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UNIVERSIDADE POTIGUAR
PRÓ-REITORIA ACADÊMICA
MESTRADO PROFISSIONAL EM ADMINISTRAÇÃO
CINTIA REGINA GALLO
O ASSÉDIO MORAL NO TRABALHO NA PERSPECTIVA SINDICAL
NATAL/RN
2016
CINTIA REGINA GALLO
O ASSÉDIO MORAL NO TRABALHO NA PERSPECTIVA SINDICAL
Dissertação apresentada ao
Programa de Pós-Graduação Stricto
Sensu em Administração, da
Universidade Potiguar, como
requisito para obtenção do título de
Mestre em Administração na Área de
Concentração Gestão Estratégica de
Negócios.
Orientador: Prof. Walid Abbas El-Aouar. Dr.
NATAL/RN
2016
Gallo, Cíntia Regina.
Assédio moral no trabalho na perspectiva sindical / Cíntia
Regina Gallo – Natal, 2016.
90 p.
Dissertação (Mestrado) – Universidade Potiguar, 2016.
Orientador: Walid Abbas El-Aouar
1.Administração. 2. Saúde mental e trabalho. 3. Assédio moral. 4.
Sindicatos. I. Título.
CINTIA REGINA GALLO
ASSÉDIO MORAL NO TRABALHO NA PERSPECTIVA SINDICAL
Dissertação apresentada ao Programa de
Pós-Graduação em Administração da
Universidade Potiguar, como requisito para
obtenção de título de Mestre em
Administração, na área de na Área de
Concentração Gestão Estratégica de
Negócios.
Aprovado em 20/05/2016
BANCA EXAMINADORA
_____________________________________________
Prof. Walid Abbas El-Aouar, Dr.
Orientador
Universidade Potiguar
_____________________________________________
Profª. Lydia Maria Pinto Brito, Dra.
Membro examinador
Universidade Potiguar
______________________________________________
Profª. Fernanda Fernandes Gurgel, Dra.
Membro examinador externo
FACISA/UFRN
Agradecimentos
Agradeço primeiramente a minha família, que desde sempre me incentiva
e apoia na vida.
Por todos os ensinamentos, apoio e suporte, agradeço ao corpo docente
e administrativo do Mestrado Profissional em Administração da Universidade
Potiguar. Em especial, ao meu orientador Walid pela confiança, pelas
cobranças(!) e pelos incentivos.
Agradeço também aos meus colegas de trabalho, que muitas vezes me
ajudaram, seja “segurando as pontas” no trabalho ou emprestando material
teórico.
Um agradecimento especial aos dirigentes sindicais que disponibilizaram
um pouco do seu tempo para falar sobre o assédio moral.
Por fim, agradeço meus colegas de mestrado que compartilharam comigo
conhecimentos e emoções.
“A obrigação de produzir aliena a paixão
de criar.”
(Raoul Vaneigem)
RESUMO
Os modos de organização da produção sofreram grandes transformações nas últimas décadas, formatados pelo sistema socioeconômico que valoriza o capital, maximiza o lucro, estabelece uma competição acirrada e exige a produtividade máxima dos trabalhadores. Esse cenário, propicia a prática do assédio moral no trabalho tanto de forma individual quanto de forma coletiva. As entidades sindicais, enquanto representantes e defensoras dos direitos de suas categorias, devem estar conscientes de seu papel na proteção à saúde do trabalhador. O presente estudo teve como objetivo compreender a perspectiva de dirigentes sindicais a respeito do assédio moral no trabalho e identificar as ações desenvolvidas pelos sindicatos em relação a prevenção e combate desse tipo de violência. A metodologia utilizada foi de abordagem qualitativa, com finalidade descritiva. A entrevista semi-estruturada foi o procedimento de coleta de dados adotado nesta pesquisa, e aplicada com dez dirigentes sindicais. Para o tratamento dos dados recorreu-se a análise de conteúdo. Os achados da pesquisa apontam que os dirigentes de sindicatos de trabalhadores apresentam uma perspectiva do assédio moral no trabalho mais ou menos próxima da literatura sobre o assunto. No entanto, o entendimento dos dirigentes sindicais sobre o assédio moral coletivo sugere um conhecimento limitado acerca de suas características. Os entrevistados compreendem o papel do sindicato no contexto laboral e acreditam que devem estabelecer maneiras de amparar os trabalhadores no enfrentamento desse tipo de violência, e para isso, adotam diversas práticas para a prevenção e combate das situações assediadoras. Dessa forma, os sindicatos se constituem como parceiros dos trabalhadores no enfrentamento do assédio moral, mas ainda pouco combativos com as formas nocivas de organização do trabalho decorrentes da reestruturação produtiva pautada no sistema capitalista de exploração da mão de obra. Palavras-chave: Saúde mental e trabalho. Relações de trabalho. Assédio moral. Sindicatos.
ABSTRACT
The organization of production methods have undergone great changes in recent decades, formatted by the socio-economic system that values the capital, maximize profit, establishes a fierce competition and demands maximum productivity of workers. This scenario provides the practice of moral harassment at work both individually as collectively. Trade unions as representatives and defenders of the rights of their categories should be aware of their role in protecting the workers' health. This study aimed to understand the perspective of trade union leaders about moral harassment at work and identify the actions taken by trade unions in relation to prevent and combat this type of violence. The methodology used was a qualitative approach with descriptive purpose. The semi-structured interview was the data collection procedure adopted in this research, and applied with ten trade union leaders. For the processing of data resorted to content analysis. The research findings indicate that the labor trade unions leaders have a perspective of moral harassment at work more or less close to the literature on the subject. However, the understanding of the trade union leaders on the collective moral harassment suggests limited knowledge about its features. Intervieweds understand the union's role in the labor context and believe they should establish ways to support workers in the face of such violence, and for this, adopt different practices for the prevention and combat of harassing situations. Thus, trade unions are constituted as partners of workers in the face of moral harassment, but still little combative with harmful forms of work organization resulting from the restructuring process guided the capitalist system of exploitation of hand labor.
Keywords: Mental health and work. Work relationships. Moral harassment. Trade Unions.
LISTA DE QUADROS
Quadro 1 – Categorias de análise ..................................................................57
Quadro 2 – Perspectivas sobre o assédio moral individual .........................61
Quadro 3 – Perspectivas sobre o assédio moral coletivo ............................65
Quadro 4 – Papel dos sindicatos em relação ao assédio moral no trabalho
...........................................................................................................................70
Quadro 5 – Implicações práticas ...................................................................75
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO................................................................................................11
1.1 CONTEXTUALIZAÇÃO...............................................................................13
1.2 PROBLEMÁTICA E QUESTÃO DE PESQUISA.........................................14
1.3 OBJETIVOS.................................................................................................16
1.3.1 Geral.......................................................................................................16
1.3.2 Específicos............................................................................................16
1.4 JUSTIFICATIVA...........................................................................................17
1.5 ESTRUTURA DO TRABALHO....................................................................19
2 REFERENCIAL TEÓRICO..........................................................................20
2.1 RELAÇÕES DE TRABALHO CONTEMPORÂNEAS..................................20
2.2 ASSÉDIO MORAL NO TRABALHO............................................................24
2.2.1 Características do assédio moral no trabalho...................................25
2.2.2 Métodos de assédio moral no trabalho...............................................28
2.2.3 Consequências do assédio moral no trabalho....................................30
2.2.4 Fatores que contribuem para a ocorrência do assédio moral no
trabalho..................................................................................................32
2.3 ASSÉDIO MORAL COLETIVO....................................................................34
2.4 OS SINDICATOS.........................................................................................42
2.5 ESTUDOS RECENTES SOBRE ASSÉDIO MORAL NO TRABALHO
.....................................................................................................................48
3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS....................................................53
3.1 TIPO DE PESQUISA....................................................................................53
3.2 PARTICIPANTES DO ESTUDO...................................................................54
3.3 INSTRUMENTO E PROCEDIMENTO DE COLETA DE DADOS.................55
3.4 CATEGORIAS DE ANÁLISE........................................................................56
3.5 TRATAMENTO DOS DADOS......................................................................58
4 ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS..........................................60
4.1 PERSPECTIVAS SOBRE O ASSÉDIO MORAL INDIVIDUAL.....................60
4.2 PERSPECTIVAS SOBRE O ASSÉDIO MORAL COLETIVO.......................65
4.3 O PAPEL DOS SINDICATOS EM RELAÇÃO AO ASSÉDIO MORAL NO
TRABALHO..................................................................................................70
4.4 A ATUAÇÃO DOS SINDICATOS EM RELAÇÃO AO ASSÉDIO MORAL NO
TRABALHO..................................................................................................74
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS.........................................................................80
REFERÊNCIAS...........................................................................................83
ANEXOS......................................................................................................88
11
1 INTRODUÇÃO
O assédio moral ou a violência psicológica no trabalho não é uma pratica nova.
É quase tão remota quanto o próprio trabalho. Ao longo da evolução histórica do
trabalho, a forma de sua organização sempre foi determinada pelo capital, dando
poderes aos que os detêm sob os que não possuem, afetando o significado da
atividade laboral na vida das pessoas e possibilitando práticas de gestão e controle
muitas vezes desumanas (ADORNO JUNIOR; SOUZA, 2008).
Os modos de produção mudaram radicalmente nas últimas décadas com a
implantação de novas tecnologias e pelas demandas de consumo da sociedade. Maior
produtividade ao menor custo de produção tem sido o mote das organizações
modernas. Com essas transformações, surgiram novas demandas para os
trabalhadores. Se no passado, os modos de organização afetavam principalmente a
saúde física dos trabalhadores, pelo excesso de carga de trabalho e condições
insalubres, por exemplo, nesse novo contexto, a saúde mental tem sido a mais afetada
(SELIGMANN-SILVA et al., 2010).
O sofrimento mental e adoecimento dos trabalhadores possuem forte relação
com os modos de organização do trabalho, como, por exemplo, o significado do
trabalho, os estilos de gestão, as relações de poder, a hierarquia e a distribuição de
responsabilidades (DEJOURS, 1992).
Observa-se uma falta de visibilidade para os fatores subjetivos do adoecimento
advindos das intensas pressões psicológicas para o alcance de metas ou
cumprimento de normas e procedimentos. O assédio moral e suas consequências, e
a síndrome de Burnout são exemplos do resultado de um meio ambiente de trabalho
doentio e consequência da atual forma de organização do trabalho (SCHINESTSCK,
2009).
No mesmo sentido, Barreto (2009) aponta diversos fatores do atual modelo de
organização do trabalho como influências diretas na saúde mental dos trabalhadores.
A divisão das tarefas e as práticas de gestão que incentivam a competitividade, o
individualismo e a responsabilização dos menos produtivos pelo não alcance de
metas, provocam sérios resultados na saúde do trabalhador e nas suas relações
interpessoais, dentro e fora do espaço de trabalho.
Nessa conjuntura, a violência psicológica ou assédio moral no trabalho, têm
sido temas recorrentes de estudos e pesquisas que visam caracterizar o fenômeno e
12
desvelar suas causas e consequências, bem como, formas de evitar e prevenir sua
ocorrência (CAHÚ et al., 2011).
Faz-se necessário, no entanto, um olhar amplo sobre o fenômeno, estudando-
o tanto ao nível individual quanto coletivo. É importante destacar o entendimento dos
conceitos, das características, das consequências para a saúde dos trabalhadores,
mas, principalmente, discutir sobre a origem do assédio, quando ele deriva da ação
perversa de um indivíduo e quando deriva do poder do empregador em determinar os
modos de organização do trabalho (BARRETO; FREITAS; HELOANI, 2008).
O sistema socioeconômico vigente, com ideais de liberdade de mercado e livre
negociação, favorecem os donos do capital e instituem uma postura profissional,
moral e ética, para os trabalhadores, que assimilam os valores culturais correntes de
que o lucro e produtividade são positivos em qualquer contexto e devem ser buscados
por todos. Ou seja, a superexploração dos trabalhadores está justificada pelo ideal do
capitalismo (ROSSI; GERAB, 2009).
Nesse cenário, os sindicatos se apresentam como entidade representativa e
legal para defender os direitos dos trabalhadores e de categorias profissionais,
inclusive os referentes às condições de trabalho e à saúde dos trabalhadores,
buscando trazer equilíbrio entre as forças do empregador e dos empregados
(QUEIROZ, 2013).
Cabe aos sindicatos defender os direitos adquiridos e a melhoria das condições
de trabalho, de salário e de proteção social dos trabalhadores de suas respectivas
categorias profissionais. Porém, na visão dos sindicatos, a gestão do trabalho e as
práticas organizacionais ainda são tratadas como prerrogativas exclusivas do
empregador e, portanto, o interesse sobre esses temas por parte das entidades
sindicais é pouco expressivo (COTANDA, 2008).
Em virtude de o assédio moral no trabalho ter se tornado mais visível ou mais
conhecido, espera-se que os sindicatos incluam esse problema na pauta de suas
discussões para que o trabalhador possa encontrar amparo quando vítima dessa
prática, tendo em vista as repercussões pessoais e sociais que o assédio moral pode
causar. Tanto em nível individual quanto coletivo.
13
1.1 CONTEXTUALIZAÇÃO
A discussão sobre os aspectos do assédio moral no trabalho e a relação com a
saúde dos trabalhadores é um tema contemporâneo, principalmente no Brasil. A longa
história de escravidão e exploração de mão de obra no Brasil, além da desigualdade
social, econômica e de oportunidades, proporcionam um ambiente propício para o
desenvolvimento da cultura baseada em valores superficiais e materiais. Nessa
cultura, já bastante assimilada por todos, o trabalhador é subjugado às mais diversas
formas de violência cada vez mais legitimada e banalizada pelo discurso do capital
(SOARES, 2006).
A busca insana por metas de uns poucos através do trabalho de muitos provoca
a necessidade de reflexão quanto às questões éticas da organização do trabalho e
seu impacto social (MORGAN, 1996). Desse modo, torna-se importante destacar o
papel do trabalho como meio de realização pessoal e inclusão social dos indivíduos,
e repudiar a visão do trabalhador como simples objeto do contrato de trabalho
(SCHINESTSCK, 2009).
As novas formas de organização do trabalho estabeleceram, o que alguns
autores denominam, de mal-estar das sociedades atuais. Resultado da degradação
das condições de trabalho, da busca desenfreada pela produtividade e do lucro, do
estímulo à competitividade e do individualismo, da coisificação do trabalhador
(BARRETO; FREITAS; HELOANI, 2008). Esse cenário, sintomático, torna-se
ambiente propício para a ocorrência do assédio moral.
Assédio moral é entendido aqui como uma conduta abusiva, que ocorre no
ambiente de trabalho, com certa regularidade, que visa humilhar, constranger,
denegrir um indivíduo ou grupo, atingindo sua dignidade e integridade profissional
(BARRETO; FREITAS; HELOANI, 2008). E também, em sentido mais amplo, como a
deterioração das condições e relações de trabalho, da precarização dos vínculos
profissionais, da imposição de normas e procedimentos ambíguos ou que ferem os
direitos dos trabalhadores.
O assédio moral coletivo, nesse sentido, se caracteriza através do uso incorreto
do poder diretivo do empregador, quando este utiliza de forma abusiva “o poder
subjetivo de organizar, regulamentar, fiscalizar a produção e punir os empregados”
(MUÇOUÇAH, 2014, p. 196), geralmente com o objetivo de aumentar a produtividade,
e disfarçada ou legitimada como política de gestão.
14
Em ambos os sentidos, o trabalhador, vítima do assédio moral, pode encontrar
apoio nas suas respectivas entidades sindicais, tendo em vista que um sindicato é a
instituição, legal e legítima que visa defender e proteger os direitos dos trabalhadores
(QUEIROZ, 2013).
O Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos –
DIEESE publicou recentemente, em seu site, um estudo sobre o conteúdo das
cláusulas negociadas em acordos e convenções coletivas que abordam o tema saúde
do trabalhador. Nessa pesquisa, são apresentadas algumas cláusulas que abordam
diretamente o tema assédio moral, tanto no aspecto individual quanto coletivo,
demonstrando que os sindicatos, mesmo que timidamente, já estão participando nas
discussões sobre os conflitos gerados pela situação do assédio (DIEESE, 2015).
Dessa forma, criam-se expectativas para novas alternativas de acolhimento e
amparo para os que estão sofrendo o assédio moral no trabalho, uma vez que, alguns
sindicatos têm buscado intervir de maneira propositiva nas negociações em prol das
relações de trabalho sadias.
1.2 PROBLEMÁTICA E QUESTÃO DE PESQUISA
Uma análise preliminar da literatura sobre o tema, permite observar que existe
um significativo volume de produções acerca do assédio moral, principalmente
relacionados aos conceitos, às características, e às consequências para a saúde do
trabalhador e para os envolvidos. Percebe-se, também, um número crescente de
produções acerca do assédio moral como parte de um sistema maior, que se
estabelece a partir do sistema socioeconômico vigente e de determinadas formas de
organização e de modelos de gestão. Por outro lado, é escassa a literatura acerca do
papel ou da participação dos sindicatos nessas discussões (FISTAROL, 2014).
Os estudos sobre a saúde mental do trabalhador vêm demonstrando uma
realidade preocupante, com o crescente número de adoecimentos decorrentes da
atividade laboral. Seligmann-Silva et al. (2010) colocam que, a partir de 2007, com o
estabelecimento do nexo causal entre adoecimento e trabalho como critério
epidemiológico pelo INSS, o número de benefícios acidentários decorrentes de
transtornos mentais e comportamentais aumentou mais de 1000 por cento, sendo a
15
depressão um dos principais motivos de notificação.
Da sua prática no Ambulatório de Doenças do Trabalho no Hospital das Clínicas
de Porto Alegre, Merlo (2014) conta que até o ano de 2010 as demandas atendidas
por este serviço eram principalmente relacionadas às Lesões por Esforços Repetitivos
e aos Distúrbios Osteomusculares Relacionados ao Trabalho e que, a partir de então,
as demandas relacionadas a saúde mental cresceram significativamente, exigindo da
equipe “mudar o olhar, quando se trata de buscar identificar o sofrimento psíquico
produzido pelo trabalho” (MERLO, 2014, p. 25).
Esse contexto propiciou o interesse pela análise qualitativa das causas de
adoecimento dos trabalhadores e potencializou as pesquisas sobre o assédio moral
no trabalho. Soboll (2008) ressalta que os estudos de Margarida Barreto são
referenciais para o entendimento do tema e que sua participação junto ao sindicato
promoveu a disseminação do tema entre os trabalhadores e sociedade em geral.
Segundo a referida autora, “é necessário reconhecer que os debates, as
pesquisa e ações sobre o assédio moral no Brasil se desenvolveram a partir de um
ritmo definido pelo movimento sindical” (SOBOLL, 2008, p. 29), reforçando a relação
das ações sindicais e as contribuições de Margarida Barreto.
Na pesquisa de Garbin (2009), sobre a representação do assédio na mídia
impressa, a autora apresenta uma agenda de reivindicações sindicais, em que está
presente a temática do assédio moral, e relata ter encontrado numerosa produção a
respeito do tema por parte dos sindicatos através de seus meios de comunicação. A
autora recomenda que estudos sobre a perspectiva dos sindicatos em relação ao
assédio moral no trabalho podem contribuir para uma melhor compreensão do
fenômeno.
Por outro lado, o estudo de Fistarol (2014), que aborda o entendimento de
assédio moral na perspectiva dos sindicatos patronais e dos sindicatos dos
trabalhadores, aponta para o conhecimento limitado dos quatro dirigentes sindicais
entrevistados acerca do assunto. Os sindicatos, como entidades que objetivam
defender os direitos dos seus associados, devem estar cônscios dos problemas que
a prática do assédio moral provoca nos indivíduos, nas organizações e na sociedade,
para poder ofertar o amparo necessário as vítimas e a prevenção de todas as formas
de assédio.
Perez (2014) fala da crise do sindicalismo, sinalizada na diminuição de greves
e manifestações, na redução da taxa de filiações e associações, da pulverização de
16
entidades sindicais e do enfraquecimento dos coletivos de trabalho. Em concordância
com essa realidade, Rodrigues (2009) menciona que, diante essa difícil situação, os
sindicatos têm se limitado a evitar perdas de direitos conquistados, não investindo em
novas reinvindicações.
Diante do exposto, percebe-se que a popularização dos conhecimentos acerca
do assédio moral no trabalho decorreu de inúmeras pesquisas e das ações do
movimento sindical, mas é um assunto que ainda carece de investigação, sobretudo
em relação ao posicionamento dos sindicatos acerca do tema.
Assim, mesmo havendo abrangente literatura sobre o tema, inclusive com
abordagens multidisciplinares, o cenário socioeconômico e organizacional, os modos
de organização da produção e as relações de trabalho cada dia mais complexas,
sugerem a necessidade de um estudo que aborde o entendimento dos sindicatos,
tanto os dos trabalhadores, quanto os patronais, bem como suas ações, em relação
aos casos de assédio moral dos quais têm algum tipo de participação.
A escassez de literatura sobre assédio moral no trabalho e a relação dos
sindicatos nesse fenômeno, aponta para uma lacuna do conhecimento que merece
ser abordada para ampliar o entendimento do assunto de forma holística e produzir
novas condutas para o enfrentamento desse problema organizacional e social.
