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UNIVERSIDADE DO SUL DE SANTA CATARINA
MARIANNA HOFER NERIS
O VÍDEO-ENSAIO COMO FERRAMENTA DE DISCURSO POLÍTICO:
UMA VISÃO SOBRE A OBRA EDUCAÇÃO, DE ISAAC PIPANO E CEZAR
MIGLIORIN
Palhoça – SC
2020
UNIVERSIDADE DO SUL DE SANTA CATARINA
MARIANNA HOFER NERIS
O VÍDEO-ENSAIO COMO FERRAMENTA DE DISCURSO POLÍTICO:
UMA VISÃO SOBRE A OBRA EDUCAÇÃO, DE ISAAC PIPANO E CEZAR
MIGLIORIN
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso
de Graduação em Cinema e Audiovisual da Universidade
do Sul de Santa Catarina como requisito parcial à
obtenção do título de Bacharel em Cinema e Audiovisual.
Profa. Dra. Ana Carolina Cernicchiaro (Orientadora)
Profa. Dra. Mara Salla (Coorientadora)
Profa. Dra. Solange Gallo (Coorientadora)
Profa. Dra. Ramayana Lira de Sousa (Coorientadora)
Palhoça - SC
2020
3
Dedico este texto inteiramente a todos que me
foram presentes no caos de 2020 – de qualquer
maneira possível – e a minha orientadora, Ana,
que forneceu todos os recursos pra tornar desta
uma boa leitura.
4
A primeira crença é no cinema e na sua possibilidade de intensificar as
invenções de mundo. A segunda é na escola, como espaço em que o
risco dessas invenções é possível e desejável. O terceiro é na criança,
como aquela que tem a criar com o mundo, com os filmes. Necessidade
da arte, urgência da democracia.
Cezar Migliorin, Isaac Pipano.
5
RESUMO
O presente trabalho tem como objetivo principal compreender a metodologia, a linguagem e o
momento trabalhados por trás do filme Educação (2017), de Cezar Migliorin e Isaac Pipano,
que aborda o movimento das ocupações das escolas brasileiras pelos estudantes secundaristas
e universitários em 2015 e 2016, que se mobilizaram em busca dos seus direitos de acesso ao
espaço escolar. Para isso, será abordado o contexto histórico do cinema buscando elucidar o
leitor sobre o surgimento da técnica do vídeo-ensaio empregada pelos autores, além de debater
as possíveis pedagogias do cinema, com objetivo de compreender e assimilar com as do filme.
Para contextualização da obra, analisarei o cenário histórico nacional que ocorre durante e após
o golpe sofrido pela ex-presidenta Dilma Rousseff, um dos principais fatores que resultou nas
políticas de sucateamento da educação brasileira. Ao final, realizarei uma análise fílmica com
objetivo de entrelaçar e relacionar os assuntos abordados nesta monografia com a obra
escolhida, buscando sempre debater a relação entre política e arte.
Palavras-chave: Vídeo-ensaio; Pedagogias do cinema; Educação; Política.
6
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Figura 1 - A Chegada do Trem na Estação ............................................................................... 14
Figura 2 - Viagem à Lua ........................................................................................................... 15
Figura 3 - Fragmentos do filme Tio Yanco .............................................................................. 19
Figura 4 - Fragmentos do filme O Demônio das Onze Horas .................................................. 19
Figura 5 - Gráfico de votações dos deputados retirado do site G1 ........................................... 28
7
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................... 8
2 COMPREENDENDO A HISTÓRIA E A PEDAGOGIA QUE INFLUENCIOU O
NASCIMENTO DO FILME EDUCAÇÃO........................................................................... 11
2.1 DO SURGIMENTO DO CINEMA ATÉ A VIDEOARTE E O VIDEO-ENSAIO .......... 13
2.2 PEDAGOGIAS DO CINEMA......................................................................................... 22
3 SOBRE OS ATAQUES À EDUCAÇÃO NO BRASIL APÓS O GOVERNO DILMA
ROUSSEFF ............................................................................................................................. 28
4 ANÁLISE FÍLMICA ........................................................................................................ 36
5 CONCLUSÃO ................................................................................................................... 43
REFERÊNCIAS...................................................................................................................... 45
8
1 INTRODUÇÃO
O presente trabalho objetiva analisar a obra Educação, de 2017, do professor,
pesquisador e doutor em cinema Cezar Migliorin (UFF, UFRJ, Sorbonne Nouvelle e University
of Roehampton) e também do doutor em cinema Isaac Pipano (UFF e Sorbonne Nouvelle) –
obra esta que se categoriza enquanto um vídeo ensaio experimental – e explicar a partir dela o
que seria e como funciona o ensaio no cinema e o próprio cinema enquanto pedagogia político-
social. Assim, nesse projeto de monografia, a esfera do audiovisual será relacionada com a área
da educação brasileira para alavancar uma tentativa de debate acerca do potencial do cinema
enquanto representante e fortalecedor da voz da democracia na união estudantil do país, dando
também um enfoque específico para o cinema experimental de montagem (ou vídeo-ensaio),
que se destaca aqui neste caso enquanto um nicho de estudos para os universitários
documentaristas e ensaísticos em formação.
Para abrir a discussão a respeito dessa obra e suas implicações, é necessário
anteriormente abrir espaço para falar das situações pertinentes que levaram à sua existência.
Educação reúne e organiza de forma coesa uma coletânea de recortes de arquivos distintos
originados das mais diversas fontes (noticiário, gravações amadoras de celular, propaganda,
etc) que documentam e abordam um momento e um lugar específico no Brasil: a escola pública
de 2016, também marcado e mais conhecido historicamente como a Primavera Secundarista.
O filme, portanto, rememora as ações políticas que aterrorizaram os estudantes secundaristas e
universitários tomadas desde o final de 2015 e que culminaram na ocupação das escolas para
garantia dos direitos dos estudantes. Estas condutas políticas se iniciam na anunciação de
projetos de terceirização para escolas estaduais, problemas com fraudes na merenda das escolas,
o controverso projeto Escola sem Partido1, a PEC do Teto de Gastos2 e a proposta de Reforma
do Ensino Médio3 e se normalizam na sociedade brasileira através do constante noticiamento e
embelezamento bancados pela mídia televisiva.
1 Escola sem partido é um movimento da sociedade civil da asa direita que surge primeiramente em 2004, criado
pelo advogado Miguel Nagib, que considera discussões de gênero e debates sobre desigualdade social, racismo
e direitos humanos como doutrinação ideológica. O movimento é considerado de extremo autoritarismo e
conservadorismo, indo contra a liberdade de expressão e os direitos humanos, e é considerado um prejudicial
à formação escolar em todos os níveis educacionais. 2 A PEC 241 (do teto de gastos) é uma medida criada para estabelecer um limite de gastos para o governo durante
20 anos a partir de 2017, congelando os gastos públicos para não excederem mais do que a inflação anual. A
PEC afeta grandiosamente as áreas da educação e da saúde brasileira. 3 Foi uma lei sancionada em 2017 pelo então presidente Michel Temer que é criticada por precarizar o ensino
médio brasileiro. Prevê principalmente a obrigatoriedade de apenas 60% das disciplinas do Ensino Médio.
9
A narrativa de Educação então logo se encontra como uma ferramenta de discurso
político uma vez que traz à tona vozes de estudantes que lutaram a favor dos seus direitos de
acesso à escola e uma montagem que traz incubada em si uma forte mensagem política. A
montagem do filme portanto indica uma visita às primeiras memórias do surgimento da
videoarte dos anos 60, uma estética que se lançou como forte subversão às autoridades
televisivas e midiáticas mainstream4, e que se apresenta na América Latina principalmente
como forma de vídeo de militância e luta política.
Ademais, para relacionar a obra com o cinema, a videoarte e vídeo-ensaio, também
é necessário abordar os porquês da discussão política trazida no filme em sua época e prossegui-
la até o momento atual, e ainda compreender como a educação e a escola se entrelaçam com o
cinema e como o cinema se apresenta necessário não apenas como uma forma de pedagogia na
escola e no ambiente coletivo, mas como forma de documentação histórica e manifesto político-
social que pode vir a ser usada de maneira educadora se inserido como tal ferramenta na
sociedade. Para tal, será necessário abordar uma breve iniciação à história do cinema enquanto
um objeto formador de opinião, e nisso tentar entender sua função através do tempo até os dias
de hoje e como ele viria a se tornar também um porta voz da opinião social.
Após compreender os conceitos citados acima, pretende-se debater a experiência
do diretor como montador e também a experiência do espectador enquanto montador crítico
visando o entendimento específico da obra Educação, abrangendo, portanto, quais
conhecimentos o levariam a atingir a capacidade de Decupagem e interpretação da imagem
cinematográfica. O debate do que é montagem e como ela pode ser exercida logicamente não
pode deixar de vir à tona quando o assunto é vídeo.
O primeiro capítulo dessa monografia, então, será dedicado inteiramente aos
assuntos de cinema, elucidando o leitor sobre o surgimento da mídia audiovisual comercial até
o momento em que a videoarte viria enquanto dispositivo de contraposição à mídia, e também
debatendo acerca da forma como o cinema se posiciona através do tempo de forma educadora,
de maneira a contextualizar o leitor e prepará-lo para o debate fílmico. No segundo capítulo,
objetiva-se uma leitura de contextura histórica e política, que será pensada de forma a relembrar
Matérias como Filosofia e Sociologia foram tiradas da grade obrigatória. O objetivo final é de que o aluno de
tenha ao seu dispor cinco itinerários formativos e possa escolher entre os que mais lhe interessam para compor
sua grade curricular, porém grande parte das escolas públicas brasileiras – devido a sua precarização – possuem
capacidade para fornecer ao estudante apenas um desses itinerários. Também foi proposto um aumento da
carga horária escolar diária para aderir ao ensino integral, ideia que vai contra a plano vigente de escolas que
possuem educação situada nos três turnos, sugerindo então que haja uma parceria com núcleos privados de
educação para efetivar esta oferta. 4 Do inglês convencional, habitual, contrário de alternativo. Na frase, se refere à grande mídia.
10
quando e como começaram os ataques à Educação no Brasil e a quantas andam atualmente, de
maneira a justificar tanto um dos possíveis argumentos para a ascensão do movimento
estudantil brasileiro quanto para explicar o surgimento de novas formas de arte como resistência
política, especificamente no formato de audiovisual. Por fim, no terceiro e último capítulo será
proposta uma análise do filme Educação a partir de sua decupagem, observando a linguagem
utilizada pelos diretores-montadores e trazendo uma relação com os capítulos estudados
anteriormente, de forma a tornar compreensível a importância da videoarte e do vídeo ensaio
em contextos de tensão política e tentar validar e popularizar esta forma de expressão artística
audiovisual para além da comunidade universitária.
11
2 COMPREENDENDO A HISTÓRIA E A PEDAGOGIA QUE INFLUENCIOU O
NASCIMENTO DO FILME EDUCAÇÃO
Educação conta a história da luta estudantil pela redemocratização do espaço
escolar após tentativas governamentais de precarizar o sistema estudantil no Brasil com a
adoção de leis que viriam de encontro às solicitações e necessidades dos estudantes. A trama
na obra é desenvolvida de maneira a não apresentar nenhum personagem específico, e no meu
entender trabalha na verdade a ideia da ocupação na escola ou a própria escola enquanto sujeito,
visto que é o assunto principal tocado nos vídeos selecionados para o preparo dessa peça
audiovisual. Para composição do material filmográfico são utilizados inúmeros recortes de
arquivos provindos de diversas emissoras de televisão brasileiras, propagandas e imagens
amadoras do youtube5 gravadas diretamente nos locais de ocupação – a estética do flagrante6
–, que se entrelaçam na trama de maneira a originar um pensamento político e criar uma
mensagem de peso.
