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UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ Adriana Gomes Pereira MEDIDAS CAUTELARES PREVISTAS NO ART. 319 DA LEI 12.403/2011: NATUREZA JURÍDICA E SUA REPERCUSSÃO NO PRINCÍPIO DA RAZOÁVEL DURAÇÃO DO PROCESSO CURITIBA 2012

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UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ

Adriana Gomes Pereira

MEDIDAS CAUTELARES PREVISTAS NO ART. 319 DA LEI 12.403/2011:

NATUREZA JURÍDICA E SUA REPERCUSSÃO NO PRINCÍPIO DA

RAZOÁVEL DURAÇÃO DO PROCESSO

CURITIBA

2012

MEDIDAS CAUTELARES PREVISTAS NO ART. 319 DA LEI 12.403/2011:

NATUREZA JURÍDICA E SUA REPERCUSSÃO NO PRINCÍPIO DA

RAZOÁVEL DURAÇÃO DO PROCESSO

CURITIBA

2012

Adriana Gomes Pereira

MEDIDAS CAUTELARES PREVISTAS NO ART. 319 DA LEI 12.403/2011:

NATUREZA JURÍDICA E SUA REPERCUSSÃO NO PRINCÍPIO DA

RAZOÁVEL DURAÇÃO DO PROCESSO

CURITIBA

2012

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao

Curso de Direito da Faculdade de Ciências Jurídicas da Universidade Tuiuti do Paraná, como requisito

parcial para a obtenção de grau de Bacharel.

Orientadora: Profª. Aline Guidalli Pilati

TERMO DE APROVAÇÃO

Adriana Gomes Pereira

MEDIDAS CAUTELARES PREVISTAS NO ART. 319 DA LEI 12.403/2011:

NATUREZA JURÍDICA E SUA REPERCUSSÃO NO PRINCÍPIO DA

RAZOÁVEL DURAÇÃO DO PROCESSO

Esta monografia foi julgada e aprovada para a obtenção de grau de Bacharel em Direito no Curso de

Direito da Faculdade de Ciências Jurídicas da Universidade Tuiuti do Paraná.

Curitiba, ___ de __________ de 2012.

___________________________ Eduardo de Oliveira Leite

Coordenador do Núcleo de Monografia

Orientadora: ______________________________

Profª. Aline Guidalli Pilati

Examinador 1: _____________________________ Prof(a). Dr(a).

Examinador 2: _____________________________

Prof(a). Dr(a).

Dedico este trabalho a Deus, razão

suprema de minha existência. Aos meus

pais, e familiares, pelo amor, carinho,

compreensão e exemplo de vida. Aos

amigos e professores, que são pessoas

queridas e especiais, sem as quais seria

impossível ter finalizado o presente

estudo.

Justiça atrasada não é justiça, senão

injustiça qualificada e manifesta. Porque

a dilação ilegal nas mãos do julgador

contraria o direito escrito das partes e,

assim, as lesa no patrimônio, honra e

liberdade. Os juízes tardinheiros são

culpados, que a lassidão comum vai

tolerando. Mas sua culpa tresdobra com a

terrível agravante de que o lesado não tem

meio de reagir contra o delinqüente

poderoso, em cujas mãos jaz a sorte do

litígio pendente. (Rui Barbosa. Oração

aos Moços. São Paulo: Russel, 2004, p.

47. 1997).

RESUMO

O presente trabalho é fruto de uma análise doutrinária e jurisprudencial das medidas

cautelares pessoais, diversas da prisão, prevista no artigo 319 da Lei 12.403/2011,

especialmente a relação desse direito com a razoável duração do processo, atualmente

constitucionalizado pela emenda n.º 45/2004, mormente, visando extrair a natureza

jurídica, do referido artigo, bem como, a sua necessária conexão, no Processo Penal

Brasileiro, com o prazo razoável de duração do processo das medidas cautelares. Sendo

assim, como não há uma limitação temporal, expressa na Lei 12.403/2011, bem como, no

Código de Processo Penal, poderia haver uma limitação temporal destas medidas, em

obediência ao direito à razoável duração do processo. Desde modo a análise proposta,

destina-se ao um direcionamento à complementação, dessa omissão, visando demonstrar

que a dilação indevida, fere os direitos fundamentais do acusado. Nessa seara, ante as

decisões prolatadas pelo Superior Tribunal Federal, alguns requisitos práticos foram

reiteradamente trazidos à tona no momento de definir o prazo razoável destas medidas,

tais como: a complexidade da causa; o comportamento do acusado; o comportamento das

autoridades. Assim, com fundamento, buscar-se-á dentre esses critérios, juntamente com

o direito comparado, um norteamento, para se estabelecer, um equilíbrio entre esses

vetores, porque nem sempre um processo célere, é um processo justo, e a solução pode se

resultar de uma interpretação tanto vinculada aos preceitos, processuais, quanto

constitucionais.

Palavras chave: Medidas Cautelares Pessoais, Duração Razoável do Processo, Direitos

Fundamentais

.

LISTA DE SIGLAS

CF – Constituição Federal do Brasil de 1988

CP – Código Penal

CPP- Código Processo Penal

CADH – Convenção Americana de Direitos Humanos

DEPEN - Departamento Penitenciário Nacional

EC – Emenda Constitucional

HC – Habeas Corpus

MP – Ministério Público

STF – Supremo Tribunal Federal

STJ – Superior Tribunal de Justiça

TEDH – Tribunal Europeu de Direitos Humanos

TJ – Tribunal de Justiça

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ..................................................................................................................8

1 MEDIDAS CAUTELARES DIVERSAS DA PRISÃO .............................................10

1.1 BREVE EVOLUÇÃO HISTÓRICA ........................................................................10

1.2 NOÇÕES GERAIS...................................................................................................12

1.2.1 Conceito e natureza jurídica ....................................................................................12

1.2.2 Pressupostos legais das medidas cautelares diversas da prisão...............................17

1.2.3 Princípios Norteadores das Medidas Cautelares.......................................................29

2 A RAZOABILIDADE E O PRAZO RAZOÁVEL DAS MEDIDAS

CAUTELARES DIVERSAS DA PRISÃO....................................................................22

2.1 NOÇÕES DA RAZOABILIDADE... ..........................................................................28

2.2 PRESSUPOSTOS E REQUISITOS DA RAZOABILIDADE............... .....................30

2.3 NOÇÕES DE PRAZO RAZOÁVEL ..........................................................................35

2.4 LIMITES NORMATIVOS PARA EVITAR A DILAÇÃO INDEVIDA...................41

2.5 SOLUÇÕES DE TUTELAS EM CASO DE VIOLAÇÃO DA LIMITAÇÃO

TEMPORAL......................................................................................................................46

3 A RAZOÁVEL DURAÇÃO DO PROCESSO E OS DIREITOS

FUNDAMENTAIS...........................................................................................................50

3.1 A DILAÇÃO INDEVIDA FERE OS DIREITOS FUNDAMENTAIS......................54

CONSIDERAÇÕES FINAIS ......................................................................................... 63

REFERÊNCIA BIBLIOGRAFICA ...............................................................................67

8

INTRODUÇÃO

A lei 12.403/2011, em seu artigo 319, introduziu um novo modelo de justiça

criminal, baseado nos fundamentos éticos, jurídicos que informam os postulados do

direito penal mínimo, deixando a prisão como última ratio, inserindo medidas

cautelares: como o comparecimento periódico ao juízo; proibição de acesso ou

frequência a determinados lugares; proibição de ausentar-se da Comarca; recolhimento

domiciliar no período noturno; internação provisória do acusado; a fiança e a

monitoração eletrônica. (NUCCI, 2011). 1

Bem como, implantou um procedimento específico, sob uma égide de

princípios, 2 objetivando evitar a instauração do Processo Penal, e consequentemente

dos seus efeitos, priorizando a presunção de inocência. (GOMES, 2011). 3

O princípio da provisoriedade, mormente à omissão contida na lei

12.403/2011 de referência a um prazo razoável do processo, manifesta-se na curta

duração que deve ter o processo da medida cautelar, estatuindo que as medidas

cautelares devam ter uma duração breve, pois podem estar sujeitas à ilegalidade, por

excesso de prazo (GOMES, 2011), 4 [...] “Assim, necessário se criar mecanismos para

que tais medidas não se prolonguem indefinidamente. Mesmo porque, não se tratando

de prisão, a tendência é que o controle sobre o prazo de duração delas seja ainda

menos rigoroso.” (GOMES, 2001). 5

1 NUCCI. Guilherme de Souza. Prisão e Liberdade. São Paulo: RT, 2011. p. 82.

2 Princípios da Autonomia; Instrumentalidade; Acessorialidade; Provisionalidade; Provisoriedade;

Revogabilidade; Substitutividade; Excepcionalidade. (LOPES JR., 2011, p. 19). 3 GOMES. Luiz Flávio. Prisão e Medidas Cautelares. São Paulo: RT, 2011, p. 180. 4 GOMES. Luiz Flávio. op. cit., p. 181. “As medidas cautelares pessoais não privam a liberdade da pessoa, mas,

algumas restringem o direito de liberdade, e seu eventual descumprimento, enseja a privação da liberdade.” 5 GOMES. Luiz Flávio. op. cit., p. 182.

9

Desde modo a análise proposta, destina-se, a um direcionamento, de

referencial normativo, para complementação, dessa omissão, delineando a natureza

jurídica e principiológica das medidas, juntamente com o direito comparado, e os

critérios da razoabilidade, que agasalha a garantia constitucional, do princípio da

razoável duração do processo, positivada no artigo 5º, inciso LXXVIII da CF.

O Princípio da Razoável duração do processo é um conceito jurídico aberto,

vago e indeterminado, o que torna dificultosa a aplicação do direito (BRASIL

JUNIOR, 2007). 6 Assim para melhor entendimento do tema proposto, o mesmo será

dividido em três capítulos, dispostos da seguinte maneira:

O primeiro capítulo será denominado “as medidas cautelares diversas da

prisão”, o qual discorrerá em linhas gerais; a evolução histórica; o conceito; a natureza

jurídica; e os princípios norteadores das medidas cautelares em comento;

Na segunda parte do estudo, denominado “medidas cautelares pessoais e sua

repercussão no princípio da razoável duração do processo”, será abordado “Noções da

razoabilidade; Limites normativos; Soluções de tutelas e o posicionamento judicial.

Após o entendimento dessa sistemática, o terceiro capítulo intitulado “a

razoável duração do processo e os direitos fundamentais,” será o ponto culminante

desse estudo, o qual analisará que a dilação indevida fere os direitos fundamentais de

ser julgado em prazo razoável no Processo Penal, de quem ainda não está devidamente

condenado.

Nas considerações finais, far-se-á uma análise geral, sob o ponto de vista

bibliográfico e jurisprudencial consultado.

6 BRASIL JUNIOR, Samuel Beira. Justiça, Direito e Processo: a argumentação e o Direito Processual de

resultados justos. São Paulo: Atlas, 2007. p. 129.

10

1 MEDIDAS CAUTELARES PESSOAIS – DIVERSAS DA PRISÃO

1.1 BREVE EVOLUÇÃO HISTÓRICA

Décadas se passaram desde a vigência do Código de Processo Penal de 1941,

que primava pelo sistema binário “prisão ou liberdade”. Tais dispositivos passaram por

contínuas reformas para adequação de seu conteúdo aos ditames da nova ordem

constitucional de 1988 (GOMES, 2011). A esse respeito ressaltam-se as palavras do

Prof. GOMES:

[...] o sistema processual penal brasileiro em matéria de prisão cautelar

sempre se caracterizou pela bipolaridade (ou binariedade): prisão ou

liberdade. Nosso sistema carecia de medidas intermediárias, que possibilitasse o juiz evitar o encarceramento desnecessário. Essa

bipolaridade conduziu à banalização da prisão cautelar. Muita gente está

recolhida nos cárceres brasileiros desnecessariamente. (GOMES, 2011). 7

Assim, aliado a nova ordem constitucional, de deixar a prisão como ultima

ratio, priorizando a presunção de inocência, surge o projeto formado pela Portaria nº

61, de 20 de janeiro de 2000, justificado por uma comissão de juristas, 8 nos seguintes

termos:

[...] “o projeto sistematiza e atualiza o tratamento da prisão, das medidas

cautelares e da liberdade provisória, com ou sem fiança. Busca assim,

superar as distorções produzidas no código de Processo Penal com as

reformas que, rompendo com a estrutura originaria, desfiguram o

sistema. [...] As novas disposições pretendem ainda proceder ao ajuste do

sistema às exigências constitucionais atinentes a prisão e a liberdade

provisória e colocá-la em consonância com modernas legislações estrangeiras, como as da Itália e Portugal” (GOMES, 2011).

9

7 GOMES. Luiz Flávio. op. cit., p. 27. 8 A comissão de juristas foi composta por: Ada Pellegrini Grinover, Petrônio Calmon Filho, Antônio Magalhães

Gomes Filho, Antônio Scarance Fernandes, Luiz Flávio Gomes, Miguel Reale Júnior, Nilzardo Carneiro Leão,

René Ariel Dotti, posteriormente substituído por Rui Stoco, Rogério Lauria Tucci, Sidney Beneti, a fim de

superar as distorções produzidas no código de Processo Penal. (GOMES. op. cit., p. 23). 9 GOMES. Luiz Flávio. op. cit., p. 23.

11

Essa proposta transformou-se no Projeto de Lei nº 4.208, de 2001. 10

Em 2004,

o projeto em discussão e alguns outros apresentados pela Comissão PELLEGRINI,

foram apontados como essenciais à modernização do Processo Penal, pelo 1º Pacto por

um Judiciário mais rápido e Republicano, um compromisso firmado pelos chefes dos

três Poderes da República para racionalização da prestação jurisdicional. Mesmo

assim, a proposta ainda foi objeto de intensos debates até 2009. 11

(GOMES, 2011). 12

Depois de uma década de tramitação no Congresso Nacional, o Projeto de Lei

4.208/2001, transformado na Lei 12.403/2011, foi aprovado. Surgindo assim um novo

sistema multicautelar, previsto no Capítulo V, artigo 319 13

da lei 12.403/2011,

intitulado como “Das Outras Medidas Cautelares.” (GOMES, 2011). 14

Em sua essência a lei 12.403/2011, encerra uma fase do sistema processual

penal brasileiro, qual seja voltada para o cárcere provisório, onde muitas vezes a

liberdade provisória era a exceção, inaugurando a fase das medidas cautelares penais

diversas da prisão (OLIVEIRA, 2001). 15

10 Lei nº 4.208, de 2001, foi de iniciativa do poder executivo, que remeteu a câmara dos Deputados, juntamente

com a mensagem nº 214/01, a exposição de motivos nº 00022 – MJ, de 25 de janeiro de 2001, do Ministério da

Justiça, após tramitar na comissão de constituição, Justiça e Cidadania – CCJC. Aprovada em 2008, a emenda

substitutiva global de Plenário apresentada pelo Grupo De Trabalho De Direito Penal e Processo Penal,

instituído no âmbito daquela casa legislativa, sob a coordenação do Deputado João Campos. (LOPES JR., 2011). 11 Segundo Luiz Flávio Gomes, em abril de 2009, o projeto foi para o senado e, distribuído ao senador

Demóstenes Torres para emitir o relatório pela comissão de constituição, Justiça e cidadania – CCJ, o qual deu

parecer favorável com algumas emendas, posteriormente afastadas pela câmara dos deputados, na votação final

do dia 07 de abril de 2011. 12 GOMES. Luiz Flávio. op. cit., p. 23. 13

O Capítulo V, artigo 319 da lei 12.403/2011, intitulado como “Das Outras Medidas Cautelares, tem a

finalidade de evitar a instrução do Processo Penal, e conseqüente seus efeitos, seguindo assim, os preceitos

constitucionais, e a tendência mundial de [...] “deixar a prisão como ultima ratio, priorizando a presunção de

inocência, e demonstrando que cabe ao Processo Penal a verdadeira garantia das liberdades civis, porque é

através dele que se exercita a limitação da intervenção estatal no ius libertatis em risco.” (MAIA NETO, Candido

Furtado. O Promotor de Justiça e os Direitos Humanos. Curitiba: Juruá, 2000, p. 41). 14 GOMES. Luiz Flávio. op. cit., p. 23. 15

OLIVEIRA, Cláudio Márcio de. O fundamento de punir e os fins da pena. Jus Navigandi, Teresina, a. 5, n. 51,

out. 2001. Disponível em: http://jus.com.br/revista/doutrina/texto.asp?id=2069.

12

1.2 NOÇÕES GERAIS

1.2.1 Conceito e Natureza Jurídica

As medidas cautelares existentes no Processo Penal, 16

segundo ISHIDA, podem ser

dividas em:

a) Medidas Cautelares Reais: quando visam garantir a satisfação de um

direito sobre a coisa (do Estado ou do ofendido); b) Medidas Cautelares Probatórias: quando objetivam obter uma prova no

Processo Penal;

c) Medidas Cautelares Pessoais: quando recaem sobre o indiciado ou acusado, como forma de garantir sua participação no processo (ISHIDA,

2010). 17

Dentro dessa classificação, as medidas cautelares diversas da prisão, são

denominadas medidas cautelares pessoais, como exemplifica AFRÂNIO SILVA JARDIM:

[...] “As medidas cautelares classificam-se em:

a) Medidas Cautelares Patrimoniais: arresto, seqüestro e especialização, e registro de hipoteca legal;

b) Medidas Cautelares relacionadas à prova: antecipação de prova

testemunhal e a interceptação telefônica c) Medicas Cautelares Pessoais: prisões em flagrante; preventiva e

temporária; prisão domiciliar; e medidas diversas da prisão, incluída nestas a

fiança, que, entretanto, é medida cautelar real (JARDIM, 2005, pag. 245). 18

Ao conceituar as medidas cautelares penais, HUMBERTO THEODORO JR.,

acentua que estas:

[...] "não tem um fim em si mesmas, já que toda sua eficácia opera em

relação a outras providências que hão de advir em outro processo,", ou seja, as medidas cautelares penais não são medidas satisfativas, mas medidas

16Afrânio Silva Jardim as exemplifica como: a) Medidas Cautelares Patrimoniais: arresto, seqüestro e

especialização, e registro de hipoteca legal; b) Medidas Cautelares relacionadas à prova: antecipação de prova

testemunhal e a interceptação telefônica; c) Medicas Cautelares Pessoais: prisões em flagrante; preventiva e

temporária; prisão domiciliar; e medidas diversas da prisão, incluída nestas a fiança, que, entretanto, é medida

cautelar real. (JARDIM, 2005, p. 245). 17 ISHIDA, Valter Kenji. Medidas cautelares pessoais e a Lei nº 12.403, de 04 de maio de 2011, uma

abordagem prática. Disponível em: www.eduardo-viana.com. Acesso em: 12/10/2011. 18 JARDIM. Afrânio Silva. Direito Processual Penal. Rio de Janeiro: Forense, 2005. p. 245.