Nesse contexto, que demonstra necessidade de mais estudos, estabeleceu-se
a seguinte questão de pesquisa: como o Assédio Moral no Trabalho é percebido
por representantes de sindicatos dos trabalhadores e sindicatos patronais?1
1.3 OBJETIVOS
1.3.1 Geral
Compreender o assédio moral no trabalho sob a perspectiva de representantes
dos sindicatos dos trabalhadores e patronais.
1 Para este estudo, serão considerados como representantes das entidades sindicais, os dirigentes sindicais, que
estejam em exercício de suas funções, conforme organizado pelo seu respectivo estatuto (Presidente, Vice-
presidente, Secretário, Tesoureiro, Diretores, etc)
17
1.3.2 Específicos
Identificar perspectivas sobre o assédio moral individual;
Identificar perspectivas sobre assédio moral coletivo;
Descrever o papel dos sindicatos em relação ao assédio moral no
trabalho;
Verificar implicações práticas dos sindicatos nas questões relativas ao
assédio moral no trabalho.
1.4 JUSTIFICATIVA
É comum encontrar definições que consideram o assédio moral como resultado
de fatores pessoais, como a personalidade do agressor ou da vítima, atribuindo à
ocorrência do assédio às características individuais. Ou seja, fatores como
insegurança, inveja, baixa autoestima, seriam os motivos para que o assédio se
instale nas relações interpessoais no trabalho. Assim, associam a prática do assédio
moral às relações pessoais, aos afetos e desafetos existentes no ambiente do
trabalho, à subjetividade dos indivíduos (LIMA; LIMA; VIEIRA, 2012).
No entanto, nos últimos anos, novas abordagens ao tema têm aquecido o
debate sobre os fatores que ocasionam o assédio moral. Nesse percurso, percebe-se
uma tendência em retirar do indivíduo, ou da personalidade do indivíduo, a “culpa”
pelo assédio moral e deslocar a responsabilidade para um contexto mais amplo, que
é nos modelos de produção e organização do trabalho (BARRETO; FREITAS;
HELOANI, 2008; MUÇOUÇAH, 2014).
São inúmeras as situações de assédio moral individual descritas na literatura,
onde uma vítima é “escolhida”, geralmente por seu superior hierárquico, para ser
humilhada, segregada, ridicularizada, devido a alguma característica pessoal que o
incomode ou ameace seu poder e status. Por outro lado, os modos de produção do
trabalho, a divisão de tarefas, o poder diretivo do empregador, os modelos de gestão,
estão sendo vistos como propagadores do assédio moral na medida que estabelecem
práticas que visam subjugar os trabalhadores das mais variadas e perversas formas
(LIMA; LIMA; VIEIRA, 2012).
Soboll (2008) coloca que analisar o assédio de forma isolada, vinculada ao
18
indivíduo e deslocada do sistema de gestão, personifica a violência e oculta o impacto
do sistema produtivo na saúde das pessoas. Ressalta, ainda, que até mesmo os
sindicatos têm dificuldade de entender o fenômeno dessa forma, o que resulta na
inabilidade de atuar juntos aos processos organizacionais que produzem a violência.
De fato, há escassez de produções científicas que estabelecem claramente a
relação dos sindicatos na situação do assédio moral. De um modo geral, observa-se
que na literatura o principal enfoque é a situação do assédio moral no trabalho e suas
consequências, enfatizando o binômio algoz-vítima. Embora em alguns estudos se
enfatize que o movimento sindical contribuiu para a disseminação do tema, como por
exemplo Sobbol (2008) e Garbin (2009), não está evidente de que forma ocorreu essa
relação.
Na literatura sobre sindicatos e movimento sindical é muito raro encontrar
alguma relação entre a prática dos sindicatos e o tema assédio moral no trabalho.
Alguns sindicatos disponibilizam cartilhas e outros materiais informativos, mas pouco
se produz em termos de conhecimento científico revelando o grande distanciamento
dos sindicatos em relação às produções científicas.
O estudo de Fistarol (2014) expõe a desinformação das entidades sindicais
quanto ao tema, e traz à tona a emergência de estudos mais amplos sobre o
entendimento dos sindicatos. Da mesma forma, Barreto e Heloani (2014) colocam que
compreender o assédio moral é um dos desafios dos sindicatos, e que estes urgem
de esclarecimentos acerca do assunto.
Academicamente, este estudo contribui para ampliar as perspectivas sobre o
fenômeno tendo em vista que o entendimento dos sindicatos pode contribuir para o
surgimento de novos arranjos teóricos e práticos no desenvolvimento de condições e
relações mais salutares de trabalho. Para Lima, Lima e Vieira (2012) o assédio moral
deve ser analisado levando em consideração todos os contextos no qual está inserido,
seja econômico, político, organizacional, social e, portanto, também o sindical. No
mesmo sentido, Garbin (2009) sugere que estudos sobre a perspectiva sindical acerca
do assédio moral são convenientes para a compreensão do fenômeno de forma mais
abrangente. Fabro e Maehler (2015) também defendem que a parceria entre
sindicatos, estudiosos e especialistas podem ajudar na amplitude e disseminação dos
conhecimentos acerca do assédio moral no trabalho.
A aplicação dos conhecimentos advindos desta pesquisa pode auxiliar na
determinação de diferentes práticas de prevenção do assédio moral nos ambientes
19
de trabalho, evitando o sofrimento e os possíveis prejuízos para todos os envolvidos,
indivíduo, organização e sociedade. As ações dos sindicatos para a prevenção do
assédio moral podem ser potencializadas se as boas práticas identificadas puderem
ser compartilhadas. Dessa forma, os saberes e fazeres das entidades sindicais em
relação ao assédio moral, podem contribuir para condições mais dignas de trabalho,
através da inserção do tema nos debates com a categoria, nas pautas de
reivindicações e nas negociações coletivas.
Para a autora, o estudo do tema contribuirá para a atuação profissional como
gestora de pessoas e como membro de diretoria de sindicato. Além disso, contribui
para a aproximação da Academia e seus estudos científicos com a atuação prática
dos sindicatos.
1.5 ESTRUTURA DO TRABALHO
Primeiramente, é apresentado o contexto onde está inserido o fenômeno que
foi pesquisado, bem como a problemática e questão de pesquisa desenvolvidas a
partir dessa conjuntura. Os objetivos da pesquisa e sua justificativa são apresentados
em seguida.
No segundo capítulo é exposto o referencial teórico adotado para este estudo,
e versa sobre as relações de trabalho contemporâneas, sobre o assédio moral no
trabalho na forma individual e coletiva, e sobre o papel dos sindicatos na luta por
melhores condições de trabalho.
O terceiro capítulo apresenta os procedimentos metodológicos empregados
nesta pesquisa, delimitando as técnicas e os processos de trabalho para garantir que
os objetivos do estudo fossem alcançados.
No quarto capítulo são apresentados a análise e discussão dos resultados,
estabelecendo relações entre os dados encontrados e o referencial teórico adotado.
Por fim, são discorridas as considerações finais e exibidas as referências e os anexos.
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2. REFERENCIAL TEÓRICO
Visando a esclarecer os conceitos que embasam o presente estudo, são
expostos, a seguir, o referencial teórico adotado quanto ao assédio moral no trabalho,
bem como sobre o assédio moral coletivo. Apresentam-se, ainda, alguns aspectos
relacionados aos sindicatos dos trabalhadores e patronais frente ao fenômeno do
assédio moral no trabalho. Contudo, para contextualizar a discussão sobre o assédio
moral no trabalho, serão expressas inicialmente, algumas considerações sobre as
relações de trabalho contemporâneas.
2.1 RELAÇÕES DE TRABALHO CONTEMPORÂNEAS
Ao longo das últimas décadas, inúmeras transformações políticas, econômicas
e sociais promoveram mudanças significativas nos modos de organização do trabalho.
A implantação de novos modelos de gerenciamento da produção, como por exemplo,
o taylorismo e o fordismo, estabeleceu novas formas de controle da produção e do
tempo, intensificando os ritmos de trabalho e ampliando a exploração da mão de obra
em benefício do aumento da produtividade e do lucro.
A reestruturação produtiva promovida pelo modelo neoliberal e determinada
pela produtividade e lucratividade, instituiu novas práticas de exploração do trabalho,
com base na flexibilização das relações de trabalho, nos modelos gerenciais e
salariais baseados em metas e resultados, além da expansão no uso de mão de obra
terceirizada (ANTUNES; PRAUN, 2015).
De acordo com Antunes e Praun (2015, p. 411), as “práticas pautadas pela
multifuncionalidade, polivalência, times de trabalho interdependentes, além da
submissão a uma série de mecanismo de gestão pautados na pressão psicológica”,
com o objetivo de aumentar o acúmulo de capital, respondem às demandas
decorrentes da implantação de novas tecnologias e de novos processos de trabalho,
como por exemplo, os programas de qualidade total e os sistemas de ganhos
vinculados a metas de produtividade.
Na medida em que a exploração da força de trabalho, justificada pela
necessidade de crescimento econômico, foi sendo intensificada e ampliada pela
aceleração dos ritmos de produção e pelo modo de organização do trabalho, as
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condições e relações laborais foram sendo empobrecidas e a precarização do trabalho
gradualmente agravada (ALVES, 2009).
Para Antunes e Praun (2015) os principais aspectos que permeiam os conflitos
de interesses entre empregadores e classe trabalhadora, são a flexibilização das
relações de trabalho, a utilização de políticas gerenciais para aumentar o desempenho
e o fenômeno da terceirização com suas características trabalhistas específicas.
A flexibilização do trabalho permitiu a utilização de diferentes formas de
contratação da força de trabalho, legitimadas pela legislação trabalhista, como por
exemplo, o uso de banco de horas e a vinculação do salário às comissões. Com o
banco de horas, pode-se prolongar as jornadas de trabalho diárias, conforme a
necessidade da produção. Embora tenha um lado positivo para o trabalhador que
poderá gozar de uma folga posteriormente, a médio e longo prazo pode ser
extenuante para os trabalhadores e afetar o equilíbrio da vida pessoal e profissional.
No mesmo sentido, a vinculação do salário às metas de produtividade e lucros,
incentiva a intensificação dos ritmos de trabalho (ANTUNES; PRAUN, 2015).
Rossi e Gerab (2009) colocam que a flexibilização é intrínseca a globalização
neoliberal e se caracteriza pela adequação ou extinção de toda e qualquer legislação
que obstaculize o capital de aumentar sua capacidade de exploração e espoliação
dos recursos (humanos e naturais). Os autores destacam algumas modificações nas
relações de trabalho que revelam os impactos da flexibilização na precarização do
trabalho, através do afrouxamento das leis e regras na contratação do trabalho, que
incidem na definição do tempo de trabalho (banco de horas, horistas, tempo parcial,
contrato temporário, entre outros), na forma de determinar a remuneração (comissões,
participação nos lucros, vinculada a produtividade individual ou do grupo) e na
possibilidade de terceirização de serviços cujos vínculos e proteção trabalhista são
mais frágeis.
A terceirização é um fenômeno cada vez mais presente nas organizações.
Visando a redução de custos e o aumento da competitividade empresarial, as
instituições, contratam outras empresas para que estas lhe forneçam os trabalhadores
necessários, sem, no entanto, constituírem vínculo empregatício com os mesmos. Os
trabalhadores terceirizados, estão expostos a relações de trabalho ambíguas, pois
devem corresponder às exigências de duas empresas distintas, e em alguns casos,
com normas e valores contraditórios. Como coloca Muçouçah (2014, p. 204),
22
Num mesmo espaço, e por vezes executando tarefas bastante similares, o desnível salarial, a insegurança, a separação física entre o empregado e o trabalhador terceirizado podem causar constrangimentos a ambos, que se perdem na confusão instaurada nessa relação jurídica-base, que é o fato de prestar serviços a um mesmo empregador.
Dessa forma, a flexibilidade das relações de trabalho amplia o processo de
terceirização, que por sua vez, aumenta a fragmentação da classe trabalhadora, tendo
em vista que viabiliza diferentes modalidades de contrato de trabalho e os converte
em relações interempresariais (ANTUNES; PRAUN, 2015). O sentimento de
coletividade e solidariedade entre os trabalhadores, perde-se na relação de trabalho
terceirizado, contribuindo para a fragmentação dos trabalhadores e na consequente
desmobilização dos mesmos como coletivo.
A outra questão sobre as relações de trabalho contemporâneas, comentada por
Antunes e Praun (2015), diz respeito às políticas de gerenciamento, pautadas na
obtenção da produtividade máxima e no alto controle operacional e fundamentadas
na lógica econômica e de avaliação de resultados. Dentre tantos modelos gerenciais,
a gestão por metas se encaixa perfeitamente nos moldes do capitalismo, pois
apresenta diversas vantagens estratégicas (para os empregadores).
Em termos financeiros, permite a fixação de um salário base (geralmente baixo)
e a estipulação de ganhos conforme o alcance das metas estabelecidas,
condicionando os trabalhadores a produzir mais intensamente para garantir um salário
melhor. A gestão por metas reúne ainda, três estratégias de controle, através da
capacidade de direcionar as tarefas para os objetivos da organização, de servir como
instrumento de avaliação do desempenho dos trabalhadores e de permitir o uso de
premiações pelo atingimento das metas, e o seu inverso cruel, punições para os que
não conseguem alcançá-las (ANTUNES; PRAUN, 2015).
Assim, a gestão por metas se configura como um modelo adverso de controle
e coerção, dissimulado pelas suas nuances propositivas de motivação e incentivo à
superação de todos os limites. Conforme as metas são definidas, todo os esforços
serão no sentido de alcança-las, ou seja, o trabalho passa a mover-se em torno do
seu cumprimento.
Para Antunes e Praun (2015), esse modelo de gestão tem um efeito
disciplinador, pois muitas vezes os trabalhadores são envolvidos na definição das
metas, criando um falso engajamento pela ilusão da participação nas decisões. Além
23
disso, a gestão por metas promove a competitividade entre os trabalhadores, o que
muitas vezes colabora no controle do absenteísmo, pois desestimula o coleguismo e
a colaboração entre os pares, fazendo com que os próprios colegas de trabalho
controlem/cobrem pela produtividade. Por fim, vale salientar que a gestão por metas
diminui o tempo de repouso do trabalhador, dado que ele deverá trabalhar o tempo e
no ritmo necessário para que as metas sejam atingidas.
A gestão por metas, embora apresentada como um modelo de gerenciamento
que promove a meritocracia, estimulando e premiando aqueles que produzem mais,
nada mais é do que um mecanismo para aumentar a produtividade através de um
discurso que preconiza a colaboração dos trabalhadores, mas só incentiva a
competitividade e a individualização.
Martiningo Filho e Siqueira (2008) salientam que pautar as avaliações pelo
volume de produção individual pode elevar a competição interna entre os
trabalhadores, e por outro lado, avaliar o desempenho pela produção de um grupo ou
equipe pode gerar pressões e situações assediadoras por parte dos próprios colegas.
Ou seja, de uma forma ou de outra, a gestão por metas ou resultados não favorece o
coleguismo e a solidariedade no ambiente de trabalho.
Dessa forma, a flexibilização das relações de trabalho, o fenômeno da
terceirização e os modelos de gestão baseados em resultados quantitativos,
desenham o cenário atual da vida laboral. Para Antunes (2014), a intensificação e
racionalização das atividades laborais servem à exploração do trabalho e resultam em
diversos impactos na vida dos trabalhadores. O autor coloca que, “A articulação
complexa existente entre financeirização da economia, neoliberalismo, restruturação
produtiva e as mutações no espaço microscópico do trabalho e da empresa não
poderiam deixar de afetar profundamente a classe trabalhadora. ” (ANTUNES, 2014,
p. 41)
Como resultado dessa conjuntura, que combina antigas e novas formas de
exploração da mão de obra, os trabalhadores encontram-se mais fragilizados pela
diminuição da proteção trabalhista, e em termos físicos e emocionais, pela exaustão
provocada pelo ritmo acelerado de trabalho e pelo processo de individualização
decorrente da competitividade exacerbada.
Barreto e Heloani (2014, p. 59) colocam que os novos modelos de gestão e
políticas de gerenciamento de recursos humanos se apresentam como modernos e
sutis “instrumentos de docilização e disciplinamento dos corpos produtivos” cuja lógica
24
se assenta na produtividade máxima e na submissão dos trabalhadores aos valores
da organização.
O próprio sentido do trabalho encontra-se afetado na medida que a
subjetividade da classe trabalhadora é crescentemente desmantelada. O
distanciamento do trabalhador em relação ao produto de seu trabalho, a rotinização
das atividades, o ritmo acelerado que impede de estabelecer relações afetivas com
os colegas, interferem no significado atribuído ao trabalho, na constituição de uma
consciência de classe e na “consciência de constituir-se como um ser que vive do
trabalho” (LARA, 2011, p. 82).
Observa-se que nesse contexto laboral, os trabalhadores são tratados como
mercadorias que devem seguir os moldes da empresa e mais amplamente, do sistema
socioeconômico. Mercadorias essas que tem valor decrescente, na medida que
adoecem, envelhecem ou questionam qualquer aspecto do trabalho (BARRETO;
HELOANI, 2014).
A desigualdade de forças existentes entre o patronato e os trabalhadores,
vulnerabiliza as relações trabalhistas e contribui para a precarização do trabalho. O
modo de organização do trabalho e seus modelos gerenciais que priorizam
unicamente o aumento da produção e o acúmulo de capital produzem o padecimento
da classe trabalhadora na medida que propiciam situações assediadoras e
moralmente degradantes.
2.2 ASSÉDIO MORAL NO TRABALHO
Vivencia-se hoje um contexto de constantes mudanças e de crescentes
exigências no mundo do trabalho. O sistema socioeconômico vigente imprime sua
marca nos modos de organização da produção, nos modelos de gerenciamento e nas
relações de trabalho. Superexploração da mão-de-obra, hiperexigências de
qualificação e competências, múltiplas responsabilidades e funções, concorrência
acirrada, condições de trabalho inadequadas e/ou insalubres são algumas das
características desse cenário laboral (RIZVI, 2008).
Embora seja um fenômeno antigo, somente nas últimas décadas surgiram
estudos sistemáticos acerca do assédio moral no trabalho. Esses estudos
25
estabeleceram uma relação multicausal entre o assédio e a saúde mental dos
trabalhadores, apontando as possíveis causas e consequências, e buscando delimitar
seu conceito e características (SOBOLL, 2008).
A partir de então, afloraram pesquisas e debates em busca de delinear o
fenômeno do assédio moral no trabalho, tecendo conceitos, características, critérios
e impactos na saúde dos trabalhadores. Nesse sentido, Rizvi (2008) chama a atenção
para a importância de compreender o fenômeno em todas suas dimensões, histórica,
cultural, política, psicológica e afetiva, incentivando a investigação do assédio moral
sob diversas perspectivas.
2.2.1 Características do assédio moral no trabalho
Na literatura dos últimos anos sobre o assunto, a maioria dos autores apontam
as pesquisas de Marie-France Hirigoyen, principalmente sua obra Mal-Estar no
Trabalho: Redefinindo o Assédio Moral, como a responsável pela popularização do
termo no mundo. Para a autora, assédio moral no trabalho é “qualquer conduta
abusiva (gesto, palavra, comportamento, atitude) que atente, por sua repetição ou
sistematização, contra a dignidade ou integridade psíquica ou física de uma pessoa,
ameaçando seu emprego ou degradando o clima de trabalho” (HIRIGOYEN, 2006, p.
17).
No Brasil, pode-se citar Margarida Barreto (2009) como uma das precursoras no
estudo do assédio moral no trabalho, tanto na atuação como pesquisadora e médica
do trabalho como na sua atuação no movimento sindical. De acordo com a autora, o
assédio moral pode ser definido como um “conjunto de procedimentos,
comportamentos e atitudes que ameaçam, desqualificam e constrangem o outro, de
forma repetitiva, sistemática” e acrescenta que essas práticas corrompem o caráter e
degradam as relações interpessoais (BARRETO, 2009, p. 8).
Barreto, Freitas e Heloani (2008, p.37) colocam que o objetivo do assédio moral
é “diminuir, humilhar, vexar, constranger, desqualificar e demolir psiquicamente um
indivíduo”, demonstrando consonância ao pensamento de Hirigoyen (2006) e
exemplificando as possíveis condutas abusivas que caracterizam a prática do assédio
moral no trabalho.
Na mesma linha de raciocínio, Soares (2006, p. 41) apresenta sua definição
26
para o fenômeno, afirmando que
[...] refere-se a um conjunto de ações violentas (de natureza psicológica e/ou física) infligidas, de maneira frequente, por um ou mais trabalhadores contra um outro trabalhador, com o objetivo de isolá-lo, desestabilizá-lo e/ou difamá-lo e, por fim, excluí-lo do contexto do trabalho, podendo lhe causar consideráveis danos de natureza física, cognitiva e/ou social.
