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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ
INSTITUTO DE TECNOLOGIA DA UFPA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENGENHARIA CIVIL
MESTRADO ACADÊMICO EM ENGENHARIA CIVIL
RAFAEL CALDEIRA MAGALHÃES
CENÁRIOS ESTRATÉGICOS EM RECURSOS HÍDRICOS:
Estudo da bacia do rio Ararandeua.
Belém-PA, Maio de 2009
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RAFAEL CALDEIRA MAGALHÃES
CENÁRIOS ESTRATÉGICOS EM RECURSOS HÍDRICOS:
Estudo da bacia do rio Ararandeua.
Dissertação aprovada no Programa de Pós-Graduação em Engenharia Civil, do Instituto Tecnológico da Universidade Federal do Pará, na obtenção do título de Mestre em Engenharia Civil.
Orientadora: Profª. Drª. Ana Rosa Baganha Barp
Belém-PA, Maio de 2009
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Dados Internacionais de Catalogação-na-Publicação (CIP) Biblioteca Central da Universidade Federal do Pará, Belém-PA
Magalhães, Rafael Caldeira, 1981-
Cenários estratégicos em recursos hídricos: estudo da bacia do rio
Ararandeua/ Rafael Caldeira Magalhães; orientadora, Ana Rosa
Baganha Barp. — 2009.
Dissertação (Mestrado) - Universidade Federal do Pará, Instituto de Tecnologia, Programa de Pós-Graduação em Engenharia Civil, Belém, 2009.
1. Recursos hídricos 2. Ararandeua, Rio, Bacia (PA). I. Título.
CDD - 22. ed. 333.91
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RAFAEL CALDEIRA MAGALHÃES
CENÁRIOS ESTRATÉGICOS EM RECURSOS HÍDRICOS:
Estudo da bacia do rio Ararandeua.
Dissertação aprovada no Programa de Pós-Graduação em Engenharia Civil, do Instituto Tecnológico da Universidade Federal do Pará, na obtenção do título de Mestre em Engenharia Civil.
Aprovado em 13 / 05 / 2009.
BANCA EXAMINADORA
___________________________________________________________________
Profª. Drª. Ana Rosa Baganha Barp (Orientadora) UFPA – FAESA
___________________________________________________________________
Profº.Dr. Lindemberg Lima Fernandes UFPA – FAESA
___________________________________________________________________
Profº. Dr. Durbens Martins Nascimento UFPA – NAEA
5
AGRADECIMENTOS
Agradeço primeiramente a Deus, pela proteção e companhia; À minha família, minha esposa Alci, meus filhos, Daniel e Débora, carinhosamente Dan Dan e Dedé, assim como minha mãe Rosa e meu pai Magalhães; À minha orientadora, professora, incentivadora Ana Rosa Baganha Barp. A convivência nesses anos enriqueceu muito a minha vida; Aos amigos e professores do Grupo de Pesquisa em Recursos Hídricos da Amazônia, principalmente Francisco Cacela pela parceria na pesquisa e no trabalho cotidiano, Aline Louzada pelo incentivo e amizade e ao profº Lindemberg Fernandes pelos diálogos científicos, acompanhamento e participação na banca; Aos moradores, lideranças e instituições de Rondon do Pará pelo apoio no trabalho de campo; Aos colegas da ong Argonautas Ambientalistas da Amazônia; Aos colegas da Paróquia Evangélica de Confissão Luterana; À CAPES – Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior, pelo apoio financeiro da bolsa de mestrado durante o período regular do curso; Ao CNPq – Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, especialmente aos Fundos Setoriais de Recursos Hídricos e Agronegócio pelo apoio financeiro do Projeto Água e Cidadania em Rondon do Pará;
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RESUMO
CENÁRIOS ESTRATÉGICOS EM RECURSOS HÍDRICOS: Estudo da bacia do rio Ararandeua.
A questão central desta pesquisa é investigar a teoria e metodologia de
criação e simulação de cenários estratégicos dos recursos hídricos em bacia hidrográfica. Esta teoria está baseada em três elementos da álgebra linear, sendo as teorias de matrizes, dos grafos e dos jogos. A integração de tais teorias foi utilizada através de métodos de análise estrutural, análise de atores sociais e análise morfológica, voltados para o planejamento e gestão da água. Para facilitar a compreensão, a modelagem computacional trouxe contribuições importantes através de três softwares: MICMAC (matriz de impacto cruzado-multiplicação aplicado à classificação), MACTOR (atores, objetivos e relações de força) e MORPHOL (matriz morfológica). A área de estudo é a bacia hidrográfica do Rio Ararandeua, caracterizada predominantemente pela prática do desmatamento na Amazônia brasileira, com grande incidência de conflitos pelo uso da água. Este trabalho demonstra a necessidade de que o planejamento do uso da água deve considerar as dinâmicas sociais, econômicas e ambientais do território na visão de desenvolvimento sustentável. A partir do trabalho de campo realizado no âmbito da pesquisa, foi possível criar e simular os cenários da bacia do Rio Ararandeua. Entre os cenários criados, destacam-se duas alternativas de gestão de recursos hídricos: o cenário sustentável e o cenário tendencial de exploração de recursos naturais. O cenário estratégico escolhido para orientar o planejamento da bacia foi o cenário sustentável, no qual os setores produtivos estão mais conscientes da responsabilidade de recuperação da bacia como forma de diversificar a produção. No meio urbano, a análise mostrou a necessidade de investimentos em saneamento para diminuir os impactos como erosão, sedimentação e destinação inadequada de resíduos sólidos e efluentes domésticos e industriais nos córregos. Neste caso, há a necessidade de consolidar o sistema de gerenciamento de recursos hídricos na região para possibilitar uma ruptura no modelo de gestão ambiental e hídrica. A principal contribuição deste trabalho é de orientar o processo decisório dos investimentos públicos e privados em recursos hídricos em bacias hidrográficas. Palavras-chave: cenários, bacia hidrográfica, gestão da água e sustentabilidade.
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ABSTRACT STRATEGIC SCENARIOS IN WATER: study of the Ararandeua River basin.
The central question in this survey is to investigate the theory and methodology of creation and simulation strategic scenarios of water resources in basin. This theory is based on three elements of linear algebra: matrices, graph and games theory. The integration was used by methods of structural, of social actors and morphological analysis for planning and water management. To facilitate the understanding, the simulation brought important contributions through three software: MICMAC (matrix of impact Cross - multiplication applied to the classification), MACTOR (actors, objectives and ratios) and MORPHOL (morphological matrix). The field of study is the river basin Ararandeua, characterized by predominantly practice deforestation in the Amazon, with high incidence of conflicts by use of water. The work demonstrates the need for water use planning should consider the dynamic social, economic and environmental territory on the vision of sustainable development. From the field work carried out under the search could create and simulate scenarios river basin Ararandeua. Between scenarios created are two alternative for management of water resources: the scenario sustainable and scenario trend of exploitation of natural resources. The scenario strategic of basin planning was sustainable, in which sectors are more aware of the responsibility of recovery basin as a way to diversify production. In urban areas, the analysis has shown that investments in sanitation to reduce the impacts as erosion, sedimentation and appropriation of inadequate solid waste and household and industrial effluent streams. In this case, there is the need to consolidate the system of water resource management in the region to enable a break in the model of environmental management and water. The main contribution of this work is to guide the decision-making process of public and private investment in water resources in river basins.
Key-words: scenarios, river basin, water management and sustainability.
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LISTAS DE ILUSTRAÇÕES
LISTA DE FIGURAS página
FIGURA 1 Exploração do futuro em cenários múltiplos 40
FIGURA 2 Método de construção de cenários descrito por Godet 47
FIGURA 3 Produto cartesiano linear da análise estrutural 50
FIGURA 4 Grafos de relações de causa-efeito 51
FIGURA 5 Exemplo de grafos de influência direta 53
FIGURA 6 Diagrama de classificação das variáveis 60
FIGURA 7 Diagrama de influência-dependência dos atores 62
FIGURA 8 Espaço morfológico 65
FIGURA 9 Representação lógica do processo de construção de cenários em recursos hídricos
67
FIGURA 10 Resultado da análise morfológica realizada no âmbito da elaboração do Plano Nacional de Recursos Hídricos
69
FIGURA 11 Localização da bacia do rio Ararandeua no Estado do Pará – Brasil
70
FIGURA 12 Localização da Bacia do Rio Ararandeua: (A) Divisão Hidrográfica Nacional; (B) Localização da Região Hidrográfica Atlântico Nordeste Ocidental com as sub-divisões; (C) Bacia Hidrográfica do Rio Ararandeua localizada na sub-bacia 31; e (D) Bacia do Rio Ararandeua.
71
FIGURA 13 Mapa da Região Hidrográfica Costa Atlântica-Nordeste 71
FIGURA 14 Representação gráfica da Bacia Hidrográfica do Rio Ararandeua
72
FIGURA 15 Principais afluentes do rio Ararandeua 73
FIGURA 16 Localização de Rondon do Pará 74
FIGURA 17 Arco do Desmatamento na Amazônia e localização do Município de Rondon do Pará
90
FIGURA 18 Evolução do desflorestamento no município de Rondon do Pará (PA) para os anos de 1992, 1997, 2000, 2002, e 2004 e a localização das áreas de carvoejamento
91
FIGURA 19 Estrutura de construção de cenários adotados nesta pesquisa 94
FIGURA 20 Matriz de influência direta e indireta das variáveis do sistema 97
FIGURA 21 Mapa de influência direta e dependência 98
FIGURA 22 Gráfico de forte influência entre as variáveis com apenas 30% das relações em ordem de importância para o sistema
99
FIGURA 23 Gráfico de forte e relativa influência indireta 100
FIGURA 24 Mapa de influência e dependência entre os atores sociais 105
FIGURA 25 Histograma de competitividade entre atores da bacia 105
FIGURA 26 Gráfico de convergência entre os atores sociais da bacia 106
FIGURA 27 Mapa de distância entre objetivos 107
FIGURA 28 Balança entre atores e objetivo de crescimento econômico 107
FIGURA 29 Balança entre atores e objetivo de promoção de turismo 108
FIGURA 30 Balança entre atores e objetivo de organização social 108
FIGURA 31 Gráfico de distância entre os objetivos 109
FIGURA 32 Mapa de escala de distância entre os atores sociais. 110
FIGURA 33 Espaço morfológico com preferências e restrições do cenário estratégico sustentável
112
9
FIGURA 34 Espaço morfológico com preferências e restrições do cenário tendencial negativo
113
LISTA DE QUADROS
QUADRO 1 Comparação dos Períodos de desenvolvimento dos recursos hídricos
16-17
QUADRO 2 Classificação de ações de gestão no âmbito de bacias hidrográficas
29
LISTA DE FOTOGRAFIAS
FOTO 1 Exemplo comum de queimadas e desmatamento na bacia do rio Ararandeua
76
FOTO 2 Imagem de desflorestamento na bacia do rio Ararandeua 77
FOTO 3 Indústria de mineração na bacia do rio Ararandeua 78
FOTO 4 Processo de extração mineral na bacia do rio Ararandeua 78
FOTO 5 Processos erosivos na área urbana da bacia do rio Ararandeua
79
FOTO 6 Uso industrial da água no laticínio 80
FOTO 7 Uso da água para produção agrícola 80
FOTO 8 Uso da água para atividade de piscicultura 80
FOTO 9 Comunidade que utiliza a água para o consumo doméstico 81
FOTO 10 Disposição inadequada de resíduos sólidos na área urbana 81
FOTO 11 Problemas na rede de drenagem de água pluviais na área urbana
82
FOTO 12 Despejo inadequado de efluentes industriais (matadouro) na área urbana
82
FOTO 13 Balneário da cidade de Rondon do Pará 82
FOTO 14 Utilização do rio Ararandeua para atividade de lazer 83
FOTO 15 Atividade de carvoarias na bacia 83
FOTO 16 Degradação ambiental devido efluentes domésticos no rio Ararandeua
86
FOTO 17 Fornos destinados a carbonização de biomassa originária de floresta primaria em Rondon do Pará
90
LISTA DE TABELAS
TABELA 1 Relação entre as Metas do Milênio e a gestão da água 24
TABELA 2 Matriz de análise estrutural com elementos genéricos 50
TABELA 3 Matriz de exemplificação da teoria dos jogos 56
TABELA 4 Relação entre variáveis da análise estrutura 59
TABELA 5 Municípios Integrados à Bacia Hidrográfica do Rio Ararandeua
72
TABELA 6 Principais produtos da extração vegetal do município de Rondon do Pará (PA)
88
TABELA 7 Principais produtos da extração vegetal do município de Rondon do Pará (PA)
89
TABELA 8 Principais produtos da extração vegetal do município de Rondon do Pará (PA)
89
TABELA 9 Principais Rebanhos Existentes 2001-2005 em Rondon do Pará (PA)
89
10
TABELA 10 Representação das variáveis do sistema estudado. 96
TABELA 11 Somatória de linha e colunas para cada variável 97
TABELA 12 Rank das variáveis de maior influenciação 101
TABELA 13 Rank das variáveis de maior dependência 101
TABELA 14 Descrição dos atores sociais da bacia 103
TABELA 15 Descrição dos objetivos dos atores da bacia 104
TABELA 16 Matriz de interação entre atores e objetivos 104
TABELA 17 Definição do espaço morfológico 111
11
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO.......................................................................................................12 Delimitação da pesquisa 14
Capítulo I – Gestão Integrada de Recursos Hídricos 21
1.1 - A interface da gestão da água e o desenvolvimento sustentável...........21
1.2 - A bacia hidrográfica: elemento de integração e gestão...........................26
1.3 - Aspectos legais e institucionais da gestão dos recursos hídricos.........30
1.4 - O plano de bacia hidrográfica.....................................................................33
Capítulo II – Prospectiva Estratégica e construção de cenários.................... 37
2.1 - Diferenças entre planejamento, prospectiva e estratégia........................37
2.2 - Elementos teórico-metodológicos..............................................................40
2.3 - Teorias Matemáticas aplicada à construção de cenários.........................47
2.3.1 - Teoria das Matrizes............................................................................... 47
2.3.2 - Teoria dos Grafos...................................................................................51
2.3.3 - Teoria dos Jogos....................................................................................55
2.4 - Metodologias informacionais de apoio à construção de cenários..........57
2.5 - Exemplo do Plano Nacional de Recursos Hídricos...................................65
Capítulo III – Estudo da bacia hidrográfica do rio Ararandeua........................70
3.1 - Localização Geográfica................................................................................70
3.2 - Características Socioambientais......................................................... ......74
3.3 - Atividades Econômicas...............................................................................88
Capítulo IV – Construção dos Cenários de recursos hídricos da bacia.........92
4.1 – Análise Estrutural........................................................................................95
4.2 – Análise dos Atores Sociais.......................................................................101
4.3 – Análise Morfológica e Cenário Estratégico da Bacia.............................110
Capítulo V – Considerações Finais...................................................................116
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 125
12
Introdução
A gestão integrada de bacias hidrográficas, em particular a gestão da água,
se sustenta especialmente na capacidade das organizações públicas e privadas de
tomar decisões e desenhar estratégias para alcançar objetivos pré-determinados por
e para um grupo relativamente grande de atores que dependem e compartilham um
mesmo recurso e território. As decisões do grupo de gestão, materializadas em
estratégias de ação, se apresentam na forma de planos.
Os planos de recursos hídricos de uma bacia hidrográfica se formulam tendo
como marco regulatório a Lei nº. 9.433/97 que é a Política Nacional de Recursos
Hídricos, estabelece que tais planos visam fundamentar e orientar a implementação
da política e o gerenciamento dos recursos hídricos.
O reconhecimento e a avaliação dos principais problemas referentes à água
que afetam a sociedade e sua relação com os recursos naturais podem resultar em
uma ação gradual e progressiva focalizada no planejamento, gestão e
desenvolvimento sustentável de recursos hídricos.
A questão central desta pesquisa é investigar o planejamento estratégico de
bacia hidrográfica, tendo como base a teoria preconizada por Godet (1993) de
construção de cenários prospectivos, e o método de análise estratégica,
materializadas através dos instrumentos computacionais: os softwares MICMAC,
MACTOR e MORPHOL© (LIPSOR, 2004), que simulam a interação entre as
variáveis e tendências do planejamento num território.
Pretende-se contribuir com a implementação dos instrumentos da gestão de
recursos hídricos, no âmbito de bacia hidrográfica e com isso avaliar a efetividade de
utilização dessas técnicas aplicadas às dinâmicas sociais, econômicas, ambientais e
territoriais da bacia hidrográfica do rio Ararandeua, que foi a área estudada.
Nesta pesquisa priorizou-se utilizar como elemento de modelagem e
simulação, a análise matemática da teoria das matrizes, teoria dos grafos e teoria
dos jogos, que trata do desenvolvimento e da aplicação da prática de métodos que
permitam descobrir e analisar as inter-relações estruturais e morfológicas entre
13
objetos, fenômenos ou conceitos e explorar os resultados obtidos na constituição de
realidades plausíveis.
A área de estudo da pesquisa é a Bacia Hidrográfica do Rio Ararandeua, que
é um território com característica predominantemente amazônica. Localiza-se na
região sudeste do Estado do Pará, fazendo parte da Região Hidrográfica Costa
Atlântica - Nordeste, conforme divisão estadual do Pará; e da Região Hidrográfica
Atlântico Nordeste Ocidental, segundo divisão federal definida pelo Conselho
Nacional de Recursos Hídricos - Resolução do CNRH nº 32, de 15 de outubro de
2003. Com uma área total 10.742,62 km², desta 95,22 % estão no Estado do Pará e
4,78% no Estado do Maranhão.
O município de Rondon do Pará reúne os principais elementos dentro do
contexto da bacia hidrográfica do Rio Ararandeua que possibilitam o
estabelecimento de análises consistentes para a construção de cenários
estratégicos em recursos hídricos. A Lei das Águas é clara e objetiva na definição
das diretrizes gerais de ação, às quais se referem à indispensável integração da
gestão da águas com a gestão ambiental. Com isso, fortalece-se o princípio da
gestão integrada entre duas políticas públicas, sendo a bacia hidrográfica do Rio
Ararandeua como lócus de estudo da política de recursos hídricos e o município de
Rondon do Pará, como lócus para a política ambiental.
O estudo da Bacia Hidrográfica do Rio Ararandeua justifica-se por duas
razões: é uma região que possui um dos maiores índices de desmatamento em todo
território brasileiro; e se encontra a sede administrativa do Município de Rondon do
Pará, o que possibilitou atribuir uma escala político-administrativo necessária para
agregar dimensões econômicas, sociais e ambientais.
A economia local do município de Rondon do Pará é sustentada basicamente
pela indústria extrativa de madeira e pela pecuária. A madeira é um produto cada
vez mais escasso, fato que tem ocasionado a desativação de várias serrarias, ou
seu deslocamento para outras cidades, contrapondo com a pecuária, que cresce
cada vez mais. Aqui cabe ressaltar que modelo de pecuária adotado na região,
como em toda a Amazônia, é o extensivo, sem controle de desmatamento, de
queimadas ou respeito aos limites legais de desmatamento, gerando além da
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destruição dos recursos florestais à contaminação, erosão e assoreamento dos
cursos d‘água na região.
A hipótese balizadora desta pesquisa é de que a utilização de técnicas de
construção de cenários de recursos hídricos constitui importante ferramenta para a
elaboração do planejamento estratégico da bacia hidrográfica do rio Ararandeua,
possibilitando, a partir da análise de dimensões sociais, econômicas, ambientais e
territoriais, reduzir incertezas e definir qual o melhor caminho a seguir na gestão da
água em regiões com alto índice de desmatamento e degradação ambiental.
Como principais variáveis consideradas neste estudo, priorizou-se:
i. Atividades produtivas (agricultura, pecuária, mineração, indústria e outros) e
sua influência nas alterações do sistema hídrico.
ii. Modelo de gestão pública institucional adotada nos âmbitos nacional, estadual
e local e sua relação com os marcos regulatórios tanto de recursos hídricos,
quanto de meio ambiente.
iii. Interesses dos atores sociais envolvidos nos processos decisórios relacionados
com a gestão de recursos hídricos na bacia hidrográfica do Rio Ararandeua.
É oportuno esclarecer que as atividades de campo, como coleta de
informações sobre a bacia e análise de atores sociais foram inseridas no âmbito do
Projeto ―Água e Cidadania para o Desenvolvimento Local Sustentável das Bacias
Hidrográficas de Rondon do Pará‖ que é coordenado pelo Grupo de Pesquisa em
Recursos Hídricos da Amazônia/UFPA, parcerias da organização não
governamental Argonautas Ambientalistas da Amazônia e Prefeitura Municipal de
Rondon do Pará e apoio financeiro do Fundo Setorial de Recursos Hídricos (CT-
HIDRO) e Fundo Setorial de Agronegócio (CT-AGRONEGÓCIO) do Conselho
Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – CNPq.
Uma característica marcante deste trabalho é o diálogo interdisciplinar com a
inserção de três inovações científicas: um novo paradigma (sustentabilidade pautada
na água e floresta na Amazônia), um novo conceito (o planejamento baseado na
gestão integrada de recursos hídricos) e um novo modelo (os cenários como forma
de reduzir as incertezas no processo decisório).
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É importante perceber que esta transversalidade científica é própria da
ciência ambiental, sendo indissociável de outras ciências como a ciência política,
administração, sociologia. No entanto, a orientação geral do trabalho faz parte da
engenharia no qual o centro do trabalho é definido.
A pesquisa foi realizada durante três anos, de 2006 à 2009, onde foram
colhidas informações tanto de bases secundárias, quanto em trabalhos de campo,
no qual foi criado um banco de dados, inclusive com a criação de mapas que
possibilitaram a visualização gráfica das informações.
Delimitação do Tema e Justificativa
Segundo Barth (2002), a Conferência Internacional sobre Água e o Meio
Ambiente, em janeiro de 1992 realizada na cidade de Dublin, Irlanda, aprovou em
sua declaração1 princípios que deram origem a várias reformas no setor de recursos
hídricos, estabelecendo que a escassez e o desperdício de água representam séria
e crescente ameaça ao desenvolvimento sustentável e à proteção do meio
ambiente. A saúde e bem-estar do homem, a garantia de alimentos, o
desenvolvimento industrial e o equilíbrio dos ecossistemas estarão sob risco se a
gestão da água e do solo não se tornar realidade, na presente década, de forma
bem mais efetiva do que tem sido no passado.
Outro documento que contribuiu de forma positiva para as grandes mudanças
ocorridas para o desenvolvimento dos recursos hídricos foi a Agenda 21,
consolidada com a realização da Conferência das Nações Unidas para o Meio
Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, ocorrida no ano de 1992 na cidade do Rio
de Janeiro.
Em seu capítulo 18, inserido na Seção II (Conservação e gerenciamento dos
recursos para o desenvolvimento) que versa sobre a ―Proteção da qualidade e do
abastecimento dos recursos hídricos: aplicação de critérios integrados no
1 Princípios da Declaração de Dublin: i. A água doce é um recurso finito e vulnerável, essencial para a
conservação da vida, a manutenção do desenvolvimento e do meio ambiente; ii. O desenvolvimento e a gestão da água devem ser baseados em participação dos usuários, dos planejadores e dos decisores políticos, em todos os níveis; iii. As mulheres devem assumir papel essencial na conservação e gestão da água; e iv. A água tem valor econômico em todos os seus usos competitivos e deve-se promover sua conservação e proteção.
16
desenvolvimento, manejo e uso dos recursos hídricos‖, a Agenda 21 agrega os
princípios de Dublin e estabelece o objetivo de assegurar que se mantenha uma
oferta adequada de água de boa qualidade para toda a população do planeta, ao
mesmo tempo em que se preservem as funções hidrológicas, biológicas e químicas
dos ecossistemas, adaptando as atividades humanas aos limites da capacidade da
natureza, reconhecendo a água em caráter multissetorial, bem como os interesses
múltiplos na utilização desses recursos.
O QUADRO 1 mostra uma comparação sobre os períodos de
desenvolvimento do setor de recursos hídricos entre os países desenvolvidos e o
Brasil no período da década de 1940 aos dias atuais.
QUADRO 1 – Comparação dos Períodos de desenvolvimento dos recursos hídricos. Período Países Desenvolvidos Brasil
1945-60 Crescimento industrial e populacional
• Uso dos recursos hídricos: abastecimento, navegação, energia, etc • Qualidade da água dos rios • Controle das enchentes com obras
• Inventário dos recursos hídricos; • Início dos empreendimentos hidrelétricos e planos de grandes sistemas.
