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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ FELIPE GORGES CORRÊA BENEFÍCIO ASSISTENCIAL (LOAS): A ANÁLISE DO CRITÉRIO DA RENDA PER CAPITA FRENTE AO PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA Biguaçu 2008

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ

FELIPE GORGES CORRÊA

BENEFÍCIO ASSISTENCIAL (LOAS): A ANÁLISE DO CRITÉRIO DA

RENDA PER CAPITA FRENTE AO PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL

DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA

Biguaçu 2008

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FELIPE GORGES CORRÊA

BENEFÍCIO ASSISTENCIAL (LOAS): A ANÁLISE DO CRITÉRIO DA

RENDA PER CAPITA FRENTE AO PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL

DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA

Monografia apresentada à Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI , como requisito parcial a obtenção do grau em Bacharel em Direito. Orientador: Prof. MSc. Marcio Roberto Paulo

Biguaçu 2008

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FELIPE GORGES CORRÊA

BENEFÍCIO ASSISTENCIAL (LOAS): A ANÁLISE DO CRITÉRIO DA RENDA

PER CAPITA FRENTE AO PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA DIGNIDADE DA

PESSOA HUMANA

Esta Monografia foi julgada adequada para a obtenção do título de bacharel e

aprovada pelo Curso de Direito, da Universidade do Vale do Itajaí, Centro de

Ciências Sociais e Jurídicas.

Área de Concentração:

Biguaçu, 31 de outubro de 2008.

Prof. MSc. Marcio Roberto Paulo

UNIVALI – Campus de Biguaçu

Orientador

Prof. MSc. Allexsandre Luckmann Gerent

UNIVALI – Campus de Biguaçu

Membro

Prof. Esp. Roberta Schneider Westphal

UNIVALI – Campus de Biguaçu

Membro

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Dedico este trabalho a minha namorada, Samantha, que me deu todo apoio

necessário à realização deste trabalho, o qual sem ela não chegaria ao fim, assim

como me incentiva e me proporciona dias melhores pelo seu amor, carinho,

compreensão e por me fazer feliz.

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AGRADECIMENTOS

A Deus, por tudo...

Aos meus pais, Vânia Luzia Gorges Corrêa e Gerson Farias Gorges Corrêa, pela

educação, atenção e preocupação em buscar que siga um caminho melhor nas

melhores condições.

Ao meu irmão, Gerson Farias Corrêa Junior, pela sua amizade e companheirismo,

aquele com quem compartilho minhas vitórias e derrotas, bem como é, para mim,

um modelo de determinação e responsabilidade.

Aos meus padrinhos, por todo carinho e admiração.

Ao Leandro Adriano de Barros, pelo grande incentivo a ingressar neste curso,

além de sua inestimável amizade.

Aos demais amigos, pelo apoio incondicional, pelas boas risadas e momentos de

lazer.

A minha prima, Mara Gabriela, que me auxiliou na formulação e conclusão desta

pesquisa.

Aos colegas de trabalho da Turma Recursal, com os quais iniciei minha vida

profissional na área do direito, e que me ensinaram, diariamente, algo mais.

A Aline por ter sido mais que uma “chefe”, uma amiga e exemplo.

Aos colegas de classe que, de certa forma, se fizeram presentes durante estes

anos prestando qualquer auxílio quando preciso.

A minha tia, Elenice, por se colocar a disposição para ajudar no que fosse preciso

quanto a sua alçada.

Ao meu orientador, professor Marcio Roberto Paulo pelo auxílio imprescindível à

realização deste trabalho.

A todos aqueles que acreditaram que este dia chegaria.

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TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE

Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo

aporte ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do

Vale do Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o

Orientador de toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo.

Biguaçu, 31 de novembro de 2008.

Felipe Gorges Corrêa

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RESUMO

Nesta monografia será apresentado um histórico da seguridade social,desde os primeiros indícios em 1821 até os dias de hoje, tratando também de aspectos gerais da assistência social, sua conceituação, princípios, objetivos e diretrizes, bem como uma abordagem, de forma geral, das suas formas de custeio da seguridade social, com a finalidade de entender como se dá o custeio, especificamente, da assistência social brasileira. Neste sentido, chegaremos ao estudo do benefício assistencial, também conhecido como benefício de prestação continuada, prestado ao idoso e ao deficiente que não possa exercer a sua manutenção ou de tê-la provida pelos seus próprios familiares, assim como uma análise minuciosa quanto ao dos seus requisitos, e, ainda, sua aplicabilidade no ramo previdenciário, buscando, assim, aprimorar o entendimento quanto ao requisito que trata da condição social familiar, em se tratando da renda per capita da família, enfrentando o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, percebendo, então, que este critério do benefício assistencial deve ser relativizado, em face da condição social do povo brasileiro e da das poucas oportunidades oferecidas àqueles que fazem jus a tal benefício. Palavra-chave: Assistência Social. Benefício Assistencial. Renda Per Capita. Dignidade da Pessoa Humana.

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RÉSUMÉ

Dans cette monographie il sera présenté une description, ainsi qu'un abordage, de forme générale, de la forme de dépenses de la sécurité sociale, avec la finalité de considérer comme sont les dépenses, spécifiquement, de l'assistance sociale brésilienne.Dans ce sens, nous arriverons à l'étude du bénéfice d'assistance, aussi bien qu’à leurs conditions que à leur application dans la branche de la prévention, cherchant ainsi à a améliorer la compréhension par rapport aux recherches qui traitent sur la condition sociale familiale, affrontant le principe constitutionnel de la dignité de la personne humaine, en percevant, alors, que ce critère du bénéfice d'assistance doit être relativisé. Mot-clé : Bénéfice d'assistance. Revenu Par habitant. Principe de la Dignité de la Personne Humaine.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO........................................................................................................ 1

1. SEGURIDADE SOCIAL...................................................................................... 3

1.1 A EVOLUÇÃO DA PROTEÇÃO SOCIAL NO BRASIL...................................... 3

1.2 ASSISTÊNCIA SOCIAL BRASILEIRA............................................................... 9

1.2.1 Histórico........................................................................................................ 9

1.2.2 Conceito ...................................................................................................... 12

1.2.3 Objetivos e diretrizes ................................................................................. 14

1.2.4 Princípios da Assistência Social .............................................................. 16

1.2.4.1 Princípio da supremacia do atendimento às necessidades sociais e sobre

exigências de rentabilidade econômica.................................................................17

1.2.4.2 Princípio da universalização dos direitos sociais.......................................18

1.2.4.3 Princípio do respeito à dignidade do cidadão, à sua autonomia e ao seu

direito a benefícios e serviços de qualidade, bem como a conveniência familiar e

comunitária............................................................................................................18

1.2.4.4 Princípio da igualdade de direitos no acesso ao atendimento...................19

1.2.4.5 Princípio da divulgação ampla de benefícios, serviços, programas e

projetos assistenciais, bem como dos recursos oferecidos ao Poder Público e dos

critérios para sua concessão.................................................................................20

1.2.5 Benefícios e programas de Assistência Social ....................................... 21

2 . O FINANCIAMENTO DA SEGURIDADE SOCIAL .......................................... 23

2.1 FONTES DE CUSTEIO DA PREVIDÊNCIA SOCIAL...................................... 25

2.1.1 Receitas dos Entes Federativos ............................................................... 27

2.1.2 As Contribuições Sociais .......................................................................... 29

2.1.2.1 Natureza Jurídica das Contribuições Sociais ............................................32

2.1.2.1 Teoria do prêmio de seguro ......................................................................33

2.1.2.2 Teoria do salário diferido ...........................................................................34

2.1.2.3 Teoria do salário anual ..............................................................................35

2.1.2.4 Teoria fiscal ...............................................................................................36

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2.1.2.5 Teoria parafiscal ........................................................................................37

2.1.2.6 Teoria da exação sui generis ....................................................................38

2.1.3 Outras fontes de custeio da previdência social ...................................... 39

2.2 CUSTEIO DA ASSISTÊNCIA SOCIAL BRASILEIRA...................................... 41

3. O BENEFÍCIO ASSISTENCIAL, A ANÁLISE DE SEUS REQUISITOS FRENTE

AO PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA.................................... 43

3.1 BENEFÍCIO ASSISTENCIAL E SEUS REQUISITOS ..................................... 43

3.1.1 Conceito de família..................................................................................... 46

3.1.2 Requisito etário .......................................................................................... 48

3.1.3 Requisito deficiência.................................................................................. 50

3.1.4 Condição socioeconômica ou de miserabilidade ................................... 54

3.2 PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA ..................................... 59

CONCLUSÃO ....................................................................................................... 63

REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA.......................................................................... 65

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INTRODUÇÃO

O objeto deste trabalho é analisar a concessão do benefício

assistencial à luz do princípio da dignidade da pessoa humana.

Propõe-se fazer uma análise crítica do requisito imposto pelo §3º

do art. 20 da Lei nº 8.742/93, o qual exige a comprovação de renda per capita familiar

inferior a ¼ de salário mínimo, de forma a demonstrar sua incompatibilidade com o

referido princípio constitucional.

Para o desenvolvimento da pesquisa, quanto à metodologia

empregada registra-se que, na Fase de Investigação foi utilizado o Método dedutivo, e

o Relatório dos Resultados expresso na presente monografia é composto pela base

lógica dedutiva.

Para demonstrar tal incompatibilidade foram traçados alguns

objetivos específicos, tais como: investigar o conceito de proteção social e sua evolução

no Brasil; analisar a assistência social; apresentar as fontes de custeio da seguridade

social, bem como de modo mais específico, o custeio da assistência social; descrever

as características e os requisitos para a concessão do benefício assistencial; abordar o

princípio constitucional da dignidade da pessoa humana; além de examinar o

entendimento jurisprudencial sobre o tema.

Salienta-se que a escolha deste tema é justificada pelo seu largo

alcance social e pelo seu fim protetivo, pois tem por fim resguardar a dignidade do

idoso e do deficiente que não possua condições de prover a sua própria manutenção,

nem de tê-la provida por sua família, bem como pela sua atualidade e pela controvérsia,

uma vez que ainda há divergência jurisprudencial sobre o assunto.

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A pesquisa apresentada neste trabalho não possui o objetivo de

esgotar o assunto abordado, tampouco oferecer soluções aos problemas

demonstrados, mas sim, suscitar o debate em torno da complexidade envolvida no

tema.

O desenvolvimento deste trabalho dar-se em três capítulos, sendo

que os dois primeiros servem de base para a compreensão do terceiro.

O primeiro capítulo tratará da seguridade social, sendo estudada

sua conceituação e evolução no Brasil, bem como as categorias da assistência social,

suas principais características e a legislação que a rege.

No segundo capítulo será abordado o financiamento da

seguridade social, estipulando as principais fontes de custeio da seguridade social e

seus conceitos, de modo que visa demonstrar como a assistência social é financiada e

de onde provém o seu custeio.

Finalmente, no terceiro capítulo será abordado o benefício

assistencial, apresentando seus requisitos para concessão, sendo feita uma análise

crítica do entendimento jurisprudencial acerca das decisões do Superior Tribunal de

Justiça, da Turma de Uniformização Nacional dos Juizados Especiais Federais e do

Supremo Tribunal Federal.

A conclusão propôs-se a apresentar uma síntese dos resultados

obtidos com o trabalho, assim como as verificações deles decorrentes, objetivando-se

gerar uma contribuição para a conscientização, o debate e a reflexão deste tema no

meio acadêmico.

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1. SEGURIDADE SOCIAL

Ao analisarmos a seguridade social, vislumbra-se a necessidade

de buscar as origens históricas dos conceitos e teorias formuladas durante todo o

processo, possibilitando entender melhor as necessidades e a evolução teórica ao

longo do tempo.

1.1 A EVOLUÇÃO DA PROTEÇÃO SOCIAL NO BRASIL

O primeiro indício de proteção social no Brasil deu-se com o

Decreto de 1o de outubro de 1821, de Dom Pedro de Alcântara, no qual foi concedida

aposentadoria aos mestres e professores e assegurou abono de ¼ dos ganhos aos que

continuassem na atividade.1

Com o fim do império criou-se o Montepio e a Caixa de Socorro.

Sendo que conceitua-se montepio como “instituições em que, mediante o pagamento

de cotas, cada membro adquire o direito de, por morte, deixar pensão pagável a alguém

de sua escolha” 2, enquanto as caixas de socorro foram criadas através da lei n. 3.397,

de 24/11/1888, destinadas aos trabalhadores das estradas de ferro estaduais, e a partir

de então, foram criados outros “benefícios” aos trabalhadores. Porém para empregados

de empresas privadas, até 1923 nada se era destinado.

Neste mesmo ano, criou-se a norma que instituiu no Brasil a

previdência social, a denominada Lei Eloy Chaves, pelo Decreto n. 4.682 de 24 de

janeiro de 1923. Assim, Ítalo Romano Eduardo, Jeanne Eduardo e Amauri Teixeira dão

a devida importância a tal diploma legal ao afirmar em sua obra:

1 MARTINS, Sérgio Pinto. Direito da Seguridade Social. 24. ed – São Paulo: Atlas, 2007. P. 6. 2 EDUARDO, Ítalo Romano, EDUARDO, Jeanne Tavares Aragão e TEIXEIRA, Amauri Santos. Curso de direito previdenciário. 3.ed – Rio de Janeiro – Elsevier, 2006. P.7.

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A Lei Eloy Chaves é considerada o marco inicial da Previdência Social no Brasil, pois, a partir dela, surgiram dezenas e dezenas de caixas de aposentadorias e pensões, sempre por empresas. Assim, os benefícios da Lei Eloy Chaves foram estendidos aos empregados das empresas portuárias, de serviços telegráficos, de água, energia, transporte aéreo, gás, mineração, entre outras, chegando a atingir o total de cento e oitenta e três caixas de aposentadorias e pensões, que, posteriormente, foram unificadas na Caixa de Aposentadoria e Pensões dos Ferroviários e Empregados em Serviços Públicos.3

Explica Sergio Pinto Martins que o objetivo da Lei Eloy Chaves

“não era conceder aposentadorias”, mas sim, trazer estabilidade aos trabalhadores que

receavam serem dispensados mesmo após dez anos de serviço naquela empresa, e

garantir um grande número de segurados para no futuro poder pagar as

aposentadorias. A Lei ainda trouxe outros tipos de aposentadorias, como aposentadoria

por invalidez, tempo de serviço, pensão por morte e assistência médica.4

Com efeito, foram criadas, após a Lei Eloy Chaves, diversas

outras caixas de aposentadorias em outros ramos da atividade econômica, afinal, ficou

estabelecido no art. 54, § 29 da Emenda Constitucional de 1926, de 3 de setembro, que

o Congresso nacional poderia legislar sobre as licenças, aposentadorias e reformas, e

ainda, neste mesmo ano, estendeu-se os benefícios da Lei Eloy Chaves aos

empregados portuários e marítimos através do Decreto legislativo n. 5.109 em 20 de

dezembro.5

Entretanto, em 1930, surgiu a primeira crise no sistema

previdenciário brasileiro, devido a fraudes e denúncias de corrupção, sendo que a

concessão de qualquer espécie de benefício ficou suspensa. Assim, o governo

procurou reformular o sistema e a partir de então este deixou de ser classificado por

3 EDUARDO, Ítalo Romano, EDUARDO, Jeanne Tavares Aragão e TEIXEIRA, Amauri Santos. Curso de direito previdenciário. p.08. 4 MARTINS, Sérgio Pinto. Direito da Seguridade Social. p. 07 e 08. 5 MARTINS, Sérgio Pinto. Direito da Seguridade Social. p. 08.