Observa-se que nos conceitos apresentados existe uma forte similaridade de
entendimentos sobre o assunto. Soboll (2008) destaca quatro características das
condutas abusivas que podem ser entendidas como situações de assédio moral no
trabalho. A primeira característica é a habitualidade, ou seja, o assédio deve ocorrer
de forma repetitiva, processual. Uma situação de hostilidade eventual não pode ser
considerada como assédio. A segunda característica trata da pessoalidade,
considerando que o assédio é direcionado a uma pessoa específica, e não de forma
generalizada. A terceira característica diz respeito ao local do assédio, que deve
ocorrer no ambiente de trabalho, durante o exercício da atividade laboral. E a quarta,
a intencionalidade, destaca que o objetivo do assédio é prejudicar outrem, de forma
que comprometa sua atuação profissional e sua saúde mental no ambiente laboral.
Em sentido semelhante, Barreto, Freitas e Heloani (2008) consideram alguns
elementos como característicos do assédio moral no trabalho, como a temporalidade,
a intencionalidade, a direcionalidade, a repetitividade e habitualidade, os limites
geográficos ou territorialidade, e a degradação deliberada das condições de trabalho.
Em relação à primeira característica citada anteriormente, a habitualidade,
observa-se na literatura sobre o assunto, um consenso em considera-la como um dos
fatores determinantes na caracterização do assédio moral. Por outro lado, não há
consenso em relação à frequência e a duração. Para alguns autores a conduta
abusiva deve ocorrer diariamente e persistir por um mínimo de seis meses. Para
outros, uma ou duas vezes por semana, mas durante o mínimo de um ano (OLIVEIRA;
SOARES, 2012).
Chirilã e Constantin (2013) chamam a atenção para alguns aspectos
frequentemente utilizados para caracterizar o assédio moral no trabalho, como a
frequência, a intencionalidade e a vulnerabilidade prática (relacionadas as
características físicas e cognitivas) e subjetiva da vítima.
Importante destacar que o processo de assédio moral no trabalho inclui o
27
elemento da subjetividade do assediado, em termos de como ele sente e percebe
esses atos e seus efeitos (MACIEL et al., 2007). Nesse sentido, as diferenças
individuais e a personalidade afetam a percepção do assédio, considerando que
pessoas apresentam níveis diferentes de sensibilidade, em diferentes momentos.
Glina e Soboll (2012) colocam que a subjetividade da vítima pode fazê-la sentir-
se assediada, sem que o agressor tenha intenção de prejudica-la de fato. Dessa
forma, questionam a intencionalidade como um dos fatores característicos do assédio
moral, uma vez que é difícil mensurar a percepção da conduta abusiva. Hirigoyen
(2006) também coloca a dificuldade de definir se há ou não a intencionalidade da
agressão, uma vez que seria necessário conhecer o nível de consciência que o
agressor tem de seus atos.
A despeito de entendimentos divergentes em alguns sentidos, os autores
concordam na necessidade de determinar características para a que o assédio seja
definido e delineado de forma correta, evitando um superdimensionamento de
situações conflituosas cotidianas, interpretações dúbias, generalizações, e a
banalização do fenômeno (OLIVEIRA; SOARES, 2012).
De acordo com Garbin (2009), os casos de assédio moral estão cada vez mais
presentes nas mídias, denunciando práticas abusivas e degradantes, que ferem a
dignidade dos trabalhadores. Diante de inúmeros casos de assédio moral, o assunto
saiu do ambiente estritamente acadêmico e se popularizou entre os meios de
comunicação de massa. Além de jornais de grande circulação, a autora também
encontrou material acerca do assédio moral nos meios de comunicação das entidades
sindicais (sites, folhetos, campanhas, entre outros).
Sob esse aspecto, Freitas e Rodrigues (2014) salientam o cuidado necessário
para que a grande exposição do assunto não produza a generalização ou vulgarização
do conceito, de forma que qualquer exigência mais pontual, ou uma pressão maior
por resultados em determinado contexto, não seja visto como assédio moral. Sugerem
que a diferença entre o assédio moral e outros conflitos relacionados ao trabalho é
que no assédio moral “os comportamentos são antiéticos, as regras não são claras,
há parcialidade nos julgamentos e avaliações”, além de comunicação pobre e
dissimulação dos conflitos (FREITAS; RODRIGUES, 2014, p. 287).
Soboll (2008) comenta algumas situações que não são consideradas assédio
moral, mas comumente confundidas, por estarem intimamente relacionadas. Na
gestão por estresse, por exemplo, trabalha-se com altos níveis de pressão e
28
exigências, mas não há a intenção de prejudicar ninguém em particular. Da mesma
forma, quando a incompetência em gerenciar as pessoas, provoca comportamentos
autoritários e manipulativos, não se pode falar em assédio, uma vez que os
comportamentos hostis derivam do despreparo, da inexperiência e da insegurança da
gestão.
Sobre esse aspecto, Hirigoyen (2006) pontua que a gestão por estresse pode
trazer danos à saúde quando o estresse é apresentado em demasia, mas que o
assédio moral é devastador por si só, independente de quantificação.
Ao pesquisar sobre a pessoalidade do assédio moral no trabalho, ou seja, à
quem a agressão está direcionada, observa-se que esta ocorre geralmente em duas
direções. Verticalmente, quando o agressor é superior na hierarquia organizacional,
fazendo uso de seu poder para abusar de seu subordinado. Pode ocorrer no sentido
contrário, a agressão de um subordinado para com seu superior, embora seja uma
situação pouco relatada. Horizontalmente, quando a agressão parte dos próprios
colegas de trabalho. Geralmente, por motivos preconceituosos, ou por omissão e
negligência quando presenciam o assédio de outro colega (SOBOLL, 2008).
Nessa perspectiva, Garbin (2009) caracteriza o assédio moral no trabalho como
multilateral, uma vez que mesmo no caso do assédio vertical, se houver a omissão
dos colegas, ele será também horizontal.
2.2.2 Métodos de assédio moral no trabalho
De acordo com Hirigoyen (2006) o assédio moral no trabalho se apresenta
através de atitudes hostis que se manifestam através da deteriorização proposital das
condições de trabalho, do isolamento e da recusa de comunicação entre algoz(es) e
vítima, do atentado contra a dignidade do trabalhador e ainda, de violência verbal,
física ou sexual.
Garbin (2009) corrobora com a autora, salientando que os métodos de assédio
moral no trabalho são exteriorizados quando alguma ou várias das possíveis
manifestações acima estão presentes na realidade laboral do trabalhador.
Para Barreto, Freitas e Heloani (2008) na deteriorização das condições de
trabalho, o agressor costuma retirar a autonomia do trabalhador, privá-lo do acesso
aos instrumentos de trabalho, atribuir tarefas muito inferiores ou muito superiores às
29
suas competências. Quando o agressor se utiliza do isolamento ou da recusa de
comunicação, o assediado é colocado separado dos outros colegas e proibido de
manter contato com qualquer pessoa. A comunicação é mínima e de maneira formal,
geralmente por escrito. No momento em que o agressor utiliza insinuações
desdenhosas para qualificar a vítima, espalha rumores, zomba de suas
características, critica suas opiniões e posicionamentos está atentando contra sua
dignidade. E nas situações de violência, a vítima pode sofrer ameaças de diferentes
naturezas, como xingamentos, gestos ou convites sexuais, ter sua privacidade
invadida, um castigo, um empurrão.
Maciel et al. (2007) citam que as condutas abusivas podem ser de quatro tipos:
I. ataques à tarefa – retenção de informações essenciais, exigências superiores à
competência ou capacidade, atividades sem importância, controle exagerado; II.
ataques pessoais – críticas, humilhações, constrangimentos, depreciações, públicas
ou veladas; III. isolamento – falta de diálogo, comunicação ambígua ou inexistente,
segregação, ostracismo; IV. ataques verbais – gritos, ofensas, desmoralizações,
ameaças físicas.
São inúmeros os exemplos de assédio moral no trabalho. Ferreira (2008)
retrata situações que considera como representações das condutas abusivas
geralmente relatadas nas pesquisas sobre o assunto. São elas:
[...] isolamento e incomunicabilidade física; proibição de conversar com os companheiros de trabalho; exclusão de atividades sociais da empresa; comentários maliciosos e desrespeitosos; atitudes e referências maldosas sobre aspectos físicos, caráter, costumes, crenças, condutas, família e outros; responsabilização por erros de outras pessoas; transmissão de informações erradas e ocultação de informações para prejudicar o desempenho profissional; divulgação de rumores sobre a vida privada; designação de tarefas pouco importantes, degradantes ou impossíveis de serem cumpridas; mudança arbitrária de horário do turno de trabalho; manipulação de material de trabalho, como apagar arquivos do computador; [...] (FERREIRA, 2008, p. 113)
Lima, Lima e Vieira (2012) relatam o caso de um vigilante, de uma empresa
terceirizada que executava seu serviço em uma agência bancária. Com a implantação
de novas normas de segurança, o seu trabalho era o de cumprir e fazer cumprir as
referidas regras. Os funcionários do banco não se agradaram das novas normas e
direcionaram sua insatisfação ao vigilante, debochando e humilhando-o pelas
30
exigências que tinha que fazer para o cumprimento de seu trabalho.
Um outro caso é apresentado por Rizvi (2008), onde a vítima, que sempre
apresentou um bom desempenho profissional, começou a ser perseguida pela sua
gerente, após um episódio onde ela se recusou a assinar um documento falso. A partir
desse fato, ela passou a receber uma quantidade inexequível de tarefas, o que a
obrigava a trabalhar após o horário do expediente e nos finais de semana. A gerente,
propositalmente avaliava mal seus trabalhos, pedido que fosse refeito diversas vezes,
e não apontava o que precisava ser melhorado. Em seguida, a gerente começou a
disseminar entre os outros colegas que a vítima era descomprometida, que não
apresentava bons resultados, que não cumpria prazos, fazendo com que os colegas
se afastassem dela, afetando sua capacidade laboral, sua saúde mental e
aumentando seu sofrimento.
2.2.3 Consequências do assédio moral no trabalho
O assédio moral no trabalho provoca nas vítimas as mais diferentes reações e
produzem os mais diversos tipos de sofrimento que se materializam através de
sintomas e doenças físicas e mentais. Mesmo diante de sintomas expressivos, muitos
trabalhadores têm dificuldade de relacionar seu sofrimento ao comportamento abusivo
que está suportando, devido à natureza sutil do assédio moral (DZUREC; BROMLEY,
2012).
Hirigoyen (2006) cita o estresse, a ansiedade, a depressão e os distúrbios
psicossomáticos como consequências mais gerais do assédio moral e acrescenta que
os efeitos mais específicos são a vergonha e a humilhação, que por sua vez acarretam
na perda do sentido pelo trabalho e produzem modificações de ordem psíquica nos
trabalhadores afetados.
De forma semelhante, Maciel et al. (2007) coloca a ansiedade, a baixa
autoestima, a sociofobia, a depressão e as doenças psicossomáticas como possíveis
distúrbios provocados pelo assédio moral no trabalho. Cahú et al. (2011) acrescenta
outras possíveis consequências, como a angústia, acometimentos digestivos,
respiratórios, das articulações, do cérebro, do coração e do sistema imunológico.
Além das consequências citadas anteriormente, pode-se elencar outros efeitos
deletérios do assédio moral no trabalho na saúde do trabalhador, como a redução do
31
bem-estar, risco de problemas psicológicos, danos cognitivos, redução da
autoconfiança, redução da satisfação, medo e desconfiança, aumento da irritabilidade,
isolamento, alcoolismo (SOARES, 2006).
Esses efeitos não se apresentam da mesma forma ou com a mesma
intensidade nas vítimas de assédio. Geralmente os sintomas começam sutis e
silenciosos e vão gradualmente se intensificando. Na fase inicial, a autoestima do
indivíduo é afetada, gerando sentimentos de menos valia, de culpa, de vergonha, de
mágoa e raiva. É a fase do mal-estar (BARRETO; FREITAS; HELOANI, 2008). Se o
assédio permanece, a autoconfiança do indivíduo enfraquece, ocorre uma
desestabilização afetiva e o surgimento de pensamentos recorrentes e repetitivos. O
indivíduo se sente perseguido, injustiçado, desvalorizado e desconfiado e então
começam a aparecer os primeiros sintomas, o cansaço, o isolamento, a apatia, as
dores de cabeça, distúrbios digestivos. Se nada for feito, e o assédio continua a
ocorrer, pode levar o indivíduo a desenvolver a depressão, a síndrome do pânico, o
alcoolismo, e até a vontade de morrer.
Lima, Lima e Vieira (2012), colocam que a exposição frequente dos
trabalhadores a situações de assédio produz sentimentos de menos-valia, desânimo,
indignação e insatisfação, e, a longo prazo, afetam a saúde mental profundamente
provocando danos físicos, psicológicos e sociais.
Tendo em vista a centralidade que o trabalho ocupa na vida das pessoas, numa
situação de assédio moral no trabalho, o trabalhador assediado é o mais afetado, pois
os danos a sua saúde mental podem ser cronificados e afetar a vida pessoal e
profissional seriamente.
Porém as organizações também se prejudicam com as repercussões do
assédio moral. Há uma tendência à diminuição da produtividade ou da qualidade, ao
aumento dos índices de absenteísmo e de acidentes de trabalho, além dos custos
com a substituição do trabalhador em caso de afastamento por licença médica
(MARTINS, 2015).
Da mesma forma, a sociedade também tem prejuízos, através do aumento dos
custos para a saúde pública, para o sistema previdenciário e na redução da população
economicamente ativa (SOARES, 2006). Além de afetar a participação do trabalhador,
vítima do assédio, em situações de cidadania que exijam opiniões, críticas ou
reivindicações, visto seu embotamento afetivo (MARTINS, 2015).
32
2.2.4 Fatores que contribuem para a ocorrência do assédio moral no trabalho
O assédio moral no trabalho acontece por diversos motivos, que variam desde
aspectos pessoais, por características individuais ou situações peculiares, até
aspectos organizacionais, culturais e socioeconômicos.
Soares (2006), aponta três principais motivos para a ocorrência do assédio
moral no trabalho, tanto no sentido de quem agride quanto no de quem sofre. O autor
coloca a crise do emprego como um dos fatores que contribuem para que o assédio
ocorra no trabalho, pois quem não trabalha é visto como preguiçoso ou vadio, sendo
os trabalhadores, os afortunados que possuem a graça de ter um trabalho e podem
dessa forma continuar a ser explorados pelo capital. Ou seja, para conseguir um
emprego ou se manter empregado, as pessoas podem ter que ser mais agressivas
com seus possíveis concorrentes ou se submeter a determinadas situações
constrangedoras.
Um outro aspecto apontado por Soares (2006) diz respeito à subjetividade dos
trabalhadores, no que tange às estratégias de defesa para evitar o sofrimento do e no
trabalho. As pessoas desenvolvem mecanismos para enfrentar a situação, muitas
vezes, distorcendo a realidade, subdimensionando as agressões, minimizando o
sofrimento para manter o equilíbrio psicológico e de modo geral, a saúde. O terceiro
aspecto abordado pelo autor apresenta a socialização como um processo de
aculturação e naturalização da violência laboral. A cultura, a educação, os valores, as
tradições e costumes levam o indivíduo a acreditar que o assédio moral no trabalho é
algo natural da prática laboral, intrinsecamente relacionada a produtividade e a
capacidade de cada um. Para o autor:
[...] uma vez que a grande maioria das pessoas aceita ou mesmo contribui diretamente para a materialização de um contexto pernicioso e desumano, seja por acreditar convictamente que o mesmo é natural e, como tal, não pode ser alterado, ou seja por, apesar de considerá-lo desumano, preferir se manter omissa, tal realidade acaba por ser legitimada (SOARES, 2006, p. 25).
A nova organização do trabalho, o cinismo e a perversidade do sistema são
apontados por Hirigoyen (2006) como contextos que favorecem a ocorrência do
assédio moral no trabalho. A autora afirma que os novos modos de organização do
trabalho podem fazer emergir o assédio uma vez que são permeados por novas
33
exigências, como por exemplo, alto desempenho, resistência e resiliência, alta
motivação, diminuição da comunicação interprofissional, padronização de saberes e
fazeres e falta de reconhecimento e valorização dos trabalhadores. O cinismo e a
perversidade do sistema podem ser percebidos pela permissão (ou omissão) dos
empregadores quanto às práticas existentes dentro de suas organizações. Seja por
falta de responsabilidade, ou por onipotência, as organizações permitem que
situações perversas ocorram em seus ambientes.
Mais especificamente, Hirigoyen (2006) apresenta algumas situações ou
condições que podem favorecer o assédio moral no trabalho. Pessoas diferentes ou
atípicas, seja por características físicas ou comportamentais, como por exemplo,
pessoas com deficiência ou tímidas demais. Pessoas muito competentes, pois podem
gerar insegurança em colegas e superiores. Pessoas que resistem à algum tipo de
padronização ou esquema, e por sua vez, são consideradas idealistas ou rebeldes.
Pessoas que não conseguem desenvolver uma comunicação correta e são muito
isoladas ou possuem amizade ou alianças com as pessoas erradas. Os assalariados
protegidos, que estão em situação de licença, reabilitação, membros de Comissão
Interna de Prevenção de Acidentes, sindicalistas, entre outras situações de proteção
legal dos direitos trabalhistas. As pessoas menos produtivas, que não possuem o ritmo
ou a qualidade imposta pelo empregador, chefe ou colegas. E ainda, as pessoas que
se encontram temporariamente fragilizadas por motivos pessoais que refletem em sua
capacidade laborativa.
Para Aguiar (2008), o assédio moral no trabalho ocorre por fatores relacionados
ao significado que o trabalho tem em nossa cultura. O autor coloca que os modos de
organização de trabalho estão enraizados em uma história laboral de dominação, de
poder, de paternalismo, de autoritarismo. Assim, obediência, submissão, formalidade,
lealdade à empresa, são valores arraigados, que se encontram naturalizados no
mundo do trabalho e internalizados pelos trabalhadores como algo intrínseco ao labor.
No mesmo sentido, Barreto e Heloani (2014) apresentam o assédio moral no
trabalho como um instrumento de gestão, pontuando os métodos de gerenciamento
como fio condutor para as práticas de assédio. Através de modernas políticas de
gestão de pessoas, que estipulam padrões de participação, de qualidade, de
comportamento e de desempenho, que estimulam a competição entre os pares e que
gerenciam pela pressão, utilizando de castigos e punições para elevar as exigências,
o assédio moral no trabalho encontra ambiente propício para acontecer.
34
Rizvi (2008) salienta o contexto socioeconômico vigente como fator de alto
impacto na vida pessoal e profissional das pessoas, enfatizando a lógica neoliberal
como fator desencadeante do assédio moral no trabalho. Para a autora,
O mundo do trabalho, que dialeticamente nos constitui e é constituído por nós, aparece como um espaço privilegiado para a expressão das “leis” e das regras do mercado neoliberal. A descartabilidade dos valores e das pessoas, subjacentes a tais regras, possibilita que as empresas sejam terreno fértil para a expressão da agressividade e das
armadilhas perversas (RIZVI, 2008, p. 313).
Em suma, pode-se dizer que o assédio moral no trabalho é multifatorial,
originado por condições intrínsecas e extrínsecas que vão desde características
pessoais até o modus operandi do sistema social, cultural, político e econômico
vigente. Dessa forma, não é possível responsabilizar uma ou outra parte, e, por outro
lado, também não é prudente desresponsabilizar nenhuma das partes. É necessário
analisar todo o contexto para entender de que maneira o assédio moral no trabalho
encontrou espaço para acontecer.
2.3 ASSÉDIO MORAL COLETIVO
O assédio moral coletivo não é uma forma diferente de assédio moral no
trabalho, mas trata-se de uma maneira mais ampla e mais sutil de violência
psicológica, cuja finalidade não é humilhar alguém, mas aumentar a produtividade.
Nessa forma de assédio, ou nessa maneira de entender o assédio, torna-se mais
evidente o impacto dos modos de organização do trabalho na saúde mental dos
trabalhadores.
As organizações têm o poder de definir, implícita ou explicitamente, a sua
estrutura de funcionamento, suas normas, seus valores, seus padrões de relações
interpessoais, os níveis de hierarquia e o grau de autonomia e de autoridade de cada
um, bem como as condições em que o labor vai ocorrer (BARRETO; FREITAS;
HELOANI, 2008).
Assim, o trabalhador, ao assinar seu contrato de trabalho está se sujeitando a
seguir as determinações ditadas pela organização que o está contratando. Dessa
forma, “o empregado de forma voluntária aliena a um terceiro, o empregador, o poder
35
de direção sobre sua atividade, em troca de remuneração” (MUÇOUÇAH, 2014, p.
84).
O poder diretivo do empregador, legitimado pela legislação trabalhista,
constitui-se pela possibilidade de administrar as atividades produtivas, através do
poder de direção, regulamentação, fiscalização e punição. Aliado a esse poder, existe
o discurso corrente na maioria das organizações, da importância do trabalho em
equipe, da colaboração de todos para o alcance dos objetivos organizacionais.
Embutido nesse discurso está a ideia de que na medida que os objetivos não forem
alcançados, a responsabilidade passa a ser do coletivo, que não trabalhou de forma
adequada ou suficientemente. Se as metas não foram alcançadas, a responsabilidade
é da equipe que não trabalhou o suficiente, e não por fatores externos, como a
instabilidade do mercado, por exemplo. Ou seja, além do contrato formal de trabalho
ao qual os trabalhadores se sujeitam e devem seguir, há também um discurso que
legitima a busca incansável pela produtividade, propiciando situações ou contextos
onde emergem as práticas de assédio moral coletivo (MUÇOUÇAH, 2014).
