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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS Faculdade de Ciências Aplicadas BÁRBARA LELLIS DE SÁ FRIZO Programa Cestas Verdes: análise sociotécnica de uma política que conecta produção e consumo na cidade de Limeira, SP. LIMEIRA 2018

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

Faculdade de Ciências Aplicadas

BÁRBARA LELLIS DE SÁ FRIZO

Programa “Cestas Verdes”:

análise sociotécnica de uma política que conecta produção e consumo na

cidade de Limeira, SP.

LIMEIRA

2018

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

FACULDADE DE CIÊNCIAS APLICADAS

BÁRBARA LELLIS DE SÁ FRIZO

Programa “Cestas Verdes”: análise sociotécnica de uma política que

conecta produção e consumo na cidade de Limeira, SP.

Orientadora: Prof.ª Dr.ª Julicristie Machado de Oliveira

Coorientador: Prof.º Dr.º Roberto Donato da Silva Junior

Dissertação de Mestrado apresentada ao Mestrado Interdisciplinar em Ciências Humanas e Sociais Aplicadas, na Faculdade de Ciências Aplicadas da Universidade Estadual de Campinas como recurso parcial para obtenção do título de Mestra em Ciências Humanas e Sociais Aplicadas.

LIMEIRA

2018

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BÁRBARA LELLIS DE SÁ FRIZO

FOLHA DE APROVAÇÃO

BANCA EXAMINADORA

______________________________________

Orientadora: Profª Drª Julicristie Machado de Oliveira

(FCA/UNICAMP)

______________________________________

Membro Externo: Profª Drª Marina Vieira da Silva

(Esalq/USP)

______________________________________

Membro Interno: Profª Drª Milena Pavan Serafim

(FCA/UNICAMP)

A Ata da defesa com as respectivas assinaturas dos membros encontra-se no

processo de vida acadêmica do aluno.

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Dedico aos meus pais: na distância, caiu a ficha.

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AGRADECIMENTOS

Acredito que está nos agradecimentos parte importante da história de

como nasce cada trabalho, a coleção de nomes que ajudou a compor a

pesquisa por diferentes motivos e perspectivas, que impactaram a pessoa que

escreve essas palavras e ressoa em cada palavra. Assim, transbordo aqui

minha gratidão pela contribuição de cada um, por serem parte desta tessitura.

Meus pais Cristina e Marcelo que estavam presente na defesa, mas que

apoiaram minha vontade em continuar estudando, em mudar de cidade, nos

meses em que a pesquisa requeria dedicação exclusiva, mas eu não tinha

como me manter e eles foram tudo que eu precisei. Obrigada! Ao meu irmão

gêmeo Lucas que sempre está em tudo que faço, companheiro de jornada

desde o útero e para sempre.

Aos que antecederam Limeira e que também sempre evoco porque

fazem parte do que sou e da minha formação, como as amigas de longa data

Caroline Esteves, Juliana Rodrigues e Ana Carolina (cabra), as que vieram

com a UNIFESP como Juliana Andrade, parceria de risada e caminhada,

Isadora e Camili, com tanto amor para dar e dado! Nossos caminhos se

distanciaram logo no começo desta etapa, mas para chegar ao mestrado você

foi essencial Eduardo, por isso um obrigado singelo.

E na ordem cronológica que remonto aqui, se tenho trabalho final para

apresentar é porque minha orientadora decidiu apostar na forasteira que veio

procurá-la perdida e sem rumo no que pesquisar. Juli, muito obrigada por ter

compartilhado tanto comigo, pela generosidade, pela relação simétrica que

temos e por muito mais. Agradeço também a aluna de iniciação científica que a

Juli colocou na minha pesquisa, Mariana Grilo, de grande ajuda e de partilha do

que desbravamos e conhecemos.

Ao professor Roberto também, pela coorientação, pelas discussões

enriquecedoras no grupo de estudos CAI/CHS, bem como os estudantes que

fizeram parte mais frequentemente dos debates e dúvidas sobre a pesquisa:

Malu e Isa (queridas companheiras de festas juninas), Bruno, Chico (o “nativo”,

que me ajudou a conhecer Limeira), Sayne (alpinista do Morro Azul), Dilan (um

esperançoso), Priscilla e Daiane.

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Outros professores do nosso programa também colaboraram de alguma

forma com a experiência que foi fazer parte do ICHSA: professor Eduardo

Marandola, dos caminhos burocráticos à dissolução de tudo que trazíamos de

bagagem em aula; professora Marta por mostrar novas abordagens na

docência e ser tão acolhedora com nossos dilemas com a academia. Ao Willon,

alunos de pós-doutorado que me ajudou a decifrar meus objetivos, sempre com

seu bom humor.

De maneira geral, todos os estudantes que entraram na mesma turma

que eu em 2016 foram marcantes, envolventes, bem-humorados, animados e

sempre dispostos à camaradagem. A interdisciplinaridade se deu entre nós,

comungamos dela em nossos diálogos, na partilha das angústias e alegrias.

Carolina Freixo e Eugênio, diferentes gerações do ICHSA, foram nomes

sempre citados e para sempre lembrados na memória e neste trabalho.

De maneira bem específica, dois nomes da minha turma merecem

menção especial. Heitor e Luis, vocês foram/ são fortaleza em vários

momentos, amizade verdadeira nascida em Limeira, obrigada!

A pesquisa só foi possível devido à abertura das diferentes profissionais

que encontrei ao longo do traçado. Todas as funcionárias com quem conversei

foram essenciais, generosas, abertas e dispostas, à todas, muito obrigada

também! Aos cooperados e cooperadas da Cooperativa Maranata, aos que se

dispuseram falar comigo, contar suas histórias, que aceitaram minha

intromissão, com a melhor das intenções, agradeço imensamente.

Às professoras Milena Serafim e Marina Vieira por aceitarem a

participação das bancas de qualificação e defesa, pelas contribuições, pela

generosidade do tempo e pela dedicação que tiveram com este trabalho,

obrigada!

É demasiado imperfeito tentar captar aqui todos que contribuíram.

O que resta é gratidão.

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RESUMO

Este trabalho tem como objetivo analisar a experiência de implementação do

programa "Cestas Verdes", uma vertente do Programa de Aquisição de

Alimentos (PAA), implementada na cidade de Limeira, SP, de abril de 2015 a

novembro de 2016. O PAA, na modalidade de Compras Diretas da Agricultura

Familiar (CDAF), desenrolou-se de maneira particular no município, com a

mudança ao longo de projeto, no sentido de realizar, além de distribuição de

alimentos às entidades, um programa que beneficiava famílias vulneráveis em

situação de Insegurança Alimentar e Nutricional (IAN) com "Cestas Verdes".

Para tanto, estavam envolvidos o Centro de Promoção Social Municipal

(Ceprosom), órgão responsável pela Assistência Social da cidade, bem como o

acampamento rural Elizabeth Teixeira. Com todos esses atores, o que se

pretendeu observar foi a rede sociotécnica que o programa foi capaz de

articular, tendo o alimento distribuído como o fio condutor. Assim, o presente

trabalho tem o objetivo de analisar o processo de implementação do programa

“Cestas Verdes” nos eixos: I. produção do alimento; II. gestão pelas técnicas

municipais e III. distribuição das cestas às famílias beneficiárias. Por meio de

entrevistas semiestruturadas, observação participante e grupos focais, foi

possível constatar nos três eixos, ao percorrer o caminho do alimento, que a

experiência em Limeira garantiu a renda de famílias do acampamento que

trabalham e se identificam com a agricultura, possibilitando a melhoria da SAN,

uma vez que os alimentos que vendiam também eram para o autoconsumo.

Para as gestoras, essa política representou um desafio possível, um novo

modo de fazer o trabalho da assistência social mesmo com acesso limitado à

discussão de SAN. Já para as famílias beneficiárias das “Cestas Verdes”, os

alimentos que receberam representaram uma melhora significativa na

alimentação, tanto para os que tiveram a contribuição das profissionais da

nutrição no aprendizado de novas receitas e preparos, quanto para os que não

passaram por um acompanhamento mais sistemático. Com efeito, o PAA

mostrou-se burocrático na sua operacionalização, mas foi capaz de coadunar

agentes humanos e não humanos em prol do desenvolvimento local e

conjuntural de SAN.

Palavras chave: Segurança Alimentar e Nutricional; Programa de Aquisição de

Alimentos; Cestas Verdes; Rede Sociotécnica. .

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ABSTRACT

This work aims to analyze the experience of implementing the "Green Baskets"

program, a component of the Food Acquisition Program (PAA), implemented in

the city of Limeira, SP, from April 2015 to November 2016. The PAA, in the

modality of Direct Purchase from Family Farmers (CDAF, in Portuguese), was

developed in a particular way in the municipality, with a change throughout the

project, in order to realize, in addition to food distribution to the entities, a

program that benefited vulnerable families in situations of Food and Nutrition

Insecurity (IAN) with "Green Baskets". To that end, the Municipal Social

Promotion Center (Ceprosom), the agency responsible for Social Assistance of

the city, as well as the Elizabeth Teixeira rural encampment were involved. With

all these actors, what was intended to be observed was the socio-technical

network that the program was able to articulate, having the food distributed as

the guiding wire. Thus, the present work has the objective of analyzing the

process of implementation of the program "Green Baskets" in the axes: I. food

production; II. management by municipal techniques and III. distribution of the

baskets to the beneficiary families. By means of semi-structured interviews,

participant observation and focus groups, it was possible to verify in the three

axes, along the food route, that the experience in Limeira guaranteed the

income of the families of the camp that work and identify with agriculture,

making possible the improvement of SAN, since the foods they sold were also

for self-consumption. For managers, this policy represented a possible

challenge, a new way of doing the work of social assistance even with limited

access to the SAN discussion. For the "Green Baskets" beneficiaries, the food

they received represented a significant improvement in food, both for those who

had the contribution of nutrition professionals in learning new recipes and

preparation, and for those who did not undergo follow-up more systematic. In

fact, the PAA proved to be bureaucratic in its operationalization, but it was able

to coordinate human and non-human agents in favor of local and conjunctural

SAN development

Key words: Food and Nutrition Security; Food Acquisition Program; Green

Baskets; Sociotechnical Network.

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LISTA DE ABREVIATURAS

BPC

CAISAN

CF

CONAB

CONSEA

CRAS

CREAS

CREN

DAP

DHAA

EBIA

FAO

FCA

IAN

IBGE

INCRA

ITESP

LOSAN

MDA

MDS

MST

PAA

PNAE

POF

PRONAF

PT

SAF

SAN

SESI

SISAN

TAR

Uniara

Benefício de Prestação Continuada.

Câmara Interministerial de Segurança Alimentar e Nutricional.

Constituição Federal.

Companhia Nacional de Abastecimento.

Conselho Nacional de Segurança Alimentar.

Centro de Referência de Assistência Social.

Centro de Referência Especializado de Assistência Social.

Centro de Recuperação e Educação Nutricional.

Declaração de Aptidão ao Pronaf.

Direito Humano à Alimentação Adequada.

Escala Brasileira de Insegurança Alimentar.

Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura.

Faculdade de Ciências Aplicadas.

Insegurança Alimentar e Nutricional.

Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística.

Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária.

Instituto de Terras de São Paulo.

Lei Orgânica de Segurança Alimentar e Nutricional.

Ministério do Desenvolvimento Agrário.

Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome.

Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra.

Programa de Aquisição de Alimentos.

Programa Nacional de Alimentação Escolar.

Pesquisa de Orçamento Familiar.

Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar.

Partido dos Trabalhadores.

Secretaria da Agricultura Familiar.

Segurança Alimentar e Nutricional.

Serviço Social da Indústria.

Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional.

Teoria Ator-Rede.

Centro Universitário de Araraquara.

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LISTA DE IMAGENS E GRÁFICOS

Imagem 1 - Distribuição espacial dos principais equipamentos públicos

estudados.......................................................................................................p.62

Gráfico 1 – Frutas mais produzidas nos últimos seis meses/kg.....................p.43 Gráfico 2 – Legumes mais produzidos nos últimos seis meses/kg................p.44

Gráfico 3 – Verduras mais produzidas nos últimos seis meses/kg.................p.44

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SUMÁRIO

1. Memorial ...................................................................................................... 13

2. Introdução ................................................................................................... 18

2.1 Alguns instrumentos ............................................................................... 22

2.2 Desenho metodológico........................................................................... 30

3. A Produção ................................................................................................. 35

3.1 O acampamento ..................................................................................... 35

3.2 Olhares sobre o PAA ............................................................................. 39

3.3 Alguns números do “Cestas Verdes” ..................................................... 42

3.4 Focalizando os agricultores do acampamento ....................................... 46

4. A Gestão ...................................................................................................... 53

4.1 A gestão em SAN ................................................................................... 53

4.2 Tecer em Limeira ................................................................................... 55

4.3 Ouvindo as gestoras .............................................................................. 61

5. A Distribuição ............................................................................................. 67

5.1 As escalas da SAN ................................................................................ 67

5.2 “Como estão as coisas em casa?” ......................................................... 70

6. Alinhavando ................................................................................................ 81

7. Referências ................................................................................................. 86

8. Apêndices ................................................................................................... 92

8.1 Apêndice 1 – TCLE dos produtores. ...................................................... 92

8.2 Apêndice 2 – TCLE das gestoras ........................................................... 96

8.3 Apêndice 3 – TCLE dos beneficiários .................................................. 100

8.4 Roteiros das entrevistas ....................................................................... 104

9. Anexos ...................................................................................................... 106

9.1 Anexo 1 - Autorização Cooperativa ...................................................... 106

9.2 Anexo 2 - Autorização Prefeitura ......................................................... 107

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Memorial

O que me trouxe especificamente à Faculdade de Ciências Aplicadas

(FCA) foi uma insegurança com relação ao rumo que parecia que eu tomava.

Minha formação ao longo da graduação em Ciências Sociais foi mais voltada

aos estudos sobre alimentação e os estágios que tive oportunidade de

trabalhar foram sempre no setor público. Entre esses dois polos que gostaria

de seguir após a formatura, no entanto, trabalhos freelances e um emprego na

área de Compliance foi o que surgiu. A carreira acadêmica ainda não tinha sido

considerada uma opção até começar a frequentar eventos que discutiam

exatamente o tema que tinha interesse. Foi em um desses que conheci a

professora Julicristie.

Ao descobrir que estava neste programa e que assim existia a

possibilidade de fazer algum trabalho na linha dela, com políticas públicas e

comida, considerei uma nova perspectiva, a vida acadêmica. Quando nos

conhecemos pessoalmente e ultrapassamos a barreira do e-mail, contei sobre

meu Trabalho de Conclusão de Curso ela enxergou uma interdisciplinaridade

que não me era óbvia. E continuou não sendo de maneira nenhuma. Meu

projeto não foi escrito de maneira a convencer a banca nesse aspecto, queria

que fosse uma pesquisa viável porque falar sobre comida não necessariamente

encerra o assunto em uma disciplina. Parece que deu certo.

Relato um pouco aqui então como foi essa trajetória até o momento,

como minha pesquisa foi modificando-se com as discussões em sala de aula,

com as discussões pessoais com os amigos que sei que fiz.

Os primeiros meses ficaram marcados com intensos debates a cerca da

interdisciplinaridade, ainda que as aulas das duas primeiras disciplinas

obrigatórias tenham sido de grande valia para repensarmos a construção do

pensamento ocidental, o que pairava muitas vezes nas entrelinhas do que

conversávamos eram as questões: o que é e como fazer.

Ainda no primeiro semestre, o grupo de estudos Ciências, Ambientes e

Interdisciplinaridades (CAI/CHS) trouxe a teoria de Bruno Latour para minha

pesquisa, não considerada incialmente no projeto, mas mais que isso, trouxe a

discussão da agroecologia. Vi teorizadas algumas coisas que vivi

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empiricamente na vida, especialmente em família, o imbricamento entre

movimento social e teoria acadêmica é fascinante. Problematizei minha relação

de consumo com os alimentos e minha própria posição enquanto vegetariana.

No segundo semestre de 2016, na maneira como foram pensadas as

disciplinas do programa, a CH003 é bastante provocativa e questiona a posição

do cientista, sua presença no texto e na ciência; a tábua da salvação que

podemos recorrer existe, se sim, está nos métodos. Seriam essas as perguntas

que nos ajudariam no caminho da interdisciplinaridade? Seria suficiente? Ainda

no mesmo período, a CH006 mexeu muito comigo e com experiências próprias,

discussões a cerca de agrotóxicos, transgenia e estudos de gênero não só nos

mobilizam academicamente, mas também nos fazem repensar nossas

posições pessoais, com questionamentos identitários na teoria feminista, sobre

a militância, qualquer que seja. A suposta objetividade da Ciência foi quebrada

aqui, as teias de conhecimentos pessoais que carregamos são inevitáveis, seja

numa pesquisa militante, seja na pesquisa não declaradamente militante. As

angústias acerca de assuntos tão pertinentes e próprios quanto alimentação

causam desespero, mas descontente e desesperadamente grito em português

angústias que parecem que nos colocam em um passado resignado, como o

dos nossos pais.

O III Seminário do nosso programa também teve impacto na pesquisa e

nas angústias. A apresentação foi atropelada, mas apenas uma pergunta

trouxe inquietação suficiente: frente ao golpe ocorrido, frente aos problemas

que já vínhamos enfrentando com as temáticas da agricultura familiar no Brasil

e que possivelmente continuaremos enfrentando, como ficam as pesquisas que

tratam de políticas públicas nessa seara, como continuar a labuta nessa via

tortuosa? A resposta foi apenas posteriormente elaborada, uma vez que a

primeira reação foi de desalento. Mas a mensagem mais difícil e a mais

importante de perceber e de se passar é da visibilidade que a pesquisa pode

trazer sobre o tema e a temática rural.

No início de 2017, a ocupação da sala UL78 trouxe uma aproximação

muito boa com colegas que já eram amigos, boa parte do meu

desenvolvimento teórico com a pesquisa ocorreu nesta sala em questão, em

discussões com outros colegas, conversando a respeito do que ocorria com a

pesquisa de cada um. Ouso dizer que no movimento de aproximarmos e

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estranharmos nossos conhecimentos, de repensar a abordagem disciplinar de

origem do colega sobre o que fazíamos, de aceitar uma contribuição alheia;

dos autores que cada um estava estudando e que falavam a respeito do que

nos movia em pesquisa; dos autores em comum com conceitos ou obras não

abordadas que podiam contribuir, seria isso então a nossa interdisciplinaridade

encontrada. Mesmo que seja pela tangente, mesmo que não seja num molde

pré-estabelecido, que talvez ainda não exista. Tanto foi o exercício que nesta

sala organizado o I Colóquio Nacional Interdisciplinaridade nas Ciências

Humanas e Sociais Aplicadas (CONICHSA). Organização esta que pode trazer

inúmeros trabalhos dos alunos do meu ano e foi de imensa riqueza a

intersecção criada, os trabalhos em conjunto tão aparentemente sem afinidade,

mas depois, com afinação e assiduidade, tomaram corpo para compor o

evento.

O primeiro CONICHSA também deixa aqui um marco, pois foi minha

primeira organização de evento em escala nacional, contudo, apesar de seguir

uma linha sobre interdisciplinaridade sob a égide do nosso programa, a

produção foi diversa e profícua, com abrangência realmente no país todo e,

dessa forma, a troca alcançada com todos foi de suma importância para

assentar tudo o que vinha estudando até então. O trabalho artesanal que é a

pesquisa científica, na minuciosa atenção a todos os detalhes que compõe o

trabalho final ganhou forma: a tapeçaria que quero entregar.

O Programa de Estágio Docente do qual fiz parte no primeiro semestre

de 2017 trouxe uma dupla oportunidade para mim: aproximei-me da minha

orientadora, de maneira a estreitar afinidades que já carregávamos

anteriormente à Unicamp, e também me aproximei da área de Nutrição, mas

com outro olhar. Apesar de termos na comida o mesmo objeto, foi um processo

digno de uma experiência etnográfica, com o estranhamento de conhecer em

campo a forma como outra disciplina trata do mesmo assunto, para além de

discursos individuais ou mesmo na somatória do coletivo de vozes que já

escutei, bem como o afastamento dos paradigmas que mediavam minhas

vivências até então. Como afirma Rosana Guber, após a experiência

antropológica, ainda que compulsiva e não deliberada, não retornamos mais os

mesmo: repensamo-nos enquanto pesquisador, enquanto nativos e mesmo

sobre a influência de novas culturas (mesmo que sejam as nossas culturas).

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Dei uma aula exatamente sobre a alimentação nas Ciências Sociais e ao fim

pareceu-me uma abstração muito grande, no entanto, o argumento biológico de

micronutrientes é uma alta racionalização que coloquei no extremo oposto do

que tratei em aula. Assim, a aproximação entre as duas áreas fez-se essencial,

um conciliatório entre quali-quanti, entre as Biológicas e as Humanas, se assim

posso essencializar, no melhor estilo da ecologia dos saberes, exatamente o

que busco construir na relação acadêmica com a professora Julicristie.

Nessa experiência, e com o CONICHSA, fui capaz de materializar o

sentido de interdisciplinaridade que os professores Roberto e Álvaro colocaram

em seu artigo. A contribuição da postura etnográfica em busca de um

pluralismo paradigmático é essencial para a construção da interdisciplinaridade

que busco.

Assim, com essa nova perspectiva, o que sei é que trilho ainda um

caminho desconhecido, mas menos angustiante com o desenrolar da pesquisa,

com os avanços do campo e com relações mais estáveis. O resto da história

que ainda precisa ser contado fica para a dissertação completa, ao final de

todos os semestres e com reticências sobre o futuro, sobre a

interdisciplinaridade. Cada mestrando conta uma história diferente de como foi

sua experiência no programa, seu desenvolvimento pessoal e profissional, mas

poder contar junto com o resultado dos dois anos é um diferencial que reforça:

nenhum ser humano é uma ilha, produzimos coletivamente e enquanto

consequência de tudo que passamos.

Esse exercício proposto então pelos professores da última disciplina

obrigatória do programa, a CH004, de escrever um memorial contando um

pouco de nossa trajetória não só nos aproxima enquanto pesquisadora de

nossa pesquisa, mas também me ajudou a romper, após esse um ano e meio

de mestrado, com a noção de solidão na pesquisa. Evoquei vários

personagens acima que foram essenciais para o texto que vou apresentar. E

essas pessoas essenciais não se resumem apenas às ligadas à FCA, todos

meus informantes estão presentes e contribuíram com reflexões pessoais e

acadêmicas, se assim posso separar enquanto recurso explicativo a mim

mesma.

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A parte de coleta de dados do meu campo propriamente dito e

delimitado pelo comitê de ética trouxe informações oficiais, mas difícil afirmar

que é esse período apenas que está relatado aqui. A escrita que faço aqui não

começa aqui. Como ilustra Mia Couto, eu me tornei disponível para contar essa

narrativa que já existia, esperando apenas uma ocasião.

A ocasião: sou de Guarulhos, grande São Paulo, e ao longo do Ensino

Médio, estudei na capital. O que mais ouvia era que morava no interior, afinal o

que resta além da capital é isso, com todas as conotações pejorativas dos

sãopaulocêntricos. Já no mestrado, minha classificação foi oposta, que eu sou

da cidade grande, acostumada com o algoz da poluição e com a movimentação

da cidade grande. Desse limbo identitário que me vi, resolvi me apegar à

imagem de “caipira” indo morar em Limeira, afirmando a história da família que

vem de outras cidades do interior do estado de São Paulo, e abracei a vida

aqui. Assim, a cidade de Limeira sempre fez parte do meu campo, desde que

me mudei até o último dia que estarei aqui. Estudar na FCA só faz sentido pra

mim porque estudo seu contexto, seu redor, enxergo a rede da qual faz parte e

que não pode ser desconectada da cidade.

