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1 UNIVERSIDADE: LOCAL DE DISPUTA OU DE HEGEMONIA? REFLEXÕES DE UMA ACADÊMICA SILVA, Ligiane Aparecida da – UEM LIMA, Rosilene de – UEM Introdução Este trabalho surgiu da necessidade de escrevermos um texto final para a disciplina de Fundamentos da Pesquisa em História da Educação, do Programa de Pós-graduação em Educação, da Universidade Estadual de Maringá. Como alunas do primeiro ano do Mestrado em Educação, na linha de pesquisa de História e Historiografia da Educação, nós, pedagogas praticamente recém-formadas, professoras (embora pouco experientes) do ensino fundamental, não esperávamos encontrar grandes dificuldades com o desenvolvimento de um tipo de trabalho com o qual já nos habituáramos desde os primeiros anos de nosso curso de graduação em Pedagogia. Ora, os artigos científicos seguem, mais ou menos, os mesmos padrões de escrita e, com o passar dos anos, vamos nos familiarizando com eles. Assim pensávamos. No entanto, as discussões da disciplina semestral que cursamos já no início do Mestrado fizeram-nos questionar algumas certezas e levaram-nos a escrever este artigo, que mais se parece com um depoimento. Desde as primeiras aulas da referida disciplina, as discussões conduzidas pela professora fizeram-nos sentir como alunas do primeiro ano de graduação: desconhecíamos os textos selecionados, desconhecíamos os autores e, principalmente, desconhecíamos aquela perspectiva de se fazer história. Nós, que ficáramos afastadas do ambiente acadêmico por um breve período, pensávamos: o que aconteceu com a Universidade durante o período em que estivemos fora? Como podemos estar tão alheias a tudo isso? E a pergunta que mais nos intrigava era a seguinte: por que razão não estudamos esses autores durante o curso de graduação em Pedagogia? Com o tempo, novas amizades foram surgindo e pudemos perceber que muitos colegas compartilhavam da mesma angústia que a minha. Esforçavam-se para superar o déficit em um

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UNIVERSIDADE: LOCAL DE DISPUTA OU DE HEGEMONIA?

REFLEXÕES DE UMA ACADÊMICA

SILVA, Ligiane Aparecida da – UEM

LIMA, Rosilene de – UEM

Introdução

Este trabalho surgiu da necessidade de escrevermos um texto final para a disciplina de

Fundamentos da Pesquisa em História da Educação, do Programa de Pós-graduação em

Educação, da Universidade Estadual de Maringá.

Como alunas do primeiro ano do Mestrado em Educação, na linha de pesquisa de

História e Historiografia da Educação, nós, pedagogas praticamente recém-formadas,

professoras (embora pouco experientes) do ensino fundamental, não esperávamos encontrar

grandes dificuldades com o desenvolvimento de um tipo de trabalho com o qual já nos

habituáramos desde os primeiros anos de nosso curso de graduação em Pedagogia. Ora, os

artigos científicos seguem, mais ou menos, os mesmos padrões de escrita e, com o passar dos

anos, vamos nos familiarizando com eles. Assim pensávamos. No entanto, as discussões da

disciplina semestral que cursamos já no início do Mestrado fizeram-nos questionar algumas

certezas e levaram-nos a escrever este artigo, que mais se parece com um depoimento.

Desde as primeiras aulas da referida disciplina, as discussões conduzidas pela

professora fizeram-nos sentir como alunas do primeiro ano de graduação: desconhecíamos os

textos selecionados, desconhecíamos os autores e, principalmente, desconhecíamos aquela

perspectiva de se fazer história. Nós, que ficáramos afastadas do ambiente acadêmico por um

breve período, pensávamos: o que aconteceu com a Universidade durante o período em que

estivemos fora? Como podemos estar tão alheias a tudo isso? E a pergunta que mais nos

intrigava era a seguinte: por que razão não estudamos esses autores durante o curso de

graduação em Pedagogia?