No mesmo sentido, Seligmann-Silva et al. (2010) colocam como assédio moral
coletivo, as formas de organização do trabalho e políticas de gestão, que através de
metas que desconsideram as competências dos trabalhadores, vão anulando sua
subjetividade e afetando a saúde mental.
Deve-se considerar o modo de produção capitalista e as formas de gestão
como fatores explicativos para a ocorrência do assédio moral coletivo nas
organizações. Nesse sentido, o assédio moral no trabalho é resultado de contradições
sociais que se concretizam através dos modos de organização e nos modelos de
gestão atuais. Para estes autores, o individualismo, o utilitarismo e o pragmatismo que
permeiam as relações profissionais e pessoais não derivam da personalidade, mas
são próprios do sistema socioeconômico vigente. “O assédio moral é o reflexo de uma
sociabilidade degradada e moralmente degradante instaurada pela lógica do valor”
(LIMA; LIMA; VIEIRA, 2012, p. 266), ou seja, está culturalmente estabelecido pelo
modo de organização da economia e da sociedade.
Considerando-se que o assédio moral está no modo de organização do
trabalho e nas políticas de gestão, pode-se dizer que ele está institucionalizado, sendo
muitas vezes, disfarçado como método eficiente de cumprimento de metas e tarefas,
subjacente ao discurso da produtividade e do trabalho em equipe e colaborativo
(MARTININGO FILHO; SIQUEIRA, 2008).
36
Araújo (2008) chama a atenção para exigências feitas aos trabalhadores em
relação às suas competências, dedicação e comprometimento. É corrente no mundo
do trabalho que para ser um bom profissional e se destacar, o trabalhador deve estar
sempre se qualificando continuamente e ser comprometido com a organização. Esse
pensamento já está bastante incutido na cultura atual, tornando-se uma obrigação
para o trabalhador que quer garantir sua empregabilidade.
Os trabalhadores sentem-se obrigados a provar diariamente que são
competentes, que agregam resultados, que estão comprometidos com os objetivos da
organização e fazem jus ao posto que ocupam. Como o caso citado por Brandt e
Damergian (2008), no qual a funcionária recém contratada ultrapassava
constantemente sua jornada diária de trabalho para demonstrar que estava
comprometida com o trabalho e com a organização. Ela o fazia por vontade própria,
mas havia uma implicação velada, sutil, incutida e aculturada de que se ela não
“comprovasse” seu comprometimento, poderia ser demitida.
Ferreira (2008) relata em sua pesquisa algumas situações vivenciadas por
bancários, onde eram induzidos a oferecer produtos ou serviços aos clientes de
maneira incompleta ou errada e muitas vezes, utilizando mentiras para poder alcançar
as metas propostas. Essa prática provoca constrangimentos e a transgressão de
valores éticos. De acordo com o autor, “A violência se apresenta naturalizada no
discurso da competência e da excelência” (FERREIRA, 2008, p. 107). Nesse sentido,
a violência seria da ordem do gerenciamento e da dominação, que de certa forma se
traduz na tolerância à injustiça e sofrimento, se apresentando de forma mais perversa
do que violenta.
Vive-se num cenário onde o comportamento abusivo tornou-se culturalmente
normal, considerando os trabalhadores como recursos que devem ser explorados ao
máximo. Conforme Freitas e Rodrigues (2014), o contexto político, social e
econômico, apontam para a precariedade das condições e das relações de trabalho,
para o crescimento da terceirização e do trabalho temporário, para o desemprego, e
para a necessidade precípua de redução de custos.
Observa-se que o assédio moral coletivo não difere essencialmente do assédio
moral individual, mas trata-se de um redimensionamento de suas origens. Se no
assédio moral individual, a violência parte de um agressor, que por motivos subjetivos
e pessoais, visa desqualificar um outro trabalhador, no assédio moral coletivo deve-
se
37
[...] entender como os atos individuais se articulam à organização do trabalho, às políticas empresariais, enfim, ao contexto no qual a atividade se realiza e a forma pela qual ela se articula com a ordem mais geral ditada pela produção de valor (LIMA; LIMA; VIEIRA, 2012, p. 264).
Assim, observa-se que no assédio moral coletivo não há intencionalidade de
prejudicar, humilhar, hostilizar uma pessoa, mas sim, de aumentar a produtividade, de
explorar ao máximo os recursos disponíveis ao menor custo possível, ou seja, diz
respeito ao poder diretivo do empregador e suas estratégias de gerenciamento da
produção (SOBOLL; FREITAS; ZANIN, 2015).
Como exemplos de assédio moral coletivo, pode-se citar as “prendas” que os
trabalhadores que não alcançaram as metas têm que realizar, que pode ser desfilar
com roupas ridículas ou com dizeres ofensivos enquanto segura um abacaxi ou uma
tartaruga, cumprir determinados exercícios físicos, fazer coreografias vexatórias, ser
xingado pelo chefe e demais colegas. Essas práticas fazem parte da cultura da
organização e são paulatinamente naturalizadas através do discurso da gestão
(BARRETO; FREITAS; HELOANI, 2008).
Martins (2015) cita como exemplo as revistas, que são um direito do
empregador, visando salvaguardar seu patrimônio. No entanto, não podem ser
invasivas demais ferindo a intimidade do trabalhador. Um outro exemplo citado pelo
autor, é o controle do uso do banheiro. Há casos, inclusive divulgados na mídia, de
organizações que limitam o uso do banheiro tanto em quantidade de vezes que pode
usar, como em tempo de permanência.
Além desses, reconhecidamente abusivos, podemos citar a imposição
exagerada do cumprimento de horas extras, controle ou monitoramento excessivo,
ameaças constantes de desemprego, instalando uma cultura de medo, disponibilidade
de materiais e equipamentos inadequados ou insuficientes para a realização do
trabalho, discriminação do trabalho terceirizado (LIMA; LIMA; VIEIRA, 2012).
Nesse contexto, o sistema de produção, capitalista, está tão arraigado nas
formas de trabalho, que o assédio moral é quase institucionalizado. O labor atual
apresenta uma série de paradoxos com o qual os trabalhadores têm que conviver e
sobreviver. O trabalhador tem que saber trabalhar em equipe, mas ao mesmo tempo
ser competitivo e mais competente que seus colegas. É chamado de colaborador, para
aumentar o pertencimento, mas se não colaborar do jeito e na quantidade
38
determinada pela organização, é considerado que não tem o perfil esperado. A
exigência das organizações por empregados polivalentes, multicompetentes,
superqualificados, sutilmente responsabiliza os trabalhadores pela necessidade de
atualização e status de empregabilidade, ou seja, não é o empregador que deve
preparar tecnicamente o trabalhador, mas sim, este deve se responsabilizar pela
preparação e provar ao empregador suas competências. (MUÇOUÇAH, 2014).
Soares (2006), fazendo referência ao pensamento de Marx, coloca que os
trabalhadores, por educação, por tradição e costume, acatam todas as determinações
dos modos de produção como leis naturais. Desse modo, a violência no ambiente de
trabalho, ao longo do processo de industrialização foi sendo naturalizada, legitimada
e banalizada.
O sistema produtivo requer a sujeição do trabalhador por meio da disciplina que lhe é imposta, a fim de torna-lo dócil à produção, tornando-o alguém útil a empresa e à sociedade. Assim, esta tecnologia política do capitalismo tem por escopo moldar, no trabalhador, seu corpo e também sua alma, aqui compreendida como o seu modo de ser moral. (MUÇOUÇAH, 2014, p. 192)
Dessa forma, o assédio moral coletivo, se caracteriza pelo atentado sistemático
da organização, através de violência moral, psíquica, velada na forma de política
empresarial, extrapolando ou abusando do seu poder diretivo, com o objetivo de
aumentar a produção.
As necessidades do sistema capitalista propiciam o assédio moral coletivo na
medida que favorecem a intolerância aos erros e ao mau desempenho, destroem as
relações interpessoais e estimulam o egoísmo, o individualismo e o utilitarismo (LIMA;
LIMA; VIEIRA, 2012).
De maneira objetiva, Muçouçah (2014) coloca que o assédio moral coletivo se
caracteriza como uma prática onde
[...] o empregador, utilizando-se abusivamente do seu direito subjetivo de organizar, regulamentar, fiscalizar a produção e punir os empregados, utiliza-se desses direitos de forma reiterada e sistemática, como política gerencial, atentando contra os direitos humanos fundamentais dos empregados em todas as dimensões, geralmente para o incremento da produção. (MUÇOUÇAH, 2014, p. 196)
Embora não fale diretamente de assédio moral, Morgan (1996) discorre sobre
39
os efeitos dos modelos de organização do trabalho onde a dominação e a exploração
do trabalho assalariado não são um fim, mas certamente uma consequência, gerando
um processo de “escravidão” social, moral, espiritual e financeira.
Também de forma indireta, Schinestsck (2009) observa e critica a visão da
qualidade de vida no trabalho proposta pelas organizações. Para a autora, o objetivo
final de um programa de qualidade de vida no trabalho não visa a saúde do
trabalhador, mas sim um meio de alcançar maior produtividade.
As formas de gerenciamento, de organização da produção, e o sentido do
trabalho são construídos histórica e culturalmente e apresentam fortes traços da
herança do período coronelista, e podem ser observadas através do “autoritarismo,
clientelismo, nepotismo, favoritismo e ausência de critérios” presentes na classe
empresarial brasileira (AGUIAR, 2008, p. 285).
Rossi e Gerab (2009) colocam que o modelo de gestão atual se utiliza do
discurso da colaboração, da integração, do “vestir a camisa”, para introduzir o
pensamento de que os objetivos são únicos, vendendo a ideia de que os objetivos
pessoais e os organizacionais devem ser os mesmos, e dessa forma, para aumentar
a produção, acabam aniquilando a subjetividade dos trabalhadores e sua consciência
de classe.
Sobre o jargão “vestir a camisa”, amplamente utilizado pelas empresas,
Muçouçah (2014) coloca que, “talvez nada traduza melhor o espírito do que buscamos
expressar: a vivência dos valores patronais no âmbito da empresa deve transcendê-
la, ao ponto de tais valores serem vestidos pelos empregados como uma camisa”
(MUÇOUÇAH, 2014, p. 193).
Araújo (2008) denomina o assédio moral coletivo como assédio moral
organizacional e define-o como
[...] a prática sistemática e reiterada de variadas condutas abusivas, sutis ou explícitas contra uma ou mais vítimas dentro do ambiente de trabalho, que, por meio de constrangimento e humilhação, tem por finalidade controlar a subjetividade dos trabalhadores (ARAÚJO, 2008, p. 89).
A autora exemplifica o assédio, na conduta da empresa ao ter seus
trabalhadores retornando de licença médica, onde os mesmos eram obrigados a ficar
sentados em frente a linha de produção, sem realizar nenhuma atividade. Mesmo sem
nenhum conflito pessoal específico, a mensagem a ser transmitida era a de que
40
afastamentos por doença não são bem tolerados pela empresa. Essa prática faz com
que os trabalhadores evitem qualquer tipo de afastamento, muitas vezes, ao custo de
esconder seu adoecimento.
No mesmo sentido, Barreto e Heloani (2014, p. 59) colocam que as formas de
gerenciamento atuais se baseiam em “sobrecarregar de trabalho e pressionar
moralmente a todos os trabalhadores”, promovendo um ambiente de trabalho
perverso onde quem não atende ao perfil desejado, não alcança as metas ou
questiona as condições de trabalho, está sujeito à humilhações, constrangimentos e
isolamento, incentivando a competitividade entre os pares e submetendo-os às regras
da organização de maneira sutil e sórdida. Os autores relatam o caso de uma empresa
que “presenteava” o funcionário que não alcançava a meta com um bode. O
funcionário deveria leva-lo para casa e cria-lo, pagando multa caso acontecesse algo
com o animal. A humilhação extrapolava os limites da empresa, uma vez que o
funcionário era obrigado a desfilar com o bode até sua casa.
Em seu estudo, Fistarol (2014) aponta que os casos considerados como
assédio moral no trabalho julgados pelo Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região,
se enquadram nos conceitos e critérios apresentados pela literatura. Apresenta que
as condutas abusivas com maior incidência são os constrangimentos, perseguições e
humilhações, seguido de ameaças e, piadas e xingamentos.
Observa-se que a lógica do gerenciamento é medir apenas os resultados. Se
as quantidades estabelecidas foram atingidas ou não. As tentativas, o esforço
desprendido, e a qualidade do trabalho não são reconhecidos, desqualificando o
empenho dos trabalhadores e provocando o sofrimento (BARRETO; HELOANI, 2014).
Vale ressaltar que o estabelecimento de metas, praticado por inúmeras
empresas, por si só pode gerar pressão, conflito, estresse e sofrimento, porém, o que
realmente pode ser considerado assédio é a forma como essas metas são exigidas,
como são valorizadas e quais as atitudes que se toma quando elas não são
alcançadas.
Nesse sentido, Soboll, Freitas e Zanin (2015), colocam que a forma como as
exigências são cobradas traduzem as práticas de gestão implantadas e defendem que
a gestão por medo, a gestão por estresse e a gestão por vergonha são modelos
gerenciais altamente propensos à prática de assédio moral coletivo. Para as autoras,
[...] gestão por estresse: compreende o uso de vigilância constante e
41
exagerada, com cobranças insistentes de resultados muito exigentes em prazos e condições compatíveis; gestão por medo: envolve o exercício do controle mobilizado por ameaças de exclusão, de prejuízos na carreira ou pelo uso de coações pessoais, psíquicas ou físicas; gestão por vergonha: refere-se a ações ou ameaça de atos de constrangimentos (sutis ou explícitos) e de humilhações públicas ou em particular que têm efeito de estratégia mobilizadora para o aumento da produtividade ou para manter a obediência no trabalho. Essa prática é com frequência associada ao uso de rankings comparativos de produtividade individual. (SOBOLL; FREITAS; ZANIN, 2015, p.56)
Fica clara a proximidade desses modelos de gestão com as práticas de assédio
moral coletivo ou organizacional, sendo, porém, naturalizadas como política
empresarial, como estratégias de negócios, que acabam por ser corriqueiramente
utilizadas pelas organizações.
As formas de organização do sistema produtivo, o modo como são
determinados os processos de trabalho, estabelecem os ritmos, as quantidades, as
formas e os meios que serão utilizados para os objetivos da produção e é por meio
desses determinantes que se originam os conflitos nas relações de trabalho
(NOGUEIRA, 2014).
Tolfo, Silva e Krawalki (2015) falam sobre relações de trabalho assediadoras e
destacam a cultura organizacional vigente e os modelos de gestão como fatores de
influência na ocorrência de assédio moral no trabalho, e colocam que nas
organizações privadas o assédio se apresenta principalmente por meio de modelos
baseados em resultados e produtividade, enquanto que nas organizações públicas,
ocorre devido a disputas de poder, de recursos, de influências e por espaços nesse
contexto.
Bradaschia (2007) relaciona alguns fatores organizacionais organizando-os em
quatro aspectos: os relacionados ao clima e cultura organizacional, os relacionados à
liderança, os relacionados à organização do trabalho e os relacionados às constantes
mudanças que vêm ocorrendo nas organizações.
Quanto aos fatores relacionados ao assédio moral e ao clima e cultura
organizacional, a autora elenca aspectos como a competição interna, conflito de
papeis, injustiça organizacional, piadas e humilhações com novos funcionários, baixos
padrões morais da organização. Os aspectos relacionados ao comportamento dos
líderes, na discussão do assédio moral, apontam para a liderança autocrática, às
deficiências no comportamento dos líderes, à existência de líderes abusivos e ainda
42
ao desinteresse da gerência (complacência). Em relação aos fatores relacionados à
organização do trabalho que apresentam correspondência com o assédio moral cita-
se problemas de comunicação, falta de clareza quanto aos objetivos e expectativas,
baixo controle sobre o trabalho e/ou falta de autonomia. Em decorrência das
progressivas mudanças nas funções e nos cenários de trabalho, situações de assédio
podem surgir devido à intensificação do ritmo de trabalho, das reestruturações, da
instabilidade e da precarização do emprego. A autora conclui, assinalando que “o
assédio é um processo multi-causal, resultado da interação de fatores individuais,
organizacionais e das mudanças que ocorrem no mundo do trabalho” (BRADASCHIA,
2007, p. 102).
De forma semelhante, Samnani e Singh (2012), colocam que os aspectos
antecedentes ao assédio moral, ao nível organizacional, estão relacionados ao estilo
de gestão e liderança, a cultura e clima organizacional, as políticas organizacionais e
a fatores situacionais, como o sistema de recompensas. Esses aspectos, por sua vez,
sofrem influência do sistema capitalista pautado na competitividade, na
individualidade e abuso de poder.
Enfim, observa-se que o assédio moral coletivo guarda uma estreita relação
com as transformações decorrentes da reestruturação produtiva das últimas décadas.
Novos modelos de gestão e exploração da mão de obra foram sendo delineados, com
o único objetivo de aumentar a produção, fragilizando as relações de trabalho e
relegando a saúde e segurança dos trabalhadores ao minimamente necessário.
2.4 OS SINDICATOS
A origem do sindicalismo no Brasil remonta o final do século XIX e está
vinculada ao processo de transformação de nossa economia, que tinha como centro
agrário o café. A substituição do trabalho escravo pelo trabalho assalariado, a
transferência do lucro do café para a indústria e o poder político nas mãos dos
cafeicultores foram algumas das mudanças nesse processo de transformação. A
origem da exploração da força de trabalho de um homem por outro não tem,
entretanto, uma data definida (LOPEZ, 2012).
Na Antiguidade a exploração dos homens já ocorria através da prática social
da escravidão, em que o explorador (proprietário) era dono do explorado (escravo).
43
Já na Idade Média o modo de exploração feudal marca as relações de trabalho onde
os explorados (servos) vendiam a sua força de trabalho para os exploradores
(senhores feudais) apenas em troca de uma gleba de terra para moradia (SOARES,
2006).
Com a Revolução Industrial e a ascensão do capitalismo, no Século XVIII, as
relações de trabalho ganham os contornos que predominam até os dias atuais, no
qual os trabalhadores vendem a sua força de trabalho para os patrões. Ainda na
Revolução Industrial, principalmente na Inglaterra, seu berço, em função da
concorrência crescente dos meios de produção, as máquinas foram ganhando cada
vez mais lugar nas fábricas, tomando o lugar de muitos operários e formando o
primeiro contingente de “mão de obra excedente”, permitindo o pagamento de salários
cada vez mais baixos e jornadas que poderiam chegar até 16 horas de trabalho
(SOARES, 2006).
As primeiras formas de organização dos trabalhadores brasileiros foram as
Sociedades de Socorro e Ajuda Mútua e a União Operária, que com o advento da
incipiente indústria nacional passou a se organizar por ramo de atividade, dando
origem aos sindicatos (QUEIROZ, 2013).
Sindicatos são, portanto, instituições que têm como finalidade principal,
defender e proteger os direitos e interesses da classe trabalhadora. Seu surgimento
foi uma conquista ao longo da história do trabalho, pois se caracteriza pela união dos
trabalhadores no combate à exploração e a mais valia e nas reivindicações por
condições de trabalho salutares e com salários dignos, entre outras questões. “Seu
principal valor está em reconhecer a existência do conflito e permitir a sua solução de
forma negociada, com regras que asseguram igualdade de condições entre
empregadores e trabalhadores” (QUEIROZ, 2013, p. 10).
Rossi e Gerab (2009) descrevem os sindicatos como organismos sociais que
objetivam defender os interesses econômicos e sociais, de suas respectivas
categorias profissionais, individual e coletivamente, com o intuito de garantir melhores
condições de trabalho e de vida.
Organizar e representar a categoria, realizar negociações coletivas (acordos,
convenções ou contratos), fomentar a consciência crítica dos trabalhadores e atuar
para garantia dos direitos trabalhistas, são algumas das funções dos sindicatos. Entre
as organizações não governamentais, os sindicatos são os únicos que possuem
prerrogativa de estabelecer uma ação regulatória com poder de lei.
44
De acordo com Queiroz (2013), a jornada de trabalho de 8 horas diárias, as
férias, o seguro-desemprego, a segurança no trabalho, são direitos conquistados que
resultam da ação e pressão dos sindicatos em favor de todos os trabalhadores.
Na pauta de lutas dos sindicatos se observam inúmeras reivindicações acerca
de melhores condições de trabalho, como redução da jornada de trabalho e controle
de horas extras, piso, isonomia e equilíbrio salarial, segurança no trabalho, combate
a terceirização e a precarização do labor. As questões referentes à saúde mental dos
trabalhadores estão presentes nas reivindicações, mas certamente não apresentam a
mesma importância que os outros pontos de pauta têm (MELO, 2013).
Atua, de certa forma, contra as práticas de assédio moral coletivo, uma vez que
luta a favor do trabalho decente e contra os abusos nos contextos de trabalho. No
entanto, quanto as questões mais específicas ou individuais do assédio moral no
trabalho, o apoio e a prevenção ainda são incipientes.