Ao assistir o filme Educação, o espectador se depara com um tipo diferente e não
tão usual de audiovisual, que apresenta em sua forma uma maneira alternativa de montagem e
de se contar uma história, utilizando de métodos não habitualmente encontrados no circuito
comercial. Em sua visualidade, o filme enxerta vários momentos distintos e recria aquele que
seria o significado inicial da imagem, portanto se apropriando daquilo que é proposto pelo
arquivo original para transmitir uma história e uma visão particular acerca do tema em debate:
as novas políticas na educação brasileira. Segundo Nadja de Carvalho Lamas (2005), o conceito
de apropriação torna-se muito complexo pois possui diversas possibilidades de entrada,
podendo manifestar-se através da “modificação, transformação, variação, hibridação, alteração,
pelo desvio, pela transgressão, mutação, mestiçagem, dentre outras”. A autora completa:
A apropriacao pode, tambem, ter um carater subversivo, como se observa nas
manifestacoes do dadaismo, situando-se no “campo da ruptura, da fratura e da
critica”10 (BERTHET, 1998, p.8). Nessa dimensao a apropriacao pode ser
transgressora e parodica. Pode ser dessacralizadora, no sentido da retirada da aura,
presente no pensamento de Walter Benjamin (apud LIMA, 1990, p.209-240). Pode
5 Website usado para armazenamento e compartilhamento público ou não de conteúdo audiovisual sem direito
autoral (www.youtube.com), podendo também ser utilizado como rede social. 6 Descrita no texto A gestão da autoria: anotações sobre ética, política e estética das imagens amadoras, de André
Brasil e Cezar Migliorin, essa estética diz respeito a imagens produzidas com aspecto “emergencial, eventual,
próprio dos flagrantes”, e são comumente captadas naturalmente pelo sujeito anônimo e permanecem no meio
também de forma anônima, engajando através do efeito real e da colaboração do espectador através do
compartilhamento. Geralmente, este tipo de imagem é de difícil censura e culpabilidade e não necessariamente
se encontram dentro dos domínios éticos. (BRASIL, MIGLIORIN, 2010/1).
12
ser situacionista, no retorno ao passado, ou, ainda, simulacionista, pois em um
universo de simulacros a autenticidade perde o significado. (LAMAS, p. 35)
É possível acrescentar ainda que os autores e montadores do filme não
necessariamente se importam ou optam por manter uma ordem cronológica que seja cem por
cento conforme a realidade, e inclusive utilizam de imagens anteriores ao evento das ocupações
nas escolas – ocorridas entre 2015 e 2016 – para contextualizar, requintar e corromper as ideias
trazidas pelos arquivos originais, que em maioria depreciavam a luta estudantil. Consuelo Lins
(2010) em seu texto sobre Um dia na vida (2010), obra similar de Eduardo Coutinho que
transmite 90 minutos de canais abertos da televisão brasileira, afirma que, se não fosse através
do filme realizado, o espectador não teria esta experiência porque “em outras circunstâncias,
ele talvez desviasse o olhar ou desligasse o aparelho de televisão”.
É importante identificar que os idealizadores da obra elegem a estética do não-uso
da imagem cinematográfica e substituem-na pela imagem videográfica para composição das
audiovisualidades, provocando uma grande inscrição autoral no produto final ao reproduzir por
vezes imagens sobrescritas ou tangíveis de uma qualidade fragmentativa e figurativa (Machado,
1995), assim informando ao telespectador para que busque sozinho seus pontos de referência
para entendimento da obra. Além da complexidade da imagem de videografia por si só, é
necessário entender que apesar de ter sido usado o termo “montagem” (tanto por mim quanto
pelos próprios autores nos créditos da obra) para denominação do processo de escolha e recorte
das imagens de arquivos, na videografia este termo não consegue ser aplicado precisamente tal
qual como no cinema, isso porque no vídeo não existe a noção própria de “plano” ou “take”7
para ocorrer a montagem, o que ocorre na verdade é meramente uma substituição de quadros –
que não necessariamente possuem conexão de espaço, história e tempo entre uma imagem e
outra.
O conceito do ensaio também pode ser utilizado para definir esteticamente essa
obra, e, portanto, a definição correta para ela, segundo meu ponto de vista, seria a de um vídeo-
ensaio. Segundo Machado (1995) e Dubois (2004), assim como o cinema, o ensaio é uma forma
de se pensar e filosofar uma ideia, e por isso comumente o ensaio é tratado enquanto forma de
escrita. Entretanto, a partir da intervenção do pensamento de Dubois, o ensaio pode passar a ser
enunciado enquanto forma audiovisual, pois é passível da transmissão de ideias, pensamentos,
conceitos subjetivos e grande eloquência, como pode ser visto em Educação. Segundo
7 Dubois afirma que o plano (ou take) é a unidade da base da linguagem cinematográfica, ou então a parte do filme
que existe entre dois cortes (2004, p. 75).
13
Machado, é com o trabalho de Godard que o vídeo-ensaio chega à sua expressão máxima, e
especificamente em sua obra Histoire(s) du Cinéma nasce um projeto de extensa pesquisa sobre
o cinema e o vídeo-ensaio.
Na mesa de edição, Godard associa lembranças, amarra ideias, enfrenta suas
obsessões, combina, dissocia, recombina materiais audiovisuais, na tentativa de fazer
um balanço de sua paixão e de seu ódio pelo cinema. Nada que se possa resgatar ou
entender verbalmente: é uma radical investida em direção a um pensamento
audiovisual pleno, construído com imagens, sons e palavras que se combinam numa
unidade indecomponível. (MACHADO, 2004, p. 20)
O resultado no filme Educação é, portanto, uma obra repleta de significados
conquistados através de um longo exercício de montagem videográfica, obtendo através da
ressignificação de imagens documentais formais e informais uma obra completa de finalidade
e originalidade. Para melhor compreensão do surgimento da estética de vídeo e do ensaio no
audiovisual que implicam uma forte influência na obra estudada, é necessário abordar desde o
surgimento do cinema e da mídia – e como se deu a formação da televisão na sociedade – para
então entender como a estética de vídeo viria numa tentativa de corromper os ideais mainstream
que vinham se desenvolvendo com intuitos comerciais desde o início do século XX, e a partir
daí entender como os cineastas da nova onda anti-cinema viriam a desenvolver os dispositivos
da linguagem de ensaio audiovisual. Este assunto será abordado no subcapítulo a seguir com
intenção de situar o leitor e adiante será retomado o debate sobre o filme de Migliorin e Pipano
com o objetivo de discutir adiante também a potência política da obra considerando o cinema
enquanto pedagogia psicossocial.
2.1 DO SURGIMENTO DO CINEMA ATÉ A VIDEOARTE E O VIDEO-ENSAIO
A história do cinema começa em 1895, na cidade de Paris, na França. Os primeiros
registros apresentados pelos irmãos Lumière, inventores do Cinematógrafo, se caracterizavam
como imagens das vivências da época de maneira documental, englobando em sua maioria
situações cotidianas, paisagens e hábitos populacionais, como uma maneira de experimentar a
descoberta da fotografia em movimento. L'Arrivée d'un train en gare de La Ciotat, ou ainda, A
14
chegada do trem na estação é talvez o mais conhecido filme trazido pelos irmãos do cinema, e
segue essa temática da exploração dessa nova técnica descoberta, trazendo na gravação uma
imagem que chocaria todos os franceses presentes naquela primeira e improvisada sala de
filmes: aproximadamente 60 segundos de um trem parando em uma estação. O ângulo em que
a imagem fora gravada permitia uma leve impressão de que o trem atravessaria o quadro na
quarta parede e estacionaria onde estava a sala de cinema, portanto é claro que a reação do
público fora extremamente excêntrica mediante essa nova situação jamais antes vista, já que a
sensação certamente era de que estavam olhando para a realidade como quem observa uma
janela. No início do século seguinte, em 1902, já logo surge também outro grande e conhecido
exemplo de obra filmográfica de ficção, Le Voyage dans la Lune (Viagem à lua) de Méliès, este
que por sua vez também trazia em si o início das técnicas de montagem cinematográfica criadas
por ele mesmo, que ocorria neste momento na forma de recorte e colagem e sobreposição das
películas gravadas.
Encantado, Méliès aplicou a nova descoberta em todos os filmes que fez dali pra
frente. [...] Os truques, realizados durante as filmagens, eram montados depois,
através de cortes e colagens no negativo. Artesão, artista e criador, George Méliès
escrevia, filmava, dirigia, editava e distribuía seus filmes, que eram exibidos em
dezenas de países. (DUARTE, 2002, p.26).
Figura 1 - A Chegada do Trem na Estação
Fonte: A Chegada do Trem na Estação. Louis Lumière e Auguste Lumière. Local: Paris, 1895. 50 seg.
15
Figura 2 - Viagem à Lua
Fonte: Viagem à Lua. Georges Méliès. Local: Paris, 1902. 18 min.
Segundo Duarte (2002, p.17), essa forma de demonstração artística não se demorou
a se popularizar, visto a febre que havia se tornado ao estrear com o público francês que logo
começaria a lotar as pequenas sessões de cinema no Gran Café em Paris, entretanto não foi até
o ano de 1915 que foi finalmente reconhecida enquanto arte – mais especificamente, a sétima
arte – ao ser reivindicada em escrito por Lindsay, numa tentativa de convencer os EUA a
providenciar prestígios culturais a esta da mesma forma como providenciava aos outros
formatos de arte. Já em meados dos anos 20 surge na Alemanha o fruto desse reconhecimento,
que seria o movimento artístico chamado Expressionismo alemão, que chegou ao cinema com
os clássicos filmes de Fritz Lang, usando uma forma completamente artística e subjetiva de se
pensar o audiovisual. Logo mais, esta forma subjetiva de se pensar cinema se moldaria também
aos olhares Surrealistas do espanhol Buñuel.
Mais tarde no século XX, com a amplificação das técnicas de reprodutibilidade
(Benjamin, 1935) para o âmbito televisivo e a partir do surgimento do cinema-indústria nos
Estados Unidos da América, o audiovisual passa a ser uma ferramenta largamente popularizada
e a partir disso emerge-se, então, uma potência mais transitável de manipulação da população.
A mídia televisiva é aprimorada finalmente por volta dos anos 30, e a partir daí os televisores
começam a se difundir dentre a alta sociedade, abrangendo agora telas em todos os lugares e
momentos. Dubois faz uma interessante análise sobre a imediatidade da TV ao compará-la com
a sala de projeção e afirma que “a imagem-tela ao vivo da televisão, que não tem mais nada de
16
souvenir (pois não tem passado), agora viaja, circula, se propaga, sempre no presente, onde
quer que seja” (2004, p.46).
É importante ressaltar que o cinema desde seu nascimento sempre foi uma
ferramenta de educação, seja por conta da própria documentação histórica ou da transmissão da
informação, mas não foi até a segunda guerra mundial que foi realmente perceptível o poder de
manipulação nele presente, com o surgimento da grandiosíssima influência da propaganda
nazista. A primeira transmissão televisiva, inclusive, fora durante as olimpíadas de 1935 na
Alemanha, sendo considerada a primeira transmissão oficial de sinal de TV, no mesmo ano que
sairia também o infame documentário de Leni Riefenstahl conhecido mundialmente como a
maior e mais sedutora propaganda nazista (Nichols, 2010, p.35).
