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UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS DA SAÚDE SHEILA MARA PEDROSA O USO NOCIVO DO CRACK: PERCEPÇÕES DE PESSOAS EM TRATAMENTO DA DEPENDÊNCIA Goiânia, 2016

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS DA SAÚDE

SHEILA MARA PEDROSA

O USO NOCIVO DO CRACK: PERCEPÇÕES DE PESSOAS EM

TRATAMENTO DA DEPENDÊNCIA

Goiânia, 2016

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TERMO DE CIÊNCIA E DE AUTORIZAÇÃO PARA DISPONIBILIZAR AS TESES E DISSERTAÇÕES ELETRÔNICAS (TEDE) NA BIBLIOTECA DIGITAL DA UFG

Na qualidade de titular dos direitos de autor, autorizo a Universidade Federal de Goiás (UFG) a disponibilizar, gratuitamente, por meio da Biblioteca Digital de Teses e Dissertações (BDTD/UFG), sem ressarcimento dos direitos autorais, de acordo com a Lei nº 9610/98, o documento conforme permissões assinaladas abaixo, para fins de leitura, impressão e/ou download, a título de divulgação da produção científica brasileira, a partir desta data.

1. Identificação do material bibliográfico: [ ] Dissertação [x ] Tese

2. Identificação da Tese ou Dissertação

Autor (a): SHEILA MARA PEDROSA

E-mail: [email protected]

Seu e-mail pode ser disponibilizado na página? [ x ]Sim [] Não

Vínculo empregatício do autor

Agência de fomento: Sigla:

País: UF: CNPJ:

Título: O uso nocivo do crack: percepções de pessoas em tratamento da dependência

Palavras-chave: Cocaína crack, Transtornos relacionados ao uso de substâncias, Vulnerabilidade em saúde

Título em outra língua: The harmful use of crack: perceptions of people in addiction treatment

Palavras-chave em outra língua: Crack cocaine; Substance-Related Disorders; Health Vulnerability

Área de concentração: Saúde coletiva

Data defesa: (16/02/2016)

Programa de Pós-Graduação: Programa de Pós-Graduação em Ciências da Saúde (FM/UFG)

Orientador (a): Marcelo Medeiros

E-mail: [email protected]

Co-orientador (a):*

E-mail: *Necessita do CPF quando não constar no SisPG

3. Informações de acesso ao documento:

Concorda com a liberação total do documento [ x ] SIM [ ] NÃO1

Havendo concordância com a disponibilização eletrônica, torna-se imprescindível o envio

do(s) arquivo(s) em formato digital PDF ou DOC da tese ou dissertação. O sistema da Biblioteca Digital de Teses e Dissertações garante aos autores, que os

arquivos contendo eletronicamente as teses e ou dissertações, antes de sua disponibilização, receberão procedimentos de segurança, criptografia (para não permitir cópia e extração de conteúdo, permitindo apenas impressão fraca) usando o padrão do Acrobat. Assinatura do (a) autor (a) _______________________________________________ Data:

1 Neste caso o documento será embargado por até um ano a partir da data de defesa. A extensão deste prazo

suscita justificativa junto à coordenação do curso. Os dados do documento não serão disponibilizados durante o período de embargo.

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SHEILA MARA PEDROSA

O USO NOCIVO DO CRACK: PERCEPÇÕES DE PESSOAS

EM TRATAMENTO DA DEPENDÊNCIA

Tese apresentada ao Programa de Pós-

Graduação em Ciências da Saúde da

Universidade Federal de Goiás, como

requisito para obtenção do título de

Doutor em Ciências da Saúde.

Orientador: Marcelo Medeiros

Linha de Pesquisa: Aspectos Nutricionais, Educacionais e

Socioculturais da Saúde Humana.

Goiânia, 2016

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Programa de Pós-Graduação em Ciências da Saúde da Universidade Federal de Goiás

BANCA EXAMINADORA DA TESE DE DOUTORADO PARA

DEFESA

Aluno(a): SHEILA MARA PEDROSA

Membros:

1. Profº Drº Marcelo Medeiros (Orientador; Presidente da Banca Examinadora)

2. Profª Drª Marcia Maria de Sousa (Membro externo ao Programa)

3. Profª Drª Mary Lopes (Membro externo ao Programa)

4. Profª Drª Camila Caixeta (Membro externo ao Programa)

5. Profª Drª Sheila Araújo Teles (Membro do Programa)

SUPLENTES:

6. Profª Drª. Walterlânia Silva Santos (Membro externo ao Programa)

5. Profª Drª Maria Alves Barbosa (Membro do Programa)

Data: 16/02/2016

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MAIS UMA VEZ

“Mas é claro que o sol vai voltar amanhã

Mais uma vez, eu sei

Escuridão já vi pior, de endoidecer gente sã

Espera que o sol já vem

(...)

Nunca deixe que lhe digam que não vale a

pena acreditar no sonho que se tem

Ou que seus planos nunca vão dar certo

Ou que você nunca vai ser alguém

Tem gente que machuca os outros

Tem gente que não sabe amar

Mas eu sei que um dia a gente aprende

Se você quiser alguém em quem confiar

Confie em si mesmo

Quem acredita sempre alcança...”

(Renato Russo/Flávio Venturini)

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AGRADECIMENTOS

Gostaria de agradecer, primeiramente, ao meu orientador, Marcelo Medeiros,

que soube conduzir o processo de construção deste trabalho com paciência,

empatia e sensibilidade, respeitando minhas limitações e ao mesmo tempo fazendo

com que me sentisse capaz de concluí-lo mesmo com os desafios que permearam o

processo.

Aos meus filhos por serem minha motivação maior para superar barreiras,

para aprimoramento profissional e pessoal e motivação para viver;

À minha mãe Heleni, irmão Leandro e cunhada Renata pelo apoio

incondicional e por me manterem de pé quando mais precisei.

Ao meu companheiro Roberto pela dedicação, parceria e paciência.

À professora Sheila Araújo Teles pelas contribuições no trabalho e pela

oportunidade de trabalharmos em parceria.

Às professoras Camila Caixeta e Márcia Maria de Souza pelas contribuições

fundamentais no meu trabalho desde a qualificação, com paciência e generosidade.

À professora Mary Lopes, pelo apoio fundamental e pelas contribuições no

trabalho

À Dalva Marques pela participação na coleta de dados.

Aos colegas, professores e funcionários do Programa de Pós-graduação em

Ciências da Saúde da UFG que fizeram parte dessa caminhada.

Aos membros do NEQUASE, grupo de pesquisa ao qual pertenço, com muito

orgulho, pela construção de conhecimento, troca de experiência e apoio.

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Aos profissionais que me acolheram e disponibilizaram seu tempo no campo

de estudo.

E a todos que de alguma forma contribuíram para o meu crescimento como

pessoa e como profissional, e nesse caso, destaco os sujeitos desse estudo, que

com toda a certeza me tornaram, além uma profissional melhor, uma pessoa melhor.

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RESUMO

O uso de drogas sempre permeou a existência humana, sendo visto em determinados

grupos sociais como um comportamento natural uma vez que alivia dores e sofrimentos em

alguns momentos e produz estímulo e entusiasmo entre outros. A cocaína é uma das

drogas cujo consumo tem crescido nos últimos anos na América do Sul, e em especial no

Brasil, sendo uma de suas apresentações, o crack a mais consumida. Essa droga ilícita,

estimulante do sistema nervoso central, muitas vezes leva a pessoa dependente a ter

prejuízos no âmbito físico, econômico e social. O isolamento ao qual a pessoa dependente

do crack está exposta configura-se em situação extrema de vulnerabilidade social que se

expõem a consequências de uma conjuntura social maior e mais abrangente que

transcende o ato de usar a droga. O objetivo deste estudo foi compreender os significados

do uso nocivo de crack por pessoas em tratamento da dependência. Pesquisa social de

abordagem qualitativa, na modalidade estratégica realizada em um hospital psiquiátrico com

39 participantes distribuídos em oito grupos focais. Foi realizada observação do campo com

registros em diário de campo. As reuniões foram gravadas e posteriormente transcritas e

analisadas por meio do método de interpretação de sentidos. Emergiram três categorias

temáticas que foram discutidas à luz teórica da vulnerabilidade social proposta por Robert

Castel. A primeira, “descoberta do crack e outras drogas” descreve as motivações para o

uso e diferencia a experimentação do crack com o de outras drogas. As motivações citadas

foram a curiosidade, excesso de liberdade dos pais e alívio para alguma decepção da vida

e, também a influência de amigos. A categoria “dor do prazer” descreve o momento após

experimentação do crack quando se instala a dependência, levando a um ciclo de períodos

curtos de tentativa de abstinência, recaída e consumo incessante. Em suas falas, embora o

crack tenha sido considerado a droga que, paradoxalmente, proporciona prazer e alívio aos

sofrimentos, leva ao consumo desenfreado, fissura incontrolável, prejuízos no trabalho,

venda de bens e afastamento da família, conflito com traficantes e policiais,

independentemente, nesse estudo, de poder aquisitivo. Por último, na categoria “retomar a

vida” os participantes descrevem o desejo de mudança de vida após chegarem a uma

situação extrema de uso da droga, falta de dinheiro, conflitos em seu meio social. Apontam

ainda, o sentimento de desespero por não mais quererem usar o crack e não serem

capazes disso em virtude da dependência. Os resultados permitiram observar que antes

mesmo da dependência do crack os participantes já se encontravam numa situação de

vulnerabilidade social. A abordagem de pessoas em tratamento da dependência do crack

deve ser realizada no sentido de reduzir a distância entre essas pessoas e a família,

sociedade e serviços de saúde, sendo esse o ponto de partida para profissionais de saúde

na proposição de ações de promoção da saúde.

Palavras chave: Cocaína crack; Transtornos relacionados ao uso de substâncias; Vulnerabilidade em saúde.

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ABSTRACT

Drug use has always permeated human existence, being seen in certain social groups as a natural behavior since it relieves aches and pains at times and produces stimulation, and exciting and others. The cocaine is a drug which consumption has grown last years in South America, especially in Brazil, and one of its types, the crack, is the most consumed. This illicit drug, stimulates the central nervous system, often leads to dependent person to take damage in the physical, economic and social context. The isolation to which the person dependent on crack is exposed sets in extreme situation of social vulnerability that expose the consequences of a larger and broader social context that transcends the act of using the drug. The objective of this study was to understand the meanings of the harmful use of crack by people in addiction treatment. Qualitative approach of strategic social research held in a psychiatric hospital with 39 participants divided into eight focus groups. Field observation was performed with records in a field notebook. The meetings were recorded and later transcribed and analyzed through the interpretation of meanings method. Data revealed three themes that were discussed in the light of theoretical social vulnerability proposed by Robert Castel. The first, "discovery of crack and other drugs" describes the motivations to use and differentiates the trial crack with other drugs. The cited reasons were curiosity, excessive liberty of parents and relief to some disappointment in life, and also the influence of friends. The "pain of pleasure" describes the time after the trial crack when installing the dependence, leading to a cycle of short periods of attempted abstinence, relapse and incessant consumption. In his speech, although the crack has been considered the drug which, paradoxically, provides pleasure and relief to suffering leads to unbridled consumption, uncontrollable craving, loss at work, sale of goods and separation from family, conflict with drug traffickers and police, regardless in this study of purchasing power. Finally, in the "return to life" participants describe the desire for change of life after reaching an extreme situation of drug use, lack of money, conflicts in their social environment. The feeling of despair for not wanting to use the crack and not be able to do it because of addiction is also highlighted. Results showed that even before the crack addiction participants were already in a situation of social vulnerability. The approach of people in treatment for crack addiction should be done to reduce the distance between these people and the family, society and health services, which is the starting point for health professionals in the proposition of health promotion actions.

Keywords: Crack cocaine; Substance-Related Disorders; Health Vulnerability

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RESUMEN

El consumo de drogas siempre ha impregnado la existencia humana, que se ve en ciertos

grupos sociales como un comportamiento natural, ya que alivia los dolores y molestias a

veces y produce estimulación, y emocionante, y otros. La cocaína es una droga que el

consumo ha crecido últimos años en América del Sur, especialmente en Brasil, y uno de sus

tipos, la grieta, es la más consumida. Esta droga ilícita, estimula el sistema nervioso central,

a menudo conduce a la persona a cargo de tomar daño en el contexto físico, económico y

social. El aislamiento de los cuales la persona dependiente en la grieta está expuesto pone

en situación extrema de vulnerabilidad social que exponen a las consecuencias de un

contexto social más grande y más amplia que trasciende el acto de usar el medicamento. El

objetivo de este estudio fue comprender los significados del consumo nocivo de la grieta por

la gente en el tratamiento de la adicción. enfoque cualitativo de investigación social

estratégica realizada en un hospital psiquiátrico con 39 participantes divididos en ocho

grupos de enfoque. La observación de campo se llevó a cabo con registros en una libreta de

campo. Las reuniones fueron grabadas y posteriormente transcritas y analizadas a través

del método de interpretación de significados. Los datos revelaron tres temas que fueron

discutidos a la luz de la vulnerabilidad social teórico propuesto por Robert Castel. La

primera, "descubrimiento de crack y otras drogas", describe las motivaciones para usar y se

diferencia de la grieta de prueba con otros fármacos. Las razones citadas fueron la

curiosidad, la excesiva libertad de los padres y alivio a una cierta decepción en la vida, y

también la influencia de los amigos. El "dolor del placer", describe el tiempo después de la

grieta juicio al instalar la dependencia, lo que lleva a un ciclo de cortos períodos de intento

de abstinencia, recaída y el consumo incesante. En su discurso, aunque la grieta se ha

considerado el fármaco que, paradójicamente, proporciona placer y alivio al sufrimiento

conduce a un consumo desenfrenado, las ansias incontrolables, pérdida de trabajo, venta de

bienes y la separación de la familia, el conflicto con los narcotraficantes y la policía, sin tener

en cuenta en este estudio de poder adquisitivo. Por último, en los participantes "retorno a la

vida" describir el deseo de cambio de la vida después de llegar a una situación extrema del

consumo de drogas, la falta de dinero, los conflictos en su entorno social. El sentimiento de

desesperación por no querer usar la grieta y no ser capaz de hacerlo a causa de la adicción

también se pone de relieve. Los resultados mostraron que, incluso antes de que los

participantes adicción al crack ya se encontraban en una situación de vulnerabilidad social.

El enfoque de las personas en tratamiento para la adicción al crack se debe hacer para

reducir la distancia entre estas personas y los servicios de la familia, de la sociedad y de

salud, que es el punto de partida para profesionales de la salud en la proposición de las

acciones de promoción de la salud.

Palabras-clave: Cocaína crack; Trastornos Relacionados con Sustancias; Vulnerabilidad en Salud.

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TABELAS, FIGURAS E ANEXOS

FIGURA 1- Número de pessoas detidas por tipo de procedimento de apreensão e

por sexo, de janeiro de 2014 a maio de 2015 .............................................. 19

FIGURA 2 – Interação entre os eixos do trabalho e da inserção relacional . 63

FIGURA 3 - Contexto de vulnerabilidade/desfiliação de quem faz uso nocivo de crack

no campo de estudo. .................................................................................. 126

FIGURA 4 - Ciclo de uso do dependente de crack. .................................... 106

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SÍMBOLOS, SIGLAS E ABREVIATURAS

AIDS – Síndrome da Imunodeficiência Adquirida

CAPS – Centro de Atenção Psicossocial

CAPS-AD – Centro de Atenção Psicossocial Álcool e outras Drogas

CID - Classificação Internacional de Doenças

CNJ – Conselho Nacional de Justiça

CONAD - Conselho Nacional Antidrogas

DENARC - Delegacia Estadual de Repressão a Narcóticos

DSM - Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders (Manual Diagnóstico e

Estatístico de Transtornos Mentais)

ECA - Estatuto da Criança e do Adolescente

CEDD-OMS – Comitê de Especialistas em Dependência de Drogas da Organização

Mundial da Saúde

EJA - Educação para Jovens e Adultos

HIV – Vírus da Imunodeficiência Humana

IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

INPAD - Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia para Políticas Públicas de Álcool

e Outras Drogas

LSD – Dietilamida do Ácido Lisérgico

NECAIH - Núcleo de Estudos em Epidemiologia e Cuidados em Agravos Infecciosos,

com ênfase em Hepatites Virais

NEQUASE - Núcleo de Estudos Qualitativos em Saúde e Enfermagem

OMS – Organização Mundial da Saúde

ONU – Organização das Nações Unidas

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ONUDC – United Nations Oficce on Drugs and Crime (Escritório das Nações Unidas

em Drogas e Crime)

ONU-HABITAT - Programa das Nações Unidas para Assentamentos Humanos

OPAS – Organização Pan-americana da Saúde

PENSE - Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar

PNAD – Política Nacional Sobre Drogas

PTDC – Pessoas em tratamento da dependência do crack

RAPS - Rede de Atenção Psicossocial

RD - Redução de Danos

SENAD - Secretaria Nacional de Políticas sobre drogas

SISNAD – Sistema Nacional Álcool e drogas

SNC – Sistema Nervoso Central

SUS – Sistema Único de Saúde

UDQ – Unidade de Dependência Química

UNODC – Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime

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SUMÁRIO

APRESENTAÇÃO ....................................................................................... 13 CAPÍTULO 1 – DELINEANDO O OBJETO DE PESQUISA........................ 17 1.1. APROXIMAÇÃO AO TEMA ................................................................... 16 1.2. QUESTÕES E OBJETIVO DO ESTUDO .............................................. 24 CAPÍTULO 2 – REFERENCIAL TEÓRICO ................................................. 25 2.1. DISCUTINDO CONCEITOS RELACIONADOS À DROGA ................... 26 2.2. O SER HUMANO E SUA RELAÇÃO COM AS DROGAS ..................... 33 2.3. POLÍTICAS PÚBLICAS VOLTADAS AO USO NOCIVO DE DROGAS 45 2.4. VULNERABILIDADE DO USÚÁRIO DE CRACK...................................57 2.5. PRESSUPOSTOS TEÓRICOS..............................................................71

CAPÍTULO 3 – METODOLOGIA ................................................................. 73 3.1. REFERENCIAL TEÓRICO-METODOLÓGICO ..................................... 74 3.2 CAMPO DE ESTUDO ............................................................................ 75 3.2.1. Os sujeitos da pesquisa .................................................................. 80 3. 3. TRABALHO DE CAMPO ...................................................................... 83 3.3.1 Coleta de dados ................................................................................. 83 3.3.1.1 Observação do campo ..................................................................... 83 3.3.1.2. Os grupos focais ............................................................................. 84 3.3.2. Análise dos dados ............................................................................ 88 3.4. PROCEDIMENTOS ÉTICOS ................................................................ 89

CAPÍTULO 4 – RESULTADOS E DISCUSSÃO .......................................... 90 4.1. CARACTERIZANDO OS SUJEITOS DO ESTUDO .............................. 91 4.2.1. Descoberta do crack e de outras drogas ....................................... 95 4.2.2. A dor do prazer ............................................................................... 105 4.2.3. Retomar a vida ................................................................................ 114

CONSIDERAÇÕES FINAIS ....................................................................... 128

REFERÊNCIAS .......................................................................................... 132

ANEXOS .................................................................................................... 146

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APRESENTAÇÃO

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Nas últimas décadas, muito tem sido discutido, formal e informalmente, sobre

o uso de crack. Trata-se de uma droga que tem ocupado espaço importante no

cotidiano de diversas pessoas, uma vez que já se observa o seu uso recorrente

pelas ruas de várias cidades. Para os profissionais da saúde, em especial o

enfermeiro, é importante compreender um pouco mais sobre a situação desses

usuários, por lidarem diariamente com a questão do uso de drogas e suas

consequências no seu contexto de trabalho. Sendo assim, nos envolvemos na

construção deste trabalho com o intuito de aprimorar o conhecimento a respeito

desta importante questão de saúde pública e melhor conhecer alguns aspectos que

consideramos fundamentais sobre a pessoa que se encontra imersa no uso dessa

droga.

Esta Tese está estruturada em quatro capítulos. No primeiro, descrevo minha

aproximação ao tema, as questões de estudo e os objetivos. No segundo, apresento

o referencial teórico que fundamenta a compreensão dos resultados advindos da

pesquisa, dividido em quatro blocos: "Discutindo conceitos relacionados à droga”, “O

ser humano e sua relação com as drogas” e “Políticas públicas voltadas ao uso

nocivo de drogas”, “Vulnerabilidade do usuário de crack”. No terceiro capítulo,

metodologia, descrevo etapas operacionais da pesquisa, desde a delimitação do

referencial teórico metodológico e do campo de estudo, bem como o trabalho de

campo. No quarto, trago os resultados e sua discussão e finalizo traçando algumas

considerações finais.

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CAPÍTULO 1 – DELINEANDO O OBJETO DE PESQUISA

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1.1. APROXIMAÇÃO AO TEMA

O uso nocivo de drogas tornou-se assunto habitual e bastante presente na

vida das pessoas, sendo que muitas relatam um caso na família ou alguém do

círculo de amizades.

Brevemente, relato aqui uma experiência individual, embora parte de um

projeto coletivo, peço licença para utilizar os verbos na primeira pessoa do singular.

Meu primeiro contato com a questão do uso nocivo de drogas, não poderia ter sido

diferente. Aconteceu observando casos de pessoas próximas ainda em minha

adolescência. Nessa época, inquietava-me o fato e questionava por que as pessoas

usavam drogas de maneira que as deixassem tão dependentes, provocando

instabilidades familiares e sofrendo preconceito da sociedade?

Mais tarde, percebi também que o uso nocivo de drogas não tinha limites

socioeconômicos atingindo desde aqueles mais desfavorecidos até os

economicamente diferenciados, inseridos (ou não) em um grupo familiar e até

mesmo no mercado de trabalho. Daí a questão se tornou mais específica, isto é, por

que as pessoas, mesmo inseridas em um grupo familiar, com emprego e renda,

tornam-se dependentes de drogas? Não seriam esses justamente os fatores que as

distanciariam do mundo das drogas?

A aproximação acadêmica com a questão das drogas ocorreu na etapa de

trabalho de campo do meu estudo de Mestrado, quando realizei a investigação com

professores da rede pública de ensino de Goiânia, buscando uma melhor

compreensão sobre a violência na escola. Nos resultados da Dissertação, os

professores relataram o uso de drogas entre os alunos que cursavam o Educação

para Jovens e Adultos (EJA) no período noturno, hábito que lhes causava

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sentimento de insegurança e intimidação, uma vez que o uso de drogas modificava

o comportamento do aluno em sala de aula e os professores não estavam

preparados nem amparados para lidar com tal situação (PEDROSA, 2011).

Meu contato acadêmico com o tema se intensificou com a oportunidade de

participar de um projeto de pesquisa a ser desenvolvido em parceria entre o Núcleo

de Estudos em Epidemiologia e Cuidados em Agravos Infecciosos, com ênfase em

Hepatites Virais (NECAIH) e o Núcleo de Estudos Qualitativos em Saúde e

Enfermagem (NEQUASE), ambos da Faculdade de Enfermagem da Universidade

Federal de Goiás. O projeto intitulado “Perfil dos usuários de crack infectados pelo

HBV, HCV e HIV em Goiânia, Brasil central”, coordenado por pesquisador do

NECAIH, tinha entre seus objetivos explorar práticas, atitudes e comportamentos de

usuários de crack por meio da utilização de abordagem qualitativa. Para contemplar

a consecução deste objetivo foi desenvolvida a presente investigação vinculada ao

NEQUASE, do qual também sou membro.

No decorrer do meu contato com o tema do uso de drogas percebi o quanto

ele é polêmico, envolto em dúvidas e julgamentos, abordado sob diversas óticas, e

concebido como problema em diversas esferas da sociedade. Segundo Nascimento

(2006), trata-se de um problema social que deve ser abordado com cautela. Mas, o

que seria esse “social”? Além desse “problema social” estar muitas vezes ligado às

consequências econômicas sofridas pelo usuário, traz consigo também

desequilíbrios que se materializam em outras importantes dimensões, como a

produtiva, educativa, de saúde, afetiva e de relações sociais e familiares. Para o

autor, as alterações que ocorrem nessas esferas trarão consequências no âmbito

econômico, o que explica o uso de drogas ser visto como problema social.

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Porém, Nascimento (2006) alerta ainda para o fato de que as tentativas de

reduzir o impacto da droga nessas dimensões não têm obtido grande êxito em

virtude do direcionamento restrito das ações do Estado no sentido único de eliminar

o consumo de drogas, assim colocando em destaque a substância e não o sujeito

que a utiliza de maneira nociva.

Nesse contexto, temos o destaque de uma droga que o uso tem provocado

discussão tanto no âmbito do senso comum, quanto no do conhecimento científico,

que é a cocaína. O consumo dessa droga tem crescido nos últimos anos na América

do Sul, e em especial no Brasil (UNODOC, 2014). No Brasil, a Região Centro-Oeste

foi a que registrou o maior consumo no ano de 2013, com proporção de 2,6% do

total da população, o equivalente a 276 mil usuários (ABDALLA, MADRUGA,

RIBEIRO, PINSKY et al, 2014).

Em Goiás, a polícia civil, por meio da Delegacia Estadual de Repressão a

Narcóticos (DENARC), apreendeu, de uma só vez, 451 quilos de pasta-base de

cocaína no mês de fevereiro de 2014, a maior apreensão em Goiás até então

(MELO, 2014). Junto à essa delegacia, obtive dados de apreensão de drogas e

detenção de pessoas por porte de drogas no estado.

A DENARC disponibilizou um documento (ANEXO A) que informa a

quantidade apreendida e, de acordo com ele, de janeiro de 2014 a abril de 2015

foram apreendidas cerca de 18,8 toneladas de drogas ilícitas, sendo que mais da

metade (74%) apreendida na capital Goiânia. A cocaína em pasta-base é a segunda

droga ilícita mais apreendida, depois da maconha segundo tal documento.

A seguir, a Figura 1 ilustra o número de pessoas detidas de acordo com o

motivo da detenção:

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Figura 1- Número de pessoas detidas por tipo de procedimento de detenção e por sexo, de janeiro de 2014 a maio de 2015, DENARC-GO, 2015:

FONTE: DENARC-GO, 2015 NOTA: *APF – Auto de Prisão em Flagrante: lavrado quando se trata de traficante **TCO – Termo Circunstanciado de Ocorrência: lavrado quando se trata de usuário de entorpecente ***BOC – Boletim de Ocorrência Circunstanciado: lavrado em casos de tráfico ou uso em que a autoria recai sobre adolescentes

Por ser psicotrópica, a cocaína é passível de gerar abuso e dependência por

agir no núcleo accumbens cerebral, reforçando sensações de prazer. Dessa forma, o

uso desse tipo de droga é caracterizado por uma necessidade crescente de

consumo (SANCHEZ, SANTOS, 2013; FORMIGONI et al., 2014).