Essas questões, mais específicas ou individuais, entre elas o assédio moral no
trabalho, por sua atualidade e novidade no contexto das empresas e das relações de
trabalho, somente agora começa a ser encarada de forma objetiva pelo movimento
sindical. A primeira barreira a ser vencida é a doutrinação por parte do sistema
formador de mão de obra na qual o trabalhador é orientado a agir exclusivamente
pautado pela competividade e de forma individual e egoísta, quando deveriam ser
incorporados na sua formação valores solidários e coletivos (SOARES, 2006).
Além disso, a exemplo dos países socialmente mais avançados, os
trabalhadores devem ser motivados a entender o papel social e político dos seus
sindicatos, na manutenção da paz social, no respeito aos valores de uma sociedade
plural e democrática e na defesa dos seus direitos, incluindo-se aí o exercício do
trabalho decente, sem nenhuma forma de exploração, submissão ou assédio moral.
De acordo com Lara (2011), existe uma variedade de fragilidades nas relações
de trabalho que afetam a saúde física e mental dos trabalhadores, e que exigem dos
sindicatos uma postura ativa e atenta em relação ao enfrentamento e superação de
todas as formas as formas abusivas de exploração da força de trabalho.
Cotanda (2008) salienta que o pouco interesse dos sindicatos por temas que
envolvem a organização do trabalho e modelos de gerenciamento advém de um
pensamento consensual, historicamente construído, que vigora em nossa sociedade
de que a gestão do trabalho e da produção são prerrogativas exclusivas do
empregador.
45
Os sindicatos patronais, por sua vez, atuam na defesa dos direitos das
empresas por eles representadas, através da participação nas negociações coletivas
com os sindicatos dos trabalhadores, buscando obter o melhor proveito das cláusulas
relacionadas com a produtividade e competitividade das empresas. Estabelecem
ainda, relações com as esferas públicas para negociação de legislações específicas
e racionalização de impostos, por exemplo, com o objetivo de obter melhores
condições para os negócios (LOPEZ, 2012).
O referido autor menciona, ainda, que ao longo dos anos, devido à pouca
atuação dos sindicatos patronais, a adesão aos mesmos e a sua credibilidade foram
abaladas. Para recuperar a adesão e a retenção de afiliados, foi e é necessário atuar
politicamente e mostrar resultados. Segundo o autor, os sindicatos patronais atuam
em duas vertentes principais:
A primeira e mais importante é a defesa dos interesses das empresas representadas, que inclui a negociação no acordo salarial com o sindicato laboral e toda a atividade de representação na esfera pública, para viabilização de melhores condições de negócio, ou seja, racionalização de impostos, mudanças na legislação específica, proteção do mercado, etc. A outra atividade desempenhada pelo sindicato patronal é a prestação de serviços e o oferecimento de produtos às empresas associadas (LOPEZ, 2012, p. 26).
O principal comprometimento dos sindicatos patronais é com o
desenvolvimento do setor produtivo, portanto, seu foco de atuação é no sentido de
promover ações para aperfeiçoar o conhecimento e as competências para os
negócios, buscando a competitividade das empresas associadas.
De acordo com Lopez (2012), os empresários pressionam os sindicatos
patronais principalmente pela racionalização da carga tributária, bastante pesada em
nosso país e que onera fortemente as atividades produtivas. Em segundo lugar, a
pressão sobre os sindicatos é pela sua representatividade junto as instâncias
governamentais em defesa dos interesses empresariais. Apenas em terceiro lugar as
relações de trabalho aparecem como tema de pressão sobre os sindicatos patronais
por parte das empresas associadas.
Dessa forma, observa-se que as relações de trabalho não são prioridade para
os sindicatos patronais. Contudo, a reação dos sindicatos para essas demandas é no
sentido de barganhar, pela própria característica desse tipo de negociação que
envolve conflito de interesses (LOPEZ, 2012).
46
Nesse sentido, é importante refletir sobre quais aspectos das relações de
trabalho são demandados aos sindicatos patronais. Ao que parece, o interesse do
patronato se refere mais a questões como estabilidades legais, impeditivos das
rescisões contratuais, descanso semanal e terceirização. De modo geral, o interesse
do patronato se refere ao ajuste das relações de trabalho às estratégias empresariais
para melhoria de seus resultados.
Um problema na atuação dos sindicatos deriva do enfraquecimento da
mobilização coletiva nos últimos anos, visto o fortalecimento do discurso da
competitividade, do individualismo e da necessidade individual de preparação e
qualificação para a empreendedorismo (BOTTEGA; MERLO; PEREZ, 2013).
A estratégia empresarial em diminuir a relevância da atividade sindical, por parcelar as atividades dos trabalhadores em facetas numerosas e dispersas ao longo da empresa, somou-se à individualização dos interesses dos empregados que adotaram, como sua, a escala patronal de valor (MUÇOUÇAH, 2014, p. 190).
Significa dizer, que o discurso do empreendedorismo, do individualismo, da
concorrência estabelecido pelas organizações contribuíram para o processo de
aculturação desses valores por parte dos trabalhadores e por consequência,
enfraqueceram a consciência de pertencimento à classe trabalhadora e, portanto, o
movimento sindical.
De acordo com Araújo e Ferraz (2006)
A organização do processo de trabalho proporciona uma experiência em que o poder se apresenta como dado naturalmente pela produção. Desaparece do universo cognitivo a percepção de subordinação, espalhando a indeterminação como norma e solapando aos sindicatos, o seu papel de acesso ao mundo público. Esse sentimento desarticula a representação de classe. (ARAÚJO; FERRAZ, 2006, p. 2)
Ainda assim, mesmo discretamente, é possível constatar debates e ações por
parte dos sindicatos com o objetivo de informar, sensibilizar e promover a prevenção
do assédio moral no trabalho, através de campanhas de informação, palestras e na
elaboração e divulgação de cartilhas (GARBIN, 2009).
Tendo o papel de defender os direitos dos trabalhadores, inclusive aos
relacionados à saúde mental, os sindicatos podem negociar cláusulas específicas nas
convenções e acordos coletivos. O relatório apresentado pelo DIEESE –
47
Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Sócio Econômicos - aponta
algumas dessas negociações, revelando o impacto das formas de organização do
trabalho e de gestão como fatores determinantes no processo saúde-doença no
ambiente laboral.
No estudo citado anteriormente, foram destacadas algumas cláusulas que
versam sobre o assédio moral em diferentes contextos, como por exemplo, assédio
moral e gênero no setor de plásticos da Bahia , sobre a constituição de comissão de
ética no setor de jornalismo em Minas Gerais, de combate à discriminação, assédio
moral e sexual dos servidores de processamento de dados, em relação ao
monitoramento e divulgação de resultados no setor bancário e por fim, da conduta no
ambiente escolar do sindicatos dos professores de Pernambuco (DIEESE, 2015).
No site do DIEESE2 há diversos relatórios disponíveis para consulta, e somente
o referente ao ano de 2015 traz informações sobre o assédio moral no trabalho,
demonstrando que o assunto até então não era problematizado em negociações
coletivas por parte dos sindicatos. E por outro lado, ressaltando o crescimento das
discussões sobre a temática no âmbito sindical e a importância de incluir esse debate
nas assembleias e na prática sindical cotidiana.
Assim, embora tenha ocorrido um enfraquecimento da mobilização coletiva,
tanto de trabalhadores, quanto patronal, é visível a participação dos sindicatos na
atenção e negociação dos casos de assédio moral no trabalho. Com vistas à
prevenção de sua ocorrência, bem como na promoção de ambiente de trabalho salutar
e condições dignas de exercício das atividades profissionais é necessário agora que
os sindicatos insistam na obtenção de legislação adequada ou que trate
especificamente do assédio moral no ambiente de trabalho.
Conforme o estudo de Perez (2014), baseado em sua experiência prática em
Clínica do Trabalho desenvolvida em entidades sindicais, as queixas prevalentes que
motivam a busca pelo sindicato, dizem respeito a situações de violência moral e
psicológica no trabalho, principalmente as relacionadas à racismo e discriminação. A
falta de condições de trabalho adequadas e a sobrecarga de trabalho também são
demandas constantes que alguns sindicatos já começam a atentar e tentar ajudar os
trabalhadores que sofrem e adoecem do trabalho.
Em uma outra perspectiva, estudos como o de Fistarol (2014) demonstram que
2 www.dieese.org.br
48
os tribunais brasileiros já estão julgando e condenando atos de assediadores,
utilizando como base o artigo 186 do Código Civil, que trata do dano moral e
determina: “Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência,
violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato
ilícito”.
Existem projetos de lei tramitando no Congresso Nacional, cujo objetivo é
regular o assédio moral no ambiente de trabalho no Brasil. Um deles, o Projeto n.
4.742/01, caracteriza o assédio moral como crime, passível de detenção de três
meses a um ano. Esse projeto deve ser amplamente discutido, tanto no sentido da
adequação da pena quanto em relação a sua viabilidade, levando em consideração o
atual sistema carcerário brasileiro.
Embora ainda não exista uma lei específica para o assédio moral no trabalho,
principalmente no âmbito federal, em algumas cidades e estados, já se observa
legislação específica. Em Natal, por exemplo, existe a Lei nº 189, de 23 de fevereiro
de 2002, que dispõe sobre o assédio em relação aos funcionários nomeados para
cargos de confiança (MARTINS, 2015).
Além do trabalho legislativo, de convencimento de deputados federais e
senadores, os sindicatos devem formar grupos internos de profissionais capacitados
como médicos, psicólogos, psiquiatras, advogados, entre outros, para analisar e
resolver os conflitos quando não há clareza por parte dos envolvidos, nos casos
individuais e para aprofundar os estudos nos casos coletivos e de maior repercussão.
A saúde física e mental dos trabalhadores é ou não de interesse mútuo dos
sindicatos patronais ou de empregados? No caso patronal evita o absenteísmo e
favorece a produção e no caso dos trabalhadores permite melhores condições de
ascensão profissional, gerando mais renda e um padrão de vida digno. Os casos de
assédio moral atentam sempre contra a saúde do trabalhador e os sindicatos devem,
portanto, tratar esse tema com a prioridade que os novos tempos exigem.
2.5 ESTUDOS RECENTES SOBRE ASSÉDIO MORAL NO TRABALHO
O assédio moral no trabalho apresenta-se como um tema com um número
significativo de produções, como artigos, dissertações, teses e livros. É discutido por
diversas áreas do conhecimento possibilitando concepções da psicologia, do direito,
49
da medicina, da administração, entre outras. Alguns autores se destacam pela
maneira peculiar de observar o fenômeno e pela profundidade de seus estudos e
serão destacados a seguir.
Para a elaboração do arcabouço teórico do presente estudo, foram consultados
artigos, dissertações e teses sobre o assunto, em periódicos indexados em bases de
dados como Scielo, Science Direct, CAPES e Lilacs, e em bibliotecas virtuais, como
BDTD – Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações, e BVS – Biblioteca
Virtual em Saúde. Também foram utilizados livros de autores referenciais e
contemporâneos na discussão do assédio moral no trabalho.
Primeiramente, destaca-se a produção de Barreto, Freitas e Heloani (2008),
onde os autores apresentam o assédio moral dentro do contexto histórico do trabalho,
suas raízes nos modos de organização da produção, as características e os impactos
nos trabalhadores e na sociedade. Além deste estudo os autores se destacam por
diversas publicações em revistas e pela fundação de um site sobre o assunto3, que
utilizam para divulgação do tema e também como canal para recebimento de histórias
e denúncias de assédio moral. As informações coletadas durante o período de 2010
e 2014 através do site (3.613 questionários e 530 histórias), foram apresentadas por
por Barreto e Heloani (2014) em um capítulo do livro Atenção à saúde mental do
trabalhador: sofrimento e transtornos relacionados ao trabalho.
Um outro estudo que merece destaque é o de Muçouçah (2014), que coloca o
assédio moral como um fenômeno que fere os direitos humanos e o relaciona com o
abuso do poder diretivo que o empregador possui legalmente, na medida que pode
estabelecer o modo de organização do trabalho e a maneira de controlar a produção.
O livro organizado por Lis Andréa Soboll (2008), Violência psicológica e assédio
moral no trabalho: pesquisas brasileiras, é uma referência para o estudo do tema, pois
apresenta diversos estudos sobre o assédio moral, sob diferentes enfoques, de
autores de diferentes áreas do conhecimento, como Adriane Araújo, Roberto Heloani,
André Aguiar, Ivana Rizvi, Juan Brandt e Sueli Damergian, entre outros.
Emmendoerfer, Tolfo e Nunes (2015), são os organizadores do livro Assédio
moral em organizações públicas e a (re)ação dos sindicatos, que conta com a
participação de vários pesquisadores da área e apresenta estudos que relacionam as
organizações sindicais e o tema do assédio no trabalho. Este tipo de relação, sindicato
3 www.assediomoral.org
50
– assédio moral, não se encontra com facilidade na literatura, podendo ser
considerado um dos poucos livros a respeito, produzidos até o momento.
Rossi e Gerab (2009) apresentam um panorama histórico do sindicalismo no
Brasil e os momentos socioeconômicos vivenciados ao longo dos anos,
contextualizando-os às formas de organização do sistema produtivo e do movimento
sindical.
Araújo e Ferraz (2006) não falam diretamente sobre assédio moral, mas
contribuem para a reflexão sobre os modos de produção e as formas coletivas de
resolução de conflitos, fazendo uma análise crítica do papel dos sindicatos e sua
atuação contemporânea.
A pesquisa de Soares (2006) identificou as práticas de assédio moral no
trabalho através da pesquisa participante em uma instituição financeira. Além de
apresentar as principais práticas de assédio moral, o estudo mostra as percepções
dos assediados e das testemunhas, bem como as repercussões físicas, afetivas,
cognitivas e sociais para os assediados.
O trabalho de Bradaschia (2007) apresenta uma sistematização dos estudos
realizados até a data. Fala do contexto organizacional, e de como o tema tem sido
mais frequentemente abordado pelas pesquisas brasileiras e internacionais e expõe
os mecanismos de combate e prevenção.
Schinestsck (2009) traz o enfoque do Direito sobre o tema e apresenta a
importância da visão humanista do meio ambiente do trabalho, com respeito aos
direitos fundamentais e preservação da saúde mental dos trabalhadores, destacando,
ainda, a responsabilidade dos sindicatos nesta questão.
O assédio moral no trabalho, investigado através das suas representações na
mídia impressa, é o enfoque da pesquisa de Garbin (2009), que desvela o quanto e
como o tema é abordado pelos jornais de grande circulação de São Paulo e de jornais
elaborados pelos sindicatos para a sua respectiva categoria.
Fistarol (2014) caracteriza as práticas de assédio moral no trabalho conforme
a perspectiva do judiciário e dos sindicatos dos trabalhadores e sindicatos patronais.
Seu estudo analisa as ações relativas a assédio moral impetradas no Tribunal
Regional do Trabalho, identificando as condutas consideradas como assédio moral
nas sentenças judiciais. Dessa forma, verifica se o entendimento dos juízes está
consoante com o que a literatura caracteriza como assédio.
O estudo de Costa et al. (2015), recentemente publicado, de natureza
51
bibliométrica, apresenta dados sobre a produção científica acerca do assédio moral
em teses e dissertações realizadas no Brasil, durante o período de 2002 a 2012. A
amostra desse estudo foi composta por 57 trabalhos, sendo 52 dissertações e 5 teses,
demonstrando um expressivo volume de produções durante a década estudada. Além
do panorama das produções acadêmicas, o estudo apresenta um mapa conceitual do
assédio moral, a partir dos descritores encontrados na literatura pesquisada.
Um estudo semelhante foi realizado por Cahú et al. (2011) que analisou a
produção científica sobre assédio moral em periódicos online no período de 2002 a
2010. Os trabalhos encontrados foram organizados em três categorias: Instituições de
ensino, Órgãos públicos e Empresas privadas, demonstrando os principais cenários
da prática do assédio moral.
Duas outras pesquisas ratificam os principais cenários de prática de assédio
moral. O artigo de Rodrigues e Freitas (2014) que trata do assédio moral nas
instituições de ensino superior e o artigo de Maciel et al. (2007) com situações de
assédio moral no contexto bancário.
A relação da saúde mental com o trabalho pode ser vista nos estudos de
Bottega, Perez e Merlo (2013) e de Barreto (2009) que apontam o sofrimento e o
adoecimento dos trabalhadores como decorrentes de um processo histórico e cultural
de precarização do trabalho e destacam a necessidade de enfrentamento desse
problema. As pesquisas de Seligmann-Silva et al. (2010) e de Lima, Lima e Vieira
(2012) também abordam os modelos contemporâneos de gestão como incipientes do
assédio moral e intrinsecamente relacionados aos processos de adoecimento dos
trabalhadores. Um outro estudo interessante acerca da saúde dos trabalhadores, é
apresentado por Ricardo Lara (2011) que aborda as mudanças nos perfis patológicos
derivados do trabalho relacionando-as com as crises que afetaram a materialidade do
trabalho.
Vale destacar os artigos do volume 37 da Revista Brasileira de Saúde
Ocupacional de 2012, uma edição temática sobre o assédio moral no trabalho que
reuniu produções de diversos estudiosos da área, contribuindo com análises
contemporâneas e diversificadas sobre a caracterização do assédio moral, seus
impactos e possíveis intervenções.
A respeito da relação dos sindicatos com o tema do assédio moral, a literatura
ainda é escassa, sendo possível encontrar alguns artigos que de alguma forma se
aproximam do assunto do presente estudo, como por exemplo, o artigo de Cotanda
52
(2008) que discorre sobre o posicionamento dos sindicatos frente às inovações
tecnológicas e organizacionais e aponta para o pouco interesse das entidades
sindicais sobre o assunto. Caso semelhante é o estudo de Cruz, Sarsur e Amorim
(2012) que apresenta a visão dos sindicalistas em relação a determinadas práticas
organizacionais, mais especificamente, à gestão por competências. Os autores
colocam que além do desinteresse, há também pouca habilidade para tratar de
assuntos como esse.
Face ao exposto nesse referencial teórico, entende-se que o assédio moral no
trabalho é um tipo sutil de violência decorrente das transformações nas relações de
trabalho, orientadas para a exploração dos trabalhadores e com vistas ao acúmulo de
capital. Dessa forma, destaca-se a participação das entidades sindicais no
enfrentamento de condutas abusivas em prol da saúde dos trabalhadores.
53
3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
Nesse tópico são explicitadas as informações referentes aos procedimentos
metodológicos escolhidos para a realização desta pesquisa; tais como, o tipo de
pesquisa, a caracterização da amostra, o plano de coleta de dados, as categorias de
análise e como se deu o processo de tratamento dos dados.
3.1 TIPO DE PESQUISA
Para a realização deste estudo, foi utilizada a abordagem qualitativa, uma vez
que se pretende analisar significados, entendimentos, sobre o tema. Teve finalidade
descritiva, pois tratou-se de investigar um fenômeno com o objetivo de apresentar uma
nova visão do tema, através do levantamento de opiniões e atitudes, que, neste caso,
foi a perspectiva dos representantes sindicais acerca do assédio moral no trabalho
(GODOY, 1995).
Conforme Godoy (1995), na pesquisa qualitativa é possível observar o
fenômeno estudado a partir do significado atribuído a ele pelas pessoas relacionadas
ao estudo, considerando a subjetividade como ponto de destaque deste tipo de
pesquisa.
Vale destacar o posicionamento de Minayo (2004) quanto a relevância da
pesquisa, principalmente a qualitativa, para o desvelamento da realidade, através da
reflexão sobre as opiniões e atitudes de determinados grupos.
Flick (2009) ressalta a importância da pesquisa qualitativa para o estudo das
relações sociais, na medida em que possibilita o conhecimento de pontos de vista e
práticas diferentes de forma contextualizada.
Tendo em vista que o objetivo da pesquisa foi o de conhecer o entendimento
dos dirigentes sindicais em relação ao assédio moral no trabalho, bem como as ações
de enfrentamento praticadas pelas entidades à que pertencem, a pesquisa qualitativa,
descritiva, pareceu ser a mais indicada para este fim.
54
3.2 PARTICIPANTES DO ESTUDO
Primeiramente, foi feito um levantamento das entidades sindicais com
abrangência estadual e com sede em Natal, através de pesquisa na internet, para
obter o endereço e formas de contato com essas instituições. Em seguida, foram feitos
contatos telefônicos para possíveis agendamentos. Foram também realizadas visitas
às sedes dos sindicatos para verificar a possibilidade de realizar a pesquisa e realizar
o agendamento. Nesses contatos, algumas entidades solicitaram enviar email com
maiores informações sobre a pesquisa, o que também foi realizado. Na maioria dos
casos foi necessário retornar o contato diversas vezes para finalmente obter um
retorno. Ao todo, foi feito contato com 54 entidades sindicais, entre patronais e de
trabalhadores. Desse montante, apenas 10 sindicatos de trabalhadores concordaram
em participar da pesquisa e agendaram a entrevista. Os contatos e as entrevistas
foram realizados durante os meses de fevereiro e março de 2016.
Participaram do estudo dez dirigentes de sindicatos de trabalhadores de
diferentes categorias profissionais. Dentre esses sindicatos há representação de
categorias de trabalhadores tanto do setor público como do setor privado. Apesar de
inúmeras tentativas, infelizmente, nenhum sindicato patronal se disponibilizou para
participar da pesquisa. Esse achado pode indicar o desinteresse das entidades
patronais em debater o assunto, visto terem outros interesses de maior importância,
conforme abordado brevemente no referencial teórico.