A Segunda Guerra Mundial foi um dos maiores acontecimentos para a influência
do surgimento de novas formas de arte audiovisual, provando assim mais uma vez a maneira
como a arte se faz surgir dos mais soturnos momentos. Dubois inclusive chegara a comentar
sobre, estabelecendo uma suposta expansão da televisão pós-Segunda Guerra (2004, p.34).
Com a chegada dos anos 40 vieram os filmes italianos do Neorrealismo, conduzidos
majoritariamente por jovens em busca da retratação daquilo que seria a bruta realidade dos
conflitos da guerra e como eles afetavam as regiões envolvidas. Segundo Duarte (2002, p.30),
essa vanguarda foi essencial para o surgimento da cinematografia em países pobres e
subdesenvolvidos por conta da escassez de recursos técnicos e orçamento. Nichols (2010)
considera nesse núcleo uma linha tênue entre o filme de ficção e o documentário, pois para sua
produção é associada uma verdade – ou uma realidade, por assim dizer – à uma trama, criando
assim uma perspectiva sobre o mundo enquanto uma esfera que é compartilhada socialmente.
Similar ao Neorrealismo, porém ao mesmo tempo tenuamente diferente, já estava
se moldando desde o início do século XX na cabeça do cineasta russo Dziga Vertov o que viria
a ser a teoria do Kino Pravda8 amplamente difundida a partir dos anos 50. Apesar de Vertov
ser um cineasta ativo desde o final do século 10, julgo como importante adicioná-lo a este
momento da linha do tempo porque seus trabalhos estarão diretamente ligados com o
surgimento do movimento a seguir.
Vertov (apud Nichols, 2010) declarava guerra direta ao filme roteirizado e ao platô,
almejando captar apenas e unicamente aquilo que fora o mais cru da realidade, sem a menor
intenção de embelezamento, somente aquilo que viria diretamente do olho da câmera. Seria,
portanto, a maneira mais verdadeira de documentário existente até então, que buscava em si a
8 Em português traduzido, cinema direto.
17
emancipação completa da câmera filmográfica dos “venenos teatrais”. Esse método passou a
ser estudado e aprimorado também pelo francês Jean Rouch, que foi um dos precursores do uso
do recém-criado aparelho de som direto (NAGRA) no cinema do final dos anos 20,
importantíssimo para o cinema direto, que captava simultaneamente pela primeira vez o áudio
juntamente com o vídeo em uma gravação. As teorias de documentário de Vertov e Rouch
circularam amplamente na comunidade cinematográfica durante os anos 50 e 60 logo
anteriormente ao nascimento da Nouvelle Vague, sendo renomeadas por Rouch como Cinema
Verité9. Rouch idealizou que no Cinema Verdade haveria a possibilidade da interação do
cineasta com o universo do documentário, visto que também é parte dele, admitindo então que
os equipamentos de gravação e a equipe aparecessem em filme. Ele também foi o idealizador
da entrevista em documentário, dando a liberdade de interação entre o público não-ator com a
câmera de forma a transmitir o pensamento e o discurso da “pessoa comum” e valorizando-o
enquanto uma perspectiva válida historicamente, socialmente e etnograficamente.
Para Timothy Corrigan (2015), o trabalho de Dziga Vertov, Um homem com uma
câmera, de 1929, foi o prelúdio a um cinema experimental ensaístico antes mesmo da
elaboração desse conceito no espectro audiovisual e anterior ainda ao surgimento de Godard na
Nouvelle Vague. Segundo o autor, “os sinais preliminares do ensaístico no filme de Vertov são
evidentes no anúncio na abertura do filme, de que ele é ‘um excerto do diário de um
cinegrafista’ e na descrição de Vertov de seu papel no filme como um ‘supervisor do
experimento’”. Ele completa “em parte, o filme é um documentário de uma cidade composta
na Rússia (com filmagens em Moscou, Kiev, Odessa) e, em parte, é uma celebração reflexiva
do poder da visão cinematográfica”.
Simultaneamente a Vertov, existia também na Rússia o cineasta e filmólogo
Serguei Eisenstein, que foi considerado o “mago da montagem” (DUARTE, 2002, p. 29) a
partir de suas técnicas inovadoras e intelectuais empregadas no filme O encouraçado Potemkin
(1925). Para Nichols (2010), a teoria de Eisenstein provocava o espectador a fazer novas
descobertas através de planos com justaposições e fragmentos provocantes para a época. Foi
Eisenstein também que formulou ao final dos anos 20 a teoria do “Cinema Conceitual”, ou
Cinema Intelectual (MACHADO, 2015, p. 17), cujos princípios articulam claramente “as
possibilidades de um cinema ensaístico” (CORRIGAN, 2015, p. 58) e que fora radicalmente
apropriada e executada por Vertov.
9 Em português traduzido, cinema verdade.
18
Segundo Machado (2003), a teoria de Einsenstein se inspira no processo de escrita
oriental, como o Kanji japonês, que trabalha com o emprego conceitos emocionais ou pictóricos
para a elaboração de palavras. O autor completa:
A montagem conceitual por ele concebida é uma forma de enunciado audiovisual que,
partindo do “primitivo” pensamento por imagens, consegue articular conceitos com
base no puro jogo poético das metáforas e das metonímias. Nela, juntam-se duas ou
mais imagens para sugerir uma nova relação não presente nos elementos isolados.
Assim, através de processos de associação, chega-se ao conceito abstrato e
“invisível”, sem perder todavia o caráter sensível dos seus elementos constitutivos.
Inspirado nos ideogramas, Eisenstein acreditava na possibilidade de se elaborar,
também no cinema, ideias complexas por intermédio apenas de imagens e sons, sem
passar necessariamente pela narração (MACHADO, 2003, p.8).
Tanto a estética do Cinema Verdade de Vertov e Rouch e a teoria do Cinema
Conceitual de Eisenstein influenciaram grandemente o movimento da Nouvelle Vague que viria
aparecer na França no fim dos anos 50, que é considerada por muitos a vanguarda que mais
influiu na maneira de se ver e produzir filmes ficcionais no século XX (Duarte, 2002, p. 31).
Nesse movimento, os autores rejeitam a estética de estúdio e optam pelas gravações em lugares
reais, como no Cinema Verdade, porém sempre focando em dilemas que acometem os
personagens fictícios de forma psicológica e existencial.
Diferentemente do neo-realismo, a nouvelle vague volta-se pouco para a situação
social francesa, ignora que a França está mergulhada numa guerra colonial contra a
Argélia e interessa-se pelas questões existenciais de seus personagens. A grande
maioria destes filmes foram eliminados pelos circuitos comerciais. Poucos diretores
sobraram; entre os mais conhecidos, Resnais, Rohmer ou Godard manterão uma
constante linha de questionamento, enquanto outros como Chabrol e Truffaut darão
continuidade ao "cinema de qualidade", ao qual se tinham oposto. (BERNARDET,
2000, p.51)
A Nouvelle Vague foi a precursora para o surgimento de vários autores que viriam
a se tornar de suma importância para a ascensão do filme-ensaio e do vídeo-ensaio, como Agnes
Varda e Jean-Luc Godard, o último sendo considerado o ápice da expressão do ensaio no
cinema de acordo com Arlindo Machado. Desde os primeiros filmes de Varda e Godard, se é
falado que o experimentalismo na forma do audiovisual dos diretores se destacou imensamente
até mesmo ao questionar o cinema dentro do movimento da Nouvelle Vague mesmo que através
de meios “estritamente cinematográficos” (DUBOIS, 2004, p. 289).
Com o passar dos anos, ambos diretores seguiriam caminhos extremamente
similares para o que seria o novo contra-cinema, Varda especificamente se ramificando com
temáticas femininas e feministas para aquele que seria chamado de contra-cinema de mulheres
dos anos 70. Não por acaso, ambos os diretores se consideravam cinescritores e trabalhavam
19
com a técnica da captação de palavras pelas câmeras para compor uma trama enigmática, “em
que o cinema é concebido como texto, como narrativa que traça suas próprias impressões”
(KIERNIEW; MOSCHEN, 2017, p. 51).
Figura 3 - Fragmentos do filme Tio Yanco
Fonte: TIO Yanco. Direção de Agnès Varda. França: Ciné-Tamaris, 1967. 18 min.
Figura 4 - Fragmentos do filme O Demônio das Onze Horas
Fonte: O demônio das onze horas. Direção de Jean-Luc Godard. França: Films Georges de Beauregard, 1965.
110 min.
Ambos autores também se especializavam naquele que na época denominavam o
Cinema de Ideias (CORRIGAN, 2015, p.72), termo que provinha da ideia de Cinema
Conceitual de Eisenstein. Para Arlindo Machado, em sua apresentação para Cinema, vídeo,
Godard (2011, p. 17), estes cineastas “introduziram o pensamento no cinema, ou seja, eles
fizeram o cinema pensar com a mesma eloquência com que, em outros tempos, os filósofos o
fizeram utilizando a escrita verbal”. Segundo Corrigan (2015), o Godard dos anos 60 já se
autodenominava um “improvisador experimental”, e Varda aproveitava desde sua primeira obra
para mapear e ampliar os limites daquilo que seria o ensaio no cinema.
Portanto, o que seria então o filme-ensaio que vinha se desenvolvendo desde
meados dos anos 20 e que ganhou força e visibilidade após a Nouvelle Vague? Para a literatura,
o ensaio é uma modalidade de escrita que carrega em si um discurso “científico ou filosófico”,
que possui como atributos como “a subjetividade de enfoque (explicitação do sujeito que fala),
a eloquência da linguagem (preocupação com a expressividade do texto) e a liberdade do
20
pensamento (concepção de escritura como criação, em vez de simples comunicação de ideias)”
(MACHADO, 2004, p.17).
É justamente essa carga de intelectualidade que configura o ensaio, também por
isso que inicialmente se denominava Cinema de Ideias. Para Machado, no filme-ensaio:
Pouco importa se a imagem com que ele [o autor] trabalha é captada diretamente do
mundo visível ‘natural’ ou é simulada com atores e cenários artificiais, se ela foi
produzida pelo próprio cineasta ou foi simplesmente apropriada por ele, depois de
haver sido criada em outros contextos e para outras finalidades, se ela é apresentada
tal e qual a câmera a captou com seus recursos técnicos ou foi imensamente
processada no momento posterior à captação através de recursos eletrônicos. A única
coisa que realmente importa é o que o cineasta faz com esses materiais, como constrói
com eles uma reflexão densa sobre o mundo, como transforma todos esses materiais
brutos e inertes em experiência de vida e pensamento (MACHADO, 2003, p.10).
Em suma, o que realmente importa no ensaio é a capacidade da obra de atingir o
espectador de uma maneira sensível, mesmo que para isso se utilize recursos cinematográficos
como a apropriação e a edição de imagens ou de sons, aspectos estes que configuram uma fuga
do tradicionalismo estético do cinema – o experimentalismo. A matéria sensível do ensaio é
extremamente particular, sendo apenas possível através de tamanha tessitura de conceitos
audiovisuais similares aos mais formidáveis textos literários. Por conta disso, o ensaio trabalha
muito facilmente com a transmissão de sensações e experiências aos espectadores. O objetivo
é que de fato seja uma obra “inapreensível pelas categorias genéricas” (BRASIL, 2006) do
cinema, e por isso se encaixa apenas naquilo que é e pode vir a ser o ensaio.
No audiovisual, o ensaio pode se tornar real tanto através de filmes quanto de
vídeos. É importante situar essa diferença, pois apenas na metade dos anos 50 que ocorre
mundialmente o surgimento do videoteipe, e nos anos 70 do videocassete (MACHADO, 1988)
originando a partir daí a estética do vídeo que levaria também ao surgimento do movimento da
Videoarte nos anos 60.