1960-70 Início da pressão ambiental
• Controle de efluentes; • Medidas não estruturais para Enchentes; • Legislação para qualidade da água dos rios.
• Início da construção de grandes empreendimentos hidrelétricos; • Deterioração da qualidade da água de rios e lagos próximos a centros urbanos.
1970-1980 Início do Controle ambiental
• Legislação ambiental • Contaminação de aqüíferos; • Deterioração ambiental de grandes áreas metropolitanas; • Controle na fonte da drenagem urbana, da poluição doméstica e industrial;
• Ênfase em hidrelétricas e abastecimento de água; • Início da pressão ambiental; • Deterioração da qualidade da água dos rios devido ao aumento da produção industrial e concentração urbana.
1980-90 Interações do Ambiente Global
• Impactos Climáticos Globais; • Preocupação com conservação das florestas; • Prevenção de desastres; • Fontes pontuais e não pontuais; • Poluição rural; • Controle dos impactos da urbanização sobre o ambiente • Contaminação de aqüíferos
• Redução do investimento em hidrelétricas; • Piora das condições urbanas: enchentes, qualidade da água; • Fortes impactos das secas do Nordeste; • Aumento de investimentos em irrigação; • Legislação ambiental
1990-2000 Desenvolvimento Sustentável
• Desenvolvimento Sustentável; • Aumento do conhecimento sobre o comportamento ambiental causado pelas atividades humanas; • Controle ambiental das grandes metrópoles; • Pressão para controle da emissão de gases, preservação da camada de ozônio; • Controle da contaminação dos
• Legislação de recursos hídricos • Investimento no controle sanitário das grandes cidades; • Aumento do impacto das enchentes urbanas; • Programas de conservação dos biomas nacionais: Amazônia, Pantanal, Cerrado e Costeiro; • Início da privatização dos serviços de energia e saneamento;
17
aqüíferos das fontes não-pontuais; 2000- Ênfase na água: metas do Milênio das Nações Unidas
• Desenvolvimento da Visão Mundial da Água; • Uso integrado dos Recursos Hídricos; • Melhora da qualidade da água das fontes difusas: rural e urbana; • Busca de solução para os conflitos transfronteriços; • Desenvolvimento do gerenciamento dos recursos hídricos dentro de bases Sustentáveis
• Avanço do desenvolvimento dos aspectos institucionais da água; • Privatização do setor energético e de saneamento; • Diversificação da matriz energética; • Aumento da disponibilidade de água no Nordeste; • Planos de Drenagem urbana para as cidades.
FONTE: adaptado de TUCCI, et al, 2000
O quadro 1 enfatiza a falta de preocupação mundial com os impactos
ambientais até o período de 1990 e o início do enfoque do desenvolvimento
sustentável e gestão integrada de recursos hídricos. Já Clarke e King (2004), em
contra-argumento da visão otimista de Tucci (2000), alerta que a situação dos
recursos hídricos vem piorando, e não melhorando, pois, apesar dos Planos
Grandiosos empenhados pelas Nações Unidas e por outros organismos
internacionais desde a década de 1970, as questões básicas precisam ser atacadas,
em termos práticos e a situação continuará a piorar até que seja tomada alguma
atitude efetiva de amplitude mundial. Clarke e King prosseguem seus estudos
considerando que no ano de 2000, o mundo todo, usou duas vezes mais água do
que em 1960; somente no ano de 2000, 500 milhões de pessoas viviam em países
com escassez crônica de água; e finalmente, a previsão mais alarmante, de que as
guerras deste século serão por água.
Segundo Barp (2004), a gestão da água é concebida através de métodos
organizados, cujo objetivo principal é solucionar os problemas concernentes ao uso
e ao controle dos recursos hídricos, atendendo, dentro de suas limitações
econômicas e ambientais e considerando os princípios de justiça social, à demanda
de água pela sociedade, a partir das disponibilidades limitadas, previstas em
estudos de investigação e diagnóstico.
Várias são as ferramentas e métodos utilizados no campo do planejamento e
gestão de recursos hídricos, como instrumentos de suporte à tomada de decisão,
orientadas para a gestão contínua e integrada e o uso racional desses recursos.
Vários são, também, os atores e agentes que, de uma forma ou de outra, estão
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envolvidos nessa questão e que atuam no processo de decisão, uma vez que a
utilização de recursos hídricos envolve interesses múltiplos.
A gestão de recursos hídricos tem passado por um período de reformulação
de seus procedimentos de avaliação e de desenvolvimento de técnicas matemáticas
de suporte à decisão. Observa-se que há certa diferença entre uma abordagem
tradicional de seleção de alternativas, baseada na análise custo-benefício, e uma
análise mais abrangente, que considera múltiplos objetivos. Trata-se da análise
multiobjetivo, cujas técnicas têm-se revelado de grande apoio à decisão,
particularmente em problemas de interesse público. Esse tipo de análise consiste na
otimização de vários aspectos e interesses de diferentes grupos, cada um com
objetivos e valores próprios, freqüentemente conflitantes (BARBOSA, 1997).
Os cenários inserem-se nesta perspectiva de análise, pois buscam construir
representações do futuro, assim como rotas que levam até essas representações.
Com essas representações é possível analisar as tendências dominantes e as
possibilidades de ruptura no ambiente em que estão localizadas as organizações,
instituições, atores sociais.
Os estudos sobre o futuro constituem um vasto conjunto de atividades e
abordagens tendo o futuro como objeto de análise. Segundo Godet (1993, p: 44):
prospectiva exploratória é um panorama dos futuros possíveis, isto é, dos cenários não improváveis, tendo em conta o peso dos determinismos do passado e da confrontação dos projectos dos actores. Cada cenário (jogo de hipóteses coerente) pode ser objecto de uma apreciação cifrada, isto é, de uma previsão.
Para Buarque (2000), dentre os estudos prospectivos, a técnica de cenários
tem se consolidado como o principal recurso metodológico, tendo sido incorporado
nos processos de planejamento estratégico, tanto empresarial quanto social
governamental. Como todo estudo prospectivo, os cenários procuram descrever
futuros alternativos – lidando com eventos e processos incertos – para apoiar a
decisão e a escolha de alternativas, destacando-se, portanto, como ferramenta do
planejamento numa realidade carregada de riscos, surpresas e imprevisibilidades.
Baseado na tese do indeterminismo, os cenários não podem nem pretendem
19
eliminar a incerteza, predizer o que vai acontecer e oferecer segurança e
tranqüilidade aos agentes econômicos. Mas, se trabalham e convivem com a
incerteza, os cenários procuram analisar e sistematizar as diversas probabilidades
dos eventos e processos, explorando-os pontos de mudança das grandes
tendências, de modo a antecipar as alternativas mais prováveis.
A partir da compreensão dos estudos sobre futuros, prospectiva exploratória e
cenários, é possível, com a identificação de certas variáveis, criar modelos
computacionais ou sistemas, nas quais pode-se visualizar a interação entre as
variáveis ao longo do tempo, através de simulações.
Segundo Godet (2000), o objetivo desta da análise é explorar de forma
sistemática os futuros possíveis a partir do estudo de todas as combinações
resultantes da decomposição de um sistema.
A análise estrutural é utilizada com base no software MICMAC. A análise de
atores é utilizada com base no software MACTOR e a análise morfológica é utilizada
como base metodológica do software MORPHOL. Tais aplicativos foram
desenvolvidos pelo Laboratório de Investigação em Prospectiva Estratégica e
Organizacional - LIPSOR, instituto francês, que representa uma referência teórico-
metodológica da pesquisa em foco.
Existem algumas experiências de construção de cenários como base do
planejamento estratégico de recursos hídricos, na qual se destaca a elaboração do
Plano Nacional de Recursos Hídricos, que, segundo MMA (2006, p: 19):
Com um intuito de imprimir um enfoque mais estratégico ao processo de elaboração do Plano Nacional de Recursos Hídricos, empregou-se a metodologia de prospectiva exploratória para a construção de cenários, de maneira que fosse explicitados futuros alternativos prováveis para os recursos hídricos nacionais, considerando o
período de 2005 à 2020.
O Plano Nacional de Recursos Hídricos, aprovado pelo Conselho Nacional de
Recursos Hídricos no ano de 2006, representa um marco na gestão das águas no
Brasil, devido ao fato de se constituir num dos principais instrumentos previstos na
20
legislação para a definição de objetivos estratégicos a melhoria da disponibilidade
hídrica, em quantidade e qualidade, a redução dos conflitos pelo uso da água e a
percepção da conservação da água como valor socioambiental relevante.
Um elemento inovador desta pesquisa é reconhecer o município como ator
social importante na gestão da água, ou seja, os municípios, além de usuários
institucionais dos recursos hídricos, são promotores, orientadores e administradores
do desenvolvimento sócio-econômico em nível local, cujas decisões têm efeitos
significativos sobre os sistemas natural e social e, por conseguinte sobre a água,
seus usos e usuários.
21
I – GESTÃO INTEGRADA DE RECURSOS HÍDRICOS
1.1 - A interface da gestão da água e o desenvolvimento sustentável
O planejamento e gestão dos recursos hídricos levantam, necessariamente,
problemas de natureza intersetorial e multidisciplinar. Tratando-se a água de um
recurso partilhado pelos mais diversos setores de atividades, não pode deixar de
estar sujeita a um regime complexo de utilização e jurisdição que tem evoluído ao
longo do tempo. No Brasil, até os anos de 1970, centrava-se grande ênfase nos
aspectos estritamente técnicos relacionados com os aproveitamentos hidráulicos.
Durante a década de 1980, a ênfase derivou para os problemas da engenharia de
recursos hídricos e para a elaboração de projetos. Já na década de 1990 e início do
século XXI, uma parte importante dos esforços concentra-se sobre o contexto da
utilização do recurso, isto é, sobre o conjunto de condicionantes ambientais,
econômico-sociais e institucionais que envolvem e circunscrevem os usos e as
funções da água e os processos de decisão a eles relacionados (BANCO MUNDIAL,
2003).
Dentro da perspectiva de abordagem da gestão integrada de recursos
hídricos, é necessário ter a compreensão sobre o enfoque do desenvolvimento
sustentável. Este conceito do desenvolvimento sustentável nasceu tendo como
objetivo a busca do equilíbrio entre o desenvolvimento socioeconômico e a
sustentabilidade do ambiente no qual a população se desenvolve. Em 1987, a
Comissão Mundial da Organização das Nações Unidas - ONU sobre o Meio
Ambiente e Desenvolvimento, apresentou um documento denominado ―Our
Common Future‖, mais conhecido por relatório de Brundtland. O relatório expõe que
―desenvolvimento sustentável é o desenvolvimento que satisfaz as necessidades do
presente sem comprometer a capacidade de as futuras gerações satisfazerem suas
próprias necessidades‖ (MMA, 2006, pg. 34).
O conceito adotado na Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente
e Desenvolvimento – CNUMAD/92, realizada na cidade do Rio de Janeiro, no Brasil,
envolvia mudanças de comportamento no plano pessoal, social e transformações
nos mecanismos de produção e hábitos de consumo. Segundo Tucci (2006), este
conceito evoluiu para a incorporação de várias dimensões na relação entre o homem
22
e a natureza, como: ambiental, a capacidade de suporte do ecossistema; ecológico,
limite de uso dos recursos naturais; social, impactos sobre a qualidade de vida;
político, atitudes da população e cidadania; econômico, investimento em eficiência;
demográfico, capacidade do território quanto aos recursos naturais à população;
cultural, manutenção das culturas regionais; institucionais, arranjos legais e de
gestão para sustentabilidade; espacial, busca da eqüidade nas relações inter-
regionais.
No entanto, Leff (2003, p. 5), considera que o referencial teórico da
abordagem sobre o desenvolvimento sustentável tem sua origem a partir da
racionalidade econômica, onde
A geopolítica da sustentabilidade se configura no contexto de uma globalização econômica, que, enquanto leva à desnaturalização da natureza – a transgenese que invade e transmuta tecnologicamente a vida –, com o discurso do desenvolvimento sustentável, promove uma estratégia de apropriação que busca ―naturalizar‖ a mercantilização da natureza. Nessa corrupção do ―natural‖ negociam-se as controvérsias entre a economização na natureza e a ecologização da economia.
Para Postel (1997) uma nova ética para a água deve ser considerada que
deve estar acima das questões da água como fator econômico. Chapin et al. (1997)
revelam que a nova ética da água, que inclui a conservação, deve considerar os
aspectos fundamentais da biodiversidade dos ecossistemas aquáticos e de sua
proteção e manutenção. É esta biodiversidade que mantém os sistemas
funcionando, que supre o homem com alimento e remédios e que pode, por fim,
manter o planeta funcionando ainda por um longo tempo.
De acordo com Correia et al (1997) existe três eixos que conformam a
sustentabilidade: o ecológico, o ético e o econômico. O eixo ecológico da
sustentabilidade refere-se ao imperativo de uma visão compreensiva dos problemas.
A formulação geral que orienta as abordagens pertinentes a esse eixo é de que a
problemática ambiental (nela inserida a de recursos hídricos) é suscitada quando se
pensa nas relações entre as sociedades e seus respectivos espaços geográficos
(binômio padrões de apropriação dos recursos naturais versus capacidade de
23
suporte do meio ambiente, que impõe limites à reprodução do antropo-social, do
biológico e do físico). O eixo econômico da sustentabilidade implica na identificação
e na avaliação dos custos e benefícios, econômicos e sociais, envolvidos nos
processos de apropriação dos recursos naturais disponíveis nas unidades territoriais
de análise. Implica, também, em considerações sobre eqüidade na distribuição de
tais benefícios e custos entre os diferentes atores sociais afetados, direta ou
indiretamente, pelos referidos processos. Finalmente, o eixo ético da
sustentabilidade refere-se aos acordos sociais e à representatividade dos múltiplos
interesses relacionados à gestão do meio ambiente em geral, e dos recursos
hídricos em particular. Inscrevem-se, nesse campo, variáveis associadas à
organização formal (instituições e aparato legal) e informal (organizações civis,
interesses difusos, hábitos e costumes decorrentes de tradição e cultura) da
sociedade.
Em função das características dos debates sobre o desenvolvimento
sustentável durante a década de 1990, as Nações Unidas referendou em 2000 os
objetivos e metas para serem atingidas no âmbito internacional até 2015,
denominados Metas de Desenvolvimento do Milênio, no qual possuem relação direta
com a água, conforme pode ser constatada na tabela 1.
24
Tabela 1 – Relação entre as Metas do Milênio e a gestão da água. Metas do Milênio para 2015 Gestão da água para atingir as metas
Erradicar a pobreza A água é um fator de produção na agricultura, indústria e atividades econômicas; Os investimentos em infra-estrutura de água são catalisadores para o desenvolvimento local e regional; A redução da vulnerabilidade relacionada com a água reduz os riscos de investimentos e na produção; A redução da degradação dos ecossistemas melhora a subsistência; Melhorar a saúde aumenta a produtividade em todos os aspectos.
Erradicar a fome A água é o insumo para a irrigação aumentar a produção de grãos; A água sustenta animais, colheitas e jardins; Produção sustentável da pesca, cultivos e outros alimentos; A população sã está mais disposta a absorver os nutrientes dos alimentos que têm contato com a água.
Obter o ensino primário universal
Aumentar a freqüência escolar e acesso à água para melhora da saúde; Ter banheiros separados para meninos e meninas nas escolas.
Promover a igualdade de gênero e a autonomia da mulher
As organizações baseadas na comunidade para o manejo da água enriquecem o capital social das mulheres; Redução da carga para a mulher pela melhora dos serviços de água, aumentando o tempo para atividades produtivas e educação; Serviços de água e esgotamento sanitário reduzem o risco de ataques sexuais às mulheres; O aumento da sobrevivência das crianças são precursores da transição demográfica para taxas menores de fertilidade.
Reduzir a mortalidade infantil
Aumento de água potável e sane amento doméstico reduzem a mortalidade infantil; O incremento da nutrição e a segurança dos alimentos reduzem a susceptibilidade de doenças; O incremento da saúde e a redução da carga poluente na água reduzem o risco de mortalidade infantil;
Melhorar a saúde materna O Incremento de saúde e nutrição reduz a possibilidade de anemias e outras condições que afetam a mortalidade maternal; Quantidade suficiente de água limpa para asseio pré e pós-nascimento reduzem a ameaça de infecções.
Combater a AIDS, a malária e outras doenças
Um melhor manejo da água reduz os habitats dos mosquitos; Um melhor manejo da água reduz o risco para várias doenças de origem e de veiculação hídrica; A melhor saúde e nutrição reduzem a suscetibilidade a severidade da AIDS e outras doenças.
Garantir a sustentabilidade do meio ambiente
A melhora do manejo da água, incluindo o controle da poluição e a conservação da água, são fatores chaves na preservação da integridade dos ecossistemas; O desenvolvimento do manejo integrado na bacia permite a sustentabilidade dos ecossistemas e resolve os conflitos de montante para jusante; O bom manejo da água fomenta a conservação da biodiversidade e o combate à desertificação.
FONTE: Adaptado de Cabezas, 2004.
Clarke e King (2005) alertam que a menos que sejam tomadas medidas
radicais para modificar o modo como as águas são manipuladas, as perspectivas
25
são desanimadoras. Por volta de 2025, o mundo pode enfrentar uma grave falta de
água e como conseqüência haverá queda na produção de alimentos, o que levará à
desnutrição, às doenças e a um desastre ecológico. Eles acrescentam que se o
mundo quiser atingir as Metas do Milênio, da ONU, que consistem em reduzir pela
metade a parcela da população sem acesso ao abastecimento de água tratada e ao
saneamento, serão necessários, aproximadamente, 150 bilhões de dólares para a
instalação de tubulações, de sistemas de esgoto e de usinas de tratamento de água.
No entanto, existem dois princípios básicos para atingir tais metas: administração
das águas e participação pública.
É importante destacar os fundamentos da gestão da água, onde a visão
sistêmica das funções gerenciais (planejamento, organização, direção e avaliação)
integra uma visão mais abrangente, sendo, segundo GWP (2000), o processo que
promove o desenvolvimento coordenado e o gerenciamento dos recursos hídricos
para maximizar o resultado econômico e social de forma eqüitativa sem
comprometer a sustentabilidade vital dos ecossistemas. Ela é integrada, pois, une a
terra e a água; bacia hidrográfica e ambiente costeiro; águas superficiais e
subterrâneas; quantidade e qualidade da água; montante e jusante;
desenvolvimento econômico, social, humano e institucional; todos os elementos da
água no meio urbano e visão integrada dos efeitos econômicos da cadeia produtiva
da água; engenharia, economia, meio ambiente, aspecto social e eficiência.
Segundo CEPAL (1994), o desenvolvimento sustentável é função do
crescimento econômico, da sustentabilidade ambiental e da equidade social. Os
processos de gestão integrada de bacias hidrográficas, por definição, devem, pelo
menos, alcançar metas de aproveitamento dos recursos da bacia (crescimento
econômico) e de manejo dos recursos com a finalidade de preservá-los, conservá-
los e proteger-los (sustentabilidade ambiental). A equidade social se alcançará na
medida em que os sistemas de gestão sejam participativos e democráticos.
Tundisi (2003) ressalta que os principais problemas referentes à quantidade e
à qualidade dos recursos hídricos no Brasil mostram uma situação diversificada e
complexa que exige avanços institucionais e tecnológicos para recuperação e
proteção, além de novas visões para a gestão preventiva, integrada e adaptativa,
tendo como princípios gerais: a consideração da dinâmica do ecossistema; a
26
consideração da sensibilidade das bacias hidrográficas às entradas externas de
material; a utilização do conhecimento dos fatores abióticos e bióticos, retendo as
estruturas naturais e protegendo a biodiversidade, respeitando a sustentabilidade do
desenvolvimento; o gerenciamento da bacia hidrográfica como parte de um todo,
adotando uma visão sistêmica; a avaliação das opções de longo prazo e os efeitos
globais do gerenciamento; confrontação dos usos conflitantes; e determinação da
capacidade assimilativa do ecossistema e não excedê-la.
Para tomar decisões adequadas com a finalidade de alcançar metas de
gestão integrada da água, é necessário harmonizar os interesses e a dinâmica das
populações com as condições e a dinâmica própria do entorno de onde habitam
essas populações, em particular com relação às bacias hidrográficas e o ciclo
hidrológico. Isto significa que as decisões devem integrar conhecimentos das
características com comportamento humano com as características do ambiente.
Segundo Roling (2000), a tecnologia e a economia podem ajudar a construir uma
sociedade sustentável somente se se aplicam dentro de um marco de pensamento e
ação coletiva superior a limitada racionalidade instrumental e econômica.
Por fim, o desenvolvimento sustentável prevê manutenção dos recursos
naturais e sua disponibilização às próximas gerações. A água ocupa papel central
nesse desenvolvimento sustentável dando condições para a renovação dos ciclos e
para a sustentabilidade da vida no planeta.
1.2 - A bacia hidrográfica: elemento de integração e gestão
A bacia hidrográfica é um território que é delimitado pela própria natureza,
essencialmente pelos limites de escoamento das águas superficiais que convergem
para um mesmo leito de rio. A bacia, seus recursos naturais e seus habitantes
impõem condições físicas, biológicas, econômicas, sociais e culturais que conferem
características que são particulares a cada uma.
A bacia hidrográfica estabelece os limites geográficos da ocorrência dos
efeitos hidrológicos e da sinergia dos impactos. Ela caracteriza os efeitos de
montante para jusante, porém grande parte das reações causa-efeito extrapolam os
limites da bacia, criando conflitos com a administração social, econômica e política.
27
A bacia hidrográfica pode ser entendida também como uma área definida
topograficamente, drenada por um curso d‘água ou um sistema conectado de cursos
d‘água tal que toda vazão efluente seja descarregada através de uma saída (VILELA
e MATTOS, 1975); ou um conjunto das áreas com caimento superficial para
determinada secção transversal de um curso d‘água, medidas em áreas de projeção
horizontal (GARCEZ, 1967). Observa-se que essa definição considera somente as
águas superficiais. Para as águas subterrâneas defini-se a bacia hidrogeológica
como aquela que contém pelo menos um aqüífero de extensão significativa. Essas
bacias, normalmente interligadas, não são coincidentes fisicamente podendo ocorrer
diferenças significativas nos seus divisores de água (COELHO et al, 2008). É
importante esclarecer que o presente trabalho está considerando apenas as águas
superficiais
Os conceitos de bacia e sub-bacias se relacionam a ordens hierárquicas
dentro de uma determinada malha hídrica (FERNANDES & SILVA, 1994). Cada
bacia hidrográfica se interliga com outra de ordem hierárquica superior, constituindo,
em relação à última, uma sub-bacia. Portanto, os termos bacia e sub-bacias
hidrográficas são relativos.
As bacias hidrográficas possuem expressividade espacial, constituindo
sistemas ambientais complexos em sua estrutura, funcionamento e evolução. As
bacias de drenagem são unidades fundamentais para mensuração dos indicadores
geomorfológicos, para a análise da sustentabilidade ambiental baseadas nas
características do geossistema e o elemento sócio-econômico (CHRISTOFOLETTI,
1999, p. 173).
O território da bacia facilita a relação entre seus habitantes
independentemente das delimitações político-administrativas, mas principalmente
sua dependência comum a um sistema hídrico compartilhado. Devido esta
interdependência, devem existir sistemas de conciliação de interesses entre os
diferentes atores que dependem de uma mesma bacia. É por esta razão que a bacia
hidrográfica é uma unidade natural que serve de base como território para articular
processos de gestão que tendem ao desenvolvimento sustentável.
28
A Política Nacional de Recursos Hídricos, Lei nº. 9.433, de 8 de Janeiro de
1997, baseia-se no fundamento que a bacia hidrográfica é a unidade territorial de
planejamento.
Segundo Silva e Pruski (2000), a adoção da bacia hidrográfica como unidade
de planejamento tem um aspecto positivo, pois a maioria dos problemas de causa-
efeito aí gerados correlaciona-se ao uso dos recursos hídricos, cuja rede de
drenagem se conforma a estes problemas.
Para Braga (2001, pg.33), o conceito da bacia hidrográfica como sistema
facilita o entendimento da gestão de recursos hídricos:
De forma geral acredita-se que o motivo pelo qual a bacia hidrográfica deva ser a base de trabalho para gestão de recursos hídricos se deva à interconexão existente entre o sistema de drenagem e ao escoamento da água que corre sempre de montante para jusante, relacionando fisicamente os usuários da bacia, sendo que sempre o usuário de jusante vai sofrer impacto (quantitativo e/ou
qualitativo) das ações que ocorrem a montante.