Com o tempo, novas amizades foram surgindo e pudemos perceber que muitos colegas

compartilhavam da mesma angústia que a minha. Esforçavam-se para superar o déficit em um

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espaço de tempo curto demais para o intento, a saber, os vinte e quatro meses que temos para

concluir o Mestrado. Porém, era o que podíamos fazer naquele momento.

As discussões continuaram e nossas densas leituras também, até que concluímos com

pesar a disciplina. Como trabalho final, deveríamos escrever um artigo e foi, então, que

esbarramos em uma dificuldade ainda maior: escrever sobre o quê, se praticamente

desconhecemos os textos? Como conduzir uma discussão bem fundamentada, se ainda não

nos apropriamos devidamente do pensamento de determinados autores? Conseguiremos

avançar em nossa forma de escrita já mais ou menos cristalizada pelas práticas e exigências da

universidade? Acreditávamos que não; não naquele momento.

Solicitamos, assim, o auxílio de nossa professora, perguntando-lhe:

- Professora, poderia, por favor, sugerir-nos um tema?

Como não podia ser diferente, ela respondeu-me:

- Procurem escrever, se possível, sobre algo que te auxilie em sua pesquisa.

Esperávamos que ela, de uma forma ou de outra, nos conduzisse, mas ela não

interferiu em nossa escolha. E não é tarefa fácil para o homem usufruir da liberdade. Por isso

nossa dificuldade ao escrever este trabalho.

Foi então que, temendo produzir algo no vazio, decidimos escrever sobre nossa

trajetória como alunas do primeiro ano - mais propriamente do primeiro semestre - do

Mestrado em Educação na disciplina de Fundamentos da Pesquisa em História da Educação,

buscando apresentar a contribuição de alguns autores trabalhados para nossa formação como

professoras e pesquisadoras em história da educação e problematizando as práticas

hegemônicas da Universidade que, muitas vezes, cerceiam o conhecimento dos alunos e os

fazem adquirir uma visão circunscrita da história.

Se o trabalho não permaneceu, ainda assim, na frivolidade, não podemos afirmar com

certeza. O defendemos, apenas, como expressão de uma angústia real, não somente nossa,

mas de muitos outros colegas que, talvez, também desejem manifestá-la quando possível. De

qualquer forma, o questionamento permanece: universidade – local de disputa ou de

hegemonia? Passaremos, a seguir, à apresentação dos textos mencionados que poderão

elucidar a pergunta.

Primeiramente, consideramos importante informar que em nossas aulas trabalhamos

sempre com fontes e intérpretes. Isso pode até parecer óbvio mas, constantemente, fomos

levados a refletir sobre a necessidade de diálogo entre autores considerados clássicos e os

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contemporâneos. Esse “casamento” foi tido entre nós como imprescindível para que verdades

cristalizadas no campo da história da educação possam vir a ser questionadas. Enquanto a

fonte nos transmite a idéia de como os homens de determinado momento histórico buscaram

resolver questões de seu tempo, o intérprete, com seu trato teórico, poderá analisar esse

mesmo período sob outro prisma, com um distanciamento e um rigor científico que só é

possível a ele mesmo. Em outras palavras e exemplificando, a fonte pode nos ajudar a

compreender a natureza humana e o intérprete, como estudá-la e compreendê-la. A simbiose é

absolutamente necessária.

Ao estudarmos Aristóteles (1973), aprendemos que a felicidade é a consciência no

agir. Somente o conhecimento, segundo ele, pode levar o homem a interferir em sua realidade

de forma consciente, contribuindo para o bem comum, que só existe quando o conhecimento

permite ao homem ter ações justas, virtuosas para com a sociedade. Mas de que forma o

pensamento de autores como Aristóteles podem contribuir para a discussão de questões

educacionais contemporâneas? Ora, se o homem que verdadeiramente conhece manifesta esse

conhecimento em todos os aspectos de sua vida, as instituições formativas deveriam oferecer

condições às pessoas de conhecer, evitando cercear ou doutrinar para determinados fins. Por

isso mesmo, há que se observar a leitura dos intérpretes, para que também não seja uma

leitura linear da história.