O vídeo no seu nascimento tem como modo estético uma apresentação
completamente diferente do filme, já que sua reprodução é completamente dependente dos
sistemas eletrônicos de transmissão de imagem. A televisão primordialmente era operada com
sistemas de emissores radiofônicos, que captavam e espalhavam imagens através de receptores
com antenas e o broadcasting para a televisão se concluía em uma reprodução massificada, onde
o aparelho televisivo desenhava uma imagem em constante movimento a partir duma escrita
sequencial “píxel após píxel, linha após linha” (MACHADO, 1988, p. 164) na tela da televisão,
enquanto o filme desde o princípio – e até atualmente - funcionava através de frames, sendo
eles em película ou digitais. Ideologicamente, o vídeo televisivo possuía também o diferencial
21
de que sua criação teoricamente fora idealizada visando um enriquecimento cultural
democrático para as massas, já que a proposta era que de a televisão fosse um objeto presente
na vida de todos.
O movimento da Videoarte surgiu oficialmente nos anos 60, mas perdurou
fortemente até os anos 90, e, apesar de terem surgido novas tecnologias de vídeo a partir dos
anos 2000, a estética é fortemente – apreciada e – utilizada até hoje através de meios simulados
(com a tecnologia) ou antiquados (fazendo uso de dispositivos antigos). A vanguarda surgiu
como um contra movimento à televisão de massas, promovendo formas artísticas que se
antepusessem à mídia mainstream, porém ainda assim apoderando-se da estética concebida pela
televisão. Para Machado (2010), o vídeo fez um trajeto mais demorado para alcançar a América
Latina, se alocando com diferentes velocidades em cada país, mas tendo registros mais
frequentes principalmente entre os anos 80 e 90. Machado (2010) alega que isso ocorre devido
aos períodos ditatoriais latinos, que causaram extrema escassez de recursos cinematográficos e
decadência, porém surge aí uma grande fonte de material político de qualidade experimental e
periférica, revelando as raízes do subdesenvolvimento e da vida na ditadura na América Latina.
Entre os anos 60 e 70, se configura também no Brasil o período do Cinema novo e
do Cinema Marginal, ambos movimentos também caracterizados por retratar fortemente as
problemáticas trazidas pela ditadura no país adotando uma estética de câmera na mão e enorme
deficiência em recursos. De acordo com Ismail Xavier (2001, apud Duarte, 2002, p. 35) este
seria para o Brasil o “período estética e intelectualmente mais denso” do cinema nacional. Os
movimentos do Cinema Novo e Cinema Marginal vieram a originar em São Paulo, na região
do bairro da Luz, um centro denominado Boca do Lixo, que surgiu após a instalação de
empresas cinematográficas nas proximidades, dando origem então àquele que seria o maior
polo de cinema independente do Brasil na época.
Não ao acaso que chegaria durante os anos 80 também em São Paulo um dos
maiores festivais experimentais do país, que permanece até a atualidade, o Festival Videobrasil
(ALMEIDA, 2017). Com o país estrondando em um surto artístico e político é que surge o
primeiro festival inteiramente dedicado ao estímulo da produção artística utilizando uma
linguagem ainda em desbravamento, festival este que se tornou futuramente um objeto de
referência mundial.
Esse panorama histórico, por fim, esclarece claramente o quanto um período afetou
o outro na história do cinema. Se não fosse pelo surgimento da mídia televisiva – que apenas
se deu por conta da parafernália do cinema – seria impossível chegar a um ponto onde a arte se
fizesse necessária para contrapô-la. A estética do ensaio, entretanto, acredito que apenas tenha
22
vindo como uma fusão de várias ideias de locais distintos que ocorreram devido à imensa
curiosidade artística do ser humano, elaborando, portanto, uma linguagem refinada e lapidada
capaz de abrigar fortes e sensíveis posicionamentos. Adiante, será abordado as metodologias
capazes de tornar o audiovisual uma ferramenta educadora, de maneira a tornar entendível o
porquê da real necessidade de um cinema capaz de fazer pensar.
2.2 PEDAGOGIAS DO CINEMA
Ao abranger o assunto do cinema enquanto pedagogia, precisamos entender como
e quando o processo cinematográfico se torna um modo de educação. O fazer do audiovisual
nada mais é do que uma evolução da metodologia criativa do ser diante da sua visão da
realidade, seja ela inventada ou não, que se desenvolve através do uso de ferramentas modernas
– como as de captação e reprodução da arte audiovisual.
Já entendemos que o cinema é por certo uma maneira de procedimento artístico que
urge em seu ápice uma mensagem política, mas o que de fato pode-se tirar de uma experiência
audiovisual – seja ela simples ou complexa? Como é feita a garantia da passagem da mensagem
do autor ao telespectador? Será que verdadeiramente existe um momento de percepção total da
obra? E como pode-se ensinar com a metodologia audiovisual?
Primeiramente, o entendimento audiovisual, conforme Duarte (2002) apud Pierre
Bordieu (1979), depende completamente do que Bordieu chama de “competência para ver”,
algo que poderia ser traduzido como a capacidade de compreensão intelectual e artística
adquirida individualmente através da trajetória de vida do sujeito social, ou seja, a obra se torna
acessível, ou ainda, legível, àqueles que dominam a capacidade de compreensão que ela requer.
Bordieu (1996) ainda ousa em falar que a arte de vanguarda e o cinema, se não
fossem pela contribuição do público intelectual, estudantil e/ou aspirante a artista,
provavelmente não existiria. A razão é de que a socialização destes indivíduos, que seriam
culturalmente mais engajados que os demais, atua na formação do domínio de diferentes
linguagens artísticas. Duarte (2002, p.14) complementa “não é por acaso que as pesquisas de
mercado indicam que 79% do público de cinema no Brasil é constituído por estudantes
universitários: oriundos, em sua maioria, de camadas médias e altas da sociedade”. Nesse
23
contexto, logicamente o fator socioeconômico contribuiria não apenas para quem seria o artista
criador, mas também para quem será o consumidor da arte.
Claramente, na conjunção política que vivemos hoje no Brasil, temos sim uma
divergência entre o acesso à arte em diferentes classes sociais principalmente tendo em mente
a precariedade da educação diante do avanço do sucateamento da educação pública. Entretanto,
qualquer forma de acesso e trabalho com audiovisual pode se tornar uma ferramenta pedagógica
com intuitos educacionais e culturais. Segundo Duarte (2002), na educação brasileira ainda é
difícil entender e reconhecer o audiovisual como um recurso educacional sem colocá-lo em
segundo plano, ao mesmo tempo que livros são assumidos como autoridades fundamentais da
educação.
Para Anita Leandro (2001), por mais que o audiovisual esteja presente em sociedade
tal qual como – ou de maneira similar – a literatura, na educação constantemente faz-se um uso
equivocado do seu dispositivo artístico. A apropriação da imagem em movimento como um
estimulador artístico e cultural acaba sendo deixada de lado, “tendo participação secundária”, e
é substituída e tratada como uma mera ferramenta de complementação de assuntos científicos
classificados como os mais importantes temas pedagógicos – como por exemplo o uso constante
de projeção nas escolas dos filmes educadores criados para explicar matérias como biologia,
história e geografia.
A escola se apropria da imagem em movimento não como quem se aproxima de uma
arte, a cinematografia, capaz, por si só, de pensar novas relações de espaço e de tempo,
por exemplo, mas como quem busca um aditivo tecnológico para incrementar
processos educativos em andamento, desencadeados por ciências já consolidadas
(LEANDRO, 2001, p.29).
Leandro também aborda a problemática da imagem pedagógica como
frequentemente sendo demasiadamente industrializada, submetendo-se a processos que
reduzem algumas partes importantes para o aprendizado do espectador. A crítica aqui vai
especificamente à cortes excessivamente rápidos e às narrações intermináveis, que trocam as
importantes pausas para reflexão e crítica do espectador por demonstrações indevidas de
técnicas cinematográficas, tornando assim o filme uma mera ilustração incapaz de fazer pensar.
Esta também é uma crítica trazida pelo psicólogo, epistemólogo e educador, Jean Piaget (apud
Leandro, p.31. 2001), que afirma que a inteligência humana vai além de meras “representações
imagéticas falantes”. Entretanto, Leandro afirma que há sim a possibilidade do filme se tornar
um objeto, ou melhor, uma imagem pedagógica, e isto se daria apenas através da utilização de
24
uma linguagem pensante, obtida apenas ao discernirmos totalmente qual o verdadeiro alcance
do audiovisual.
O trabalho do filme, o filme como local de trabalho, local de realização do ato criador
do homem e, portanto, de transformação do mundo: essa parece ser a pedagogia
essencial da imagem. A imagem pensa e faz pensar, e é nesse sentido que ela contém
uma pedagogia intrínseca (LEANDRO, 2001, p. 31)
Já em contrapartida à hipótese um tanto classista de Bordieu, Piaget (citado por De
La Taille, 2019) confecciona na sua teoria um ideal de educação totalmente democrático e não-
hierarquizado – no caso se tratando especificamente do ensino em nível escolar, o mesmo nível
abordado pela obra Educação estudada em questão nessa monografia. O grau educacional e
socioeconômico pouco importa para o teórico quando há disponibilidade de diferentes
elementos sujeitos a trocas de valores com os estudantes, cujas interpretações diferem de aluno
a aluno, porém não limitam o estudante como um ser passivo em sua educação. Da mesma
maneira, Migliorin e Pipano (2019) exemplificam o cinema como um atuante estético e político
nas escolas, passível de intensas e diversificadas interpretações que não se adequam
especificamente a nenhuma hierarquia de conhecimento. A igualdade entre alunos e mestres,
entretanto, não é um princípio do desaparecimento do professor como orientador, e sim uma
“igualdade produtiva, fruto da produção do coletivo que não existe sem o trabalho e a igualdade
de inteligências – a possibilidade de um sujeito qualquer fazer parte e diferença na criação”
(MIGLIORIN e PIPANO, 2019, p. 71).
Portanto, segundo Migliorin e Pipano, o cinema na educação exerce um papel
totalmente democrático na sua maneira de se fazer interpretar pelo seu espectador infantil.
Segundo os autores, “para a criança não há filme difícil” (2019, p. 39), visto a infinidade de
possibilidades que provém da imaginação e da intepretação de diferentes signos. O pensamento
Piagetiano aplicado em uma análise paralela com Migliorin e Pipano defende que crianças
empregam diferentes definições para os mesmos conceitos, e não procuram avaliar essa
diferença entre si. Cada um segue suas próprias regras, inclusive no interpretar e no fazer da
arte. É nesse sentido que se faz necessário com urgência o cinema enquanto arte na educação,
pois sua forma inclusiva, democrática e acessível se rende às necessidades infantis com
tranquilidade.
Na análise da pedagogia da montagem, Anita Leandro (2001) revela que o cinema
da didática revolucionária possui uma linguagem intensamente intelectual e estética – a
linguagem sendo concebida pelo diretor, e a estética pelo cameramen –, que visa atribuir um
discurso no interior da obra, e não apenas no exterior. Segundo a autora, no Brasil temos como
25
um grande exemplo o cineasta Gláuber Rocha, que, segundo ele mesmo (apud Leandro, 2001,
p. 32) possui como objetivo principal em sua obra “alfabetizar, informar, educar, conscientizar
as massas ignorantes, as classes médias alienadas”. Conforme Leandro, as escolhas feitas nos
cortes audiovisuais do que mostrar, quando mostrar, e onde mostrar, todas remetem à uma ética
a qual o autor busca compartilhar.
A ideia de como revelar o mundo ao espectador através da montagem se inicia
justamente com a teoria da montagem intelectual de Eisenstein comentada no capítulo anterior.
