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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL FACULDADE DE VETERINÁRIA ESPECIALIZAÇÃO EM ANÁLISES CLÍNICAS VETERINÁRIAS MÉTODOS DE DIAGNÓSTICO DO HIPOTIREOIDISMO CANINO: REVISÃO BIBLIOGRÁFICA Autora: Márcia Helena Soldan Cattani Monografia apresentada à Faculdade de Veterinária como requisito parcial no curso de Especialização em Análises Clínicas Veterinárias. Orientador: Álan Gomes Pöppl PORTO ALEGRE 2009

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL

FACULDADE DE VETERINÁRIA

ESPECIALIZAÇÃO EM ANÁLISES CLÍNICAS VETERINÁRIAS

MÉTODOS DE DIAGNÓSTICO DO HIPOTIREOIDISMO CANINO:

REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

Autora: Márcia Helena Soldan Cattani

Monografia apresentada à Faculdade de

Veterinária como requisito parcial no

curso de Especialização em Análises

Clínicas Veterinárias.

Orientador: Álan Gomes Pöppl

PORTO ALEGRE

2009

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RESUMO

CATTANI, M.H.S. Métodos de diagnóstico do hipotireoidismo canino: revisão

bibliográfica [Methods for diagnosis of canine hypothyroidism: bibliographic review] Porto

Alegre, 2009, 40p. Monografia (Curso de Especialização em Análises Clínicas Veterinárias) –

UFRGS.

A tireóide é uma glândula que exerce vários efeitos no organismo e é fundamental para o

desenvolvimento embrionário e crescimento normal dos indivíduos. Os hormônios

tireoidianos mantêm a estabilidade metabólica ao regular as necessidades de oxigênio, peso

corporal e metabolismo intermediário. O metabolismo tireoidiano esta sob um fino controle

hipotalâmico e hipofisário, além de contar com outros mecanismos de controle. O

hipotireoidismo é a endocrinopatia mais comum no cão e, ainda hoje, é um desafio

diagnóstico tanto no que se refere aos sinais clínicos, que são vários e não patognomônicos,

quanto aos exames laboratoriais disponíveis, que também são vários, na grande maioria têm

custo elevado e não oferecem 100% de eficácia. Propõe-se neste trabalho que após exclusão

de outras doenças concorrentes por histórico e exame clínico detalhado, além dos exames

laboratoriais de rotina, seja realizada a mensuração da tiroxina livre pelo método de diálise de

equilíbrio porque este método tem alta sensibilidade e sofre pouca influência de outras drogas

e doenças concomitantes.

Palavras-chave: hipotireoidismo canino, T4 livre, função tireodiana

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ABSTRACT

CATTANI, M.H.S. Methods for diagnosis of canine hypothyroidism: bibliographic

review [Métodos de diagnóstico do hipotireoidismo canino: revisão bibliográfica] Porto

Alegre, 2009, 40p. Monografia (Curso de Especialização em Análises Clínicas Veterinárias) –

UFRGS.

Thyroid gland exerts many effects in the body and is primordial to embriologic development

and normal growth of individuals. Thyroid hormones keep metabolic stability regulating

oxygen demands, body weight and intermediary metabolism. Thyroid metabolism is under a

delicate hypothalamic and pituitary control, as well as other controls. Hypothyroidism is the

major dog´s endocrinopathy, and nowadays still a diagnostic challenge in terms of clinical

signs, that are quite wide and not patognomonic, as well as by laboratorial available tests, that

are expensive and haven´t 100% efficacy. This work proposes that after exclusion of other

concurrent diseases by means of anamnesis, clinical signs and laboratorial data base, free

equilibrium T4 must be performed once this method is less susceptible to drugs and diseases

influences and have a high sensibility. Also, there are no false negatives secondary to auto-

antibodies anti-tiroxine in pacient serum.

Key words: canine hypothyroidism, free equilibrium T4, thyroid function.

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LISTA DE FIGURAS

Página

Figura 1 – A. Estruturas profundas na extremidade cranial do pescoço do cão: vista

lateral esquerda. O músculo oblíquo da cabeça foi removido expondo as vértebras

atlas e axis e o segundo nervo espinhal cervical passando pelo segundo forame

intervertebral, localizado entre aquelas vértebras (DONE et al, 2002). B.

Nomenclatura referente à Figura.................................................................................... 8

Figura 2 - Desenho esquemático do folículo da glândula tireóide normal e do folículo

estimulado pelo TSH. Notar a alteração da forma celular de cubóide para colunar e o

núcleo deslocado para a base da célula e a aparência festonada do lúmen folicular..... 9

Figura 3 - Síntese dos hormônios tireoidianos. Todas essas reações ocorrem com

moléculas de tirosina que são incorporadas dentro da tireoglobulina por ligações

peptídicas. T4 e T3 são as moléculas hormonais biologicamente

ativas............................................................................................................................... 11

Figura 4 - Esquema geral da síntese e eliminação do HT. A síntese de T4 e T3 ocorre

dentro da molécula de TG na borda do citoplasma e no lúmen do folículo................... 13

Figura 5 - Mecanismo de ação via segundo mensageiro dos hormônios esteroidais e

HT................................................................................................................................... 14

Figura 6 - Regulação do eixo hipotálamo-pituitária-tireóide.......................................... 17

Figura 7 - Tecido tireoidiano canino com tireoidite linfocítica leve. Infiltração de

linfócitos que resulta na destruição da arquitetura normal da tireóide........................... 20

Figura 8 - Algoritmo para o diagnóstico de hipotireoidismo.......................................... 25

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LISTA DE TABELAS

Página

Tabela 1 - Causas estabelecidas de hipotireoidismo em cães............................................. 19

Tabela 2 - Sinais clínicos do hipotireoidismo canino ........................................................ 23

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SUMÁRIO

Página

1 INTRODUÇÃO................................................................................................. 7

2 REVISÃO DE LITERATURA....................................................................... 8

2.1 Anatomo-histologia da glândula tireóide............................................................. 8

2.2 Fisiologia da glândula tireóide............................................................................. 10

2.2.1 Biossíntese dos hormônios tiroidianos................................................................. 10

2.2.2 Secreção, transporte e metabolização dos hormônios tireoidianos...................... 12

2.2.3 Ação dos hormônios da tireóide ......................................................................... 14

2.2.4 Regulação da função da tireóide......................................................................... 15

2.3 Hipotireoidismo canino........................................................................................ 17

2.3.1 Classificação......................................................................................................... 18

2.3.2 Etiologia................................................................................................................ 19

2.3.3 Sinais clínicos........................................................................................................ 22

2.3.4 Diagnóstico........................................................................................................... 24

2.3.4.1 Avaliação laboratorial de rotina............................................................................ 26

2.3.4.2 Avaliação laboratorial específica.......................................................................... 27

2.3.4.3 Outros Exames..................................................................................................... 34

2.3.5 Tratamento............................................................................................................. 36

2.3.5.1 Monitoramento do tratamento............................................................................... 36

3 CONCLUSÃO..................................................................................................... 37

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ........................................................................... 38

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1 INTRODUÇÃO

Hipotireoidismo é a endocrinopatia mais comum em cães, na maior parte dos casos

causada por tireoidite auto-imune ou atrofia da glândula tireóide idiopática, ocorrendo

aproximadamente com igual frequência (MOONEY, 2008; FINORA e GRECO, 2007).

Esta é uma das doenças endócrinas mais desafiadoras quanto ao diagnóstico na prática

clínica de pequenos animais, mas se diagnosticado e tratado adequadamente, o prognóstico

será muito bom. O desafio surge na variação da apresentação clínica e no dilema da escolha

dos testes mais apropriados para o diagnóstico que muitas vezes se torna ainda mais

complicado pela confusão na interpretação dos resultados (DIXON, 2004).

A endocrinologia é altamente dependente de medições laboratoriais exatas porque

pequenas mudanças no nível dos hormônios muitas vezes podem ser mais específicas e mais

sensíveis no diagnóstico da doença precoce que sinais físicos clássicos da doença. A crítica

dependência do clínico na qualidade das mensurações do laboratório combinada com

informações mínimas acerca da execução destes testes coloca os endocrinologistas em uma

posição vulnerável. A concentração da maioria dos hormônios é muito mais baixa que aquelas

gerais da análise química, sendo assim técnicas especializadas são necessárias para mensurar

essas baixas concentrações (KLEE, 2003).

O melhor entendimento dos mecanismos patofisiológicos levou ao desenvolvimento e

ao aumento do uso da mensuração da concentração de hormônio tireoidiano e dinâmicos

testes da função da tireóide na medicina veterinária. Entretanto, essa maior disponibilidade de

procedimentos de ensaio também requer do veterinário ter um bom alcance de entendimento

das vantagens e desvantagens dos testes de função da tireóide (PETERSON, 2006).