Uma das apresentações da cocaína que desencadeia mais rápido e

intensamente o uso nocivo, e por isso tem se disseminado e causado preocupação

de modo geral, é a “cocaína fumada”, em especial representada pelo crack - uma

droga psicotrópica, ilícita, estimulante do SNC, derivada da cocaína, que pode

causar dependência rapidamente. Tem esse nome devido ao barulho feito quando

está sendo queimada. O crack é composto da mistura de pasta-base de cocaína

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com água e bicarbonato de sódio que, aquecida, dá origem a cristais, conhecidos

como “pedras” de crack (RAUPP, 2011).

Ao ser fumado, provoca efeitos estimulantes em aproximadamente 15

segundos, mantendo-os por cerca de cinco minutos. Esses dois fatores associados

contribuem para a necessidade de o usuário buscar constantemente a droga

(BALBINOT, ALVES, AMARAL JUNIOR, ARAUJO, 2011; RAUPP, 2011).

Entre os motivos relatados para o consumo pela primeira vez de crack

constam a vontade/curiosidade de experimentar/sentir o efeito da droga, problemas

familiares ou perdas afetivas e a pressão/influência de amigos (BASTOS e

BERTONI, 2014).

Em pesquisa realizada por Bastos e Bertoni (2014) nas capitais e no Distrito

Federal, as estimativas de uso regular de crack e/ou similares ficaram na proporção

de aproximadamente 0,81% (Intervalo de Confiança de 95% (IC95%): 0,76 – 0,86), o

que representaria cerca de 370 mil usuários, sendo que a estimativa para o número

de usuários de drogas ilícitas em geral (com exceção da maconha) é de 2,28%

(IC95% 2,17-2,38), ou seja, aproximadamente 1 milhão de usuários. Na análise dos

consumidores de drogas ilícitas, os usuários de crack e/ou similares corresponderam

a 35% dos consumidores nas capitais do país (BASTOS, BERTONI, 2014).

Importante mencionar que, ao longo das duas últimas décadas, o consumo

desse tipo de droga tem aumentado, e o interesse da comunidade científica também

se intensificou, a qual direcionou estudos principalmente para a investigação das

alterações orgânicas provocadas pela droga (RODRIGUES, et al, 2012).

Desde a entrada do crack no país, o foco conferido ao uso da substância

esteve relacionado à dependência que rapidamente é por ela provocada e o

comportamento do usuário diante da necessidade de consumi-la, que, com

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frequência envolve-se em crimes e comportamento sexual de risco em troca de

favores e atos violentos para a obtenção de dinheiro para a compra da droga

(CHAVES et al 2011).

Dessa forma, as consequências da dependência do crack não são apenas

relacionadas à deterioração física, mas também a prejuízos econômicos e sociais

pela estigmatização associada. Podemos citar os danos físicos relacionados ao

acometimento pulmonar, à exposição ao Vírus da Imunodeficiência

Adquirida/Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (HIV/AIDS), às hepatites B e C, à

violência física, à mortalidade, entre outros. No aspecto socioeconômico, destacam-

se o isolamento social e familiar, a marginalização por atos ilícitos, a violência, o

rompimento de laços afetivos, a perda ou o afastamento do emprego quando

inserido no mercado de trabalho, o caos e o pânico coletivos que corroboram para

minimizar a qualidade de vida, a perda de esperança na vida e as dificuldades de

acesso aos serviços de saúde (RODRIGUES et al, 2012).

No momento em que o uso nocivo de crack leva à dependência, ou seja,

quando a pessoa passa a consumir a droga não para sentir prazer, mas como uma

demanda física, uma necessidade, um alívio da dor, há a necessidade de obter a

droga a qualquer custo (ACIOLI NETO, SANTOS, 2014).

É necessário, então, que visualizemos um outro aspecto da condição de

quem faz uso nocivo de crack, uma vez que a imagem concebida pela sociedade

não é a mesma vivida e relatada por quem vivencia a situação. Essas pessoas

sentem-se cada vez mais isoladas, fato que favorece a manutenção do vício e piora

de sua condição de vida (ACIOLI NETO, SANTOS, 2014).

O isolamento ao qual a pessoa dependente do crack está exposta se

configura em uma situação de vulnerabilidade social. O conceito de vulnerabilidade,

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que será melhor discutido posteriormente, deve ser utilizado com parcimônia, de

maneira a superar o caráter individualizante e abarcar aspectos coletivos e

contextuais. Com isso, amplia-se a visão desse sujeito social no sentido de que a

situação dessas pessoas, dependentes do crack e expostas a uma vida

extremamente desfavorável, é consequência de uma conjuntura maior e mais

abrangente, que transcende o uso nocivo de drogas (MUNOZ SANCHEZ E

BERTOLOZZI, 2007).

No caso específico da dependência do crack, as relações sociais e laborais

do usuário estão sujeitas a ruírem rapidamente devido à necessidade de consumir a

droga a qualquer custo e ao comportamento desenvolvido por esse dependente que,

após perder seus bens, passa a lançar mão do patrimônio/dinheiro da família e de

pessoas próximas até o momento em que esses decidam não mais ajudar

(MAGALHÃES, SILVA, 2010).

No Brasil, estudo conduzido por Bastos e Bertoni (2014) mostrou que, entre

os usuários de crack e/ou similares, aqueles que estavam usando a droga na rua no

momento da coleta de dados apresentaram o perfil de ser, na sua maioria, homens,

jovens, pouco escolarizados, vivendo em situação de rua, sem emprego/renda fixa

(BASTOS e BERTONI, 2014).

Porém, no mesmo estudo, observou-se que a maioria das pessoas que fazem

uso nocivo de crack e seus derivados na rua não é composta de moradores de rua e

relata obter o dinheiro para comprar a droga em trabalho esporádico ou autônomo

(BASTOS e BERTONI, 2014). Tal resultado mostra que apesar de todas as

adversidades encontradas nesse contexto de uso da droga, inclusive na rua, essas

pessoas buscam sustentar o vício de forma socialmente aceitável.

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Diante do exposto, fica evidente que a dependência do crack configura-se um

problema social e de saúde pública e, como tal, também é entendido como uma

responsabilidade da enfermagem que deve, por meio de ações vinculadas ao

trabalho interdisciplinar, ampliar o seu cuidado. Dessa forma, o entendimento desse

uso incontrolável e dos mecanismos que interferem na busca por apoio durante o

processo de tratamento é de fundamental importância uma vez que contribui para

que o enfermeiro possa propor ações de cuidado e de promoção da saúde.

No entanto, quando se observa a atuação do enfermeiro voltada ao

dependente de crack notam-se alguns obstáculos, como falta de estrutura dos

hospitais que recebem as pessoas para tratamento da dependência, ausência de

preparo da equipe de enfermagem para lidar com tais pacientes e dificuldade do

trabalho em equipe (SOUZA, PINTO, 2012). Sendo assim, é de suma importância

identificar e compreender a problemática do uso nocivo do crack e seu tratamento

sobretudo sob o olhar do próprio usuário.

Entendendo a relevância do tema pudemos observar que o estudo do usuário

de crack ainda é incipiente o que foi também identificado no estudo de Rodrigues et

al (2012) investigando a produção dos programas de pós-graduação Strictu Sensu,

onde constataram que, neste âmbito, o conhecimento produzido no Brasil sobre o

uso do crack além de incipiente aborda temas pontuais e de baixa resolubilidade e

está concentrado em determinadas regiões, como a Sudeste. Diante dos resultados,

os autores recomendam a descentralização do conhecimento visando à abordagem

desse tema nas diferentes realidades regionais, com suas potencialidades e

fragilidades para o enfrentamento da problemática (RODRIGUES et al, 2012).

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1.2. QUESTÕES E OBJETIVO DO ESTUDO

Ante o exposto, delineamos as seguintes questões de pesquisa: O que leva

uma pessoa a usar nocivamente o crack? Como é a vivência desse uso nocivo e da

dependência? Quais estratégias são utilizadas pelo usuário de crack na busca de

apoio e de tratamento?

Com vistas a responder essas questões, estabelecemos, como objetivo para

este estudo compreender os significados do uso nocivo de crack por pessoas em

tratamento da dependência.

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CAPÍTULO 2 – REFERENCIAL TEÓRICO

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Para melhor contextualizar a situação de quem faz uso nocivo ou é

dependente do crack faz-se necessária a discussão de aspectos fundamentais que

permeiam esse contexto, assim como definir as bases conceituais utilizadas nesse

trabalho sobre o tema nas quais o assunto é abordado não de modo a esgotar a

temática, mas no sentido de pontuar aspectos importantes que sustentarão a análise

dos dados da pesquisa. Assim, a fundamentação teórica deste trabalho está

organizada em quatro partes: “discutindo conceitos relacionados à droga”, “o ser

humano e sua relação com as drogas”, “políticas de saúde voltadas ao uso nocivo

de drogas” e “vulnerabilidade do usuário de crack”.

2.1. DISCUTINDO CONCEITOS RELACIONADOS À DROGA

Para melhor entendimento da relação do homem com a droga é necessária a

discussão do conceito de droga. O termo vem do holandês “droog”, em referência a

produtos secos transportados no período da exploração marítima de especiarias no

século XVI (CARNEIRO, 2005).

Na tentativa de padronizar e conceituar as drogas, a Organização Mundial da

Saúde (OMS), por meio do Comitê de Especialistas em Dependência de Drogas

(CEDD-OMS), tem formulado alguns conceitos a elas relacionados e também ao seu

consumo ao longo dos anos.

Em 1957, o CEDD-OMS inseriu as terminologias “drogadição” ("drug

addiction") e hábito em drogas ("drug habituation"), ambas sem diferenças

marcantes. Sendo assim, em 1965, o referido comitê introduziu uma nova

terminologia na tentativa de abranger todos os tipos de abuso de drogas e incluiu o

termo dependência a drogas (Drug dependence), definido como estado de

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dependência física ou psíquica, ou ambos, que surge na pessoa após a

administração de drogas em um período específico ou continuamente (tradução livre

de: “a state of psychic or physical dependence, or both, on a drug, arising in a person

following administration of that drug on a periodic or continuous basis”) (CEDD-OMS,

1965, p.722).

Em 1969, o termo droga foi novamente definido como “uma substância que,

quando introduzida no organismo, pode modificar uma ou mais das suas funções

[tradução livre] (CEDD, 1969, p.6)”.

Com base nesses aspectos, entendemos que o conceito de droga é

abrangente e pode ser associado a substâncias de consumo habitual, como café,

chocolate, açúcar ou fármacos, passando pelo álcool e tabaco, até a cocaína e

derivados, heroína, Dietilamida do Ácido Lisérgico (LSD), maconha e outras drogas,

uma vez que todas alteram uma ou mais funções do organismo.

A dependência da droga também foi discutida e, em 1974, a definição

adotada pela CEDD-OMS diferenciou a dependência física da psíquica, sendo a

segunda decorrente de uma condição em que uma droga produz sentimento de

satisfação e estado psicológico que requerem sua nova administração, de maneira

periódica ou contínua, com a finalidade de reproduzir a sensação prazerosa ou

evitar desconfortos (CEDD-OMS, 1974, p.14). Já a dependência física foi

conceituada como um estado adaptativo que se manifesta por si só em intensos

distúrbios físicos quando a administração da droga é suspensa (CEDD-OMS, 1974,

p.14).

No entanto, para uma melhor caracterização do termo ‘droga’, a CEDD-OMS

avaliou a necessidade de adotar, em 1981, uma definição hierárquica ou

taxonômica, a qual poderia ser discutida em quatro níveis (CEDD-OMS, 1981).

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No primeiro nível, a necessidade de reduzir a amplitude do termo ‘droga’ pela

forma como foi concebido em 1969. No segundo, era necessário especificar o uso

dessas substâncias - se para combater doenças (medicamentos, agentes

terapêuticos, remédios, etc.) ou com propósitos não terapêuticos. No terceiro nível,

buscou-se diferenciar o agente químico de acordo com sua influência nas bases

funcionais ou sistêmicas do corpo. No quarto nível de definição, a preocupação

dirigia-se aos possíveis efeitos adversos no aspecto de saúde ou social (CEDD-

OMS, 1981).

Em 1994, em documento oficial de termos relacionados a drogas e álcool,

mencionou-se o termo droga psicoativa, conceituada como aquela que, quando

ingerida, interfere nos processos mentais, cognitivos e afetivos, mas que não

necessariamente provocaria dependência (CEDD-OMS, 1994).

Quanto à ação no organismo, as drogas psicotrópicas, ou seja, aquelas que

podem levar à dependência, foram classificadas por Chaloult (1971) em

estimulantes, depressoras e perturbadoras, classificação bastante difundida quando

se trata dos efeitos da droga. As drogas estimulantes aumentam a atividade de

determinados sistemas neurais (Ex: cocaína, crack); as depressoras diminuem a

atividade global ou de certos sistemas específicos do Sistema Nervoso Central

(SNC) (Ex: álcool), e as perturbadoras alteram o funcionamento do cérebro,

resultando em fenômenos psíquicos anormais como delírios e alucinações, daí

serem consideradas, também, alucinógenas (Ex: maconha). Importante lembrar que,

dependendo de como se utiliza e da resposta do indivíduo, uma mesma droga pode

apresentar mais de um efeito (SANCHEZ, SANTOS, 2013).

Outra forma de conceituação do termo é aquela utilizada no senso comum,

influenciando principalmente os adolescentes, em especial a respeito do crack. É

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também muito influenciada pelas concepções das áreas da saúde e segurança

pública, expressas por meio de políticas e ações difundidas pelas mídias em geral, e

consiste em associar o termo droga àquelas ilícitas, partindo-se da ideia que causam

prejuízos ao ser humano e, portanto, não devem, de forma alguma, ser

experimentadas (BRUSAMARELLO, 2008; SANCHEZ et al, 2011; UNODC, 2015).

Sendo assim, neste estudo, quando mencionarmos a palavra “droga” estaremos nos

referindo às ilícitas, ou seja, aquelas cujo consumo é considerado ilegal, tal como já

estabelecido no senso comum e em nosso cotidiano.

Há, todavia, diferença na forma como o ser humano consome a droga. No

relatório da ONU de 2014, foram usados os termos “uso de drogas” e “consumo de

drogas” por serem considerados neutros e não haver consenso (OMS, 2014). Já no

relatório de 2015, a mesma organização utilizou o termo “uso problemático de

drogas” (OMS, 2015).

De modo geral, seu aspecto prejudicial está relacionado à forma de utilização,

às propriedades do aspecto farmacológico de cada droga, à constituição biológica

própria de quem usa, passando pelo estado psíquico e expectativas da pessoa no

momento em que essa faz o uso, além do ambiente/contexto em que essa pessoa o

faz, das companhias, e do que este uso representa na sua vida social. Acresce-se

ainda a facilidade ou dificuldade da oferta e do acesso a droga (SENAD, 2013;

ANDRADE, ESPINHEIRA, 2014).

Como bem observa Espinheira (2014), ainda que pessoas utilizem os

mesmos tipos de drogas, o uso não é igual e não provoca os mesmos efeitos. Além

disso, dependendo do ambiente em que é usada, causa diferentes reações em

pessoas socialmente também distintas. Dessa forma, observa o autor, as

drogas/substâncias não constituem, por si só, o problema, mas são as razões que

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motivam o consumo e a substância consumida que levam à ação social de consumo

de drogas, necessitando, portanto, que a abordagem seja conduzida de modo a

evitar reducionismos e estigmatização.

Sendo assim, seu uso é permeado por um conjunto complexo de fatores que

transcendem o tipo de droga consumida. Nesse sentido, percebemos a importância

do aspecto cultural do uso de drogas que foi, com o passar do tempo, associando tal

uso a prejuízos, proibições e discriminação social.

Para fins deste trabalho, utilizaremos o termo “uso nocivo de droga” por

entendermos ser mais específico, uma vez que o uso de drogas, por si só, tal como

discutido anteriormente, não é o problema, mas sim a forma como são utilizadas. Se

consumidas de forma nociva, causam efeitos maléficos à vida dos sujeitos em seus

aspectos físico, social, econômico e psicológico.

Mas, então, o que caracteriza o uso nocivo de uma droga psicotrópica?

Para diagnóstico dos transtornos decorrentes do uso de drogas psicotrópicas

utilizam-se dois critérios: a Classificação Internacional de Doenças (CID), que se

encontra em sua décima revisão (CID-10), e o Manual de Diagnóstico e Estatística

(DSM), em sua 5ª revisão (DSM-V). O CID-10 considera dois estágios do uso de

psicotrópicos, sendo o uso nocivo o padrão que causa prejuízo físico ou mental à

saúde, mas que ainda não se configura como dependência. Já a dependência

propriamente dita é considerada um:

Conjunto de fenômenos comportamentais, cognitivos e fisiológicos que se desenvolvem após repetido consumo de uma substância psicoativa, tipicamente associado ao desejo poderoso de tomar a droga, à dificuldade de controlar o consumo, à utilização persistente apesar das suas consequências nefastas, a uma maior prioridade dada ao uso da droga em detrimento de outras atividades e obrigações, a um aumento da tolerância pela droga e, por vezes, a um estado de abstinência física (OMS, 2008).

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De acordo com a DSM-V, o abuso e a dependência de drogas foram

unificados em um único diagnóstico: ‘Transtorno por uso de substâncias’,

classificado como leve, moderado ou grave, dependendo do número de critérios

preenchidos.

De acordo com a observação de Galduróz e Ferri (2014), de modo geral, o

CID-10 e o DSM-V abrangem as mesmas características expressas pelo usuário

para diagnóstico de dependência a algum tipo de droga, a saber: tolerância (doses

crescentes são necessárias para obtenção do efeito desejado), compulsão de uso,

perda de controle do uso (substância frequentemente consumida mais do que o

planejado), síndrome de abstinência (uso da substância ou de similar para aliviar ou

evitar os sintomas de abstinência), negligência de atividades diárias e tempo gasto

cada vez maior para se recuperar dos efeitos da droga e manutenção do uso,

apesar dos prejuízos causados.

De acordo com Andrade e Espinheira (2014), os efeitos de uma droga no

indivíduo estão associados a basicamente três elementos: propriedades

farmacológicas, condições físicas e psíquicas da pessoa que usa e contexto social

do usuário (ANDRADE, ESPINHEIRA, 2014).

Com o avanço da neurociência, ficou nítido o fato de que as drogas

psicoativas são aquelas que alteram a consciência, a disposição e os pensamentos,

provocam a fármaco-dependência, um transtorno crônico, recorrente, associado a

fatores biológicos e genéticos que independem da vontade ou não de permanecer

dependente (OMS, 2004).

Há de se considerar ainda que o uso de drogas ilícitas é permeado por

opiniões de diversas naturezas, e o tema é igualmente visto sob distintas lentes,

como no âmbito das religiões, da segurança pública, da saúde pública e da política,

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que muitas vezes não são coincidentes. Cada uma dessas instituições tem seu

modo próprio de lidar com essa situação - desde uma forma coercitiva a outra

tolerante ou mais acolhedora -, o que causa diversidade de opiniões também na

sociedade em geral.

Por consequência, o tratamento de dependentes de drogas ilícitas no Brasil

sofreu e sofre influência da cultura estigmatizante a esse grupo populacional.

Estratégias como a de redução de danos e serviços de saúde como os do

consultório na rua, dos Centros de Atenção Psicossocial Álcool e Drogas (CAPS-

AD), a reserva de leitos em hospitais gerais para dependentes químicos, mesmo

sendo importantes meios de recuperação e ressocialização, não se consolidam pela

quantidade insuficiente de recursos, por despreparo e desinformação dos

profissionais que trabalham com essa população e pela cultura social de que não se

deve investir no tratamento dessas pessoas em detrimento ao atendimento à

população em geral (ANDRADE, 2011).

Outro aspecto importante sobre o tratamento contra a dependência foi

mencionado no Relatório Mundial sobre Drogas e Crime do Escritório das Nações

Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC) de 2015. Segundo o relatório, de cada três

usuários, um é mulher, sendo que somente uma em cada seis pessoas dependentes

de droga tem acesso ao tratamento. Para as mulheres em especial, o acesso parece

ainda mais difícil, pois há somente uma, em cada grupo de cinco, em tratamento.

Sugere-se, nesse mesmo relatório, o desenvolvimento de novos estudos para

maior entendimento e conscientização do uso de drogas como uma condição crônica

e que, portanto, necessita de tratamento e cuidado a longo prazo (UNODC, 2015).

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2.2. O SER HUMANO E SUA RELAÇÃO COM AS DROGAS

O uso de drogas que alteram a percepção do mundo sempre permeou a

existência humana e, até certo ponto, foi visto e ainda é, como um comportamento

natural em determinados contextos e situações (INVERSEN, 2012; CARNEIRO,

2005). A necessidade de consumo de drogas advém de seu poder de alívio de dores

e sofrimentos de diversas naturezas e, ao mesmo tempo, por serem produtoras de

estímulo e entusiasmo, notados desde os primórdios da humanidade. Pensemos

então na trajetória do uso da droga pelo ser humano que, de ferramenta de estímulo

sensorial em rituais e tratamento de enfermidades, tornou-se um hábito condenado e

estigmatizado pela sociedade.

Ao que parece, a relação do homem com substâncias que alteram o

funcionamento do organismo começou com as plantas e, à medida que as

experimentava e essas lhe faziam bem ou mal, ampliava-se o conhecimento a seu

respeito. Assim explica-se o fato dos herboristas e botânicos terem sido os primeiros

a escrever histórias sobre drogas (CARNEIRO, 2005). É da China antiga, do século

II, um dos primeiros registros sobre remédios fitoterápicos de origem animal, mineral

e vegetal (INVERSEN, 2012).

Assim como a China, diversos países e regiões do mundo catalogaram

substâncias que consideravam curativas e, muitas vezes, seus efeitos eram

associados a rituais religiosos ou crenças conduzidas pelos curandeiros

(INVERSEN, 2012).

As drogas psicoativas, segundo Carneiro (2005, p.4), apresentam sua história

associada à própria história da mente humana, uma vez que descreve as relações

que, por meio da cultura, são estabelecidas “entre a mente e moléculas capazes de

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interagir com os processos químicos, ou seja, da capacidade humana de tornar sua

subjetividade um objeto de intervenção química deliberada”.

Nesse sentido, a expansão europeia pela Ásia, África e América no século

XVI impactou a vida cotidiana no velho mundo, antes baseada na moral medieval; a

partir de então, passou-se a experimentar a busca pelo lucro e consumo de

substâncias antes não conhecidas e que proporcionavam prazer, como açúcar,

pimenta, tabaco e bebidas alcoólicas (CARNEIRO, 2005).

Carneiro (2005) assinala a influência de tais substâncias na economia

mundial e destaca importantes ciclos comerciais do séc. XVI ao XIX que envolviam o

comércio do vinho, especiarias, açúcar, aguardente, tabaco e chás (CARNEIRO,

2005).

Um desses ciclos de comércio foi o das bebidas quentes e excitantes,

bastante ativo no séc. XVIII, que desequilibrou a balança comercial da Inglaterra

com países asiáticos devido à intensa procura pelo chá. A situação, inclusive,

provocou duas guerras contra a China, chamadas ‘guerras do ópio’, nome

decorrente da exigência imposta pela Inglaterra para que se pagasse pelo chá

chinês em ópio e não com prata (CARNEIRO, 2005).

No entanto, as especiarias perderam os holofotes no comércio internacional

com a chegada de um novo grupo de produtos, os alimentos-droga: café, chá,

chocolate, açúcar, tabaco e bebidas alcóolicas (CARNEIRO, 2005).

As bebidas fermentadas e destiladas sempre tiveram grande importância

sociocultural no mundo, presentes em rituais religiosos, celebrações diversas e

festas, de modo que o seu consumo foi perpetuado ao longo da história da

humanidade (CARNEIRO, 2005). Nesse aspecto, percebe-se o papel fundamental

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da cultura na preservação de tradições e hábitos envolvendo o consumo de

substâncias que alteram a percepção humana.

Assim,

Foi pelo açúcar que os africanos foram escravizados numa diáspora de milhões de degregados [termo em português de Portugal] para as américas; pelas especiarias, os europeus se lançaram aos mares desconhecidos em busca do caminho das Índias; pelo chá, a Inglaterra inundou a China de ópio; com o tabaco se colonizou a Virgínia; com o café se ampliou a capacidade de trabalho e de vigília do proletariado e dos soldados da era contemporânea e com o álcool destilado se obteve consolo, anestesia, impostos e lucros. (CARNEIRO, 2005, p.7)

Dessa forma, o que inicialmente era considerado supérfluo, passou a ser

valorado e necessário, como o caso do tabaco e do álcool no início da colonização

do Brasil (CARNEIRO, 2005). As grandes navegações fizeram com que as drogas,

em seu sentido amplo, fossem difundidas, e a disputa cambial para comercializá-las

deu lugar ao proibicionismo baseado numa justificativa, primeiramente religiosa e

posteriormente médico-moral (CARNEIRO, 2005).

Por outro lado, no período da Renascença, a medicina começou a ser

desenvolvida segundo uma nova abordagem: a experimental, em especial após a

descoberta da circulação sanguínea, descrita em 1628 por William Harvey

(INVERSEN, 2012). Nessa época, houve também o desenvolvimento da alquimia, ou

seja, a introdução da química na medicina, e das ideias de Paracelso que defendia,

com pouco sucesso, que as doenças deveriam ser tratadas com substâncias

químicas (VARGAS, 2008).

O século XVII, por sua vez, foi propício à difusão do álcool pelo fato de, na

época, as bebidas destiladas e fermentadas terem se tornado mais baratas e

competitivas após a queda do preço dos cereais no mundo capitalista. O fenômeno

do comércio do álcool e do tabaco moldou o estilo de vida do mundo moderno,

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sendo as principais mercadorias de escambo por escravos na África (CARNEIRO,

2005).

Posteriormente, após o marco do desenvolvimento industrial, a produção do

álcool passou a ser destinada também ao consumo em larga escala, com novos

tipos de bebidas e inovadores costumes, mantendo-se a bebida disponível durante

todos os dias da semana e não apenas no período de colheita, que era quando se

conseguia produzi-las nas civilizações antigas. Isso promoveu um consumo nocivo

que, à medida que comprometia a sobriedade da mão de obra trabalhadora, foi se

tornando alvo da política de proibição (OMS, 2014).

A partir do século XIX a cientificidade realmente começou a influenciar a

prática médica, momento de grande e acelerado desenvolvimento e uso de drogas

terapêuticas como o iodo, a insulina e a morfina, utilizada em cirurgias e partos

(VARGAS, 2008; INVERSEN, 2012).

Percebe-se, nesse período, uma tendência crescente do uso de certas drogas

como ‘remédio’, associando-as ao tratamento e à cura de doenças, o que motivou a

ampla difusão de drogas terapêuticas e, ao mesmo tempo, o surgimento na

população de seus diversos efeitos colaterais (VARGAS, 2008; INVERSEN, 2012).

