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1 Universidade Federal de Itajubá Instituto de Matemática e Computação Curso de Licenciatura em Matemática ESTADO DO CONHECIMENTO DE PESQUISAS BRASILEIRAS QUE TEM COMO FOCO DE ESTUDO AS DISCIPLINAS DE CONTEÚDO ESPECÍFICO DE MATEMÁTICA NA LICENCIATURA ITAJUBÁ MG 2016

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Universidade Federal de Itajubá

Instituto de Matemática e Computação

Curso de Licenciatura em Matemática

ESTADO DO CONHECIMENTO DE PESQUISAS BRASILEIRAS QUE

TEM COMO FOCO DE ESTUDO AS DISCIPLINAS DE CONTEÚDO

ESPECÍFICO DE MATEMÁTICA NA LICENCIATURA

ITAJUBÁ – MG

2016

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AMANDA LARISSA DE ALMEIDA

ESTADO DO CONHECIMENTO DE PESQUISAS BRASILEIRAS QUE

TEM COMO FOCO DE ESTUDO AS DISCIPLINAS DE CONTEÚDO

ESPECÍFICO DA MATEMÁTICA NA LICENCIATURA

Orientadora: Profª Drª. Eliane Matesco Cristovão

ITAJUBÁ – MG

2016

Trabalho Final de Graduação em

Matemática Licenciatura, apresentado à

Universidade Federal de Itajubá como

requisito parcial para a obtenção do título de

Licenciada em Matemática.

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AMANDA LARISSA DE ALMEIDA

ESTADO DO CONHECIMENTO DE PESQUISAS BRASILEIRAS QUE

TEM COMO FOCO DE ESTUDO AS DISCIPLINAS DE CONTEÚDO

ESPECÍFICO DA MATEMÁTICA NA LICENCIATURA

Banca Examinadora:

Profa. Dra. Eliane Matesco Cristovão

Universidade Federal de Itajubá (UNIFEI)

Profa. Dra. Flávia Sueli Fabiani Marcatto

Universidade Federal de Itajubá (UNIFEI)

Prof. Dr. Antônio Carlos Fernandes

Universidade Federal de Itajubá (UNIFEI)

ITAJUBÁ – MG

2016

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DEDICATÓRIA

Aos meus pais, Lucília e Joaquim

Meus exemplos de vida!

Antes mesmo de alguma razão

Eu os amo profundamente

Simplesmente pelo fato de serem assim

do jeito que são...

A vocês, muita gratidão por tudo

que fizeram e fazem por mim!

Aos meus irmãos

Ana Fabrícia, Fabiana, Raíssa e Fábio

Essa conquista é nossa!

Amo-os profundamente desde sempre

E para todo sempre!

A minha sobrinha Eloá

que há três anos faz com que

muitas tardes de estudo sejam mais leves e alegres!

E ao seu/sua irmã(o)

que antes de nascer já amo muito!

À Deus, toda Honra e toda Glória hoje e para sempre...

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AGRADECIMENTOS

Ao Bom Deus

pelo dom da vida, amor sem igual

e fé para viver cada dia

de acordo com Sua vontade

A minha família e amigos

Em especial minha irmã Fabi, por toda ajuda e apoio

E a prima querida Sibele e amiga Aline

Pelas madrugadas de estudo, conversa e apoio de sempre.

Aos meus amigos e colegas da graduação

Pelos momentos e aprendizados compartilhados

Em especial à Bruna e Leticia, juntas em tudo

dividindo experiências, desafios e conquistas

E aos colegas bacharéis Matheus e Ronisio

por toda ajuda e amizade.

Aos meus professores da graduação

Em especial as professoras Eliane, Flávia e Mariana

grandes educadoras e exemplos para mim

E ao professor Antônio Fernandes

pela orientação durante a IC e apoio.

Aos colegas do PIBID Matemática da Unifei

Oportunidade maravilhosa

de crescimento pessoal e profissional

Vou levar pra vida os momentos compartilhados!

À professora e orientadora deste trabalho

Dra Eliane Matesco Cristovão

Que de forma muito especial

tem contribuído na minha formação

sempre me ensinando muito

e hoje é uma referência de professora e pesquisadora!

...

A vocês, minha gratidão e carinho!

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Resumo

A formação matemática do professor na licenciatura tem sido discutida em pesquisas do

campo da Educação Matemática e estas apontam que as disciplinas referentes aos conteúdos

específicos não têm cumprido seus papeis enquanto formadoras do professor que vai ensinar

matemática. Comumente prioriza-se a matemática acadêmica sem nenhuma reflexão ou

relação com a matemática escolar (MOREIRA e DAVID, 2005; FIORENTINI, 2005;

GRILO, BARBOS e LUNA, 2015). Assim, esta pesquisa de Trabalho Final de Graduação

(TFG) busca colaborar com a discussão e problematização desta formação oferecida na

licenciatura. Este trabalho integrou a segunda fase do projeto Universal “Mapeamento e

Estado da Arte da pesquisa brasileira sobre o professor que ensina matemática”, desenvolvido

entre 2014 e 2016 na Faculdade de Educação (FE) da Unicamp. Pesquisadores de todas as

regiões do Brasil mapearam as pesquisas produzidas em programas de Pós-Graduação stricto

sensu que tiveram como foco de estudo o professor que ensina matemática, delimitando um

corpus de 858 trabalhos entre teses e dissertações, localizados no período de 2001 a 2012. Os

15 trabalhos que estudaram, no contexto da formação inicial, disciplinas de conteúdo

específico de matemática, tornaram-se o corpus deste TFG. Assim, esta pesquisa, do tipo

estado do conhecimento (FERREIRA, 2002; FIORENTINI e LORENZATO, 2006), teve

como objetivo compreender e analisar como as pesquisas brasileiras que estudaram

disciplinas de conteúdo específico de matemática dos cursos de licenciatura têm contribuído

para investigar o campo da formação inicial. Visando captar o movimento destas pesquisas,

realizou-se uma análise baseada no Paradigma Indiciário (GINZBURG, 1989) e norteada pela

questão de investigação “O que estas pesquisas têm buscado apontar como essencial para

aproximar a formação acadêmica da prática pedagógica do futuro professor?”. Os dados são

oriundos dos fichamentos produzidos no âmbito do projeto universal e dos trabalhos

completos. A partir da leitura destes materiais, foram estabelecidas duas categorias de análise:

(I) Concepções de formadores, professores e futuros professores sobre disciplinas de conteúdo

específico e (II) Caminhos para uma formação matemática por meio de propostas ou práticas

inovadoras em disciplinas de conteúdo específico. A análise apontou que há propostas

interessantes, mas também algumas lacunas, tanto em relação a algumas disciplinas que são

pouco investigadas quanto em relação a práticas e abordagens que privilegiam o

desenvolvimento da disciplina de modo a problematizar e confrontar a matemática estudada

para que de fato seja feita uma articulação entre formação matemática do professor e sua

futura prática docente.

Palavras-chave: Formação inicial de professores; Formação matemática; Disciplinas de

conteúdo específico; Estado do conhecimento.

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Sumário

INTRODUÇÃO .................................................................................................................................................... 7

Da experiência de formação ao tema da pesquisa ......................................................................... 8

A inserção da pesquisa em um projeto universal ........................................................................... 9

A estrutura da pesquisa ......................................................................................................................... 11

CAPÍTULO I - Compreendendo o objeto de estudo ......................................................................... 12

O curso de licenciatura em Matemática .......................................................................................... 13

A formação matemática na Licenciatura ......................................................................................... 14

CAPÍTULO II – Objetivos, referencial metodológico e de análise.............................................. 18

Delineando os objetivos ........................................................................................................................ 19

Percursos Metodológicos ...................................................................................................................... 19

Um caminho para análise ...................................................................................................................... 24

CAPÍTULO III - A análise dos dados ....................................................................................................... 26

Um panorama geral das pesquisas que focam em disciplinas de conteúdo específico de

matemática ................................................................................................................................................. 27

I - Pesquisas que investigam concepções de formadores, professores e futuros

professores. ................................................................................................................................................ 29

II - Pesquisas que apresentam possíveis caminhos para disciplinas de conteúdo

específico da matemática ...................................................................................................................... 34

a - Trabalhos que focam em apresentar uma proposta de conteúdo para uma

disciplina de conteúdo específico. ................................................................................................... 34

b - Trabalhos que apresentam abordagens que podem privilegiar o desenvolvimento

da disciplina investigada. ................................................................................................................... 41

CONSIDERAÇÕES FINAIS .......................................................................................................................... 46

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ........................................................................................................... 48

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INTRODUÇÃO

“Não há caminho, caminho se faz ao caminhar”

Leandro Karnal

Da experiência de formação ao tema da pesquisa

Recordo que desde as primeiras séries da escola, aprender matemática era uma alegria.

Esta era sem dúvida a matéria que eu mais gostava! Assim foi em todo ciclo da educação

básica, o que me levou a acreditar que deveria de alguma forma, prosseguir no seu estudo e,

aliada a minha pretensão de exercer uma profissão que trabalhasse com pessoas, no final do

ensino médio decidi que a licenciatura seria uma opção ideal.

Ingressei no curso de Matemática Licenciatura com expectativa de aprender formas de

ensinar os conteúdos da matemática para meus futuros alunos, pois até então acreditava já

dominar a matemática a ser ensinada. Uma justificativa para pensar desta forma pode ser a

concepção de matemática que construí ao longo dos anos escolares. Eu aprendia um conteúdo

e depois fazia exercícios sobre eles e isso bastava para ser considerada a melhor aluna da

turma! Diante dessa situação, a graduação constituiu-se como uma grande surpresa,

mostrando-me a matemática de uma forma ampla e complexa como jamais havia imaginado

existir. Toda a concepção que eu tinha do que era ser professor estava se desconstruindo e fui

percebendo que minha base de matemática era um tanto superficial.

Tive dificuldades em aprender a nova matemática que se apresentava aos meus olhos,

mas a vontade de continuar me fez permanecer e com o passar do tempo me apaixonei pelo

curso, principalmente quando ouvia dos meus professores que éramos uma pequena parte da

população que tinha contato com aquele conhecimento tão sofisticado. Sentia-me o máximo!

Então fui me acostumando com conceitos abstratos, definições formais e os famosos teoremas

e preposições, aguardando ansiosamente pela disciplina de análise na expectativa de aprender

os fundamentos da matemática. Parecia que aquilo sim, era saber matemática!

Ao participar do Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência (PIBID) e

depois dos estágios obrigatórios, comecei a perceber que a matemática que eu estava

aprendendo não me ajudava na hora de elaborar um plano de aula para os alunos ou explicar

de forma significativa algum conceito. Assim veio a dificuldade de estabelecer relações entre

os conteúdos que aprendia na universidade e as ações necessárias para ser professora de

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matemática na prática. Eu sentia não conseguir conectar esses dois mundos que faziam parte

do meu dia a dia.

Estes momentos me angustiavam e algumas questões começaram a me intrigar:

“Quando vou aprender a matemática que se aprende na escola básica?”, “Porque a matemática

aprendida na universidade não se aplicava na escola?”, “Porque deveríamos aprender

conceitos tão complexos se de nada pareciam servir para ensinar?”, “Como vou ser uma boa

professora, se não sei muitos porquês daquilo que um dia vou ensinar?”.

