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UNIVERSIDADE PAULISTA
YGOR PIERRY PIEMONTE DITÃO
A EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 66 DE 2010
A sobrevivência da separação
SÃO PAULO
2012
3
YGOR PIERRY PIEMONTE DITÃO
A EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 66
A sobrevivência da separação
Trabalho de conclusão de curso
para obtenção do título de
bacharel em Direito apresentado
à Universidade Paulista –
UNIP.
Orientador: Prof. Dr. Ms.
_________________________
_________________________
SÃO PAULO
2012
4
YGOR PIERRY PIEMONTE DITÃO
A EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 66
A sobrevivência da separação
Trabalho de conclusão de curso
para obtenção do título de
bacharel em Direito apresentado
à Universidade Paulista –
UNIP.
Aprovado em:
BANCA EXAMINADORA
__________________/___/___
Prof. __________________________
Universidade Paulista – UNIP
Prof.__________________________
Universidade Paulista – UNIP
Prof. _________________________
Universidade Paulista - UNIP
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DEDICATÓRIA
Dedico este trabalho, claro, a minha família, razão pela qual vi que, lutar quando se
parece impossível tem lá seus bons frutos, razão que me sustenta em ir contra o vento e contra
a maré, para lutar por àquilo que acredito, ou seja, a família.
Dedico, também, aos meus amigos sempre presentes, pois a “Amizade é a
aproximação pela semelhança” (Aristóteles).
Dedico, por derradeiro, aos meus mestres que me possibilitaram galgar a humilde
pretensão de simplesmente aprender, e, deste modo, dedico com honra em especial ao
caríssimo Mestre Fabiano Lourenço, que me orientou com tanta paciência e minha caríssima
mama nessa arte do Jus postulandi, Advogada Marcia Felix da Silva.
Dedico a Deus!
6
AGRADECIMENTOS
Obrigado, Deus.
7
“Ser bom é fácil. O difícil é ser
justo.”
(Victor Hugo)
8
RESUMO
Trata-se de um Trabalho de conclusão de curso que defenderá a sobrevivência da
separação (tanto judicial, como extrajudicial, de fato etc.) após a entrada em vigor da Emenda
Constitucional nº 66 de 2010. Expondo, um breve resumo da evolução histórica do divórcio,
bem como conceitos de casamento, sociedade e vínculo conjugal. Trará em campo os pilares
da separação e do divórcio, seus conceitos e requisitos, bem como sua finalidade. Levantará,
também, o entendimento contrário que crê inexistir a separação (seja qual for a modalidade)
após a EC n. 66/2010, e, finalizará expondo os fundamentos principais das razões que
coincidem em manter viva a separação, expondo além dos valores jurídicos, também, os
valores sociológicos e filosóficos que dão guarida ao trabalho ora apresentado, concluindo o
justo entendimento de que a separação sobrevive.
9
ABSTRACT
It is a work of completion that will defend the survival of the separation (both judicial
and extrajudicial, indeed etc..) After the entry into force of the Amendment Constitutional No.
66 of 2010. Exposing a brief overview of the historical evolution of divorce, as well as
concepts of marriage, society and conjugal bond. Will bring the pillars of separation and
divorce, their concepts and requirements, as well as its purpose. Rise also the contrary view
that believes inexistence separation (whatever mode) after AC No. 66/2010, and will finalize
exposing the foundations of the main reasons that coincide in keeping alive the separation, in
addition to exposing legal values also sociological and philosophical values that give shelter
to the work presented, concluding that the fair understanding of the separation survives.
10
SUMÁRIO
DEDICATÓRIA
RESUMO
ABSTRACT
1. INTRODUÇÃO...........................................................................................................11
2. BREVE EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO DIVÓRCIO............................................12
3. DA SOCIEDADE CONJUGAL E VÍNCULO MATRIMONIAL.........................14
3.1. Do casamento...............................................................................................................14
3.2. Sociedade conjugal......................................................................................................16
3.3. Vínculo matrimonial...................................................................................................18
4. DA SEPARAÇÃO E DO DIVÓRCIO.....................................................................19
4.1. Da separação conjugal................................................................................................19
4.1.2. Breves relatos...............................................................................................................19
4.1.3. Requisitos.....................................................................................................................20
4.1.4. Formas de separação....................................................................................................21
4.1.4.1. Separação consensual e litigiosa.......................................................................21
4.1.4.2. Separação judicial e extrajudicial.....................................................................24
4.1.4.3. Separação de corpos.........................................................................................26
4.1.5. Efeitos jurídicos............................................................................................................28
4.2. Do divórcio...................................................................................................................30
4.2.1. Breves relatos................................................................................................................30
4.2.2. Requisitos......................................................................................................................31
4.2.3. Formas de divórcio........................................................................................................32
4.2.3.1. Divórcio consensual e litigioso.........................................................................32
4.2.3.2. Divórcio judicial e extrajudicial........................................................................34
4.2.3.3. Divórcio conversão e divórcio direto................................................................35
4.2.4. Efeitos jurídicos.............................................................................................................36
5. EXTINÇÃO DA SEPARAÇÃO SOB A ÉGIDE DA EMENDA
CONSTITUCIONAL Nº 66....................................................................................................37
5.1. Razões para a extinção da separação........................................................................37
5.2. Conclusões sobre a extinção da separação................................................................42
6. PRESERVAÇÃO DA SEPARAÇÃO APÓS PLUMO DA EMENDA
CONSTITUCIONAL Nº 66....................................................................................................43
6.1. Noções introdutórias..................................................................................................43
6.2. Razões para a manutenção da separação................................................................46
6.2.1. Princípio da dignidade da pessoa humana....................................................................47
6.2.2. Princípio da liberdade ou da não intervenção..............................................................48
6.2.3. Da recepção da EC. 66/2010.........................................................................................49
6.2.4. Confronto com os direitos e garantias fundamentais....................................................52
6.3. Conclusões sobre a manutenção.................................................................................55
7. CONCLUSÃO...................................................................................................................57
8. REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS............................................................................58
11
1. INTRODUÇÃO
O tempo passa e com sua evolução as coisas mudam. O direito por si só é uma eterna
alomorfia, que se dirá então do Direito de família? O que é hoje, talvez, não será amanhã, mas
foi ontem. Isso é o que se verá na presente produção. Abordando, antemão, a evolução
histórica, ver-se-á a drástica luta para que o Divórcio e, por fim, na verdade, a dissolução da
célula mater fosse consagrada em nosso país. A luta dos religiosos e a conquista do
divorcistas.
Por conseguinte, este trabalho apresentará conceitos introdutórios e esclarecedores
acerca do conceito perfunctório do casamento, do vínculo conjugal, bem como da sociedade
conjugal. Inobstante a tudo isso, fará também exposição acerca dos conceitos de divórcio e
separação; suas modalidades, seus requisitos, suas possibilidades jurídicas e seus efeitos,
enlaçando em consonância com toda a doutrina pátria acerca destes elementos.
Levantam-se, neste patamar, a feroz doutrina que vai contra a linha deste estudo: a
extinção da separação após a Emenda Constitucional n. 66/2010. Com fundamento em
interpretações da norma, finalidade social e desuso, nomes como Carlos Roberto Gonçalves,
Silvio de Salvo Venosa e Paulo Lôbo, defendem que a separação inexiste daqui em diante,
devendo se tornar um elemento obsoleto do Código Civil, vez que se vê revogado.
Porém, por sua vez, em sequência, este trabalho fundamenta sua essência, expondo
que, na verdade, a separação permanece viva no ordenamento jurídico, mesmo após a
promulgação da Emenda Constitucional n. 66/2010, fundamentado em necessidade de se
observar o fim social da separação, resolução da culpa, inconstitucionalidade, ferimento a
direitos de garantias fundamentais, sobrestado por nomes como Maria Helena Diniz, Yussef
Said Cahali e Paulo Nader.
Por fim, este trabalho apresentará as razões meritórias que fundamentam a
permanência da separação no texto pátrio após a promulgação da tão contenciosa Emenda
Constitucional. Na busca da proteção da família e não somente da celeridade do processo de
desfragmentação da família, bem como a proteção das garantias dos consortes e tantas outras
infinidades de fundamentos, sempre na busca de proteger a família.
12
2. EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO DIVÓRCIO:
Para sucinto esclarecimento, aponta ilustríssimo doutrinador Silvo de Salvo Venosa
que “A história do divórcio no Brasil traduz a uma árdua e calorosa batalha legislativa e
social, decorrente de longa e histórica tradição antidivorcista, sustentada basicamente pela
Igreja, que erige o casamento em sacramento.” 1. Apontando de maneira mais precisa,
descobre-se, após certa infringência, a possibilidade do primeiro divórcio no bojo legal
brasileiro quando do “Decreto n. 181, de 1890, que instituiu o casamento civil no Brasil,
previa o divórcio a thoro et mensa (Divórcio canônico), que acarretava somente a separação
de corpos, mas não rompia o vínculo matrimonial.” 2. Portanto, ver-se-á um justo senso ao
expor que a influência da religião era deveras absoluta.
No entanto, como aponta claramente uma luta árdua, o efeito do decreto antes exposto
foi minúsculo, porém, o suficiente para uma evolução considerável:
“Quando da edição do Código Civil de 1916, o enlace juramentado era indissolúvel.
A única possibilidade legal de romper com o matrimônio era o desquite, que, no
entanto, não o dissolvia. Permanecia intacto o vinculo conjugal, a impedir novo
casamento, mas não novos arranjos familiares, pois cessavam os deveres de
fidelidade e manutenção da vida em comum sob o mesmo teto. Remanescia, no
entanto, a obrigação de mutua assistência, a justificar a permanência de encargo
alimentar em favor do cônjuge inocente e pobre.” 3.
A posterior, com essa pequena evolução, mas de retumbantes efeitos, no ano de 1977,
com o aplumo da Lei 6.515 de 26 de dezembro de 1977, aponta no horizonte do antigo
casamento sacramentado o direito de dissolução do vinculo matrimonial. Neste sentido,
melhor e mais clara elucidação traz, o douto Carlos Roberto Gonçalves, que assim expõe:
“O divórcio vincular, que dissolve o vínculo e permite novo casamento, somente
passou a ser aplicado no Brasil com a aprovação da Emenda Constitucional n. 9, de
28 de junho de 1977, que deu nova redação ao art. 175 da Constituição de 1969,
suprimindo o principio da indissolubilidade do vinculo matrimonial, e após a sua
regulamentação pela Lei 6.515, de 26 de dezembro de 1977.” 4.
Neste momento, passa o direito brasileiro a usufruir, mesmo que um tanto burocrático,
do divórcio que possibilita o alcance de novas núpcias, antes completamente proibido.
Passando-se longas datas ao efeito da lei 6.515, o Brasil com o advento da Constituição
Federal de 1988 estipulou, antes da emenda n. 66, a primeira possibilidade do divórcio direto,
assim exposto, In verbis:
1 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil: direito de família/ Silvio de Salvo Venosa. – 11ª Ed. – São Paulo: Atlas. –
(Coleção direito civil; v. 6) 2 GONÇALVES. Carlos Roberto. Direito Civil brasileiro, volume 6: Direito de família/ Carlos Roberto Gonçalves –
8. Ed. rev. e atual. – São Paulo: Saraiva. 2011. 3 DIAS. Maria Berenice. Manual de direito das famílias. / Maria Berenice Dias. – 7. Ed., rev., atual. e ampl. – São
Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010. 4 GONÇALVES. Carlos Roberto. Direito Civil brasileiro, volume 6: Direito de família/ Carlos Roberto Gonçalves –
8. Ed. rev. e atual. – São Paulo: Saraiva. 2011.
13
Art. 226. § 6º O casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio, após prévia
separação judicial por mais de um ano nos casos expressos em lei, ou comprovada separação
de fato por mais de dois anos.
A partir desse ponto, antes exposto, conhece a legislação brasileira a primeira
possibilidade (por vias extraordinárias) de um divórcio direto e não o demagogo (no caso em
tela) divórcio-conversão ocorrido no caso de prévia separação judicial.
Por derradeiro, o divórcio, bem como a separação, encontraram como ultima evolução
até então com a promulgação da emenda n. 66, onde, expõe o douto Venosa que “A ultima
concessão que ainda vigorava era a dicotomia separação judicial-divórcio extinta com a
Emenda Constitucional nº 66/2010.” 5.
Corrobora em esclarecer Maria Berenice Dias que “A Emenda Constitucional 66,
publicada em 14 de julho de 2010, deu nova redação ao § 6º do art. 226 da CF, e com um só
golpe alterou o paradigma de todo o direito das famílias. A dissolução do casamento sem a
necessidade de implemento de prazos ou identificação de culpados tem um efeito simbólico.” 6.
Por derradeiro, há de se perceber que o Brasil simplesmente enfrentou longa e
burocrática luta pelo reconhecimento do divórcio como um direito pleno, legítimo e sem os
impasses temporais trazidos por uma força religiosa, antes fortíssima na pátria. Conforme
salienta Venosa, justa menção se merece ao Senador Nelson Carneiro que nesta luta pela a
instituição do divórcio dispôs longos anos de trabalho para tanto. Indiscutível é, portanto, que
o divórcio como se vê, foi o alcance de uma árdua luta e gratificante proveito que venceram
cerca de um século. No entanto, a redação do artigo constitucional conforme a aplicação da
discutida emenda trouxe profundo debate doutrinário e jurisprudencial no país, tudo, pois
conforme o artigo infra exposto, In verbis:
Art. 226. § 6º O casamento pode ser dissolvido pelo divórcio.
Há, por isso, duas vertentes doutrinárias que se enfrentam no país; a primeira
defendendo a extinção do instituto da separação (tanto judicial, como extrajudicial, bem como
a consensual, como a litigiosa), restando aos cônjuges somente o divórcio; e a segunda
defende a permanência do instituto da separação, ficando a critério dos cônjuges o uso deste
ou desse. Nisto, se delimita o presente trabalho a discorrer sobre tanto, nos termos a seguir
expostos.
5 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil: direito de família/ Silvio de Salvo Venosa. – 11ª Ed. – São Paulo: Atlas. –
(Coleção direito civil; v. 6) 6 DIAS. Maria Berenice. Manual de direito das famílias. / Maria Berenice Dias. – 7. Ed., rev., atual. e ampl. – São
Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010.
14
3. DA SOCIEDADE CONJUGAL E O VÍNCULO MATRIMONIAL
3.1. Do casamento:
É tolice tamanha tecer um assunto que é termino sem expor seu meio e inicio. Razão
essa que se disserta inicialmente sobre o casamento e sua definição, mesmo que superficial,
pois é impossível conjugar ou até mesmo conjurar o instituto do divórcio e da separação sem
que exista o casamento, ponto pelo qual se define, de maneira perfunctória, o casamento na
doutrina nacional.
Inicialmente, aponta-se que “O casamento, como todas as instituições sociais, varia
com o tempo e os povos.” 7. Portanto, uma definição exclusiva é inviável bem como é
“Impossível ser original, diante de tantas definições, antigas e modernas.” 8. No entanto, o
presente trabalho merece a exposição mínima dos conceitos mais bem aceitos pela doutrina
pátria.