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Introdução

É possível observar que o estudo da alimentação humana esteve

presente, em certa medida, na história da Sociologia, porém não ocupou ou

ocupa posição de destaque. No processo de categorização disciplinar, desde a

divisão ocorrida entre as Ciências Naturais e as Ciências Humanas e Sociais e,

posteriormente, com as ramificações internas, a alimentação perpassou

enquanto um objeto de estudo indexador. Temos campos de estudos derivados

da Sociologia bem estabelecidos e que tratam do tema: Sociologia Rural,

Sociologia do Trabalho, Sociologia da Religião, Sociologia Urbana, Estudos de

Gênero (POULAIN, 2013, p. 150), ou mesmo na Antropologia, se estendermos

a abrangência às Ciências Sociais. No entanto, a constituição de um campo de

estudos estabelecido e bem delimitado enquanto Sociologia da Alimentação

ainda está em construção, principalmente se considerarmos a hierarquia de

prestígio com relação a certas temáticas, na qual essa é entendida algumas

vezes como menor e menos nobre.

Mesmo assim, é possível observar em certas localidades uma

consolidação e institucionalização maior desse campo de estudos, com

trabalhos de levantamentos bibliográficos interessantes em relação ao que já

foi produzido e que apontam caminhos para serem trilhados1. A polissemia a

respeito da comida que comemos, como comemos, com quem comemos e

indagações derivadas e infinitas sobre o tema é evidente.

Apesar do alcance da produção científica de fora do Brasil acerca desse

tema ser maior se comparado ao da produção nacional, especialmente ao

considerarmos o destaque de certos países na liderança de criação e

perpetuação de epistemologias e na estruturação global da produção científica

(SANTOS, 1989), no Brasil, a partir da década de 1980, começaram a surgir

estudos mais focalizados na alimentação. Entre outros autores, Canesqui

(1988) fez um balanço bibliográfico a respeito da alimentação no país, com um

recorte entre as populações rurais e urbanas. Ainda que mais próxima da

1 Principalmente na França é possível observar uma boa produção nos trabalhos de GRIGNON

& GRIGNON, 1980, FISCHLER, 1990, POULAIN, 2003, 2014, RÉGNIER et al., 2006, e na Espanha com DÍAZ MENDÉZ & GARCÍA ESPEJO, 2014.

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Antropologia, a análise do estudo empreendido se deu desde a década de

1940, em diferentes regiões brasileiras, demonstrando uma característica dos

estudos da área de alimentação: um elo entre outras atividades sociais, como

ritos religiosos, festas e questões de gênero. Outro trabalho de esforço

interdisciplinar é a obra Antropologia e Nutrição (CANESQUI, GARCIA, 2005),

com a colaboração de diversas áreas para demonstrar primeiramente o caráter

multifacetado da alimentação e questionar o biologicismo que podemos

observar em algumas análises. Na área de Antropologia da Alimentação, de

grande contribuição para a construção de uma autonomia desse tipo de

empreendimento científico, temos obras que enfatizam ingredientes marcantes

e constituintes da identidade nacional, como a farinha de mandioca, o dendê e

o coco (LODY, 2008).

Ainda que seja esse um tema pulverizado em diversas áreas e subáreas

e que exista um esforço disciplinar de criação de mais uma especialização

sobre o tema, a alimentação precisa ser compreendida também através das

estruturas sociais que a sustenta. O sistema capitalista sob a égide da geração

de riquezas no qual vivemos passa por um momento de crise que afeta

também este tópico tão íntimo à vida humana. Contudo, a crise não é do

fracasso e sim dos triunfos; esse sistema foi bem sucedido em sua reprodução

e observamos cada vez mais o que é sólido desmanchar-se no ar (BECK,

2013, p.13).

A fase da industrialização na qual estamos, denominada por Beck (2011)

de modernização reflexiva, uma etapa do desenvolvimento do sistema

econômico hegemônico caracterizada exatamente por incertezas e medo.

Essa, por sua vez, cria condições para a emergência de uma Sociedade de

Risco, onde nossa produção de riquezas ultrapassa nossa habilidade de prever

os riscos engendrados nessa produção. E, segundo o autor, os riscos são

globais, irrestritos e imprevistos, de consequências cada vez mais

imprevisíveis.

Em um movimento crescente de tentativa de homogeneização e

globalização de nossa alimentação, as características da Sociedade de Risco

aplicam-se nesse tema também, entretanto, esse pode ser considerado uma

forma curta de ler a história, como afirma Poulain (2013). Anteriormente aos

processos industriais recentes envolvendo nossa comida, sempre fizemos

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ponderações acerca dos riscos que envolvem o ato de comer, essa constante

na alimentação humana, então, atua com uma lógica própria na incorporação e

no consumo, bem como marca identitária (POULAIN, 2013, p.93).

Assim, fora do contexto capitalista, temos, por exemplo, a maestria dos

indígenas em desenvolver tecnologia e habilidades para lidar com a mandioca

brava (Idem, p.95), ou mesmo na cosmologia de dadas comunidades em que

as regras alimentares não estão cindidas da construção lógica do ordenamento

social, com suas purezas e tabus (DOUGLAS, 1991). De fato, não importa em

qual contexto decidimos estudar a alimentação, sempre haverá certo nível de

reflexão. A questão notória a ser ressaltada aqui é que estão imbrincadas

ambas as abordagens: tanto as características da sociedade do risco descritas

acima na temática alimentar, enquanto vitórias do capitalismo e como estrutura

social, quanto às noções de cunho mais particular e de identidade cultural.

Para além do que elencamos como elegíveis para nossa alimentação

enquanto comunidade, muitos estudos surgiram para se debruçar àqueles que

pouco ou nenhum acesso tem a alimentos adequados às suas necessidades.

Assim, o paradigma da fome e da falta de acesso à comida é abordado no

Brasil desde o final do século XIX por Rodolfo Teófilo, culminando na obra

acadêmica mais conhecida sobre a realidade brasileira a respeito da fome com

Josué de Castro, passando mais recentemente pelo diário de Carolina Maria de

Jesus. No campo da literatura, (se é que podemos distinguir realidade de

ficção) temos as obras O Quinze de Raquel de Queiroz e Vidas Secas, de

Graciliano Ramos. Além dos exemplos nacionais citados, a obra do economista

Amartya Sen (1981) traz reflexões sobre grandes fomes em locais como

Bangladesh e Etiópia. Aparentemente, nos últimos anos, a média do

crescimento econômico mundial superavitário concomitante às políticas

públicas de caráter mais progressista em certas localidades, foi possível

observar a redução de estados de fome e desnutrição (FAO, 2014). Contudo,

os números que foram postos como marcos de vitória há poucos anos atrás já

começam a regredir, num cenário político de grande instabilidade, tanto no

Brasil, quanto no mundo (FAO, 2017). Assim, é preciso questionar se o

baluarte da discussão, que caminhava cada vez mais do polo da quantidade ao

polo da qualidade, foi superado.

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Na intersecção desses dois polos e no cenário de incertezas difusas que

a sociedade ocidental vive cada vez mais latente, intensificou-se o debate a

cerca de ações de políticas públicas mais assertivas e que abrangessem

ambas as preocupações. Para isso foi preciso conceituar o que é Segurança

Alimentar e Nutricional (SAN). No Brasil está definida da seguinte forma:

A Segurança Alimentar e Nutricional consiste na realização do direito de todos ao acesso regular e permanente a alimentos de qualidade, em quantidade suficiente, sem comprometer o acesso a outras necessidades essenciais, tendo como base práticas alimentares promotoras de saúde que respeitem a diversidade cultural e que sejam ambiental, cultural, econômica e socialmente sustentáveis. (BRASIL, 2006, Lei 11.346, Art. 3º).

No texto jurídico acima, a conceituação de SAN tenta abarcar a

totalidade do ato de alimentar-se em aspectos como produção, distribuição,

biodiversidade de alimentos, suas condições higiênicas, o efeito na saúde e a

regulamentação estatal, compreendendo de maneira mais global a rede em

que cada alimento produzido pertence. O espaço na agenda do governo para

esse tema foi uma conquista da sociedade civil, que sentia os efeitos das

políticas neoliberais de privilégio exclusivo do capital (PINHEIRO, CARVALHO,

2010).

E no bojo das conquistas da sociedade civil, a população rural também

teve um papel determinante neste período na esfera política, pois pressionou a

criação de diversos programas federais (GRISA, SCHNEIDER, 2015), entre

eles o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), criado em 2006, através da

Lei 10.696, enquanto ação estruturante dentro do Programa Fome Zero

(BRASIL, MDS, 2006). A experiência do PAA em Limeira, objeto de estudo

desta pesquisa, se deu na modalidade de Compras Diretas da Agricultura

Familiar – CDAF, por meio da mediação da prefeitura municipal. O diferencial

desta experiência foi ter sido desdobrado um novo público alvo ao longo do

projeto que visava atender apenas entidades socioassistenciais conveniadas

com a rede municipal de assistência social. Tendo em vista o volume sem

precedentes que a produção da cooperativa do acampamento Elizabeth

Teixeira alcançou e buscando atender um público em Insegurança Alimentar e

Nutricional (IAN) mapeado na cidade, foi elaborado o projeto “Cestas Verdes”.

O referido projeto consistia em remessas semanais, a princípio, dos alimentos

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produzidos, como legumes, verduras e algumas frutas às famílias vulneráveis

acompanhadas em várias partes de Limeira.

Assim, seguindo o caminho do alimento, os capítulos foram divididos nos

três eixos de análise. O primeiro capítulo trata da produção dos alimentos, da

relação dos agricultores com o PAA, como foi para eles a experiência de

participação. Para tanto, pretendeu-se compreender como se deu a escolha

dos alimentos para venda, se eles se alimentam com outros alimentos além

dos que plantavam; se possuem a noção de que sua produção ia para pessoas

que não podiam comprar alimentos de qualidade e se essa concepção de

qualidade rebate no que pensavam sobre alimentação saudável, se afeta seus

próprios hábitos alimentares.

O segundo capítulo explicita a relação das gestoras municipais com o

PAA, como foi trabalhar com esse programa federal. Buscou-se compreender

também a rotina do processo de distribuição dos alimentos e, para tanto,

levavam em consideração quais os alimentos que faziam sentido e

sustentariam a fome das pessoas que iam recebê-los.

O terceiro capítulo versa sobre o encontro entre os alimentos e as

famílias vulneráveis, trata-se, assim, do eixo da distribuição. Enquanto os

beneficiários finais do projeto “Cestas Verdes”, neste capítulo buscou-se fazer

uma avaliação da política pública e compreender o quão efetiva foi essa

distribuição de alimentos às famílias que os receberam, como cozinharam e

como comiam esses alimentos. Fazia sentido receber alimentos como raiz de

mandioca, couve e abóbora?

Por fim, as considerações finais fecham este trabalho com algumas

respostas para as perguntas levantadas e sinalizam alguns possíveis pontos

cegos que o PAA como política de âmbito federal não consegue enxergar

localmente.

Alguns instrumentos

Para tratar do programa “Cestas Verdes” em questão, da experiência do

PAA em Limeira, foi escolhida a análise de redes sociotécnicas. Para

compreender como essa política se desenvolveu e fazer sua avaliação, foi

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necessária uma habilidade tecelã. Desde o intuito inicial do projeto que versava

sobre as compras diretas e, posteriormente, sobre a distribuição das “Cestas

Verdes”, foram engendradas possibilidades para traçar essa rede, essa trama,

que, outrora, eram apenas fios desvinculados, relações difusas e

desencaixadas.

“A Moça Tecelã”, de Marina Colasanti (2004), elucida o procedimento

que será necessário fazer para evocar todos os fatores importantes nessa

política. A moça acorda cedo para, em seu tear, fazer existir o sol e a chuva.

Com sua vontade, tece sua realidade, cumpre com as necessidades vitais a

partir do tear. Com os fios e na tapeçaria, constrói e desmonta castelos.

O empreendimento para tecer esta rede sociotécnica é similar ao da

personagem, dadas as relações já existentes e o emaranhado teórico para

sustentação e fabrico das linhas que contarão a experiência em Limeira. Assim,

foi necessário um esforço para entender o que era imprescindível para tecer,

compor a tapeçaria, como os fios, as cores, o material... Elementos

fundamentais que conectam, definem, materializam, montam a trama e contam

a história.

Um dos fios da meada para a tessitura está na obra de Deleuze e

Guatarri (2017). O pano de fundo de toda a obra de Mil Platôs passa pela

discussão sobre a filosofia da diferença, sobre a binaridade do pensamento

ocidental, polarizado e compartimentado. Como aponta Ferreira (2008), o

paradigma imperativo na maneira como pensamos e agimos está localizado em

Platão, nas classificações, oposições e hierarquizações do pensamento (p. 29).

A produção científica consolida-se conforme estes parâmetros platônicos a

partir do século XIX, no auge de nossa busca por um projeto de modernidade.

No enfrentamento das caraterísticas dominantes na epistemologia

ocidental, o que Deleuze e Guatarri buscam é uma proposta que se afaste

dessa dicotomização, das categorias binárias que produzem e reproduzem o

que chamam de pensamento arborescente, stunk e pré-moldado. A imagem da

partitura do músico Sylvano Bussoti, logo no começo do volume I, pode ilustrar

um exemplo para a narrativa a respeito do oposto ao pensamento

arborescente, o rizoma: diferentemente da “realidade espiritual” da árvore-raiz,

no seio da produção hegemônica como já colocado, o sistema do rizoma busca

fazer o múltiplo (DELEUZE, GUATTARRI, 2017, p.21), longe da linearidade e

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trabalhando sempre na conjunção, somando novas possibilidades nos fios que

podem parecer soltos.

Os princípios elencados pelos autores são importantes para

compreendermos o rizoma, e, por sua vez, a construção da Teoria Ator-Rede

(TAR). Os princípios de conexão e heterogeneidade dizem a respeito das

ligações improváveis que o rizoma pode fazer se nos ater em como nosso

pensamento está fixado na binaridade; os vínculos mais diversos são possíveis

e uma prerrogativa desse sistema, sempre “efetuando um descentramento

sobre outras dimensões e outros registros” (Idem, p.23). O princípio da

multiplicidade elucida sobre uma multiplicidade diferente daquela em oposição

ao todo, ao uno, essa por sua vez não se deixa codificar, foge das

classificações, é indefinida e indefinível. O princípio de ruptura assignificante

estabelece uma característica do rizoma de possibilidade de ser rompido e

retomado a partir de qualquer outra parte e, em consonância com os outros

princípios, a partir da multiplicidade, a ruptura opera em qualquer parte

desterritorializando qualquer significação que pudesse ocorrer. Por fim, os

princípios de cartografia e decalcomania são ainda relacionados com os

princípios anteriores, na qual o pensamento arborescente possui a mesma

lógica do decalque, nos moldes pré-estabelecidos e pré-estruturados,

fechados; o rizoma, no entanto, é um mapa aberto, “(...) conectável em todas

as suas dimensões, desmontável, reversível, suscetível de receber

modificações constantemente. (...) adaptar-se a montagens de qualquer

natureza, ser preparado por um indivíduo, um grupo, uma formação social”

(Idem, p.30).

Um fio puxa outro e logo chegamos a Bruno Latour. É possível observar

nas obras do autor, inicialmente em Jamais Fomos Modernos (LATOUR,

2012a), um desdobramento convergente do pensamento de Deleuze, que vai

ao encontro do postulado construído de modernidade, pois apesar de

operarmos na lógica compartimentada, nossa vida não funciona por meio de

subdivisões. O argumento é que o projeto alexandrino de expansão do

pensamento helenístico teve grande força para nos estruturar enquanto

ocidente, bem como nossa produção epistemológica. Porém, no apontamento

acima com o pensamento arborescente, no entanto, dificilmente nos

enxergamos agindo dessa forma. Essencialmente, o ocidente “moderno”

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dividiu-se entre discurso, fato e natureza, separados formalmente em suas

especialidades. Enquanto antropólogo, o que Latour afirma é que não

conseguimos enxergar em nossa sociedade o nosso próprio tecido inteiriço, o

entrelaçamento dos mais diferentes temas da vida. E assim, a modernidade

nunca chegou de fato. Ao considerarmos esta premissa de Latour, o que é

possível observar, cada vez mais acontecendo nessa incongruência de

compartimentação e binarismos é a proliferação de híbridos, categorias que

vão se recombinando entre natureza, fato e discurso, mas não transicionam

entre si, apenas vão cruzando de maneira indisciplinar barreiras firmemente

construídas quase espontaneamente (BACHUR, 2016).

A exemplo das notícias de jornal que Latour (2012a) narra, ao nos

depararmos com os alimentos enquanto objeto de estudo, também podemos

observar esse comportamento indisciplinar: as barreiras disciplinares não

conseguem ser respeitadas, os alimentos protagonizam escândalos globais de

contaminação, são alvos de polêmicas quanto às suas propriedades

nutricionais (que diga o ovo!), são motivo de revoltas, são oferendas, são

identitários. Enfim, o que não são definitivamente é assunto exclusivo de um

único tipo de especialista que podemos encontrar no jornal, em livros e redes

sociais.

Como vimos, se já não cabemos na boca de um tipo de especialista, e

se a vida não é compartimentada, binária e cindida como somos estruturados a

pensar e agir, se à maneira das comunidades estudadas pelos antropólogos na

categoria de “outro” temos também imbricados todos nossos aspectos da vida

um no outro, a proposta teórica e metodológica de Bruno Latour é encararmos

o social da maneira mais simétrica possível, sem hierarquias valorativas dadas

a priori. Por mais difícil que seja desvincularmo-nos de nossos valores

“modernos” ao estudarmos nossa sociedade, Latour (2012b) sugere três

incertezas, três suspeitas que devemos ter com binarismos muito fortes e

enraizados: as noções de erro e certeza; a oposição modernidade e tradição, e

os polos colocados como distantes e díspares de sociedade e natureza. Todas

essas categorias são estruturantes e perpetuamente estruturadas em nossa

sociedade, com a preponderância sempre do ser humano, com certos adjetivos

mais “adequados” no polo positivo. O que é essencial na premissa da simetria

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do social é ter o intuito de dar agência também ao não humano, afinal produzir

existência não é primazia nossa.

Fazer ciência não significa, então, desvelar um mundo de coisas independentes do homem, mas relatar e organizar as articulações em um coletivo, redefinindo funções e recolocando as possibilidades de ação de humanos e não humanos. (GONZALES, BAUM, 2013, p. 148).

O trecho acima traz a dimensão do papel do cientista, mas

especialmente daquele envolvido com essa teoria, da importância de saber

articular todos os fios já existentes, de compreender as associações e suas

possibilidades. Além dos conceitos deleuzianos apresentados aqui, parte

importante da constituição de uma rede sociotécnica está nos fundamentos da

Sociologia das Associações de Gabriel Tarde (2003). Ao contrário do que

ocorreu para a consolidação da cátedra de Sociologia, com o afastamento

rigoroso da Filosofia, entre outras disciplinas, Tarde buscou justamente no

campo da filosofia a teorização do social, mais especificamente nas mônadas

de Leibniz. Essas são estruturas pensadas como um átomo, a matéria última e

indivisível do século XVIII, mas que para Tarde trouxeram reflexões a respeito

do social, da divisão acadêmica entre indivíduo e sociedade. O argumento do

autor é de que as mônadas não se encerram em si, não são microcosmos, elas

trazem o Universo em si e estão relacionadas coletivamente (VARGAS, 2003).

Os estudos do filósofo alemão não estavam relacionados necessariamente aos

humanos, mas aí está a reinvenção que Tarde pôde proporcionar, ao

estudarmos as coisas colocamos cargas valorativas diferentes, assumimos

uma posição superior e dizemos que o que não conhecemos é muito mais

simplista. É chamado de neomonismo esse desdobramento realizado por

Tarde, que traz consigo o que Vargas chama de miriateísmo (Idem, p. 27), uma

miríade de possibilidades cabidas em humanos e não humanos; pregando

inclusive contra o antropocentrismo nas ciências humanas.

Outros nomes importantes também trouxeram contribuições, como John

Law e Michel Callon. Em consonância com o conceito de simetria apresentado,

Law defende que à TAR cabe tratar da mecânica do poder, não assumindo

hipóteses a priori em busca de causalidades, mas sim as origens dos desníveis

sociais, da compreensão de interações mais bem estabelecidas e

rigorosamente mais fortes, ou seja, “(...) como tamanho, poder e organização

são gerados.” (LAW, s/d, p.3). Outro aspecto importante que o autor ressalta é

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o carácter heterogêneo da rede, da importância de entender que para

analisarmos uma rede a noção de social é composta de diferentes materiais e

é essencial percebermos a justaposição de elementos diferentes dos humanos

envolvidos. Para além da racionalidade humana na produção do conhecimento,

o contexto social precisa ser incorporado, sem, no entanto, nos esquecermos

do papel fundamental dos computadores, dos livros, de instituições de ensino e

fomento, etc., e assim, a TAR seria para o autor, portanto, uma “engenharia

heterogênea”.

Se a observação que mais pudemos notar sobre a TAR é que não se

pode fazer nenhuma afirmação apriorística, ela é colocada, então, radicalmente

como empírica e o tecer das redes é, assim, um fazer conjuntural, localizado e

variável em sua significação (LAW, s/d). Ainda para o autor, existem quatro

estratégias para que ocorra a tradução, um verbo essencial na TAR e que

“implica transformação e a possibilidade de equivalência, a possibilidade de

uma coisa (por exemplo, um ator) representar outra (por exemplo, uma rede).”

(LAW, s/d, p. 10). As duas primeiras estratégias dizem a respeito de tempo e

espaço, versam sobre a durabilidade de diferentes materiais envolvidos em

nosso social, sempre considerando essa duração enquanto um efeito

relacional; e sobre a espacialidade dos acontecimentos, na relação centro e

periferia e o poder de ação em longa distância, sob a égide de vigilância e

controle, especialmente com os avanços tecnológicos. A terceira estratégia

coloca com maior grau de efetividade a tradução quando antecipa as reações

dos materiais no processo de tradução, fugindo, no entanto, de determinismos

e entendendo também enquanto efeitos relacionais2. A última estratégia, por

sua vez, reforça o objetivo da rede que é localizado, muito embora uma rede

não seja isolada e ramifica-se através de outras, o que pode ajudar a tecer a

realidade macro.

Assim como foi observado, os antropólogos, e cientistas sociais como

um todo, ao debruçarem-se para suas próprias sociedades “se apequenam”

diante de uma dita complexidade da modernidade e por não conseguirem

desvincular-se de seus valores. Contudo, o que os teóricos da TAR nos

2 Dois outros autores de grande relevância apresentados no argumento de Law são Michel

Foucault e Max Weber, cada um abordando de certa forma tanto a questão da transmissão do poder quanto as relações sociais enquanto teias (redes!) de conhecimento.

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mostram é que podemos ter deixado passar, desde Thomas Kuhn, a noção de

controvérsia. Essa compreende que para cada novo paradigma que se

estabelece, em qualquer área da ciência, existe um conflito de interesses que

vai além dos humanos envolvidos, uma rede de apoio que possibilita a

consolidação ou não de dado projeto. Perceber de outra forma o contexto

social implicado na produção de conhecimentos retoma a atitude sugerida de

desconfiança com relação às hierarquias pré-estabelecidas. Assim, a rede

pode trazer uma diluição no sentido em que “(...) representa uma terceira via, a

que reconcilia modernização e tradição, a que torna compatíveis ação

individual e projeto coletivo, a que nos faz entrar em um mundo que

partilhamos pacificamente com as coisas que criamos” (CALLON, 2013, p. 79).