O território que define uma bacia hidrográfica não é, certamente, o único
dentro do qual se pode dirigir e coordenar ações de desenvolvimento, considerando
a dimensão ambiental. Porém a consideração dos limites de uma bacia é uma
condição necessária para considerar os aspectos ambientais, sobretudo a água e
seus recursos associados. Neste sentido é fundamental que toda proposta de
gestão no âmbito de bacia se faça tendo em conta sua relação com os sistemas de
gestão que funcionam com outros limites, inclusive com os limites político-
administrativos, entre os quais os municípios são prioritários. Ou seja, os municípios,
além de usuários institucionais dos recursos hídricos, são promotores, orientadores
e administradores do desenvolvimento sócio-econômico no âmbito local, cujas
decisões têm efeitos significativos sobre os sistemas natural e social e, por
conseguinte sobre a água, seus usos e usuários.
A gestão integrada de bacias, em particular a gestão da água, se sustenta
especialmente na capacidade de organizações públicas e privadas para tomar
decisões e desenhar estratégias para alcançar objetivos pré-determinados por e
29
para um grupo relativamente grande de atores que dependem e compartilham um
mesmo recurso e território. As decisões do grupo de gestão, materializadas em
estratégias de ação se apresentam usualmente na forma de planos e marcos
regulatórios (CEPAL, 1995).
Quando se considera uma bacia hidrográfica para a gestão das águas é
necessário atentar a duas condições fundamentais: a garantia da disponibilidade
hídrica e o atendimento qualitativo e quantitativo às demandas de água naquele
território.
O quadro 2 sintetiza os diversos enfoques de gestão no âmbito de bacias
hidrográficas. É uma matriz que relaciona os grupos de fatores, as etapas do
processo de gestão de bacias e os objetivos do processo.
QUADRO 2 – Classificação de ações de gestão no âmbito de bacias hidrográficas
Fonte: Dourojeanni (1994, p.18)
É apresentado no Quadro 2 uma diferenciação clara entre as etapas do
processo de gestão e os recursos naturais que são considerados na bacia
hidrográfica. O mesmo autor afirma que a etapa prévia do processo de gestão é
30
composta por estudos, formulação de planos e projetos; a etapa intermediária
constitui-se pela habilitação da bacia para aproveitamento de seus recursos
naturais; e a etapa permanente configura-se como uma etapa de operação e
manutenção das obras construídas, gestão e conservação dos recursos naturais. Já
os recursos naturais que são considerados na bacia apresentam-se em quatro
grupos. No primeiro grupo são considerados todos os recursos naturais e infra-
estrutura na bacia; o segundo grupo são todos os recursos naturais existentes na
bacia; o terceiro grupo é representado pelos usos múltiplos da água; e finalmente o
quarto grupo são os usos setoriais da água.
A proteção das águas superficiais é promovida, principalmente, pela proteção
dos ecossistemas naturais e pela regulação do uso do solo, tanto nas áreas urbanas
quanto nas áreas rurais. As águas subterrâneas são fortemente afetadas pelo
cuidado dispensado às áreas de recarga dos aqüíferos, bem como quanto às
disposições de poluentes que podem contaminá-las e pela impermeabilização das
camadas drenantes que alimentam os lençóis. Ademais, a manutenção dos
ecossistemas aquáticos, parte importante no equilíbrio geral do meio ambiente,
necessita de aporte de água com quantidade e qualidade suficiente, devendo ser
garantida no balanço hídrico da bacia.
Dessa forma, as áreas de proteção ambiental e as políticas de uso e
ocupação do solo contribuem fundamentalmente para a definição dos limites a
serem considerados para uma unidade de planejamento e gestão, além de
representar um passo adiante em direção à articulação e integração com a Política
de Meio Ambiente.
1.3 - Aspectos legais e institucionais da gestão dos recursos hídricos
A relação existente entre a administração pública brasileira e a gestão dos
recursos hídricos tem sido considerada por alguns autores como historicamente
centralizada e setorial (VICTORINO, 2003; MACHADO, MIRANDA e PINHEIRO,
2004; GARJULLI, RODRIGUES e OLIVEIRA, 2004; ABERS & JORGE, 2005;
SAMPAIO, 2004; NOVAES & JACOBI, 2002). Uma série de trabalhos científicos
aborda a evolução da legislação do setor a partir, principalmente, do Código de
31
Águas de 1934, bem como a sua pouca efetividade no avanço de uma gestão que
compatibilizasse suas múltiplas dimensões.
Assunção (2000) revela que não só a gestão das águas no Brasil
desenvolveu-se de forma setorizada e privilegiada de grupos de interesse, como
padeceu da dispersão de seu ordenamento por uma série de instrumentos legais
(decretos e outras políticas que tratavam de diferentes aspectos da gestão de
águas) que se seguiram principalmente a partir do Código de Águas de 1934. Esta
dispersão, segundo a autora, foi acompanhada, ainda, por uma multiplicidade de
agentes reguladores de diferentes aspectos dos recursos hídricos – seu uso na
agricultura, mineração, energia elétrica, saneamento, pesca, abastecimento,
navegação, etc.
Segundo Lanna (1999), o período que se segue ao Código de Águas até
finais da década de 1940 está marcado pelo modelo ―burocrático‖ de gestão da
água, fundamentado no cumprimento de instrumentos legais; e, a partir da década
de 50 até o processo de revisão da política de águas, na década de 80, a gestão
fundamenta-se no modelo ―econômico-financeiro‖, em que são aplicadas medidas
econômicas e financeiras para o controle do uso dos recursos hídricos e o estímulo
do seu gerenciamento adequado dentro do processo de desenvolvimento regional.
Após o modelo econômico-financeiro, a gestão das águas transita para o modelo
―sistêmico de integração participativa‖ onde a água é considerada como bem público
e, segundo Freitas (2000, p.81):
se empregam quatro tipos de negociação social (econômico, político-direto, político-representativo e jurídico) e três instrumentos de trabalho (planejamento estratégico por bacia hidrográfica, tomada de decisão por deliberações multilaterais e descentralizadas e
estabelecimento de instrumentos legais e financeiros).
Com a Política Nacional de Recursos Hídricos, de 8 de janeiro de 1997, o
Brasil inaugura um novo modelo de gestão da água, considerando, de forma
prioritária, a participação da sociedade na tomada de decisões acerca do
gerenciamento dos recursos hídricos. A Lei das Águas é clara e objetiva na definição
das diretrizes gerais de ação, às quais se referem à indispensável integração da
gestão da águas com a gestão ambiental. Outros avanços confirmam o caráter de
32
bem essencial à vida, eis que, em situações de escassez, o uso prioritário é o
consumo humano e de animais, devendo a gestão dos recursos hídricos
proporcionar sempre o uso múltiplo das águas.
Com relação ao aspecto institucional, Silva & Pruski, 2000, colocam que:
um processo de gestão de recursos hídricos, deve ser constituído por uma política que estabeleça as diretrizes gerais, por um modelo de gerenciamento, que estabeleça a organização (ou configuração) administrativa e funcional necessária para tal e por um sistema de gerenciamento, constituído pelo conjunto de organismos, agências e
instalações governamentais e privadas, para execução da política, por meio do modelo adotado e tendo por instrumento o planejamento
Ambiental.
A Política é definida como ―conjunto de princípios e medidas postos em
prática por instituições governamentais e outras, para solução de certos problemas
da sociedade‖ (CAMPOS & STUDART, 2001).
O modelo institucional deve ser concebido visando à eficiência no
cumprimento das atividades a ele atribuídas, ou seja, é necessário o conhecimento
das funções atribuídas (gestão, oferta, uso, preservação e complementares) e a
serem desempenhadas na utilização racional dos corpos d‘água.
O sistema de gestão é formado pelas instituições que realizam as funções da
gestão (planejamento, administração e a regulamentação), representada pelo órgão
gestor (BARP, 2004).
Segundo Barth (1987), a condição fundamental para que a gestão de
recursos hídricos seja efetivamente implantada é a motivação política, que faz
prevalecer os interesses públicos sobre os interesses particulares e corporativistas.
Havendo decisão política, motivada pela escassez relativa de tais recursos, é
possível planejar o seu aproveitamento e controle mediante a implantação de obras
e medidas recomendadas.
A Lei nº. 9.433/97 cria o Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos
Hídricos objetivando coordenar a gestão integrada das águas; arbitrar
administrativamente os conflitos relacionados com os recursos hídricos; implementar
33
a Política Nacional de Recursos Hídricos; planejar, regular e controlar o uso, a
preservação e a recuperação dos recursos hídricos; e promover a cobrança pelo uso
de recursos hídricos. Integram o Sistema: o Conselho Nacional de Recursos
Hídricos (CNRH), a Secretaria Executiva do CNRH, a Agência Nacional de Águas,
os Conselhos de Recursos Hídricos dos Estados e do Distrito Federal, os Comitês
de Bacia Hidrográfica e os órgãos dos poderes públicos federal, estaduais, do
Distrito Federal e municipais cujas competências se relacionem com a gestão de
recursos hídricos.
São instrumentos da Política Nacional de Recursos Hídricos os Planos de
Recursos Hídricos; o enquadramento dos corpos de água em classes, segundo os
usos preponderantes da água; a outorga dos direitos de uso de recursos hídricos; a
cobrança pelo uso dos recursos hídricos; a compensação aos municípios e; o
Sistema de Informações sobre Recursos Hídricos.
A Lei n° 9.984/2000 estabelece a criação da Agência Nacional de Águas e
regulamenta alguns artigos da PNRH e a Lei n° 10.881/2004 regulamenta a
delegação de funções de Agências de Águas referentes aos recursos hídricos de
domínio da União a entidades reconhecidas pelo Conselho Nacional de Recursos
Hídricos.
1.4 - O plano de bacia hidrográfica
Segundo Van Acker (2000) apud Meguins (2007), a gestão de recursos
hídricos depende de planejamento institucionalizado não podendo o uso das águas
ser condicionado apenas a planos setoriais e, à decisão de cada caso concreto, sem
vinculação com o planejamento do uso dos recursos hídricos da bacia.
Em geral, o planejamento como instrumento de gestão opera melhor em
escalas relativamente pequenas e manejáveis, pois se conta com melhor
informação, capacidade de coordenação e, sobretudo, de execução.
O planejamento, segundo Silva (1997; 37), ―é um processo técnico
instrumentado para transformar a realidade existente no sentido de objetivos
previamente estabelecidos‖. O processo de planejamento instrumentaliza-se
mediante a elaboração do plano. O plano é, assim, o instrumento formal que
34
consubstancia e materializa as determinações e os objetivos previstos no
planejamento.
Os Planos de Recursos Hídricos são planos diretores que visam a
fundamentar e orientar a implementação da Política Nacional de Recursos Hídricos
e o gerenciamento dos recursos hídricos. Devem conter diagnóstico da situação
atual dos recursos hídricos, análises sócio-econômicas, balanços entre
disponibilidade e demandas futuras, metas, prioridades para outorgas, critérios para
cobrança pelo uso da água, propostas para criação de áreas sujeitas à restrição de
uso.
Os planos de recursos hídricos se constituem no primeiro instrumento da
Política Nacional de Recursos Hídricos. Neste contexto, aliado à responsabilidade
legal e como parte dos desafios impostos pelos compromissos internacionais
assumidos, foi elaborado o Plano Nacional de Recursos Hídricos (PNRH), aprovado
pelo Conselho Nacional de Recursos Hídricos em 30 de Janeiro de 2006. A
construção deste plano estabeleceu um caráter participativo e descentralizado,
permitindo estabelecer, para um horizonte temporal até 2020, diretrizes, programas
e metas, pactuados social e politicamente por meio de um amplo processo de
discussão, que contaram com uma base técnica consistente para subsidiar a
elaboração de propostas (MMA, 2006). É importante destacar a utilização da
metodologia de prospectiva exploratória (PROSPEX), testada em diversas
organizações públicas e privadas, porém inovadora no âmbito do planejamento de
recursos hídricos, permitiu a definição e três cenários sobre recursos hídricos no
Brasil para 2020: ―Água para Todos‖, ―Água para Alguns‖ e ―Águas para Poucos‖
(MMA,2006).
O objetivo geral do Plano de Bacia Hidrográfica juntamente com os demais
planos de recursos hídricos, vem inscrito no art 6°, da Lei n° 9.433/97, que é
fundamentar e orientar a implementação da Política Nacional de Recursos Hídricos
e o gerenciamento de recursos hídricos. Isso significa que, embora devam ser
identificados objetivos específicos de acordo com as necessidades da unidade de
planejamento de recursos hídricos na qual se deseja intervir, fato é, que tais
objetivos devem estar em sintonia com os objetivos da própria política, ou seja: a)
assegurar a atual e futuras gerações a necessária disponibilidade de água em
35
padrões de qualidade adequados aos respectivos usos; b) a utilização racional e
integrada dos recursos hídricos, incluindo o transporte hidroviário, com vistas ao
desenvolvimento sustentável; e, c) a prevenção e a defesa contra eventos
hidrológicos críticos de origem natural ou decorrentes do uso inadequado dos
recursos naturais.
Para a condução de um bom planejamento é crucial a clareza de objetivos.
Os objetivos que irão nortear o planejamento podem ser fixados a partir da
identificação dos conflitos relativos a utilização dos recursos hídricos existentes no
âmbito da bacia hidrográfica, tais como, direitos de alocação de água, usuário a
jusante e poluidores a montante do rio, controle de inundações, construção de
reservatórios, alocação de investimentos.
Tomando como exemplo o contexto europeu, onde se verifica uma
considerável experiência com processos de planejamento de recursos hídricos, a
Diretiva-Quadro da Água (Diretiva 2000/60/CE) enfatiza dois aspectos importantes
para o futuro da gestão integrada de recursos hídricos em bacias hidrográficas: a
necessidade de planejamento de longo prazo e da adoção de processos
participativos. O uso desses conceitos não é novidade, no entanto, a sua utilização
de forma integrada, ou seja, o desenvolvimento de processos de planejamento de
longo prazo de recursos hídricos de forma participativa é algo recente (HELM, 2003).
A prospectiva, metodologia de planejamento de longo prazo por cenários, vem
ganhando adeptos no planejamento de recursos hídricos, sendo, no entanto, já
consagrada em outras áreas da ciência, como prospecção tecnológica.
Outro aspecto que merece atenção no âmbito de processos de planejamento
de recursos hídricos, relaciona-se à questão da participação e da aprendizagem
social. Para Gomes (2001) há uma mudança em curso, relacionada à busca de
formas de diálogo para minimizar o abismo entre o planejamento técnico e a
execução social, política, cultural e econômica das propostas de planos, invocando
as relações entre as partes envolvidas e contrapondo-se à concepção dos atores
sociais como receptáculos passivos de intervenções bem-intencionadas e
―tecnicamente perfeitas‖. Além disso, o aprendizado social decorrente dessa
participação pró-ativa, só pode funcionar no sentido social/institucional se as
pessoas participarem em conjunto, trocarem idéias a respeito de novos padrões
36
resultantes de reflexões sobre experiências, construírem uma teoria comum,
planejarem e agirem em conjunto (HEIJDEN, 2004).
Diante deste quadro do referencial teórico da gestão integrada de recursos
hídricos a partir da abordagem do desenvolvimento sustentável, da bacia
hidrográfica, dos aspectos institucionais do gerenciamento dos recursos hídricos,
aprofundar-se-á, na segunda parte deste capítulo, o processo de elaboração do
planejamento com base na construção de cenários prospectivos, no intuito de
buscar modelos capazes de responder às demandas complexas de promover a
sustentabilidade dos sistemas hídricos no território delimitado pela bacia
hidrográfica, tendo como pano de fundo os interesses dos atores sociais.
37
2 – PROSPECTIVA ESTRATÉGICA E CONSTRUÇÃO DE CENÁRIOS
2.1 - Diferenças entre planejamento, prospectiva e estratégia
Para Buarque (2003) o futuro tem sido uma preocupação permanente dos
seres humanos com o seu destino, mesmo quando predominava a convicção de que
esse era um desejo da natureza, ou, ainda, quando o ciclo da vida parecia
apresentar uma grande regularidade. Atualmente, com a descoberta do risco e com
a menor sujeição da humanidade aos desejos da natureza, a expectativa em relação
ao futuro assume um papel importante como referência para as decisões e escolhas,
tanto individuais quanto coletivas.
A história da humanidade está diretamente ligada ao planejamento, porém as
experiências de planificação se intensificaram nas sociedades capitalistas após a 2ª
Guerra Mundial.
Os governos, as empresas, os grupos organizados e até mesmo os
indivíduos, para desempenharem suas atribuições, devem lançar mão de
instrumentos de diversas naturezas de forma eficaz, no sentido de maximizar os
retornos sociais e econômicos que visam tanto o bem estar da sociedade como de si
próprios. Todavia, para que isso ocorra, o processo de tomada de decisões deve ser
coordenado através de técnicas que permitam eleger e relacionar as melhores
alternativas de ação tendo como referência a melhor relação entre custo e benefício.
Holanda (1975, p. 112), procurou comentar algumas características do
planejamento, principalmente sob a ótica econômica, que é bem mais freqüente na
bibliografia existente até o final dos anos de 1980:
Todo e qualquer tipo de planejamento (...) apresenta algumas características básicas: procurar estabelecer uma relação entre presente, passado e futuro; definir cursos alternativos de ação para anos vindouros; analisar critérios para uma escolha entre as alternativas disponíveis; antecipar soluções para problemas previsíveis e especificar as medidas de política econômica
38
necessárias para remover os obstáculos que limitam o crescimento
da renda e a mudança estrutural da economia.
No entanto, segundo Buarque (2001), o planejamento é sempre um processo
político. É também um processo ordenado e sistemático de decisão, o que lhe
confere uma conotação técnica e racional de formulação e suporte para as escolhas
da sociedade. Desta forma, o planejamento incorpora e combina uma dimensão
política e uma dimensão técnica, constituindo uma síntese técnico-política. Técnico,
porque ordenado e sistemático e porque deve utilizar instrumentos de organização,
sistematização e hierarquização da realidade e das variáveis do processo e um
esforço de produção e organização de informações sobre o objeto e os instrumentos
de intervenção. Político porque toda decisão e definição de objetivos passa por
interesses e negociações entre atores sociais.
Já para Ackoff (1981, p. 17), que definiu planejamento de forma imparcial, ou
seja, sem limitar-se ao aspecto econômico ou social ou ambiental, conceitua
planejamento como
um processo que envolve tomada e avaliação de cada decisão de um conjunto de decisões inter-relacionadas, antes que seja necessário agir, numa situação na qual se acredita que, a menos que se faça alguma coisa, um estado futuro desejado não deverá ocorrer e que, se tomadas as atitudes apropriadas, pode-se aumentar a
probabilidade de um resultado favorável.
Para Chiavenato e Sapiro (2003), estratégia significa o comportamento global
da organização em relação ao ambiente que a circunda. A estratégia é quase
sempre uma resposta organizacional às demandas ambientais. O planejamento
estratégico é a maneira pela qual a estratégia é articulada e preparada. Contudo, ele
não é descontínuo. Quanto maior for a mudança ambiental, mais deverá ser feito e
refeito de maneira contínua o planejamento estratégico.
O processo de planejamento enfrenta uma série de dificuldades para alcançar
seus objetivos. Esses obstáculos podem estar relacionados com diversos fatores,
gerados principalmente, pelo mau entendimento do processo de planejamento; pela
39
compreensão que o plano é apenas uma reunião de previsões (muito comum em
formulações tradicionais); por obstáculos conjunturais (inclusive internacional); pela
falta de preocupação com a preparação ao longo do tempo, de pessoal capacitado
para efetivar o processo de planejamento, para a elaboração e avaliação do plano e
para gerar informações atualizadas; pela instabilidade política; pela exclusão da
sociedade no processo de planejamento; e pela falta de informações atualizadas, o
que compromete a qualidade do acompanhamento, das previsões do
comportamento dos sistemas e a análise da estrutura e da conjuntura da sociedade
em geral.
Arguin (1988) e Matus (1997) comentam a importância da construção de
cenários como uma ferramenta para reduzir incertezas no contexto do planejamento
estratégico. Diz Matus que o conteúdo propositivo do plano ―é o TEXTO e o cenário
é o contexto‖, ou seja, o conjunto de condições ou pressupostos históricos em que
se situa o plano. A construção do cenário de um plano baseia-se em conhecimento.
Não se trata de adivinhar o futuro. Trata-se de identificar tendências, explorar o
movimento da realidade, avaliar possibilidades, descobrindo ameaças e
oportunidades do plano, quer no ambiente interno, quer no ambiente externo.
Na realidade, nem é tanto o ‗planejamento‘ que está em causa, mas a
maneira como ele é posto em prática. A complementação ‗estratégico‘ ao termo
planejamento corresponde às possibilidades de interações entre o ambiente interno
e externo das organizações, com a identificação de variáveis responsáveis pela
mudança de rumos, e, principalmente, pela apropriação das informações que irão
nortear as ações individuais e coletivas.
De acordo com autores clássicos, como Poirier (1987) e Ansoff (1965), a
noção de estratégia remete para a ação de uma organização com o meio envolvente
e para a reflexão para essa ação. Embora as noções ‗estratégia‘ e ‗prospectiva‘
sejam frequentemente associadas, elas representam conceitos distintos. Roubelat
(1996) sustenta a idéia de que certas prospectivas sejam estratégicas e outras não,
pois a decisão estratégica é aquela suscetível de por em definição a existência da
organização, a sua independência, as suas missões, o campo das suas atividades
principais. Para Godet (1993) não se deve confundir os cenários prospectivos (que
projetam os desejos e as angústias face ao futuro) com a escolha das opções
40
estratégicas (onde a ambição da vontade se inscreve no princípio da realidade das
evoluções previsíveis do ambiente da organização).
Para facilitar o entendimento e possibilitar a definição desses conceitos são
formuladas cinco questões: q1. O que pode acontecer no futuro?; q2. O que posso
fazer?; q3. O que vou fazer?; q4. Como vou fazê-lo?; e uma pergunta prévia
essencial, q5. Quem sou eu? A prospectiva, em sentido estrito, ocupa-se apenas na
questão q1.‖O que pode acontecer?‖. Ela torna-se estratégica quando uma
organização se interroga sobre q2. ―Que posso fazer‖. Uma vez tratadas essas duas
questões, a estratégia parte do q3. ―Que vou fazer‖ para q4. ―Como vou fazê-lo‖.
2.2 - Planejamento com base em cenários: elementos teórico-metodológicos
Cenários representam uma descrição de uma situação futura e do conjunto de
eventos que permitirão que se passe da situação original para a situação futura. O
futuro é múltiplo e diversos futuros potenciais são possíveis (Figura 1): o caminho
que leva a um futuro ou outro não é necessariamente único.
Figura 1 – Exploração do futuro em cenários múltiplos
FONTE: Macroplan, 2004.
Variações
Canônicas
Cenário de Referência
(mais Provável)
Futuro Alternativo
A
Futuro
Alternativo N
Futuro Alternativo
B
Situação
Atual
Extrapolação da Tendência
Situação Futuro Livre
de Surpresas
41
A descrição de um futuro potencial e a progressão em direção à ele
representam um cenário (GODET & ROUBELAT, 1996). Godet (2000, p. 26)
acrescenta:
Para ser fecundo, ou seja, portador de futuro, o casamento entre Prospectiva e a Estratégia deve-se encarnar-se na realidade quotidiana e dar origem, através da apropriação (por todos os actores envolvidos, do topo à base da hierarquia), a uma verdadeira mobilização da inteligência colectiva. Embora o encontro entre a Prospectiva e a Estratégia fosse inevitável, de facto, ele não conseguiu apagar a confusão de gêneros e conceitos que ainda existe. Estes últimos são bastante mais próximos do que geralmente se admite.
Ribeiro (2001) salienta que, quando se utiliza o planejamento por cenários, é
dado um passo à frente das tradicionais metodologias de planejamento, visto que é
integrado às incertezas na construção do futuro, bem como capta a riqueza e a
variedade de possibilidades, organizando-as em narrativas de fácil visualização e
entendimento – ao invés de armazenar somente grandes volumes de dados
estatísticos sobre o assunto em discussão. Além de levar em conta essas
características, o autor refere-se à utilização do planejamento por cenários para:
identificar possíveis oportunidades de atuação; testar a estratégia em múltiplos
cenários; monitorar a execução da estratégia; pesquisar mudanças no ambiente
para determinar as estratégias que deverão ser adaptadas ou alteradas para a
sobrevivência da organização; reduzir as incertezas com relação à capacidade da
liderança em promover ajustes; incrementar a qualidade do pensamento estratégico
(reduzindo pensamentos rotineiros).