De alguma forma eu acreditava que estes conflitos se davam por eu ter sido aluna de

uma escola pequena, pública, de zona rural e de repente estar estudando em uma universidade

federal. Mas participando de uma discussão sobre a formação matemática do professor,

baseada no livro “Formação Matemática do professor: licenciatura e prática docente escolar”

(MOREIRA e DAVID, 2005), no contexto de uma das práticas de ensino que cursei, percebi

que tais conflitos não eram apenas meus. O desencontro entre a formação acadêmica e prática

docente escolar configuram-se como uma problemática da formação de professores, a qual é

permeada por fatores como a desarticulação entre o que se aprende e o que se precisa

aprender para ser professor de matemática.

Ao tomar consciência da discussão sobre esta formação matemática e conversar com a

professora da disciplina de Prática de Ensino V, atual orientadora deste trabalho e que

também era uma pesquisadora integrante de um projeto de âmbito nacional intitulado

“Mapeamento e Estado da Arte da pesquisa brasileira sobre o professor que ensina

matemática”, desenvolvido na Faculdade de Educação (FE) da Universidade Estadual de

Campinas (Unicamp), chegamos juntas à ideia de investigar, a partir do referido projeto,

como graduanda e orientadora, o que as pesquisas sobre a formação matemática na

licenciatura apontavam como caminhos para articular a formação acadêmica com a prática

docente de um professor.

A inserção da pesquisa em um projeto universal

O projeto de âmbito nacional “Mapeamento e Estado da Arte da pesquisa brasileira

sobre o professor que ensina matemática” foi financiado pelo CNPq através do edital MCTI/

CNPq nº 014/2014 e desenvolvido na Faculdade de Educação (FE) da Universidade Estadual

de Campinas (Unicamp) sob a coordenação do Professor Dr. Dario Fiorentini. O objetivo do

referido projeto era mapear, descrever e sistematizar as pesquisas brasileiras produzidas no

âmbito dos programas de Pós-Graduação Stricto Sensu das áreas de Educação e Ensino e que

tem como foco de estudo o professor que ensina matemática (PEM).

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O projeto contou com pesquisadores de diversas regiões do Brasil, principalmente

pesquisadores do Grupo de Estudos e Pesquisas sobre Formação de Professores que Ensinam

Matemática (GEPFPM) - grupo interinstitucional, com sede na FE/Unicamp, que congrega

pesquisadores da Unicamp, Universidade Estadual Paulista – UNESP Campus de Rio Claro,

Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), Pontifícia Universidade Católica (PUC-

Campinas), Universidade São Francisco (USF) e a professora Eliane Matesco Cristovão da

Universidade Federal de Itajubá (UNIFEI).

Tal projeto iniciou-se em 2014, acontecendo em duas fases e sendo finalizado

juntamente com este TFG, em novembro de 2016. A primeira fase consistiu no mapeamento

das teses e dissertações dos mais de 200 programas de Pós-Graduação Stricto Sensu da área

de Educação e Ensino, em todas as regiões do Brasil, distribuídas em sete regionais: Centro-

Oeste, Nordeste, Norte, Sul, Minas Gerais, Rio de Janeiro/Espírito Santo e São Paulo. Este

processo resultou no levantamento de 858 trabalhos que tiveram o PEM como foco de estudo.

O quadro 1 mostra a distribuição do corpus de trabalho por cada regional.

Quadro 1 - Distribuição por regional do corpus total de trabalhos.

Regional Corpus de trabalho

São Paulo 349

Sul 131

Nordeste 110

Centro-Oeste 86

Rio de Janeiro/Espírito Santo 71

Minas Gerais 60

Norte 51

Total 858 Fonte: Dados do projeto universal.

Os pesquisadores envolvidos, agrupados em 7 subgrupos, elaboraram fichas de leitura

apresentando informações específicas de cada pesquisa e além disso, fizeram um mapeamento

regional contendo informações gerais e específicas dos trabalhos, entre elas, ano de produção,

orientadores, focos, contextos, tendências, metodologias, principais referenciais teóricos e

resultados. Esta fase resultou na elaboração de um e-book, ainda em fase de revisão, com

textos descritivos sobre o mapeamento. Ele será publicado para livre acesso de toda

comunidade acadêmica interessada em compreender este campo de pesquisa.

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A segunda fase se deu por meio da realização de estudos descritivos e analíticos de

temáticas e problemáticas específicas do corpus de estudo, tomando por base o mapeamento e

os fichamentos produzidos na primeira fase e o interesse manifestado pelos pesquisadores

participantes. Os artigos produzidos poderão ser publicados em periódicos nacionais e/ou

internacionais de Educação Matemática. Foi nesta fase que a presente pesquisa passou a

integrar o projeto. Partindo do corpus total de teses e dissertações buscou-se identificar

trabalhos que estudavam disciplinas de conteúdo específico da matemática nos cursos de

Licenciatura em Matemática e para isso, foi realizada uma leitura dos textos produzidos na

primeira fase e também de uma planilha que apresentava dados gerais dos trabalhos

acompanhados de seus respectivos endereços eletrônicos. Num primeiro momento foram

encontrados 24 trabalhos, os quais após análise cuidadosa dos resumos e dos trabalhos

completos se reduziram a 15 teses e dissertações que tiveram como foco ou contexto, uma ou

mais disciplina de conteúdo específico.

A estrutura da pesquisa

No capitulo I apresentamos um breve histórico sobre os cursos de Licenciatura em

Matemática, uma breve revisão dos estudos sobre a formação matemática do professor e sobre

as problemáticas que têm permeado este campo da formação.

No capítulo II delineamos os objetivos e questão de pesquisa, apresentando em

seguida, o referencial metodológico (FERREIRA, 2002; FIORENTINI E LORENZATO,

2006)) e de análise (GINZBURG, 1989) aqui adotados. Além disso, apresentamos os

procedimentos de constituição e categorização do corpus de análise.

No capítulo III, inicialmente, apresentamos alguns dados quantitativos e

característicos dos trabalhos que constituem o corpus da pesquisa. Estas informações levam a

compreensão do movimento do campo das pesquisas que estão se dedicando a investigar a

formação matemática do professor na licenciatura. Num próximo momento exibimos a análise

dos trabalhos em duas categorias que apresentam concepções sobre o papel/ensino das

disciplinas investigadas e possíveis caminhos para o desenvolvimento dessas disciplinas.

Para finalizar retomamos a questão norteadora desta investigação e expomos as

considerações finais sobre a pesquisa realizada.

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CAPÍTULO I

Compreendendo o objeto de estudo

“Não pense que o mundo acaba ali aonde a vista

alcança. Quem não ouve a melodia acha maluco

quem dança. Se você já me explicou agora muda

de assunto. Hoje eu sei que mudar dói, mas não

mudar dói muito!” Oswaldo Montenegro

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O curso de licenciatura em Matemática

Segundo Moreira e David (2005), quando surgiram as licenciaturas no Brasil, os

cursos eram constituídos por um modelo conhecido como “3+1” ou “bacharelado+didática”.

Este modelo constituía-se por três anos de formação disciplinar específica e um ano dedicado

à formação pedagógica ou, mais especificamente, um conjunto de técnicas para a transmissão

do conhecimento adquirido nos três anos anteriores. Nesse contexto, as questões da docência

eram consideradas complementares ou nem discutidas, enquanto o saber específico era o

principal foco da formação.

De acordo com Queiroz et al. (2015), este modelo de formação começou a passar por

mudanças a partir da década de 1970 com o inicio de discussões sobre o papel social e

político da educação, provocada pela resistência e primeiras greves de professores e

trabalhadores que clamavam pela democratização do país, num contexto delicado em que o

Brasil se encontrava: era o período da ditadura militar.

Para estes autores, desde então, diversas mudanças ocorreram como as Leis de

Diretrizes e Bases (LDB nº. 5.692/71 e LDB nº. 9.394/96), Diretrizes Curriculares Nacionais

para os cursos de licenciatura, entre outras, de modo que o saber específico não se constituísse

como o fundamental e a formação pedagógica deixasse seu caráter de um conjunto de

técnicas, passando a incluir disciplinas de sociologia da educação, política educacional,

práticas de ensino entre outras, sem que a formação específica perdesse sua importância e o

professor deixasse de ser conhecido como, por exemplo, professor de Matemática, professor

de Geografia, etc.

O Conselho Nacional de Educação, por meio do Parecer CNE/CES nº. 1.302/20011

(BRASIL, 2001) orienta que o curso de licenciatura em Matemática devem conter

necessariamente em seu currículo conteúdos de matemática (Cálculo Diferencial e Integral,

Álgebra Linear, Fundamentos de Análise, Fundamentos de Álgebra, Fundamentos de

Geometria e Geometria Analítica), conteúdos da ciência da Educação, da História e Filosofia

das Ciências e conteúdos matemáticos presentes na educação básica e de áreas afins à

matemática. Ambos têm a responsabilidade de formar matematicamente e pedagogicamente o

professor para atuar na educação básica (FIORENTINI, 2005).

As disciplinas que abordam conteúdo matemático ainda ocupam boa parte dos

currículos e como destaca Grilo; Barbos; Luna (2015), embora tenham foco na formação

1 O Parecer não se tornou em Resolução. Desta forma, o entendemos como uma orientação aos cursos de

Licenciatura em Matemática e não uma diretriz.

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matemática, não são ausentes de expor um modo de conceber a matemática e de ser professor.

Geralmente elas são organizadas e lecionadas por profissionais da área, em sua grande

maioria Matemáticos cuja formação inicial se deu em cursos de bacharelado.

Várias pesquisas que investigam este campo da formação inicial têm apontado que

essas disciplinas não têm cumprido adequadamente o seu papel na formação de professores

(MOREIRA e DAVID, 2005; FIORENTINI, 2005 e GRILO; BARBOS; LUNA, 2015,

VIOLA DOS SANTOS, 2012). Em muitas instituições, alunos dos cursos de Licenciatura e

Bacharelado em Matemática compartilham várias disciplinas de conteúdo específico da

matemática, mesmo sendo cursos com focos distintos (BRASIL, 2001). Desta forma, o futuro

professor tem contato com conteúdos matemáticos sem que seja estabelecida qualquer relação

com a matemática do seu campo de trabalho.

Desde o surgimento da Educação Matemática como campo de estudo e pesquisas, no

final dos anos de 1970 e inicio dos anos de 1980, quase ao mesmo tempo em que é constituída

a Sociedade Brasileira de Educação Matemática (SBEM) e os primeiros programas de pós-

graduação em Educação Matemática (FIORENTINI e LORENZATO, 2006), vêm sendo

realizadas pesquisas sobre os cursos de licenciatura, formação do professor, práticas docentes,

entre outras. Moreira e David (2005) argumentam que apesar de um movimento crescente

destas pesquisas, principalmente na produção de teses e dissertações, raramente se têm

focalizado na relação entre o conhecimento matemático associado ao processo de formação e

o conhecimento matemático necessário à prática docente.

Buscaremos agora problematizar a formação matemática nos cursos de licenciatura,

discutindo estas duas formas de conhecimento matemático e aprofundando na compreensão

das problemáticas que permeiam esta área da formação. A partir deste ponto, toda vez que nos

referirmos a “disciplina de conteúdo específico” ou “disciplinas específicas” estaremos

mencionando as disciplinas que abordam conteúdos matemáticos previstos nos currículos dos

cursos de licenciatura.