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empresas e passou a ser definido por categorias profissionais, garantindo um fundo

próprio a cada uma delas, passando a ter uma abrangência nacional.6

A Constituição de 1934 foi a primeira a abranger a seguridade

social em seu texto, estabelecendo a forma tríplice de custeio, sobre o ente público, o

empregado e o empregador, tornando obrigatória a contribuição, na forma do art. 121,

parágrafo 1o, h.7

Com a Constituição de 1937, pouco foi alterado e até mesmo pode

se dizer que foi um atraso na evolução do sistema de previdência social, sendo até

mesmo denominado de, naquela época, “seguro social”, tratado em apenas duas

alíneas no seu texto constitucional.8

Só então, a partir de 1945, buscou-se uma forma de uniformizar a

legislação e unificar a administração, ao estabelecer um só tipo de instituição de

previdência social que abrangeria todo o sistema: o Instituto de Serviços Sociais do

Brasil. 9 Entretanto, aquele não se solidificou por falta de regulamentação, que segundo

Carlos Alberto de Castro e João Batista Lazzari, “deveria ter normatizado a organização

e funcionamento do que seria o Instituto de Serviços Sociais do Brasil, instituição que

nunca chegou a existir”.10

Com a promulgação da Constituição de 1946, em 18 de setembro

de 1946, denomina-se de “previdência social” aquilo que se chamava “seguro social”,

sendo que o art. 157, XVI, consagrava a previdência, “mediante contribuição da União,

do empregado, em favor da maternidade e contra as conseqüências da doença e

velhice, da invalidez e da morte”.11

6 CASTRO, Carlos Alberto Pereira de. LAZZARI, João Batista. Manual de Direito Previdenciário. 8 ed.São Paulo:LTr, 2006, p. 66. 7 MARTINS, Sérgio Pinto. Direito da Seguridade Social. p. 09. 8 MARTINS, Sérgio Pinto. Direito da Seguridade Social. p. 10. 9 MARTINS, Sérgio Pinto. Direito da Seguridade Social. p. 10. 10 CASTRO, Carlos Alberto Pereira de. LAZZARI, João Batista. Manual de Direito Previdenciário. p. 67. 11 MARTINS, Sérgio Pinto. Direito da Seguridade Social. p. 11.

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Somente em 1960, com a lei no. 3.807, denominada de Lei

Orgânica da Previdência Social (LOPS), adicionou-se ao sistema previdenciário o

auxílio-reclusão, o auxílio-funeral e o auxílio-natalidade, assegurando assim, um maior

número de benefícios e atendendo um público maior de segurados, além dos

empregadores e os profissionais liberais, tornando-se unificado em 1966 com o

Decreto-lei no. 72. Entretanto, os trabalhadores rurais ainda não disponibilizavam de

benefícios, sendo que apenas em 1963, passaram a dispor do Fundo de Assistência ao

Trabalhador Rural (FUNRURAL), implantando, de certa forma, alguns serviços

assistenciais.12

Logo, a Constituição de 1967 inova-se ao criar o seguro-

desemprego, denominando-o como auxílio-desemprego, passando a desenvolver um

sistema de seguro social, “abandonando a idéia do contrato de seguro do Direito Civil”,

como era tratado nos moldes mais antigos. No mais, Emenda Constitucional n. 1, de

1969, não nos trouxe alterações substanciais.13

Na década de 70, com o surgimento de diversos diplomas legais,

surgiu a necessidade de reestruturação, afim de reuni-los, o que por meio do Decreto n.

77.077 de 1976, resultou na Consolidação das Leis da Previdência Social (CLPS).14

Assim, criou-se o SINPAS – Sistema Nacional de Previdência e

Assistência Social – a fim de rever as formas de concessão e manutenção de bens e

serviços, e reorganizar as gestões administrativas, financeiras e patrimoniais, sendo

criada através da Lei n. 6.439, de 1° de julho de 1977, subordinada ao Ministério da

Previdência Social – MPS.15

12 EDUARDO, Ítalo Romano, EDUARDO, Jeanne Tavares Aragão e TEIXEIRA, Amauri Santos. Curso de direito previdenciário. p. 08. 13 MARTINS, Sérgio Pinto. Direito da Seguridade Social. p. 12. 14 EDUARDO, Ítalo Romano, EDUARDO, Jeanne Tavares Aragão e TEIXEIRA, Amauri Santos. Curso de direito previdenciário. p. 09. 15 EDUARDO, Ítalo Romano, EDUARDO, Jeanne Tavares Aragão e TEIXEIRA, Amauri Santos. Curso de direito previdenciário. p. 09.

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Sobre o tema, os doutrinadores João Batista Lazzari e Carlos

Alberto Pereira de Castro citam Antonio Carlos de Oliveira que tece importantes

comentários acerca da natureza das alterações obtidas com esta lei:

A Lei n. 6.439, que instituiu o SIMPAS, alterou, portanto, apenas estruturalmente a previdência social brasileira, racionalizando e simplificando o funcionamento dos órgãos. Promoveu uma reorganização administrativa, sem modificar nada do que tange a direitos e obrigações, natureza e conteúdo, condições das prestações, valor das contribuições, etc., como ficara bem claro na Exposição de Motivos com que o então Ministro da Previdência, Nascimento e Silva,

encaminhara o anteprojeto.16

A partir de então, definiu-se divisões pré-estabelecidas

constituindo as subdivisões: Instituto Nacional de Previdência Social (INPS); Instituto

Nacional de Assistência Médica de Previdência Social (INAMPS), Fundação Legião

Brasileira de Assistência (LBA); Fundação do Bem-Estar do Menor (FUNABEM);

Empresa de Processamento de Dados de Previdência Social (DATAPREV); Instituto de

Administração Financeira da Previdência Social (IAPAS); e Central de Medicamentos

(CEME), as quais buscam atender os segurados de uma maneira ampla e ainda prestar

auxílios assistenciais.17

A Constituição Federal de 1988, promulgada em 5 de outubro de

1988, reservou um capítulo, denominado de ordem social, disposto a tratar somente da

seguridade social, garantindo direito aos cidadãos quanto à saúde, previdência e

assistência social18. Ressalta-se que esta monografia, apenas se aprofundará na

questão da assistência social, aprimorando seus aspectos e funcionalidades.

16 CASTRO, Carlos Alberto Pereira de. LAZZARI, João Batista. Manual de Direito Previdenciário. p. 70. 17 MARTINS, Sérgio Pinto. Direito da Seguridade Social. p. 14 e 15. 18 EDUARDO, Ítalo Romano, EDUARDO, Jeanne Tavares Aragão e TEIXEIRA, Amauri Santos. Curso de direito previdenciário. p.10.

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Com efeito, a obra coordenada por Meire Lúcia Gomes Monteiro,

nos ensina uma definição sintética e atual sobre a seguridade social ao dispor que “o

conjunto de medidas constitucionais de proteção dos direitos individuais e coletivos

concernentes à saúde, à previdência e à assistência social”. 19

Em 1990, com a Lei n. 8.029, houve a criação do Instituto

Nacional do Seguro Social (INSS), que segundo Carlos Alberto Pereira de Castro e

João Batista Lazzari, tem a responsabilidade de “arrecadação, fiscalização, cobrança,

aplicação de penalidades e regulamentação da parte de custeio do sistema de

seguridade social como pela concessão de benefícios e serviços aos segurados e seus

dependentes”, autarquia federal resultante da fusão INPS e IAPAS, vinculada ao

Ministério do Trabalho e Previdência Social.20

Em 1991, houve o surgimento das Leis n. 8.212 e 8.213, que

tratavam do Plano de Custeio e Organização da Seguridade Social e do Plano de

Benefícios da Previdência Social, que logo foram substituídos pelo Regulamento da

Previdência Social – RPS, pelo Decreto n. 3.048 de 1999.

Já em 1995 foi publicada a Lei n. 9.032, que foi

determinantemente modificada pelas leis 9.528/97, 9.711/98 e 9.732/98, quanto à

aposentadoria especial. 21

Visto os elementos determinantes do ordenamento jurídico

previdenciário, percebe-se a presença de um sistema de Seguridade composto pelo

seguinte tripé: saúde, previdência e assistência social.

19 MONTEIRO, Meire Lúcia Gomes (Coord.). Introdução ao Direito Previdenciário. São Paulo: LTr, 1998, p. 40. 20 CASTRO, Carlos Alberto Pereira de. LAZZARI, João Batista. Manual de Direito Previdenciário. p. 66. 21 MARTINEZ, Wladimir Novaes. Curso de Direito previdenciário, Tomo I : Noções de Direito Previdenciário. 2 ed. São Paulo: LTr, 2001, p. 23.

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De acordo com o tema proposto, faz-se necessária uma análise e

um estudo abrangente no tocante à Assistência Social, conforme veremos no decorrer

deste capítulo.

1.2 ASSISTÊNCIA SOCIAL BRASILEIRA

Para que se entenda os objetivos e interesses da política da

Assistência Social, é necessário tecer um breve histórico acerca de sua instauração no

Brasil.

1.2.1 Histórico

É certo afirmar que a Assistência Social acompanhou a evolução

da proteção social e da previdência, porém, travou uma luta particular na tentativa de

formar suas próprias instituições determinadas a atender e amparar aqueles que dela

necessitavam.

Todavia, não existia uma compreensão da pobreza enquanto

expressão da questão social, que era tratada como uma disfunção individual. Apenas

em 1942 criou-se a Legião Brasileira de Assistência (LBA), que trazia uma idéia de

sociedade civil com finalidades não econômicas, voltadas para “congregar as

organizações de boa vontade”, ou seja, a assistência social como ação social é ato de

vontade e não direito de cidadania22.

22 SPOSATI, A. O. (Coord). A Assistência Social no Brasil 1983-1990. 6 ed. São Paulo: Cortez, 1991, p. 20.

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Sendo assim, foi a primeira grande instituição de assistência

social, criada em 1977 pela lei n° 6.439, a L.B.A., marcada pela intenção notória de

ajudar a população necessitada através de programas sociais e atendimento às

pessoas23.

Logo, após um período de guerras e ditaduras militares, e com a

promulgação da Constituição Federal de 1988, a assistência social passou a ter uma lei

própria. Nas disposições gerais do capítulo que trata da seguridade social, em seu

artigo 194 dispôs:

Artigo 194 – A seguridade social compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos poderes públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social.24

Desta forma, a Constituição dividiu a seguridade social em três

esferas independentes, dando autonomia e sendo disciplinada nos seus artigos 203 e

204, traçando seus objetivos principais, disposta a prestar auxílio aos seus cidadãos e

traçando diretrizes. E ainda, passou a fazer parte da ordem social que estabelece no

seu artigo 193 que tem “como objetivo o bem-estar e a justiça sociais” e “como base o

primado do trabalho”.

Conceituam a ordem social os Juízes Federais e doutrinadores

Simone Barbisan Fortes e Leandro Paulsen:

[...] política destinada a impossibilitar, num primeiro momento, efetivo exercício de cidadania e, em seguimento, na medida do possível,

23 MARTINS, Sérgio Pinto. Direito da Seguridade Social. p. 495. 24 BRASIL. Código de processo civil. Vade mecum. 2 ed. rev., ampl. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p. 84.

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habilitar seus beneficiários à inserção no mercado de trabalho, com isso ofertando-lhes a mais abrangente proteção da Previdência Social.25

Em 1990, houve a criação do Instituto Nacional do Seguro Social,

conforme já mencionado anteriormente.

Somente em 1993 foi encaminhada ao Congresso Nacional a lei

n° 8.742, e sancionada pelo presidente Itamar Franco, que tinha por finalidade dispor

sobre a organização de Assistência Social e dar outras providências. A denominada Lei

Orgânica de Assistência Social (LOAS) veio amparar benefícios em espécie,

organização e gestão, programas de Assistência Social, entre outros assuntos.

Na referida Lei, houve a criação de um órgão que viria anos

depois integrar a estrutura do Ministério da Assistência e Promoção Social. Para

explicar melhor a definição deste órgão público, ressaltam em sua obra Carlos Alberto

Pereira de Castro e João Batista Lazzari:

O CNAS é o órgão da Administração Pública Federal responsável pela coordenação da Política Nacional da Assistência Social, composto por dezoito membros e respectivos suplentes, sendo:

a) nove representantes governamentais, incluindo um representante do Estados e um dos Municípios;

b) nove representantes da sociedade civil, dentre representantes dos usuários ou de organizações de usuários, das entidades e organizações de assistência social e dos trabalhadores do setor, escolhidos em foro próprio sob fiscalização do Ministério Público Federal.26

Após a criação da Lei Orgânica de Assistência Social, pelo

Decreto n° 1.330, de 8 de dezembro de 1994, foi regulamentado o benefício de

25 FORTES, Simone Barbisan. PAULSSEN, Leandro. Direito da seguridade social: Prestações e custeio da previdência, assistência e saúde. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2005. p. 264. 26 CASTRO, Carlos Alberto Pereira de. LAZZARI, João Batista. Manual de Direito Previdenciário. p. 130.

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prestação continuada, já previsto na lei. Porém, este decreto acabou sendo revogado

pelo Decreto n° 1.744 de 8 de dezembro de 1995, exatamente um ano após sua

promulgação, dando uma nova interpretação à regulamentação do benefício, sendo

denominado a partir de então, de “benefício de prestação continuada devido à pessoa

portadora de deficiência e ao idoso”27.

Assim, fica caracterizado o rápido crescimento da assistência

social no Brasil, sendo ela um direito novo e contemporâneo, que busca, com base na

Constituição Federal, uma igualdade social, visando proteger os que dela necessitam.

1.2.2 Conceito

A busca pelo conceito de assistência social é interessante para

aprimorarmos o entendimento sobre o tema, dando-lhe a devida a importância e correta

interpretação da assistência prestada pelo Estado à sociedade.