Neste sentido, “O professor WASHINGTON DE BARROS MONTEIRO conceituou o
casamento como a união permanente entre o homem e a mulher, de acordo com a lei, a fim de
se reproduzirem, de se ajudarem mutuamente e de criarem os seus filhos.” 9. Expõe MARIA
HELENA DINIZ que “O casamento é, tecnicamente, o vínculo jurídico entre o homem e a
mulher que visa o auxilio mutuo material e espiritual, de modo que haja uma integração
fisiopsíquica e a constituição de uma família.” 10
. Por sua vez, defende SILVÍO DE SALVO
VENOSA esmiuçando com maior detalhe que:
“O casamento é o centro do direito de família. Dele irradiam suas normas
fundamentais. Sua importância, como negócio jurídico formal, vai desde as
formalidades que antecedem sua celebração, passando pelo ato material de
conclusão até os efeitos do negócio que deságuam nas relações entre os cônjuges, os
deveres recíprocos, a criação e assistência material e espiritual recíproca de da
prole.” 11
.
Portanto, pode-se resumir todos os acimas expostos com o parecer do excelso
doutrinador NELSON NERY que assim finaliza:
“Relação contratual. Casamento é o contrato bilateral e solene, realizado entre duas
pessoas de sexo diferente, pelo qual é constituída, legalmente, a união destas. É o
contrato de direito de família que regula a vida em comum (não só a união sexual)
entre o varão e a mulher (Pontes de Miranda. Tratado, t. VII, §765, n. 8, p. 210). O
casamento é um contrato especialíssimo que muito se distingue dos contratos de
cunho meramente patrimonial. Estes últimos norteiam a atividade de interesse
7 GONÇALVES. Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, volume 6: Direito de família/ Carlos Roberto Gonçalves –
8ª Ed. rev. e atual. – São Paulo: Saraiva, 2011. 8 Idem.
9 MONTEIRO. Washington de Barros. Curso de direito civil – 37 ed. rev. e atual., por Regina Beatriz Tavares da
Silva. – São Paulo: Saraiva. 2004. 10
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro, volume 5: direito de família/ Maria Helena Diniz – 27. Ed. – São Paulo: Saraiva, 2012. 11
VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil: direito de família/ Silvio de Salvo Venosa. – 11ª Ed. – São Paulo: Atlas. – (Coleção direito civil; v. 6)
15
econômico, enquanto o casamento se prende a elevados interesses morais e pessoais
e de tal forma que, uma vez ultimado o contrato, produz ele desde logo efeitos que
não mais podem desaparecer, subsistindo sempre e sempre como que para mais lhe
realçar o valor (Carvalho Santos. CC Interpretado, v. IV, art. 80, n. 1, p. 11).”12
Concluindo MARIA BERENICE DIAS que “O casamento tanto significa o ato de
celebração do matrimonio como a relação jurídica que dele se origina: a relação
matrimonial.” 13
.
Portanto, o casamento é o ato jurídico que dá forma a todas as demais perspectivas do
direito de família, incluindo neste paradigma o lógico instituo aqui exposto e discutido
(separação e divórcio), ou seja, o casamento é o preceito legal que:
Código Civil, in verbis:
Art. 1.511. O casamento estabelece comunhão plena de vida, com base na igualdade
de direitos e deveres dos cônjuges.
12
NERY JUNIOR. Nelson. Código civil comentado/ Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery. – 8º ed. rev. , ampl. e atual. até 12.07.2011. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais. 2011. 13
DIAS. Maria Berenice. Manual de direito das famílias. / Maria Berenice Dias. – 7. Ed., rev., atual. e ampl. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010.
16
3.2 Da sociedade conjugal:
A sociedade conjugal não pode se confundir com o vínculo conjugal também
nominada de vínculo matrimonial, ainda que ambas consignem o entendimento lógico do
matrimonio. Porém, uma pode viver sem a outra, em certa medida. A priori, ambas são
encontradas numa entidade matrimonial e são frutos do solene ato do matrimonio, no entanto,
onde há sociedade conjugal há vínculo matrimonial, mas nem sempre onde há vínculo
conjugal há sociedade conjugal.
Nisso observa-se, antemão, que se vale dissecar em ordem o assunto, da mesma
maneira que disse o Código Civil em seu artigo 1.571, instituindo o término da sociedade
conjugal, nos termos dos seus incisos, no entanto, restringindo o término do vínculo conjugal
(transcrito no parágrafo primeiro como o casamento válido) somente em hipóteses menores, a
saber: A morte (incluindo neste ato o ausente, nos termos do Código Civil) e o divórcio.
Por isso que a assertiva inicial deste item merece prevalência, vez que a sociedade conjugal
pode receber término em hipóteses maiores (numérica), mas o fim do vínculo é restrito a duas
hipóteses. Portanto, sim, onde há sociedade conjugal há vínculo matrimonial, mas onde não
há sociedade conjugal não significa que tenha consumado o fim do vínculo matrimonial. Um
dado exemplo disso é o caso da separação judicial que põe termo á sociedade conjugal de
maneira temporária, mas não alcança o vínculo matrimonial nestes mesmos efeitos,
mantendo-o, portanto, intacto.
O determinístico entendimento para tanto é o que sustenta a tese em tela e a luta pela
permanência da separação no direito brasileiro, pois é a separação judicial que evita uma
atitude drástica demais e, muitas vezes, irremediável. Isso ocorre em virtude de um elemento:
O término da sociedade conjugal dada pela separação judicial (art. 1.571, III do CC/2002) não
impossibilita a reabilitação do casamento, dando aos cônjuges a possibilidade de
reconciliação, outrora inviável no divórcio, podendo e, na verdade, conseguindo desfazer
vitaliciamente uma família em função de um estado emocional fragilizado.
Inobstante aos assuntos de cunho subjetivo, vale ressaltar, antes de abranger a cética
discussão pela luta da permanência da separação judicial no texto legal nacional (como de
fato ocorreu), que, como antes salientado, a sociedade conjugal é um elemento do binômio
matrimonial, a saber: “é o complexo de direitos e obrigações que formam a vida em comum
dos cônjuges.” 14
.
Portanto, sociedade conjugal é o conjunto de todos os elementos de direitos e deveres
dado aos cônjuges a partir do momento em que se consuma o solene ato do casamento, tanto é
que, nos termos do art. 1.723, § 1º do CC/2002, a União Estável é reconhecida se houver uma
separação de fato ou de direito. Pois, “Com a dissolução apenas da sociedade conjugal, cessa
para os cônjuges os deveres de coabitação e de fidelidade e os direitos e deveres decorrentes
do regime de bens do casamento, mas permanece hígido o vínculo matrimonial.” 15
.
Sociedade Conjugal é, conforme Lei 6.515/77, In verbis:
14
GONÇALVES. Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, volume 6: Direito de família/ Carlos Roberto Gonçalves – 8ª Ed. rev. e atual. – São Paulo: Saraiva, 2011. 15
NERY JUNIOR. Nelson. Código civil comentado/ Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery. – 8º ed. rev. , ampl. e atual. até 12.07.2011. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais. 2011.
17
Art. 3° “A separação judicial põe termo aos deveres de coabitação, fidelidade
recíproca e ao regime matrimonial de bens como se o casamento fosse dissolvido.” (Grifo do
autor).
18
3.3 Do vínculo conjugal
Antes da retumbante Emenda Constitucional n. 66, o divórcio deveria obedecer a uma
linha taxativa para ser alcançado, ou seja, precisaria passar pela separação (de direito ou de
fato) para então se impelir na empreita do divórcio. No entanto, a partir da respectiva Emenda
o dito desapareceu, possibilitando, isto é, somente possibilitando (não os obrigando), aos
cônjuges conjurarem o divórcio sem a circunspeção de qualquer ato meio.
Isso foi, de fato, uma revolução a liberalidade dos cônjuges para que, vendo a
impossibilidade de manterem a entidade familiar, colocarem termo final ao mesmo. Nisso
observa-se que a luta se direcionou a esse campo em virtude deste primordial elemento
discorrido neste item, o vínculo conjugal. Ao contrário da sociedade conjugal, o vínculo
matrimonial inviabiliza com os cônjuges contraiam novas núpcias, onde, se o fizerem
cometeram ilícito civil e penal (Bigamia).
Portanto, a luta do IBDFAM (Instituto Brasileiro de Direito de Família) foi a de trazer
aos cônjuges o direito de que, se for vosso querer, divorciarem-se sem o infortúnio de
permanecerem presos a alguém em virtude da lei. Por derradeiro, vínculo conjugal é a
sobreposição dos elementos apontados na sociedade conjugal, ou seja, é a obrigação entre os
casados de fidelidade mútua, vida comum em domicilio conjugal, mutua assistência,
igualdade no governo do lar conjugal etc., acrescida de uma questão: a de não poderem
contrair novas núpcias.
Neste sentido, elucida o douto CARLOS ROBERTO GONÇALVES que “O
casamento válido, ou seja, o vínculo matrimonial, porém, somente é dissolvido pelo
divórcio.” 16
. Devendo-se encerrar que vínculo conjugal é o casamento válido e o liame
jurídico do ato solene perfeito que vincula os cônjuges vitaliciamente até que exista o
cumprimento de uma de suas possibilidades para que seja desfeito, a saber: Morte, ausência e
divórcio.
Por isso vínculo conjugal é, conforme infra, Lei 6.515/77, In verbis:
Art. 24. “O divórcio põe termo ao casamento e aos efeitos civis do matrimônio
religioso.” (Grifo do autor).
16
GONÇALVES. Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, volume 6: Direito de família/ Carlos Roberto Gonçalves – 8ª Ed. rev. e atual. – São Paulo: Saraiva, 2011.
19
4 SEPARAÇÃO E DIVÓRCIO
4.1. Da separação conjugal
4.1.1 Breves relatos:
“Após a Emenda Constitucional n° 9 e a Lei n° 6.515, o divórcio foi finalmente
admitido. Todavia, em solução de compromisso com os antidivorcistas, a legislação
manteve o desquite, sob a denominação eufemística de separação judicial, ao lado
do divórcio. Assim permaneceu inclusive após a Constituição de 1988 e,
consequentemente, com o Código Civil de 2002. A separação amigável (judicial ou
extrajudicial) ou litigiosa apenas dissolve a sociedade conjugal, como ocorria com o
desquite, persistindo o vínculo matrimonial, impedindo novo casamento aos ex-
cônjuges.” 17
.
17
Direito de família no novo milênio: Estudos em homenagem ao professor Álvaro Villaça Azevedo/ José Fernando Simão, Jorge Shiguemitsu Fujita, Silmara Juny de Abre Chinellato, Maria Cristina Zucchi, Organizadores. – São Paulo: Atlas, 2010 – Texto de: Paulo Luiz Netto Lôbo - Dissolução da sociedade conjugal: separação judicial e suas modalidades.
20
4.1.2 Requisitos: A separação seja litigiosa, consensual, judicial, extrajudicial ou até
mesma a separação de fato, não encontram mais no território nacional a necessidade de um
requisito para ser requerida. Na verdade, o douto YUSSEF SAID CAHALI aborda que:
“Esses deveres, explícitos ou implícitos na lei, em função de causas primarias pelas
quais a sociedade foi constituída e merece a proteção do Estado, encontram sua
fonte também na moral, na religião, nos usos e costumes, nas convenções sociais,
com similar tutela jurídica. Daí a sanção indireta da separação, quando violados os
deveres pela conduta grave de qualquer dos cônjuges, provocando a
insuportabilidade da vida em comum.” 18
.
Isso ocorre por uma razão, antes o texto pátrio trazia em seu bojo uma necessidade de
provar-se a incompatibilidade do convívio conjugal em razão, muitas vezes, de grave violação
dos deveres conjugais (mais bem delineado no art. 1.573 do Código Civil) e que eram todos
resumidos no parágrafo único do respectivo artigo, ou seja, outros fatos que impossibilitem a
vida em comum.
Porém, após a chegada da Emenda Constitucional n. 66, essa discussão não mais
existe, devendo, portanto, os cônjuges provarem tão somente que são casados e requererem a
devida separação ou o divórcio direto, conforme vontade das partes. Nesse sentido, expõe
JOSÉ FERNANDO SIMÃO que:
“Discuta-se a culpa, mas não mais entre os cônjuges (presos por um vínculo
indesejado), e sim por ações autônomas, entre ex-cônjuges. O leitor pode estar se
perguntando qual é a vantagem da mudança introduzida quando da aprovação da
Emenda Constitucional n. 66. A mudança é evidente e espetacular. O divórcio se
dará de maneira célere e com um único ato (seja uma decisão judicial ou escritura
pública nos casos admitidos pela Lei nº 11.441/2007); o casamento estará desfeito e
os antigos cônjuges podem, agora, divorciados, buscar, em nova união ou
casamento, a felicidade que buscaram outrora na relação que se dissolve.
Assim, livres para buscarem a realização pessoal e felicidade, se necessário, que
passem anos discutindo a culpa em uma morosa ação de alimentos ou de
indenização por danos morais.” 19
.
Portanto, nestes termos, o único requisito para a realização de uma separação é a existência
fática de um casamento.
18
CAHALI, Yussef Said. Separações conjugais e divórcio/ Yussef Said Cahali. – 12. Ed. rev., atual. e ampl. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011. 19
SIMÃO, José Fernando. A Emenda Constitucional n. 66: a revolução do século em matéria de Direito de Família – a passagem de um sistema antidivorcisa para o divorcista pleno. Artigo publicado na Revista do Advogado, n° 112, Ano XXXI – em Julho de 2011.
21
4.1.3 Formas de separação
4.1.3.1 Separação Consensual e litigiosa: Como dito, a separação é o meio jurídico pelo qual
se põe termo a sociedade conjugal, retirando dos cônjuges a obrigação de zelarem pelos
deveres conjugais, cessando, inclusive, o regime de bens. Há de se ressaltar, no entanto, que
em função de sua iniciativa existem duas modalidades, a saber: A consensual e a litigiosa.
A primeira, separação consensual, apresenta-se:
“Tal como no direito anterior, e na generalidade das legislações modernas, o
Código Civil mantinha a separação por mútuo consentimento dos cônjuges ‘se
forem casados por mais de um ano e o manifestarem perante o juiz, sendo por ele
devidamente homologada a convenção’ (art. 1.574, caput). Doutrinariamente, a
separação consensual classifica-se como modalidade de separação-remédio, ante a
ausência de pressuposto de culpa de qualquer dos cônjuges, como causa para a sua
concessão.” 20
.
Porém, levanta-se entendimento diferente quando assim se vê que a separação por
mútuo consentimento é classificada pelo Douto WASHINGTON DE BARROS MONTEIRO
como uma espécie de ruptura e não remédio, nesse sentido, assim expõe “E são classificadas
como ruptura as separações que se fundam no mútuo consentimento (Lei do Divórcio, art. 4°,
e Código Civil de 2002, art. 1.574).” 21
.
Complementa-se na doutrina o seguinte entendimento de que:
“A separação judicial requerida por ambos os cônjuges ou por mútuo consentimento
é também chamada de amigável ou consensual. É procedimento típico de jurisdição
voluntária, em que o juiz administra interesses privados. Não há litigio, pois ambos
os cônjuges buscam a mesma solução: a homologação judicial de acordo por eles
celebrados.” 22
.
