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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ SETOR DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES – SCHLA DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS SOCIAIS – DECISO NATALIA PANIS KASEKER PARTICIPAÇÃO POLÍTICA E INTERNET: UMA ANÁLISE DOS COMENTÁRIOS NO PORTAL ESTADÃO.COM NA ELEIÇÃO PARA PRESIDENTE DE 2010. CURITIBA 2012

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ

SETOR DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES – SCHLA

DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS SOCIAIS – DECISO

NATALIA PANIS KASEKER

PARTICIPAÇÃO POLÍTICA E INTERNET: UMA ANÁLISE DOS

COMENTÁRIOS NO PORTAL ESTADÃO.COM NA ELEIÇÃO PARA

PRESIDENTE DE 2010.

CURITIBA

2012

NATALIA PANIS KASEKER

PARTICIPAÇÃO POLÍTICA E INTERNET: UMA ANÁLISE DOS

COMENTÁRIOS NO PORTAL ESTADÃO.COM NA ELEIÇÃO PARA

PRESIDENTE DE 2010.

Trabalho de conclusão de curso

apresentado como requisito parcial à

obtenção de grau de Bacharel em

Ciências Sociais pela Universidade

Federal do Paraná.

Prof° Orientador: Emerson Urizzi Cervi

CURITIBA

2012

TERMO DE APROVAÇÂO

NATALIA PANIS KASSEKER

PARTICIPAÇÃO POLÍTICA E INTERNET: UMA ANÁLISE DOS

COMENTÁRIOS NO PORTAL ESTADÃO.COM NA ELEIÇÃO PARA

PRESIDENTE DE 2010.

Trabalho de conclusão de curso aprovado como requisito parcial para obtenção

do grau de Bacharel no curso de Graduação de Ciências Sociais, Setor de

Ciências Humanas, Letras e Artes da Universidade Federal do Paraná, pela

seguinte banca organizadora:

Orientador: Prof° Dr. Emerson Urizzi Cervi, UFPR

Prof° Dr. Adriano Nervo Codado, UFPR

Prof° Dr. Sérgio Soares Braga, U FPR

Curitiba, 21 de março de 2013

AGRADECIMENTOS

Gostaria de agradecer primeiramente aos meus pais, Sônia e Edson,

pois são eles os principais responsáveis pela minha formação como ser

humano, que antecede a formação intelectual e que foi, sem dúvida, decisiva.

São eles as pessoas que mais confiam em mim, mesmo quando eu mesma

não confio. Serei eternamente grata e nem mesmo assim conseguirei chegar

perto de agradecer toda dedicação deles em relação a mim e ao meu irmão,

garantindo condições essenciais para que permanecêssemos na Universidade.

Sou grata ao meu irmão Francisco pela companhia e principalmente a

ajuda nos momentos difíceis e a todos meus familiares que estiveram torcendo

pela minha formação, meus avós, tios, tias, primos e primas.

Em relação aos velhos e novos amigos agradeço a paciência pela minha

ausência e as palavras de incentivo e apoio. Agradeço principalmente ao

Osíris, por atender as chamadas angustiadas e estar sempre disponível, seja

para tomar um café, ver um filme, ou revisar a monografia.

De maneira geral, agradeço também aos professores que fizeram parte

da minha trajetória dentro da Universidade, em especial ao Professor Dimas

Floriani por abrir os meus olhos às coisas verdadeiramente importantes. Aos

professores Renato Perissinotto, Adriano Codato e Luciana Veiga, por serem o

tipo ideal de profissional: competentes e assertivos. Também aos professores

Emerson Cervi e Sérgio Braga, por se manterem acessíveis e dispostos a

ajudar.

RESUMO

O TCC aborda o tema comunicação e eleições na era das novas mídias.

O objetivo do trabalho é analisar os comentários no portal estadão.com durante

a eleição para presidente de 2010, os comentários são, portanto, o objeto.

Entendemos que ao comentar as notícias postadas os internautas estão

formulando e expressando suas opiniões, o que significa, de acordo com Dahl

(1997), uma forma de participação política. Uma forma de participação que

acontece em um espaço específico, que é a internet, levando a análise dos

dados a um contexto da relação entre participação e os novos meios de

comunicação. Diante desta relação entendemos que a internet oferece novas

vias de participação e interação entre os usuários, o que facilitaria, portanto,

uma mobilização de internautas para gerar debates em torno das questões

eleitorais daquele período, para verificar isso procuramos responder a seguinte

questão: como se dá a participação dos eleitores do Estadão no debate a partir

da cobertura dos candidatos à presidência? A hipótese é a de que os usuários,

através dos comentários, exploram pouco as possibilidades de participação. As

principais conclusões apontam que há um padrão de participação político

restrito na medida em que os usuários apresentam um comportamento mais

discursivo do que de debate.

Palavras-chave: Participação política, comunicação, comentários, internet.

LISTA DE TABELAS

Tabela 1 – Média de comentários por tema......................................................42

Tabela 2 – Frequência simples de valência (Dilma)..........................................46

Tabela 3 - Frequência simples de valência (Serra)...........................................47

Tabela 4 - Frequência simples de valência (Marina).........................................48

Tabela 5 – Frequência simples de postagem....................................................49

Tabela 6 – Cruzamento: tipo de post x valência (Dilma)...................................51

Tabela 7 – Cruzamento: tipo de post x valência (Serra)...................................52

Tabela 8 – Cruzamento: tipo de post x valência (Marina).................................53

Tabela 9 – Frequência simples de formato........................................................54

Tabela 10 – Frequência simples de reflexividade..............................................56

Tabela 11 – Frequência simples de relação......................................................58

Tabela 12 – Relacionado aos demais comentários x reflexividade...................59

Tabela 13 – Cruzamento: Reflexividade x tempo..............................................60

LISTA DE GRÁFICOS

Gráfico 1 – Percentual de comentários por mês................................................40

Gráfico 2 – Porcentagem de comentários por nível de participação.................43

Gráfico 3 – Média de comentários por formato..................................................44

Gráfico 4 – Média de comentários por link........................................................45

SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO.................................................................................................9

2. CAPÍTULO 1: O Conceito de Participação Política ...................................13

2.1 PARTICIPAÇÃO POLÍTICA E COMUNICAÇÃO POLÍTICA.............17

3. CAPÍTULO 2: Participação Política e Internet...............................................21

3.1. PARTICIPAÇÃO POLÍTICA DIRETA...............................................28

4. CAPÍTULO 3: Metodologia e Análise de dados.............................................36

4.1. OBJETO EMPÍRICO........................................................................36

4.2. METODOLOGIA...............................................................................36

4.3 ANÁLISE...........................................................................................39

4.3 I Análise do comentários em relação ao portal.................................39

4.3 II Análise dos comentários em relação aos candidatos....................46

4.3 III Análise dos comentários em relação aos internautas...................55

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS...........................................................................62

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS..................................................................64

ANEXOS............................................................................................................67

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1. INTRODUÇÃO

Este trabalho está situado nas áreas de Comunicação Eleitoral, que

compreende um debate entre mídias e eventos políticos, principalmente as eleições

(Panke, 2011); Participação política, que se constitui no direito garantido aos

cidadãos de formular e expressar opiniões (Dahl, 1997); e Internet, a rede de

computadores interligados em todo o mundo. Neste sentido, o trabalho articula-se

entre estas áreas na medida em que, inserido sob o contexto das eleições

presidências de 2010, propõe-se uma análise acerca da participação política, a qual

está inserida em um plano específico, que é a internet, ou seja, o jornal estadão

online.

Este trabalho procurou entre os jornais de maior circulação nacional, um

portal que fosse mais “democrático”. Democrático no sentido de permitir o acesso e

interação sem quaisquer requisitos, e dentre eles elegemos “O Estado de São

Paulo”, estadão.com.br, já que era o único portal nas eleições de 2010, que permitia

aos leitores comentar suas postagens e que qualquer um pudesse consultar tanto o

conteúdo do jornal quanto os demais comentários. Nos outros não existia

essa possibilidade, ou era restrita a assinantes. Sendo assim o “Estadão” será

nosso objeto empírico de análise. Encontrar um jornal que possibilite aos usuários a

comentar as notícias postadas foi essencial para a construção deste trabalho, pois

partimos do pressuposto de que participação política é importante e que a

internet apresenta novas possibilidades de integração capaz de criar espaços

onde cidadãos possam, além de informar-se, discutir e expressar preferências.

Diante disso, nosso objeto é: a análise dos comentários feitos por internautas

no portal estadão.com durante o período eleitoral de 2010, ou seja, todos os

comentários submetidos entre 5 de julho a 31 de outubro de 2010 em todas as

notícias em que se citava ao menos um dos três principais candidatos à presidência:

Dilma Rouseff (PT), José Serra (PSDB) e Marina Silva (PV). Foram contabilizados,

no total, 17091 comentários em 2184 notícias, o que dá uma média de

aproximadamente 7 comentários em cada notícia.

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Partimos do pressuposto de que a participação política é uma característica

importante para o bom desempenho da democracia, e que desta forma, deve ser

garantido ao cidadão formas de participação, e que, nosso objeto, os comentários,

se constitui como tal. Para legitimar esta afirmação, percorremos diversos teóricos

que formularam conceitos de democracia e de participação política, a fim de explicar

o que é o conceito de participação para cada autor e verificar se sua formulação

cabe ou não ao caso do presente estudo. Entretanto, trabalhamos com a hipótese

de que os usuários, através dos comentários, não manifestam uma participação

política abrangente.

Os teóricos revistados foram respectivamente: Rousseau (1992), Benjamim

Barber (1992), Sartori (1994), Berelson (1992), Schumpeter (1975), Downs (1999),

Manin (1997) e Dahl (1997). Ao longo do trabalho percebemos que os principais

problemas que distanciaram alguns autores do trabalho foram dois. O primeiro

problema seria em relação ao arranjo democrático, pois, autores como Rousseau

(1992) e Barber (1992) ao defenderem uma forma de participação política plena,

sugeria que os cidadãos participassem ativamente desde a elaboração e a execução

de leis, porém, este formato, no entanto, é impensável dentro do contexto deste

trabalho, pois vivemos em um modelo de democracia de representação, ou seja,

pela inviabilidade de que toda a massa componha os processos legislativos e

executivos construímos um sistema o qual elege representantes para que eles, em

ultima instância, ocupem estes arranjos onde são pensadas e executadas as leis. Se

esse modelo é de fato o melhor, não sabemos, mas como um dado, o modelo de

participação dos autores não cabe, por isso precisamos encontrar entre os teóricos

aqueles que estejam formulando a noção de participação em arranjos democráticos

compatíveis ao nosso.

O segundo problema foi que, entre os autores Berelson (1992), Sartori (1994)

e Schumpeter (1975), a participação política não é importante, ela é, inclusive, uma

ameaça ao modelo democrático, portanto, apesar dos autores estarem sob o mesmo

contexto de democracias representativas eles afirmam, cada um a sua maneira, que

o voto é a única via de participação, e o que quer que esteja, além disso, trará

problemas para o arranjo político.

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Entre autores que superestimam a participação e outros que se opõem,

encontramos uma alternativa em Dahl. De acordo com Dahl (1997), a participação é

proporcional ao sucesso da governabilidade democrática, ou seja, quanto mais

subsídios tem a população para participar, maior as chances da eficácia da

democracia. Sendo assim, Dahl aponta três formas de garantir aos cidadãos seu

lugar como participante do jogo político: “1) A garantia de que todo indivíduo possa

formular suas preferências; 2) Expressar suas preferências a seus concidadãos e ao

governo através da ação individual e da coletiva e 3) De ter suas preferências

igualmente consideradas na conduta do governo, ou seja, consideradas sem

discriminação decorrente do conteúdo ou da fonte da preferência” (Dahl, 1997, p

26). Com isso, entendemos que nosso objeto compreende a primeira e a segunda

garantia elencada por Dahl, pois os comentários representam a formulação e

expressão de posicionamentos dos cidadãos frente ao contexto eleitoral.

Encontramos também entre os autores Downs (1999) e Manin (1997) mais

contribuições para o trabalho. Estes, embora não falem da participação política de

forma muito ampla, resumindo-se ao voto, levantam uma questão importante. A

disponibilidade das informações aos cidadãos é uma realidade que antecede a

participação através do voto, logo, as informações dispostas aos eleitores também

são importantes para a eficácia da democracia, e que devem ser levadas a análise.

Essa percepção direciona o trabalho a pensar as relações da participação política

com a informação. Deste modo, ao rever nosso objeto, comentários, identificamos

que o contexto em que estão inseridos, uma vez que são elaborados diante do

jornal, com as informações que estão dispostas naquele momento, e ainda por cima

online, o que remete ao debate da relação da participação política com os meios de

comunicação, principalmente os chamados novos meios, que é a internet.

Dado o debate na literatura e a partir do objeto empírico de análise,

procuramos responder a seguinte pergunta: como se dá a participação dos

eleitores/web eleitores do estadão no debate a partir da cobertura dos candidatos à

presidência em 2010?

Para tentar responder a esta questão a monografia está dividida em três

capítulos. O primeiro é responsável por fazer uma contextualização entre os

principais conceitos de participação e na relação que ela mantém com os meios de

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comunicação e em especial, as novas mídias, a internet. Estabelecida esta relação o

segundo capítulo se encarrega de mapear as especulações e verificações de como

a internet vem ocupando espaço sob o contexto da participação e de que forma ela

vem gerindo esta relação, as principais constatações do segundo capítulo foram a

de que, em termos práticos, a internet tem capacidades substancias para contribuir

muito para que haja mais participação, tanto de cidadãos, quanto de candidatos e de

arranjos institucionais (Gomes 2009), porém, o principal sujeito que trará bons

resultados dessas possibilidades de participar, são os usuários, e não o meio

(MAIA,2011).

Com isso, os dois primeiros capítulos existem para situar nosso objeto como

uma forma de participação política e como uma relação a ser verificada, entendida a

importância da relação entre os novos meios, para entender como, no caso

específico dos comentários no portal, os usuários tem se colocado, que será o

objetivo do terceiro capítulo.

Diante do embate das novas possibilidades e dos problemas que a internet

acabou gerando, é necessário desenvolver, neste momento, um trabalho empírico,

que compreende a análise de dados. A análise de conteúdo dos comentários,

portanto, será o assunto tratado no terceiro capítulo, de que forma ela se distribuiu,

qual seu posicionamento diante dos candidatos, e como a participação se articulou

entre os internautas.

13

2. O Conceito de Participação Política

Participação política é uma expressão que pode designar diferentes

comportamentos. Segundo definição de Bobbio (1998) presente no dicionário de

ciência política, estes comportamentos podem ser:

“o ato do voto, a militância num partido político, a participação em manifestações, à contribuição para certa agremiação política, a discussão de acontecimentos políticos, a participação num comício ou uma reunião de seção, o apoio a um determinado candidato no decorrer da campanha eleitoral, a pressão exercida sobre um dirigente político, a difusão de informações política e por ai além.” (BOBBIO, N; 1998. Pag 888)

Este primeiro capítulo pretende apresentar as principais teorias formuladas

acerca de participação política. Partimos do pressuposto de que nosso objeto de

análise, os comentários no portal do Estadão, compreende uma forma de

participação política, no entanto, esse pressuposto deve basear-se em categorias já

constituídas teoricamente. Além da busca por legitimar o objeto de estudo, este

capítulo também pretende mostrar porque a participação política deve ser estudada

tanto sob o contexto das democracias quanto dos meios de comunicação, pois,

como veremos, estes dois contextos atuam simultaneamente.