A formação matemática na Licenciatura

De acordo com Viola dos Santos (2012), discutir a formação matemática da

licenciatura não é uma tarefa fácil. Alguns dos motivos que levam a esta dificuldade são a

complexidade de se formar um professor levando em consideração as demandas sociais do

contexto no qual estamos inseridos e as divergências de concepções entre matemáticos e

educadores matemáticos sobre como as disciplinas devem ser organizadas e lecionadas.

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Nos últimos anos, várias pesquisas brasileiras no campo da educação matemática têm

tomado como foco de estudo a formação matemática do professor (MOREIRA e DAVID,

2005; FIORENTINI, 2005 e GRILO; BARBOS; LUNA, 2015, VIOLA DOS SANTOS,

2012). Também internacionalmente, diversas pesquisas (BALL, THAMES E PHELPS, 2008;

FLORES-MEDRANO, SOSA e RIBEIRO, 2016; RIBEIRO e AMARAL, 2016) têm se

preocupado com esta formação, investigando quais conhecimentos matemáticos são

relevantes para a formação do professor e buscando propor e revisar modelos de análise que

contribuem para uma melhor compreensão do campo.

Grilo; Barbos; Luna (2015) estudaram a repercussão de disciplinas específicas de

matemática dos cursos de licenciatura na ação do futuro professor e reforçam o problema da

desarticulação entre teoria e prática evidenciando que os conteúdos da escola básica são

tratados na universidade apenas como revisão, sem possibilitar reflexões sobre como ensiná-

los e que os conteúdos matemáticos, abordados nos cursos, não apresentam aprofundamento

que possibilite ao professor saber como usá-los para fins de ensino.

Fiorentini (2005) também discute esta problemática ao afirmar que,

Para ser professor de Matemática não basta ter um domínio conceitual e

procedimental da matemática produzida historicamente. Sobretudo, necessita

conhecer seus fundamentos epistemológicos, sua evolução histórica, a

relação da matemática com a realidade, seus usos sociais e as diferentes

linguagens com as quais se pode representar ou expressar um conceito

matemático (p. 110).

Moreira e David (2005) ao investigarem “que Matemática deve o professor de

matemática estudar”, problematizam a dicotomia entre a Matemática Acadêmica e

Matemática Escolar, sendo a primeira um corpo científico de conhecimento percebido e

produzido pelos matemáticos e a segunda, um conjunto dos saberes “validados”, associados

especificamente ao desenvolvimento do processo de educação escolar básica em Matemática.

Os autores discutem a necessidade de um redimensionamento da formação matemática na

licenciatura, de modo a equacionar os papéis destas diferentes formas de conhecimento

matemático, destacando que a formação matemática,

ao adotar a perspectiva e os valores da Matemática Acadêmica, desconsidera

importantes questões da prática docente escolar que não se ajustam a essa

perspectiva e a esses valores. As formas do conhecimento matemático

associado ao tratamento escolar dessas questões não se identificam –

algumas vezes chegam até a se opor – à forma com que se estrutura o

conhecimento matemático no processo de formação (MOREIRA e DAVID,

p. 103).

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Da maneira que os currículos são organizados, há uma hipervalorização da matemática

acadêmica, desconsiderando o contexto educativo em que as práticas matemáticas se

desenvolvem na educação básica, assim como seu papel, aspectos estruturais e diferentes

formas de representação dos conceitos. Nesse contexto,

a Matemática Escolar costuma se reduzir à parte elementar e simples da

Matemática Acadêmica e a complexidade do saber profissional do professor

vai se localizar em conhecimentos considerados de natureza essencialmente

não matemática (MOREIRA e DAVID, p. 15).

O resultado disso é que futuros professores têm ingressado nos cursos de licenciatura

sem bem compreender os conteúdos da educação básica e saído sem saber como ensiná-los.

De acordo com Martines (2012), isso acontece porque os cursos se preocupam em ensinar

uma matemática mais avançada, alegando a necessidade de fornecer uma base sólida, porém

nem sempre a oferecem, e mesmo quando isso realmente acontece, pode-se ainda perguntar:

Esta base sólida é suficiente para o professor atuar na complexidade da educação básica?

Para Manrique (2009), a licenciatura em Matemática precisa de um projeto curricular

que ultrapasse o rol de disciplinas e tenha diretrizes próprias para a formação de professores

propiciando “atividades contextualizadas culturalmente e socialmente, para que o futuro

professor possa estabelecer relações internas e externas à disciplina que leciona, além de

considerar estruturas curriculares mais criativas que a tradicional organização linear” (p. 521).

Manrique (2009) ainda argumenta que é comum encontrar nos cursos de licenciatura

uma concepção de que o professor apenas transmite o conteúdo apresentado habitualmente

em livros didáticos ou em outras fontes de informações e afirma que com estas concepções “a

aprendizagem é entendida como um processo que envolve meramente a atenção, a

memorização, a fixação de conteúdos e de procedimentos, principalmente por meio de

exercícios mecânicos e repetitivos” (p.522). A forma como a matemática é trabalhada nas

disciplinas de conteúdo específico da Matemática nos cursos de licenciatura pode reforçar a

concepção de transmissão de conhecimento, pois os professores formadores, em sua grande

maioria matemáticos, embora não percebam, além do conteúdo, “ensinam também um jeito

de ser pessoa e professor, isto é, um modo de conceber e estabelecer relações com o mundo e

com a matemática e seu ensino” (FIORENTINI, 2005, p.110-111).

No contexto da educação básica, a matemática é a disciplina na qual a maioria dos

alunos apresenta níveis baixos de desempenho em provas internas e externas. Além disso, é

percebida por eles como um amontoado de algoritmos e contas, visão que é fruto do ensino

que recebera, ou seja, das práticas matemáticas com as quais se envolvem na sala de aula.

Assim, o futuro professor desta área do conhecimento enfrentará muitos desafios, o que exige

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uma formação que o permita compreender o papel da matemática nos currículos e o leve a

desconstruir práticas e crenças anteriormente vivenciadas pelos alunos para construir sua

própria prática “constituindo-se como mediador entre o conhecimento historicamente

produzido e aquele - o escolar reelaborado e relevante socioculturamente - a ser apropriado e

construído interativamente pelos alunos em sala de aula” (FIORENTINI et al, 1998, p. 316).

A pesquisa de Passos et. al. (2006), ao analisar contextos colaborativos de formação

de professores aponta que “as práticas reflexivas, investigativas e colaborativas em ambientes

coletivos de aprendizagem docente constituem uma poderosa tríade catalisadora do

desenvolvimento profissional dos professores de Matemática” (p. 215). Assim, na análise

realizada, procuramos identificar, além dos conhecimentos mobilizados, em que medida as

práticas desenvolvidas se aproximam desta tríade, buscando evidenciar as contribuições das

pesquisas investigadas.

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CAPÍTULO II

Objetivos, referencial metodológico e de análise.

“Nossa maior fraqueza está em desistir. O

caminho mais certo de vencer é tentar mais uma

vez”. Thomas Edison

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Delineando os objetivos

Diante das necessidades e possibilidades apontadas para se propiciar uma formação

matemática adequada na licenciatura nos propusemos a analisar um corpus composto por

dissertações e teses produzidas nos programas de pós-graduação Stricto Sensu no período de

2001 à 2012 que tivessem como foco o professor que ensina matemática, especialmente

aquelas realizadas no contexto da formação inicial, e que buscaram analisar com mais cuidado

as disciplinas de conteúdo específico da matemática na licenciatura. Num primeiro momento,

pensávamos que seria possível compreender que práticas pedagógicas eram evidenciadas nas

pesquisas que analisam propostas diferenciadas para as disciplinas específicas da Matemática

na Licenciatura.

No entanto, os primeiros olhares para os 15 trabalhos que compunham o corpus,

mostraram que nem todas as pesquisas apontavam caminhos ou propostas, e que seria

necessário separar os trabalhos em diferentes categorias. Diante disso, o objetivo passou a ser

compreender como as pesquisas brasileiras que tomam como foco de estudo as disciplinas de

conteúdo específico de matemática dos cursos de licenciatura têm contribuído para investigar

o campo da formação inicial.

Percebendo que algumas pesquisas apontavam caminhos e outras investigavam

concepções de professores, licenciandos e coordenadores do curso de licenciatura, tomamos

como norteadora a seguinte questão de investigação: O que estas pesquisas têm apontado

como essencial para aproximar a formação matemática da prática pedagógica do futuro

professor?

Percursos Metodológicos

Fiorentini e Lorenzato (2006) caracterizam uma pesquisa como um processo rigoroso

caracterizado numa busca sistemática, ou seja, um caminho que permite o pesquisador tratar

ou responder a questão de investigação que a originou. Desta forma, a opção pelos métodos e

modalidades para buscar, analisar dados e expor os resultados, tais como seu sucesso,

dependem diretamente das pretensões do pesquisador.

Para essa pesquisa adotamos uma modalidade de pesquisa qualitativa de caráter

histórico-bibliográfico (FIORENTINI e LORENZATO, 2006), denominada “Estado da Arte

ou do Conhecimento” que um pesquisador utiliza quando quer ter conhecimento acerca da

totalidade de trabalhos produzidos numa determinada área. Para Ferreira (2002, p. 259), o

pesquisador do Estado da Arte ou do Conhecimento “é movido pelo desafio de conhecer o já

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construído e produzido, para depois buscar o que ainda não foi feito”. O processo de coleta de

dados e informações é realizado por meio da análise de determinando conjunto de produções

(definidas de acordo com o objetivo da pesquisa) a partir de critérios pré-determinados, de

forma que ao apresentar e discutir o assunto traga possíveis contribuições para a continuidade

de pesquisas no campo investigado.

Ferreira (2002) apresenta o “estado da arte” e “estado do conhecimento” como sendo

sinônimos. No entanto, algumas pesquisas como Fiorentini et. al. (2002), Viol (2010) e Melo

(2006) utilizaram o termo “estado do conhecimento da pesquisa” uma vez que não

pretenderam inventariar e descrever toda uma área de conhecimento, mas, sim um conjunto de

pesquisas de uma área do conhecimento que investigaram um foco específico. Como o foco

desta pesquisa é mapear e discutir as teses e dissertações que investigaram disciplinas de

conteúdo específico de matemática na licenciatura, que é um foco dentre outros que poderiam

ser tomados no âmbito do projeto universal, assumiremos a nomenclatura “estado do

conhecimento”.

O diagrama abaixo localiza o foco da pesquisa dentro de um contexto maior, o qual foi

percorrido pelo projeto Universal citado anteriormente.

Recorte de tempo: 2001 a 2012.

Figura 1: Diagrama elaborado pela autora inspirado em Viol (2010)

TESES E DISSERTAÇÕES

TESES E DISSERTAÇÕES EM

EDUCAÇÃO MATEMÁTICA

858 TESES E DISSERTAÇÕES COM

FOCO NO PROFESSOR QUE

ENSINA MATEMÁTICA

TESES E DISSERTAÇÕES

QUE INVESTIGAM DISCIPLINAS DE CONTEÚDO ESPECÍFICO DE MATEMÁTICA

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Delimitado o foco da pesquisa e tomando por base os textos2 e uma planilha geral dos

trabalhos, ambos produzidos na primeira fase do projeto Universal, foram localizadas as

pesquisas desenvolvidas no contexto de disciplinas de conteúdo específico de matemática na

licenciatura ou que tomaram estas disciplinas como foco. A leitura e releitura dos textos

(produzidos na 1ª fase do projeto universal e que comporão o e-book), focando especialmente

no contexto da formação inicial, permitiu encontrar a maioria dos trabalhos. Também foram

checados na planilha, outros possíveis trabalhos que ainda poderiam compor o corpus. O

critério utilizado neste caso foi a leitura de todos os títulos, buscando encontrar palavras que

se referiam a disciplinas de conteúdo específico, como cálculo, geometria, álgebra, etc. Esta

busca, após refinamento a partir da leitura de resumos e trabalhos completos, em alguns

casos, resultou em 15 trabalhos, dispostos no quadro 2.