Já o período que compreende o final do séc. XIX e início do séc. XX foi

marcado pela pressão no aspecto moral a respeito do uso de drogas, precedido pela

atitude proibicionista, que constitui uma prática moral e política com bases em

grupos militantes da sociedade (RODRIGUES, 2008).

Tal proibição esteve atrelada à questão da biopolítica que, ao mesmo tempo,

disciplina a prática médica, ditando normas a serem seguidas pelos profissionais, no

sentido de evitar a automedicação e o livre uso de substâncias. Por outro lado, tal

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proibicionismo serviria também para conter uma parcela da população composta por

pessoas consideradas “perigosas” (RODRIGUES, 2008).

A partir de então, temos a Conferência de Xangai, em 1909, para tratar da

limitação do comércio de ópio e seus derivados, e a aprovação da Lei Seca, em

1919, nos Estados Unidos, fundamentada em práticas puritano-moralistas, proibindo

o consumo, o comércio e a importação ou exportação de álcool em todo território

nacional, fato que levou a um comércio ilícito da droga (RODRIGUES, 2008).

Esse movimento proibicionista, impactante nos Estados Unidos e presente em

outros países americanos e também na Europa, vinculava a droga a determinados

grupos populacionais, sobretudo negros, hispânicos, irlandeses e chineses, os quais

foram submetidos ao poder da polícia, transformando o uso de drogas em ‘grave

problema para a saúde pública’ (RODRIGUES, 2008).

No entanto, considerando que a mão de obra trabalhadora deveria

desenvolver sua atividade incansavelmente, o uso de drogas psicoativas não

condizia com a proposta de progresso almejado principalmente pelos EUA, a quem

interessava ter trabalhadores dóceis, submissos, sãos e, acima de tudo, produtivos

(RODRIGUES, 2008).

Desde então, a questão do combate às drogas e das políticas proibicionistas

provocam certa confusão entre o componente proibido, a droga e,

consequentemente, quem consome o item proibido. A ‘guerra às drogas’ passa a ter

como foco, ao que nos parece, quem a consome, indivíduo considerado ‘fora da lei’

e passível de ser submetido aos rigores da segurança pública.

Nesse contexto, outro ponto importante a ser discutido é o aspecto legal.

Classificá-las como lícitas e ilícitas nem sempre leva em consideração o aspecto

prejudicial ou não à saúde. As drogas consideradas lícitas têm a comercialização

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permitida para maiores de 18 anos (como álcool e tabaco) e as ilícitas,

comercialização proibida (SENAD, 2013). Vale lembrar que estamos usando a

palavra comercialização, o que não garante que os menores de 18 anos não irão

consumi-la.

Em levantamento feito pela SENAD dos principais aspectos legislativos sobre

o uso e porte de drogas, para consumo pessoal, envolvendo 10 países da América

do Sul, 6 da América Central, 2 da América do Norte e 29 países europeus, notou-se

que aqueles da América do Sul, proporcionalmente, descriminalizaram o uso de

drogas em detrimento da América do Norte, Central e Europa. No entanto, mesmo

que tenham poucos países europeus que descriminalizaram o uso de drogas ilícitas,

muitos deles utilizam critérios objetivos para distinção entre o uso e o tráfico

(SENAD, 2015).

Outro aspecto que preocupa tanto a sociedade quanto o poder público e as

instituições de segurança pública é o tráfico de drogas, pois percebe-se que suas

tendências de oferta e demanda são desiguais entre regiões e países, bem como

entre os tipos de drogas traficadas (UNODC, 2014; BRASIL, 2005).

No Brasil, estudo feito pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) em 2012

mostra uma faceta ainda mais delicada do tráfico que é o uso de menores como

“mulas” para distribuir o entorpecente nas cidades. As infrações cometidas por

menores demonstram o elevado índice de prisões em decorrência do tráfico,

sobretudo no Sudeste e Sul do país (35% e 21%, respectivamente), sendo que no

Centro-Oeste o índice foi de 12% (CNJ, 2012).

Ainda nesse estudo, quando analisada a idade com a qual os menores

cometeram o primeiro ato infracionário, essa situava-se entre 12 e 17 anos; no caso

do tráfico de drogas, destacaram-se as Regiões Sudeste e Sul, sendo o segundo ato

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infracional mais praticado, com representações de 32% e 24%, respectivamente

(CNJ, 2012).

Além disso, os crimes associados ao uso pessoal ou tráfico cresceram no

período compreendido entre 2003 e 2013, em contraste com aqueles associados a

propriedades e violência, sendo a maioria deles atualmente relacionada à maconha

(UNODC, 2014).

Aliado ao poderoso efeito relaxante e estimulante dessas drogas, de acordo

com Carneiro (2005, p.4), deve-se considerar que “há uma ‘cultura das drogas’ muito

mais ampla do que as estimativas de morbidade ou enfermidades relacionadas a

elas podem expressar”, o que explica a dificuldade em se estabelecer um limiar do

proibido e de se trabalhar com proibições e aspectos de certo ou errado em um

contexto de uso já arraigado na própria história e cultura humanas.

Como exemplos, temos o álcool e o tabaco que, mesmo sendo drogas lícitas,

quando consumidas em excesso geram sérios problemas de saúde e, de certa

forma, sob nossa perspectiva, no caso do álcool, o consumo chega a ser estimulado

pela cultura e mídia do país, assim como foi com o consumo do tabaco décadas

atrás.

Nos dias atuais, as pessoas consomem drogas por diversos motivos: desde

por necessidade de recreação, para expressar a religiosidade, celebrar, até para

aliviar o estresse e a pressão social (BUCHELLE E CRUZ, 2013). Assim, as drogas

antes consideradas exóticas e fascinantes, adquirem um caráter de mercadoria,

integrando-se ao estilo de vida de uma sociedade contemporânea, pautada no

consumismo (BUCHELLE E CRUZ, 2013).

Para avaliarmos a dimensão do uso de drogas no mundo, examinemos

alguns dados. No que diz respeito ao álcool, em 2012, 5,9% de todas as mortes

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globais foram atribuíveis a tal substância. Em 2010, 38,3% da população com mais

de 15 anos de idade consumiam bebidas alcoólicas regularmente, sendo que nas

Américas 61,5% eram consumidores (OMS, 2014).

No Brasil, segundo levantamento feito pela OMS, a prevalência de

consumidores regulares de bebidas alcoólicas em 2012 variou de 40%-59,9% (OMS,

2014).

Em estudo conduzido por Laranjeira et al (2014) sobre álcool e outras drogas

em 2012, observou-se mudança no hábito de consumo de bebidas alcoólicas. Já do

ano de 2006 para 2012 não houve crescimento significativo no número de pessoas

que ingeriram álcool, mas foi observada mudança no número de doses entre

aqueles que o consomem. Entre os participantes que consumiam cinco doses ou

mais, houve crescimento tanto em homens (38%-47%) quanto em mulheres (17%-

27%). Além disso, elevou-se a precocidade de experimentação: entre as mulheres,

passou de 1% para 4% a experimentação antes dos 11 anos, e de 7% para 13%

entre 12 e 14 anos. No entanto, a estabilidade foi mantida entre os homens antes

dos 11 anos (5%) e subiu de 11% para 19% entre 12 e 14 anos. Quanto ao consumo

regular de bebidas alcoólicas, passou de 8% para 14% dos entrevistados que

afirmaram início de consumo regular antes dos 15 anos (LARANJEIRA et al, 2014).

Ainda de acordo com o estudo de Laranjeira et al (2014), em relação ao

tabaco, obteve-se uma prevalência de 16,9% de fumantes, com queda de 19% em

relação a 2006, principalmente entre as classes socioeconômicas D e E, com

redução de 22% entre os homens e de 13% entre as mulheres, no período entre

2006 e 2012. A faixa etária com maior prevalência foi entre 40 e 49 anos, e a de

experimentação por volta de 16 anos, sendo que o consumo regular iniciava-se em

torno dos 17 anos (LARANJEIRA et al, 2014).

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Mesmo que o número de adultos fumantes tenha caído de 20,8% para 16,9%

entre 2006 e 2012, o número de adolescente fumantes (14 a 17 anos) cresceu nas

Regiões Norte e Centro-Oeste, tendo a última obtido maior prevalência (11,9%) em

comparação com o restante do país (3,4%) (LARANJEIRA et al, 2014).

No que se refere às drogas ilícitas, a prevalência de uso e o número de

usuários com transtorno ou dependência mantiveram-se estáveis de 2009 a 2011

(UNODC, 2014). Em 2012, no mundo, o número estimado de pessoas que usaram

drogas ilícitas naquele ano ficou entre 162 e 324 milhões, correspondendo,

respectivamente, a 3,5 e 7% da população mundial com idade entre 15 a 64 anos

(UNODC, 2014). Uma em cada 20 pessoas entre 15 e 64 anos consumiu drogas

ilícitas no ano de 2013, e um em cada dez consumidores era considerado

problemático, o que equivale a cerca de 27 milhões de pessoas sofrendo más

consequências pela dependência (UNODC, 2015). Cerca de metade dos

consumidores considerados problemáticos (12,19 milhões) consome drogas

injetáveis, e, entre estes, foram estimados 1,65 milhões de portadores de HIV em

2013 (UNODC, 2015).

Além disso, estimou-se um total de 183.000 mortes associadas a drogas em

2012, com taxa de mortalidade de 40/1 milhão entre a população com 15 - 64 anos

de idade no mundo (UNODC, 2014). Porém, o que gera preocupação é o fato de

haver uma lacuna na prestação de serviços/cuidados para essa população, sendo

que, em nível mundial, apenas um em cada seis consumidores problemáticos de

droga já teve acesso a serviços de tratamento da toxicodependência a cada ano

(UNODC, 2014).

Mesmo que se disponha de dados sobre o uso de substâncias isoladas,

aspecto importante a ser ressaltado é o hábito de poliuso de drogas. Trata-se de

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uma tendência cada vez mais crescente associada a consequências graves pelo

aumento da toxicidade, overdose e morte. É importante entendermos os padrões de

policonsumo de drogas, visto que esse modo de utilização invalida o perfil de

usuário que tem sido estabelecido e caracterizado pois, até então, considerava-se

apenas o uso de uma droga específica (UNODC, 2014).

Existem três padrões distintos de poliuso de drogas. O primeiro é o uso

simultâneo de substâncias diferentes, para obtenção de efeito cumulativo ou

complementar, por exemplo, o uso comum de maconha e cocaína, que pode ainda

ser usada em combinação com o álcool. O segundo padrão consiste na utilização de

uma droga para reduzir os efeitos adversos de outra, a exemplo da associação entre

cocaína e heroína ("speedball"), ou cocaína e outros opioides. Já o terceiro padrão

está relacionado ao uso de uma droga que está gradualmente substituindo outra em

decorrência de alterações no preço/disponibilidade ou porque a droga está na moda

(UNODC, 2014).

Entre os sexos, nota-se diferença de uso no quesito tipo de droga consumida.

Quando analisado o consumo de drogas ilícitas, os homens são maioria, porém,

quando tomamos o uso nocivo de medicamentos, predominam as mulheres

(UNODC, 2014).

No entanto, os opiáceos ainda são a droga que causa mais preocupação

mundialmente, em geral pela facilidade de overdoses, por ser injetável, o que facilita

a transmissão do HIV, e demandar mais tratamento na Ásia e Europa. A cocaína,

porém, é a mais preocupante na América Latina e no Caribe, sendo a América do

Sul sua principal produtora (UNODC, 2015).

No Brasil, houve aumento do consumo de cocaína nos últimos anos, o que

pode ser explicado pela localização geográfica próxima aos principais países

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produtores (Colômbia, Bolívia e Peru), fato que o situa na rota de distribuição, e pelo

elevado número de pessoas que residem na zona urbana do país (UNODC, 2014).

Também no Brasil, segundo levantamento sobre a prevalência do uso de

cocaína entre 2011 e 2012, as taxas de uso na vida chegaram a 3,9% (4,6 milhões

de pessoas), dos quais 76% a consumiram na forma aspirada e 24% fumada. Na

avaliação particular das 4,6 milhões de pessoas que já experimentaram cocaína,

45% consumiram pela primeira vez antes dos 18 anos, 50% no último ano e, entre

esses últimos, 48% são dependentes, o equivalente a 1 milhão de pessoas. Entre os

que apresentam dependência, 62% são dependentes de cocaína aspirada e 38%

fumada (ABDALLA, MADRUGA, RIBEIRO et al, 2014).

Sobre o consumo de cocaína, devemos relembrar que as folhas de coca são

utilizadas há centenas de anos por moradores da Bolívia, do Peru, da Colômbia e

por povos indígenas na Amazônia em rituais que perpetuam a cultura e que, por

seus efeitos estimulantes, tais folhas sempre foram usadas via mastigação ou na

preparação de chás (BARRETO, 2013). Além disso, os povos andinos as utilizam

como forma de minimizar os efeitos do ar rarefeito nas elevadas altitudes da

Cordilheira dos Andes.

Porém, além do uso cultural e restrito das folhas de coca, temos também o

uso nocivo da cocaína que geralmente é apresentada sob três formas: sal de

hidrocloreto (cocaína em pó), em forma de base-livre (pasta-base) e/ou de pequenos

cristais (crack). A primeira (sal de hidrocloreto) pode ser administrada por via oral,

venosa ou intranasal (aspirada). A segunda, em base-livre, é obtida no processo

inicial de transformação das folhas e utilizada de diversas formas, inclusive

transformada na pedra do crack que é posteriormente fumada (BALBINOT, ALVES,

AMARAL JUNIOR, ARAUJO, 2011).

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Embora apresente a mesma composição química, a cocaína fumada possui

aspecto diferente da aspirada, além de em ambas as formas serem adicionados

diferentes produtos químicos durante a preparação. As formas de cocaína fumada

mais citadas são a pasta-base, o crack e o oxi. São geralmente fumadas em latas de

alumínio, copos, cachimbos ou outros instrumentos improvisados pelos usuários, e

podem ser misturadas a cigarros de tabaco ou maconha ou usadas

concomitantemente com o álcool e/ou tabaco (BALBINOT, ALVES, AMARAL

JUNIOR, ARAUJO, 2011; BASTOS e BERTONI, 2014).

De acordo com Bastos et al (2011), têm sido relatados por membros de

comunidades afetadas pelo uso de crack e suas variantes quatro tipos diferentes de

crack fumado que circulam no Brasil contemporâneo. Seriam as pedras de crack

(derivado de cloridrato de cocaína com a adição de bicarbonato de sódio), a pasta

de coca composta de cocaína em livre-base, a 'merla' (uma preparação com aspecto

pastoso, contendo solventes, especialmente ácidos obtidos de baterias de carro, às

vezes combinados com diferentes solventes orgânicos) e, mais recentemente, a

chamada "oxi", uma forma curta para "oxidação", preparada com restos de pasta de

cocaína aquecidos com gasolina/querosene e cal virgem.

Embora não haja consenso nem estudos que comprovem definitivamente o

surgimento dessa nova e diferenciada apresentação do crack, foi possível observar

diferentes aspectos da pedra denominada “oxi”, os quais parecem variar de acordo

com a proporção dos componentes. Nesse sentido, se as pedras são arroxeadas há

proporções semelhantes de gasolina/querosene e cal; se esbranquiçadas, a

proporção de cal predomina e, se amarelada, há maior proporção de

gasolina/querosene (BASTOS et al, 2011).

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Observa-se que o “oxi” é muito popular no estado do Acre e pode ser

preparado de forma caseira, vendido a um preço muito baixo, mesmo em

comparação com os valores cobrados pela pasta de cocaína e pelo crack, além de

comumente comercializado por varejistas do mercado informal (BASTOS et al,

2011).

Estudo realizado em Recife menciona ainda a utilização de borato de cocaína,

conhecido entre os usuários como “virado”. Trata-se da pedra do crack transformada

em pó, misturada a ácido bórico, substância vendida em farmácias, e inalada, com

efeito menos fissurante que o crack, mas que provoca graves problemas na mucosa

nasal (NAPPO et al, 2012).

Percebe-se assim serem atualmente comuns estratégias dos traficantes para

elaborar formas cada vez mais baratas da cocaína fumada, a fim de facilitar a

acessibilidade da população, assim aumentando o consumo e a dependência.

2.3. POLÍTICAS PÚBLICAS VOLTADAS AO USO NOCIVO DE DROGAS

Antes de pensarmos em políticas de saúde para abordagem do uso nocivo de

drogas, devemos primeiramente discutir aspectos deste uso que são fundamentais

para elaboração de tais políticas. De acordo com Nowlis (1975), devemos considerar

três elementos: a substância, a pessoa que usa e o contexto social e cultural de

quem usa. Os três são altamente complexos em seus processos e constituem elos

de um processo maior. Assim, caso um deles seja ignorado ou tomado de forma

simplificada, é possível que não haja mudança no comportamento de uso nocivo de

drogas psicoativas (NOWLIS, 1975).

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A mesma autora aponta ainda quatro pontos de vista fundamentais sobre o

tema: o ético-jurídico tradicional, o médico ou sanitário, o psicossocial e o

sociocultural, os quais geram modelos que englobam também os três elementos já

mencionados (a substância, a pessoa e o contexto) (NOWLIS, 1975).

O ético-jurídico enfatiza a droga classificando-a em inofensiva ou perigosa, o

que justifica a necessidade de afastar as pessoas de tais riscos, a todo custo:

usando de ameaça, amedrontamento, exposição de grandes danos físicos,

psicológicos e sociais que as drogas causam, além do aumento do custo e combate

à comercialização. Esforços são empenhados no sentido de aplicar medidas legais

ao cultivo, à posse, à venda e à distribuição da droga. Percebe-se, por

consequência, uma divisão também entre os indivíduos: aqueles que usam a droga

lícita ou a ilícita (NOWLIS, 1975).

Já no modelo médico ou sanitário, a substância, a pessoa e o contexto se

transformam em agente, hospedeiro e meio ambiente, respectivamente, semelhante

ao modelo utilizado para doenças infecciosas, sendo que a droga assume um papel

principal, com enfoque nas que causam dependência. A diferença em relação ao

modelo anterior é que não se restringe às drogas ilícitas, englobando em seu campo

de trabalho substâncias lícitas, como o cigarro, por exemplo (NOWLIS, 1975).

O modelo psicossocial, por sua vez, tende a atribuir mais valor ao indivíduo

considerando a tríade substância-indivíduo-contexto. Nessa abordagem, a pessoa e

seu contexto configuram a relação que carece de intervenção, sendo de interesse o

grupo de convivência por sua influência no comportamento de uso da droga. Esse

modelo propõe soluções muitas vezes aplicáveis a outros problemas que não

apenas o do uso de drogas (NOWLIS, 1975).

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O modelo sociocultural leva em conta a complexidade e variabilidade do

contexto no droga-indivíduo-contexto. Assim, a importância de determinada droga

depende mais do modo como a sociedade concebe o seu uso, das pessoas que a

consomem e da relação entre eles do que de suas propriedades farmacológicas. A

preocupação está voltada para a questão do caráter destrutivo da substância em

questão, tanto lícita quanto ilícita, uma vez que se causar comportamentos

considerados inapropriados, esse indivíduo sofrerá reações por parte da sociedade

(NOWLIS, 1975).

A autora deixa claro que cada um dos elos droga-homem-contexto constitui

uma lente para visualizar o homem, a droga, a sociedade e suas interações, o

número e os tipos de discriminações presentes no interior de cada elemento, a

natureza das reações e a capacidade das diversas instituições e profissões em

processos mais eficazes de intervenção (NOWLIS, 1975).

Mas como a questão do uso de drogas foi vista ao longo da história da

humanidade? E como isso interferiu nas políticas? O que se nota a respeito da

aceitabilidade ou não das drogas é que com a expansão europeia pelo mundo, nas

sociedades pré-capitalistas, a grande produção de mercadorias abrangeu também

as drogas, tornando-as mercadorias comercializáveis, difundindo mundialmente

diversas substâncias psicoativas, divergindo, portanto, do antigo e restrito uso em

rituais específicos (CARNEIRO, 2005; TRAD, 2004). Quando as drogas começaram

a ser utilizadas de forma compulsória, provocaram prejuízos sociais, econômicos e

de saúde ao indivíduo e, então, tornaram-se objeto de discussão mundial, tendo sido

inicialmente perpetradas medidas proibicionistas no sentido de evitar o tráfico entre

países. Contudo, posteriormente, essas medidas se perpetuaram nas políticas

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internas de diversas nações (NOWLIS, 1975; TRAD, 2004; CARNEIRO, 2005;

VENTURA, 2011).

No Brasil, até 1900, não se tinha qualquer medida restritiva à utilização de

drogas psicotrópicas, pois seu uso era restrito a jovens ricos que as consumiam em

prostíbulos. Em 1921, porém, com a difusão do uso dessas substâncias por classes

tidas como ‘perigosas’ (jovens pobres, pardos, imigrantes) foi instituída pelo governo

uma lei proibindo o uso de ópio, morfina, heroína e cocaína, exceto se administradas

por recomendação médica. Caso contrário, seria passível de punição (EDITORIAL,

2009; FANTAUZZI, AARÃO, 2010). Também em 1921, publicou-se o Decreto 14.969

de 1921, que determinava a criação dos sanatórios para toxicômanos (VENTURA,

2011).

Tal conduta proibitiva, difundida em grande parte da América e Europa,

decorreu também de convenções e tendências internacionais e manteve-se vigente

no país, colocando as pessoas que faziam uso de drogas em isolamento, com

abordagem voltada à segurança pública em virtude da necessidade e justificativa de

se manter a ordem entre a população (EDITORIAL, 2009; MOTA, RONZANI, 2013).

No Brasil, após o golpe militar de 1964, a droga passou a ser considerada

elemento de subversão e, seguindo tendências nacionais e internacionais, os

investimentos foram gradativamente mais direcionados ao seu combate (VENTURA,

2011).

A partir da década de 70, além de manter o caráter proibicionista, houve a

patologização do uso de drogas, fato que reafirmou a necessidade de repressão e

ausência total de consumo, agora com apoio de novos dispositivos, tais como os

hospitais psiquiátricos, voltados para as drogas ilícitas. Neste momento, o usuário

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passou a ser considerado doente, além de criminoso (VENTURA, 2011; MOTA,

RONZANI, 2013).

Leis como a nº 5.726 de 1971, que estabeleceu a relação de igualdade entre

usuários e traficantes, passíveis de serem condenados com até seis anos de pena

privativa de liberdade, são propostas sempre com vistas à criminalização do uso de

drogas. Tais leis, até os anos 80 e 90, eram voltadas quase que exclusivamente

para os jovens pobres, deixando o tratamento disponível apenas para aqueles de

classes mais favorecidas (VENTURA, 2011).

Somente por volta dos anos 80 e 90 o tratamento do dependente de drogas

centrado na coibição, abstinência e punição de grupos específicos começou a tomar

nova forma após o início da epidemia do HIV/AIDS, que alterou a concepção de

grupos de risco para de vulnerabilidade. À época, também contribuiu para esta

mudança a implementação de ações de redução de danos como resposta à

necessidade de novas abordagens a situações tão complexas, envolvendo

definitivamente o campo da saúde no contexto do usuário de drogas (MACHADO,

BOARINI, 2013; MOTA, RONZANI, 2013).

Em 1998, durante a XX Assembleia Geral das Nações Unidas, em sessão

especial voltada para o problema do uso nocivo de drogas, aprovou-se a Declaração

dos Princípios Orientadores da Redução da Demanda de Drogas, que se revelou um

direcionador para o Brasil no processo de construção de um modelo para controle da

demanda e oferta de drogas. A partir de então, o Brasil, assim como os demais

países, deu início à construção de uma diretriz nacional sobre drogas amparada em

políticas e acordos internacionais (VENTURA, 2011; DUARTE, DALBOSCO, 2014).

O então vigente Conselho Federal de Entorpecentes (CONFEN) passou a ser

denominado Conselho Nacional Antidrogas (CONAD), e criou-se, por meio da

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medida provisória nº 1669 de 1998, a Secretaria Nacional Antidrogas (SENAD),

vinculada à então Casa Militar da Presidência da República. Assim, a SENAD ficava

responsável por criar uma política específica para o tema, fato ocorrido em 2002, por

Decreto Presidencial nº4.345 de 26 de agosto. Surgia, então, a Política Nacional

Antidrogas (PNAD) (DUARTE, DALBOSCO, 2014).

Com as transformações sociais, políticas e econômicas vividas pelo país

nessa época, emergiu a necessidade de reavaliar a PNAD, com vistas a uma

abordagem menos voltada para ações punitivas e mais dirigida a ações de

prevenção do uso e reinserção social do usuário (DUARTE, DALBOSCO, 2014).

Assim, em 2006, pela ação e assessoramento via SENAD, aprovou-se a Lei

nº 11.343, o que demonstra avanço considerável no direcionamento das ações para

o manejo do uso de drogas, por ter diferenciado usuários de traficantes e incluído

ações de advertência, prestação de serviços à comunidade e medidas

socioeducativas (VENTURA, 2011; DUARTE, DALBOSCO, 2014).

Mais tarde, em 2008, instituiu-se a Lei nº 11.754, por meio da qual o Conselho

Nacional Antidrogas passou a ser denominado Conselho Nacional de Políticas sobre

Drogas (CONAD). Alterou-se ainda a nomenclatura da Secretaria Nacional

Antidrogas para Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas (SENAD) (BRASIL,

2008a). Nesse contexto, a ação do CONAD foi descentralizada no que se refere ao

trabalho dos conselhos estaduais e municipais de políticas sobre drogas.

No que concerne ao álcool, em 19 de junho de 2008, por meio da Lei nº

11.705, conhecida como “Lei Seca”, o código de trânsito foi alterado e o motorista

com qualquer concentração de álcool no sangue passou a ficar sujeito a medidas

administrativas e penalidades, além de ter sido proibida a venda de bebidas

alcoólicas com teor superior a 0,5 Graus Gay-Lussac. As medidas administrativas e

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penalidades tornariam-se mais severas com a Lei 12.760 de 2012, por ter

autorizado, para os casos em que o condutor se recusasse a fazer o teste com o

etilômetro ou bafômetro, mais comumente conhecido, a utilização de outros meios,

tais como exame clínico, teste de alcoolemia ou até mesmo gravações (BRASIL,

2008b; 2008c).

Quanto ao tabaco, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) (Lei 8.069

de 13 de julho de 1990) proíbe vender, fornecer ou entregar, à criança ou ao

adolescente, produtos cujos componentes possam causar dependência física ou

psíquica. Além do ECA, temos leis que proíbem o uso de produtos fumígeros em

recintos fechados coletivos ou privados (Lei 9.294 de 1996) (BRASIL, 1996). Há

também lei que proíbe o patrocínio de eventos esportivos internacionais por marcas

de cigarros e determina que sejam difundidas advertências sobre os efeitos

maléficos do tabagismo em eventos esportivos (Lei 10.702/2003). A taxação de

produtos derivados de tabaco e o aumento dessas taxas foram estabelecidos pelos

Decretos 6.006/2006 e 6.072/2007, respectivamente.

