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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS LETRAS E ARTES PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ESTUDOS DA LINGUAGEM DOUTORADO EM ESTUDOS DA LINGUAGEM LUCÉLIO DANTAS DE AQUINO REPRESENTAÇÕES DISCURSIVAS DE LULA NAS CAPAS DAS REVISTAS ÉPOCA E VEJA NATAL RN 2015

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE

CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS LETRAS E ARTES

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ESTUDOS DA LINGUAGEM

DOUTORADO EM ESTUDOS DA LINGUAGEM

LUCÉLIO DANTAS DE AQUINO

REPRESENTAÇÕES DISCURSIVAS DE LULA NAS CAPAS DAS REVISTAS

ÉPOCA E VEJA

NATAL – RN

2015

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Lucélio Dantas de Aquino

REPRESENTAÇÕES DISCURSIVAS DE LULA NAS CAPAS DAS REVISTAS

ÉPOCA E VEJA

Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação em

Estudos da Linguagem do Centro de Ciências

Humanas, Letras e Artes da Universidade Federal do

Rio Grande do Norte – UFRN como requisito

parcial para obtenção do título de Doutor em

Estudos da Linguagem, área de concentração em

Linguística Aplicada.

Orientador: Prof. Dr. Luís Álvaro Sgadari Passeggi

NATAL – RN

2015

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Seção de Informação e Referência

Catalogação da Publicação na Fonte. UFRN / Biblioteca Central Zila Mamede

Aquino, Lucélio Dantas de.

Representações discursivas de Lula nas capas das revistas Época e Veja / Lucélio

Dantas de Aquino. – Natal, RN, 2015.

230 f.

Orientador: Luís Álvaro Sgadari Passeggi.

Tese (Doutorado em Estudos da Linguagem) – Universidade Federal do Rio

Grande do Norte. Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes – Programa de Pós-

graduação em Estudos da Linguagem.

1. Linguística do texto - Tese. 2. Análise Textual dos Discursos - Tese. 3.

Representações discursivas - Tese. 4. Lula – Tese. 5. Gênero de discurso capa de

revista – Tese. I. Passeggi, Luís Álvaro Sgadari. II. Título.

RN/UF/BCZM CDU 81’42

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Lucélio Dantas de Aquino

REPRESENTAÇÕES DISCURSIVAS DE LULA NAS CAPAS DAS REVISTAS

ÉPOCA E VEJA

Esta tese foi julgada adequada para a obtenção do grau de Doutor em Estudos da Linguagem,

área de concentração em Linguística Aplicada, e aprovada em sua fase final pelo Programa de

Pós-Graduação em Estudos da Linguagem da Universidade Federal do Rio Grande do Norte –

UFRN.

Natal, 05 de agosto de 2015.

Banca Examinadora:

_________________________________________________

Prof. Dr. Luís Álvaro Sgadari Passeggi

Orientador e presidente

Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN)

_________________________________________________

Profa. Dra. Maria Eliete de Queiroz

Membro externo

Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (UERN)

_________________________________________________

Prof. Dr. Gilton Sampaio de Souza

Membro externo

Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (UERN)

_________________________________________________

Profa. Dra. Maria das Graças Soares Rodrigues

Membro interno

Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN)

_________________________________________________

Profa. Dra. Marise Adriana Mamede Galvão

Membro interno

Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN)

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DEDICATÓRIA

Muitas são as representações que buscamos construir, mas,

nenhuma delas é tão importante quanto aquelas que nos

acompanham ao longo da vida. Representações reais de amor,

carinho, sabedoria, discernimento e experiência.

Na construção textual e real da vida em que referenciações,

predicações, modificações e demais elementos podem

construir representações, apego-me as figuras que mais têm a

acrescentar na construção das minhas representações

discursivas: filho, batalhador, estudioso, feliz e amado...

PAI e MÃE, a vocês dedico este trabalho.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço a Deus por toda a força que me concedeu nesta longa jornada.

A minha família, meu porto seguro e maior incentivadora de minha formação pessoal

e profissional.

Ao Programa de Pós-Graduação em Estudos da Linguagem do Departamento de

Letras da Universidade Federal do Rio Grande do Norte e a todos os meus mestres,

especialmente aqueles que colaboraram diretamente para a construção deste trabalho.

Ao meu orientador, Luís Álvaro Sgadari Passeggi, pelo olhar teórico sempre crítico e

visionário, bem como pelo seu apoio aos meus interesses de pesquisa.

Aos examinadores da qualificação e da defesa que dedicaram seu tempo à leitura desta

pesquisa e que, decididamente, cooperaram para a realização de um trabalho mais coerente e

coeso.

Aos meus amigos/irmãos Alexandro Gomes e Adriana Jales por todos os momentos

em que estiveram ao meu lado, torcendo por mim e contribuindo com discussões linguísticas

e extralinguísticas enriquecedoras.

À professora Medianeira Souza que tão sabiamente me conduziu pelo caminho da

Multimodalidade Discursiva, permitindo com que os conhecimentos obtidos por suas

orientações refletissem no meu trabalho de doutoramento.

Aos presentes que Deus me deu em forma de amigos e que muito acrescentaram na

fase final do meu trabalho: Alex Nascimento, Luzia e Mário Sérgio. Obrigado por

compartilharem comigo noites de tensões e de alegrias.

À família Rodrigues que me acolheu como um dos seus, especialmente a Dulcinéia,

Mayara, Maxwell e Jane Fonseca. Obrigado por tudo.

Aos meus colegas de doutorado da turma 2011.1, especialmente às amigas Anahy

Zamblano, Rosângela Bernardino e Elis Betânia Costa.

Aos meus colegas do Instituto Metrópole Digital pelo incentivo e camaradagem e, em

especial, a minha chefinha Apuena Gomes por me incentivar e torcer pelo meu sucesso.

Ao Programa REUNI pelo ano de concessão de bolsa para atuar junto ao componente

curricular Práticas de Leitura e Escrita na Escola de Ciências e Tecnologia.

A minha paixãozinha, Saphyra Aquino. Obrigado pela companhia de tantas noites.

Enfim, a todos que direta ou indiretamente contribuíram ou participaram deste

momento da minha formação.

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AULA DE PORTUGUÊS

A linguagem

na ponta da língua,

tão fácil de falar

e de entender.

A linguagem

na superfície estrelada de letras,

sabe lá o que ela quer dizer?

Professor Carlos Góis, ele é quem sabe,

e vai desmatando

o amazonas de minha ignorância.

Figuras de gramática, esquipáticas,

atropelam-me, aturdem-me, sequestram-me.

Já esqueci a língua em que comia,

em que pedia para ir lá fora,

em que levava e dava pontapé,

a língua, breve língua entrecortada

do namoro com a prima.

O português são dois; o outro, mistério.

(Carlos Drummond de Andrade)

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RESUMO

Esta tese se propõe a analisar as representações discursivas de Lula nas capas das revistas

Época e Veja, considerando os elementos verbovisuais que constituem o gênero de discurso

capa de revista. Nesse sentido, buscamos descrever e interpretar as representações discursivas

(Rds), tomando como fundamentação teórica a Análise Textual dos Discursos – ATD,

elaborada por Jean-Michel Adam (2011a), concentrando nossa atenção no nível semântico do

texto, isto é, na dimensão que nos permite compreender as Rds vigentes em um texto. Para a

discussão sobre as Rds e suas categorias de análise – referenciação, predicação, modificação,

relação e localização espacial e temporal –, partimos dos estudos de Grize sobre as operações

lógico-discursivas (1990, 1996), até chegarmos aos estudos que discutem questões

linguísticas, textuais e discursivas em enunciados concretos, tais como Castilho (2010),

Rodrigues; Passeggi; Silva Neto (2010), Neves (2011), Rodrigues et al. (2012), Passeggi

(2001; 2012), Queiroz (2013), entre outros. Além desses, amparamo-nos na Multimodalidade

Discursiva para darmos conta da verbovisualidade presente na capa de revista (KRESS; van

LEEUWEN, 2006; DIONISIO, 2011; DIONISIO; VASCONCELOS, 2013). Através de uma

pesquisa de abordagem qualitativa com apoio quantitativo, de tipo documental, realizamos

com base no método dedutivo-indutivo a descrição e interpretação do corpus (SEVERINO,

2007; CHIZZOTTI, 2010; OLIVEIRA, M., 2013), a fim de reconstruirmos as Rds de Lula. O

corpus é constituído por quarenta e uma capas de revistas, sendo dezessete da revista Época e

vinte e quatro da revista Veja. As capas datam da candidatura em que Lula foi eleito o

Presidente do Brasil, no ano de 2002, ao último ano de mandato após a reeleição em 2006, no

ano de 2010, ou seja, um período de nove anos. Com base na análise realizada podemos

afirmar que as revistas Época e Veja constroem diversas Rds de Lula, tais como: candidato;

candidato eleito; presidente; presidente eleito; presidente reeleito; governante e membro de

partido político; político; petista/sigla do PT; aliado de governos internacionais; cúmplice e

participante em escândalos de corrupção; amigo, irmão, primo, sobrinho, pai, parente e

homem; além de outras que se desdobram a partir destas por intermédio dos modificadores

dos referentes e processos, pelos próprios processos e conexões e analogias realizadas sobre o

objeto de discurso Lula. Não obstante, a reconstrução dessas Rds se deram pela descrição e

interpretação das escolhas linguístico-textuais e discursivas que as revistas fazem para

produzir as proposições-enunciados, bem como pelas escolhas das imagens e demais recursos

visuais, todas elas operando co(n)textualmente articuladas para produzir efeitos de sentido

desejados pelas revistas. Em conclusão, as Rds verificadas exigem uma reflexão, descrição e

interpretação acerca da referenciação, da predicação, da relação e da localização

espaciotemporal que só foram possíveis pela análise textual-discursiva do arranjo verbovisual

que compõe o texto do gênero de discurso capa de revista.

Palavras-chave: Análise Textual dos Discursos. Representações discursivas. Lula. Gênero de

discurso capa de revista. Época e Veja.

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RESUMEN

Esta investigación se propone a analizar las representaciones discursivas de Lula en las

portadas de las revistas Época y Veja, considerando los elementos verbo-visuales que

constituyen el género de discurso portada de revista. En ese sentido, buscamos describir e

interpretar las representaciones discursivas (Rds), tomando como fundamentación teórica el

Análisis Textual de los Discursos – ATD, teoría elaborada por Jean-Michel Adam (2011a),

concentrando nuestra atención en el nivel semántico del texto, o sea, en la dimensión que nos

permite comprender las Rds en un texto. Para la discusión sobre las Rds y sus categorías de

análisis – referenciación, predicación, cambio, relación y localización espacial y temporal –,

partimos de los estudios de Grize sobre las operaciones lógico-discursivas (1990, 1996), hasta

los estudios que discuten cuestiones lingüísticas, textuales y discursivas en enunciados

concretos, tales como Castilho (2010), Rodrigues; Passeggi; Silva Neto (2010), Neves (2011),

Rodrigues et al. (2012), Passeggi (2001; 2012), Queiroz (2013), entre otros. Además, nos

amparamos en la Multimodalidad Discursiva en lo que se refiere a la verbo-visualidad

presente en la portada de revista (KRESS; van LEEUWEN, 2006; DIONISIO, 2011;

DIONISIO; VASCONCELOS, 2013). A partir de una investigación de abordaje cualitativo

bajo un apoyo cuantitativo, de tipo documental, realizamos con base en el método deductivo-

inductivo la descripción e interpretación del corpus (SEVERINO, 2007; CHIZZOTTI, 2010;

OLIVEIRA, M., 2013), con el fin de reconstruir las Rds de Lula. El corpus está formado por

cuarenta y una portadas de revistas, diecisiete de la revista Época y veinticuatro de la revista

Veja. Las portadas son del período de la candidatura en la que Lula fue electo Presidente de

Brasil, en el año de 2002, hasta el último año de mandato tras la reelección en 2006, en 2010,

o sea, un período de nueve años. Con base en el análisis realizado podemos afirmar que las

revistas Época y Veja construyen diversas Rds de Lula, tales como: candidato; candidato

electo; presidente; presidente electo; presidente reelecto; gobernante y miembro de partido

político; político; petista/sigla del PT; aliado de gobiernos internacionales; cómplice y

participante en escándalos de corrupción; amigo, hermano, primo, sobrino, padre, familiar y

hombre; además de otras que se desarrollan a partir de estas por intermedio de los

modificadores de los referentes y procesos, por los propios procesos y conexiones y analogías

realizadas sobre el objeto de discurso Lula. No obstante, la reconstrucción de esas Rds

ocurren a partir de la descripción e interpretación de las elecciones lingüístico-textuales y

discursivas que las revistas realizan para producir las proposiciones-enunciados, así como por

las elecciones de las imágenes y demás recursos visuales, todas ellas operando

co(n)textualmente articuladas para producir los efectos de sentido que quieren las revistas. A

modo de conclusión, las Rds verificadas exigen una reflexión, descripción e interpretación

sobre la referenciación, la predicación, la relación y la localización espaciotemporal que

solamente son posibles por el análisis textual-discursivo de la relación verbo-visual que

compone el texto del género de discurso portada de revista.

Palabras-clave: Análisis Textual de los Discursos. Representaciones discursivas. Lula.

Género de discurso portada de revista. Época y Veja.

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ABSTRACT

This doctoral dissertation proposes to analyze the discursive representations of Lula, as they

appear on the covers of the magazines, Época and Veja, targeting the verbo-visual elements

that comprise the genre, magazine covers. In this way, we seek to describe and interpret the

discursive representations (Drs), using a theoretical framework based on the Textual

Discourse Analysis – TDA, developed by Jean-Michel Adam (2011a), focusing on the

semantic level of the text, that is, on the dimension that allows for the comprehension of Drs

present in a text. For a discussion about the Drs and their categories of analysis – referencing,

predication, modification, relation and spatial localization and time – we use as a starting

point, the study by Brize about the logical-discursive operations (1990, 1996), and continue

through the studies that discuss linguistic, textual, and discursive operations in concrete

utterances, such as Castilho (2010), Rodrigues; Passeggi; Silva Neto (2010), Neves (2011),

Rodrigues et al. (2012), Passeggi (2001; 2012), Queiroz (2013), among others. In addition, we

rely on Multimodal Discourse for the verbo-visual aspects present on magazine covers

(KRESS; van LEEUWEN, 2006; DIONISIO, 2011; DIONISIO; VASCONCELOS, 2013).

Using a research approach that is qualitative with quantitative support, and which is

documental, and based on deductive-inductive methods, we describe and interpret a corpus

(SEVERINO, 2007; CHIZZOTTI, 2010; OLIVEIRA, M., 2013), aiming to reconstruct Lula’s

Drs. The corpus is comprised of forty one magazine covers – sixteen from Época and twenty

four from Veja. The covers date from the election period in which the candidate, Lula, was

elected President of Brazil in 2002, the last mandate after his re-election in 2006, and in the

year 2010 – a period of 9 years. Based on the analysis carried out, we can affirm that the

magazines, Época and Veja, construct diverse Drs by Lula, such as: candidate; elected

candidate; governing member and member of a political party; re-elected president; politics;

workers party acronym PT; international governments as allies; accomplices and participants

in scandals of corruption; friend, brother, cousin, nephew, father, parent and man; among

others that unfold throughout these by the mediation of the modifiers of the referents and

processes, and by the very processes and connections, and analogies made on the object of

discourse, Lula. Nonetheless, the reconstruction of these is derived from the description and

interpretation of the textual-linguistic and discursive choices that the magazines make to

produce the proposition-utterances, as well as by the choices of images and other visual

resources, all operating as co(n)textually articulated to produce the magazine’s desired effect.

In conclusion, the Drs verified demand the reflection, description and interpretation of the

referencing, prediction, the relationship and spatial-temporal localization, which was only

possible through the textual-discursive analysis of the verbo-visual arrangements that

comprise texts in the genre – magazine cover.

Keywords: Textual Discourse Analysis. Discoursive Respresentations. Lula. The Genre –

magazine cover. Época and Veja.

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Esquema 1 – O lugar da Linguística do Texto na Análise dos Discursos .................. 33

Esquema 2 – Níveis da Análise Textual dos Discursos ................................................ 37

Esquema 3 – Nivel da Análise do Discurso: o lugar do(s) gêneros(s) ......................... 40

Esquema 4 – As três dimensões da proposição-enunciado ......................................... 57

Esquema 5 – A esquematização na situação de interlocução (GRIZE, 1996, p. 68) . 61

Esquema 6 – Os papeis temáticos numa perspectiva semântica ................................ 67

Figura 1 – Interdiscurso na capa de revista ................................................................. 91

Figura 2 – A estrutura composicional do gênero de discurso capa da revista ........... 94

Figuras 3 e 4 – Capas de revistas sem imagens e chamadas secundárias .................. 96

Figura 5 – Capa de revista sem chamada principal .................................................... 96

Figura 6 – Diálogo entre a recategorização e a imagem principal na construção da

referenciação ...................................................................................................................

105

Figura 7 – O sentido do modificador “desanimado” pela imagem principal ............ 106

Figura 8 – Recategorização de Lula como “sombra” pela imagem principal ........... 107

Figura 9 – Capa de Época com a categorização de Lula como “Presidente” ............ 108

Figura 10 – Capa de Época com a categorização de Lula como “Lula da Silva” ..... 109

Figura 12 – A contribuição da imagem principal para a predicação de futuro

“serão” .............................................................................................................................

116

Figuras 13 e 14 – Predicação e sentido nas capas da revista Época ........................... 118

Figura 15 – Conexão por meio da imagem e texto ....................................................... 123

Figuras 16 e 17 – Conexão verbovisual e mecanismos de foricidade no texto das

capas de Época ...............................................................................................................

124

Figuras 18 e 19 – Referenciações de Lula construídas apenas pela imagem

principal ...........................................................................................................................

129

Figura 20 – Capa de Veja em que a imagem principal é categorizada pela

nominalização “Lula” .....................................................................................................

131

Figura 21 – Capa de Veja em que a imagem principal é categorizada pela

nominalização “Presidente” ...........................................................................................

133

Figura 22 – Contribuições da verbovisualidade para a interpretação dos sentidos

na cadeia referencial .......................................................................................................

137

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11

Figura 23 – Arranjo verbovisual como construtor da Rd de Lula ............................. 140

Figuras 24 e 25 – A contribuição da imagem para a Rd de Lula como presidente

que não quer deixar a presidência .................................................................................

150

Figura 26 – Contribuição da imagem principal para a Rd de Lula como

danificado por fatores externos .....................................................................................

152

Figura 27 – Contribuição da imagem principal para a Rd de Lula como

danificado por fatores externos .....................................................................................

155

Figura 28 – Contribuição visual para a construção da metáfora Lula-de-mel ......... 162

Figura 29 – Verbovisualidade na construção da metáfora de Lula em analogia

com ex-presidente Collor ................................................................................................

163

Figura 30 – Logotipo de Collor na campanha a presidente da República em 1989 . 163

Figuras 31 e 32 – A conexão por meio da imagem nas capas de Veja ....................... 165

Figura 33 – A localização temporal por meio de recursos verbovisuais .................... 170

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LISTA DE QUADROS

Quadro 1 – Os três grupos da representação discursiva (Rd) .................................... 63

Quadro 2 – Exemplo de constituição básica da predicação ........................................ 69

Quadro 3 – Exemplo de aspectualização e elemento ................................................... 71

Quadro 4 – Exemplos de comparação e metáfora ....................................................... 74

Quadro 5 – Advérbios e/ou expressões adverbiais de tempo e lugar ......................... 75

Quadro 6 – Relações de metodologia entre os trabalhos sobre Rds ........................... 80

Quadro 7 – Total de capas que compõe o corpus da pesquisa .................................... 86

Quadro 8 – Código utilizado para a análise das capas de revista .............................. 86

Quadro 9 – Código utilizado para a análise dos enunciados das capas ..................... 87

Quadro 10 - Nominalizações do objeto de discurso presentes em capas em que o

referente dá-se pela imagem principal ..........................................................................

100

Quadro 11 – Referenciações do tema Lula nas capas da revista Época .................... 101

Quadro 12 – Referenciações de Lula na função de participante sujeito nas

proposições-enunciados ..................................................................................................

102

Quadro 13 – Referenciações de Lula na função de participante complemento nas

proposições-enunciados ..................................................................................................

103

Quadro 14 – Recategorizações do referente categorizado como Lula ....................... 104

Quadro 14 – Recategorizações do referente Lula da Silva ......................................... 110

Quadro 15 – Processos utilizados pela revista Época para a construção da Rd de

Lula ..................................................................................................................................

111

Quadro 17 – Conjugação dos processos utilizados pela revista Época para a

construção da Rd de Lula ..............................................................................................

112

Quadro 18 – Predicações com processos de ação ......................................................... 113

Quadro 19 – Predicações com processos de estado ...................................................... 115

Quadro 20 – Processos de ação que materializam estados sobre o referente Lula ... 117

Quadro 21 – Representações discursivas de Lula por meio das predicações............. 119

Quadro 22 – Conectivos usados nos textos da revista Época ...................................... 120

Quadro 23 – Conectivos aditivos usados nos textos da revista Época ....................... 121

Quadro 24 – Conectivos integrantes usados nos textos da revista Época .................. 121

Quadro 25 – Conectivos adversativos usados nos textos da revista Época ............... 121

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13

Quadro 26 – Conectivo final usado nos textos da revista Época ............................. 122

Quadro 27 – Estabelecimento de conexão do elemento fórico “ele” com a imagem

principal (referente) ........................................................................................................

125

Quadro 28 – Estabelecimento de conexão por meio do possessivo “sua” .................. 125

Quadro 29 – Localizadores espaciais e temporais nas capas da revista Época ......... 126

Quadro 30 – Formas de referenciação do objeto de discurso Lula nas capas da

revista Veja ......................................................................................................................

127

Quadro 31 – Referenciações (categorizações e recategorizações) do tema Lula nas

capas da revista Veja ......................................................................................................

130

Quadro 32 – Categorizações do tema tratado pela nominalização “Lula” nas

capas de Veja ...................................................................................................................

131

Quadro 33 – Categorizações do tema tratado pela nominalização “presidente” nas

capas de Veja ...................................................................................................................

134

Quadro 34 – Referenciações de Lula na função de participante sujeito nas capas

de Veja .............................................................................................................................

135

Quadro 35 – Recategorizações do referente Lula nas capas da revista Veja ............ 138

Quadro 36 – Processos utilizados pela revista Veja para a construção da Rd de

Lula ..................................................................................................................................

142

Quadro 37 – Conjugação dos processos utilizados pela revista Veja para a

construção da Rd de Lula ..............................................................................................

144

Quadro 38 – Predicações em torno do eixo semântico de candidato ......................... 146

Quadro 39 – Predicações em torno do eixo semântico de presidente ........................ 148

Quadro 40 – Predicações sobre o referente Lula no eixo semântico de escândalos

de corrupção ....................................................................................................................

151

Quadro 41 – Conectivos usados nos textos da revista Veja ........................................ 156

Quadro 42 – Conectivos aditivos usados nos textos da revista Veja .......................... 157

Quadro 43 – Conectivos integrantes usados nos textos da revista Veja .................... 159

Quadro 44 – Conectivos adversativos usados nos textos da revista Veja .................. 160

Quadro 45 – O elemento fórico “ele” nos textos das capas de Veja ........................... 165

Quadro 46 – Estabelecimento de conexão por elementos fóricos possessivos nas

capas de Veja ...................................................................................................................

166

Quadro 47 – Localização espacial nas capas de Veja .................................................. 168

Quadro 48 – Localização temporal nas capas de Veja ................................................ 169

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14

Quadro 49 – Representações discursivas de Lula nas capas das revistas .................. 172

Quadro 50 – Síntese dos recursos utilizados nas categorias semânticas das Rds de

Lula ..................................................................................................................................

175

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ADF – Análise do Discurso Francesa

ANPOLL – Associação Nacional de Pós-Graduação em Letras e Linguística

ATD – Análise Textual dos Discursos

Ep – Época

EUA – Estados Unidos da América

FD – Formação Discursiva

GT LTAC – Grupo de Trabalho Linguística do Texto e Análise da Conversação

im(A) – Imagem do locutor

im(B) – Imagem do alocutário

im(T) – Imagem do tema tratado

LT – Linguística do Texto

N1 – Nível 1

N2 – Nível 2

N3 – Nível 3

N4 – Nível 4

N5 – Nível 5

N6 – Nível 6

N7 – Nível 7

N8 – Nível 8

PdV – Ponto de Vista

PdVs – Pontos de Vista

PT – Partido dos Trabalhadores

Rd – Representação discursiva

Rds – Representações discursivas

TIC – Tecnologias de Informação e Comunicação

Ve - Veja

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................... 18

2 DA LINGUÍSTICA DO TEXTO À ANÁLISE TEXTUAL DOS DISCURSOS ........... 23

2.1 CONSIDERAÇÕES GERAIS SOBRE A LINGUÍSTICA DO TEXTO ........................... 23

2.1.1 Linguística do Texto no Brasil ........................................................................................ 26

2.2 ANÁLISE TEXTUAL DOS DISCURSOS ........................................................................ 32

2.2.1 Níveis do texto e do discurso na Análise Textual dos Discursos .................................... 35

2.2.2 Da linguagem como ação aos gêneros de discurso ......................................................... 40

2.2.2.1 Multimodalidade discursiva: parte integrante do gênero ............................................. 43

2.2.3 O gênero de discurso capa de revista .............................................................................. 47

3 REPRESENTAÇÃO DISCURSIVA ................................................................................. 56

3.1 DA PROPOSIÇÃO-ENUNCIADO AO NÍVEL SEMÂNTICO DO TEXTO: A NOÇÃO

DE REPRESENTAÇÃO DISCURSIVA ................................................................................. 56

3.1.1 Da esquematização aos grupos da Representação discursiva .......................................... 60

3.1.2 Categorias semânticas para análise da Representação discursiva ................................... 64

3.1.2.1 Referenciação ............................................................................................................... 66

3.1.2.2 Predicação ..................................................................................................................... 69

3.1.2.3 Modificação .................................................................................................................. 71

3.1.2.4 Relação ......................................................................................................................... 72

3.1.2.5 Localização ................................................................................................................... 74

4 QUESTÕES TEÓRICO-METODOLÓGICAS DA PESQUISA .................................... 77

4.1 CONTEXTUALIZAÇÃO DA PESQUISA ....................................................................... 77

4.2 ASPECTOS METODOLÓGICOS DA PESQUISA .......................................................... 80

4.3 APRESENTAÇÃO DO CORPUS ..................................................................................... 84

4.4 PROCEDIMENTOS DE ANÁLISE .................................................................................. 86

5 ANÁLISES DAS REPRESENTAÇÕES DISCURSIVAS DE LULA NAS CAPAS DE

ÉPOCA E VEJA ...................................................................................................................... 89

5.1 CAPA DE REVISTA: CONSIDERAÇÕES SOBRE O NÍVEL DO DISCURSO ............ 89

5.2 CAPA DE REVISTA: CONSIDERAÇÕES SOBRE O NÍVEL DO TEXTO .................. 93

5.3 RDS DE LULA NAS CAPAS DA REVISTA ÉPOCA ..................................................... 97

5.3.1 Referenciação e seus modificadores ................................................................................ 98

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5.3.2 Predicação e seus modificadores ................................................................................... 111

5.3.3 Relação .......................................................................................................................... 119

5.3.4 Localização espacial e temporal .................................................................................... 126

5.4 RDS DE LULA NAS CAPAS DA REVISTA VEJA ....................................................... 127

5.4.1 Referenciação e seus modificadores .............................................................................. 128

5.4.2 Predicação e seus modificadores ................................................................................... 141

5.4.3 Relação .......................................................................................................................... 156

5.4.4 Localização espacial e temporal .................................................................................... 167

5.5 SÍNTESE DA ANÁLISE DAS RDS DE LULA NAS CAPAS DE REVISTA .............. 171

6 CONCLUSÃO .................................................................................................................... 174

REFERÊNCIAS ................................................................................................................... 179

ANEXOS ............................................................................................................................... 187

ANEXO A: CAPAS DA REVISTA ÉPOCA ...................................................................... 188

ANEXO B: CAPAS DA REVISTA VEJA .......................................................................... 206

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CAPÍTULO 1

1 INTRODUÇÃO

Desde 2008, com a publicação, em português, da obra A linguística textual: uma

introdução à análise textual dos discursos, de Jean-Michel Adam, bem como pela

constituição do Grupo de Pesquisa em Análise Textual dos Discursos, do Departamento de

Letras da Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN, estudos vêm sendo

empreendidos, a fim de descrever, interpretar e analisar práticas discursivas concretas.

Com o objetivo de contribuir teórica e metodologicamente para a consolidação da

Análise Textual dos Discursos, as pesquisas realizadas por esse grupo têm descrito dados

textuais diversos em suas distintas dimensões: sequencial-composicional, enunciativa,

argumentativa e semântica.

A tese Representações discursivas de Lula nas capas das revistas Época e Veja

apresenta-se como mais um estudo desenvolvido junto a esse grupo, com o propósito de

consolidar uma das abordagens possíveis da Análise Textual dos Discursos (ATD), a saber: o

nível semântico do texto. Para tanto, tomamos como objeto de estudo o gênero de discurso1

capa de revista.

Esta pesquisa está concentrada na grande área de Linguística, Letras e Artes e, mais

especificamente, na área da Linguística, haja vista pertencermos à linha de pesquisa Análise

linguística de textos: teoria e descrição, com a qual se visa à descrição linguística de textos de

diferentes gêneros, desenvolvendo questões teóricas, metodológicas e empíricas, com base na

Análise Textual dos Discursos.

Nessa ótica, considerando o grande leque de subáreas que a Linguística contempla,

dentre as quais estão a Linguística do Texto e a Análise do Discurso, correntes teóricas que

fundamentam a formulação da teoria proposta por Jean-Michel Adam, é que desenvolvemos

essa pesquisa de doutoramento, orientada pelo Prof. Dr. Luis Álvaro Sgadari Passeggi.

Nesse contexto, nossa pesquisa se justifica por apresentar relevância científica e

acadêmica para os estudos realizados no âmbito das pesquisas com o objeto texto, aos quais

incorporamos os pressupostos do estudo verbovisual, especificamente, da Multimodalidade

1 Embora as pesquisas linguísticas contemplem nomenclaturas distintas para tratar da categoria gênero, tais como

gênero discursivo (BAKHTIN, 2003), gênero de texto (BRONCKART; 2003), gênero textual (MARCUSCHI,

2008; 2011a), entre outras, adotamos, em nossa tese, a nomenclatura utilizada por Adam (2011a), a saber:

gêneros de discurso.

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Discursiva. Isto posto, além de considerarmos os fenômenos linguístico-textuais e discursivos

inerentes ao estudo do texto, adicionamos a perspectiva visual como forma de descrição e

compreensão das representações discursivas do tema tratado no gênero de discurso capa de

revista. Desse modo, acreditamos que esta será uma contribuição para a área de pesquisa em

textos multimodais que, segundo alguns estudiosos, é um dos novos desafios teóricos da

Linguística Textual a serem enfrentados neste século (BENTES; ALVES FILHO; RAMOS,

P., 2010; RAMOS, P., 2012).

Outros fatores que justificam nossa pesquisa estão associados ao corpus selecionado

para a análise. O primeiro deles diz respeito à escolha das revistas, a partir das quais

extraímos os textos, isto é, decidimos por usar as revistas Veja e Época devido ao fato de elas

serem por nós estudadas desde a elaboração de nossa dissertação de mestrado, em que

analisamos mecanismos verbovisuais de interação no gênero editorial. Além disso, esses dois

veículos de informação semanal são os mais vendidos no Brasil, revelando sua importância no

contexto do jornalismo de revista brasileiro.

O segundo fator diz respeito à escolha do gênero de discurso capa de revista, uma vez

que sempre foi de nosso interesse e curiosidade compreender a construção de sentidos no

texto de capas de revista, além de ser ele é um gênero que ainda não foi estudado nas

pesquisas em Análise Textual dos Discursos, o que representa o caráter inovador de nossa tese

frente aos trabalhos desenvolvidos nesse nicho acadêmico-científico.

O terceiro motivo está associado ao objeto de discurso sobre o qual buscamos

compreender as representações discursivas construídas por Veja e Época em suas capas, ou

seja, Lula. A escolha desse tema se deu pela entrada emblemática de Lula na presidência em

2002, permanecendo por oito anos (dois mandatos) como presidente da República do Brasil.

A figura de Lula foge a tradicionalidade dos presidentes brasileiros anteriores, pois sua

origem e história de vida foram marcas que o consagraram como o político que realizou um

feito histórico na trajetória política do país. Primeiro, por ele ter sido um ex-operário e

retirante nordestino que foi eleito presidente; segundo, pelas expectativas que cercaram o seu

governo, devido sua trajetória de vida; e, terceiro, por ser esta a primeira vez que as forças de

esquerda tomariam controle da nação. Acresça-se a isso o fato de ele ter sido reeleito em 2006

e fechar o seu governo em 2010 com índice 80% de aprovação pessoal, conforme dados da

pesquisa do Ibope encomendada pela CNI (Confederação Nacional da Indústria).

Diante disso, como o estudo das representações discursivas nos permite reconstruir o

as representações (imagens) do locutor, dos alocutários e do tema tratado, optamos por essa

abordagem teórica para sabermos como uma das figuras mais importantes do cenário político

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atual foi representada discursivamente pelo jornalismo de revista, em especial, em um texto

multimodal que podemos chamar de “convite ao leitor” – o gênero de discurso capa de

revista.

Por tais questões, assumimos, aqui, a proposta de desenvolvimento de uma pesquisa

que está situada no âmbito geral da Linguística do Texto, tomando referência em Marcuschi

(2009 [1983]), Koch (2009), Fávero e Koch (2012), Fávero (2012), entre outras. E, mais

especificamente, na Análise Textual dos Discursos, orientada por Adam (2011a) e estudos

baseados em suas propostas, tais como Rodrigues, Passeggi e Silva Neto (2010), Passeggi et

al. (2010), Ramos, M. (2011), Rodrigues et al. (2012), Oliveira, K. (2013), Queiroz (2013),

entre outros. Dentre os estudos mencionados, a representação discursiva é focalizada em

diferentes textos verbais: discurso político, carta-testamento, textos de vestibulandos e pré-

vestibulandos, cartas pessoais, etc.

Em nosso estudo, ao mesmo tempo em que temos a intenção de contribuir para as

pesquisas em Análise Textual dos Discursos, buscamos contemplar uma questão que não tem

sido observada nos trabalhos até então realizados, isto é, buscamos apresentar o texto em sua

complexidade, considerando os elementos verbais e visuais que constituem textos

multimodais. Isto é, além de considerarmos os elementos linguístico-discursivos (palavras

e/ou expressões), consideramos as imagens que compõem a capa de revista e, por

conseguinte, buscamos compreender a contribuição destas para a (re)construção das

representações discursivas de Lula.

Para tanto, respaldamo-nos na teoria da Multimodalidade Discursiva, tomando como

princípio geral os postulados de Kress (2003), Kress e van Leeuwen (2006), bem como os

estudos de seus contemporâneos brasileiros (DIONISIO, 2011; DIONISIO;

VASCONCELOS, 2013), entre outros. Vale ressaltar, portanto, que a Multimodalidade

Discursiva toma como pano de fundo a Semiótica Social (van LEEUWEN, 2004; 2006), uma

teoria que visa a estudar o texto, considerando os mais variados modos semióticos que

acompanham o modo verbal.

À vista disso, nosso intuito é responder as seguintes questões de pesquisa:

Que representações discursivas de Lula são construídas pelas revistas Época e Veja no

gênero de discurso capa de revista?

Como as imagens contidas nas capas de revista corroboram para a análise e construção

das representações discursivas de Lula?

Quais as diferenças ou semelhanças entre os recursos verbovisuais utilizadas para

construir as representações discursivas de Lula nas capas das revistas Época e Veja?

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Com o propósito de responder a essas questões, delineamos como objetivo geral dessa

tese analisar as representações discursivas do tema Lula nas capas das revistas Época e Veja,

considerando os elementos verbovisuais que constituem o referido gênero de discurso.

De modo mais específico, os objetivos que refletem as três perguntas realizadas

anteriormente são: a) descrever e interpretar os recursos verbovisuais que são utilizados pelas

revistas Época e Veja para construir as representações discursivas de Lula no gênero de

discurso capa de revista; b) compreender o papel das imagens presentes nas capas das revistas

Época e Veja e a sua contribuição para a construção das representações discursivas do tema

tratado; e c) comparar os recursos verbovisuais utilizados pelas revistas Época e Veja para a

construção das representações discursivas de Lula.

Para tal fim, realizamos uma pesquisa de abordagem qualitativa, que por intermédio da

técnica descritivo-interpretativista, permite-nos descrever e interpretar o texto das capas de

revista, com vistas a reconstruir as representações discursivas de Lula presente nas capas de

Época e Veja. Em face disto, utilizamos as seguintes categorias de análise: referenciação e

seus modificadores; predicação e seus modificadores; relação; e, localização espacial e

temporal.

Diante da caminhada realizada, no CAPÍTULO 1: Introdução, situamos

contextualmente o nosso estudo, bem como as questões de pesquisa e os objetivos que

delimitam o problema a ser estudado e, por conseguinte, apresentamos resumidamente as

demais partes que constituem este fazer acadêmico e científico.

No CAPÍTULO 2: Da Linguística do Texto à Análise Textual dos Discursos, iniciamos

a discussão teórica que fundamenta este trabalho. Para tanto, realizamos um breve percurso

teórico da Linguística do Texto, começando pelos estudos europeus até chegarmos às

primeiras publicações brasileiras que focalizaram esse ramo teórico da Linguística, bem como

apresentamos as perspectivas atuais de estudo do texto, oral e escrito, com base na obra

Linguística do texto e análise da conversação: panorama das pesquisas no Brasil, de Bentes

e Leite (2010). Em seguida, verticalizamos nossa atenção para a Análise Textual dos

Discursos, proposta teórico-metodológica de análise de textos concretos, elaborada por Adam

(2011a), a partir da qual refletimos sobre os pressupostos gerais dessa corrente. Nesse capítulo

também apresentamos o nosso conceito de texto, o que entendemos por gêneros de discurso e

os modos de linguagem utilizados na produção destes.

No CAPÍTULO 3: Representação discursiva, discutimos sobre o nível semântico do

texto, bem como apresentamos as categorias que servem de fundamento teórico-metodológico

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para a análise da construção e reconstrução das representações discursivas em textos

concretos.

No CAPÍTULO 4: Questões teórico-metodológicas da pesquisa, contextualizamos o

nosso trabalho no âmbito das produções em Análise Textual dos Discursos, especificamente

aquelas que se ocupam do estudo das representações discursivas pautadas em textos

concretos, a fim de mapearmos as orientações metodológicas que se tem seguido nas

pesquisas sobre essa temática. A partir disso, apresentamos a abordagem de pesquisa, o

método, o corpus e os procedimentos de análise elencados para a análise das representações

discursivas de Lula nas capas das revistas.

No CAPÍTULO 5: Análise das representações discursivas de Lula nas capas das

revistas Época e Veja, realizamos a descrição e interpretação dos elementos textuais que se

fazem presentes nas capas de revista para, enfim, compreendermos como são construídas as

representações discursivas de Lula. Neste momento, efetivamos a análise tanto a partir dos

elementos linguísticos quanto dos visuais, haja vista defendermos a corroboração desses

modos de linguagem para a construção das representações discursivas do tema tratado nas

capas das revistas Época e Veja. Além disso, realizamos a análise com base em cada uma das

revistas, a começar pela revista Época e, por conseguinte, a revista Veja. Da análise de Veja,

apresentamos as comparações das representações discursivas, bem como dos recursos

verbovisuais, a fim de expormos semelhanças e diferenças entre as formas de construção das

representações erigidas por ambos os suportes (revistas).

Ao final, no CAPÍTULO 6: Conclusão, retomamos os objetivos dessa pesquisa com o

intuito de discutirmos os resultados alcançados, o que pode, a nosso ver, contribuir para novas

pesquisas que se voltem para a análise textual-discursiva, mais especificamente as que

venham a tratar de representações discursivas, bem como para o discurso multimodal –

tendências que cada vez mais recebem atenção no estudo das práticas discursivas

contemporâneas.

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CAPÍTULO 2

2 DA LINGUÍSTICA DO TEXTO À ANÁLISE TEXTUAL DOS DISCURSOS

Neste capítulo, apresentamos os pressupostos teóricos gerais que fundamentam este

trabalho. Para tanto, partimos da discussão sobre a Linguística do Texto2 – LT e seus

fundamentos epistemológicos, os quais sustentam os estudos sobre o texto, desde a década de

sessenta, no exterior, e depois disso no Brasil para, então, chegarmos aos postulados de Jean-

Michel Adam acerca de uma teoria sobre Análise Textual dos Discursos – ATD. Em seguida,

verticalizamos a discussão sobre a linguagem como ação, buscando refletir sobre os gêneros

de discurso enquanto instâncias sociointeracionais de materialização do discurso.

2.1 CONSIDERAÇÕES GERAIS SOBRE A LINGUÍSTICA DO TEXTO

No século XX, com a consolidação da Linguística enquanto ciência da linguagem

(LYONS, 1982), a figura de Ferdinand de Saussure passou a ser centro no estudo dos

fenômenos linguísticos, sendo estes observados a partir da descrição e análise da língua –

objeto de estudo da Linguística. Com o passar do tempo, o estudo imanente da língua cedeu

espaço para a dimensão social, pragmática e discursiva da linguagem, ultrapassando os limites

da frase – unidade complexa de análise linguística.

As ideias do mestre genebrino, organizadas por Charles Bally e Albert Sechehaye no

Curso de Linguística Geral (SAUSSURE, 2006), obra póstuma publicada no ano de 1916,

contribuíram para a formalização teórico-metodológica da ciência linguística. Com o passar

do tempo, essas ideias possibilitaram o surgimento de diversas correntes teóricas ou

ramificações da Linguística. Vale mencionar que essas correntes constituíram-se em

perspectivas ou de concordância com as ideias defendidas por Saussure ou de divergência

com algum princípio exposto no Curso.

Por esse motivo, podemos afirmar que, a partir do século XX, a pesquisa linguística se

dividiu em dois tipos: a formalista e a funcionalista. Em síntese, a corrente formalista

2 Por uma questão de manutenção terminológica, usamos, ao longo desse trabalho, a terminologia Linguística do

Texto, haja vista a possibilidade de também chamar essa corrente teórica de Linguística Textual ou Linguística

de Texto.

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enfatizava a forma, entendendo a língua como um sistema, uma estrutura, independente das

intenções de uso e da situação de comunicação. A corrente funcionalista, por sua vez,

compreende a língua em uma perspectiva sociointeracionista e funcional, isto é, ao mesmo

tempo em que se observa a forma, observa-se a função, haja vista estudar a língua em

situações reais de comunicação (WILSON, 2010).

Esse segundo tipo de pesquisa linguística, o paradigma funcionalista como é chamado

pelos estudiosos da linguagem, fez surgir diversas escolas linguísticas, a saber: a

sociolinguística, o funcionalismo, a análise do discurso, a pragmática, a linguística do texto,

entre outras. Como se pode notar, os preceitos saussurianos possibilitaram a observação de

um mesmo objeto por olhares diferentes. Todavia, algumas dessas correntes, na constituição

de seus reais interesses de estudo, foram além dos limites da língua.

A Linguística do Texto (LT), uma dessas vertentes de estudo linguístico, antes de ser

percebida como parte do seio funcionalista, seguiu diferentes orientações (estruturalista e

gerativista, por exemplo), até consolidar-se como corrente teórica.

Fávero e Koch (2012, p. 15), na obra Linguística textual: introdução, afirmam que a

LT “começou a desenvolver-se na década de 1960, na Europa e, de modo especial, na

Alemanha”. Segundo as autoras, a proposta desse ramo linguístico é tomar, não mais a

palavra ou a frase como objeto de estudo, “mas sim o texto, por serem os textos a forma

específica de manifestação da linguagem” (Ibid., p. 15).

Muitos são os estudiosos que contribuíram para o desenvolvimento da LT na Europa.

De acordo com Fávero e Koch (2012, p. 15), “destacam-se autores como Heildoph, Hartung,

Isenberg, Thümmel, Hartmann, Harweg, Petöfi, Dressler, Van Dijk Schmidt, Kummer,

Wunderlich, entre outros, cujos trabalhos se desenvolvem, sobretudo, em equipes,

concentradas em núcleos importantes”.

Fávero (2012) afirma que os principais centros de desenvolvimento da LT foram

Münster, Colônia, Berlin Est, Constança e Bielefeld. Nas palavras da autora, houve um

verdadeiro “boom” com as produções desses centros. “O impacto foi muito grande e um

levantamento bibliográfico feito em 1973 por Dressler e Schmidt documentava quase 500

títulos, além de números especiais, monográficos, de várias revistas” (Ibid., p. 225).

Algo que devemos ressaltar é que a LT não se desenvolveu de forma homogênea.

Segundo Marcuschi (2009 [1983], p. 16), essa corrente, tal como a conhecemos,

“desenvolveu-se rapidamente e em várias direções”. Para o autor, o que, afinal, une as

diferentes propostas teóricas sob a alcunha de Linguística do Texto é “um dogma de fé: o

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texto é uma unidade linguística hierarquicamente superior à frase. E uma certeza: a gramática

da frase não dá conta do texto” (MARCUSCHI, 2009 [1983], p. 16).

Nessa perspectiva, sem buscarmos fazer uma exaustiva discussão acerca da LT na

Europa, apresentamos os principais momentos que abrangem as preocupações teóricas

naquela ocasião. Acerca disso, Bentes (2004, p. 246) afirma que:

Não há consenso entre os autores de que houve uma certa cronologia na

passagem de um momento para o outro. Podemos afirmar, no entanto, que

houve não só uma gradual ampliação do objeto de análise da Linguística

Textual, mas também um progressivo afastamento da influência teórico-

metodológica da Linguística Estrutural saussureana [...].

Pelas palavras de Bentes (2004), compreendemos que não houve um período

específico de ascensão de proposta teórica de estudo da LT em detrimento de outro, o que se

pode constatar é que as fases dessa corrente caracterizam-se muito mais como uma mudança

tipológica do que uma mudança de ordem cronológica. Afinal, essas fases refletem os

principais momentos na passagem da teoria da frase à teoria do texto.

De acordo com Fávero e Koch (2012, p. 18, grifos das autoras), subsidiadas pelos

postulados de Conte (1977), temos três momentos: “o da análise transfrástica”; “o da

construção das gramáticas textuais”; e “o das construções das teorias do texto”. De forma

resumida, Bentes (2004, p. 246-247, grifos da autora) afirma que:

[...] em um primeiro momento, o interesse predominante voltava-se para a

análise transfrástica, ou seja, para fenômenos que não conseguiam ser

explicados pelas teorias sintáticas e/ou pelas teorias semânticas que ficassem

limitadas ao nível da frase; em um segundo momento, com a euforia

provocada pelo sucesso da gramática gerativa, postulou-se a descrição da

competência linguística do falante, ou seja, a construção de gramáticas

textuais; em um terceiro momento, o texto passa a ser estudado dentro de seu

contexto de produção e a ser compreendido não como um produto acabado,

mas como um processo, resultado de operações comunicativas e processos

linguísticos em situações sociocomunicativas; parte-se, assim, para a

elaboração de uma teoria do texto.

Algo que devemos considerar, baseando-nos nesses momentos é que, para cada um

deles, houve um conceito de texto predominante. No primeiro, o texto era visto como um

conjunto sucessivo de unidades linguísticas, constituído “mediante a concatenação

pronominal ininterrupta”, conceito orientado pelos estudos de Harweg (FÁVERO; KOCH,

2012, p. 18). No segundo momento, ainda buscando mostrar o texto como portador de

propriedades que diziam respeito ao próprio sistema abstrato da língua, “postulava-se o texto

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como unidade teórica formalmente construída, em oposição ao discurso, unidade funcional,

comunicativa e intersubjetivamente construída” (BENTES, 2004, p. 249, grifos da autora). O

terceiro momento, situado na virada pragmática3, por sua vez, compreende o texto como uma

“unidade de comunicação/interação humana” (KOCH, 2009, p. 13).

Nesse panorama, cabe dizer que a LT passou por diversos momentos, nos quais,

orientações teóricas e perspectivas acerca do texto revelaram matizes diversos desse objeto:

ora observado em sua microestrutura, ou seja, elementos de coesão; ora considerado com base

na ideia de ato de comunicação, focalizando a coerência; ora observado em sua vinculação a

contextos reais de uso da língua(gem) – perspectivas sociocomunicativa e interacionista.