Em apertada síntese a douta MARIA HELENA DINIZ assim salienta que “Como já
vimos, permite a norma jurídica que os cônjuges se separem consensualmente, propondo uma
ação que tem por fim precípuo legalizar a conveniência dos consortes de viverem separados.” 23
.
Aponta, por sua vez o doutrinador SILVIO DE SALVO VENOSA uma matriz de
crucial veracidade quando expõe que “Desse modo, tal como continham os arts. 317 e 318 do
Código de 1916 persistiram as causas culposas não culposas de separação, traduzindo
modalidades de separação-sanção e separação-remédio.” 24
.
20
CAHALI, Yussef Said. Separações conjugais e divórcio/ Yussef Said Cahali. – 12. Ed. rev., atual. e ampl. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011. 21
MONTEIRO. Washington de Barros. Curso de direito civil – 37 ed. rev. e atual., por Regina Beatriz Tavares da Silva. – São Paulo: Saraiva. 2004. 22
GONÇALVES. Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, volume 6: Direito de família/ Carlos Roberto Gonçalves – 8ª Ed. rev. e atual. – São Paulo: Saraiva, 2011. 23
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro, volume 5: direito de família/ Maria Helena Diniz – 27. Ed. – São Paulo: Saraiva, 2012. 24
VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil: direito de família/ Silvio de Salvo Venosa. – 11ª Ed. – São Paulo: Atlas. – (Coleção direito civil; v. 6)
22
MARIA BERENICE DIAS, contudo, assevera em sua obra com feroz contundência
uma elucidação acerca do instituto de suas regras e requisitos, do qual, assim entende que:
“A lei admitia o término da sociedade conjugal pela separação por mútuo
consentimento ou por meio de demanda judicial litigiosa. A regra que regulamenta a
separação judicial consensual encontra-se perdida entre os dispositivos que tratam
da separação litigiosa (CC art. 1.574). De forma absolutamente injustificada, era
assegurado verdadeiro prazo de validade do casamento. Embora houvesse consenso
dos cônjuges, era necessário que estivessem casados há mais de um ano para
buscarem a separação. Clara a intenção da lei de preservação do casamento, o que,
no entanto, acabava adquirindo caráter punitivo.” 25
.
Em suma, tem-se o seguinte entendimento:
“Se os cônjuges não quiserem aguardar o término do prazo de dois anos de
separação de fato para ingressarem com o pedido consensual ou litigioso de
divórcio, poderão optar pela separação judicial consensual, mediante requerimento
assinado por ambos e por seus advogados e submetido à homologação do juiz.” 26
.
Portanto, majoritariamente é a separação consensual a separação-remédio requerida
pelos cônjuges para que, durante seu período, tanto exerçam seus ânimos para buscarem novo
envolvimento como para requererem o divórcio definitivo ou até mesmo viabilizarem uma
reconciliação.
Por sua vez, a segunda se refere (separação litigiosa) a uma realidade mais fática
acerca do ordenamento jurídico brasileiro, vez que é obvio a consignação de que o término
natural de todo o envolvimento de cunho emocional, principalmente com a profundidade do
matrimônio, chegue a este estado de maneira violenta e contenciosa entre os cônjuges.
A doutrina pátria é mais consoante no sentido de dar a esta o seu entendimento de uma
separação-sanção, ou seja, um meio de exercício de uma sanção indireta ao cônjuge que não
respeitou os deveres a si atribuídos na lide da justa empreitada de preservar o matrimonio nos
enlaces adequados.
Contudo, há de trazer a campo um entendimento mais bem aprofundado aludido pela
douta MARIA HELENA DINIZ que defende a linha de que a própria separação litigiosa pode
abarcar não somente o campo da separação-sanção, mas sim outras duas além desta, conforme
o caso concreto. Ou seja, além da separação judicial litigiosa como sanção, expõe ainda a
separação litigiosa como falência e também a como remédio. Resumindo assim que:
“Permite o art. 1.572 do Código Civil a separação judicial a pedido de um dos
cônjuges, mediante processo contencioso, qualquer que seja o tempo de casamento,
estando presentes hipóteses legais, que tornem insuportável a vida em comum.
Recomenda-se ‘uma apreciação objetiva dos fatos, que tornem evidente a
25
DIAS. Maria Berenice. Manual de direito das famílias. / Maria Berenice Dias. – 7. Ed., rev., atual. e ampl. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010. 26
Direito de família no novo milênio: Estudos em homenagem ao professor Álvaro Villaça Azevedo/ José Fernando Simão, Jorge Shiguemitsu Fujita, Silmara Juny de Abre Chinellato, Maria Cristina Zucchi, Organizadores. – São Paulo: Atlas, 2010 – Texto de: Paulo Luiz Netto Lôbo - Dissolução da sociedade conjugal: separação judicial e suas modalidades.
23
impossibilidade da vida em comum’ (Enunciado n. 100 do Conselho Federal da
Justiça, aprovado nas jornadas de Direito Civil de 2002).” 27
.
Para a separação-sanção, detém como linha de pensamento clássica de que a
“Separação litigiosa como sanção, que se dá quando um dos consortes imputar ao outro
qualquer ato que importe em grave violação dos deveres matrimoniais e torne insuportável a
vida em comum (CC, arts. 1.572 e 1.573, I a VI).” 28
. Por conseguinte, a:
“separação litigiosa como falência (CC, arts. 1.572, § 1º), que se efetiva quando
qualquer dos cônjuges provasse a ruptura da vida em comum há mais de um ano e
impossibilidade de sua reconstituição, não importando a razão da ruptura, sendo,
ainda, irrelevante saber qual dos consortes foi culpado pela separação, legalizando
tão somente uma separação de fato.” 29
.
Por derradeiro, a “separação litigiosa como remédio, ocorre quando o cônjuge a pede
ante o fato de estar o outro acometido de grave doença mental manifestada após o
matrimonio, que torne impossível a continuação da vida em comum, por acarretar, p. ex.,
constantes agressões físicas.” 30
. Neste ultimo parecer, há de levantar também o consoante
entendimento de NELSON NERY que reflete a luz da lei que a separação, neste caso, é uma
“Separação remédio. O Cônjuge deve provar que o outro está acometido de grave doença
mental, há mais de dois anos; que não há probabilidade de cura; que a doença é posterior ao
casamento (CC 1572, § 2°; CC 1572, § 3°. – de separação remédio).” 31
.
Há de se ressaltar que não é pacifico o entendimento de se há ou não discussão acerca
de culpa na separação, mantendo em uma tênue linha o entendimento supra, porém, tendo em
vista, este não ser o foco ao qual se sustenta esta tese, deixa-se exclusivamente os pareceres
dos cientistas jurídicos.
27
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro, volume 5: direito de família/ Maria Helena Diniz – 27. Ed. – São Paulo: Saraiva, 2012. 28
Idem. 29
Idem. 30
Idem. 31
NERY JUNIOR. Nelson. Código civil comentado/ Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery. – 8º ed. rev. , ampl. e atual. até 12.07.2011. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais. 2011.
24
4.1.3.2 Separação judicial e extrajudicial: Neste item, a lei traz uma inovação considerável
que de tão célere fascina, bem como reduz, nos seus casos de possibilidade jurídica, o
demasiado numero de processos nas mesas do Poder Judiciário. Isso se refere claro a
separação extrajudicial que, conforme a Lei nº 11.441/2007 permite que a separação (bem
como o divórcio) cumprido os seus requisitos taxativos, proponha-se a mesma em vias
extrajudiciais, ou seja, em escritura pública.
Nesse sentido observa-se o seguinte:
“Quando tanto se critica o Pode Judiciário no andamento dos processos, sejam eles
de que natureza forem e em que, ao mesmo tempo, vem-se procurando, com
reformas de ordem variada e que acabaram por transformar o Código de Processo
Civil em uma verdadeira ‘colcha de retalhos’, foi publicada a Lei n° 11.441, de
2007, destinada também a alterar dispositivos da mesma codificação, mas de forma
a permitir, no âmbito das separações e divórcios consensuais, sua realização pela via
administrativa, o mesmo se dando, ainda, quanto às partilhas e inventários, desde
que observados os requisitos indicados no mesmo diploma legal.” 32
.
Todavia, esse procedimento implica em algumas restrições de ordem pública que
vetam seu uso e que para se usufruir tanto se necessita o enquadramento em determinados e
peremptórios requisitos exposto na lei supramencionada. Nisso, com maestria aponta
CARLOS ROBERTO GONÇALVES os requisitos que lhes são necessários, a saber: a)
Inexistência de filhos menores ou incapazes do casal; b) Consenso do casal sobre todas as
questões emergentes da separação ou divórcio; c) Lavratura de escritura pública por tabelião
de notas; e, d) Assistência de advogado.
Na consecução deste doutrinador observa cada um de seus requisitos do seguinte
modo: a) “Em principio, pois, a existência de filhos menores ou incapazes impede a
dissolução do casamento mediante escritura pública, devendo ser observado o procedimento
judicial, mais demorado.” 33
. Por conseguinte, b) “Assim como sucede na separação judicial e
no divórcio judicial consensuais, a escritura pública deve expressar a livre decisão do casal
acerca da partilha dos bens comuns, do quantum e do modo de pagamento dos alimentos que
um dos cônjuges pagará ao outro, ou sua dispensa, e da retomada, ou não, do nome de
solteiro.” 34
. c) No que tange ao tabelionato, ressalta-se que “Preceitua o § 1° do art. 1.124-A
do diploma processual civil (redação dada pela Lei n. 11.441/2007): ‘A escritura não depende
de homologação judicial e constitui título hábil para o registro civil e o registro de imóveis’”. 35
. d) Por sua vez, finaliza expondo que “Cumpre enfatizar que assistência não é simples
presença formal do advogado ao ato para sua autenticação, mas de efetiva participação na
orientação do casal, esclarecendo as dúvidas de caráter jurídico e redigindo a minuta do
acordo para a lavratura da escritura pública. O advogado comparece ao ato e subscreve a
32
Direito de família no novo milênio: Estudos em homenagem ao professor Álvaro Villaça Azevedo/ José Fernando Simão, Jorge Shiguemitsu Fujita, Silmara Juny de Abre Chinellato, Maria Cristina Zucchi, Organizadores. – São Paulo: Atlas, 2010 – Texto de: Antônio Carlos Mathias Coltro – Dissolução da sociedade conjugal: separação extrajudicial. 33
GONÇALVES. Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, volume 6: Direito de família/ Carlos Roberto Gonçalves – 8ª Ed. rev. e atual. – São Paulo: Saraiva, 2011. 34
Idem. 35
Idem.
25
escritura, como assistente das partes, não havendo necessidade de procuração.” 36
. Por
derradeiro, expõe que não se discute o requisito periódico para a separação ou até mesmo o
divórcio, vez que a Emenda Constitucional n. 66 da Constituição Federal retirou do
ordenamento jurídico a necessidade de qualquer vacância.
Em seguida, a menção acerca da separação judicial, mesmo consensual, se tornou
uma norma subsidiária, sendo, portanto, usada somente quando inviável a consensual
extrajudicialmente ou quando se encontra menor ou incapaz no matrimonio, do qual, para que
seja apreciada pelo Magistrado requer-se seja ouvido o Membro do Ministério Público. Neste
sentido temos: “Quando não se apresentam as condições favoráveis à solução consensual, o
conflito do casal deverá ser resolvido pelo juiz, mediante separação litigiosa.” 37
. Conforme
ensinos da Excelentíssima MARIA HELENA DINIZ temos que “Tanto a separação
consensual como a litigiosa dependem de sentença homologatória do juiz, no primeiro caso, e
decisória, no segundo, por isso são denominadas, genericamente, ‘separação judicial’”. 38
.
Corrobora em um sentido mais minucioso SILVIO DE SALVO VENOSA que “A Lei nº
6.515/77 conservou do direito anterior a separação judicial por mútuo consentimento (art. 4º)
e a separação judicial pedida por um só dos cônjuges, com índole de sanção, com imputação
ao outro de ‘conduta desonrosa ou qualquer ato que importe em grave violação dos deveres
do casamento e torne insuportável a vida em comum’ (art. 5º).” 39
.
Portanto, separação judicial é aquela em que se recebe a apreciação do Estado-Juiz.
36
Idem. 37
Direito de família no novo milênio: Estudos em homenagem ao professor Álvaro Villaça Azevedo/ José Fernando Simão, Jorge Shiguemitsu Fujita, Silmara Juny de Abre Chinellato, Maria Cristina Zucchi, Organizadores. – São Paulo: Atlas, 2010 – Texto de: Paulo Luiz Netto Lôbo - Dissolução da sociedade conjugal: separação judicial e suas modalidades. 38
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro, volume 5: direito de família/ Maria Helena Diniz – 27. Ed. – São Paulo: Saraiva, 2012. 39
VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil: direito de família/ Silvio de Salvo Venosa. – 11ª Ed. – São Paulo: Atlas. – (Coleção direito civil; v. 6)
26
4.1.3.3 Separação de corpos: Dê-se nota de que o ordenamento jurídico brasileiro admite em
seu bojo, no que tange ao direito processual, ou seja, o instrumento que dará forma ao direito
material, três formas de ações. Neste sentido, temos que:
“O processo classifica-se de acordo com o tipo de tutela postulada. Podem-se
classificar os processos da mesma maneira que as ações (Capítulo 4, item 3.7.3
supra): de conhecimento, em que se busca uma tutela cognitiva, para que o juiz diga
o direito. A prestação jurisdicional, preenchidas as condições, virá como sentença de
mérito; de execução, em que a pretensão não é mais ao acertamento do direito, mas
a sua satisfação; e os cautelares, em que se procura uma tutela protetiva, de
resguardo do direito que está em perigo, pela demora do processo.” 40
.
Neste caso, observa-se que a separação de corpos se refere ao terceiro, ou seja, a uma
cautelar. Isso ocorre, pois como já suscitado anteriormente (Capítulo III, item 1.3.1.
Separação litigiosa), natural é que o fim do matrimonio seja precedido por inúmeras
contendas e atritos de incompatibilidade, no entanto, em certas ocasiões, esses atritos fogem
da normalidade iniciando uma verdadeira empreitada de risco à integridade e até mesmo uma
latente proeminência de morte dentro do lar conjugal. Para que isso não ocorra “Estabelece o
art. 1.562 do CC que, antes de mover a ação de separação judicial, poderá requerer a parte,
comprovando sua necessidade, a separação de corpos, que será concedida pelo juiz com
possível brevidade.” 41
.
Ressalta-se que a Lei pátria assim expôs pois:
“Ocorrerá, no entanto, situações em que o interessado pela providência jurisdicional
se verá aflito por problemas que exigem uma resposta imediata do Estado, vale
dizer, questões que, se não solucionadas de imediato, perderão seu objeto, dada a
irreparabilidade do dano poderá ser causado. Para essas hipóteses, o jurisdicionado
não poderá aguardar o trâmite natural de um processo, sob pena de, ao final, a
decisão que vier a ser proferida, ainda que lhe sendo favorável, não ter mais forças
de produzir os efeitos que eram solicitados. (...) Justamente para tutelar essas
situações, o ordenamento jurídico coloca à disposição do interessado o chamado
processo cautelar, instrumento apto a assegurar a realização de providências tidas
como urgentes e necessárias para resguardar a utilidade da atividade jurisdicional.” 42
.
