa os alimentos provisionais" . 2. Habeas corpus concedido. (HC 22.401/SP, Rel. Ministro CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO, TERCEIRA TURMA, julgado em 20/08/2002, DJ 30/09/2002 p. 253) Esta egrégia Corte de Justiça já se manifestou no mesmo sentido; vejamos:

Page 27: UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ Denise Forneatcconline.utp.br/.../08/A-PRISAO-CIVIL-DO-DEVEDOR-DE-ALIMENTOS.pdf · As Leis Ordinárias também cuidam da prisão civil por alimentos

27

AGRAVO INSTRUMENTO - EXECUÇÃO - ALIMENTOS - ACORDO HOMOLOGADO PELO JUIZADO ESPECIAL CRIMINAL - TÍTULO EXECUTIVO EXTRAJUDICIAL - RITO DO ARTIGO 732 DO CPC - DESCABIMENTO DE PRISÃO CIVIL - DECISÃO MANTIDA. 01. Mesmo que se cuide de execução de alimentos, mas em razão de estar embasado em acordo homologado perante o Juizado Esp ecial Criminal, forçoso concluir que o ajuste alimentar q ue instruiu a ação de execução proposta sob o rito especial do artigo 733 do CPC não deixa de ter caráter extrajudicial e, portanto, imp restável para o fim pretendido pelo Agravante, na medida em que o proce dimento executório por ele manejado, por conter ameaça à li berdade do indivíduo, só pode ser utilizado quando o credor de alimentos, conforme preceito contido na norma legal citada, o seja por força de manifestação judicial . 02. Recurso desprovido. Unânime. (20100020078880AGI, Relator ROMEU GONZAGA NEIVA, 5ª Turma Cível, julgado em 28/07/2010, DJ 10/08/2010 p. 291) PROCESSO CIVIL - AGRAVO DE INSTRUMENTO - EXECUÇÃO DE ALIMENTOS - ACORDO HOMOLOGADO PELO MINISTÉRIO PÚBLICO - TÍTULO EXECUTIVO EXTRAJUDICIAL - PRISÃO CIVIL - IMPERTINÊNCIA - DECISÃO MANTIDA. 1. O descumprimento de acordo celebrado entre os interessados perante o Ministéri o Público, fixando alimentos e sem a intervenção do Poder Judiciário, não pode ensejar a prisão civil do devedor com apoio no art. 733 do CP C, restrito à "execução de sentença ou de decisão, que fixa os al imentos provisionais" . Precedentes. 2. O título executivo extrajudicial é apto para aparelhar execução sob constrição patrimonial, mas não pedido de prisão que, por exigência expressa do art. 733 d o CPC, deve estar embasado em título executivo judicial . 3. Agravo de Instrumento conhecido e não provido. (20080020081980AGI, Relator HUMBERTO ADJUTO ULHÔA, 3ª Turma Cível, julgado em 10/09/2008, DJ 22/09/2008 p. 101) AGRAVO DE INSTRUMENTO - EXECUÇÃO DE ALIMENTOS - ACORDO HOMOLOGADO PELO MINISTÉRIO PÚBLICO - TÍTULO EXECUTI VO EXTRAJUDICIAL - RITO DO ARTIGO 732 DO CPC - DESCABIMENTO DE PRISÃO CIVIL - PRELIMINAR DE NULIDADE REJEITADA. 01. O que a lei exige é que o juiz ou tribunal dê as razões de seu convencimento e não que a decisão seja amplamente fundamentada, pois não se pode confundir motivação sucinta com ausência de fundamentação. 02. "O título executivo extrajudicial é apto para agasalhar execu ção sob constrição patrimonial, mas não pedido de prisão que, por exig ência do art. 733 do CPC, deve estar embasado em título executivo jud icial " . (TJRS, Apelação Cível Nº 70008231375). 03. Recurso desprovido. Unânime. (20070020042993AGI, Relator ROMEU GONZAGA NEIVA, 5ª Turma Cível, julgado em 26/09/2007, DJ 14/11/2007 p. 85) PROCESSO CIVIL. EXECUÇÃO FORÇADA DE ACORDO SOBRE ALIMENTOS HOMOLOGADO NO JUIZADO INFORMAL DE PEQUENA S CAUSAS. INEFICÁCIA PARA COMPULSÃO EXECUTÓRIA DA PRI SÃO CIVIL DO DEVEDOR. I - A TRANSAÇÃO VERSANDO SOBRE ALIMENTOS HOMOLOGADO PELO EXTINTO JUIZADO ESPECIAL DE PEQUENAS CAUSAS, NÃO TEM EFICÁCIA EXECUTIVA PREVISTA NO ART. 19 DA LEI DE ALIMENTOS E ART. 733 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL, SENÃO DE TÍTULO EXECUTIVO EXTRAJUDICIAL, HÁBIL PARA FUNDAMENTAR EXECUÇÃO DE CARÁTER PATRIMONIAL. II - DEU-SE PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO, PARA QUE A EXECUÇÃO PROSSIGA SOB O RITO DA CONSTRIÇÃO PATRIMONIAL (CPC, ART. 646 E SEGUINTES). (APC4948898, Relator JOSÉ DIVINO DE OLIVEIRA, 2ª Turma Cível, julgado em 08/04/1999, DJ 09/06/1999 p. 47) Nesse descortino, frise-se que a tutela perquirida - o pagamento da prestação alimentícia, não restará prejudicada em f ace da inaplicabilidade da medida coercitiva, uma vez que, como já

Page 28: UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ Denise Forneatcconline.utp.br/.../08/A-PRISAO-CIVIL-DO-DEVEDOR-DE-ALIMENTOS.pdf · As Leis Ordinárias também cuidam da prisão civil por alimentos

28

demonstrado, poderá ser suficientemente obtida pelo s meios executivos de constrição patrimonial . Essas as razões por que NEGO PROVIMENTO ao agravo de instrumento, mantendo íntegra a r. decisão hostilizada" (Destaques no original). Registro, por fim, que o pedido quanto ao reconhecimento da 'preclusão do juiz' não comporta guarida, porquanto a preclusão é instituto dirigido, tão-somente, às partes, não podendo ser estendida aos atos do julgador, notadamente quando se refiram às questões de ordem pública, como retrata a espécie. Com estas considerações, nego provimento ao recurso. Votaram de acordo com o(a) Relator(a) os Desembargador(es): EDUARDO ANDRADE e GERALDO AUGUSTO. SÚMULA: NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO.

Já Luiz Guilherme Marinoni e Sérgio Cruz Arenhart entendem que o uso da

coerção pessoal, pela restrição da liberdade, como técnica de cumprimento da

prestação alimentar, é expressamente autorizada pelo texto constitucional. Segundo

o art. 5º, LXVII da CF, “não haverá prisão civil por dívida, salvo a do responsável

pelo inadimplemento voluntário e inescusável de obrigação alimentícia e a do

depositário infiel”.

Nos termos da determinação constitucional, não há dúvida de que a prisão

civil só tem aplicação quando o descumprimento da obrigação alimentar for

voluntário e inescusável. Caso o inadimplemento decorra de justificativa legítima ou

de causa involuntária (caso fortuito ou força maior), não se poderá recorrer à prisão

civil. Assim, se o devedor encontra-se impossibilitado de cumprir prestação porque,

por exemplo, não dispõe de recursos em razão de estar desempregado, ou por

causa da iliquidez do seu patrimônio, descabe a aplicação da medida.

Entre todas as técnicas destinadas à execução da obrigação alimentar a

prisão civil é a mais drástica e a mais agressiva ao devedor, e como se pode

perceber, os doutrinadores são partidários da regra geral vigente no ordenamento

jurídico brasileiro, ou seja, a prisão é “exceção”, pois a regra geral é a “liberdade” do

cidadão.