Dessa forma, numa teoria que parece ser de reconciliação, que

reconstrói laços desfeitos no projeto de modernidade, “(...) a teoria do ator-rede

não abre mão do hífen entre seus termos: só existem atores articulados em

rede; a rede articula a ação.” (BACHUR, 2016, p. 7), e assemelha-se então

com a metáfora da erva-daninha que surge nos espaços menos esperados,

aparentemente impossíveis da vida acontecer, preenche vazios; se dá no meio,

entre as coisas (DELEUZE, GUATTARI, 2017, p.40). Por fim, caracterizada

assim, retomamos na agulha a linha que define de outra forma o rizoma, que

“não começa nem conclui, ele se encontra sempre no meio, entre as coisas,

inter-ser, intermezzo” (Idem, p. 48).

Posto os principais elementos da teoria que entrelaça humanos e não

humanos, a TAR tem dupla função, pois se qualifica também enquanto

metodologia. As redes sociotécnicas são exatamente a expressão dessa

metodologia, da tessitura entre a natureza, o social e o discurso, da

reconstrução do tecido inteiriço social, de inspiração etnográfica, pensando na

trajetória dos autores apresentados. O desafio é reter na pesquisa e na

pesquisadora a qualidade desenvolvida pelos antropólogos no olhar ao que foi

classificado socialmente enquanto “outro”, seja o outro uma coisa, uma

tecnologia, ou mesmo uma pessoa percebida enquanto parte de outra rede. É

possível, inclusive, questionar o posicionamento clássico entre sujeito-objeto

que, de certa forma, Latour não levou até às últimas consequências

(BANCHUR, 2016), mas que tenta diluir ao propor agenciamentos não

antropocêntricos. Por mais que se proponha rizomática uma narrativa à luz da

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TAR, está estabelecida essa hierarquia, a posição do pesquisador acaba sendo

ainda principal, uma vez que é ele o detentor do discurso que tece tal rede, que

finca o começo e o fim da história.

A simetria radical de Latour que Bachur (2016) critica será levada em

consideração na redação deste texto. Como recurso analítico, a redução em

três essências de nossa sociedade dita moderna que Latour faz em fato,

natureza e discurso, aqui já apresentadas, será também um norteador para

compreendermos os diferentes elementos nessa pesquisa. As entrevistas feitas

com as pessoas elencadas como atores importantes ao longo da rede são o

discurso preponderante. Por isso, o esforço engendrado foi de saber dar vida a

uma rede e materializar as relações ainda não descritas, aos modos da moça

tecelã trazer todos esses elementos que em suas miríades de possibilidades e

características desvelam-se em Limeira sob essa política pública.

Objetivo

O objetivo desta pesquisa foi analisar o processo de implementação do

programa “Cestas Verdes”, uma vertente do PAA de Limeira, SP, nos eixos: I.

produção do alimento; II. gestão pelas técnicas municipais e III. distribuição das

cestas às famílias beneficiárias.

Objetivos Específicos

De forma específica, ao percorrer o caminho do alimento nos três eixos,

esta pesquisa buscou responder:

1. Para os agricultores, quais são os alimentos para serem vendidos?

Como esses alimentos são produzidos? Há diferença entre os

alimentos para vender e para consumo próprio?

2. Para as gestoras e executoras, como foi trabalhar com uma política

de SAN? Como esses alimentos foram distribuídos? Quais foram os

maiores desafios ao trabalharem com a alimentação das famílias?

3. Para os beneficiários, quais são os alimentos que fazem sentido

como comida adequada e/ou saudável? A distribuição das cestas

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contribuiu para a amenização da pobreza, da IAN e a promoção de

hábitos alimentares saudáveis? Como os alimentos são apropriados

e incorporados no cotidiano alimentar dos beneficiários? Quais

modos de cozinhar e armazenar são empregados?

Desenho metodológico

Para a análise do programa “Cestas Verdes” em questão, desenvolveu-

se um desenho metodológico com diferentes ferramentas de coleta de dados,

adaptadas para cada eixo em que foi dividida a política.

Em primeiro lugar, a TAR tem forte inspiração etnográfica e exige um

exercício difícil ao pesquisador para deslocar-se de suas certezas e desconfiar

de informações apriorísticas em seus estudos, especialmente naqueles que

envolvem a “nós mesmos”. Assim, os primeiros dados a serem apresentados

em cada um dos capítulos são do diário de campo da pesquisa elaborado a

partir de observações participantes realizadas nos três eixos pelos quais

percorreu o alimento, entre Outubro e Dezembro de 2016. Segundo Minayo

(2014), a observação participante ampara-se em um amplo debate teórico e é

uma das metodologias de coleta de maior importância na área qualitativa, pois

possibilita uma inserção na “realidade”. Longe de determinar o que é a

realidade, a participação nesse caso serve para posicionar a pesquisadora,

colocar-me in loco, e o diário de campo foi um instrumento de registro, uma vez

que “é exatamente esse acervo de impressões e notas sobre as diferenciações

entre falas, comportamentos e relações que podem tornar mais verdadeira a

pesquisa de campo” (MINAYO, 2014, p. 295).

Para o primeiro eixo, foram pensadas entrevistas semiestruturadas com

uma amostra de cinco produtores vinculados à cooperativa e que participaram

efetivamente desse projeto do PAA no município. No entanto, ao propor e

tentar realizar a coleta de dados dessa forma houve uma contraproposta de

realização de uma entrevista coletiva pelos próprios agricultores, reunindo-se

alguns deles entre os pré-selecionados e outros não previstos para uma única

conversa. Conforme é explicado no capítulo um, uma série de fatores

contribuiu para a mudança dessa parte do desenho, porém não causou

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maiores prejuízos à pesquisa e aos participantes. A entrevista coletiva, por fim,

foi bastante profícua para ouvir de todos como foi a experiência do PAA,

ocorrida no dia 18/09/2017, com a duração de 39 minutos.

A princípio, para a construção dessa parte da amostra da pesquisa,

foram levantados os dados quantitativos de toda a produção no período de abril

de 2015 a novembro de 2016, a partir das planilhas de prestação de contas

fornecidas pelo Ceprosom – Centro de Promoção Social Municipal, órgão

responsável pela área de Assistência Social e pela gestão do projeto. Assim,

ao analisar toda a produção, foram elencados para compor a amostragem

quatro agricultores, duas mulheres e dois homens, dois que não conseguiram e

dois que conseguiram alcançar a meta colocada no projeto inicial, e um

coordenador. Assim, foram agendadas as entrevistas, porém houve uma

entrevista coletiva, quando foi possível captar seus relatos e impressões a

respeito da participação no projeto, bem como fazer a avaliação a partir da

perspectiva desse grupo. No dia da conversa, foram ouvidos sete agricultores,

quatro mulheres e três homens, sem maior controle se tinham ou não

alcançado a cota de produção.

Para o segundo eixo, na gestão municipal, as entrevistas

semiestruturadas também foram eleitas para a coleta dos dados, tanto para as

gestoras que ajudaram a elaborar a política e colocá-la em prática, quanto para

as que estavam na operacionalização e materialização de todo o processo,

desde a coleta, montagem e distribuição das “Cestas Verdes”. A amostra foi

pensada exatamente para captar as vozes de funcionárias (todas as ouvidas

foram mulheres) ao longo de toda a capilaridade da instituição do Ceprosom.

Assim, foram realizadas entrevistas com duas gestoras de maior influência, que

participaram na elaboração do projeto e colocaram-no em prática; outra gestora

com menor participação nos trâmites burocráticos, mas profundamente

envolvida na gestão e operacionalização de todo o projeto. Ademais, foram

entrevistadas duas assistentes sociais com envolvimento direto com os

beneficiários, de dois territórios distintos do município, com experiências

diferentes. Ao todo, foram cinco entrevistas, realizadas no mês de abril de

2017, com durações variadas, entre 30 a 90 minutos de conversa.

Para o terceiro eixo, exatamente no momento da observação

participante, foram realizadas visitas em todos os Centros de Referência à

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Assistência Social (CRAS) do território de Limeira que faziam a distribuição das

cestas, através da capilaridade característica de seu atendimento. Sendo estes

o CRAS Nossa Senhora das Dores, CRAS Presidente Dutra, CRAS Casa das

Famílias, CRAS Cecap, além do CREN (Centro de Reabilitação Nutricional) e o

CREAS (Centro de Referência Especializado de Assistência Social). Ficaram

marcantes as diferentes experiências em cada equipamento, mas foi preciso

escolher dois locais para aprofundar a coleta de dados da pesquisa,

especialmente com os beneficiários finais.

Para a amostra desse eixo, ocorreram duas etapas. Inicialmente,

aplicamos apenas no Centro Comunitário Odécio Degan os mesmos

questionários que os gestores do Ceprosom elaboraram para a compreensão

da situação de IAN das famílias que potencialmente poderiam receber as

cestas, já com o PAA em andamento, mas antes de colocarem em prática as

“Cestas Verdes”. Tais questionários foram aplicados pela gestão municipal

quase no final do projeto e o intuito era de compreender quais os perfis das

famílias que recebiam as cestas. Depois, após escolhidos o centro comunitário

Odécio Degan, referenciado ao CRAS Casa das Famílias, e o centro

comunitário Morro Branco, referenciado ao CRAS Nossa Senhora das Dores,

foram recolhidas as informações documentadas de todos os beneficiários que

receberam as cestas, como nome, endereço, quantas vezes recebeu as cestas

e se e quando houve descontinuidade do recebimento. Com esse levantamento

de todo o período, foi decidido que seria melhor avaliar a partir apenas dos

últimos seis meses, uma vez que a última entrega foi em novembro de 2016 e

conversar com as pessoas que recebiam os alimentos no começo do projeto

poderia ser infrutífero.

Ao fim desse levantamento de dados, um grupo focal para cada território

elencado foi convocado, com apenas a realização de um encontro, visando

amenizar a expectativa com relação à volta do programa “Cestas Verdes” que

para os beneficiários poderia parecer eminente. A estratégia de grupo focal,

compreendendo esse enquanto “um conjunto de pessoas selecionadas e

reunidas por pesquisadores para discutir e comentar um tema, que é o objeto

de pesquisa, a partir de sua experiência pessoal” (POWELL, SINGLE, 1996,

apud GATTI, 2012, p. 7), foi importante para se alcançar o objetivo dessa

seção da pesquisa. Esse é um método que permite compreender práticas

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cotidianas, comportamentos e atitudes, uma vez que se consegue colocar uma

série de indivíduos dos quais se quer obter as informações em interação,

possibilitando um melhor diálogo e amenizando também a hierarquia que

possa existir entre pesquisador e pesquisado. Ao optarmos por essa

ferramenta para a construção coletiva das opiniões a respeito da política

pública da qual participaram, utilizamos um método de coleta que pode ser

considerado intermediário entre as entrevistas e a observação participante

(GONDIM, 2002, apud TRAD, 2009, p. 781), amplificando as formas de coleta

de dados.

O grupo focal no bairro Odécio Degan ocorreu em dois de junho de 2017

e contou com a participação de 11 pessoas, além das pesquisadoras

presentes, e teve a duração de 42 minutos. O grupo focal no bairro Morro

Branco ocorreu em 19 de julho de 2017 e contou com a participação de sete

pessoas, excluindo as pesquisadoras presentes, e teve a duração de 32

minutos.

A participação de todos os sujeitos de pesquisa mencionados só foi

possível por meio da mediação dos funcionários do Ceprosom, que foram

abrindo os caminhos e recebendo a proposta de pesquisa de maneira

receptiva, na esperança de uma contribuição ao trabalho deles. As etapas de

trabalho de campo, realizadas com os agricultores, com gestores e técnicos e

com os beneficiários foram tranquilas e propiciaram um bom ambiente para a

observação participante. Parte considerável dos dados coletados veio das

observações feitas durante alguns momentos considerados exploratórios, de

conhecimento da política e das pessoas envolvidas, para então traçar-se a

rede sociotécnica.

Os instrumentos de campo utilizados como roteiros, tanto nas

entrevistas como para os grupos focais, os Termos de Consentimento Livre e

Esclarecido (TCLE), bem como as autorizações, seguem nos apêndices e

anexos, respectivamente, e foram todos submetidos ao Comitê de Ética em

Pesquisa e aprovados, sob o número do processo 64438316.5.0000.5404, dia

23 de abril de 2017.

Os áudios de todas as entrevistas, individuais ou coletivas, e os grupos

focais foram gravados com auxílio de smartphones e tablets. Os referidos

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áudios foram transcritos e armazenados em arquivo do tipo texto para, então,

serem interpretados. Todas as coletas de dados foram realizadas pela autora

dessa dissertação, com apoio de mais duas pesquisadoras (uma aluna de

iniciação científica da FCA/Unicamp e a professora orientadora).

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A Produção

O presente capítulo aborda o processo produtivo dos alimentos que

eram distribuídos às famílias que receberam as “Cestas Verdes”. Inicialmente,

serão descritos os dados coletados com o diário de campo para uma

caracterização local do acampamento. Posteriormente, serão expostos alguns

olhares sobre o PAA, no qual as “Cestas Verdes” estavam inseridas, por meio

de um breve levantamento bibliográfico sobre essa política pública federal,

especialmente no que se refere à população rural. Em seguida, serão

apresentados os dados quantitativos sobre a produção no acampamento

Elizabeth Teixeira, o que ajuda a nortear a sessão a respeito dos beneficiários,

bem como sobre os próprios agricultores participantes da pesquisa. E nesse

ensejo, por fim, serão apresentados os dados coletados na conversa com os

agricultores e agricultoras.

O acampamento

A observação participante foi feita nos últimos meses de 2016, no final

do ciclo de dois anos para este projeto do PAA. Foi uma coleta de dados mais

exploratória, para compreender a dinâmica do programa, conhecer os

diferentes atores humanos e não humanos envolvidos e quais matizes seriam

mais interessantes de abordar no segundo momento de entrevistas mais

aprofundadas. Assim, segue a parte do diário de campo com as observações

feitas com relação a essa etapa, que diz respeito ao acampamento, mas

inevitavelmente acaba se entrelaçando com as linhas dos outros eixos.

Às sete da manhã era o horário combinado com as funcionárias da

prefeitura para ir ao acampamento em dia de coleta do PAA. Como já

ressaltado anteriormente, a viabilidade da pesquisa em muito se deu à

receptividade das funcionárias do Ceprosom, que abriram os caminhos para

conversar e conhecer todos os espaços e todas as pessoas envolvidas no

PAA. Dessa forma, as primeiras visitas ao acampamento também ocorreram

por intermédio delas. Das falas que pude presenciar em uma das ocasiões,

algumas foram marcantes a respeito do Elizabeth Teixeira: primeiramente, no

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último dia do projeto, em que a gestora das funcionárias que estavam

semanalmente envolvidas compareceu e descreveu o perfil dos agricultores da

cooperativa como “a maioria analfabeta e sem condições mínimas para

manterem-se”. O que condiz, inclusive, com o que relatou na entrevista cedida

à pesquisa:

Na verdade, foi muito importante pro município, pras famílias que receberam, pra entidades que receberam, pro assentamento Elizabeth Teixeira, que na verdade eles não tinham renda nenhuma, né. Não tinham com o que sobreviver e esse era um dinheiro que entrava mensalmente, ou mesmo que não fosse mensalmente, porque tínhamos muitos problemas com prestação de contas por parte deles, tendo em vista até a falta de organização deles e planejamento, mas assim, era um dinheiro que entrava na conta e a maior parte deles sobrevivia com essa, esse valor. Então acho que foi muito produtivo, pra todo mundo. Infelizmente agora, nós estamos num processo que o governo federal não renovou, né, o assentamento Elizabeth Teixeira também está com pendência com relação à documentação, problemas deles, eles e prefeitura e INCRA, então por isso a gente não conseguiu dar continuidade. (...) Todo o atendimento do assentamento, na verdade, a gente fez um trabalho que era pra eles fazerem e eles não davam conta de fazer. Então, no PAA eles teriam que entregar esses alimentos pra gente já pesados, limpos e organizados. Eles nunca conseguiram fazer isso, então o município se disponibilizou a pegar caminhão, equipe, embaixo de sol, embaixo de chuva, sem local, ir lá, pesar, separar as brigas deles que também são muitas, e fazer toda essa articulação. Então todo o trabalho que era pro assentamento fazer, o município fez. Pra que a gente conseguisse cumprir, né, o que a gente tinha se proposto fazer. (Gestora L., 2017).

Como meu acesso inicial se deu por meio dessas trabalhadoras, suas

falas foram o rascunho que tive para compreender o acampamento. Em outra

entrevista, uma das gestoras que estava mais diretamente envolvida na

elaboração da política pública afirmou que o PAA começou a ser gestado

também para atender o acampamento Elizabeth Teixeira. A história do

acampamento é de conflitos com a gestão municipal desde sua chegada e

estabelecimento no Horto Florestal (apesar do que foi afirmado pelos

participantes do grupo focal, como veremos mais adiante). Assim, esse

convênio estabelecido, de acordo com a entrevistada, foi de serventia para

“acalmar os ânimos”. Com alguns pré-requisitos burocráticos atendidos pelos

cooperados, toda a infraestrutura para a concretização da política foi fornecida

pela prefeitura: caminhão para escoamento e transporte até o banco de

alimentos, vasilhames para o carregamento, balança para pesar a produção,

etc.

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No entanto, no processo de renovação da documentação dos produtores

junto ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA), foram

encontrados empecilhos para dar continuidade com sua regularização. Hoje,

com o término do PAA em Limeira, eles estão impossibilitados de entrarem em

outro programa de compra estatal. As condições do acampamento, que ainda

não conseguiu se estabelecer como assentamento, são bem precárias, pois

não possuem de itens básicos como energia elétrica, água encanada e rede de

saneamento.

Ao assumir boa parte da infraestrutura que possibilitou o projeto (um

barracão foi construído quase ao final pelos acampados para melhorar a

condição das coletas, diminuindo os problemas com sol e chuva, por exemplo),

os órgãos estatais não deixam de estar cumprindo com obrigações mínimas,

tendo em vista a situação dessa população rural e a condição material que

obviamente possui e deve estar à disposição para esses casos. Ainda hoje,

boa parte dos bolsões de pobreza no Brasil está nessas áreas (CAMARGO,

BACCARIN, SILVA, 2013, p. 16).

Importante ressaltar aqui que, assim como a população rural é bastante

diversa por todo o Brasil, no acampamento Elizabeth Teixeira não é diferente.

Entrevistar os cooperados foi uma escolha por se tratar dos conveniados do

PAA e público alvo específico do estudo, porém, nem a cooperativa nem os

entrevistados representam o acampamento. Existem conflitos internos entre os

cooperados e não cooperados que habitam a mesma terra. Uma fala marcante

do mesmo participante em questão foi ele dividindo o acampamento entre “nós”

e “eles”: nós a cooperativa, eles o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-

Terra (MST), parecendo haver inclusive uma esperança nessa divisão em

conseguir alguma coisa junto à prefeitura quando a cooperativa se afasta do

MST (“ligado ao PT”) para tentar se aproximar da nova gestão municipal.

Lógica essa em convergência com um diálogo ouvido na manhã da

última coleta, início de novembro de 2016, após as eleições municipais. A

caminho do acampamento, com três funcionários no carro, a discussão foi

sobre o novo Secretário de Habitação que entraria no cargo com a nova gestão

e seria o responsável pela população no Elizabeth Teixeira. Aparentemente,

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ele estaria ligado ao Partido dos Trabalhadores (PT), fato esse que parecia

trazer um alívio aos gestores, pois significava acalmar os ânimos do “pessoal”,

dos “invasores”, irregulares e enrolados com suas demandas.

Segundo Taufic (2014), desde 2007 existe a ocupação em uma área

próxima ao Horto Florestal Tatu, em Limeira. Desde então, desencadeou-se

muitos entraves de sangue e de lei. No mesmo ano, houve um processo de

revisão do Plano Diretor Municipal, com outras intenções para o espaço

ocupado. Antes da revisão, no entanto, o uso desse território estava destinado

a uma Zona de Reserva Ambiental, o que já causaria um impasse com a

ocupação, mas assim que se instalaram a ação da prefeitura foi direta: a

reformulação do Plano Diretor serviu para reafirmar os interesses econômicos

para esse território e a briga territorial aconteceu no desacordo do discurso e

da ação. No mesmo ano, por ordem da prefeitura, ocorreu uma das

reintegrações de posse mais violentas enfrentada pelo MST, mesmo quando

comparada ao caso mais recente de Pinheirinho (TAUFIC, 2014). A luta pela

terra ainda segue e as negociações legais e jurídicas estão paradas.

O trabalho do economista Rodrigo Taufic (2014) apresenta um histórico

do acampamento e o embate jurídico que foi desde o momento da ocupação,

mas como essa se deu através do MST, seu foco está junto ao movimento,

especificamente. Dessa forma, o contexto acima ajuda a compreender o

acampamento como um todo, onde está inserida a cooperativa. Esses

agricultores e agricultoras estão imersos nessas condições, mas não foi um

aspecto abordado nas entrevistas.

Ao olhar para além dos plantios destinados à venda, chama a atenção

também a intenção estética que as pessoas colocam em suas casas: ao

caminhar pelo acampamento e passar pela casa das pessoas é inegável a

beleza das diversas floradas, seja no caminho de entrada para seus lares, seja

ao redor das plantações, nas hortas. É resistência também quando do mesmo

solo que se planta para sobrevivência se planta o belo, aquilo que não

necessariamente tem função econômica. A rosa do povo floresce no mesmo

sentido que poetiza Drummond, enfrentando todas as adversidades postas.

Como não houve um convívio mais intenso no acampamento, não foi possível

observar com mais detalhes o roçado fora do âmbito do PAA.

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Olhares sobre o PAA

De qualquer forma, todos que estão vivendo no Elizabeth Teixeira têm o

mesmo propósito: que é viver da terra, ter seu sustento na agricultura. A

categoria de agricultores familiares, à qual cooperados e não cooperados

pertencem, lutou e ainda luta por reconhecimento e igualdade de condições

frente à concentração fundiária no Brasil. Segundo Cátia Grisa e Sérgio

Schneider (2015), foi durante o processo de fortalecimento da própria

democracia brasileira, com o marco na Constituição Federal de 1988, que os

agricultores familiares, até então chamados de pequenos agricultores,

começaram a ganhar notoriedade e fortaleceram-se para exigir políticas

públicas voltadas à sua realidade. O que os autores pontuam ser de grande

importância é uma sociedade civil participativa, imprescindível para a existência

da possibilidade de colocar suas questões próprias em debate e para a

formulação de algum tipo de ação do Estado. Por mais que a permeabilidade

do Estado brasileiro começasse a indicar uma maior participação de outros

atores que não os grupos de influência já presentes desde sempre no poder,

sempre ocorreu e ocorrerá embate.

A categoria dos agricultores familiares já passou por muitas lutas e hoje

mais do que nunca precisa perseverar para não perder os direitos

conquistados. Afinal, foi por meio de conquistas nos âmbitos institucionais e

jurídicos que conseguiram a base da criação do PAA, entre outas políticas

públicas que favorecem esses atores. Primeiramente, com a criação do

Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf) em

1995, depois com a criação do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA)

em 1999, e da Secretaria da Agricultura Familiar (Saf) em 2001, dentro dele.

Outro marco importante, posterior à criação do PAA é a Lei de Agricultura

Familiar em 2006 (GRISA, SCHNEIDER, 2015).