Rousseau pode ser considerado o teórico por excelência da participação

(Pateman, 1992, p. 35). Sua ideia de sociedade democrática, no entanto, é bastante

diferente da realidade a qual contemplamos, já que fala, segundo Pateman (1992),

em uma sociedade de pequenos proprietários, camponeses, que viviam em

igualdade e independência, onde os valores e princípios deveriam ser geridos pela

sociedade através da participação direta. A igualdade garantiria que nenhum

indivíduo tivesse uma importância maior em relação ao outro, tornando assim a

participação política uma prática através da qual as deliberações eram tomadas em

acordo comum, num tipo de participação na qual o povo age diretamente na

elaboração de leis e intervém ativamente nos processos políticos. Através dessa

prática os indivíduos tornar-se-iam cada vez mais aptos e consequentemente

acabariam gerindo suas atividades políticas com mais eficácia e consciência.

Para este trabalho, essa concepção está longe de ser viável. Vivemos em

uma democracia representativa de massa, isto é, um sistema político onde toda

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população maior de 18 anos deve eleger seus representantes através de eleições,

delegando a eles o papel de elaborar e exercer leis. As eleições se justificam na

inviabilidade de que toda a população pudesse constituir os processos decisórios,

como deveria ser sob a ótica de Rousseau (Schumpeter, 1961) como também pela

opção pela democracia representativa, independente de ser de massa ou não. De

qualquer maneira, independentemente de utilizar-se das teorias de Rousseau,

vemos como o debate de participação política é antigo.

Assim como Rousseau, Benjamin Barber (1984; apud Pateman; 1992) propõe

que a participação política deveria se constituir através da participação popular,

cabendo ao povo organizar-se autonomamente, independente do Estado. Ao

organizar-se, a sociedade estabeleceria laços, vínculos, que seriam a principal

garantia da eficácia da participação, fazendo com que ela persista. Esta teoria da

participação popular remete ao mesmo problema que o apontado acima. Nas

democracias de massa, as relações são mais heterogêneas e complexas, os

indivíduos podem integrar vários grupos sociais, e assim, a participação popular

através da organização e da criação de vínculos torna-se cada vez mais difícil

(Wirth, 1987).

Sartori (1994) é um dos autores que se debruçam sobre o tema da

participação política em sociedades representativas de massa. Expoente da teoria

das elites, que acredita que quem governa as instituições é uma minoria, uma

minoria pertencente às elites. Sua percepção, contudo, é bastante pessimista.

Sartori demonstra-se cético quanto à influência que a participação política popular

possa causar nos processos decisórios. Ele reconheceu nos indivíduos a apatia, a

inatividade dos cidadãos, que para ele se dá pelo fato de que as pessoas agem em

relação a assuntos que lhes interessam, e a política seria um tema que não

compreende a zona de interesse. Para Sartori, essa falta de interesse pela política é

um fato que devemos aceitar, pois essa condição de apatia garante a estabilidade

da democracia (1994). Entretanto, uma vez que centenas de usuários se dedicaram

a postar suas opiniões, discutindo seus principais posicionamentos, entendemos os

comentários, a partir do conteúdo do portal estadão.com, como uma forma de

participação política. Embora não tenhamos dados suficientes para inferir o impacto

dessa participação nos processos decisórios, que é a principal preocupação de

15

Sartori, verificamos que seu argumento de que a política não está entre assuntos da

zona de interesse das pessoas não é regra.

Outros autores seguem essa mesma linha pessimista acerca da participação.

Berelson, por exemplo, é um autor que concorda com Sartori na medida em que

também acredita que a participação em larga escala não é eficaz para o bom

funcionamento da democracia, segundo Pateman (1992). É necessário que haja

apatia e desinteresse da maior parte dos cidadãos para garantir sua estabilidade.

Assim, há necessidade de participação sim, mas desde que seja de uma minoria.

Schumpeter (1975) formulou uma concepção que se tornou a base da teoria liberal

da democracia. Para ele, democracia é um conjunto de procedimentos institucionais

que geram mecanismos que asseguram a vontade geral (vontade geral sendo o

resultado do sistema político, e não a causa). Essa definição é bastante realista e

pragmática, pois vê a democracia como um arranjo institucional. A participação

política em sua teoria não ocupa um lugar muito abrangente, uma vez que sua única

expressão realmente eficaz seria através do voto, pois ele acredita que, quando

exercida de outra forma, ela não favoreceria o bom funcionamento da democracia,

pelo contrário.

Não é essa visão pessimista, no entanto, que adotamos neste trabalho.

Entendemos os comentários dos eleitores durante a campanha política presidencial

de 2010 como uma expressão de participação política que contribui para o processo

democrático.

A teoria da escolha racional compartilha do pressuposto Schumpeteriano de

definição da democracia, como um arranjo institucional baseado na relação de

representação, que se estabelece por intermédio do voto. Anthony Downs(1999),

estudioso desta perspectiva, procura desenvolver a questão do voto, que para

Schumpeter é o máximo da expressão política do eleitorado, como uma relação

econômica. Nesta relação o eleitor vai buscar sempre a tomada de decisão que mais

o beneficie, ou seja, a decisão do voto corresponde a uma equação de valores, onde

o resultado buscado é sempre a maximização de benefícios. A partir disso, Downs

(1999) levanta uma preocupação com as informações que são dispostas aos

cidadãos. Mais importante do que a participação política através do voto, para ele, é

verificar quais informações estão disponíveis nos momentos que antecedem a

16

eleição, pois há uma demanda por elas para a tomada de decisão, logo, a qualidade

das informações é indispensável.

Seguindo outra linha, Bernad Manin (1997) desenvolve seu pensamento

lamentando que as democracias modernas tivessem se configurado de tal maneira

que deixaram de lado em sua formação o estabelecimento de uma relação entre a

sociedade e a política. Para ele, a participação política popular não precisaria ter

toda a autonomia sobre os processos decisórios, mas as instituições democráticas

deveriam oferecer mecanismos de interação entre elas e a sociedade, para que haja

o mínimo de influência mútua.

Essas duas perspectivas apresentadas: a importância das informações

(Downs, 1999) e a da existência de arranjos que coloquem os cidadãos em

interação entre si, e entre as instituições (Mainin, 1997) dão corpo ao objeto de

análise do trabalho. Os comentários de eleitores no portal estadão.com, durante o

período das eleições, também se constituem como um espaço de busca de

informação e de debate, para que eleitores possam formalizar suas preferências

para então votar; uma via de interação entre uma instituição democrática – ainda

que não uma instituição estatal, mas de comunicação - e os cidadãos, como também

de interação destes entre si; além disso, pode ser entendido como uma forma de

participação política, seguindo a perspectiva de Robert Dahl (1997), uma vez que os

comentários equivalem à expressão de opinião.

De acordo com Dahl (1997), em uma democracia todo cidadão deve ter

liberdade para: 1) Formular suas preferências; 2) Expressar suas preferências a

seus concidadãos e ao governo através da ação individual e da coletiva e 3) De ter

suas preferências igualmente consideradas na conduta do governo, ou seja,

consideradas sem discriminação decorrente do conteúdo ou da fonte da preferência

(Dahl, 1997, p 26). Estes critérios nos indicam que Dahl confere importância central

à participação para sua definição de democracia. Quando ele postula que os

cidadãos devem ter liberdade de expressar suas preferências, significa que isso

pode se dar através do voto, mas também por outros meios.

O conceito de democracia de Dahl (1997) refere-se à existência de condições

que garantam aos cidadãos a capacidade de integrar espaços de decisões políticas.

Trata-se de oferecer igualitariamente as oportunidades de expressão da opinião

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pública, bem como garantir o sufrágio universal, o acesso a informações políticas, o

planejamento participativo e a integração de todos como cidadãos de direitos. Para

que assim seja, as instituições devem se preocupar em garantir o exercício dessas

condições por meio de eleições diretas, justas e periódicas para a escolha de

funcionários eleitos pelos cidadãos; em garantir a liberdade de expressão livre de

quaisquer punições e da livre associação entre os cidadãos, bem como o exercício

pleno da cidadania com a garantia dos direitos disponíveis aos indivíduos, direito de

votar, de se candidatar, por exemplo; e por último, mas não menos importante,

fornecer aos cidadãos fontes de informação diversificadas. Estes critérios, uma vez

garantidos, constituirão não só um governo mais democrático como também

promoverá a participação efetiva dos indivíduos.

A preocupação com a diversificação das fontes de informação, também

presente em Downs, nos abre caminho para pensar a participação política junto aos

meios de comunicação, os principais provedores de informação. Se entendermos os

meios de comunicação como uma instituição, não de Estado, mas de informação,

uma vez havendo relação entre os provenientes de informação com a prática

política, há, de acordo com o entendimento de Manin, uma via de interação que

contribui para a eficácia da democracia. Percebemos, com isso, que a participação

política está diretamente relacionada com o acesso a informações. Por isso, é

necessário fazer um breve percurso pelo qual passou o processo de produção de

informação para entendermos melhor sua relação com a participação política.

2.1. Participação Política e Comunicação Política

A relação entre os meios de comunicação e a participação política é onde se

estabelece o intercâmbio entre a informação e os indivíduos, formulam suas

preferências e opiniões para, por conseguinte, integrar espaços de militância, de

debate ou mesmo o de uma conversa informal entre amigos. Este intercâmbio

começou há muito tempo, quando alguns cidadãos reuniam-se em espaços

públicos, para discutir artigos de jornal, ou participando dos jornais enviando cartas

que eram posteriormente publicadas. Assim criou-se uma cultura de comunicação

dialógica, denominada de “face a face” por Habermas (2003). Nessa fase de

comunicação interpessoal, o homem era o único responsável por mediar a

comunicação. Esse exercício de discursividade fora considerado uma característica

18

da vida burguesa, pois os burgueses constituíam que integrava esses espaços de

discussão. Habermas (2003) acredita que isso se originou da tradição da família

conjugal patriarcal burguesa, onde o pai, o mais velho, ensina aos mais novos; logo,

nem a nobreza, nem as classes populares integravam estes espaços, tão pouco

participavam das discussões.

Entre a passagem do século XIX para o XX, a comunicação política teve uma

ampla produção de informação impressa através de jornais, livros, revistas e

panfletos, exigindo do público um exercício cognitivo maior para que apreendesse o

sentido de suas palavras e suas mensagens. Mais tarde, no início do século XX, o

rádio também viria a dividir a atenção das pessoas, trazendo a oralidade para as

palavras impressas dos jornais. Entretanto, foi a chegada da televisão que mais

causou impacto quanto ao nível de difusão de informações. Com a ampliação do

voto, com o sufrágio universal, o número de pessoas que precisavam informar-se

para a tomada de decisão aumentou, surgindo, assim, a necessidade de alguém

tornar-se responsável por mediar as discussões, nortear o que deveria ser colocado

em pauta. É neste momento que os meios de comunicação em massa passam a

assumir a função de mediadores.1

De acordo com Miguel (2004), percebemos quatro pontos bastante nítidos em

que as mídias trouxeram à prática política novas configurações. Primeiramente, a

mídia passou a ser o principal aparelho de contato entre políticos e cidadãos, o que

era anteriormente uma característica dos partidos políticos. Com isso, cria-se um

afastamento dos esquemas políticos tradicionais, já que o partido não é mais esse

instrumento. O discurso político também sofreu alterações com o progresso das

mídias, já que a imagem dos políticos passou a estar mais em evidência do que

seus discursos, que se tornaram mais evasivos e sem conteúdo aprofundado. Para

que haja notoriedade midiática, os discursos reduziram-se a frases de efeito.

De acordo com Miguel (2004), percebemos quatro pontos bastante nítidos em

que as mídias trouxeram à prática política novas configurações. O primeiro aspecto 1 Assim, o desenvolvimento dos meios de comunicação de massa, como é a televisão, percorreu

todo o século XX impactando nossas atividades cotidianas, e por sua vez o universo da política. Então foi neste período, com o surgimento do rádio, seguido da televisão, que o contexto político alterou-se, já que ele é sensível a mudanças sociais e culturais, assim, tanto cidadãos quanto os próprios políticos, tiveram que incluir em sua vida cotidiana os impactos causados deste desenvolvimento dos meios de comunicação, a adequação da rotina à emissão e a constante exposição a informações a todo tempo e sobre tudo.

19

ocorreu na medida em que a mídia passou a ser o principal aparelho de contato

entre políticos e cidadãos, o que era anteriormente encargo dos partidos políticos e

assim cria-se um afastamento dos esquemas políticos tradicionais. O discurso

político também sofreu alterações com o progresso das mídias, sendo o segundo

ponto em que a mídia exerceu interferência, já que a imagem dos políticos passou a

estar mais em evidência do que seus discursos, que se tornaram mais evasivos e

sem conteúdo aprofundado. Para que haja notoriedade midiática, os discursos

reduziram-se a frases de efeito.

O terceiro aspecto é o de agenda-setting, isto é, a produção de agenda

pública. McCombs (2009) foi um dos teóricos responsáveis por definir este conceito,

que trata de perceber como a mídia é a principal referência para pautar as questões

relevantes, ou seja, elencar os temas que terão mais visibilidade para serem

tratados pelos cidadãos comuns e pela política. Por último, temos a gestão de

visibilidade, onde os candidatos passaram a preocupar-se com sua exposição, seu

discurso, sua vida privada, e assim gerir com cuidado sua projeção nos veículos

midiáticos.

No Brasil estas novas configurações nos processos de comunicação

começaram a interessar mais aos pesquisadores a partir de 1989, com o fim da

ditadura militar e a retomada das eleições presidenciais diretas, trazendo à

campanha eleitoral, por exemplo, uma mudança significativa. (Chaia, 2011).

Aconteceu que, antes, na ausência dos meios eletrônicos, os candidatos deviam

dominar técnicas de retórica, de postura de corpo e voz; hoje, tornou-se mais

importante ter uma atitude carismática e um bom perfil. (Miguel, 2002). Isto é o

resultado da transformação da sociedade informativa em sociedade

espetacularizada (SCHWARTZENBERG, 1978; DEBORD, 1997).

A incorporação de novas estratégias através da mídia norteou o

desenvolvimento de algumas práticas políticas. (Miguel, 2002) Isso pode ser

verificado no aumento de profissionais gerindo e coordenando campanhas, como

marketeiros, publicitários e outros. A centralidade midiática é, portanto, visivelmente

reconhecida nos processos políticos contemporâneos, e por isso deve ser pensada

junto à participação política. Tanto para os cidadãos, quanto para os líderes

políticos, os veículos de informação passaram a definir e pautar o que deve ou não

20

ser discutido. Aos cidadãos a mídia possui competência para formular as

preocupações públicas, e aos políticos e funcionários públicos cabe dar uma

resposta as estas preocupações. A mídia é tão inseparável da vida política que os

processos de socialização política são primeiramente mediados pela televisão ou a

imprensa escrita. Os meios de comunicação em massa, portanto, são atores de

debate, com influências e intervenções. (MIGUEL,2004).

No entanto, o desenvolvimento das mídias não parou com o surgimento da

televisão. Hoje estamos diante de novas tecnologias com a internet. Em tese, o que

difere a internet das outras formas de comunicação e o que a constitui como uma

nova mídia é a possibilidade de interação envolvendo candidatos e cidadãos, bem

como o suporte e ferramentas que dão ao leitor a opção de escolher sua fonte de

informação. A internet viabiliza uma comunicação mais horizontal, interativa e

constante que tem potencial para dar novas possibilidades de práticas de

participação política. A relação das chamadas novas mídias e com a participação

política será o tema do capítulo que segue.

No entanto, o desenvolvimento das mídias não parou com o surgimento da

televisão. Hoje estamos diante de novas tecnologias com a internet. Em tese, o que

difere a internet das outras formas de comunicação e o que a constitui como uma

nova mídia é a possibilidade de interação envolvendo candidatos e cidadãos, bem

como o suporte e ferramentas que dão ao leitor a opção de escolher sua fonte de

informação. A internet viabiliza uma comunicação mais horizontal, interativa e

constante que tem potencial para dar novas possibilidades de práticas de

participação política. A relação das chamadas novas mídias com a participação

política será o assunto a ser tratado no próximo capítulo.