Isso assim ocorre em virtude de que, muitas vezes, necessário se faz que, normalmente
a mulher, invoque essa medida para preservação de sua integridade física e de, infelizmente,
seus filhos, vez que a separação é fim e jamais será alcançado se, por exemplo, os cônjuges se
matarem. Corrobora neste sentido MARIA BERENICE DIAS em expor que:
40
GONÇALVES, Marcus Vinicius Rios. Direito processual esquematizado/ Marcus Vinicius Rios Gonçalves. – 2ª ed. revista e atualiza São Paulo: Saraiva, 2012. 41
CAHALI, Yussef Said. Separações conjugais e divórcio/ Yussef Said Cahali. – 12. Ed. rev., atual. e ampl. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011. 42
WAGNER JUNIOR. Luiz Guilherme da Costa. Processo Civil – curso completo/ Luiz Guilherme da Costa Wagner Junior. 4ª ed. revista e atualizada. – Belo Horizonte: Del Rey, 2010.
27
“Todas as ações que envolvem vínculos afetivos desfeitos carregam grande dose de
ressentimentos e mágoas. Sempre a tendência é culpar o outro pelo fim do sonho de
amor eterno. Assim, não é difícil imaginar o surgimento de conflitos, que possam
comprometer a vida ou a integridade física dos cônjuges e também da prole, quando
um dos cônjuges revela a intenção de se separar. Esse é o motivo autorizador do
pedido de separação de corpos (CC 1.562), mesmo antes de intentada a ação para
pôr fim ao casamento.” 43
.
Note-se que “Quando os cônjuges instauram o litigio ou quando estão prestes a
instaurá-lo, o art. 888, VI do CPC permite que o juiz determine ou autorize o afastamento
temporário de um dos cônjuges do lar conjugal.” 44
. Neste patamar, encontra-se na doutrina
uma discussão ainda não pacificada, do qual relata-se acerca da temporariedade do
afastamento, onde reflete-se se há ou não cautelar satisfativa para a Separação de Corpos.
Como este assunto não é razão de mérito para o enfoque, vale-se tão somente expor
dois pareceres de peso, a saber: a). Silvio de Salvo Venosa, “Seguindo a regra geral, em 30
dias caducará a medida concedida se não for proposta a ação principal, no caso, a separação
ou divórcio.” 45
. Defendendo que a cautelar de separação de corpos não pode ser vista como
satisfativa e; b). Maria Berenice Dias, “A separação de corpos é reconhecida como cautela
satisfativa, não se lhe aplicando o referido prazo decadencial.” 46
. Que defende a
satisfatividade da cautelar em tela.
Por fim, a Separação de corpos é processo cautelar que visa proteger cônjuges e o lar
conjugal de qualquer impropério advindo de um fim turbulento do matrimonio, nos termos do
art. 1.562 do CC.
43
DIAS. Maria Berenice. Manual de direito das famílias. / Maria Berenice Dias. – 7. Ed., rev., atual. e ampl. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010. 44
VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil: direito de família/ Silvio de Salvo Venosa. – 11ª Ed. – São Paulo: Atlas. – (Coleção direito civil; v. 6) 45
Idem. 46
DIAS. Maria Berenice. Manual de direito das famílias. / Maria Berenice Dias. – 7. Ed., rev., atual. e ampl. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010.
28
4.1.4 Efeitos jurídicos: Emérito entendimento deve ser levantado em ressaltar que toda
ação exercida no mundo jurídico visa uma finalidade e produzem determinados efeitos em
proporção ao seu ato, isso não seria diferente no caso em pauta. Portanto, resigne-se ao
entendimento de que a separação conjugal também produz seus efeitos que devem justa
menção conforme segue-se, pois:
“Muito embora esse artigo47
se refira somente à extinção dos deveres de fidelidade e
coabitação, a exemplo do que estipulava a Lei do Divórcio, no art. 3º, caput, os
demais deveres – mútua assistência e respeito e consideração mútuos – extinguem-
se após a separação judicial, já que é somente o dever de assistência material que,
em hipóteses determinadas em lei, converte-se em obrigação de alimentos. Outro
feito se aplica, segundo o art. 1.576, a todas as espécies de separação judicial é a
extinção do regime de bens, o que já dispunha o art. 3º, caput, da Lei nº 6.515/77” 48
.
Conforme esclarecimento de YUSSEF SAID CAHALI:
“A dissolução da sociedade conjugal produz efeitos genéricos de natureza pessoal e
patrimonial, interessando aos cônjuges, à prole e a terceiros; a separação judicial
produz efeitos específicos, conforme tenha sido decretada em razão de mútuo
consentimento, no pressuposto da culpa unilateral ou recíproca, ou sem pressuposto
de culpa de qualquer dos cônjuges.” 49
.
Complemente MARIA HELENA DINIZ que:
“Seus efeitos verificam-se em relação à pessoa dos cônjuges, aos bens e em relação
aos filhos, variando conforme seja a separação judicial consensual ou litigiosa. Se
consensual, conforma-se às condições ajustadas pelo próprio casal, e, se litigiosa,
são estabelecidos, com certa margem de arbítrio, pelo juiz dentro dos termos legais.
A sentença produz efeitos a partir do trânsito em julgado ou da data que concedeu a
separação de corpos.” 50
.
No que tange a processualística dos efeitos decisórios dados pela sentença ou
homologação da separação judicial, bem como da própria separação de corpos, ressalta com
inteligência una a douta MARIA BERENICE DIAS que:
“A sentença que decreta a separação produz efeitos a partir de seu trânsito em
julgado. É o que a Lei do Divórcio assegura. No entanto, a sentença dispõe de efeito
retroativo, alcançando a separação cautelar (LD 8.º). Ou seja, os efeitos da sentença
de separação judicial retroagem à data da separação de corpos. Apesar de a sentença
dispor de eficácia desconstitutiva – termina a sociedade conjugal -, tal se opera
desde a separação de corpos. Em face deste permissivo legal construiu-se uma firme
47
Refere-se ao artigo 1.576 do Código Civil – “A separação judicial põe termo aos deveres de coabitação e fidelidade recíproca e ao regime de bens.”. 48
MONTEIRO. Washington de Barros. Curso de direito civil – 37 ed. rev. e atual., por Regina Beatriz Tavares da Silva. – São Paulo: Saraiva. 2004. 49
CAHALI, Yussef Said. Separações conjugais e divórcio/ Yussef Said Cahali. – 12. Ed. rev., atual. e ampl. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011. 50
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro, volume 5: direito de família/ Maria Helena Diniz – 27. Ed. – São Paulo: Saraiva, 2012.
29
jurisprudência emprestando à separação de corpos todos os demais efeitos do
término da sociedade conjugal: romper com os deveres conjugais e pôr fim ao
regime de bens. Inclusive há possibilidade de a separação de corpos ser
transformada em divórcio (CC 1.580).” 51
.
Por derradeiro, nada mais justo do que finalizar a elucidação acerca dos efeitos da
separação, bem como todo este item acerca do referido instituto com o desenho fático legal,
ou seja, o entendimento ex lege.
Portanto, In verbis:
CC/2002 – Art. 1.576. “A separação judicial põe termo aos deveres de coabitação e
fidelidade recíproca e ao regime de bens.”.
51
DIAS. Maria Berenice. Manual de direito das famílias. / Maria Berenice Dias. – 7. Ed., rev., atual. e ampl. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010.
30
4.2 Do divórcio
4.2.1 Breves relatos:
“Tem-se a seguinte evolução constitucional no Brasil, em relação ao divórcio:
a) Com a emenda do divórcio em 1977, a separação judicial era requisito
necessário e prévio para o pedido de divórcio, que tinha de aguardar a consumação
de prazo de três anos daquela; não havia, portanto, divórcio direto;
b) Com a Constituição de 1988, a separação judicial deixou de ser requisito para
o divórcio, passando a ser facultativa, tendo duas modalidades: 1ª – ser convertida
em divórcio, após um ano da decisão de separação judicial (ou da separação de
corpos), o que a tornava em requisito por decisão dos cônjuges; 2ª – permitir a
reconciliação dos separados, antes do divórcio por conversão. O divórcio direto, por
sua vez, dependia de requisito temporal (dois anos) da separação de fato;
c) Com a emenda 66 de 2010 que deu nova redação ao § 6º do art. 226 da
Constituição, a separação judicial desapareceu, (...); desapareceu, igualmente, o
requisito temporal para o divórcio, que passou a ser exclusivamente direto, tanto por
mutuo consentimento dos cônjuges (judicial ou extrajudicial), quanto litigioso.” 52
.
Encerra-se, no entanto, discordando com a demasiada incisão acerca do
desaparecimento da separação e expondo tão somente o que merece real menção e que “O
divórcio é o meio voluntário de dissolução do casamento.” 53
.
52
LÔBO. Paulo. Direito civil: famílias/ Paulo Lôbo. – 4ª ed. –São Paulo: Saraiva, 2011. – (Direito civil). 53
Idem.
31
4.2.2 Requisitos: Uma única frase seria requisito peremptório para ser base preponderante
do presente item, a saber: “Não há mais qualquer causa, justificativa ou prazo para divórcio.” 54
. No entanto, carece de melhor esmiuçada o assunto para desfazer qualquer intempérie que
possa ser deixada em virtude do tema tão profundamente discutido.
Assim como na separação, os efeitos trazidos pela Emenda Constitucional 66 de 2010
foram bem contundentes neste presente item. O maior e mais querido requisito vencido pela
Emenda foi o demagogo lapso temporal. Com a própria Constituição de 88 itens
consideráveis já foram vencidos, como, por exemplo, a possibilidade do divórcio direto sem
prévia separação, a não ser somente a separação de fato. Porém, o CC de 2002, promulgado
poucos anos depois, trouxe em seu texto a caótica discussão de culpa para a separação e
ratificou o entendimento, à época, constitucional da separação de direito obrigatória.
Neste sentido, esclarece-se que a inovação retumbou no seguinte entendimento de que
“O divórcio pode ser requerido a qualquer tempo. No mesmo dia ou no dia seguinte ao
casamento. Acabou o desarrazoado prazo de espera, pois nada justifica impor que as pessoas
fiquem dentro de uma relação quando já rompido o vínculo afetivo.” 55
. Complemente no
mesmo e lógico sentido de que “A ação de divórcio não dispõe de causa de pedir. Não é
necessário o autor declinar o fundamento do pedido. Assim, não há defesa cabível. A culpa
não integra a demanda, não cabe ser alegada, discutida e muito menos reconhecida na
sentença.” 56
.
Portanto, tal como exposto no item da separação, ressalta-se derradeiramente que o
único requisito para o divórcio é a latente existência de um casamento válido, nada mais
restando.
54
Idem. 55
DIAS. Maria Berenice. Manual de direito das famílias. / Maria Berenice Dias. – 7. Ed., rev., atual. e ampl. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010. 56
Idem.
32
4.2.3 Formas de divórcio:
4.2.3.1 Divórcio consensual ou litigioso: como já bem salientado, o divórcio, “Assim como
a separação judicial, o divórcio é causa terminativa da sociedade conjugal; porém, este possui
efeito mais amplo, pois dissolve o vínculo matrimonial.” 57
. Sabido isso, vale lembrar que
assim como na separação o divórcio pode ser requerido tanto por um dos cônjuges como por
ambos os consortes.
Nisso, ver-se-á que o divórcio consensual é a ação de divórcio ou o divórcio dirigido
ao tabelião nas formas da Lei 11.441/2007, que é invocada pelos cônjuges que, estando em
comum, acordo resolvem dissolver a entidade familiar antes conjurada. Ressalta-se que “O
pedido de divórcio pode, portanto, nessas premissas, ser formulado em conjunto por ambos os
cônjuges, na modalidade consensual.” 58
. Complementa-se que “desse modo, as portas do
divórcio-remédio foram definitivamente abertas no ordenamento brasileiro, seguindo a
tendência da maioria das legislações.” 59
.
Por isso, pode-se dar ao divórcio consensual o sucinto entendimento de sê-lo uma
medida remédio para o matrimonio que já não comporta mais vias de prosseguimento, sendo
requerida por ambos os cônjuges tanto por vias cartorárias (conforme item 1.3.2) ou por vias
judiciais.
Lembra-nos a douta MARIA HELENA DINIZ que:
“O divórcio-remédio destinava-se a solucionar situações insustentáveis que
sacrificassem, demasiadamente, um dos cônjuges. O divórcio-falência se dava
quando houvesse ruptura da vida em comum, tornando sua reconstituição impossível
(RT, 529:83). O divórcio-sanção tinha por escopo aplicar ao consorte que violasse
os deveres conjugais a pena da dissolução do enlace matrimonial.” 60
.
Nestes termos, resume-se que o divórcio consensual é o remédio jurídico, ou seja, “é uma
permissão jurídica colocada à disposição dos consortes” 61
. para que, querendo, usufruam do
instituto quando se observarem inviável a continuidade.
Por sua vez, o divórcio litigioso, é instituto semelhantíssimo, diferenciando-se tão
somente no critério de que o mesmo não é requerido pelos dois cônjuges e salvaguardado
consenso, mas por um único consorte que, desgostoso com a relação, decide, não importando
razões de cunho subjetivo, bastando, portanto, somente o animus objetivo, de divorciar-se.
Assevera-se que:
57
CAHALI, Yussef Said. Separações conjugais e divórcio/ Yussef Said Cahali. – 12. Ed. rev., atual. e ampl. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011. 58
VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil: direito de família/ Silvio de Salvo Venosa. – 11ª Ed. – São Paulo: Atlas. – (Coleção direito civil; v. 6) 59
Idem. 60
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro, volume 5: direito de família/ Maria Helena Diniz – 27. Ed. – São Paulo: Saraiva, 2012. 61
Idem.
33
“O casal, como não há necessidade de imputar culpa a qualquer dos divorciandos
pelo termino do casamento, para pleitear o divórcio, deverá apresentar certidão de
casamento, sem ter de indicar o motivo do fim da relação matrimonial ou que
comprovar a culpabilidade dos interessados oi a fluência de qualquer prazo de
eventual separação judicial ou de fato.” 62
.
Em suma, divórcio litigioso é aquele em que “apenas discutir-se-ão, não havendo
acordo dos divorciandos, sobre a guarda de filhos, visitação, uso do nome, partilha de bens,
alimentos etc.” 63
.
62
Idem. 63
Idem.
34
4.2.3.2 Divórcio judicial e extrajudicial: Conforme lei, o divórcio pode ser requerido em
duas modalidades, mesmo que consensual, ou extrajudicial ou judicialmente. No entanto, de
maneira extrajudicial ele sempre será consensual, porém, essa mesma assertiva não prevalece
em litigio. Ou seja, trata-se aqui do divórcio conforme onde se propõe a requisição de sua
feitura, tanto em cartório de tabelião de pessoas civis naturais (extrajudicial) como diante do
Poder Judiciário (judicial).
