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UNIVERSIDADE ESTADUAL DA BAHIA – UNEB GOVERNO DO ESTADO DA BAHIA SECRETARIA DE MEIO AMBIENTE E RECURSOS HÍDRICOS – SEMARH CENTRO DE RECURSOS AMBIENTAIS – CRA NÚCLEO DE ESTUDOS AVANÇADOS DO MEIO AMBIENTE – NEAMA SERVIÇO NACIONAL DE APRENDIZAGEM INDUSTRIAL – SENAI GILSON GOMES SANTOS IMPACTOS DA CRIAÇÃO DE CAPRINOS NO BIOMA CAATINGA: REGIÃO DE ARACI - BAHIA Salvador - Bahia 2004

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DA BAHIA – UNEB

GOVERNO DO ESTADO DA BAHIA

SECRETARIA DE MEIO AMBIENTE E RECURSOS HÍDRICOS – SEMARH

CENTRO DE RECURSOS AMBIENTAIS – CRA

NÚCLEO DE ESTUDOS AVANÇADOS DO MEIO AMBIENTE – NEAMA

SERVIÇO NACIONAL DE APRENDIZAGEM INDUSTRIAL – SENAI

GILSON GOMES SANTOS

IMPACTOS DA CRIAÇÃO DE CAPRINOS NO BIOMA CAATINGA:

REGIÃO DE ARACI - BAHIA

Salvador - Bahia

2004

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GILSON GOMES SANTOS

IMPACTOS DA CRIAÇÃO DE CAPRINOS NO BIOMA CAATINGA:

Região de Araci-Bahia

Monografia apresentada à Universidade

Estadual da Bahia/UNEB, no 1° Curso de pós

Graduação em Gestão Ambiental Municipal,

como requisito parcial para obtenção do título

de especialista.

Orientador: Prof. Msc Fernando Antonio

Esteves.

Salvador - Bahia

2004

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TERMO DE APROVAÇÃO

GILSON GOMES SANTOS

IMPACTOS DA CRIAÇÃO DE CAPRINOS NO BIOMA CAATINGA:

Região de Araci-Bahia

Monografia aprovada como requisito parcial para obtenção do título de especialista no 1° Curso

de Pós-Graduação em Gestão Ambiental Municipal, Universidade Estadual da Bahia/UNEB,

pelo seguinte parecerista:

Prof. Fernando Antonio Esteves – Orientador __________________________________

Mestre em Desenvolvimento Sustentável pela UnB

Salvador-Ba, 29 de outubro de 2004.

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“Qual ocorre na esfera simples da natureza, acontece no reino complexo da alma. A corrigenda é sempre rude, desagradável, amargurosa; mas, naqueles que lhe aceitam a luz, resulta sempre em frutos abençoados de experiência, conhecimento, compreensão e justiça”.

(CHICO XAVIER, 1956, p.26)

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Ofereço esta monografia à minha

companheira, Marlene, a meus filhos, Vinícius e Marcelo, e a todos os colaboradores deste curso de especialização.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 06

1. A CAATINGA 10

1.1. CARACTERIZAÇÃO DO BIOMA CAATINGA 10

2. OS CAPRINOS E SUA HISTÓRIA 13

2.1. ORIGEM, ADAPTAÇÃO E PRECONCEITOS CONTRA A ESPÉCIE 13

3. A REGIÃO DE ARACI 16

3.1. ASPECTOS GERAIS 16

3.2. A CAPRINOCULTURA EM ARACI. Balanço, análise e comentários 20

4. A PASTAGEM NATURAL 26

4.1. O PASTO NATURAL, SEU USO E SEU IMPACTO 26

4.2. ALTERNATIVAS DE MANEJO DA CAATINGA 28

4.2.1. Tipos de manejo da caatinga 30

4.2.2. Controvérsias sobre o manejo da caatinga 35

4.3. O QUE DIZ A LEGISLAÇÃO? 38

5. COMO CRIAR DENTRO DA CAATINGA 46

5.1. MANEJO DE CAPRINOS 46

5.1.1. Considerações sobre a genética 47

5.1.2. Alimente-os bem 48

5.1.3. Sanidade é essencial 52

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS 55

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

APÊNDICES I, II, III, IV

ANEXOS I, II, III

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INTRODUÇÃO

Toda região Nordeste da Bahia, que sempre ocupou uma produção privilegiada de

caprinos e ovinos do Estado e aonde se situa o município de Araci, hoje se encontra no auge

destes tipos de criações, que são os principais fatores de sustento do sertanejo em época de

seca. Porém, é necessário que desde já, saibamos que para o futuro, teremos que enfrentar

sérios problemas além dos que já enfrentamos hoje, se não adequarmos nosso sistema de

criação aos critérios amparados pelo que se encontra bastante em voga, “a sustentabilidade

ambiental”.

Todos ruminantes contribuem para o aumento dos impactos na caatinga, mas, o título

de “destruidores” recai quase que exclusivamente sobre os caprinos. Esta monografia achou por

bem tomar como base esta espécie, que embora reconheçamos os prejuízos ambientais que ela

causa, pretendemos demonstrar que o maior responsável nesta história é o próprio homem.

Os ovinos serão sempre mencionados neste trabalho, por serem animais que, assim

como os caprinos, representam uma importância econômica e social enorme para o pequeno

sitiante. Em Araci, os ovinos constituem o primeiro maior rebanho, praticamente equilibrados

em número com os bovinos, estando à cabra em terceiro entre estes herbívoros de médio e

grande porte.

Existem fortes preconceitos em relação aos caprinos, dentre estes, a forma como

normalmente são criados dentro da caatinga, sem qualquer planejamento, o que lhes condiciona

o título de “formadores de desertos”. Inegavelmente as cabras são vorazes destruidoras de

vegetais, tanto que os criadores ao adotá-las como animais de criação, primeiramente vêm a

preocupação de reforçarem suas cercas, pois elas quando soltas podem devorar uma lavoura

inteira em muito pouco tempo. Quando criadas no meio da caatinga promovem um estrago

enorme: destroem as plantas em estágio de crescimento impedindo-as de completarem seu ciclo

de vida, concorrem com os demais animais da floresta, contribuem para a erosão do solo, etc.

Estas qualidades que imputam aos caprinos podem estender também aos ovinos, bovinos e

demais animais domésticos criados de forma inadequada.

Araci, bem como toda a região, possui um potencial enorme de pastagem natural

aonde se pode intensificar mais ainda a pecuária, em particular a caprino-ovinocultura,

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destinados a dar uma maior contribuição, principalmente em carne e leite, grandes carências

não só do mercado interno mais mundial.

O mercado de caprinos tende a crescer muito, o Ceará, segundo Cerri (2000)

importava nesta época carne ovina da Argentina e do Uruguai, e que não conseguia suprir nem

70% de sua demanda por caprinos. Os Emirados Árabes compravam 60 milhões de dólares em

caprinos e ovinos de vários países do mundo. O mercado da Itália também seria outro potencial

comprador além dos muitos países asiáticos.

Existe no momento, uma expectativa inusitada pela expansão da caprinocultura. A

oferta de leite “in natura” e seus derivados ao consumidor ainda é muito baixa tanto dentro

como fora do País. A tendência do mercado é nos impelir para a criação de cabras

especializadas em leite.

Devido a estes e outros mercados favoráveis é que paralelamente, num trabalho que

primeiramente deverão ser observados os requisitos de sustentabilidade, deveremos nos

empenhar para aumentarmos a nossa oferta. Algumas políticas no Estado da Bahia vêm sendo

implementadas. A Secretaria da Agricultura, Irrigação e Reforma Agrária do Estado, lançou o

Programa de Desenvolvimento da Caprino-Ovinocultura, e mais recentemente o Programa

Cabra Forte. Tal concepção foi baseada numa proposta de melhoria da produtividade dos atuais

sistemas de produção, para modelos de exploração mais eficientes, estimulando, a produção

caprina nos aspectos referentes à carne (cortes especiais, embutidos e defumados), pele

(curtimento vegetal e mineral) e leite (queijos, iogurtes e doce de leite).

Além dos produtos acima, a cabra produz 600 quilos/ano/cabeça de adubo, que é mais

rico em nutrientes do que da maioria das espécies herbívoras domésticas.

Cerri (2000), falando da caprinocultura do Nordeste do Brasil comenta que,

“a vocação regional, teimosamente ignorada pelas elites e

órgãos públicos, adquiriu incontornável transparência na seca impiedosa que se abateu no biênio 97/98. Quando tudo desidratou – roçados, açudes, bois e homens -, o bode resistiu, como sempre, no papel do último esteio. Desta vez, porém, há chance para que ele sirva não apenas para recomeçar, mas também para reinventar a convivência atribulada do homem com o sertão” (p.42).

Se pelo lado econômico as vantagens estão “à vista”, no que se refere ao lado social e

ambiental, temos visto que os nossos sistemas de criação ora adotados, levarão a caatinga não

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só da região de Araci, mas de todo o Nordeste do Brasil a uma barrocada sem precedentes, pois

estaremos contribuindo para a destruição do ecossistema e com ela, sua cultura e sua gente,

sobrando no final de tudo um terreno erodido e invadido por plantas invasoras, ou, um deserto.

FIG. Nº 1 - ÁREA ANTROPIZADA – VEJA O PROCESSO ACENTUADO DE

EROSÃO, ARACI - 2004

A criação extensiva de caprinos, sem o conjunto, das práticas técnico-ambientais e

técnico-agronômicas, tem levado a caatinga a este tipo de desastre ecológico, mas que tende a

se acelerar daqui para frente com o aumento da população, da falta de uma política fundiária e

pelos impactos que a caatinga vem sofrendo ao longo do tempo, em virtude da exploração

predatória dos seus recursos naturais.

Pesquisadores do Centro Nacional de Pesquisa de Caprinos (EMBRAPA de Sobral,

Ce.), vem desenvolvendo modelos de manejo da caatinga, para que se evite que a expansão da

caprinocultura possa contribuir sobremaneira para a destruição do bioma. Urge, portanto, que

acompanhemos o progresso, a tempo de salvarmos o que ainda nos resta.

A desertificação atinge cerca de 15% da caatinga brasileira, a população do Nordeste

do Brasil vive um impasse motivado pela pobreza de seus 12 milhões de habitantes e a

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exploração predatória da natureza com a influência principalmente do superpastoreio,

desmatamento e queimadas, Revista Globo Rural (2000).

A criação também em locais proibidos por lei, sem que se tomem as providencias

devida, é algo insustentável do ponto de vista ambiental. É preciso que se tenha consciência de

que se deve impedir com maior veemência este ato delituoso.

O CRA - Centro de Recursos Ambientais, através do NEAMA – Núcleo de Estudos

Avançados do Meio Ambiente – Salvador – Ba, ao promover o 1º Curso de Pós Graduação em

Gestão Ambiental Municipal, também abriu espaço para que técnicos de prefeituras municipais,

comprometidos com as questões ambientais locais, trouxessem à lume estudos inerentes as

atividades cotidianas mais preocupantes de seus municípios de origem. Esta monografia aqui

apresentada e acredito as de vários colegas deste curso, chamam a atenção para algumas

práticas inadequadas de suma importância na área ambiental. Os assuntos expostos consistem

em mostrar a existência de alternativas de criação de caprinos no meio da caatinga sem que o

ecossistema sofra impactos consideráveis. Pretende também, contribuir para o aprofundamento

do debate a cerca da importância da caprinocultura exercida neste tipo de pastagem, tendo em

vista o papel econômico e social que esta atividade desempenha.

São estudos que evidenciam ainda mais o papel dos municípios como unidade cidadã,

servindo como estímulo à política necessária e urgente da municipalização, dando

responsabilidades justas aos atores locais.

Existem poucas bibliografias que se referem às questões aqui expostas. São na maioria

textos ainda dispersos, que versam mais profundamente sobre as questões econômicas, sem um

enfoque mais contundente relacionado à questão ambiental. O pouco que se tem, entretanto,

constitui uma excelente contribuição.

A realização do nosso estudo também contou com a eficiente participação de criadores

de caprinos e ovinos do município de Araci, que solicitados, prontamente nos atenderam,

respondendo-nos algumas perguntas contidas em um questionário aqui publicado no anexo I

deste trabalho.

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1. A CAATINGA

1.1. CARACTERIZAÇÃO DO BIOMA CAATINGA

A caatinga é única no mundo, é um privilégio do Nordeste do Brasil. Estende-se pelos

estados do Piauí, Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco, Alagoas, Sergipe, Bahia e

norte de Minas Gerais, compreendendo uma área aproximada de 734.478 km². Alguns autores

concordam que a palavra caatinga é de origem tupi, derivada de caa (mato, vegetação) e tinga

(branco), porém outros estudiosos dizem que caa não se refere ao mato propriamente dito, mas

aos morros e sua vegetação. A controvérsia é grande, dizem também que por ser uma mata

aberta e devido a grande quantidade da luz que nela penetra sem ser retida pelas copas das

árvores é que originou o nome caatinga. Na verdade os mistérios da caatinga já começam pelo

seu próprio nome. A caatinga ou sertão segundo Eitene, (1983) citado por (DUARTE, et al.,

2004) “É uma mata seca, abert a, decídua, verde na estação das chuvas, formada por árvores

baixas ou médias e arbustos espinhosos”.

A caatinga tem uma fisionomia de deserto cuja pluviosidade é muito baixa, variando

segundo os meses chuvosos e secos e de local para local chegando de 200 mm em anos secos a

1000 mm em anos bons, porém estas chuvas são irregulares aonde se diz que o regime das

chuvas no sertão é torrencial, porque chove “tudo de uma só vez”. A temperatura média mínima

anual varia entre 24 e 38ºC. Em períodos de seca a região da caatinga está submetida a ventos

fortes e secos contribuindo mais ainda para a semi-aridez. A umidade relativa do ar varia de

85% próximo à costa e 55% na direção da parte central do bioma. A água, geralmente no mês

de agosto, chega a evaporar 7 mm por dia e a temperatura do solo pode atingir 60ºC. A região é

caracterizada por forte insolação, chegando-se a ultrapassar 3200 horas anuais em muitos

lugares. A evapotranspiração média é de 1800 mm, variando de 5,0 a 8,0 mm/dia.

O solo é fértil e raso e na grande maioria amarelo-avermelhado e não consegue

armazenar com facilidade a água que cai evaporando-se com muita facilidade, devido à alta

temperatura. Também é um solo muito pedregoso dificultando a agricultura. Os pedregulhos

acham-se misturados com argila vermelha ou escura ou com areia. As rochas em muitos lugares

afloram. O relevo consiste de extensas planícies interplanálticas e intermontanas. Ainda no solo

da caatinga existe uma grande quantidade de sais, não apenas o cloreto de sódio, mas também o

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salitre e o gesso; os animais se aproveitam dos sais da terra para suprirem suas necessidades. A

presença de sal contribui para que a água de muitos poços e lagoas fique imprópria para se

beber ou ser utilizada na irrigação.

A vegetação é diversificada. São reconhecidos 12 tipos diferentes de caatinga em todo

o Nordeste do Brasil, onde existem várias espécies vegetais, muitas delas endêmicas ao bioma,

quer dizer, que não são encontradas em outros ecossistemas. 380 espécies são consideradas

endêmicas, isto em relação às 932 espécies que atribuem terem sido registradas na caatinga. A

família mais bem representada em número é a das leguminosas com 80 espécies, seguida das

cactáceas com 41 espécies. As plantas na grande maioria são caducifólias, isto é, perdem as

folhas na estação das secas. Além dessas particularidades elas constituem, na verdade, completa

e verdadeira adaptação às condições de seca prolongada. Outra característica importante é que a

caatinga possui três estratos: arbóreo (8 a 12 metros), arbustivo (2 a 5 metros) e o herbáceo

(abaixo de 2 metros).