De acordo com Mota e Ronzani (2013), as medidas adotadas no país, tanto

as proibitivas quanto as medicalizantes, podem coexistir, o que muitas vezes leva a

uma divergência de ideias entre ambas, a exemplo da criminalização e redução de

danos: de um lado, uma entende ser legítima a internação compulsória e, do outro,

há o entendimento da ineficácia da abstinência total.

Com a publicação da Política Nacional Sobre Drogas (PNAD), o manejo da

pessoa que faz uso nocivo de drogas passou a contemplar ações nos aspectos de

prevenção; tratamento, recuperação e reinserção social; redução dos danos sociais

e da saúde; redução da oferta de drogas e estímulo e amparo a estudos, pesquisas

e avaliações (BRASIL, 2005). Já o trabalho da SENAD, que é parte integrante do

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Ministério da Justiça, está pautado em três eixos referentes a: atividades voltadas

para a realização do diagnóstico situacional por meio de levantamentos sobre o uso

de drogas nos diversos grupos sociais; capacitação de agentes do SISNAD por meio

de cursos de formação para todas as pessoas que trabalham com quem faz uso de

drogas; e planos estratégicos, como parcerias entre os estados, cooperação

internacional e informação à população como um todo, entre outros (DUARTE,

DALBOSCO, 2014).

Aspecto importante abordado na PNAD é a questão do trabalho em redes de

atenção que, no caso do atendimento ao uso nocivo e à dependência de drogas,

denomina-se Rede de Atenção Psicossocial (RAPS), regulamentada em 2011 por

meio da Portaria nº 3088.

A PNAD preconiza a conformação de uma rede assistencial integrada e

articulada, que contemple ações de prevenção, tratamento e reinserção social,

redução de danos e da oferta, estudos e pesquisas sobre o tema.

A RAPS é constituída por instituições governamentais, não governamentais e

privadas vinculadas ao Sistema Único de Saúde e Sistema Único de Assistência

Social. É composta por unidades básicas de saúde, ambulatórios, Centro de

Atenção Psicossocial (CAPS), Centro de Atenção Psicossocial Álcool e Drogas

(CAPSAd), (que são centros com atuação de equipe multiprofissional com atuação

em área territorial específica), serviços de residências terapêuticas (que são

moradias inseridas na comunidade, destinadas a acolher pessoas egressas de

internação de longa permanência), grupos de autoajuda e ajuda mútua, hospitais

gerais e psiquiátricos, hospital-dia, serviços de emergência, corpo de bombeiros,

clínicas especializadas, casas de acolhimento, comunidades terapêuticas, entre

outros (BRASIL, 2011).

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Entre os anos de 2006 e 2007, realizou-se uma caracterização dessa rede

assistencial com mapeamento das instituições de atenção às questões relacionadas

ao consumo de álcool e outras drogas no país, com 9.503 instituições mapeadas

entre governamentais e não governamentais (CARVALHO, 2007). O mapeamento

mostrou predomínio de instituições não governamentais, em especial Comunidades

Terapêuticas (38,5%), o que, segundo Alves e Lima (2013), expressa resistência

tanto do modelo de internação quanto da abstinência total.

No contexto do campo da saúde, a história da conformação do arcabouço de

políticas voltadas ao uso nocivo/dependência de drogas está atrelada ao da saúde

mental. Comecemos pela reforma psiquiátrica - um marco nas ações de Saúde

Mental no país. Até então, no Brasil, a saúde de pessoas com transtornos mentais

e/ou com problemas relacionados à dependência de drogas era trabalhada por meio

da internação em hospitais psiquiátricos e cerca de um terço dessas internações era

de pessoas que faziam uso nocivo ou eram dependentes de álcool e outras drogas.

A questão do uso nocivo/dependência de álcool e outras drogas esteve à margem

da discussão que se ampliou com a reforma psiquiátrica, a qual focalizou os debates

sobre práticas de saúde nos transtornos mentais (ALVES, LIMA, 2013).

A partir dos anos 2000, novamente alguns acontecimentos redirecionaram as

discussões e a formulação de ações voltadas para as pessoas que fazem uso nocivo

ou são dependentes de álcool e drogas. No ano seguinte, em 2001, ocorreu a III

Conferência Nacional de Saúde Mental, em que ficou explícita a proposta dos

serviços ambulatoriais e de base comunitária, bem como a lógica da redução de

danos para tal assistência. Nesse mesmo ano foi promulgada a Lei n° 10.216 que,

pautada nos direitos humanos, conferiu visibilidade aos direitos das pessoas

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portadoras de transtornos mentais e redirecionou o modelo assistencial em saúde

mental (BRASIL, 2001).

Pouco depois, em 2002, houve a promulgação da Portaria 336 de 19 de

fevereiro de 2002 que inseriu definitivamente a temática do uso nocivo/dependência

de drogas nas ações de saúde pública e saúde mental, regulamentando o

funcionamento dos CAPSAd (Centro de Atenção Psicossocial Álcool e drogas).

Já em 2003, via Ministério da Saúde, publicou-se a Política para Atenção

Integral a Usuários de Álcool e outras Drogas (BRASIL, 2003). Para Machado

(2006), o processo de construção e implementação de tal política pautou-se na

mudança do cenário da saúde no Brasil, por sua vez promovida pela implementação

do Sistema Único de Saúde (SUS), da política de reestruturação da atenção em

saúde mental, da política de prevenção ao HIV/AIDS e, sobretudo, pela iniciativa dos

programas de redução de danos (MACHADO, 2006).

Nesse sentido, a Estratégia de Redução de Danos (RD) reveste-se de

fundamental importância por ter contribuído para uma nova forma de abordagem de

quem faz uso nocivo ou é dependente de drogas. De acordo com Machado, Boarini

(2013), tal estratégia tem suas bases mais expressivas na Holanda, a partir de um

movimento social em prol dos usuários de drogas injetáveis com trocas de seringas

e que se difundiu para outros países como Canadá, França, Inglaterra e Escócia,

defrontando com as concepções proibicionistas dos Estados Unidos.

No Brasil, foi a partir da década de 80, com a epidemia da AIDS, que a

estratégia ganhou força na cidade de Santos, em 1989. No entanto, sofreu várias

críticas e resistência, principalmente por parte da Igreja Católica e de órgãos de

segurança pública (MACHADO e BOARINI, 2013). Evidencia-se, dessa forma, o seu

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caráter contestador e de luta de direitos à igualdade de assistência a um grupo

populacional tão discriminado.

De forma gradual, a noção de grupo de risco, centrada no indivíduo, cedeu

lugar ao entendimento de comportamento de risco, assim compreendendo que toda

a população deveria ser alvo de ações. Posteriormente, adotou-se a concepção de

vulnerabilidade, ou seja, os contextos social, político e econômico também devem

ser considerados nas ações de saúde, o que possibilitou que a estratégia de

redução de danos fosse melhor entendida e aceita no âmbito brasileiro (MACHADO

e BOARINI, 2013).

O ano de 2005 marcou a promulgação da política de redução de danos, cujas

ações são voltadas a informação, educação e aconselhamento; assistência social e

à saúde e disponibilização de insumos de proteção à saúde e prevenção ao

HIV/Aids e hepatites (BRASIL, 2005). Houve, portanto, um avanço no que se refere

à abordagem de pessoas que fazem uso nocivo ou são dependentes de drogas.

Porém, o estigma que permanece associado ao uso da droga e a ausência de

profissionais capacitados para uma abordagem adequada dificultam a aproximação

da sociedade, do poder público e do setor saúde a essa população vulnerável

(ANDRADE, 2011).

Diante da problemática configurada pelo uso nocivo/dependência de crack no

país, foi publicado em 20 de maio de 2010 o decreto nº 7179 que instituiu o Plano

Integrado de Enfrentamento ao Crack e outras Drogas por meio da criação do

Comitê Gestor. Em dezembro de 2011, sob coordenação do Ministério da Justiça, o

programa “Crack é possível vencer”, em parceria com os Ministérios da Saúde e do

Desenvolvimento Social e Combate à Fome, da Educação e Secretaria de Direitos

Humanos.

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O programa propõe ações no aspecto da prevenção (por meio de educação,

disseminação de informações e capacitação de diferentes agentes sociais), cuidado

(aumentar a oferta de ações de atenção aos usuários de crack) e autoridade

(enfrentamento do tráfico e das organizações criminosas).

Pelegrini (2015) discute sobre as políticas voltadas para quem faz uso nocivo

ou é dependente do crack apontando para a ineficácia das políticas e programas

desenvolvidos até agora para essa população (PELEGRINI, 2015). Para o autor, e

na nossa visão, é notável que o enfoque em ações de segurança pública não

resolveu a situação das pessoas que são dependentes de crack e que medidas

como o programa “De braços abertos” desenvolvido pela prefeitura de São Paulo,

em que os usuários de crack são direcionados à ações conjuntas das secretarias de

assistência social, saúde, educação, segurança, habitação e de trabalho, para

obtenção de trabalho, moradia e assistência de sua saúde.

Medidas como a citada na cidade de São Paulo talvez consigam alcançar de

maneira mais efetiva a problemática da dependência do crack uma vez que não

focam no uso da droga e sim a condição de vulnerabilidade social em que essas

pessoas se encontram.

Achamos que ainda há descompromisso do estado com ações efetivas

mesmo com todo um arcabouço de polícias voltadas para quem é dependente de

crack e outras drogas, além da concentração e expansão desregrada dos serviços

oferecidos pelas comunidades terapêuticas que apresentam, muitas vezes, estrutura

física inadequada e profissionais em quantidade incipiente e pouco preparada para

lidar com essa população.

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2.4. VULNERABILIDADE DO USUÁRIO DE CRACK

Como mencionado anteriormente, a vulnerabilidade é um tema relativamente

novo no âmbito da saúde e tornou-se proeminente a partir da década de 80, com o

propósito de melhor interpretar o fenômeno da infecção pelo HIV e ampliar as

discussões sobre o conceito de risco, até então muito utilizado. O risco mostrou-se

individualizante e voltado para objetos e não sujeitos, tornando as ações

consequentemente pouco abrangentes, ligadas a contextos específicos (MUNOZ

SANCHEZ e BERTOLOZZI, 2007).

Um entendimento sobre a vulnerabilidade, que aqui chamaremos de

vulnerabilidade social, refere-se a uma forma de compreender as situações de

âmbito social que expõem as pessoas a situações que implicam consequências

negativas e prejudiciais à qualidade de vida. Porém, é importante deixarmos clara a

diferença entre vulnerabilidade e exclusão social.

A discussão sobre a exclusão teve origem na França, no fim do século XX, e

inicialmente referia-se a diversos problemas sociais. O conceito de exclusão era

empregado para caracterizar situações extremas de pobreza que abarcavam o

isolamento socioeconômico. As críticas acerca do termo exclusão social envolvem

três pontos principais: o caráter estático que esse sugere, permitindo inferir que o

indivíduo, supostamente excluído, não tem chance de sair dessa condição; o uso

errôneo do termo em países em desenvolvimento, os quais nunca experimentaram o

nível de integração social plena, não tendo embasamento para diferenciar a

integração da exclusão; e o fato da exclusão ser uma situação que não vem

acompanhada de causa, motivo, origem, deixando o aspecto do trabalho deteriorado

fora da pauta de discussão sobre exclusão ou inclusão (DEDECCA et al, 2007). Ou,

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como alerta Castel (2013), “falar em termos de exclusão é rotular com uma

qualificação puramente negativa que designa a falta, sem dizer no que ela consiste

nem de onde provém” (CASTEL, 2013, p.31).

Associado a isso, com a crise do padrão de desenvolvimento impulsionado no

período pós-guerra e as mudanças no mercado econômico mundial, como abertura

do mercado e novas estratégias adotadas pelas empresas para vencer a

concorrência, modificou-se o cenário do capitalismo contemporâneo. Tais mudanças

levaram à precarização do trabalho e geraram insegurança até mesmo para os

trabalhadores dos países desenvolvidos, além de terem aumentado o desemprego

de longa duração nos países em desenvolvimento (DEDECCA et al, 2007).

É nesse cenário de precarização do trabalho, no final dos anos 90, que o

conceito de vulnerabilidade começou a ser desenvolvido em novos estudos,

primeiramente relacionado ao mundo do trabalho (DEDECCA et al, 2007).

Os países de passado colonial diferem daqueles que vivenciaram o

feudalismo na Europa Ocidental, os quais, mesmo se baseando na exploração de

grande parte do povo, com uma política ativa nas revoluções burguesas,

conseguiram se libertar. Por outro lado, as colônias de exploração, entre elas o

Brasil, assim se mantiveram por muito tempo, com processos de independência

pautados em mudanças superficiais que perpetuaram a desigualdade de classes

(GUERRA, POCHMANN, SILVA, 2014).

Os mesmos autores afirmam que as revoluções sociopolíticas promoveram

uma maior capacidade de controle social na Europa. Sendo assim, países que não

desenvolveram o mesmo senso de contestação e revolução social tendem a

apresentar maior alienação política e condicionamento de grande parte de sua

população à vulnerabilidade social (GUERRA, POCHMANN, SILVA, 2014).

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Porém, a vulnerabilização social do trabalhador também ocorreu na Europa

durante a revolução industrial, e pode ser explicada pela precarização das condições

do trabalho, já mencionada, e falta de oportunidades no mercado de trabalho,

consequências da difusão e do avanço da política neoliberal (POCHMANN e

AMORIM, 2003; CASTEL, 2010).

Nos países em desenvolvimento, como os da América Latina, a

vulnerabilidade social gira em torno do risco de desemprego e da precariedade do

trabalho, da pobreza e da falta de proteção social (DEDECCA, 2007). Nesse

contexto, é necessário o retorno aos fundamentos dessa vulnerabilidade, iniciada

com a colonização e exploração que fundaram sua estrutura social e econômica.

No entanto, mesmo após a independência, o Brasil manteve a profunda

desigualdade socioeconômica acompanhada de precária assistência à população. A

partir do século XX, mais especificamente de 1960 a 1980, o país experimentou uma

fase de aumento do número de empregos formais, porém, ampliava-se também a

vulnerabilidade social entre parcelas da população antes preservadas, como os

jovens de elevada escolaridade, pessoas com mais de 40 anos, homens não negros

e famílias monoparentais, isto é, constituídas por apenas um dos cônjuges

(POCHMANN E AMORIM, 2003).

Entre 1980 e 2000, esse cenário se modificou e tivemos, portanto, a

diminuição da composição no número total de empregos formais, além da ampliação

do desemprego estrutural e da precarização das condições de trabalho

(POCHMANN E AMORIM, 2003).

Segundo Guerra, Pochmann e Silva (2014), os brasileiros sempre

vivenciaram fases de crescimento econômico desvencilhadas de distribuição de

renda e redução da desigualdade socioeconômica. A partir de 2004, com a ativação

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do mercado interno e por meio de políticas de distribuição de renda, o enfrentamento

à vulnerabilidade foi mais expressivo. Todavia, o país está entre os quinze mais

desiguais do mundo, com diferenças importantes na distribuição de renda entre as

regiões, que se perpetuam ao longo dos anos.

Guerra, Pochmann, Silva (2014) discutem a vulnerabilidade social no Brasil

com base em sete variáveis principais que envolvem exposição à violência,

autoconhecimento, pertença social, ocupação laboral, poder criativo e de iniciativa

com percepção do mundo, acesso à informação e cultura e poder de consumo.

Avaliando esses aspectos nos municípios brasileiros, em 2010, as regiões com pior

situação foram a Norte e Nordeste.

Pelo exposto acima, concordamos com Wanderley (2013) que entende que à

medida que a industrialização se estabeleceu nos países latino-americanos, a

questão social e sua imbricada rede de transformações tornaram-se cada vez mais

parecidas com a realidade europeia, o que não impede ou compromete utilizar

referenciais de vulnerabilidade social europeus para discussões da realidade

brasileira.

Dessa forma, optamos por utilizar a vulnerabilidade social como alicerce do

nosso estudo, por ser mais abrangente, possuir caráter processual e não engessar

as pessoas em situações de vida desfavoráveis de modo definitivo (DEDECCA, et al

2007; CASTEL, 2010). Dessa forma, embasaremos nossa discussão na visão do

sociólogo francês Robert Castel, que lança luz sobre a vulnerabilidade social

vivenciada pelos países europeus e, mais especificamente a França, durante sua

construção como nação.

Castel (2010) considera que o indivíduo está sob a proteção de dois eixos: o

do trabalho e o da inserção relacional em redes familiares e de sociabilidade. Para o

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autor, ambos se complementam e a fragilidade de um pode ser compensada pela

estabilidade do outro.

No eixo da sociabilidade, Castel (2010) discute a existência da sociabilidade

primária, desenvolvida no seio familiar, com vizinhos ou colegas de trabalho, por

meio de sistemas de regras que promovem ligação entre os membros e, ao mesmo

tempo, interdependência, sem que haja, nessas relações, interferência de

instituições. E a sociabilidade secundária, proporcionada pela assistência do Estado.

Dessa forma, mesmo que o indivíduo não esteja empregado, ele pode ser amparado

por uma rede de relações sociais.

No caso do eixo do trabalho, a pessoa pode estar vinculada tanto a um

emprego estável quanto a um com condições precárias, informal ou, ainda, pode

não ter trabalho algum, portanto, sem fonte de renda. E no caso do eixo relacional a

pessoa pode ter suporte relacional, estar vulnerável com relações frágeis ou estar

afastado da família, amigos e comunidade (CASTEL, 2010).

A densidade das relações sociais, juntamente com uma estabilidade no

trabalho, influencia diretamente o nível de integração dos indivíduos na sociedade.

Dependendo da qualidade desses vínculos, tanto social quanto com o trabalho, o

indivíduo flutua por diferentes zonas, as quais Castel denomina Zona de Integração,

Zona de Vulnerabilidade, Zona de Assistência e Zona de Desfiliação (CASTEL,

2010).

A Zona de Integração caracteriza-se por relações sociais estáveis e

estabilidade no trabalho. A Zona de Vulnerabilidade, que tem cada vez mais se

expandido nas sociedades, apresenta relações sociais frágeis e instabilidade laboral.

A Zona de Desfiliação está associada à exclusão do mercado de trabalho e à

ausência de vínculos familiares e sociais de modo geral (CASTEL, 2010).

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Uma boa inserção relacional tende a compensar a precariedade/ausência do

trabalho. Tal quadro compõe outra zona, denominada Zona da Assistência, em que

há dependência de maneira segurada/integrada. O indivíduo, apesar de muitas

vezes não possuir um vínculo empregatício, conta com apoio, assim evitando a

desfiliação. Dessa forma, há quatro zonas que compõem a variação situacional do

indivíduo, considerando-se os eixos da inserção laboral e inserção relacional

(CASTEL, 1994).

Castel (2010) ressalta que tais zonas não são engessadas, mas permeadas

pela oscilação, ou seja, caso uma crise econômica se instale no país, a zona da

vulnerabilidade se expande comprimindo as outras, por exemplo.

Algumas pontuações são importantes. A primeira é sobre a porosidade entre

as fronteiras das referidas zonas, sobretudo no que diz respeito à de desfiliação, que

se expande sobre a de vulnerabilidade em situações de precariedade de trabalho e

fragilidade relacional (CASTEL, 1994).

A segunda refere-se ao fato da questão laboral ter menos reflexo sobre a

relação Integração-Desfiliação, visto que em uma sociedade onde a maioria das

pessoas é pobre, o temor é da miséria que leva à uma dependência do Estado, com

relações sociais precarizadas ou desfeitas e que necessitam de assistência

(CASTEL, 1994).

Esquematicamente, a Figura 1 nos mostra como a vulnerabilidade social pode

acometer a pessoa quando há isolamento relacional ou ausência de inserção

laboral. Além disso, quando não se tem inserção laboral nem relacional, temos a

desfiliação. Na zona de integração, observam-se os dispositivos do eixo do trabalho

e da inserção relacional. A zona de Assistência encontra-se no eixo negativo do

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trabalho, ou seja, a pessoa não apresenta qualquer atividade laboral ou vínculo

relacional.

No entanto, o Estado, por meio de programas, políticas ou atividades, tenta

suprir a falta desse vínculo relacional. Esse indivíduo não é considerado na zona de

integração porque não está integrado nem no aspecto do trabalho nem do relacional

e, portanto, encontra-se na zona de Assistência, que serve de amparo temporário e,

na maioria das vezes, não consegue integrar efetivamente quem recebe essa

assistência.

Figura 1 – Interação entre os eixos do trabalho e da inserção relacional

Fonte: elaborada pela autora, com base em Malfitano (2007) e Gontijo, Medeiros (2009)

Os desfiliados, ou como Castel descreve, os ‘inúteis para o mundo’ não

chegaram à zona de desfiliação, na maioria das vezes, de forma imediata. Da

situação de vulnerabilidade, os pobres, percorrem uma trajetória até essa

desfiliação. Discutiremos a seguir dois aspectos abordados por Castel (1994; 2010):

os vínculos relacionais e a inserção no mercado de trabalho, para melhor

Inserção relacional

Isolamento relacional

Trabalho Não Trabalho

Zona de Integração

Zona de Vulnerabilidade

Zona de Vulnerabilidade

Zona de Desfiliação

Zona de Assistência

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entendimento dos fatores que influenciam no movimento que ocorre entre

integração/vulnerabilidade/desfiliação.

Comecemos pela família, um dos fundamentos da sociabilidade do ser

humano. Ela faz parte da sociabilidade primária que também envolve o

pertencimento à vizinhança e a rede relacional no trabalho. Tais relações são

interdependentes e não dispõem de instituições intermediárias (CASTEL, 2010).

A configuração da família e os papéis desempenhados por seus membros

estão intimamente ligados ao contexto político e econômico configurado ao longo do

tempo (MARTINS, FERRIANI, 2008).

O modelo da família brasileira advém da europeia, perpetuada por meio da

colonização. Esse modelo se estabeleceu com a Revolução industrial visando

preparar e preservar a força de trabalho. O pai poderia trabalhar na indústria, a mãe

cuidaria da casa e dos filhos, visando futuros adultos disciplinados (MARTINS,

FERRIANI, 2008).

No entanto, a partir do século XX, podemos perceber uma mudança na

estrutura familiar patriarcal. A mulher vivenciou um processo de autonomia e

liberdade sexual, com o aperfeiçoamento dos métodos anticoncepcionais e da

inseminação artificial na década de 70, e assim passou a escolher se teria ou não

filhos (MARTINS, FERRIANI, 2008).

O adiamento do casamento, a falta de tempo para estar em casa e o

individualismo crescente têm contribuído para mudanças nas famílias, de forma que

os laços que envolvem seus membros se tornam cada vez mais frágeis (IBGE,

2009).

Porém, é equivocado pensar que toda a responsabilidade pelo

comportamento dos indivíduos é da família, uma vez que o contexto social e

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econômico influencia diretamente no desenvolvimento e na socialização desde a

infância (MARTINS, FERRIANI, 2008).

A inserção laboral, outro pilar que pode ou não contribuir para a integração

social do homem, está relacionada à configuração do modo de produção capitalista

que, inicialmente, exerceu poder sobre o homem na transformação da sua natureza,

moldando-o ao ambiente de trabalho das fábricas. Com o decorrer das décadas, a

produção de materiais foi sendo ampliada para o setor de serviços, assim

envolvendo processos cognitivos e comunicativos do mundo subjetivo do homem

(TAGLIAMENTO, TONELI, 2010). Dessa forma, de acordo com os mesmos autores,

o homem tornou-se “sujeito e objeto do trabalho” (TAGLIAMENTO, TONELI, 2010,

p.346).

Pensando que no mundo contemporâneo o homem tem sua vida, em todos os

aspectos, subordinada ao modo de produção e mercado de trabalho, torna-se

penoso permanecer nesse padrão, visto ser compreensível que muitos não se

adequem aos moldes estabelecidos, os quais os mantêm reféns de um padrão de

consumo que propõe uma necessidade constante de preparação para o mercado de

trabalho.

Castel (1994, 2010) discute a situação de crianças, idosos, famílias

monoparentais, que constituem grupos da sociedade que necessitam das políticas

de assistência. O autor cita ainda os “indigentes válidos”, pessoas que mesmo não

apresentando qualquer impedimento psíquico ou físico para o trabalho não

conseguem emprego e se mantêm nessa situação por um longo tempo (CASTEL,

2010). São indivíduos em uma situação complexa porque não são considerados

dignos da assistência e não apresentam os requisitos necessários para o mercado

de trabalho.

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Aborda-se, portanto, o “indigente válido” como aquele suscetível, entre outros

malefícios, ao uso nocivo de drogas lícitas e ilícitas, sobretudo quando enfrenta uma

situação em que não está inserido em uma rede relacional que lhe dê suporte e não

possui um trabalho que lhe promova estabilidade laboral, por não apresentar

requisitos exigidos pelo mercado, como educação escolar formal, experiência

profissional ou indicação de algum empregador.

Nesse sentido, a vulnerabilidade social expõe o indivíduo ao uso nocivo de

drogas, lícitas ou ilícitas, numa forma de aliviar a tensão sofrida pelo desajuste

relacional ou laboral. No entanto, o contrário também é verdadeiro, isto é, o indivíduo

que faz o uso nocivo ou é dependente de drogas pode apresentar, na visão da

sociedade, um comportamento que não condiz com o que essa sociedade exige, ou

seja, roubar, usar de violência, apresentar comportamento sexual de risco. Dessa

forma, consideramos que esse indivíduo sofrerá isolamento e estará sujeito a uma

situação de desfiliação. Nesse sentido, o uso de drogas e a situação de

vulnerabilidade social/desfiliação estão interligados.

Acresce-se que a diversidade de opiniões sobre o uso de drogas ilícitas tem

mantido uma visão muitas vezes equivocada de quem é dependente, principalmente

do crack. A ideia de que o crack é uma droga nova e não uma variação da via de

uso da cocaína alardeia a população e se torna palco de exploração da mídia.

Dessa forma a mídia contribui para uma visão, muitas vezes equivocada a

respeito de quem usa o crack uma vez que que impregna nas pessoas uma imagem

reducionista daqueles que são dependentes, dificultando aproximação, amparo e

apoio do Estado, da sociedade e dos profissionais de saúde (ROMANINI, ROSO,

2013; ROSO, 2013).

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De acordo com Nappo, Sanches, Ribeiro (2012), as taxas de uso na vida e

nos últimos 12 meses no Brasil demonstram ser necessário refletir se há realmente

uma epidemia de cocaína ou crack (NAPPO, SANCHES, RIBEIRO, 2012). Por outro

lado, os dependentes de crack estão no anonimato e, portanto, são de difícil acesso

e abordagem, o que os leva a uma condição cada vez mais imersa no isolamento e

na invisibilidade (SENAD, 2013).