“De enorme significado a alteração introduzida no Código de Processo Civil que
admitiu a possibilidade da dissolução consensual do casamento, bem como os
inventários e partilhas serem realizados extrajudicialmente por escritura pública
perante tabelião (CPC 1.124-A). A EC 66/10 em nada alterou questões de natureza
procedimental, seja na esfera judicial ou extrajudicial. Com isso, demandas que
envolvem somente maiores e capazes podem ser resolvidas na via administrativa
sem a participação do juiz ou do Ministério Público. Aliás, por inexistir conflito
entre as partes, esses procedimentos são chamados de jurisdição voluntária.” 64
.
Esclarece-se ainda que:
“O divórcio extrajudicial consensual, introduzido pela Lei n. de 11.441/2007, é
realizado mediante escritura pública lavrada por notário, desde que os cônjuges
estejam assistidos por advogado ou defensor público, quando forem cumpridos dois
outros requisitos fundamentais: a) inexistência de filhos menores; b) acordo sobre
todas as questões essenciais.” 65
.
Fora o caso supra, todos os demais serão por dias do divórcio judicial, tanto de
jurisdição voluntária como contenciosa, Ou seja, impossibilitados o cumprimento destes
requisitos, inclusive o da consensualidade em qualquer dos assuntos, mesmo que
intermitentes, o divórcio haverá de ser judicial com a manifestação, inclusive, nos casos de
incapazes de menores, do ilustre membro do Ministério Público. “No divórcio judicial
consensual, inexiste audiência dos cônjuges perante o juiz para fins de tentativa de
conciliação (...). No divórcio litigioso, por ser processo de jurisdição contenciosa, é cabível a
tentativa de conciliação” 66
.
Por essas razões, divórcio judicial é todo o pedido de divorcio dirigido ao Estado-Juiz
para respectiva apreciação deferindo ou homologação ou decisão.
64
DIAS. Maria Berenice. Manual de direito das famílias. / Maria Berenice Dias. – 7. Ed., rev., atual. e ampl. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010. 65
LÔBO. Paulo. Direito civil: famílias/ Paulo Lôbo. – 4ª ed. –São Paulo: Saraiva, 2011. – (Direito civil). 66
Idem.
35
4.2.3.3 Divórcio conversão e divórcio direto: Salienta-se que neste item a discussão recebe
maior peso e discordância entre os doutrinadores, havendo inúmeras correntes, do qual, serão
mais bem explicadas a posterior.
O divórcio conversão esclarece-se que, nas palavras de SÍLVIO DE SALVO
VENOSA:
“Não há prazo para essa ação de conversão, que é imprescritível. Os que se
encontram ainda nessa situação após a Emenda constitucional nº 66/2010 podem
convertê-la em divórcio a qualquer tempo. Na verdade, a faculdade para requerer a
dissolução do vínculo matrimonial, seja por separação, seja por divórcio, insere-se
no rol de direitos facultativos ou protestativos, cuja possibilidade de promover a
ação persiste enquanto for mantida determinada situação jurídica.” 67
.
Neste caso, o divórcio poderá ser tanto consensual como litigioso, mas na verdade o
que se analisa é que o próprio passa por um binômio para sua consumação fática, ou seja,
passa por uma separação de direito anterior. Neste sentido, “O divórcio indireto, ante o fato da
existência de separação (judicial ou extrajudicial) anterior à reforma constitucional (LINDB,
art. 6º e CF, art. 5º, XXXVI).” 68
. Portanto, divórcio conversão é o divórcio de advém de uma
separação anterior, atualmente não mais obrigatória, mas possível.
Por sua vez, no que tange ao divórcio direto, aponta CARLOS ROBERTO
GONÇALVES que:
“A Emenda Constitucional n. 66/2010 aboliu o divórcio-conversão ou indireto,
remanescendo apenas o divórcio direto, sem o requisito temporal e que pode ser
denominado simplesmente divórcio. Tal modalidade pode tresdobrar-se em: a)
divórcio judicial litigioso; b) divórcio judicial consensual; e c) divorcio extrajudicial
consensual. Em todos eles se exige apenas a exibição da certidão de casamento.” 69
.
Aponta-se que “Era chamado de divórcio direto, para se distinguir da ação de
conversão da separação em divórcio. A ação pode ser consensual ou litigiosa.” 70
. Anote-se
que o presente trabalho não concorda com o entendimento trazido de que o divórcio
conversão inexiste, mas saliente justa necessidade de expor o parecer desses doutos
pensadores, do qual dá, em unanimidade, o entendimento de que o divórcio direto se trata,
nada mais e nada menos, do divórcio requerido sem a necessidade de nenhum ato meio.
67
VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil: direito de família/ Silvio de Salvo Venosa. – 11ª Ed. – São Paulo: Atlas. – (Coleção direito civil; v. 6) 68
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro, volume 5: direito de família/ Maria Helena Diniz – 27. Ed. – São Paulo: Saraiva, 2012. 69
GONÇALVES, Marcus Vinicius Rios. Direito processual esquematizado/ Marcus Vinicius Rios Gonçalves. – 2ª ed. revista e atualiza São Paulo: Saraiva, 2012. 70
DIAS. Maria Berenice. Manual de direito das famílias. / Maria Berenice Dias. – 7. Ed., rev., atual. e ampl. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010.
36
4.2.4 Efeitos jurídicos: No que tange a este item de crucial importância, é justo expor o
parecer do douto YUSSEF SAID CAHALI que se indigna ao dizer que:
“A omissão se mostra lamentável quando se considera que o instituto tem passado
por modificações quanto a sua admissibilidade, com sucessivas modalidades de
dissolução do casamento, cada uma delas reclamando tratamento específico quanto
aos efeitos colaterais. Estatuem-se alguns efeitos, esparsamente, no corpo da lei,
porém sem qualquer disciplina metódica.” 71
.
Porém a falta de compromisso do legislativo não faz com que jurisprudência e a
doutrina padeçam no leito da inércia, onde expõe que “O efeito principal do divórcio é a
dissolução da sociedade e do vinculo conjugal, com seus consectários, principalmente a
separação de corpos e a extinção dos demais deveres conjugais. Outro efeito importante é a
extinção do regime de bens, provocando sua partilha.” 72
.
Complementa-se ainda que “A sentença do divórcio, que homologa ou decreta, possui
eficácia ex nunc, não atingindo ou suprimindo os efeitos produzidos pelo casamento antes de
seu pronunciamento.” 73
. E, deste modo, finaliza-se o entendimento doutrinário acerca do
assunto expondo que “O efeito mais importante do decreto de divórcio é pôr termo ao
casamento e aos efeitos civis do matrimonio religioso. Dissolvida a sociedade conjugal pelo
divórcio, os cônjuges podem contrair novas núpcias, desaparecendo o impedimento legal.” 74
.
Portanto, vale reforçar e redigir novamente que Divórcio é o que (Lei 6.515/77, In
verbis):
Art. 24. “O divórcio põe termo ao casamento e aos efeitos civis do matrimônio
religioso.” (Grifo do autor).
71
CAHALI, Yussef Said. Separações conjugais e divórcio/ Yussef Said Cahali. – 12. Ed. rev., atual. e ampl. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011. 72
LÔBO. Paulo. Direito civil: famílias/ Paulo Lôbo. – 4ª ed. –São Paulo: Saraiva, 2011. – (Direito civil). 73
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro, volume 5: direito de família/ Maria Helena Diniz – 27. Ed. – São Paulo: Saraiva, 2012. 74
VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil: direito de família/ Silvio de Salvo Venosa. – 11ª Ed. – São Paulo: Atlas. – (Coleção direito civil; v. 6)
37
5 EXTINÇÃO DA SEPARAÇÃO SOB A ÉGIDE DA EMENDA
CONSTITUCIONAL Nº 66
5.1 Razões para a extinção da separação: Quando se inicia à dissecação deste
entendimento, nada mais justo do que inicia-lo pelo doutrinador que presidiu a luta de
tamanha empreitada, a saber, o douto PAULO LÔBO, presidente da IBDFAM (Instituto
Brasileiro de Direito de Família). Como tal, o respectivo jurista defende com tamanha
proeminência a falência do instituto da separação na nova forma constitucional que a sua obra
a partir de então (emenda n. 66/2010) não passou mais a constar o instituto de separação, nem
mesmo como “leitura complementar”, como, por exemplo, manteve SILVIO DE SALVO
VENOSA, ou até mesmo, sem fazer menção que fez o cientista jurídico CARLOS
ROBERTO GONÇALVES que assim mencionou em sua obra quando começou a tecer acerca
do instituto da separação:
“Observação do autor: Este tópico trata da separação judicial por mútuo
consentimento, que foi eliminada do nosso ordenamento pela Emenda
Constitucional n. 66/2010. Todavia, será ele mantido como consta da edição
anterior deste volume, até a consolidação da jurisprudência, para atender aos
que entendem de forma diversa e defendem a manutenção da legislação
infraconstitucional, bem como pelo fato de os casais anteriormente separados
conservarem essa qualidade.” 75
.
Por essas razões, nada mais justo que iniciar a abordagem da corrente que defende,
equivocadamente, a extinção da separação no texto pátrio por tal doutrinado onde, nesse
sentido assim expõe PAULO LÔBO que:
“é possível argumentar que a separação judicial permaneceria enquanto não
revogados os artigos que dela tratam no Código Civil, porque a nova redação do § 6º
do art. 226 da Constituição não a teria excluído expressamente. Mas esse
entendimento somente poderia prosperar se arrancasse apenas a interpretação literal,
desprezando-se as exigências de interpretação histórica, sistemática e teleológica da
norma.” 76
.
Claro que este parecer é tão somente a nota introdutória acerca de todos os fundamentos dos
que defendem esta corrente, que verterá em uma tese extensa, mas ilógica e contraditória.
Também em apertada síntese expõe YUSSEF SAID CAHALI que:
“Depois, a Emenda Constitucional n. 66, de 2010, como foi visto (Capítulo III)
suprimiu a modalidade de divórcio por via de conversão da separação judicial,
remanescendo agora apenas a ação direta de divórcio, que pode ser ajuizada a
qualquer tempo e dispensa a discussão da causa de dissolução do casamento.” 77
.
75
GONÇALVES. Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, volume 6: Direito de família/ Carlos Roberto Gonçalves – 8ª Ed. rev. e atual. – São Paulo: Saraiva, 2011. 76
LÔBO. Paulo. Direito civil: famílias/ Paulo Lôbo. – 4ª ed. –São Paulo: Saraiva, 2011. – (Direito civil). 77
CAHALI, Yussef Said. Separações conjugais e divórcio/ Yussef Said Cahali. – 12. Ed. rev., atual. e ampl. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011.
38
Portanto, seguindo a linha trazida pelo PAULO LÔBO e, assim, expor em ordem
concisa os pontos que defendem a extinção da separação, a saber, os métodos de interpretação
tanto “Histórico, lógico ou racional, sistemático e teleológico,” 78
.
No que tange à interpretação histórica, tem-se o seguinte:
“Baseia-se na investigação dos antecedentes da norma, do processo legislativo, a fim
de descobrir o seu exato significado. É o melhor método para apurar a vontade do
legislador e os objetivos que visava atingir (ratio legis). Consiste na pesquisa das
circunstancias que nortearam a sua elaboração, de ordem econômica, politica e
social (occasio legis), bem como do pensamento dominante ao tempo de sua
formação.” 79
.
Corrobora neste sentido PAULO LÔBO que:
“Como se demonstrou, a inserção constitucional do divórcio evoluiu da
consideração como requisito prévio ao divórcio até sua total desconsideração. Em
outras palavras, a Constituição deixou de tutelar a separação judicial. A
consequência da extinção da separação judicial é o que concomitantemente
desapareceu a dissolução da sociedade conjugal que era a única possível, sem
dissolução do vínculo conjugal, até 1977. Com o advento do divórcio, a partir dessa
data e até a emenda constitucional que deu nova redação ao § 6º do art. 226 da
Constituição, a dissolução da sociedade conjugal passou a conviver com a
dissolução do vínculo conjugal, porque ambas recebiam tutela constitucional
explicita. Portanto, não sobrevive qualquer norma infraconstitucional que trate da
dissolução da sociedade conjugal isoladamente, por absoluta incompatibilidade com
a Constituição, de acordo com a nova redação do § 6º do artigo 226 da Constituição,
que apenas admite a dissolução do vínculo conjugal.” 80
.
Por mais que se pareça um tanto redundante, é justo expor os pioneiros acerca do
assunto que são os doutores PAULO LÔBO e CARLOS ROBERTO GONÇALVES, que
esmiúçam com perícia incomum a disseminação das respectivas interpretações da preceituada
norma constitucional. Já explanada a interpretação histórica, faz-se justo agora o
levantamento da interpretação lógico ou racional, que:
“Na interpretação lógica ou racional, que atende ao espirito da lei, procura-se
apurar o sentido e a finalidade da norma, a intenção do legislador, por meio de
raciocínios lógicos, com abandono dos elementos puramente verbais. O intérprete
procura extrair as várias interpretações possíveis, eliminando as que possam parecer
absurdas e que levem a um resultado contraditório em relação a outros preceitos,
para descobrir a razão de ser das leis.” 81
.
Neste sentido, aprofunda expondo que:
78
GONÇALVES. Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, volume 6: Direito de família/ Carlos Roberto Gonçalves – 8ª Ed. rev. e atual. – São Paulo: Saraiva, 2011. 79
Idem. 80
LÔBO. Paulo. Direito civil: famílias/ Paulo Lôbo. – 4ª ed. –São Paulo: Saraiva, 2011. – (Direito civil). 81
GONÇALVES. Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, volume 6: Direito de família/ Carlos Roberto Gonçalves – 8ª Ed. rev. e atual. – São Paulo: Saraiva, 2011.
39
“Ora, nada mais lógico e racional do que considerar que a Emenda Constitucional n.
66/2010 veio fechar o ciclo evolutivo iniciado com a Lei do Divórcio de 1977. Para
que esta fosse aprovada, criou-se, mediante acordo entre divorcista e antidivorcista,
o sistema dual de rompimento do vínculo legal do casamento. Verificou-se então,
com o passar dos anos, que esse sistema, baseado em uma moral religiosa, não mais
se justificava, pois a tendência observada nos ordenamentos jurídicos ocidentais é a
de que o Estado deixa de interferir na vida privado e na intimidade dos cidadãos.” 82
.
Confirma, por derradeiro, que:
“A realidade é que a Constituição Federal eliminou de seu bojo a única referência
que fazia à separação judicial. Não se limitou a suprimir os prazos, senão também o
requisito obrigatório ou voluntário da prévia separação judicial ao divórcio por
conversão. Ante tal constatação, é de perguntar: qual seria o objetivo de manter em
vigor o instituto da separação judicial, se ela não pode mais ser convertida em
divórcio? E mais: para que serve a separação judicial com imputação de culpa ao
cônjuge (adultério, por exemplo) se este pode, em contrapartida, ajuizar, tronando
prejudicada aquela demanda, ação de divórcio, que só pode ser negada pelo
Judiciário se o requerente não for casado, uma vez que não subsiste mais nenhum
requisito objetivo ou subjetivo para a sua concessão, a não ser o mencionado estado
civil?” 83
.