O presente trabalho, utilizando o recurso da revisão bibliográfica, teve como objetivo

verificar o método mais eficiente e eficaz para o clínico veterinário chegar ao diagnóstico de

hipotireoidismo canino.

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2 REVISÃO DE LITERATURA

2.1 Anatomo-histologia da glândula tireóide

A tireóide é uma glândula bilateral presente em todos os vertebrados, a qual tem a

capacidade de captar iodo. É originada a partir do epitélio do piso da faringe. Está localizada

lateralmente sobre a traquéia, abaixo da laringe (Figura 1). Aproximadamente 50% dos cães

adultos têm tireóides acessórias embutidas na gordura sobre a aorta pericardial, as quais

podem ser localizadas mediante fixação de iodo radioativo e sua origem é a crista neural. As

tireóides acessórias são completamente funcionais e respondem à TSH (GONZÁLEZ E

SILVA, 2006).

Figura 1 A. Estruturas profundas na extremidade cranial do pescoço do cão: vista lateral esquerda. O músculo oblíquo da cabeça foi removido expondo as vértebras atlas e áxis e o segundo nervo espinhal cervical passando pelo segundo forame intervertebral, localizado entre aquelas vértebras (DONE et al, 2002). B. Nomenclatura referente à Figura (DONE et al, 2002).

A unidade anatômica e funcional da tireóide é o folículo tireoidiano, uma esfera oca de

células cercada por uma membrana basal. A parede do folículo é composta por uma única

camada de células, as quais são cubóides quando em repouso e colunares quando ativas

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(Figura 2). O lúmen folicular contém um colóide, secreção clara e viscosa que contém

tireoglobulinas (GONZÁLEZ E SILVA, 2006; FELDMAN e NELSON, 2004).

Figura 2. Desenho esquemático do folículo da glândula tireóide normal e do folículo estimulado pelo TSH. Notar a alteração da forma celular de cubóide para colunar e o núcleo deslocado para a base da célula e a aparência festonada do lúmen folicular (GENUTH, 2004c). O crescimento e a diferenciação das células foliculares da tireóide e sua expressão

gênica requer proteínas únicas para a síntese do hormônio tireoidiano, sendo estimulados e

regulados por três fatores de transcrição nucleares: fator de transcrição 1 (TTF-1), 2 (TTF-2) e

PAX 8. Além das células foliculares, existem as células parafoliculares que ficam espalhadas

no espaço interfolicular também chamadas de células C, que produzem o hormônio

polipeptídico calcitonina (GENUTH, 2004c).

O lúmen folicular contém colóide que é um gel viscoso que é essencialmente um

estoque de tireoglobulina secretado pelas células de tireóide (FELDMAN e NELSON, 2004).

A tireoglobulina é uma glicoproteína contendo oligossacarídeos formados por

hexosamina, galactose, manose e outros glicídeos, além de aminoácidos iodados ou

iodotirosinas, tais como a monoiodotirosina (MIT) e a diiodotirosina (DIT), e compostos

derivados ou iodotironinas, como a triiodotiroina (T3) e a tetraiodotironina ou tiroxina (T4).

As duas últimas são os hormônios tireoidianos (HT) (GONZÁLEZ E SILVA, 2006).

Na tireóide são sintetizados três hormônios: T3, T4 e calcitonina. Os dois primeiros

são sintetizados nos folículos e têm a ver com a regulação do metabolismo de glicídeos,

lipídeos e proteínas, bem como o crescimento e diferenciação celular, enquanto a calcitonina,

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sintetizada nas células C, tem a ver com o controle hormonal dos níveis de cálcio no sangue

(GONZÁLEZ e SILVA, 2006).

2.2 Fisiologia da glândula tireóide

2.2.1 Biossíntese dos hormônios tireoidianos

Iodo e tirosina são os substratos básicos envolvidos na síntese de hormônios da

tireóide (Figura 3) (FINORA e GRECO, 2007).

A adequada ingestão de iodo é pré-requisito para a síntese normal dos hormônios da

tireóide pela tireóide. O iodo é transportado ativamente do fluido extracelular para dentro da

célula folicular da tireóide, onde é rapidamente oxidada pela tiroperoxidase (TPO)

(FELDMAN e NELSON, 2004).

O iodo oxidado é incorporado aos resíduos de tirosina, os quais são muito abundantes

na tireoglobulina, para formar MIT e DIT. O iodo na forma de MIT ou DIT perfaz 70% do

iodo tireoidiano. Essas duas iodotirosinas podem formar enzimaticamente os hormônios

tireoidianos mediante o acoplamento por condensação oxidativa de 2 DIT para dar T4, ou

uma DIT e uma MIT para formar um T3 (Figura 3). Esta condensação, que requer energia,

ocorre na interface colóide-membrana da célula folicular sendo susceptível de ser inibida por

sulfas, tiouréia e ácido para-aminobenzóico (PABA) (FINORA e GRECO, 2007).

O sentido da biossíntese dos hormônios tireoidianos nos folículos é único, pois a

montagem final é realizada extracelularmente no colóide do folículo (GONZÁLEZ E SILVA,

2006).

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Figura 3. Síntese dos hormônios tireoidianos. Todas essas reações ocorrem com moléculas de tirosina que são incorporadas dentro da tireoglobulina por ligações peptídicas. T4 e T3 são as moléculas hormonais biologicamente ativas (GENUTH, 2004c).

O produto secretado pela glândula tireóide são as iodotironinas resultantes de uma

série de combinações de duas moléculas de tirosina iodada. Aproximadamente, 90% da

produção da tireóide é 3,5,3´,5´-tetraiodotironina (tiroxina ou T4), 10% é 3,5,3´-

triiodotironina (T3) e menos de 1% é 3,3´,5´-triiodotironina (T3 reversa ou rT3), no entanto,

T3 é a molécula responsável pela maioria das ações do hormônio tiroidal (FINORA e

GRECO, 2007; GENUTH, 2004c).

T3 e T4 ficam ligadas à tireoglobulina e são estocadas no colóide e sob controle do

TSH a tireoglobulina sofre proteólise e libera T3 e T4. Os hormônios da tireóide são

insolúveis em água e sua capacidade para circular depende da ligação com proteínas de

transporte (FINORA e GRECO, 2007).

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2.2.2 Secreção, transporte e metabolização dos hormônios tireoidianos

A glândula tireóide é a única entre as glândulas endócrinas que armazena grande

quantidade de hormônio e tem baixa taxa de reabsorção (1%/dia). Esse aspecto de economia

da tireóide tem valor homeostático na medida em que o reservatório fornece proteção

prolongada contra depleção do hormônio circulante. Em humanos, a administração de agentes

antitireoidianos por duas semanas tem pouco efeito na concentração sérica de T4. Na tireóide

humana normal tem aproximadamente 250 µg T4/g ou 5000 µg de T4 em 20 g de glândula.

Isso é suficiente para manter o estado eutiroideo por pelo menos 50 dias (LARSEN et al.,

2003).

O primeiro estágio para a liberação do hormônio da tireóide é a endocitose do colóide

do lúmen folicular por dois processos: macropinocitose por pseudópodes formados na

membrana apical e micropinocitose por pequenas vesículas que revestem a superfície apical

(Figura 4). Após a endocitose, vesículas endocíticas se fusionam com lisossomos e ocorre

proteólise liberando iodotirosinas das tireoglobulinas que são rapidamente deiodadas e o iodo

liberado é reciclado (LARSEN et al., 2003).

Após ação da protease lisossomal e liberação de T4 e T3 (Figura 4) que deixam a

célula através da base da membrana plasmática entram na corrente circulatória através de rico

plexo capilar adjacente (GENUTH, 2004c).

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Figura 4. Esquema geral da síntese e eliminação do HT. A síntese de T4 e T3 ocorre dentro da molécula de TG na borda do citoplasma e no lúmen do folículo (GENUTH, 2004c). Os hormônios T3 e T4 liberados no sangue são conjugados às proteínas plasmáticas

transportadoras, principalmente à globulina transportadora de tiroxina (TBG) e, em menor

grau, à pré-albumina ligada a tiroxina (TBPA), à albumina e certas lipoproteínas plasmáticas.

Menos de 1% fica livre, não ligada a outra molécula (FELDMAN e NELSON, 2004).

A união dos HT às proteínas transportadoras diminui sua perda pelos rins e aumenta

sua meia-vida servindo de importante reservatório dos hormônios o que permite manter o

nível de hormônio livre dentro de um limite muito estreito. A maior parte do hormônio da

tireóide (>99%) é ligada a proteína e a porção restante não ligada é metabolicamente ativa

chamada forma livre. Uma vez nos tecidos periféricos, T4 é deiodado em T3 antes de se ligar

ao receptor. A maior parte do T3 é derivada da deiodinação do T4 extratiroidal (FINORA e

GRECO, 2007).