21

3. Participação Política e Internet

A participação política constituiu uma estreita relação com os meios de

comunicação, como vimos no capitulo anterior, produzindo efeitos sobre a

democracia. “O desenvolvimento das novas tecnologias, como a internet,

proporciona uma infraestrutura mais rápida e mais barata, com grande potencial

para a produção e difusão autônoma de informação e com uma gama variada de

recursos para a ação política em escala local, nacional e transnacional.” (MAIA,

2011, pag.47). Com o progresso da internet, novas possibilidades de participação

podem ser pensadas através da existência de novos espaços no meio digital. Esta

tarefa é o que move muitos trabalhos recentes na área da comunicação política.

Neste capítulo faremos uma breve explanação de como os teóricos estão se

posicionando sobre o tema, com o objetivo de entender quais as principais questões

emergentes dessa relação.

Da perspectiva de uma revisão de literatura, é pelo menos digno de menção o

fato de que o grosso da publicação que mais fortemente denunciava a crise da

comunicação política, no final dos anos 80 e primeira metade dos 90, coincide com a

fase de maior encantamento com o advento dos novos meios de massa; advento

saudado como o renascimento das possibilidades democráticas. (Gomes, 2009, pag

10).

Os estudos sobre a relação da participação política com as novas tecnologias

começaram a partir da década de 90, período no qual o uso da internet era ainda

incipiente. Hoje, os estudos nessa área persistem, mas foram incorporando cada vez

mais dados. Gomes e Aggio (2009) realizaram um trabalho que busca organizar

esse percurso a partir de um exercício sintético sobre a literatura formada em torno

das campanhas online no período que vai de 1991 a 2009.

Segundo os Gomes e Aggio (2009) os primeiros trabalhos registrados nos

Estados Unidos surgiram em 1992. Eles constataram que o desempenho das

campanhas dependeu de como os candidatos articularam seus websites e redes

sociais de modo a estabelecer mecanismos de interação e mobilização. A princípio,

entre os anos 1992 e 1996, os websites eram como panfletos eletrônicos, não

havendo diferenciação em relação a outras mídias. Já entre 2000 e 2002,

desenvolveram-se mecanismos de interação, como fóruns, enquetes, bate-papos,

22

ainda que de maneira ainda pouco significativa, e um maior acúmulo de informação,

como a disponibilização de bancos de dados. De 2003 a 2009, os autores estiveram

diante de um fenômeno particular de uso da internet, que foi o caso da campanha

Obama2.

Outra revisão dessa bibliografia foi feita por Borges (2009). De acordo com a

autora, Bruce Blimber (2009) fez um estudo das campanhas eleitorais norte-

americanas de 1996 e 1998 e percebeu que, naquele momento, os candidatos se

inseriam no meio digital alimentando apenas sites simples, que ofereciam ao eleitor,

no máximo, um endereço de e-mail para contato. As possibilidades da internet

estavam longe de serem suficientemente exploradas. Devemos levar em

consideração, entretanto, que nessa época a internet não estava tão disseminada

quanto hoje, o que faz com que não seja surpresa que as campanhas online não

tenham apresentado formas muito significativas.3

O debate geral no qual esses trabalhos se inserem é o da discussão dos

principais problemas e das principais vantagens emergentes do uso efetivo da

internet atrelado à participação política. Em síntese, Gomes (2009) destacou uma

lista com sete pontos em que os novos meios têm capacidade de agir de modo a

criar uma série de vantagens para a democracia.

Em primeiro lugar, a internet oferece o suporte necessário para romper as

barreiras de tempo e de espaço e encurtar distâncias, indo além daquilo que foi

alcançado pelos meios de comunicação tradicionais, já que através do ciberespaço

é possível haver diálogos simultâneos entre um grande número de pessoas, estejam

elas onde estiverem. Em segundo, a troca de informações é irrestrita e tem ampla

capacidade de disseminação. O problema da extensão e capacidade de

2 A campanha de Barak Obama para concorrer a presidência dos Estados Unidos, no ano de 2009, é

tomado como exemplo e exceção do bom uso da internet. O candidato promoveu uma campanha utilizando-se de emails, sites, redes sociais, blogs, mensagens de celular, com o objetivo de atender seu eleitorado e também produzir agregação de novos apoiadores, provocando o engajamento e a mobilização. 3 Em 1999, Pierre Lévy (1999) também pensava a internet. Ele constrói um pensamento bastante

otimista, mas de certo modo diferente. O autor acredita que a web é um espaço que viabiliza a constituição de uma inteligência coletiva, o que podia ser percebido já em alguns casos, como o web site Wikipédia, onde há uma troca de informações entre as pessoas acessível a todos. Assim, ele acredita que esse processo criará uma nova linguagem, que nem mesmo ele sabe explicar, mas afirma que quando esta se concretizar, a inteligência coletiva será responsável por todo o desenvolvimento humano. Essa ideia bastante abstrata se revela muito otimista em relação ao que o ciberespaço pode oferecer para os processos sociais.

23

armazenamento de informações é superado por sua potência de oferecer uma

enorme infra-estrutura de armazenamento e compartilhamento.

Comodidade, conforto, convivência e custo são condições priorizadas nas

sociedades modernas. Uma terceira vantagem seria a de os indivíduos não

precisarem escolher entre a comodidade e o engajamento, pois podem integrar

mecanismos de participação sem preocupar-se com grandes esforços de

deslocamentos. O simples acesso à internet, que pode ser feito de dentro de casa,

garante mobilização sem esforço. A facilidade e a extensão de acesso à internet

assumem uma oportunidade, possivelmente inalcançável por outros meios, de

disponibilidade, abertura, e transparência, afirma Gomes.

A internet também não tem controle total sobre seu provimento de

informações, que correm em livre fluxo. Não há, portanto, filtros ou controles,

condições adversas à qualidade da informação. Ela ainda oferece a possibilidade da

interação, com comunicação e informação de mão dupla, que desencoraja a

passividade do eleitor em favor de um indivíduo capaz de interagir e se posicionar,

expor e trocar ideias. A interatividade, inclusive, é o argumento mais forte em defesa

da internet, já que não ocorre nos outros meios com toda a estrutura que a rede

online permite. O último ponto do qual o autor trata é o das vozes minoritárias ou

excluídas, que têm na internet, alternativas para se organizar e intervir no campo

político, ganhando força para trazer suas questões à tona.

Contudo, não são só de expectativas que constitui-se a internet. Gomes

(2009) mostra que crescem os estudos que apresentam as contrapartidas dessas

expectativas. Neste sentido, ele próprio apresenta alguns contrapontos àquilo que

disse anteriormente.

A começar pela disposição das informações. O problema de uma enorme

oferta de informações como a que a internet suporta é que o cidadão fica

incapacitado de distinguir quais delas são pertinentes, livres de distorção e

relevantes. As informações qualificadas permanecem à disposição dos meios de

comunicação de massa e até mesmo do Estado, mas pouco chegam aos cidadãos.

Castells (2008) e Pipa Norris (2008) são dois autores que atentam para a falta de

confiabilidade na veracidade das informações que circulam na internet (apud

Gomes, 2009). Ela tem sido mais um espaço onde o jornalismo impresso, o

24

jornalismo televisivo e o rádio-jornalismo podem se estender, conquistando um

publico consumidor diferente. O problema do acesso também gera controvérsia. “É

consenso que um governo democrático deve estender-se a todos, porém, em

nenhuma sociedade, nem mesmo naquelas mais homogêneas, verificou-se até

agora uma distribuição equânime de acesso às oportunidades digitais de

participação.” (Gomes, 2009; pag 22).

A cultura política, que entendo, a partir da definição de Almond e Verba

(1963), como uma abordagem comportamental que leva em conta aspectos

subjetivos de orientação política, crenças e sentimentos, também pode ser um

entrave. Mesmo que haja novas formas de comunicação, com tendências positivas

em relação à democracia, isso não basta e nem implica necessariamente que as

pessoas vão se utilizar delas para se informar sobre política. Esse receio é muito

parecido com aquela posição defendida por Sartori (1994). Por outro lado, James

Creighton (2005, apud Marques, 2008, p.235) revela que, atualmente, cerca de um

terço dos cidadãos norte-americanos emprega apenas a Internet para a aquisição de

informação política, dispensando as emissões televisivas ou radiofônicas.

Mas um dos principais argumentos desse contraponto é que “o sistema

político permanece fechado” (2008. P. 25). Mesmo com o surgimento de um novo

meio de comunicação como a internet, ele não foi capaz de transformar o ambiente

político vigente, trazendo configurações mais democráticas. Assim, ela fica refém do

uso conveniente de grupos fechados, como, por exemplo, os partidos políticos, que

se utilizam dos novos meios para reafirmar o que já vem dizendo fora deles. Outros

estudos, em contrapartida, seriam menos rigorosos em relação a essa afirmação de

que sistema político permanece fechado. Marques (2008), por exemplo, cita a

criação do Portal da Transparência do Governo Federal, no Brasil, criado em 2004

com o objetivo de tornar público informações anteriormente restritas ao Tribunal de

Contas da União.

O último argumento refere-se a uma condição complexa, a da liberdade de

expressão. Por um lado, ela é considerada uma condição da democracia, mas na

internet, em especial com a possibilidade do anonimato, pode ser usada também por

práticas antidemocráticas de grupos de ultra-esquerdas, conservadores, racistas,

homofóbicos, que se sentem mais encorajados no universo online.

25

O que dizer de tudo isso? Recursos tecnológicos não podem frustrar nem realizar promessas de efeitos sociais. Recursos tecnológicos são instrumentos à disposição de agentes sociais, estes sim com capacidade de fazer promessas ou de frustrar esperanças. A internet não frustrou expectativas de participação política porque tampouco poderia formular promessas de transformação da democracia. É um ambiente, um meio que, como ainda é claro para todos, está pleno de possibilidades, desde que as sociedades consigam dela retirar tudo o que de vantajoso à democracia pode oferecer.

(Hamlet, apud Gomes, 2009).

Se os agentes sociais são os principais responsáveis pela forma com que são

usados os recursos tecnológicos, quais seriam as motivações que os levam a

integrarem a internet de forma a “fazer promessas” e não “frustrar esperanças”?

Marques (2008) elenca três. Primeiro o baixo custo, critério decisivo também para

Dahl (1997), a conveniência, de não precisar se expor totalmente, pois garantido sua

privacidade a participação torna-se menos comprometedora e, portanto, mais

intensa, estimulando o indivíduo a se posicionar e emitir opiniões, e a facilidade e

rapidez em comunicar-se com outros cidadãos ou mesmo políticos e instituições.

O segundo critério categorizado por Marques (2008) que atrai a participação é

a capacidade de organizar-se sem os obstáculos de tempo e espaço. Assim, grupos

e associações podem juntar-se por uma causa em comum desafiando os padrões

tradicionais, de tempo, de espaço e de desigualdades, por exemplo, através de

comunidades virtuais ou sites onde possam juntar-se e boicotar alguma empresa ou

instituição do estado. Estes obstáculos, que Marques identifica, são rompidos

quando fazemos uso da internet, pois não é necessário que duas pessoas devam

estar juntas para que possam discutir e com a simultaneidade da internet, nem o

tempo é uma barreira.

Por último critério, Marques trata da aptidão em atrair cidadãos que pouco ou

nada se envolviam no universo político. Esta motivação está principalmente entre os

jovens, que ao se interessarem pela política buscam alternativas que não as dos

meios tradicionais para emergir no universo político, e uma destas portas é a

internet, (Marques 2008).

Mesmo diante destes incentivos à participação, elencados por Marques

(2008), o autor acredita que eles não são suficientes para mobilizar novos

indivíduos, mas sim, reforçar o empenho do público que já participava do jogo

político fora da internet. Para Pipa Norris (apud Marques; pag 246; 2008) os

26

recursos para integrar o espaço virtual com práticas políticas trata-se de “pregar para

os já convertidos”. Entretanto, a participação efetiva não se estende a atividades

muito complexas, Gibson, Lusoli e Ward (2005), segundo Marques (2008)

verificaram que a participação implica em coisas do tipo: escrever e-mails aos

candidatos, repassar mensagens noticiosas e subscrever abaixo-assinados. Para

Marques (2008), o mais importante seria que as instituições do estado e seus

representantes assegurassem aos cidadãos mecanismos de interação que os

fizesse sentir que são parte importante do processo de discussão e de deliberação e

assim eles se colocariam a disposição da participação política.

Faria (2012) também identifica problemas provenientes da relação entre

participação e novas mídias, que vem completar o que os outros autores

mencionados já destacaram. Primeiramente a “Fragmentação e polarização” (Faria,

2012) identificada por Cass Sunstein (2007), segundo Faria (2012), onde a internet

gera a fragmentação de informações em excesso e a polarização se dá por conta da

insistência em criar preferências e perfis que prejudicam o desempenho das

discussões, já que os indivíduos tendem a se posicionar relatando suas opiniões e

afinidades e formatando comportamentos polares. Em seguida: “Muitos falam,

poucos escutam” (Faria, 2012) . Este é outro desafio do uso da internet, de acordo

com Mathew Hindman (2009), segundo Faria (2012), mesmo que haja blogs e sites

políticos, quem se ocupa de ler e acompanhar essas informações é um grupo

irrisório.

“Os mais ouvidos são poucos” (Faria, 2012) ainda com referência a Hindman

(2009), de acordo com Faria (2012), o autor constatou que, já que existe muita

informação na internet, houve a necessidade de criar sites de busca onde os

usuários podem encontrar as informações que procura, entretanto, Hindman afirma

que esses chamados search engines, sites de busca, trazem resultados enviesados,

já que a maioria deles tem um sistema que encontra os sites mais acessados de

acordo com um ranking, uma espécie de filtro que acaba por prejudicar o acesso a

outras fontes menos visitadas. “Mais informação, menos reflexão” (Faria, 2012.).

Como a internet é um acervo inesgotável de dados existe uma preocupação entre os

estudiosos acerca da qualidade destas informações. Existe também uma

preocupação com a prática de leitura dos usuários, pois estudiosos verificam,

segundo Faria, que os indivíduos leiam apenas uma parte dos textos e passam para

27

outras matérias. “A fraca relação entre internet e eficácia política” (Faria, 2012) , este

problema acontece pois ainda que haja mobilização e engajamento online, os

autores não conseguiram reconhecer um impacto real nos processos políticos.

A participação política através do uso da internet pode, também, depender de

um grupo de quatro fatores, elencados por Silva (2006), que seriam:

1) fatores estruturais, que correspondem a parte técnica de ter ferramentas e condições de acesso, este fator é o princípio básico, entretanto é irrelevante para a prática da participação política se estiver isolado dos outros fatores como, por exemplo,

2) fatores comportamentais, estes são decisivos para que as novas tecnologias deixam de ser mais um veículo de comunicação e passe a ter resultados positivos para a democracia de massa, pois é através dos aspectos psicológicos políticos e ideológicos, por exemplo, que cada indivíduo possui que pode configurar em comportamentos de participação e mobilização política.

3) Fatores conjunturais através de acontecimentos, eventos ou agendamentos podem gerar “ondas”, segundo Silva, de participação política, são normalmente acontecimentos que incitam em comoção pública e provocam a mobilização. Por ultimo

4) fatores legais, que trata-se de prerrogativas constitucionais que asseguram a criação de canais de participação onde os cidadãos possam integrar não só os espaços de discussão quanto a parte deliberativa. Estas leis e políticas públicas colocam ao Estado a obrigação de viabilizar estes canais de intervenção. Em suma, para Silva, estes fatores são capazes de interferir no processo de mobilização dos cidadãos às práticas políticas.