Desde já, destaca Odonel Urbano Gonçalves que a Constituição

“nada obstante não traga para o mundo jurídico o conceito de assistência social,

delineia sua natureza e especifica seus objetivos”.28

O conceito de assistência social é dado por vários doutrinadores,

mas também está regulamentado em suas normas. O art. 4° da lei n° 8.212/199129 e o

art. 3° do decreto 3.04830 estabelecem que “a Assistência Social é a política social que

provê o atendimento das necessidades básicas, traduzidas em proteção à família, à

maternidade, à infância, à adolescência, à velhice e a pessoa portadora de deficiência,

27 MARTINS, Sérgio Pinto. Direito da Seguridade Social. p. 495. 28 GONÇALVES, Odonel Urbano. Manual de Direito Previdenciário. 11 ed. São Paulo: Atlas, 2005, p. 21. 29 BRASIL. Lei n. 8.742, de 7 de dezembro de 1993. Lei Orgânica de Assistência Social. Brasília, DF: Senado Federal,1993. 30 BRASIL. Decreto n. 3.048, de 6 de maio de 1999. Regulamento da previdência social. Brasília, DF: Senado Federal,1999.

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independentemente de contribuição à Seguridade social”, enquanto a lei 8.742/1993, a

LOAS, dispõe logo em seu art. 1° que “é direito do cidadão e dever do Estado, sendo

política de Seguridade Social não-contributiva, que prevê os mínimos sociais, realizada

por meio de um conjunto integrado de ações da iniciativa pública e da sociedade para

garantir o atendimento às necessidades básicas”.

Com efeito, pode-se perceber que buscam as leis uma garantia ao

cidadão do mínimo necessário a sua subsistência, por meio do Estado, sem que este

seja obrigado a contribuir com a Previdência Social.

Para Simone Barbisan Fortes e Leandro Paulsen, que não fogem

do conceito estabelecido nas leis que definem a assistência social, assim conceituam:

A Assistência Social, portanto, constitui-se em uma das vias do sistema de proteção social, destinada a abarcar os sujeitos não cobertos pela proteção da Previdência Social (cujo caráter, como já se acentuou, é eminentemente contributivo), justamente por sua ausência de inserção no mercado formal de trabalho e de renda mínima, de modo a oferta-lhes condições de sobrevivência em enfretamento à miséria, num primeiro momento e, para além disto, também propiciar condições mínimas de sobrevivência com dignidade.31

E por fim, Sergio Pinto Martins cita Wladimir Novaes Martinez, que

vai mais a fundo na questão social e define a assistência social desta forma:

Um conjunto de atividades particulares e estatais direcionadas para o atendimento dos hipossuficientes, consistindo os bens oferecidos em pequenos benefícios em dinheiro, assistência à saúde, fornecimento de alimentos e outras pequenas prestações. Não só complementa os

31 FORTES, Simone Barbisan. PAULSSEN, Leandro. Direito da seguridade social: Prestações e custeio da previdência, assistência e saúde. p.264.

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serviços da Previdência Social, como amplia, em razão da natureza da clientela e das necessidades providas.32

Logo a assistência social visa garantir meios de subsistência às

pessoas que não tenham condições de suprir o próprio sustento, dando especial

atenção às crianças, velhos e deficientes, como poderemos ver melhor a seguir, ao

tratar dos objetivos e diretrizes da assistência social.

1.2.3 Objetivos e diretrizes

Os objetivos traçados pela assistência social, são como metas a

serem cumpridas, ou seja, são limites impostos pelos conceitos que definem a quem e

de que forma será prestada essa assistência.

Daniel Machado da Rocha afirma que o objetivo central é

“contemplar aqueles que não têm condições de prover seu próprio sustento” 33, e isso é

repetido por outros autores.

Todavia, Martins trata deste tema de uma forma mais ampla que

os demais. Afirma que “são objetivos porque não informam, não inspiram ou orientam o

legislador, mas apenas são situações que a Assistência Social pretende cobrir” 34, e

ainda cita os objetivos principais que são a proteção à família, à maternidade, à

infância, à adolescência e à velhice; o amparo às crianças e adolescentes carentes,

objetivo este que está disposto no §1° do art. 227 da Constituição; as iniciativas de

inserção dos cidadãos ao mercado de trabalho; a habilitação e reabilitação das pessoas

portadoras de deficiência e também a sua integração à sociedade; e por último, o

32 MARTINS, Sérgio Pinto. Direito da Seguridade Social. p. 495. 33 ROCHA, Daniel Machado da. Temas Atuais de Direito Previdenciário e Assistência Social. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2003, p. 143. 34 MARTINS, Sérgio Pinto. Direito da Seguridade Social. p. 497.

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pagamento de uma renda mensal vitalícia às pessoas portadoras de deficiência ou

idosos que não possam manter a própria subsistência ou de tê-la provida por sua

família.35

Como podemos perceber, a Constituição Federal traça tais

objetivos e acrescenta em seu artigo 208 que o Estado tem o dever de garantir a

educação a todos e até mesmo atendimento em creches e pré-escolas às crianças de

zero a 6 anos de idade.

Importante lembrar é que o pólo ativo ao cumprimento dos

objetivos da assistência social tem de ser o Estado, que de forma sólida deve buscar

meios necessários ao cumprimento desta obrigação com a sociedade.

Entretanto, acrescenta o doutrinador Odonel Urbano Gonçalves ao

falar sobre a efetivação do objetivo do trabalho previdenciário:

O trabalho assistenciário é efetivado por meio de políticas setoriais, sendo consideradas organizações ou entidades de assistência social aquelas que, sem finalidade lucrativa, prestam atendimento aos beneficiários do sistema.36

As leis que tratam da assistência social ainda falam sobre as

diretrizes, que buscam aprimorar a forma de organização desta área. Primeiramente

destaca-se a Lei n° 8.742/93 que em seu art. 5°, busca garantir a descentralização

político-administrativa para os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, e comando

único das ações em cada esfera de governo; a participação da população, por meio de

organizações representativas, na formulação das políticas e no controle das ações em

todos os níveis, bem como, a primazia da responsabilidade do Estado na condução da

política de assistência social em cada esfera de governo.

35 MARTINS, Sérgio Pinto. Direito da Seguridade Social. p. 496. 36 GONÇALVES, Odonel Urbano. Manual de Direito Previdenciário. p. 23.

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Assim, não menos importante, o art. 204 da Constituição nos

define que as ações governamentais sobre as assistências sociais usarão recursos do

orçamento da seguridade social, além de outras fontes, e assim passa a definir as

diretrizes que são: a descentralização político-administrativa, cabendo a coordenação e

as normas gerais à esfera federal e a coordenação e a execução dos respectivos

programas às esferas estadual e municipal, bem como a entidades beneficentes e de

assistência social; e a participação da população, por meio de organizações

representativas, na formulação das políticas e no controle das ações em todos os

níveis.

Enfim, necessária é a imposição dessas diretrizes, pois são elas

que regulam e dão sentido às ações governamentais que organizam a assistência

social. E ainda, ficou demonstrado que o custeio da assistência social é um ônus que a

sociedade é quem tem que dispor.37

1.2.4 Princípios da Assistência Social

Um bom conceito de princípio jurídico traz Robert Alexy, e assim

dispõe em sua obra:

Os princípios são normas jurídicas que ordenam que se realize algo na maior medida possível, em relação com as possibilidades jurídicas e fáticas. Os princípios são, por conseguinte, mandados de otimização que se caracterizam por que podem ser cumpridos em diversos graus e porque a medida ordenada de seu cumprimento não depende só de possibilidades fáticas, mas também das possibilidades jurídicas. O campo das possibilidades jurídicas está determinado por meio de

37 GONÇALVES, Odonel Urbano. Manual de Direito Previdenciário. p. 23.

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princípios e regras que jogam em sentido contrário. (ALEXY, Robert.

Derecho y razon practica. México: Distribuciones Fontamara, 1993. p. 14)38

Sendo assim, os princípios serão uma base à assistência social,

devendo ser sempre seguidos e cumpridos como se lei fossem. No entanto, a própria lei

da assistência social traz cinco princípios básicos dispostos no art. 4° da lei 8.742/93,

que defendem a supremacia do atendimento às necessidades sociais sobre as

exigências de rentabilidade econômica; a universalização dos direitos sociais, a fim de

tornar o destinatário da ação assistencial alcançável pelas demais políticas públicas; o

respeito à dignidade do cidadão, à sua autonomia e ao seu direito a benefícios e

serviços de qualidade, bem como à convivência familiar e comunitária, vedando-se

qualquer comprovação vexatória de necessidade; a igualdade de direitos no acesso ao

atendimento, sem discriminação de qualquer natureza, garantindo-se equivalência às

populações urbanas e rurais, assim como, a divulgação ampla dos benefícios, serviços,

programas e projetos assistenciais, bem como dos recursos oferecidos pelo Poder

Público e dos critérios para sua concessão.

Wladimir Novaes Martinez busca o entendimento de que os

princípios da assistência social “não são desprezíveis para o seguro social. Embora sua

influencia seja menor, eles fazem parte do ordenamento científico da Previdência Social

e colaboram na compreensão do fenômeno jurídico”.39

Acerca do entendimento de cada princípio, os doutrinadores

trazem comentários e conceitos a cada um deles.

1.2.4.1 Princípio da supremacia do atendimento às necessidades sociais e sobre

exigências de rentabilidade econômica

38 http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/revista/Rev_55/Artigos/Art_Fernando.htm acessado em 8 de abril de 2008. 39 MARTINEZ, Wladimir Novaes. Princípios de Direito Previdenciário. 4 ed. São Paulo: LTR, 2001, p.205.

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Este princípio busca o atendimento às ordens sociais. Simone e

Leandro entendem que este princípio decorre do princípio da solidariedade social e da

próprio conceito de assistência social, e ainda o conceituam:

Significa dizer que a Assistência Social incumbe fornecer, pela via de suas prestações, à todos aqueles que se enquadram na faixa de necessidade legalmente determinada, os meios para o envolvimento de sua condição de cidadãos, independentemente do custo financeiro que isto possa importar ao orçamento da Seguridade Social.40

Sendo assim, este princípio dá maior importância às necessidades

sociais das pessoas que delas precisam, colocando em segundo plano a rentabilidade

econômica ou os argumentos de ordem financeira.41

1.2.4.2 Princípio da universalização dos direitos sociais

Segundo Martinez “o esforço do Estado deve ser no sentido de

permitir ao cidadão alcançar o estágio de segurado, sem precisar depender das suas

ofertas condicionadas”, fazendo parecer como se segurado fosse, pretendendo que o

Estado atenda a todos, dando assim o sentido de universal.42

1.2.4.3 Princípio do respeito à dignidade do cidadão, à sua autonomia e ao seu direito a

benefícios e serviços de qualidade, bem como a conveniência familiar e comunitária

40 FORTES, Simone Barbisan. PAULSSEN, Leandro. Direito da seguridade social: Prestações e custeio da previdência, assistência e saúde. p.268. 41 FORTES, Simone Barbisan. PAULSSEN, Leandro. Direito da seguridade social: Prestações e custeio da previdência, assistência e saúde. p.268. 42 MARTINEZ, Wladimir Novaes. Princípios de Direito Previdenciário. p.207.

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Este princípio básico cabe não só aos que necessitam da

assistência social, mas todas as pessoas, como conceitua Simone Barbisan Fortes ao

expor em sua obra que:

Segundo o principio do respeito à dignidade do cidadão, incumbe à Assistência Social ofertar proteção não vexatória, no que tange à comprovação da situação da necessidade, e, com seus serviços, promover a inclusão social dos beneficiários, isto é, proporcionar-lhes o efetivo exercício de sua cidadania.43

Com base nisto, este princípio garante a todo cidadão que precise

da assistência social a dignidade que a Constituição já defende, associada a atitude do

estado em fazê-los dispor de direitos à benefícios e prestando serviços.

1.2.4.4 Princípio da igualdade de direitos no acesso ao atendimento

Tal princípio busca a satisfação daqueles que necessitam da

Assistência Social, sem discriminação, e assim nos ensina Martinez:

Diferentemente do seguro social, os beneficiários da assistência social estão na mesma condição, variando apenas a intensidade da necessidade. Não há progresso ba situação; o status permanece o mesmo. Pouco importa qual tenha sido a contribuição para a sociedade, se a necessidade é presente.44

43 FORTES, Simone Barbisan. PAULSSEN, Leandro. Direito da seguridade social: Prestações e custeio da previdência, assistência e saúde. p.269. 44 MARTINEZ, Wladimir Novaes. Princípios de Direito Previdenciário. p.214.

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Acrescenta, ainda, que “os beneficiários da assistência social são

todos acessíveis, sem distinção; contribuem indiretamente e na mesma proporção de

quanto consomem” 45, fazendo com que todos se tornem iguais perante a assistência

social.

1.2.4.5 Princípio da divulgação ampla de benefícios, serviços, programas e projetos

assistenciais, bem como dos recursos oferecidos ao Poder Público e dos critérios para

sua concessão.

Para entender melhor este princípio, Simone Barbisan Fortes

explica e assim ensina:

Objetiva ele permitir o mais amplo acesso da população ao sistema da Assistência Social, uma vez que não se pode presumir que aqueles que já se encontram em situação de vulnerabilidade social sejam suficientemente instruídos acerca das suas prestações a que possam fazer jus, incumbindo, assim, ao próprio Poder Público alcançar-lhes as necessárias informações sobre pertinentes direitos.46

Com efeito, o conceito deste princípio resolve-se pela sua própria

denominação, que explica que o Estado tem o dever que divulgar os benefícios,

serviços, programas e projetos assistenciais, bem como os recursos oferecidos ao

Poder Público e as formas para serem adquiridos.

45 MARTINEZ, Wladimir Novaes. Princípios de Direito Previdenciário. p.214. 46 FORTES, Simone Barbisan. PAULSSEN, Leandro. Direito da seguridade social: Prestações e custeio da previdência, assistência e saúde. p.270.

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1.2.5 Benefícios e programas de Assistência Social

Com a Lei n. 8.742, de 1993, extinguiu-se as rendas vitalícias de

caráter assistencial, denominadas de auxílio-natalidade e auxílio-funeral, previstas nos

arts. 140 e 141 da Lei n. 8.213/91 anteriormente, passando a ser revogados pelo art. 15

da Lei n. 9.528/97. Assim, os benefícios da Lei 8.742/93, independem de contribuição

do postulante, conforme dispõe o art. 210 da Constituição Federal.

Esses benefícios eventuais são classificados por Odonel Urbano

Golçalves47 em apenas duas formas: em razão da natalidade e em razão de morte.