Quadro 2- Distribuição por estado do compõe o corpus da pesquisa

Estado São Paulo Minas Gerais Paraná Ceará Total

Autores

Costa (2007)

Freitas (2006)

Marin (2009)

Martines (2012)

Mondini (2009)

Moreno (2010)

Reis (2001)

Resende (2007)

Richt (2005).

Campos (2007)

Gonçalves (2012)

Procópio (2011)

Santos (2011)

Bolognesi (2006) Pinheiro

(2008)

5

15

Fonte: Elaborado pela autora.

A leitura destes trabalhos viabilizou a construção do quadro a seguir que explicita o

foco de cada pesquisador diante da disciplina investigada. O quadro mostra a recorrência de

alguns focos de investigação tomados pelas pesquisas como concepções, propostas de

atividades e ainda propostas de abordagens.

Quadro 3– Foco de cada pesquisador diante da disciplina investigada.

Trabalho Foco do pesquisador

Costa, 2007 Identificar as percepções dos professores formadores sobre a inclusão da

Estocástica nos currículos escolares e como estes vêm abordando seus

conteúdos na formação de futuros professores.

2 São os 7 textos produzidos pelos pesquisadores no projeto universal no mapeamento das 7 regionais

brasileiras anteriormente citadas

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22

Moreno, 2010 Estudar características das atividades de uma formação Estatística, com

alunos de um curso de licenciatura em matemática, que pudessem favorecer a

apreensão da vulnerabilidade em um conjunto de valores.

Freitas, 2006 Investigar como futuros professores participam e respondem à experiência de

uma disciplina de formação matemática (Geometria Plana e Desenho) com

uma proposta diferenciada, que privilegia o registro escrito de seus

pensamentos e ideias, durante o processo de formação.

Marin, 2009 Investigar como os professores que usam tecnologias em suas aulas, o fazem

no ensino de Cálculo. Dois dos entrevistados eram professores que

lecionavam Cálculo para a licenciatura.

Reis, 2001 Compreender a relação tensional entre o rigor e a intuição nas disciplinas de

Cálculo e Análise, no âmbito dos cursos de licenciatura.

Martines, 2012 Compreender o papel da disciplina de Análise Matemática nos cursos de

licenciatura em matemática.

Mondini, 2009 Investigar concepções de professores de Álgebra sobre a disciplina para a

formação de professores.

Resende, 2007 Compreender e ressignificar a disciplina Teoria dos Números na formação de

professores de matemática, visando a prática docente na escola básica.

Richit, 2005 Descrever e analisar como trabalhar com projetos em Geometria Analítica,

usando softwares de geometria dinâmica e visando favorecer a formação dos

futuros professores de matemática.

Campos, 2007 Descrever a experiência com o Projeto Pedagógico “Trabalho de Projetos e

Educação Estatística na Universidade”, desenvolvido ao longo de cinco

semestres no âmbito da disciplina Estatística e Probabilidade e analisa o

processo de produção de saberes associado à participação no mesmo.

Gonçalves, 2012 Apresentar e analisar aplicações de derivadas no Cálculo Diferencial e

Integral I, aliada as Tecnologias da Informação e Comunicação na Educação

– TICE’s na perspectiva da Educação Matemática no Ensino Superior, visando

contribuir para a formação de futuros Professores de Matemática.

Procópio, 2011 Incentivar os diferentes modos de produção de significados em sala de aula,

especialmente em relação às questões de visualização e de representação

gráfica nas disciplinas de Geometria Plana e Geometria Espacial.

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Santos, 2011 Investigar como se caracteriza um ambiente de aprendizagem e exploração de

tópicos de Geometria Analítica com o uso das Tecnologias de Informação e

Comunicação na Educação Matemática – TICEM.

Pinheiro, 2008 Analisar a mediação realizada em sala de aula para a construção do raciocínio

geométrico dos alunos da disciplina de Desenho Geométrico.

Bolognesi, 2006 Investigar qual a contribuição da disciplina Análise Matemática na formação

do professor de Matemática que irá atuar no ensino médio e como é a

articulação desta disciplina com as disciplinas didático-pedagógicas.

Fonte: Elaborado pela autora com base nos resumos e/ou textos completos.

Realizando uma análise cuidadosa do quadro acima e atentos ao procedimento de

categorização definido por Fiorentini e Lorenzato (2006), como sendo “um processo de

classificação ou de organização de informações em categorias, isto é, em classes ou conjuntos

que contenham elementos ou características comuns” (p. 134), identificamos dois focos

principais entre todas as pesquisa e que vieram a compor duas categorias de análise do tipo

emergente, ou seja, “obtidas mediante um processo interpretativo, diretamente do material de

campo” (p.135).

I. Concepções de formadores, professores e futuros professores sobre disciplinas de

conteúdo específico;

II. Caminhos para uma formação matemática por meio de propostas ou práticas

inovadoras em disciplinas de conteúdo específico.

A categoria I é formada por 6 trabalhos que investigaram concepções de professores

formadores ou, em alguns casos, de licenciandos e professores da escola básica, sobre o

ensino de alguma disciplina de conteúdo específico em relação a formação do futuro

professor, em alguns casos, com foco em sua prática pedagógica.

A categoria II composta por 9 trabalhos que apresentam caminhos para uma formação

matemática por meio de propostas ou práticas inovadoras, capazes de favorecer uma

articulação entre a disciplina investigada e a prática do futuro professor. Algumas das

pesquisas apresentam que matemática pode ser ensinada e outras se dedicam a apresentar um

caminho condutor no ensino da disciplina investigada. Analisaremos estes trabalhos em duas

subcategorias não dissociadas:

a. Trabalhos que focam em apresentar uma proposta de conteúdo para uma disciplina de

conteúdo específico.

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b. Trabalhos que apresentam abordagens que podem privilegiar o desenvolvimento da

disciplina.

Um caminho para análise

Em relação ao processo de análise dos dados, esta pesquisa fundamenta-se no modelo

epistemológico denominado “Paradigma Indiciário”, apresentado pelo historiador italiano

Carlo Ginzburg no ano de 1989 quando publicou o livro “MITOS, EMBLEMAS, SINAIS –

Morfologia e História” com um capitulo intitulado “Sinais: raízes de um paradigma

indiciário” (GINZBURG, 1989).

Ginzburg (1989) apresenta o Paradigma Indiciário relatando antigas práticas

vivenciadas pelo ser humano como, por exemplo, o fato de que por milênios o homem foi

caçador e depois de inúmeras perseguições precisou desenvolver habilidades e a perceber

"pegadas na lama, ramos quebrados, bolotas de esterco, tufos de pêlos, plumas, plumas

emaranhadas e odores estagnados" (p.151), assim como aprendeu a fazer operações

mentalmente complexas no meio de um bosque ou uma cilada, aprendendo a farejar,

registrar, interpretar e classificar pistas infinitesimais como fios de barba.

No entanto, os exemplos mais evidentes do Paradigma Indiciário sugiram

silenciosamente nas ciências modernas no final do século XIX, no qual o historiador destaca a

Semiótica Médica, que é o diagnóstico de doenças inacessíveis à observação direta na base de

sintomas superficiais, exigindo a atenção de sintomas minuciosos que vão constituindo e

encaminhando à uma conclusão. Outro exemplo é o “método de Morelli” que trabalhou numa

busca em desvendar a falsificação de um quadro da época, sendo necessário olhar além de

características mais vistosas, que não são facilmente fáceis de falsificar. Este método baseado

em uma observação cuidadosa dos detalhes faz com que as pistas até então imperceptíveis, se

tornem elementos relevantes diante de um atento pesquisador.

Para Ginzburg (1989) este método interpretativo de pesquisa permite um olhar

composto por padrões que fogem da formalização, dando lugar à uma análise própria de uma

pesquisa, baseada numa observação atenta de dados marginais, detalhes secundários,

particularidades insignificantes, sinais e indícios, aparentemente negligenciáveis e muitas

vezes imperceptíveis. O Paradigma Indiciário consiste em “farejar, registrar, interpretar e

classificar pistas infinitesimais” (p.151) e assim “a partir de dados aparentemente

negligenciáveis, remontar a uma realidade complexa não experimentável diretamente”

(p.152).

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25

Buscando estes detalhes sempre de forma cuidadosa, porém sistemática, organizando

tabelas, destacando trechos recorrentes ou singulares das pesquisas, tentando interpretar as

pretensões do pesquisador e os fatos que mesmo ocultos, traziam um dizer sobre um

determinado trabalho, fomos compondo a análise que apresentamos a seguir. Esta visão e

análise paradigmática favoreceu esta pesquisa em relação aos seus objetivos, considerando

que muitas vezes, mesmo que sem intenção uma determinada prática ou abordagem de um

conteúdo oferece um ambiente de aprendizagem, favorecendo a adesão de habilidades e ou

conceitos importantes na formação de um professor.

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26

CAPÍTULO III

A análise dos dados

“Eu sei o preço do sucesso: dedicação, trabalho

duro, e uma incessante devoção às coisas que

você quer ver acontecer”. Frank Lloyd Wright

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27

Um panorama geral das pesquisas que focam em disciplinas de

conteúdo específico de matemática

Dentre os 15 trabalhos analisados, 8 são dissertações de mestrado acadêmico, 4

dissertações de mestrado profissional e 3 teses de doutorado. Estas pesquisas se dividem entre

pesquisas de campo e pesquisas teórico/bibliográficas, todas apresentando em comum a

abordagem qualitativa.

Quadro 4 – Distribuição das pesquisas por programa de pós-graduação.

Nível Mestrado Acadêmico Mestrado Profissional Doutorado

Trabalhos

Bolognesi (2006)

Campos (2007)

Costa (2007)

Marin (2009)

Martines (2012)

Mondini (2009)

Pinheiro (2008)

Richt (2005)

Gonçalves (2012)

Moreno (2010)

Procópio (2011)

Santos (2011)

Freitas (2006)

Reis (2001)

Resende (2007)

Fonte: Elaborado pela autora.

Nove disciplinas que compõem o rol de disciplinas de conteúdo específico na

Licenciatura em Matemática foram investigadas nas pesquisas: Álgebra Linear, Análise

Matemática, Cálculo, Estatística, Geometria Analítica, Geometria Plana Espacial, Desenho

Geométrico e Teoria dos Números. O quadro abaixo mostra a distribuição dos trabalhos por

categoria e disciplina investigada.

Quadro 5 – Distribuição das pesquisas por disciplinas analisadas e categorias de análise.

DISCIPLINA/

CATEGORIA

Categoria I

Categoria II

Subcategoria a Subcategoria b

Álgebra Linear

Mondini (2009)

Análise Matemática Bolognesi (2006)

Martines (2012)

Reis (2001)

Cálculo Marin (2009)

Gonçalves (2012)

Estatística Costa (2007)

Moreno (2010) Campos (2007)

Geometria Analítica

Santos (2011) Richit (2005)

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28

Fonte: Elaborado pela autora.