Portanto, “Nessa consonância, impõem-se a conclusão de que a separação de direito,
judicial ou extrajudicial, foi suprimida do ordenamento jurídico pela referida emenda
constitucional.” 84
. Nisto, resume-se o sentido de interpretação lógica ou racional que
fundamenta, ao ver somente destes doutrinadores, a exclusão da separação no seio legal
nacional. Por conseguinte, vale e necessita abordar, também, o molde de interpretação de
cunho sistemático, onde “A interpretação sistemática parte do pressuposto de que uma lei não
existe isoladamente e deve ser interpretada em conjunto com outras pertencentes à mesma
província do direito.” 85
.
Consonante a tanto, basta-se lembrar das lições introdutórias de direito civil de
MARIA HELENA DINIZ que assim expõe:
“A maioria dos juristas entende ser impossível uma solução absoluta ou perfeita do
problema da distinção entre o direito público e privado. Embora o direito objetivo
constitua uma unidade, sua divisão em público e privado é aceita por ser útil e
necessária, não só sob a prisma da ciência do direito, mas também sob o ponto de
vista didático. Todavia, não se deve pensar que sejam dois compartimentos
estanques, estabelecendo uma absoluta separação entre as normas de direito público
e as de direito privado, pois intercomunicam-se com certa frequência.” 86
.
Por isso:
82
Idem. 83
Idem. 84
Idem. 85
Idem. 86
DINIZ. Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro, volume 1: teoria geral do direito civil/ Maria Helena Diniz. – 29ª ed. – São Paulo: Saraiva, 2012.
40
“No que respeita à interpretação sistemática, não se pode entender que a norma
restringiu. Nem se pode interpretar e aplicar a norma desligando-se de seu contexto
normativo. Tampouco podem prevalecer normas do Código Civil ou de outro
diploma infraconstitucional, que regulamentavam o que previsto de modo expresso
na Constituição e que esta excluiu posteriormente. Inverte-se a hierarquia normativa,
quando se pretende que o Código Civil valha mais que a Constituição e que esta não
tenha força revocatória suficiente.” 87
.
E Seguindo essa lógica, SILVIO DE SALVO VENOSA, MARIA BERENICE DIAS,
CARLOS ROBERTO GONÇALVES, todos em conjunto com o presidente do IBDFAM, o
doutor PAULO LÔBO, defendem que a separação inexiste depois da emenda constitucional
n. 66 de 2010 em virtude de que sua interpretação sistemática que trouxe fiel entendimento de
que:
“No direito brasileiro, há grande consenso doutrinário e jurisprudencial acerca da
força normativa própria da Constituição. Sejam as normas constitucionais regras ou
princípios não dependem de normas infraconstitucionais para estas prescreverem o
que aquelas já prescreveram. O § 6º do art. 226 da Constituição qualifica-se como
regra-norma, pois seu suporte fático é precisamente determinado: o casamento pode
ser dissolvido pelo divórcio, sem qualquer requisito prévio, por exclusivo ato de
vontade dos cônjuges.” 88
.
E nestes fundamentos, defendem obscura e agressivamente, com base em
interpretações histórica, racional ou lógica e sistemática pelo desaparecimento da separação
do texto legal pátrio. Inobstante, não se finaliza assim, levantando ainda para complemento da
corrente que defende a fim da separação como direito potestativo dos cidadãos e cônjuges,
também, a interpretação teleológica. Nela aponta CARLOS ROBERTO GONÇALVES que:
“A interpretação teleológica ou sociológica tem por objetivo adaptar o sentido ou a
finalidade da norma às novas exigências sociais, com abandono do individualismo
que preponderou no período anterior à edição da Lei de Introdução ao Código Civil.
Tal recomendação é endereçada ao magistrado no art. 5º da referida lei, que assim
dispõe: ‘Na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se destina e
às exigências do bem comum.’” 89
.
Complementa-se ainda que “Os fins sociais e o bom comum são, portanto, sínteses
éticas da vida em comunidade, por pressuporem uma unidade de objetivos do comportamento
humano social.” 90
. Portanto:
“No plano da interpretação teleológica, indaga-se quais os fins sociais da nova
norma constitucional. Responde-se: permitir, sem espaços e sem intervenção estatal
na intimidade dos cônjuges, que estes possam exercer com liberdade seu direito de
dissolver a sociedade conjugal, a qualquer tempo e sem precisar declinar os motivos.
Consequentemente, quais os fins sociais da suposta sobrevivência da separação
87
LÔBO. Paulo. Direito civil: famílias/ Paulo Lôbo. – 4ª ed. –São Paulo: Saraiva, 2011. – (Direito civil). 88
Idem. 89
GONÇALVES. Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, volume 6: Direito de família/ Carlos Roberto Gonçalves – 8ª Ed. rev. e atual. – São Paulo: Saraiva, 2011. 90
DINIZ. Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro, volume 1: teoria geral do direito civil/ Maria Helena Diniz. – 29ª ed. – São Paulo: Saraiva, 2012.
41
judicial, considerando que não mais poderia ser convertida em divórcio? Ou ainda,
que interesse relevante subsistiria em buscar um caminho que não pode levar à
dissolução do casamento, pois o divórcio é o único modo que passa a ser previsto na
Constituição? O resultado da sobrevivência da separação judicial é de palmar
inocuidade, expurgando os resíduos de quantum despótico: liberdade e autonomia
sem interferência estatal.” 91
.
E estas são as razões que fundamentam a demagoga luta por expurgar do sistema
jurídico-positivo o instituto da separação, fazendo-me menção a interpretações equivocadas
do texto constitucional e dando-lhe sentido além de sua realidade fática e finalidade leal.
91
LÔBO. Paulo. Direito civil: famílias/ Paulo Lôbo. – 4ª ed. –São Paulo: Saraiva, 2011. – (Direito civil).
42
5.2 Conclusões sobre a extinção: “Como percebemos, com a atual ordem constitucional,
escancararam-se as portas do divórcio, ficando a separação judicial relegada efetivamente
para segundo plano. A tendência legislativa era efetivamente a eliminação da possibilidade de
separação judicial entre nós, como já de há muito deveria ter ocorrido. Não havia mais sentido
de sua manutenção juntamente com o divórcio.” 92
.
Pois, “Afastado o instituto da separação do texto constitucional, foram derrogados
todos os dispositivos da legislação infraconstitucional referentes ao tema.” 93
. Consolidando
claramente que “O fato é que a separação tornou-se um instituto obsoleto.” 94
. Dando ao
direito brasileiro a justa compreensão de “que já não mais existe em nosso direito a
dissolução do vínculo conjugal matrimonial por via indireta de conversão da separação
judicial em divórcio.” 95
.
Finalizando-se que:
“Considerar-se-ão revogados todos os dispositivos do Código Civil que tratarem da
separação judicial, exceto os que digam respeito à guarda dos filhos, aos alimentos
devidos ao cônjuge e aos filhos, à manutenção ou não do nome de casado (sem
requisito da culpa) e à partilha de bens.” 96
.
92
VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil: direito de família/ Silvio de Salvo Venosa. – 11ª Ed. – São Paulo: Atlas. – (Coleção direito civil; v. 6) 93
DIAS. Maria Berenice. Manual de direito das famílias. / Maria Berenice Dias. – 7. Ed., rev., atual. e ampl. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010. 94
Idem. 95
CAHALI, Yussef Said. Separações conjugais e divórcio/ Yussef Said Cahali. – 12. Ed. rev., atual. e ampl. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011. 96
Direito de família no novo milênio: Estudos em homenagem ao professor Álvaro Villaça Azevedo/ José Fernando Simão, Jorge Shiguemitsu Fujita, Silmara Juny de Abre Chinellato, Maria Cristina Zucchi, Organizadores. – São Paulo: Atlas, 2010 – Texto de: Paulo Luiz Netto Lôbo - Dissolução da sociedade conjugal: separação judicial e suas modalidades.
43
6 PRESERVAÇÃO DA SEPARAÇÃO APÓS PLUMO DA EMENDA
CONSTITUCIONAL Nº 66
6.1 Noções introdutórias:
As divergências das correntes que se enlaçam no presente trabalho são de feroz
contundência, tendo, cada uma delas, ao seu lado doutrinadores de incomum maestria,
apontando, cada qual a linha de sua própria persecução; uns equivocados, outros não. No
entanto, dizer quem está certo ou quem está errado seria o mais pretensioso erro de qualquer
jurista, vez que ambos estão certos, porém, não se pode olvidar que uma regra definitiva se
aplique para um caso tão peculiar como o direito de família. Ou seja, é mister a justa flexão
das interpretações.
Por mais antagônico que seja, resumir-se-á que ambas as teses estão corretas, e, por
sua vez, ambas estão equivocadas, devendo-se isso ao delicado entendimento que:
“o termo ‘direito’ não é unívoco, e nem tampouco equívoco, mas análogo, pois
designa realidades conexas ou relacionadas entre si. Deveras, esse vocábulo ora se
aplica à ‘norma’, ora à ‘autorização ou permissão’ dada pela norma de ter ou fazer
o que ela não proíbe, ora à ‘qualidade do justo’ etc., exigindo tantos conceitos
quantas forem as realidades a que se refere.” 97
.
O presente trabalho se apoia nesse sentido. Tendo em vista que é impossível apontar
um como certo ou outro como o errado de forma categórica. Aqui, tão somente se buscará
defender as razões meritórias que fundamentem a querida manutenção da separação judicial
no texto pátrio após a turbulenta EC. N. 66/2010. Antes exposto, a tese contrária que defende
a extinção da separação judicial ou extrajudicial fundamentada nas inúmeras “interpretações”
da Emenda, como nas “regras de controle de constitucionalidade”, olham para o direito de
família, mais especificamente ao instituto do divórcio, in stricto sensu, ou seja, olham-no
somente como um elemento distinto tanto dos princípios constitucionais, como dos princípios
de direito de família e até mesmo dos demais ramos do direito, pois:
“A maioria dos juristas entende ser impossível uma solução absoluta ou perfeita do
problema da distinção entre direito público e privado. Embora é aceita por ser útil
e necessária, não só sob o prisma da ciência do direito, mas também sob o ponto de
vista didático. Todavia, não se deve pensar que sejam compartimentos estanques,
estabelecendo uma absoluta separação entre as normas de direito público e as de
direito privado, pois intercomunicam-se com certa frequência.” 98
.
Exposto isso, analisa-se que o juízo precipitado da corrente contrária resultará
claramente em que “chegará o tempo em que os falsos benefícios resultaram em males reais.”
97
DINIZ. Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro, volume 1: teoria geral do direito civil/ Maria Helena Diniz. – 29. Ed. – São Paulo: Saraiva, 2012. 98
Idem.
44
99. Quando o mesmo ignora que o elemento primordial do direito não é o estudo da lei, mas
sim o estudo dela para a humanidade, com toda sua certeza cairá no erro citado por
Aristóteles. Não podemos, em função da celeridade, por exemplo, preconizar que as famílias
sejam destruídas na mesma velocidade que os cadáveres de bombas atômicas. O direito é o
exercício da tutela dos valores de uma sociedade, bem como de seus cidadãos, e, isso não
pode ser ignoto.
Além desse elemento um tanto sociológico, como filosófico, como humanista de
buscar a proteção da sociedade pela defesa direta das famílias, há de se ressaltar que não
podem ser ignorados, também, os princípios gerais do direito, os costumes e a equidade, e,
que face ao fato concreto, “O juiz, então, restabelece a igualdade.” 100
.
O direito é dinâmico, relativo e análogo. Não é senhor de todas as questões, mas é
assistente que visa resolução de caso a caso. O direito, também, não é solitário e necessita de
amparo da filosofia, sociologia, psicologia, antropologia etc., para que compreenda a
aplicação de suas matrizes. Portanto, refutar a manutenção da separação sobre a ótica de que
“o fato é que a separação tornou-se um instituto obsoleto.” 101
, é, no mínimo, uma agressão as
essências elementares de uma sociedade, pois “a cidade é a união de famílias e povoados para
uma vida perfeita e autossuficiente, a qual consiste uma vida feliz e nobre.” 102
. Não se avilta
aqui o entendimento da igualdade das famílias, pelo contrário, a defende com maior
proeminência, podendo, inclusive, por analogia, usufruir a presente tese também aos
elementos de proteção das uniões estáveis. Mas é notório que, se por meio da separação, for
possível evitar o dano definitivo dado pelo divórcio por qual razão não faríamos?
Assim como o artigo 226, § 3º da Constituição Federal de 1988 visa salutar que a
família matrimonial receba maiores cuidados e atenção, da mesma forma este trabalho aponta
para o caminho de sua proteção. É por isso que a linha de raciocínio trazida pela corrente
contrária merece ser refutada, pois analisa o direito para si e não para o homem, esquecendo-
se que “Poderíamos dizer, também, que o ser do homem é o seu dever. O homem não é
simples entidade psicofísica ou biológica, redutível a um conjunto de fatos explicáveis pela
psicologia, pela física, pela anatomia, pela biologia. No homem existe algo que representa
uma possibilidade de inovação e de superamento.” 103
. Ou seja, o homem é a fonte de valor
das normas e não as normas a fonte de valor do homem.
Sim, agora o casamento pode ser dissolvido pelo divórcio, que, na verdade, sempre
pode104
, mas onde está expresso que um casal que se encontra melindrado por intempéries
ocorridas no matrimônio não possa requerer a separação? Ou até mesmo, um só lado? Não é a
demasia também injustiça? Vez que “é evidente, pois, que procurando pelo justo, os homens
procuram por um termo médio, visto que a lei é o justo meio.” 105
. Portanto, a tese da extinção
da separação restará vencida, nos termos do item posterior, pela lógica violadora do justo
99
ARISTÓTELES. Política. 5ª Ed, 3ª reimpressão. Tradução: Pedro Constantin Toles. Editora Martin Claret. 100
ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. 5ª Ed, 9ª reimpressão. Tradução: Torrieri Guimarães. Editora Martin Claret. 101
DIAS. Maria Berenice. Manual de direito das famílias. / Maria Berenice Dias. – 7ª ed. revista, atualizada e ampliada. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010. 102
ARISTÓTELES. Política. 5ª Ed, 3ª reimpressão. Tradução: Pedro Constantin Toles. Editora Martin Claret. 103
REALE. Miguel. Filosofia do direito. / Miguel Reale. – 20ª Ed. – São Paulo: Saraiva, 2002. 104
Desde 1977. 105
ARISTÓTELES. Política. 5ª Ed, 3ª reimpressão. Tradução: Pedro Constantin Toles. Editora Martin Claret.
45
meio, pois assim como um cidadão roga seu direito subjetivo de casar-se com quem quiser,
rogará também o direito de escolher se prefere a separação ou o divórcio, mas não o Estado.
Aliás, o cidadão não se casou com o Estado.
46
6.2 Razões para a manutenção da separação:
“- Esqueceste-te novamente, meu amigo, que à lei não importa que uma classe
qualquer da cidade passe excepcionalmente bem, mas procura que isso aconteça à totalidade
dos cidadãos, harmonizando-os pela persuasão ou pela coação.” 106
.