Os sindicatos que participaram do estudo foram os seguintes:
SINDIMOVÉIS – Sindicato dos Corretores de Imóveis do Rio Grande do
Norte
SINDSEGUR – Sindicato Intermunicipal dos Vigilantes
SINPOL – Sindicato dos Policiais Civis e Servidores da Segurança Pública
do Rio Grande do Norte
Sindicato dos Bancários do Rio Grande do Norte
SINDUSCON – Sindicato do Trabalhadores da Indústria e Construção Civil
do Rio Grande do Norte
Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Rio Grande do Norte
SINDCONFECÇÕES – Sindicato dos Oficiais Alfaiates, Costureiras e
Trabalhadores nas Indústrias de Confecção de Roupas no Estado do Rio
Grande do Norte
55
SINPEF – Sindicato dos Servidores do Departamento da Polícia Federal no
Rio Grande do Norte
SECERN – Sindicato dos Empregados no Comércio do Rio Grande do Norte
SINDMOTO – Sindicato dos Trabalhadores, Condutores de Utilitários em
duas ou três rodas, motorizadas em entrega de mercadorias a domicilio do
Rio Grande do Norte
A proposta inicial para a delimitação do número de participantes da pesquisa
seria seguir o princípio de saturação teórica, que ocorre quando os novos dados
coletados não contribuem para a pesquisa, ou seja, quando se julga desnecessário a
captação de novos dados visto estes serem redundantes (FONTANELLA;
MAGDALENO JÚNIOR, 2012).
Porém, diante da dificuldade de agendamento devido a (pouca) disponibilidade
dos dirigentes sindicais em participar do estudo, foi utilizado o critério de conveniência,
que “se refere à seleção de casos mais acessíveis sob determinadas condições”
(FLICK, 2009, p. 125). A dificuldade de acesso se deu principalmente pelo fato de os
dirigentes sindicais não terem a liberação de seus empregadores para o exercício da
atividade sindical e dessa forma, não possuírem uma agenda fixa dentro das
entidades. Geralmente, só comparecem ao sindicato nas reuniões e assembleias, ou
quando há alguma demanda específica.
3.3 INSTRUMENTO E PROCEDIMENTO DE COLETA DE DADOS
Para a coleta de dados foram realizadas entrevistas semiestruturadas com os
presidentes ou outros membros da diretoria de sindicatos de trabalhadores. As
entrevistas tiveram como base o roteiro desenvolvido por Fistarol (2014), na sua
pesquisa junto aos dirigentes sindicais, que foi adaptado para o alcance dos objetivos
do presente estudo.
Os representantes sindicais foram questionados sobre o entendimento que têm
acerca do assédio moral no trabalho, tanto individual como coletivo, bem como se a
entidade recebe queixas por parte de seus associados de situações de assédio moral.
Foi questionado, ainda, sobre quais ações são desenvolvidas pelas entidades em
relação ao assédio moral no trabalho.
Vale salientar que o roteiro da entrevista serviu apenas como guia para que
todas as questões fossem abordadas e os objetivos deste estudo alcançados. Na
56
prática, os participantes do estudo muitas vezes respondiam duas ou mais questões,
como por exemplo, quando perguntados sobre o entendimento do assédio moral,
apresentavam casos que chegavam ao sindicato e inclusive qual a conduta adotada.
De acordo com Flick (2009), a técnica da entrevista é largamente utilizada nas
pesquisas qualitativas. É uma técnica de coleta de dados que possibilita obter
informações, percepções, opiniões e entendimentos a respeito de determinado
assunto. Dessa forma, permitem pesquisar um tema com maior profundidade.
O tipo de entrevista aplicado neste estudo foi o que Flick (2009) denomina como
entrevista com especialistas, uma vez que o interesse maior da pesquisa não está na
opinião pessoal dos entrevistados, e sim, na perspectiva deles enquanto
representantes de uma categoria profissional e membros de uma entidade sindical.
A primeira entrevista, realizada com um sindicato de trabalhadores da área de
segurança, serviu como teste piloto, com o objetivo de analisar a adequação do roteiro
da entrevista.
Na realização das entrevistas foram explicados os objetivos da pesquisa e
solicitado a leitura e assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, bem
como, ressaltado o sigilo na identificação dos participantes do estudo. As entrevistas
ocorreram, na maioria dos casos, nas sedes das entidades sindicais. Foi utilizado um
gravador na realização das entrevistas para obter maior fidelidade na transcrição
posterior.
3.4 CATEGORIAS DE ANÁLISE
As categorias de análise foram sendo delineadas a partir da transcrição e leitura
das entrevistas, conforme a identificação de padrões presentes nos discursos dos
participantes, levando em consideração os objetivos do presente estudo. De acordo
com Godoy (2005, p. 87), “A análise indutiva dos dados leva a identificação de padrões
recorrentes, temas comuns e categorias”. Dessa forma, as categorias de análise são
apresentadas conforme o quadro a seguir:
57
Quadro 1 – Categorias de análise
Objetivos específicos
Categorias de análise
Descrição Instrumento
Identificar perspectivas sobre o assédio moral individual
Perspectivas sobre o assédio moral individual
Qualquer conduta abusiva (gesto, palavra, comportamento, atitude) que atente, por sua repetição ou sistematização, contra a dignidade ou integridade psíquica ou física de uma pessoa, ameaçando seu emprego ou degradando o clima de trabalho. (HIRIGOYEN, 2006, p. 17)
O que você entende por assédio moral individual? Quais as características de um assédio?
Identificar perspectivas sobre o assédio moral coletivo
Perspectivas sobre o assédio moral coletivo
[...] o empregador, utilizando-se abusivamente do seu direito subjetivo de organizar, regulamentar, fiscalizar a produção e punir os empregados, utiliza-se desses direitos de forma reiterada e sistemática, como política gerencial, atentando contra os direitos humanos fundamentais dos empregados em todas as dimensões, geralmente para o incremento da produção. (MUÇOUÇAH, 2014, p. 196)
O que você entende por assédio moral coletivo ou organizacional?
Descrever o papel dos sindicatos em relação ao assédio moral no trabalho
Papel dos sindicatos em relação ao assédio moral no trabalho
Organismos sociais que objetivam defender os interesses econômicos e sociais, de suas respectivas categorias profissionais, individual e coletivamente, com o intuito de garantir melhores condições de trabalho e vida. (ROSSI; GERAB, 2009)
Em sua opinião, qual o papel dos sindicatos frente ao assédio moral? Que orientações o sindicato dá aos trabalhadores em relação ao assédio moral?
Verificar implicações práticas dos sindicatos nas questões relativas ao assédio moral no trabalho
Implicações práticas dos sindicatos nas questões relativas ao assédio moral no trabalho.
Ações de acolhimento, de apoio, combate e prevenção promovidas pelas entidades.
Como o sindicato atua nos casos de assédio moral que toma conhecimento? O que o sindicato faz para evitar a prática do assédio moral?
58
3.5 TRATAMENTO DOS DADOS
O tratamento dos dados utilizado foi a análise de conteúdo, que possibilita o
estudo das significações de temas cotidianos, sendo adequado para objetivo deste
estudo. De acordo com Bardin (2009), a análise de conteúdo se caracteriza como um
conjunto de métodos de
[...] análise das comunicações visando obter por procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das mensagens, indicadores (quantitativos ou não) que permitam a inferência de conhecimentos relativos às condições de produção/recepção (variáveis inferidas) destas mensagens (BARDIN, 2009, p. 44)
Através dessa metodologia de tratamento de dados, pretendeu-se analisar as
falas dos membros da diretoria dos sindicatos acerca do assédio moral, criando
categorias a partir dos sentidos construídos pelos entrevistados.
Para tanto, foram seguidas as fases propostas por Bardin (2009), a organização
da análise, a codificação e a categorização. A fase de organização da análise
corresponde ao planejamento e preparação do material que será utilizado para a
análise de conteúdo e se caracteriza pela leitura preliminar do material e pela
organização do mesmo. A fase de codificação faz referência ao processo de
transformar os dados brutos em unidades que representem o conteúdo pesquisado.
É nesta fase que se escolhe a unidade de registro que serão “recortadas” do texto, e
se estabelece as categorias de análise nas quais, os “recortes” serão “agregados”
posteriormente. Na fase da categorização, as unidades de registro são categorizadas
conforme aspectos em comum, de forma a possibilitar a análise temática dos dados.
Por fim, são realizadas as inferências sobre os dados encontrados à luz do referencial
teórico apresentado.
Dessa forma, para a realização deste estudo, primeiramente foi realizado a
organização do material, onde se procedeu com a transcrição das entrevistas e a
leitura inicial das mesmas, o que possibilitou a definição da unidade de registro e o
esboço das categorias de análise. A unidade de registro adotada foi o tema, que “é a
unidade de significação que se liberta naturalmente de um texto analisado segundo
certos critérios relativos à teoria que serve de guia à leitura” Bardin (2009, p. 131).
Posteriormente as entrevistas foram impressas e iniciou-se o processo de
59
codificação, onde cada unidade temática foi destacada do texto (recortada) conforme
as categorias de análise propostas. Nessa fase, cada entrevista foi analisada,
identificando as perspectivas dos entrevistados de acordo com o sentido expresso em
afirmações e frases relacionadas às categorias de análise, ou seja, a percepção do
assédio moral individual, do assédio moral coletivo, do papel do sindicatos e das ações
realizadas pelas entidades sindicais.
Na categorização, as unidades temáticas foram classificadas e agrupadas nas
respectivas categorias. Foi elaborado um quadro-síntese para cada categoria de
análise, agrupando as unidades temáticas a fim de organizar as falas dos
respondentes e identificar os aspectos em comum de suas perspectivas.
Finalmente, cada categoria foi analisada e contextualizada relacionando os
achados da pesquisa com a literatura sobre o tema.
60
4 ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS
Este capítulo dedica-se à análise e discussão dos achados da pesquisa,
resultantes das entrevistas com os representantes sindicais acerca do assédio moral
no trabalho. Os resultados demonstram a percepção dos sindicatos, por meio de seus
diretores, a respeito do assédio moral, tanto em nível individual quanto em nível
coletivo, bem como as ações que estes sindicatos costumam adotar diante dos casos
que tomam conhecimento.
Devido a ausência da participação dos sindicatos patronais, não é possível
conhecer o ponto de vista dos mesmos em relação ao assédio moral. Por outro lado,
abre margem para inferências a respeito da indisponibilidade em falar sobre o
assunto. Lopez (2012) pontua que os sindicatos patronais têm como prioridade os
embates para diminuição da carga tributária, relegando ao segundo plano, as
discussões sobre relações de trabalho.
De modo geral, o patronato deseja que as relações de trabalho sejam
estabelecidas de maneira que favoreçam os seus negócios. Assim, pode-se inferir que
o assédio moral no trabalho seja um assunto espinhoso para os empresários e que
reflete na postura de suas entidades sindicais.
Pensar sobre o assédio moral implica em refletir sobre a exploração da mão da
obra em todas suas nuances, e qualquer coisa que implica em diminuição de capital,
mesmo que seja para a melhoria na saúde do trabalhador, não é de interesse do
patronato.
4.1 PERSPECTIVAS SOBRE O ASSÉDIO MORAL INDIVIDUAL
Para a apresentação inicial dos dados e a título de organização, foi elaborado
um quadro que sintetiza o entendimento do assédio moral no trabalho por parte dos
dirigentes sindicais entrevistados.
61
Quadro 2 - Perspectivas sobre o assédio moral individual
Sindicatos Descrição
S1
“todo ato inconveniente” “que excede” “o desencontro de informações e atitudes que são consideradas erradas, inconvenientes”
S2 “você é desrespeitado como trabalhador” “usa de abuso de poder para ameaçar”
S3
“constrangimentos praticados pelo empregador para com o empregado ou de um mesmo colega” “quando reiterada essas condições” “tortura psicológica para enfraquecer o empregado emocionalmente”
S4 “usurpação de tarefas e atribuições” “faz parte da cultura organizacional então acaba entrando na normalidade, é normal, é comum, isso acontece em toda organização”
S5
“extrapolação dos limites de alguém de um cargo superior com relação aos seus subordinados” “tratamento desproporcional com o empregado” “desde agressões verbais, físicas, psicológicas até a estipulação de metas que praticamente não são atingidas pelos funcionários”
S6
“toda e qualquer situação que coloque um profissional numa situação de constrangimento” “esse desrespeito pode ser de várias formas, pode ser uma agressão física, pode ser uma agressão verbal, pode ser uma situação de constrangimento”
S7 “é você gritar com alguém ou desconhecer a capacidade do outro” “quando você acha que é melhor que o outro”
S8
“a questão das metas” “o que caracteriza é essa cobrança constante, essa lembrança constante, essa ameaça constante, isso vai fazendo com que a pessoa vai perdendo o sono, vai perdendo a alegria, vai perdendo a saúde mental e física”
S9
“exposição a situação humilhantes e constrangedoras, repetitivas e prolongadas durante a jornada de trabalho e no exercício de suas funções” “o constrangimento, as ameaças, o isolamento” “deboche”
S10 “o que entendo é patrões ou pessoas de cargos de confiança na empresa que grita o funcionário, às vezes confunde a vida pessoal e levam para o lado amoroso”
Fonte: Dados da pesquisa
Em uma análise preliminar, observa-se que os representantes dos sindicatos
pesquisados têm algum entendimento, mesmo que superficial, sobre o assédio moral
no trabalho. Demonstra que o tema já chegou ao conhecimento das organizações
sindicais e que em maior ou menor grau, estão familiarizados com o assunto.
Comportamentos e/ou atitudes como, desrespeito, constrangimento, abuso de
poder, inconveniência, estão presentes nos discursos dos dirigentes sindicais, como
características do assédio moral. Esse entendimento está consoante com o
apresentado pela literatura.
62
Por outro lado, existem elementos conceituais e característicos do assédio
moral que não foram abordados. Estudiosos do assunto pontuam a questão da
repetitividade como aspecto característico e definidor do assédio moral, ou seja, para
ser considerado assédio moral, os comportamentos abusivos devem ocorrer de forma
constante. Neste aspecto, por exemplo, somente três representantes sindicais (S3,
S8 e S9) citaram essa característica.
O dirigente do sindicato 1 (S1) entende o assédio moral como “ato
inconveniente” relacionando-o com uma situação pontual, entre duas pessoas,
derivado da relação de trabalho e decorrente da incapacidade técnica do assediador.
O dirigente entende que o assédio é decorrente de características pessoais do
agressor (“a pessoa nasce daquele jeito, é daquela forma, só pode passar aquilo que
recebeu”) ou por algum despreparo em sua atuação e dessa forma age com
agressividade para esconder uma inabilidade profissional (“uma espécie de resposta
da sua incompetência”).
No mesmo sentido, o representante do sindicato 5 (S5) e o representante do
sindicato 7 (S7) compreendem o assédio moral como algo pessoal, que parte do
superior para o inferior (“muitas vezes o problema é de um encarregado, de um
supervisor”) e que se caracteriza por palavras ofensivas e agressões aos
subordinados. O dirigente do sindicato 10 (S10) também assinala que as agressões
partem de um superior hierárquico, mas considera assédio qualquer “grito” ou conflito
interpessoal, tendendo ao assédio sexual.
De fato, a literatura relaciona uma série de casos onde a situação do assédio
aconteceu devido a características pessoais do assediador, como insegurança,
ambição, inveja, mau humor, competitividade, arrogância, entre outras, ou, devido a
características físicas ou cognitivas da vítima, que de alguma forma, trazem
incômodos para os algozes (MARTINS, 2015; HIRIGOYEN, 2006). Por outro lado, há
quem critique essa concepção como deveras reducionista, estigmatizante e
descontextualizada (BARRETO; FREITAS; HELOANI, 2008; LIMA; LIMA; VIEIRA,
2012).
Situações de constrangimento foram apontadas como a principal característica
do assédio moral no trabalho, na percepção dos dirigentes dos sindicatos 3 e 6 (S3 e
S6, respectivamente), tanto por parte de colegas quanto por seus superiores. Sendo
que o dirigente do S3 deixa claro que estas situações devem ocorrer de forma
reiterada para ser considerado assédio moral, enquanto que o dirigente do S6 coloca
63
que “essas situações podem até se exceder, passar do constrangimento para algo
mais grave, algo mais sério”, revelando a dificuldade que se tem em definir um limiar
para a configuração do assédio.
A responsabilidade do empregador em intervir nos casos de assédio foi
levantada pelo representante do S3 (“e o empregador não tomar nenhuma iniciativa,
aí é caracterizado o assédio moral”) e acrescenta que algumas empresas “que não
gostam de dar as contas do trabalhador” se utilizam de tortura psicológica para
pressionar o empregado até que ele peça demissão. Nesse caso, pode-se considerar
essa prática como proveniente da política empresarial, uma vez que fica nítido que o
objetivo é não arcar com as despesas demissionais.
Dois representantes sindicais (S2 e S9) entendem que o assédio se dá por
abuso de poder de superiores hierárquicos, com anuência da gestão que não se
posiciona de forma correta. O representante do S2 relata que ameaças sutis são
cotidianamente impetradas aos trabalhadores através de situações do tipo: “se você
não fizer isso, você vai assinar advertência”, caracterizando um clima decorrente de
uma gestão por medo, como colocado pela literatura (SOBOLL; FREITAS; ZANIN,
2015). De forma semelhante, o representante do S9 compreende que o assédio
sofrido pela categoria se dá por abuso de poder, sendo que nesse caso, por se tratar
de servidores públicos, a hierarquia formal, os interesses políticos e econômicos, e a
briga por poder e status, contribuem para situações assediadoras tais como, desvios
de função, ameaças de transferências e humilhações que os superiores hierárquicos
se acham no direito de verbalizar publicamente por estarem revestidos em cargo
superior.
O dirigente do S2, destaca uma outra forma de assédio que se dá em função
da atividade terceirizada que grande parte da categoria exerce, a restrição de uso de
áreas de alimentação e repouso das empresas em que prestam serviço. Os
trabalhadores são proibidos de usar a copa ou área afim, pois essa é destinada
apenas aos trabalhadores da empresa. Dessa forma, em seu horário de almoço, o
terceirizado é obrigado a comer em algum outro lugar, geralmente em local
inapropriado, como por exemplo, no banheiro.
Em um caso recente, o trabalhador tirou uma foto sua almoçando dentro do
banheiro e postou nas redes sociais. O caso teve certa repercussão e a empresa agiu,
remanejando a equipe para outro posto e colocando uma nova equipe no local. Este
caso demonstra uma pequena parcela da fragilidade das relações de trabalho a que
64
estão expostas diversas categorias de trabalhadores terceirizados.
Já o representante do S9 relata que o maior problema são as ameaças de
transferências, “quando a gente desagradava nosso chefe, por qualquer coisa que
fosse, por qualquer situação que ele achava que nós estávamos o desagradando,
éramos transferidos [...] como um saco de batata”. E acrescenta: “simplesmente
porque não agrada o gestor em algum posicionamento ou é contrário à política que
ele adota no local de trabalho”.
Embora isso também aconteça no setor privado, são situações típicas de
instituições públicas, onde o poder hierárquico, o poder político, o tráfico de
influências, são práticas sutis e culturalmente instituídas, como bem observa Tolfo,
Silva e Krawalski (2015) quando discorrem sobre os clientelismos, corporativismos e
favoritismos existentes nas organizações públicas.
O dirigente do sindicato 4 (S4), que representa servidores públicos, também
relata situações semelhantes, de abuso de poder institucionalizado pela cultura
organizacional que perpassa o funcionalismo público brasileiro. Para o representante
do S4, os principais problemas são a carência de material adequado para o trabalho
e a falta de uma gestão profissional, sem “panelinhas”. Acrescentam que os
sindicalistas sofrem perseguições devido aos enfrentamentos na busca por melhores
condições de trabalho. Entendem, dessa forma, que o assédio moral no trabalho não
se configura por causa da personalidade agressora de um superior, mas de
posicionamentos estruturais e gerencias ligados à cultura da instituição.
Diferentemente de outros sindicatos, o representante do sindicato 8 (S8)
entende que o estabelecimento de metas é uma forma de assédio moral individual, na
medida que as metas são individuais, mas compõem uma parte significativa do
salário. Segundo o dirigente do S8, “muitos, muitos colegas estão reféns da sua
comissão e a sua comissão é garantida na medida em que ele possa atingir as metas,
e uma vez atingidas, a meta seguinte vem maior”. Ou seja, todos estão expostos a
mesma situação, numa relação de dependência da comissão, imposta gradativamente
pelas instituições (para redução de custos fixos) e fazendo com que todos se
submetam as mais diversas situações de constrangimento para manter seus
rendimentos. Como coloca o representante do S8, “e não cumpra meta pra você ver”,
o clima de cobranças é contínuo e corriqueiro, e traz consequências maléficas para a
saúde dos trabalhadores.
Dessa forma, o dirigente do S8 entende que o assédio moral no trabalho advém
65
das políticas de gestão, da cobrança exagerada para o atingimento de metas,
utilizando e-mails, mensagens por celular, comparações e sutilmente exigindo que se
trabalhe além do horário, pois quem não o faz é considerado preguiçoso. Por outro
lado, o dirigente sindical reconhece que há casos de assediadores contumazes,
pessoas sem escrúpulos que fazem qualquer coisa para alcançar os objetivos, mas
entendem também, que muitas vezes o assediador não percebe seus atos por estar
sendo vítima de um mesmo sistema, pautado em relações assediadoras.