Page 29: UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ Denise Forneatcconline.utp.br/.../08/A-PRISAO-CIVIL-DO-DEVEDOR-DE-ALIMENTOS.pdf · As Leis Ordinárias também cuidam da prisão civil por alimentos

29

Não podemos deixar de lembrar que após a ratificação do Pacto de São

José da Costa Rica, restringe-se a prisão civil - exclui-se a do adquirente na

alienação fiduciária que não encontra proteção na ordem constitucional brasileira,

mas o mesmo não se passa com o inadimplemento alimentar. Assim se sustenta

porque há ampliação da garantia esboçada pelo Pacto em relação à Constituição

Federal, e não uma colisão com a pretensão do credor.33

Ainda temos que por meio da Súmula 309 do Superior Tribunal de Justiça o

débito alimentar dará sim autorização para a prisão civil, do alimentante que se

escusar de efetuar o pagamento da obrigação alimentar, dando ensejo a medida

coercitiva em relação às três prestações anteriores ao ajuizamento da execução de

alimentos, bem como poderão ser cobradas também as que se vencerem no curso

do processo.34

Porém, para decretar a prisão civil, a jurisprudência majoritária, inclusive a

do egrégio Superior Tribunal de Justiça (Súmula 309), fixou o prazo de 03 (três)

meses, o que significa que, se a dívida for relativa há 02 (dois) anos atrás, por

exemplo, não será decretada a prisão civil do devedor, devendo para tanto, a

execução prosseguir pelo rito do art. 732 do Código de Processo Civil, pois neste

caso, entende-se que o caráter de urgência tenha desaparecido.

Neste sentido:

EMENTA: CONSTITUCIONAL - HABEAS CORPUS - EXECUÇÃO DE ALIMENTOS - MEIO INADEQUADO PARA REEXAME DE PROVAS - PRESTAÇÕES VINCENDAS NO CURSO DA EXECUÇÃO - CARÁTER

33 FACHIN, Rosana Amara Girardi. Dever alimentar para um novo direito de família. Rio de Janeiro: Renovar. 2005. p. 78. 34 Súmula nº 309 STJ - 27/04/2005 - DJ 04.05.2005 - Alterada - 22/03/2006 - DJ 19.04.2006 -Débito Alimentar - Prisão Civil - Prestações Anteriores ao Ajuizamento da Execução e no Curso do Processo – “O débito alimentar que autoriza a prisão civil do alimentante é o que compreende as três prestações anteriores ao ajuizamento da execução e as que se vencerem no curso do processo”.

Page 30: UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ Denise Forneatcconline.utp.br/.../08/A-PRISAO-CIVIL-DO-DEVEDOR-DE-ALIMENTOS.pdf · As Leis Ordinárias também cuidam da prisão civil por alimentos

30

ALIMENTAR - DENEGAÇÃO DA ORDEM - INTELIGÊNCIA DA SÚMULA 60 DESTE EG. TRIBUNAL DE JUSTIÇA. Em se tratando de prisão civil por débito alimentar, o âmbito de cognoscibilidade do Habeas Corpus se restringe ao aspecto da legalidade, isto é, se foi obedecido o devido processo legal, se a decisão está devidamente fundamentada e foi prolatada por juízo competente. A prisão civil é justificada pela ATUALIDADE do débito referente às 03 (três) últimas parcelas anteriores ao ajuizamento da Execução e vincendas d urante o trâmite processual . HABEAS CORPUS Nº 1.0000.04.412807-2/000 - COMARCA DE BELO HORIZONTE - PACIENTE(S): MARCELO DOS SANTOS MARTINS - COATOR(A)(ES): JD 11ª V. FAMÍLIA DA COMARCA DE BELO HORIZONTE - RELATOR: EXMO. SR. DES. DORIVAL GUIMARÃES PEREIRA - ACÓRDÃO (Segredo de Justiça). Vistos etc., acorda a 5ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, incorporando neste o relatório de fls., na conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas, à unanimidade de votos, EM DENEGAR A ORDEM. Belo Horizonte, 28 de outubro de 2004. EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO. ALIMENTOS. EXECUÇÃO. PARCELAS PRETÉRITAS. ART. 732 DO CPC. PRISÃO DO DEVEDOR. NÃO CABIMENTO. A execução de alimentos que possibilita a prisão do devedor tem como pressuposto a "ATUALIDADE do débit o", assim compreendidas, por construção jurisprudencial, some nte as três PRESTAÇÕES anteriores à propositura da ação e aquel as que vencerem em seu curso (Súmula 309 do STJ). A execuç ão que compreende parcelas pretéritas subsume-se ao proced imento do art. 732 do CPC, não consentâneo com a prisão civil do d evedor alimentar. Recurso conhecido e provido. ACÓRDÃO (Segredo de Justiça). Vistos etc., acorda, em Turma, a 3ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, incorporando neste o relatório de fls., na conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas, à unanimidade de votos, EM REJEITAR A PRELIMINAR E DAR PROVIMENTO. AGRAVO DE INSTRUMENTO N° 1.0024.08.968991-3/001 - COMARCA DE BELO HORIZONTE - AGRAVANTE(S): R.L.P.M.C.S. - AGRAVADO(A)(S): G.L.P.M.C.S. REPRESENTADO(A)(S) P/ MÃE P.P.S./.O. - RELATORA: EXMª. SRª. DESª. ALBERGARIA COSTA. Belo Horizonte, 30 de abril de 2009.

Enfim, para que ocorra a decretação da prisão civil, por ausência de

pagamento da pensão alimentícia, são necessários os seguintes requisitos: a) a

citação do devedor para, em 03 (três) dias efetuar o pagamento, provar que o fez ou

justificar a impossibilidade de efetuá-lo; b) inércia voluntária e inescusável do

devedor; e c) ausência de pagamento das prestações dos 03 (três) meses,

imediatamente, anteriores à execução.

A prisão não pode ser banalizada, mas sempre deve ser decretada quando

presentes os pressupostos legais desde que combinados com os temperamentos do

princípio da razoabilidade.

Page 31: UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ Denise Forneatcconline.utp.br/.../08/A-PRISAO-CIVIL-DO-DEVEDOR-DE-ALIMENTOS.pdf · As Leis Ordinárias também cuidam da prisão civil por alimentos

31

Desta forma, evidentemente, faltando quaisquer desses requisitos, é vedado

ao juiz decretar a prisão do devedor, conforme a doutrina e a jurisprudência

majoritária.35

4.2- CONTROVÉRSIAS ACERCA DOS PRAZOS PRISIONAIS.

Aduz Luiz Guilherme Marinoni e Sérgio Cruz Arenhart que em relação ao

prazo da prisão, resta clara ser esta, uma questão extremamente polêmica. De

acordo com o art. 733, § 1º do CPC, este prazo deve ser fixado entre 01 (um) e 03

(três) meses. Segundo o art. 19 da Lei de Alimentos, o limite do prazo da prisão é de

60 (sessenta) dias. Há quem entenda que os prazos são aplicáveis a situações

distintas, não podendo o prazo exceder a 60 (sessenta) dias nos casos de alimentos

provisórios36 e definitivos37 - fixados com base na Lei de Alimentos – e devendo ser

fixado entre 01 (um) e 03 (três) meses no caso de alimentos provisionais38 (art. 852

do CPC)39.