Esse foi o entorno que originou estudos em LT pelo mundo e que, de forma particular,

aguçou o interesse de brasileiros por estudar o objeto texto. Dito isso, cabe fazermos um breve

percurso da história da LT no Brasil, começando pelos primeiros trabalhos publicados, suas

acepções teóricas e os resultados de todo um empreendimento linguístico de estudo do texto.

Desse modo, para Koch (2009, p. XV-XVI), no introito do livro Introdução à linguística

textual: trajetória e grades temas:

[...] a Linguística Textual percorreu um longo caminho até chegar ao

momento atual. Aqueles que não acompanharam a sua trajetória estão longe

de poder avaliar o que hoje essa disciplina vem se propondo como objeto de

investigação e a contribuição que seu estudo vem dando em prol de um

melhor conhecimento de como se realiza a produção textual do sentido.

2.1.1 Linguística do Texto no Brasil

No Brasil, após, aproximadamente vinte anos de estudos em LT na Europa,

começaram a ser produzidos os primeiros trabalhos em LT. O primeiro trabalho de que se tem

notícia é o do Prof. Dr. Ignácio Antônio Neis, da PUCRS, intitulado Por uma gramática

textual. Em 1983, são publicadas as duas obras que são referências, até os dias de hoje, em se

tratando de LT. São elas: Linguística do texto: o que é e como se faz, de Luiz Antônio

Marcuschi e Linguística Textual: introdução, de Leonor Lopes Fávero e Ingedore Grunfeld

Villaça Koch (FÁVERO, 2012).

3 A virada pragmática foi um movimento linguístico que data da segunda metade do século XX. Nela,

priorizava-se a interação social, isto é, o uso e o funcionamento da língua em situações concretas no cotidiano

dos falantes. Logo, nesse período, o foco nas funções sociocomunicativas das produções linguísticas

sobrepunham-se ao enfoque formal.

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No texto de Neis (1981), constatou-se que a sua preocupação era baseada em dois

aspectos: “a construção de gramáticas do texto e a importância dada por ele à coerência, vista

então como propriedade do texto” (FÁVERO, 2012, p. 227). Assim como os linguistas da

Europa, Neis sustentou seus posicionamentos de formulação de uma gramática do texto,

amparando-se na linguística gerativa, pois, para ele “é na linguística gerativa que se encontra

um conjunto de procedimentos metodológicos e de descrições empíricas que servirão de base

sólida para se proceder à extensão da gramática frasal para uma gramática textual” (NEIS,

1981 apud FÁVERO, 2012, p. 228).

De acordo com Fávero (2012), seguindo a orientação de linguistas como Isenberg,

Neis não faz distinção entre os conceitos de coesão e coerência, chegando a chamá-los,

respectivamente, de coerência microestrutural e coerência macroestrutural, haja vista ser a

coerência a noção fundamental da gramática textual.

Algo que devemos mencionar é que, embora pouco seja mencionado nos estudos da

LT, Fávero (2012, p. 229) afirma que “o trabalho de Neis foi realmente importante e pouco se

faz referência a ele”.

A obra de Fávero e Koch – Linguística Textual: introdução – foi publicada em 1983.

Nela, as autoras apresentam a LT desde a sua origem, as fases pelas quais a LT passou, bem

como conceituam o objeto de estudo desse “novo ramo da linguística” (FÁVERO; KOCH,

2012, p. 15). Para elas, as concepções de texto apresentadas pelos estudiosos da LT são

variadas, o que possibilitou “além de análise transfrástica e gramática do texto, outras

denominações tais como Textologia (Harseg), Teoria de Texto (Schimdt), Translinguística

(Barthes), Hipersintaxe (Palek), Teoria da estrutura do texto – Estrutura do mundo (Petöfi)

etc.” (FÁVERO; KOCH, 2012, p. 16, grifos das autoras).

Além disso, as autoras buscam diferenciar texto e discurso, a fim de esclarecer

confusões criadas pelas diferentes concepções que esses dois termos agregam. Segundo elas:

“As diferentes concepções de texto e discurso acabaram por criar uma confusão entre dois

termos, ora empregados como sinônimos, ora usados para designar entidades diferentes”

(FÁVERO; KOCH, 2012, p. 31, grifos das autoras). Em conclusão a essa querela linguística:

É lícito concluir, portanto, que o termo texto pode ser tomado em duas

acepções: texto, em sentido lato, designa toda e qualquer manifestação da

capacidade textual do ser humano (quer se trate de um poema, quer de uma

música, uma pintura, um filme, uma escultura etc.), isto é, qualquer tipo de

comunicação realizado por meio de um sistema de signos. Em se tratando da

linguagem verbal, temos o discurso, atividade comunicativa de um falante,

em uma situação de comunicação dada, englobando o conjunto de

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enunciados produzidos pelo locutor (ou por este e seu interlocutor, no caso

do diálogo) e o evento de sua enunciação. O discurso é manifestado,

linguisticamente, por meio de textos (em sentido estrito). Neste sentido, o

texto consiste em qualquer passagem, falada ou escrita, que forma um todo

significativo, independente de sua extensão. Trata-se, pois, de uma unidade

de sentido, de um contínuo comunicativo contextual que se caracteriza por

um conjunto de relações responsáveis pela tessitura do texto – os critérios ou

padrões de textualidade, entre os quais merecem destaque especial a coesão

e a coerência. (FÁVERO; KOCH, 2012, p. 34, grifos das autoras).

Em sendo assim, para as autoras, o texto deve ser compreendido como uma unidade de

sentido, capaz de estabelecer a comunicação entre interlocutores. Para tanto, esse texto é

composto por elementos que são responsáveis por sua organização. O discurso, por sua vez,

tanto pode ser considerado na perspectiva de texto (discurso político, discurso midiático etc.),

isto é, materializado, como na perspectiva de algo mais amplo, ou seja, o entorno discursivo

que permite a proliferação de enunciados concretos, os textos.

A continuação do trabalho das autoras consiste em fazer apresentar um panorama, em

perspectiva, de momentos significativos da LT e, como elas mesmas afirmam: realizar uma

resenha dos trabalhos de alguns autores da Europa, especificamente de linguistas do campo da

gramática textual (FÁVERO; KOCH, 2012).

Marcuschi (2009 [1983]), na obra Linguística do Texto: o que é e como se faz?, ao

partir das definições de texto, desde a imanência do sistema linguístico até a noção de texto

como mapeamento cognitivo, busca definir o que é a Linguística do Texto e os principais

aspectos “observáveis na produção, construção e recepção de textos” (MARCUSCHI, 2009

[1983], p. 38).

Para ele, a LT é uma linha investigativa interdisciplinar, o que requer categorias e

métodos de diversas naturezas. Dessa forma, o autor propõe que a LT seja vista “como o

estudo das operações linguísticas e cognitivas reguladoras e controladoras da produção,

construção, funcionamento e recepção de textos orais e escritos” (Ibid., p. 35). Este

posicionamento do autor perdura até hoje nos estudos do texto. Desse modo, a LT deve ser

concebida além do texto pelo texto, ou seja, devemos tomar o texto como objeto de estudo e

considerá-lo a partir de todas as relações que o constituem, quer sejam elas textuais,

cognitivas, discursivas e/ou pragmáticas.

Vale ressaltar que Marcuschi (Ibid., p. 34) entendia o texto como “uma unidade

comunicativa atual realizada tanto ao nível do uso como ao nível do sistema. Tanto o uso

como o sistema têm suas funções essenciais”. Para o autor, o texto é sempre situacionalmente

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condicionado, haja vista ser uma entidade concreta e situacional, ou seja, a cada situação

comunicativa o texto atualiza-se para cumprir funções inerentes ao contexto no qual é

produzido, não podendo ser tomado, então, como uma entidade abstrata.

Seguindo a linha dessas publicações, empreende-se no país a divulgação da LT e

constitui-se uma grande área de pesquisa, abordando o texto como ponto de partida para a

análise textual. Todavia, como afirma Marcuschi (2009 [1983], p. 34, grifos do autor):

“embora toda análise textual deva ter como ponto de partida a entidade linguística concreta –

o texto – que encontra pela frente, não deve parar aí”.

Nessa perspectiva, atualmente, a LT vem-se tornando, segundo Koch (2009, p. 175),

“um domínio multi- e transdisciplinar, em que se busca compreender e explicar essa entidade

multifacetada que é o texto”4. Para tanto, ao entender esse domínio como inerente à LT,

teorias como a Pragmática, a Análise da Conversação, a Teoria da Argumentação, a Análise

do Discurso, entre outras, passaram a dialogar com vistas a alcançar os objetivos que as

movem. Todas unificadas pelo mesmo objeto: o texto.

Sob a luz desse campo relacional de teorias e áreas do conhecimento com a LT,

recentemente foi publicada a obra Linguística de texto e análise da conversação: panorama

das pesquisas no Brasil (BENTES; LEITE, 2010). Organizado por Ana Cristina Bentes e

Marli Quadros Leite, o livro é dividido em quatro partes que coadunam os interesses dos

pesquisadores e suas filiações teóricas. O compêndio constitui-se de uma organização que

visa a celebrar os 25 anos de pesquisa do Grupo de Trabalho Linguística do Texto e Análise

da Conversação (GT LTAC) da Associação Nacional de Pós-Graduação em Letras e

Linguística (ANPOLL). Além disso, esse livro é posto como uma homenagem a Luiz Antônio

Marcuschi, “que era a alma do grupo” (KOCH, 2010, p. 39).

Na primeira parte, Histórico do Grupo de Trabalho Linguística de Texto e Análise da

Conversação da Associação Nacional de Pós-Graduação em Letras e Linguística (ANPOLL),

dividida em dois capítulos, traça-se o percurso das duas áreas de investigação. Aqui, daremos

destaque ao capítulo de Ingedore G. V. Koch – Uma história, dois campos de estudo, um

homenageado... –, no qual a estudiosa relata a contribuição de Marcuschi para a construção e

consolidação do Grupo de Trabalho (GT) e, desenha o perfil dos membros que o compõem.

Segundo a autora, pelos trabalhos desenvolvidos ao longo do tempo no grupo, na área

da LT e da Análise da Conversação (AC), pode-se dizer que:

4 O pensamento exposto por Koch (2009) está associado às relações da Linguística do Texto tanto com outras

disciplinas quanto com outras áreas do conhecimento. Dentre estas áreas, a linguista aponta “a Neurologia, a

Neuropsicologia, as Ciências da Cognição, a Ciência da Computação e, por fim, com a Teoria da Evolução

Cultural” (KOCH, 2009, p. 175).

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Em consequência do grande interesse pela dimensão sociointeracionista da

linguagem e dos processos afeitos a ela, surge (ou ressurge) uma série de

questões pertinentes para a agenda de estudos da linguagem e, é claro, para a

agenda de estudos do GT LTAC, dentre as quais as diversas formas de

progressão textual, a dêixis textual, o processamento sociocognitivo do

texto, a multimodalidade, os gêneros, inclusive os da mídia eletrônica, a

comparação interlingual e intermidiática de gêneros textuais (textologia

contrastiva), as questões ligadas ao hipertexto, intertextualidade, entre várias

outras. (KOCH, 2010, p. 44-45).

Para ela, estas são apenas algumas questões com as quais o GT LTAC vêm-se

dedicando a estudar, “considerando-se sempre as diferenças de direcionamento teórico e de

seleção de objetos de estudo de cada subgrupo dentro do GT” (KOCH, 2010, p. 45).

Na segunda parte, Estudos sobre conversação, interação e língua falada, os dois

capítulos que a compõe destinam-se a tratar de questões relativas à AC, a saber: i) a interação

em diversos contextos, concebendo a conversação “como um processo que implica

participação conjunta de interlocutores em uma conversação casual” (FÁVERO et al., 2010,

p. 92); e, ii) considerando o uso do vocabulário gírio na sociedade contemporânea, no qual,

Preti (2010) apresenta um estudo sobre a inclusão e exclusão social, tomando como objeto de

estudo a gíria de grupo.

Na terceira parte, Estudos do texto e do discurso: teorias e modelos, concentram-se

três capítulos. O primeiro capítulo tem como objetivo apresentar “duas teorias linguísticas que

privilegiam a argumentação como objeto de estudo” (BARBISAN et al., 2010, p. 171), a

Semiolinguística do Discurso, de Patrick Charaudeau, e a Teoria da Argumentação, de

Oswald Ducrot. As autoras reconhecem existir pontos de contato e de distanciamento entre as

duas teorias, porém, a partir da análise de um texto jornalístico opinativo – o artigo de opinião

“O gigante de barro”, de autoria de Carlos Heitor Cony –, elas afirmam o seguinte:

Vale, por fim, reforçar que o distanciamento entre as duas teorias, que

lançam olhares distintos sobre o discurso, não constitui entrave para

relacioná-las, partindo-se do fato de que se ocupam do mesmo objeto e de

uma mesma afirmação, a da necessidade de se investigar o emprego da

língua a partir da enunciação que aí se produz. Esses elementos parecem

suficientes para justificar as reflexões e análises sob as duas perspectivas

teóricas [...]. (BARBISAN et al., 2010, p. 223).

O segundo capítulo dessa terceira parte ocupa-se de duas dimensões específicas do

texto: os processos referenciais e o tópico discursivo. Segundo os autores, o propósito do

trabalho consiste em muito mais do que mostrar como eles articulam-se e como se

interdependem, “mas também de salientar a importância que têm para uma análise da

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coerência textual, numa perspectiva sociocognitivo-discursiva de par inseparável

texto/discurso” (CAVALCANTE et al., 2010, p. 254).

Seguindo nessa mesma linha de raciocínio, ou seja, do texto e do discurso como

dimensões inter-relacionadas, o terceiro capítulo5 dessa parte também discute o texto escrito,

tomando por fundamento teórico os postulados de Jean-Michel Adam, linguista francês que

formulou a Análise Textual dos Discursos. Sem esgotar todas as questões discutas por Adam

(2008), os autores buscam especificar os níveis de análise propostos pelo autor e examinam,

com mais detalhes, as unidade textuais: “proposições, períodos, sequências e planos de texto”

(PASSEGGI et al., 2010, p. 264).

Verticalizando as discussões na sequência argumentativa, os autores direcionam suas

atenções para o nível da enunciação, isto é, a reponsabilidade enunciativa/ponto de vista.

Assim sendo, os estudiosos ressaltam que: “Deve ter ficado claro, entretanto, o esforço de

síntese e de articulação de sua proposta [Análise Textual dos Discursos], assim como sua

abertura para aprofundamentos e desenvolvimentos” (PASSEGGI et al., 2010, p. 309).

Os três últimos capítulos que integram a obra constituem a quarta parte, Aplicações e

desenvolvimentos dos estudos sobre interação e texto. O foco dessa peça é direcionado às

questões de ensino de textos, orais e escritos. Gomes-Santos et al. (2010), em seu capítulo

versam sobre o ensino a partir da incorporação das teorias do texto. Para tal, focalizam a

oralidade, atentando para as práticas de leitura, de escrita e de reflexão gramatical. Com base

no estudo por eles realizado, os autores acreditam “que um dos desafios da LT com relação ao

ensino ainda seja este [a definição de com quais gêneros trabalhar], tendo em vista o que seria

pertinente para desenvolver as competências tanto para a produção quanto para a

compreensão de textos” (Ibid., p. 349).

Marquesi et al. (2010) discutem no nono capítulo da obra uma temática bastante

contemporânea, haja vista tratarem da LT na relação com as TIC (Tecnologias de Informação

e Comunicação). As autoras esboçam no capítulo uma reflexão sobre “como os meios digitais

propiciados pelo desenvolvimento das TIC podem, dentro de uma visão de leitura e escrita,

ser pensados no/para o ensino” (MARQUESI et al., 2010, p. 355). Em consequência disso, as

autoras afirmam que essa discussão deve permear a formação docente, posto que o uso das

TIC revolucionou as formas de interagir socialmente e, como consequência disso, o professor

tem de saber usar as ferramentas tecnológicas disponíveis, com vistas a favorecer a sua

5 Como esse capítulo constitui-se como referencial teórico de base para o objetivo desta tese, retomamos sua

discussão no tópico seguinte com vistas a complementar a apresentação da Análise Textual dos Discursos e

definição das categorias de análise das representações discursivas.

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prática. Assim sendo, faz-se necessário que o processo de ensino seja desenvolvido “de modo

a propiciar o aprendizado de forma participativa e significativa por meio de atividades que

priorizem uma metodologia centrada na construção do conhecimento pelo aluno”

(MARQUESI et al., 2010, p. 384).

Bentes, Ramos e Alves Filho (2010), no último capítulo, tecem algumas propostas

para abordar três objetos que eles consideram desafiadores no âmbito da LT e ensino. São

eles: as relações entre texto e contexto; a emergência da autoria no curso dos processos de

produção textual; e, a natureza multimodal dos textos escritos. Ao buscar uma análise

integrada desses três objetos, foi-se realizada uma investigação de uma propaganda

institucional, ou seja, um texto multimodal. A partir da análise, percebeu-se que existe a

necessidade de, ao considerar os processos de produção, circulação e recepção dos textos,

alargar o conceito de texto, incluindo neste o contexto. Diante disso, os autores concluem que

os textos:

[...] longe de se restringirem a elementos a partir dos quais o contexto apenas

se organiza, constituem-se como um lugar de interação entre a linguagem, a

cultura e o mundo social vivenciados pelos sujeitos, sendo a autoria e a

multimodalidade elementos constitutivos da arquitetura textual e por meio

dos quais é possível perceber este complexo e dinâmico relacionamento.

(BENTES; RAMOS; ALVES FILHO, 2010, p. 422).

Tudo isso, portanto, reflete a dimensão que tem tomado os estudos do texto, oral ou

escrito. Ora atendo-se ao aspecto textual, ora ao discursivo, ora ao ensino e, até mesmo,

coadunando essas perspectivas. Os estudos que aqui apresentamos ressaltam peculiaridades e

necessidades de novos empreendimentos de pesquisa sobre o objeto texto, o que buscamos

realizar também em nossa tese.

Portanto, na tentativa de traçar o desenho teórico desta pesquisa, dialogamos

diretamente com uma das produções apresentadas em Bentes e Leite (2010), a saber, a da

Análise Textual dos Discursos, orientação teórica que discutimos na subseção a seguir.

2.2 ANÁLISE TEXTUAL DOS DISCURSOS

Na linha de trabalhos que visam a estreitar a relação entre texto e discurso, Jean-

Michel Adam desenvolveu um aparato teórico e metodológico que ele denominou de Análise

Textual dos Discursos, doravante ATD. Acerca disto, o autor afirma que a sua obra inscreve-

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se “na perspectiva de um posicionamento teórico e metodológico que, com o objetivo de

pensar o texto e o discurso em novas categorias, situa decididamente a linguística textual no

quadro mais amplo da análise de discurso” (ADAM, 2011a, p. 24)6.

Para ele, a LT, desde seu surgimento, desenvolveu-se em separado da Análise de

Discurso Francesa (ADF). Em suas palavras, o autor define a LT como “uma teoria da

produção co(n)textual de sentido, que deve fundar-se na análise de textos concretos” (ADAM,

2011a, p. 23). No que concerne a Análise de Discurso, o autor coloca-a como sendo um

campo mais vasto, de onde surgem e prospectam-se as práticas discursivas. Segundo Brait

(2008, p. 18), “considera-se práticas discursivas, portanto, uma produção verbal, visual ou

verbo-visual, necessariamente inserida em determinada esfera, a qual possibilita e dinamiza

sua existência, interferindo diretamente em suas formas de produção, circulação e recepção”.

Desse modo, ao elaborar a ATD, Adam (2011a, p. 43) propõe-se a “articular uma linguística

textual desvencilhada da gramática do texto e uma análise de discurso emancipada da análise

de discurso francesa (ADF)”. Desta forma, contempla-se o texto na relação discursiva de

produção e os efeitos de sentido provenientes do co(n)texto.

Nessa perspectiva, ao afirmar que o que se pretende com a ATD é a análise

co(n)textual do sentido, intenta-se desfazer contradições existentes acerca dessa separação

entre texto e discurso. Não é a toa que, em A linguística textual: uma introdução à análise

textual dos discursos, de Adam (2011a), a LT aparece como parte do arquétipo definidor da

análise de discurso, isto é “como um subdomínio do campo mais vasto da análise das práticas

discursivas” (Ibid., p. 43). Vejamos essa relação no esquema a seguir:

Esquema 1 – O lugar da Linguística do Texto na Análise dos Discursos

Fonte: Esquema 3, Adam (2011a, p. 43).

6 Embora a primeira edição do livro de Jean-Michel Adam tenha sido publicada no ano de 2008, como atesta a

produção de Passeggi et al. (2010), optamos, nesta tese, por utilizar a versão revisada e atualizada do ano de

2011 – 2ª edição.

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De acordo Adam (2011a, p. 44, grifos do autor):

Esse esquema evidencia o jogo complexo das determinações textuais

“ascendentes” (da direita para esquerda) que regem os encadeamentos de

proposições no sistema que constitui a unidade TEXTO – objeto da

linguística textual – e as regulações “descendentes” (da esquerda para

direita) que as situações de interação nos lugares sociais, nas línguas e nos

gêneros dados impõem aos enunciados – objeto da análise de discurso. Sob

o impacto das necessidades de expressão e interação, os enunciados

assumem formas infinitas, mas os gêneros e as línguas intervêm como

fatores de regulação.

Com vistas a definir a ATD, Adam observa que a produção do texto está associada a

aspectos linguísticos (palavras, proposições, períodos e/ou sequências, plano do texto) em

operações de segmentação – descontinuidade (tipografia da escrita, parágrafos, estrofes,

seções e subseções, entonações e/ou movimento dos olhos etc.), vinculadas pelas operações

de ligação “que consistem na construção de unidades semânticas e de processos de

continuidade pelos quais se reconhece um segmento textual” (ADAM, 2011a, p. 64).

Isto posto, é válido ressaltar que o pensamento de Adam pauta-se na intenção de

realizar análises de textos amparadas na realidade material, uma vez que, segundo ele, a ADF

não se ocupa do texto como tal, mas, sim, das condições de produção do texto, entretanto, o

discurso que subjaz a prática discursiva é regulado, textualmente, por instâncias discursivas

como os gêneros de discurso e as línguas (ADAM, 2010). Logo, é a união dos dois lados – o

esquerdo e o direito – que fomentam a formulação da ATD, “a qual passa a entender os

elementos linguísticos do texto integrados aos fenômenos do campo discursivo” (QUEIROZ,

2013, p. 25).

Dessa forma, o pensamento de Adam (2010, p. 10) é de que “a LT deve teorizar as

fronteiras peritextuais ao mesmo tempo integradas e situadas na fronteira da unidade texto. A

LT deve também teorizar as relações entre cotextos inseridos numa organização

(macro)textual agrupando um certo número de textos”, isto é, para se realizar a análise

textual, deve-se partir do material linguístico (cotexto), buscando compreender os efeitos de

sentido que são emanados pelos enunciados. Além disso, fica evidente nas palavras do autor

que o cotexto não deve ser considerado apenas em sua relação mediata, mas, que a análise de

um corpus permite, pela relação interdiscursiva entre cotextos, a atribuição de sentidos

co(n)textuais.

Nesse momento, vale destacar a opção desse autor pela escrita de co(n)texto. Em suas

palavras:

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35

Escrevemos “co(n)texto” para dizer que a interpretação de enunciados

isolados apoia-se tanto na (re)construção de enunciados à esquerda e/ou à

direita (cotexto) como na operação de contextualização, que consiste em

imaginar uma situação de enunciação que torne possível o enunciado

considerado. Essa (re)construção de um co(n)texto pertinente parte,

economicamente, do mais diretamente acessível: o cotexto verbal e/ou o

contexto situacional de interação. [...] na escrita, o cotexto é o dado mais

imediatamente acessível. Se o cotexto está disponível e se mostra suficiente,

o interpretante não vai procurar em outro lugar. (ADAM, 2011a, p. 53).

Para tanto, o texto deve ser tomado em sua complexidade descritiva, demandando e

justificando a necessidade de recorrer a uma teoria que contemple o domínio discursivo desse

objeto, pois, como afirma Adam (2011a, p. 25), por ser o texto um objeto empírico tão

complexo “sua descrição poderia justificar o recurso a diferentes teorias, mas é de uma teoria

desse objeto e de suas relações com o domínio mais vasto do discurso em geral que temos

necessidade”. Então, por essa necessidade, é que ele propõe a ATD.

Na perspectiva dessa teoria, a ATD, para analisarmos um texto, devemos interpretá-lo

como um construto que explícita ou implicitamente manifesta um contexto. Portanto, o apoio

no cotexto precedente e posterior é fundamental para construir os sentidos do que é dito.

Além do mais, os diferentes sentidos assumidos pelas palavras que constituem os enunciados

são determinados pelas formações discursivas, pois, “toda a ação de linguagem inscreve-se,

como se vê, em um dado setor do espaço social, que deve ser pensado como uma formação

sociodiscursiva, ou seja, como um lugar social associado a uma língua e a gêneros de

discurso” (Ibid., p. 63).

Toda essa discussão que se faz em torno da ATD revela a preocupação de Adam, bem

como o propósito de seu empreendimento teórico-metodológico que é reintegrar as teorias do

texto às teorias do discurso, por meio da centralidade da análise textual (ADAM, 2010). Para

compreendermos melhor esse objetivo, na subseção a seguir tratamos dos níveis do texto e do

discurso propostos por Adam (2011a).

2.2.1 Níveis do texto e do discurso na Análise Textual dos Discursos

Nas palavras de Marcuschi (2008, p. 81, grifos do autor): “Não é interessante

distinguir rigidamente entre texto e discurso, pois a tendência atual é ver um contínuo entre

ambos com uma espécie de condicionamento mútuo”. Essa afirmação do autor presentifica a

ideia adotada para a constituição da ATD, uma vez que, para Adam (2010), fazer AD é

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desenvolver um trabalho filológico, isto é, analisar o texto em sua materialidade real,

interpretando os enunciados que o constituem, a fim de compreender os efeitos de sentido na

relação textual-discursiva.

Nesse segmento, Adam (2010, p. 10, grifos do autor) afirma que:

Compreendo que os analistas do discurso não tenham um interesse

excepcional pela questão – decisiva, no entanto – da organização sequencial

dos textos, organização inseparável da organização reticular que os analistas

do discurso descrevem por meios estatísticos. Trata-se de dois princípios tão

complementares quanto repetição e progressão, ligação e segmentação.

O texto e o discurso, nessa perspectiva, não podem ser vistos separadamente como se

preconizava no início dos estudos do texto. O que se observa, considerando a ATD, bem

como os estudos atuais de linguística do texto, é a tendência de afinar cada vez mais as

relações entre o texto e o discurso, considerando-os como aspectos complementares da

atividade enunciativa (COUTINHO, 2004 apud MARCUSCHI, 2008). Em sendo assim,

Marcuschi (2008, p. 81-82) assevera que “o discurso dar-se-ia no plano do dizer (a

enunciação) e o texto no plano da esquematização (a configuração)”, isto porque este seria

considerado como objeto de figura e aquele como objeto de dizer.

A discussão esboçada por Marcuschi (2008), ao tratar da relação entre texto e

discurso, está amparada nas teorizações de Adam (1999), na obra Linguistique Textuelle. Des

genres de discours aux textes. Nela, o autor afirma que a separação do textual e do discursivo

é apenas de caráter metodológico, propondo que ambos sejam tomados de forma articulada, o

que permitiria diluir sensivelmente a distinção entre eles (ADAM, 1999).

Com isso, chegamos, então, a ideia de complementariedade entre o texto o discurso.

Para reforçar esse conceito, Maingueneau apud Adam (1999, p. 40) assevera que “ao falarmos

de discurso articulamos o enunciado sobre uma situação de enunciação singular; ao falar de

texto, colocamos o acento sobre aquilo que lhe confere uma unidade, que o torna uma

totalidade e não um simples conjunto de frases”.

Segundo Marcuschi (2008), essa visão “é importante e tem como consequência o fato

de não frisar apenas um dos lados do funcionamento da língua”, logo, deve-se entender que os

pontos de vista expressos por Maingueneau e adotados por Adam são complementares e,

consequentemente, relevantes para a interpretação do texto como forma de construir o seu

sentido em discurso.

Assim, ao definir a ATD como um construto teórico-metodológico para a análise de

textos concretos, Adam (2011a) propõe um esquema no qual os níveis do texto estão imersos

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nos níveis do discurso. Segundo o autor, esse esquema serve para especificar o esquema que

utilizamos anteriormente para falarmos do lugar da LT na ATD. Vejamos:

Esquema 2 – Níveis da Análise Textual dos Discursos

Fonte: Esquema 4, Adam (2011a, p. 61).

Ao observarmos o esquema 2, podemos compreender o modelo que configura a ATD,

ou melhor, as categorias que são definidas por Adam para a análise textual-discursiva. Com

base em Adam (2011a) e estudiosos contemporâneas, buscamos, a seguir, especificar os

níveis (N) apresentados nesse esquema.

No Nível 1 (N1), segundo Adam (2011a, p. 61), “a ação linguageira [...] realizada por

meio de um texto explica a eficácia da ação sociodiscursiva realizada”. Como se pode ver, o

autor coloca o N1 entre a ação de linguagem e a interação social. Desse modo,

compreendemos que as ações de linguagem refletem os interesses dos enunciadores em um

dado contexto sociocomunicativo de interação. Nesse sentido, Queiroz (2013, p. 36)

acrescenta que, nesse nível discursivo, o sujeito inicia uma ação de linguagem, demonstrando

“quais são os objetivos que o falante possui em produzir o seu discurso, para ser orientado,

argumentativamente, por uma intenção comunicativa”.

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O Nível 2 (N2), por sua vez, tramita entre a interação social e a formação discursiva.

Nele, os enunciados são atualizados pelos enunciadores e postos em circulação. De acordo

com Adam (2011a), constam nesse nível as condições de produção e de recepção dos

enunciados, haja vista as formações discursivas regularem o que vai ser dito pelo enunciador

na ação de linguagem.

Vale ressaltar o que entendemos por formação discursiva (FD). Para tanto, recorremos

a Mussalim (2004, p. 119) ao afirmar que:

[...] uma formação FD determina o que pode/deve ser dito a partir de um

determinado lugar social. Assim, uma formação discursiva é marcada por

regularidades, ou seja, por “regras de formação”, concebidas como

mecanismos de controle que determinam o interno (o que pertence) e o

externo (o que não pertence) de uma formação discursiva. Assim, uma FD,

ao definir-se sempre em relação a um externo, ou seja, em relação a outras

FDs, não pode mais ser concebida como um espaço estrutural fechado. Ela

sempre será invadida por elementos que vêm de outro lugar, de outras

formações discursivas. Neste sentido, o espaço de uma FD é atravessado

pelo “pré-construído”, ou seja, por discursos que vieram de outro lugar (de

uma construção anterior e exterior) e que são incorporados por ela numa

relação de confronto ou aliança.

Constituído pelo que poderíamos denominar de subníveis (socioletos e intertextos), o

Nível 3 (N3) diz repeito ao interdiscurso, isto é, “outros discursos e gêneros” aos quais os

enunciados podem estar relacionados ou fazer uso (PASSEGGI et al. 2010, p. 267). Ainda no

que concerne a esse nível, podemos dizer que, devido a ação de linguagem se increver em um

dado espaço social, essa ação deve ser pensada como um lugar, no qual, por meio da variante

da comunidade de fala (socioleto) e dos gêneros de discurso os sentidos são manifestados

(PASSEGGI et al. 2010; ADAM, 2011a). Além disso, é proveniente desse nível que ocorre o

destaque para os gêneros na ATD. Estes são apresentados como “a (inter)mediação da análise

textual e discursiva, já que o gênero não existe sozinho, ele existe para ser analisado, tendo

em vista um conjunto de textos” (QUEIROZ, 2013, p. 36).

Os níveis 1, 2 e 3 correspondem ao nível discursivo, ou seja, na perspectiva adaniana,

o espaço social em que as ações de linguagem ocorrem, por meio de gêneros de discurso,

regulados pelas formações sociodiscursivas, constituem o contexto de produção e de recepção

dos mas variados textos. Estes, por seu turno, devem ser analisados com base nas

considerações que o nível discursivo autoriza, quer pelo sentidos mediados pelo material

linguístico, quer pelo efeitos de sentido que o discurso evoca com base nas relações

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interdiscursivas. Sendo assim, mais uma vez evidenciamos a necessidade de uma análise que

tenham por fundamento a complementariedade entre texto e discurso.

Os níveis que se seguem estão no nível textual. O Nível 4 (N4), em parceria com o

Nível 5 (N5) constituem o que Rodrigues, Passeggi e Silva Neto (2010) chamam de nível

sequencial-composiconal. Para esses autores, nesse nível:

[...] os enunciados elementares (a proposição-enunciado ou proposição

enunciada) se organizam em períodos, que comporão as sequências. Estas,

por sua vez, agrupam-se conforme um plano de texto. Esse nível focaliza a

estruturação linear do texto, no qual as sequências desempeham um papel

fundamental. (Ibid., p. 152, grifo dos autores).

Para Adam (2011a), as proposições enunciadas, períodos, sequências e planos de texto

formam “o conjunto das operações de textualização”. É nesse sentido que, Passeggi et al.

(2010, p. 267) afirmam que os níveis 4 e 5 “remetem diretamente à

textura/composicionalidade do texto, isto é, de forma ampla, à sua sequencialidade ou

linearidade”.

O Nível 6 (N6) é o nível semântico do texto

7, “apoiado na noção de representação

discursiva e em noções conexas (anáforas, correferências, isotopias, colocações), que

remetem ao conteúdo referencial do texto” (RODRIGUES, PASSEGGI, SILVA NETO, 2010,

p. 152, grifos dos autores).

De acordo com Adam (2012), as razões teóricas que amparam o Nível 7 (N7) advém

da teoria da enunciação (Beveniste) e da teoria do ponto de vista (Rabatel, Nølke), por esse

motivo, discute-se a noção de responsabilidade enunciativa. Segundo Rodrigues, Passeggi e

Silva Neto (2010, p. 152), essa noção “corresponde às ‘vozes’ do texto, à sua polissemia”.

Sobre isso, Adam (2011a, p. 117) afirma que “o grau de responsabilidade enunciativa de uma

proposição é suscetível de ser marcado por um grande número de unidades da língua”. Nesse

sentido, podemos dizer que esse nível se ocupa de compreender os diferentes graus de (não)

assunção dos enuncidos, a partir de elementos como: os índices de pessoas, os dêiticos

espaciais e temporais, os tempos verbais, as modalidades, etc.

Considerado como o enunciado propriamente dito, é com o Nível 8 (N8) que se pode

compreender a força que o enunciado produz, uma vez que ele reflete os atos de discurso e a

7 Por ser a representação discursiva – nível semântico – o foco deste estudo de doutoramento, dedicamos, a

seguir, um tópico exclusivo para esse nível textual, a fim de compreender mais detalhadamente o nosso objeto

teórico. Por esse motivo, não nos alargamos, nesse momento, em sua discussão.

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orientação argumentativa que o enunciador intenciona manifestar por meio do dizer

(afirmações, perguntas, promessas, etc.).

Algo que deve ser ressaltado é que os níveis 6, 7 e 8 “são dimensões constantes ao

longo do texto, tanto em nível local como global, pois cada enunciado elementar do texto

expressa, simultaneamente, um conteúdo semântico, um ponto de vista e uma valor

ilocucionário/argumentativo” (PASSEGGI et al. 2010, p. 268).

Nesse ínterim, no nível textual estão as questões relacionadas à textura, à estrutura, à

semântica, à enunciação e aos atos de discurso (níveis 4, 5, 6, 7 e 8, respectivamente).

Todavia, na ATD, proposta de análise pragmática textual ligada à análise do discurso, essas

questões devem ser vistas na relação com o nível do discurso, ou seja, observando a ação de

linguagem, a interação social e a formação discursiva que institui pragmaticamente os gêneros

de discurso (níveis 1, 2 e 3), uma vez que é na relação entre esses níveis que se constroem os

efeitos de sentidos passíveis de interpretação.

2.2.2 Da linguagem como ação aos gêneros de discurso

Entender a linguagem como uma forma de ação sociodiscursiva é fundamental para

que compreendamos os interesses da ATD. Isso porque, Adam (2011a), em muitas das suas

posições, assume que a linguagem tem caráter sociointeracional. Para melhor

compreendermos essa afirmação, faz-se necessário que observemos o esquema em que o autor

situa o nível da Análise de Discurso.

Esquema 3 - Nível da Análise do Discurso: o lugar do(s) gênero(s)

Fonte: Adaptado do Esquema 4 (ADAM, 2011a, p. 61).

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Nesse esquema, observamos que a interação verbal funciona como o intermediador

dos enunciados, ou seja, das ações visadas pelos interlocutores no ato de linguagem. Além

disso, esses enunciados são produzidos com base nas formações sociodiscursivas em que o

interdiscurso e as línguas (socioletos) regulam o que pode e deve ser dito na situação de

interação social.

Nesse sentido, tudo o que está por trás ou como base da produção de um discurso é o

que na ADF é conceituado como condições de produção. De acordo com Brandão (2008, p.

29), este é um termo fundamental para a ADF e pode ser definido como:

[...] o conjunto dos elementos que determinam a produção de um discurso: o

contexto histórico-social, os interlocutores, o lugar de onde falam, a imagem

que fazem de si, do outro e do assunto que estão tratando. Todos esses

aspectos devem ser levados em conta quando procuramos entender o sentido

de um discurso.

Logo, o nosso entendimento é o de que um texto deve, enquanto produto de uma ação

de linguagem contextualmente situado, tomar todos os aspectos referidos pela autora

(contexto histórico-social, os interlocutores, o lugar de onde falam e as imagens de si, do

outro e do assunto tratado), observando o sentido a partir do material textualizado, pois, é ele

que permite, ao analista textual-discursivo, reconstruir o sentido sem incorrer em análises que

não reflitam os propósitos comunicativos dos interlocutores.

Esses propósitos estão associados aos lugares discursivos nos quais os interlocutores

atuam, uma vez que permitem a eles produzirem e compreenderem os enunciados. Nesse

sentido, Bakhtin (2003, p. 261) afirma que:

Todos os diversos campos da atividade humana estão ligados ao uso da

linguagem. Compreende-se perfeitamente que o caráter e as formas desse

uso sejam tão multiformes quanto os campos da atividade humana [...]. O

emprego da língua efetua-se em forma de enunciados (orais e escritos)

concretos e únicos, proferidos pelos integrantes desse ou daquele campo da

atividade humana.

Para o autor, esses enunciados concretos e únicos refletem as condições específicas de

cada campo da atividade humana, por conseguinte, são também os campos, entendidos por

nós como lugares discursivos, que orientam os propósitos das ações de linguagem neles

realizadas. É nesse sentido que Adam (2011a, p. 44) afirma que “sob os impactos das

necessidades de expressão e de interação, os enunciados assumem formas infinitas, mas os

gêneros e as línguas intervêm como fatores de regulação”.

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Seguindo, portanto, essa mesma linha de pensamento, Faraco (2009, p. 126-127)

afirma que “o pressuposto básico da elaboração de Bakhtin é que o agir humano não se dá

independentemente da interação; nem o dizer fora do agir [...] nesta teoria estipula-se que

falamos por meio de gêneros no interior de determinada esfera8 da atividade humana”. Desse

modo, o processo de comunicação discursiva acontece por meio de sujeitos ativos, tanto

aquele que fala/escreve – o locutor, quanto aquele que ouve/lê – o interlocutor. Ambos, com

base na atividade humana de interação, são responsáveis pela construção de enunciados.

Diante disso, podemos entender que os textos concretos, a que se refere Adam

(2011a), são enunciados orais e escritos que, discursivamente, são denominados de gêneros de

discurso, haja vista estes serem práticas sociais e discursivas realizadas por interlocutores em

um dado campo da atividade humana. Converge para essa afirmação o posicionamento de

Maingueneau (2001, p. 59, grifo do autor), ao afirmar que “todo texto pertence a uma

categoria de discurso, a um gênero de discurso”.

Sendo assim, o gênero de discurso é, enquanto prática discursiva, considerado como

“uma produção verbal, visual ou verbo-visual, necessariamente inserida em determinada

esfera, a qual possibilita e dinamiza a sua existência, interferindo diretamente em suas formas

de produção, circulação e recepção” (BRAIT, 2008, p. 18). Isso significa que as práticas

discursivas podem ser entendidas como os textos com os quais interagimos socialmente, tanto

por meio da produção, como pela recepção.

Nesse segmento, podemos afirmar que Adam (2011a) coloca o gênero no nível da

Análise de Discurso, incumbindo a ele a tarefa de estabelecer uma ponte entre os textos

(enunciados concretos) e as condições de produção destes enquanto práticas discursivas

mediadas pelas ações de linguagem.

A nosso ver, o gênero de discurso é uma instância fundamental para compreender o

texto em qualquer um de seus níveis (sequencial-composicional, enunciativo, argumentativo,

semântico, etc.). Isso porque, segundo Adam (2011a), todas as ações de linguagem estão

inscritas em uma dada formação sociodiscursiva, em campos da atividade humana, os quais

determinam os sentidos do dizer por meio da língua e dos gêneros de discurso.

Em suma, os gêneros de discurso “são práticas discursivas institucionalizadas” que se

realizam em enunciados concretos, (ADAM, 2011a, p. 60), isto é, materializados por textos,

orais e escritos, os quais são:

8 Em nosso trabalho não faremos distinção entre esferas da atividade humana e campos de atividade humana,

ambos são tomados como sinônimos.

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[...] constituídos de uma palavra, um conjunto de palavras, palavras

associadas a um projeto visual, ou seja, constitutivas de um projeto verbo-

visual, e que são consideradas enunciados concretos, porque são enunciadas

e recebidas a partir de determinada esfera discursiva, ideológica. (BRAIT,

2008, p. 18).

Portanto, os gêneros de discurso podem apresentar em sua forma composicional

diversos modos de linguagem que corroborem ao propósito comunicativo da ação de

linguagem que ele desempenha na comunicação discursiva. Todavia, esses modos de

linguagem (verbal, visual, audiovisual, etc.), assim como as escolhas linguísticas, são

condicionados pelos campos da atividade humana nos quais os gêneros circulam. Em

consonância a esse pensamento, discutimos, na próxima seção, a multimodalidade como parte

integrante dos gêneros de discurso.

2.2.2.1 Multimodalidade discursiva: parte integrante do gênero

Na trilha das discussões até aqui realizadas, entendemos que:

Todas as nossas manifestações verbais mediante a língua se dão como texto

e não como elementos isolados. Esses textos são enunciados no plano das

ações sociais situadas e históricas. Bakhtinianamente falando, toda a

manifestação linguística se dá como discurso, isto é, uma totalidade viva e

concreta da língua e não como uma abstração formal que se tornou o objeto

preferido e legítimo da linguística. O enunciado ou discurso não é um ato

isolado e solitário, nem na oralidade nem na escrita. O discurso diz respeito

aos usos coletivos da língua que são sempre institucionalizados, isto é,

legitimados por alguma instância da atividade humana socialmente

organizada. (MARCUSCHI, 2011, p. 20).

Assim, ao tratar de gêneros de discurso, estamos falando de enunciados concretos,

realizados por interlocutores nos mais variados campos de atividade humana. A realização,

concretização desses enunciados, materializa-se por meio de textos. Desse modo, percebemos

a intrínseca relação entre enunciado e texto, principalmente se tomarmos, como fundamento, a

posição teórica de Adam (2011a), para o qual, os textos podem ser entendidos como as

diversas formas assumidas pelo enunciado para que os interlocutores possam se expressar e

interagir socialmente, o que só ocorre por meio dos gêneros de discurso historicamente

legitimados pela sociedade.

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Portanto, considerando o caráter social dos gêneros de discurso, não podemos deixar

de situar contemporaneamente a questão da multimodalidade discursiva inerente ao gênero.

Para tanto, recorremos a Kress (2003), haja vista ele afirmar que vivemos em uma era de

novos meios de comunicação, o que implica na necessidade de atentarmos para os diversos

recursos semióticos que constituem os textos. Ocidentalmente, não temos apenas a escrita

alfabética, esta coocorre no contexto de outros modos no processo comunicativo.

Nesse sentido, Dionisio e Vasconcelos (2013, p. 23), afirmam que “as interações

humanas se realizam por meio de linguagens as mais diversas e não nos referimos aqui apenas

às interações mediadas por enunciado linguístico falado ou escrito, mas sim por qualquer

artefato9”. Podemos compreender esses artefatos, a que as autoras se referem, como sendo os

demais modos de linguagem que se associam a escrita alfabética e que compõem os gêneros

enquanto práticas sociais de linguagem. É, portanto, a junção desses diversos modos que

constituem o que se chama de texto complexo.

Para Kress e van Leeuwen (2006), os textos complexos ou multimodais são aqueles

cujos sentidos são produzidos através de mais de um código semiótico. Ainda, para esses

autores, essa definição está intrinsecamente ligada ao estudo por eles denominado de

Semiótica Social - uma ciência que estuda os recursos semióticos em suas mais diversas

manifestações, investigando como eles são utilizados, a fim de construírem sentidos.

A expressão “recurso semiótico” é termo chave nos estudos da Semiótica Social.

Conforme van Leeuwen (2006), podemos definir recurso semiótico como artefato que usamos

para nos comunicar. De acordo com o autor, essas ações podem ser linguísticas ou não. Se na

linguagem escrita, recursos linguísticos são utilizados para expressar as experiências, interagir

socialmente e organizar as informações em mensagens, da mesma maneira ocorre com as

imagens e outras semioses como as cores, as formas geométricas etc. “Assim, além dos

modos linguísticos, isto é, a fala e a escrita, temos de dar conta dos demais modos a eles

integrados, tais como som, imagem, gestos, imagens em movimento etc.” (MARCUSCHI,

2011, p. 27-28).

Dionísio e Vasconscelos (2013, p. 19) afirmam que:

A sociedade na qual estamos inseridos se constitui como um grande

ambiente multimodal, no qual palavras, imagens, sons, cores, músicas,

aromas, movimentos variados, texturas, formas diversas se combinam para

9 Aqui, artefatos são entendidos como objetos culturais e sociais que possibilitam a concretização de funções

específicas na sociedade, ou seja, elementos que usamos para nos comunicarmos. As placas de trânsito, por

exemplo, são artefatos culturais e sociais que, por meio de uma linguagem verbovisual, fornecem instruções aos

motoristas e pedestres. Para Kress (2003), o gênero é um artefato linguístico, mas de natureza cultural e social.

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serem lidos pelos nossos sentidos. Nossos pensamentos e nossas interações

se moldam em gêneros textuais [de discurso] e nossa história de indivíduos

letrados começa com nossa imersão no universo em que o sistema linguístico

é apenas um dos modos de constituição dos textos que materializam nossas

ações sociais.

Nesse sentido, além de observarmos os diversos recursos existentes na construção do

texto multimodal, devemos considerar os contextos social, histórico e cultural específicos e

como as pessoas falam sobre esses recursos nesses contextos, posto que isso permitirá uma

recepção mais adequada do texto, ou melhor, dos sentidos do texto.

Por esse viés, hoje, percebemos, cada vez mais, o uso da imagem associada ao texto

escrito, isto é, de modos diferentes constituindo textos. Isso acontece pelo fato de que essa

inter-relação também constrói sentidos diversos, assim como a linguagem verbal. Para Kress e

van Leeuwen (2001), os modos são recursos semióticos que permitem a realização simultânea

de discursos e de interação social. Logo, os gêneros de discurso podem ser entendidos como

os padrões culturais que estruturam o verbal e o visual para atender as práticas sociais de

linguagem (KRESS; VAN LEEUWEN, 2006).

Nesse sentido, cabe mencionar o posicionamento de Brait (2010, p. 194), no qual a

autora afirma que:

Em determinados textos ou conjunto de textos, artísticos ou não, a

articulação entre os elementos verbais e visuais forma um todo indissolúvel,

cuja unidade exige do leitor, e notadamente do analista, a percepção e o

reconhecimento dessa particularidade. São textos em que a verbo-

visualidade se apresenta como constitutiva, impossibilitando o tratamento

excludente do verbal ou do visual e, especialmente, das formas de

articulação assumidas por essas dimensões para produzir sentido, efeitos de

sentido, construir imagens de enunciadores e enunciatários, circunscrever

destinatários etc.