(SILVA, 2006)

Diante disso, percebe-se que as conclusões as quais os autores chegam

acerca dos limites e alcances da internet não são incompatíveis, pelo contrário, eles

partem das mesmas expectativas quanto à internet e a esfera civil, mas ao longo

das experiências de pesquisas empíricas, passado o entusiasmo teórico de início, os

estudos mostram que o principal empecilho do bom uso (melhor que bom uso seria

dizer “explorar todas as possibilidades democráticas”) da internet vem sendo os

próprios usuários, como sugere Maia:

No momento atual, diversos autores têm concordado que a mera existência da internet não leva ao aumento da organização e da participação política se os usuários não têm um interesse prévio nestas questões. Nesse sentido, estudos empíricos têm mostrado que a internet é mais utilizada para manter os laços já existentes do que para criar novos vínculos (Uslaner, 200; Wellman, 2001; KavNAUGH E Patterson, 2001; Lilleker e Jackson, 2004). Experiências diversas mostram que a facilitação do acesso à internet em cidades ou ambientes específicos não redundou em mudanças significativas nos contatos pessoais, no comprometimento com as comunidades e no engajamento cívico.

28

(MAIA, 2011, pag 71)

Sendo assim, a velocidade com a qual se desenvolveu a internet e as

mudanças que ela gerou, estimularam o crescimento de estudos sobre seus usos e

efeitos na área da comunicação política. Os argumentos que vimos em defesa da

internet dizem que ela criaria canais de interação que ofereceriam novas maneiras

de relacionar cidadãos, representantes e instituições políticas. Porém, só a internet

não gera novas configurações, elas são de responsabilidade dos próprios atores, ou

seja, dos cidadãos, representantes e instituições, portanto, neste momento, mais

importante do que olhar para a internet por si mesma, devemos deslocar a atenção

aos usuários e como eles tem gerido suas atividades online.

3.1. Participação direta: instituições, candidatos e eleitores.

Partindo do pressuposto de que o maior responsável pelo uso eficaz da

internet é o usuário, é importante ter uma noção de como estes atuam. Para isso,

apresentaremos três trabalhos que mostram como cada um deles pode agir na

construção de mecanismos que fomentem a participação política.

A começar pelas instituições. Marques (2008) fez um estudo sobre as

possibilidades que as instituições de Estado teriam para desenvolver um

relacionamento com a sociedade civil através das ferramentas digitais e do suporte

técnico da internet. De acordo com o autor, o Brasil tem um papel de destaque

entres os países que promovem, através de instituições públicas do Estado,

ferramentas como orçamentos participativos, audiências ou consultas públicas, além

de transformar procedimentos tradicionais em procedimentos exclusivamente

informatizados4, como a arrecadação de impostos, por exemplo, trazendo mais

eficiência aos seus serviços.

4 Essa informatização provém de uma idéia de governo eletrônico (também chamado de e-

government ou e-gov), que de acordo com Irina Netchaeva (apud Marques, 2008), trata-se da concepção de tornar procedimentos burocráticos mais baratos com a utilização das novas tecnologias, descartando o uso de impressões de papéis e serviços prestados. A princípio, a redução dos custos foi o que impulsionou essa nova tendência do e-government. Contudo, Grant Kippen e Gordon Jenkins (apud Marques, 2008) afirmam que o interesse do governo passou a ser também a possibilidade de potencializar seu relacionamento político com os cidadãos, oferecendo serviços de mais eficácia e mais comodidade. No entanto, o conceito de governo eletrônico não inclui a participação dos cidadãos nos processos deliberativos. Este tipo de interação está presente em outro conceito, chamado e-governança, que Sunny Marche e James McNiven (apud Marques, 2008) diferenciaram da noção de governo eletrônico na medida em que a noção de e-governança privilegia

29

O trabalho de Marques, vem, neste sentido, com o objetivo de verificar como

uma determinada instituição do estado está se utilizando destes recursos

tecnológicos para sua prática diária. Para isso o autor procura responder algumas

questões que considera essenciais para o compreender a efetividade do uso da

internet:

Quais são as oportunidades de participação oferecidas aos cidadãos através dos sites dos agentes e instituições selecionados? A quem elas contemplam? Quais as características mais relevantes de tais oportunidades? O que elas proporcionam? Como estas oportunidades permitem que determinado processo participativo se desenvolva? Em que medida é possível apontar indícios que impliquem modificações na dinâmica de discussão e elaboração das políticas públicas uma vez que estas ferramentas sejam empregadas? Que outras ferramentas poderiam ser sugeridas a fim de se aproveitar adequadamente o potencial participativo dos media digitais?

(Marques; 2008; pag 276) As respostas a estas perguntas, para Marques, norteiam o quão as

instituições de estado - Portal da Presidência da República e o Portal da Câmara de

Deputados- estão comprometidas com a integração de mecanismos participativos.

Com este estudo temos mais referências pra pensar como as instituições de Estado

podem ampliar espaços de participação na internet.

Porém, a discussão de como os novos meios podem interferir na democracia

de massa privilegiando a participação política popular caminha não só no sentido de

como são ofertados os mecanismos de participação, mas também no sentido de

como os próprios participantes têm gerido seu comportamento diante dos

mecanismos que lhes são ofertados, ou seja, os cidadãos. É nesse sentido que o

trabalho de SAMPAIO, R. C; MAIA, R. C. M. e MARQUES, F. P (2010) percorre.

Sob o contexto de uma política de orçamento participativo, o artigo analisa o

comportamento discursivo dos cidadãos de Belo Horizonte durante um fórum online.

O orçamento participativo é uma prática de deliberação conjunta entre gestores e

cidadãos, com o objetivo de chegar a resultados políticos mais justos e legítimos, de

acordo com Fung (apud SAMPAIO, R. C; MAIA, R. C. M. e MARQUES, F. P ; 2010

pag 2), trata-se do conceito de deliberação pública que para Habermas, segundo os

autores é essencial para o sucesso das práticas democráticas, pois elas incluem a

a participação pública nos processos deliberativos. Estes dois conceitos – e-government e e-governança - apresentam formas possíveis de integração dos cidadãos às instituições de estado usando-se das novas tecnologias.

30

participação popular tanto no papel decisório, mas principalmente no

estabelecimento diálogo e na comunicação com os agentes administrativos.

A deliberação seria, assim, a busca, através de práticas discursivas, da “melhor

solução”, ou ainda, daquela mais válida, justa e verdadeira.

(SAMPAIO, R. C; MAIA, R. C. M. e MARQUES, F. P ; 2010 449)

A importância da deliberação pública é, não só por contemplar um uso eficaz

da internet, mas também contribuir para o próprio desempenho das práticas

democráticas mesmo fora da rede, trazendo a tomada de decisão mais eficaz, já que

incluem as demandas dos cidadãos, os maiores interessados em políticas públicas

pertinentes para o desenvolvimento do mundo, principalmente do mundo o qual

fazem parte, seu bairro, sua cidade, seu estado. Com a internet as vantagens das

práticas deliberativas ficam bem mais acessíveis e viáveis, ao passo que não se tem

mais o empecilho do tempo e espaço limitando a reunião de pessoas em torno de

um debate. Porém, de acordo com os autores, estudos empíricos realizados nesta

área têm obtido resultados não muito otimistas.

Um estudo feito por Jankowski e Van Os (apud SAMPAIO, R. et alia ; 2010

pag 5), de fóruns digitais na Holanda revela que as discussões foram geradas por

grupos pequenos que acabaram restringindo a abrangência dos temas e também

limita o entendimento da verdadeira representação dos interesses populares, já que

apenas uma parcela muito pequena da população está envolvida no processo

deliberativo. Outra crítica que se faz ao processo deliberativo é a de que os grupos

que participam são muito homogêneos. Para Wilhelm (apud SAMPAIO, R. et alia ;

2010 pag 450), grupos homogeneizados significa um grupo de pessoas com

pensamentos e opiniões muito similares, e isso não é favorável pois para que haja

debate, deve haver embate de ideias, diversidade. Davis (apud SAMPAIO, R. et alia

; 2010 pag 450) aponta mais um indicativo de mau uso dos espaços de deliberação

online quando nos mostra que as pessoas envolvidas das discussões procuram

mais registrar os seus posicionamentos, que geralmente não se diferem muito uns

dos outros, do que dialogar em função de procurar melhores formas de resolver os

problemas que estão sendo colocados. Sendo assim os três exemplos, examinados

pelos autores, concluem que os cidadãos não estão participando com grande

empenho e, portanto não levam a resultados muito eficazes da prática democrática.

Mesmo diante destas perspectivas frustrantes, SAMPAIO, R. C; MAIA, R. C.

M. e MARQUES, F. P insistem em examinar os fóruns do orçamento participativo de

31

Belo Horizonte. Para realizar este estudo os autores acreditam que é fundamental

para que se estabeleçam critérios de análise. Estes critérios são,

(I) o contexto no qual a discussão se desenvolve; (II) a estrutura ou o design das ferramentas digitais de comunicação e (III) as estratégias metodológicas empregadas para se apreender a deliberação. (SAMPAIO, R. C; MAIA, R. C. M. e MARQUES, F. P; 2010; pag 451)

O contexto foi entendido a partir do perfil do tópico do debate, bem como o do

ator político que o representa, já que era inviável produzir uma pesquisa, através de

um survey com os participantes. O segundo critério se da a importância de perceber

como as ferramentas digitais estão dispostas. Para os autores, o espaço de

comentários disponível nos fóruns é a principal ferramenta a ser avaliada. O ultimo

quesito está relacionado com o método de análise dos discursos, que compreendeu

catalogar e ler todas as postagens do eleitorado. A classificação seguiu utilizando

critérios de metodologia, baseados nas mesmas categorias de análise de Lincoln

Dahlberg. O primeiro é chamado de “Tematização e críticas racionais de pretensões

de validade”, que tem o objetivo de indicar nos discursos de participação se eles são

de 1)Reciprocidade, ou seja, os comentários estão visivelmente relacionados uns

com os outros, demonstrando que foram lidos e respondidos, se não, estes

comentários são categorizados como 2) Monológicas. Essa categorização foi

incorporada neste trabalho, como veremos mais adiante. A partir do que os autores

estão falando sobre reciprocidade e monológica, nos incluímos variáveis que

pudessem identificar se as pessoas que participaram comentando, no jornal o

Estadao, estavam em diálogo entre si, ou somente estavam expressando suas

preferências sem discutir ou importar-se com as outras opiniões, pois isso ajuda a

definir em que sentido a participação se dá.

Em seguida, no trabalho dos autores, é observada a justificativa dos

comentários. Se eles apresentam explicações baseadas em fatos, dados ou notícias

trata-se de 1)Justificativa Externa, mas se as explicações são fundamentadas em

ponto de vista do próprio usuário, com expressão de seus princípios e valores é

2)Justificava Interna, e quando não há justificativa, apenas posicionamentos sem

explicações categoriza-se como 3)Posição. A “Reflexividade”, para Dahlberg (apud

SAMPAIO, R. et alia ; 2010 pag 437) refere-se a avaliação que os participantes

fazem sobre os comentários uns dos outros e em como eles se relacionam com eles.

32

A reação pode ser de 1)Persuasão, onde o usuário sente-se persuadido tanto por

algum comentários específico quanto pela discussão, ou de 2)Progresso, onde o

participante está de acordo com afirmações feitas por outros usuários, se ele não

estiver de acordo, e nem persuadido chamamos a reação de 3) Radicalização, que é

quando o usuário reage contrariado a outra postagem radicalizando seu ponto de

vista. Esta sumarização também foi incorporada neste trabalho e será melhor

definida mais tarde, pois acreditamos que observar a justificativa dos comentários

explica se eles estão trazendo elementos de novas informações, dados, ou se a

discussão fica travada em valores pessoais e morais, a importância em identificar

isso está em reconhecer se a participação traz desfechos democráticos ou não.

O terceiro critério, a partir da classificação de Dahlberg (apud SAMPAIO, R. et

alia ; 2010 pag 458) se chama “Ideal Role Taking”, que identifica se os participantes

estão sendo tolerantes e se dispondo a ouvir e respeitar as opiniões uns dos outros.

Este critério deriva dois possíveis comportamentos 1)Respeito Implícito, onde não

há manifestações negativas, mas nem positivas e 2)Respeito Explícito se dá quando

há nitidamente um posicionamento positivo em relação aos outros usuários. De

maneira que as postagens sem respeito aos demais comentários foram

contempladas com as categorias formuladas por Papacharissi (2004, apud

SAMPAIO, R. et alia ; 2010 pag 459), que são 1)Respeito: rude; quando o

posicionamento faz referencias irônicas e de ataque e 2)Respeito: incivil; onde os

ataques são mais ofensivos, preconceituosos e odiosos. Embora este critério

também seja importante para identificar em que níveis de democratização

acontecem a participação em nosso objeto de estudo, esta não foi incorporada.

Diante de todo esse processo de estabelecer critérios de análise para melhor

apreender o sentido dos discursos feitos durante o período de votação, do projeto

das obras a serem desenvolvidas da cidade de Belo Horizonte, os autores concluem

que: o orçamento participativo digital foi um projeto de sucesso ao que corresponde

ao recrutamento, pois conseguiu envolver uma parcela considerável de eleitores. A

participação do público mostrou altos índices de justificação, respeito e identificação.

Houve a notificação de números razoáveis de troca argumentativa, mas de um modo

geral os autores afiram que as pessoas tendem mais a se posicionar, sem dar muita

atenção aos outros comentários. Entretanto, eles acreditam que os resultados são

mais positivos do que parecem, pois foi percebido um alto índice de respeito e

argumentação que eram a principio, inesperados. Mesmo que as pessoas não

33

estejam estabelecendo diálogos entre elas e nem aprofundando muito nos temas, de

qualquer maneira elas estão se posicionando e colocando seu ponto de vista para

quem quiser saber. Outro ponto positivo é a de que todos os comentários

permanecem visíveis no site, e isso serve de informação para um terceiro que tenha

acesso ao site, e assim, este indivíduo poderá participar do processo de formação

de opinião ao ler o que outras pessoas conversaram, mesmo sem ter feito parte do

corpo de debatedores.

Conforme os autores destacam:

É importante ressaltar que algumas dessas conclusões são aplicáveis unicamente ao caso estudado, não podendo ser generalizadas a todas aquelas manifestações e fenômenos discursivos que têm lugar na internet. Entretanto, parece claro que experiências como essa podem ser importantes para a ideia de uma democracia com traços discursivos mais proeminentes. (SAMPAIO, R. C; MAIA, R. C. M. e MARQUES, F. P; 2010; pag 473)

Mesmo que os resultados sejam específicos para cada grupo analisado, a

construção desta analise é muito importante para que possa ser verificada em outros

casos, como por exemplo, neste trabalho, uma vez que incluímos algumas de suas

características metodológicas, para identificar, mais adiante, como a participação

política civil se manifesta na sociedade de informação.

Como vimos tanto instituições, quanto cidadãos podem fazer uso da internet

no contexto político e de participação. Este uso também pode ser estendido aos

candidatos, ou representantes políticos já eleitos, com o objetivo de maximizar o

processo democrático. Um estudo que retrata como os candidatos utilizam a internet

durante suas campanhas foi feito por BRAGA, S. S.; BECHER, A; NICOLÁS M. A,

(2011). De acordo com os autores, o uso da internet na campanha do Barack

Obama, nos EUA, em 2008, vem sendo utilizado como parâmetro para verificar se

outros candidatos tem demonstrado o mesmo desempenho ou se o caso Obama foi

um fenômeno não mais. Logo, a pergunta a ser compreendida na análise dos

autores é em que grau os candidatos usaram os novos meios digitais e com que

sucesso. De acordo com trabalho, os estudos empíricos sobre internet e eleições

realizados no Brasil estão em estágios iniciais, por isso, a importância de realizar

trabalhos nesta área se dá para contribuir ao progresso de uma literatura cada vez

mais ampla e que acompanhe o desempenho do uso das novas tecnologias.