Dentre as plantas da caatinga distinguimos: aroeira-do-sertão ou aroeira-preta

(Myracrodruon urundeuva), aroeira-do-campo ou vermelha (Astronium fraxinifolium), aroeira-

branca ou aroeirinha (Lithrea molleoides), aroeira-salsa (Schinus molle), aroeira-mansa

(Schinus terebinthifolius Raddi), umbu (Spondias tuberosa), a baraúna (Schinopsis

brasiliensis), o mandacaru (Cereus jamacaru), o juazeiro (Ziziphus joazeiro), xique-xique

(Cereus gounellei), licuri ou ouricuri (Syagrus coronata), angico-vermelho (Anadenanthera

columbrina var. cebil), babaçu (Orbignya phalerata), barriguda (Chorisia speciosa),

carnaubeira (Copernicia prunifera), favela (Dimorphandra gardneriana) caroá (Neoglaziovia

variegata), quixabeira (Bumelia sarporum), coroa-de-frade (Melocactus oreas), imburana ou

amburana (Amburana cearensis), jurema-preta (Mimosa tenuiflora), pau-de-rato ou caatingueira

(Caesalpinia pyramidalis), pau–branco (Auxemma glazioviana), pau-ferro (Caesalpinia ferrea),

pinhão-da-baía (Jatropha mutabilis) e sabiá (Mimosa caesalpiniifolia), dentre outras.

Das plantas existentes na caatinga, algumas delas estão em extinção como a baraúna, a

aroeira e o angico vermelho.

A fauna da caatinga também é muito rica, nela encontramos o urubu (Coragyps

atratus), a siriema (Cariama cristata), o gavião (Buteo nitidus), o joão-de-barro (Furnarius

leucopus), o pica-pau (Colaptes melanochloros), o gambá (Didelphis marsupiais), tamanduá-

bandeira (Myrmecoplaga tridactyla), bicho-preguiça (Bradypus variegatus), tatu-canastra

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(Priodontes maximus), lobo-guará (Chrysocyon brachyurus) e o mocó (Kerodon rupestris),

dentre outros. Muitos destes animais se encontram ameaçados de extinção.

A característica do homem que vive no sertão é bem diferente dos que vivem em

outros lugares do mundo “Se a caatinga é adaptada à seca, o sertanejo é um homem adaptado à

caatinga” (BRANCO, 1994, P. 40). Geralmente é magro, angulosos, tostado pelo sol e meio

curvado. Não dispensa um bom animal de montaria, sabendo cavalgar com desembaraço em

meio aos espinheiros e plantas tortuosas da caatinga. Quase sempre os encontramos vestidos

com uma roupa de couro que facilita a sua passagem por entre os espinhos dos cactos e de

outras plantas que os agridem quando perseguem uma novilha, ou quando estão caçando neste

ambiente inóspito. O gado é o seu principal sustento na época das secas, pois, quando perdem

as lavouras de feijão, milho e mandioca é o gado magro que lhe sobra como único recurso para

continuar vivendo.

Na maioria das vezes o gado não pertence ao vaqueiro. Ele é apenas um contratado

pelo fazendeiro, um rico proprietário que vive em outro local e que muitas vezes nem conhece

suas próprias terras. Uma grande parte dessas fazendas tem limite incerto. Não há cercas, não há

porteiras, o gado de diferentes proprietários é criado junto, misturado pelo meio da caatinga,

que é seu pasto comum.

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2. OS CAPRINOS E SUA HISTÓRIA

2.1. ORIGEM, ADAPTAÇÃO E PRECONCEITOS CONTRA A ESPÉCIE

A cabra pertence à espécie Capra hircus. O seu tronco selvagem é a espécie Capra

aegragus auxiliada pela Capra falconiere, que viviam respectivamente, na Ásia e Índia.

As cabras têm uma história muito interessante: Foi o segundo animal a ser

domesticado pelo homem, é considerada a 1ª ama de leite conhecida e foi disseminada por todas

as partes do mundo chegando ao Brasil na época da colonização.

Sampaio et al. (1984) comentam que os caprinos sendo levados de seu local de origem

para outras partes do mundo, e que, por interferência de fatores externos surgiram inúmeras

raças possuidoras de inúmeras aptidões. Dizem ainda que a grande maioria ao sofrerem as

asperezas do ambiente, constituíram-se principalmente a partir da influência do clima e

fertilidade do solo.

A República Federal da Alemanha publicou alguns resultados de experimentos

provando a preferência da cabra por uma série muito ampla de espécies botânicas nos seus

habitos alimentares: de 557 espécies botânicas oferecidas às cabras como alimento, 499 foram

aceitas, ou seja, 78%; o que demonstra sua habilidade em se manter especialmente na caatinga,

onde encontram uma diversidade de flora muito rica.

Alguns produtores inadvertidamente tentam um criatório de caprinos especializados

em leite, inclusive com importação de raças oriundas de clima frio e de alto padrão genético e

põem para serem criados em plena caatinga, sem observância da alta temperatura da região,

tipos de alimento e de outros fatores que também influenciam. Muitos destes animais terminam

morrendo e se atribui a diferentes causas, muitas vezes a doenças desconhecidas. Nossos

caprinos catingueiros, já se encontram altamente adaptados ao ambiente como as nativas e as

SRD (sem raça definida).

FIG. Nº 2 - CAPRINO NATIVO – REPRODUTOR DA RAÇA CANINDÉ.

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Fonte: Caprinos, EMBRAPA – CPAMN, 1994.

Normalmente estes caprinos são mais destinados à produção de carne, porém, já

existem trabalhos de melhoramento, principalmente com as cabras nativas para se atingir uma

produção maior também em leite. Se convir aos produtores, estes terão em suas propriedades,

caprinos com dupla afinidade genética em um só animal, havendo, portanto, a opção em

trabalhar com dois produtos distintos o que constitui uma grande vantagem. Um melhoramento

também no campo alimentar e sanitário, além de aumentar os benefícios econômicos do criador,

é também uma grande iniciativa do ponto de vista ambiental.

Mesmo no sertão existem áreas de condições climáticas mais favoráveis aonde se

podem criar cabras mais especializadas na produção de leite, utilizando-se, para este fim, de um

regime de criação em confinamento. O que dificulta, entretanto, é a produção de forragem em

quantidade e qualidade adequadas, que em muitos lugares são difíceis de obter.

Os caprinos ainda são considerados de diminuta importância por muitos. Isto se deve

ao preconceito que se tem contra esses animais, inclusive com sugestões de se acabar com a

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espécie. Alegam que são destruidores de arbustos e árvores e que também são responsáveis pela

desertificação.

Este tipo de preconceito até que teria fundamento se não fosse à forma como são

criados, sem as condições mínimas de técnica possível onde não são observados a capacidade

de suporte das pastagens e o manejo destas, além do manejo dos próprios caprinos e as demais

condições básicas para uma equilibrada criação. Ainda sobre este assunto comenta Sampaio

et.al.(1984).

“O homem sempre foi e continua sendo o maior destruidor da

natureza. Sua acomodação e despreparo para a lida com a espécie transformam o caprino em animal nocivo. Assim, é mais fácil imputar toda a culpa às cabras do que analisar e reformular o comportamento do homem diante desse animal, que não aceita descuidos e, paralelamente, criar e fazer cumprir uma legislação protetora da natureza. A indução subliminar da propaganda exercida por países evoluídos e economicamente mais poderosos, dirigida para outras espécies, termina por prejudicar o aproveitamento daquelas mais ajustadas a determinadas áreas, especialmente os trópicos” (p. 12-13).

Por serem animais que na grande maioria são criados por setores mais acomodados e

com menor influência, esta espécie, também é vista de forma negativa por muitos homens

públicos.

Os caprinos são animais inquietos e ariscos, ao contrário dos ovinos que são mais

quietos e fáceis de criar e, portanto, constitui também motivos de serem mais aceitos por muitos

criadores. Apesar de difícil contenção, uma das qualidades positivas dos caprinos é a afinidade

que os mesmos possuem com a caatinga, característica não tão acentuada nos ovinos. Algumas

práticas de manejo são indispensáveis para diminuir a inquietude dos caprinos, tornando-os

mais fáceis de lidar.

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3. A REGIÃO DE ARACI

3.1. ASPECTOS GERAIS

Araci é muito semelhante aos demais municípios do Nordeste da Bahia nos aspectos

econômicos, sociais e ambientais, além disso, é um dos que sofrem maiores impactos, motivo

pelo qual tomamos como referência como município representativo da região para o estudo em

questão.

Este município situa-se na Microrregião Homogênea de Serrinha, conforme

classificação da Superintendência de Estudos Econômicos e Sociais da Bahia (SEI), na Região

de Planejamento Nordeste, Região Administrativa de Serrinha e Região Econômica Nordeste,

ver anexo II.

Possui uma área de 1.570 Km², encontra-se a 11º20’ de latitude Sul e 38º57’ de

longitude Oeste. Está a 212 metros de altitude e fica distante da capital 211 km. Limita-se ao

Sul com Serrinha, Biritinga e Teofilandia, ao Norte com Cansanção e Quijingue, a Oeste com

Santa Luz e Conceição do Coité e a Leste com Tucano, ver anexo III.

Ainda com relação ao município de Araci, o mesmo está situado na bacia hidrográfica

do rio Itapicuru, possui uma temperatura média de 24,0°C, com amplitude térmica muito

pequena: o mês mais frio é julho, com média de 21,3°C, enquanto os meses mais quentes são

novembro, dezembro e janeiro, com média de 25,5°C. A umidade relativa do ar apresenta uma

média anual de 70%, ocorrendo pouca variação ao longo do ano: o mês mais seco é outubro,

com média de 62%, enquanto o mês mais úmido é junho, com média de 78%. A evaporação na

bacia é relativamente alta, com média anual de 1847,8 mm, estando dentro da faixa típica de

uma região semi-árida.

A distribuição espacial das chuvas na bacia não diverge, em complexidade, daquela

que se verifica na região nordestina tomada em seu conjunto. A precipitação anual neste trecho

da bacia varia de 411,2 a 718,1 mm com chuvas durante todo o ano, porém com má

distribuição.

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A grande extensão geográfica da Bacia do Rio Itapicuru, com uma área de cerca de

36000 Km², aliada à grande diversidade de condições geomorfológicas e fisiográficas,

proporciona a existência de variadas regiões fito-ecológicas.

Com relação à região objeto de estudo, encontramos uma caatinga arbustiva densa,

apresentando estrato uniforme, com predominância de leguminosas dos gêneros Mimosa e

Cássia. Ocorre alternadamente com a caatinga arbórea, onde houve exploração da vegetação ou

por fatores vinculados às condições de solo e clima.

Na caatinga arbórea com subosque denso destaca-se a ocorrência no estrato, da

quixabeira, baraúna, faveleira, juazeiro, imburana-de-cambão ou simplesmente imburana, licuri,

mandacaru facheiro e umbu, no subosque o pau-de-rato, jurema (Mimosa tenuiflora), flor-de-

são-joão (Chamaecrista belemii), as cactáceas coroa-de-frade, quipá (Opuntia inamoema)

e a bromélia macambira-de-lajedo (Encholirium spectabile). Na caatinga arbustiva observa-se

uma grande freqüência de pau-de-rato e jurema. Ocorre também o xique-xique, caxacubri

(Cabralea canjerana), a epífita arbórea denominada de barba-de-velho (Tillandsia usneoides) e

a epifítica terrícola denominada de cipó-chumbo (Cuscuta umbelata),

a trepadeira olho-de-boi ou mucunã (Mucuna urens), pinhão (Jatropha gossyppiifolia) e aroeira

do sertão ou ariri. Nas caatingas aluvionares observa-se a existência de mata ciliar constituída

basicamente por caraibeiras (Tatebuia aurea), e em alguns trechos de clima mais úmido a

gameleira (Fícus Gomelleira) e o ingá (Inga fagifolia). Na zona de espraiamento verifica-se a

dominância do turco (Parkisonia sp), mussambê ou macambira de lajedo e mulungu (Erythrina

velutina). Nas lagoas e aguadas ocorrem espécies como o golfo (Nymphaea rudgeana), junco

(Juncus effusus), erva-de-jacaré (Euphorbia pilulifera), pimenta d’água (Polygonum sp.),

salvínia (Salvinia auriculata) e tabúa (Tipha dominguensis).

As principais atividades econômicas do município de Araci e região são a pecuária e a

agricultura. Quanto à pecuária, as criações que mais se destacaram no ano 2002 e 2003,

tomando-se Araci como amostra, foram os rebanhos ovinos, bovinos e caprinos seguidos dos

suínos, eqüinos, asininos, muares e aves. Ver quadro nº 1 e nº 2.

Depois do Vale do São Francisco que detém um efetivo aproximado de 2.130.320

cabeças, a segunda mesorregião maior produtora de caprinos da Bahia é a Nordeste que abriga

aproximadamente 795.990 animais, sendo que 77% localizam-se na microrregião de Euclides

da Cunha. Entretanto, muitos municípios que não chegam a ser “ Record” em caprinos são

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grandes produtores de ovinos. Torno a me referir aos ovinos, porque para muitos mercados, não

há preferência exclusiva por um tipo de carne; destas duas espécies citadas, compra-se

indistintamente.

QUADRO Nº 1 - EFETIVO DOS REBANHOS DO MUNICÍPIO DE ARACI-BA, NOS

ANOS DE 2002 E 2003.

EFETIVO REBANHO

2002 2003

Bovinos 24386 23283

Vacas ordenhadas 4733 4970

Porcas criadeiras 2263 2577

Outros porcos e porcas 4048 4169

Galinhas 30439 32268

Galos, frangas, frangos e

pintos

46118 47508

Eqüinos 834 855

Asininos 549 563

Muares 220 226

Caprinos 10871 11958

Ovinos 27773 29162

Obs. Os dados do ano de 2003 são preliminares, estando sujeitos à retificação. Fonte: IBGE - Agência de Serrinha.

QUADRO Nº 2 - PRODUÇÃO DURANTE OS ANOS DE 2002 E 2003, NO

MUNICÍPIO DE ARACI-BA.

QUANTIDADE PRODUTOS

2002 2003

Leite produzido (litro) 1656550 1739500

Ovos de galinha (dz) 245100 306375

Mel (kg) 14500 17500

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19 Obs. Os dados do ano de 2003 são preliminares, estando sujeitos à retificação. Fonte: IBGE – Agência de Serrinha.

Além das atividades acima mencionadas, um dos fatores que contribui para a fixação

de muitas famílias no município de Araci são dois grandes reservatórios d’água: o Açude do

Poço Grande com uma área aproximada de 613,65 ha e capacidade de 65.839 m³ e também o

Açude do Maracujá, este de menor porte. Ambos, com grande potencial para a produção de

peixe e camarões em grande escala, porém, ainda se constitui num processo bastante rudimentar

de exploração, necessitando se investir na piscicultura e na carcinocultura, a fim de ser mais

uma fonte de renda para os moradores do município. Toda a região é muito propícia para o

criatório de peixes, um exemplo disto é o grande Açude de Cocorobó que abastece a região,

inclusive Araci, detentora destes potenciais hídricos que comentamos.