Seguindo a linha dos autores que discutem a multimodalidade discursiva dos gêneros

de discurso, discordamos de Brait (2010) apenas no ponto em que a autora afirma que a

articulação entre elementos verbais e visuais se dá “em determinados textos”. Nos

contrapomos a isso por assumirmos a concepção de que todo gênero de discurso se realiza por

textos multimodais, quer na fala, quer na escrita (KRESS, 2003; VAN LEEUWEN, 2006;

MARCUSCHI, 2008; 2011; DIONISIO, 2011; DIONISIO; VASCONCELOS, 2013).

Para Dionísio (2011, p. 138), “na atualidade, uma pessoa letrada deve ser alguém

capaz de atribuir sentidos a mensagens oriundas de múltiplas fontes de linguagem, bem como

ser capaz de produzir mensagens, incorporando múltiplas fontes de linguagem”. Desse modo,

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faz-se necessário que as pessoas consigam atribuir sentidos às múltiplas formas de linguagem

que compõem os gêneros de discurso.

Algo comum entre os autores que tratam do discurso multimodal, isto é, da

multimodalidade discursiva, é o fato de eles concordarem em não haver supremacia da

palavra sobre a imagem e vice-versa. Ambas são tomadas como complementares na e para a

produção, circulação e recepção dos gêneros de discurso.

A imagem é, portanto, a forma mais particular de expressão de sentidos e de aquisição

de conhecimento, pois em todas as culturas ela se desvela pelo olhar do observador. Sobre

esta discussão, Christin (2006, p. 63) afirma que “a imagem permite ao grupo comunicar-se

com mundos em que não se fala sua língua, isto é, com os deuses, que se manifestam para ele

através dos sonhos ou das visões. A imagem revela o invisível.” Isso nos faz compreender que

a imagem ultrapassa as barreiras culturais e sociais, proporcionando ao interlocutor interpretar

e reconstruir a compreensão do mundo que o rodeia, amparando-se nos recursos visuais.

De acordo com Kress e van Leeuwen (2006, p. 33) o uso de imagens, hoje, não é mais

o mesmo de 50 anos na sociedade ocidental, não é o mesmo de uma sociedade para outra,

nem o mesmo em grupos sociais ou instituições distintas. Atualmente, as imagens

apresentam, vendem, conquistam, convencem e veiculam informações, dentre outras funções.

Assim, podemos dizer que interpretar a linguagem, ler e compreendê-la, é atribuir

sentido aos enunciados concretos, isto é, aos textos verbovisuais que circulam nos mais

diferentes campos de atividade humana. Para tanto, faz-se necessário atentar para todos os

modos de comunicação existentes na elaboração do gênero de discurso: palavras, imagens,

tipografias, cores, etc. Somente dessa forma, seremos capazes de dar conta dos diversos

sistemas que estão inter-relacionados na constituição dos textos.

Por tudo isso, entendemos a multimodalidade discursiva como uma possibilidade de

análise e descrição de enunciados verbovisuais, produzidos socialmente por interlocutores em

diferentes campos de atividade humana. Por conseguinte, compartilhamos com Dionísio

(2011) da afirmação de que todo e qualquer gênero é multimodal.

Portanto, a discussão que estamos apresentando converge para a mesma perspectiva, a

de que a união de recursos semióticos formula os sentidos de um gênero de discurso e, para

compreendê-lo faz-se necessário a interpretação desses recursos e os sentidos que eles

manifestam no todo do texto multimodal. Desse modo, “a linguagem verbo-visual será aqui

considerada uma enunciação, um enunciado concreto articulado por um projeto discursivo do

qual participam, com a mesma força e importância, a linguagem verbal e a visual” (BRAIT,

2010, p. 194).

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Desta feita, apresenta-se, nesse momento, a necessidade situarmos teoricamente o

texto que visamos a analisar em nosso estudo. Entendemos que essa ocasião vai além da

oportunidade de conhecer o gênero de discurso que será foco de nossa investigação. Ela se

configura como um espaço, também, de definirmos nossa posição frente aos postulados da

ATD. Desse modo, na próxima seção discorremos acerca do gênero de discurso capa de

revista.

2.2.3 O gênero de discurso capa de revista

Todo gênero que é produzido socialmente corresponde a propósitos específicos de um

dado campo de atividade humana (literatura, ciência, religião, mídia, educação, etc.). Ao

utilizar exemplos como charges, propagandas, capas e páginas de veículos informativos,

editorias, artigos de opinião, reportagens, entre outros, estamos nos referindo a gêneros que

são produzidos no campo da atividade humana jornalismo. Assim como nesse campo, tantos

outros gêneros são produzidos, circulam e são recebidos nos demais campos existentes na

sociedade com vistas a cumprir com os propósitos comunicativos a eles inerentes.

Nesse sentido, muitos são os propósitos comunicativos que se realizam por meio dos

gêneros de discurso. No campo do jornalismo, por exemplo, comportando as divisões que lhe

são particulares, os gêneros se ajustam a cada divisão, atendendo aos propósitos

comunicativos da instituição, quais sejam: informar, opinar, vender, satirizar etc.

Dentre os gêneros que circulam na instituição jornalística, categorias são estabelecidas

para que se possa compreender com mais nitidez o papel que cada um deles exerce. Nesse

sentido, “os gêneros jornalísticos são determinados pelo modo de produção dos meios de

comunicação de massa e por manifestações culturais de cada sociedade” (MEDINA, 2001, p.

53). Dessa forma, os gêneros jornalísticos são manifestações da linguagem produzidos e

reproduzidos em sociedade por interlocutores, realizando papeis específicos, de acordo com a

função que cada gênero desempenha.

Diante disso, partimos do pressuposto de que a capa de revista é um gênero de

discurso que pertence ao campo de atividade humana jornalismo. Afirmamos isto, por ser esse

gênero uma prática discursiva que circula na mídia impressa, especificamente na mídia

jornalística, tendo como função “promover o primeiro contato do consumidor com o produto”

(COSTA, 2012, p. 61). Além disso, a capa faz parte de um todo que é o suporte, isto é, da

revista.

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Marcuschi (2003, p. 10) afirma que o suporte “é imprescindível para que os gêneros

circulem na sociedade e deve ter alguma influência na natureza do gênero suportado. Mas isto

não significa que o suporte determine o gênero e sim que o gênero exige um suporte

especial”. Desse modo, a condição básica para a existência da noção de suporte é a

necessidade de circulação dos gêneros.

Assim, podemos afirmar que a capa de revista configura-se como uma prática de

linguagem que estabelece a primeira relação entre o veículo de informação (tomado, por nós,

como locutor) e o consumidor (entendido como alocutário). Essa relação acontece por

interesses – propósitos – do lugar de circulação social, historicamente ocupado por esse

gênero de discurso, ou seja, do campo jornalístico.

Quanto à função desempenhada pelos gêneros de discurso jornalístico, vale apresentar

a divisão de Melo (2003)10

. Para ele, no jornalismo brasileiro, os gêneros se dividem em duas

categorias: jornalismo informativo e jornalismo opinativo. Essa classificação separa os

gêneros de acordo com sua correspondência funcional, posto que:

Os gêneros que correspondem ao universo da informação se estruturam a

partir de um referencial exterior à instituição jornalística: sua expressão

depende diretamente da eclosão e evolução dos acontecimentos e da relação

que os mediadores profissionais (jornalistas) estabelecem em relação aos

seus protagonistas (personalidades ou organizações). Já no caso dos gêneros

que se agrupam na área da opinião, a estrutura da mensagem é co-

determinada por variáveis controladas pela instituição jornalística [...].

(MELO, 2003, p. 65)

Todavia, mesmo tratando-se de uma divisão aparentemente coesa, não concebemos os

gêneros do jornalismo como sendo instâncias de propósitos comunicativos estanques. O

próprio autor afirma que não se podem estabelecer limites entre as produções jornalísticas

informativas e opinativas, sendo essa classificação “uma fronteira metodológica” (MELO,

2003, p. 73).

No que concerne ao jornalismo de revista, Scalzo (2011, p. 58) afirma que:

O que não dá pra confundir é o texto de revista com texto opinativo. É

verdade que muitas revistas carregam na opinião, mas o bom texto de revista

deve estar calcado prioritariamente em informações. Rechear um texto

apenas com juízos de valor (próprios ou tomados emprestados de alguém) é

10

Ressaltamos que, para discutirmos sobre o gênero capa de revista, bem como o entorno sociodiscursivo que o

engendra, tomamos alguns conceitos advindos da teoria do jornalismo. Ressaltamos, também, que as

nomenclaturas adotadas para caracterizar os elementos constitutivos do gênero de discurso capa de revista, além

de serem tomadas de textos que discutem esse gênero numa perspectiva linguística, são também advindas dos

estudos jornalísticos sobre revista e design.

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fácil – as opiniões são livres e baratas –, mas são sempre as informações que

garantem a qualidade e consistência do texto jornalístico.

A revista, assim como os demais suportes que fazem circular os gêneros de discurso,

abre espaço para gêneros com diferentes funções, a depender das intenções comunicativas.

Isso significa que os textos de revista podem utilizar-se da informação e da opinião, desde que

o seu uso contribua para o alcance do objetivo pretendido: a priori, atingir o público leitor.

Os estudiosos do jornalismo de revista afirmam que a capa de revista é uma espécie

de marketing e informação que visa a chamar a atenção do leitor, fazendo-o adquirir a revista

(ABREU, 2009; GOMES, 2010; SCALZO, 2011). Com isso, torna-se evidente o diálogo

entre o campo do jornalismo e o campo da publicidade, isso porque, “o gênero capa de revista

tem inicialmente como seu propósito comunicativo vender a revista, captando a atenção do

leitor. Busca atrair o público, promovendo o que ela tem de melhor a oferecer: a informação”

(GOMES, 2010, p. 303).

Consenso entre os estudiosos da capa de revista, na perspectiva jornalística, está a

afirmação de que ela indica o tipo de público para o qual a revista se destina.

Independentemente do quão heterogêneo seja o perfil do leitor, a revista vai buscar, pelo

projeto gráfico, constituído pelo assunto da edição (tema), seduzir o maior número possível de

consumidores que a informação, ali veiculada, possa agradar (ABREU, 2009; GOMES, 2010;

SCALZO, 2011).

Na capa de revista, os temas evidenciados são os mais diversos, o que não permite

precisar o assunto que será destaque na capa, principalmente pela pluralidade de temas

socialmente relevantes e atuais que surgem a cada dia na sociedade. Contudo, questões como

política, saúde, economia, sustentabilidade, meio ambiente, entre outros temas, podem

aparecer como assunto tratado na capa de revista, contanto que sua relevância e perspectiva

revelem informações atualizadas e estejam relacionadas ao conteúdo interno da revista. Sobre

isso, Abreu (2009, p. 114) afirma que:

[...] atualmente, essa maneira de relacionar as informações da capa ao

conteúdo da revista está muito vinculada com as questões de marketing, pois

o design deve estar em sintonia com o seu público leitor, e disso resulta o

sucesso da comercialização da publicação.

Outrossim, os assuntos tratados jornalisticamente por uma revista se diferem das

formas como os veículos de informação tratam o mesmo assunto, pois é característica dos

jornais, do rádio, da internet e da televisão a busca por apresentar a informação

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imediatamente, isto é, a notícia em tempo real. A revista, por seu turno, não pode ser pensada

como esses suportes, uma vez que a sua periodicidade não permite esse tipo de imediatismo

informacional, a não ser que a revista publique uma edição especial com uma informação

inédita. As revistas são publicadas com periodicidade: semanal, quinzenal ou mensal.

Portanto:

Não dá para imaginar uma revista semanal de informações que se limite a

apresentar ao leitor, no domingo, um mero resumo do que ele já viu e reviu

durante a semana. É sempre necessário explorar novos ângulos, buscar

notícias exclusivas, ajustar o foco para aquilo que se deseja saber, conforme

o leitor de cada publicação. (SCALZO, 2011, p. 41)

À vista disso, assim como o assunto deve ter um foco que o torne capaz de configurar

como o tema a ser tratado em uma revista, faz-se necessário um projeto gráfico que chame a

atenção do leitor e que o faça levar a revista para casa. Por este motivo, “as editoras se

esforçam cada vez mais em criar efeitos de comunicação visual nas capas de suas revistas

para atrair um número cada vez maior de leitores” (ABREU, 2009, p. 112). Segundo Gomes

(2010, p. 303), “pode-se dizer que o gênero capa de revista se configura enquanto uma vitrine,

ou seja, é produzido para não só chamar atenção do leitor, mas para vender a revista”.

Desse modo, o estilo da capa de revista, como gênero de discurso, não está associado

somente ao texto escrito. Tudo que está em jogo na produção de uma capa (texto verbal,

imagens, cores, etc.) é constituidor do estilo desse gênero, pois o torna reconhecível e único

perante o seu público leitor, principalmente pelo nome que ostenta como assinatura (PUZZO,

2009).

É notório que, ao chegar em uma banca de revistas, o leitor de revistas semanais de

informação como Veja, Época, Isto é, entre outras, não sinta dificuldades em reconhecê-las.

As capas dessas revistas variam, minimamente, em seu projeto gráfico. Segundo Scalzo

(2011), essa diagramação mais ou menos fixa das revistas semanais ocorre pelo curto prazo

para o seu fechamento, uma vez que ela é impressa e distribuída com maior velocidade do que

as revistas mensais, por exemplo. Todavia, isso não implica pobreza na formulação do gênero

de discurso capa de revista, considerando, principalmente, a sua inteireza verbovisual.

De acordo com Gomes (2010, p. 303), “a capa de revista se caracteriza enquanto um

gênero multimodal capaz de combinar variadas semioses significativas em sua composição,

tais como: cores, imagens gráficas, textos verbais”, o que contribui, visualmente, para que o

leitor compre-a e leia-a.

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Por isso, além de sempre possuir um apelo visual que a transforma em uma

espécie de peça promocional, obrigatoriamente, nos casos de livros,

periódicos ou revistas, deve conter algumas informações essenciais, entre

outras, o título, o subtítulo, o nome do autor, editora, edição e data, o que

para nós, nesse caso, faz da capa um gênero (COSTA, 2012, p. 61).

Dessa forma, a capa de revista configura-se como um gênero de discurso por

apresentar um conteúdo temático, ou seja, o assunto em pauta, o qual é constituído pelas

diversas semioses que compõem o texto, bem como pelas informações que nela se

apresentam, tornando esse enunciado relativamente estável e reconhecido socialmente.

Em se tratando das características inerentes à forma composicional da capa, temos:

logotipo, chamada principal, chamadas secundárias, subtítulos, imagem principal, imagens

secundárias, editora, edição e data. Abreu (2009), afirma que todos esses elementos formam o

que é chamado de manifestação visual gráfica, a qual ele considera como uma única imagem.

Desse modo, “é na capa que aparecem os primeiros sinais ou as primeiras pistas daquela

publicação, e é através desses sinais que o leitor poderá sentir-se capturado para percorrer

suas páginas e explorar seus conteúdos” (Ibid. 118).

Antes de adentrarmos nos elementos que formam a capa de revista, vale mencionar

que esse gênero é reconhecido como capa ilustrada, tendo em conta o fato de ela ser composta

por fotografias e desenhos, frequentemente de temática alusiva ao assunto tratado no interior

da revista, bem como pelo uso de cores, contrastes e brilho que a tornam uma vitrine para o

leitor (FARIA; PERICÃO, 2008; ABREU, 2009; SCALZO, 2011). As capas de revista

semanais como Época e Veja, portanto, enquadram-se nessa definição, pois, além do texto

verbal, imagens e cores unem-se para compor uma unidade de sentido acerca dos assuntos que

serão discutidos no interior da revista. Nesse segmento, vejamos o papel de cada um desses

elementos que podem compor o gênero de discurso capa de revista.

O logotipo funciona como a identificação da revista. Para Abreu (2009, p. 132), “o

logotipo é a representação visual da marca da revista e, portanto, identifica a publicação

através do nome”. Salientamos que, a depender da revista, da edição, das imagens e das cores

que se presentificam na capa de revista, o logotipo pode variar em termos de cores e

tamanhos, porém, é constante a sua localização na parte superior da página.

A imagem principal é apresentada como um forte elemento na forma composicional

do gênero de discurso capa de revista, haja vista a sua relação direta com o assunto principal

que constitui o tema da capa. Segundo Scalzo (2011, p. 63), “uma boa imagem será sempre

importante – e é ela o primeiro elemento que prenderá a atenção do leitor. O logotipo da

revista também é fundamental, principalmente quando ela é conhecida e já detém uma

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imagem de credibilidade junto ao público”. Percebe-se, com isso, que além de o logotipo

representar a marca da revista, ele também pode ser sinônimo de confiança e respeito e que,

associado a uma boa imagem (fotografia, desenho, etc.), tem mais chance de angariar leitores

e consumidores da revista. Vale ressaltar que, de acordo Scalzo (2011), fotografia e revista

parecem ter nascido uma para a outra. “As [revistas] semanais de informação são as que mais

usam o fotojornalismo, que, muitas vezes, foi o responsável por alguns de seus momentos

editorias” (Ibid., p. 70).

Nesse sentido, a imagem apresenta-se cada vez mais como elemento constituidor de

sentidos e de representações dos ideários dos editores de revistas, haja vista a sua força de

persuasão e informação. Não é à toa que o referido autor afirma que de nada “adianta ter uma

foto excelente na mão e espremê-la no pé da página ou cortá-la na junção entre duas páginas

diferentes” (SCALZO, 2011, p. 70). Essa afirmação casa diretamente com os postulados da

multimodalidade, uma vez que esta pressupõe a imagem como um elemento essencial para a

comunicação na sociedade em que vivemos.

De acordo com Lage (2006, p. 28-29),

A fotografia jornalística é atividade especializada, cujo desempenho envolve

conhecimentos muito além do manuseio do processo. Trata-se de selecionar

e enquadrar elementos semânticos de realidade de modo que, congelados na

película fotográfica, transmitam informação jornalística.

Desse modo, além de capturar momentos relevantes para a edição, as

imagens/fotografias constroem sentidos que, na conjuntura do gênero de discurso capa de

revista, funcionam como muito mais do que um simples adorno do texto verbal, elas

possibilitam sentidos que devem ser reconstruídos pelo leitor (alocutário) no ato da

interpretação do enunciado verbovisual que se nos apresenta. Nesse sentido, a imagem

principal configura-se como um elemento muito importante na forma composicional da capa

de revista, a “imagem principal tem como função definir o assunto mais importante da revista

e, de certa forma, é ela quem cria, através do visual, a atmosfera daquela edição” (ABREU,

2009, p. 123).

As imagens secundárias, por sua vez, como o próprio nome já diz, não são tão

relevantes quanto à imagem principal, pois, os assuntos de que elas tratam não têm a mesma

dimensão social, histórica, econômica etc., mas, ao aparecerem na capa, são assumidos como

questões merecedoras de destaque (ABREU, 2009). Todavia, essa não é uma característica

fixa da capa de revista, como são o logotipo e a imagem principal. As imagens secundárias,

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dependendo da intenção do editor, podem não figurar com elementos da capa de revista, o que

nos revela a importância do assunto representado pelas imagens da capa.

No que diz respeito às chamadas, tanto a principal quanto as secundárias, têm por

função apresentar assuntos que serão discutidos no interior da revista, configurando-se como

uma síntese da edição. “A chamada principal tem a função de, através da palavra, apresentar o

tema principal, já mostrado na imagem principal” (ABREU, 2009, p. 122). “As chamadas

secundárias teriam a função de identificar o que está sendo noticiado através das imagens

secundárias” (Ibid., p. 122). Mesmo estando associadas às imagens, não se pode tratar as

chamadas como legendas, uma vez que estas tem a função de, por meio de um breve texto,

geralmente abaixo da imagem, trazer uma breve explicação do que foi retratado. As

chamadas, por sua vez, tratam de assuntos e não de explicações de imagens (ABREU, 2009;

SCALZO, 2011). A estas chamadas podem estar associados subtítulos que visam a esclarecer

esse enunciado principal, ou até mesmo expandir o assunto apresentado.

Ressaltamos, porém, que juntamente com as imagens, as chamadas apresentam

características que nos fazem identificá-las e, por conseguinte, interessarmo-nos em adquirir a

revista. Geralmente, faz-se uso de letras em tamanhos maiores e cores que se destaquem na

capa. “Letras enormes fazem as frases gritar e corres berrantes, de fato, berram. Elas devem

ser usadas apenas quando a situação, ou a linha editorial da publicação assim o exigir”

(SCALZO, 2011, p. 69). No gênero capa de revista, esses recursos são válidos, pois fazem

com que o leitor prenda a sua atenção ao que está sendo enunciado, levando ao interesse

pelo(s) assunto(s) veiculado(s) pela revista.

Assim como as imagens secundárias que podem ou não aparecer na forma

composicional da capa de revista, as chamadas secundárias e subtítulos também podem ser

omitidos, visando a destacar a chamada principal. Essa possibilidade de retirar elementos da

composição do gênero reflete a relativa estabilidade dos gêneros de discurso e a maleabilidade

e dinamicidade destes (BAKHTIN, 2003; MARCUSCHI, 2008; 2011).

Concluindo, então, a apresentação dos elementos que compõem o gênero de discurso

capa de revista temos a logomarca da editora (editora), o número da edição e a data. Esses

elementos são circunstanciais, haja vista refletirem o espaço e o tempo que constituem o

gênero, o que não os tornam menos relevantes, pois os gêneros são históricos e socialmente

situados.

Portanto, com base em todas essas questões, afirmamos que a capa de revista é um

gênero de discurso multimodal, posto que, ao utilizar a linguagem, situada no campo do

jornalismo, esse gênero “mobiliza outros sistemas simbólicos além da comunicação

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linguística” (LAGE, 2006, p. 10). Em sua forma composicional apresentam-se textos verbais

(sucintos, coesos e coerentes), formados por palavras ou frases de forte impacto (chamadas e

subtítulos) e imagens que dialogam diretamente com o texto das chamadas (principais e

secundárias).

Seguindo o campo de comunicação humana em que o gênero de discurso capa de

revista é produzido, circula e é recebido, a mídia jornalística impressa, compreendemos que

sua linguagem reflete o estilo desse campo de atividade humana, isto é, uma linguagem por

definição referencial, pois “fala de algo no mundo, exterior ao emissor, ao receptor e ao

processo de comunicação em si” (Ibid., p. 51). Todavia, sabemos que a linguagem jornalística

não é totalmente neutra, conforme prescrevem os manuais de redação, mas, que a linguagem,

por meio dos enunciados concretos, reflete interesses do locutor, pensados em função do

interlocutor (AQUINO, 2010).

Nesse sentido, afirmamos que a capa de revista é um gênero produzido pela relação de

múltiplas semioses que se unem com vistas a compor uma imagem única, capaz de falar ao

leitor, uma vez que é este que define uma revista (SCALZO, 2011), bem como é para este que

os enunciados são direcionados. Por consequência disso, os assuntos tratados e representados

na capa de revista têm por intenção persuadir o leitor e fazer com que ele adquira a revista.

Nesse sentido, considerando que o papel do interlocutor é bem mais do que apenas interpretar

o que lê, de forma passiva, cabe a ele a responsabilidade de concretizar o objetivo ou

propósito comunicativo da capa de revista, isto é, responder ao enunciado concreto que se lhe

apresenta, comprando ou não a revista.

Por esse viés, reafirmamos o caráter dinâmico, maleável e multimodal do gênero de

discurso capa de revista, concordando com os estudos de gêneros de discurso e da

multimodalidade discursiva, posto que a capa somente configura-se como enunciado pleno

pelo seu projeto discursivo verbovisual, condicionado pelo campo de atividade humana no

qual ele é produzido, veiculado e recebido, enfim, na interação social de comunicação

discursiva que permite o diálogo entre os enunciados e seus interlocutores.

Diante disso, em nossa tese, compreendemos o gênero capa de revista como um texto

complexo, isto é, constituído pela relação entre o verbal e o visual. Assim, entendemos que,

como esses modos se combinam para construir o enunciado concreto que é esse gênero, só se

é possível compreender os efeitos de sentido dele provenientes se atribuirmos sentidos ao

todo textual que nele se presentifica pela junção dos recursos/elementos ali empregados.

Nesse panorama, sendo a capa de revista o nosso objeto de estudo, o qual será

estudado por meio do escopo semântico que se ocupa das representações discursivas,

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apresentamos no próximo capítulo a noção de representação discursiva e as categorias que

irão fundamentar a análise das representações discursivas de Lula no gênero de discurso capa

de revista.

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CAPÍTULO 3

3 REPRESENTAÇÃO DISCURSIVA

No sentido de darmos continuidade a discussão teórica que norteia o nosso propósito

de investigação, neste capítulo, discutimos o conceito de representação discursiva adotado

pelos estudos em ATD. Além disso, com base nos trabalhos já desenvolvidos sobre a temática

em questão, apresentamos as categorias de análise que nos orientam para a compreensão das

representações discursivas de Lula nas capas de Época e Veja, exemplificado e demonstrando

linguisticamente os fatos de língua que se presentificam no texto para a construção e

interpretação das representações discursivas.

3.1 DA PROPOSIÇÃO-ENUNCIADO AO NÍVEL SEMÂNTICO DO TEXTO: A

NOÇÃO DE REPRESENTAÇÃO DISCURSIVA

Sendo o texto o objeto de estudo da ATD, Adam (2011a) propôs uma unidade mínima

sobre a qual o analista textual-discursivo pode lançar o seu olhar e interpretar os sentidos dela

proveniente, ela é denominada por proposição-enunciado ou proposição enunciada. Segundo

Rodrigues, Passeggi, Silva Neto (2010) essa unidade mínima está no nível sequencial-

composicional do texto, o que implica uma linearidade, todavia, os demais níveis semântico,

enunciativo e argumentativo tanto podem obedecer à linearidade do texto como dar-se de

forma não linear, conforme mencionado na seção anterior.

Nesse sentido, a proposição-enunciado é o “produto de um ato de enunciação: ela é

enunciada por um enunciador inseparável de um coenunciador” (ADAM, 2011a, p. 108,

grifos do autor), o que implica em um todo significativo, isto porque “não existe enunciado

isolado [...]” (Ibid., p. 109). Dessa forma, todo enunciado sempre vai estar em ligação com

outros enunciados, quer pelas relações do próprio texto (referência, por exemplo), quer pela

evocação de respostas ou continuação do dizer.

Adam (2011a), afirma que uma proposição-enunciado compreende três dimensões

complementares. Essa discussão é materializada pelo autor no seguinte esquema:

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Esquema 4 – As três dimensões da proposição-enunciado

Fonte: Esquema 10, Adam (2011a, p. 111).

Conforme Adam (2011a, p. 109, grifos do autor):

As três dimensões complementares de toda proposição enunciada são: uma

dimensão enunciativa [B] que se encarrega da representação construída

verbalmente de um conteúdo referencial [A] e dá-lhe uma certa

potencialidade argumentativa [ORarg] que lhe confere uma força ou valor

ilocucionário [F] mais ou menos identificável.

Fica evidente, no esquema apresentado por Adam (2011a), que a proposição

enunciada é constituída pelos níveis 4 e 5, ou seja, pelo nível sequencial-composicional.

Desse modo, cabe-nos compreender que as proposições-enunciados – unidades textuais de

base – funcionam como parte de um processo de construção do texto e não como o texto em

si. Com essa mesma linha de pensamento, Passeggi et al. (2010, p. 271) afirmam que “as

proposições-enunciados, ligam-se entre si através de diversos processos, entre os quais:

correferência e anáforas; isotopias; colocações; elipses e implícitos; conectores, incluindo os

organizadores textuais e os conectores argumentativos”. Esses elementos, nos níveis 6, 7 e 8,

a depender do objeto de investigação, podem funcionar como categorias de análise para

compreender as dimensões que a esses níveis correspondem. Diante disso, como o enfoque

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desse trabalho é a noção de representação discursiva deter-nos-emos na parte A (nível 6), isto

é, na representação discursiva construída pelo conteúdo referencial11

.

Adam (2011a, p. 110) afirma que o ato de referência é uma operação construída no e

pelo discurso, e que “o fato de se colocar o valor descritivo de todo o enunciado na parte [A]

não implica sua separação dos outros componentes”. Dessa forma, observar o nível semântico

(referência como representação discursiva) é atentar tanto para a proposição-enunciado na

linearidade do texto, concepção do nível sequencial-composicional, quanto para a sua

reticularidade, uma vez que é por meio dos movimentos de sentido que se constrói a

referência na atividade discursiva.

De acordo com Adam (2011a, p. 113-114):

Toda proposição enunciada possui um valor descritivo. A atividade

discursiva de referência constrói, semanticamente, uma representação, um

objeto de discurso comunicável. Esse microuniverso semântico apresenta-se,

minimamente, como um tema ou objeto de discurso posto e o

desenvolvimento de uma predicação a seu respeito. A forma mais simples é

a estrutura que associa um sintagma nominal a um sintagma verbal, mas, de

um ponto de vista semântico, uma proposição pode muito bem se reduzir a

um nome e um adjetivo.

Como vemos, Adam situa no valor descritivo de uma proposição enunciada o

potencial de construir semanticamente uma representação, ou seja, de fazer referência ao

mundo ou a um objeto no mundo e, para isso, aponta a relação entre tema e predicação como

sendo a forma prototípica de manifestação dessa referência.

Sob essa ótica, Rodrigues, Passeggi, Silva Neto (2010, p. 173) afirmam que “[...] toda

proposição, na condição de ‘microuniverso semântico’, constitui uma representação

discursiva mínima”, isto é, por mais que uma proposição-enunciado apresente apenas um ou

dois constituintes (nome e adjetivo, por exemplo), essa construção referencia algo no mundo,

isto é, um objeto de discurso. Este, entendido, aqui, como o referente: entidade discursiva

utilizada e atualizada no e pelo discurso pelos agentes de linguagem.

Sendo assim, compreendemos objeto de discurso12

como uma construção discursiva,

isto é, um produto, uma representação que é alimentada pela atividade linguística, na qual

locutores enunciam referentes (fundamentalmente culturais) e os colocam em circulação por

11

Esta posição teórica que assumimos em nosso trabalho tem caráter puramente metodológico, haja vista sermos

reconhecedores da dissociabilidade das dimensões semântica, enunciativa e argumentativa para a construção dos

efeitos de sentido do texto. 12

O conceito de objeto de discurso é muito caro para o estudo do nível semântico do texto, haja vista ser por

meio dele que buscamos compreender como são representados, discursivamente, o locutor, o interlocutor e os

temas tratados no texto.

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meio dos textos. Por seu turno, esses referentes sofrem transformações na memória discursiva

dos interlocutores, o que garante aos objetos de discurso uma intrínseca instabilidade13

(APOTHÉLOZ, REICHLER-BÉGUELIN, 1995; KOCH, 2002; 2006; CAVALCANTE,

2011).

Seguindo esse princípio de que os objetos de discurso servem para referenciar

linguisticamente as entidades discursivas existentes na memória dos indivíduos, retomamos

um posicionamento do idealizador da ATD, no qual afirma que “a atividade de referência

constrói, semanticamente, uma representação, um objeto de discurso comunicável” (ADAM,

2011a, p. 113). Portanto, ao por em discurso um objeto (referente), o locutor produz uma

proposição-enunciado que constrói, por meio dos sentidos possíveis a ela atribuídos, uma

representação discursiva do conteúdo referencial.

A representação discursiva, doravante Rd, é colocada como uma das principais noções

do nível semântico, ao lado de anáforas, isotopias, colocações, entre outras, que são

responsáveis pelos entornos significativos regentes do texto. Rodrigues, Passeggi, Silva Neto

(2010, p. 173), afirmam que “todo texto constrói, com maior ou menor explicitação, uma

representação discursiva do seu enunciador, do seu ouvinte ou leitor e dos temas ou assuntos

que são tratados”.

Para Adam (2011a, p. 113), uma representação discursiva é “a expressão de um ponto

de vista [PdV]”. Portanto, para interpretá-la, devemos atentar para a representação que é

construída pelo conteúdo proposicional.

Passeggi (2012, p. 232) admite que as representações discursivas “são de natureza

linguística, manifestadas nos/pelos textos”. Desse modo, a representação enquanto referência

do enunciador, do leitor ou dos assuntos tratados só pode ser percebida na/pela produção

co(n)textual de sentidos, o que implica uma (re)construção do sentido por parte do

interpretante. Sobre isso, Adam (2011a, p. 114) afirma que:

É o interpretante que constrói a Rd a partir dos enunciados

(esquematização), em função de suas próprias finalidades (objetivos,

intenções) e de suas representações psicossociais da situação, do enunciador

e do mundo do texto, assim como de seus pressupostos culturais.

Assim, ao construir uma Rd em um dado texto, recai sobre o leitor/interpretante o

papel de (re)construí-la com base em suas representações (psíquicas, sociais, culturais, etc.), a

13

A instabilidade a que nos referimos diz respeito à possibilidade de modificações do referente, em virtude dos

valores culturais que constituem os sujeitos envolvidos na atividade de linguagem.

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fim de obter os resultados semânticos ali atribuídos. Não significa dizer que o interpretante

deverá agir simetricamente ao locutor, mas ele é solicitado a desenvolver uma atividade

semelhante de (re)construção do sentido (ADAM, 2011a).

Ao tratarmos a Rd como algo passível de ser (re)construída pelo interpretante, através

de suas representações sociais, cognitivas, etc., isto é, dos objetos de discurso que fazem

parte, culturalmente, da memória discursiva dos interpretantes, esclarecemos que o princípio

que rege a formulação do conceito de representação discursiva advém da lógica natural14

e,

mais especificamente, da noção de esquematização proposta por Grize (1990; 1996).

A lógica natural é definida por Grize (1990, p. 65) como:

[...] o estudo de operações lógico-discursivas que permitem construir e

reconstruir uma esquematização. O duplo adjetivo é para sublinhar o fato de

que se está em presença de operações de pensamento, mas somente na

medida em que esses se expressam através de atividades discursivas. Quanto

ao termo operação, ele deve ser tomado em seu sentido matemático. Trata-se

sempre de uma aplicação de um conjunto sobre ele mesmo (operação

interna) ou em outro conjunto (operação externa).

Adam (2011b, p. 95), ao citar Grize (1996), afirma que “o conceito-chave da lógica

natural [...] é o de esquematização, portanto, de representação discursiva”. Assim, com a

esquematização, busca-se compreender as operações, isto é, as escolhas e os arranjos das

palavras, orquestrados entre os interlocutores em uma situação de comunicação.

3.1.1 Da esquematização aos grupos da Representação discursiva

Para Grize (1990; 1996), a situação de comunicação entre interlocutores é um espaço

sociodiscursivo de interação. Essa posição carrega, em sua base, os postulados bakhtinianos

acerca da dimensão dialógica da linguagem, uma vez que, para o referido autor, a atividade de

esquematização é constituída pelo caráter dialógico da atividade comunicativa. Além disso,

outro postulado que assume a perspectiva dialógica, na lógica natural, é o:

da situação de interlocução, que admite que toda comunicação se

desenvolve numa situação que apresenta duas dimensões. A primeira,

concreta, enquanto atividade discursiva situada em certo momento, em certo

14

Assumimos essa posição por estarmos em consonância com os trabalhos realizados por Adam (1999, 2011b),

Passeggi (2001, 2012), Oliveira (2013) e Queiroz (2013), para os quais a representação discursiva tem suas bases

na lógica natural, de Jean-Blaise Grize, e mais especificamente no conceito de esquematização.

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lugar, visando a uma finalidade e estabelecendo um conjunto de relações

sociais e históricas; a segunda, a própria atividade discursiva, que contribui

para a elaboração da situação. (PASSEGGI, 2001, p. 247, grifos nossos).

É, portanto, considerando os postulados do dialogismo e da situação de interlocução

que Grize começa a conceber o que ele entende por esquematização na situação de

interlocução. Isto posto, cabe afirmar que, além desses postulados, outros três são

apresentados pelo autor – das representações, dos pré-construídos culturais e da construção

dos objetos –, todavia, estes vinculam-se mais diretamente à esquematização discursiva. De

forma resumida:

O postulado das representações remete às “representações mentais” dos

interlocutores. Embora a lógica natural não pretenda examinar a realidade

psicológica das representações mentais [...] ela assume que os interlocutores

têm representações e que estas são fundamentais na comunicação discursiva.

O postulado dos pré-construídos culturais estabelece que os interlocutores

mobilizam um conjunto de conhecimentos pré-construídos, de natureza

cultural e social, a começar pela própria língua utilizada. [...] São os pré-

construídos que fazem com que um texto seja, ao mesmo tempo, um produto

verbal e um produto social. Finalmente, o postulado da construção dos

objetos refere-se ao fato de que o discurso constrói objetos de pensamento, a

partir da significação dos termos que utiliza. Esses objetos remetem aos

referenciais do discurso, que devem ser, pelo menos parcialmente, comuns

aos interlocutores. (PASSEGGI, 2001, p. 248).

Grize (1996), ao definir esquematização, articula esses postulados em um esquema

que representa o seu entendimento sobre a situação de interlocução. Vejamos:

Esquema 5 – A esquematização na situação de interlocução (GRIZE, 1996, p. 68)

Fonte: Passeggi (2001, p. 251, com adaptações).

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62

Uma esquematização é resultado da interação sociodiscursiva entre um locutor (A) e

um alocutário (B). “Trata-se de sujeitos que desempenham cada um uma atividade: atividade

de construção por parte de A e atividade de reconstrução por parte de B” (GRIZE, 1996, p.

68).

Passeggi (2001, p. 249) afirma que “toda esquematização contém imagens que, na

terminologia de Grize, são os elementos visíveis no texto para um observador, ressalvadas as

interpretações possíveis”. Com isso, entendemos que A constrói (esquematiza), por meio de

enunciados, uma representação discursiva através de objetos de discurso que são postos em

jogo com base nos pré-construídos e no propósito comunicativo que ele intenciona. Por sua

vez, cabe ao interlocutor (B) – um sujeito ou um auditório – reconstruir os sentidos

provenientes dos objetos construídos por A. Para isso, B terá de interpretar o conteúdo

referencial com base nos seus próprios pré-construídos culturais e sociais, bem como em seu

propósito comunicativo.

Todavia, faz-se necessário ressaltar que “a construção dos objetos do discurso deve

ser, necessariamente, uma co-construção, na medida em que estes são sempre objetos ad hoc

que devem adequar-se a propósitos discursivos específicos e momentâneos” (PASSEGGI,

2001, p. 248). Isto porque, os interlocutores A e B são vistos como agentes nos processos de

produção e interpretação dos enunciados.

É, com base nas questões da lógica natural apresentadas, que percebemos a intersecção

entre os pressupostos desse estudo com os da ATD no que concerne à noção de representação

discursiva. Entendemos, a priori, que “esquematizar é construir [...] uma representação

discursiva por definição parcial e seletiva de uma realidade” (ADAM, 2011b, p. 102), logo, os

conteúdos referenciados por meio dos objetos de discurso serão sempre construídos “com

certa visão de quem o produz” (QUEIROZ, 2013, p. 53), bem como reconstruídos pelo

interpretante a partir de sua visão, o que demanda, de ambos, conhecimentos de mundo

comuns sobre o assunto tratado, os quais serão transmitidos e percebidos parcialmente, haja

vista as experiências singulares de cada um deles.

Outro ponto que adotamos para o estudo da Rd, e que a lógica natural apresenta ao

tratar da esquematização, é que esta constrói três imagens: a do locutor – im (A); a do

alocutário – im (B); e a do tema tratado – im (T) (GRIZE, 1996). Nesse sentido, propomos

uma adaptação terminológica, considerando a epistemologia que rege a ATD. Essa adaptação

pode ser evidenciada no quadro a seguir:

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63

Quadro 1 – Os três grupos da Representação discursiva (Rd)

Grize Adam Definição

Imagem do

locutor: im(A)

Representação

discursiva de si

Também chamada de ethos, refere-se à imagem que

o locutor constrói de si mesmo pelas palavras que

evoca em seu texto/discurso. Com base em Adam

(2011b, p. 107), podemos entender que a Rd de si

está associada a “função (lugar) e o(s) papel(éis)

que [orador] assume, com seus fins próprios, seus

pré-construídos culturais e representações da

situação de enunciação, do objeto do discurso, de

seu auditório (B) e as representações psicossociais

de si mesmo”.

Imagem do

alocutário:

im(B)

Representação

discursiva do

alocutário

Associada a Rd que o locutor faz do alocutário (B),

essa representação é percebida pela dialogicidade

da interação comunicativa. Nesse sentido, Amossy

(2011, p. 124) afirma que “o bom andamento da

troca exige que à imagem do auditório corresponda

uma imagem do orador”. Assim, por ser o

alocutário um coconstrutor da representação

presente no texto/discurso, a constante troca de

experiências singulares se presentifica nos

enunciados, revelando a imagem do alocutário

(GRIZE, 1996; PASSEGGI, 2001).

Imagem do tema

tratado: im(T)

Representação

discursiva do tema

tratado

Constituem o que Passeggi (2001, p. 249-250)

chama de “conteúdos do manifesto da

esquematização e remetem diretamente às

operações lógico-discursivas de sua construção”.

As operações a que o autor se refere, concernem à

escolha e o arranjo das palavras que os

interlocutores fazem, permitindo a construção e a

reconstrução das representações discursivas dos

conteúdos referencias evidenciados no e pelo texto

(ADAM, 2011; QUEIROZ, 2013). Fonte: Autor.

Os três tipos de Rd que apresentamos, pelos pressupostos da lógica natural e da ATD,

só são possíveis de serem interpretados considerando a situação de comunicação. Dessa

forma, cabe ao interpretante identificar as pistas textuais deixadas pelo locutor para que se

possa reconstruir, discursivamente, as representações discursivas do locutor, do alocutário (Rd

que coaduna a imagem do próprio interpretante) e dos temas tratados.

Em se tratando da interpretação, outra questão que concerne à esquematização e que

deve orientar o trabalho do analista da Rd é que:

A atividade de reconstrução do alocutário consiste na interpretação da

esquematização. Isso supõe, além da aplicação dos princípios gerais de

cooperação e de coerência, um certo número de competências: competências

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linguísticas, inicialmente lexicais, mas também sintáticas e pragmáticas;

competências culturais, ou enciclopédicas, que remetem a um conhecimento

sociocultural; competências retóricas, baseadas, em grande parte, no uso das

metáforas; competências lógicas, que dependem das anteriores pois

consistem, principalmente, em inferências. (PASSEGGI, 2001, p. 250).

Como vemos, a interpretação de uma Rd não é algo tão simples, posto que demanda

do analista textual-discursivo competências diversas, as quais são necessárias para reconstruir

os efeitos de sentido materializados nas mais diversas atividades de linguagem pelos entornos

sociodiscursivos que regem os textos, orais e escritos.

Em suma, entendemos a representação discursiva como uma propriedade semântica do

texto. A Rd, portanto, revela as interpretações possíveis do locutor, do alocutário e dos temas

tradados, através dos objetos de discurso presentes no texto, dos pré-construídos culturais e

sociais inerentes aos interlocutores, das representações sociocognitivas utilizadas tanto para a

construção como para a reconstrução dos conteúdos referenciais. Enfim, a Rd deve ser

analisada co(n)textualmente para que sejam atribuídos, devidamente, os sentidos permitidos

pelo texto na sua relação com o discurso.

Para tanto, é indispensável tomar conhecimento acerca das categorias semânticas que

possibilitam a análise da Rd, pois elas fornecem os mecanismos necessários para analisarmos

as representações discursivas de Lula nas capas de revista.

3.1.2 Categorias semânticas para análise da Representação discursiva

Conforme apresentado, a noção de representação discursiva tem por base os

postulados da lógica natural, especificamente, do conceito de esquematização (representação),

entendido como a representação semântica que os interlocutores constroem, a partir de suas

atividades sociodiscursivas de interação.

De acordo com Rodrigues et al. (2012, p. 298), na ATD, “a noção de representação

discursiva, ainda que claramente colocada e reconhecida na economia geral das categorias

textuais, encontra-se relativamente pouco desenvolvida e incompleta”.

Na obra de Adam (2011a), o que aparece como particularidades que orientam o estudo

da Rd está atrelada à discussão acerca da sequência descritiva. Para o autor, “inerente ao

exercício da fala, a descrição é, de início, identificável no nível dos enunciados mínimos”

(Ibid., p. 217, grifos do autor). Isto porque, como visto no esquema 3, “a teoria ilocucionária

localiza a parte descritiva dos enunciados no conteúdo proposicional (p), sobre o qual se

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65

aplica um marcador de força ilocucionária” (ADAM, 2011, p. 217). À vista disso, de acordo

com Adam (2011a), basta que se acrescente a um sujeito o predicado para termos um

conteúdo proposicional.

Algo que consideramos relevante na contenda apresentada pelo autor é que ele

diferencia a sequência descritiva das demais (narrativa, argumentativa, explicativa e dialogal).

Nas palavras do autor, “a descrição não comporta uma ordem de agrupamento das

proposições-enunciados em macroproposições ligadas entre si” (Ibid., p. 216). Por esse

motivo, é afirmado pelo autor que a descrição tem uma tênue determinação sequencial.

Confirmando essa fragilidade da caracterização da sequência descritiva, Adam (2011a,

p. 217-218, grifos do autor) afirma que “no nível da composição textual, sejam quais forem

os objetos do discurso e a extensão da descrição, a aplicação de um repertório de operações de

base gera proposições descritivas que se agrupam em períodos de extensão variável,

ordenadas por um plano de texto”. Todavia, como o próprio autor afirma:

Os textos são, de fato, estruturados de maneira muito flexível, e a

importância dos planos [...] é preponderante. Na medida em que os

agrupamentos de proposições não correspondem sempre a sequências

completas, podemos dizer que o principal fator unificador da estrutura

composicional é o plano de texto. [...] Os planos de texto estão, juntamente

com os gêneros, disponíveis no sistema de conhecimentos dos grupos

sociais. Eles permitem construir (na produção) e reconstruir (na leitura ou na

escuta), a organização global de um texto, prescrita por um gênero. (ADAM,

2011a, p. 258).

Por conseguinte, as sequências descritivas não podem ser tomadas como pontuais no

texto, ou seja, um elemento identificável e constituidor do texto, mas, como parte do todo que

compõe o plano textual, o qual possibilita a construção e reconstrução dos sentidos do texto

(discursivamente concretizados em gêneros de discurso).

Pensando, portanto, nos procedimentos de construção semântica da proposição-

enunciado, considerados como ferramentas importantes de descrição dos conteúdos

discursivos, seguimos a orientação de Rodrigues, Passeggi e Silva Neto (2010), que tem por

alicerce as operações de base da sequência descritiva de Adam (2011a) e o estudo das

operações lógico-discursivas de Grize (1990; 1996)15

.

Vale destacar que as categorias que apresentamos nesse trabalho são de cunho

linguístico-textual, embora, algumas vezes, possam apresentar uma nomenclatura concernente

15

Considerando que já foi realizado, por Queiroz (2013), um trabalho de correlações entre as operações logicas

de Grize (1990; 1996) e as demais operações e categorias que norteiam o estudo da Rd, detemo-nos, diretamente,

nas categorias semânticas propostas pelos estudos em ATD.

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ao estudo gramatical da linguagem, assim como fez Adam (2011a) ao afirmar que a junção de

um sujeito a um predicado constitui uma proposição. Diante disso, nos apropriamos de

estudos linguísticos e gramaticais para complementar as categorias semânticas que subsidiam

a análise da Rd, tais como Ilari (2009), Neves (2011) e Castilho (2010).

Ademais, na esteira dos trabalhos desenvolvidos pelo Grupo de Pesquisa em Análise

Textual dos Discursos, especialmente os que focalizam a representação discursiva, adotamos

como categorias semânticas para a análise da Rd a referenciação, a predicação, a

modificação, a relação e a localização espacial e temporal (RODRIGUES; PASSEGGI;

SILVA NETO, 2010; ADAM, 2011a; RAMOS, M., 2011; PASSEGGI, 2012; RODRIGUES

et al., 2012; OLIVEIRA, 2013; QUEIROZ, 2013; entre outros).

3.1.2.1 Referenciação

De acordo com Koch (2009, p. 61), “a referenciação constitui [...] uma atividade

discursiva”. Essa afirmação converge para a ideia de Rd como construção e reconstrução de

objetos de discurso, haja vista ser por meio da ação linguageira que o locutor realiza escolhas

no repertório linguístico que ele possui a sua disposição, com vistas a representar estados de

coisas, isto é, “os processos de referenciação são escolhas do sujeito em função de um querer-

dizer” (KOCH, 2009, p. 61).