A distinção entre tais prazos, ao se ligar aos alimentos provisórios e

definitivos, de um lado, e provisionais, de outro, não tem qualquer racionalidade,

uma vez que os conteúdos destas espécies de alimentos não têm qualquer

correlação lógica com a discriminação realizada. Não há como esquecer que as 35 Revista Jurídica Cesumar – Mestrado – v. 4. 2004. p. 433 36 Alimentos provisórios – quando fixados incidentalmente no curso de um processo de cognição ou liminarmente em despacho inicial, em ação de alimentos, de rito especial, após prova de parentesco, casamento, ou união estável (Lei nº. 5.478/68 - arts. 2º e 4º. Têm natureza antecipatória. 37 Alimentos definitivos – se estabelecidos pelo magistrado ou pelas partes (no caso de separação judicial consensual), com prestações periódicas, de caráter permanente, embora sujeitos a revisão (art. 1699 do CC). 38 Alimentos provisionais – se concedidos concomitantemente, ou antes, da ação de separação judicial, de nulidade ou anulação de casamento ou de alimentos, para manter o suplicante ou sua prole na pendência da lide. Tem natureza antecipatória e cautelar. 39 “Art. 852. É lícito pedir alimentos provisionais: I - nas ações de desquite e de anulação de casamento, desde que estejam separados os cônjuges; II - nas ações de alimentos, desde o despacho da petição inicial; III - nos demais casos expressos em lei. Parágrafo único. No caso previsto no no I deste artigo, a prestação alimentícia devida ao requerente abrange, além do que necessitar para sustento, habitação e vestuário, as despesas para custear a demanda”.

Page 32: UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ Denise Forneatcconline.utp.br/.../08/A-PRISAO-CIVIL-DO-DEVEDOR-DE-ALIMENTOS.pdf · As Leis Ordinárias também cuidam da prisão civil por alimentos

32

técnicas executivas previstas no Código de Processo Civil e na Lei de Alimentos se

aplicam a todos os tipos de alimentos, devendo os meios de execução ser definidos

a partir da aplicação, no caso concreto, das regras do meio idôneo e da menor

restrição possível.

Esclareça-se, por outro lado, que a norma da Lei de Alimentos é anterior à

norma do Código de Processo Civil. Assim, se o prazo da prisão, segundo o Código

de Processo Civil, pode variar entre 30 (trinta) e 90 (noventa) dias, e a Lei de

Alimentos o limita há 60 (sessenta) dias, logo, não há dúvida de que o juiz deverá

fixar o prazo da prisão entre 30 (trinta) e 90 (noventa) dias, conforme as

particularidades do caso concreto.

A questão, porém, é polêmica nos tribunais, como se vê adiante:

EMENTA: EXECUÇÃO DE PRESTAÇÃO ALIMENTÍCIA - ACORDO JUDICIAL - PARCELAMENTO DO DÉBITO - ACORDO NÃO CUMPRIDO - EXTINÇÃO DO PROCESSO - PRISÃO DECRETADA E CUMPRIDA - RENOVAÇÃO DO DECRETO PRISIONAL - POSSIBILIDADE, ATÉ ATINGIR O PRAZO MÁXIMO QUE A LEI PREVÊ. O parcelamento do acordo firmado entre as partes enseja a suspensão da execução (art. 792, CPC). Entretanto, se a obrigação não é adimplida, deve prosseguir, até que todo o débito seja quitado. A extinção da execução com base no que dispõe o art. 794, l, do CPC, somente é admissível quando já quitado integralmente o débito. Não se justifica a extinção do processo a obrigar a menor ao ajuizamento de nova execução. Decorridos trinta dias sem que o DEVEDOR tenha efetivado o pagamento do débito alime ntar, a PRISÃO pode ser estendida até alcançar o limite MÁXIMO de sessenta dias, nos termos do art. 19 da Lei nº. 5.478/68 . APELAÇÃO CÍVEL N° 1.0188.05.036033-1/001 - COMARCA DE NOVA LIMA - APELANTE(S): E.M.S.C. REPRESENTADO(A)(S) P/ MÃE J.D.S. - APELADO(A)(S): G.G.C. - RELATOR: EXMO. SR. DES. WANDER MAROTTA - ACÓRDÃO (Segredo de Justiça). Vistos etc., acorda, em Turma, a 7ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, sob a Presidência do Desembargador EDIVALDO GEORGE DOS SANTOS , incorporando neste o relatório de fls., na conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas, à unanimidade de votos, EM DAR PROVIMENTO. Belo Horizonte, 16 de março de 2010.

EMENTA: - À luz da Súmula nº. 309, STJ, para se livrar da PRISÃO civil por débito alimentar, não basta ao paciente pagar apenas as 03 (três) últimas parcelas vencidas no período anterior ao ajuizamento da execução, devendo fazê-lo, também, no que tange a todas aquelas que se venceram no decorrer do processo. - Por ser especial, a norma do art. 19 da Lei nº. 5.478/68 - Lei de ALIMENTOS, que estabelece o perío do MÁXIMO da PRISÃO civil por débito alimentar em 60 (sessenta) dias se sobrepõe à

Page 33: UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ Denise Forneatcconline.utp.br/.../08/A-PRISAO-CIVIL-DO-DEVEDOR-DE-ALIMENTOS.pdf · As Leis Ordinárias também cuidam da prisão civil por alimentos

33

genérica do art. 733, CPC, que autoriza o juiz decr etar a PRISÃO pelo PRAZO de 01 (um) a 03 (três) meses . HABEAS CORPUS CÍVEL N° 1.0000.10.035857-1/000 - COMARCA DE UNAÍ - PACIENTE(S): ALEXANDRE AGUIAR - AUTORID COATORA: JD 2 V COMARCA UNAI - RELATOR: EXMO. SR. DES. EDIVALDO GEORGE DOS SANTOS - ACÓRDÃO. Vistos etc., acorda, em Turma, a 6ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, sob a Presidência do Desembargador EDILSON FERNANDES, na conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas, à unanimidade de votos, EM CONCEDER PARCIALMENTE A ORDEM. Belo Horizonte, 10 de agosto de 2010.

Vale salientar, que é possível novo decreto prisional a cada

descumprimento, de modo que o prazo total da prisão pode ser superior ao limite de

90 (noventa) dias.

Mas, uma vez pagos os alimentos, o devedor deverá ser imediatamente

posto em liberdade, pouco importando a circunstância de não ter findado o prazo

prisional, e independentemente do não pagamento de outros valores devidos, como,

por exemplo, custas processuais e honorários advocatícios.

É evidente também que a submissão do devedor à prisão decretada não o

eximirá do seu vínculo à obrigação de pagar o montante devido (art. 733, § 2º do

CPC e art. 19, § 1º da Lei de Alimentos).

Em síntese, a dívida deverá ser cobrada pelo rito da expropriação, isto é, a

execução continuará pelo rito do art. 732 do CPC, pois o simples cumprimento do

decreto prisional não obstará a continuidade da ação com o fito de ver a obrigação

alimentar ser devidamente adimplida, obtendo assim, o sucesso do feito.

Note-se, ainda, que somente o adimplemento da dívida (ou o esgotamento

do prazo máximo admitido) poderá autorizar a libertação do devedor (art. 733, § 3º

do CPC).40

40 MARINONI, Luiz Guilherme e ARENHART, Sérgio Cruz. Curso de processo Civil. v. 3. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009. p. 392 e 393.

Page 34: UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ Denise Forneatcconline.utp.br/.../08/A-PRISAO-CIVIL-DO-DEVEDOR-DE-ALIMENTOS.pdf · As Leis Ordinárias também cuidam da prisão civil por alimentos

34

Já Athos Carneiro critica,

A permanência do lamentável descompasso entre a lei especial e o Código de Processo Civil, no alusivo ao prazo da prisão. Enquanto pela norma codificada o juiz decretará a prisão do devedor de alimentos provisionais ‘pelo prazo de 01 (um) a 03 (três meses)’ (art. 733, § 1º do CPC), pela Lei nº. 5.478 (Lei de Alimentos), o ‘cumprimento do julgado ou do acordo’ poderá ser garantido pela ‘decretação de prisão do devedor até 60 (sessenta) dias’ (art. 19, caput). Mais rigorosos, assim, os meios de coerção pessoal quanto aos alimentos provisionais, embora fixados até inaudita altera pars (art. 854, parágrafo único do CPC), do que relativamente aos alimentos fixados pelo consenso das partes ou após o contraditório judicial.