A região também é rica em minerais metálicos e não metálicos. O ouro, cromo, urânio,

manganês, calcário, cobre, diamante, grafita, além de uma lista muito grande de outros minerais

que ocorrem em muitos municípios do Nordeste baiano, segundo informação do DNPM (1988),

citado pela CAR (1994).

Dentre as lavouras temporárias a região produz feijão, mandioca, amendoim, andu,

milho, gergelim, melancia e, em menor escala as hortaliças, representadas pela batata doce,

cenoura, beterraba, pimentão, tomate e o maxixe. Dentre as permanentes destacam-se o caju,

sisal, pinha, manga e banana.

As pastagens estão disseminadas em toda a região da bacia. As áreas ocupadas pela

caatinga, em razão de sua grande riqueza em leguminosas nativas, são tradicionalmente

utilizadas para a pecuária extensiva.

Além disso, existe a extração vegetal comumente explorada em toda a região:

mangaba, umbu, quixaba, pitanga (mouriri glazioviana), cambucá ou jabuticaba (Mouriri pusa),

umburana, araticum (Anona longifolia), folha larga (Moquilea tormentosa Bent), licuri, arirí,

pirí (Swartzia dipetala), caroá, juazeiro, mulungú, jurema, cajuí (Anacardium humile), cajazeira

(Spondias monbin), madeira para carvão e lenha, dentre outras.

Em muitos trechos da região já não é freqüente uma vegetação densa. O aumento da

população rural ao longo do tempo intensificando a ação do homem no ambiente natural, o

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aumento gradativo do intenso pastoreio, a questão fundiária com um número acentuado de

minifúndios, fizeram com que a caatinga fosse ficando cada vez mais impactada e difícil do

sertanejo se manter.

3.2. A CAPRINOCULTURA EM ARACI. Balanço, análise e comentários

Apesar de a cabra ser considerada “a vaca do pobre”, por ser acessível à classe mais

pobre, existe uma predominância muito grande de bovinos no município. Chega até a constituir

um contra senso este número elevado, se observarmos a quantidade de minifúndios existentes,

ver quadro nº 3. A cabra é considerada uma vaca em miniatura, oito cabras consomem a mesma

quantidade de alimento que uma vaca e proporcionalmente ao seu peso, são maiores produtoras

de leite o que constitui uma grande vantagem para o pequeno produtor.

QUADRO Nº 3 - DEMONSTRATIVO DA SITUAÇÃO FUNDIÁRIA DE

ARACI.

UF - Bahia Município - Araci Exercício - 2002

Fonte: INCRA - UMC – Araci-Ba.

Quem vive no sertão não é raro ouvir alguém dizer que “na caatinga a cabra se cria”,

ou, “no sertão a cabra é quem cria o homem”. Pelo menos para quem vive no município de

Araci e outras localidades do Nordeste da Bahia, estas frases já estão sendo consideradas como

resquícios de um tempo de fartura quando os imóveis rurais eram enormes, onde os animais

domésticos possuíam um imenso campo a explorar, os sítios de pastagens eram bem formados

CLASSIFICAÇÃO TOTAL DE IMÓVEIS CADASTRADOS

Grande Propriedade 2

Minifúndio 3660

Média Propriedade 21

Não Classificada 5

Pequena Propriedade 168

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de plantas forrageiras, quase que não existiam cercas limítrofes separando os imóveis ou

dividindo os mangueiros, e a população urbana e rural era bem menor. Este sistema de criação,

mais conhecido como ultra-extensivo, era o que predominava naquela época, porém, este

quadro vem mudando com a intensificação dos minifúndios e pequenas propriedades. Este

sistema ultra-extensivo, onde em muitos municípios do semi-árido baiano já está ficando raro

de se encontrar, quase que em geral todo rebanho é solto na caatinga e “se viram”,

independentemente do homem, para encontrarem alimentos. O proprietário não sabe quantos

caprinos possui! Na época de marcação das crias, geralmente seis meses após a parição, os

familiares do vaqueiro vão para a caatinga arrebanhar seus animais para o chiqueiro. Pelas

marcas existentes nas orelhas das matrizes são identificadas às crias, esta ocasião é conhecida

como “a pega do bode”. Os animais retornam a caatinga após o término das poucas operações,

somente voltando ao chiqueiro quando do descarte.

Devido ao tamanho reduzido dos imóveis rurais e também a baixa capacidade de

suporte da caatinga, muitos criadores vêm adotando o sistema de criação semi-intensivo

também conhecido como semiconfinado. As necessidades de suprirem as carências nutricionais

dos animais os obrigam a se valerem dos restolhos das culturas e do plantio da palma e outras

forrageiras, usando-os como suplemento alimentar em todo o período do ano, mais

intensamente, no período da seca. Entretanto, estes criadores necessitam de um melhor

incentivo ao manejo sustentável em relação à caatinga utilizada e desgastada ao longo do

tempo, sem que houvesse o mínimo de reposição do que lhe fora tirada. Chamamos a atenção

não só pela sobrevivência do ecossistema, como também, para que os criadores obtenham uma

renda melhor com o advento das práticas conservacionistas a serem incorporadas.

Uma outra forma de criação que vem sendo cada dia aceita em Araci e que está a

merecer especial atenção das autoridades é o da utilização da cabra cumprindo, efetivamente, o

seu papel da “vaca do pobre”, no suprimento de leite à família do pequeno sitiante e, com

destaque, às populações de baixa renda. É uma solução simples, de cunho prático, que consiste

num tipo de pastejo controlado, isto é, a cabra comendo amarrada, ou seja, como conhecidos

comumente, “animais de corda”.

FIG. Nº 3 - ANIMAIS DE CORDA.

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Fonte: Criação de cabras leiteiras, EMBRATER, 1984.

Outro Sistema, o agrossilvipastoril, desenvolvido e incentivado pela pesquisa, vem

sendo também uma grande opção, se usado com a devida cautela e orientação técnica. Será uma

ótima alternativa para todos os níveis de criadores e de quase todos tamanhos de propriedades.

Pesquisas realizadas no Estado do Ceará pela EMBRAPA - caprinos demonstraram que o

sistema agrossilvipastoril trouxe benefícios no aumento da produção agrícola e da

produtividade dos rebanhos, e também na recuperação de solo nas propriedades onde fora

implantado o experimento.

Nos imóveis de médio a grande porte encontramos mais comumente sistemas

extensivos, em que a alimentação é obtida exclusivamente no pastoreio direto, não apenas na

caatinga como também, em pastagens artificiais. Poucos produtores controlam a lotação, e a

disponibilidade de alimentos dependem dos efeitos do clima nas pastagens. Por não existirem

outras formas de suprimento alimentar e um controle sanitário eficiente, a taxa de mortalidade

dos animais é alta.

A caatinga vem sofrendo um impacto considerável em seus três estratos: herbáceo,

arbustivo e arbóreo. Os animais na caatinga, principalmente em época de seca defendem sua

sobrevivência como pode. Cada espécie dentro do seu habito de pastejo, utiliza o que de melhor

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consegue: os ovinos, por pastarem com a cabeça baixa, comem gramíneas e leguminosas

rasteiras; os bovinos e eqüídeos comem gramíneas e leguminosas rasteiras e arbustivas; os

caprinos comem gramíneas e leguminosas rasteiras, trepadeiras, arbustos, conseguindo alcançar

locais não acessíveis para outras espécies, encontrando meios de buscar alimento nas partes

mais altas das árvores como umbuzeiros, juazeiros, etc. Portanto, não é de se admirar o impacto

considerável que estes animais vêm causando nos três níveis de vegetação, sem que se tomem

devidamente as providencias imediatas para um manejo realizado de forma adequada.

FIG. Nº 4 – CAATINGA ARBÓREA COM A INEXISTÊNCIA DE ESTRATO

HERBÁCEO, ARACI - 2004

A agressão mais violenta que ocorre dentro da caatinga se dá exatamente nos sítios de

pastagens, comentadas adiante mais detalhadamente, onde as espécies consideradas forrageiras

cedem lugar às plantas indesejáveis ou invasoras em conseqüência do pastejo intensivo.

Dos poucos criadores que fornecem sal mineral ao rebanho não o fazem de forma

adequada, dando-lhe quase que exclusivamente o cloreto de sódio deixando os animais com

carência dos demais minerais. Outros, já adquirem em casas de produtos agropecuários algumas

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misturas, que, fornecidas aos caprinos e ovinos, não suprem devidamente suas reais

necessidades, pois, apesar dessas misturas prestarem um grande benefício, continuam

inadequadas, muitas vezes com deficiência ou excessos na dosagem dos macro e micro

elementos.

A maior parte dos caprinos que vivem na região semi-árida de Araci são SRD.

Praticamente não existe um melhoramento genético reconhecido e aceito por todos criadores, o

que mais ocorre e que muitos têm como certo, é a mestiçagem, que consiste no acasalamento

desordenado de animais mestiços, confundido muito com o processo de mestiçamento, que tem

como princípio a união de caracteres entre duas raças. Ambos os processos, entretanto, são

combatidos veementemente por caprinocultores e técnicos conceituados, que querem admitir

um melhoramento genético mais consistente, envolvendo raças já adaptadas desde muito tempo

às condições do Nordeste Brasileiro como é o caso das nativas. Araci, e toda a região,

necessitam veementemente melhorar o seu rebanho, definindo-se por uma raça que possua em

suas características, sobretudo, boa rusticidade.

Não podemos deixar de nos referir às áreas de proteção permanente e às áreas de

reserva legal, muitas já degradadas e outras em fase de degradação. Razão pela qual devemos

intensificar os meios para preservação e recuperação destes locais que são indispensáveis à vida

dos animais e vegetais da caatinga. Constatamos também a inexistência de aguadas naturais ou

mesmo construídas pelo homem, que deveriam destinar-se à dessedentação dos animais

silvestres. Parece-nos que existe bem pouca preocupação neste sentido, não apenas por parte

dos criadores, mas de forma geral.

A REVISTA O BERRO nº 52, publicou uma matéria de autoria de Guimarães Filho

(2002), em que diz:

“ Não há como um caprinocultor, mesmo com um nível tecnológico razoável de exploração oferecer um padrão de vida condigno à sua família com um estabelecimento de área inferior a 200 ou 300 hectares. A não ser com irrigação e vendendo raça, e não simplesmente carne e pele. É necessário um rebanho caprino com, pelo menos, 300 matrizes para proporcionar esse padrão mínimo, sob condições de dependência de chuvas. Nas condições extensivas tradicionais, esse rebanho exigiria cerca de 600 hectares de boa caatinga para produzir satisfatoriamente” (p.52).

Se nós projetarmos a evolução do rebanho e computarmos receitas e despesas, nós

iremos nos surpreender com esta incontestável realidade.

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No caso de Araci, nos deparamos com a necessidade de se fazer urgentemente ajustes

fundiários, em virtude do grande número de minifúndios existentes.

Pelo conhecimento que temos da região, muitos caprinocultores mesmo possuindo

áreas pequenas, desconhecem a necessidade da estabilização do rebanho. Às vezes recebem

poucos caprinos financiados, que proliferam, até ao extremo da degradação da caatinga pela

superlotação.

4. A PASTAGEM NATURAL

4.1. O PASTO NATURAL, SEU USO E SEU IMPACTO

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O Serviço de Conservação de Solos dos Estados Unidos citado por Costa (1973)

reconhece cinco tipos de pastagens: “ pastagens naturais, pastagens nativas, pastagens

artificiais permanentes, pastagens artificiais temporárias e ‘florestas com áreas para pastoreio’”.

Para o nosso estudo em particular, já que estamos estudando a região de Araci,

interessa-nos apenas a pastagem natural caatinga.

Pastagem natural, definida pelo Range Science department Texas e citado por Costa

(1973) é,

“uma pastagem onde a vegetação original (vegetação clímax)

é composta principalmente de gramíneas e plantas herbáceas não gramíneas; ou uma pastagem onde a vegetação clímax é composta principalmente de gramíneas, plantas herbáceas não ramíneas e arbusto”.

Como exemplos, Costa complementa:

“os campos naturais do Rio Grande do Sul, os ‘pampas’ da

Argentina, os ‘llanos’ da Venezuela, os ‘velds’ da África do Sul, o pantanal do Mato Grosso, os campos limpos do Brasil Central, os agrestes e caatingas do Nordeste do Brasil, os campos naturais dos Estados Unidos, Canadá e México” (p.6).

A composição florística de uma pastagem natural é bastante heterogênea, possui

espécies dominantes e subdominantes. Estudos revelam que existem variações na composição

da flora e na proporção quantitativa das espécies, podendo ser encontradas em diferentes áreas

da pastagem. Estas áreas geralmente possuem potenciais diferentes para produzir forragem.

O uso racional das pastagens tem sido motivo de muita preocupação. A identificação

das espécies dominantes e subdominantes têm sido cada vez mais estudadas.

As diferentes composições florísticas existentes em qualquer área de pastagem natural

e a quantidade proporcional de espécies quando comparadas a outras áreas de pastagem, é o que

denominamos de “sítio”. Pode existir um ou mais sítios a depender do solo, clima e topografia.

Distúrbios poderão levar a difícil identificação dos sítios que não deve basear-se

apenas na vegetação, como por exemplo: os causados por corte de plantas, pastejo excessivo,

estiagem prolongada ou fogo podem modificar ou destruir a vegetação original (clímax). Para

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facilitar o reconhecimento dos sítios de pastagem, fazem-se necessários classificá-los de acordo

com o tamanho, dar-lhes nomes que não sejam nomes de plantas e se fazer o mapeamento de

acordo com a produtividade do sítio e sua influencia na unidade da pastagem.

Entretanto os sítios podem se recuperar através da sucessão primária e secundária, e

formar novamente a vegetação clímax, a depender do impacto sofrido. A ação do homem pode

influenciar sobremaneira na regeneração destes.

Um (disclimax) na vegetação original (clímax) da pastagem natural indica um declínio

da condição da pastagem.

As espécies da vegetação clímax que decrescem em quantidade quando a pastagem é

submetida à pastejo contínuo intensivo é que são denominadas espécies desejáveis ou

decrescentes. São plantas mais palatáveis.

Quando as espécies da comunidade de plantas da vegetação clímax aumentam em

quantidade quando a pastagem é submetida à pastejo contínuo intensivo, são denominadas

espécies menos desejáveis ou aumentadoras. São plantas menos palatáveis e aumentam em

proporção, na medida em que as espécies desejáveis decrescem. Algumas espécies menos

desejáveis, que possuem menos palatabilidade podem aumentar em proporção para depois

decrescer, caso o pastejo intensivo continue. Outras, a tendência é dominar o sítio da pastagem,

pois tem menor preferência pelos animais.

As espécies indesejáveis ou invasoras não são componentes da vegetação clímax da

pastagem. São plantas que invadem os sítios logo que as espécies de plantas desejáveis e menos

desejáveis vão desaparecendo com o pastejo intensivo. Podem, entretanto, serem componentes

da vegetação clímax em outro sítio ou serem espécies exóticas. Elas podem ser anuais,

herbáceas perenes e arbustivas e podem ter algum ou nenhum valor como forrageira, ver figura

Nº 5.

FIG.Nº 5 - DIAGRAMA ILUSTRANDO A CONDIÇÃO DA PASTAGEM

NATURAL, BASEADO EM DADOS QUANTITATIVOS DAS ESPÉCIES

“DESEJÁVEIS” OU DECRESCENTES, “MENOS DESEJÁVEIS” OU

AUMENTADORAS E “INDESEJÁVEIS” OU INVASORAS.