O início da deiodação do T4 pode ocorrer no anel externo, produzindo T3 ou no anel

interno produzindo T3 reverso (rT3). A conversão de T4 em T3 representa um reforço na

atividade biológica enquanto que a conversão de T4 em rT3 tem efeito contrário. A conversão

de T4 em T3 ou rT3 dentro ou fora do anel iodotironina deiodase é a principal etapa de

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regulação da atividade biológica do hormônio da tireóide. Menos que 20% do total do T3 é

produzido na tireóide e o remanescente 80 a 90% é derivado de anel externo de

monodeiodação de T4 em tecidos periféricos. Os tecidos que mais concentram HT são o

fígado, rins e músculo. Conjugação de HT com glicuronídeos e sulfatos com subsequente

excreção na bile e urina representa outra importante via metabólica do HT (FELDMAN e

NELSON, 2004).

2.2.3 Ação dos hormônios da tireóide

Os HT podem atravessar as membranas plasmáticas e têm seus receptores localizados

no núcleo (Figura 5). O mecanismo de ação destes hormônios é mais lento, pois devem

atravessar a membrana citoplasmática por difusão simples, são lipofílicos, entram no citosol e

alcançam o núcleo, requerem tempo para a síntese de mRNA no núcleo e a subsequente

síntese de proteínas nos ribossomos. O tempo de ação destes hormônios é de horas ou dias. O

complexo hormônio-receptor nuclear ativado se une a regiões específicas do DNA para ativar

ou inativar genes específicos. Seletivamente afeta a transcrição e a produção do mRNA

mensageiro respectivo. O mRNA é depois traduzido nos ribossomos para produzir a proteína

específica que causa a resposta metabólica (GONZÁLEZ E SILVA, 2006, LAZAR, 2003).

Figura 5. Mecanismo de ação via segundo mensageiro dos hormônios esteroidais e HT (GONZÁLEZ E SILVA, 2006).

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Os hormônios tireoidianos, nas quantidades fisiológicas, são anabólicos; em conjuntos

com o hormônio do crescimento e a insulina, eles estimulam a síntese protéica e reduzem a

excreção de nitrogênio. No entanto, em excesso (hipertireoidismo), eles podem ser

catabólicos; neste caso, aumentam a gliconeogênese, o desdobramento protéico e o

desperdício de nitrogênio. No hipotireoidismo, o prejuízo na produção e na secreção dos

hormônios tireoidianos resulta em diminuição na taxa metabólica (KAHN, 2008).

Os hormônios da tireóide afetam vários processos metabólicos influenciando na

concentração e atividade de várias enzimas; no metabolismo de substratos, vitaminas e

minerais; na secreção e degradação de praticamente todos os outros hormônios; e na resposta

dos seus tecidos alvos. Os hormônios da tireóide são criticamente importantes no

desenvolvimento fetal, particularmente no desenvolvimento do sistema nervoso e esquelético.

Eles atuam em praticamente todos os aspectos do metabolismo do carboidrato e lipídeos

incluindo a síntese, metabolização e degradação. Além disso, os hormônios da tireóide têm

importante efeito cronotrópico e inotrópico no coração e estimulam a eritropoiese e formação,

reposição e reabsorção óssea (FELDMAN e NELSON, 2004).

Os efeitos dos HT são divididos em duas categorias: os efeitos que se manifestam

dentro de minutos a horas após a conjugação com receptores hormonais e não exigem síntese

protéica e os efeitos que se manifestam posteriormente (mais de 6 horas) e exigem síntese de

novas proteínas. Cerca de metade do aumento do consumo de oxigênio produzido pelos

hormônios tireoidianos se relaciona com ativação da Na+/K+ -ATPase conjugada com a

membrana plasmática; os HT também estimulam o consumo de oxigênio mitocondrial. Os

efeitos mais crônicos relacionam-se com ações celulares que exigem interação com os

receptores de T3 nucleares, seguida por aumento na síntese protéica crucial para processos

fisiológicos, tais como crescimento, diferenciação, proliferação e maturação (KAHN, 2008).

2.2.4 Regulação da função da tireóide

O sistema nervoso e o sistema endócrino têm importantes semelhanças funcionais.

Cada um deles é basicamente um sistema de sinalização. Ambos são cruciais para a função

fisiológica cooperativa de órgãos, tecidos e células altamente diferenciados que compõe o

organismo. Portanto, o sistema endócrino e o nervoso frequentemente respondem juntos a

estímulos recebidos a fim de integrar a resposta do organismo a alterações no seu ambiente

externo e interno. A estreita relação entre os sistemas endócrino e imune também foi

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verificado. Células do sistema imune secretam citocinas e essas moléculas agem nas células

alvo através de mecanismos semelhantes aos hormônios. Células endócrinas podem ser os

alvos dessas citocinas de tal forma que respostas imunes e endócrinas ao estresse são

coordenadas ou ações hormonais são reforçadas (GENUTH, 2004a).

A unidade hipotálamo-pituitária é o mais complexo e dominante componente do

sistema endócrino e regula a função da tireóide, adrenal, glândulas reprodutivas e é

diretamente responsável pelo crescimento somático e lactação, também ajuda a manter a

homeostasia (GENUTH, 2004b).

A proximidade das várias áreas hipotalâmicas entre si tem uma lógica funcional. Por

exemplo, hormônios da glândula tireóide aumentam o consumo de energia, taxa metabólica e

termogênese. Os neurônios que fazem o controle da saída através de sua secreção hormonal

estimulante, TSH, são anatomicamente próximos e conectados por neurônios que regulam a

entrada de energia via controle do apetite e temperatura (GENUTH, 2004b).

O TSH é um hormônio glicoprotéico cuja função é regular o crescimento e

metabolismo da glândula tireóide e seus hormônios, T4 e T3. A secreção de TSH é regulada

por dois fatores principais: TRH que aumenta a taxa de secreção enquanto que o HT inibe por

feedback negativo (Figura 6) (GENUTH, 2004b).

A síntese e secreção dos HT são reguladas por mecanismos extratireoidianos (TSH) e

intratireoidianos (autoregulação). O TSH é o principal modulador da atividade da tireóide, o

resultado direto é o aumento da secreção de HT. A secreção de TSH pela pituitária é

modulada por HT pelo mecanismo de feedback negativo (FINORA e GRECO, 2007;

FELDMAN e NELSON, 2004).

O eixo hipotálamo-hipófise-tireóide é responsável pela manutenção do controle dos

níveis de dos hormônios extratireoidianos. O hipotálamo produz TRH que estimula tireotrofos

na pituitária anterior a produzir TSH. Além disso, para liberar hormônio o TSH estimula o

crescimento da glândula tireóide. Os hormônios tireoidianos, particularmente T3, fornecem

feedback para o hipotálamo e a pituitária para regular produção de TSH e TRH (FINORA e

GRECO, 2007).

Os HT agem tanto na pituitária como no hipotálamo (Figura 6). O controle de

feedback da pituitária pelo HT é notavelmente preciso. A administração de pequenas doses de

T3 e T4 inibe a resposta da tireotropina pelo TRH e pequenos decréscimos do nível de

hormônio da tireóide no plasma são suficientes para sensibilizar a pituitária pelo TRH. O

TRH estimula a secreção de tireotropina dentro de poucos minutos através de sua ação no

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receptor de membrana enquanto a ação dos hormônios da tireóide, mediados por receptores

intracelulares requerem muitas horas para atingirem seus efeitos (CONE et al, 2003).

Figura 6. Regulação do eixo hipotálamo-pituitária-tireóide (CONE et al, 2003).

2.3 Hipotireoidismo canino

Hipotireoidismo é a doença endócrina mais comumente diagnosticada em cães, mas na

realidade, provavelmente seja menos freqüente que hiperadrenocorticismo e diabetes mellitus

(MOONEY, 2007).

O diagnóstico definitivo na prática é difícil por várias razões. Os sinais clínicos são

variáveis e mimetiza outras doenças comuns; existem vários testes diagnósticos, alguns

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relativamente novos, mas nenhum deles é perfeito e existem fatores não tireoidianos como a

síndrome do eutireóideo doente e certas drogas comumente usadas que podem afetar

profundamente os resultados dos testes (MOONEY, 2007).

Hipotireoidismo é uma das doenças endócrinas mais comuns e seu diagnóstico ainda é

um desafio na prática clínica. Uma vez diagnosticado com precisão e tratado adequadamente

o prognóstico é excelente. Os desafios se encontram na variedade da apresentação clínica e na

escolha dos testes de função da glândula tireóide (DIXON, 2004).