Segundo Marie-Claire Ropars-Wuilleumier (apud Migliorin e Barroso, 2019, p.92), a
pedagogia de Eisenstein coloca o espectador “em um lugar de criação onde sua personalidade,
longe de estar a serviço da personalidade do autor, floresce se misturando com a ideia do autor”.
Migliorin completa “nesses casos, a montagem dialética demandaria um engajamento do
espectador, mantendo-o, entretanto, alienado”. Ambos autores chegam à essa conclusão porque,
assim como Anita Leandro, concordam que nesse caso o cinema cria e transmite pontos de vista
que forçam o espectador para dentro das percepções do filme através de uma construção de um
mapa ou de um caminho mental.
Para o cineasta Dziga Vertov, a montagem intelectual significava também expor o
espectador à uma possibilidade de compreensão da imagem além da tela, de maneira a
estabelecer um diálogo entre possível mentor e aprendiz. De acordo com Faucon (apud
Migliorin e Barroso, 2019, p. 93) ao possuir essa qualidade “formadora”, o cinema de Vertov
permitiria ao espectador não apenas a aplicação do método cinematográfico, mas como também
a tomada da consciência dos mecanismos e dispositivos do cinema.
Se para Eisenstein a participação do espectador se dá através de um intricado jogo ou
caminho mental, para Vertov, podemos dizer, a percepção da montagem repousa na
distinção entre ver e olhar o intervalo entre as imagens. Vertov escreve: “A montagem
é o resumo das observações feitas pelo olho humano sobre o assunto tratado
(montagem das próprias observações, ou melhor, montagem das informações
fornecidas pelos cine-exploradores) (...) Como resultado final de todas essas junções,
deslocamentos, cortes, obtemos uma espécie de fórmula visual. [...] É então
fundamental entender que o espectador é mobilizado não penas pelo movimento do
seu olhar, mas também pelo deslocamento do seu próprio corpo ou ainda pela sua
vivência do movimento (MIGLIORIN e BARROSO, 2019, p. 93).
Já na montagem experimental de Godard, que, segundo Anita Leandro (2013), é
também um historiador cinematográfico de montagem, o diretor utiliza uma metodologia
pedagógica completamente exploradora, que, de acordo com Migliorin e Barroso (2019, p. 96)
é também “um método de investigação e produção de conhecimento”.
26
Nas suas obras mais fragmentadas e experimentais, como Histoire(s) du Cinéma, a
intenção é relembrar e ensinar, através de um labirinto histórico, a pesquisa de Godard acerca
do próprio universo do cinema. O autor propõe ao espectador um grande leque de opções de
montagem, que revelam ao espectador não apenas as histórias do passado, mas também “as
possibilidades do futuro” (LEANDRO, p.110, 2013).
Para Ronaldo de Noronha (2013), o diretor até mesmo em suas obras de ficção adota
uma maneira muito documental de realizar o cinema, tentando reproduzir a realidade como ela
é ao espectador. Segundo Daney (apud Noronha, 2013, p. 35), esse método é utilizado para
evitar a descrença do espectador perante a obra, formulando, portanto, uma realidade
indubitável, que rompe com os padrões do cinema para justamente através desta ruptura causar
uma impressão de seus personagens – ou do seu objetivo – no espectador, envolvendo-o na
busca do entendimento daquilo que é proposto.
Por vezes, o discurso godardiano afirma que essa fecundidade “chega” e o cineasta é
capaz de anunciar que encontrou algo: Eureka! Mas, de um modo geral, como bem explica Didi-Huberman, é a montagem que introduzirá hesitações, aproximações
dialéticas ou paralogismos que devolverão seu cinema à busca e à investigação. [...]
O traço comum que destacamos pode ser posto a partir da colocação de Serge Danley
sobre o cinema de Gordard: “O cinema de Godard é uma dolorosa meditação sobre o
tema da restituição, ou melhor, da reparação. Reparar é entregar as imagens e os sons
àqueles dos quais elas foram extraídas”. O cinema, assim como a educação, funciona
devolvendo algo do sujeito ao mundo, inventando um receptor para essa devolução.
Uma devolução que não é da coisa em si, mas da coisa atravessada por uma mediação
estético-política. É nessa mediação que a montagem torna-se uma pedagogia
(MIGLIORIN e BARROSO, 2019, p. 97).
Pode-se dizer também que o audiovisual, independente do diretor, possuí uma
pedagogia do sensível, conceito teorizado pelo filósofo Rancière. A veracidade da sensibilidade
na arte cinematográfica inclui na educação e na socialização do ser uma formação pessoal
inerente, na medida que a arte propõe novas experiências e valores para a compreensão de cada
indivíduo. Mário Alves Coutinho (2013, p. 19) já dizia que a verdadeira obra de arte não se
propõe em ensinar nada, apenas em apresentar uma diversidade de experiências sensíveis.
Segundo o autor, o artista, antes de propor uma interpretação consciente, trabalha com o
inconsciente: da maneira que o espectador pode não compreender a teoria conceitual da obra,
ele consegue sentir.
O filme, enquanto um objeto estético sensível, consegue, portanto, transformar a
habitual maneira do saber para um processo político e emocional. A partilha do sensível através
da arte possibilita na educação novas formas de pedagogias, que ocorrem através do sentir.
27
Porém, na educação, o cinema pode ser possível não apenas como sentir, mas como fazer. O
fazer audiovisual remete ao sujeito pedagógico um experimentalismo que põe em xeque sua
criatividade através do forjamento e da manipulação de possibilidades de visões de mundo. A
investigação das imagens pelo estudante provoca um aprendizado metalinguístico sobre a
própria criação audiovisual em si, proporcionando um exercício Godardiano sobre o cinema –
questionando o quê e como se faz. O aprendizado se dá justamente nas dúvidas e nas incertezas,
na tentativa e na subversão.
Em suma, a pedagogia audiovisual entrega ao estudante e cineasta a possibilidade
de novas descobertas. Não seria então sem a descoberta e o experimentalismo que surgiria a
linguagem do ensaio no cinema, que se explora e se desdobra em uma forma extremamente
política de se expressar o mundo pela arte. Para compreender um pouco mais porque se faz
necessário na conjuntura brasileira atual a representação da arte política, é necessário efetuar
uma avaliação dos processos governamentais que vêm ocorrendo no Brasil.
28
3 SOBRE OS ATAQUES À EDUCAÇÃO NO BRASIL APÓS O GOVERNO DILMA
ROUSSEFF
Enquanto estudante, venho acompanhando, desde que atingi a idade eleitoral e
entrei na universidade, as movimentações políticas que ocorreram no Brasil, com destaque
especialmente ao período que precedeu o golpe da ex-presidenta Dilma Rousseff – até os dias
atuais. Em 2016, culminou no país juntamente com a luta contra o governo golpista e os
governos estaduais a chamada Primavera Secundarista10, um movimento estudantil com
características horizontais e de autogestão, totalmente independente mas apoiado por entidades
como a União Nacional dos Estudantes (UNE) e União Brasileira dos Estudantes e
Secundaristas (UBES), que se espalhava pouco a pouco por todo o território nacional contra a
precarização e o sucateamento da educação pública e a corrupção no governo brasileiro
(PIOLLI; PEREIRA; MESKO, p. 24, 2016).
Apesar do vice-presidente de Dilma, Michel Temer, ter assumido o cargo efetivo
de presidente apenas em agosto de 2016, o golpe presidencial – ou para alguns, o impeachment
– de Rousseff já vinha se concretizando desde o fim de 2015 e era apoiado por diversos
deputados, senadores e governadores pelo país. No momento de posse, o governo do ex-
presidente Temer então se formalizou como o mais conservador desde a redemocratização do
Brasil pós-ditadura militar até então.
Figura 5 - Gráfico de votações dos deputados retirado do site G1
Fonte: G1, 02/08/2017.
10 Ou ainda, a Mobilização estudantil no brasil de 2015 e 2016.
29
As primeiras medidas estaduais contra a educação foram tomadas no estado de
Goiás, por Marconi Perillo, numa tentativa de decretar a terceirização de escolas do governo do
estado. O movimento se estendeu para São Paulo após os escândalos da merenda no governo
Alckmin, e tomou conta quando o governador anunciou corte de 78% dos investimentos nas
Escolas Técnicas do estado e arrocho salarial para os professores, preparando as escolas
estaduais para um movimento de privatização do ensino médio que impactaria os estudos de
mais de 310 mil alunos (CATINI; MELLO, 2016). As medidas provocaram então o início de
uma série de manifestações sociais nas ruas e o que viria a se tornar a maior ocupação estudantil
nas escolas do Brasil. Logo em seguida, mais crises governamentais surgiram no Rio de Janeiro,
Ceará e Rio Grande do Sul, e em pouco tempo o país inteiro sentiria a revolta e a crise política
na educação.
No final de 2015, inspirados no modelo americano, os parceiros do Programa
Compromisso SP, atuaram na proposição do projeto de Reorganização das Escolas
que previa o fechamento de 92 escolas e a reorganização para segmento único de mais
754 escolas. Apesar da justificativa pedagógica por parte da Secretaria da Educação
de que escolas menores produzem melhores resultados e de que a reorganização se
fazia necessária em razão das mudanças na pirâmide etária da população em idade
escolar. Como já apontamos, o projeto tinha um claro caráter gerencial que foi
ocultado na sua proposição original. [...]
O Plano de Reorganização foi adiado em razão da resistência estudantil e da
intervenção do Ministério Público e Defensoria Pública do Estado. Tal projeto sofreu
forte resistência dos estudantes secundaristas, que promoveram um grande
movimento de ocupação de mais de 200 escolas durante cerca de 60 dias. (PIOLLI;
PEREIRA e MESKO, 2016, UNICAMP, p. 23-24).
Os estudantes realizaram uma série de manifestações juntamente com as ocupações,
incluindo marchas, mobilizações, manifestações performáticas, travamentos em vias públicas e
mais, numa tentativa de serem noticiados e percebidos também por fora da mídia, que no
momento buscava retratar a luta estudantil como um cenário de possíveis desvios de conduta,
acusando o movimento de diversas supostas “depravações”. O protagonismo estudantil foi
grandiosamente difamado pelo noticiamento das grandes emissoras e pelas vozes dos
governadores, e não tardou em ser perseguido pelas autoridades militares. Já diria Peter Pál
Pelbart (2016) em sua carta aberta: “aos olhos de nossos gestores políticos, a resistência dos
secundaristas não passava de uma reação passageira, de um estorvo a ser rapidamente
removido, uma insanidade juvenil”.
Os estudantes não se deixaram abalar. O momento foi de descoberta para muitos
jovens, visto que a grande maioria dos estudantes nunca havia se envolvido em núcleos de
manifestação anteriormente, e em sua maioria estavam em seu despertar político e pessoal. As
tomadas das decisões coletivas pelo núcleo estudantil sempre aconteciam por meio de
30
assembleias abertas, que estabeleciam relações de pertencimento e participação ativa entre os
estudantes (PIOLLI; PEREIRA; MESKO, p. 28, 2016). Em 2019, Eliza Capai viria a lançar um
documentário chamado Espero Tua (Re)volta, que inclui imagens de arquivo, extensas
entrevistas e captações da época, exibindo como se davam as relações entre os estudantes, as
pautas e a militância, mostrando a realidade por dentro das escolas e do movimento – um filme
digno de visualização à quem busca entender o que se passava pelo tão abandonado olhar
discente.
Em maio de 2016, houve também uma movimentação em torno das universidades
estaduais de São Paulo que buscava através da greve um avanço contra o racismo institucional,
visto que naquela altura a Unicamp e a USP ainda não possuíam a implementação das cotas
raciais – em 2017, viriam finalmente a implementá-las devido às solicitações.