O planejamento por cenários, observadas as suas características, seus
enfoques e respectivas tipologias, direciona a busca constante por sinais de
mudança, o que requer coragem intelectual para revelar evidências que não estão
adequadas aos modelos mentais, principalmente quando significam uma ameaça à
própria existência organizacional. Esse processo, respeitando os seus passos
permite mais do que projetar cenários satisfatórios, na medida em que conduz a
42
uma transformação quase revolucionária na organização, tão importante quanto o
desenvolvimento dos próprios cenários.
Como forma de contornar a complexidade de interpretação da realidade e
evitar um grande esforço teórico – estudos de longo prazo que buscam descrever
dinâmicas de decisões estratégicas em processos – se utiliza uma abordagem
sistêmica2, representando a totalidade complexa por um conjunto de variáveis
centrais e procurando compreender a lógica da interação entre as mesmas e a
lógica de determinação do sistema. Os macro-sistemas podem, por outro lado, ser
agrupadas em grandes dimensões (ou sub-sistemas) com um corte aproximado de
disciplinas de conhecimento, como econômica, sócio-cultural, ambiental,
tecnológica, político-institucional, etc., procurando compreender o sistema-objeto e
seu contexto. Embora a construção de cenários não possa nem deva se perder num
embate acadêmico e científico, e apesar das dificuldades de abordagem de sistemas
complexos e multi-disciplinares, não há como escapar do recurso, implícito ou
explícito, de um referencial teórico.
Como o futuro é uma construção social, segundo a definição de Michel Godet,
os atores sociais devem ocupar uma posição central na construção de cenários. De
um modo geral, cada cenário configura e expressa um determinado quadro
hegemônico com o predomínio de uma aliança de atores em torno de um dado
projeto. É este projeto político que oferece e assegura a sustentação política dos
cenários, especialmente importante quando se trata de cenários de macro-sistemas
para o planejamento intersetorial. O futuro depende fortemente da capacidade dos
atores constituírem um projeto dominante, assumindo a condução do Estado e
conferindo a ele capacidade de intervenção e, principalmente, definindo suas
prioridades e formas de atuação nas áreas social, econômica, ambiental, regional,
diplomática ou científico e tecnológica.
2Segundo a teoria de sistemas, cada objeto de análise constitui ―... um todo integrado cujas
propriedades essenciais surgem das relações entre suas partes‖, (CAPRA, 1996, pg. 39); de modo que as suas características só podem ser entendidas pela organização do todo, da mesma forma que o conjunto será apreendido apenas como resultado das múltiplas e complexas interações das suas partes. Como indica Capra, nenhuma parte de um sistema (sub-sistema) possui as propriedades do todo que decorre, precisamente dos controles mútuos que cada uma delas exerce sobre as outras gerando a síntese integradora da totalidade. Na abordagem sistêmica, as propriedades de um organismo ―... são destruídas quando o sistema é dissecado, física ou teoricamente, em elementos isolados. Embora possamos discernir partes individuais em qualquer sistema, essas partes não são isoladas, e a natureza do todo é sempre diferente da mera soma das suas partes.‖ (CAPRA, 1996, p. 40 e 41).
43
Quando se trata da construção do cenário normativo, a análise dos atores se
torna mais importante ainda, não tanto para verificar quais cenários teriam uma base
política, mas sim para interpretar o futuro desejado pela sociedade. Neste caso, o
trabalho se concentra em formas diferenciadas de consulta aos atores sociais para
apreender os seus desejos em relação ao futuro, formulando o futuro desejado, base
para a construção do cenário normativo. Esta consulta deve permitir a definição de
uma vontade dominante na sociedade sobre o futuro desejado (desejo dominante)
com base em um tratamento técnico que identifica as convergências e interpreta os
interesses diferenciados com seus distintos pesos na estrutura de poder. Apenas
quando expressa os desejos dominantes na sociedade, o cenário normativo terá
força e legitimidade política para orientar as ações, políticas e estratégias de
desenvolvimento.
Como referido antes, os estudos de cenários utilizam a abordagem sistêmica
para a interpretação das interações entre os sub-sistemas (variáveis centrais),
situando o objeto de análise no contexto mais amplo, com o qual interage e,
sobretudo, do qual recebe influências com maior ou menor poder de determinação
do futuro. Assim, a região deve ser sempre observada e analisada como um sub-
sistema do sistema nacional e mundial mais complexo, no qual está inserido e do
qual recebe múltiplas e diferenciadas influências; que tendem a ser maior ou menor,
dependendo das características da região e seu grau de interdependência em
relação ao contexto. Balizado neste contexto, Durance e Godet (2007, p.10),
apresentaram a ―prospectiva territorial‖ da seguinte maneira:
L‘idée centrale inhérente à la prospective est que l'avenir n'est pas une fatalité, qu‘il se construit pas à pas, qu‘il est moins à découvrir qu'à inventer. Pour pouvoir le construire, il faut faire preuve d'anticipation. Sans anticipation, reste les seules urgences qui ne laissent guère de marges de manoeuvre. Dans une phase exploratoire, la prospective s‘efforce donc de réduire l‘incertitude face à l‘avenir, de décrypter et de conjecturer collectivement des futurs possibles. Puis, dans une phase plus normative, elle permet de faire émerger la vision d‘un futur souhaitable, ainsi que la trajectoire pour y parvenir, en se donnant les marges de manoeuvre nécessaires, même si ces dernières se réduisent, peu à peu, compte tenu de l‘importance croissante des variables externes qui pèsent de plus en plus sur le devenir des territoires.
44
Planejar com cenários prospectivos significa elaborar estratégias que vão
definir o futuro do sistema e, para tanto, os estudos de cenários recorrem a um
conjunto de metodologias, técnicas, processos de sistematização e organização das
informações e hipóteses, as quais buscam analisar e prospectar o macroambiente, a
organização e a sua visão de futuro. Neste sentido, os cenários para fins de
planejamento e gestão estratégica podem ser projetados a partir da combinação de
diferentes técnicas3, passíveis de ser utilizadas pelos gestores para prever eventos e
tendências futuras.
Grumbach e Marcial (2002) citam técnicas de criatividade, tais como
brainstorming, sinética, análise morfológica, questionário e entrevista; técnicas de
avaliação, tais como o método Delphi, impactos cruzados, modelagem e simulação;
e técnicas de análise multicritério, tais como exámenes, Pattern, Electre, AHP e
Macbeth.
De acordo com a literatura pesquisada, Bethlem (2002) sistematizou os
métodos de elaboração de cenários que possuem base conceitual, passos definidos
e filosofia4:
a) Método descrito por Michel Godet (1993);
b) Método descrito por Peter Schwartz (1988) ou da Global Business Network
(GBN);
c) Método descrito por Michael Porter (1998);
d) Método descrito por Grumbach (2005).
É importante reforçar que o presente trabalho se propõe a aprofundar
somente o referencial da teoria, metodologia e técnicas preconizadas por Godet.
3Segundo Kato (2005), as técnicas auxiliares de previsão são utilizadas amplamente na elaboração
de cenários, sem, contudo, que haja unanimidade em sua forma de apresentação e classificação entre os autores. 4Apesar do presente trabalho se preocupar-se somente com a descrição do método de Godet (1993),
é de valiosa a contribuição que outros métodos possuem na construção de cenários.
45
O método de elaboração de cenários exploratórios, descrito por Michel Godet
(1993) em Manual de prospectiva estratégica: da antecipação à ação, compõe-se
basicamente de seis etapas:
1. Delimitação do sistema e do ambiente: é a primeira fase do método,
quando o sistema é delimitado pelo objeto de estudo, o horizonte temporal e a área
geográfica. O ambiente é o contexto mais amplo onde está inserido o sistema, com
um e outro se influenciando mutuamente.
2. Análise estrutural do sistema e do ambiente: delimitado o sistema, inicia-se
a fase da análise estrutural, que consiste na elaboração de uma lista preliminar, a
mais completa possível, das variáveis relevantes do sistema e de seus principais
atores. Realiza-se também a análise da situação passada para destacar os
mecanismos e os atores determinantes da evolução passada. Posteriormente,
processa-se a análise da situação atual, que permite identificar mudanças ou fatos
portadores de futuro na evolução das variáveis essenciais, bem como as estratégias
dos atores que dão origem a essa evolução e suas alianças.
Após, retorna-se à análise estrutural para rever a lista preliminar de variáveis
e atores. Ao final da revisão, as variáveis são cruzadas para identificar a influência
de uma sobre as outras, através da formação da matriz de análise estrutural das
variáveis. As variáveis são, então, analisadas quanto a sua motricidade e
dependência e classificadas em variáveis-chave: explicativas, de ligação, de
resultado e autônomas.
O próximo passo é a análise das estratégias dos atores, identificando os seus
projetos e motivações, seus meios de ação e seus desafios estratégicos. A
identificação dos atores mais influentes no sistema é realizada mediante o
cruzamento atores x variáveis a fim de verificar a motricidade de cada um.
3. Seleção das condicionantes do futuro: com base nessas análises obtêm-se
como resultado as condicionantes do futuro. Podem-se listar as tendências de peso,
os fatos portadores de futuro, os fatores predeterminados, as variantes e as alianças
existentes entre os atores. A análise de estratégia dos atores é muito importante,
pois muitas rupturas de tendências são causadas em função do movimento desses
46
atores. Os atores são capazes de fazer com que o sistema evolua segundo suas
ações. Caso o comportamento de uma variável esteja em desacordo com a
estratégia de um ator, certamente esse comportamento será alterado em função das
ações desencadeadas pelo ator com o intuito de realizar o seu projeto.
A identificação dos atores mais influentes no sistema é realizada através do
cruzamento atores x variáveis para verificar a motricidade de cada ator. Apenas os
atores que apresentarem grande motricidade serão analisados no quadro ―estratégia
dos atores‖. Este quadro é composto pelo cruzamento (ator x ator) das estratégias
desses atores. A diagonal do quadro é composta pelos objetivos, problemas e meios
utilizados pelo ator envolvido. Os demais cruzamentos são preenchidos pelos
meios/ações utilizados por cada ator sobre os demais, com o objetivo de realizar o
seu projeto.
4. Geração de cenários alternativos: após a análise de todas as
condicionantes do futuro, passa-se a realizar a análise morfológica, que constitui a
base para a geração dos cenários alternativos. Essa análise é realizada
decompondo-se cada variável explicativa em seus possíveis comportamentos ou
estados futuros, segundo as estratégias dos atores. O passo seguinte é a
elaboração dos cenários propriamente ditos, levando-se em conta as variáveis-
chave, as tendências de peso, as estratégias dos atores e os fatos portadores de
futuro já identificados.
5. Testes de consistência, ajustes e disseminação: com o objetivo de
assegurar a coerência dos encaminhamentos entre as diferentes imagens, realizam-
se testes de consistência para verificar se, durante a descrição dos cenários, alguma
variável ou ator está se comportando de forma não-coerente ou não-consistente com
a lógica estabelecida para cada cenário.
6. Opções e planos de monitoração estratégica: os cenários revisados devem
ser utilizados pela cúpula da organização na elaboração das opções e dos planos
estratégicos. Devem ser analisados os pontos fortes e fracos da organização em
relação aos ambientes futuros. A integração entre a seqüência das seis etapas pode
ser constatada na figura 2.
47
Figura 2 – Método de construção de cenários descrito por Godet (1993)
Marcial e Grumbach (2005) recomendam a implantação de um sistema de
monitoração a fim de avaliar as opções estratégicas desenvolvidas, quaisquer que
sejam as adotadas e os planos descritos.
2.3 – Teorias Matemáticas aplicada à construção de cenários
Esta abordagem da matemática situa-se no estudo da álgebra linear, ou seja,
buscou-se uma resposta de elementos matemáticos, neste caso de sistemas
lineares, para explicar problemas de outras ciências, como administração aplicada
ao planejamento e gestão de recursos hídricos.
2.3.1 - Teoria das Matrizes
Segundo Yamane (1974), Lancaster e Timenetsky (1985), uma matriz A, m x n é uma tabela de mn números dispostos em m linhas e n colunas
A = a11 a12 .... a1n
a21 a22...... a2n
am1 am2.....amn
A partir desta abordagem é possível definir operações com matrizes, assim
como provar propriedades que são válidas para essas operações. Para este trabalho
de pesquisa interessa apenas descrever quatro definições de operações com
4. Geração de Cenários
CENÁRIO
1. Delimitação do sistema e do ambiente
2. Análise estrutural do sistema e do ambiente
2. Análise retrospectiva
e da situação atual
3. Seleção de condicionantes do futuro
5. Teses de consistência, ajustes e disseminação
6. Opções
estratégicas e planos/
monitoração estratégica
48
matrizes: soma, multiplicação de matriz por um escalar, multiplicação entre matrizes
e transposta de uma matriz.
A soma de duas matrizes de mesmo tamanho A = (aij) mxn e B = (bij)mxn é
definida como sendo a matriz m x n
C = A + B
obtida somando-se os elementos correspondentes de A e B, ou seja, cij = aij + bij;
para i = 1,...,m e j = 1,..., n. Escreve-se também [A + B]ij = aij + bij .
A multiplicação de uma matriz A = (aij)mxn por um escalar (número) α é
definida pela matriz m x n
B = α . A
obtida multiplicando-se cada elemento da matriz A pelo escalar α, ou seja,
bij = α aij ;
para i = 1,..., m e j = 1,..., n. Escrevemos também [α A]ij = α aij . Diz-se que a matriz
B é um múltiplo escalar da matriz A.
O produto de duas matrizes, tais que o número de colunas da primeira matriz
é igual ao número de linhas da segunda, A = (aij)mxp e B = (bij)pxn é definido pela
matriz m x n
C = A . B
obtida da seguinte forma:
cij = ai1 b1j + ai2 b2j + ... + aip bpj;
para i = 1,.., m e j = 1,.., n. Escreve-se também [AB]ij= ai1 b1j + ai2 b2j + ... + aip bpj.
A transposta de uma matriz A = (aij)mxn é definida pela matriz n x m
B = At
obtida trocando-se as linhas com as colunas, ou seja,
49
bij = aji ;
para i = 1,..., n e j = 1,..., m. Escrevemos também [At]ij = aji.
Tais operações matriciais inserem-se no âmbito de sistema de equações
lineares. Uma equação linear em n variáveis x1, x2,..., xn é uma equação da forma
a1x1 + a2x2 +....+ anxn = b,
em que a1, a2,..., an e b são constantes reais.
Um sistema de equações lineares ou simplesmente sistema linear é um
conjunto de equações lineares, ou seja, é um conjunto de equações na forma
a11x1 + a12x2 + : : : + a1nxn = b1 a21x1 + a22x2 + : : : + a2nxn = b2 : am1x1 + am2x2 + : : : + amnxn = bm
Esta abordagem possibilita uma série de proposições no campo das
ferramentas metodológicas de gestão e planejamento. No caso do estudo de
cenários, existe uma forma de construir, simular e avaliar análises estruturais de um
sistema linear. Além disso, é possível simular influências diretas ou indiretas, definir
restrições, enfatizar determinadas variáveis utilizando operações matriciais.
Outra aplicação importante para o estudo dos cenários é a possibilidade de
representação das análises de operações da álgebra matricial em planos
cartesianos, com a plotagem dos pontos das equações lineares em quadrantes, no
qual representam respostas metodológicas às demandas de cada pesquisa.
O cruzamento entre linhas e colunas das matrizes é o principal fundamento
da metodologia integrada da análise estrutural, análise de atores sociais e análise
morfológica, pois fornece a interação das variáveis de um sistema entre si, isto é,
atribuindo pesos escalares para as interações entre as variáveis, possibilita gerar
uma classificação de importância para tais variáveis e com isso identificar os
principais elementos de análise do sistema.
50
Para exemplificar a matriz de impactos cruzados, tem-se que as equações
lineares genéricas
( i ) aX+bY+cZ=d ( ii ) fX+gY+hZ=k ( iii) mX+nY+pZ=q,
sendo X, Y e Z como variáveis do sistema, pode-se visualizar a seguinte matriz
representada na TABELA 2:
TABELA 2 – Matriz de análise estrutural com elementos genéricos
Variável X Variável Y Variável Z linha
Variável X a b C d
Variável Y f g H k
Variável Z m n P q
coluna d‘ k‘ q‘
As letras a, b, c, f, g, h, m, n, e p denotam parâmetros que caracterizam o
mapeamento do sistema.
Se desconsiderarmos as relações entre as mesmas variáveis (XX‘, YY‘, ZZ‘),
obtém-se as seguintes interações: X.Y ; X.Z ; Y.Z ; Com a atribuição de pesos de
importância para cada variável das três equações lineares pode-se obter sua
somatória entre as linhas e as colunas da cada variável. No caso das linhas este
somatório pode ser representado pelas letras d, k e q. Para o caso das colunas este
somatório pode ser representado por d‘, k‘ e q‘, resultando no produto cartesiano
linear como mostra a FIGURA 3:
Coluna (Máximo de d‘, k‘ e q‘)
a n
PM COLUNA k
f
c
B m
g
q h
Linha (Maximo de d, k e q)
PM LINHA FIGURA 3 – Produto cartesiano linear da análise estrutural
51
A partir desta abordagem é possível definir pontos médios (PM) para linhas e
colunas, definido pela média entre o maior e menor valor entre as linhas ou colunas.
Com a plotagem de cada variável no plano é definida uma classificação, resultando
em análises de maior ou menor importância para o sistema estudado.
Outro aspecto necessário da análise de cruzamento de variáveis de matrizes
são as relações de influenciação, que podem ser de ordem direta ou indireta. Perlis
(1958) conceitua relações de dependência e independência linear. Um conjunto de
vetores (x1, x2, ..., xk), xi Є Rn , i = 1,...., k, é linearmente dependente se existem
escalares α1, α2,..., αk, não todos nulos, tais que
Caso o contrário, o conjunto (x1, x2,..., xk) é linearmente independente.
2.3.2 - Teoria dos Grafos
A Teoria dos Grafos é o ramo da matemática que estuda as propriedades de
grafos. Um grafo é um conjunto de pontos, chamados vértices (nós), conectados por
linhas, chamadas de arestas (ou arcos). Dependendo da aplicação, arestas podem
ou não ter direção, pode ser permitido ou não arestas ligarem um vértice a ele
próprio e vértices e/ou arestas podem ter um peso (numérico) associado. A teoria
de grafos dirigidos pode ser usada para modelar, matematicamente, diversos tipos
de relações. Dentre os autores pesquisados, destacam-se Feofiloff et al (2005) e
Biggs et al (1976).
Para qualquer conjunto V, aqui denotado por V(2) o conjunto de todos os
pares não ordenados de elementos de V tem n elementos, então V(2) tem [n (n – 1)
/2] elementos. Os elementos de V(2) serão identificados com os subconjuntos de V
que têm cardinalidade 2. Assim, cada elemento de V(2) terá a forma {v,w}, sendo v e
w dois elementos distintos de V.
52
Um grafo é um par (V,A) em que V é um conjunto arbitrário e A é um
subconjunto de V(2) . Os elementos de V são chamados vértices e os de A são
chamados arestas. Este trabalho se restringiu a grafos em que o conjunto de
vértices é finito
Uma aresta como {v , w} será denotada simplesmente por v w ou por w v.
Define-se que a aresta v w incide em v e em w e que v e w são as pontas da aresta.
Se v w é uma aresta, diremos que os vértices v e w são vizinhos ou adjacentes.
De acordo com esta definição, um grafo não pode ter duas arestas diferentes
com o mesmo par de pontas (ou seja, não pode ter arestas ―paralelas‖). Também
não pode ter uma aresta com pontas coincidentes (ou seja, não pode ter ―laços‖).
Para Feofiloff et al (2005), um caminho é qualquer grafo da forma ({v1, v2, . . .
, vn} , {vivi+1 : 1 ≤ i < n}). Em outras palavras, um caminho é um grafo C cujo
conjunto de vértices admite uma permutação (v1, v2, . . . , vn) tal que {v1v2, v2v3, . .
. , vn−1vn} = A(C) .
Os vértices v1 e vn são os extremos do caminho. O caminho descrito pode
ser denotado simplesmente por v1v2 · · · vn . Por exemplo, o grafo ({u, v,w, z}, {wz,
vz, uw}) é um caminho, que pode ser denotado por uwzv .
O comprimento de um caminho ou circuito é o número de arestas do grafo.
Evidentemente, um caminho de comprimento k tem k + 1 vértices, e um circuito de
comprimento k têm k vértices.
Duas arestas de um grafo G são adjacentes se têm uma ponta comum. Um
emparelhamento num grafo é um conjunto de arestas duas a duas não-adjacentes.
Uma coloração do conjunto das arestas de um grafo é uma atribuição de
cores às arestas tal que arestas adjacentes recebem cores diferentes. É conveniente
formalizar a definição da seguinte maneira: uma coloração das arestas de um grafo
G é uma partição de A(G) em emparelhamentos. Se {E1, . . . ,Ek} é uma tal partição,
diz-se que cada emparelhamento Ei é uma cor e k é o número de cores.
53
Uma coloração de arestas é um tipo particular de coloração de vértices. De
fato, qualquer coloração das arestas de um grafo G é uma coloração dos vértices do
grafo das arestas de G.
Com esta base conceitual sobre a teoria dos grafos é possível estabelecer
análises contundentes sobre a relação entre variáveis de um sistema linear, apoiada
na teoria de mapeamento cognitivo, no qual se identifica relações de causa e efeito
através de setas direcionadas (figura 4), bi-direcionadas ou multi-direcionadas, como
por exemplo:
FIGURA 4 – Grafos de relações de causa-efeito.
Neste caso, M é um conjunto de variáveis que impulsionam o sistema
(também chamadas de variáveis motrizes); L é um conjunto de variáveis de ligação
do sistema; D é um conjunto de variáveis dependentes do sistema; e I é um conjunto
de variáveis independentes. Estas relações matemáticas foram demonstradas por
Lucchesi (1979).
Cabe ressaltar a necessidade de conceituar elementos teóricos do
mapeamento cognitivo, como apoio às análises dos grafos no processo de
planejamento e de construção de cenários.
Segundo Baganha (2005), o mapeamento cognitivo insere-se no âmbito dos
métodos de mapeamento para estruturação de dados qualitativos. Este método foi
descrito por Éden e Ackermann (2002), como um processo composto por uma série
de transformações psicológicas pelas quais um indivíduo adquire, armazena e
decodifica informações sobre as localizações e o atributo relativo aos fenômenos em
seu ambiente espacial diário.
54
Para esta pesquisa específica estão sendo utilizados mapas causais, pois
revela influência, causalidade, dinâmica do sistema e argumentação. Ou seja, esses
mapas assumem diferentes graus de complexidade e variadas formas de
representação, sendo, sem dúvida, a mais apelativa, aquela que recorre ao
diagrama baseados na estrutura de grafos.
Quanto à complexidade, esta incide na quantidade de tipos disponíveis de
interligação entre construtos. Outras variantes prevêem a inclusão de níveis de
incerteza nas relações entre construtos e de pesos de influência (BAGANHA, 2005).
O exemplo da figura 5 está relacionado com esta pesquisa e demonstra a
complexidade dos grafos para a análise estrutural, fase preliminar e necessária à
construção de cenários. É possível visualizar os grafos demonstrando relações
causais, pesos entre as relações, além de arestas de cores diferentes para explicar
diferentes graus de influência.
FIGURA 5 – Exemplo de grafos de influência direta
55
2.3.3 - Teoria dos Jogos
Para Abrantes (2004), jogo é um conjunto de regras que governam o
comportamento de dado número de indivíduos ou grupo de indivíduos, dominados
jogadores. Em geral, as regras do jogo consistem numa sucessão finita de lances
realizados segundo determinada ordem. Os lances são elementos componentes do
jogo e podem ser de dois tipos: pessoais ou aleatórios.
Lance pessoal é o ato através do qual o jogador escolhe entre várias
alternativas que se lhe oferecem. A decisão tomada designa-se por escolha. No
lance aleatório, a escolha é feita a partir de uma seleção de alternativas. Resumindo:
jogo é uma sucessão de lances e a partida uma sucessão de escolhas.
Há vários critérios de classificação:
i) Atendendo ao número de jogadores que nele participam, temos os jogos de
2 (duas) pessoas, jogos de 3 (três) pessoas, jogos de n- pessoas. No entanto, dizer-
se que um jogo é de n- pessoas, não significa dizer, que nele tomam parte
necessàriamente n- pessoas, mas, que as regras do jogo são tais, que os
participantes se podem dividir em grupos exclusivos, tendo as pessoas dentro de
cada grupo, interesses comuns. Na estrutura do jogo, cada grupo é considerado
uma pessoa.
ii) Atendendo ao número de lances, os jogos podem ser finitos e infinitos. Os
primeiros têm um número finito de lances e de alternativas. Os segundos têm um
número infinito de lances e de alternativas. Quando tem em cada lance completo
conhecimento das escolhas efetuadas até essa altura, os jogadores entram num
jogo com informação perfeita ou completa. Caso contrário, a informação é
imperfeita.