2.3.1 Classificação

Anormalidades funcionais ou estruturais da glândula tireóide podem causar deficiência

na produção de HT. A classificação adequada é baseada na localização do problema dentro do

eixo hipotalâmico-hipofisário-tireoidiano (FELDMAN e NELSON, 2004).

Hipotireoidismo primário é a forma mais comum nos cães, resultante de problemas na

glândula tireóide, sendo que a destruição da glândula é a processo mais encontrado.

Hipotireoidismo secundário é a disfunção das células tireotróficas da pituitária

comprometendo a secreção de TSH, é raro em cães. Hipotireoidismo terciário é definido

como deficiência de secreção de TRH pelo hipotálamo e ainda não foi diagnosticado em cães

(FELDMAN e NELSON, 2004).

A tireoidite linfocítica e a atrofia idiopática da tireóide são as causas mais comuns de

hipotireoidismo primário em cães (MOONEY, 2007). Causas menos comum incluem

neoplasia, deficiência de iodo, infecção, destruição iatrogênica causada por drogas, cirurgia e

tratamento por radioiodo (FINORA e GRECO, 2007).

Causas secundárias e terciárias de hipotireoidismo são raras. Entre as causas

secundárias estão tumor da pituitária, má formação congênita da pituitária, infecção ou

supressão de TSH causado por drogas, hormônios ou doença concomitante. Causas de

hipotireoidismo terciário não têm sido relatadas na medicina veterinária (FINORA e GRECO,

2007).

Os mesmos autores sugerem que o hipotireoidismo pode ser classificado em adquirido

ou congênito. O adquirido pode ser primário, secundário ou terciário. Na forma primária o

tecido tiroidal foi destruído e substituído tornando-se menos responsivo ao TSH, por isso os

níveis de T3 e T4 declinam gradualmente e ocorre aumento de TSH.

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2.3.2 Etiologia

Hipotireoidismo primário é a causa natural mais comum de falha da tireóide no cão

adulto ocorrendo em mais de 95% dos casos de hipotireoidismo. Duas formas histológicas de

hipotireoidismo primário predominam no cão: tireoidite linfocítica e atrofia idiopática (Tabela

1). O resultado final de ambas as formas é a mesma: destruição progressiva da glândula

tireóide resultando em deficiente circulação dos hormônios da tireóide (FELDMAN e

NELSON, 2004).

Tabela 1: Causas estabelecidas de hipotireoidismo em cães

Hipotireoidismo primário

Tireoidite linfocítica

Atrofia idiopática

Hiperplasia da célula folicular

Destruição neoplásica

Iatrogênica

Remoção cirúrgica

Medicamento antitireoidiano

Tratamento com iodo radioativo

Hipotireoidismo secundário

Malformação da pituitária

Destruição da pituitária

Neoplasia

Supressão das células tireotróficas da pituitária

Hiperadrenocorticismo adquirido naturalmente

Síndrome do eutireóideo doente

Iatrogênica

Terapia com drogas, principalmente glicocorticóides

Terapia com radiação

Hipofisectomia

Hipotireoidismo congênito

Disgenese da tireóide (ectasia, hipoplasia, aplasia)

Defeito na captação de iodo

Ingestão deficiente em iodo

Fonte: FELDMAN e NELSON, 2004

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Tireoidite linfocítica

Aproximadamente metade dos casos de hipotireoidismo em cães adultos resulta da

tireoidite linfocítica. Do ponto de vista histológico a tireoidite linfocítica é caracterizada por

infiltração multifocal ou difusa de linfócitos, macrófagos e células plasmáticas. As células do

epitélio folicular normal têm aparência cubóide e tornam-se colunares devido à estimulação

do TSH que aumenta. Há engrossamento da membrana basal e substituição do tecido

tireoidiano normal por tecido conectivo fibroso maduro (Figura 7). Esse processo é

progressivo e a destruição total da tireóide pode levar meses ou anos e o tecido deixa de ser

funcional. Os sinais clínicos só aparecem quando 75% da glândula estiver comprometida

(FINORA e GRECO, 2007; DIXON, 2004; FELDMAN e NELSON, 2004).

Figura 7. Tecido tireoidiano canino com tireoidite linfocítica leve. Infiltração de linfócitos que resulta na destruição da arquitetura normal da tireóide (FINORA e GRECO, 2007).

Tireoidite linfocítica é uma desordem imunomediada. Mecanismos imunológicos

humorais estão envolvidos: aumento de autoanticorpos na circulação contra antígenos da

tireóide incluindo tireoglobulina, T4 e T3, espessamento da membrana basal por depósito de

imunocomplexos no folículo da tireóide e processos imunológicos em cascata são ativados

causando destruição da célula folicular (FELDMAN e NELSON, 2004).

A genética parece ter papel importante no desenvolvimento da tireoidite linfocítica

principalmente devido a maior incidência desta desordem em certas raças e em certas

linhagens dentro da mesma raça (FELDMAN e NELSON, 2004; DIXON, 2004).

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Atrofia idiopática da tireóide

A maioria dos casos de hipotireoidismo, excluídos os casos de tireoidite, será de

atrofia idiopática da tireóide e são caracterizados por degeneração das células foliculares com

redução do tamanho do folículo e substituição do parênquima normal por tecido adiposo

(DIXON, 2004 apud Gosselin et al, 1981).

A causa subjacente é desconhecida, mas parece pela histologia ser um processo

degenerativo não inflamatório. Talvez a atrofia idiopática da tireóide seja o estágio final da

tireoidite linfocítica visto que há aumento de TgAAs (auto anticorpos antitireoglobulina)

circulante observado tipicamente em animais jovens diferentemente dos animais com atrofia

idiopática da tireóide (DIXON, 2004).

Juntos os dois processos (tireoidite linfocítica e atrofia idiopática) somam 95% dos

casos de hipotireoidismo canino, parecido com os humanos que somam 99% (FINORA e

GRECO, 2007).

Outras causas de hipotireoidismo primário incluem destruição por neoplasia,

medicação antitirreoidal, terapia por radiação e defeitos congênitos, embora incomuns no cão

(FINORA e GRECO, 2007; DIXON, 2004).

Hipotireoidismo central

Hipotireoidismo central é causado pela falha de secreção normal de TSH pelas células

tireotróficas da pituitária. Esta forma de apresentação da doença representa cerca de 5% dos

casos de hipotireoidismo espontâneos. As causas mais comuns de reduzida secreção de TSH

seriam associadas a tumores hipofisários, deficiência congênita de TSH, hipofisectomia,

secundário ao uso crônico de glicocorticóides ou frente ao hiperadrenocorticismo (DIXON,

2004).

Hipotireoidismo congênito

Hipotireoidismo congênito é raro em medicina veterinária, é causado por defeito

herdado ou por exposição do feto ou recém nascido tanto ao excesso como a falta de iodo na

dieta. Hipotireoidismo congênito pode ser classificado em com bócio ou sem bócio. Na

categoria dos animais que tem bócio (aumento da glândula tireóide) há aumento da liberação

de TSH (FINORA e GRECO, 2007).

Hipotireoidismo congênito é uma desordem comum em crianças. Em contraste,

somente 3,6% dos casos de hipotireoidismo ocorrem em cães com menos de um ano de idade.

O hipotireoidismo congênito pode ser causado por aplasia ou hipoplasia da glândula tireóide,

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disormoniogênese, ingestão de substancias bociogênicas maternas, iodo radioativo materno,

deficiência de iodo, tireoidite autoimune, hipopituitarismo, deficiência de tireotropina, doença

hipotalâmica ou deficiência de TRH (GRECO, 2001).

Tem sido relatada uma forma autossômica recessiva de hipotireoidismo congênito em

cães das raças Fox Terrier (FINORA e GRECO, 2007 apud FYFE, KAMPSCHMIDT e

DANG, 2003). Já se registrou hipotireoidismo secundário congênito (associado com sintomas

clínicos de nanismo desproporcional, letargia, anormalidades na marcha e constipação) em

uma família de cães da raça Schnauzer Gigante (KAHN, 2008, FINORA e GRECO, 2007

apud GRECO, FELDMAN e PETERSON, 1991). Os animais afetados têm deficiência de

peroxidase tireoidiana. Está disponível teste genético para detectar Fox Terrier portador

(FINORA e GRECO, 2007 apud FYFE, KAMPSCHMIDT e DANG, 2003). O

hipotireoidismo congênito também é notado como um elemento do panhipopituitarismo

(FINORA e GRECO, 2007).

