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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ECOLOGIA E
CONSERVAÇÃO
INFLUÊNCIA DE FATORES AMBIENTAIS NA RIQUEZA E
COMPOSIÇÃO DA MICOTA LIQUENIZADA EM ÁREA DE
BREJO DE ALTITUDE E CAATINGA
Jeanne dos Reis Silva
Mestrado Acadêmico
São Cristóvão
Sergipe – Brasil 2015
JEANNE DOS REIS SILVA
INFLUÊNCIA DE FATORES AMBIENTAIS NA RIQUEZA E COMPOSIÇÃO DA MICOTA LIQUENIZADA EM ÁREA DE
BREJO DE ALTITUDE E CAATINGA
Dissertação apresentada ao Programa
de Pós-Graduação em Ecologia e
Conservação da Universidade Federal
de Sergipe, como requisito parcial
para obtenção do título de Mestre em
Ecologia.
Orientadora: Profa. Dra. Marcela
Eugenia da Silva Cáceres
São Cristóvão Sergipe – Brasil
2015
FICHA CATALOGRÁFICA ELABORADA PELA BIBLIOTECA CENTRAL
UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE
Silva, Jeanne dos Reis
S586i A influência de fatores ambientais na riqueza e composição da micota liquenizada em área de brejo de altitude e caatinga / Jeanne dos Reis Silva ; orientadora Marcela Eugenia da Silva Cáceres. – Aracaju, 2015.
71 f. : il.
Dissertação (mestrado em Ecologia)– Universidade Federal de
Sergipe, 2015.
1. Ecologia. 2. Líquens - Composição. 3. Caatinga. I. Cáceres,
Marcela Eugenia da Silva, orient. II. Título.
CDU 574
AGRADECIMENTOS
ÀS FORÇAS DO BEM QUE ME GUIAM E ILUMINAM, AS QUAIS EU CHAMO DEUS!
A minha orientadora, Professora Dra. Marcela Cáceres, que me acolheu quando
me sentia sem rumo, por toda sua paciência, por todos os conhecimentos
compartilhados e, principalmente, pela confiança em mim depositada; meu muito
obrigada!
Aos meus primeiros amores, meus pais e minha avó, pelo incentivo, pela
paciência e amor a mim dedicado. Vovó, me destes livros e eu vos dou os frutos da
leitura.
Ao meu amor, pela paciência, atenção, carinho, por tudo de bom que me
proporciona. Tinha medo que o amor podasse meus sonhos, mas você os multiplicou e
passou a sonhar comigo.
As minhas tias e a família Lima Nascimento que me acolheram quando precisei,
Obrigada por tudo!
Aos companheiros de coleta pelo tempo que dispuseram pra me ajudar,
Dannyelly, Jaciele, Paulo e Viviane, agradeço imensamente a colaboração de vocês,
sem vocês esse trabalho não seria possível. A Luiz Custódio, o amigo Custódio, que
mesmo estando longe se dispôs a ajudar e foi também fundamental para realização
desse trabalho, e aos outros que por meio do seu pedido se dispuseram a nos ajudar.
Aos liquenólogos Dr. André Aptroot (ABL Herbarium, Holanda), Dr. Robert
Lücking (The Field Museum, Chicago) pelo auxílio nas identificações e ao colega
Cleverton Mendonça pelo auxilio com a estatística e todas as outras dicas passadas.
A Juliana Cordeiro, secretária do PPEC (Programa de Pós-Graduação em
Ecologia e Conservação), pela disposição em nos ajudar, sempre que necessitamos.
A Dona Zefa da Guia, e toda sua comunidade pela cordialidade com que nos
recebeu e acolheu no seio do seu lar durante nossas coletas. Obrigada, Dona Zefa,
aprendemos muito com a senhora, exemplo de solidariedade e acolhimento com todos
que necessitam.
A CAPES/FAPITEC pela concessão da bolsa, e a banca examinadora por aceitar
fazer parte deste momento.
A todos que fizeram parte dessa caminhada, em
especial a minha família.
DEDICO!
“Liberdade é uma palavra que o sonho
humano alimenta, não há ninguém que
explique e ninguém que não entenda.”
Cecília Meireles
SUMÁRIO LISTA DE FIGURAS .......................................................................................................9 LISTA DE TABELAS.....................................................................................................10 RESUMO GERAL ..........................................................................................................11 GENERAL ABSTRACT ................................................................................................12 INTRODUÇÃO GERAL ................................................................................................14 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ...........................................................................19
Capítulo 1. LIQUENS CORTICÍCOLAS CROSTOSOS EM ÁREA DE CAATINGA E BREJO DE ALTITUDE NA SERRA DA GUIA, POÇO REDONDO, SERGIPE, BRASIL 23 RESUMO ....................................................................................................................... 23 ABSTRACT .................................................................................................................. 25 INTRODUÇÃO ............................................................................................................ 26 MATERIAIS E MÉTODOS ........................................................................................ 29 Área de estudo ............................................................................................................... 29 Serra da Guia .................................................................................................................. 29 Coleta e Processamento de material biológico ........................................................... 31 Coleta do material biológico........................................................................................... 31 Processamento e identificação das amostras .................................................................. 32 Análises estatísticas dos dados ..................................................................................... 32 Análise da Riqueza ......................................................................................................... 32 Análise da Composição de espécies ............................................................................... 33 RESULTADOS ............................................................................................................. 33 Riqueza e composição de espécies ............................................................................... 33 DISCUSSÃO ................................................................................................................. 42 Riqueza de espécies ....................................................................................................... 42 Composição de espécies ................................................................................................ 43 CONCLUSÃO ............................................................................................................... 43 REFERÊNCIAS............................................................................................................ 45
Capítulo 2. INFLUÊNCIA DE FATORES BIÓTICOS E ABIÓTICOS NA RIQUEZA DE LIQUENS CORTICÍCOLAS EM ÁREAS DE BREJO DE ALTITUDE E CAATINGA ......................................................................................... 50 RESUMO ....................................................................................................................... 51 ABSTRACT .................................................................................................................. 53 INTRODUÇÃO ............................................................................................................ 54 MATERIAIS E MÉTODOS ........................................................................................ 57 Área de estudo ............................................................................................................... 57 Serra da Guia .................................................................................................................. 57 Coleta do material biológico ........................................................................................ 59 Processamento e identificação das amostras .................................................................. 60 Amostragem dos fatores bióticos e abióticos .............................................................. 60 Aferimento do pH da casca do hospedeiro ..................................................................... 60 Medição do diâmetro à altura do peito (DAP) ............................................................... 60 Medição da intensidade luminosa................................................................................... 61 Análise da intensidade luminosa .................................................................................... 62 Análises estatísticas dos dados ..................................................................................... 62 Análise da Riqueza ......................................................................................................... 62 Análise da Composição de espécies ............................................................................... 63 RESULTADOS ............................................................................................................. 63 DISCUSSÃO ................................................................................................................. 65 Riqueza ........................................................................................................................... 65 Composição .................................................................................................................... 66 CONCLUSÃO ............................................................................................................... 67 REFERÊNCIAS............................................................................................................ 68
LISTA DE FIGURAS Capítulo 1 – Liquens corticícolas crostosos em área de Caatinga e Brejo de Altitude na Serra da Guia, Poço Redondo, Sergipe, Brasil
Figura 1. Mapa territorial do estado de Sergipe com a localização das áreas de coletas ..............................................................................................................................30 Figura 2. Serra da Guia, Poço Redondo, Sergipe, Brasil .............................................. 31 Figura 3. Representação da área de Brejo de Altitude (esquerda); Caatinga (direita), Serra da Guia, município de Poço Redondo Sergipe .......................................................32 Figura 4. Desenho amostral do transecto demarcado nas áreas de Caatinga e Brejo de altitude para coleta de liquens corticícolas ......................................................................32 Figura 5. Liquens corticícolas amostrados nas duas fitofisionomias. (A) Glyphisscyphulifera,(B) Lecanora achroa, (C) Ramboldia russula, (D) Graphis cincta, (E) Trypethelium eluteriae, (F) Dirinarialeopoldii(G) Pyrenula anômala, (H) Diorygmapoitaei ..............................................................................................................39
Figura 6. Boxplot da ANOVA de Kruskal-Wallis entre a riqueza em relação ás duas áreas Local (1) Caatinga, (2) Brejo de Altitude. ..............................................................40
Figura 7. Análise de Cluster da composição de espécies entre as fitofisionomias. Local (1) Caatinga, (2) Brejo de Altitude ................................................................................. 41
Figura 8. Análise NMS da composição das espécies de liquens em relação as fitofisionomias. Local (1) Caatinga, (2) Brejo de Altitude..............................................42
Capítulo 2 - Influência de fatores bióticos e abióticos na riqueza de liquens corticícolas em áreas de Brejo de Atitude e Caatinga. Figura 1. Mapa territorial do estado de Sergipe com a localização das áreas de coletas ............................................................................................................................. 57 Figura 2. Serra da Guia, Poço Redondo, Sergipe, Brasil .............................................. 58 Figura 3. Representação da área de Brejo de Altitude (esquerda); Caatinga (direita), Serra da Guia, município de Poço Redondo Sergipe ...................................................... 59
9
Figura 4. Desenho amostral do transecto demarcado nas áreas de Caatinga e Brejo de altitude para coleta de liquens corticícolas ..................................................................... 59 Figura 5. Foto hemisférica tirada em campo com o auxílio da lente olho-de-peixe (A) e tratada com o programa GLA (B)....................................................................................61 Figura 6. Boxplot da ANOVA de Kruskal-Wallis entre a riqueza em relação ás duas áreas Local (1) Caatinga, (2) Brejo de Altitude ...............................................................64
Figura 7. Teste de correlação de Spearman entre o DAP e a riqueza ............................65 Figura 8. Análise NMS da composição das espécies de liquens em relação as fitofisionomias e os fatores bióticos e abióticos amostrados. Local (1) Caatinga, (2) Brejo de Altitude .............................................................................................................66
LISTA DE TABELAS
Capítulo 1. Liquens corticícolas crostosos em área de Caatinga e Brejo de Altitude
na Serra da Guia, Poço Redondo, Sergipe, Brasil.
Tabela 1. Lista de espécies de liquens corticícolas amostrados nas duas áreas de estudo. CA– Caatinga, BR – Brejo de Altitude ...........................................................................35
Tabela 2. Teste de Monte Carlo referente às espécies indicadoras das fitofisionomias. (P < 0,05), VI – Valor de Indicação ................................................................................42
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RESUMO GERAL Os liquens surgem a partir da interação simbiótica entre um fungo, o micobionte, e um
ou mais componentes fotossintéticos, fotobiontes, que podem ser algas verdes e, ou
cianobactérias. Este trabalho teve como objetivo comparar a riqueza e composição de
liquens corticícolas crostosos em duas fitofisionomias, Caatinga e Brejo de Altitude, no
semiárido brasileiro, verificando se a riqueza e composição de espécies destes liquens
são influenciadas pelos fatores bióticos e abióticos, como luminosidade, pH da casca e
diâmetro na altura do peito (DAP) do hospedeiro, e altitude. Para a coleta dos liquens,
foram demarcados dois transectos de 300 m, um em cada área de estudo. Ao longo
destes transectos foram demarcados pontos a cada 10 m, sendo 30 pontos para cada
área, perfazendo um total de 60 pontos. Para cada ponto demarcado, foram adotados
como critério de escolha do hospedeiro a maior proximidade do ponto e a presença de
talos liquênicos na altura de 0,5 m até 1,50 m em relação ao solo no tronco da árvore.