Para Zugman (2005), Jogo é toda a situação em que existem duas ou mais
entidades em uma posição em que as ações de um interferem nos resultados de
outro. A Teoria dos Jogos também é conhecida como a ciência do conflito.
Estratégia é algo que um jogador faz para alcançar seu objetivo. Um jogador
sempre procura uma estratégia que aumente seus ganhos ou diminua as perdas.
56
No equilíbrio de Nash ou equilíbrio não-cooperativo, nenhum jogador se
arrepende de sua estratégia, dadas as posições de todos os outros. Ou seja, um
jogador não está necessariamente feliz com as estratégias dos outros jogadores,
apenas está feliz com a estratégia que escolheu em face das escolhas dos outros.
Situações de conflito, tomada de decisão e desenvolvimento de estratégias reúnem-
se nesse campo de estudo.
Yamane (1977) exemplifica matematicamente a teoria dos jogos supondo que
um jogador P1 tenha que escolher um número pertencente ao conjunto {1, 2} = {α1,
α2} e que o jogador P2 tenha que escolher um número do conjunto {1, 2} = {β1, β2}.
Segundo certas regras pré-determinadas P1 ou P2 podem ganhar. O exemplo pode
ser representado na matriz da tabela 3:
TABELA 3 – Matriz de exemplificação da teoria dos jogos
P2
β1=1 β2=2
P1 α1=1 a11= $1 a12= $ - 4
α2=2 a21= $3 a22= $4
Esta matriz pode ser assim interpretada: Se P1 escolhe α2=2 e P2 escolhe
β2=2, então P1 receberá de P2 $4. Se P1 escolher α1=1 e P2 escolher β2=2, então
P1 receberá de P2 $ (- 4), isto é, P1 pagará a P2 $4. Ou seja, o jogo necessita de
estratégia para desencadear uma vantagem para determinado lado. Tais valores
podem ser expressos em atores e a ação do jogador pode ser expressa em
objetivos de determinado ator social.
Esta abordagem integra-se com o método utilizado nesta pesquisa através da
matriz de análise de atores sociais e relações de força. Neste caso, há a
necessidade de relacionar pesos de dominância, dependência e de ligação, tanto
para atores sociais, quanto para seus objetivos.
Nesta pesquisa, como já foi observado no texto, é utilizado um aplicativo
MACTOR, no qual utiliza como apoio tanto a teoria das matrizes, quanto a teoria dos
grafos. No entanto, o principal fundamento teórico, especialmente na matemática, é
a teoria dos jogos, pois possibilita uma análise concreta de definição sobre quais as
57
decisões que se deve tomar para o planejamento com base em cenários dos
recursos hídricos na bacia hidrográfica estudada.
2.4 - Metodologias informacionais de apoio à construção de cenários
Segundo Levy (1999) apud Barp (2007), metodologias informacionais são
tecnologias que amplificam, exteriorizam e modificam numerosas funções cognitivas
humanas como: memória (banco de dados, hiperdocumentos, arquivos digitais),
imaginação (simulação), percepção (sensores digitais, telepresença, realidade
virtual) e raciocínio (inteligência artificial, modelagem de sistemas complexos).
Serão apresentadas, neste tópico, algumas ferramentas utilizadas no âmbito
da construção de cenários prospectivos preconizada pela metodologia de Michel
Godet, centrando atenção em três módulos, que serão utilizadas e aplicadas nesta
pesquisa: análise estrutural (MICMAC), análise de atores (MACTOR) e análise
morfológica (MORPHOL). Todas essas ferramentas foram desenvolvidas no
Laboratory for Investigacion in Prospective and Strategy – LIPSOR, Paris-França.
a) Análise Estrutural
A análise estrutural, através da utilização do método MICMAC (Matrice
d’Impacts Croisés – Multiplicacion Appliqué à um Classement / Matriz de Impactos
Cruzados – Multiplicação Aplicada a uma Classificação), tem como objetivos: reduzir
a complexidade do sistema (pois a prospectiva parte do complexo para o simples),
detectar as variáveis-chaves (hierarquizando-as) e detectar os atores na origem da
evolução das variáveis-chave. Em síntese, consiste em elaborar uma imagem do
estado atual do sistema, constituído pelo ambiente (político, econômico, ambiental,
etc) que o envolve. Segundo Alvarenga e Carvalho (2007) esta delimitação do
sistema e a subseqüente determinação das variáveis-chave permite colocar em
evidência uma hierarquia das variáveis (motrizes e dependentes), confirmar (ou não)
as intuições iniciais e eventualmente levantar, para outras variáveis, questões que,
de outra forma, não teriam sido colocadas.
Foram identificadas três fases fundamentais da análise estrutural:
Recenseamento das variáveis que intervêm no sistema; construção de uma matriz
de análise estrutural com a identificação das relações diretas entre as variáveis; e
58
hierarquização das variáveis por ordem de motricidade e dependência indiretas e
seleção das variáveis-chave.
A primeira etapa consiste em recensear o conjunto das variáveis que
caracterizam o sistema estudado e o seu ambiente (externo e interno). Segundo
Godet (1993), é desejável alimentar a recolha das variáveis por meio de entrevistas,
não estruturadas, com representantes dos atores sociais do sistema estudado. Com
relação à fase intermediária (descrição das relações entre as variáveis), dentro de
uma abordagem sistêmica5, uma variável só existe através das relações que
mantém com as outras variáveis. Assim, a análise estrutural procura identificar as
relações existentes entre as variáveis, utilizando um quadro de dupla entrada
denominado matriz de análise estrutural. A fase que finaliza o método (identificação
das variáveis-chave) consiste em identificar as variáveis essenciais à evolução do
sistema através de classificações diretas e indiretas. Neste último caso, é possível
utilizar o software MICMAC para facilitar as análises.
Utilizando uma matriz quadrada (variável-variável) – cruzando todas as
variáveis entre si – é possível dar pesos de influenciação de cada uma sobre todas
as outras, expressando, aproximadamente, a intensidade diferenciada de influência
das mesmas e as relações de causalidade. Somando as linhas – adição de todas as
influências individualizadas de cada variável – chega-se a um resultado final que
representa o poder de influenciação das mesmas sobre o sistema. Por outro lado, a
soma das colunas apresenta uma hierarquia representativa do grau de dependência
das variáveis em relação ao sistema. A relação entre as variáveis pode ser
exemplificada na tabela 4.
5 Segundo Perin Filho (1995), sistema é um conjunto de componentes que interagem de modo
regular entre si e com o meio ambiente, satisfazendo à certas restrições ambientais provenientes da escassez de recursos, para atingir determinados objetivos.
59
Tabela 4 – Relação entre variáveis da análise estrutural.
VARIÁVEL
A
B
C
D ...
Poder
de Influência
A
B
C
D :
Grau de
Dependência
Outra informação gerada pelo MICMAC é a classificação de variáveis, que
podem ser: Motrizes: são variáveis de força, que regem os acontecimentos futuros;
Dependentes: são aquelas que sofrem influência das variáveis motrizes; seu
comportamento vai depender do desempenho das motrizes; de Ligação: variáveis
que, ao mesmo tempo, têm alta motricidade e alta dependência, ou seja, têm ao
mesmo tempo capacidade de influenciar e serem influenciadas pelo sistema6;
Independentes: são aquelas de baixa motricidade e baixa dependência, que acabam
por não influenciar o sistema. Em certos casos, podem até ser desconsideradas da
análise. A classificação das variáveis em motrizes, dependentes, de ligação ou
independente é feita por meio da figura 6, onde as variáveis localizadas no
quadrante I são consideradas motrizes, no quadrante II são consideradas de ligação,
no quadrante III são as independentes e no quadrante IV são consideradas
dependentes.
6Sistemas com um grande número de variáveis de ligação tendem a serem instáveis.
60
FIGURA 6 – Diagrama de classificação das variáveis
As forças motrizes são o insumo para a realização da análise estrutural, e
devem advir da análise das variáveis relevantes levantadas na etapa anterior. A
metodologia consiste em realizar a análise das relações existentes entre essas
variáveis, por meio da matriz de relacionamentos, obtendo como um dos resultados
o conhecimento daquelas variáveis que mais afetam o sistema (variáveis motrizes).
Uma vez conhecendo como as variáveis (ou aspectos) relacionadas aos
recursos hídricos se comportam no sistema, parte-se para a definição das Incertezas
Críticas. Essa definição é qualitativa, realizada com os atores sociais locais. As
Incertezas Críticas são aspectos que afetam muito os recursos hídricos na bacia
hidrográfica estudada e que apresentam alta incerteza quanto ao seu
comportamento futuro.
b) Análise dos Atores7
É um método de análise dos jogos de atores sociais. Procura avaliar as
relações de força entre esses e estuda suas convergências e divergências dada
7Está sendo considerado, neste trabalho, ―ator‖ como sendo todo aquele que participa, direta ou
indiretamente, do processo decisório. Na literatura de língua inglesa, é chamado de stakeholder. Cada ator tem um sistema de valores que defende e que o representa.
I
II
III
IV
M
O
T
R
I
C
I
D
A
D
E
DEPENDÊNCIA
61
uma configuração de um conjunto de objetivos estratégicos, os quais descrevem ou
determinam essa situação de futuro. Constitui-se como uma ferramenta importante
dentro da perspectiva da metodologia integrada de Godet (1993). A metodologia
―Matriz de atores, objetivos e relações de força‖ – MACTOR – configura-se em dois
elementos principais: relação entre ator-ator e relação ator-objetivos. É importante
ressaltar que essas análises são bastante relativas, pois o resultado do jogo de
forças é indeterminado, dependendo precisamente do objeto de análise, isto é, do
poder e das posições dos atores. Segue uma seqüência da análise estrutural.
A percepção dos conflitos e alianças deve ser uma preocupação constante. O
processo pode também contribuir para uma maior participação e reflexão estratégica
por parte dos diferentes atores, sendo desejável a realização de entrevistas a esses
atores objeto de análise.
Godet (1993) define os elementos de maior importância para o
encaminhamento do método, nas quais serão priorizados nesta pesquisa através de
aplicação de entrevistas com os atores e posteriormente sistematização da relação
entre ator-ator e ator-objetivo.
A primeira fase do método é construir o quadro das estratégias dos atores. A
construção deste quadro diz respeito aos atores que comandam as variáveis-chave
obtidas na análise estrutural: é justamente o jogo destes atores ‗motores‘ que explica
a evolução das variáveis comandadas. As informações recolhidas sobre os atores
devem contemplar as finalidades, objetivos, projetos em desenvolvimento (e de
intenção futura), suas motivações políticas e meios de atuação.
A segunda fase identifica os desafios estratégicos e os objetivos associados.
Pode ser realizada uma reunião com esses atores ou através da aplicação de
entrevista com questionário qualitativo, onde possibilita revelar os atores que
possuem objetivos convergentes ou divergentes.
A terceira fase se preocupa em posicionar os atores em função dos objetivos
e identificar as convergências e divergências. Trata-se de descrever, através de uma
matriz ―atores x objetivos‖ a atitude de cada ator, na atualidade, em relação a cada
objetivo, indicando seu acordo (+), desacordo (-1) ou neutralidade (0), da mesma
62
forma como no exemplo da matriz de análise estrutural. Esta matriz permite
visualizar grupos de atores em convergência de interesses, identificar atores
potencialmente ameaçados e analisar a estabilidade do sistema. É possível
estabelecer grafos para representar tais relações.
A quarta fase serve para hierarquizar para cada ator as suas prioridades de
objetivos. Para aproximar o modelo à realidade, convém ter em consideração
igualmente a hierarquia dos objetivos para cada ator. Avalia-se, assim, a intensidade
do posicionamento de cada ator por meio de uma escala específica.
A quinta etapa consiste em avaliar as relações de força dos atores. Constrói-
se uma matriz das influências diretas entre atores a partir do quadro estratégico dos
atores, valorizando os meios de ação de cada ator. O software MACTOR pode
ajudar no cálculo das relações de força, tendo em conta, simultaneamente, as
influências diretas e indiretas. Seguidamente, constrói-se um diagrama de influência-
dependência dos atores, conforme a figura 7.
FIGURA 7 – Diagrama de influência-dependência dos atores.
A sexta fase integra as relações de força na análise das convergências e
divergências entre os atores permitindo observar a deformação das alianças e
Influência
Dependência
Atores
dominantes
Atores autônomos
Atores de
ligação
Atores dominados
63
conflitos potenciais, tendo em conta as hierarquias dos objetivos e das relações de
força entre os atores.
A última fase do MACTOR serve para formular as recomendações
estratégicas e as questões-chave para o futuro. Ajuda, por exemplo, a testar
possibilidades de evolução das relações entre atores, a emergência e o
desaparecimento de atores, as mudanças de papéis, etc.
c) Análise Morfológica
A análise morfológica (metodologia na base do software MORPHOL) clarifica
e simplifica e elaboração de cenários a partir das evoluções possíveis/prováveis das
variáveis-chave (identificadas na análise estrutural), refletindo o comportamento dos
atores (estudado na análise de jogos dos atores). O princípio fundamental é a
decomposição do sistema estudado em subsistemas ou componentes, sendo que as
componentes devem ser as mais independentes possíveis e cobrir a totalidade do
sistema estudado. Cada componente pode ter diferentes configurações, existindo
tantas soluções possíveis quanto combinações de configurações. Por exemplo, num
sistema de quatro componentes, com quatro configurações cada, existem
4x4x4x4=256 possibilidades de combinações. Este espaço dos possíveis também se
denomina ―espaço morfológico‖.
Segundo Godet (1993) e Ritchey (2006), a análise morfológica foi idealizada
por, Fritz Zwicky do Instituto de Tecnologia da Califórnia entre os anos de 1930/40
para estabelecer estratégias militares na Segunda Guerra Mundial. Durante os
últimos 10 anos, vêm sido computadorizada e estendida para estruturação e
análises políticas complexas, desenvolvendo cenários futuros e modelando
estratégias alternativas.
A Sociedade Sueca de Análise Morfológica foi identificada como um dos
principais centros mundiais de estudos e práticas sobre este método. No entanto, a
LIPSOR tem apresentado um longo histórico de trabalhos científicos, na qual se
destaca a criação do software MORPHOL.
Segundo Ritchey (2006), a estruturação e a análise de sistemas sócio-técnico
complexos apresentam-se como numerosos problemas metodológicos e isto
64
acontece devido o envolvimento de fatores não mensuráveis quantitativamente,
além de conter dimensões sociais, políticos, cognitivos. Até os anos de 1940, o
termo morfológico era bastante utilizado somente para descrever elementos
biológicos. A partir daí, Zwicky (1969, p. 34) apud Ritchey (2006, p. 3) delimitou uma
abrangência mais generalista para o termo, no qual
Attention has been called to the fact that the term morphology has long been used in many fields of science to designate research on structural interrelations - for instance in anatomy, geology, botany and biology... I have proposed to generalize and systematize the concept of morphological research and include not only the study of the shapes of geometrical, geological, biological, and generally material structures, but also to study the more abstract structural interrelations among phenomena, concepts, and ideas, whatever their character might be.
A análise morfológica tem sido empregada para desenvolver cenários e
modelar cenários em laboratório; desenvolver estratégias alternativas; análise de
risco; relacionar entradas e saídas em sistemas políticos complexos; desenvolver
modelos para analisar posições dos stakeholders; avaliar diferentes estruturas
organizacionais; apresentar e compreender sistemas complexos através de modelos
visuais.
A análise morfológica comporta duas etapas metodológicas: construção do
espaço morfológico e redução do espaço morfológico. Na primeira etapa,
decompõe-se o sistema ou a função estudada. No entanto, deve-se ter o cuidado (a
partir de uma reflexão aprofundada) com a escolha desta decomposição. Convém,
em primeiro lugar, dispor de componentes o mais independente possível. Estes
componentes devem também dar conta da totalidade do sistema estudado. Porém,
demasiados componentes, rapidamente tornarão impossível a análise do sistema,
do mesmo modo que um número muito restrito de componentes, certamente a
empobrecerão. Na segunda etapa, referente à redução do espaço morfológico,
consiste em introduzir condicionalismos de exclusão, de critérios de seleção, a partir
do qual as combinações pertinentes poderão ser examinadas.
A análise morfológica permite um varrimento sistemático do campo dos
possíveis. Para não ser submerso pela combinatória, é necessário aprender a
65
navegar no interior do espaço morfológico, graças a critérios de preferências ou
restrições de escolha permitidos pelo software MORPHOL. No caso da construção
de cenários, a partir das etapas anteriores do método integrado (análise estrutural e
análise de jogos de atores), são definidas as incertezas críticas e as hipóteses do
sistema estudado. A representação pode ser visualizada na figura 8.
INCERTEZAS
CRÍTICAS
HIPÓTESES
INCERTEZA ―A‖
A1
(Hipótese 1 da incerteza A)
A2
(Hipótese 2 da incerteza A)
INCERTEZA ―B‖
B1
(Hipótese 1 da incerteza B)
B2
(Hipótese 2 da incerteza B)
INCERTEZA ―C‖
C1
(Hipótese 1 da incerteza C)
C2
(Hipótese 2 da incerteza C)
Idéia
Força 1
Idéia
Força 2
Idéia
Força 3
Idéia
Força 4
Figura 8 – Espaço morfológico.
2.5 – Exemplo do Plano Nacional de Recursos Hídricos
O Plano Nacional de Recursos Hídricos (PNRH), aprovado em dezembro de
2005, é um bom exemplo do uso dos cenários prospectivos nessa área, tendo sido
desenvolvido de forma participativa. Nesse estudo, em que a Secretaria de
Recursos Hídricos do Ministério do Meio Ambiente esteve à frente, consultaram-se
os mais variados setores da sociedade das diferentes regiões hidrográficas
brasileiras, tendo lhes sido facultado espaço para explicitar seus anseios e temores
com relação à gestão dos recursos hídricos.
O PNRH (MMA, 2006) definiu que os cenários de recursos hídricos no Brasil
sofrem influência em primeiro lugar, dos possíveis desdobramentos futuros do
mundo e do País em seu conjunto. No mundo, alguns condicionantes são vitais e é
importante explicitá-los.
66
Em primeiro lugar, está o aumento da demanda de alimentos; em segundo, o
desenvolvimento científico e tecnológico, particularmente nos processos de inovação
que impactam o consumo e a conservação das águas; a dinâmica econômica, em
geral, também contribui para influenciar os cenários de recursos hídricos no Brasil,
na medida em que oferece oportunidades de crescimento econômico para o País,
incidindo em expansão de atividades econômicas que impactam o acesso, o
consumo e a conservação das águas.
O condicionante mais fundamental, em termos internacionais, é o leque de
oportunidades que ele pode oferecer ao Brasil em função de sua maior ou menor
dinâmica econômica. O mundo pode manter o ritmo de crescimento observado nos
últimos anos ou pode arrefecer em função de diversos fatores, sejam eles
econômicos (crises), tecnológicos (esgotamento) ou políticos (guerras e rupturas).
O contexto nacional possui também condicionantes que influenciam de
maneira decisiva o uso e a gestão dos recursos hídricos nos próximos anos: a
organização político-ideológica hegemônica no âmbito das forças políticas, com
reflexo sobre a governança e governabilidade do Estado; o grau de modernização
que alcançará o Estado brasileiro, ampliando ou não sua capacidade de gestão, de
formulação e implementação das políticas públicas; a superação ou não de gargalos
infra-estruturais e institucionais ao desenvolvimento econômico; o grau de abertura
da economia brasileira e sua exposição à concorrência internacional; o ritmo da
inovação tecnológica na indústria e na agroindústria nacional; a concentração ou
desconcentração regional; os indicadores de desenvolvimento humano.
A Figura 9 mostra a lógica de construção de cenários, em que ficam claras as
relações das condicionantes, assim como a dependência do desempenho dos
recursos hídricos em relação à um contexto Nacional e Mundial.
67
FIGURA 9 – Representação lógica do processo de construção de cenários em recursos
hídricos. Fonte: MMA, 2006
Neste contexto, foi possível construir três cenários plausíveis para o Brasil do
ano de 2020. O cenário 1 ―Água para todos ou a água como bem comum‖. Em um
mundo que cresce de maneira contínua, o Brasil adota modelo de desenvolvimento
redutor da pobreza e das desigualdades sociais, com bom índice de crescimento
econômico e políticas sociais consistentes e integradas. Impulsionado, em parte,
pelos freqüentes conflitos, o País encontra uma forma mais eficaz no uso das águas,
incluindo o uso múltiplo.
O cenário 2 ―Água para alguns ou água com bem econômico‖ parte do
argumento de que o mundo e o Brasil são regidos por forte dinamismo excludente,
com expansão das atividades econômicas no País, fortes impactos sobre os
recursos hídricos e aumento da desigualdade social. A degradação dos recursos
hídricos é notória, com uma gestão liberal, planos inoperantes, participação social
formal e pouca regulamentação e fiscalização no uso das águas. Assim, os conflitos
crescem e a degradação compromete a qualidade dos recursos hídricos,sobretudo
nas regiões em expansão. O uso múltiplo das águas é parcialmente resolvido,
apenas, nas áreas de exportação.
68
O cenário 3 ―Água para poucos ou a água com bem secundário‖ acredita que
o Brasil não aproveita as poucas oportunidades de um mundo instável e
fragmentado, e tem pequeno crescimento das atividades econômicas e da infra-
estrutura urbana, com manutenção dos índices de pobreza e desigualdade social.
Não há expansão significativa no fornecimento de energia hidrelétrica. Os
investimentos em proteção de recursos hídricos são pequenos, seletivos e
corretivos, sob uma gestão burocrática. Os conflitos e problemas em torno dos
recursos hídricos crescem, particularmente nas regiões hidrológicas já deficientes e
localidades já problemáticas.
A complexidade do processo de elaboração do planejamento estratégico com
base em cenários dos recursos hídricos na Região Hidrográfica Amazônica exige
uma análise detalhada de cada elemento metodológico, onde permitirão definir as
variáveis e atores relacionados com os aspectos institucionais da gestão da água.
Descreve-se, aqui, de maneira extremamente sucinta a metodologia utilizada
na construção de cenários utilizada na elaboração do Plano Nacional de Recursos
Hídricos-PNRH, onde se destacam sete passos: a seguir anunciados:
Estudo retrospectivo do sistema a ser cenarizado. A finalidade desse
procedimento é de definir quais as variáveis de mudança e permanência no
sistema de recursos hídricos que prevaleceu nas últimas duas décadas.
Descrição da situação desse sistema. Serve para identificar a natureza e as
principais características do sistema de recursos hídricos, possibilitando
identificar suas principais variáveis e atores.
Identificação dos seus condicionantes de futuro. Processo de identificação no
sistema de recursos hídricos de suas invariáveis e incertezas críticas, assim
como seus atores mais relevantes e as incertezas críticas, fundamentais no
processo de geração de cenários.
Investigação morfológica. Técnica que permite, a partir de uma matriz
construída com as incertezas críticas, e suas hipóteses plausíveis,
articulando-as de forma racional e coerente, gerar a filosofia e a lógica dos
cenários plausíveis, sempre seguida da análise de coerência dos cenários
construídos.
69
Testes de plausibilidade dos cenários gerados. Aplicação de técnicas que
permitem examinar a plausibilidade dos cenários gerados. Entre essas
técnicas encontra-se a matriz de sustentação política, utilizada no PNRH.
Desenvolvimento dos cenários. Com os cenários gerados e selecionados em
função de sua factibilidade, é o momento de seu desenvolvimento segundo
dimensões definidas previamente.
Comparação e quantificação dos cenários. Trabalho de analisar,
comparativamente, os cenários selecionados e desenvolvidos, que são em
seguida quantificados com indicadores previamente escolhidos, de forma não
determinística, mas indicativa.
Especificamente ao resultado da análise morfológica é apresentada a figura
10, onde, como se pode observar, foram utilizados sete componentes (cenários
mundiais e nacionais, ocupação e uso do solo, usinas hidrelétricas, saneamento,
gestão, investimentos e despesas públicas), com, no máximo, quatro configurações
(neste caso foram utilizados critérios que variam com cada componente
especificamente).
Figura 10 – Resultado da análise morfológica realizada no âmbito da elaboração do Plano
Nacional de Recursos Hídricos. Fonte: MMA (2006).