A minoria das pesquisas dedicou a investigar o Cálculo, Análise, Álgebra e a Teoria

dos Números, que são base da formação matemática do professor. Por outro lado, 5 pesquisas

investigam conteúdos da Geometria seja plana, espacial ou analítica, que também se constitui

como uma importantíssima área da Matemática. Já conteúdos da Estatística, foram foco de 3

pesquisas entre a categoria I e subcategorias II.a e II.b, sendo a única disciplina em que são

apresentadas concepções sobre seu papel e ensino, uma proposta de conteúdo e uma

abordagem que pode privilegiar seu ensino.

Dentre o período delimitado, percebe-se que as disciplinas de conteúdo específico em

matemática vêm sendo tomadas como foco de forma mais recorrente a partir de 2006, embora

não haja indícios de um crescimento expressivo.

Tabela 1- Linha do tempo de produção das pesquisas no período de 2001 a 2012.

Ano 2001 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012

Quantidade 1 1 2 3 1 2 1 2 2

Fonte: Elaborada pela autora.

As teses ou dissertações foram produzidas em 9 Universidades3, porém apenas 4 delas,

localizadas em São Paulo (SP), abarcam 9 trabalhos. A Universidade Estadual Paulista

(UNESP) campus de Rio Claro – SP foi a que apresentou o maior número de pesquisas.

Tabela 2- Distribuição das pesquisas por Instituição de Ensino Superior (IES)

Estado

SP MG PR CE

IES

UNESP PUC UNICAMP USF UFOP UFU UFJF PUC UECE

QUANTIDADE 4 2 2 1 2 1 1 1 1

Fonte: Elaborada pela autora.

Com relação aos procedimentos de coleta de dados, as pesquisas que apresentam

concepções adotam as entrevistas ou questionários, já as pesquisas que de alguma forma

3 Universidade Estadual Paulista (UNESP), Pontíficia Universidade Católica (PUC), Universidade Estadual de

Campinas (UNICAMP), Universidade São Francisco (USF), Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), Universidade Federal de Uberlândia (UFU), Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP) e Universidade Estadual do Ceará (UECE).

Geometria Plana

e/ou Espacial e/ou

Desenho Geométrico

Procópio (2011) Freitas (2006)

Pinheiro (2008)

Teoria dos Números

Resende (2007)

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apresentam propostas de trabalho com alguma disciplina, coletam os dados por meio de

participação direta em campo, vídeos gravados ou então analisando dados bibliográficos.

A seguir, procederemos com uma análise mais profunda destes trabalhos de acordo

com cada categoria estabelecida.

I - Pesquisas que investigam concepções de formadores,

professores e futuros professores

Em sua pesquisa de mestrado, realizada na Unesp de Rio Claro/SP, Martines (2012)

buscou investigar como coordenadores do curso de licenciatura em matemática e professores

da disciplina de Análise compreendem o papel desta na formação de professores de

matemática. A pesquisadora coletou dados em quatro instituições públicas de São Paulo,

analisando-os a partir de três categorias não dissociadas que revelam concepções de que o

papel da Análise é fundamentar, consolidar e aprofundar o conhecimento matemático do

futuro professor. Diante das afirmações dos entrevistados, a pesquisadora reafirma a

positividade da separação entre o Bacharelado e a Licenciatura, mas defende que o que

fundamenta essa separação é o objetivo de procurar estabelecer vínculos entre a disciplina e

as questões da formação do professor (p. 68) e não apenas para reduzir conteúdo. Ainda nessa

perspectiva, a pesquisadora afirma que a “formação do professor deveria tomar por base a

matemática escolar, como uma possibilidade para que o futuro professor desenvolva uma

prática pedagógica baseada na construção e negociação de significados” (p.103).

Segundo Martines (2012), há uma concordância sobre a necessidade de repensar a

disciplina de análise, visando “a importância de alguns conteúdos dessa disciplina para

formação do professor como: números reais, infinito, limite, séries, sequências, continuidade

e funções”. Sobre a abordagem desses conteúdos, argumenta que “não deveriam apenas

fundamentar o conhecimento do professor, mas dar condições para que o mesmo possa

discuti-los com seus alunos”. E ainda defende que “pouco adianta o professor saber do que

fala, se não conseguir falar disso com os seus alunos” (p. 106).

Em seu mestrado realizado na PUC/PR, Bolognesi (2006) buscou verificar, a partir da

análise comparativa das propostas curriculares dos cursos de licenciatura e bacharelado, qual

a contribuição da Análise Matemática para a formação do professor que irá atuar no ensino

médio e como se dá a articulação dessa disciplina com as disciplinas pedagógicas no curso de

licenciatura em matemática. O autor coletou dados por meio de questionários abertos com 22

alunos e professores das duas modalidades em um curso de Matemática e 6 professores de

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Matemática do ensino médio da rede pública. Para os licenciandos que participaram, a

disciplina de análise pouco contribui para a formação do professor, assim como não os

prepara com os conteúdos que poderiam vir a auxiliá-los no campo de atuação. Para os

professores da escola básica, coube um consenso de que a disciplina não serve para nada. Para

eles a formação e a prática escolar são realidades diferentes e que não se relacionam.

O pesquisador conclui que há necessidade de uma reforma curricular, valorizando e

dando prioridade ao ensino de matemática para a licenciatura. Ele destaca que há professores

formadores que acreditam que a mudança deva vir do professor, enquanto outros defendem

que ela depende dos alunos, os quais devem ser mais responsáveis e dedicados. Percebe-se,

nestas afirmações, um reforço da concepção de que o aluno aprende por meio de manipulação

e treino, a qual Manrique (2009) afirma ser comum encontrar nos cursos de licenciatura.

Dessa forma, mesmo não percebendo, o professor formador ensina um modo de ser como

professor, assim como uma possibilidade de relação com a matemática (FIORENTINI, 2005)

que não contribui para o desenvolvimento de uma aprendizagem com significado para o aluno

da educação básica.

Em suas considerações finais, o pesquisador defende que não é possível continuar

trabalhando a disciplina de Análise sem explorar o seu contexto histórico, de forma

fragmentada e com um aprofundamento desnecessário para o exercício profissional do

professor. Bolognesi (2006) afirma que a disciplina deve ser trabalhada “de forma

contextualizada, aplicada, com uma metodologia voltada para o ensino, com demonstrações

que lhe servirão para um entendimento e aplicação em sala de aula de ensino médio” (p. 80).

Embora estas duas pesquisas apontem concepções sobre como deve ser o ensino da

disciplina de Análise, não é explicitado o que se entende por “metodologia voltada para o

ensino”, ou seja, não há uma relação com o tipo de conhecimento necessário à formação do

professor visando a sua prática profissional. Que tipo de demonstração servirá para o

entendimento e aplicação em sala de aula? A demonstração da matemática acadêmica ou da

matemática escolar? Para Moreira e David (2005) compreender esta distinção é importante na

medida em que permite pensar o conhecimento do professor de forma global.

Em sua tese de doutorado realizada na Unicamp/SP, Reis (2001) teve por objetivo

compreender como a relação tensional entre rigor e intuição no ensino de Cálculo e Análise

se manifesta no âmbito da formação do professor de matemática. Para isso analisou manuais

didáticos e realizou entrevistas com quatro professores pesquisadores que se destacam, na

área, como autores de estudos e livros didáticos.

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31

A análise dos livros mostrou que geralmente apresentam uma abordagem bastante

rigorosa, não sendo adequada para a licenciatura. Para o pesquisador, isso não significa que

deve ser mais fácil e sim apresentar outra abordagem, igualmente profunda, pautada em outra

concepção de conhecimento, voltada para o foco da formação. Os entrevistados foram

unânimes em considerar a disciplina fundamental à formação matemática do professor de

matemática. Contudo não houve uma concordância sobre como essa disciplina poderia ser

desenvolvida, diante da intenção de formar o professor de matemática. Este é o mesmo

problema já apontado na análise dos dois trabalhos anteriores, em que reafirmam a

necessidade de repensar essa formação, mas não apresentam indícios concretos do que fazer

em direção à este caminho.

Quanto ao cálculo, os entrevistados afirmam que

deve ser um curso menos formal, baseado fortemente em aplicações e em

situações-problema, fazendo o pêndulo entre intuição e rigor pender mais

para o lado da intuição sem que, com isso, deixe de existir algum tipo de

rigor, de preferência não formal (isto é, sem épsilons e deltas, por exemplo)

(p. 200).

Para o pesquisador, o estudo parece mostrar que “intuição e rigor são dimensões

interdependentes, uma não podendo existir sem a outra, embora possamos, equivocadamente,

privilegiar uma delas em detrimento da outra”. E ainda “cumprem papéis importantes e

complementares na formação do pensamento e do conhecimento diferencial, integral e

analítico, tanto do professor de matemática quanto do matemático”. Mas para que isso de fato

se concretize “existe ainda um grande caminho a ser construído pelos docentes formadores de

professores” (p.200).

Mais uma vez percebemos as lacunas em relação ao conhecimento que deve ser

privilegiado. Que outra concepção de conhecimento é defendida? Que tipo de conhecimento é

voltado para a formação? Apenas o equilíbrio entre rigor e intuição basta para que o ensino de

cálculo contribua para a prática do futuro professor? Que relações precisam ser estabelecidas

entre o conhecimento construído nas aulas de cálculo e o conhecimento a ser ensinado na

escola?

Embora o trabalho de Costa (2007), realizado na USF/SP, não tenha investigado

especificamente uma disciplina, ele teve como parte de seus objetivos, investigar percepções

dos professores formadores sobre o ensino de Estatística na formação do futuro professor de

Matemática. O autor afirma que o estudo de probabilidade e estatística não é obrigatório no

curso de licenciatura e, por isso, fica a critério da instituição optar por incluir ou não seu

estudo na matriz curricular. Assim, quando há disciplinas nessa área do conhecimento na

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licenciatura, geralmente elas são lecionadas por profissionais com formação específica, “que

colocam a ênfase no seu papel de pesquisador dentro da universidade, ficando a docência – e,

principalmente, a docência em cursos de licenciatura – em segundo plano” (p. 108).

Analisando questionários utilizados na coleta de dados, o pesquisador conclui que “a

Estatística apresentada na licenciatura muitas vezes não é capaz de dar subsídios aos

professores para atuar nas salas de aula” (p.138). Os entrevistados também apontam a ementa

como uma barreira no trabalho com a disciplina, considerando que não tem autonomia para

alterá-la.

Os conteúdos de Estatística, desenvolvidos nos cursos de licenciatura a partir

das ementas - pensadas, muitas vezes, para todos os cursos de graduação -,

não contemplam o movimento do pensamento crítico e o desenvolvimento

da pesquisa ou da investigação, tornando o aprendizado estanque e não

transformador. (p. 139)

As constatações do pesquisador apontam para um distanciamento muito grande do que

preconizam Pamplona e Carvalho (2006) ao discutirem que os licenciandos em Matemática

necessitam de uma ampla formação estatística, capaz de fazê-los ultrapassar a condição de

meros “consumidores” das ideias e conhecimentos estatísticos. Para estes autores “o futuro

professor de Matemática e Estatística deve ser capaz de compreender, além das relações entre

Matemática e Estatística, a existência de contornos próprios e complementares entre estas

duas áreas” (p.4).