Foram analisadas a riqueza e composição de espécies para cada área. Ao todo, foram
coletadas 576 amostras, totalizando 96 espécies de microliquens corticícolas. Não houve
uma diferença significativa na riqueza entre as duas áreas. Com relação à composição de
espécies, as áreas apresentaram diferença, porém com algumas espécies comuns para as
duas áreas. Comparando a riqueza de liquens corticícolas com os fatores bióticos e
abióticos, apenas o diâmetro à altura do peito (DAP) do hospedeiro selecionado,
apresentou-se de forma significativa em relação à riqueza de espécies de liquens
corticícolas. Relacionando a composição de espécies e os fatores bióticos e abióticos,
tivemos elevação, DAP e fitofisionomias (local), abertura do dossel, e riqueza
influenciando a composição. Desta forma, os resultados apresentados neste estudo
visam contribuir para o conhecimento ecológico dos fungos liquenizados, assim como
se torna subsídio para outras pesquisas que venham a aprimorar e enriquecer o
conhecimento ecológico e liquenológico da Caatinga e Brejos de Altitude.
Palavras-chave: Liquens corticícolas, Riqueza, Composição, Caatinga, Brejo de Altitude
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GENERAL ABSTRACT
Lichens are the result of an symbiotic interaction between fungus, the mycobiont, and
one or more photosynthetic components, the photobionts, which can be a green algae
and/or a cyanobacteria. This study aimed to compare the species richness and
composition of corticolous crustose lichens in two forest types, Caatinga and Brejo de
Altitude, in relation to the influence of biotic and abiotic parameters such as light, bark
pH and diameter at breast height (DBH) of the host, and elevation. To collect the lichens
two transects of 300 m each were delimited, one per site. Along these transects,
sampling points were marked every 10 m, in a total of 30 points per site and 60 points
for the whole work. For each of the points, the nearest tree was selected which had a
lichen cover at the height of 0.5 m to 1.50 m from the ground on the tree trunk. The
species richness and composition for each area were analyzed. Altogether, 576 samples
were collected, totaling 96 species of corticolous microlichens. There was no significant
difference in species richness between the two areas. With respect to the species
composition, the areas were different, but with some common species between them.
Comparing the species richness of corticicolous lichens with biotic and abiotic factors,
only the diameter at breast height (DBH) of the selected host presented a significant
relationship. Relating the composition and biotic and abiotic factors, we had elevation,
DBH and vegetation types, canopy openness, influencing the species composition. Thus,
the results presented in this study are intended to contribute to the ecological knowledge
of lichenized fungi, and enhancing the ecological and lichenological knowledge on
Caatinga and Brejo de Altitude.
Keywords: Corticicolous lichens, species richness, species composition, Caatinga,
Brejo de Altitude, semiarid
12
INTRODUÇÃO GERAL 13
INTRODUÇÃO GERAL
Os liquens surgem a partir da interação simbiótica entre um fungo, o micobionte,
e um ou mais componentes fotossintéticos, fotobiontes, que podem ser algas verdes e,
ou cianobactérias (Ahmadjian, 1993, Nash III, 2008, Purvis, 2000). Essa união resulta
na formação de um talo liquênico, que não é encontrado em seus componentes quando
não liquenizados (Chaparro & Ceballos, 2002).
O Reino Fungi abrange uma enorme diversidade de táxons, que apresenta
diferentes ecologias, estratégias reprodutivas e morfologias. Aproximadamente 20% de
todos os fungos são liquenizados, representando quase metade de todos os Ascomycota,
em torno de 13.500 espécies, com poucas espécies de Basidiomycota liquenizados (Kirk
et al., 2001).
Os liquens variam em sua complexidade, desde formas muito simples até
estruturas morfológicas e anatômicas muito complexas, sendo separados, de acordo com
a forma de crescimento, em crostosos, esquamulosos, foliosos, filamentosos e fruticosos
(Purvis, 2000).
Os liquens foliosos apresentam estrutura dorsiventral, aderidos ao substrato por
algumas regiões do talo, geralmente a parte central, e apresentam um córtex inferior. Os
liquens de talo fruticoso são compostos por ramos, que podem ser simples, divididos,
cilíndricos ou achatados. O talo esquamuloso é formado por pequenas escamas
agregadas de talo, interligadas apenas por micélio fúngico. Os filamentosos, um dos
tipos mais simples de talo, são formados por filamentos frouxos e entrelaçados
(Spielmann, 2006). Os liquens com crescimento crostoso, também denominados de
microliquens (Lücking et al., 2009), representam a maioria das espécies liquênicas,
principalmente em regiões tropicais, compreendendo cerca de 75% das espécies
conhecidas de fungos liquenizados. Estes talos crostosos caracterizam-se pela ausência
de córtex inferior, aderindo ao substrato por toda a sua medula, tornando difícil a sua
remoção de rochas, folhas e cascas de árvores sem o substrato (Carlile et al., 2001,
Ahmadjian, 1993).
Mesmo representando a grande maioria das espécies, os liquens crostosos ainda
são o grupo menos conhecido, principalmente em regiões tropicais e subtropicais.
Geralmente, estes talos, por apresentarem um tamanho reduzido, passam despercebidos,
não sendo coletados (Dal Forno, 2009).
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O tipo de substrato em que um fungo liquenizado cresce pode ser importante na
identificação, já que, muitas vezes, determinadas espécies são bastante seletivas quanto
ao substrato utilizado. Neste aspecto, os liquens são classificados em corticícolas,
(quando crescem sobre o córtex das árvores), saxícolas (sobre rocha), terrícolas (no
solo), muscícolas (sobre musgos) e foliícolas, sobre folhas (Nash III, 2008).
Os liquens fazem parte de um grupo extremamente diverso, encontrado em quase
todos os habitats terrestres, desde os trópicos às regiões polares (Nash III, 2008). Estão
presentes em, aproximadamente, 8% da superfície terrestre como a forma de vida
dominante (Odum, 2008). Sendo sua abundância notável em ambientes onde as
condições são extremas para a maioria dos organismos isoladamente (Ahmadjian,
1993), essa capacidade é resultado da combinação de vários fatores que lhe
proporcionam uma adaptabilidade relevante na associação simbiótica (Morales et al. 2009). Entre esses fatores estão sua capacidade de produzir substâncias químicas que,
provavelmente, fazem parte de um sistema de defesa contra herbivoria, assim como a
capacidade de colonização de uma grande variedade de substratos (Morales et al. 2009),
e a sua capacidade para mudança rápida e frequente de um estado ativo a um estado de
inatividade metabólica, quando as condições ambientais se tornam adversas, como
temperatura, radiação e disponibilidade hídrica (López 2006).
Segundo Umaña & Sipman (2002), são vários os fatores que influenciam a
distribuição dos liquens. Dentre esses fatores, temos características dos forófitos, como
o pH da casca e DAP (diâmetro à altura do peito), relações hídricas, disposição de
nutrientes e condições ambientais microclimáticas como umidade do ar, luminosidade e
temperatura (Käffer et al., 2007, Topham, 1977, Brodo, 1973), a elevação e umidade da
área (Morales et al. 2009), além da atividade humana (Umaña & Sipman, 2002).
O Nordeste brasileiro é composto por uma variedade de ecossistemas em sua
extensão territorial, apresentando desde fragmentos de Mata Atlântica até encraves de
Cerrado (Santos & Melo, 2010). A Caatinga é o tipo de vegetação que cobre a maior
parte da região com clima semiárido, destacando-se por apresentar uma grande
diversidade de espécies vegetais (Giulietti et al, 2003).
A Caatinga ocupa cerca de 11% do território brasileiro (844.453 km²) e, apesar
de ser o Bioma menos conhecido do país, é o principal da região Nordeste, abrangendo
os estados da Bahia, Sergipe, Alagoas, Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte,
Ceará, Piauí, Maranhão e Norte de Minas Gerais. Apresenta uma grande riqueza de
ambientes e espécies (MMA, 2014), sendo a única grande região natural brasileira cujos
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limites estão inteiramente restritos ao território nacional, entretanto, menos de 1% desse
ecossistema está situado em Unidades de Conservação (UCs) (Santos et al., 2011).
Para Tabarelli e Vicente (2004), a recente descrição de espécies de fauna e flora
da Caatinga demonstra um conhecimento zoológico e botânico precário. O que é
preocupante já que de acordo com Leal et al. (2003), a Caatinga vem passando por um
extenso processo de alteração e deterioração ambiental provocado pelo uso
insustentável dos seus recursos naturais, o que esta levando à rápida perda de espécies
únicas, à eliminação de processos ecológicos chaves e à formação de extensos núcleos
de desertificação em vários setores da região. Segundo estes autores, o estudo e a
conservação da diversidade biológica da Caatinga é um desafio para a ciência brasileira.
A maior diversidade na Caatinga está associada ás maiores altitudes,
especialmente em áreas rochosas que captam maior umidade atmosférica, atuando como
refúgio para as espécies florestais, como pode ser observado pela presença das florestas
de Brejo de Altitude dentro dessa região (Giulietti et al., 2003).
Os Brejos de Altitude ou Matas serranas são encraves de Mata Atlântica
inseridos no Bioma Caatinga em regiões de maior altitude (Machado, 2011). De acordo
com Theulen (2004), as áreas de Brejos de Altitude são núcleos de relevante
importância para a preservação da biodiversidade, seja por sua singularidade e raridade,
ou pelos muitos atributos naturais ali encontrados, em particular a diversidade natural de
espécies.
Dados obtidos na literatura referem-se à existência de 43 Brejos de Altitude,
distribuídos nos estados do Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba e Pernambuco,
cobrindo uma área original de aproximadamente 18.500 km2. Somente Pernambuco e
Paraíba possuem 31 brejos, distribuídos em 28 municípios do agreste e sertão (Tabarelli
& Santos, 2004).
A existência destas ilhas de floresta está associada à ocorrência de planaltos e
chapadas entre 500—100 m de altitude na Caatinga, onde as chuvas orográficas
garantem níveis de precipitação superiores a 1200 mm/ano (Tabarelli & Santos, 2004).
As condições favoráveis ao crescimento vegetal nos brejos propiciam maiores
diversidade e densidade animais em relação às áreas vizinhas. Suas características de
isolamento geográfico e reduzida extensão tornam-se potenciais refúgios para espécies
animais endêmicas ou ameaçadas (Theulen, 2004).
Segundo Tabarelli & Santos (2004), o atual ritmo de degradação ao qual os
Brejos de Altitude estão submetidos resulta na extinção de espécies lenhosas devido à
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interrupção de processos chaves, como a polinização e a dispersão associada ao
desaparecimento de vertebrados frugívoros devido à fragmentação e a caça, o que,
consequentemente, pode levar esses ecossistemas ao completo desaparecimento em um
futuro próximo.