Consequentemente, a reconstrução desses objetos de discurso dá-se pela representação

que os pré-construídos culturais, sociais e cognitivos do interlocutor (interpretante) têm em

comum com os do locutor, posto que:

todo discurso constrói uma representação que opera como uma memória

compartilhada (memória discursiva, modelo textual) [...], sendo os

sucessivos estágios dessa representação responsáveis, ao menos em parte,

pelas seleções feitas pelos interlocutores, particularmente em se tratando de

expressões referenciais. (Ibid., p. 61).

Embora não utilize a nomenclatura referenciação, Adam (2011a, p. 218) afirma que “a

escolha de um nome próprio ou de um nome de objeto mais ou menos específico muda,

naturalmente, o enquadramento do objeto do discurso”. Entendemos, com isso, que, a

depender da situação de comunicação e das intenções do locutor, os referentes adquirem

nuances de sentido, as quais devem ser reconstruídas pelo interlocutor na interpretação.

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67

A referenciação pode ser identificada como o elemento linguístico-discursivo sobre o

qual se estabelece uma predicação, isto é, um elemento que representa algo do mundo

(pessoas, coisas, acontecimentos, etc.) e que desencadeia uma situação discursiva referencial

(RODRIGUES, PASSEGGI, SILVA NETO, 2010).

Nesse sentido, Castilho (2010, p. 126) afirma que a referenciação é “a função pela

qual um signo linguístico representa quaisquer entidades do mundo extralinguístico, reais ou

imaginários”16

. Posto isso, quando enunciamos a palavra “Lula”, por exemplo, em uma dada

situação discursiva, possibilitamos ao interpretante reconstruir uma representação desse

objeto de discurso (referente). Ratificamos que a interpretação dar-se-á a partir dos pré-

construídos culturais e sociais que o interpretante possui acerca do referente dado.

Na perspectiva semântica, o referente (objeto de discurso produzido na e pela prática

discursiva de uso da linguagem) é construído pela operação de referência, esta compreendida

como uma “operação linguística por meio da qual selecionamos, no mundo que nos cerca, um

ou mais objetos (isto é, pessoas, coisas, acontecimentos) específicos, tomando-os como

assuntos das nossas falas” (ILARI, 2009, p. 177). Os referentes, no jogo discursivo,

desempenham papeis temáticos que “são distintos das funções gramaticais de sujeito, objeto e

adjunto [...]” (Ibid., p. 132).

Esquema 6 – Os papeis temáticos numa perspectiva semântica

Fonte: Autor.

Esse esquema põe em questão a referenciação na atividade de linguagem. Por meio

dela, o locutor constrói os objetos de discurso, ou referentes, os quais, pela ação visada do

16

Essa definição apresentada por Castilho apoia-se nos estudos de Ducrot/Todorov (1972/1998).

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locutor, assumem papeis temáticos. É também por meio da referenciação que o alocutário17

vai interpretar os objetos de discurso, reconstruindo os sentidos a partir dos papeis temáticos

que esses objetos assumem na ação de linguagem.

Ilari (2009) afirma que os papeis temáticos apresentados no esquema são os mais

comuns. Desta forma, esses papeis só são possíveis de definir de acordo com o sentido

proveniente da ação, ou seja, por meio do verbo que rege o enunciado.

De forma sintética, os papeis temáticos podem ser conceituados do seguinte modo:

o agente (o indivíduo que tem a iniciativa da ação, que tem controle

sobre a realização da ação);

o alvo [paciente] (o indivíduo ou objeto diretamente afetado pela

ação);

o instrumento (o objeto de que o agente se serve para praticar a

ação);

o beneficiário (o indivíduo a quem a ação traz proveito ou prejuízo);

o experienciador (o indivíduo que passa pelo estado psicológico

descrito pelo verbo). (ILARI, 2009, p. 131, grifos do autor).

São esses papeis semânticos, linguisticamente referenciados por meio de nomes

(substantivos) ou expressões equivalentes, que chamaremos de participantes (PASSEGGI,

2012). Ressaltamos que a adoção dessa terminologia se dá por estarmos em consonância com

o trabalho de Passeggi (2012, p. 236), no qual ele afirma que os participantes “são entidades –

seres, coisas, lugares, etc. – envolvidas nos eventos”, logo, referentes discursivamente

textualizados. Além disso, Ilari (2009) e Neves (2011) apontam para o uso dos artigos

definidos (o, a, os e as) e os pronomes demonstrativos (esse, essa, aquele, aquela, etc.) como

marcas que facilitam a localização e compreensão dos referentes no discurso.

Outra questão com a qual concordam os estudiosos da referenciação é o fato de ela

poder ocupar duas posições: a de tematização (ou categorização) e a de retematização (ou

recategorização)18

.

A primeira diz respeito à ancoragem que, segundo Adam (2011a), seria o termo que

sustenta a predicação. Koch (2009, p. 64, grifos da autora) afirma que “quando representado

por uma expressão nominal, esta opera uma categorização do referente”.

17

Em nossa tese, adotamos a denominação alocutário em detrimento de interlocutor pela filiação aos estudos da

esquematização proposto por Grize (1990; 1996) e que orientam a concepção de Rd por nós assumida. 18

Para efeito de análise, em nossa tese, adotamos as nomenclaturas categorização e recategorização, uma vez

que seguimos os trabalhos realizados na perspectiva da Análise Textual dos Discurso, especificamente aqueles

que discutem as Rds em textos concretos (RAMOS, M., 2011; QUEIROZ, 2013; OLIVEIRA K., 2013; entre

outros). Além disso, quando usarmos os termos tema, tematizado, ou similares, estaremos nos referindo ao

assunto abordado pelas revistas, uma vez que buscamos compreender as representações discursivas de Lula, i.é,

do tema tratado por Época e Veja em suas capas.

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A segunda, por sua vez, pode ser definida como “fenômeno cognitivo-discursivo que

corresponde à evolução natural que todo referente sofre ao longo do desenvolvimento do

texto” (CAVALCANTE, 2011, p. 90). Adam (2011a) afirma que para haver a retematização,

ou seja, uma nova denominação do objeto, faz-se necessário “a existência de uma primeira

nomeação [N] do objeto do discurso”.

Em síntese, entendemos que a referenciação, através dos objetos de discurso

(referentes), constitui a base semântica para a compreensão da Rd, haja vista ser por meio dela

que os sujeitos realizam operações de representação do conteúdo referencial, à medida que o

discurso se desenvolve (KOCH, 2009).

3.1.2.2 Predicação

Adam (2011a) não dispensa, na ATD, um tópico à predicação enquanto

macrooperação de análise da Rd, mas, ao tratar da sequência/período descritivo, o autor

afirma que: “A atribuição mínima de um predicado a um sujeito constitui a base de um

conteúdo proposicional” (ADAM, 2011, p. 217). Como vemos, o autor reconhece que o

predicado, aqui, tratado numa categoria mais abrangente, – predicação –, é fundamental para

se compreender o conteúdo descritivo que expressa um ponto de vista.

Nesse sentido, consideramos a predicação como elemento de grande importância para

se compreender as representações que se criam dos objetos de discurso: as predicações são

seleções feitas pelo enunciador para designar um processo (ação, estado, ou outro) que

gerencia a enunciação, bem como situa os participantes na proposição (RODRIGUES;

PASSEGGI; SILVA NETO, 2010; PASSEGGI, 2012).

De acordo com Passeggi (2012), a predicação é, linguisticamente, construída por meio

de verbos e locuções verbais, os quais ele denomina por processos, terminologia que também

adotamos em nosso trabalho. Assim, a predicação é sempre algo que se diz sobre um referente

e que caracteriza o valor semântico, primariamente pelo processo.

Quadro 2 – Exemplo de constituição básica da predicação

O PT fica rico e monta uma supermáquina.

Participante Processos

SUJEITO PREDICADO Fonte: Autor

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No quadro, que ora apresentamos, PT (Partido dos Trabalhos) é o participante, ou seja,

o referente sobre o qual se predica algo. Os processos fica e monta constituem o predicado, ou

seja, são os responsáveis pela predicação no enunciado. Passeggi (2012, p. 237) relata que

“mantemos o termo tradicional de ‘predicado’ para expressar ‘o que se diz (predica) do

sujeito’, pois trata-se de uma importante ferramenta de análise semântica. Para designar o

verbo ou a locução verbal usaremos o termo ‘predicador’”. Por isso, os processos fica e monta

são os predicadores do sujeito PT.

De acordo com Castilho (2010, p. 243), “no sistema de semântica, a predicação pode

ser definida como um processo de atribuição de traços semânticos”, ou seja, a predicação

atribui sentidos a um determinado elemento da proposição. Sendo assim, um predicador

poderá exercer um traço semântico sobre o referente ou sobre os demais argumentos

envolvidos em um enunciado, o que possibilita compreender as representações que se deseja

criar ou são inconscientemente criadas pelo enunciador.

Para Castilho (2010), que utiliza uma noção de predicação mais ampla que a da

predicação verbal – incluindo substantivos, adjetivos e preposições –, a predicação é uma

operação de transferência de traços semânticos que, quando ocorre sobre uma classe-escopo19

manifesta três grandes mecanismos:

(i) a transferência afetou a intensão da classe-escopo: ocorreu uma

predicação por qualificação, como em livro divertido; (ii) a transferência

afetou a extensão da classe-escopo: ocorreu uma predicação por

quantificação, como em tanta risada; (iii) a transferência afetou a

modalidade da classe-escopo: ocorreu uma predicação por modalização,

como seria em [...] De fato, aquele velhinho está lendo atentamente um livro

divertido. (CASTILHO, 2010, p. 128, grifos do autor).

Como vemos, a predicação se dá por operações distintas que desencadeiam atributos,

quantificações ou modalizações sobre um referente. “Nesse sentido, a predicação e a

referenciação formam a base de constituição dos enunciados em que à predicação se associam

os termos ligados pelo processo de referenciação.” (QUEIROZ, 2013, p. 61). Enfim, a

predicação sobre um referente pode atribuir sentidos às pessoas, a objetos, ou a

acontecimentos, isto é, objetos de discurso.

19

Uma classe-escopo pode ser entendida como sendo um constituinte do enunciado sobre o qual se predica algo

como, por exemplo, o referente.

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3.1.2.3 Modificação

Para a discussão acerca dessa categoria, tomamos como norte a discussão esboçada em

Oliveira (2013) e Queiroz (2013). As estudiosas, fundamentadas nos postulados da ATD,

propõem chamar de modificação a categoria denominada por Adam (2011a) como

aspectualização. Considerando, que o termo aspectualização pode estabelecer um conflito

com a noção de aspecto verbal, as autoras optam pela referida nomenclatura. Todavia, apenas

se foi alterado o nome da categoria, haja vista ter-se mantido o fundamento teórico-

epistemológico que a conceitua. Por esse motivo, seguimos as orientações de Rodrigues,

Passeggi e Silva Neto (2010), Adam (2011a), Ramos, M. (2011), Passeggi (2012)20

, adotando

a nomenclatura utilizada nos trabalhos sobre a Rd.

Em sua obra, Adam (2011, p. 219) coloca a aspectualização (modificação) como uma

macrooperação “que se apoia na tematização”. Por sua vez, Rodrigues, Passeggi e Silva Neto

(2010, p. 175), afirmam que ela “refere-se às características ou propriedades tanto dos

referentes como das predicações”.

Nas palavras de Queiroz (2013, p. 59), “interpretamos essa categoria como sendo a

modificação do referente”. Ao definir, portanto, a modificação, a estudiosa diz que “ela está

ligada tanto ao sujeito, por meio de adjetivos e/ou expressões adjetivas, quanto às ações

verbais dos predicados, por meio das circunstâncias adverbiais” (Ibid., p. 67).

Diante disso, a modificação traz consigo a ideia de transformar, de variar, de mudar,

ou seja, de atribuir características aos objetos de discurso. Dessa forma, compreendemos que

a modificação diz respeito à conferência de qualidades a sujeitos e a predicados. Nessa

perspectiva, conforme Rodrigues, Passeggi e Silva Neto (2010), as predicações são incluídas

como elementos passíveis de serem qualificados, o que nos auxilia na análise da Rd em textos

concretos. Vejamos no quadro, a seguir, um caso de aspectualização:

Quadro 3 – Exemplo de aspectualização e elemento

O PT deixou o Brasil mais burro?

Participante Modificação da predicação

SUJEITO LOCUÇÃO ADJETIVA Fonte: Autor.

20

Ao utilizar a nomenclatura aspectualização estamos mantendo o respeito às obras anteriores aos estudos de

Oliveira, K. (2013) e Queiroz (2013) e que lhes serviram de fundamentação. Todavia, em nosso trabalho,

aspectualização deve ser entendida como modificação.

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72

A locução adjetiva “mais burro” atribui uma qualificação ao objeto de discurso “o

Brasil”, no predicado regido pelo processo deixou.

Concluindo nosso posicionamento, resumimos o que entendemos por modificação e

como ela é identificada linguisticamente na referenciação de participantes e na predicação.

Quando tratamos dos participantes (referentes no discurso) são usados mecanismos de

linguagem que fornecem atributos ou qualificam os referentes, ou seja, são utilizados

adjetivos ou expressões qualificativas. No que concerne aos processos – verbos –, a

modificação designa características ou propriedades desses processos e é verificada na

proposição como expressões que são típicas de indicação de circunstância. Nesses casos, os

adjetivos e os advérbios e locuções adverbiais (elementos circunstanciais), exceto as

circunstâncias de tempo e lugar, são marcas que atribuem sentidos aos referentes e aos verbos

os qualificando, o que possibilita uma interpretação da Rd.

3.1.2.4 Relação

Adam (2011a) caracteriza a macrooperação de relação como constituída por duas

outras operações: contiguidade e analogia. A primeira atua no texto por meio de elementos

que deem continuidade ao que está sendo enunciado e a segunda com base nas comparações e

metáforas.

Rodrigues, Passeggi, Silva Neto (2010) referem-se à primeira operação como sendo

um processo de ligação entre enunciados e Passeggi (2010) denominou a relação de

contiguidade como conexão: esses elementos estabelecem ligações entre enunciados,

elementos de enunciados ou partes do texto.

Nessa perspectiva, Castilho (2010, p. 133) ao descrever as categorias de análise

semântica afirma que a conectividade é “gramaticalizada como preposições e conjunções”.

Nesse sentido, os conectores vão estabelecer, semanticamente no texto, relações de causa,

consequência, finalidade, etc. Além de servir como marcador sequencial ou conceitual-

cognitivo, para usar as palavras de Marcuschi (2009 [1983]), os quais conectam logicamente o

texto (coesão) e podem atribuir sentidos por meio de seus usos (coerência), desencadeando

um contínuo textual. Portanto, os conectores desempenham papel semântico importante na

produção co(n)textual de uma prática discursiva, haja vista eles serem orquestradores de uma

coesão textual necessária a uma interpretação.

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Deve-se ressaltar, porém, que “do ponto de vista lógico, o discurso aparece como uma

concatenação de enunciados; isso exige que conheçamos as conexões que existem entre eles.

Por outro lado, não implica que as conexões de representação discursiva sejam sempre

lineares” (PASSEGGI, 2001, p. 260). Isto posto, entendemos que, mesmo a conexão sendo

um elemento importante na construção do texto/discurso e, consequentemente, na construção

da Rd, não é pela sua falta ou pela pouca presença de marcas de contiguidade que as

proposições-enunciados deixarão de, discursivamente, construir e possibilitar a reconstrução

de sentidos.

A analogia, segunda operação de que trata Adam (2011a), pode ser percebida no texto

por meio de comparações e metáforas, ou seja, figuras de linguagem que estabelecem

significação por meio de elementos que indicam relação entre domínios cognitivos diferentes

(RAMOS, M., 2011).

A comparação é marcada pelo estabelecimento de uma relação de semelhança entre

dois objetos de discurso. Linguisticamente, ela difere-se da metáfora pela presença explicita

de elementos comparativos, tais como as conjunções. Segundo Queiroz (2013, p. 67), a

comparação “é reconhecida no texto por meio de elementos linguístico-discursivos que

demarcam a comparação entre objetos, que pode ser feita por meio de pares textuais: como,

tanto... quanto..., ou de metáforas”.

Todavia, as metáforas não se manifestam por meio de um elemento explícito, estas são

constituídas por uma comparação implícita que resulta na utilização de domínios semânticos

diversos para a construção comparativa. É, nesse sentido, que Marcuschi (2007, p. 119)

afirma que a metáfora é “algo mais do que um simples fenômeno linguístico”.

Na verdade, ela pode ser tida como ponto de apoio para uma análise de

capacidade criativa espontânea do indivíduo, sendo então, apenas do ponto

de vista operacional, uma transposição de significado, mas, do ponto de

vista genético e psicológico, ela seria a criação de novos universos de

conhecimento. Criaria, pois, uma realidade nova. (Ibid., p. 121).

Por esse ângulo, a metáfora ultrapassa os limites de uma comparação, ela reflete novas

perspectivas sobre os objetos de discursos para os quais ela se refere. Por esse motivo, é que o

autor afirma que a metáfora não está presa a linguagem “ao criar uma realidade nova não

puramente linguística” (MARCUSCHI, 2007, p. 122). Assim, ao construir uma Rd, o locutor

faz uso da metáfora para representar, discursivamente, por meio de universos distintos, um

conteúdo referencial.

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Quadro 4 – Exemplos de comparação e metáfora

Metáfora Comparação

OS PTBULLS

Financiados pelo governo e chefiados por um dirigente do

partido, os agitadores que depredaram o Congresso

Nacional são apenas um dos grupos que se comportam

como o braço armado do PT

Campos semânticos diferentes

Partidários do PT ≠ Animal

Uso da conjunção comparativa “como”

Fonte: Autor.

A metáfora, ora apresentada, é o que intitula o texto que segue e no qual aparece a

comparação. Além de constituir-se de um neologismo, percebemos campos semânticos

diferentes entre os elementos que constituem o referente. Na comparação, por seu turno, é

explicitada a comparação entre “os agitadores que depredaram o Congresso Nacional” e “o

braço armado do PT”, ambos articulados pela conjunção como.

Em conclusão a categoria relação, entendemos que o uso de proposições-enunciados

comparativo ou metafórico pode ser visto como uma construção capaz de reforçar, depreciar,

elogiar, etc. Desse modo, tais elementos textuais manifestam, no discurso, representações dos

participantes envolvidos na prática discursiva. Vale lembrar que, mesmo dada uma proposição

que opere por analogia, a interpretação do sentido empregado só ocorre co(n)textualmente,

através da representação que locutor e interlocutor comportam em sua memória discursiva.

3.1.2.5 Localização

A última categoria que elencamos, em nosso trabalho, é a localização. Segundo

Rodrigues, Passeggi, Silva Neto (2010, p. 176), essa categoria “indica as circunstâncias

espaçotemporais nas quais se desenvolvem os processos e participantes”.

Adam (2011a), nomeia os elementos que indicam tempo e espaço, referente a Rd,

como organizadores. Em suas palavras, “os organizadores exercem um papel capital no

balizamento dos planos textuais” (ADAM, 2011a, p. 181). Esse posicionamento concerne à

estrutura do texto, pensando, por exemplo, a ideia de início, meio e fim do texto; em primeiro

lugar, em segundo lugar... por último, etc.

Porém, conforme já dissemos, à Rd, o autor aponta apenas dois tipos de organizadores:

os espaciais e os temporais. Em nossa tese, seguindo os trabalhos com ênfase na Rd, usamos a

nomenclatura localização espacial e temporal (RODRIGUES et al., 2012; OLIVEIRA, 2013;

QUEIROZ, 2013).

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75

Linguisticamente, a localização é marcada no texto por expressões que indicam tempo

e lugar, ou seja, advérbios e/ou expressões adverbiais, tais como:

Quadro 5 – Advérbios e/ou expressões adverbiais de tempo e lugar

Elementos que

expressam localização Tempo Lugar

ADVÉRBIOS

afinal, agora, amanhã, antes,

ontem, breve, cedo, nunca,

depois, enfim, enquanto, isso,

hoje, sempre, já, jamais, tarde,

imediatamente, primeiramente,

constantemente, etc.

abaixo, acima, adiante, afora,

aí, além, ali, aqui, atrás, cá, lá,

dentro, embaixo, longe, perto,

nenhures (em nenhum lugar),

alhures (em outro lugar),

algures (em algum lugar), etc.

EXPRESSÕES

ADVERBIAIS

às vezes, à tarde, à noite, de

manhã, de repente, de vez em

quando, de quando em quando,

em breve, hoje em dia, etc.

a distância, à distância de, de

longe, de perto, de cima, à

direita, à esquerda, ao lado, em

volta, por aqui Fonte: Autor.

Com base nesse quadro, percebemos que são muitos os elementos linguísticos que

expressam a localização espacial e temporal, entretanto, ao fazermos uso de um elemento em

detrimento dos demais, estamos imbuindo nesse uso sentidos que só podem ser determinados

no contexto discursivo em que o elemento foi enunciado. Além disso, Adam (2011a, p. 182,

grifos do autor) ressalta que, no texto, “os organizadores temporais possuem uma propriedade

interessante: a de poder se combinar conforme uma ordem de informatividade crescente: E +

então + depois + após/em seguida/mais tarde/logo em seguida”. Assim, essa categoria, no

texto, possibilita, ao interpretante, reconstruir localizações espaçotemporais dos conteúdos

referenciais enunciados pelo locutor, situando a representação feita dos objetos de discurso.

Todas as categorias apresentadas refletem apenas uma parte daquelas que podem

servir aos propósitos do analista da Rd, pois, concordamos com Passeggi (2012, p. 238), que

“as categorias mencionadas não constituem uma lista fechada”, uma vez que elas podem ser

desdobradas em subcategorias, contribuindo ainda mais para uma análise textual-discursiva da

Rd. Todavia, “são todas situações metodologicamente aceitáveis, e até positivas, na medida

em que levam a focalizar as perspectivações conceptuais mais finas do texto” (Ibid., p. 238).

Por fim, concordamos quando Rodrigues et al. (2012, p. 298) afirmam que as

categorias apresentadas tratam-se de “procedimentos de textualização gerais e elementares

que estão na base da construção de todo texto”, por isso, “são transversais a todos os tipos de

sequência (i.é, quanto ao seu conteúdo referencial/descrito)”.

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Além disso, por ser a Rd “habitualmente composta por um conjunto – uma rede – de

proposições e uma rede lexical” (RODRIGUES; PASSEGGI; SILVA, 2010, p. 174), isso

demanda categorias distintas, como as que apresentamos, para que seja possível dar conta da

interpretação da(s) representação(ões) discursiva(s) de Lula nas capas das revistas Época e

Veja.

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CAPÍTULO 4

4 QUESTÕES TEÓRICO-METODOLÓGICAS DA PESQUISA

Destinamos a este capítulo a descrição teórico-metodológica que ampara a nossa

pesquisa de doutoramento. Ressaltamos, portanto, que o uso do termo teórico-metodológico

explica-se por buscarmos situar teoricamente o nosso estudo, partindo das pesquisas

desenvolvidas sobre representações discursivas21

, explicitando conceitos que serão

fundamentais para compreendermos melhor o corpus analisado. Além disso, a metodologia,

ora apresentada, constitui os princípios científicos que norteiam nosso trabalho para que

possamos alcançar os objetivos a que nos propomos e que foram explicitados na introdução.

4.1 CONTEXTUALIZAÇÃO DA PESQUISA

Conforme mencionamos na introdução desse trabalho, nossa tese integra-se a um

leque de pesquisas realizadas junto ao Grupo de Pesquisa Análise Textual dos Discursos. Por

este viés, tomando por referência a ATD, os pesquisadores que compõem esse grupo têm

dedicado sua atenção às diversas questões textuais-discursivas, com o objetivo de descrever,

interpretar e analisar práticas discursivas concretas.

Vimos também que, ao propor a ATD, Adam (2011a) pensa a produção co(n)textual

dos sentidos como sendo uma constituição relacional entre os níveis do texto e os níveis do

discurso, colocando-os como necessariamente conjuntos para a produção, construção e

recepção dos textos. Ao apresentar esses níveis, Adam (2011a) aponta possibilidades de

análise do texto, refletindo as várias nuances teóricas que constituem a sua proposição

teórico-metodológica. Cada nível pode ser analisado isoladamente a partir do texto, mas isso

não os coloca como entidades estanques. Os conhecimentos sobre cada nível são igualmente

relevantes e necessários à descrição, à interpretação e à análise dos textos concretos.

21

Com isso, não pretendemos realizar o estado da arte sobre os estudos que discutem a representação discursiva,

mas, sim, construirmos, pelo contexto das produções, um quadro metodológico que norteará as nossas escolhas

metodológicas para a realização desta tese.

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78

Nessa perspectiva, nossa vinculação teórica à ATD é definida pelo sexto nível

proposto por Adam (2011a), isto é, o nível semântico do qual a representação discursiva

encontra-se como a noção principal a ser observada nos textos.

Dentre as publicações já referenciadas no segundo e terceiro capítulos que discutem a

ATD e, mais especificamente, questões relativas aos níveis de análise textual-discursiva,

destacamos as produções de Rodrigues, Passeggi, Silva Neto (2010), Passeggi et al. (2010),

Passeggi (2012), Rodrigues et al. (2012), as quais tomam textos concretos e analisam, entre

outras questões de pesquisa, a representação discursiva.

No panorama dos estudos científicos sobre a representação discursiva, principalmente

aqueles que foram produzidos por pesquisadores em formação, vinculados ao Grupo de

Pesquisa em Análise Textual dos Discursos, hoje, temos duas dissertações de mestrado e três

teses de doutorado defendidas, as quais apresentamos suscintamente para, em seguida,

elaborarmos um quadro descritivo das definições metodológicas adotadas por essas pesquisas.

O primeiro trabalho a ser defendido sobre a temática das Rds foi a tese Representações

discursivas de Ficar e Namorar em textos de vestibulandos e pré-vestibulandos, de autoria de

Milton Guilherme Ramos, no ano de 2011. Em seu trabalho, o pesquisador coaduna ao estudo

da ATD os postulados da Semântica de Frames. Além de uma análise textual-discursiva, o

autor propõe-se a observar as implicações de seu estudo em relação ao ensino da produção de

texto. Desse modo, no que diz respeito às representações discursivas, conforme Ramos, M.

(2011), por meio de designações dos referentes, da predicação, da aspectualização, das

circunstâncias espaciotemporais e das metáforas pode-se evidenciar diferentes representações

discursivas de ficar e namorar22

.

O segundo trabalho é a dissertação Representações discursivas da figura feminina no

jornal o porvir (Currais Novos/Rio Grande do Norte - 1926-1929): um sexo que ironicamente

se intitula de frágil, de autoria de Karla Geane de Oliveira, defendida no ano de 2013. Nela, a

autora analisa como se constroem as representações discursivas da figura feminina no jornal

O PORVIR, periódico que circulou na cidade de Currais Novos, entre os anos de 1926 e 1929.

Como resultados, a autora evidenciou que as representações discursivas mais presentes foram:

senhorinha, mãe, esposa e dona de casa. Essas representações sempre ocorreram em

consonância com as questões de ordem da maternidade, do casamento e da dedicação ao lar,

as quais “não se distanciam dos modelos preconizados no início do século XX, para servirem

de padrão para essa figura” (OLIVEIRA, K., 2013, p. 15).

22

Para maiores esclarecimentos quanto às representações discursivas de “ficar” e “namorar”, ver Ramos, M.

(2011).

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O terceiro trabalho defendido foi o de Queiroz (2013) – Representações discursivas no

discurso político. “Não me fiz sigla e legenda por acaso”: o discurso de renúncia do senador

Antonio Carlos Magalhães (30/05/2001). Em sua tese, a estudiosa traça como objetivo

investigar como as representações discursivas do locutor e dos alocutários são construídas no

discurso de renúncia ao mandato de senador, proferido por Antonio Carlos Magalhães

(ACM), na 62ª sessão deliberativa ordinária, em 30/5/2001. De acordo com a autora, “na

representação discursiva de si, o locutor desencadeia um conjunto de representações: ‘vítima;

político; sigla; nordestino; presidente do senado; senador confiante; condenado’.”

(QUEIROZ, 2013, p. 176). Essas são as principais constatações feitas pela autora, haja vista

ela analisar outras representações subjacentes ao discurso de renuncia, as quais dizem respeito

aos alocutários, isto é, aqueles sobre os quais Antonio Carlos Magalhães relata em seu

discurso.

O quarto trabalho, A representação discursiva da vítima e do agressor no gênero

sentença judicial, de autoria de autoria de Alba Valéria Saboia Teixeira Lopes, foi defendido

em 2014. Em sua dissertação, a pesquisadora se propõe a identificar e descrever o fenômeno

da representação discursiva da vítima e do agressor, tomamdo como objeto de pesquisa o

gênero sentença judicial. Assim como as demais pesquisas, Lopes (2014) parte da ATD,

focalizando a noção da representação discursiva proposta por Jean-Michel Adam. Como

resultados, a autora afirma que a construção da representação discursiva dos sujeitos (vítima e

agressor) a partir de PdV de enunciadores distintos, podem aproximar-se ou distanciar-se de

acordo com a orientação argumentativa do texto.

O último trabalho sobre representação discursiva defendido pelo grupo foi o de

Zamblano (2014). Tese intitulada por Análise textual das representações discursivas no

discurso político brasileiro: o discurso da primeira posse da presidenta Dilma Rousseff

(1°/01/2011). Nesse trabalho, a pesquisadora descreve a representação discursiva que a

presidenta Dilma Rousseff faz de si mesma no seu discurso de posse. Seus achados apontam

que a representação discursiva da presidenta é configurada por meio de diferentes domínios

conceituais, com destaque para as designações e ações e para os estados de mulher e de

presidenta, que remetem, respectivamente, aos domínios de gênero e ao papel político-

institucional. Além disso, o discurso de posse explicita, portanto, designações positivas da

presidenta, como líder do Brasil, com ativa participação na ação de transformar o país, mas

também levando em consideração uma história de vida, uma biografia de lutas.

Para a realização dessas pesquisas foram estabelecidos quadros metodológicos que, de

modo sintético, nos orientam em relação à realização do nosso trabalho. Vejamos, no quadro a

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seguir, as definições metodológicas dos trabalhos apresentados para, posteriormente,

expormos as nossas definições metodológicas.

Quadro 6 – Relações de metodologia entre os trabalhos sobre Rds

Questões Metodológicas

Definições

Pesquisadores

Ramos, M.

(2011)

Oliveira, K.

(2013)

Queiroz

(2013)

Lopes

(2014)

Oliveira, A.

(2014)

Abordagem Quali-

quantitativa

Quantitativa e

qualitativa Qualitativa Qualitativa

Qualitativa e

quantitativa

Natureza Descritiva e

interpretativa

Descritiva e

interpretativa Interpretativa Descritiva

Descritiva e

interpretativa

Campo de

investigação

Texto

empírico –

redações – e

vestibulandos

e pré-

vestibulandos

Texto

empírico –

textos de

jornal que

abordam a

figura

feminina

Texto

empírico –

discurso

político de

renúncia

Texto

empírico –

sentença

judicial

Texto

empírico –

discurso de

posse

Tipo de

pesquisa -

Documental

(fontes

primárias)

Documental Documental -

Método Indutivo - Dialético-

hermenêutico

Indutivo-

dedutivo -

Técnica - Análise de

conteúdo

Análise de

conteúdo - -

Fonte: Autor.

4.2 ASPECTOS METODOLÓGICOS DA PESQUISA

Na trilha dos estudos que visam a descrever e a interpretar as unidades linguísticas,

textuais e discursivas que estão em jogo na composição de ações de linguagem e, por

conseguinte, permitem a manifestação de sentidos, realizamos uma pesquisa que toma a

abordagem qualitativa como fundamento metodológico principal. Essa orientação se deu pelo

fato de a abordagem qualitativa ser “um processo de reflexão e análise da realidade através da

utilização de métodos e técnicas para compreensão detalhada do objeto de estudo em seu

contexto histórico e/ou segundo sua estruturação” (OLIVEIRA, M., 2013, p. 37).

Os pressupostos de uma pesquisa qualitativa, segundo Chizzotti (2010), opõem-se ao

pressuposto experimental. Este “defende um padrão único de pesquisa para todas as ciências,

calcado no modelo de estudo das ciências da natureza” (Ibid., p. 78). Por seu turno, a pesquisa

qualitativa entende que:

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81

O conhecimento não se reduz a um rol de dados isolados, conectados por

uma teoria explicativa; o sujeito-observador é parte integrante do processo

de conhecimento e interpreta os fenômenos, atribuindo-lhes um significado.

O objeto não é um dado inerte e neutro; está possuído de significados e

relações que sujeitos concretos criam em suas ações. (CHIZZOTTI, 2010, p.

79).

Nesse sentido, o conhecimento é construído pela relação entre o pesquisador e objeto

pesquisado, haja vista não haver uma rigidez no controle dos dados de forma a se ter uma

explicação fixa para o que é estudado. Na abordagem qualitativa o pesquisador exerce

influência sobre os dados, pois, o que é abstraído como resultado depende dos saberes do

pesquisador sobre estes em sua plurissignificação. Não obstante, o processo de uma

abordagem qualitativa “implica em estudos segundo a literatura pertinente ao tema,

observações, [...] análise de dados, que deve ser apresentada de forma descritiva”

(OLIVEIRA, M., 2013, p. 37). Tudo isso é fundamental para que o pesquisador construa sua

base conceitual para que ele possa agir com mais plausibilidade ao descrever e interpretar o

fenômeno em estudo.

Em nossa pesquisa, amparamo-nos em tal opção metodológica pelo enfoque teórico –

Análise Textual dos Discursos – que adotamos como literatura norteadora desse trabalho. À

vista disso, a ATD visa a analisar a produção co(n)textual dos sentidos em textos concretos,

conforme apresentamos no segundo capítulo. Por conseguinte, baseando-nos na proposta da

ATD, desenvolvemos uma análise das representações discursivas de Lula nas capas das

revistas Época e Veja. Para tanto, a análise implica em uma descrição do fenômeno citado e

demanda conhecimentos que não estão dados a priori. Alude, portanto, a uma busca por

elementos e seus significados na composição do texto, os quais produzem, de acordo com as

ações visadas, representações dos temas que são, ali, evidenciados e os quais só são possíveis

pelo olhar do interlocutor23

, ou como denomina Adam (2011), o interpretante.

Em complemento a essa abordagem, adotamos também a abordagem quantitativa de

pesquisa, uma vez que ela nos serve para demonstrar a ocorrência dos elementos

representativos das categorias semânticas de análise das Rds de Lula nas capas das revistas

Época e Veja. Para Oliveira, M. (2013, p. 39-40, grifos da autora):

Adotar a prática de combinar técnicas de análise quantitativa com técnicas

de análise qualitativa proporciona maior nível de credibilidade e validade

aos resultados da pesquisa evitando-se, assim, o reducionismo por uma só

23

Em nosso caso, será o olhar do pesquisador que possibilitará a reconstrução das Rds do tema Lula nas capas

das revistas Época e Veja.

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opção de análise. [...] Levando-se em consideração tais benefícios, pode-se

chegar à seguinte afirmativa: fazer pesquisa não é acumular dados e

quantificá-los, mas analisar causas e efeitos, contextualizando-os no tempo e

no espaço, dentro de uma concepção sistêmica.

Nessa perspectiva, ao intencionarmos a realização de uma pesquisa que se fundamente

nessas duas abordagens de pesquisa, apontamos, com mais precisão, os mecanismos

linguístico-textuais que são materializados no gênero de discurso capa de revista e, a partir

disso, interpretar os sentidos e funções deles para a construção das representações discursivas

de Lula.

Adicionalmente, nossa pesquisa configura-se como de tipo documental24

, uma vez que

o nosso objeto de estudo (capa de revista) é um material que não teve um tratamento analítico,

bem como é uma fonte primária (dado original), visto que temos uma relação direta com os

dados a serem analisados, sendo, portanto, de nossa responsabilidade, enquanto pesquisador,

o desenvolvimento da investigação e análise (SEVERINO, 2007; OLIVEIRA, M., 2013).

Além da definição da abordagem de pesquisa e tipo de pesquisa que seguimos em

nossa tese, outra decisão metodológica se nos apresenta como essencial para o tratamento dos

dados de nosso estudo, isto é, o método utilizado. Ao considerarmos o corpus que será

analisado, bem como os princípios teóricos que norteiam esta tese, assumimos que nosso

trabalho opera com dois métodos que se imbricam para a realização desse fazer acadêmico, a

saber, a dedução e a indução.

Os referidos métodos visam a dar conta de um estudo que já traz em sua

fundamentação a ideia de que todo enunciado permite a construção de uma representação

discursiva, quer seja de si (locutor), do alocutário ou do tema tratado na proposição

enunciada. Nesse sentido, a dedução age como subjacente ao enfoque teórico que orienta a

nossa pesquisa.

De modo mais específico, realizar uma pesquisa que toma a dedução como método,

garante ao pesquisador a certeza de que o corpus será capaz de gerar repostas condizentes

com as questões de pesquisa. Não obstante, Oliveira, M. (2013, p. 49) afirma que a dedução

parte “dos princípios já reconhecidos como verdadeiros e indiscutíveis para se chegar a

determinadas conclusões”. Em nosso trabalho, temos ciência de que os textos concretos

analisados (capas de revista) possibilitam a compreensão das representações discursivas de

Lula, o que valida a dedução como parte do método que utilizamos em nossa pesquisa.

24

Pesquisa documental é aquela que tem como fonte documentos (jornais, fotos, revistas, filmes, etc.), os quais

não tiveram nenhum tratamento analítico.

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83

Na outra ponta, a indução, enquanto método, “é uma ferramenta que conduz o

pesquisador(a) a observar a realidade para fazer seus experimentos e tirar suas conclusões”

(OLIVEIRA, M. 2013, p. 50-51). Por esta perspectiva, vemos a indução como complementar

a dedução em nosso trabalho, haja vista ser ela o procedimento que permite ao pesquisador

fazer suas conclusões, desde que estas sejam formuladas a partir da observação do corpus.

Melhor dizendo, embora saibamos que as capas de revista sejam textos que permitem a

construção de representações discursivas, sem a observação, descrição e interpretação do

corpus é impossível afirmar quais representações de Lula são construídas nas capas das

revistas Época e Veja. Para tanto, fez-se necessário adotarmos a indução como método para

garantir conclusões reais dos fatos observados no corpus.

Em sendo assim, propomos como método de pesquisa a dedução-indução, uma vez

que este se revela como o método mais adequado para alcançar os nossos objetivos de

pesquisa, posto que, de modo sucinto, permiti-nos dizer que as capas de revista possibilitam a

construção e reconstrução de representações discursivas (dedução) e que, para chegarmos a

um posicionamento acerca de quais representações ali existem, precisamos observar o objeto

de estudo – as capas de revistas – e, a partir dos resultados encontrados, apresentar as

conclusões (indução), ou seja, compreender as representações discursivas que as revistas

construíram de Lula por meio do gênero de discurso capa de revista.

Em síntese, por ser uma pesquisa que se pauta em categorias de análises que permitem

a descrição e interpretação textual-discursiva, acreditamos ser essa a orientação metodológica

condizente com o nosso objetivo de descrever e interpretar o gênero de discurso capa de

revista e, por conseguinte, analisar as representações discursivas do tema Lula nas capas das

revistas Época e Veja, considerando os elementos verbovisuais que constituem o referido

gênero de discurso.

Quanto à técnica de pesquisa, ao invés de adotarmos uma técnica predefinida pelos

manuais de metodologia científica, seguimos os postulados teórico-metodológicos da ATD,

isto é, realizamos uma análise descritiva e interpretativa dos dados. Em um primeiro

momento, tabulamos os dados a fim de termos uma descrição do corpus. Em um segundo

momento, com base nos dados tabulados, demos início às interpretações do fenômeno da

representação discursiva construída pelas revistas acerca do tema tratado em suas capas, ou

seja, as Rds de Lula.

Diante disso, após essa apresentação/discussão dos aspectos teórico-metodológicos

que orientam nossa pesquisa, apresentamos o corpus de nossa tese, ou seja, o nosso objeto de

estudo, a partir do qual fizemos a análise dos dados.

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84

4.3 APRESENTAÇÃO DO CORPUS

A grande mídia tem demonstrado cada vez mais o interesse por questões políticas e,

consequentemente, pelos políticos que estão à frente de partidos ao assumir cargos

importantes no cenário político. Desde 2002, com a campanha vitoriosa do então candidato

Luiz Inácio Lula da Silva, o espaço de Lula nas publicações jornalísticas (jornalismo de

televisão, jornais impressos, revistas de publicação semanal, entre outras) ganhou mais

destaque, haja vista a sua posição perante a nação brasileira.

Pela dimensão que essa figura tomou na mídia jornalística, foi-nos despertado o

interesse em saber como Lula é representado discursivamente pela mídia impressa,

especificamente, pelas capas de revista – gênero de discurso que além de promover a revista,

promove apreciações, avaliações e desejo do consumidor em comprá-la.

Nesse quadro, para compor o nosso corpus, fizemos a opção por buscar as duas

revistas de informação que tivessem uma grande circulação em nível de Brasil. Assim, em

pesquisa realizada com vistas a obtermos a informação sobre quais as revistas mais vendidas,

fomos direcionados a página do portal R7 que, em julho de 2013, publicou a lista das dez

revistas mais vendidas no Brasil. O resultado dessa listagem colocou em primeiro lugar a

revista Veja (média de 1.098.642 exemplares por semana) e, em segundo lugar ficou a revista

Época (média de 417.798 exemplares vendidos por semana). Logo, esse passou a ser o

critério de definição dos veículos de comunicação midiática que tomamos como fonte para a

coleta do corpus.

Em síntese, primeiro definimos o objeto de discurso a ser analisado, a fim de

descrevermos e interpretarmos as Rds, ou seja, nossa investigação toma Lula como objeto de

discurso/tema tratado pelos veículos midiáticos25

de circulação nacional; em seguida, diante

dos variados gêneros que compõe a revista, definimos o gênero de discurso capa de revista

como a prática discursiva concreta a ser analisada; posteriormente, realizamos a pesquisa

online e decidimos por observar as duas maiores revistas de circulação nacional Época e Veja.

Feitas essas definições que delinearam com mais nitidez o nosso objeto de estudo,

passamos a delimitar o corpus a ser analisado. Para tanto, usamos dois critérios: i) recorte

temporal e ii) composição verbovisual. No que concerne ao primeiro critério, decidimos por

coletar os exemplares que tematizassem sobre Lula no período que compreende o ano da

candidatura em que Lula foi eleito como presidente do Brasil até o ano que ele saiu da

25

Utilizamos veículos midiáticos para nos referirmos as revistas Época e Veja.

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presidência após o segundo mandato, isto é, cronologicamente delimitamos o tempo entre os

anos de 2002 a 2010. Quanto ao segundo critério, fizemos a opção de que somente constituiria

parte do corpus os exemplares em que a imagem de Lula estivesse como imagem principal da

revista e que, por conseguinte, pudéssemos perceber o diálogo com as demais partes que

compõem a estrutura composicional do gênero de discurso capa de revista, mais

especificamente com a chamada principal e o subtítulo dessas chamadas, isto é, foram

selecionadas as capas em que Lula era verbovisualmente tratado como parte ou como o

assunto principal abordado pela revista.

A partir dessas definições, a coleta do material para a composição do corpus se deu

por meio eletrônico, a partir dos sites da revista Época26

e da editora Abril27

. Durante a coleta

chegamos a dois números totais. O primeiro número constituído pelas capas totalizou 47

(quarenta e sete) exemplares que de alguma forma tratavam de Lula, todavia, em análise mais

apurada e considerando o segundo critério para delimitação do corpus (composição

verbovisual), foram eliminados 6 (seis) exemplares, uma vez que as imagens não sinalizavam

o objeto de discurso que seria investigado. Essa decisão também se deu pelo fato de o tema

tratado colocar Lula apenas como uma informação secundária no assunto em destaque na

revista, por exemplo, crescimento do Brasil, desejo popular, Mensalão28

, caixa dois, etc.

Nessa perspectiva, o corpus de estudo de nossa pesquisa passou a contar com um total de 41

(quarenta e um) exemplares do gênero de discurso capa de revista.

26

AS CAPAS de época. Disponível em: <http://revistaepoca.globo.com//tempo/noticia/2013/05/capas-de-

epoca.html>. Acesso em 16 de maio de 2013. 27

Ano de 2002. Disponível em : <http://veja.abril.com.br/busca/resultado-capas.shtml?Vyear=2002>. Acesso

em 25 de junho de 2013.

Ano de 2003. Disponível em : <http://veja.abril.com.br/busca/resultado-capas.shtml?Vyear=2003>. Acesso em

25 de junho de 2013.

Ano de 2004. Disponível em : <http://veja.abril.com.br/busca/resultado-capas.shtml?Vyear=2004>. Acesso em

25 de junho de 2013.

Ano de 2005. Disponível em : <http://veja.abril.com.br/busca/resultado-capas.shtml?Vyear=2005>. Acesso em

25 de junho de 2013.

Ano de 2006. Disponível em : <http://veja.abril.com.br/busca/resultado-capas.shtml?Vyear=2006>. Acesso em

25 de junho de 2013.

Ano de 2007. Disponível em : <http://veja.abril.com.br/busca/resultado-capas.shtml?Vyear=2007>. Acesso em

25 de junho de 2013.

Ano de 2008. Disponível em : <http://veja.abril.com.br/busca/resultado-capas.shtml?Vyear=2008>. Acesso em

25 de junho de 2013.

Ano de 2009. Disponível em : <http://veja.abril.com.br/busca/resultado-capas.shtml?Vyear=2009>. Acesso em

25 de junho de 2013.

Ano de 2010. Disponível em : <http://veja.abril.com.br/busca/resultado-capas.shtml?Vyear=2010>. Acesso em

25 de junho de 2013. 28

Mensalão é o nome dado ao escândalo de corrupção política mediante compra de votos de parlamentares

no Congresso Nacional do Brasil, que ocorreu entre 2005 e 2006. O caso teve como protagonistas alguns

integrantes do governo do então presidente Luiz Inácio Lula da Silva, membros do Partido dos Trabalhadores e

de outros partidos.

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86

Quadro 7 – Total de capas que compõe o corpus da pesquisa

Corpus da pesquisa

Tema tratado Capas das revistas

Época Veja

Lula 17 24

Total de capas 41 Fonte: Autor.

Diante dessa apresentação, expomos no tópico seguinte como procedemos à análise

das Rds do tema tratado Lula nas capas das revistas Época e Veja.

4.4 PROCEDIMENTOS DE ANÁLISE

Para a realização da análise, seguimos os seguintes passos:

1º PASSO – Com base nos níveis N1, N2 e N3, situamos co(n)textualmente o nosso

objeto de pesquisa, o que implica em observar elementos do discurso que incidem sobre a

constituição do gênero de discurso e, por conseguinte, do texto – material empírico analisado.

2º PASSO – seguindo a análise dos níveis propostos por Adam (2011) para a

realização da análise de textos concretos, descrevemos o nível sequencial-composicional do

gênero de discurso capa de revista. Para tanto, nos respaldamos nos níveis N4 e N5. Nessa

ocasião, validando as definições teóricas acerca da capa de revista, observamos a sua

composicionalidade e plano de texto pelo viés da multimodalidade discursiva, o que significa

a consideração do projeto verbovisual que compõe o gênero de discurso capa de revista.

Desse modo, quando tratamos da capa, de um modo geral, usamos um código constituído

pelas duas letras inicias do nome da revista Época (Ep) e Veja (Ve), seguidas do número da

edição, conforme podemos exemplificar com o quadro a seguir, para o qual utilizamos dois

exemplares do corpus, respectivamente, a primeira capa de Época e a primeira capa de Veja.

Quadro 8 – Código utilizado para a análise das capas de revista

Revista Edição Código

Época 205 Ep205

Veja 1752 Ve1752 Fonte: Autor.

3º PASSO – Descrevemos e tabulamos os dados com base nas categorias de análise

propostas para o estudo das Rds. Aqui, além de quantificarmos as ocorrências linguísticas,

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realizamos as descrições, observando as Rds construídas de Lula pelas revistas, ou seja,

realizamos as análises das Rds separando-as por cada uma das revistas.