2.3.3 Sinais clínicos

A deficiência do HT afeta a função de todos os sistemas orgânicos; como resultado

disso, os sinais clínicos (Tabela 2) ficam difusos, variáveis, frequentemente inespecíficos e,

em raras vezes, patognomônicos (KAHN, 2008).

A obesidade está presente em 50% dos cães hipotireoideos em razão da diminuição da

taxa de metabolismo. Pelame seco, sem brilho, alopecia, seborréia e hiperpigmentação estão

presentes em 80% dos casos. A alopecia ocorre em áreas de fricção incluindo cauda, pescoço

e região torácica ventral e com o progresso da doença a maioria das raças desenvolve alopecia

simétrica bilateral no tronco (PANCIERA e CARR, 2007).

Muitos sintomas clínicos se relacionam diretamente com retardamento do

metabolismo celular, o que resulta em embotamento mental, letargia, intolerância a exercícios

e ganho de peso sem aumento correspondente do apetite (KAHN, 2008).

A severidade dos sinais clínicos é variável e alguns animais se mantêm praticamente

assintomáticos. A maioria dos cães hipotireoideos tem algum sinal clinico dermatológico

como pêlo seco, seborréia, alopecia no tronco, “rabo-de-rato”, comedões, hiperpigmentação

ou pioderma. Eles podem sofrer de mixedema devido ao acúmulo de aminoglicanos na derme

que causa a expressão facial “trágica” em alguns hipotireoideos (KAHN, 2008, MELIÁN,

2008).

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É prudente que o clínico conheça os sinais clínicos menos frequentes, entre eles,

galactorréia consequente ao incremento da produção de prolactina devido à estimulação do

eixo hipotalâmico-hipofisário (TRH) em resposta a deficiência de T4. Sinais menos

frequentes semelhantes à acromegalia como aumento do tamanho da mandíbula e aumento do

espaço interdental devido ao aumento do hormônio do crecimento (GH) também como

consequência da alteração do eixo hipotalâmico-hipofisário. Alguns cães podem desenvolver

sinais neurológicos como síndrome vestibular periférica, convulsões, lesão do neurônio motor

inferior ou paralisia laríngea (MELIÁN, 2008).

Alopecia do tronco simétrica bilateral não pruriginosa é relatada em 88% dos cães

hipotireoideos. Os hormônios da tireóide são necessários para o início da fase anágena

(crescimento ativo do pêlo). Na falta dos hormônios da tireóide o pêlo torna-se seco, duro e

quebradiço porque permanecem na fase telógena (FINORA e GRECO, 2007).

O hormônio da tireóide aumenta a resposta imunológica linfática. No hipotireoideo há

decréscimo da função das células T e imunidade humoral. Essa falta de imunidade local torna

a pele mais susceptível a infecções. Demodicose generalizada e infecções por Malassezia spp

são comuns. Há aumento da incidência de otite externa nos hipotireoideos (FINORA e

GRECO, 2007).

Tabela 2. Sinais clínicos do hipotireoidismo canino

Comum (40-49% dos casos) Incomum (9-15% dos casos) Raro (<5% dos casos)

Ganho de peso Pioderma Paralisia nervo facial

Letargia Bradicardia Doença vestibular

Alopecia Pêlo seco, sem brilho, quebradiço Polineuropatia

Embotamento mental Mixedema Hiporreflexia

Hiperpigmentação Engrossamento de pele Queratoconjuntivite seca

Seborréia seca ou oleosa Fraqueza Conjuntivite

Intolerância ao exercício Déficits proprioceptivos Convulsões

Cauda de rato Ataxia, andar em círculos

Otite Lipidose corneana

Anormalidades reprodutivas

Transito intestinal lento

Megaesôfago

Diarréia por grande crescimento bacteriano

Poliendocrinopatia autoimune Fonte: Adaptado de FINORA e GRECO, 2007.

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Coma mixedematoso é raro e potencialmente fatal devido ao hipotireoidismo grave e

pode ser tratado com sucesso com terapia agressiva com levotiroxina endovenosa (FINORA e

GRECO, 2007).

Os sintomas do hipotireoidismo congênito são: atraso no desenvolvimento tanto

mental como físico e nanismo (FINORA e GRECO, 2007), aumento da cabeça, membros

curtos, macroglossia, atraso na erupção dentária, pelame seco, distensão abdominal,

constipação, letargia, confusão mental e ataxia (PANCIERA e CARR, 2007).

2.3.4 Diagnóstico

Os fatores que afetam a dificuldade no diagnóstico de hipotireoidismo em cães são a

diversidade dos sinais clínicos e as limitações dos testes diagnósticos especialmente em

pacientes com outra doença concorrente ou em tratamento com outras drogas. Este

diagnóstico não deve basear-se somente no resultado dos testes de função da tireóide, mas

numa avaliação cuidadosa de dados que confirmem o caso, na eliminação de fatores não

tireoidianos que possam influenciar os resultados dos testes e na interpretação da combinação

entre sinais clínicos, achados do exame físico, anormalidades bioquímicas e testes de função

da tireóide (MELIÁN, 2008; MOONEY, 2008; FINORA e GRECO, 2007).

As etapas recomendadas para a investigação da suspeita de hipotireoidismo são

representadas na forma de algoritmo (Figura 11) adaptado de FINORA e GRECO, 2007 e

resumidas a seguir:

a. Em caso suspeita de hipotireoidismo canino baseado nos sinais clínicos, achados de

exame físico e histórico deve-se proceder aos exames laboratoriais de rotina para

eliminar doenças não tireoidianas e tratá-las se for o caso.

b. Avaliar uso de drogas e a possível interferência com os testes endócrinos.

c. Proceder à primeira linha de testes para diagnóstico: T4 e TSH canino.

d. Se houver queda de T4 e aumento de TSH deve-se tratar o hipotireoidismo, se normais

aguardar 4 semanas e refazer os testes se houver persistência dos sinais clínicos.

e. Se os níveis de T4 estiverem baixos, mas TSH normal ou baixo, ou ainda aumento de

TSH e T4 normal procede-se à segunda linha de avaliação de testes hormonais: fT4

pelo método de diálise de equilíbrio modificada.

f. Se a concentração de fT4 estiver baixa confirma o diagnóstico de hipotireoidismo e

segue-se o tratamento.

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g. Se a concentração de fT4 estiver normal e ainda persistirem os sinais clínicos de

hipotireoidismo deve-se aguardar 4 semanas e repetir os exames (FINORA e GRECO,

2007).

Figura 8. Algoritmo para o diagnóstico de hipotireoidismo.

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2.3.4.1 Avaliação laboratorial de rotina

O hemograma, exames bioquímicos e urinálise ajudarão a suportar a suspeita clínica

de hipotireoidismo, mas o principal valor é descartar outras doenças concorrentes que possam

afetar o resultado dos testes da função da tireóide. Estes testes devem ser realizados antes dos

testes da função da tireóide (MELIÁN, 2008).

O achado hematológico clássico associado com o hipotireoidismo em cães é a anemia

não regenerativa normocítica e nornocrômica e a anormalidade bioquímica sérica clássica é a

hipercolesterolemia que ocorre em aproximadamente 80% dos cães (KAHN, 2008, MELIÁN,

2008). Isso é consequência da atividade metabólica periférica reduzida e redução na demanda

de oxigenação dos tecidos, além do menor estímulo à eritropoiese (DIXON, 2004).

Segundo FINORA e GRECO, 2007 além da hipercolesterolemia, as alterações

bioquímicas mais comuns no hipotireoideo hipertrigliceridemia e hiponatremia. Essas

alterações são decorrentes do decréscimo do metabolismo lipídico que acompanha o

hipotireoidismo. Níveis elevados de colesterol e triglicerídeos têm sido associados com

aterosclerose em cães, embora isso seja raro. Os autores também afirmam que 28% a 32% dos

cães têm anemia, normalmente normocítica, normocrômica e não regenerativa. Isso ocorre

devido à combinação de três mecanismos: decréscimo da produção de eritropoietina, reduzida

resposta das células precursoras da eritropoietina e decréscimo da estimulação das células

iniciais da eritropoiese. O hipotireoidismo não afeta a duração de vida dos eritrócitos.

Elevação da creatina quinase (CK) é comumente relatado no hipotireoidismo,

entretanto animais eutireoideos têm aumento da CK em 35% dos casos (DIXON, 2004).

Elevação média das enzimas do fígado, particularmente fosfatase alcalina e gama-

glutamil transferase (GGT) são observados em até 30% dos casos, em decorrência da maior

deposição de gordura no fígado e consequente discreta lipidose (DIXON, 2004).