No Brasil, ainda são poucos os estudos ecológicos relacionados aos liquens,
principalmente fora das regiões Sul e Sudeste (Cáceres, 2007). Segundo Menezes et al. (2011), ainda menor é o número de trabalhos dedicados ao estudo da resposta dos
liquens crostosos aos fatores bióticos e abióticos, sendo que novas áreas precisam ser
estudadas a nível regional, para uma melhor representação da diversidade destes
organismos em áreas de Caatinga, no semiárido nordestino.
No Nordeste brasileiro, Cáceres et al. (2007) estudaram a composição e riqueza
de espécies de liquens corticícolas crostosos em uma área de Floresta Atlântica no
Estado de Alagoas, correlacionando-as com características da casca do hospedeiro e a
intensidade de luz incidente. Além desse trabalho, temos uma comparação entre a
composição de espécies de liquens de três fitofisionomias ocorrentes nas regiões, Mata
Atlântica, Caatinga e Brejos de Altitude, no qual foi observado uma baixa similaridade
entre as áreas, que pode ser relacionada ao tipo de vegetação e grau de luminosidade
(Cáceres et al. 2008). E, recentemente, um estudo ecológico e florístico da micota
liquenizada corticícola crostosa, na Chapada do Araripe, em áreas de carrasco e
cerradão, no Ceará, empregou a mesma metodologia proposta no presente estudo
(Menezes, 2013).
São poucos os estudos realizados sobre liquens corticícolas crostosos em Brejos
de Altitude, exceto trabalhos realizados no estado de Pernambuco, nos quais foram
visitados a Serra dos Cavalos e o município de Bonito (Cáceres, 2007, Cáceres &
Lücking, 2000, Cáceres et al., 2008, Lücking & Cáceres, 2004) e, recentemente, um
estudo ecológico e florístico da micota liquenizada corticícola crostosa na Mata do Pau-
ferro, área de Brejo de Altitude no Estado da Paraíba, que empregou a mesma
metodologia proposta no presente estudo (Xavier-Leite, 2013).
Diante do exposto, esta dissertação tem como objetivo principal comparar a
riqueza e composição de liquens corticícolas crostosos em duas fitofisionomias,
Caatinga e Brejo de Altitude, no Estado de Sergipe, verificando se a riqueza e
composição de espécies destes liquens são influenciadas pelos fatores bióticos e
abióticos, como luminosidade, pH da casca e diâmetro na altura do peito (DAP) do
hospedeiro e altitude.
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Este trabalho é apresentado em dois capítulos. O primeiro capítulo tem como
objetivo comparar a riqueza e composição de liquens corticícolas em duas
fitofisionomias, Brejo de Altitude e Caatinga, no estado de Sergipe; o segundo capítulo
traz como objetivo verificar se a riqueza e composição são influenciadas pelos fatores
bióticos e abióticos, luminosidade, pH da casca e diâmetro à altura do peito (DAP) do
hospedeiro, e altitude.
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20
Spielmann AA. 2006. Checklist of lichens and lichenicolous Fungi of Rio Grande do
Sul (Brazil). Caderno de Pesquisa. Série Biologia (UNISC) 18: 7-125.
Tabarelli, M. & Santos, AMM. 2004. Uma breve descrição sobre a história
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Xavier-Leite ABX. 2013. Influência de fatores ambientais na riqueza e composição de
espécies de liquens corticícolas em área de Brejo de Altitude e Caatinga.
Dissertação (mestrado em Ecologia e Conservação) – Universidade Federal de
Sergipe- UFS. São Cristóvão. 89 p.
21
CAPÍTULO 1
LIQUENS CORTICÍCOLAS CROSTOSOS EM ÁREA DE CAATINGA E BREJO DE
ALTITUDE NA SERRA DA GUIA, POÇO REDONDO, SERGIPE, BRASIL
22
LIQUENS CORTICÍCOLAS CROSTOSOS EM ÁREA DE CAATINGA E
BREJO DE ALTITUDE NA SERRA DA GUIA, POÇO REDONDO, SERGIPE,
BRASIL
Jeanne dos Reis Silva¹, André Aptroot², Robert Lücking³ & Marcela Eugenia da
Silva Cáceres¹
¹Programa de Pós-Graduação em Ecologia e Conservação, Universidade Federal de
Sergipe, CEP: 49100-000, São Cristóvão, Sergipe, Brasil. ²ABL Herbarium, G.v.d. Veenstraat 107, NL-3762 X K Soest, The Netherlands. ³Science & Education, The Field Museum of Natural History, 1400 South Lake Shore
Drive, Chicago, Illinois 60605, USA.
RESUMO: Os liquens fazem parte de um grupo diversificado de fungos, sendo
unidades biológicas resultantes da associação simbiótica entre um componente
heterotrófico, o fungo, e um componente autotrófico, que pode ser uma alga ou
cianobactéria. Constituindo um grupo biológico e não sistemático, os liquens são
reconhecidos pela sua estratégia nutricional. O presente trabalho testou a hipótese de
que a riqueza e composição de espécies de liquens corticícolas são distintas para as duas
áreas estudadas, Caatinga e Brejo de Altitude, devido à diferença do tipo de vegetação.
Em duas fitofisionomias, Caatinga e Brejo de Altitude, na Serra da Guia, município de
Poço Redondo, estado de Sergipe, foram demarcados dois transectos de 300 m, um em
cada área. Nestes transectos, foram demarcados pontos a cada 10 m, sendo 30 pontos
para cada área, perfazendo um total de 60 pontos. Para cada um dos 60 pontos
demarcados, foram adotados como critério de escolha do hospedeiro maior proximidade
da árvore e a presença de talos liquênicos no tronco, na altura de 0,5 m até 1,50 m em
relação ao solo. Foram analisadas a riqueza e composição para cada área. Foram
coletadas 576 amostras, totalizando 96 espécies de microliquens corticícolas, em 53
gêneros e 28 famílias. Não houve uma diferença significativa na riqueza entre as duas
áreas. Com relação à composição de espécies, as áreas apresentaram diferença, porém
com algumas espécies comuns para as duas áreas, também foi possível identificar
algumas espécies como indicadoras para cada fitofisionomia. Considerando que são
poucos os estudos a respeito da diversidade de liquens corticícolas para essas áreas, e
23
nenhum estudo para a Serra da Guia, esta pesquisa se torna de suma importância para o
conhecimento da riqueza e composição de espécies para o Brejo de Altitude e a
Caatinga, buscando através do conhecimento taxonômico, novas informações para o
conhecimento e preservação destas fitofisionomias, ressaltando seu potencial biológico.
Palavras-chave: Liquens corticícolas, Riqueza, Composição, Caatinga, Brejo de Altitude
24
ABSTRACT: Lichens are part of a diverse group of fungi. They are biological units
that result from a symbiotic association between a heterotrophic component, a fungus,
and an autotrophic partner, which may be an algae or cyanobacteria. Lichens constitute
a biological and not systematic group, recognized for its nutricional strategy. The
present study tested the hypothesis that species richness and composition of
corticicolous crustose lichens are different for the two studied areas, due to the
difference in the type of vegetation. In two forest types, Caatinga and Brejo de Altitude,
at Serra da Guia, municipality of Poço Redondo, Sergipe State, two transects (one per
area) of 300 m each were delimited. In each of these transects, sampling points were
marked every 10 m, making a total of 30 points for each area and 60 points as a
whole.For each of the points, the nearest tree was selected which had a lichen cover on
the tree trunk at the height of 0.5 m to 1.50 m from the ground. Altogether, 576 samples
of corticicolous microlichens were collected, totaling 96 species, in 53 genera and 28
families. There was no significant difference in species richness between the two areas.
With respect to species composition, the areas were different, but with some shared
species found in both areas. Some species were also identified as indicators for each
vegetation type. The fact that there are few studies about the diversity of corticicolous
crustose lichens for such types of vegetation, and no study for Serra da Guia, this
research is of great importance for the understanding species richness and composition
to the Brejo de Altitude and the Caatinga, searching through the taxonomic study new
information to the knowledge and preservation of these areas, highlighting their
biological potential.
Keywords: Corticicolous lichens, Diversity, Caatinga, Brejo de Altitude
25
INTRODUÇÃO
Os liquens fazem parte de um grupo diversificado de fungos encontrados na
natureza que estão associados a uma alga e/ou cianobactéria (Webster & Weber, 2007).
São unidades biológicas estáveis resultantes da associação simbiótica entre um
componente heterotrófico, o fungo, e um componente autotrófico fotossintetizante
(Nash, 2008). Os componentes fotossintetizantes, ou fotobiontes, que podem ser algas
e/ou cianobactéras, são responsáveis pela produção dos compostos carbônicos ricos em
energia, sendo protegidos dos extremos de variação ambiental e dissecação pelo
micobionte. Além disso, os fotobiontes recebem os nutrientes minerais que os fungos
retiram do ambiente externo (Raven et al., 2014). Os liquens constituem um grupo
biológico e não sistemático, reconhecido pela sua estratégia nutricional (Kirk et al.,
2001). Com relação a sua nomenclatura, o Código Internacional de Nomenclatura
Botânica (Capítulo II, Seção 4, Artigo 13.1 (d), 2003) estabelece que, os nomes
científicos que se aplicam aos liquens se referem exclusivamente ao fungo.
Os liquens apresentam distribuição cosmopolita, sendo capazes de colonizar
vários substratos, graças à associação liquênica (Odum, 2008). Representam uma
porção significativa da biodiversidade das florestas em todo o mundo (De Bolt et
al.,2007). No entanto, o conhecimento da distribuição liquênica é limitado (Flakus et
al., 2006) em relação às regiões tropicais e subtropicais e, principalmente, aos liquens
que formam talos crostosos que, apesar de representar a grande maioria das espécies,
constituem o grupo menos conhecido (Dal-Forno, 2009).
Até pouco tempo, estimava-se que o número de espécies de liquens fosse cerca
de 13.500 em todo o mundo (Deacon 2006; Grube & Kroken 2000; Wesbter & Weber
2007). O Filo Ascomycota, que abriga a maioria dos liquens, é o maior grupo de fungos
existente, com cerca de 64.000 (Kirk et al., 2008). No entanto, estimativas mais precisas
da diversidade de espécies deste grupo de organismos são limitadas devido a alguns
fatores como, por exemplo, os conceitos de espécies em grupos instáveis, a existência
de inúmeros problemas taxonômicos não resolvidos, especialmente nos liquens
crostosos, e o escasso estudo da micota liquênica em diversas áreas do mundo,
principalmente em regiões tropicais (Feuerer &. Hawksworth, 2006).