E sustenta ainda que,

A Lei nº. 6.014/1973, embora modificando a redação de vários dispositivos da Lei de Alimentos, com vistas à harmonizá-los com o novo Código de Processo Civil, não alterou, contudo, a redação do art. 19, caput; daí emprestar o seu prestígio a acórdão da 1ª. Câmara Cível do TJRS (HC 29.020 - 04.10.1977), “que considerou não revogado pela Lei nº. 6.014/1973 o prazo expressamente fixado no art. 733, § 1º do CPC” - ressalvando que “é tema, contudo, que merece renovada atenção.

Barbosa Moreira preconiza a unificação do critério do “tempo da prisão”, com

o asserto de que o art. 19, caput, parte final, da Lei nº. 5.478/1968 teria sido

derrogado pelo art. 733, § 1º do CPC: O juiz decretará, em qualquer caso, a prisão

do devedor, por tempo não inferior a 01 (um) nem superior a 03 (três) meses. Mas,

este entendimento do emérito jurista em relação a esta forma de derrogação esbarra

no art. 2º, § 2º da LICC.41

Esforço notável realizou Adroaldo Furtado Fabrício a fim de harmonizar as

normas discrepantes. Argumenta que, adaptada a Lei nº. 5.478/1968 por diploma

posterior ao Código de Processo Civil, não quanto à vigência, e, sim, no concernente

à existência – a Lei nº. 6.014/197342 entrou em vigor em 31.12.1973, já o Código de

Processo Civil, em 01.01.1974, então, o prazo máximo de prisão segue regulado

41 “Art. 2º. Não se destinando à vigência temporária, a lei terá vigor até que outra a modifique ou revogue”. “§ 2º. A lei nova, que estabeleça disposições gerais ou especiais a par das já existentes, não revoga nem modifica a lei anterior”. 42 Lei nº. 6.014/1973 - Adaptação ao novo Código de Processo Civil as leis que menciona

Page 35: UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ Denise Forneatcconline.utp.br/.../08/A-PRISAO-CIVIL-DO-DEVEDOR-DE-ALIMENTOS.pdf · As Leis Ordinárias também cuidam da prisão civil por alimentos

35

pela lei especial, que contém “regra mais favorável ao paciente da medida

excepcional (odiosa restringenda)”.43

Entende Yussef Said Cahali, “contudo, que, não fixando o art. 19 da Lei nº.

5.478/1968 lapso temporal mínimo para a prisão do devedor de alimentos deve o

dispositivo ser complementado pelo art. 733, § 1º do Código de Processo Civil, que

prevê o tempo mínimo de 30 (trinta) dias.44

Carlos Roberto Gonçalves preconiza, no entanto, que tem prevalecido o

critério unitário de duração máxima de 60 (sessenta) dias, aplicando-se a todos os

casos o art. 19 da Lei de Alimentos, por se tratar de lei especial, além de conter

regra mais favorável ao paciente da medida excepcional.45

Maria Berenice Dias não tece maiores comentários, limitando-se a citar tão

somente jurisprudência do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul:

Execução de alimentos. O prazo da prisão civil do devedor de alimentos não pode ultrapassar 60 (sessenta) dias. Proveram parcialmente. Unânime. TJRS, 7ª. Câmara Cível, AI 70020841342, Relator Desembargador Luiz Felipe Brasil Santos, j. 12.09.200746

Ilustrando o acima exposto, verificamos:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO DE ALIMENTOS. 1. Considerando que somente o adimplemento integral do débito tem o condão de afastar o decreto prisional, e que o acolhimento da justificativa em demanda executiva de alimentos pressupõe a ocorrência de situação excepcional, verdadeira força maior que, modo inesperado, venha a retirar a possibilidade de pagamento ao devedor, e essa não foi devidamente comprovada, a prisão dele é medida que se impõe. 2. O prazo da prisão civil do devedor de alimentos não pode ultrapassar 60 (sessenta) dias. PROVERAM PARCIALMENTE. UNÂNIME. (SEGREDO DE JUSTIÇA) (Agravo de Instrumento Nº 70020841342, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Luiz Felipe Brasil Santos, Julgado em 12/09/2007) (grifo nosso)

43 ASSIS, Araken de. Da execução de alimentos e prisão do devedor. 6. ed. São Paulo: Editora Revistas do Tribunais. 2004. p. 192. 44 CAHALI, Yussef Said. Dos alimentos. 5. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2007. p. 765. 45 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro. 3 ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 499, ap. Curso, cit. 37. Ed., v. 2, p. 503. 46 DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. 5. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009. p. 524.

Page 36: UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ Denise Forneatcconline.utp.br/.../08/A-PRISAO-CIVIL-DO-DEVEDOR-DE-ALIMENTOS.pdf · As Leis Ordinárias também cuidam da prisão civil por alimentos

36

H.C. ALIMENTOS. ALEGAÇÃO DE DESEMPREGO. ILEGALIDADE INEXISTENTE. Não cabe em sede de habeas corpus conhecer de matéria atinente à impossibilidade de pagamento da integralidade da pensão alimentícia. Somente para combater ilegalidade do decreto prisional é que se mostra adequado o writ. REGIME PRISIONAL. Conforme orientação da Corregedoria-Geral da Justiça, através do Ofício-Circular 21/93, a prisão do devedor de alimentos deve ser cumprida, preferencialmente, em regime aberto. PRAZO DA PRISÃO. O prazo da prisão civil do devedor de alimentos não pode ultrapassar 60 (sessenta) dias. (grifo nosso) CONCEDERAM PARCIALMENTE A ORDEM, TÃO-SÓ PARA REDUZIR O PRAZO DA PRISÃO PARA 60 (SESSENTA) DIAS E DETERMINAR O CUMPRIMENTO EM REGIME ABERTO. (Habeas Corpus Nº 70009722182, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Luiz Felipe Brasil Santos, Julgado em 29/09/2004) HABEAS CORPUS. EXECUÇÃO DE ALIMENTOS. ART. 733, CPC. PRAZO DA PRISÃO. O prazo da prisão civil do devedor de alimentos não pode ultrapassar 60 dias. (grifo nosso) CONCEDERAM A ORDEM, PARA REDUZIR O PRAZO DA PRISÃO PARA 60 DIAS. UNÂNIME. (SEGREDO DE JUSTIÇA) (Habeas Corpus Nº 70011349628, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Luiz Felipe Brasil Santos, Julgado em 04/05/2005) HABEAS CORPUS” - DECRETO DE PRISÃO - ALIMENTOS - MEIO INADEQUADO PARA ANÁLISE DE PROVAS - CONCESSÃO PARCIAL DA ORDEM - PRAZO MÁXIMO DE PRISÃO: 60 DIAS - ART. 19 DA LEI 5.478/68 - HABEAS CORPUS CÍVEL N° 1.0000.08.486104-6/000 - COMARCA DE RIBEIRÃO DAS NEVES - PACIENTE(S): L.P.P. - AUTORID COATORA: JD V FAMILIA SUCESSOES COMARCA RIBEIRAO NEVES - RELATOR: EXMO. SR. DES. AUDEBERT DELAGE. ‘Ante o exposto, concedo parcialmente a ordem, somente para reduzir o PRAZO fixado para a PRISÃO de 90 para 60 dias. (grifo nosso) SÚMULA: CONCEDERAM, EM PARTE, A ORDEM, VENCIDO O PRIMEIRO VOGAL. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS HABEAS CORPUS - PRISÃO CIVIL - DÍVIDA DE ALIMENTOS - INADIMPLEMENTO - INSUFICIÊNCIA FINANCEIRA - NÃO COMPROVAÇÃO - DECRETO DE PRISÃO - MANUTENÇÃO - PRAZO MÁXIMO - 60 (SESSENTA) DIAS - LEI DE ALIMENTOS - CONCESSÃO PARCIAL DO WRIT. - A concessão da ordem no habeas corpus impetrado contra prisão civil por dívida de alimentos depende da comprovação do pagamento das parcelas em atraso ou de que o descumprimento da obrigação foi inescusável. Verificada a inadimplência, descabida a revogação do mandado de prisão. - O prazo máximo para a prisão civil por débito alimentar é de 60 (sessenta) dias, por força do disposto no art. 19, da Lei n. 5.478/68 - Lei de Alimentos. (grifo nosso) Súmula: CONCEDERAM A ORDEM PARCIALMENTE – HABEAS CORPUS (CÍVEL) N° 1.0000.07.458789-0/000 - COMARCA DE GOVERNADOR VALADARES - PACIENTE(S): J.C.M. - AUTORID COATORA: JD 4 V CV COMARCA GOVERNADOR VALADARES - RELATORA: EXMª. SRª. DESª. HELOISA COMBAT - Data do julgamento: 14/08/2007 – Data da Publicação: 28/08/2007 - 7ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais.