A fructosamina foi recentemente proposta como um indicador com até 80% de

sensibilidade para hipotireoidismo, aumentos discretos na sua concentração são causados por

uma redução na renovação das proteínas e não por causa de hiperglicemia, uma vez que este

exame é um indicador no diagnóstico e monitoramento da diabetes mellitus. Normalmente em

cães com hipotireoidismo observam-se valores próximos ao limite superior de fructosamina

(cerca de 300 µmol/L) (DIXON, 2004).

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2.3.4.2 Avaliação laboratorial específica

As mensurações endócrinas dos laboratórios modernos iniciaram com o

radioimunoensaio com Berson e Yalow (FEDERMAN, 2003).

A descoberta que anticorpos podem fazer a diferenciação entre os hormônios e juntá-

los com alta afinidade, junto com o desenvolvimento de métodos que identificam por

detecção de sensibilidade tem revolucionado a endocrinologia (KEMPPAINEM, 2004).

Cada vez mais, métodos que evitam o uso de radioisótopos estão sendo desenvolvidos.

Os ensaios enzimáticos (ELISA) são testes em que hormônios ou seus anticorpos são

marcados com uma enzima detectável por um substrato enzima-específico. Estes testes têm

muitas vantagens sobre os que utilizam radioisótopos como período de vida mais longo, não

há exposição a radioisótopos e mais fácil de tratar os resíduos. O principal limitante desses

métodos é a sensibilidade, ou seja, capacidade em determinar de forma confiável a

concentração frequentemente encontrada em baixos limites no cão e no gato

(KEMPPAINEM, 2004).

Hoje muitos testes hormonais usados por laboratórios veterinários de endocrinologia

são produzidos como kits designados para amostras de humanos. Contanto que suficiente

cuidado seja tomado para verificar a validade destes testes, muitos desempenham bem quando

são usadas amostras de animais de companhia. Felizmente, nos últimos anos mais testes estão

sendo produzidos e são específicos para hormônios de cães e gatos (KEMPPAINEM, 2004).

Vários fatores resultam em baixas concentrações basais de HT sendo os mais comuns

doenças concomitantes, por exemplo, síndrome do eutireóideo doente, drogas, especialmente

glicocorticóides e flutuações aleatórias nas concentrações do hormônio da tireóide em cães

saudáveis, eutiroideos com enfermidade concomitante ou hipotireoideos (NELSON e

COUTO, 2006).

O uso de testes para mensurar a concentração hormonal na circulação em animais de

companhia apresenta uma série de desafios: essas substâncias circulam em pequena

quantidade (frequentemente índice mais baixo que o mesmo hormônio em humanos);

diferenciação entre hormônios do mesmo tipo pode ser desafiador, por exemplo, hormônios

esteróides são todos derivados do colesterol e as estruturas das proteínas hormonais podem ter

diferença significante entre espécies (KEMPPAINEM, 2004).

A função da glândula tireóide é mensurada pela concentração sérica hormonal ou

avaliada pela resposta a testes de estimulação, por exemplo, teste de estimulação por TRH.

Muitos testes estão disponíveis para avaliar a função tireoidiana como a mensuração de tT4,

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fT4, tT3, fT3, T3 reversa (rT3) e tireotropina (TSH) (FINORA e GRECO, 2007). O T4 é o

hormônio mais secretado pela glândula tireóide. A relação T4/T3 no plasma sanguíneo é de

20/1 ou mais. Em pequena quantidade são secretados o T3 e menor quantidade ainda o rT3

(GONZÁLEZ e SILVA, 2006; FELDMAN e NELSON, 2004).

Existem vários testes de função da tireóide, mas nenhum deles oferece 100% de

eficácia, por isso, é aconselhável realizar mais de um teste (MELIÁN, 2008).

Dosagem de T4

O teste da concentração de T4 basal, fração do hormônio ligada à proteína, tem alta

sensibilidade. Aproximadamente 90% dos cães hipotireoideos terão esse valor mais baixo que

o cão eutireoideo. T4 normal em cão hipotireoideo pode ser explicado pela flutuação do T4

plasmático e pela interferência de anticorpos anti T4 na mensuração de T4 (MELIÁN, 2008).

Existem vários métodos através dos quais hormônios circulantes podem ser

mensurados. A técnica de radioimunoensaio (RIA) é o método que incorpora marcadores

radioativos e é considerado padrão para mensuração da concentração do T4 no soro e aceito

como método de referência (FELDMAN e NELSON, 2004).

A concentração sérica basal de T4 é a soma do hormônio livre e do ligado a proteína,

atualmente, são usados os métodos de radioimunoensaio (RIA) e ensaio imunoenzimático.

Existem os testes de ELISA realizados na própria clínica que são econômicos, rápidos e fáceis

de realizar e permitem ao clínico fazer recomendações no mesmo dia do exame (NELSON,

2007).

Várias raças do tipo Galgo (Sighthounds) têm valores baixos, também existe

correlação inversa entre idade e concentração total de T4 com o progresso de valores mais

baixos em cães mais velhos (MOONEY, 2008).

A principal limitação do T4 é a baixa especificidade, ou seja, possibilidade de falso

positivo (síndrome do eutiroideo doente), considerar isso na prática clínica e postergar os

testes da tireóide em animais com outras doenças com a finalidade de evitar falsos positivos

de hipotireoidismo.

Segundo NELSON e COUTO, 2006 a concentração sérica de T4 deve ser usada para

confirmar a função normal da tireóide e não hipotireoidismo em si. Ou seja, a concentração de

T4 normal estabelece a função da glândula tireóide normal, a exceção de menos de 1% dos

hipotireoideos com tireoidite linfocítica que têm anticorpos de T4 que interferem no RIA.

Baixo T4 deve ser interpretado sempre no contexto do quadro clínico e dos exames

sanguíneos de rotina.

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Concentração sérica de T4 menor que 0,5 µm/dL (6 nmol/L) em conjunto com

apropriados sinais clínicos, achados físicos e testes sanguíneos de rotina suportam o

diagnóstico de hipotireoidismo, especialmente se não houver doença concomitante. O

diagnóstico definitivo necessita da prova com a levotiroxina. Se o resultado for menor que 1

µm/dL (13 nmol/L), mas sinais clínicos, achados físicos e exames sanguíneos de rotina não

apóiam fortemente a doença ou alta chance de síndrome do eutiroideo doente ou estão sendo

administradas drogas conhecidas por diminuírem a concentração de T4, então testes

adicionais da função da tireóide são recomendados (NELSON, 2007).

A mensuração de T4 basal por RIA é mais exata do que métodos como ELISA

realizados na clínica, por exemplo, SNAP T4 Test (Idexx) (FINORA e GRECO, 2007;

NELSON e COUTO, 2006).

Teoricamente, a interpretação da concentração sérica basal deveria ser fácil naqueles

cães com hipotireoidismo, que deveriam ter valores baixos se comparados com os valores de

cães saudáveis. Infelizmente, a faixa de concentração sérica de T4 em caninos hipotireoideos

se sobrepõe àqueles de cães saudáveis e esta sobreposição se torna evidente em cães

eutiroideos com doença concomitante. Quanto maior a concentração de T4, maior a

probabilidade de o cão ser eutiroideo. A única exceção é o canino hipotireoideo com

anticorpos anti-hormônio da tireóide circulante. Por outro lado, quanto menor o valor de T4,

maior a probabilidade de hipotireoidismo, considerando outros dados da história e exame

clínico compatíveis (NELSON e COUTO, 2006).

Apesar dessas considerações, o teste de triagem inicial normalmente requisitado é

mensuração de T4, este é o teste que avalia a habilidade do tecido da tireóide em produzir

hormônio, mas não é definitivo no diagnóstico de disfunção da tireóide (FINORA e GRECO,

2007).

A T4 é mensurada em amostra de soro coletado em tubo separador de soro (contém

gel que separa o soro porque sua densidade está entre a densidade das células do sangue e

soro). Evitar amostras de sangue com EDTA ou com citrato. As amostras podem ficar em

temperatura ambiente por sete dias. Proceder ao congelamento para um período maior de

armazenamento e evitar congelar e descongelar por várias vezes (NACHREINER e REFSAL,

2004).

Dosagem de T3

Como a T3 é o HT mais potente em nível celular, parece lógico medir sua

concentração para propósitos diagnósticos. No entanto, as concentrações séricas podem estar

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baixas, normais ou ocasionalmente altas em cães com hipotireoidismo registrado (KAHN,

2008).

Não há vantagem na dosagem de T3 sobre T4 na investigação das disfunções da

tireóide (MOONEY e PETERSON, 2004). A concentração sérica de T3 continua normal em

muitos cães hipotireoideos, por isso não é recomendável fazer este teste (MELIÁN, 2008).

Dosagem de T4 livre (fT4)

A mensuração do fT4 é considerada um dos melhores testes para diagnosticar

hipotireoidismo e hipertireoidismo em cães e gatos respectivamente, mas dificuldades são

encontradas devido à diminuta quantidade circulante que chega a quase mil vezes menos que

o T4 total (KEMPPAINEM, 2004).