Ainda são poucos os estudos desenvolvidos em relação à diversidade de espécies
de liquens no Brasil se comparados aos realizados em outros países, especificamente no
que diz respeito aos microliquens (Cáceres 2007; Cáceres et al. 2008a). Na região Sul,
destacam-se os trabalhos realizados sobre Graphidaceae (Dal Forno, 2009; Feuerstein &
26
Eliasaro, 2014), além de estudos florísticos em geral de liquens foliosos (Fleig &
Riquelme, 1991; Fleig & Filho, 1990; Käffer & Mazzitelli, 2005; Käffer et al., 2010;
Martins & Marcelli, 2011; Martins et al., 2011; Spielmann 2006). Para a região Sudeste,
Benatti & Marcelli (2007) realizaram um inventário dos gêneros de liquens crostosos
em área de manguezal. De igual relevância, há o estudo de liquens do Parque Nacional
do Caraça, com novos registros e novas espécies, no estado de Minas Gerais (Aptroot,
2002), assim como o inventário de liquens em duas áreas de Mata Atlântica no Estado
de Minas Gerais (Lombardi et al., 1999).
Trabalhos atuais de grande importância para o estudo da diversidade de fungos
liquenizados realizados no Brasil foram desenvolvidos por Cáceres et al. (2012, 2014),
e Aptroot & Cáceres (2014), na Amazônia brasileira, resultando em novas espécies e
combinações de microliquens corticícolas.
Em termos de estudos escológicos de liquens crostosos na Região Nordeste, os
trabalhos de Cáceres et al. (2007, 2008) são considerados um marco inicial. Nestes
estudos, foram analisadas a composição e riqueza de espécies de liquens em uma área
de Floresta Atlântica no Estado de Alagoas, correlacionando estas variáveis com
características da casca do hospedeiro e a intensidade de luz incidente (Cáceres et al.,
2007). Também foi realizada uma comparação entre a composição de espécies de
liquens de três fitofisionomias ocorrentes nas regiões, a Mata Atlântica, Caatinga e
Brejos de Altitude, no qual foi observada uma baixa similaridade entre as áreas, que
pode ser relacionada ao tipo de vegetação e grau de luminosidade (Cáceres et al. 2008).
E, recentemente, um estudo ecológico e florístico da micota liquenizada corticícola
crostosa na Mata do Pau-ferro, área de Brejo de Altitude no Estado da Paraíba, que
empregou a mesma metodologia proposta no presente estudo (Xavier-Leite, 2013).
Em relação ao Estado de Sergipe, ainda são escassos os estudos sobre a
diversidade e ecologia de liquens, sendo o primeiro trabalho no semiárido sergipano
realizado por Rodrigues (2012), com o levantamento da micota liquenizada em uma
área de caatinga, relacionando a ocorrência a alguns fatores ambientais. Mais
recentemente, destaca-se o estudo da influência de diferentes estágios sucessionais na
composição e riqueza de liquens na caatinga (Mendonça, 2014).
A Caatinga pode ser caracterizada como floresta arbórea ou arbustiva,
compreendendo, principalmente, indivíduos baixos, geralmente dotados de espinhos,
apresentando microfilia e algumas características xerófitas (Prado, 2005). Este tipo de
27
vegetação cobre a maior parte dos Estados do Piauí, Ceará, Rio Grande do Norte,
Paraíba, Pernambuco, Alagoas, Sergipe, Maranhão, Bahia e a parte norte de Minas
Gerais, no vale do Jequitinhonha (Leal et al., 2005).
Os Brejos de Altitude nordestinos são considerados encraves da Mata Atlântica
em áreas de Caatinga, que formam ilhas de floresta úmida em maiores elevações na
região semiárida, apresentando uma condição climática bastante atípica e privilegiada
quanto à umidade do ar e do solo, temperatura, vegetação e cobertura vegetal (Andrade-
Lima, 1966). Essas florestas mais úmidas estendem-se sobre as encostas e topos das
chapadas e serras com mais de 600 m de altitude e que recebem mais de 1.200 mm de
chuvas orográficas (Andrade-Lima 1966, Prado, 2005).
Segundo Odum (2004), é importante reconhecer que a diversidade de espécies
tem um certo número de componentes que podem responder de forma diferente aos
fatores geográficos, de desenvolvimento ou físicos. Sendo que a composição de
espécies de uma área refere-se às espécies que estão presentes e a riqueza de espécies
pode ser expressa como o número de ―tipos‖ de componentes (espécies) por unidade de
espaço (Odum & Barrett 2008). Diante do exposto, o presente estudo tem como objetivo
analisar a diversidade de liquens corticícolas em duas fitofisionomias, Caatinga e Brejo
de Altitude, comparando a riqueza e composição para as duas áreas de estudo, testando
a hipótese de que a riqueza e composição de espécies de liquens corticícolas crostosos
são diferentes para as duas áreas, diante da diferença do tipo de vegetação, sendo a
riqueza maior para a área de Brejo de Altitude.
28
MATERIAIS E MÉTODOS
Área de estudo
A coleta de liquens para o desenvolvimento do presente trabalho foi realizada no
mês de Janeiro de 2014, em áreas de Brejo de Altitude e Caatinga, no Estado de
Sergipe, Brasil. Ambas as áreas são localizadas, mais especificamente, na Serra da Guia,
município de Poço Redondo, em Sergipe (Figura 1).
Figura 1. Mapa do Estado de Sergipe, localização das áreas de coleta.
Serra da Guia
A Serra da Guia (9° 58’S e 37° 52’W) faz parte do complexo da Serra Negra e
está localizada na divisa dos municípios de Poço Redondo, em Sergipe, e Pedro
Alexandre, na Bahia (Figura 2), sendo o ponto mais alto do Estado de Sergipe, com 740
m (Machado, 2011).
29
Figura 2. Serra da Guia, Poço Redondo, Sergipe, Brasil. (Fonte: SILVA, 2014).
A região possui altitudes que variam entre 300 e 740 metros, podendo ser
observada a presença de duas fitofisionomias bastante diferentes ao longo desse
gradiente altitudinal, uma Caatinga arbustiva e uma formação vegetal arbórea
semelhante à Mata Atlântica (Figura 3) (Machado, 2011).
A Serra da Guia trata-se de uma formação vegetal completamente circundada
pelo semiárido, com uma mata exuberante em seu topo e encostas com vegetação
nativa, ligando-se á Caatinga da depressão sertaneja no seu sopé (Machado, 2011).
Ainda segundo este autor, o clima da região é semiárido e a precipitação pluviométrica
média é de cerca de 650 mm/ano, bastante irregular, e com volumes de chuvas mais
concentrados entre os meses de maio e julho.
A formação vegetal denominada Brejo de Altitude localiza-se entre 650 e 750
metros de altitude e possuem uma área de aproximadamente 20 hectares. O dossel da
vegetação varia de 10 a 20 metros de altura, onde pode ser observada a fisionomia e
composição florística totalmente distintas da Caatinga a sua volta, havendo dominância
das famílias Myrtaceae, Moraceae, Solanaceae e Piperaceae, com um grande número de
epífitas (Machado, 2011).
30
Figura 3. Representação da área de Brejo de Altitude (esquerda); Caatinga (direita), na
Serra da Guia, município de Poço Redondo, Sergipe. (Fonte: SILVA, 2014).
Coleta e Processamento de Material Biológico
Coleta do material biológico
Para a coleta dos liquens crostosos, foram demarcados dois transectos de 300 m, um
por área, seguindo metodologia adaptada de Cáceres et al. (2007). Nestes transectos,
foram demarcados pontos a cada 10 m, sendo 30 pontos para cada área e um total de 60
pontos (Figura 4). Para os 60 pontos demarcados, foram adotados como critério de
escolha do hospedeiro a presença de talos liquênicos na altura de 0,5 m até 1,50 m em
relação ao solo. A demarcação dos transectos na área de Caatinga e Brejo de Altitude
serviu apenas para orientar a escolha do hospedeiro, sendo que cada árvore selecionada
representou uma unidade amostral.
Figura 4. Desenho amostral do transecto demarcado nas áreas de Caatinga e Brejo de
altitude para coleta de liquens corticícolas. (Fonte: SILVA, 2014).
31
Para remoção dos talos liquênicos do córtex das árvores, foram utilizados
martelo e faca. Posteriormente, as amostras foram acondicionadas em envelopes de
papel, nos quais foram registrados data e local de coleta, transecto e número da árvore.
Processamento e identificação das amostras
Ainda em campo as amostras de fungos liquenizados coletadas foram prensadas
com auxílio de prensas botânicas utilizando jornais e papelão em temperatura ambiente.
Em seguida, as amostras foram levadas ao Laboratório de Liquenologia do
Departamento de Biociências, da Universidade Federal de Sergipe, Campus Professor
Alberto Carvalho, em Itabaiana, Sergipe. Foram confeccionadas exsicatas, utilizando-se
papel cartão branco de dimensões 15 x 7 cm, com as informações do local, transecto,
número da árvore e data da coleta. Para identificação das espécies de liquens crostosos,
foram feitas secções no talo e ascoma com auxílio de lâmina de aço. Posteriormente, foi
feita a análise dos cortes ao microscópio e foram observadas características
morfológicas das estruturas de valor taxonômico, como também testes de coloração
histoquímicos utilizando solução aquosa de hidróxido de potássio (KOH) àpreparação
de 10% (observação de reações com compostos secundários) e solução lugol a 2% (para
reações amilóide e dextrinóide) comumente empregados em taxonomia de fungos
liquenizados, além de auxílio de bibliografia especializada (Cáceres 2007; Lücking et
al. 2009; Lücking et al. 2011; Rivas-Plata et al. 2006; Schumm & Aptroot 2010;
Sipman et al. 2012).
Análises estatísticas dos dados
Análise da Riqueza
Para análise da riqueza de espécies entre as áreas, foram utilizados testes não
paramétricos comparando múltiplas amostras independentes, com a análise de variância
(ANOVA) de Kruskal-Wallis para a diferença da riqueza entre as duas fitofisionomias,
no programa ESTATISTICA versão 6.0.
32
Análise da Composição de espécies
Para análise da composição de espécies de liquens entre as áreas de estudo, em
relação às influências que afetam o padrão de distribuição das mesmas entre as duas
áreas, foi utilizado o teste estatístico escalonamento multidimensional não métrico
(NMS) através do programa PC-ORD Version 5.10 (McCune&Mefford 2006). No
mesmo programa, foi feita a análise de similaridade correlacionando a presença ou
ausência de espécies através da técnica de agrupamento de Cluster entre as áreas de
estudo. A partir desta análise pode-se identificar espécies com características
semelhantes e organizá-las em grupos de acordo com o grau similaridade ou
dissimilaridade. Para os dois testes foi utilizando a distância de Sørensen. Para a análise
de espécies indicadoras foi utilizado o teste de aleatorização de Monte Carlo através do
software PC-ORD Version 5.10 (McCune&Mefford 2006).
RESULTADOS
Riqueza e composição de espécies
Foram amostrados 60 forófitos, sendo coletadas 576 amostras de liquens,
distribuídas entre as duas áreas, Caatinga e Brejo de Altitude. Deste total, 96 espécies
foram identificadas, sendo 53 gêneros e 28 famílias (Tabela 1, Figuras 5). Vale salientar
que, devido à inexistência de trabalhos sobre liquens crostosos para a Serra da Guia,
todas as espécies aqui apresentadas são novas ocorrências para a área.