13

instrumentais, de modo a garantir a eficácia do processo principal

(THEODORO JR., 2010). 19

Assim verifica-se que as medidas cautelares no Processo Penal objetivam

evitar danos a pessoas ou bens, 20

e ainda assegurar 21

que não desapareçam os direitos

litigiosos no curso do processo. (FREITAS, 2008). 22

O termo cautela tem origem no latim [...] “cautus” e “cautum”, 23

admitindo

com o mesmo sentido “cautela” “ae” (FREITAS, 2008), 24

que significa cuidado para

evitar um mal, precaução, 25

prevenção, segurança. (AURÉLIO, 2010). 26

Sob essa perspectiva, as medidas cautelares pessoais (também denominadas de

medidas restritivas de direitos), somente existiam em leis extravagantes.27

Com o

advento da nova reforma estas foram inseridas no Código de Processo Penal, através

do artigo 319 da Lei 12.403/2011, que as conceitua da seguinte forma:

[...] São medidas cautelares diversas da prisão: I - comparecimento periódico em juízo, no prazo e nas condições fixadas

pelo juiz, para informar e justificar atividades;

II - proibição de acesso ou frequência a determinados lugares quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado permanecer

distante desses locais para evitar o risco de novas infrações;

19 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. V. 2. 45ed. Rio de Janeiro: Forense,

2010, p. 492. 20 Também podem ser definidas, como providências adotadas pelo Estado-juiz com o fito, de, em última razão,

assegurar o resultado útil do processo, servindo de instrumento para efetividade da prestação jurisdicional. 21 Nesse sentido leciona, Edilson Mougenot Bonfim: [...] “medidas cautelares são em linhas gerais,

providencias estatais que buscam garantir a utilidade e efetividade do resultado da tutela jurisdicional, que se

dará pela sentença penal condenatória, ou eventualmente absolutória.” (BONFIM, 2011, p. 19). 22 FREITAS. Sérgio Henriques Zandona. Medidas cautelares judiciais e de polícia no processo constitucional

penal: abordagem no Estado Democrático de Direito. Belo Horizonte, 2008. 23 A sua cognação (origem) vernacular está representada por cultismos do século XIV em diante. 24

FREITAS. Sérgio Henriques Zandona. op. cit., p. 71. 25

[...] “Na seara penal, essa precaução, busca evitar que o transgressor cometa novos delitos, fuja da aplicação da

lei ou a atrapalhe, impondo-lhe obrigações, sob pena de adoção de medidas mais severas, ou até a prisão

preventiva em último caso.” (BONFIM, 2011). 26 FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Dicionário Da Língua Portuguesa. 2. ed. Rio de Janeiro:

Nova Fronteira, 2005. 27 Como por exemplo, o caso da suspensão ou proibição de dirigir veículos automotores da Lei n.º 9.503/97

(Código de Trânsito Brasileiro), e, do afastamento do lar, domicílio ou local de convivência, do acusado de

praticar violência doméstica, recentemente introduzida pela Lei n.º 10.455/2002, ratificada pela Lei n.º

11.449/2007, que alterou o art. 69 da Lei n.º 9.099/95.

14

III - proibição de manter contato com pessoa determinada quando, por

circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado dela

permanecer distante; IV - proibição de ausentar-se da Comarca quando a permanência seja

conveniente ou necessária para a investigação ou instrução;

V - recolhimento domiciliar no período noturno e nos dias de folga quando o

investigado ou acusado tenha residência e trabalho fixos; VI - suspensão do exercício de função pública ou de atividade de natureza

econômica ou financeira quando houver justo receio de sua utilização para a

prática de infrações penais; VII - internação provisória do acusado nas hipóteses de crimes praticados

com violência ou grave ameaça, quando os peritos concluírem ser

inimputável ou semi-imputável (art. 26 do Código Penal) e houver risco de

reiteração; VIII - fiança, nas infrações que a admitem, para assegurar o comparecimento

a atos do processo, evitar a obstrução do seu andamento ou em caso de

resistência injustificada à ordem judicial; IX - monitoração eletrônica.

Aliado a esta conjuntura,

28 extrai-se do referido artigo, as seguintes

características: autonomia, 29

instrumentalidade, 30

acessorialidade, 31

provisoriedade,

32 revogabilidade,

33 substitutividade; excepcionalidade, e não-definitividade,

34 vez

28 Como bem observado, no referido artigo, as Medidas cautelares pessoais diversas da prisão, tem a finalidade

de assegurar o comparecimento do acusado, a todos os atos do processo, através das medidas restritivas de

direitos, evitando a obstrução e andamento processual, quando presente os pressupostos que a legitimam, sem

necessariamente privar a liberdade, de quem ainda não está definitivamente condenado (ISHIDA, 2010). 29 AUTONOMIA: Por ser um processo independente daquele de conhecimento ou execução, o processo cautelar

é autônomo, com sentença própria e necessidade de petição inicial específica. No entanto, existem simples

“medidas cautelares”, que não se identificam como processo cautelar, por este nelas não existir, sem possuírem

aquelas, portanto, a característica de autonomia. (FREITAS. op. cit., p. 108). 30 INSTRUMENTALIDADE: cabe ao processo cautelar na medida em que ele não tem um fim em si mesmo, porque é um instrumento, ou tem existência em função de outro processo. Por estar a serviço de um processo e

não depender da certeza da decisão favorável daquele processo designou Calamandrei à expressão o

complemento de hipotética. Bastaria então a demonstração em abstrato da probabilidade da consecução da tutela

final do direito, para se dizer instrumentalidade hipotética. Essa denominação, no entanto, é rechaçada por forte

corrente contrária que defende o argumento de que o essencial seria o requisito da provisoriedade. Importa

entender a instrumentalidade no processo cautelar no mesmo sentido da instrumentalidade dos processos em

geral, ressaltando-se apenas que nesse caso específico o bjetivo é assegurar ou garantir o desenvolvimento e o

bom resultado do fim almejado no processo de conhecimento ou de execução, bastando, para tanto, a existência

do interesse processual, ainda que não haja a efetiva existência do direito subjetivo. (FREITAS. op. cit., p. 108). 31 ACESSORIEDADE: Conforme foi dito, o processo cautelar, apesar de autônomo, existe em razão do processo

principal, e por esse motivo detém em relação a este a característica de acessório. Esse vínculo futuro com o processo é tanto evidente que, no processo civil, exige, por imposição legal (CPC, art. 801, IV), que na petição

inicial da ação cautelar se exponha a lide do processo principal e seu fundamento, com a exposição sumária do

direito ameaçado. (FREITAS. Op. cit., p. 112). 32 PROVISORIEDADE: Esta característica se justifica na existência limitada do processo cautelar. Tendo em

vista ser uma situação emergencial, a duração da tutela cautelar provisória deixa de vigorar quando advém a

decisão no processo principal ou qualquer outra situação que a torne desnecessária. Entretanto, mesmo sendo

tutela provisória, não há impedimento para uma medida de natureza executória, para dar satisfação a uma

cautelar concedida e não cumprida espontaneamente pela parte, proporcionando, nesta situação, uma execução

equivalente a uma tutela satisfativa cautelar, o que difere do conceito de cautelar satisfativa, cuja existência não é

15

que não fazem coisa julgada (FREITAS, 2008). 35

Tais características principiológicas

elencadas esclarecem que na adoção das cautelares, é necessária a presença dos

requisitos, previstos nos incisos I e II do artigo 282 do Código de Processo Penal, 36

sob pena de ilegalidade da medida, que poderá ser combatida por meio de petição ao

juiz da causa, demonstrando a desnecessidade ou inadequação da cautelar.

No tocante a natureza jurídica das medidas cautelares pessoais, assevera ADA

PELLEGRINI que [...] “as “penas restritivas de direitos”, são medidas penais ou

processuais alternativas que procuram evitar a pena de prisão.” (GRINOVER, 2000). 37

Nesse sentido CLÁUDIO MÁRCIO DE OLIVEIRA ressalta que: 38

[...] as “penas restritivas de direitos”, aplicadas nas medidas cautelares

pessoais diversas da prisão, são de “caráter substitutivo”, que a sociedade

apelidou de "Penas Alternativas”. A "pena alternativa" impõe uma sanção ao

aceita pela doutrina. Acrescenta e amplia o entendimento João Gualberto Garcez Ramos, ao dizer que não seria

uma característica da tutela cautelar a provisoriedade, mas sim a temporariedade, visto que esta é um traço

característico da tutela cautelar, não sendo da mesma forma a anterior. (FREITAS. op. cit., p. 108. 2008). 33 REVOGABILIDADE: A tutela cautelar é revogável, por ser esta provisória. Sua revogação acontece para se

adaptar o pronunciamento judicial a novas circunstâncias; permitindo ao juiz proferir decisão com base na

plausibilidade do direito alegado pelo autor, uma vez que é produto de uma cognição sumária (FREITAS. op.

cit., p. 87). 34

NÃO-DEFINITIVIDADE: (por não fazer coisa julgada material). No processo cautelar só se torna possível, na

sentença, a coisa julgada formal. Isto porque a coisa julgada material no processo cautelar tem, em sua

incapacidade de ser gerada, o motivo de não se estender à totalidade do conflito de interesses, não definindo, no plano cognitivo, o caso a ser julgado no Processo Penal de conhecimento; além do fato de que a finalidade da

tutela cautelar é diversa da finalidade do processo de conhecimento. (FREITAS. op. cit., p. 88) 35 FREITAS. Sérgio Henriques Zandona. op. cit., p. 86. 36 Art. 282 CPP. As medidas cautelares previstas neste Título deverão ser aplicadas observando-se a: I -

necessidade para aplicação da lei penal, para a investigação ou a instrução criminal e, nos casos expressamente

previstos, para evitar a prática de infrações penais; II - adequação da medida à gravidade do crime,

circunstâncias do fato e condições pessoais do indiciado ou acusado. § 1º As medidas cautelares poderão ser

aplicadas isolada ou cumulativamente. § 2º As medidas cautelares serão decretadas pelo juiz, de ofício ou a

requerimento das partes ou, quando no curso da investigação criminal, por representação da autoridade policial

ou mediante requerimento do Ministério Público. § 3º Ressalvados os casos de urgência ou de perigo de

ineficácia da medida, o juiz, ao receber o pedido de medida cautelar, determinará a intimação da parte contrária, acompanhada de cópia do requerimento e das peças necessárias, permanecendo os autos em juízo. § 4º No caso

de descumprimento de qualquer das obrigações impostas, o juiz, de ofício ou mediante requerimento do

Ministério Público, de seu assistente ou do querelante, poderá substituir a medida, impor outra em cumulação,

ou, em último caso, decretar a prisão preventiva (art. 312, parágrafo único). § 5º O juiz poderá revogar a medida

cautelar ou substituí-la quando verificar a falta de motivo para que subsista, bem como voltar a decretá-la, se

sobrevierem razões que a justifiquem. § 6º A prisão preventiva será determinada quando não for cabível a sua

substituição por outra medida cautelar. 37

GRINOVER. Ada Pellegrini. Juizados Especiais Criminais: comentários a lei 9099/95. São Paulo. RT, 2000. 38 OLIVEIRA, Cláudio Márcio de. Idem. Ibidem.

16

indivíduo, sem, no entanto removê-lo de sua vida, de seu trabalho e de seus

hábitos particulares. (OLIVEIRA, 2001). 39

Assim, as medidas cautelares diversas da prisão além da “natureza jurídica,

instrumental,” possuem “natureza jurídica, substitutiva, 40

e autônoma,” 41

como

explicita o artigo 45 do Código Penal 42

(OLIVEIRA, 2001). 43

A natureza jurídica,

autônoma substitutiva de tais medidas ocorre pela seguinte razão: [...] “As penas

restritivas de direitos estão previstas in abstracto no Código Penal, logo, não podem

ser aplicadas diretamente. Portanto, o juiz aplica a pena privativa de liberdade, e, se

presentes os requisitos legais, ele a substituirá pela restritiva de direitos.” (OLIVEIRA,

2001). 44

Ademais o juízo abstrato, sem indicação de elementos fáticos, não pode

embasar decreto segregatório, segundo posicionamento do Supremo Tribunal Federal.

Nota-se, que tal entendimento também poderia ser adotado na aplicação das medidas

cautelares, diversas da prisão, nesse sentido, leciona o Ministro EROS GRAU:

39 OLIVEIRA, Cláudio Márcio de. Ibidem. Ressalta que nesta seara as “Penas Alternativas”, ao contrário daquela explicitada na parte geral do código penal, não tem por objetivo constranger a liberdade de ir e vir do

cidadão, ela visa apenas alterar seu status perante o meio em que ele vive, sem, entretanto, removê-lo, isolá-lo

daquela coletividade, ou seja, implicitamente, protegem a dignidade da pessoa humana, e a presunção da

inocência, princípios fundamentais esculpidos na Constituição Federal. 40 Art. 45 CP: Na aplicação da substituição prevista no artigo anterior, proceder-se-á na forma deste e dos arts.

46, 47 e 48. 41 Segundo Claúdio Marcio de Oliveira, o conceito de autonomia, no referido dispositivo legal, diz respeito ao

fato de que a pena restritiva de direitos, por si só, satisfaz o cumprimento da pena. A pena restritiva de direitos

não coexiste com a pena privativa de liberdade, ou se aplica uma, ou se aplica outra, jamais as duas ao mesmo

tempo. Mas nada impede que uma pena de multa seja aplicada conjuntamente com uma pena restritiva de

direitos (OLIVEIRA, Cláudio Márcio de. Ibidem). 42

Nessa perspectiva uma pena restritiva de direitos, por medidas cautelares, não deve ser de forma isolada, deve

sempre haver uma manifestação prévia a uma pena de detenção ou reclusão, pois as penas restritivas de direitos

podem substituir as penas privativas de liberdade, a recíproca também é verdadeira, como afirma o § 4º do art.

44 do Código Penal (OLIVEIRA, Cláudio Márcio de. Ibidem). Importante também aclarar que a denominação

"medidas cautelares pessoais diversas da prisão" não tem o condão de deixar subentendido que o julgador poderá

aplicar tanto a pena privativa de liberdade, quanto a pena restritiva de direitos, valendo-se do que considerar

mais adequado. 43

OLIVEIRA, Cláudio Márcio de. Idem. Ibidem. 44 OLIVEIRA, Cláudio Márcio de. Idem. Ibidem.

17

[...] PROCESSUAL PENAL. GARANTIA DE ORDEM PÚBLICA E DA

APLICAÇÃO DA LEI PENAL. AUSENCIA DE BASE FÁTICA.

GRAVIDADE DO CRIME. INIDONEIDADE. EXISTENCIA DE INQUÉRITOS E DE AÇÕES PENAIS EM ANDAMENTO. OFENSA AO

ARTIGO 5º, INCISO LVII, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DO

BRASIL. 1. Prisão cautelar para garantia de eficácia da aplicação da lei

penal fundada em simples afirmação de sua necessidade, sem indicação de elementos fáticos que a ampare, inidoneidade. 2. A invocação da

gravidade abstrata do crime não justifica a prisão preventiva para garantia de

ordem pública. Precedentes. (STF – HC 96618 SP. Relator: Ministro EROS GRAU, data 01/06/2010, segunda Turma). Em igual sentido no STF: HC

83.943; HC 98862-MC; HC 06.715-MC; HC 106.591/SP-MC; HC

87.041/PA; HC 93.477/RJ; HC 100.959/TO; HC 95.464/SP.

Outrossim, importante ressaltar que somente poderão ser decretadas as

medidas (taxativas) previstas no artigo 319 da lei 12.403/2011, tendo em vista que o

Código de Processo Penal não prevê o chamado “Poder Geral de Cautela,” o que

aponta, ab initio, para a vedação de sua aplicação nessa seara (OLIVEIRA, 2011). 45

LUIZ FLAVIO GOMES, ao tratar do assunto em sua obra ressalta que:

[...] “não existe no Processo Penal o famoso poder de cautela geral do juiz (CPC, art. 797). Todas as medidas cautelares são típicas (possuem forma

determinada). Não temos (não podemos ter), medidas cautelares atípicas no

Processo Penal. Não se pode confundir o Processo Penal com o processo civil. O nível de intervenção do poder público nos direitos fundamentais do

indivíduo, no âmbito do Processo Penal é muito mais contundente que no

processo civil.” (GOMES. 2001). 46

Ainda segundo o autor, no Processo Penal, não existem medidas cautelares

inominadas, a tipicidade é a forma da garantia, logo não há espaço para poderes gerais,

pois todo o poder do juiz é estritamente vinculado aos limites e a forma legal. 47

1.2.2 Pressupostos Legais das Medidas Cautelares

45 OLIVEIRA, Cláudio Márcio de. Idem. Ibidem. 46 GOMES. Luiz Flávio. op. cit., p. 46. 47 Nesse sentido, nota-se que o poder geral de cautela do juiz criminal, existe, mas fica adstrito à redação do

artigo 282, § 5º do Código de Processo Penal, o qual lhe confere somente poderes para que revogue, substitua,

ou decrete medidas cautelares de forma fundamentada.

18

Devido à importância desse instituto, e a necessidade de sua correta

ampliação, a Lei 12.403/2011, disciplinou em seu artigo 319, possibilidades de

acautelar o processo, dentro de um juízo de proporcionalidade/legalidade,

regulamentando no artigo 282 do CPP, seus pressupostos: [...] a) a Necessidade e

Adequação; 48

b) o Fumus Commissi 49

e o Periculum Libertatis. 50

(NUCCI, 2011).51

LOPES JR., ao abordar o tema em tela, faz ressalvas, 52

aduzindo que a

expressão, periculum in mora e fumus boni iuris, não encontra espaço no Processo

Penal, e que os dois fundamentos, regulamentado no artigo 282 do CPP, “ordem

econômica” e “ordem pública,” padecem de inconstitucionalidade para aplicação

destas medidas, sob o argumento, que não é função do judiciário proteger a ordem

pública, tendo em vista que a Constituição, no artigo 144, incumbe tal missão aos

órgãos de segurança pública. (LOPES JR., 2011). 53

48 No tocante a necessariedade, a aplicação das medidas cautelares diversas da prisão deve guardar relação de

proporcionalidade, com a pena que poderá ser aplicada ao final do processo [...] “em observância a três

requisitos de necessariedade, previstos no artigo 282 do código de Processo Penal: a necessidade para aplicação

da lei penal, conveniência para a investigação ou a instrução criminal nos casos expressamente previstos na lei, a

fim de evitar a prática de infrações penais” (NUCCI, 2011). Já quanto à adequabilidade, a aplicação das medidas

cautelares exige três requisitos de adequação: “a gravidade do crime, a circunstâncias do fato e as condições pessoais do indiciado ou acusado, ou a garantia da ordem pública” (artigo 319 VI), visando à eficiência da

atividade persecutória estatal. 49 O fumus commissi delicti, ocorre quando houver prova da existência do crime e indícios suficientes de autoria. 50 O periculum libertatis, ocorre quando houver conveniência da instrução criminal e futura aplicação da lei

penal, para garantia da ordem pública e econômica, conferindo uma interpretação constitucional, acreditando que

à ordem pública está em perigo quando o criminoso simboliza um risco, pela possível prática de novas infrações,

caso permaneça em liberdade a garantia da ordem econômica visa evitar que o indivíduo, se solto estiver,

continue a praticar novas infrações afetando a ordem econômica (LOPES JR., 2011. p. 72). 51 NUCCI. Guilherme de Souza. Prisão e Liberdade. São Paulo: RT, 2011. p. 28. 52 [...] correto é afirmar que o requisito para decretação de uma prisão cautelar é a existência do fumus commissi

delicti, enquanto probabilidade da ocorrência de um delito e não de um direito, ou mais especificamente, na sistemática do CPP, a prova da existência de um crime e indícios suficientes de autoria. (LOPES JR., 2011, p.

14) Em relação ao periculum, esclarece que esse não é requisito da prisão cautelar, mais sim seu fundamento. Os

fundamentos do periculum in mora não encontram espaço no Processo Penal, pois o fator determinante não é

lapso temporal entre o provimento cautelar e o definitivo, mas a situação de perigo criada pela conduta do

imputado, assim defende a adoção da expressão periculum libertatis, o risco do Processo Penal está na liberdade

do imputado, podendo este em liberdade colocar em risco o normal desenvolvimento do processo, como a

colheita de provas ou frustrar a execução da pena com a fuga. (LOPES JR., 2011. p. 14; 75 a 80). 53

LOPES JR., Aury. Direito Processual Penal e sua Conformidade Constitucional, Volume II. 3. Ed. Rio de

Janeiro: Lumen Juris, 2008.p. 72 a 75.