70
3 - ESTUDO DA BACIA HIDROGRÁFICA DO RIO ARARANDEUA
3.1 – Localização Geográfica
A área de estudo é a bacia hidrográfica do Rio Ararandeua (Figura 11) no
município de Rondon do Pará, localizado na mesorregião Sudeste Paraense, Brasil ,
afluente à bacia hidrográfica do Rio Capim.
FIGURA 11 – Localização da bacia do rio Ararandeua no Estado do Pará – Brasil
Fonte: CACELA FILHO, 2008.
Segundo a Divisão Hidrográfica Nacional8, a bacia do rio Ararandeua pertence
à Região Hidrográfica Atlântico Nordeste Ocidental (figura 12). Já para a Divisão
Hidrográfica Estadual do Pará, a referida bacia encontra-se inserida, segundo
SECTAM (2007), na bacia do rio Capim, que por sua vez é localizada na sub-região
Guamá-Mojú da Região Hidrográfica Costa-Atlântica Nordeste, conforme a figura 13.
8Resolução 032 de 15 de outubro de 2003 – Conselho Nacional de Recursos Hídricos.
71
FIGURA 12 – Localização da Bacia do Rio Ararandeua: (A) Divisão Hidrgráfica
Nacional; (B) Localização da Região Hidrográfica Atlântico Nordeste Ocidental com as sub-divisões; (C) Bacia Hidrográfica do Rio Ararandeua localizada na sub-bacia 31; e (D) Bacia do Rio Ararandeua. FONTE: CACELA FILHO (2008).
FIGURA 13 – Mapa da Região Hidrográfica Costa Atlântica-Nordeste.
Fonte: SECTAM, 2007.
72
A bacia do Ararandeua possui uma área total de 10.742,62 km² , sendo que
9.714,08 km², correspondendo 90 % da bacia, localizam-se no estado do Pará e
1028,54 km², correspondendo a 10% da bacia hidrográfica, estão no estado do
Maranhão (MA), conforme a figura 14.
FIGURA 14 - Representação gráfica da Bacia Hidrográfica do Rio Ararandeua.
FONTE: CACELA FILHO (2007).
O rio Ararandeua nasce no estado do Maranhão no município de Açailândia a
uma altitude aproximada de 400 metros. A tabela 5 discrimina a divisão político-
administrativa dos municípios e respectivas áreas que ocupam dentro da bacia.
TABELA 5 - Municípios Integrados à Bacia Hidrográfica do Rio Ararandeua
Nº
ESTADO
NOME DO MUNICÍPIO
ÁREA DO MUNICIPIO EM KM² (IBGE)
PERCENTUAL DA ÁREA INTEGRADA TOTAL PARCIAL
INTEGRADA À BACIA
01 PARÁ GOIANESIA DO PARÁ
6.958,80 2.118,61 30,44 (%)
02 PARÁ RONDON DO PARÁ
8.277,30 7.595,47 91,76 (%)
03 MARANHÃO AÇAILANDIA 6.354,60 1.028,54 16.18 (%) Fonte: CACELA FILHO, 2008.
73
Os principais afluentes do rio Ararandeua são pela direita o rio Santa Lúcia e
rio do Ouro e, pela esquerda, os maiores e mais numerosos, que são os rios Água
Azul, Pitinga, Surubiju e Dourado, além dos igarapés Garrafão e Sete Voltas (figura
15).
FIGURA 15 – Principais afluentes do rio Ararandeua. Fonte: CACELA FILHO, 2008.
O município de Rondon do Pará reúne as principais características
econômicas, administrativas, políticas, sociais e ambientais da bacia hidrográfica do
rio Ararandeua. Ressalta-se que os municípios de Goianésia do Pará e Açailândia-
MA possuem importância relativa para o presente estudo, haja vista que pouco
abrangem da área total da bacia, não configurando elementos suficientes para o
estabelecimento das análises para a construção de cenários.
Entretanto, deve-se ter atenção para o fato do município de Açailândia conter
fragmentos de nascentes da referida bacia hidrográfica. Além disso, a sede
administrativa do município de Rondon do Pará é banhada pelo rio Ararandeua. A
partir desta constatação, tal estudo versará importantes descrições sobre a dinâmica
municipal, aproximando reflexões entre a gestão de recursos hídricos com a gestão
ambiental, onde priorizar-se-á a descrição dos elementos ambientais, das atividades
74
produtivas e a relação com as alterações no sistema hídricos e finalmente a análise
dos interesses dos atores sociais, constituídos como variáveis do processo
metodológico.
Com uma extensão territorial de 8.296,30 km2, o município de Rondon do
Pará está localizado na mesorregião sudeste paraense 06 e microrregião
Paragominas 017, tendo como coordenadas geográficas 04º47‘04‘‘ de Latitude Sul e
48º04‘49‘‘ de Longitude Oeste de Greenwich, limitando-se ao norte com os
municípios de Moju, São Domingos do Capim, Paragominas e Dom Elizeu; ao sul
com Abel Figueiredo, Bom Jesus do Tocantins e Marabá; à leste com Dom Elizeu e
Estado do Maranhão; e a oeste com Jacundá, Goianésia e Moju. A sede municipal
dista 532 km‘s da capital do Estado do Pará e 136 km‘s de Marabá, principal pólo
econômico da mesorregião, com o acesso pela BR-222, rodovia federal totalmente
asfaltada ver figura 16.
Figura 16 – Localização de Rondon do Pará
3.2 – Características socioambientais
O rio Ararandeua é o principal rio do Município de Rondon do Pará, o qual
nasce em terras do Estado do Maranhão, mas tem todo o seu curso atravessando o
município na direção Sudeste-Noroeste-Norte.
75
Esta região é produto do modelo desordenado de ocupação da Amazônia nas
décadas de 60-70, uma vez que os primeiros migrantes, vindos do sudeste e do
nordeste, chegaram nesta região no final dos anos 60 quando as estradas estavam
sendo abertas e a Belém-Brasília asfaltada. Resultante de um processo migratório
intenso e de exploração predatória dos recursos naturais, o município que, em 1986,
possuía 27,8% da cobertura vegetal de sua área alterada, hoje possui menos de
40% de sua área inalterada, estando localizado na área denominada de Arco do
Desmatamento9, conforme mostra a Figura 17, onde estão situados os 50
municípios responsáveis por 70% do desmatamento ocorrido no período de 2000-
2006 na Amazônia, com uma taxa de 3,6% de incremento no período
(MMA/SCA/SPRN, 2007).
FIGURA 17: Arco do Desmatamento na Amazônia e localização do Município de Rondon do
Pará. Fonte: Base cartográfica do IBGE. Adaptado de Monteiro, et al (1998).
9 Uma das características principais do desmatamento da Amazônia é a concentração geográfica, isto
é, A maior parte do desmatamento na região tem se concentrado ao longo de um ―Arco‖ que se estende entre o sudeste do Maranhão, o norte do Tocantins, sul do Pará, norte de Mato Grosso, Rondônia, sul do Amazonas e o sudeste do Acre. No período de 2000-2001, aproximadamente 70% do desmatamento na Amazônia Legal ocorreram em cerca de cinqüenta municípios nos estados de Mato Grosso, Pará e Rondônia, que representam em torno de 15,7% da área total da região. Entre alguns municípios desses estados, a área desmatada chega aos 80-90% de sua superfície total.
Para Becker (2002), a região do Arco do Desmatamento é uma área onde as atividades econômicas e a estrutura social e política já estão consolidadas; por isso, não cabe mais falar de "fronteira" ou de "desmatamento" para essas áreas. Ou seja, se a Amazônia é efetivamente uma região, então há que se substituir a política de ocupação por uma política de consolidação do desenvolvimento. Uma política de ocupação não tem mais cabimento, porque a região já está ocupada. As florestas que restaram devem permanecer com seus habitantes. É necessário articular os diferentes projetos e os diversos interesses e conflitos que incidem na região.
76
Nas últimas décadas a região amazônica vem sendo amplamente alterada
pela crescente presença humana e seus modos de exploração de recursos naturais,
principalmente na sua vertente sul onde se localiza o arco do desmatamento. Esta
forma geográfica de arco é decorrente da expansão da zona de fronteira agrícola
nas periferias da Amazônia, tendo a pecuária e posteriormente a soja como formas
predominantes de uso da terra (FEARNSIDE,1999).
A cobertura vegetal da área de estudo é vocacionada para a atividade
madeireira e está composta por duas formações florestais bem distintas, a floresta
equatorial subperenifólia e a floresta equatorial higrófila de várzea. O primeiro tipo
(subperenifólia) cobre a maior parte da região do município. Todavia, em
determinadas áreas, esta formação tem sido substituída através de processos
antrópicos por revestimento florístico do tipo ―capoeiras latifoliadas‖ com várias
idades, resultante do processo da exploração extrativista madeireira. Já o segundo
tipo de formação florestal (higrófila), regionalmente conhecida como ―mata da
várzea‖ é pouco representativa na área estudada.
Grande parte do município configura-se como área de desmatamento,
resultante das atividades de pecuária e de carvoaria, conforme pode ser visualizado
nas fotos 1 e 2.
FOTO 1 – Exemplo comum de queimadas e desmatamento na bacia do rio Ararandeua.
Os dados do DETER – Detecção do desmatamento em tempo real (MMA,
2008) confirmam que o município de Rondon do Pará (e consequentemente a bacia
77
hidrográfica do rio Ararandeua), está na lista dos 36 municípios que respondem por
50% do desmatamento do bioma amazônico. Entre agosto de 2006 e julho de 2007,
o município de Rondon do Pará foi o 9º município que mais desmatou no Estado do
Pará. A metodologia utilizada neste estudo foi o Sistema PRODES, que usa imagens
de satélite com resolução espacial entre 20 e 30 m (satélites LANDSAT e CEBERS).
Foto 2 – Imagem de desflorestamento na bacia do rio Ararandeua.
Em vários pontos das nascentes do rio Ararandeua a mata ciliar encontra-se
suprimida devido atividades em desacordo com a legislação ambiental, como
atividades de carvoarias e agropecuária.
A geologia do município é representada, em sua maior expressão, pela
Formação Barreiras (60% da área), constituída por sedimentos clásticos, mal
selecionados, variando de siltitos a conglomerados, com amarelo e vermelho como
cores predominantes, compondo os materiais formadores dos solos latossolo
amarelo distrófico e argissolo amarelo; e pela formação Itapecurú (35% da área),
constituída quase que exclusivamente por arenitos de cores diversas, predominando
cinza, róseo e vermelho, finos, argilosos, com estratificação cruzada e silicificações,
formadores dos argissolos vermelho amarelo e gleissolo hápico, com presença de
cascalhos e pedras localizados em relevo ondulado e forte ondulado.
Percebe-se a importância desta caracterização geológica neste estudo, na
qual agrava-se a relação existente com o nível de impactos de erosão e
sedimentação na bacia hidrográfica, além de favorecer a atividade de exploração
78
mineral, principalmente para a construção civil. Esta realidade por ser observada nos
registros fotográficos 3, 4 e 5.
FOTO 3 – Indústria de mineração na bacia do rio Ararandeua
FOTO 4 – Processo de extração mineral na bacia do rio Ararandeua
79
FOTO 5 – Processos erosivos na área urbana da bacia do rio Ararandeua.
O IDH-M – Índice de Desenvolvimento Humano Municipal - de Rondon do
Pará em 1991 estava em 0.615, tendo aumentado para 0.685 em 2000, índices
inferiores à taxa estadual, que estava em 0.663 e 0.720 nos respectivos anos. O
município ocupava o 43º lugar no ranking estadual em 1991, tendo caído para a 55ª
posição em 2000. Os dados do ano 2000 apontam para uma taxa de 75,70% de
alfabetização de adultos; 71,38% de freqüência escolar; 66,78 anos de esperança
de vida ao nascer; e índices de 0.696 de longevidade, 0.743 de educação e de 0.617
de renda, com R$ 156,81 de renda per capta. A perda do poder aquisitivo da
população e a diminuição de sua renda per capta são contrastantes com todos os
investimentos sociais feitos pelo Poder Público nos últimos anos, que geraram a
melhoria dos índices sociais e educacionais que compõem o IDH e o IDH-M.
Nas áreas de cabeceira da bacia, o conflito pelo uso da água e a falta de
fiscalização do órgão gestor é uma realidade. A comunidade local utiliza água para a
subsistência familiar (criação de gado e suínos, micro – sistemas de abastecimento
e cacimbas) e se opõem as indústrias locais, que utilizam o solo e a rede hídrica
com exploração irracional e desenfreada dos recursos naturais sem a preocupação
ambiental.
Observou-se o conflito pelo uso da água na principal nascente do Rio
Ararandeua, no município de Açailância-MA, envolvendo quatro atores sociais
importantes da bacia:
80
1. uso industrial da água no laticínio (foto 6),
2. uso da água para produção agrícola (foto 7) ,
3. uso da água para atividade de piscicultura (foto 8),
4. comunidade que utiliza a água para o consumo doméstico (foto 9).
FOTO 6 – Uso industrial da água no laticínio.
FOTO 7 – Uso da água para produção agrícola.
FOTO 8 – Uso da água para atividade de piscicultura.
81
FOTO 9 – Comunidade que utiliza a água para o consumo doméstico.
Na área urbana da bacia localiza-se a sede municipal do município de
Rondon do Pará. Configura-se como uma área de crescimento urbano desordenado,
principalmente com relação ao saneamento ambiental, com a identificação de
problemas de abastecimento de água, coleta e tratamento de esgoto, problemas na
rede de drenagem de águas pluviais e destinação final de resíduos sólidos (fotos 10,
11 e 12).
FOTO 10 – Disposição inadequada de resíduos sólidos na área urbana
82
FOTO 11 – Problemas na rede de drenagem de água pluviais na área urbana.
FOTO 12 – Despejo inadequado de efluentes industriais (matadouro) na área urbana.
Tanto os rejeitos domésticos e industriais, quanto à poluição por resíduos
sólidos escoam ao rio Ararandeua, prejudicando atividades de pesca, uso da água
para o consumo humano, atividades turísticas (foto 13) e de recreação (foto 14),
além de contribuir para o sério problema social de saúde pública no município.
FOTO 13 – Balneário da cidade de Rondon do Pará.
83
FOTO 14 – Utilização do rio Ararandeua para atividade de lazer.
Além disso, a atividade de carvoarias não respeita os limites de conservação
dos recursos hídricos, provocando assoreamento do rio Ararandeua (foto 15).
FOTO 15 – Atividade de carvoarias na bacia.
O município de Rondon do Pará foi criado através da Lei Estadual 5.027, de
13 de maio de 1982, tendo sido desmembrado do município de São Domingos do
Capim, no momento de criação de novos municípios no Estado do Pará devido à
construção da Hidrelétrica de Tucuruí, em 1984.
84
Através de convênios e parcerias com o Governo Federal e Governo
Estadual, o poder público municipal implementa diversos programas e projetos,
dentre os quais destacam-se os que possuem relação com a questão ambiental:
a) ―Rondon e sua Agenda 21, financiado pelo MMA - Ministério do Meio
Ambiente desde julho 2004;
b) ―Fortalecimento da Gestão Ambiental Municipal‖ financiado pelo FNMA -
Fundo Nacional do Meio Ambiente;
c) Para promoção do saneamento ambiental, o município elaborou convênio
com o Banco Interamericano de Desenvolvimento - BID visando estender o
abastecimento de água potável para 90% da população (o índice atual é de 60%
pelo sistema municipal de abastecimento e 25% por microssistemas comunitários
e 15% sem qualquer cobertura).
d) Em parceria com o Sistema de Proteção da Amazônia – SIPAM, através de
Termo de Cooperação Técnica, o intercâmbio de informações, documentos,
pesquisas e base de dados, tendo esse órgão já repassado informações
cartográficas e imagens de satélite para elaboração da Agenda 21 Local e do
Plano Diretor Municipal.
O Projeto de Fortalecimento da Gestão Ambiental, em conjunto com a
Agenda 21 Local e o Plano Diretor Municipal possibilitaram um momento propício
para promoção do capital social da comunidade, suprindo a carência de
capacitação, planejamento coletivo e junção de esforços comunitários em torno de
uma estratégia comum para mudar a realidade de devastação ambiental e pobreza
predominante na Amazônia. É importante ressaltar e identificar, entre os atores
sociais locais, o papel relevante que aqueles que compõem o Fórum de
Desenvolvimento Sustentável têm cumprido na promoção da participação, da
democratização e do desenvolvimento do município. São esses atores, em conjunto
com o CONSEMA - Conselho Municipal do Meio Ambiente - e com a Administração
Pública Municipal que serão inseridos na perspectiva de realização de entrevistas
qualitativas para complementar o processo metodológico desta pesquisa.
Outro ator social relevante no processo de gestão de recursos hídricos é o
CIDES - Consórcio Intermunicipal de Desenvolvimento Sustentável da BR-222,
composto pelos municípios de Rondon do Pará, Abel Figueiredo, Bom Jesus do
85
Tocantins e Dom Elizeu, é um potencial influenciador na criação de espaços de
gerenciamento da bacia do rio Ararandeua, pois agrega decisores fundamentais, ou
seja, os prefeitos, para impulsionar a integração entre a gestão ambiental e a gestão
de recursos hídricos nesta região.
O município de Rondon do Pará tem uma população de 46.311 habitantes
(IBGE, 2006), dos quais 34.917 domiciliados em área urbana e 11.394 em área
rural; composta por 49,19% de mulheres e 50,81% de homens, sendo
preponderantemente jovem, pois, 60,4% têm menos de 24 anos de idade. Esse fator
torna-se especialmente agravante, pois o município passa por uma crise social que
se agrava a cada dia, com a diminuição das oportunidades de trabalho e a queda da
renda da população, originada pela ―migração‖ da indústria madeireira para novas
frentes de expansão, uma vez que a matéria-prima por ela utilizada encontra-se
escassa, graças ao modelo exploratório irracional e predatório.
O abastecimento de água na sede é administrado pela Prefeitura através da
autarquia municipal Serviço Autônomo de Água e Esgoto - SAAE, existente desde
1984, que gerencia o fornecimento e manutenção do sistema, assim como também
administra suas receitas. O sistema de abastecimento do SAAE atende 70% da
população. Do restante da população, 25% são supridos por microssistemas
comunitários e 15% não têm cobertura de serviço. A rede de distribuição, no geral, é
incompatível com as normas técnicas. Um problema sério é o racionamento do uso
da água para consumo doméstico. Segundo informações colhidas no trabalho de
campo, constatou-se deficiência de reservatório de água no sistema de
abastecimento além do déficit de 55Km de rede de abastecimento. A captação é de
água subterrânea.
Na zona rural, o abastecimento de água é através de cinco microssistemas
de abastecimento de água administrados pela Prefeitura e pelas próprias
comunidades, sendo que não há recolhimento de taxas e a manutenção do sistema
é encargo do Poder Público Executivo. Esta cobertura é estendida à cerca de 30%
da população. Nos últimos anos, houve investimentos já concluídos nas localidades
de Santa Helena, Vila Palestina e estão em fase de conclusão os projetos do Km 56
e 69 da BR 222.
86
Inexiste o esgotamento sanitário tanto na zona urbana, quanto na rural. A
pequena rede de drenagem de águas pluviais existente não coleta água de todas as
bacias existentes, restringindo-se à coleta dos pontos críticos de linhas d‘água, que
são sete: seis no centro da cidade, e um, no bairro Gusmão.
Por falta de rigor na fiscalização, muitos moradores acabam canalizando as
fossas domésticas para essas galerias de redes de drenagem, o que resulta na
poluição do rio Ararandeua, que margeia a sede do Município, conforme pode ser
observado na foto 16.
FOTO 16 – Degradação ambiental devido efluentes domésticos no rio Ararandeua.
Fonte: Rondon do Pará (2007).
A Política Estadual de Recursos Hídricos do Pará, Lei nº 6.381/2001 ainda
não se tornou uma realidade na bacia do rio Ararandeua. Nenhum dos instrumentos
da Política foi implementado na bacia. O Governo do Estado têm realizado ações
limitadas de fiscalização ambiental. No entanto, o Governo Federal vêm
implementando, através do IBAMA – Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos
Recursos Naturais Renováveis, e a Polícia Federal, ações de combate à exploração
ilegal das florestas, com a Operação ―Arco do Fogo‖. No entanto, esta iniciativa não
vem possuindo êxito, principalmente com a atividade de carvoarias ilegais.
87
Os principais problemas socioambientais na bacia hidrográfica decorrentes
das atividades produtivas são:
I. o desmatamento descontrolado, inclusive das áreas de reserva legal e
preservação permanente;
II. a deposição de resíduos de serrarias (pó de serragem e restos de madeira)
em locais inadequados, como margens de rios e na área urbana;
III. a poluição do ar causada pela atividade de carvoarias e queima de
resíduos de madeiras em área urbana;
IV. a poluição dos rios, na área urbana, por lixos e dejetos lançados pelo
matadouro, por empreendimentos e atividades comerciais e industriais
poluidores e a canalização de fossas domésticas para os canais de águas
pluviais; e na área rural, pelo desmatamento da mata ciliar;
V. as queimadas indiscriminadas durante o verão, gerando poluição do ar e
destruição dos recursos florestais;
VI. a extração desordenada de minérios utilizados na construção civil, como o
seixo e areia, provocando assoreamento e poluição dos rios;
VII. a deposição de lixo em locais públicos inadequados, contribuindo para a
proliferação de insetos, roedores e doenças, assim como a ausência de
tratamento do lixo;
IX. a baixa capacidade do poder público em planejar estrategicamente o
desenvolvimento sustentável do município;
X. a baixa qualificação técnica dos quadros da administração pública e da
sociedade civil local, redundando num baixo capital social;
XI. a poluição urbana provocada pelas oficinas, postos de lavagem, lava-jatos,
laticínios, assim como por pequenos empreendimentos comerciais que não
acondicionam adequadamente seus resíduos;
88
XII. a ocupação urbana irregular.
3.3 – Atividades econômicas
A economia local ainda é sustentada basicamente pela indústria extrativa de
madeira e pela pecuária. Este setor agropecuário representa 49,3% do Produto
Interno Bruto Municipal. A agricultura é incipiente, constatando-se a produção de
culturas anuais, cujos principais produtos são: arroz, feijão e milho; e culturas
permanentes, tendo como principais produtos a pimenta-do-reino, o coco, o café e o
cupuaçu. Foi a partir da necessidade de estimular alternativas econômicas que a
administração municipal implantou o viveiro para reposição florestal, com uma
produção média de 70.000 mudas de espécies florestais e frutíferas ao ano,
distribuídas gratuitamente a produtores rurais e utilizadas para plantio e reposição
na área urbana.
A madeira, que mantém em atividade 24 serrarias, 08 fábricas de
compensados e 27 movelarias, é um produto cada vez mais escasso, fato que tem
ocasionado a desativação de vários estabelecimentos, ou seu deslocamento para
outras cidades, contrapondo com a pecuária, que cresce cada vez mais. No ano de
1996, a quantidade produzida de madeira em tora (m³) foi de 993.600 toneladas. Já
o carvão vegetal, para o mesmo período, teve uma quantidade produzida de 10.800
toneladas. No ano 2000, a quantidade de madeira em tora produzida foi de 349.580
toneladas. Por sua vez, o carvão vegetal contribuiu com 29.600 toneladas. Para o
ano de 2005, a quantidade produzida de madeira em tora foi de 218.869 toneladas.
Essas informações podem ser constatadas pelas tabelas 6, 7 e 8.
Tabela 6 – Principais produtos da extração vegetal do município de Rondon do Pará (PA).
Produtos Quantidade Produzida (t) Valor (Mil R$) 1994 1995 1996 1994 1995 1996
Carvão vegetal 44 52 10.800 9 16 2.160 Lenha (m³) 3.850 4.042 - 15 24 -
Madeira em tora (m³) 434.715 456.451 993.600 19.562 22.823 24.840 Fonte: IBGE/PEVS (2007).
89
Tabela 7 – Principais produtos da extração vegetal do município de Rondon do Pará (PA).
Produtos Quantidade Produzida (t) Valor (Mil R$)
1998 1999 2000 1998 1999 2000
Carvão vegetal 28.700 28.190 29.600 5.740 5.638 ... Lenha (m³) 5.100 5.860 5.485 41 53 ...
Madeira em tora (m³) 381.500 368.700 349.580 19.838 22.122 ... Fonte: IBGE/PEVS (2007).
Tabela 8 – Principais produtos da extração vegetal do município de Rondon do Pará (PA).