33
Tabela 1. Lista de espécies de liquens corticícolas amostrados nas duas áreas de estudo. CA– Caatinga, BR – Brejo de Altitude. Ordem Arthoniales Henssen ex D. Hawksw. & O.E. Arthonia antillarum (Fée) Nyl. Erikss. Arthonia sp. Arthoniaceae Reichenb. ex Eichenb. Arthotelium sp. Roccellaceae Chevall. Bactrospora myriadea (Fée) Egea & Torrente
Chrysothrix xanthina (Vain.) Kalb Coniocarpon cinnabarinum DC. Crypthotecia sp. Enterographa subserialis (Nyl.) Redinger Opegrapha anguinella (Nyl.) Ertz & Diederich Opegrapha subdictyospora M.Cáceres, E.L.Lima & Aptroot Herpothallon rubrocinctum (Ehrenb.:Fr.) Aptroot, Lücking & G. Thor
Dothideomycetes Families incertae Sedis Arthopyrenia cinchonae (Ach.) Müll. Arg. Arthopyreniaceae W. Watson Mycoporum compositum (A. Massal.) R. C. Harris Mycoporaceae Zahlbr.
Teloschistales D. Hawksw. & O. E. Erikss Stigmatochroma epimarta (Nyl.) Marbach Caliciaceae Chevall. Heterodermia obscurata (Nyl.) Trevisan Physciaceae Zahlbr.
Campylothelium sp. Trypetheliales Lucking, Aptroot& Sipman Polymeridium albocinereum (Kremp.) R. C. Harris Trypetheliaceae Zenker Trypethelium aeneum (Eschw.) Zahlbr.
Trypethelium eluteriae Spreng. Trypethelium nitidiusculum (Nyl.) R. C. Harris Trypethelium ochroleucum (Eschw.) Nyl Trypethelium tropicum (Ach.) Müll. Arg. Pseudopyrenula subnudata Müll. Arg. Pseudopyrenula diluta var. degenerans Vain. Pseudopyrenula subgregaria Müll. Arg. Laurera megasperma (Mont.) Riddle Mycomicrothelia thelena (Ach.) D. Hawksw.
CA BR X X X X X X X X X X X X X
X
X X
X
X
X
X X
X X
X X X X
X X X X X X X
34
Ordem Lecanoromycetidae P.M. Kirk, P.F. Cannon & Bapalmuia confusa Kalb & Lücking
J.C. David ex Lutzoni Huhndorf & Lumbsch Byssoloma leucoblepharum (Nyl.) Vain.
Lecanorales Nannf. Bulbothrix tabacina (Mont. & Bosch) Hale
Haematommataceae Hafellner Haematomma personii (Fée) A. Massal.Hafelia curatellae Marbach
LecanoraceaeKörb. Hafelia demutans (Stirton)
Parmeliaceae Zenker
Hafellia bahiana (Malme) Sheard
Pilocarpaceae Zahlbr.
Lecanora achroa Nyl
Malmideaceae Kalb, HYPERLINK
"http://species.wikimedia.org/wiki/Rivas_Plat
a" Rivas Plata & Lumbsch
Lecanora coronulans Nyl.
Pilocarpaceae Zahlbr.
Lecanora endochroma Fée
Lecanora helvaStizenb
Lecanora hypocrocina Nyl
Lecanora leproplaca Zahlbr.
Lecanora leprosa Fee
Lecanora tropica Zahlbr.
Pyrrhospora palmicola Aptroot & Seaward
Protoparmelia capitata Lendemer
Malmidea vinosa (Eschw.) Kalb, Rivas Plata & Matthes-Leicht
Ramboldia haematites Körb.
Ramboldia russula (Ach.) Kalb, Lumbsch & Elix
Ostropales Nannf. Chapsa sp.
Diorygma hieroglyphica (Pers.) M. Nakan. & Kashiw.
Graphidaceae Dumort. Diorygma poitaei(Fée) Kalb, Staiger &Elix
Diorygma reniforme (Fée) Kalb, Staiger & Elix
Diorygma sipmanii Kalb, Staiger & Elix 2004
Dyplolabia afzelii (Ach.) A. Massal
Fissurina sp.
Glyphis cicatricosa Ach.
Glyphis scyphulifera (Ach.) Staiger
Platythecium sp.
CA BR X X X
X X
X X
X
X X
X X
X X X
X X
X
X X
X X
X X X X X X X
X X X X
X
35
Ordem Graphis acharii Fée Graphis angustata Eschw. Graphis caesiella Vain. Graphis chrysocarpa (Raddi) Spreng. Graphis cincta (Pers.) Aptroot Graphis cinerea Fée Graphis conferta Zenker Graphis glaucescens Fée Graphis sp. Graphis submarginata Lücking Helminthocarpon leprevostii Fée Phaeographis brasiliensis (A. Massal.) Kalb & Matthes-Leicht. Phaeographis fusca Staiger Phaeographis neotricosa Redinger Phaeographis punctiformis (Eschw.) Mull. Arg. Platygramme caesiopruinosa Fée
CA BR
X X
X X
X X X
X
X
X X X
X X X
X X X
Porinaceae Reichenb.
Pyrenulales Fink ex D. Hawksw. & O.E. Erikss. Pyrenulaceae Rabenh.
Porina conspersa Malme Pyrenula
anomala (Ach.) Vain. Pyrenula
mamillana (Ach.) Trevis. Pyrenula ochraceoflava (Nyl.) R. C. Harris Pyrenula aspistea Ach.
X
X X X
X X X
Peltigerales Walt. Watson Coccocarpia palmicola (Spreng.) Arv. & D.J.Galloway Coccocarpiaceae Henssen
X X
36
Ordem CA BR X
PertusarialesM. Choisy ex D. Hawksw. & O.E. Erikss. PertusariaceaeKörb. ex Körb.
Pertusaria flavens Nyl. Pertusaria
quassiae (Fée) Nyl. Pertusaria
trachythallina Erichsen
Pertusaria ventosa Malme
X X
X X
X X X X
Ochrolechiaceae R.C. Harris ex Lumbsch & I. Schmitt Pyrenulales Fink ex D. Hawsw. & O. E. Erikss. Pyrenulaceae Rabenh
Pertusaria wulfenoides B. de Lesd. Ochrolechia africana Vainio
Anthracothecium duplicans (Nyl.) Müll. Arg.
X
Ostropales Nannf Coenogoniaceae (Fr.) Stizenb. Gomphillaceae W. Watson ex Hafellner Thelotremataceae (Nyl.) Stizenb.
Teloschistales D. Hawksw. & O. E. Erikss. Caliciaceae Chevall. Verrucariales Mattick ex D. Hawksw. & O. E. Erikss. Verrucariaceae Zenker
Coenogonium disjunctum Nyl. X
Coenogonium subdentatum (Vezda & G. Thor) Rivas Plata, Lücking, Umaña & Chaves X
X
Coenogonium subdilutum (Malme) Lucking, Aptroot & Sipman
X
Echinoplaca sp.
X
Gyalideopsis rubrofuscaKalb& Vezda
X
X
X
Leucodecton occultum (Eschw.) Frisch & Lumbsch
Ocellularia pseudopyrenuloides Lücking
Dirinaria leopoldii (Stein) D. D. Awasthi X
Normandina pulchella (Borrer) Nyl. X
37
A B
C D
E F
G H Figura 5. Liquens corticícolas amostrados nas duas fitofisionomias. (A) Glyphis
scyphulifera (B) Lecanora achroa (C) Ramboldia russula (D) Graphis cincta (E) Trypethelium eluteriae (F) Dirinaria leopoldii (G) Pyrenula anômala (H) Diorygma
poitaei.
38
De acordo com a ANOVA (P < 0,5818) entre os dados de riqueza e as áreas
amostradas, não houve uma correlação significativa (Figura 6). Considerou-se riqueza
como o número de espécies de liquens entre as áreas em estudo e, desta forma, foram
observados valores de riqueza próximos entre as duas áreas de estudo, Caatinga e Brejo
de Altitude.
Figura 6. Boxplot da ANOVA de Kruskal-Wallis entre a riqueza em relação ás duas
áreas Local (1) Caatinga, (2) Brejo de Altitude.
A análise da ordenação NMS mostrou que, para a composição de espécies, há
uma diferenciação de similaridade entre as espécies do Brejo de Altitude e as espécies
presentes na Caatinga, embora haja algumas espécies que façam parte da composição
dos dois ambientes (Figura 8). Isso também é evidenciado na análise de Cluster, onde a
composição para cada área apresentou-se em dois grupos distintos, sendo um grupo
39
representado pelas espécies de liquens para a área de Caatinga e o outro grupo, pra a
área de Brejo de Altitude. (Figura 7).
Figura 7. Análise de Cluster da composição de espécies entre as fitofisionomias. Local (1) Caatinga, (2) Brejo de Altitude.
40
Figura 8. Análise NMS da composição das espécies de liquens em relação as
fitofisionomias. Local (1) Caatinga, (2) Brejo de Altitude.
A análise de espécies indicadoras revelou sete espécies com valores
significativos (p < 0,05), distribuídas entre as duas áreas (Tabela 2). Os maiores valores
de indicação estão correlacionados com Lecanora leprosa e Phaeographis punctiformis
para a Caatinga, e Graphis chrysocarpa para o Brejo de Altitude.
Tabela 2. Teste de Monte Carlo referente as espécies indicadoras das fitofisionomias.
(P < 0,05), VI – Valor de Indicação.
Espécies Local VI P* Glyphis scyphulifera Caatinga 23.7 0.0284 Lecanora helva Caatinga 26.7 0.0062 Lecanora leprosa Caatinga 43.3 0.0002 Phaeographis punctiformis Caatinga 30.3 0.0086 Ramboldia haematites Caatinga 30.0 0.0032 Graphis chrysocarpa Brejo de Altitude 23.3 0.0136 Laurera megasperma Brejo de Altitude 20.0 0.0200
41
DISCUSSÃO
Riqueza de espécies
Considerando a hipótese H1 deste trabalho, na qual considera-se que a riqueza e
composição de espécies de liquens corticícolas são diferentes para as duas áreas, diante
da diferença do tipo de vegetação, sendo a riqueza maior para área de Brejo de Altitude.
Foi constatado, com os resultados obtidos, que esta hipótese não foi corroborada, sendo
observados valores de riqueza próximos entre as duas áreas de estudo.
Os resultados para riqueza entre as áreas mostraram uma semelhança entre a
quantidade de espécies de liquens corticícolas para a Caatinga, e Brejo de Altitude
comparado com Cáceres et al. (2008a), onde o Brejo apresentou uma maior diversidade
geral, e Xavier-Leite (2013), que mostra a caatinga com uma maior diversidade. Em
relação a Cáceres et al. (2008a), essa diferença nos resultados encontrados e os deste
trabalho pode ter ocorrido devido à disparidade do método de análise amostral utilizado,
já que, Cáceres et al. (2008b) demostraram que a técnica de amostragem a ser escolhida
é fundamental para estimar a riqueza de espécies de liquens dentro de uma determinada
área, indicando o método utilizado neste trabalho como o ideal e mais eficiente para
inventários de liquens crostosos. Essa disparidade de método de coleta também foi
utilizada por Xavier-Leite (2013) para explicar a maior diversidade da Caatinga em
relação ao Brejo de Altitude encontrada em seu trabalho.