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EXCELENTE BOA RAZOÁVEL PRECÁRIA

90

80

70

60

50

40

30

20

10

0

100 75 50 25

Percentagem de vegetação clímax em resposta ao superpastejo

Fonte: Boletim Técnico n.º 15, IPEAL, junho/1973.

Em Araci, como em toda a região, o impacto proporcionado pelo pastejo contínuo e

intenso, tem demonstrado que cada vez mais tendemos a nos aproximar para uma condição de

predomínio de espécies indesejáveis ou invasoras dentro do bioma, havendo o perigo de

desaparecimento da caprino-ovinocultura e de outras criações de animais domésticos, com

transtornos para nossa economia, a sociedade e ao ambiente. Isto poderá levar o homem da

caatinga ao extremo desespero, que, na sua ânsia de sobrevivência, retira do ambiente tudo o

que é necessário para ele, sem contudo, devolver a natureza a proteção e os meios necessários

para a sua recomposição e desenvolvimento.

4.2. ALTERNATIVAS DE MANEJO DA CAATINGA

Diversos trabalhos ecológicos e zootécnicos foram e estão sendo realizados, visando o

melhoramento do manejo das pastagens naturais.

Manejo de uma pastagem natural é a arte e a ciência de se planejar e dirigir o uso de

uma pastagem natural de forma sustentável.

Cob

ertu

ra re

lativ

a (%

)

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É muito importante se saber a quantidade de animais que se deve colocar em uma

determinada área de pastagem para que se obtenha um bom resultado econômico e também

reduzir a influência negativa ao meio ambiente resultante da superlotação de animais dentro de

um pasto. Sampaio et al. definem carga ou lotação animal como “o número de animais por

unidade de área”. Definem também capacidade de suporte como sendo “o número de cabeças,

em geral, expresso em unidades animais (U.A.) que uma área suporta pelo período de um ano (1

UA = 450 kg do peso vivo)” (SAMPAIO et al.1984, p. 104 -105).

Representa-se a carga animal geralmente por animal/ha/ano ou ha/animal/ano. Uma

unidade animal é representada por um bovino adulto pesando 450 kg (peso vivo) ou uma vaca

adulta com bezerro.

Com base na matéria seca consumida em um ano por categoria animal, pode-se

calcular a equivalência em U.A., ver quadro n° 4.

QUADRO N° 4 – EQUIVALÊNCIA EM U.A. POR CATEGORIA DE REBANHO.

DISCRIMINAÇÃO

(tanto para caprinos quanto para ovinos)

EQUIVALÊNCIA

EM

U.A.

Adultos com peso vivo de 35 kg 0,14

Crias com peso vivo de 15 kg 0,07

Fonte: Banco do Nordeste do Brasil SA – AGENDA DO PRODUTOR RURAL, 2003, p. 158

Existem diferentes recomendações de capacidade de suporte para a caatinga, aqui,

neste trabalho, não iremos recomendar qualquer uma delas, pois achamos que não é admissível

tomar-se como base uma região da caatinga como representação do todo e estipular-se valores,

como se todos os imóveis rurais fossem a cópia fiel um do outro. Acreditamos sim, que o

técnico responsável pela assistência deverá visitar cada imóvel rural, estabelecer contato com o

proprietário a fim de verificar o histórico da vegetação e da criação, fazer um levantamento da

flora com suas características forrageiras, observar o potencial dos sítios de pastagens e definir

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os estratos da vegetação e estágios de crescimento, aí sim; estabelece-se para cada imóvel (não

para uma região), a capacidade de suporte correspondente.

Tudo que foi abordado em relação à capacidade de suporte, só se pode realizar com

um técnico próximo ao agricultor, convivendo no ambiente da caatinga e comprometido com o

município. E isto só será conseguido com o advento da municipalização.

4.2.1. Tipos de manejo da caatinga

O emprego de práticas que modifiquem a arquitetura (rebaixamento), a composição

florística (raleamento) e a diversidade da vegetação da caatinga (enriquecimento) resultam, em

incrementos consideráveis na sua produção pastoril. Estas práticas são chamadas de manejo, são

elas:

• REBAIXAMENTO

Um dos tipos de manejo da caatinga consiste no rebaixamento seletivo das copas das

árvores e arbustos de valor forrageiro e de outras plantas, fazendo o controle das plantas não

produtoras de forragem e de plantas tóxicas além de preservar as que servem para outras

finalidades como lenha, remédio, curtume, etc. Na operação de rebaixamento as plantas são

podadas a uma altura de 30-40 cm do solo. Esta operação geralmente é feita no verão (época

seca) para provocar a rebrota no inverno (época das chuvas), isto para as forrageiras, porque

para as não forrageiras a poda deverá ser feita no início das chuvas. Estas recomendações são da

ASSOCIAÇÃO PLANTAS DO NORDESTE, baseado em pesquisa do CNPC, UVA E UFC.

O aumento da disponibilidade de forragem se distribui em 40% provenientes das

espécies herbáceas e 60% das lenhosas. O roço da rebrota deverá ser feito de 2 em 2 ou 3 em 3

anos, para manter a copa sempre ao alcance dos animais. Deverá haver um roço seletivo para as

plantas rebaixadas, destinadas a produzir lenha ou estacas para cercas, isto no final do primeiro

ano, poupando-se até três rebrotas, para obter-se com isso a produção de forragem e madeira.

Além da broca do verão deverá fazer-se o roço das rebrotas na época das chuvas. Para

manter a pastagem produtiva devem-se tomar os cuidados a seguir, conforme recomendação da

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EMBRAPA - caprinos, contido no Caderno de Tecnologias para a Agricultura Familiar-II,

Salão Nordestino da Agricultura Familiar, (p. 5 e 6):

• Manter uma faixa de mata ciliar ao longo dos riachos;

• Preservar cerca de 200 árvores por hectare, ou o equivalente a um sombreamento de 35-

40% do terreno;

• Manter uma boa cobertura morta do solo, poupando-se a cada ano de 40-50% da forragem

produzida.

O objetivo deste manejo da caatinga visa aumentar a oferta de forragem e melhorar a

sua utilização. Somente se aplica esta técnica em áreas de um potencial para o desenvolvimento

de um estrato herbáceo rico em forrageiras e que tenham uma quantidade muito grande em

árvores e arbustos que podem ser consumidos pelos animais. É muito importante se estudar a

área previamente para se saber o tipo de tecnologia a ser implantada.verificar as restrições

recomendadas para as áreas de preservação permanente, em áreas de reserva legal e nas demais

áreas de unidade de conservação. Este tipo de manejo geralmente é feito em solos considerados

mais adequados, são eles: planossolos solódicos, solonetz solodizados, podzólicos vermelhos

amarelos e brunos não-cálcicos.

O custo da operação depende da condição da vegetação na área a ser aplicado. Segundo

a EMBRAPA - caprinos, a operação de broca seletiva com retirada da madeira útil pode utilizar

em média 42H/dia/ha, sendo 32 para a broca propriamente dita e 10 para a retirada da madeira.

Há casos em que estes números são significativamente inferiores. O roço da rebrota utiliza em

média 5H/dia/ha. A operação de broca é feita uma só vez. Os trabalhos tecnológicos tendem a

diminuir os riscos, mesmo em ocorrência de secas, mesmo porque estes trabalhos são feitos em

vegetação nativa, não sendo introduzida outras forrageiras, com o controle da redução da

competição entre as plantas. O que pode ocorrer é a intensificação da erosão, caso haja um

descontrole das recomendações da capacidade de suporte animal, contribuindo para a exposição

do solo. Diz a EMBRAPA que em áreas apropriadas, pode-se incrementar a produção pastoril

em 800%. Significa que a produção de forragem em muitas áreas da caatinga poderá passar dos

atuais 400 kg/ha para cerca de 2400 kg/ha, a capacidade de suporte no caso dos caprinos

aumentará de 0,5 cab/ha para 2-3 cab/ha. A produção de peso vivo animal também no caso dos

caprinos poderá alcançar 45-50 kg/ha/ano, a depender da região, solo, clima, rusticidade dos

animais, vegetação, manejo dos animais, etc.

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32

O rebaixamento deverá ser feito de forma gradativa e sob estreita orientação técnica,

adequando-se a carga animal à área, bem como se fazendo o controle do extrato herbáceo com a

espécie caprina. Outro aspecto a ser considerado refere-se à rotação da área.

• RALEAMENTO

Outro tipo de manejo é o raleamento da caatinga. Significa rebaixar as árvores que

servem para utilizar como lenha. Segundo a Revista Rádio Nordeste (2002), numa área onde

tem dez árvores lenhosas, pode-se brocar seis, ou seja, manter um sombreamento de 40%. Esta

prática oferece condições para o fortalecimento das árvores existentes.

FIG. Nº 6 - CAATINGA SENDO RALEADA PARA O PLANTIO DE CAPIM,

ARACI-2004

O raleamento aumenta a produção de forragem com maior participação das herbáceas,

isto é, do capim e plantas de pequeno porte. Melhora também a capacidade dos animais

resistirem à seca como também a estabilização da produção animal. O incremento da

disponibilidade de forragem consiste em 80% oriundos do estrato herbáceo e 20% do lenhoso.

• ENRIQUECIMENTO

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33

O enriquecimento da caatinga é um outro tipo de manejo que se dá principalmente em

áreas de vegetação nativa degradadas, ou, em áreas com razoável potencial agrícola. O replantio

com mudas ou ressemeadura constitui a melhor opção para o aumento das forrageiras.

Tecnicamente é necessário que o raleamento alcance valores de 10 a 15% de

sombreamento. Também existe uma técnica de semeadura onde se e é efetuado um cultivo

mínimo.

• SISTEMA INDIANO

Uma outra forma de manejo, onde se pode utilizar parte dos outros três tipos

mencionados com mais algumas inovações, é descrito por Araújo Filho, Técnico da

EMBRAPA de Sobral, citado por Cerri (2000). O pesquisador inicia o texto com um nome “o

bode rotativo”, veja o que ele diz:

“O uso destrutivo está recobrindo a caatinga de marmeleiro,

uma espécie pioneira que já domina 40% da paisagem cearense.

A sucessão vegetal na caatinga leva 45 anos para se recompor. Mas o sujeito derruba, queima, planta e, três anos depois, volta ao mesmo lugar. Começa tudo de novo. Não se completa nem o ciclo de regeneração herbácea. Vem a erosão. Vira tudo deserto – ou marmeleiro.

Uma caatinga plena produz quase 280 quilos de forragem por hectare. Mas apenas 10% disso são acessíveis ao pastoreio. Uma parte é impalatável; a outra fica na copa das árvores, fora do alcance animal. A alternativa é rebaixar as árvores forrageiras. Torna-las disponíveis. E fortalecer o estrato herbáceo, quer dizer, o pasto. De dois jeitos: raleando a vegetação arbustiva para o capim sair melhor e, se necessário, enriquecendo a área com buffel, palma, cunhã e leucena. Isso dobra a capacidade de suporte animal e acelera o ganho de peso. Melhor que tudo: evita a destruição itinerante. Dá fôlego para a caatinga respirar e para o homem viver”.

Até este ponto da descrição, não constitui nenhuma novidade em relação aos três tipos

de manejo descritos anteriormente. Mas, existe uma particularidade muito interessante,

diferente das técnicas mais conhecidas, que foram testadas experimentalmente e que de forma

ainda acanhada, vem sendo admitida por sertanejos do Nordeste do País e que consideramos

para o momento, como uma das melhores soluções para ser observada também na região de

Araci, devido à quantidade de minifúndios existentes. O texto descrito ainda enfatiza:

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34 “Mas é indispensável criar um sistema de rotação de áreas.

Ou a caatinga vai se transformar numa verdadeira Savana empobrecida.

O risco é real porque mais de 30% das propriedades do

semi-árido têm menos de 10 hectares, em média. A solução é trabalhar com um modelo agrossilvipastoril. Três

módulos de 3 hectares cada um, explorados em sistemas de rodízio, assim divididos: lavoura; pastoreio e reserva – inclusive para uso madeireiro. É recomendável também montar um banco de proteína com leucena. Vai reforçar a bóia do rebanho na seca, duas horas por dia. As áreas trocam de funções a cada sete anos. O roçado vira pastoreio; este volta a ser reserva e a reserva passa a ser cultivada. Numa etapa do ciclo, a brotação serve de alimento; numa outra, segue em frente, vira árvore de novo. É uma sabedoria índia adaptada ao sertão”. ( P. 50).

Araci e região vêm desenvolvendo uma atividade semelhante, porém, duvidosa do

ponto de vista técnico. Planta-se o sisal (Agave sisalana Perrine) no meio da caatinga, que

também num processo simultâneo, sem que haja um rodízio da área, criam-se também cabras

e ovelhas. Os agricultores se queixam, que o sombreamento e também as dilacerações

causadas às folhas do sisal pelos espinheiros, além dos estragos provocados pelos animais,

fazem com que os produtos percam em qualidade e quantidade. É muito difícil se fazer uma

roçagem adequada porque as plantas espinhosas se entrelaçam com o sisal. O beneficiamento

também se complica quando as folhas defeituosas passam pelo processo de desfibramento. Os

produtores também demonstraram insatisfações quanto ao aparecimento de doenças, causando

a morte de muitos pés de sisal.

Existe a necessidade de que uma lavoura tão importante para a região como é o caso

do sisal seja mais bem contemplada no sentido de se avaliar melhor estes simples aspectos, de

grande significância do ponto de vista da sustentabilidade.

FIG. Nº 7 - PROCESSO SIMULTANEO DE CRIAÇÃO EM ARACI:

CAPRINOS, OVINOS, SISAL E CAATINGA, ARACI – 2004.

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35

Outra questão muito grave que temos observado é o plantio de algaroba (Prosopis

juliflora) no meio da caatinga. A algaroba, por ser uma planta que se desenvolve com muita

rapidez, domina por completo a área, constituindo-se em uma espécie invasora competindo

com as demais plantas da caatinga, não deixando que estas sobrevivam.

É importante que muitas árvores e arbustos nos processos de manejo devam ser

preservados do corte, pois estas plantas são indispensáveis para produção de madeira, para

produzirem forragem com a queda das folhas e para a própria preservação da floresta.

Muitas plantas forrageiras da caatinga podem ser plantadas e, ou, conservadas, ver

apêndice I – POTENCIAL FORRAGEIRO DA CAATINGA.

4.2.2. Controvérsias sobre o manejo da caatinga

Apesar de alguns criadores virem adotando os tipos de manejo citados, e estes serem

estimulados pelos órgãos de pesquisa e extensão, existem considerações importantíssimas por

parte de alguns defensores da natureza, cujas abordagens têm correlação com estas práticas.

Muitas, fundamentadas em princípios de que os cortes das árvores influenciam negativamente

em variados aspectos. Observe o que diz Vivan (1998):

“A capacidade de rebrote tem como base a herança genética, que reflete a coevolução da planta e seu meio. Ainda, fatores como

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36 idade e disponibilidade de recursos (radiação, água, nutrientes) podem influir nesta capacidade. ..............................................................................................................

A renovação de folhas e raízes tem implicações a nível de toda a fauna e flora associadas que formam a rizosfera e filosfera. Portanto, num sistema clímax, após uma troca de folhas ou um distúrbio causado por eventos naturais (vendavais, granizo, etc), pode-se esperar também alterações ao nível de solo, em termos de disponibilidade de alimento (nutrientes). Essa disponibilidade conjuntural de nutrientes no solo logo é complexificada pelos transformadores, como insetos, minhocas, fungos e bactérias. Eventualmente, pequenos herbívoros aproveitam as folhas secas antes de serem decompostas, o que é bastante comum nas matas de cerrado e caatingas. ..............................................................................................................