Em nossas aulas, discutimos o distanciamento que temos em relação a determinados

autores, especialmente os medievais, que nos remetem a modelos diferenciados de instrução.

Ao estudarmos São Tomás de Aquino (2001), observamos que este mestre discutia questões

de sua época com um olhar diferenciado, não mais baseado apenas nas verdades religiosas,

mas também pautado na ciência, cujo grande representante no século XIII foi o próprio

Aristóteles. Para ele, o homem diferencia-se de todas as demais criaturas divinas pelo seu

intelecto, que lhe dá condições de fazer suas próprias escolhas. Segundo Oliveira (2008), o

próprio ambiente citadino promovido pelo desenvolvimento do comércio e das corporações de

ofício – inclusive as universidades -, propiciaram esse clima de liberdade favorável ao debate

e questionamento de dogmas antes irrefutáveis. A autora afirma que houveram duas grandes

conquistas nesse período histórico:

[...] De um lado, uma grande conquista institucional, uma vez que as cidades obtiveram suas liberdades em relação aos seus senhores feudais e puderam, a partir delas, organizar um sistema administrativo novo, imbuído do espírito burguês, como nos mostrava Guizot e Le Goff. De outro lado, a autonomia e

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a liberdade do intelecto, provenientes dos debates teóricos travados no interior das idéias ensinadas na Universidade [...] (OLIVEIRA, 2008, p. 247-248).

Particularmente, confessamos que esse olhar diferenciado para a Idade Média causou-

nos grande impacto. Aprendêramos sobre esse período o que todos (ou, pelo menos, a grande

maioria) dos estudantes de nossa geração aprenderam: período de trevas, de repressão, de

imposições religiosas, de acolhimento. Então, quando soubemos que o homem medieval havia

encontrado espaço para a dúvida, para a reflexão, para a produção do conhecimento, sentimo-

nos, de certa forma, lesadas e, ao mesmo tempo, extremamente admiradas pelo novo.

Questionamos com nossa professora a razão pela qual essas informações não nos

foram transmitidas, nem mesmo na universidade. Então aprendemos que a escola do século

XIX foi fundada em um contexto que não permitiu ao homem olhar para a Idade Média de

forma legítima, pois era preciso romper com o passado da dúvida para poder “progredir”.

Como as verdades já estavam estabelecidas a partir da Revolução Francesa, havia uma razão

política para a negação do passado naquele momento histórico. Mas será que essa razão ainda

permanece? Se não, por que motivo conservamos o olhar cristalizado para a história? Não

seria a universidade o local propício para este e muitos outros debates?

Nesse sentido, podemos afirmar que ficou muito claro para nós a importância do

intérprete para que se possa fazer uma leitura mais legítima da fonte. Como afirma Costa

(2005), o historiador pode fazer perguntas novas para os mesmos objetos, buscando

problematizar sua fonte, rompendo com a forma linear de pensamento e dialogando com os

demais campos do conhecimento. Para elucidar essa afirmativa, tivemos acesso, durante esse

semestre de estudos, à leitura de vários autores que buscam seguir por esse caminho, como,

por exemplo: Jacques Verger (2001), Jean Pierre Vernant (2001), George Duby (1999), Peter

Burke (1992), Norbert Elias (1990), Jacques Le Goff (2003), Renata Garrafoni (2005), Michel

de Certau (1982), March Bloch (2001).