19

Destarte, as medidas cautelares, previstas no artigo 319 da lei 12.403, devem

ser utilizadas, quando presentes [...] “os requisitos fumus commissi delicto e periculum

libertatis, bem como, quando cabível a prisão preventiva, mas, quando em razão da

proporcionalidade, houver uma outra restrição, menos onerosa, que sirva para tutelar

aquela situação.” (LOPES JR., 2011). Predominando a seguinte sistemática:

[...] “Nos crimes dolosos cuja pena máxima é superior a 4 anos e exista

fumus commissi delicti e o periculum libertatis – caberá medidas cautelares diversas, ou seja, inadequadas e insuficientes, a prisão preventiva; [...] Nos

crimes dolosos cuja pena máxima é igual ou inferior a 4 anos e exista

fumus commissi delicti e o periculum libertatis, somente poderá haver decretação de medida cautelar diversa; [...] Nos crimes dolosos cuja pena

máxima é igual ou inferior a 4 anos e exista fumus commissi delicti e o

periculum libertatis, e exista uma das situações dos incisos II ou III do artigo

313, poderá ser decretada medida cautelar diversa ou excepcionalmente, a prisão preventiva.” (LOPES JR., 2011).

54

Em síntese segundo o autor, as medidas cautelares diversas da prisão, são

todas aquelas cabíveis nos crimes cuja pena máxima, é igual ou inferior a 4 (quatro)

anos, desde que exista fumus commissi delicti e o periculum libertatis, requisitos

necessários para sua aplicação.

1.2.3 Princípios Norteadores das Medidas Cautelares

São princípios norteadores das medidas cautelares diversas da prisão, [...] “a

Jurisdicionalidade, provisionalidade, provisoriedade, excepcionalidade,

proporcionalidade e o contraditório.” (LOPES JR., 2011). 55

Também se aplica o

princípio da [...] “substitutividade das medidas, quando constatada a inadequação da

54 LOPES JR., Aury. O novo Regime jurídico da Prisão Processual, Liberdade Provisória e medidas Cautelares

Diversas. Rio de janeiro: Lumen Juris. 2011. p. 125 a 126. 55 LOPES JR., Aury. op. cit., p. 19 a 33.

20

medida anterior, permitindo substituir a medida por outra mais eficiente, ou cumular a

medida descumprida com outra harmônica.” (NUCCI, 2011). 56

Em obediência ao principio da Jurisdicionalidade e Motivação, 57

as medidas

cautelares pessoais só podem ser adotadas por decisão judicial fundamentadas,

excepcionalmente, algumas medidas podem ser adotadas por órgão ou pessoa que não

a judiciária, tais como a prisão em flagrante. (LOPES JR., 2011). 58

Além da observância dos requisitos necessários para a decretação da medida

cautelar pessoal, a conduta do juiz frente ao caso concreto deve ser norteada pelo

princípio da proporcionalidade, com a aplicação racional dos seus subprincípios da

adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito. (GOMES, 2011). 59

O princípio da provisionalidade está consagrado no artigo 282 § 4º e 5º do

Código de Processo Penal, o qual regula a legitimidade das medidas cautelares, bem

como, as razões que a justifica, assim, a medida cautelar não pode ser definitiva, mas

simplesmente vinculada ao período de necessidade de sua imposição. A

provisionalidade autoriza a revogação ou substituição das medidas, a qualquer tempo,

no curso do processo, desde que desapareçam os motivos que a legitimam. (LOPES

JR., 2011). 60

56 NUCCI, Guilherme de Sousa. Prisão e liberdade. São Paulo: RT. 2011, p. 32. 57 Na ordem brasileira, a jurisdicionalidade está consagrada no art. 5º, LXI, da Constituição da República,

estando intimamente ligada ao due process of law, previsto no inciso LIV do aludido artigo, e, ainda, ao

princípio da legalidade, de modo que somente pode ser adotada uma prisão cautelar determinada em lei e nos

seus limites da lei, não se admitindo, aqui, o chamado poder geral de cautela. (LOPES JR., op. cit., p. 23). 58

LOPES JR., Aury. op. cit., p. 25. 59 GOMES. Luiz Flávio. Prisão e Medidas Cautelares. São Paulo: RT, 2011, p. 181. 60 “[...] Nesse sentido verifica-se que a provisionalidade tutela uma situação fática, corporificada no fumus

commissi delicti e no Periculum Libertatis, que a legitimam, ou seja, a manutenção da prisão cautelar deve estar

condicionada à presença da situação fática que justificou a sua imposição, e, desaparecendo a situação fática que

a legitimou, a medida deve cessar, por estar eivada de ilegalidade. [...] “Uma vez desaparecido o suporte fático

legitimador da medida (requisitos e fundamentos) corporificado pelos pressupostos fumus commissi ou

periculum Libertatis, o princípio da provisionalidade impõe a imediata soltura do imputado” (LOPES JR. op.

cit., p., 23 e 24).

21

Diferentemente do princípio anterior, o princípio da provisoriedade 61

está

relacionado com o tempo de duração da medida, estatuindo que a medida cautelar deva

ter duração breve, [...] “manifesta-se, assim, na curta duração que deve ter a medida

cautelar, até porque é apenas tutela de uma situação fática (provisionalidade) e não

pode assumir contornos de uma pena antecipada.” (LOPES JR., 2011). 62

A excepcionalidade está atrelada a necessidade de análise da adequação e

suficiência das demais medidas cautelares, e deve ser lida em conjunto com os

princípios da presunção de inocência, e da proporcionalidade. (LOPES JR., 2011). 62

O Princípio do contraditório está consagrado no artigo 282 § 3º do Código de

Processo Penal, o qual autoriza a intimação da parte contrária, 63

assim que receber o

pedido de medida cautelar, desde que isso não prejudique a eficácia da urgência da

medida. 64

Sua inobservância acarretará a nulidade da substituição, cumulação ou

revogação da medida cautelar imposta, sendo está remediável pela via do habeas

corpus. (LOPES JR., 2011). 65

61 Pontua Freitas, que a provisoriedade e a instrumentalidade são correlacionadas com dois outros pressupostos

fundamentais para concessão: o periculum in mora (perigo de demora), que diz respeito à urgência de afastar o

perigo de perecimento do direito resultante do decurso do tempo, principalmente o ocioso, e o fumus boni juris

(plausibilidade do direito alegado), responsável pela possibilidade de uma solução favorável no Processo Penal,

aduzindo que ambos, têm o [...] “objetivo na cautelar de prevenir direitos alegados, evitar perecimento de coisas

e evitar dano iminente, assegurando a efetividade (os efeitos) de uma já expedida ou futura sentença ou efeitos

da própria ação vindoura, ou já proposta.” (FREITAS, 2008, p. 89). 62 LOPES JR., Aury. Direito Processual Penal e sua Conformidade Constitucional, Volume II. 3. Ed. Rio de

Janeiro: Lúmen Júris, 2008. p. 24. 63

[...] “Assim deverá o juiz conceder um prazo razoável para que a defesa se manifeste, sobre o pedido e

produza sua prova, bem como se necessário a oitiva de testemunhas, podendo nesse caso, o juiz marcar

imediatamente a realização de uma audiência.” (LOPES JR., 2011, p. 22). 64 Nesse sentido, assevera Aury Lopes Junior: [...] “Tal contraditório dependerá das circunstancias do caso

concreto, sendo delimitado pela urgência ou risco concreto de ineficácia da medida. Terá difícil aplicação (mas

não impossível) nos pedidos de prisão preventiva fundados no risco de fuga, mas nada impede que o juiz decrete

a medida, e faça o contraditório posterior, com a condução do réu/suspeito a sua presença para que seja ouvido

sobre os motivos do pedido. Após, decidirá pela manutenção ou não da prisão.” (LOPES JR., 2011, p. 22) 65 LOPES JR., Aury. op. cit., p. 23.

22

2 MEDIDAS CAUTELARES PESSOAIS – DIVERSAS DA PRISÃO E SUA

REPERCUSSÃO NO PRINCÍPIO DA RAZOÁVEL DURAÇÃO DO

PROCESSO

Um dos questionamentos havidos desde a publicação da Lei 12.403/2011, no

que pertine ao artigo 319, reside em: Qual prazo deve ser estabelecido para a duração

do processo das medidas cautelares? Pois, ao contrário de outras legislações, tanto a lei

12.403/2011, como o Código de Processo Penal, não prevê prazo expresso para a sua

duração (GOMES, 2011). 66

Em virtude desta ausência de prazo expresso, o princípio da provisoriedade,

que esta relacionado com o tempo de duração das medidas, tornou-se o principal

sustentáculo da aplicação do princípio da razoável duração do processo, nas medidas

cautelares, tendo em vista que o [...] “Estado não está aparelhado convenientemente, e

não pode exigir que seus cidadãos fiquem presos ou submetidos a medidas cautelares,

por tempo excessivo.” (GOMES, 2011). 67

A observância do princípio da razoável duração do processo, evita a subversão

do prazo e consequentemente a violação dos preceitos de eficiência que regulam o

Estado que atacam a eficácia do método processual, o qual necessita seguir os

Princípios para que seja constitucionalmente válido. (LOPES JR., 2011). 68

O prazo razoável, antes de uma construção doutrinária, é uma imposição

constitucional que não é limitada pelo encerramento da instrução, sendo, ainda assim,

66 GOMES. Luiz Flávio. op. cit., p. 75. 67 GOMES, Luiz Flávio. op. cit., p. 61. 68

LOPES JR., Aury. Direito Processual Penal e sua conformidade constitucional. 3º edição revisada e

atualizada. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2009. p. 112.

23

devida. Assim, o desrespeito a tal enunciado é uma demonstração de parcialidade

punitivista que não atua na materialização constitucional. (SANTOS, 2009). 69

Certamente a dilação indevida dos prazos representa gravame incicatrizável na

história de vida do acusado, principalmente nos casos, em que sobrevém absolvição,

nesse sentido importante o posicionamento de BRETAS, que assim leciona:

[...] Seja solto ou preso, seja condenado ou absolvido, o acusado padece

de desnecessário sofrimento, com a delonga indevida, de seu processo. Daí a necessidade de se estipular prazos razoáveis para o decurso de um

Processo Penal: para minimizar suas atrozes marcas na vida do acusado. O

axioma enunciado por RUI BARBOSA, em sua Oração aos Moços, bem esclarece a idéia de que “justiça atrasa não é justiça, senão injustiça

qualificada e manifesta”. De fato, a idéia de tempestividade da pena, está

intimamente atrelada com a legitimidade da punição. Pena tempestiva é pena

legítima. Pena extemporânea nada mais é do que vingança (BRETAS, 2011).

70

Assim observou-se que se faz necessário o equilíbrio da razoabilidade, entre o

processo demasiadamente excedido, em que se atropelam os direitos e garantias

fundamentais, e, de outro, aquele que se arrasta, equiparando-se à negação da justiça e

agravando todo o conjunto de restrições de direitos do acusado. (LOPES JR., 2005). 71

Como bem afirmou LOPES JR.:

[...] “A questão da dilação indevida do processo, também deve ser

reconhecida quando o imputado está solto, pois ele pode estar livre do

cárcere, mas não do estigma e da angústia. É inegável que a submissão ao Processo Penal autoriza a ingerência estatal sobre toda uma série de direitos

fundamentais, para além da liberdade de locomoção, pois autoriza restrições

sobre a livre disposição de bens, a privacidade das comunicações, a inviolabilidade do domicílio, e a própria dignidade do réu.” (LOPES JR.,

2005). 68

69 SANTOS, Diego Prezzi. A Razoável Duração do Processo como Garantia e Proteção dos Objetivos da

República. Nómadas - Revista Crítica de Ciencias Sociales y Jurídicas. 2009. p. 8. 70 BRETAS, Sérgio Adriano Nunes. O excesso de Prazo no Processo Penal. Curitiba: JM Editora, 2006. p. 45. 71 LOPES JR., Aury. O tempo como pena processual: em busca do direito de ser julgado em um prazo razoável.

In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, 22, 31/08/2005. Disponível em http://www.ambito- juridico.com. br/site/index.

php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=458. Acesso em: 12/02/2012.

24

Complementa ainda o referido autor que o caráter punitivo está calcado no

tempo de submissão ao constrangimento estatal, e não apenas na questão espacial de

estar intramuros, fundamentando em ANA MESSUTI, que assim afirma:

[...] “não é apenas a separação física que define a prisão, pois os muros não

marcam apenas a ruptura no espaço, senão também uma ruptura do tempo. A marca essencial da pena (em sentido amplo) é “por quanto tempo? Isso

porque, o tempo, mais que o espaço, é o verdadeiro significante da pena.

O Processo Penal encerra em si uma pena (la pena de banquillo), 72

ou conjunto de penas se preferirem, que mesmo possuindo natureza diversa da

prisão cautelar, inegavelmente cobra(m) seu preço e sofre(m) um sobre-

custo inflacionário proporcional a duração do processo. Em ambas as situações (com prisão cautelar ou sem ela), a dilação indevida deve ser

reconhecida, ainda que os critérios utilizados para aferi-la, sejam diferentes,

na medida em que havendo prisão cautelar, a urgência se impõe a partir da

noção de tempo subjetivo.” (MESSUTI, 2004). 73

Ainda é importante ressaltar, no tocante as medidas cautelares, que existe uma

pena processual mesmo quando não há prisão cautelar, e que ela aumenta

progressivamente com a duração do processo. Seu imenso custo será ainda maior, a

partir do momento em que se configurar a duração excessiva do processo, pois então,

essa violência passa a ser qualificada pela ilegitimidade do Estado em exercê-la.

(LOPES JR., 2005). 74

Nota-se que a lista de direitos fundamentais violados cresce na mesma

proporção em que o Processo Penal se dilata indevidamente. (LOPES JR., 2005). 75

O princípio da razoável duração do processo foi positivado, com a EC nº

45/2004, que assim dispõe: [...] “a todos, no âmbito judicial e administrativo, são

72

Pena de “banquillo” é uma pena autônoma, que cobra um alto preço por si mesma, independentemente de

futura pena privativa de liberdade (que não compensa nem justifica, senão que acresce o caráter punitivo de todo

o ritual judiciário). 73 MESSUTI, Ana. O tempo como pena. Trad. Tadeu Antonio Dix Silva e Maria Clara Veronesi de Toledo. São

Paulo: Revista dos Tribunais, 2003. p. 33. 74 LOPES JR., Aury. O tempo como pena processual: em busca do direito de ser julgado em um prazo razoável.

In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, 22, 31/08/2005. Disponível em http://www.ambito- juridico.com. br/site/index.

php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=458. Acesso em 12/02/2012. 75 LOPES JR., Aury. Idem. Ibidem.

25

assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de

sua tramitação”. (ART. 5º, LXXVIII, CF/88). 76

Assim, figurou consagrado na Constituição Federal de 1988, o [...] “direito de

ser julgado em um prazo razoável” (LOPES JR., 2005), 77

ainda que anteriormente já

estivesse prevista essa garantia nos artigos 7.5 e 8.1 da CADH - Convenção

Americana de Direitos Humanos, 78

já recepcionada pelo direito Brasileiro. (LOPES

JR., 2005). 79

Quanto à evolução jurisprudencial, é preciso reconhecer que [...] “o Supremo

Tribunal Federal, em sua atual composição, pródiga na incorporação de modernas

teorias jurídicas, em geral ligadas ao chamado pós-positivismo, vivencia uma "nova

era" do Judiciário brasileiro, de vertiginosa ascensão (como tem dito Luís Roberto

Barroso), sendo chamado cada vez mais à solução de questões mais complexas 80

e de

significativa repercussão prática.” (BARRUFFINI, 2008). 81

Segundo Frederico

Liserre Barruffini, [...] “essa “nova era” também tem sido marcada pela destacada

preocupação da mais alta Corte do país 82

com a celeridade da prestação jurisdicional”.

(BARRUFFINI, 2008). 83

76 BRASIL, Constituição. Constituição da Republica Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal. 1988. 77 LOPES Jr. Aury. Introdução Crítica ao Processo Penal, 2ª ed., Rio de Janeiro: Ed. Lumen Juris, 2005. p. 120. 78 Dispõe a Convenção Americana de Direitos Humanos:

[...] Artigo 7.5. CADH: Toda pessoa detida ou retida deve ser conduzida, sem demora, à presença de um juiz ou

outra autoridade autorizada pela lei a exercer funções judiciais e tem direito a ser julgada dentro de um prazo

razoável ou a ser posta em liberdade, sem prejuízo de que prossiga o processo. Sua liberdade pode ser

condicionada a garantias que assegurem o seu comparecimento em juízo.

[...] Artigo 8.1. CADH: Toda pessoa tem direito a ser ouvida, com as devidas garantias e dentro de um prazo

razoável, por um juiz ou tribunal competente, independente e imparcial, estabelecido anteriormente por lei, na apuração de qualquer acusação penal formulada contra ela, ou para que se determinem seus direitos ou

obrigações de natureza civil, trabalhista, fiscal ou de qualquer outra natureza. 79 LOPES Jr. Aury. 2005. op. cit., 120. 80[...] casos das células-tronco, do aborto do feto anencéfalo, de terras indígenas as questões relacionadas às

grandes operações realizadas pela para o desmantelamento de organizações criminosas sofisticadas. 81 BARRUFFINI, Frederico Liserre. Possibilidade de efetivação do direito à razoável duração do processo. Jus

Navigandi, Teresina, ano13, n 893. 2008. Disponível: http://jus.com.br/revista/texto/11685. Acesso: 11/03/2012. 82

[...] entre as medidas que o confirmam, estão: I. O já considerável número de enunciados que integram a

súmula vinculante do Supremo Tribunal Federal, atualmente em número de 13 (agosto de 2008); II. A

26

Uma das soluções, para a eficácia do princípio em estudo, necessariamente se

dirige para a eficiência da administração judiciária [...] “Neste sentido, pode-se

começar pela eliminação do que Babosa Moreira chamou de “pontos mortos do

processo”, isto é, daquelas situações em que os autos do processo se encontram por

tempo demasiado sem impulso, ao arrepio da própria norma procedimental.”

(TAVARES, 2006). 84

Complementa ainda o professor Tavares que [...] “a eficiência da

funcionalidade do serviço público, fundamentado no artigo 37, caput, da CF, será

obtida, se a gestão da máquina judiciária for entregue aos profissionais da área de

administração e não aos juízes, que ainda hoje acumulam com a função.” (TAVARES,

2006). 85

Nesse sentido defende MARINONI, 86

que o dever de tutela jurisdicional em

prazo razoável, também é dever do:

[...] LEGISLADOR (o dever de proteção normativa): O legislador é obrigado a

dar proteção normativa ao direito fundamental à duração razoável em três

dimensões. I - Deve editar normas com o fim de regular a prática dos atos processuais em prazo razoável. Assim, deve estabelecer prazos que realmente

permitam a prática dos atos processuais (preparação da defesa, interposição de

recurso, produção de provas etc). II - O legislador tem o dever de dar às partes meios

de controle das decisões judiciais que violem as normas processuais destinadas a dar

proteção ao direito fundamental à duração razoável, assim como formas de controle

das decisões que, sem atentar contra regras infraconstitucionais, neguem diretamente

o direito fundamental à duração razoável. III - O legislador tem o dever de instituir

meios processuais capazes de permitir o exercício da pretensão à tutela ressarcitória

contra o Estado. (MARINONI, 2009).

regulamentação do instituto da repercussão geral e seus efeitos práticos já captados pela estatística do Tribunal

(Regimento interno do Supremo Tribunal Federal, artigos nºs 322-A e 328, com a redação da Emenda

Regimental nº 21/07, artigo nº 328-A, com a redação da Emenda Regimental nº 23/08 e artigo nº 13, com a

redação da Emenda Regimental nº 24/08). 83 BARRUFFINI, Frederico Liserre. Idem. Ibidem. 84 TAVARES, Fernando Horta. Op. cit, p. 14 e 15. 85 TAVARES, Fernando Horta. Idem. Ibidem. 86

MARINONI. Luiz Guilherme. Direito Fundamental À Duração Razoável Do Processo. Estação Científica

(Ed. Especial Direito) Juiz de Fora, V.01, n.04, outubro e novembro/2009.