Os nutrientes incorporados nesta biomassa ao nível de solo vão lentamente se reestruturando na massa vegetal. Este lapso de tempo, que pode ser de dezenas de anos, é o clímax dinâmico, e é onde a agricultura deve se situar. Portanto, o conceito de renovação da vegetação pela podação e o conceito de clímax dinâmico estão intimamente ligados. O objetivo primeiro da renovação da vegetação deve ser conduzir o sistema ao estágio de clímax dinâmico, ou reproduzi-lo quando já existente”. ( p. 84)

O princípio defendido por Vivan é sem dúvida uma grande realidade que deverá ser

observada, principalmente quando o produtor, em desacordo com as leis do nosso País, se

aventura em aplicar práticas de manejo com podas drásticas de árvores em locais com algumas

restrições como APP’s e RL’s. Por outro lado, não se pode fazer agricultura sem que haja algum

impacto, este impacto, entretanto, deverá ser mínimo possível e em locais preestabelecidos.

Tanto os agricultores quanto os técnicos devem na medida do possível se cingir das precauções

observadas por Vivan.

Primack e Rodrigues (2001), também prestam sua colaboração a esta questão,

enfatizando que:

“Um meio ambiente bem conservado tem grande valor

econômico, estético e social. Mantê-lo significa preservar todos os seus componentes em boas condições: ecossistemas, comunidades e espécies. O aspecto mais sério do perigo ambiental é a extinção das espécies. As comunidades podem ser degradadas e confinadas a um espaço limitado, mas na medida em que as espécies originais sobrevivam, ainda será possível reconstituir as comunidades. Da mesma forma, a variação genética das espécies será reduzida se o tamanho da população for diminuído, mas estas podem ainda recuperar o potencial de sua variação genética através de mutação, seleção natural e recombinação. Entretanto, uma vez que a espécie é extinta, a informação genética única contida em seu DNA e a combinação especial de caracteres que ela possui estarão perdidas

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37 para sempre. Uma vez que uma espécie tenha sido extinta, sua população não pode ser recuperada, a comunidade que ela habita torna-se empobrecida e seu valor potencial para os seres humanos jamais poderá se concretizar”. (p. 17).

Como se vê, a preocupação deste estudioso é de grande importância, principalmente

quando vemos muitas espécies sendo extintas nos diversos ecossistemas, e outras tantas em fase

de extinção. É preciso defender o princípio da sustentabilidade, de fato, senão toda a

humanidade juntamente com muitas espécies terá um fim trágico, infelizmente.

Outros cientistas, porém, tem opiniões divergentes em relação a estas questões tidas

como drásticas ao ambiente. Vejamos por exemplo o que diz Bicudo (1982), no texto “Ecologia

não é o ‘não mexer’”:

“Anoto que o excesso de cuidados ecológicos é tão

prejudicial quanto o descaso total. Especialmente num País, como o nosso, ainda por fazer. Temos multidão de recursos, distribuídos em ecossistemas ainda inatingidos, na prática. Para chegar lá algum arranhão tem que ocorrer, é lógico. Sabendo-se, entretanto, como fazer (aqui é que deve estar o nosso esforço político e tecnológico!) as coisas naturais se acomodarão: serão novos ecossistemas, igualmente protegidos.

Sucede que ecologia não é exatamente o “não-mexer” – tão

suspirado pela ecologia do tipo emocional ou romântico. As excessivas preocupações com o meio ambiente não são realmente tão graves, pois, a natureza, conforme as leis de Darwin, demonstra que as espécies se renovam, se substituem; e, as não adaptadas cedem lugar às que evoluem”. (P. 122).

Bicudo continua discorrendo sobre outros assuntos bastante interessantes e igualmente

polêmicos, mas, o que já foi dito pelo autor, demonstra também a sua preocupação com os

destinos ambientais, e com ele somam-se os ideais de outros homens de ciência que concordam

que nossos potenciais florestais devam ser explorados, quando os impactos decorrentes sejam

amenos. E isto, como se vê nos tipos de manejo acima propostos, já se encontra em bastante

evidencia. É claro que devemos ser sensatos e encarar a questão com parcimônia para que os

argumentos de Bicudo, embora revestidos de uma certa lógica, não venham a ser interpretados

indevidamente por alguns aproveitadores interessados em explorar nossas reservas, exaurindo

sem consciência nosso patrimônio florestal, que hoje em dia já é evidente ser um bem

esgotável.

Como se vê a questão é realmente polêmica. A humanidade necessita de alimentos,

que para serem produzidos às vezes é necessário lançar-se mão dos recursos naturais. Que seja

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evidente o auxílio das técnicas mais apropriadas, para que possamos transferir este patrimônio

natural com a segurança devida às futuras gerações.

4.3. O QUE DIZ A LEGISLAÇÃO?

Ao estudarmos o grande número de leis ambientais do Brasil, logo percebemos a

vontade de muitos em resolverem os intrincados problemas de toda ordem. Porém, são

questões difíceis de se ajustarem, porque envolvem situações aonde ferem princípios

enraizados de longas datas e que necessitam de se alinharem à realidade.

Nos aspectos relacionados à vegetação, nos deparamos com redações de alguns

artigos, especialmente as do Código Florestal, aonde ensejam muitas discussões, apesar das

corrigendas através de medidas provisórias. Trata-se de redações aparentemente contraditórias

e que vem suscitando diferentes interpretações.

Levando-se em consideração que as questões ambientais ganharam amplitude de

pouco tempo para cá, os avanços nesta área têm sido animadores, vejamos o que dizem nossas

leis, Federal e Estadual:

A) SOB O PONTO DE VISTA DA LEGISLAÇÃO FEDERAL

O Código Florestal – Lei 4.771, de 15.9.65, estabelece em seu artigo 1°:

1. As florestas existentes no território nacional e as demais formas de vegetação,

reconhecidas de utilidade às terras que revestem, são bens de interesse comum a

todos os habitantes do País, exercendo-se os direitos de propriedade com as

limitações que a legislação em geral e especialmente esta Lei estabelecem.

2. O artigo 2° do Código Florestal elenca a vegetação considerada de preservação

permanente. Algumas alíneas cuidam da proteção do solo e se preocupam com todo o

ecossistema que poderia ser alterado com a remoção da vegetação.

3. A resolução CONAMA 303, de 20.03.02, que veio estabelecer parâmetros, definições

e limites referentes às áreas de preservação permanente. Contém as definições

necessárias à aplicação das disposições constantes do art. 2° do Código Florestal.

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4. Ainda no que se refere à vegetação de preservação permanente, deve ser citada a Lei

7.754, de 14.4.89, não regulamentada até esta data, que estabeleceu medidas para

proteção das florestas existentes nas nascentes dos rios.

5. De acordo com o Código Florestal e modificações posteriores, especialmente a MP

1956-52, que modificou seu art. 3°, a supressão total ou parcial de florestas de

preservação permanente só será admitida com prévia autorização do Poder Executivo

Federal, quando for necessária à execução de obras, planos, atividades ou projetos de

utilidade pública ou interesse social.

6. O art. 4° do Código Florestal, com redação dada pela MP n. 2.166-67, de 24.08.01,

assim dispõe:

A supressão de vegetação em área de preservação permanente somente poderá ser

autorizada em caso de utilidade pública ou de interesse social, devidamente

caracterizados e motivados em procedimento administrativo próprio, quando inexistir

alternativa técnica e locacional ao empreendimento proposto.

No que respeita à supressão de vegetação em APP, o Código Florestal estabelece que:

§ 1° - A supressão de que trata o caput deste artigo dependerá de autorização do

órgão ambiental estadual competente, com anuência prévia, quando couber, do órgão

federal ou municipal de meio ambiente, ressalvado o disposto no § 2° deste artigo.

.................................................................................................................................

§ 3° - O órgão ambiental competente poderá autorizar a supressão eventual e de

baixo impacto ambiental, assim definido em regulamento, da vegetação em área de

preservação permanente.

§ 4° - O órgão ambiental competente indicará, previamente à emissão da autorização

para a supressão de vegetação em área de preservação permanente, as medidas

mitigadoras e compensatórias que deverão ser adotadas pelo empreendedor.

.................................................................................................................................

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40

§ 7° - É permitido o acesso de pessoas e animais às áreas de preservação permanente,

para obtenção de água, desde que não exija a supressão e não comprometa a

regeneração e a manutenção a longo prazo da vegetação nativa.

7. Quanto às áreas destinadas a abrigar vegetação de preservação permanente mas que se

encontram desmatadas ou utilizadas por culturas, assim dispõe o Código Florestal:

Artigo 18 – Nas terras de propriedade privada, onde seja necessário o florestamento

ou o reflorestamento de preservação permanente, o Poder Público Federal poderá

fazê-lo sem desapropriá-las, se não o fizer o proprietário.

§ 1° - Se tais áreas estiverem sendo utilizadas com culturas, de seu valor deverá ser

indenizado o proprietário.

§ 2° - As áreas assim utilizadas pelo Poder Público Federal ficam isentas de

tributação.

8. O artigo 16 do Código Florestal trata de reserva florestal legal, matéria de extrema

importância e que vem sendo objeto de regulamentações e modificações por Medidas

Provisórias. Este código, com a redação dada pela MP assim a define:

Área localizada no interior de uma propriedade ou posse rural, excetuada a de

preservação permanente, necessária ao uso sustentável dos recursos naturais, à

conservação e reabilitação dos processos ecológicos, à conservação da

biodiversidade e ao abrigo e proteção de fauna e flora nativas.

.................................................................................................................................

§ 2° - A vegetação da reserva legal não pode ser suprimida, podendo apenas ser

utilizada sob regime de manejo florestal sustentável, de acordo com princípios e

critérios técnicos e científicos estabelecidos no regulamento, ressalvadas as hipóteses

previstas no § 3° deste artigo, sem prejuízo das demais legislações específicas.

O citado art. 16 estabelece as seguintes porcentagens mínimas da área de reserva legal:

.................................................................................................................................

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- Vinte por cento, na propriedade rural situada em área de floresta ou outras

formas de vegetação nativa localizada nas demais regiões do País.

A localização da reserva legal não é de livre escolha do proprietário da área, mas deve

ser aprovada pelo órgão ambiental estadual competente.

9. O art. 44 da Lei 4.771/65 com a redação dada pela MP estabelece que, caso a reserva

legal existente numa propriedade seja inferior ao estabelecido, ou já não mais existir,

seu proprietário deverá:

- recompo-la mediante o plantio, a cada 3 anos, de no mínimo 1/10 da área total

necessária a sua recomposição;

- possibilitar sua regeneração natural; ou

- compensar a reserva legal por outra área equivalente em importância ecológica e

extensão, desde que pertença ao mesmo ecossistema e esteja localizada na mesma

micro-bacia, conforme critérios estabelecidos em regulamento.

Seu § 4°, acrescentado pela MP merece maiores comentários. Diz ele que:

Em se tratando de reserva legal a ser instituída em áreas já comprometidas por usos

alternativos do solo, o proprietário poderá optar, mediante aprovação do órgão

federal de meio ambiente, pela sua compensação por outras áreas, desde que

pertençam aos mesmos ecossistemas, estejam localizados dentro do mesmo Estado e

sejam de importância ecológica igual ou superior a da área compensada.

10. A lei 4771/65, com as alterações que foram sendo introduzidas por medidas

provisórias, exige a averbação da reserva legal à margem da inscrição de matrícula do

imóvel, no registro de imóveis competente, sendo vedada a alteração de sua

destinação, nos casos de transmissão, a qualquer título, ou de desmembramento da

área.

11. Com a redação dada pela MP n. 1.956-54, de 21.09.00, estabelece no seu art. 14:

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Além dos preceitos gerais a que está sujeita a utilização das florestas, o poder

público, federal ou estadual poderá:

.................................................................................................................................

b) proibir ou limitar o corte das espécies vegetais raras, endêmicas, em perigo ou

ameaçadas de extinção, bem como as espécies necessárias a subsistência das

populações extrativistas, delimitando as áreas compreendidas no ato, fazendo

depender de licença prévia, nessas áreas, o corte de outras espécies.

B) SOB O PONTO DE VISTA DA LEGISLAÇÃO DO ESTADO DA BAHIA

Comentários sobre o Decreto 6.785 de 23 de Setembro de 1997

Regulamento da LEI 6.569 de 17 de janeiro de 1994

1. Toda propriedade deve possuir no mínimo 20% de RL – Reserva Legal, a ser averbada

às margens do registro do imóvel no cartório da comarca, a qual o mesmo está

submetido. Art. 19 §1º e Art. 20;

2. Além das RL’s, deve -se efetuar o levantamento das APP’s – área de preservação

permanente, as quais devem ser definidas obedecendo aos critérios do Art. 4º;

3. As RL’s independem das APP’s, exceto nos casos em que estas representarem uma

parcela muito significativa da área total do imóvel, aí então a SFC – Superintendência

de Desenvolvimento Florestal e Unidade de Conservação, estabelecerá critérios para a

inclusão das APP’s nas RL’s. Nos casos de pequenas propriedades rurais, qualquer

remanescente da vegetação natural, bem como maciços de porte arbóreo, seja frutífero

ou ornamental, podem ser computados para formação do limite mínimo (20%) da RL.

Art. 19 §3º;

4. Todas as restrições das APP’s servem para as RL’s. Art. 19 §3º;

5. Os proprietários ficam obrigados a recompor, em suas propriedades as APP’s e RL’s,

quando estas forem degradadas. Esta recomposição pode ser realizada com espécies de

valor econômico, como frutíferas e/ou exóticas ecologicamente adaptadas. Art. 21;

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6. 50% da propriedade, excetuando-se as RL’s e APP’s, destina -se exclusivamente ao

uso alternativo do solo enquanto os outros 50% são exclusivamente para exploração

florestal. Art. 22 e Art. 45.

7. Em resumo, nas APP’s e RL’s com vegetação primária, estádios médio ou avançado

de regeneração, o uso alternativo do solo (ou alteração do uso do solo) é proibido.

Comentários sobre o decreto 6.785 de 23 de setembro de 1997

Regulamento da LEI 6.569 de 17 de janeiro de 1994

Amparados pela MP 1.956-54 de 21/09/2000

1. Áreas de preservação permanente e de reserva legal que foram degradadas estão à

obrigatoriedade da recomposição, podendo ser com espécies arbóreas de interesse

econômico desde que sejam ecologicamente adaptadas e a mesma não seja promovida

como monocultivo ou cultivo consorciado, ficando o corte raso proibido. (vide art. 21

do decreto 6.785 de janeiro de 1997). Entretanto para tal faz-se necessário um

diagnóstico das referidas áreas de preservação permanente e reserva legal, para que

alguns produtores não venham a degradá-las e sob o argumento da recuperação,

promover um sistema agroflorestal com espécies de conveniência pessoal, pois a

constatação de tal ato caracterizará má fé e, portanto infração à lei.

2. As práticas de manejo de caatinga e cerrado (raleamento), para aproveitamento de

pastagem natural (prática silvopastoril), como é recomendado por diversos autores,

principalmente na ovino-caprinocultura, em que 30% da alimentação concentra-se no

extrato herbáceo, não poderão exceder os 50% da área total excetuando-se a área de

preservação permanente e a reserva legal, pois esta é uma prática de supressão vegetal.

(art. 45 do Decreto 6.785 de 23 de janeiro de 1997).