O primeiro relato da existência do crack no Brasil foi no final dos anos 80, e a

primeira apreensão em 1991, coincidindo com uma fase de rápida disseminação do

HIV (NAPPO et al, 2004; NAPPO et al, 2012; RODRIGUES, et al, 2012). Assim,

essa associação contribuiu para que a droga tivesse preferência entre os usuários

de cocaína por oferecer menor risco de contaminação se comparada às injetáveis.

Além disso, na época, os traficantes desenvolveram a estratégia de disponibilizar o

crack em vez de maconha e cocaína em pó, por exemplo, o que levou as pessoas a

utilizá-lo, ainda que quisessem fumar a maconha (NAPPO et al, 2004; NAPPO et al,

2012; RODRIGUES, et al, 2012).

Outros fatores também contribuíram para essa expansão: seu efeito mais

rápido e intenso; o menor custo se comparado ao da cocaína em pó; e a fácil

utilização, podendo ser fumado conjuntamente com outras drogas e passar

desapercebido (RODRIGUES, et al, 2012; ANDRADE, ESPINHEIRA, 2014).

Importante mencionarmos que a intensidade e frequência de uso não diferem

significantemente entre as pessoas de classes de maior ou menor poder aquisitivo

(FREIRE et al, 2012).

O crack, quando fumado, libera substâncias rapidamente absorvidas pela

mucosa pulmonar, provocando uma sensação de prazer, euforia e estado

prolongado de alerta. Isso leva a um consumo intenso e compulsivo por dias,

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conhecido como bunge. Após os efeitos terem passado, instala-se outro

comportamento - o de busca incontrolável pela droga, conhecido pelos usuários

como “fissura” (craving na língua inglesa). Tanto o bunge quanto o craving levam à

dependência rápida (NOTO, GALDUROZ, NAPPO, 2003; BALBINOT, ALVES,

AMARAL JUNIOR, ARAUJO, 2011; RAUPP, 2011).

Estudo de Ribeiro, Sanches e Nabo (2010) sobre estratégias para o uso

desenvolvidas pelos usuários de crack mostrou hábitos como a associação do crack

com a maconha para evitar a overdose e a utilização da droga em local protegido e

acompanhado para evitar ser abordado com violência pela polícia. Dizer a verdade

aos policiais que abordam também é uma estratégia e outra é nunca ter dívida com

traficantes, uma vez que impõem regras rígidas, muitas vezes pagas com a vida do

próprio usuário (RIBEIRO, SANCHES, NABO, 2010; OLIVEIRA, NAPPO, 2008).

Essas estratégias podem explicar o aumento dos anos de uso de usuários do crack,

situação que já está sendo demonstrada por alguns pesquisadores (VARGENS,

CRUZ, SANTOS, 2011).

O contato com a droga tem sido cada vez mais precoce, começando já na

infância e adolescência. Tal fato é preocupante, visto que essas faixas etárias

constituem importantes fases do ciclo de vida em que os indivíduos estão

vulneráveis, entre outros comportamentos de risco, ao uso de drogas, o que acaba

levando também a comportamento sexual de risco e consequente exposição ao

vírus HIV, vírus da Hepatite B e vírus da Hepatite C e outras doenças sexualmente

transmissíveis, baixa frequência à escola e, portanto, fracasso escolar (MACHADO,

MOURA, CONCEIÇÃO, GUEDES, 2010; ANDRADE, 2011; GIACOMOZZI et al,

2012).

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Quanto à terapêutica, no estudo de Dias, Araújo, Laranjeira (2011) que

acompanhou 131 indivíduos decorridos 12 anos de alta após o tratamento contra a

dependência do crack, 20,6% haviam falecido por mortes violentas ou pela AIDS, o

que demonstrou a vulnerabilidade que permeava parte desse grupo de pessoas que

sofria com a dependência do crack.

Aliás, a morte para quem usa o crack passa a ser uma realidade com a qual

lidam diariamente e que tem um significado dual, em que o uso da substância leva o

usuário dependente da droga a ter a morte como companheira e a apresentar um

comportamento que não permite vínculos ou expectativas, ou seja, configurando

uma situação de nulidade da existência (SILVA JÚNIOR, MONTEIRO, 2012).

A nosso ver, isso faz com que o comportamento do dependente de crack nos

pareça, no primeiro momento, de desapego à preservação da própria vida, uma vez

que a motivação maior reside na obtenção e no uso da droga, porém, refletimos se,

por outro lado, o uso do crack para quem é dependente, também não passaria a ser

uma necessidade vital já que provoca alívio das “dores” físicas, psíquicas e sociais.

A dependência de algumas drogas, tanto lícitas quanto ilícitas, provoca

estigmatização do usuário e uma visão da sociedade de “um ‘bêbado’ ou ‘bêbada’

(ou, um ‘noiado’, no caso do crack), ignorando o fato de que o usuário pode ser,

entre tantas coisas, também um pai ou uma mãe, trabalhador ou trabalhadora

(ANDRADE, ESPINHEIRA, 2014, p.17). Tal situação contribui para o afastamento e

isolamento cada vez maiores daqueles rotulados com tais expressões.

Quando se mantém esse comportamento, é difícil desassociar o usuário de

drogas do afastamento tanto do mercado de trabalho quanto do convívio familiar,

uma vez que a família faz parte da sociedade e, portanto, compartilha das mesmas

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concepções arraigadas culturalmente, ou seja, considera o indivíduo “drogado” como

problema e motivo de vergonha perante os amigos e a comunidade.

No caso da família, essa pode ser impulsionadora do uso nocivo do crack,

quando seus membros estão envolvidos em desajustes, violência ou falta um

alicerce afetivo. Por outro lado, em muitos casos, em outro momento, ela se torna

também o apoio primeiro para o enfrentamento da problemática (GABATZ et al,

2013).

No caso do trabalho, o empregador não admite uma pessoa que possa, na

sua visão, a qualquer momento, usurpar bens ou materiais de seu ambiente de

trabalho, uma vez que o uso de droga, principalmente do crack, devido ao seu poder

de dependência ser rápido, leva a uma busca quase que desesperada para

obtenção do entorpecente.

Em estudo realizado por Silva e Pereira (2015) com mulheres em tratamento

em CAPS-AD em um município do estado do Rio de Janeiro, em que 100%

buscavam a cura para dependência de crack/cocaína, identificou-se predomínio de

usuárias com mais de 30 anos, seguidas daquelas com idade de 20 a 29 anos,

solteiras (55,7%), com filhos menores, os quais residiam com os familiares. Eram

mulheres sem trabalho remunerado e sustentadas pela família (SILVA, PEREIRA,

2015).

No Paraná, em estudo realizado por Yabuuti e Bernardy (2014), também em

CAPS-AD, com prontuários de gestantes atendidas nesse serviço, constatou-se que

a maioria era dependente de crack, com baixa escolaridade, multigesta, filhos sob os

cuidados dos avós; 67% tinham endereço fixo e 33% estavam em situação de rua

(YABUUTI, BERNARDY, 2014).

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Além disso, no cotidiano de uso do crack, para suprir a necessidade da droga,

o usuário se arrisca em diversas situações: acertos de contas com traficantes, sexo

sem proteção, violência, roubos e conflito com a polícia (RIBEIRO, SANCHEZ,

NABBO, 2010).

Todo esse contexto de estigma, imagem distorcida da sociedade, a

vulnerabilidade da mulher que se torna dependente, a falta de apoio familiar, social

ou mesmo de saúde, contribui para que, muitas vezes, o dependente de crack não

tenha condições de ser (re)integrado nas relações sociais, o que se torna, ao longo

desse processo, a causa e a consequência para o uso cada vez maior da droga.

3.5. PRESSUPOSTOS TEÓRICOS DO ESTUDO

Historicamente o uso de drogas psicoativas é realizado pelo ser humano, no

entanto quando esse uso passa a interferir em interesses ou condutas humanas

estabelecidas o uso dessa droga torna-se proibido, como visto no referencial teórico.

O crack é uma droga que tem ocupado espaço importante no cotidiano de

diversas pessoas, uma vez que já se observa o seu uso recorrente pelas ruas de

várias cidades tendo seu uso exibido pelas mídias em geral. Parte-se do

pressuposto de que pessoas que vivem em situação de vulnerabilidade e desfiliação

podem estar mais expostas ao uso nocivo do crack. Uma vez usuários, carregam

consigo um significativo estigma e preconceito no âmbito familiar e social que podem

dificultar ou mesmo impedir quaisquer ação ou ações assistenciais. Porém, esses

usuários, em algum momento podem desejar romper com o uso contínuo

estabelecendo estratégias em busca de apoio e/ou tratamento.

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Com isso, é importante que os profissionais da saúde, em especial o

enfermeiro, compreendam um pouco mais sobre a situação desses usuários, por

lidarem diariamente com a questão do uso de drogas e suas consequências no seu

contexto de trabalho.

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CAPÍTULO 3 – METODOLOGIA

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3.1. REFERENCIAL TEÓRICO-METODOLÓGICO

Para o alcance dos objetivos traçados, optamos pela abordagem qualitativa

da Pesquisa Social, na modalidade estratégica (MINAYO et al, 2005).

A abordagem qualitativa tem como foco a ação social e visa à compreensão, ao

entendimento dos fenômenos sociais e ao significado do ponto de vista dos atores, o

que torna o pesquisador agente de uma compreensão interpretativa da vivência dos

atores sociais (MINAYO et al, 2005, p.81).

Os estudos qualitativos trabalham com realidades particulares que não devem

ser quantificadas, uma vez que são significações, crenças e valores que fazem parte

da realidade social. Dessa forma, essa realidade é passível de conhecimento

quando emergida das falas dos sujeitos que a vivenciam (MINAYO, 2007; MERIGHI,

PRAÇA, 2003).

Minayo (2008, p.47) compreende a Pesquisa Social como “os vários tipos de

investigação que tratam do ser humano em sociedade, de suas relações e

instituições, de sua história e de sua produção simbólica”. Permite, assim, uma visão

“macro” do indivíduo, entendendo ser o homem um ente que possui particularidades

e, ao mesmo tempo, é influenciado pelo meio em que vive.

No caso deste estudo, tendo em vista que buscamos conhecer os significados

do uso do crack sob a perspectiva de quem dele fazia uso nocivo ou era dependente

e estava em tratamento, a utilização da Pesquisa Social era necessária, pois foi por

meio dos relatos e posteriormente dos significados que emergiram das falas que

identificamos o contexto em que estiveram e construíram suas relações e

percepções de mundo e, por consequência, suas atitudes e condição situacional.

Seguimos ainda os pressupostos da Pesquisa Social Estratégica que, de

acordo com Minayo (2008, p.50), tem a finalidade de “lançar luz sobre determinados

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aspectos da realidade”, sem priorizar soluções práticas para a questão à qual busca

resposta. O que não quer dizer que os achados da Pesquisa Social Estratégica não

possam amparar a reflexão de tais alternativas.

3.2 CAMPO DE ESTUDO

Entendemos como campo de estudo o espaço que abrange empiricamente o

objeto investigado (MINAYO, 2008). Nesse sentido, consideramos necessário

descrever, além da instituição onde os sujeitos estavam internados, a rede de

atendimento da qual a instituição faz parte e o município que abarca essa rede, uma

vez que se influenciam mutuamente.

Apesar de nem todos os sujeitos do estudo residirem em Goiânia, os que não

residiam estiveram na cidade por algum tempo ou pretendiam nela permanecer.

Sobre a capital Goiânia, temos que está situada na região Centro-Oeste brasileira.

Goiânia possuía 1.302.001 habitantes em 2010, distribuídos em área territorial de

741 Km², com renda per capta de 1031 reais e maioria da população entre 25 e 59

anos (IBGE, 2015).

A Região Centro-Oeste brasileira tem demonstrado, ao longo dos últimos dez

anos, significativo crescimento econômico, e seus níveis de desigualdade e

vulnerabilidade social estão em queda (GUERRA, POCHMANN, SILVA, 2014).

Goiânia está inserida em uma região que atrai imigrantes, visto que, em 2013,

a Região Centro-Oeste foi aquela que apresentou menor proporção de população

residente natural (70,5%), ou seja, quase 1/3 daqueles que nela residiam (29,5%)

era natural de outra região (IBGE, 2014).

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Estudo realizado em municípios no mundo todo em 2005 colocou Goiânia no

posto de cidade mais desigual no país (ONU-HABITAT, 2011). Já em 2010, foi

considerada o município com mais de 1 milhão de habitantes com melhores índices

de infraestrutura urbana, segundo informantes dos domicílios consultados (IBGE,

2010). Os dados revelam a ambiguidade do cenário onde se insere o campo de

estudo.

Quanto à questão de drogas ilícitas, toda droga apreendida em Goiás é

encaminhada à Delegacia Estadual de Repressão a Narcóticos (DENARC) da

Polícia Civil do estado de Goiás, e, após perícia e comprovação de que se trata de

substância ilícita, é incinerada perante representantes da segurança pública,

vigilância sanitária e Ministério Público, em evento oficial.

O estado de Goiás, de acordo com o relatado à pesquisadora por um dos

delegados da DENARC de Goiânia, é rota do tráfico da droga que vem da Colômbia

e dos demais países produtores e tem ocorrido, cada vez mais, apreensões de

drogas ilícitas no estado. Quando a droga chega à Região Sudoeste goiana, é

direcionada para a capital Goiânia e Distrito Federal e/ou segue para a Região

Sudeste brasileira. A maioria das apreensões está, portanto, ligada a essas rotas:

região sudoeste de Goiás-Goiânia ou Distrito Federal - Sudeste Brasileiro.

Falando de assistência à saúde mental no quesito de dependência de álcool e

drogas, Goiânia dispõe de uma rede de atendimento que conta, além dos dez

Centros de Assistência Integral à Saúde (CAIS) e quatro Centros Integrados de

Atenção Médico Sanitária (Ciams), conta com Ambulatório Municipal de Psiquiatria,

Consultório na Rua que atende a população em situação de rua, cinco serviços

residenciais terapêuticos, seis Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) sendo dois

voltados para a população infantil (CAPS-i) e dentre esses, um deles álcool e

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drogas; um pronto-socorro psiquiátrico responsável pela demanda de casos de

urgência de Goiânia e municípios pactuados e por regular o paciente no sistema de

atendimento municipal; duas Associações de Trabalho e Produção Solidária da

Saúde Mental (GERARTE); o Centro de Referência e Atenção à Saúde da Pessoa

Idosa (CRASPI) e um Centro de Referência em Diagnóstico e Terapêutica (CRDT).

Em situações mais graves, que exijam internação, encaminha-se para leitos

conveniados ao SUS em hospitais psiquiátricos de Goiânia (GOIÂNIA, 2015).

O hospital, campo de estudo para nosso trabalho, compõe essa rede de

atendimento, disponibilizando leitos de internação ao SUS para casos graves. É

também a instituição que disponibiliza mais leitos para dependentes de álcool e

drogas do município. Situa-se em uma região que, segundo o que nos foi informado

na DENARC e confirmado pelos funcionários e, posteriormente pelos sujeitos do

estudo, é local de venda e uso de drogas, inclusive nas suas imediações.

A realização do estudo exigia um ambiente com estabilidade para a

realização da coleta de dados e fácil acesso à essa população. Dessa forma para

contemplar esse aspecto, optamos por coletar os dados no ambiente hospitalar.

O hospital foi fundado em 1972 como associação jurídica de direito privado,

filantrópica, educacional que recebe pacientes encaminhados do serviço de

emergência psiquiátrica do município de Goiânia e também de vários estados do

país. Atende adolescentes, jovens e adultos. No caso de internação de menores,

eles devem ser acompanhados por um responsável.

Dispõe de uma unidade ambulatorial, uma unidade de dependência química,

Unidade de hospital integral e Unidade de Hospital-Dia. O público atendido é

constituído por pessoas portadoras de transtornos mentais de distintas naturezas;

crianças, adolescentes e jovens que participam de atividades educacionais em

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ensino de pré-escola, ensino fundamental, ensino médio e de atividades culturais e

esportivas complementares ao ensino regular.

Ocupa uma área de 135.000 m², composta de jardins, praças, bosques,

fontes de água, lagos, viveiros de plantas e de animais (galinhas, vacas, cavalos e

cães) cuidados pelas pessoas que estão em tratamento sob supervisão de

funcionários do hospital.

A Unidade de Dependência Química (UDQ) foi inaugurada em 1999. Além

dos pacientes do SUS, o hospital oferece leitos conveniados com alguns planos de

saúde e também presta atendimentos particulares. O tratamento aos dependentes

químicos é compreendido pelo atendimento ambulatorial, com consultas em

psiquiatria, psicologia, grupos terapêuticos multiprofissionais de prevenção de

recaídas para dependência química e outros transtornos mentais, e ambulatório da

família.

Além do atendimento ambulatorial, oferece internação hospitalar, com

Unidades de Internação independentes no complexo hospitalar, em apartamentos e

enfermarias. Há, para esses casos, procedimentos específicos para quadros

psicóticos agudos, depressivos, alcoolismo e abuso de drogas.

Na UDQ, os muros são altos e possuíam cerca elétrica instalada que,

segundo os funcionários, não funcionava. Quartos/enfermarias apresentavam

grades nas janelas. Mesmo sendo alto, muitos internos pulavam por sobre o muro e

fugiam ou traziam objetos e alimentos para dentro do hospital, também segundo

relatos de funcionários e sujeitos do estudo.

Já de acordo com a gerência de enfermagem do hospital a instituição não

realizava internações, mas um processo inicial de desintoxicação do paciente,

situação confirmada pelas falas dos internos, visto que, em momento algum, se

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referiram ao local como sendo hospital e sim “casa”. Além disso, o aspecto das

enfermarias não condiz com o contexto hospitalar tradicional.

Um problema apontado pela chefia de enfermagem diz respeito à internação

compulsória, em que, por meio de um mandado, o hospital é obrigado a atender

pessoas que muitas vezes não desejam o tratamento, mas precisarão ficar

internadas por até 90 dias, o que provoca, muitas vezes, fugas do local. Nos casos

de internação com esse propósito, a instituição responde ao mandado e informa que

não está voltada para tais casos, resposta nem sempre compreendida pelos juízes.

Quando o paciente recebe alta, é encaminhado para um Centro de Atenção

Psicossocial (CAPS) ou Comunidades Terapêuticas. Como dito anteriormente, o

hospital é voltado para a desintoxicação do usuário de drogas e não possui proposta

de internação por mais de um mês, mesmo que, em alguns casos, a pessoa possa

solicitar mais tempo de permanência na instituição o que, muitas vezes, é concedido.

Por política institucional não foi possível acesso a dados como tipos de internação e

reinternações.

Para a coordenação de enfermagem, após esse período, os temas abordados

começam a se tornar repetitivos, o que muitas vezes motiva os internos a saírem.

Por outro lado, alguns pacientes são considerados aptos para a alta antes dos 28

dias em virtude da boa resposta ao tratamento ou por não apresentarem quadro de

dependência à droga.

Para alguns pacientes, o trabalho da instituição é visto como de redução de

danos devido ao grande número de internações e pelo próprio comportamento do

interno, que sugere possibilidade remota de deixar a droga. Assim, o paciente fica

alguns dias, tem uma melhora física, ganho de peso, redução dos níveis da droga no

sangue, mas, assim que tem alta, retorna ao uso.

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Os pacientes internados vêm encaminhados pela unidade de pronto-

atendimento psiquiátrico - a única na rede de atendimento do SUS no município.

Também são recebidos pacientes que pagam pelo serviço de forma privada, bem

como pessoas encaminhadas pelos CAPS e internadas por meio de planos de

saúde. Dos 216 leitos oferecidos pelo hospital, 108 são destinados à UDQ e, entre

os últimos, 66 são reservados para atendimento via SUS. Porém, o valor pago pelo

SUS por leito é muito inferior ao recebido pelo leito privado, o que, segundo a chefia

de enfermagem do hospital, tem levado os demais hospitais privados que atendem

as pessoas com dependência de drogas psicoativas da cidade a deixarem de

atender pacientes encaminhados pelo SUS. Isso contribui para que o hospital,

campo deste estudo, esteja sempre lotado.

3.2.1. OS SUJEITOS DA PESQUISA

Os sujeitos do estudo eram 39 pessoas que estavam em tratamento no

hospital, campo do estudo, para dependência do uso de crack e que atendiam aos

seguintes critérios de inclusão: ser maior de 18 anos, ter utilizado crack por, pelo

menos, 25 dias nos seis meses anteriores ao início da coleta de dados (OPAS,

2008); ser capaz de ler, discutir e assinar, antes da inclusão no estudo, o Termo de

consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), não estar sob efeito de droga ilícita no

momento da coleta de dados e, finalmente, não apresentar, também nesta etapa do

estudo, comportamento que inviabilizasse a sua participação e o fornecimento de

informações.

De acordo com a gerência de enfermagem, a instituição tinha como objetivo

internar o paciente somente se o mesmo demonstrasse interesse, exceto nos casos

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em que haja algum transtorno de base ou se estiver sob o efeito de substância

psicoativa ou ainda, se viesse por ordem judicial. No primeiro caso, ele é internado

com o consentimento da família; no segundo, é aconselhado a retornar quando já

estiver consciente da decisão de se internar. Essa norma foi incorporada pela

instituição devido ao grande número de pacientes que deixavam o local no momento

em que conseguiam obter relativa melhora no quadro de desnutrição e fraqueza

apresentado quando do ingresso no hospital.

Geralmente eles chegavam acompanhados da família, por policiais,

profissionais da saúde, ou às vezes, por iniciativa própria. Anteriormente, eram

orientados a trazer quatro pares de peças de roupa, chinelo e produtos de higiene

individual. No entanto, passou a ser solicitado à família o pagamento de uma taxa

referente à aquisição de um Kit preparado pela própria instituição contendo materiais

de higiene corporal e outros itens, em virtude da ocorrência de casos em que os

próprios familiares colocavam substâncias psicoativas junto desses objetos.

Nesse sentido, destacamos que os três primeiros dias de internação são

críticos para o paciente devido à administração de altas doses de medicação para

que suporte a abstinência. Em decorrência também da medicação, os internos

tendiam a um comportamento letárgico, com a fala bastante prejudicada, o que foi

percebido pelo próprio comportamento de alguns.

Todos os dias havia um grupo de acolhimento para os recém- internados,

momento em que eram informados sobre normas e rotinas do hospital. Um dia da

semana, geralmente às terças-feiras, era realizada uma assembleia geral com a

equipe, da qual participam também tanto os recém-internados quanto os que já

estavam há mais tempo na instituição, a fim de reiterar as normas e fornecer

orientações ou comunicados. Ao final, tal assembleia, era aberta à participação dos

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pacientes, momento em que eram frequentes as reclamações sobre os serviços

oferecidos e discussões entre os internos, além da grande solicitação de apoio da

assistência social do hospital.

Nos primeiros meses em que estivemos no hospital, o local destinado às

internações na UDQ abrigava tanto homens quanto mulheres, os quais eram

acomodados em quartos separados, embora convivessem fora deles. Alguns meses

depois, as mulheres foram transferidas para outro setor e, desde então, não têm

mais convivência com os homens. O que nos foi relatado por funcionários é que

essa mudança foi realizada porque algumas delas se prostituíam no próprio hospital,

e tendiam a ter vários parceiros, sendo motivo de ciúmes e conflitos. Assim, nos

quartos anteriormente destinados às mulheres hoje são acomodados os

homossexuais, também alvos de conflitos pelo mesmo motivo das mulheres.

Drogas e objetos que pudessem provocar ferimentos sempre eram

encontrados com os pacientes o que demonstra o contato com o ambiente externo.

Em uma determinada época, havia uma cantina dentro da UDQ que foi fechada

porque os internos estavam vendendo algumas mercadorias da referida cantina para

estabelecimentos comerciais localizados nos arredores do hospital, cujos donos

insistiam em comprar, apesar de algumas orientações dos funcionários para que não

o fizessem.

A alta hospitalar era realizada às quartas feiras, pela manhã, após a

realização de uma atividade grupal com todos que estavam aptos para tanto. Nessa

atividade, os pacientes eram orientados sobre a continuidade do tratamento por

meio de acompanhamento ambulatorial, com consultas periódicas; no caso de

serem encaminhados, havia orientação também sobre o local para onde deveriam se

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dirigir. A instituição realizava ainda o “Grupo de Recaída”, para reforço das

orientações sobre prevenção de reincidência do uso de drogas.

3. 3. TRABALHO DE CAMPO

O trabalho de campo compreendeu a coleta e análise de dados, sendo que

todos os aspectos éticos foram rigorosamente observados na condução do estudo.

3.3.1 COLETA DE DADOS

A coleta de dados ocorreu por meio de três métodos: observação do campo de

estudo, confecção do diário de campo e realização de grupos focais, sendo que o

corpus principal do estudo foi composto pelos dados obtidos nos grupos focais por

meio das falas dos participantes.

3.3.1.1 Observação do campo

Consideramos que para a apreensão e compreensão dos significados

atribuídos pelos sujeitos da pesquisa ao uso do crack, é necessário contatá-los

previamente, uma vez que “o observador fica em relação direta com seus

interlocutores no espaço social deles, no seu cenário cultural, mas com a finalidade

de colher dados e compreender o contexto da pesquisa” (MINAYO, 2007, p.70).

A observação permitiu apreender a relação dos usuários entre si, com a

equipe e com o contexto do hospital. Ocorreu no pátio da UDQ, no momento em que

praticavam esporte, alimentavam-se, cuidavam de animais, participavam de

atividades do serviço de terapia ocupacional, algumas vezes enquanto cortavam o

cabelo ou, ainda, na recepção do ambulatório que também recebe a demanda para

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internação. Na realização dos grupos focais, pudemos perceber a relação entre eles

e como se portavam frente à situação de internação. Todos esses dados foram

descritos no diário de campo.

3.3.1.2. Os grupos focais

Pelo fato dos sujeitos compartilharem do mesmo ambiente de tratamento e de

várias experiências e dificuldades relacionadas ao uso nocivo do crack e outras

drogas, a realização dessa técnica foi fundamental, por possibilitar a tão necessária

discussão de distintas perspectivas do mesmo fenômeno, almejada nos objetivos do

estudo.

O grupo focal pode ser conceituado como:

[...] uma técnica de pesquisa na qual o pesquisador reúne, num mesmo local e durante um certo período, uma determinada quantidade de pessoas que fazem parte do público-alvo de suas investigações, tendo como objetivo coletar, a partir do diálogo e do debate com e entre eles, informações acerca de um tema específico. (CRUZ NETO, MOREIRA, SUCENA, 2002, p.5)

A técnica de coleta de dados de Grupo focal prevê a realização de discussões

previamente planejadas, em ambiente que deixe os participantes à vontade e sem

constrangimentos para que possam expressar livremente suas percepções, crenças

e representações sociais (WESTPHAL, BOGUS, FARIA, 1996).