Embora tenham sido extintos, não deixaram de existir benefícios

eventuais ditados pela assistência social, como leciona Martins:

Poderão ser estabelecidos outros benefícios eventuais para atender as necessidades advindas de situações de vulnerabilidade temporária, com prioridade para a criança, a família, o idoso, a pessoa portadora de deficiência, a gestante, a nutriz e nos casos de calamidade pública.

O CNAS poderá propor, ouvidas as respectivas representações de Estados e Municípios dele participantes, na medida das disponibilidades orçamentárias das três esferas de governo, a instituição de benefícios subsidiários no valor de até 25% do salário mínimo para cada criança de até 6 anos de idade, se a família tiver renda mensal familiar per capita

inferior a ¼ do salário mínimo.48

Neste sentido, com a ajuda do governo, são criados auxílios

destinados a atender a população que necessita de determinado fim, com o objetivo de

enfrentar a pobreza, como por exemplo, os programas de Bolsa-Família e de Bolsa-

Escola, que objetivam ajudar aqueles que, no caso, não tenham como prover a

subsistência de sua família e/ ou a manutenção de seus filhos na escola.

47 GONÇALVES, Odonel Urbano. Manual de Direito Previdenciário. p. 41. 48 MARTINS, Sérgio Pinto. Direito da Seguridade Social. p. 496.

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Quanto aos programas, Martins destaca:

Os programas de assistência compreendem ações integradas e complementares com objetivos, tempo e áreas de abrangência definidos para qualificar, incentivar e melhorar os benefícios e serviços assistenciais. Serão os programas definidos pelos respectivos Conselhos de Assistência Social, com prioridade para inserção

profissional e social. 49

Por fim, destaca-se o Benefício de Prestação Continuada, que

surge, de certa forma, como um programa voltado ao idoso e a integração da pessoa

portadora de deficiência, o qual será tratado posteriormente.

Agora, será apresentada as formas de custeio da previdência

social, analisando as principais fontes de financiamento da seguridade social buscando

entender como acontece o financiamento da Assistência Social brasileira, conforme

será visto no próximo capítulo.

49 MARTINS, Sérgio Pinto. Direito da Seguridade Social. p. 496

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2 . O FINANCIAMENTO DA SEGURIDADE SOCIAL

O financiamento da seguridade é determinado pela Constituição

Federal, ao firmar, em seu art. 195, que deve ser “financiada por toda a sociedade, na

forma direta ou indireta, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, do

Distrito Federal e dos municípios, e das contribuições sociais”.

Daniel Machado da Rocha, partindo do preceito do art. 10 da lei

8.212 de 1991, no qual tem como base o texto literal da Constituição, comenta o

assunto:

O preceito em comento reproduz a idéia nuclear contida no artigo 195 da Lei Fundamental: Ancorada no princípio da solidariedade, e tendo em vista o ônus financeiro necessário para que o Estado possa viabilizar as políticas de seguridade social, toda a sociedade e convocada para colaborar no financiamento da proteção social. Esta participação é

realizada de maneira direta e indireta.50

O financiamento direto é feito através das contribuições sociais,

que são instituídas por lei, e sua finalidade específica é o financiamento da seguridade

social. Enquanto o indireto é “realizado por meio de dotações orçamentárias fixadas no

orçamento fiscal” ou provenientes de arrecadação de impostos pela União, Estados,

Municípios e Distrito Federal.

Todavia, os recursos serão sempre oriundos da sociedade, seja

direta ou indiretamente, sendo assim, todos os entes são responsáveis pela seguridade

e cada um é responsável em fixar os respectivos gastos em seus orçamentos.51

50 VELLOSO, Andrei Pitten; ROCHA, Daniel Machado da, JUNIOR José Paulo Baltazar. Comentários à lei do custeio da seguridade social: Lei n. 8.212 de 24 de julho de 1991, atualizada até a LC 118/2005. Porto Alegre: Livraria do Advogado Ed., 2005. p. 50. 51 IBRAHIM, Fabio Zambitte. Curso de direito previdenciário. 8. ed. Rio de Janeiro: Impetrus, 2006. p. 72.

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Na tentativa de especificar e diferenciar os significados de

financiamento direto e indireto, Wladimir Novaes Martinez expôs o seu ensinamento:

Forma direta significa a contribuição social, descontada do trabalhador ou por ele recolhida enquanto contribuinte individual, sem participação da empresa ou da sociedade. Forma indireta, a parte patronal da empresa, o COFINS, a taxa do Imposto de Renda (Lei 9.249/95) e o resultado operacional do concurso de prognósticos e do Estado.52

Sérgio Pinto Martins afirma, no entanto, que a seguridade social

não pode ser financiada, mas sim custeada. Explica que no financiamento deveria ser

devolvido o montante com juros e correção monetária, comparando com um

empréstimo bancário, enquanto o custeio é feito apenas por contribuição social.53

Miguel Horvath Junior explica do que se trata o plano de custeio

em sua obra ao afirmar:

É o conjunto de normas as quais codificam as receitas as quais deverão ser auferidas pelo sistema que estabelecem o modo pelo qual essas receitas serão geridas. O plano de custeio nada mais é do que uma previsão do dispêndio do sistema de Seguridade Social. Custeio da Seguridade social é a quantia necessária para pagar as prestações e os gastos da administração do sistema previdenciário.54

Desta forma, vislumbra-se que o sistema depende de contribuição,

porém para as prestações de serviços a saúde e a assistência não são necessárias

respectivas contribuições, ou seja, os serviços são prestados independentemente de

52 MARTINEZ, Wladimir Novaes. Curso de direito previdenciário.Tomo II: previdência social. 2. ed. – São Paulo: LTr, 2003. p. 228. 53 MARTINS, Sergio Pinto. Direito da seguridade social. p. 63. 54 JUNIOR, Miguel Horvath. Direito previdenciário. 5. ed. – São Paulo: Quartier Latin,2005. p. 312

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contribuição aos beneficiários carentes ou necessitados. Assim, a previdência se

caracteriza por ser a fonte de custeio de toda a seguridade.55

Ressalvada tal importância, veremos a seguir as fontes de custeio

da previdência, elencados pela doutrina e pela Legislação Federal.

2.1 FONTES DE CUSTEIO DA PREVIDÊNCIA SOCIAL

Ao tratar de fontes de custeio, pode ser interpretar que são “os

meios econômicos e, principalmente, financeiros obtidos e destinados à concessão e à

manutenção das prestações da Seguridade Social”, conforme Martins.56

Para corroborar, Eduardo Rocha Dias e José Leandro Monteiro de

Macedo, buscam seu entendimento no mesmo sentido:

Fontes de custeio da seguridade social, por sua vez, são meios econômicos e, principalmente, financeiros obtidos e destinados à concessão e manutenção da seguridade social. A concepção de custeio da seguridade social, na Constituição Federal, está delineada no art. 195, caput, [...].57

Sérgio Pinto Martins, além de lembrar que as fontes diretas são as

contribuições sociais e que as indiretas são os impostos, apresenta também as devidas

fontes de custeio da Seguridade Social, da seguinte maneira:

55 OLIVEIRA, Lamaratino França de. Direito previdenciário. 2. ed. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais: LFG – Rede de Ensino Luiz Flávio Gomes, 2006. p. 52. 56 MARTINS, Sergio Pinto. Direito da seguridade social. p. 63. 57 DIAS, Eduardo Rocha e MACEDO, José Leandro Monteiro de. Curso de direito previdenciário. São Paulo: Método, 2008. p. 392.

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a) dos empregados, incidentes sobre a folha de salários, o faturamento e o lucro. Sobre o faturamento incide a Confins (Lei complementar n. 170/91) e o PIS (Lei complementar 7/70) . Sobre o lucro incide a tributação social criada pela Lei n. 7. 689/88;

b) dos trabalhadores

c) sobre a receita de concursos de prognósticos;

d) do importador de bens ou serviços do exterior, ou de quem a lei

quiser equiparar (Lei n. 10.865/04).58

No entanto, existem outros posicionamentos, como interpretam

Eduardo Rocha Dias e José Leandro Monteiro de Macedo59, e Marcelo Leonardo

Tavares60 que entendem existir apenas três fontes de custeio da previdência social, que

seriam os Entes Federativos, compostos por União, Estados, Municípios e Distrito

Federal, os quais integram o financiamento com recursos provenientes de seus

respectivos orçamentos, as Contribuições sociais, por excelência, e as outras fontes

que podem ser criadas com base no art. 195, parágrafo 4o da Constituição Federal.

Todavia, João Batista Lazzari e Carlos Alberto Pereira de Castro61,

quanto à primeira fonte mencionada, entendem que apenas a União exerce o dever

soberano de custeio.

Assim dispõe o art. 11 da Lei 8.21262. de 1991, a Lei de custeio da

Previdência Social, ao tratar das fontes de custeio no âmbito federativo da seguridade

social:

58

MARTINS, Sergio Pinto. Direito da seguridade social. p. 63. 59 DIAS, Eduardo Rocha e MACEDO, José Leandro Monteiro de. Curso de direito previdenciário. p. 392 e 393. 60 TAVARES, Marcelo Leonardo. Direito previdenciário: Regime geral de previdência social e regimes próprios de previdência social. 8.ed. ver., ampl. e atual. até a Emenda Constitucional 47/2005 – Rio de Janeiro: Editora Lumen Júris, 2006. p. 311. 61 CASTRO, Carlos Alberto Pereira de. LAZZARI, João Batista. Manual de Direito Previdenciário. p. 200. 62 BRASIL. Lei n. 8.212, de 24 de julho de 1991. Lei Orgânica da Seguridade Social. Brasília, DF: Senado Federal,1991.

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Art. 11 – No âmbito federal, o orçamento da seguridade social é composto das seguintes receitas:

I – Receitas da União;

II – Receitas das contribuições sociais

III – Receitas de outras fontes.

Estas fontes integram o financiamento das três áreas de atuação

da seguridade social, provindas unicamente da previdência social, afinal as demais

áreas provêm de caráter meramente assistencial. 63

Contudo, não se pode considerar apenas as receitas vinculadas

às contribuições sociais como fontes de custeio da previdência social, visto que a União

e os outros entes federativos, além de outras fontes de custeio também exercem papel

fundamental na totalidade do financiamento social, conforme veremos no decorrer

desta pesquisa.

2.1.1 Receitas dos Entes Federativos

Os Entes Federativos, a União, os Estados, Municípios e o Distrito

Federal, têm o dever de participar do financiamento da seguridade social com os

recursos de seus orçamentos.

Entretanto, a Lei 8.212/91, em seu texto, não delineia qualquer

norma complementar dispondo especificamente sobre este aspecto. Sendo assim, a

63 DIAS, Eduardo Rocha e MACEDO, José Leandro Monteiro de. Curso de direito previdenciário. p. 392 e 393.

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participação fica a mercê dos respectivos orçamentos arrecadados por cada Entidade,

sem previsão alguma.64

Quanto à União, será compreendia por três orçamentos anuais,

Sendo que um deles trata da seguridade social. O art. 165, III, § 5o, III, da Constituição,

garante que a “lei orçamentária anual compreenderá o orçamento da seguridade social,

abrangendo todas as entidades e órgãos a ela vinculados, da administração direta ou

indireta, bem como os fundos e fundações instituídos e mantidos pelo Poder Público”.

Carlos Alberto Pereira de Castro e João Batista Lazzari traçam a

importância do papel da União como fonte de custeio da previdência, definida pelo art.

16 da Lei n. 8.212 de 1991, ao afirmar:

Ela participa atribuindo dotações no seu orçamento à Seguridade Social, fixados obrigatoriamente em Lei Orçamentária anual, além de ser responsável pela cobertura de eventuais insuficiências da Seguridade, em razão do pagamento de benefícios de prestação continuada pela previdência social (art. 16 da Lei n. 8.212/91). Não há um percentual mínimo definido para ser destinado à Seguridade Social, tal como ocorre com a educação (art. 212 da Constituição). É, como sempre foi, uma parcela aleatória. 65

Percebe-se que a seguridade social provém de um orçamento

próprio, e que, no entanto compreende-se que a União não participa, de certa forma,

com uma determinada parcela, e sim com uma parcela fixa que seria acrescida às

outras fontes de custeio, ou seja, sua participação fica submetida as dotações previstas

na Lei Orçamentária anual.66

64 TAVARES, Marcelo Leonardo. Direito previdenciário: Regime geral de previdência social e regimes próprios de previdência social. p. 282. 65 CASTRO, Carlos Alberto Pereira de. LAZZARI, João Batista. Manual de Direito Previdenciário. p. 202. 66 VELLOSO, Andrei Pitten; ROCHA, Daniel Machado da, JUNIOR José Paulo Baltazar. Comentários à lei do custeio da seguridade social: Lei n. 8.212 de 24 de julho de 1991, atualizada até a LC 118/2005. p. 88.

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A União exerce a função de suprir as insuficiências financeiras

decorrentes do deferimento de benefícios de prestação continuada, pois tem o dever e

o comprometimento por zelar e garantir o funcionamento do sistema da seguridade,

responsabilizando-se por eventuais défices que possam surgir no Regime Geral.67

Em suma, nos ensina Eduardo Rocha Dias e José Leandro

Monteiro de Macedo, ao falar deste assunto:

[..] No que se refere à ações de previdência social, a União somente irá destinar seus recursos adicionais se houver deficit, ou seja, se as despesas com a previdência social superarem as receitas oriundas das contribuições das empresas sobre a folha de salários e demais rendimentos do trabalho e das contribuições dos trabalhadores (art. 167, inciso XI, da CF/1988).68

Isto posto, passaremos a estudar as diversas formas de

contribuições sociais, buscando entender seu conceito e a forma com que se propõem

a auxiliar no financiamento da seguridade social deste regime previdenciário.

2.1.2 As Contribuições Sociais

As contribuições já foram denominadas, na lei n. 3.807/60 e no

inciso II do art. 217 do CTN69 de quotas de previdência ou, até mesmo, cotização. No

decorrer dos anos foi denominada de contribuição previdenciária, embora a

Constituição aplica a expressão contribuição social, em alguns de seus dispositivos. 70

67 GONÇALVES, Odonel Urbano. Manual de Direito Previdenciário. p. 57. 68 DIAS, Eduardo Rocha e MACEDO, José Leandro Monteiro de. Curso de direito previdenciário. p. 394. 69

BRASIL. Código de tributário nacional. Vade mecum. 2 ed. rev., ampl. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p. 679. 70 MARTINS, Sergio Pinto. Direito da seguridade social. p. 66.

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As contribuições sociais estão elencadas na Constituição Federal,

no capítulo reservado ao Sistema Tributário Nacional, o qual estabelece em seu art.

149 as normas gerais para sua instituição, e no art. 195 normas especiais em relação

as contribuições para a Seguridade Social.71

Para conceituar as contribuições sociais, Carlos Alberto Pereira de

Castro e João Batista Lazzari, trazem ao estudo dois doutrinadores: Ruprecht e Hugo

de Brito Machado.