A concentração de fT4 reflete mais apuradamente o status da tireóide que o T4 total. A

tiroxina livre é a fração de hormônio no sangue não ligada à proteína e representa menos de

1% da tiroxina circulante. Essa é a fração que entra na célula produzindo efeito biológico,

também regula o mecanismo de feedback negativo com o hipotálamo e a pituitária para o

ajuste da secreção de TSH (KEMPPAINEM, 2004).

A concentração sérica basal de fT4 é atualmente medida por RIA e por diálise de

equilíbrio modificada (MED) que utiliza uma etapa de diálise curta para separar o fT4 do T4

ligado às proteínas, seguida de RIA para fT4 (NELSON e COUTO, 2006; NELSON, 2007).

Quando comparado os resultados de fT4 por diferentes métodos o RIA foi

significantemente menor que a técnica de MED (SCHACHTER et al., 2004). Por esta razão o

MED é o método preferido para mensuração de fT4 em cães e gatos (FINORA e GRECO,

2007; NELSON, 2007).

Segundo MELIÁN (2008) a diálise por equilíbrio é o método de referencia para

determinação de fT4. A sensibilidade de fT4 para hipotireoidismo é alta (98%) e

particularmente efetiva em cães hipotireoideos com anticorpos anti T4. Também será menos

afetada com doenças concorrentes, mesmo assim, 20% dos eutiroideos doentes terão baixa

concentração de fT4.

Dosagem de fT4 medida pelo MED maior que 1,5 ng/dL (20 pmol/L) é indicativo de

eutireoidismo, valor menor que 0,8 ng/dL (10 pmol/L), especialmente 0,5 ng/dL (6,5 pmol/L),

indicam hipotireoidismo desde que história e exame clínico e resultados de exames

sanguíneos de rotina sejam compatíveis com hipotireoidismo e doença sistêmica grave não

esteja presente. Anticorpos circulantes anti-hormônio da tireóide não afetam resultados de fT4

pelo MED e efeitos supressivos de doenças concorrentes não afetam tanto fT4 como T4,

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embora doença grave possa causar queda abaixo de 0,5 ng/dL (6,5 pmol/l) em fT4 (

NELSON, 2007; NELSON e COUTO, 2006).

O melhor método para estimar o fT4 envolve diálise direta ou de equilíbrio disponível

em forma de kit para uso em humanos. Nesse sistema, amostra não diluída do paciente é

colocada dentro da câmara de diálise. O fT4 se difunde através da membrana de diálise em

um tampão e depois isso é mensurado usando uma sensível RIA. Esse método é mais caro

porque requer uma câmara para cada amostra, mas é mais preciso que o método atual. A

validação de um teste hormonal requer avaliação da sensibilidade, precisão, especificidade e

acurácia (KEMPPAINEM, 2004).

A técnica de diálise direta é o método mais preciso para determinação das

concentrações séricas de fT4, é preferido para avaliar a função da glândula tireóide em

caninos. A precisão do método MED tem sido superior a 90% em todos os estudos nos quais

ele tem sido avaliado criticamente, comparado a uma eficácia de 75% a 80% para o T4 sérico.

Neste teste os anticorpos anti-hormônio da tireóide circulantes não interferem nos resultados

de fT4, também não sofre tanta interferência dos efeitos supressores de enfermidade

concomitante embora doenças graves possam ocasionar uma diminuição nas concentrações de

fT4 para menos de 0,5 ng/dL na síndrome do eutiroideo doente (NELSON e COUTO, 2006).

Segundo NELSON (2007) na maioria dos laboratórios o intervalo de referencia para

fT4 sérica pelo método de MED em cães e gatos é aproximadamente de 0,8 a 3,4 ng/dL (10 a

45 pmol/L e 1 a 4 ng/dL (13 a 50 pmol/L) respectivamente.

KRATZSCH et al. (2005) fizeram o primeiro estudo que visa estabelecer um novo

intervalo de referencia para TSH e hormônios tireoidianos em humanos saudáveis. Para isso,

o estudo obedeceu critérios da National Academy of Clinical Biochemistry (NACB) e

ultrasonografia da tireóide com o intuito de eliminar todos aqueles indivíduos que possuíam

histórico familiar de doença tireoidiana, patologias da tireóide, e aumento da anti-tiroide

peroxidase ou anticorpos anti-tiroglobulinas evitando assim qualquer interferência nos

resultados. Quando comparados os dados de referencia do grupo de pessoas com glândula

tireóide normal frente aos dados do grupo total de sadios foram encontradas diferenças

significativas. Este estudo demonstra o intervalo de referencia é mais específico quando a

análise for mais criteriosa, possivelmente em humanos há erros de diagnóstico. Em veterinária

as dificuldades ainda são maiores porque na maioria dos casos não se tem histórico familiar e

nem exames anteriores e os critérios de avaliação dos dados são menos específicos.

A amostra para dosagem de fT4 por MED deve ser o soro coletado em tubo separador de

soro. A amostra pode ser mantida por 5 dias a 20°C, se mantida por 5 dias a 37°C a

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concentração do hormônio será maior que deveria. Severa lipemia também afetará os

resultados (NACHREINER e REFSAL, 2004).

Dosagem de TSH

A tireotropina (TSH) estimula a atividade secretora e biossintética das células

foliculares da tireóide, estimulando a captação de iodeto pela glândula, a produção e liberação

de T3 e de T4, e a proteólise da tireoglobulina. A secreção de TSH é modulada pelos

hormônios tireoidianos por um mecanismo de feedback negativo (GONZÁLEZ e SILVA,

2006).

O teste de TSH tem alta especificidade e baixa sensibilidade. T4, fT4 e TSH são

elementos do mecanismo de feedback do eixo hipotálamo-pituitária-tireóide, por isso, devem

ser interpretados juntos (FINORA e GRECO, 2007).

Como a maioria dos cães tem origem primária do hipotireoidismo é esperado que a

maioria tenha alto nível de TSH. Entretanto, a concentração de TSH mantém-se normal em 20

a 40% dos casos de hipotireoidismo em cães. É provável que todos os cães com

hipotireoidismo primário tenham alta concentração de TSH inicialmente e com o tempo o

hipotálamo perca a habilidade de responder a baixa concentração de T4 e o TSH se estabilize

(MELIÁN, 2008).

Devido à baixa sensibilidade do TSH (60 a 80%), valor normal de TSH não exclui a

doença em cães com sinais clínicos compatíveis, mas ainda é um teste útil porque fornece

especificidade (90%) minimizando resultado falso positivo. Baixo T4 e alto TSH confirmam

o diagnóstico de hipotireoidismo considerando a probabilidade de achar essa combinação em

cães eutiroideos doentes menor que 2% (MELIÁN, 2008).

Os testes de estimulação de TSH e TRH avaliam a resposta da glândula tireóide à

administração exógena de TSH e TRH. A vantagem é diferenciar hipotireoidismo da

síndrome do eutireóideo doente em cães com baixas concentrações basais de hormônio da

tireóide. Embora o teste com estimulação com TSH seja preferido, o TSH para injeção não

está mais acessível a um custo razoável para caninos e felinos. O teste de estimulação com

TRH ainda está disponível para uso em caninos e felinos, embora a obtenção do TRH para

injeção esteja se tornando difícil. Há diversos protocolos de aplicações e ocorrem efeitos

adversos em aplicações acima de 0,1 mg/kg (NELSON e COUTO, 2006).

Em cães o TSH sérico pode ser mensurado usando imunoradiometria,

quimiluminescência, imunometria e ensaio imunométrico enzimático. Concentração sérica de

TSH de 0,6 ng/mL é usada pela maioria dos laboratórios como limite superior de referencia, o

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limite inferior está abaixo da sensibilidade dos testes. Não é possível a diferenciação entre

nível baixo e normal de TSH (NELSON, 2007).

O teste de estimulação de TSH foi por muitos anos considerado o teste de escolha,

porém tem limitada utilidade devido ao custo e potencial reação anafilática (MELIÁN, 2008).

Segundo NELSON (2007) a mensuração de TSH em cães é mensurada como parte da

avaliação diagnóstica da glândula tireoidiana em cães com suspeita de hipotireoidismo. Valor

maior que 0,6 ng/dL é compatível com hipotireoidismo, porém TSH pode estar normal em

cão hipotireoideo (confirmado com histologia) e aumentado no eutiroideo doente ou cães que

recebem drogas como fenobarbital. TSH sérico deve ser sempre interpretado junto com os

resultados de T4, fT4 ou ambos. TSH aumentado pode significar eutireoidismo ou

hipotireoidismo se resultados de T4 e fT4 são compatíveis (NELSON, 2007).