A agenda para essa questão foi bastante conflituosa. As conquistas em

termos institucionais apontadas acima foram ganhos paulatinos que ajudaram a

inserir as pautas do campo, mas não sem conflitos e disputas de poder. O

próprio marco de 2006 só foi possível no primeiro governo de Luis Inácio Lula

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da Silva (2003 - 2006), antes o debate era mais difícil de conseguir alcançar a

própria agenda para então ser discutido (CAMARGO, BACCARIN, SILVA,

2013). A formulação da operacionalização das modalidades do PAA contou

com a participação de diversos atores: enquanto uma política interssetorial,

com a participação do MDA e do então Ministério do Desenvolvimento Social e

Combate à Fome (MDS)3, e apoiada na descentralização dos poderes desde

1988, a ideia é que a política seja gerida pela Companhia Nacional de

Abastecimento (CONAB) ou pelos Estados e municípios conveniados,

dispensando o uso de processos burocráticos e demorados de licitação.

Os cooperados não cessam de desejar a continuidade do programa. No

entanto, uma característica marcante da política para muitas pessoas

envolvidas é a burocracia, que parece emaranhar os caminhos que deveriam

ser de fácil acesso e compreensão (vide a quantidade de siglas envolvidas, de

esferas de poder, de canais de acesso). Em algumas falas, a esperança dos

agricultores parecia repousar na figura do prefeito, por vezes no Ceprosom, ou

ainda personificada em certas figuras da gestão na assistência social

municipal.

Todos os eixos tem isso em comum: tanto as assistentes sociais, ou

burocratas de nível de rua se as consideramos como a ponta final de execução

da máquina estatal em contato direto com os cidadãos (LIPSKY, 1980, apud

LIMA, D’ASCENZI, 2013, p. 104), diretamente envolvidas com a distribuição

das cestas e repasse das informações aos beneficiários, quanto os agricultores

demonstraram desconhecer alguns condicionantes essenciais do PAA. Como

veremos no capítulo sobre a distribuição, os beneficiários também acreditavam

em uma solução simples que uma canetada poderia resolver.

A partir do que reitera o agricultor e vice-presidente da cooperativa

entrevistado, as dificuldades da comunidade da qual ele fala para conseguirem

resolver a situação junto ao INCRA é o maior obstáculo. Enquanto durou, o

PAA foi de grande importância para todas as famílias no acampamento que

3 Desde 2016, com o golpe que a presidenta Dilma Rousseff sofreu, o Ministério em questão

teve seu nome alterado para Ministério do Desenvolvimento Social, agregando também o Ministério do Desenvolvimento Agrário, conforme o site oficial (Disponível em: http://mds.gov.br/acesso-a-informacao/institucional, acessado dia 22/01/2018). Como tratamos aqui de programas que foram criados antes dessa alteração, todas as vezes que a sigla MDS for utilizada estará em referência à antiga nomenclatura e sua designação, bem como na lista de abreviaturas.

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participaram e o recurso do Governo Federal era uma das principais fontes de

renda. Estar inserido na lógica de operação da máquina estatal é de suma

importância, bem como saber seu funcionamento e tê-lo a seu favor, assim,

consegue-se transpor barreiras. Quando se vive a situação contrária, as

barreiras formam labirintos que nos encerram em perspectivas perversas de

desigualdades.

Desde a segunda Revolução Verde, após a década de 1950, a produção

agrícola de maneira geral passou por grandes transformações. No mote de

produzir uma quantidade de alimentos que atendesse a demanda da população

crescente, o setor agrícola foi incorporando “inovações tecnológicas” que

deixassem mais produtivas e eficazes as plantações, como a substituição da

mão-de-obra humana pelo maquinário em larga escala, o uso extensivo de

agrotóxicos e engenharia genética para “melhorar” a qualidade das plantas e

sua resistência a intempéries naturais (MAZZALA NETO, BERGAMASCO,

2017). O Brasil, entre outros países periféricos, tem uma economia fortemente

embasada no setor agrícola, voltado à produção em massa de commodities,

principalmente no modelo de produção exportador. Já para o mercado interno,

a maioria dos principais produtos consumidos advém dos agricultores

familiares (IBGE, 2006). Na relação de forças entre esses dois modos distintos

e heterogêneos entre si de produção, o que temos é uma lógica especulativa

de má distribuição que força um cenário de superabundância em produção de

commodities (alimento?), na qual um polo é mais forte que outro, política e

financeiramente.

Esse modelo de produção, altamente lucrativo para poucos, está

consensualmente posto como uma das principais causas de degradação

ambiental. Parte das ações para melhoria desse cenário cabe ao Estado e

suas políticas públicas voltadas à cadeia alimentar. O desafio está posto então:

“os governos podem atuar tanto para corrigir as falhas de produção, buscando

um processo produtivo mais sustentável, quanto no consumo, ao optar por

adquirir, nas compras públicas, produtos com menor impacto no meio

ambiente” (SAMBUICHI, 2014, p. 75). O papel das Compras Públicas

Sustentáveis (CPS), como o próprio PAA, revela-se assim de suma

importância. Na extensa bibliografia existente acerca do PAA, podemos ver

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diversas contribuições que essa modalidade trouxe tanto para os agricultores,

quanto para os beneficiários finais (HESPANHOL, 2009; BECKER, DOS

ANJOS, BEZERRA, 2010; CAMARGO, BACCARIN, SILVA, 2013; BATISTA et

al, 2016; entre tantos outros).

Para este capítulo especificamente, o que vamos observar é a

percepção do impacto do programa na vida dos agricultores e agricultoras, em

seu autoconsumo e se ao longo do projeto foi possível uma melhora na SAN

dessas pessoas. Algumas das contribuições dos estudos aqui apontados

encontram convergência nos dados que serão apresentados na última sessão

do capítulo.

Alguns números do “Cestas Verdes”

Os dados quantitativos apresentados foram obtidos a partir dos

registros nas planilhas de prestação de contas pelas gestoras municipais e

cedidas pelo Ceprosom. Com o intuito de ter acesso a dados mais

consolidados do desenrolar da política, a análise se deu mais especificamente

sobre os últimos seis meses do projeto, de junho a novembro de 2016. Com

base nesse momento, foi possível observar quais foram os produtores que

conseguiram atingir a cota ao final do PAA e quais não conseguiram, o que

balizou a entrevista coletiva, em termos de dificuldades para ter uma produção

diversificada.

Ao final do caminho do alimento, esse levantamento também se mostrou

útil para nortear a conversa no grupo focal com as famílias, tentar trazer os

alimentos produzidos mais recentemente à conversa e assim rememorar um

pouco do que ocorreu na política pública. Pois, diferentemente da maneira com

a qual o campo aconteceu com as gestoras, com esses dois outros eixos

(Produção e Distribuição) a coleta de dados foi posterior ao término do “Cestas

Verdes”.

Para a apresentação dos gráficos a seguir, foram separados os

alimentos entre frutas, raízes e legumes (o que incluiu a mandioca), verduras

(todas as folhas produzidas) e leguminosas, sendo essa última sem produção

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no acampamento, apesar de constar na lista dos alimentos previamente

acordada no projeto.

Gráfico 1 – Frutas mais produzidas nos últimos seis meses/kg.

Como podemos observar acima, entre as frutas mais produzidas nos

últimos seis meses, bananas nanica e da terra despontam. Ao longo dos outros

meses, outras frutas apareceram, como limão e abacate. A própria lista

proposta contemplava certa gama de variedades de frutas, no entanto, aos

olhos das famílias não pareceu suficiente. O anseio maior das pessoas ouvidas

nos grupos focais era de oferecer mais frutas.

As frutas são alimentos que costumam dar mais trabalho para cultivar,

precisam de um planejamento, pois demoram mais até o ponto de venda e dão

perdas por conta de insetos e concorrência com outros animais quando se tem

uma produção sem veneno, como no acampamento.

Aqui, enquanto dado preliminar de análise do campo, podemos afirmar

que as duas pontas não conseguiram um diálogo melhor a respeito da lógica

de oferta e demanda. No capítulo a seguir, veremos para a gestão como foi

muito novo trabalhar nesses moldes, com inúmeros desafios ao longo do PAA,

por isso também a dificuldade de ajudar a alinhar a produção com a demanda

das famílias. Por isso também esta pesquisa se apresenta como uma análise

da política pública, para que essas questões possam vir à tona com a

importância que merecem.

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Gráfico 2 – Raízes e legumes mais produzidos nos últimos seis meses/kg.

Gráfico 3 – Verduras mais produzidas nos últimos seis meses/kg.

O trabalho agrícola como um todo preconiza um cuidado diário e de

muita atenção com a produção, não somente com relação ao pomar. Se

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observarmos as raízes e legumes que foram mais produzidos nos últimos seis

meses no gráfico acima, podemos ver que a raiz de mandioca era o alimento

mais produzido, disparado, bem como ao longo de todo o projeto.

Alguns agricultores não residem no acampamento, moram no centro de

Limeira, ou mesmo em outras cidades da região. Isso não deslegitima,

contudo, sua identidade rural e o vínculo que estabeleceram com o quinhão de

terra que lhes pertence no acampamento. Assim, para viver ainda se faz

necessário outros tipos de trabalho, outro arranjo na vida que transborda os

limites daquela terra. Dadas às condições do acampamento, sem energia

elétrica instalada e sem água encanada, é compreensível o esforço que fazem

para produzir o que produzem, mesmo que a venda ainda seja insuficiente para

que vivam apenas disso. No entanto, ficam prejudicados, de certa forma, a

horta, o pomar e as “Cestas Verdes” por consequência. A presença marcante

da mandioca está na hipótese de que é uma raiz de fácil manuseio e pouca

manutenção, ao contrário das frutas, como já dito.

Já as verduras e as folhagens verdes, tiveram destaque a chicória e a

couve, com um pico considerável em agosto de mais de uma tonelada de

chicória apenas. No inverno, especificamente para as verduras, o plantio fica

mais fácil porque não tem tantos insetos para danificar as folhas, e caso não

tenha nenhum frio extremo, a produção não sente tanto e é possível ter um

bom retorno.

A respeito dos agricultores, alguns números que pudemos observar é

que dos 53 cooperados que participaram do projeto e tinham seu nome na lista

de prestação de contas, apenas 36 apresentaram ao final do projeto um saldo

maior que R$4000, ou seja, mais da metade dos agricultores não conseguiu

vender metade da cota. Entre esses, cinco produtores permaneceram com o

saldo inicial de R$8000. E apenas 17 agricultores tinham ao final o saldo menor

que R$4000,00, ou seja, conseguiram vender metade ou mais do valor da cota

para os dois anos de projeto. Como apontamos acima, a vida desses

trabalhadores e trabalhadoras rurais não está concentrada apenas no

acampamento. Por infortúnio, como pude ouvir, ainda não conseguem viver

apenas do trabalho com a terra e o esforço para ganhar o sustento fica difuso

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em outras atividades. Essa pode ser uma das hipóteses explicativas para o

baixo alcance das cotas por parte dos cooperados.

A análise descritiva desses dados quantitativos foi importante para

elencar alguns agricultores para conversar a respeito da experiência deles no

PAA em Limeira, conforme veremos a seguir. No entanto, apesar de ter sido

pensada a amostra com o intuito de ouvir vozes com diferentes experiências

(homens e mulheres; produtores que atingiram e produtores que não atingiram

a cota), essa parte da coleta de dados acabou acontecendo de outra forma.

Focalizando os agricultores do acampamento

Inicialmente, no desenho da amostra para essa parte da coleta de

dados, foi escolhida a entrevista semiestruturada. Para tanto, a partir dos

dados apresentados acima, cinco agricultores foi o número acordado para as

entrevistas, visando captar distintas experiências. Foram escolhidos como

participantes o vice-presidente da cooperativa, que foi o elo de comunicação

com os cooperados, uma vez que sempre esteve presente nos dias de coleta

do PAA; bem como duas agricultoras, uma que atingiu e outra que não atingiu

a cota de vendas; e dois homens, seguindo os mesmos critérios.

Ao realizar os contatos e tentar chegar à melhor data para entrevistar

todos os agricultores e agricultoras selecionados, contudo, o vice-presidente

propôs que conversássemos todos juntos, de maneira que a data não fosse

mais um problema, tanto para a pesquisadora, quanto para os participantes,

que tem seus afazeres próprios também. Assim, na mudança feita de última

hora, o que seria uma coleta por meio de entrevistas semiestruturadas acabou

sendo um grupo focal improvisado, sem a presença de outro pesquisador como

o observador da dinâmica.

A gravação dos áudios, consentida por todos os presentes, ajudou a

remontar este momento que acabou fugindo do planejamento prévio

necessário por parte da pesquisadora, como sugere a bibliografia a respeito

dessa metodologia.

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Além da sugestão com relação a metodologia de coleta de dados, o

vice-presidente também demonstrou descontentamento com os nomes

selecionados para participar da pesquisa. Ao informar os nomes escolhidos

que eu gostaria de entrevistar, ele manifestou certa hesitação e sugeriu outras

pessoas para participar, que na sua visão seriam mais colaborativas e tinham

contribuído mais com o PAA. De certa maneira, ao sugerir tal modificação,

demonstrou também as desavenças existentes dentro do acampamento, que

como já apontamos, não é um lugar de homogeneidade. Como a presença dos

agricultores dependia do contato que o vice-presidente estabelecia, também

não fui capaz de questionar essa decisão dele.

Assim, a entrevista coletiva, ou grupo focal improvisado, ocorreu no

barracão da cooperativa, dentro do acampamento, com a presença de sete

agricultores, três casais mais uma senhora, número considerado adequado

para a realização de um grupo focal, permitindo que todos pudessem se

expressar a respeito dos tópicos abordados. A conversa teve duração de 39

minutos.

O primeiro assunto que conversamos, e que sempre está em pauta

quando fazia contato com o vice-presidente, foi a questão da regularização da

DAP (Declaração de Aptidão ao PRONAF). Não possuir esse documento

inviabiliza a participação do acampamento e, por extensão, a cooperativa de

participar dos programas de compras públicas, como o PAA e o Programa

Nacional de Alimentação Escolar (PNAE). Tal documento tem uma validade de

dois anos e o da Cooperativa Maranata já está vencido. Ao relatarem as

dificuldades que encontram para resolver essa questão e a frustação de como

gostariam de estar trabalhando (“a ver navio”, “com a produção parada”),

também depositam de certa forma na pesquisadora, enquanto uma possível

interlocutora com o alcance de outras esferas de poder, uma esperança de

conseguirem solucionar esse entrave. Conforme conta Zangelmi (2016) sobre

um estudo seu realizado em assentamentos rurais desvinculados ao MST, a

situação que o pesquisador pode encontrar de “abandono” e de condições de

vida precárias pode gerar expectativas por parte dos entrevistados, o que

facilmente pode acarretar frustação e impotência por parte do pesquisador (p.

132).

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Com este trabalho de campo o sentimento não foi diferente. No entanto,

de maneira distinta da que o autor encontrou em seus estudos, com

assentamentos mais politizados e consolidados, no caso dos cooperados

ouvidos não foi possível notar uma atitude de desconfiança: “ninguém tem

nada pra esconder, estamos falando a verdade”, por isso mesmo não tiveram

nenhuma objeção com a gravação do áudio, não se sentiram intimidados.

Como já descrito, o acampamento como um todo sofre de algumas

privações de infraestrutura, como falta de água encanada, energia elétrica (os

próprios agricultores compraram postes pré-fabricados de energia elétrica, mas

nunca foram ligados) e saneamento básico. Cada lote foi se adaptando, com

placas de energia solar, fossas sépticas, poços artesianos, e todos vão se

ajudando. Apesar dessas condições, quando perguntados se encontravam

dificuldades tanto para viver quanto o reflexo de suas condições de vida na

produção vendida para o PAA, a resposta nunca apontava para essa direção.

Afirmaram todas as vezes que perguntei sobre dificuldades que não tinham

nenhuma, ainda que esse discurso começasse pela fala do vice-presidente, ao

ser o primeiro a responder as perguntas colocadas para todos. Depois, em

outros momentos ao longo da conversa, outros participantes colocaram o

problema da água como uma grande dificuldade, tanto para consumo próprio,

(mesmo com o caminhão pipa que a prefeitura manda semanalmente) como

para o plantio e a criação presente no acampamento. O gado é tanto de leite

quanto de corte, os porcos e galinhas são todos para consumo, ou como

afirmou uma das participantes “não é pra vender não, é pra gasto mesmo”.

Mesmo não tendo acompanhado mais sistematicamente a vida dos

agricultores no acampamento e mesmo não sendo tão próxima da vida no

campo e da lida na roça, para além da falta de acesso à água, outras

dificuldades ficaram evidentes, como por exemplo, a falta de acompanhamento

ou de instrução da assistência técnica de extensão rural para o planejamento

dos plantios. Chegaram a relatar desperdício de frutas como manga e banana

devido a grande produção e não conseguirem vender ou escoar de alguma

forma, o que poderia ter sido diferente se alguém os tivesse ajudado ainda na

etapa de elaboração da política pública. De maneira mais abrangente, as

políticas de assistência técnica em extensão rural sofreram desmontes por todo

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o Brasil (KAWAKAMI, SOUZA, 2015), e assim, não apenas o acampamento em

questão não o recebeu, mas vários pesquisadores apontam para as

descontinuidades que essa assistência tem sofrido por todos os estados

brasileiros.

O fato de terem sido escolhidos pelo vice-presidente, com a presença

também da presidenta (esposo e esposa), agricultores que conseguiram

alcançar a cota e de afirmarem que não foi difícil a participação no projeto diz

muito sobre a autoimagem que o grupo quer pra si. “Quem não trabalhou

direitinho é quem não atingiu as cotas, né?”, afirma uma agricultora presente;

“a maior parte teve que parar de entregar porque ultrapassou o permitido para

certos produtos”, relata outro entrevistado; “com toda a luta, Deus ajudou”.

Falar de dificuldade seria falar de fracasso, seria afirmar uma incapacidade de

produzir a qual rejeitam fortemente.

A autoimagem que querem para o grupo é de trabalhadores sérios.

Apesar de dizerem ter uma boa relação com a prefeitura, percebem da mesma

forma que são considerados de maneira homogênea como sendo todos

integrantes do MST, como se tivessem ouvido o funcionário dentro do carro do

Ceprosom declarando certo nível de preocupação com os ânimos do “pessoal

do acampamento”. E serem considerados do MST é uma imagem que o

funcionário e os cooperados compartilham de um mesmo estereótipo que a

mídia cria e perpetua. A “satanização” que esses trabalhadores rurais sofrem

(AYOUB, 2006) prejudica de maneira sutil até aqueles que não sofrem

diretamente da ação. Sua imagem de grupo é danificada e vão buscando assim

novos caminhos de atuação e sobrevivência.

Parte das estratégias para se viver ali depende de condições para o

escoamento dos produtos. O que essa parcela de agricultores relatou é que

desde que acabou o projeto estão com tudo parado. Ao lado mesmo de onde

conversávamos tinha uma roça de milho seca, perdida também pela escassez

de chuva, já dando um mês de seca. Se houve semanas em que a coleta do

PAA saiu com três toneladas de alimentos, é possível imaginar a capacidade

de produção e o volume que se perde hoje. Um dos participantes relatou da

seguinte maneira essa questão do escoamento:

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Aqui em Limeira, os comerciantes já vão tudo no CEASA e já traz né. Porque lá no Mato Grosso, no norte, onde estão meus irmãos lá, os mercadinho tudo compra do cara da roça, vai lá fazer pedido, não, pode levar que nós compra. E lá não tem CEASA. E aqui não, você vai nesses mercadinho tudo aqui, que eu já fui desde o começo, e não, nós já traz tudo do CEASA. Então, eles faz um pouco caso da gente porque já traz do CEASA. Se tivesse um representante, ai sim, pra ir lá na cidade. Mas a gente mesmo, plantar, irrigar, cuidar, colher e levar, não dá.

As funções cumulativas ao plantio acabam tirando os agricultores da lida

com o que gostam. Ao perguntar sobre suas histórias de vida e como

chegaram ao Elizabeth Teixeira, as respostas sempre colocavam o trabalho

com a terra como central, sempre buscaram seu quinhão para trabalhar e viver.

A identificação com o meio rural mostrou-se muito presente em todos os

participantes, sejam os cinco que vieram do Paraná e no casal que veio da

Bahia. Acabaram numa cidade da região Metropolitana de Campinas, num

estado que possui histórias de violência contra os movimentos sociais, num

embate entre projetos políticos conflitantes (TAUFIC, 2014).

Estar com a produção parada implica diretamente na alimentação

dessas pessoas. Com a diversificação da produção que a CONAB em certa

medida exigia da cooperativa, por sua vez, a produção para o autoconsumo

dos agricultores era beneficiada. Após o final do projeto, uma agricultora

chegou a afirmar que atualmente “nós compra mais do que nós planta. Por

causa dessa DAP, nós tava usufruindo dos produtos que nós tava plantando,

mas acabou, parou”. Uma vez que não conseguem se regularizar e assim

participar das compras públicas, ou mesmo atingir um mercado consumidor

fora da esfera estatal, a alimentação deles parece ficar comprometida,

implicando em um potencial problema de Insegurança Alimentar e Nutricional.

No estudo feito sobre produção para autoconsumo em assentamentos

rurais do Estado de São Paulo, o Instituto de Terras do Estado de São Paulo

(Itesp) e o Centro Universitário de Araraquara (Uniara) trouxeram informações

importantes e que mesmo após 15 anos ainda são significativas. Das

comunidades observadas em várias regiões do estado, o que eles puderam ver

na alimentação da população de assentados é a presença crescente de

produtos mais comumente vistos na alimentação urbana, como processados e

ultraprocessados (bolachas, iogurtes, doces e refrigerantes), uma tendência da

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globalização e da modernidade, como afirmam. Alguns alimentos que

requerem processamento industrial mínimo, como café e alguns derivados do

leite são produzidos em algumas localidades. A dependência encontrada na

compra de gêneros alimentícios como óleo, açúcar e sal é unânime.

Já a produção que têm para autoconsumo, com alimentos in natura e

derivados animais, é muito importante para a noção de fartura entre eles e

consegue melhor assegurar aos agricultores de que não irão faltar alimentos

em momentos de incerteza (SANTOS, FERRANTE, 2003). O tripé observado

pelos pesquisadores relaciona o desempenho econômico dos assentamentos

em escoar a produção comercial, que beneficiará o autoconsumo quanto

melhor e maior for o desempenho. Em outras palavras, a insegurança

relacionada à falta de alimentos é amenizada nessa parcela da população

quando se tem condições para plantar o sustento. Situação essa similar ao que

encontramos no Elizabeth Teixeira.

Assim, entre os outros objetivos, avaliar se está sendo assegurada a

SAN para estes trabalhadores através do PAA é também de suma importância.

Pudemos notar pelas falas acima que, desde o fim do projeto, esse grupo de

pessoas tem menos certezas com relação sua alimentação, podendo apoiar-se

cada vez menos em seu trabalho para geração de renda e autoconsumo,

comprometido tendo em vista a situação fundiária do acampamento e

dependendo cada vez mais de compras de produtos externos. Conforme a

conceituação jurídica apresentada acima, a SAN é baliza em muitos estudos a

cerca do PAA.