Em seu mestrado realizado na Unesp de Rio Claro/SP, Mondini (2009) estudou as

concepções de professores formadores da mesorregião de Porto Alegre sobre o ensino e a

aprendizagem da disciplina de Álgebra. Alguns entrevistados acreditam que sua finalidade é

generalizar os conceitos da Aritmética, outros entendem a álgebra como uma linguagem, um

meio de escrever, comunicar e compreender as ideias da matemática e ainda há professores

que compreendem a Álgebra como o estudo das Estruturas. Porém com relação à formação de

professores, coube um consenso de que

a Álgebra da Licenciatura é fundamental para dar oportunidade ao aluno

desse curso construir um conhecimento organizado e fundamentado para

que, ao atuar como professor da Educação Básica, trabalhe com atividades

que criem um ambiente de aprendizagem aos seus alunos. (Mondini, 2011,

p.144)

Os depoentes criticaram a organização dos cursos de licenciatura, pelo fato de que

geralmente a disciplina é oferecida num formato único para atender alunos de diferentes

cursos. Estes professores acreditam que o aluno do curso de Licenciatura precisa conhecer a

Álgebra presente na Educação Básica e as suas relações com as estruturas algébricas,

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principalmente suas aplicações, apontando a necessidade de redirecionar essa formação para a

futura atuação do licenciando. Quando os professores foram questionados sobre como deve

ser o trabalho da disciplina para a licenciatura, demonstraram concordância de que deve ser

ministrada diferente do bacharelado, alegando “a não necessidade de estudar certas

complexidades das estruturas da Álgebra e [em vez disso] conhecer [e] (...) discutir os

conceitos que futuramente trabalharão na Educação Básica” (p. 165).

Esta concepção nos parece ainda problemática, do ponto de vista da formação

matemática do professor, pois embora proponha que se discuta o conteúdo da educação

básica, não aponta de que forma este conhecimento pode ser problematizado para propiciar ao

futuro professor uma visão sobre como ensiná-lo. É necessário considerar que a prática

profissional na educação básica se desenvolve num contexto educativo (Moreira e David,

2005), exigindo, por exemplo, o uso de definições mais descritivas e formas alternativas de

demonstração, argumentação e apresentação de conceitos. Questões estas que precisam ser

discutidas e exploradas no interior da formação.

Uma de suas professoras entrevistadas enfatiza que “ser professor de Matemática é

mais do que domínio do conteúdo. É preciso compreensão, paciência e envolvimento com o

que faz” (p.153). Utilizando uma linguagem simples, mas com a experiência de quem atua na

escola, a professora parece trazer à tona a mesma concepção defendida por Fiorentini (2005)

em relação ao conhecimento do conteúdo quando este afirma que o professor “necessita

conhecer seus fundamentos epistemológicos, sua evolução histórica, a relação da matemática

com a realidade, seus usos sociais e as diferentes linguagens com as quais se pode representar

ou expressar um conceito matemático” (p. 110).

Em outro trabalho de mestrado na Unesp de Rio Claro/SP, Marin (2009) investigou

como professores de cálculo usam as tecnologias de informação e comunicação (TIC) em suas

aulas nos cursos de graduação e para isso entrevistou 13 professores de diversos cursos. Dos

professores investigados, apenas dois lecionavam cálculo para o curso de Licenciatura em

Matemática. Embora este trabalho não trate explicitamente de concepções, buscamos

encontrá-las nos relatos dos professores entrevistados.

Uma professora usa um software de livre acesso conhecido como winplot e também

trabalha com um projeto desenvolvido na faculdade utilizando links e applets para abordar os

conceitos de Funções, Limites, Derivadas e Integrais de uma variável. A mesma relata que

usa pouco o livro de apoio e quando necessário dá as aulas fora dos computadores, mas

destaca o uso continuo das TIC em suas aulas. O segundo professor trabalha com o software

winplot há 8 anos e faz uma integração entre a sala de aula comum e a sala de informática,

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dependendo da necessidade e foco de cada aula. O mesmo afirma que os alunos se sentem

motivados com as atividades e também com a teoria, pois conseguem por meio da

visualização, compreender melhor conceitos e resultados.

O pesquisador evidencia a contribuição do uso de softwares para visualização de

conceitos até então abstratos, permitindo que os alunos possam elaborar hipóteses para

discussão de problemas. Nesse sentido os alunos têm contato com aplicações do conteúdo,

podendo visualizar a teoria na prática e ainda aprende uma forma de ensinar a matemática na

educação básica. No entanto, não foi possível perceber uma preocupação destes formadores

quanto a matemática que o professor vai ensinar, ou seja, preocupação com o uso da

tecnologia no Cálculo articulando, por exemplo, com o conceito de funções que o professor

vai ensinar aos seus alunos na educação básica.

As pesquisas desta categoria reforçam a problemática da formação matemática do

professor e o distanciamento que há entre uma disciplina de conteúdo específico e as questões

da prática docente na educação básica. Apesar disso, apresentam poucas contribuições no

sentido de esclarecer que caminho pode ser tomado para que a formação oferecida pela

disciplina, de fato, contribua para a atuação profissional do professor.

II - Pesquisas que apresentam possíveis caminhos para

disciplinas de conteúdo específico da matemática

Como algumas pesquisas priorizam a matemática que pode ser ensinada e outras se

dedicam a apresentar um caminho condutor no ensino da disciplina investigada, analisaremos

estes trabalhos separadamente, classificando-os nestas duas subcategorias. Elas não são

totalmente dissociadas, pois há trabalhos que além de apresentar uma matemática a ser

ensinada, abordam também práticas que favorecem o ambiente de aprendizagem, mas esta

divisão auxilia na compreensão sobre quais práticas relatadas foram capazes de propiciar

efetivamente uma articulação entre a disciplina investigada e a prática do futuro professor.

a - Trabalhos que focam em apresentar uma proposta de conteúdo para uma disciplina de

conteúdo específico.

No contexto da disciplina Estatística, em seu mestrado realizado na PUC/SP, Moreno

(2010) estudou as características de atividades que favoreçam a apreensão da variabilidade em

um conjunto de valores e para isto, desenvolveu uma sequência didática com um grupo

voluntário de 17 alunos de licenciatura. A sequência, disponibilizada nos apêndices do

trabalho analisado, foi elaborada segundo a proposta de construção de cenários de

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aprendizagem e composta por 43 atividades divididas em sete partes: Introdução à média;

Medidas-resumo de tendência central, quartis e variabilidade; reflexões sobre a média e sobre

a variação dos dados; reflexão sobre o uso da média e a amplitude como medida de Variação;

insuficiência da amplitude como medida de variação; a busca de um instrumento mais

abrangente; o papel do desvio-padrão na criação de intervalos para análise e o desvio-padrão e

evento raro.

De acordo com o pesquisador, as atividades estavam articuladas, de modo que os

conhecimentos já incorporados fossem mobilizados para construção de conceitos novos a

partir de situações problemas que não estavam necessariamente ligadas a conteúdos

previamente estudados. Em cada bloco de situações, acontecia uma discussão com toda a

turma e, pautado nessa interação, institucionalizava-se o que foi aprendido. Ou seja, os alunos

interagiam com o problema sem saber qual conceito o professor queria lhes ensinar. A

resposta considerada mais conveniente para solucionar o problema era o conceito a ser

formalizado. Na Figura 1 apresentamos um exemplo de atividade.

Figura 2: Exemplo de atividades envolvendo o conceito de média.

Adotou-se a dinâmica do trabalho em grupo para propiciar a cooperação, a troca de

ideias e o debate em torno das propostas de solução das questões. Os licenciandos deveriam

apresentar suas sugestões, defender suas posições, ouvir as críticas dos colegas e juntos

formular a solução. Nestes momentos, coube ao formador destacar alguns pontos que

considerava relevantes para a noção trabalhada, fazer certos questionamentos a respeito dos

aspectos do problema que não foram apreendidos pelos alunos e incentivar o debate.

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A proposta desta sequência didática aliada à maneira como ela foi desenvolvida, difere

do ensino expositivo e formal de uma disciplina, por propiciar momentos de reflexão entre os

participantes, levando-os a mobilizar diversos conceitos abordados anteriormente. Neste

cenário o professor constituiu-se como mediador da construção do conhecimento no qual os

conceitos estudados estavam problematizados gerando constante reflexão e discussão e esta

postura certamente contribui para que o futuro professor reflita sobre a postura que poderá

assumir em sua futura prática profissional.

Apesar dos avanços evidenciados em relação às práticas no âmbito da disciplina de

Estatística, percebe-se que, não há, na sequência proposta, uma problematização dos conceitos

abordados na disciplina que possibilite ao licenciando refletir sobre o conteúdo a ser ensinado,

sobre as diversas formas de abordar este conteúdo ou sua relação com o cotidiano, enfim, as

questões do seu ensino, na escola, não são abordadas. Fica a cargo desse futuro professor,

fazer a ponte entre o conteúdo abordado e a sua prática profissional.

Em sua pesquisa de mestrado realizado na UFJF/MG, Procópio (2011) buscou

identificar que características devem ter uma disciplina de geometria direcionada para a

licenciatura no qual desenvolveu durante um ano letivo as disciplinas de Geometria Plana e

Geometria Espacial com foco nos processos de ensino e aprendizagem em Geometria e na

formação profissional do Professor de Matemática. Esta pesquisa sugere que é possível

promover o desenvolvimento profissional dos professores por meio do desenvolvimento de

atividades que revelam a mudança do cenário tradicional e formalista. A proposta visou

incentivar os diferentes modos de produção de significados em sala de aula, especialmente em

relação às questões de visualização e de representação gráfica, utilizando a resolução de

problemas como dinâmica de ensino e evitando a abordagem axiomático-dedutiva, além de

não se restringir ao estudo da geometria euclidiana e estimular o uso do desenho geométrico

como parte dos argumentos nas demonstrações.

As aulas frequentemente começavam com problemas para causar estranhamento,

questionamentos, promovendo debates entre os alunos, de modo que eles atribuíssem

diferentes significados que iam sendo problematizados e por fim negociados. Além disso,

eram recorrentes discussões em grupo e tarefas individuais, nas quais os alunos trabalharam

com representação gráfica e utilizaram a escrita para argumentar.

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Figura 3: Exemplos de problemas propostos

O pesquisador destaca que na dinâmica adotada “não é o professor quem resolve o

problema, são os alunos que a partir de suas crenças-afirmações, de suas justificações, vão

produzindo conhecimento e encaminhando a resolução” (p.59). Aponta ainda que a

abordagem metodológica exclusivamente expositiva, não é o caminho para a formação de

futuros professores, sendo necessárias estratégias diversificadas, trabalho em grupo, discussão

e problematização, de modo a estimular a produção de significado pelo aluno e seu

envolvimento com o que está aprendendo.

Na UFOP/MG, Santos (2011) propôs-se a apresentar/discutir o ensino de Geometria

Analítica Plana na perspectiva da Educação Matemática nos Ensinos Médio e Superior,

visando contribuir para a formação de futuros professores de matemática. Para isso

desenvolveu atividades exploratórias utilizando o software Geogebra com alunos da

licenciatura, explorando conceito de retas, circunferências e cônicas. O objetivo foi propiciar

a exploração, argumentação, questionamento, dedução de definições ou equações e

principalmente, a discussão entre os licenciandos sobre os objetos explorados. A figura 3

mostra parte de uma das atividades.