27

[...] EXECUTIVO (o dever de dotação): o direito fundamental à duração razoável

exige do Executivo uma prestação de caráter econômico. O Executivo, diante deste

direito fundamental, é gravado por um dever de dotação. A jurisdição, para se

desincumbir do seu dever de prestar a tutela jurisdicional de modo tempestivo,

necessita de boa estrutura administrativa, ou seja, pessoal qualificado, tecnologia e

material de expedientes idôneos. Por outro lado, quando a execução da sentença

judicial depende da participação do Executivo e esse deixa de colaborar, sem

justificativa, para a efetivação da tutela jurisdicional do direito, a dilação indevida é

da sua responsabilidade. Nesse caso, a prestação fático-administrativa do Executivo

é imprescindível para a realização do direito fundamental à duração razoável.

(MARINONI, 2009).

[...] JUIZ (o dever de tutela jurisdicional em prazo razoável): O juiz tem o dever

de prestar a tutela jurisdicional em prazo razoável não somente para tutelar os

direitos, mas igualmente para que o réu tenha um processo justo. Não é justo

submeter o réu aos males da pendência processual por um prazo desrazoável. Tais

atos podem ter natureza comissiva e omissiva. A injustificativa da dilação é

imanente ao ato comissivo ou equivocado que determina a utilização de uma técnica

processual em lugar de outra. Mas há maior dificuldade diante de dilação omissiva.

O Estado é obrigado a reservar parte da sua receita para dotar o Judiciário de forma

a lhe permitir prestar a tutela jurisdicional de forma efetiva e célere. O Estado tem o

dever de tutelar os direitos não apenas através da jurisdição, mas também mediante as atividades legislativa e administrativa. [...] A tutela jurisdicional dos direitos é

certamente indissociável da dimensão do tempo, pois tutelar de forma intempestiva

equivale a não proteger ou a proteger de forma indevida. (MARINONI, 2009).

Diante do exposto, observa-se que caberia não só ao judiciário, mas também

ao legislativo, e executivo, ou pelo menos, deveria caber, o dever de tutela

jurisdicional em prazo razoável, a harmonização das relações sociais, a imposição de

limites razoáveis ao patamar de direito fundamental. Tendo em vista que não basta

garantir somente o acesso ao Judiciário, é necessário garantir a plena efetivação de

direitos reconhecidos em tempo razoável. Para LOPES JR.:

[...] “O primeiro problema é a falta de uma clara definição do prazo

máximo de duração do Processo Penal. Esse é o ponto nevrálgico da

questão. Contudo, diante da ausência, a consagração constitucional já representa um avanço democrático: respeitar o tempo-do-outro. A

preocupação centra-se agora em acelerar o processo para evitar a ilegítima

pena processual decorrente da (de)mora. Mas, ao mesmo tempo, recusar a aceleração utilitarista, fundada na supressão de direitos e garantias

fundamentais. A solução está no difícil equilíbrio do ciclista (somente

possível no movimento): não correr demais, para não cair; não ir excessivamente devagar, porque senão, igualmente caímos. Esse é o

equilíbrio que se busca, através da recusa aos dois extremos” (IBCCRIM,

2011). 87

87

LOPES JR. Aury. A (de)mora jurisdicional e o direito de ser julgado em um prazo razoável no Processo

Penal. Boletim IBCCRIM. São Paulo, v.13, n.152, p. 4 e 5, jul. 2005.

28

O Brasil, como vários outros sistemas jurídicos estrangeiros têm se debruçado

sobre o tema, na tentativa de diagnosticarem possíveis causas para esse

engarrafamento de processos em todas as instâncias e, é claro, encontrarem soluções

viáveis que visem acelerar a marcha do trâmite dos processos, sem, contudo, sobrepor

à necessidade de celeridade em face das garantias fundamentais do indivíduo (HOTE,

2007). Ressalta REJANE SOARES HOTE, que [...] “o que se busca mundialmente é

uma Justiça rápida e efetiva, porém e acima de tudo, sem se perder a qualidade que

deve ser inerente a toda atividade jurisdicional prestada”. (HOTE, 2007). 88

Destarte, demonstra as referidas medidas cautelares diversas da prisão, a

imprescindível necessidade de se visualizar a sistemática processual sob a perspectiva

constitucional das garantias e liberdades fundamentais do indivíduo, em prazo

razoável. 89

Desta forma, não mais é possível tolerar em um Estado democrático de

direito, o processo, como Cândido Rangel Dinamarco já afirmou, [...] “fonte perene de

decepções.” (DINAMARCO, 2001). 90

2.1 NOÇÕES DE RAZOABILIDADE

O postulado da razoabilidade teve sua origem na Magna Charta inglesa e no

Bill of Rights norte-americano, 91

mas foi a Suprema Corte norte-americana, no Século

88 HOTE, Rejane Soares. A garantia da razoável duração do processo como direito fundamental do indivíduo. Revista da Faculdade de Direito de Campos, Ano VIII, Nº 10 - Junho de 2007. 89 HOTE, Rejane Soares. idem. Ibidem. 90 DINAMARCO, Cândido Rangel. Fundamentos do Processo Civil Moderno. 4. Ed., São Paulo: Malheiros,

2001. p. 2. 91 Nesse sentido, leciona Barroso: A sua consagração deu-se através das emendas 5ª e 14ª da Constituição norte-

americana. A 5ª emenda estabeleceu que “ninguém será privado da vida, liberdade ou propriedade sem o devido

processo legal” e a 14ª “nenhum Estado privará qualquer pessoa da vida, liberdade ou propriedade sem o devido

processo legal”. A cláusula do due process of law tornou-se uma das principais fontes da expressiva

jurisprudência da Suprema Corte norte-americana ao longo dos últimos dois séculos. (BARROSO, 1988, p. 65).

29

XX, que desenvolveu uma jurisprudência 92

mais consistente sobre o princípio da

razoabilidade, no âmbito da aplicação substantiva do devido processo legal.

(GUERRA FILHO, 2000). 93

Quanto ao fundamento da razoabilidade no ordenamento jurídico brasileiro, é

salutar destacar que o mesmo, não se encontra expresso, mas sua característica de ser

um princípio regulador de conflitos entre os demais princípios e garantias

fundamentais, o tornou segundo parte da doutrina, positivado pelo princípio do devido

processo legal, no artigo 5º inciso LIV da CF. (PONTES, 2000). 94

A esse respeito, o professor AFFONSO SOUZA, salienta:

[...] “o princípio da razoabilidade, em sua face processual, enquanto

princípio do devido processo legal, encontra-se positivado no capítulo de

direitos e garantias individuais, no artigo 5º, inciso LIV. Nesta mesma esfera, tocante à processualística penal da qual é oriundo, o inciso XXXIX

do citado artigo expõe a idéia central do “nullum crimen, nulla poena, sine

lege” (SOUZA, 2012). 95

Diante desta constatação, BARROSO observa, objetivamente, que:

[...] “abrem-se duas linhas de construção constitucional, uma e outra

conducentes ao mesmo resultado: o princípio da razoabilidade integra o

direito constitucional brasileiro, devendo o teste de razoabilidade ser

aplicado pelo intérprete da Constituição em qualquer caso submetido ao

seu conhecimento. A primeira linha, mais inspirada na doutrina alemã,

92 [...] “O primeiro caso na jurisprudencial na direção de definição do postulado da razoabilidade, também

denominada de “duração indevida” foi no caso “Wemhoff – STEDH” em 27 de junho de 1968, através do qual

foram convencionados critérios para determinar a valoração razoável, denominados de “doutrina dos sete

critérios” (LOPES JR., 2005), são eles: a) a duração da prisão cautelar; b) a duração da prisão cautelar em

relação à natureza do delito, a pena fixada e a provável pena a ser aplicada em caso de condenação; c) os efeitos

pessoais que o imputado sofreu, tanto de ordem material como moral ou outros; d) a influência da conduta do

imputado em relação à demora do processo; e) as dificuldades para a investigação do caso (complexidade dos

fatos, quantidade de testemunhas e réus, dificuldades probatórias, etc.); f) a maneira como a investigação foi conduzida; g) a conduta das autoridades judiciais.” (LOPES JR. 2011). 93 GUERRA FILHO, Willis Santiago. Teoria processual da constituição. São Paulo: Celso Bastos Editor:

Instituto Brasileiro de Direito Constitucional, 2000. p. 75 a 76. 94 PONTES, Helenilson Cunha. O princípio da proporcionalidade e o direito tributário. São Paulo: Dialética,

2000. p. 93. 95 SOUZA, Carlos Affonso Pereira de. & SAMPAIO, Patrícia Regina Pinheiro. O princípio da razoabilidade e o

Princípio da proporcionalidade: uma abordagem constitucional. Artigo publicado na Internet, no site:

http://www.pucrio. br/sobrepuc/depto/direito/pet_jur/cafpatrz.html - acessado em: 05.01.2012, p. 7.

30

vislumbrará o princípio da razoabilidade como inerente ao Estado de direito,

integrando de modo implícito o sistema, como um princípio constitucional

não-escrito. De outra parte, os que optarem pela influência norte-americana, pretenderão extraí-lo leis se torna exigível por força do caráter substantivo

que se deve dar à cláusula”. (BARROSO, 2011). 96

Por sua vez, MEIRELLES, citando CÁRMEM LÚCIA ROCHA, elucida:

[...] “Sem dúvida, pode ser chamado de princípio da proibição de excesso, que, em última análise, objetiva aferir a compatibilidade entre os meios e os

fins, de modo a evitar restrições desnecessárias ou abusivas por parte da

Administração Pública, com lesão aos direitos fundamentais. Como se percebe, parece-nos que a razoabilidade envolve a proporcionalidade, e vice-

versa. Registre-se, ainda, que a razoabilidade não pode ser lançada como

instrumento de substituição da vontade da lei pela vontade do julgador ou do

intérprete, mesmo porque “cada vontade tem uma razão de ser.” (MEIRELLES, 1999).

97

O princípio da razoabilidade é utilizado na aplicação da igualdade, para exigir

uma relação de congruência entre o critério distintivo e a medida discriminatória. [...]

“O exame da decisão permite verificar que há dois elementos analisados, critério e

medida, e uma determinada relação de congruência exigida entre eles.” (ÁVILA,

2007). 98

2.2 PRESSUPOSTOS E REQUISITOS DA RAZOABILIDADE

Ante as decisões prolatadas pelo Superior Tribunal Federal, os critérios

práticos, balizadores, que puderam ser verificados como sendo reiteradamente trazidos

no momento de definir a razoabilidade das medidas cautelares, foram: [...] “1) a

96 BARROSO, Luís Roberto. Os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. Artigo publicado na

Internet, no site: http://www.actadiurna.com.br/biblioteca/doutrina/d19990628007.htm: acessado: 19.11.2011. 97 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. São Paulo: Malheriros Editores, 1999, Edição nº

24, pág. 86. 98

ÁVILA, Humberto. Teoria dos Princípios. Da definição à aplicação dos princípios jurídicos. 7ª Ed.

Malheiros. São Paulo. 2007. p. 139 e 143.

31

complexidade da causa; 2) a conduta dos litigantes; 3) o contexto em que se

desenvolveu o processo; 4) a atuação das autoridades judiciais e 5) a importância do

litígio para os demandantes.” (PEIXOTO, 2008). 99

Entretanto, tais critérios, passaram por inúmeros ajustes, para chegar a fim de

proporcionar um equilíbrio que garanta o direito do acusado de ser julgado num prazo

razoável. [...] “Pois nem sempre um processo célere, é um processo justo.”

(IBCCRIM, 2011). 100

Assim constatou-se que a análise da duração razoável do processo deve ser

feita em cada caso concreto, não sendo possível uma formulação de regra abstrata e

genérica sobre o tema: [...] “Os critérios da “razoabilidade” tanto pode se dar quando o

processo estiver findo ou quando este ainda estiver em curso, ainda que a situação de

retardo venha ser recuperada.” (NICOLITT, 2006). 101

Razão pela qual, a “teoria dos sete critérios”, não restou expressamente

acolhida pelo TEDH - Tribunal Europeu de Direitos Humanos, como referencial

decisivo, mas tampouco foi completamente descartada, tendo sido utilizada pela

Comissão em diversos casos posteriores e servido de inspiração para um referencial

mais enxuto: a “teoria dos três critérios” básicos [...] “complexidade do caso; o

comportamento do acusado (a atividade processual do interessado (imputado); e o

comportamento das autoridades judiciárias.” (BRETAS, 2006). 102

Esses três critérios têm sido sistematicamente invocados, tanto pelo TEDH –

Tribunal Europeu de Direitos Humanos, como também pela CADH - Corte Americana

99 PEIXOTO. Marcos Augusto Ramos. Duração razoável do processo. Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro. 2ª

Vara Criminal de Nova Iguaçu Processo nº 2006.038.004747-1. J. data: 2 de setembro de 2008. 100 LAURIA, Mariano Paganini. Duração razoável do Processo: um direito fundamental do acusado como limite

temporal à prisão preventiva. Boletim IBCCRIM. São Paulo. 2011. Disponível em: http://www.ibccrim.org.br 101

NICOLITT, André Luiz. A Duração Razoável do Processo. Rio de Janeiro: Lumen Júris, 2006. p. 68. 102 BRETAS. Adriano Sérgio Nunes. op. cit., p. 58.

32

de Direitos Humanos. Pois ainda que mais delimitados, não são menos discricionários

(BRETAS, 2006). No que tange o primeiro critério da razoabilidade, BRETAS, apud

PEUKERT, pondera:

[...] “A complexidade da causa é um conceito tão vago, quanto à

razoabilidade do prazo. Com efeito, a graduação de causas mais complexas e causas menos complexas depende de uma avaliação subjetiva. Não obstante

a definição de complexidade se reveste de profunda dificuldade epistêmica.

Por outra banda, a doutrina tem sugerido, como referencia da complexidade, a pluralidade de réus, a natureza do delito (hediondo ou não), a

interlocalidade da conduta. De qualquer forma por mais impreciso que seja o

conceito de “complexidade da causa”, é inegável que se trata de uma definição menos imperfeita do que “razoabilidade do prazo” (BRETAS,

2006). 103

Nesse sentido o seguinte julgado:

[...] "HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ORDINÁRIO. PRISÃO PREVENTIVA. FUNDAMENTAÇÃO. INSTRUÇÃO

CRIMINAL. EXCESSO DE PRAZO. RAZOABILIDADE.

COMPLEXIDADE DA CAUSA. 1. É legítima a prisão preventiva fundada na necessidade da instrução criminal, na garantia da aplicação da lei penal e

na preservação da ordem pública, estando esses requisitos concretamente

demonstrados na decisão que a decretou. 2. Excesso de prazo na instrução criminal. Alegação improcedente, dada a complexidade do processo

caracterizada pela quantidade de corréus e a necessidade da expedição de

precatórias para a oitiva de testemunhas residentes em outras comarcas.

Precedentes. Habeas corpus indeferido" (STF - HC 82138/SC - Segunda Turma - Rel. Min. Maurício Corrêa - Decisão Unânime - j. 01/10/2002 -

DJU 14/11/2002, p. 53).

Já quanto ao segundo critério, o referido autor ressalva, 104

que convém

salvaguardar as garantias da ampla defesa e do contraditório aos litigantes. [...]

“Todavia comprovada a má-fé, de inequívoco animus protelandi, o conceito de prazo

103 BRETAS. Adriano Sérgio Nunes. Idem. Ibidem. 104 [...] “Quando se toma o comportamento do acusado como referencia de razoabilidade, não se pode exigir que

o acusado permaneça inerte, perante acusação que lhe pesa, [...] “há que se distinguir a linha nada tênue, que

separa as fronteiras entre exercício legítimo da ampla defesa e o abuso protelatório de manobras descabida. A

diferença entre esses dois conceitos vai determinar a razoabilidade de tempo do processo.”

33

razoável pode ser ampliado, desde que fiquem demonstradas cabalmente as manobras

protelatórias do acusado.” (BRETAS, 2006). 105

Nesse sentido, a jurisprudência ressalta:

[...] “HABEAS CORPUS. ART. 299, DO CÓDIGO PENAL. EXCESSO

DE PRAZO PARA TÉRMINO DA INSTRUÇAO. RAZOABILIDADE. ALEGAÇÃO DE CONDUTA PESSOAL FAVORÁVEL DO

ACUSADO. AUSÊNCIA DE CONSTRANGIMENTO ILEGAL.

DEMORA JUSTIFICADA. REQUISITO INSUFICIENTE PARA A CONCESSAO DO WRIT. ORDEM DENEGADA. 299CÓDIGO PENAL1.

Em sede de Habeas Corpus, a ocorrência de eventual constrangimento ilegal

por excesso de prazo, desde que calcado na razoabilidade para a

conclusão da instrução processual, é plenamente justificável. 2. A

existência de conduta pessoal favorável do acusado é insuficiente para a

concessão do writ, desde que presentes os elementos que legitimam a

constrição do acusado. 3. Ordem denegada.” (100040012989 ES 100040012989, Relator: ALEMER FERRAZ MOULIN. Data de

Julgamento: 15/09/2004, PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL, Data de

Publicação: 28/09/2004, undefined).

Nesse passo, a conduta dos litigantes 106

somente deve ser levada em conta

quando se constata que a dilação imprópria não decorreu de falha do Estado.

[...] “O comportamento desidioso das partes quando requerem reiteradamente adiamentos de audiências, ora em razão de alegação de saúde

quando o problema não impede o comparecimento, a troca freqüente de

advogados, configuram responsabilidade civil comum daquele que deu

causa, e não do Estado.” (CINTRA; GRINOVER; DINAMARCO, 2006). 107

Quanto ao terceiro critério, a atuação do órgão jurisdicional é o principal

critério para aferição da razoabilidade. Pode ser classificada em dilações organizativas

e funcionais, [...] “as primeiras decorrem de fatores estruturais do Judiciário, como

sobrecarga de trabalho ou falta de organização das secretarias. Já as segundas são

105 BRETAS, Adriano Sérgio Nunes. op. cit., p. 58. 106 “Os fatos especiais devem ser levados em conta pela relevância que pode acabar tendo no caso concreto. Por exemplo, quando o processo se dá durante o período eleitoral; quando um período de racionamento de energia

diminuiu o trabalho dos juízes, entre outros.” (CINTRA; GRINOVER; DINAMARCO. op. cit., p. 93). 107

CINTRA, A. C. de A.; GRINOVER, A. P.; DINAMARCO, C. R. Teoria Geral do Processo. 26 ed. São

Paulo: Malheiros, 2006. p. 93.