Em junho do mesmo ano, o governo de Michel Temer anunciaria a Emenda
Constitucional no 95, mais conhecida como a PEC do Teto de Gastos, que até dezembro
terminaria de tramitar pelo congresso e seria totalmente aprovada. A PEC foi anunciada como
um plano para corrigir a crise econômica que vinha se desenvolvendo desde 2014 no Brasil,
buscando evitar ainda mais o recuo do PIB (Produto Interno Bruto) e o aumento das taxas de
desemprego através de uma proposta de congelamento de gastos do governo que duraria 20
anos. A ideia é de que as despesas do governo se restrinjam aos mesmos valores (corrigidos)
gastos no ano anterior para destinar o dinheiro economizado à quitação das dívidas públicas,
porém isso limitaria o orçamento público destinado aos investimentos em educação e também
a outras necessidades sociais, como por exemplo o Sistema Único de Saúde.
Em setembro, Temer apresentaria formalmente pela primeira vez, juntamente com
seu ministro da educação Mendonça Filho, a proposta de Reforma do Ensino Médio, que,
através da criação de uma Base Nacional Curricular Comum (a nova BNCC) faria com que os
estudantes secundaristas tivessem sua formação baseada na escolha individual das suas áreas
de interesse. Com a reforma, o Ensino Médio também teria sua carga horária aumentada para
período integral, debates sobre questões de gênero seriam “inexistentes” e 40% das disciplinas
não seriam mais obrigatórias. Segundo Uczak, Bernardi e Rossi, é importante também ressaltar
que:
Ainda que primeira versão a BNCC tenha tido 12 milhões de contribuições da
sociedade civil, a questão para a qual chamamos a atenção é o interesse e a influência
do setor privado na construção da mesma e na garantia de que ela seja implementada.
Trata-se de instituições financeiras, empresas, fundações e instituições filantrópicas
que são chamadas pelo governo de ‘parceiras’.
Com maior ou menor protagonismo, fazem parte da ‘parceria’ os bancos Itaú/
Unibanco, Bradesco, Santander, as empresas Gerdau, Natura, as Fundações Victor
31
Civita, Roberto Marinho, Camargo Corrêa, Lemann e Todos pela Educação e Amigos
da Escola. Vale destacar ainda que tais instituições do setor privado criaram, em 2013,
o Movimento pela Base Nacional Comum – MBNC que se define como um grupo não
governamental de ‘profissionais da educação’ que atuam junto ao processo de
construção da Base Nacional Comum Curricular – BNCC (MBNC, 2017). Daí decorre
uma indagação: por que esses empresários estariam interessados em promover
iniciativas na educação em âmbito nacional? Quais são os seus interesses em
influenciar no processo de criação da Base? (UCKZAK, L. H; BERNARDI, L. M;
ROSSI, A. J. 2020).
Nesse momento, a crise educacional saía dos âmbitos estaduais pra se tornar
também totalmente federal. Temer logo declararia extinto uma série de ministérios importantes,
como o da Cultura, das Comunicações e o MMIRDH11. O ministro da educação anunciara
redução de 29% dos investimentos no FIES12, reduzindo o teto do financiamento em R$12 mil
por semestre. Assim, as marchas de manifestações agora reclamavam outro grito, o “fora
Temer”. Até o fim de seu governo, Temer então cederia à pressão popular e revogaria as
decisões tomadas contra os ministérios – com algumas mudanças – e o FIES, reabrindo-os e
retomando o valor anterior dedicado ao financiamento estudantil.
Em outubro de 2016, há um momento histórico que sucede no Paraná com a fala de
uma estudante de 16 anos na Assembleia Legislativa após um furdunço midiático feito por
conta de uma morte de um estudante em uma escola ocupada, crime esse que ocorreu por conta
de um ataque de faca feito por um colega de classe. No momento do incidente, os alunos
continuavam ocupando a escola em protesto contra a PEC 241 aprovada por Temer, e após o
fato foram obrigados a desocupar mediante pressão das autoridades e do governo. Apenas após
o decorrer do acontecimento foi que o governo do estado demonstrou uma espécie de
preocupação perante o que se passava com os alunos, e é justamente nisso que a fala de Ana
Júlia, a estudante de 16 anos, se foca:
Vocês estão aqui representando o Estado, e eu convido vocês a olhar a mão de vocês.
A mão de vocês está suja com o sangue de Lucas. Não só do Lucas como de todos os
adolescentes que são vítimas disso. O sangue do Lucas está na mão de vocês, vocês
representam o Estado. [...] Eu peço desculpa, mas o ECA (Estatuto da Criança e do
Adolescente) nos diz que a responsabilidade pelos nossos adolescentes, pelos nossos
estudantes é da sociedade, da família e do Estado. (Apud BRUM, Eliane, 2016).
A escola pública, que fora abandonada por décadas pelo governo e seus
representantes, deposita na fala da estudante um peso aos deputados da assembleia. Eliane
Brum, jornalista que compôs a matéria sobre o caso, afirma “O deputado entendeu muito bem
11 Ministério das Mulheres, da Igualdade racial e dos Direitos Humanos. 12 Fundo de Financiamento ao Estudante do Ensino Superior, destinado pelo Ministério da Educação à financiar a
graduação de alunos em instituições não gratuitas.
32
que ela não se referia a mãos literalmente ‘sujas de sangue’ ou apontava uma relação direta com
a morte do estudante, mas estava, sim, chamando atenção sobre a responsabilidade
constitucional dos parlamentares em sua função pública”. A coragem da estudante mediante a
situação e a fala por ela composta, apesar de poderosa, infelizmente não surte o efeito desejado
nos governantes, e adiante não deixa de crescer o movimento neoliberal que parte em busca de
uma bancada ainda mais conservadora e privatista que a de Temer.
Desde o segundo mandato de Dilma, o país visivelmente passava por um momento
de ascensão da nova Extrema Direita que buscava derrubar a presidenta, e com o fim do
mandato de Temer logo não se esperaria menos do que a eleição daquele que se tornara o
símbolo representante do novo movimento extremista e radicalmente conservador, Jair
Bolsonaro. Nas eleições de outubro de 2018, foi eleito então o ex-deputado federal e ex-militar
filiado ao PSL, que foi recebido desde antes da tomada presidencial pelo movimento antifascista
e progressista Ele Não, que possuía como objetivo rejeitar a candidatura do ex-deputado.
A candidatura de Bolsonaro era desacreditada sobretudo devido aos escândalos
atrelados aos posicionamentos políticos do ex-deputado, que já tinha se manifestado
publicamente a favor de práticas antiéticas como a tortura – homenageando um dos maiores
torturadores da ditadura em pleito legislativo e convocando comemorações ao aniversário do
golpe militar de 1964 –, tido falas racistas, machistas e LGBTfóbicas. O candidato também
ficou conhecido nacionalmente por seguir e propagar as políticas ideológicas de Olavo de
Carvalho, um polêmico discursista anticomunista rejeitado pela comunidade científica e
filosófica por fomentar discursos de ódio contra minorias e absurdas teorias de conspiração.
O início do governo Bolsonaro já dava sinais ainda mais preocupantes para as
políticas sociais do Brasil, que se via diante de um presidente abertamente capitalista que
governava visando a concentração de lucros e riquezas para empresários e a alta sociedade. A
ameaça da privatização das estatais veio desde o princípio com as propostas do Ministro da
Economia – Paulo Guedes – de redução do estado, propostas essas que destituíam os
trabalhadores de seus direitos. Em fevereiro de 2019, o ano de posse do presidente, já havia
sido anunciada a proposta da Reforma da Previdência de Guedes e Bolsonaro, prevendo
aumento da idade mínima de aposentadoria tanto em setores públicos quanto privados e
mudando uma série de regras de contribuição.
Para Safatle (2019), a aprovação em primeiro turno da reforma da previdência fora
“a maior derrota da história da classe trabalhadora brasileira desde o início da ditadura militar”.
O filósofo e cientista social completa:
33
Enquanto a idade mínima para homens aposentarem passou para 65 anos, estados
como Maranhão, Piauí e Alagoas têm expectativa de vida masculina em torno de 67
anos. Nos bairros pobres da cidade de São Paulo, como Cidade Tiradentes, Jardim
Ângela, Anhanguera, Grajaú, Iguatemi a expectativa de vida varia de 54 a 57 anos.
Na verdade, 36 dos 96 distritos paulistanos têm expectativa de vida abaixo de 65 anos.
Ou seja, essas pessoas simplesmente não irão se aposentar mais. Elas estão
condenadas a parar de trabalhar apenas no momento em que se aprontarem para a
morte. (SAFATLE, Vladimir, 2019.).
O Ministério da Educação de Bolsonaro também já se consolidava desde o início
com um rigoroso perfil ideológico ao assumir como ministro Ricardo Vélez Rodriguez, um
discípulo Olavista altamente defensor do movimento Escola sem Partido e enaltecedor do
antigo regime militar brasileiro. O ministro, que ficou apenas 97 dias no cargo, participou de
alguns escândalos de alta repercussão, como o da criação de uma comissão de avaliação para a
prova do ENEM, que ficaria encarregada de censurar questões consideradas inadequadas ao
público, e o escândalo da reprodução e gravação do hino nacional nas escolas contendo slogan
da campanha de Bolsonaro, decisão que fora rapidamente recuada pelo MEC.
O segundo ministro da educação de Bolsonaro foi Abraham Weintraub, que tomou
posse dia 8 de abril de 2019, e ficou conhecido como o ministro do sucateamento da
universidade brasileira. O ministro iniciou seu mandato se posicionando a favor da diminuição
de verbas para três universidades federais brasileiras, a UFF, a UFBA e a UnB, alegando que o
“baixo desempenho” das instituições era devido ao que ele se referia como “balbúrdia”.
Inicialmente, o corte seria de 30% das verbas originais e afetaria apenas estas determinadas
instituições, entretanto posteriormente a medida valeria para todas as instituições universitárias
da Federação como forma de congelamento, e seria retomado, segundo o ministro, a partir de
setembro do mesmo ano. Segundo Cislaghi, Cruz, Santos, Mendonça e Ferreira:
O discurso do MEC sobre os cortes é embasado pelo combate ideológico nas
universidades, às “balbúrdias”. O objetivo real, no entanto, é garantir o cumprimento
da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), a meta de superávit primário e o teto dos
gastos imposto pela EC 95/2016. Os dados orçamentários revelam que se trata de uma
escolha orientada pela política macroeconômica do atual governo, alinhada a um
aprofundamento da perspectiva neoliberal. Isso fica evidente ao expormos os dados
oficiais de forma mais ampliada. Os 46 bilhões da função educação representam
4,7% do Orçamento Geral da União enquanto a função “encargos especiais”, que
representa o refinanciamento, as amortizações e serviços da dívida interna e
externa somam um total de 374,1 bilhões de reais, representando um impacto
de 38,63% no Orçamento Geral da União(Siga Brasil, 2019). (CISLAGHI, CRUZ,
SANTOS, MENDONÇA e FERREIRA. 2019).
Os cortes de Weintraub afetaram grandiosamente a vida dos estudantes, que tiveram
bolsas de pesquisa e estudos do CAPES e do CNPq encerradas. Junto com as bolsas, outros
tipos de segmentos vinculados às instituições superiores como os Restaurantes Universitários e
34
as Assistências Estudantis também foram impactados, e em certas instituições foram
completamente parados pela falta de verba. Os ocorridos novamente foram combatidos pelos
estudantes do país inteiro com manifestações sociais e greves na Universidade Federal em junho
de 2019, num movimento unificado com os trabalhadores que estavam protestando contra a
Reforma da Previdência. Em São Paulo culminou a maior manifestação do país com cerca de
300 mil participantes que lotaram completamente a Avenida Paulista.