Figura 4: Parte de uma atividade desenvolvida

O pesquisador discute que o ensino da Geometria Analítica utilizando o software

GeoGebra contribuiu para a constituição de um ambiente capaz de privilegiar as ações dos

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alunos na construção do conhecimento matemático, proporcionando ricas possibilidades de

visualização de conceitos e propriedades, privilegiando a experimentação e enfatizando a

interpretação de construções geométricas que são difíceis de serem trabalhadas em sala de

aula. Além disso, concluiu que esse tipo de vivência estabelece uma ponte entre o a formação

do professor e o ensino médio na medida em que o futuro professor recria uma concepção de

ensino e o uso da tecnologia nas aulas de matemática, podendo adotar essa prática ao ensinar

Geometria Analítica aos seus alunos.

Os conceitos de retas, circunferências e cônicas estão presentes no ensino da

geometria analítica da educação básica e discuti-los na formação, utilizando a tecnologia

como um espaço propício para a exploração e visualização dos conceitos é importantíssimo.

Da mesma forma, práticas que propiciam um ambiente de reflexão, como o descrito pela

pesquisa de Procópio (2011) promovem importantes mudanças de postura. Ainda assim, não

foi possível perceber, em nenhuma das duas pesquisas que abordam as Geometrias, uma

discussão sobre o ensino destes conceitos com os licenciandos, de modo que eles refletissem

e/ou relacionassem a experiência de ensiná-los enquanto futuros professores. Então nos

perguntamos. Foi realmente feita uma articulação entre a formação e prática profissional? Ou

a forma de abordar esta matemática que é apresentada tornou-a apenas mais compreensível

aos licenciandos?

Em seu mestrado, também realizado na UFOP/MG, Gonçalves (2012) buscou

compreender as contribuições de atividades investigativas com o uso das Tecnologias da

Informação e Comunicação na Educação (TICE’s) para os processos de ensino e

aprendizagem do conceito de derivadas e suas aplicações em Cálculo Diferencial e Integral

I para a formação de futuros professores de Matemática. Sendo assim desenvolveu atividades

investigativas, utilizando o software Geogebra, com 9 alunos matriculados na disciplina que

se dispuseram a participar num período extraclasse. A atividade foi composta por 4 problemas

adaptados de dois livros didáticos de cálculo e realizadas pelos alunos agrupados em dupla ou

trio. Em cada problema os licenciandos descreviam uma ideia para a resolução, a partir disso

buscavam resolver o problema, sendo incentivados a refletir sobre o resultado em seu

contexto. A figura 4 mostra um dos problemas resolvidos e discutidos.

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Figura 5: Problema 1 da atividade.

Para a pesquisadora, as atividades contribuíram para uma ressignificação dos

conhecimentos dos alunos em relação às aplicações das derivadas, além de criar um ambiente

de aprendizagem diferenciado e complementar à sala de aula, colaborando na constituição de

um novo professor de matemática para a educação básica. Porém, nos cabe questionar se o

caminho apontado é suficiente para constituir um professor educador matemático.

Percebemos que não é confrontado, apenas para exemplificar, o conceito de derivada,

estudado no âmbito do Cálculo, com a determinação da fórmula para calcular o vértice de

uma parábola, conteúdo frequentemente abordado no Ensino Médio. Esta não seria uma

discussão necessária no âmbito da disciplina se queremos formar professores?

Em seu doutorado realizado na PUC/SP, Resende (2007) mobilizada pela

problemática do ensino da álgebra nos diferentes níveis de escolaridade e na formação de

professores, teve como objetivo compreender a Teoria dos Números enquanto saber a

ensinar e buscar elementos para ressignificar seu papel na licenciatura em matemática. Para

isso analisou: propostas curriculares das disciplinas que tratam de Teoria dos Números de

doze universidades brasileiras e dez livros didáticos escolhidos dentre os mais citados nos

programas das disciplinas pesquisadas. Realizou ainda sete entrevistas semiestruturadas com

professores e pesquisadores em Teoria dos Números e em Educação Matemática.

Partindo das análises e das entrevistas, a pesquisadora apresenta, além de concepções

sobre o papel da Teoria dos Números para a formação de professores, algumas características

essenciais para a composição da ementa da disciplina e também quais conteúdos matemáticos

podem ser abordados visando à formação do professor da escola básica. São elencados quatro

pontos a serem considerados tanto na seleção de conteúdos quanto nos objetivos da disciplina

(1) privilegiar os tópicos de teoria dos números presentes na educação básica, ou seja, os

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números naturais e os números inteiros; (2) considerar a teoria dos números como um espaço

propício para o desenvolvimento de ideias matemáticas relevantes relativas aos números

naturais e algumas também estendidas aos inteiros, presentes na matemática escolar; (3)

considerar que a teoria dos números é um campo propício para uma abordagem mais ampla

da prova, ultrapassando seu sentido tradicional, porque oferece ricas oportunidades para a

exploração dos diferentes tipos de provas, permitindo ao licenciando perceber que a prova

tem diferentes funções e que, no ensino, não deve ser compreendida da mesma forma que na

pesquisa em matemática e (4) promover, no âmbito da disciplina, atividades de investigação

matemática, porque permite a exploração de padrões e relações numéricas, o uso da recursão

e da indução matemática, oportunizando o desenvolvimento das habilidades de conjecturar,

generalizar, testar e validar as conjecturas.

Segundo a pesquisadora, essas potencialidades sustentam a concepção de uma

disciplina que está sendo denominada Teoria Elementar dos Números, a qual tem como fonte

o saber científico, mas também os saberes escolares e as demandas que o seu ensino apresenta

ao professor. Constituem tópicos essenciais a serem abordados nesta disciplina os números

inteiros em seus aspectos históricos, epistemológicos e procedimentais; a divisibilidade,

números primos e equações diofantinas lineares. Seus objetivos e abordagens devem

considerar que o conhecimento do conteúdo e o conhecimento pedagógico do conteúdo, a

teoria e a prática devem estar presentes na sua constituição, como elementos indissociáveis e

imprescindíveis.

Esta pesquisa foi enquadrada nesta categoria por apresentar mais do que apenas

concepções. Ela parece propor uma abordagem para a disciplina de Teoria dos Números, a

qual tende a propiciar uma aprendizagem que vai além do conhecimento dos processos

formais dos números, dando lugar à discussão e análise crítica, avaliando seus limites e

possibilidades enquanto objetos de ensino, favorecendo a construção de uma autonomia ao

professor para explorá-los e problematizá-los de forma pedagogicamente mais significativa

(Moreira e David, 2005). Infelizmente não apresenta formas efetivas de fazê-lo, com

exemplos e situações que podem ser exploradas.

Finalizado esta subcategoria, concluímos que as pesquisas, até aqui analisadas,

mostram que a forma de apresentação dos conteúdos é determinante numa disciplina. Nos

exemplos discutidos, a problematização, a investigação e a exploração que compõem a tríade

descrita por Passos et. al (2006), estão presentes e ofereceram um olhar diferente para o objeto

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de estudo, ultrapassando largamente o alcance de uma abordagem expositiva ou formal dos

conceitos.

Entretanto, não podemos negar que elas ainda apresentam lacunas sobre qual

conhecimento poderia ser mobilizado nas disciplinas para contribuir com a futura prática

docente. Embora estas pesquisas busquem apontar a Matemática a ser ensinada nas

disciplinas de conteúdo específico e apresentem abordagens interessantes, tais abordagens

parecem ainda carecer de uma problematização dos desafios a serem enfrentados pelos

futuros professores em sua prática pedagógica. As atividades propostas nos parecem distantes

das apresentadas por Ribeiro e Amaral (2015), por exemplo, ao proporem a realização de uma

divisão (536:12) para evidenciar o “conhecimento especializado para ensinar” (specialised

knowledge for teaching), mobilizado por futuros professores das séries iniciais.

Este tipo de conhecimento compõe o modelo MTSK, adotado pelos autores para

analisar o conhecimento matemático mobilizado por futuros professores em suas práticas.

Ball, Thames e Phelps (2008), apresentam o modelo Mathematical Knowledge for Teaching

“MKT” enquanto Flores-Medrano, Sosa e Ribeiro (2016), propõem o transito deste para um

modelo mais amplo “MTSK”, que “reconoce la potencialidade de describir um cuerpo de

conocimiento que solamente tenga sentido para el professor de matemáticas” (p. 10).

Embora a divisão proposta pareça ser simples, seu resultado requer a compreensão do

conceito de número racional e os conhecimentos mobilizados ao solicitar que os futuros

professores realizem a divisão e em seguida proponham problemas adequados aos resultados

obtidos foram cruciais para propiciar formação matemática que realmente está articulada com

sua prática profissional. Este é um conhecimento especializado para ensinar. Não se trata

apenas de abordar o conteúdo de forma diferenciada, mas colocar em evidência as questões

epistemológicas desse conteúdo, problematizando relações entre procedimentos e resultados,

entre expressões e situações práticas, antecipando inclusive possíveis erros dos alunos,

saberes subjetivos do conteúdo que inevitavelmente serão necessárias em sua prática.

b - Trabalhos que apresentam abordagens que podem privilegiar o desenvolvimento da

disciplina investigada.

Em seu doutorado realizado na Unicamp/SP, Freitas (2006), no contexto da disciplina

Geometria Plana e Desenho Geométrico, investigou como os estudantes do curso de

licenciatura em Matemática participam e respondem à experiência de uma disciplina de

formação matemática com uma proposta que privilegia o registro escrito de seus pensamentos

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e ideias. Foram propostas atividades que exploravam o uso da escrita, associada à utilização

de tecnologias de informação e comunicação e ao desenvolvimento de projetos. A

pesquisadora analisou produções dos licenciandos como autobiografias, atividades

desenvolvidas na disciplina (cartas, bilhetes, relatórios, projetos), entrevistas semi-

estruturadas, questionários e textos de mensagens eletrônicas.

A proposta da disciplina envolvia atividades semanais desenvolvidas em dois

ambientes: o das aulas teóricas, em sala de aula regular, e o das aulas práticas, em laboratório

de informática nas quais era priorizado o uso do software Tabulæ. Além desses dois

ambientes, os alunos realizavam um projeto em dupla, cujas versões seriam apresentadas para

discussão em sala durante o semestre.

A avaliação foi baseada nas atividades de laboratório semanais (individuais) e no

projeto (em duplas), com datas predefinidas para apresentação do pré-projeto para discussão,

entrega do texto escrito do projeto e apresentação oral do mesmo. Desde o início a professora,

que trabalhava em parceria com a pesquisadora, deixou claro que a avaliação era distribuída

ao longo do processo, valorizando o registro do raciocínio por meio da linguagem escrita em

vez de provas formais.

O projeto a ser desenvolvido em duplas tinha por objetivos: criar uma proposta de

atividade de laboratório, para alunos do ensino fundamental ou médio, envolvendo a

geometria; registrar, por escrito, o processo de criação, o material produzido e uma solução

para a proposta apresentada; apresentar oralmente o material desenvolvido, compartilhando as

ideias com a classe. Cada etapa do projeto foi cuidadosamente delineada e apresentada aos

alunos e o processo de avaliação do mesmo não era baseado apenas no parecer da professora.

Tanto os colegas participavam avaliando o projeto (25%) quanto a própria dupla, por meio de

uma auto-avaliação (25%).