Quanto à diferença dos resultados encontrados nesse trabalho em relação aos
encontrados por Xavier-Leite (2013), pode ser justificado pelo fato de que houve uma
diferença em relação à trasmitância total de luz entre Caatinga e Brejo de altitude, onde
a Caatinga obteve maior grau de luminosidade. Essa diferença não foi verificada em
relação ao Brejo de altitude e a Caatinga estudados neste trabalho, onde a transmitância
total não apresentou uma diferença significativa em relação aos dois ambientes.
Rodrigues (2012) afirma que a abertura do dossel explica 95% da variação na
comunidade, e que os maiores valores de abertura do dossel estão diretamente
relacionados com os forófitos que possuíam uma maior riqueza de espécies de liquens.
Como ambos os ambientes apresentaram grau de luminosidade semelhante, isso pode
explicar o fato de não haver uma diferença significativa na riqueza.
42
Composição
Em relação à composição de espécies de liquens corticícolas crostosos, os
resultados corroboram a hipótese H1, já que a composição de espécies é diferente para
as duas áreas, diante da diferença do tipo de vegetação, conforme observado na análise
de cluster (Figura 7) e os padrões no NMS (Figura 8). Nestes dois gráficos, observa-se a
formação de dois grupos, um formado pelas espécies de Brejo e o outro pelas espécies
de Caatinga, embora sejam observadas espécies que fazem parte da composição dos
dois ambientes.
Sendo os Brejos de Altitude considerados encraves da Mata Atlântica, formando
ilhas de floresta úmida em plena região semiárida (Andrade-Lima 1966), o
aparecimento de espécies comuns para área de Caatinga e áreas de Brejo deve ocorrer
pelo fato de áreas do Brejo estarem sendo mais degradadas, onde pode ser observado o
efeito de borda, com a vegetação ficando mais aberta em alguns locais (Cáceres et al. 2007), permitindo um grau de luminosidade semelhante ao da Caatinga.
De acordo com o grande numero de trabalhos que consideram os liquens como
indicadores ambientais (Koch 2012, Cáceres 2007, Lima 2013, Rivas-Plata et al. 2008),
pode-se afirmar que, algumas espécies podem ser utilizadas como indicadores de
ambientes de Caatinga e Brejo de Altitude. Neste sentido, vale ressaltar as espécies com
maiores valores de indicação como Lecanora leprosa e Phaeographis punctiformis,
indicadoras do ambiente de Caatinga, e Graphis chrysocarpa, indicadora do ambiente
de Brejo de Altitude. Da mesma forma, em estudo anterior, Lecanora leprosa foi citada
como indicadora de área de Caatinga, nesse caso relacionada a um estágio inicial de
sucessão da floresta (Mendonça, 2014).
CONCLUSÃO
Diante dos dados analisados no presente estudo constatamos que não houve uma
diferença significativa na riqueza entre a área de Caatinga e Brejo de Altitude, no
entanto em relação á composição ficou claro uma diferenciação na composição de
espécies entre as duas fitofisionomias. O que ressalta a importância do conhecimento e
preservação. Considerando que são poucos os estudos a respeito da diversidade de
liquens corticícolas para essas áreas, e nenhum estudo para a Serra da Guia.
43
Dessa forma, esta pesquisa se torna de suma importância para o conhecimento
da riqueza e composição de espécies para o Brejo de Altitude e a Caatinga, buscando
através do conhecimento taxonômico, novas informações para o conhecimento e
preservação destas fitofisionomias, ressaltando seu potencial biológico.
44
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49
CAPÍTULO 2
INFLUÊNCIA DE FATORES BIÓTICOS E ABIÓTICOS NA RIQUEZA DE LIQUENS CORTICÍCOLAS EM ÁREAS DEBREJO DE ALTITUDE E CAATINGA
50
Influência de fatores bióticos e abióticos na riqueza de liquens corticícolas em
áreas de Brejo de Atitude e Caatinga
Jeanne dos Reis Silva¹, André Aptroot2, Robert Lücking
3& Marcela Eugenia da
Silva Cáceres¹
¹Programa de Pós-Graduação em Ecologia e Conservação, Universidade Federal de
Sergipe, CEP: 49100-000, São Cristóvão, Sergipe, Brasil. ²ABL Herbarium, G.v.d.Veenstraat 107, NL-3762 X K Soest, The Netherlands. ³Science & Education, The Field Museum of Natural History, 1400 South Lake Shore
Drive, Chicago, Illinois 60605, USA.
RESUMO: Os liquens fazem parte de um grupo extremamente diverso encontrado em
quase todos os habitats terrestres, desde os trópicos às regiões polares. Além de
excelentes bioindicadores da qualidade e das alterações ambientais, os fungos
liquenizados são produtores de uma grande quantidade de substâncias biologicamente
ativas. Os liquens escolhem seu substrato de acordo com a composição química e
qualidades físicas específicas do mesmo, sendo vários os fatores que influenciam a
distribuição destes organismos, destacando-se a água, temperatura, luz, substrato e
atividade humana, e características do hospedeiro. O presente trabalho tem como
objetivos verificar se a riqueza e composição de espécies de liquens corticícolas
crostosos são influenciadas pelos fatores bióticos e abióticos, tais como, a luminosidade,
pH da casca do hospedeiro, diâmetro na altura do peito (DAP) e altitude. Em duas
fitofisionomias, Caatinga e Brejo de Altitude, na Serra da Guia, município de Poço
Redondo, estado de Sergipe, foram delimitados dois transectos de 300 m, um em cada
área. Nestes transectos, foram demarcados pontos a cada 10 m, sendo 30 pontos para
cada área e o total de 60 pontos neste estudo. Para os 60 pontos demarcados, foram
adotados como critério de escolha do hospedeiro a maior proximidade do ponto e
presença de talos liquênicos na altura de 0,5 m até 1,50 m em relação ao solo. Ao todo,
foram coletadas 576 amostras, totalizando 96 espécies, sendo 53 gêneros e 28 famílias
de microliquens corticícolas. Em relação a riqueza, não houve uma diferença
significativa entre as duas áreas. Com relação à composição de espécies, as áreas
apresentaram diferença, porém com algumas espécies comuns para as duas áreas.
Comparando a riqueza de liquens corticícolas com os fatores bióticos e abióticos,
51
apenas o diâmetro à altura do peito (DAP) do hospedeiro selecionado apresentou-se de
forma significativa em relação à riqueza de espécies. Relacionando a composição e os
fatores bióticos e abióticos, tivemos elevação, DAP e fitofisionomias (local) e abertura
do dossel. Esse foi o primeiro trabalho que estudou os liquens na Serra da Guia. Dessa
forma os resultados apresentados nesse estudo visam contribuir para o conhecimento
ecológico dos fungos liquenizados, assim como torna-se subsídio para outras pesquisas
que venham a aprimorar e enriquecer o conhecimento ecológico e liquenológico da
Caatinga e Brejos de Altitude.
Palavras-chave: Liquens Corticícolas, Ecologia, Caatinga, Brejo de Altitude
52
ABSTRACT: Lichens are part of an extremely diverse group, found in almost all
terrestrial habitats from the tropics to polar regions. In addition to excellent indicators of
environmental change and quality, the lichenized fungi also produce a great amount of
biologically active substances. Lichens choose their substrate according to its chemical
composition and specific physical characteristics, and many of the factors that influence
lichen distribution include light intensity, water, temperature, substrate and human
activity, and characteristics of the host bark. This study was conducted to verify whether
lichen species richness and composition are influenced by biotic and abiotic factors
such as light, pH of the bark and diameter at breast height (DBH) of the host tree, and
elevation. In two forest types, Caatinga and Brejo de altitude, at Serra da Guia,
municipality of Poço Redondo, in Sergipe State, two 300 m transects (one per area)
were delimited. Sampling points were marked every 10 m along each transect, totallin
thus 30 points per transect and 60 points as a whole. For the 60 marked points, the
neaerest tree with lichen thalli cover form at a height of 0.5 m to 1.50 m from the
ground was selected. Altogether 576 samples OF corticicolous microlichens were
collected, comprising 96 species, in 53 genera and 28 families. Regarding the species
richness, there was no significant difference between the two areas. With respect to
species composition, the areas were different, but with some common species to the two
areas. Comparing the species richness of corticicolous lichens with biotic and abiotic
factors, only the diameter at breast height (DBH) of the host presented significantly.
Relating the composition and biotic and abiotic factors, we had elevation, DBH and
vegetation types (local), and canopy openness influencing the composition. This was the
first work that studied the lichens in Serra da Guia. Thus, the results presented in this
study are intended to contribute to the ecological knowledge of lichenized fungi, and
represents a starting point to other researches, which will enhance and enrich the
ecological and lichenological knowledge about Caatinga and Brejo de Altitude.
Keywords: Corticicolous Lichens, Ecology, Caatinga, Brejo de Altitude
53
INTRODUÇÃO
Os liquens fazem parte de um grupo extremamente diverso encontrado em quase
todos os habitats terrestres, desde os trópicos às regiões polares (Nash, 2008). Variam
em sua complexidade, desde formas muito simples até estruturas morfológicas e
anatômicas muito complexas, sendo separados, de acordo com a forma de crescimento,
em crostosos, esquamulosos, foliosos, filamentosos e fruticosos (Purvis, 2010).
Os liquens foliosos apresentam estrutura dorsiventral, aderido ao substrato e
apresentam um córtex inferior. Os crostosos são em geral bastante achatados, muito
aderidos ao substrato e não apresentam córtex inferior. Os liquens de talo fruticoso são
compostos por ramos, que podem ser simples, divididos, cilíndricos ou achatados. O
talo esquamuloso, é formado por pequenas escamas agregadas. Os filamentosos, um dos
tipos mais simples de talo, são formados por filamentos frouxos e entrelaçados
(Spielmann, 2006).
Quanto ao tipo de substrato os liquens podem ser classificados em corticícolas,
quando crescem sobre o córtex das árvores, saxícolas (sobre rocha), terrícolas (no solo),
muscícolas (sobre musgos) e foliícolas, sobre folhas, sendo essa uma característica
importante na identificação, já que, muitas vezes, determinadas espécies são bastante
seletivas quanto ao substrato utilizado (Nash, 2008).
Além de excelentes bioindicadores da qualidade e das alterações ambientais, os
fungos liquenizados são produtores de uma grande quantidade de substâncias
biologicamente ativas (McCune 2000, Rivas Plata et al. 2008). E responderem às
transformações resultantes das sucessões das florestas, tanto estruturalmente como
funcionalmente, podendo servir como mais uma ferramenta na caracterização de áreas
em estágios de regeneração e/ou conservação distintos, possibilitando a avaliação da
situação da floresta de forma mais rápida e simplificada (Koch, 2012).