Page 37: UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ Denise Forneatcconline.utp.br/.../08/A-PRISAO-CIVIL-DO-DEVEDOR-DE-ALIMENTOS.pdf · As Leis Ordinárias também cuidam da prisão civil por alimentos

37

4.3- DESCARACTERIZAÇÃO DA URGÊNCIA DA COBRANÇA.

Apesar da extrema importância do tema, analisando diversos doutrinadores,

verificou-se a falta de um aprofundamento maior, uma vez que ele aparece no

contexto geral do tema da obrigação alimentar.

Somente Sílvio de Salvo Venosa, adverte que a jurisprudência somente tem

admitido a execução, nos termos do art. 733 do Código de Processo Civil (com

prisão do alimentante), para cobrança das prestações alimentares dos últimos 03

(três) ou no máximo 06 (seis) meses - para as mais antigas, exige-se que a

execução seja nos termos do art. 732, do mesmo diploma legal47.

Se chega a esta conclusão quando se analisa a jurisprudência abaixo

descrita:

EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO DE ALIMENTOS . ART. 733 CPC. PARCELAS PRETÉRITAS. DESCARACTERIZAÇÃO DA URGÊNCIA. ORDEM DE PRISÃO REVOGADA. - Se a prestação alimentícia não está sendo cumprida há longo tempo, a execução deve seguir pelo art. 732 do CPC e não o procedimento qu e tem previsão de prisão, já que a tolerância da inadimplência descar acteriza a URGÊNCIA para a subsistência do alimentado e desaut oriza a medida extrema da prisão civil . - Recurso a que se dá provimento. AGRAVO DE INSTRUMENTO CÍVEL N° 1.0024.06.104085-3/001 - COMARCA DE BELO HORIZONTE - AGRAVANTE(S): I.E.S. - AGRAVADO(A)(S): R.C.R.S. REPRESENTADO(A)(S) P/ MÃE F.C.R. - RELATOR: EXMO. SR. DES. ERNANE FIDÉLIS - ACÓRDÃO (Segredo de Justiça) - Vistos etc., acorda, em Turma, a 6ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, sob a Presidência do Desembargador ERNANE FIDÉLIS, incorporando neste o relatório de fls., na conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas, à unanimidade de votos, EM DAR PROVIMENTO. Belo Horizonte, 13 de abril de 2010.

Conforme decisão prolatada pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais é

totalmente possível a mudança de ritos, do art. 773 para o art. 732 do CPC,

vejamos:

47 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil. Direito de Família. 7. ed. São Paulo: Editora Atlas S.A., 2007. p. 364

Page 38: UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ Denise Forneatcconline.utp.br/.../08/A-PRISAO-CIVIL-DO-DEVEDOR-DE-ALIMENTOS.pdf · As Leis Ordinárias também cuidam da prisão civil por alimentos

38

PROVIDO. Em ação de execução de alimentos, totalmen te possível a conversão da execução proposta nos termos do art. 7 33, CPC, na do rito do art. 732 do mesmo 'Codex', em obediência ao s princípios da economia e celeridade processuais. (TJMG; APCV 4423 614-50.2004.8.13.0024; Belo Horizonte; Oitava Câmara Cí vel; Rel. Des. Vieira de Brito; Julg. 05/08/2010; DJEMG 29/11/2010 ) (TJMG; APCV 4423614-50.2004.8.13.0024; Belo Horizonte; Oitava Câmara Cível; Rel. Des. Vieira de Brito; Julg. 05/08/2010; DJEMG 29/11/2010) EMENTA: FAMÍLIA - EXECUÇÃO DE ALIMENTOS - DÍVIDA PRETÉRITA - INADEQUAÇÃO DO RITO DO ART. 733 DO CPC - CONVERSÃO NA DO ART.732, CPC - ADMISSIBILIDADE - RECURSO PROVIDO. Em ação de execução de alimentos, totalmente possível a conversão da execução proposta nos termos do art.733, CPC, na do rito do art.732 do mesmo 'Codex', em obediência aos princípios da economia e celeridade processuais. APELAÇÃO CÍVEL N° 1.0024.04.442361-4/001 - COMARCA DE BELO HORIZONTE - APELANTE(S): A.H.F.A. REPRESENTADO(A)(S) P/ MÃE M.F. - APELADO(A)(S): C.A.S. - RELATOR: EXMO. SR. DES. VIEIRA DE BRITO ACÓRDÃO (SEGREDO DE JUSTIÇA) Vistos etc., acorda, em Turma, a 8ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, sob a Presidência da Desembargadora TERESA CRISTINA DA CUNHA PEIXOTO , incorporando neste o relatório de fls., na conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas, à unanimidade de votos, EM DAR PROVIMENTO AO RECURSO. Belo Horizonte, 05 de agosto de 2010. DES. VIEIRA DE BRITO - Relator NOTAS TAQUIGRÁFICAS O SR. DES. VIEIRA DE BRITO: VOTO Trata-se de apelação cível, manejada por A.H.F.A, repdo. por sua genitora M.F, contra a sentença proferida às f.111/112, em que MMª. Juíza de Direito da 1ª Vara Cível desta Capital, nos autos da EXECUÇÃO DE ALIMENTOS proposta em desfavor de C.A.S, extinguiu o processo nos termos do art.794, CPC c/c art.733, §2º, CPC, tendo em vista que o executado (apelado) cumpriu integralmente o decreto prisional, sem quitação do débito. O ora apelante, requereu a conversão da execução de alimentos proposta no rito do art.733, CPC para a do art.732, do mesmo Codex, o que não foi aceito pela preclara julgadora a quo. Irresignado com o teor da decisão singular, A.H.F.A manejou razões de recurso às f.116/121, requerendo, em apertada síntese, o prosseguimento do feito com conversão do rito, para aquele previsto no art.732, CPC. Não houve apresentação de contrarrazões. (Certidão de f.123) Instada a se manifestar, a Cúpula Ministerial, em parecer da lavra do Dr. Luiz Antônio de S. P. Ricardo, opinou pelo provimento do recurso. (f.132/134). É O BREVE RELATÓRIO. Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso. Em exame pormenorizado do caderno probatório, tenho que a decisão combatida carece de reforma, eis que a douta Juíza a quo não agiu com o costumeiro acerto em sua decisão, eis que decidiu de forma totalmente contrária aos princípios da economia e celeridade processuais. Como se sabe, a prisão civil representa medida excepcional, só sendo cabível ante o inadimplemento voluntário do alimentante. O fato do apelado não ter pago o pensionamento e ter sido preso em razão de sua inadimplência não o exime da execução patrimonial, todavia, negar a conversão pleiteada pelo apelante se afigura, com a devida vênia, medida

Page 39: UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ Denise Forneatcconline.utp.br/.../08/A-PRISAO-CIVIL-DO-DEVEDOR-DE-ALIMENTOS.pdf · As Leis Ordinárias também cuidam da prisão civil por alimentos

39

que afronta a economia processual, bem como a celeridade da prestação jurisdicional. No caso vertente, tenho que a conversão postulada pelo apelante apresenta-se totalmente cabível, qual seja, converter a execução fundada no art. 733 do Digesto Processual Civil, naquela prevista no art. 732 do referido Diploma Processual. Assim, entendo que não deve a execução prosseguir sob o rito do art. 733 do CPC, mas sim, transmudar-se para a prevista no art. 732 do mesmo Codex. Isto posto, mediante tais considerações, com supedâneo nos princípios da economia processual e celeridade, DOU PROVIMENTO AO RECURSO, para anular a sentença de primeiro grau, determinando o prosseguimento da execução pelo rito do art. 732 do Código de Processo Civil. Custas, ex lege. É como voto. Votaram de acordo com o(a) Relator(a) os Desembargador(es): BITENCOURT MARCONDES e FERNANDO BOTELHO. SÚMULA : DERAM PROVIMENTO AO RECURSO.