34

decorrência da má condução do andamento do processo por parte dos Juízes e

Desembargadores.” (CINTRA; GRINOVER; DINAMARCO, 2006). 108

Salienta CARVALHO FILHO:

[...] “já que “duração razoável” é expressão fluida e sem densidade de

exatidão – parece-nos que a ofensa ao referido princípio implicará sempre a investigação sobre a forma como se desenvolveu o serviço, de modo que a

conclusão a que chegar o intérprete terá que enveredar pelo terreno da culpa

no serviço.” (CARVALHO FILHO, 2007). 109

Ainda segundo o autor, [...] “A Razoável Duração do Processo somente se

configurará em relação aos atos administrativos judiciários, quando envolvem a

prestação jurisdicional, ou seja, em caso de “denegação de justiça pelo juiz,

negligência no exercício da atividade, falta de serviço judiciário, desídia dos

serventuários, mazelas do aparelho policial.” (CARVALHO FILHO, 2007). 110

No tocante a essa relação de critérios auferidos ao princípio da razoabilidade

ARAÚJO, apud ARÁN, 111

leciona:

[...] “O reconhecimento desses critérios traz como imediata

conseqüência a visualização das dilações indevidas como um conceito

indeterminado e aberto, que impede de considerá-las como a simples não

observância dos prazos processuais prefixados, conforme acentua Mercedez Garcia Arán, professora da Universidade de Barcelona (La Prevaricación

Judicial, Editora Tecnos, Madrid, 1990, p. 156). Assim também se tem

comportado a doutrina norte-americana no tocante à interpretação da Sexta Emenda Constitucional. Tanto na Europa como nos Estados Unidos da

América, tem sido conferida ao juiz ampla margem de discricionariedade no

estabelecimento dos limites em que há de ser aplicado este ou aquele prazo. Mas, como é evidente, discricionariedade não deve traduzir arbítrio.”

(ARAÚJO, 1999). 112

108 CINTRA, A. C. de A. et. al. Idem. Ibidem. 109

CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 17 ed. Rio de Janeiro: Lumém

Juris, 2007. p. 254. 110 CARVALHO FILHO. Idem. Ibidem. op. cit., p. 254. 111 ARÁN, Mercedez Garcia. La Prevaricación Judicial, Editora Tecnos, Madrid, 1990, p. 156. 112

ARAÚJO, Francisco Fernandes. Responsabilidade do Estado pela Morosidade da Justiça, Ed. Copola

Editora. 1999. p. 146.

35

Tais critérios, também, podem ser direcionados, para definir um prazo

razoável, na aplicação das medidas cautelares pessoais. Pois nesse sentido, já se

pronunciou ALBERT EINSTEIN, na clássica explicação que deu sobre a Relatividade

à sua empregada: [...] “quando um homem se senta ao lado de uma moça bonita,

durante uma hora, tem a impressão de que passou apenas um minuto. Deixe-o sentar-

se sobre um fogão quente durante um minuto somente – e esse minuto lhe parecerá

mais comprido que uma hora – Isso é a relatividade.” (LOPES JR., 2009). 113

2.3 NOÇÕES DE PRAZO RAZOÁVEL

Os prazos são instrumentos, que devem atuar junto ao procedimento, segundo

a égide do princípio do prazo razoável (BRETAS, 2006). 114

Nossa doutrina, antes da

reforma do Código de Processo Penal, elaborou entendimento segundo o qual, a

instrução criminal, deveria estar concluída nos prazos previstos, da Lei nº 9.034/95

(que cuida das ações praticadas por organizações criminosas), cujo artigo 8º estabelece

o prazo de 81 (oitenta e um) dias para o encerramento da instrução criminal, quando

preso o acusado, sob pena de caracterização de constrangimento ilegal (BRETAS,

2006). 115

113 LOPES JÚNIOR, Aury. O tempo como pena processual: em busca do direito de ser julgado em um prazo

razoável. 2007. Disponível em: http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php. Acesso em: 10/02/2012. p. 2. 114

BRETAS, Sérgio Adriano Nunes. op. cit., p. 82. 115 BRETAS, Sérgio Adriano Nunes. op. cit., p. 83.

36

Na doutrina de ROCHA, 116

citado por BRETAS em sua obra, 117

é possível

discriminar a forma pela qual se somava os 81 dias, regulamentares da instrução

criminal:

[...] “Inquérito..........................................................................10 dias (art. 10);

Denúncia.................................................................................05 dias (art. 46); Defesa Prévia........................................................................03 dias (art. 395);

Inquirição testemunhas – MP................................................20 dias (art. 401);

Requerimento de diligências................................................ 02 dias (art. 499); Despacho de requerimento.........................10 dias (art. 499, c/c art. 800 § 3º);

Alegações finais (pelas partes)............................................. 06 dias (art. 500);

Diligências do Juiz................................................ 05 dias (art. 800, inciso II); Sentença.....................................................20 dias (art. 502, c/c art. 800, § 3º)

Total.....................................................................................................81 dias.”

Nesse sentido a jurisprudência leciona:

[...] “Para alguns Tribunais, deve, o prazo, ser contado de maneira global atingindo a marca de 81dias, acrescentado de mais 20 dias se arroladas

testemunhas pela defesa” [...] “Todavia, pela inteligência dos arts. 535 do

Código de Processo Penal e 2º da Lei n.º 1.508, de 1951, os autos da prisão

em flagrante devem ser remetidos a Juízo nas 48 horas seguintes. Também o Código de Processo Penal determina o prazo de dez dias para o término do

inquérito e sua remessa ao Juízo, em se tratando de réu preso. Igualmente, a

denúncia deve obedecer ao prazo do art. 46 do Código de Processo Penal. É imperativo. Ultrapassado o lapso fatal previsto nesses artigos, é de se

reconhecer o constrangimento ilegal causado pelo excesso de prazo.” (HC

Nº11. 999 - SE (2001/0137653-0) DJU 04.02.02, Seção 1, P. 422) Rel.: Min. Felix Fischer).

Seguiu-se o mesmo caminho, até o ano de 2008, por meio da Lei 11.689/2008

e 11.719/2008, iniciada com a lei do Crime Organizado, de estipular prazos certos para

a conclusão do processo. Assim previu-se o tempo de 90 dias para o encerramento da

primeira fase e do procedimento do júri (art. 412 do CPP) e o de 60 dias para a

realização da audiência única de instrução, debates e julgamentos do procedimento

116 ROCHA, Francisco de Assis do Rêgo Monteiro. Curso de Direito processual Penal. 1. Ed. Rio de janeiro:

Forense, 1999. p. 968. 117 BRETAS, Sérgio Adriano Nunes. op. cit., p. 85.

37

comum ordinário, previsto no artigo 400 do Código de Processo Penal. (LOPES JR.,

2011). 118

Contudo, essa compreensão doutrinária e jurisprudencial foi paulatinamente

mitigada, diante de uma diversidade de processos em que a complexidade da causa é

forte, e a aferição deva ser feita segundo critérios da causa a ser julgada. (MENDES,

2006). 119

A jurisprudência não tratou, contudo, da dignidade para aferição do prazo, mas

convencionou que os princípios devem ser os imperativos de valor que incidem sobre

o prazo razoável e sobre a situação do processo de forma conjunta com os outros

critérios jurisprudenciais, como a complexidade da causa. Consoante tal determinação,

o ensinamento do Ministro do STF GILMAR MENDES:

[...] “EMENTA: HABEAS CORPUS. HOMICÍDIO QUALIFICADO E

TENTATIVAS DE HOMICÍDIO. PRISÃO PREVENTIVA. EXCESSO DE

PRAZO. 1. A duração prolongada da prisão cautelar afronta princípios

constitucionais, especialmente, o da dignidade da pessoa humana,

devido processo legal, presunção de inocência e razoável duração do

processo. 2. A demora na instrução e julgamento de ação penal, desde que

gritante, abusiva e irrazoável, caracteriza o excesso de prazo. 3. Manter uma pessoa presa cautelarmente por mais de dois anos é desproporcional e

inaceitável, constituindo inadmissível antecipação executória da sanção

penal. 4. Precedentes. 5. Ordem de habeas corpus deferida de ofício” (HC 86915, Relator (a): Min. GILMAR MENDES, Segunda Turma, julgado em

21/02/2006, DJ 16-06-2006 PP-00028 EMENT VOL-02237-02 PP-00309

LEXSTF v. 28, n. 332, 2006, p. 414-425).

Observa-se, segundo o julgado, que o princípio constitucional da razoabilidade

e, conseqüentemente, protetor do princípio constitucional da duração razoável do

118 LOPES JR., Aury. idem. Ibidem. 119 GIACOMINI Bruno Sitta; SANTOS, Diego Prezzi. A Recente Superação da Súmula 52 do STJ Pela

Jurisprudência e a Normatividade Do Princípio do Prazo Razoável. Disponível em:

http://www.diritto.it/pdf/28099.pdf. 2009. Acessado 11.02.2012. p. 5.

“Com a reforma do Código de Processo Penal, a fixação desses prazos foi vista com descrédito, imaginando-se

que, a ultrapassagem dos períodos estipulados não seria eficazmente controlada, continuando a sua observância a

depender exclusivamente do empenho dos defensores.” (LOPES JR., 2011).

38

Processo Penal, recebeu um status ainda maior, deixando de ser apenas um norteador

das decisões do Superior Tribunal Federal, passando a ser um meio efetivo de fixação

do tempo da delimitação do excesso de prazo, permitindo-se, também, ser aplicado às

medidas cautelares diversas da prisão.

Assim em relação ao prazo razoável das prisões cautelares, as decisões do

Supremo Tribunal Federal, são imperativas em direcionamento, determinando que se o

Estado avocou o direito de punir deve ser eficiente e permitir o julgamento do

processo, em prazo razoável, por ofensa a dignidade da pessoa humana e do devido

processo legal:

[...] “PROCESSO PENAL – PRISÃO CAUTELAR - EXCESSO DE PRAZO - INADMISSIBILIDADE - OFENSA AOS POSTULADOS

CONSTITUCIONAIS DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA (CF,

ART. 1º, III) - TRANSGRESSÃO À GARANTIA DO DEVIDO PROCESSO LEGAL (CF, ART. 5º, LIV) Nada pode justificar a

permanência de uma pessoa na prisão, sem culpa formada, quando

configurado excesso irrazoável no tempo de sua segregação cautelar.” (RTJ 137/287 – RTJ 157/633 - RTJ 180/262-264 - RTJ 187/933-934).

Ainda segundo o Supremo, o excesso de prazo, quando exclusivamente

imputável ao aparelho judiciário, não derivando, portanto, de qualquer fato

procrastinatório causalmente atribuível ao réu, traduz situação anômala que

compromete a efetividade do processo, pois, além de tornar evidente o desprezo estatal

pela liberdade do cidadão, frustra um direito básico que assiste a qualquer pessoa: o

direito à resolução do litígio, sem dilações indevidas (CF, art. 5º, LXXVIII), e com

todas as garantias reconhecidas pelo ordenamento constitucional, inclusive a de não

sofrer o arbítrio da coerção estatal representado pela privação cautelar da liberdade por

tempo irrazoável ou superior àquele estabelecido em lei. (GIACOMINI, 2009). 120

120 GIACOMINI, Bruno Sitta. et. al. idem. Ibidem. p. 8.

39

Destarte, o sistema brasileiro adotou a chamada “doutrina do não-prazo,”

persistindo numa sistemática ultrapassada e que a jurisprudência do Tribunal Europeu

de Direitos Humanos vem há décadas debatendo-se, 121

restando à jurisprudência

brasileira, com o mesmo problema dos tribunais Europeus. (NICOLITT, 2006). 122

Sobre o assunto NICOLITT, lembra:

[...] “A Comissão Interamericana de Direitos Humanos, no Informe nº 12/96,

perfilha o entendimento de que não é possível fixar-se um prazo razoável, e que os Estados não estão obrigados a prescrever um prazo fixo. Também cita

os precedentes do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos, no sentido de

que o prazo razoável, ou o processo sem dilações indevidas, deve ser apreciado em cada caso concreto, sob a orientação de critérios objetivos. (NICOLITT, 2006).

123

Dessa forma, a indeterminação conceitual do art. 5°, LXXVIII, da

Constituição, nos conduzirá pelo mesmo tortuoso caminho da jurisprudência do TEDH

e da CADH. Trazendo sérias conseqüências como: [...] “a própria razoabilidade

militando em seu desfavor.” 124

Tendo em vista que os critérios do princípio da

razoabilidade passaram a ser invocados, como justificativa para a dilação dos prazos.

Nesse sentido, BRETAS, afirma:

[...] “Com a posição sofismática e insustentável da jurisprudência, no sentido de invocar a razoabilidade para justificar o extrapolamento do prazo, restou

deturpado o significado do que é razoável. [...] Afinal, se “a demora é

decorrente de dificuldades materiais, causadas pelas deficiências dos meios que o Estado dispõe’, não é o acusado que deve “pagar”, pela insatisfatória

atuação estatal. A razoabilidade impõe a retomada de sua liberdade e não a

manutenção de sua custódia. [...] Não há como conceber,

epistemologicamente, uma extrapolação que seja razoável. Toda estrapolação, por sua própria natureza, foge à razoabilidade. Se não, não

seria extrapolação. São conceitos ontologicamente incompatíveis,

121 Tanto a Convenção Americana de Direitos Humanos como a Constituição, não fixaram prazos máximos para

a duração dos processos e tampouco delegaram para que lei ordinária regulamentasse a matéria. 122 NICOLITT, André Luiz. A Duração Razoável do Processo. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006. p. 68. 123

NICOLITT, André Luiz. Idem. Ibidem. 124 BRETAS, Sérgio Adriano Nunes. op. cit., p. 109.

40

inconciliáveis a razoabilidade e a extrapolação. O que é razoável não

extrapola, e o que extrapola não é razoável. (BRETAS, 2006). 125

Devido tal conseqüência, a construção (de 81 dias) de um prazo razoável, “foi

relativizada pelos Tribunais Superiores, que costumam aceitar o prolongamento do

prazo em comento, em razão das peculiaridades do caso em concreto, como por

exemplo, a complexidade do caso, o número de acusados, et coetera.” (ARRUDA,

2006). 126

Assim, ainda colhe-se o seguinte julgado:

[...] “Sem embargo de toda discussão sobre os limites temporais e a necessidade da lei estabelecer prazos claros e objetivos, bem como a

conseqüência da superação desses limites (POR TODOS, VER

DELMANTO: 2001, 235 e SS.), vem ganhando freqüente espaço a

adoção do “princípio da razoabilidade” para o tratamento da matéria

que somente tem um viés: o alargamento do prazo da forma como

mencionada nos tópicos precedentes. Assim, sem embargo da

literalidade da lei, vem-se admitindo a dilação temporal para além do determinado, sempre sob o manto da “razoabilidade,” (TJSP – HABEAS

CORPUS N.º 249.974-3 – SÃO PAULO – 2.ª CÂMARA CRIMINAL –

RELATOR: PRADO DE TOLEDO – 16.02.98 – V.U.) muitas vezes

empregada como sinônimo de “complexidade” (TJSP – HABEAS CORPUS N.º 257.119-3 – JACAREÍ – 4.ª CÂMARA CRIMINAL – RELATOR:

PASSOS DE FREITAS – 02.06.98 – V.U.) ou das “dificuldades do

processo.” (TJSP – HABEAS CORPUS N.º 276.805-3 – SÃO PAULO – 4.ª CÂMARA CRIMINAL – RELATOR: PASSOS FREITAS – 23.02.99 –

V.U.). Cumpre deixar claro que toda essa discussão somente tem a distorção

apresentada no direito brasileiro porque, como em todos os modelos inquisitivos de procedimento (vide crítica nestes Comentários), os atos se

protraem excessivamente no tempo e no espaço e na cultura inquisitiva,

quem deve efetivamente pagar a conta dessa (des)estrutura é a pessoa

acusada, sendo mínimas as responsabilidades do Estado.” (CHOUKR, 2009).

127

Nota-se ainda, segundo o autor que o direito do acusado ser julgado em um

prazo razoável, não pode ser traduzido como um direito do Estado extrapolar os

125 BRETAS, Sérgio Adriano Nunes. op. cit., p. 110. 126 ARRUDA, Samuel Miranda. O direito fundamental à razoável duração do processo, Brasília: Brasília

Jurídica. p. 270 e ss. 127

CHOUKR, Fauzi Hassan. Código de Processo Penal. Comentários Consolidados e Crítica Jurisprudencial.

3.ª ed. rev. atual e comentada. Rio de Janeiro: Lumen Juris. 2009. P. 541-542.

41

prazos, [...] “pois embora o critério da razoabilidade é demasiadamente, variável, e

aplicável indistamente a qualquer caso, a jurisprudência deve adaptá-lo como uma

garantia do acusado, objetivamente demonstrada, pois quando utilizado em benefício

do arbítrio da máquina judiciária, pode ser subjetivamente vacilante. E isso é

razoável?” (BRETAS, 2006). 128

2.4 LIMITES NORMATIVOS PARA EVITAR A DILAÇÃO INDEVIDA

No tocante a dilação indevida, uma questão a ser levantada, 129

segundo

LOPES JR., reside em: Quais são os limites aos critérios invocados, que poderão

considerar como “justificada” a dilação do prazo? Tendo em vista, que não há

limitações normativas a esse respeito.

Para caracterizar se a dilação é “indevida,” será necessário que o ordenamento

jurídico interno defina limites ordinários para a duração dos processos, atualmente, um

referencial do que seja a “dilação devida.” Nesse sentido, ressalta LOPES JR.:

[...] “O adjetivo “indevida” que acompanha o substantivo “dilação”, constitui o ponto nevrálgico da questão, pois a simples dilação não constitui o

problema em si, eis que pode estar legitimada. Para ser “indevida”, deve-se

buscar o referencial “devida”, enquanto marco de legitimação, verdadeiro divisor de águas (para isso é imprescindível um limite normativo, conforme

tratado a continuação). (LOPES JR., 2005). 130

128 BRETAS, Sérgio Adriano Nunes. op. cit. p. 110. 129 Outra questão de suma relevância [...] “brota da análise do “Caso Metzger”, da lúcida interpretação do TEDH no sentido de que o reconhecimento da culpabilidade do acusado através da sentença condenatória não justifica a

duração excessiva do processo.” (LOPES, 2005). É notório que a tendência sempre foi de “justificar” qualquer

abuso ou excesso do prazo, pela sentença condenatória, mas é importante frisar, que o fim não justifica os meios.

Segundo Aury [...] “se o “fim” justificasse os arbitrários “meios” empregados. Desnecessária qualquer

argumentação em torno do grave erro desse tipo de premissa, mas perigosamente difundida atualmente pelos

movimentos repressivistas de lei e ordem, tolerância zero.” (LOPES, 2005). 130 LOPES JR., Aury. O tempo como pena processual: em busca do direito de ser julgado em um prazo razoável.

In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, 22, 31/08/2005. Disponível em http://www.ambito- juridico.com. br/site/index.

php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=458. Acesso em 12/02/2012.

42

Parte da doutrina e jurisprudência recorre aos mesmos limites, invocados aos

critérios da razoabilidade, para “justificar” a “dilação indevida,” 131

nesse sentido leia-

se, o seguinte julgado:

[...] PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. RECEPTAÇÃO. ALEGAÇÃO DE EXCESSO DE PRAZO. PLURALIDADE DE RÉUS.

COMPLEXIDADE DA CAUSA. DEMORA JUSTIFICADA.

RAZOABILIDADE. INDEFERIMENTO DO PEDIDO DE LIBERDADE PROVISÓRIA. DECISÃO FUNDAMENTADA. GARANTIA DA ORDEM

PÚBLICA. CONDIÇÕES PESSOAIS FAVORÁVEIS. IRRELEVÂNCIA.