Apenas para ressoar junto com o que pudemos ouvir do caso de Limeira

e tecer coletivamente melhorias sobre o PAA, segue alguns exemplos entre a

vasta bibliografia produzida sobre essa política pública. Um caso é do estudo

feito em Ubá, MG, para entender a percepção dos agricultores sobre sua

própria participação no programa (BATISTA et al., 2016). No frigir dos ovos, o

incremento na renda melhora a qualidade de vida dos agricultores e, por

conseguinte, sua alimentação também. Assim como em Limeira, a produção

gerada é capaz de ter em qualidade e quantidade alimentos para o

autoconsumo e para a comercialização. Os autores apontam no final do artigo

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a necessidade de se continuar os estudos com a categoria de agricultores

familiares para que se possam compreender suas necessidades, que podem

diferir com relação à modalidade do programa, com relação às especificidades

locais, entre outros motivos. É compreensível que a preocupação ministerial

seja com as toneladas entregues de alimentos, números que ajudam a todos

na cadeia alimentar, no entanto, são precisos ajustes para que todos os

objetivos do PAA sejam alcançados com excelência.

Outro estudo, esse realizado em algumas cidades gaúchas, Becker, dos

Anjos e Bezerra (2009) concluíram, entre outros resultados, que o mercado

institucional promove uma maior diversificação da produção, o que incide no

autoconsumo e práticas alimentares, bem como os dados aqui coletados

puderam demonstrar. Um alto grau de satisfação das famílias agricultoras com

o futuro da atividade agrícola também foi um ótimo resultado encontrado, uma

vez que possuíam a garantia de comercialização através do programa. Um dos

agricultores do Elizabeth Teixeira pintou a cena: “Quando tinha a DAP, eu sinto

comigo assim, era tão gostoso, o povo alegre, cantando, cantando assobiando,

[...] todo mundo alegre, né, todo mundo plantando a sua horta [...]”.

O fortalecimento tanto dos agricultores ouvidos no caso de Limeira,

quanto em outras localidades do Brasil, está cada vez mais prejudicado através

do PAA. Conjuntamente com o PNAE, são os maiores programas de compras

públicas, contudo, seguem sobre duros regimes de cortes4 que prejudicam um

seguimento do Brasil rural historicamente invisibilizado. Os embates

mencionados anteriormente nunca cessaram. No momento em que a maior

parte do Brasil segue com incertezas, a classe dirigente, um amálgama entre a

classe política e econômica, perpetua as suas próprias certezas. Os cortes

realizados de até 96% são de fato a extinção de programas que representaram

avanços sociais para a parte da nossa população que alimenta nossa mesa.

4 Programas sociais têm cortes de até 96% em quatro anos:

http://www.valor.com.br/brasil/5149370/programas-sociais-tem-corte-de-ate-96-em-quatro-anos. Fonte: Jornal Valor Econômico, 09/10/2017. Acessado dia: 20/10/2017.

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A Gestão

Chegamos à junção das duas pontas: a gestão municipal, que articula a

CONAB no pagamento dos agricultores, faz a prestação de contas e faz a

distribuição até a ponta que consideramos final, os alimentos chegam às

famílias que ela mesma mapeou. Neste capítulo, portanto, pretende-se

compreender como se deu o processo de distribuição dos alimentos, como as

pessoas envolvidas com a gestão do programa em Limeira lidaram com o PAA.

Para compor as “Cestas Verdes”, levavam em consideração quais os alimentos

que sustentariam a fome das pessoas que iam receber? Ao longo das

subdivisões, vamos observar, primeiramente, os desafios na gestão da SAN

em escala municipal e quais são os equipamentos presentes para auxiliar

nessa empreitada. Logo em seguida, trataremos do diário de campo feito no

acompanhamento do trabalho das gestoras e, por fim, os dados coletados nas

entrevistas realizadas serão apresentados.

A gestão em SAN

Nesta rede complexa e imbricada de uma política interconectada, para

além das pessoas envolvidas que elaboram, fazem a gestão e executam as

políticas públicas de que tratamos aqui, as instituições do aparato jurídico e

político são de grande importância também. Ao tratarmos sobre o pacote das

políticas de SAN, estamos discutindo uma engrenagem que vincula os três

níveis de governo. A maneira como foram pensadas para estar em articulação

e de acordo com a disposição política de cada poder local para aderir às

normativas, engendram um primeiro passo para a gestão das políticas. O

MAPASAN, documento elaborado em 2014 pelo MDS, mostra a situação atual

do país, relacionando todas as atuações das instâncias federal, estadual e

municipal, e a aderência às políticas específicas a partir de uma amostra (MDS,

2014).

A partir de tal levantamento, podemos perceber de que maneira as

diferentes políticas que se abrigam no guarda-chuva da SAN devem agir, com

quais respaldos e em articulação com diferentes Ministérios. No entanto, a

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partir da elaboração do governo federal, com a criação inclusive da Câmara

Interministerial de Segurança Alimentar e Nutricional (CAISAN), não

conseguimos observar com efeito a manutenção de diálogos intersetoriais ao

longo dos outros níveis de governo. No MAPASAN, ao analisarem se os

municípios pesquisados possuíam uma secretaria específica para tratar da

questão da SAN, apenas 11% dos munícipios da Região Sudeste, por

exemplo, possuíam essa estrutura (Idem, 2014). Em muitos casos, não se tem

um equipe específica para se pensar sobre o tema.

Em Limeira temos a mesma situação, na qual o tema da SAN fica sob o

resguardo da pasta de Assistência Social, dividido entre diferentes

profissionais, atuando de maneira pontual e esparsa. Não que a temática da

SAN ou mesmo da garantia ao Direito Humano à Alimentação Adequada

(DHAA) não possa ser também uma prioridade da Assistência Social, mas

precisa ser compreendida como multidimensional e por isso mesmo perpassa a

Saúde, o Trabalho, a Educação, entre outras pastas e agendas.

Apesar do caráter descentralizador da Constituição Federal (CF) de

1988, os modelos de gestão ainda são tradicionais e focalizados, e apresentam

limites na execução e nos resultados (GARAJAU, 2016). Especialmente ao

tratarmos de SAN, estamos falando de intervenções estatais necessárias em

outras esferas e a desarticulação que o modelo operante e observado também

no caso de Limeira, pode trazer dificuldades para mitigar graves problemas

sociais encontrados. Os dois casos escolhidos para aprofundarmos nossos

conhecimentos sobre a experiência do PAA em Limeira trazem inspirações que

nos mostram o caminho da intersetorialidade, essa vista como “estratégica na

condução e operacionalização dos serviços ofertados, na reorganização da

gestão, viabilizando que ocorra uma nova relação entre o munícipe, os

gestores, considerando-se as peculiaridades locais” (Idem, p. 8).

Dessa forma, as gestoras que se engajaram com as “Cestas Verdes”,

mas principalmente as duas assistentes sociais ouvidas em cada local

escolhido, souberam perceber as peculiaridades locais e buscaram adaptar o

projeto à realidade dos bairros onde trabalham, foram atrás de parcerias que

enriquecessem o trabalho que estavam fazendo, seja por meio das

nutricionistas, como no caso do Centro Comunitário Morro Branco, ou com o

Serviço Social da Indústria (Sesi), no Odécio Degan. Para ambas as

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localidades, o destaque que justamente fez com que fossem escolhidos os

equipamentos estava na parceria que aliava áreas diferentes da gestão

municipal na execução de uma política que visa promover SAN. No entanto,

não está nesse caminho aqui apontado a melhor solução, mas sim uma

sugestão de como podem atuar as gestoras, e principalmente as executoras,

que se vêm nessa empreitada.

Tecer em Limeira

Antes de detalhar as duas experiências escolhidas para compor este

trabalho, segue o diário de campo que relata o processo de conhecimento de

toda a rede de assistência social que capilarizava a distribuição das “Cestas

Verdes”. A rede que o alimento traça é nosso principal foco com este trabalho,

no entanto, a rede paralela de Assistência Social é também de grande

importância para a articulação do projeto e conhecê-la de perto foi

fundamental, em todos os territórios que o município é dividido.

O início do campo se deu por meio dos próprios funcionários da gestão,

partindo de manhã logo cedo com o carro do Ceprosom ao acampamento, para

recolher os alimentos, em um caminhão que partiam juntos outros funcionários.

A relação dos funcionários com os agricultores do acampamento pareceu, à

primeira vista, ser amigável, especialmente com o resultado das urnas depois

da eleição em outubro de 2016. Esse sentimento parecia ser reforçado pelos

agricultores, que faziam questão de estreitar esses laços, pensando que o

projeto poderia estender-se, que com a nova administração municipal poderia

haver uma melhora para a vida deles, com uma renovação das compras

públicas. A falta de equipamentos, como as cestas para o carregamento dos

alimentos, a balança e o caminhão, faz com que seja um impeditivo para que

possam participar de outras compras públicas, como o PNAE, por exemplo.

Os encontros se davam para a coleta dos alimentos, pesagem e entrega

dos recibos de compra, logo após, os funcionários encarregados seguiam com

os alimentos em caixas também do Ceprosom até o banco de alimentos da

cidade, para separação e montagem das cestas. No banco de alimentos

pareceu existir um problema com o quadro de funcionários, com cargos de

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confiança instáveis, ou concursados que atuam no improviso. Para as

atividades operacionais de separar e montar as cestas estavam alguns

moradores dos abrigos da cidade trabalhando como eventuais, que podiam ser

empregados efetivamente, talvez fechando ciclo do “assistencialismo”.

Mesmo com um olhar não técnico voltado ao banco de alimentos, a

estrutura do equipamento deixa a desejar: manejando todos os produtos no

chão (pobre coluna), com um prédio quente e chão escorregadio. Sem muita

infraestrutura no equipamento e com a capacidade máxima de produção

relatada de três toneladas recolhidas em uma semana, talvez ajude a explicar

esse modo de fazer improvisado.

No começo do PAA, o objetivo do programa era atender apenas as

entidades filantrópicas conveniadas com o Ceprosom para atender idosos,

crianças em vulnerabilidades, no entanto, com a produção do acampamento

claramente superando a demanda existente e após fazer um breve

mapeamento sobre IAN em alguns CRAS, uma das gestoras, mais diretamente

envolvida com o planejamento, resolveu incorporar essas famílias mapeadas e

distribuir as “Cestas Verdes”. O PAA, ao final, mudou os rumos de sua

proposta uma vez que, como afirma Arretche (2001), ao longo da fase de

implementação de um política pública quem faz a política de fato são os

agentes e suas decisões.

Antes de conversar com cada coordenadora de cada CRAS e

compreender a experiência de cada território do município, a operacionalização

do programa parecia confusa. Como as cestas são montadas? Qual a

participação de cada tipo de profissional para pensar a composição das

cestas? Cestas essas que são montadas em sacos plásticos, prejudicando a

durabilidade dos alimentos, especialmente em dias mais quentes. Em

entrevistas com duas gestoras que participaram de todo o projeto, foi

ressaltado que o material para distribuição das cestas deveria mudar, como

sugestão de melhoria.

No banco de alimentos, as necessidades de cada instituição ficavam

estampadas em uma planilha colada na parede, mas nem sempre foram

atendidas à risca, pois quando a produção do acampamento foi muito superior,

se diziam que 8 quilos de mandioca eram suficientes por semana, a técnica

mandava 20 quilos, pois precisava escoar a produção. Certa vez ouvi que se

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espera que eles congelassem esse alimento para conseguir reaproveitar e não

ter prejuízo.

Após seguir algumas vezes com as técnicas do Ceprosom o caminho do

alimento até o final, foi essencial apresentar-me em todos os pontos de entrega

das cestas para conhecer cada realidade, como operacionalizavam, se era

uma diretriz única para atuação ou se era descentralizada e autônoma as

ações. Os pontos de entrega eram na própria rede de assistência social, a

partir dos CRAS, em cinco dos sete no município e em seus respectivos Centro

Comunitários, assim como no CREAS (Centro de Referência Especializado da

Assistência Social) e no CREN.

No CREN, até o final do de 2016 o enfoque foi atender as famílias de

seu entorno com vulnerabilidades detectadas, no entanto, em 2017 a creche

abriu seus serviços para atender as outras crianças que frequentam outros

estabelecimentos da rede. O atendimento do CREN foi de 30 famílias, contudo,

apenas 27 recebem, tendo uma das beneficiárias se recusado a receber as

cestas alegando ser inviável ter que carregar no ônibus.

Os equipamentos municipais para a assistência social foram pensados

de maneira descentralizada desde a Constituição Federal de 1988 para que o

atendimento visasse as realidades locais e específicas de cada região. Assim,

as pessoas que são atendidas nos CRAS estão referenciadas no território de

abrangência, no entanto, por mais capilarizado que seja o atendimento, é

preciso pensar também na locomoção das pessoas, especialmente quando

precisam carregar peso. Considerar o meio de transporte que utilizam, na

malha viária do transporte público e dos pedestres, nessa outra rede de

transportes que tanto pode viabilizar, quanto inviabilizar um projeto como no

caso da beneficiária acima.

A primeira reunião para conhecer as diferentes experiências ocorreu no

bairro Presidente Dutra, com a coordenadora e com uma assistente social do

centro comunitário, existente desde 1988. Ao perguntar sobre critério para

seleção das famílias que receberam as “Cestas Verdes”, ambas informaram

que passaram por um treinamento, no início da implantação das cestas no

PAA. Foram passadas instruções que diziam a respeito das prioridades, como:

famílias numerosas, com pessoas enfermas, idosos e crianças. Assim, no

território foi feita uma busca ativa e levantadas 86 famílias que entrariam nos

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critérios de IAN. Dessa busca ativa realizada por cartas, apenas uma família

retornou. De novo, outro processo precisou ser feito entre os usuários de

outros programas para conseguir encontrar as 20 famílias que inicialmente

receberiam os alimentos. Em meados de 2016, esse número de famílias teve

que ser reduzido devido a uma baixa na produção do acampamento. A

assistente social chegou a afirmar que tinham muitos problemas com a

qualidade dos alimentos no começo, problemas com a aparência (“a casca da

berinjela era estranha, de aparência diferente”) e com o estado das verduras

mais frescas, também devido ao calor e forma de transporte e distribuição. O

relato de ambas as profissionais é que é frequente também alguns

beneficiários não aparecerem para buscar as cestas, alegam a distância e o

peso para não aparecerem. No entanto, apesar do número oficial ter sido

reduzido, alguns casos eram mantidos “na manga”, para quando sobravam

cestas. As profissionais acabaram criando estratégias próprias, que não tinham

sido passadas em nenhum treinamento, para aproveitar as cestas e suprir a

demanda de famílias que gostariam/ necessitavam dos alimentos.

O treinamento que o CRAS Presidente Dutra afirmou ter tido logo no

começo do projeto não foi unanimidade. No CRAS Nossa Senhora das Dores,

por exemplo, não foi realizado um questionário de SAN antes do início do

programa “Cestas Verdes”. Os critérios de participação no projeto costumam

ter pequenas variações e pequenos ajustes em cada território, de acordo com a

sua realidade específica. Os critérios desenvolvidos pelo CRAS em questão

para selecionar as famílias que receberam as cestas foram: famílias

participantes do Programa Bolsa Família, e pessoas que apresentam algum

agravante de saúde. A lista de espera também era praticada nesse bairro.

Um diferencial que o CRAS Nossa Senhora das Dores apresentou foi

que contaram com o trabalho de duas nutricionistas que realizaram com as

famílias palestras de educação alimentar e nutricional. Vários temas foram

trabalhados: pirâmide alimentar, como preparar os alimentos recebidos nas

“Cestas Verdes”, aproveitamento integral dos alimentos, receitas, etc. Esses

encontros aconteceram nos dias em que as cestas eram distribuídas, e a

presença nas palestras era obrigatória. As profissionais envolvidas com as

“Cestas Verdes” relataram as experiências dos beneficiários, com novas

experimentações de preparações, alimentos que antes não comiam (como

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berinjela). Um dos objetivos descritos pela assistente social diretamente

envolvida é o de reeducar o paladar. Ela ressaltou também que a partir de julho

de 2016 foi percebida uma maior procura das famílias pelas cestas, e uma

maior responsabilidade (de ir buscar, ou então avisar que não irá buscar as

cestas para que seja repassada para outra pessoa).

O CRAS Casa das Famílias, cujo local de distribuição aos beneficiários é

de incumbência do centro comunitário Odécio Degan, distribui 40 cestas (30 no

bairro Odécio Degan, e dez no bairro Ernesto Kuhl). No começo do projeto, um

critério de seleção era o recebimento de cestas básicas, mas ao final do projeto

elas eram escolhidas de acordo com a quantidade de crianças, idosos e

pessoas com problema de saúde nas famílias. Quando uma pessoa ficava sem

buscar as cestas por até três vezes, os funcionários investigavam os motivos,

para saber se poderiam repassar para outra família. O bairro foi colocado pela

coordenadora do CRAS como uma das regiões mais vulneráveis de Limeira. As

famílias receberam uma palestra sobre SAN no começo do Programa e uma

palestra sobre a preparação de alimentos com uma nutricionista, em parceria

com a área da Saúde. Contudo, apenas uma pequena parte das famílias

atendidas (8-12 famílias) compareceu. Além de terem sido atendidos com

relação aos alimentos das cestas e de como prepará-los de forma mais

saudável, a assistente social que esteve mais próxima das famílias relatou que

foram oferecidos cursos eventuais de culinária, a pedido dos próprios

beneficiários, como cursos profissionalizantes sobre doces de festas,

salgadinhos, etc.

A assistente social do centro comunitário Odécio Degan discorreu sobre

outra rede, à parte do PAA, de abastecimento mais formal e perene, de locais

no bairro onde as pessoas podem comprar alimentos frescos, como os que

vêm nas cestas: uma senhora que tem uma horta e vende seus produtos,

existem alguns varejões pelo bairro, mas a partir de sua própria experiência em

compras de alimentos, considera um pouco caro fazer refeições sempre

“adequadas”:

Eu acho assim, nós temos vários varejões, nós temos três, dois varejões aqui no território, né. Então, eles espera e nós temos ofertas daqui do varejão, do Qualimais, que as vezes abaixa o preço de dia de terça-feira, mas é uma forma que tem da economia mesmo, deles não ter pra comprar toda semana, né? Mas eles costumam tá... pelo menos eu vejo, a sacola, né, mas não nem de todos, tá? Às vezes é o

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arroz feijão, é a salsicha, ou então a linguiça, ou então o hábito. E a gente tem também uma senhora que planta e faz horta aqui embaixo. (CRAS Casa das Famílias, Gestora P., 2017).

No CRAS Cecap também ocorreu uma parceria nesse projeto, com a

Secretaria de Educação, para atender as crianças da rede pública de ensino no

contra turno da escola. Assim, a assistente social ouvida explicou a experiência

que teve com o programa: os critérios de escolhas das famílias estavam

atrelados diretamente à frequência assídua das crianças nas atividades

extracurriculares oferecidas. Para esse território, foram disponibilizadas 34

cestas, destinadas a algumas famílias certas, mas houve um caso de recusa

em que a família reconheceu que não precisava ou afirmava que não teria

tempo para o preparo dos alimentos recebidos. Novamente, é possível

observar a relativa autonomia do território na escolha dos critérios de inclusão

no projeto, muito alinhados com o propósito do CRAS para a comunidade. A

assistente social parecia ter grande preocupação se as crianças de 6 a 14 anos

que recebiam estavam gostando dos alimentos, e elas diziam que a mandioca

frita era a melhor parte.

As funcionárias dos centros comunitários, de maneira geral eram

bastante próximas das pessoas que lidavam, não só dos beneficiários das

“Cestas Verdes”, que eram beneficiários de outros programas, mas de toda a

comunidade. Ao ouvi-las e conhecê-las, o discurso de seu ofício era sempre

voltado para a comunidade e para os resultados.

Como em todas as visitas realizadas, no CREAS a assistente social que

estava disponível para conversar foi bastante receptiva e informou que fazia

pouco tempo esse equipamento realizava a distribuição de um número

reduzido de cestas, cerca de 10, para famílias que não eram fixas, em estado

de risco iminente. Ela explicou que esse tipo de benefício é da alçada da

Proteção Social Básica, realizado nos CRAS, mas para algumas famílias com

perda de vínculos eles começaram a distribuir esse benefício também, para

amenizar pelo menos essa violação de Direito Humano à Alimentação

Adequada. A dinâmica é diferente no CREAS, uma vez que é apenas um para

todo o território do município: nos dias de coleta dos alimentos, um motorista

próprio deles vai até o banco de alimentos e leva a cesta na casa de cada

família; nesse dia também são feitas algumas visitas para o acompanhamento

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da situação da família, mas sem um viés nutricional. Os critérios elencados

além do risco iminente é a quantidade de membros que a família possui.

Uma característica que ficou bastante marcada é que a política parece

ser burocrática e complicada para todos os envolvidos, em seu funcionamento

e operacionalização. Não são todos os agentes que compreendem bem sua

existência e sua função. E ao longo de toda a cadeia que o alimento engendra

é possível observar que as assistentes sociais diretamente envolvidas com a

distribuição das cestas, por vezes, têm à sua disposição apenas informações

imprecisas para relatar aos beneficiários - esses acreditam em uma política de

governo, atrelada a gestões específicas, não relacionando diretamente com o

nível nacional de governança; da mesma forma foi possível observar no

acampamento.

Ouvindo as gestoras

Feito o périplo pela cidade, para conhecer os equipamentos e suas

experiências diversas, foram escolhidos duas localidades para a próxima parte

deste estudo. A imagem a seguir ilustra, portanto, no mapa do município onde

estão localizados os CRAS, o Ceprosom e o Banco de alimentos do município

(marcadores azuis), os respectivos centros comunitários escolhidos

(marcadores roxos) e a localidade do acampamento Elizabeth Teixeira

(marcador laranja), de onde saiam os alimentos.

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Imagem 1 – Distribuição espacial dos principais equipamentos

públicos estudados.

1 Fonte: Google My Maps - elaboração própria.

O primeiro momento descrito acima, no qual foi apresentada a pesquisa

às pessoas envolvidas, foi mais raso, de olhares curiosos difusos, mas com

inquietações que ajudaram na escolha e justificativa. Ao retornar nos lugares

escolhidos a experiência adensou-se. A falta também pode ajudar a compor

uma rede? O bairro Odécio Degan pode parecer discrepante com o resto da

cidade, como disseram várias pessoas da rede de assistência social, no

entanto, o estranhamento maior é no conflito de referenciais de bairros

vulneráveis. As casas são de alvenaria, com algumas apenas sem

acabamento, nada prejudicial. Tem muitos comércios de bairro, como lojas de

roupas, cabeleireiro, bares, mas equipamentos públicos são mais escassos e

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presentes em pontos chave. Via de regra, nas periferias o Estado mínimo já

existe.

O caminho de ônibus é diferente: os passageiros são, na maioria, negros

e pardos, as rotas levam para longe dos condomínios de luxo avistados quando

se toma as vias sugeridas pelo Google Maps. Algumas poucas habitações de

madeira, em estado precário foram avistadas. O bairro Aeroporto, próximo ao

Centro Comunitário, tem esse nome porque existia um antigo aeroporto na

cidade; hoje, no terreno do Ministério da Aeronáutica já é possível avistar uma

ocupaçãozinha tímida, uns barracos e um cachorro viviam depois do arame

farpado, no meio do mato.

O centro comunitário parece uma antiga escola, ou pelo menos

construída de forma similar para atender crianças no contra tempo escolar. Nos

outros lugares visitados, havia uma placa de fundação da década de 1980;

muito provavelmente no ensejo da descentralização do poder depois da CF de

1988. Parece um centro de distribuição: algumas doações são feitas, como

carrinhos de bebê. Ao final das atividades um lanche padrão é distribuído: pão

com salsicha e molho, uma fruta (no dia, maçã) e um suco de caixinha.

Até que ponto vai a circunscrição aqui? A quantidade de lixo gerada é

enorme, linha de fuga, nova rede. A presença de papéis na gestão, “na ponta

do lápis”, (talvez uma deficiência em contraposição a uma almejada eficiência,

uma defasagem, ou uma fixação com modos antigos do saber fazer da

profissão). A não utilização ou pouco uso de computadores no trabalho de

gestão e execução no dia-a-dia também caracteriza essa rede? Linha de fuga,

nova rede.