91497515 - AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO DE ALIME NTOS. PARCELAS QUE SE VENCEREM NO CURSO DA EXECUÇÃO. Ao credor é facultada a opção de conversão da execução ajuizada pelo rito do art. 733 do CPC para o rito do art. 732 do CPC. Agravo de instrumento desprovido, de plano. (TJRS; AI 7003826 2937; Porto Alegre; Sétima Câmara Cível; Rel. Des. Jorge Luís D all´Agnol; Julg. 01/10/2010; DJERS 05/11/2010) AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO DE ALIMENTOS. PARCELAS QUE SE VENCEREM NO CURSO DA EXECUÇÃO.Ao credor é facultada a opção de conversão da execução ajuizada pelo rito do art. 733 do CPC para o rito do art. 732 do CPC. Agravo de instrumento desprovido, de plano. Agravo de Instrumento Sétima Câmara Cível Nº 70038262937 Comarca de Porto Alegre J.A.D. AGRAVANTE W.V. AGRAVADO DECISÃO MONOCRÁTICA Vistos. José Augusto D. agrava de instrumento da decisão que determinou o prosseguimento da execução de alimentos ajuizada por Waldir V. pelo rito do art. 732 do CPC, intimando-o a pagar o débito apurado pela contadoria (fl. 347) em 15 dias, sob pena de multa de 10% sobre o valor da dívida, acrescendo que o período objeto da cobrança é de outubro de 2009 a junho de 2010 (por cópia às fls. 350 e 359). Sustenta, em síntese, que as parcelas que se venceram durante o curso da demanda não podem ser cobradas pelo rito do art. 732 do CPC mas, sim, em novo processo executivo. Pede o provimento do recurso, para que seja extinta a execução (fls. 02-08). Intimada, a agravada contra-arrazoou, pedindo o desprovimento do recurso e a condenação do agravante nas penas da litigância de má fé, entendendo que o recurso é meramente procrastinatório (fls. 367-373). O Ministério Público opinou pelo desprovimento do agravo de instrumento (fls. 376/377).

Page 40: UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ Denise Forneatcconline.utp.br/.../08/A-PRISAO-CIVIL-DO-DEVEDOR-DE-ALIMENTOS.pdf · As Leis Ordinárias também cuidam da prisão civil por alimentos

40

2. O presente recurso merece ser desprovido de plano, visto que manifestamente improcedente, o que autoriza julgamento singular, nos termos do art. 557, caput, CPC. A execução de alimentos, pelo rito da coerção pessoal, abrange as três parcelas imediatamente anteriores ao ajuizamento da execução, bem como aquelas que se vencerem no curso da demanda, por força do art. 290 do CPC. Exame dos autos demonstra que a exequente manifestou-se pelo prosseguimento da execução de parcelas posteriores ao ajuizamento da ação, apurado o valor devido pela contadoria (fl. 347), pelo rito expropriatório do art. 732 do CPC. Nesse sentido, jurisprudência desta Corte: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE EXECUÇÃO DE ALIMENTOS. RITO DO ART. 733 DO CPC. PRISÃO CIVIL DO DEVEDOR. PROSSEGUIMENTO DA EXECUÇÃO. COBRANÇA DAS PARCELAS VENCIDAS NO CURSO DA AÇÃO. ADMISSIBILIDADE. A extinção da execução pressupõe a quitação de todas parcelas devidas pelo devedor de alimentos. Após cumprida a prisão civil pelo devedor da verba alimentar, cabe o prosseguimento do feito para pagamento das parcelas vencidas posteriormente, pelo rito do art. 733 do CPC. Aplicação da Súmula 309 do STJ e da Conclusão n.º 23.º do Centro de Estudos deste Tribunal. Precedentes desta Corte. Sentença de extinção da execução desconstituída para prosseguimento da ação em relação às parcelas remanescentes e inadimplidas. DERAM PROVIMENTO A APELAÇÃO E DESCONSTITUÍRAM A SENTENÇA. (Apelação Cível Nº 70035396977, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: André Luiz Planella Villarinho, Julgado em 22/09/2010) A questão foi bem enfrentada pelo digno agente do Ministério Público, Dr. Roberto Bandeira Pereira, razão pelo qual acolho e agrego suas ponderações como razão de decidir, até para evitar tautologia, exaradas nos seguintes termos: No mérito, entende o Signatário que o recurso deve ser desprovido. A decisão agravada encontra-se em consonância com o entendimento jurisprudencial acerca do tema. É cediço na Corte local que as parcelas vencidas no curso da demanda devem ser incluídas na cobrança. Nesse sentido: AGRAVO DE INSTRUMENTO. FAMÍLIA. EXECUÇÃO DE ALIMENTOS. RITO EXPROPRIATÓRIO. INCLUSÃO DAS PARCELAS QUE SE VENCERAM NO CURSO DA AÇÃO. POSSIBILIDADE. PRESTAÇÕES SUCESSIVAS. ART. 290 DO CPC. Tratando-se de cobrança de débito alimentar, cujas prestações são periódicas, ou seja, trato sucessivo, as parcelas vincendas devem ser incluídas na execução pelo rito do art. 732 do CPC. AGRAVO DE INSTRUMENTO DESPROVIDO. (Agravo de Instrumento Nº 70030044838, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: José Conrado de Souza Júnior, Julgado em 12/08/2009) Outrossim, no caso em tela, considerando que o alimentante permaneceu inadimplente desde o início da cobrança, limitando-se a realizar, apenas, pagamentos parciais, cabível o prosseguimento da execução pelos valores apurados pela contadoria, porquanto tais quantias englobam parte das parcelas vencidas desde antes do ajuizamento. Por outro lado, não havendo mais atualidade do débi to, mostra-se correta a conversão do rito da execução para o expr opriatório (art. 732 do CPC), conforme determinado pelo julgador monocrá tico. Por derradeiro, descabe o pedido de litigância de má fé, veiculado pela agravada, uma vez que não configurada quaisquer das hipóteses previstas no artigo 17 do CPC. Deste modo, manifesta a improcedência do agravo de instrumento, que se impõe reconhecida de logo, na esteira dos precedentes desta Corte, até para evitar desdobramentos desnecessários e que só protrairiam o desfecho, já sabido, do recurso.

Page 41: UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ Denise Forneatcconline.utp.br/.../08/A-PRISAO-CIVIL-DO-DEVEDOR-DE-ALIMENTOS.pdf · As Leis Ordinárias também cuidam da prisão civil por alimentos

41

Nestes termos, nego provimento ao agravo de instrumento, pois manifestamente improcedente, nos termos do art. 557, caput, CPC. Porto Alegre, 1º de outubro de 2010. Des. Jorge Luís Dall´Agnol, Relator.