34

A partir de uma estruturação em um modelo de análise de mecanismos de

interação e de participação de FERBER et. AL. (2008), os autores acreditam que

para compreender também um mapeamento sobre os recursos utilizados pelos

candidatos em seus websites, seis categorias devem ser analisadas, sendo elas:

1)Navegabilidade e acessibilidade que compreende integrar mecanismos de

navegação; 2)Informação, que significa dispor aos usuários informações políticas

úteis; 3)Comunicação e mídia, onde é ofertado aos internautas outros estruturas

comunicativas através de vídeos ou imagens; 4)Participação e “falas cidadãs”

através de canais que possibilitem aos eleitores participar com mensagens, envio de

arquivos e etc.; 5)Mobilização e integração em rede que significam oferecer

informações de prestação de contas e transparências e, por ultimo, se o site possui

6)Redes sociais e ferramentas web 2.0 mais recentes, incluindo links que remetem a

outras mídias como o facebook e canais do youtube, por exemplo.

O que os autores observaram durante a pesquisa foi que dos 406 candidatos,

69,2% se utilizaram de websites durante o período eleitoral, mas esse índice diante

dos dados dos EUA, por exemplo, ainda é baixo. Em relação a eleições passadas,

campanha de 2010 mostrou-se diferente em duas características, a atenuação do

“digital divide” e a ampliação do uso de redes sociais. O uso da internet pelos

candidatos tem viabilizado o: fortalecendo os mecanismos de accountability,

coordenação estratégica entre militantes e elaboração de mensagens mais

personalizadas pelos candidatos, entretanto ainda são raros os exemplos bem-

sucedidos de experiências de deliberação entre vários participantes por intermédio

da internet (BRAGA, S. et. Alia. 2011; pag 22). Assim, podemos observar que o uso

da internet pelos candidatos não tem sido tão significativo, pois vem sendo

explorado muito pouco diante de tantas possibilidades de ferramentas que a internet

pode oferecer. Embora nosso trabalho não corresponda em como os candidatos

trabalham com o uso da internet, estas seis categorias não são exclusivas a uso dos

candidatos, elas poderiam ser incorporadas pelo próprio jornal o qual estamos

pesquisando, e assim, de acordo com sua resposta a estes critérios, saberemos

qual sua aproximação de estratégias democráticas, que no final das contas ajuda na

construção de uma maior ou menor participação política.

Em resumo, este capítulo apontou que os resultados das análises sobre o uso

da internet no contexto da participação política tem sido polarizado entre problemas

35

e vantagens, porém, nenhuma afirmação pode ser arbitrária, mas sim feita através

da verificação empírica, pois se trata de uma relação de mão dupla entre a internet,

como ferramenta, e o usuário, que estabelece relações específicas em cada

contexto, e, como sabemos, esse contexto muda muito rápido devido aos avanços

das tecnologias. Com isso, a pergunta que este trabalho se coloca no momento é:

Entendendo o espaço de comentar noticias postadas que o portal online oferece

como um subsídio a favor da interação entre usuários e da expressão de suas

preferências, como os internautas vem utilizando? Com esta questão em aberto, o

próximo capítulo se encarrega de discutir a metodologia utilizada para a coleta de

informações do nosso objeto de estudo, seguido da análise e discussão dos dados.

36

4. Metodologia e Análise de dados

Este capítulo tem como objetivo apresentar o objeto empírico – portal do

estadão e comentários sobre matérias políticas – e realizar uma análise sobre a

participação política no portal online estadao.com. Os dados que serão usados para

cumprir esta análise referem-se aos comentários que os internautas fizeram em

notícias publicas pelo Estadão, que mencionavam ao menos um dos três principais

candidatos a presidência, no período eleitoral de 2010, Dilma Rouseff, José Serra e

Marina Silva. Primeiramente apresentaremos qual a metodologia utilizada que

permitiu transformar todo o conteúdo destes comentários, em formato de texto, para

números passíveis de serem analisados. E em seguida faremos uma exposição dos

principais resultados obtidos

4.1. O objeto empírico

De acordo com o que já foi dito na introdução, procuramos, no contexto

eleitoral, um portal online que oferecesse a possibilidade de comentar notícias

postadas e que estas estivessem, por sua vez, disponíveis para qualquer usuário.

Assim, o portal estadão.com foi o único que cumpria com estas premissas. Logo,

foram coletados 17.092 comentários dentre todo o período oficial de campanha que

foi de 5 de julho a 31 de outubro, o que sugere uma média de aproximadamente 143

comentários por dia, e, que, frente a 2.184 notícias, estabeleceu uma relação de 13

comentários por postagem do portal.

Os comentários são, portanto, o objeto empírico de analise, sendo

denominado também como participação política, entendido que ele expressa uma

forma de participação, que em paralelo com Dahl (1997), compreende a

oportunidade ofertada aos cidadãos de formular suas opiniões e de expressá-las de

alguma forma.

4.2. Metodologia

A partir de uma metodologia quantitativa de dados construímos um livro de

códigos específico para descrever as notícias do portal, e outra para delinear os

comentários (que segue em anexo). Dentre todas as variáveis as quais o método

37

propõe, algumas foram decisivas para a análise, e por isso trataremos destas de

uma forma mais detalhada, enquanto as outras estarão compreendidas em anexo,

com as suas descrições.

Em relação ao portal, as variáveis que constituem a análise são: Mês de post,

que significa indicar em que mês entre julho, agosto, setembro e outubro, a notícia

foi postada. Número de comentários, que aponta quantos comentários cada notícia

recebeu. A variável tema responsável por explicitar qual assunto é tratado

predominantemente no corpo da postagem, podendo variar em 17: Campanha

eleitoral, político institucional, economia, política social, infraestrutura e meio

ambiente, violência e segurança , ético-moral, política para esporte, cultura e

variedades, política estadual e nacional, política internacional, outros temas, imagem

política dos candidatos, imagem pessoal dos candidatos, imagem administrativa dos

candidatos, imagem do governo em disputa e, por último, o tema de imagem da

campanha e eleitores. Os temas podem variar, entretanto, alguns estiveram

entre os mais recorrentes, o que foi o caso de campanha eleitoral, que ocupou

46,7% de todas as notícias, ou seja, quase a metade de tudo que foi publicado pelo

portal manteve relação com o tema campanha eleitoral, que significa acompanhar

agendas, discursos e desfechos da propaganda eleitoreira. O segundo índice mais

alto fora imagem política dos candidatos, com 12,4%. A variável formato

também será proposta em análise, ela define se as notícias eram formalizadas em

textos, ou textos e imagens, assim como a presença de links, que apontam se

houveram links no corpo da notícia, ou não.

Já as variáveis que correspondem a descrição dos comentários foram:

Valência para candidato, a qual buscamos verificar que valores estão associados

entre os comentários e a visibilidade dos candidatos, assim, cada vez que um

comentário mencionasse explicitamente o nome de pelo menos um dos três

principais candidatos teríamos que identificar se esta menção é positiva, negativa,

equilibrada ou neutra. A categoria tipo de comentário tem o objetivo de indicar qual a

relação o comentário está estabelecendo. Neste caso as possíveis alternativas

seriam: relacionado com o tema, ao jornalista, ao portal, aos internautas, aos

candidatos, ao governo Lula, a campanha e outros.

38

Em formato do comentário a intenção foi apontar o que estava predominante

no texto, esta categoria pode derivar em até 16 opções, que são: elogio à pessoa

do jornalista, elogio à posição política do jornalista, elogio à posição do jornalista

sobre o tema, elogio aos demais comentaristas, elogio a candidatos/políticos, elogio

ao governo em disputa, elogio a outros jornalistas ou imprensa, de campanha, crítica

à pessoa do jornalista, crítica à posição política do jornalista, crítica à posição do

jornalista sobre o tem, crítica aos demais comentaristas, crítica a

candidatos/políticos, crítica ao governo em disputa, crítica a outros jornalistas ou

imprensa e outros.

As categorias que seguem estão associadas a um trabalho de SAMPAIO, R.

C; MAIA, R. C. M. e MARQUES, F. P;. (2010) que também propõe uma análise de

comentários na internet. Dentre as diversas categorias utilizadas, três delas

poderiam acrescentar mais informações relevantes em nosso trabalho e por isso

foram adaptadas e incorporadas no livro de códigos, sendo elas, Relacionado com

demais comentários, que significa que um comentário pode estar 1.totalmente

relacionado, 2. relacionado indiretamente e 3 não relacionado com outro comentário.

A ideia desta categoria é mensurar se os comentários são de reciprocidade ou

monológicas, isto é,

“Inicialmente, é avaliada a Reciprocidade (1), ou seja, se os usuários demonstram estar lendo as mensagens e respondendo a elas. É um nível mais elementar, que não exige elaboração da réplica, mas apenas o ato de responder a outro usuário ou ao assunto em pauta. As mensagens que não apresentarem respostas serão classificadas como Monológicas (2).” (SAMPAIO, R. C; MAIA, R. C. M. e MARQUES, F. P;. 2010)

A categoria Justificativa que pode variar em quatro opções que são 1-

justificativa externa, 2-justificativa interna, 3-posição e 4-outros. Item que procura

entender que tipos de argumentos estão sendo mobilizados pelos internautas, ou

seja, de acordo com a citação a seguir, é possível verificar se os internautas buscam

argumentos factuais, de valores pessoais ou apenas de posicionamento.

“Depois, é avaliada a justificativa, ou seja, se os participantes estão apresentando razões para apoiar seus argumentos. Jensen (2003) apresenta três possibilidades de justificação: a Justificação Externa (3) é aquela em que o usuário se utiliza de fontes externas para manter seu argumento, sejam fatos, dados, notícias etc. A Justificativa Interna (4) é baseada no próprio ponto de vista do usuário, que utiliza explicitamente seus padrões e valores e histórico pessoal (testemunho) para apoiar seu

39

argumento. “Finalmente, Jensen (2003) afirma que é possível ter uma alegação, ou seja, a pessoa afirma sua posição, mas não apresenta sua justificativa ou algum fato, o que chamaremos, simplesmente, de Posição” (SAMPAIO, R. C; MAIA, R. C. M. e MARQUES, F. P; 2010)

Em a última variável que compreende Reflexividade que tem por objetivo

avaliar que efeitos os comentários exercem uns nos outros, portanto, essa categoria

depende que haja relação entre os Comentários, que serão verificados na categoria

anterior de relacionado com os outros comentários. Assim, a reflexividade pode ser

de persuasão, progresso ou radicalização, ou outro que de acordo com a referência

significam:

“Segundo Jensen (2003), a reflexividade pode ser avaliada de três formas. Persuasão (6), quando há sinais explícitos de que um usuário se sente persuadido pela argumentação de outro participante ou pela discussão no geral. Progresso (7), quando um usuário reflete sobre outra postagem, responde com novos argumentos ou informações ou, mesmo, tenta criar uma síntese dos argumentos. Ou Radicalização (8), quando o usuário reage negativamente à outra postagem e radicaliza seu ponto de vista anterior, não estando aberto a outras possibilidades. Em nosso critério, uma mensagem só poderia ser considerada como reflexiva se ela também apresentar reciprocidade”

(SAMPAIO, R. C; MAIA, R. C. M. e MARQUES, F. P; 2010)

4.3. Análise

A análise dos dados está dividida em três partes principais. Em um primeiro

momento verificamos como foi a distribuição dos comentários frente as

características do portal. Em seguida verificamos esta distribuição de acordo com a

com as variáveis que se referem aos candidatos (valência, tipo e formato). E por

último, procuramos ver como os comentários se dispuseram diante da relação que

mantinham uns com os outros.

4.3. Análise dos comentários em relação ao portal

Lembrando que a análise procede sobre o contexto específico do período

eleitoral de 2010, que compreendeu 5 de julho a 31 de outubro no qual os

comentários foram lidos e transformados em dado. A distribuição destes

comentários, ao longo das eleições presidenciais pode ser notada no gráfico (1)

abaixo:

40

Gráfico 1 – Percentual de comentários por mês

Fonte: Núcleo de Pesquisa em Comunicação Política e Opinião Pública

Como podemos observar que a participação (percentual de comentários)

através dos comentários só aumentou ao longo das eleições (mês), indo de 13,3%

em julho a 40,9% em outubro, ou seja, 1993 comentários em julho contra 7637 em

outubro, um crescimento de 27,6%. Esta informação demonstra certo interesse e

comprometimento do internauta em levar sua participação até o último momento do

processo decisório, que foram as eleições do dia 31 de outubro de 2010.

As explicações acerca do que levaria esta crescente participação através dos

comentários pode ser pela demanda de informações que vimos em Downs (1999), a

qual os eleitores, frente ao processo decisório, buscam informação para votar, logo,

quanto mais se aproxima o dia da tomada de decisão, mais as pessoas procuram

subsídios para a escolha eleitoral, portanto, neste sentido o aumento é coerente.

Veiga (2011) também segue nessa lógica de que o período eleitoral provoca maior

41

busca por informação, para ela, quem cumpre a função de alertar o cidadão é o

HGPE – Horário Gratuito de Propaganda Eleitoral, pois ele situa o eleitor:

“A primeira função do Horário Eleitoral é mobilizar o eleitor para a disputa. As pessoas despertam para a “hora da política”, como costumam chamar o período de eleições, com a veiculação do Horário Gratuito de Propaganda Eleitoral (HGPE). Neste momento, elas se dão conta que precisam decidir o voto. Trata-se de um momento de incertezas e angústias na medida em que a percepção da necessidade da escolha do candidato vem associada à crença de que qualquer político que venha a ser escolhido dificilmente corresponderá à sua expectativa. Contudo, paralelo à ideia de que os políticos não cumprem o que prometem, existe a percepção de que pelo menos alguma coisa eles fazem. Ou seja, a dúvida está em identificar entre os candidatos aquele que maiores benefícios proverá uma vez eleito. É precisamente esta incerteza que motiva a busca pela informação.” (VEIGA, 2011)

O crescimento da participação vem seguido pela demanda por informação,

logo, o portal esteve a cada dia mais presente na rotina dos usuários se assumirmos

o crescente número de comentários como indicativo.

Todavia, o mês de outubro também foi marcado pelo segundo turno, o que

tornou o debate mais polarizado e acirrado, e neste momento, dois temas emergiram

da disputa eleitoral e que acabou repercutindo com muita força entre as mídias, e

consequentemente no debate, que foram temas como o aborto e corrupção. Por

exemplo, no dia 11 de outubro, a primeira notícia postada pelo portal, intitulada

Alckmin continua a mostrar confiança na vitória de Serra, obteve 2 comentários,

enquanto a notícia seguinte, Arcebispo de João Pessoa acusa Dilma e PT por

defesa do aborto, alcançou 625 comentários. Apenas com o título da notícia

entendemos que os temas polêmicos chamaram muito a atenção dos usuários, e

somado ao fato de que eles aconteceram em outubro, podemos inferir que houve

influência no percentual de participação. O cenário da disputa eleitoral do segundo

turno foi bem mais conflitante, com ataques e acusações explícitas entre os

candidatos, o que provoca ainda mais inquietudes por parte do eleitorado.