ORDEM DENEGADA. I - Por aplicação do Princípio da Razoabilidade,

mostra-se justificada eventual dilação de prazo para a conclusão da

instrução processual, visto que resta configurada a complexidade do feito

em face da pluralidade de réus com diferentes patronos,II - A simples

alegação de que o paciente goza dos pressupostos da primariedade, dos bons antecedentes, do domicílio certo e da profissão definida, por si só, não ilidem

a necessidade da manutenção da custódia cautelar, quando restar

devidamente demonstrada a presença dos elementos autorizadores a que alude o art. 312, do CPP. Precedentes do STJ. III - Ordem denegada.

Decisão unanimidade. 312CPP. (5871820108170650 PE. 0005283-

73.2011.8.17.0000, Relator: Alderita Ramos de Oliveira. Data de Julgamento: 11/05/2011, 3ª Câmara Criminal, Data de Publicação: 94/2011,

undefined).

Na busca da efetividade dos critérios da razoabilidade, para justificar a dilação

indevida, emergiram no “direito comparado” diversos direcionamentos interessantes,

de limites normativos para evitar a dilação indevida. (IBCCRIM, 2011). 132

Na Itália a legislação estipulou limites de duração da prisão cautelar, de forma

autônoma, para diversas fases, ou seja, entre as investigações e o início da ação penal.

Pois, até 1955 o tempo de encarceramento preventivo não encontrava limites

máximos. Sendo limitado, somente após a vigência do artigo 303 do Códice Di

131

“É notório que a tendência sempre foi de “justificar” qualquer abuso ou excesso do prazo, pela sentença

condenatória, mas é importante frisar, que o fim não justifica os meios. Segundo Aury [...] se o “fim” justificasse

os arbitrários “meios” empregados. Desnecessária qualquer argumentação em torno do grave erro desse tipo de

premissa, mas perigosamente difundida atualmente pelos movimentos repressivistas de lei e ordem, tolerância

zero. (LOPES, 2005). 132

LAURIA, Mariano Paganini. Duração razoável do Processo: um direito fundamental do acusado como limite

temporal à prisão preventiva. Disponível em: http://www.ibccrim.org.br.

43

Procedura Penale, 133

o qual passou a estipular prazos máximos diferentes, em razão

natureza do delito, e da gravidade do crime imputado. (IBCCRIM, 2011). 134

Na Espanha a Ley de Enjuiciamento Criminal, também estabeleceu um prazo

máximo de custódia cautelar, dependendo da pena cominada ao delito, estipulando três

meses o prazo máximo, quando se tratasse de delito a que corresponda à pena de

arresto maior (nem superior de um ano quando a pena seja de prisão menor, ou de

dois, quando a pena seja de prisão maior). Podendo tais termos máximos ser

prorrogados no caso de impossibilidade de julgamento da ação penal [...] “nos prazos

máximos fixados, e caso haja alguma prova de que o acusado possa se subtrair da ação

da Justiça, mas mesmo nesses casos excepcionais – e também nas hipóteses de prisão

menor ou superior - não poderá ultrapassar metade da pena imposta na sentença

quando desta houver recurso.” (IBCCRIM, 2011). 135

Ainda a título ilustrativo ao direito comparado, vale abordar, ainda que

resumidamente, a sistematização feita por VINICIUS LANG DOS SANTOS, 136

que

em sua dissertação, cita que países como Paraguai, Argentina, Peru, Itália, Espanha,

França e Alemanha, partiram para uma positivação, de previsão temporal “máxima de

duração de prisões cautelares e medidas cautelares”, e advoga pela tese, de lege

ferenda, com base em abalizados doutrinadores, tais como: José Rogério Cruz e Tucci,

133 LAURIA, Mariano Paganini. Idem. Ibidem. p. 7. “Para crimes com pena de reclusão que não ultrapasse 20

anos o termo máximo é 04 de custódia cautelar, de outra banda, para os crimes com pena de reclusão superior a

20 anos ou pena de prisão perpétua (Ergastolo) é possível o encarceramento cautelar por até 6 anos.” 134 LAURIA, Mariano Paganini. Idem. Ibidem. p. 7. 135 LAURIA, Mariano Paganini. Idem. Ibidem. p. 8. 136

SANTOS, Vinicius Lang dos. O Direito Constitucional ao Prazo Razoável e a Duração da Prisão

Preventiva. Dissertação de mestrado em Ciências Criminais. Porto Alegre: PUCRS. 1997.

44

Antônio Scarance Fernandes, e Aury Lopes Junior, 137

ressaltando: [...] “que se adote

tal postura em nosso país.” (SANTOS, 2008). 138

Ressalte-se que o Código Processal Penal do Paraguai foi reformulado no ano

de 2003, a fim de se amoldar ao Pacto de San José de Costa Rica, dispondo uma

fixação máxima de duração do Processo Penal, bem como, o direito à indenização do

Estado, para a vítima do delito, quando ocorra a extinção do processo por inércia

judicial. (ZDANSKI, 2006). 139

Leia-se:

[...] Artículo 136. DURACION MÁXIMA - Toda persona tendrá derecho

a una resolucion judicial definitiva em un prazo razonable. Por lo tanto, todo procedimiento tendrá una duración máxima de três años, contados

desde el primer acto del procedimiento. [...] Este plazo sólo se podrá

extender por seis meses más cuando exista una sentencia condenatória, a fin

de permitir la tramitacion de los recursos.

[...] Artículo 137. EFECTOS - Vencido el plazo previsto en el artcículo

anterior el juez o tribunal, de ofício o a peticíon de parte, declarará extinguida la acción penal, conforme lo previsto por este código. [...]

Cuando se declare la extinción de la acción penal por morosidad judicial, la

víctima deberá ser indemnizada pro los funcionários responsables y por el

Estado.

[...] Artículo 118. VÍCTIMA - La protección y reparación del daño

causado a la víctima del delito son objetivos del proceso penal. El Ministerio Público está obligado a velar por dichos intereses en todas las

fases. Por su parte, los jueces garantizarán la vigencia de sus derechos y el

respeto, protección y reparación durante el proces. 140

Interessante notar que o Código Processal Penal do Paraguai, prestigia a

vítima do crime, historicamente esquecida pelo direito Processual Penal. Nada mais

natural, afinal, se ao cidadão é vedada a autotutela, tendo chamado o Estado para si

137

LOPES JÚNIOR, Aury Celso Lima. Direito Processual Penal e sua Conformidade Constitucional. 3.ª ed.

rev. atual. Rio de Janeiro: Lumen Juris. 2008. 138 SANTOS, Vinicius Lang dos. O Direito Constitucional ao Prazo Razoável e a Duração da Prisão

Preventiva. Dissertação de mestrado em Ciências Criminais. Porto Alegre: PUCRS. 1997. 139 ZDANSKI, Claudinei. O princípio da razoável duração do processo e seus reflexos no inquérito policial. Jus

Navigandi, Teresina, ano 11, n. 1260, 13 dez. 2006. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/9271>.

Acesso em: 27/03/2012. 140

PARAGUAY. Código Processual Penal da República del Paraguay. 2003. Livro Segundo, Título I,

Capítulo-V.

45

essa tarefa, cabe-lhe também a obrigação de, efetivamente, prestar uma resposta a

vitima do ato ilícito. (ZDANSKI, 2006). 141

Nesse sentido, nota-se que o Código Processal Penal paraguaio é sem dúvida,

um exemplo de limite normativo a ser seguido, pois assim como o Brasil, está em

harmonia com as diretrizes da CADH, bem como, apresenta graves deficiências na

Administração da Justiça Penal, mas com um importante diferencial do Brasil [...] “ao

invés de reformas pontuais, inconsistentes e eivadas de dicotomias, partiram para um

novo código, norteado pela Convenção Americana de Direitos Humanos.” (LOPES

JR., 2005). 142

Nesse sentido LOPES JR., assevera:

[...] “Um bom exemplo de limite normativo interno, encontramos no Código

de Processo Penal do Paraguai (Ley 1286/1998), que em sintonia com a

CADH, estabelece importantes instrumentos de controle para evitar a dilação indevida. [...] O prazo máximo de duração do Processo Penal será de 3

anos (arts. 136 e ss), após o qual, o juiz o declarará extinto (adoção de uma

solução processual extintiva). Também fixa, no art. 139, um limite para a

fase pré-processual (a investigação preliminar), que uma vez superado, dará

lugar a extinção da ação penal. Por fim, cumpre destacar a resolução ficta,

insculpida nos arts. 141 e 142 do CPP paraguaio, através da qual, em síntese,

se um recurso contra uma prisão cautelar não for julgado no prazo fixado no Código, o imputado poderá exigir que o despacho seja proferido em 24h.

Caso não o seja, se entenderá que lhe foi concedida a liberdade.”

Ainda segundo o autor, são vantagens de uma codificação que, além de

corajosamente avançada, possui um princípio unificador, demonstrando que no Brasil,

[...] “há uma necessidade de um referencial normativo claro da duração máxima do

Processo Penal, tanto das prisões, como das medidas cautelares, bem como, uma

141 ZDANSKI, Claudinei. Idem. Ibidem. 142 LOPES JR., Aury. O tempo como pena processual: em busca do direito de ser julgado em um prazo razoável.

In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, 22, 31/08/2005. Disponível em http://www.ambito-

juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=458. Acesso em 12/02/2012.

46

referencia de soluções para ser invocadas, em caso de violação desses limites.”

(LOPES, 2005). 143

Em tom crítico à de qual seria o “prazo razoável,” se manifesta BRETAS: [...]

“De fato, a conclusão mais imediata que deriva do direito de ser julgado num prazo

razoável é a de que esse prazo esteja explicitamente objetivado na lei, sob pena de

insegurança jurídica.” (BRETAS, 2006). 144

Como se vê, a comunidade jurídica mundial tem se debruçado

incansavelmente sobre a problemática da razoável duração do processo, porém

permanecem a indeterminação e a dificuldade de uma definição, que redundam em

óbices à efetivação do direito, em que pese à literalidade do disposto no § 1º do art. 5º

da Constituição Federal. (OLIVEIRA JR., 2011). 145

2.5 SOLUÇÕES DE TUTELAS EM CASO DE VIOLAÇÃO DA LIMITAÇÃO

TEMPORAL

Reconhecida a violação do direito a um processo sem dilações indevidas,

deve-se buscar uma das seguintes Tutelas, classificadas por PASTOR, em El Plazo

Razonable en el Proceso del Estado de Derecho, 146

comentadas por LOPES JR:

1. Soluções Compensatórias: Na esfera do direito internacional, pode-se

cogitar de uma responsabilidade por “ilícito legislativo”, pela omissão em

dispor da questão quando já reconhecida a necessária atividade legislativa na

143 LOPES JR., Aury. Idem. Ibidem, http://www.ambito-juridico.com.br/site/index. 2005. 144 BRETAS, Adriano Sérgio Nunes. op. cit., p.55. 145 OLIVEIRA JR., João Augusto Figueiredo de Oliveira. Duração razoável do processo - é possível sua

efetivação? Revista Consulex/observatório jurídico/ CNJ/Conselho Nacional De Justiça. 07/12/2011. Disponível

em: http://cnj.myclipp.inf.br/default.asp?smenu=ultimas&dtlh=204446&iABA=Not%EDcias&exp= acessado

em 13/02/2012. 146

PASTOR, Daniel. El Plazo Razonable en el Proceso del Estado de Derecho, Buenos Aires, Ad Hoc. 2002, p.

79.

47

CADH. Noutra dimensão, a compensação poderá ser de natureza civil ou

penal. Na esfera civil, resolve-se com a indenização dos danos materiais e/ou

morais produzidos, devidos ainda que não tenha ocorrido prisão preventiva. Existe uma imensa e injustificada resistência em reconhecer a ocorrência de

danos, e o dever de indenizar, pela (mera) submissão a um Processo Penal

(sem prisão cautelar), e que deve ser superada (PASTOR, 2002). [...] “Já a

compensação penal poderá ser através da atenuação da pena ao final aplicada (aplicação da atenuante inominada, art. 66 do CP) ou mesmo

concessão de perdão judicial, nos casos em que é possível (v.g. art. 121, §

5º, art. 129, § 8º do CP). Nesse caso, a dilação excessiva do Processo Penal - uma conseqüência da infração - atingiu o próprio agente de forma tão

grave, que a sanção penal se tornou desnecessária. Havendo prisão

cautelar, a detração (art. 42 do CP), é uma forma de compensação, ainda

que insuficiente.” (LOPES JR., 2005).

2. Soluções Processuais: a melhor solução é a extinção do feito, mas

encontra ainda sérias resistências. Ao lado dele, alguns países prevêem o arquivamento (vedada nova acusação pelo mesmo fato) ou a declaração de

nulidade dos atos praticados após o marco de duração legítima (PASTOR,

2002). [...] “Como afirmado no início, a extinção do feito é a solução mais adequada, em termos processuais, na medida em que reconhecida a

ilegitimidade do poder punitivo pela própria desídia do Estado, o processo

deve findar. Sua continuação, além do prazo razoável, não é mais legítima e

vulnera o Princípio da Legalidade, fundante do Estado de Direito, que exige limites precisos, absolutos e categóricos – incluindo-se o limite temporal -

ao exercício do poder penal estatal. Também existe uma grande resistência

em compreender que a instrumentalidade do processo é toda voltada para impedir uma pena sem o devido processo, mas esse nível de exigência não

existe quando se trata de não aplicar pena alguma. Logo, para não aplicar

uma pena, o Estado pode prescindir completamente do instrumento, absolvendo desde logo o imputado, sem que o processo tenha que tramitar

integralmente. Finalizando, também são apontadas como soluções

processuais: possibilidade de suspensão da execução ou dispensabilidade

da pena, indulto e comutação.” (LOPES JR., 2005).

3. Soluções Sancionatórias: punição do servidor (incluindo juízes,

promotores, etc.) responsável pela dilação indevida. Isso exige, ainda, uma incursão pelo direito administrativo, civil e penal (se constituir um delito).

(PASTOR, 2002). [...] “A Emenda Constitucional n. 45, além de recepcionar

o direito de ser julgado em um prazo razoável, também previu a

possibilidade de uma sanção administrativa para o juiz quer der causa a demora. A nova redação do art.93, II, e, determina que: “não será

promovido o juiz que, injustificadamente, retiver autos em seu poder além

do prazo legal, não podendo devolvê-los ao cartório sem o devido despacho ou decisão.” (LOPES JR., 2005).

Segundo LOPES JR., na atual sistemática brasileira, não existe dificuldade na

aplicação das soluções compensatórias e sancionatórias de natureza cível, mas na

esfera penal, não se vislumbra a aplicação da atenuante genérica do art. 66 do CP,

48

como solução compensatória, tendo em vista, que [...] “Para além dessa indiscutível

incidência, somos partidários de que a atenuante pode reduzir a pena além do mínimo

legal, estando completamente equivocada a linha discursiva norteada pela Súmula 231

do STJ.” (LOPES, 2005). 147

Mas a jurisprudência vem enfrentando a violação do direito de ser julgado

num prazo razoável, com a seriedade e o comprometimento efetivo que a questão

exige, entendendo, ser até possível a aplicação da atenuante nº 66 do CP, nas “soluções

compensatórias”. 148

Nesse sentido o seguinte julgado:

[...] PENAL. ESTUPRO E ATENTADO VIOLENTO AO PUDOR. AUTORIA E MATERIALIDADE SUFICIENTEMENTE

COMPROVADAS. Condenação confirmada. Redimensionamento da pena.

Atenuante inominada do artigo 66 do Código Penal caracterizada pelo longo e injustificado tempo de tramitação do processo (quase oito anos)

associado ao não cometimento de novos delitos pelo apelante. Hediondez

afastada. Provimento parcial. Unânime. (5ª Câmara do Tribunal de Justiça do

Estado do Rio Grande do Sul, na apelação nº 70007100902, Rel. Des. Luis Gonzaga da Silva Moura, 17/12/2003).

Quanto às soluções processuais, o problema é ainda mais grave. O sistema

processual penal brasileiro está completamente engessado e inadequado para atender

as diretrizes da CADH. Não dispõe de instrumentos necessários para efetivar a

garantia do direito a um processo sem dilações indevidas. [...] “sequer possui um prazo

máximo de duração das prisões ou medidas cautelares.” (LOPES JR., 2005). 149

Nesse sentido Lopes ressalta:

[...] “O ideal seria uma boa dose de coragem legislativa para prever

claramente o prazo máximo de duração do processo e das prisões

147LOPES JR., Idem. Ibidem. http://www.ambito-juridico.com.br/site/index. 2005. Acesso em 12/02/2012. 148 [...] “O fato de apontarmos soluções compensatórias não significa que toleramos pacificamente as violações

do Estado, senão que elas são um primeiro passo na direção da efetivação do direito de ser julgado num processo

sem dilações indevidas. A flecha do tempo é irreversível e o tempo que o Estado indevidamente se apropriou,

jamais será suficientemente indenizado, pois não pode ser restituído. (PASTOR, 2002). 149 LOPES JR., Idem. Ibidem. http://www.ambito-juridico.com.br /site/index. 2005. Acesso em 12/02/2012.

49

cautelares, fixando condições resolutivas pelo descumprimento. Na fase de

investigação preliminar, deve-se prever a impossibilidade de exercício da

ação penal depois de superado o limite temporal, ou, no mínimo, fixar a pena de inutilidade para os atos praticados após o prazo razoável.” [...] “Também

é preciso que se compreenda a instrumentalidade do Processo Penal, de

modo que, para não aplicar uma pena, o Estado pode prescindir

completamente do instrumento, absolvendo desde logo o imputado, sem que o processo tenha que tramitar integralmente. Isso permite que se exija, por

exemplo, o pronto reconhecimento da prescrição pela provável pena a ser

aplicada, como imediata extinção do feito.” (LOPES, 2005). 150

Nesse sentido complementa o autor uma importante solução: [...] “Deve-se

voltar os olhos para os sistemas europeus, mas, também para o Código de Processo

Penal paraguaio, que acertadamente consagra um instrumento que efetivamente

assegura a eficácia do direito fundamental de ser julgado num prazo razoável:

resolução ficta em favor do imputado.” (LOPES JR., 2005).

Destarte, assim, como o direito penal está estritamente limitado pelo princípio

da legalidade e o procedimento pelas diversas normas que o regulam, também a

duração do processo, deve ser objeto de regulamentação normativa, utilizando às

tutelas, já relacionadas, em caso de violação da limitação temporal, [...] “como um

“direito fundamental processual, a um processo sem dilações indevidas.” (DIDIER,

2007). 151

150 LOPES JR., Aury. Idem. Ibidem. 151

DIDIER JÚNIOR, Fredie. Curso de Direito Processual Civil: Teoria Geral do Processo e Processo de

Conhecimento. Salvador: Jus PODIVM. 2007.

50

3 RAZOÁVEL DURAÇÃO DO PROCESSO E OS DIREITOS

FUNDAMENTAIS

A Constituição Federal, em seu art. 3º, inciso I, 152

garante uma sociedade

justa, decorrente de uma construção histórica, da necessidade de proteger os cidadãos

contra os arbítrios do Estado, de outro Estado ou da própria sociedade (IBCCRIM,

2011). 153

Cumpre destacar, que com a chamada constitucionalização dos direitos

humanos, surge uma noção mais atualizada dos direitos fundamentais, os “direitos

fundamentais processuais,” tema bem desenvolvido, e classificado por MULLER:

[...] “Os direitos fundamentais processuais, são todos aqueles expressos no

art. 5º, caput, e seus incisos XXXV, LIII7, LIV, LV, LV e LX, ou seja, os princípios da igualdade, do devido processo legal, contraditório, ampla

defesa, publicidade dos atos processuais, inadmissibilidade de provas

obtidas por meios ilícitos, inafastabilidade da jurisdição e juiz natural.” (MULLER , 2004).