Produtos Quantidade Produzida (t) Valor (Mil R$)
2003 2004 2005 2003 2004 2005
Carvão vegetal 44.982 8 - 13.495 5 - Lenha (m³) 11.205 4.850 43.385 247 136 1.215
Madeira em tora (m³) 220.100 206.355 218.869 23.771 26.826 28.891 Fonte: IBGE/PEVS (2007).
Segundo PARÁ (2007), Em 2005, o rebanho bovino contava 360.598
cabeças, em mais de 900 propriedades cadastradas. Existe, ainda, um rebanho
considerável de 6.645 eqüinos, 11.290 suínos, 2.491 caprinos, 4.527 ovinos,
conforme pode ser observado na tabela 9 com a respectiva evolução recente.
Tabela 9 – Principais Rebanhos Existentes 2001-2005 em Rondon do Pará (PA).
Rebanhos Efetivo
2001 2002 2003 2004 2005
Bovinos 234.090 290.430 292.290 288.105 360.598
Suínos 8.771 17.590 16.777 13.932 11.290
Eqüinos 5.193 6.577 6.682 6.650 6.645
Asininos 728 847 877 1.600 1.610
Muares 2.217 2.866 2.895 2.708 3.187
Bubalinos - - 360 340 515
Ovinos 2.033 3.546 3.575 3.508 4.527
Galinhas 13.318 19.520 19.850 19.328 19.320
Galos, Frangos e Pintos
19.978
25.080
25.588
25.222
24.180
Caprinos 2.606 2.639 2.685 2.573 2.491
Vacas Ordenhadas
17.906 23.640 25.100 25.008 28.958
Fonte: IBGE/PEVS (2007).
Aqui cabe ressaltar que modelo de pecuária adotado na região, como em toda
a Amazônia, é o extensivo, sem controle de desmatamento, de queimadas ou
respeito aos limites legais de desmatamento, gerando além da destruição dos
recursos florestais à contaminação, erosão e assoreamento dos cursos d‘água na
região. Além disso, esses dados mostram que, longe de representar uma diminuição
90
da pressão sobre os recursos naturais, o que tem ocorrido é o avanço da pecuária
extensiva e o agravamento da crise social nas áreas urbanas.
Apesar da diminuição da quantidade de madeira produzida, uma atividade de
grande expressividade na bacia do rio Ararandeua e o carvoejamento, conforme
pode ser observado da foto 17.
Foto
: M
ayk
a A
mara
l
FOTO 17: Fornos destinados a carbonização de biomassa originaria de floresta primaria em Rondon do Pará (PA), 2005. Fonte: Monteiro et al. (2006).
É importante fazer um destaque para a localização das áreas de
carvoejamento na área do município, no qual percebe-se a degradação das
nascentes do Rio Ararandeua, conforme pode ser observado na figura 18.
91
FIGURA 18 - Evolução do desflorestamento no município de Rondon do Pará (PA) para os
anos de 1992, 1997, 2000, 2002, e 2004 e a localização das áreas de carvoejamento. Fonte: Monteiro et al. (2006)
O matadouro municipal registra uma média mensal de 470 bovinos e 170
suínos abatidos. O abate de animais ovinos e caprinos é informal, constatando-se,
também, que existe em larga escala o abate informal de bovinos, em desrespeito às
normas sanitárias. A estrutura física e higiênica desse logradouro público é precária,
contribui para a degradação ambiental do rio Ararandeua e não segue os padrões
sanitários legais.
92
IV – CONSTRUÇÃO DOS CENÁRIOS DE RECURSOS HÍDRICOS DA
BACIA
O componente metodológico desta pesquisa está fundamentado em quatro
elementos principais: i. construção da base de dados sobre as variáveis escolhidas;
ii. Aplicação de técnicas qualitativas e informacionais de construção de cenários
como base de planejamento de recursos hídricos em bacia hidrográfica; e iii.
sistematização, interpretação das informações e apresentação dos resultados.
Com relação ao primeiro elemento, optou-se escolher as seguintes variáveis,
de acordo com a caracterização da área de estudo, que constam em um banco de
informações sintetizadas neste trabalho:
a) Atividades produtivas:
Extração Vegetal
Agro-Pecuária
Mineração
Carvoaria
b) Alterações ambientais no sistema hídrico da bacia
Desmatamento
Erosão e sedimentação
Impactos devido à urbanização
Degradação das nascentes
c) Gestão pública para recursos hídricos e meio ambiente
Âmbito nacional
Âmbito estadual
Âmbito local
Este estudo das variáveis do sistema foi realizado in loco, de forma conjunta
com o Projeto ―Água e cidadania para o desenvolvimento local sustentável das
baças hidrográficas de Rondon do Pará‖. Foram realizadas duas missões de estudo
de campo, a primeira no mês de maio de 2008 e a segunda no mês de dezembro de
93
2008. Cada trabalho de campo durou sete dias e objetivou realizar as seguintes
atividades de pesquisa:
observações sistemáticas sobre a situação do município quanto às
variáveis,
levantamento de informações junto aos órgãos locais de interesse da
pesquisa,
realização de entrevistas com os atores sociais,
apoio ao mapeamento físico da bacia,
identificação das principais atividades produtivas,
apoio à realização de diagnóstico da qualidade da água da bacia,
identificação e caracterização de conflitos pelo uso da água,
apoio à medição da vazão do rio Ararandeua.
No que se refere ao segundo elemento metodológico, foi aplicado um caso de
simulação restrita às ferramentas integradas de construção de cenários: análise
estrutural, análise do jogo de atores e análise morfológica, conforme a figura 19.
94
FIGURA 19 – Estrutura de construção de cenários adotado nesta pesquisa.
Delimitação do Sistema
e pesquisa das variáveis chave
Variáveis Externas Motrizes
Variáveis Internas Dependentes
Meio Geral
(Variáveis Externas)
Fenômenos Estudados
(Variáveis Internas)
Estratégia dos Atores
Jogos de hipóteses probabilizados sobre questões chave para o futuro
Cenários 1- Encaminhamentos 2- Imagens 3- Planejamento
4- Estratégias
Análise Estrutural
MICMAC
Análise de
Atores
MACTOR
Retrospectiva Mecanismos Tendências Atores Motores
Situação Atual Germes de Mudança
Projeto dos Atores
Análise Morfológica
(MORPHOL)
95
4.1 – Análise Estrutural
A análise estrutural inicia-se com a delimitação das variáveis mais
importantes do sistema, na qual já estão definidas pelo item anterior. Constrói-se a
matriz de influência entre as variáveis no sentido de identificar quais são as variáveis
motrizes, dependentes, de ligação e independentes. Neste estudo, para o
preenchimento da matriz de influência, adotou-se valores de zero a três, sendo:
Zero – não existe influência
1 – influência fraca
2 – influência moderada
3 – influência forte
A matriz é preenchida da linha para a coluna em que é indicada a influência
que a variável da linha exerce nas variáveis da coluna. A diagonal principal é sempre
nula uma vez que não considera a influência da variável nela mesma.
Após o preenchimento da matriz, somam-se os valores das linhas e das
colunas. O valor das linhas indica a força que essa exerce no sistema, ou seja,
quanto maior o valor, maior é a motricidade da variável. O valor das colunas indica o
grau de dependência da variável, quanto maior o valor, maior é a influência que essa
variável recebe do sistema.
Define-se, então, os pontos médios de motricidade (PM), dado pela média
entre os maior valor de motricidade (VM) e o menor valor de motricidade (vM), como
indicado na equação 1. Da mesma forma, é determinado o ponto médio de
dependência (PD) dado pela média do maior valor de dependência (VD) e pelo
menor valor de dependência (vD), como indicado na equação 2.
PM = [(VM) + (vM)] / 2 equação 1
PD = [(VD) + (vD)] / 2 equação 2
96
Variáveis com valores de motricidade acima de PM são consideradas de alta
motricidade e variáveis com valores abaixo de PM são consideradas de baixa
motricidade. Da mesma forma, variáveis com dependência acima de PD são
consideradas de alta dependência e abaixo desse valor são consideradas de baixa
dependência. Com esses valores das variáveis e dos pontos médios, é possível
plotar o mapa de motricidade e dependência. Neste sentido, foi construída a tabela
10 para representar as variáveis do sistema.
Tabela 10 – Representação das variáveis do sistema estudado.
Domínio da Variáveis Variáveis Representação da variáveis
Atividades produtivas Exploração Madeireira Exp_Mad
Agro-Pecuária Agro-Pec
Mineração Carvoaria
Min Carv
Alterações ambientais Desmatamento Desm
no sistema hídrico da Erosão e sedimentação Ers_Sdm
Bacia Degradação de nascentes Deg_nas
Impactos da Urbanização Imp_Urb
Gestão Hídrica e âmbito Nacional Gha_Nac
Ambiental âmbito Estadual Gha_Est
âmbito Local ges_mun
O preenchimento da matriz é possível por meio das informações coletadas
pelo diagnóstico, reconhecimento do sistema e o estudo aprofundado da área,
sendo realizado pelo próprio analista. A partir deste ponto, utilizou-se o aplicativo de
livre acesso MICMAC®, desenvolvido pelo Laboratório de Prospectiva Estratégica e
Organizacional (LIPSOR).
A Matriz de Influência Direta – MDI relaciona a influência direta entre as
variáveis que definem o sistema pode ser analisada na figura 20. A tabela 11 mostra
a somatória de cada variável tanto para linhas quanto para colunas, no sentido de
subsidiar a construção dos pontos médios com a intenção de delimitar as variáveis
motrizes e dependentes, que está apresentado na figura 21.
97
1 : e
xp_m
ad
2 : a
gro
_pec
3 : m
in
4 : c
arv
5 : d
esm
6 : e
rs_sed
7 : d
eg_nas
8 : im
p_urb
9 : g
ah_nac
10 : g
ah_est
11 : g
es_m
un
1 : Exploração Madeireira
2 : Agro-Pecuária
3 : Mineração
4 : Coavoarias
5 : Desmatamento
6 : Erosão e Sedimentação
7 : Degradação de Nascentes
8 : Impactos da Urbanização
9 : Gestão Ambiental e Hídrica no Âmbito Nacional
10 : Gestão Ambiental e Hídrica no Âmbito Estadual
11 : Gestão Pública Municipal
0 1 0 3 3 3 1 2 2 2 2
3 0 2 3 3 3 2 2 3 2 2
0 0 0 1 2 3 1 2 1 2 1
3 0 1 0 3 2 0 3 2 1 1
2 2 2 2 0 3 2 1 1 2 2
2 1 2 2 3 0 1 1 1 1 1
2 1 1 1 1 0 0 2 3 2 1
3 1 0 2 1 1 2 0 2 2 3
2 1 2 2 2 2 3 2 0 3 2
1 1 2 1 1 1 2 1 2 0 2
1 1 0 1 1 2 2 3 1 1 0
© L
IPS
OR
-EP
ITA
-MIC
MA
C
FIGURA 20 – Matriz de influência direta e indireta das variáveis do sistema
TABELA 11 – Somatória de linha e colunas para cada variável. N° V A R I A B L E TO T A L N U M B E R
O F R O W S TO T A L N U M B E R O F
C O L U M N S
1 Exploração Madeireira 19 19
2 Agro-Pecuária 25 9
3 Mineração 13 12
4 Carvoarias 16 18
5 Desmatamento 19 20
6 Erosão e Sedimentação 15 20
7 Degradação de Nascentes 14 16
8 Impactos da Urbanização 17 19
9 Gestão Ambiental e Hídrica no Âmbito Nacional
21 18
10 Gestão Ambiental e Hídrica no Âmbito Estadual
14 18
11 Gestão Pública Municipal 13 17
Totals 186 186
98
FIGURA 21 – Mapa de influência direta e dependência.
Pode-se observar no mapa de influência direta e dependência que a variável
motriz principal do sistema é a agropecuária, responsável pela situação atual da
bacia do rio Ararandeua. Gestão ambiental e hídrica no âmbito nacional,
desmatamento e exploração madeireira são variáveis de ligação do sistema.
Observa-se que cada uma dessas três variáveis representa questões de
administração da bacia, alterações ambientais no sistema hídrico e atividade
produtiva, respectivamente.
A gestão ambiental e hídrica no âmbito nacional é uma variável de ligação
devido a capacidade de influenciar outras variáveis como a gestão ambiental e
hídrica nos âmbito estadual e local. No caso do desmatamento, a classificação desta
variável em ligação deve a possibilidade de influenciação sobre outras variáveis
como erosão e sedimentação e degradação das nascentes. Já para a exploração
madeireira, é também considerada de ligação, pois agrega outras atividades
produtivas como a carvoaria. Mineração é considerada uma variável independente
relaciona com as outras, porém é importante explicar que o aplicativo MICMAC
apresenta os mapas com os limites das variáveis para formar o plano cartesiano.
99
A figura 22 mostra o gráfico de influência direta entre as variáveis do sistema.
Novamente é possível integrar as análises matemática dos grafos, indicando
relações causais com pesos de influenciação. Neste caso, são utilizados pesos de
influenciação forte (peso 2) e muito forte (peso 3) entre as variáveis. Tais análises
gráficas permites apresentar todos os tipos de relação de influenciação, no entanto,
priorizou-se mostrar apenas as principais ênfases do programa computacional para
facilitar o entendimento da pesquisa científica.
FIGURA 22 – Gráfico de forte influência entre as variáveis com apenas 30% das relações
em ordem de importância para o sistema.
Para verificação de influência indireta, o MICMAC realiza multiplicações
sucessivas da matriz de influência direta por ela mesma até a seqüência de
ordenamento das variáveis (classificação por motricidade e dependência)
permaneça estável, ou seja, não se alterar mais. A classificação das variáveis segue
o mesmo procedimento utilizado na influência direta. Finalmente a figura 23
demonstra o gráfico de influência indireta.
100
FIGURA 23 – Gráfico de forte e relativa influência indireta.
Uma das principais contribuições metodológicas da análise estrutural de apoio
à construção cenários é a classificação das variáveis em critérios de motricidade e
dependência no sistema. Com base nas tabelas 12 e 13, é possível perceber que a
variável de maior motricidade é a agropecuária. Já a variável de maior dependência
é o desmatamento. Esta análise apenas contribui para o diagnóstico identificado nas
matrizes, gráficos e mapas mostrados na pesquisa. As ligações entre as duas
colunas de variáveis mostra a proximidade de motricidade (mineração e gestão
pública municipal) e de dependência no sistema (gestão ambiental e hídrica nos
âmbitos nacional e estadual).
101
TABELA 12 – Rank das variáveis de maior influenciação.
TABELA 13 – Rank das variáveis de maior dependência.
4.2 – Análise de atores
Para a compreensão do comportamento dos atores dentro do sistema-objeto,
Godet (1993) apresenta a metodologia MACTOR, (Método de Atores, Objetivos e
Fatores de Força). Por ter sido julgado o mais pertinente, esse método será usado
no suporte metodológico deste trabalho para caracterizar o comportamento dos
atores envolvidos. Dispõe-se, também, de um aplicativo de livre acesso para a sua
aplicação, MACTOR®, desenvolvido pelo Laboratório de Pesquisa em Estratégia
Prospectiva e Organizacional (LIPSOR, 2004b).
Esse método tem por objetivo analisar o comportamento de um determinado
grupo de atores com relação a uma situação futura, dada uma configuração de um
102
conjunto de objetivos estratégicos, os quais descrevem ou determinam essa
situação de futuro. Para esse suporte metodológico, os objetivos estratégicos
analisados são aqueles que o sistema de gestão dos recursos hídricos considera
mais pertinentes para alcançar uma gestão adequada.
Como o desfecho e o rumo da maioria dos condicionantes de futuro
dependem diretamente das posições e das ações que esses atores podem vir a
tomar, é necessário avaliar seu comportamento, assim como seus interesses dentro
do sistema analisado e sua capacidade de influenciar outros atores envolvidos.
No caso específico da análise dos jogos de atores, foram realizadas
entrevistas qualitativas com o objetivo de aproximar a simulação computacional com
realidade da bacia hidrográfica. Tais entrevistas tiveram como foco os diversos
representantes dos atores sociais envolvidos nos processo decisórios relacionados à
questão hídrica e ambiental. Os principais pontos a serem desenvolvidos nesta
entrevista estão relacionados com as seguintes questões norteadoras:
quais os principais objetivos de sua organização com relação aos
recursos hídricos na bacia do rio Ararandeua;
como sua organização se relaciona com outros segmentos socais e
setores econômicos para atingir tais objetivos;
quais as estratégias desenvolvidas para atingir tais objetivos;
qual a influência social que sua organização possui com relação aos
outros atores sociais.
Após as informações sistematizadas a partir do trabalho de campo, foi
definida a matriz de forças entre atores, matriz de influência direta (MDI). Essa
matriz estabelece o nível de influência que cada ator tem com relação aos outros.
Para isso, deve-se conhecer bem a dinâmica e o comportamento desses atores
dentro do sistema estudado. Nesse caso, também são definidos pesos para indicar o
nível de influência que um ator exerce em outro. Para isso, também é necessário
conhecer bem o comportamento dos atores e ter um histórico das ações que esses
atores têm tomado com relação aos recursos hídricos.
Esses pesos seguem os seguintes critérios:
103
0: O ator i não influencia o ator j;
1: O ator i influencia temporariamente algumas ações do ator j;
2: O ator i influencia na definição de projetos (ou pretensões) do ator j;
3: O ator i influencia os objetivos estratégicos do ator j;
4: O ator i influencia a própria existência do ator j.
O método MACTOR funciona da mesma forma que o MICMAC. A partir de
interações entre os atores x atores e atores x objetivos, é possível estabelecer
matrizes de influência direta e indireta, gráficos de motricidade e dependência. O
aplicativo MACTOR® apresenta relações de aliança e conflitos para cada objetivo, na
forma de um histograma que, quando apresentado em ordem decrescente de
possíveis conflitos, são consideradas as menores diferenças em módulo entre os
valores a favor e em contrário para cada objetivo. Esse histograma é chamado de
histograma de posicionamento dos atores.
Para a situação deste caso de estudo, são definidos como atores de maior
relevância para a gestão de recursos hídricos do Rio Ararandeua, conforme a tabela
14.
TABELA 14 – Descrição dos atores sociais da bacia.
N° Long label Short label
1 Poder Público (âmbitos nacional, estadual e municipal) Pod_Pub
2 Madeireiros Mad
3 Laticínio e Matadouro Lat_Mat
4 Agro-Pecuaristas Agro_Pec
5 Mineradores Min
6 Organizações Não-Governamentais ong
7 Representantes das comunidades não organizadas formalmente comun
8 Agricultores da nascente agri_nasc
9 Produtor de Peixe (piscicultura) piscic
10 Pescadores pesc
11 Donos de carvoaria carvao
12 Donos de balneários turísticos tur
104
Foram definidos os objetivos de acordo com a pesquisa de campo e através
de entrevistas junto aos atores sociais (tabela 15).
TABELA 15 – Descrição dos objetivos dos atores da bacia
N° Long label Short label
1 Crescimento Econômico Cres. Ec
2 Organização social OS
3 Fiscalização Ambiental Fisc. Amb.
4 Adequação às normas ambientais e sanitárias ambsanit
5 Desenvolvimento Sustentável desen_sust
6 Acesso à água aces_água
7 Preservação das nascentes do rio pres_nasc
8 Recomposição das matas ciliares rec_matcil
9 Promoção do Turismo prom_tur
A tabela 16 mostra a matriz de influencia direta entre atores sociais.
TABELA 16 – Matriz de interação entre atores e objetivos.
Pod_Pub Mad Lat_Mat Agro_Pec Min ong comun agri_nasc piscic pesc carvao tur
Pod_Pub 0 3 2 2 2 2 3 1 1 0 1 1
Mad 2 0 0 4 1 3 3 2 1 3 3 2
Lat_Mat 1 2 0 1 0 0 2 3 1 2 0 1
Agro_Pec 3 3 3 0 0 2 2 2 1 1 2 0
Min 1 0 0 0 0 3 2 0 0 4 0 1
Ong 2 1 2 2 1 0 2 2 1 1 1 1
Comum 2 1 0 0 1 3 0 2 1 1 0 1
agri_nasc 1 0 0 1 0 2 2 0 2 1 0 0
Piscic 1 0 0 0 0 2 1 1 0 2 0 0
Pesc 1 0 0 0 0 2 1 1 1 0 0 1
Carvão 2 2 0 1 0 2 1 0 0 2 0 1
Tur 1 0 0 0 0 1 1 0 0 2 0 0
O mapa de influencia e dependência entre os atores sociais (figura 24) mostra
como funciona o ciclo de interesses. No primeiro quadrante observa-se os atores
que estão diretamente relacionados com a exploração de recursos florestais e
agropecuária. No segundo quadrante, observa-se atores de diretamente
relacionados com o desenvolvimento social da bacia. No terceiro quadrante vê-se
atores que iniciam uma atividade produtiva alternativa da madeira e do gado, por
isso são consideradas independentes no sistema. Já no quarto quadrante observa-
se atores dependentes, ou seja, são atores que são diretamente influenciados pelas
decisões dos atores motrizes.
105
FIGURA 24 - Mapa de influencia e dependência entre os atores sociais.
O histograma de competitividade (figura 25) mostra o poder de influencia
indireta entre os atores sociais, que condiz com a realidade local no qual o poder
econômico exerce influencia fundamental no sistema estudado.
FIGURA 25 - Histograma de competitividade entre atores da bacia.
106
O gráfico de convergência entre os atores sociais da bacia (figura 26) mostra
a relação direta dos objetivos de interesse público para os governos e a sociedade
civil. Isto pode ser explicado pelo fato de um histórico de participação social,
principalmente no caso de agricultores familiares da região. No entanto, com o apoio
das cores e pesos de influência é possível perceber que mesmos atores muito
distintos podem ter objetivos convergentes os principais atores que influenciam o
sistema: poder público e agro-pecuária.
FIGURA 26 - Gráfico de convergência entre os atores sociais da bacia.
O mapa de distância entre objetivos (figura 27) mostra claramente a
aglutinação importante e que pode influenciar diretamente o sistema da bacia. São
os objetivos que focam a sustentabilidade do sistema. Isto significa um elemento de
grande importância estratégica da construção do cenário da bacia, pois possibilitará
a mudança de modelo de exploração madeireira para o uso sustentável dos
recursos naturais da bacia, resolução de conflitos sociais e ambientais, recuperação
de áreas degradadas com acesso à água em qualidade e quantidade necessária ao
desenvolvimento humano e econômico com respeito aos limites de conservação dos
recursos hídricos.
107
FIGURA 27 – Mapa de distância entre objetivos.
O aplicativo MACTOR possibilita análise de equilíbrio dos atores sociais com
relação a determinado objetivo. Na figura 28 percebe-se a relação entre atores
sociais com relação ao objetivo de crescimento econômico. É possível analisar que
os atores motrizes deste objetivo são os pecuaristas, madeireiros e donos de
carvoaria.
FIGURA 28 – Balança entre atores e objetivo de crescimento econômico.
108
A mesma análise pode ser observada com outros objetivos. Na figura 29
mostra que a bacia pouco influencia na promoção de turismo, apesar do potencial da
região para o ecoturismo e turismo rural. No caso da figura 30, é mostrada a
importância do trabalho das organizações não governamentais, das comunidades
para a elevação da organização social na bacia do rio Ararandeua.
FIGURA 29 – Balança entre atores e objetivo de promoção de turismo.
FIGURA 30 – Balança entre atores e objetivo de organização social.
109
FIGURA 31 – Gráfico de distância entre os objetivos.
O gráfico de distância entre os objetivos (figura 31) mostra que há uma
relação de grande importância do sistema estudado entre crescimento econômico e
fiscalização ambiental. Isto pode ser explicado pelo fato de que as principais
atividades produtivas (carvoarias, pecuária e exploração madeireira) serem
realizadas sem critérios de sustentabilidade social e ambiental. Atualmente a região
passa por um colapso ambiental no tange ao desmatamento. Como conseqüência
percebe-se diversos conflitos que integram tanto à disputa pela terra, quanto à
disponibilidade hídrica da bacia do rio Ararandeua, como foi mostrado no capítulo
referente ao estudo da bacia.
110
FIGURA 32 – Mapa de escala de distância entre os atores sociais.
O mapa de escala de distância entre os atores sociais (figura 32) mostra o
isolamento de três grupos: donos de carvoaria, mineradores e pescadores. Isto pode
ser explicado a partir de um contexto social de mudança do modelo de exploração
madeireira, trabalho infantil nas carvoarias do Estado do Pará. Os pescadores da
bacia do rio Ararandeua são cada vez mais escassos e não-organizados não têm
acesso à financiamento. No caso dos mineradores, seus objetivos são claramente
definidos como extração mineral. No entanto, foram identificados potenciais
impactos ambientais da atividade, o que aproxima do grupo de atores sociais
principal (pecuaristas, do sistema de cenarização dos recursos hídricos da bacia do
rio Ararandeua, madeireiros, poder público, comunidades, agricultores da nascentes,
ongs) na construção dos cenários estratégicos da bacia do rio Ararandeua.