Fácil o entendimento do por que da mudança de ritos, este visa, tão somente

“assegurar a efetividade do processo”. O princípio da economia processual se refere

a uma economia de custo, uma economia de tempo e uma economia processual,

onde se busca a obtenção de maior resultado com o menor uso de atividade

jurisdicional, ou seja, o menor número de atos, bem como o aproveitamento dos atos

que não forem prejudicados pelo vício, desde que não traga prejuízo para as partes,

a aplicação da fungibilidade, e finalmente seu papel mais importante que é o social,

cuja finalidade visada é de uma eficiente prestação jurisdicional, proporcionando

uma justiça rápida e de baixo custo, tanto para as partes como para o Estado,

atendendo aos valores constitucionais em uma perspectiva concreta e não apenas

formal, oferecendo soluções justas, efetivas e tempestivas” 48.

Embora haja o conhecimento da possibilidade da Descaracterização da

Urgência da Cobrança, pode-se verificar também que o credor/a de prestação

alimentícia inicie a execução de alimentos por meio do instituto do art. 732 do CPC,

o qual possibilita a penhora em relação aos bens do executado, e não obtendo

sucesso no feito, se valer do art. 733 do mesmo diploma legal para ver o seu

objetivo cumprido.

Basta uma simples leitura do julgado abaixo:

11062064 - CIVIL E PROCESSO CIVIL. ALIMENTOS. EXECUÇÃO. ARTS. 732 E 733 DO CPC. CONVERSÃO DE RITO. POSSIBILIDADE. PRISÃO CIVIL. DEVEDOR DE ALIMENTOS. EXECUÇÃO NA FORMA DO ARTIGO 733 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. Cabe a credora a escolha do rito processual a ser seguido para a execução de al imentos. Nada

48 Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais - APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.0607.03.014621-3/001.

Page 42: UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ Denise Forneatcconline.utp.br/.../08/A-PRISAO-CIVIL-DO-DEVEDOR-DE-ALIMENTOS.pdf · As Leis Ordinárias também cuidam da prisão civil por alimentos

42

obsta que primeiramente tente a penhora de bens do executado, como na espécie e, uma vez frustrada a execução pelo rit o comum, valha-se a exeqüente da ameaça do Decreto prisional . - Na execução de alimentos, prevista pelo artigo 733 da Lei Processual Civil, ilegítima se afigura a prisão civil do devedor fundada no inadimplemento de prestações pretéritas, assim consideradas as anteriores às três últimas prestações vencidas antes do ajuizamento da execução. - Recurso parcialmente conhecido e, nessa extensão, provido. (STJ; RESP 216560; SP; Quarta Turma; Rel. Min. Francisco Cesar Asfor Rocha; Julg. 28/11/2000; DJU 05/03/2001; pág. 00169)

Contudo, como já restou pacificado pelos tribunais, a utilização do art. 733

do CPC ficou restrita às últimas 03 (três) prestações devidas (e às subseqüentes

após a citação), remetendo o credor de alimentos com prestações mais antigas à

aplicação do art. 732 do CPC.

Existe também a tese contrária no sentido de que não deve ser

descaracterizada a urgência, urge-se aos olhos daqueles que tanto necessitam da

prestação alimentícia.

A prisão civil por dívida de alimentos é medida excepcional, empregada em

casos extremos, diante da contumácia, obstinação, teimosia, rebeldia do devedor

que, embora possua meios necessários para saldar a dívida, procura protelar a

quitação.

A prisão é uma sanção a quem viola o pacto da legalidade. Sendo a medida

necessária para conscientizar o devedor/alimentante de seu dever de sustentar o

alimentando/a. Infelizmente ainda ocorre que aquele que gera somente repassa a

verba alimentar devida a seus filhos diante da perspectiva de ser aprisionado, não

podendo então, de outra forma o julgador tirar a urgência quando a situação se tratar

de prestação alimentícia.

Page 43: UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ Denise Forneatcconline.utp.br/.../08/A-PRISAO-CIVIL-DO-DEVEDOR-DE-ALIMENTOS.pdf · As Leis Ordinárias também cuidam da prisão civil por alimentos

43

4.4- FUNDAMENTO CONSTITUCIONAL.

A prisão civil está prevista na Constituição da República de 1988, em seu

art. 5º, LXVII49, para os casos de depositário infiel e injustificada ausência de

pagamento de prestação alimentícia. A segunda hipótese, aliás, está contemplada

também na Convenção de São José de Costa Rica, subscrita pelo Brasil e

promulgada pelo Congresso Nacional.

Pois, bem, este artigo dispõe que a coerção pessoal será devida em relação

à obrigação alimentar, e segundo os princípios do direito processual civil brasileiro, a

execução das dívidas que têm caráter patrimonial, poderão ser cobradas por meio

do poder judiciário quando invocado, lançando mãos dos bens do devedor e

destinando-os à satisfação do credor, conforme o estabelecido em lei.

No entanto, neste tipo de obrigação, abre-se uma exceção, permitindo-se a

coação pessoal do alimentante devedor para que o mesmo cumpra com o acordado

judicialmente ou extrajudicialmente, justamente, para resguardar a dignidade das

pessoas que necessitam de alimentos, filhos ou mesmo esposas e ex-esposas.

Em contrapartida, às criticas de ilegalidade da medida coercitiva, assim

entende o professor Sérgio Gilberto Porto, com fundamentos em decisões

jurisprudenciais,

(...) não se pode inquinar de ilegal ou abusiva a decisão que ameaça o devedor de alimentos definitivos ou provisórios de prisão, uma vez que é meio coercitivo adequado para obrigar o devedor rebelde e ladino a pagar aquilo que injustificadamente se nega. Portanto, legítima é a prisão do marido, se decretada para forçá-lo a pagar alimentos à esposa e filhos.50

49 “Art. 5º - Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...) LXVII - não haverá prisão civil por dívida, salvo a do responsável pelo inadimplemento voluntário e inescusável de obrigação alimentícia e a do depositário infiel”; 50 Revista Jurídica Cesumar – Mestrado – v. 4. 2004. p. 431

Page 44: UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ Denise Forneatcconline.utp.br/.../08/A-PRISAO-CIVIL-DO-DEVEDOR-DE-ALIMENTOS.pdf · As Leis Ordinárias também cuidam da prisão civil por alimentos

44

Yussef Said Cahali ressalta que em função de sua excepcionalidade, como

meio coercitivo que se dirige contra a liberdade do indivíduo, garantida pelo Estado,

não se admite a prisão civil por alimentos senão, em virtude de lei. Exatamente por

isso, a prisão civil por dívida, é cabível apenas no caso dos alimentos previstos nos

arts. 1.566, III, e 1.694 do atual Código Civil, que constituem relação de direito de

família.

No direito brasileiro, a Constituição Federal de 1988, ainda que mantendo o

instituto, deu ênfase, no confronto com o texto constitucional anterior51, ao caráter

excepcional da prisão, proclamando agora, entre os direitos e garantias individuais,

que “não haverá prisão por dívida, salvo a do responsável pelo inadimplemento

voluntário e inescusável de obrigação alimentícia (...)” (art. 5º, LXVII).

A disciplina legal recepcionada encontra-se difusamente estatuída na Lei de

Alimentos, cujo art. 19 dispõe que “o juiz, para instrução da causa, ou na execução

da sentença ou do acordo, poderá tomar todas as providências necessárias para

seu esclarecimento ou para o cumprimento do julgado ou do acordo, inclusive a

decretação de prisão do devedor até sessenta dias”; enquanto o art. 18 faz remissão

igualmente à execução da sentença de alimentos, “na forma dos arts. 732, 733 e

735 do Código de Processo Civil.