Nesse momento da análise, tomamos, conforme mencionamos na fundamentação

teórica, as revistas Época e Veja como os locutores da ação de linguagem, os

leitores/interpretantes como os alocutários, ou seja, a quem o discurso é dirigido e, por fim,

Lula foi tomado como o tema tratado e sobre o qual dedicamos nossa atenção nas análises.

Vale mencionar que a análise foi realizada com base na capa de revista, considerando-

a como um texto verbovisual. Logo, nossa análise considera os três elementos mais fortes do

gênero de discurso capa de revista, a saber: a imagem principal, a chamada principal e o seu

subtítulo. Desse modo, a depender do papel realizado pelos recursos verbais e visuais

partimos da imagem para o texto, ou do texto para imagem, buscando compreender o papel de

cada elemento para a construção das Rds.

Além disso, utilizamos o recurso do sublinhado sempre que estivermos analisando

uma das categorias, a fim de marcar nos exemplos o elemento que se enquadra em dada

categoria de análise.

4º PASSO – Associado ao passo anterior, em decorrência dos dados obtidos pela

descrição dos dados tabulados, realizamos a interpretação dos enunciados verbovisuais que

compõem as capas de revista e que, consequentemente, constroem as Rds dos tema tratado.

Para a análise, identificamos os enunciados de cunho linguístico-textual (verbais) com

um código que considera os elementos composicionais da capa de revista selecionados para

análise, a saber: para a chamada principal, utilizamos a sigla CP+ código da revista; para os

subtítulos, usamos a sigla SUB + código da revista. Vejamos:

Quadro 9 – Código utilizado para a análise dos enunciados das capas

Elemento composicional da capa de

revista (sigla)

Código da

revista

Código para análise dos

enunciados

Chamada principal (CP) Ep205 CPEp205

Subtítulo (SUB) SUBEp205

Chamada principal (CP) Ve1752 CPVe1752

Subtítulo (SUB) SUBVe1752 Fonte: Autor.

Embora seja esse o momento em que tratamos dos enunciados linguisticamente

materializados na capa de revista, ressaltamos que não será dispensada a análise conjunta do

elemento visual que a compõe, haja vista defendermos que a Rd na capa de revista é

construída pela relação verbovisual que compõe o gênero.

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5º PASSO – Dados os resultados obtidos com as análises das Rds de Lula nas capas

de Época, realizamos, quando relevante, a comparação desses resultados com os achados da

análise das Rds nas capas de Veja, observando as convergências e divergências com que as

revistas, isto é, os locutores, elaboram a construção das Rds do tema tratado.

Após termos percorrido esse trajeto, acreditamos ter sido possível vislumbrar

analiticamente as Rds de Lula nas capas de Época e de Veja, assim como perspectivar estudos

que se desenvolvam a partir dos resultados dessa pesquisa.

Feitas as devidas considerações teórico-metodológicas, passemos às análises do

corpus, começando pelas capas da revista Época.

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89

CAPÍTULO 5

5 ANÁLISES DAS REPRESENTAÇÕES DISCURSIVAS DE LULA NAS CAPAS DE

ÉPOCA E VEJA

Neste capítulo, realizamos a análise do corpus. Em primeiro lugar, procedemos à

análise do gênero de discurso capa de revista, considerando os níveis do discurso e do texto

que corroboram para a realização dessa ação de linguagem. Em segundo lugar, dividimos a

análise com base nos veículos midiáticos de comunicação selecionados para compor o nosso

corpus; descrevemos e interpretamos as Rds do tema tratado (Lula); e, na realização da

análise das capas de Veja, tecemos algumas comparações entre as revistas, a partir dos

resultados obtidos da análise de Época, observando semelhanças e diferenças entre as marcas

textuais e as Rds evidenciadas. Além disso, considerando o caráter de complexidade do

gênero, ou seja, a multimodalidade que o constitui, a análise verbovisual será feita

conjuntamente, observando a contribuição da imagem para a construção de sentidos do texto,

bem como para a construção das Rds de Lula.

5.1 CAPA DE REVISTA: CONSIDERAÇÕES SOBRE O NÍVEL DO DISCURSO

O gênero de discurso capa de revista, enquanto ação de linguagem, trata-se de um

texto complexo que permite a interação social entre o veículo de comunicação – a revista – e

os seus possíveis leitores. Nesse sentido, a revista assume o papel de locutor ao construir

enunciados que passam a circular midiaticamente nos mais diversos ambientes sociais,

alcançado os mais distintos alocutários29

, ou melhor, entre a revista e seus leitores. Com isso,

passa-se a existir um diálogo para o qual convergem as mais diferentes ideologias imbricadas

no enunciado.

No nosso corpus, figura fortemente três formações discursivas que se coadunam para

alcançar o objetivo desejado pela revista, a saber, a formação discursiva midiática, a formação

discursiva jornalística e a formação discursiva política. A primeira por seu caráter de

divulgação e de projeção de informações para o grande público. A segunda por seu caráter

29

Alocutário e leitor, em nossa tese, serão tomados de forma sinonímica para representar aqueles para quem o

enunciado é produzido.

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informativo e especulativo da realidade e que, em parceria com a primeira, faz chegar a

grande massa o conhecimento do que está acontecendo no mundo. A terceira, por sua vez

mais específica, diz respeito aos assuntos que são tratados jornalisticamente pelos meios de

comunicação.

No gênero capa de revista, em se tratando do nosso material de análise, a formação

discursiva política30

, governada por uma posição ideológica, é o que poderíamos chamar de

“mote” para a produção, divulgação e circulação das revistas. É a partir dela que as revistas

buscam evidenciar temas atuais e polêmicos que chamem a atenção do leitor, a fim de que

esse assunto possa mobilizá-lo a adquirir a revista e, consequentemente, tomar ciência do que

se é tratado no interior do veículo de informação, por meio do texto. Por esse motivo, dizemos

que a capa de revista, enquanto enunciado concreto e único é um texto que se configura como

uma enunciação, na qual a própria revista é o locutor dos dizeres que linguística e

discursivamente são materializados nesse gênero de discurso.

Desse modo, as capas de revistas, por meio dos enunciados que as compõem,

possibilitam compreendermos como os temas que se nos apresentam são discursivamente

representados sob a ótica da própria revista. Para isso, faz-se necessário que os interlocutores

(revista e leitores) compartilhem de pré-construídos e da finalidade com que se instaura a

situação de interlocução, pois, somente a partir disso é que os sentidos do texto poderão ser

construídos pela revista e, consequentemente, reconstruídos pelos leitores.

Embora o locutor – a revista – e os alocutários – os leitores – estejam em lugares

diferentes, o que os une para a produção e recepção dos dizeres do texto é justamente o

trabalho que o locutor empreende ao construir um discurso que possa chamar a atenção do

leitor. Logo, o discurso que se apresenta em uma capa de revista é construído pelo locutor

com vistas a despertar nos alocutários o interesse pelo que ali é dito. Especificamente no caso

das revistas que produzem suas matérias a partir de assuntos que em algum momento tiveram

repercussão, a produção dos enunciados faz vir à tona os pré-construídos que o leitor possui

sobre o assunto em cheque. Por conseguinte, o que diferencia o discurso de revista é o

enfoque que é dado ao tema, projetando no alocutário uma curiosidade mais específica sobre

como a revista vê e trata o assunto.

Diante disso, são as formações discursivas subjacentes aos interlocutores que

possibilitam a compreensão do discurso que circula midiaticamente nas capas de revista. São

30

Outras formações discursivas como a religiosa, familiar, educacional, entre outras são também dadas em

destaque a depender da edição da revista. Em nosso caso, como tratamos das Rds de Lula, as capas de revista

que compõem o nosso corpus evidenciam fortemente o aparecimento da formação discursiva politica como

principal intenção discursiva do texto.

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elas também que nos permitem dizer, por exemplo, que além do discurso político,

marcadamente em nosso corpus, outros discursos se cruzam para a construção das Rds de

Lula. Evidenciamos esses entrecruzamentos de discursos, ou interdiscurso, em casos como o

da capa de revista a seguir:

Figura 1 – Interdiscurso na capa de revista

Fonte: Revista Época, edição 284.

Com base na figura 1, podemos verificar as informações que discutimos

anteriormente, uma vez que, com essa capa, a revista, na condição de locutor, projeta um

discurso político e relaciona duas formações discursivas para construir o sentido desejado

para a capa dessa edição. Aqui, a formação discursiva política entra em relação com a

formação discursiva familiar, constituindo um interdiscurso para afirmar que o Lula é um

presidente que representa a família brasileira, que ele é um brasileiro de raiz se considerarmos

seu sobrenome “Silva”, dentre outras interpretações possíveis. Todavia, qualquer

interpretação que venha a ser realizada por meio desse texto só será possível se considerado o

entorno discursivo que subjaz a produção do texto, isto é, para se compreender a relação

familiar, vigente pelo uso de imagens e subtítulos, bem como a ideia de política presente no

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texto, temos de recorrer a conhecimentos como o de que o sobrenome Silva é comumente

utilizado em países como Portugal (de onde o sobrenome foi trazido) e no Brasil, sendo este

um dos países em que o sobrenome é um dos mais utilizado em território nacional.

Esse conjunto de informações é percebido através da relação que o texto, material

empírico, possibilita ao leitor através dos conhecimentos que são partilhados entre ele e a

revista, os quais são materializados pelo socioleto que é variante linguística culta utilizada

pela revista para codificar os enunciados verbais. Somente ao chegar a uma interpretação do

material linguístico em consonância com as imagens é que o leitor/interpretante fará valer a

ação de linguagem visada pela revista.

É, pois, com a concretização de sentidos permitida pela interpretação do discurso que

vigora na capa de revista que passamos do discurso para o texto, haja vista serem todas essas

questões fundamentais para compreendermos o gênero que se nos apresenta como elemento

de análise em nossa tese. Isto porque, o gênero de discurso capa de revista é o resultado da

ação de linguagem que se constitui na interação social entre revista e leitor (Nível 1), o qual

tem como objetivo levar o leitor a consumidor o produto oferecido pela mídia – a revista.

Além disso, para que haja essa interação social e o objetivo da ação de linguagem seja

alcançado, a revista dispõe de condições de produção que permitem ao leitor entender o

sentido do texto, tais como: o conhecimento sobre a história de Lula, a importância histórico-

social do sobrenome “Silva”, o papel da revista enquanto veículo de informação semanal, bem

como a forma como a revista trata o assunto apresentado em capa. Desse modo, é o conjunto

de formações discursivas associadas às condições de produção do gênero capa de revista

(Nível 2) que vão permitir ao alocutário reconstruir os sentidos permitidos pelos enunciados.

Ademais, cabe ao leitor a responsabilidade de compreender os discursos que se

entrecruzam na constituição do enunciado, este materializado linguisticamente pela variante

culta da Língua Portuguesa (Nível 3) na capa de revista, pois, somente com o domínio dos

discursos presentes e da língua em uso é que o enunciado toma forma de gênero e materializa

a ação social de linguagem em forma de texto.

Nesse quadro, a passagem do discurso para o texto se dá pelo gênero de discurso que é

uma atividade de linguagem social, histórica e culturalmente reconhecida pelos interlocutores

no processo de produção, circulação e recepção de textos. A capa de revista, nesse sentido, é o

gênero que permite ao locutor/revista divulgar seu discurso, bem como se promover

mercadologicamente, levando o alocutário/leitor a adquirir a tiragem da semana,

principalmente pelo caráter convidativo que o texto verbovisual e o assunto da revista têm a

oferecer.

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93

Sendo assim, o discurso midiático jornalístico que está na fonte da produção do gênero

de discurso capa de revista alcança seu objetivo quando o leitor é convidado pela capa a

comprar o exemplar da revista. Desse modo, no âmbito do discurso, o ciclo discursivo se

fecha quando o gênero cumpre o seu papel social de vender ao leitor um tema instigante e, por

conseguinte, a revista.

Feitas as devidas considerações sobre o nível da Análise de Discurso que subjaz a

produção, circulação e recepção do gênero de discurso capa de revista, passemos ao nível do

texto, observando o plano de texto do gênero em análise.

5.2 CAPA DE REVISTA: CONSIDERAÇÕES SOBRE O NÍVEL DO TEXTO

Chamamos a capa de revista de um gênero de discurso complexo por seu enunciado

ser composto pelo misto entre o verbal e o visual. Dessa forma, são esses modos de

materialização do gênero de discurso que nos permitem compreender o plano de texto que

constitui essa prática discursiva, ou seja, entender a capa de revista como um texto concreto e

único.

Nesse sentido, com vistas a descrevermos o nível sequencial-composicional31

que

constitui o gênero de discurso capa de revista, tomamos os níveis 4 e 5 do nível da análise

textual, propostos por Adam (2011).

A capa de revista, enquanto enunciado concreto, é linguisticamente composto por

construções verbais curtas, denominadas de chamadas, podendo ser estas constituídas por

uma palavra, uma oração, seguida ou não, por um ou mais subtítulos. De acordo com Gomes

(2010, p. 303-304), a capa “é estruturada de forma a captar a atenção do leitor; para tanto, se

vale de um resumo, ou uma chamada sintética, geralmente formada por grupos nominais, ou

orações reduzidas”. Como afirma Werneck (2000), o texto escrito na capa da revista, embora

seja breve, tem um grande valor, uma vez que ele também serve de estímulo ao interesse do

leitor pelo conteúdo e, consequentemente, pela revista.

Desse modo, podemos afirmar que a textura (Nível 4) do gênero de discurso capa de

revista não obedece a uma linearidade, uma vez que as informações apresentadas, em sua

maioria, não são colocadas justapostas, com operações de ligação entre elas. Não é comum,

31

Por não ser esse o foco de nosso trabalho, as considerações tecidas acerca do plano de texto do gênero de

discurso capa de revista dar-se-ão de modo sucinto, dialogando com a discussão apresentada no 2.2.3 O gênero

de discurso capa de revista.

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por exemplo, a construção de períodos longos orquestrados por conectivos. Como

mencionado antes, são textos curtos, breves e de impacto, muitas vezes constituídos por uma

palavra ou uma proposição-enunciado de caráter nominal.

Quanto à estrutura composicional, a capa de revista não obedece a uma estrutura

textual comum aos textos constituídos apenas por meio da escrita. A construção do texto dá-se

de forma reticular, no sentido de que a imagem e o texto se articulam em um movimento de

ida e volta entre eles para que se possa concretizar o propósito desejado com a produção do

texto.

A fim de conhecermos mais detidamente o que compõe esse gênero, em termos de sua

estrutura composicional (Nível 5), apresentamos a seguir os elementos básicos que fazem

parte do gênero de discurso capa de revista. Para tanto, utilizamos mais uma capa da revista

Época que compõe o nosso corpus, a fim de observarmos quais e como são apresentados

esses elementos.

Figura 2 – O plano de texto do gênero de discurso capa de revista

Fonte: Revista Época, edição 205.

Logotipo

Imagem

principal

Chamada

principal

Chamadas

secundárias

com

subtítulos

Edição e

data

Imagens

secundárias

Subtítulo

Logomarca

da editora

Legenda

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A capa da revista Época possui diversos elementos que a compõe. Nesta edição, o

logotipo é apresentado em letras pretas, sob um fundo vermelho, com um globo substituindo a

letra “o” da primeira sílaba. Essa estrutura do logotipo de Época é recorrente de uma edição

para outra, o que afirma, ainda mais, o estilo do gênero capa da revista, possibilitando ao

leitor identificá-la facilmente. Por ser ele o nome da revista (marca), é interessante

observarmos a semântica inerente à sua denominação. As revistas Época e Veja, por exemplo,

semanticamente, possuem nomes que estão associados à ideia de acontecimento, observação,

momento histórico, ou seja, informações que acontecem em um dado momento e que

repercutem socialmente, precisando de mais detalhes.

Além do logotipo, na figura 2, observamos que a imagem principal toma a maior parte

da capa, inclusive sobrepondo-se ao logotipo, ficando este parcialmente coberto pela imagem.

Ademais, por estar localizada no centro da capa e por apresentar uma luminosidade e brilho

que ressaltam a imagem, percebemos isso como uma estratégia de marketing para que os

leitores sejam seduzidos a adquirir a revista, o que ressalta a força da imagem principal para o

propósito comunicativo do gênero.

A chamada principal, por ser o destaque da edição, recebe uma formatação especial,

como podemos comprovar na figura 2. Nela, temos o nome de Lula apresentado em letras

maiores do que o restante da chamada e seu subtítulo. Além disso, a cor da fonte desse nome

é vermelha, dando um destaque ainda mais concentrado no personagem focado pela edição

como assunto principal. Quanto às chamadas secundárias, estas são apresentadas em amarelo

e em caixa alta, diferindo-se dos subtítulos que as acompanham, os quais são apresentados em

uma fonte menor, servindo para endossar as chamadas, por vezes, elucidando o assunto.

Esses destaques de grafia utilizados pela revista são recursos que compõem a textura

do texto, ou seja, também estão associados ao N4, proposto por Adam (2011). Dito isso, algo

que não se pode ver de forma tão estanque são esses níveis que compõem o nível sequencial-

composicional do gênero de discurso.

No que concerne às imagens secundárias, o nosso corpus comprova a maleabilidade e

dinamicidade desse gênero de discurso, conforme Marcuschi (2008; 2011), uma vez que

algumas capas não fazem uso desse recurso em sua estrutura composicional. O mesmo

acontecendo com as chamadas secundárias e as legendas32

(pequeno texto, geralmente

descritivo ou explicativo, que se coloca abaixo ou do lado das ilustrações ou fotografias a que

se refere). Vejamos nos exemplos a seguir:

32

Pela presença da legenda em alguns exemplares do nosso corpus, descrevemos esse mecanismo como um dos

elementos opcionais utilizados pelas revistas na estrutura composicional do gênero de discurso capa de revista.

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Figuras 3 e 4 – Capas de revistas sem imagens e chamadas secundárias

Fonte: Revista Época, edição 232.

Fonte: Revista Veja, edição 1760.

A ausência desses elementos na capa de revista sinaliza a supervalorização tanto da

imagem principal como da chamada principal, o que nos indica a relevância do assunto

apresentado na capa. Isso não significa dizer que os assuntos tratados pelos elementos

secundários não tenham valor para a composição do gênero, mas, que a depender da edição, a

revista, pelas mãos do editor, pode optar pela presença ou não de outros elementos, com

propósitos específicos de alcançar o público. Não obstante, há casos em que até a chamada

principal também pode ser posta de lado para que a imagem fale ao leitor, convidando-o a

tomar contato com a revista. Vejamos:

Figura 5 – Capa de revista sem chamada principal

Fonte: Revista Veja, edição 1975.

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Entretanto, esse é um caso excepcional, posto que, em todo o corpus de nossa

pesquisa, apenas essa capa não apresenta a chamada principal. Mais uma vez, entendemos

com isso que a capa de revista possui um grande apelo visual e que a imagem é central para o

alcance dos objetivos visados pela ação de linguagem que se corporifica no gênero de

discurso capa de revista.

Conforme já mencionamos, a logomarca da editora (editora), o número da edição e a

data são elementos circunstanciais, o que não implica diretamente nos sentidos veiculados

pelos assuntos destacados pela revista, mas que, independentemente de sua força para a

temática, eles refletem o espaço e o tempo que constituem o gênero, dando-lhes um caráter

histórico e socialmente situado.

Em suma, a textura (Nível 4) do gênero capa de revista é organizado por proposições

curtas, muitas vezes constituídas por proposições-enunciados de caráter nominal e com forte

apelo a formatação e cores que chamem a atenção do leitor. A estrutura composicional (Nível

5), por sua vez, acontece por meio do arranjo entre palavras e imagens e possui uma certa

regularidade com a presença do logotipo, da imagem principal e da chamada principal. Por ser

um gênero dinâmico, maleável e plástico, com um padrão gráfico predefinido, a depender dos

interesses da revista o uso de imagens e chamadas secundárias podem figurar no plano de

texto do gênero capa de revista. Diferentemente desses últimos, a logomarca, o número da

edição e a data são elementos fixos da composição do gênero em foco.

A partir desse conjunto de elementos que compõem o gênero de discurso capa de

revista, considerando-a como um texto complexo, passamos a análise das representações

discursivas de Lula nas capas das revistas Época e Veja. Para tanto, aplicamos as categorias

de análise propostas para a análise das Rds, observando o material linguístico-textual.

5.3 RDS DE LULA NAS CAPAS DA REVISTA ÉPOCA

Para a análise das Rds de Lula, partimos do princípio de que a revista Época, enquanto

locutor, emite seu PdV, responsabilizando-se pelos dizeres que estão textualmente

materializados nos enunciados verbovisuais que compõem o gênero de discurso capa de

revista, isto é, é esse PdV que traz verbovisualmente o conteúdo referencial sobre o qual se é

possível reconstruir, a partir do texto, as Rds de Lula33

.

33

O mesmo ocorrerá quando formos analisar as Rds de Lula nas capas de Veja.

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Desse modo, em termos de esquematização/representação discursiva, percorremos o

seguinte caminho34

para compreender as Rds de Lula:

1. Na condição de leitor/interpretante, observamos as marcas linguísticas utilizadas nas

capas para referenciar o objeto de discurso Lula;

2. A partir das marcas de referenciação evidenciadas, interpretamos o sentido que elas

assumem no contexto imediato, buscando, posteriormente, o diálogo que elas mantem

com outras formas para a reconstrução das Rds;

3. Em seguida, observamos os processos verbais utilizados para estabelecer as

predicações acerca do referente em análise, interpretando os sentidos delas para

reconstruirmos as Rds construídas co(n)textualmente pela revista;

4. Ao observar as referenciações e predicações, observamos os modificadores que

acompanham o objeto de discurso, uma vez que eles possibilitam os sentidos para

reconstruir as qualificações dadas ao tema tratado e que, por conseguinte, são basilares

para compreendermos como a revista constrói as Rds de Lula;

5. Adiante, tratamos da relação e da localização espacial e temporal, finalizando a

análise.

5.3.1 Referenciação e seus modificadores

No texto das capas da revista Época, Lula é apresentado referencialmente por meio

das imagens e de nominalizações, tais como “Lula”, “Lula da Silva” e “Presidente”. Quanto

às imagens, das dezessete capas de revista, Lula aparece assumindo total ou parcialmente a

imagem principal da capa. Em alguns casos, por se tratar de um texto complexo, a imagem

principal assume o papel de referente, pois é a partir dela que são desencadeadas a chamada

principal e os subtítulos.

Vejamos os exemplares que trazem a imagem de Lula como o referente, a partir do

qual o texto se organiza:

34

Usaremos essa mesma linha de raciocínio para tratar das Rds de Lula nas capas de Veja.

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99

Exemplo 1 – Capas de época em que a imagem principal assume o papel de referente

(Ep404) (Ep412)

(Ep433) (Ep436)

(Ep442) (Ep500)

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100

Nessas capas, a imagem principal pode ser tomada como o objeto de discurso sobre o

qual se desenvolve a ação de linguagem. Desse modo, ela é o referente sobre o qual se

desenvolve o querer-dizer da revista. Essa interpretação decorre do fato de as chamadas

principais não trazerem nominalizações que configurem um objeto de discurso, mas, sim, tão

somente o retomam por meio do pronome pessoal “ele” ou pelo entorno discursivo que

constitui o texto presente na capa de revista.

Apenas nos subtítulos das chamadas principais é que a imagem é categorizada e

recategorizada por meio de nominalizações. Como categorização do objeto de discurso,

podemos observar a presença da marca linguística “Lula” atualizada nos subtítulos. Vejamos:

Quadro 10 - Nominalizações do objeto de discurso presentes em capas em que o referente dá-se pela

imagem principal

Exemplo Enunciados Código

Exemplo 2 Como entender a espetacular mudança de cenário que vai

tornando Lula, contra todos os prognósticos, o grande favorito

para a eleição presidencial

SUBEp404

Exemplo 3 O impacto do caso Palocci sobre Lula SUBEp412

Exemplo 4 Na campanha de 2002, as promessas de Lula passaram de 700.

ÉPOCA investigou o resultado de cada uma delas

SUBEp433

Exemplo 5 Por dentro da histórica derrota de Lula SUBEp500

Exemplo 6 Quem perde

Lula, Mantega, Serra, Aécio – e a gastança pública

SUBEp500

Fonte: Autor.

Como vemos, das seis revistas em que a imagem principal aparece como o referente,

quatro delas retomam a imagem pela nominalização “Lula”, uma vez que os exemplos 5 e 6

são do mesmo exemplar da revista. Nesses casos, poderíamos dizer que, verbalmente, o

referente é categorizado por meio de um nome que representa o objeto de discurso sobre o

qual se constrói o enunciado. Dizemos isso por estarmos de acordo com Koch (2009) e Adam

(2011) ao afirmarem que a categorização se dá pela primeira vez que o objeto de discurso é

materializado no texto.

Todavia, nos casos em análise, por não ser a imagem um elemento verbal, mas um

elemento textual, entendemos que ela assume o papel de âncora do dizer, ou seja, é com ela e

a partir dela que se prospectam as proposições-enunciados que constituem o todo textual do

gênero de discurso capa de revista e, por conseguinte, as nominalizações do tema tratado pela

revista. Adicionalmente, esta é característica somente dos seis casos analisados no exemplo 1.

De modo ponderado, afirmamos que a imagem tem essa mesma função em todos os

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101

exemplares da revista Época, haja vista ela sempre estar em diálogo com as chamadas

principais e os subtítulos que as seguem.

Além disso, é valido mencionar que as capas Ep346 e Ep442 não possuem uma

nominalização que categorize o objeto de discurso apresentado pela imagem de Lula. A

própria imagem funciona como referente do dizer para que possamos entender o que a revista

quer enunciar com as chamadas principais “Ninguém contou para ele?” (CPEp436) e “Como

serão os próximos quatro anos” (CPEp442). Sem a imagem seria impossível prever quem ou

o quê seria esse “ele” presente em Ep436, muito menos que os “próximos quatro anos” se

referem ao segundo mandato de Lula na Presidência da República, em Ep442.

Nesse sentido, a imagem configura-se como um instrumento visual de grande valia

para a compreensão das referenciações nas capas da revista Época, tanto pela possibilidade de

ancoramento do discurso, quanto pela categorização que as nominalizações trazem numa

relação multimodal com a imagem que se apresenta como foco da edição da revista, ou

melhor dizendo, da composição verbovisual do gênero de discurso capa de revista.

No tocante à referenciação por meio de recursos linguísticos, evidenciamos algumas

nominalizações e outras marcas que a revista, enquanto locutor, utiliza para materializar o

tema tratado na capa. A seguir, apresentamos um quadro com as referenciações, o número de

ocorrências, os modificadores das referenciações e as recategorizações do referente presentes

nas capas de revista e que auxiliam na reconstrução das Rds de Lula construídas pela revista

Época.

Quadro 11 – Referenciações do tema Lula nas capas da revista Época

Referenciação

(categorização)

Número de

ocorrências

Modificadores da

referenciação

Recategorização

Lula 16 Presidente?35

; x Serra;

quase lá; presidente!;

sem rodeios;

desanimado.

Governo do PT; Luiz Inácio

Lula da Silva; o 36º presidente

da República; candidato; um

sonho popular; uma nova

esperança nas ruas; mudança na

história; presidente; o

presidente; o grande favorito

para a eleição presidencial;

presidente; sombra.

Presidente 01 - -

Lula da Silva 01 - Irmão; primo; sobrinho; parente. Fonte: Autor.

35

Para efeito de análise será mantida a pontuação quando esta for necessária à interpretação dos sentidos do

texto.

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102

Como podemos notar, a revista Época categoriza o tema tratado de três formas:

“Lula”, “presidente” e “Lula da Silva”. Essas categorizações se dão por nominalização, uma

vez que é esta a forma linguística mais comum de se marcar os objetos de discurso no texto.

Em se tratando da categorização “Lula”, a mais recorrente no corpus, ressalta-se que,

das dezesseis ocorrências, quatorze dão-se sob a função de sujeito das proposições, isto é, a

nominalização se refere ao participante como aquele de quem se fala, e nas demais a

categorização “Lula” aparece como complemento36

da proposição-enunciado. Vejamos os

casos em que Lula é referenciado na função de sujeito:

Quadro 12 – Referenciações de Lula na função de participante sujeito nas proposições-enunciados

Exemplo Enunciados Código

Exemplo 7 Lula presidente? CPEp205

Exemplo 8 Lula x Serra CPEp229

Exemplo 9 Lula prepara uma frente dos adversários do governo SUBEp229

Exemplo 10 Lula quase lá CPEp231

Exemplo 11 Lula presidente! SUBEp500

Exemplo 12 Lula um sonho popular

CPEp233

Exemplo 13 Lula toma posse e o povo se aproxima do poder SUBEp242

Exemplo 14 Lula sem rodeios CPEp330

Exemplo 15 Os piores dias de Lula CPEp369

Exemplo 16 Como entender a espetacular mudança de cenário que vai

tornando Lula, contra todos os prognósticos, o grande favorito

para a eleição presidencial

SUBEp404

Exemplo 17 Na campanha de 2002, as promessas de Lula passaram de 700.

ÉPOCA investigou o resultado de cada uma delas

SUBEp433

Exemplo 18 Por dentro da histórica derrota de Lula SUBEp500

Exemplo 19 Quem perde

Lula, Mantega, Serra, Aécio – e a gastança pública

SUBEp500

Exemplo 20 Depois de Lula Fonte: Autor.

Mesmo aparecendo na função de sujeito nas proposições-enunciados, apenas nos

exemplos 9, 13 e 17, o participante “Lula” é colocado como o praticante da ação, isto é,

nesses exemplos o tema tratado assume o papel temático de agente. Isso significa dizer que a

revista constrói o enunciado imputando a responsabilidade do dizer ao participante

categorizado no enunciado.

36

Entendemos complemento na perspectiva de Castilho (2010) para o qual os objetos direto, indireto e obliquo

exercem funções centrais na sentença, uma vez que são argumentos selecionados pelo verbo, assim como o

sujeito.

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103

Outro papel semântico é desempenhado pelo referente Lula ao observarmos os

exemplos 16, 18 e 19. Neles, respectivamente, o objeto de discurso assume o papel de

beneficiário da ação, haja vista a ação de “tornar” apontar um ganho positivo para o referente

no que concerne a sua reeleição, o processo “derrota” indica uma perda sofrida negativamente

pelo referente, o que é complementado com o processo “perder”, que coloca Lula como um

dos prejudicados em não poder gastar o dinheiro público. Vale ressaltar que há uma

complementariedade entre os processos “derrota” e “perder”, uma vez que ambos fazem parte

de enunciados que compõem o texto da mesma capa de revista.

Nos demais casos (exemplos 7, 8, 10, 11, 12, 14, 15 e 20), pela ausência de processos,

temos proposições-enunciados nominais. Desse modo, não se é possível observar um papel

temático, uma vez que, para observarmos o papeis desempenhados pelo referente se faz

necessário a presença do processo. Todavia, é nas proposições-enunciados de caráter nominal

que os modificadores agem, construindo a Rd de Lula como possível presidente (presidente?),

um indivíduo que está na disputa presidencial (x Serra), com chances de chegar à presidência

da República (quase lá), eleito (presidente!) e objetivo (sem rodeios). Esses modificadores

revelam atributos e qualificações ao tema tratado, fazendo-nos compreender como a revista

enxerga a figura de Lula como candidato e presidente eleito.

As proposições-enunciados em que a revista apresenta a categorização Lula na função

de complemento são as seguintes:

Quadro 13 – Referenciações de Lula na função de participante complemento nas proposições-enunciados

Exemplo Enunciados Código

Exemplo 21 Pesquisa aponta que 1/3 dos eleitores preferem a sigla de Lula SUBEp291

Exemplo 22 Dinheiro de Marcos Valério foi usado na campanha de Lula SUBEp337

Exemplo 23 O impacto do caso Palocci sobre Lula SUBEp232 Fonte: Autor.

Ao assumir a função de complemento, o referente é colocado sobre dois papeis

temáticos: o de beneficiário (exemplos 21 e 22) e o de alvo (exemplo 23). Logo, o objeto de

discurso não é mais aquele que pratica a ação, mas aquele que de alguma maneira foi

favorecido co(n)textualmente. Já no exemplo 23, o adjetivo impacto exerce uma força verbal

que coloca o referente Lula como afetado por um acontecimento ocorrido com um de seus

correligionários.

Todos esses papeis temáticos são extremamente relevantes para a construção da Rd de

Lula nas capas de Época, quer das proposições-enunciados em que Lula aparece como sujeito,

quer daquelas em que ele figura como complemento, haja vista ser por meio desses papeis que

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104

compreendemos como a revista trata o tema em foco. Nesse sentido, podemos dizer que

Época constrói a Rd de Lula como um indivíduo de atitude, mas que é afetado por

acontecimentos ao seu redor, os quais são colocados pela revista ora como beneficiadores, ora

como prejudiciais ao objeto de discurso Lula.

Além dos papeis temáticos e dos modificadores que definem o objeto de discurso, a

revista Época utiliza recategorizações para se referir a Lula. Essas recategorizações fornecem

novas denominações ao referente e, consequentemente, novas nuances para a construção da

Rd do tema tratado. Observemos a seguir as proposições-enunciados em que ocorre a

recategorização do objeto de discurso37

:

Quadro 14 – Recategorizações do referente categorizado como Lula

Exemplo Enunciados Código

Exemplo 24 As forças e fraquezas de um governo do PT SUBEp205

Exemplo 25 Serra pode até crescer mas se as pesquisas estão corretas, no dia

27 Luiz Inácio Lula da Silva se torna o 36º presidente da

República

SUBEp231

Exemplo 26 A vitória do candidato que pedia mudanças SUBEp232

Exemplo 27 O país não mudou. Mas há uma nova esperança nas ruas SUBEp233

Exemplo 28 Em entrevista à Época, o presidente diz que é preciso ter

cautela para que o Brasil cresça por mais dez anos: “Não há

mais espaço para espetáculo”

SUBEp330

Exemplo 29 Desanimado, o presidente prevê meses de crise e admite

desistir da reeleição

SUBEp369

Exemplo 30 Como entender a espetacular mudança de cenário que vai

tornando Lula, contra todos os prognósticos, o grande favorito

para a eleição presidencial

SUBEp404

Exemplo 31 O legado do presidente e sua sombra sobre o futuro governo SUBEp646 Fonte: Autor.

Como já se sabe, as recategorizações servem para dar continuidade, retomando o

referente por meio de denominações que vão construindo uma rede referencial ao longo texto

(KOCH, 2009; CAVALCANTE, 2011; NEVES, 2011). No nosso corpus, a revista Época

apresentou recategorizações apenas nos subtítulos, o que nos revela a continuidade textual

entre a imagem principal, a chamada principal e os subtítulos que as seguem.

Ao recategorizar Lula como “governo do PT” (exemplo 24), a revista situa o

participante como parte de um grupo que pode chegar ao poder, ou seja, a presidência da

República. Não obstante, associada a essa recategorização são dispostos no cotexto

37

Quando houver modificadores do referente (categorizado ou recategorizado) e dos processos nas predicações,

destacaremos em itálico para que a análise possa ser mais precisa sobre os sentidos que os modificadores operam

nas referenciações e nas predicações, a fim de constituir as Rds do tema tratado.

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105

precedente dois adjetivos que modificam a recategorização, apontando que o Lula, na

condição de governante e membro de partido político, apresenta pontos fortes e fracos para

gerenciar a nação brasileira.

Ainda tratando Lula como um possível presidente a ser eleito (exemplo 25), Época

enuncia, por meio de uma recategorização, o nome completo do candidato “Luiz Inácio Lula

da Silva”, dando visibilidade ao referente para, posteriormente, recategorizá-lo mais uma vez

com o prognóstico de que ele poderá se tornar “o 36º presidente da República”, haja vista as

pesquisas estarem, na ocasião, colocando-o a frente do candidato da oposição José Serra.

As demais recategorizações construídas por Época vão contextualizando os estados de

Lula no cenário político. Primeiro, ele é colocado como “candidato” eleito (exemplo 26) e que

deseja mudanças para o país, o que nos faz compreender a recategorização de Lula como

“uma nova esperança nas ruas” (exemplo 27) como algo desejado pelo povo que também

anseia por mudanças. É válido apresentar, aqui, a capa que traz essa última recategorização,

pois o sentido que apresentamos a partir da recategorização está totalmente atrelado ao arranjo

visual da capa. Vejamos:

Figura 6 – Diálogo entre a recategorização e a imagem principal na construção da referenciação

Fonte: Revista Época, edição 233.

A ideia de “uma nova esperança nas ruas” que serve de recategorização para o

referente Lula é materializada visualmente na imagem principal que aparece como grafitagem

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em uma parede por trás de um homem tipicamente caracterizado como morador de rua. Além

disso, a revista traz com essa recategorização e arranjo verbovisual a proposição de que Lula,

na condição de presidente, estará atento aos menos favorecidos, uma vez que a sua trajetória

política sempre focalizou os menos abastados.

No exemplo 28, a forma de recategorização “o presidente” coloca Lula literalmente na

posição política que ele assume, ao passo que, no exemplo 29, a mesma recategorização é

modificada pelo adjetivo “desanimado”. Ao usar o adjetivo, a revista expressa o estado de

espírito do presidente com relação a uma possível crise nacional. Essa interpretação se faz

mais evidente se observarmos a imagem principal que traz Lula de cabeça baixa e pensativo,

como se, além de desanimado, ele estivesse preocupado com a situação. Vejamos:

Figura 7 – O sentido do modificador “desanimado” pela imagem principal

Fonte: Revista Época, edição 369.

As outras duas recategorizações, por sua vez, colocam Lula em momentos de

transição, isto é, do primeiro mandato para a tentativa de reeleição – “o grande favorito para a

eleição presidencial” –, exemplo 30, sinalizando a possível vitória de Lula no pleito; e do final

de seu segundo mandato a passagem da faixa presidencial. Neste segundo momento, Lula é

recategorizado por duas marcas linguísticas: “presidente” e “sombra” (exemplo 31).

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107

Quando do uso de “presidente”, a revista usa o modificador “legado” para referir-se a

Lula como um presidente que deixou implementado um conjunto de ações em benefício do

país, ou seja, as conquistas dele enquanto presidente.

Todavia, quando do uso de “sombra” como recategorização, a revista passa a ideia de

que Lula figurará como um pano de fundo no novo governo, podendo até mesmo influenciar

nas tomadas de decisões do presidente que o suceder. Mais uma vez, a revista, pelo uso da

imagem, potencializa a construção da Rd de Lula como uma sombra ao trazer, em sua capa,

apenas a silhueta da face e das mãos de Lula definidas por uma luz branca sob um fundo

escuro como uma sombra. Observemos essa orquestração de sentidos na figura a seguir:

Figura 8 – Recategorização de Lula como “sombra” pela imagem principal

Fonte: Revista Época, edição 646.

Desse modo, as recategorizações complementam os sentidos da categorização “Lula”

na medida em que a revista vai construindo a Rd deste como um candidato que chegou a

presidência, desejado pelo povo como um sonho de mudança e que, por seu primeiro mandato

ter sido bem sucedido, é o favorito e volta a se reeleger. Em sequência, a revista enuncia que

ao sair de seu segundo mandato com conquistas que ficam na história, sinaliza a possibilidade

de Lula não querer mais deixar a presidência, ficando como uma sombra sobre o governo que

o sucederá.

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108

Além da categorização de “Lula” como referente, outras duas categorizações foram

utilizadas pela revista para construir a Rd de Lula enquanto objeto de discurso, a saber:

“presidente” e “Lula da Silva”. Cada uma dessas categorizações tiveram apenas uma

ocorrência no corpus. A seguir, discutimos cada uma delas, começando pela categorização de

“presidente”.

Exemplo 32

Presidente reage e testa sua candidatura à reeleição (SUBEp377)

Como vimos, em alguns casos, o substantivo presidente ocupou a função de

modificador e recategorizador do referente Lula. Nos casos dos modificadores, a revista

utilizou a palavra presidente associada a uma pontuação específica – Lula presidente?

(interrogação), Lula presidente! (exclamação) –, gerando um efeito de atributo ao referente.

No caso das recategorizações, o substantivo “presidente” era utilizado após ser referido o

objeto de discurso como forma de retomada e manutenção do objeto no discurso.

Diferentemente, o vocábulo “presidente” (exemplo 32) não está associado a uma

forma linguística anterior do texto. A sua recategorização dá-se em virtude da imagem

principal dada no topo da capa da revista, vejamos:

Figura 9 – Capa de Época com a categorização de Lula como “Presidente”

Fonte: Revista Época, edição 377.

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109

A categorização do tema Lula como “presidente” aparece no subtítulo que está

diretamente relacionado à chamada principal e à imagem principal. Semanticamente,

“presidente” assume o papel temático de agente da proposição-enunciado, uma vez que

demonstra ação desempenhada pelo participante (presidente) frente à crise que se apresenta

no cenário político. A ação desempenhada pelo participante diz respeito ao fato de Lula,

mesmo em um momento de crise, o que poderia ser prejudicial a sua campanha a reeleição,

não desistir e por seu nome à prova na candidatura à presidência na eleição do ano de 2006.

Desse modo, a revista constrói a Rd de Lula como um politico reagente e que não teme a

derrota.

Exemplo 33

Lula da Silva uma família com cara de Brasil (CPEp284)

Em se tratando da categorização do objeto de discurso como “Lula da Silva”, esta é

posta em uma capa de revista que exige do leitor uma leitura verbovisual para compreender o

sentido desejado pela revista. Observemos a capa a seguir:

Figura 10 – Capa de Época com a categorização de Lula como “Lula da Silva”

Fonte: Revista Época, edição 284.

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110

Conforme já discutimos, na figura 1, em que vislumbramos essa capa de revista sob o

enfoque do interdiscurso presente no gênero de discurso capa de revista, podemos afirmar

que a Época, ao categorizar de Lula como “Lula da Silva”, busca materializar a dimensão

familiar, popular e nacional do então presidente por meio do sobre nome “Silva”. Essa

constatação dá-se pela sequência descritiva que se segue na chamada principal “... uma

família com a cara de Brasil”.

Em uma análise verbovisual, vemos que a revista se utiliza da cor vermelha para

relacionar a categorização Lula da Silva a uma recategorização desse referente, a saber: Lula

Brasil; posto que estas duas palavras (Lula e Brasil) conectam-se pelo destaque no tamanho

da fonte e da cor vermelha que faz remissão a cor do partido de Lula, o PT. Além disso, às

margens da chamada principal é apresentado um conjunto de fotos e enunciados que sugerem

outras recategorizações do referente Lula da Silva, tais como irmão, amigo, parente, primo e

sobrinho. Vejamos no quadro a seguir os subtítulos que acompanham essas fotos e os

elementos que possibilitam a compreensão dessas recategorizações.

Quadro 14 – Recategorizações do referente Lula da Silva

Exemplo Enunciados Recategorização

de Lula da Silva

Código

Exemplo 34 Casal Demarchi: feriado na alvorada Amigo SUBEp284

Exemplo 35 Imãos: Vavá, Jaime e Frei Chico

Irmão

SUBEp284

Exemplo 36 Ruth: a irmã merendeira SUBEp284

Exemplo 37 Jaime: o irmão metalúrgico SUBEp284

Exemplo 38 Tia Maria, de Venturosa Sobrinho SUBEp284

Exemplo 39 Dudinha: primo de Garanhuns Primo

SUBEp284

Exemplo 40 Antonio, primo de Caetés SUBEp284

Exemplo 41 Prima Maria e Sebastião, inscritos no

Fome Zero Parente

SUBEp284

Fonte: Autor.

As recategorizações evidenciadas por meio dos enunciados estão inscritas no discurso

familiar, o qual possibilita, co(n)textualmente, inferirmos que a revista dimensiona Lula como

uma representante do povo brasileiro.

Diante disso, podemos afirmar que a Rd do tema tratado “Lula”, construída pela

revista Época, referencia esse objeto de discurso como um candidato que chega a presidência

da República, que enfrenta problemas relacionados à sua carreira política, mas que, mesmo

assim, é um homem de família que representa a nação brasileira e seu sonho de mudança.

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111

Portanto, feitas as considerações sobre as referenciações (categorizações e

recategorizações) de Lula nas capas de Época, passemos a análise das predicações e como

estas auxiliam a construção das Rds de Lula.

5.3.2 Predicação e seus modificadores

Em nosso estudo sobre as predicações que contribuem para a construção das Rds de

Lula, entendemos que a predição opera sobre uma classe-escopo (o sujeito) presente nas

proposições-enunciados, bem como sobre os complementos presentes nessas proposições

(NEVES, 2011). Desse modo, antes de analisarmos textualmente os sentidos provenientes

dessas predicações38

para a construção das Rds de Lula, observemos um quadro

demonstrativo dos processos39 que se apresentam no corpus e a ocorrência destes.

Quadro 15 – Processos utilizados pela revista Época para a construção da Rd de Lula

Processos Número de ocorrências Capas

Prepara 01 Ep229

Torna 01 Ep231

Pedia 01 Ep232

Toma 01 Ep242

É preciso ter 01 Ep330

Prevê 01 Ep369

Admite desistir 01 Ep369

Foi usado 01 Ep377

Reage 01 Ep377

Testa 01 Ep377

Estava 01 Ep404

Vai tornando 01 Ep404

Aguenta 01 Ep412

Fez 01 Ep433

Passaram 01 Ep433

Contou 01 Ep436

Serão 01 Ep442

Perde 01 Ep500 Fonte: Autor.

38

Salientamos que, para efeito de análise, devido ao nosso corpus não ser um texto único, mas, composto por

vários textos do mesmo gênero de discurso, reuniremos os enunciados em que os processos se dão no mesmo

campo semântico e/ou convergem para uma Rd de mesmo sentido. 39

Relembramos que a utilização do termo processo diz respeito aos verbos e locuções verbais utilizadas na

formulação das proposições-enunciados.

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112

De um total de dezoito ocorrências de processos no corpus da revista Época,

constatamos a não repetição dos processos, o que por um lado dificulta a interpretação dos

sentidos das predicações que constroem a Rd de Lula, mas que, por outro lado, permiti-nos

observar a consonância de sentidos que diferentes processos intercambiam para que a revista

construa as Rds do tema tratado.

Embora a maior recorrência seja de processos em tempos simples, vale ressaltar que

apenas quatro processos são constituídos por locução verbal, o que sinaliza uma característica

da revista em construir enunciados de caráter nominal ou com poucas predicações, apesar de a

predicação poder ocorrer também pela elisão verbal, ou seja, a ausência de um processo que já

foi utilizado antes e que não se faz necessário a sua repetição para estabelecer relação com o

escopo seguinte. Todavia, nas proposições-enunciados de Época não foi constatada a presença

elíptica de processos.

Por meio das predicações verificadas foi possível perceber o tratamento temporal dado

aos processos, o que, por oportuno, caracteriza o tema tratado em consonância com o ideário

da revista, ou seja, de tratar informações que aconteceram (passado), acontecem (presente) ou

acontecerão (futuro), permitindo-nos, além de situarmos em um tempo real, “nos deslocarmos

livremente pela linha do tempo, de acordo com nossas necessidades expressivas”

(CASTILHO, 2010, p. 432).

Com o intuito de vislumbrarmos essa temporalidade dos processos em Época, vejamos

o quadro a seguir:

Quadro 17 – Conjugação dos processos utilizados pela revista Época para a construção das Rds de Lula

Tempos e modos dos processos Número de

ocorrências

Processos

Presente do Indicativo 09 Prepara; torna; toma; prevê; reage;

testa; aguenta; fez; perde.

Pretérito Perfeito do Indicativo 02 Passaram; contou.

Pretérito Imperfeito do Indicativo 02 Pedia; estava.

Futuro do Presente do Indicativo 01 Serão

Presente do Indicativo + Infinitivo 01 Admite desistir; é preciso ter.

Presente do Indicativo + gerúndio 01 Vai tornando

Pretérito Perfeito do Indicativo +

Particípio Passado

01 Foi usado

Fonte: Autor.

Com o maior número, nove ocorrências, o presente do indicativo foi o tempo verbal

mais utilizado por Época nos processos presentes nas predicações. Acreditamos ser este fato

decorrente da busca que a revista faz por trazer à tona a expressão de fatos/certezas sobre o

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113

que é enunciado sobre o referente, o que ocorre também com o processo “admite desistir”,

constituído pelo presente do indicativo + infinitivo.

Em seguida, com duas ocorrências, temos os processos constituídos no pretérito

perfeito do indicativo, por meio dos quais a revista materializa acontecimentos já concluídos,

o que também acontece através da locução verbal “foi usado” (única ocorrência de processo

no tempo pretérito perfeito do indicativo + particípio passado). Nesses casos, a revista

consolida o fato e o apresenta ao leitor, permitindo a este compreender algo acontecido.