4.3 – Análise Morfológica
A primeira fase da análise morfológica consiste em decompor o conjunto de
variáveis evoluídas da análise estrutural e análise de atores. É importante
esclarecer, novamente, que o presente trabalho, propõe-se a construir um cenário
estratégico da bacia, ou seja, com base na gestão integrada de recursos hídricos e o
111
desenvolvimento sustentável. Na tabela 17 o sistema estudado é decomposto em
hipóteses plausíveis com o objetivo de simular a criação de cenários
TABELA 17 – Definição do espaço morfológico.
Domínios Variáveis Hipótese 1 Hipótese 2 Hipótese 3
Atividades produtivas
Exploração madeireira
Incremento estagnação Adequação ambiental
Agro-Pecuária Verticalização da
produção Recuperação de
áreas degradadas maior conflito
socioambiental
Mineração Identificação de
novas áreas Adequação ambiental
assoreamento e contaminação
Carvoarias Diminuição drástica aumento da produção
maior ficalização ambiental
Alterações ambientais no sistema hídrico da
bacia
Desmatamento Aumento Estagnação agricultura sem
uso do fogo
Erosão e sedimentação
reabilitação do solo assoreamento dos
corpos d'água
Degradação de nascentes
proteção ambiental fiscalização ambiental
diminuição de água à jusante
Impactos da Urbanização
controlado investimento em
saneamento falta de água e de
esgotamento
Gestão Hídrica e
Ambiental
âmbito Nacional Descentralizada e
participativa inoperante
âmbito Estadual gestão integrada mais fiscalização
ambiental estagnada
âmbito Local consciente do
problema social dependente do
poder econômico paternalista
Atores sociais
Setor Produtivo comprometido com
a bacia
conivente c/ as questões
ambientais
Sociedade Civil capacitada atuante cooptada pelo coronelismo
político
Como o objetivo desta pesquisa é de criar um cenário estratégico para a
bacia do rio Ararandeua, priorizou-se utilizar o método de restrições e preferências
de variáveis no sentido de possibilitar uma escolha necessária para o caminho a se
seguir na gestão de recursos hídricos da bacia.
A simulação morfológica propõe estabelecer restrições para que não haja
superposição de cenários. Um exemplo disso é a impossibilidade de haver forte
impacto ambiental (desmatamento, erosão, degradação de nascentes) com um setor
produtivo consciente sobre as causas de tal impacto ambiental. Ou mesmo, haver
forte impacto ambiental na bacia com uma gestão hídrica e ambiental bem
estruturada e atuante. Todo cenário que conter essas restrições é excluído. Da
112
mesma forma, podem-se estabelecer preferências, onde são considerados todos os
cenários que tiverem uma determinada combinação de hipóteses.
Neste sentido, optou-se por definir somente dois cenários: um sustentável e
outro cenário de crise socioambiental e econômica. A figura 33 mostra o espaço
morfológico com as preferências de hipóteses do cenário sustentável, enquanto que
na figura 34 vê-se o cenário de crise no setor agropecuário no que se refere à
estagnação das atividades produtivas e o ciclo de desmatamento na região.
FIGURA 33 – Espaço morfológico com preferências e restrições do cenário estratégico
sustentável.
113
FIGURA 34 – Espaço morfológico com preferências e restrições do cenário tendencial negativo.
Desta forma, são apresentados os seguintes cenários da bacia:
CENÁRIO TENDENCIAL DE CRISE ECONÔMICA SOCIOAMBIENTAL
Com o histórico de estagnação do setor florestal na região do arco do fogo da
Amazônia, muitas madeireiras e serrarias funcionam de forma precária e ilegal. A
pecuária acirra o ciclo de desmatamento e o uso improdutivo das fazendas. Como
conseqüência, aumenta os conflitos pela terra e pela disponibilidade hídrica. Sem a
fiscalização ambiental necessária, a atividade de carvoaria ganha destaque como
um dos elementos de maior impacto social e ambiental, pois aumenta o
desmatamento e a degradação das áreas de preservação permanente. A exploração
114
mineral na bacia intensifica-se sem o controle ambiental, o que prejudica a tanto a
qualidade da água, quanto o assoreamento do rio.
Devido à falta de controle ambiental, os laticínios e matadouros localizados
nas áreas de cabeceira da bacia, despejam seus efluentes industriais in natura nos
corpos d‘água, fato que tem diminuído a produção de água para jusante da bacia,
além de prejudicar outras atividades produtivas (como agricultura familiar, criação de
peixes, turismo e pesca) e a comunidade que necessita de água de qualidade
suficiente para a satisfação das necessidades domésticas. Tais impactos colaboram
com a falta de planejamento urbano, sem infra-estrutura de saneamento básico para
população urbana e rural, o que agrava a situação ambiental da bacia e prejudica a
população, que fica sem acesso à água potável.
Com a Gestão Pública Municipal dependente do poder econômico e político
dos donos de carvoarias, pecuaristas e atores sociais conservadores da região,
pratica o paternalismo histórico com os munícipes. De forma isolada, a gestão
ambiental e hídrica no âmbito do Estado do Pará e Maranhão é conivente com os
problemas ambientais da região. E no âmbito federal a Política de Recursos hídricos
torna-se inoperante, pois os mecanismos de gestão não se aplicam à realidade
regional. Além disso, a sociedade civil está desorganizada para o desafio de
promover o desenvolvimento da bacia do Rio Ararandeua.
CENÁRIO ESTRATÉGICO DE SUSTENTABILIDADE DA BACIA DO RIO
ARARANDEUA
O modelo de desenvolvimento adotado na bacia hidrográfica da bacia do rio
Ararandeua visa a sustentabilidade dos recursos hídricos. As atividades produtivas
agregam valor ambiental aos seus produtos, com a extração vegetal diversificada
através de projetos de reflorestamento e recuperação de áreas degradadas pela
pecuária. Com isso há diminuição gradual da atividade de carvoejamento na região,
possibilitada pelas alternativas econômicas de turismo, agroecologia e piscicultura. A
mineração destinada para construção civil impulsiona a economia local, adequada
às normas de licenciamento ambiental. Entretanto, preocupa a possibilidade de
contaminação e de impactos desta atividade.
115
Com a diminuição das alterações ambientais na bacia, novas práticas
agrícolas sem o uso do fogo e manejo florestal substituem o desmatamento e as
queimadas. A reversão de processos erosivos na área urbana e rural foi
possibilitada pela reabilitação do solo, dando nova vida aos corpos d‘água da bacia
com a diminuição do assoreamento. As principais nascentes da bacia, localizadas
no Estado do Maranhão, estão protegidas e a fiscalização ambiental se faz presente
no sentido de controlar a qualidade dos efluentes industriais dos laticínios e
matadouros que são despejados à montante do rio Ararandeua. Na área urbana,
grande investimentos são realizados em infra-estrutura de saneamento com o
objetivo de fornecer água em qualidade e quantidade suficiente para população do
município de Rondon do Pará. Além disso, o déficit de esgotamento sanitário diminui
e a cidade possui mais qualidade de vida e oportunidade de trabalho e renda.
Um sistema de gestão ambiental e hídrica no âmbito nacional bem
estruturado e atuante consegue, junto com os Estados do Pará e Maranhão,
gerenciar a bacia do rio Ararandeua de forma integrada com os usuários e
sociedade civil. Os municípios de Rondon do Pará, Goianesia do Pará e Açailância,
conscientes dos problemas ambientais unem-se para proteger a bacia do rio
Ararandeua, dirimindo conflitos pelo uso da água e fortalecendo o papel do
município como orientador do desenvolvimento local, com atores sociais
comprometidos com a região e organizações não-governamentais atuantes no
processo de gestão ambiental e hídrica.
116
V – CONSIDERAÇÕES FINAIS
Na presente pesquisa, foi proposta a elaboração de um suporte metodológico
para o planejamento em recursos hídricos no âmbito da bacia hidrográfica utilizando
prospecção de informações para a construção de cenários estratégicos. Formulou-
se, nesse caso, a hipótese, segundo a qual, a metodologia integrada preconizada
por Godet (1993) pudesse ajudar a construir cenários de recursos hídricos em um
determinado território delimitado por uma bacia hidrográfica, incorporando
dimensões sociais, ambientais e econômicas e com isso contribuir com o processo
decisório relativo à gestão de recursos hídricos e de meio ambiente.
Para a base deste processo metodológico, buscaram-se metodologias que
ajudassem a mudar a percepção do decisor e que pudessem levá-lo a reconhecer a
situação futura, para tomar decisões no presente, com vistas à amadurecer o
processo de planejamento e gestão de recursos hídricos numa bacia hidrográfica.
Neste sentido, optou-se por utilizar uma adaptação do suporte metodológico
integrado da prospectiva estratégica, da seguinte maneira:
a) Construção da base de dados sobre as variáveis escolhidas;
b) Aplicação de técnicas qualitativas e informacionais de construção de
cenários como base de planejamento de recursos hídricos em bacia hidrográfica; e
c) Sistematização, interpretação das informações e apresentação dos
resultados.
Para tanto, foi desenvolvido este processo metodológico para um caso de
estudo na bacia hidrográfica do rio Ararandeua. A escolha da bacia se deve a dois
fatores principais: é uma das bacias hidrográficas mais desmatadas de toda região
do bioma amazônico devido à extração vegetal e a pecuária; e o segundo motivo
está relacionado ao desenvolvimento do projeto ―Água e Cidadania para o
Desenvolvimento Local Sustentável das Bacias Hidrográficas de Rondon do Pará‖,
no qual foram realizados processos de desenvolvimento de capacidades, avaliação
do sistema hídricos, diagnóstico da qualidade da água e estudo de indicadores de
117
recursos hídricos. Isto facilitou o financiamento da pesquisa para a construção da
base de dados sobre as variáveis escolhidas.
Como principal elemento de análise da bacia hidrográfica do rio Ararandeua,
delimitou-se o município de Rondon do Pará, tanto por sua extensão territorial na
bacia, como pelo conjunto de informações disponibilizadas sobre dimensões
ambientais, sociais, econômicas e políticas.
Objetivando propiciar um melhor entendimento das discussões apresentadas
neste último capítulo, o mesmo foi estruturado em quatro etapas:
1. Metodologia utilizada: é avaliado o procedimento metodológico
adotado;
2. Objeto da pesquisa: refere-se à aplicabilidade da metodologia proposta
e pertinência como instrumento de apoio ao planejamento e gestão dos
recursos hídricos;
3. Abordagem empregada no suporte metodológico proposto: análise da
concepção da ferramenta apresentada, assim como suas limitações e
possíveis recomendações para melhoria na continuidade da pesquisa;
4. Caso de estudo – a bacia do rio Ararandeua: discussão sobre os
resultados encontrados no exercício de simulação de construção de
cenários para a bacia de estudo.
Metodologia utilizada
Adotou-se para este trabalho uma abordagem metodológica de natureza
exploratória, o que levou, em um primeiro momento, à construção de uma referencial
teórico focado em dois pontos:
Gestão Integrada de Recursos Hídricos: Aqui se realizou uma abordagem
sobre a fundamentação das bases conceituais acerca do desenvolvimento
sustentável e a relação com os recursos hídricos, com informações consistentes das
diversas escolas de pensamento filosófico e histórico desta concepção até os dias
atuais com as Metas de Desenvolvimento do Milênio da ONU. Caracterizou-se a
importância da bacia hidrográfica como base de gestão de recursos hídricos.
Mostrou-se a importância dos marcos regulatórios da gestão, com a Lei n°9.433/97,
118
seus fundamentos, objetivos, instrumentos e sistema de gerenciamento. Finalmente,
focou no planejamento em recursos hídricos, trazendo elementos suficientes para
abordar processos metodológicos frente ao desafio de compatibilizar os diversos
interesses sociais presentes nos usos múltiplos da água.
Prospectiva Estratégica e Construção de Cenários: o primeiro ponto a ser
abordado foi estabelecer diferenças claras e objetivas entre planejamento,
prospectiva e estratégia. A partir de estudos bibliográficos, percebeu-se que há
muitas dúvidas sobre este trinômio, o que pode dificultar o processo decisório em
recursos hídricos. Em decorrência de tais definições conceituais, partiu-se para o
estudo do planejamento estratégico com base em cenários, trazendo diversas
escolas do planejamento, porém focando na metodologia preconizada por Godet
(1993; 1997; 2000; 2007), dentro de uma visão sistêmica, territorial e qualitativa,
onde se aprofundou o referencial metodológico no que se refere à análise estrutural,
análise dos jogos de atores sociais e análise morfológica, sendo as ferramentas
integradas para a construção de cenários. Como apoio teórico utilizou-se elementos
matemáticos, especificamente da álgebra linear para explicar como funciona a
análise estrutural, análise de atore sociais e a análise morfológica. Tais teorias são
fundamentais para simular as situações na forma matricial e gráfica. Por fim, foi
necessário estabelecer uma análise prática da aplicação da metodologia e o caso
escolhido para fazer tal demonstração foi a elaboração do Plano Nacional de
Recursos Hídricos do Brasil, onde percebeu-se a importância de haver participação
para chegar num resultado mais próximo da realidade.
No entanto, para a construção da base de dados sobre as variáveis
escolhidas, realizaram-se estudos bibliográficos, coletas de informações in loco e
conversas presenciais com determinados atores sociais locais. Para a validação das
informações, foi necessário realizar duas viagens com objetivo de trabalho de
campo, que propiciou uma base sólida de dados para estabelecer resultados mais
próximos da realidade.
No capítulo que trata do método propriamente dito, foi possível realizar
simulações de análise estrutural, análise de atores e análise morfológica. Tais
simulações constituíram-se de exercícios práticos que posteriormente as variáveis
119
foram recenseadas e calibradas com as informações colhidas em trabalho de
campo.
Objeto de pesquisa
É importante compreender o que pode vir a acontecer no futuro a partir de
eventos e decisões ocorridas no presente. A construção de uma visão de futuro,
para estabelecer uma relação de causa e efeito, pode não só auxiliar no processo de
tomada de decisão como levar a um maior conhecimento atual do sistema hídrico
em estudo, já que se promove a definição das variáveis que buscam explicar o
funcionamento do sistema, assim como aquelas variáveis, externas ao sistema, mas
que com ele interagem fortemente.
Adicionalmente, o conhecimento dos atores envolvidos, assim como a análise
de seu comportamento com relação ao sistema hídrico, ajuda a construir programas,
estratégias e ações mais efetivas e com mais apoio dos mesmos, uma vez que eles
podem ser consultados sobre como seria a melhor forma de implementar essas
ações por parte do órgão gestor, podendo favorecer a gestão participativa, como
previsto na lei 9433/97.
A estratégia de gestão, proposta pelo suporte possibilita, também, identificar
as questões para as quais os gestores de recursos hídricos podem potencializar
suas ações (postura pró-ativa) e prevenir-se, da melhor forma possível, com relação
a ameaças externas, sobre as quais não têm influência (postura pré-ativa). Esse
conhecimento é de grande valia para alocar recursos escassos de forma mais
eficiente e obter o máximo de desempenho possível do Sistema de Gestão dos
Recursos Hídricos.
Abordagem empregada no suporte metodológico proposto
Quanto à escolha da abordagem adotada no suporte metodológico, verifica-se
que a construção de cenários mostrou-se ser uma ferramenta adequada para lidar
com problemas semi-estruturados e não-estruturados em gestão dos recursos
hídricos, ainda mais no âmbito estratégico proposto para este trabalho.
120
A análise estrutural fornece uma boa noção do comportamento das variáveis
que fazem parte do sistema hídrico em estudo e das variáveis externas que
influenciam esse sistema, ao prescrever a classificação em variáveis motrizes,
dependentes, de ligação ou independentes. O aplicativo MICMAC classifica as
variáveis de acordo com a sua importância no sistema, possibilitando o
detalhamento do relacionamento de influencia entre as variáveis.
A análise de atores se apresenta como uma metodologia que busca não só
descrever o comportamento dos atores considerados relevantes para o sistema
hídrico, como também indicar estratégias para que esses atores possam fazer valer
seus interesses e objetivos. O comportamento é analisado a partir de um conjunto
de objetivos específicos que o ator que realiza o exercício prospectivo, no caso em
questão, o órgão gestor de recursos hídricos, considera estratégicos para
consecução de seu objetivo geral a gestão sustentável dos recursos hídricos. Nessa
análise, puderam-se detectar possíveis relações de conflito, quando outros atores
têm interesses contrários com relação a esses objetivos, além de possíveis relações
de aliança quando atores têm o mesmo posicionamento pela realização, ou não, de
algum desses objetivos. Essa informação pode auxiliar o órgão gestor na escolha da
estratégia ou da ação que tenha menos resistência dos opositores e maior apoio por
parte dos atores que são favoráveis, aumentando assim a sua efetividade.
A análise morfológica se apresentou como uma ferramenta adequada para
organizar o campo morfológico dos cenários possíveis, permitindo sua construção,
uma vez definidas as hipóteses para cada variável pertinente. No entanto, para a
construção dos cenários finais, o aplicativo MORPHOL não se demonstrou tão
eficiente, já que apresentou limitações para definir as restrições necessárias à
redução do número de cenários possíveis. Além disso, o aplicativo computacional
mostrou-se inoperante para tarefas de simulação computacional.
Esses tipos de abordagens requerem alto grau de atenção e sensibilidade por
parte do analista que está aplicando o suporte metodológico proposto a um caso de
estudo. Parte-se do princípio de que esse analista tem um alto grau de
conhecimento do sistema hídrico em estudo, ou que, pelo menos, esteja muito bem
assessorado, para garantir a verossimilhança dos cenários gerados ao final.
121
Caso de estudo – a bacia do rio Ararandeua
A bacia do rio Ararandeua possui características sócio-econômicas na qual
duas atividades produtivas predominam: a pecuária e a exploração madeireira. No
entanto, ao analisar o período retrospectivo de 15 anos para a atualidade, percebeu-
se que as madeireiras diminuíram relativamente sua produção, enquanto que a
pecuária aumentou fortemente. Este modelo de desenvolvimento provocou grandes
problemas socioambientais, entre os quais se destaca o desmatamento (é, inclusive,
uma área situada no arco do desmatamento), a degradação das nascentes e
assoreamento dos córregos.
O município de Rondon do Pará constituiu-se como um elemento de base das
análises econômicas, ambientais, sociais, administrativas (que se refere à gestão
dos recursos hídricos). Neste sentido, foi priorizado o estudo de quatro variáveis
relacionadas com as atividades produtivas e suas alterações no sistema hídrico da
bacia, assim como a análise da gestão (de meio ambiente e recursos hídricos) e os
interesses dos atores sociais locais. Tais variáveis foram subdivididas em treze
outras variáveis.
A análise estrutural, com o apoio informacional do software MICMAC,
possibilitou a classificação das variáveis que possuem mais força de influência sobre
as outras, que são: agropecuária; a gestão hídrica e ambiental no âmbito nacional e
a exploração madeireira. A única variável autônoma é a mineração e a variável mais
dependente é a gestão hídrica e ambiental no âmbito local. As variáveis
relacionadas com o impacto da urbanização e a degradação das nascentes
possuem um grau elevado para causar maiores problemas ambientais e influenciar
nas atividades produtivas no futuro.
O método possibilitou analisar a relação entre determinadas variáveis. Como
exemplos, gráficos mostram as influências entre o modelo de gestão com as
atividades produtivas. Neste caso, a pecuária foi bastante incentivada durante os
anos 90 e reforçada pelo modelo de gestão no âmbito estadual, que a partir do
zoneamento ecológico-econômico, definiu tais áreas como prioritárias para a
atividade agropecuária.
122
Por outro lado, aplicou-se restrições de exclusão da variável sobre gestão e
observou-se que existe maior influência da pecuária sobre o desmatamento, a
extração madeireira e a erosão e sedimentação.
Exclui-se, em outra simulação, a variável atividade produtiva. Neste caso,
houve maior influência do desmatamento com a gestão pública no âmbito nacional,
haja vista que esta última variável é a responsável por propor políticas mais amplas
de controle e redução ao desflorestamento. Já os impactos da urbanização tiveram
maior influência da gestão pública estadual, pois é esta última que possui a
responsabilidade legal de controlar os efluentes domésticos.
O resultado da análise de atores sociais mostrou que as forças motrizes do
sistema são exatamente aquelas ligadas à exploração de recursos naturais. Além
disso, a análise possibilitou agregar os atores de acordo com seus objetivos
comuns. Gráficos mostraram a preocupação do setor produtivo em gerar novas
alternativas econômicas como o turismo, piscicultura e mineração. Outro ponto
abordado com a simulação de atores sociais foi o estado de dependência que
pescadores, agricultores das nascentes do rio Ararandeua e as comunidades têm
com relação às atividades produtivas tradicionais. Foi possível visualizar claramente
a oposição de objetivos que atores sociais possuem no caso dos conflitos pelo uso
da água nas nascentes do Ararandeua.
Através dos mapas de distância entre objetivos foi possível visualizar que
apesar da situação histórica de exploração dos recursos naturais na região, existe
um grupo de atores que convergem para ampliar o acesso à água, para
recomposição de matas ciliares, organização social, preservação das nascentes e
ao desenvolvimento sustentável da bacia.
O aplicativo MACTOR amplia sua capacidade de utilização em gestão de
recursos hídricos quando permite balancear objetivos de acordo com grupos de
atores sociais. Foi mostrado que a balança para o objetivo de crescimento
econômico fica estabilizada com o peso que possui a atividade de agropecuária,
madeireira e de carvoaria. Isto foi comprovado no item do estudo da bacia referente
à descrição das atividades econômicas da bacia.
123
A análise morfológica foi o método de maior dificuldade de se estudar, pois foi
necessário decompor todo o sistema-objeto para simular hipóteses e
condicionantes. Além disso, houve certa dificuldade no manuseio do programa
informacional MORPHOL. A partir de tal constatação, optou-se por realizar uma
simulação simples para facilitar o entendimento da ferramenta. O resultado
fundamentou-se em duas visões totalmente distintas: um cenário bastante promissor
e outro cenário tendencial.
O cenário tendencial mostra o histórico de estagnação do setor madeireiro
paraense, numa região da Amazônia de contrastes de fronteira agrícola, onde o ciclo
do desmatamento está presente com a exploração florestal sem critérios ambientais,
com a pecuária forte e o acirramento dos conflitos socioambientais.
Já o cenário estratégico trouxe uma visão de sustentabilidade do sistema, no
qual os setores produtivos estão mais conscientes da responsabilidade de
recuperação da bacia como forma de diversificar a produção. No meio urbano, a
análise mostrou a necessidade de investimentos em saneamento para diminuir os
impactos como erosão, sedimentação e destinação inadequada de resíduos sólidos
e efluentes domésticos e industriais nos córregos. Neste caso, há a necessidade de
consolidar o sistema de gerenciamento de recursos hídricos na região para
possibilitar uma ruptura no modelo de gestão ambiental e hídrica.
Com este trabalho, verificou-se a importância da aplicação de uma visão
estratégica à gestão dos recursos hídricos, indicando-se uma série de vantagens
advindas de uma postura antecipatória com relação à gestão da água e do meio
ambiente.
Esta pesquisa reforça a necessidade de integrar as análises de planejamento
com base em cenários utilizando o método integrado (análise estrutural, análise de
atores e análise morfológica) em conjunto com mapas de caracterização da bacia
para as situações dadas. Isto significa realizar projeções em mapas, constituindo
uma compreensão mais concreta para a situação projetada. Neste caso, há a
necessidade de integrar o mapeamento estratégico, abordado neste trabalho, com o
mapeamento físico da bacia, para posteriormente criar mapas das situações futuras.
124
Com relação ao caso de estudo apresentado, acredita-se que o suporte
metodológico proposto pôde apresentar outras perspectivas para a gestão dos
recursos hídricos nesse território, propiciando uma visão mais ampla do sistema
hídrico em estudo e uma possibilidade de elaborar estratégias e ações eficazes e
mais eficientes. Neste sentido, existe a oportunidade de os gestores deixarem uma
postura puramente reativa (bombeiro), para passar a adotar posturas preventivas
(prevenido) e aproveitar oportunidades em que possa ter uma postura pró-ativa
(conspirador), com respeito à gestão dos recursos hídricos.
125
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