Os posicionamentos dos representantes sindicais em relação ao assédio moral
no trabalho estão coerentes com o apresentado pela literatura, embora se percebam
algumas considerações pouco abrangentes ou reducionistas. O fato dos dirigentes
dos sindicatos terem conhecimento sobre o assunto, revela que o assédio moral no
trabalho já é um tema discutido e tratado pelas entidades sindicais, em maior ou menor
grau, e de acordo com as particularidades de cada categoria representada.
4.2 PERSPECTIVAS SOBRE O ASSÉDIO MORAL COLETIVO
Além do entendimento dos sindicatos em relação ao assédio moral individual,
também foi questionado suas opiniões sobre o assunto, no que se refere à forma
coletiva ou organizacional. Os dados coletados sobre a percepção dos sindicatos a
respeito do assédio moral coletivo foram organizados no quadro a seguir e serão
discutidos em seguida.
Quadro 3 - Perspectivas sobre o assédio moral coletivo
Sindicatos Descrição
S1 “é um mal social”
S2 “determinada empresa, tem muitos horistas” “como são quatro horas, não tem direito a nada, só estar ali, trabalhar e calar a boca”
S3 “escravatura branca” “a forma como os empregadores intimidam os empregados”
S4
“você é servidor público, você está investido naquela função e você precisa atuar mas o cara não te dá condição” “são vários problemas de gestão que acabam fortalecendo uma cultura assediadora”
S5 “é principalmente com relação a estipulação das metas”
S6 “a denominação é igual ao o individual, pra mim só vai abranger, atingir mais pessoas, mas ele vai prejudicar da mesma forma que prejudica um profissional”
S7 “é quando você faz danos morais ao outro”
66
S8
“ele vem de uma forma brutal, via plano de cargos e salários que não sai, via reestruturações que você faz dentro do setor e que atinge blocos inteiros, segmentos da categoria que é obrigada a se mudar dali, ir pra outro estado, ou ir pra outro local, ou se sujeitar em condições muito diferentes do que aquilo ali e via acordo coletivo”
S9
“por falta de estrutura adequada, era desviado de sua função” “presença de pessoas estranha ao quadro de pessoal, com a conivência dos nossos chefes, dentro das unidades de trabalho” “falta de estrutura, pressão por efetivo insuficiente e punições inadequadas”
S10 “os patrões ou pessoas no cargo de chefia que, por exemplo, alguns trabalhadores são obrigados a fazerem entregas apressados sem poder usar o banheiro”
Fonte: Dados da pesquisa
Numa análise geral, observa-se que nenhum representante de sindicato soube
conceituar o assédio moral coletivo, alguns apresentam uma caracterização através
de exemplos, enquanto outros não apresentaram familiaridade com o assunto e
expuseram em suas percepções uma visão semelhante ao do assédio moral
individual. Se referindo apenas a questão quantitativa para diferenciar os conceitos.
Isso pode apontar para o distanciamento do conhecimento produzido nas academias
com a realidade sindical cotidiana.
Observa-se esse pensamento por parte dos representantes dos sindicatos 1, 6
e 7 (S1, S6 e S7, respectivamente), que colocam que o assédio moral coletivo é igual
ao individual, atingindo, porém, um número maior de pessoas. O representante do S6
entende que abrange mais pessoas, mas que é tão prejudicial quanto na forma
individual, quando atinge uma determinada pessoa. Os representantes dos sindicatos
1 e 7 colocam o assédio moral coletivo de forma muito vaga, como “um mal social” ou
quando se provoca “danos morais ao outro”, demonstrando um certo
desconhecimento do assunto, que pode ser derivado da pouca intimidade com essa
forma de assédio.
Uma particularidade trazida pelos representantes desses sindicatos é que
nenhum deles relatou ter recebido casos de assédio moral no trabalho. Dessa forma,
pode-se imaginar que as formas coletivas de assédio, advindas da organização do
trabalho, não afetam essas categorias, ou que a categoria e seus representantes
sindicais não atentaram ainda para essas sutis formas de assédio moral.
O dirigente do sindicato 3 (S3) relaciona o assédio moral coletivo ao que ele
denomina “escravatura branca” fazendo alusão à exploração da mão de obra e a
submissão ao trabalho abusivo, que se dá na forma de como os empregadores tratam
67
seus empregados, bem como no estabelecimento de metas excessivas, com a
finalidade de lucros maiores.
As metas abusivas também são consideradas como assédio moral coletivo pelo
representante do sindicato 5 (S5), pois provocam a necessidade de um ritmo intenso
de trabalho, e as cobranças excessivas e contínuas acabam por resultar em uma
política organizacional assediadora, pela via da alta produtividade imposta.
O assédio moral coletivo decorrente do estabelecimento de metas é bastante
discutido pela literatura, que entende essas exigências como uma característica da
gestão do processo produtivo e, portanto, prerrogativa do empregador. E justamente
por entender o estabelecimento de metas como derivado do modelo de organização
do trabalho, os sindicatos sentem-se pouco implicados nesse âmbito de negociação
(COTANDA, 2008).
A respeito disso, o dirigente do S5 coloca que “muitas vezes, como são
questões que afetam o processo produtivo propriamente dito, a gente já sabe que é
perda de tempo né, a empresa vai dizer: é o sindicato que determina a minha forma
de produção? ”, demonstrando a dificuldade de atuação e negociação sobre esses
aspectos. Além disso, esse comentário reflete o pensamento do patronato no que se
refere a intromissão dos sindicatos laborais nas discussões sobre a organização do
trabalho.
Um outro ponto de vista sobre o assédio moral coletivo é apresentado pelo
dirigente do sindicato 2 (S2), que aborda a questão da precarização dos vínculos
trabalhistas como uma forma ultrajante de assediar trabalhadores. O dirigente do S2
relata o caso dos horistas, que são contratados apenas para “tirar horário de almoço”
de outros colegas. Nesse caso, os “horistas” estão expostos às mesmas exigências e
condições dos colegas, mas sem a mesma garantia de direitos trabalhistas. Além da
perda de direitos, esses trabalhadores ainda sofrem humilhações de seus
empregadores, quando buscam esclarecimentos ou tentam melhores condições de
trabalho.
Além disso, pela característica do trabalho, que se faz principalmente pela
atividade terceirizada, os trabalhadores estão sujeitos às condições das empresas em
que prestam serviço. O dirigente do S2 coloca que em algumas empresas, os
trabalhadores terceirizados não podem utilizar áreas comuns, como a copa, o local
para repouso, entre outros. Assim, o entendimento de assédio moral coletivo, para o
representante do S2, se caracteriza pela precarização do trabalho, pela terceirização,
68
e pela fragilidade de alguns tipos de vínculos trabalhistas.
A perspectiva apresentada por esse dirigente sindical corrobora com o
posicionamento de Muçouçah (2014), que coloca a terceirização como uma forma de
assédio moral coletivo, pois nessa relação os contratos de trabalho são mais
vulneráveis, alguns direitos são descartados e principalmente, porque o maior objetivo
é a redução de custos trabalhistas para o aumento da competitividade e lucratividade
organizacional. O autor acrescenta que os empregados terceirizados não podem
receber ordens da empresa na qual estão prestando o serviço, podendo ser
considerado vínculo empregatício, e dessa maneira, reforça a invisibilidade dos
trabalhadores terceirizados, pois em muitos casos, não se deve nem falar com eles.
Nos dois sindicatos que representam servidores públicos (S4 e S9), seus
representantes entendem o assédio moral coletivo de forma semelhante, como
consequência da precarização das condições de trabalho e das formas de gestão.
Instalações físicas inadequadas ao trabalho, equipamentos obsoletos, defeituosos ou
a falta de equipamentos, e as práticas de gestão, que utiliza ameaças de transferência,
abuso de poder e autoritarismo, são os exemplos citados por esses sindicatos como
forma de assédio moral coletivo e estão arraigados na cultura organizacional do
serviço público brasileiro.
De acordo com esses representantes sindicais, essa cultura organizacional
está tão naturalizada no cotidiano que se torna difícil de percebê-la como assediadora.
São condições consideradas típicas de instituições públicas e dessa maneira, julgadas
como inerentes ao trabalho. As organizações públicas, muitas vezes se comportam,
na analogia de Morgan (1996), como sistemas políticos, onde predomina a busca pelo
poder, seja por meio do controle de recursos, informações ou pelo processo decisório.
No mesmo sentido, Tolfo, Silva e Krawalski (2015) salientam que nas
instituições públicas, por questões políticas, hierárquicas e culturais, as relações de
trabalho são ambíguas, instáveis e propensas a desigualdades e conflitos. Estas
questões são consideradas pelos dirigentes dos sindicatos 4 e 9 quando eles colocam
que “não temos gestão profissional”, ou quando observam os desvios de função e os
cargos comissionados, ou ainda, pela aplicação de punições indevidas ou
injustificadas pelos gestores.
Numa perspectiva um pouco diferente das demais, o representante do sindicato
8 (S8) coloca como assédio moral coletivo, as reestruturações promovidas dentro do
setor e que atingem segmentos inteiros, os remanejamentos de setores e até de
69
cidades, e os acordos coletivos de trabalho firmados pelos empregadores com a
anuência dos sindicatos. De acordo com o representante do S8, um exemplo claro do
assédio moral sofrido pela categoria foi a obrigação de trocar o plano de aposentadoria
para poder ser beneficiado pelo plano de cargos e salários.
O dirigente do S8 relata que desde 2006, o setor vem promovendo mudanças
nos planos de cargos e salários e de aposentadoria. Essas mudanças condicionam
um ganho à uma perda. Para o trabalhador ter direito ao plano de cargos e salários,
ele precisa mudar do plano de aposentadoria que fazia parte de seu contrato de
trabalho para outro plano, mais inseguro e instável. Esse acordo teve participação do
movimento sindical majoritário, que segundo o representante sindical, não teve senso
crítico e foi incapaz de se opor ao governo.
Após 2006, muitos outros planos foram sendo implementados, para as diversas
categorias existentes dentro do setor. Na maioria das vezes, os planos apresentavam
melhorias significativas, mas também haviam perdas de direitos anteriormente
conquistados, além de gerar maior dependência às comissões e outros bônus
variáveis. Dessa forma, as instituições diminuíram custos fixos e aumentaram sua
lucratividade, enquanto os trabalhadores foram obrigados a se sujeitar às condições
impostas.
Nesse sentido, Maciel et al. (2007) destaca que o impacto da estrutura
organizacional e do desequilíbrio de poder nas relações de trabalho, resulta em
situações propicias para o assédio moral coletivo.
O representante do sindicato 10 (S10) faz referência ao assédio moral coletivo,
colocando que na sua categoria ele se apresenta através de cobranças para o
cumprimento dos prazos, culminando no controle de uso do banheiro, para que não
haja atrasos. Entende, assim, que o assédio moral se manifesta na medida que os
interesses organizacionais se sobrepõem as necessidades básicas dos
trabalhadores.
O poder diretivo do empregador lhe dá direito de definir como organizar,
regulamentar, fiscalizar e disciplinar o modo de produção. A definição desse “modo de
fazer” dá origem a cultura organizacional e as políticas de gestão, e em alguns casos,
podem ser consideradas abusivas e acarretar em assédio moral coletivo, na medida
que ferem direitos trabalhistas e direitos humanos (MUÇOUÇAH, 2014).
O entendimento que os dirigentes dos sindicatos têm sobre o assédio moral
coletivo condiz com a realidade por eles vivenciada e se aproxima mais ou menos do
70
indicado pela literatura. Embora o assédio moral coletivo pareça ser mais óbvio, mais
facilmente identificado, é justamente o contrário que se estabelece, pois ele está
disfarçado e institucionalizado como política organizacional e legitimado pelos
trabalhadores como algo natural e inerente ao trabalho.
4.3 O PAPEL DOS SINDICATOS EM RELAÇÃO AO ASSÉDIO MORAL NO
TRABALHO
Como entidades que representam categorias profissionais, os sindicatos
cumprem um papel importante e fundamental na defesa de interesses e direitos
trabalhistas e na luta por melhores condições de trabalho para os trabalhadores. Os
sindicatos devem promover uma formação social e política para seus dirigentes e toda
categoria, para que juntos possam atuar em favor de ambientes de trabalho salutares
e livres de qualquer tipo de degradação à saúde.
Assim, buscou-se identificar como os representantes sindicais percebem a
função do sindicato frente ao assédio moral no trabalho. O resultado foi organizado
no quadro abaixo e será discutido em seguida.
Quadro 4 - Papel dos sindicatos em relação ao assédio moral no trabalho
Sindicatos Descrição
S1 “isso é uma exceção de regra”
S2 “o sindicato é totalmente contra” “quando chega ao nosso conhecimento a gente procura logo a empresa. É inadmissível”
S3 “primeiro, o combate”
S4 “combater e só combatendo é que a gente vai conseguir evitar que no futuro aconteça novamente”
S5 “da defesa e da prevenção”
S6
“é uma das funções precípuas do sindicato. A gente precisa zelar pela legalidade da profissão, pelo respeito as normas trabalhistas, mas precisa zelar também pelas condições de trabalho e isso incide diretamente na condição de trabalho”
S7 “é uma pessoa que atingiu ela não é a empresa. Ele, aquele ofendido, tem que ir numa delegacia prestar uma queixa de que ele ofendeu. Uma pessoa física contra outra”
S8
“nós temos que coibir, nós temos que acompanhar, dar as condições pra os colegas para que eles se sintam amparados” “o sindicato tem esse papel de denunciar, de prover o ministério público de informações, de coibir, de combater, de fazer zoada, vamos dizer assim”
71
S9 “o sindicato foi responsável em fomentar essa ideia, a categoria comprou essa ideia e fomos pra luta. Passou a ser pauta de reivindicação”
S10 “é dever do sindicato lutar contra o assédio”
Fonte: Dados da pesquisa
De um modo geral, observa-se que o combate aparece como uma das
principais funções dos sindicatos em relação ao assédio moral no trabalho. Os
dirigentes sindicais entendem que devem lutar contra qualquer tipo de degradação do
trabalho, para que o bem-estar e a saúde dos trabalhadores sejam preservados.
No entanto, para alguns representantes dos sindicatos, o assédio moral no
trabalho é uma realidade distante da categoria representada e, portanto, se referem
ao papel do sindicato com relação ao assunto de forma vaga ou se esquivando dessa
responsabilidade. Por exemplo, o representante do sindicato 7 (S7) entende que o
assédio moral ocorre na relação entre duas pessoas, de forma desvinculada do
contexto organizacional, e que assim, o trabalhador, vítima de assédio moral, deve
procurar a polícia e denunciar o agressor, independentemente de a situação ser
decorrente de circunstâncias laborais. Para o dirigente do S7, os trabalhadores estão
mais interessados nas possíveis indenizações, em obter um retorno financeiro,
demonstrando descrédito ao adoecimento real dos trabalhadores e isentando as
empresas de qualquer responsabilidade. Não quer dizer que o sindicato deve se
abster nesses casos, mas não percebe a relação do assédio com a atividade laboral,
relacionando-o a questões individuais, em que o sindicato não precisa atuar.
O dirigente do sindicato 1 (S1) entende que o assédio moral no trabalho é uma
exceção, que raramente acontece, e a regra é seguir a ética e “trabalhar com
prudência de atitudes”. Reconhece que o sindicato deve defender o trabalho digno,
ético, mas por não haver casos na categoria, acredita que não é assunto pertinente
ou relevante para o cotidiano sindical.
Embora também não tenha relato de casos de assédio moral no trabalho, o
representante do sindicato 6 (S6) compreende que esse tipo de violência está
relacionado as condições de trabalho, que precisam ser zeladas para a garantia de
um ambiente de trabalho saudável. De acordo com o dirigente sindical do S6 o debate
sobre assédio moral no trabalho ainda é muito incipiente no Rio Grande do Norte e
acrescenta que somado a isso, aqui no Estado não há uma cultura de denúncia. Do
ponto de vista deste dirigente sindical, a questão preponderante para a ausência de
72
casos de assédio na categoria é a existência de muitos profissionais no mercado e
poucas oportunidades de emprego, então por medo de perder seus empregos, os
trabalhadores não costumam denunciar. Apesar desse contexto, o representante do
S6 acredita que é papel de qualquer sindicato zelar por condições de trabalho dignas
e salutares.
O dirigente do sindicato 3 (S3) coloca o combate como a característica principal
da atuação da entidade frente ao assédio moral. Relata que costumam procurar o
sindicato patronal para a solução de conflitos decorrentes do assédio moral, partindo
do princípio que essas situações não correspondem aos valores e política da
empresa, mas de certos indivíduos que podem inclusive “manchar” o nome da
empresa. De qualquer forma, acredita que é uma prática que deve ser combatida
pelos sindicatos, principalmente nos casos em que fica claro que é o posicionamento
estratégico da empresa, como no caso de pressionar o trabalhador para pedir
demissão e evitar os custos com os encargos demissionais.
Para os representantes dos sindicatos 5 e 10 (S5 e S10, respectivamente), é
dever das entidades sindicais lutar contra o assédio moral no trabalho. Sendo que o
representante do S5 acrescenta que os sindicatos não devem apenas combater o
assédio, mas também prevenir sua ocorrência. Infelizmente, prevenir não é tarefa
fácil, pois como coloca Magalhães Filho e França (2015), é a partir das denúncias de
assédio moral que se pode definir um plano de intervenção, para posteriormente atuar
de forma preventiva, mas baseada em situações reais.
Além de denúncias, os sindicatos podem pautar suas ações a partir de dados
sobre a saúde de seus trabalhadores. O dirigente do sindicato 4 (S4) por exemplo,
começou a atentar para o assédio moral por causa dos altos índices de afastamento
do trabalho por adoecimento e pelo número de suicídios que vinham acontecendo na
categoria. De acordo com o representante do S4, 35% dos afastamentos estão
relacionados a problemas psíquicos e a cada três meses se efetiva um suicídio. Diante
desses números, o sindicato começou a investigar as possíveis causas desses
afastamentos e suicídios e iniciou uma campanha para combater o assédio moral no
trabalho. Assim, o dirigente do S4 entende que o papel do sindicato é combater
qualquer forma de assédio para preservar a saúde ocupacional dos trabalhadores,
principalmente a saúde mental.
De maneira semelhante, o representante do sindicato 9 (S9) partiu da realidade
vivenciada pela categoria, com números significativos de afastamentos e suicídios,
73
para perceber a necessidade de atuar na proteção da saúde dos trabalhadores. Os
casos de doença e afastamento estavam relacionados as más condições de trabalho
e ao assédio moral no trabalho, precipitando assim, a necessidade de criar
campanhas de esclarecimento, demonstrando para a categoria que certas situações
laborais eram insalubres e deveriam ser combatidas. O dirigente do S9 entende que
o assédio moral deve ser combatido pelos sindicatos através da sensibilização e
orientação dos profissionais para que as condutas abusivas sejam denunciadas e
erradicadas, e também por meio de reivindicações de melhores, e mais justas,
condições de trabalho.
Para o representante do sindicato 3 (S3) o assédio moral no trabalho é
inaceitável e logo que toma conhecimento de algum caso, age imediatamente,
procurando maiores informações e entrando em contato com a empresa para
estabelecer um diálogo e tentar uma solução amistosa. Além disso, orienta os
trabalhadores a procurar uma maneira de obter provas do assédio moral sofrido, tanto
para se assegurar em caso de questionamento por parte da empresa, quanto para
provar perante a justiça, se for o caso. O dirigente do S3 salienta que é importante
investigar o que de fato está acontecendo, lembrando que nem toda queixa é
realmente um assédio moral, uma vez que “a gente sabe que tem trabalhador que é
trabalhoso, então tudo isso a gente observa”. Em questões de assédio coletivo, busca
através de acordos coletivos, negociar melhores condições de trabalho e que os
direitos trabalhistas sejam garantidos para toda a categoria de forma igualitária. Assim,
esse representante sindical, da mesma maneira que os outros, acredita que é dever
dos sindicatos combater o assédio moral, na medida que afeta a saúde dos
trabalhadores.
Por ser tão corriqueiro e generalizado na categoria profissional representada
pelo dirigente do sindicato 8 (S8), o assédio moral no trabalho já é ponto de pauta
permanente. Para esse representante, a função do sindicato frente ao assédio moral
é a de combater e coibir essa prática perversa, através de denúncias e
acompanhamento dos casos. Relata receber mais casos de assédio moral no trabalho
do que de outras doenças ocupacionais típicas da categoria como LER e DORT e por
isso o tema tem enfatizado as discussões e ações de combate a esse tipo de violência
laboral. O sindicato conta com um jornal semanal no qual faz denúncias, que são lidas
pelos procuradores do ministério do trabalho e que já serviu de base para abertura de
processos sobre assédio moral. O sindicato atua de forma enérgica na defesa dos
74
interesses da categoria e com isso conquistou a confiança dos trabalhadores, de
forma que eles se sentem amparados e representados.