Esses autores, embora ainda não nos julguemos com autoridade suficiente para discutir

seu pensamento - como já afirmado no início deste trabalho -, oferecem uma importante

contribuição para o estudo da história e para o campo da história da educação. Alguns inovam

com sua forma de fazer história e outros trazem à discussão a importância da disputa para a

produção do conhecimento, questionam a hegemonia na forma de se pensar e fazer história, o

que constitui uma inovação dentro do espaço da academia e um processo que, certamente,

ainda encontra muitas resistências. Essa nova noção de história defende que não se pode mais

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conceber a análise da sociedade em sua totalidade, mas considerar as particularidades das

diferentes civilizações. Para tanto, a história passa a dialogar com os demais campos do

conhecimento (ou fronteiras), a saber, a antropologia, a geografia, a cultura, a psicologia,

entre outros. Assim, modifica-se o olhar e relativiza-se o método. Ora, se o embate entre

historiadores do século XX parte da crítica à visão totalizante da história, querem os críticos

que as análises não mais sejam pré-determinadas pela economia, pois consideram essa

generalização nociva ao estudo da história.

Um outro importante autor medieval que conhecemos, Hugo de São Vítor (2001), nos

ajudou a refletir sobre nossa concepção de método. Este mestre buscou orientar os leitores de

seu tempo a adquirirem o conhecimento com mais facilidade e menos dispêndio de energia.

São Vítor afirma que o leitor deve saber o que ler e em que ordem fazê-lo, ou seja, seguir um

procedimento pré-estabelecido para a leitura. Entende que a compreensão do homem torna-se

estreita quando seu conhecimento é limitado; por isso orienta seus leitores para que conheçam

de tudo, pois de tudo tirarão algum proveito.

Somos reerguidos pelo estudo, para que conheçamos a nossa natureza e aprendamos a não buscar fora de nós aquilo que podemos encontrar dentro de nós. A procura da sapiência é, com efeito, “um grande conforto na vida”. Quem a encontra é feliz, e quem a possui é beato (VÍTOR, 2001, p. 51).

Observamos, mais uma vez, que a Idade Média (mais precisamente o século XIII),

contava com mestres nas universidades que possibilitavam o diálogo, a discussão, o embate,

pois o objetivo maior era a busca pela “sapiência”. Hugo de São Vítor concebe método como

uma forma de organizar os estudos de tal modo a facilitar o processo de aquisição do

conhecimento. Mas a quê a palavra “método” nos remete nos dias de hoje?

Sabemos que o método em nossas pesquisas, na maioria das vezes, é definido antes

mesmo de se escolher o próprio tema. A metodologia precede as leituras e o conhecimento

subordina-se a uma concepção metodológica que pretende responder a todas as perguntas

possíveis. Ficamos submissos a ele, nossas leituras vão de encontro com ele, em nossos textos

ele está explícito e é ele quem define a conclusão de nossos trabalhos. É assim que

“produzimos” conhecimento.

Quando li o De Magistro, de São Tomás de Aquino (2001) em nossa disciplina, refleti

bastante sobre a questão que acabo de citar. Para ele, o conhecimento do mestre difere-se do

conhecimento dos demais profissionais da sociedade, como o médico e o arquiteto, por

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exemplo. Esses profissionais, embora o autor considere-os de extrema importância, exercem

uma função que, diferentemente da função do mestre, pode ser transmitida a outro homem se

devidamente ensinada. Já o professor, mesmo ao ensinar, não pode fazer uma “transfusão”

daquilo que aprendeu em seu aluno. Isso quer dizer que, além de depender da predisposição

de quem aprende, cada um constrói seu próprio conhecimento, cada um é aquilo que conhece.

O mestre é aquilo que conhece, não pode separar-se de seu próprio conhecimento.

Compreendemos que estamos falando de um outro momento histórico completamente

diferente do nosso e nem pretendemos fazer uma transposição do que foi a Idade Média para

nossos dias. No entanto, acreditamos que os textos desses autores nos ajudam a refletir sobre

as questões de nosso próprio tempo, como a produção do conhecimento em nossas

universidades, por exemplo. Como professoras, não podemos deixar de indagar sobre meu

próprio conhecimento. Será que podemos afirmar categoricamente que conhecemos, se ainda

não fizemos minhas próprias escolhas, se não trilhamos nosso próprio caminho na busca pelo

conhecimento?