Uma característica a ser ressaltada é que a composição dos grupos e o seu

planejamento devem estar atrelados aos objetivos do estudo. Além disso, um dos

pontos que diferenciam a utilização do grupo focal da entrevista semiestruturada, por

exemplo, é que buscamos a fala em debate, a divergência de opiniões, as distintas

percepções e concepções a respeito de um mesmo assunto. Assim, geralmente os

dados são obtidos pela realização de mais de um grupo (WESTPHAL, BOGUS,

FARIA, 1996; CRUZ NETO, MOREIRA, SUCENA, 2002).

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De acordo com o pretendido com esses debates e estabelecido como objetivos

da pesquisa, podem ser realizados vários grupos focais com os mesmos

participantes, utilizando diferentes temas para discussão, ou manter os temas e

mudar os participantes (CRUZ NETO, MOREIRA, SUCENA, 2002).

Neste estudo, a escolha foi manter as questões norteadoras e alterar os

componentes do grupo, pois percebemos que havia grande rotatividade dos sujeitos

por fuga ou pela política da instituição de promover internações de no máximo 28

dias, o que, muitas vezes, impossibilitava a manutenção do mesmo grupo.

Segundo Minayo (2008), o grupo focal caracteriza-se por um tipo de

entrevista em grupos pequenos e homogêneos e se constitui em recurso

metodológico para aprofundamento das inter-relações dos participantes. Neste

estudo percebemos que os próprios sujeitos se interessavam pela história de vida e

concepções do outro, enriquecendo o debate e possibilitando novos

questionamentos e reflexões.

No segundo semestre de 2012, foram iniciadas visitas ao campo de estudo,

quando foi possível conhecer a maioria das instalações, conversar com o diretor

administrativo e o coordenador de enfermagem e promover aproximação aos

sujeitos da pesquisa. Foi disponibilizado um auditório dentro da UDQ para realização

dos grupos focais, o qual impunha uma dificuldade pelo fato das cadeiras serem

fixadas ao chão, em filas. Desse modo, nos dias de realização dos grupos focais, era

necessário buscar cadeiras de outros locais para formar um círculo.

Para a realização dos grupos focais, foi observado o requisito de sua

composição envolver um número de sujeitos que permitisse que todos falassem,

gerando diversas opiniões, sendo o ideal reunir, no mínimo, quatro e, no máximo,

doze pessoas por grupo. Houve cuidado também com o tempo de duração, que não

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deveria ultrapassar 90 minutos, conforme recomendado (MINAYO, 2008; CRUZ

NETO, MOREIRA, SUCENA, 2002). No presente estudo os grupos foram realizados

com no mínimo 4 participantes e no máximo 6.

De acordo com Krueger e Casey (2009), o ideal é que sejam realizados três

ou quatro grupos focais com cada categoria de participantes. Após, já é possível

determinar se houve ou não saturação dos dados. No presente estudo, a

rotatividade dos sujeitos que davam entrada no hospital possibilitou grande

diversidade de opiniões, uma vez que apresentavam distintas classes sociais,

naturalidades, idades e concepções.

Foram realizados dez grupos focais no período compreendido entre 08/2012 a

04/2013, sendo que dois deles não foram analisados por considerarmos que faziam

parte da observação, interação e percepção inicial do perfil dos sujeitos. Dessa

forma, foram analisadas as falas dos sujeitos participantes de oito grupos, dos quais,

o intervalo de realização variou de acordo com a disponibilidade da pesquisadora

como descrito no Quadro 1.

Quadro 1 - Grupos focais realizados, com respectivas datas, participantes e total de participantes. Goiânia, 2015.

Grupo Data Participantes Total de participantes

1 21/09/2012 P1 – P6 6

2 28/09/2012 P7 – P11 5

3 11/01/2013 P12 – P16 5

4 01/03/2013 P17 – P21 5

5 08/03/2013 P22 – P25 4

6 22/03/2013 P26 – P31 6

7 19/04/2013 P32 – P35 4

8 26/04/2013 P36 – P39 4

TOTAL 39 FONTE: elaborado pela autora

A equipe responsável pela condução dos grupos contou com um mediador

(pesquisadora responsável), que conduziu as discussões e buscou, ao máximo,

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nelas não interferir. Houve ainda a participação de um pesquisador auxiliar,

encarregado da montagem do equipamento de áudio para a gravação das falas e de

descrever, por escrito, o comportamento dos sujeitos dos grupos.

Com base nos critérios de inclusão e nas orientações da pesquisa, membros

da equipe de enfermagem selecionaram, no total, 39 participantes, considerando

seu conhecimento para indicar quais internos atendiam aos critérios de inclusão da

pesquisa, sobretudo no que diz respeito ao tempo de internação e à capacidade de

verbalização. Além disso, dois grupos para teste foram realizados, possibilitando

estabelecer um número adequado de participantes por grupo.

Solicitávamos à equipe que convidasse ao local de realização dos grupos no

máximo cinco participantes que se adequassem aos critérios já mencionados. No

entanto, alguns não se dirigiam ao local e outros saíram depois de alguns minutos

após o início do grupo e, ainda, no caso de um grupo, um participante a mais foi

solicitado, mas que não causou prejuízo à condução do grupo. Assim, os grupos

variavam numericamente os participantes.

De acordo com Neto, Moreira, Suscena (2002) o pretendido com o debate no

grupo e com os objetivos da pesquisa, podemos realizar vários grupos focais, com

os mesmos participantes, utilizando diferentes temas para discussão ou até mesmo

manter os temas e mudar os participantes.

Após a permissão dos sujeitos, os grupos tiveram o áudio gravado e as

observações sobre o comportamento dos participantes foram anotadas pelo

observador, assim compondo o diário de campo. Posteriormente, procedeu-se à

transcrição, na íntegra, das gravações desses grupos.

Asseguramos total liberdade aos sujeitos em não participar, caso assim

desejassem, sendo que alguns deixaram o local destinado à realização dos grupos

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decorrido algum tempo. Os sujeitos, de modo geral, demonstravam certo grau de

agitação e ansiedade. Falavam rápido, balançavam as mãos ou os pés e alguns

saíam e retornavam ao auditório.

Para realização dos grupos focais foram elaboradas previamente quatro

questões, a fim de nortear a discussão: “Por que do início do uso?”; “Como foi o

uso?”; “O que acha do tratamento?”; e, por fim, “Quais são as suas expectativas

para quando sair do hospital?”

Inicialmente, havia uma apresentação da equipe e dos sujeitos, seguida de

esclarecimentos sobre o trabalho e objetivos e, em seguida, fazia-se a leitura do

termo de consentimento livre e esclarecido (ANEXO B). A assinatura ocorria ao final

de cada grupo, uma vez que muitos assinavam o termo e, após pouco tempo, saíam.

3.3.2. Análise dos dados

Os encontros dos grupos focais foram gravados e transcritos pela própria

pesquisadora, e os resultados submetidos a análise por meio do método de

interpretação de sentidos, que consiste em “caminhar tanto na compreensão (atitude

hermenêutica) quanto na crítica (atitude dialética) dos dados gerados de uma

pesquisa” (GOMES, 2007, p.15-16).

Esse método é definido como:

[...] um caminho de análise de significados dentro de uma perspectiva das correntes compreensivas das ciências sociais que analisa: (a) palavras; (b) ações; (c) conjunto de inter-relações; (d) grupos; (e) instituições; (f) conjunturas, dentre outros corpos

analíticos. (GOMES et al, 2005, p. 202).

A análise percorreu as seguintes etapas: leitura compreensiva do material

selecionado para que pudéssemos nos impregnar do conteúdo coletado, ter uma

visão mais ampla do conjunto de falas e, ao mesmo tempo, apreender

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particularidades nesse conjunto. Na segunda etapa, realizamos a construção de

inferências, que são “operações pelas quais se aceita uma proposição em virtude de

sua relação com outras anteriormente acatadas como verdadeiras” e, na terceira, foi

feita uma síntese interpretativa, considerada uma reinterpretação, por meio de uma

construção criativa de possíveis significados (GOMES, 2007, p.203).

3.4. PROCEDIMENTOS ÉTICOS

No que se refere às questões éticas, o trabalho foi norteado pelas diretrizes

de pesquisas envolvendo seres humanos, previstas na Resolução 466/2012 do

Conselho Nacional de Saúde. A proposta deste trabalho foi submetida ao Comitê de

Pesquisa Humana e Animal do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de

Goiás (HC/UFG), tendo sido aprovada sob protocolo nº117/2011(ANEXO C).

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CAPÍTULO 4 – RESULTADOS E DISCUSSÃO

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Neste capítulo são apresentados e discutidos os dados obtidos no trabalho de

campo. Primeiramente os sujeitos do estudo foram caracterizados e, em seguida, os

significados do uso do crack por eles atribuídos puderam ser discutidos por meio das

categorias temáticas identificadas no material qualitativo analisado.

4.1. CARACTERIZANDO OS SUJEITOS DO ESTUDO

A experiência de estar mais perto de usuários de crack em fase de tratamento

e do contexto em que estiveram inseridos modificou a minha visão no sentido de

ampliar minhas percepções e concepções sobre esses usuários. Assim, de pessoas

que antes ofereciam certa periculosidade, passaram a ser compreendidos, ao longo

dos dias no campo de estudo, como indivíduos comuns, em busca de ajuda. Diante

deste novo olhar, o termo “usuário” começou a incomodar, fato que me levou a

refletir sobre uma forma mais adequada de chamá-los. Classificá-los simplesmente

como “usuários” desconsiderava o fato de serem também pais, mães, trabalhadores,

pessoas comuns, e favorecia que fossem rotulados por uma condição

potencialmente transitória.

Concordo com Bizzotto (2010) ao afirmar que o usuário de crack, antes de sê-

lo, é uma pessoa como qualquer outra e, portanto, a abordagem deve residir no

indivíduo e não na droga. A questão que se coloca é sobre o motivo pelo qual ele

usa determinada substância para aliviar a tensão de sua existência (BIZZOTTO,

2010). Percebemos que a questão do uso/dependência de drogas e, por

consequência, do crack (mesmo com suas particularidades), é permeada por

complexidade que talvez não tenha sido objeto de séria discussão no âmbito macro

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na sociedade, ficando restrita a concepções morais, de segurança pública ou de

saúde pública.

Então, nesse questionamento, pensamos que os participantes são pessoas

em tratamento da dependência do crack (PTDC) e que essa denominação expressa,

de forma mais pertinente, a condição de estarem temporariamente em um hospital

psiquiátrico, em ala para dependentes químicos, de modo que, quando deixarem

esse local, continuarão suas vidas como pais e mães de família, trabalhadores e

parte da sociedade, ainda que não alcancem a tão almejada abstinência. É sob essa

ótica que vemos os sujeitos deste estudo, mesmo que eles próprios não

conseguissem se situar no contexto maior do uso do crack e apreender a real

problemática que envolve sua dependência.

Quanto à caracterização das questões socioeconômicas dos participantes,

tentei abordá-las durante a realização dos grupos, quando, de forma natural, foram

descrevendo esses aspectos de suas vidas.

Em geral, cada grupo contou com 4 participantes, sendo que, no total,

participaram 39 pessoas (34 homens e 5 mulheres), com média de 32 anos. Mais da

metade informou ser solteira 20 (54%), 17 (46%) referiram ter filhos e, entre estes, a

média foi de 3 filhos por pessoa. A maioria relatou que no momento se encontrava

em condições socioeconômicas extremamente desfavoráveis por não ter moradia,

emprego, ter vendido os bens e se afastado da família ou pessoas de referência

desde que desenvolvido o comportamento de dependência da droga. Essa condição

socioeconômica desfavorável foi também identificada em outros estudos com

usuários de drogas psicoativas (MASCARENHAS et al, 2104; HORTA et al, 2011;

NUNES, et al 2007).

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Importante esclarecer ainda que os participantes, portanto, PTDC, ainda

estavam na condição de dependência do crack. Pela descrição de suas rotinas de

uso percebe-se concordância com o quadro de dependência considerado pela DSM-

IV e pelo CID-10 que expressa perda de controle de uso da droga. Assim, o

entendimento adotado neste estudo é de que não foi o uso esporádico da droga que

os levou ao quadro de vulnerabilidade/desfiliação em que se encontravam no

momento da coleta de dados, mas que isso foi ocorrendo à medida que a

dependência se instalava.

No campo de estudo da presente investigação, além de outras atividades,

desenvolve-se um trabalho de desintoxicação do crack e são recebidas pessoas

encaminhadas do pronto-socorro psiquiátrico da capital. Dessa forma, quando

chegavam ao local em busca da internação, alguns estavam em situação de rua

e/ou sem condições de deambular ou deambulavam com dificuldade, emagrecidos,

há vários dias sem realizar a higiene corporal, dormir ou comer.

Pelo relato das PTDC observei ainda que alguns pacientes que chegavam ao

hospital com relato de situação de rua apresentavam maior tendência à insatisfação

com o tratamento, e que os mais jovens tinham dificuldade de se adaptar às normas,

por estarem habituados a uma vida com horários próprios que não se adequavam

aos do hospital. De acordo com os participantes, o consumo do crack na rua ou em

locais específicos como as “bocas” é intenso e, com o passar dos meses ou anos de

uso, desenvolve-se um comportamento particular adaptado e algumas vezes

planejado para aquisição e uso da droga.

Os conflitos no hospital eram constantes, tanto entre os próprios internos

quanto desses com a equipe. De modo geral, percebo a tentativa dos profissionais

para estabelecer uma convivência harmônica com os internos, os quais, no entanto,

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demonstram desconfiança constante por meio de seus relatos e condutas. Nesse

sentido, assim que cheguei ao hospital fui alertada sobre a periculosidade das PTDC

e o quanto eram “traiçoeiros”, sendo aconselhada a tomar cuidado com meus

pertences e gravadores utilizados nos grupos.

O conflito com a lei foi bastante mencionado pelos participantes, os quais

descreveram períodos de privação de liberdade por roubo, homicídio e tráfico de

drogas. Alguns, inclusive, estavam internados por ação judicial. Relataram também a

forma como alguns funcionários os tratavam, como se estivessem em uma

instituição punitiva.

Afirmo, no entanto, que até o final do meu contato com os participantes não

fui furtada, nem ofendida ou maltratada, tendo concluído o estudo com outra

percepção dessas pessoas que lutam tanto para sobreviver sem o crack.

4.2. OS SIGNIFICADOS DO USO DO CRACK

Os significados atribuídos ao uso do crack pelos sujeitos deste estudo

indicam que mesmo que essa não seja a droga de primeira escolha é a que mais

impacta a vida do usuário, uma vez que seu uso intenso é permeado por violência,

tráfico, sofrimento e perdas em todas as esferas da vida. Nesse contexto, tentativas

de abstinência são geralmente motivadas pela vontade de viver com a família ou ao

lado de entes queridos. Embora pretendam retomar a vida laboral e relacional, os

sujeitos veem a abstinência do crack como um desafio em virtude de alguns motivos

principais: desconfiança da família, julgamento social, irresistível prazer

proporcionado pela droga e consequente esquecimento dos problemas vividos. Suas

falas expressam essa percepção:

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“Eu já fiquei fumando na rua porque não tinha dinheiro de pagar o hotel entendeu. Eu tinha que fazer a opção, ou eu comprava mais droga, ou eu pagava o hotel... eu falei ‘eu vou comprar mais droga’” (P3) “Que eu comecei a usar droga tem uns quatro meses que foi essa daí [crack] pra mais nunca na minha vida, eu perdi tudo o que eu tinha, eu tinha tênis bom, eu tenho um lote, eu tava quase vendendo o meu lote, tinha moto, vendi minha moto, tinha tudo que você pensar de bom eu tinha.” (P20) “[Quando sair do hospital] perdão da tua mãe, do pai né, caçar uma religião, tem que ocupar a cabeça... mas não, não é fácil, afastar de amizades [...] você tá forte, tá gordo e tal... aí você enquanto fumava três por dia, você começa a fumar seis, nove...” (P25)

Essas falas sobre o alto poder de vício da droga, não comparado às demais,

possibilitaram-me compreender que as PTDC se colocam como dominadas pela

droga, como se fosse um objeto dotado de vida própria, capaz de forçá-las ao

consumo. Essa percepção é relatada na fala a seguir:

“O demônio existe, o demônio tá com essa droga, essa droga veio pra destruir, isso aí é o mal do século [...]” (P19)

Do processo de análise minuciosa dos dados, emergiram elementos para a

construção de três categorias temáticas: “Descoberta do crack e outras drogas”; “A

dor do prazer”; e “Retomar a vida”.

Essas categorias foram construídas com base no referencial teórico

apresentado no capítulo 2 e nos dados extraídos do diário de campo, e discutidas

com apoio da literatura atual referente ao tema.

4.2.1. DESCOBERTA DO CRACK E DE OUTRAS DROGAS

Antecedendo seus relatos sobre a rotina de uso a que estavam habituados,

os participantes descreveram o porquê e como começaram a usar drogas.

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De modo geral, a motivação inicial esteve associada à curiosidade própria da

juventude, uma vez que a maioria referiu o início do uso na infância e adolescência.

Além disso, o excesso de liberdade com o qual os filhos são criados e o alívio para

alguma decepção da vida (morte de algum dos pais ou conflitos familiares, por

exemplo) também foram mencionados. Em todos os relatos, a família esteve

envolvida tanto como contexto de frustrações, negligência ou violência quanto como

modelo de uso nocivo de drogas.

“Meu pai morreu, eu com sete anos, minha mãe criou seis filhos sozinha, então, até por isso, às vezes eu fui tendo essa curiosidade de usar esses certos tipos de droga”. (P4) “Eu comecei meu uso de drogas muito cedo, desde os 12 anos com álcool, com uns 12 passei pra maconha.” (P7) “Quer dizer, isso já não é só de mim, isso vem da geração, minha família tudo gosta de um raio [cocaína inalada]” (P16) “Eu perdi minha mãe eu tinha 14 anos [...] eu fiquei mais solto assim...com mais liberdade, sabe, fazia o que queria [...]” (P11)

Pode-se perceber também a dificuldade de se reconhecerem responsáveis

pelas escolhas e decisões tomadas nesse processo de experimentação e uso de

drogas.

No entanto, a criança e o adolescente, principalmente aqueles que se

encontram em situação de vulnerabilidade social, tendem a ser mais suscetíveis à

experimentação de drogas por vivenciarem uma fase de estruturação de convívio

social e afastamento gradativo do vínculo familiar nuclear. Assim, tudo o que

observaram até então no núcleo familiar servirá de base para o comportamento que

irão desenvolver no meio social (MACHADO, MOURA, CONCEIÇÃO, GUEDES,

2010; ANDRADE, 2011; GIACOMOZZI et al, 2012).

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O estudo de Silva et al (2015) com dependentes de álcool em tratamento

mostrou associação entre o início do uso dos participantes e o uso frequente entre

os respectivos familiares, o que demonstra haver perpetuação do hábito (SILVA et

al, 2015).

No estudo de Guimarães et al (2009) com meninas que usavam drogas

evidenciou-se que essas viviam em famílias disfuncionais, ou seja, estavam privadas

de afeto, limites e diálogo. Tal situação mostra-se especialmente preocupante por

envolver meninas, para as quais a influência familiar se revela ainda mais

fundamental em distintos aspectos, podendo, no caso das drogas, incentivar ou

desestimular o uso.

Nesse aspecto da falta de acompanhamento dos filhos pelos pais, em estudo

realizado com estudantes do 9º ano do ensino fundamental no Brasil, pouco mais da

metade (58,5%) declarou que os pais ou responsáveis sabiam o que eles faziam

durante o tempo livre nos últimos 30 dias (IBGE, 2013).

Em relação à saúde mental, nesse mesmo estudo do IBGE, 16,5% dos

estudantes no Brasil declararam ter se sentido sozinhos nos 12 meses que

antecederam à pesquisa. Houve diferença entre meninos e meninas: enquanto

21,7% delas declararam ter experimentado esse sentimento, entre eles a proporção

foi de 10,7% (IBGE, 2013).

Assim, vivemos hoje em uma sociedade onde os pais, muitas vezes, não

conseguem oferecer o suporte necessário aos filhos devido ao estilo vida imposto

pelo sistema econômico, fato observado também no estudo de Pedrosa (2011).

Além da influência dos pais para o uso de drogas, os sujeitos do presente

estudo relataram violência e falta de apoio emocional e/ou financeiro na infância e

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adolescência, o que pode, com grandes chances, tê-los deixado vulneráveis ao

consumo, uso nocivo e dependência.

Alguns relatos trouxeram o desejo de matar o pai ou o cônjuge, a agressão

física por membros da família ou a vivência de agressões graves cometidas pelo pai

contra a mãe.

“meu pai e minha mãe eram alcóolatras [...] meu pai já esfaqueou a minha mãe, já colocou a mão da minha mãe no fogo umas três, quatro vezes, meu pai já abandonou a gente [...]” (P19)

Maus tratos e violência exercem influência sobre o uso nocivo e a

dependência de substâncias psicoativas, inclusive o crack (TRACTENBERG et al,

2012; LONGMAN-MILLS et al, 2015; GOMEZ et al, 2015).

A família faz parte da sociabilidade primária e é nela que o ser humano

primeiro se sociabiliza e aprende condutas relacionais para melhor conviver, a

princípio com os familiares e, posteriormente, junto a vizinhos e amigos

(CASTEL,1994; 2010). O suporte relacional começa, portanto, com a família, que

dispõe de laços independentes, não necessitando de intermediação para sua

formação ou estabelecimento. No entanto, de acordo com os participantes, o suporte

familiar experimentado por eles não foi satisfatório na grande maioria dos casos.

Desse modo, quando a sociabilidade primária não consegue desempenhar seu

papel de apoio e formação da criança ou adolescente no sentido de oferecer

exemplos de enfrentamento dos problemas sem a necessidade de medicamentos,

violência, bebidas ou outras drogas, os filhos podem também adotar postura

semelhante a dos pais, recorrendo a tais artifícios futuramente.

Pudemos observar na condução dos grupos que houve falha também na

sociabilidade secundária, ou seja, aquela desenvolvida pelo Estado, por meio de

políticas, ações e serviços oferecidos à sociedade, uma vez que dentro dos grupos

não foi mencionado apoio no sentido de envolvimento da equipe de saúde e demais

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instituições estatais de apoio nessa trajetória de uso e dependência do crack. Assim,

em virtude de más condições socioeconômicas e ausência de oportunidades para

formação escolar e exercício de atividade laboral ao longo de suas vidas, essas

pessoas ficaram vulneráveis tanto ao uso, inclusive o nocivo, quanto à dependência

do crack e de outras drogas.

Intrigou-me, de modo especial, a situação de dois participantes cujas falas

estão a seguir:

“Eu acho que a pessoa entra na droga porquê... por um descuido familiar momentâneo.” (P3) “[motivo para usar droga] A culpa foi minha mesmo. Meu pai teve a maior dedicação prá nós, colocou nós na escola tudo mais, gastava dinheiro com nós, comprava roupa das melhores prá nós, por que nós tinha que ir prá rua? Por que quando ele viajava para trabalhar nós tínhamos que ir prá rua conversar? Não a culpa é nossa. ” (P10)

O primeiro, um senhor com mais de 50 anos, que começou a utilizar o crack

após os 40 anos. Embora ele procedesse de uma família com situação econômica

confortável e tivesse o total apoio dos pais, foi enviado a um colégio interno quando

adolescente e lá experimentou a maconha. A outra participante, uma jovem que

perdeu a mãe ainda criança, criada pela madrasta e os filhos dela em ambiente de

graves conflitos, violência verbal e física, o que a levou a passar a maior parte do

tempo na rua, onde experimentou o crack na adolescência. Segundo o primeiro

participante, a motivação para experimentar a droga foi o excesso de liberdade dos

pais. Por outro lado, para a jovem, a culpa era sua, pois, em vez de ela e a irmã

ficarem em casa, ainda que em situação desfavorável e imprópria para permanência,

desde cedo foram para a rua consumir drogas; agora pondera que deveriam ter

suportado a situação, pois o pai trabalhava para sustentá-las.

Diante dessas situações, questiono-me sobre a forma como os participantes

veem esse início de uso de drogas e sua responsabilidade para tanto, ou seja, até

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que ponto o comportamento decorre de uma influência genética e social ou de sua

própria decisão. Pude perceber que a visão dos sujeitos não está engessada por

compreenderem que o uso de crack não é feito apenas por pessoas desfavoráveis

do ponto de vista socioeconômico ou que só o adolescente está a ele suscetível. Ao

contrário, para eles a motivação transcende a idade, o sexo ou a classe econômica,

pois depende fundamentalmente das relações e do suporte relacional que recebem

no decorrer da vida.

No presente estudo, as drogas primeiramente experimentadas foram as de

mais fácil acesso, sendo as mais citadas o álcool, o cigarro e a maconha; entretanto,

a utilização de solventes e benzodiazepínicos também foi relatada. No caso do

álcool, tabaco e maconha, na maioria das vezes continuaram a ser consumidos

mesmo quando os participantes já estavam dependentes do crack, o que configura

um poliuso de drogas, tal como identificado nos estudos de Santos Cruz et al (2013),

Ribeiro, Sanchez e Nappo (2010), Guimarães et al (2008) e Vieira (2010). Alguns

participantes, não habituados ou que não gostavam de ingerir bebidas alcoólicas,

afirmaram que passaram a consumi-las nocivamente quando em uso incessante de

crack.

“[...] e as portas de tudo, a meu ver é o álcool, eu comecei a fumar maconha, mas o álcool e a maconha foi a porta, foi o gatilho pra mim para certas drogas, né.” (P11) “No início começou tudo com cervejinha, fumava nas balada com amigos, numa dessas baladas, a maconha” (P15)

O estudo de Morales et al (2011) evidenciou que a permissividade para o uso,

o fácil acesso à droga, o valor atribuído ao consumo e a sensação de suposto

autocontrole constituem fatores de risco para o consumo de drogas psicoativas entre

acadêmicos de enfermagem. Por outro lado, a espiritualidade e a satisfação com as

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relações interpessoais revelaram-se domínios protetores para tal consumo

(MORALES et al, 2011).

Levantamentos nacionais e internacionais registram ingestão considerável de

bebidas alcoólicas e tabaco por adolescentes. As bebidas alcoólicas são as

primeiras a serem por eles consumidas, sendo que 31,7% ingerem a primeira dose

aos 13 anos ou menos (LARANJEIRA et al, 2012; OMS, 2014; IBGE, 2013).