Já o bairro em que está o Centro Comunitário Morro Branco, do CRAS

Nossa Senhora das Dores, tem uma configuração diferente. Caminhar a pé por

ele é perceber menos casas sem acabamento, comércios locais, mas também

grandes empresas que querem estar perto da Rodovia dos Bandeirantes.

Como ressaltou a assistente social que trabalha nesse bairro, não se vê

criança na rua, é um bairro de idosos.

Por isso, a “cesta da mandioca”, como ela relatou, trazia mais do que a

mistura, mas também um desafio. Os alimentos das cestas, de acordo com ela,

são mais trabalhosos e mais caros se comparados aos alimentos

ultraprocessados vendidos nos mercados.

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Então o que acontecia, a gente acabou vendo a necessidade de atender essas famílias, porque com a idade, vai ficando mais idoso, ele já perde um pouco o paladar, ele já perde a vontade de cozinhar, né, acaba comendo só pão, pão, bolacha porque é mais fácil, vai lá,

abre o pacotinho. (CRAS Dores, Gestora M., 2017).

Foi fechada uma parceria com o SESI para ensinar novos usos dos

elementos das cestas e para incentivar o consumo da mandioca de maneiras

diferentes, tendo em vista a qualidade dos alimentos, bastante exaltada:

Às vezes quando a gente tava trabalhando lá na separação, às vezes o pessoal pegava uma fruta, a gente comia, era totalmente diferente o sabor, porque é orgânico, né, quase a maior parte é tudo orgânico. (CRAS Dores, Gestora M., 2017).

Essas parcerias foram vistas também por outra gestora como essencial

para ensinar a população tanto a utilizar os alimentos, como para passar os

hábitos saudáveis de alimentação:

(...) a população ficou muito feliz com o atendimento, porque melhorou muito a qualidade de alimentação deles, né... Todos os cursos que foram feitos também com o Sesi, pra capacitação dessas famílias, com relação ao uso desses alimentos, porque a população não é acostumada, né, a comer mandioca, alface, jiló... (...) Eles não são muito acostumados a comer, então tinha toda a capacitação do SESI também com relação à orientação alimentar. (Ceprosom, Gestora L., 2017).

Com o intuito de promover a SAN das famílias e de conseguir

desenvolver certa autonomia com relação aos preparos dos alimentos,

sobretudo de maneira considerada saudável, essas parcerias foram essenciais,

mas é sempre necessário o cuidado para não reforçar o mito da ignorância

nessas tentativas de mostrar o caminho da saúde, tão presentes nas primeiras

políticas públicas voltadas ao combate à fome e desnutrição (PINHEIRO &

CARVALHO, 2010).

Como já apontamos acima, trabalhar com o tema de SAN é muito difícil

e oferece desafios diários para essas profissionais, consideradas a ponta final

da política pública. E foi em um dos relatos que conseguimos captar essa

dimensão, a ação isolada do PAA com a Assistência Social não poderia

garantir uma melhoria do quadro de IAN no município, as equipes deveriam ser

interdisciplinares e o trabalho intersetorial, como ocorre nas instâncias federais

do governo. Essa foi a opinião de uma das gestoras, a tal ponto de não

conseguir afirmar se o programa cumpriu seu intuito. Inclusive, ela relatou

achar muito difícil afirmar que foi exatamente assim que ocorreu o PAA, pois a

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sua versão é apenas uma visão dos fatos. Sua entrevista foi uma das mais

longas, marcada de muita certeza em alguns dados, mas com essa oscilação

entre a assertividade e a humildade de reconhecer que o PAA pode ter sido

muito mais do que ela conta. Partilhamos do mesmo sentimento. Quanto mais

alto o cargo das trabalhadoras com quem conversei, mais dificuldades

pareciam apontar, desde o cenário nacional, até essas questões de aporte

teórico. As assistentes sociais tinham a postura de arregaçar as mangas e

chamar parceiros, cada dia superando o desafio que aparecia.

Uma das assistentes sociais apontou que, apesar de ter ocorrido uma

melhoria com relação à responsabilidade dos beneficiários de ir buscar os

alimentos e entender sua importância para o quadro de saúde da família ao

final do projeto, seria necessário fazer uma “conscientização”, nas palavras da

gestora, desde o começo, seja com as funcionárias envolvidas, seja com as

pessoas elencadas para receber. O que ela ressalta é que seu trabalho

também precisa ser valorizado, o planejamento feito às vezes caia por terra

quando não aparecia gente para receber as cestas e ela precisava distribuir de

alguma forma o alimento ali parado, mas as condições que estavam por trás de

cada não comparecimento precisam também ser entendidas. Como é preciso

rearranjar a rotina em busca mesmo daquilo que sabemos que vai ajudar, que

está como um direito nosso.

A gestora encarregada no Ceprosom apontou como dificuldade a parte

financeira. Não estando diretamente envolvida nem com a coleta dos

alimentos, nem com a distribuição, ela compreendia todo o jogo político e as

diferentes instituições que articulam o PAA e, apesar do prefeito, apesar do

INCRA, apesar do governo federal e apesar da crise econômica, seria esse o

desafio que ela poderia apontar. Uma vez que a sua fala reverbera em todas as

outras entrevistas, é um discurso coletivo e comunitário, no sentido de ação em

conjunto em prol de quem precisa. Tendo esse time alinhado para cumprir com

o projeto do PAA e das “Cestas Verdes”, o dinheiro é o único empecilho.

Todas as funcionárias que puderam participar da pesquisa contribuíram

para rememorar o PAA em Limeira; as informações que estavam difusas em

cada fala e em cada documento compuseram este capítulo. As articulações

entre estas pessoas classificadas como gestão com as pessoas do

acampamento, bem como com as famílias, foram únicas nesta experiência do

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PAA. E também a forma como trabalharam, como puderam articular seus

conhecimentos com outras áreas não previstas de início no projeto, como as

parcerias feitas com Educação e Saúde.

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A Distribuição

O presente capítulo visa fazer uma análise a respeito do alimento em

seu ponto de chegada desta rede sociotécnica, ou seja, a distribuição às

famílias que receberam as “Cestas Verdes”. Para tanto, a situação de SAN no

Brasil e em Limeira será o contexto para a discussão. Em seguida, serão

apresentados os dados coletados nos dois grupos focais realizados com os

beneficiários.

As escalas da SAN

A promoção de SAN está como um dos principais pilares do PAA, tendo

em vista a relevância dos pequenos agricultores na produção dos alimentos

consumidos pela grande maioria dos brasileiros. Além desse programa, a

construção de instituições e aparatos jurídicos que dessem o respaldo e

ajudassem a garantir o conceito de SAN também foi essencial. Em 1985, houve

uma primeira menção ao termo de SAN em uma política pública, ainda sem a

noção do nutricional envolvida (MACHADO, 2017, p.82).

Especialmente a partir de 2003, com a criação do Programa Fome Zero,

de onde se originou o PAA, e com a recriação do Conselho Nacional de SAN

(CONSEA), essa temática ganhou força para então ser criada a Lei Orgânica

de SAN (LOSAN). O mapeamento do cumprimento ou não das diretrizes da lei

podem ser feitos através de políticas municipais, ou observando a ação de

governos estaduais na implementação de restaurantes populares, por exemplo.

São vários os equipamentos que compõem o SISAN (Sistema Nacional de

SAN) e contribuem para amenizar situações de IAN, uma vez que esses

conceitos andam juntos, como pudemos ver no MAPASAN citado acima (MDS,

2014).

O último relatório produzido pela FAO (Organização das Nações Unidas

para a Alimentação e a Agricultura) sobre o Brasil traz perspectivas otimistas

com relação à SAN, com o grande avanço de termos saído, à época, do mapa

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da fome. Os avanços foram de fato inegáveis e davam sólidas esperanças de

continuarem, uma vez que:

As estruturas e capacidades que resultam da evolução e institucionalização

da governança da segurança alimentar e nutricional e o contínuo

compromisso político e orçamentário colocam o Brasil em uma base sólida

para proteger os avanços alcançados e para enfrentar os novos desafios

(FAO, 2014, p.9).

Contudo, o compromisso político que podíamos enxergar de certa forma

engajado com essa temática não mais se encontra no poder. O próprio Plano

Nacional de SAN (PLANSAN), para o período de 2016 a 2019, relata inúmeros

desafios que ainda precisam ser enfrentados no Brasil. Infelizmente, essa é

uma tendência observada em várias partes do mundo em relatório mais

recente da FAO, em 2017.

No presente trabalho, denominam-se de beneficiários aqueles que

receberam as “Cestas Verdes” pelo menos uma vez ao longo do período em

que o PAA esteve em voga, mas, se compreendermos de maneira mais ampla

a abrangência dessas políticas, os agricultores também podem ser

considerados beneficiários. Ainda que esse seja um termo que conote uma

ação benevolente das instituições públicas, de fato é uma obrigação do Estado

à garantia de vida digna a toda sua população (LIMA, 2016, p. 17).

Ao considerarmos então o público alvo deste capítulo a população

limeirense (ainda que restrita apenas a parcela que recebia os produtos das

cestas), vamos atentar-nos a seguir aos números sobre SAN especificamente

no munícipio.

O relatório municipal de Informações de SAN, fornecido pela CAISAN a

respeito da cidade de Limeira traz alguns dados para auxiliar o município na

elaboração de seu próprio diagnóstico e nos informa também a respeito da

população ouvida nos grupos focais. Os dados demográficos, os indicadores

de SAN e os equipamentos do SISAN presentes em Limeira compõem o painel

situacional da população e da gestão.

A inserção econômica da cidade sempre foi pelo viés da agricultura,

passando pela cana-de-açúcar e do café, posteriormente a produção de

laranjas ganhou grande força, aliado ao desenvolvimento industrial (D’ANTONA

et al., 2012). O crescimento da cidade se deu conjuntamente à urbanização,

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assim, hoje 97% da população do município reside em áreas urbanas (Idem, p.

77). É um município de médio porte, com a parcela majoritária de sua

população branca. Os dados do último Censo demográfico que o documento

da CAISAN relata circunscrevem na porcentagem de 1,7% da população

vivendo em extrema pobreza em relação à população total do município, entre

os que habitam na zona urbana e rural.

Além dos macro dados apresentados acima, para compreendermos

melhor a situação da população com qual íamos trabalhar nos grupos focais,

fizemos a escolha de aplicar alguns questionários elaborados por uma das

gestoras entrevistadas. O intuito da gestora foi elaborar um questionário com a

Escala Brasileira de Insegurança Alimentar (EBIA) e, ao adaptar para o

contexto do PAA, compreender duas instâncias: tanto a situação em que viviam

as pessoas e assim ponderar se valia a pena instituir um desvio de curva do

projeto inicial e colocar em prática as “Cestas Verdes”; quanto para realizar um

proto diagnóstico de IAN no município, aproximando os dados de seu poder de

realização ao fazer ela e sua equipe a coleta.

No entanto, a aplicação não foi uniforme em todas as localidades, ela

mesma não soube responder em quais lugares foram aplicados, as gestoras

dos centros comunitários e as assistentes sociais dos CRAS também não

precisaram a informação. Dos questionários que encontramos, nenhum tinha

sido tabulado, e assim, a partir dos dados a informação não foi gerada. O que

impossibilitou fazer uma avaliação de continuidade, sobre o antes e depois do

PAA. O não diagnóstico da SAN, nesse caso, por si só já caracteriza o quadro

da cidade, seja pelas dificuldades encontradas em sua efetuação, seja na

aproximação daqueles que mais precisam do diagnóstico.

De qualquer forma, resolvemos aplicar alguns questionários, ao longo de

duas horas, enquanto as cestas eram distribuídas, no penúltimo dia de entrega

em que o projeto estava em voga. A experiência serviu para dar o tom dos

grupos focais. Nada do que já tinha vivido enquanto pesquisadora de campo

poderia me preparar para perguntar àquelas pessoas se elas sentem fome, se

passam um dia inteiro sem comer nada, se seus filhos ou outras crianças

também passavam fome ou ficavam sem uma das refeições do dia.

A mera preocupação se o dinheiro ou a comida vai acabar já caracteriza

um lar com insegurança alimentar leve (MDS, 2014), que foi o indicador que

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mais ouvimos das pessoas. A insegurança grave, caracterizada pelos lares em

que crianças passam privações (Idem), não foi captada em nosso breve campo

porque, à época, em período letivo e, pelo menos nos dias de semana, as

crianças comem na escola e não ficam sem pelo menos uma refeição.

Assim como será possível observar na sessão a seguir, passar pelas

perguntas do questionário de qual a frequência com que comiam frutas,

hortaliças, e mesmo carnes, a resposta vinha com um sorriso de

constrangimento, repetia-se “quase nunca”, “nunca”. Certas categorias

provocavam risadas do entrevistado, como que zombando deles, por exemplo,

na pergunta “com qual frequência você costumar comer castanhas ou

oleaginosas?”. As maiores frequências de resposta ficavam nos alimentos que

veremos abaixo bem representados, arroz, feijão, pão, macarrão, mas também

outros que não captamos nos grupos focais, como sucos em pó

industrializados, embutidos como salsichas e biscoitos recheados.

“Como estão as coisas em casa?”

Conforme explicado anteriormente, cada território em que um grupo

focal foi feito tem características distintas. As pessoas que compuseram os

grupos focais não foram as mesmas entrevistadas no momento anterior da

pesquisa, com os questionários. O comparecimento ao encontro foi facultativo

e assim, não pudemos controlar se as mesmas pessoas viriam. A partir dessas

características então, começo a descrever o encontro ocorrido no bairro Odécio

Degan.

Convocamos o grupo focal por intermédio da assistente social da

localidade, que distribuía bilhetes que elaboramos chamando para um “chá

com conversa”, no dia do encontro a assistente ainda telefonou para as

pessoas, reforçando o convite. Levamos quitutes como pão de queijo e bolo de

fubá, o centro comunitário ofereceu o café. A assistente social desse centro

comunitário foi de extrema importância para reunir as pessoas e disponibilizou

de seu tempo e um espaço no CRAS para que ocorresse a reunião da melhor

forma. Assim, ela esteve presente também para a conversa, o que não

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configurou uma intimidação para os participantes, no sentido da presença dela

representar o poder público e inibir as respostas. Essa executora em especial

tem uma relação muito boa com a comunidade na qual trabalha, ajuda a todos

em tudo que puder ajudar, em diferentes aspectos. Tanto que, ao longo da

conversa, ela era sempre evocada (“ela sempre me ajuda”, “ela está aqui pra

não me deixar mentir”, “ela sabe a situação que eu passo”).O grupo focal teve

a presença de 11 pessoas que receberam pelo menos uma vez as cestas,

entre as que estavam na lista de prioridades e aqueles que ficavam na lista de

espera, e aguardando no dia a possibilidade de pegar uma cesta que alguém

deixou pra trás.

Em comparação à outra territorialidade, o bairro em questão é de

composição etária mais jovem, veem-se mais crianças pelas ruas. Assim, as

pessoas que compuseram o grupo focal vinham todas de famílias jovens, mães

com crianças pequenas, com adolescentes, mulheres grávidas e avós que

cuidam de toda uma família extensa (marido, cunhado, filhos, netos, sobrinhos

e afilhados). Em ambos os grupos focais, todos os presentes para a nossa

conversa eram mulheres. Elas que buscavam as cestas (a pé, de ônibus ou de

carro, morando perto ou longe dos locais de distribuição), que higienizavam os

alimentos, faziam as porções dos ingredientes de maneira que prolongasse sua

duração e, por fim, preparavam a comida.

Uma informação em consonância com vários lares e várias pesquisas é

a relação entre alimentação e gênero, a prática feminina de alimentar-se,

alimentar o outro e, por conseguinte cuidar da família por meio da preocupação

com a alimentação saudável está estrutural e historicamente embrenhada em

nossa sociedade (BERNARDES, FRUTUOSO, SILVA, 2016). Majoritariamente,

tanto no Brasil quanto em outros lugares do mundo ocidental especificamente,

recai sobre a população feminina o trabalho que o preparo da alimentação

envolve (fazer a lista de compras, ir até um mercado ou feira, fazer as compras,

guardar, preparar, planejar as refeições, de acordo com as preferências de

todos da família e de maneira saudável), e mesmo assim, no peso que é cuidar

da família para garantir saúde e bem estar através da alimentação, são as

mulheres que seguem as menos favorecidas com os nutrientes que melhor

selecionam aos outros em casa (ALLEN, SACHS, 2012).

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Ao tratarmos sobre a alimentação da família, não falamos no grupo focal

de uma categoria à parte de outras preocupações na vida das mulheres

ouvidas, transpassamos a comida. Ao ouvirem a primeira questão, “como estão

as coisas em casa”, referente apenas ao quesito alimentação, as breves

narrativas das histórias de vida preencheram o ambiente: as pesquisadoras

presentes (a aluna de iniciação científica e a professora orientadora) eram só

consternação, todas com os sentidos acolhendo o que ouviam.

O que compunha a homogeneidade desse grupo em uma classe social é

multifatorial, para além da renda mensal per capita. A mesma renda que não

dava para comprar verduras, colocadas como itens caros, é a mesma que não

consegue pagar as contas de água e luz exorbitantes, segundo relatos, e

soma-se assim mais uma preocupação. Famílias com desempregados,

mulheres grávidas, crianças pequenas, pessoas doentes, pagando

empréstimos, contas atrasadas, neto internado, filho com problemas na escola

e fazendo acompanhamento psicológico. Qual é a prioridade nesse cenário?

Uma das participantes estava fazendo semi-jóias durante o grupo focal e

precisava entregar até às 16h: tinha uma bandeja no colo para dar suporte a

todos os apetrechos, um alicate na mão e os olhos fixos no trabalho, na renda

extra.

Acessar a memória desse encontro foi bastante emotivo, pois trouxe

todos os sentimentos do dia, o nó na garganta, a impotência; reposicionou-me

em meus privilégios e no mundo. A transcrição foi difícil também porque não

tinha percebido até então como aquelas mulheres falavam baixo, como as falas

pareciam custar sair. Até a senhora que estava ao meu lado, no áudio, com o

volume no máximo, tive dificuldade de entendê-la. Não sei se baixa autoestima

ou se constrangimento, fraqueza, pesar, preocupações... Se a causa era do

corpo, do espírito, ou dos dois.

Muitos afirmaram não ter o que comer em muitos dias, mas nunca faltou

ajuda. A comunidade toda acaba se ajudando e criando uma rede de apoio. Ao

responderam quais alimentos elas mais consumiam em casa no dia-a-dia os

alimentos que se repetiam em todas as respostas foram o arroz, feijão

(condizente com a última Pesquisa de Orçamento Familiar, POF, realizada pelo

IBGE entre 2008 e 2009) e macarrão. As misturas não foram citadas porque

afirmaram não ter, a carne apareceu como item “de luxo”, de vez em quando

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comem (frango, linguiça, “não sei outros nomes de carne”). Ter a carne na

alimentação de maneira mais frequente é um marcador simbólico de distinção

muito forte (BOURDIEU, 2004), os cortes citados, ou citados sem nome como

acima, geralmente são associados às classes menos favorecidas, em oposição

aos cortes bovinos, entre outras carnes consideradas exóticas, consumidas

pelas classes abastadas. De qualquer forma, esperava-se que a carne fosse

mais suscitada, que aparecesse mais nos anseios das famílias, no que elas

gostariam que melhorassem em suas refeições, tendo em vista que este

costuma ser um item mais frequente no consumo alimentar das famílias

quando a renda aumenta (POF, 2008), no entanto, não foi possível captar

neste trabalho.

A noção de mistura pode variar também, para alguns pode ser carne ou

outros derivados de animais. A mesma senhora que estava do meu lado dizia

que o neto não come sem mistura, mas “tendo um tomate, uma cenoura, ele já

come”. Outras afirmam que tem que comer o que tem, mencionou o fubá que

até então não havia sido mencionado. A presença do milho na alimentação,

enquanto tradicional alimento das roças paulistas vem desaparecendo cada

vez mais, como já havia afirmado Antônio Candido em sua obra “Parceiros do

Rio Bonito”, em 1964.

Para todas as entrevistadas a quantidade de alimentos que vinha nas

“Cestas Verdes” era insuficiente, considerando suas composições familiares

“dava mais ou menos”, “a gente faz durar, não cozinha tudo de uma vez”. As

folhas iam primeiro, para fazer salada, colocavam para amadurecer o que

precisava e iam utilizando aos poucos os alimentos, especialmente ao final do

programa, quando as cestas eram distribuídas quinzenalmente. Não sobrava

nada.

Sem muito controle da amostra, acabou que o grupo focal foi composto

por pessoas que receberam apenas uma vez ao longo do projeto, durante um,

três ou quatro meses, trazendo assim diferentes resgates na memória dos

alimentos que receberam. A mandioca era a primeira da lista, “vinha em toda

cesta”, mas também falaram do limão, maracujá, abacate, chicória, cheiro

verde, “que bom que vinha, a verdura está um absurdo no mercado”.

As frutas, apesar de serem produzidas no acampamento e terem sido

entregues em algumas cestas ao longo do projeto, foram os itens que elas

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mais relataram que fazia falta. Algumas não chegaram a receber em suas

cestas, muito provavelmente porque não pegaram em época de produção ou a

quantidade foi insuficiente (apesar do esforço para igual distribuição das

técnicas). Quando essa tímida reclamação começou a surgir, no mesmo

momento questionamos porque levamos os nossos quitutes para a reunião, e

não frutas.

Sobre as preparações, a mandioca era quem suscitava uma maior

curiosidade, afinal, como prepararam em tamanha quantidade e frequência?

Mas o repertório que relataram era vasto e sem reclamações: cozida com sal,

cozida com açúcar (de maneira bem tradicional e quase não mais

reconhecida), frita, na sopa, bolo de mandioca. A versatilidade do ingrediente

foi ilimitada na mão dessas mulheres, “mandioca é uma delícia de qualquer

jeito”. A chicória era preparada como salada ou abafada/ refogada. A abóbora

também se mostrou presente, cozida nas saladas ou “abafadinha”, e

alegremente acabaram trocando rápidas receitas. Todas falando ao mesmo

tempo de como preparam os alimentos, como gostam de comê-los, como

fazem para suas famílias.

Como nos conta a biógrafa das hortaliças Évelyne Bloch-Dano, a

hortaliça exige tempo de nós, para que saibamos bem prepará-la e aproveitá-

la, mas está exatamente no tempo que investimos nelas a chave para

encontrarmos prazer, e não incômodo (BLOCH-DANO, 2011). Da mesma

forma, as mulheres ouvidas não disseram ser trabalhoso lidar com os alimentos

que recebiam, mesmo a mandioca, que suscitava tantas indagações por ser

uma raiz que demanda mais processos até que se possa comê-la. Nesse

momento de troca, encontramos o que a autora nos diz a seguir:

Cada um de nós tem suas evocações, suas lembranças e outros tantos sabores que falam ao nosso coração. Os legumes têm algo haver com o íntimo, o familiar, com a tradição doméstica. [...] Para as mulheres, o cotidiano, as cenouras, os nabos e os alhos-porós na panela que cozinha a fogo lento – literalmente, a sopa -, o doce de fruta que canta na panela, a torta de maçã no forno. (Idem, p. 40).

À parte o contexto europeu, especificamente do norte da França com

suas hortaliças e pratos típicos, a autora conseguiu relatar com grande

proximidade a relação que criamos com a comida, tida muitas vezes como

banal, mas que é tão importante para construir nossa identidade e nossa

afetividade.