Também, com duas ocorrências, temos o pretérito imperfeito do indicativo que dá ideia de

uma ação durativa no passado.

O futuro do presente, por sua vez, permite à revista perspectivizar acontecimentos ou

levar o leitor à reflexão sobre o que pode acontecer, colocando o referente como escopo da

ação. Já o presente do indicativo + infinitivo, com o processo “é preciso ter”, dá um caráter de

inacabamento pela modalização que o verbo auxiliar possui. Quanto ao presente do indicativo

+ gerúndio, a revista projeta um estado sobre o referente, dando a este um caráter de

inacabamento do processo.

Nesse sentido, a temporalidade nos processos contidos nas proposições-enunciados

proferidas pela revista em sua capa dimensiona o leitor a compreender a Rd do referente ao

longo do tempo, bem como situam os fatos em seus respectivos aspectos de acabamento ou

inacabamento da ação, do estado etc.

Vale também mencionar que, quando a revista enuncia sobre o referente Lula, ela

utiliza verbos que se apresentam na terceira pessoa do singular, independentemente do tempo

verbal que o processo encerra. Nesse sentido, quer se trate da referenciação do tema tratado

como “Lula” ou “presidente”, sempre temos o verbo amparado no pronome pessoal do caso

reto “ele”.

Feitas as devidas considerações linguísticas sobre os processos que constituem as

predicações em torno do objeto de discurso Lula, passemos a análise das Rds desse tema por

meio das predicações. Para tanto, comecemos pelos enunciados que utilizam processos do

campo semântico acional.

Quadro 18 – Predicações com processos de ação

Exemplo Enunciados Código

Exemplo 42 Lula prepara uma frente dos adversários do governo SUBEp232

Exemplo 43 A vitória do candidato que pedia mudanças SUBEp232

Exemplo 44 Lula toma posse e o povo se aproxima do poder SUBEp284

Exemplo 45 Em entrevista à Época, o presidente diz que é preciso ter

cautela para que o Brasil cresça por mais dez anos: “Não há

SUBEp330

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114

mais espaço para espetáculo”

Exemplo 46 Desanimado, o presidente prevê meses de crise e admite

desistir da reeleição

SUBEp369

Exemplo 47 Presidente reage e testa sua candidatura à reeleição SUBEp377

Exemplo 48 O que ele fez CPEp433

Exemplo 49 Na campanha de 2002, as promessas de Lula passaram de 700.

ÉPOCA investigou o resultado de cada uma delas

SUBEp433

Fonte: Autor.

A revista, ao tratar Lula na condição de candidato, se utiliza de duas predicações:

“prepara” e “pedia” (exemplos 42 e 43). Com essas predicações, a revista constrói a Rd

discursiva de Lula como um candidato articulado e aparelhado para enfrentar o pleito,

percebido pelo processo “prepara”, bem como de um candidato insatisfeito com a situação

política do Brasil, através do processo “pedia”, com o qual se faz remissão a um desejo do

candidato que é anterior a sua vitória em 2002. Além disso, pela proposição-enunciado do

exemplo 43, podemos percebemos que a maneira de agir do candidato, imbuída no processo

pedia, foi uma das vantagens que o fez garantir a vitória na eleição presidencial.

O processo “toma”, exemplo 44, revela uma Rd de Lula não mais como candidato,

mas, sim, como presidente, pois está incutida nesta predicação a ideia de ocupante de cargo

público, isto é, a partir desse momento, haja vista o processo estar no tempo presente, Lula

será o encarregado pelo gerenciamento da nação brasileira em todas as suas instâncias –

política, econômica, educacional etc.

No exemplo 45, a revista Época constrói a representação discursiva de Lula como

cauteloso, o que se percebe pela presença do processo “é preciso ter”. Com isso, a revista

sinaliza o modo como Lula agirá em seu mandato enquanto presidente do Brasil.

Por meio das predicações constituídas pelos processos “prevê”, “admite desistir”,

“reage” e “testa” (respectivamente, exemplos 46 e 47), a revista Época constrói a imagem de

Lula como um presidente que está um passo a frente da situação brasileira e que antecipa

possíveis acontecimentos (prevê), no caso, uma crise. Todavia, na mesma proposição-

enunciado do processo “prevê”, a revista imputa a Lula a ideia de fraqueza (admite desistir),

uma vez que, segundo a revista, Lula afirma que não dará continuidade a sua candidatura à

reeleição, desistindo da presidência da República.

Diferentemente do processo “admite desistir” com o qual a revista constrói a Rd de

Lula como desertor, pelas predicações constituídas pelos processos “reage” e “testa”, Época

materializa textual e discursivamente Rds positivas de Lula, a saber, de resistente, de

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batalhador, sem medo de por à prova o seu nome e o seu trabalho como presidente. Isso revela

a atitude comportamental de Lula frente ao novo pleito que, na ocasião, se aproximava.

As proposições-enunciados dos exemplos 48 e 49 estão contidas na mesma capa de

revista. A voz da revista, com a chamada principal, põe em cheque as ações de Lula como

presidente, através do processo “fez”, o que é ratificado pela predicação dada no subtítulo da

capa com o enunciado “na campanha de 2002, as promessas de Lula passaram de 700”. O

processo “passaram”, associado a seu modificador “de 700”, revela uma extensão da classe-

escopo “... as promessas de Lula”, isto porque, o modificador projeta na predicação uma

quantificação, por conseguinte, o fato de Época se colocar como investigadora dos resultados,

faz crer no leitor, pelo excesso de promessas, que Lula não deve ter honrado com todos esses

compromissos, construindo, portanto, uma Rd negativa de Lula como prometedor.

Outro campo semântico que coaduna os processos das predicações instauradas pela

revista Época em torno do objeto de discurso Lula são as de cunho circunstancial (estado).

Estas revelam mudanças e constroem conjuntamente as Rds inerentes ao referente.

Observemos os enunciados que apresentam essa função.

Quadro 19 – Predicações com processos de estado

Exemplo Enunciados Código

Exemplo 50 Serra pode crescer mas se as pesquisas estão corretas, no dia 27

Luiz Inácio Lula da Silva se torna o 36º presidente da

República

SUBEp231

Exemplo 51 Quem disse que ele estava morto? CPEp377

Exemplo 52 Como entender a espetacular mudança de cenário que vai

tornando Lula, contra todos os prognósticos, o grande favorito

para a eleição presidencial

SUBEp404

Exemplo 53 Como serão os próximos quatro anos SUBEp404 Fonte: Autor.

Ao utilizar o processo tornar em suas formas conjugadas de 3ª pessoa do singular –

“torna” (exemplo 50) e na forma de gerúndio na locução verbal “vai tornando” (exemplo 52),

a revista Época representa discursivamente o objeto de discurso Lula em dois momentos de

eleição, fazendo conjecturas sobre a sua possível eleição em 2002 e a sua plausível reeleição

em 2006. Desse modo, ao revelar essa provável mudança de condição, ou seja, de candidato a

presidente, a revista constrói a Rd de Lula como possível vitorioso.

No exemplo 51, o próprio processo (estava) já representa o estado de Lula que se

segue pelo adjetivo “morto” (predicativo do sujeito). Ao fazer isso, a revista cria, por

antonímia, a ideia de que o referente permanece vivo e com chances de se reeleger, mesmo

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contra todas as especulações em torno da sua vida política. Semanticamente, a revista

expressa através da predicação “estava morto” a ideia de que, embora com todos os desgastes

sofridos pelo primeiro mandato de Lula, ele ainda está no páreo e com grandes chances de ser

vitorioso. Tal condição dada ao referente por essa predição é comprovada pela predicação do

exemplo 52 – “Como entender a espetacular mudança de cenário que vai tornando Lula,

contra todos os prognósticos, o grande favorito para a eleição presidencial”.

Quanto ao exemplo 53, a revista realiza por meio do processo no futuro (serão) uma

inferência acerca do que, após os quatro primeiros anos de mandato, o que poderá acontecer

como Lula e seu governo nos próximos quatro anos. Desse modo, indiretamente, Época

representa Lula como expectador, curioso e interessado em saber como será o seu próximo

mandato. Podemos inferir esse sentido pela imagem principal do então presidente reeleito

retratada na capa da revista. Vejamos:

Figura 12 – A contribuição da imagem principal para a predicação de futuro “serão”

Fonte: Revista Época, edição 442.

Nesta capa, a revista apresenta a imagem de Lula com uma expressão facial de

visionário e otimista, olhando para cima e com um sorriso no rosto, vislumbrando o que está

por vir no seu próximo mandato. Nesse sentido, com o processo “serão”, atrelado ao sentido

permitido pela imagem principal, podemos dizer que a revista constrói de Lula a Rd de

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expectador, porém, um expectador confiante e satisfeito com o acontecimento da reeleição e

do que há de vir pela frente.

Quadro 20 – Processos de ação que materializam estados sobre o referente Lula

Exemplo Enunciados Código

Exemplo 54 Dinheiro de Marcos Valério foi usado na campanha de Lula SUBEp377

Exemplo 55 Ele aguenta? CPEp412

Exemplo 56 Ninguém contou para ele? CPEp436

Exemplo 57 Quem perde

Lula, Mantega, Serra, Aécio – a gastança pública

SUBEp500

Fonte: Autor.

Nas proposições-enunciados dos exemplos 54, 55 e 56, temos três verbos de ação que

não são necessariamente ações praticadas por Lula, mas, sim, por outros alocutários e que,

através das predicações resvalam sobre o tema tratado, o que nos faz compreender a intenção

da revista em construir Rds de Lula sob vieses positivos ou negativos. Em 54, a revista coloca

Lula como beneficiário, ou seja, o processo “foi usado” coloca Lula como o indivíduo que

tirou proveito de algo, no caso, do dinheiro de Marcos Valério - um empresário brasileiro da

área publicitária, que se tornou nacionalmente conhecido em 2005 por seu envolvimento no

chamado escândalo do Mensalão. Nesse sentido, a revista ao pôr Lula como beneficiário

desse dinheiro, inferencialmente, constrói uma Rd dele como cúmplice de desvios financeiros

realizados por Marcos Valério.

Com os exemplos 55 e 56, respectivamente os processos “aguenta” e “contou”, a

revista busca revelar um estado psicológico do referente Lula nas predicações, haja vista as

predicações além de permitirem o sentido indicado pelo verbo, contextualmente poderem

apresentar o estado do referente na proposição. Em sendo assim, a revista constrói a Rd de

Lula como desinformado, “coitadinho”, com base em uma ironia relacionada aos casos de

corrupção, dos quais Lula sempre asseverou não ter sido informado. Essa interpretação dá-se

por dois elementos: os predicadores, conforme atestado anteriormente, e as imagens principais

das capas da revista. Vejamos:

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Figuras 13 e 14 – Predicação e sentido nas capas da revista Época

Fonte: Revista Época, edição 412. Fonte: Revista Época, edição 436.

Ao enunciar “Ele aguenta?” e “Ninguém contou para ele?”, a revista questiona a

condição de Lula, ou seja, o estado psicológico do participante. Na imagem principal da

edição que tem por predicação o processo “aguenta”, Lula aparece como uma sombra da

situação que é materializada no subtítulo “O impacto do caso Palocci sobre Lula”,

significando o afetamento sofrido pelo presidente. Palocci Filho foi um dos políticos

envolvidos no escândalo do Mensalão por receber entre 2001 e 2004 R$ 50 mil mensais

de propina da empresa Leão&Leão, que seria favorecida em licitações da prefeitura de

Ribeirão Preto e o dinheiro dessa propina seria usado para abastecer um caixa dois de

candidatos do PT. Direta ou indiretamente, com a proposição “Ele aguenta?”, através do

verbo “aguentar”¸ a revista põe em cheque a idoneidade de Lula nesse escândalo e constrói

dele uma imagem negativa, duvidando de sua resistência diante do acontecimento do

escândalo.

A representação discursiva de Lula como “coitadinho”, desinformado, evidenciada

pela predição “contou a ele?” é figurativizada pela imagem de Lula cabisbaixo na imagem

principal de Ep436. A imagem representa o estado de Lula quanto aos casos de corrupção

acontecidos em seu governo, mas isso de forma irônica, sinalizando a desconfiança da revista

quanto ao fato de ele realmente não saber.

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No exemplo 57, Lula é colocado com um conjunto de outros políticos que são

considerados perdedores em relação a gastos públicos. Diante disso, a revista constrói a Rd de

lula, com base no processo “perde”, como perdedor por não poder mais utilizar o dinheiro

público de forma desmedida, configurando um estado do referente e dos demais alocutários

presentes na proposição-enunciado.

Em síntese, ao construir as predicações referentes ao objeto de discurso Lula, a revista

constrói Rds em dois segmentos: as que tratam o tema de forma positiva e as que o tratam de

maneira negativa. A saber:

Quadro 21 – Representações discursivas de Lula por meio das predicações

Referente Sentido das predicações Representações discursivas

Lula

Positivas

Candidato articulado e aparelhado (prepara);

insatisfeito com a política nacional (pedia);

ocupante de cargo público e gerente da nação

brasileira (toma); resistente e batalhador (reage);

sem medo de por à prova o seu nome (testa);

possível vitorioso (torna, vai tornando); vivo e

com chances de se reeleger (estava).

Negativas

Fraco e desertor (admite desistir); prometedor

(fez e passaram); cúmplice (foi usado);

desinformado, coitadinho (contou); sem

resistência (aguenta); perdedor (perde). Fonte: Autor.

5.3.3 Relação

Nos textos das capas da revista Época, a única operação de relação evidenciada diz

respeito à contiguidade, isto é, a ligação entre os enunciados que, conforme mencionamos no

subtópico 3.1.2.4, trataremos por conexão. A categoria de conexão cria vínculos entre as

partes que constroem o conjunto de proposições. Linguisticamente, observamos a presença de

quatro tipos de conectivos nas proposições-enunciados das capas da revista, assumindo a

função de conectar as partes que compõem o texto. Quais sejam:

Quadro 22 – Conectivos usados nos textos da revista Época

Conectivos Número de ocorrências Função textual-discursiva

E 06 Aditivo

Que 02 Integrante

Mas 02 Adversativo

Para que 01 Final Fonte: Autor.

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Numa perspectiva coesiva, Neves (2011, p. 223) afirma que a conexão “abrange os

mais diversos tipos de estruturação de superfície”, ou seja, são as conjunções (conectivos) os

responsáveis pelo encadeamento entre o que se apresenta no cotexto precedente com o cotexto

posterior. Dessa forma, faz-se possível a compreensão de sentidos com base nesses elementos

que conectam partes do texto, quer por coordenação ou subordinação, haja vista eles

condicionarem às proposições-enunciados os objetivos visados pelo locutor ao produzir a

ação de linguagem. Vejamos, portanto, o sentido do conector “e”, recurso de conexão mais

frequente nas capas de Época.

Quadro 23 – Conectivos aditivos usados nos textos da revista Época

Exemplos Enunciados Código

Exemplo 58 As forças e fraquezas de um governo do PT SUBEp205

Exemplo 59 Lula toma posse e o povo se aproxima do poder SUBEp242

Exemplo 60 Desanimado, o presidente prevê meses de crise e admite desistir

da reeleição

SUBEp369

Exemplo 61 Presidente reage e testa sua candidatura à reeleição SUBEp377

Exemplo 62 Quem perde

Lula, Mantega, Serra, Aécio – e a gastança pública

SUBEp500

Exemplo 63 O legado do presidente e sua sombra sobre o futuro governo SUBEp646 Fonte: Autor.

Nas proposições-enunciados em que a conjunção aditiva aparece, temos o acréscimo

de informações (exemplos 58, 62 e 63) pela união de constituintes no sintagma ou a conexão

entre sentenças (exemplo 59, 60 e 61). No exemplo 58, pelo uso do “e”, a revista adiciona um

atributo “fraquezas”, oposto a outro atributo (forças) aferido ao participante Lula,

recategorizado como “governo do PT”. Com isso, o referido conectivo auxilia a reconstrução

da Rd do tema tratado como aquele que apresenta pontos fortes e pontos fracos para governar

o Brasil. O mesmo ocorre no exemplo 62, pois a Rd de Lula como parte daqueles que são

perdedores, no que diz respeito a não poder mais utilizar o dinheiro público de forma

desmedida, dá-se pelo uso do conectivo “e” que adiciona o sintagma nominal “a gastança

pública” como uma das perdas a que se refere o processo perde. Em 63, seguindo o mesmo

princípio de adição, o “e” conecta “o legado do presidente” a “sua sombra” com vistas a

contribuir com a Rd do referente como aquele que deixou uma herança para o futuro governo

e que, por isso, não será possível descartá-lo no governo seguinte, tornando-se ele uma

sombra que seguirá a nova gestão.

Nos demais exemplos, a conexão se dá entre sentenças, implicando uma continuidade

das ações praticadas pelo referente nas proposições-enunciados. Com o exemplo 59, a revista

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acrescenta a ideia de que, com a posse de Lula, o povo se aproxima do poder, contribuindo,

portanto, para a construção da Rd de Lula como o candidato do povo. No exemplo 60, o

conectivo articula a primeira sentença “prevê meses de crise” a outra que revela a Rd de Lula

como desistente. Por fim, com o exemplo 61, a revista adiciona à ação de reagir a de testar,

contribuindo para a Rd do participante como resistente e sem medo de se expor ao teste

público.

Quadro 24 – Conectivos integrantes usados nos textos da revista Época

Exemplos Enunciados Código

Exemplo 64 Em entrevista à Época, o presidente diz que é preciso ter

cautela para que o Brasil cresça por mais dez anos: “Não há

mais espaço para espetáculo”

SUBEp330

Exemplo 65 Quem disse que ele estava morto? CPEp404 Fonte: Autor.

O uso do “que” para estabelecer relação entre as proposições-enunciados implica em

subordinações substantivas asseverativas (CASTILHO, 2010, p. 357). Nesse sentido, o

conectivo integra a sentença principal a uma sentença que a ela está subordinada, ou seja, que

integra o sentido da principal. Assim sendo, a revista se utiliza desse conectivo para construir

afirmações sobre o objeto de discurso, dando desenvolvimento às proposições-enunciados.

Ao observarmos os exemplos, percebemos os seguintes sentidos que o conectivo

integrante “que” possibilita nas proposições-enunciados em que aparece: em 64, o uso do

conectivo corrobora para a construção da Rd de Lula como presidente cauteloso, uma vez que

ele integra uma afirmação “é preciso ter cautela” a oração principal “o presidente diz”; em 65,

ao construir a interrogativa, a revista pretende afirmar o fato de Lula estar vivo e com chances

de se reeleger, por isso, a conjunção “que” integra o “ele estava morto” a “quem disse”

(oração principal), gerando um efeito diferente do que se pretende, geralmente, com uma

proposição-enunciado declarativa afirmativa.

Quadro 25 – Conectivos adversativos usados nos textos da revista Época

Exemplos Enunciados Código

Exemplo 66 Serra pode crescer mas se as pesquisas estão corretas, no dia 27

Luiz Inácio Lula da Silva se torna o 36º presidente da República

SUBEp231

Exemplo 67 O país não mudou. Mas há uma nova esperança nas ruas SUBEp233 Fonte: Autor.

O uso do “mas” corrobora para a construção da Rd de Lula como possível vitorioso da

campanha à eleição de 2002 (exemplo 66) e para a construção da Rd de Lula como uma nova

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esperança nas ruas (exemplo 67), uma vez que estabelece as respectivas oposições: Serra

versus Lula nos resultados das pesquisas e país que não muda versus Lula como esperança de

transformação.

Quadro 26 – Conectivo final usado nos textos da revista Época

Exemplos Enunciados Código

Exemplo 68 Em entrevista à Época, o presidente diz que é preciso ter cautela

para que o Brasil cresça por mais dez anos: “Não há mais

espaço para espetáculo”

SUBEp330

Fonte: Autor.

Com o uso do “para que” (exemplo 68), Época materializa o discurso de Lula com

vistas a apresentar como ele vê a situação do Brasil, descrita pelo discurso direto como um

país que viveu de espetáculo, uma vez que para ele se deve ter cautela com as ações que serão

realizadas, a fim de que o Brasil cresça. Desse modo, a revista materializa um pensamento de

Lula e constrói a representação do objeto de discurso como cauteloso, em virtude da relação

de finalidade que o conector apresenta no texto.

A conexão nas capas de revista, por sua vez, não se dá apenas no nível linguístico-

textual. Percebemos que a relação verbovisual, assim como os demais elementos de relação,

também possibilita a contiguidade informacional do texto, pois como já afirmamos na análise

das referenciações, por vezes a imagem funciona como o referente que é retomado pelas

demais partes que constituem o texto presente na capa de revista. Essa discussão reforça ainda

mais a necessidade se observar a imagem como parte constitutiva do gênero de discurso e não

apenas como um adereço para chamar a atenção do leitor.

Para exemplificar a conexão por meio da verbovisualidade do gênero de discurso capa

de revista, observemos os exemplares que seguem:

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123

Figura 15 – Conexão por meio da imagem e texto

Fonte: Revista Época, edição 242.

Na capa de revista em que Lula toma posse para exercer o seu primeiro mandato,

temos como chamada principal a proposição “Mudança na história”. Como se percebe, não há

nessa chamada uma referenciação de Lula, nem muito menos um termo que recategorize o

objeto de discurso tratado pela revista. Entretanto, a imagem principal contendo Lula do lado

da primeira dama em um carro, o Rolls-Royce Silver Wraith, veículo de cerimônia utilizado

pelo chefe de estado em datas comemorativas, no caso, a posse, permite ao leitor inferir que a

mudança na história diz respeito a Lula chegar ao poder. Adicionalmente, o subtítulo da

chamada principal concretiza no texto o referente, dando destaque ao evento que está

acontecendo.

Percebemos com isso que a articulação verbovisual é fundamental para a elaboração

do texto no gênero de discurso capa de revista e, por conseguinte, que a imagem desencadeia

sentidos que contribuem para a construção das Rds de Lula nas capas da revista Época. Dito

isso, é válido salientar que o gênero em análise é constituído de proposições-enunciados

relativamente curtas, o que não permite uma progressão textual conectada entre todos os

enunciados do corpus, porém, pela presença da imagem de Lula em todos os exemplares em

análise (ver anexo A), podemos dizer que é por ela que os textos das capas de revista se

conectam, dando possibilidade a nossa interpretação das Rds de Lula nas capas da revista

Época.

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A afirmação feita anteriormente de que a imagem de Lula é responsável pela

conexão do corpus em análise é validada quando observarmos capas como as que seguem:

Figuras 16 e 17 – Conexão verbovisual e mecanismos de foricidade no texto das capas de Época

Fonte: Revista Época, edição 404. Fonte: Revista Época, edição 436.

As duas capas de revista acima representam a manifestação visual como elo de

conexão entre os textos que compõem o corpus das capas da revista Época. Lula é

apresentado visualmente como o elemento principal da temática da revista, sendo retomado

pelo dispositivo anafórico “ele”. É nesse sentido que Adam (2011a, p. 76, grifos do autor)

afirma que: “Os pronomes de terceira pessoa ele(s) e ela(s) devem, com efeito, ser

(re)classificados no domínio das retomadas, com os demonstrativos, certos indefinidos e

certos grupos nominais definidos [...]”.

Fato importante é que a presença do elemento fórico “ele” nas capas de época aparece

sempre na chamada principal, necessitando de algo que possibilite a ancoragem do referente,

o que acontece por meio da imagem principal, isto porque, as consagradas anáforas, caso do

“ele” em nossos textos de análise, “são responsáveis pela continuidade referencial e exigem a

consideração de um termo-âncora formalmente dito no cotexto” (CAVALCANTE, 2011).

Entretanto, o papel de âncora é realizado em algumas capas pela própria imagem. Nessa

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125

condição, portanto, é que a anáfora ocorre quatro vezes nas capas de Época, possibilitando ao

leitor compreender a quem se relaciona o “ele” referenciado na capa.

Vejamos, então, as proposições-enunciados em que essa manifestação textual ocorre,

exigindo a ancoragem no elemento visual.

Quadro 27 – Estabelecimento de conexão do elemento fórico “ele” com a imagem principal (referente)

Exemplos Enunciados Código

Exemplo 69 Quem disse que ele estava morto? CPEp404

Exemplo 70 Ele aguenta? CPEp412

Exemplo 71 O que ele fez CPEp433

Exemplo 72 Ninguém contou para ele CPEp436 Fonte: Autor.

Isolados da capa de revista, enquanto texto complexo, poder-se-ia dizer que a marca

linguística em destaque nas quatro proposições-enunciados (exemplos 69, 70, 71 e 72) assume

a função de pronome (participante sujeito) ou de complemento nas proposições-enunciados,

entretanto, como nas capas de revista o elemento assume o papel de retomar o referente dado

pela imagem, podemos fazer uma interpretação fórica do item (CASTILHO, 2010),

entendendo ser o “ele” responsável por garantir a continuidade do texto pela relação

verbovisual.

Outro pronome que aparece nas capas da revista Época e que assume a função fórica

de retomar o objeto de discurso na cadeia textual é o pronome possessivo de terceira pessoa

do singular “sua”. Vejamos a ocorrência desse fenômeno no quadro a seguir:

Quadro 28 – Estabelecimento de conexão por meio do possessivo “sua”

Exemplos Enunciados Código

Exemplo 73 Presidente reage e testa sua candidatura à reeleição SUBEp377

Exemplo 74 O legado do presidente e sua sombra sobre o futuro governo CPEp412 Fonte: Autor.

Diferentemente da análise do pronome “ele”, a utilização do possessivo “sua” nas

capas de Época se dá como forma de manter o referente que já textualizado nas proposições-

enunciados, assinalando a continuidade do dizer sobre o objeto de discurso. Desse modo,

tanto no exemplo 73 como no exemplo 74, o pronome possessivo é utilizado para retomar o

referente Lula, atribuindo-lhe a ideia de possuidor: Lula possui o título de candidato (exemplo

73) e Lula possui uma sombra (exemplo 74). No primeiro, pelo uso do possessivo, a revista

constrói do referente a Rd de um presidente que não teme se candidatar novamente por pôr à

prova seu nome. No segundo, Época atribui pelo possessivo a ideia de um ex-presidente que

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não intenta sair do seio presidencial, o que se evidencia pela palavra “sombra” como parte de

Lula que seguirá como voz ativa nas decisões do governo que o sucederá.

Nesse sentido, seguindo o resultado obtido por meio da análise do pronome “ele”, ao

interpretamos o possessivo “sua” a partir de sua propriedade semântica, podemos afirmar, em

consonância com Castilho (2010, p. 504), que ao atuarem como um fórico, os pronomes

possessivos contribuem para a coesão do texto, isto é, possibilitam manter a cadeia referencial

no discurso, permitindo ao leitor/alocutário reconstruir os efeitos de sentido pretendidos pelo

locutor no ato de linguagem.

Portanto, podemos afirmar que para a reconstrução das Rds de Lula, dadas nas capas

das revistas Época, faz-se necessário observar os conectores textuais, assim como a conexão

verbovisual, ambos perspectivizadores de sentidos pela possibilidade de continuação textual e

referencial do discurso.

5.3.4 Localização espacial e temporal

Considerando a localização espacial e temporal como circunstâncias que permitem

situar as Rds construídas pela revista acerca do tema tratado, verificamos que Época pouco se

utiliza desses marcadores em seus enunciados. Para a localização espacial são percebidas três

marcas, enquanto que para a localização temporal também observamos o mesmo numero de

ocorrências. Vejamos os elementos circunstanciais no quadro a seguir:

Quadro 29 – Localizadores espaciais e temporais nas capas da revista Época

Exemplos Enunciados Código

Exemplo 75 Lula quase lá CPEp231

Exemplo 76 O país não mudou. Mas há uma nova esperança nas ruas SUBEp233

Exemplo 77 Em entrevista à Época, o presidente diz que é preciso ter

cautela para que o Brasil cresça por mais dez anos: “Não

há mais espaço para espetáculo”

SUBEp330

Exemplo 78 Na campanha de 2002, as promessas de Lula passaram

de 700. ÉPOCA investigou o resultado de cada uma delas

SUBEp433

Exemplo 79 Como serão os próximos quatro anos (Ep442) CPEp442 Fonte: Autor.

No exemplo 75, a revista Época utiliza dois advérbios que modificam a situação do

referente Lula na proposição enunciado. O advérbio de intensidade “quase”, associado ao

adverbio de lugar “lá”, revelam a ideia de tempo e espaço. Um tempo impreciso e um lugar

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127

que não é físico, mas, sim, conceitual, haja vista se tratar do cargo a presidente do Brasil.

Desse modo, podemos dizer que a revista, por meio da locução adjetiva, contribui para a

construção da Rd de Lula como candidato com chances de ganhar a eleição para presidente da

República.

Respectivamente nos exemplos 76 e 77, os substantivos “país” e “Brasil” caracterizam

o lugar de onde fala a revista e que, por conseguinte, auxilia a construir as Rds de Lula como

representante da nação, presidente, entre outras. A funcionalidade desses vocábulos nas

proposições-enunciados ultrapassam, desse modo, uma mera descrição conceitual-gramatical,

pois textual e discursivamente eles são responsáveis por situar o discurso no espaço.

Quanto aos locativos temporais, tivemos a ocorrência de três expressões que incidem

sobre as Rd de Lula construídas por meio das referenciações e predicações. No exemplo 76, a

expressão “dez anos” ressalta a representação de Lula como cauteloso, construída por meio do

processo “é preciso ter”. Desse modo, para Lula, ser cauteloso é o que se precisa para

desenvolver o país do qual ele é presidente.

A expressão temporal “Na campanha de 2002” (exemplo 78) corrobora com a

construção da Rd de Lula como prometedor, haja vista ter sido nesse período que o candidato

realizou as mais de 700 promessas que foram investigadas por Época. E, por fim, a expressão

“os próximos quatro anos”, presente no exemplo 79, também contribui com uma das Rds

construídas pela revista, a saber a de expetador, isto porque, o tempo dado no enunciado

remete ao período que Lula estará exercendo o cargo de presidente pela segunda vez, após a

sua reeleição. Sendo assim, essa expressão associada ao predicador “serão” revelam um Lula

curioso, ansioso e expectador de um futuro que ele vivenciará na presidência da República.

Em síntese, vale ressaltar a importância da localização espacial e temporal para a

construção das Rds de Lula nas capas de época, uma vez que eles nos permitem compreender

o lugar em que a revista situa o objeto de discurso, bem como esse objeto é visto em um

tempo determinado (exemplo 78) ou em um tempo perpectivizado (exemplos 77 e 79).

5.4 RDS DE LULA NAS CAPAS DA REVISTA VEJA

Seguindo o paradigma adotado para a análise das Rds de Lula nas capas da revista

Época, passamos a análise dos textos nas capas da revista Veja. É importante ressaltar que,

para manter o padrão de análise, descrevemos e interpretamos as Rds de Lula a partir das

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128

categorias semânticas, considerando o sentidos manifestados pelas marcas verbovisuais

utilizadas co(n)textualmente no gênero de discurso capa de revista.

Não obstante, para efeito de continuação analítico-qualitativa, tecemos comparações

dos resultados obtidos da análise das capas da revista Época com os resultados impetrados

com descrição e interpretação das Rds de Lula nas capas da revista Veja, dando uma

completude à análise do corpus em estudo.

5.4.1 Referenciação e seus modificadores

No que concerne à referenciação, apenas dois elementos são utilizados pela revista

Veja para referenciar o objeto de discurso Lula, a saber: a imagem principal e a nominalização

“Lula”. Nesse sentido, podemos dizer que as Rds de Lula nas capas de Veja são construídas

com base nessas duas referenciações. Assim sendo, observemos a recorrência dessas marcas

(imagem e denominações) no arcabouço geral das capas em análise.

Quadro 30 – Formas de referenciação do objeto de discurso Lula nas capas da revista Veja

Referenciações Ocorrências Porcentagem

Imagem principal 14 58%

Nominalização “Lula” 10 42% Fonte: Autor.

Diferentemente das referenciações realizadas nas capas da revista Época em que as

nominalizações foram mais frequentes, nas capas de Veja, conforme se pode notar, a maior

frequência de formas de referenciação do objeto de discurso Lula se dá por meio da imagem

principal, ou seja, em quatorze capas (58%) a imagem se torna responsável por manifestar o

tema sobre o qual será veiculada a informação. Desse modo, fica evidente a força da imagem

para a construção das Rds do tema tratado, o que também evidência a concordância com os

estudos jornalísticos que defendem ser a imagem uma forte aliada do jornalismo de revista.

As demais capas, que equivalem a dez exemplares (42%), referenciam o tema tratado pela

denominação “Lula”.

Analisemos alguns casos em que a imagem principal funciona como o referente sobre

o qual são construídas as proposições-enunciados sobre o tema tratado Lula.

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Figuras 18 e 19 – Referenciações de Lula construídas apenas pela imagem principal

Fonte: Revista Veja, edição 1975. Fonte: Revista Veja, edição 2189.

A construção da referenciação em textos verbovisuais permite ao veículo de

informação a oportunidade de deixar a imagem “falar” ao interpretante/leitor. Desse modo, a

revista Veja faz uso da força argumentativa desse recurso para expressar o seu PdV, o que,

por sua vez, demanda um esforço cognitivo maior do interlocutor para chegar ao efeito de

sentido pretendido pela representação do participante em foco. Vale mencionar que nas capas

de Ve1975 (figura 18) e de Ve2189 (figura 19) não são apresentadas nominalizações que

categorizem o objeto de discurso exposto pela imagem principal. Apenas em Ve2189 temos

alguns elementos de retomada (ele, dele) e a palavra repetida “presidência” que nos situam

sobre o que e sobre quem, co(n)textualmente, a revista trata como tema.

Nas figuras 18 e 19, a revista referencia o tema tratado (Lula) com base em caricaturas

do então presidente passíveis de serem compreendidas pela notória dimensão sociocultural

que essa figura assume na conjuntura de governança do país. Além de reconhecermos o objeto

de discurso focalizado por Veja, os elementos que constroem a imagem principal atribuem a

ele o status presidencial, o que pode ser notado pela presença da faixa que o candidato eleito

recebe em sua posse. Nos casos em análise, uma gama de efeitos de sentido pode ser atribuída

a essa faixa: Lula como presidente da república (figuras 18 e 19); Lula como presidente que

não enxerga ou não quer enxergar o que acontece ao seu redor (figura 18); Lula como

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representante da justiça, remetendo ao fato de a justiça ser cega, imparcial (figura 18); Lula

como eterno presidente (figura 19); Lula como um presidente que não deseja sair do comando

do país, mesmo que em uma situação de descanso ou término de seu segundo

mandato/reeleição, sentido evidenciado pela faixa em forma de tatuagem na pele do

participante caricaturado (figura 19); entre outros. Esses efeitos de sentido remetem a Rds que

a revista constrói de Lula por meio da imagem. Acrescente-se a isso o fato de que, por ser

uma caricatura, está implicado na imagem um tom humorístico que revela críticas acerca do

objeto de discurso referenciado, o que ressalta a pluralidade de sentidos que poder ser

evidenciada por meio da leitura verbovisual.

Nesse panorama, é válido mencionar que apenas a revista Veja referencia Lula por

meio de imagens que não contém a presença de categorização do objeto de discurso. Mais

uma vez, isso revela o caráter multimodal do gênero de discurso capa de revista, bem como a

força ilocucionária da imagem para alcançar o propósito comunicativo/interacional da revista

que é fazer com que o leitor seja atraído pelo que observa e, por conseguinte, adquira o

produto ofertado.

Outrossim, nas capas da revista Veja também encontramos referenciações de Lula que

partem da imagem e são categorizadas por nominalizações. Veja recorre a duas formas de

categorizar verbalmente esse objeto, são elas: Lula e presidente. Assim como nas capas da

revista Época, essas categorizações anunciam linguisticamente o objeto de discurso que é

apresentado visualmente, articulando o todo textual no que podemos chamar de cadeia

referencial.

Para tanto, apresentamos um quadro geral com a recorrência das nominalizações em

que o tema tratado é categorizado como “Lula” e como “presidente”.

Quadro 31 – Referenciações (categorizações e recategorizações) do tema Lula nas capas da revista Veja

Referenciação

(categorização)

Número de

ocorrências

Recategorizações Número de

ocorrências

Lula 24

Presidente 04

Petista 01

Sujeito oculto 01

Grande guia 01

Bobo da corte 01

Pai 01

Político 01

Lulismo 01

Presidente 02 - - Fonte: Autor.

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131

Para ilustrar o papel da imagem como objeto de discurso que é categorizado por essas

nominalizações, apresentamos apenas uma das capas em que esse procedimento acontece e,

por conseguinte, as proposições-enunciados contidas nas capas que são constituídas em

relação a imagem principal. Comecemos pelo uso da categorização do tema tratado como

“Lula”.

Figura 20 – Capa de Veja em que a imagem principal é categorizada pela nominalização “Lula”

Fonte: Revista Veja, edição 1760.

Quadro 32 – Categorizações do tema tratado pela nominalização “Lula” nas capas de Veja

Exemplos Enunciados Código

Exemplo 80 Quem vai ser o anti-Lula? CPVe1760

Exemplo 81 Lula voltou dos EUA chamando Bush de aliado SUBVe1782

Exemplo 82 Lula-de-mel CPVe1784

Exemplo 83 Com seu governo paralisado, Lula cai nas pesquisas e ainda

tem de carregar o peso morto do ex-homem forte do Planalto

SUBVe1847

Exemplo 84 Com a demissão de José Dirceu, Lula tenta salvar o governo

e sua biografia

SUBVe1910

Exemplo 85 55% dizem que Lula sabia da corrupção SUBVe1913

Exemplo 86 A denúncia do procurador-geral não deixa dúvida: Lula é o

sujeito oculto da “organização criminosa que tinha como

objetivo garantir a continuidade do projeto de poder do PT”

SUBVe1952

Exemplo 87 Lula dormiu como o “grande guia” da América Latina e

acordou como mais um bobo da corte do venezuelano Hugo

Chávez, que tramou o roubo do patrimônio brasileiro na

Bolívia

SUBVe1955

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Exemplo 88 O primeiro mandato de Lula foi pífio... SUBVe1981

Exemplo 89 Lula exagera, ignora o stress e tem uma crise de hipertensão

que, como ensinam os médicos, poderia ser evitada

SUBVe2150

Fonte: Autor.

A figura 20 exemplifica o uso da imagem como o objeto de discurso sobre o qual se

irão desenvolver os enunciados na capa de revista, tendo como categorização a denominação

“Lula”. Observemos que o exemplo 80 constitui o texto verbal em evidência na capa Ve1760,

trazendo o nome de Lula associado a um prefixo que modifica o sentido da categorização no

texto. Com essa modificação, a revista deixa de focalizar o objeto de discurso para destacar os

opositores de Lula – Ciro e Serra. Acreditamos que o diálogo verbovisual explica as escolhas

realizadas pela revista para a construção do enunciado “Quem vai ser o anti-Lula?”, isto

porque, assim como a imagem de Lula aparece em um segundo plano pela saturação de cores

evidenciada no arranjo visual da capa, o entorno discursivo coloca Lula como expectador da

disputa pela vaga para o segundo turno, efetivando o sentido da ação de linguagem visada

pela revista. Desse modo, as imagens de Ciro Gomes e José Serra são apresentadas como

complementares ao propósito da revista, uma vez que um deles será o possível candidato que

enfrentará Lula, o que explica o significado do prefixo modificador “anti” ao categorizar Lula

como o objeto de discurso no texto verbal. Sendo assim, podemos interpretar esse

modificador no sentido de oposição. Nesse sentido, a revista constrói a Rd de Lula como

aquele que será desafiado e que terá de vencer um de seus opositores para chegar à

presidência da República.

Nos demais exemplos, do 81 ao 89, a revista categoriza o objeto de discurso pela

nominalização “Lula”, dando a este a função de âncora para o desenvolvimento do tema

tratado, o que nos permite compreender as Rds de Lula com base nas predicações que são

construídas em torno do referente.

Outra questão que merece destaque nessa análise é o caso dos exemplos 86 e 87.

Neles, há recategorizações da nominalização “Lula”. No exemplo 86, ao tratar de crimes

associados ao PT, a revista enuncia, por meio da voz do procurador-geral, a participação de

Lula como membro de uma organização criminosa que beneficiaria o PT e daria continuidade

ao projeto petista de se manter no governo. Essa interpretação parte da presença da

recategorização de Lula como “sujeito oculto”, ou seja, entende-se que, através do contexto,

Lula faz parte dessa organização, mesmo podendo não haver marcas de sua presença ou

provas que validem a afirmação do procurador-geral.

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Em 87 são utilizados mais duas recategorizações: “grande guia” e “bobo da corte”. O

contexto do qual emerge a construção da proposição-enunciado remete a uma trama

arquitetada pelo presidente boliviano Hugo Chávez para se apossar da refinaria da Petrobras,

o maior campo de extração de gás natural da Bolívia. Ao se valer da recategorização de Lula

como “grande guia”, a revista ironiza a pretensão de Lula a líder da América Latina,

utilizando um tom debochado que é sancionado negativamente pelo sentido construído na

proposição-enunciado. Em consequência disso, ao fazer uso da recategorização “bobo da

corte” diante da trama de expropriação, a revista atribui ao participante a ideia de palhaço,

enganado. Sendo assim, podemos dizer que a revista, amparando-se da ironia, constrói Rds

negativas de Lula ao situá-lo co(n)textualmente, permitindo, portanto, observar o referente em

um processo de transformação que ocorre pela passagem de “grande guia” a “bobo da corte”.

Das ocorrências evidenciadas, em apenas dois exemplares das capas da revista Veja o

objeto de discurso é categorizado como “presidente”. Isso, após ter a imagem principal como

referente da ação de linguagem visada pela revista. Vejamos, agora, os casos em que o tema

tratado é recategorizado como “presidente” nas capas de Veja.

Figura 21 – Capa de Veja em que a imagem principal é categorizada pela nominalização “Presidente”

Fonte: Revista Veja, edição 1775.

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Quadro 33 – Categorizações do tema tratado pela nominalização “presidente” nas capas de Veja

Exemplos Enunciados Código

Exemplo 90 O primeiro presidente de origem popular SUBVe1775

Exemplo 91 Os desafios do presidente eleito para unir um país dividido e

fazer o Brasil funcionar

SUBVe1980

Fonte: Autor.

O exemplo 90, presente na figura 21, situa-se no período em que Lula foi eleito pela

primeira vez como presidente da República, no ano de 2002. Observemos nesse exemplo que

o categorizador “presidente” é ladeado por dois modificadores: um no cotexto precedente com

o uso do numeral com função de adjetivo “primeiro”; e um no cotexto posterior, constituído

pela expressão “de origem popular”, que tem por função especificar e, por conseguinte,

complementar o sentido do modificador que o precede. Com isso, a revista representa

discursivamente o objeto de discurso Lula como um presidente que modificou, alterou a

ordem prototípica dos presidentes brasileiros, devido a sua origem e classe social.

De modo decisivo, a relação imagem e texto contribui para a construção da Rd de Lula

como um presidente que altera o panorama histórico, isto porque, conforme podemos notar no

exemplar Ve1775 (figura 21), Lula aparece segurando a bandeira do Brasil e portando na

expressão facial um sorriso que demonstra a sua satisfação em ter sido eleito para a

presidência. Ademais, a chamada principal “Triunfo histórico” ressalta o valor da vitória no

contexto republicano brasileiro. Esse triunfo é ainda revalidado pelo subtítulo na parte

superior da capa que apresenta Lula na condição de “primeiro presidente de origem popular”,

ou melhor dizendo, um vitorioso que quebra o paradigma de presidentes de origens e classes

sociais mais abastadas.

Por se tratar de uma proposição-enunciado de caráter nominal (exemplo 90), ao

referente “presidente” não pode ser atribuído um papel temático. Por seu turno, no exemplo

91, a categorização do objeto de discurso Lula como “presidente” – núcleo do sintagma

nominal “Os desafios do presidente eleito” – pode ser entendida pelo papel temático de

alvo/paciente, isto é, na proposição-enunciado o tema tratado é exposto pelo locutor como o

indivíduo que é afetado pela ação. Além disso, essa categorização também é modificada pelo

adjetivo “eleito”, construindo a Rd do tema tratado como aquele que foi vitorioso mais uma

vez, haja vista ser o texto dessa capa representativo da reeleição de Lula à presidência no ano

de 2006. Todavia, a revista coloca o resultado dessa eleição como um desafio para o

presidente, uma vez que, segundo Veja, o país ficou dividido e demanda de Lula esforços para

uni-lo.

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Ainda no que diz respeito à referenciação, vale observar o papel linguístico do

referente Lula nas proposições enunciadas pela revista Veja. Vale mencionar que parte dos

enunciados que tem Lula como categorização do referente já foram discutidos na análise da

relação verbovisual de construção da referência e, por esse motivo, incluímo-los no quadro

geral, mas, priorizamos para discussão as proposições-enunciados que ainda não foram

descritas e interpretadas.

Das vinte e quatro manifestações de Lula como categorização do tema tratado, apenas

uma assume a função sintática de adjunto nominal, o que não implica em um papel temático

acerca do objeto de discurso linguisticamente textualizado por Veja, qual seja: O

“Ronaldinho” de Lula (CPVe1979). As demais, vinte e três ocorrências, apresentam o

participante como sujeito ou núcleo do sujeito nas proposições enunciadas por Veja.

Observemos o quadro a seguir com alguns exemplos de proposições-enunciados em que o

objeto de discurso aparece categorizado como Lula na função de sujeito40

.

Quadro 34 – Referenciações de Lula na função de participante sujeito nas capas de Veja

Exemplos Enunciados Código

Exemplo 92 Porque Lula assusta o mercado CPVe1752

Exemplo 93 Lula vai a César CPVe1781

Exemplo 94 Com seu governo paralisado, Lula cai nas pesquisas e ainda

tem de carregar o peso morto do ex-homem forte do Planalto

SUBVe1847

Exemplo 95 Com a demissão de José Dirceu, Lula tenta salvar o governo

e sua biografia

SUBVe1910

Exemplo 96 55% dizem que Lula sabia da corrupção SUBVe1913

Exemplo 97 Quando e como Lula foi alertado SUBVe1914

Exemplo 98 Sem ação diante do escândalo que devorou seu partido e

paralisou seu governo, Lula está em uma situação que já

lembra a agonia da era Collor

SUBVe1917

Exemplo 99 A denúncia do procurador-geral não deixa dúvida: Lula é o

sujeito oculto da “organização criminosa que tinha como

objetivo garantir a continuidade do projeto de poder do PT”

SUBVe1952

Exemplo 100 Lula dormiu como o “grande guia” da América Latina e

acordou como mais um bobo da corte do venezuelano Hugo

Chávez, que tramou o roubo do patrimônio brasileiro na

Bolívia

SUBVe1955

Exemplo 101 Lula exagera, ignora o stress e tem uma crise de hipertensão

que, como ensinam os médicos, poderia ser evitada

SUBVe2150

Fonte: Autor.

40

Nessa análise damos destaque às proposições-enunciados em que o participante é sujeito e núcleo do sujeito ao

mesmo tempo, haja vista as situações em que ele não aparece como núcleo do sujeito fazerem referência a

subtemas associados ao objeto de discurso.

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A revista Veja ao expressar o seu PdV em relação ao tema tratado, constrói Rds de

Lula, atribuindo-lhe papeis temáticos que estão diretamente relacionados a ações ou estados

do participante tematizado na função de sujeito. Assim sendo, podemos depreender quatro

papeis temáticos realizados pela referenciação “Lula”, são eles: agente, alvo/paciente,

beneficiário e experienciador.

No exemplo 92, Lula assume o papel temático de experienciador, uma vez que o

processo “assusta” permite compreender o estado psicológico atribuído pela revista ao

participante. Nesse caso, não se trata de Lula ter a consciência de que ele assusta o mercado,

mas, sim, como a revista o vê no contexto da economia e administração brasileira.

Assumindo outro papel temático atribuído pela revista ao objeto de discurso Lula,

temos o papel de alvo/paciente com quatro ocorrências, conforme se pode observar nos

exemplos 94, 96, 97 e 99. Com isso, a revista constrói Rds de Lula como um participante

afetado pelos acontecimentos do seu governo: a paralização de seu governo o faz cair nas

pesquisas (exemplo 94); conhecedor de casos de corrupção (exemplo 96); indivíduo que

precisa de informação (exemplo 97); e, integrante de uma organização criminosa que

beneficiaria o seu partido (exemplo 99). Essas interpretações são possíveis pelo entorno

discursivo que circunda a construção textual das proposições-enunciados, nas quais, além da

voz da revista Veja, outras vozes são trazidas pelo veículo de informação para expressar o

PdV sobre o tema tratado, a saber, as vozes de indivíduos que participaram de pesquisa

divulgada pela revista (exemplo 96) e a voz do procurador-geral (exemplo 99).