154

Nesse sentido, importante mencionar também, a classificação feita por

FREDIE DIDIER JÚNIOR:

[...] “São direitos fundamentais processuais: a) o direito fundamental a um processo devido (devido processo legal); b) direito fundamental à efetividade

(à tutela executiva); c) direito fundamental a um processo sem dilações

indevidas; d) direito fundamental à igualdade; e) direito fundamental à participação em contraditório; f) direito fundamental à ampla defesa; g)

direito fundamental à publicidade.” (DIDIER, 2007). 155

152 GIACOMINI, Idem. Ibidem. Disponível em: www.ibccrim.org.br. Acessado em: 14/01/2012.

“CF. Art. 3º: Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: I - construir uma sociedade livre, justa e solidária; II - garantir o desenvolvimento nacional; III - erradicar a pobreza e a marginalização e

reduzir as desigualdades sociais e regionais; IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça,

sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.” 153 GIACOMINI, Bruno Sitta, SANTOS, Diego Prezzi. A recente superação da súmula 52 do STJ pela

jurisprudência e a normatividade do princípio do prazo razoável. Disponível em: www.ibccrim.org.br. 2011. 154 MULLER, Julio Guilherme. Direitos fundamentais processuais. Dissertação de Mestrado apresentada à

Universidade Federal do Paraná. Curitiba: 2004. p. 66. 155

DIDIER JÚNIOR, Fredie. Curso de Direito Processual Civil: Teoria Geral do Processo e Processo de

Conhecimento. Salvador: Jus PODIVM, 2007.

51

Dentro desta ótica, encontra-se à razoável duração do Processo Penal como

um elemento densificador do Devido Processo Legal, norma de validade do próprio

instituto procedimental, que ganhou envergadura constitucional expressa com a

entrada em vigor da emenda 45/2004. (PAGANINI, 2011). 156

Segundo entendimento do Supremo Tribunal Federal, o princípio da razoável

duração do processo, já seria um princípio implícito do devido processo legal: 157

[...] “A Corte suprema do Brasil, no que concerne de forma específica a um direito ao processo em tempo razoável, pronunciou-se recentemente no

sentido de que [...] “o julgamento sem dilações indevidas constitui projeção

do princípio do princípio do devido processo legal.” (HC 80.379. Rel. Celso Mello). Esta foi a primeira decisão do STF em que de forma explícita se deu

o reconhecimento de uma dimensão temporal da cláusula “due process off

Law”. (ARRUDA, 2006). 158

Para outra parte da doutrina, ele foi albergado desde a incorporação dos

demais diplomas legais supranacionais, dos quais o Brasil é signatário, Nesse sentido

colhe-se a lição de TUCCI:

[...] “Sem dúvida, a partir da edição desse diploma legal supranacional, que

o direito sem dilações indevidas passou a ser concebido como um direito

subjetivo constitucional, de caráter autônomo, de todos os membros da coletividade (incluídas as pessoas jurídicas) à tutela jurisdicional dentro de

um prazo razoável, decorrente da proibição do non liquet, vale dizer do

dever que têm os agentes do Poder Judiciário de Julgar as causas com a estrita observância das normas de direito positivo.” (TUCCI, 1997).

159

Feito essas considerações, necessário se faz refletir, se a duração razoável do

processo, prevista no artigo 5º, LXXVIII da Constituição Federal é um direito ou uma

garantia fundamental? Nesse sentido, o ministro GILMAR MENDES, ressalta que:

156 LAURIA, Mariano Paganini. Ibidem. 157 MELLO. Celso Bandeira. HC 80.379. 158 ARRUDA. Samuel Miranda. O Direito Fundamental à Razoável Duração do Processo. Brasília: Brasília

Jurídica. 2006. 159

TUCCI. Rogério Cruz e. Tempo e Processo: uma análise empírica das repercussões do tempo na

fenomenologia processual (civil e penal). São Paulo: Revista dos Tribunais. 1997. p. 67.

52

[...] “o âmbito das classificações dos direitos fundamentais, intenta-se, por

vezes, distanciar os direitos das garantias. Há, no Estatuto Político, direitos

que têm como objeto imediato um bem específico da pessoa (vida, honra, liberdade física). Há também outras normas que protegem esses direitos

indiretamente ao limitar, por vezes procedimentalmente, o exercício do

poder. São essas normas que dão origem aos direitos-garantia, às chamadas

garantias fundamentais. As garantias fundamentais asseguram ao indivíduo a possibilidade de exigir dos Poderes Públicos o respeito ao direito que

instrumentalizam. Vários direitos previstos nos incisos do art. 5.º da

Constituição se ajustam a esse conceito. Vejam-se, por exemplo, as normas ali consignadas de direito processual penal. Nem sempre, contudo, a

fronteira entre uma e outra categoria se mostra límpida – o que, na realidade,

não apresenta maior importância prática, uma vez que a nossa ordem

constitucional confere tratamento unívoco aos direitos e garantias fundamentais.” (MENDES, 2008).

160

Nota-se, portanto, na lição do ministro, que nossa ordem constitucional

confere tratamento unívoco aos direitos e garantias fundamentais. Assim fica nítida a

íntima relação entre o direito da razoável duração do processo e as garantias

fundamentais, segundo HOTE:

[...] “A presença da garantia da razoável duração do processo como direito fundamental demonstra a necessidade de que a prestação da tutela

jurisdicional atenda à realidade sócio-jurídica a que se destina, atuando como

instrumento à efetiva realização de direitos.” (HOTE, 2007). 161

Assim ao erigir a garantia da razoável duração do processo ao patamar de

direito fundamental, pretendeu o legislador salvaguardar tal prerrogativa dos interesses

prejudiciais de qualquer ordem (HOTE, 2007). A esse respeito, HOTE ainda ressalta:

[...] “destarte, demonstra a referida modificação, a imprescindível

necessidade de se visualizar a sistemática processual sob a perspectiva

constitucional das garantias e liberdades fundamentais do indivíduo. Desta forma, não mais é possível tolerar em um Estado democrático de direito, o

processo, como Cândido Rangel Dinamarco já afirmou, fonte perene de

decepções. [...] “Erigir a garantia da razoável duração do processo a

direito fundamental foi a medida encontrada com o objetivo de

salvaguardar de interesses prejudiciais esta prerrogativa, além é claro,

160 MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de

Direito Constitucional. 2ª ed. rev. atual. São Paulo: Editora Saraiva. 2009. p. 268. 161

HOTE, Rejane Soares. A garantia da razoável duração do processo como direito fundamental do indivíduo.

Revista da Faculdade de Direito de Campos, Ano VIII, Nº 10 - Junho de 2007.

53

de representar o compromisso firmado pelo Poder Público em favor dos

jurisdicionados na incessante luta pelo aperfeiçoamento do aparelho

judicial.” (HOTE, 2007). 162

Com fundamento, após tal leitura, pode-se partir do pressuposto de que “a

duração razoável do processo” é sim um direito fundamental, a esse respeito, assevera

LAURIA:

[...] “partir-se-á do pressuposto de que a duração é sim um direito

fundamental, apto, portanto, a gerar direitos subjetivos ao acusado (aqui

latu sensu, leia-se imputado, indiciado, réu et coetera) - notadamente no

âmbito do Processo Penal. Tal orientação tem como pressuposto teórico a matriz de fundamentalidade formal e material, do direito em tela, bem como

as suas características de relatividade, universalidade, generalidade,

abstração, historicidade e irrenunciabilidade que se coadunam àquelas dos

demais direitos fundamentais em espécie.” (LAURIA, 2011). 163

A esse respeito, também se posicionou GILMAR MENDES:

[...] "O reconhecimento de um direito subjetivo a um processo célere –

ou com duração razoável – impõe ao Poder Público em geral e ao Poder

Judiciário em particular, a adoção de medidas destinadas a realizar esse

objetivo. Nesse cenário, abre-se um campo institucional destinado ao planejamento, controle e fiscalização de políticas públicas de prestação

jurisdicional que dizem respeito à própria legitimidade de intervenções

estatais que importem, ao menos potencialmente, lesão ou ameaça a direitos

fundamentais. (...) O direito à razoável duração do processo, a despeito e

sua complexa implementação, pode ter efeitos imediatos sobre situações

individuais, impondo o relaxamento da prisão cautelar que tenha

ultrapassado determinado prazo, legitimando a adoção de medidas antecipatórias, ou até o reconhecimento da consolidação de uma dada

situação com fundamento na segurança jurídica.” (MENDES, 2009). 164

Na leitura em questão, ao ser reconhecido como um direito fundamental,

segundo GILMAR MENDES, [...] “o direito a razoável duração, tem aplicabilidade

imediata, sobre situações individuais,” assim urge a possibilidade de efetivação do

direito à razoável duração do processo nas medias cautelares.

162 HOTE, Rejane Soares. Idem. Ibidem. 163

LAURIA, Mariano Paganini. Idem. Ibidem. http://www.ibccrim.org.br. 164 MENDES, Gilmar Ferreira. Idem. Ibidem. p. 500-501.

54

3.1 A DILAÇÃO INDEVIDA FERE OS DIREITOS FUNDAMENTAIS

O direito a razoável duração do processo, introduzido pela EC nº. 45, no rol

dos Direitos Fundamentais, Título II, Capítulo I, artigo 5º, inciso LXXVIII da

Constituição Federal Brasileira de 1988, recebeu de logo a terminologia de “Princípio

Constitucional da Duração Razoável do Processo.”

Assim, sendo a razoável duração do processo, um direito fundamental,

importante se faz uma análise aprofundada da redação do inciso LXXVIII: “A todos,

no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e

os meios que garantam a celeridade de sua tramitação,” a qual foi muito bem delineada

por MESQUITA, citando, WAMBIER; CARVALHO e TAVARES: 165

[...] “Ao escriturar o “termo duração,” o inciso LXXVIII, do artigo 5º, da

Constituição Brasileira se refere à tramitação dos procedimentos

administrativos ou judiciais e não ao Processo, pois que este é um direito, e como tal impossível de ser enquadrado numa estrutura abstrata de duração

do tempo, e tampouco a qualquer conceito de razoabilidade.” (TAVARES,

2006). 166

[...] “Verifica-se que o dispositivo “é dirigido a todos,” deve ser

interpretado como alcance aos brasileiros natos ou naturalizados e

estrangeiros residentes no país, como também, alicerçado no entendimento do STF e doutrina, através de interpretação sistemática do caput do art. 5º, é

destinada aos estrangeiros não residentes.” (MESQUITA, 2007). 167

[...] “Conquanto a expressão “duração razoável do processo,” assim, será aquela em que melhor se puder encontrar o meio-termo entre a definição

segura da existência do direito e a realização rápida do direito cuja existência

foi reconhecida pelo juiz.” (WAMBIER, Luiz Rodrigues, et. al. 2005). 168

[...] “Assim, a expressão “razoável duração”, denota flexibilidade, no

sentido de que o mesmo, por ser cláusula geral, aberta, como assim o é quase

165 MESQUITA, Ivonaldo da Silva. O Princípio Fundamental À Razoável Duração Do Processo E Celeridade

De Tramitação. 2007. Disponível em: http://www.faete.edu.br/revista. 23-02-2012. 166 TAVARES, Fernando Horta. Tempo e Processo. In: GALUPPO, Marcelo Campos (org.). O Brasil que

queremos: Reflexões sobre o Estado Democrático de Direito. Belo Horizonte: PUC Minas, 2006. p. 8. 167 MESQUITA, Ivonaldo da Silva. Idem. Ibidem. 168

WAMBIER, Luiz Rodrigues e Teresa Arruda Alvim, MEDINA, José Miguel Garcia. Breves comentários à

nova sistemática processual civil. 3 ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais. 2005. p. 29.

55

todos os princípios jurídicos, é adaptável a todo e qualquer litígio, a todo e

qualquer processo que se encontre sob sua aplicação.” (MESQUITA,

2007).169

[...] “o caráter razoável da duração de um processo deve ser apreciado

conforme as circunstâncias particulares da espécie em julgamento, levando-

se em conta três critérios principais, quais sejam, a complexidade das questões de fato e de direito discutidas no processo, o comportamento das

partes e de seus procuradores e a atuações dos órgãos jurisdicionais no caso

concreto.” (CARVALHO DIAS, 2004). 170

[...] “a expressão duração,” que significa “módulo de tempo com marcos

de começo e fim,” e, especificamente, a expressão “duração razoável do

processo” - na linguagem de Horta o correto seria “duração razoável do

procedimento - deve ser compreendida como sendo “a oportunização da

prática de um ato processual em tempo confortável, de modo que não haja

colisão com o princípio constitucional da ampla defesa estando, pois, ligada a uma racionalidade procedimental” (TAVARES, 2006).

171

Ainda, segundo MESQUITA, a segunda parte do princípio, qual seja, [...] “a

tramitação célere” – “os meios que garantam a celeridade de sua tramitação,” o

legislador constitucional quis buscar ao máximo uma tramitação processual sem atos

que se mostrem deszarrazoados, conduzindo a ultrapassagem das fases processuais e a

atos que não denotam ser essenciais para descoberta da verdade e para a eficácia das

decisões. (MESQUITA, 2007). 172

Desta feita, aduz o referido autor, que o legislador:

[...] “não quer que a operacionalização do princípio, em termos de

celeridade, implique em sumarização da cognição, mas sim que os meios

(previstos na Constituição e na legislação infraconstitucional) realmente sejam os estritamente necessários, como observância efetiva dos prazos

previstos na legislação, respeito aos princípios processuais democráticos.

(isonomia, contraditório e ampla defesa, acesso à justiça, direito ao advogado, fundamentação das decisões, todos estes derivações do devido

processo legal).” (MESQUITA, 2007). 173

Ainda segundo o autor:

169 MESQUITA, Ivonaldo da Silva. Idem. Ibidem. 170 CARVALHO DIAS, Ronaldo Brêtas de. Responsabilidade do Estado pela Função Jurisdicional. Belo

Horizonte: Del Rey, 2004. p. 200. 171 TAVARES, Fernando Horta. op. cit., p. 8. 172

MESQUITA, Ivonaldo da Silva. Idem. Ibidem. 173 MESQUITA, Ivonaldo da Silva. Idem. Ibidem.

56

[...] “O princípio, ou norma-princípio, não pode cair no vazio. Sabe-se que é

difícil harmonizar os princípios fundamentais processuais (razoável duração do processo e celeridade de tramitação, devido processo legal, contraditório

e ampla defesa), e, então, se consiga a tão almejada tutela efetiva. Aliás,

como assinala a Doutrina atual, a grande dificuldade do processualista

moderno é justamente tentar sistematizar a convivência harmônica

entre essas garantias fundamentais do devido processo legal com outro

escopo finalístico do processo, ou seja, a efetividade. A efetividade obsta,

de certa maneira, à segurança. Não há como idealizar um processo de efeitos imediatos. Essa fugacidade não lhe é peculiar, devendo-se sempre

dispor de razoável prazo para a produção das provas necessárias a formar o

convencimento do juiz. O problema está justamente em caracterizar o que

pode ser aceito como prazo razoável, para que as dilações indevidas do processo não o desnaturem, tornando-o instrumento ineficaz na busca dos

direitos. (MESQUITA, 2007). 174

Observa-se, segundo a Constituição Federal, que a eficácia do direito a

razoável duração do processo como um princípio constitucional, trata-se de eficácia

plena, e aplicabilidade imediata, como dispõe o artigo 5º §1º, da Constituição Federal:

[...] “As normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicabilidade

imediata”.

Nesse sentido, para haver efetivação do princípio da razoável duração do

processo, não podem prevalecer argumentos que releguem este direito fundamental a

qualquer remissão posterior do legislador, [...] “pois a remissão ao legislador não retira

da norma sua plena eficácia e aplicabilidade imediata, mas apenas significa a

possibilidade de restrições posteriores na esfera dos efeitos jurídicos.” (SARLET,

2007). 175

Sobre o assunto JOSÉ AFONSO DA SILVA, reconhece que as normas de

direitos fundamentais têm apenas a eficácia contida, mencionando:

174 MESQUITA, Ivonaldo da Silva. Idem. Ibidem. 175

SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos Direitos Fundamentais. 8º ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado,

2007. p. 271 a 277.

57

[...] “Por regra, as normas que consubstanciam os direitos fundamentais

democráticos e individuais são de eficácia contida e aplicabilidade imediata"

(...) mas, "A orientação Doutrinária moderna é no sentido de reconhecer eficácia plena e aplicabilidade imediata à maioria das normas

constitucionais, mesmo a grande parte daquelas de caráter sócio-ideológico,

as quais até bem recentemente não passavam de princípios programáticos.”

(SILVA, 2001). 176

Todavia, o referido autor ao analisar o artigo 5º, § 1º, da Constituição da

República, faz a seguinte ressalva:

[...] “Então... que valor tem o disposto no § 1º do art. 5º, que declara todas de

aplicação imediata? Em primeiro lugar, significa que são aplicáveis até onde

possam, até onde as instituições ofereçam condições para seu atendimento. Em segundo lugar, significa que o Poder Judiciário, sendo invocado a

propósito de uma situação concreta nelas garantida, não pode deixar de aplicá-

las, conferindo ao interessado o direito reclamado, segundo as instituições

existentes.” (SILVA, 2001). 177

Nessa mesma linha de raciocínio, leciona ALEXANDRE DE MORAES:

[...] “Em regra, as normas que consubstanciam os direitos fundamentais

democráticos e individuais são de eficácia e aplicabilidade imediata. A

própria Constituição Federal, em uma norma-síntese, determina tal fato dizendo que as normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm

aplicação imediata.” (MORAES, 1997). 178

Assim, observa-se que o respeito e a aplicabilidade ao prazo razoável como

um direito fundamental, é assim como os diversos princípios, um dever do magistrado,

do Parquet e do Estado, no bojo do processo, prover uma identificação dos meios

possíveis para a consecução de finalidades, a fim de que a norma possa ser efetiva,

tendo o reconhecimento acertado em manifestações recentes da jurisprudência, as

quais aniquilam o teor da Súmula 52 do STJ: “Encerrada a instrução criminal, fica

176 SILVA, José Afonso. Aplicabilidade das normas constitucionais. 5. ed. São Paulo: Malheiros, 2001. p.165. 177

SILVA, José Afonso. Idem. Ibidem. 178 MORAES, Alexandre de. Direitos Humanos Fundamentais. São Paulo: Atlas, 1997. p.42.

58

superada a alegação de constrangimento por excesso de prazo,” e também combate a

faculdade de arbítrio que o Estado, antes, recebia. (GIACOMINI; SANTOS, 2011): 179

PROCESSUAL PENAL. EXCESSO DE PRAZO. DILIGÊNCIAS

COMPLEMENTARES REQUERIDAS PELO MINISTÉRIO PÚBLICO.

MAIS DE UM ANO PARA CUMPRIMENTO. FLEXIBILIZAÇÃO DO

TEOR DA SÚMULA Nº52. GARANTIA DA RAZOÁVEL DURAÇÃO

DO PROCESSO. RECURSO PROVIDO. 1. Não padece de ilegalidade o

decreto prisional lastreado em elementos concretos a aconselhar a medida. 2.