Estando entre os organismos menos exigentes enquanto às suas necessidades
nutricionais, os fungos liquenizados são capazes de crescer até onde a água é fornecida
apenas por um curto espaço de tempo diário ou apenas durante um curto período do ano
(Sochting 1999), os tornando uma forma de vida peculiar presentes em praticamente
todos os ecossistemas do planeta (Umaña & Sipman 2002).
Os liquens escolhem seu substrato de acordo com a composição química e
qualidades físicas específicas do mesmo (Marmor & Randlane 2007; Morales et al. 2009). Desaparecendo muito rapidamente de regiões sob impacto ambiental, sendo a
54
posterior reconstituição da comunidade, quando possível, extremamente lenta, pois os
liquens crescem, normalmente, à razão de milímetro por ano e as sucessões liquênicas
podem levar de décadas a séculos (Marcelli, 2006).
Dentre os fatores que influenciam a distribuição dos liquens, destaca-se, água,
temperatura, luz, substrato e atividade humana. Além destes fatores também podemos
citar características do hospedeiro, como rugosidade da casca (Käfferet al. 2007),
diâmetro na altura do peito (DAP) da árvore (Bunnell et al. 2008), e a elevação e
umidade da área (Morales et al. 2009).
No Brasil, poucos trabalhos dedicaram-se ao estudo da resposta dos liquens aos
fatores bióticos e abióticos. Na Região Sul, foram realizados estudos sobre a
comunidade da comunidade liquênica de acordo com a rugosidade da casca do
hospedeiro, em uma mata de Araucárias (Kaffer et al. 2007), além de uma avaliação em
relação à preferência por forófitos e sua relação com o pH da casca e (Käffer et al. 2010). Já Koch et al. (2012) analisaram a influência de fatores na comunidade de
liquens foliosos quanto à composição, riqueza e cobertura de espécies.
No Nordeste brasileiro, temos os trabalhos de Cáceres et al. (2007) onde foi
estudado a composição e riqueza de espécies de liquens corticícolas crostosos em uma
área de Floresta Atlântica no estado de Alagoas relacionando-as com características da
casca do hospedeiro e a intensidade de luz incidente. Além deste trabalho, foi realizada
uma comparação entre a composição de espécies de liquens de três fitofisionomias
ocorrentes nas regiões, Mata Atlântica, Caatinga e Brejos de Altitude, onde foi
observada uma baixa similaridade entre as áreas com relação ao tipo de vegetação e
grau de luminosidade (Cáceres et al.2008a). E, mais recentemente, tivemos o trabalho
de Xavier-Leite (2013), que estudou a influência de fatores bióticos e abióticos na
riqueza da comunidade liquênica em áreas de Brejo e caatinga no Estado da Paraíba, e
Mendonça (2014), que estudou a influência de diferentes estágios sucessionais na
composição e riqueza de liquens na caatinga, avaliando alguns fatores ambientais e
atributos funcionais dos liquens.
Os Brejos de Altitude ou matas serranas são encraves de Mata Atlântica
inseridos no Bioma Caatinga em locais de maior altitude, que de acordo com Theulen
(2004) configuram áreas núcleos de importância para preservação da biodiversidade.
Estando a maior diversidade da Caatinga associada ás maiores altitudes principalmente
em áreas rochosas que captam maior umidade atmosférica e atuam como refúgio para as
espécies vegetais (Giulietti et al.,2003). A Serra da Guia constitui um remanescente de
55
Brejo de Altitude no sertão sergipano. Trata-se de uma formação vegetal completamente
circundada pelo semi-árido, com uma mata exuberante em seu topo (Machado 2011).
A Caatinga é um bioma endêmico do semiárido brasileiro, Ocupando o
equivalente a 800.000 km², sendo dominado por tipos de vegetação com características
xerofíticas com extratos compostos por gramíneas, arbustos e árvores, com grande
quantidade de plantas espinhosas entremeadas de outras espécies como as cactáceas e
bromeliáceas, caracterizando um banco genético exclusivo para ao país. Apresentando
um sistema anual de chuvas extremamente irregular, resultando em secas periódicas e
severas (Albuquerque& Bandeira, 1995). Na região do entorno da Serra da Guia, até o
limite aproximado de 600 m de altitude, verifica-se a presença de uma vegetação
arbustiva típica de Caatinga, área que encontra-se bastante antropizada pela presença de
atividade agropecuária (Machado, 2011).
Diante do exposto, e tendo os liquens uma participação ativa na ciclagem de
nutrientes dentro dos ecossistemas florestais, além da ausência de estudos sobre liquens
corticícolas crostosos para as áreas de Caatinga e Brejo de Altitude, localizadas na Serra da
Guia, bem como, a análise da influência de fatores bióticos e abióticos para a riqueza e
composição de liquens, este trabalho, pioneiro para a área, tem como objetivo verificar se a
riqueza e composição são influenciadas pelos fatores bióticos e abióticos, tais como, a
luminosidade, pH da casca do hospedeiro, diâmetro na altura do peito (DAP) e altitude.
Para isto, foram testadas as seguintes hipóteses: (H1) A riqueza de liquens corticícolas será
maior para a área com maior intensidade luminosa, (H2) Hospedeiros com pH da casa ácido
terão uma resposta mais significativa na riqueza, (H3) A riqueza de espécies de
microliquens será maior para a área com hospedeiros de maiores valores de DAP, e (H4)
Maiores altitudes proporcionará maior riqueza de liquens corticícolas.
56
MATERIAL E MÉTODOS
Áreas de estudo
A coleta de liquens para o desenvolvimento do presente trabalho foi realizada no
mês de Janeiro de 2014, em áreas de Brejo de Altitude e Caatinga, no Estado de
Sergipe, Brasil. As áreas ambas são localizadas, mais especificamente na Serra da Guia
município de Poço Redondo do referido Estado de Sergipe (Figura 1).
Poço
Redondo Figura 1. Mapa do Estado de Sergipe, localização das áreas de coleta.
Serra da Guia
A Serra da Guia (9° 58`S e 37° 52`W) faz parte do complexo da Serra Negra e
está localizada na divisa dos municípios de Poço Redondo (Sergipe) (Figura 2) e Pedro
Alexandre (Bahia). Sendo o ponto mais alto do Estado de Sergipe (750 m.s.m.)
(Machado, 2011).
57
Figura 2. Serra da Guia, Poço Redondo, Sergipe, Brasil. (Fonte: SILVA, 2014).
A região possui altitudes que variam entre 300 e 740 metros, podendo ser
observado à presença de duas fitofisionomias bastante diferentes ao longo desse
gradiente altitudinal, uma Caatinga arbustiva e uma formação vegetal arbórea
semelhante à Mata Atlântica (Machado, 2011).
Segundo Machado (2011), a Serra da Guia trata-se de uma formação vegetal
completamente circundada pelo semiárido, com uma mata exuberante em seu topo e
encostas com vegetação nativa ligando-se a Caatinga da depressão sertaneja no seu
sopé. O clima da região é semiárido e a precipitação pluviométrica média é de cerca de 650
mm/ano, bastante irregular e com volumes de chuvas mais concentrados entre os meses
de maio e julho (Machado, 2011).
A formação vegetal denominada Brejo de Altitude localiza-se entre 650 e 750
metros de altitude e possui uma área de aproximadamente 20 hectares. O dossel da
vegetação varia de 10 a 20 metros de altura, onde pode ser observado a fisionomia e
composição florística totalmente distintas da Caatinga a sua volta, havendo dominância
das famílias Myrtaceae, Moraceae, Solanaceae e Piperaceae, com um grande número de
epífitas (Machado, 2011) (Figura 3).
58
Figura 3. Representação da área de Brejo de Altitude (esquerda); Caatinga (direita),
Serra da Guia, município de Poço Redondo Sergipe. (Fonte: SILVA, 2014).
Coleta do material biológico
Para a coleta dos liquens crostosos, foram demarcados dois transectos de 300 m,
seguindo metodologia adaptada de Cáceres et al. (2007). Nestes transectos, foram
demarcados pontos a cada 10 m, sendo 30 pontos para cada área e o total de 60 pontos
(Figura 4). Para os 60 pontos demarcados, foram adotados como critério de escolha do
hospedeiro a presença de talos liquênicos na altura de 0,5 m até 1,50 m em relação ao
solo.
Para remoção dos talos liquênicos do córtex das árvores, foram utilizados
martelo e faca. Posteriormente as amostras foram acondicionadas em envelopes de
papel, nos quais foram registrados data e local de coleta, transecto e número da árvore.
Figura 4. Desenho amostral do transecto demarcado nas áreas de Caatinga e Brejo de
altitude para coleta de liquens corticícolas. (Fonte: SILVA, 2014).
59
Processamento e identificação das amostras
Ainda em campo as amostras de fungos liquenizados coletadas foram prensadas
com auxílio de prensas botânicas utilizando jornais e papelão em temperatura ambiente.
Em seguida, as amostras foram levadas ao Laboratório de Liquenologia do
Departamento de Biociências da Universidade Federal de Sergipe, Campus Professor
Alberto Carvalho em Itabaiana - SE, onde foram confeccionadas exsicatas, utilizando-se
papel cartão branco de dimensões 15 x 7 cm, com as informações do local, transecto,
número da árvore e data da coleta. Para identificação das espécies de liquens crostosos,
foram feitas secções no talo e ascoma com auxílio de lâmina de aço. Posteriormente, foi
feita a análise dos cortes ao microscópio, onde foram observadas características
morfológicas das estruturas de valor taxonômico, como também testes de coloração
histoquímicos utilizando solução aquosa de hidróxido de potássio (KOH) à preparação
de 10% (observação de reações com compostos secundários) e solução lugol a 2% (para
reações amilóide e dextrinóide) comumente empregados em taxonomia de fungos
liquenizados, além de auxílio de bibliografia especializada (Cáceres 2007; Lücking et
al. 2009; Lücking et al. 2011; Rivas-Plata et al. 2006; Schumm&Aptroot 2010;
Sipmanet al. 2012).
Amostragem dos fatores bióticos e abióticos
Aferimento do pH da casca do hospedeiro
Foi utilizado o aparelho Skin pH Meter – HI 9918, posicionado no hospedeiro na
área mais próxima de onde foi retirado o talo liquênico. Foram realizadas três medições
para cada hospedeiro e o valor considerado foi a média destas, adotando os valores de
pH da casca como ácido (de 0 a 6,9), neutro (7,0) e base (7,1 a 14) (Käffer et al. 2010).
Medição do diâmetro à altura do peito (DAP)
A medida do DAP foi feita através da circunferência a altura do peito (CAP) de
cada forófito, dada por uma fita métrica colocada ao redor do tronco, numa altura de 1,5
m distante do solo. Segundo Batista, 2001, a forma mais simples de se medir o ―Diâmetro à Altura do Peito‖ (DAP) é medir o perímetro ou circunferência do tronco
60
(CAP) e convertê-la para diâmetro, considerando que a secção transversal do tronco à
altura do peito é perfeitamente circular, assim, todos os valores do CAP foram
convertidos em DAP para posterior análise estatística dos dados, utilizando-se a seguinte equação DAP = CAP/π.