Vale lembrar que identificamos o papel temático do participante nas proposições pelo

sentido que o sujeito tem na relação com o processo que constitui o enunciado (ILARI, 2009).

Desse modo, ao inscrever Lula como aquele que pratica a ação, a revista apresenta situações

realizadas pelo participante que estão diretamente ligadas a sua forma de governar.

Em 93, por exemplo, Veja comenta o encontro de Lula com George Bush, comparando

este a César, o que sinonimicamente rotula Bush de Imperador. Ao fazer isso, e com base no

processo “vai”, constrói-se de Lula a Rd de um político que se desloca até outro com vistas a

construir alianças governamentais, negociações, que servirão ao desenvolvimento do país.

Tais interpretações advêm da relação verbovisual que é construída pela cadeia referencial na

capa da revista Ve1781. Vejamos:

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137

Figura 22 – Contribuições da verbovisualidade para a interpretação dos sentidos na cadeia referencial

Fonte: Revista Veja, edição 1781.

Nota-se que a revista prioriza a imagem de Bush, figurativizado pelas roupas como

sendo o Imperador, e dispõe a fotografia de Lula em um segundo plano, destacando o

propósito de sua ida ao encontro do presidente americano, uma vez que esse encontro pode vir

a “definir o tipo de nação que o Brasil será”, conforme anunciado no subtítulo. Mencione-se,

ainda, que o referido encontro aconteceu antes de Lula tomar posse como presidente, o que

possibilita a interpretação de que o candidato eleito a presidência do Brasil já começava a se

articular com líderes de outros países para o desenvolvimento do seu pleito.

Adicionalmente, o exemplo 81 do quadro 32 – “Lula voltou dos EUA chamando Bush

de aliado” –, tem o participante Lula como agente e, nesse enunciado se concretiza os efeitos

de sentido obtidos da interpretação de Ve1781, haja vista a noção de parceria consolidada

entre os presidentes, dado o retorno de Lula ao Brasil. O processo “voltou” e a substantivação

do processo “chamar” dão-se como pistas para se chegar a Rd de Lula como aliado, isto

porque, a qualificação atribuída a Bush pela forma como Lula o classifica (aliado) funciona

como caracterização do próprio referente na proposição-enunciado.

No exemplo 95, a revista Veja também atribui a Lula o papel temático de agente, posto

que, diante de um contexto de corrupção que implicou no pedido de demissão por parte de

José Dirceu, então Ministro-Chefe da Casa Civil, e que impactou diretamente na imagem do

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presidente Lula, a revista apresenta Lula como prejudicado pelos acontecimentos. Todavia, o

processo “tenta salvar”, presente no enunciado, constrói a Rd do participante como alguém

que tenta corrigir os agravos, consertar os danos que tais acontecimentos geraram ao seu

governo e a sua própria imagem/biografia.

Ainda na função semântica de agente, os processos “exagera” e “ignora” (exemplo

101) possibilitam à Veja construir a Rd de Lula como alguém que não se preocupa com a sua

saúde, isto porque, essas ações praticadas pelo participante o levam a uma crise hipertensiva.

Em consequência disso, na mesma proposição-enunciado surge outro papel temático atribuído

ao participante Lula, o de beneficiário. Desse modo, o processo “tem” que expressa a ideia de

resultado revela o prejuízo que as ações de exagerar e ignorar o stress provocaram no

participante, o que possibilita compreender a Rd de Lula como negligente a sua saúde.

Outra proposição-enunciado em que o referente Lula é apresentado por Veja com o

papel temático de beneficiário é a do exemplo 98. Neste exemplo, a revista contextualiza o

governo de Lula como devorado e paralisado pelo escândalo do Mensalão e, que por

consequência disso, “Lula está em uma situação que já lembra a agonia da era Collor”. Com

isso, evidencia-se através do prejuízo causado ao referente, a Rd de alguém que está

paralisado, sem atitude e que corre o risco de impedimento ou impugnação de mandato, dada

o efeito que o referido escândalo causou.

Todos esses papeis temáticos atribuídos ao referente Lula ajudam a reconstruir as Rds

desse objeto de discurso na cadeia referencial presente nos textos do gênero de discurso capa

de revista, especificamente as Rds construídas pela revista Veja. Ressaltamos, porém, que ao

tratarmos de ação ou estado do referente Lula, na condição de sujeito na proposição

enunciada, estamos nos referindo a ações e a estados atribuídos pela revista a esse referente,

haja vista ser Veja o locutor dos dizeres no texto.

Nesse sentido, assim como Veja escolhe categorizações e a elas atribuem papeis

temáticos, no jogo textual a revista também recategoriza esse objeto de discurso dando-lhe

denominações que revelam outras representações de Lula ou corroboram com as Rds já

demarcadas pelo emprego dos categorizadores. Nesse sentido, vejamos as recategorizações

construídas pela revista após a categorização de Lula como referente do dizer.

Quadro 35 – Recategorizações do referente Lula nas capas da revista Veja

Exemplos Enunciados Código

Exemplo 102 Empresários disputam a agenda do petista SUBVe1752

Exemplo 103 A defesa do presidente na televisão não convence e ele perde

a chance de explicar o escândalo

SUBVe1918

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139

Exemplo 104 O presidente comparou o filho empresário ao craque de

futebol. Mas os dons fenomenais de Fábio Luís, o Lulinha, só

apareceram depois que o pai chegou ao Planalto

SUBVe1979

Exemplo 105 A busca de um terceiro mandato pode degenerar na criação

de um presidente vitalício no Brasil?

SUBVe2056

Exemplo 106 Pago por empresas privadas com interesse no governo, o

filme sobre a vida do presidente é um melodrama que depura

a sua biografia, endeusa o político e servirá de propaganda

em 2010

SUBVe2140

Exemplo 107 O Brasil depois de 8 anos de lulismo SUBVe2197 Fonte: Autor.

Todas as recategorizações em destaque podem ser entendidas como “uma atividade de

continuidade de um núcleo referencial” (KOCH, 2009). Sendo assim, todas elas se referem ao

objeto de discurso Lula, referencialmente categorizado nas chamadas principais das capas de

revista. Assim como nas capas da revista Época, as recategorizações do referente Lula

ocorrem nos subtítulos, garantindo a progressão da cadeia referencial no texto e articulando

imagem principal, chamada principal e subtítulos.

Como vemos, a recategorização mais recorrente é a de Lula como “presidente”. Essa

recategorização constrói a imagem de Lula como líder da nação brasileira, ao mesmo tempo

que desdobra essa representação pelos sentidos que o cotexto determina. No exemplo 102,

Lula é o presidente que se defende diante do escândalo do Mensalão, mas que, segundo a

revista, não convence e perde a chance de se explicar.

No exemplo 105, considerando a possibilidade de Lula chegar a um terceiro mandato e

de ele ainda ser presidente em 2026, conforme expressa a chamada principal de Ve2056:

“‘2026, é Lula outra vez...’”; a revista associa o modificador “vitalício” à recategorização de

“presidente”, constante no subtítulo, construindo uma Rd de Lula como um presidente que

poderá ficar a vida toda na presidência, caso ele concorra a um terceiro mandato.

Nos demais casos em que Lula é recategorizado como presidente, podemos observar

duas formações sociodiscursivas distintas: uma que segue a esteira dos exemplos 103 e 105,

isto é, da política e outra que se enquadra no contexto familiar. A primeira está presente no

exemplo 108, na qual Veja, após recategorizar Lula como “presidente” devido o foco ser no

filme que estava sendo produzido sobre a sua vida, substitui o referente por “político”,

construindo, portanto, a Rd de Lula como um político que, na condição de presidente, está se

aproveitando de um filme financiado por empresas privadas para torná-lo um deus e, por

conseguinte, iniciar a campanha para eleição de 2010.

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140

A segunda formação sociodiscursiva se manifesta no exemplo 104, no qual a revista

recategoriza Lula como “presidente”, trazendo à tona o papel de Lula no cenário político

brasileiro para, em seguida, construir uma crítica à comparação que ele fez do seu filho

empresário Fábio Luís (o Lulinha) com o craque de futebol Ronaldo (O fenômeno), dados os

dons fenomenais de ambos. Todavia, a revista ironiza essa comparação ao afirmar que “os

dons fenomenais de Fábio Luís, o Lulinha, só apareceram depois que o pai chegou ao

Planalto”. Disso, podemos depreender que o contexto familiar, principalmente pela posição

política que Lula ocupa, é o que permitiu o aparecimento do filho dele no ramo empresarial.

Além disso, podemos inferir que a revista constrói uma Rd de Lula como beneficiador da

empresa ou de seu filho, mesmo que o benefício seja apenas pela ascensão que a família de

Lula adquiriu após ele ter chegado à presidência.

Ao recategorizar Lula como “petista” (exemplo 102), a revista associa a imagem de

Lula a seu partido, o Partido dos Trabalhadores, construindo a Rd de um candidato que pode

colocar em risco a economia do país. Essa representação é inferida pela ideia de disputa que

os empresários têm travado para ter a atenção de Lula, bem como pela chamada principal de

Ve1752 e pela imagem principal da capa. Vejamos:

Figura 23 – Arranjo verbovisual como construtor da Rd de Lula

Fonte: Revista Veja, edição 1752.

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141

Todos os recursos presentes na figura 23 – imagem, gráfico com a situação de risco

Brasil, a chamada principal e o subtítulo – possibilitam a reconstrução da Rd de Lula como o

candidato que assusta o mercado, construída pela revista Veja. Nesse sentido, a

recategorização do objeto de discurso como “petista” permite a interpretação de que Lula

causa medo tanto ao mercado quanto aos que não compartilham dos seus ideais partidários.

Tais efeitos de sentido são provenientes da multimodalidade presente no gênero de discurso,

pois, acreditamos que não se pode chegar a essas interpretações somente pelo texto verbal.

No exemplo 107, a recategorização utilizada pela revista para se referir a Lula é

formada por meio do sufixo “ismo”. Tendo por denominação o vocábulo “lulismo”, a revista

remete ao período no qual o presidente esteve à frente do governo nacional brasileiro e, com

isso, ela constrói a Rd do tema tratado como uma ideologia, um sistema a ser seguido. Melhor

dizendo, a proposição-enunciado presente na capa de Veja perspectiviza o futuro do Brasil

após a consolidação do trabalho de Lula na presidência.

Diante disso, com base nas referenciações do objeto de discurso Lula, quer pelas

imagens, quer pelas denominações, a revista constrói Rds do tema tratado as articulando sobre

eixos semânticos que o define como homem, pai, candidato, candidato eleito, político,

presidente, líder da nação brasileira, presidente afetado por casos de corrupção, aliado de

governos internacionais, entre outras. Esses eixos ora apresentam Lula numa perspectiva

positiva, ora numa perspectiva negativa, o que reflete os objetivos visados pela revista ao

tomar Lula como referente do discurso textualizado nas capas de revista.

Em complementação às referenciações que constroem Rds de Lula, os processos que

articulam os participantes nas proposições-enunciados do gênero de discurso capa de revista

realizam predicações que possibilitam a continuação de efeitos de sentido sobre os referentes.

Desse modo, tratamos a seguir sobre as predicações e os modificadores destas acerca do

objeto de discurso Lula.

5.4.2 Predicação e seus modificadores

Conforme mencionamos, as predicações realizam a continuação dos dizeres sobre o

objeto de discurso referenciado no texto. Nesse sentido, são os processos, linguisticamente

reconhecidos como verbos, que realizam a função de articular os participantes nas

proposições-enunciados, auxiliando na construção e reconstrução das Rds. Vejamos, portanto,

os processos presentes nos textos das capas da revista Veja.

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142

Quadro 36 – Processos utilizados pela revista Veja para a construção da Rd de Lula

Processos Número de ocorrências Capas

Tem 03 Ve1919; Ve1981; Ve2150.

Sabia 02 Ve1913

Sairá 02 Ve2189

Assusta 01 Ve1752

Disputam 01 Ve1752

Vai ser 01 Ve1760

Retomar 01 Ve1775

Corrigir 01 Ve1775

Colocar 01 Ve1775

Vai 01 Ve1781

Voltou 01 Ve1782

Chamando 01 Ve1782

Começa 01 Ve1784

Sair 01 Ve1847

Cai 01 Ve1847

Tem de carregar 01 Ve1847

Tenta salvar 01 Ve1910

Dizem 01 Ve1913

Foi alertado 01 Ve1914

Devorou 01 Ve1917 Paralisou 01 Ve1917

Está 01 Ve1917 Lembra 01 Ve1917

Convence 01 Ve1918

Perde 01 Ve1918

Explicar 01 Ve1918

Deixa 01 Ve1952

É 01 Ve1952

Tinha 01 Ve1952

Garantir 01 Ve1952

Doeu 01 Ve1955

Dormiu 01 Ve1955

Acordou 01 Ve1955

Tramou 01 Ve1955

Comparou 01 Ve1979

Apareceram 01 Ve1979 Chegou 01 Ve1979

Unir 01 Ve1980

Fazer 01 Ve1980 Funcionar 01 Ve1980

Foi 01 Ve1981

Deixar 01 Ve1981

Pode degenerar 01 Ve2056

Depura 01 Ve2140

Endeusa 01 Ve2140

Servirá 01 Ve2140

Exagera 01 Ve2150

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143

Ignora 01 Ve2150 Ensinam 01 Ve2150

Poderia ser evitada 01 Ve2150 Queria ver terminar 01 Ve2197

Fonte: Autor.

Com base nas proposições-enunciados da revista Veja, identificamos a presença de

cinquenta e cinco processos, sendo que três deles se repetem ao longo do corpus: o tem é

utilizado na formulação de três proposições-enunciados de capas distintas; o sabia ocorre

duas vezes na mesma capa; e o sairá também é usado duas vezes na construção do texto da

mesma capa. Esses dados revelam uma diferença em relação às predicações das proposições

enunciadas por Época, isto porque, nesta revista não ocorre repetição dos processos.

Outra observação que espelha a distinção entre as revistas é o fato de a maioria dos

processos evidenciados em Veja atuarem na relação com outros processos na mesma capa, o

que revela uma maior textualização, ou seja, a presença de sequências textuais mais

desenvolvidas. Disso resultam apenas sete capas com proposições-enunciados produzidas

entorno de apenas um processo, situação que foi mais recorrente em Época, haja vista das

dezoito ocorrências de processos nesta revista, nove delas ocorrem em capas diferentes.

Por outro lado, proporcionalmente, podemos afirmar que ambos os veículos de

informação semanal pouco se utilizam de locuções verbais, uma vez que em Época apenas

quatro processos são constituídos por locução verbal e, em Veja, dos cinquenta e cinco,

apenas sete são locuções verbais. Nesse segmento, vale mencionar também que não foi

constatada a presença elíptica de processos nas capas de Veja, tal qual ocorrido nas

proposições-enunciados de Época. Assim, atribuímos essas semelhanças ao estilo dos textos

das capas de revista: proposições curtas de caráter objetivo e que despertem a atenção do

leitor/alocutário, o que, possivelmente, seria menos viável pela presença de longos textos

escritos.

No que concerne à temporalidade verbal, tanto nas proposições-enunciados de uma

revista como da outra, os processos revelam PdVs que fazem menção a informações do

presente, do passado e do futuro. Vejamos no quadro a seguir a distribuição dos processos de

acordo com o tempo e o modo, observando o número de ocorrências.

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144

Quadro 37 – Conjugação dos processos utilizados pela revista Veja para a construção da Rd de Lula

Tempos e modos dos processos Número de

ocorrências

Processos

Presente do Indicativo 22 Assusta; disputam; vai; começa; cai;

tem; sabia; dizem; está; lembra;

convence; perde; deixa; é; depura;

endeusa; exagera; ignora; ensinam.

Pretérito Perfeito do Indicativo 11 Voltou; devorou; paralisou; doeu;

dormiu; acordou; tramou; comparou;

apareceram; chegou; foi.

Infinitivo 10 Retomar; corrigir; colocar; sair;

explicar; garantir; unir, fazer;

funcionar; deixar.

Presente do Indicativo + Infinitivo 05 Vai ser; tem de carregar; tenta salvar;

pode degenerar; queria ver terminar.

Futuro do Presente do Indicativo 03 Servirá; sairá.

Pretérito Imperfeito do Indicativo 01 Tinha

Pretérito Perfeito do Indicativo +

Particípio Passado

01 Foi alertado

Futuro do Pretérito do Indicativo +

Infinitivo + Particípio Passado

01 Poderia ser evitada

Gerúndio 01 Chamando Fonte: Autor.

Com base no quadro 37, podemos inferir que as revistas semanais de informação

primam por expressar fatos atuais, o que se justifica pela maior ocorrência do tempo verbal

presente do indicativo, que em Veja foi utilizado vinte e duas vezes para a construção das

predicações sobre o referente. Semelhante ao presente do indicativo são as locuções verbais

produzidas no tempo verbal presente do indicativo + infinitivo (cinco ocorrências), isto

porque, com elas a revista busca apresentar ao leitor o que está acontecendo naquele

momento, indicando um inacabamento dos processos que auxiliam na construção das Rds de

Lula, mas que refletem fatos atuais.

Com onze ocorrências, tivemos a presença de predicações no pretérito perfeito do

indicativo. Todavia, se considerarmos a ideia de acontecimentos já concluídos, materializado

por esse tempo verbal, também devemos adicionar a esse entendimento a locução verbal “foi

alertado” (única ocorrência de processo no tempo pretérito perfeito do indicativo + particípio

passado), pois essa forma de marcar a temporalidade do processo permite à revista consolidar

o fato e o apresentar ao leitor como algo ocorrido.

Gramaticalmente, os verbos no infinitivo (dez ocorrências) não expressam tempo e

modo, o que pode ser evidenciado nas palavras de Rocha Lima (2011, p. 168, grifos do autor)

ao afirmar que “O infinitivo é antes um substantivo: como este, pode ser sujeito ou

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145

complemento de um verbo, e, até, vir precedido de artigo”. Isso porque, segundo o autor, a

forma infinitiva do verbo não possui função exclusivamente verbal, sendo, portanto,

considerada como forma nominal (CASTILHO, 2010; ROCHA LIMA, 2011). Todavia,

quando tratamos de predicação, não podemos desconsiderar os processos de caráter infinitivo,

uma vez que eles implicam em ações ou estados atribuídos ao referente, e, que, por

conseguinte, contribui para compreendermos as Rds que são construídas acerca do tema

tratado.

O futuro do presente, como três ocorrências nas proposições-enunciados de Veja,

assim como nas de Época, colocam o referente como escopo da ação e permitem à revista

perspectivizar acontecimentos ou levar o leitor à reflexão sobre o que pode acontecer.

Os demais, com apenas uma ocorrência, situam os processos em três conjugações

distintas. No que concerne ao pretérito imperfeito do indicativo, a revista constrói uma

proposição-enunciado em que o processo não incide em uma conclusão do acontecimento

ocorrido, isto é, não afirma o início ou fim da ação. Já o processo constituído pela

temporalidade futuro do pretérito do indicativo + infinitivo + particípio passado, realiza o

que podemos chamar de perífrase modal, ao informar sobre a atitude do locutor, do

interlocutor ou do tema tratado na proposição enunciado. Com esse processo, a revista indica

ações que iriam acontecer com o referente, mas que não vão mais. Por fim, o gerúndio, bem

como o infinitivo, devido a sua função gramatical de nominalização verbal, é considerado

pelos gramáticos muito mais como um advérbio pela circunstancialidade que ele apresenta,

mas, que, na predicação, de modo geral, o concebemos como um elemento que expressa

continuidade da ação praticada pelo referente.

Nessa perspectiva, entendemos que a conjugação dos processos, numa perspectiva

macro em que se incluam as formas nominais, proporcionam o aferimento de sentidos

necessários à reconstrução das Rds de Lula, situando as ações e estados em seus aspectos de

acabamento ou inacabamento.

Diante desse olhar linguístico-gramatical lançado sobre os processos e suas

conjugações no corpus constituído pelas capas da revista Veja e, comparando-o às descrições

realizadas da análise de Época, algo que difere é o fato de que nem todos os processos se

apresentam na terceira pessoa do singular. Alguns processos como “disputam”, “dizem”,

“apareceram”, entre outros, revelam os PdV de outras fontes acerca do tema tratado, além do

PdV da revista. Assim, essas outras fontes constroem Rds de Lula as vinculando às situações,

às ações e aos estados expressos pelos processos e participantes envolvidos na produção do

texto.

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146

Devido a essas constatações, a seguir, agrupamos as proposições-enunciados em que

as predicações sinalizam um mesmo eixo semântico no que concerne às representações

discursivas construídas pela revista Veja41

.

Ao predicar sobre o objeto de discurso Lula como candidato, candidato eleito, ou

possível candidato, temos as seguintes predicações:

Quadro 38 – Predicações em torno do eixo semântico de candidato

Exemplos Enunciados Código

Exemplo 108 Por que Lula assusta o mercado CPVe1752

Exemplo 109 Empresários disputam a agenda do petista CPVe1752

Exemplo 110 Quem vai ser o anti-Lula? SUBVe1760

Exemplo 111 Seu desafio: retomar o crescimento e corrigir as injustiças

sociais sem colocar em risco as conquistas da era FHC

SUBVe1775

Exemplo 112 Lula vai a Cesar CPVe1781

Exemplo 113 Lula voltou dos EUA chamando Bush de aliado SUBVe1782

Exemplo 114 Os desafios do presidente eleito para unir um país dividido e

fazer o Brasil funcionar

SUBVe1980

Exemplo 115 ... e agora ele tem mais quatro anos para deixar um legado de

grandeza

SUBVe1981

Exemplo 116 A busca do terceiro mandato pode degenerar na criação de

um presidente vitalício no Brasil?

SUBVe2056

Fonte: Autor.

Nos exemplos 108 e 109, pertencentes a mesma capa de revista, as predicações

instauradas por meio dos processos “assusta” e “disputam”, contribuem para a construção da

Rd de Lula como um candidato que amedronta o setor comercial e, que, por esse motivo, os

empresários disputam um espaço de diálogo com o candidato. Não obstante, entendemos que

a ideia de medo inferida pelo uso do verbo “assustar”, relacionado à recategorização do

referente como “petista”, pode estar associada ao fato de Lula ser o candidato que representa

as classes sociais menores sobre a sigla do PT. Dessa forma, a revista constrói de Lula a Rd

de um candidato que pode não ser um bom representante para o setor econômico e que

coloque em risco a classe comerciária e a economia do país.

A locução verbal “vai ser”, no exemplo 110, está associada à Rd do tema trado como o

candidato que será enfrentado. Logo, com a interrogação feita pela revista, podemos

compreender que Lula é o candidato com mais chances de ganhar a eleição e que terá de

esperar pra saber quem será o seu opositor no segundo turno das eleições presidenciais de

2002. Ademais, a relação instaurada pelo modificador no conjunto da proposição-enunciado

41

Devido ao maior numero de processos constantes em Veja, não nos foi possível agrupar os exemplos pelas

características dos processos, isto é, pelos eixos semânticos da ação ou do estado. Desse modo, optamos por

agrupá-los pelo eixo semântico-discursivo que autoriza a produção das proposições-enunciados.

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147

acrescenta a essa representação a ideia de que a revista espera que o adversário de Lula o

vença, sentido materializado pelo prefixo “anti”.

No exemplo 112, por meio do processo “vai”, a revista apresenta Lula como o

candidato eleito que busca estabelecer alianças antes mesmo de iniciar o seu pleito como

presidente. Conforme mencionamos na análise da referenciação, esse sentido se evidencia na

capa Ve1782, posterior a publicação em que aparece o processo “ir” conjugado em terceira

pessoa do singular, referindo-se a Lula. Nesta capa, o subtítulo apresenta o processo “voltou”,

indicando o retorno de Lula após o encontro com o presidente do EUA e, dada a relação direta

do processo voltou com a ação desempenhada por Lula (chamando), a revista constrói dele a

Rd de aliado do governo americano, denotando a forma como será a relação entre os países e

os seus presidentes durante o governo Lula.

Ao representar Lula como o candidato eleito, tanto na eleição de 2002 quanto na de

2006, a revista formula as proposições-enunciados com base em processos no infinitivo,

demonstrando os desafios que o futuro presidente terá a frente do comando da nação

brasileira. Em 111, os processos retomar e corrigir determinam as atitudes que Lula terá de

tomar para gerenciar o país. A isso, acrescenta-se o sentido do processo “colocar”,

acompanhado do modificador “sem”, isto porque, como se pode notar, a revista entende que o

desafio/problema para a realização do governo será resolver as questões relacionadas ao

crescimento e injustiças sociais sem ameaçar as conquistas da era FCH.

No exemplo 114, o desafio colocado por Veja remete ao fato de que o candidato

reeleito terá o desafio de unir o Brasil que ficou divido na votação entre Lula e Alckmin. A

predicação instaurada pelo processo “unir” é apenas uma das conquistas que o presidente terá

de realizar com o início de seu segundo mandato. Nesse sentido, a revista projeta Lula como

alguém que dividiu a população brasileira e que precisa contornar essa situação.

Adicionalmente, a revista ainda constrói de Lula a imagem de alguém que tem muito trabalho

pela frente, o que fica evidente pela presença dos processos “fazer” e “funcionar”, atribuindo

ao referente à ideia de que durante o primeiro mandato de Lula até a sua reeleição o país não

funcionou e, por isso, ele precisa trabalhar para que o funcionamento do Brasil aconteça.

Na mesma linha de raciocínio, o exemplo 115 prospecta ações de Lula em relação ao

seu segundo mandato, isto porque, o processo “tem” imputa ao referente a obrigação de que o

presidente eleito terá de desenvolver um bom trabalho para que ele possa deixar uma herança

às próximas gerações presidenciais que o engradeça no panorama presidencial brasileiro. Essa

obrigação é intensificada pelo advérbio “mais” que modifica a predicação. Desse modo, a

ideia de obrigação revelada pelo processo “tem” é, portanto, complementada pelo infinitivo

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148

“deixar”, funcionando este como o resultado da obrigatoriedade de Lula quanto ao seu

segundo mandato. Em vista disso, Veja representa o objeto de discurso como alguém que

ainda não realizou grandes feitos para adquirir o status de grandeza que se espera de um

presidente.

No último exemplo que constrói representações de Lula no eixo semântico de

candidato, a ideia expressa pelo processo “pode degenerar” (exemplo 116) está atrelada ao

plano de Lula em concorrer a um terceiro mandato, o que, pela interpretação que podemos

fazer do PdV da revista, entendemos ser essa uma atitude que não trará benefício ao Brasil.

Assim, inferimos pela referenciação presente na proposição-enunciado que a volta de Lula ao

cargo de presidência pode instituir um estado de poucas mudanças no cenário presidencial.

Desta maneira, a Rd de Lula como possível candidato ao terceiro mandato é explicitamente

colocada como negativa aos olhos da revista Veja.

Outro conjunto de predicações é realizado pela revista para tratar o objeto de discurso

no eixo semântico de presidente em atuação. Vejamos:

Quadro 39 – Predicações em torno do eixo semântico de presidente

Exemplos Enunciados Código

Exemplo 117 A partir de agora, começa a cobrança SUBVe1784

Exemplo 118 Essa doeu! SUBVe1955

Exemplo 119 Lula dormiu como o “grande guia” da América Latina e

acordou como mais um bobo da corte do venezuelano Hugo

Chávez, que tramou o roubo do patrimônio brasileiro na

Bolívia

SUBVe1955

Exemplo 120 O presidente comparou o filho empresário ao craque de

futebol. Mas os dons fenomenais de Fábio Luís, o Lulinha, só

apareceram depois que o pai chegou ao Planalto

SUBVe1979

Exemplo 121 O primeiro mandato de Lula foi pífio... SUBVe1981

Exemplo 122 Pago por empresas privadas com interesse no governo, o

filme sobre a vida do presidente é um melodrama que depura

a sua biografia, endeusa o político e servirá de propaganda

em 2010

SUBVe2140

Exemplo 123 Ele sairá da presidência, mas a presidência sairá dele? CPVe2189

Exemplo 124 O ano que Lula não queria ver terminar SUBVe2197 Fonte: Autor.

O exemplo 117, que traz o processo “começa”, apresenta Lula como presidente

empossado que, a partir daquele momento, deve honrar com suas promessas, caso contrário,

as cobranças serão feitas. Desse modo, a revista intenciona construir de Lula uma Rd de um

governante que tem obrigações com o país, o que relaciona essa representação àquelas feitas

com relação aos seus desafios como presidente (exemplo111).

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149

Com os processos “doeu” (exemplo 118), “dormiu”, “acordou” e “tramou” (exemplo

119), a revista predica sobre o referente Lula o choque que a atitude do presidente

venezuelano Hugo Chávez teve sobre o presidente brasileiro. Desse modo, a intenção de

expropriação da Petrobras, por parte de Chávez, é evidenciada pelo processo “tramou”, o que

possibilita a reconstrução de uma Rd de Lula como traído, principalmente quando a isso é

acrescido o sentido advindo do predicador “doeu”, posto que a traição foi inesperada e atingiu

em cheio o presidente Lula. Além disso, a transformação gerenciada pelos processos

“dormiu” e “acordou”, permite-nos compreender que a revista constrói de Lula a Rd de um

presidente considerado um grande líder, mas, que da noite para o dia foi enganado por um de

seus vizinhos.

Com o exemplo 120, a revista se utiliza da relação familiar entre pai e filho para

construir a Rd de Lula como agente beneficiador dos negócios da família, devido o seu cargo

público. Tal interpretação é possível pelo uso dos processos “comparou”, “apareceram” e

“chegou”. Segundo a revista, a comparação que Lula faz entre o seu filho, o Lulinha, e o

Ronaldo fenômeno não é assim tão semelhante, pois os dons de Lulinha só tomaram

proporção após Lula se tornar presidente (sentido intrínseco ao processo “chegar”). Nesse

segmento, o processo “apareceram” é colocado na proposição antecedido pelo modificador

“só”, advérbio que exprime o sentido de apenas, somente, unicamente, ou seja, antes da

presidência, o filho de Lula não tinha tantos dons como empresário, diferente do craque de

futebol.

Em 121, a revista Veja avalia o primeiro mandato de Lula, descrevendo-o como pífio,

ou seja, sem muita importância. Essa avaliação é marcada pelo uso do processo “foi”, que em

uma sequência descritiva42

, atribui a Lula a Rd de um presidente que não realizou muitas

conquistas em seu mandato e, por isso não se pode perceber grandes feitos.

No exemplo 122, ao tratar do filme que representa a vida do presidente, a revista se

utiliza do processo “pago” para evidenciar os interesses das empresas privadas na manutenção

do governo Lula, interesse que é ressaltado pelo uso do processo “servirá”, que ao ser

introduzido na proposição-enunciado nos permite compreender o desejo dessas empresas pela

manutenção de Lula e, por conseguinte, do seu partido na presidência. Isso porque, ao

apresentar o filme, a revista faz uso dos processos “é”, “depura” e “endeusa” que descrevem

Lula como puro ao ponto de ser reconhecido como um deus. Desse modo, ao falar do

pagamento dado por empresas privadas, a revista critica a intenção velada por trás da

42

Sequencia prototípica para a análise da Rd, segundo Adam (2011a).

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150

produção cinematográfica de representar a vida do presidente como a vida de um deus.

Portanto, constrói a Rd de Lula como um beneficiário de dinheiro privado para se promover e

se manter com o seu partido no governo, mesmo não podendo ser ele o candidato a concorrer

nas eleições de 2010, haja vista a constituição brasileira não permitir mais de dois mandatos

consecutivos pelo mesmo presidente.

Já com os exemplos 123 e 124, Veja constrói a Rd de Lula como um presidente que

não gostaria de deixar o cargo presidencial. O processo “sairá” (exemplo 123), com duas

ocorrências na mesma proposição-enunciado, funciona como afirmação e indagação ao

público leitor sobre o término do segundo mandato de Lula. Com isso, a revista passa a ideia

de que Lula está terminando o seu mandato, mas não tem a intenção de afastar-se totalmente

da presidência, tecendo considerações sobre o futuro do presidente.

No exemplo 124, com a presença do processo “queria ver terminar”, modificado pelo

advérbio de negação “não”, a revista atribui a Lula o desejo de que o seu mandato não

chegasse ao fim. Nesse contexto, podemos dizer que a revista se utiliza dessas predicações

para tentar expressar o desejo de Lula e o representar como o presidente que não quer deixar o

seu cargo público. Essa interpretação também pode ser verificada pela imagem principal

contida nas duas capas em que os enunciados aparecem. Vejamos:

Figuras 24 e 25 – A contribuição da imagem para a Rd de Lula como presidente que não quer deixar a

presidência

Fonte: Revista Veja, edição 2189. Fonte: Revista Veja, edição 2197.

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151

Conforme podemos notar, a Rd de um presidente que não deseja deixar o seu cargo é

visualmente materializada pela faixa presidencial posta como uma pintura no corpo de lula,

uma tatuagem que não sai (figura 24) e pela imagem de Lula segurando o ponteiro dos

minutos para evitar que o ano termine e, com isso, que o seu mandato chegue ao final (figura

25). Em sendo assim, a revista enfatiza através de imagens a Rd que é construída por meio das

predicações realizadas pelos processos “sairá” e “não queria ver terminar”.

Analisemos, agora, as predicações que constroem Rds de Lula, associando-o a

escândalos de corrupção e, mais especificamente, ao Mensalão – que ficou conhecido como o

maior escândalo de corrupção política no Brasil.

Quadro 40 – Predicações sobre o referente Lula no eixo semântico de escândalos de corrupção

Exemplos Enunciados Código

Exemplo 125 Como vai sair dessa? CPVe1847

Exemplo 126 Com seu governo paralisado, Lula cai nas pesquisas e ainda

tem de carregar o peso morto do ex-homem forte do

Planalto

SUBVe1847

Exemplo 127 Tem conserto? CPVe1910

Exemplo 128 Com a demissão de José Dirceu, Lula tenta salvar o governo

e sua biografia

SUBVe1910

Exemplo 129 Ele sabia? CPVe1913

Exemplo 130 55% dizem que Lula sabia da corrupção SUBVe1913

Exemplo 131 Quando e como Lula foi alertado CPVe1914

Exemplo 132 Sem ação diante do escândalo que devorou seu partido e

paralisou seu governo, Lula está em uma situação que já

lembra a agonia da era Collor

SUBVe1917

Exemplo 133 A defesa do presidente na televisão não convence e ele perde

a chance de explicar o escândalo

SUBVe1918

Exemplo 134 A denúncia do procurador-geral não deixa dúvida: Lula é o

sujeito oculto da “organização criminosa que tinha como

objetivo garantir a continuidade do projeto de poder do PT”

SUBVe1952

Fonte: Autor.

Com os exemplos 125, 126, 127 e 128, pertencentes a duas edições consecutivas da

revista Veja, o veículo de informação questiona sobre o desenvolvimento do governo de Lula

frente à demissão do ex-Ministro-Chefe da Casa Civil, José Dirceu, envolvido em caso de

corrupção. Para tanto, nas duas chamadas principais são formuladas interrogações que

refletem sobre a condição de Lula diante desse acontecimento. Com a pergunta “Como sair

dessa?”, a revista indiretamente atribui ao objeto de discurso Lula uma situação que o

compromete, haja vista José Dirceu fazer parte das escolhas de Lula para a cúpula que o

auxiliaria durante o seu mandato. Por consequência disso, com o processo “vai sair” (exemplo

125), presente no questionamento, a revista põe em cheque a idoneidade de Lula em relação

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152

ao ato corrupto do qual o ex-Ministro-Chefe, bem como indica a dificuldade dele em se livrar

de manchas advindas do escândalo.

Com o sentido de complementariedade à proposição-enunciado da chamada principal

da capa Ve1847, o subtítulo apresenta o resultado que o escândalo gerou na imagem do

presidente. Ao utilizar o processo “cai” (exemplo 126), a revista constrói a Rd de Lula como

prejudicado pela ação corrupta de José Dirceu, mas que, mesmo assim, Lula ainda é obrigado

a levar consigo os danos advindos do envolvimento do seu ex-ministro em corrupção, o que é

materializado pela predicação “tem de carregar”, modificada pelo advérbio “ainda”, no

exemplo 128. Contextualmente, a revista atribuiu ao referente Lula certa parcela de culpa

quanto ao fato textualizado.

Os exemplos analisados a seguir estão situados temporalmente entre os anos de 2005 e

2006, período em que estourou a bomba sobre a compra de votos de parlamentares no

Congresso Nacional do Brasil e que ficou conhecido como Mensalão.

Para análise dos exemplos 127 e 128, vejamos a figura a seguir:

Figura 26 – Contribuição da imagem principal para a Rd de Lula como danificado por fatores externos

Fonte: Revista Veja, edição 1910.

Conforme podemos notar, o processo “tem” que é apresentado na interrogação

(exemplo 127) dialoga diretamente com o processo “tenta salvar” no subtítulo da capa

(exemplo 128). Com essas predicações, a revista demonstra o impacto negativo que o

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153

escândalo do Mensalão, no qual estava envolvido José Dirceu, gerou na presidência de Lula e

até mesmo, sobre a biografia do então presidente, uma vez que Lula está buscando reverter

essa situação e reconstruir seu governo e seu cargo. Adicionalmente, a imagem do presidente

representada como uma estátua cheia de rachaduras sinaliza que a revista vê em Lula as

marcas de desgaste que o escândalo provocou sobre o presidente e seu governo. Por

conseguinte, a revista constrói por meio dessas predicações e da imagem principal a Rd de

Lula como um presidente que mostra o intento de livrar seu governo e sua biografia de danos

externos provocados pelo escândalo do Mensalão.

Através das predicações com os processos “sabia” (exemplos 129 e 130), “dizem”

(exemplo 130) e “foi alertado” (exemplo 131), a revista veja constrói a Rd de Lula como

sabedor do que estava acontecendo. Isto porque, em 129, o predicador “sabia”, que orienta a

pergunta da chamada principal, tem por intenção diagnosticar a participação de Lula no

escândalo e, ao mesmo tempo, fazer com que o leitor reflita sobre essa possível ciência de

Lula quanto ao Mensalão. A resposta obtida e apresentada no subtítulo é predicada pelo

processo “dizem”, com o qual se revela o PdV dos pesquisados e que, por conseguinte, é

autorizado pela revista com a publicação dos dados. Em vista disso, o processo “sabia”,

presente nos dois exemplos, predicam uma verdade que é imputada ao referente e que se

confirma pela chamada principal de Ve1914, pois, ele não só sabia como “foi alertado” em

um dado momento e de certo modo não especificados na capa, mas que são

circunstancialmente sinalizados pelos advérbios “quando” (tempo) e “como” (modo),

respectivamente. Assim, mediante o sentido advindo dessas predicações, entendemos que

Veja constrói de Lula a Rd de conhecedor das atitudes ilícitas praticadas no Mensalão.

No exemplo 132, por intermédio dos processos “devorou” e “paralisou”, a revista

apresenta a situação do partido de Lula e de seu governo devido ao escândalo do Mensalão e,

no segmento da proposição-enunciado, através do processo de estado “está”, a revista

descreve a situação de Lula por meio do predicar “lembra”, comparando a situação do então

presidente à agonia vivenciada por o Collor, que resultou em impeachment. Isto posto,

podemos dizer que a revista constrói uma Rd de Lula como aflito, agoniado e com

possibilidades de impedimento de seu pleito governamental.

Adicionalmente, percebemos que a revista não acredita na inocência de Lula quanto a

seu envolvimento no escândalo, posto que, no exemplo 133, com o uso dos processos

“convence” (modificado pelo advérbio de negação “não”), “perde” e “explicar”, a revista

predica sobre o referente a ideia de que ele não conseguiu utilizar a televisão a seu favor para

elucidar o escândalo, o que, por conseguinte, deixou de convencer os brasileiros, tendo sido,

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portanto, um prejuízo a sua imagem. Nesse segmento, com a predicação instaurada nessa

proposição-enunciado, a revista representa Lula como incapaz de se defender das acusações

feitas a ele sobre o seu envolvimento no escândalo do Mensalão.

Por último, em se tratando ainda das Rds de Lula associadas à corrupção, a revista

Veja se utiliza da voz do procurador-geral para reforçar a Rd de Lula como envolvido no

Mensalão (exemplo 134). Para isso, a revista, com a voz do procurador-geral, faz uso do

processo “deixa”, modificado pelo advérbio de negação “não”, com o propósito de afirmar

sobre a inconteste participação de Lula, mesmo que velada. Dessa forma, através de uma

sequência descritiva, gerenciada pelo processo “é”, Lula é descrito pela revista com sujeito

oculto, ou seja, como um indivíduo que não aparece, mas que pode ser recuperado no

contexto. Essa Rd de Lula é reforçada pelas palavras diretas do procurador que a revista

utiliza entre aspas para não se responsabilizar pelo dizer, mas que, pelo enunciado revela o

compartilhamento do PdV entre ambos. Assim, na voz do procurador, os processos “tinha” e

“garantir” revelam o interesse de Lula (sujeito oculto) e dos demais envolvidos no escândalo

do Mensalão, por ele chamada de “organização criminosa”. O pretenso objetivo, portanto,

seria a manutenção do PT no governo do país, com a consequente reeleição de Lula. Nesse

caso, Veja se ampara na voz do procurador para construir a Rd de Lula como parte de uma

organização criminosa que gerou o evento do Mensalão, mesmo que a sua participação não

tenha sido trazida à tona, nem provas tenham sido apresentadas.

Com relação ao eixo semântico que trata Lula na condição de homem, passível de

acometimentos contra a sua saúde, a revista apresenta a seguinte proposição enunciado:

Exemplo 135

Lula exagera, ignora o stress e tem uma crise de hipertensão que, como ensinam os

médicos, poderia ser evitada (SUBVe2150)

Neste exemplo, a revista faz uso de cinco processos que incidem sobre as ações de

Lula e que o fizeram ter uma crise hipertensiva. Por intermédio da sequência inicial dos

processos na proposição-enunciado (exagera, ignora e tem), a revista constrói a Rd de Lula

como o próprio culpado pela crise. Os demais processos “ensinam” e “poderia ser evitada”

atuam como alerta que o participante não seguiu e que, por isso, gerou o problema. Nesse

sentido, a Rd criada pela revista é de um Lula que não se preocupa com a saúde, devidos aos

excessos cometidos e que repercutem como doença, atingindo não a função de presidente,

mas, sim, ao homem Lula, conforme verificamos na imagem principal da capa Ve2150.

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155

Figura 27 – Contribuição da imagem principal para a Rd de Lula como danificado por fatores externos

Fonte: Revista Veja, edição 2150.

Com base na imagem principal, em que objeto de discurso aparece com uma expressão

abatida e realizando um gesto de quando se tosse, ao levar a mão fechada à boca, a revista

representa o estado de saúde de Lula, o que é endossado pela chamada principal “Sob

pressão”, que remete ao fato de a pressão dele estar alta, condicionando uma crise

hipertensiva. Mas, como afirma Veja, ocasionada pelos exageros e stress vivenciado por Lula.

Como vemos, muitas são as Rds de Lula construídas por meio das predicações

instauradas pelos cinquenta e cinco processos presentes nas capas da revista Veja. Todas elas

atreladas a eixos semânticos que orientam a argumentação da revista para expor seu PdV

sobre o tema tratado, tais como: as representações associadas ao eixo semântico de candidato

são de que Lula assusta o mercado, que tem desafios a vencer, etc.; quando associado ao eixo

semântico de presidente reverberam críticas ao governo; quando associado ao eixo da

corrupção, ora o colocam como afetado pelas ações, ora como conhecedor ou como

participante da corrupção; e, até mesmo ao tratá-lo como homem, a revista culpa Lula por seu

estado de saúde.

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156

5.4.3 Relação

Nos textos das capas da revista Veja, além de relações de contiguidade, ou conexão,

realizadas pelas conjunções coordenativas e subordinativas, identificamos a subcategoria da

analogia que se instaura por comparações e metáforas. Desse modo, o uso da analogia se

apresenta como um diferencial entre os recursos de relação empregados pelas revistas na

produção do gênero de discurso capa de revista. Entretanto, algo que se assemelha entre as

relações presentes nas capas de revista é o fato de a imagem também estabelecer a conexão

entre os exemplares do corpus de Veja, em análise, bem como no corpus analisado de Época.

Para descrevermos e interpretarmos a relação nas capas de Veja, começamos pelos

recursos verbais de contiguidade presente nos textos dessa revista.

Assim como nas capas de Época, apenas quatro conectivos foram identificados, sendo

que um deles apresenta duas funções diferentes de relação nas proposições-enunciados em

que aparecem. Todavia, em comparação ao número total de ocorrências, podemos dizer que

Veja constrói proposições-enunciados mais textualizadas, ou seja, elas são mais desenvolvidas

verbalmente do que as de Época, embora também possam ser consideradas curtas, objetivas e

concisas pelo caráter informativo e diretivo que apresentam. Nesse sentido, vejamos o quadro

com os conectivos utilizados nos textos das capas da revista Veja, sua ocorrência e função

textual-discursiva.

Quadro 41 – Conectivos usados nos textos da revista Veja

Conectivos Número de ocorrências Função textual-discursiva

E 11 Aditivo

Que 04 Integrante

Mas 02 Adversativo

Como 02 Comparativo

Como 01 Conformativo Fonte: Autor.

Como vemos, o conector “e” é o recurso de conexão mais frequente nas capas de Veja.

Vejamos os sentidos e relações que ele estabelece para auxiliar na construção das Rds de

Lula.

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157

Quadro 42 – Conectivos aditivos usados nos textos da revista Veja

Exemplos Enunciados Código

Exemplo 136 Seu desafio: retomar o crescimento e corrigir as injustiças

sociais sem colocar em risco as conquistas da era FHC

SUBVe1775

Exemplo 137 Com seu governo paralisado, Lula cai nas pesquisas e ainda

tem de carregar o peso morto do ex-homem forte do Planalto

SUBVe1847

Exemplo 138 Com a demissão de José Dirceu, Lula tenta salvar o governo

e sua biografia

SUBVe1910

Exemplo 139 Sem ação diante do escândalo que devorou seu partido e

paralisou seu governo, Lula está em uma situação que já

lembra a agonia da era Collor

SUBVe1917

Exemplo 140 A defesa do presidente na televisão não convence e ele perde

a chance de explicar o escândalo

SUBVe1918

Exemplo 141 Lula dormiu como o “grande guia” da América Latina e

acordou como mais um bobo da corte do venezuelano Hugo

Chávez, que tramou o roubo do patrimônio brasileiro na

Bolívia

SUBVe1955

Exemplo 142 Os desafios do presidente eleito para unir um país dividido e

fazer o Brasil funcionar

SUBVe1980

Exemplo 143 ... e agora ele tem mais quatro anos para deixar um legado de

grandeza

SUBVe1981

Exemplo 144 Lula, o mito, a fita e os fatos CPVe2140

Exemplo 145 Pago por empresas privadas com interesse no governo, o

filme sobre a vida do presidente é um melodrama que depura

a sua biografia, endeusa o político e servirá de propaganda

em 2010

SUBVe2140

Exemplo 146 Lula exagera, ignora o stress e tem uma crise de hipertensão

que, como ensinam os médicos, poderia ser evitada

SUBVe2150

Fonte: Autor.

Das onze ocorrências do conector “e” nas capas da revista Veja, apenas uma realiza a

função de conectar constituintes no mesmo sintagma. Isso ocorre no exemplo 144, em que o

recurso linguístico é utilizado pela revista para adicionar a informação “os fatos” na chamada

principal. Com esse uso, Veja intenciona mostrar o seu PdV sobre o filme que contará a

história sobre a vida do presidente Lula. Dessa forma, a adição que o conectivo opera,

possibilita a compreensão de que a revista constrói de Lula a Rd de alguém que pode não ser

retratado fielmente pelo que será apresentado no filme e que tem interesses velados com essa

produção cinematográfica, o que pode ser atestado pelo uso do conectivo “e” no exemplo 145,

em que a revista menciona ser a produção uma estratégia de marketing para a propaganda

política de 2010.