Ruprecht afirma que ”a contribuição pode ser definida como uma

obrigação legal se impõe a entidades e indivíduos para que contribuam para as

despesas dos regimes de seguridade social, com base em determinados critérios

legais”. 72

Enquanto Hugo de Brito Machado entende por contribuição social

como “espécie de tributo com finalidade constitucionalmente definida, a saber,

intervenção no domínio econômico, interesse de categorias profissionais ou

econômicas e seguridade social”. Por fim, trazem seu próprio conceito, “a contribuição

para a seguridade social é uma espécie de contribuição social, cuja receita tem por

finalidade o financiamento das ações nas áreas da saúde, previdência e assistência

social”. 73

Sobre a competência para instituir as contribuições, dispõe o art.

149, caput, e parágrafo 1o da Constituição ao firmar:

71 CASTRO, Carlos Alberto Pereira de. LAZZARI, João Batista. Manual de Direito Previdenciário. p. 203. 72

CASTRO, Carlos Alberto Pereira de. LAZZARI, João Batista. Manual de Direito Previdenciário. p. 204. 73 CASTRO, Carlos Alberto Pereira de. LAZZARI, João Batista. Manual de Direito Previdenciário. p. 204.

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Art. 149 - Compete exclusivamente à União instituir contribuições sociais, de intervenção no domínio econômico e de interesse das categorias profissionais e econômicas, como instrumento de atuação nas respectivas áreas, observado o disposto nos arts. 146, III, e 150, I e III, e sem prejuízo ao previsto no art. 195, parágrafo 6o, relativamente às contribuições a que alude o dispositivo.

§1o Os Estados, o Distrito federal e os Municípios instituirão contribuição, cobrada de seus servidores, para o custeio, em beneficio destes, do regime previdenciário de que trata o art. 40, cuja alíquota não será inferior à da contribuição dos servidores titulares de cargos da União.

[...]

O parágrafo único do art. 11 da Lei n. 8.212/91, assinala as

principais contribuições sociais destinadas ao financiamento da seguridade social: 74

Art. 11 [...] Parágrafo único. Constituem Contribuições sociais: a) as das empresas, incidentes sobre remuneração paga ou creditada aos segurados a seu serviço; b) as dos empregadores domésticos; c) as dos trabalhadores, incidentes sobre o seu salário-de-contribuição; d) as das empresas, incidentes sobre faturamento e lucro; e) as incidentes sobre a receita de concursos de prognósticos.

Logo, analisaremos a natureza jurídica das contribuições sociais,

buscando enquadrá-la na categoria a qual pertence no ramo do direito, bem como,

compreender as regras que são aplicadas, e em seguida, aprofundaremos o estudo das

principais contribuições que financiam a seguridade social.

74 VELLOSO, Andrei Pitten; ROCHA, Daniel Machado da, JUNIOR José Paulo Baltazar. Comentários à lei do custeio da seguridade social: Lei n. 8.212 de 24 de julho de 1991, atualizada até a LC 118/2005. p. 50.

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2.1.2.1 Natureza Jurídica das Contribuições Sociais

Pelo texto constitucional do art. 149, entende-se que as

contribuições têm natureza tributária e que se dividem em três espécies: “contribuições

sociais, contribuição de intervenção no domínio econômico e contribuições de interesse

de categorias profissionais ou econômicas” 75, conforme classificam Eduardo Rocha

Dias e José Leandro Monteiro de Macedo. Sendo assim, veremos a natureza jurídica

das contribuições sociais.

Sobre o tema, Jorge Franklin Alves Felipe ao tratar da natureza

jurídica das contribuições sociais no momento da mudança da Constituição de 1967

para a Constituição de 1988, entende que:

Com a Constituição de 1988 não vislumbramos razões para deixar de considerar a contribuição previdenciária como tributo. Muito mais do que não própria Constituição de 1967, na Constituição de 1988 a contribuição previdenciária se identifica com os tributos. Está no capítulo do Sistema Tributário, sem qualquer equívoco que justifique uma interpretação restritiva de sua concepção tributária. [...] A contribuição previdenciária sempre foi um tributo, que é, em si mesmo, uma prestação pecuniária, compulsória, exigível daqueles que incorram nas situações legalmente definidas como fato gerador ou hipótese de incidência.76

Assim, a contribuição social se enquadra no conceito de tributo,

trazido pelo art. 3°77 do Código Nacional Tributário. Assim, “seja por submeter-se ao

75 DIAS, Eduardo Rocha e MACEDO, José Leandro Monteiro de. Curso de direito previdenciário. p. 397. 76 FELIPE, Jorge Franklin Alves. Curso de direito previdenciário. p. 161. 77 Art. 3° do Código Tributário Nacional – Tributo é toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada.

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regime jurídico tributário, seja por amoldar-se à definição legal de tributo, as

contribuições sociais da seguridade social iniludivelmente têm natureza tributária”. 78

Enfim, é pacífico nas doutrinas e na jurisprudência nacional a

natureza tributária das contribuições sociais, conforme citam Carlos Alberto Pereira de

Castro e João Batista Lazzari, sobre a orientação firmada pelo STF de que “a

contribuição para a seguridade social é modalidade de tributo que não enquadra na

espécie de imposto, taxa ou contribuição de melhoria (RE n. 217.252-1 / MG, 2ª Turma,

rel. Min. Nelson Jobim, DJU de 16.4.99; AGRAG n. 174.540-2/ AP, 2ªa Turma, rel. Min.

Maurício Corrêa, DJU de 26.4.96)”.79

Sérgio Pinto Martins classifica a natureza jurídica das

contribuições sociais à seguridade social dividindo-as em seis “orientações”, que são: a

teoria do prêmio de seguro; teoria do salário diferido; teoria do salário anual; teoria

fiscal; teoria parafiscal e a teoria da exação sui generis.80

No entanto, Carlos Alberto Pereira de Casto e João Batista

Lazzari classificam como sendo as mais importantes a teoria fiscal, a teoria parafiscal e

a teoria da exação sui generis.81

2.1.2.1 Teoria do prêmio de seguro

Esta teoria também pode ser chamada de “prêmio de seguro

público”, visto que há uma obrigatoriedade de contribuição para o custeio da seguridade

social, visando proteger os segurados. 82

78 DIAS, Eduardo Rocha e MACEDO, José Leandro Monteiro de. Curso de direito previdenciário. p. 398. 79 CASTRO, Carlos Alberto Pereira de. LAZZARI, João Batista. Manual de Direito Previdenciário. p. 207. 80 MARTINS, Sergio Pinto. Direito da seguridade social. p. 66. 81 CASTRO, Carlos Alberto Pereira de. LAZZARI, João Batista. Manual de Direito Previdenciário. p. 205.

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Neste sentido, Sérgio Pinto Martins explica o conceito de prêmio

de seguro, distinguindo-o da seguridade social:

[...] é a contraprestação devida pelo segurado ao segurador, em razão de risco assumido pelo segundo. A idéia, porém, de prêmio de seguro não se assemelha à previdência social, pois tem por objetivo amparar as pessoas que estejam em situação de necessidade, que não se verifica no segundo se não houver pagamento das prestações. A seguridade social tem também por objetivo distribuir renda, o que não se observa nas empresas de seguro, que inclusive são privadas.83

Há de se ressaltar que Sérgio Pinto Martins equipara a teoria do

prêmio de seguro, quanto à natureza jurídica da contribuição à seguridade, com o

prêmio de seguro pago pelo beneficiário às companhias seguradoras. Ademais, explica

que “não depende da autonomia da vontade”, pois a contribuição social está prevista

em lei.84

2.1.2.2 Teoria do salário diferido

Na teoria do salário diferido é reservada uma parte do salário do

empregado que se destina à seguridade social, com o objetivo de garantir, futuramente,

a proteção a um risco social que possa arcar. 85

Sérgio Pinto Martins exemplifica como uma poupança, na qual,

preveniria um amparo no caso de algum tipo de aposentadoria, morte, ou invalidez para

82 MARTINS, Sérgio Pinto. Direito da Seguridade Social. p. 66. 83 MARTINS, Sérgio Pinto. Direito da Seguridade Social. p. 66. 84 MARTINS, Sérgio Pinto. Direito da Seguridade Social. p. 66 e 67. 85

MARTINS, Sérgio Pinto. Direito da Seguridade Social. p. 67.

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esse empregado. Assim como a teoria do premio de seguro, independe da vontade ao

pagamento desta contribuição, em virtude de lei.86

Martins ainda defende que não tem natureza salarial ao afirmar:

[...] não é salário, pois não é pago diretamente pelo empregador ao empregado (art. 457 CLT), mas pelo INSS, nem o empregado vai receber o mesmo valor que perceberia como salário em caso da aposentadoria, em razão do achatamento dos cálculos do benefício e do estabelecimento de um valor-teto de aproximadamente dez salários mínimos.87

Autônomos e empresários também podem receber os benefícios,

mesmo que não recebam salário, desde que contribuam com a seguridade social,

conforme previsão na lei. 88

2.1.2.3 Teoria do salário anual

Para explicar esta teoria, Martins ressalta que:

A contraprestação do trabalho do empregado é retribuída pelo empregador mediante o pagamento de duas quotas: uma que é entregue diretamente ao operário, constituindo-se em retribuição pelos serviços prestados; outra que é imediata e obrigatoriamente destinada aos fins da seguridade social. 89

No entanto, a quota destinada à seguridade social “visa assegurar

uma existência digna para a garantia da satisfação de necessidades futuras”, como a

86 MARTINS, Sérgio Pinto. Direito da Seguridade Social. p. 67. 87 MARTINS, Sérgio Pinto. Direito da Seguridade Social. p. 67. 88 MARTINS, Sérgio Pinto. Direito da Seguridade Social. p. 67. 89 MARTINS, Sérgio Pinto. Direito da Seguridade Social. p. 69.

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aposentadoria, morte, invalidez, ou qualquer outro benefício que ao beneficiário possa

ser prestado, sendo que este evento futuro e incerto, venha prejudicar a situação

econômica deste beneficiário.90

Ademais, esta teoria é criticada, pois não há lei que a sustente

plenamente e o salário não é pago pelo empregador, conforme especifica o art. 457 da

CLT91, e dita como ultrapassada.92

2.1.2.4 Teoria fiscal

A teoria fiscal afirma que as contribuições estão incluídas no

direito tributário, visto que abrangem o conceito de tributo elencado no art. 3° do CTN.

Neste sentido, afirmam Carlos Alberto Pereira de Castro e João Batista Lazzari ao tratar

sobre o tema e explicam:

De acordo com a teoria fiscal, a contribuição para a seguridade social tem natureza tributária, pois se trata de uma prestação pecuniária compulsória instituída por lei e cobrada pelo ente público arrecadador com a finalidade de custear as ações nas áreas da saúde, previdência e assistência social. O fato de não se enquadrar como imposto, taxa ou contribuição de melhoria, espécies de tributo relacionados no art. 145 da Constituição Federal e no art. 5° do Código Tributário Nacional, não afasta sua natureza tributária, isto porque a instituição das contribuições sociais está prevista no art. 149 da Constituição, que compõe o capítulo “Do Sistema Tributário Nacional”.93

90 MARTINS, Sérgio Pinto. Direito da Seguridade Social. p. 69. 91

BRASIL. Consolidação das leis do trabalho. Vade mecum. 2 ed. rev., ampl. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. p.761. 92 MARTINS, Sérgio Pinto. Direito da Seguridade Social. p. 69. 93 CASTRO, Carlos Alberto Pereira de. LAZZARI, João Batista. Manual de Direito Previdenciário. p. 205.

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Carlos Alberto Pereira de Castro e João Batista Lazzari citam

ainda Roque Antonio Carrazza que defende esta natureza tributária das contribuições

sociais ao afirmar que as contribuições são necessariamente tributos por obedecerem

ao Sistema Tributário Nacional, bem como aos princípios que nos norteiam.94

Para Sérgio Pinto Martins, a teoria é inadequada, pois não se

pode classificar a contribuição social em nenhuma das espécies tributárias, citadas pela

Constituição Federal.95

2.1.2.5 Teoria parafiscal

Sobre a teoria parafiscal, Carlos Alberto Pereira de Castro e João

Batista Lazzari endossam:

[...] há que diferenciar os tributos fiscais dos parafiscais. A contribuição para a Seguridade Social teria a natureza da parafiscalidade, pois busca suprir os encargos do Estado, que não lhe sejam próprios, no caso, o pagamento de benefícios previdenciários.96

E ainda, explicam que as receitas têm um orçamento distinto do

orçamento da União, um sistema próprio, e os recursos servem basicamente para o

atendimento das principais necessidades econômicas e sociais de alguns grupos ou

categorias profissionais e econômicas. Por fim, “embora a exigência da contribuição

94 CASTRO, Carlos Alberto Pereira de. LAZZARI, João Batista. Manual de Direito Previdenciário p. 206. 95 MARTINS, Sérgio Pinto. Direito da Seguridade Social. p. 70. 96 CASTRO, Carlos Alberto Pereira de. LAZZARI, João Batista. Manual de Direito Previdenciário p. 206.

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seja compulsória, o regime especial de contabilização financeira afasta a natureza

fiscal”. 97

2.1.2.6 Teoria da exação sui generis

Ao tratar das exações, Eduardo Rocha Dias e José Leandro

Monteiro de Macedo, explicam que “são instrumentos da ação estatal na área social e

econômica, atendendo também aos interesses de categorias profissionais e

econômicas”. 98

Wladimir Novaes Martinez ao tratar sobre este tema ressalta:

A natureza jurídica da exação previdenciária é a área na qual o Direito Previdenciário mais se relaciona com o Direito Tributário. Sede de formidáveis divergências entre publicistas e previdenciaristas, tem estimulado enormemente os estudiosos e propiciando respeitável posição doutrinaria.

Entretanto, para Carlos Alberto Pereira de Castro e João Batista

Lazzari a exação sui generis não está implícita no Direito Tributário, pois não possui

natureza fiscal e muito menos parafiscal, conforme as teorias anteriores demonstraram.

De forma que passa a ser interpretada como uma “imposição estatal atípica”, baseada

em uma natureza jurídica “especial”.99

Martins, em suma, explica que não é tributo, pois é “uma exação

sui gênesis, isto é, uma exigência compulsória, com previsão legal” e afirma que é a

97 CASTRO, Carlos Alberto Pereira de. LAZZARI, João Batista. Manual de Direito Previdenciário. p. 206. 98 DIAS, Eduardo Rocha e MACEDO, José Leandro Monteiro de. Curso de direito previdenciário. p. 396. 99 CASTRO, Carlos Alberto Pereira de. LAZZARI, João Batista. Manual de Direito Previdenciário. p. 206.