Diante do exposto, é possível observar um reconhecimento por parte das
entidades sindicais de suas funções precípuas, que devem incluir as questões
relacionadas ao processo de trabalho (organização e gestão do trabalho) em suas
pautas de discussões e negociações. Mesmo aqueles que não relatam casos de
assédio moral, percebem que esses aspectos da atividade laboral merecem a atenção
dos sindicatos. Com exceção do sindicato 7 que entende a situação de assédio como
um conflito interpessoal que deve ser resolvido entre as partes e nada tem a ver com
a atividade laboral e portanto não considera que o sindicato deve se envolver.
Como Cotanda (2008, p. 632) coloca, o envolvimento dos sindicatos no
combate ao assédio moral no trabalho, “supõe a afirmação do processo de trabalho
como um campo de conflito sobre o qual a entidade sindical deve atuar”. Dessa forma,
compreender que o assédio moral é resultado das desigualdades existentes nas
relações de trabalho, exige dos sindicatos uma postura política ativa, orientadora e
mediadora.
Amazarray, Câmara e Carlotto (2014), afirmam que os sindicatos que são
instruídos e atuantes quanto aos processos de sofrimento e adoecimento dos
trabalhadores, costumam ter mais informações e empoderam a categoria com
esclarecimentos acerca de como identificar o assédio moral e onde buscar ajuda.
Quanto maior o conhecimento sobre o assunto, mais as entidades sindicais
poderão fazer cumprir seu papel de proteger a saúde mental de seus trabalhadores e
defender os interesses da categoria representada de obter um ambiente de trabalho
saudável e decente.
Por fim, vale lembrar que até mesmo os dirigentes sindicais podem ser vítimas
de assédio moral, pelo fato se serem sindicalistas. Há relatos de perseguições e
atitudes antissindicais., tendo em vista o papel que os representantes sindicais
exercem junto à categoria e que muitas vezes desagrada aos empregadores.
4.4 A ATUAÇÃO DOS SINDICATOS EM RELAÇÃO AO ASSÉDIO MORAL NO
TRABALHO
Além de conhecer as perspectivas que os sindicatos têm sobre o assédio moral
75
no trabalho, também foi pesquisado qual a conduta adotada diante dos casos por eles
atendidos. Ou seja, questionou-se quais as ações praticadas pelos sindicatos diante
do conhecimento de possíveis situações de assédio moral. As informações coletadas
foram compiladas no quadro abaixo.
Quadro 5. Implicações práticas
Sindicatos Descrição
S1 Não recebem queixas
S2 Conversa com as empresas. Encaminha para Ministério Público. Discute o assunto em assembleias.
S3 Entra em contato com núcleo pró-dignidade do Ministério do Trabalho. Pontualmente, em discussões ou jornal do sindicato.
S4 Resolvem na justiça
S5 Palestras. Ministério Público
S6 Comissão de ética e assessoria jurídica
S7 Palestras
S8 Denuncia no jornal do sindicato que é enviado semanalmente ao Ministério Público. Atos públicos. Seminários. Ponto de pauta constante.
S9 Cartazes em todas unidades de trabalho. Outdoors. Camisas. Adesivos. Boca a boca com a categoria.
S10 Forma comissão para visitar a empresa e se necessário, encaminha para o Ministério Público.
Fonte: Dados da pesquisa
Com a identificação das implicações práticas das entidades sindicais, é
possível perceber que diversas ações em prol do combate do assédio moral no
trabalho são realizadas. Na maioria dos casos, o Ministério Público do Trabalho tem
sido parceiro dos sindicatos, apoiando a atuação sindical no acompanhamento dos
casos e promovendo o debate para que medidas de prevenção e combate sejam
consumadas.
Conforme relatado pelo seu representante, o sindicato 1 não recebe queixas
de assédio moral no trabalho e considera esse tipo de violência inexistente dentro da
categoria, ou quando existe, é de forma individual e diz respeito a personalidade do
algoz e da vítima, não podendo ser alterada. Consequentemente, não realiza qualquer
ação preventiva ou corretiva em relação ao assédio moral.
O representante do sindicato 6 também alega não receber queixas de assédio
moral, mas disponibiliza um comitê de ética para analisar os casos e determinar quais
os encaminhamentos necessários de acordo com cada situação. Se for necessário,
será demandado ao setor jurídico para as providências cabíveis. É importante frisar
76
que o sindicato tem uma postura acolhedora e reconhece a existência de práticas
abusivas, mas considera a questão da falta de emprego como fator determinante para
ausência de denúncias.
Soboll, Freitas e Zanin (2015) sinalizam a importância do acolhimento individual
por parte das organizações sindicais, mas destacam que é fundamental desenvolver
uma percepção mais ampliada, empreendendo uma análise do contexto de trabalho
da categoria e possibilitando o debate sobre o impacto das formas de organização e
gestão do trabalho na saúde dos trabalhadores.
De acordo com o representante do sindicato 7, os casos de assédio na
categoria são pontuais e geralmente com interesse pecuniário, ainda assim, palestras
são realizadas no ambiente de trabalho, para esclarecimentos quanto aos direitos dos
trabalhadores e sensibilização para os aspectos relacionados a saúde e a segurança
no trabalho. Não discute o assédio moral no trabalho especificamente, mas instrui os
trabalhadores para que seus direitos sejam conhecidos e preservados. A parca
implicação por parte da entidade sindical corrobora com sua postura frente ao assédio
moral, uma vez que considera o assédio como resultado de uma situação conflitante
entre duas pessoas, descontextualizada da situação laboral.
Segundo Fabro e Maehler (2015), as entidades sindicais devem atuar
principalmente na prevenção de práticas abusivas, partindo do princípio que o assédio
deve ser entendido como um risco à saúde ocupacional dos trabalhadores. Porém o
que se observa nas entidades sindicais acima destacadas, são atitudes refratárias, na
tentativa de reparação dos danos e/ou da superação do conflito.
O sindicato 5 (S5), de acordo com seu representante, recebe mais denúncias
de assédio moral coletivo, principalmente referentes ao estabelecimento de metas
inatingíveis, e sua conduta é encaminhar ao Ministério Público para averiguação
através de seus fiscais do trabalho. Em termos preventivos, o sindicato realiza
inúmeras palestras em parceria com o próprio Ministério Público, com o Centro de
Referência em Saúde do Trabalhador e com outras organizações, buscando
esclarecer os trabalhadores sobre o assédio moral no trabalho. Os dirigentes sindicais
também participam de capacitações com objetivo de melhor se prepararem para a
atuação nas negociações demandadas. O representante deste sindicato relatou
ainda, que muitas empresas foram multadas em valores significativos, que acabaram
por inibir parcialmente o exagero na estipulação das metas.
A capacitação dos representantes sindicais prepara-os para um
77
acompanhamento mais qualificado dos casos, desde o acolhimento das vítimas até a
mediação com a empresa e/ou sindicato patronal (FABRO; MAEHLER, 2015). Além
disso, destaca a importância de discutir os aspectos contemporâneos de adoecimento
dos trabalhadores diante dos novos contextos de trabalho.
O representante do sindicato 3 expõe que a entidade sindical, ao receber um
caso de assédio moral no trabalho costuma fazer contato com o núcleo Pró-Dignidade
para orientação e encaminhamentos. Além disso, os diretores participam de debates
no Ministério do Trabalho e no Fórum Permanente sobre o assédio moral no trabalho
que a Federação dispõe. Em relação a categoria, promove debates pontuais sobre o
assunto e transmite informações elucidativas através do jornal do sindicato.
De acordo com Soboll e Glina (2012), as intervenções devem ser direcionadas
aos trabalhadores para que eles possam se instrumentalizar e enfrentar a situação
assediadora, e às organizações, na expectativa de modificação dos aspectos
estruturais e situacionais provocadores de assédio moral no trabalho.
Percebe-se que as reações dos sindicatos acima, frente ao assédio moral, têm
se caracterizado por intervenções em nível individual, prestando auxilio ao
trabalhador, mas não intervindo em nível organizacional, nas relações de trabalho e
no modo de organização do trabalho. Como coloca Soboll (2008), em situações de
assédio moral no trabalho, as entidades sindicais enfatizam o agressor ao invés de
direcionar suas ações nos processos organizacionais que deflagram as condutas
abusivas.
No sindicato 4, segundo um dos seus representantes, a conduta tem sido
procurar a justiça, pois já houve muito desgaste em negociações com os gestores
resultando na inviabilidade do debate nesse âmbito. Por ser um sindicato do setor
público, não possui prerrogativa de negociação coletiva, dependendo da criação de
leis para a proteção e ampliação de direitos laborais. Assim, a atuação do sindicato
tem sido no sentido de pleitear uma legislação que privilegie melhores condições de
trabalho afim de evitar o adoecimento da categoria. Paralelamente, diante dos
inúmeros casos de adoecimento e suicídios, o sindicato disponibilizou um médico
psiquiatra e um psicólogo para acolhimento e acompanhamento da saúde mental dos
servidores.
O sindicato 9 também pertence ao setor público e vivencia as mesmas
limitações de suas prerrogativas quanto às negociações. No entanto, esse sindicato
conquistou recentemente, através de muita luta, a aprovação de um estatuto
78
atualizado, moderno e condizente com a realidade de trabalho vivenciada pela
categoria. A luta segue no sentido de fazer cumprir o estatuto em toda sua
integralidade. De acordo com o representante do sindicato, uma grande campanha
está em andamento para o combate do assédio moral no trabalho. Confeccionaram e
afixaram cartazes em todas as unidades de trabalho, explicando o que é assédio e
incentivando as denúncias através do contato informado no cartaz. Além disso, foram
colocados outdoors em diversos pontos da cidade, expondo para a sociedade as
necessidades da categoria e ainda distribuídos adesivos com o telefone para
denúncias e camisas personalizadas para os servidores. A campanha de combate ao
assédio moral continua através do contato dos sindicalistas com a categoria através
de visitas as unidades de trabalho ou em conversas informais, no corpo a corpo com
os servidores.
No sindicato 2, a conduta praticada nos casos de assédio moral individual é de
acolhimento e orientação. Quando algum trabalhador procura o sindicato, ele é ouvido
e orientado a produzir provas da violência sofrida. Diante das provas, o sindicato entra
em contato com a empresa e solicita uma reunião para tentar solucionar o problema
de forma consensual. Quando não há acordo, o sindicato encaminha o caso para o
Ministério Público. Quanto ao assédio moral coletivo, neste caso, a situação dos
trabalhadores horistas, o sindicato tem batalhado para que os contratos de trabalho
sejam modificados, garantindo os mesmos direitos dos demais trabalhadores. O
sindicato realiza muitos eventos comemorativos e palestras educativas, e nestes
momentos costuma falar sobre o assédio moral no trabalho, instruindo os
trabalhadores na identificação dessa prática e na maneira de agir.
Nesse sentido, Fabro e Maehler (2015) salientam que as entidades sindicais
devem oferecer apoio e suporte, ensinando os trabalhadores maneiras de enfrentar o
assédio, de encontrar e organizar as provas do assédio e de se proteger, de modo
que possam estabelecer estratégias que provoquem mudanças nas condições que
estimulam a prática do assédio. Sugerem que essa intervenção seja ampliada para
toda equipe, incluindo os gestores.
No sindicato 8, as ações referentes ao combate do assédio moral no trabalho
fazem parte da rotina. O sindicato recebe os trabalhadores, escuta, ampara, orienta e
dá os encaminhamentos necessários. Entra em contato com as instituições, denuncia
ao Ministério Público e acompanha os casos de forma efetiva, participando de
audiências e dando todo o suporte necessário para o trabalhador. Faz campanhas
79
ostensivas, através da mídia sindical, dispositivos do Ministério do Trabalho e das
mídias sociais. Expõe situações de assédio em outdoors, contrata carro de som e vai
até a empresa protestar. Além disso, promove seminários, com a participação de
renomados estudiosos do assunto. Segundo o representante do sindicato, costuma-
se “fazer zoada”, revelando a postura ativa, enérgica e pouco discreta que praticam
em prol de suas reivindicações.
Observa-se que maioria das entidades sindicais pesquisadas estão
conscientes dos problemas que o assédio moral no trabalho inflige à saúde de seus
trabalhadores e realizam ações voltadas para o combate e a prevenção de situações
assediadoras. Os sindicatos, tímida mas gradativamente, estão suplantando as
questões de remuneração e estabilidade e se preocupando com aspectos
relacionados a saúde mental dos trabalhadores. Neste aspecto, Magalhães Filho e
França (2015) destacam que os sindicatos não devem apenas amparar as vítimas,
mas principalmente agir para a modificação dos contextos em que o assédio ocorre.
Por outro lado, considerando o assédio moral como resultado de um modelo de
organização da produção, ou de uma política de gestão, ou seja, como algo
culturalmente estabelecido, torna-se visível a inabilidade das entidades sindicais em
agir no sentido de modificar o contexto assediador. Somente com a participação de
toda categoria, esclarecida e politizada, se poderá conquistar um ambiente de trabalho
salutar e livre de qualquer tipo de violência moral (LARA, 2011).
Na verdade, somente em uma sociedade em que não haja desigualdade social,
onde todos tenham oportunidade de um trabalho digno e saudável e com um sistema
sócio-político-econômico justo para todos, é que se pode pensar em trabalho decente.
Enquanto isso, as entidades sindicais e os trabalhadores seguem na luta para que os
efeitos deletérios do labor degradante sejam minimizados.
80
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Diante de tantas circunstâncias que afetam a atividade laboral, buscou-se neste
estudo, analisar o fenômeno do assédio moral no trabalho, na perspectiva das
entidades sindicais, buscando conhecer a percepção dos sindicatos e suas ações
frente a esse tipo de violência psicológica.
Os objetivos da pesquisa foram identificar o entendimento dos representantes
de sindicatos de trabalhadores e patronais, sobre o assédio moral individual e coletivo
e conhecer as implicações práticas das entidades sindicais voltadas para a prevenção
e/ou combate de situações assediadoras. Nesse sentido, os objetivos foram
alcançados, visto que as entrevistas possibilitaram conhecer as perspectivas dos
dirigentes sindicais sobre o tema.
Os resultados encontrados demonstram que os sindicatos têm algum nível de
conhecimento sobre o assédio moral, que vão desde conceitos do senso comum até
visões mais elaboradas e complexas do fenômeno. Em algumas categorias, o assédio
moral já é ponto de pauta, considerando as características práticas, históricas e
culturais da atividade laboral e da organização sindical. Em outras categorias a
discussão sobre assédio moral é inexistente ou muito incipiente.
Nesse sentido, vale refletir se o não reconhecimento do assédio moral no
trabalho, por parte de algumas entidades sindicais se dá pelo fato de que a categoria
realmente não sofre nenhum tipo de assédio moral, ou porque historicamente foram
condicionados a aceitar a submissão nas relações de trabalho e simplesmente não
percebem as condutas abusivas e perversas de seu cotidiano de trabalho. Ou ainda,
porque o medo de perder o emprego é maior que o sofrimento e silencia o trabalhador.
No que se refere ao assédio moral coletivo, os resultados sugerem que os
representantes sindicais apresentam perspectivas bem diversas. Alguns entendem
que a diferença é apenas quantitativa, ou seja, o assédio moral individual é dirigido a
uma pessoa e o coletivo a várias pessoas. Outros, embora não apresentem uma
definição formal do assédio moral coletivo, exemplificam com casos, que o assédio
moral coletivo está relacionado ao modo de organização da produção e o poder
diretivo do empregador. Em relação ao papel das entidades sindicais frente ao
assédio moral, os dirigentes sindicais estão conscientes de sua função de apoio,
orientação e combate. A maioria dos sindicatos percebem o assédio como uma
questão de saúde ocupacional, que deve ser atentada e discutida por seus dirigentes,
81
uma vez que é sua função amparar e representar os trabalhadores nesse aspecto.
As ações desenvolvidas pelos sindicatos demonstram o grau de implicação
com as questões relacionadas ao assédio moral no trabalho. Os resultados apontam
que as práticas são proporcionais ao entendimento e interesse dos sindicatos pelo
assunto. Os sindicatos que detém mais informações e maior clareza sobre o assédio
moral no trabalho, que recebem queixas frequentemente e que discutem o assunto
com interesse, desenvolvem mais ações de prevenção e combate, tanto em termos
quantitativos como qualitativos.
As principais práticas identificadas foram a realização de palestras, o
acolhimento e orientação dos trabalhadores, e o encaminhamento dos casos ao
Ministério Público. Uma atividade importante, que algumas organizações sindicais
realizam, diz respeito ao diálogo com as empresas, na intenção de mediar os conflitos
buscando uma solução positiva e evitar maiores desgastes, decorrentes de processos
judiciais. Observa-se, ainda, em alguns sindicatos, a utilização da imprensa sindical e
das mídias sociais para a divulgação de informações, para sensibilização e
mobilização da categoria, e também para criar um canal de comunicação e denúncias.
Diante do exposto, considera-se que o presente estudo contribuiu para o
reconhecimento das entidades sindicais como um aliado do trabalhador no
enfrentamento do assédio moral no trabalho. As perspectivas sindicais colaboram
para ampliar o debate sobre assunto, na medida em que os sindicatos se constituem
atores importantes no contexto laboral e podem intervir com medidas que assegurem
a saúde ocupacional dos trabalhadores, por meio de suas prerrogativas legais.
Encontra-se na literatura, vasto material sobre o assédio moral no trabalho, mas
a maioria versa sobre suas características e seus malefícios. Pouco se fala sobre o
papel e/ou atuação do sindicato nesse assunto. Assim, o estudo também contribuiu
para aproximar a produção acadêmica da realidade vivenciada pelas organizações
sindicais.
A principal limitação enfrentada na realização deste estudo diz respeito a
participação de um maior número de entidades sindicais laborais, que por diversas
razões, não se disponibilizaram em participar do estudo e cujas opiniões
enriqueceriam os resultados.
Para estudos futuros, sugere-se uma pesquisa que preencha a lacuna deixada
por este, ou seja, que a percepção dos representantes de sindicatos patronais a
respeito do assédio moral no trabalho seja investigada. Outra possibilidade seria
82
ampliar a pesquisa, inserindo a opinião de representantes das Federações e Centrais
Sindicais.
Uma outra sugestão é a de investigar os casos demandados aos sindicatos,
procurando identificar as características e o contexto em que o assédio ocorre e
fazendo relação com as particularidades da atividade profissional da categoria
representada, com vistas a propor um plano de ações personalizado e
intrinsecamente ligado às necessidades dos trabalhadores.
A pesquisa sobre o assédio moral no trabalho deve incluir tantas dimensões
possíveis. É necessário compreender a conjuntura política, econômica e social, as
particularidades de cada profissão, as condições de trabalho, os dispositivos de
suporte e de que forma ocorre a interação desses fatores na prática do assédio moral.
O conhecimento sobre o assédio moral no trabalho tem de ser ampliado e
aprofundado, para que as pessoas possam analisar criticamente seu contexto laboral,
sabendo diferenciar uma situação assediadora de um conflito interpessoal, evitando a
banalização do tema ou a sua supervalorização.
Hirigoyen (2006) coloca que em torno de quarenta por cento das vítimas de
assédio recorrem aos sindicatos para conseguir ajuda. No Brasil, em seu estudo
realizado em uma entidade sindical, Perez (2014) relata que a maior demanda do
sindicato são as questões relacionadas à violência psicológica. Da mesma forma,
Santos (2014) identificou que a maioria dos trabalhadores, vítimas de assédio,
procuraram o sindicato como principal alternativa de enfrentamento.
Dessa forma, os sindicatos, que despontam como os dispositivos mais
procurados pelas vítimas, exercem papel fundamental e, portanto, seus dirigentes
devem estar qualificados para o acolhimento e orientação dos trabalhadores, assim
como, preparados para agir com uma abordagem ampliada, incluindo as questões que
envolvem modos de produção e modelos de gestão.
83
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88
ANEXO 1
ROTEIRO DE ENTREVISTA COM OS SINDICATOS DE TRABALHADORES
Cargo no sindicato:
Escolaridade:
O que você entende por assédio moral no trabalho?
Quais as principais características de um assédio?
O que você entende por assédio moral coletivo ou organizacional?
Tem conhecimento de alguma prática de assédio moral individual ou organizacional?
O sindicato recebe queixas envolvendo assédio moral? Quais as queixas mais
comuns?
Em sua opinião, qual o papel dos sindicatos frente ao assédio moral?
Que orientações o sindicato dá aos trabalhadores em relação ao assédio moral?
Como o sindicato atua nos casos de assédio moral que toma conhecimento?
O que o sindicato faz para evitar a prática do assédio moral?
.
89
ANEXO 2
ROTEIRO DE ENTREVISTA COM OS SINDICATOS PATRONAIS
Cargo:
Escolaridade:
O que você entende por assédio moral no trabalho?
Quais as principais características de um assédio?
O que você entende por assédio moral coletivo ou organizacional?
Tem conhecimento de alguma prática de assédio moral coletivo ou organizacional?
O sindicato recebe queixas envolvendo assédio moral? Quais as queixas mais
comuns?
Em sua opinião, qual o papel dos sindicatos frente ao assédio moral?
Que orientações o sindicato dá às empresas em relação ao assédio moral?
Em geral, o que as empresas fazem quando são processadas?
Como o sindicato atua nos casos de assédio moral que toma conhecimento?
O que o sindicato faz para evitar a prática do assédio?