Para verificar esta informação podemos ver como foi a distribuição dos

comentários por temas. Cada notícia do jornal poderia ser enquadrada como uma de

17 temas possíveis. O pressuposto é de que as pessoas podem ter uma relação de

interesse em algumas temáticas específicas, e por isso vir a participar mais em

algumas notícias do que em outras. Ao partirmos dessa ideia, verificamos que ao

fazer uma media dos comentários por temas, alguns estiveram entre os mais

comentados, destacados em amarelo na tabela(1) a seguir:

42

Tabela 1 – média de comentários por tema

Tema Média N de comentários

Campanha Eleitoral 35,42 1020

Político-institucional 20,15 136

Economia 18,79 42

Política Social 33,96 52

Infra-estrutura e meio ambiente 16,32 44

Violência e segurança 19,59 17

Ético-moral 55,02 222

Política para Esporte 0,00 2

Cultura_variedades 11,88 8

Política Estadual_Nacional 20,25 51

Política Internacional 4,71 21

Outros temas 24,66 83

Imagem política dos candidatos 26,25 271

Imagem pessoal dos candidatos 28,47 57

Imagem administrativa dos candidatos 16,00 45

Imagem do governo em disputa 34,83 24

Imagem da campanha e eleitores 24,53 89

Total 32,25 2184

Fonte: Núcleo de pesquisa em Comunicação Política e Opinião Pública

O tema “ético-moral” foi o que mais recebeu comentários, com uma média de

55,02 de repercussão, conforme mostra a tabela. Este tema é onde encaixam as

notícias que envolvem quaisquer juízos de valor, e por isso aborda assuntos mais

polêmicos, e sob esta constatação é bem possível que o grande aumento de

comentários no final das eleições derivado não só da proximidade com a tomada de

decisão, como também por ter sido o cenário de notícias mais polêmicas, que

chamam mais atenção do internauta.

Embora se verifique um aumento na participação proporcional ao tempo,

pensamos que ao transformar nossa variável escalar em ordinal, percebemos que

embora exista um total de comentários muito alto, eles estão distribuídos

desigualmente, quer dizer, a maior parte das postagens tem pouca participação,

chegando a não receber nenhum comentário, como mostra o gráfico (2):

43

Gráfico 2 – Porcentagens de comentários por nível de participação

Fonte: Núcleo de Comunicação Política e Opinião Pública

São uns e outros posts que possuem altos números de comentários que

acabam puxando uma tendência de muita participação, entretanto as maiores

porcentagens presentes no gráfico nos mostram que 49,5% comentam muito pouco,

tem baixo nível de comentários, não ultrapassando 10 comentários por notícias.

14,2% do total de notícias postadas em quatro meses não tiveram nenhuma

participação, trata-se de uma porcentagem bastante alta. Apenas 8,2%

correspondem a altos números de comentários. É bastante complicado neste

sentido, pensarmos que existe uma participação equilibrada e contínua, já que

aparentemente essa participação possui picos. O que explica essa alta participação

é, provavelmente, os temas polêmicos distribuídos ao longo do período eleitoral

onde a participação aumenta muito, e depois cai.

Durante a coleta de dados verificamos que algumas notícias eram compostas

apenas por texto, ou texto e imagem. Pensando em estratégias de visibilidade, será

44

que textos com imagens tiveram mais atenção entre os internautas na hora dos

comentários? Para testar essa hipótese, fizemos um gráfico(3) de barras simples

que mostra a média de comentários por formato, ou seja, postagens de texto e de

texto com imagem:

Gráfico 3 – média de comentários por formato

Fonte: Núcleo de Comunicação Política e Opnião Pública

O resultado obtido, conforme o gráfico 3, foi de que quando o texto possui

imagem a média de comentários é quase 5 vezes maior do que quando o formato é

apenas de texto, com 131 contra 27,7 comentários em textos com imagem e textos

sem imagens.

Assim, além de temas polêmicos chamarem mais a atenção dos internautas,

notícias com imagens também despertam mais interesse levando o leitor a participar

através dos comentários. Além disso, diferentemente dos meios de comunicação

tradicionais, a internet oferece a possibilidade de incluir links, que remete o leito à

um outro site, ou uma cobertura mais aprofundada acerca do que estão lendo, e isto

pode ter influência na distribuição dos comentários.

Para verificarmos essa distribuição fizemos um gráfico (4) em barras que nos

aponta que existe uma forte tendência de haver mais comentários em notícias com

links do que em notícias sem links. Embora seja uma relação otimista, a quantidade

45

de links oferecidos pelo site durante todo o período eleitoral foi muito baixa, então

por mais que haja uma tendência, os internautas não são suficientemente

favorecidos. Observe no gráfico 4:

Gráfico 4 – Média de comentários por notícias com e sem link

Fonte: Nucleo de Comunicação Política e Opinião Pública

Nossos principais resultados nos mostraram que podemos pensar em

algumas tendências de comportamento, pois ao relacionar o número de comentários

com outras variáveis, como tema, mês, texto com e sem imagem, presença de links,

vimos uma equação de forças, onde algumas variáveis levam a mais comentários do

que outras. Sendo assim, é possível traçar um padrão de comportamento da

participação, pois ela não segue uma distribuição arbitrária uma vez que quanto

mais próximo das eleições, maior a participação, ou, maior a participação em temas

ético moral, ou em textos com imagens ou em textos com links.

4.3. Análise dos comentários em relação aos candida tos

Nesta segunda parte mapeamos em que sentido se deu a distribuição de

comentários segundo o tratamento destes para com os candidatos. Começando por

46

valência, isto é, a que tipo de valor os candidatos estavam sendo associados. Estes

valores poderiam ser: positivo, negativo, neutro ou equilibrado. Dilma, como se vê na

tabela 2, esteve mais relacionada a valores negativos:

Tabela 2 – Frequência simples de valência para Dilma

Valência Frequência Percentual

Positiva 1123 6,6

Negativa 2378 13,9 Neutra 1549 9,1 Equilibrada 32 0,2

Total 5082 29,7 Ausência 12009 70,3

Total 17091 100,0

Fonte: Núcleo de Pesquisa em Comunicação Política e Opinião Pública

Isso significa, portanto, que entre todas as postagens em que o nome da

candidata Dilma esteve veiculado, a maior parte estava associada a uma opinião

negativa. Para identificar as valências como negativas, ou mesmo positivas, era

necessário que os comentários fizessem referências de valor explícitas, pois

nada pode ser interpretado pelo pesquisador, o que acaba gerando uma

tendência a caracterizar a valência como neutra, pois muitas vezes os

comentários eram ambíguos e sarcásticos e, portanto, não podiam ser

entendidos como crítica ou apoio, pois demandam certa interpretação que nem

sempre o usuário que está ali, lendo e discutindo compartilha. Um exemplo do

que seria um comentário de valência negativa para Dilma:

Comentado em: No 1º duelo, Dilma parte para ataque a Serra

11 de Outubro de 2010 | 12h39

No debate, revelou-se a candidata Dilma, com os olhos injetados, totalmente descontrolada, não ser digna de estar à frente da presidência. Portanto, o recado que todos daremos é; DILMA/PT NÃO votaremos NAO à descontrolada e inexperiente DILMA/PT.

Apesar do índice de valência neutra ser alto, ainda sim a maior parte dos

internautas não ficou em cima do muro e posicionou-se de forma clara, em

relação a candidata Dilma, ou mesmo em relação a Serra, já que o candidato

47

também obteve maior valência negativa:

Tabela 3 – Frequência simples de valência para Serra

Valência Frequência Percentual

Positiva 879 5,1

Negativa 2335 13,7 Neutra 1716 10,0 Equilibrada 46 0,3

Total 4976 29,1 Ausência 12115 70,9

Total 17091 100,0 Fonte: Núcleo de Pesquisa em Comunicação Política e Opinião Pública

Assim, embora a valência neutra também seja alta para Serra, com 34,5%

dos comentários, os usuários ao se posicionarem criticamente, mostram que o que

Marques (2008) apontava como uma das três motivações que levam os indivíduos a

participarem, a conveniência em tomar posição sem comprometer-se, uma vez que

sua privacidade está garantida, é, em certa medida, compreendida pelos

internautas. Em tempo, um exemplo de como seria um comentário de valência

negativa para Serra:

Comentado em: Presidente do PT discorda da avaliação de que Dilma estaria mais agressiva

15 de Outubro de 2010 | 23h21

Lendo alguns comentários neste post, fico surpreso com tamanha ignorância de muitos leitores!! Alguns acham que o Serra será um grande,... Realmente ele é grande mentiroso, estúpido, maquiavélico,.... Assistindo o programa eleitoral de hoje, 15/10/2010, vi que tudo que o Serra disse foi mentira. Só quem conhece e vivencia a Educação Pública do governo Serra sabe o quanto ele mente. Se mente descaradamente sobre a educação, deve mentir sobre tudo que fala.

Conforme as tabelas, a candidata Marina Silva foi a única em que as

valências positivas e negativas foram distribuídas mais uniformemente, ou seja, com

pouca diferença, embora a valência neutra ainda seja mais expressiva, como

também no caso dos candidatos Dilma e Serra.

Tabela 4 – Frequência simples de valência para Marina

48

Valência Frequência Percentual

Positiva 250 1,5

Negativa 227 1,3 Neutra 401 2,3

Equilibrada 21 0,1

Total 899 5,3 Ausência 16192 94,7

Total 17091 100,0

Fonte: Núcleo de Pesquisa em Comunicação Política e Opinião Pública

Com 27,8% de valência positiva, Marina foi a única candidata que obteve uma

porcentagem positiva que superou a negativa, entretanto, com 44,6% dos

comentários associando seu nome a valores neutros. Marina não teve uma

visibilidade muito significante, pois na maior parte do tempo em que as pessoas

vinculavam seu nome aos comentários, ele não expressava valores nem de

preferência e nem de rejeição.

As valências sofrem, no entanto, outro tipo de distribuição, isto é, além de

estarem associadas ao candidato, elas também estão associadas a um contexto

específico, o tipo de postagem, que, como vimos anteriormente, indica a que o

comentário está se referindo, que podem ser, de acordo com a tabela, relacionados

ao tema, ao portal, aos internautas, ao candidato, ao governo lula, a campanha e

outros. Ao total são 16 tipos de postagens, porém, desconsideramos na análise

todos que estiveram percentual válido abaixo de 0,5% porque são insignificantes em

termos de relevância.

Quando os comentários estão relacionados ao tema, entendemos que eles

fazem referência ao tema principal abordado pelo jornal, por exemplo, se a notícia

trata predominantemente de assuntos de política externa, e o comentarista se coloca

sobre o mesmo assunto, entendemos que sua participação está relacionado ao

tema. Ao relacionar-se com o portal significa que o comentarista está claramente se

direcionando ao Estadão.com, de alguma forma, seja por crítica ou em acordo com a

cobertura que o jornal oferece acerca de determinada questão, ou de outra forma

em que fique nítido que o usuário está se posicionando em relação ao jornal. Para

com os internautas a relação se dá no momento em que o comentarista se dirige a

49

outro usuário, ou a vários, onde, na maior parte das vezes eles citam os nomes dos

demais internautas, para que assim possam se corresponder. Já em relacionado aos

candidatos entendemos que há relação quando o usuário constrói seu comentário se

referindo à eles, independente do tema. Sempre que um comentarista baseia,

predominantemente, sua opinião em informações que remetem ao governo do então

presidente Lula, entendemos que sua participação está relacionada ao governo

deste. Quando o usuário se posiciona fazendo referência a campanha, ou seja, de

agenda dos candidatos, por exemplo, associamos seu comentário com relação à

campanha. E por fim, em outros coube tudo aquilo que não se encaixava em

nenhuma das categorias de tipo de postagem.

Como se pode observar através da tabela 4, que segue, de frequência

simples de tipo de post, é nítido que os tipos de postagens mais expressivos estão

relacionados aos candidatos, ao tema e aos internautas:

Tabela 5 – Frequência simples de tipo de postagem

Tipo Frequência Percentual

Relacionada ao tema 4111 24,1 Relacionada ao portal 202 1,2 Relacionado aos internautas 2587 15,1 Relacionado ao candidato 5117 29,9 Relacionado ao governo Lula 1600 9,4 Relacionado à campanha 351 2,1

Outros 3085 18,1

Total 171 100,0

Fonte: Núcleo de Comunicação Política e Opinião Pública

Em 29,9% dos comentários foi identificado relação com os candidatos. Entre

todos os tipos de postagens, este foi o que atingiu a porcentagem mais alta. A

inferência mais provável deste fenômeno se dá pelo contexto, pois entendido que no

período eleitoral há demanda por informação (Downs, 1999) para que as pessoas

possam formular a decisão do voto, é inegável que o assunto mais pertinente entre

elas sejam os candidatos. Downs afirma que quanto mais informações o eleitor

obtém, mais confiante sobre sua decisão ele estará, e por isso, supõe-se que os

internautas, afim da escolha, estejam atentos aos candidatos seja em suas atitudes,

50

suas declarações, sua agenda de campanha, afiliações e enfim, tudo que está

relacionado diretamente à ele.

Quando o comentário está relacionado ao candidato, o comentarista cita o

nome e procura direcionar sua fala como se estivesse, realmente, diante do

candidato, na maioria dos casos, como ilustra o exemplo:

Comentado em: Aécio e Marina lideram apostas para 2014

1 de Novembro de 2010 | 21h45

..... ESSA COITADA ... PERDEU A GRANDE CHANCE DE SUA VIDA.... ADEUS MARINA !!!!!!!!

O segundo tipo de postagem que mais ocorreu foi o relacionado ao tema, este

significa que os comentários estão lendo e especulando sobre as informações que o

portal disponibiliza, o que resolve, nesse caso, um problema apontado por Faria

(2012) de que a internet é uma fonte infinita de informações, no entanto, as pessoas

não tem a preocupação em ler e refletir, o que ele chama de “mais informação,

menos reflexão”, porém, com estes dados onde 24,1% dos comentários estão

relacionados ao tema, entendemos que os indivíduos não só acompanharam as

notícias do jornal, quanto refletiram e complementaram essas informações

articulando sua opinião através de comentários, por exemplo, diante de uma

postagem do portal, cujo tema era uma especulação de quem seriam os possíveis

candidatos das eleições de 2014, um comentarista disse:

Comentado em: Aécio e Marina lideram apostas para 2014

3 de Novembro de 2010 | 13h14

É muito cedo para fazer esse tipo de previsão... em quatro anos muito água ainda via rolar...Heloisa Helena, do PSOL é um exemplo...em 2006 foi muito bem votada e hoje quase não tem expressão a nível nacional e nem mesmo conseguiu se eleger Senadora...e aí?

Temos também os comentários relacionados aos internautas, que compreendem

15,1% das postagens dos usuários. Este dado é interessante, pois revela que os

usuários estabeleceram certo diálogo, que veremos adiante, e que demonstra que a

internet realmente cumpre o papel que Gomes (2009) aponto de romper as barreiras

de tempo e espaço, estabelecendo condições para diálogos simultâneos entre

muitas pessoas não importa onde estejam.

51

Contudo, o cruzamento entre estas duas variáveis que vimos podem gerar

novas possibilidades analíticas. Ao relacionar valência do candidato e tipo de

postagem podemos ver se o estabelecimento de valor aos candidatos varia de

acordo com cada tipo de postagem, pressupondo que uma vez que o comentarista

se posiciona em relação ao candidato ele estabelecerá um posicionamento mais

definido (positivo ou negativo), do que quando ele relaciona seu comentário com o

tema, por exemplo.

Como foi percebido através da tabela 5 o tipo de postagem mais recorrente

entre todos os comentários foram: relacionado ao tema, e relacionado ao candidato.

Portanto, para fazer o cruzamento das tabelas que seguem, foram considerados

apenas os percentuais que correspondem a este tipo de postagem, para oferecer ao

leitor um recorte mais claro da distribuição dos comentários, entendendo recorrência

como mais relevante distribuídos individualmente.