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tese em que os doutrinadores especializados na área previdenciária se apóiam para

explicar a natureza jurídica das contribuições sociais à seguridade social.100

2.1.3 Outras fontes de custeio da previdência social

Podem ser instituídas outras fontes de custeio desde que sejam

acatados os requisitos “da prévia edição de lei complementar e da não-cumulatividade”,

de acordo com o parágrafo 4o, do art. 195 da Constituição, como explica Daniel

Machado da Rocha ao tecer os seguintes comentários:

Conquanto a Constituição tenha vedado expressamente a bitributação e o chamados bis in idem, em conformidade com a dicção do Pretório Excelso, inexiste vedação entre identidade de fato gerador e base de calculo entre impostos e contribuições de seguridade social. Assim, uma nova contribuição poderia ter a mesma base de cálculo de um imposto já existente, mas não de outra contribuição. 101

Neste sentido, Carlos Alberto Pereira de Casto e João Batista

Lazzari interpretam que poderão ser criadas outras fontes de custeio mediante lei

complementar, “sendo para financiar novos benefícios e serviços, seja para manter os

já existentes”, muito embora esteja o legislador impossibilitado de criar ou estender

benefício ou serviço, ou aumentar o seu valor, sem que indique uma fonte de custeio

determinada atender as despesas geradas.102

Leciona Marcelo Leonardo Tavares ao citar outras formas de

receita da seguridade social, como as multas, a atualização monetária e os juros

100 MARTINS, Sérgio Pinto. Direito da Seguridade Social. p. 71. 101 VELLOSO, Andei Pitten; ROCHA, Daniel Machado da, JUNIOR José Paulo Baltazar. Comentários à lei do custeio da seguridade social: Lei n. 8.212 de 24 de julho de 1991, atualizada até a LC 118/2005. p. 58. 102 CASTRO, Carlos Alberto Pereira de. LAZZARI, João Batista. Manual de Direito Previdenciário. p. 200.

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moratórios; a remuneração dos serviços prestados de arrecadação, fiscalização, e

cobrança a terceiros; receitas da prestação de outros serviços e de fornecimento ou

arrendamento de bens; as demais receitas patrimoniais, industriais e financeiras; as

doações, legados, subvenções e outras receitas eventuais; cinqüenta por cento da

receita arrecadada na forma do parágrafo único do art. 243 da Constituição; quarenta

por cento do resultado de leiloes dos bens apreendidos pela Secretaria da Receita

Federa (SRF); cinqüenta por cento do valor total do premio recolhido, destinando ao

Sistema Único de Saúde (SUS); e outras receitas previstas em legislações específicas,

as quais estão dispostas no art. 27 da Lei n. 8. 212/91.103

Sobre estas outras fontes de receitas da seguridade social Carlos

Alberto Pereira de Castro e João Batista Lazzari afirmam:

Tais receitas não se constituem contribuições sociais, pois não se revestem das características de tributo. As multas, exigidas por infração à legislação, são penalidades pecuniárias; os juros também se caracterizam como espécie de penalidade pelo inadimplemento; as demais verbas constantes do dispositivo se revelam como transferências de recursos públicos aos cofres da Seguridade Social. 104

Podemos também acrescentar as contribuições dos segurados

facultativos, visto que estes não se enquadram em nenhuma das classificações até aqui

mencionadas e considerando que se filiam voluntariamente, visto que não obtêm

ligação alguma com uma “fonte de rendimentos tributáveis” no âmbito da seguridade

social.105

Ante o exposto, será acrescentado o entendimento sobre o custeio

da assistência social brasileira.

103 TAVARES, Marcelo Leonardo. Direito previdenciário: Regime geral de previdência social e regimes próprios de previdência social. 8.ed. ver., ampl. e atual. até a Emenda Constitucional 47/2005. p. 311. 104 CASTRO, Carlos Alberto Pereira de. LAZZARI, João Batista. Manual de Direito Previdenciário. p. 209. 105 OLIVEIRA, Lamaratino França de. Direito previdenciário. p. 53.

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2.2 CUSTEIO DA ASSISTÊNCIA SOCIAL BRASILEIRA

O custeio da assistência social será prestado com recursos da

seguridade social, financiada por toda a sociedade direta ou indiretamente, pelos

sujeitos já mencionados neste capítulo, conforme dispõe o art. 204 da Constituição:

Art. 204 As ações governamentais na área da assistência social serão realizadas com recursos do orçamento da seguridade social, previstos no art. 195, além de outras fontes, [...]

O financiamento da assistência social, quanto aos benefícios,

serviços, programas, entre outros projetos que prevê a Lei 8.742 de 1993, será

estabelecido pelos Entes Estatais, tais como a União, os Estados, o Distrito Federal e

os Municípios, e ainda, pelas contribuições sociais prestadas à seguridade social,

elencadas no art. 195 da Constituição, bem como os recursos que compõem o Fundo

Nacional da Assistência Social (FNAS), que é gerido pelo “órgão da Administração

Pública Federal responsável pela coordenação da Política Nacional de Assistência

Social, o CNAS”. 106

O FNAS traçou seus objetivos e é definido da seguinte forma:

O Fundo Nacional de Assistência Social (FNAS), instituído pela Lei n° 8.742, de 7 de dezembro de 1993, tem por objetivo proporcionar recursos e meios para financiar o benefício de prestação continuada e apoiar serviços, programas e projetos de assistência social. Cabe ao Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, como órgão responsável pela coordenação da Política Nacional de Assistência

106 MARTINS, Sérgio Pinto. Direito da Seguridade Social. p. 488.

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Social, gerir o Fundo Nacional de Assistência Social, sob orientação e controle do Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS).107

Assim, os recursos da “União destinados à assistência social

serão automaticamente repassados ao FNAS, à medida que se forem realizando as

receitas”, enquanto os recursos que financiam os benefícios assistenciais serão

repassados pelo Ministério da Previdência Social para o INSS, que é o “órgão

responsável por sua execução e manutenção”.108

Sobre este tema, dispõe Sérgio Pinto Martins:

É condição para transferência de recursos do FNAS ao Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios a comprovação orçamentária dos recursos próprios destinados à Assistência Social, alocados em seus respectivos fundos de Assistência Social. A partir do exercício de 1999. 109

No capítulo seguinte, será estudado o Benefício Assistencial de

Prestação Continuada, foco desta pesquisa, analisando seus requisitos e a sua

aplicabilidade no ramo previdenciário à luz do principio da dignidade da pessoa

humana.

107 http://www.mds.gov.br/institucional/fundo-nacional-de-assistencia-social-fnas acessado em 4 de outubro de 2008. 108 MARTINS, Sérgio Pinto. Direito da Seguridade Social. p. 488. 109 MARTINS, Sérgio Pinto. Direito da Seguridade Social. p. 489.

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3. O BENEFÍCIO ASSISTENCIAL, A ANÁLISE DE SEUS REQUISITOS

FRENTE AO PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA

Em se tratando de prestações assistenciais, ou seja, benefícios

prestados pela Assistência Social de uma forma geral, Simone Barbisan Fortes traz o

seguinte entendimento:

Os benefícios são, portanto, prestações assistenciais de cunho pecuniário, alcançadas aos cidadãos que se encontrem nas situações de necessidade constitucional e legalmente fixadas, com valor variável (conforme a continência enfrentada), nunca superior a um salário mínimo mensal.110

Entendendo o objetivo específico dos benefícios assistenciais,

passaremos a nos aprofundar no estudo selecionado do tema proposto por esta

monografia, que é o benefício assistencial de prestação continuada e seus requisitos,

buscando a sua aplicabilidade no direito perante os Tribunais dos Estados, a Turma

Nacional de Uniformização de Jurisprudência dos Juizados Especiais, bem como sua

relevância frente ao STJ e STF.

3.1 BENEFÍCIO ASSISTENCIAL E SEUS REQUISITOS

O benefício quando instituído na forma de renda mensal vitalícia,

em 1974 pela lei n. 6.179, era conhecido como “amparo previdenciário”, conforme

110 FORTES, Simone Barbisan. PAULSSEN, Leandro. Direito da seguridade social: Prestações e custeio da previdência, assistência e saúde. p. 274.

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consta na lei, todavia o termo ainda é utilizado. No entanto, naquela época o benefício

era prestado em metade de um salário mínimo.111

Para explicar como funcionava tal benefício àquela época João

Ernesto Aragonés Vianna dispõe em sua obra que “era devida ao maior de 70 anos ou

ao inválido que não exercesse atividade remunerada e que comprovasse não possuir

meios de provar sua própria subsistência ou de tê-la provida por sua família“.112

Primeiramente, foi reconhecido no art. 203, V, da Constituição, a

“garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e

ao idoso que comprovem não possuir meio de prover sua própria manutenção ou de tê-

la provida por sua família, conforme dispuser a lei”.

Com a Lei n. 8.213 de 1991, o benefício passou a ser prestado no

valor de um salário mínimo, de acordo com o art. 139. Somente foi regulamentado com

a Lei n. 8.742 de 1993, nos arts. 20 e 21 e o Decreto n. 1.744 de 1995, implantando

assim, o benefício de prestação continuada e passando a ficar extinta a renda mensal

vitalícia.113

O art. 20, caput, da Lei Orgânica de Assistência Social assim

dispõe, em seu capítulo IV:

Art 20 - O benefício de prestação continuada é a garantia de 1 (um) salário mínimo mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso com 70 (setenta) anos ou mais e que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família.

111 MARTINS, Sérgio Pinto. Direito da Seguridade Social. p. 492. 112 VIANNA, João Ernesto Aragonés. Curso de direito previdenciário. 2 ed. – São Paulo: LTr, 2007. p. 38. 113 MARTINS, Sérgio Pinto. Direito da Seguridade Social. p. 492.

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Sobre a importância deste benefício, Simone Barbisan Fortes

ressalta que este “é o primeiro dos benefícios garantidos pela Assistência Social, e o

único que encontra sua específica previsão na própria Constituição Federal [...]”.

A pessoa que percebe outro tipo de benefício pecuniário, não terá

direito ao benefício de prestação continuada, em virtude da inacumulatividade com

outros benefícios, muito embora, ainda tenha direito à assistência médica prestada pela

Assistência Social. De forma que não há período de carência, pois a lei não especifica

tal aspecto.114

Sobre o §5° do art. 20, da Lei Orgânica de Assistência Social, Lei

n. 8742/93, Simone Barbisan Fortes esclarece:

[...] a situação de internato não prejudica o direito do idoso ou do portador de deficiência ao beneficio. Trata-se de importante referencia, já que muitas vezes os indivíduos idosos ou deficientes em situação de miserabilidade acabam sendo abandonados pelas famílias, e recolhidos em abrigos, geralmente municipais (asilos e casas de crianças) e, em tal situação, sem renda alguma, não ficam alijados do direito à prestação.115

Nesses casos nada impede que o valor percebido pelo idoso ou

deficiente seja repassado à entidade que os abriga no intuito de que este valor seja

utilizado no auxílio a sua subsistência.116

Vislumbra-se até aqui, que os beneficiários são exatamente os

idosos e deficientes que comprovem não possuir meios de prover sua própria

subsistência ou ao menos tê-la provida por seus familiares, e que se enquadrem nos

114 MARTINS, Sérgio Pinto. Direito da Seguridade Social. p. 494 e 495. 115 FORTES, Simone Barbisan. PAULSSEN, Leandro. Direito da seguridade social: Prestações e custeio da previdência, assistência e saúde. p. 276. 116 IBRAHIM, Fabio Zambitte. Curso de direito previdenciário. p. 15.

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requisitos estipulados nos parágrafos do art. 20 da Lei n. 8742/93. Ademais, o

beneficiário não precisa ter contribuído para a seguridade social.117

O benefício será concedido apenas aos brasileiros, cidadãos, que

não sejam amparados por qualquer outro sistema de previdência social ou ao

estrangeiro que seja naturalizado e esteja domiciliado neste país, desde que também

não esteja amparado por outro sistema previdenciário, mesmo que estrangeiro.118

Para a concessão deste benefício exige-se o preenchimento dos

requisitos de caráter pessoal do requerente, de acordo com os doutrinadores Carlos

Alberto Pereira de Castro e João Batista Lazzari:

Comprovação da deficiência ou da idade mínima de 65 anos para o idoso não-deficiente;

Renda familiar mensal per capita inferior a ¼ do salário mínimo; 119

Estes requisitos serão aprofundados com base em doutrinas e

jurisprudências pesquisadas no âmbito nacional.

3.1.1 Conceito de família

A Lei nº. 8.742/93, em seu art. 20, §1º, preceitua que a família

incapacitada é o conjunto de pessoas elencadas no artigo 16 da Lei nº. 8.213/91, desde

que vivam sob o mesmo teto. Dispõe o artigo supra citado:

117 FORTES, Simone Barbisan. PAULSSEN, Leandro. Direito da seguridade social: Prestações e custeio da previdência, assistência e saúde. p. 276. 118 IBRAHIM, Fabio Zambitte. Curso de direito previdenciário. p. 15. 119 CASTRO, Carlos Alberto Pereira de. LAZZARI, João Batista. Manual de Direito Previdenciário. p. 550.

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Art. 16. São beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, na condição de dependentes do segurado:

I - o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho não emancipado de qualquer condição, menor de vinte e um anos ou inválido;

II - os pais; ou

III - o irmão não emancipado, de qualquer condição, menor de vinte e um anos ou inválido.

Assim, sobre o conceito de família, com base no artigo

mencionado, Sérgio Pinto Martins traz o seguinte ensinamento, o qual é corroborado

por Carlos Alberto Pereira de Casto e João Batista Lazzari:

Entende-se por família a unidade mononuclear, vivendo sob o mesmo teto, cuja economia é mantida pela contribuição de seus integrantes. Unidade mononuclear compreende o cônjuge, companheiro (a), filho (a) menor de 21 anos, pais, irmãos menores de 21 anos.120

Este benefício é intransferível, não podendo ser objeto de pensão

por morte, extinguindo-se com a cessação. Entretanto, o valor que o beneficiário

deveria receber em vida será pago aos seus herdeiros. Ademais, o benefício pode ser

pago a mais de um membro da família, desde que cumpram as condições exigidas

pelos seus requisitos.121

Para a comprovação do vínculo familiar das pessoas relacionadas

no art. 16 da Lei nº. 8.213/91, exige-se:

a. Cônjuge: certidão de casamento;

b. Ausência: sentença declaratória de ausência, regularmente inscrita no Registro Civil das Pessoas Naturais (Art. 29, VI, da Lei nº 6.015/73);

120 MARTINS, Sérgio Pinto. Direito da Seguridade Social. p. 493. 121 IBRAHIM, Fabio Zambitte. Curso de direito previdenciário. p. 15.