Ainda que encerrada a instrução, é possível reconhecer o excesso de

prazo, diante da garantia da razoável duração do processo, prevista no

artigo 5º, inciso LXXVIII da Constituição. Reinterpretação da Súmula nº

52 à luz do novo dispositivo. 3. Recurso provido. (RHC 20566/BA, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA,

julgado em 12/06/2007, DJ 25/06/2007, p.300).

Nesse passo, nos parece que o argumento de que o direito fundamental à

razoável duração do processo constitui uma mera cláusula aberta, dependente da

edição de normas infraconstitucionais (direitos humanos) para aquisição de sua

eficácia plena, seja porque, na ausência dessas normas, a atividade do hermeneuta

deverá supri-la. Esse é o entendimento majoritário:

[...] “Ora, em que pese o conteúdo aberto de tais normas, é incontroverso que

o exercício dos direitos fundamentais por elas veiculados poderá ser judicialmente assegurado na hipótese de omissão do ente estatal responsável,

pois já se reconheceu em nossa mais alta Corte que "(...) A interpretação

da norma programática não pode transformá-la em promessa constitucional inconseqüente.” (RE nº 368.041, Rel Min. Joaquim Barbosa,

DJ 17/06/05).

Ou seja, o conteúdo aberto da norma, não poderá servir de pretexto para que se

negue aplicação prática, seja porque o sistema já oferece instrumentos voltados à

garantia da celeridade processual. Assim conclui TÉRCIO SAMPAIO FERRAZ JR.:

[...] “Com base em tais considerações e à luz da teoria da efetividade dos direitos fundamentais, entendemos que se deva atribuir aplicabilidade

179

GIACOMINI, Bruno Sitta, SANTOS, Diego Prezzi. A recente superação da súmula 52 do STJ pela

jurisprudência e a normatividade do princípio do prazo razoável. 2011. Disponível em: www.ibccrim.org.br.

59

imediata e eficácia plena à garantia constitucional da razoável duração do

processo, competindo ao intérprete, com o objetivo de lhe conferir máxima

efetividade, a identificação dos meios possíveis para a consecução das finalidades a que a norma se destina como, aliás, vem expressamente

apregoado no artigo 5º da Lei de Introdução ao Código Civil. (FERRAZ

JÚNIOR, 1990). 180

Assim a criação das medidas cautelares diversas da prisão, como uma

determinação legislativa de concretização da presunção de inocência é uma necessária

reverencia ao princípio da razoável duração do processo, que depois de consagrado

como uma garantia fundamental do acusado torna-se, como as demais garantias, [...]

“um verdadeiro limite democrático à abusiva exploração midiática em torno do fato

criminoso e do próprio processo judicial.” (LOPES JR., 2011). 181

Em matéria de inovação legislativa, direta ou indiretamente ligadas à

preocupação com a razoável duração do processo, segundo BARRUFFINI, podemos

citar: a Lei n.º 11.418/2006 (repercussão geral como requisito de admissibilidade do

recurso extraordinário); a Lei n.º 11.672/2008 (procedimento relativo ao julgamento de

recursos especiais repetitivos no âmbito do STJ); a Lei n.º 11/689 (novo procedimento

do Júri), e a Lei n.º 11/719 (novo procedimento no Processo Penal).

Tais inovações legislativas visam a realização de providências processuais,

como parâmetro para se estabelecer o prazo razoável (BARRUFFINI, 2008). Nesse

sentido o Supremo Tribunal Federal tem decidido, caso a caso, as possíveis violações à

razoável duração do processo, como se nota nos seguintes julgados:

[...] "DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS.

RAZOÁVEL DURAÇÃO DO PROCESSO. CONVERSÃO DA PRESTAÇÃO PECUNIÁRIA EM PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE.

180 FERRAZ JÚNIOR, Tércio Sampaio. Interpretação e Estudos da Constituição de 1988. São Paulo: Atlas,

1990. 181

LOPES JR., Aury. O novo Regime jurídico da Prisão Processual, Liberdade Provisória e medidas

Cautelares Diversas. Rio de janeiro: Lumen Juris. 2011. p. 12.

60

PEDIDO DE PARCELAMENTO. 1. A despeito da falta de informação a

respeito do julgamento do habeas corpus no âmbito do Superior Tribunal de

Justiça, a hipótese comporta certa relativização do enunciado nº 691, do

Superior Tribunal de Justiça, notadamente em razão da razoável

duração do processo (CF, art. 5º, LXXVIII), bem como de

circunstâncias relacionadas ao caso concreto, a impor a suspensão, ao

menos provisória, dos efeitos da decisão do magistrado que converteu as

prestações pecuniárias em penas privativas de liberdade. 2. A razoável

duração do processo, especialmente no segmento do habeas corpus, foi

alçado à garantia fundamental no Direito brasileiro, não se revelando

admissível que matéria não tão complexa demore mais de dois anos sem

merecer solução adequada pelo Superior Tribunal de Justiça." (HC

92476 / SP - SÃO PAULO, HABEAS CORPUS Relator (a): Min. ELLEN

GRACIE, Julgamento: 24/06/2008 Órgão Julgador: Segunda Turma).

[...] "AÇÃO PENAL. PRISÃO PREVENTIVA. DECRETAÇÃO EM

SENTENÇA DE PRONÚNCIA. EXCESSO DE PRAZO. CARACTERIZAÇÃO. Custódia que perdura por mais de quatro (4)

anos e quatro (4) meses. Instrução processual ainda não encerrada.

Demora não imputável à defesa. Dilação não razoável. Constrangimento

ilegal caracterizado. HC concedido. Aplicação do art. 5º, LXXVIII, da

CF. Precedentes. A duração prolongada, abusiva e irrazoável da prisão

cautelar do réu, sem julgamento da causa, ofende o postulado da dignidade

da pessoa humana e, como tal, consubstancia constrangimento ilegal, ainda que se trate da imputação de crime grave." (HC 87676 / ES - ESPÍRITO

SANTO, HABEAS CORPUS, Relator (a): Min. CEZAR PELUSO

Julgamento: 06/05/2008, Órgão Julgador: Segunda Turma).

[...] "HABEAS CORPUS. PENAL, PROCESSUAL PENAL E

CONSTITUCIONAL. PRISÃO PREVENTIVA. CONCESSÃO DA ORDEM, NO STJ, REVOGANDO, AB INITIO, A AÇÃO PENAL POR

INOBSERVÂNCIA DO RITO DA LEI N. 10.409/02. MANUTENÇÃO DA

PRISÃO PREVENTIVA, CONSIDERADO O FLAGRANTE POR CRIME

DE TRÁFICO DE ENTORPECENTES (LEI N. 11.343/06). EXCESSO DE PRAZO. JULGAMENTO EM PRAZO RAZOÁVEL (CONSTITUIÇÃO

DO BRASIL, ART. 5, INC. LXXVIII). CONSTRANGIMENTO ILEGAL.

1. Paciente preso em flagrante e condenado pelos crimes tipificados nos artigos 12 e 14 da Lei n. 6.368/76 e 14 e 16 da Lei n. 10.826/03. 2.

Anulação, ab initio, da ação penal pelo Superior Tribunal de Justiça,

por inobservância do contraditório prévio determinado no artigo 38 da

Lei n. 10.409/02, sem expedição de alvará de soltura. 3. Prisão cautelar que perdura desde o dia 5 de fevereiro de 2004. Ausência de previsão quanto

à renovação dos atos processuais, em cumprimento à decisão do Superior

Tribunal de Justiça. Situação configuradora de constrangimento ilegal,

pouco importando tratar-se de paciente preso em flagrante por delito de

tráfico de entorpecentes. 4. A Constituição do Brasil determina em seu

artigo 5º, inciso LXXVIII que "a todos, no âmbito judicial e

administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os

meios que garantam a celeridade de sua tramitação". 5. No caso dos

autos, não é razoável, ainda que a título cautelar, o cumprimento

antecipado de quatro anos de eventual pena, especialmente quando sequer há previsão do término da instrução criminal. Ordem concedida.

(HC 93116 / SP - SÃO PAULO, HABEAS CORPUS, Relator(a): Min.

EROS GRAU, Julgamento: 08/04/2008, Órgão Julgador: Segunda Turma).

61

Acertadamente, no Superior Tribunal de Justiça não tem sido diferente. Além

da edição da Resolução n.º 8 (em vigor desde 08/08/08), que define procedimentos

para a aplicação da Lei n. 11.672/2008 (julgamentos de recursos repetitivos no âmbito

do STJ), reiterados julgados vêm reconhecendo efetividade ao direito à razoável

duração do processo (BARRUFFINI, 2008):

[...] “PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS LIBERATÓRIO. ROUBO CIRCUNSTANCIADO EM ESTABELECIMENTO

COMERCIAL. PACIENTES PRESOS EM FLAGRANTE EM 10.10.07.

PRISÃO PREVENTIVA. ALEGAÇÃO DE CONSTRANGIMENTO ILEGAL DECORRENTE DE AUSÊNCIA DOS REQUISITOS PARA A

CUSTÓDIA CAUTELAR. DECRETO SUFICIENTEMENTE

FUNDAMENTADO. GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA. MODUS

OPERANDI. EXCESSO DE PRAZO. INEXISTÊNCIA. ORDEM DENEGADA. (...) 4. A concessão de Habeas Corpus em razão da

configuração de excesso de prazo é medida de todo excepcional, somente

admitida nos casos em que a dilação (1) seja decorrência exclusiva de diligências suscitadas pela acusação; (2) resulte da inércia do próprio

aparato judicial, em obediência ao princípio da razoável duração do

processo, previsto no art. 5o., LXXVIII da Constituição Federal; ou (3)

implique em ofensa ao princípio da razoabilidade. (...)” (HC 98.448/RN, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, QUINTA TURMA, julgado

em 24.06.2008, DJe 18.08.2008).

[...] “HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. CRIME DE

HOMICÍDIOQUALIFICADO. PRISÃO PREVENTIVA. EXCESSO DE PRAZO. RÉUS CUSTODIADOS HÁ MAIS DE DOIS ANOS.

CONSTRANGIMENTO ILEGAL CONFIGURADO. VIOLAÇÃO AO

PRINCÍPIO DA DURAÇÃO RAZOÁVEL DO PROCESSO. DEMORA

INJUSTIFICADA. PRECEDENTES. PACIENTE FORAGIDO. ÉDITO CONSTRITIVO SUFICIENTEMENTE FUNDAMENTADO.

PRECEDENTES DESTA CORTE SUPERIOR. 1. Na hipótese, os Réus,

com exceção do Paciente José Gleibson Dias, foram presos preventivamente no dia 23 de janeiro de 2006, situação essa que perdura até o presente

momento. 2. A instrução criminal ainda não foi encerrada, encontra-se com

audiência de inquirição de testemunha de acusação marcada, somente, para o dia 23/07/2008. Como não existem justificativas suficientes para

amparar a morosidade do feito, bem como não se vislumbra nos autos

qualquer informação que pudesse atribuir exclusivamente à defesa o

motivo do atraso, afigura-se flagrante o constrangimento ilegal contra

os Pacientes, diante da violação ao princípio da tempestividade do

processo ou da razoabilidade dos prazos processuais. 3. A Emenda

Constitucional n.º 45/2004 inseriu o princípio da razoável duração do

processo dentro das garantias fundamentais asseguradas a cada

indivíduo, insculpido no art. 5.º, inciso LXXVIII, da Constituição

Federal de 1988. 4. Noticiado nos autos que a ordem de prisão sequer foi

62

consumada, em razão de o Paciente José Gleibson Dias encontrar-se

foragido, fato que motivou, inclusive, a suspensão do processo nos termos

do art. 366, do Código de Processo Penal, para que não prejudicasse o andamento da instrução processual em relação aos outros Acusados, reforça-

se a necessidade da cautela determinada pelo Juízo condutor da instrução

criminal. Precedentes do Superior Tribunal de Justiça. 5. Ordem concedida

para relaxar, em razão do excesso de prazo na formação da culpa, a prisão cautelar dos Pacientes Wilson Tenório Soares e Alexandre Sebastião

da Silva, salvo se por outro motivo não estiverem presos. E denegada a

ordem quanto ao Paciente José Gleibson Dias." (HC 94.774/PE, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, julgado em 17.04.2008, DJe

12.05.2008).

Assim a duração das medidas cautelares diversas da prisão, somados a

incontestável atribuição de caráter normativo ao direito à razoável duração do processo

(art. 5º, inciso LXXVIII, da Constituição Federal), operacionando o mandamento

constitucional (de eficácia plena e aplicabilidade imediata), podem ser efetivados, em

obediência ao principio da razoável duração do processo, para a adoção ou realização

de providências processuais, como parâmetro para se saber qual o prazo razoável para

que a providência seja atendida. (BARRUFFINI, 2008). 182

182 BARRUFFINI, Frederico Liserre. Possibilidade de efetivação do direito à razoável duração do processo. Jus

Navigandi, Teresina, ano 13, n. 1893, 6 set. 2008. Disponível em: http://jus.com.br/revista/texto/11685. Acesso

em: 25/02/2012.

63

CONSIDERAÇÕES FINAIS

As medidas cautelares previstas no artigo 319 da lei 12.403/2011 têm a

finalidade de assegurar o comparecimento do acusado, a todos os atos do processo,

evitando a obstrução e o andamento processual, quando presente os pressupostos que a

legitimam: necessidade e adequação, fumus commissi delicti e o Periculum Libertatis,

objetivando evitar danos a pessoas ou bens, e ainda assegurar que não desapareçam os

direitos litigiosos no curso do processo.

Aliado a esta conjuntura, segundo LOPES JR., constatou-se que as

características que norteiam as medidas cautelares pessoais, também são

principiológicas, pois decorrem dos seus próprios princípios, e sua inobservância,

acarretará a nulidade, a substituição, a cumulação ou revogação da medida cautelar

imposta. Assim, as medidas cautelares diversas da prisão além da “natureza jurídica,

instrumental,” possuem “natureza jurídica, autônoma e substitutiva.”

O princípio da provisoridade é a necessária conexão, das medidas cautelares

pessoais, com o princípio da razoável duração do Processo Penal Brasileiro. Pois

estatui que as medidas cautelares pessoais devem ter duração breve, não podendo

assumir contornos de uma pena antecipada, decorrente da falta de limitação temporal

omissa na legislação vigente.

Assim, a análise proposta, procurou trazer direcionamentos de limites

normativos, visando a complementação dessa omissão, de um referencial normativo à

efetividade da razoável duração do processo, das medidas cautelares pessoais.

64

Tendo em vista, que um processo demasiadamente excedido, atropela os

direitos e garantias fundamentais, sendo de suma importância, que o ordenamento

jurídico interno brasileiro, defina limites ordinários para a duração dos processos,

mormente, um referencial do que seja a “dilação indevida,” sob a perspectiva

constitucional das garantias e liberdades fundamentais do indivíduo, em ser julgado

dentro de um prazo razoável. 183

Deste modo, constatou-se que tais limites ordinários normativos, à razoável

duração do processo, poderiam ser complementados em observância, tanto dos

preceitos processuais (estipulação de um prazo máximo), quanto constitucionais

(razoável duração do processo; critérios da razoabilidade).

No tocante aos preceitos constitucionais, um importante referencial normativo

se direciona para a eficácia do princípio da razoável duração do processo, através de

um equilíbrio, entre os vetores da razoabilidade: a complexidade do caso; o

comportamento do acusado; e o comportamento das atividades judiciárias, que

segundo NICOLITT, tais critérios devem ser analisados em cada caso concreto, não

sendo possível uma formulação de regra abstrata e genérica sobre o tema.

Como bem observado, a complexidade da causa é um conceito aberto,

indeterminado, assim como à razoabilidade, dependendo de uma avaliação subjetiva.

Que podem trazer sérias conseqüências como: [...] “a própria razoabilidade militando

em seu desfavor.” 184

Tendo em vista que os critérios do princípio da razoabilidade

passaram a ser invocados, como justificativa do judiciário para a dilação dos prazos.

183 HOTE, Rejane Soares. A garantia da razoável duração do processo como direito fundamental do indivíduo.

Revista da Faculdade de Direito de Campos, Ano VIII, Nº 10 - Junho de 2007. 184 BRETAS, Sérgio Adriano Nunes. op. cit., p. 109.

65

Ainda quanto ao comportamento do acusado, devem ser observados os

princípios do contraditório, ampla defesa, e boa-fé, pois havendo inequívoco animus

protelandi, o conceito de prazo razoável pode ser ampliado. (BRETAS, 2006).

Outro referencial normativo direciona-se, juntamente com a chamada

constitucionalização dos direitos humanos, ou seja, a observância dos direitos

fundamentais processuais, expressos no art. 5º, caput, e seus incisos XXXV, LIII, LIV,

LV, LVI e LXII, os quais se justificam, como normas definidoras dos direitos e

garantias fundamentais, de aplicabilidade imediata.

No tocante, a observância dos preceitos processuais de um referencial

normativo, segundo abalizados doutrinadores, poderia ser adotado, pelo ordenamento

jurídico brasileiro, uma positivação de “duração máxima” do processo, a exemplo de

vários países, como Paraguai, que estipulou a previsão temporal “máxima de duração,”

[...] “até três anos a partir do primeiro ato do processo.” Este exemplo é sem dúvida,

um limite normativo que poderia ser seguido, pelo Brasil, pois o Paraguai (assim como

o Brasil) está em harmonia com as diretrizes da CADH. (LOPES JR., 2005).

Outro direcionamento de efetividade de um prazo razoável do processo, das

medidas cautelares, necessariamente se dirige para a eficiência da administração

judiciária, que segundo MARINONI, o dever de uma tutela jurisdicional em prazo

razoável, é dever, não só, do judiciário, mas também do Legislativo e do Executivo.

Ressaltando que o Estado é obrigado a reservar parte da sua receita para dotar o

Judiciário de forma a lhe permitir prestar a tutela jurisdicional de forma efetiva e

célere, mediante as atividades legislativas e administrativas, diante deste direito

fundamental.

66

Assim, observou-se que um dos [...] “primeiros problemas, é a falta de uma

clara definição do prazo máximo de duração no Processo Penal Brasileiro. Esse é o

ponto nevrálgico da questão. Contudo, diante dessa ausência de limitação temporal, a

consagração constitucional prevista no artigo 5º LXXVIII, da razoável duração do

processo, já representa um avanço democrático: respeitar o tempo-do-outro.” (LOPES

JR., 2005). 185

Em ultima análise, como reflexão sobre o tema, afirmar que o acusado tem o

direito de ser julgado dentro de um prazo razoável não quer dizer nada, se não é

possível esquadrinhar, na prática, o conceito de razoabilidade. [...] “Afinal, o que vem

a ser um prazo “razoável”? Quais os critérios objetivos que podem nortear a aferição

da razoabilidade temporal? Trata-se sem dúvida, de um terreno epistemológico um

tanto delicado. A razoabilidade seria cronometrada dentro de limites rígidos? Ou seria

possível flexibilizar a extensão temporal de um processo, de acordo com as

peculiaridades inerentes a cada caso em espécie? O prazo razoável para a conclusão de

um processo seria fixado em qual medida de tempo: dias, semanas ou meses?

”(BRETAS, 2006). 186

O excesso de trabalho, a falta de pessoal, as deficiências estruturais, todos

estes pretextos acabarão por sepultar o novo princípio da celeridade processual, se não

ocorrerem mudanças que realmente impliquem em uma nova dinâmica processual.

(BRETAS, 2006).

185 LOPES JR. Aury. A (de)mora jurisdicional e o direito de ser julgado em um prazo razoável no Processo

Penal. Boletim IBCCRIM. São Paulo, v.13, n.152, p. 4 e 5, jul. 2005. 186 BRETAS, Adriano Sérgio Nunes. op. cit., p.55.

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