Os cursos de Pedagogia poderiam, então, permitir uma abertura maior ao diálogo com

as demais concepções metodológicas e com os campos do conhecimento, no intuito de

permitir que o futuro professor tenha uma compreensão mais ampla da história e uma leitura

atualizada que os prepare para os cursos de pós-graduação.

Como escrevemos este texto influenciadas pelas leituras indicadas por nossa

professora, acreditamos que são os professores, no final das contas, que dispõem do arsenal

necessário para nos instrumentalizar e orientar nosso processo de aprendizagem.

Questionamos, no entanto, a doutrinação e/ou a omissão a que somos submetidos durante esse

tempo. Porém, parece-nos que a hegemonia já começa a ceder lugar à disputa.

Deixamos registrada, portanto, uma pequena frase do mestre Hugo de São Vítor, que

resume bem o nosso sentimento ao escrever este texto: “ [...] Mesmo não podendo dizer tudo

o que queremos, não devemos silenciar aquilo que podemos dizer” (VÍTOR: 2001, p. 73). E

era isso o que tínhamos a dizer no momento.

Considerações finais

Este breve texto pretendeu abrir espaço para uma discussão já existente no interior da

universidade, porém, com uma distinção: a crítica parte de duas alunas e não dos próprios

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intelectuais. O texto, por esse motivo, não caracterizou-se por apresentar um debate científico

aprofundado, mas uma problematização que partiu de nossas próprias dificuldades e carências

teóricas.

Percebemos, durante esse primeiro semestre de aulas que, apesar de nosso

distanciamento em relação a determinados autores, há também um espaço para discussão

aberto por alguns professores que acreditam ser fundamental a disputa e até mesmo o conflito

para que se possa produzir o conhecimento nas universidades. Além disso, as próprias

dificuldades dos alunos (especialmente os alunos do Mestrado em Educação, no caso deste

texto) têm funcionado como um impulso à busca por um aprofundamento maior, de modo a

contribuir, de uma forma ou de outra, para o desenvolvimento das pesquisas.

A questão que se coloca, no entanto, é a seguinte: se os alunos do Mestrado em

Educação esbarram-se nessa dificuldade, a problemática pode estar vinculada àquilo que se

pretende ensinar nos cursos de graduação (neste caso, o curso de Pedagogia), como uma

prática hegemônica e irrefutável. Esses alunos, que em maior ou menor número, ingressarão

em cursos de pós-graduação, possivelmente só se darão conta dessa falta quando forem, de

fato, cobrados e aí, como afirmei no início deste trabalho, o tempo é curto.

Alguns autores estudados nesse período de aulas nos ajudaram a refletir sobre nossa

própria concepção de conhecimento e de metodologia. Estaria o conhecimento sujeito a uma

metodologia determinada a priori ou será o conhecimento quem fornece as ferramentas

necessárias para que o pesquisador defina a metodologia mais adequada à sua pesquisa?

Como, felizmente, pudemos ter contato com fontes medievais e intérpretes com uma

noção de história diferenciada, aprendemos que a universidade foi criada em um espaço de

dúvida, disputa e questionamentos, pois era essa a concepção que se tinha sobre produção de

conhecimento naquele momento histórico e a academia foi o lugar criado especialmente para

esse fim. Assim, a universidade do século XIII nos ajudou a refletir sobre nossa própria

universidade e as intenções subjacentes a ela.

Se, porventura, algum aluno de graduação ou pós-graduação vier a ter contato com

este texto, pode ser que identifique-se com minhas dificuldades e também reflita a respeito. A

nosso ver, a reflexão é importante porque, à medida que novas e legítimas pesquisas se

desenvolvem, amplia-se o espaço para o debate. Todavia, preferimos encerrar este trabalho

com um questionamento a mais: nós, alunos do Mestrado em Educação, teremos tempo?

Creio que nossas pesquisas poderão responder.

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Referências

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VÍTOR, Hugo de São. Didascálicon da arte de ler. Petrópolis: Vozes, 2001.