No caso do tabaco, a experimentação atingiu 19,6% entre escolares

brasileiros e o índice daqueles que experimentaram cigarro em idade igual ou inferior

aos 13 anos foi de 15,4% (IBGE, 2013). Um grande desafio reside no fato de que a

taxação recomendada para os produtos derivados do tabaco, medida considerada

de maior impacto para redução do consumo, não é praticada na maioria dos países

(OMS, 2015). Dessa forma, além do cigarro poder ser consumido, é disponibilizado a

um preço que as pessoas ainda estão dispostas a pagar, o que o torna, muitas

vezes, a porta de entrada para o uso de drogas ilícitas, como mostrado no estudo de

Backes et al (2014).

O álcool e o tabaco são substâncias que, apesar de terem o consumo

legalizado, provocam prejuízos à saúde e são porta de entrada para o consumo

nocivo de drogas. No presente estudo, após habituarem-se ao uso das drogas

lícitas, a curiosidade e a necessidade de consumir substâncias com efeitos mais

potentes levaram os participantes a experimentar a maconha, a qual, entre as

drogas ilícitas, é a mais usada no Brasil e no mundo (IBGE, 2013; UNODC, 2015).

Para eles, o consumo de drogas lícitas foi considerado de menor

periculosidade, como um comportamento já enraizado na sociedade, principalmente

em relação ao álcool, que faz parte da cultura e festividades típicas brasileiras. O

álcool é a droga que primeiro aprendemos a consumir, consumo esse legitimado em

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diversas situações (saída do trabalho e nas várias comemorações durante o ano),

com ampla divulgação na mídia. O álcool, no entanto, foi considerado por alguns dos

participantes como uma droga que promove dependência de difícil tratamento

devido à facilidade de obtenção.

O consumo de álcool exerce muita influência na trajetória de uso de drogas

na sociedade, sendo imprevisível saber quem pode ou não experimentá-lo ou quem

tem chances ou não de desenvolver dependência dessa droga. O fato é que a

cultura de consumo excessivo e a necessidade de usar o álcool para distanciar-se

da realidade ou promover euforia não têm limites, pois, além do consumo da

substância, há de se considerar o contexto em que é consumida, sempre em

ocasiões de muita animação e socialização familiar ou social. Trata-se, portanto, de

um consumo legitimamente cultural, distinto do tabaco, por exemplo, que passa hoje

por um processo mais vigilante de condenação.

Situações de embriaguez, consumo excessivo e até mesmo condução de

veículos sob ação do álcool são relatadas pelas pessoas habitualmente, sem

grandes perplexidades. Nada, porém, comparado à situação de quem faz uso nocivo

de crack, uma vez que os contextos de uso e efeitos de ambas as drogas são

distintos, sendo mais intensos aqueles proporcionados pelo crack.

Após relatarem o consumo de álcool, tabaco, maconha e outras drogas, os

participantes se depararam, neste percurso de experimentação, com o crack.

Segundo eles, o primeiro contato com tal substância diferiu bastante do que haviam

sentido em relação a outras drogas:

“Bom depois que meu vô faleceu eu saí de casa de 12 pra 13 anos [...] E me envolvi com droga... primeiro foi pó. Tomava chá de beladona, cheirava tinner, maconha algumas vezes, até que veio o crack.” (P36) “A primeira droga que eu usei eu tinha dez anos, o crack eu experimentei eu tinha dezesseis.” (P10)

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“Eu vi um amigo usando e aquilo me chamou a atenção, a forma... foi o cara, furando a lata, todo aquele ritual que se tem pra consumir o crack, e eu fiquei pensando “pô, vou fumar esse treco aí, né? Vô fumar pra ver como é que é”. (P7)

Em seus relatos, afirmaram também que o início do uso do crack veio com o

decorrer do consumo de outras drogas, não se caracterizando como aquela de

primeira escolha para experimentação; no entanto, é considerada a mais impactante,

sobrepondo-se às demais ao longo do tempo, o que provoca reviravolta em suas

vidas. Alguns mencionaram que usaram o crack por ter faltado maconha nas

“bocas”, ocasiões em que o traficante teria oferecido o crack como opção.

Relatos mencionaram ainda a busca por um prazer maior àquele já obtido

com outras drogas e a curiosidade de experimentar o crack, cujos efeitos eram

bastante comentados e difundidos entre os amigos.

“Curiosidade. Eu vi um amigo usando e aquilo me chamou a atenção, a forma... foi o cara, furando a lata, todo aquele ritual que se tem prá consumir o crack, e eu fiquei pensando ‘pô, vou fumar esse treco aí né? Vô fumar prá ver como é que é’.” (P7) “Essa merla aí foi destruição na minha vida! Cheguei a ficar internado, aí depois de muito tempo, eu já tinha até largado da merla, sabe? Aí veio o crack. E aí foi o fim.” (P32)

Para essa experimentação, somente dois participantes relataram influência de

familiares, sobretudo do pai, dependente de cocaína inalada. Já no estudo de Horta

et al (2014), 48,3% dos entrevistados referiram já ter consumido crack com algum

familiar, sendo esta possibilidade maior entre aqueles com quem mantinham

parentesco de ordem horizontal, como irmãos e cônjuges, do que com pais. O

consumo com cônjuge, no entanto, foi o mais relatado (HORTA et al, 2014).

O uso do crack leva a uma rotina de busca pela droga e gera um padrão

diferente de uso, pois, em alguns casos, provoca dependência e pode apresentar

alguns fatores predisponentes, como transtorno de personalidade antissocial, déficit

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de atenção/hiperatividade, dependência na vida de álcool, maconha, anfetaminas,

sedativos hipnóticos e opioides (OLIVEIRA, NAPPO, 2008; FALCK, WANG,

CARLSON, 2008; VIEIRA, 2010).

“Aí teve um dia que eu falei assim ‘ah, vou ver qual desse trem aí’ eu estava fumando maconha né, estava na lombra da maconha, e fui fumar essa pedra do crack. Aí falei assim ‘nossa, é uma coisa muito... vou confessar que é a melhor sensação que já tive na minha vida’. Nossa aí agora que eu fui, imbernei [uso incessante do crack], imbernei, imbernei, imbernei.”(P9)

No presente estudo, os participantes comentaram que a mudança do padrão

do uso de drogas após a experimentação do crack gerou prejuízos para suas vidas,

de tal modo que o uso, antes passível de controle e compatível com o trabalho e as

relações familiares e sociais, assumiu outra proporção e passou a envolver

descontrole financeiro e relacional o que, segundo eles, era motivo para um uso

cada vez mais constante.

De acordo com suas falas, a falta de suporte na socialização primária se

perpetuou na secundária, não tendo emergido referências a nenhum apoio de

estruturas estatais, programas de saúde públicos ou assistência social. No momento

de experimentação, a maioria encontrava-se em situação de vulnerabilidade social,

em que o suporte relacional que ainda existia era frágil. Associado a isso, a situação

econômica era desfavorável para quase todos os participantes.

Para aqueles com mais de 40 anos, a situação revelava-se ainda mais crítica,

pois os serviços atualmente disponíveis no município, no estado e no país ainda não

eram estruturados e o uso do crack, na juventude desses adultos, estava em fase de

disseminação, substituindo a maconha nas “bocas”.

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4.2.2. A dor do prazer

Após experimentarem o crack, os participantes relataram sentir um desejo

incontrolável e crescente de usá-lo, caracterizando uma situação de dependência.

Quando a dependência está instalada, ocorre a busca e o uso descontrolado da

droga, sendo que a droga muitas vezes é consumida no ambiente de trabalho,

gerando prejuízos laborais e relacionais.

“eu fumava, eu já fumei pedra de crack na lata dentro da máquina, [...] pegava a lata lá [...] botava a cinza, botava a pedrinha, e dava o pega ali, e já botava lá, e já botava o pé no acelerador de novo [...]” (P1)

Em seguida os participantes descrevem uma fase de depressão por

arrependimento das ações realizadas para obtê-la. Esse ciclo compreende períodos

curtos de tentativa de abstinência por meio do tratamento, quando imersos no

arrependimento, que são geralmente interrompidos por alguma desilusão.

“Olha meus braços! [mostrando as diversas cicatrizes de cortes] Isso aqui é abstinência, depois que fuma tudo, que faz tudo, vai pensar ‘que que eu fui fazer! ’ Mais aí não adianta fazer isso aqui não.” (P37)

Nessas situações, são frequentes as tentativas de suicídio, o comportamento

de craving ou “fissura” e a busca de meios para obtenção do crack, assim

configurando um ciclo (Figura 4).

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Figura 2 - Ciclo de uso relatado pelas PTDC. Goiânia, GO, 2015.

Fonte: elaborada pela autora.

No estudo desenvolvido por Rezende e Pelicia (2013), tal ciclo de uso e

recaída também foi identificado entre os entrevistados usuários de crack. Essas

pessoas oscilavam de um estado de abstinência total, enquanto estavam em alguma

instituição de saúde, até uma entrega total à droga, não havendo o efetivo

tratamento, o qual, segundo os autores, é permeado por recaídas e usos

esporádicos.

Neste estudo, o crack foi considerado a droga que, paradoxalmente,

proporciona prazer e alívio aos sofrimentos, mas também leva ao consumo

desenfreado, fissura incontrolável, prejuízos no trabalho, venda de bens e

afastamento da família. Podemos considerar inclusive, que para eles, o momento em

que estavam no hospital era de descanso para alguns e para outros era uma

oportunidade de manutenção, mesmo que temporária, de abstinência.

Durante a realização de todos os grupos, foi possível observar relatos, ainda

que pontuais, de prazer relacionado ao uso de crack. As falas expressam foco no

tratamento hospitalar, voltado para a abstinência e concepção de droga como algo

Tentativa

de

abstinência

total

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nocivo, destruidor da sua moral e dignidade, materializando todas as intempéries

pelas quais haviam passado.

Assim, falar da droga e dos malefícios do seu uso parece não ser algo fácil,

como relatado abaixo, uma vez que o ambiente em que se encontravam

proporcionava um tratamento voltado para os efeitos da droga no organismo

enfocando a abstinência:

“Porque aqui dentro [...] já tem os telefones, já tem as pessoas que sabe onde tem mais barato, tem pessoas falando aqui que sabe onde tem não sei quê, que entrega na porta, então não é um tratamento, cê tá tentando... Eu não quero isso pô, eu tenho 48 anos, eu sou coroa já, então eu não quero isso aí. [...] igual o crack, toda hora fala nesse tal desse crack, antes, de manhã cedo faz uma oração e ‘oh gente o crack é o seguinte’ sabe, não dá, na hora do almoço vamos comer ‘ó fulano, o seguinte, o crack...’ então o trem tá ali com você.” (P6)

Interessante notar que na presente pesquisa, segundo os relatos, os

comportamentos motivados pelo desespero diante da necessidade da droga

independiam do poder aquisitivo dos sujeitos, pois eles afirmaram que quando a

dependência de crack se instala, as consequências para o dependente são as

mesmas. Esse fato é sintetizado nas seguintes falas:

“Todo mundo que passa aqui é tudo a mesma, mesma vida, né? O crack é uma história pra todos...” (P26) “o crack [...] você vai perceber que as histórias... os finais das histórias são muito parecidos, são filmes repetidos, pessoas que venderam suas coisas, chegaram à sarjeta, à rua, o término é aí mesmo...” (P3) “eu sempre fui envolvido com tudo, mas geralmente, mesmo agora, o que me abalou mais foi o crack. Tirou de mim essa vontade de estudar, vontade de trabalhar, vontade de tudo” (P32)

Tal evidência também foi encontrada no estudo de Freire et al (2012), em que

não houve diferença na intensidade e frequência de uso do crack quando os autores

compararam dois grupos pertencentes a distintas classes econômicas.

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Por outro lado, Jorge et al (2013) assinalam que a estrutura socioeconômica,

em especial a referente ao sistema econômico, influencia os padrões de consumo

das pessoas levando ao exagero e à necessidade de se obter o novo

indefinidamente. Os autores ponderam ainda sobre o fato da sociedade

contemporânea satisfazer incessantemente os prazeres, de forma que todo esse

contexto de consumo e busca de satisfação influencia também o consumo do crack,

que é o produto final, o ápice de uma trajetória de consumo de drogas psicoativas

numa sequência crescente de busca pelo prazer.

Sob a ótica dos participantes, o uso de crack, por causar fissura e

dependência incontroláveis, promove o afastamento tanto da família, que não

consegue lidar com o comportamento do dependente, quanto do próprio

dependente, que deixa sua casa para usar a droga em local distante das críticas.

Muitas vezes, esse afastamento é desencadeado por embates e desajustes na

rotina e cultura familiar. Contribuem também para o desgaste das relações o furto de

objetos de familiares, a negligência com membros da família, as discussões e os

comportamentos que testam a confiança de parentes, tais como mentir sobre a

finalidade de dinheiro na verdade gasto para compra do crack.

“Porque esse trem machucou muito nossa vida, sabe? Cê perdeu a moral com a família, com vizinho, com mulher, com filho, com tudo. Aí chega em casa, às vezes, o pai sai carregando tudo, guarda tudo, guarda DVD.” (P6) “Gente, mas celular mesmo...perdi as contas de celular que eu roubei da família.” (P27) “Muitas vezes eu chegava nele e mentia, ‘pai eu tô doente, me arruma uns vinte reais’, ele ‘toma’. Agora chegou num ponto deu chegar nele e falar assim ‘pai eu tô doente’, ‘vamo na farmácia, eu compro o remédio pra você’. (P12)

Com o afastamento da família e sem suporte laboral, os participantes

relataram algumas atividades ilícitas por eles praticadas quando não possuíam mais

trabalho ou dinheiro, como furto, roubo, assassinato, assalto à mão armada ou

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tráfico de drogas. Ressalta-se que tais delitos poderiam ser cometidos algumas

vezes com violência.

“Se não me der, e se não me der o que eu quero, eu vou falar para você, eu endemoniava, ou eu saía machucado demais ou a pessoa saía machucada demais”. (P11) “Fiquei preso por causa de um homicídio. Aí eu saí. Fui preso de novo no 157, que é um assalto com mão armada”. (P38)

As atividades ilícitas, relatadas pelos participantes do presente estudo e de

outros, estão muitas vezes associadas a um nível maior de depressão e fissura

(OLIVEIRA, NAPPO, 2008; GUIMARÃES et al, 2008; MARTINS, PILLON, 2008).

Os atos ilícitos tornaram-se costumeiros entre os dependentes de crack, que

passaram a incorporar a denominação de “vagabundo”, usada, segundo Castel

(2010), como figura para se referir àqueles à margem da lei e da assistência. Assim,

ao mesmo tempo em que não contam com suporte relacional nem laboral, também

não agem sob as leis das instituições que dispõem desse suporte. No território da

dependência do crack, as leis são outras e a linha da ilegalidade, por eles já

ultrapassada, tende a ter seus limites cada vez mais imprecisos. Nesse contexto, o

furto inicial de objetos em casa ganha outras proporções, estende-se a objetos de

estranhos e, em seguida, as ações para obter a droga tornam-se cada vez mais

arriscadas, expondo-os, inclusive, ao risco de morte.

No contexto de uso do crack, os sujeitos descreveram a relação com o tráfico

e seu sentimento de revolta para com o traficante, por entenderem que ele visa

exclusivamente ao lucro e conduz a venda de maneira nefasta, valorizando quem

tem dinheiro para a compra e desprezando quem não o tem. Afirmaram também não

existir amizade entre ambas as partes, sendo comum o relato de morte de pessoas

próximas por dívida de droga. Ao mesmo tempo, a relação com a polícia também

não é cordial e a ação dos agentes de segurança pública foi descrita pelos

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participantes como sendo coercitivas e algumas vezes injustas uma vez que o

dependente de crack, por temer retaliação do traficante, omite informações sobre a

localização das “bocas” e, consequentemente, é tratado com truculência por

policiais, situação também relatada no estudo de Ribeiro, Sanchez e Nappo (2010).

No presente estudo, no entanto, os participantes consideraram o uso do crack

incompatível com o tráfico, uma vez que as características fortemente viciantes

desta droga os colocariam sempre em risco por dívidas “eternas”. Na vivência

relatada por alguns que já traficaram, embora exista rápida elevação do poder

aquisitivo, pelo fato do tráfico ser uma atividade bastante rentável, os bens

conquistados também eram rapidamente perdidos quando queriam obter a droga.

“Nós vendíamos de quantidade, de dez, vinte, de trinta quilos. Porque a gente mesmo plantava na roça. Então, a gente mandava pro Rio de Janeiro, [...] mandava 500kg, 1000kg de maconha, mandava a carreta, pro comando vender. ”(P24) “O pessoal só quer vender o crack, né? ... crack dá mais dinheiro. Dá dinheiro... uma pedrinha assim do tamanho do carocinho de feijão, dez reais. Cê fuma ele em dez minutos... Dez reais de maconha cê fuma em dez dias.” (P8) “Crack, eu só fumava. Porque o seguinte, se você traficar... o crack, se você fumar, não consegue, porque você vai fumar tudo, o traficante vai pedir o dinheiro aí não tem.” (P24)

O tráfico de drogas é uma das frentes de trabalho da Política Nacional sobre

Drogas no sentido de promover a redução da oferta. Mas quem são esses

traficantes? No presente estudo ficou perceptível que os participantes que relataram

ter se envolvido com o tráfico, ainda que adquirissem alguns bens, acabavam

perdendo o patrimônio, para obter o crack.

Segundo Zaccone (2014), há vários tipos de traficantes. O perfil daquele

exposto na mídia e que prevalece no imaginário social é de alguém destemido, que

comanda as favelas e enriquece rapidamente; no entanto, o autor discute que o

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negro, pobre, economicamente desfavorecido e morador de locais com pouca

assistência do Estado é o mais comum na realidade. Esses traficantes são

conhecidos como “mulas”, “boca” ou “aviõezinhos”, e ficam com apenas uma

pequena parcela do dinheiro do narcotráfico.

As falas permitem apreender essa realidade uma vez que os sujeitos que

relataram passagens pelo tráfico não tinham acesso a grande parte do montante de

dinheiro e não eram os chefes de tráfico.

Prosseguindo a discussão dos resultados, no contexto da dependência do

crack, alguns aspectos precisam ser destacados pelo maior potencial de

vulnerabilidade, por exemplo, o sexo. Assim, o uso desta droga por mulheres tem

suas especificidades, conforme expressaram as participantes deste estudo. Houve

tendência do sexo feminino se importar mais com o contexto familiar e, em especial,

com os filhos, e elas também expressaram maior descontentamento em relação a

situações nas quais expuseram seus filhos a riscos em decorrência da dependência

de crack. Em suas falas, justificaram o uso inicial de drogas por sentirem-se sós,

desamparadas, imersas em conflitos familiares ou por necessidade de perder peso,

o que demonstra grande influência da esfera afetiva e de aspectos relacionados à

autoimagem da mulher na utilização da droga.

Nesse sentido, observa-se tendência de aumento dos indicadores do uso de

drogas psicoativas entre mulheres, tanto das lícitas como das ilícitas, constituindo

um desafio para a saúde pública e os serviços especializados (SILVA, PEREIRA,

2015; UNODC, 2015; LARANJEIRA et al, 2014).

Além disso, alguns fatores fazem com que a dependência do crack entre

mulheres cause problemas mais sérios, uma vez que não raro são solteiras, mães,

em idade fértil, sem renda própria, suscetíveis a situações de violência e prostituição

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como forma de acesso à droga. Aliado a isso, há de se considerar a questão de

estarem suscetíveis a gestações de risco, com efeitos nocivos ao bebê e grande

possibilidade de posterior negligência de cuidados aos filhos (YABUUTI, BERNARDI,

2014; SILVA, PEREIRA, 2015).

O estudo de Zavaschi et al (2014), que comparou um grupo de gestantes que

faziam uso nocivo de crack com outro de não usuárias, evidenciou que a maioria

daquelas que consumiam a droga não tinha parceiro e apresentava maior

prevalência de transtorno de personalidade antissocial e risco de suicídio. Grande

parte delas também não havia feito acompanhamento pré-natal (75%). Os bebês,

filhos de mães que faziam uso nocivo de crack, pesaram menos ao nascer. Dado

importante é que as mães usuárias relataram ter diminuído o consumo da droga

durante a gravidez, o que, segundo os autores, demonstra abertura a uma possível

intervenção para cessação do uso durante a gestação (ZAVASCHI et al, 2014).

Alguns estudos mostram não terem sido comprovados prejuízos específicos

na exposição pré-natal, no quesito referente ao desenvolvimento físico ou cognitivo.

Quando comparados o cigarro de tabaco e a cocaína, as crianças expostas ao

primeiro demonstraram maiores prejuízos motores, embora possam ocorrer também

consequências mais tardias no comportamento de tais crianças e futuros

adolescentes nos quesitos controle comportamental e regulação emocional, além de

se tornarem mais vulneráveis ao uso de substâncias na adolescência (LESTER,

PADBURY, 2009).

Embora atualmente não estejam disponíveis dados consistentes a respeito

das consequências do uso de crack na gestação e de suas implicações para o bebê,

estudo de Zavaschi et al (2014) demonstrou que o uso leva ao policonsumo de

drogas entre as gestantes que geralmente consumiam álcool e tabaco

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conjuntamente com o crack, substâncias comprovadamente nocivas para o feto. O

referido estudo evidenciou também que, após o nascimento, a criança fica exposta

ao comportamento muitas vezes agressivo da mãe usuária de cocaína/crack, o que,

segundo Eiden et al (2015) pode interferir na sua autorregulação, ou seja, no

controle de suas próprias ações que, por sua vez, interferem em suas relações

sociais futuras.

Nesse contexto de usar incessantemente o crack em decorrência do

mecanismo de dependência, chegando a uma situação de desfiliação, as pessoas

são motivadas a buscar ajuda somente quando chegam ao “fundo do poço”, como

eles mesmos denominam. Esse momento caracteriza-se pela somatória de falta de

dinheiro, de apoio familiar, de local para dormir e pelo sentimento de desespero por

não mais querer usar o crack, mas não ser capaz disso em virtude da dependência

já instalada. Acresce-se a consciência de que a dependência causa sofrimento à

família, principalmente mãe, esposa e filhos.

Importante mencionar ainda que a desfiliação permeia suas vidas, de maneira

mais ou menos impactante, ao ponto de alguns, apesar de aptos a deixar o hospital,

precisarem nele permanecer por não ter para onde ir. A falta de apoio nesta esfera,

por não pertencer mais a um núcleo familiar, também foi observada no estudo de

Seleghim et al (2011) como motivo para que tenham a rua como única opção.

O contexto de desfiliação social em que se encontravam os participantes

remete à questão colocada por Castel (1994), quando discute a situação daqueles

que denomina indigentes válidos. Segundo o autor, essas pessoas ou não se

encaixam no perfil para a assistência, a qual é dirigida àqueles inválidos ou

impossibilitados de trabalhar por incapacidade física, ou são mulheres, mães de

famílias monoparentais, idosos ou mesmo órfãos.

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Castel descreve uma figura em particular que ele denomina de indigente

válido sendo “os aptos-para-o-trabalho-que-não-trabalham” que “são postos em um

duble bind: injunção de trabalhar, impossibilidade de trabalhar”, ou seja, o sujeito

vivencia externa e/ou internamente uma pressão para o trabalho, porém esses não

estão capacitados, ou pelo menos não demonstram estar, para serem integrados ao

mercado de trabalho (CASTEL, 1994, p.26).

O autor ainda complementa que essa exigência e a simultânea

impossibilidade de trabalhar fazem com que esse indigente válido passe a ser

considerado criminoso e que suas atitudes justifiquem atos de repressão. Embora o

autor se refira à situação de grupos integrantes da história europeia nos últimos

séculos, considero que o perfil de algum dos participantes do presente estudo se

identifique ao de indigente válido. São pessoas que conseguem trabalhar, mas não

são “empregáveis”, e apresentam laços relacionais muito prejudicados, por não os

possuírem desde crianças ou tê-los perdido quando em processo de uso nocivo ou

dependência da droga.

4.2.3. Retomar a vida

Após se arrependerem e chegarem ao fundo do poço, os sujeitos, de modo

geral, mencionaram projetos de cessar o consumo de crack, buscar inserção no

mercado de trabalho formal, estudar e retomar as relações familiares, ao mesmo

tempo em que consideraram a abstinência um desafio a ser vencido com fé e

vontade de reconstruir a família, recuperar a dignidade por meio do trabalho honesto

e, assim, obter suporte para superar a dependência. Consideram fatores

dificultadores para a abstinência a desconfiança da família e da sociedade, o efeito

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prazeroso do crack, os relacionamentos amorosos com outros usuários e o

tratamento do hospital, o qual, paradoxalmente, é permeado pelo uso de drogas.

“Eu quero voltar denovo, fazer um curso, passar para uma máquina maior [...] e caçar uma mulher, claro, me casar, porque eu também tenho um grande sonho de ter filho.” (P1) “Uma coisa é que nós temos que viver como se fosse uma criança, começar a reviver denovo. Sabe, deixar tudo aquilo prá trás. Esquecer e começar a viver denovo”. (P11) “É bobagem pensar que eu vou sair daqui, eu não vou ver uma pedra de crack sem dar vontade...é muito pra nós que usamos crack é muito... nossa senhora, a gente tem que segurar demais. Eu fiquei um mês, depois que saí do presídio, eu fiquei um mês, só que eu gastei dinheiro de um mês dentro de dois dias, quase cabei com a minha vida aí oh! Meu pescoço. Faltou um centímetro pra pegar minha artéria, um!” (P37)

Os sujeitos relataram também planos para quando deixassem o hospital, os

quais residiam em retomar ou conseguir um trabalho, voltar a estudar e recuperar as

relações familiares anteriores à dependência, por considerarem fundamental obter

dinheiro por meio do trabalho e resgatar as relações destruídas pelo uso do crack,

assim reiniciando uma nova família, agora também pensando em ter filhos.

Nesse sentido, a palavra recomeço foi frequentemente empregada pelos

participantes para expressar o que almejavam para suas vidas após a alta

hospitalar. Sob suas perspectivas, o recomeço caminha no sentido de retornar à

essência, esquecendo o tempo vivido com a droga.

“Nós temos que viver como se fosse uma criança, começar a reviver de novo. Sabe, deixar tudo aquilo prá trás. Esquecer e começar a viver de novo” (P17)

Desse modo, os participantes demonstraram compartilhar da concepção

imperante na sociedade que defende a abstinência como a única via para uma vida

considerada correta. No entanto, trata-se de um projeto ainda distante para alguns,

que admitiram as próprias pulsões e descreveram a dificuldade de cessar o

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consumo até pelo prazer e alívio que proporciona. A maioria afirmou considerar

necessário abolir o uso da droga em todo e qualquer contexto, bem como as

amizades que levassem a esse consumo, aspecto também observado no estudo de

Rezende e Pelicia (2013).