Um ano depois, durante a atual pandemia de COVID-19, Bolsonaro e Weintraub
anunciaram uma Medida Provisória que permitia ao ministro escolher os novos reitores das
Universidades Federais, sem a necessidade de novas eleições. Segundo eles, seria dispensada
qualquer necessidade de consulta à comunidade escolar ou acadêmica, fazendo com que várias
universidades passassem pela intervenção do ministro que chegou a nomear inclusive reitores
que nem ao menos faziam parte do quadro das instituições. A comoção causada pela medida do
ministro desta vez não pode se mostrar tão grandiosamente como anteriormente, por conta das
medidas de distanciamento social adotadas como precaução à pandemia.
O ministro Weintraub deixa o governo ainda em junho de 2020, após polêmicas
relacionadas a crimes de injúria raciais cometidos nas redes sociais e ameaças feitas a ministros
do STF. O próximo ministro nomeado por Bolsonaro, Decotelli, nem ao menos chega a tomar
posse no MEC devido à descoberta de falsas informações no seu currículo poucos dias após
nomeação. O quarto nomeado, que toma posse ao cargo dia 10 de julho, é então Milton Ribeiro,
que permanece ativo até o momento da escrita dessa monografia. O novo ministro é, além de
professor, pastor e advogado, e tanto ele como Bolsonaro se posicionam contra o processo de
quarentena orientado pela OMS como medida de prevenção da pandemia de COVID-19 e
contra o processo de afastamento da educação presencial em todos os segmentos educacionais.
É através desta contextualização que pretendo gerar um entendimento ao leitor, que
talvez não tenha acompanhando intensamente da mesma forma que acompanhei as jornadas
estudantis através dos últimos anos, e lançar uma justificativa ao vídeo-ensaio político,
principalmente quando se trata de uma militância estudantil pró-educação. No Brasil pós
redemocratização da era militar, os avanços na educação são intensamente necessários para
toda a comunidade brasileira e, portanto, o sucateamento que vem ocorrendo após a ascensão
neoliberal extremamente capitalista é nocivo ao desenvolvimento da nação como um todo. O
filme ou o vídeo político de militância ou de denúncia serve não apenas como objeto de
resguarde e lembrança histórica, mas como uma forma de conscientização social uma vez que
amplia a informação e planeja sua distribuição aos olhos dos espectadores. A educação
35
brasileira deve ser lembrada e considerada, e a arte audiovisual pode ser sim um aliado a esse
objetivo. É a partir disso que vamos então à análise do filme Educação, de Migliorin e Pipano.
36
4 ANÁLISE FÍLMICA
A obra Educação é, acima de tudo, de um filme político que discute, através de uma
reunião de imagens de origens diversas, o tema de como as escolas públicas brasileiras foram
afetadas pelas medidas políticas comentadas no capítulo anterior, ocorridas no período durante
e após o golpe da presidenta Dilma Rousseff.
Para concepção da obra, os diretores trabalharam com a seleção de imagens
videográficas públicas que – em sua maioria – inicialmente não produziam qualquer sentido
ideológico de crítica à gestão governamental. O uso destas imagens, que anteriormente ao filme
já se encontravam acessíveis a qualquer telespectador pela televisão ou pela internet, permite
ao espectador crítico e aos próprios diretores chegarem a uma conclusão, já também abordada
por Pipano e Migliorin no capítulo do livro Cinema de Brincar no qual falam sobre o processo
do filme Educação: “o capitalismo não tem nada a esconder” (2019, p. 110). Isso porque, ao
assistir aos arquivos isolados fazendo jus ao uso inicial das imagens, chega-se a uma conclusão
totalmente distinta da trazida pela montagem do filme Educação, mas ao reorganizá-los pode-
se chegar a um ponto de vista crítico, simplesmente através do uso de uma montagem politizada.
Portanto, antes mesmo de Migliorin e Pipano se tornarem diretores, eles foram,
primeiramente, espectadores críticos destes arquivos públicos utilizados pela mídia e pela
internet para estigmatizar a escola pública brasileira. Para Consuelo Lins (2010), é exatamente
neste momento de discernimento do caráter dessas imagens que Migliorin e Pipano realizam
uma interferência pessoal, e transformam-se então no que seria o espectador-montador, aquele
que cria a própria versão do que experimentou da imagem. Ao anunciar que o capitalismo nada
tem a esconder, os autores então já deixam claro que qualquer outra interpretação da imagem é
passível, desde que haja uma mínima noção crítica no imaginário do espectador. O que eles
fazem, portanto, é meramente estimular este pensamento através da montagem trazida pelo
filme Educação.
Para Negri e Hardt (2014), o sujeito midiatizado – que nesta ocasião, seria
especificamente o espectador da montagem de Educação – tem suas barreiras da percepção
completamente borradas, tornando-se, portanto, incapaz de compreender por si só as
interpretações possíveis que estão implícitas na imagem. Isso torna-os sujeitos absortos na
mídia comunicativa, distanciando-os de quaisquer afetos políticos. É por isso então que na
pedagogia da montagem de Migliorin e Pipano, cria-se, através da reunião dos arquivos brutos
e da comparação entre as imagens – quando um plano conversa com o outro – , uma didática
37
capaz de colocar o telespectador em um profundo momento de reflexão, momento este que se
mostra capaz de inserir e transmitir a crítica trabalhada pelos diretores-montadores.
Na conversa trazida sobre o filme no livro Cinema de Brincar, os diretores-
montadores afirmam que, apesar da obra em sua totalidade apresentar uma função política ao
desmontar e remontar a razão das imagens, a crítica foi criada para não ser explicitada no filme
como seria em um cinema propriamente militante. Segundo eles, esse caminho foi optado por
duas hipóteses: “a primeira, é que não poderíamos perder espectadores que se distanciam de
nós, ética e ideologicamente. A segunda é que o espectador deveria ser convidado a se perguntar
sobre cada sequência do filme: como me posiciono diante do que o filme mostra?” (2019, p.
112). Essa didática se torna especialmente interessante ao analisarmos que, de fato, pessoas que
não possuem uma ideologia política militante – ou que simplesmente não compactuam com
qualquer diálogo político que tenha uma mínima intenção progressista – se afastariam
prontamente de assistir a obra. Entretanto, ao se abster de um posicionamento ideológico inicial,
e ao mesmo tempo promover um estranhamento causado por imagens chocantes e
constrangedoras utilizadas pela mídia e promovidas pelos governantes da época, os diretores-
montadores propõem um exercício mental que interroga e leva o espectador a pensar “será que
realmente compactuo com estas posições imorais?”.
Para Consuelo Lins (2010), este seria o princípio da criação de um espectador
emancipado, onde o diretor infunde algumas poucas pistas para guiar o espectador a estabelecer
sua própria verdade, que, nesse caso, ocorre por meio da dissociação da imagem (promovidas
por Migliorin e Pipano) e da provocação de um pensamento analítico no espectador. Para Negri
e Hardt (2014), é neste processo também que há a quebra da pós-verdade, que é aquela
produzida inicialmente nos “arquivos brutos” retirados diretamente da mídia televisiva. A
violação do “feitiço” criado pela televisão acaba, portanto, renovando a potência daquela
imagem e rompendo o domínio dos autores envolvidos na própria fabricação desta imagem
(MIGLIORIN, PIPANO, 2019).
Tanto nesta monografia como na literatura de Migliorin e Pipano, por vezes
tratamos a obra Educação como “filme” de maneira a simplificar seu entendimento para todos
os espectadores e leitores, entretanto é mais do que claro após as discussões promovidas nos
capítulos anteriores que a definição correta para a obra é de um vídeo-ensaio, sendo a
videografia aqui definida enquanto uma imagem captada com fins televisivos e/ou amadores, e
o ensaio sendo uma modalidade reflexiva do cinema praticada através de uma filosofia
conceitual, que vai muito além de uma representação ficcional de histórias com personagens ou
de uma obra estritamente documental. Tanto o vídeo como o ensaio remetem aqui a uma
38
aproximação com o trabalho de experimentalistas como Godard e Varda e da vanguarda da
videoarte, mas também é importante citar que a ideia dos autores de Educação de trabalhar com
um formato artístico que remonta o tempo-espaço e se apropria e destrói os signos originais da
coisa se assemelha também com o trabalho do artista brasileiro Hélio Oiticica, da vanguarda da
antiarte.
Oiticica (1986) constrói em sua conceptualização para a antiarte um ideal
subversivo para com as grandes mídias ditadoras da estética, buscando ser totalmente
experimental e fora do convencional apropriando-se de infinitas fontes e referências para tornar
da arte um objeto a ser vivenciado, não contemplado. O artista ao longo dos anos 60 formulou
o que chamou de Esquema Geral da Nova Objetividade, que se constituía em um estado não
dogmático e esteticista da obra de arte no movimento antiarte, relacionando o estado da arte
com a linguagem cultural e política brasileira ao mesmo tempo que propunha uma arte
formulada pelo coletivo. Importante também relacionar o esquema de Oiticica à obra Educação
justamente por conta do fator político, já que ele ressaltava especialmente a importância do
artista em se envolver não apenas com fatores estéticos e sim com “os acontecimentos e
problemas do mundo, consequentemente influindo e modificando-os” (OITICICA, 1967).
Em Educação, além de uma clara tentativa de influir na política ou então ao menos
na visão que a sociedade possui sobre ela, há também através da pedagogia atribuída à obra
uma tentativa de educar e impactar o telespectador. Com o distanciamento em relação ao
cinema comercial e a aproximação do cinema experimental, os autores promovem também um
uso diferenciado das técnicas cinematográficas de montagem e edição, pois apoiam seu trabalho
inteiramente no ato da apropriação e do deslocamento da imagem. Diferentemente de Godard,
por exemplo, que usava da videoescrita como tática de embelezamento até mesmo em suas
obras ensaísticas e experimentais, os autores de Educação não atribuem quaisquer efeitos
cinematográficos de edição ou montagem aos arquivos da obra. O filme nada mais é do que um
agrupamento de recortes, sem transições entre planos, sem técnicas complicadas, sem trilha. A
única interferência feita é a da apropriação, do recorte e da reorganização, se assemelhando
então completamente ao conceito do Ready-made utilizado por Duchamp, onde a arte ocorre
através do deslocamento de uma peça pronta cuja finalidade prática inicial não possuía nada de
artístico.
Talvez por isso gere tanto estranhamento em um espectador de primeira viagem ao
experimentalismo audiovisual. Quem em sã consciência pararia para assistir reportagens,
propagandas e imagens amadoras sobre a educação brasileira? Tal como explicitei na fala de
Consuelo Lins no início do capítulo anterior, esse exercício torna-se imensamente
39
circunstancial, pois tratam-se de imagens de um “bem comum” (DIDI-HUBERMAN apud
LINS, 2013) que apenas sob novos olhares podem alcançar um novo significado. Novamente,
é apenas através da recontextualização promovida pela montagem de Migliorin e Pipano que o
filme se empossa deste caráter político artístico.
Em seu livro Cinema de Brincar, os autores revelam o motivo da escolha da não
interferência na imagem apropriada: “a diferença do falar naturalizante que se dá no jornalismo
e na mídia como um todo, aqui, tanto o deslocamento para a sala de cinema, quanto a montagem
com outros discursos, nos convidam efetivamente a ouvir e problematizar o que é dito” (2019,
p. 116). Ou seja, o ato que eles mesmos denominam de “montar e deixar falar” (2019, p. 117)
ocorre estritamente para repararmos sozinhos na problemática dos discursos escolhidos que
parecem um tanto quanto ordinários no seu formato original.