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c. Separado judicialmente: certidão de casamento com a averbação desta situação;

d. Viúvo: certidão de casamento e certidão de óbito do cônjuge falecido;

e. Companheiro: declaração firmada pelo pleiteante ou seu representante legal;

f. Pais: certidão de nascimento do requerente e documentos de identidade dos pais;

g. Filhos: certidões de nascimento;

h. Irmão não emancipado, menor de 21 anos ou inválido: certidão de nascimento;

i. Enteado: certidão de nascimento do enteado; certidão de casamento do requerente com a mãe ou pai do seu enteado;

j. Menor tutelado: certidão judicial de tutela.

Assim, busca-se o estudo do requisito etário, que é destinado

apenas à comprovação da idade do idoso, não interferindo no benefício daquele que é

portador de deficiência.

3.1.2 Requisito etário

O art. 20 da Lei n. 8.742/93 afirma que o benefício assistencial

será prestado à pessoa portadora de deficiência ou ao idoso com idade igual ou

superior a 70 anos de idade. De uma forma lógica, a apresentação deste requisito não

vale para os portadores de deficiência, e sim para os idosos.

Todavia, este requisito era aplicável apenas no momento da

regulamentação e explicam Eduardo Rocha Dias e José Leandro Monteiro de Macedo

que este requisito obteve três “fases” até chegarmos ao conceito atual, conforme

veremos:

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no período de 1.° de janeiro de 1996 a 31 de dezembro de 1997, vigência da redação original do art. 38 da lei 8.742, de 1993, a idade mínima para o idoso era a de 70 anos;

a partir de 1.° de janeiro de 1998, a idade mínima para o idoso passou a ser de 67 anos, conforme nova redação ai art. 38 (Lei 8.742, de 1993) dada pela MP 1.599-39, de 1997, e reedições, convertida na Lei 9.720, publicada no DOU em 1° de dezembro de 1998;

a partir de 1.° de janeiro de 2004, a idade mínima para o idoso passou a ser de 65 anos, conforme o art. 34 da Lei 10.741, de 1.° de outubro de 2003.122

Neste sentido, considerar-se-á pessoa idosa, a qual poderá dispor

do benefício assistencial, aquela que se enquadra conforme o art. 34, caput, da Lei n.

10.741123 de 2003, conhecida como Estatuto do Idoso, que dispõe:

Art. 34. Aos idosos, a partir de 65 (sessenta e cinco) anos, que não possuam meios para prover sua subsistência, nem de tê-la provida por sua família, é assegurado o benefício mensal de 1 (um) salário-mínimo, nos termos da Lei Orgânica da Assistência Social – LOAS.

Assim, a comprovação de sua idade se dá por meio da

apresentação de alguns destes documentos para que seja cumprida essa condição à

concessão do benefício (art. 8º, Decreto nº. 1.744/95):

a. certidão de nascimento;

b. certidão de casamento;

c. certidão de reservista;

d. carteira de identidade;

122 DIAS, Eduardo Rocha e MACEDO, José Leandro Monteiro de. Curso de direito previdenciário. p. 372. 123

BRASIL. Lei n. 10.741, de 1° de outubro de 2003. Estatuto do Idoso. DF: Senado Federal, 2003.

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e. Carteira de Trabalho e Previdência Social (CTPS) emitida há mais de cinco anos ou certidão de inscrição eleitoral.

Quando se tratar de beneficiário idoso naturalizado e domiciliado

no Brasil, a prova da idade se dá através dos documentos supra arrolados ou do título

declaratório de nacionalidade brasileira; passaporte e certidão ou guia de inscrição

consular ou certidão de desembarque devidamente autenticadas (art. 9º, Decreto nº.

1.744/95).

3.1.3 Requisito deficiência

O art. 2° da Lei n. 7.853 de 1989, que trata sobre os deficientes

dispôe sobre os seus direitos:

Artigo 2º - Ao Poder Público e seus órgãos cabe assegurar às pessoas portadoras de deficiência o pleno exercício de seus direitos básicos, inclusive dos direitos à educação, à saúde, ao trabalho, ao lazer, à previdência social, ao amparo à infância e à maternidade, e de outros que, decorrentes da Constituição e das leis, propiciem seu bem-estar pessoal, social e econômico. (grifo nosso)

Ademais, o §2° do art. 20 da Lei n. 8.742, de 1993, afirma que

“para a concessão deste benefício, a pessoa portadora de deficiência é aquela

incapacitada para a vida independente e para o trabalho”.

Acrescenta, nestes termos, Sérgio Pinto Martins ao esclarecer seu

conceito:

Considera-se pessoa portadora de deficiência a incapacitada para a vida independente e para o trabalho, em razão das anomalias ou lesões

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irreversíveis de natureza hereditária, congênita ou adquirida, que empeçam o desempenho de suas atividade e de sua vida diária e do trabalho.124

O site de pesquisa Wikipédia traz um breve conceito para definir o

significado de deficiência:

Deficiência é o termo usado para definir a ausência ou a disfunção de uma estrutura psíquica, fisiológica ou anatômica. Diz respeito à biologia da pessoa. Este conceito foi definido pela Organização Mundial de Saúde. A expressão pessoa com deficiência pode ser aplicada referindo-se a qualquer pessoa que possua uma deficiência. Contudo, há que se observar que em contextos legais ela é utilizada de uma forma mais restrita e refere-se a pessoas que estão sob o amparo de uma determinada legislação.125

Neste sentido foi editada a súmula 29 da Turma Nacional de

Uniformização dos Juizados Especiais Federais, ao entender que na análise do §2 do

art. 20 da Lei n. 8742/93, a “incapacidade para a vida independente não só é aquela

que impede as atividades mais elementares da pessoa, mas também a impossibilita de

prover ao próprio sustento”.

A jurisprudência pacífica no Superior Tribunal de Justiça é no

sentido de que basta a comprovação de que o requerente é incapaz de exercer suas

atividades laborativas:

PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. ASSISTÊNCIA SOCIAL. PREVISÃO CONSTITUCIONAL. ART. 20, § 3º, DA LEI Nº 8.742/93. ANÁLISE DO CRITÉRIO UTILIZADO PELO TRIBUNAL DE ORIGEM PARA AFERIR A RENDA MENSAL. IMPOSSIBILIDADE DE REAPRECIAÇÃO POR ESTA CORTE. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 7/STJ. RECURSO ESPECIAL IMPROVIDO.

124 MARTINS, Sérgio Pinto. Direito da Seguridade Social. p. 493. 125 <http://pt.wikipedia.org/wiki/Deficiencia> Acessado em 20 de outubro de 2008.

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1. O benefício de prestação continuada é uma garantia constitucional, de caráter assistencial, previsto no art. 203, inciso V, da Constituição Federal, e regulamentado pelo art. 20 da Lei nº 8.742/93, que consiste no pagamento de um salário mínimo mensal aos portadores de deficiência ou idosos que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção e nem de tê-la provida pelo núcleo familiar.

[...]

3. Infere-se dos autos que o Tribunal de origem reconheceu que os autores – comprovadamente portadores de distúrbios mentais – preenchem os requisitos legais para o deferimento do pleito, não só em virtude da deficiência física, da qual decorre a total incapacidade para o trabalho, como também por restar comprovado o seu estado de miserabilidade.

[...]126

Eduardo Rocha Dias e José Leandro Monteiro de Macêdo afirmam

que para os menores de 16 anos basta atestar a sua deficiência e seu “impacto na

limitação do desempenho de atividade e restrição da participação social”, não se

fazendo necessária à incapacidade para o trabalho.127

E neste sentido afirma também Carlos Alberto Pereira de Castro e

João Batista Lazzari:

Em relação aos menores de dezesseis anos de idade, a avaliação médico-pericial deverá apenas verificar a existência da deficiência, em razão de eu a incapacidade para a vida independente e para o trabalho, em virtude de tenra idade, é presumida.128

126 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Resp n. 1025181/RS. Sexta Turma. Rel. Min Maria Thereza de Assis Moura. Julgado em 11 de setembro de 2008. <http://www.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/doc.jsp?livre=beneficio+assistencial+deficiencia&&b=ACOR&p=true&t=&l=10&i=1> Acessado em 20 de outubro de 2008. 127 DIAS, Eduardo Rocha e MACEDO, José Leandro Monteiro de. Curso de direito previdenciário. p. 374. 128 CASTRO, Carlos Alberto Pereira de. LAZZARI, João Batista. Manual de Direito Previdenciário. p. 550.

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Para acrescentar tal critério, o voto complementar em seu inteiro

teor do Desembargador Federal Rômulo Pozzolatti, do Tribunal Regional Federal da 4ª

Região afirma:

Destarte, estando os autores, substituídos na presente ação, incapacitados para o trabalho, também o estão para a vida independente, independentemente do fato de eventual necessidade de auxílio de terceiros para alimentar-se ou mesmo vestir-se, pelo que resta atendido o requisito estabelecido no art. 20 da Lei n.º 8.742/93, para o deferimento do benefício.

Como visto, é de ser mantida a sentença recorrida, quando reputa como portador de deficiência, para efeitos da concessão do benefício de prestação continuada, o interessado que apresente dependência qualificada ou grau mais acentuado, assim compreendido "quando o portador de deficiência que decorra de lesão, deformidade, doença congênita ou grave enfermidade, em razão de total incapacidade para o trabalho, constatável ao tempo do exame pericial, tem sujeitada sua manutenção à providência alheia, necessitando ou não de atendimento específico de natureza pedagógica ou terapêutica, e estando ou não em condições de freqüência ou internamento em estabelecimento de educação especial. A possibilidade de habilitação profissional não prejudica sua caracterização.” 129

Nestes termos, Simone Barbisan Fortes afirma que o conceito

constitucional tem que ser tratado de forma diferente. Este trata especificamente

daqueles não têm meios de prover a sua própria subsistência e nem, ao menos,

praticar atos habituais independentemente, sendo que o principal é a incapacidade de

exercer atividades laborativas.130

129 BRASIL. Tribunal Regional Federal da 4ª Região. AC n. 200671170010953/RS. Quinta Turma. Rel Dês. Federal Rômulo Pozzolatti. Julgado em 11 de setembro de 2008. <http://www.trf4.jus.br/trf4/jurisjud/inteiro_teor.php?orgao=1&documento=2157974> Acessado em 20 de outubro de 2008. 130 FORTES, Simone Barbisan. PAULSSEN, Leandro. Direito da seguridade social: Prestações e custeio da previdência, assistência e saúde. p. 277.

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Conclui-se que para os principais tribunais a independência

necessariamente para o trabalho, também se faz à vida independente, havendo ou não

auxílio de terceiros para as atividades habituais.

Ante o exposto, estudar-se-á o requisito de miserabilidade do

grupo familiar, conforme trata o art. 20, §3° da Lei Orgânica de Assistência Social.

3.1.4 Condição socioeconômica ou de miserabilidade

Nos resta então, avaliar o último requisito, o qual dispõe o art. 20,

§3° da Lei n. 8.742, de 1993, “considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa

portadora de deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a

1/4 (um quarto) do salário mínimo”, definindo-se, assim, um limite objetivo de forma a

interpretar a miserabilidade do grupo familiar.

Para explicar, Carlos Alberto Pereira de Castro e João Batista

Lazzari afirmam que “o critério estabelecido no dispositivo legal é objetivo, ou seja, uma

vez constatada a percepção de valor inferior a ¼ do salário mínimo por cada um dos

membros do grupo familiar, a miserabilidade é presumida”.131

Este limite objetivo de renda foi objeto de discussão por parte do

Supremo Tribunal Federal e foi declarada a sua constitucionalidade na Ação Direta de

Inconstitucionalidade, que contestava a validade do § 3° do artigo já mencionado

anteriormente, sendo julgada improcedente e afirmando que a Constituição tem poder

para classificar o conceito de miserabilidade, cuja ementa afirma:132

131 CASTRO, Carlos Alberto Pereira de. LAZZARI, João Batista. Manual de Direito Previdenciário. p. 551. 132 FORTES, Simone Barbisan. PAULSSEN, Leandro. Direito da seguridade social: Prestações e custeio da previdência, assistência e saúde. p. 277.

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CONSTITUCIONAL. IMPUGNA DISPOSITIVO DE LEI FEDERAL QUE ESTABELECE O CRITÉRIO PARA RECEBER O BENEFÍCIO DO INCISO V DO ART. 203, DA CF. INEXISTE A RESTRIÇÃO ALEGADA EM FACE AO PRÓPRIO DISPOSITIVO CONSTITUCIONAL QUE REPORTA À LEI PARA FIXAR OS CRITÉRIOS DE GARANTIA DO BENEFÍCIO DE SALÁRIO MÍNIMO À PESSOA PORTADORA DE DEFICIÊNCIA FÍSICA E AO IDOSO. ESTA LEI TRAZ HIPÓTESE OBJETIVA DE PRESTAÇÃO ASSISTENCIAL DO ESTADO. AÇÃO JULGADA IMPROCEDENTE.133

Contudo, não é esse o posicionamento prevalecente no Superior

Tribunal de Justiça, tampouco nos Tribunais Federais e no âmbito da Turma Nacional

de Uniformização dos Juizados Especiais Federais, os quais entendem que o critério de

aferição da renda mensal, previsto no art. 20, § 3º, da Lei nº 8.742/93, deve ser tido

como um limite mínimo, um valor considerado insatisfatório à subsistência da pessoa

portadora de deficiência ou idosa, não impedindo, porém, que o julgador faça uso de

outros fatores que digam respeito à situação econômico-financeira do beneficiário e que

tenham a finalidade de comprovar a condição de miserabilidade da parte e de sua

família.

Nesse sentido, colaciona-se os julgados a seguir elencados do

Superior Tribunal de Justiça;

PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL. ASSISTÊNCIA SOCIAL. BENEFÍCIO DA PRESTAÇÃO CONTINUADA. REQUISITOS LEGAIS. ART. 20, § 3º, DA LEI Nº 8.742/93. ANÁLISE DE DISPOSITIVO CONSTITUCIONAL. IMPOSSIBILIDADE EM SEDE DE RECURSO ESPECIAL.

I - A assistência social foi criada com o intuito de beneficiar os miseráveis, pessoas incapazes de sobreviver sem a ação da Previdência.

133 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. ADIn. n. 1.232/DF, STF, Tribunal Pleno. Rel. Min. Ilmar Galvão e rel. para acórdão Min. Neslson Jobim. Julgado em 27 de agosto de 1998. <http://www.stf.gov.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=(ADI$.SCLA.%20E%201232.NUME.)%20OU%20(ADI.ACMS.%20ADJ2%201232.ACMS.)&base=baseAcordaos > acessado em 21 de outubro de 2008.