Tabela 6 Cruzamento Tipo de post x Valência

Tipo de post Valência Dilma Total Positiva negativa Neutra equilibrada

Relacionada ao tema 188 (18,5%)

351 (34,5%)

475 (46,7%)

4 (0,4%)

1018 (100%)

Relacionado ao candidato 622

(22,3%) 1548

(55,6%) 592

(21,3%) 23

(0,8%) 2785

(100%)

Total 1123

(22,1%) 2378

(46,8%) 1549

(30,5%) 32

(0,6%) 5082

(100%)

Fonte: Nucleo de Comunicação Política e Opinião Pública

Como podemos perceber, quando o comentarista se coloca em relação ao

tema os percentuais mais altos de valência são de neutralidade para Dilma, o que

pode significar que o sujeito central a ser tratado em cada comentário não é

necessariamente o candidato, ou mesmo que seja, não se tem como objetivo

estabelecer valor a ele, pois o contexto está mais associado ao tema o qual o jornal

está se referindo.

No entanto, ao olharmos para a valência quando esta está relacionada,

diretamente, ao candidato, sem dúvidas a valência negativa ganha mais

expressividade, aqui temos certeza de que há tomada de posicionamento, uma vez

52

que o tipo de postagem relacionado ao candidato, o assunto tratado é,

necessariamente, um dos três candidatos, neste caso, Dilma. Embora a valência de

Serra segue uma distribuição parecida, como demonstra a tabela 6:

Tabela 7 Cruzamentro Tipo de post x Valência

Tipo de post Valência Serra Total Positiva negativa neutra equilibrada

Relacionada ao tema 143

(14,4%) 313

(31,5%) 532

(53,5%) 6

(0,6%) 994

(100%)

Relacionado ao candidato 529 (18,5%)

1679 (58,6%)

625 (21,8%)

32 (1,1%)

2865 (100%)

Total 879

(17,7%) 2335

(46,9%) 1716

(34,5%) 46

(0,9%) 4976

(100%)

Fonte: Núcleo de Pesquisa em Comunicação Política e opinião Pública

Serra, ainda sim, obteve uma valência negativa bastante expressiva diante dos

outros percentuais. Quando o comentário era relacionado ao candidato, 58,6% dos

comentários explicitavam uma postura negativa para com o candidato, enquanto

que, em relacionado ao tema, prevalece a neutralidade, com 53,5%. A distribuição

das porcentagens segue muito parecida com a candidata Dilma e, portanto,

podemos afirmar que o eleitorado que comentava no portal não tinha uma

preferência explícita, a discussão esteve sempre bem divida entre os dois

candidatos, fosse ela a favor ou contra.

No caso do cruzamento relacionado a Marina, há certa diferença, pois, apesar

da valência neutra ser bem maior quando o post está relacionado ao tema, com

66,4%, como é também para os outros, o segundo índice mais alto está em valência

positiva, com 20,4% contra 11,8% de valência negativa, sendo que em Dilma e

Serra a segunda maior porcentagem era negativa. Isso pode estar associado a uma

cobertura menos crítica do jornal para com a candidata Marina Silva, implicando em

menos críticas, pois, de fato, a cobertura eleitoral do jornal Estadão, embora

estivesse mais polarizada entre Dilma e Serra, ao referir-se à Marina, manteve-se

mais positiva do que em relação aos demais.

53

Tabela 8 Cruzamento Tipo de Post x Valência

Tipo de post Valência Marina Total Positiva negativa neutra equilibrada

Relacionada ao tema 43 (20,4%)

25 (11,8%)

140 (66,4%)

3 (1,4%)

211 (100%)

Relacionado ao candidato 175

(30,8%) 189

(33,2%) 188

(33%) 17

(3%) 569

(100%)

Total 250 (27,8%)

227 (25,3%)

401 (44,6%)

21 (2,3%)

899 (100%)

Fonte: Núcleo de Pesquisa em Comunicação Política e Opinião Pública

Outro dado diferente no caso Marina é que, apesar da valência negativa

também predominar quando o comentário está relacionado ao candidato, em

comparação as outras valências a diferença é menor, o percentual está mais

nivelado, o que significa, de certa forma, que a Marina esteve sempre em um meio

termo, e não foi o principal sujeito dos comentários, nem para mostrar apoio, nem

para receber críticas. Isso é, a certo modo, um reflexo das pesquisas de intenção de

voto, que sempre apontavam Marina com 10% a 14%, enquanto Serra e Dilma,

respectivamente de 26% a 30% e 48% e 32%, de acordo com o caderno de eleições

do G1, no período de setembro.

Com tudo imaginamos, portanto, que a maior parte dos comentários foi de

crítica aos candidatos. Para verificar isso podemos analisar a tabela de frequência

simples do formato. Formato deriva de tipo de postagem. Por exemplo, um

comentário que está relacionado ao candidato pode possuir um formato de elogio ou

crítica, o tom predominante do comentário é o que define seu formato. Ao analisar a

tabela 8 confirmamos que 43% dos comentários foram construídos a bases de

crítica, isso sem contar as outras críticas referentes aos demais comentaristas, ao

governo em disputa e aos jornalistas ou imprensa.

Tabela 9 – Frequência simples de formato

Tema Frequência Percentual

Elogio a candidatos políticos 1035 6,1

54

Elogio ao governo em disputa 341 2,0

De campanha 251 1,5 Crítica aos demais comentaristas 1537 9,0 Crítica a candidatos ou políticos 7357 43,0 Crítica ao governo em disputa 1512 8,8 Crítica a outros jornalistas ou imprensa 592 3,5 Outro 4283 25,1

Total 17091 100,0

Fonte: Núcleo de Comunicação Política e Opinião Pública

O formato está sempre dividido entre elogio ou crítica a alguma coisa,

entretanto, alguns dados foram retirados da tabela, pois não alcançaram nem 0,5%,

por exemplo, elogio aos demais comentaristas. No final das contas 64,3% do total de

comentários produziu alguma espécie de crítica. Essa afirmação pode derivar duas

explicações: primeiro a de que na internet, com a segurança do anonimato, como

afirma Gomes (2009), os indivíduos podem se posicionar sem constrangimentos, e,

portanto imagina-se que os usuários estão se entregaram firmemente a uma

postura de crítica devido a liberdade de expressão, em contraponto não sabemos se

essa postura é crítica ao ponto de ser construtiva, pois demonstra que o individuo

está preocupado em questionar e em provocar discussão, ou se se resume a

afirmações de opinião irredutíveis e fechadas que provém de grupos fechados, os

quais Gomes (2009) mencionou, que fazem um uso da internet afim, apenas, de

reafirmar posicionamentos já tomados fora da web.

A única forma de discernir melhor sobre essa postura crítica é analisando as

variáveis mais relacionadas aos comentaristas do que aos candidatos, objetivo do

terceiro tópico. Ao olhar para a forma como eles se relacionam e em que termos de

conteúdo pode explicar se a participação deriva de todo um contexto de formular e

expressar opiniões (Dahl, 1997), ou é, de fato, reafirmações de um posicionamento

já estabelecido previamente.

4.3. Análise dos comentários em relação aos interna utas

55

Ao analisar os comentários e as relações estabelecidas entre si, sem a

preocupação de associar ao candidato, como foi o item anterior, podemos entender

um pouco mais sobre a forma como eles estão sendo construídos. Um dado

importante a ser destacado, para começar, é a de reflexividade. A reflexividade

significa que efeitos os comentários exercem uns nos outros, podendo ser de

persuasão, que se dá quando um usuário sente-se influenciado a responder a outros

comentários, mas que não significa necessariamente que está de acordo, por

exemplo:

Comentado em: Índio da Costa vota e diz que pesquisas estão erradas

31 de Outubro de 2010 | 10h35

BARBOSA???????????? O QUE VOCÊ ESTÁ QUERENDO DIZER

A reflexividade pode ser dar também de tipo progresso, onde há sempre uma

relação de acordo e continuidade do assunto, o usuário demonstra ter lido os demais

comentários e está se posicionando referente aquilo que leu, como mostra o

exemplo:

Comentado em: ‘Serra sai menor desta eleição’, diz Lula após

votar em São Bernardo do Campo

1 de Novembro de 2010 | 13h54

Pascoal, essa sua conta é muito boa, esclarecedora, pois, em

que ser números e números não mentem, nem podem ser

manipulados, por outro lado podem ser omitidos. É o que o

psdb-serra derrotado acrescido da tv globo e cia fazem,

objetivando enganar o povo. Mais à frente, em ato típico de

estelionatários, tem a coragem de falar que é outrem quem

mentem. Acusam Dilma de ser terrorista, mas omitem que havia

sido instaurado no País o Terrorismo de Estado, o qual Dilma

lutou. E os acusadores, simplesmente cairam fora do Brasil,

esperaram os que ficaram lutar para, depois, voltarem tranquilos

56

e seguros. Todavia, ao invés de reconhecer o mérito de quem

lutou, de reconhecer que lutou por eles, de forma egoista

querem o poder para continuar a venda do Brasil aqui e receber

la fora.

Como também um comentário pode demonstrar reflexividade através da

radicalização. Em radicalização os usuários demonstram que leem os comentários

uns dos outros, mas se posicionam de forma critica e fazendo oposição, por

exemplo:

Comentado em: Dilma vota em Porto Alegre acompanhada de Tarso Genro

31 de Outubro de 2010 | 13h15

Por favor bando de energúmenos. Shut the fuck up!!!

A variável reflexividade, podendo varias nestes três tipos, apresenta, portanto

a relação que os internautas mantém entre eles. A distribuição pode ser observada a

partir da tabela 10:

Tabela 10 – Frequência simples de Reflexividade

Tipo Frequência Percentual % Válido

Persuasão 1700 9,9 44,3% Progresso 743 4,3 19,3% Radicalização 1259 7,4 32,8% Outro 138 ,8 3,6%

Total 3840 22,5 100,0% Ausência 13251 77,5

Total 17091 100,0

Fonte: Núcleo de Comunicação Política e Opinião Pública

Como mostra a tabela, a reflexividade entre os comentários gerou mais efeito

de persuasão, do que de radicalização e progresso, isto é, 44,3% da participação

mostrou-se empenhado em ler e responder os demais comentários. O fato é que os

comentaristas sentiam-se persuadidos pelo que liam e isso os motivava a contribuir

para a discussão. Embora isso seja relativamente bom, pois aponta que as pessoas

57

estão interagindo de maneira positiva no sentido de mesmo que não estejam em

pleno acordo estão lendo e respondendo uns aos outros, fazendo bom uso das

ferramentas de interação que só são possíveis de tal forma pela internet, em

contraponto o segundo maior índice é o de radicalização, ou seja, 32,8% dos

comentários, embora estivessem mantendo uma relação de leitura e de

reflexividade, o formato da radicalização é sempre de rigidez e muitas vezes

ofensivos, que não contribui para a manutenção de uma interação plural.

No entanto, a reflexividade pode variar de acordo com o grau de relação

estabelecido entre os comentários. O grau de relação pode se dar em três níveis:

relacionado diretamente, relacionado indiretamente e não relacionado. Percebe-se

que um comentário está relacionado diretamente quando o autor escreve o nome de

alguém em específico para indicar que está tratando daquela pessoa, ou para ela,

por exemplo:

Comentado em: Dilma vota em Porto Alegre acompanhada de Tarso Genro

31 de Outubro de 2010 | 12h18

jocoso45 Parabéns! Voce disse as palavras que todos deveriam de ler, ouvir e guardar, pois do lulismo e da sanguinária guerrilheira, verme do demonio, vai trazer a desgraça a este Pais que era tão bom e vai se acabar por uma cadela raivosa dilma russef!

Relacionar-se indiretamente implica em relações menos explicitas e mais

gerais, falando para um todo, usando-se da terceira pessoa, ou subtendendo que

está respondendo a alguém, mesmo sem indicar um nome:

Comentado em: ‘Serra sai menor desta eleição’, diz Lula após votar em São Bernardo do Campo

31 de Outubro de 2010 | 13h13

Faltam 61 dias para deixarmos de ouvir as besteiras deste presidente de sindicato. Falta pouco vamos ter fé!!!

Enquanto que quando não há relação, percebe-se que o comentarista esta

mais preocupado com outros assuntos como tratar do candidato, ou expressar

alguma opinião sobre a noticia postada independente dos outros comentários.

Comentado em: Aécio e Marina lideram apostas para 2014

1 de Novembro de 2010 | 15h47

58

Aécio vai ter que largar o PSDB pra se candidatar, a Marina vem forte, mas nunca vai conseguir mais de 30%, e o Picolé de Chuchu não vai ter dó de sacrificar a agora moribunda carreira política do "querido companheiro" pra se lançar candidato.

Acreditamos que, em ultima instância, todos estavam persuadidos, pois

mantinham uma relação de ler e responder, mas pressupomos que um internauta ao

se direcionar especificamente a um outro, a relação deixava de ser de persuasão

para ser de ataque. Para verificar essa hipótese formulada a partir das impressões

da coleta de dados é necessário, portanto, cruzar as variáveis de reflexividade e de

relação, porém, primeiro veremos como foi a distribuição dos comentários ao

estabelecer relação entre si:

Tabela 11 – Frequência simples de relação

Tipo Frequência Percentual

Relacionado diretamente 2469 14,4

Relacionado indiretamente 1371 8,0 Não relacionado 13251 77,5

Total 17091 100,0

Fonte: Núcleo de Comunicação Política e Opinião Pública

Como podemos ver na tabela 10, 77,5% dos comentários não estabelecem

relação entre si, ou seja, quando vemos os indicativos de reflexividade, acredita-se

que há algum indicativo de um diálogo, ou seja, os comentários demonstram que

estão lendo uns aos outros e produzindo suas opiniões num sentido mais interativo,

entretanto, ao ver a tabela de frequência simples sob a distribuição da relação que

os comentários mantêm, podemos afirmar que os comentaristas, neste momento,

não estão interessados em interagir uns com os outros, portanto, mesmo que a

internet seja um canal potencializado do debate por oferecer mecanismos de

interatividade (Gomes, 2009) o principal ator dessa ferramenta, o usuário, não a

explora suficientemente (MAIA, 2011).

Entre os 22% restantes divididos em 14% que se relacionam diretamente, e

8% que se relacionam indiretamente, a pergunta que resta é: que tipo de

reflexividade eles mantém uns com os outros? Para responder a essa questão

cruzamos a reflexividade com a relação:

59

Tabela 12 - Relacionado aos demais comentaristas x reflexividade

Relação Total Direta Indireta

Reflexividade Persuasão 634 (25,7%)

1066 (77,8%)

1700 (44,3%)

Residual -13,9 18,6 Progresso 577

(23,4%) 166

(12,1%) 743

(19,3) Residual 4,5 -6,1

Radicalização 1134 (45,9%)

125 (9,1%)

1259 (32,8%)

Residual 11,4 -15,3 Outro 124

(5%) 14

(1%) 138

(3,6%)

Residual 3,7 -5,0

Total 2469

(100%) 1371

(100%) 3840

(100%) Fonte: Núcleo de Comunicação Política e Opinião Pública

Quando vimos anteriormente sobre reflexividade, entendemos que ela pode

se dar em três sentidos diferentes: de persuasão, progresso e radical, entretanto,

estas três variáveis só podem ser entendidas quando um usuário demonstra

claramente diálogo com outro. Neste caso, o que foi percebido através da

participação dos internautas é que os usuários ao se relacionarem diretamente ao

outro, estabeleceram uma relação maior de radicalização, com 45,9%, ou seja, de

crítica e de contestação.