A citação platônica, antes exposta, seria mais do que suficiente para fazer entender que
a separação não pode e muito menos deve ser riscada do ordenamento jurídico pátrio. No
entanto, a preponderância da corrente contrária se sustenta na morfologia da praticidade
visando a extinção da separação. Porém, tal praticidade tem o poder de desconstituir toda uma
doutrina, levando ao risco toda uma cadeia, por exemplo, de princípios amplamente estudados
e defendidos?
Nessa congruente indagação, vale ressaltar, antemão, os dois primordiais princípios do
direito de família, ambos estes, que justificam a equidistante manutenção da separação,
suprimindo a tese contrária, a saber, são os seguintes:
106
PLATÃO. A República. São Paulo. Editora Martin Claret. 7ª Reimpressão. 2009. Tradução: Pietro Nassetti.
47
6.2.1 Princípio da dignidade da pessoa humana: “Constitui a base da comunidade
familiar (biológica ou socioafetiva), garantindo, tendo por parâmetro a afetividade, o pleno
desenvolvimento e a realização de todos os seus membros” 107
, pois “A dignidade da pessoa
humana é o núcleo existencial que é essencialmente comum a todas as pessoas humanas,
como membros iguais do gênero humano, impondo-se um dever geral de respeito, proteção e
intocabilidade.” 108
. Complementa-se, contudo, que:
“Ora, se é direito da pessoa humana constituir núcleo familiar, também é direito
seu não manter a entidade formada, sob pena de comprometer-lhe a existência
digna. É direito constitucional do ser humano ser feliz e dar fim àquilo que o aflige
sem inventar motivos. Desse modo, também é direito buscar o divórcio.” 109
.
Portanto, por qual razão também não é direito buscar a separação?
A separação é, também, por exemplo, meio pelo qual se discute a culpa em seus casos
específicos (art. 1.573 do CC/2002). Porém, a menção de se extirpar a separação faz com que
expurgue conjuntamente a discussão da culpa e, por conseguinte, anula completamente o art.
1º, III da CF/88, isto é, o princípio da dignidade da pessoa humana. Entende-se que:“No
direito de família, o núcleo familiar organiza-se em razão da existência dessas normas de
condutas. Esse núcleo essencial, base de toda a sociedade, necessita de disciplina jurídica
para que a nação, como um todo, seja preservada,” 110
, e, por sua vez, o principio em pauta:
“havida como cláusula geral de tutela da personalidade, a dignidade será violada
se, numa relação conjugal desfeita pelo comportamento culposo de um dos
cônjuges, ainda mais quando esse comportamento acarreta danos morais e/ou
materiais ao consorte, vier a ser negada a preservação a esse valor supremo de
nosso ordenamento jurídico, diante de recusa quanto à decretação da culpa e, por
conseguinte, quanto às consequências legais dessa decretação, antes examinada.” 111
.
Por isso que a separação deve permanecer no texto pátrio legal, tanto pelo seu
elemento normativo de que sua existência não ofende sua regulamentação, ou seja, o casal
que decide por separar-se e não por divorciar-se não está agredindo o principio da dignidade
da pessoa humana; tanto pelo seu elemento formal de apuração da culpa, sob pena de
transformar todo o direito de família em mera demagogia, vez que “os cônjuges receberiam
meras recomendações da lei, de fidelidade ou de respeito recíproco, mas não estariam
obrigados a cumprir esses deveres, já que seu descumprimento nenhuma consequência
sancionatória receberia.” 112
.
107
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro, volume 5: direito de família/ Maria Helena Diniz – 27. Ed. – São Paulo: Saraiva, 2012. 108
LÔBO. Paulo. Direito civil: famílias/ Paulo Lôbo. – 4ª ed. –São Paulo: Saraiva, 2011. – (Direito civil). 109
DIAS. Maria Berenice. Manual de direito das famílias. / Maria Berenice Dias. – 7. Ed., rev., atual. e ampl. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010. 110
TAVARES DA SILVA, Regina Beatriz. A emenda constitucional do divórcio/ Regina Beatriz Tavares da Silva. – São Paulo: Saraiva, 2011. 111
Idem. 112
Idem.
48
6.2.2 Principio da liberdade ou não intervenção: é o princípio que regulamenta o “livre
poder de constituir uma comunhão de vida familiar por meio de casamento ou união estável,
sem qualquer imposição ou restrição de pessoa jurídica de direito público ou privado (CC,
art. 1.513); na decisão livre do casal, unido pelo casamento ou pela união estável, no
planejamento familiar.” 113
, complementa-se ainda que “Em face do primado da liberdade, é
assegurado o direito de constituir uma relação conjugal, uma união estável hétero ou
homossexual.” 114
.
Isto é, o Estado não tem o direito de meter seu “dedão” nas escolhas dos cônjuges,
de tal modo que, vale dar nota no seguinte, se “é inconstitucional, por afrontar ao princípio
da liberdade, a imposição coacta do regime de separação de bens aos maiores de 60 anos
(CC 1.641, II) e a possibilidade de ver negada a separação pretendida pelos cônjuges (CC
1.574, parágrafo único).” 115
, por que não seria inconstitucional obrigar os cônjuges a se
divorciarem quando fazem requisição da separação?
Um dado exemplo de tanto é a possibilidade dos consortes optarem tanto pela via
judicial como pela via administrativa para a instauração da separação/divórcio quando
possível pela lei. Isto é, ao consorte cabe a escolha livre e desimpedida de qualquer imposição
coercitiva de terceiros (seja o Estado, Pessoas públicas ou qualquer outro cidadão alienígena
ao enlace amoroso) para escolher qualquer uma das vias dissolutivas. Nesse sentido, tem-se
“É facultada aos cônjuges a escolha da via judicia, ao invés da via extrajudicial, mesmo
diante do preenchimento dos respectivos requisitos, embora caiba a solicitação de suspensão
do processo judicial em curso, ou de sua extinção, por via da desistência do pedido judicial,
para que realizem o procedimento extrajudicial (Resolução n. 35/2007, art. 2º).” 116
.
Portanto, tendo em vista o caso antes exposto, por qual razão se vedaria aos
consortes o usufruto do instituto da separação, impondo-lhes, por conseguinte, uma
inconstitucional e ilegal intervenção Estatal-normativa imerecida?
Além destes dois princípios, vale trazer a campo as discussões acerca da recepção
deste instituto, bem como a causídica violação de direitos e garantias fundamentais se for
levado a ferro e fogo a interpretação de que a separação simplesmente desapareceu. Assim
refuta-se:
113
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro, volume 5: direito de família/ Maria Helena Diniz – 27. Ed. – São Paulo: Saraiva, 2012. 114
DIAS. Maria Berenice. Manual de direito das famílias. / Maria Berenice Dias. – 7. Ed., rev., atual. e ampl. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010. 115
Idem. 116
TAVARES DA SILVA, Regina Beatriz. A emenda constitucional do divórcio/ Regina Beatriz Tavares da Silva. – São Paulo: Saraiva, 2011.
49
6.2.3 Da recepção da Separação na EC. 66/2010:
“A disposição constitucional, em sua nova versão, continua não tendo nenhuma
pertinência com a separação legal, à qual agora nem ao menos fez referência,
prevista aquela, como sempre esteve, a respectiva disciplina, de forma autônoma e
exclusiva regulada na legislação ordinária.” 117
.
Notório é que, demagogo se fez, tentar extirpar a separação quando, na verdade, a
mesma nada mais é do que uma mera norma ordinária autônoma sem nenhuma protuberância
com a Constituição, vez que não a ofende.
Nesse sentido, vale ressaltar que:
“A abordagem da matéria comporta os planos de lege ferenda e de lege lata. Sob o
primeiro enfoque, da lei ideal, é possível a pluralidade de entendimentos quanto à
conveniência ou não do instituto da separação oficial permanecer integrando à
ordem jurídica, à vista da facilidade de formalização do divórcio. Neste plano, há
quem veja a importante função social na separação, ao permitir o recuo do casal
em seu desejo de promover o fim do casamento, bastando-lhe requerimento ao juiz
do feito, para que a sociedade conjugal se restabeleça. Psicologicamente a
separação favorecia a reaproximação, mais do que o divórcio, que leva o desenlace
às ultimas consequência. Por convicção religiosa, muitos casais admitem apenas a
separação. O Codex Iuris Canonici, de 1983, pelo cân. 1.141 vedou o divórcio, ao
admitir a dissolução do casamento apenas com a morte, e pelo cân. 1.153 previu
expressamente a separação. A permanência em vigor deste instituto permite o
questionamento de culpa, indagação inexistente no divórcio. A definição da culpa
na separação é relevante para determinados efeitos jurídicos, como na fixação do
valor dos alimentos, à vista dos arts. 1.702 e 1.704 do Código Civil, e da
permanência do direito ao uso do nome de casado (art. 1.571, §2º, e art. 1.578,
ambos do Código Civil)” 118
.
Continua ainda:
“Na esfera de lege lata, nossa atenção se concentra no ordenamento como um todo,
não apenas na emenda ora considerada, procurando tirar as conclusões em
conformidade com os princípios hermenêuticos. Esta perspectiva é a única de
natureza científica que poderá responder à indagação quanto à permanência ou
não em vigor do instituto de separação. (...) A Emenda Constitucional, sem
qualquer menção às regras do Código Civil, pertinentes à separação, limitou-se a
modificar o §6º do art. 226 da Lei Maior e tão somente para excluir a exigência de
prévia separação judicial ou de fato para a obtenção do divórcio. Se a pretensão de
quem propôs a Emenda e a dos signatários do projeto foi a extinção do instituto da
separação, tal como constou na exposição de motivos e em pareceres, este efeito
deveria vir expresso no ato ou constar em lei regulamentar. Não ocorreu nenhuma
destas hipóteses. A menção não seria necessária, nem a superveniente promulgação
da lei, caso a Emenda fosse incompatível com a permanência em vigor do instituto
da separação. Mas não é. O que poderá ocorrer na pratica, e certamente ocorrerá,
é a preferência maciça de casais pela obtenção do divórcio, perspectiva que em
117
CAHALI, Yussef Said. Separações conjugais e divórcio/ Yussef Said Cahali. – 12. Ed. rev., atual. e ampl. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011. 118
NADER, Paulo. Curso de direito civil, v. 5: direito de família/ Paulo Nader. – Rio de Janeiro: Forense, 2011.
50
nada influencia na apreciação da presente quaestio iuris. O desaparecimento da
separação em nosso ordenamento seria automático, como alguns estão
pretendendo, caso não fosse um instituto autônomo, mas apenas uma fase do
processo de divórcio. Não é o que ocorre, pois a separação possui terminalidade;
não foi instituída em função do divórcio.” 119
.
Por tais razões se vê que a Emenda não teve força para anular a congruência que
admoesta o instituto da separação, mantendo seu vigor e estrutura com a mesma maestria de
décadas atrás. A separação e o divórcio são institutos ligados ao matrimônio, mas estranhos
um ao outro e completamente autônomos com finalidades únicas. Complementa ainda
CAHALI que:
“Essas afirmações se prestam para explicar que a supressão dos prazos feita pela
EC não interfere em nada com a prerrogativa de um dos consortes de aforar ação
de separação judicial contra o outro para fim de, apontando a causa e
demonstrando a sua ocorrência, ter desfeita a sociedade conjugal com as
consequências legais estabelecidas pelo Código Civil.” 120
.
É justo, por conseguinte, salientar que:
“Claro está que, das regras sobre o divórcio constantes do Código Civil em sua
redação original, somente foi recepcionada aquela que regula o divórcio
conversivo, excetuada a parte que estabelece o prazo de um ano contado da
sentença de separação judicial ou medida cautelar correspondente, destinada aos
que querem converter em divórcio o estado civil de separado judicialmente. Nem se
diga que os separados judicialmente deveriam sujeitar-se a processo direto de
divórcio e não conversivo, diante da EC n. 66/2010, porque essa ideia, impensada,
levaria a fraudes incontáveis, por deixar no passado e sem efeito as regras
estabelecidas na separação, fosse consensual, fosse litigiosa, substituindo-se
livremente por aquelas dispostas em nova ação: a de divórcio. A conversão de
separação judicial em divórcio deve permanecer em nosso ordenamento jurídico,
para que se preserve o que foi estabelecido na separação judicial, a ser alterado
somente diante do consentimento das partes, também ouvido o Ministério Público e
com decisão do juiz em caso de existência de filho menor ou maior incapaz.” 121
.
Deontologicamente sustenta ainda que “é preciso haver como recepcionadas as
normas da legislação ordinária no que se refere às espécies dissolutórias e aos seus efeitos
diversos, e também recriá-las, com a migração dessas espécies para o divórcio, pela razões,
em especial constitucionais.”122
Por vias de consecução, entender-se-á (juridicamente) que:
119
Idem. 120
CAHALI, Yussef Said. Separações conjugais e divórcio/ Yussef Said Cahali. – 12. Ed. rev., atual. e ampl. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011. 121
TAVARES DA SILVA, Regina Beatriz. A emenda constitucional do divórcio/ Regina Beatriz Tavares da Silva. – São Paulo: Saraiva, 2011. 122
Idem.
51
“A tese de extinção do instituto da separação, por muitos sustentada, não encontra
apoio na Lei de Introdução ao Código Civil123
, a qual dispõe, no §1º do art. 2º, que
a revogação de uma lei anterior se efetiva quando: a) a lei nova assim o declarar
expressamente; b) for incompatível com a lei posterior; c) a nova lei regular
inteiramente o seu objeto. Os argumentos, para serem jurídicos, devem se
concentrar em uma destas hipóteses, no entanto a tese de revogação não considera
o teor deste §1º, deixando o plano de lege lata e se apoiando no de lege ferenda. O
argumento de que a Lei Maior deixou de se referir à separação não implica a
revogação deste instituto civil, uma vez que a lei ordinária não pressupõe previsão
constitucional.” 124
.
Por derradeiro, mister faz-se, diante de tanto desavença na doutrina pátria, trazer ao
presente trabalho, o entendimento pacificado pelos jurisconsultos e o Conselho nacional de
Justiça, que assim expõe TAVARES em sua obra que:
“Em razão da EC n. 66/2010, a Resolução n. 35/2007 foi alterada, por
unanimidade, pelo Conselho Nacional de Justiça, em decisão de 14-9-2010, tendo
como relator o Conselheiro Jefferson Luis Kravhychyn, com a manutenção da
separação ao lado do divórcio. Somente foi revogado o seu art. 53, que regulava o
requisito temporal do divórcio, e modificado o seu art. 52, que dispunha sobre o
divórcio direto e conversivo, conservando-se a possibilidade deste ultimo. Em suma,
foram mantidas intactas todas as demais normas sobre a sepração, que já contavam
da Resolução n. 35/2007, como se verifica em seu arts. 33 e 46 a 51 (Pedido de
Providências n. 0005060-32.2010.2.00.0000). A adaptação da lei n. 11.441/2007 à
EC n. 66/2010, portanto, já recebeu o pronunciamento do CNJ, mantidos a
separação e o divórcio.” 125
.
Por tais razões, finaliza-se coerente e congruentemente que a separação continua no
ordenamento pátrio.