Os demais exemplos operam relacionando as sentenças nas proposições-enunciados,

adicionado informações as sentenças principais e dando continuidade aos textos que se nos

apresentam nos subtítulos das capas da revista. Em 136, por exemplo, a revista utiliza o

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158

conectivo “e” para relacionar ações que deverão ser tomadas por Lula para cumprir com o

desafio que a ele se apresenta devido a sua eleição para presidente do Brasil no ano de 2002, o

que corrobora para a construção de sua Rd como candidato eleito que tem desafios a vencer.

Nesse mesmo sentido temos o exemplo 142, no qual Lula é apresentado como o candidato

reeleito e que tem desafios a vencer, inclusive fazer o país funcionar, posto que a revista

representa o tema tratado como aquele que, em seu primeiro mandato, não fez o Brasil

executar o que poderia sob o seu comando.

Os exemplos 137, 138, 139 e 140 apresentam o conectivo “e” como forma de

adicionar ao referente consequências advindas dos escândalos ocorridos durante o seu

primeiro mandato. Desse modo, a revista não só estabelece uma relação de contiguidade pela

junção que o conectivo realiza, como também, contribui para a construção da Rd de Lula

como alguém que foi afetado direta ou indiretamente pelo escândalo do Mensalão, ficando ele

sujeito até mesmo a ter o seu governo impedido (exemplo 139), uma vez que ele não

convencia de sua inocência (exemplo 140).

No contexto das Rds de Lula como grande líder da nação e palhaço, enganado por

Chávez, a revista faz uso do conector “e” (exemplo 141) para encadear essa oposição de Rds

realizadas pela revista sobre o referente.

No exemplo 143, o uso do conectivo da continuidade ao outro subtítulo presente em

Ve1981 que tem como texto “O primeiro mandato de Lula foi pífio”. Nesse sentido, o “e” em

143, adiciona a informação de que Lula terá mais quatro anos de mandato para tentar realizar

grandes atos, pois, conforme podemos interpretar, a revista constrói de Lula a Rd de um

presidente que não realizou grandes feitos em seu primeiro mandato, o que se evidencia pela

adição gerada pelo conectivo.

Por último, com o conectivo “e”, no exemplo 146, a revista acrescentas as ações de

exagerar e ignorar o resultado sofrido por Lula, gerando, então, a Rd do referente como um

homem que se importa mais com a vida pública do que com a sua saúde.

Diante disso, podemos afirmar que o conectivo “e” expressa sentidos adicionais que

relacionam tanto as partes do texto quanto os enunciados que estão inscritos sob o mesmo

contexto, como por exemplo, os casos em que as Rds são construídas ao considerar a figura

de Lula como envolvido no escândalo do Mensalão ou como por este afetado. Além disso, o

valor semântico do conectivo “e” se presentifica nas proposições-enunciados como forma de

adicionar informação sobre os fatos destacados nas capas de revista, corroborando ao caráter

informativo dos veículos de divulgação semanal (Época e Veja), ora analisados.

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159

Outro conectivo identificado nas capas de Veja foi o integrante “que”. Vejamos os

exemplos em que ele ocorre:

Quadro 43 – Conectivos integrantes usados nos textos da revista Veja

Exemplos Enunciados Código

Exemplo 147 Sem ação diante do escândalo que devorou seu partido e

paralisou seu governo, Lula está em uma situação que já

lembra a agonia da era Collor

SUBVe1781

Exemplo 148 Pago por empresas privadas com interesse no governo, o

filme sobre a vida do presidente é um melodrama que depura

a sua biografia, endeusa o político e servirá de propaganda

em 2010

SUBVe1917

Exemplo 149 Lula exagera, ignora o stress e tem uma crise de hipertensão

que, como ensinam os médicos, poderia ser evitada

SUBVe2140

Fonte: Autor.

A conjunção integrante “que” nos exemplos acima relaciona sentenças que

intercambiam sentidos referentes à sentença principal e auxiliam na reconstrução das Rds de

Lula. No exemplo 147, o referido conectivo ocorre duas vezes, atribuindo ao referente a ideia

de que Lula foi afetado pelos escândalos de corrupção ocorridos durante o seu primeiro

mandato, bem como sugere um possível impeachment do presidente em exercício. Desse

modo, o conectivo revela uma continuidade textual, descrevendo a situação do referente

frente ao contexto por ele enfrentado.

No exemplo 148, a revista ao usar o conectivo integrante desenvolve a ideia de que o

referente é apresentado no filme que trata de sua vida como um homem e político sem

maculas em sua biografia, um deus, asseverando que a produção cinematográfica foi

orquestrada (paga) por empresas privadas que tem o interesse de manter o PT a frente do

governo do Brasil, uma vez que o filme “servirá de propaganda em 2010” – ano de campanha

política para o cargo de presidente, mesmo não podendo Lula ser o candidato que concorrerá

na eleição.

No exemplo 149, o integrante “que” é utilizado pela revista para desenvolver a ideia

de que a crise de hipertensão sofrida por Lula poderia ter sido evitada se ele não tivesse

exagerado e ignorado o stress que a sua função política condiciona.

É válido ressaltar que em outras proposições-enunciados também é percebida a

presença do conectivo integrante que, mas, não as consideramos nessa análise pelo fato de

elas não estarem relacionando sentenças que tratavam do objeto de discurso Lula, mas, sim,

de outros participantes e acontecimentos inerentes aos governos gerenciados por Luiz Inácio

Lula da Silva.

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Quadro 44 – Conectivos adversativos usados nos textos da revista Veja

Exemplos Enunciados Código

Exemplo 150 O presidente comparou o filho empresário ao craque de

futebol. Mas os dons fenomenais de Fábio Luís, o Lulinha, só

apareceram depois que o pai chegou ao Planalto

SUBVe1979

Exemplo 151 Ele sairá da presidência, mas a presidência sairá dele? SUBVe2189 Fonte: Autor.

Com o uso do “mas” a revista estabelece oposição entre as ideias expressas nas

proposições-enunciados, corroborando para a construção da Rds de Lula como favorecedor

dos seus familiares (exemplo 150), ao contrariar a comparação que Lula fez de seu filho ao

craque de futebol Ronaldinho, atribuindo o surgimento dos dons fenomenais de Lulinha como

empresário apenas após Lula (o pai) ter chegado ao Planalto.

No exemplo 151, o conector adversativo contraria a ideia de que Lula sairá da

presidência, o que pode se verificar pelo questionamento orquestrado com o uso “mas”. Nesse

sentido, a revista projeta de Lula a Rd de que ele não deixará a presidência, mesmo que não

seja ele o presidente da próxima gestão.

Outro conectivo que se realiza no plano da conexão entre enunciados é o “como” com

função textual-discursiva de conformativo. Vejamos no exemplo a seguir:

Exemplo 152

Lula exagera, ignora o stress e tem uma crise de hipertensão que, como ensinam os médicos,

poderia ser evitada (SUBVe2150)

Nesse caso, o conectivo relaciona fatos pela ideia de conformidade presente na

proposição-enunciado. Assim sendo, ao utilizar o “como”, a revista traz um fato de

conhecimento geral (o de que a hipertensão pode ser evitada com uma vida mais tranquila e

sem stress) e a ele associa o fato de que os médicos ensinam que o exagero e o stress geram

problemas de saúde. Sendo assim, a revista, pela intercalação da sentença gerenciada pelo

conectivo “como” (“como ensinam os médicos”), constrói a Rd de Lula como displicente com

os seus modos de vida e, por consequência, com a sua saúde.

Já no exemplo a seguir, o uso do “como” estabelece comparações de Lula no que

poderíamos chamar de “momentos de transformação”, evidenciados pela relação dos

processos “dormiu” e “acordou” seguidos, respectivamente, pelo conectivo de comparação.

Nesse caso, além da contiguidade que é inerente aos conectivos, o “como” desempenha na

proposição-enunciado a operação de analogia. Vejamos o exemplo:

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161

Exemplo 153

Lula dormiu como o “grande guia” da América Latina e acordou como mais um bobo da

corte do venezuelano Hugo Chávez, que tramou o roubo do patrimônio brasileiro na Bolívia

(SUBVe1955)

Na proposição-enunciado do exemplo 153 há duas comparações instauradas pelo uso

do conectivo “como”. A primeira comparação é feita de Lula na condição de “grande guia”,

ou seja, por intermédio dessa analogia, a revista Veja constrói a Rd do referente como

pretenso líder da América Latina, mas, ao encadear a sentença principal à sentença secundária

pelo uso do conector aditivo “e”, a segunda comparação é projetada pela revista dando a ideia

de que a pretensão de Lula não se concretizou, ou pior, ao invés disso ele “acordou como mais

um bobo da corte do Venezuelano Hugo Chávez”. Nesse sentido, a segunda comparação feita

pela revista remete a Rd do tema tratado como palhaço, enganado pelo presidente

venezuelano que tramou a expropriação da Petrobras na Bolívia.

Tanto uma comparação quanto à outra atribuem a Lula Rds que o caracterizam em um

panorama de transformação, isto é, da noite para o dia, o presidente do Brasil passa de líder da

América Latina a traído por alguém em que Lula demonstrava confiar.

Além das comparações discutidas, Veja também se utiliza de metáforas para relacionar

informações e, consequentemente, construir Rds de Lula. Em relação à metáfora, apenas dois

exemplos são constituídos com este tipo de analogia nas capas da revista. Vejamos:

Exemplo 154

Lula-de-mel (CPVe1784)

Exemplo 155

Lulla (CPVe1917)

A relação de analogia, conforme Adam (2011a, p. 223), “descreve o todo ou as partes,

colocando-as em relação com outros objetos-indivíduos”. Nesse sentido, os exemplos 154 e

155 relacionam por analogia o referente Lula à ideia de comemoração e ao ex-presidente

Collor, respectivamente. Adicionalmente, podemos dizer que as duas metáforas são

construídas por neologismos em que a letra “l” é acrescentada as palavras Lua e Lula nas

chamadas principais.

A metáfora existente no exemplo 154 é estabelecida pela relação entre “lua de mel” e

a posse de Lula em seu primeiro mandato. O sentido proveniente dessa metáfora faz-se pela

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162

analogia entre o período de celebração privada que sucede ao casamento, por parte de um

casal, com a celebração do casal (presidente e primeira dama) ao tomar posse no 36º mandato

presidencial. Nesse sentido, com a analogia, a revista constrói a Rd de Lula como aquele que

comemora a sua posse, após a sua vitória na eleição de 2002.

Para mais entendimento dessa metáfora, vejamos a capa de Veja em que aparece essa

relação analógica.

Figura 28 – Contribuição visual para a construção da metáfora Lula-de-mel

Fonte: Revista Veja, edição 1784.

Ao observarmos a figura 28, podemos compreender melhor a metáfora estabelecida

pelo composto “Lula-de-mel”. O sentido de comemoração se dá pela imagem do desfile

presidencial que celebra a posse do presidente eleito, significado que é ressaltado pelos papeis

picados que remetem ao arroz jogado nos noivos após a cerimônia de casamento, que no caso

do presidente Lula diz respeito cerimônia de posse. Desse modo, a metáfora concretiza-se

pela comparação que faz da posse de Lula como se ele estivesse, a partir da posse, casado

com o Brasil. Além disso, pelo destaque amarelo da cor da letra “l”, conseguimos arrolar

analogicamente o referente Lula na relação com a ideia de festividade e comemoração da “lua

de mel”.

Desse modo, os sentidos da metáfora se complementam com os sentidos visuais

advindos dos recursos presentes na capa, confirmando a perspectiva multimodal de que os

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163

elementos verbovisuais se completam para veicular os efeitos de sentido pretendidos pelo

locutor, no caso, a revista.

Essa relação multimodal também se presentifica na capa de Veja em que consta o

exemplo 155. Vejamos:

Figura 29 – Verbovisualidade na construção da metáfora de Lula em analogia com ex-presidente Collor

Fonte: Revista Veja, edição 1917.

A relação metafórica que o neologismo evoca entre o referente Lula e o ex-presidente

Fernando Collor é instaurada pela remissão que a chama principal faz ao logotipo utilizado

por Collor em sua campanha presidencial no ano de 1989, conforme podemos verificar na

figura a seguir.

Figura 30 – Logotipo de Collor na campanha a presidente da República em 1989

Fonte: Collor e seu novo colorido. Disponível em: <http://poderonline.ig.com.br/index.php/2010/07/25/collor-

e-seu-novo-collorido/>. Acesso em 18 de junho de 2015.

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164

A metáfora existente no exemplo 155 diz respeito à ideia de impeachment sofrido por

Collor no seu mandato presidencial e que, pela situação de Lula no contexto do escândalo do

Mensalão, coloca o tema tratado (Lula) sobre o mesmo prisma. Desse modo, a relação entre

os presidentes está associada à possibilidade de impedimento da função de presidente, ou seja,

Lula corre o risco de perder o seu lugar na cadeira de presidente da República, assim como

Collor perdeu.

Embora as cores estejam em posições trocadas, a revista se vale dos dois eles nas cores

verde e amarelo para expressar a similitude da condição em que se encontra o presidente Lula

(situação de impeachment que foi vivida por Collor). Além disso, na figura 29, a revista

apresenta uma fotografia de Lula com a expressão de desolamento e de preocupação (agonia),

típica de quem está sendo acometido por um acontecimento ruim.

Nesse sentido, podemos dizer que a relação de analogia presente em Ve1917 é

resultado de um arranjo multimodal que concretiza semelhanças entre períodos vivenciados

por Lula e por Collor, mas, que ainda não teve o mesmo resultado, pois como afirma no

subtítulo: “Lula está em uma situação que já lembra a agonia da era Collor” (SUBVe1917).

Logo, o processo “lembrar” remete apenas ao estado e não ao fato de os dois terem sofrido o

impeachment.

Ainda no que concerne à relação presente nos textos das capas da revista Veja, além da

conexão e analogia, a revista se utiliza da imagem e de elementos fóricos para,

respectivamente, conectar o tema tratado no corpus e retomar o referente no discurso presente

nas capas, o que colabora para a reconstrução das Rds de Lula construídas por Veja. À vista

disso, vejamos alguns exemplos em que a imagem estabelece a relação de conexão nas capas

em análise.

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165

Figuras 31 e 32 – A conexão por meio da imagem nas capas de Veja

Fonte: Revista Veja, edição 1816. Fonte: Revista Veja, edição 1913.

A conexão realizada pela imagem nas capas de Veja funciona relativamente como a

que acontece nas capas de Época, isto porque, de modo geral, todas as capas se conectam pela

presença do objeto de discurso Lula representado visualmente por sua fotografia, por sua

silhueta demarcada na capa e por caricaturas. Desse modo, podemos dizer que a imagem de

Lula é o elo que conecta os textos das capas da revista Veja que compõem o corpus, conforme

vemos com as figuras 31 e 32. Ademais, por vezes, é a partir da imagem principal que ocorre

a ligação referencial do texto, possibilitando a revista retomar o referente por marcas que não

são nominalizações do objeto de discurso, a exemplo dos pronomes “ele”, “seu”, “sua” e

“dele”, que realizam o papel semântico-discursivo de elementos fóricos.

Nesse quadro, passemos à análise dos elementos fóricos como forma de retomada do

referente no texto/discurso.

Quadro 45 – O elemento fórico “ele” nos textos das capas de Veja

Exemplos Enunciados Código

Exemplo 156 Ele sabia? CPVe1913

Exemplo 157 A defesa do presidente na televisão não convence e ele perde

a chance de explicar o escândalo

SUBVe1918

Exemplo 158 ... e agora ele tem mais quatro anos para deixar um legado de

grandeza

SUBVe1981

Exemplo 159 Ele sairá da presidência, mas a presidência sairá dele? CPVe2189 Fonte: Autor.

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166

Em todas as proposições-enunciados em que o “ele” aparece, percebemos uma

retomada do referente Lula, quer seja este dado pela imagem (exemplos 156 e 159), quer seja

ele retomado a partir de uma nominalização explícita no cotexto precedente (exemplos 157 e

158). Desse modo, ao assumir o papel de elemento fórico, o “ele” funciona como uma anáfora

que garante a continuidade do texto.

Importa observar, por exemplo, a força desse elemento se considerarmos a figura 32

em que temos o exemplo 156. Nesse caso, o “ele” presente na chamada principal retoma a

imagem principal que funciona como âncora do dizer, ou seja, o objeto de discurso sobre o

qual a revista irá construir o texto. Além do mais, a revista apresenta uma fotografia do

presidente que condiz com a ideia de incerteza sobre o fato de ele ter conhecimento ou não

sobre os casos de corrupção ocorridos em seu governo, pois a imagem de Lula aparece com

uma expressão de dúvida, reconhecida pelo gesto com a mão que coça o queixo.

Essa mesma relação de retomada do objeto de discurso também pode ser evidenciada

pelo uso dos possessivos “seu”, “sua” e “dele”. Vejamos:

Quadro 46 – Estabelecimento de conexão por elementos fóricos possessivos nas capas de Veja

Exemplos Enunciados Código

Exemplo 160 Seu desafio: retomar o crescimento e corrigir as injustiças

sociais sem colocar em risco as conquistas da era FHC

SUBVe1775

Exemplo 161 Com seu governo paralisado, Lula cai nas pesquisas e ainda

tem de carregar o peso morto do ex-homem forte do Planalto

SUBVe1847

Exemplo 162 Com a demissão de José Dirceu, Lula tenta salvar o governo

e sua biografia

SUBVe1910

Exemplo 163 Sem ação diante do escândalo que devorou seu partido e

paralisou seu governo, Lula está em uma situação que já

lembra a agonia da era Collor

SUBVe1917

Exemplo 164 Pago por empresas privadas com interesse no governo, o

filme sobre a vida do presidente é um melodrama que depura

a sua biografia, endeusa o político e servirá de propaganda

em 2010

SUBVe2140

Exemplo 165 Ele sairá da presidência, mas a presidência sairá dele? CPVe2189 Fonte: Autor.

Os pronomes possesivos auxiliam na construção da coesão referencial pessoal, ou seja,

retomam a pessoa do discurso sobre a qual se diz algo, isto é, o referente. Nesse segmento, o

uso do pronome “seu” nos textos das capas de Veja revela pertencimento, ou seja, o desafio

pertencente a Lula que terá de enfrentar diante da presidência da República (exemplo 160),

um presidente afetado por escândalos de corrupção em que ele é detentor de um governo

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167

gerido pelo seu partido, o PT (exemplos 161, 162 e 163), e dono de uma biografia que é

purificada na dramaturgia cinematográfica (exemplo 164).

Em vista disso, a atribuição e ideia de propriedade gerenciada pelos possessivos nas

capas de Veja refletem o interesse da revista em construir Rds do tema tratado na relação com

seu papel e história diante da presidência da República do Brasil. Para tanto, esses

dispositivos fóricos retomam o referente por uma espécie de metonímia, dando continuidade

ao discurso pela relação de pertencimento de fatos que a ele são inerentes.

No exemplo 165, a contração estabelecida pela preposição de posse (de) mais o

pronome reto (ou seja, de + ele = dele, pronome possessivo) é utilizada pela revista para

indicar que a presidência está em posse de Lula, o que, por conseguinte, contribui para a Rd

que a revista constrói de Lula como um presidente que não tem a intenção de afastar-se

totalmente da presidência. Essa interpretação pode ser evidenciada pela observação da

imagem caricatural de Lula presente na capa de Ve2189, em que aparece tatuada em seu

corpo a faixa de presidente da República do Brasil, dando a ideia de propriedade do título

presidencial, conforme descrevemos e interpretamos ao analisar a figura 24.

Em suma, podemos dizer que, assim como na revista Época, a relação de contiguidade

nos textos das capas da revista Veja é construída pelo uso de conectivos, pelas imagens e

pelos pronomes pessoais e possessivos com função fórica de retomar o objeto de discurso na

cadeia referencial (especialmente os de 3ª pessoa do singular). Por outro lado, a revista Veja

apresenta relações de analogia (comparações e metáforas) que não foram verificadas nas

proposições-enunciados de Época, o que sinaliza a ideia de que diferentemente daquela, esta

preza por enunciados mais diretivos, objetivos e que não demandem do alocutário a ativação

de outros conhecimentos para compreender os efeitos de sentido pretendidos com o texto.

5.4.4 Localização espacial e temporal

Nas capas da revista Veja, os elementos circunstanciais que expressam lugar e tempo

totalizam dezessete ocorrências. Desse total, doze são utilizadas pela revista para situar o

referente no espaço e cinco o situam no tempo. Esse dado demonstra a semelhança entre os

usos feitos pelas duas revistas, haja vista Época também se utilizar mais dos localizadores

espaciais do que dos temporais na composição de suas proposições-enunciados. Assim sendo,

começamos nossa análise pelos fenômenos linguístico-textuais que expressam a noção de

espaço.

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168

Quadro 47 – Localização espacial nas capas de Veja

Exemplos Enunciados Código

Exemplo 166 O encontro de Lula com George Bush em Washington marca

o início de uma longa negociação que vai definir que tipo de

nação o Brasil será

SUBVe1781

Exemplo 167 Lula voltou dos EUA chamando Bush de aliado SUBVe1782

Exemplo 168 Com seu governo paralisado, Lula cai nas pesquisas e ainda

tem de carregar o peso morto do ex-homem forte do Planalto

SUBVe1847

Exemplo 169 A defesa do presidente na televisão não convence e ele perde

a chance de explicar o escândalo

SUBVe1918

Exemplo 170 Lula dormiu como o “grande guia” da América Latina e

acordou como mais um bobo da corte do venezuelano Hugo

Chávez, que tramou o roubo do patrimônio brasileiro na

Bolívia

SUBVe1955

Exemplo 171 O presidente comparou o filho empresário ao craque de

futebol. Mas os dons fenomenais de Fábio Luís, o Lulinha, só

apareceram depois que o pai chegou ao Planalto

SUBVe1979

Exemplo 172 Os desafios do presidente eleito para unir um país dividido e

fazer o Brasil funcionar

SUBVe1980

Exemplo 173 A busca de um terceiro mandato pode degenerar na criação

de um presidente vitalício no Brasil?

SUBVe2056

Exemplo 174 O Brasil depois de 8 anos de lulismo SUBVe2197 Fonte: Autor.

Das doze ocorrências de elementos circunstanciais de lugar, apenas quatro situam o

referente Lula fora do espaço brasileiro, são eles: Washington, EUA, América Latina e

Bolívia. O primeiro, presente no exemplo 166, refere-se ao local onde o presidente eleito se

encontrou com o presidente americano George Bush para dar início às negociações que

definiriam o tipo de nação que seria a brasileira na relação com o governo americano. No

exemplo 167, temos a consequência do encontro dos presidentes que é novamente marcada

com o localizador EUA (Estados Unidos da América), país onde está localizada a cidade de

Washington. Desse modo, em 167, o localizador se apresenta como o lugar de onde Lula

retornou e que, por conseguinte, conseguiu estabelecer alianças com o presidente do EUA,

por isso, chamando-lhe de aliado.

Numa perspectiva contraria, no exemplo 170, podemos evidenciar a localização

espacial de parte do continente americano (América Latina) para o país que nele está situado

(Bolívia). Por meio desses localizadores a revista situa mais um encontro presidencial entre

Lula e Hugo Chávez. Contudo, a revista sinaliza esse encontro como negativo, uma vez que o

presidente boliviano tramou para desapropriar a Petrobras que é um patrimônio brasileiro,

traindo a confiança de Lula.

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169

Quanto ao uso do localizador espacial “televisão”, exemplo 169, a revista apresenta

este como espaço que poderia ter sido usado por Lula para esclarecer as dúvidas dos

brasileiros quanto ao seu envolvimento (ou não) no escândalo Mensalão, mas que não foi

aproveitado pelo presidente.

Nos casos em que os localizadores espaciais remetem ao lugar onde Lula ocupa o

cargo de presidente, a revista utiliza essas marcas para auxiliar na construção das Rds de Lula

como gerenciador de uma nação. O uso de planalto (exemplos 168 e 171) remete ao lugar em

que a função de presidente é exercida. Tanto em um exemplo quanto no outro, a revista se

utiliza do localizador para criticar atitudes de Lula no seu exercício de presidente, uma vez

que, em 168, Lula é acometido pela ação de José Dirceu que era “o ex-homem forte do

Planalto”, isto é, do governo Lula, e para criticar a comparação que Lula faz entre seu filho e

Ronaldinho, posto que, segundo a revista, “os dons fenomenais de Fábio Luís, o Lulinha, só

apareceram depois que o pai chegou ao Planalto”.

Ao utilizar o localizador “país” (exemplo 172), a revista corrobora à construção da Rd

como candidato que dividiu a nação brasileira e, portanto, terá como desafio uni-la. Já com o

uso de “Brasil”, no exemplo 172, percebemos a extensão do desafio que Lula terá de enfrentar

em seu segundo mandato, pois, na proposição-enunciado o termo “Brasil” revela um lugar

que não teve êxito ao ser governado por Lula, ressaltando a Rd do tema tratado como um

presidente sem muitos êxitos em seu primeiro mandato. Nos exemplos 173 e 174, “Brasil” é

utilizado para auxiliar na construção das Rds de Lula como presidente que ocupou a

presidência por “8 anos” (exemplo 174) e que pode vir a ser palco do surgimento de um

presidente vitalício (exemplo 173).

No que concerne ao localizadores temporais, a revista Veja se utiliza de advérbios e de

locuções adverbiais de tempo, bem como de datas para gerar um efeito de acontecimento

situado cronologicamente. Vejamos os exemplos no quadro a seguir.

Quadro 48 – Localização temporal nas capas de Veja

Exemplos Enunciados Código

Exemplo 175 ... e agora ele tem mais quatro anos para deixar um legado

de grandeza

SUBVe1981

Exemplo 176 “2026, é Lula outra vez...!” CPVe2056

Exemplo 177 Pago por empresas privadas com interesse no governo, o

filme sobre a vida do presidente é um melodrama que depura

a sua biografia, endeusa o político e servirá de propaganda

em 2010

SUBVe2140

Exemplo 178 Retrospectiva 2010 CPVe2197

Exemplo 179 O Brasil depois de 8 anos de lulismo SUBVe2197 Fonte: Autor.

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170

No exemplo 175, a revista situa o referente em seu segundo mandato que será de 2006

a 2010. Com isso, a revista contribui para a construção da representação de Lula como

detentor de mais uma chance para realizar feitos que ficarão na história, haja vista ela

considerar o primeiro mandato do presidente como “pífio”, isto é, sem muita importância. No

localizador “mais quatro anos”, pode-se perceber que o advérbio “mais” intensifica a ideia de

“deixar um legado de grandeza” com o decorrer dos quatro anos, uma vez que os quatro anos

antecessores não foram suficientes para tal feito.

No exemplo 176, a referência ao ano de 2026 possibilita a reconstrução da Rd de Lula

como político que tem interesse de voltar à presidência da República, o que se constata pela

sequência da proposição-enunciado “... é Lula outra vez”.

O ano “2010” usado pela revista como localizador temporal em duas proposições-

enunciados sinaliza o término do segundo mandato do presidente Lula, sendo que, no

exemplo 177, essa data aparece como período em que ocorrerá o processo eleitoral para a

nova presidência, para a qual Lula não poderá se candidatar, mas que o filme que conta a sua

história, associado a seus feitos nos dois mandatos presidenciais, pode servir à campanha do

candidato por ele apoiado.

Por fim, os exemplos 178 e 179 estão contidos no mesmo texto da capa Ve2197 e

representam o momento de transição presidencial e a saída de Lula após oito anos de mandato

a frente da presidência da República do Brasil. Vejamos:

Figura 33 – A localização temporal por meio de recursos verbovisuais

Fonte: Revista Veja, edição 2197.

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171

Como é de costume, em sua última edição do ano a revista Veja rememora os

acontecimentos ocorridos, no caso, 2010, que está para se encerrar. Assim, do lado esquerdo

da capa podemos notar a presença da chamada principal “Retrospectiva 2010”, bem como a

imagem de Lula segurando o ponteiro dos minutos de um relógio como se ele não desejasse

que o ano acabasse. Esse entendimento advém do uso do marcador temporal “8 anos”,

presente no exemplo 179, isso porque, com a retrospectiva, a revista pretende mostrar as

realizações de Lula durante o período em que ele ocupou o cargo de presidente – período

denominado pela revista de “lulismo”.

Portanto, o arranjo visual construído por Veja auxilia na construção da Rd de Lula

como o presidente que não deseja ver o ano de 2010 terminar e, juntamente com ele, o seu

mandato presidencial.

Em suma, os localizadores espaciotemporais presentes nas capas de Veja possibilitam

reconstruir o lugares e o tempo que situam o referente no discurso, tal qual os localizadores

espaciais e temporais presentes nas capas da revista Época.

5.5 SÍNTESE DA ANÁLISE DAS RDS DE LULA NAS CAPAS DE REVISTA

Com a realização da análise das Rds de Lula como tema tratado pelas revistas Época

e Veja, através das categorias referenciação, predicação, relação e localização

espaciotemporal, percebemos que as revistas se utilizam do arranjo verbovisual para expressar

seus PdVs sobre o objeto de discurso.

Tanto em uma revista quanto na outra, as referenciações do objeto de discurso se dão

pela imagem principal que ancora os dizeres no texto e por nominalizações que categorizam o

referente no discurso e/ou o recategorizam, dando segmento à cadeia referencial. Além disso,

em alguns casos, os referentes são modificados por adjetivos que auxiliam a construir Rds do

tema como Lula na condição de membro de partido político, candidato, candidato eleito,

presidente, homem, pai, irmão, amigo, etc.

As proposições-enunciados em que essas referenciações se apresentam permitem a

construção de sentenças nominais ou verbais. Nesse sentido, as predicações são constituídas

por processos que a eles se agrupam participantes para compor as proposições-enunciados. Na

revista Época, a ocorrência de processos é bem menor que nas capas da revista Veja, o que

demonstra características diferentes entre as estruturas sequenciais-composicionais das

revistas. Assim sendo, percebemos que é mais recorrente na revista Época a construção de

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172

proposições-enunciados de caráter nominal, enquanto que na revista Veja, por via dos

cinquenta e cinco processos evidenciados, as proposições-enunciados mais frequentes são de

caráter verbal.

Ambas as revistas prospectam o referente Lula em papeis temáticos diferentes, indo

desde agente das ações, alvo/paciente, beneficiário, experienciador, etc. Nesse sentido, as

informações dadas nos enunciados projetam Rds de Lula que são relacionadas às

referenciações e predicações demarcadas pelos processos. Vejamos algumas delas no quadro

a seguir:

Quadro 49 – Representações discursivas de Lula nas capas das revistas

Rds de Lula nas capas da revista Época Rds de Lula nas capas da revista Veja

Candidato; candidato eleito; presidente;

presidente eleito; presidente reeleito;

governante e membro de partido político;

amigo; irmão; primo; sobrinho; parente; entre

outras.

Candidato; candidato eleito; presidente;

presidente eleito; político; petista; aliado de

governos internacionais; envolvido em

escândalo de corrupção; pai; homem; entre

outras. Fonte: Autor.

Ressaltamos, porém, que algumas dessas Rds são textualizadas e desenvolvidas nas

capas de revista e outras são obtidas inferencialmente pela interpretação dos fenômenos de

referenciação e de predicação na relação com os modificadores que os acompanham, como

por exemplo, as Rds de Lula como irmão, primo, sobrinho, parente, amigo, envolvido em

escândalo de corrupção e homem.

Diante desse quadro, podemos afirmar que são as referenciações e as predicações os

elementos mais importantes no ato da (re)construção das representações do objeto de discurso

tematizado pelas revistas, haja vista que, além de serem os elementos principais de

constituição das proposições-enunciados, elas podem ser modificadas, respectivamente, por

adjetivos e locuções adjetivas ou advérbios e locuções adverbiais.

Quanto as categoriais de relação e de localização espacial e temporal, estas são

utilizadas, respectivamente, para estabelecer relações (de conexão e de analogia) no interior

das proposições-enunciados e para situar as ações e estados do referente no tempo e no

espaço, o que geralmente sinaliza acontecimentos recentes à edição da revista que será

publicada na tiragem da semana pelas revistas.

Fato que deve ser ressaltado é que apenas nas capas de Veja foram observadas relações

analógicas (comparações e metáforas). Por outro lado, os conectivos foram utilizados na

construção das proposições-enunciados das duas revistas, mesmo sendo menos utilizado em

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173

Época. Ademais, a conexão nas revistas também se deu pelas imagens principais que ligam o

corpus como um todo e pelo uso de pronomes (pessoais retos e possessivos) com função

fórica que retomam o objeto de discurso, dando continuidade a cadeia referencial ao longo do

texto.

Já no que concerne aos elementos circunstanciais de espaço e de tempo, as duas

revistas recorreram a marcas comuns para situar o referente no espaço (advérbios de lugar

como Brasil e país, por exemplo) e situá-lo no tempo (advérbios de tempo textualizados como

datas e construções que definem momentos ou perspectivizam o dizer sobre o referente).

Em suma, as marcas textuais-discursivas funcionam como pistas para a identificação

dos elementos pertencentes a cada categoria, que, por conseguinte, possibilitam a descrição e

interpretação das Rds de Lula construídas co(n)textualmente pelos recursos verbovisuais que

compõem o gênero de discurso capa de revista, materializando discursivamente os PdVs das

revistas sobre o tema tratado.

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174

CAPÍTULO 6

6 CONCLUSÃO

Na linha dos estudos que consideram o texto na relação com o discurso, devemos estar

atentos aos fenômenos da linguagem que possibilitam a construção de efeitos de sentidos e

que permitem ao leitor compreender as ações de linguagem visadas pelo locutor. Para tanto,

entender o gênero de discurso como o resultado de uma interação social é a base para se poder

reconstruir esses efeitos e, por conseguinte, concretizar a relação texto e discurso.

Nesse sentido, conforme nos propomos com esta tese, analisamos o texto do gênero de

discurso capa de revista, com vistas a descrever e interpretar as Rds que as revistas Época e

Veja constroem do objeto de discurso Lula (figura política que esteve à frente de dois

mandatos consecutivos na presidência da República do Brasil). A descrição e interpretação

dos resultados nos fizeram perceber que, além do material linguisticamente utilizado na

construção do texto desse gênero, a imagem se faz imprescindível para que pudéssemos

compreender as Rds, bem como o propósito dessa ação de linguagem no contexto midiático-

jornalístico.

Segundo afirmamos, a ação de linguagem visada pelo gênero de discurso capa de

revista é de chamar a atenção de leitor e, consequentemente, fazê-lo comprar a revista, pois,

além de veicular informações atuais sobre os acontecimentos do mundo, a capa de revista

funciona como uma espécie de vitrine que é organizada para seduzir o leitor e o levar a

consumir o produto. Desse modo, a articulação verbovisual da capa de revista proporciona

esse encantamento, despertando o interesse em querer saber mais sobre os assuntos que ali são

tratados. Além disso, como toda ação de linguagem expressa em maior ou menor grau o PdV

do locutor (em nossa tese, da revista), podemos compreender por meio desse gênero como as

revistas Época e Veja veem e tratam os temas destacados em suas capas, especificamente, o

tema Lula – foco de nossa investigação.

Após a realização da análise, percebemos que os fenômenos linguísticos utilizados na

produção do texto das capas de revistas revelaram diferentes Rds de Lula. Esses fenômenos,

ao serem interpretados com base em categorias textuais, demonstraram que as revistas fazem

escolhas do repertório linguístico para construir as proposições-enunciados que são expressas

nas chamadas principais e subtítulos. Além disso, a escolha e uso das imagens podem ser

considerados como intencionais pela revista para criar efeitos de sentido que atendam as

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175

finalidades estabelecidas com o propósito interacional do veículo de informação semanal. Em

vista disso, no quadro a seguir, apresentamos os recursos utilizados pelas revistas para

compor o texto e, consequentemente, as Rds do tema tratado.

Quadro 50 – Síntese dos recursos utilizados nas categorias semânticas das Rds de Lula

Categorias

semânticas

Recursos utilizados nas Capas de

Época

Recursos utilizados nas Capas de

Época

Referenciação Verbais – nomes próprios e

substantivos ou expressões

substantivas (sintagmas nominais)

Visuais – imagem principal

(referente)

Verbais – nomes próprios e

substantivos ou expressões

substantivas (sintagmas nominais)

Visuais – imagem principal

(referente)

Modifcadores do

referente

Adjetivos e substantivos com

função de adjetivo

Locuções adjetivas

Prefixo

Adjetivos e numeral com função

adjetiva

Locuções adjetivas

Predicação Processos (de ação e de estado) Processos (de ação e de estado)

Modificadores

das predicações

Advérbios (de quantidade) Advérbios (de concessão, de

intensidade, de negação e de

inclusão)

Relação Conexão – conectivos (conjunções

aditivas, adversativas, integrantes e

finais)

Elementos fóricos – pronome

pessoal reto (ele) e pronome

possessivo (sua)

Conexão – conectivos (conjunções

aditivas, adversativas, integrantes e

conformativas)

Analogia – comparação

(conjunções comparativas) e

metáforas (neologismos)

Elementos fóricos – pronome

pessoal reto (ele) e pronomes

possessivos (seu, sua e dele)

Localização

espacial e

temporal

Espaço – substantivos e advérbios

ou expressões adverbiais de lugar

Tempo – expressões adverbiais de

tempo

Espaço – substantivos

Tempo – datas e expressões

adverbiais de tempo

Fonte: Autor.

Por intermédio desses elementos escolhidos pelas revistas para compor o texto e as

proposições-enunciados presentes nas capas de revista é que pudemos realizar a reconstrução

das Rds de Lula. Todavia, os sentidos evocados por esses recursos só foram possíveis de

serem recuperados pela ativação dos pré-construídos, isto é, dos conhecimentos linguísticos,

enciclopédicos e compartilhados entre a revista e o interpretante.

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Desse modo, devemos ressaltar a importância que o nível do texto tem para a análise

das Rds de Lula, mas, não podemos nos esquecer do nível do discurso, isto porque, por um

lado, no nível textual, as proposições-enunciados que compõem o gênero de discurso capa de

revista são curtas e agem de forma reticular, intercambiando sentidos entre imagem e texto

que contribuem para a interpretação das Rds. Por outro lado, para que os sentidos sejam

validados, devemos recorrer às condições de produção, recepção e circulação do texto para

que as interpretações adquiram consistência e estejam em consonância com a intenção dos

locutores – as revistas. Caso contrário, o empreendimento realizado pela interpretação pode

atribuir sentidos não permitidos pelo texto.

Diante disso, afirmamos que só foi possível a compreensão das Rds de Lula pela

análise textual-discursiva. Posto que, com a descrição e interpretação dos recursos

verbovisuais (imagens, nomes próprios, substantivos, adjetivos, processos, advérbios,

conectivos, metáforas, dentre outros) utilizados pela revista, conseguimos reconstruir

co(n)textualmente os PdVs e descrições acerca do objeto de discurso desenvolvido na cadeia

referencial, chegando as seguintes Rds do tema tratado: Lula como candidato; Lula como

candidato eleito; Lula como presidente; Lula como presidente eleito; Lula como presidente

reeleito; Lula como governante e membro de partido político; Lula como político; Lula como

petista/sigla do PT; Lula como aliado de governos internacionais; Lula como cumplice e

participante em escândalos de corrupção; Lula como amigo, irmão, primo, sobrinho, pai,

parente e homem; entre outras.

Vale ressaltar que essas Rds se desmembram a depender dos interesses das revistas,

uma vez que as referenciações e seus modificadores, as predicações e seus modificadores, a

relação e a localização espaciotemporal adicionam informações no enunciado, ou seja, as Rds

que evidenciamos nessa conclusão funcionam como uma espécie de síntese, incluindo outras

representações que são descritas e interpretadas nos tópicos 5.3 e 5.4 do capítulo 5.

Outro ponto que merece destaque em nossa conclusão é o fato de que a

multimodalidade presente no gênero de discurso capa de revista não pode ser posta como

acessória na reconstrução das Rds, uma vez que, conforme apresentamos em nossa análise, o

jornalismo de revista tem na imagem um forte aliado para alcançar seus objetivos, dentre eles

aguçar a curiosidade e interesse do leitor sobre o assunto que é destacado pela ação de

linguagem promovida pela revista, levando-o a consumir o produto oferecido. Desse modo,

embora Passeggi (2012, p. 232) admita que as representações discursivas “são de natureza

linguística, manifestadas nos/pelos textos”, entendemos que, no estudo de textos complexos,

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as Rds devem ser consideradas como de natureza multimodal, construídas pelo arranjo

verbovisual que compõe o texto.

Em vista disso, a imagem passa de um simples recurso de ilustração a um elemento

fundamental para a reconstrução de sentidos pretendidos pela revista, quer seja ela pela

função de materializar o objeto de discurso que será tematizado no texto, quer seja pela

função de referente do discurso, quer seja pelos efeitos de sentido que ela provoca na

interseção com as proposições-enunciados verbalizadas no texto. Assim, com base na análise

de nosso corpus, além de desempenhar funções textuais, a imagem desempenha funções

discursivas que auxiliam na interpretação das Rds de Lula que foram construídas pelas

revistas Época e Veja em suas capas.

Nesse caso, ratificamos a definição de capa de revista como um gênero de discurso

complexo pela sua composição verbovisual e pela reticularidade que lhe é inerente. Isto posto,

permiti-nos concordar com os pressupostos da multimodalidade discursiva, para a qual todo

texto é multimodal e que os recursos verbovisuais contidos nos gêneros se complementam

para a construção dos efeitos de sentido (KRESS, 2003; KRESS; van LEEUWEN, 2006;

DIONÍSIO, 2011). Também, concordamos com Adam (2011a) ao afirmar que a interpretação

do texto nem sempre se dá de forma linear, demando do interpretante movimento reticulares

entre as informações presentes no texto, a fim de se chegar a reconstrução dos sentidos

pretendidos com a ação de linguagem.

Ressaltamos, porém, que o trabalho de análise de Rds em textos como o do gênero de

discurso capa de revista pode ser considerado mais delicado do que os casos em que os textos

se apresentam de modo linear, em razão de os enunciados serem curtos e não manterem um

tópico discursivo único nos textos. Não obstante, em nossa análise, considerando os quarenta

e um exemplares que compõem o nosso corpus, reunimos os textos com base no tema tratado,

ou seja, o objeto de discurso Lula foi o elemento que estabeleceu a ligação entre as

proposições-enunciados, tornando possível a compreensão das Rds, mesmo que, por vezes, os

textos de cada capa discutissem assuntos distintos.

Diante dessas considerações, entendemos que muito ainda pode ser feito se

considerarmos o gênero de discurso capa de revista como objeto de pesquisa, principalmente

no que se refere aos estudos da ATD, tanto nível semântico do texto quanto nos demais níveis

que dão conta dos fenômenos textuais concretos (nível da enunciação, nível dos atos do

discurso, etc.). Entretanto, com os resultados obtidos com essa pesquisa de doutoramento,

acreditamos ter contribuído para os estudos das Rds, bem como para os postulados teóricos da

ATD pela inclusão de uma perspectiva multimodal de análise de textos concretos.

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Além disso, conforme apontam os estudos realizados sobre as Rds, as contribuições de

uma pesquisa como essa ultrapassam o limite de uma teoria, o que nos faz perceber a

contribuição de nossos achados para outras áreas de estudo do texto, tais como a leitura, a

produção de texto, os gêneros do discurso, entre outras. Além do fato de o nosso estudo estar

situado em contexto no qual o linguístico, o textual e o discursivo se integram para a

produção e compreensão de sentidos veiculados pelos textos concretos que circulam em nossa

sociedade.

Por fim, acreditamos ter cumprido com os nossos objetivos e esperamos que nossa

pesquisa possa servir a todos os que se interessam pela área da Linguística, em especial da

Linguística do Texto e do Discurso, da Multimodalidade Discursiva e dos estudos de textos

midiático-jornalísticos em diferentes perspectivas. Ademais, que possamos estimular a

produção de outros trabalhos acadêmico-científicos, compartilhando em concordância ou

refutação os nossos resultados, pois, somente assim é que se pode fazer uma ciência da

linguagem de qualidade.

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ANEXOS

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188

ANEXO A: CAPAS DA REVISTA ÉPOCA

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189

Época, São Paulo: Globo, n. 205, 22 de abril de 2002.

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190

Época, São Paulo: Globo, n. 229, 07 de outubro de 2002.

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191

Época, São Paulo: Globo, n. 231, 21 de outubro de 2002.

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192

Época, São Paulo: Globo, n. 232, 28 de outubro de 2002.

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193

Época, São Paulo: Globo, n. 233, 04 de novembro de 2002.

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194

Época, São Paulo: Globo, n. 242, 06 de janeiro de 2003.

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195

Época, São Paulo: Globo, n. 284, 27 de outubro de 2003.

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196

Época, São Paulo: Globo, n. 330, 13 de setembro de 2004.

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197

Época, São Paulo: Globo, n. 369, 13 de junho de 2005.

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198

Época, São Paulo: Globo, n. 377, 08 de agosto de 2005.

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199

Época, São Paulo: Globo, n. 404, 13 de fevereiro de 2006.

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200

Época, São Paulo: Globo, n. 412, 10 de abril de 2006.

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201

Época, São Paulo: Globo, n. 433, 04 de setembro de 2006.

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202

Época, São Paulo: Globo, n. 436, 25 de setembro de 2006.

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203

Época, São Paulo: Globo, n. 442, 06 de novembro de 2006.

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204

Época, São Paulo: Globo, n. 500, 17 de dezembro de 2007.

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205

Época, São Paulo: Globo, n. 646, 04 de outubro de 2010.

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ANEXO B: CAPAS DA REVISTA VEJA

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207

Veja. São Paulo: Editora Abril. Ed. 1752, Ano 35, n. 20, 22 de maio de 2002.

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208

Veja. São Paulo: Editora Abril. Ed. 1760, Ano 35, n. 28, 17 de julho de 2002.

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209

Veja. São Paulo: Editora Abril. Ed. 1775, Ano 35, n. 43, 30 de outubro de 2002.

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210

Veja. São Paulo: Editora Abril. Ed. 1781, Ano 35, n. 49, 11 de dezembro de 2002.

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211

Veja. São Paulo: Editora Abril. Ed. 1782, Ano 35, n. 50, 18 de dezembro de 2002.

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212

Veja. São Paulo: Editora Abril. Ed. 1784, Ano 36, n. 1, 08 de janeiro de 2003.

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213

Veja. São Paulo: Editora Abril. Ed. 1816, Ano 36, n. 33, 20 de agosto de 2003.

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214

Veja. São Paulo: Editora Abril. Ed. 1847, Ano 37, n. 13, 31 de março de 2004.

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215

Veja. São Paulo: Editora Abril. Ed. 1847, Ano 37, n. 13, 31 de março de 2004.

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216

Veja. São Paulo: Editora Abril. Ed. 1913, Ano 38, n. 28, 13 de julho de 2005.

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217

Veja. São Paulo: Editora Abril. Ed. 1914, Ano 38, n. 29, 20 de julho de 2005.

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218

Veja. São Paulo: Editora Abril. Ed. 1917, Ano 38, n. 32, 10 de agosto de 2005.

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219

Veja. São Paulo: Editora Abril. Ed. 1918, Ano 38, n. 33, 17 de agosto de 2005.

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220

Veja. São Paulo: Editora Abril. Ed. 1952, Ano 39, n. 15, 19 de abril de 2006.

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221

Veja. São Paulo: Editora Abril. Ed. 1955, Ano 39, n. 18, 10 de maio de 2006.

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222

Veja. São Paulo: Editora Abril. Ed. 1975, Ano 39, n. 38, 27 de setembro de 2006.

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223

Veja. São Paulo: Editora Abril. Ed. 1979, Ano 39, n. 42, 25 de outubro de 2006.

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224

Veja. São Paulo: Editora Abril. Ed. 1980, Ano 39, n. 43, 01 de novembro de 2006.

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225

Veja. São Paulo: Editora Abril. Ed. 1981, Ano 39, n. 44, 08 de novembro de 2006.

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226

Veja. São Paulo: Editora Abril. Ed. 2056, Ano 41, n. 15, 16 de abril de 2008.

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227

Veja. São Paulo: Editora Abril. Ed. 2140, Ano 42, n. 47, 25 de novembro de 2009.

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228

Veja. São Paulo: Editora Abril. Ed. 2150, Ano 43, n. 5, 03 de fevereiro de 2010.

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229

Veja. São Paulo: Editora Abril. Ed. 2189, Ano 43, n. 44, 03 de novembro de 2010.

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230

Veja. São Paulo: Editora Abril. Ed. 2197, Ano 43, n. 52, 29 de dezembro de 2010.

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