Medição da intensidade luminosa
Para o diagnóstico da cobertura vegetal e transmitância total de luz incidente na
área da árvore amostrada, foi utilizada uma câmera fotográfica digital (Sony, modelo H20) com 10 Megapixels, com uma lente ―olho de peixe‖ (modelo FCE9) acoplada,
que fornece a abertura do dossel em 180º com a qual foram feitas fotos hemisféricas
(Silva et al, 2009) (Figura 5).
A B
Figura 5. Foto hemisférica tirada em campo com o auxílio da lente olho-de-peixe (A) e
tratada com o programa GLA (B). (Fotos: SILVA, 2014).
Ao todo foram captadas três fotos de cada forófito amostrado com auxílio de um
tripé posicionado de costas para a face escolhida para a coleta dos liquens. O tripé foi
nivelado ao solo e direcionado ao norte magnético com auxílio de uma bússola e
posicionado a cerca de 1m do solo (Koch et al, 2012), tendo a lente nivelada com nível
de bolha e a câmera posicionada superiormente para o Norte magnético, detectado
através de bússola (Garcia et al, 2007), este nivelamento é importante devido ao
programa utilizado para análise das fotos (Silva et al, 2009). As fotos foram amostradas
entre 6h a 8h ou 16h a 17:30 h, durante o mês de janeiro de 2014.
61
Cada hospedeiro registrado foi marcado pelo GPS (Global Position System)
como parte da análise das fotos, já que se utilizam a altitude e coordenadas locais no
tratamento destas, e para posterior comparação das altitudes entre as áreas. A declinação
magnética foi corrigida com a inserção dos dados necessários no site
<http://geomag.nrcan.gc.ca/calc/mdcal-eng.php>, acesso em 20 de novembro de 2014,
(Frazer et al. 1999).
Análise da intensidade luminosa
Para analisar a porcentagem de abertura do dossel e a transmitância através
cobertura vegetal (radiação direta + radiação difusa), será utilizado o programa Gap
Light Analyzer Version 2.0 (GLA) (Frazer et al, 1999), onde será comparado a relação
da radiação fotossintética ativa na composição e riqueza da comunidade liquênica entre
as árvores selecionadas nas áreas coletadas.
As fotos hemisféricas para cada ponto foram analisadas através do software Gap
Light Analyzer (GLA) Version 2.0, da seguinte maneira: processadas no software GLA
2.0, a fotografia digital é convertida em preto e branco e recortada no formato quadrado
requisitado pelo GLA. A fotografia é dividida radialmente e em círculos concêntricos
eqüidistantes de acordo com a geometria óptica da lente de maneira que cada setor
represente uma proporção igual do hemisfério. Esse cuidado visa eliminar o efeito de
visada obliqua crescente à medida que se afasta do centro da fotografia. Finalmente, a
fotografia é segmentada em bitmap binário usando um limiar estimado visualmente
(Silva et al. 2009). Posteriormente foram obtidas diversas variáveis, sendo utilizado
neste trabalho apenas a transmitância total que é a radiação fotossinteticamente ativa
transmitida através do dossel (radiação direta + radiação difusa) (Garcia et al. 2007), e a
abertura do dossel a fim de verificar a influência dos fatores bióticos e abióticos na
comunidade liquênica (Koch et al, 2012).
Análises estatísticas dos dados
Análise da Riqueza
Para análise da riqueza de espécies entre as áreas, foram utilizados testes não
paramétricos comparando múltiplas amostras independentes com a análise de variância
62
(ANOVA) de Kruskal-Wallis para a diferença da riqueza entre as duas fitofisionomias,
e o teste de correlação de Spearman entre a riqueza e as possíveis influências que
afetam o padrão de organização da comunidade liquênica (pH da casca, abertura do
dossel, transmitância total e DAP), no programa ESTATISTICA versão 6.0.
Análise da Composição de espécies
Para á analise da composição de espécies de liquens entre as áreas de estudo, e
às influências que afetam o padrão de distribuição das mesmas entre as duas áreas foi
utilizado o teste estatístico escalonamento multidimensional não métrico (NMS) através
do programa PC-ORD Version 5.10 (McCune & Mefford 2006). Para os dois testes
utilizou-se a distância de Sørensen.
RESULTADOS
De acordo com a ANOVA (P < 0,5818) entre os dados de riqueza e as áreas
amostradas não houve uma correlação significativa (Figura 6). Considerou-se riqueza
como o número de espécies de liquens entre as áreas em estudo, e desta forma foram
observados valores de riqueza próximos entre as duas áreas de estudo, Caatinga e Brejo
de Altitude.
Figura 6. Boxplot da ANOVA de Kruskal-Wallis entre a riqueza em relação ás duas
áreas Local (1) Caatinga, (2) Brejo de Altitude.
63
Quando levado em consideração a correlação entre a riqueza e os fatores
ambientais amostrados DAP, elevação e os dados obtidos (pH, abertura do dossel,
transmitância total, transmitância difusa e as porcentagens das transmitâncias total e
difusa), apenas o DAP (P <0,035383) possui correlação significativa.
A riqueza diferiu significativamente em relação aos valores de DAP, foi possível
perceber que hospedeiros com menores valores do DAP proporcionaram um aumento
significativo na riqueza de liquens corticícolas (p =0,035383) (Figura 7).
Figura 7. Teste de correlação de Spearman entre o DAP e a riqueza.
A análise da ordenação NMS mostrou que para a composição de espécies há
uma diferenciação de similaridade entre as espécies do Brejo de Altitude e as espécies
presentes na caatinga, embora haja algumas espécies que fazem parte da composição
dos dois ambientes (Figura 8). Ainda na mesma análise, fica clara a relação explicativa
entre a composição de espécies e os fatores bióticos e abióticos amostrados, onde
altitude, DAP e fitofisionomias (local), estão correlacionados com as espécies de Brejo (1) e Caatinga (2), e abertura do dossel (CANOPENE), está relacionada á Caatinga (1).
64
Figura 8. Análise NMS da composição das espécies de liquens em relação as
fitofisionomias e os fatores bióticos e abióticos amostrados. Local (1) Caatinga, (2)
Brejo de Altitude.
DISCUSSÃO
Riqueza
Estudos recentes feitos na Caatinga revelam que a riqueza da comunidade de
liquens corticícolas responde a fatores bióticos e abióticos, como, pH da casca, DAP do
hospedeiro, abertura do dossel e a transmitância total (Mežaka et al. 2008; Kaffer et al. 2010; Marmor & Randlane 2007; Martins &Marcelli2011; Cáceres et al. 2007; Morales
et al. 2009; Käffer et al. 2007; Bunnell et al. 2008; Friedel et al. 2006; Koch et al. 2012,
Xavier-Leite, 2013, Mendonça,2014).
65
Neste trabalho a riqueza é afetada de forma significativa pelo DAP, visto que
quanto menores os valores de DAP, maior a riqueza, sustentando, em partes, o
observado na literatura. Bunnel et al. (2008) em estudo desenvolvido com liquens
crostosos em toras de madeira, o diâmetro na altura do peito (DAP) dos hospedeiros foi
considerado como uma característica importante para a ocorrência de liquens. O mesmo
foi observado por Xavier-Leite (2013) em seu estudo comparando a riqueza da Caatinga
com a do Brejo de Altitude, observou a correlação entre a riqueza e DAP, onde
hospedeiros com menores valores do DAP possuem um aumento significativo na
riqueza. Já Rodrigues (2012) afirma que a abertura do dossel e os valores do DAP
explicam 95% da variação na comunidade, assim como Friedel et al. (2006) que
demonstrou em seus estudos em florestas da Alemanha que o DAP foi a variável
explicativa mais importante para o número de espécies por árvore, mostrando que a
riqueza de espécies cresceu com o aumento do DAP.
Composição
A análise da ordenação NMS, mostra que a comunidade de liquens responde a
alguns dos fatores bióticos e abióticos amostrados, onde elevação, DAP e
fitofisionomias (local), estão correlacionados com as espécies de Brejo (1) e Caatinga
(2), e abertura do dossel (CANOPENE), está relacionado a caatinga (1). Desta forma, é
possível concluir que a comunidade de liquens sofre influência da elevação da
fitofisionomia, e do ambiente.
Segundo Dyer & Letourneau (2007), muitos liquens crescem quando a luz é
abundante, ainda que difusa, assim a intensidade luminosa demonstra ser,
provavelmente, o efeito direto do seu crescimento. Para Webster & Weber (2007),
diante da relação dos liquens com o fator luminosidade, tais organismos possuem uma
resposta positiva, que estaria possivelmente relacionada às suas características
morfológicas onde, nos talos de liquens corticícolas, as células dos fotobiontes são
posicionadas em uma camada definida localizada por baixo de um córtex superior
formado exclusivamente pelo micobionte, sendo a luminosidade necessária para que
seja possível a realização da fotossíntese nesta camada de algas.
Já para Morales et al. (2009), os liquens crostosos são mais frequentes em
ecossistemas e micro-habitats onde há condições de baixa luminosidade e pouca
66
precipitação, isso explicaria a homogeneidade na composição de liquens onde os
valores de abertura do dossel foram maiores.
Estudo feito por Cáceres et al. (2008a), foi observada uma baixa similaridade
entre áreas de Caatinga, Brejo de Altitude e Zona da Mata com relação ao tipo de
vegetação e grau de luminosidade, o que explicaria o fato do local está influenciando na
composição, com relação a altitude já era esperado que esta influenciasse na
composição, visto que os Brejos em oposição à Caatinga, são encraves de Mata
Atlântica (Andrade-Lima 1966), e situam-se em serras e planaltos do semiárido (Rodal
et al. 2005).
CONCLUSÃO
O estudo da influência de fatores bióticos e abióticos na riqueza e composição de
liquens torna-se uma importante referência na distribuição e no conhecimento ecológico
dos fungos liquenizados.
Os resultados apresentados mostram que os liquens mantem preferências em
relação ao substrato de acordo com as características do hospedeiro, verificando que a
riqueza diferiu significativamente em relação aos valores de DAP, sendo observado que,
hospedeiros com menores valores do DAP proporcionaram um aumento significativo na
riqueza de liquens corticícolas, além de observarmos que a composição da comunidade
liquênica é influenciada por alguns fatores bióticos e abióticos, tais como, altitude, DAP
e fitofisionomias (local), estando correlacionados com as espécies de Brejo e Caatinga,
e abertura do dossel, estando relacionado a caatinga.
Este trabalho foi o primeiro a amostrar tais influências em relação à riqueza e
composição de liquens corticícolas nas fitofisionomias Caatinga e Brejo de Altitude, no
estado de Sergipe. Também é o primeiro estudo sobre liquens na Serra da Guia.
Diante dos dados apresentados e da importância de se conhecer a micota
liquenizada, e as fitofisionomias em estudo, os resultados apresentados nesse estudo
visam contribuir para o conhecimento ecológico dos fungos liquenizados, assim como
torna-se subsídio para outras pesquisas que venham a aprimorar e enriquecer o
conhecimento ecológico e liquenólogico da Caatinga e Brejos de Altitude.
67
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