Analisaremos a seguir, então, aquilo que nos é trazido pelas imagens remontadas
pelos autores numa tentativa de entender o que acontece ao longo do filme Educação e como
se dá a experiência de vivenciamento e contemplação desta obra.
Em primeiro momento, a montagem de Migliorin e Pipano exibe um vídeo que
parece ser extraído de uma gravação amadora da internet, que mostra a ação do estado numa
tentativa de intervir em uma ocupação escolar. Ao escrever sobre esta cena, os diretores-
montadores explicam que “este impressionante plano-sequência de 30 minutos é dividido no
filme em três partes. Em nossa montagem, ele é o primeiro e o último plano, além de aparecer
na metade do filme” (MIGLIORIN, PIPANO, 2019, p. 113). A mulher que aparece em cena é
uma oficial de justiça e parece buscar um diálogo com as crianças que se encontram dentro da
escola, informando-as que um juiz de direito decretara o fim da ocupação e a retomada das
atividades escolares. Disso, corta-se a cena para o que parece ser uma propaganda educativa
que discute o que seria uma técnica didática para estabelecer debates em sala de aula. Apesar
da professora seguir a didática, a dinâmica não parece surtir um efeito positivo. Muito pelo
contrário, os alunos respondem-na com extrema monotonia. A cena contrapõe-se imensamente
à próxima, que revela um aluno em uma discussão com plena eloquência e conhecimento dos
seus direitos discutindo em uma intervenção de um policial fardado na escola ocupada. Aqui,
como também em outros momentos adiante do filme, é dado ao espectador a chance de
presenciar um diálogo entre takes, estes que por sua vez não são oriundos da mesma fonte e da
mesma perspectiva, entretanto o contato entre as mise-en-scène fornece uma tensão e um
questionamento acerca do que está sendo mostrado. Migliorin e Pipano propõe ao espectador:
será que faz mais sentido engajar-se na imagem de um tutorial autoritário e completamente
falho, ou na imagem da criança que se contrapõe ao estado em busca dos seus direitos?
40
Logo após, vemos uma entrevista com Herman Voorwald, ex-secretário da
Educação do Estado de São Paulo, justificando a escolha das novas medidas para a educação
do estado em “dados”, numa montagem que parece se repetir infinitamente, sem exibir
quaisquer fontes que apresentem quais são estes supostos dados. Não se sabe ao menos quais
são os dados e o que se dá nos dados argumentados pelo secretário. É reforçado e escrachado
na montagem a falta desta informação, que nunca chega a público.
Em seguida, aparece o que é potencialmente um dos planos mais chocantes da obra,
um extrato de uma reportagem assinada pela rede Globo de televisão, que apresenta os alunos
e as escolas retratando-os com tamanha marginalidade e distanciamento que se assemelha a
uma prisão. Não que seja cabível ao ambiente carcerário este tipo de retratação, entretanto as
imagens de crianças em silhuetas, com cadeados e grades ao fundo ou em primeiro plano
enfatizam o quanto a mídia criminalizava estes adolescentes, dessensibilizando o espectador de
qualquer empatia para com as crianças, que, naquela situação, não passavam de vítimas de mais
um ataque do governo contra a escola pública. A próxima reportagem, que provém da rede
Record, apresenta novamente uma estética criminosa dentro das escolas, exibindo novos
circuitos de monitoramento de segurança e vigilância protegidos por grades, sistema adotado
para supostamente fornecer “suporte ao professor” na sala de aula e na escola em si.
Continuando, vemos um compilado de cenas que abordam desde entrevistas com
pessoas como João Dória (ex-prefeito da capital e atual governador do Estado de São Paulo) e
Aloizio Mercadante (ex-ministro da Educação) assim como reportagens jornalísticas que
abordam comumente o tema da necessidade da digitalização da educação, e sobre como os
profissionais educadores necessitam acompanhar as novas tecnologias propostas pela geração
do futuro. É exibido uma reportagem sobre um jogo falsificado em distribuição nas redes
escolares do Rio, que conversa com uma cena de novela onde dois alunos são pegos em
flagrante por terem feito algo na escola. O jornal então anuncia a volta dos protestos contra a
reorganização das escolas públicas e divulga a prisão de cinco estudantes.
A cena da oficial de justiça retorna, e dessa vez ela aparece com um conselheiro
tutelar interrompendo a fala dos estudantes, novamente falando da decisão de um juiz para
interromper a ocupação na escola filmada. Os alunos retrucam, afirmando que desocuparão
pacificamente no momento que forem ouvidos, e ela responde falando que a intenção é que
desocupem, sim, pacificamente, caso contrário o estado utilizará da força para realizar a
desocupação dos menores.
Novamente observamos uma cena do mesmo segmento de tutorial de técnicas
didáticas. Então, uma propaganda de ensino a distância, seguida de uma conversa no jornal
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alegando ser o FIES o melhor financiamento estudantil até então, para depois ser desmentido
pela presidenta Dilma, numa entrevista em que alega que foi cometido um erro ao passar o
controle do FIES ao setor privado.
Aparece então um compilado de propagandas de financiamento privado e
reportagens e entrevistas com grupos de educação privados, cujos entrevistadores e
entrevistados tratam como apenas um business, uma mera empresa movida pelo capital como
qualquer outra, procurando discutir como elevar seus lucros e subir seu negócio, relembrando
então a discussão proposta ao fim do capítulo anterior sobre as crescentes privatizações
adotadas nos governos conservadores.
Somos atingidos, em seguida, com uma cena do então senador Magno Malta em
2011, falando publicamente no plenário sobre como o suposto “kit homossexual”13 tornaria as
escolas “verdadeiras academias de homossexuais”. Em seguida, vemos em uma entrevista o ex-
secretário da Educação do município de São Paulo, Cortella, explicando ao entrevistador a
diferença entre escolarização e educação. No próximo take, Lucas Koka Penteado, personagem
importante na luta secundarista presente também no filme documentário Espero Tua (Re)volta,
aparece tentando entrevistar uma repórter, que foge alegando que não irá se posicionar.
A montagem exibe mais duas entrevistas vexaminosas com representantes do
movimento Escola Sem Partido, uma reportagem sobre os chips de localização inseridos nos
uniformes de estudantes na Bahia e outra sobre a militarização das escolas, para então retornar
à cena da oficial de justiça novamente na escola.
O que sucede a seguir é muito emocionante. A câmera foca em um papel que
alguém trouxera para a oficial de justiça, mostrando que os estudantes possuem um prazo de
mais 10 dias para concessão do efeito suspensivo. A oficial então avisa: hoje, a polícia não virá,
e caso haja depredação da escola, os pais serão responsabilizados. A câmera vira e revela então
os estudantes, todos sentados organizadamente atrás das grades chaveadas da escola. Cada um
com um cartaz de protesto, em silêncio. Eles sabem que a escola não será depredada. Significa
então, mais uma vez, que naquele momento os estudantes venceram.
Ao assistir Educação, entendemos então que a abordagem dos diretores-
montadores se dá por aproximação. Não existe uma linha cronológica, uma continuidade, e sim
uma estratégia que se desloca através de múltiplas similaridades nos discursos providenciados
pelas mais diversas pessoas. A tensão criada na separação das cenas da oficial de justiça frente
13 Oficialmente conhecido como programa Escola sem Homofobia. Uma iniciativa governamental para educar as
escolas contra a homofobia, através de um material didático distribuído em formato de cartilhas pelo MEC.
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à escola designam uma grande inquietação à obra. O ato corajoso de “montar e deixar falar”
(MIGLIORIN, PIPANO, 2019, p. 117) dos diretores perante as falas homofóbicas ou gestos de
militarização da educação e chipamento estudantil permite ao espectador entender por si qual a
gravidade de cada acontecimento. A tática sempre foi de que as imagens falassem por si, de
forma a fazer o objeto se autorrevelar na sua intenção. A montagem de Migliorin e Pipano não
foi um enfrentamento, então, mas sim uma revelação, carregada de peso, originalidade e
política.
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5 CONCLUSÃO
Acredito particularmente que todas as pessoas que se envolvem com arte têm certa
preocupação em politizar sua linguagem. Nesta pesquisa, me pareceu mais do que claro como
os meios artísticos, sejam lá das quais infinitas esferas existentes, se tornam um vetor fortíssimo
para a transmissão destas mensagens pessoais que sempre acabam por tomar partido – queiram
ou não – de algum assunto qualquer. No caso do filme Educação, onde encontramos uma
narrativa política exclusiva do contexto brasileiro, conceitua-se uma obra de extrema
importância sociológica para a atualidade, que debate não apenas a ocasião política da ocupação
nas escolas entorno do contexto da época, como também questiona a veracidade da informação
que acomete uma sociedade do cansaço, totalmente anestesiada, na era da pós-verdade.
Os potenciais criativos são extremamente diversificados quando tratamos de uma
montagem experimental no meio audiovisual, e para o processo escolhido por Migliorin e
Pipano de ressignificação da imagem – principalmente no sentido político – há necessidade de
um vasto embasamento sobre o contexto a qual se busca remeter a fala. É interessantíssimo
pensar, como os autores da obra observaram, que especificamente estes recortes por eles
escolhidos conseguiriam se autodifamar apenas imaginando uma separação do seu contexto
original, dando à montagem um grande potencial discursivo.
A recapitulação que a obra traz acerca do tema da luta estudantil secundarista e
universitária pela redemocratização do espaço escolar público é de extrema importância
também para o ano de 2020 em que concluo essa monografia, no qual passamos por uma
redefinição do espaço acadêmico onde o ensino se tornou completamente digital devido à
pandemia de COVID-19, passando a se tornar novamente excludente para as classes mais
dependentes da sua acessibilidade. Assim como em 2016, há uma grande parcela de estudantes
– principalmente provindos da educação pública – que foram afetados com a decisão de alguns
governos de seguir com o ensino digital, devido ao fato de frequentemente dependerem da
própria disponibilidade da universidade pública para obterem acesso a computadores e/ou
internet. Esse problema se relaciona também fortemente com o projeto neoliberal do governo
Bolsonaro, que busca elitizar a educação já que apenas um perfil socioeconômico é capaz de
arcar com os dispositivos online que se mostram completamente obrigatórios para a obtenção
de qualquer contato entre aluno e docente.
Nesse contexto, a luta estudantil que se formava desde 2016, com a união dos
secundaristas e universitários, também passa por um processo de rebaixamento, dispersão e
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extinção, visto que grande parcela dos estudantes que se afastaram da sua cidade natal para
obter acesso à educação pública perderam seus sustentos vinculados à universidade (em
modalidades como bolsas de pesquisa e estágios internos) e foram obrigados a migrar de volta
a estes ambientes. Portanto, acredito que diante dessa situação o filme questiona ainda como
pode ser feita uma nova possibilidade de luta para redemocratização do sistema de ensino
brasileiro em um momento em que há tanta gente dependendo deste espaço para estudar e viver,
levando em conta o aumento da discrepância social que essa nova era política está acometendo
aos jovens.
Por isso afirmo, então, que a pesquisa feita em torno do filme Educação, que
acomete tanto discursos políticos quanto artísticos, não se resume e não se finda inteiramente
tanto na obra de Migliorin e Pipano como nessa monografia. Os próprios processos políticos
que ocorrem no país atualmente são uma prova de que a arte brasileira – que sempre foi uma
arte de resistência – ainda tem muito o que dizer sobre os transtornos deste momento. Acredito,
também, que os estudantes ainda protagonizarão importantíssimas lutas no cenário nacional, e
darão espaço com a criatividade da juventude para novos combates histórico-artísticos.
Enquanto houver política, haverá arte.
45
REFERÊNCIAS
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204.
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