A amostra para dosagem de TSH deve ser o soro, evitar amostra hemolisada ou

lipêmica para teste por quimiluminescência. A amostra é estável na temperatura ambiente,

pode ser congelada para estocagem por longo tempo e ser recongelada (NACHREINER e

REFSAL, 2004).

Detecção de autoanticorpos

Testes para a presença de autoanticorpos de tireoglobulina circulante (TgAA), T3 e T4

no soro de cães podem ser usados para identificar a presença de tireoidite linfocítica, para

explicar resultado incomum de T3 e T4 e possivelmente como um teste de rastreio genético

para hipotireoidismo causado por tireoidite linfocítica (NELSON, 2007).

Os autoanticorpos desenvolvem-se predominantemente contra tireoglobulina

circulante (Tg), esta é a proteína que fornece estímulo antigênico. T3 e T4 não são por si só

antigênicos, entretanto autoanticorpos contra T3 e T4 têm sido relatados (FINORA e GRECO,

2007).

A presença de anticorpos antitireóide em um cão com hipotireoidismo sugere que a

etiologia seja tireoidite linfocítica. Essa é uma doença hereditária razão pela qual a

reprodução destes animais não é recomendada, porém o manejo clínico para ambos (tireoidite

linfocítica e atrofia idiopática) é o mesmo. Os efeitos clínicos de alta concentração de

anticorpos antitireoide (antitireoglobulina: TGAA, anti T4: T4AA, anti T3: T3AA) para o

diagnóstico de hipotireoidismo é incerto. Esses anticorpos indicam tireoidite, mas nem todos

os cães com tireoidite são hipotireoideos e nem todos progridem para hipotireoidismo embora

predisponha (MELIÁN, 2008).

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O teste de ELISA para detecção de TgAA é específico, sensível e comercialmente

disponível. Resultado positivo de TgAA para tireoidite linfocítica não fornece informações

sobre a severidade e natureza progressiva do processo inflamatório, mas aumenta a suspeita

de hipotireoidismo se T4 e fT4 estiverem baixos. A identificação de TgAA apóia o

diagnóstico de tireoidite linfocítica se o cão tiver sinais clínicos, achados físicos e os testes da

função tireoidiana forem coerentes com a doença. Os testes de função tiroidal deverão ser

repetidos entre 3 a 6 meses se estiverem normais. Autoanticorpos de T4 e T3 são

interpretados de maneira similar (NELSON, 2007).

Vacinação recente pode causar aumento de anticorpos antitireoglobulina sem

associação com hipotireoidismo. Autoanticorpos tem reação cruzada com testes de T4. Isto é

clinicamente importante porque quando autoanticorpos estão presentes o nível de T4 pode

estar elevado dentro do limite de referencia ou dentro do limite de hipertireoidismo causando

perda de diagnóstico de hipotireoidismo (FINORA e GRECO, 2007).

Resposta ao tratamento com levotiroxina

A resposta ao tratamento tem sido sugerida como método de diagnóstico válido em

cães quando há suspeita de hipotireoidismo. Um inconveniente do tratamento como

diagnóstico é que causa longo tempo de supressão da secreção endógena de TSH o qual pode

afetar os testes da tireóide. Portanto, a confirmação do diagnóstico pode dificultar, sendo

necessário esperar de 6 a 8 semanas após cessar o tratamento. A resposta ao tratamento deve

ser após um período de tratamento de 2 a 3 meses com a resolução de todos os sinais clínicos

como apatia, letargia, alopecia, anemia e hipercolesterolemia (MELIÁN, 2008).

2.3.4.3 Outros Exames

Ultrassonografia

Recentemente foi provado que a avaliação da ecografia glândula da tireóide pode ser

útil na diferenciação entre hipotireoideos e eutiroideos (ambos sadios ou doentes) (MELIÁN,

2008).

Cães eutiroideos apresentam parênquima da tireóide homogêneo o que parece

isoecoico ou hiperecoico enquanto cães hipotireoideos apresentam parênquima heterogêneo e

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hipoecoico e com tamanho menor e cápsula irregular. O volume da tireóide continua a

decrescer durante o tratamento com levotiroxina (MELIÁN, 2008).

Gamagrafia

Esse método da medicina nuclear foi usado durante décadas em medicina humana para

detecção de hiperfunção de nódulos da tireóide. É especialmente útil para diferenciar cães

hipotireoideos e eutireoideos. A principal desvantagem é a disponibilidade limitada

(MELIÁN, 2008).

Biópsia de pele

A validade da biópsia de pele é controversa porque muitas mudanças cutâneas não são

específicas e várias endocrinopatias podem demonstrar alterações semelhantes. Entretanto,

certos achados incluindo espessamento dérmico, mixedema e vacuolização do músculo eretor

do pelo são as principais características do hipotireoidismo (FINORA e GRECO, 2007).

Hipotireoidismo congênito

O diagnóstico de hipotireoidismo congênito em cães é baseado nos sinais clínicos que

suportam a patologia clínica e testes da função tireoidiana. Cães normais com idade entre 5 e

6 semanas tem a concentração de tT4 no soro de duas a três vezes maiores que o cão adulto,

portanto, tT4 de 2 µg/dL é normal para um cão adulto e será baixo para um filhote de seis

semanas de idade e indica disfunção da tireóide. Com o advento da dosagem de TSH canino

endógeno permitiu a diferenciação entre hipotireoidismo primário e secundário (deficiência

de TSH). Será esperado que filhotes com hipotireoidismo primário tenham elevada

concentração de TSH endógeno (GRECO, 2001).

2.3.5 Tratamento

Uma vez diagnosticado a doença pode ser facilmente controlada com suplementação

hormonal (FINORA, GRECO, 2007).

O tratamento do hipotireoidismo congênito em filhotes de cães e gatos é similar ao

tratamento do adulto (22-44 µg/kg no cão e 11 µg/kg uma vez ao dia no gato). Quando o

tratamento for realizado precocemente resultará na normalização do físico (GRECO, 2001).

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2.3.5.1 Monitoramento do tratamento

A concentração sérica de T4 é usada para monitorar a levotiroxina no tratamento do

hipotireoidismo no cão e o metimazole no tratamento do gato com hipertireoidismo,

Normalmente o teste é realizado de 4 a 6 horas após a administração quando recebem a

mediação duas vezes ao dia e 4 a 6 horas antes quando são medicados uma vez ao dia. Se a

dose e o regime posológico estão apropriados, a concentração de T4 deve ficar entre 2,0 e 4,5

µg/dL (25 a 60 nmol/L). Se o teste for realizado antes deste período a concentração de T4 não

deve estar no seu pico. Se esta medida estiver abaixo de 2,0 µg/dL (25 nmol/L) a decisão de

ajustar a dose deve se basear na história, no exame físico, no horário do exame em relação à

administração da levotiroxina e se o cão consumiu a medicação. A dose de levotiroxina deve

diminuir sempre que a dosagem for maior que 5 µm/dL (65 nmol/L) independentemente da

presença de tireotoxicose (NELSON, 2007).

TSH sérico pode ser usado para monitorar terapia do hipotireoidismo principalmente

quando antes do tratamento o TSH estava aumentado. O TSH menor que 0,6 ng/mL é

favorável a adequado tratamento de levotiroxina enquanto valor maior que este sugere falta de

supressão da pituitária e há necessidade de ajustar a dose de levotiroxina (NELSON, 2007).

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3 CONCLUSÃO

O diagnóstico das doenças que envolvem transtornos da tireóide é complexo e exige

do clínico profundo conhecimento da patofisiologia das disfunções da tireóide.

É essencial proceder a uma boa investigação do histórico clínico, exame físico

detalhado e requisitar exames de rotina para eliminar e/ou tratar doenças concorrentes.

Após esses procedimentos e eliminação de doenças concorrentes se finaliza o

diagnóstico com os testes da função da tireóide.

A porção metabolicamente ativa do hormônio da tireóide ou fT4 pode ser mensurada

por diferentes métodos, mas a mensuração de fT4 pelo método de diálise de equilíbrio atenua

as influências de anticorpos antitireoglobulina e sofre menor influencia de drogas. É o teste

que tem a melhor precisão.

Propõe-se com este trabalho que se a suspeita clínica de hipotireoidismo persistir

depois de realizados exames laboratoriais de rotina e descartada a possibilidade de doenças

concorrentes se proceda diretamente o teste de fT4. A realidade econômica da maioria dos

nossos clientes impossibilita vários exames como T4 e cTSH como triagem para depois

proceder o fT4. A intenção desse protocolo seria diminuir custos e abreviar o tempo de

diagnóstico.

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