No período de 14 de julho a 6 de agosto de 2003 foram propostos através de diferentes

setores do estado da Bahia, algumas diretrizes para a elaboração da lei ambiental do

referido Estado. Foram destacados os seguintes questionamentos/posicionamentos:

• A legislação florestal do Estado é rica em disposições sobre florestas plantadas

(caráter econômico dos recursos florestais), porém deveria ser mais consistente quanto

às florestas nativas, inclusive no que se refere às possibilidades de seu uso;

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• O cerrado e a caatinga deveriam receber o mesmo nível de proteção que o existente

para a mata atlântica;

• Aquele que requerer um empréstimo para a produção deveria receber uma quantia

para recuperar a vegetação (APP, mata ciliares, reserva legal), mediante comprovação

do que efetivamente realizou;

• Criação de fundo florestal, ICMS ecológico e outros mecanismos;

• Incentivo à subsistência familiar através da exploração sustentável dos recursos

florestais (apicultura, extrativismo) etc.;

• Realização de estudos visando alternativas de baixo custo para recuperação de área de

preservação permanente (com nativas, frutíferas);

• A questão florestal deveria ser encarada como forma e oportunidade de inclusão

social, permitindo a geração de emprego, elevação de renda e melhoria da qualidade

de vida. (Dificuldades de acesso aos instrumentos creditícios à população de baixa

renda);

• Criação de estímulos creditícios e tributários compatíveis com a questão econômica,

social e ambiental. (Atualmente existem 17 tipos de tributos incidentes na área

florestal, o que acaba estimulando a clandestinidade de atividades no setor florestal);

• Plano de manejo contemplando não só a vegetação como também a fauna;

• Disciplina e gestão da fauna pelo Estado. A análise dos aspectos florestais, por parte

do Estado, fica incompleta sem o exame da fauna.

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5. COMO CRIAR DENTRO DA CAATINGA

5.1. MANEJO DE CAPRINOS

Verificamos que o modelo atual da pecuária caprina dentro da caatinga não é

sustentável, Drumond et al. citados por Tabarelli et al. (2004) dizem, com muita propriedade,

que “a vegetação natural sofre uma grande pressão e com isto a biodiversidade termina sofrendo

uma grande perda”. Entretanto, e xistem causas que podem ser controladas e a principal delas

está exatamente na área administrativa e técnica.

Antes de qualquer iniciativa quando se deseja criar, deve-se preliminarmente fazer-se

uma avaliação do potencial da caatinga, com a identificação das espécies forrageiras

principalmente nos sítios de pastagens; levantamento das alternativas de suplementação

alimentar volumosa e concentrada; zoneamento agroecológico; e, providencias estrutural para

melhor cuidar da sanidade dos caprinos.

A falta de cuidados para com os caprinos pode levar a doenças prejudiciais à fauna e a

flora silvestres, aos demais animais domésticos e ao próprio homem. A carga excessiva de

animais tem efeitos marcantes para a população de animais e plantas da caatinga. As

populações de animais silvestres sofrem uma intensa competição e muitos poderão ser extintos.

As pastagens da caatinga têm capacidade de suporte variável. Alguns órgãos

trabalham com o indicador 0,35 U.A., para a caatinga em condições normais de pastoreio.

Porém, outros órgãos apontam índices muito aquém ou muito além. Quanto a estes dados não

existe um consenso, pois o técnico extensionista trabalha com diferentes tipos de caatinga.

Alguns extensionistas, embora sabendo da complexidade da questão não dispõem de outras

alternativas para que se possa fazer uma avaliação mais consistente. Porém, afirmamos que é

uma questão onde se requer um estudo local mais aprofundado e não generalizado como muitos

pensam. Concordamos que estes indicadores sejam propostos para uma caatinga em pleno

equilíbrio, servindo apenas como parâmetro de estudo, onde deve ficar bem explícita esta

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condição entre os técnicos extensionistas que deverão sempre fazer as perguntas: Este indicador

é para ser aplicado em qual região? Em qual município? Em qual imóvel?

Os índices calculados em algumas amostras de campo em diferentes áreas de criação,

revelam lotações muito acima dos indicadores recomendados, o que é muito preocupante.

5.1.1. Considerações sobre a genética

Dantas, proprietário da Fazenda Carnaúba em Taperoá, PB, citado por Cerri (2000),

comenta que, quando se fala em caprinocultura, a primeira providencia é buscar raças puras. A

importação maciça ele considera uma insensatez econômica, uma temeridade genética. Ele acha

que constitui um retrocesso e que é desperdiçar-se centenas de anos de degeneração metabólica

que redundou na adaptação das nossas nativas ao ambiente sertanejo. Diz que na Fazenda

Carnaúba, o que se tenta fazer, há mais de 20 anos, é o roteiro inverso. Resgatar as raças do

sertão, como a parda sertaneja, a moxotó, a graúna e a azul. É preservar-se essa mina de

rusticidade à beira da extinção e identificar sua homologia européia. Aí sim, dar uma passada de

sangue com raças puras correspondentes. Só para melhorar a aptidão leiteira dos animais.

FIG. Nº 8 - CAPRINO MELHORADO NA FAZENDA CARNAÚBA

Fonte: Revista GLOBO RURAL, fev.2000.

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Dantas ainda afirma que ha dez anos virou moda cruzar nativas com anglo-nubianas.

Maciçamente. Ele diz que isto não é melhoramento, é cruzamento absorvente, perda de

rusticidade, um crime genético. Na Carnaúba ao contrário, busca-se conciliar as funções de

rusticidade e leite, mas com prioridade para a primeira. Se ela se perder, a cabra deixa de ser

viável na caatinga.

Cremos que estas considerações de Dantas, têm um grande fundamento, pois, Sampaio

et al. (1984) salientam que este grupo de caprinos nativos, aonde ele inclui também as raças

marota, canindé e repartida, foram formados a partir da aclimatação degenerativa hereditária de

raças européias importadas da Península Ibérica na época da colonização. Dizem que são

animais de pequeno porte e que isto não constitui, absolutamente, demérito, e que estão

suficientemente ajustadas ao ambiente tropical nordestino. São raças que, por falta de seleção e

em regime alimentar precário, diminuíram de tamanho e produção, para alcançarem o equilíbrio

com o meio em que vivem. Em resumo, sofreram redução nas aptidões fisiológicas, para

atingirem o nível de sobrevivência desejável, com o ambiente.

Consideraram na época de publicação desta matéria que era discutível se, em curto

prazo, uma bem conduzida “pressão de s eleção”, pudesse, efetivamente, realizar gr andes

progressos nos aspectos, velocidade de crescimento e produção de leite.

Também quanto ao tamanho, acrescentam que, a pequenez destes caprinos permite a

manutenção de maior numero de animais por unidades de área de pasto, até certo ponto

compensatório, quando comparadas às raças de maior porte.

Na Fazenda Carnaúba, Dantas afirma, que o melhoramento genético destas raças para

a produção de leite, que a princípio em 1975 produziam meio litro de leite/ dia, hoje já atinge a

média de 1,55 litro/dia a 1,60 litro/dia em anos melhores de inverno. Só com uma passada

criteriosa de sangue das homólogas e a melhoria de manejo. Mas que a preferência continua

sendo a rusticidade. E acrescenta: “Prefiro um animal que produza menos e paste na caatinga a

um recordista de gaiola que precisa ser tratado na boca”.

5.1.2. Alimente-os bem

Um bom manejo alimentar é fundamental. Os caprinos necessitam receber uma

alimentação adequada em quantidade e qualidade durante todo o período do ano. Em uma

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criação ultra-extensiva esta condição foge ao controle do criador. Já num sistema semi-

intensivo os animais ao receberem a suplementação alimentar no cocho, diariamente,

acostumam-se com esta rotina e constantemente estarão visitando o curral e são fáceis de serem

observados e supridos suas necessidades em remédios, sais minerais e deficiências de

forrageiras mais adequadas à alimentação.

Sampaio et al. (1984) dizem que a vocação tropical é para a produção de forragem rica

em fibras (lignina) distintas das condições de clima temperado, onde o pasto produzido tem

melhores índices de proteína e menor teor de fibras. Assim, as forragens nos trópicos são menos

ricas em proteínas e fósforo. Daí a necessidade de suprirmos estas necessidades através de uma

alimentação rica destes componentes. O uso indiscriminado de concentrados é antieconômico,

pois, encarece muito o manejo além de provocar modificações no aparelho digestivo. Devemos

enfatizar, portanto, o uso de plantas com maior valor protéico, como é o caso das leguminosas.

As cabras são consideradas por muitos como sendo normalmente animais sociáveis,

mansos, inteligentes, limpos, rústicos e obedientes, entretanto, quando lhes faltam alimentos são

inquietos e difíceis de serem contidos e são capazes de encontrar o primeiro buraco numa cerca

deixado por um criador desprevenido, indo invadir e destruir a roça do vizinho. Um animal bem

alimentado é muito difícil de adoecer e é também muito mais dócil.

A deficiência de sais minerais constitui um problema grave. A mistura mineral

oferecida aos caprinos deve conter todos os macro e microelementos necessários.

A SEGUIR FORNECEMOS ALGUMAS RECOMENDAÇÕES DE PRÁTICAS DE

ALIMENTAÇÃO QUE IRÃO AJUDAR O CRIADOR NUM SISTEMA SEMICONFINADO:

• O uso de pastagem natural é de grande utilidade na criação de caprinos, porque reduz o

custo de produção. A manipulação e o manejo da caatinga são práticas muito indicadas.

• A mineralização do rebanho é uma prática indispensável para quem deseja ver um

rebanho saudável.

• As pastagens cultivadas constituem uma das formas para o aumento da produção. O uso

destas pastagens, para pastejo direto, produção de feno, capineiras para produção de

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silagem, de cactáceas e banco de proteínas, são indispensáveis nas épocas de

dificuldades de alimentos.

• A capineira deve constituir parte importante do esquema de volumosos suplementares e

garantia para o período de estiagem. Pode ser consumida na forma verde ou conservada

como silagem.

• O sorgo (Sorghum vulgare) é uma ótima alternativa de alimento. É cultivado na época

da chuva e conservado em forma de silagem para o período de estiagem.

• A palma (Opuntia sp.) é uma das forrageiras importantíssimas pela sua alta produção e

resistência à seca. Por conter 90% de umidade contribui na suplementação de água.

Deve ser utilizada com fenos, palhadas e outros alimentos de baixa umidade para elevar

o teor na matéria seca da dieta.

• A melancia de cavalo (Citrillus lanatus) tem uso semelhante ao da palma, pelo seu alto

teor em umidade.

• A maniçoba (Manihot glaziovii) deve ser usada como feno, que é de excelente qualidade

e também como silagem, porém, tanto uma forma como a outra, constituem processos

que requerem certa experiência devido o seu uso ser um tanto complicado, e sendo

usados sem critério técnico poderá intoxicar o animal.

• No período seco devem-se utilizar restos de cultivo de milho, feijão, mandioca e outros.

• Também é recomendado como alimento o milho hidropônico. Ver PRODUÇÃO DE

FORRAGEM DE MILHO POR HIDROPONIA, apêndice II.

• Utiliza-se também o resíduo do desfibramento do sisal, muito comum no município de

Araci e região, em forma de silagem e desidratado, na alimentação de caprinos em

crescimento.

A PRODUÇÃO DE LEGUMINOSAS É MUITO IMPORTANTE PARA A MELHORIA

DA QUALIDADE DA ALIMENTAÇÃO.

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• A leucena (Leucaena leucocephala) pode ser usada em pastejo direto (banco de

proteínas), em produção de feno, silagem ou verde no cocho.

• A algaroba além de produzir vagem de grande valor nutritivo, também produz madeira

para moirões e estacas. A produção maior de vagem se dá no período da seca.

• A cunhã (Clitoria ternatea) é utilizada em consórcio, pastejo e corte.

• O feijão guandu (Cajanus cajan) é utilizado em corte, principalmente para a produção

de feno.

• A gliricídia (Gliricidia sepium) é utilizada na forma de feno ou fornecida verde.

• O siratro (Macroptilium atropurpureus) é utilizado em consórcio com o capim.

A SILAGEM É UMA FORRAGEM ÚMIDA, FERMENTADA E CONSERVADA EM

RECIPIENTE DENOMINADO SILO.

A forrageira está no ponto de corte quando apresenta bom valor nutritivo e volume de

massa, o que, nas capineiras, corresponde a uma altura de 1,60 metros. O material colhido é

transportado para serem picados em picadeiras motorizadas. Às vezes é picado direcionado para

o silo ou transportados em sextos para o enchimento dos silos. No processo de ensilagem a boa

compactação do material é muito importante, pois visa expulsar o ar contido neste. Com a

presença do ar, a silagem pode ficar inaproveitável. A silagem deve ser vedada completamente,

usando lonas plásticas, para a sua conservação. O silo deve ser protegido contra o acesso de

animais, para não danificar o plástico e estragar a silagem.

É sabido que no semi-árido existe pouco alimento para os animais, porém, temos

verificado um grande desperdício como o observado na figura nº 9, onde vemos ovelhas

comendo superficialmente o resíduo novo resultante do desfibramento do sisal. A parte que fica

embaixo da pilha, apodrece e fica imprestável como alimento, aproveitando-se como adubo

orgânico o que normalmente poderia servir como silagem a ser consumida em época de seca.

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FIG. Nº 9 – DESPERDICIO DO RESÍDUO RESULTANTE DO DESFIBRAMENTO DO

SISAL, ARACI - 2004

FENO É UMA FORRAGEM VERDE DESIDRATADA COM UMIDADE DE 15 a 20%.

O feno pode ser produzido de forrageiras cultivadas ou de pasto natural. A forrageira

está no ponto de corte quando apresentar bom valor nutritivo e volume de massa. Com as

gramíneas isso acontece antes da floração, e, com as leguminosas, quando a floração atinge 1/3

das plantas. Depois de cortadas a forrageira é espalhada no campo ou em terreiros para

desidratar. O material deve ser revirado constantemente. O ponto de feno é quando ao pegar um

feixe e torcer, se sair água o feno ainda não está no ponto; se quebrar passou do ponto. O feno

deve ser enfardado ou ensacado para facilitar o transporte.

5.1.3. Sanidade é essencial

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Sabemos que algumas doenças dos caprinos são transmissíveis a alguns animais da

floresta, a outros animais domésticos e ao próprio homem. Para que isto não ocorra é necessário

cuidarmos para que o plantel tenha um bom manejo sanitário, ver apêndice III-ALGUNS

TIPOS DE DOENÇAS DE CAPRINOS E CONTROLE.

Alguns cuidados na propriedade ajudam a diminuir o número de animais doentes:

• Deixar limpos os chiqueiros e bebedouros das criações;

• Dar sal mineral aos animais;

• Tirar o estrume dos chiqueiros pelo menos três vezes ao ano. As limpezas devem ser

feitas pelo menos no início, no meio e no fim das chuvas;

• Colocar cal na entrada dos chiqueiros para que as criações pisem e evitem a frieira na

época das chuvas;

• Guardar palha de milho e ramas de feijão para dar aos animais no tempo da seca;

• Ter na propriedade alguns remédios para dar às criações quando elas ficarem doentes;

• Criar os animais em chiqueiro grande, para evitar que eles fiquem muito juntos e passem

doenças uns aos outros;

• Ver os animais no chiqueiro todos os dias e tratar dos animais doentes;

• Cuidar das feridas que aparecem nas criações, usando algodão molhado com um

desinfetante (água oxigenada, álcool ou álcool com tintura de iodo). Colocar remédio

para evitar as moscas varejeiras (spray);

• Evitar contato com rebanhos vizinhos, pois os animais podem trazer com eles muitas

doenças e contaminar o rebanho. Observe quadro nº 5.