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Não encontramos uma unanimidade, porém, no repertório de todas para

cozinhar tudo que receberam. Uma senhora afirmou que só sabe fazer o

chuchu como salada, cozido, se possível com ovos também. Mas não foi

encarado como um problema isso, ao contrário, não reclamaram de nada, por

não saberem preparar ou qualquer outro motivo. Sobre os alimentos que

gostariam que viessem nas cestas, uma pessoa disse que não veio batata,

ingrediente esse que pode fazer falta enquanto composição dos carboidratos

da refeição, ainda mais se considerarmos que a maioria das pessoas que

recebia esses alimentos também contava com o auxílio da cesta básica, e essa

sofreu um corte na quantidade do arroz, de dez para cinco quilos por mês.

A batata remonta também uma questão histórica, além de sua

característica de alimento que sustenta, ela sempre foi vista com grande

importância para a alimentação das classes populares, tanto na América Latina

que é seu centro de origem, quanto na Europa, quando começou a ser

introduzida no século XVIII. Por exemplo, na dieta dos operários ingleses

durante o racionamento do trigo ao longo da Revolução Industrial. A esse

respeito, o historiador E. P. Thompson destaca o estigma envolvido no

consumo do tubérculo: mesmo com fome, a população operária recusava-se a

comê-lo por não querer qualquer identificação com os imigrantes irlandeses,

que introduziram a batata na dieta dos bretões (THOMPSON, 1987). Ao longo

do período czarista na então Prússia, ela também teve importância para acabar

com fomes endêmicas e as doenças correlatas. No entanto, precisou do aval

da monarquia para que a população começasse a produzi-la e fazer seu

consumo, que era rechaçado devido sua aparência e por não ser um alimento

que aparecia nos textos bíblicos (WOORTMANN, 2016).

Ao perguntar se consideravam que a alimentação em casa tinha ficado

mais saudável por causa das “Cestas Verdes”, todas consideraram que sim. Os

relatos às vezes se sobrepunham, contando as suas diferentes necessidades

nos benefícios dos alimentos para a saúde de sua família, “a couve pode

ajudar a matar o câncer do meu neto”, “a minha diabete melhorou muito”. Uma

senhora respondeu da seguinte maneira:

Eu tenho um filho de 11 anos de idade e 65 quilos, e ele foi diagnosticado com obesidade infantil. Antes eu não comprava salada, então ele não tinha o costume de comer. Ai nas cestas vinha alface, chicória, e ele aprendeu a comer salada, hoje ele gosta.

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Podemos observar, que, à exemplo dessa família, o PAA conseguiu

impactar até nos hábitos alimentares das famílias através das “Cestas Verdes”.

Não é uma questão de não gostarem dos alimentos tidos como saudáveis/

adequados, mas sim uma questão de acesso.

Ao final do encontro, ficou tanto a reivindicação para que voltem as

cestas, quanto para que consigam implementar uma horta comunitária no

centro comunitário. Chegaram a cobrar da gestora se conseguiriam isso. A

senhora que foi mais contundente com o pedido recebeu apenas uma vez a

cesta, mas sentia muita falta dos alimentos que recebeu porque não conseguia

comprar e comer legumes e verduras, como ela disse, “sou criada no mato, eu

sinto falta”.

E ainda, ao explicar que sua identidade seria preservada e seu nome

não constaria no trabalho, ela pediu pelo menos a chamasse de Senhora

Couve, “gosto muito de couve”. Segue o registro, Senhora Couve.

*

O grupo focal no bairro Morro Branco foi composto por participantes de

características distintas do anterior, pois eram senhoras da terceira idade.

Nesse território, especificamente, decidiram entregar as cestas à população

idosa, identificada também enquanto vulnerável e em situação de IAN no

município. A assistente social que estava responsável por este centro

comunitário identificou que os idosos, na sua maioria, vivem sozinhos e

acabam cozinhando menos, tem menos vontade de cozinhar apenas para si e

recorrem a alimentos prontos, direto da embalagem e sem grandes valores

nutricionais.

Para a convocação desse grupo focal também foi essencial contar com a

assistente social. Após sua entrevista individual, apresentei a necessidade de

conversar com aqueles que receberam as cestas e ela sugeriu que logo após o

encontro mensal que ela já realizaria com eles, fosse realizado o grupo com as

pessoas que eu precisava conversar. E assim foi arranjado.

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Diferente da estratégia que tivemos no outro grupo focal, de levar

quitutes para a conversa, dessa vez decidimos por frutas, laranjas e bananas.

Na manhã fria de julho em que comparecemos no centro comunitário, não

esperávamos (apenas eu e a aluna de iniciação científica) encontrar tantas

pessoas para a reunião, faltou banana. A sala estava repleta, mas para a

conversa depois da reunião estavam presentes apenas sete mulheres, que

receberam pelo menos uma vez as “Cestas Verdes” nos últimos seis meses do

programa (tempo que esse território participou), número que consideramos

adequado para a conversa.

Nos dois grupos, dizer que estávamos reunidos para conversar sobre o

PAA e as “Cestas Verdes” gerava certa expectativa de que o programa voltaria

(assim como para os agricultores também). No Morro Branco, precisei explicar

mais de uma vez a dinâmica burocrática no trâmite do programa, de como não

dependia do novo prefeito, nem do acampamento, e muito menos de mim (“se

você conseguir trazer de volta pra gente, vai ser uma maravilha!”).

Outra convergência com o outro grupo, é que as mulheres nessa

ocasião também afirmaram que não consomem mais verduras porque são

caras, mais ainda assim é um alimento mais em conta que a carne, consumida

de vez em quando, “se deixar eu como só arroz, feijão e pimenta”. A fruta

também é consumida em raras ocasiões. Assim, o que os dois grupos

apresentam em comum então é que estava nas “Cestas Verdes” a única fonte

(em muitas refeições) de consumo de frutas, verduras e legumes.

O que acarreta diretamente na saúde dessas mulheres e de seu círculo

familiar abastecido com os alimentos. Na fala delas era bastante recorrente

contar de suas condições de saúde (diabetes, derrame, osteoporose,

acidentes, pressão alta). O que gera gastos também com medicamentos,

quando não oferecidos gratuitamente pela rede pública. As contas dessas

famílias também estão apertadas, com algumas recebendo pensão,

aposentadorias, outras continuam trabalhando de maneira informal, mas tendo

que recorrer a empréstimos no banco, que “refrescam aquele mês nas contas,

mas agora a gente sofre pra pagar”. Algumas conseguem receber os auxílios

de transferência de renda, como o Bolsa Família ou o Benefício de Prestação

Continuada (BPC). Apesar de terem confiado nas duas pesquisadoras para

dizer o quanto recebem e qual a fonte, o tom era de que a ajuda que recebem

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(enxergando menos como uma obrigação do Estado e mais como uma

caridade) vinha não porque elas têm medo do trabalho, mas porque não estão

mais nas melhores condições que poderiam e já estiveram para trabalhar de

maneira que possam contribuir com mais dinheiro em casa. As idades das

senhoras presentes eram diversas, algumas recém-chegadas na terceira idade

(considerada a partir dos 60 anos de idade) e a mais idosa com 80 anos.

Além desses auxílios no quesito renda, algumas recebem também a

cesta básica, que, à época, somada aos alimentos que vinham nas cestas,

representavam grande suporte para a alimentação delas. Felizmente, relataram

que o apoio da comunidade, dos vizinhos e até de algumas igrejas do bairro,

nunca deixaram faltar nada. A rede de apoio é fundamental nesses casos

quando as condições de vida tornam-se adversas e parecem contrariar toda

forma de existência, e constituem também uma partilha de valores e um fator

importante de enfrentamento (MARTINS, 2011), o que foi possível observar em

ambos os casos.

Sobre os alimentos que elas lembraram que mais vinham nas cestas,

evocou-se a mandioca (claro!), alface, almeirão, chicória, batata-doce, e

apenas a banana de fruta. Uma senhora disse que nunca veio frutas pra ela.

Esses alimentos chegavam a durar até duas semanas, até a próxima data de

entrega. Achavam a aparência dos alimentos muito boa e queriam inclusive

conhecer a “horta dos sem-terra”. Sobre a forma de manuseio e preparo dos

alimentos, todas afirmaram a importância dos cursos com as nutricionistas.

Essas profissionais ensinaram a lavar, descascar, reaproveitar e armazenar os

alimentos, utilizando o congelador, por exemplo. Assim, as preparações que

faziam também eram bastante sortidas, faziam a mandioca (alimento-ícone)

cozida, frita, sopa e purê. A chicória, faziam crua na salada ou refogada, “mas

antes eu fazia errado, jogava muita vitamina fora”. Trocamos muitas receitas!

Não souberam dizer quantas aulas tiveram com as nutricionistas, mas

afirmaram que foram muitas e que ganharam livros de receitas também. Não

encontrei também os registros das aulas para saber quantas foram, ou os

conteúdos ministrados, para deixar como relato dessa experiência particular,

dentro da experiência específica que já foi o PAA em Limeira.

O relato dessas senhoras sobre o cuidado minucioso com os alimentos,

(“às vezes tava quente, a verdura ficava o dia inteiro no calor, então chegava

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tudo murcha. Não adianta só colocar na bacia com água. Eu colocava, cortava

bem no pezinho, onde já tinha cortado, e ai ela voltada tudo”), remonta outra

passagem da autora Bloch-Dano, suscitada acima, em que é preciso respeitar

a hortaliça e seu ciclo natural. Ela diz ainda que as verduras e os legumes “não

são tão vegetativos quanto se poderia pensar. Eles nascem, vivem e morrem.

Modestamente, porém, sem que se note, constituem talvez o encontro mais

fecundo entre natureza cultura” (BLOCH-DANO, 2011, p.41).

As senhoras ouvidas contam em seus relatos de seus próprios saberes,

adquiridos ao longo da vida, mas prestigiam muito o aprendizado adquirido,

“com 80 anos eu ainda estou aprendendo a cozinhar”, “eu não sabia que se eu

como arroz eu não posso comer a mandioca junto”, “o arroz e a mandioca

juntos dá um pote de açúcar, pra eu que sou diabética é um perigo”. Ao

aprenderem sobre as combinações dos alimentos, quais ter em cada refeição,

está implícito também o conhecimento que adquirem sobre o planejamento das

refeições e quais alimentos preparar.

Uma mesma questão levantada em ambas as conversas, é que caso

tivessem como plantar seus alimentos, as entrevistadas enxergam que não

estariam na mesma situação, “a gente mora na cidade, né, como faz? Não tem

um pedaço de terra pra plantar, então passa apertado”. Uma senhora disse que

tinha um canteirinho e chegou a plantar a raiz da cebolinha e brotou e deu por

algum tempo. Essa questão evoca a produção de autoconsumo dos

agricultores já mencionada. Assim como visto em outros estudos e com os

cooperados de Limeira, o roçado que serve como geração de renda, também

se presta para mitigar as preocupações com a própria alimentação. Como

vimos, o simples fato de sempre ter em mente o medo de que a comida possa

acabar caracteriza a insegurança alimentar leve, e está na possibilidade de ter

um pedaço de terra para plantar uma estratégia que favorece os dois principais

públicos-alvo do PAA.

As estratégias para o melhor aproveitamento de tudo que recebiam, seja

congelar o cheiro-verde para ter por mais tempo, ou plantar em um espaço por

menor que seja, já as ajudaram a melhorar sua alimentação. Tudo o que

receberam foi muito bem-vindo e bem preparado, não relataram nenhuma

dificuldade em saber cozinhar os alimentos, ainda mais depois do

acompanhamento que tiveram. O que pediram que viesse mais nas cestas,

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enquanto sugestão e não reclamação, foi o mesmo pedido do outro grupo:

frutas. “Uma judiação no mercado sobra tanto, estraga, e a gente aqui sem

dinheiro pra comprar”.

Na inspiração etnográfica que este trabalho tem, para compor a rede

sociotécnica, podemos recuperar o folclorista (etnógrafo também?) Camara

Cascudo. Para Gonçalves (2004), o extenso trabalho realizado por Camara

Cascudo de levantamento de comidas e bebidas brasileiras, de um Brasil

antigo e da modernidade na qual ele escreveu, parece constituir uma extensa e

difusa linguagem, utilizada pela população para falarem sobre si e para si.

Claramente, não é particularidade da sociedade brasileira, teria inclusive um

potencialidade universal essa linguagem, mas “é possível especular que no

Brasil essa linguagem pode assumir um papel preponderante na vida cotidiana.

[...] ela é uma espécie de linguagem privilegiada que as pessoas usam para

descrever suas experiências públicas e privadas” (GONÇALVES, 2004, p.50).

Assim, ao trazer as práticas alimentares das pessoas ouvidas, dentro de

uma narrativa etnográfica, aos modos de Camara Cascudo, estamos

descrevendo também seus modos de ser, desvelando mais do que a maneira

como se relacionam com os alimentos.

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Alinhavando

Para o traçado que apresentamos, falamos muito de divisões, de

repartições e compartimentalizações. Essa dinâmica própria da forma de

constituição do conhecimento ocidental, e aqui se evoca a Antropologia

também, passou por várias nomenclaturas. De acordo com Tim Ingold (2015),

podemos ver nas classificações que os estudiosos fazem ao separar artefato e

paisagem, ou mesmo natureza e cultura. No entanto, é possível separar todas

as coisas de acordo com essa categorização stunk? E ainda, para falar do

alimento in natura, a exemplo do objeto (!) de estudo deste trabalho, recém-

recolhido do pé ou da terra, não estaria sujeito à ação humana, borrando essas

barreiras científicas? E por que os alimentos que passaram por algum tipo de

processamento industrial seriam menos naturais que os da categoria anterior,

com interação da atividade dos seres humanos?

A binarização na qual operacionalizamos o mundo, que indicamos com

Deleuze e Guattari e em certa medida Bruno Latour, tratada logo no começo do

texto surge aqui também como ponto de crítica, mas de outra forma. Talvez de

maneira mais radical que Latour, a assimetria entre natureza e cultura para

Ingold ganha potência quando o autor desvela o mundo dos objetos,

caracterizado por essa ciência que criticamos; e o mundo das coisas, com o

reconhecimento da vida das coisas, do homem enquanto coisa, de interações

mais fluidas. Não é possível separar-nos, enquanto humanos, em um mundo à

parte com os objetos e outro das coisas. O que o autor chama atenção é que

nos envolvemos com objetos prontos em suas relações estabelecidas

socialmente. A comida enquanto símbolo culturalmente pronto e passível de

discussões e julgamentos morais chama também nossa atenção quando

discutimos sobre seus nutrientes e interações, como objetos (!) de estudo. A

falha é que não estabelecemos relação com o alimento enquanto coisa,

compreendendo seu ciclo natural, as relações de vida e morte que fazemos

quando nos alimentamos, quando interagimos com eles.

Para além dos materiais que compõem esta rede sociotécnica, é preciso

enxergar também a materialidade das coisas que buscamos elencar aqui, dos

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alimentos produzidos, para além das cestas, das toneladas de alimentos

entregues. O alimento, seus nutrientes que estudamos para compor a melhor

dieta, para sanar doenças, para manter nosso corpo saudável, para dar

energia, é também demarcador simbólico, registro de memória e sinal de

status. A verdura, o legume e a fruta são as coisas essenciais e centrais e

sempre coabitarão o mesmo mundo dos nutrientes que expiram, acabam ou

oxidam. “Trazer coisas à vida, portanto, não é uma questão de acrescentar a

ela uma pitada de agência, mas de restaurá-las aos fluxos geradores do mundo

de materiais no qual elas vieram à existência e continuam a existir” (INGOLD,

2015, p.63).

A defesa final do autor é de que precisamos levar os materiais a sério,

uma vez que é partir deles que tudo é feito (Idem, 2015), sobretudo quando

falamos daquilo que incorporamos, no sentido mais literal do verbo, e que nos

move e coloca vivendo, que tem relações para além das físico-químicas. A

autora Bloch-Dano nos sugere também a contar a História Universal pelo

portão da horta. “Porque o legume mais modesto contém a aventura do mundo”

(p. 10). Comemos uma verdura ou um legume e incorporamos toda a história

do mundo porque somos o mundo no humano e no alimento. Entre a grande e

pequena história, queremos que o alimento seja a união das duas. Fica o

esforço aqui de compreender que a mesma ciência dos nutrientes é aquela dos

simbolismos sociais, que essencializa categorias “objetivas” para o estudo de

determinada maneira. Se partirmos para a conceituação que propõe Ingold,

estaremos abertos a um mundo de coisas que permeia e está mais disposto a

compreender a relação entre humanos e não humanos, como partes de um

mesmo mundo, como coisas de mesma materialidade.

Com relação à metodologia que foi utilizada, não é frequente observar o

uso da TAR em estudos de análise de políticas públicas, no entanto, a

potencialidade do aspecto da heterogeneidade dessa teoria tem chamado a

atenção dos pesquisadores da área (GRAU et al., 2010) e contribui para

chegarmos até aqui. As relações entre os humanos não depende mais apenas

da mediação de outros humanos, e tentamos aqui alargar nosso raio e abarcar

outas coisas, tecnologias, instituições, tornando difusas barreiras que pareciam

bem erguidas (Idem, p. 70).

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O que os autores defendem, e foi imprescindível para nossa rede em

Limeira, é que é preciso abrir mão de preconceitos enraizados e compreender

que o social é mais do que a sociedade humana, esse tipo de pesquisa evocou

diferentes elementos, como pudemos ver. A rede sociotécnica é o fruto das

relações que a proporcionou existir e ser narrada aqui, para tanto, as

intencionalidades e os propósitos de sua existência não estão arraigados nem

nos humanos nem nas coisas (Idem, p. 72). A horizontalidade também foi

essencial tanto para não hierarquizar em um só ator, quanto para nos permitir

compreender as várias interações que ocorreram.

A divisão dos capítulos foi feita de acordo com os diferentes momentos e

lugares pelos quais o alimento passou e foi encontrando e alinhavando em sua

rede: instituições, de instâncias distintas; humanos que o manuseava de

diferentes maneiras, seja no plantio, no cuidado, na colheita. No segundo

momento, por meio da malha viária da cidade em que o circunscreve, o

alimento passa pela lógica de um novo grupo de pessoas, preocupadas em

como melhor aproveitá-los, assim, direto para as caixas, dentro do caminhão,

depois para o chão, uma longa separação, quais alimentos vão para quem,

voltam ensacados para o caminhão para diferentes rumos por toda a cidade.

Novas pessoas distribuem àqueles que podem ajudar no alcance de suas

mãos e seus ofícios. As chamadas cestas vão a pé, de ônibus ou carona para

famílias, para ser parte do repertório de suas refeições, ou inaugurar uma

receita nova que aprenderam antes de chegarem em casa. São complemento

ou prato único, no forno, no fogão a gás ou a lenha.

Foi possível observar que por vezes o PAA parece operar de maneira

truncada para algumas pessoas, em vários pontos evocou-se a dificuldade em

operacionalizá-lo, saber os trâmites legais para colocá-lo em prática, cumprir

certos procedimentos, ter diversos documentos em dia. No entanto, a

disposição de todos os gestores e gestoras (principalmente) em fazer

acontecer essa política é o que mais se destaca.

Por mais que exista um histórico de truculência e intolerância com o

acampamento, não passa despercebida a situação em que vivem nem o status

de cidadãos da cidade. Assim, expresso nas “Cestas Verdes”, esse caso do

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PAA conseguiu integrar de maneira produtiva uma parcela da população que

comumente sofre de preconceitos e acaba não conseguindo realizar

plenamente seu trabalho. Tanto a gestão, quanto os beneficiários finais

reconhecem nos alimentos vendidos a qualidade do esforço e do produto final.

Os agricultores e as agricultoras têm um auto sustento e uma renda, encontram

prazer com aquilo que se identificam fazendo, em um cenário de grande

desvantagem. No que parece o ofício de Sísifo, estão em constante

reafirmação de seu valor perante o próprio Estado e a sociedade civil.

As gestoras ouvidas quase seis meses após o término do projeto

transpareceram nostalgia com esse encargo adicionado em sua rotina, que foi

desgastante porque carregavam peso, lidavam com questões inusitadas como

a preocupação com a alimentação adequada das pessoas com as quais

trabalham, mas também demonstraram que pode ser feito. Essa experiência foi

de grande valia e aprendizado para elas e suas equipes, na lida com esse

assunto, no manejo de outras folhas que não só as de sulfite, no orgulho da

qualidade daquilo que entregavam e que sabiam que podia saciar por mais

algum tempo a fome de que ouviam relatos, que presenciavam.

A falta de alimentos, “não ter comida em casa”, era uma frase frequente

do que foi possível acompanhar ao longo das entregas. A comida que lhes falta

é a básica, indexada por todos em nossa cultura da mesma forma: arroz, feijão,

hortaliças, frutas. E reconhecem ainda que seriam esses os alimentos

adequados os quais deveriam consumir, a informação não lhes falta. No

entanto, o mesmo cenário desigual, entremeado de outros agentes, acomete

essas famílias. Preços muito baratos em produtos altamente processados

contra preços abusivos ao produtor e consumidor, com uma rede de

abastecimento em muitos casos deficitária. Individualizar o problema é

encontrar mais e mais sintomas de uma questão muito maior. Aliadas à

obrigação do Estado de restituir vínculos e garantir os direitos humanos, as

compras públicas estão entre uma das melhores soluções no Brasil. O caso de

Limeira, ao menos, indica esse caminho, passível de melhorias, mas com

grandes sugestões de aplicações.

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Desvelar essa rede foi um esforço para construir um artesanato

intelectual (WRIGHT MILLS, 1959), na melhor intenção de buscar contribuir

com a melhoria de uma política pública de grande potencialidade, relevância e

significação. Ao modo do que faz Colasanti (2004), aqui são tessituras

contadas por tecelãs, que precisou de diferentes malhas para compor este

tecido, ou rede sociotécnica, ou dissertação.

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Apêndices

Apêndice 1 – TCLE dos produtores.

TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO

Programa de Aquisição de Alimentos – PAA: análise sociotécnica de uma

política que conecta produção e consumo na cidade de Limeira, SP.

Bárbara Lellis de Sá Frizo

Número do CAAE: 64438316.5.0000.5404

Você está sendo convidado a participar como voluntário de uma

pesquisa. Este documento, chamado Termo de Consentimento Livre e

Esclarecido, visa assegurar seus direitos como participante e é elaborado em

duas vias, uma que deverá ficar com você e outra com o pesquisador.

Por favor, leia com atenção e calma, aproveitando para esclarecer suas

dúvidas. Se houver perguntas antes ou mesmo depois de assiná-lo, você

poderá esclarecê-las com o pesquisador. Se preferir, pode levar este Termo

para casa e consultar seus familiares ou outras pessoas antes de decidir

participar. Não haverá nenhum tipo de penalização ou prejuízo se você não

aceitar participar ou retirar sua autorização em qualquer momento.

Justificativa e objetivos: Este projeto tem como objetivo fazer uma análise da

política pública municipal de distribuição de Cestas Verdes às famílias já

mapeadas por equipamentos da área de Assistência Social na cidade de

Limeira vinculada ao Programa de Aquisição de Alimentos. A ideia é percorrer

o caminho feito pelos alimentos desde sua produção, passando pela gestão de

técnicos municipais até o momento de entrega às famílias. Assim, pretende-se

também compreender como esses alimentos são recebidos, como as famílias

incorporam ou não em sua rotina e se podem contribuir ou não para a

implantação de hábitos alimentares tidos como saudáveis.