O foco da pesquisa foi delinear o “como ensinar”, sem questionar quais os conteúdos a

serem ensinados. Isso fica evidente pelo fato de a pesquisadora ter apresentado apenas

insights da Matemática que era desenvolvida, porém a preocupação em estabelecer relação

com o ensino fica evidente no projeto a ser elaborado. Uma das atividades matemáticas

relatadas, por exemplo, foi relacionada à divisão em três partes iguais de um quadrado e

posteriormente de um retângulo, problemas típicos de uma disciplina de Geometria Plana e

Desenho Geométrico, no entanto, a pesquisadora destaca que este trabalho se deu a partir da

exploração de uma dobradura, culminando com uma atividade de demonstração realizada com

o auxílio do software Tabulæ, o que delineia um modo de ensinar muito diferente do

tradicionalmente adotado.

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Ao revisitar os registros escritos - sejam simbólicos, gráficos ou discursivos – os

alunos puderam repensar o conteúdo em evidência, revelando vestígios de suas possíveis

dúvidas conscientes ou inconscientes. Aos alunos foi solicitada ainda a escrita de cartas que

explicassem a uma pessoa leiga em matemática o que eles haviam desenvolvido em três das

atividades propostas no livro adotado pela professora. Estas cartas exigiam que eles

explicitassem as semelhanças e diferenças entre o material trabalhado na aula sobre

quadriláteros e a teoria proposta no livro-texto adotado; explicar a maneira como a

demonstração do Teorema de Pitágoras havia sido pensada e desenvolvida. A última tratava

da introdução de elementos da geometria hiperbólica e deveria explicitar, no mínimo, dois

resultados específicos desta geometria e dois resultados que são comuns às duas geometrias: a

euclidiana e a hiperbólica. Este exercício contribuiu para desenvolver a habilidade de

explicar, argumentar e comunicar, tão importante para o professor que irá trabalhar com

alunos de ensino Fundamental e Médio e que não necessariamente têm afinidade ou facilidade

com a Matemática.

Richit (2005) em seu mestrado realizado na Unesp de Rio Claro/SP, propôs-se a

descrever e analisar uma experiência de trabalho com Projetos em Geometria Analítica,

desenvolvida com o auxílio do software de Geometria Dinâmica Geometricks. A experiência

foi direcionada a oito alunos de licenciatura em matemática, em recuperação na disciplina. Os

objetivos foram promover a construção de saberes específicos desta área do conhecimento e

contribuir para que os sujeitos envolvidos pudessem desenvolver saberes de uso pedagógico

do software, visando favorecer a formação destes futuros professores de Matemática.

A cada dupla foi proposto a escolha de tópicos da Geometria Analítica e elaboração

de, no mínimo cinco atividades propondo a abordagem daqueles conceitos por meio do uso do

software Geometricks. Assim, cada dupla fez suas escolhas e propôs atividades envolvendo

tais conceitos.

A realização das atividades foi dividida em módulos, incluindo a familiarização com o

software, investigação e discussão dos conceitos de Geometria Analítica abordados pelas

duplas, elaboração de atividades envolvendo os conteúdos selecionados, organização do

projeto e discussão coletiva posterior a apresentação das mesmas, analisando-se a viabilidade

e contribuição aos processos de ensino e aprendizagem desta disciplina. Além disso, foram

promovidas, também, sessões de discussão de conceitos, demonstração de propriedades e

equações, assim como resolução de problemas propostos em livros didáticos, visando retomar

tópicos deficitários e formalizar as proposições apresentadas nas atividades, priorizando

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sempre a representação gráfica e a passagem desta para a representação algébrica a partir das

propriedades visualizadas.

No contexto apresentado, os alunos prepararam atividades para alunos da educação

básica a partir de tópicos de Geometria Analítica que estavam estudando na disciplina. Esta

vivência viabilizou conexão entre a formação e a futura prática docente do licenciando, de

modo que além de aprender os tópicos, houvesse reflexão sobre como ensiná-los aos alunos

na educação básica.

As pesquisas de Gonçalves (2012), Santos (2011), Freitas (2006) e Richit (2005)

reafirmam a contribuição de tecnologias para o ensino da matemática, evidenciando que as

disciplinas de conteúdo específico são privilegiadas com sua utilização ao possibilitarem

manipulação e visualização de conceitos de forma mais dinâmica. Além disso, proporciona ao

futuro professor uma experiência de como ensinar matemática na educação básica de modo a

incorporar em sua prática docente, a tecnologia como ambiente de aprendizado.

Em seu mestrado realizado na UFU/MG, Campos (2007) buscou compreender como

um Projeto Pedagógico intitulado “Trabalho de Projetos e Educação Estatística na

Universidade”, desenvolvido de forma concomitante à disciplina Estatística e

Probabilidade, pode contribuir para o desenvolvimento profissional dos estudantes do curso

de matemática.

Os grupos participantes tiveram que formular uma questão ou determinar um tema de

investigação, definir os instrumentos de coleta de dados, organizar e escolher a representação

mais adequada para comunicá-los. Em seguida, houve a preparação do ambiente para a

escolha dos temas, planejamento das atividades, problematização e por último, a síntese das

informações. Para Campos (2007), a conexão entre o conteúdo específico da disciplina

Estatística e Probabilidade com situações de aplicação possibilita a articulação dos diferentes

conceitos estatísticos entre si e com outras áreas do conhecimento, promove a

indissociabilidade ensino/pesquisa, tendo como suporte o trabalho com projetos

fundamentados em um trabalho colaborativo.

Quanto às contribuições à prática pedagógica do professor, a pesquisadora constata

que este tipo de projeto “permite que o professor adote uma postura educativa com ênfase na

investigação do saber estatístico, onde se aprende Estatística fazendo Estatística” (p.105) de

modo que o saber estatístico deixa de ser um saber de fórmulas e algoritmos para ser um saber

em ação.

Em sua pesquisa de mestrado realizado na UFOP/MG, Pinheiro (2008) buscou analisar

a mediação realizada em sala de aula para a construção do raciocínio geométrico dos alunos

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matriculados na disciplina de Desenho Geométrico. O trabalho foi desenvolvido com um

professor que trabalhou a disciplina com régua e compasso na licenciatura. O professor

regente possuía formação inicial de Engenharia Civil e há 32 anos trabalhava como professor

de Geometria, possuindo domínio de diversas técnicas de desenhos, e apresentando aos alunos

passo a passo e modelos consistentes.

No começo e no fim da disciplina, foi proposto aos alunos vários exercícios com o

objetivo de analisar o nível do conhecimento conceitual da Geometria Plana, antes e depois

destas aulas. Segundo Pinheiro (2008), durante a disciplina o professor não trabalhou com

conceitos e demonstrações teóricas, mas o professor estava sempre questionando e instigando

os alunos. Às vezes ele fazia as construções na lousa explicando aos alunos, outras vezes os

alunos guiavam verbalmente a construção e ainda havia momentos em que os alunos e

professor iam pensando-a coletivamente.

O pesquisador discute que nestas aulas a ação docente estava em constante construção

por meio das interações entre professor e alunos, formando a prática com base no conteúdo a

ser trabalhado, diferenciando da metodologia tradicional de ensino da Matemática, cujos

conteúdos costumam ser apresentados numa sequência lógica: dedução formal, exercícios

resolvidos e exercícios propostos. Entretanto, problematiza a formação na engenharia do

professor que carrega domínio da técnica, mas muitas vezes não discute a matemática

envolvida nos processos, assim como a argumentação e exploração das construções. Para o

pesquisador, é necessário promover o diálogo e a reflexividade com os alunos a partir das

construções propostas, para que eles possam aprender além do raciocino geométrico.

A disciplina de Geometria precisa promover o desenvolvimento do raciocínio

algébrico e geométrico, buscando explorar as relações entre ambos, fornecendo uma

aprendizagem ampla da geometria e a pesquisa de Pinheiro (2008) mostra que, embora a

mediação do professor seja um fator que contribui para a construção deste raciocínio, a

exploração, argumentação e problematização da matemática envolvida se faz necessária para

que o saber em questão seja significativo ao futuro professor.

As pesquisas analisadas nesta subcategoria apresentam disciplinas de conteúdo

específico desenvolvidas numa dinâmica diferente da que ainda predomina nos cursos de

licenciatura. Tais propostas privilegiam contextos de trabalho em grupo, atividades

contextualizadas, aplicações de conceitos, problematização, discussão e reflexão. Embora

ainda existam lacunas, têm sido privilegiados, nestas práticas, os elementos que compõem o

trio catalisador: práticas investigativas, reflexivas e colaborativas, que Passos et al (2006)

definem como práticas promotoras de desenvolvimento profissional do professor.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

“O mundo, assim como a gente, nunca tá pronto.

Vive mudando. Muda pra viver. Ser contra todas

as transformações faz tão pouco sentido quanto

ser a favor de todas elas”. Humberto Gessinger

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Esta pesquisa buscou compreender o que as teses ou dissertações realizadas entre 2001

e 2012, com foco em disciplinas de conteúdo específico, têm apontando como essencial para

aproximar a formação acadêmica da prática pedagógica do futuro professor. Em busca desta

compreensão, analisamos um corpus de 15 trabalhos em duas categorias que apresentaram

concepções sobre o papel e/ou ensino das disciplinas de conteúdo específico e possíveis

caminhos para aproximar estas disciplinas da atuação do futuro professor da educação básica.

Buscando retomar a questão de investigação “O que estas pesquisas têm buscado

apontar como essencial para aproximar a formação matemática da prática pedagógica do

futuro professor?” discutiremos duas questões emergentes que consideramos importantes.

A primeira questão é que as pesquisas analisadas reafirmam que o ensino da

matemática para futuros professores precisa ir além da abordagem expositiva e apresentação

formal dos conteúdos, para que efetivamente contribua matemática e pedagogicamente com a

prática docente do futuro professor. Na busca desta aproximação, as pesquisas têm apontado

caminhos que viabilizam a construção de um cenário de articulação entre a teoria e a prática.

No entanto, a maioria das propostas foi desenvolvida em paralelo ou concomitante com a

disciplina investigada, atingindo apenas alunos que se dispunham a participar. É necessário

que estas propostas sejam pensadas para dentro das disciplinas, propiciando a todos uma

oportunidade de desenvolvimento profissional que inclui a período da formação inicial.

A segunda questão é que poucas pesquisas têm promovido, efetivamente, o

desenvolvimento de abordagens diferenciadas para as disciplinas de conteúdo específico,

buscando atender as necessidades e demandas da formação do professor de matemática. E

ainda que existam pesquisas preocupadas com a formação matemática oferecida na

licenciatura, dentro de um corpus de 858 teses ou dissertações, não percebemos uma

preocupação de investigação/discussão sobre que conhecimento é essencial para o professor

que vai ensinar matemática diante da demanda atual da educação básica e a problemática que

tem permeado a formações de professores.

Por fim, acreditamos que muitas pesquisas com enfoque no desenvolvimento de

práticas efetivas, no âmbito das disciplinas de conteúdo específico, ainda precisam ser

realizadas para que os professores formadores tenham subsídios para repensar o papel das

disciplinas de conteúdo específico na formação e atuação do professor, assim como suas

próprias práticas docentes. Talvez, um caminho para isso, seja tornar as práticas desses

formadores seus principais objetos de estudo, ou pelo menos parte deles.

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Dissertação (MP em Educação Matemática) – ICEB, UFOP, Ouro Preto/MG, Orientador:

Frederico da Silva Reis.