Quando o comentário manteve relação indireta, ou seja, demonstra que está

lendo, mas não aponta tomes, a reflexividade se deu em termos de persuasão, ou

seja, quando os comentários foram mais assertivos eles tenderam a uma postura

mais crítica, mas quando estavam apenas rodeando os comentários uns dos outros,

participando de uma mesma conversa sem direcionar-se especificamente a alguém,

77,8 % o faziam com um caráter de persuasão, sentindo-se convidados a integrar a

conversar e trazer seu ponto de vista. Em nenhum momento, entre a relação direta

ou indireta, os comentários no sentido de progresso, ou seja, de acordo e

confirmação, alcançaram os maiores índices, ficando entre 12% a 23%.

Ainda sobre a distribuição da reflexividade nos comentários é sua relação

com o tempo, para verificar se, na medida em que a tomada de decisão se

60

aproximava, com o fim da campanha e a votação, alguma coisa mudou no

comportamento entre os comentaristas.

Tabela 13 – Cruzamento entre Reflexividade x Tempo

Mês do post

Total Julho Agosto Setembro Outubro

Reflexividade Persuasão 80 186 259 1161 1686 Progresso 99 252 253 138 742 Radicalização 92 187 294 680 1253 Outro 125 11 1 1 138

Total 396 636 807 1980 3819 Fonte: Núcleo de Pesquisa em Comunicação Política e Opinião Pública

De acordo com a tabela 13, de cruzamento entre o tempo, em meses, e a

reflexividade, percebe-se que essa foi crescendo entre as categorias de persuasão e

radicalização na medida em que se aproximavam as eleições, enquanto a relação

de progresso sofre uma queda. Isso mostra que há, visivelmente, alguma influencia

do tempo, pois os índices aumentam expressivamente em duas de três formatos da

reflexividade, o que nos faz pensar, contudo, que na medida em que a decisão do

voto deve ser definida, aumenta-se a busca por subsídios, e a vulnerabilidade dos

atores em aceitar e ouvir mais os outros para que construa e formule suas

preferências está baixa, pelo contrário, os atores têm, cada vez mais, suas opiniões

fortes, pois o processo decisório está perto, e, portanto, assumem uma postura de

radicalização, ou seja, irredutíveis ao outro, pois sua formação de opinião não está

em questão.

Os principais resultados deste capítulo apontam para algumas tendências ao

que corresponde a articulação dos comentários as demais variáveis analisadas.

Estes resultados seriam: O aumento da participação em relação ao tempo, quanto

mais se aproxima as eleições mais comentários são introduzidos no portal. A forte

relação entre comentários e o tema ético-moral, elevando a participação dos

usuários. O desiquilíbrio das postagens em relação ao nível de participação, que

indica que os comentários concentram-se em algumas notícias enquanto a maior

parte das postagens recebe poucos comentários. O aumento da porcentagem de

comentários em relação a textos com imagens contra notícias de textos, apenas,

61

assim como aumenta a participação através dos comentários em relação as

postagens com links frente as postagens sem.

Apesar dos índices de valência neutra serem bastante expressivos, ainda sim,

a maior parte dos internautas se posicionou de forma negativa, e, portanto,

assertivos em relação a sua postura. Porém, ao ver a valência em relação ao tipo de

postagem uma nova distribuição é sugerida, onde, neste caso, quando os

internautas se dispõem a falar dos candidatos, suas opiniões tendem a ser mais

negativas, do que quando o comentário está relacionado a outro tipo de postagem,

como tema, por exemplo. Ao analisar estes comentários sob a categoria formato,

vimos que a maior parte deles fazem críticas a algo ou alguém, o portal, candidatos,

e internautas.

Entre as três possibilidades de se gerar reflexividade (de persuasão, progresso e

radicalização) os dados mostram que os maiores índices foram de comentários que

se demonstraram persuadidos uns pelos outros na medida em que respondiam e

aparentavam estar lendo e articulando suas opiniões de acordo com os demais.

Porém, a reflexividade, de acordo com o grau de relação estabelecidos entre os

comentários revelam que ao passo que os internautas se relacionavam diretamente

uns com os outros, a reflexividade se expressa predominantemente como de

radicalização, ou seja, de oposição. E, por último, quando colocamos reflexividade

frente ao tempo, vemos que quanto mais perto da tomada de decisão, o voto, mais

fechados estão os comentaristas entre si, mantendo-os com uma postura de

radicalização.

62

5. Considerações Finais

Ao trabalhar com a hipótese de que os usuários não estariam promovendo

formas de participação política, onde os comentários se constituiriam como um

mecanismo de participação verificamos que a hipótese está confirmada. Com esta

constatação vimos que a resposta que se formula para a questão proposta na

introdução: como se dá a participação dos eleitores/web eleitores do estadão no

debate a partir da cobertura dos candidatos à presidência em 2010 é a de que diante

das perspectivas que a internet oferece (Gomes 2009), os internautas ainda não

demonstram um comportamento produtivo, no sentido de um bom uso das

ferramentas, pois os comentários foram, em grande parte, uma oportunidade de

manifestação de uma opinião previamente definida, pois a interação entre os

usuários não os comoveu a trocar muitas ideias e relativizar as preferências,

estabelecendo um diálogo. As tentativas de interatividade entre os comentaristas

foram insignificantes, na medida em que, quanto mais os eleitores direcionavam sua

fala a alguém, mais o faziam em relação a criticar, pois vimos que, 77,5% dos

comentários não estabelecem relação entre si, e entre os 14,4% que se relacionam

diretamente, 45,9% eram de reflexividade de radicalização, ou seja, de crítica.

De certa forma, esta postura rígida de expor críticas, não só em relação entre

os internautas, mas para com os candidatos, também, compreende a falta de

constrangimentos ofertada pela internet de posicionar-se sem assumir

responsabilidades, aí sim, neste sentido, os comentaristas estariam de fato se

expressando livre de sujeições, já que, ao relacionarem-se diretamente aos

candidatos, as valências negativas para Dilma e Serra, foram, respectivamente,

55,6% e 58,6%. Ao analisar o formato do comentário, 64,3% do total de comentários

produziu alguma espécie de crítica.

Outra consideração é a de os comentários foram pouco plurais ao passo em

que polarizam sua participação entre temas polêmicos de ético-moral, que

compreendeu uma média de 55,2 de comentários destinado a este tema, a mais alta

entre 17 categorias, e, desta forma não exploram suficientemente outros tema.

Também foram pouco plurais na medida em que concentram os comentários em

determinados momentos, e não ao longo de todo o período de campanha eleitoral,

pois 49,5% comentam muito pouco, não ultrapassando 10 comentários por notícias,

63

enquanto 14,2% do total de notícias postadas em quatro meses não tiveram

nenhuma participação, e que, apenas 8,2% correspondem a altos números de

comentários. Porém, em relação ao tempo, os usuários demonstraram uma forte

relação de comprometimento, na medida em que as porcentagens de comentários

aumentam proporcionalmente a proximidade das eleições, como expressa o dado de

crescimento de um 27,6% comentários de julho para outubro.

Por fim, a importância deste trabalho se resume na proposição de um

problema, que é de avaliar como tem se dado a participação nos contextos eleitorais

e de internet. Este problema tem sido objeto de muitos trabalhos empíricos, e que

chegam sempre na mesma conclusão de que continua sendo importante avaliar

cada caso e suas particularidades, pois estamos diante de um arranjo que trás

novas configurações muito rápidas e, portanto demandam futuras pesquisas.

64

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SCHUMPETER, J. Capitalismo, socialismo, democracia. Rio de Janeiro: Fundo de Cultura, 1961

SILVA, Sivaldo Pereira da. Participação Política e Internet : propondo uma análise teórico metodológica a partir de quatro conglomerados de fatores. 2006.

WARREN, Isle Scherer-. Redes Sociais, Internet e Práticas Políticas . Redes sociais na sociedade de informação. Editora UFMG. 2006.

WIRTH, Louis. O Urbanismo como modo de vida . In: VELHO, Otávio G. (org.). O Fenômeno urbano. Rio de Janeiro: ed. Guanabara. 1987.

ALVERGA, Carlos Frederico Rubino Polari de. Democracia Representativa e Democracia Participativa no Pensamento Político de Locke e Rousseau . Brasília, UnB. 2003.

SANTOS, Reinaldo do. Mídia, Democracia e participação efetiva . Liberdade, igualdade e participação política. 2009.

MARQUES, Francisco Paulo Jamil. Eleiçoes online. 2008. PANKE, Luciana; SERPA, Marcelo. (Org.)C742 Comunicação Eleitoral : conceitos e estudos sobre as eleições presidenciais de 2010 / Luciana Panke e Marcelo Serpa (organizadores). Coleção Voto Hoje. Rio de Janeiro : Instituto CPMS Comunicação, 2011. VEIGA, Luciana. Em busca de razões para o voto : O uso que o homem comum faz do horário eleitoral. Rio de Janeiro. 2001

66

WOLTTON, Dominique. Internet, e depois? Uma teoria crítica das novas mídias.

ANEXO 1

Livro de Códigos para o Portal DE CONTEÚDO – PORTAIS DE JORNAIS/2010

Núcleo de Pesquisa em Mídia, Política e Atores Sociais – UEPG Grupo de Pesquisa em Comunicação, Política e Opinião Pública - UFPR

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DESCRIÇÃO DAS POSTAGENS: (para cada postagem) DATA JORNAL 1 – Título completo da Postagem (copiar título da postagem) 2 - tipo de postagem (forma predominante)

1 - texto 2 – texto e imagem

3 3 – autoria (nome do autor) 4 – tipo de fonte predominante (indicar o que é descrito no post):

1 - Partidos/Coligações 2 – Instituições de Estado 3 – Especialistas 4 – Cidadão Individualizado 5 - Agência de notícias/jornalista 6 – Outro

5 – tema: CÓDIGO TEMA

1 Campanha Eleitoral 2 Político-institucional 3 Economia 4 Política Social 5 Infra-estrutura e meio ambiente 6 Violência e segurança 7 Ético-moral 8 Política para Esporte 9 Cultura/variedades

10 Política Estadual/Nacional 11 Política Internacional 12 Outros temas 13 Imagem política dos candidatos 14 Imagem pessoal dos candidatos 15 Imagem administrativa dos 16 Imagem do governo em disputa 17 Imagem da campanha e eleitores

6 – Enquadramento

1 – corrida de cavalos – avanços em pesquisas 2 – personalista – descrição de personalidade de quem esta sendo tratado 3 – temático – padrões interpretativos 4 – episódico – relato simplificado

7 – Visibilidade dos candidatos no título (1 = presença; 0 = ausência)

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8 - Visibilidade dos candidatos no texto (número de citações) 9 – valência do candidato na postagem

1 - positiva 2 - negativa 3 – neutra 4 – equilibrada

10 – Formato predominante 1 - informação (só informativo) 2 - interpretação (avaliações além da informação, sem declarar posição explícita) 3 - opinião (predomina uma declaração explícita de um posicionamento) 11 – Presença de hiperlinks

1 – Sim 2 – Não

12 – Número de hiperlinks no texto (total de hiperlinks apresentados no post) 13 – Hiperlinks presentes no texto (reproduzir todos os hiperlinks apresentados no texto – o objetivo é permitir, depois, a identificação da página linkada para saber se gera diversificação mesmo ou se remete apenas aos meios tradicionais). 14 – número de comentários (número de pessoas que comentaram a postagem em determinado na primeira semana do post). 15 – OBSERVAÇÕES

ANEXO 2

DESCRIÇÃO DOS COMENTÁRIOS: (informações coletadas para cada comentário)

1 – Portal 2 – Data

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3 – Título da postagem (título da postagem a que se refere o comentário) 4 – Título do comentário 5 – Autor do comentário (se for anônimo é vazio) 6 – Número do comentário (sequencial por ordem de aparição na página) 7 – tipo de comentários

1 – relacionada ao tema 2 – relacionada ao jornalista 3 – relacionada ao portal 4 – relacionado aos internautas 5 – relacionado ao candidato 6 _ relacionado ao governo Lula

7 – relacionado a campanha 8 – outros 8 - valência dos comentários PARA CADA CANDIDATO

1 – positiva 2 – negativa 3 – neutra 4 - equilibrada

9 – formato dos comentários (presença e predominância)

1 – elogio à pessoa do jornalista 2 – elogio à posição política do jornalista 3 – elogio à posição do jornalista sobre o tema 4 – elogio aos demais comentaristas. 5 – elogio a candidatos/políticos 6 – elogio ao governo em disputa 7 – elogio a outros jornalistas ou imprensa. 8 – de campanha 9 – crítica à pessoa do jornalista 10 – crítica à posição política do jornalista 11 – crítica à posição do jornalista sobre o tema 12 – crítica aos demais comentaristas. 13 – crítica a candidatos/políticos 14 – crítica ao governo em disputa 15 – crítica a outros jornalistas ou imprensa. 16 – outros

10 – Relacionado com demais comentários 1 totalmente relacionado 2 relacionado indiretamente 3 não relacionado REFERÊNCIA:Participação e deliberação na internet: Um estudo de caso do Orçamento Participativo Digital de Belo Horizonte. “Tematização e críticas racionais de pretensões de validade

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O primeiro critério proposto para se mensurar o grau de deliberatividade é chamado de “Tematização e críticas racionais de pretensões de validade” (DAHLBERG, 2002). O objetivo é entender se as posições estão sendo apresentadas e se são debatidas criticamente. Os argumentos dos participantes, no ideal deliberacionista, devem ser apoiados por razões. Inicialmente, é avaliada a Reciprocidade (1), ou seja, se os usuários demonstram estar lendo as mensagens e respondendo a elas. É um nível mais elementar, que não exige elaboração da réplica, mas apenas o ato de responder a outro usuário ou ao assunto em pauta. As mensagens que não apresentarem respostas serão classificadas como Monológicas (2).” Pg.11

12 – REFLEXIVIDADE 1- persuasão; 2- progresso; 3- radicalização; 4- outro

REFERENCIA: “Segundo Jensen (2003), a reflexividade pode ser avaliada de três formas. Persuasão (6), quando há sinais explícitos de que um usuário se sente persuadido pela argumentação de outro participante ou pela discussão no geral. Progresso (7), quando um usuário reflete sobre outra postagem, responde com novos argumentos ou informações ou, mesmo, tenta criar uma síntese dos argumentos. Ou Radicalização (8), quando o usuário reage negativamente à outra postagem e radicaliza seu ponto de vista anterior, não estando aberto a outras possibilidades. Em nosso critério, uma mensagem só poderia ser considerada como reflexiva se ela também apresentar reciprocidade” Pg. 13 11. Qual a justificativa 1 , justificativa externa. 2, justificativa interna. 3, posição 4 outro REFERENCIA: “Depois, é avaliada a justificativa, ou seja, se os participantes estão apresentando razões para apoiar seus argumentos. Jensen (2003) apresenta três possibilidades de justificação: a Justificação Externa (3) é aquela em que o usuário se utiliza de fontes externas para manter seu argumento, sejam fatos, dados, notícias etc. A Justificativa Interna (4) é baseada no próprio ponto de vista do usuário, que utiliza explicitamente seus padrões e valores e histórico pessoal (testemunho) para apoiar seu argumento Finalmente, Jensen (2003) afirma que é possível ter uma alegação, ou seja, a pessoa afirma sua posição, mas não apresenta sua justificativa ou algum fato, o que chamaremos, simplesmente, de Posição”

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13 – Presença de hiperlinks nos comentários (1 – Sim; 0 – Não) 14 – Número de hiperlinks em cada comentário (total de apresentado no comentário) 15– Hiperlinks no comentário (reproduzir todos os hiperlinks apresentados no comentário para permitir a identificação da página linkada e saber se gera diversificação mesmo ou se remete apenas aos meios tradicionais). 16 – OBSERVAÇÕES