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II - O preceito contido no art. 20, § 3º, da Lei nº 8.742/93 não é o único critério válido para comprovar a condição de miserabilidade preceituada no art. 203, V, da Constituição Federal. A renda familiar per capita

inferior a 1/4 do salário-mínimo deve ser considerada como um limite mínimo, um quantum objetivamente considerado insuficiente à subsistência do portador de deficiência e do idoso, o que não impede que o julgador faça uso de outros fatores que tenham o condão de comprovar a condição de miserabilidade do autor. Precedentes.

(...)

Agravo regimental desprovido.134

E, ainda, a jurisprudência da Turma Nacional de Uniformização

dos Juizados Especiais Federais:

BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. LIMITE DE ¼ DO SALÁRIO MÍNIMO PREVISTO NO § 3°, ART. 20, DA LEI N° 8.742/93.

1. A Turma Recursal de Tocantins negou ao autor o direito ao beneficio assistencial sob o fundamento de sua renda ultrapassar o limite de ¼ (um quarto) de salário mínimo, previsto artigo 20 da Lei 8.742/1993.

2. A questão atinente à comprovação da miserabilidade vem sofrendo modificações jurisprudenciais, para considerar que o preceito contido no art. 20, §3º da Lei nº 8.742/93 não é o único critério válido para comprovar a condição de miserabilidade preceituado no artigo 203, V, da Constituição Federal.

3. Incidente conhecido e parcialmente provido, para anular o acórdão e sentença proferidos.135

134 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. AgRg no REsp 835.439/SP, Quinta Turma, Rel.Min. Felix Fischer. Julgado em 9/10/2006. <http://www.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/doc.jsp?livre=%28%28%27AGRG+NO+RESP%27.clap.+ou+%27AGRG+NO+RESP%27.clas.%29+e+%40num%3D%27835439%27%29+ou+%28%27AGRG+NO+RESP%27+adj+%27835439%27.suce.%29&&b=ACOR&p=true&t=&l=10&i=1> Acessado em 18 de outubro de 2008. 135 BRASIL. TNU – JEFs. Ped. De Unif. De int. de Lei Federal n. 200543009039683. Rel. Juíza Federal Maria Divina Vitória. Julgado em 13 de agosto de 2007. <http://www.jf.jus.br/juris/?> Acessado em 21 de outubro de 2008.

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Ademais, a Lei 9533, de 1997, “estabeleceu critério mais

vantajoso para a análise objetiva da miserabilidade”, em seu art. 5°, inciso I, ao definir

renda familiar per capita inferior a ½ do salário mínimo, abrangendo assim, um maior

número de grupos familiares, com base no princípio da dignidade da pessoa

humana.136

Sobreveio então, a Lei. 10.689 de 2003, que instituiu o Programa

Nacional de Acesso à Alimentação (PNAA), a qual declarou no §2° do art. 2°, que seus

benefícios seriam concedidos àquelas famílias onde a renda mensal per capita fosse

inferior a ½ salário mínimo.137

Daí por diante, sem exceção, os programas que tinham o intuito

de erradicar a fome e nutrir seus cidadãos, os quais abrangiam também o requisito de

renda, passaram a considerar “miserável a pessoa cuja renda per capita de seu grupo

familiar fosse inferior a ½ salário mínimo”138

A Súmula 11 da Turma Nacional, dispunha que “a renda mensal,

per capita, familiar, superior a ¼ do salário mínimo não impede a concessão de

benefício assistencial previsto no art. 20, §3°, da Lei n. 8.742 de 1993, desde que

comprovada, por outros meios, a miserabilidade do postulante”. Porém, foi cancelada

na sessão do dia 24 de abril de 2006, no julgamento do PU n. 200470950095456, Rel.

Juiz Federal Hélio Silvio Ourem Campos, publicado no DJ de 12 de maio de 2006.139

Cumpre salientar que o estatuto do idoso (Lei n. 10.741/2003)

destaca no parágrafo único do art. 34, que a renda do idoso não será computada para

136 CASTRO, Carlos Alberto Pereira de. LAZZARI, João Batista. Manual de Direito Previdenciário. p. 551. 137 CASTRO, Carlos Alberto Pereira de. LAZZARI, João Batista. Manual de Direito Previdenciário. p. 551. 138 CASTRO, Carlos Alberto Pereira de. LAZZARI, João Batista. Manual de Direito Previdenciário. p. 551. 139 CASTRO, Carlos Alberto Pereira de. LAZZARI, João Batista. Manual de Direito Previdenciário. p. 552.

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fins de cálculo da renda per capita do novo benefício requerido, já que este pode ser

concedido para mais de um membro da família.140

Para se comprovar a renda familiar per capita é necessária a

apresentação dos seguintes documentos de todos aqueles em que se enquadram no

conceito de família já especificando anteriormente que exerçam atividade remunerada:

a. CTPS com anotações atualizadas;

b. Contracheque de pagamento ou documento expedido pelo empregador;

c. Carnê de contribuição do INSS;

d. Extrato de pagamento de benefício ou declaração fornecida pelo INSS ou outro regime de previdência público ou privado; e

e. Declaração de entidade autoridade ou profissional de assistência social.141

Isto posto, através do estudo jurisprudencial realizado, pôde-se

perceber uma uniformidade no entendimento do Superior Tribunal de Justiça e da

Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais, no que se refere à

possibilidade de flexibilização do requisito esculpido no §3º do art. 20 da Lei 8.742/93,

de forma a facultar outros meios probatórios para comprovação da miserabilidade do

núcleo familiar.

Logo, estas Cortes defendem a possibilidade de o magistrado

analisar, no caso concreto, se restou preenchido ou não o requisito da miserabilidade

de tal núcleo familiar, mesmo que este apresente renda superior a ¼ de salário mínimo.

Desta forma, o que resulta desta divergência do Supremo Tribunal

Federal é a transformação do juiz em um mero aplicador estático da lei, sem condições

140 DIAS, Eduardo Rocha e MACEDO, José Leandro Monteiro de. Curso de direito previdenciário. p. 376. 141 MARTINS, Sérgio Pinto. Direito da Seguridade Social. p. 495.

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de interagir e de formar seu convencimento, tendo que ignorar substancialmente as

particularidades que cada caso venha a apresentar.

A seguir buscou-se à definição e o estudo do princípio da

dignidade da pessoa humana relacionando-o com o benefício assistencial, mais

especificamente quanto ao requisito que trata da condição social da família do

postulante.

3.2 PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA

Enfim, chegou-se à discussão principal do tema, que se dá em

virtude da análise do princípio constitucional da dignidade humana em face do requisito

que trata da condição socioeconômica ou miserabilidade da família, do benefício

assistencial de prestação continuada.

O princípio da dignidade da pessoa humana torna-se

constitucional por estar disposto no inciso III, do art. 1° da Constituição Federal, o qual

traz este como um direito fundamental de cada indivíduo.

Para conceituar este princípio constitucional, Alexandre de Moraes

enfatiza:

A dignidade da pessoa humana é um valor espiritual e moral inerente a pessoa, que se manifesta singularmente na autodeterminação consciente e responsável da própria vida e que traz consigo a pretensão ao respeito por parte das demais pessoas, constituindo-se em um mínimo invulnerável que todo estatuto jurídico deve assegurar, de modo que apenas excepcionalmente possam ser feitas limitações ao exercício

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dos direitos fundamentais, mas sempre sem menosprezar a necessária estima que merecem todas as pessoas enquanto seres humanos142

Maria Celina Bodin de Moraes complementa:

O princípio constitucional visa garantir o respeito e a proteção da dignidade humana não apenas no sentido de assegurar um tratamento humano e não degradante, e tampouco conduz ao mero oferecimento de garantias a integridade física do ser humano.143

Neste sentido, podemos também afirmar que o direito à vida

privada, à intimidade, à honra, à imagem, entre outros, são inclusos e complementares

ao princípio da dignidade da pessoa humana, definindo assim a importância dela ao

indivíduo.144

Tanto que está positivado também, indiretamente, nos art. 5°, III,

X, XLI, XLIII e XLIX; art. 7°, IV e XXX; art. 182; e art. 186, IV, todos da Constituição,

como uma forma de garantir, de forma ampla e específica, os direitos fundamentais ao

ser humano.145

Este princípio apresenta dois aspectos distintos. A princípio, pode-

se interpretá-lo como um direito individual protetivo, seja em relação ao Estado ou aos

demais indivíduos da sociedade e também como um dever abrangido pelos direitos

fundamentais devendo ser comum entre os indivíduos de uma mesma sociedade.146

142 MORAES, Alexandre de. Constituição do Brasil: interpretada e legislação constitucional. 3ª ed.- São Paulo. Atlas, 2003. p. 128 e 129. 143 SARLET, Ingo Wolfgang (Coord.). Constituição, direitos fundamentais e direito privado. Porto alegre. Livraria do Advogado Editora, 2003. p.116. 144 MORAES, Alexandre de. Constituição do Brasil: interpretada e legislação constitucional. p. 129. 145 SLAIBI FILHO, Nagib. Direito constitucional. 2. ed. Rio de Janeiro. Forense, 2006. p. 129. 146 MORAES, Alexandre de. Constituição do Brasil: interpretada e legislação constitucional. p. 129.

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Importante ressaltar que a Declaração Universal dos Direitos

Humanos “reconhece a dignidade como inerente a todos os membros da família

humana e como fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo”. 147

O benefício assistencial é caracterizado como um direito

fundamental social, havendo uma ligação com o princípio da dignidade da pessoa

humana, pois o benefício assistêncial é prestado as pessoas portadoras de deficiência

e aos idosos, que não podem prover sua própria manutenção ou de tê-la provida pela

sua própria família. Sendo assim, a Constituição garante que o Estado os amparará,

com a finalidade de, ao menos, obter uma vida digna.

Ademais, contempla André Ramos Tavares ao dispor sobre a

dignidade da pessoa humana na condição da pessoa idosa, que podemos interpretar

analogicamente que também serve para as pessoas deficientes:

[...] dos direitos dos idosos, entende-se que estes são os direitos decorrentes da previdência social, porque basicamente esta foi concebida como uma das principais dimensões dos direitos dos idosos.

Mas os direitos dos idosos também contemplam, atualmente, direitos outros que não apenas aqueles decorrentes da seguridade social. Assim, ao idoso é reconhecido o direito de ser amparado pelo Estado, pela Sociedade e pela família (art. 230 da C.F) [...]148

Tavares cita Paulo Roberto Barbosa Ramos que explica:

A sociedade precisa oferecer esses benefícios desde o início da existência das pessoas, porque se assim não agir estará atentando contra o direito à vida destas, uma vez que tivessem uma vida com

147 MORAES, Alexandre de. Constituição do Brasil: interpretada e legislação constitucional. p. 129. 148 TAVARES, André Ramos. Curso de direito constitucional. 5. ed. Ver. E atual. São Paulo. Saraiva, 2007. p. 522.

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dignidade, desde o princípio, teriam oportunidade de ter uma vida mais longeva.149

Contudo, fica claro que o estado detém a responsabilidade de

garantir aos indivíduos regidos por esta Constituição, uma vida digna, e neste caso,

buscar garantir aos idosos e deficientes uma condição social harmoniosa que fuja da

miserabilidade auxiliando-os por meio de seus benefícios assistenciais.

O grande problema é a definição do limite objetivo para a renda

per capita desse benefício requerido, sendo que está em desacordo com as demais

normas que tratam deste assunto e de certa forma, demasiadamente rigoroso,

impedindo algumas classes inferiores de se favorecerem do benefício, havendo assim

um conflito que fere o princípio da dignidade da pessoa humana.

Assim, a consideração do limite objetivo da renda per capita

inferior a ½ salário mínimo é importantíssima para haja respeito ao princípio da

dignidade da pessoa humana, devendo o Estado abranger um número maior de

famílias miseráveis no termo deste dispositivo para a concessão do benefício de

prestação continuada (LOAS) que hoje é de 1 (um) salário mínimo para a pessoa idosa

ou deficiente.

149 TAVARES, André Ramos. Curso de direito constitucional. p. 523.

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CONCLUSÃO

No primeiro capítulo deste trabalho abordou-se a evolução da

proteção social no Brasil, traçando-se um histórico evolutivo da mesma, passando-se a

estudar a assistência social, apresentando, também, os princípios que a norteiam.

O segundo capítulo, por suas vez, iniciou-se versando sobre o

financiamento da seguridade social, trazendo suas principais fontes de custeio, suas

funções no ordenamento jurídico, bem como o custeio da assistência social.

Por fim, o terceiro e último capítulo, foco desta pesquisa, tratou do

benefício assistencial por si só, apresentando seus requisitos, a legislação que o

regulamenta e a problemática em torno da concessão deste benefício, no tocante à

exigência de comprovação de renda familiar per capita inferior a ¼ de salário mínimo,

de forma a situar e introduzir o objeto deste estudo.

Na seqüência, tratou-se do princípio constitucional da dignidade

da pessoa humana, estabelecendo-se sua íntima relação com o benefício assistencial e

sua função constitucional.

Defendeu-se, neste capítulo, a possibilidade de o juiz aferir, no

caso concreto, a comprovação do requisito de miserabilidade do postulante ao

benefício, através da realização de um estudo sócio-econômico, ou de outro meio

idôneo de prova.

Também, levantou-se a diversidade de critérios para leis de

mesma natureza, uma vez que o Programa Federal de Garantia de Renda Mínima - Lei

nº 9.533/97, o Bolsa Escola – Lei nº 10.219/01 e o Programa Nacional de Acesso à

Alimentação- Lei nº 10.689/03 (todas com caráter assistencial), trouxeram como

parâmetro para concessão do benefício, a comprovação de renda per capita familiar

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não superior a ½ salário mínimo, ou seja, o dobro da prevista pela Lei nº 8.742/93.

Realizou-se uma análise crítica do entendimento jurisprudencial

do Superior Tribunal de Justiça, da Turma Nacional de Uniformização dos Juizados

Especiais Federais e do Supremo Tribunal Federal, acerca da observância da

comprovação, pelo postulante ao benefício assistencial, de renda per capita familiar

inferior a ¼ de salário mínimo.

Foi apurado, pela referida análise, que apenas o Supremo

Tribunal Federal apresenta entendimentos divergentes, eis que seus ministros

defendem que o benefício assistencial só pode ser concedido se o postulante

comprovar que possui a renda familiar per capita inferior ao requisito legal,

posicionamento este que não demonstra uma efetiva realização de justiça. Ainda, os

demais órgãos apresentam uma flexibilização no momento da análise do limite objetivo

imposto pelo art. 20, §3° da Lei n. 8.742/93.

Por fim, a pesquisa busca uma efetiva contribuição para a

conscientização da sociedade sobre o caráter social e propiciador de dignidade humana

que deve revestir a concessão do benefício assistencial.

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