Resolvido, por mais esta, a questão acerca da recepção da separação à EC n. 66/2010,
recomenda-se à volitiva necessidade de exemplificar o pernicioso risco de violação aos
direitos e garantias fundamentais, nesse sentido averígua-se da seguinte forma:
123
Atualmente nomeada por Lei de Introdução ao Direito Brasileiro Decreto-lei n. 4.657, de 4-9-1942. 124
NADER, Paulo. Curso de direito civil, v. 5: direito de família/ Paulo Nader. – Rio de Janeiro: Forense, 2011. 125
TAVARES DA SILVA, Regina Beatriz. A emenda constitucional do divórcio/ Regina Beatriz Tavares da Silva. – São Paulo: Saraiva, 2011.
52
6.2.4 Confronto com os direitos e garantias fundamentais: Inúmeros são os exemplos
hipotéticos que podem ser levantados na presente elucidação acerca de proeminentes
violações de direitos e garantias fundamentais, no entanto, em função da limitação técnica do
presente trabalho, mostra-se justo que se vincule somente a um deles. No caso em pauta, ao
enfrentamento com a liberdade religiosa. Assim exposto, é justo fazer alguns apontamentos
esclarecedores acerca das questões de religião, fé e seus correlatos da seguinte forma: a)
CHAUÍ esclarece que “A palavra religião vem do latim religio, formada pelo prefixo re
(‘outra vez, de novo’) e o verbo ligare (‘ligar, unir, vincular’). A religião é um vínculo. Quais
as partes vinculadas? O mundo profano e o mundo sagrado, isto é, a natureza (água, fogo,
ar, animais, plantas, astros, pedras, metais, terra, humanos) e as divindades que habitam a
natureza ou um lugar separado da natureza.” 126
; b) “nas religiões da interioridade, como
por exemplo o judaísmo e o cristianismo, a falta ou pecado é uma ofensa cometida contra
Deus por meio de uma ação interna invisível – a intenção -, que se manifesta num ato externo
visível, tendo como causa ou uma vontade má ou um entendimento equivocado.” 127
; e, c) a
finalidade da religião é a de “reelaborar as relações sociais existentes como regras e normas,
expressões da vontade dos deuses ou de Deus, garantindo a obrigatoriedade da obediência a
elas sob pena de sanções sobrenaturais.” 128
.
Portanto, conforme se mostrará a seguir, extinguir a separação do ordenamento
jurídico, como pretendem os defensores de tal tese, fará com que se fira o direito à religião de
inúmeros cidadãos (principalmente em nosso país de grande monta Católico) que, carregando
o conceito de culpa sobre si própria, viverão indignamente para consigo mesmo, crendo, por
muitas vezes, em uma condenação concreta de vossa alma, e, deste modo, fazendo violar o
primeiro principio trazido à baila – o princípio da dignidade da pessoa humana.
Esclarece CAHALI que:
“Embora se pretenda que o divórcio tivesse sido largamente tolerado e consentido
nos primeiros séculos do Cristianismo, é certo que a Igreja desde logo reagiu
contra a dissolubilidade do vínculo, tomando como ponto de partida a parábola de
Cristo (‘Não separe o homem o que Deus uniu’). A respeito dela, contudo, existe
divergência entre os evangelistas.” 129
.
Complementa a síntese de CAHALI a doutrinadora TAVARES que “Sabe-se que o
Brasil é um Estado laico e que as relações sociais regem-se pelo Direito brasileiro. Pelo
ordenamento jurídico pátrio, não restam dúvidas: o casamento pode ser dissolvido.” 130
. No
entanto, Estado laico não é Estado Ateu, ou seja, permite-se o exercício de seu culto, fé ou
religião (Art. 5º, VI CF/88). Nesse mesmo sentido, tem-se o seguinte:
126
Chauí, Marilena. Convite à filosofia. / Marilena Chauí. 13ª Edição, 3ª impressão – São Paulo, SP, Editora Ática. 2005. 127
Idem. 128
Idem. 129
CAHALI, Yussef Said. Separações conjugais e divórcio/ Yussef Said Cahali. – 12. Ed. rev., atual. e ampl. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011. 130
TAVARES DA SILVA, Regina Beatriz. A emenda constitucional do divórcio/ Regina Beatriz Tavares da Silva. – São Paulo: Saraiva, 2011.
53
“A natureza laica do Estado, porém, não se traduz na proibição de cultos religiosos
ou do exercício da fé. Bem ao contrário, o Estado laico deve proteger a liberdade
religiosa. E assim se procede no direito brasileiro. A Constituição garante em seu
art. 5º, VI, que ‘é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo
assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a
proteção aos locais de culto e as suas liturgias’. Com isso, conclui-se que o
ordenamento constitucional prevê que é fundamental criar condições para a prática
de cada uma das religiões.” 131
.
Ou seja, é direito de todo cidadão seguir aquilo que crê, da forma que crê e como lhe é
imputado seguir. No entanto, a dedução hipocondríaca de se retirar a separação do texto pátrio
colocará a mercê uma grande parte, por exemplo, da população brasileira (Católica,
principalmente) sob o domínio de ofensas a este direito intimamente ligado a sua dignidade.
Dá-se nota no seguinte ponto:
“Para a Igreja Católica, o vínculo conjugal é indissolúvel132
, conforme o cânon
1.141 do Código Canônico: ‘O matrimônio ratificado e consumado não pode ser
dissolvido por nenhum poder humano nem por nenhuma causa, exceto a morte. ’
Porém, o Direito Canônico reconhece que, em alguns casos, a convivência pode se
tornar insuportável, dando causa à separação. Por isso, de acordo com o cânon
1.153, §1º: ‘Se um dos cônjuges é causa de grave perigo para alma ou para o corpo
do outro cônjuge ou dos filhos ou, de outra forma, torna difícil a convivência, está
oferecendo ao outro causa legitima se separação, por decreto do Ordinário local e,
havendo perigo na demora, também por autoridade própria.” 133
.
Portanto se, hipoteticamente, o números de Católicos superem a número de 50%
(cinquenta por cento) da população nacional, teremos, aproximadamente, um número de cem
milhões de cidadãos vinculados indignamente ao sentido de culpa e condenação espiritual por
força de uma incisiva intervenção iniqua do Estado às normas de separação e divórcio de um
casal.
Pois:
“Se desaparecesse o instituto da separação do Direito brasileiro, restaria apenas o
divórcio como forma de dissolução do casamento. Impedidos de se divorciarem por
seu credo, os católicos não poderiam regularizar o seu estado civil, num dilema
entre viver numa situação irregular de separação de fato ou divorciar-se e
desrespeitar as leis canônicas.” 134
.
Portanto, essa é uma das razões que a separação permanecerá no ordenamento jurídico
brasileiro, protegendo um de tantos direitos e garantias fundamentais sob a égide da nossa
atual Carta Magna, podendo entender que se protege, dessa forma, não somente o rol do art.
5º da CF/88, mas também os princípios antes trazidos, concluindo que:
“Por isso, em consideração ao principio basilar da liberdade religiosa e da
preservação dos direitos dos católicos, a permanência da separação judicial no
131
Idem. 132
Conforme citação também apontada por Yussef Said Cahali, na nota n. 32. 133
TAVARES DA SILVA, Regina Beatriz. A emenda constitucional do divórcio/ Regina Beatriz Tavares da Silva. – São Paulo: Saraiva, 2011. 134
Idem.
54
Direito brasileiro é essencial. Isso não significa que a separação deva ser requisito
do divórcio. Apenas deve existir a possibilidade da separação para aqueles que
precisarem, por dever religioso, fazer uso delas.” 135
.
O direito antes de ser prático deve ser justo, razão pela qual se conclui pela
manutenção da separação após a égide da Emenda Constitucional n. 66 de 2010, nos termos
antes expostos.
135
Idem.
55
6.3 Conclusões sobre a manutenção:
Confesso é, em apertada síntese, que além dos elementos já expostos no presente
trabalho muitos mais poderiam ser dissecados para aprofundar uma tese, deveras eloquente
acerca da proteção da família pelas vias da manutenção da separação. No entanto, o presente
trabalho não comporta espaço para tanto, e, claro, a capacidade de síntese deve ser um
instrumento na mão de quem se propõe a ser jurista. Por essas razões, nada mais justo do que
deixar sobre as palavras da Excelsa doutrinadora Maria Helena Diniz o encerramento do
presente trabalho defendendo a manutenção da separação no direito brasileiro, que assim
expõe:
“Com a nova redação do art. 226, §6º, da Carta Magna, dada pela EC n. 66/2010,
há interpretação, por nós seguida, de que as normas relativas à separação judicial
ou extrajudicial poderão perder sua eficácia social, apesar de continuarem válidas
e vigentes, por serem leis especiais e por não conflitarem com o comando
constitucional, que tão somente se refere a uma das formas de dissolução do vínculo
matrimonial, que é o divórcio. Assim sendo, as normas do Código Civil e as do
Código de Processo Civil e as leis extravagantes alusivas à separação continuarão
vigorando até que lei ordinária especial as revogue, regulamentando de forma
diversa a situação engendrada pela reforma constitucional, embora possam perder
seu suporte eficacial, em virtude da supressão da necessidade de prévia separação
(judicial ou extrajudicial) e do prazo de carência de uma ano e do de dois anos de
separação de fato como requisitos para obtenção do divórcio, levando á economia
do tempo, à desburocratização da separação de casais desafetos e à redução de
volume de processos, evitando não só acréscimo de despesas com honorários
advocatícios, custas processuais e lavratura de escrituras, como também o desgaste
emocional dos cônjuges e da prole e agilizando a possibilidade de convolar novas
núpcias. Diante de tantas vantagens, a ineficácia social daquelas normas tornar-se-
á uma realidade.” 136
.
Nome de também notório reconhecimento, o Doutor Nelson Nery, também
defendendo a respectiva manutenção, complementa que “O sistema infraconstitucional da
dissolução do casamento e da sociedade conjugal, previsto e regulado no CC, sobrevive em
todos os seus termos justamente porque não é incompatível com o divórcio direto, estatuído
na CF 226, § 6º, com a redação da EC 66/10.” 137
.
Observa-se que:
“Deveras, uma coisa é certa, diante da reforma constitucional, como para o
divórcio não há mais necessidade de uma anterior separação e de observância de
prazo de carência, facilitando a dissolução do vínculo conjugal, o instituto da
separação está fadado a desaparecer do nosso cenário jurídico. Mas, como a EC n.
66/2010 apenas se refere à dissolução do casamento por meio do divórcio, mantidas
estão as normas sobre separação, até que seja totalmente definida a situação por lei
especial, pela doutrina e pela jurisprudência, esclarecendo todas as dúvidas.” 138
.
136
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro, volume 5: direito de família/ Maria Helena Diniz – 27. Ed. – São Paulo: Saraiva, 2012. 137
NERY JUNIOR. Nelson. Código civil comentado/ Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery. – 8º ed. rev. , ampl. e atual. até 12.07.2011. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais. 2011. 138
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro, volume 5: direito de família/ Maria Helena Diniz – 27. Ed. – São Paulo: Saraiva, 2012.
56
Por sua vez, há também que “Urge lembra que a V jornada de Direito Civil aprovou o
seguinte Enunciado n. 513: ‘A EC 66/2010 não extinguiu o instituto da separação judicial e
extrajudicial. ’” 139
.
Concluir-se-á, portanto, diante de inteligíveis ponderações:
“Além de mantidas as espécies atuais, dentro da unidade e coerência do
ordenamento jurídico, surgem três novas formas de dissolução conjugal: a) o
divórcio ruptura, sem causa e sem prazo para sua obtenção, b) o divórcio culposo,
fundado nas mesmas causas da separação judicial culposa e com as mesmas
consequências previstas no Código Civil para essa espécie dissolutória, e c) o
divórcio remédio com fulcro na mesma causa e consequência da separação judicial
remédio. Dessa forma, satisfeita, em um só instituto, a finalidade de facilitação da
quebra do vínculo conjugal, assim como a de proteção aos direitos fundamentais ou
á personalidade dos divorciandos.” 140
.
Justo é que esse é o ânimo buscado no presente trabalho, no entanto, por mais
sonhador que seja este trabalho ou mais pessimista que seja a tese antagônica, o melhor
remédio é o justo-meio, vez que, “É evidente, pois, que, procurando pelo justo, os homens
procuram por um termo médio, visto que a lei é o justo meio.” 141
. E, por conseguinte,
sabendo que “Com efeito, o futuro nos é impenetrável,” 142
, só pode se resumir em:
“Há ou não, o instituto da separação judicial? Isso só o tempo dirá.” 143
.
139
Idem. 140
TAVARES DA SILVA, Regina Beatriz. A emenda constitucional do divórcio/ Regina Beatriz Tavares da Silva. – São Paulo: Saraiva, 2011. 141
ARISTÓTELES. Política./ Aristóteles. São Paulo, SP. 5ª Edição, 3ª reimpressão. Martin Claret. 2010. 142
ARISTÓTELEs. Ética à Nicômaco. São Paulo, SP. 5ª Edição, 9ª reimpressão. Martin Claret. 2011. 143
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro, volume 5: direito de família/ Maria Helena Diniz – 27. Ed. – São Paulo: Saraiva, 2012.
57
7 CONCLUSÃO
Após profunda discussão exaurida nos meios acadêmicos entre os maiores
jurisconsultos do país, não se pode negligenciar que o assunto não é pacífico. No entanto, o
presente trabalho trouxa a baila questões que merecem justa analise como, por exemplo, a
inconstitucionalidade de se negar aos consortes o uso da separação, quando por eles
requeridas, bem como sua recepção pela Emenda, vez que não fere nem a Constituição e
muito menos se encontra em uma das hipóteses da Lei de Introdução ao Direito Brasileiro que
justifique a respectiva revogação.
Ressalta-se, por conseguinte, que mesmo diante de toda a força da tese contrária não
se pode ignorar que a Emenda não revogou as normas de separação, bem como simplesmente
excluir do ordenamento jurídico a separação sem os cuidados necessários e a aplicação do
instituto ferirá grosseiramente a dignidade da pessoa humana de muitos consortes malogrados
nesses relacionamentos ruídos pelos fatos da vida. Lembre-se, ainda que, o direito de requerer
a separação é ato exclusivo dos cônjuges e não é uma imposição do Estado, da mesma forma
que, com isso se buscará proteger, por exemplo, o direito à religião de muitos cidadãos.
Sim, a EC n. 66/2010 foi uma revolução jurídica e um mérito do IBDFAM, mas não
pode ignorar que a finalidade não pode ser deturpada e sim buscar proteger as famílias que se
encontram sob o caos de relacionamentos destruídos para que, tendo certeza irrevogável,
utilizem-se do divórcio sem demagogia. No entanto, não é regra absoluta, devendo ser
flexibilizada para os casais que se encontram somente melindrados, mas passíveis de
reabilitação do matrimônio.
Sim, talvez a separação simplesmente caia em desuso, mas as revoluções de normas
consuetudinárias levam tempo e não podemos prever categoricamente o dito, mas somente
esperar, devendo pensar em todos e em todas as situações, razão pela qual se conclui que a
separação, mesmo diante de todos os elementos externos, sobrevive!
58
8. REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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59
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