Uma vez que a abstinência era necessária, de acordo com as falas dos

participantes, eles deixaram claro que se este não fosse o desejo da pessoa, de

nada adiantaria a internação, pois essa deveria ser por motivações próprias:

“A gente só pode trazer uma pessoa pra cá se quiser, se ela não quiser, se ela não quiser o tratamento dela...não adianta, porque da outra vez eu não queria meu tratamento eu fui por causa do meu pai, ficou me barulhando demais, aí eu peguei e fui, não adiantou nada,

um mês depois eu tava lá.”(P10)

“Vocês têm que ter força de vontade. Se falar assim ‘eu quero isso e pronto’, tem que ter opinião. Se não tiver opinião... cabou, o que vc fez aqui cabou.” (P24)

Dessa forma, medidas que confiram mais liberdade ao dependente e

respeitem sua autonomia parecem mais pertinentes. A redução de danos e a

utilização de métodos que permitam acompanhamento mais próximo, via telefone,

por exemplo, foram recomendadas em outros estudos (SANTOS CRUZ et al, 2013;

BISCH et al, 2011).

Pelo fato de estarem em situação de desfiliação social, os participantes

contavam com a assistência, a qual, segundo Castel (1994), consiste em uma

tentativa de substituir a sociabilidade primária, neste caso ausente, e oferecer

condição ao menos mínima de sobrevivência a essas pessoas. Neste estudo, o

hospital representa uma dessas ferramentas da assistência.

Outras buscas por ajuda relatadas foram a serviços de urgência/emergência,

seja no hospital campo do estudo, no qual muitos referiram ter conseguido vaga por

meio de familiares que conheciam pessoas influentes na cidade, seja no serviço de

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emergência psiquiátrica do município. Neste último, no entanto, ressaltaram que se

sentiam desconfortáveis por serem atendidos no mesmo local de pessoas com

transtornos mentais, e verbalizaram grande dificuldade de conseguir vaga no serviço

de saúde que almejavam, ou seja, o hospital campo deste estudo.

Outro meio pelo qual poucos relataram terem buscado ajuda foram as

comunidades terapêuticas e os grupos de ajuda como Alcoólicos Anônimos e

Narcóticos Anônimos. Nenhum dos participantes mencionou o acompanhamento por

serviços oferecidos nos CAPS ou pelas unidades da Estratégia de Saúde da Família.

No entanto, devo destacar a fala de dois participantes que expressa o quanto

o caráter de promoção da saúde e prevenção do uso nocivo e dependência é

fundamental na problemática das drogas psicoativas e em especial do crack:

“O cara, o cara que tem que ser tratado é aquele que não usou, por quê? Porque o risco dele usar é maior do que o nosso, porque nós estamos aqui tentando sair, nós estamos aqui tentando sair de uma coisa que, cê sabe que ela é impossível.” (P14) “É isso...Nunca fume, esse é meu recado, nunca dá um pega, nunca dar o desejo. ” (P26)

Além disso, o estudo de Narvaez et al (2015) sobre a concepção de pessoas

em tratamento contra a dependência de crack mostrou que a maioria estava

insatisfeita com o serviço oferecido. Assim, torna-se fundamental que os espaços de

tratamento priorizem uma atuação multiprofissional abrangente, que traga a família

para a discussão acerca da reinserção social e das comorbidades do usuário.

A desconfiança da família, o efeito da droga, os relacionamentos com

pessoas também usuárias e o uso de drogas no hospital foram aspectos

mencionados pelos participantes como dificultadores do processo de abstinência e

geradores de recaídas. Além disso, não foi possível perceber uma integração

expressiva da instituição com a rede de assistência à saúde mental ou com o a

família de quem recebe tratamento.

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Estudo de Pedroso et al (2014) que mapeou a trajetória de 207 homens em

tratamento da dependência de crack e descreveu as tentativas de hospitalização e

recaídas, evidenciou que na primeira tentativa de hospitalização, 50% da amostra

aguardaram até 3 dias para internação, sendo que em 92,8% dos casos a busca foi

pelo serviço público de saúde. Os pesquisadores identificaram ainda que os

problemas ocupacionais e jurídicos foram os principais interferentes na recaída após

a alta da primeira internação, correspondendo a 65,5% e 62,1%, respectivamente

(PEDROSO et al, 2014). Na percepção dos sujeitos, os principais fatores que podem

influenciar a abstinência após a alta são a medicação e a capacidade de lidar com

situações de risco. A maioria dos participantes relatou internações anteriores a

menos de um mês após a alta (PEDROSO et al, 2014).

No presente estudo os sujeitos mencionaram a desconfiança da família em

relação à cessação do uso da droga tanto quando ainda estavam no hospital como

após a alta. Nesse sentido, relataram ser comum que os familiares escondessem

objetos de valor ou desconfiassem quando os participantes saíam de casa.

Tal desconfiança foi validada pelos próprios participantes por reconhecerem

que seus comportamentos pregressos levaram à falta de credibilidade, fator agora

apontado como dificultador para o tratamento. Dessa forma, naquele momento de

suas trajetórias de vida, mantinham uma relação delicada com o seu suporte

relacional, buscando ajustes e construção de confiança. Trata-se de uma situação

de difícil abordagem, mas que deve ser valorizada por quem tem interesse no

processo de retomada do convívio social daqueles em tratamento contra a

dependência do crack.

Nesse contexto, é importante a discussão sobre o estigma sofrido pelo

usuário de drogas, em especial o de crack. Estigma pode ser definido como uma

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“uma marca física ou social de conotação negativa ou que leva o portador dessa

‘marca’ a ser marginalizado ou excluído de algumas situações sociais” (ANDRADE,

RONZANI, 2014, p.27).

De acordo com Goffman (2004, p.7), “um indivíduo que poderia ter sido

facilmente recebido na relação social quotidiana possui um traço que pode-se impor

a atenção e afastar aqueles que ele encontra, destruindo a possibilidade de atenção

para outros atributos seus”. Assim, o que nós, enquanto sociedade, esperamos de

determinados grupos populacionais poderá ou não estigmatizar um indivíduo, pois

isso depende do quanto eles correspondem à nossa expectativa.

Goffman (2004) ainda classificou o estigma em três tipos: o relacionado ao

aspecto físico, como os portadores de necessidades especiais; o ligado ao caráter

individual, que incluem os vícios em drogas, homossexualismo, desemprego,

desonestidade, entre outras; e o estigma, denominado pelo autor de tribais de raça,

nação e religião, o qual leva ao sofrimento do filho em decorrência de determinadas

características dos pais, perpetuando costumes pré-estabelecidos (GOFFMAN,

2004).

Concepções como o dependente de drogas é “fraco” ou “mau caráter” e que

esse problema “não tem solução” são ideias arraigadas na sociedade e, por

consequência, aos hábitos dos profissionais de saúde (ANDRADE, RONZANI,

2014).

No trabalho de Kopetz et al (2013) com mulheres usuárias de cocaína/crack

em situação de risco para HIV, identificou-se associação entre sofrer rejeição social

e o número de parceiros sexuais de maneira perceptível apenas entre as mulheres

(KOPETZ et al, 2013). Os autores assinalam ainda a possibilidade que uma vivência

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de desfiliação social exponha o dependente de crack ao comportamento de risco e

autodestruição.

O estudo de Latkin et al (2013) mostrou que pessoas sem moradia fixa, com

estigma, que convivem com outros usuários que atualmente utilizam cocaína ou

crack têm maior chance de sofrer depressão. Nesse sentido, os autores ressaltam a

necessidade de capacitar os membros das equipes que atuam junto aos usuários de

drogas para combater o estigma entre profissionais, familiares dos usuários e

sociedade como um todo (LATKIN et al, 2013).

O estigma e a ausência de uma visão holística a respeito do usuário e/ou

dependente de drogas também comprometem a aproximação dos profissionais de

saúde da ESF, que estão no atendimento direto às famílias. O estudo de PAULA et

al (2014) com membros da ESF evidenciou estigma e receio da equipe com esse

grupo social por considerá-lo caso de polícia, capaz de cometer atos violentos e/ou

ilegais, visão que condiz com a da sociedade de maneira geral.

Essas concepções imprimem no dependente do crack e de outras drogas

uma conotação que acaba por encobrir todas as demais características, assim

desvalorizando essas pessoas e construindo uma barreira entre o serviço de saúde

e o dependente de drogas.

O preconceito e o estigma vivenciados pelo dependente de crack constituem

mais um obstáculo a ser vencido em direção à integração social. A visão daqueles

que consomem crack, tão associada à de pessoas com vestimentas sujas,

comportamento inadequado, praticantes de violência e roubo, contribui para mantê-

los distantes do restante da sociedade. Os participantes deste estudo, cientes deste

fato, buscam a abstinência como forma de superação do estigma e aceitação da

família e sociedade.

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Outro ponto fundamental apontado pelas PTDC para retomada de suas vidas

foi o aspecto laboral. Havia, entre todos, o desejo de conseguir um emprego formal e

adquirir bens perdidos para aquisição da droga:

“Arrumar um serviço em primeiro lugar. Eu quero um serviço de carteira fichada. Toda vida eu trabalhei.” (P23) “Eu penso em providenciar um trabalho primeiro. Eu perdi...o hábito de trabalhar. Até feio falar isso, mas... eu preciso trabalhar.” (P7)

Um dos aspectos fundamentais para reabilitação do dependente do crack é a

inserção laboral. Entre dependentes de substâncias psicoativas, o prejuízo do

vínculo laboral geralmente está presente, visto que não raro já apresentam déficit de

formação educacional formal, ou a rotina de uso da droga inviabilizou a manutenção

do vínculo empregatício, ou até mesmo pelo estigma que sofrem dos empregadores

e colegas de trabalho (BONADIO, DUAILIBI, 2012).

Para Castel (1994; 2010), a inserção laboral é uma das bases para a efetiva

integração das pessoas na sociedade. Para os participantes deste estudo, o trabalho

representa a via para obtenção de dinheiro, recuperação da dignidade e do valor

perante a sociedade e família. Revelou-se, portanto, fundamental o sustento próprio

e da família por meio lícito e estável, o que, no decorrer do uso nocivo de crack, é

um dos, senão o primeiro, aspecto comprometido.

No entanto, essa inserção no mercado de trabalho, vista com esperança pela

maioria dos participantes, demanda ações conjuntas que devem ser amparadas pela

rede de assistência social e acompanhadas de perto pela família e pelos diversos

parceiros da saúde. Todos devem atuar de maneira integrada com vistas à formação

para o trabalho, a qual, no caso dos sujeitos deste estudo, já era deficitária no

momento em que adentraram no hospital, uma vez que a maioria tinha poucos anos

de estudo formal e maior experiência de trabalho no mercado informal. Essa

construção de uma nova vida não é fácil, como relatado pelos participantes:

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“Uma das dificuldades do usuário de crack é o recomeço. Parece que tudo é mais difícil. Aí você começa... parece que tem que começar tudo do zero de novo. Aí é por isso que geralmente, a maioria recai.” (P26)

Embora tenham expressado o desejo de mudar de vida e superar o vício, os

participantes apresentaram, de forma ambígua, um discurso fatalista no sentido de

considerarem a abstinência, o grande propósito da maioria, algo inalcançável, pelas

diversas recaídas por eles já vivenciadas.

O estudo de Barnaby e Gibson (2008) sobre o tratamento contra a

dependência de drogas evidenciou que 22,8% das pessoas abandonaram o

tratamento, e os motivos incluíam resistência aos cuidados médicos ou pedido de

alta (27,4%), fugas (19,6%), conflitos (9,8%), uso de drogas (5,9%), e outras

violações de regras, incluindo a prática sexual (15,7%).

O abandono mostrou-se mais provável nos jovens do sexo masculino,

solteiros, com menor escolaridade e classe social desfavorecida, desempregados,

portadores de comorbidades psicológicas, como angústia, depressão ou psicose, e

com pouca motivação, dependentes de crack ou álcool (BARNABY, GIBSON, 2008;

ALMEIDA, 2013). Por outro lado, ser mulher, com abuso somente de álcool em

comparação com o policonsumo, possuir relação familiar ruim, receber algum

benefício econômico social e ter idade entre 41 e 50 anos foram fatores que

interferiram positivamente na manutenção do tratamento (BARNABY, GIBSON,

2008; ALMEIDA, 2013).

Estudo de Aguilar e Pillon (2005) revelou que algumas situações provocam

mais tentação quando se está em tratamento para a dependência: estar em locais

onde todos usam drogas, estar com alguém que as utiliza, festejar com os amigos,

ver alguém usando, sentir-se extremamente ansioso, estressado e frustrado. Tais

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fatores estão relacionados principalmente às influências socioambientais (AGUILAR,

PILLON, 2005).

No estudo de Schmitt, Phibbs e Piette (2003), aspecto que favoreceu a

manutenção do tratamento contra a dependência de substâncias psicoativas após a

alta em hospital psiquiátrico foi a proximidade entre o hospital e o local de

atendimento ambulatorial, no caso do Brasil, os CAPS. Nesse sentido, os autores

assinalam a necessidade de que as unidades que dão o suporte nesse tratamento

pós-alta hospitalar sejam próximas das pessoas que delas necessitam (SCHIMITT,

PHIBBS, PIETTE, 2003).

O estudo de Batista, Batista e Constantino (2012) permitiu identificar algumas

mudanças no perfil de pacientes atendidos em CAPSAd em município do Rio de

Janeiro, entre 2000 e 2009, a saber: crescimento do percentual de mulheres e

adolescentes tratados no serviço, usuários manterem ocupações informais,

pacientes anteriormente encaminhados a essas unidades por meio de demanda

judicial, com expressivo consumo de crack associado a outras substâncias

psicoativas (BATISTA, BATISTA, CONSTANTINO, 2012).

Ainda segundo o estudo, há diferença também entre pessoas internadas em

hospitais e comunidades terapêuticas no que se refere à motivação, o que, segundo

os autores, decorre da diversidade de tratamento oferecido nos dois tipos de

serviços (BATISTA, BATISTA, CONSTANTINO, 2012). Assim, se no hospital a

conduta é centrada no tratamento médico e nas suas prescrições, as comunidades

terapêuticas norteiam-se pelo exercício da autonomia e ofertam uma diversidade de

atividades, abordam a questão religiosa e tendem a não medicar as pessoas em

tratamento (SOUSA et al, 2013).

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De acordo com Bezerra e Dimenstein (2011), alguns fatores comprometem a

continuidade do tratamento, como a ausência tanto de programas eficientes de

reabilitação quanto de acompanhamento posterior à alta hospitalar (BEZERRA,

DIMENSTEIN, 2011).

No presente estudo pudemos observar a reinternação da maioria dos

participantes, sendo esse um dos grandes desafios impostos ao tratamento da

dependência do uso de crack, sob a perspectiva da coordenação de enfermagem.

“Eu me considero hoje como dependente, muitas das vezes eu não queria aceitar isso, já fui internado oito vezes, essa é a nona.” (P22) “Aqui, eu tenho é doze internações.” (P16) “E hoje eu me encontro de novo, fui internado aqui cinco vezes já, aqui é a quinta vez.” (P21)

No estudo de Sousa et al (2013) com pessoas dependentes de crack em

tratamento, a maioria estava em estágio considerado de contemplação, ou seja, a

pessoa admite que tem um problema e afirma sua intenção de mudar o

comportamento, mas se encontra em processo de avaliação entre modificá-lo ou

não, em situação chamada pelos autores de ambivalente. Neste momento, reflete

sobre as consequências do seu comportamento para si e àqueles mais próximos.

Para os autores, estar nesse tipo de estágio pode justificar o alto índice de recaídas

e reinternações.

No presente estudo, para o alcance da abstinência, a maioria expressou

confiança em Deus e fé diante das dificuldades. Afirmaram-se católicos, evangélicos

e espíritas, acreditando que Deus poderia proporcionar o suporte e a força de que

tanto necessitavam para se manterem abstinentes.

“Pretendo eu, hoje erguer a cabeça, me apegar com Deus.” (P13) “Se não fosse Deus, acho que eu tinha saído da minha vida.” (P22)

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“Eu experimentei o crack essa droga é terrível e a abstinência que só Deus pode curar, mais depende da gente tentar buscar comunicar com Ele.” (P39)

Tal fato pode ser justificado pelo hospital ter caráter religioso e recorrer a

princípios da doutrina espírita para condução do tratamento, além de outras

atividades. Sob tal perspectiva, a religiosidade tem sido considerada importante

recurso para o tratamento contra a dependência de drogas, uma vez que a fé

proporciona maior qualidade de vida e ameniza a responsabilidade exclusiva do

usuário, que passa a contar com a ajuda de Deus. Além disso, as várias religiões

promovem a sociabilização das pessoas que buscam os diversos seguimentos

religiosos (SANCHEZ, NAPPO, 2008).

Além da confiança em Deus, os participantes mencionaram a necessidade de

que a família confie na sua recuperação, sobretudo as mães e esposas, as que mais

deram suporte, acompanharam a evolução do vício e as tentativas de abstinência e

incentivaram a busca pelo tratamento. A figura do pai, na maioria dos relatos, esteve

distante e não se mostrou participativa na vida nem na trajetória de uso de drogas

dos participantes.

Destaca-se que a família é muitas vezes considerada intolerante pelos

sujeitos, por cobrar uma postura de cessação do uso de drogas ou se recusar a

fornecer apoio econômico aos participantes.

No contexto da vulnerabilidade social descrita por Castel, após a análise das

falas dos sujeitos do presente estudo pudemos enxergar a situação de quem faz uso

nocivo ou é dependente do crack e se encontrava em tratamento no campo de

estudo no momento da coleta de dados da seguinte forma:

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Figura 3 – Contexto social de quem faz uso nocivo/dependente de crack.

Fonte: elaborada pela autora.

Entendemos que a situação de quem chegava ao referido estabelecimento de

saúde era de vulnerabilidade ou desfiliação social, e que, o tempo em que passavam

no hospital e as medidas que eram tomadas na área de assistência social, como

encaminhamento ao CAPS ou outros estabelecimentos de saúde da rede de

assistência em saúde mental proporcionavam a zona de assistência à esses

participantes. Tal situação não era garantia de integração à essas pessoas visto

que, a quantidade de internações, os relatos de relações familiares e sociais

fragilizadas e afastamento ou ausência de trabalho demonstram a vulnerabilidade e

algumas vezes, a desfiliação que permeavam suas vidas. A integração, portanto,

dos sujeitos do presente estudo era almejada e estava presente na fala dos sujeitos,

VULNERABILIDADE SOCIAL

Comportamento de risco para a

saúde Busca incessante pela droga Conflito com a lei Fragilidade laboral Conflitos familiares

DESFILIAÇÃO

Situação de rua Perda do emprego Afastamento da família e rede

social

ASSISTÊNCIA

Programas e políticas de saúde Relações próximas Apoio de Organizações não

governamentais Apoio de programas de

assistência social Apoio religioso

INTEGRAÇÃO

Vínculo empregatício Relações familiares e sociais

(re)estabelecidas Controle da dependência do crack

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às vezes com tom otimista às vezes com certo conformismo de que não seria algo

fácil de se obter.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

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Os dados deste estudo possibilitam algumas reflexões sobre o perfil de quem

está em busca de tratamento contra a dependência do uso de crack. Pessoas

economicamente desfavorecidas, em situação de vulnerabilidade/desfiliação,

chegam ao hospital psiquiátrico na esperança de deixar os antigos hábitos

causadores de sofrimento e isolamento social por meio da abstinência e

reconstrução dos laços familiares e laborais.

Retomando a proposta inicial de compreender os significados do uso nocivo

de crack atribuídos por pessoas em tratamento contra a dependência, consideramos

ter alcançado nosso objetivo.

Os participantes relataram fatores influentes para o uso de crack ligados à

necessidade cada vez maior de prazer, em uma sequência de uso iniciada

geralmente com álcool, tabaco e maconha. Em seus relatos, expressaram vivenciar

afastamento da família, perda do emprego e exposição ao estigma social, situação

que, em suas perspectivas, só poderia ser superada por meio da abstinência. Para

tanto, consideraram fontes de apoio a fé em Deus, o suporte e a confiança da família

e de amigos, bem como da sociedade.

No entanto, o fato de já terem furtado os familiares, mentido sobre a

destinação do dinheiro usado, na verdade, para comprar a droga, a fraqueza moral e

o poder de vício do crack foram aspectos mencionados como dificultadores para a

manutenção da abstinência e mudança de vida.

No presente estudo, a trajetória de experimentação do crack e a chegada “ao

fundo do poço”, conforme seus próprios relatos, passam pelo processo de

desfiliação.

A vulnerabilidade e a desfiliação permeavam a vida dos participantes e eram

visíveis em diversas situações por eles relatadas. O que pudemos também observar

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é que a assistência oferecida pelo hospital, de forma isolada, não era capaz de

promover a integração do dependente que buscava este espaço de atendimento

com tanta expectativa. O trabalho da rede é, portanto, fundamental, principalmente

após a alta hospitalar, momento em que se inicia o grande desafio.

Este desafio, por sua vez, pode ser facilitado se houver o necessário apoio da

família, de amigos, dos empregadores, da religião e, também, força de vontade dos

próprios usuários para superar o vício e retomar a vida após o crack.

Outro ponto que devemos mencionar é que, mesmo que tenhamos utilizado o

grupo como ferramenta de coleta de dados, a interação proporcionada aos

participantes nesse momento nos pareceu ser de grande benefício para os mesmos,

uma vez que expunham sentimentos muitas vezes sem receio, se emocionavam e

se consolavam, trocavam conselhos e apoio, recebiam e davam feedback, sendo

visível assim, o potencial dessa estratégia para o alcance de novas perspectivas

para as pessoas em tratamento da dependência do crack. O enfermeiro é um dos

profissionais indicado para condução desses grupos e, inserido em equipe

muldisciplinar, deve buscar conhecer melhor as pessoas que estão em busca de

tratamento da dependência do crack, suas angústias, relação com a família, fatores

que dificultam/facilitam o tratamento e dar apoio nas recaídas.

Como não investigamos a perspectiva dos familiares, sugerimos essa

abordagem em futuras investigações, uma vez que o suporte relacional primário é

fundamental para a efetiva construção, sob base sólida, da autoestima e

ressignificação da vida das pessoas que são dependentes de drogas, principalmente

do crack.

E para finalizar, é necessária que tanto o profissional enfermeiro como os

demais profissionais não perpetuem o estigma à PTDC visto que por trás do

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comportamento apresentam existe todo um fundamento e contexto específicos, o

que nos torna, profissionais da saúde, responsáveis em diminuir as barreiras entre

pessoas dependentes de crack e serviços de saúde, educação e assistência social e

da própria convivência com a família e sociedade como um todo, integrando ou

reintegrando esses cidadãos de direito.

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REFERÊNCIAS

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ANEXOS

ANEXO A – Documentos fornecidos pela DENARC

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ANEXOS

ANEXO A – Documentos fornecidos pela DENARC

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ANEXO B – TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO (TCLE)

Você está sendo convidado (a) para participar, como voluntário, em uma pesquisa. Meu nome é Sheila Mara Pedrosa, sou o pesquisador responsável e minha área de atuação é a da Saúde Pública. Após ler com atenção este documento e ser esclarecido (a) sobre as informações a seguir, no caso de aceitar fazer parte do estudo, assine ao final deste documento, que está em duas vias. Uma delas é sua e a outra é do pesquisador responsável. Em caso de dúvida sobre a pesquisa, você poderá entrar em contato com os pesquisadores responsáveis, Prof. Dr. Marcelo Medeiros nos telefones e Enf. Sheila Mara Pedrosa. Em caso de dúvidas sobre os seus direitos como participante nesta pesquisa, você poderá entrar em contato com o Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Goiás, nos telefones: 32698338 ou 32698426. Informações importantes que você precisa saber sobre a pesquisa: • O título da pesquisa é: “O USO DE CRACK E O TRATAMENTO CONTRA A DEPENDÊNCIA: CONCEPÇÕES DE EX-USUÁRIOS E PROFISSIONAIS DE SAÚDE”. • A pesquisadora responsável, através da coleta de suas informações, utilizará os dados para realização da análise que será inserida em sua tese de doutorado, que está vinculada ao programa do Ciências da Saúde da Universidade Federal de Goiás. • O objetivo geral do trabalho é compreender os significados do uso de crack e de seu tratamento para ex-usuários e para a equipe responsável por esses usuários que permanecem em uma unidade de internação para desintoxicação de Goiânia - GO. • A pesquisa será realizada através de grupos focais com os pacientes e funcionários dessa comunidade terapêutica na qual você está sendo cuidado. Os grupos focais serão realizados através de reuniões previamente marcadas onde os participantes da pesquisa, intermediados pela pesquisadora, discutem o tema da pesquisa. Essas reuniões ocorrerão na própria comunidade, serão gravadas e transcritas na íntegra para posterior análise. • Não haverá riscos, prejuízos ou desconforto pela sua participação na pesquisa. Você tem o direito de pleitear indenização em caso de danos decorrentes de sua participação na pesquisa bem como ressarcimento de despesas pela sua participação. • Não haverá nenhum tipo de pagamento ou gratificação financeira pela sua participação, porém ela será fundamental para a compreensão dos significados sobre o uso de crack e outras drogas. • Garantimos o sigilo de sua identidade, seu nome não será exposto, utilizaremos apenas suas falas. Você possui a liberdade de não aceitação, bem como de retirar o consentimento, sem qualquer prejuízo da continuidade da pesquisa. Os dados coletados serão utilizados apenas para esta pesquisa e não serão armazenados para estudos futuros. Na redação da Tese de Doutorado e/ou em artigos a serem publicados em periódicos científicos, serão preservadas as possibilidades de identificação dos sujeitos da pesquisa: Nome do pesquisador: _______________________________________________ Assinatura: _________________________________________ CONSENTIMENTO DA PARTICIPAÇÃO DA PESSOA COMO SUJEITO DA PESQUISA Eu, ___________________________________________________________ de RG n°________________ CPF: _________________________ abaixo assinado, concordo em participar desse estudo, sob a responsabilidade da Enf. Sheila Mara Pedrosa e do Prof. Dr. Marcelo Medeiros como sujeito voluntário. Fui devidamente informado e esclarecido pela pesquisadora ________________________________________ sobre a pesquisa, os procedimentos nela envolvidos, assim como os possíveis riscos e benefícios decorrentes de minha participação. Foi me garantido que posso retirar meu consentimento a qualquer momento, sem que isto me prejudique.

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Goiânia, ____/_____/_____ Nome do sujeito ________________________________________________________ Assinatura:_______________________________________________________________. TESTEMUNHAS: Presenciamos a solicitação de consentimento, esclarecimento sobre a pesquisa e aceite do sujeito em participar. Testemunhas (não ligadas à equipe de pesquisadores): Nome:______________________________Assinatura:_______________________ Nome:_______________________________Assinatura:______________________

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ANEXO C - PARECER DO COMITÊ DE ÉTICA

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ANEXO D – COMPROVANTE DE SUBMISSÃO DO ARTIGO