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QUADRO Nº 5 - CALENDÁRIO DE VACINAÇÃO PARA CAPRINOS

DOENÇAS PERÍODO DE

VACINAÇÃO

ESPÉCIE

VACINADA

LOCAL DE

VACINAÇÃO

CONSERVAÇÃO

Aftosa

(vacinação

obrigatória)

Semestral

(março/setembro)

Caprinos Subcutânea ou

intramuscular

Entre 2 a 8º C

Linfadenite

caseosa

Semestral Caprinos Subcutânea Entre 2 a 8º C

Pasteurelose Anual Caprinos Subcutânea Entre 2 a 8º C

Raiva

(vacinação

obrigatória)

Anual Caprinos Subcutânea ou

intramuscular

Entre 2 a 8ºC

Fonte: SEAGRI/DDA

Obs: Ver apêndice IV – OUTROS MANEJOS IMPORTANTES PARA CAPRINOS.

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6. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Não se pretende que com esta obra se possa apresentar soluções de emergência para se

resolver uma questão tão delicada como o impacto do pastoreio de caprinos na caatinga da

região de Araci. O que mais se deseja neste trabalho, é cooperar para o desenvolvimento de

praticas ambientalmente sustentáveis e o restabelecimento de áreas degradadas.

Este ecossistema, como foi dito, é único no mundo o que constitui mais um motivo

para preservá-lo. A recuperação do bioma somente poderá ser realizada através de

comportamentos renovados, em que é imprescindível a participação da União, do Estado, dos

Municípios e, sobretudo a participação popular.

O que sugerimos como medida mais imediata, é que se elabore um zoneamento

ambiental e um plano de recuperação de áreas degradadas e de manejo da caatinga para fins

pastoris e agrícolas. A prioridade da escolha da região Nordeste da Bahia se justifica acima de

tudo, por ser uma das mais secas e das mais degradadas do Estado nestas modalidades de

impactos, merecendo das autoridades uma atenção especial.

Os métodos tradicionais de criação como o ultra-extensivo e o extensivo propriamente

dito, deverão ceder lugar a técnicas mais adequadas. Não se pode conceber que a caatinga seja

explorada, ignorando-se que este ecossistema constitui um bem esgotável, que suprimido irão

também juntos uma cultura e um povo.

Vimos que os sítios de pastagens, ao terem as espécies desejáveis e as espécies menos

desejáveis impactadas com o pastejo intensivo, imediatamente, aparecerão às plantas

indesejáveis ou invasoras que dominam toda a área e que não servem como alimento para os

animais. Com isto, o criador e sua família ficam com a caatinga degradada e sem terem aonde

criarem seus animais. Não possuindo alternativas, abandonam o local e se mudam para o Sul,

por já não existir o seu gado magro para venderem por qualquer preço em época de seca, como

seu último recurso de sobrevivência. Restando-lhes apenas a terra erodida, abandonada em

pleno sertão esturricado. Surge mais uma área desertificada.

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É necessário que estes sítios de pastagens sejam recuperados, através do

enriquecimento com espécies forrageiras específicas de cada sítio, não só pelos benefícios

ambientais e sociais, mas também, para o aumento da eficiência produtiva da caatinga.

Até mesmo, por uma questão de consciência, chega a ser constrangedora a forma

como os animais são criados: ficam sujeitos ao relento, passam fome principalmente em época

de seca e ficam predispostos a todo o tipo de doenças, transmitindo-as para os demais animais

da floresta e ao próprio homem.

Acreditamos plenamente que um planejamento no manejo tanto da caatinga como dos

caprinos; O estímulo que poderemos dar ao cultivo de frutas nativas de sabores diversificados e

inigualáveis (primeiramente no campo do melhoramento destas fruteiras, depois se buscaria

alternativas de atingir mercados para se colocar tais produtos); a forragem que se pode produzir

com nossas cactáceas e outras forrageiras podendo tornar o município de Araci e região um

grande pólo forrageiro; o estabelecimento de estudos mais aprofundados que deveremos adotar,

antes de recomendarmos a introdução de plantas exóticas, resultando num comprometimento da

caatinga; Com estas alternativas, e mais, outras que poderão surgir, poderemos dar a trégua

merecida à caatinga, até que a mesma se recomponha e possa ser mais útil ao homem.

Neste particular, sugerimos aos órgãos de pesquisa e extensão que intensifiquem seus

experimentos e seus esforços de forma mais integrada. É muito importante que quando os

técnicos de qualquer das duas áreas saiam a campo sempre troquem idéias entre si. Temos

observado ao longo do tempo que pesquisa e extensão trabalham isoladamente. Com esta

iniciativa de um trabalho conjunto temos a certeza de que irão resultar em frutos valiosos para a

melhoria ambiental. Esta nossa sugestão, aliada a uma política correta por parte dos demais

órgãos governamentais, irá melhorar também os inconvenientes de uma baixa produção,

contribuindo sobremaneira para o aumento da renda familiar, e do padrão de vida do homem

sertanejo.

Os municípios deverão incluir em seus orçamentos, projetos de recuperação dos sítios

de pastagens, fomentando-os com a ajuda necessária dos demais níveis de governo, com

formação de mudas de plantas nativas; não só forrageiras, como também as fruteiras, como o

pirí, o cambucá, o araticum e tantas outras, para serem distribuídas e plantadas com a

participação da população. Outras atividades paralelas como programas de educação ambiental

e formação de bancos de sementes, também deverão ser igualmente estimulados.

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Não constitui nenhuma novidade que muitos criadores também exploram

indevidamente áreas de APP’s e AR’s. Na maioria das vezes não é desrespeitando as leis , e sim,

porque desconhecem a proibição. É necessário traçarmos programas de conscientização neste

campo.

A rotação dos caprinos em piquetes muitas vezes não é feita. E às vezes nem se pode

fazer, devido ao tamanho limitadíssimo dos imóveis. O produtor, nestas condições, deverá optar

para criatórios também adaptados ao tamanho do imóvel. O desgaste das vegetações nas

pequenas, médias e grandes propriedades, advindas dos sucessivos pastoreios ao longo do

tempo, concorre para que os sítios de pastagens, mais propriamente nos pequenos imóveis onde

os impactos são sempre maiores, fiquem completamente infestados por plantas invasoras.

Muitos outros fatores nos levam a crer que os recursos às vezes fáceis, que chegam às

mãos de proprietários sem a devida orientação técnica, fazem com que as inconveniências no

setor agrícola, principalmente nos minifúndios, concorram para um lógico desespero dos

mutuários na hora de saudarem seus débitos, contribuindo sobremaneira para a infeliz situação

também dos próprios agentes financeiros.

Os caprinos necessitam de espaço para terem um manejo adequado, se isto não é

possível em algumas propriedades, deve-se mudar o sistema de criação, ou isto implicará,

inevitavelmente, num fato gerador de grandes inconformidades.

Quando os caprinos são mantidos sob pastejo controlado, isto é, comendo amarrados,

comumente denominados animais de corda, muitos inconvenientes de se criar em uma área

muito restrita desaparecerão. Vale uma sugestão para que os órgãos de financiamento estudem a

possibilidade de financiarem de forma desburocratizada mesmo a quem não possua

propriedade, mas que tenha um lugarzinho cedido por um vizinho com a finalidade de amarrar

suas cabras. Só que estes animais deverão receber alimentação suplementar quando retornarem

ao chiqueiro, tendo muitas vezes o “sem terra”, a necessidade de formar p arcerias com o

visinho para em processo conjunto, efetuarem suas criações.

Este sistema favorece o plantio de lavouras em pequenos imóveis sem que estes

animais possam importunar, além de não necessitar de construções de cercas internas para

manejo dos mesmos. Com estes custos diminuídos é bem provável que estes mini-investidores

obtenham algum lucro, tornando-se uma atividade economicamente viável, além de evitar-se o

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êxodo rural tão temido pelos governos das metrópoles. Entretanto, tudo isto deverá passar pelo

crivo da observação da pesquisa e não introduzida de forma aleatória.

Como a região de Araci contém muitos minifúndios e pequenas propriedades, o

sistema de manejo agrossilvipastoril é uma alternativa que pode ser também introduzida, porém

observando-se os inconvenientes de se adotarem a incorporação de plantas exóticas. Por outro

lado, as frutas tropicais, conceituadas nos mercados interno e externo, mereceriam uma especial

priorização em seus cultivos, pois, acredito que irá alicerçar a economia do sertanejo juntando-

se para isto, naturalmente, uma efetiva conquista de mercados.

Se as fruteiras tropicais nativas da caatinga, por qualquer motivo que se alegue,

principalmente o de não servirem como alternativa econômica ou social, no conceito de muitos

que apressadamente assim o justifique, ao menos, o seu plantio, com certeza trará a tarefa nobre

na alimentação dos animais silvestres, muitos em processo de extinção, que, sem estes, a vida

no planeta se tornará difícil de viver e também menos humana.

Também como resultado de nossas observações e com base nos questionamentos

dirigidos aos produtores rurais do município de Araci, chegamos às seguintes

conclusões:

1. A caatinga em Araci (município tomado como referência de estudo da região Nordeste

da Bahia) vem sofrendo vários impactos motivados pela superlotação das pastagens;

processo que vem sendo acelerado pelo grande número de minifúndios e pela falta de

um manejo adequado, tanto das pastagens quanto dos animais.

2. Os caprinos também são criados nas RL’s e APP’s, sem que haja a observância das

restrições de utilização de uso destas áreas.

3. Não é compatível com a realidade a quantidade de caprinos criados soltos na caatinga,

destinados à manutenção de uma família; os minifúndios limitam esta possibilidade.

Os produtores se excedem na quantidade destes animais nas pastagens, indo além de

suas capacidades de suporte, no afã de um retorno econômico compensador, o que

acaba por degradar a caatinga. Faz-se necessário urgentemente o recurso de ajustes

fundiários.

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4. A caatinga deve ser definida como ecossistema prioritário a fim de ser mais bem

assistida.

5. O atual modelo não é sustentável, para tanto, medidas deverão ser adotadas, como:

• Treinamento e capacitação dos criadores;

• Práticas de manejo sustentável da caatinga;

• Práticas de manejo adequado dos rebanhos;

• Adoção de políticas públicas como: planejamento e fiscalização do uso da

caatinga; zoneamento ambiental; recuperação de áreas degradadas; educação

ambiental; desenvolvimento da pesquisa; criação de fundo florestal, ICMS

ecológico e outros mecanismos; apoio técnico e creditício aos pequenos e

médios produtores; averbação das RL’s no cartório das comarcas;

intensificação do processo de licenciamento ambiental; criação de espaços

territoriais especialmente protegidos; perda ou suspensão de participação em

estabelecimentos oficiais de crédito; uso mais intenso do instrumento de

avaliação de impacto ambiental; compatibilização do uso e ocupação do solo

em relação aos aspectos econômico, social e ambiental; plano de manejo

contemplando também a fauna; dentre outras medidas.

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APÊNDICE I

POTENCIAL FORRAGEIRO DA CAATINGA

A caatinga é muito rica e diversificada em plantas forrageiras. O produtor deverá conseguir

mudas ou sementes destas plantas e de acordo com a aptidão dos sítios de pastagem realizarem

a regeneração destas áreas que estiverem degradadas. Entre as inúmeras espécies se destacam:

QUADRO Nº 6 – ALGUMAS FORRAGEIRA DA CAATINGA

NOME VULGAR NOME CIENTÍFICO

Angico Anadenanthera macrocarpa Benth Pau-ferro Caesalpinia férrea Mart. ex.Tul Catingueira, a catingueira-rasteira Caesalpinia microfila Mart Canafístula Senna spectabilis var. excelsa Sharad H.S. Irwine § Barnely Marizeiro Geoffraea spinosa Jacq Jurema-preta Mimosa tenuiflora Wild. Poiret Sabiá Mimosa caesalpinifólia Benth Rompe-gibão Pithecelobium avaremotemo Mart. Mororó Bauhinia sp. Juazeiro Zizyphus joazeiro Mart Engorda- magro Desmodium sp Feijão–bravo Capparis flexuosa L Marmelada–de–cavalo Desmodium sp. Mata-pasto Senna sp Urinárias Zornia sp Mucunãs Stylozobium sp. Cunhas Centrosema sp. Jurema–branca Acacia bahiensis Benth Unha - de – gato Acacia langsdorfii Benth Monzê Albizia polycephala, Benth. killip Miroró Bauhinia cheilantha, Bong. Steud Catinga – de – porco Caesalpinia pyramidalis Tul Feijão - de – porco Canavalia cictyota Piper Camaratuba Cratylia mollis Mart. ex Benth Mucunã Dioclea grandiflora Mart. ex Benth Calumbí Mimosa arenosa Willd Poir Jurema–cor–de-rosa Mimosa gemmulata Barneby Angico–de–bezerro Piptadenia moniliformis Benth Carrancudo Poecilanthe ulei Harms; Arroyo & Rudd

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Canjuão Senna macrathera Collad; H.S.Irwin & Barneby Canjuãozinho Senna rizzinii H.S. Irwin & Barneby Carrapicho-amarelo Aeschynomene mollicula Kunth Mata–pasto–branco Crotalaria holosericea; Nees & Mart Desmanto Desmanthus virgatus L. Wild Feijãozinho – bravo Galacthia jussiaeana Kunth Feijão–de–rama Galactia remansoana Harms Feijão - de - rola Macroptilium lathyroides L. Urb Orelha-de-onça Macroptilium martii Benth; Marechal & Baudet Jequitirana-vermelha Periandra coccínea; Schrad. Benth Arroiozinho Zornia myriadena

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APÊNDICE II

PRODUÇÃO DE FORRAGEM DE MILHO POR HIDROPONIA

Fonte: EMATER-RN

CANTEIROS:

5 metros de comprimento com declividade 4 a 8%; 1,2 metros de largura; 5 cm de

profundidade; enchimento com terra batida, sendo a última camada de areia fina; forrar o

canteiro com lona plástica.

SUBSTRATO:

Capim seco elefante, palha de milho, sorgo, raspas de mandioca, bagaço de cana, feno.

PLANTIO:

Colocar o milho de molho durante 24 horas;

Fazer a cama de 2 cm de espessura sobre o piso forrado com plástico;

Molhar bem o substrato;

Distribuir 2,5 kg de sementes de milho por metro quadrado;

Cobrir com outra camada do substrato;

Deixar dois dias sem molhar com a solução nutritiva;

Irrigar com a solução nutritiva a partir do 3º dia, quando já aparecem as raízes.

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SOLUÇÃO NUTRITIVA

FÓRMULA “A” – MACRONUTRIENTES

340 gramas de fosfato de amônia;

2.080 gramas de nitrato de cálcio;

1.100 gramas de nitrato de potássio;

10 litros de água.

FÓRMULA “B” – MICRONUTRIENTES

492 gramas de sulfato de magnésio;

0,48 gramas de sulfato de cobre;

12,48 gramas de sulfato de manganês;

1,20 gramas de sulfato de zinco;

6,20 gramas de ácido bórico;

0,02 gramas de mobilado de amônia;

15 gramas de quelato de ferro;

4 litros de água.