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93

Procedimentos: A pesquisadora irá de encontro com o (a) produtor (a)

diretamente no acampamento. Após explicar do que se trata a pesquisa, será

conduzida uma entrevista sobre a experiência de participar do Programa de

Aquisição de Alimentos (PAA); será gravada em áudio a partir da sua

autorização. A entrevista tem a duração calculada de 30 minutos, a depender

da extensão das respostas às perguntas feitas. Após a realização da pesquisa,

os áudios das entrevistas serão armazenados em plataformas digitais privadas

por cinco (cinco) anos.

( ) Concordo em participar do presente estudo, porém NÃO AUTORIZO o

armazenamento da gravação da minha entrevista, devendo a mesma ser

descartada ao final desta pesquisa.

( ) Concordo em participar do presente estudo e AUTORIZO o armazenamento

da gravação da minha entrevista, sendo necessário meu consentimento a cada

nova pesquisa, que deverá ser aprovada pelo CEP institucional.

Desconfortos e riscos: Você não deve participar deste estudo caso não se

sinta confortável com algumas perguntas feitas durante a entrevista, a respeito

da relação do (a) produtor (a) vinculado (a) à cooperativa e ao Programa de

Aquisição de Alimentos, mediado pela prefeitura. Um risco possível é você se

sentir desconfortável em responder a entrevista, pois pode tomar um pouco de

tempo. A duração da entrevista pode ser desconfortável, a depender da

extensão das respostas dadas. Possíveis constrangimentos também podem

acontecer em perguntas sobre a alimentação dos produtores da cooperativa.

É importante ressaltar o anonimato na participação da pesquisa e a não

vinculação da pesquisadora com nenhum dos órgãos responsáveis pela

operacionalização do Programa de Aquisição de Alimentos.

Benefícios: Não há benefícios diretos ao participante da pesquisa, mas sua

colaboração pode trazer o benefício de ajudar a melhorar as compras estatais,

a gestão local pode aprimorar as relações com os produtores e o canal de

comunicação com a prefeitura pode ficar muito mais claro, com os problemas

encontrados pelo senhor produtor ou a senhora produtora explicitados.

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94

Acompanhamento e assistência: Após sua participação com essa

entrevista, os resultados encontrados na pesquisa serão disponibilizados

diretamente a você, na melhor e mais eficiente maneira, para que tenha acesso

irrestrito e imediato, especialmente com relação às dificuldades encontradas na

produção dos alimentos comercializados ao Programa de Aquisição de

Alimentos e o que mais afetaria o seu trabalho.

Você receberá assistência integral e imediata, de forma gratuita, pelo tempo

que for necessário em caso de danos decorrentes da pesquisa.

Sigilo e privacidade: Devido ao pequeno número de participantes na

pesquisa, uma possível identificação pode ocorrer, mesmo que de maneira

indireta, mas você tem a garantia de que sua identidade será mantida em sigilo

e nenhuma informação será dada a outras pessoas que não façam parte da

equipe de pesquisadores. Na divulgação dos resultados desse estudo, seu

nome não será citado. Os resultados referentes à pesquisa serão apresentados

no texto da redação de dissertação de mestrado da pesquisadora.

Ressarcimento e Indenização: A participação no projeto é voluntária,

ninguém será obrigada a participar, e se participar, receberá apenas o

agradecimento da equipe. Você terá a garantia ao direito à indenização diante

de eventuais danos decorrentes da pesquisa.

Contato: Em caso de dúvidas sobre o estudo, você poderá entrar em contato

com Bárbara Lellis de Sá Frizo, aluna do Programa de Mestrado Interdisciplinar

em Ciências Humanas e Sociais Aplicadas, integrante do Laboratório de

Promoção e Educação em Saúde (LAPES), na sala UL17, Faculdade de

Ciências Aplicadas, FCA/Unicamp: Rua Pedro Zaccaria, 1300; Caixa Postal

1068; Cep 13484-350; Limeira, SP; Tel.: (19) 3701-6720; Celular: (11) 9-8332-

2476; e-mail: [email protected].

Em caso de denúncias ou reclamações sobre sua participação no

estudo, o senhor ou a senhora pode entrar em contato com a secretaria do

Comitê de Ética em Pesquisa (CEP): Rua: Tessália Vieira de Camargo, 126;

CEP 13083-887 Campinas – SP; telefone (19) 3521-8936; fax (19) 3521-7187;

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95

e-mail: [email protected]. Horário de atendimento: Segunda à Sexta Feira

08h30 às 11h30 - 13h00 às 17h00.

O Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) O papel do CEP é avaliar e acompanhar

os aspectos éticos de todas as pesquisas envolvendo seres humanos. A

Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (CONEP) tem por objetivo

desenvolver a regulamentação sobre proteção dos seres humanos envolvidos

nas pesquisas. Desempenha um papel coordenador da rede de Comitês de

Ética em Pesquisa (CEPs) das instituições, além de assumir a função de órgão

consultor na área de ética em pesquisas.

Consentimento livre e esclarecido: Após ter recebido esclarecimentos

sobre a natureza da pesquisa, seus objetivos, métodos, benefícios previstos,

potenciais riscos e o incômodo que esta possa acarretar, aceito participar e

declaro estar recebendo uma via original deste documento assinada pelo

pesquisador e por mim, tendo todas as folhas por nós rubricadas:

Nome do (a) participante:

_______________________________________________________________

__________________________________________________Data:__/___/__.

(Assinatura do participante ou nome e assinatura do responsável)

Responsabilidade do Pesquisador: Asseguro ter cumprido as

exigências da resolução 466/2012 CNS/MS e complementares na elaboração

do protocolo e na obtenção deste Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

Asseguro, também, ter explicado e fornecido uma via deste documento ao

participante. Informo que o estudo foi aprovado pelo CEP perante o qual o

projeto foi apresentado e pela CONEP, quando pertinente. Comprometo-me a

utilizar o material e os dados obtidos nesta pesquisa exclusivamente para as

finalidades previstas neste documento ou conforme o consentimento dado pelo

participante.

_______________________________________________ Data: ___/___/___.

Bárbara Lellis de Sá Frizo

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Apêndice 2 – TCLE das gestoras

TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO

Programa de Aquisição de Alimentos – PAA: análise sociotécnica de uma

política que conecta produção e consumo na cidade de Limeira, SP.

Bárbara Lellis de Sá Frizo

Número do CAAE: 64438316.5.0000.5404

Você está sendo convidado a participar como voluntário de uma

pesquisa. Este documento, chamado Termo de Consentimento Livre e

Esclarecido, visa assegurar seus direitos como participante e é elaborado em

duas vias, uma que deverá ficar com você e outra com o pesquisador.

Por favor, leia com atenção e calma, aproveitando para esclarecer suas

dúvidas. Se houver perguntas antes ou mesmo depois de assiná-lo, você

poderá esclarecê-las com o pesquisador. Se preferir, pode levar este Termo

para casa e consultar seus familiares ou outras pessoas antes de decidir

participar. Não haverá nenhum tipo de penalização ou prejuízo se você não

aceitar participar ou retirar sua autorização em qualquer momento.

Justificativa e objetivos: Este projeto tem como objetivo fazer uma análise da

política pública municipal de distribuição de Cestas Verdes às famílias já

mapeadas por equipamentos da área de Assistência Social na cidade de

Limeira vinculada ao Programa de Aquisição de Alimentos. A ideia é percorrer

o caminho feito pelo alimento desde sua produção, passando pela gestão de

técnicos municipais até o momento de entrega às famílias. Assim, pretende-se

também compreender como esses alimentos são recebidos, como as famílias

incorporam ou não em sua rotina e se podem contribuir ou não para a

implantação de hábitos alimentares tidos como saudáveis.

Procedimentos: A pesquisadora irá ao seu encontro no próprio equipamento

da prefeitura em dia e hora marcados de acordo com sua disponibilidade. Será

conduzida uma entrevista sobre como foi fazer a gestão do Programa de

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Aquisição de Alimentos (PAA), com um gravador, mediante a autorização do

(a) entrevistado (a), com duração média de 40 minutos, a depender da

extensão das respostas dadas. Após a realização da pesquisa, os áudios das

entrevistas serão armazenados em plataformas digitais privadas por cinco

(cinco) anos.

( ) Concordo em participar do presente estudo, porém NÃO AUTORIZO o

armazenamento da gravação da minha entrevista, devendo a mesma ser

descartada ao final desta pesquisa.

( ) Concordo em participar do presente estudo e AUTORIZO o armazenamento

da gravação da minha entrevista, sendo necessário meu consentimento a cada

nova pesquisa, que deverá ser aprovada pelo CEP institucional.

Desconfortos e riscos: Você não deve participar deste estudo caso se sinta

desconfortável ao falar de procedimentos específicos de seu trabalho, no

próprio ambiente de trabalho. É importante ressaltar que é possível marcar a

entrevistas em horários flexíveis, em que o local esteja mais tranquilo para a

conversa e, o mais importante, o anonimato na participação deste estudo é

irrevogável.

Um risco possível é o senhor ou a senhora se sentir desconfortável em

responder a entrevista, pois pode tomar um pouco de tempo. A duração da

entrevista também pode trazer incômodos, a depender das respostas dadas.

Benefícios: Não há benefícios diretos ao participante da pesquisa, mas a

pesquisa poderá trazer um olhar inesperado a respeito das práticas cotidianas

na gestão do Programa de Aquisição de Alimentos, uma nova perspectiva

sobre os problemas encontrados e assim contribuir para melhorar futuros

empreendimentos parecidos.

Acompanhamento e assistência: Após sua participação com a entrevista, os

resultados encontrados na pesquisa serão disponibilizados diretamente ao

senhor ou à senhora, na melhor e mais eficiente maneira, para que tenha

acesso irrestrito e imediato, especialmente com relação às dificuldades

encontradas na gestão do Programa de Aquisição de Alimentos e o que mais

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98

afetaria o seu trabalho enquanto servidor público. Você receberá assistência

integral e imediata, de forma gratuita, pelo tempo que for necessário em caso

de danos decorrentes da pesquisa.

Sigilo e privacidade: Devido ao pequeno número de participantes na

pesquisa, uma possível identificação pode ocorrer, mesmo que de maneira

indireta, mas você tem a garantia de que sua identidade será mantida em sigilo

e nenhuma informação será dada a outras pessoas que não façam parte da

equipe de pesquisadores. Na divulgação dos resultados desse estudo, seu

nome não será citado. Os resultados referentes à pesquisa serão apresentados

no texto da redação de dissertação de mestrado da pesquisadora.

Ressarcimento e Indenização: A participação no projeto é voluntária,

ninguém será obrigada a participar, e se participar, receberá apenas o

agradecimento da equipe. Você terá a garantia ao direito à indenização diante

de eventuais danos decorrentes da pesquisa.

Contato: Em caso de dúvidas sobre o estudo, você poderá entrar em contato

com Bárbara Lellis de Sá Frizo, aluna do Programa de Mestrado Interdisciplinar

em Ciências Humanas e Sociais Aplicadas, integrante do Laboratório de

Promoção e Educação em Saúde (LAPES), na sala UL17, Faculdade de

Ciências Aplicadas, FCA/Unicamp: Rua Pedro Zaccaria, 1300; Caixa Postal

1068; Cep 13484-350; Limeira, SP; Tel.: (19) 3701-6720; Celular: (11) 9-8332-

2476; e-mail: [email protected].

Em caso de denúncias ou reclamações sobre sua participação no estudo, o

senhor ou à senhora pode entrar em contato com a secretaria do Comitê de

Ética em Pesquisa (CEP): Rua: Tessália Vieira de Camargo, 126; CEP 13083-

887 Campinas – SP; telefone (19) 3521-8936; fax (19) 3521-7187; e-mail:

[email protected] Horário de atendimento: Segunda à Sexta Feira 08h30 às

11h30 - 13h00 às 17h00.

O Comitê de Ética em Pesquisa (CEP)

O papel do CEP é avaliar e acompanhar os aspectos éticos de todas as

pesquisas envolvendo seres humanos. A Comissão Nacional de Ética em

Pesquisa (CONEP) tem por objetivo desenvolver a regulamentação sobre

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99

proteção dos seres humanos envolvidos nas pesquisas. Desempenha um

papel coordenador da rede de Comitês de Ética em Pesquisa (CEPs) das

instituições, além de assumir a função de órgão consultor na área de ética em

pesquisas.

Consentimento livre e esclarecido: Após ter recebido esclarecimentos

sobre a natureza da pesquisa, seus objetivos, métodos, benefícios previstos,

potenciais riscos e o incômodo que esta possa acarretar, aceito participar e

declaro estar recebendo uma via original deste documento assinada pelo

pesquisador e por mim, tendo todas as folhas por nós rubricadas:

Nome do (a) participante:

_______________________________________________________________

____________________________________________ Data: ____/____/____.

(Assinatura do participante ou nome e assinatura do responsável)

Responsabilidade do Pesquisador: Asseguro ter cumprido as

exigências da resolução 466/2012 CNS/MS e complementares na elaboração

do protocolo e na obtenção deste Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

Asseguro, também, ter explicado e fornecido uma via deste documento ao

participante. Informo que o estudo foi aprovado pelo CEP perante o qual o

projeto foi apresentado e pela CONEP, quando pertinente. Comprometo-me a

utilizar o material e os dados obtidos nesta pesquisa exclusivamente para as

finalidades previstas neste documento ou conforme o consentimento dado pelo

participante.

____________________________________________ Data: ____/____/____.

Bárbara Lellis de Sá Frizo

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Apêndice 3 – TCLE dos beneficiários

TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO

Programa de Aquisição de Alimentos – PAA: análise sociotécnica de uma

política que conecta produção e consumo na cidade de Limeira, SP.

Bárbara Lellis de Sá Frizo

Número do CAAE: 64438316.5.0000.5404

Você está sendo convidado a participar como voluntário de uma

pesquisa. Este documento, chamado Termo de Consentimento Livre e

Esclarecido, visa assegurar seus direitos como participante e é elaborado em

duas vias, uma que deverá ficar com você e outra com o pesquisador.

Por favor, leia com atenção e calma, aproveitando para esclarecer suas

dúvidas. Se houver perguntas antes ou mesmo depois de assiná-lo, você

poderá esclarecê-las com o pesquisador. Se preferir, pode levar este Termo

para casa e consultar seus familiares ou outras pessoas antes de decidir

participar. Não haverá nenhum tipo de penalização ou prejuízo se você não

aceitar participar ou retirar sua autorização em qualquer momento.

Justificativa e objetivos: Este projeto tem como objetivo fazer uma análise da

política pública municipal de distribuição de Cestas Verdes às famílias já

mapeadas por equipamentos da área de Assistência Social na cidade de

Limeira. A ideia é percorrer o caminho feito pelo alimento desde sua produção,

passando pela gestão de técnicos municipais até o momento de entrega às

famílias. Assim, pretende-se também compreender como esses alimentos são

recebidos, como as famílias incorporam ou não em sua rotina e se podem

contribuir ou não para a implantação de hábitos alimentares tidos como

saudáveis.

Procedimentos: Após um primeiro contato através das assistentes sociais do

CRAS (Centro de Referência de Assistência Social), a pesquisadora irá marcar

um dia e horário que for de acordo com sua disponibilidade para a realização

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101

de um grupo focal com outras famílias que também recebem as Cestas Verdes.

Será uma conversa em grupo informal, em um centro comunitário mais próximo

com a utilização de um gravador e com uma duração por volta de uma hora,

para aprofundar algumas questões a respeito do recebimento dos alimentos

das cestas verdes da prefeitura, seu modo de preparo, etc.

( ) Concordo em participar do presente estudo, porém NÃO AUTORIZO o

armazenamento da gravação do grupo focal, devendo a mesma ser descartada

ao final desta pesquisa.

( ) Concordo em participar do presente estudo e AUTORIZO o armazenamento

da gravação do grupo focal, sendo necessário meu consentimento a cada nova

pesquisa, que deverá ser aprovada pelo CEP institucional.

Desconfortos e riscos: Um risco possível é você se sentir desconfortável ao

participar do grupo focal, pois pode tomar um pouco de tempo. O senhor ou a

senhora pode se sentir desconfortável ao conversar sobre um assunto tão

íntimo como a alimentação de sua família na frente de outras pessoas.

Existe o risco do senhor ou a senhora se preocupar com a situação de

Segurança Alimentar e Nutricional de sua família, mas saiba que os índices

não servem para dizer uma verdade absoluta sobre o estado de saúde de sua

família e como ela se alimenta.

A duração do grupo também podem trazer desconfortos, a depender da

duração das respostas dadas.

A aplicação do questionário pode ser um desconforto e pode ser

considerada repetitiva, mas foi elaborado para acontecer o mais breve

possível.

Benefícios: Não há benefícios diretos ao participante da pesquisa, mas você

estará contribuindo com a pesquisa na área interdisciplinar e em políticas

públicas, para a geração de conhecimento a partir de mais de uma visão mais

abrangente e, assim, um maior esclarecimento para podermos propor medidas

que melhore as condições de vida de todos.

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102

Acompanhamento e assistência: Após o término da pesquisa, com todos os

dados computados a respeito da sua família, os resultados serão

disponibilizados diretamente ao senhor ou a senhora, da melhor e mais

conveniente maneira, para que possa ter acesso irrestrito e imediato, e também

aos gestores públicos que estão diretamente envolvidos, para que possam

sempre melhorar a qualidade do serviço. Você receberá assistência integral e

imediata, de forma gratuita, pelo tempo que for necessário em caso de danos

decorrentes da pesquisa.

Sigilo e privacidade: Devido ao pequeno número de participantes na

pesquisa, uma possível identificação pode ocorrer, mesmo que de maneira

indireta, mas você tem a garantia de que sua identidade será mantida em sigilo

e nenhuma informação será dada a outras pessoas que não façam parte da

equipe de pesquisadores. Na divulgação dos resultados desse estudo, seu

nome não será citado. Os resultados referentes à pesquisa serão apresentados

no texto da redação de dissertação de mestrado da pesquisadora.

Ressarcimento e Indenização: A participação no projeto é voluntária,

ninguém será obrigada a participar, e se participar, receberá apenas o

agradecimento da equipe. Você terá a garantia ao direito à indenização diante

de eventuais danos decorrentes da pesquisa.

Contato: Em caso de dúvidas sobre o estudo, você poderá entrar em contato

com Bárbara Lellis de Sá Frizo, aluna do Programa de Mestrado Interdisciplinar

em Ciências Humanas e Sociais Aplicadas, integrante do Laboratório de

Promoção e Educação em Saúde (LAPES), na sala UL17, Faculdade de

Ciências Aplicadas, FCA/Unicamp: Rua Pedro Zaccaria, 1300; Caixa Postal

1068; Cep 13484-350; Limeira, SP; Tel.: (19) 3701-6720; Celular: (11) 9-8332-

2476; e-mail: [email protected].

Em caso de denúncias ou reclamações sobre sua participação no estudo, o

senhor ou a senhora pode entrar em contato com a secretaria do Comitê de

Ética em Pesquisa (CEP): Rua: Tessália Vieira de Camargo, 126; CEP 13083-

887 Campinas – SP; telefone (19) 3521-8936; fax (19) 3521-7187; e-mail:

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[email protected] Horário de atendimento: Segunda à Sexta Feira 08h30 às

11h30 - 13h00 às 17h00.

O Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) O papel do CEP é avaliar e acompanhar

os aspectos éticos de todas as pesquisas envolvendo seres humanos. A

Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (CONEP) tem por objetivo

desenvolver a regulamentação sobre proteção dos seres humanos envolvidos

nas pesquisas. Desempenha um papel coordenador da rede de Comitês de

Ética em Pesquisa (CEPs) das instituições, além de assumir a função de órgão

consultor na área de ética em pesquisas.

Consentimento livre e esclarecido: Após ter recebido esclarecimentos

sobre a natureza da pesquisa, seus objetivos, métodos, benefícios previstos,

potenciais riscos e o incômodo que esta possa acarretar, aceito participar e

declaro estar recebendo uma via original deste documento assinada pelo

pesquisador e por mim, tendo todas as folhas por nós rubricadas:

Nome do (a) participante:

_______________________________________________________________

____________________________________________ Data: ____/____/____.

(Assinatura do participante ou nome e assinatura do responsável)

Responsabilidade do Pesquisador: Asseguro ter cumprido as

exigências da resolução 466/2012 CNS/MS e complementares na elaboração

do protocolo e na obtenção deste Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

Asseguro, também, ter explicado e fornecido uma via deste documento ao

participante. Informo que o estudo foi aprovado pelo CEP perante o qual o

projeto foi apresentado e pela CONEP, quando pertinente. Comprometo-me a

utilizar o material e os dados obtidos nesta pesquisa exclusivamente para as

finalidades previstas neste documento ou conforme o consentimento dado pelo

participante.

_____________________________________________ Data: ___/____/____.

Bárbara Lellis de Sá Frizo

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Roteiros das entrevistas

Agricultores:

Como foi a experiência com o PAA aqui em Limeira?

Costumam participar de outras compras públicas?

Foi difícil atingir as cotas com a CONAB?

Quais foram as maiores dificuldades?

Qual a sua relação com o acampamento?

Há quanto tempo está aqui?

Sempre trabalhou com agricultura?

Por que esses alimentos foram escolhidos para serem vendidos?

Quais alimentos vocês produzem para consumo próprio no acampamento? Por quê?

O que vocês vendem, são alimentos que vocês comem?

Haviam alimentos produzidos que não eram vendidos?

Como foi sua relação com o pessoal da prefeitura?

Gestores municipais: Você faz parte da equipe do projeto do PAA em Limeira desde o começo?

Como foi a implementação da política?

Quais foram os critérios para que fossem incluídas as famílias no projeto?

A rede de atendimento do SUAS na cidade atende também a zona rural?

A ideia é atender especificamente as famílias da zona urbana? Ou foram mapeadas as famílias da zona rural também?

O que acha dos produtos que recolhiam dos produtores?

Como são montadas as cestas?

Qual a quantidade de alimento, mais ou menos, que colocava em cada cesta?

O que você entende por Segurança Alimentar e Nutricional?

Você encontra alguma dificuldade para a execução desse projeto?

Você acha que existe uma expectativa da família com relação à cesta verde?

Como você avalia a experiência com o PAA no município?

Alguma sugestão?

Famílias:

Alguém lembra por quanto tempo recebeu as cestas verdes?

Quantas foram?

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Como estão as coisas em casa com relação à comida? Tem faltado comida em casa? O que tem faltado? Quais são os alimentos no dia-a-dia na sua casa?

Acha suficiente a quantidade de comida em sua casa?

Quantas vezes no mês pegava a cesta?

E quando tinha as cestas, com essa questão de ter comida, como era? Ajudava?

Uma viagem no tempo, quanto tempo duravam as cestas?

O que acha dos alimentos que vinham nas cestas verdes?

Tentando lembrar, o que mais vinha nas cestas?

Pensando nos alimentos mais produzidos (mandioca, batata-doce, abóbora, chicória, quiabo e vagem), quem quer falar um pouco como era produzidos?

Lembrando, como eram cozinhados?

Quem cozinhava?

Como guardavam na geladeira? Duravam bem?

Era suficiente? Dava pra todo mundo comer?

Vocês usavam os alimentos, dava pra todo mundo, sobrava? Vocês acabavam ajudando alguém?

Tem algum alimento que vocês gostariam de receber alguma outra comida?

Tinha alguma comida que vocês recebiam e não sabiam como fazer?

Era difícil buscar os alimentos nos Centros Comunitários?

Pra vocês, a cesta ajudou na alimentação da família? Achavam que estavam comendo mais ou menos saudável?

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Anexos

Anexo 1 - Autorização Cooperativa

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Anexo 2 - Autorização Prefeitura