Mas, assimétrico, prescreve o art. 733 do Código de Processo Civil que, “na

execução de sentença ou de decisão, que fixa os alimentos provisionais, o juiz

mandará citar o devedor para, em três dias, efetuar o pagamento, provar que o fez

ou justificar a impossibilidade de efetuá-lo. § 1º. Se o devedor não pagar, nem se

escusar, o juiz decretar-lhe-á a prisão pelo prazo de 01 (um) a (três) meses.”52

51 O art. 153, § 17, da CF de 1967, c/c a EC nº. 1/69, referia-se apenas a ‘inadimplemento de obrigação alimentar, na forma da lei”. 52 CAHALI, Yussef Said. Dos alimentos. 5. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2007. p. 743.

Page 45: UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ Denise Forneatcconline.utp.br/.../08/A-PRISAO-CIVIL-DO-DEVEDOR-DE-ALIMENTOS.pdf · As Leis Ordinárias também cuidam da prisão civil por alimentos

45

No entendimento de Rosana Amara Girardi Fachin, afigura-se razoável,

diante da mudança de paradigmas do Direito Privado contemporâneo, colocar em

debate a hipótese autorizativa de prisão civil. Preciso é o teor da norma

constitucional, a ser analisada em atenção ao fundamental direito de liberdade do

cidadão (conforme assegurado pelo caput do artigo 5º, consonante), e em face dos

princípios alicerçados no artigo 1º da Carta da República que tem como fundamento

no inciso III, a dignidade da pessoa humana e no inciso IV os valores sociais do

trabalho.

Continua, salientando estar com inteira razão à doutrina que enfoca o centro

de irradiação dos afazeres na Constituição:53

Do ponto de vista dos operadores jurídicos, trata-se de afirmar que o jurista,

especialmente o juiz, deve firmemente orientar sua atividade jurisdicional – quer

quando decide conflitos intersubjetivos de natureza privada - no sentido do horizonte

traçado pela Constituição, qual seja, repita-se, a edificação de uma sociedade mais

justa, livre e solidária, construída sobre o fundamentalíssimo pilar da dignidade de

todos os seus cidadãos. Isso significa, necessariamente, que a magistratura

necessariamente deve ser co-partícipe de uma política de inclusão social, não

podendo aplicar acriticamente institutos que possam representar formas excludentes

de cidadania (apud FACHINI NETO, 2003).

Conclui, ainda, uma reflexão, tendo como paradigma repersonalização do

Direito Civil, a reformulação da pena privativa de liberdade no direito penal, bem

assim os princípios esculpidos no artigo 1º e a disposição do artigo 5º, inciso LXVII

da Constituição Federal, pretendendo realizar um diálogo entre o Direito Civil e o

Direito Constitucional, que também perpassa pela análise de instrumentos

53 FACHIN, Rosana Amara Girardi. Dever alimentar para um novo direito de família. Rio de Janeiro: Renovar. 2005. p. 3.

Page 46: UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ Denise Forneatcconline.utp.br/.../08/A-PRISAO-CIVIL-DO-DEVEDOR-DE-ALIMENTOS.pdf · As Leis Ordinárias também cuidam da prisão civil por alimentos

46

supranacionais como o Pacto de São José da Costa Rica, dentre outros, revelando

não só a questão ética da prisão civil por dívida frente a esses mecanismos legais

como também os efeitos da medida no plano prático.54

54 FACHIN, Rosana Amara Girardi. Dever alimentar para um novo direito de família. Rio de Janeiro: Renovar, 2005. p. 4.

Page 47: UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ Denise Forneatcconline.utp.br/.../08/A-PRISAO-CIVIL-DO-DEVEDOR-DE-ALIMENTOS.pdf · As Leis Ordinárias também cuidam da prisão civil por alimentos

47

5. CONCLUSÃO.

O propósito do presente trabalho foi o de apresentar, ainda que de maneira

sucinta, as estruturas que regulam o instituto da prisão civil por dívida alimentar, no

que diz respeito ao inadimplemento voluntário e inescusável de obrigação

alimentícia.

Embora a prisão civil seja feita por meio do artigo 733 do Código de

Processo Civil (03 – três – últimas parcelas e as que vencerem no curso da

demanda), não é a única maneira de chamar à responsabilidade o devedor de

alimentos, mas, é a maneira que consegue atingir com mais precisão o alimentante

que deixa a mercê o alimentando, pois só assim se vê obrigado a repensar o porquê

do não pagamento de sua dívida.

Em determinados casos verifica-se que não há a má-fé do devedor em não

pagar os alimentos devidos, mais sim, somente uma fase passageira de dificuldade

financeira, entretanto, na maioria dos casos postulados judicialmente se verifica o

emocional comandando os devedores, alegando os mais diversos pretextos, mesmo

que estapafúrdios, para o não adimplemento das pensões alimentícias, quais sejam:

o fim do relacionamento (casamento, união estável, etc.) o afastamento de seus

filhos e do lar, a guarda mesmo que provisória dada às mães, enfim, infindáveis

podem ser os motivos ensejadores.

Mas, o grande celeuma está no lapso temporal para ser concluída uma

execução de alimentos, independente do meio utilizado: art. 733 (prisão civil) ou art.

732 (expropriação).

Page 48: UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ Denise Forneatcconline.utp.br/.../08/A-PRISAO-CIVIL-DO-DEVEDOR-DE-ALIMENTOS.pdf · As Leis Ordinárias também cuidam da prisão civil por alimentos

48

As Varas ou Secretarias de Família estão abarrotadas de processos de

Execução de Alimentos que se arrastam por anos, dificultando e muito a vida dos

que necessitam das verbas alimentares para a sua sobrevivência.

O resultado disto pode ser percebido facilmente: os responsáveis pela

guarda tendo que buscar outras alternativas para o sustento dos filhos, os quais

devem ter suas necessidades diárias supridas, não podem aguardar o deslinde do

litígio.

O ideal seriam os acordos, que, aliás, são uma tendência positiva que vem

sendo adotada em cumprimento a orientação emanada do Conselho Nacional de

Justiça.

Mas há um longo caminho a ser percorrido até que essa seja a regra geral.

Até que essa forma de resolução de litígio se consolide, inevitavelmente teremos

que conviver com os inúmeros recursos processuais existentes, que insistem em

retardar o andamento processual, o qual já não é propriamente célere.

Inobstante os percalços diários que acometem as nossas Varas e

Secretarias de Família, foram absorvidas várias lições em minha vida acadêmica e,

posteriormente, estagiando nesta área, aprendizado este que somado à pesquisa

realizada para compor este trabalho de final de curso, me dá a consciência de que

posso vir a fazer diferença, atuando com dignidade, respeito pelo próximo, amor a

profissão.

O somatório de todas as experiências já vivenciadas nesta área de família,

acrescido ao imenso desejo de contribuir com a melhora do sistema, mostra que o

caminho correto para desatar o nó é o da perseverança, o do estudo e muito bom

senso.

Page 49: UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ Denise Forneatcconline.utp.br/.../08/A-PRISAO-CIVIL-DO-DEVEDOR-DE-ALIMENTOS.pdf · As Leis Ordinárias também cuidam da prisão civil por alimentos

49

6. BIBLIOGRAFIA.

ASSIS, Araken de. Da Execução de Alimentos e Prisão do Devedor. 6ª edição. São

Paulo, 2004.

CAHALI, Yussef Said. Dos Alimentos. 4ª edição, de acordo com o Novo Código Civil.

São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002.

DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. 5ª edição. Revista dos

Tribunais. São Paulo, 2009.

DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. Vol. 5. Direito de Família. 24ª

edição. São Paulo: Saraiva, 2009.

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro. Vol. VI. Direito de Família. 6ª

edição. Saraiva, 2009.

LEITE, Eduardo de Oliveira. Direito Civil Aplicado. Vol. 5. Direito de Família. São

Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2005.

MARINONI, Luiz Guilherme. Curso de Processo Civil. Vol. 3. Execução. 2ª edição.

São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008.

VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil. Vol. VI. Direito de Família. 9ª edição. São

Paulo: Atlas, 2009.