IRRIGAÇÃO (por aspersão ou regador)

1,25 ml da fórmula “A” e 0,50 ml da fórmula ”B” para cada litro de Água;

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Molhar com solução nutritiva 4 vezes ao dia; se o dia estiver muito quente, molhar

outras vezes com água pura;

Colheita 14 a 15 dias após o início do trabalho, ou seja, após se colocar o milho de

molho.

Produtividade; 130 kg por canteiro de 5 metros.

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APÊNDICE III

ALGUNS TIPOS DE DOENÇAS DE CAPRINOS E CONTROLE

ABORTOS NÃO INFECCIOSOS – Provocados por fatores ambientais adversos acarretando

alterações nas glândulas endócrinas maternas, as causas são: carência de iodo e manganês,

ingestão de plantas tóxicas ou de alimentos mal conservados, traumatismos provocados por

chifradas, má nutrição e administração de certos anti-helmínticos no final da gestação.

ABORTOS INFECCIOSOS – Ocasionados por toxoplasmose, leptospirose, brucelose e

micoplasmose.

AFTOSA - O agente é um vírus. O vírus aparece nas excreções e secreções. Aconselha-se

proceder à separação entre bovinos, suínos e caprinos; bem como, vacinar semestralmente os

animais. O que é uma obrigação.

ANEMIA – Mucosa da boca, vagina, conjuntivas pálidas; Edema entre as mandíbulas. Tratar

das causas da anemia, combater verminose, ectoparasitos, piroplasmose.

APARELHO GENITAL DO MACHO – Pode surgir degeneração testicular, hipoplasia

testicular, criptorquitismo, atrofia testicular, granuloma espermático e funiculite, dentre outras.

APARELHO GENITAL FEMININO – Também podem surgir: Vulvite, vaginite, cervicite,

metrite, piometria, perimetrite e salpingite. Podem ocorrer em cabras, geralmente resultantes de

complicações do parto. Ocorrem também em cabras, afecções do ovário podendo se constituir

de atrofia e presença de corpo lúteo persistente. Tumores do aparelho genital e torção do útero.

São relatados como raros na espécie caprina.

BERNE, BICHEIRA E MIÍASE – são larvas de moscas conhecidas por varejeiras que atacam

as feridas dos animais, Existe a formação de abcesso e formação subcutânea de larvas. A mosca

do berne é também conhecida como mosca berneira. Aplicar bernicidas, principalmente

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fosforados, manter pastagens e instalações limpas. Pode-se tirar todos os bichinhos de dentro e

trata-la com azeite de castanha de caju.

BEXIGA – São carocinhos que nascem no couro cabeludo do animal. Vender os animais para o

abate é a solução.

BRUCELOSE – Aborto, retenção de placenta, esterilidade. È bom ao adquirir matrizes, fazer o

teste de brucelose (soro aglutinação). Não existe tratamento para brucelose. Deve-se fazer a

vacinação das fêmeas com 3 a 8 meses de idade.

CAEV – Artrite encefalite virótica caprina – Articulações inchadas (joelhos) contendo líquido,

causando febre e paralisia. Não existe tratamento. Separar recém nascidos das mães suspeitas,

logo após o nascimento. Administrar leite e colostro pasteurizado. Quarentena nos animais a

serem adquiridos.

CALCULO RENAL – Alta concentração de fósforo, presença de sílica na ração,etc. Espádua

encurvada, membros posteriores rígidos, dores, chegando a complicações quando da obstrução

da uretra causando inclusive a morte. Aplicação de cloreto de amônia.

CARBUNCULO SINTOMÁTIOCO – Tumores crepitantes nos quartos, peito e faringe,

claudicação. No início pode haver cura com a aplicação de antibióticos. Incisão e desinfecção

dos tumores com água oxigenada. Vacinar os animais com 4 a 6 meses de idade, revacinando-

os com 1 ano.

CASPAS DO OUVIDO – A caspa aparece nas orelhas da criação. Embaixo destas caspas tem

uns bichinhos que irritam a pele e a orelha fica susceptível à bicheira. Tire as caspas com

algodão molhado em água oxigenada, álcool ou álcool com tintura de iodo; depois coloca-se

spray. Repetir o tratamento até sarar.

COLIBACILOSE – O agente causal é a ameba coli habitante do trato digestivo. Diarréia,

desidratação, coma e morte. As instalações deverão ser limpas e desinfetadas; o tratamento é

preventivo através de vacinas. E a cura através de antibióticos.

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ECTIMA CONTAGIOSA – Boqueira – Ataca ao redor da boca e gengivas dos cabritos e

também o úbere das cabras. O tratamento é remover as cascas secas e passar um algodão

molhado com uma mistura de álcool, tintura de iodo e glicerina, todos os dias até sarar.

EIMERIOSE – Curso negro ou coccidiose – isolar os animais com diarréia sanguinolenta e

proceder ao exame parasitológico e bacteriológico. Usar medicamentos à base de sulfas ou

antibióticos específicos para enterites.

ENTERETOXEMIA – Do trato digestivo dos ruminantes, o agente produz grande quantidade

de toxinas, depressão, incoordenação, andar vacilante, prostração e morte. Deve-se ter um bom

manejo alimentar e divisão dos animais por faixa etária. O controle é feito através da bacterina

feita a partir do próprio material coletado para diagnóstico.

HIPOCALCEMIA – Febre do leite- Perda de cálcio na gestação e lactação.

HIPOGLICEMIA – Deficiência no metabolismo de carboidrato no final da gestação ou início

da lactação. Depressão, andar vacilante, odor de cetona no ar, na urina e no leite.

INTERSEXUALIDADE – Herança de caracteres indesejáveis.

INTOXICAÇÃO POR PLANTAS – Andar cambaleante, tristeza, salivação intensa, respiração

difícil. Medicação antitóxica. Erradicação das plantas tóxicas, isolamento das áreas que contém

plantas tóxicas.

LEPTOSPIROSE – Anemia, aborto. Deve-se eliminar ratos e outros roedores do contato com

animais e alimentos. O tratamento é com antibióticos após teste sorológico.

LINFADENITE CASEOSA – mal do caroço – Trata-se de um micróbio que ataca o animal e o

local atacado se torna inflamado e com pus dentro. Para resolver o problema deve-se cortar o

local e pela abertura retirar todo o pus, depois coloca-se iodo e receita-se antibióticos. É bom

vacinar os animais semestralmente.

MAMITE – Processo inflamatório das tetas dos animais, deixando o úbere endurecido e

avermelhado. O leite apresenta cor amarela, aspecto sanguinolento e sabor amargo. Deve-se

tomar cuidados higiênicos e aplicar pomadas à base de antibióticos. A retirada total do

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concentrado faz-se necessário. As crias devem ser descornadas com 4 a 10 dias de nascidas para

que os seus chifres não traumatizem o úbere da cabra. Deve-se usar o CMT (Califórnia Mamites

Teste), quinzenalmente, Examinar na compra animais de alto valor.

MICOPLAMOSE – Agalaxia contagiosa e micoplasmose – Pouco comum no Brasil ataca as

vias respiratórias. O tratamento é feito à base de antibióticos.

ONFALOFLEBITE – umbigueira – inflamação do umbigo com miíase, Aplicação de larvicida,

antibióticos, desinfecção do umbigo após nascimento com corte do umbigo a 3 cm após sua

secção.

PAPILOMATOSE – constitui lesões localizadas na cabeça, pescoço, espáduas e membros

dianteiros. A vacina constitui prática de controle.

PASTEURELOSE – A doença se caracteriza por pneumonia aguda e pleurisia. Podem ocorrer

dispnéia, tosse e secreção nasal. E importante manter os animais em boa condições nutricionais

e sanitárias. È bom vacinar os animais anualmente, num trabalho preventivo.

PIOLHOS, CARRAPATOS E SARNAS – São parasitas que atacam a pele dos animais,

causando-lhes queda de pêlos e aparecimento de feridas. Deve-se banhar o animal com timbó

ou melão de são caetano, até que ele fique curado.

PNEUMONIA – Secreção nasal, dificuldade respiratória, tosse, cansaço e febre. Tratamento

com antibióticos e quimioterápicos.

PODODERMITE INFECCIOSA – frieira – Caracteriza-se por inflamação dos tecidos sensíveis

da pata, conhecido como podridão dos cascos. Evitar feridas traumáticas, e o tratamento é o

pedilúvio com solução de sulfato de cobre.

POLICEFALOMALÁCIA – Destruição da vitamina “B” devido à ingestão de ração mofada ou

excesso de melaço. Se caracteriza por espasmos convulsão e morte.

RAIVA – Provocada por um vírus é transmitida por morcegos hematófagos. Os animais

morrem dentro de poucos dias com paralisia e excitabilidade. A vacinação é obrigatória, e em

caso de surto esta é aconselhada num raio de 15 km.

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SALMONELOSE – Provoca gastrenterites, com febre e intensa diarréia. O tratamento e

controle é o mesmo para a colibacilose.

TOXOPLAMOSE – Pode ser responsável por abortos, os fetos podem se apresentar

mumificados ou macerados e serem eliminados sobre a forma de restos não identificáveis. A

prevenção é feita afastando gatos e outros felinos da convivência com os caprinos. Pode haver

contaminação do homem através da carne, leite e fezes.

TUBERCULOSE – Aumenta quando os caprinos são mantidos em associação com bovinos

infectados. O controle é feito com isolamento dos suspeitos, desinfecção de cochos e

bebedouros; suspender o aleitamento. O tratamento não é recomendável, aconselha-se o

sacrifício dos positivos.

VERMINOSE – helmintose – É um dos problemas que mais ataca os animais, o cuidado com a

alimentação diminui a ocorrência desse problema. Uma forma de controle é dando a infusão do

alho com leite, semente de mamão torrada e semente de abóbora torrada.

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APÊNDICE IV

OUTROS MANEJOS IMPORTANTES PARA CAPRINOS:

• Não existe um padrão de raça definida para a caatinga o que mais se cria é a

anglunubiana, mambrina e bhuj. Enfatizamos, que as raças nativas são uma grande

alternativa para os criadores.

• Substituição dos reprodutores de 02 em 02 anos.

• As matrizes devem preferentemente estar numa área plana, com pastagem natural ou

cultivada, ricas em gramíneas e leguminosas; isto num pré parto.

• A análise do solo, de forrageiras e da água deve ser feita antes de se prescrever uma

formulação mineral apropriada para os caprinos.

• Os animais devem ser marcados com correia de couro presa ao pescoço, e estas correias

devem ser marcadas com ferro candescente.

• Os machos devem ser castrados com 03 a 04 meses (ha quem recomende com apenas 01

mês de idade). Aplicando-se os métodos ao alcance do produtor, de preferência os

menos dolorosos.

• Fazer limpeza das instalações empilhando o esterco para uso na agricultura, no mínimo

três vezes ao ano (ha quem recomende uma vez por mês), e depois polvilhar com cal

todo o ambiente.

• O umbigo dos cabritos deve ser cortado com tesoura ou gilete limpa, a uns 02 dedos da

cavidade umbilical e desinfetado com tintura de iodo a 10%.

• O cio é o período em que as cabras aceitam ser cobertas pelo bode, e isto ocorre aos 04

ou 06 meses, porém alguns técnicos defendem que o período de cobertura deverá se

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processar somente aos 08 ou 10 meses. Em nossa região as cabras são enxertadas logo

no primeiro cio, pois ficam à vontade entre os reprodutores sem que os criadores se

preocupem em separá-las. Normalmente a repetição entre cios é de apenas 21 dias e a

sua duração é de 01 a 05 dias.

• Após 02 meses se as tetas e o ventre estiverem inchados, a cabra estará prenhe e deve

ser colocada no piquete maternidade.

• Depois de 05 meses após a cobertura chega a hora do parto. A cabra procura um canto

confortável, berra com freqüência, e apresenta o úbere muito inchado. As gestantes

devem ser contidas no piquete maternidade quando forem evidentes os sinais de parto

próximo.

• Após o nascimento, deve-se limpar o cabrito e depois deixa-lo mamar o primeiro leite

que é chamado colostro. As crias devem mamar o colostro nas primeiras horas após o

parto.

• O cabrito deve mamar até 03 ou 04 meses e só deve acompanhar a mãe ao pasto quando

estiver com 20 a 40 dias de nascido. O uso de saltador na porteira do abrigo facilita a

retenção dos cabritos e este tipo de manejo.

• Recomenda-se a divisão do rebanho em três lotes:

a) Reprodutores, matrizes e cabritos até 120 dias.

b) Fêmeas com até 08 a 10 meses ou com 65% do peso vivo das matrizes.

c) Bodecos.

Obs. Existem outras recomendações.

• O capim buffel grass é sempre o mais preferido, mas pode-se plantar o pangola

(Digitaria decumbens), estrela africana (Cynodon plectostachyum), green panic, na

formação da pastagem.

• Ao adquirir um animal, este deve ficar de quarentena em um pasto à parte, e sobre

vigilância para verificar se apresenta algum tipo de doença.

• Os animais doentes devem ficar isolados dos demais, recebendo tratamento adequado.

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• O curral deve ser construído deixando-se dois metros quadrados por cabeça. Quanto aos

apriscos, animais até 08 meses, meio metro quadrado por cabeça, e animais acima de 08

meses 0,8 metros quadrados por cabeça.

• Os saleiros devem ser construídos de pneus, tábuas, troncos escavados, etc., e

pendurados para evitar que os animais subam no cocho.

• Deve-se construir currais para machos e fêmeas.

• Os cochos e bebedouros não devem ser construídos muito longe dos currais.

• O sal mineral deve ser dado à vontade, deixando que os animais limitem o seu uso.

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ANÉXO I

QUESTIONÁRIO APLICADO AOS OVINOCAPRINOCULTORES DO MUNICÍPIO

DE ARACI:

1. Qual o tamanho de seu imóvel e quantos hectares estão destinados à criação e lavoura?

2. Você acha que a caatinga está enfraquecida com os criatórios de cabras, ovelhas e

bovinos?

3. Qual seu sistema de criação?

4. Você tem uma base de quantas cabras ou ovelhas você cria por hectare?

5. Costuma descansar o pasto?

6. a) Se a cabra além da carne fosse melhorada para produzir também o leite, você acha que

criadores de ovinos mudariam a criação para caprinos, já que o costume da região é não se

produzir e nem consumir o leite de ovelha e sim o de cabra?

b) Você mudaria para a criação de caprinos se tivesse conhecimento de um incentivo

financeiro e técnico, para além da carne se produzir também o leite de cabra?

7. Sabe de alguém que cria cabra na corda?

8. Faz o melhoramento do seu rebanho?

9. Você ajuda a caatinga a produzir mais forragens para os seus animais?

10. Já ouviu falar em área de reserva legal e em área de proteção permanente?

11. Você sabia que é proibido explorar essas áreas e degradá-las?

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12. Possui dentro da caatinga algum tipo de aguada para matar a sede dos animais que vivem

lá?

13. Você fornece sal mineral ao rebanho? Qual o tipo?

14. Compra ração no período de estiagem?

15. Qual a raça que você cria? Esta raça é mais adaptada a viver na caatinga?

16. a) Que acha de enriquecer a caatinga com forrageiras e plantas frutíferas da própria

caatinga?

b) Se produzir frutas próprias da caatinga é fácil de comercializá-las?

17. Já ouviu falar em rebaixamento, raleamento e enriquecimento da caatinga?

18. Além das criações você também planta lavouras? Quais?

19. Sabia que se não tivermos cuidado a caatinga poderá deixar de existir?

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ANEXO II

Nordeste

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ANEXO III

Araci

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